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93

Mestrado Profissional em Agroecossistemas

A FORMAO TERICO-PRTICA DO TCNICO EM AGROECOLOGIA NA ESCOLA 25 DE MAIO DE FRAIBURGO/SC.

Mestrando: Paulo Davi Johann

Orientadora: Prof. Dr Marlene Ribeiro - UFRGS

Co-Orientadora: Prof. Dr. Sandra Luciana Dalmagro - UFSC

Florianpolis/SC

Maro 2015

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA UFSC

CENTRO DE CINCIAS AGRRIAS

PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM AGROECOSSISTEMAS

Mestrado Profissional em Agroecossistemas

A FORMAO TERICO-PRTICA DO TCNICO EM AGROECOLOGIA NA ESCOLA 25 DE MAIO DE FRAIBURGO/SC.

Mestrando: Paulo Davi Johann

Dissertao apresentada como pr-requisito para a obteno do grau de Mestre em Agroecossistemas sob a orientao da Dr Marlene Ribeiro e a co-orientao da Dr Sandra Luciana Dalmagro.

Florianpolis/SC

Maro - 2015

SUMRIO

INTRODUO...................................................................................................................... 02

I CAPTULO A RELAO TEORIA E PRTICA NA EDUCAO.......................... 15

1.1 O processo histrico do vnculo ou desvnculo terico/prtico na formao humana...15

1. 2 Unidade teoria e prtica para a educao emancipatria.............................................. 21

1. 3 Unidade teoria e prtica na educao escolar............................................................... 25

II CAPTULO FORMAO EM AGROECOLOGIA NO MST E A RELAO TEORIA E PRTICA NA FORMAO DO TCNICO EM AGROECOLOGIA............................. 33

2. 1 Agroecologia e o processo de formao humana......................................................... 33

2. 2 A educao escolar e a agroecologia..............................................................................40

2.3 A formao tcnica e a Agroecologia..............................................................................47

III CAPTULO A UNIDADE TEORIA E PRTICA NA FORMAO DO TCNICO EM AGROECOLOGIA: A PROPOSTA DE EDUCAO DO MST.................................... 51

3.1 Histrico da luta pela Escola 25 de Maio....................................................................... 51

3. 2 A Escola 25 de Maio como espao de formao em agroecologia................................ 54

3.3 O Curso Tcnico em Agroecologia na Escola 25 de Maio .............................................57

3. 4 A relao teoria e prtica na formao do Tcnico em Agroecologia............................ 61

3. 5 A realidade do Curso Tcnico em Agroecologia na Escola 25 de Maio........................ 63

3. 6 O desafio da Escola 25 de Maio na formao do Tcnico em Agroecologia.................78

CONSIDERAES FINAIS...................................................................................................83

INTRODUO

A pesquisa aqui apresentada abordar a formao terico-prtica, a partir da relao entre educao e trabalho, trabalho manual e trabalho intelectual, como unidade dialtica necessria formao do tcnico em agroecologia. Explica-se pela contribuio que poder oferecer s escolas do campo de forma geral, e em particular, as escolas de formao tcnica para avanar na formao, no s no sentido estritamente tcnico, mas tambm a formao que contemple a totalidade do ser humano.

A problemtica da formao tcnica est presente nas discusses do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em suas instncias. Como militante do MST e no sentido de poder colaborar na qualificao desse debate, escolhi, como tema, a articulao da teoria com a prtica, ou do trabalho manual com trabalho intelectual, na formao do tcnico em Agroecologia, na Escola 25 de Maio, que est localizada no Assentamento Vitria da Conquista, no municpio Fraiburgo, no estado de Santa Catarina. uma Escola que oferece a formao tcnica em Agroecologia, integrada ao Ensino Mdio. A referida Escola vincula-se, por um lado, rede estadual de educao de Santa Catarina, e, por outro lado, tem vnculo orgnico com o MST. No seu Projeto Poltico Pedaggico (PPP) ela incorpora o vnculo da teoria com a prtica, tendo o trabalho como princpio educativo e instrumento didtico pedaggico para auxiliar no aprendizado.

A educao ligada ao mundo do trabalho no pode ficar alheia s exigncias complexas dos processos produtivos e a ao educativa deve refletir sobre estas questes selecionando contedos vinculados ao mundo do trabalho e acompanhando experincias de trabalho educativo. O trabalho torna-se, tambm um recurso pedaggico ao provocar, atravs, de sua prtica, necessidades de aprendizagem, bem como pela sua condio de construtor das relaes de classe (PPP, 2013, p. 7-8).

A formao do tcnico em Agroecologia, vinculada ao MST, muito discutida nesse Movimento, em particular nos setores de Educao e Produo. A discusso que o MST est fazendo est relacionada a esta formao de tcnicos em Agroecologia, que possam se apropriar dos elementos tcnicos vinculados aos elementos polticos, ou ainda, realizar a articulao terico-prtica. Em outras palavras, a questo : como a Escola poder formar este tcnico em Agroecologia, com capacidade tcnica e compromisso poltico para atuar junto aos camponeses e contribuir, tanto no aumento da produo de base agroecolgica, como na organizao dos camponeses, enquanto classe, para a luta pela construo do paradigma da agroecologia em contraposio ao paradigma do agronegcio. Nesse sentido, a formao tcnica pensada pelo MST procura aliar elementos tcnicos aos elementos polticos. Mas, a partir da podem ser formuladas vrias questes como: possvel numa sociedade de classes, que separa trabalho manual do intelectual e que produz uma educao escolar divorciada do processo produtivo, aliar a teoria prtica como uma unidade dialtica? E ainda: trabalho manual e trabalho intelectual? E como fazer isso na prtica do cotidiano escolar?

A partir de estudos de pesquisadores crticos que j escreveram sobre esta problemtica da vinculao da teoria com a prtica, trabalho manual com trabalho intelectual, educao escolar com o trabalho prtico, pode-se dizer que sim. Mais adiante, veremos mais sobre isso. Antes quero expor sobre a problemtica vivenciada pelas escolas vinculadas ao MST, em relao formao omnilateral, uma formao que vincule teoria prtica, trabalho prtico ao trabalho intelectual, conhecimento tcnico ao compromisso poltico na luta pela emancipao do ser humano.

O MST tem como princpio que a escola dever trabalhar a formao omnilateral do ser humano. Esta formao possvel a partir da unio do trabalho prtico com trabalho intelectual, ou, uma educao que articule a teoria com a prtica, no sentido da prxis. A prxis inerente formao do ser humano omnilateral, ou seja, formao nas dimenses fsica, moral, espiritual, artstica, etc. Nessa concepo, o trabalho deixa de ser atividade puramente prtica para se converter em atividade terica prtica. uma atividade em que se encerra o pensar e o fazer como uma unidade dialtica.

esta unidade dialtica, fazer e pensar, prtica e teoria que, no caso de uma formao omnilateral, sustenta ao educativa da escola. Mas, se percebe no trabalho de assistncia tcnica desenvolvido pelos egressos da Escola, a qual objeto de minha pesquisa, a existncia de uma lacuna entre o conhecimento terico e o conhecimento prtico. Ou seja, os tcnicos egressos, de certa forma, tm um bom conhecimento terico (discurso) acerca da Agroecologia, mas por outro lado, tm dificuldade em relacionar a teoria prtica. Pode-se perceber no trabalho desses tcnicos a dificuldade em relacionar a atividade prtica da assistncia tcnica com o conhecimento poltico-organizativo, no sentido de uma melhor compreenso da unidade do conhecimento prtico com o conhecimento terico. Este poderia ser um caminho estratgico em contraposio ao agronegcio, e, ao mesmo tempo, para a construo do paradigma da Agroecologia, como instrumento na luta pela construo de uma sociedade em que a diviso de classes seja superada.

O objetivo da Educao do Campo projetada pelos movimentos sociais populares do campo, unificados na Via Campesina Via Campesina uma organizao social do campo formado pelo Movimento dos trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Movimento dos Atingidos pelas Barragens (MAB), Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Movimento das Mulheres Camponesas (MMC), Pastoral da Juventude Rural (PJR), Federao dos Estudantes de Agronomia do Brasil (FEAB), Comisso Pastoral da Terra (CPT), Associao Brasileira dos Estudantes de Engenharia Florestal (ABEEF), Conselho Indigenista Missionrio (CIMI) e Pescadores e Pescadoras Artesanais. de forma geral, e de modo particular pelo MST, a compreenso articulada prtica da educao como instrumento de emancipao humana. Por isso, a Educao do Campo se articula luta pela reforma agrria, com a terra para os que nela trabalham e vivem deste trabalho, e por um projeto popular de sociedade, que penso seja socialista. Mas para que a Educao do Campo possa cumprir com esta funo necessrio trabalhar a formao do ser humano em todas as suas dimenses, ou seja, segundo Marx (1978) uma educao omnilateral em oposio educao unilateral do liberalismo.

A partir da compreenso do trabalho como princpio educativo, e da forma pedaggica de estabelecer a relao entre a teoria e prtica, trabalho manual e trabalho intelectual na educao escolar, que esta pode contribuir no avano da formao tcnica, no sentido de formar tcnicos, no s comprometidos com os movimentos sociais populares que lutam pela terra de trabalho no/do campo, mas tambm com capacidade tcnica e poltica de contribuir na construo de processos de mudana social e cultural do campons incidindo sobre a produo agropecuria. Em outras palavras: contribuir na construo de processos de converso da agricultura oriunda da revoluo verde A Revoluo Verde foi concebida como um pacote tecnolgico insumos qumicos, sementes de laboratrio, irrigao, mecanizao, grandes extenses de terra conjugado ao difusionismo tecnolgico, bem como a uma base ideolgica de valorizao do progresso (PEREIRA, Mnica, 2012, p. 685). Este era um amplo programa idealizado pelo capital para aumentar a produo agrcola no mundo por meio da introduo de melhorias genticas em sementes, uso intensivo de insumos industriais (agrotxicos), mecanizao e reduo do custo de manejo com a promessa de acabar com a fome no mundo. para a agricultura com base orgnica, preservando e respeitando a natureza e compreendendo o homem como parte da natureza. E, ainda, organizando-se de forma solidria para definir alternativas de defesa deste trabalho, e da sociedade humana que o exige.

A escolha do tema articulao teoria e prtica na educao escolar, tendo o trabalho como mediao na formao do tcnico em agroecologia se deu em virtude da necessidade da formao de tcnicos agrcolas com capacidade terico-prtica que possa contribuir com os camponeses para a construo de processos agroecolgicos de produo. A formao exigida pelos Movimentos Sociais Populares do campo no sentido da formao unitria, que decorre de uma formao tcnica aliada formao humanista (GRAMSCI, 1982). Esta proposta est fundamentada em documentos do MST, em que foram definidas as linhas polticas a construo da Agroecologia Agroecologia, mais do que simplesmente tratar sobre o manejo ecologicamente responsvel dos recursos naturais, constitui-se em um campo do conhecimento cientfico que, partindo de um enfoque holstico e de uma abordagem sistmica, pretende contribuir para que as sociedades possam redirecionar o curso alterado da coevoluo social e ecolgica, nas suas mais diferentes inter-relaes e mtua influncia (CAPORAL, 2009, p.4). como paradigma de desenvolvimento do campo em contraposio ao agronegcio Princpios filosficos: 1) educao para a transformao social; 2) educao para o trabalho e a cooperao; 3) educao voltada para as vrias dimenses da pessoa humana; 4) educao com/para valores humanistas e socialistas; e 5) educao como um processo permanente de formao/transformao humana. Princpios pedaggicos: 1) relao entre prtica e teoria; 2) combinao metodolgica entre processos de ensino e de capacitao; 3) a realidade como base da produo do conhecimento; 4) contedos formativos socialmente teis; 5) educao para o trabalho e pelo trabalho; 6) vnculo orgnico entre processos educativos e processos polticos; 7) vnculo orgnico entre processos educativos e processos econmicos; 8) vnculo orgnico entre educao e cultura; 9) gesto democrtica; 10) auto-organizao dos/das educandos; 11) criao de coletivos pedaggicos e formao permanente dos educadores/das educadoras; 12) atitude e habilidades de pesquisa; e 13) combinao entre processos pedaggicos coletivos e individuais (MST, 1999, p 04).. Portanto, a escolha da Escola 25 de Maio, como objeto de minha pesquisa, explica-se pelo fato de ela organicamente vinculada ao MST.

A Escola 25 de Maio tem, por objetivo, a formao omnilateral do tcnico em Agroecologia, no sentido de capacitar seus educandos tecnicamente e politicamente para contribuir na construo da Agroecologia como paradigma de desenvolvimento do campo, em contraposio ao paradigma hegemnico do agronegcio. Em outras palavras, a formao do tcnico deve contribuir na luta pela transformao no s do campo, mas de toda sociedade, ou seja, na construo de uma sociedade sem classes, em que seja superada a dicotomia trabalho manual e trabalho intelectual. Os objetivos que deixam esta afirmao mais clara constam nos princpios filosficos e organizativos das escolas do MST

.

Agroecologia o estudo de processos econmicos e de agroecossistemas, como tambm, um agente para as mudanas sociais e ecolgicas complexas que necessitam ocorrer no futuro a fim de levar a agricultura para uma base verdadeiramente sustentvel (BALEM; SILVEIRA, 2002, p. 4).

Na definio de agroecologia dada por Balem e Silveira, na obra citada, pode-se perceber como se faz necessrio formar tcnicos agrcolas que no s se capacitem, ou se formem tecnicamente, mas tambm politicamente para poderem contribuir na interveno da complexa realidade campo. Na Escola 25 de maio, segundo Mohr e Ribas (2010, p. 2), desde o princpio de sua fundao, esto presentes os ideais da pedagogia socialista, de Makarenko (s/d) e Pistrak (2000), pedagogia esta que considera a organizao coletiva e o trabalho como princpios educativos.

Na luta pela mudana do paradigma de desenvolvimento do campo, empreendida pelos Movimentos sociais populares do campo de forma geral e, em particular pelo MST, a educao, formao/capacitao fazem parte desta luta. nesse intuito que o MST luta por escolas de forma geral e, em especfico, por escolas tcnicas para formar os sujeitos que vivem nos assentamentos. A formao que as escolas vinculadas ao MST pretendem oferecer s pessoas que vivem nos assentamentos a formao omnilateral, como afirmado antes. Formao esta que possibilite ao estudante compreender no s a Agroecologia, mas tambm a agricultura convencional e como este modelo contribui para o desequilbrio da natureza, afetando o clima, a flora e a fauna, mas, acima de tudo, sendo concentrador da terra, de renda, e excluindo, cada vez mais, um nmero maior de camponeses.

A compreenso de que o educando no seu processo de formao na escola deva incorporar conhecimentos que possam contribuir na construo do novo, fundamental. Mas novo, aqui, significa a mudana do paradigma de desenvolvimento do campo. A agroecologia. E na escola que o estudante vai apreendendo os conhecimentos cientficos e vai articulando-os com seus conhecimentos emprico-populares enquanto filho de camponeses. A articulao entre conhecimento o cientfico e o conhecimento emprico-popular vai se dando, no na teoria, mas na prxis social. Apreender este conhecimento fundamental para o tcnico que pretende atuar junto aos camponeses, sejam eles assentados ou no.

Compreendendo a importncia do trabalho como prxis social na vida do ser humano que as escolas ligadas ao MST incorporam a prxis nos seus objetivos pedaggicos. Esta incorporao se d por ser esta que, segundo Engels (1999), formou o ser humano. Prxis social aqui entendida como trabalho, pois no ato de trabalhar, quando o trabalho livre, que se sintetiza a teoria com a prtica. Pois, foi assim que o ser humano durante milhes de anos foi se produzindo a partir do trabalho. A relao dialtica entre o ato do fazer, a prtica do trabalho e o pensar sobre o trabalho que a prxis social precisa estar presente na educao escolar. Para compreender melhor como se d esta relao na educao de forma geral e, em particular, na escola o que me fez pensar em estudar este tema.

Este texto est organizado em trs partes. Na primeira parte farei uma apresentao da proposta de pesquisa onde explicitarei o problema da pesquisa, os objetivos gerais e especficos, a metodologia que vou utilizar ou o caminho metodolgico e os procedimentos a serem utilizados para alcanar os objetivos, ou responder a questo central da pesquisa.

Na segunda parte tratarei sobre a base terica que vai fundamentar o estudo. Ou seja, o referencial que servir de apoio ou que auxiliar na compreenso dos fatos, ou do fenmeno a ser estudado. Sobre a Escola 25 de Maio e o processo de luta pela conquista dessa escola, assim como sua caracterizao e organizao, seu duplo vnculo, por um lado com o Estado e, por outro, com o MST so itens da terceira parte. Ainda integram esta parte as primeiras impresses que tive ao fazer a primeira visita Escola, para fazer as observaes propostas na metodologia. Por ltimo temos os anexos.

Passo, agora, apresentao do problema que d origem s questes de pesquisa as quais orientam a escrita desta dissertao. Assim, neste meu trabalho de pesquisa, cujo tema a formao terico-prtica na formao do tcnico em Agroecologia, tenho as seguintes indagaes: de que forma a Escola 25 de Maio vincula o trabalho educao? Ou melhor, como a referida Escola estabelece o vnculo entre o trabalho e educao escolar? Que lugar a escola d s atividades de trabalhos manuais realizadas pelos estudantes? Ou ainda, como articula teoria e prtica, estudos tericos e trabalhos manuais? E, em base a estas indagaes, formulo a seguinte questo de pesquisa: como a escola 25 de Maio articula estudos tericos e trabalho prtico na formao do tcnico em Agroecologia?

Estas questes, ou interrogaes, me despertaram o interesse em estudar para poder contribuir com a Escola, com a formao dos tcnicos em Agroecologia, e com o MST, na discusso sobre a relao trabalho-educao no processo de formao para a emancipao humana. Estas, a meu ver, so questes que implicam no alcance ou no dos objetivos da educao a qual o MST discute em suas instncias organizativas. Objetivos estes que esto direcionados emancipao humana.

E a partir das questes suscitadas so formulados os objetivos que definem os caminhos a serem trilhados nesta pesquisa, atravs da qual me proponho a averiguar se os estudos tericos esto, de fato, articulados aos trabalhos prticos desenvolvidos pelos estudantes da Escola 25 de Maio, considerando que a mesma, orientada pelos princpios e mtodos do MST, pretende formar tcnicos em Agroecologia. Para isso, foi necessrio identificar o lugar do trabalho prtico efetuado na e pela Escola Agrotcnica 25 de Maio; analisar a concepo de educao e de formao tcnica associadas formao poltica, alm de refletir sobre os limites e as possibilidades que a Escola apresenta no que concerne formao tcnica em agroecologia. Assim, com o estudo sistematizado nesta Dissertao pretendo estar contribuindo para a formao do tcnico militante, com capacidade para intervir junto agricultura camponesa, visando fortalecer a produo agroecolgica.

A Dissertao est organizada em trs captulos. No primeiro abordarei a relao teoria e prtica na educao, tendo por base o processo histrico que aponta o vnculo terico prtico na formao humana, considerando a unidade teoria e prtica na educao emancipatria e como esta unidade pode ser possvel ou no, na educao escolar. A relao entre a formao humana e a agroecologia ser o tema do segundo captulo, no qual aprofundarei esta questo ao incluir a educao desenvolvida pela Escola 25 de Maio, mais propriamente a formao do tcnico em agroecologia. No terceiro captulo abordarei a unidade entre teoria e prtica na formao do tcnico em agroecologia que feita pela Escola acima nomeada, situada em Fraiburgo/SC. Para isso ser preciso trazer a histria da luta para a conquista desta Escola, como espao de uma formao em Agroecologia demandada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ao qual esto vinculados os estudantes.

Para desenvolver esta Dissertao sero apresentados alguns elementos da relao educao e trabalho a partir da teoria marxista. Nesse sentido, tentarei trazer uma viso histrica de como a relao educao e trabalho foi se distanciando do mundo da produo, durante determinado tempo, na medida em que os seres humanos iam organizando a produo de modo a organizar, tambm, a sociedade de classes sociais em contradio e que, portanto, se contrapem. Da emerge a pergunta: como que a unio entre o trabalho e a educao poder contribuir na formao humana em todas suas dimenses, incluindo a luta pela emancipao, quando estamos imersos nesta sociedade de classes? a questo que orienta o estudo aqui desenvolvido sobre a formao do Tcnico em Agroecologia efetuado pela Escola 25 de Maio.

A pesquisa que fundamenta a Dissertao foi desenvolvida na Escola de Educao Bsica 25 de Maio, situada em Fraiburgo/SC, mais especificamente, com turmas de estudantes matriculadas no ano de 2012 e 2013, no curso Tcnico em Agroecologia, tendo como sujeitos de pesquisa: professores, estudantes, integrantes do conselho escolar, pais de alunos e lideranas locais do Movimento Sem Terra (MST) com o qual a escola tem vnculo orgnico. Para isso, adotou-se uma metodologia de carter qualitativo.

Os dados obtidos atravs de entrevistas, observaes, leituras de documentos, foram analisados com base no referencial do materialismo histrico-dialtico, onde o real se apreende a partir da anlise do fenmeno, partindo do emprico (abstrato) para o concreto (apropriao do concreto em nossa mente), considerando as relaes que se estabelecem entre o fenmeno particular com o geral-universal. Segundo Marx (2006) o concreto concreto por que expressa as mltiplas relaes que o determinam. Ou seja, o fenmeno no se se deixa conhecer pela aparncia, mas pela essncia que ocultada na sua aparncia por um invlucro produzido pela diviso do trabalho na sociedade de classes. Kosik (1986) aprofunda esta questo proposta por Marx, na obra citada, ao apontar que a essncia desta forma de organizao injusta, que histrica, se mostra como aparncia, ocultando a real explorao/expropriao da classe trabalhadora e, com isso, dificulta a percepo da sociedade que no como se mostra.

Nesse sentido, busquei compreender o fenmeno a ser estudado a partir das informaes coletadas pela observao in loco, pelas entrevistas, leituras de documentos produzidos pela escola tentando captar o fenmeno e como este se manifesta e por ela manifestado, o que exigiu uma anlise capaz de ir alm das aparncias, para penetrar na essncia. E, para isso, ou seja, para chegar essncia do fenmeno torna-se necessrio, em primeiro lugar, buscar as relaes que se estabelecem entre o fenmeno a ser conhecido como totalidade, ou seja, com a forma como a sociedade se organiza para produzir a vida. E, em segundo lugar, no se pode analisar o fenmeno em si desconsiderando as relaes internas e externas que o fazem ser tal como . Assim, s possvel conhecer verdadeiramente os fenmenos sociais, quando se utiliza um mtodo e uma abordagem que vo para alm das aparncias. Este mtodo o materialismo histrico dialtico, que sustenta esta abordagem substancialmente qualitativa.

Para realizao deste estudo, alm da pesquisa de campo cujas tcnicas foram apontadas anteriormente, tambm foi realizada uma pesquisa documental e bibliogrfica. Alm das entrevistas, a pesquisa baseou-se na observao, feita em trs momentos, atravs de visitas Escola, perfazendo um total de vinte e sete dias de observao. As visitas e observaes foram realizadas, conforme o previsto no Projeto de pesquisa. Nas visitas foram observados os seguintes aspectos:

a) Em relao s aulas ministradas pelos professores:

Abordagem dos aspectos pedaggicos dos contedos do currculo, alm da abordagem didtica, ou seja, como se processou a articulao entre teoria e prtica no trabalho do/a professor/a, seja em sala de aula ou no trabalho de campo; Como que o princpio da escola, ou seja, o trabalho aparecia, enquanto articulao teoria e prtica, no planejamento do professor, no seu trabalho pedaggico; Se havia ou no a articulao da teoria e prtica na escola como um todo, ou eram s algumas disciplinas que trabalhavam esta relao; Como que se mostrava a relao teoria e prtica no trabalho escolar; Como que o/a professor/a abordava, em sala de aula, o trabalho prtico realizado pelos estudantes; Como se processava o vnculo das disciplinas tcnicas em relao s disciplinas do Ensino mdio; Como aparecia o vnculo entre teoria e prtica nas disciplinas tcnicas e nas disciplinas tericas do Ensino Mdio; Se, de fato, existia, uma relao dos contedos tericos com os trabalhos prticos realizados pelos alunos; Quais os procedimentos didticos metodolgicos que o/a professor/a utilizava nas atividades pedaggicas; Como se dava o processo de interao entre o/a professor/a e os estudantes em sala de aula; Como que o processo de planejamento das atividades da escola, realizado pelos alunos, era abordado em sala de aula; Como que o professor estabelecia o vnculo da teoria com o trabalho concreto.

b) Em relao ao trabalho prtico realizado pelos estudantes: conforme os princpios da educao das escolas vinculadas ao MST os estudantes realizam trabalhos prticos. Foi, ento, observado, se a escola aplicava este princpio em relao aos trabalhos prticos:

Estudantes se envolviam na limpeza do ambiente de convivncia, ou seja, sala de aula, alojamento, refeitrio, recolher o lixo, cuidar dos animais, etc., Como que os estudantes percebiam este trabalho; Este trabalho expressava vnculo com a formao procurada pela escola; Como que os estudantes aplicavam a relao teoria e prtica nos espaos de sua auto-organizao, como Ncleos de Base (NB), ou nos encontro destes Ncleos.

c) Em relao ao coletivo de professores e grupo orgnico da escola:

Como era abordada a relao teoria e prtica no coletivo de professores e no grupo orgnico;E como estes coletivos compreendiam esta relao.

d) Em relao organizao da Escola:

Se a forma de organizao do trabalho escolar era condizente com o projeto poltico pedaggico da escola; Como que se mostrava a relao teoria e prtica na organizao escola; O Conselho Escolar era ou no parte constitutiva da Escola, Como este Conselho era percebido por estudantes e professores/as.

Para registrar os dados coletados atravs da observao, utilizei um caderno de campo para anotar as percepes dos fatos, do que era observado. Este registro foi efetuado durante o processo de observao, ou seja, durante a observao foi anotado tudo o que dizia respeito aos aspectos acima descritos, assim como eram feitas reflexes em torno do observado.

Para as entrevistas foram usadas questes semiestruturadas. Num universo de vinte e quatro estudantes, entrevistei sete, ou seja, trs matriculados em 2012 e quatro matriculados em 2013. Alm dos estudantes, entrevistei cinco professores, incluindo o diretor. As entrevistas foram assim distribudas: alm do diretor, quatro professores que trabalham disciplinas da rea tcnica, num universo de doze professores, assim como um representante do Conselho Escolar e uma liderana regional do MST. Na visita de observao, feita no ms de agosto de 2013, tambm realizei trs entrevistas com um professor da rea tcnica e dois estudantes, um matriculado em 2012 e outro matriculado em 2013. As entrevistas foram gravadas para serem posteriormente transcritas.

Outro instrumento metodolgico utilizado foi a leitura de documentos produzidos pela Escola, tais como: atas do Conselho Escolar desde a criao da Escola 25 de Maio, que somam quase uma centena; o Projeto Poltico Pedaggico, o planejamento anual de 2013, elaborado por cada um dos professores em suas reas de atuao, ou as disciplinas que trabalham. Tambm realizei leituras de livros, revistas, artigos, dissertaes, teses, assim como pesquisei em stios da rede mundial de comunicao, buscando compreender como que, historicamente, o tema da relao teoria e prtica, do trabalho manual e trabalho intelectual, vem se configurando na educao, de forma geral, e, em especfico, na educao escolar, sobretudo, na relao ensino e trabalho.

Para anlise dos dados e informaes coletadas buscarei utilizar o mtodo dialtico. Este mtodo consiste em compreender o fenmeno a ser estudado a partir das determinaes e relaes que se estabelecem entre este com o todo do processo. Ou seja, determinaes e relaes existentes entre trabalho e educao que ocorrem na escola a ser estudada, em relao ao que se estabelece entre trabalho e educao na sociedade burguesa.

O ponto de partida para o mtodo dialtico na pesquisa a anlise crtica do objeto a ser pesquisado, o que significa encontrar as determinaes que o fazem ser o que . Tais determinaes tm que ser tomadas pelas suas relaes, pois a compreenso do objeto dever contar com a totalidade do processo, na linha da intencionalidade do estudo, que estabelecer as bases tericas para sua transformao. (WACHOWICZ, 2001, p. 01).

Segundo a mesma autora, o mtodo dialtico se caracteriza pela contextualizao do problema a ser pesquisado. Podendo efetivar-se mediante respostas s questes: quem faz pesquisa, quando, onde e para que? (WACHOWICZ, 2001). Nesse sentido, o mtodo dialtico requer que o objeto de pesquisa seja analisado dentro do contexto histrico poltico-social, em que est inserido. Nesse sentido, historicismo, totalidade e contradio foram categorias que acompanharam todo processo de anlise dos dados, materiais, informaes coletadas acerca do fenmeno. Alm dessas categorias metodolgicas da Dialtica, como pesquisador posso utilizar categorias simples do contedo conforme o tema a ser investigado. Nesse sentido, utilizei as categorias trabalho, educao, alienao, prxis, e emancipao.

I CAPTULO

A RELAO TEORIA E PRTICA NA EDUCAO

Compreender a relao educao e trabalho, trabalho manual e trabalho intelectual, relao teoria e prtica, ou melhor, como o trabalho contribui na formao do ser humano em tempos nos quais se anuncia o fim da centralidade do trabalho na reproduo da vida humana fundamental para a efetivao de uma educao escolar voltada emancipao humana. Para compreender esta relao buscarei a fundamentao, principalmente nas obras de: Os principais autores nos quais estar embasado este estudo so: Karl Marx; Friedrich Engels, Antonio Gramsci, Istvn Mszros, Gaudncio Frigotto, Ivo Tonet, Mario Alighiero Manacorda, Dermeval Saviani, Accia Kuenzer, entre outros. E para compreender a relao entre trabalho agrcola e educao escolar, acrescento: Moisey M. Pistrak, Anton S. Makarenko, Clia Vendramini, Silvana Gritti, Marlene Ribeiro, Moacir Gadotti, entre outros.

Portanto, neste Captulo I trabalharei com o que fundamenta a afirmao do trabalho como princpio educativo.

1. 1 O processo histrico do vnculo ou desvnculo terico/prtico na formao humana.

O conceito de trabalho segundo a acepo marxista a ao do ser humano sobre a natureza para transformar esta natureza em coisas teis para satisfazer suas necessidades. O trabalho ao modificar a natureza para a produo de coisas para satisfazer a necessidade do homem tambm produz modificaes nele prprio. Nesse sentido d para dizer que o trabalho criou o prprio homem. Ou seja, nas palavras de Marx (1968, p. 202) trabalho :

(...) um processo de que participam homem e a natureza. Processo em que o ser humano com sua prpria ao, impulsiona, regula e controla seu intercambio material com a natureza. Defronta-se com a natureza como uma de suas foras. Pe em movimento as foras naturais de seu corpo, braos e pernas, cabea e mos, a fim de apropriar-se dos recursos da natureza, imprimindo-lhe forma til vida humana. Atuando assim sobre a natureza externa e modificando-a ao mesmo tempo modifica sua prpria natureza. Desenvolve as potencialidades nela adormecidas e submete ao seu domnio o jogo das foras naturais.

Ou ainda, conforme Engels (1999, p. 05): a condio bsica e fundamental de toda a vida humana. E em tal grau que, at certo ponto, podemos afirmar que o trabalho criou o prprio homem. Se o trabalho uma eterna necessidade humana de produzir coisas para atender as necessidades por ele criadas, permite ao ser humano se criar/recriar continuamente como humano. Ento, foi atuando sobre a natureza, produzindo coisas teis para satisfazer suas necessidades, ou seja, foi trabalhando que o homem se educou e se humanizou. Nesse sentido, pode-se dizer que existe uma relao de origem entre trabalho e educao. Dito de outra forma, o ser humano foi se educando no processo do trabalho. Trabalho este compreendido como a unidade dialtica teoria e prtica, ou trabalho manual e trabalho intelectual, pensar e fazer, conceber e aplicar. nessa compreenso que trabalho e educao nascem juntos.

Para compreender como o trabalho foi se configurando no processo histrico da existncia humana, ou seja, como o trabalho que, na sua origem, criou o prprio homem e no processo histrico da existncia humana foi se transformando em algo que levou e leva o ser humano desumanizao, preciso pesquisar sobre como a sociedade foi se constituindo. Isto quer dizer, compreender como os seres humanos foram organizando o processo produtivo e estabelecendo relaes entre si e com a natureza, para produzir a sua existncia.

O conhecimento perdido sobre o processo de produo por parte dos trabalhadores parciais se concentra no capital, com o qual se confrontam. um produto da diviso manufatureira do trabalho se opor-lhes as foras intelectuais do processo material de produo como propriedade alheia e poder que os domina. Esse processo de dissociao comea na cooperao simples, em que o capitalista representa em face dos trabalhadores individuais a unidade e a vontade do corpo social de trabalho. O processo desenvolve-se na manufatura, que mutila o trabalhador, convertendo-o em parcial. Ele se completa na grande indstria, que separa do trabalho a cincia como potncia autnoma de produo e a fora a servir ao capital (MARX, ENGELS 1988, p. 283-284).

Na sociedade primitiva em que no havia diviso de classes e nem diviso social e tcnica do trabalho, os seres humanos se educavam no e pelo trabalho. Com o surgimento da sociedade de classes, que divide esta sociedade entre proprietrios e no proprietrios dos meios de produo, produz-se, tambm, a diviso do trabalho. Ou seja, de um lado, a classe proprietria dos meios de produo que vive fora do mundo do trabalho, ou melhor, vive do trabalho alheio e comea a criar espaos fora do processo produtivo para se educar. Com isso, cria-se a escola. Por outro lado, a classe que vive do trabalho, a no proprietria, continua se educando no e pelo trabalho. a sociedade de classes que condiciona a separao do trabalho da educao.

A diviso do trabalho que se inicia com a diviso sexual do trabalho, depois, com a gerao de excedentes a diviso ocorre entre aqueles que gestam/administram e aqueles que realizam o trabalho manual. Neste processo vo se constituindo as classes sociais que, na sua forma de organizao, do origem diviso social do trabalho, entre trabalho manual e intelectual, que perpassa desde a sociedade escravista, feudal e burguesa, depois tambm se expressa numa diviso internacional do trabalho. Para efetivao da diviso do trabalho, ou melhor, para que a diviso do trabalho pudesse se consumar era preciso separar os homens entre os que pensam o processo produtivo e os que o fazem acontecer. Ou seja, separar o trabalho intelectual do manual, do pensar e fazer. Nesse sentido, a diviso do trabalho em manual e intelectual produz um ser humano parcial que no consegue mais compreender o todo, tornando-o unilateral.

A diviso do trabalho s surge efetivamente a partir do momento em que se opera uma diviso entre o trabalho material e intelectual. A partir deste momento, a conscincia pode supor-se algo mais do que a conscincia da prtica existente, que representa a de fato qualquer coisa sem representar algo de real (MARX; ENGELS. 1978 p. 16, em itlico no original).

Sendo a diviso da sociedade em classes que condiciona a diviso do trabalho, essa s pode se realizar no momento em que se separa trabalho manual do intelectual. Nesse sentido, a diviso da sociedade em classes, em ltima instncia, produto da diviso entre trabalho manual e trabalho intelectual.

O modo capitalista de produo que revolucionou as relaes de produo, primeiro com a manufatura e depois sob a grande indstria, destruindo as antigas formas de propriedade camponesa, libertando o servo da terra, assim como provocou a destruio das antigas formas artesanais de produo, transformando, com isso, o campons e o arteso em trabalhadores livres livres sob todos os aspectos. Ou seja, livres da propriedade e livres para vender sua fora de trabalho. Neste sentido, a inveno das mquinas proporcionou um aumento extraordinrio de industrializao e isto condicionou a um aumento da diviso do trabalho.

O aumento da diviso do trabalho propiciou a cooperao no processo de produo. Isso porque a diviso social do trabalho e a incorporao da mecanizao no processo produtivo necessitam da cooperao. Esta nova forma de organizao do processo produtivo aumenta a produtividade do trabalho, assim como produz o homem dividido. Esta diviso se apresenta como trabalho manual e intelectual. Referindo-se obra de Marx, afirma Manacorda (2010, p. 83):

A diviso do trabalho condiciona a diviso da sociedade em classes e, com ela, a diviso do homem; e como esta se torna verdadeiramente tal apenas quando se apresenta como diviso entre trabalho manual e trabalho mental, assim as duas dimenses do homem dividido, cada uma das quais unilateral, so essencialmente as do trabalhador manual, operrio, e as do intelectual.

A diviso da sociedade em classes sociais, condicionada pela diviso do trabalho, se mostra sob a diviso do trabalho manual e trabalho intelectual transformando o trabalhador em trabalhador parcial. Isto quer dizer que este perde o conhecimento sobre o todo do processo produtivo. Ou seja, o trabalhador parcial no mais consegue compreender o porqu, para que e para quem produz. Nesse sentido, ao no compreender o processo de produo o trabalho torna-se algo estranho a ele. Em vez de ser a sua autorrealizao torna-se algo penoso, fadigoso. Em outras palavras, o trabalho perante os trabalhadores um sacrifcio, uma tortura, algo alheio a ele, que, em vez de trazer satisfao traz insatisfao.

As potncias intelectuais da produo ampliam sua escala por um lado porque desaparecem por muitos lados. O que os trabalhadores parciais perdem, concentra-se no capital com que se confrontam. um produto da diviso manufatureira do trabalho opor-lhes as foras intelectuais do processo material de produo como propriedade alheia e poder que os domina. Esse processo de dissociao comea na cooperao simples, em que o capitalista representa em face dos trabalhadores individuais a unidade e a vontade do corpo social de trabalho. O processo desenvolve-se na manufatura, que mutila o trabalhador, convertendo-o em trabalhador parcial. Ele se completa na grande indstria, que separa do trabalho a cincia como potncia autnoma de produo e a fora a servir ao capital. Com o advento da sociedade burguesa o capital no s se apropria do conhecimento historicamente produzido pela humanidade pelo e no trabalho, mas tambm expropria do trabalhador o produto do seu trabalho. Ao efetuar esta dupla explorao do conhecimento e do trabalho, promove e intensifica, cada vez mais, uma maior diviso de trabalho. Todas estas condies impostas aos trabalhadores resultam numa maior acumulao de capital, que aumenta na proporo em que a maquinaria utilizada reparte as tarefas produtivas at ao extremo de fazer do trabalhador apenas um apndice das mquinas. Assim, o aumento da diviso do trabalho por um lado, e por outro, a acumulao do capital, produzem uma dependncia cada vez maior do trabalhador para com o capital (MARX. 1985, p. 475).

Outro elemento que contribui para o aumento da diviso do trabalho a incorporao de novas tcnicas de produo, condicionando cada vez mais a simplificao do trabalho. Dessa forma exige cada vez menos uso das capacidades intelectuais do trabalhador, transformando-o em complemento da mquina, como afirmado no pargrafo anterior. Com a introduo da produo mecanizada e a inveno de tcnicas de produo exige uma maior diviso do trabalho e, ao mesmo tempo, simplifica o trabalho. O trabalho torna-se mais simples e exige cada vez menos uso das capacidades intelectuais do trabalhador, transformando o trabalhador em apndice da mquina. Nesse sentido, o trabalho de uso de capacidades espirituais e fsicas transformado em trabalho puramente mecnico. Em outras palavras, o capital transforma o trabalho em pura atividade corporal em que s se usam os braos, as pernas, o corpo para sua execuo. Ou seja, um trabalho unilateral.

O acmulo do capital aumenta a diviso do trabalho e a diviso do trabalho aumenta o nmero de trabalhadores; mutuamente, o nmero crescente de trabalhadores aumenta a diviso do trabalho e a diviso crescente intensifica a acumulao do capital. Como resultado da diviso do trabalho, por um lado, e da acumulao do capital, por outro, o trabalhador torna-se mesmo mais inteiramente dependente do trabalho e de um tipo de trabalho particular, demasiadamente unilateral, automtico. Por este motivo, assim como ele se v diminudo espiritual e fisicamente condio de uma mquina e se transforma de ser humano em simples atividade abstrata e em abdmen (MARX, 2006, p.68).

Este tipo de trabalho (re)produzido pelo modo de produo capitalista que, alm de separar trabalho intelectual e manual, o pensar do fazer, a teoria da prtica, nega ao trabalhador a apropriao do fruto do seu trabalho, nega tambm o direito de ele se reproduzir enquanto humano pelo trabalho. Pois, o salrio que lhe pago pelo empresrio capitalista serve apenas para que se reproduza enquanto trabalhador e no enquanto ser humano. Alm disso, cria uma dependncia deste trabalhador e de sua famlia em relao ao capital, pois se ficar desempregado no tem a garantia de sua reproduo como trabalhador e nem como ser humano. Nesse sentido, para Marx (2006), o modo de produo capitalista transforma o trabalho em algo estranho a si prprio, pois o trabalhador no se realiza pelo trabalho. Mas, pelo contrrio, o trabalho se torna algo penoso. Assim, sob o modo de produo capitalista o trabalho, que no processo histrico da constituio do homem o humanizou (Engels, 1999), agora deforma o ser humano tornando-o apenas um apndice da mquina, aniquilando-o como humano, uma vez que se torna mercadoria. Nesse sentido:

A produo no produz somente o homem como uma forma mercadoria, a mercadoria humana, o homem sob a forma de mercadoria; de acordo com tal situao, produz ainda a ele como um ser espiritual e fisicamente desumanizado Imoralidade e deformidade dos trabalhadores e capitalistas... O seu produto a mercadoria autoconsciente e ativa... A mercadoria humana (MARX, 2006, p 124).

O capital no s se apropria do conhecimento historicamente produzido pela humanidade pelo e no trabalho, mas tambm expropria do trabalhador o produto do trabalho. Ao efetuar esta dupla explorao do conhecimento e do trabalho, condiciona cada vez a uma maior diviso de trabalho. Todos estes fatores combinados resultam em uma maior acumulao de capital. O aumento da diviso do trabalho por um lado, e por outro lado, a acumulao do capital, produz uma dependncia cada vez maior do trabalhador para com o capital.

Dessa forma, de produtor de coisas para satisfazer as necessidades humanas e de autor da realizao do ser humano, o trabalho passa a ser um fardo, deixando de ser um instrumento de humanizao. De produtor de produtos para sua realizao ou do trabalho livre, voluntrio, o trabalhador passa ao trabalho forado, que no lhe pertence mais, que no lhe permite a realizao enquanto humano, inibindo, portanto, a sua capacidade de (re)criao da realidade. Ou seja, de produtor da sua humanizao passa a (re)produzir a sua prpria desumanizao. Com isso, o trabalhador se sente estranho em relao ao produto do seu trabalho, ao processo de produo, em relao aos outros homens e em relao a si mesmo.

Este tipo de trabalho produzido pelo modo de produo capitalista que, alm de separar trabalho intelectual e manual, nega ao trabalhador a apropriao do fruto do seu trabalho, nega, tambm, o direito de ele se reproduzir enquanto humano pelo trabalho. Isso porque o salrio que a empresa capitalista paga ao trabalhador serve para ele se reproduza enquanto trabalhador e no enquanto ser humano. Alm disso, cria uma dependncia deste trabalhador e de sua famlia em relao ao capital, pois se ficar desempregado no tem a garantia a sua reproduo como trabalhador e nem como ser humano.

(...) o trabalhador se relaciona com o produto do seu trabalho como a um objeto estranho. Com base nesse pressuposto, claro que quanto mais o trabalhador se esgota a si mesmo, mais poderoso se torna o mundo dos objetos, que ele cria diante de si, mais pobre ele fica na sua vida interior, menos pertence a si prprio (MARX, 2006, p 112).

O capital ao produzir o trabalhador sob a forma mercadoria tambm aliena o trabalhador do produto do seu trabalho, que ele no mais reconhece como seu. Sob esta forma, ao trabalhador produtor de toda riqueza negado o direito de se apropriar da riqueza por ele produzida. Esta negao causa ao trabalhador uma estranheza em relao ao produto produzido por ele, pois o produto no lhe pertence. No s alienado em relao ao produto por ele produzido, mas tambm em relao ao processo de produo e aos demais seres humanos com os quais reparte as condies de vida e de (re)produo.

E esta realidade da separao do trabalhador do produto do seu trabalho que vai determinar a organizao da escola na sociedade capitalista, na qual se produz uma educao dualista (unitria), separando, assim,(tambm), a formao intelectual da formao prtica, ou educao e trabalho. De produtor de produtos para sua realizao ou do trabalho livre, voluntrio, o trabalhador passa ao trabalho forado que no lhe pertence mais, que no lhe permite a realizao enquanto humano, inibindo, portanto, a sua capacidade de (re)criao da realidade. Ou seja, de produtor da sua humanizao passa a (re)produzir a sua prpria desumanizao. Com isso, o trabalhador se sente estranho em relao ao produto do seu trabalho, ao processo de produo, em relao aos outros homens e em relao a si mesmo.

Na continuidade ser abordada a educao escolar como unidade entre teoria e prtica na perspectiva da emancipao humana.

1. 2 Unidade teoria e prtica para a educao emancipatria

A partir do conceito de trabalho elaborado por Marx pode-se dizer que existe uma relao de origem entre trabalho e educao. Ou seja, o ser humano foi se educando no processo do trabalho. Portanto teoria e prtica, trabalho manual e trabalho intelectual, trabalho e educao nascem juntos. Porm, na sociedade capitalista, que divide, separa e contrape as classes sociais, coloca-se a diviso entre trabalho manual e trabalho intelectual, que aparece na escola sob a forma de diviso entre trabalho e educao. Isso porque, sendo a escola um produto desta sociedade dividida em classes, ela reproduz esta sociedade.

Portanto, diviso do trabalho e diviso entre trabalho e educao tem relao direta. A educao, que antes da diviso do trabalho acontecia no e pelo trabalho no processo de produo, agora sob a sociedade de classes e o trabalho dividido se afastou do processo original de produo/formao humana. Isto quer dizer, formao omnilateral no sentido da emancipao humana, em contraposio formao unilateral que se d nas relaes de produo capitalista, e que se reflete na maioria das escolas, onde se reproduz a separao do trabalho manual do trabalho intelectual, em que a teoria separada da prtica, gerando o trabalho de forma alienada. Dessa forma, reproduz a sociedade de classes e a diviso do trabalho que se materializa na sociedade burguesa.

A prtica do cotidiano escolar para a educao voltada formao omnilateral numa sociedade de classes, como a atual, que separa o trabalho manual do trabalho intelectual, o fazer do pensar, a teoria da prtica, est sendo estudada por diversos pesquisadores crticos da rea da educao e tambm da sociologia. Sobre esta problemtica j se tem produzido diversas teses, dissertaes, artigos cientficos, assim como livros.

Os autores que abordam as questes relacionadas ao trabalho como princpio educativo, a relao trabalho manual e trabalho intelectual, teoria e prtica como uma unidade dialtica, partem do pressuposto marxista de que o ser humano produziu-se como humano, no e pelo trabalho, ou seja, foi se educando no processo produtivo, na ao prtica de atuar sobre a natureza produzindo coisas para satisfazer suas necessidades. Dessa forma, o ser humano foi transformando a natureza e transformando, tambm, a si mesmo. Se o trabalho base da educao do ser humano, e, se desde a sociedade primitiva, trabalho e educao, teoria e prtica, trabalho manual e trabalho intelectual, pensar e fazer esto articulados, com o surgimento da sociedade dividida em classes, e, mais especificamente com a sociedade burguesa que divide trabalho manual do intelectual, a educao tambm sofre a separao em relao ao trabalho e a teoria em relao prtica. Desta forma, torna-se impossvel alcanar a emancipao a qual pressupe a relao dialtica entre trabalho-educao como base da formao humana (MARX; ENGELS, 1978).

A sociedade burguesa sob o modo capitalista de produo ao produzir o trabalhador parcial, que separa trabalho manual e intelectual, necessita de outro espao para fazer a educao, que se chama de escola. Esta educao se d fora do processo de trabalho. Nesse sentido no modo capitalista a escola torna-se espao principal de educao, e nela se materializa a separao entre a teoria (conhecimento) e a prtica (trabalho).

O modo como a sociedade se organiza para a produo da vida que condiciona o tipo de educao e o espao que ela ocupa como principal, pois, nos diversos modos de produo cada uma tinha um tipo e um espao privilegiado para a educao. Nesse sentido, para compreender a escola e como ela determina a educao preciso historicizar esta escola e olhar as mltiplas determinaes que a configuraram, no seu processo de sua constituio nos diversos modos de produo. Isto quer dizer, olhar o desenvolvimento da instituio escolar no processo do desenvolvimento histrico da sociedade humana, e perceber como ela foi-se constituindo e se distanciando em relao ao mundo do trabalho, at um dado momento em que ela se reaproxima, novamente, do trabalho.

Segundo Manacorda (1992 p. 10), a origem da escola como espao especfico de educao dos filhos da classe dominante remonta ao antigo Imprio Egpcio, por volta do quarto milnio A.C. A escola desde o seu surgimento no processo histrico de sua constituio vai passando por transformaes a partir das transformaes que ocorrem na base material da produo da vida. Nesse sentido, desde a sua origem at os nossos dias, a escola passou por profundas mudanas nas formas de organizao, assim como nos mtodos de ensino e nos contedos a serem trabalhados. Ou seja, conforme o processo de produo da vida do ser humano vai se transformando, a educao tambm vai se modificando para formar o ser humano que a sociedade necessita e, ao mesmo tempo, a educao vai se condicionando s mudanas nas formas de organizao da produo da vida.

O processo de mudana na organizao da escola condicionada pela transformao da base material da produo da vida no acontece de forma linear e continuada. Isto se pode perceber ao ler a obra de Mario Alighiero Manacorda: A histria da Educao: da Antiguidade aos nossos dias (1989). Nos processos de mudana h continuidades com descontinuidades, tanto modificaes como permanncias. Ou seja, nesse processo h incorporao de elementos novos com a permanncia de elementos antigos. Nesse sentido, h uma relao dialtica entre educao e forma de organizao da base material da vida. Isto quer dizer que a educao, tanto condicionada a ser instrumento de manter a forma de organizao social para a produo da vida, quanto ela poder condicionar a mudana dessa forma em outra forma superior.

Nas sociedades de classes que antecederam a sociedade burguesa, a educao escolar se dava desvinculada do trabalho, pois esta educao era destinada classe dominante que vivia fora do processo produtivo, ou seja, classe que vivia sem trabalhar, que vivia do trabalho alheio. A classe que vivia do trabalho se educava do processo produtivo. Ou seja, nessas sociedades a educao dava-se de forma principal no e pelo trabalho. Era no espao do trabalho onde a grande maioria das pessoas se educava. Ou seja, o filho do arteso, o aprendiz se educava na oficina do arteso junto ao processo produtivo.

Segundo Manacorda (2010, p. 127) Nessas sociedades s a classe dominante tinha um espao especifico para a formao das futuras geraes, espao este que foi chamado de escola. J a classe dominada no conhecia este espao. Nesse sentido, nas sociedades de classes, anteriores sociedade burguesa, segundo o mesmo autor, a oposio de classe, quanto educao, no se dava em torno da escola do trabalho e escola de formao geral, mas em torno de escola e no escola. A escola se coloca frente ao trabalho como no trabalho e o trabalho se coloca frente escola como no escola (MANACORDA, 2010, p. 127).

A oposio entre escola do trabalho e escola de formao geral, ou escola desinteressada e escola profissional, comea a surgir com a revoluo industrial quando a escola torna-se acessvel para todos. Na sociedade burguesa, diferentemente das sociedades de classes anteriores onde a classe dominante vivia do no trabalho, o trabalho torna-se necessidade de toda sociedade, porm, nessa sociedade, aprofunda-se o divrcio entre trabalho manual do trabalho intelectual. A separao entre trabalho manual e intelectual cria uma escola tambm dividida entre educao geral para a classe burguesa e educao profissional para a classe trabalhadora. Superar este dualismo na educao s possvel se for superado na sua totalidade, quando superada a sociedade de classe, e com ela, a superao do trabalho dividido.

Se nas sociedades pr-capitalistas h um profundo divrcio entre educao escolar e educao pelo trabalho, na sociedade burguesa, com a revoluo industrial, comea-se a organizar escolas para o produtor, trabalhador, pois a sociedade emergente passa a necessitar de trabalhadores que tenham o mnimo de conhecimento para poder operar novas tecnologias em constante desenvolvimento. Nesse sentido, a educao escolar se vincula ao trabalho. Porm, este vnculo se d de forma abstrata ou de forma prtica. Ou seja, ensina-se teoria sem prtica, ou o contrrio, a prtica sem teoria, ou seja, a escola educa de uma forma unilateral. Isso quer dizer que a escola concentra-se na formao de apenas uma das dimenses do ser humano, ou formao para o trabalho intelectual ou formao para o trabalho manual.

Ainda segundo Manacorda (2010), Marx discute a questo do trabalho em vrios dos seus escritos, dentre os quais pesquisamos para esta Dissertao: Manifesto do Partido Comunista (s/d), Manuscritos Econmicos e Filosficos (2006), O Capital (1986), que o germe da educao do futuro est na unio entre educao e trabalho. Isso porque o trabalho historicamente determinado na sociedade burguesa, em que ele aparece dividido entre manual e intelectual no s negatividade, ou trabalho alienado, unilateral, desumanizador, produo de misria fsica e espiritual. Apesar de significar a desumanizao completa do homem, o trabalho tambm apresenta aspectos positivos, pois: sendo a atividade vital humana, ou manifestao de si, uma possibilidade universal de riqueza no trabalhador tambm est contida tambm uma possibilidade humana universal, conforme Marx, em Manacorda (2010, p. 68).

1. 3 Unidade teoria e prtica na educao escolar

Na sociedade burguesa, onde o trabalho aparece dividido entre trabalho manual e trabalho intelectual cria-se uma escola em que a educao tambm se d de forma dividida entre educao de formao geral e educao profissional, ou melhor, educao do conhecimento terico cientfico e educao do conhecimento prtico. Nesse sentido, a educao produto da forma como a sociedade se organiza para produzir a vida. Ou seja, a educao aparece dividida tal qual como a sociedade tambm aparece dividida. Em outras palavras, assim como a sociedade burguesa divide o trabalho manual e trabalho intelectual, na escola se divide e separa a educao que fornece o conhecimento geral e a educao que forma o profissional pelo conhecimento prtico. Em outras palavras, a educao escolar reproduz a sociedade dividida entre os que pensam o processo produtivo e os que fazem o trabalho prtico.

Esta diviso est ligada diviso da sociedade entre proprietrios dos meios de produo a terra, os bens materiais, as mquinas e as tecnologias avanadas aplicadas na produo e os no proprietrios, ou seja, os que vivem do seu trabalho (ANTUNES, 2003). Isto quer dizer que, na sociedade capitalista, destina-se aos proprietrios dos meios de produo a funo de pensar a organizao do processo de produo e aos no proprietrios as funes de execuo das tarefas.

Nesse sentido, para compreender a educao de forma geral e a educao escolar em particular preciso buscar compreender a forma como se realiza o trabalho sob o modo de produo capitalista. Como vimos acima, o modo de produo capitalista, comeando pela manufatura e se complexificando sob a grande indstria, condiciona, cada vez mais, a uma maior diviso do trabalho. Esta diviso transforma o trabalhador em trabalhador parcial. Este processo produz a alienao do trabalhador diante do produto do seu trabalho e do processo de produo. Pois, a realidade social em que o ser humano est inserido, ou seja, a forma social da organizao do trabalho e do processo de produo, que determinam a forma de pensar e de agir.

O primeiro pressuposto de toda existncia humana naturalmente a existncia de indivduos humanos vivos. O primeiro fato a constatar , pois, a organizao corporal destes indivduos e, por meio disto, sua relao dada com o resto da natureza. [...] Tal como os indivduos manifestam sua vida, assim so eles. O que eles so coincide, portanto com sua produo, tanto com o que produzem, como com o modo como produzem. O que os indivduos so, portanto, depende das condies materiais de sua produo (MARX; ENGELS, 1986, p.27-28).

Admitindo que as condies reais de produo determinem a forma de ser e de pensar do ser humano, torna-se necessrio criar escolas que ultrapassem a viso liberal de articular trabalho e educao, sob a forma de estgios, nas empresas. Nessa viso, a unio da educao ao trabalho meramente uma questo do aprendizado das tcnicas para aumentar a produtividade do trabalho e, dessa forma, o trabalhador se integrar ao mercado de trabalho com melhor qualificao, possibilitando aumentar a produo de mais valia ao capital. Portanto, a unio entre educao e trabalho pode ser funcional ao capital. Esta viso no possibilita uma formao omnilateral, mas, ao contrrio, ao reproduzir a sociedade dividida em classes, mantm dividido o homem entre trabalhador manual e trabalhador intelectual. Portanto reproduz um ser humano unilateral.

A viso marxista de unio da educao com trabalho na escola a possibilidade de formar um ser humano que compreenda que foi o trabalho que o produziu. Nesse sentido permite a este ser humano compreender o processo histrico de sua (de)formao. Em outras palavras, como que o trabalho que produziu o humano, sob a sociedade de classes foi se desumanizando pela diviso do trabalho. Isto quer dizer, compreender que a diviso do trabalho foi produzindo uma sociedade de classes e esta, sob a diviso do trabalho entre trabalho manual e trabalho intelectual, foi produzindo um homem parcial, unilateral. Ou seja, que foi a sociedade de classes, fruto da diviso social do trabalho, que dividiu aquilo que unido formou o ser humano, o trabalho manual e o trabalho intelectual o fazer, o pensar e o agir.

Nesse sentido, a escola no muda aquilo que produzido nas relaes de produo. Para se mudar as relaes de produo indispensvel a luta revolucionria da classe trabalhadora. Nessa perspectiva, com certeza a escola tem uma funo importante, que a de formar corpos/sentimentos/conscincias dos homens e das mulheres sobre a necessidade de revolucionar as relaes de produo para que possam se produzir como seres humanos. Pois o humano est na unio do trabalho manual com o trabalho o intelectual. E isto s ser verdadeiramente possvel numa sociedade sem classes, pois na sociedade de classes, fruto da diviso do trabalho, a separao do trabalho manual do intelectual parte integrante, essencial, como vimos mostrando at aqui. Sem a diviso do trabalho e com ele o humano parcial, unilateral, deformado, desumano, sem isso a sociedade de classes no subsiste. O homem omnilateral, emancipado, completo, s ser possvel numa sociedade sem classes.

Segundo Marx (1978), no modo de produo capitalista o aparato escolar surge como aparelho ideolgico do Estado burgus no s pelas funes temtica e explicitamente ideolgicas por ela comportada, mas tambm pela criao de um marco em que a alienao da fora de trabalho vista como algo natural, e, ainda, por que ela reproduz a diviso do trabalho que necessidade que advm da diviso da sociedade dividida em classes.

...atravs da diviso do trabalho torna-se possvel aquilo que se verifica efetivamente: que a atividade intelectual e material, o gozo e o trabalho, a produo e o consumo, caibam a indivduos distintos; ento a possibilidade que esses elementos no entrem em conflito reside unicamente na hiptese de acabar de novo com a diviso do trabalho (MARX, 1978, p. 16, em itlico no original).

Neste sentido, para que a educao possa ser instrumento na luta pela emancipao humana, que ultrapasse os limites da emancipao social torna-se necessrio, de alguma forma, mudar a estrutura organizacional da escola. Nesse sentido, no basta mudar os contedos curriculares, pois a forma de organizao do trabalho escolar educa, de certo modo, muito mais do que os componentes curriculares. Pois, segundo Marx (1986) no a conscincia que determina o ser social, mas, pelo contrrio, o ser social que determina a conscincia.

A formao omnilateral como necessidade para emancipao humana proposta por Marx (2002) e Gramsci (1982) implica em unir trabalho e educao, trabalho manual e trabalho intelectual no s no sistema educacional, mas, sobretudo, nas bases materiais da produo. Ou seja, superar a sociedade de classes e com ela o homem dividido entre trabalho manual e trabalho intelectual. O rompimento da escola dual, em que se trabalha a formao propedutica, a formao geral com conhecimentos da cultura universal para a classe dominante e a formao para o trabalho para a classe trabalhadora, fundamental quando se pensa a educao voltada para a formao integral do ser humano. Pois a educao unilateral criticada por Marx (2002) e por Gramsci (1982), pois ela contribui para a manuteno do modo de produo capitalista reproduzindo a diviso o trabalho e a alienao. Ou seja, a desumanizao.

Para a democratizao da educao do atual sistema educacional, para a superao da educao dual, ou seja, educao profissional para a classe trabalhadora e educao geral para a classe dominante preciso transformar todo sistema de ensino, desde a questo dos contedos at a forma de organizao do funcionamento das escolas. Caso contrrio a democratizao anunciada pelo Estado no passa de falcia.

Na escola atual, em funo da crise profunda da tradio cultural e da concepo da vida e do homem, verifica-se um processo de progressiva degenerescncia: as escolas de tipo profissional, isto , preocupadas em satisfazer interesses prticos imediatos, predominam sobre a escola formativa, imediatamente desinteressada. O aspecto mais paradoxal reside em que este novo tipo de escola aparece e louvado como democrtico, quando na realidade, no s destinado a perpetuar as diferenas sociais, como ainda a cristaliz-las em formas chinesas (GRAMSCI, 1982, p. 136).

Na obra de Gramsci (1982) encontra-se uma crtica escola dual existente, na Itlia, no sculo passado. Esta dualidade expressa na separao entre uma escola de formao geral, para a elite dirigente (escola desinteressada) e uma escola de formao para o trabalho, para a classe trabalhadora. (escola interessada). Nessa crtica, o autor usa o conceito de escola imediatamente desinteressada para designar a escola em que os educandos aprendem contedos relacionados aos conhecimentos gerais, da cultura universal e das cincias humanas e fsico-naturais. caracterizada como desinteressada por no ter uma finalidade prtica imediata. O conceito de escola imediatamente interessada aquela em que os educandos aprendem somente como operar os instrumentos de trabalho para produzir mais valia ao capital. imediatamente interessada porque serve para o trabalho imediato, ou tem uma finalidade prtica. Podemos estender esta crtica ao sistema educacional brasileiro, pois, na essncia, este no se diferencia muito daquela escola existente na Itlia na poca de Gramsci.

O fato da dualidade estrutural no ter sido resolvido no interior do sistema de ensino, apesar da tentativa feita pela Lei n 5.6 92/71, no deve causar espanto, na medida em que ela apenas expressa a diviso que est posta na sociedade brasileira, enquanto separa trabalhadores intelectuais e trabalhadores manuais e exige que se lhes d distintas formas e quantidades de educao. Ao mesmo tempo, essa impossibilidade revela, mais uma vez, a ingenuidade das propostas que pretendem resolver, atravs da escola, problemas que so estruturais nas sociedades capitalistas. Neste sentido, a escola brasileira, antes de resolver a dicotomia educao/trabalho no seu interior, referenda, atravs do seu carter seletivo e excludente, esta separao, que uma das condies de sobrevivncia das sociedades capitalistas, uma vez que determinada pela contradio fundamental entre capital e trabalho (KUENZER, 1991, p. 13-14).

Para a superao da escola dual existente no modo de produo capitalista preciso articular a luta pela mudana no sistema de ensino, no s na rea dos contedos escolares, mas tambm na forma de organizao escolar junto luta pela transformao social. Abrir espaos, no sentido de propor mudanas no atual sistema de ensino significa transformar a educao escolar, que reproduz no seu interior a sociedade de classes, a diviso do trabalho e a alienao, em uma educao que possa ser instrumento da emancipao humana. Para isso, Gramsci (2001) prope a escola unitria que se contrape escola dual como forma de superao da dicotomia trabalho manual e trabalho intelectual, de modo a formar todos os seres humanos como dirigentes ou com a capacidade de serem dirigentes.

Escola () de cultura geral, humanista, formativa, que equilibre de modo justo o desenvolvimento da capacidade de trabalhar manualmente (tecnicamente, industrialmente) e o desenvolvimento das capacidades de trabalho intelectual. (GRAMSCI, 2001, p. 33).

Nesse sentido, no pensamento de Gramsci a construo da escola unitria teria por finalidade a formao da classe trabalhadora para a construo de uma nova cultura se contrapondo a cultura burguesa.

O desafio era o de pensar uma escola socialista, que articulasse ensino tcnico-cientfico ao saber humanista. Esta seria uma chave para que os trabalhadores pudessem perseguir a sua autonomia e desenvolver uma nova cultura, antagnica quela da burguesia. A luta dos trabalhadores para garantir e aprofundar a cultura e para se apropriar do conhecimento, traria consigo o esforo e o empenho para assegurar a sua autonomia em relao aos intelectuais da classe dominante e ao seu poder desptico (ROIO, 2006, p. 312).

A escola nica proposta por Gramsci (2001) tem o trabalho como princpio educativo. Nessa escola, o trabalho executado deveria ter articulao com os contedos estudados. O trabalho no seria uma coisa a parte. Esta relao entre trabalho produtivo e as cincias possibilitaria a superao de uma viso ingnua, desarticulada, folclrica da realidade. Nesse sentido para Gramsci (Apud NASCIMENTO, et alii, 2008, p. 289):

(...) o processo de trabalho como princpio educativo imprescindvel na formao de novos intelectuais orgnicos para a classe trabalhadora que, organizada, concretize o ideal de uma sociedade emancipadora, onde tanto o trabalho material quanto o trabalho imaterial absorva uma viso crtica da realidade, uma viso coerente e unitria, que leve em conta a racionalidade, a totalidade e a historicidade das relaes sociais.

A educao entendida dessa forma possibilita unir trabalho intelectual e trabalho manual, que a sociedade burguesa, sob o modo de produo capitalista, separou. Este divrcio entre trabalho manual e trabalho intelectual, trabalho e educao, produziu uma ruptura entre a teoria e a prtica, transformando, dessa forma, o trabalho enquanto produto e produtor do ser humano, em trabalho alienado e no qual este ser humano resta desumanizado. Superar a dicotomia trabalho manual e trabalho intelectual, ou seja, trabalhar a educao integral do ser humano imprescindvel na educao que pensa ser instrumento de emancipao humana. Segundo Tonet (2006), na sociedade burguesa, mesmo que o discurso seja que a educao deve formar o ser humano integral, isto no possvel de ser realizado na sua totalidade. Mas poder ser construda uma educao com perspectivas de emancipao humana atravs da realizao de atividades que se movam nessa direo.

Esta impossibilidade de se ter uma educao voltada para emancipao humana na sua totalidade se d pelo fato de existir a contradio entre o discurso e a realidade objetiva, onde se pode verificar que, de fato, apenas um discurso. Ou seja, o avano do desenvolvimento das foras produtivas que possibilitam a superao da separao entre trabalho manual e intelectual, o acesso a todos dos bens produzidos e uma educao para a emancipao humana so impedidos, travados pelas relaes sociais baseadas na propriedade privada. Esta contradio decorre da contradio fundamental entre capital versus trabalho, presente no modo de produo capitalista.

Contudo, o pleno desabrochar dessas possibilidades bloqueado e pervertido pelas relaes sociais fundada na propriedade privada. Vale dizer, a diviso social do trabalho intensificada; o acesso a educao cada vez mais dificultado; os prprios contedos so cada vez mais fragmentados e alienados; o processo educativo sempre mais submetido s regras do mercado. Disso tudo resulta uma formao dos indivduos cada vez mais unilateral, deformada e empobrecida. Destaca-se, porm, que isto se d ao mesmo tempo em que se torna sempre mais amplo o fosso entre a realidade e o discurso. Enquanto aquela vai no sentido da fragmentao, da oposio entre os indivduos, da guerra de todos contra todos, da excluso social, do aumento das desigualdades sociais, este intensifica o apelo por uma educao humanista, solidaria, integral, cidad democrtica e participativa (TONET, 2005, p.134).

No sentido de se contrapor a uma educao desumanizadora e desenvolver atividades que possam contribuir para que a educao venha a se tornar, de fato, um instrumento de emancipao humana, torna-se necessrio compreender a forma como o capital explora a fora de trabalho e, com isso, aliena o trabalhador do que este produz. Caso contrrio, o discurso mostra que, cada vez menos, se compreende a relao da educao com a forma como a sociedade se organiza para produzir sua existncia. Ivo Tonet (2005, p. 134) nos auxilia a entender melhor esta questo:

Ora, este discurso no s no uma forma correta de fazer frente aos aspectos desumanizadores do capitalismo atual, como muito mais um sintoma do agudo extravio da conscincia. A nosso ver, ele est a indicar que a conscincia no compreende mais a lgica do processo social e por isso onde se encontra a matriz dele. Est a indicar tambm que admite que o sujeito no tem condies de atacar as bases materiais, que so o fundamento da sociabilidade, limitando-se a apontar o dedo acusador para os seus efeitos. O resultado que quanto menos compreendida e atacada a realidade prtica desumanizadora, tanto mais forte o discurso dito humanista, critico, etc.

Para que a educao possa se constituir como instrumento de emancipao humana necessita que se compreenda que a dissociao entre a base material de produo da vida e a educao precisa ser superada. No compreender que a educao, sob a sociedade burguesa, um instrumento que naturaliza a sociedade de classes e a diviso social do trabalho e, dessa forma, ser instrumento do capital para a reproduo material e ideolgica dessa sociedade, contribuir para manuteno da sociedade desumanizada. Nesse sentido, fundamental compreender que educao e trabalho, como confirma Frigotto (2006), nascem juntos, portanto tm uma relao de identidade. Esta relao de identidade se rompe com o surgimento da sociedade de classes. Ao romper a identidade entre trabalho e educao na sociedade de classes, em que aparece a diviso do trabalho e, com isso, vai se separando tambm trabalho manual e intelectual, produz-se, deste modo, um ser humano alienado e desumanizado.

Como vimos anteriormente, para que a educao possa ser uma ferramenta que possa contribuir na superao da dissociao entre trabalho manual e intelectual extremamente necessrio compreender que a educao, numa sociedade de classes, instrumento para contribuir na reproduo desta sociedade. Mas, por outro lado, como a luta de classes tambm se expressa no interior da escola, abrem-se possibilidades de introduzir atividades que possam unir trabalho manual e intelectual, no sentido da emancipao humana.

Por isso, quando se fala que a unidade entre trabalho e educao meio de transformao social e instrumento de formao moral e fsica, compreende-se que esta unidade devolve ao ser humano o trabalho como atividade criadora, e, portanto, humanizadora. Isso possibilita a compreenso do trabalho sob a sociedade de classes e a diviso do trabalho como alienador e desumanizador. Dessa forma, para que haja um processo de humanizao e desalienao do trabalho preciso construir outra sociedade em que no haja a diviso do trabalho. Sociedade onde o ser humano possa assumir o trabalho como produtor de coisas teis para satisfazer suas necessidades e, ao mesmo tempo, que se reproduza como mais humano.

Ainda segundo Gadotti (1997, p. 54) A integrao entre ensino e trabalho constitui-se na maneira de sair da alienao crescente, reunificando o homem com a sociedade. Assim o trabalho como princpio pedaggico pode ser identificado na afirmao de que a unio entre trabalho e ensino servir de motivao para a formao tcnico-cientifico e cultural. Esta facilmente identificada na pedagogia burguesa. Pois, esta tambm propala a integrao de trabalho e educao, mas esta integrao fica muito mais numa relao genrica, abstrata, na qual a escola se liga ao o ensino, vida, relao entre o estudo e o mundo natural.

A pedagogia burguesa tambm havia se preocupado em estabelecer a relao entre a escola e a atividade prtica. Entretanto, fundada na filosofia idealista, s podia entender essa relao genericamente, e abstratamente como uma relao entre a escola e a vida, entre estudo e meio natural (GADOTTI, 1997, p.53).

Sob a teoria marxiana de educao, a escola possibilitar trabalhar de forma unida aquilo que a sociedade de classes separou, ou seja, o trabalho manual e trabalho intelectual. Isto , trar a possibilidade da formao do ser humano nas vrias de suas dimenses, fsicas, espirituais e polticas. Esta escola pode articular trabalho manual e trabalho intelectual como duas faces de um mesmo ser e no como opostos que a sociedade de classes impe. Ou seja, os estudantes sendo educados de forma a articular trabalho manual e trabalho intelectual, como uma unidade dialtica, tero elementos para compreender a sociedade de classes, como ela, durante processo histrico, foi se constituindo, se transformando, e, dessa forma transformando o trabalho. E, com isso, compreender que as formas divididas e separadas de trabalho so frutos do processo histrico da sociedade de classes. Este um elemento fundamental para se compreender o trabalho hoje sob o atual estgio de desenvolvimento do capitalismo.

Como que o segundo capitulo repetia quase todo o primeiro capitulo introduzi este capitulo s deixando e aprimorando o item 3.1 introduzindo as orientaes. Vejam se os ttulos podem ser estes. Poders sugerir outros que ficarei

II CAPTULO

A FORMAO EM AGROECOLOGIA NO MST E A RELAO TEORIA E PRTICA NA FORMAO DO TCNICO EM AGROECOLOGIA.

Neste captulo procurarei compreender a agroecologia como matriz produtiva e tecnolgica poder contribuir na formao para emancipao humana. Nesse intuito a compreenso de que a agroecologia como matriz produtiva necessita articular teoria e prtica como unidade dialtica para contribuir na formao do ser humano. Sabendo-se como vimos no captulo anterior que nas formaes histricas da sociedade, o trabalho se constitui como formador da essncia humana passa a se constituir, na sociedade capitalista e no agronegcio como o deformador do ser humano.

Para apreender esse processo necessrio focar na agroecologia enquanto unidade dialtica da teoria e prtica, ou unidade de trabalho manual e trabalho intelectual como base da formao omnilateral do ser humano. Ou seja, a agroecologia tem essa possibilidade, pois compreende-se dela essencialmente unidade teoria e prtica.

Ainda nesse capitulo para poder dar sustentao terico-prtica como que a educao escolar contribuir na formao da conscincia ecolgica no simplesmente terica, mas tambm prtica. Ou seja conscincia ecolgica como unidade teoria e prtica. Por ltimo tratarei a formao tcnica e a agroecologia, focando como o MST assume a agroecologia como matriz produtiva e tecnolgica na produo nas reas dos assentamentos. Nessa perspectiva surge a necessidade de criar os cursos para formao de tcnicos em agroecologia para contribuir no processo de implantao dessa matriz produtiva.

2.1 - Agroecologia e o processo de formao humana

O processo histrico da formao humana tem sua base no trabalho (Engels 1999). Ou seja, o ser humano foi-se formando enquanto humano pelo processo do trabalho. Com o advento da sociedade de classes comea haver uma dissociao entre estes que se formam a partir da atividade intelectual, espiritual e os que se formam no processo do trabalho manual, ligado sobrevivncia imediata. Mas o trabalho sob a sociedade de classe se converte em trabalho alienado. O dualismo na forma de conceber a formao humana perpassa todos os perodos histricos das sociedades de classe.

A formao humana vista na perspectiva da sociedade de classes uma formao unilateral. Primeiro porque os que no trabalham e se apropriam do trabalho de outrem se formam na atividade intelectual e os que trabalham e parte do trabalho apropriado por outrem se formam na atividade prtica, no trabalho manual. Nesse sentido a sociedade de classes desvincula teoria da prtica. Isto podemos verificar principalmente nas sociedades antigas e medievais onde a atividade espiritual era superior a atividade prtica. No entanto, estas palavras, que expressam momentos altos da trajetria humana, tambm deixar entrever a unilateralidade com que era vista esta formao humana (TONET, 2006, p. 1).

Se compreendermos como Marx (1968), Engels (1999), e tantos outros autores comungam com estes, o trabalho enquanto atividade prtico- terica que forma o ser o humano em todas as suas dimenses, ou seja, na sua totalidade enquanto homem, como verdadeiramente humano. A partir desse pressuposto possvel dizer que no h formao humana fora ou independente do processo do trabalho

Nesse sentido ao estudarmos a histria da formao da sociedade de forma geral e da agricultura em particular percebe-se que esta, se desenvolve em distintos perodos histricos. Estes perodos histricos esto relacionados com a forma que os homens organizam a produo para produzir sua vida material. A produo da vida material condiciona a produo da vida espiritual. Ou seja, a base da formao do ser humano est condicionada a base material. Isto quer dizer, segundo Marx (1998) que o que determina a formao espiritual, a forma de pensar, de compreender a realidade est dialeticamente relacionado como os homens se organizam para a produo dos bens necessrios para a produo e reproduo de sua existncia.

Nas distintas formas dos homens organizar a produo de sua existncia podemos perceber que em um dado momento histrico o campo se separa da cidade, assim como a agricultura se subordina a indstria. Estes fatos produzem conforme Marx, (1968) uma falha no metabolismo entre homem e a natureza. Esta falha produz um duplo desequilbrio. Um social Sobre o desequilbrio social refiro-me as desigualdades sociais produzidas pelo modo capitalista de produo. A diviso da sociedade entre os que possuem os meios de produo e que no trabalham e se apropriam do trabalho de outrem e os trabalhadores (proletariado) que trabalham e no ficam com o trabalho materializado, mas que o entregam aos donos dos meios de produo. e outro naturalSobre desequilbrio natural refiro-me sobre as que esto ocorrendo no nosso planeta. Mudanas que se referem a desertificao, destruio do solo, clima, poluio. Estas mudanas tambm incidem sobre a sade e o bem estar do ser humano. .

O capitalismo que tem produzido a separao campo cidade e a separao da sociedade entre a burguesia e o proletariado, primeiramente na indstria, depois avana sobre o campo expulsando os camponeses de suas terras tornando-os livres para vender sua fora de trabalho ao mercado capitalista.

Ao passo que o capitalismo avana, vai revolucionando as foras produtivas, introduzindo novas tcnicas no processo produtivo, primeiramente na indstria e depois tambm na agricultura.

Na agricultura este processo de inovao tecnolgica acontece principalmente a partir do descobrimento da qumica industrial, juntamente com o descobrimento de como os vegetais se desenvolvem e se nutrem. Em 1840 Justus von Liebig na Alemanha descobre que as nutries das plantas tambm podem ser realizadas atravs de fertilizantes solveis, sintticos (PINHEIRO MACHADO, 2014.p. 31). Este descobrimento, segundo Foster (2014) possibilita uma imensa revoluo na agricultura. Este progresso oriundo a partir das descobertas realizadas ainda no sculo XIX produzem problemas relacionados ao meio ambiente e um aprofundamento da expulso dos camponeses das suas terras acarretando uma maior concentrao e centralizao da propriedade fundiria caracterstica ou propriedade intrnseca ao Modo Capitalista de produo.

Com as descobertas cientficas relacionadas a agricultura acentua-se a contradio sob uma nova e surpreendente perspectiva da reproduo do capital. Este avano tecnolgico na agricultura cria as bases para a agricultura moderna embasada no plantio em linha, na monocultura e no uso de adubos qumicos de base sinttica produzidos na indstria. Alm disso possibilita a produo das sementes hibridas, dos agrotxicos. Pinheiro Machado 2014 chama isto de negao da natureza, Pois segundo este pesquisador existe uma relao dialtica entre natureza e ser humano que sob a sociedade de classe e principalmente na sociedade capitalista foi sendo colocada como oposio. O modo capitalista de produo produz no ser humano uma viso que ser humano est separada da natureza, e portanto, poder dominar esta, com o uso de tecnologias que possibilitam produzir mais em menos tempo e espao produz tambm a destruio da natureza e a destruio do ser humano.

No Brasil isto que muitos pesquisadores sociais chamam de modernizao conservadora que esmaga a cultura camponesa. Do mesmo modo que a revoluo verde Utilizo o termo de revoluo verde para designar o processo de modernizao da agricultura com a introduo da agricultura embasada na mecanizao e no uso de adubos qumicos sintticos de origem industrial assim como das sementes hibridas e dos agrotxicos. Agricultura subordinada a indstria. propiciou a destruio da biodiversidade com a implantao das monoculturas, tcnicas de capital intensivo, contribuindo essencialmente na expulso dos camponeses do campo, no nmero crescente e incontrolvel da criminalidade urbanas.

A agricultura existente antes da mecanizao do processo do trabalho no campo e a utilizao de sementes hibridas produzidas por empresas especializadas nesse ramo de produo, e conjuntamente a utilizao de agrotxicos herbicidas, fungicidas e inseticidas, produz no campo o mesmo efeito que o uso da mecanizao na produo industrial. Ou seja, produz no agricultor uma separao entre o pensar o processo produtivo e fazer a produo. Dessa forma com o passar do tempo o agricultor transformado de conhecedor do processo produtivo em simples operador de mquinas para realizar a produo. Este processo que se inicia no Brasil a partir da dcada de 1950-60 e se aprofunda a partir da dcada de 1990 contribuiu com a dissociao, no trabalho do campo, entre o pensar e o fazer. Em outras palavras, at este momento o agricultor de certa forma ainda dominava a tcnica do como e quando produzir ao mesmo tempo que ele produzia, embora fossem tcnicas rudimentares. Isto quer dizer o agricultor ia construindo o conhecimento no processo de produo, mesmo sendo um conhecimento no tivesse nenhum cunho cientfico. Era um conhecimento acumulado durante sculos denominado saber popular.

O processo do avano do capitalismo que possibilitou tambm o avano das cincias e a descoberta da qumica industrial, proporciona a mecanizao da agricultura, a inveno dos fertilizantes de base qumica sinttica, os agrotxicos herbicidas, inseticidas, fungicidas, assim como primeiramente as sementes hbridas e mais tarde as sementes transgnicas. Este processo foi chamado de revoluo verde. A revoluo verde permitiu um aumento significativo na produo agrcola, mas por outro lado deixou e deixando graves problemas ambientais no que se refere a contaminao do meio ambiente por resduos de agrotxicos, assim como a destruio da flora e da fauna.

A implantao da revoluo verde no Brasil foi apoiada pela comunidade cientfica e financiada pelo Estado, com o discurso que essa seria necessria para aumentar a produo agropecuria como forma de erradicar a fome no mundo. O processo da revoluo verde implantada na agricultura uma necessidade do capitalismo que necessita cada vez mais a concentrao e centralizao do capital (PINHEIRO MACHADO 2014). Segundo este mesmo autor o que na verdade est acontecendo no espao do campo a partir de 1950-60 no uma revoluo e muito menos verde. Mas isto faz parte do processo do desenvolvimento do capitalismo mundial da necessidade eterna de aumentar a extrao de mais valia e consequentemente o lucro (Marx,1968). Para o capitalista o aumento da produo est intimamente relacionado ao aumento do lucro e no de satisfazer as necessidades da humanidade.

A revoluo verde produz no agricultor uma maior dissociao entre o pensar e fazer. Ao introduzir novas tecnologias para a produo agrcolas, agora no mais do domnio do agricultor, mas sim do capital, tira do agricultor a possibilidade de produzir a partir do conhecimento produzido durante a vida de centenas de ano. Ou seja, o conhecimento adquirido no processo produtivo. Dessa forma produzindo no agricultor uma dependncia para com o capital. Esta dependncia condicionou o agricultor a perda daquilo que especificamente humano, a unidade entre teoria e prtica, pensar e fazer pela introduo de novas tecnologias, que necessita cada vez mais uma maior diviso do trabalho. Com a introduo do pacote tecnolgico na agricultura como a mecanizao, uso adubos de origem sinttica, herbicidas, fungicidas, inseticidas, sementes hibridas e transgnicas, tecnologias estas produzem no homem do campo uma perca da capacidade de pensar sobre o fazer. Pois segundo Marx o conhecimento agora no est mais no trabalhador, mas embutido nas tcnicas e nas tecnologias. Nesse sentido tudo isso produz no homem do campo uma diminuio na sua capacidade de pensar sobre o fazer vai separando o trabalho intelectual do trabalho manual, o pensar do fazer na agricultura. Pois segundo Marx 1968 o conhecimento que estava no trabalho transferido ao capital pela tecnologia. Isto quer dizer, sob a agricultura capitalista tirara-se do agricultor a necessidades de pensar sobre o como produzir e o quando produzir, pois isto j estava/est embutido na tecnologia produzida pelo capital.

Conceber e compreender este fenmeno como parte do desenvolvimento da sociedade de classes e de forma mais avanada no modo de produo capitalista torna-se essencial para a compreenso da agroecologia enquanto nova matriz produtiva e tecnolgica que vai se opondo a produo capitalista intitulado agronegcio. Se o modelo tecnolgico da agricultura capitalista separa trabalho manual e trabalho intelectual, pensar e fazer, homem da natureza, a agroecologia enquanto matriz produtiva que segundo Caporal 2009 produtora de novas relaes socioprodutivas que possibilitam aproximar trabalho intelectual e trabalho manual, pensar do fazer e dessa forma se tornando um espao de formao humana.

A compreenso segundo Foster 2014, embasado no pensamento de Marx, de como as