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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC SP PEDRINA ROSA ARAÚJO Concepções do designer educacional sobre a aprendizagem para o desenvolvimento de recursos multimídia Mestrado em Tecnologias da Inteligência e Design Digital São Paulo 2011

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC SP

PEDRINA ROSA ARAÚJO

Concepções do designer educacional sobre a aprendizagem para o

desenvolvimento de recursos multimídia

Mestrado em Tecnologias da Inteligência e Design Di gital

São Paulo

2011

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC SP

PEDRINA ROSA ARAÚJO

Concepções do designer educacional sobre a aprendizagem para o

desenvolvimento de recursos multimídia

Mestrado em Tecnologias da Inteligência e Design Di gital

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Tecnologias da Inteligência e Design Digital - Aprendizagem e Semiótica Cognitiva, sob a orientação da Professora Doutora Ana Maria Di Grado Hessel.

São Paulo

2011

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Banca Examinadora:

________________________________________

________________________________________

________________________________________

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À luz eterna que carregarei sempre no coração:

STELLA.

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AGRADECIMENTOS

À energia superior que com toda sua grandeza, mesmo nos momentos mais difíceis

da vida, nos possibilita a superação, o crescimento e a transformação.

À minha família - José, Maria, Mateus, Selma, Isabel, Marcia, Tamiris, Emerson e

Breno - que me fez entender e valorizar o que realmente importa. Especialmente os

meus pais, que com toda sua simplicidade e dedicação são exemplos de luta, de

sacrifícios, de perseverança e de conquistas sem nunca perderem de vista os

ensinamentos mais valiosos: o respeito e amor ao próximo.

Ao meu colega nos estudos, amigo, irmão, companheiro e alma-gêmea, Edinho, que

há 11 anos torna minha vida muito mais completa e feliz.

À inseparável, incansável e doce Frida. Sinônimo de que a linguagem do respeito e

do amor ao próximo não tem raça, etnia, idioma, tamanho e nem lugar.

A todos os amigos e colegas que mesmo inconscientemente doaram um pouco de si

e levaram um pouco de mim em seus caminhos.

A todos os professores que passaram por minha formação escolar e acadêmica,

que, ao ultrapassarem os limites educacionais, contribuíram grandemente em minha

formação pessoal. E na verdade vocês não passaram, pois estão comigo em cada

ensinamento que compartilharam.

Ao SENAC-SP pelo incentivo e apoio nesta pesquisa e por proporcionar uma

educação de qualidade e inovadora para seus alunos e funcionários.

Às professoras Adriana Bruno e Graça Moreira pelos sábios apontamentos no

momento da qualificação que me possibilitaram ampliar os olhares sobre esta

pesquisa.

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Aos designers educacionais entrevistados que muito solicitamente contribuíram para

que esta pesquisa fosse realizada.

À querida Ana Di Grado, orientadora, amiga e grande mensageira de que o

“eternamente” existe. É preciso mais que palavras para expressar minha gratidão.

Muito obrigada!

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RESUMO

ARAÚJO, Pedrina Rosa. Concepções do designer educacional sobre a aprendizagem para o desenvolvimento de recursos mul timídia . Programa de Pós-Graduação em Tecnologias da Inteligência e Design Digital. 2011. 89 p. Dissertação de mestrado. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

A presente dissertação apresenta um estudo sobre a aprendizagem humana, em especial sobre sua nova cultura, que se utiliza cada dia mais de estratégias tecnológicas como facilitadoras em ambientes online. O objetivo desta pesquisa foi delimitado em qual o papel do designer educacional para a aprendizagem dos alunos de cursos a distância online, na qual foi investigado que conhecimentos esses profissionais possuem sobre aprendizagem para elaborar recursos educacionais multimídia que contribuam com a aprendizagem nesses ambientes. A pesquisa qualitativa se desenvolveu por meio de estudo de campo se utilizando de entrevistas como estratégia para coleta de dados com os designers educacionais selecionados. Isso possibilitou que emergisse dos discursos seus conceitos, práticas e percepções sobre seus afazeres profissionais. Os estudos desenvolvidos sob as concepções biológicas e culturais da aprendizagem, as concepções da aprendizagem multimídia e da carga cognitiva revelaram que esses profissionais possuem conhecimentos diversos sobre a aprendizagem, principalmente no campo da multimídia. Entretanto, foi possível constatar que esses conhecimentos são, em sua maioria, de natureza empírica, resultantes de suas observações e experiências adquiridas no dia a dia da profissão, o que confirmou a premissa proposta nesta pesquisa. Como um processo complexo e que envolve aspectos de naturezas diversas, a aprendizagem é inerente à própria história da humanidade e, por isso, independentemente do meio a que se propõe, ela deverá sempre estar no foco de todos os profissionais envolvidos no desenho das estratégias educacionais, entre eles, o designer educacional.

Palavras-chave: Aprendizagem, designer educacional e recursos educacionais

multimídia.

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ABSTRACT

This dissertation presents a study about human learning, especially about its new culture, which is used increasingly as a facilitator of technological strategies in online spaces. The aim of this research was limited in the role of educational designer for the learning of students from distance education online courses which was investigated that knowledge these professionals have about learning to develop multimedia educational resources whose intentionality is to help to learning in these spaces. The qualitative research was developed through field study where some interviews were made with selected educational designers as strategy to collect datas. These interviews allowed to emerge from their speeches their conceptions, practices and perceptions about their professional tasks. The studies developed based on the biological and cultural conceptions of learning, conceptions of multimedia learning and cognitive load revealed that these professionals have diverse knowledge about learning, especially in the field of multimedia. However, it was possible to notice that these knowledge are mostly empirical, resulting from their observations and experiences in daily life of their profession which confirmed the premise proposed in this research. As a complex process which involves aspects of diverse natures, the learning is inherent from owner history of mankind, and therefore, it independent on the way that the learning happens, it should always be in focus from all the professionals who involved in the design of educational strategies, among them, the educational designer.

Keywords: Learning, educational designer and multimedia educational resources.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1- Neurônio .................................................................................................... 18

Figura 2- Condições da aprendizagem ..................................................................... 26

Figura 3- Processos controlados e automáticos........................................................ 28

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SUMÁRIO

RESUMO..................................................................................................................... 7

ABSTRACT ................................................................................................................. 8

LISTA DE FIGURAS ................................................................................................... 9

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 12

Capítulo 1: Aspectos biológicos da aprendizagem ... ........................................... 17

1.1 – Como o cérebro funciona? ............................................................................... 17

1.2- Aprendizagem e Memória .................................................................................. 21

1.2.1- Aprendizagem Associativa .............................................................................. 24

1.2.2- Aprendizagem Construtiva .............................................................................. 26

1.3 - A mente, a consciência e a aprendizagem ........................................................ 28

Capítulo 2: Aspectos culturais da aprendizagem .... ............................................. 32

2.1- Breve contextualização da cultura ocidental ...................................................... 32

2.2- Breve contextualização cultural da aprendizagem ............................................. 34

2.3 – Nova cultura da aprendizagem ......................................................................... 41

Capítulo 3: Aprendizagem online ........................................................................... 44

3.1- Aprendizagem multimídia ................................................................................... 46

3.2- Aprendizagem e a carga cognitiva ..................................................................... 52

3.3- O design (er) educacional .................................................................................. 53

3.3.1- Os processos do design educacional .............................................................. 55

3.3.2- A criação dos recursos educacionais multimídia e os princípios da aprendizagem multimídia e da carga cognitiva ......................................................... 57

Capítulo 4: A pesquisa ............................ ................................................................ 61

4.1- Contexto institucional ......................................................................................... 61

4.2- Sujeitos da pesquisa ....................................................................................... 62

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4.3- Contexto da entrevista ..................................................................................... 64

4.4- Descrição, análise e interpretação dos dados ................................................. 65

4.4.1- Concepções biológicas e culturais da aprendizagem ..................................... 65

4.4.2- Concepções da aprendizagem multimídia ...................................................... 67

4.4.3- Concepções da carga cognitiva ...................................................................... 75

Capítulo 5: Considerações finais .................. ......................................................... 79

Referências bibliográficas ......................................................................................... 83

APÊNDICES .............................................................................................................. 87

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INTRODUÇÃO

Tudo começou com meu ingresso na graduação.

Iniciei meus estudos no curso de Tecnologias e Mídias Digitais como um livro

praticamente em branco, que ao longo de quatro anos foi se preenchendo com

diversos saberes resultantes de uma formação interdisciplinar e, entre eles, a

educação a distância - EAD.

Ao tomar contato com a EAD, um novo mundo de possibilidades e

curiosidades surgiu, trazendo consigo diversas questões sobre essa modalidade de

ensino e que obviamente não foram sanadas durante a graduação. Mais tarde,

descobriria que só encontraria mais respostas e questionamentos no mercado de

trabalho.

Dentre as diversas questões que surgiram durante a graduação, a mais

pertinente ocorreu no momento da escolha do problema de pesquisa para o

Trabalho de Conclusão de Curso. Como ele foi realizado em grupo, optamos por

pesquisar a não-linearidade em cursos a distância. Alinhado a esse problema,

criamos um curso-piloto com conteúdos não-lineares para testar nossa hipótese de

que essa característica contribuiria para o aprendizado dos alunos.

Por meio de uma pesquisa qualitativa com os alunos participantes do curso

piloto, concluímos que não só a não-linearidade contribuiu, mas também as

estratégias de ensino que inserimos no curso, como HQ, vídeos e ilustrações foram

apontadas como facilitadoras da aprendizagem. Na ocasião, 61% dos participantes

sinalizaram que esse conjunto contribuiu para uma melhor assimilação do conteúdo

proposto. Porém, não foi possível descobrir o motivo pelo qual as estratégias não

contribuíram para o aprendizado dos outros 39% dos participantes, ficando esse

questionamento em aberto.

Alguns anos mais tarde, já atuando como designer educacional em cursos

online no Senac SP, e vendo de perto como tudo ocorre na prática, ressurgiu a

antiga curiosidade em estudar o motivo pelo qual uma estratégia é eficiente para um

grupo de alunos e para outros, não.

Essa é uma incógnita de grande relevância para meu trabalho, pois sou

responsável pelo desenho educacional do conteúdo nos cursos que desenvolvo e,

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por essa razão, preciso dar conta de algumas demandas que vão desde a

elaboração1 do material didático dos cursos até a análise do curso já produzido.

Com esse cenário surgiu, em um primeiro momento, o interesse em pesquisar

a aprendizagem humana por meio do papel que os recursos multimídia têm nesse

processo. Porém, esses recursos são concebidos por designers educacionais e, por

isso, o foco da pesquisa direcionou-se para a questão do que esses profissionais

sabem acerca da aprendizagem para conceber tais recursos, delimitando-a para a

aprendizagem multimídia em cursos online.

Dessa maneira, entendo que os estudos acerca da aprendizagem multimídia

são de grande relevância, já que cursos a distância online, geralmente, se utilizam

de recursos multimídia como estratégia de ensino a fim de auxiliar os alunos na

compreensão de seus conteúdos. E mesmo havendo mediação docente e interação

com outros participantes do curso, a interface de comunicação nesses casos se faz

por meio de uma máquina, comumente, um computador. Por isso, é importante que,

além de interfaces amigáveis, os ambientes virtuais de aprendizagem tenham

conteúdos que sejam trabalhados de maneira que motivem os alunos a acessá-los,

chamando sua atenção para os principais conceitos abordados, a fim de auxiliá-los

na construção de sua aprendizagem.

A comunicação homem-máquina requer do primeiro um trabalho linguístico-cognitivo, visando a tarefa a que se propõe. É necessário interpretar os recursos da interface, (re)conhecer suas funções e aprender como acioná-las. Isso não se faz sem a participação da língua, que, remetendo a sistemas de referências historicamente construídos, oferece ao usuário condições de interpretar e utilizar significativamente o programa computacional: sua terminologia, ícones, janelas, funções etc. (FREIRE, 1999, p. 72 apud SILVA, 2003).

Ao trazer a perspectiva de Freire para o contexto da educação a distância, a

utilização de recursos educacionais em cursos online se torna pertinente, pois é

possível perceber a importância de se utilizar estratégias que não só ajudem os

alunos a navegarem pelos ambientes virtuais, mas que os auxiliem a entender as

funcionalidades de suas ferramentas. Além disso, o emprego de recursos que se

utilizem das possibilidades que a multimídia oferece também pode ajudá-los na

compreensão e significação dos conteúdos desses cursos, pois estratégias com

1 Em parceria com o especialista da área.

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essa característica trabalham com diferentes sentidos dos alunos, dividindo a carga

informacional entre seus canais de processamento.

A concepção desses recursos, por sua vez, faz parte das atribuições do

designer educacional que, de acordo com Filatro (2008), é quem concebe um

produto com propósitos bem definidos e que se utiliza de conversões inteligentes

para facilitar a compreensão de um determinado assunto e, ainda, é ele que tem:

a ação intencional e sistemática de ensino, que envolve o planejamento, desenvolvimento e a utilização de métodos e técnicas entre diversos outros recursos a fim de facilitar a aprendizagem humana a partir dos princípios de aprendizagem e instrução conhecidos (Ibid., p. 3).

Conforme aponta a autora, é a esse profissional que cabe a intencionalidade

pedagógica de escolher e conceber os recursos educacionais que deverão facilitar a

aprendizagem dos alunos nos cursos por ele desenhados e, por isso, o objetivo

geral desta pesquisa está pautado em compreender qual o papel do designer

educacional na aprendizagem dos alunos de cursos a distância online, já que é ele o

responsável por conceber recursos educacionais multimídia com a finalidade de

auxiliar esses alunos a construírem seus conhecimentos. Dessa maneira, o

problema desta pesquisa se propõe a investigar “que conhecimentos o designer

educacional possui sobre aprendizagem para elaborar recursos educacionais

multimídia? ”.

A partir do delineamento do problema, os objetivos específicos buscam

identificar no fazer diário desses profissionais:

� O que sabem sobre os processos biológicos e culturais envolvidos na

aprendizagem;

� Quais concepções da aprendizagem multimídia estão presentes no

desenvolvimento de estratégias e recursos educacionais;

� Quais os critérios que, de maneira geral, mais impactam em suas escolhas

com relação às estratégias e recursos utilizados.

A premissa para essa questão é de que “seus conhecimentos sobre a

aprendizagem são, principalmente, de natureza empír ica, resultantes de suas

práticas diárias na elaboração de roteiros para rec ursos e estratégias

educacionais para cursos online”, pois a formação acadêmica para essa área é

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variada, ora pendendo à Comunicação e Pedagogia ou à Tecnologia, fazendo com

que questões específicas acerca da aprendizagem multimídia não sejam

contempladas em suas formações. E, dessa maneira, seus conhecimentos vão se

consolidando conforme sua observação e prática.

Para contemplar todos os conhecimentos envolvidos nos objetivos traçados,

foi elaborado referencial teórico inspirado nas ideias de Maturana & Varela (2002, p.

40-1), por afirmarem que o ser humano “não é independente do meio”, e se

queremos “entender o ser vivo, o que temos que encarar é o que o faz, o que o

constrói”. Em outras palavras, é necessário levar em conta toda história do indivíduo,

pois o ambiente à sua volta influencia sua maneira de ser e pensar. Além desses

autores, os estudos de Basbaum (2009) também se mostraram pertinentes, ao

esclarecer a relação biológico-cultural existente no ser humano:

Onde se busque no homem um mero bicho, se queira reduzi-lo ao biológico - como hoje em dia muito se faz - se encontrará um ser de cultura que instala sobre o naturalmente dado um mundo que lhe é próprio; e onde quer que se busque isolar esse mundo de cultura, de pulsões e desejos sublimados pelas convenções, ali se encontrará os traços de uma vida biológica, um animal vestido nos trajes da cultura (p. 14).

Esta é uma pesquisa qualitativa, cujo método de trabalho objetivou o

desenvolvimento de um estudo de campo. A técnica escolhida para coleta dos

dados foi a entrevista, visto que a intencionalidade era deixar emergir do discurso

dos entrevistados suas concepções, suas práticas e suas percepções sobre os

afazeres diários de um designer educacional. E, de acordo com Bervian, Cervo &

Silva (2007), essa técnica é uma das possibilidades indicadas para contextos

similares.

O teor das entrevistas permitiu a definição das categorias nas quais os dados

foram agrupados, analisados e interpretados. São elas: concepções biológicas e

culturais da aprendizagem, concepções da aprendizagem multimídia e as

concepções da carga cognitiva.

Com base nessas percepções entendi que para estudar a aprendizagem seria

necessário compreender os aspectos biológicos e culturais envolvidos nesse

processo, além das concepções da aprendizagem multimídia, por tomar os cursos

online como foco da pesquisa. Dessa maneira, além da introdução, a pesquisa foi

estruturada em cinco capítulos:

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No capítulo 1 , o propósito é abordar algumas características cognitivas

envolvidas no processo de aprendizagem humana. Embasado, principalmente, nos

estudos de McCrone (2002), Pozo (2002) e Izquierdo (2004), esse capítulo explana

um pouco sobre a anatomia e funcionamento do cérebro, função dos neurônios e de

suas sinapses, e o papel da memória para a aprendizagem, o que foi fundamental

para a compreensão de toda a complexidade envolvida no processo de assimilação

de conhecimentos.

Embasado em Cambi (1999), o capítulo 2 apresenta, brevemente, as

principais transformações culturais humanas ao longo da história e como elas

impactaram na maneira de aprender. Com isso ficou claro, no campo da

aprendizagem, o quanto ainda somos semelhantes com nossos ancestrais em pleno

século XXI. E com Matui (1995), os caminhos que a educação - e com ela

aprendizagem - foi seguindo no Brasil até as abordagens atuais se fizeram mais

claros.

No capítulo 3 , baseado nos estudos de Filatro (2008), Mayer (2009) e

Oliveira (2009) são apresentadas as principais características do designer

educacional, bem como as concepções da aprendizagem multimídia e da carga

cognitiva. É nesse momento que se delineiam de maneira mais completa os

conhecimentos que o público investigado nesta pesquisa precisa possuir.

O capítulo 4 vem para contextualizar, analisar e interpretar os dados

coletados nas entrevistas, a fim de verificar a premissa proposta. Aqui é possível

identificar quais são seus conhecimentos, bem como a natureza deles.

O capítulo 5 sintetiza os dados coletados e apresenta as considerações

finais, elaboradas a partir da interpretação dos dados, em que são propostos alguns

conhecimentos considerados pertinentes para os designers educacionais.

Como também atuo na área de design educacional, considero fundamental o

desenvolvimento de um estudo que investigue junto a outros profissionais quais são

os seus conhecimentos sobre esse tema, que há tempos me causa grandes

indagações e curiosidades, que certamente não se esgotarão com esta pesquisa: a

aprendizagem.

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Capítulo 1: Aspectos biológicos da aprendizagem

Apesar de ser um processo complexo e que envolve questões de diversas

naturezas, incluindo as particularidades de cada indivíduo, neste capítulo, a

aprendizagem será abordada sob o ponto de vista biológico objetivando um melhor

entendimento de alguns aspectos físicos envolvidos nesse processo.

Para tanto é importante compreender o que é o cérebro e como se dá seu

funcionamento já que, segundo McCrone (2002), ele é responsável por transformar

entradas de informações em saídas de informações com o máximo de eficiência,

graças a sua anatomia.

Na sequência, será explanado um pouco qual é o papel da memória na

aprendizagem, pois, segundo Pozo (2002), ela afeta seriamente nossa maneira de

aprender porque a aprendizagem consiste em incorporar novas representações à

memória permanente ou mudar as representações que já possuímos.

Por fim, será abordado o problema mente e cérebro a fim de explicar,

segundo Teixeira (2008), suas duas diferentes visões para tentar entender o que

vem a ser a consciência para, a partir daí, tentar estabelecer suas relações com o

processo de aprendizagem.

1.1 – Como o cérebro funciona?

“A função do cérebro é transformar entradas de informações em saídas de

informações com o máximo de eficiência, pois ele foi feito para agir e isso fica

evidente quando se examina a sua anatomia” (MCCRONE, 2002, p.17).

A observação da anatomia do cérebro humano, segundo os estudos atuais,

indica que ele tem aproximadamente 100 bilhões de neurônios (células nervosas

cerebrais) e que cada um desses neurônios pode fazer entre mil e várias centenas

de milhares de sinapses2. Ou seja, o cérebro é capaz de produzir cerca de 100

2 De acordo com Dicionário Eletrônico Houaiss, sinapse é o local de contato entre neurônios, onde ocorre a transmissão de impulsos nervosos de uma célula para outra. Em outras palavras podemos dizer que sinapse é a junção entre dois neurônios.

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trilhões de conexões e todas elas são significativas e têm a sua própria história e o

seu próprio objetivo (MCCRONE, 2002).

Mas o que são os neurônios? Um neurônio é uma versão incrementada de

uma célula comum, pois:

Todas as células têm a capacidade de secretar e responder a mensagens químicas. Todas também possuem uma diferença natural de carga elétrica entre seu interior e exterior [...] O que era necessário para criar um neurônio era dar formato às células – esticá-las para fora a fim de criar uma via de entrada e saída (Ibid., p.23).

Figura 1- Neurônio Fonte: http://www.sogab.com.br/anatomia/sistemanervosojonas.htm

Em uma das extremidades do neurônio há um tufo de ramificações

conhecidas como dendritos, já na outra extremidade há uma longa ramificação,

como se fosse um braço, conhecida como axônio, então, quando o neurônio atinge

seu limite de cargas elétricas recebidas pelos dendritos, ele dispara um impulso

nervoso que parte do axônio até seu destino.

Fisicamente, a diferença entre um neurônio e uma célula comum é muito

pequena, mas quando se observa a capacidade de um neurônio em armazenar

informação e a precisão na entrega de mensagens, a diferença se torna enorme,

pois em todas as células trafegam mensagens químicas, porém, a entrega dessas

mensagens é meio a esmo, porque os sinais precisam se difundir por tecidos ou ser

conduzidos ao longo de vasos sanguíneos para atingir seus alvos. Já com os

neurônios não, eles podem entregar uma mensagem em qualquer lugar do corpo

quase instantaneamente, pois:

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Nervos motores com grosso isolamento conduzem seus sinais a várias centenas de quilômetros por hora. As próprias mensagens são codificadas em padrões flexíveis de impulsos nervosos. Um neurônio pode estar transmitindo sinais sobre visões ou sons, paladares ou movimentos, anseios e frustrações. Os impulsos nervosos parecem exatamente iguais; o significado está nos padrões de conexão que estão sendo formados (MCCRONE, 2002, p.23-5).

No cérebro, cada neurônio está conectado a milhares de outros e a força de

cada uma dessas conexões3 é ajustada por experiência. Isso pode explicar por que

grande parte dos neurônios morre ou se atrofia4 em determinado período da vida já

que inicialmente o sistema nervoso produz um grande excesso de fibras neuronais e

que mais tarde morrem ou atrofiam envolvendo entre 15% a 85% da população

neuronal inicial (GARDNER, 1994).

Mas qual o motivo de haver um grande excesso de conexões iniciais para

depois grande parte delas se atrofiar? O autor diz que um “brotamento” precoce

excessivo constitui a flexibilidade do período de crescimento, pois é uma

característica normal do desenvolvimento e apresenta vantagens adaptativas. Ele

exemplifica dizendo que, caso ocorra algum dano enquanto houver uma quantidade

excessiva de conexões, haverá maiores chances de que o organismo sobreviva

apesar deste dano. Além disso, em uma competição entre as células, as mais

eficazes em formar conexões de força e especificidade terão mais chances de

sobreviver (Ibid.).

Bruno (2010) traz uma visão complementar acerca desse assunto ao dizer

que os sistemas cerebrais são multicomponentes e plásticos, além de indicarem a

possibilidade de novas conexões celulares ao longo da existência humana. Além

disso, a aprendizagem também pode promover a plasticidade5, pois seu processo

3 Os receptores numa sinapse podem mudar seu formato depois de uma explosão de atividade. Por cerca de um segundo, uma conexão se tornará mais sensível e a longo prazo, a ponta de um dendrito pode inchar para expor novas sinapses, fortalecendo fisicamente a conexão, ou um neurônio poderia fazer brotar dendritos inteiramente novos (MCCRONE, 2002). 4 Pesquisas publicadas nos últimos anos estão reforçando a ideia de que a neurogênese em humanos não se limita à infância, ao contrário do que se acreditou por muito tempo. Fonte: Instituto Ciência Hoje. Disponível em: http://cienciahoje.uol.com.br/noticias/neurociencia/bulbo-olfatorio-tem-novos-neuronios/?searchterm=neuronios. Acesso em 23/11/10. 5 “A ideia de plasticidade humana transcende o próprio organismo enquanto máquina biológica. Para a educação, a plasticidade que é social e cultural, além de biológica, sinaliza que quanto mais rico for o ambiente, de modo a estimar atividades mentais e sociais, maior o impacto sobre as capacidades cognitivas e da memória” (BRUNO, 2010, p. 46).

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faz com que ocorram alterações estruturais e funcionais nas células neurais e suas

conexões.

Sendo assim, desde muito cedo, são as vivências e aprendizagens

ocasionadas pelo meio em que se vive que influenciam a maneira de perceber o

mundo, pois dependendo desse meio, algumas conexões sinápticas podem ser

reforçadas ao invés de outras e vice-versa resultando em um “panorama neural

esculpido pelas próprias experiências”.

Assim que nasce, o indivíduo começa a aprender. O legado genético vai se ajustando pela história pessoal de experiências. A pessoa se adapta ao seu próprio mundo, e suas respostas refletem a trajetória particular, que inclui ameaças e oportunidades com as quais aprendeu a lidar (MCCRONE, 2002, p.18).

O autor explica que cada momento representa “um conjunto singular de

desafios” e que o sistema nervoso deve montar uma resposta mental tão precisa

quanto esse desafio, pois são as compreensões, reações e experiências adquiridas

anteriormente que irão determinar um padrão de conexões para melhor comandar o

momento atual. “É como se o cérebro estivesse concentrando a atenção no

significado de cada instante, focando aquela atividade específica” (Ibid., p.18-9).

Nesse processo de conexões, houve uma mudança significativa:

Nos cérebros grandes tanto processamento como as mudanças de memória ficaram quase instantâneas. Assim, aquilo que era originalmente um panorama neural e estava sendo esculpido pela experiência genética evoluiu para um processo ativo de reestrutura neural, que causa a experiência. A resposta do cérebro não é apenas reflexiva, uma série de padrões emitidos por vias fixas. O cérebro sabe porque está agindo da maneira que está agindo. Ele está fazendo escolhas. Está ciente (Ibid., p.26).

O autor ainda diz que qualquer cérebro nada mais é do que uma elaboração

do sistema nervoso, mecanismo que junta sensações e ações e, ao mesmo tempo,

é o produto final de um longo processo evolutivo remanescente de uma seleção

natural. Nesse sentido, Bruno (2010) ainda acrescenta alguns estudos, já

confirmados por neurocientistas atuais, sugerindo que as funções mentais humanas

não se localizam em zonas isoladas do cérebro, mas habitam locais diferentes e

distantes uns dos outros não se limitando a um único sistema neural ou processo.

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Em outras palavras, além de juntar ações e sensações, o cérebro também

permite adquirir os mais diversos conhecimentos ao longo da vida, já que é capaz de

estabelecer novas conexões neurais a todo o momento e até produzir novos

neurônios. Além disso, a memória é um dos principais processos envolvidos na

aprendizagem, pois armazena e “gerencia” todas as sensações e ações de maneira

tão eficiente que, por um segundo, uma pessoa é capaz de relembrar a mais remota

informação que há muito se fazia esquecida.

É por todos esses motivos que conhecer o funcionamento do cérebro torna-se

importante, uma vez que é por seu intermédio que se dá a percepção e assimilação

do mundo necessitando para isso, de seus neurônios e sinapses, pois são os

responsáveis por transmitir todos esses estímulos através do sistema nervoso

possibilitando que sejam selecionados, armazenados e recuperados quando

necessário pela memória.

1.2- Aprendizagem e Memória

“Memória é a aquisição, conservação e evocação de informações”

(IZQUIERDO, 2004).

Além da percepção, cognição e linguagem, a memória também é um

processo cerebral importante para a aprendizagem, já que é a responsável pela

seleção, armazenamento e recuperação de informações e/ou conhecimentos

adquiridos pelo sistema cognitivo. Caso não houvesse um armazenamento mental

das representações do passado, não haveria uma solução para tirar proveito das

atuais experiências. Em outras palavras, a memória está intimamente associada

com a aprendizagem, já que esta última é, entre outras definições, a habilidade de

mudarmos o nosso comportamento por meio das experiências que foram

armazenadas na memória, logo, a memória é a retenção dos conhecimentos

aprendidos6.

Pozo (2002), ao falar sobre o sistema da aprendizagem, diz que existem dois

sistemas de memória interconectados com características e funções diferentes: uma

6 Definição completa na Revista Eletrônica Cérebro & Mente. Disponível em: http://www.cerebromente.org.br/n01/memo/memoria.htm. Acesso em 28/10/10.

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memória de trabalho - curto prazo - e memória permanente - longo prazo. Já

Izquierdo (2004) diz que a memória pode ser dividida em dois tipos:

� De acordo com sua duração: memória imediata que dura alguns segundos;

memória de curta duração que dura de uma a seis horas; e memória de longa

duração que dura muitas horas, dias ou anos.

� De acordo com sua função: memória de trabalho que não armazena arquivos

permanentemente; memórias declarativas que são aquelas que podemos

dizer que existem e como são; e memórias procedurais, também conhecidas

como hábitos, que estão relacionadas com nossas habilidades sensoriais

e/ou motoras.

Pozo (2002) ainda faz a comparação do sistema cognitivo com alguns

aspectos dos computadores7, pois de maneira similar, a memória de trabalho é

bastante reduzida restringindo as possibilidades do nosso funcionamento cognitivo.

Izquierdo (2004) traz o termo seleção ao invés de restrição para a memória de

trabalho, pois além de ser extremamente seletiva, escolhe com bastante precisão o

que guardar e o que descartar, porém, “uma vez guardadas as informações

pertinentes a cada memória, o cérebro pode decidir que elementos de cada uma

convêm guardar, quais é melhor extinguir e quais é melhor esquecer” (Ibid., p. 55).

Ou seja:

A memória humana é um sistema construtivo e interativo, não um arquivo ou um museu (como nos computadores) em que o conhecimento é armazenado e repousa a espera que alguém um dia o recupere ou venha vê-lo. Ela assemelha-se mais a um jardim, em que um dia plantamos certas sementes, mas isso não basta, é preciso regá-las e alimentá-las para que cresçam, é preciso mantê-las com cuidados ativos, já que são expostas a muitas influências externas. Seu crescimento afetará outras plantas e organismos (POZO, 2002, p. 87).

O autor afirma ainda que essa propriedade orgânica da memória afeta

seriamente a maneira de aprender, pois a aprendizagem consiste em incorporar

7 Izquierdo (2004) explica que as analogias entre memória e formas de funcionamento dos computadores ou outros sistemas não significam que uma coisa seja explicável pela outra, pois “[...] Um computador tem que ser ligado na tomada ou a uma bateria para funcionar; nós, não. Um computador grava suas memórias em circuitos integrados; nós não. Nós formamos, guardamos e evocamos memórias com fortes componentes emocionais e sob intensa modulação hormonal; os computadores, não. Nós seres vivos utilizamos processos bioquímicos localizados em diferentes células de nosso sistema nervoso para fazer ou evocar memórias; os computadores não têm bioquímica” (p. 16).

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novas representações à memória permanente ou mudar as que já temos, mas que

para se adquirir novos conhecimentos são necessários diferentes processos mentais

que vão desde a repetição ou assimilação de uma nova informação por aquelas que

já estão presentes na memória, até os processos radicais de reestruturação. Esses

processos serão mais eficazes quanto maior e mais significativa for a relação que se

estabelece entre a nova informação e os conhecimentos que já estavam

representados na memória. Além desses processos mentais, o autor diz que são

necessários, ainda, certos processos externos que otimizam ou minimizam a

eficiência da aprendizagem:

1- Motivação: o aluno deve ter algum motivo para aprender, do contrário, a

aprendizagem será bastante improvável;

2- Atenção: com a característica seletiva da memória de trabalho é necessário

destacar a informação que o indivíduo deverá considerar, pois, assim, terá um

melhor aproveitamento de seus recursos cognitivos;

3- Recuperação e transferência das representações presentes na memória:

as aprendizagens que não são incorporadas tendem a ser esquecidas mais

facilmente. Quanto mais forem mobilizados os resultados de uma aprendizagem,

mais fácil será sua transferência, mas também, quanto mais o indivíduo

compreender o que faz, quanto mais consciência houver sobre os próprios

conhecimentos, maior será a probabilidade de se recorrer a eles em novas

situações, já que será possível relacioná-los com muitas outras situações;

4- Consciência e o controle dos próprios mecanismos de aprendizagem: o

ideal é fazer com que seja o próprio indivíduo quem exerça o controle de seus

processos, utilizando-os de maneira estratégica, mediante uma tomada de

consciência dos resultados que espera de sua aprendizagem.

Além desses processos Pozo (2002) ainda ressalta a importância de outro

mecanismo para aprendizagem que é o esquecimento:

O esquecimento é um mecanismo adaptativo de nosso sistema cognitivo, que está vinculado ao próprio funcionamento da memória e não com possíveis limites em sua capacidade. [...] A memória humana não só serve para representar e recordar o aprendido como também para esquecê-lo quando deixa de ser útil ou eficaz. [...] A lembrança – e com ela o

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esquecimento – é função da organização de nossas representações de memória (POZO, 2002, p. 106-7).

Essa ideia converge com Izquierdo (2004, p. 13) ao afirmar que “eu sou eu, e

você é você, porque cada um tem sua própria história para lhe dizer isso. O conjunto

de memórias que cada um de nós tem é o que nos caracteriza como indivíduos. Mas

também nos caracteriza como indivíduos aquilo que resolvemos ou desejamos

esquecer”.

Mas como é que incorporar novas aprendizagens na memória? Pozo (2002)

responde apresentando dois métodos de aprendizagem: o associativo e o

construtivo. Basicamente, o método associativo é adquirido pela repetição e

automatização de ações, já o construtivo é adquirido pela compreensão das ações.

1.2.1- Aprendizagem Associativa

A aprendizagem associativa é considerada a maneira ancestral de aprender o

que assemelha os humanos a todos os mamíferos, vertebrados e invertebrados.

Porém, na espécie humana, há novas possibilidades, pois a capacidade

computacional é consideravelmente superior às outras espécies permitindo

estabelecer mais relações ou associações entre informações, comportamentos ou

fatos (Ibid.).

Um primeiro processo associativo está formado para extrair regularidades do

ambiente, estabelecendo sequências de previsões de fatos e comportamentos que

permitam viver em um mundo mais previsível e controlado, como, por exemplo, ao

perceber nuvens carregadas, logo podem ser associadas com chuva. Essa é a base

da aprendizagem associativa: não apenas detectar co-variações simples, pois há

uma relação de contingência entre dois fatos quando a probabilidade de que

ocorram juntos é maior do que a de que ocorram de modo separado. Esse processo

é muito importante, pois:

Detectar contingências e não só co-variações requer um sofisticado sistema de cômputo, com um alto valor adaptativo, já que nos permite antecipar os fatos mais prováveis a partir de um antecedente e obter certas consequências prováveis mediante nosso comportamento. É um mecanismo associativo, implícito, do qual não temos consciência e que não usamos de modo deliberado (Ibid., p. 116).

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Um segundo processo associativo, ocasionado devido à característica

seletiva da memória de trabalho, é a condensação ou fundição de elementos

informativos como, por exemplo, agrupamentos de números em forma de chunks

(pedaços, fragmentos) ou peças de informações que se recuperam como uma única

representação, pois ainda que o número de cifras seja o mesmo, a quantidade de

informação se reduz, o que facilita a recordação (POZO, 2002). Além desses

processos, o autor ainda cita um terceiro, conhecido como automatização, que

ocorre com a prática repetida de certas aprendizagens que se consolidam na

memória de trabalho até o ponto de passarem de atividades controladas para rotinas

automatizadas, sem controle consciente.

Uma das vantagens dos comportamentos automatizados é sua rapidez de

execução, pois “as pessoas que automatizaram habilidades consomem menos

tempo ao executá-las que os aprendizes que realizam essas mesmas tarefas de

modo controlado” (Ibid., p. 121), por exemplo: resolução de equações, diagnósticos

médicos etc. Entretanto, o automatismo pode levar um indivíduo a cometer erros

fatais, pois a resposta é disparada ante os indícios habituais sem que se dê conta de

uma leve diferença na situação, como ao excluir um documento importante do

computador, por exemplo.

Apesar disso, ainda há a vantagem de sua eficácia em tarefas múltiplas8: a

realização de dois comportamentos que requerem comportamento controlado

produz uma interferência mútua que reduz grandemente a qualidade de cada uma

delas devido a característica seletiva da memória de trabalho. À medida que se

automatiza um conhecimento o indivíduo torna-se capaz de usá-lo paralelamente

com outras tarefas e essa capacidade é um requisito imprescindível para um

funcionamento cognitivo eficiente.

A principal limitação da aprendizagem associativa é que, somente repetindo e

juntando peças, não há grandes possibilidades de compreender o que se está

fazendo conforme acontece na aprendizagem construtiva.

8 A ideia de automatização do conhecimento que proporciona a realização de algumas tarefas ao mesmo tempo pode ser percebida no comportamento da geração dos nativos digitais ou geração Y, nascida após os anos de 1980, que é conhecida pela capacidade de fazer diversas tarefas ao mesmo tempo: ver TV, ouvir música, teclar no celular etc. Fonte: Jornal online O Globo. Disponível em: http://oglobo.globo.com/tecnologia/mat/2009/05/18/nativos-digitais-ja-estao-dominando-mundo-transformando-forma-como-ser-humano-se-comunica-755911408.asp. Acesso em 01/02/2011.

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1.2.2- Aprendizagem Construtiva

Enquanto que a aprendizagem associativa ocorre por meio da repetição,

junção e automatização de informações e/ou ações, a aprendizagem construtiva

ocorre por meio da compreensão desses mesmos processos.

Uma das maneiras de se produzir aprendizagem construtiva é fazendo uma

organização conceitual interna nos materiais de aprendizagem para serem

compreendidos, ou seja, que estejam internamente organizados de forma que cada

elemento de informação tenha uma conexão lógica ou conceitual com outros

elementos, como pode ser observado na figura 2.

Figura 2- Condições da aprendizagem Fonte: Adaptado Pozo, 2002, p. 127

Como observado na figura, além da conexão lógica ou conceitual com outros

elementos é necessário que o material tenha um vocabulário adaptado ao contexto

do aluno e que seus conhecimentos prévios9 sobre o tema sejam levados em

9 FENKER & SCHUTZE (2008 apud BRUNO, 2010) dizem que pesquisas recentes apontam para importância de oferecer novos conteúdos aos alunos nos momentos iniciais da aula ao invés do

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consideração fazendo com que haja uma predisposição à compreensão desse

conteúdo criando significado10 e sentido em relação ao que está sendo aprendido.

Para que um aprendiz compreenda um material ele precisa ter a atitude ou

disposição favorável a esta aprendizagem, pois compreender exige mais esforço e

supõe mais consumo de recursos cognitivos do que simplesmente decorar (POZO,

2002).

Compreender implica, em maior ou menor medida, uma construção pessoal do significado da tarefa. [...] É sempre traduzir um material às próprias palavras, reconstruí-lo a partir dos próprios contos armazenados na memória permanente (Ibid., p.128).

Ao observar a figura 3 torna-se perceptível que as características dos

processos controlados diferem dos processos automáticos.

Processos

Controlados Automáticos

Consomem atenção Mal consomem atenção

Não são rotinas aprendidas São adquiridos por aprendizado

São flexíveis e se adaptam a novas situações

Uma vez adquiridos modificam-se com dificuldade

Requerem esforços conscientes Não exigem esforços conscientes

Perdem eficiência em condições adversas

Podem ser executados com eficácia em condições adversas

Produzem interferências em situações de dupla tarefa

Não interferem na execução de uma segunda tarefa

tão explorado levantamento de conhecimentos prévios, pois esse movimento pode favorecer a dispersão diante de temas já conhecidos pelos alunos, enquanto que novas informações ativam áreas cerebrais que melhoram significativamente a memória. “Estudos indicaram que as “novidades” potencializam as atividades no hipocampo, bem como a substância negra e a área tegmentar ventral, podendo favorecer o aprendizado e a memória, assim como sua duração” (p. 48). 10 A teoria da aprendizagem significativa, elaborada por Ausubel, é entendida por relacionar uma nova informação de maneira significativa (não-arbitrária) com os conhecimentos que o aluno já possui. Isso produz uma transformação tanto no novo conteúdo assimilado quanto naquele que o aluno já sabia (MARTÍN & SOLÉ, 2004).

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Figura 3- Processos controlados e automáticos Fonte: Adaptado Pozo, 2002, p. 120

Comparando cada um dos processos, em síntese, verifica-se que os

processos controlados – aqueles que levam a compreender determinado assunto –

exigem atenção ou consciência enquanto que os automáticos – aqueles que já se

conhece ou “decora” – não, pois já estão incorporados no indivíduo.

Ambos os processos são de grande importância ao sistema cognitivo, pois se

não houvesse a capacidade de automatizar algumas aprendizagens, não seria

possível, a cada instante, a incorporação de novos conhecimentos por uma possível

sobrecarga cognitiva, tema que será abordado no terceiro capítulo desta

dissertação.

Mas além da memória e todos os seus processos, teriam a mente e a

consciência algum papel na aprendizagem? É isso que será discutido a seguir.

1.3 - A mente, a consciência e a aprendizagem

“O cérebro existe para que possamos perceber o mundo e saber como reagir, já a

mente existe para otimizar nosso comportamento” (MCCRONE, 2002, p.17).

[...] “o termo consciência tem hoje tantos significados distintos, que, às vezes, mais

que um conceito ou um processo cognitivo, parece um curinga, uma palavra que

serve para denominar tudo o que nos escapa ou escorre por entre os dedos quando

estudamos o sistema cognitivo humano” (POZO, 2002, p.157).

Teixeira (2008) trata de maneira muito clara alguns questionamentos

filosóficos acerca do problema mente e cérebro que há muito tempo divide a

comunidade científica sobre o que é a mente humana e se ela é algo imaterial que

independe do cérebro (visão dualista) ou se mente e cérebro são a mesma coisa

sendo a existência do cérebro necessária para que a mente possa existir (visão

materialista).

Para os dualistas “o mental se sobrepõe ao físico e determina algo para além

das propriedades físicas” (Ibid., p. 33), ou seja, não é possível mapear o que

acontece na mente. Já para os materialistas, “toda nossa vida mental nada mais

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seria do que uma grande variação dos estados químicos e físicos do cérebro”

(TEIXEIRA, 2008, p. 21), ou seja, estados mentais são iguais aos estados cerebrais.

Para ajudar a entender esse paradoxo, o autor cita como exemplo o problema

da vaca amarela que ilustra um filósofo pensando em estrelas coloridas seguidas

por uma vaca amarela e que por fim é tomado pela sensação de calor. A partir

desses três movimentos, ele argumenta que, se alguém pudesse abrir o cérebro do

filósofo e examiná-lo, “não veria estrelas coloridas nem uma vaca amarela. Veria

apenas neurônios e tempestade elétrica ocorrendo” (Ibid., p. 9). Baseado nisso, ele

afirma que os estados mentais (pensamento) não podem ser considerados iguais

aos estados cerebrais (neurônios e tempestade elétrica) conforme a visão

materialista. Porém, ao falar sobre o que é a mente, ele diz que caso o cérebro de

uma pessoa seja danificado, sua mente também será afetada e que por isso deve

haver uma relação entre os estados mentais e cerebrais.

Sobre a consciência, McCrone (2002) diz que sua natureza não é passiva,

pois ela está relacionada com a percepção dos aspectos do mundo que exigem uma

resposta ou ação. Ele ainda diz que apesar de se sentir consciente para dirigir a

própria mente, os indivíduos não possuem controle absoluto sobre seu núcleo

psíquico. É o cérebro que faz, conscientemente, suas próprias escolhas.

Uma possível relação entre a mente, a consciência e a aprendizagem é

apresentada por Pozo (2002) ao dizer que:

não é casual que a mente humana, o único sistema capaz de se autoprogramar, de refletir sobre si mesmo, seja a máquina de aprender mais potente que se conhece, não só pelo ótimo uso que faz de seus recursos limitados, como também porque pode aprender de uma forma mais controlada e reflexiva que o resto dos sistemas que conhecemos (p. 159). A característica que melhor identifica a mente humana quando a comparamos com outros sistemas de conhecimento é que pode refletir sobre si mesma, pode tomar consciência de seus estados e inclusive, as vezes, de seus processos (Ibid., p. 161).

Ainda para o mesmo autor, enquanto alguns processos - como atenção ou

recuperação - desempenham uma função concreta, específica e localizada em

momentos determinados das tarefas de aprendizagem, a consciência tem uma

função distinta, menos sólida ou concreta.

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Ao analisar os diversos níveis de análise cognitiva, a consciência está acima, ou abaixo, do resto dos processos, é transversal a eles, já que trata de regulá-los ou controlá-los. Em vez de ter uma função específica em dados momentos da aprendizagem, é algo onipresente. Está sempre aí, ou talvez nunca esteja, como uma névoa que flutua sobre todo o funcionamento cognitivo. Sua onipresença, unida a algumas de suas propriedades mais conhecidas (caráter difuso e inapreensível, vagos contornos, contínua mobilidade) faz da consciência uma entidade, digamos, mais gasosa. Como os gases, está em todos os lugares e em nenhum (POZO, 2002, p. 156-7).

Segundo McCrone (2002), nos últimos anos, está se assumindo que o

sistema cognitivo humano não é apenas um complexo e sutil mecanismo para

adquirir e armazenar representações, pois também é capaz de adquirir consciência

de si mesmo, regular sua própria atividade e refletir sobre suas próprias produções.

Ele ainda fala sobre como a reflexão consciente dos processos cognitivos

(metaconhecimento) é uma característica que diferencia a mente humana de outros

sistemas de conhecimento, sejam orgânicos ou artificiais, junto com outras

características diferenciadoras, que são apontadas por Pozo (2002):

a representação simbólica da realidade através de uma linguagem compartilhada e tingida não só de cultura, como também de desejos, intenções, humor, ironia, ou, a capacidade de aprender de modo construtivo e atribuir significados, gerada no marco de uma cultura da aprendizagem com o fim de construir novas formas culturais que modifiquem, simbólica e realmente, o mundo em que vivemos (p.161-2).

O surgimento do Homo sapiens, aproximadamente 100 mil anos atrás, trouxe

consigo uma impressionante diferença em relação aos demais hominídeos: os

símbolos11 e, com isso, a capacidade de pensar de maneira inovadora, além de ter

imaginação suficiente para se influenciar por superstições e temores (MCCRONE,

2002). Mas o que poderia ter produzido essa transformação intelectual? O autor diz

que “essa revolução intelectual deve ter sido resultado da linguagem, provocada

pelo desenvolvimento da fala articulada e da gramática” e que “a fala foi a

ferramenta mental que permitiu nossa grande evolução” (Ibid., p. 55-6).

A linguagem permitiu que a mente do Homo sapiens fosse libertada. [...] um cérebro que domine não só o tempo presente mas também tenha a capacidade de analisar o passado e refletir e ponderar sobre o futuro iria se tornar fundamental para sua franca evolução (p. 57). [...] A fala foi o

11 Eles esculpiam figurinos, decoravam cavernas com cenas de caça e enterravam seus mortos com rituais. Essa evidência arqueológica não deixa dúvida de que se tornaram modernos e conscientes de nosso passado e futuro (MCCRONE, 2002, p. 54).

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mecanismo. A fala, especialmente quando usada como voz interior, deu-nos novo tipo de software, que conseguiu levar o nosso cérebro já consciente a lugares em que jamais havia estado antes. As palavras puderam nos transportar a situações do nosso imaginário, podemos até imaginar como seríamos vistos pelos outros. As palavras favoreceram o exercício não só da consciência como da autoconsciência – capaz de compreender que o nosso grande atributo é ter individualidade com história e futuro, com desejos e responsabilidades (MCCRONE, 2002, p. 58).

Se essa condição única dos seres humanos - de ter uma mente consciente

que regula e controla nossos processos de aprendizagem e possuir um sistema de

linguagem tingido de cultura e percepções – transformou-os em grandes aprendizes,

como é que a cultura influenciou esse processo? É o que o próximo capítulo busca

esclarecer.

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Capítulo 2: Aspectos culturais da aprendizagem

Para entender a aprendizagem sob seus aspectos culturais, devido às

diversas dimensões que a cultura possibilita, serão, brevemente, consideradas as

principais transformações humanas ao longo da história e como estas impactaram

nossa maneira de aprender, já que para Pozo (2002) a aprendizagem é tão antiga

quanto a própria história da espécie humana, entretanto, como atividade socialmente

organizada, ela é muito mais recente, pois nem sempre os humanos tiveram a

cultura de viver em sociedade.

Para McCrone (2002), uma pessoa é uma coleção de memórias e hábitos que

moldam seu fluxo mental, fazendo da individualidade apenas um acúmulo de

histórias. Assim, pode-se partir do princípio que todas as transformações pelas quais

a humanidade passou, e ainda passará, remontam a cultura humana e, como

consequência, sua maneira de aprender.

Para haver um melhor entendimento da relação entre os conceitos de cultura

e aprendizagem é necessário, primeiramente, entender brevemente como a cultura

ocidental se consolidou para, então, observar como os processos de aprendizagem

foram se transformando desde os primórdios, por meio da imitação até a utilização

dos recursos tecnológicos na atualidade.

2.1- Breve contextualização da cultura ocidental

Nossa continuidade cultural histórica ocidental foi definida através da helenização após Alexandria, da unificação do Império Romano somada à manutenção da cultura antiga por parte da Igreja Cristã. [...] a cultura seria o resultado de uma longa construção da manutenção e das diferenciações entre várias outras culturas (BAIRON, 2002, p. 26).

Antes de abordar, resumidamente, alguns movimentos que contribuíram para

a constituição da cultura ocidental, há um longo caminho a ser percorrido que, de

acordo com as ideias de Cambi (1999), se iniciou com a pré-história humana quando

os primeiros hominídeos adquiriram a posição ereta tornando-os capazes de

controlar o território com o olhar e, sobretudo, liberando as mãos que se tornaram

independentes do caminhar e se transformaram no instrumento fundamental de

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múltiplo uso modificando radicalmente a sua relação com a natureza e preparando o

processo da cultura, mesmo que ainda grosseiramente e elementar.

A partir dessa conquista, os hominídeos ainda passaram por diversas

evoluções que vão desde o Australopithecus, passando pelo Pitecanthropus e o

homem de Neanderthal até surgir o Homo sapiens que já possuía as características

atuais: domínio da linguagem, elaboração de múltiplas técnicas, educação de seus

“filhotes”, domínio da caça, nômade, “artista” impregnado de cultura, cultos e

crenças. Durante essas evoluções, os hominídeos deixaram de ser simples

caçadores que lascavam pedras e construíam abrigos, passando a viver da colheita

e caça para, mais tarde, aperfeiçoar suas armas, além de desenvolver culto aos

mortos e pinturas que transmitiam o seu ainda simples saber técnico: a posse do

fogo, o uso das armas, a caça, os rituais etc. (CAMBI, 1999).

Há cerca de oito ou dez mil anos iniciou-se o período Neolítico no qual,

segundo o autor, houve uma verdadeira e própria revolução cultural, pois nasceram

as primeiras civilizações agrícolas permitindo um aperfeiçoamento das técnicas, tais

quais: fabricação de vasos, tecelagem, aragem da terra, além da divisão do trabalho

entre homem e mulher e o nascimento de uma arte cada vez mais rica e sofisticada,

estilizada e simbólica, com função mágica e educativa ao mesmo tempo.

O milagre grego, que se iniciou no século VII a.C. e se estendeu até o século

VI d.C., embora mesclado de elementos provenientes do mundo oriental - mítico-

religiosos - e de outros ligados ao mundo mediterrâneo - técnico-pragmáticos -

tendeu a tornar esses elementos em instrumentos nas mãos dos homens para

compreender e dominar o mundo natural e humano em que viviam. Além disso,

esses homens tenderam a laicizar-se, fugindo das práticas mágicas e esotéricas

tornando o conhecimento como próprio da mente humana.

“Assim, no centro da cultura grega, coloca-se a racionalidade, ou seja, aquele

uso rigoroso da mente que se desenvolve na direção lógica e crítica e que organiza

cada âmbito da experiência humana, submetendo-o a uma reconstrução à luz da

teoria.” (Ibid., p.72). Ainda de acordo com ele foi essa virada que a civilização grega

proporcionou no mundo antigo que tornou a cultura mais autônoma e enciclopédica,

mais humana e abertamente teorética, colocando esse modelo no centro da história

ocidental alimentando o mundo moderno.

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Com o advento do cristianismo, iniciado com o nascimento de Jesus Cristo,

operou-se uma profunda revolução cultural no mundo antigo, que talvez tenha sido a

mais profunda que o mundo ocidental conheceu em sua história, pois se tratava de

“uma revolução da mentalidade, antes mesmo que da cultura e das instituições

sociais e, depois, políticas também” (CAMBI, 1999, p. 121), ou seja, surgia um novo

“tipo” de homem com características de igualdade, solidariedade, com a virtude da

humildade, do amor universal, da dedicação pessoal e ainda da castidade e

pobreza.

Nasce um novo modelo de sociedade inspirada e sustentada pelos valores do evangelho e que encontra na igreja o seu ideal-guia e o seu instrumento de atuação, já que se afirma como uma sociedade baseada em relações de fraternidade e civilidade, além de igualdade, e como o motor de todo o processo de renovação da vida social (Ibid., p. 122).

Toda essa revolução estabeleceu uma grande ruptura na organização social,

política e cultural em relação ao mundo antigo, pois foram difundidos novos valores,

que, em sua maioria, foram inversos aos valores clássicos, como a humildade diante

do poder e a paz diante da força, entre outros.

Essas transformações sociais e políticas, desde a pré-história humana até o

advento do cristianismo, acabaram por ajudar a moldar não só a cultura ocidental,

mas também, como consequência, revolucionaram o campo educativo

transformando todo processo de ensino e aprendizagem que se iniciou com a

imitação, passou pela repetição e memorização e que hoje, além de se utilizar de

todos esses processos, também utiliza recursos e meios tecnológicos

complementares para alcançar os mesmos propósitos.

2.2- Breve contextualização cultural da aprendizage m

Partindo do princípio de que a aprendizagem, como uma atividade biológica,

remonta à própria história da humanidade (POZO, 2002) é possível supor que os

indivíduos já nasçam aprendendo. Mas será que desde os primórdios a humanidade

aprende da mesma maneira? Pelo que é possível perceber, ao observar a história

da sua evolução, fica claro que, com o passar do tempo, eles acumularam diferentes

maneiras de aprender possibilitando sua evolução.

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De acordo com o autor, a imitação foi a primeira estratégia de aprendizagem

utilizada pelo homem primitivo, já que foi dessa maneira que ele aprendeu ou

ensinou a utilizar armas, a caçar e colher, se utilizar da linguagem etc. Já no período

do Homo sapiens, a educação dos jovens tornou-se o instrumento central para a

sobrevivência do grupo e a atividade fundamental para realizar a transmissão e o

desenvolvimento da cultura, porém, eles continuavam se utilizando da mesma

estratégia para isso, qual seja: o jogo-imitação.

Com o advento do período neolítico, a humanidade e, consequentemente, a

aprendizagem sofreu algumas mudanças importantes que, apesar de ainda estar

baseada na transmissão da tradição e imitação, tornou-se mais independente desse

modelo, redefinindo-se como processo de aprendizagem e transformação ao mesmo

tempo. Além disso, ligou-se cada vez mais à linguagem, primeiro oral, depois escrita,

tornando-se cada vez mais transmissão de saberes discursivos e não somente de

práticas e, por fim, reivindicando a institucionalização dessa aprendizagem em um

local apropriado para transmissão da tradição e saberes diversos: a escola12.

Na civilização assírio-babilônica, aproximadamente entre os anos de 1300

a.C. a 539 a.C., Cambi (1999) diz que sacerdotes eram os responsáveis pela

formação escolar que acontecia em três etapas: primeiro aprendia-se a língua

oralmente, depois de maneira codificada e por fim na dimensão de escrita comum.

Era essa experiência escolar que formava os escribas e já ocorria em ambientes

aparelhados para escrever sobre tabuletas de argila, com o controle de um mestre

sob uma rígida disciplina.

Já na civilização egípcia, surgida há aproximadamente 4000 a.C., o autor diz

que o primeiro instrumento do sacerdote-intelectual era a escrita, cuja aprendizagem

se fazia por transcrição de hinos e livros sagrados, acompanhada de “exortações

morais” e de “coerções físicas”. Nessa civilização, além da escrita, já se ensinava

também aritmética.

12 Segundo Pozo (2002), os vestígios mais antigos já encontrados que sugere a aprendizagem como atividade humana, ou seja, institucionalizada, pertenciam à civilização suméria e datam de aproximadamente 3000 a.C. Ele ainda diz que após este período, com os assentamentos neolíticos próximos ao atual Iraque, surgiu o primeiro sistema de escrita que se tem conhecimento e, consequentemente, com o tempo, foi surgindo a necessidade de formar escribas e depois as primeiras escolas formais que trabalhavam uma “aprendizagem memorística ou repetitiva” (p. 27), ou seja, os aprendizes decoravam para, então, reproduzir o que aprendiam.

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Na Grécia, com a leitura educativa dos poemas homéricos, aproximadamente

entre os séculos IX e VIII a.C.13, que foram utilizados como texto de formação pelas

classes dominantes, desenvolveu-se o modelo ideal de formação ligado à excelência

e ao valor. Além disso, existiram três aspectos da educação grega que pesaram de

modo particular sobre a tradição educativa ocidental: 1- a noção de Paideia, que

universalizou e tornou mais independente o processo de formação, entendido como

um formar-se se universalizando e desenvolvendo a própria humanitas; 2- a

Pedagogia como teoria, destinada a universalizar e tornar rigoroso (no sentido

racional) o tratado dos problemas educativos; 3- a problematização da relação

educativa, que supera o nexo pedagogo-pai e docente-discente, relação autoritária e

formalista, abstrata e geralmente impessoal, para, ao contrário, delinear essa

relação como eminentemente espiritual, quase um segundo nascimento, que faz do

“mestre” o interlocutor fundamental de um processo de formação e, portanto, um

educador dotado de excepcional carisma e de uma exemplaridade que induz à

imitação (CAMBI, 1999).

Foram todos esses aspectos, segundo o autor, que colocaram a experiência

grega no ápice da cultura pedagógica antiga e que evidenciaram bem o papel de

inspiradora que, por tão longo tempo, ela assumiu dentro do Ocidente romano,

depois cristão e medieval e, por fim, também moderno.

Anos mais tarde, com a difusão do cristianismo e sua legitimação político-

religiosa sob Constantino, no século III d.C., criou-se uma ruptura no terreno

educativo, pois os cristãos depreciavam a retórica greco-romana14 e a cultura dos

pagãos em geral e atacavam as escolas que transmitiam uma literatura contrária ao

espírito cristão e orientada para valores diferentes dos evangélicos. Ou seja, “a

revolução do cristianismo é também uma revolução pedagógica e educativa, que

durante muito tempo irá marcar o Ocidente, constituindo uma das suas complexas,

mas fundamentais, matrizes” (Ibid., p. 123).

13 De acordo com Murari e Pereira Melo (2009). Disponível em: http://www.ppe.uem.br/publicacoes/seminario_ppe_2009_2010/pdf/2009/36.pdf. Acesso em 05/02/11. 14 Pozo (2002) ainda acrescenta que na Grécia e Roma clássicas, nas escolas de ensino superior, os modelos de aprendizagem diferiam da simples revisão e repetição citando o exemplo da academia de Platão, cujo modelo era baseado em diálogos e persuasão ou “comunidades de aprendizagem” reduzidas e fechadas em si mesmas.

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Na Idade Média, a educação se desenvolveu em estreita convivência com a

Igreja, com a fé cristã e com as instituições eclesiásticas que eram as únicas

delegadas a educar, a formar, a conformar. A escola, tal como se conhece hoje, é

produto desse período: estrutura ligada à presença de um professor que ensina

muitos alunos de diversas procedências e que deve responder pela sua atividade à

Igreja ou a outro poder. Porém, segundo Pozo (2002), durante os quase dez

séculos, desde a queda do Império Romano até o Renascimento, mal existiram

alterações no modelo de aprendizagem, pois as mudanças mais notáveis na cultura

da aprendizagem se devem a uma revolução na tecnologia da escrita: a invenção da

imprensa que, juntamente com a cultura do Renascimento, permitiu maior

divulgação, acesso e conservação do conhecimento. A escrita passou a ser a

memória da humanidade e, com isso, ocorreu um declive social da memória

repetitiva.

Com a Modernidade, iniciada aproximadamente no século XVI, ocorreram

algumas mudanças na educação, pois agora ela se destinava a um indivíduo ativo

na sociedade, liberado de vínculos e de ordens, nutrido pela fé laica e aberto para o

cálculo racional da ação e suas consequências. Além disso, os meios educativos

também passaram por mudanças, fazendo da escola um lugar cada vez mais central

e funcional para o desenvolvimento da sociedade moderna. E, finalmente, as teorias

pedagógicas também mudaram, se emancipando de um modelo unitário, definido a

priori e considerado invariante tomando uma conotação histórica e empírica,

encarregando-se das novas exigências sociais de formação e instrução, modelando

fins e meios da educação em relação ao tempo histórico e às condições naturais do

homem, que, portanto, deveria ser estudado cientificamente. Com a Modernidade,

nasceu a Pedagogia como ciência: como saber da formação humana que tende a

controlar racionalmente as complexas (e inúmeras) variáveis que ativam esse

processo (CAMBI, 1999).

No início da Pedagogia moderna, no século XVI, o método utilizado para

aprendizagem era o praelectio: leitura de uma passagem sem interrupção, na

explicação do sentido das partes mais obscuras, na conexão de uma com a outra e

nas observações adequadas a cada classe e a concertatio: disputa suscitada pela

pergunta do docente e pelas correções dos concorrentes ou pela interrogação

recíproca dos próprios concorrentes e tida em alta consideração e, usada as vezes,

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com grande incentivo aos estudos. Esses métodos ainda eram acompanhados da

atribuição de tarefas escritas e repetições orais a fim de reforçar a memória (CAMBI,

1999).

Mas foi nos anos de 1600 que a escola se racionalizou e se laicizou,

tornando-se um instrumento cada vez mais central na vida do Estado e também da

sociedade civil e, portanto, cada vez mais submetida ao controle e à planificação do

poder público. Já entre o fim dos anos de 1600 e os primeiros decênios dos 1700

foram tomando corpo dois modelos pedagógicos, culturais e educativo-escolares

que se opunham frontalmente ao racionalismo e ofereciam uma imagem

radicalmente nova dos processos formativos, ligando-a aos processos empírico-

naturais e às suas conotações histórica e geograficamente variáveis; ou recorrendo

à história, à linguagem, à cultura em todas as suas formas, vistos como terrenos em

que o homem se realiza a si próprio e nos quais vem operar sua formação mais

específica (Ibid.).

O empirismo e o historicismo elaboraram dois modelos pedagógicos15 que,

embora se contrapondo, alimentaram o debate e o desenvolvimento da Pedagogia,

sobretudo contemporânea, chegando até aos anos de 1900.

Se o empirismo valoriza a ciência como meio e fim educativo, reportando a educação à instrução e esta para a formação da mente interpretada no sentido cognitivo e epistemológico, o historicismo fixa o valor da história como habitat da formação, como centro da cultura, mas também como modelo de formação, que implica a construção da personalidade enquanto entremeada de cultura e caracterizada pelo pensamento como atividade crítica (Ibid., p. 315-6).

O século XVIII acabou por completar o processo de laicização, que foi típico

do mundo moderno, que o animou e que o caracterizou profundamente, impondo

uma emancipação das condições de vida e de produção de âmbito social,

emancipação de uma concepção do mundo dominado pelo modelo religioso e de

uma explicação mágica dos eventos. O efeito de todos esses processos,

acompanhado também pelo papel cada vez mais incisivo e mais amplo assumido

15 Esses dois modelos, embora se excluíssem reciprocamente, se evocaram e se integraram historicamente. “A pedagogia ou se liga à natureza, à biofisiologia, ao corpo, e desenvolve uma formação que se atenha às conotações do processo natural (crescimento e desenvolvimento), ou se vincula à história e à cultura e as indica como os terrenos mais próprios da formação, que é sempre

um processo espiritual” (CAMBI, 1999, p. 315).

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pelo nascimento e difusão do livro, pela expansão da alfabetização - inicialmente por

razões religiosas, depois civis e econômicas -, pelo amadurecimento do novo perfil

de intelectual - o intelectual moderno não mais emissário do poder religioso e

político, mas caracterizado por uma autonomia e um papel social mais incisivo e

dinâmico - foi um grande processo de laicização, de uma maior liberdade por parte

de classes sociais e de indivíduos que se tornaram independentes de modelos

unívocos e vinculantes, agora valorizados justamente pela sua independência.

Foi nesse cenário que nasceu a escola contemporânea16: com suas

características públicas, estatais e civis, sua estrutura sistemática, seu diálogo com

as ciências e os saberes em transformação, dando lugar, no nível da didática, a

processos de ensino e aprendizagem bastante inovadores: mais científicos ou mais

empíricos ou mais práticos. Esta é, sobretudo, a Pedagogia do iluminismo (CAMBI,

1999).

Já o século XIX, para o autor, pode ser definido como o “século da

Pedagogia”, pois com o advento da sociedade de massa e com a afirmação do

industrialismo, viu-se diante do problema da conformação a novos modelos de

comportamento das novas classes sociais, de povos, de grupos, realizáveis apenas

por meio da educação, mas uma educação nova e regulada por teorias novas, por

uma pedagogia consciente do desafio a que ela deve responder.

A partir dessa consciência, diversos pensamentos/movimentos pedagógicos

emergiram e pouco a pouco foram formando uma nova cultura da aprendizagem.

Foi com a Escola Nova17 - movimento iniciado na Inglaterra no final do século

XIX e que chegou ao Brasil na década de 1920 - que uma nova visão de mundo

passou a ser considerada na educação: não há uma essência humana determinada

desde o nascimento, mas sim construída durante toda sua existência, assim, a

educação deveria seguir o ritmo da vida variando de pessoa a pessoa. Esse

16 A época contemporânea nasce – convencionalmente – em 1789, com a Revolução Francesa, já que é com aquele evento crucial que caem por terra seculares equilíbrios sociais, econômicos e políticos, enquanto toda a sociedade europeia entra numa fase de convulsão e de transformação que se prolongará por muito tempo e que mudará as características e profundas da história (CAMBI, 1999, p. 377). 17 As características da escola nova foram definidas em oposição às da escola tradicional que deriva da visão fixista do mundo que, nascida do idealismo grego, considerava que as coisas foram criadas acabadas, de uma vez por todas. Assim, na escola tradicional, o objetivo era ensinar a ler, escrever e contar por meio de uma metodologia autoritária e rígida, “pois se existe uma essência humana, o ensino deve ser igual para todos, numa ordem lógica e preestabelecida” (MATUI, 1995, p.5).

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movimento deu uma contribuição inquestionável à história da Pedagogia inventando

vários métodos e técnicas de ensino (MATUI, 1995).

Ainda na metade dos anos de 1950 se constituiu a psicologia cognitiva, que

operou uma revolução da qual, segundo o autor, ainda não foi possível explorar os

limites. Porém, as sementes plantadas nessa época germinaram rapidamente no

decênio seguinte, difundindo os resultados da ciência cognitiva também em outros

âmbitos, mas tendo em primeiro lugar a Pedagogia (Ibid.). Assim, segundo Cambi

(1999), tomou corpo uma nova concepção da Pedagogia, pouco atenta aos

problemas sociais da educação e muito atenta aos problemas da aprendizagem e da

instrução, sobretudo científica.

Entre os anos de 1960 e 1970 foi introduzido no Brasil o modelo educacional

americano conhecido como Escola Tecnicista, cujo objetivo era produzir indivíduos

competentes para o mercado de trabalho por meio da transmissão de informação de

maneira rápida, eficiente, objetiva e precisa. Esse modelo via o aluno como

depositário passivo de conhecimentos que deveriam ser acumulados na mente por

meio de associações (MATUI, 1995).

Segundo o autor, hoje o cognitivismo é considerado como parte de uma nova

ciência da mente da qual o construtivismo18 e o sócio-interacionismo19 fazem parte;

ele junta os dois conceitos tratando-os como “construtivismo sócio-histórico”, pois

considera que a aprendizagem não procede só do sujeito, nem só do objeto, mas da

interação de ambos.

Essa visão permite ao construtivismo focalizar a interação sujeito-objeto como uma estrutura bifásica ou bipolar, cujos elementos são inseparáveis. Não há sujeito sem objeto e não há objeto sem sujeito que o construa. O sujeito não está simplesmente situado no mundo, mas o meio (o objeto) entra como parte integrante do próprio sujeito, como matéria e conteúdo cognitivo e histórico (Ibid., p. 45).

18 Para Piaget, um dos principais estudiosos dessa linha teórica, o desenvolvimento cognitivo é “um processo de construção de estruturas lógicas, explicada por mecanismos endógenos, e para a qual a intervenção social externa pode ser uma facilitadora ou obstaculizadora”, ou seja, “uma teoria universalista e individualista do desenvolvimento, capaz de oferecer um sujeito ativo porém abstrato (“epistêmico”), e que faz da aprendizagem um derivado do próprio desenvolvimento” (CASTORINA, 2003, p. 12). 19 A teoria de Vygotsky, um dos principais estudiosos dessa linha, “aparece como uma teoria histórico-social do desenvolvimento que, pela primeira vez, propõe uma visão da formação das funções psíquicas superiores como “internalização” mediada da cultura e, portanto, postula um sujeito social que não é apenas ativo mas sobretudo interativo” (CASTORINA, 2003, p. 12).

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Ou seja, nesse momento, além da repetição e memorização, que já

pressupunha a interação entre indivíduos, percebeu-se que o ser humano está,

constantemente, construindo seus conhecimentos por meio da interação com o

próprio ambiente em que se situa, além é claro, da interação com outros indivíduos

já que também não deixou de aprender com a repetição e memorização.

O final do século XX trouxe consigo diversas mudanças. Já na década de

1980 a sociedade vivenciou o tempo das mídias, especialmente do computador,

deixando a certeza de que na década de 1990, parte da população mundial teria um

computador em suas casas. No Brasil essa década representou o sonho de ter um

computador conectado à internet e, assim, esse período foi marcado pela

comunicação e por toda a tecnologia que a envolve (BRUNO, 2007).

Com a chegada do século XXI, a população teve mais acesso aos

computadores e à internet e, com eles, a informação. Por esse motivo, segundo a

autora, ouve-se com frequência termos como Era da informação, Sociedade da

informação e Sociedade do conhecimento, termos estes que estão intimamente

ligados a uma nova maneira de aprender, pois os alunos têm fácil acesso à

informação não recorrendo apenas ao mestre em seus processos de ensino e

aprendizagem.

Com esse cenário está sendo construída uma nova cultura da aprendizagem

que, a cada dia, acrescenta meios tecnológicos que objetivam contribuir com a

promoção da aprendizagem.

2.3 – Nova cultura da aprendizagem

De acordo com Pozo (2002), a nova cultura da aprendizagem pode ser

definida como a construção do conhecimento que ocorre por meio de uma educação

generalizada e uma formação permanente e massiva, além de também ocorrer por

saturação informativa e por um conhecimento descentralizado e diversificado.

Diante dessa nova cultura, proporcionada pelo fácil acesso à informação, uma

das propostas inovadoras encontra-se na Educação a Distância20 online que se

20 Segundo Bruno (2007) foi a partir do século XlX, com a evolução dos meios tecnológicos, que passaram a ser oferecidos cursos por correspondência (material impresso), rádio, fitas cassete, vídeo, TV, computador, internet, vídeo e teleconferência etc. Com a incorporação desse segmento para cursos destinados a profissionais de diversas áreas do conhecimento, mudanças paradigmáticas

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diferencia de outros ambientes digitais pelo propósito de auxiliar a aprendizagem

entre seus alunos.

Bruno (2007) diz que nessa modalidade de ensino é necessário que o aluno

seja mais responsável pelo seu próprio processo de aprendizagem, porém, esse

processo de transformação envolve mudanças que atingem os sujeitos da

aprendizagem em seus mais diversos aspectos, como a reflexão em seu conviver e

interferência direta sobre as propostas educacionais e no formato dos cursos a

distância.

Peters (2003 apud BRUNO, 2007) diz que apesar de os indivíduos já terem

incorporado alguns tipos aprendizagens - leitura de textos impressos, por imagens,

pela audição, pelas relações interpessoais ou pelo estudo autodirigido entre outros -

o desenvolvimento tecnológico fez com que fossem desenvolvidas outras

habilidades para aprendizagem, “permitindo-nos sair da linearidade, que nos

aprisionou durante tanto tempo, para vislumbrar o ‘caos’ da não-linearidade, que

vem ao encontro da forma como pensamos, criamos, aprendemos” (p.192), porém,

os mecanismos para aprendizagem em ambientes online, apesar de contarem com

elementos familiares, não ocorrem da mesma maneira que os presenciais, pois

suscitam a apropriação de ferramentas cuja estrutura envolve autonomia para auto-

aprendizagem, ainda que exista a presença de um mediador.

Além disso, a autora destaca também que o fato de a educação online

integrar recursos tecnológicos educacionais, tais como: imagens, textos, sons,

animação ou mesmo interligar informações em sequências não-lineares, não é

garantia de boa qualidade pedagógica e de uma nova abordagem educacional, pois

apesar de refletir preocupações com a escolha da abordagem e com estratégias

didáticas que favoreçam a aprendizagem do aluno, esses recursos não asseguram a

aprendizagem (BRUNO, 2007).

Dessa maneira é interessante investigar como se dá a concepção desses

recursos tecnológicos educacionais, pois é importante que sejam levados em

consideração alguns princípios da aprendizagem multimídia para facilitar a

estão ocorrendo em todos os envolvidos no processo e essas mudanças estão favorecendo o surgimento de comunidades de aprendizagem, nas quais os indivíduos, por meio da formação de ambientes interativos de aprendizagem online, se encontram e constroem seu próprio conhecimento.

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assimilação do conteúdo apresentado. São esses princípios que o próximo capítulo

busca explanar.

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Capítulo 3: Aprendizagem online

Por milênios, ensinar e estudar foram atos que sempre ocorreram em proximidade física. Isto se fixou firmemente na consciência das pessoas. Por isso o ensinar e estudar a distância é considerado de antemão como excepcional, não comparável ao face-to-face e, muitas vezes, também como especialmente difícil (PETERS, 2001, p. 47).

Foi a partir do século XIX, com a evolução dos meios tecnológicos, que

cursos a distância passaram a ser oferecidos.

Kearsley & Moore (2007) relacionam essa evolução com as cinco gerações

da educação a distância: a primeira realizada por meio de correspondência; a

segunda por transmissão em rádio e televisão; a terceira surgiu de experiências

norte-americanas que integravam áudio/vídeo e correspondência com orientação

face a face; já a quarta utilizou a teleconferência por áudio, vídeo e computador,

proporcionando a primeira interação em tempo real entre alunos e instrutores a

distância; e, por fim, a quinta geração, que, com base na internet, utiliza-se de

classes virtuais online permitindo a convergência entre texto, áudio e vídeo em uma

única plataforma de comunicação conhecida como ambiente virtual de

aprendizagem (AVA)21.

Soares & Valentini (2005) afirmam que com a evolução desse contexto

educacional, as tecnologias diminuíram algumas barreiras de tempo e espaço

tornando a interação entre indivíduos e instituições educacionais mais rápida. O

resultado disso foi o surgimento de novas necessidades educacionais, por parte dos

alunos, e a criação de novas estratégias pedagógicas que respondessem a essas

necessidades, por parte das instituições de ensino. Essas estratégias estão

relacionadas com as novas possibilidades que cursos a distância online podem

oferecer a fim de auxiliar a aprendizagem por meio de recursos multimídia.

Mayer (2009), ao apresentar o estudo sobre aprendizagem multimídia,

considera como hipótese fundamental que mensagens educacionais multimídia22,

concebidas a partir da forma como a mente humana funciona, têm mais

21 Essa expressão tem sido utilizada, segundo Soares & Valentini (2005), para se referir ao uso de recursos digitais de comunicação utilizados para mediar a aprendizagem, ao desenvolvimento de condições, estratégias e intervenções de aprendizagem num espaço virtual na web, organizado de tal forma que propicie a construção de conceitos, por meio da interação entre alunos, professores e objeto de conhecimento.

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probabilidades de levar a uma aprendizagem significativa do que as que não o são,

pois as pessoas aprendem melhor por meio de palavras e imagens do que apenas

por palavras.

Mayer diz ainda que durante milhares de anos, as palavras foram o principal

formato do ensino: primeiramente as palavras ditas e, nos últimos séculos, as

palavras impressas. Com os avanços tecnológicos nos dias de hoje, as formas

pictóricas de ensino estão mais acessíveis, principalmente através das

extraordinárias capacidades gráficas dos computadores. Porém, o autor diz que o

simples fato de adicionar imagens às palavras não garante uma melhoria da

aprendizagem, pois nem todas as apresentações multimídia são igualmente

eficazes.

Nesse sentido, Kearsley & Moore (2007) dizem que o preparo de um curso de

educação a distância requer não apenas o especialista em conteúdo, mas também

profissionais da área de instrução, que possam organizá-lo de acordo com aquilo

que é conhecido a respeito da teoria e da prática do gerenciamento da informação e

da teoria do aprendizado, pois em virtude de os cursos e o ensino serem veiculados

utilizando a tecnologia, seus materiais precisam ser elaborados por especialistas

que saibam como fazer o melhor uso de cada uma das tecnologias disponíveis. E

por mais que alguns especialistas em conteúdo também possuam aptidão para

elaboração de instruções ou tenham conhecimento de tecnologia, muito poucos são

igualmente especialistas nessas três áreas, fazendo com que o ideal seja que essas

responsabilidades possam ser assumidas por especialistas diferentes.

Isso reforça a ideia de que, na elaboração de cursos a distância online, é

necessária a constituição de uma equipe com profissionais especializados em

diversas áreas e, para mediar todos eles, é necessário também que haja um

profissional com conhecimentos multidisciplinares responsável pela concepção de

mensagens e recursos educacionais do curso a fim de facilitar a aprendizagem dos

alunos. Esse profissional é conhecido como designer educacional23 que ainda será

melhor caracterizado neste capítulo.

22 Uma mensagem educacional multimídia é uma comunicação que contém palavras e imagens destinadas a promover a aprendizagem. A comunicação pode ser veiculada por qualquer meio, incluindo o papel (livros) ou o computador (MAYER, 2009). 23 Filatro (2008) denomina os profissionais que criam as instruções como designers instrucionais, porém, de acordo com a CBO - Classificação Brasileira de Ocupações, o Designer instrucional também pode ser chamado de: Desenhista instrucional, Designer educacional e Projetista

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Logo, para entender como se dá a aprendizagem em cursos a distância online

que, geralmente, se utilizam de recursos multimídia para auxiliar a aprendizagem

dos alunos, é necessário conhecer quais são os princípios da aprendizagem

multimídia que precisam ser levados em consideração na concepção desses

recursos educacionais por parte do designer educacional.

3.1- Aprendizagem multimídia

Conforme já pontuado nesta pesquisa, a aprendizagem é um processo que

envolve aspectos de diversas naturezas e que vem evoluindo junto com a história da

humanidade. Com isso é possível supor que o advento das tecnologias na

educação, o que inclui a educação a distância e seus recursos multimídia, seja

consequência dessa evolução resultando em outras possibilidades de adquirir

conhecimento, já que os alunos são expostos a novas dinâmicas e recursos digitais

de ensino.

Alves & Nova (2003) dizem que a apreensão de elementos por via audiovisual

traz algumas vantagens diferentes em relação à realizada por meio de textos

escritos ou pela fala, pois, em geral, as imagens são percebidas com mais rapidez

do que os textos e a sua memorização, geralmente, é melhor do que a memorização

de representações verbais. Além disso, as autoras afirmam que a maior parte dos

raciocínios espontâneos utiliza muito mais a simulação de modelos mentais

imagéticos do que cálculos (lógicos) sobre cadeias de caracteres e que as

representações icônicas são independentes de idiomas e, por isso, eliminam parte

das dificuldades de tradução. Por fim, as imagens possuem um poder, muito maior

que a escrita e a fala, de evocar a multiplicidade de visões e de leituras de seus

significantes e significados.

Logo, é possível considerar que o contato com o universo audioimagético é

uma das maneiras privilegiadas à concretização do processo de construção do

conhecimento. Por esse motivo, é interessante entender como os conteúdos

multimídia são processados no sistema cognitivo.

Mayer (2009) apresenta a teoria cognitiva da aprendizagem multimídia, que

se baseia em três princípios da ciência cognitiva para aprendizagem: (1) o instrucional. Nesta pesquisa, optou-se por designer educacional por ser essa a nomenclatura oficial da CBO.

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pressuposto do canal duplo de processamento, (2) a capacidade limitada de

processamento e (3) processamento ativo de informações.

O pressuposto do canal duplo prevê que os seres humanos possuem canais

distintos na memória de trabalho para processamento de informações visuais e

auditivas, ou seja, possuem um canal auditivo/verbal e um canal visual/pictórico.

Então, quando a informação é apresentada aos olhos (ilustrações, animações,

vídeos ou textos), o processamento dessa informação inicia-se no canal visual;

quando a informação é apresentada aos ouvidos (uma narração ou sons não

verbais) o processamento dessa informação inicia-se no canal auditivo. Por isso, ao

conceber uma estratégia para um curso online, é importante levar em consideração

esse pressuposto, pois caso se apresente ao aluno um recurso que exija muito de

apenas um de seus canais, este poderá ser sobrecarregado, prejudicando a

aprendizagem, conforme será observado na teoria da carga cognitiva mais adiante.

O segundo pressuposto fala sobre a limitação humana em relação ao

processamento de informações, ou seja, quando se apresenta ao aluno uma

ilustração ou animação, ele só consegue reter na memória de trabalho algumas

imagens a cada momento e não uma cópia exata. O mesmo ocorre quando se

apresenta uma narração, ele só consegue reter simultaneamente algumas palavras

na memória de trabalho e não a reprodução exata. Isso ocorre porque a memória de

trabalho24 é utilizada para reter, temporariamente e de maneira consciente, os

conhecimentos adquiridos para conseguir manipulá-los - armazenando-os e

recuperando-os quando necessário - tornando possível a integração dos novos

conhecimentos com os que já estão armazenados na memória de longo prazo.

O pressuposto da aprendizagem ativa ocorre quando o aluno aplica

processos cognitivos ativos - prestar atenção, organizar as informações recebidas e

integrá-las com outros conhecimentos - às informações que recebe. O objetivo

desses processos é ajudá-lo a conseguir que essas informações façam sentido

resultando na construção de uma representação mental coerente, o que permite ver

a aprendizagem como um processo de construção de modelos de aprendizagem

que é único para cada um.

24 Conforme já exposto no primeiro capítulo, enquanto que Mayer (2009) e Pozo (2002) falam em limitação da memória de trabalho, Izquierdo (2004) diz que sua função é de selecionar as informações que serão processadas no sistema cognitivo, o que não quer dizer que ela seja limitada.

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Em outras palavras, as pessoas processam as informações ativamente

buscando sentido nas apresentações multimídia. Porém, para que essa

aprendizagem, em ambientes online, seja significativa, o aluno ainda precisará

proceder a cinco processos cognitivos durante a aprendizagem:

1- Escolha das palavras relevantes no texto ou narrativa

Na seleção das palavras relevantes, o aprendiz deve prestar atenção a

algumas das palavras apresentadas na mensagem multimídia: se as palavras forem

apresentadas de maneira falada, este processo começa no canal auditivo, mas se

forem apresentadas como texto digital ou impresso, o processo iniciará no canal

visual, podendo passar para o canal auditivo, caso o aluno articule mentalmente as

palavras impressas.

A necessidade de selecionar uma parte da mensagem apresentada decorre da capacidade limitada de cada canal do sistema cognitivo. Se essa capacidade fosse ilimitada, não seria necessário centrarmo-nos apenas numa parte da mensagem verbal (MAYER, 2009, p.221).

O autor ainda reforça que a seleção das palavras não deve ser aleatória. O

aluno é quem deverá determinar quais são as palavras mais relevantes do texto,

pois, dessa maneira, ele estará agindo de maneira ativa no seu aprendizado.

2- Escolha de imagens relevantes das ilustrações apresentadas

Na seleção das imagens relevantes, o aluno deve prestar atenção a uma

parte da animação ou das ilustrações apresentadas na mensagem multimídia. Esse

processo começa no canal visual, mas é possível convertê-lo em parte para o canal

auditivo caso o aprendiz narre mentalmente a animação em curso.

Assim como na seleção de palavras relevantes, a necessidade de selecionar

apenas uma parte do material pictórico apresentado resulta, segundo o autor, do

fato de a capacidade de processamento do sistema cognitivo ser limitada. Também

nesse caso, o processo de seleção de imagens não deve ser aleatório porque o

aluno precisa avaliar quais são as imagens mais relevantes para perceber o sentido

da apresentação multimídia.

3- Organização das palavras selecionadas numa representação verbal coerente

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49

Na organização das palavras selecionadas, além de organizá-las, o aluno

deve também estabelecer ligações entre diferentes fragmentos de conhecimentos

verbais, por isso, há mais probabilidades de este processo ser realizado no canal

auditivo estando sujeito às mesmas limitações de capacidade que afetam o

processo de seleção.

4- Organização das imagens selecionadas numa representação pictórica coerente O processo de organização de imagens é paralelo ao da seleção de palavras

e nele o aluno estabelece ligações entre diferentes partes de conhecimentos

pictóricos. Tal processo ocorre no canal visual, que possui as mesmas limitações de

capacidade para estabelecer todas as ligações possíveis na sua memória de

trabalho devendo, por isso, concentrar-se na construção de um conjunto simples de

ligações. Tal como acontece no processo de organização das palavras, o processo

de organização das imagens também não é aleatório, pelo contrário, reflete o

esforço de construir uma estrutura simples que faça sentido ao aluno em uma cadeia

de causa e efeito.

5- Integração das representações pictóricas e verbais com os conhecimentos

anteriores

Talvez seja essa a fase mais importante da aprendizagem multimídia. Nela há

uma mudança de duas representações distintas – um modelo pictórico e um modelo

verbal – para uma representação integrada na qual os elementos e relações

correspondentes de cada modelo são inscritos no outro. A entrada de informação

dessa fase é formada pelos modelos pictórico e verbal que o aluno construiu até o

momento e a saída é um modelo integrado, baseado na ligação das duas

representações.

Esse modelo integrado inclui ainda as ligações com os conhecimentos já

existentes que envolvem a construção de relações entre as partes correspondentes

aos modelos pictórico e verbal e também conhecimentos da memória de longo

prazo. Desenrola-se na memória de trabalho visual e verbal e implica uma

coordenação entre ambas. É um processo extremamente exigente que obriga a

utilização eficiente da capacidade cognitiva e, em certa medida, é um resumo da

busca de sentido, uma vez que o aluno precisa se concentrar na estrutura

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50

subjacente às representações visuais e verbais. Esse processo pode ser facilitado

com a utilização dos conhecimentos já existentes na memória de longo prazo do

aluno.

Além desses pressupostos que auxiliam na significação das informações

recebidas pelos alunos possibilitando a aprendizagem, Mayer (2009) também

explica como ocorre o processamento dos elementos comunicacionais25 presentes

nos recursos educacionais multimídia pelos canais visual/pictórico e auditivo/verbal:

imagens, palavras ditas (narração) e palavras impressas (textos digitais ou

impressos).

No caso do processamento de imagens , por um breve período de tempo, o

olho do aluno fixa a fotografia ou os frames da animação, o que ocorre sem grande

esforço. Porém, em seguida, há o início do processamento cognitivo ativo, no qual o

aluno já possui algum controle consciente sobre esse processo.

Caso o aluno preste atenção nessas imagens, parte delas ficarão

representadas na memória de trabalho, o que corresponde à fase de seleção de

imagens. Quando a memória de trabalho fica cheia de pedaços de imagens, o passo

seguinte consiste na organização desses pedaços numa estrutura coerente,

correspondendo à organização de imagens.

O resultado desse processo de conhecimento é a criação, segundo o autor,

de um modelo pictórico ou, em outras palavras, o aluno constrói uma representação

visual organizada dos principais componentes do cenário ilustrado ou um conjunto

organizado de imagens representativas da sequência de causa e efeito.

Por fim, o processamento cognitivo ativo integra a nova representação a

outros conhecimentos. Além disso, se os alunos tiverem produzido também um

modelo verbal podem tentar ligá-lo ao modelo pictórico, por exemplo, fazendo a

correspondência entre uma frase do texto e uma parte da imagem, dando origem a

uma aprendizagem integrada.

No processamento de palavras ditas , quando o computador emite uma

narração, os sons são captados pelos ouvidos do aluno e ficam temporariamente

25 Filatro (2008) define imagens como gráficos que podem ser estáticos (ilustrações, fotografias, modelagem) ou dinâmicos (animações, vídeos, realidade virtual). Define animação e vídeo como uma sequência de imagens que, uma vez exibida, demonstra alterações de uma imagem para outra, porém, o vídeo se diferencia da animação no sentido de trabalhar com imagens reais.

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retidos na memória sensorial auditiva. Se ele prestar atenção aos sons que lhe

chegam aos ouvidos, alguns desses sons serão selecionados para serem incluídos

na base de sons de palavras, iniciando o processamento cognitivo ativo.

Essa base de palavras são fragmentos desorganizados, sendo o passo

seguinte sua transformação numa estrutura mental coerente. Nesse processo, as

palavras deixam de estar representadas com base no seu som, passando a estar

representadas com base no seu significado. O resultado pode ser uma corrente de

causa e efeito nas diferentes fases do cenário ilustrado. Por fim, o aluno pode utilizar

os seus conhecimentos prévios para ajudar a explicar a transição de um passo para

outro e pode também ligar as palavras a imagens.

No processamento de palavras impressas , a apresentação de texto

impresso em mensagens multimídia constitui um desafio para o sistema de canal

duplo em termos de processamento de informação, pois caso um aluno tenha que

ler um texto e ver uma ilustração ao mesmo tempo, a informação precisará passar

por diversas etapas até receber um significado e ser assimilado.

Primeiramente as palavras serão apresentadas visualmente e começarão a

ser processadas através dos olhos. Depois o aluno poderá prestar atenção em

algumas palavras recebidas e levá-las à memória de trabalho como parte integrante

das imagens. Por fim, quando os recursos verbais são obrigados a entrar pelo canal

visual, as palavras têm de fazer um percurso complexo através do sistema e

também disputar a atenção com a ilustração que o aluno também está processando

pelo canal visual. Caso o aluno pronuncie mentalmente as imagens das palavras

impressas, ele pode transportar as palavras para o canal auditivo/verbal que, na

sequência, serão processadas como palavras ditas pelo método correspondente,

descrito anteriormente.

Essa disputa de atenção que acontece quando um recurso se utiliza do

mesmo canal para comunicar duas ou mais informações pode sobrecarregá-lo a

ponto de prejudicar o processamento das informações que estão sendo transmitidas

ao aluno, comprometendo sua aprendizagem. Outro ponto que precisa ser levado

em consideração no desenho dos recursos é o fato de uma mensagem visual poder

ser direcionada para o canal auditivo e vice-versa, pois isso pode se tornar mais um

tipo de disputa de atenção, agravando ainda mais o processo de aprendizagem.

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52

A teoria cognitiva da aprendizagem multimídia pode ser resumida com a ideia

de que ela está fundamentada numa arquitetura cognitiva que consiste numa

memória de trabalho limitada, com unidades de processamento parcialmente

independentes associadas à informação visual/espacial e auditivo/verbal, que

interage com uma memória de longo prazo comparativamente ilimitada (PAAS,

TUOVINEN ET AL., 2003 apud OLIVEIRA, 2009). Oliveira diz ainda que, para

aprender a resolver problemas usando as tecnologias, é necessária uma utilização

criteriosa e fundamentada dessas ferramentas e uma cuidadosa preparação dos

materiais de instrução que devem, entre outros, respeitar a arquitetura e

funcionamento cognitivos para não sobrecarregar a memória de trabalho (carga

cognitiva).

3.2- Aprendizagem e a carga cognitiva

A carga cognitiva refere-se à atividade mental na qual a memória de trabalho

está sujeita em cada instante, por exemplo, ao ler um texto, ao observar uma

imagem ou animação etc. Ela é formada pela carga cognitiva intrínseca, relativa à

natureza da informação - dificuldade - e pela carga cognitiva estranha, dependente

do modo como a informação é apresentada - materiais instrucionais (OLIVEIRA,

2009).

A carga cognitiva da memória de trabalho pode ser sobrecarregada quando,

por exemplo, o aluno é exposto a uma animação com legendas textuais, pois ele

precisará, através do canal visual, observar as imagens em movimento e ainda ler

as legendas. Essa carga pode ser minimizada se, ao invés de legendas textuais, as

cenas forem narradas, pois, dessa maneira, as informações serão processadas por

dois canais - auditivo e visual - ao invés de apenas um - visual.

O autor ainda apresenta algumas estratégias que podem ser utilizadas em

cursos online para reduzir a carga cognitiva do aluno melhorando sua

aprendizagem, por exemplo:

Quando o canal visual está sobrecarregado pode-se deslocar algum

processamento para o canal auditivo, pois há uma melhor transferência dos

conhecimentos armazenados na memória de longo prazo quando as palavras são

apresentadas na forma narrativa do que em texto.

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Quando os canais visual e auditivo estão sobrecarregados pode-se

acrescentar tempo entre pequenos segmentos sucessivos do recurso, pois há

melhor transferência dos conhecimentos armazenados na memória de longo prazo

quando uma lição é apresentada em segmentos controlados do que em uma

unidade contínua. Também é interessante eliminar materiais desnecessários e

destacar o que for mais relevante de modo a reduzir o processamento de material

estranho melhorando a transferência de conhecimentos entre as memórias de

trabalho e de longo prazo. Quando um ou dois canais estão em sobrecarga pode-se colocar as

palavras impressas perto das imagens ou gráficos correspondentes de modo a

reduzir a captação visual e evitar a apresentação de torrentes de palavras impressas

e faladas, pois há melhor transferência dos conhecimentos armazenados na

memória de longo prazo quando palavras impressas estão junto das partes gráficas

correspondentes e quando as palavras são apresentadas em forma narrativa do que

nas formas narrativa e texto escrito. Também é possível apresentar a narração e a

correspondente animação simultaneamente para minimizar a necessidade de reter

representações na memória, pois há melhor transferência dos conhecimentos

armazenados na memória de longo prazo quando a animação e narração

correspondentes são apresentadas simultaneamente, porém isso é válido para

alunos com elevada perícia espacial, caso não sejam, a apresentação deverá ser

desenhada para acontecer sequencialmente. O desenho e/ou design de recursos para auxiliar a aprendizagem que não

utilize toda a capacidade da memória de trabalho, isto é, com baixa carga cognitiva e

que utilize materiais com procedimentos de instrução adequados, encoraja os alunos

a envolverem-se no processo cognitivo que é diretamente relevante na construção

de seus esquemas, fundamental na aprendizagem (OLIVEIRA, 2009).

A concepção dessas instruções, bem como o tipo de materiais multimídia que

podem ser utilizados em um curso online, geralmente, cabe ao designer

educacional.

3.3- O design (er) educacional

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Em um curso a distância online é possível se utilizar de diferentes recursos

multimídia como apoio à aprendizagem, porém, caso esses recursos não sejam

concebidos de maneira didática e respeitando a arquitetura do sistema cognitivo, ao

invés de ajudar, poderão dificultar a aprendizagem devido à sobrecarga nos canais

de processamento.

Para otimizar as possibilidades que esses recursos podem oferecer para os

alunos de um curso online há um profissional responsável por concebê-los e

adequá-los de maneira didática a fim de contribuir com sua aprendizagem em cursos

dessa modalidade. Esse profissional é o designer educacional cuja função é

desenvolver o design educacional de cursos a distância.

A prática do design educacional é definida como:

a ação intencional e sistemática de ensino que envolve o planejamento, o desenvolvimento e a aplicação de métodos, técnicas, atividades, materiais, eventos e produtos educacionais em situações didáticas específicas, a fim de promover, a partir dos princípios de aprendizagem e instrução conhecidos, a aprendizagem humana (FILATRO, 2008, p. 3).

Cabe ao designer educacional, em conjunto com outros profissionais de

diferentes áreas, o direcionamento e a execução de todas essas atribuições.

Kearsley & Moore (2007) dizem que os profissionais que criam as instruções

devem trabalhar com os especialistas em conteúdo para ajudá-los a decidir sobre

assuntos que vão desde os objetivos do curso, passando pelo layout do texto e

ilustrações até as questões para sessões interativas online, por áudio ou

videoconferência. Designers gráficos, programadores de internet e outros

especialistas em mídia devem ser agrupados para transformar as ideias dos

especialistas em conteúdo e dos designers educacionais em materiais e programas

do curso de boa qualidade. Por fim, os especialistas em avaliação e pesquisa devem

planejar o modo de avaliar o aprendizado individual do aluno, bem como a eficácia

de todos os aspectos do curso, a fim de assegurar que ele dê certo.

Filatro (2008) diz que, ao trabalhar com profissionais de diferentes áreas, uma

das principais atribuições desse profissional “é assegurar a boa comunicação entre

os diferentes membros da equipe, de modo que as ideias iniciais se concretizem em

soluções de qualidade” e, além disso, “também é responsável por apresentar e

validar com o cliente e demais interessados os produtos resultantes de cada fase,

apresentando relatórios de análise e acompanhamento, documentos de

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55

especificação, pilotos e avaliações” (p. 26). Além dessas, de acordo com a

Classificação Brasileira de Ocupações - CBO26, suas atribuições também podem

englobar desde a implementação, avaliação, coordenação e planejamento de

projetos pedagógicos, passando pela aplicação de técnicas para facilitar o processo

de ensino e aprendizagem até a viabilização do trabalho coletivo.

Além de tudo isso, esse profissional ainda precisa produzir conhecimento

sobre os princípios e os métodos de instrução mais adequados a diferentes tipos de

aprendizagem e, para isso, fundamenta-se em diferentes campos do conhecimento,

como as ciências humanas, ciências da informação e ciências da administração

(FILATRO, 2008). Logo, para que consiga fazer a ponte entre todos os profissionais

envolvidos no projeto educacional e desenhar adequadamente os recursos

educacionais multimídia de um curso online, ele precisa ter conhecimento em

diferentes áreas, pois também lhe cabe “especificar que tipo de informações verbais

e não verbais devem fazer parte dos conteúdos do aprendizado eletrônico” (Ibid., p.

84).

Mas qual é o processo de trabalho do designer educacional? O que ele

precisa saber antes de conceber os recursos multimídia?

A autora responde essas questões trazendo alguns processos envolvidos no

desenvolvimento do desenho educacional de um curso e uma síntese dos

pressupostos da aprendizagem multimídia e da carga cognitiva que devem ser

levados em consideração no desenvolvimento de recursos educacionais multimídia.

3.3.1- Os processos do design educacional

Filatro diz que o formato mais utilizado no processo do design educacional é o

ADDIE - do inglês: Analysis, Design, Development, Implementation e Evaluation. Em

português essas cinco etapas equivalem a: análise, desenho, desenvolvimento,

implementação e avaliação.

É na etapa de análise que o problema educacional é entendido para que seja

elaborada uma solução adequada. “Isso é feito por meio da análise contextual, que

26 Atribuições também utilizadas para as funções de coordenador pedagógico, orientador educacional, pedagogo, professor de técnicas e recursos audiovisuais, psicopedagogo e supervisor de ensino. Disponível na CBO: http://www.mtecbo.gov.br/cbosite/pages/pesquisas/BuscaPorTituloResultado.jsf;jsessionid=FA20E83E479E8031E6A6A502772BC5D9.lbroute813. Acesso em 15/02/11.

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abrange o levantamento das necessidades educacionais propriamente ditas, a

caracterização dos alunos e a verificação de restrições” (FILATRO, 2008, p. 28).

Na etapa do design é feito o planejamento e o desenho didático do curso por

meio de um mapeamento e sequenciamento dos conteúdos que serão trabalhados.

Além disso, é feita também “a definição das estratégias e atividades de

aprendizagem para alcançar os objetivos traçados, a seleção de mídias e

ferramentas mais apropriadas e a descrição dos materiais que deverão ser

produzidos para utilização por alunos e educadores” (Ibid., p. 28-9).

É no desenvolvimento que se realiza a produção de tudo que foi elaborado

na fase de design. Além disso, é feita também “a adaptação de recursos e materiais

didáticos impressos e/ou digitais, a parametrização de ambientes virtuais e a

preparação dos suportes pedagógico, tecnológico e administrativo” (Ibid., p. 30).

A etapa de implementação é quando tudo que foi desenhado e produzido é

publicado e finalmente executado pelos alunos no ambiente virtual no caso de

cursos online.

Por fim, na etapa de avaliação é verificada a efetividade da solução proposta

e é quando também pode ser feita a revisão das estratégias implementadas

“avaliando tanto a solução educacional quanto os resultados de aprendizagem dos

alunos” (Ibid., p. 31) que poderá refletir na adequação do design educacional do

curso. A autora ainda enfatiza que o início dessa etapa pode ser realizado antes

mesmo da execução do curso, pois deve permear todo o processo de desenho

desde a primeira etapa verificando os produtos resultantes de cada fase do

desenvolvimento e as características dos alunos matriculados percebendo se

possuem determinados conhecimentos e habilidades.

Ao desenvolver todas essas etapas e atribuições é muito importante que o

designer educacional tenha conhecimento acerca dos princípios da aprendizagem

multimídia e da carga cognitiva para que a compreensão dos materiais

desenvolvidos, por parte dos alunos, seja favorecida, pois caso contrário, esses

materiais poderão sobrecarregar os canais de processamento do aluno tornando

todo o processo envolvido na aprendizagem ainda mais complexo.

Mayer (2009) ainda afirma que o desenho de um recurso carrega em si a

influência de quem o concebeu, logo, é possível supor que essa influência pode

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incluir seus saberes, sua maneira de ver o mundo e, principalmente, a sua maneira

de aprender e a visão de como os outros aprendem.

O autor também enfatiza que o design de recursos multimídia requer que:

1- Os materiais apresentados tenham uma estrutura coerente;

2- A mensagem deve dar uma orientação ao aluno sobre a forma de construir

sua própria estrutura ou modelo de aprendizagem.

Caso a informação não tenha uma estrutura coerente - se for um conjunto de

fatos isolados, por exemplo - os esforços do aluno para construir um modelo de

aprendizagem serão infrutíferos. Se a mensagem não contiver uma indicação sobre

a forma de estruturar os materiais apresentados, seus esforços podem não dar

qualquer resultado.

Assim, o conceito de design de recursos multimídia poderia resumir-se à

tentativa de ajudar os alunos a construírem seus próprios modelos de aprendizagem

(MAYER, 2009) ou, em outras palavras, ajudá-los a criar significados selecionando,

ordenando e integrando os novos conhecimentos aos que já estão armazenados na

memória de longo prazo.

É a memória de trabalho que une informações visuais e auditivas e,

posteriormente, as integra ao conhecimento já armazenado na memória de longo

prazo. É por essa razão que oferecer palavras, imagens e sons em uma

apresentação unificada torna a integração entre os canais de processamento

sensorial mais fácil. Da mesma maneira, atividades práticas ativam o processo de

integração dos novos conhecimentos aos conhecimentos já existentes (FILATRO,

2008).

Para contribuir com a recuperação e a transferência dos conhecimentos

armazenados na memória de longo prazo, de acordo com a autora, o designer

educacional deve oferecer exemplos e atividades práticas que incorporem

elementos e situações autênticas dos contextos de uso pós-aprendizagem. Isso

ajudará os alunos a criar âncoras de recuperação e transferência do aprendizado.

3.3.2- A criação dos recursos educacionais multimíd ia e os princípios da

aprendizagem multimídia e da carga cognitiva

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Conforme já apontado nesta pesquisa, os princípios da aprendizagem

multimídia e da carga cognitiva devem ser levados em consideração na concepção

dos recursos multimídia para que esses, de fato, auxiliem na aprendizagem dos

alunos de cursos online.

Filatro (2008), de maneira bem resumida, elenca sete princípios que orientam

a concepção de um design educacional multimídia com baixa carga cognitiva. São

eles:

O princípio da multimídia

Enfatiza que o aprendizado eletrônico deve incluir textos e imagens e não

apenas um desses dois tipos de informação e, além disso, eles devem ser

apresentados ao aluno de maneira conjunta ao invés de separadamente.

Em outras palavras, ao apresentar um texto escrito ao aluno é interessante

que o designer apresente também algum recurso imagético – desde uma simples

ilustração até um vídeo mais elaborado – que, de acordo com a autora, torne esse

conteúdo mais interessante ou ofereça uma visão geral dele, que direcione a

atenção do aluno para a informação mais importante, que ajude a reduzir sua carga

cognitiva, que o ajude a construir novas memórias ou que o auxilie no entendimento

mais aprofundado do conteúdo.

O princípio da proximidade espacial

Ao trabalhar com textos e imagens, esses devem ser apresentados de modo

integrado, ou seja, textos posicionados próximo às imagens a que se referem,

poupando o aluno da tarefa de reuni-los. Hiperlinks devem ser abertos em janelas

que não cubram a tela original do texto, as orientações ou atividades devem ser

posicionadas na mesma tela de realização das atividades e o feedback deve ser

exibido na mesma tela em que o aluno realizou ou respondeu uma atividade, pois

informações apresentadas de maneira simultânea são mais facilmente integradas do

que as que são apresentadas de maneira sequencial.

O princípio da coerência

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Textos, imagens ou sons não relevantes ao assunto abordado devem ser

excluídos, evitando distrações que disputarão a atenção do aluno com os recursos

que realmente contribuem para o significado do conteúdo do curso.

Ou seja, imagens meramente decorativas, música de fundo, recursos

educacionais sem necessidade pedagógica só aumentarão a carga cognitiva do

aluno sobrecarregando sua memória de trabalho.

O princípio da modalidade

Para melhorar o processamento das informações, os recursos imagéticos

devem ser acompanhados por áudio ao invés de texto escrito, pois isso reduzirá a

demanda por processamento visual simultâneo diminuindo a carga cognitiva nesse

canal.

Por exemplo, ao desenhar um vídeo ou animação, o designer deve optar por

locução para descrição das imagens ao invés de legendas, pois, com isso, o aluno

poderá prestar atenção nas imagens enquanto ouve a locução ao invés de precisar

dar conta das imagens e legendas ao mesmo tempo.

O princípio da redundância

Quando um elemento informacional pode ser entendido por si só - por

exemplo, um determinado texto - não há necessidade de se utilizar um recurso -

como uma ilustração - para auxiliar seu entendimento, pois isso pode causar

sobrecarga cognitiva no aluno. Nesses casos, de acordo com Filatro (2008), é

recomendado que toda informação já apresentada anteriormente ou elaborada em

outra mídia, considerada irrelevante ou já conhecida pelo aluno, seja removida.

O princípio da personalização

As orientações educacionais estabelecidas com o aluno devem ser próximas

dele e em estilo conversacional, mas sem ferir o princípio da coerência

apresentando informações que não estejam relacionadas ao conteúdo apresentado.

Por exemplo, pode-se falar diretamente com o aluno utilizando frases na

primeira e terceira pessoa - eu, nós, você e vocês.

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O princípio da prática

O aprendizado online deve propor atividades e exercícios práticos em

contextos autênticos, em vez de simplesmente reconhecer ou recuperar informações

previamente fornecidas, pois assim, os alunos serão desafiados a integrar esses

novos conhecimentos aprendidos.

É importante lembrar que, mesmo levando em consideração todos esses

princípios, não há garantia de aprendizado por parte do aluno, pois a aprendizagem

é um processo que depende unicamente do indivíduo para se concretizar. E, de

acordo com Filatro (2008), isso ainda depende da capacidade que esse indivíduo

possui para captar as informações através dos sentidos, armazená-las

temporariamente na memória de trabalho para que sejam manipuladas e,

posteriormente, possam interagir com os conhecimentos armazenados na memória

de longo prazo e, por fim, sejam integradas e armazenadas na memória de longo

prazo.

Todo esse processo pode ser mais eficiente caso o aluno se envolva

ativamente aumentando sua consciência e o controle sobre seus processos mentais.

E esse envolvimento, muito provavelmente, está diretamente ligado com sua

motivação para aprender, pois, caso ele não esteja motivado, a aprendizagem

poderá se tornar improvável, independente da qualidade do material elaborado pelo

conteudista, das estratégias desenvolvidas pelo designer educacional, da mediação

docente e de todos os esforços dos outros integrantes da equipe de

desenvolvimento do curso.

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Capítulo 4: A pesquisa

Para responder a questão deste estudo, foi realizada uma pesquisa de campo

por meio de entrevista. A opção por esse método se deu pelas suas características,

como: observar, registrar, analisar e correlacionar fatos ou fenômenos sem

manipulá-los; por tratar-se de uma conversa orientada para um objetivo definido, a

fim de recolher, por meio do interrogatório do informante, dados à pesquisa. A

entrevista ainda é indicada nos casos em que não houver fontes mais seguras para

as informações desejadas ou até mesmo quando for necessário completar dados

extraídos de outras fontes (BERVIAN, CERVO e SILVA, 2007).

A seguir será apresentado o contexto institucional no qual as entrevistas

foram realizadas, bem como os sujeitos da pesquisa, o contexto da entrevista e a

descrição, análise e interpretação das categorias abordadas.

4.1- Contexto institucional

O Senac SP é uma instituição educacional criada em meados dos anos 1940,

com o intuito de promover a profissionalização dos empregados do comércio e

serviços. Com o passar dos anos sua atuação foi aumentado e, nos dias de hoje,

além dos cursos livres e técnicos profissionalizantes, há também a oferta de cursos

de graduação, extensão universitária e pós-graduação, atendendo aos mais diversos

públicos.

É importante destacar que, exceto a graduação, as demais modalidades de

formação também são ofertadas a distância, demandando novas estratégias e

possibilidades de aprendizagem.

O Núcleo de Tecnologias Aplicadas à Educação (TAE) foi criado justamente

para dar conta dessas novas demandas que a educação a distância apresenta27 e

também para estimular a inserção de tecnologias em sala de aula.

27 Importante destacar que a proposta educacional do Senac SP é embasada no desenvolvimento de competências profissionais que procura fortalecer a autonomia dos alunos na aprendizagem, desenvolvendo sua capacidade crítica, a criatividade e a iniciativa. Dessa maneira, além dos conteúdos e recursos educacionais desenvolvidos pelo TAE, os cursos online ainda contam com mediação docente, atividades reflexivas e interativas, entre outras estratégias que visam o

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Para desenvolver todas as soluções e recursos multimídia é preciso haver

uma equipe multidisciplinar e qualificada para atender aos diferentes saberes

envolvidos nesse desenvolvimento. No Senac SP essa equipe multidisciplinar é

dividida, resumidamente, da seguinte maneira:

� Coordenação do núcleo

Responsável pela gestão de todas as equipes que integram o núcleo;

� Equipe pedagógica

Composta pela coordenação de projetos, coordenação pedagógica e designers

educacionais, que são responsáveis pelo desenho e estratégia dos cursos e

recursos multimídia;

� Equipe de produção

Composta pela coordenação de produção, designers de interface, programadores e

ilustradores, que são responsáveis pela criação multimídia de todo curso;

� Equipe de tecnologia

Composta pela coordenação de tecnologia e programadores responsáveis pela

manutenção e customização do ambiente virtual;

� Equipe administrativa

Composta por assistentes administrativos responsáveis por todos os assuntos

funcionais e administrativos do núcleo.

É nesse contexto institucional, junto à equipe pedagógica, que os sujeitos

selecionados para a entrevista atuam28.

4.2- Sujeitos da pesquisa

Os sujeitos selecionados para participar da entrevista são designers

educacionais que possuem experiência de um e três anos nessa função; são

graduados nos cursos de Comunicação e Multimeios, Jornalismo, Pedagogia e

Tecnologia e Mídias Digitais; e têm entre 22 e 30 anos de idade.

desenvolvimento das competências-alvo propostas para os cursos. Fonte: Proposta pedagógica do Senac SP. Disponível em: http://www.sp.senac.br/pdf/29550.pdf. Acesso em 12/05/2001. 28 É no mesmo contexto institucional que a pesquisadora também atua como designer educacional há três anos, desenvolvendo cursos de extensão universitária, técnicos e livres.

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Nessa equipe são desenvolvidos cursos online com diferentes propósitos:

cursos corporativos, que são customizados de acordo com as necessidades dos

clientes para o treinamento de suas equipes de trabalho, podendo ter o formato

auto-instrucional ou mediado por um docente; cursos livres, que introduzem

conceitos profissionais básicos voltados ao público de ensino médio; cursos de

extensão universitária, que aprofundam alguns conceitos profissionais ao público do

ensino superior e, mais recentemente, cursos técnicos, que oferecem formação

profissional ao público de ensino médio.

Nesse sentido, os designers educacionais, além de mediar os envolvidos nos

projetos em que atuam, ainda são responsáveis, durante a etapa de design, por

desenvolver tarefas como:

� Orientar e acompanhar o desenvolvimento do material educacional pelo

conteudista, para que seja didático e de acordo com a mídia na qual o curso

será veiculado, nesse caso, web;

� Transformar o material desenvolvido pelo conteudista em roteiro e/ou

storyboard – roteiro desenhado - para que a equipe de produção transforme-o

no material educacional multimídia que será oferecido aos alunos;

� Desenhar recursos educacionais, multimídia ou não, no material educacional,

de preferência com auxílio do conteudista, possibilitando aos alunos outras

possibilidades de interação e compreensão com esse material;

� Elaborar, preferencialmente em conjunto com o conteudista, estratégias e

atividades que fomentem a recordação de informações importantes – por

meio de quiz e outras estratégias de memorização; que ajudem os alunos a

organizar as novas aprendizagens e estabelecer significados com os

conhecimentos anteriores – por meio de mapas conceituais, resumos,

agrupamento das informações; que levem os alunos a exercer a criatividade e

o pensamento crítico – por meio de brainstorm, elaboração de metáforas,

estudo de casos e, principalmente, que incentive à cooperação entre os

alunos no ambiente virtual – por meio de fóruns, trabalhos em grupo, análise

e avaliação do trabalho dos colegas etc.

Já na fase de implementação dos cursos, outras demandas são necessárias

para o andamento do projeto:

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� Análise e conferência do material produzido junto à equipe de produção

multimídia, a fim de corrigir eventuais problemas técnicos no material e

recursos;

� Montagem do ambiente virtual com todos os conteúdos, recursos e atividades

desenvolvidos para o curso em sequência lógica e com as devidas instruções

para execução de cada etapa por parte dos alunos.

É importante reforçar que, dependendo do contexto institucional, essas

demandas podem sofrer alterações significativas, aumentando ou atenuando as

responsabilidades desse profissional.

4.3- Contexto da entrevista

Para a coleta dos dados foi utilizada a estratégia de entrevista que teve o

propósito de investigar quais os conhecimentos que os designers educacionais têm

sobre aprendizagem para elaborar recursos educacionais multimídia em cursos

online. Para tanto, foram utilizadas doze questões norteadoras embasadas nos

aspectos biológicos e culturais da aprendizagem e as concepções da aprendizagem

multimídia e da carga cognitiva já abordados nesta pesquisa.

A entrevista foi gravada individualmente, na própria instituição em que o

público selecionado atua, e teve duração média de vinte minutos cada uma. O

público era composto por quatro designers educacionais do Senac SP. Eles

discorreram, sem maiores problemas, sobre as questões abordadas, mas em alguns

momentos houve a necessidade de elaborar perguntas complementares para que

fossem melhor compreendidas e respondidas dentro do foco esperado.

Os participantes, apesar de pensativos com algumas questões, estavam bem

à vontade e motivados a contribuir com a pesquisa. A escolha desse público se deu

pelo fato de compartilharem do mesmo contexto institucional e da mesma equipe de

trabalho que a pesquisadora, com demandas e métodos de trabalho afins.

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4.4- Descrição, análise e interpretação dos dados

Ao iniciar a entrevista, com o propósito de assegurar a privacidade dos

designers educacionais (DEs), foi solicitado que cada um escolhesse um nome pelo

qual gostaria de ser tratado e, a partir de suas escolhas, eles passaram a ser

identificados como: Carol, Jean, Marília e Peres.

A descrição, análise e interpretação dos dados coletados foram separadas

por categorias de acordo com o referencial teórico desta dissertação, quais sejam:

concepções biológicas e culturais da aprendizagem, concepções da aprendizagem

multimídia e concepções da carga cognitiva.

4.4.1- Concepções biológicas e culturais da aprendi zagem

Nessa categoria a análise e interpretação dos dados coletados buscou

investigar os conhecimentos dos DEs sobre os processos biológicos envolvidos na

aprendizagem e quais os fatores culturais que fazem parte de suas práticas diárias

de trabalho.

Ao serem questionados sobre a clareza do processo de aprendizagem do

aluno, cujo objetivo era investigar seus conhecimentos acerca dos processos

biológicos e culturais, os apontamentos mais recorrentes foram sobre a importância

da motivação e atenção desse aluno, bem como sua pré-disposição e faixa etária,

conforme relatos:

A aprendizagem acontece muito de acordo com a pré-disposição do aluno [...] Eu posso até não interagir o suficiente no próprio recurso digital, mas o que eu vou ler, o que eu vou conversar com o tutor. Eu acho que a aprendizagem acontece mais ou menos aí. (Marília) Varia do público-alvo: adolescente tem que prender muito a atenção, tem que ser uma coisa muito mais dinâmica, tem que ter muito mais interações. Agora, se for um público atual, mas com uma maturidade maior, então, ele tem que ter um dinamismo um pouco menor, tem que ser um pouco mais controlado, ter um pouco mais de conteúdo... (Peres)

Ainda foram apontadas as particularidades com que cada aluno aprende, a

importância do professor em ambientes online, a utilização de diferentes tipos de

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recursos educacionais e a recuperação e transferência de conhecimentos já

presentes na memória:

Acho que a grande maioria dos alunos assimila pela exposição mais do que só com a leitura, sozinho. Esse papel do professor é bastante importante nessa assimilação. No ambiente online força um pouco mais ele (aluno) a aprender sozinho. (Carol)

Cada um aprende de um jeito. Na hora da criação da animação, quanto mais recursos você utilizar, eu diria assim, mais você vai causar (recuperar) as lembranças deles em situações anteriores [...] mais aquilo pode ser efetivo para ele. Às vezes você coloca um sonzinho dentro da animação, que nossa, aquilo fez ele lembrar de alguma coisa. Ele associa o que ele está aprendendo naquele momento com uma coisa que ele já tinha antes. (Jean)

Esses apontamentos dão conta de alguns dos processos biológicos e

culturais envolvidos na aprendizagem, pois a motivação, atenção, recuperação e

transferência de conhecimentos já presentes na memória de um indivíduo são

apontados por Pozo (2002) como processos externos, complementares aos

processos mentais, que podem otimizar ou minimizar a aprendizagem. No entanto, o

quarto processo, consciência e controle da própria aprendizagem, não foi

mencionado em nenhum momento pelos participantes.

Com o propósito de investigar alguma particularidade na prática dos DEs, foi

investigado quais os conhecimentos sobre aprendizagem que eles consideram

indispensáveis a um designer educacional no momento de elaborar um roteiro.

As respostas foram diversificadas e apontaram à importância de saber como

é que a aprendizagem vai ocorrer para o aluno, além da necessidade de se

considerar e tentar aproveitar alguns pontos dos ambientes web. Além disso, o tipo

de conteúdo e a noção de qual impacto o recurso poderá causar também surgiram,

conforme os primeiros relatos:

[...] como que (o aluno) vai realizar essa aprendizagem, como que vai acontecer? [...] O aluno online, ele vai com uma visão do que ele vê em sites, do que ele vê, enfim. [...] você trazer uma... Alguns pontos disso para aprendizagem, acho que é super válido. (Marília) Qual o tipo de conteúdo que ele (DE) está lidando, do que ele vai apresentar. Essa noção de leitura, de disposição, essa noção sobre os recursos, sobre qual impacto que cada recurso causa, sendo utilizado com tal conteúdo e ter essa noção de aluno

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mesmo, de docente e aluno, ler a respeito, ter um pouco de conhecimento sobre isso. (Carol)

A questão da experiência, seja por observação em situações anteriores, por

parte do DE, ou mesmo no sentido de propor experiências diversas ao aluno

também foi observada por dois participantes em seus relatos:

Experiência, ter certo conhecimento sobre algumas experiências anteriores para poder fazer esse curso e criar em cima disso, e também ter a cabeça muito aberta. (Peres) Você acaba fazendo experiências, puxa isso deu certo, aquilo não deu. [...] Um grande trabalho de experimentação, por isso, quando a gente fala roteiro, você acaba sempre falando: vou desenvolver imagens. Só que você não desenvolve imagens, você desenvolve experiências, porque você tem interatividade, você tem áudio, você tem recursos imagéticos, e tudo isso, de alguma maneira, está refletido na cabeça do aluno. Você tem que ter ciência de que você está mexendo com a cabeça dele e não com uma imagem, não é com um som. (Jean)

Com esses apontamentos é possível perceber que há ciência sobre os

diversos fatores envolvidos no processo de aprendizagem, incluindo os aspectos

biológicos e culturais, porém, torna-se claro que todos esses conhecimentos que

esses designers educacionais consideram indispensáveis em suas práticas

profissionais resultam de suas observações diárias, como: conhecer o público-alvo,

o propósito, o formato, o tamanho e o tipo de conteúdo do curso. Entretanto, isso

não quer dizer que eles não tenham conhecimentos de natureza teórico-científica,

porém, esses aspectos não foram observados em suas respostas.

4.4.2- Concepções da aprendizagem multimídia

Nessa categoria a análise e interpretação dos dados coletados objetivou

investigar quais os conhecimentos que os designers educacionais selecionados

possuem sobre as concepções da aprendizagem multimídia.

Para verificar, de maneira geral, o que os participantes entendem sobre

aprendizagem online, eles foram questionados sobre quais são as principais

características dessa aprendizagem.

As respostas emergiram, naturalmente, para o cuidado com a elaboração do

material educacional, já que essa é a principal atribuição do designer educacional no

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contexto institucional estudado. Os apontamentos ainda sugerem que o conteúdo

online deve ser mais leve e acessível, e sintetizar o que precisa ser dito; se utilizar

de mais recursos que facilitem a aprendizagem, já que o ambiente online possui um

dinamismo e uma grande variedade em seus recursos, possibilitando buscas

diversas ao mesmo tempo. O tipo de conteúdo, perfil do público-alvo, formato do

curso e a integração de diferentes mídias foram também considerados como

características relevantes da aprendizagem online, conforme os relatos:

[...] um conteúdo um pouco mais acessível, uma coisa bem... Síntese. [...] Acho que depende, na verdade, do conteúdo, do público-alvo desse conteúdo online. (Carol) [...] nos recursos online você tem uma variedade muito maior e você consegue buscar muito mais coisa ao mesmo tempo... (Peres) Eu acho que tem essa questão de o material que vai ser desenvolvido [...] acho que o ponto principal é esse: na mudança que esse conteúdo vai ser apresentado. (Marília) As melhores formas (de aprender online) são aquelas que integram mais mídias, sejam elas linguagem de vídeo, linguagem de TV, linguagem radiofônica, linguagens visuais, como as HQs, imagens estáticas ou um mix de todos esses tipos de linguagem, que podem potencializar a aprendizagem. (Jean)

No apontamento da Carol observa-se a importância dos fatores culturais ao

dizer que depende do perfil do público-alvo. Os discursos de Peres e Jean mostram-

se de acordo com as concepções da aprendizagem multimídia apresentadas por

Mayer (2009), que defende a utilização de diversas mídias no conteúdo dos cursos

online, por contribuírem para uma aprendizagem mais significativa.

Ao serem questionados sobre qual o objetivo dos recursos e estratégias

educacionais que elaboram, as respostas indicaram, de maneira geral, a

preocupação em facilitar a aprendizagem do aluno, promovendo sua atenção e

motivação. Surgiu também a preocupação com o objetivo, linguagem e público-alvo

do curso no momento da criação desses recursos ou estratégias, conforme apontam

os relatos:

Eu acho que não consigo ver um princípio. Por exemplo, vou fazer um jogo, primeiro eu penso no objetivo... Porque se é só passar uma informação, às vezes é melhor o texto só, sem recurso nenhum... O que exatamente, de que forma o aluno tem que absorver aquilo e aí, pensando nisso, qual conteúdo, que recurso que eu posso trabalhar com aquele conteúdo [...] é mais ou menos pegando no lado de objetivo, linguagem e público-alvo. [...] Se no conteúdo que eu tenho cabe um jogo, mas o

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objetivo daquele curso, o objetivo daquele conteúdo não vai ser passado com um jogo, não cabe um jogo ali, apesar de o conteúdo ser bacana e encaixar. (Marília) Atingir o aluno e passar o conteúdo de uma maneira que fixe de verdade [...] O maior objetivo que eu tenho quando desenvolvo um recurso ou alguma coisa do gênero é simplesmente fazer com que ele fixe sem essa obrigação (sem se sentir obrigado

a aprender). (Peres) Além de facilitar a aprendizagem do aluno, prender essa atenção dele [...] São para facilitar, para assimilar, para chamar a atenção [...] Quando trabalha com uma metáfora, quando ele usa outro tipo de estratégia para mostrar o mesmo conteúdo [...] o aluno consegue extrapolar e consegue compreender melhor até o que ele já tinha visto. (Carol) Se ele estiver motivado para aprender, se ele quiser, se ele estiver disposto a aprender e aberto, é bem possível que ele, utilizando o recurso que a gente cria, ele pode conseguir a aprendizagem. (Jean)

A preocupação em motivar o aluno a construir sua própria aprendizagem de

maneira consciente não foi observada no discurso de nenhum dos designers

educacionais, o que entra em desacordo com o conceito de design de recursos

multimídia, segundo o qual deve-se tentar ajudar os alunos a construírem seus

próprios modelos de aprendizagem (MAYER, 2009), o que acabaria por contribuir

para a consciência e controle dos processos de aprendizagem dos alunos. Segundo

Pozo (2002), na medida em que há consciência do processo de aprendizagem, esta

se torna mais significativa para o aluno.

Entretanto, foi observado na fala da Marília o princípio da redundância, Filatro

(2008), em que caso um elemento possa ser entendido por si só, não há

necessidade de se utilizar um segundo elemento, o que poupará recursos cognitivos

do aluno.

Ainda complementando a questão, foram colocadas duas situações para que

os DEs avaliassem se haveria alguma diferença para a aprendizagem: a) material

didático apresentado somente de maneira textual, e b) material didático apresentado

de maneira multimídia.

As respostas de dois participantes penderam mais para o estilo de

aprendizagem do aluno como fator determinante nessas situações, mas também

houve duas visões diferentes, que enfatizaram a importância entre forma e conteúdo

para mostrar que ambos são indissociáveis, além do fato de se aprender a todo o

momento, independentemente do meio em que a informação está disponibilizada, e

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também a vantagem do conteúdo multimídia em relação ao textual, por trabalhar a

interação e os sentidos do aluno, conforme os relatos:

Você tem determinado tipo de pessoa que vai buscar só o texto, para ela aquilo é suficiente [...] Eu acho que texto e imagem, áudio ou vídeo, o que tiver é interessante e ajuda bastante. (Peres)

Depende do aluno, porque tem gente que é mais visual, tem uma memória visual melhor, uma memória auditiva melhor, tem gente que só assimila mesmo quando ela escreve, faz um mapa mental, um esquema. Tem gente que só com leitura para ela é melhor, só texto corrido mesmo. (Carol)

É uma situação muito antiga que vem lá de Platão, o que é mais importante a forma ou o conteúdo? Sendo que, por exemplo, você não consegue dissociar uma coisa da outra. [...] Qual é o objetivo que você quer com aquilo? [...] A gente aprende a todo o momento, não é só com o computador. (Jean)

Tem bastante (diferença) [...] Você pega um conteúdo em texto e pega esse mesmo conteúdo com uma parte em texto e outra em áudio, eu tenho certeza de que ela vai absorver mais daquilo. [...] você vai trabalhar diversos fatores com a pessoa que vai interagir, ela vai ler, ela vai ouvir, enfim, e aí, isso vai fazer que ela absorva mais o conteúdo, com certeza. (Marília)

De maneira geral, eles percebem que a convergência dos elementos textual,

imagético e auditivo é importante para a aprendizagem, até pelo fato de cada aluno

aprender de uma maneira diferente, fazendo com que essa convergência atenda um

maior número de pessoas. Entretanto, não justificaram essa percepção com base

nos princípios da aprendizagem multimídia e nem em outras teorias. Algumas

respostas sugerem que tal conhecimento provém de experiência adquirida com a

própria prática de trabalho, e outras, além de experiência, também estavam

baseadas em leitura de livros e artigos que abordavam o assunto:

[...] Algumas coisas (eu sei) são por experiência própria, por conhecer pessoas que trabalham com isso, elas realmente buscam uma coisa mais interativa, uma coisa mais chamativa. (Peres) É instintivo mesmo. (Carol) [...] Eu pesquisei essa questão. (Marília)

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Com o propósito de verificar se há clareza sobre os princípios da

aprendizagem multimídia entre os DEs, foram questionados os papéis da imagem,

texto e áudio na aprendizagem, e como eles pensam que esses recursos e

estratégias auxiliam no processo de aprendizagem dos alunos.

No caso das imagens, as respostas indicam que seu papel está vinculado a

auxiliar o aprendizado, pois, além de chamar a atenção do aluno, elas ainda

complementam o conteúdo, possibilitando uma visualização mais ampla,

melhorando a fixação dos conceitos abordados, conforme os trechos selecionados:

[...] aquela velha história de que uma imagem vale mais do que mil palavras, muitas vezes ela é verdade [...] a imagem consegue traduzir muito mais um conteúdo, ela fixa muito melhor no aluno do que textos [...] (Peres) [...] a imagem vai dar um complemento que vai fazer a pessoa, eu acho, entender melhor, eu acho que vai dar uma visualização mais concreta do conteúdo [...] (Marília)

Com relação ao texto, também ficou perceptível que existe consciência sobre

sua importância, pois reconheceram que cabe a ele o papel explicativo dos cursos e,

por isso, precisa ser apresentado de maneira equilibrada com as imagens, o que

contribui para uma compreensão mais completa do conteúdo. Além disso, estão

conscientes também de que texto em excesso nos ambientes online fica cansativo e

sobrecarrega o aluno, conforme os relatos:

O texto é sempre necessário, na verdade é o que te traz a informação [...] (Carol) Eu vejo mais como um papel explicativo [...] ele serve muito mais como uma legenda ou uma explicação daquilo que está acontecendo [...] o texto junto com a imagem eles se completam para poder fazer com que o aluno compreenda o conteúdo por inteiro. (Peres) [...] é fundamental também, mas tem que ser uma coisa meio casada [...] texto demais no online sobrecarrega e fica cansativo [...] Texto é tão importante quanto imagem, só que tem que ter [...] uma sincronia entre os dois para não ficar nem só imagem, mas também não só texto. (Marília)

Já o papel do áudio é visto como um recurso que deve ser usado sempre que

possível, pois ele aproxima o aluno de alguém, como um intermediário entre ele e o

curso, ou até mesmo o professor. Além disso, ele também é importante para chamar

e prender a atenção do aluno, conforme é possível verificar nos relatos:

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O áudio é uma estratégia muito interessante, porque é como se trouxesse um interlocutor, outra pessoa para aquele momento aluno-computador, então, aproxima ele de alguém, como se fosse um intermediário, mas que chama atenção por causa disso, por ser um recurso diferente. (Carol) Basicamente ele (o áudio) é para chamar a atenção e para diversificar, por exemplo, uma aula narrada, [...] ao mesmo tempo em que ele (aluno) tem os recursos multimidiáticos, ele tem lá o professor, ele se sente mais próximo do professor falando também [...] (Peres)

A convergência da imagem, texto e áudio é uma medida estratégica, pois

mobiliza os sentidos, auxilia no aprofundamento de situações e possibilita uma maior

compreensão do conteúdo. O relato do participante Jean resumiu claramente a

importância da convergência entre esses três elementos:

Eles são compostos, são coisas que se complementam a todo o momento, não dá para escrever um curso só com imagem, não dá para escrever um curso só com texto nem só com falas [...] Você pode se limitar bastante (caso desenhe um curso com apenas um dos elementos), você pode perder momentos importantes em que, por exemplo: você coloca uma imagem que suscita algo e aquilo toca o aluno de alguma maneira. Ele vai se sentir aberto e em seguida, se você coloca um texto que resume tudo que você quer dizer com aquilo, você está quase conseguindo atingir seu objetivo, que é fazer com que ele aprenda, coisa que se você coloca texto corrido durante muito tempo, você não consegue achar um momento em que, bom, quando é que ele vai parar para respirar e tomar água e continuar o curso [...] Quando você faz essa divisão, esse mix, você consegue determinar momentos em que, bom, aqui e agora entra o texto, aqui entra um áudio, você consegue perceber mais.

De maneira geral, as respostas apresentam alguns saberes oriundos da

aprendizagem multimídia e outras teorias, como: a utilização de imagens para

melhorar a fixação do conteúdo, o equilíbrio entre texto, imagem e áudio, bem como

a convergência entre esses elementos.

Em complemento à questão anterior, ainda procurou-se investigar na

entrevista quais os critérios que motivam os designers educacionais a utilizar uma

determinada imagem, áudio, vídeo e animações no material didático. As respostas,

em sua maioria, estavam sempre vinculadas, de alguma maneira, com o tipo de

conteúdo trabalhado.

No caso da imagem, os critérios apontados penderam para o tipo de conteúdo

em questão, no sentido de utilizá-la como reforço do texto. Critérios como coerência,

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redundância e a cultura do público-alvo em relação à compreensão das imagens

também surgiram nos relatos:

Eu acho que depende do conteúdo [...] na maioria das vezes, são imagens ligadas ao conteúdo, para reforçar [...] (Marília)

[...] o que me motiva mais a buscar uma imagem nesse aspecto é isso: é fazer uma leitura daquela parte do texto, só que visualmente. (Peres)

Inicialmente coerência, se ela vai ajudar em alguma coisa ou se ela vai só fazer mais do mesmo, mostrar alguma coisa, mas quando ela consegue extrapolar um pouquinho do que já foi dito no texto, acho que vale a pena a imagem estar lá. (Carol)

Passa por um filtro muito particular que o designer educacional (tem) [...] quantas imagens, quantas pessoas vão reconhecer essa imagem que eu estou colocando? Será que, por exemplo, minha mãe, meus irmãos vão entender essa imagem? Ah, mas eu posso falar: meus irmãos (entenderão) e minha mãe não. (Jean) No relato de Marília e Peres, fica evidente a redundância como critério para

escolha de imagens, pois elas são utilizadas para reforçar o que já está sendo

informado no conteúdo. Nesse sentido, Filatro (2008) aponta que ao elaborar um

recurso, não há necessidade de utilizar um segundo para repetir ou reforçar o que

pode ser entendido por si só, para não haver sobrecarga cognitiva.

Na fala da Carol foi possível observar o oposto, ao dizer que vale a pena se

utilizar de uma imagem, caso ela extrapole o que o texto traz. Em outras palavras,

percebe-se o critério da coerência em seu relato, pois conforme a mesma autora

aponta, imagens meramente decorativas ou não relevantes devem ser excluídas

para não disputarem a atenção do aluno com o que realmente é importante.

Já a fala do Jean reforça a afirmação de Mayer (2009) de que o desenho do

recurso carrega em si a influência de quem o concebeu, ao dizer que o critério de

escolha de uma imagem passa por um filtro muito particular do DE. Logo, é possível

supor também que é de grande importância atentar às características culturais do

designer educacional.

Os critérios utilizados para utilização do áudio em materiais didáticos

multimídia vão desde a análise do tipo de conteúdo trabalhado até a utilização como

um recurso complementar e como uma possibilidade de diversificação em relação

ao texto, conforme foi relatado:

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[...] para usar o áudio, tem que ser uma coisa bem diferente, porque senão fica como se realmente a pessoa estivesse realmente falando a mesma coisa que você acabou de ler, então, acho que o áudio, mais que a imagem, tem que ser algo bem complementar. (Carol)

Principalmente em conteúdos densos, que precisam ser contados de maneira mais fluida, você consegue ter um poder muito maior (de associação) do que uma leitura. (Jean)

No caso do áudio também é possível perceber no relato da participante Carol

sua preocupação com a coerência desse elemento com o conteúdo textual, o que

diminuirá a carga cognitiva do aluno favorecendo sua atenção para outros pontos

relevantes do curso (FILATRO, 2008). Já o relato do Jean acorda com as

concepções da aprendizagem multimídia (MAYER, 2009), ao propor uma maneira

alternativa para abordar um conteúdo mais denso, o que aliviará o canal visual ao

desviar parte do material para o canal auditivo.

Os vídeos e animações também são utilizados de acordo com os conteúdos

trabalhados e são percebidos como mais eficazes que o áudio e as imagens,

justamente por contê-los em um único recurso, conforme apontam os relatos:

[...] o vídeo também te dá mais liberdade [...] Você pode colocar um vídeo que não fale exatamente sobre aquele conteúdo, mas que vai fazer... (o aluno extrapolar o assunto abordado). (Marília)

[...] você já não precisa mais do texto para poder passar o conteúdo que precisa, então, talvez o vídeo seja uma coisa bem mais ilustrativa do que uma imagem. (Peres)

[...] o vídeo te transporta mais que o áudio, te transporta acho que para outro lugar, para um outro espaço, que tem cenário, personagem, [...] pessoas. (Carol)

Os apontamentos supracitados acordam, de maneira geral, com a concepção

da aprendizagem multimídia. Mayer (2009) diz que vídeos e animações com locução

são considerados ótimos recursos, por explorarem os dois canais de processamento

dos alunos - visual e auditivo - ao mesclarem em um único recurso áudio e imagens.

Caso esses mesmos recursos sejam acompanhados de legendas, o canal visual do

aluno será sobrecarregado por ter que dar conta do texto e imagem ao mesmo

tempo.

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Essa sobrecarga informacional também é abordada por Oliveira (2009) em

seus estudos acerca da carga cognitiva. Ele diz que a concepção de recursos para a

aprendizagem não deve utilizar toda a capacidade da memória de trabalho do aluno,

pois isso o encoraja a envolver-se no processo cognitivo, o que é de grande

relevância na construção de seus esquemas mentais, fundamental na

aprendizagem.

4.4.3- Concepções da carga cognitiva

Nessa categoria a análise e interpretação dos dados coletados buscou

investigar o que os designers educacionais selecionados sabem sobre as

concepções da carga cognitiva, bem como o seu impacto na aprendizagem do

aluno.

Com o objetivo de identificar quais os princípios para a concepção de um

design multimídia, os DEs foram questionados se estavam preocupados com a

convergência de tempo e espaço entre elementos textuais, imagéticos e sonoros na

elaboração de uma estratégia ou recurso educacional.

As respostas indicaram certa unanimidade, pois todos se preocupam em

equilibrar os recursos, porém, os motivos para tal são diversos e apontam para como

o aluno irá interagir com o recurso, o que deve ser destacado, a ordem de leitura da

tela, o tipo de conteúdo e da mídia que será utilizada para publicação do curso,

conforme os relatos:

Eu acho que eu tenho (preocupação com a convergência) [...] No começo a tendência é você colocar o que você acha [...] mas aí você começa a entender que... Não tem uma lógica por trás da pessoa [...]. Já é comprovado que a pessoa vai entrar para ver XYZ na ordem N (relativo ao conteúdo que os usuários da internet procuram e como seus olhos navegam pelas telas), então eu já penso nessa questão de como o aluno vai interagir. Não adianta colocar uma informação super importante, por exemplo, numa tela bem pequenininha porque eu acho que ficou bonito aqui se o interessante é deixar ela no centro, sei lá em que parte, porque é ali que o aluno vai ver primeiro. (Marília)

(Me preocupo) Bastante, porque você não pode deixar nunca nenhum deles (elementos) de lado [...] você tem que ter a parte textual e a parte imagética, a parte do áudio você tem que ter elas sempre trabalhando em conjunto [...]. Eu busco a quantidade de texto. Se o destaque está na imagem, então a imagem (fica) um pouco mais

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centralizada, um pouco maior, depende muito do layout do curso, do layout do próprio conteúdo. [...] É bastante instintivo (o motivo para tal preocupação). (Peres)

Sim, acho que toda estratégia que você cria para mostrar um conteúdo, ela tem que ser muito bem dividida, não dá para colocar um vídeo gigante, um conteúdo que foi minimamente apresentado e o vídeo falando só sobre aquilo, mais do mesmo por uma hora [...] o aluno pode ficar disperso. [...] (Convergência) É sempre de acordo com o conteúdo e quanto tempo é o curso, o tamanho do conteúdo... Depende. [...] Eu penso na forma com que a gente lê (ordem de

leitura da tela). (Carol) É o primordial de tudo, independente da mídia que você vai usar. Se colocar texto seguido de texto e no último, uma imagem, o aluno não vai chegar nem na metade do texto que você quer que ele leia, e a sua imagem provavelmente não vai ser vista. (Jean)

Com base nas concepções da carga cognitiva (OLIVEIRA, 2009), a

importância em equilibrar os recursos educacionais, exposta pelos participantes

Peres, Carol e Jean, é muito importante para não sobrecarregar o aluno expondo-o

a recursos educacionais que contenham apenas um tipo de elemento em seu

desenho, o que exigirá esforços de apenas um de seus canais de processamento.

Entretanto, esse ponto de vista não foi apontado em nenhum depoimento.

Ainda complementando essa questão, os DEs foram questionados se essa

convergência pode causar sobrecarga informacional no aluno.

As respostas também foram similares, reforçando o argumento de que se não

houver um equilíbrio e cautela entre os elementos, pode, sim, haver uma sobrecarga

informacional prejudicando a intencionalidade do recurso e o processo de

aprendizagem do aluno o que acorda com as concepções de Oliveira (2009). Ainda

foi mencionada a importância de entender o que é melhor para o público-alvo

trabalhado, conforme os relatos a seguir:

[...] Tem que ter um equilíbrio, não adianta você querer, ah porque vídeo é legal e jogo é bacana e tem fundamento, então vamos colocar tudo. Não adianta também porque até perde a funcionalidade da coisa, então, eu acho que pode ficar uma overdose péssima, tem que ter uma mescla. (Marília)

Se utilizado sem cautela nenhuma, sem uma estratégia bem elaborada, eles podem atrapalhar, pode ficar muita informação, e você não tem aquele respiro para conseguir assimilar, e tudo mais. Fica muita coisa e acaba atrapalhando mesmo. (Carol)

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Você não tem que achar que o aluno é obrigado a receber tudo aquilo que você acha que é bom para ele, o pensamento é o contrário, não é o que eu acho que é bom e sim o que eu realmente pesquisei e tive certeza que dentre todos os recursos que eu tenho disponíveis o X e o Y são os mais propícios para aquele determinado público. (Jean) [...] se você não disponibiliza de uma maneira equilibrada cada um deles, ele pode às vezes ser muita coisa na tela e ficar muito poluída... Aí sim, você perde a informação que você precisa passar. (Peres)

É perceptível que os DEs estão cientes de como se deve utilizar recursos

multimídia e que os alunos não conseguem dar conta de muitas informações ao

mesmo tempo. Porém, essas concepções foram construídas, provavelmente, de

maneira empírica, com base em suas práticas diárias, já que nenhuma

argumentação explicitou conhecimentos teóricos a respeito da carga cognitiva ou

outras teorias.

Os designers educacionais ainda foram questionados sobre o que deve ser

observado no desenvolvimento de uma estratégia ou recurso educacional para um

curso online. Em outras palavras, quais os critérios que estão envolvidos nesse

desenvolvimento.

Nas repostas evidenciou-se que há uma preocupação com o equilíbrio entre o

público-alvo, o objetivo e a estrutura do curso, a aplicabilidade e coerência do

recurso educacional, bem como as características culturais do público que utilizará

esse recurso. Os relatos exemplificam:

(Devemos observar no recurso) Se ele é pedagogicamente aplicável e se ele é bom para aquele momento, para aquele conteúdo, se é coerente com o que você quer, com o que você está desenvolvendo... (Carol)

[...] de acordo com o público-alvo você vai adaptar a linguagem, o curso, quais os recursos e tudo mais. (Marília)

Além do público-alvo, me baseio na estrutura do curso [...] você tem sempre que equilibrar o conteúdo e o público-alvo para trabalhar e fazer um recurso de acordo. (Peres) Saber para quem você está fazendo o curso, o que ele precisa aprender, o que ele lê, o que ele assiste, quanto tempo ele já estudou na vida dele, saber a fluência dele com os diferentes tipos de linguagem, seja ela escrita, falada ou mesmo visual. (Jean)

Nas falas dos participantes Carol, Marília e Peres, mais uma vez fica claro

que Mayer (2009) foi muito assertivo ao dizer que o desenho de um recurso carrega

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em si a influência de quem o concebeu, pois mesmo levando em consideração todo

o perfil do público e curso que será desenvolvido, é a maneira como o designer

educacional percebe esse contexto que determinará o tipo de recurso que será

inserido naquele material educacional.

Já na fala do Jean percebe-se a preocupação com o contexto do usuário.

Logo, é possível supor que, quanto mais o designer entender o universo do seu

público-alvo, maiores serão as chances de atingi-lo, pois assim ele assimilará

algumas dessas características e conseguirá elaborar recursos mais próximos da

realidade desse aluno.

Observando, de maneira geral, todos os relatos dos participantes

selecionados para entrevista, fica perceptível sua diversificação quando analisados

sob o ponto de vista teórico das categorias abordadas. Dessa maneira, faz-se

importante a indicação de alguns saberes teórico-científicos para complementar os

conhecimentos já assimilados pelos designers educacionais. São essas indicações

que as considerações finais desta dissertação pontuam.

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Capítulo 5: Considerações finais

A aprendizagem humana é um processo complexo que envolve diversos

aspectos de natureza biológica e cultural e que evolui juntamente com a história da

humanidade.

Por meio do percurso teórico desenvolvido nesta pesquisa foi possível

identificar parte desses processos, permitindo compreender como essa nova cultura

da aprendizagem é, por nós, construída a cada dia, independentemente do meio

selecionado: seja em uma sala de aula tradicional, em que o professor tanto se

utiliza de giz e lousa quanto de novas tecnologias educacionais; seja também por

meio de todo o acervo informacional disponível na internet ou até mesmo por meio

de ambientes virtuais de aprendizagem que integram a boa e velha experiência do

professor com as novas tecnologias educacionais que surgem a todo o momento.

A educação a distância online, além de outras possibilidades, integra essa

nova cultura e com ela traz diferentes possibilidades à aprendizagem de seus

alunos. Os recursos educacionais multimídia concebidos, geralmente, por designers

educacionais, a fim de contribuir com a compreensão dos conceitos estudados pelos

alunos, são parte dessas novas possibilidades que, se forem bem planejadas,

trabalham os sentidos dos alunos auxiliando-os em seus processos de seleção,

armazenamento, recuperação e transferência de conhecimentos nas memórias de

trabalho e de longo prazo, ou seja, na assimilação de novos conhecimentos. Logo, é

possível perceber o tamanho das responsabilidades que permeiam as demandas

desse profissional, daí a relevância em investigar quais eram seus conhecimentos

acerca da aprendizagem ao propor esses recursos.

Por meio de entrevistas foi possível perceber que a premissa proposta de que

os conhecimentos dos designers educacionais sobre a aprendizagem são,

principalmente, de natureza empírica, resultantes de suas práticas diárias na

elaboração de roteiros educacionais para recursos e estratégias multimídia em

cursos online foi confirmada, apesar de os relatos concedidos pelos participantes

evidenciarem que, além dos conhecimentos empíricos29, conhecimentos adquiridos

por meio de pesquisas rotineiras e estudos acadêmicos também se fazem presentes

29 O que é “baseado na experiência e na observação, metódicas ou não”. Fonte: Dicionário Eletrônico Houaiss 3.0.

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no momento de conceber um recurso ou estratégia educacional. O cruzamento das

informações sobre o tipo de curso, o perfil do público-alvo e conteúdo também

aparecem em praticamente todos os relatos como primordiais à concepção do

recurso, o que acorda com a fase de análise - dentro do processo ADDIE do design

educacional - de um curso a distância, conforme aponta Filatro (2008).

A abordagem da entrevista, nesta pesquisa, possibilitou obter algumas

impressões sobre a ação desses designers educacionais que, de maneira geral,

levou à conclusão de que:

� O modo como posicionam cada elemento na tela é pautada na maneira

como lhes faz sentido, levando em consideração a ordem de leitura de

telas web;

� Os recursos elaborados objetivam, principalmente, chamar a atenção do

aluno para o contexto abordado, motivá-lo a continuar no curso e também

para facilitar sua aprendizagem;

� Eles têm consciência de que se não houver equilíbrio nos recursos

utilizados o aluno pode ser sobrecarregado;

� Percebem que as características culturais do aluno impactam em seu

aprendizado;

� Os recursos, muitas vezes, são utilizados de maneira redundante;

� A convergência entre os elementos textuais, imagéticos e auditivos se faz

importante, bem como a ineficiência em se utilizar apenas um deles no

desenho de um curso;

� Os conteúdos multimídia proporcionam maiores vantagens em relação aos

que não o são por diversificarem as opções de aprendizagem aos alunos;

� Há grande preocupação em adequar o conteúdo do curso à linguagem

web ou para a linguagem apropriada com a mídia do curso, pois entendem

a dinâmica e facilidades que esses ambientes oferecem;

� Suas estratégias remontam à própria maneira como aprendem.

Dentre todas essas constatações, o que mais intrigou foi a observação de

que, sob o ponto de vista teórico acerca da aprendizagem, os designers

educacionais se mostraram com opiniões diversificadas e com pouca clareza sobre

os processos envolvidos. Isso pode ser decorrente das diferentes áreas do

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conhecimento envolvidas em suas formações acadêmicas, que abordam as

questões da aprendizagem sob diversos pontos de vista e profundidades. Também

foi possível perceber que quanto maior o tempo de atuação do profissional nessa

área, melhor é a sua articulação entre os afazeres diários com uma teoria que tenha

algum relacionamento com o assunto.

Em outras palavras, esses apontamentos reforçam a impressão do caráter

empírico existente no fazer desses profissionais, o que não quer dizer que eles

estejam mais ou menos qualificados ou que não sejam assertivos em suas

estratégias, pois também de nada adiantaria possuírem amplos conhecimentos

teóricos se não possuíssem as competências necessárias para articular esses

saberes com as atividades práticas que essa profissão demanda. Porém, era

esperado que mesmo sem um grande aprofundamento houvesse certa clareza

sobre os processos da aprendizagem, pois, com esse conhecimento, a concepção

de suas estratégias poderia ser potencializada e, além disso, proporcionaria um

melhor aproveitamento sobre suas novas experiências que são adquiridas no dia a

dia.

Sendo assim, é interessante apontar que designers educacionais de cursos

online tenham maior consciência sobre os processos envolvidos na aprendizagem

multimídia, pois além de entender como as informações se transformam em

conhecimento, isso contribuiria também para a concepção de recursos que

privilegiem o modo como o sistema cognitivo humano funciona, evitando estratégias

com grande carga cognitiva.

Logo, é importante sugerir que esses profissionais tenham um mínimo

entendimento acerca:

� Do funcionamento da memória, pois é ela que seleciona e recupera as

informações recebidas pelos sentidos na memória temporária e as

transfere e integra aos conhecimentos já armazenados na memória

permanente;

� Da importância do contexto cultural do aluno, pois ao reconhecer em um

recurso algo que o remeta a seu contexto, sua atenção provavelmente se

voltará para o propósito a que se destina tal recurso, possibilitando que

sua aprendizagem seja mais significativa;

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� Dos pressupostos da aprendizagem multimídia e, entre eles, os da carga

cognitiva, pois apresentam princípios que muito podem contribuir para

uma aprendizagem mais efetiva que não sobrecarregue o sistema

cognitivo do aluno e, também, por orientar o designer educacional no que

deve ser considerado no momento da concepção de seus recursos;

� E, principalmente, da relevância em propor recursos que, ao invés de

apenas facilitarem a aprendizagem, auxiliem o aluno na construção de

uma aprendizagem mais ativa e significativa.

É importante destacar que, além desses conhecimentos, tudo que foi relatado

pelos profissionais entrevistados também é essencial em sua atividade. Além disso,

outros diversos conhecimentos ainda podem ser incorporados a esses tópicos, pois

é sabido que não existem categorias suficientes que deem conta das

particularidades humanas envolvidas no desenvolvimento de um curso. Sempre

haverá diferentes fatores que precisarão ser levados em consideração.

Como não há docência sem discência (FREIRE, 1996) ou, em outras

palavras, não há ensino sem aprendizagem, também “não há ensino sem pesquisa

nem pesquisa sem ensino” (Ibid., p.29), assim, fica evidente a importância da

continuidade desta pesquisa nas mais variadas linhas de pensamento, pois sendo o

ato de ensinar “uma especificidade humana” (Ibid., p. 91), e a aprendizagem

inerente e determinante na própria história da humanidade (POZO, 2002), quanto

maiores os conhecimentos nessa área, tanto maior serão os ganhos para todos os

indivíduos.

Assim, fica a indicação de que outros contextos institucionais e perfis de

designers educacionais merecem ser investigados a fim de se obter maior

entendimento sobre seus conhecimentos teóricos e empíricos acerca da

aprendizagem humana. Também merece investigação o papel que os recursos

multimídia exercem para os próprios alunos que se utilizam de cursos online, para

melhor direcionar seu desenvolvimento.

“[...] é pensando criticamente na prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar

a próxima prática. [...]” (FREIRE, 1996, p. 39).

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APÊNDICES

APÊNDICE A - Termo de Consentimento Livre e Esclare cido

Você está convidado a participar de uma pesquisa de mestrado que investiga quais

são os conhecimentos que o designer educacional possui em relação a

aprendizagem em cursos online.

Essa pesquisa será realizada por meio de entrevista que terá duração de

aproximadamente 15 minutos e abordará entre dez e quinze questões. A entrevista

será gravada e seus dados serão mantidos em sigilo, pois cada participante definirá

um nome fictício pelo qual será identificado em todos os momentos da pesquisa.

Você terá total liberdade e direito de não responder as questões apresentadas e de

se retirar do estudo se assim desejar.

Solicitamos sua autorização para o uso de suas declarações para publicação nessa

pesquisa de mestrado e para produção de artigos técnico-científicos futuros sempre

mantendo seus dados em sigilo absoluto.

Obrigada pela participação e colaboração.

Pedrina Rosa Araújo

Mestranda em Tecnologias da Inteligência e Design Digital – PUC/SP

Consentimento

Declaro que fui informado (a) sobre os procedimentos da pesquisa, que recebi de

maneira clara e objetiva todas as explicações pertinentes ao projeto e que todos os

meus dados serão mantidos em sigilo.

Declaro ainda que minha participação é voluntária e sigilosa.

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Nome: ______________________________________________

RG: _______________________

São Paulo, ______/______/_______ Assinatura: __________________________

APÊNDICE B - Roteiro para entrevistas

1- Pensando em assegurar sua privacidade, como você prefere ser chamado

durante a entrevista?

2- Em sua opinião, quais as características da aprendizagem online?

3- Você tem clareza sobre o processo de aprendizagem do aluno? Explique.

4- Qual o objetivo dos recursos e estratégias educacionais que você elabora?

5- O que é importante observar no desenvolvimento uma estratégia ou recurso

educacional para um curso online?

6- Ao desenvolver uma estratégia ou recurso educacional, como você percebe o

papel da imagem, do texto e do áudio no processo de aprendizagem?

7- Como você pensa que os recursos e estratégias educacionais auxiliam o

processo de aprendizagem dos alunos?

8- Em sua opinião há diferença para aprendizagem do aluno quando o material

didático é apresentado: a) de maneira textual ou b) sob a forma de texto com

imagem ou áudio? Explique.

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9- Quais são os critérios que te motiva a utilizar uma determinada imagem

no material didático? E para utilizar áudio? E víde os e animações?

10- Você se preocupa com a convergência (temporal e de espaçamento) entre os

elementos textuais, imagéticos e sonoros na elaboração de uma estratégia ou

recurso educacional? Como é isso?

11- Você acha que a convergência desses elementos pode causar sobrecarga

informacional ao aluno?

12- Para elaborar um roteiro quais são os conhecimentos sobre aprendizagem

que você considera indispensáveis a um designer educacional?