do recinto externo ao santuário interno

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o trajeto da alma segundo a visao esoterica

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DO RECINTO EXTERNO AO SANTURIO INTERNO

Annie Besant

A par de sua atividade como lder de muitos movimentos de cunho social,

Annie Besant (1847-1933), autora de mais de 300 livros e panfletos, desenvolveu

intensa atividade junto Sociedade Teosfica, da qual tornou-se a segunda

presidente mundial.

Muitos de seus trabalhos tiveram origem em conferncias proferidas em suas

longas viagens pelo mundo, analisando temas que serviram de inspirao e

orientao para milhares de pessoas vidas por descobrirem o sentido da vida.

Igual origem tiveram os cinco captulos aqui reunidos sob um ttulo geral --

Do Recinto Externo ao Santurio Interno -- nos quais Annie Besant descreve a

jornada da evoluo humana e mostra a trilha ao longo da qual a humanidade

caminha lentamente rumo ao Templo, que a sua meta, explicando o porqu dessa

caminhada e as razes da sua extrema lentido.

EDITORA PENSAMENTO

1

Sobre a autora:

Nascida em Londres em 1847, a dra. Annie Besantassumiu em 1907, nessa mesma cidade, apresidncia da Sociedade Teosfica,prosseguindo, a, seu glorioso apostolado em prolda justia e da verdade, porm sob um prismamais translcido e delicado, onde operou atransmutao de seus princpios como livre-pensadora. Alis, no somente nesse campodesempenhou papel de destaque, como tambmem outras atividades, como escritora,administradora, instrutora e educadora. Aeminente tesofa sempre encontrou tempo paratrabalhar em qualquer setor construtivo.A orientao intelectual e espiritual ministrada aoento jovem pensador Krishnamurti, hoje nomeuniversalmente conhecido e cujas idias vm hlongos anos revolucionando o vasto campo dafilosofia, tambm esteve a cargo da dra. Besantque, dessa forma, pde efetivamente contribuirpara a formao do esprito do filsofo hindu aquem muitos devem a descoberta de novoshorizontes no campo do espiritualismo.

Pea catlogo gratuito EDITORA PENSAMENTO Rua dr. Mrio Vicente, 374 Fone: (0XX11) 272-1399 Fax: (0XX11)272-4770 E-mail: [email protected] http://www.pensamento-cultrix.com.br

2

DO RECINTO EXTERNO

AO

SANTURIO INTERNO

3

ANNIE BESANT

DO RECINTO EXTERNO

AO

SANTURIO INTERNO

Traduo

NAIR LACERDA

EDITORA PENSAMENTO

So Paulo

4

Ttulo do original:

From the Outer Court to the Inner Sanctum

Publicado originalmente pela The Theosophical Publishing House

Edio O primeiro nmero esquerda indica a edio, Ano reedio, desta obra A primeira dezena direita3-4-5-6-7-8-9-10-11 indica o ano em que esta edio ou reedio foi 01-02-03-04-05-06 publicado.

Direitos de traduo para a lngua portuguesa adquiridos com exclusividade pela EDITORA PENSAMENTO LTDA. Rua Dr. Mrio Vicente, 374 - 04270-000 - So Paulo, SP Fone: 272-1399 - Fax: 272-4770 E-mail: [email protected] http://www.pensamento-cultrix.com.br que se reserva a propriedade literria desta traduo.

Impresso em nossas oficinas grficas.

5

ndiceI. PURIFICAO .........................................................................................................7II. O CONTROLE DO PENSAMENTO ......................................................................26III. A FORMAO DO CARTER .............................................................................46IV. ALQUIMIA ESPIRITUAL ......................................................................................66V. NO LIMIAR............................................................................................................85

6

I. PURIFICAO

Se nos fosse possvel colocar-nos, em pensamento, num centro do

espao, do qual pudssemos ver o curso da evoluo, e estudar a histria da nossa

cadeia de mundos, tal como podem ser vistos pela imaginao mais do que pelo

aspecto que apresentam, poderamos interpretar o todo num quadro. Vejo uma

grande montanha situada no espao, com um caminho que vai girando em torno

dela at atingir seu pice. As voltas que esse caminho d so sete, e em cada volta

h sete estaes onde os peregrinos ficam durante algum tempo. Dentro dessas

estaes eles tm de subir, volta por volta. Quando traamos o caminho que sobe

por aquela trilha em espiral, vemos que ele termina no topo da montanha, e leva a

um majestoso Templo, como que feito de mrmore, de uma brancura radiante, e

que ali se ergue, cintilando contra o azul etreo.

Esse Templo a meta da peregrinao, e os que esto no seu interior

terminaram o seu percurso -- no que se refere montanha -- e ali permanecem

apenas para auxiliar os que ainda esto subindo. Se observarmos o Templo mais

atentamente, constataremos, ao tentar ver a sua construo, que ele tem, ao centro,

um Santo dos Santos. Em torno desse centro esto os quatro Ptios, circundando o

Santo dos Santos como crculos concntricos. Todos esto dentro do Templo.

Uma parede separa cada Ptio do que lhe contguo, e para passar de

um Ptio para o outro o caminhante deve atravessar uma porta, apenas uma em

cada parede circundante. Assim, todos os que alcanarem o centro tero de passar

por aquelas quatro portas, uma por uma. Fora do Templo ainda h outro recinto

fechado -- o Ptio Externo -- e esse Ptio acolhe muitos peregrinos, mais do que

os que esto dentro do Templo propriamente dito.

-

7

Olhando para o Templo e para os Ptios, e para o caminho que sobe em

espiral pela montanha, vemos esse quadro da evoluo humana e a trilha ao longo

da qual a raa est caminhando, bem como o Templo, que a sua meta. Ao longo

daquele caminho que d voltas montanha, vasta massa de seres humanos vai de

fato subindo, mas subindo vagarosamente, passo por passo. s vezes, tem-se a

impresso de que cada passo para a frente corresponde a um passo para trs, e

embora a tendncia de toda aquela massa seja para subir, a ascenso to lenta

que os passos mal se fazem perceptveis.

Esta evoluo enia da raa, subindo sempre, parece to lenta,

extenuante e dolorosa que nos perguntamos como podem os peregrinos ter nimo

para subir durante tanto tempo. Dando voltas montanha, milhes de anos se

passam, e na marcha de milhes de anos o peregrino segue. Enquanto ele caminha

por ali durante esses milhes de anos, uma infindvel sucesso de vidas parece

passar, todas despendidas na subida. Cansamo-nos s de observar as imensas

multides subindo to lentamente, caminhando, volta por volta, na escalada daquela

estrada em espiral. Observando-as, indagamo-nos: "Por que sobem com tanto

vagar? Por que esses milhes de homens empreendem uma viagem to longa? Por

que se esforam por alcanar aquele Templo situado l no pice?"

A marcha se nos afigura muito lenta porque eles no vem seu ponto de

chegada, a sua meta, e no percebem em que direo esto viajando. Observando

alguns caminhantes, vemos que esto sempre se desviando para os lados, atrados

para c e para l, sem qualquer propsito em seu caminhar. No andam diretamente

para a frente, atentos ao que fazem, mas perambulam, como crianas, correndo

atrs de uma flor ali, tentando apanhar uma borboleta acol. Assim, temos a

8

impresso de que todo seu tempo desperdiado, e apenas um pequeno avano

chega a ser conquistado quando a noite cai sobre eles e o dia de marcha termina.

No parece sequer que o prprio progresso intelectual, lento como

tambm , torne o passo mais rpido. Quando observamos aqueles cujo intelecto

escassamente desenvolvido, eles do a impresso de que, depois de cada dia

vivido, mergulham no sono e dormem quase que no mesmo lugar que ocuparam na

noite anterior. E quando voltamos os olhos para aqueles que se mostram mais

altamente evoludos, no que se refere ao intelecto, tambm esses esto viajando

devagar, muito devagar, e a cada dia de vida parecem fazer pequeno progresso.

Olhando assim para eles, nosso corao sente-se fatigado com aquela subida, e

ficamos a pensar por que no erguem os olhos e entendem em que direo seu

caminho os est levando.

Agora, o Ptio Externo, que alguns dos caminhantes da vanguarda esto

alcanando, aquele Ptio Externo do Templo, d a impresso de que pode ser

atingido no apenas pelo caminho circulante, volta por volta, to longo em torno da

montanha, mas tambm por caminhos mais curtos que no a circundam, mas que

podem ser escalados diretamente pelos flancos, se o corao do viajante for

corajoso e suas pernas se mostrarem resistentes. Ao tentar ver como os homens

encontram um caminho mais rpido para o Ptio Externo do que aquele que vem

sendo trilhado por seus companheiros de viagem, parece que percebemos que o

primeiro passo dado para fora dessa longa espiral quando alguma Alma, que

talvez por milnios tenha estado viajando volta por volta, compreende, pela primeira

vez, o propsito da viagem, e vislumbra, por um momento, uma cintilao vinda do

Templo, l do pice. Porque aquele Templo branco envia raios de luz sobre os

flancos da montanha. De vez em quando um viajante levanta os olhos, afastando-os

9

das flores, das pedrinhas e das borboletas que esto pelo caminho, e aquela

cintilao atrai o seu olhar. Olha para cima, para o Templo, e, por um momento, ele

o v.

Depois desse momentneo relancear de olhos, nunca mais aquele

peregrino ser o mesmo, porque, embora apenas por um instante, compreendeu

quais eram a meta e a finalidade. Viu o pice rumo ao qual est galgando, e viu

tambm o caminho ngreme, mas muito mais curto, que sobe diretamente do flanco

da montanha at o lugar onde o Templo resplandece. Compreende, naquele

momento, que a estrada tem um nome -- "servio" -- e que os que enveredam pelo

caminho mais curto devem entrar atravs de uma porta, onde as palavras "Servio

do Homem" esto brilhando com letras douradas. A Alma compreende que, antes

de poder alcanar pelo menos o Ptio Externo do Templo, deve passar atravs

daquela porta e compreender que a vida feita para o servio e no para a auto-

procura, que a nica maneira de subir mais rapidamente faz-lo por amor dos

retardatrios, a fim de que o auxlio mais eficaz, vindo do Templo, possa ser enviado

ao encontro dos que vm subindo, o que de outra forma no seria possvel.

Essa viso no passou de um vislumbre fugaz, foi apenas um rpido olhar

ziguezagueante, porque os olhos foram colhidos por um nico dos raios de luz

dimanados do alto da montanha. H tantas coisas atraentes dispersas ao longo

daquela estrada em espiral, que o relancear dos olhos da Alma facilmente se deixa

atrair para elas. Mas, uma vez recebida aquela cintilao, existe a possibilidade de a

alma obt-la de novo, com maior facilidade. Quando a meta procurada, o dever e o

poder do servio lograram essa momentnea e imaginativa compreenso da Alma,

permanece ali o desejo de trilhar uma senda mais curta e encontrar o caminho que

leve diretamente, pelo flanco da montanha, ao Ptio Externo do Templo.

10

Aps aquela primeira viso, a Alma visitada amide pelos raios de luz,

cujo brilho vai se tornando cada vez mais intenso. Vemos que essas Almas, que

apenas por um momento reconheceram que h um escopo, um propsito na vida,

comearam a subir com maior resoluo do que suas semelhantes. Embora ainda

estejam dando voltas em torno da montanha, observamos que comeam a agir com

maior firmeza no que se refere s virtudes, e que se dedicam com maior persistncia

ao que reconhecemos como religio, essa religio que se esfora por ensinar-lhes

como podem subir, e como o Templo pode finalmente ser alcanado.

Essas so as Almas que se distinguem entre as suas semelhantes pela

sua diligncia e vigilncia. Elas caminham mais depressa, porque esto seguindo

uma direo que principiam a vislumbrar qual seja, e assim comeam, ainda que de

maneira imperfeita, a tentar viver com um propsito definido. Apesar de ainda mal

identificarem a natureza desse propsito -- porque tm dele mais uma vaga intuio

do que uma compreenso precisa -- ainda assim j no esto perambulando ao

acaso, de um lado para outro, s vezes um pouco para cima, s vezes mais para

baixo. Esto, agora, subindo deliberadamente pelo caminho em espiral, e a cada dia

seguem um pouco mais depressa, at se destacarem nitidamente frente das

multides pela espiritualidade de sua vida, pela prtica das virtudes e pelo desejo

crescente de serem teis aos seus semelhantes. Comeam a empreender seu

caminho para a vanguarda com maior celeridade, esto sempre buscando ajudar os

que as rodeiam e tentando impulsion-los mais depressa ao longo do caminho.

Em breve, com aqueles que, assim, esto amando e servindo, vir ao seu

encontro uma figura que bela, embora primeira vista seu aspecto seja severo.

Essa figura o Conhecimento, e ele sussurra-lhes algo sobre as condies

exigidas para um progresso mais rpido. A Religio, que os tem ajudado na prtica

11

das virtudes, , por assim dizer, a irm desse Conhecimento, como tambm o o

Servio do Homem. E os trs, reunidos, comeam a encarregar-se da Alma.

Por fim, uma alvorada mais brilhante se faz presente, e, com ela, a

identificao mais completa. E percebemos que a Alma comea a definir para si

mesma a finalidade da sua subida, no apenas sonhando com o futuro, mas

tornando esse sonho mais concreto em sua inteno. Veremos essa Alma

identificando o Servio como lei da vida. Agora, deliberadamente, desprende-se

suavemente dos seus lbios a promessa de ajudar no progresso da raa. Esse voto

o primeiro que a Alma faz, o de doar-se, s vezes, ao servio da raa -- um voto

que ainda no contm um propsito bem-definido, mas que j existe em embrio.

L-se, numa Escritura Antiga, que um dos Grandes Seres subiu pelo

caminho ngreme, e to rapidamente, que deixou para trs toda a sua raa,

encontrando-se sozinho frente de todos, simbolizando a primeira oferenda da

humanidade. Sobre ele, que posteriormente foi conhecido como o Buda, afirma-se:

"Ele aperfeioou seu voto, Kalpa aps Kalpa." A obra que iria coroar Sua vida teve

de iniciar-se com a promessa de Servio. Esse voto da Alma que vai uni-la aos

Grandes que j partiram, e produz, por assim dizer, o vnculo que a leva ao caminho

probatrio, o caminho que a conduzir para dentro, e, atravs do Ptio Externo,

para cima, para a prpria porta do Templo.

Por fim, aps muitas vidas de esforos, muitas vidas de trabalho,

tornando-se mais pura, mais nobre e mais sbia vida aps vida, a Alma revela

distintamente uma vontade que agora se faz mais forte. Quando essa vontade se

exprime como claro e definido propsito, no mais o sussurro que aspira, mas a

palavra que ordena, ento essa vontade resoluta bater porta que leva ao Ptio

Longo perodo de tempo, composto de perodos menores chamados Manvantaras, que, por sua vez,compreendem perodos mais curtos chamados Yugas. palavra snscrita. (N. T.)

12

Externo do Templo, com um toque que ningum poder recusar. Esse toque revela

a fora da Alma que est determinada a vencer, e aprendeu bastante para ter noo

da magnitude da tarefa que vai empreender.

uma tarefa que no pretende menos do que isso: separar-se da sua

raa, daquela raa que vai subindo, volta por volta, durante milnios, passando

ainda pelas rondas de um globo a outro, aquilo que conhecemos como a cadeia em

fatigante sucesso. Essa Alma corajosa pretende subir a mesma montanha em

apenas umas poucas vidas humanas; pretende, passo a passo, enfrentar a colina

em seu mais ngreme ponto, o caminho que a conduzir diretamente para cima, para

o prprio Santo dos Santos. Tarefa de tal grandeza que o crebro, ao pretender

enfrent-la, poder at vacilar.

Seria possvel afirmar que a Alma que se prope a tanto comeou a

compreender sua prpria divindade e a onipotncia que est dentro dela prpria

como em um relicrio. Empreender em poucas vidas o que a raa, como um todo,

vai realizando, no s quanto s raas que esto frente, mas quanto s rondas

que tambm esto no futuro -- fazer isso , certamente, tarefa digna de um Deus, e

a sua realizao significa que o poder divino est se aperfeioando dentro de uma

forma humana.

Assim, a Alma bate porta, que se abre para dar-lhe passagem, e ela

entra no Ptio Externo. Atravessa-o, passo por passo, at alcanar a primeira das

portas que levam ao Templo. Cada uma daquelas quatro portas uma das grandes

Iniciaes. Alma alguma pode caminhar para alm da primeira se no tiver aceito o

Eterno para sempre, se no tiver renunciado ao interesse pelas coisas meramente

transitrias que a rodeiam. Porque uma vez que a Alma, atravs da porta do

Templo, tenha adentrado um dos Ptios Interiores que ficam para alm dessa

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porta e conduzem ao Santo dos Santos, nunca mais poder sair dali. Aquela Alma

escolheu seu destino para todos os milnios vindouros, e est no lugar do qual

ningum sai, uma vez nele entrado.

A primeira Grande Iniciao faz-se dentro do prprio Templo. A Alma,

cuja evoluo estamos descrevendo, entretanto, ainda se encontra em preparao

naquele Ptio Externo do Templo, a fim de que em vidas futuras tenha a

possibilidade de galgar os sete degraus para a primeira porta, e ali esperar

permisso para atravessar o limiar do Templo propriamente dito. Qual ser, ento,

seu trabalho no Ptio Externo? Dali por diante, Como levar suas vidas, a fim de

tornar-se digna de bater porta do Templo? Esse o assunto que temos pela

frente.

Ao descrever esse Ptio Externo, talvez eu diga muita coisa que possa

parecer pouco atraente, at mesmo repelente. bastante difcil encontrar o caminho

para

O Ptio Externo, bastante difcil praticar a religio e todas as virtudes

que tornam a Alma humana preparada para, ao menos, bater porta desse estgio

externo. Os que ingressam nesse Ptio fizeram grande progresso no passado. Pode

ser, e ser, que para algum que ainda no tenha compreendido de maneira

definitiva a finalidade da vida, a vida que ali se leva se lhe afigure desagradvel.

Porque no Ptio Externo no h ningum que no se tenha devotado em definitivo

ao servio, que no tenha renunciado a tudo e que nada pea em troca, seno o

privilgio de servir. Reconheceram, de modo positivo, a natureza transitria das

coisas terrenas e aceitaram, da mesma forma, a tarefa que desejam realizar. Haver

muita luta, naquele Ptio Externo, porque muito precisar ser feito ali em curto

espao de tempo.

14

As divises que fiz desta tarefa so arbitrrias. No se trata de passos,

por assim dizer, atravs do Ptio, porque todas elas devem ser alcanadas

simultaneamente. Trata-se de um treinamento simultneo, no dividido em estgios,

como tive necessidade de dividir para clareza da explicao. Chamei essas divises

de "Purificao", de "O Controle do Pensamento", de "A Formao do Carter", de

"Alquimia Espiritual" e "No Limiar".

A Alma, no Ptio Externo, est ocupada com todo esse trabalho, em

todas as vidas que ali passa; essas tarefas devem, pelo menos parcialmente, ser

aprendidas antes que a Alma ouse enfrentar a porta do prprio Templo. Precisamos

compreender que no a perfeita realizao de qualquer desses passos o que a

Alma deve obter antes de alcanar a porta da primeira Iniciao; o que ela precisa

esforar-se, com algum sucesso, devendo compreender seu trabalho e realiz-lo

com diligncia. Quando o trabalho estiver perfeitamente realizado, a Alma estar no

prprio Santo dos Santos.

A Purificao, ento, deve ser parte do seu trabalho, a auto-purificao,

a purificao da natureza inferior, at que cada parte dela vibre em perfeita

harmonia com a superior. Tudo que pertence parte temporria do homem deve ser

puro para aquilo que chamamos personalidade, que no tem em si a individualidade

permanente, sendo apenas uma reunio de qualidades e caractersticas que o

indivduo assimila, ao longo de muitas vidas. Esses so os invlucros com que a

Alma se cobre e leva consigo vida aps vida; tudo quanto a individualidade

permanente rene quase sempre em torno de si durante a vida terrena, e disso

extrai a essncia, a fim de transfundi-la para seu prprio Eu, crescente e eterno.

A posio da Alma, nesse momento, quando entrou deliberadamente no

Ptio Externo e viu o trabalho que a espera, est muito bem simbolizada na frase

15

usada pelo Sr. Sinnett: "Submisso ao Eu Superior." Isso significa deliberada

deciso de pr parte tudo o que temporrio e pertence personalidade inferior.

Cada vida a ser vivida nesse mundo inferior deve ser devotada ao propsito nico

de reunir material til, que ento pode ser entregue ao Superior, que vive e cresce

com aquilo que o Eu inferior rene. O Eu inferior compreende que seu nico

trabalho no mundo servir de agente ativo e temporrio, cujo papel acumular tudo

o de que o Eu permanente necessita. A sua essncia pode, assim, construir a

individualidade sempre crescente, que superior personalidade de uma vida. A

"submisso ao Eu Superior" significa o reconhecimento, pelo Eu inferior, do servio

que lhe cabe, o viver no mais para si mesmo, mas para o fim do servio que deve

suportar. Toda a vida no Ptio Externo tem de ser essa vida de positiva fidelidade

ao Eu Superior, que agora compreendido como o verdadeiro Eu, que deve

permanecer atravs dos tempos.

Os leitores talvez se recordem de terem lido em um dos Upanishads que

se um homem quiser encontrar a Alma, a primeira coisa a fazer "abandonar o mau

caminho", mas presumo que a Alma tenha feito isso ainda antes de entrar no Ptio

Externo, porque os que ali entram j no esto sujeitos s tentaes mais comuns

da vida terrena, j as superaram. Quando chegam encarnao que os levar ao

Ptio Externo, pelo menos tero se desviado do mau caminho e deixado de trilh-lo

prazerosamente. Se forem encontrados em tal caminho, porque sofreram um

sbito escorrego, imediatamente controlado, nasceram com uma conscincia que

se recusa a deix-los errar, quando o bem est diante deles. Embora a conscincia

possa agir erradamente, s vezes, pouco antes de entrar no Ptio Externo, e

mesmo depois de ter ali entrado, ela ainda desejar, de uma forma ardente, escolher

Livros sagrados hindus do sculo VI a.C, posteriores aos Vedas. (N. T.)

16

o bem. As almas que ali entraram tm o desejo deliberado de agir da melhor

maneira possvel.

Agora tero de tratar, no com as grosseiras tentaes do mundo exterior,

mas com as sutis e mais penetrantes tentaes que chegam alma, quando ela tem

de viver to rapidamente atravs de suas vidas, quando tem de subir com tanta

rapidez pelo flanco da montanha. No tm tempo a desperdiar desviando-se de

tentaes, formando as virtudes lentamente. Devem subir, para a frente e para cima,

sempre.

Essas almas ver-se-o envolvidas por dificuldades intelectuais --

tentaes de ambio intelectual, de vaidade intelectual, tentaes de se orgulhar

pelo que assimilaram, e de agarrar-se firmemente, por amor de si prpria, ao que

obtiveram. No s iro sentir o forte apelo da ambio que mantm tudo para si e

constri uma parede entre elas prprias e os que esto abaixo, mas tambm sero

acometidas pelo desejo do conhecimento, conhecimento para si mesmas,

conhecimento do que podem ganhar e manter, que dispe mais contra o mundo do

que a favor dele.

Essa tentao assume o disfarce de amor ao conhecimento em si mesmo,

amor verdade por ela prpria. Muitas vezes a Alma chega a descobrir, medida

que sua viso se torna mais aguda e clara, que essa suposta aspirao ao amor

apenas o desejo de estar separada de seus semelhantes, de possuir o que eles no

podem compartilhar, de gozar o que no se lhes d. A separatividade um dos

grandes perigos da Alma em crescimento, o orgulho da separatividade e o desejo

de estar separada, o desejo de crescer, aprender e obter um resultado, a fim de

poder possuir. Essa uma das tentaes que iro acomet-la, mesmo depois de ela

ter transposto a porta do Ptio Externo.

17

Em breve a Alma comear a compreender que, se quiser transpor o

Ptio Externo e alcanar a porta que est cintilando frente, deve despojar-se da

ambio e do orgulho intelectual, e de tudo que a separa de seus semelhantes.

Ento, comear a purificar sua natureza intelectual, a perscrutar os motivos que a

impelem ao esforo, a observar-se cuidadosamente luz que irradia atravs das

janelas do Templo e que inunda o Ptio Externo com as ondas da sua vida

espiritual. Sob essa luz, toda sombra parece mais escura, e mesmo as coisas que se

apresentam brilhantes no mundo inferior so vistas como sendo, afinal, sombras, e

no raios de luz.

A Alma compreende ento que essa natureza de desejo, que se mescla

com a intelectual, deve ser purificada de qualquer contato com o eu pessoal. E ela

comear, de maneira deliberada, o trabalho de purificao. Consciente e

firmemente, dedicar-se- ao trabalho de renunciar a tudo que procura obter para a

personalidade, tudo que tende, seja em que sentido for, separ-la dos que esto

abaixo, bem como dos que se acham acima. A Alma aprende -- e essa uma das

lies do Ptio Externo -- que h uma nica maneira para que as portas que a

separam do Templo se abram: demolir as paredes que a separam dos seus

semelhantes que esto mais abaixo.

Ento, as paredes que separam a Alma dos que esto frente

desaparecem, absorvidas, por assim dizer, pela sua ao, porque a porta que tem

de ser transposta s se abrir quando a Alma derrubar as paredes de sua prpria

natureza e estiver desejosa de partilhar com todos tudo aquilo que conseguir.

Assim, ela toma em mos o eu inferior, para expurg-lo de tudo quanto

seja pessoal. No deseja destruir, porque o que assimilou como experincia est

construdo em faculdades e transmutado em poder, e agora ela precisa de todos os

18

poderes que esteve amealhando. Deseja levar consigo esses poderes, mas lev-los

purificados e no poludos. Deve manter a essncia de todas as qualidades,

enquanto se afasta de tudo quanto seja pessoal. Deve levar consigo a essncia de

cada qualidade, porque isso o resultado de toda a sua subida pela montanha, mas

deve lev-la como ouro puro ao altar, e no como impureza mesclada ao ouro.

Tomemos uma ou duas dessas qualidades, a fim de vermos claramente o

que significa a purificao, porque se a compreendermos em relao a uma ou duas

qualidades, poderemos, ento, trabalh-la para as demais. Tomemos a qualidade

situada num estgio mais inferior, e que conhecemos como clera, ira, como esse

tremendo poder que o homem desenvolve, com o qual ele luta em seu caminho

atravs do mundo, com o qual combate, e pelo qual, muitas vezes, domina toda

oposio. Essa a tremenda energia da alma que irrompe da natureza inferior e

destri o caminho do homem atravs de dificuldades, no estgio inicial do seu

crescimento, at que ele tenha aprendido a gui-la e control-la. Essa energia

indisciplinada; e destrutiva, por ser indisciplinada; uma fora tremenda, valiosa

porque fora, embora destrutiva em suas aes, como vemos no mundo inferior.

O homem, antes mesmo de penetrar no Ptio Externo, j modificou de

alguma forma essa energia da Alma. Transformou-a em virtude, uma virtude muito

real, e por muito tempo manteve essa virtude no mundo externo. At ento ela

aparecia com o nome de nobre indignao, de paixo contra a injustia, de dio

contra tudo que injusto ou cruel. Esse homem prestou bons servios no mundo

exterior sob muitas formas de energia destrutiva, porque, antes ainda de chegar ao

Ptio Externo, esteve trabalhando no mundo. Quando via a crueldade com que

eram tratados os fracos, sua clera se insurgia contra isso; quando uma injustia era

perpetrada por um tirano, levantava-se contra ela, indignado. Aprendera, enquanto

19

praticava essa virtude, a depur-la de toda impureza. A clera que sentira no incio

da sua vida era clera por si prprio. Irava-se quando sofria uma injria, reagia no

mesmo tom quando algum o atingia. Mas de h muito dominara a ira simplesmente

bruta da sua natureza inferior, a ira que se defende de uma afronta atravs da

energia destrutiva, e retribui o mal com o mal e o dio com o dio. Aprendera, at

certo ponto, a transformar em si aquela energia colrica, purificando-a muitssimo

em relao ao elemento pessoal, e aprendera a indignar-se menos quando ele

prprio era injuriado do que quando uma outra pessoa sofria essa injria. Dessa

forma, usara a clera superior para dominar a inferior, a paixo mais nobre para

aniquilar a paixo animal da sua vida inferior. Lembrem-se de que ele era um

homem que de h muito reconhecera que o servio era um dever, e que uma das

formas de servio era a de exterminar os opressores e afastar os que estivessem

infligindo sofrimento.

Porm, na atmosfera mais calma do Ptio Externo, iluminada pelos raios

da absoluta compaixo, que chegam, cintilantes, do Santo dos Santos, no h

lugar para qualquer tipo de clera, embora essa clera seja depurada de

antagonismo pessoal. O aspirante, quela altura, deve aprender que os que se

comportam de modo errneo tambm so seus irmos, e sofrem mais em suas

aes injustas do que seus semelhantes pelo mal que eles lhes possam fazer. Deve

aprender que aquela nobre indignao que sente, que aquela paixo contra a

injustia no a caracterstica da Alma que se esfora em direo do Divino.

A Vida Divina ama todos os filhos que envia a este mundo, seja qual for

sua posio, seja qual for o grau da sua evoluo, por muito inferior que seja.

Porque o amor do Divino, de onde tudo emana, nada tem fora de si prprio. A Vida

Divina o mago de tudo o que existe, e Deus est presente tanto no corao do

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malfeitor como no corao do santo. No Ptio Externo, o Divino deve ser

reconhecido, no importando quo espessos sejam os vus que o escondem, pois

ali os olhos do Esprito abrir-se-o e no haver vus entre ele e o Eu dos outros

homens. Portanto, aquela nobre indignao tem de ser depurada de tudo quanto

seja clera, e transformada numa energia que nada marginaliza do seu mbito

auxiliador, amparando tanto o tirano como o escravo, e encerrando, no mesmo

abrao, tanto o opressor como o oprimido. Porque os Salvadores dos homens no

fazem acepo entre os que Eles devem servir -- Seu Servio no conhece

limitaes. Os que so servidores de todos no odeiam ningum no Universo. O que

antes era clera tornou-se, pela purificao, proteo aos fracos, oposio

impessoal aos grandes males, justia perfeita para todos.

E o que fez com a clera deve fazer com o amor. O amor comea a

manifestar-se na Alma sob seu aspecto mais pobre, sob seu aspecto inferior,

quando ela comea a progredir. Talvez sob o aspecto que s conhece a procura

exterior do outro, e que, em sua auto-satisfao, nem mesmo se preocupa com o

que acontece quela que amou. Quando a Alma se faz mais elevada, o amor

transforma seu aspecto, faz-se mais nobre, menos egosta, menos pessoal, at ligar-

se aos elementos superiores do bem-amado, em vez de ligar-se ao invlucro

externo. O amor, que era sensual, torna-se moralizado e purificado.

Esse amor deve fazer-se ainda mais puro quando o candidato entrar no

Ptio Externo do Templo. O candidato deve levar consigo o amor que perdeu seu

exclusivismo. o amor que deve manter seu fogo sempre ardendo, mais aquecido,

mas esse calor deve espalhar-se cada vez mais amplamente, e estar depurado de

tudo quanto se refere natureza inferior. Isso significa que o amor, dirigindo-se a

outros, procurar constantemente saber quanto poder dar aos outros, e no quanto

21

poder receber deles. Esse o amor que se ir tornando gradualmente Divino em

sua essncia, espalhando-se na medida em que for necessrio, mais do que na

riqueza da retribuio.

Enquanto a Alma se esfora por se purificar, tem de passar por provas

que lhe sero aplicadas durante todo o processo que ela est vivendo. Quando

trabalha usando sua energia, a fim de realizar algum servio, leva para esse servio

a espada de Ithuriel, a espada da ausncia de personalismo e responde ao seu

toque. Quando sua energia se dirige para realizar alguma coisa que a Alma

reconhece como boa, se, ao testar essa ao e seu motivo para empreend-la,

descobre que o "Eu" est sutilmente mesclado com essa energia, que est

buscando menos o xito do trabalho do que o sucesso de quem o faz, se lhe

acontece que ao ver esse mesmo trabalho realizado por outro sente certo

desapontamento mesclado ao clice de sua satisfao ao ver realizado o trabalho

que pretendia fosse seu, ento sabe que o personalismo ainda est presente. Se ele

fosse o que deveria ser, a Alma s se preocuparia com o xito do servio, e no

com o ter contribudo pessoalmente para esse xito. Se perceber que quando h

fracasso pessoal ainda sente a nota de desapontamento, algo que por um momento

obscurece sua paz e sua serenidade, ento a Alma compreende que ainda h uma

parte de personalismo que precisa ser eliminada. E pe-se ao trabalho de livrar-se

daquela fraqueza, e de afastar aquela sombra dos olhos da Alma.

Pode ser que ela descubra, ao medir e testar a natureza do seu amor,

que ali existem uma certa tibieza, um leve tom de desencanto, sempre que aqueles

aos quais serviu com nobreza, e amou grandemente, permanecem indiferentes ao

que ela lhes deu, que o fluxo externo do amor esteja inclinado a retrair-se, cessando

Ithuriel: o anjo que, no Paraso perdido, de Milton, era encarregado de procurar Sat, que entrara noParaso. O anjo estava armado de uma espada, cujo toque mais leve revelava o embusteiro. (N.T.)

22

seu curso, porque aqueles a quem ama no retribuem com amor. Ento, aquela

Alma -- to severa consigo mesma e to compassiva para com todas as outras

Almas -- sabe que ainda est trabalhando por alguma coisa para si prpria, e no

encontra sua mais alta alegria na simples glria de servir. Ento, dedica-se

novamente ao trabalho para purificar aquela parte de personalismo que ainda

permanece ali, at que o amor flua para o exterior, jamais desejando saber se h,

ali, uma resposta. Porque a Alma sabe que a necessidade de amor mais premente

onde no h resposta ao amor, e sabe que as Almas mais necessitadas de receber

amor so as que no retribuem, de modo nenhum, ao amor que as auxilia.

Dessa forma, a Alma trabalha de maneira deliberada para evoluir.

Deliberadamente, trabalha para si mesma, purificando sempre sua natureza inferior

com incansvel esforo e incessante exigncia. Est sempre de olhos fitos naqueles

que j atingiram a meta, sem olhar para baixo, para os que ainda esto apenas

subindo para o Ptio Externo. No pode repousar nem por um momento, no pode

estar jamais satisfeita, enquanto no se vir chegando cada vez mais perto da sua

meta, at que exista dentro de si menos oposio para dar passagem luz que vem

dos Sagrados que se tornaram Divinos.

No Ptio Externo as tentaes dos homens dirigem-se s suas virtudes,

no aos seus vcios. Tentaes sutis, que aparecem como anjos de luz, assaltam

sua natureza, vm atravs do que elevado, mais nobre neles, que j passaram

pelo ponto em que o vcio poderia conspurc-los ou tent-los. E s atravs da

mscara da virtude que a iluso poderia induzi-los, extraviando-os. Por isso que

aquelas Almas aprendem a ser to severas consigo mesmas, por isso que so to

exigentes no que desejam de si prprias. Sabem muito bem -- por suas prprias

faltas e pelas dos seus semelhantes -- que as virtudes, cuja perfeio difcil de se

23

obter no mundo inferior, so faclimas para os que j se encontram no Ptio

Externo. Elas so, por assim dizer, roubadas pelo inimigo, a fim de que aquelas

Almas recaiam em tentao. As Almas aprendem, assim, que a nica segurana

consiste em viverem iluminadas pela luz do Eu Superior. Por essa razo,

compreendem que no devem atrever-se a postar-se ante a Porta do Templo at

que a Luz brilhe, radiante, dentro delas. Por isso, elas se esforam continuamente

por se tornarem inteiramente translcidas.

Como ousariam expor-se luz que ofusca olhos impuros pela intensidade

de seus raios; que torna cheio de imperfeies o que chamamos virtude; para a qual

a beleza terrena fealdade e vulgaridade? Como ousariam entrar no Templo, sob o

olhar vigilante do Mestre, com a Alma nua, em Sua presena? Como se atreveriam

a permanecer ali, se no corao ainda h ndoa de imperfeio e, olhando dentro

desse corao, Ele encontraria mculas que ofendem a pureza do seu olhar?

Destarte, acontece que no Ptio Externo as coisas que so dolorosas no

mundo exterior se transformam em alegrias, e o sofrimento que purifica o amigo

bem-recebido. O modelo de todos os Iogues -- Aquele que dizem ser Ele Prprio

o Grande logue, o Mestre e Patrono de todos -- est sempre em terreno ardente,

e as chamas cercam sempre Sua presena, consumindo tudo o que tocam. Porque

no corao daqueles que esto no Ptio Externo ainda h lugares ocultos onde a

luz no chegou, e a purificao final, pouco antes que eles entrem no Templo, vem

das chamas vivas do prprio Senhor. Elas queimam tudo que se embosca e se

oculta no mais recndito do corao daquele que vai ser um discpulo, que se

entregou ao Senhor e nada busca ocultar. Naquele poderoso solo ardente, defronte

porta do Templo, jazem as chamas atravs das quais todos devem passar antes

que essa Porta se lhes abra.

24

Alm do fogo, e no seu bojo, a figura do Grande logue vista, e dele

que as chamas se estendem, recebendo seu poder purificador da glria de Seus

Ps. Dele, do Grande Guru, que vem a purificao final ao discpulo. Ento, o

discpulo entra pela porta que o encerrar para sempre, separando-o de todos os

interesses do mundo inferior, menos o de servir; que o separar de todos os desejos

humanos, menos o de trabalhar pela redeno da humanidade. Nada permanece ali

que consiga atra-lo, porque ele viu a Face do Senhor e, diante dela, todas as luzes

se obscurecem.

25

II. O CONTROLE DO PENSAMENTO

No que se refere de modo especial mente, o ponto de vista de um

homem do mundo, ponderado, bem-equilibrado e virtuoso ser diferente do ponto de

vista de um Ocultista. A diferena vir de acordo com a posio que o pensador

assumir sobre o lugar que a mente ocupa em relao ao homem em sua natureza

em desenvolvimento. Consideremos um homem bom e justo, nem descuidado nem

frvolo, nem mundano, no sentido comum da palavra; sbrio em seus julgamentos,

equilibrado em seus pensamentos. Como veria ele essa questo do auto-controle

mental?

Um homem que tenha colocado deliberadamente diante de si um ideal de

virtude que se esfora por cumprir, compreender aquilo que chamamos natureza

inferior, e que representa uma coisa a ser dominada. Quanto a isso no haver

dvidas. Nosso homem virtuoso dir que certamente se devem dominar e restringir

as paixes e apetites do corpo, as emoes inferiores que impelem as pessoas

impetuosas, todo aquele lado da natureza do homem que manipulado por agentes

exteriores, de forma a lev-lo a agir impensadamente. Dar-lhe- o nome de natureza

inferior, e procurar faz-la obediente natureza superior. O que entendemos em

linguagem comum por pessoa controlada, ou antes, auto-controlada, o homem que

exerce esse domnio mental sobre a natureza inferior, de forma que a mente controle

seus desejos.

Mais do que isso: se o olharmos com mais ateno, veremos que possui

uma vontade forte -- vontade que trabalha ao longo de certas linhas definidas de

conduta, e que, mesmo sob circunstncias muito difceis, ainda pode guiar a

natureza, da qual faz parte, por uma direo clara e definida.

26

Descobriremos tratar-se de pessoa cuja mente se acha muito

desenvolvida, de forma que, quando se decide a agir e decidir sobre uma ao a

empreender, ela no se deixa determinar pelas vrias atraes que possam

influenci-la do exterior, nem pela resposta da natureza animal a essas atraes.

Perceberemos que essa pessoa est sendo induzida por uma gama de experincias

gravadas naquilo que se chama memria. Recordaes de eventos passados,

comparao de resultados provenientes desses fatos. A mente trabalhou sobre

todos eles, arranjou-os, por assim dizer, comparou uns com os outros, extraindo

deles um resultado definido atravs de esforo intelectual e lgico.

Esse resultado permanece como regra de conduta, regra instalada em

momento de calma, quando a natureza de desejo no est trabalhando ativamente,

quando no est rodeada de tentaes. Quando o homem se v sob circunstncias

que dominariam uma vontade fraca, e talvez extraviassem uma pessoa comum,

esse homem mais forte, cuja mente mais desenvolvida, orienta a sua conduta pela

regra assim determinada. Ele no admite ser afastado do seu caminho pelas

atraes ou pelos impulsos do momento.

Tratando com pessoa assim, com freqncia podemos prever o que ela

ir fazer. Conhecemos os princpios sobre os quais sua conduta se baseia,

conhecemos as linhas de pensamento que dominam sua mente, e nos sentimos

bastante seguros -- observando seu carter, que definido e solidamente formado

-- de que, sejam quais forem as tentaes exteriores, aquele homem ir cumprir, em

momentos de luta, o ideal que concebeu em momentos de calma e reflexo.

isso o que geralmente queremos dizer quando falamos de um homem

auto-controlado. Trata-se de um homem que alcanou esse estgio de

desenvolvimento que, observaremos, no de forma alguma um estgio inferior, no

27

qual ele se ps deliberadamente a trabalhar, a fim de dominar, refrear e dirigir essa

natureza inferior. Quando ela for mais estimulada ao por agentes exteriores, a

Alma ter condies de sustentar-se contra a tentao que pretende assol-la. Esse

homem agir de maneira nobre, sejam quais forem as tentaes.

H, porm, um outro estgio ao qual esse homem pode chegar, porque

pode vir a ter contato com um grande filsofo da vida que lhe explique algo mais

sobre os trabalhos da mente. Pode ter contato, por exemplo, com os grandes

ensinamentos teosficos, contidos em livros antigos ou modernos, oriundos da ndia,

do Egito, da Grcia, ou da moderna Europa. Nessa filosofia talvez ele adquira uma

nova viso do Universo, e isso pode modificar deveras sua prpria posio.

Suponhamos que tal homem ingresse na Sociedade Teosfica e aceite

suas doutrinas fundamentais. Comear a compreender, muito antes de estudar as

coisas sob o ponto de vista teosfico, a enorme influncia que tm os seus,

pensamentos. Comear a compreender que quando sua mente est funcionando,

ela exerce aquele poder criativo que, provavelmente, to familiar para a maioria de

vocs -- que a mente est criando, de fato, existncias ou entidades definidas.

Nessa criativa ao da mente, ela est enviando constantemente ao

mundo circundante entidades ativas, que trabalham para o bem ou para o mal, que

muitas vezes agem sobre a mente e a vida de pessoas com as quais o criador de

tais entidades no tem contato pessoal. Comear por compreender que, para

impressionar as mentes alheias, no necessrio de forma alguma exprimir seu

pensamento pela palavra oral ou escrita. Tampouco necessrio que seu

pensamento se traduza em aes, para que seu exemplo possa tornar-se forte para

o bem ou para o mal. Compreende que pode ser uma pessoa completamente

obscura no sentido em que o mundo considera a obscuridade, que pode estar bem

28

longe dos olhos do pblico, que pode ter influncia apenas no pequeno crculo de

seus amigos e parentes que esto em contato pessoal com ela. Ver, contudo, que

tem um poder que transcende tanto a fora do exemplo como a fora da palavra ou

da linguagem. A ss, isolada dos homens, no que se refere ao mundo fsico, pode

estar purificando ou maculando o progresso do mundo, elevando um pouco as

mentes de sua gerao, contribuindo, ajudando, ou prejudicando a evoluo do

mundo, erguendo sua raa um pouco para o plano superior, ou deprimindo-a. Essas

energias sutis do pensamento agem tanto mais fortemente pelo fato de serem

invisveis, e exercem influncia mais ampla exatamente por serem to sutis e no

reconhecveis pelas massas sobre as quais provocam efeito.

proporo que esse homem cresce em conhecimento, seu pensamento

assumir novo aspecto, e ele compreender que sua responsabilidade se estende

para muito mais longe do que lhe possvel ver. Muitas vezes e responsvel, de

forma bastante real, pelos crimes que ocorrem na sociedade em que vive, bem como

pelos atos de herosmo. Captar a verdade daquele grande princpio que diz que

nem sempre o autor de uma ao o exclusivo responsvel por ela e pelos seus

efeitos. Toda ao que chega a se manifestar uma verdadeira encarnao de

idias. Todos os que tomam parte na gerao de idias tomam parte na

responsabilidade pelas aes delas decorrentes.

Compreendendo isso e adotando o ponto de vista mais amplo, comear

a entender que deve controlar seus pensamentos, escolher o tipo de pensamento

que sua mente engendra. Isso extrapola em muito o ponto de vista assumido pelo

nosso homem do mundo.

Ele tambm descobre, ao estudar um pouco mais, que o tipo de

pensamento que atrai para si mesmo, vindo do mundo exterior, ser grandemente

29

determinado pela natureza dos pensamentos gerados por ele prprio. Sente que no

apenas um m que emite ondas de pensamento sobre seu campo magntico,

mas tambm atrai para si prprio as substncias que respondem fora magntica

que envia. Esteja sua mente repleta de bons ou maus pensamentos, isso depender

amplamente das linhas atravs das quais sua prpria fora mental exercida.

Comear a entender que, gerando um bom pensamento, no s est cumprindo

um dever supremo para com seus semelhantes, mas que -- tal como sempre

acontece quando um homem est em harmonia com a Lei Divina -- ele prprio est

lucrando com aquilo que d. Sua prpria mente ser auxiliada e fortalecida por

esses pensamentos que dela fluem para fora, atrados, por assim dizer, pela

afinidade magntica. Reconhece, tambm, com dor e vergonha, que ao enviar para

o mundo um mau pensamento deixou que se formasse em sua mente um centro

similar, que atrair os pensamentos mais baixos da atmosfera, e assim aumentar

sua tendncia para o mal.

Quando chegar a compreender essa fraternidade mental que liga todos os

homens, sua atitude em relao mente se modificar. Sentir essa

responsabilidade de enviar para o exterior e dele receber. Compreender esses

vnculos que confluem para ele de todas as direes. Em sua vida cotidiana

comear a tratar mais com o pensamento do que com a ao, compreendendo que

na regio do invisvel so geradas todas as foras que descem para a vida psquica

e fsica.

H, porm, um passo frente quando ele entra no Ptio Externo. Agora,

ele um candidato a entrar no Caminho mais ngreme e mais curto que leva para

cima; agora, ele entrou no estgio probatrio daquele prprio Caminho. Ento, algo

mais vir ter com ele alm desse reconhecimento pertencente ao homem que

30

principia a entender alguma coisa sobre a natureza da vida que o rodeia. esse

novo conhecimento que o leva porta e que a abre parcialmente para ele.

Assim como um homem, no decorrer do seu desenvolvimento, reconhece

a superioridade da mente sobre os desejos, assim tambm compreende que aquela

mente, na aparncia to grande, aquela mente que parecia to poderosa, que ainda

h pouco tempo dava-lhe a impresso de ter o governo do mundo, que aquela

mente -- da qual foi dito por um pensador, que "nada h maior no Universo do que o

homem e nada maior do que o homem a no ser a mente" -- estava sendo vista de

um ponto baixo, com olhos vendados. Quando essa viso comea a clarear, v-se

que existe algo maior no Universo, algo maior do que a mente, algo mais sublime,

mais vasto, algo que fulgura apenas por um momento, e ento torna a ficar velado.

O homem captou um relance do Sol. Para ele, um raio de luz desceu para a sua

mente, vindo de algo que est acima, e ainda assim pareceu-lhe sentir,

obscuramente, com um estranho senso, que se trata da prpria mente, que

idntica a ele. De incio haver confuso, um tatear nas trevas, entre aquilo que

parece ser ele prprio, que ele mesmo pensara tratar-se da mente, embora dando a

impresso de ser to maior do que ela. De incio, ele no sabe de onde vem aquele

claro, nem se a esperana que esse claro fez nele nascer um sonho e nada

mais.

Antes, porm, que possa abordar os fatos com bastante clareza, deve

tentar ver o que entende pelas palavras "Mente" e "Alma", e o que quer dizer quando

fala de "Conscincia", porque essas palavras no devem ser compreendidas como

fichas com as quais se joga, mas como moedas verdadeiras que representam algo

da riqueza mental que temos, algo de idias. Eu defino a Alma como aquilo que

individualiza o Esprito Universal, que focaliza a Luz Universal em um ponto

31

isolado, que , por assim dizer, um receptculo no qual o Esprito derramado.

Aquilo que em si universal, posto naquele receptculo, aparece como separado,

sempre idntico em sua essncia, mas separado agora em sua manifestao. A

finalidade dessa separao fazer com que um indivduo se desenvolva e cresa;

que a Alma tenha uma potente vida individualizada, em todos os planos do

Universo; que possa ter conhecimento tanto no plano fsico como no psquico, tal

como tem no plano espiritual, e que sua conscincia no sofra ruptura de qualquer

espcie; que possa obter para si prpria os veculos de que necessita, a fim de

adquirir conscincia alm do seu prprio plano. A alma, ento, pode purificar

gradualmente esses veculos, um por um, at que eles no mais atuem cegamente,

ou como empecilhos, mas como intermedirios puros e translcidos, atravs dos

quais todo o conhecimento pode vir, em todos os planos.

Utilizando, entretanto, a palavra ou a imagem "receptculo", talvez eu os

tenha induzido em erro. Temos aqui a dificuldade habitual quanto a todas as

expresses apropriadas para o pensamento intelectual: a de que uma imagem

aplicvel em certo ponto, e j em outro faz-se enganadora. Porque esse processo de

individualizao no , de forma alguma, a fabricao de um receptculo e o

derramar dentro dele algo que toma contorno definido, de acordo com o feitio do

vaso que o recebeu. O que acontece aproxima-se mais da maneira como se forma

qualquer grande sistema solar, por exemplo.

Se fizerem sua imaginao regredir no tempo, podero imaginar um

espao no qual nada visvel. Podero, ento, imaginar que aquele espao -- onde

parece haver o vcuo, mas onde, em realidade, h repleo, apenas repleo

invisvel aos olhos -- tem uma nvoa tnue, to delicada que quase no se pode

chamar assim. Ento, enquanto observamos, a nvoa faz-se cada vez mais densa

32

com o decorrer do tempo, agregando-se cada vez mais, e tornando-se mais

destacada no espao que a rodeia. Aquilo que parecia ser a mais esmaecida das

sombras comea a tomar feitio, fazendo-se cada vez mais definido proporo que

o processo continua. Se estivssemos observando essa construo dos mundos,

veramos a nvoa tornando-se cada vez mais densa, separando-se definitivamente

no espao, at que um sistema viria a ser formado, com um sol central e planetas

em volta. Assim, parece, a chegada do Esprito individualizao. como que a

vaga aparncia de uma sombra no vcuo universal, sendo esse vcuo, entretanto, o

mais repleto entre os repletos. Essa sombra faz-se nvoa, e ento vai tomando

forma sempre mais clara, fazendo-se cada vez mais definida, enquanto a evoluo

continua, at que haja um indivduo, a Alma. Tal o processo esquematizado dessa

formao da conscincia individual.

De incio, aquela Alma no algo completo, mergulhando, como um

escafandrista, no oceano da matria. Ela vai sendo lentamente construda, ou

densificada, se ainda posso usar tal imagem, at que do Universal venha o

individual, sempre crescendo, conforme a evoluo continua. A Alma permanece,

como sabemos, de rida para vida, atravs de infindveis anos, atravs de infindveis

sculos. o indivduo em crescimento, e sua conscincia a conscincia de tudo o

que ficou para trs no processo do seu crescimento. Seu passado historiado est

sempre presente na sua conscincia que cresceu to largamente durante a jornada

que ela fez ao longo do caminho percorrido.

A cada novo nascimento e a cada experincia nova que deve ser

acumulada, essa Alma projeta uma parte de si mesma nos prprios novos

invlucros, para reunir nova experincia. Essa parte flutua exteriormente, nos planos

33

inferiores, para que ali possa aumentar o conhecimento atravs do qual a Alma

crescer ainda mais, tornando-se maior.

Essa parte a Mente no homem -- a parte da Alma que est trabalhando

no crebro, confinada no crebro, penosamente agrilhoada a ele sob o peso da

carne, literalmente falando. Sua conscincia faz-se mais enevoada, porque no

pode transpor aquele vu de matria mais espessa. Toda a grandeza que

conhecemos como Mente apenas a parte lutadora da Alma, que trabalha naquele

crebro com o propsito de obter o crescimento dela. Trabalhando, mostra os

poderes da Alma porque a prpria Alma, embora envolvida nessa limitao da

matria. Aquilo que a Alma pode manifestar atravs do crebro a mente da

pessoa que conhecemos. s vezes manifestar muito, s vezes pouco, segundo o

estgio de evoluo alcanado. O homem que est no Ptio Externo compreende

que aquela Alma ele prprio, sendo a mente uma manifestao passageira. Tal

como o corpo e a natureza de desejo devem estar sujeitos mente, que a parte

aprisionada da Alma, tambm a prpria Alma deve estar sujeita grande Alma, da

qual ela apenas a representante projetada no momento. Ela no passa de um

instrumento, de um rgo da Alma, manifestado no interesse do trabalho que

realiza.

A mente aprende. Quando essa mente entra em contato com o mundo

exterior, ela rene fatos, arranja-os, faz a tabulao deles, julga-os, e leva a cabo

todo o resto do seu processamento intelectual. O resultado dessa atividade passa

para cima -- ou antes, para dentro -- durante essa expanso da Alma na prpria

Alma. isso que a Alma leva consigo para o Devachan, e ali trabalha sobre o que

levou, para transform-lo em sabedoria. Porque a sabedoria muito diferente do

aprendizado. O aprendizado toda aquela gama de fatos e de julgamentos desses

34

fatos, com as concluses da extradas; a sabedoria a essncia haurida do todo,

daquilo que a Alma reuniu em todas as suas experincias.

Ento, o candidato comea a compreender por que se diz que desde o

princpio ele deve distinguir entre o "Eu" que suporta e essa mente que apenas

manifestao passageira do "Eu". A Mente a manifestao da Alma no mundo da

matria.

Tendo assim encontrado seu caminho para o Ptio Externo, o discpulo

envia ao Mestre seu primeiro apelo por ensinamento:

" Mestre, que devo fazer para alcanar sabedoria?

Sbio, que fazer para atingir a perfeio?" Palavras que no

incio parecem estranhas vm dos lbios do Sbio: "Procura os

Caminhos. Mas, Discpulo, que teu corao esteja limpo

antes que empreendas a jornada. Antes de dar o primeiro

passo, aprende a discernir entre o real e o falso, entre o

transitrio e o eterno."

Ento, o Mestre continua, explicando a diferena entre o aprendizado e a

sabedoria -- o que a ignorncia, o que o conhecimento e o que a sabedoria

que sucede a ambos. A distino apresentada mente -- a mente que "como

um espelho: junta p enquanto reflete"; a mente que precisa da "brisa da sabedoria

da Alma para varrer a poeira das nossas iluses". O candidato reflete sobre essas

palavras.

H. P. Blavatsky, The Voice of the Silence (originalmente publicado pela Theosophical PublishingHouse, Quest Miniatures, 1980), p. 36. Em portugus, A voz do silncio, Ed. Pensamento, So Paulo.

35

Qual a diferena entre o real e o transitrio, e por que isso est

relacionado com a manifestao da mente? Que diferena essa entre o espelho

que reflete e a Alma que precisa espanar o espelho se quiser livrar-se da iluso?

Qual a parte que deve ser tomada por essa mente, que parece uma funo to

poderosa que chega a representar o prprio homem no mundo inferior? Qual a sua

funo, afinal, se o primeiro passo para o Caminho distinguir entre o ilusrio e o

real, e a mente, de certa maneira sutil, est relacionada com a produo da iluso?

H outras palavras que ele tambm recorda terem vindo dos lbios

desses Mestres da Sabedoria. Lembra-se do Raj dos sentidos, governante e rei

da natureza inferior, que no amigo do discpulo. Lembra-se que lhe ordenaram

procurar o Raj dos sentidos para que pudesse compreend-lo, porque ele o

"Produtor de Pensamentos, o que desperta iluso". E dizem ao discpulo:

"Essa mente a grande exterminadora do Real. Que

o discpulo destrua a exterminadora."

Aqui, ento, parece que estamos na pista de algum pensamento que

iluminar o candidato. Que o Raj, ou Rei dos Sentidos, o produtor dos

pensamentos e aquele que produz pensamentos quem desperta a iluso, quem

aniquila a Realidade. Porque no Mundo Espiritual h Realidade. proporo que

o processo de diferenciao caminha, a iluso produzida e essa mente, essa

mente em crescimento, que produz a iluso. Essa mente que tem incomensurveis

imagens e desenhos, que tem a faculdade de elaborar imagens qual nos referimos

como "imaginao", e a faculdade de raciocnio que ergue castelos sobre a fantasia

The Voice of the Silence, p. 17.

36

que criou. Isso o que realmente cria a iluso, isso o que destri a Realidade, no

que se refere ao discpulo, e o primeiro trabalho deste exterminar a destruidora. A

menos que ele consiga libertar-se desse ilusrio poder da mente, limais poder

penetrar no Ptio Externo.

Ento, ouvindo ainda o Mestre, ele escuta tambm uma voz que lhe

ordena mesclar sua Mente e sua alma. Seu trabalho consistir em proceder a

alguma transformao nessa mente inferior, transformao esta que a ponha em

condies de mesclar-se superior, alguma destruio do seu poder ilusrio que a

capacite a conhecer o ente superior que a engendrou, para que o Pai e o Filho se

identifiquem em um s.

Ento, o discpulo ouve um ensinamento que em linguagem mstica diz-

lhe que deve destruir o corpo lunar, que deve limpar o corpo da mente. Esforando-

-se por acompanhar o que significa aquilo, aprende, atravs da alegoria e do

smbolo, que o chamado corpo lunar pertence ao Karma ou Desejo, conhecido

como o homem astral. "Purifica teu corpo mental" -- diz-lhe o Mestre, porque s

limpando-o da poeira da iluso ser possvel a esse corpo entrar novamente em si

mesmo, para mesclar-se com a sua Alma.

A essa altura ele comea a compreender o trabalho que tem diante de si

no Ptio Externo, no que se refere sua Mente. Ao invs de a Mente ser a

senhora, deve ser uma escrava obediente, instrumento na mo de quem a tem,

serva daquele que a envia para a frente. A natureza da sua tarefa desdobra-se

diante dele, e o discpulo comea a treinar a mente.

De incio ter de comear com assuntos muito simples. Descobrir que

aquela mente est sempre passando de uma coisa para outra, que difcil de

Ibid., pp. 36-37.

The Voice of the Silence, p. 25.

37

controlar, difcil de ser dominada, tal como Arjuna, do Bhagavad-Gita, descobriu, h

cinco mil anos. Comear por trein-la como se treina um cavalo que est sendo

domado, a fim de que possa cavalgar definitivamente pela estrada escolhida, sem

pular cercas e valas, sem correr pelo campo em todas as direes, para que

caminhe pela estrada que o cavaleiro deseja percorrer. Esse nosso candidato deve

realizar tudo isso em sua vida no mundo e, assim, aos poucos, treina a mente para

pensar de modo consecutivo e definido. No permitir que o desviem do caminho as

mltiplas tentaes que o rodeiam. Recusar-se- a dispersar pensamentos, insistir

em seguir o caminho estabelecido. Recusar receber de maneira fragmentria todo

o seu conhecimento, como se no tivesse capacidade para seguir um argumento

prolongado. Ir ler por opo, e por um motivo premeditado -- porque aqui que o

esprito do candidato ser treinado --, sustentando argumentos, longas linhas de

argumentos que treinam a mente para caminhar numa direo definida durante um

perodo considervel. No permitir que ela salte de uma coisa para outra,

rapidamente, intensificando, assim, a agitao, que um obstculo em seu caminho,

a ponto de bloque-lo inteiramente, enquanto no for dominado.

Assim, dia a dia, ms a ms, ano a ano, ele se ocupar de sua mente,

treinando-a nesse hbito de pensamento consecutivo, e aprender a escolher aquilo

em que quer pensar. J no mais permitir ser tiranizado e subjugado por um

pensamento. Ser o senhor em sua prpria casa.

Poder ter transtornos em sua vida cotidiana, mas isso no importa,

porque esses transtornos ajudaro o treinamento da sua mente. Quando a presso

deles foi muito forte, quando se sentir inclinado a lanar os olhos para o porvir,

preocupando-se com os futuros transtornos, dir: "No, essa ansiedade no

permanecer em minha mente. Nada ficar ali se no for por escolha minha e por

38

meu convite." H pessoas que passam a noite acordadas, cheias de pensamentos

ansiosos, quase se matando, no pelos transtornos em si, mas pelas preocupaes

que esses transtornos causam mente. Toda essa espcie de coisa deve ter um fim

por iniciativa do candidato.

Esse ser um treinamento definitivo, longo e difcil, porque os

pensamentos surgem, e ele tem de expuls-los. Muitas e muitas vezes ter de

repetir isso. No h outra maneira seno voltar-se para tais pensamentos todas as

vezes que eles surgirem, e, deliberadamente, recusar-lhes abrigo.

Enquanto o candidato no se fortificar bastante para fechar, para trancar

as portas da sua mente, permanecendo ali impassvel, no poder substituir um

pensamento por outro, sempre por algum pensamento elevado que trate como

permanente, em lugar daquele do qual quer se livrar, e que se trata do transitrio.

Isso servir ao duplo propsito de livrar-se do pensamento transitrio e habituar-se a

repousar no eterno, atingindo aquele senso de proporo, aquele senso de que o

presente est passando, portanto no vale a pena perturbar-se a propsito dele. Ao

lado do permanente, ele fortalecer esse apoiar-se da mente no eterno, que o

segredo de toda a paz neste mundo e em qualquer outro.

Treinando sua mente dessa maneira, e obtendo, aos poucos, poder sobre

ela, o aspirante pode faz-la pensar nas coisas que escolher, e evitar os

pensamentos indesejveis. Dar um passo avante, mais difcil do que qualquer

outro. Ir retirar-se da prpria mente e pensar sem ela -- no por tornar-se

inconsciente, mas porque est buscando uma conscincia mais profunda; no

porque a vida, nele, seja montona ou se est fazendo letrgica, mas porque tornou-

se to vivida que o crebro j no pode cont-la.

39

Com esse crescimento da vida interior, com o aumento da energia vital

que flui para a Alma, ele descobrir, lentamente, que possvel alcanar um estgio

em que o "pensamento" j no ser pensamento da mente, mas a conscincia da

Alma. Bem antes disso, descobrir essa conscincia e ir compreend-la intacta, por

assim dizer, e passar pelos estgios de vaguidade, de inanidade, de vazio -- um

dos estgios mais penosos, talvez, na vida do nosso candidato ao Ptio Externo.

Ento, ele comear a compreender, vagamente, a significao

subjacente s palavras do Mestre: "Reprime teu eu inferior com teu eu Divino, e com

o Eterno reprime o Divino." O Eu Divino essa Alma que deve reprimir a mente

inferior. No obstante, para alm da Alma, est o Eterno, e, em algum ponto do

futuro que est dentro do Templo, esse Eterno vai reprimir o Divino nele, como o

Divino reprime seu eu inferior.

Aos poucos, lentamente, ele aprende que deve ser o senhor de tudo que

est em torno, e com o que a mente est relacionada de toda maneira. Chegar a

um dos estgios, nesse Ptio Externo, onde as tentaes sutis afluiro em redor,

tentaes que no tocam na natureza inferior, mas ousam levantar-se contra a

superior, e se esforam por usar a mente do aspirante para destru-lo, tendo falhado

no uso da natureza de desejo, ou nas mais grosseiras tentaes do corpo. Ento,

sobrevm aquelas tentaes sutis que lanam o homem interior em uma armadilha,

quando ele est subindo ao longo do difcil caminho; tentaes do pensamento

mundano aglomerando-se em redor dele, por todos os lados.

Ele deve, esto, ter obtido elevado controle sobre as imagens mentais

que ele prprio criou quando ainda no era capaz de se manter inabalvel, sereno,

tranqilo, entre todas aquelas hostes de pensamentos galopantes. Agora, tais

The Voice of the Silence, p. 48.

40

pensamentos vm ter com ele, vitalizados e reforados, no mais pela mente fraca

do homem do mundo inferior, mas com o tremendo impulso que tem algo da

natureza das foras do plano espiritual. Eles vm do lado escuro, no do lado

branco, vm daqueles que de bom grado matariam a Alma, e no daqueles que

desejariam ajud-la. Atiram-se sobre ele com a energia nascida das poderosas

foras do mal. Se ele no treinou a si mesmo para ser o senhor dentro dos limites da

mente, contra os mesquinhos ataques que lhe vm ao encontro, oriundos do mundo

exterior, como poder manter-se contra as hostes de Mara, a perversa? Como pode

atravessar aquele quarto estgio no Ptio Externo, em torno do qual esses inimigos

da Alma esto se agrupando, estgio que recusa dar passagem a todo aquele que

no esteja absolutamente em paz?

Ento, surge aquela fora que nasce da fixidez da mente, da mente que

agora se fez to forte que se pode fixar no que quiser e ali manter-se inabalvel,

seja qual for o turbilho que possa existir em torno. Essa fixidez to grande, to

firme, que nada do que seja externo pode agit-la, to forte que j no precisa

esforar-se, porque ultrapassou o estgio onde tal esforo necessrio. Quanto

mais forte a Alma, menor o esforo em seu trabalho, mais dominante o seu poder,

e menos sente os assaltos provenientes do exterior.

Isso ocorre quando aquele estgio da mente alcanado, quando, ao

invs de serem mortos, os pensamentos fenecem por si mesmos, quando alcanam

o sacrrio. A mente j no precisa matar, j no precisa ser morta.

Fez-se limpa, obediente, pura. Esse o resultado do incio da mescla da

Mente e da Alma. No h mais necessidade de lutar, porque tudo quanto exigia luta

cai morto pelo recuo surgido do seu prprio golpe. Essa fixidez da mente descrita

como lmpada colocada em local firme, onde vento algum pode bruxulear a sua

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chama. Ela est em um lugar de repouso, onde a vontade comea a ser

compreendida, onde reina paz absoluta, lugar que fica sombra das paredes do

Templo.

L-se, em antiga Escritura, que quando um homem se liberta do desejo,

quando se liberta da mgoa, , ento, na tranqilidade dos sentidos que ele

contempla a majestade da Alma. Na verdade, ele v, pela primeira vez, no mais

atravs de relances furtivos, pelo raio que vai e vem, mas nessa paz absoluta onde

no h desejo nem inquietao pela mgoa. Ali, a majestade da Alma brilha por

inteiro, e a mente a reflete tal como ela realmente . Porque essa mente, que antes

era um espelho coberto de p, um lago encapelado pelos ventos que sopravam de

todos os lados, tornou-se um espelho polido que tudo reflete com perfeio. Tornou-

se um lago que reproduz o que o cu e as montanhas lhe mostram, restituindo as

rvores s rvores, as estrelas s estrelas, conferindo aos cus uma imagem

perfeita das mutaes de cores.

Antes disso, todavia, h um momento de perigo, a que a voz da

advertncia se referiu. H um momento em que o ponto est quase alcanado,

quando a chama da lmpada j no bruxuleia, quando a mente e a Alma renem-se

por um momento, no ltimo embate. Ento, a mente torna-se um elefante

enraivecido na selva. o esforo final do inferior para sobrepujar o superior,

sentindo os grilhes que esto sobre ele -- esse levante da natureza inferior da qual

todos os livros de iniciao falam. Porque afirma-se que quando o candidato se

aproxima da porta, um pouco antes de passar para o templo, todos os poderes da

Natureza se erguem contra ele, a fim de arrast-lo para baixo; todo o poder que est

no mundo insurge-se contra ele. a ltima lia a ser sustentada, atravs da qual

Kathopanishad, ii, 20.

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chega-se conquista plena. Nos planos superiores ainda h uma luta da qual esta

o reflexo; em planos to elevados que nem mesmo podemos fazer idia a seu

respeito, e rumo aos quais o maior dos grandes encontrou seu caminho. Isso est

simbolizado na ltima luta de Buda sob a rvore Sagrada, onde lhe sobreveio a

ltima iluminao que o tornou Buda. Todas as hostes reuniram-se sua volta para

essa ltima luta, a fim de ver se sua passagem podia ser bloqueada. Embora sobre

planos infinitamente inferiores ocorra essa luta crucial na vida do discpulo que agora

se aproxima do Templo.

Como ele vencer essa luta? Como ele ir, nesse caminho probatrio,

pisar as pegadas dos precursores?

Das palavras do Mestre vem o auxlio, dos Seus lbios, a sugesto que

nos guiar: " preciso" -- ouvimos no silncio -- "encaminhar essa luta para a Alma

Diamante."

O que a Alma Diamante? a Alma que est acima de todas as outras,

a que realizou uma unio com o verdadeiro Eu, sem mcula ou falha em qualquer

parte, translcida -- como o Diamante translcido -- Luz do LOGOS que ela

focaliza para os homens, atravs da qual a prpria luz do LOGOS fulgura sobre os

homens, to puro o Diamante. a Alma que procuramos ver nos momentos da

nossa mais elevada aspirao.

Para subirmos em direo a ela, precisamos ter apenas um vislumbre da

sua beleza, um toque do seu fogo. Porque a Alma cresce para cima, como a flor

cresce voltada para a luz, e as foras que a atraem para o alto so as foras

radiantes, nascidas dos fulgores oriundos da Alma Diamante, que se derramam

The Voice of the Silence, p. 37.

43

sobre o que ela prpria , embora to fraca e hesitante, e que a levam a subir com

vigor Divino, a fim de que se una consigo mesma.

Quando o discpulo comea a entender, cresce nele a idia do que

significa o que se chama Alma Diamante, e compreende que nele prprio tambm

aquela Alma Diamante deve ser reencarnada -- "Olha para o interior! Tu s Buda!"

-- que aquela mente, como seu corpo, no seno um instrumento para esse

servio.

quando, pela devoo, essas cordas da mente so afinadas, altamente

submetidas Alma. A Alma as torna afinadas pelo poder da devoo, e por isso

sua mente faz-se um instrumento musical, preparado para o toque do Mestre, e da

todas as melodias do cu e da terra podem soar. Por fim, o discpulo coloca-se

diante da porta, e compreende que ele prprio encontrou Ele Prprio. A Alma, que

Ele Prprio, est voltada para cima, para UM ainda maior, com o qual ela se ir

mesclar. Essa unio vindoura tem lugar apenas no interior do Templo. Colocando-se

diante da porta, ele apenas uniu o Ele Prprio eterno ao seu eu perecvel -- Ele

Prprio, Alma, ao ele prprio que a sua mente.

Ento, comea a venerao que significa a identificao com o Mais Alto.

O candidato aprende que em sua vida cotidiana a Alma pode estar sempre

venerando, faa a mente o que fizer, ocupe-se o corpo no que se ocupar.

Compreende, finalmente, que a vida do discpulo , absolutamente, venerao

ininterrupta do Mais Alto, na incessante contemplao da Alma Diamante.

Enquanto a Alma est assim ocupada, no Ptio do Templo, o corpo e a mente

estaro trabalhando pela humanidade que precisa deles, no Ptio Externo, e alm

dele, no mundo. O corpo e a mente so instrumentos en quanto o homem est vivo;

so seus mensageiros e seus trabalhadores, enquanto ele prprio est em

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verenao. E ento ele compreende a significao de "no cu . . . Anjos contemplam

a face do Pai", porque a viso da Alma-Pai uma viso ininterrupta. Nuvem alguma

da terra pode obscurec-la, nenhum trabalho da terra pode desfigur-la. A Alma

est sempre em contemplao, enquanto a mente e o corpo esto trabalhando.

Quando isso alcanado, o limiar est sendo transposto, e, do Ptio Externo, a

Alma est entrando para o Templo do seu Senhor.

Mateus, 18:10.

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III. A FORMAO DO CARTER

Delineando as qualificaes do candidato que chega ao Ptio Externo,

parto da premissa de que h um auto-treinamento deliberado na direo do objetivo

determinadamente reconhecido, embora aquelas qualificaes no precisem ser

alcanadas no seu todo. Ele est comeando, por assim dizer, a formao do seu

carter. Compreende, at certo ponto, o que deve ser, esfora-se, com maior ou

menor sucesso, por se tornar aquilo a que aspira chegar. No que a purificao

definitiva, o completo domnio do pensamento, ou a perfeita formao do carter, ou,

mesmo, a inteira transmutao do inferior para o superior, tudo isso deva ser

realizado. Na verdade, ele est ocupado em atrair os fundamentos de suas

construes, em esboar, cuidadosamente e de forma razovel, os contornos

daquele edifcio que espera levar perfeio. A tarefa, em todas essas frentes -- a

construo desses fundamentos, o levantamento de paredes cada vez mais altas, a

colocao da pedra final que ir coroar a obra -- realizada dentro do Templo,

depois que os olhos se abriram e no enquanto eles estiverem parcialmente

vendados, estando o aspirante ainda no Ptio Externo. Ainda assim, por muito

elevadas que paream ser essas aspiraes, por muita magnificncia que os

contornos preenchidos paream ter, eles tm de ser definitivamente admitidos como

verdadeiros no Ptio Externo. Por muito baixas que sejam as realizaes do

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presente, nem por isso elas deixam de ser os fundamentos definidos, sobre os quais

as gloriosas realizaes do futuro tero de se basear.

No Ptio Externo no preciso sentir desnimo ou desesperana,

porque, enquanto os esboos esto sendo traados, eles podem ser considerados

apenas enquanto tais. Transposto o limiar, h ainda muitas vidas nas quais esses

esboos podem ser levados execuo, e esses planos do arquiteto servem de

base para o edifcio concludo.

A formao do carter tem de ser clara e positiva, pois o candidato o

colocar diante de si. J vimos que ele precisar ter sido, em vidas passadas, um

homem virtuoso e religioso, e que quaisquer tendncias que ainda existam ali devem

ser inteiramente extirpadas. Embora ainda possa haver falhas na consecuo de

certo aperfeioamento, no haver, em definitivo, satisfao em permanecer no erro.

Todas as partes grosseiras da natureza j devem ter sido eliminadas, todas as

partes rudes da luta ntima estaro destrudas. Pedras muito brutas mas no podem

ser levadas ao Ptio Externo do Templo para a construo. O desbaste deve ter

sido feito durante muitas vidas anteriores, antes que elas estejam em condies de

servir construo, mesmo no Ptio Externo de um Templo assim.

Aqui, estamos tratando da formao de virtudes positivas, de virtudes de

um tipo inexcedivelmente alto e nobre -- virtudes que no so apenas aquelas que

o mundo considera necessrias, mas as que o aspirante deseja obter, a fim de

chegar a ser um dos Auxiliares e Salvadores do mundo.

Talvez a primeira coisa a nos chamar a ateno na formao do carter

de algum que esteja no Ptio Externo seja a sua natureza extremamente

deliberada. No coisa de caprichos e mpetos, formao feita sob displicncia e

descaso. No se trata de um ir e vir procura de algum propsito: esse propsito

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est identificado, e o objetivo conhecido. Essa formao deliberada, feita por

algum que sabe que tem tempo, e que nada na Natureza pode ser perdido. Ele

comea com o material que tem em mos, com o carter tal como reconhecido

como existente. Averigua, tranqilamente, todas as suas foras e todas as suas

fraquezas, e pe-se ao trabalho de aumentar umas e remediar outras -- esculpindo,

em material permanente, uma esttua que j tenha sido modelada em seus

contornos gerais.

O homem sabe que levar consigo tudo quanto fez, que de vida para vida

levar os tesouros que tiver acumulado, que, se encontrar uma deficincia e s

parcialmente puder repar-la, ainda assim ela se conservar reparada at aquele

ponto, at aquela parte do trabalho feito. Se adquiriu para si um poder, esse poder

seu para sempre, uma parte da Alma que jamais ser retirada, que est tecida na

textura da individualidade, para nunca mais tornar a separar-se dela.

O candidato trabalha com esse propsito deliberado que tem suas razes

no conhecimento, identificando a Lei subjacente em todos os aspectos da Natureza.

Por compreender que a Lei imutvel, por saber que pode confiar nela com a

mxima e mais completa f, apela para a Lei e sabe que ela responder. Tudo o que

distribui trar, inevitavelmente, a sua colheita. Semeia cada semente com a absoluta

certeza de que ela produzir frutos da sua espcie; esse fruto, e nenhum outro, ser

sua recompensa em tempos futuros. Assim, no h pressa alguma em seu trabalho,

nenhuma impacincia em seu labor. Se o fruto no est maduro, ele pode esperar

para colh-lo; se a semente no est pronta, pode esperar que ela cresa. Sabe que

a Lei, qual se entregou, , ao mesmo tempo, imutvel e boa, que a Lei tudo lhe

trar no tempo aprazado para ele e para o mundo.

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Assim, comea com o material disponvel, contentando-se com ele porque

o que a Lei lhe traz do seu passado. Farto ou escasso, pobre e pequeno, ou rico e

grande, comea a trabalhar com ele, sabendo que por muito escasso que se

apresente, no h limite para a vastido que esse material pode alcanar durante os

anos que ele tem pela frente. O aspirante sabe que ele deve ter xito, e isso no

uma questo de probabilidade, mas de certeza, no de sorte, mas de decisiva

realidade. A lei deve devolver-lhe o equivalente quilo que ele