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João Pessoa - PB, 26 a 29 de julho de 2015 SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural DISTRIBUIÇÃO DOS CRÉDITOS DO PRONAF EM RELAÇÃO AO NÚMERO DE AGRICULTORES E RENDA BRUTA DA AGRICULTURA FAMILIAR NAS REGIÕES GEOGRÁFICAS BRASILEIRAS, DE 1999 A 2013 DISTRIBUTION OF CREDITS OF PRONAF IN RELATION TO FARMERS NUMBER AND GROSS INCOME FAMILY FARM IN REGIONS GEOGRAPHICAL BRAZILIAN, FROM 1999 TO 2013 Autores: Rafaela Lourençano Pereira, Denise Boito Pereira da Silva, José Giacomo Baccarin. Filiação: Bolsista Projeto CNPq/UNESP/UNASUL, Mestre Geografia e Bolsista Projeto CNPq/MDIC, Professor Doutor da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, UNESP, campus de Jaboticabal (SP). E-mail: [email protected], [email protected], [email protected]. Grupo de Pesquisa: 7. Agricultura Familiar e Ruralidade Resumo: Este trabalho tem como objetivo analisar a conformidade na distribuição dos contratos e dos recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), de acordo com o número de estabelecimentos familiares e renda bruta da agricultura familiar, em cada região geográfica do Brasil entre 1999 e 2013, nas modalidades custeio e investimento, fazendo observações às mudanças institucionais realizadas no programa durante o período analisado. Além da revisão bibliográfica, foi realizado estudo analítico a partir de dados disponibilizados pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, Banco Central do Brasil e Censo Agropecuário 2006 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Os dados do Censo Agropecuário 2006 auxiliaram a respeito da distribuição geográfica e renda bruta da agricultura familiar. De acordo com as dados analisados, ocorreu expansão da evolução de recursos aportados entre 1999 e 2013 e no número de contratos realizados, ainda que com variações, tanto no país como nas regiões geográficas. As mudanças institucionais que se sucederam no programa ao longo do período permitiram maior acesso de famílias nordestinas, culminando na diminuição da desigualdade de distribuição total de recursos e contratos durante o período de 2005 e 2006. Porém outras mudanças permitiram acesso de agricultores mais capitalizados, o que resultou em uma reconcentração dos recursos e um claro aumento do valor médio dos contratos a partir de 2007. A Região Nordeste, com maior percentual de agricultores familiares, registrou percentuais mais elevados na participação dos contratos de investimento. Porém, ainda que com variações no decorrer do tempo, conserva-se a concentração de recursos, tanto de custeio como de investimento, na Região Sul do País, para onde, em 2013, foram destinados 50% do seu total. Palavras-chave: PRONAF, distribuição de crédito, agricultura familiar. Abstract: This work aims to analyze compliance in the distribution of contracts and resources of the National Program for Strengthening Family Farming - PRONAF, according to the number of family farms and gross income in each geographical region between 1999 and 2013, the modalities costing and investment, making comments to the institutional changes made to the program over the analysis period. Besides the review was conducted analytical

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João Pessoa - PB, 26 a 29 de julho de 2015

SOBER - Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

DISTRIBUIÇÃO DOS CRÉDITOS DO PRONAF EM RELAÇÃO AO NÚMERO DE

AGRICULTORES E RENDA BRUTA DA AGRICULTURA FAMILIAR NAS

REGIÕES GEOGRÁFICAS BRASILEIRAS, DE 1999 A 2013

DISTRIBUTION OF CREDITS OF PRONAF IN RELATION TO FARMERS

NUMBER AND GROSS INCOME FAMILY FARM IN REGIONS GEOGRAPHICAL

BRAZILIAN, FROM 1999 TO 2013

Autores: Rafaela Lourençano Pereira, Denise Boito Pereira da Silva, José Giacomo Baccarin.

Filiação: Bolsista Projeto CNPq/UNESP/UNASUL, Mestre Geografia e Bolsista Projeto

CNPq/MDIC, Professor Doutor da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, UNESP,

campus de Jaboticabal (SP).

E-mail: [email protected], [email protected], [email protected].

Grupo de Pesquisa: 7. Agricultura Familiar e Ruralidade

Resumo: Este trabalho tem como objetivo analisar a conformidade na distribuição dos

contratos e dos recursos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar

(PRONAF), de acordo com o número de estabelecimentos familiares e renda bruta da

agricultura familiar, em cada região geográfica do Brasil entre 1999 e 2013, nas modalidades

custeio e investimento, fazendo observações às mudanças institucionais realizadas no

programa durante o período analisado. Além da revisão bibliográfica, foi realizado estudo

analítico a partir de dados disponibilizados pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário,

Banco Central do Brasil e Censo Agropecuário 2006 do Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística. Os dados do Censo Agropecuário 2006 auxiliaram a respeito da distribuição

geográfica e renda bruta da agricultura familiar. De acordo com as dados analisados, ocorreu

expansão da evolução de recursos aportados entre 1999 e 2013 e no número de contratos

realizados, ainda que com variações, tanto no país como nas regiões geográficas. As

mudanças institucionais que se sucederam no programa ao longo do período permitiram maior

acesso de famílias nordestinas, culminando na diminuição da desigualdade de distribuição

total de recursos e contratos durante o período de 2005 e 2006. Porém outras mudanças

permitiram acesso de agricultores mais capitalizados, o que resultou em uma reconcentração

dos recursos e um claro aumento do valor médio dos contratos a partir de 2007. A Região

Nordeste, com maior percentual de agricultores familiares, registrou percentuais mais

elevados na participação dos contratos de investimento. Porém, ainda que com variações no

decorrer do tempo, conserva-se a concentração de recursos, tanto de custeio como de

investimento, na Região Sul do País, para onde, em 2013, foram destinados 50% do seu total.

Palavras-chave: PRONAF, distribuição de crédito, agricultura familiar.

Abstract: This work aims to analyze compliance in the distribution of contracts and resources

of the National Program for Strengthening Family Farming - PRONAF, according to the

number of family farms and gross income in each geographical region between 1999 and

2013, the modalities costing and investment, making comments to the institutional changes

made to the program over the analysis period. Besides the review was conducted analytical

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study based on data provided by the Ministry of Agrarian Development, Brazil's Central

Bank, Agricultural Census. Data from the 2006 Agricultural Census helped concerning

geographic distribution and gross income of family farming. According to the data analyzed,

there was expansion of the evolution of resources invested between 1999 and 2013, and the

number of contracts made, albeit with variations, both at home and in geographic regions. The

institutional changes that took place in the program over the period allowed greater access

northeastern families, culminating in the reduction of the total inequality of distribution of

resources and contracts during the period of 2005 and 2006. But other changes allowed access

more capitalized farmers, which resulted in a re-concentration of resources and a clear

increase in the average value of contracts from 2007. The Northeast region, with the highest

percentage of family farmers, recorded higher percentages in the share of investment

contracts. However, even with variations over time, preserve the concentration of resources,

both costing as investment in Southern Brazil, where, in 2013, was allocated 50% of its total.

Key words: PRONAF, credit distribution, family farmers

1. Introdução O surgimento do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar

(PRONAF) deu-se em época em que a escassez do crédito e o alto custo eram apontados

como os principais problemas enfrentados pelos agricultores familiares. Por um lado, os

movimentos sindicais ligados à Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura

(CONTAG) e ao Departamento Nacional de Trabalhadores Rurais da Central Única dos

Trabalhadores (DNTR/CUT) reivindicavam a formulação e implantação de políticas de

desenvolvimento rural e acesso aos diversos serviços oferecidos pelo sistema nacional

financeiro (MATTEI, 2007). Por outro, a importância dos estudos realizados em conjunto

pela Food and Agriculture Organization (FAO) e Instituto Nacional de Colonização e

Reforma Agrária (INCRA) ressaltaram o papel social da agricultura familiar e estabeleceram

uma série de diretrizes e formulações que vieram a contribuir para o novo cenário do

desenvolvimento das politicas públicas para a agricultura. (AZEVEDO e PESSÔA, 2011).

Até a criação do PRONAF, “o futuro econômico do campo pertencia exclusivamente

a grande agricultura moderna fortemente mecanizada” (SACHS, 2001). A modernização

seletiva da agricultura, arquitetada juntamente ao Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR),

favoreceu os grandes estabelecimentos agropecuários, o que acabou por gerar um ambiente

caracterizado pela exclusão dos pequenos produtores ao crédito subsidiado e uma urbanização

prematura e excessiva marcada pelo contraste da proliferação de favelas e o luxo dos bairros

nobres. A institucionalização do PRONAF representou a preocupação dos poderes públicos

com a agricultura familiar “rompendo com a prática do apoio exclusivo à agricultura

patronal e ao agribusiness, considerados como único caminho viável de modernização para a

agricultura brasileira” (SACHS, 2001).

O crédito é um instrumento utilizado com o objetivo de gerar ambiente favorável ao

desenvolvimento econômico. Ao proporcionar recursos para o financiamento de atividades

produtivas que supram as necessidades dos agricultores, o crédito possibilita a modernização

e a manutenção dos setores produtivos, permitindo o aprimoramento de suas atividades e,

dessa maneira, contribuindo para o progresso da economia (CAPOBIANGO et al, 2013).

Instituído através do Decreto Presidencial nº 1.946 de 28 de junho de 1996, o PRONAF se

apresenta com a intenção de financiar projetos individuais ou coletivos para custeio e

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investimento da agricultura familiar, com as mais baixas taxas de juros do mercado financeiro

de crédito rural (MDA, 2014).

O Manual do Crédito Rural (MCR) estabelece os objetivos específicos do crédito

rural: estimular os investimentos rurais para produção; possibilitar o fortalecimento

econômico e estimular a geração de renda dos produtores rurais, notadamente os agricultores

familiares; favorecer o custeio oportuno e adequado da produção e a comercialização de

produtos agropecuários; incentivar a introdução de métodos racionais de produção, visando o

aumento da produtividade, a melhoria do padrão de vida das populações rurais, entre outros.

O Crédito Rural abrange recursos destinados a custeio, comercialização (não contemplado

pelo PRONAF) e investimento e suas regras, finalidades e condições estão estabelecidas no

MCR, que é elaborado pelo Banco Central do Brasil (BACEN, 2015).

Os créditos de investimento são destinados à formação de culturas permanentes,

pastagens, construção, reformas e instalação de benfeitorias permanentes, florestamento e

reflorestamento, eletrificação rural, obras de irrigação, inversão para aquisição de animais,

aquisição de veículos, aquisição de máquinas e equipamentos de longa duração utilizáveis

nessas atividades (BACEN, 2015). Neste caso pode-se entender que o programa “permite aos

beneficiários aquisição de insumos tanto para aumento da área, como para incorporação de

tecnologias recomendadas, possibilitando também a elevação do rendimento” (MATTEI et

al, 2007). Os créditos de custeio destinam-se às despesas do ciclo produtivo das lavouras,

desde o preparo das terras até a fase da colheita. Para a pecuária fica destinado a qualquer

despesa normal de produção, desde compra de arames, sêmen, sal, ração, fenação, silagem,

produtos veterinários e outros que se destinam ao consumo do rebanho (BACEN, 2015).

Os recursos aplicados no PRONAF se originam de diversas fontes que são

remuneradas, sendo que a única que não implica custos ao banco constituem os recursos

obrigatórios. Se necessário, o Tesouro Nacional arca com as despesas relativas à diferença

entre os custos decorrentes do uso dos recursos (administrativos, tributários e de captação) e a

rentabilidade oferecida pelos financiamentos do PRONAF (CONTI e ROITMAN, 2011).

Desde o inicio, a maior parte dos subprogramas do PRONAF adota uma politica de

remuneração com alto percentual de subsídio, bem como o estabelecimento de outras

condições especiais de pagamento e operação de crédito. O argumento central é que os

produtores familiares, com baixa produtividade e descapitalizados, não estariam em condições

de tomar empréstimos em condições comerciais para realizar os investimentos em

modernização e elevação da produtividade. Pelo menos na etapa inicial do processo de

acumulação, os seus rendimentos não seriam compatíveis nem suficientes para reembolsar

empréstimos tomados a juros de mercado (GUANZIROLI, 2007).

Em 1999 o PRONAF deixou de fazer parte do Ministério da Agricultura, Pecuária e

Abastecimento (MAPA) e passou a fazer parte do Ministério do Desenvolvimento Agrário

(MDA), ganhando maior importância no âmbito social e governamental. No mesmo ano as

regras para fins de enquadramento tornaram-se mais adequadas com a criação de diferentes

grupos de agricultores familiares que puderam ser classificados de acordo com o nível da

renda bruta anual, tornando o programa mais próximo à realidade social desse segmento

(MATTEI et al, 2007).

A partir de 2003, primeiro ano da edição do Plano Safra da Agricultura Familiar, o

PRONAF ganhou tendeu a ganhar maior abrangência em termos de regiões e agricultores

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beneficiados. Atualmente, o PRONAF é a principal política do MDA. A cada ano o Plano

Safra realiza ajustes nas linhas de crédito para custeio e investimento e nas taxas de juros a

serem aplicadas. O limite da renda para fins de enquadramento e a criação de linhas especiais

de financiamento também o compõem. Dessa forma, as condições de pagamento e as taxas de

juros, tornam-se determinantes para ao bom desempenho do programa.

O Quadro 1 especifica os diferentes grupos de agricultores familiares conforme o

Plano Safra da Agricultura Familiar de 2014/15. Para cada um desses grupos são ofertados

créditos com condições diferenciadas em termos de taxa de juros e limites de financiamento,

além de algumas modalidades contarem com bônus de adimplência (BACEN, 2014).

Quadro 1- Grupos de agricultores contemplados pelo PRONAF.

Beneficiário Especificação

Grupo A Assentados e beneficiários de crédito fundiário.

Grupo B Renda bruta familiar anual de até 20 mil reais

Grupo A/C Agricultores familiares egressos do grupo A.

Grupo AF (Renda Variável) Renda bruta familiar anual de até 360 mil reais. Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do Plano Safra 2014/15 (SAF, 2014).

Ao longo dos anos, o número de agricultores atingidos pelo PRONAF cresceu

vigorosamente e em menos de 15 anos o programa atingiu todos os estados e quase todos os

municípios do País. Desse modo, o PRONAF tornou-se instrumento fundamental para

discussão do desenvolvimento rural no Brasil (MATTEI, 2014).

A necessidade da formulação e desenvolvimento de políticas públicas para o

fortalecimento da agricultura familiar torna-se relevante não só para o abastecimento interno e

a segurança alimentar, mas para o desenvolvimento do país. Seu crescimento tende a gerar

desenvolvimento regional e aumento da oferta de alimentos, atribuindo efeitos positivos para

estabilidade de preços e preservação do salário real (CONTI; ROITMAN, 2011).

O objetivo deste trabalho é indicar as principais mudanças nas condições de concessão

de crédito do PRONAF de 1999 a 2013, a evolução dos recursos aportados e o número de

contratos realizados e fazer uma análise da conformidade da distribuição dos contratos e dos

recursos entre as regiões geográficas do Brasil durante o período. Essa conformidade se

baseará na compararão, para cada região, do número de contratos e do volume de recursos

recebidos com, respectivamente, o número de agricultores e a renda bruta da agricultura

familiar. Além desta introdução o trabalho está dividido em três seções, a segunda trata das

fontes e do tratamento de dados, a terceira da discussão dos resultados, encerrando-se com as

considerações finais.

2. Procedimentos Metodológicos

Foi realizado um estudo analítico da evolução das contratações de crédito do PRONAF

através do montante de recursos e contratos concedidos de 1999 a 2013, e análise quanto ao

alcance do programa nas grandes regiões geográficas a fim de testar a conformidade na

distribuição de acordo com o número de estabelecimentos familiares e renda por eles auferida.

Além da revisão da literatura, foi realizado estudo com base nas informações disponibilizadas

pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), pelo Banco Central do Brasil (BACEN)

e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), basicamente no Censo Agropecuário

de 2006.

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As informações a respeito das mudanças institucionais realizadas no PRONAF foram

coletadas a partir de dados do portal da Secretaria da Agricultura Familiar (SAF) do MDA,

órgão responsável pela implementação do PRONAF no País, lançando anualmente o Plano

Safra da Agricultura Familiar e estabelecendo as normas para fins de enquadramento de cada

grupo de agricultor familiar.

Dados referentes à distribuição dos recursos e número de contratos foram obtidos

junto à base de dados do PRONAF, disponibilizada pelo Banco Central do Brasil, no Anuário

Estatístico do Crédito Rural, que pode ser encontrado em sua página eletrônica.

O número de agricultores e a renda bruta da agricultura familiar foram obtidos no

Censo Agropecuário da Agricultura Familiar 2006, disponibilizado pelo IBGE no ano de

2009 e pode ser encontrado em sua pagina eletrônica. Não há fonte de dados conhecida, que

permita obter essas informações para cada um dos anos analisados. A vantagem é que a

informação censitária refere-se, praticamente, à metade do período considerado e estabelece-

se que a distribuição do número de agricultores e da renda bruta da agricultura familiar entre

as regiões brasileiras não se alterou durante esse período.

Os valores monetários foram deflacionados pelo Índice Geral de Preços

Disponibilidade Interna (IGP-DI) para 2014 de acordo com a tabela disponível na pagina

eletrônica do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea Data).

A análise dos dados foi realizada com foco na evolução do montante de recursos de

custeio e investimento no Brasil e regiões geográficas por ano, e do número de contratos de

custeio e investimento no Brasil e nas regiões geográficas por ano.

A metodologia utilizada partiu da relação para cada região brasileira da participação

porcentual do número de contratos e do número de agricultores familiares, bem como dos

recursos financeiros em relação à renda bruta da agricultura familiar.

3. Apresentação e Análise de Dados A análise dos dados está dividida em duas partes. A primeira trata da evolução das

contratações de crédito do PRONAF no Brasil, bem como as principais mudanças feitas no

programa ao longo do período analisado, e a distribuição geográfica da agricultura familiar. A

segunda seção discorre sobre a conformidade na distribuição dos contratos e recursos

aportados por região geográfica nas modalidades custeio e investimento, de acordo com a

renda e a distribuição geográfica da agricultura familiar.

3.1. Expansão do PRONAF no Brasil

Durante o período analisado constata-se que houve grande expansão do montante de

recursos contratados, através do PRONAF, os quais somam mais de R$ 163 bilhões

ultrapassando os 22 milhões de contratos. De 1999 a 2002 o montante de recursos aportados

manteve-se praticamente estável, na faixa dos R$ 5 bilhões. A partir de 2003 os recursos

apresentaram crescimento ininterrupto, com exceção de 2007. No ano de 1999 as contratações

totais de crédito somavam próximo a 5,5 bilhões de reais, em 2013 esse valor foi de R$ 21

bilhões, como pode ser observado no Gráfico 1.

Quanto ao número de contratos, Gráfico 2, nota-se expansão após o ano de 2003,

chegando aos 2,5 milhões de contratos em 2006, maior número de contratos realizados dentro

do período. Esse forte aumento do número de contratos, especialmente nos anos de 2005 e

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2006 esteve associado às mudanças institucionais realizadas no programa e novas propostas

do Plano Safra 2003/04 e 2004/05, as quais permitiram a entrada de mais agricultores

familiares localizados na Região Nordeste, em que houve aumento expressivo do número de

contratos, especificamente os de investimento. A partir de 2007 houve declínio do número de

contratos, apresentando leve retomada no ano de 2012, e somando pouco mais de 2,1 milhões

de contratos em 2013.

Gráfico 1 – PRONAF - Recursos Aportados no Brasil entre 1999 e 2013. Valores atualizados pelo IGP-DI 2014.

Fonte: Banco Central do Brasil, Anuário Estatístico do Crédito Rural. Elaboração própria

Gráfico 2 – Evolução do Número de Contratos do PRONAF no Brasil entre 1999 e 2013

Fonte: Banco Central do Brasil, Anuário Estatístico do Crédito Rural. Elaboração própria.

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As variações observadas quanto à evolução do número de contratos pouco afetou a

evolução dos recursos, havendo aumento no valor médio dos contratos realizados de 1999 a

2013. No Gráfico 3 pode-se acompanhar a variação do valor médio dos contratos, ao observar

que a diminuição do valor médio nos anos de 2005 e 2006 é decorrente da expansão do

número de contratos realizados nestes anos. Após 2007 houve aumento geral no valor médio

dos contratos, mantendo valor estável após 2011. O aumento no valor médio dos contratos,

bem como a queda do número de contratos e aumento dos recursos aportados permite

interpretar que um número menor de agricultores está acessando o programa.

Gráfico 3 – PRONAF - Valor Médio dos Contratos, Brasil, 1999 a 2013. Valores atualizados pelo IGP-DI 2014.

Fonte: Banco Central do Brasil. Anuário Estatístico do Crédito Rural. Vários anos. Elaboração própria.

O aumento no montante de recursos e do valor médio dos contratos observado a partir

de 2008 está associado ao lançamento do Plano Safra 2008/2009 que elevou em quase 100%

o limite de financiamento para investimento e criou novas linhas, com destaque ao PRONAF

Mais Alimentos, com objetivo de destinar recursos para investimentos em infraestrutura do

estabelecimento agropecuário e, dessa forma, acelerar sua modernização através da compra de

máquinas e implementos que propiciem aumento de produção de alimentos (MDA, 2008).

Esta mudança justificou a realização de contratos em valores mais altos e, por isso, o aumento

no valor médio dos contratos.

O cenário de expansão dos recursos do PRONAF deve-se ao um conjunto de medidas

com o propósito de ampliar o público do programa. O limite de renda máxima anual para fins

enquadramento passou de R$ 27.500,00 em 1999, para os R$ 360.000,00 na safra 2014/2015.

Houve diminuição da taxa de juros, aumento do limite máximo de financiamento, aumento do

limite de renda para fins de enquadramento, criação de linhas especiais de financiamento para

o Semiárido, bem como a criação das linhas: PRONAF Jovem, PRONAF Mulher, PRONAF

Agroecologia, PRONAF Cota-Parte e PRONAF Agroindústria, que permitiram que um maior

número de agricultores familiares em maior diversidade tivessem acesso ao PRONAF Crédito

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(GRISA e WESZ JUNIOR, 2010). O Quadro 2 traz um resumo do histórico das principais

mudanças institucionais que ocorreram no programa durante o período. Quadro 2- Resumo das Condições de Financiamento e Criação de Grupos da Agricultura Familiar, anos

escolhidos de 1999 a 2014.

Safra

Renda Máxima Anual grupo (mil R$) Custeio Investimento Linhas

Especiais B C D E Limite

mil R$

Juros

% a. a.

Limite

mil R$

Juros

% a. a.

1999/00 1,5 8 27,5 -

2003/04 2 14 - 6 2 a 4 27 1 a 3 Semiárido

2004/05 2 60 28 2 a 4 54 1 a 7,25

Agroecologia,

Cota-Parte,

Mulher,

Agroindústria,

Jovem

2008/09 5 110.000 (Grupo AF) 30 1,5 a 5,5 100 0,5 a 5

Mais

Alimentos,

Recuperação de

dívidas com

Coop. Crédito,

Recuperação

Catástrofe (SC)

2011/12 6 110.000 50 1,5 a 4,5 130 0,5 a 2

2012/13 10 160.000 80 1,5-4 130 0,5 a 2

2013/14 20 360.000 100 1,5 a 3,5

150 (300

avicultura,

suinocultura

fruticultura)

0,5 a 2

2014/15 20 360.000 100 1,5 a 3,5

150 (300

avicultura,

suinocultura

fruticultura,

empr.

familiares)

1,0 a 2 Produção

Orientada

Fonte: MDA, Secretaria da Agricultura Familiar. Vários anos. Adaptado.

O Plano Safra da Agricultura Familiar 2014/15 intitulado “Alimentos Para o Brasil” se

apresentou com a finalidade de estimular ainda mais a produção de alimentos ao inserir

milhares de assentados junto ao programa. Também lançou medidas de crédito que

consideram as diversidades regionais, e criou nova linha especial de financiamento PRONAF

Produção Orientada, voltada à produção sustentável de alimentos com foco nas regiões Norte,

Nordeste e Centro-Oeste. As taxas de juros para financiamentos variam entre 1% e 3,5% ao

ano, e o limite de renda para fins de enquadramento permaneceu em R$ 360.000,00 por ano,

além de anunciar a ampliação da oferta de crédito para R$ 24,1 bilhões, cerca de 14% a mais

que na safra anterior, evidenciando que o programa vem expandindo seu universo de atuação.

Embora muitas mudanças tenham sido realizadas no programa a fim de alcançar

parcela maior de agricultores, precisa-se saber em qual região encontram-se estes agricultores

e quem são eles. A distribuição geográfica da agricultura familiar nos mostra que mais de

50% dos agricultores familiares encontram-se localizados no Nordeste e que estes detêm

apenas 22% do total da renda bruta auferida pelos estabelecimentos familiares no Brasil,

enquanto a Região Sul responsável pela extração da maior renda advinda de atividades

agropecuárias, representa apenas 19,5% do total de estabelecimentos familiares.

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Guanzirolli et al. (2010) estimam que, com base no Censo Agropecuário de 2006, os

agricultores familiares com renda superior a três vezes o valor anualizado da diária regional

representavam 9,0% do total de agricultores familiares. Os que contavam com renda entre

metade e três vezes o valor anualizado da diária regional eram 33,2% e os que percebiam

menos que metade daquele valor eram 57,6% do total de agricultores familiares. Enquanto o

primeiro grupo era responsável por 67,8% do Valor Bruto da Produção da agricultura

familiar, o segundo tinha uma participação de 21,0% e o terceiro de apenas 11,2%.

Evidencia-se que existem agricultores familiares que usam tecnologias modernas, com

atividades econômicas integradas ao mercado, embora sujeitos, normalmente, a condições

menos favoráveis em relação aos preços pagos e recebidos pelos grandes agricultores.

Existem também os que praticam agricultura de subsistência, vivem em condições de pobreza,

sendo que muitas vezes obtêm parcela de seu rendimento com o assalariamento temporário

fora de seus estabelecimentos. Neste caso, a maioria deles está localizada na Região do

Semiárido, que impõe severas restrições edafoclimáticas às práticas agropecuárias.

Considerando a herança histórica da estruturação produtiva que se processou de forma

mais intensa nas regiões Sul e Sudeste, a tendência predominante do capitalismo é fazer com

que algumas áreas acumulem mais recursos técnicos e econômicos (ELIAS, 2007). A Região

Sul detêm os agricultores familiares com maior valor de renda bruta, como descrito no

Quadro 3, e apresentam maior participação percentual na contratação total dos recursos –

como se verá a seguir. Quadro 3 – Número de Estabelecimentos e Renda Bruta da Agricultura Familiar nas Regiões Geográficas.

Região Estabelecimentos Familiares % Renda Bruta %

Norte 412.666 9,5 6.418.628,66 9,33

Nordeste 2.187.131 50,1 15.692.357,86 22,81

Sudeste 699.755 16,0 15.452.441,10 22,46

Sul 849.693 19,5 27.493.458,65 39,96

Centro- Oeste 217.022 5,0 3.745.463,35 5,44

Fonte: Censo Agropecuário 2006. IBGE, 2009. (valores atualizados pelo IGP-DI para 2014).

A agricultura familiar também é responsável por parte significativa da produção de

alimentos para o mercado interno, bem como da geração de renda no meio rural. Como

constatado no Censo Agropecuário de 2006, a agricultura familiar correspondia a 38% do

valor bruto da produção da agropecuária brasileira, usava apenas 24% da área total e absorvia

74,4% da mão de obra ocupada nos estabelecimentos agropecuários. Também foi apontado

que 87% da produção nacional de mandioca, 69,6% de feijão, 45,5% do milho, 38% do café,

33% do arroz e 58% do leite originavam-se da agricultura familiar, e, ao mesmo tempo,

possuía 59% do plantel de suínos, 51% de aves e 30% dos bovinos (IBGE, 2009). Por esta

razão, estratégias que possam contribuir para o desenvolvimento social e o progresso desse

setor na economia, são estimuladas por meio de políticas públicas, através de ações nas áreas

de pesquisa, extensão rural, garantia de preços e renda, crédito subsidiado, disponibilização de

recursos para atividades produtivas, entre outras. (CAPOBIANGO et al, 2013).

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3.2. Conformidade na distribuição de recursos e contratos do PRONAF nas regiões

geográficas.

Nesta etapa compara-se, entre as regiões brasileiras, a distribuição percentual de

agricultores familiares com a distribuição percentual do número de contratos do PRONAF, e a

distribuição percentual dos recursos em relação ao percentual de renda auferida nos

estabelecimentos familiares.

Observa-se no Gráfico 4 que as regiões Sul e Centro-Oeste tenderam a obter recursos

do PRONAF em porcentual maior que a renda bruta de suas agricultura familiares, fato que

tendeu a se atenuar ao longo dos anos. No Sudeste a relação aproximou de 1,0 no final do

período e o Nordeste e o Norte foram contemplados com recursos do PRONAF de forma

relativamente menos significativa que a importância da renda de sua agricultura familiar. No

caso do Nordeste, esta situação pareceu que iria se alterar em 2004 e 2005, mas não teve

continuidade nos anos seguintes.

Gráfico 4 – Relação entre participação porcentual nos recursos do PRONAF e na renda bruta da agricultura

familiar nas regiões geográficas, Brasil, 1999 a 2013. Valores atualizados pelo IGP-DI 2014.

Fonte: BACEN, Anuário Estatístico do Crédito Rural (vários anos).

Em termos de distribuição do número de contratos, observa-se no Gráfico 5 que a

Região Sul sempre foi relativamente mais beneficiada, embora tal fato tenha se atenuado ao

longo dos anos. Em relação ao início do período, o Sudeste e o Nordeste melhoraram sua

participação no número de contratos do PRONAF, aproximando-se da relação unitária. O

Norte sempre teve uma participação relativa no número de contratos bem menos significativa

do que seu número de agricultores e o Centro-Oeste, depois de verificar uma situação mais

favorável no início do período, aproximou-se no final da condição da Região Norte.

Embora tenha havido uma leve melhora na conformidade da distribuição total dos

recursos e contratos entre os anos de 2004 e 2006, nota-se que os recursos e contratos na linha

de custeio mantiveram alto grau de concentração na Região Sul em relação ao Norte e

Nordeste em todo o período, principalmente após o ano de 2008, no qual a desigualdade na

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conformidade se acentua. As regiões Sudeste e Centro-Oeste foram as com melhor relação

percentual de distribuição dos recursos conforme Gráfico 6, e do número contratos de custeio,

a partir de 2005, conforme o Gráfico 7. As regiões Norte e Nordeste mantiveram-se bem

abaixo do nível de conformidade na distribuição dos contratos, sobretudo a partir de 2007,

tanto no que se refere ao seu volume financneiro quanto ao seu número.

Gráfico 5- Relação entre a participação porcentual no número de contratos do PRONAF e no número de

agricultores familiares nas regiões geográficas, Brasil, 1999 a 2013.

Fonte: BACEN, Anuário Estatístico do Crédito Rural (vários anos).

Gráfico 6 - Relação entre participação porcentual nos recursos de custeio do PRONAF e na renda bruta da

agricultura familiar nas regiões geográficas, Brasil, 1999 a 2013. Valores atualizados pelo IGP-DI 2014.

Fonte: BACEN, Anuário Estatístico do Crédito Rural (vários anos).

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Gráfico 7 - Relação entre a participação porcentual no número de contratos de custeio do PRONAF e no número

de agricultores familiares nas regiões geográficas, Brasil, 1999 a 2013.

Fonte: BACEN, Anuário Estatístico do Crédito Rural (vários anos).

Os recursos na linha de investimento são os que apresentam melhor conformidade na

relação percentual de distribuição entre as regiões geográficas notadamente após 2008. No

período de 1999 a 2006 a região Centro-Oeste apresenta concentração expressiva nos recursos

de investimento. Entre 2004 e 2007, a Região Nordeste manteve os recursos concentrados,

como dito anteriormente, reflexo das mudanças institucionais feitas do programa, que

permitiram maior acesso de seus agricultores.

Gráfico 8 - Relação entre participação porcentual nos recursos de investimento do PRONAF e na renda bruta da

agricultura familiar nas regiões geográficas, Brasil, 1999 a 2013. Valores atualizados pelo IGP-DI 2014.

Fonte: BACEN, Anuário Estatístico do Crédito Rural (vários anos).

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Já o número de contratos de investimento, Gráfico 9, apresentam concentração inicial

na região Centro-Oeste e conformidade de distribuição na Região Nordeste, após 2003 o

número de contratos apresentam movimento concentrador para região Nordeste, evidenciando

que esta região tem maior participação no número de contratos de investimento. Após 2006 o

Centro-Oeste foi a região que apresentou pior conformidade na distribuição dos contratos de

investimento, justamente o oposto do que se verificou na participação dessa região no volume

financeiro dos contratos do PRONAF, conforme Gráfico 8.

Gráfico 9 - Relação entre a participação porcentual no número de contratos de investimento do PRONAF e no

número de agricultores familiares nas regiões geográficas, Brasil, 1999 a 2013.

Fonte: BACEN, Anuário Estatístico do Crédito Rural (vários anos).

A tendência inicial da desconcentração no total de recursos, entre os anos de 2005 e

2007 deu-se devido à desconcentração ocorrida na linha de investimento no mesmo período,

resultado da expansão dos contratos realizados na Região Nordeste, reflexo das mudanças

realizadas no Plano Safra 2003/04 através da criação de uma linha especial de financiamento

para o Semiárido e o aumento do limite de financiamento na linha investimento de R$ 15 mil

para R$ 27 mil. Após este período o programa estendeu-se, também, a outros públicos

específicos, sendo estes: povos indígenas, pescadores artesanais, piscicultores, comunidades

quilombolas, silvicultores, criadores de animais silvestres, maricultores e extrativistas

(SEBRAE, 2011).

Assim, como algumas mudanças contribuíram para que maior número de agricultores

nordestinos tivessem acesso ao programa, outras mudanças contribuíram para que houvesse

ampliação da participação de agricultores mais capitalizados. O Plano Safra que em 2004/05

já havia ampliado o limite de financiamento da linha custeio de R$ 6 mil para R$ 28 mil, e o

limite de financiamento para linha de investimento de R$ 27 mil para R$ 54 mil, aumentou

ainda mais esse limite na safra 2008/09, com a criação da linha especial Mais Alimentos

como pode ser constatado no Quadro 2, além de estabelecer o limite máximo de renda para

fins de enquadramento para R$ 110 mil, e extinguir alguns grupos. A partir do Plano Safra

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20013/14 os limites ampliaram-se ainda mais, aumentando para R$ 360 mil o limite de renda

bruta anual para o Grupo AF, agricultores mais capitalizados, e para R$ 20 mil o limite do

Grupo B (microcrédito rural). No mesmo ano safra foi ampliado para R$ 100 mil o limite de

financiamento de custeio e para R$ 360 mil o de investimento. Estas medidas contribuíram

para que um número maior de agricultores, mais capitalizados, tivesse mais acesso aos

benefícios do programa, podendo efetuar contratos em valores mais altos.

No Gráfico 10 pode-se observar que houve tendência de aumento no valor médio dos

contratos em todas as regiões, com exceção do Nordeste, em que se constatam os valores

médios mais baixos de contratos.

Gráfico 10- Valor Médio dos Contratos nas Regiões Geográficas, Brasil, 1999 a 2013. Valores atualizados pelo

IGP-DI 2014.

Fonte: Banco Central do Brasil, Anuário Estatístico do Crédito Rural (vários anos).

As regiões Sul e Sudeste foram responsáveis por mais de 70% na participação total

dos recursos, e por 54% na participação total dos contratos, embora a região Sudeste

apresente melhor conformidade no percentual de distribuição como analisado anteriormente.

As regiões Norte e Centro-Oeste sempre apresentaram menor participação no número

contratos e recursos do PRONAF em relação às outras regiões, e também correspondem às

regiões com o menor número de estabelecimentos familiares. Porém, a Região Centro-Oeste

sempre apresentou níveis altos em relação à conformidade percentual na distribuição dos

recursos, e é a região que apresenta o valor médio mais elevado dos contratos durante todo

período.

A entrada de agricultores mais capitalizados no programa permite que o sistema

financeiro opte pelo financiamento de contratos maiores a juros mais altos, facilitando o

acesso de agricultores com maior capacidade de oferecer garantias e que, por serem mais

capitalizados, se encontram em condições de efetuarem contratações de financiamento em

valores mais altos (SOUZA et al, 2013).

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Em estudo realizado sobre a participação dos grupos A e A/C (menos capitalizados) na

contratação de recursos do PRONAF, Mattei (2010) chama atenção para a baixíssima

participação desses grupos, a notável queda na participação dos recursos, ao longo dos anos, e

para o problema “tantas vezes já debatido” da concentração de recursos na região Sul.

Apesar da remuneração dos custos administrativos das operações contratuais, da equalização

da taxa de juros e do pagamento do spread bancário, feitos pelo Governo Federal ao sistema

bancário, estes ainda continuam trabalhando com seus “clientes preferenciais, o que acaba

dificultando e limitando o acesso às diferentes modalidades de crédito por parte de todos os

segmentos de agricultores familiares”.

A desigualdade na distribuição regional de recursos vem sendo discutida por alguns

autores desde o inicio da operacionalização do programa, como por Abramovay e Veiga

(1999), porém convém destacar que o PRONAF surgiu como uma novidade institucional, a

qual precisou e precisa de reformulações para que um número maior de agricultores familiares

menos capitalizados possa acessar seus recursos.

Informações do Banco Central do Brasil mostram que o PRONAF já abrange quase a

totalidade de municípios em todas as regiões brasileiras, comprovando a acessibilidade ao

programa. Silva e Filho (2009) argumentam que “a questão principal é que o Pronaf, de um

modo geral, continua atrelado à lógica concentradora de recursos que é definida pelas

exigências do sistema bancário, o que dificulta o acesso por parte dos agricultores familiares

menos capitalizados.”

Abramovay (2005) discorre sobre a problemática da intermediação bancaria. Já que a

intenção do PRONAF é de promover desenvolvimento e a geração de renda através do crédito

bancário, esta política se encontra ameaçada “pela distância potencial entre racionalidade

econômica e necessidades sociais”. O banco por sua vez, tende “a voltar sua atenção aos

segmentos de maior renda e maior integração a mercados estáveis da agricultura familiar.”

4. Considerações Finais

As mudanças institucionais sucedidas no PRONAF entre 1999 e 2013 proporcionaram

aumento das contratações dos recursos em todas as regiões geográficas, assim como o alcance

do programa em quase todos os municípios do Brasil. As regiões Norte e Centro-Oeste

sempre apresentaram menor participação no número de contratos e recursos do PRONAF em

relação às outras regiões, e também correspondem às regiões com menos número de

estabelecimentos familiares, entretanto, apresenta a região Centro-Oeste maior valor médio de

contratos e alta concentração de recursos de investimento, de acordo com a conformidade de

distribuição, até 2006.

Mesmo com quase a metade do número de agricultores familiares localizados na

Região Nordeste, esta não obteve conformidade na participação dos recursos, e apresentou

leve concentração na participação dos recursos de investimento, como também apresenta

menos valor médio nos contratos. Sendo que a Região Sul, com participação de 19,5% nos

estabelecimentos familiares, manteve alta concentração no montante total de recursos e

contratos, destacando-se a altíssima concentração para a modalidade custeio.

Embora o valor dos recursos de investimento tenha sido um pouco maior durante um

período de 2006 na Região Nordeste, a maior parte dos recursos de crédito do PRONAF

acaba por se concentrar na Região Sul do país.

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É importante frisar que a desigualdade de acesso presente na Região Nordeste em

relação à Região Sul, não é apenas em relação aos recursos. A desigualdade na distribuição

dos contratos entre estas regiões, mostra que existe uma dificuldade de acesso, por parte dos

agricultores localizados em regiões mais pobres ao próprio programa. Embora a lógica

concentradora tenha se mostrado reversível no ano de 2006, e a Região Nordeste atingido

conformidade na distribuição dos contratos no ano de 2013, neste mesmo ano, se

considerarmos 1 contrato para cada estabelecimento, chegaremos à conclusão de que 53%

dos estabelecimentos familiares do Nordeste ficaram sem efetuar contratos.

É evidente que pelas normas do PRONAF ele é direcionado aos agricultores menos

favorecidos, mas a lógica de distribuição dos recursos, para custeio e investimento, levam a

questionar se o PRONAF diferencia-se da lógica concentradora presente durante a

modernização agrícola que beneficiou os agricultores mais integrados a mercados mais

dinâmicos localizados nas regiões Sul e Sudeste.

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