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    Universidade Federal do Rio de JaneiroCentro de Cincias Matemticas e da Natureza

    Instituto de GeocinciasPrograma de Ps-graduao em Geografia

    Gesto Ambiental e Gerenciamento Costeiro Integrado

    no Brasil: uma anlise do Projeto Orla em Cabo Frio - RJ

    Ricardo Voivodic

    Rio de Janeiro - 2007

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    Gesto Ambiental e Gerenciamento Costeiro Integrado no Brasil: uma anlise do Projeto Orla em

    Cabo Frio - RJ

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    Gesto Ambiental e Gerenciamento Costeiro Integrado no Brasil: uma anlise do Projeto Orla em Cabo Frio - RJ

    Por

    Ricardo Augusto de Almeida Voivodic

    Dissertao apresentada para o cumprimento parcial das exigncias para o ttulo de

    Mestrado em GeografiaUniversidade Federal do Rio de Janeiro

    Banca examinadora:

    Cludio Antnio Gonalves Egler (orientador)

    Dieter Muehe

    Antnio Carlos Robert Moraes

    Rio de Janeiro Fevereiro de 2007

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    Voivodic, Ricardo Augusto de Almeida.

    Gesto Ambiental e Gerenciamento Costeiro Integrado no Brasil: uma anlise doProjeto Orla em Cabo Frio - RJ

    Rio de Janeiro: UFRJ / IGEO/PPGG, 2007

    181 pg.

    Dissertao apresentada para o cumprimento parcial das exigncias para o ttulode Mestrado em Geografia - Universidade Federal do Rio de Janeiro

    1. Gesto Ambiental2. Gerenciamento Costeiro Integrado3. Planejamento Urbano4. Projeto Orla

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    Gesto Ambiental e Gerenciamento Costeiro Integrado

    no Brasil: uma anlise do Projeto Orla em Cabo Frio - RJ

    Por

    Ricardo Augusto de Almeida Voivodic

    Dissertao apresentada para o cumprimento parcial das exigncias para o ttulo de

    Mestrado em GeografiaUniversidade Federal do Rio de Janeiro

    Aprovada em

    Banca examinadora

    _________________________________________________________________________Prof. Dr. Cludio Antnio Gonalves Egler - Orientador

    IGEO/PPGG - URFJ

    _________________________________________________________________________Prof. Dr. Dieter MueheIGEO/PPGG - URFJ

    _________________________________________________________________________Prof. Dr. Antnio Carlos Robert Moraes

    Universidade de So Paulo

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    O real no est na sada nem na chegada: Ele se dispe para a gente no meio da travessia

    Guimares Rosa

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    Para a Bel

    Agradecimentos

    Antes de tudo, gostaria de destacar a importncia para a minha formao o fato deter me graduado e feito o mestrado na Geografia da UFRJ, mas no posso deixarde mencionar que trabalhar no Instituto Brasileiro de Administrao Municipal temme oferecido mais do que uma excelente escola de vida, tem sido a possibilidadereal de atuar nas questes ambientais, sociais e democrticas, e que me permitesonhar e ajudar a construir uma realidade um pouco melhor e mais justa.

    A todos os colegas e funcionrios do IBAM, que certamente fazem dainstituio referncia rea de planejamento urbano, na descentralizaoadministrativa e no apoio aos municpios. E, em especial, Ana Lcia Nadalutti LaRovere, superintendente da rea de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente,por todo o apoio e confiana.

    A Alberto Lopes, por ter sempre estado disposto a me ouvir e ajudar comimportantes conselhos e orientaes. Aos amigos do IBAM: Pedro, Rodrigo, Nin,Jansen, Maurcio, Flavia, Gil, Alexandre, Adriana e Leo, por fazerem com que ashoras de trabalho sejam momentos de grande descontrao e aprendizado

    Ao Joo, amigo de todas as horas e pea fundamental na discusso dosassuntos tratados neste trabalho.

    Aos colegas de mestrado, em especial Mariana, que compartilhou comigoas mesmas dificuldades.

    Um agradecimento especial aos grandes amigos que so parte integrante daminha prpria constituio: Vitor, Gui-gui, Laura, Henrique, Paulada, Flavinho,Roger e Tapajs.

    Tnia, pela ajuda com a redao.

    Bel, pelo companheirismo, compreenso e todo o carinho nas horas boase difceis.

    minha me, por tudo, mas principalmente por ter me despertado o amorpelas cincias humanas. Sem esquecer, claro, o apoio prtico nas correes eleitura crtica.

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    RESUMO

    Palavras-chave: Gesto Ambiental; Gerenciamento Costeiro Integrado;Planejamento Urbano; Projeto Orla

    O Brasil abriga ao longo do litoral diversos ecossistemas de alta relevncia do

    ponto de vista ecolgico, mas presses da ocupao antrpica, no entanto,

    constituem grave ameaa a esse patrimnio ambiental. A degradao do ambiente

    costeiro fruto de um acelerado processo de ocupao. A gesto ambiental umgrande desafio, pois os instrumentos de planejamento e gesto implementados ao

    longo das ltimas dcadas para a Zona Costeira Brasileira apresentam diversos

    problemas. O propsito deste trabalho avaliar os conflitos de competncia

    institucional existentes no Projeto Orla, decorrentes da falta de definio de escalas

    de atuao nas formas de descentralizao do poder. Um estudo de caso foi

    realizado tendo como foco o Municpio de Cabo Frio-RJ, onde foram identificadas

    estratgias locais voltadas para o desenvolvimento do municpio que incorporam a

    dimenso ambiental em seu discurso, mas no rompem com prticas e com

    modelos de desenvolvimento altamente lesivos ao meio ambiente, pondo em risco

    o patrimnio paisagstico do local.

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    LISTA DE QUADROS

    Quadro 1: Aes Essenciais que Correspondem aos Passos do Ciclo deGerenciamento Costeiro Integrado .................................................... 72

    Quadro 2: Principais Aes e Medidas Identificadas no mbito do ProjetoOrla ........................................................................................................ 102

    Quadro 3: Relao de Escalas de Apreenso dos Fenmenos e Atividades deGesto .............................................................................................. 114

    Quadro 4: Cabo Frio Populao Total, Urbana e Rural, e Taxa deCrescimento Mdio Anual ................................................................... 139

    Quadro 5: Atendimento da Concessionria PROLAGOS em Cabo Frio RJ .. 145

    Quadro 6: Diviso em Unidades de Paisagem....................................................... 149

    Quadro 7: Classificao dos Trechos da Orla de Cabo Frio .............................. 159

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    LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    CILJS Consrcio Intermunicipal Lagos So JooCIRM Comisso Interministerial para os Recursos do MarCONAMA Conselho Nacional de Meio AmbienteFEEMA Fundao Estadual de Engenharia e Meio AmbienteFIRJAN Federao das Indstrias do Rio de JaneiroGCI Gerenciamento Costeiro IntegradoGERCO Gerenciamento CosteiroGESAMP

    Joint Group of Experts on the Scientific Aspects of Marine Environmental Protection GIGERCO Grupo de Integrao de Gerenciamento CosteiroGRPU Gerncias Regionais do Patrimnio da UnioIBAM Instituto Brasileiro de Administrao MunicipalMMA Ministrio do Meio AmbienteMPO Ministrio do Planejamento Oramento e GestoOEMA rgos Estaduais de Meio AmbientePMCF Prefeitura Municipal de Cabo FrioPMGC Plano Municipal de Gerenciamento CosteiroPNMA Poltica Nacional de Meio AmbientePNGC Programa Nacional de Gesto CosteiraPOOC Planos de Ordenamento da Orla Costeira (de Portugal)SERLA Superintendncia Estadual de Rios e LagoasSIG Sistemas de Informaes Geogrficas

    SIGERCO Sistema de Informaes do Gerenciamento CosteiroSPU Secretaria do Patrimnio da UnioSQA/MMA Secretaria de Qualidade Ambiental do Ministrio do Meio AmbienteUFRJ Universidade Federal do Rio de JaneiroZEEC Zoneamento Ecolgico Econmico Costeiro

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    SUMRIO

    APRESENTAO.............................................................................................. xiii

    1 INTRODUO................................................................................................ 20

    1.1 Conextualizao do Tema .......................................................................... 201.2 Objetivos ..................................................................................................... 321.3 Questes Norteadoras ............................................................................... 331.4.Estrutura da Dissertao ........................................................................... 341.5 Mtodos de Pesquisa ................................................................................. 351.6 Tcnicas de Coleta de Dados .................................................................... 36

    2 A PROBLEMTICA AMBIENTAL NA ZONA COSTEIRA E MECANISMOSDE GESTO.................................................................................................... 38

    2.1 Espao Costeiro Particularidades e Presses . .................................... 382.2 Urbanizao Turstica no Litoral - O Fenmeno da Segunda

    Residncia ................................................................................................... 412.3 Dificuldades na Gesto Ambiental na Zona Costeira ............................. 572.4 Definindo Conceitualmente o Gerenciamento Costeiro Integrado ........ 632.5 Gerenciamento Costeiro no Brasil ............................................................ 753 O PROJETO ORLA......................................................................................... 803.1 Uma mudana de escala no mbito do Gerenciamento Costeiro .......... 883 2 O Uso dos Terrenos de Marinha e seus Acrescidos ............................... 963.3 Os Planos de Interveno na Orla Martima ............................................. 1004. ENQUADRAMENTO TERICO SOBRE A QUESTO INSTITUCIONAL.... 1064.1 Centralizao ou Descentralizao no Brasil - A Poltica de Escalas

    no Gerenciamento Costeiro ....................................................................... 1154.2 A Questo das Escalas e seu Debate na Geografia ................................ 1245 ESTUDO DE CASO: A IMPLEMENTAO DO PROJETO ORLA EM

    CABO FRIO..................................................................................................... 1305.1 Histrico da Ocupao ............................................................................... 1335.2 Evoluo Demogrfica do Municpio........................................................ 1385.1 O Processo Histrico de Apropriao de Terras em Cabo Frio ............. 1404.4 Impactos Ambientais do Processo de Urbanizao de Cabo Frio ........ 1434.5 Os Impactos da Urbanizao Turstica na Orla Martima de Cabo Frio 1485.6 O Projeto Orla em Cabo Frio ..................................................................... 1496 CONSIDERAES FINAIS............................................................................ 167

    REFERNCIAS.................................................................................................. 172

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    APRESENTAO

    Esta dissertao no tem a pretenso de ser conclusiva, nem de exaurir

    todas as possibilidades de anlise sobre os elementos nela contidos. Ela , isto

    sim, o estudo de um processo e de como os fatos e as lies se dispuseram ao

    longo dele, modificando o seu rumo e alterando suas concluses. Por isso, tomo

    como ponto de partida a minha prpria insero nesse processo.

    Tendo sido graduado bacharel em geografia pela Universidade Federal do

    Rio de Janeiro (UFRJ), e tendo dado nfase especial ao papel da geografia no

    Planejamento Urbano e Territorial, tive a minha primeira experincia profissional no

    Instituto Brasileiro de Administrao Municipal (IBAM), que atualmente conta com

    54 anos de experincia em atendimento aos municpios. A misso institucional do

    IBAM promover o Municpio enquanto esfera autnoma de Governo, fortalecendo sua capacidade de formular polticas, implementar projetos de desenvolvimento e

    promover o ordenamento urbano.

    Dentre as diversas reas de atuao do IBAM, realizei a maior parte dos

    meus trabalhos em projetos vinculados rea de Desenvolvimento Urbano e Meio

    Ambiente, na qual tive experincias diversas que envolveram estudos e relatrios

    de indicadores ambientais e urbanos, consrcios municipais de desenvolvimento,

    cadastro multifinalitrio, Plano Diretor e o Projeto Orla. Desses, o primeiro que

    pressupunha uma participao real com uma atuao em campo, isto , a partir do

    municpio, participar diretamente da formulao de propostas e polticas, foi o

    Projeto Orla.

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    O Projeto Orla Projeto de Gesto Integrada da Orla Martima uma

    iniciativa do Ministrio do Meio Ambiente (MMA), em parceria com o Ministrio do

    Planejamento, Oramento e Gesto (MPO), via Secretaria do Patrimnio da Unio

    (SPU), que atua nos municpios, buscando aplicar diretrizes de ordenamento de

    uso e ocupao da Orla Martima.

    A concepo de gesto apresentada nos documentos e manuais do Projeto

    Orla vincula-o aos princpios da poltica ambiental brasileira e tem como

    pressupostos legais: a Lei n 7661/1988, que institui o Plano Nacional de

    Gerenciamento Costeiro, o Decreto n 5300/2004 e a Lei n 9636/1998, que dispe

    sobre regularizao, administrao, aforamento e alienao de bens imveis de

    domnio da Unio, incluindo os localizados na orla martima.

    O arranjo institucional proposto pelo Projeto Orla orientado no sentido da

    descentralizao de aes de planejamento e gesto dos terrenos defrontantes

    com o mar, da esfera federal para a do municpio. Cumpre ressaltar que tais reas,

    em sua grande maioria, so Terrenos de Marinha, isto , esto sob domnio da

    Unio; esse instituto legal ser analisado no captulo 2 desta dissertao. A

    proposta do Projeto visa a articular os rgos de meio ambiente e as Gerncias

    Regionais do Patrimnio da Unio (GRPU) s administraes municipais e

    organizaes no-governamentais locais, alm de estabelecer contatos com outras

    entidades e instituies relacionadas ao patrimnio histrico, artstico e cultural,

    bem como vincul-los a questes fundirias ou a atividades econmicas

    especficas como as porturias ou relativas explorao petrolfera cuja

    atuao tenha reflexo destacado naquele espao.

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    So apresentados, como objetivos estratgicos do Projeto Orla: o

    fortalecimento da capacidade de atuao e a articulao de diferentes atores do

    setor pblico e privado na gesto integrada da orla; o desenvolvimento de

    mecanismos institucionais de mobilizao social para sua gesto integrada; e o

    estmulo de atividades scio-econmicas compatveis com o desenvolvimento

    sustentvel da orla (BRASIL, 2002).

    O IBAM iniciou sua participao no Projeto Orla, em carter ad hoc, na fase

    de desenvolvimento e validao da metodologia, incluindo sua aplicao e

    avaliao em quatro Municpios-piloto, todos do Piau. Participou, tambm, da

    Reunio de Trabalho sobre Procedimentos de Implementao do Projeto Orla,

    realizada em Braslia nos dias 23 e 24 de maio de 2002. Essa reunio tinha como

    objetivos: a articulao das equipes dos rgos Estaduais de Meio Ambiente

    (OEMAs/GERCO) e das Gerncias Regionais do Patrimnio da Unio (GRPUs/SPU); a discusso da estratgia de conduo do projeto na esfera

    estadual; e a discusso da minuta do Termo de Convnio entre SPU e Municpios

    (IBAM, 2004).

    Alm das atividades de concepo e planejamento, descritas acima,

    participei diretamente, pelo IBAM, em conjunto com a coordenao nacional do

    Projeto Orla, das seguintes fases:

    Capacitao dos instrutores etapa que compreendeu: a realizao da

    oficina de treinamento dos instrutores para o repasse da metodologia do

    Projeto Orla; a preparao do programa das atividades presenciais; a

    organizao do material didtico de apoio e de informaes bsicas a serem

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    disponibilizadas nas oficinas; e reunies para definio e ajuste das

    estratgias de execuo das atividades.

    Aplicao prtica da metodologia atividade realizada junto aos Municpios

    selecionados, em dois momentos do cronograma de trabalho:

    - Atividade presencial I repasse da metodologia que conduz elaborao do Plano de Interveno na Orla Martima (diagnstico da situao socioeconmica e ambiental, definio e delimitao da faixa de orla, seleo e classificao de trechos para interveno, formulao de cenrios e propostas). Apresentao do Roteiro de Elaborao do Plano de Interveno.- Atividade presencial II apresentao da verso preliminar do Plano de Interveno, elaborado pela equipe local, seguida de discusso e sugestes para a complementao do documento.Detalhamento dos itens do Roteiro relativos s estratgias de implementao, legitimao, acompanhamento e avaliao do Plano de Interveno. Definio da composio e das atribuies do Comit Gestor.

    Acompanhamento da elaborao dos Planos de Interveno na Orla

    Martima atividade realizada no intervalo entre as Atividades Presenciais I

    e II; a etapa posterior s Atividades consistiu na assistncia tcnica prestada

    s equipes locais responsveis pela elaborao dos planos.

    Ao longo de dois anos, atuei diretamente na implementao do Projeto Orla

    realizando as atividades descritas para fornecer assistncia tcnica a quarenta

    Municpios (ver Figura 1), selecionados em dez Estados, que estavam em fase de execuo de projetos de gerenciamento costeiro no mbito do PNMA II, a saber:

    - Amap Macap e Santana; - Cear Beberibe e Icapu; - Paraba Joo Pessoa e Cabedelo; - Pernambuco Cabo de Santo Agostinho e S. Jos da Coroa Grande; - Sergipe Itaporanga dAjuda; e Estncia; - Bahia Conde;

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    - Rio de Janeiro Araruama, Iguaba Grande, So Pedro da Aldeia e Saquarema; Armao dos Bzios, Arraial do Cabo, Cabo Frio,Casemiro de Abreu, Rio das Ostras, Campos dos Goytacazes,Carapebus, Maca, Quissam, Angra dos Reis, Mangaratiba e Paraty; - Paran Pontal do Paran, Matinhos e Guaratuba; - Santa Catarina Navegantes, Itaja, Balnerio de Cambori, Itapema,Porto Belo e Bombinhas; - Rio Grande do Sul Torres, Arroio do Sal, Capo da Canoa e Rio

    Grande.

    Figura 1: Municpios Participantes do Projeto Orla Cuja Execuo Coube ao IBAM

    Do contato direto com os tcnicos dos municpios e constatando os problemas, conflitos e aes propostas para mitig-los, observei um conjunto de

    questes, reincidentes nas preocupaes de municpios muito diferentes entre si.

    De um modo geral, refletiam, por diversos aspectos, preocupaes com a atrao

    de investimentos, a promoo imobiliria e o desenvolvimento turstico, revelando

    os interesses de grupos especficos ou disputas polticas. Muitas vezes, embora

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    houvesse consenso durante a oficina de repasse da metodologia e preparao do

    Plano de Interveno sobre determinadas questes de carter preservacionista,

    secretrios ou tcnicos mais prximos s instncias decisrias na poltica municipal

    mostravam-se cticos, afirmando que seriam diretrizes ou aes incuas, pois

    dificilmente seriam implementadas.

    De um modo geral, percebe-se que o poder pblico municipal tem um

    conjunto de questes que lhes so prprias. Em parte, elas refletem tanto a

    consolidao do poder e interesses econmicos que se manifestam na escala local

    (como interesse imobilirio ou polticas clientelistas, por exemplo), quanto a disputa

    em torno da distribuio de funes e competncias entre esferas de governo para

    a gesto de assuntos que dizem respeito aos interesses locais.

    Nesse sentido, pude observar que esferas de governo e seus

    representantes e atores institucionais, alocados em diversas escalas, se utilizam de

    estratgias discursivas e de mecanismos legais que determinam as capacidades

    de atuao e promoo de seus interesses, ou de interesses de grupos de presso

    especficos de cada escala.

    Da observao dessa delicada mediao de interesses e da necessidade de

    se construrem polticas integradas, surgiu o interesse por discutir teoricamente a

    questo das escalas e dos arranjos interinstitucionais, buscando identificar como

    diferentes escalas se articulam especificamente dentro do sistema de governo a

    partir de uma perspectiva de gesto integrada, nos marcos polticos e conceituais

    da Gesto Integrada da Zona Costeira ou Gerenciamento Costeiro Integrado.

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    Assim, de posse de um conjunto de questionamentos. Surgiu o interesse em

    incorporar a observao crtica, oriunda do trabalho tcnico, que se situa na ponta

    do processo, para aprofundar o estudo e a conceituao sobre os benefcios e as

    deficincias do Projeto Orla. Dessa forma, visando identificar as possibilidades de

    implementao de uma poltica de Gerenciamento Costeiro Integrado ainda mais

    coerente e sustentvel, que enfrentei o desafio (e os riscos) de analisar um

    processo que ainda est em curso e que, portanto, conta com diversas dificuldades

    de avaliao. A vantagem, por outro lado, que as analises aqui feitas podem subsidiar alteraes no Projeto, uma vez que o caminho a ser percorrido por ele

    apenas comeou.

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    1 INTRODUO

    1.1 Contextualizao do Tema

    Desde o descobrimento do Brasil, as regies costeiras vm sendo utilizadas

    como espaos privilegiados para o assentamento humano, e a relao do homem

    com esses espaos permeada por aspectos culturais e socioeconmicos

    altamente relevantes. Junto a isso, necessrio salientar a importncia, nos

    ltimos cinqenta anos, do crescimento do turismo como fenmeno sociocultural

    de grande magnitude, principalmente por sua relevncia na incorporao e

    modificao dos espaos litorneos.

    Os ambientes marinhos e costeiros do Brasil tm sofrido, nos ltimos anos,

    um contnuo processo de degradao, gerado pela crescente presso da atividade

    humana sobre os recursos naturais marinhos e continentais e pela capacidade

    limitada de esses ecossistemas absorverem os impactos dela resultantes. A

    modificao do balano de nutrientes, a alterao ou destruio de hbitats, as

    mudanas na sedimentao, a superexplorao de recursos pesqueiros, a poluio

    industrial, principalmente por poluentes persistentes, e a introduo de espciesexticas constituem-se nos maiores impactos ambientais verificados na Zona

    Costeira brasileira (SANTOS; CMARA 2002).

    Podem ser encontrados, ao longo do litoral brasileiro, diversos ecossistemas

    de alta relevncia do ponto de vista ecolgico, tais como: mangues, campos de

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    dunas e falsias, baas e esturios, recifes e corais, praias e cordes arenosos,

    costes rochosos e plancies de mars, entre outros. tambm na Zona Costeira

    que se localizam as maiores manchas residuais de mata atlntica. Tal mosaico de

    situaes e ambientes diversificados confere Zona Costeira diversas

    oportunidades para atividades econmicas, como, por exemplo, a pesca, a

    agricultura, a aqicultura, a explorao de recursos minerais, e a explorao

    turstica, entre outros (SANTOS; CMARA, 2002).

    As presses da ocupao antrpica, no entanto, constituem grave ameaa a

    esse patrimnio ambiental. Alm disso, a diversidade de condicionantes ao longo

    da Zona Costeira torna a gesto integrada desses espaos um desafio, uma vez

    que situaes freqentemente dspares e presses de grupos sociais com

    interesses econmicos nas reas litorneas dificultam a elaborao e a

    implementao de polticas preventivas e corretivas. Ao longo da Zona Costeirabrasileira, grandes centros urbanos (cinco das nove regies metropolitanas

    brasileiras encontram-se beira-mar) so entremeados por reas de baixa

    densidade de ocupao, onde ocorrem ecossistemas de alta relevncia ambiental.

    Entretanto, essas reas costeiras com baixa densidade populacional vm sofrendo

    um rpido processo de ocupao, que tem como vetores a urbanizao, o turismo

    e a industrializao.

    Quando se consideram, alm das cinco regies metropolitanas costeiras, os

    efetivos de outras conurbaes litorneas, chega-se a quase 25 milhes de

    habitantes, distribudos em apenas onze aglomeraes urbanas na costa. Metade

    da populao brasileira reside a no mais de duzentos quilmetros do mar, o que

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    equivale a um efetivo de mais de setenta milhes de habitantes, cuja forma de vida

    impacta diretamente os ambientes litorneos.

    As diversas situaes existentes ao longo da Zona Costeira brasileira tm,

    como elemento comum, a fragilidade dos ecossistemas encontrados e a

    complexidade da sua gesto, com uma demanda enorme por insumos e material

    tcnico e cientfico que subsidie a elaborao e a implantao de polticas pblicas

    para esse espao.

    Os mecanismos de planejamentos implementados ao longo das dcadas de

    80 e 90 para a Zona Costeira brasileira apresentaram problemas e dificuldades

    gerais comuns aos modelos tradicionais de planejamento, quais sejam: a

    fragmentao da produo do conhecimento, a identificao histrica com o

    tecnocratismo (legitimador de uma matriz conservadora) e a falta de articulao

    entre esferas de governo. Alm dessas dificuldades gerais, existe o fator agravante

    de que essa rea apresenta um mosaico com imensa variedade de situaes,

    unidades fisiogrficas, nveis e formas de ocupao do territrio.

    De fato, como veremos no captulo 2, a Zona Costeira um ambiente

    repleto de particularidades no tocante s dimenses ambientais e sociais. Em parte

    devido a esse motivo, at mesmo a definio dos termos Zona Costeira e

    Ambiente Costeiro esto sujeitos a vrias formas de interpretao e delimitao,

    que variam de acordo com o tipo de anlise ou interesse (MORAES, 1999). Para

    fins poltico institucionais, mais interessante, por exemplo, definir a Zona Costeira

    a partir de limites poltico-administrativos, como foi feito na reviso do Programa

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    Nacional de Gerenciamento Costeiro, o PNGC (BRASIL, 2001). J discusses

    acadmicas, pesquisas cientficas ou instituies estritamente vinculadas

    dinmica dos ecossistemas comumente utilizam critrios biofsicos para delimitar

    os limites geogrficos desse espao, tais como acidentes geogrficos, rios,

    esturios ou outro ecossistema natural relevante (MARRONI; ASMUS, 2005).

    Tomemos como ponto de partida a definio mais tradicional e tambm mais

    geral de Zona Costeira, isto , um sistema ambiental formado pela interao direta

    de sistemas ambientais localizados no continente, sistemas ambientais localizados

    no oceano e sistemas atmosfricos. Embora essa delimitao parea um tanto

    quanto genrica e pouco elucidativa, ela est presente na legislao brasileira

    desde a elaborao da primeira verso do Plano Nacional de Gesto Costeira

    (PNGC), em maio de 1988, que no Pargrafo nico de seu artigo 2 define: Para

    os efeitos desta Lei, considera-se Zona Costeira o espao geogrfico de interaodo ar, do mar e da terra, incluindo seus recursos renovveis ou no, abrangendo

    uma faixa martima e outra terrestre, que sero definidas pelo Plano (BRASIL,

    1998). Encontra-se presente, novamente, na Resoluo 01 da Comisso

    Interministerial para os Recursos do Mar (CIRM), de 21 de novembro de 1990, que

    definiu a Zona Costeira como: a rea de abrangncia dos efeitos naturais

    resultantes das interaes terra-mar-ar (BRASIL, 1990).

    A definio final dos limites legais da Zona Costeira brasileira foi, portanto,

    estabelecida na atualizao do Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (PNCG

    II) (CIRM, 1997) (BRASIL, 2001), dirigindo sua definio ao atendimento de uma

    intencionalidade de gesto desse espao, ficando compreendida uma faixa

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    terrestre e uma martima. A faixa terrestre abrange municpios selecionados de

    acordo com os critrios estabelecidos no PNGC II, totalizando cerca de

    quatrocentos municpios, distribudos ao longo de 7.367 km de costa (que alcana

    8.698 km de extenso ao se considerar as reentrncias), numa rea de

    aproximadamente 388 mil km (Figura 2). A faixa martima vai at as 12 milhas

    martimas, compreendendo a totalidade do Mar Territorial brasileiro.

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    Figura 2: Municpios que Compem a Zona Costeira Brasileira

    Fonte: Tagliani, 2005

    A Zona Costeira est presente tambm no texto constitucional em seu Ttulo

    VIII, Captulo VI, nas disposies sobre o meio ambiente, Artigo 225, que afirma:

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    Todos tm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem deuso comum do povo e essencial sadia qualidade de vida, impondo-se aoPoder Pblico e coletividade o dever de defend-lo e preserv-lo para as

    presentes e futuras geraes (BRASIL, 1998).

    Sobre a Zona Costeira, o 4 Pargrafo define:

    A Floresta Amaznica brasileira, a Mata Atlntica, a Serra do Mar, oPantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira so patrimnio nacional, e suautilizao far-se-, na forma da lei, dentro de condies que assegurem apreservao do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursosnaturais (id. ibid.).

    Se observarmos, como fez Moraes (1999), que os remanescentes de Mata

    Atlntica e a Serra do Mar encontram-se, quase em sua totalidade, inseridos na

    Zona Costeira, temos uma tripla conceituao da Zona Costeira enquanto

    Patrimnio Nacional , alando-a a um alto grau de prioridade para a gesto

    ambiental.

    A despeito de tal importncia, diversos problemas decorrentes do uso

    intensivo desses espaos, principalmente a partir de meados do sculo passado,

    tm se tornado entraves ao desenvolvimento sustentvel da Zona Costeira.

    Intervir no meio ambiente costeiro objetivando proteg-lo significa atuar

    sobre uma unidade espacial complexa, constituda pela interao de elementos

    diversos, atores e interesses convergentes e conflitantes. Por isso, fundamental

    ao gestor a interao entre os meios tcnicos e poltico-institucionais e o meio

    acadmico, visando a uma constante retroalimentao e reavaliao dos

    problemas e tcnicas disponveis a essa gesto.

    Ao pensar em Desenvolvimento Sustentvel e Gesto Integrada da Zona

    Costeira, importante ter-se clareza de que o meio ambiente , segundo Becker;

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    interao entre elementos fsicos e bioqumicos e sociais , bem como um

    processo poltico, que mescla elementos da administrao e elementos da

    governabilidade. O bom funcionamento da gesto ambiental pressupe a interao

    dessas duas vertentes.

    necessrio observar, ainda, o conceito de planejamento ambiental

    expresso por Lanna (1995, p. 18), como

    (...) um processo organizado de obteno de informaes, reflexo sobre osproblemas e potencialidades de uma regio, definio de metas e objetivos,definio de estratgias de ao, definio de projetos, atividades e aes,bem como definio do sistema de monitoramento e avaliao que irretroalimentar o processo. Este processo visa organizar a atividade scio-econmica no espao, respeitando suas funes ecolgicas, de forma apromover o desenvolvimento sustentvel.

    Percebe-se nesse ponto de vista que, embora a gesto ambiental se

    caracterize por aes bastante diferenciadas do planejamento ambiental, no

    deveria ser desvinculada deste. Dessa forma, planejamento e gesto ambientaldeveriam acontecer concomitantemente, num processo iniciado pelo planejamento

    e retroalimentado continuamente pelas aes de gesto ambiental. A preocupao

    com a gesto ambiental um assunto cuja discusso vem crescendo no pas,

    muito embora o Brasil detenha uma das mais importantes biodiversidades mundiais

    e possa contar com um aparato legal considerado suficiente para poder facilit-la.

    Na tentativa de analisar as mudanas que ocorreram no mbito das aes

    governamentais e que resultaram na adoo de polticas pblicas como estratgias

    e diretrizes da prpria ao governamental, importante identificar o espao

    privilegiado de atuao dessas polticas que tm como meta e objetivo a

    sustentabilidade ambiental na Zona Costeira. Nesse sentido, para Meadowcroft

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    (1997), o planejamento e a gesto ambiental, no devem objetivar apenas a

    elaborao de solues amplas e acabadas, mas sim assumir um carter de

    processo com capacidade incremental e que seja suficientemente dinmico, a

    ponto de ser capaz de incluir a sua prpria reestruturao enquantodesign

    institutional , de forma a minimizar, assim, as necessidades de constantes

    intervenes. Essa concepo nos aproxima bastante do conceito de Gesto

    Costeira Integrada, que exposto por Cicin-Sain como:

    Gerenciamento Costeiro Integrado um processo, pois o mesmo caracteriza-se por ser participativo, contnuo, interativo e adaptativo, e que inclui umasrie de deveres associados, e que tambm devem alcanar metas eobjetivos pr-determinados. Este envolve, ainda, uma avaliao abrangenteda realidade em que est inserida e objetiva o planejamento de usos, e ogerenciamento dos sistemas e recursos, levando tambm em consideraoaspectos de natureza histrica, cultural e das tradies, bem como osconflitos de interesses e a utilizao do espao a ser analisado (CICIN-SAIN,apud POLETTE & SILVA, 2003, p. 3).

    As polticas pblicas, por sua vez, constituem instrumentos da ao

    governamental sendo, como destaca Bucci (2002, p. 45), programas de aogovernamental visando a coordenar os meios disposio do Estado e as

    atividades privadas, para a realizao de objetivos socialmente relevantes e

    politicamente determinados. Em realidade, h um componente prtico e finalstico

    na idia de poltica pblica como programa de ao governamental para um setor

    da sociedade ou um espao geogrfico (id. ibid.), buscando a concretizao de

    determinados objetivos e metas.

    importante, que a geografia utilize os instrumentos de anlise de que

    dispe para contribuir com o debate e a formulao de polticas pblicas sobre o

    ambiente, visto que a cincia ainda um frum privilegiado de discusses e

    reflexo. O propsito de ampliar o debate sobre Gerenciamento Costeiro Integrado

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    na Geografia particularmente interessante, pois trata-se de um campo sob o qual

    a capacidade de anlise pode contribuir para demonstrar a importncia das

    relaes scio-espaciais e da estrutura de classe no entendimento da problemtica

    ambiental. Segundo Coelho (2001, p. 20), Alm dos aspectos sociais e polticos,

    cabe aos gegrafos, especificamente, analisar a estruturao e reestruturao

    sociespacial, processo em que os benefcios e riscos ambientais so repartidos

    desigualmente no seio de uma sociedade heternoma. Segundo essa lgica, a

    Geografia um frum privilegiado para a discusso da gesto ambiental integrada,na viso de Becker e Gomes:

    A geografia pretende dar sempre questo do ambiente uma dimenso maisampla, que inclua suas mltiplas e complexas relaes com a sociedade, aqual tambm contextualiza e conduz a reflexo sobre a natureza. Estapretenso de sntese cria a via de uma obrigatria solidariedade disciplinar e,simultaneamente, coloca a geografia como produtora de um discursoespecfico, centrado no na naturalidade pura dos fenmenos, mas sim emsuas imbricaes com os fatos sociais (BECKER; GOMES, 1993, p. 148).

    Nessa perspectiva, ainda que no caiba a nenhum campo acadmico a

    propriedade sobre a questo ambiental ou urbana enquanto objetos de

    investigao prprios , visto que ambas so temticas interdisciplinares por

    excelncia, pretende-se, neste estudo, explorar as formas e instrumentos de

    anlise com que a geografia pode contribuir para a gesto ambiental, supondo-se

    que tais anlises podem vir a configurar valiosos aportes na formulao de polticas

    pblicas nesses temas.

    De incio, a Gesto Integrada da Zona Costeira requer, conforme o seu

    prprio nome aponta, uma necessria articulao entre diferentes setores e nveis

    de atuao. Tal processo de articulao estende-se desde a participao da

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    sociedade na formulao do diagnstico, a definio de prioridades e a

    implementao de programas, organizao de uma base poltico-institucional

    para a gesto costeira, que envolva, necessariamente, uma articulao mais

    harmnica e eficiente entre os trs nveis de governo. Essa articulao, como

    aponta Moraes (2005, p. 1), revela-se problemtica no Brasil, onde a questo

    federativa nunca foi bem equacionada. Operar na prtica o princpio da atuao

    cooperativa e concorrente presente na Constituio Federal no tarefa fcil. O

    autor deixa claro que tal tarefa fatalmente gera conflitos de competncia e entravesao planejamento e gesto integrados nos trs nveis de governo.

    Assim, pretende-se discutir, nesta dissertao, o papel da representao

    espacial dos fenmenos e das estratgias operacionais e discursivas adotadas

    para tratar dos problemas ambientais identificados na Zona Costeira brasileira,

    observando como a desregulamentao e re-regulamentao institucional tornam-se estratgias para a dinamizao da economia local. Trata-se de evidenciar como

    a retrica de transferncia de competncias e gesto local, baseada em

    intervenes pontuais e localizadas, integra um entrelaamento de discursos e

    prticas que tm o espao como referncia, configurando o que vem a ser

    chamado de poltica de escalas (ACSELRAD, 2006, p. 14). De acordo com esse

    autor,

    (...) para entender os meandros de uma tal poltica, no poderemos tomar adesconstruo e reconstruo de escalas espaciais como auto-evidentes;devemos, ao contrrio, procurar capt-las ao mesmo tempo como expressode relao de poder e como dinmicas que, por sua vez redistribuem estepoder sobre o territrio e seus recursos, sejam eles materiais, institucionaisou polticos (id. ibid.).

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    1.2 Objetivos

    O objetivo geral da presente dissertao , portanto, analisar se ocorre no

    Brasil uma efetiva Gesto Integrada da Zona Costeira, a partir da anlise do papel

    da representao espacial dos fenmenos e das estratgias operacionais e

    discursivas adotadas para tratar dos problemas ambientais identificados na zona

    costeira. Pretende-se observar a implementao e a execuo do Projeto Orla,

    particularmente no municpio de Cabo Frio, no Estado do Rio de Janeiro, posto que

    tal municpio pode ser visto como uma situao emblemtica de crescimento sob

    uma enorme presso turstica e de incorporao imobiliria.

    A partir dessa anlise, pretende-se identificar a ocorrncia de problemas e

    dificuldades decorrentes das relaes institucionais que se tornaram verdadeiros

    obstculos Gesto Integrada da Zona Costeira.

    Para concretizar-se essa meta, definiram-se os seguintes objetivos

    especficos:

    Analisar, com vistas ao seu perfeito entendimento, os agentes

    envolvidos e as presses sobre a zona costeira, com foco na

    observao dos mecanismos institucionais de gesto desse espao;

    Identificar o enquadramento legal e o arcabouo jurdico-institucional

    que rege os espaos costeiros e a poltica urbana;

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    Explicar o significado e os procedimentos do Projeto Orla enquanto

    um dos principais mecanismos de Gerenciamento Costeiro em

    implementao pelo governo federal nos dias atuais;

    Realizar um estudo de caso sobre as presses da ocupao e a

    implementao do Projeto Orla em Cabo Frio, RJ.

    1.3 Questes Norteadoras

    No contexto apresentado, esta pesquisa se utilizou de alguns

    questionamentos bsicos:

    Quais so os principais conflitos identificados no mbito do Projeto Orla?

    Eles so inerentes apenas s dinmicas e aos processos locais, ou h interaes

    com processos mais amplos que a esfera municipal? Qual a capacidade dos

    municpios em gerir esses conflitos?

    Que mudanas na forma de apropriao do territrio pretende-se conquistar

    com o Projeto Orla e quais as implicaes e o reflexo dessas mudanas no meio

    fsico-natural e na qualidade de vida dos grupos sociais afetados?

    Qual o papel do Projeto Orla frente s necessidades de articulao poltica

    entre esferas e agncias de governo? Ele atua para que haja o necessrio apoio

    institucional ao municpio (num processo, de transferncia de poder)? Contribui

    para gerir conflitos territoriais (associados ao uso e ocupao do solo) e conflitos

    ambientais nas esferas da prpria competncia administrativa do municpio?

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    1.4 Estrutura da Dissertao

    Esta dissertao est organizada em mais cinco captulos, alm deste,

    introdutrio.

    O captulo 2 foi pensado a partir, da dialtica existente entre as presses

    exercidas por variados grupos de interesse, em constante conflito com o

    compromisso do Estado no que diz respeito aos dispositivos legais relativos

    preservao do meio ambiente, e a interao possvel entre essas duas realidades

    em oposio. Entende-se que essa uma estrutura coerente para fazer uma

    apresentao clara dos problemas ambientais e suas origens, bem como da

    atuao de grupos de interesses sobre o espao costeiro. Assim, busca-se analisar

    como os principais problemas da atualidade na Zona Costeira so tratados emresposta a essas presses, observando os instrumentos de gesto urbana e de

    Gesto Integrada da Zona Costeira, bem como as estratgias poltico-institucionais

    associadas a essa gesto, em especial no mbito do Projeto Orla.

    No captulo 3, so apresentadas todas as caractersticas do Projeto Orla,

    mostrando as mudanas previstas no gerenciamento costeiro, os usos de Terrenosde Marinha e os planos de interveno a serem aplicados na orla marinha.

    O captulo 4 apresenta uma anlise conceitual mais aprofundada das

    implicaes do sistema poltico e das escalas de interpretao e apreenso desses

    fenmenos e processos. Entendendo que a estrutura poltico-institucional responde

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    por parte das dificuldades de implementao de um processo de Gesto Costeira

    Integrada (GCI) mais abrangente e coerente.

    No captulo 5, foi realizado um estudo de caso que buscou avaliar a

    implementao do Projeto Orla em Cabo Frio, no Rio de Janeiro, onde buscou-se

    avaliar como grupos de interesse que estabelecem relaes de poder com atuao

    na escala do municpio determinam diferentes estratgias discursivas e prticas de

    gesto que so capazes de mobilizar consensos e perpetuar suas esferas de

    influncia sem alterar substancialmente suas prprias prticas e formas de

    apropriao dos recursos naturais e paisagsticos.

    Finalmente, so apresentadas, no captulo 6, algumas consideraes,

    guisa de concluso sobre as relaes entre o que foi observado nos captulos

    tericos e a sua analogia com o que observado na realidade municipal, buscando

    fornecer caminhos para pensar mudanas que garantam melhores condies de

    implementao de um processo de Gesto Integrada da Zona Costeira.

    1.5 Mtodos de Pesquisa

    Quanto ao nvel pretendido, a pesquisa de natureza qualitativa, pois noprocura quantificar, mas sim elaborar uma anlise complexa com o objetivo de

    buscar aspectos [do problema da articulao institucional para a gesto ambiental

    e implementao de um programa de gerenciamento costeiro integrado] que ainda

    no foram investigados (RIZZINI, 1999, p. 89). Esta pesquisa est lidando com a

    impreciso de analisar um processo dinmico ainda em execuo. Considera-se,

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    ainda, que, como o Projeto Orla funciona a partir de bases tcnicas e conceituais

    extremamente inovadoras, o presente estudo s se tornou possvel por meio de

    uma pesquisa participativa, que permitiu a observao direta e ampla de variadas

    situaes. S assim, com a participao efetiva deste pesquisador, foi possvel a

    identificao das idiossincrasias prprias de cada caso e dos problemas comuns

    ao processo como um todo.

    1.6 Procedimentos Tcnicos de Coleta de Dados

    A opo quanto aos meios de investigao e procedimentos tcnicos de

    coleta de dados foi, inicialmente, encetar uma pesquisa documental, pois, de

    acordo com Vergara (2004), a pesquisa documental aquela que busca

    informaes em documentos conservados no interior de rgos pblicos

    (VERGARA, 2004, p. 49). Para este estudo, buscam-se dados na leitura de

    documentos normativos e tcnicos relativos aos instrumentos de Gerenciamento

    Costeiro e gesto ambiental e urbana.

    Alm da realizao de uma pesquisa documental, porm, foi imprescindvel

    utilizar, tambm, a busca de fundamentao terica em livros, por meio de uma

    pesquisa bibliogrfica, o que deu sustentao para a discusso da temtica tratadaneste trabalho. A opinio abalizada de tericos em Cincia Poltica possibilitou o

    contraditrio entre o que ideal, na ao poltica responsvel, comprometida com

    a preservao do meio ambiente e, por outro lado, os elementos de presso

    representados por grupos de interesse na sociedade civil.

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    E, como principal foco deste estudo, utilizou-se, ainda, a experincia

    adquirida por este pesquisador ao longo de dois anos de trabalho com os gestores

    municipais para subsidiar o entendimento dos problemas e situaes analisados

    nessa dissertao, tendo realizado, dessa forma, uma observao participante. De

    acordo com Almeida Pinto, na pesquisa participante, as diversas tcnicas

    reforam-se, sendo sujeitas a uma constante vigilncia e adaptao segundo as

    reaes e as situaes. (ALMEIDA; PINTO, 1995). Assim, nesta pesquisa foi

    utilizado no s o conhecimento formal, lgico, mas tambm um conhecimentoexperencial, em que esto envolvidas sensaes, percepes, impresses e

    intuies. Segundo Ldke e Andr (1986), este carter subjetivo importante no

    processo de anlise dos dados, porque enriquece a pesquisa qualitativa, visto que,

    na observao participante, o principal instrumento de pesquisa, o investigador,

    num contacto direto, freqente e prolongado com os atores sociais e os seus

    contextos.

    A maneira como a sociedade nela compreendidos os Governos nos

    mbitos municipal, estadual e federal, bem como os diversos grupos de interesses

    que se interpem s normas e legislaes interage, gerando presses, um fator

    primordial para qualquer estudo acerca da implementao de um projeto de Gesto

    Integrada. , pois, da dinmica causadora dos principais conflitos de interessesque este estudo parte, para obter a compreenso do processo como um todo.

    importante, ento, que o primeiro passo deste trabalho se volte para uma reflexo

    sobre a problemtica ambiental, frente aos mecanismos de gesto, e as presses

    dela decorrentes.

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    2 A PROBLEMTICA AMBIENTAL NA ZONA COSTEIRA E MECANISMOS DE

    GESTO

    2.1 Espao Costeiro Particularidades e Presses

    As zonas costeiras so sistemas altamente complexos, resultantes daintercepo da hidrosfera, da geosfera, da atmosfera e da biosfera. precisamente desta complexidade que resultam no apenas a elevadavariabilidade que apresentam, mas tambm as grandes potencialidades queas caracterizam. (DIAS, 2003).

    Com uma faixa de 8.698 quilmetros de costa, o Brasil abriga, ao longo do

    litoral, diversos ecossistemas de alta relevncia do ponto de vista ecolgico, tais

    como: mangues, campos de dunas e falsias, baas e esturios, recifes e corais,

    praias e cordes arenosos, costes rochosos e plancies de mars, entre outros.

    tambm na zona costeira que se localizam as maiores manchas residuais de mata

    atlntica. Tal mosaico de situaes e ambientes diversificados confere zona

    costeira diversas oportunidades para atividades econmicas, como, por exemplo, a

    pesca, a agricultura, a aqicultura, a explorao de recursos minerais, etc

    (SANTOS e CMARA, 2002).

    Esses ambientes originais da Zona Costeira foram profundamente alterados

    pela ocupao humana. Essa rea detm quase um quarto (23,9%) da populao

    do Pas, isto , 40,6 milhes de pessoas (censo demogrfico de 2000),

    concentradas em 7% dos municpios brasileiros (so cerca de 400 os municpios

    costeiros, de um total de 5.561). A densidade mdia de 105 hab/Km, nmero

    cinco vezes superior mdia nacional (20 hab/Km) (ASMUS & KITZMANN 2004).

    O nmero de habitantes em reas urbanas correspondia, em 1991, a 87,66% do

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    total, destacando-se que treze das dezessete capitais dos estados litorneos

    situam-se beira-mar. Alm disso, para Egler (2001, p. 28), ocorre na Zona

    Costeira uma

    (...) concentrao espacial do equipamento produtivo e energtico em zonase centros industriais. A associao de centrais energticas com terminaisespecializados e complexos industriais aumenta de sobremaneira o risco deacidentes, bem como favorece a exposio a longo prazo da populao asubstncias txicas na gua e no ar.

    Sobre os usos da rea litornea, esse autor afirma: evidente a

    concentrao produtiva na Zona Costeira, onde esto presentes campos de

    extrao, terminais e dutos de petrleo e gs, usinas termoeltricas e nuclear e

    expressiva concentrao dos complexos qumico e metal-mecnico (id. ibid.).

    Dessa forma, os riscos de acidentes como derramamentos de leo, vazamentos de

    gases e efluentes txicos so maiores em vrios trechos do litoral brasileiro em

    comparao com outras reas menos frgeis do Pas, pondo em risco os

    ecossistemas naturais e o patrimnio paisagstico representado por esse espao.

    Para Souza et al (2003), a zona costeira pode ser considerada como um

    espao repleto de contrastes, constituindo-se, dessa forma, um campo privilegiado

    para o exerccio de diferentes estratgias de gesto ambiental. Ao longo do litoral,

    so encontradas reas onde para onde convergem intensa urbanizao, atividadesindustriais de ponta e atividades porturias, bem como uma explorao turstica em

    larga escala (principalmente junto s metrpoles litorneas, que constituem centros

    difusores dos movimentos de ocupao territorial, do litoral).

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    Um aspecto fundamental associado questo dos usos desse espao e dos

    recursos ambientais da zona costeira reside no fato de que, nesses locais,

    definem-se, em geral, quadros problemticos do ponto de vista da gesto

    ambiental, o que demanda aes de carter corretivo, com a mediao dos

    "mltiplos conflitos de uso" dos espaos e recursos comuns e de controle do

    impacto sobre o ambiente marinho, decorrente de poluio e contaminao por

    diferentes tipos e fontes (SOUZA et al, 2003).

    Por outro lado, os espaos litorneos so permeados por reas de baixa

    densidade de ocupao1 aliada ocorrncia de ecossistemas de grande

    significado ambiental, que, no entanto, vm sendo objeto de acelerado processo de

    ocupao, demandando aes preventivas, de direcionamento das tendncias

    associadas dinmica econmica emergente (a exemplo do turismo e da segunda

    residncia para fins de veraneio, por exemplo) e o reflexo desse processo nautilizao dos espaos litorneos e no aproveitamento dos respectivos recursos

    ambientais.

    Optou-se, nessa dissertao, em focalizar o fenmeno urbano na Zona

    Costeira, observando a ampliao da ocupao a partir de uma dinmica de

    incorporao turstica e de lazer do espao costeiro, visto que tal fenmeno tmrepresentado uma grande fonte de presso sobre os recursos e ecossistemas

    contidos nesse espao.

    1 Para Moraes (1999), essa caracterstica de espaos densamente povoados entremeados poroutros ainda relativamente preservados est associada ao processo histrico de ocupao do litoralbrasileiro.

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    variadas, e com pequenos povoados costeiros sendo convertidos em grandes

    cidades. Muitos trechos litorneos, que ao longo de toda a histria quase no

    tinham sido ocupados, ficaram sobre-ocupados em poucas dcadas (Dias 2003).

    Dessa maneira, imprescindvel analisar as dinmicas do processo de

    urbanizao a partir do fenmeno turstico e da incorporao de novas reas. Tal

    fenmeno impulsionado por um processo mais amplo de articulao do Estado

    expanso capitalista. Assim, conforme exposto por Macedo (1993, p-55), o mar

    como valor cnico e a praia como espao de lazer so incorporados (...) ao

    repertrio urbano brasileiro. Em funo desse fenmeno, o autor estipula algumas

    conseqncias geradas na organizao espacial dessas cidades tursticas, entre

    elas destacam-se:

    Como conseqncia de seu uso exclusivamente sazonal, tais reasapresentam caractersticas prprias, sendo a principal o totaldesvinculamento de grande parte de sua populao de veranistas (donos damaior parte das residncias) com o municpio em que esto instaladas suaspropriedades. (...)Esse fato se reflete diretamente na forma de estruturao da trama urbana,que em geral ineficiente para receber elevados contingentes de veranistasque durante o ano multiplicam em muitas vezes a populao destas cidades.As deficincias so muitas: desde a inexistncia de servios deabastecimento adequados de gua, at a ausncia total de esgotos. Pormuitas vezes a vida urbana e at mesmo a economia da cidade e domunicpio esto estruturadas em funo exclusiva da temporada de vero(MACEDO, 1993, p. 61).

    Macedo ressalta, ainda, que raros so os municpios que conseguemaparelhar suas sedes para atender contingentes to grandes de populao

    unicamente com a renda advinda desse tipo de turismo. De fato, ao longo de dois

    anos de implementao do Projeto Orla em cerca de quarenta municpios ao longo

    da costa brasileira, constata-se que, por diversas vezes, tcnicos dos municpios

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    informaram que o ndice de inadimplncia no pagamento de IPTU era

    extremamente alto no caso de segundas residncias.

    Outro problema apontado por Macedo diz respeito ao fato de que tais

    ocupaes so voltadas para a mxima explorao dos valores paisagsticos

    ligados praia e ao mar, pois estes so os principais focos de atrao deste tipo

    de ocupao, e que os demais valores paisagsticos e ambientais, como barras de

    rios, manguezais e matas, no so objetos de ateno imediata nem para o

    empreendedor, nem para a maior parte do pblico consumidor e so eliminados

    quando necessrio (MACEDO 1993, p. 61). Dessa forma, as reas planas junto s

    praias so as mais pressionadas, sendo as preferidas para a implantao de

    loteamentos tursticos de segunda residncia. Outro aspecto dessa questo, que

    tais residncias, que ficam fechadas a maior parte do ano, alm de alterarem a

    paisagem, criam um custo de infra-estrutura que absorvido e pago pelosmoradores locais.

    Assim, observa-se que a dilatao de reas residenciais em linha ao logo da

    orla martima tem-se constitudo um dos processos bsicos da urbanizao

    turstica. Tais reas diferenciam-se no meio urbano em funo da diviso social do

    espao, o que reflete a diviso em classes sociais da populao urbana: as reasresidenciais expressam as condies de reproduo de cada classe social em

    funo da sua localizao, do acesso a equipamentos sociais, da qualidade das

    moradias, mas, fundamentalmente, no caso da incorporao turstica do espao,

    das amenidades naturais, que so apropriadas de maneira diferencial.

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    O crescimento dos processos de urbanizao turstica, ou de segunda

    residncia, esteve associado, inicialmente, ao provimento de novos padres de

    consumo de bens de longa durao (casas de veraneio) para as classes de maior

    poder aquisitivo. Entretanto, por se constiturem em expresses de necessidades e

    mecanismos intrnsecos ao prprio desenvolvimento capitalista, envolvem

    populao e capital na busca de um ajustamento aos padres de produo e

    consumo, por isso esse mesmo processo j foi incorporado s aspiraes de

    consumo de classes mdias.

    As regies litorneas, de reas naturais conservadas e os atributos

    paisagsticos, tornam-se alvo dessa aspirao de consumo, sendo intensa a

    procura pelo litoral nas proximidades de reas metropolitanas, de maneira que

    suas caractersticas originais so transformadas e suas paisagens modificadas.

    Assim, os potenciais atrativos, decorrentes de praias lmpidas, vegetaoabundante e diversidade topogrfica, tornam-se ameaados pelo uso indevido e

    pela ausncia de um planejamento adequado.

    Nesse contexto, observa-se que existe uma clara associao do fenmeno

    da urbanizao turstica a um processo de expanso metropolitana, pois as

    metrpoles detm condies e especificidades favorveis ao surgimento edesenvolvimento desse tipo de expanso. Entre tais condies, podem ser citados:

    - A disponibilidade de capital e a necessidade de incorporao de

    novas reas e formas de investimento.

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    - A presena de populao suficientemente favorecida capaz de se

    constituir em demanda potencial para investir em novas formas de

    consumo.

    - O crescimento da chamada indstria do lazer, capaz de mobilizar

    instrumentos de promoo e ampliao de uma cultura de consumo de

    massa do turismo litorneo, que se manifesta, essencialmente, nas

    formas de expanso e ocupao do espao.

    Para fazer uma anlise da composio de foras e de interesses que atuam

    na incorporao desse espao de consumo turstico-balnear, fundamental ter

    clareza de que essa incorporao se d nas estruturas de apropriao do espao

    vinculadas ao meio urbano, ou seja, a apropriao do espao ocorre dentro de uma

    expanso urbana inserida em um contexto capitalista. Nesse sentido, Roberto

    Lobato Corra (1989) j havia observado a composio dos atores chave no

    contexto urbano: os moradores, os proprietrios fundirios, promotores imobilirios,

    os incorporadores imobilirios e, fundamentalmente, o Estado.

    Nesse processo, entretanto, preciso salientar que, independentemente de

    se tratar de urbanizao turstica ou no, existem diferentes formas de anlise da

    relao sociedade-espao, e que esta pode ser vista tambm como uma relao

    valor-espao, principalmente tendo em vista que a apropriao de recursos

    naturais e a prpria dominao e substituio do espao natural por um espao

    humanizado um processo de criao de valor. Vale tambm observar que a

    noo de valor do espao est intrinsecamente associada ao seu valor de uso,

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    embora as condies de uso e as formas de apropriao do espao nem sempre

    sejam iguais para todos (MORAES; COSTA,1999). Alm disso, a noo de valor de

    um determinado local dentro do espao urbano faz-se essencialmente a partir de

    elementos que permitem uma diferenciao espacial, isto , o valor de

    determinados locais est associado ao no-valor de outros, seja pela presena de

    amenidades naturais, equipamentos sociais e urbansticos ou pelo valor simblico

    associado a determinados locais (CASTELLS, 1972).

    Nesse sentido, observamos que os principais mecanismos de produo da

    cidade capitalista esto baseados no princpio econmico da maximizao do

    benefcio, segundo o qual o solo torna-se valor de troca, ao se aplicar capital e

    trabalho mediante a urbanizao e a construo. Assim, no apenas os elementos

    da cidade (edifcios, habitaes, terrenos) convertem-se em mercadorias, a serem

    comercializados, mas tambm o diferencial de amenidades naturais que compemo processo de valorizao do solo tambm se converte em mercadoria.

    Desta maneira, possvel afirmar que a propriedade privada, fundamento do

    modo de produo capitalista, beneficia-se do valor de troca e apropria-se,

    enquanto elemento diferencial de valor, do patrimnio paisagstico que, a princpio,

    pertence a toda a coletividade. Alm disso, altera e pe em risco esses prprios

    valores paisagsticos. As contnuas transformaes da paisagem urbana tambm

    so conseqncias da busca do mximo benefcio pelo capital.

    Os proprietrios fundirios so os agentes responsveis, em grande parte,

    pela criao do padro de segregao urbana, uma vez que seus interesses esto

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    em ltima anlise, a existncia do espao como mercadoria, proporcionando a

    sustentao das relaes capitalistas.

    Na viso de Castells (1972), o Estado atua como regulador do conflito de

    classe e reflete, atravs de suas intervenes, as relaes polticas entre classes

    diferentes, representando, assim, uma estrutura para o exerccio do poder. Para

    Castells, o Estado s pode ser entendido como referncia estrutura de classes

    de uma sociedade, e, em particular, das classes dominantes e de sua relao com

    as classes dominadas. Dialeticamente, para Castells o Estado exerce (...) a

    dominao de uma classe, mas trata de regular, na medida do possvel, as crises

    do sistema, a fim de preserv-lo (CASTELLS, 1972, p. 295).

    Na acepo de Castells, o Estado estruturado de forma hierrquica e

    dotado de capacidade concreta de exerccio do poder em uma relao de

    subordinao-dominao, que, em ltima anlise, utilizada por burocratas para o

    exerccio de controle sobre a sociedade.

    Alm disso, ele concebe sua essncia, a tarefa concreta de dominao, damesma forma que realiza o poder econmico historicamente peladestruio, no curso do tempo, do espao social e pela sua substituio porum espao instrumental, fragmentado, e uma estrutura administrativahierrquica desenvolvida no espao (GOTTDIENER, 1993, p.146).

    essa capacidade de dominao que garante, segundo Acselrad (2004),

    que os recursos, danos e benefcios ambientais sejam apropriados, tanto em sua

    dimenso material, quanto simblica, de maneira diferenciada entre as classes

    com maior acesso aos centros decisrios. Dessa maneira, para esse autor, o

    Estado insere-se na luta pela apropriao simblica da base material, impondo a

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    definio de natureza estatizada, integrada ao capital, e de uma natureza residual

    onde acomodam-se os agentes que resistem ou so excludos (Ibidem, p. 21).

    importante aqui fazer um breve parntesis na tentativa de delimitar

    conceitualmente o que est sendo entendido como Estado. Afinal, mesmo no

    mbito da cincia poltica, esse conceito ainda um tanto impreciso, conforme

    aponta Bresser-Pereira (1995, p. 86):

    comum confundir-se Estado com governo, com estado-nao ou pas, emesmo com regime poltico, ou com sistema econmico. Na tradio anglo-sax, fala-se em governo e no em Estado. Dessa forma, perde-se adistino entre governo e Estado, o primeiro entendido como a cpulapoltico-administrativa do segundo. Na tradio europia, o Estado freqentemente identificado ao estado-nao, ou seja, ao pas. Expressescomo Estado liberal ou Estado burocrtico so normalmente uma indicaoque a palavra Estado est sendo utilizada como sinnimo de regimepoltico. Finalmente, expresses do tipo Estado capitalista ou Estadosocialista, identificam o Estado com um sistema econmico. vlido utilizarexpresses como essas quando desejamos definir o tipo de Estadopredominante em diferentes tipos de regimes polticos e modos de produo.Nesse caso, no estamos confundindo o Estado com o regime poltico oucom o sistema econmico, mas simplesmente dizendo que o Estado em umademocracia ser diferente de um Estado em um regime autoritrio, ou que oEstado no capitalismo diverso do Estado no feudalismo ou no estatismo.

    Independentemente dessa impreciso, o conceito de Estado utilizado para

    este trabalho ser claramente diferenciado dos conceitos de governo, de estado-

    nao, de regime poltico ou mesmo de territrio. O Estado visto aqui como uma

    parte da sociedade. uma estrutura poltica e organizacional que se sobrepe

    sociedade ao mesmo tempo em que dela faz parte.

    Em uma perspectiva histrico-materialista, entende-se o Estado enquanto

    um poder, isto , uma estrutura organizacional e poltica que emerge da

    progressiva complexificao da sociedade e da sua diviso em classes. Essa

    diviso destinada a manter a ordem dentro da sociedade, e, portanto, a manter o

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    sistema de classes vigente (BRESSER-PEREIRA, 1995). Complementarmente,

    esse autor destaca:

    Adotando-se uma perspectiva lgico-dedutiva ao invs de histrica, possvel afirmar que o Estado o resultado poltico-institucional de umcontrato social atravs do qual os homens cedem uma parte de sua liberdadea esse Estado para que o mesmo possa manter a ordem ou garantir osdireitos de propriedade e a execuo dos contratos (BRESSER-PEREIRA,1995, p. 89).

    Nesse sentido, no ser adotada, aqui, uma perspectiva marxista

    generalista, que entenda que a ao estatal simplesmente age de acordo com os

    interesses da classe dominante, sendo uma expresso poltica da estrutura de

    classes vigente. Desdobrando essa concepo, entende-se o Estado tambm

    como uma formao pluralista, onde se destaca a existncia de numerosos grupos

    de interesses difusos. Ainda assim, que fique claro que no se est negligenciando

    o papel exercido na mediao dos conflitos sociais, nos quais o Estado est

    profundamente envolvido.

    Para CASTRO (2005, p. 41), os conflitos de interesses surgem das

    relaes sociais e se territorializam, ou seja, materializam-se em disputas entre

    esses grupos e classes sociais para organizar o territrio da maneira mais

    adequada aos objetivos de cada um, ou seja, do modo mais adequado aos seus

    interesses.

    No contexto da determinao das funes do Estado na Gesto Ambiental e

    de suas atividades no mbito do planejamento e da gesto, alguns aspectos e

    escalas de anlise merecem ser mais bem detalhados, principalmente tomando por

    base que o poder pblico na escala do municpio , segundo Moraes (1999), um

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    espao privilegiado para o exerccio do planejamento e da ao poltica.

    Situando essa afirmao juridicamente, podemos observar que aConstituio de 1988 concedeu ao Municpio um significativo ganho em autonomia

    administrativa, desde que este ente federado obedea s normas constantes da

    legislao federal. Com relao questo ambiental, ocorreu um aumento das

    atribuies do Municpio, ampliando a esfera de sua competncia na proteo

    compartilhada do meio ambiente, assim como foi acrescentada a responsabilizao

    dos governos locais na proteo do patrimnio ambiental. Essa diretriz expressa

    no Art. 30 da Constituio Federal, que afirma que a proteo ao meio ambiente e

    o combate poluio em todas as suas formas so competncias comuns Unio,

    Estados e Municpios. Entre outras questes com impactos presumveis na

    dinmica ambiental da zona costeira, cabe salientar que compete ao Municpio,

    planejar o uso e a ocupao do solo em seu territrio, em especial na rea urbana;estabelecer normas de construo, de loteamento, de arruamento e de

    zoneamento urbano, bem como as limitaes urbansticas convenientes

    ordenao do seu territrio; conceder licena para localizao e funcionamento de

    estabelecimentos industriais, comerciais, prestadores de servio e quaisquer

    outros, renovar a licena e determinar o fechamento de estabelecimentos que

    funcionem irregularmente.

    Sendo assim, cabe ao poder pblico municipal, uma funo fundamental no

    mbito do planejamento, que deve ser visto como uma proposta tcnica

    consistente para a execuo de suas polticas pblicas. Nesse sentido, os critrios

    de sustentabilidade e de preocupao com a manuteno de ecossistemas e com

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    prticas polticas que privatizam as esferas decisrias, a definio de prioridades e

    os caminhos para a gesto.

    Ao projetar um cenrio de atuao poltica no meio urbano, a tendncia

    natural de um governo comprometido com a questo ambiental buscar prover

    algum tipo de resposta sociedade. Os governos locais, entretanto, tm

    encontrado dificuldade para fazer frente s demandas por polticas ambientais que

    amenizem a dramtica situao da maior parte das grandes cidades brasileiras.

    Isso fruto de um processo histrico criado por uma economia que se

    industrializou e provocou urbanizao descontrolada, com crescente concentrao

    de renda, acumulando um passivo ambiental elevado.

    Esse conjunto de polticas ambientais pode ser definido como medidas ou

    intervenes que pressupem uma tentativa de mediao dos conflitos pela

    apropriao de recursos, uma reduo dos processos que acarretam perda do

    patrimnio ambiental e paisagstico e uma equalizao de desnveis sociais e

    ambientais visando recuperao e ao acesso da populao a esses bens.

    necessrio, no entanto, que haja clareza quanto a: (a) as limitaes do poder local,

    dada sua escala de atuao e capacidade de investimento para promover

    mudanas estruturais em nvel de sociedade, uma vez que contradies inerentesao sistema no podem ser alteradas apenas por adoo de polticas locais; e (b) os

    governos locais permanecem pressionados, por um lado pela escassez de

    recursos, e, por outro, pela presso de interesses privados de grupos locais de

    poder.

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    Por esses motivos, a lgica da interveno governamental obedece a

    distintas estratgias, que se formam de acordo com as tenses organizacionais e

    com a estruturao, em maior ou menor grau, de grupos de presso no interior do

    espao urbano (VOIVODIC, 2002). Assim, essas intervenes tendem a variar de

    acordo com os diferentes nveis de governo ou com as estruturas das agncias

    burocrtico-administrativas. Ou, ainda, a interveno governamental obedece a

    estruturas de relacionamento poltico entre sociedade e grupos de poder

    (historicamente construdas), e segue, diversas vezes, por caminhos que nemsempre conduzem ao fortalecimento da cidadania e da participao poltica.

    Nesse contexto, segundo Acselrad (2004b), a prtica do planejamento

    urbano e do prprio urbanismo passa a ser concebida just in time , comandada em

    grande parte pela lgica do mercado imobilirio. Os grupos de poder localizados

    retiram da esfera do estado central certos papeis de coordenao das condiesde reproduo do capital e atribuem a si um papel mais pr-ativo nas estratgias

    de desenvolvimento local. Para Ribeiro (2000, p. 237), beneficiam-se dessa lgica

    projetos de renovao urbana que segmentam o tecido social e que mercantilizam

    a vida espontnea, favorecendo o embelezamento apenas da paisagem e

    ampliando os obstculos apropriao social da cidade.

    Assim, para Oliveira (2004, p. 110) a retrica da proteo ao meio ambiente

    e da conservao e defesa da natureza so elementos que passam a servir como

    recursos discursivos em processos de reestruturao do espao e reordenamento

    de usos recursos esses utilizados na construo de novas lgicas scio-

    espaciais com o fim de redefinir novas territorialidades, inclusive no interior dos

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    aparelhos do estado (e em suas diversas esferas).

    A questo da ocupao das zonas costeiras e da tendncia expanso daurbanizao turstica torna-se particularmente grave em funo da fragilidade

    desses ambientes. Alm do mais, o fenmeno da urbanizao turstico-balnear

    processou-se com tal rapidez, que a capacidade institucional dos organismos de

    gesto foi incapaz de conferir mecanismos regulatrios que impedissem a

    degradao ambiental. Antes da abertura de rodovias, os litorais ocenicos eram

    de tal modo sub-ocupados, que no havia preocupaes relevantes com a sua

    gesto. Perante os benefcios econmicos diretos do turismo (essencialmente a

    entrada de divisas), e diante da forte presso pela incorporao imobiliria

    (inclusive com umboom de emancipaes municipais), e da falta de corpo tcnico

    e capacidade institucional local, que garantisse um contraponto mnimo

    voracidade com que a urbanizao ocorreu, quase tudo foi permitido. A partir deento, comeam a surgir os problemas: contaminao das guas devido a

    deficincias (ou ausncia) dos sistemas de saneamento bsico; carncias de gua

    potvel devido sobre-explorao de aqferos e contaminao dos corpos

    dgua superficiais; perda de valores culturais; forte sazonalidade das atividades

    econmicas, com sobrecarga dos sistemas de abastecimento e saneamento nos

    perodos de pico; decaimento (e, em alguns casos, desaparecimento) da maior

    parte das atividades tradicionais; destruio de ecossistemas importantes; perda

    do patrimnio paisagstico e, at mesmo, perda do prprio novo patrimnio

    edificado, que pe-se em risco ameaado pelos temporais ou pela eroso costeira.

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    2.3 Dificuldades na Gesto Ambiental na Zona Costeira

    clara a necessidade de, urgentemente, o poder pblico proceder a uma

    regulao poltica eficaz. A interveno poltica necessria para detectar as

    conseqncias ecolgicas da atividade econmica, para avaliar os custos das

    externalidades e para garantir mecanismos regulatrios que restrinjam, pelo menos

    a forma como a ocupao se d, , no entanto, frequentemente limitada pelos

    alinhamentos institucionais do Estado capitalista. Isso porque, uma vez que os

    estados contam com as economias capitalistas para receberem suas receitas

    fiscais, existem grandes presses para restringirem a imposio de custos

    ecolgicos s atividades econmicas, nelas includas a prpria urbanizao.

    A dificuldade que as institucionalidades demonstram em regulamentar as

    questes ambientais passa pela dicotomia entre o ganho eleitoral da promulgaode leis ambientais e o custo poltico de sua implementao de fato. Existe, segundo

    Habermas, uma tenso bsica entre os princpios normativos de um Estado

    democrtico e as exigncias funcionais da acumulao capitalista: O Estado

    democrtico confere primazia integridade do mundo natural, e a acumulao

    capitalista atinge os seus limites legtimos no ponto em que a integridade social do

    mundo natural ameaada (HABERMAS, 1988. apud GOLDBLAT,1996, p.178)

    Outro problema tem relao com as distintas esferas e escalas em que os

    problemas ambientais so observados bem como os diferentes escales

    institucionais entre a concepo da ao planejadora e a sua implementao,

    como ser mostrado no captulo 5.

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    Segundo Lowry (2002), um dos maiores problemas atuais da gesto

    ambiental a dificuldade de transformar as metas ambientais em aes efetivas. O

    resultado dessa dificuldade chamado de lacuna de implementao ou

    implementation gap . Essa lacuna, segundo esse autor, est associada

    inconsistncia entre metas polticas estabelecidas em um nvel de governo e a

    translao dessas metas para atividades especficas de manejo em outros nveis

    ou em outras agncias de governo.

    Nas disputas que envolvem a produo do espao, urbano em geral e na

    zona costeira especificamente, existe, por parte dos atores envolvidos, uma

    apropriao de estratgias e variados recursos discursivos, no esforo de

    concretizao de seus interesses. Inclui-se, nesse rol, a propagao da

    modernidade e do emprego como estratgias de valorizar a atrao de

    investimentos e de incorporaes tursticas e imobilirias para determinadascidades. Nesse sentido, a questo da degradao ambiental tomada como um

    mal secundrio, sem haver uma clareza no entendimento dos supostos benefcios

    oriundos do crescimento urbano.

    Assim, dentro da lgica de um novo protagonismo do Municpio quanto

    regulao urbana, os espaos pblicos tornam-se instrumentos primordiais nacompetio por investimentos. Nesse contexto, o que est posto dot-los de

    significados, para que atuem na promoo das cidades. Esse fenmeno pode at

    responder por uma requalificao desses espaos, segundo um ponto de vista de

    melhoria das condies ambientais. Entretanto, os fins que justificam essa melhoria

    raramente so estritamente ambientais, e sim uma lgica de valorizao do espao

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    urbano a ser incorporado ou reestruturado para fins imobilirios. Em geral, esses

    novos espaos tm-se caracterizado por serem construtores ou reafirmadores de

    identidades e por estarem voltados para o consumo. A qualidade paisagstica,

    nesse caso, ganha um novo sentido, pois nesses espaos a apropriao privada

    do patrimnio ambiental se coloca como fator constituinte.

    Sobre esse aspecto, fundamental observar que espaos pblicos e

    privados so regidos por regras e mecanismos de controle distintos, conforme

    observa Eva (2004),

    Private space is organized according to the dimension and the concept ofproperty; who has the biggest property has a proportional level of power;private space is organized according the concept of inequality. ()Private property of the territory cut strongly the space, separating the privateone (with its proper authoritarian rules) and leaving us the public space(represented by the state) as a simulacrum of participation/negociation; thefact is that the social space the private owners are in condition to have moredecisional power and theres a continuous fight between inequalities.

    Para Gomes (2002, p. 164-165), o espao pblico o resultado de um

    gnero de relao contratual com o espao. tambm o lugar das inscries e

    do reconhecimento do interesse pblico sobre determinadas dinmicas e

    transformaes da vida social.

    As formas de organizao desse espao e o arranjo fsico das coisas e

    elementos que compem o espao pblico so consideradas por Gomes (idem, p.

    172) como agentes ativos na realizao de determinadas aes sociais, e essa

    ordem espacial concebida como uma condio para que essas aes se

    produzam. Esse ponto de vista nos remete dialtica do espao, isto , as

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    praticas sociais so fruto de uma dada forma de organizao do espao ao mesmo

    tempo em que condicionam essa mesma organizao espacial.

    Nesse sentido, esse autor defende que um olhar geogrfico sobre o espao

    pblico deve considerar, por um lado, sua configurao fsica e, por outro, o tipo de

    prticas e dinmicas sociais que a se desenvolvem (GOMES, 2002, p. 172).

    A opo por tratar do problema ambiental da zona costeira a partir das

    relaes existentes no mbito do espao urbano decorre justamente doentendimento de que a cidade um palco privilegiado dessa combinao repleta

    de conflitos entre a apropriao pblica e privada do espao. A zona costeira e a

    orla martima, em especial, revelam-se exemplos bastante paradigmticos desse

    tipo de relao, pois trata-se de espaos dotados de particularidades que lhes

    conferemstatus privilegiado, seja como Patrimnio Nacional (a zona costeira), seja

    como bens de domnio da Unio (os terrenos de marinha e seus acrescidos) ou

    bem de uso comum do povo brasileiro as praias, ou seja como propriedades

    privadas de alto valor comercial, no caso de residncias, hotis, etc.

    Cada municpio tem hoje a tarefa de combater a degradao ambiental e,

    por isso, todos eles devem adotar polticas pblicas e sistemas de gesto que

    permitam compatibilizar a construo e a manuteno de infra-estruturas

    necessrias ao desenvolvimento econmico, com o controle da poluio e do uso e

    ocupao do solo urbano, a criao de reas de preservao ambiental e a

    participao da populao na gesto ambiental.

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    A degradao do ambiente costeiro fruto, do complexo e acelerado

    processo de apropriao do espao e das relaes sociais que a se impe,

    conforme foi apresentado. Essa apropriao, no entanto, revela um significativo

    paradoxo, pois ao mesmo tempo em que ela o fator da perda do patrimnio

    ambiental e cultural do litoral, tambm um potencial de desenvolvimento.

    preciso, entretanto, observar que a qualidade paisagstica, a beleza cnica e a

    salubridade do ambiente so os fatores de atratividade dos espaos litorneos e

    representam um importante ativo ambiental e que, assim, o comprometimentodesses fatores pode significar a estagnao econmica, derivada da perda da

    qualidade ambiental (BUTLER, 1980). Por isso, o ordenamento desse espao, nos

    termos da proteo ao ambiente natural, passou a ser uma prioridade (BRASIL,

    1996) e modelos de desenvolvimento regional compatveis ecologicamente

    permearam o discurso tcnico e acadmico vigente a partir de meados dos anos

    80.

    A incorporao da questo da degradao ambiental na Zona Costeira no

    discurso acadmico particularmente importante, pois, segundo Hanningan

    (1995), existem seis fatores que so fundamentais para a construo com xito de

    um problema ambiental e para a busca de solues:

    1. Autoridade cientfica para a validao das exigncias2. Existncia de propagadores que possam estabelecer a ligao entre ambientalismo e a

    cincia3. Ateno dos meios de comunicao social onde o problema estruturado como novidade e

    importante4. Dramatizap do problema em termos