dissertação mestrado em teologia

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SEMINÁRIO TEOLÓGICO EBENÉZER DEPARTAMENTO DE TEOLOGIA BÍBLICA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM TEOLOGIA MESTRADO EM TEOLOGIA EM DEFESA DO SÁBADO: EXAME DAS PRINCIPAIS OBJEÇÕES CONTRA O DIA DO SENHOR JOSÉ BARBOSA DA SILVA

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Em Defesa do Sábado

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SEMINÁRIO TEOLÓGICO EBENÉZERDEPARTAMENTO DE TEOLOGIA BÍBLICA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM TEOLOGIAMESTRADO EM TEOLOGIA

EM DEFESA DO SÁBADO:EXAME DAS PRINCIPAIS OBJEÇÕES CONTRA O DIA DO SENHOR

JOSÉ BARBOSA DA SILVA

CURITIBA – PRDEZEMBRO -2004

JOSÉ BARBOSA DA SILVA

EM DEFESA DO SÁBADO:Exame das Principais Objeções Contra o Dia do Senhor

Dissertação apresentada ao programa de pós-graduação em Teologia do Seminário Teológico Ebenézer como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Teologia, sob a orientação do Prof. Dr. Kenneth O’Brian.

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CURITIBA – PRDEZEMBRO -2004

JOSÉ BARBOSA DA SILVA

EM DEFESA DO SÁBADO:Exame das Principais Objeções Contra o Dia do Senhor

Dissertação aprovada no dia ___ de ____ de 2004.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________Prof. Kenneth O’Brian, Th.D, Ph.D.

Orientador

____________________________________________Prof. James Morden, Th.D.

Membro

_____________________________________________Prof. Carlos Alberto Seabra, Th.D.

Membro

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CURITIBA – PA 2004

DEDICATÓRIA

A John Nevis Andrews (1829-1883), erudito líder sabatista, teólogo, poliglota, pesquisador e biblicista de notoriedade no século XIX, capaz de citar de memória todo o Novo Testamento.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pela iluminação do Seu santo e bom Espírito.A meus pais, por incutirem desde cedo em mim o amor do conhecimento.A minha companheira, pela compreensão e paciência.A meus filhos, Yanê Costa da Silva e Ulisses Costa da Silva, por existirem.Ao Prof. Dr. Kenneth O’Brian, pela erudita orientação na hermenêutica bíblica e histórica.A todos, que de uma forma ou de outra

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“Não há nada nas Escrituras que exijam de nós a observância do domingo como dia santo em vez do

sábado.”

— Harold Lindsell, Christianity Today, 5 DE NOVEMBRO DE 1976.

RESUMO

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O presente estudo procura dar uma resposta plausível às objeções mais comuns contra o sábado do sétimo dia como o dia consagrado por Deus desde a criação como tempo de santo repouso. Apesar de sua biblicidade e antigüidade, porém, poucas doutrinas estiveram mais tempo sob o fogo cruzado da controvérsia durante a história da igreja cristã do que o sábado. A pesquisa tem como objetivo examinar objeções de natureza bíblica e extrabíblica, contemplando tanto ataques recentes contra o sábado como os mais antigos, desde a literatura patrística até nossos dias, dentro um contexto histórico mais amplo em consulta constante à Palavra de Deus. A obra examina a importância do sábado a partir das perspectivas teológica, histórica, litúrgica e social. Explica textos bíblicos problemáticos sobre o sábado no Antigo e no Novo Testamento. Averigua tanto a base bíblica quanto a gênese histórica do domingo e trata colateralmente também da Lei dos Dez Mandamentos, já que, na tentativa de atingir o sábado, muitos críticos procuram não só invalidar o Decálogo, mas também, por vezes, desacreditar todas as Escrituras do Antigo Testamento. Procurou-se, de maneira sistemática e metódica, apresentar uma resposta honesta aos argumentos “clássicos” mais comumente empregados para negar a continuidade e validade do sábado em nossos dias. Nessa investigação adotamos um método eminentemente bibliográfico. Os resultados obtidos revelam que as objeções, embora engenhosas, não são consistentes com o ensino bíblico nem com a lógica, tampouco encontram apoio na História e na Ciência.

Palavras-chave: sábado, judeus, domingo, descanso, lei.

ABSTRACT

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The present study seeks to give a reasonable reply to the more common objections against the seventh-day Sabbath in its capacity as the day consecrated to God since the Creation like sacred day of rest. Despite of its biblical nature and its seniority, few doctrines had been more time under the crossfire of controversy during the history of the Christian church than the Sabbath. The research has as objective to investigate objections from biblical and extra biblical nature, taking into consideration both recent the attacks against the Sabbath and oldest ones, since the patristic literature until nowadays, within a more ample historical context, in continual consultation to God’s Word. This study examines the importance of the Sabbath from a theological, historical, liturgical, and social perspective. It explains problematic scriptures on the Sabbath in the Old and New Testaments. It inquires into the biblical evidences for Sunday as well as the historical emergence of Sunday, and it deals collaterally with the Law of Ten Commandments, since many critics, in an attempt at attacking the Sabbath, ends up not only invalidating the Decalogue, but also discrediting at times all the Holy Writ of the Old Testament. We tried, in a systematic and methodic way, to present an honest reply to the “classical” arguments more commonly used to deny the continuity and validity of Sabbath in nowadays. The end results demonstrate that the objections, though ingenious and clever, are not consistent with the biblical teaching or with legitimate logical argumentation. Neither have they found support in History and Science.

Key words: Sabbath, Jews, Sunday, rest, law.

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SUMÁRIO

RESUMO .................................................................................................... viiABSTRACT ................................................................................................ viiiINTRODUÇÃO ........................................................................................... 10 PARTE UM – O SÁBADO E O ANTIGO TESTAMENTO ................................. 13 Gênesis .................................................................................................... 14Êxodo ...................................................................................................... 34 Levítico ..................................................................................................... 50Números .................................................................................................. 55 Deuteronômio .......................................................................................... 59Josué ........................................................................................................ 632 Reis ....................................................................................................... 64Neemias ................................................................................................... 66Isaías ....................................................................................................... 70 Oséias ...................................................................................................... 74

PARTE DOIS – O SÁBADO E O NOVO TESTAMENTO .................................. 76Os Evangelhos ......................................................................................... 77 Mateus ..................................................................................................... 84Marcos ...................................................................................................... 96Lucas ...................................................................................................... 101João ........................................................................................................ 107Atos ....................................................................................................... 120 Romanos ................................................................................................ 1311 Coríntios .............................................................................................. 1452 Coríntios .............................................................................................. 152Gálatas ................................................................................................... 157Efésios .................................................................................................... 170Colossenses ........................................................................................... 1731 Timóteo ............................................................................................... 178Hebreus .................................................................................................. 1791 João ..................................................................................................... 187Apocalipse .............................................................................................. 188

PARTE TRÊS – O SÁBADO E OUTRAS QUESTÕES .................................... 191O Sábado e a Ciência ............................................................................. 192O Sábado na História ............................................................................ 204 O Sábado e Sua Observância ................................................................ 225

CONCLUSÃO ........................................................................................... 231

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REFERÊNCIAS ......................................................................................... 233

INTRODUÇÃO

O sabatismo, ou seja, a celebração e guarda do sábado no judaísmo e em algumas igrejas cristãs, tem sido uma pedra no sapato para o cristianismo em geral, que, numa atitude reducionista, costuma considerar este dia uma instituição exclusivamente mosaica, abolida por Cristo e condenada por Paulo. Numericamente superiores, os cristãos dominicalistas acreditam piamente que Jesus, ao criar o cristianismo, a nova e vibrante religião que superou o antigo e decadente judaísmo, também deu o golpe mortal no símbolo máximo do judaísmo, quando transferiu também o dia de repouso e adoração do sábado para o domingo.

Apesar, porém, de sua biblicidade e antigüidade, poucas doutrinas bíblicas estiveram mais tempo sob o fogo cruzado da controvérsia durante a história da igreja cristã do que o sábado1. Uma pesquisa bibliográfica revela que, somente desde a Reforma Protestante do século dezesseis até hoje, foram publicados mais de 3.000 livros sobre a questão sábado/domingo2. E isso, sem mencionar a pesada artilharia teológica dirigida contra o sabbath sob a forma de apostilas, revistas e folhetos “apologéticos”, lançados de quando em quando, da parte de dominicalistas ou ex-sabatistas, apresentando enésimas "razões" para não se observar o dia do Senhor. Parece, como disse alguém num trocadilho irônico, que o sábado não conhece descanso!

Recentemente a controvérsia foi reacesa devido a três importantes acontecimentos: (1) a publicação de numerosa quantidade de trabalhos

1 Quando falarmos em sábado (Sabbath) neste trabalho, estaremos nos referindo ao “dia de repouso e assembléia solene observado como sagrado a Deus por parte dos judeus e de algumas igrejas cristãs no sétimo dia da semana [Saturday] desde o pôr-do-sol de sexta-feira até o pôr-do-sol de sábado” (Merriam-Webster’s Unabridged Dictionary), como prática ordenada pelo quarto mandamento do Decálogo. E não ao termo aplicado, desde a Reforma, ao primeiro dia da semana (Sunday), observado pela maioria dos cristãos em comemoração da ressurreição de Cristo. “Este uso foi originalmente ligado à opinião de que a lei sabática do Decálogo permanece em vigor sob a dispensação cristã, tendo a data do sábado (Sabbath) mudado por ordem divina do sábado para o domingo” (Oxford English Dictionary).2 Robert Cox, The Literature of the Sabbath Question.

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acadêmicos elaborados por eruditos católicos e protestantes argumentando em favor da ab-rogação do sábado no Novo Testamento e da origem apostólica do domingo; (2) o abandono da guarda do sábado por parte de antigas organizações sabatista como a Worldwide Church of God (Igreja de Deus Mundial, fundada por Herbert Armstrong) e outras congregações independentes, sob a alegação de que este dia não passa de uma ordenança mosaica não mais vigente para os cristãos da “teologia da nova aliança”; (3) o lançamento, em 31 de maio de 1998, por parte do papa João Paulo II, da Carta Pastoral Dies Domini (Dia do Senhor), onde o pontífice faz apaixonado apelo em prol de um reavivamento na observância do domingo – carta histórica por sinal, pois pela primeira vez a Igreja Católica muda de atitude e, em vez de admitir (como tinha feito por 1.600 anos) que foi o catolicismo que mudou o sábado para o domingo, pretende provar neste documento que os autores desta mudança foram o próprio Cristo e Seus apóstolos.

Esta dissertação procura examinar tanto esses ataques recentes contra o sábado como os mais antigos, desde a literatura patrística até nossos dias, dentro um contexto histórico mais amplo em consulta constante à Palavra de Deus. A obra avalia a importância do sábado a partir das perspectivas teológica, histórica, litúrgica e social, analisando os argumentos mais comuns utilizados para negar a atual continuidade e validade do sábado como dia de repouso e adoração. Explica textos bíblicos problemáticos sobre o sábado no Antigo e no Novo Testamento. Averigua tanto a base bíblica quanto a gênese histórica do domingo e trata colateralmente também da Lei dos Dez Mandamentos, já que, na tentativa de atingir o sábado, muitos críticos procuram não só invalidar o Decálogo, mas também, por vezes, desacreditar todas as Escrituras do Antigo Testamento.

A questão fundamental que se impõe é: Continua o sábado do sétimo dia sendo válido como o dia verdadeiro de repouso e adoração para a cristandade? Na busca de respostas para esta alta indagação, partimos para a pesquisa bibliográfica, visto que este nos pareceu o método mais adequado em nossa investigação bíblica e histórica. Debruçamo-nos sobre

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centenas de livros e obras de referência e dedicamos um sem-número de horas de pesquisa em obras de referências e páginas da Web. É preciso, porém, ressalvar-se que o fato de citarmos determinado erudito não significa que concordemos com todas as idéias e posturas por ele defendidas nem que esse erudito aceite plenamente todos os pontos de vista que adotamos.

Embora nos países de língua inglesa haja fartura de trabalhos sobre essa questão (Heyllyn, Andrews, Lewis, Andreasen, Armstrong, Bailey, Bond, Carlow, Crews, Goldstein, Heschel, Kiesz, Walker etc.), entre nós pouco se publicou em defesa do sabatismo, a não ser sob a forma de panfletos, folhetos e capítulos avulsos em livros que tratavam de outras temáticas. É possível contar nos dedos de uma só mão os apologistas sabatarianos que trataram do assunto no todo ou em parte de maneira mais ou menos profunda, tais como Arnaldo B. Christianini (Sutilezas do Erro), Alfons Balbach (Conhecereis a Verdade), Lourenço Gonzalez (Toda a verdade sobre o sábado; Assim diz o Senhor), Carlyle Haynes (Do sábado para o domingo) e mais recentemente a tradução de Francis D. Nichol (Respostas a objeções). Ao que se sabe, porém, nenhum situou o problema de maneira mais desenvolvida, sistemática e abrangente, como a que ora empreendemos.

Dentre as fontes consultadas para produção desta pesquisa, é justo registrar aqui as três que, por assim dizer, lançaram os fundamentos dialéticos e estruturais da obra: a Série de Comentário Bíblicos e Referências Adventistas: SDA Bible Commentary; o monumental volume The History of the Sabbath, de John Andrews; e os escritos de um que é, a nosso ver, o maior perito em sábado da atualidade – o Dr. Samuele Bacchiocchi. A versão bíblica utilizada foi a Almeida Revista e Atualizada (ARA), 2ª edição, a menos que se mencione outra fonte.

O desenvolvimento deste trabalho foi estruturado em três partes distintas. A primeira parte, intitulada O Sábado e o Antigo Testamento, trata das objeções contra o sábado cujas evidências pretendem apoiar-se em alguma passagem véterotestamentária. A segunda parte, intitulada O Sábado e o Novo Testamento, examina as objeções cujas evidências

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tencionam justificar-se em alguma passagem neotestamentária, notadamente nos escritos do apóstolo Paulo. A terceira e última parte, nomeada O Sábado e Outras Questões, aborda as objeções pretensamente alicerçadas em questões extrabíblicas, de ordem científica, histórica ou social.

Devido à própria natureza generalista do livro, nem todas as objeções contra o sábado foram aqui examinadas, senão as mais recorrentes (136 nesta edição concisa). O presente catálogo não tem caráter oficial nem alimenta a pretensão de ser exaustiva, já que são infinitas as possibilidades de falácias e cavilações. Procurou-se, no entanto, de maneira sistemática e metódica, apresentar uma resposta honesta aos argumentos “clássicos” mais comumente empregados para negar a continuidade e validade do sábado em nossos dias. Para alcançar este propósito, vimo-nos na contingência de recorrer numerosas vezes ao grego e ao hebraico. Fizemo-lo, não com a intenção de aborrecer o leitor nem de ostentar erudição, mas simplesmente de resguardar o sentido textual de tendências sectaristas ou condicionamentos culturais, religiosos e ideológicos refletidos em algumas versões bíblicas.

Os textos bíblicos nos quais se baseiam as objeções tratadas neste livro aparecem na ordem em que a Bíblia os apresenta, facilitando assim aos leitores a sua localização. Se determinado assunto não é discutido no lugar esperado, talvez seja tratado sob outra referência bíblica. Os temas controversos presentes nos sinópticos são tratados em Mateus, embora os que apareçam nos outros Evangelhos sejam remetidos para o lugar devido. Inserimos na parte final do livro a bibliografia consultada para os que desejarem efetuar estudos mais exaustivos.

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PARTE UMO SÁBADO E O ANTIGO TESTAMENTO

GÊNESISOBJEÇÃO Nº 01: A GEOLOGIA NÃO ADMITE A ORIGEM CRIACIONAL DO SÁBADO

ARGUMENTO: A geologia moderna ensina que nosso mundo veio à existência, não em seis dias, mas em milhões de anos. Isto lança por terra toda a doutrina do sábado do sétimo dia como tendo sua origem na criação.

RESPOSTA: Enquanto os geólogos tradicionais ensinam, baseados em datação radiométrica, que a Terra se originou há cerca de 4,5 bilhões de anos por um processo de longos períodos geológicos (teoria da Terra Antiga), os criacionistas garantem, baseados nas Escrituras, que a Terra foi criada no período de uma semana literal (Êxo. 20:11), além de sugerir, por dados cronológicos e

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genealógicos dela derivados, que isto tudo sucedeu num tempo não muito superior a 6.000 ou 7.000 anos (teoria da Terra Jovem). É óbvia a discrepância entre os dois pontos de vista. Temos, porém, motivos plausíveis para confiar no registro bíblico e, portanto, na origem criacional do sábado.

A Ciência Verdadeira Na Contradiz a Bíblia. Não existe conflito entre a Bíblia e a verdadeira Ciência. As Palavras e as Obras de Deus acham-se em perfeita harmonia. Os conflitos surgem é das interpretações errôneas de ambas as partes. “A geologia genuína é tão verdadeira quanto a Bíblia e não contradiz a Bíblia, pois a verdade não pode contradizer a verdade” (D. T. Bourdeau, in Review and Herald 29:98, 5 de fevereiro de 1867).

Limitações do Conhecimento Científico. Os que afirmam que a Terra possui bilhões de anos de existência são incapazes de demonstrar cientificamente sua hipótese. Isso acontece porque o método científico é limitado e não dispõe de know-how nem de instrumentos precisos capazes de testar e explicar quanto tempo se gasta na “criação” de um sistema solar e de um planeta fervilhante de vida como o nosso. Só consegue observar e medir os processos de integração e desintegração que se acham em andamento.

Falibilidade dos Sistemas de Datação. Além disso, os sistemas de datação geológica de que a geologia se serve para tentar provar sua hipótese são incapazes de determinar com exatidão a idade da Terra. Mesmo as técnicas de datação radioativas, empregadas para “provar” essas longas eras, são altamente sujeitas a falhas. Métodos com o radiocarbono, por exemplo, amplamente utilizado para “datar” eventos com mais de 50.000 anos, envolve pelo menos uma dúzia de suposições improváveis e graves incertezas. Verifica-se o mesmo com o método potássio-argônio, urânio-chumbo rubídio-estrôncio, todos eles “relógios” geológicos que apenas dão margem para deduções.3

Interpretação Errônea dos Fatos. Não bastasse isso, a precisão do resultado depende da confiabilidade dos pressupostos utilizados na interpretação das medidas. É verdade que alguns vestígios encontrados na terra parecem contradizer a interpretação literal do relatório mosaico da criação. Mas é preciso levar em conta que muitos desses dados, ou estão incompletos ou estão sendo erroneamente interpretados. O mundo antediluviano era um mundo sui generis, com condições que em muitos aspectos são extremamente diferentes de agora. O desenvolvimento da vida vegetal, animal e humanal era superior. Por ocasião do dilúvio fragmentou-se a superfície da Terra, notáveis mudanças ocorreram,

3 Kem Ham, The Book of Answers.

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inclusive a remodelação da crosta terrestre. Materiais daquele período, portanto, não podem ser usados como padrão de amostragem.

Evidências a Favor de Um Mundo Jovem. Além disso, a maioria das evidências geológicas (composição e estrutura da Terra) não tendenciosas aponta, curiosamente, na direção de um mundo relativamente jovem. Entre essas evidências, podemos mencionar a pouca lama existente no leito dos mares, a rápida erosão dos continentes, a ausência de erosão nas lacunas entre as camadas sedimentares, o baixo nível de sódio no mar, o rápido decaimento do campo magnético da Terra, a escassa quantidade de hélio na atmosfera, a existência de halos pleocróicos na fundação rochosa da crosta terrestre, a escassez de esqueletos da Idade da Pedra, a recentidade da História e da agricultura etc. 4

Entendemos, finalmente, que Moisés escreveu sob a guia do Espírito de Deus. Portanto, para aceitar o sábado bíblico como ordenança criacional, não precisamos explicar a semana da criação à luz das modernas teorias científicas; basta-nos a fé. “Pela fé, entendemos que foi o universo formado pela Palavra de Deus, de maneira que o visível veio a existir das coisas que não aparecem” (Heb. 11:3).

OBJEÇÃO Nº 02: O GÊNESIS NÃO PASSA DE UM RELATO MITOLÓGICO

ARGUMENTO: Como aceitar que o sábado teve sua origem na criação quando tantas pessoas negam a historicidade dos dois primeiros capítulos do Gênesis e chegam até mesmo a considerá-los mitológicos ou, na melhor das hipóteses, alegóricos?

RESPOSTA: Este argumento não é válido. Verdade Não Determinada Por Maioria. Primeiro porque a verdade nunca

é determinada por voto majoritário. O fato de muitos crerem numa mentira (como é o caso de considerar o relato do Gênesis fábula ou folclore), não converte a verdade de Deus em mentira. Pelo contrário, a verdade sempre foi impopular. A Bíblia reconhece isso quando nos aconselha a não seguir a multidão para fazer o mal (Êxo. 23:32) ou quando Jesus declara que são muitos os entram pelo caminho espaçoso que conduz à perdição (Mat. 7:13-14). Assim sendo, o

4 Ver art. “Evidence for a Young Earth”, pelo Dr. Russel Humphreys, in Creation Ex Nihilo 13(3):28-31, June-August 1991 (http://www.answersingenesis.org).

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fato de muita gente acreditar na interpretação alegórica ou mítica do Gênesis, não torna realidade essa crença equivocada.

Veracidade Histórica. Segundo porque a Bíblia, segundo evidências internas e externas, não é um livro mitológico (2 Ped. 1:16). Na verdade, o Gênesis é a única fonte disponível de uma narração lógica e coerente do princípio do mundo. Comparado aos fantasiosos relatos pagãos sobre a criação, o relato bíblico demonstra claramente a sua superioridade.5 Ainda que haja na Bíblia certas porções poéticas, alegóricas, parabólicas e proféticas, o restante de seu conteúdo consiste na narração de fatos históricos autênticos, que devem ser interpretados literalmente, a menos que se prove o contrário. Este é o caso de Gênesis, que, segundo os princípios normais da exegese bíblica, deve ser entendido como narrativa histórica, autêntica e literal. Grande parte do seu relato já foi, está sendo ou será confirmado pela arqueologia, pela linguística, pela geografia, geologia e ciências de modo geral. Este é o caso do Dilúvio, da ancestralidade comum da raça humana, da existência da Torre de Babel, da historicidade de Abraão etc. (ver The Archaelogical Encyclopedia of the Holy Land; e The Historical Evidences of the Truth of the Scripture Records).

Doutrina Fundamental. Terceiro porque a doutrina da criação é de relevância fundamental para toda teologia bíblica (ver João 5:46-47; Mat. 19:4-6). A credibilidade de todos os profetas do passado, bem como dos apóstolos e do próprio Jesus dependem da veracidade do relato genesíaco. Isso ocorre porque todos, de uma maneira ou de outra, ensinaram ou escreveram sobre o assunto. Em João 5:46-47, lemos as palavras de Jesus: “Porque, se, de fato, crêsseis em Moisés (autor do Gênesis), também creríeis em mim; porquanto ele escreveu a Meu respeito. Se, porém, não credes nos seus escritos, como crereis nas Minhas palavras?”. Em Luc. 16:31, Jesus cita Abraão dizendo: “Se não ouvem a Moisés e aos Profetas, tampouco se deixarão persuadir, ainda que ressuscite alguém dentre os mortos.”6 Portanto, tratar o relato da criação (Gên. 1-2) como uma narrativa mitológica implica em reduzir em última análise toda a Bíblia a um mito inacreditável (Sal. 11:3).

5 Alguns pontos de distinção entre o relato do Gênesis e as cosmogonias pagãs (sumerianas, babilônicas, assírias, caldaicas, egípcias e cananéias): (1) Reconhece que a matéria não é eterna; (2) Deus está separado da criação; (3) a divindade não é politeísta; (4) a criação é ordenada e lógica; (5) a criação tem propósito e significado; (6) homem e mulher são vistos como epítome da criação; (7) tanto a criação em geral como o homem em particular são vistos como essencialmente bons. — Daniel H. King, Sr. “The Genesis Account and Ancient Myth”, Watchman Magazine, abril de 1999.6 Ken Ham, Evolution: The Lie.

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Assumido Como Verdade. Quarto porque a própria Bíblia sempre interpretou Gênesis 1 a 11 como história literal. Adão, Eva, a serpente e Satanás são todos vistos como personagens históricas no drama do grande conflito. São inúmeras as referências cruzadas de outros escritores bíblicos que provam ser a criação fato histórico, isto é, algo que realmente ocorreu no espaço e no tempo. Algumas dessas passagens enfatizam a onipotência e sabedoria de Deus manifestas na obra da criação (Isa. 40:12-14 e 26-28; Amós 4:13). Algumas passagens falam da criação como obra fundamental de Deus (1 Cor. 11:9; Col 1:16; Isa. 42:5; Apoc. 4:11). Algumas passagens falam sobre o propósito divino na criação (Isa. 45:18; Rom. 1:25). Outras passagens pormenorizam a história da criação, discorrendo sobre a ordem de Adão e Eva (1 Cor. 11:8-9) ou reportando-se à tentação por parte da serpente (1 Tim. 2:13). Uma das declarações mais explícitas sobre a criação deste mundo é Neemias 9:6: “Só Tu és Senhor, Tu fizeste o céu, o céu dos céus e todo o seu exército, a terra e tudo quanto nela há, os mares e tudo quanto há neles; e Tu os preservas a todos com vida, e o exército dos céus Te adora”.

Passagens como estas, tiradas daqui e dali da Bíblia, mostram claramente que a história da criação registrada em Gênesis 1-2 é amplamente aceita como fato nas Escrituras. Os escritores do NT fazem com frequência citações do Gênesis por uma simples e óbvia razão: consideram o livro historicamente exato e divinamente inspirado. O próprio Jesus adota a mesma atitude ao citar especificamente os dois primeiros capítulos de Gênesis em Mat. 19:4-6. Sim, “é impossível que Deus minta”. Heb. 6:18 (Samuele Bacchiocchi, The Sabbath in the New Testament, Answers to Questions).

OBJEÇÃO Nº 03: NÃO EXISTE A PALAVRA "SÁBADO" NO GÊNESIS

ARGUMENTO: Costuma-se alegar que o sábado é uma instituição estabelecida na criação. Acontece que, embora em Gênesis 2:2-3 apareça a expressão “sétimo dia”, não se menciona aí a palavra “sábado”. Esta omissão sugere que o sábado, como dia de observância, originou-se, não na criação, mas posteriormente, no tempo de Moisés.

RESPOSTA: É verdade que a forma aportuguesada “sábado” não ocorre nem na passagem em questão nem em todo o livro de Gênesis. Isso, contudo, não é prova concludente de que o sábado não tenha origem criacional. Eis as evidências que nos fazem pensar o contrário:

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Shabbath e Sábado. Embora não encontremos a palavra sábado no relato da criação, ocorre ali a raiz de onde se deriva tal vocábulo. O verbo hebraico empregado em Gên. 2:2 por Moisés para “descansar” é shebet (“cessar”, “interromper”, “pausar” ou “desistir”), que vem de shabat — o termo primitivo de onde se derivou a palavra shabbath (“sábado”). Foi desta forma verbal cognata, em sua raiz primitiva, que significa também “sete” (sheba)7, que o sábado adquiriu seu significado lexical de dia de repouso. Se fizermos, portanto, uma tradução literal de Gênesis 2:2, obteremos a seguinte frase: “E, havendo Deus terminado no dia sétimo a sua obra, que fizera, sabadeou nesse dia de toda a sua obra que tinha feito.” Esse foi, sem dúvida, o primeiro sábado da história humana.

Há, na língua hebraica, pelo menos uma dezena de verbos que encerram a ação de descansar: nuwach (Gên.8:4, Êxo.10:14, Núm.10:36; 11:25-26, Est. 9:17,18,22), chanah (Núm. 9:18,23), shakan (Núm.10:12), shaqat (Jos.11:23), achaz (1 Reis 6:10), camak (2 Crôn.32:8), daman (Jó 30:17). Moisés poderia ter empregado qualquer um desses termos. Por que preferiu usar shabat? A língua hebraica é clara e sem ambigüidades em seu intento.

O Sétimo Dia é o Sábado. Embora não encontremos no livro de Gênesis nenhuma menção ao sábado à parte do relato da criação, no livro de Êxodo, durante a outorga do Decálogo, ao proferir o quarto mandamento, o próprio Deus define, identifica e associa claramente o sétimo dia da criação ao sábado: “Lembra-te do dia de sábado, para o santificar. Seis dias trabalharás e farás toda a tua obra. Mas o sétimo dia é o sábado do Senhor, teu Deus; não farás nenhum trabalho . . .” (Êxo. 20:8-11). Três meses antes da proclamação da lei, o Todo-Poderoso já identificara o sábado como o sétimo dia: “Vede, porquanto o Senhor vos deu o sábado, portanto ele no sexto dia vos dá pão para dois dias; cada um fique no seu lugar, ninguém saia do seu lugar no sétimo dia” (Êxo. 16:29). Portanto, fica implícita a obrigação oficial e pactual do sábado, mesmo antes da outorga da lei no Sinai.

O Testemunho de Jesus e de Paulo. Não bastasse isso, duas passagens do Novo Testamento declaram formalmente o sábado como um preceito moral e universal que remonta à criação. “O sábado”, declarou Jesus, “foi estabelecido

7 A íntima relação entre as palavras “sábado” e “sete” é vista no significado do nome Bateseba (bath-sheba), que significa “filha do sábado”. — Jewish Encyclopedia, art. “Bathsheba”. Ou ainda em Sabetai, que quer dizer “nascido no sábado” (Esd. 10:15; Nee. 8:7; 11:6). Gerhard Hasel mostra a relação etimológica entre “sábado” e “sete” em The Anchor Bible Dictionary, vol. 5, pág. 849.

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[no gr. egéneto, “veio a existir no princípio” ou “foi criado ou gerado”] por causa do homem.” Mar. 2:27. Paulo ratificou: “E descansou Deus, no sétimo dia, de todas as obras que fizera”. Heb. 4:4. Tanto para Jesus com para Paulo, o sábado era uma ordenança criacional. Ambos associaram o sétimo dia de Gên 2 ao mandamento de Êxo 20, equiparando o sétimo dia com o sábado.

Prudente Omissão. Se é assim, o que levou então Moisés a evitar o emprego específico da palavra? Aparentemente, a designação do dia pelo número ordinal no lugar do nome talvez reflita a preocupação do autor em sublinhar não somente a ordenança perpétua desse dia, mas também em evitar qualquer associação dele com os “sábados” astrológicos das nações pagãs vizinhas de Israel, já que os nomes semíticos desses astros eram considerados por muitos dos vizinhos de Israel nomes de divindades. Foi nesta conformidade também que deliberadamente não designou o Sol, a Lua e as estrelas pelo nome, mas os chamou eufemística e genericamente de “luzeiros”, a fim de impedir a mínima sugestão de astrolatria (os nomes próprios das deidades pagãs eram associadas a esses corpos celestes), tão comum no antigo Oriente Médio (Gên. 1:14-18). O número parece ter sido usado intencionalmente também para diferençar o sábado divino (shabbat) do das nações pagãs (shabbatu), relacionado com as fases da Lua (U. S. Cassuto, A Commentary on the Book of Gênesis, pág. 63, 68).

OBJEÇÃO Nº 04: O SÁBADO NÃO É DE ORIGEM DIVINA

ARGUMENTO: O sábado não é uma instituição originalmente divina, mas derivada de outras fontes que influenciaram Israel.

RESPOSTA: Existem várias teorias que tentam explicar a origem do sábado no contexto da história social e religiosa do antigo Oriente Próximo. Dentre essas teorias, as principais podem ser situadas em três momentos históricos: (1) antes ou durante o tempo de Moisés; (2) após o estabelecimento em Canaã ou (3) durante ou após o exílio. As principais razões apresentadas para essas origens podem ser classificadas em: (1) astrológico-astronômicas, (2) socioeconômicas e (3) mágico-simbólicas. Visto ser impossível fazer uma análise detalhada das diversas teorias, faremos aqui uma breve alusão, remetendo o leitor interessado num tratamento mais amplo ao livro de Samuele Bacchiocchi, Divine Rest for Human Restlessness.

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1. ORIGEM PRÉ-MOSAICA E MOSAICA DO SÁBADO

As teorias de que o sábado se originou mais ou menos pelo tempo de Moisés se apóiam principalmente na suposta influência de fatores tais como o planeta Saturno, as fases da Lua e a existência de um período mesopotâmico de sete dias.

Teoria Quenita. Acreditam alguns que o sábado do AT provenha da observância do dia de Saturno por parte dos queneus, tribo com a qual Moisés entrou em íntimo contato por casamento quando fugiu para Midiã (Juí. 4:11, 17) e onde — ainda de acordo com essa teoria — ele pela primeira vez adorou Jeová (Êxo. 3:15; 6:2-3). Especula-se que, para os queneus, forjadores do deserto, o dia de Saturno era um dia proibido, no qual não acendiam seus fornos de fundição. Os israelitas teriam, supostamente, adotado este dia quenita e aplicado seus regulamentos às suas rotinas domésticas normais. Procura-se apoio para esta hipótese na proibição de fazer fogo no sábado (Êxo. 35:3; Núm. 15:32-36).

A fraqueza primária desta hipótese consiste no fato de repousar na suposição de que os queneus possuíam uma semana de sete dias, na qual um dia era dedicado a Saturno. Tanto quanto sabemos, foi somente com a introdução da semana planetária perto do início da era cristã que o dies saturni semanal apareceu pela primeira vez. Também não existe nenhuma indicação nem no AT nem na antiga literatura judaica de que o sábado tenha sido alguma vez dedicado a Saturno. Por essas e por outras razões, a hipótese quenita é na atualidade desacreditada por praticamente todos os eruditos.

Teoria Lunar. A teoria lunar relaciona a origem do sábado aos dias associados com as quatro fases da Lua. Um calendário assírio encontrado em 1869, entre as tabuinhas cuneiformes no Museu Britânico, assinala o 7°, 14°, 19°, 21° e 28° dias do mês como ûmê lemnuti, ou seja, dias aziagos ou desfavoráveis. Alguns atribuem a origem desses dias infaustos às quatro fases da Lua, que se repetem a cada sete dias aproximadamente. Segundo essa teoria, os hebreus teriam recebido seu sábado de um antigo ciclo lunar mesopotâmico.

A teoria apresenta, porém, três fragilidades. Primeiro, o mês lunar (lunação) consiste não em 28 dias exatos (4 x 7), mas em mais de 29 dias, já que cada fase da Lua representa 7 ¾ dias — um período que não é divisível por semanas de sete dias cada uma. Segundo, se os babilônios empregavam os dias aziagos num ciclo “semanal” civil (o que aparentemente não faziam), o ciclo seria interrompido no início de cada mês, visto que seu primeiro dia aziago ocorria oito

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ou nove dias depois do último dia aziago (28° dia) do mês anterior. Terceiro, nada nos textos cuneiformes sugere que os babilônios tenham empregado alguma vez os dias aziagos recorrentes como divisão “semanal” do tempo para propósitos civis.

Teoria da Lua Cheia. A teoria da Lua cheia é até certo ponto semelhante à teoria das fases lunares. O termo shabbatu, que se parece com a palavra hebraica shabbat (sábado) e soa bastante parecido com ela ocorre em diversos documentos acadianos da antiga Mesopotâmia. O termo aparentemente designava o décimo quinto dia do mês, ou seja, o dia da Lua cheia. Em vários tabletes sabbatu é definido como ûm mûh libbi, geralmente traduzido como “dia de repouso para o coração” ou “dia do apaziguamento”. Sabbatu era, portanto, o dia da Lua cheia, ocasião em que presumivelmente os deuses eram propiciados ou apaziguados. A similaridade visual e sonora entre o sabattu acadiano e o shabbat hebreu, bem como a associação no AT entre o sábado e a Lua nova levou alguns eruditos a concluir que o sábado fora originalmente não uma festividade semanal, mas mensal relacionada com o dia da Lua cheia. A conversão do sábado de uma festividade mensal para semanal teria ocorrido muito depois, sob a égide de Ezequiel em resposta a uma demanda por repouso.

A teoria da Lua cheia, porém, não consegue explicar como um “sábado mensal” veio a ser observado com um sábado semanal do sétimo dia. Se, durante séculos, os israelitas tivessem observado o dia da Lua cheia como seu sábado, é estranho que não se possa encontrar nenhum registro disso em tempos posteriores. O dia da Lua cheia em hebraico se chama keseh (Sal. 81:3), um termo sem nenhuma relação etimológica com o sabattu acadiano. A teoria também ignora o fato de que não há em Ezequiel nenhuma maneira nova de observar o sábado. Pelo contrário, Ezequiel lamenta que Israel não tenha conseguido observar o sábado à moda antiga (Eze. 10:12ss; 22:8, 26; 23:38; 44:24).

Teoria do Período Setenário. Outra teoria localiza a origem do sábado nas celebrações de sete dias mencionadas em alguns documentos mesopotâmicos antigos. Nas histórias mesopotâmicas do dilúvio, por exemplo, a duração da tempestade foi de sete dias e o primeiro pássaro foi enviado sete dias depois do navio ter repousado sobre uma montanha.

As poucas referências a períodos de sete dias oferecem, conforme mostra Siegfried H. Horn, escassa evidência de uma semana babilônica primitiva, “especialmente em vista das centenas de milhares de registros cuneiformes

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recuperados no vale mesopotâmico. Se os antigos sumérios, babilônios ou assírios possuíssem uma semana como a dos hebreus dos tempos bíblicos, ou atribuíssem ao sétimo dia de tal semana uma santidade especial, eles certamente nos teriam deixado um registro mais claro disto” ("Was the Sabbath Known in Ancient Babylonia? Archeology and the Sabbath," The Sabbath Sentinel [December 1979]: 21-22).

2. ORIGEM CANANÉIA DO SÁBADO

Teoria da Instituição Social. O fracasso das fontes extrabíblicas em fornecer uma explicação satisfatória para a origem do sábado levou os eruditos a procurarem as raízes desse dia dentro de textos do AT. Tal estudo fez com que alguns chegassem à conclusão de que o sábado surgiu pela primeira vez após a ocupação de Canaã. As razões apresentadas para o surgimento do sábado baseiam-se principalmente em considerações sociais e econômicas. A necessidade de um dia de descanso para os trabalhadores e de um dia de mercado para compra e venda de produtos teria estimulado à introdução do sábado como um "dia livre". Com o tempo, argumenta-se, o sábado teria evoluido de instituição social para instituição religiosa, ou seja, de um dia devotado a escravos e ao mercado para um dia dedicado a Yahweh. Acredita-se que os responsáveis por essa transformação tenham sido os profetas e sacerdotes, os quais, na época do exílio, teriam desenvolvido uma teologia do sábado para promover-lhe a observância religiosa.

Prevalece contra esta teoria, porém, o fato de que não se achou nenhum indício de semanas de mercado regulares na Palestina, muito menos com intervalos de sete dias. Além disso, a denúncia profética contra o comércio feito por alguns no sábado sugere que o que aconteceu com o sábado foi exatamente o contrário da teoria, ou seja, de que o dia degenerou para um dia de mercado ao invés de ter-se originado dele (Nee. 13:14-22; Jer. 17:19-27; Amós 8:5).

3. ORIGEM EXÍLICA DO SÁBADO

O período do exílio judaico em Babilônia (605-539 a.C.) é geralmente considerado crucial para a história do sábado. Para alguns eruditos, o exílio representa exatamente o tempo em que se originou o sábado. Para outros, os períodos exílico e pós-exílico são o ponto crítico no desenvolvimento teológico e cultual do sábado. Não precisamos deter-nos no primeiro ponto de vista, já que ele é nitidamente contraditado por passagens pré-exílicas como 2 Reis 4:23 e 2

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Reis 11:4-12, que mencionam a existência do sábado mais de dois séculos antes de Ezequiel.

O segundo ponto de vista merece consideração. O exílio, como se reivindica, teria contribuído em pelo menos duas maneiras para transformar o sábado de uma instituição social (um dia por causa de escravos e animais) para uma festividade religiosa (um dia por causa de Deus). Primeiro, a perda da pátria e de trabalhadores dependentes teria eliminado as razões sociais do sábado e ao mesmo tempo teria induzido à busca por justificativas teológicas. Segundo, a perda de um lugar santo (o tempo de Jerusalém em 586 a.C.) teria superdimensionado a importância do tempo santo (o sábado), especialmente levando-se em conta que o tempo não tem limitações geográficas, podendo ser celebrado em qualquer lugar, mesmo no exílio.

A informação fornecida pelo AT para este período, porém, não favorece essa teoria. Os profetas exílicos não propõem uma nova teologia ou uma prática inovadora para o sábado. Ezequiel, por exemplo, não prescreve nenhuma maneira nova ou motivação nova para a celebração do sábado. Ao contrário, o profeta apresenta a profanação do sábado no passado como a causa principal para as calamidades que sobrevieram a Israel (Eze. 20:15-16, 21, 36; 22:26, 31). Para promover um retorno à devida observância do sábado, Ezequiel apela não para uma nova explicação teológica, mas para o antigo significado histórico do sábado, a saber, o fato de ser ele um “sinal” ou penhor do relacionamento pactual de Israel com Deus (Eze. 20:12, 20). Esta função pactual do sábado se tornou mais relevante durante a experiência do exílio, visto que a ameaça de desintegração ou mesmo desaparecimento nacional era uma realidade sempre presente.

Será que o sábado desenvolveu-se num tempo santo em resultado da perda de um lugar santo (o templo de Jerusalém)? Novamente, é bastante improvável que Ezequiel tenha sugerido isso, já que ele mesmo costuma associar o sábado a coisas santas (Eze. 22:26; 23:38) e ao serviço no futuro templo (Eze. 45:17; 46:1-4, 12). O período do exílio, com sua deportação e privação de culto, parece ter contribuído não para inovações práticas ou ideológicas radicais, mas para a consolidação de instituições tais como o sábado. Isto é sugerido também pelas mensagens dirigidas por Jeremias e as medidas por ele adotadas durante o exílio e por Neemias após o exílio, de cessar as atividades comerciais em Jerusalém no sábado (Jer.17:19-27; Nee. 10:31, 33; 13:15-22). Os esforços deles visavam não transformar a instituição do sábado, mas reformar seus abusos.

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As tentativas de fazer remontar a origem do sábado ao tempo de Moisés, ao tempo da fixação de Israel em Canaã ou ao tempo do exílio babilônico devido a considerações astronômicas ou sócio-econômicas não suportam o escrutínio. Cada vez mais eruditos estão admitindo que é preferível buscar a origem do sábado no registro bíblico em vez de em fontes extrabíblicas. O sábado “não é de origem astronômica, numérica, histórica ou lógica, mas de origem divina.” (Fran-cis Nigel Lee, The Covenantal Sabbath: The Weekly Sabbath Scripturally and His-torically Considered, pág. 312; ver também SDA Encyclopedia, art. “Sabbath”, III. Theories on the Origin of the Sabbath). — VER OBJEÇÃO 22 (INVENÇÃO DO SÁBADO).

OBJEÇÃO No. 05: O SÉTIMO DIA DA CRIAÇÃO NÃO FOI UM DIA DE 24 HORAS

ARGUMENTO: O sétimo dia de Gênesis 2:2 não apresenta a fórmula de encerramento "tarde e manhã" (ereb e boqer), portanto não foi um dia literal de 24 horas como os seis dias precedentes, mas um tempo simbólico, representativo do repouso redentor dos redimidos.

RESPOSTA: Rabinos e escritores cristãos têm interpretado a ausência da fórmula “tarde e manhã” com relação ao sétimo dia como representando o futuro e eterno repouso dos redimidos. Agostinho chega mesmo a falar da salvação como de um “sábado que nunca anoitece” (Confissões 13, 24-25). Existe de fato uma interpretação espiritual e escatológica para o sábado da criação, encontrada em Hebreus 4:9, 11, a qual aponta não somente para um descanso soteriológico neste mundo como para um descanso escatológico no mundo por vir. Essa interpretação simbólica, porém, não nega a realidade da coisa simbolizada nem sua duração literal de 24 horas. Temos pelos menos quatros motivos para pensar assim:

O Sétimo Dia é Numerado. O sétimo dia é numerado como os seis dias que o precederam — uma característica peculiar aos dias de 24 horas na Bíblia (Gên. 2:2). Se a palavra “dia” empregada em Gênesis 1:14 não especifica um dia literal, então a palavra “anos” citada no mesmo versículo ficaria sem sentido: “Disse também Deus: Haja luzeiros no firmamento dos céus, para fazer separação entre o dia e a noite; e sejam eles para sinais, para estações, para dias e anos”.

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O Sétimo Dia é Literal. É contrário à razão e às leis da linguagem que a palavra “dia” ao ser usada pela primeira vez tenha caráter simbólico. Uma palavra não pode ser usada simbolicamente (sentido conotativo) em seu primeiro emprego, visto não ter um significado literal (sentido denotativo) em que se fundamentar. Seria o mesmo que conceber fumaça sem fogo ou sombra sem corpo.

O Sétimo Dia é Yom. O sábado é chamado “dia” nas Escrituras (Gên. 2:2). A palavra hebraica traduzida por “dia” em Gênesis é yom, que isoladamente pode significar tanto um dia ordinário de 24 horas, como a parte clara de um dia ordinário de 24 horas ou ainda, ocasionalmente, um período indefinido de tempo8. Note, porém, que a acepção primária da palavra (seu uso comum em qualquer dicionário) é para um dia literal. A palavra hebraica yom é usada mais de 2.000 vezes no Antigo Testamento. Um estudo apressado revela que em mais de 1.900 casos (95%) a palavra é claramente usada para descrever um dia de 24 horas, ou a parte iluminada de um dia normal. Os outros 5% se referem aos usos incomuns.9

Além disso, quando yom se faz acompanhar de um número definido em uma narrativa histórica, sempre — e este sempre é absolutamente exato — significa um dia literal de 24 horas. Isto ocorre sete vezes em Gênesis 1-2 e todas as 359 vezes em que “dia” é usado desta maneira fora de Gênesis 1-2. Se Moisés quisesse indicar um período de tempo mais longo para as fases da criação teria empregado, por exemplo, a palavra olam, bem mais apropriada.

O Sétimo Dia é Um Mandamento. Os Dez Mandamentos oferecem outra evidência de que o relato da criação, no Gênesis, envolve dias literais. Ali se afirma claramente que cada um dos seis dias (yom) literais foi preenchido com atividade criadora e que o sétimo representou o clímax da semana criacional (Êxo. 20:11). Ao alinhar os sete dias da criação com os sete dias de uma semana literal, composta de 144 horas de trabalho e 24 de descanso, o quarto mandamento sugere os sete dias da criação foram o arquétipo dos sete dias da semana e que, portanto, que o sétimo dia foi um dia terreno ordinário como os outros seis. Este paralelo não faria nenhum sentido se cada dia da criação representasse longos períodos de tempo.

O Sétimo Dia é Um Dia Civil. Toda passagem que menciona o sétimo dia da criação como base do sábado terreno sempre o considera um dia ordinário (Êxo. 20:11; 31:17; cf. Mar. 2:27; Heb. 4:4), e não um símbolo de repouso eterno. O mandamento para guardar o sábado como dia memorial do sábado da criação

8 Augustus Strong, Systematic Theology.9 Richard Niessen, “A Suposta Base Para a Teoria Dia-Era”.

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(Êxo 20:11) implica um sábado original e astronômico, isto é, um dia de 24 horas de duração. Seria absurdo Deus ordenar a Seus filhos que trabalhassem seis dias e repousassem no sétimo seguindo Seu exemplo, se o sétimo dia não fosse um dia de rotação ordinária do planeta.

À luz dessas evidências, temos forçosamente de concluir que o sétimo dia da criação foi um dia literal de 24 horas de duração, e não um dia simbólico. — VER OBJEÇÃO 06 (SÁBADO COMO DIA NÃO LITERAL) E 112 (REPOUSO EM CRISTO)

OBJEÇÃO No. 06: O SÉTIMO DIA DA CRIAÇÃO DUROU MIL ANOS

ARGUMENTO: Tomando por base 2 Pedro 3:8, podemos crer que cada dia da semana da criação foi um período de mil anos, inclusive o sétimo dia (Gênesis 1:3, 8, 12, 19, 23, 31; 2:2). Portanto não há como guardar sábados semanais.

RESPOSTA: O argumento de citar 2 Pedro 3:8 tentando provar que os dias da Criação não representam dias literais de 24 horas, mas longos períodos de mil anos (Teoria Dia-Era), não faz nenhum sentido.

Fora do Contexto. Primeiro porque o verso em questão nada tem que ver com a duração da semana da criação. Não existe a mais remota ligação entre a passagem petrina e a mosaica. Enquanto Pedro fala a respeito da segunda vinda de Cristo, Moisés fala da criação do mundo, dois eventos bastante distintos.

A Eternidade de Deus. A palavra “mil”, citada por Pedro, não é expressão aritmética, mas tão-somente um hebraísmo para indicar grande quantidade indefinida (cf. Sal. 84:10; Isa. 30:17; 60:22 Ecles. 7:28). O fato de a palavra “dia” estar contrastada com “mil anos” sugere não equivalência, mas comparação. Ou seja, a passagem trata, não de medidas cronológicas, mas da natureza de Deus. Pedro não está dizendo que mil anos na Terra correspondem a um dia no Céu ou que exista alguma zona especial de tempo chamada “Tempo Padrão de Deus”, onde um dia divino equivalha a mil anos humanos.

Na verdade, ao parafrasear Sal. 90:4, o apóstolo está apenas tentando comunicar a idéia de que Deus não é limitado por processos naturais nem pelo espaço e o tempo, como o homem. Ao contrário, Deus transcende o tempo. “Para Ele não existe passado nem futuro; todas as coisas são um eterno presente. Ele não precisa de nosso limitado conceito de tempo, nem nós podemos confiná-Lo em nossas escalas de dias e anos” (SDA Bible Commentary). O resultado é que, quando o tempo é visto da perspectiva da eternidade, uma era não parece mais

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longa que um único dia breve, e um dia não parece mais breve que uma longa era (nota de rodapé da Bíblia de Estudo NVI).

Absurdos. Quando a Bíblia quer estabelecer uma medida profética de tempo, afirma isso claramente, como no caso de Núm. 14:34 e Eze. 4:7. Note, porém, que a equivalência profética é sempre de um dia por um ano, e não de um dia por mil anos. Se ignorarmos esse princípio e aceitarmos a hipótese de um dia da Criação correspondendo a 1.000 anos, acabaremos esbarrando em pelo menos duas dificuldade intransponíveis. (1) Em tal esquema, à tardinha do sexto dia da Criação – logo no fim do seu primeiro “dia” de vida, Adão estaria com mil anos de idade, o que contradiz frontalmente o relato bíblico de que ele morreu, muito tempo depois, com a idade de apenas 930 anos, (Gên. 5:5), tempo suficiente para guardar mais de 47.800 sábados! (2) Se cada dia da criação correspondesse realmente a 1.000 anos, uma vez que os dias da Criação foram divididos em partes iguais, de luz e de trevas, cada noite teria ocupado aproximadamente a metade deste tempo, ou 500 anos. A vegetação, com sua necessidade fotossintética, não conseguiria sobreviver a 500 anos de escuridão.

Não precisamos escamotear os fatos. O próprio contexto da passagem esclarece o sentido: aos impacientes quanto à vinda de Cristo, Pedro fala da longanimidade divina que quer dilatar o tempo desse grandioso acontecimento para que todos cheguem ao arrependimento. Não tem, pois, nada que ver com os dias da criação. Refere-se especificamente à Segunda Vinda de Cristo. — VER OBJEÇÃO 05 (SÁBADO COMO DIA NÃO LITERAL).

OBJEÇÃO No. 07: A BÍBLIA NÃO IDENTIFICA O SÉTIMO DIA

ARGUMENTO: Visto que a palavra sábado no original significa “descanso” (o vocábulo não provém da nossa língua; é uma transliteração do hebraico), isto significa que o conceito de descanso pode ser aplicado a qualquer dia da semana. Gênesis 2:2 nos diz a razão, mas não o tempo em que Deus santificou o sábado.

RESPOSTA: Embora bastante difundida entre os relativistas e defendida historicamente por católicos e protestantes, a doutrina de “qualquer dia em sete” não encontra apoio bíblico. Em parte alguma das Escrituras é dada à criatura a opção de decidir o dia de adorar a seu Criador. Apoc. 1:10 diz com muita clareza que o Senhor tem um dia específico: “o dia do Senhor”. Mat. 12:8 identifica esse

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dia como o sábado. Além disso, Deus considerou o sábado tão importante que fez dele um dos Dez Mandamentos: o quarto (Êxo. 20:8-11). Este mandamento, que nos ordena santificar esse dia, não é um mandamento opcional, facultativo, subordinado ao critério e conveniência de seres frágeis e pecadores. Nosso Deus não é um Deus anárquico, mas um Deus de ordem, que, por meio de um ato específico, abençoou um dia específico como memorial de um acontecimento específico, vinculando Seu descanso a um dia específico da semana. Consagrou esse dia (Êxo. 31:15) e ordena que o guardemos e reconheçamos sua santidade (Êxo. 19:30; 20:8).

Que o sábado é um dia específico e não genérico, indicam com clareza as seguintes evidências:

Idéia de “Um Dia em Sete” É Recente. A tese de um dia em sete não é escriturística nem surgiu em tempos apostólicos. Foi proposta pela primeira vez por Nicholas Bownd em 1595 quando a questão do dia de guarda agitava a Inglaterra (Philip Schaff, The Creeds of Christendom, vol. 1, pág. 762). Ninguém, durante os 4.000 anos antes de Cristo nem por quase 1600 anos depois, jamais pensou em fazer tão estapafúrdia interpretação do mandamento!

O Sétimo Dia Tem Nome. De todos os dias da semana, o sétimo foi o único que o Senhor chamou pelo nome: sábado. Embora o nome do sétimo dia da semana em hebraico receba o nome de shabbath, palavra derivada de uma raiz que significa “descansar”, a língua hebraica possui ampla variedade de termos para o substantivo abstrato “descanso” (shabbathown, nuwach, m@nuchah, manowach, shalah, betach, shaqat, ma’adan, nachath, d@miy, margowa‘, raga‘, puwgah, haphugah). Não há, portanto, confusão entre os dois conceitos (ver Êxo. 16:23). Sábado é descanso, mas descanso especial, com direito a nome próprio. Este dia corresponde ao sábado do nosso calendário civil atual.

Os outros seis dias foram apenas numerados (Gên. 1:5, 8,13,19,23,31; 2:1-3). Posteriormente o dia antes do sábado passou a ser chamado de “preparação” para o sábado (Mat. 28:1; Atos 20:7; Mar. 15:42; João 19:31)! Se, em algumas línguas, como por exemplo, o egípcio antigo e o latim, bem como o inglês e o alemão modernos, os dias da semana possuem nomes, receberam-nos, muito tempo depois, por influência de mitologias e astrologias pagãs.

Sétimo Dia é o Sábado. Podemos provar que o sétimo dia é o sábado tanto biblicamente, como lingüisticamente e astronomicamente. (1) Biblicamente. Êxodo 20:8-11 estabelece uma clara conexão entre o sétimo dia de repouso do Gênesis 2:2-3 e o sétimo dia da semana, o sábado. Mar. 15:42 e

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Luc. 23:54 descrevem o sábado como o dia que fica entre a sexta-feira e o primeiro dia da semana (domingo). Mat. 28:1 e Mar. 16:1 afirmam que o dia anterior ao sábado é a sexta-feira ou dia da preparação e o dia posterior ao sábado é o primeiro dia da seman (domingo). (2) Lingüisticamente. Qualquer fonte de referência existente no mundo (dicionários, enciclopédias, manuais, almanaques etc) nos diz que o sábado é o sétimo e último dia da semana. Um exemplo: “Sábado — o sétimo dia da semana que tem início no domingo” (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa). (3) Astronomicamente. Uma rápide olhada em qualquer calendário sério mostra que o domingo é o primeiro dia; segunda é o segundo; terça é o terceiro; quarta é o quarto; quinta é o quinto; sexta é o sexto; e sábado é o sétimo dia. 10

A Bíblia determina expressamente o dia que deve ser guardado e formalmente o individua e particulariza: “o sétimo” dia. Nem o domingo nem qualquer outro dia da semana satisfazem as exigências e pretensões do quarto mandamento.

OBJEÇÃO No. 08: DEUS NÃO SE CANSA PARA DESCANSAR NO SÁBADO

ARGUMENTO: Os sabatistas afirmam que Deus descansou no sétimo dia dando o exemplo para a observância do sábado (Gênesis 2:3). Acontece que a Bíblia diz que Deus não Se fatiga nem Se cansa (Isa. 40:28).

RESPOSTA: O argumento acima expõe o que supostamente seria uma contradição bíblica: um versículo bíblico afirmando (e não os sabatistas) que Deus descansou e outro dizendo que Deus não Se cansa. A contradição, porém, é apenas aparente; e o problema pode ser resolvido por meio de uma abordagem mais profunda.

Repouso Divino Versus Repouso Humano. O repouso de Deus é diferente do homem. O verbo usado em Gên. 2:2-3 para descrever o descanso de 10 Mark A. Finley. The Almost Forgotten Day, págs. 21-26.

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O SÁBADO É CHAMADO PELO NOME 109 VEZES NO ANTIGO TESTAMENTO

Shabbath — “cessação” ou “pausa” — Usado 104 vezes (Êxo. 16:23,25,26,29; Êxo 20:8,10,11; 31:13,14,15,15,16; 35:2,3; Lev. 16:31; 19:3,30; 23:3,3,11,15,16,32,38; 24:8; 25:2,4,6,8,8; 26:2,34,34,35,43; Núm. 15:32; 28:9,10; Deut. 5:12,14,15; 2 Reis 4:23; 11:5,7,9,9; 2 Reis 16:18; 1 Crôn. 9:32; 23:31; 2 Crôn.

2:4;8:13; 23:4,8,8; 31:3; 36:21; Nee. 9:14; 10:31,31,33; 13:15,15,16,17,18,19,19,19,21,22; Sal. 92; Isa. 1:13; 56:2,4; 58:13,13; 66:23; Jer. 17:21,22,22,24,27,27; Lam. 2:6; Eze. 20:6,12,20,21,24; 22:8,26; 23:38; 44:24;

45:17; 46:1,3,4,12; Oséias 2:11; Amós 8:5.).Shabath — "cessar” ou “guardar o sábado" — Usado 1 vez (Gên. 2:).

Shabbathon — "cessação ou pausa" — Usado 3 vezes (Lev. 23:24,39,39).Mishbattim — “cessações” ou “desolações” — Usado 1 vez (Lam. 1:17)

Deus é shabat, que significa literalmente "cessar" ou “interromper” trabalho ou atividade, enquanto o verbo usado em Êxodo 20:11 para descrever o descanso do homem é nuah, que quer dizer "relaxar”, “ficar tranqüilo”. Embora em Êxodo 31:17 seja dito que, no primeiro sábado do mundo, Deus “descansou e tomou alento”, a expressão “tomar alento” aí vem de naphash, “respirar”, empregado aí nitidamente de uma maneira antropomórfica e enfática.

Natureza do Repouso. O repouso de Deus não foi o resultado de exaustão ou fadiga, mas a interrupção de Suas atividades anteriores. Deus parou de criar coisas novas no sétimo dia, não porque estivesse cansado, porque um Deus Todo-poderoso não precisa de descanso (Isa. 40:28), mas simplesmente porque havia terminado Sua obra criadora e talvez quisesse distinguir Sua obra de criação da obra de providência que posteriormente desenvolveria no mundo.11

Pode ser ainda que fosse Sua intenção dar o exemplo ao homem para que descansasse também. O certo é que, ao cessar o trabalho, não o fez como alguém que estivesse cansado, mas pela satisfação com os frutos perfeitos de Sua sabedoria e bondade, a certeza do sucesso e com as manifestações de Sua glória. “O descanso de Deus, no sétimo dia, compreende a cessação do trabalho criador e a satisfação em face do que tinha sido realizado” (Nota de rodapé da Bíblia Shedd). Dessa natureza foi também o repouso de Adão enquanto permaneceu sem pecado, pois não havia cansaço antes no Éden. A fadiga decorrente do trabalho é conseqüência do pecado. Antes da Queda, Adão não se fatigava nem suava (Gên. 3:17, 19).

O Motivo Maior do Descanso Divino. Se Deus não Se cansa, por que então a Bíblia realça o fato de Ele haver descansado? Pelo mesmo motivo porque Jesus, que não tinha pecado, Se batizou: para nosso exemplo e instrução! “Para que possamos guardar esse dia como um dia de descanso religioso” (Mattew’s NT Poole’s Commentary). — VER OBJEÇÃO 63 (DEUS NÃO PÁRA DE TRABALHAR).

OBJEÇÃO No. 09: NÃO HÁ NO GÊNESIS ORDEM PARA SE GUARDAR O SÁBADO

ARGUMENTO: Não há no livro de Gênesis nenhum mandamento explícito para a humanidade repousar no Sábado. Isto mostra que o Sábado não é uma ordenança criacional para a humanidade, mas uma instituição temporária introduzida posteriormente por Moisés exclusivamente para Israel. Mesmo

11 The Quest Study Bible.

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porque uma lei enquanto não é promulgada não é obrigatória (Lex non promulgata non obligat).

RESPOSTA: É verdade que em nenhum lugar do Gênesis há ordem para guardar o sábado. Esse argumento, porém, ignora seis importantes considerações:

Gênesis Descreve Origens e Não Mandamentos. Gênesis não é um livro de mandamentos, mas de origens (ver Gên. 5:1; 6:9; 10:1). Escrito por Moisés 2.500 anos após a criação, seu objetivo não é decretar leis pelas quais os patriarcas devessem pautar sua vida — pois a essa altura já estavam todos mortos —, mas apresentar um breve relato das origens e história da adoração do Senhor desde o Éden até o Egito. Não somente o quarto, mas nenhum dos preceitos do Decálogo é mencionado ali. Esse silêncio, longe de denotar ausência, parece mais sinalizar no sentido de que os princípios da lei de Deus eram conhecidos tão universalmente que não havia necessidade de mencioná-los (Gên. 26:5).12 Há muito que aprender-se dos princípios e primeiras menções bíblicas: eles freqüentemente estabelecem princípios, padrões, modelos, paradigmas ou precedentes para tudo o mais que se segue.

Gênesis é Relato Sucinto. O Gênesis cobre 2.370 anos de história em apenas cinqüenta capítulos, numa média de quarenta anos por divisão. Esse curto período de tempo não deixa espaço para minudências. Não é só o sábado que este primeiro livro da Bíblia omite; ele também nada fala sobre a futura recompensa dos justos, embora saibamos que os patriarcas eram bem informados sobre esta doutrina. Abraão e Jó criam na ressurreição dos mortos (Jó 19:25-26). Aprenderam isso de quem, se a doutrina não é mencionada em parte alguma no Gênesis? (ver Heb. 11:13, 16, 19).

O Sábado no Gênesis Tem Função Cosmológica. No relato da criação o sétimo dia desempenha mais uma função cosmológica do que antropológica. O ato divino de repousar no sétimo dia tem por fim dizer-nos como Deus se sentia a respeito de Sua criação. Ele estava extremamente satisfeito e, para dramatizar este fato, parou de trabalhar, já que aquilo que fora criado estava perfeito e sem necessidade de retoques. Já no Êxodo o mandamento é apresentado em sua função antropológica.

O Descanso Divino Tem Função Exemplificativa. O ato divino de repousar é apresentado como um exemplo a ser seguido pela humanidade. O

12 O sábado também não é mencionado em seis sucessivos livros bíblicos (Josué, Rute, 1 e 2 Samuel e 1 Reis), abrangendo um período de 500 anos, que vai desde Moisés até Davi, mas isto não significa que não fosse conhecido.

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próprio Gênesis deixa isso implícito. Por que Deus haveria de estabelecer o sábado através de três atos distintos (descanso, bênção e santificação), se não estivesse pensando em Suas criaturas, feitas à Sua imagem e semelhança (Gên. 1:26-27)? Está claro que, em Gên. 2:2-3, Ele deu um exemplo a ser seguido por um ser comissionado a continuar a obra de criação (Gên. 1:28).13 E o exemplo divino fala mais alto do que qualquer ordem, principalmente para seres morais sem pecado, feitos à imagem e semelhança de Deus e em plena sintonia com a natureza do Criador. O imago dei deve ser também um imitatio dei. Se fomos feitos à semelhança de Deus, devemos agir à semelhança de Deus. “É voz corrente nas Escrituras que Deus terminou toda a criação em seis dias e descansou no sétimo, dando-nos um exemplo para que trabalhássemos seis dias e descansássemos no sétimo” (Adam Clarke’s Commentary). O agir de Deus é o modelo do agir humano.14

Um princípio estabelecido como exemplo divino não é menos obrigatório do que um enunciado por mandamento divino. As ações falam mais alto do que as palavras. O que torna qualquer preceito divino moral e universal? Não é o fato de ser um reflexo da natureza divina? Ora, poderia Deus ter dado mais clara revelação da natureza moral do sábado do que o tornando uma regra de Sua própria conduta? A ordem evangélica é: “Sede, pois, imitadores de Deus, como filhos amados” (Efés. 5:1)!

O Sábado Foi Santificado Por Deus. “Se não tivéssemos nenhuma outra passagem além desta (Gên. 2:3), ainda assim não haveria dificuldade em deduzir dela o preceito para a observância universal de um sábado, ou sétimo dia, a ser consagrado a Deus como tempo sagrado, por todos aqueles para quem a Terra e sua natureza foram especialmente preparadas. O primeiro homem certamente entendeu isto. A frase “[Deus] o santificou” não poderiam ter outro significado. Constituiria uma lacuna, a não ser que se referisse a alguém de quem se exigisse santificá-lo” (Lange’s Commentary, vol. 1, pág. 197). Essa também é a conclusão de George Bush, professor de Literatura Hebraica e Oriental da Universidade Municipal de Nova York: “O fato de Deus santificar um dia equivale a uma ordem divina para que o homem também o santifique” (Notes on Genesis 2:3).

O Êxodo Mostra Que o Sábado Era Mandamento no Gênesis. O próprio Êxodo declara a origem criacional do sábado. Ao inserir o mandamento do sábado no Decálogo pelo imperativo “Lembra-te”, Deus faz presumir a anterioridade do mandamento, pois remonta o sábado à referência histórica da 13 John H. Sailhamer. The Pentateuch as Narrative, págs. 96-97.14 Ver Derek Kidner, Gênesis: Introdução e Comentário, pág. 50.

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criação (Êxo. 20:8-11). Como poderiam os israelitas lembrar-se de algo que nunca haviam visto antes? O que era no Gênesis uma imitação voluntária da atitude divina, é no Êxodo, devido à mudança das condições humanas em virtude da Queda, uma determinação moral expressa sob a forma de mandamento.

O Sábado Foi Promulgado no Gênesis. Quanto à questão da promulgação da lei, é bom lembrar que, pelo menos a princípio quando a mente humana não sofrera ainda o impacto do pecado, Deus não precisou de fórmulas oficiais e solenes para tornar conhecidas as Suas leis. Implantou-as diretamente na consciência do homem, escreveu-as no coração dele, fazendo com que fossem conhecidas naturalmente (Rom. 2:15). O sábado, que é um dos mandamentos de uma dessas leis, foi transmitido a Adão e à sua posteridade quando Deus santificou esse dia, deixando assim um exemplo a ser seguido. Evidência disto é o próprio verbo usado em Gên. 2:3 falando da santificação do sábado. O verbo santificar ali, como em Êxo. 20:8, vem de qadash, definido pelo grande lexicógrafo Genesius como “pronunciar santo”, “instituir como coisa santa” (Hebrew Lexicon, pág. 914). Esse mesmo termo é usado repetidamente no AT para indicar proclamação pública (Jos. 20:7; Joel 1:14, 2:15; 2 Reis 10:20, 21; Sof. 1:7). Portanto, quando Deus declarou o sábado santo no Éden era como se estivesse oficialmente ordenando a Adão que, a partir dali, tratasse aquele dia como dia santo.

OBJEÇÃO No. 10: OS PATRIARCAS NÃO GUARDARAM O SÁBADO

ARGUMENTO: A ausência de um exemplo de observância do sábado no período patriarcal, isto é, de Gênesis 2 a Êxodo 16 (uma lacuna de 2.500 anos) é uma clara indicação de que o sábado em particular e os Dez Mandamentos em geral não eram conhecidos nem observados antes de Moisés.

RESPOSTA: Essa inferência não é tão clara como parece. A ausência de alusões explícitas ao sábado entre Gênesis 2 e Êxodo 16 não significa necessariamente que o princípio da observância deste dia fosse desconhecido no período compreendido entre Adão e Moisés.

A melhor explicação para o silêncio a respeito do sábado talvez seja a de que a observância do sábado simplesmente não foi mencionada porque era algo

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assumido e admitido como certo.15 Eis as razões que embasam este ponto de vista:

Silêncio Não Significa Negação. O fato de Gênesis não mencionar expressamente nenhuma lei a respeito do sábado não deve ser visto como algo excepcional. Silêncio sobre práticas estabelecidas não significa negação. Aliás, é preciso que se diga algo a respeito do extrair conclusões do silêncio. Os evangelhos nunca mencionam, por exemplo, que Jesus tenha beijado Sua mãe. Seria legítimo concluir-se daí que Ele jamais a beijou? Da mesma forma, seria injustificado inferir-se da ausência do mandamento do sábado que ele não tenha existido.

Não bastasse isso, temos um paralelo desse silêncio a respeito da observância do sábado no período compreendido entre os livros de Deuteronômio e 2 Reis, um espaço de tempo que cobre a jornada no deserto, os reinos de Saul, Davi e Salomão; a divisão do reino judaico etc. Dificilmente, porém, isto poderia ser interpretado como não-observância do sábado durante esse período, já que durante todo esse tempo a transgressão desse mandamento continuou a ser punido com a morte, e 2 Reis 4:23 mostra que era costume de Israel suspender os trabalhos aos sábados e visitar um profeta para receber instrução, além de referências incidentais aos sete dias da semana (1 Reis 20:29; 2 Reis 3:9; 1 Crôn. 9:25).

Ainda que o sábado não tivesse sido observado durante este período, isto não significaria que o sábado não era conhecido, mas somente que estava sendo negligenciado. Entre Josué e Neemias também existiu um período de quase mil anos em que não se observou a Festa das Cabanas (Nee. 8:17), significa isto, porém, que a festa era desconhecida? Evidente que não!

Evidências Bíblicas da Existência da Semana. Existem em Gênesis e nos primeiros capítulos de Êxodo evidências históricas circunstanciais que apontam para a existência de uma divisão setenária de tempo tanto antes quanto depois do Dilúvio. Há quatro referências a um ciclo de sete dias no relato do Dilúvio (Gên. 7:4, 10; 8:10, 12). Períodos de sete dias foram observados na festa nupcial de Jacó em Padã-Arã (Gên. 29:27-28). Menciona-se um período sétuplo ao ser Jacó perseguido pelo sogro, Labão e ainda outra vez um período de sete dias no funeral de Jacó (Gên 29:2, 28; 31:23; 50:10). Uma última referência diz respeito 15 A história prova que, geralmente, só se dá ênfase a uma coisa, quando esta coisa é questionada ou desafiada. Veja-se, como exemplo, o caso da violação comum do sábado antes e durante o exílio babilônico (Jer. 17:19; Eze. 20:13, 16, 21, 24; 22:8, 38), que levou os profetas a ressaltarem a devida observância desse dia (Amós 8:5; Isa. 1:13; 58:13-14; Eze. 20:12).

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ao período de condolências expressas pelos amigos de Jó (Jó 2:13). Ao que parece, todas essas cerimônias encerravam-se com a chegada do sétimo dia. Embora não se mencione um sétimo dia de descanso, sabe-se que o precedente para a divisão da semana em sete dias foi a divisão da obra da criação divina em seis unidades de tempo, coroadas por um sétimo dia de repouso (Gên. 2:2-3). Ora, se existia semana de sete dias (que não é subdivisão natural do ano solar ou do mês lunar), era porque existia o sábado, pois a semana só veio a existir devido à marcação cronológica do sábado.

Evidências Bíblicas da Existência da Lei. Por dedução sabemos que os ante-diluvianos conheciam a lei de Deus, inclusive o preceito do sábado. Segundo a Bíblia, o padrão aferidor de justiça são os Mandamentos de Deus (Sal. 119:172). Portanto se Jesus testificou que Abel, um dos filhos de Adão, era “justo” (Mat. 23:35), fez isso porque sabia que Abel era um guardador dos mandamentos, inclusive do sábado. Enoque “andou com Deus” (Gên. 5:22, 24). Andar com Deus é expressão escriturística indicadora de plena harmonia com a vontade de Deus (Deut. 13:4; Miq. 6:8; Efés. 5:1-2). Isto significa que Enoque também guardou a lei de Deus, lídima expressão de Sua vontade, inclusive o sábado. Adão viveu até o tempo de Noé, tendo tempo suficiente para ensinar aos antediluvianos o mandamento do sábado. Noé certamente aprendeu de Adão ou de algum descendente dele a prática de observar o sétimo dia. E Noé guardou os mandamentos de Deus, inclusive o sábado, porque a Bíblia diz que Noé era um pregador de justiça (Gên. 6:9; 2 Ped. 2:5) e o padrão aferidor de justiça só pode ser encontrado nos mandamentos (Sal. 119:172). Noé morreu apenas dois anos antes de nascer Abraão, sua nona geração.

A Bíblia diz explicitamente que Abraão foi um homem justo, obediente aos mandamentos de Deus (Gên. 18:19; 26:25). Visto que a lei ainda não havia sido escrita, esses mandamentos lhe foram dados oralmente (“Abraão obedeceu à Minha voz”). Ora, se Abraão guardou os mandamentos de Deus, é certo que também guardou o sábado, pois as “Minhas leis” reveladas a Abraão em Canaã eram sem dúvida as mesmas “Minhas leis” ratificadas 650 anos depois no deserto do Sinai. O Novo Testamento confirma essa linha de raciocínio: Tiago 2:23 declara que Abraão foi “chamado amigo de Deus” e, em João 15:14, Jesus define Seus amigos como aqueles que obedecem a Seus mandamentos.

Evidências Bíblicas da Existência do Sábado. O sábado é apresentado em Êxodo 16 e 20 como um preceito pré-mosaico, e em Êxodo 20:8-11 como um preceito que remonta à criação mundo (Gên. 2:1-3). A Bíblia dá a entender

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também, ainda por dedução, que havia uma primitiva observância do sábado. É dito, por exemplo, que Caim e Abel, por exemplo, costumavam apresentar a Deus periodicamente uma oferta num dia específico dedicado à adoração. “E aconteceu, ao cabo de dias, que Caim trouxe do fruto da terra uma oferta ao Senhor.” Gên. 4:3, RC. A expressão “ao cabo de dias” ou no “fim dos dias [de trabalho]” significa certamente no último dia da semana, no sétimo dia, o dia de adoração e repouso que fechava o ciclo semanal. Registra-se também que Lameque pôs no filho o nome de Noé (que significa “repouso), e deu a razão para tal: “Este nos consolará dos nossos trabalhos e das fadigas de nossas mãos, nesta terra que o Senhor amaldiçoou.” Note a sugestiva associação de idéias. Lameque expressa sua gratidão ao Criador por ter-lhes dado um dia semanal de descanso, o qual servia de tipo não temporário para o Descanso vindouro. Além disso, o Dilúvio começou no sétimo dia, um castigo bem apropriado para quem profanava o dia santo de Deus (Gên. 7:10).

“O sétimo dia era observado desde o tempo de Abraão; ou melhor, desde a criação. Os judeus identificaram sua própria história com a instituição do sábado. Eles o amavam e veneravam como um costume patriarchal.” (Alexander Campbell, in Debate on the Evidences of Christianity … Between Robert Owen … and Alexander Campbell, pág. 291).

OBJEÇÃO No. 11: AS LEIS OBSERVADAS POR ABRAÃO ERAM APENAS RITUAIS

ARGUMENTO: A presunção dos sabatistas de que as leis guardadas por Abraão incluíam os Dez Mandamentos é infundada. Os Dez Mandamentos só foram dados 430 anos depois do patriarca (Gál. 3:16). As leis de Gênesis 26:5 era constituídas somente de instruções circunstanciais (1 Cor. 14:37) ou preceitos cerimoniais (Gen. 21:4; Êxo. 8:27).

RESPOSTA: É verdade que os patriarcas foram instruídos explicitamente sobre ofertas (Gên. 4:3-4), altares (Gên. 8:20), sacerdócio (Gên. 14:18), dízimos (Gên. 14:20), circuncisão (Gên. 17:19), matrimônio (Gên. 2:24; 34:9) e outras ordenanças. Há, porém, sólidas evidências para crermos que as leis observadas por Abraão, como condição do pacto celebrado entre ele e Deus, abrangiam também os mandamentos constantes no código moral, e isto 600 anos antes de Moisés!

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Terminologia Especializada. O próprio contexto revela que Abraão também foi instruído quanto à lei moral. Repare nos termos hebraicos utilizados por Moisés para descrever os quatro tipos de legislações dadas ao patriarca por Deus: Abraão “guardou os meus mandados [mishmarti], os meus preceitos [miswoth ay], os meus estatutos [huqqoth ay] e as minhas leis [weth oroth ay]”. Aben Ezra acredita que esses termos abranjam tanto a legislação moral como a cerimonial e a civil.16 Se o sistema de leis de que Abraão dispusesse fosse apenas um código primitivo e limitado, por que o autor usaria terminologia tão especializada para referir-se à legislação daquela época? Não faz sentido.

Terminologia Idêntica à do Sinai. Mais surpreendente ainda é o fato de que a seqüência de termos hebraicos usados no Gên. 26:5 seja exatamente a mesma empregada em Deut. 11:1 com relação à obediência à aliança do Sinai: “Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, e todos os dias guardarás os seus preceitos [mishmarto], os seus estatutos [huqqoth ayw], os seus juízos [mishparayw] e os seus mandamentos [miswoth ayw].” Evidências como estas mostram que, vivendo 1650 anos depois de Adão e 430 anos antes da saída dos filhos de Israel do Egito, na antiga Ur dos Caldeus, Abraão efetivamente conhecia os mandamentos morais de Deus e os observava.17 Seus descendentes também eram fiéis observadores dos mandamentos.

Lei Interior e Exterior. Depois da morte de Jacó e de José, porém, os filhos de Israel tornaram-se escravos no Egito. Os egípcios não observavam o sábado nem os outros mandamentos de Deus. Pelo contrário, durante várias gerações (150 a 170 anos) obrigaram os israelitas não somente a não adorarem o Deus verdadeiro, mas também não observar-Lhes os mandamentos. Era, portanto, necessário que os israelitas, ao serem libertados daquela terra pagã, fossem reeducados no conhecimento de Deus. Daí a razão da parada no Sinai para receberem a lei, não pela primeira vez, como imaginam muitos, mas como uma recapitulação mais detalhada das leis com as quais a geração anterior ao cativeiro estava familiarizada. Foi somente devido ao obscurecimento da luz da razão e do desvio da vontade que se tornou necessário o registro externo dos mandamentos, pois já estava escrito no coração desde o princípio.

16 John Gill’s Expositor.17 Expositor’s Bible Commentary. (ver Mixná, m. Qiddushin 4:14).

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ÊXODOOBJEÇÃO No. 12: NO SÁBADO NINGUÉM PODE SAIR DE CASA

ARGUMENTO: Para se guardar o sábado devidamente, neste dia ninguém podia sair de casa (Êxodo 16:29). Isto torna o mandamento impraticável em nossos dias.

RESPOSTA: Essa é uma visão distorcida e radicalizada da passagem. Além do mais, o texto de Êxodo 16:26 foi nitidamente retirado de seu contexto. O sábado não é um dia de indolência, como supõem alguns. Evidentemente a ordem "ninguém saia do seu lugar [isto é, do acampamento] no sétimo" não tencionava que as pessoas deviam ficar estáticas e paralisadas durante as 24 horas do sábado ou que passassem o dia dormindo, encerradas entre quatro paredes. O versículo 27 esclarece o sentido: Ninguém deixe o acampamento para "colher maná". Ou seja, ninguém se mexa no sábado para fazer coisas proibidas pelo mandamento. Para as coisas lícitas, havia sim e ainda há livre trânsito e perfeita mobilidade. Mesmo porque repouso não é inércia.

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Note que, apesar de Êxodo 20:8-11 ordenar a cessação de todas as obras servis, o texto paralelo de Levítico 23:3 ordena reunião de culto. (ver Sal. 42:4; Luc. 4:16; Atos 16:13). Ezequiel 46:1 diz: “A porta do átrio interior, que olha para o oriente, estará fechada durante os seis dias que são de trabalho; mas no sábado ela se abrirá e também no dia da Festa da Lua Nova”.

Alguns acham que a proibição também tenha relação com o empreender longas viagens desnecessárias no dia de sábado. — VER OBJEÇÃO 16 (OCIOSIDADE

NO SÁBADO).

OBJEÇÃO No. 13: A LEI ERA SOMENTE PARA OS LIBERTOS DO EGITO

ARGUMENTO: Êxodo 20:2 dá a entender que os Dez Mandamentos só se aplicava aos judeus, pois só eles é que foram tirados do Egito; Não somos obrigados a obedecer a esta lei, porque nunca fomos escravos no Egito. Outros textos confirmam esse ponto de vista (Êxo. 34:27-28; Deut. 4:13; 5:2, 3; 9:9; 1 Reis 8:9, 21; 2 Crôn. 6:11; Heb. 9:1, 4).

RESPOSTA: A idéia de que o Decálogo se aplicava somente aos libertos do cativeiro egípcio não somente é ridícula, senão também que desconsidera algumas particularidades óbvias:

A Lei é Anterior ao Sinai. A lei moral, resumida e registrada por escrito no Decálogo, surgiu pela primeira vez no tempo de Moisés. Tinha uma pré-existência de mais vinte séculos antes de Israel surgir no cenário mundial. “Temos evidência explícita que [os Dez Mandamentos] estavam em vigor e foram sancionados antes do Sinai. . . . Visto que não começaram a ter relevância no Sinai, semelhantemente não cessaram de ter relevância quando a economia mosaica foi ab-rogada.” J. D. Douglas, O Novo Dicionário da Bíblia, art. “Ética Bíblica”.

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OS DEZ MANDAMENTOS EM GÊNESIS

Primeiro — Gênesis 35:2-4Segundo — Gênesis 31:19-34Terceiro — Gênesis 12:3Quarto — Gênesis 2:1-3; Êxodo 16:4-26Quinto — Gênesis 9:20-25Sexto — Gênesis 4:8-15Sétimo — Gênesis 39:7-9Oitavo — Gênesis 44:8-16Nono — Gênesis 27:12Décimo — Gênesis 25:29-34; 27:1-45.

Nenhuma Distinção Entre Judeu e Gentio. A Escritura ensina que não há distinção ética entre judeu e grego (Atos 21:20; Rom. 10:12). Se formos adiante com a tolice de que os mandamentos proclamados por Deus no Sinai foram impostos somente aos judeus ou se limitarmos o uso da palavra judeu apenas a este segmento da espécie humana, havermos de concluir que o mandamento “não furtarás” deve ser obedecido somente pelos judeus ou então entender que o "Deus dos hebreus" (Êxodo 7:16; 9:13) não é o Deus de toda humanidade ou ainda que Ele só criou os judeus, e descambaremos assim para inconciliável absurdo.

Os Princípios da Lei São Universais. A realidade dos fatos, porém, não é esta. Deus criou Sua lei, não somente para os judeus, mas como “luz para as nações”. Isa. 51:4, NVI. Os princípios morais contidos no Decálogo (dentro do qual está inserido o sábado) são princípios de alcance mundial e obrigação perpétua. Governam a ordem moral do universo. Nele se assentam as bases para as relações de respeito, harmonia e estabilidade dentro de qualquer sociedade. Serve para reger a conduta das nações, das famílias e dos indivíduos de todas as terras e de todas as épocas.

A Lei Foi Entregue no Deserto. Um rabino diz que o fato de a lei ter sido entregue num deserto e não dentro de um espaço território nacional indica sua universalidade. Ocorreria com o deserto o mesmo que ocorre com a região do alto mar, chamada de águas internacionais, que fica além do mar territorial ou jurisdicional de cada Estado (faixa marítima adjacente ao litoral e que se estende por cerca de 200 milhas marítimas). O Decálogo teria sido entregue à humanidade, e não à determinada nação, visto ter outorgado no deserto, isto é, em “areias internacionais”.

O Preâmbulo da Lei Não é a Lei. O fato de, em Êxo. 20:2, Deus ter-se dirigido primariamente a Israel ao outorgar o Decálogo (por volta de 1250 a.C.), não é prova de que a lei moral se restringe a Israel, como alegam alguns. Repare que o texto da lei só começa realmente no versículo 3. O versículo 2 não é parte integrante da lei. Constitui apenas um preâmbulo e prólogo histórico, conforme a estrutura dos tratados reais da época, nos quais o rei (neste caso Deus) Se identifica aos israelitas, para que soubessem quem era o Legislador daquela lei que estava sendo promulgada, e depois, para que se fizesse memória das circunstâncias históricas do acontecimento, esboça seus atos de misericórdia para com os súditos.18 Só depois deste cabeçalho oficial é que vem as

18 John L. McKenzie, Dicionário da Bíblia, art. “Decálogo”.

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estipulações legais. A lei propriamente dita, segundo os testemunhos do historiador judeu Josefo e do filósofo judeu Filo, compreende somente os versículos 3 a 17, e nada tem que ver particularmente com o fato de haver Deus tirado Israel do Egito. A expressão “Eu sou o Senhor teu Deus, que te tirei da terra do Egito” não qualifica a lei, mas sim a Deus. Portanto, se a libertação de Israel afeta alguma coisa, então afeta, não a Lei, mas ao Senhor. E neste caso, Deus não seria Deus de Noé, nem de Abraão porque não os tirou do Egito. Nem seria Deus dos cristãos, pois também não foram por Ele libertos do Egito, pelo menos não do Egito material.

Todo Cristão é Israelita Espiritual. Ainda que a lei se limitasse somente a Israel, os cristãos não estariam isentos, pois, em certo sentido, todos fomos libertos do Egito. Visto que as Escrituras consideram o Egito símbolo da condição de pecado (ver Apoc. 11:8), o livramento de Israel do Egito pode ser apropriadamente comparado ao livramento do povo de Deus do poder do pecado. O Senhor libertou Seu povo da terra de Faraó a fim de outorgar-lhes Sua lei (Sal. 105:422-45). Semelhantemente, por meio do evangelho, Cristo nos liberta do cativeiro do pecado (João 8:34-36; 2 Ped. 2:19) a fim de que possam guardar a Sua lei, que nEle se traduz em verdadeira obediência (João 15:10; Rom. 8:1-4). Que todos quantos ensinam que o evangelho de Cristo nos libera da obediência aos santos mandamentos do Decálogo reflita sobre esta verdade. A libertação do Egito devia servir de motivação para a obediência à lei de Deus. Observe a seqüência: primeiro o Senhor salva Israel, depois lhe entrega a lei que devem guardar. Existe a mesma ordem sob a dispensação evangélica. Cristo primeiro nos salva do pecado (ver João 1:29; 1 Cor. 15:3; Gál. 1:4), depois introduz Sua lei em nosso coração para que esta possa governar nosso comportamento na esfera da redenção (Gál. 2:20; Rom. 4:25; 8:1-3; 1 Ped. 2:24)” (The Seventh-day Adventist Bible Commentary, sobre Êxo. 20:2).

A vontade de Deus expressa no Decálogo (Rom. 2:18) é para todos os seres humanos. A lei moral, quer os homens a conheçam quer não, e ainda que tenham desenvolvido costumes contrários a ela, não lhe diminui a universalidade. Não faz sentido, portanto, ficar limitada a um só povo ou nação. — VER OBJEÇÕES 18 (A LEI SOMENTE PARA OS JUDEUS) e 23 E 34 (SÁBADO COMO INSTITUIÇÃO JUDAICA).

OBJEÇÃO No. 14: O SÁBADO NÃO EXISTIU ANTES DO SINAI

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ARGUMENTO: O mandamento do sábado só veio a existir no Sinai (Êxodo 20), quando o Decálogo foi promulgado. A própria palavra lei (lex) deriva de legere (ler), portanto a lei tem que ser escrita.

RESPOSTA: Em resposta a essa objeção, diversas coisas precisam ser observadas.

O Sábado no Éden. A primeira coisa é que o sábado é tão antigo quanto o mundo (Gên. 2:2-3). Foi criado 2.500 anos antes do Sinai, sendo um mandamento anterior à promulgação formal de todas as leis, quer cerimoniais quer morais. Nesse sentido, o quarto mandamento é uma invocação da lembrança do sábado edênico.

O Sábado no Egito. A segunda coisa é que a observância do sábado foi reimplantada, antes do Sinai, enquanto Israel ainda se achava no cativeiro egípcio. Os feitores egípcios tinham tentado forçar os israelitas a violarem o sábado, acrescentando trabalho e tornando as condições mais cruéis e opressivas. Moisés e Arão instituíram uma reforma na observância do sábado, instruindo os israelitas a descansarem no sétimo dia. Ao ser notificado deste fato, Faraó reclamou: “Por que, Moisés e Arão, por que interrompeis o povo no seu trabalho? Ide às vossas tarefas. . . O povo da terra já é muito, e vós o distraís das suas tarefas” (Êxo. 5:4-5). Acontece que o verbo traduzido no versículo 5 por “distrair”, no original hebraico é shabath, o mesmo termo usado em Gên. 2:2-3. Numa tradução mais fiel teríamos: “O povo da terra já é muito, e vós o fazeis descansar no sábado de suas tarefas”.19 Na verdade, um dos propósitos para os quais Deus retirou Seu povo Israel do Egito foi para que pudessem observar o Seu santo sábado sem embaraços.

O Sábado no Deserto. A terceira coisa é que a Bíblia apresenta claramente em Êxodo 16 a atenção do povo sendo dirigida para a santidade do sábado, ainda no deserto de Sim, pelo menos três meses antes de a lei ser promulgada no Sinai por meio do milagre do maná (Êxodo 19:1). Somente neste capítulo o sábado é citado nada mais nada menos que quatro vezes associado a regras atinentes à coleta e preparo do maná (vers. 23, 25, 26, 29). Durante um período de quarenta anos (ou seja, 2080 sábados consecutivos) de vagueações no deserto, o milagre do maná os fez recordar esse esquema de seis dias de trabalho e um de descanso, pois caía somente de domingo até sexta-feira. Ou

19 A idéia de uma observância do sábado durante o cativeiro egípcio pode ser depreendida do Livro de Jasar 70:41-51.

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seja, Deus enviava o maná durante seis dias, e o povo o recolhia durante seis dias, mas descansava no sábado.

Alem dessas, encontramos nas Escrituras outras evidências da anterioridade do sábado:

(1) Quando a ordem para não sair em busca do maná no sábado, como uma prova de obediência aos mandamentos de Deus, foi desconsiderada por alguns do povo, Deus reclamou: “Até quando recusareis guardar os meus mandamentos e as minhas leis?” (v. 28). Essa frase dá a entender que a desobediência não era um fenômeno novo. A expressão “até quando?” implica que a violação da lei era problema já existente. De acordo com Jamieson, Fausset and Brown Commentary, “... o sábado é mencionado incidentalmente ao considerar o miraculoso suprimento de maná e não se dá a mínima sugestão de que ele estava sendo instituído pela primeira vez naquela ocasião”. (Ver Êxo. 16:23).

(2) O verbo “dar” (nathan) do versículo 29, quando usado em relação ao sábado é conjugado no tempo passado em contraste com a mesma palavra, no mesmo versículo, usado em relação ao maná, que é flexionado no tempo presente. Isso é uma prova adicional que os israelitas já estavam familiarizados com sábado. O maná era uma novidade; o sábado, não!

(3) No versículo 30, quando se relata que o povo descansou no sétimo dia, o verbo usado para “repousar” é o mesmo encontrado em Gênesis 2:3, quando se afirma que Deus descansou no sétimo dia: shabat. Moisés poderia ter empregado outro termo, já que o hebraico possui pelo menos uma dúzia de outros verbos para traduzir a idéia de “descansar.”

(4) Três meses depois, quando o preceito é inserido no Decálogo, Deus o introduz pelo imperativo. A própria palavra “lembra-te”, na abertura do mandamento (Êxo. 20:8), fazia memória da criação e implicava que não era a primeira vez que eles travavam conhecimento com o sábado, “algo já conhecido e reconhecido como período de repouso sagrado” (Jamieson, Fausset and Brown Commentary, sobre Êxo. 20:8).

Essas menções bíblicas do sábado antes do Sinai são uma prova irrefutável de que o santo sábado do Senhor não se originou com a legislação sinaítica, pois em Êxo. 20:8-11 ele é fundamentado nas ordenanças da Criação (Gên. 2:2-3). O sábado é anterior à Lei de Moisés, e “tem existido desde o princípio do mundo” (Luther’s Works, XXXV, pág. 330).

Opiniões Teológicas Abalizadas. Com base nessas certezas, temos de concordar com o teólogo judeu Martin Buber, quando afirma que o sábado “não

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foi introduzido pela primeira vez no deserto de Sim, onde se encontrou o maná. Ele aqui é proclamado como algo que já existia.” — Moses, pág. 80.

De acordo com o erudito Gerhard Hasel, Êxodo 16 “revela que a instituição do sábado era conhecida antes da outorga da lei no Monte Sinai e antes do seu aparecimento no deserto de Sim.” — “The Sabbath in the Pentateuch”, in The Sabbath in Scripture and History, ed. Kenneth Strand, pág. 27

“Há evidências de que este dia [o sábado] era de alguma forma observado pelo povo judeu antes deste mandamento ser dado a Moisés. O dia é mencionado pela primeira vez no Antigo Testamento em ligação com a queda do maná, sendo até mesmo referido como algo com que os israelitas já estavam familiarizados. A legislação sinaítica, conforme os escritores mencionam, simplesmente deu força de lei a um costume já existente” (Vincent J. Kelly, Forbidden Sunday and Feast-Day Occupations, págs. 15-16).

A Razão da Outorga da Lei. Se o Decálogo em geral e o sábado em particular já existiam, porque codificá-los no Sinai? Agostinho responde: “Deus escreveu nas tábuas da lei aquilo que os homens não conseguiam ler em seus corações” (Enarratio in Psalmos, 57,1). A Lei, a princípio, não foi escrita externamente. Isso não era necessário, pois os mandamentos haviam sido escritos interiormente no coração de Adão e Eva bem como no de seus descendentes. Além disso, após a Queda, os preceitos foram passados fielmente de pai para filho pela tradição oral. No entanto, após o Dilúvio, a raça humana entrou num processo de degeneração física e mental acentuada. A mente humana, depravada pelo pecado, tornou-se incapaz de lembrar, entender e interpretar corretamente a vontade de Deus. Fez-se necessário o surgimento de uma lei exterior, objetiva. A Lei também foi escrita formalmente no Sinai para lembrar ao povo de Deus aquilo que de que haviam esquecido durante os 400 anos de escravidão egípcia. — VER OBJEÇÕES 28, 32, 82 E 98 (LEI SÓ NO SINAI).OBJEÇÃO No. 15: PARA GUARDAR O SÁBADO É PRECISO TRABALHAR SEIS

DIAS COMPLETOS

ARGUMENTO: O quarto mandamento diz que só devemos descansar no sábado depois de trabalhar seis dias completos (Êxodo 20:9). Isto significa que o sabatista que trabalha só uma jornada de trabalho de 40 horas semanais, não observa o sábado conforme o mandamento.

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RESPOSTA: Será que pelo fato de o mandamento dizer que devemos trabalhar seis dias, impõe a obrigação de trabalharmos exata e necessariamente 144 horas completas por semana, sem as oito horas de sono diárias? Nunca poderemos tirar férias? Nunca poderemos ficar doentes? E se nos tornarmos inválidos? Não, a coisa não é bem assim. Falta bom senso a esta interpretação.

Se examinarmos com atenção, veremos que o tempo imperfeito traduzido tradicionalmente como mandamento “trabalharás” é mais uma nuança de permissão. O ponto focal do mandamento é a proibição do trabalho no sétimo dia.20

Além disso, o mandamento não acaba com a ordem: “seis dias trabalharás”, mas continua a dizer “e farás toda a tua obra.” A ordem é para fazer o trabalho dos seis dias dentro dos seis dias e não para preencher todo o número de horas dos seis dias. Se o trabalho pode ser feito e concluído dentro deste período, não há dificuldade. O importante é realizarmos nossas obras pessoais dentro do limite dos seis dias, de modo que o sábado seja reservado para repouso espiritual e comunhão com Deus. A observância do sábado independe do trabalho nos seis dias. Quer trabalhemos nos dias anteriores, quer não, precisamos guardar o sétimo dia.

OBJEÇÃO No. 16: NO SÁBADO NÃO SE PODE FAZER NADA

ARGUMENTO: O quarto mandamento diz que não devemos fazer nenhum tipo de trabalho no sábado (Êxodo 20:10). Isto é humanamente impossível.

RESPOSTA: O mandamento não ordena absolutamente que as pessoas, para observarem o mesmo ritmo de serviço a Deus no mundo criado, devam passar 24 horas como múmias paralíticas, encasteladas em quatro paredes. De maneira nenhuma! O que se tem em vista aí propriamente não é a ação ou a inação em si, mas a intenção por detrás da ação. O preceito não proíbe radicalmente todas as ações (se fosse assim, não poderíamos nem respirar!), mas somente as que não se acham de acordo com a santidade do sábado — “tua obra [humana]”.21 O 20 Nota de estudo da Bíblia NET (New English Translation) para o versículo.21 Note que o mandamento divide a semana em duas partes: Seis dias dedicados ao trabalho e o sétimo reservado para o descanso e adoação. A palavra usada para trabalho aí é melakhah, termo que abrange apenas os trabalhos de natureza secular, comum ou servil. Outras passagens bíblicas ajudam a lançar luz adicional sobre o assunto, ao definirem especificamente algumas atividades que profanam a santidade do sábado, como cozer ou assar alimentos (Êxo. 16:23), recolher maná (Êxo. 16:26-30), arar a terra e colher frutos (Êxo. 34:21), acender fogo (Êxo. 35:3), apanhar lenha (Núm. 15:32), transportar cargas (Jer. 17:21-22), comprar e vender, (Nee. 10:31; 13:15-22), pisar lagar

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mandamento não proíbe as obras de misericórdia nem o trabalho essencial para a preservação da vida e da saúde que não pode realizar-se em outros dias. Sempre é lícito fazer o bem no sábado (Mat. 12:1-14).

Mesmo em Israel o sábado não era dia de total inatividade, pois os sacerdotes prosseguiam normalmente em seus serviços. Era nesse dia que se trocavam os pães da proposição (ver Lev. 24:8). No sábado havia a adição de um sacrifício especial (ver Núm. 28:9-10). Em certos casos, o rito da circuncisão era oficiado em dia de sábado (ver Lev. 12:3; cf. João 7:22). Mas a convocação sabática (ver. Lev. 23:1-3) denotava ser esse dia reservado ao povo para fins de adoração ao Senhor. Ver McClintock and Strong’s Cyclopedia, art. “Convocation”. É como diz Jó 37:7, “Assim, torna Ele inativas as mãos de todos os homens, para que reconheçam as obras dEle.”

Nenhuma Fórmula Padronizada. Não existe, porém, nenhuma fórmula padronizada que determine quais atividades são apropriadas ou não para o sábado, mesmo porque as necessidades físicas e mentais das pessoas variam e as tentativas de classificar ou especificar atividades sabáticas lícitas ou ilícitas geralmente degeneram em restrições opressivas, sufocando o espírito de liberdade e recreatividade do sábado. Em vez de prescrever uma fórmula normativa, a Bíblia parece sugerir quatro diretrizes simples:

1) O sábado deve ser um dia de adoração, estudo das Escrituras e louvor espiritual (Êxo. 20:8-11; Lev. 23:2; Luc. 4:16; Sal. 92).

2) O sábado deve ser um dia de descanso físico e mental (Êxo. 20:8-11)3) O sábado deve ser um dia de companheiro com a família, com os amigos e

com Deus (Mat. 12:8)4) O sábado deve ser um dia de boas obras (Mat. 12:12).

Como se pode ver, o descanso do sábado é um descanso dinâmico e não de ócios. O quarto mandamento não proíbe atos de misericórdia, atividades essenciais à preservação da vida e da saúde e trabalhos relacionados com os serviços religiosos (como dos profissionais da saúde, dos ministros evangélicos etc.) que não podem ser realizadas noutro dia (Núm. 28:9; Mat. 12:5; João 7:23). É sempre “lícito fazer bem aos sábados” (Mat. 12:1-14; Mar. 2:23-29). Por aí se vê que a expressão “nenhuma obra” não é tão absoluta assim, mas comporta (Nee. 13:15), comerciar (Amós 8:5), fazer viagens seculares ou desnecessárias (Atos 1:12) etc. Embora algumas dessas atividades não sejam mais praticadas em nossos dias ou difiram em nossa cultura, o princípio por detrás da proibição permanece o mesmo e deve ser contextualizado. — Catholic Encyclopedia, art. “Sabbath”.

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exceções religiosas e humanitárias (ver Isa. 58:6-14). Mesmo quando proíbe determinadas atividades (Isa. 58:13-14; Mat. 12:1; Luc. 13:15-16; 14:1), o principal objetivo não é cercear, mas desobstruir tudo quanto impeça a dedicação exclusiva a Deus naquele dia, a qual inclui não só o culto jubiloso quanto o descanso conveniente do espírito e do corpo. — VER OBJEÇÃO 12 (IMOBILIDADE NO SÁBADO).

OBJEÇÃO No. 17: O SÁBADO NÃO SUSCITA CONVICÇÃO MORAL

ARGUMENTO: O sábado não é um mandamento moral, pois a consciência natural não acusa aquele que trabalha no sábado como acusa os que matam, roubam ou adulteram.

RESPOSTA: É crasso erro supor que a obrigação moral de obedecer a mandamentos seja questão de consciência.

Teoria Filha do Escolasticismo. Primeiro porque a noção de que o Decálogo se baseia na Lei Natural ou nela se apóia não é bíblica, mas é manufatura do escolasticismo (influenciado por filosofia moral clássica). Na Bíblia, tanto o sábado como o restante dos mandamentos derivam, não da razão humana, mas da revelação divina.

A Consciência Não é Guia Seguro. Segundo porque esperar que a consciência defina o que é certo e o que é errado é uma forma muito subjetiva de resolver questões éticas. A consciência humana nunca foi, não é e nunca será um guia seguro para se decidir a verdade, pois está maculada pelo pecado. Há consciências acomodadas, enfraquecidas, corrompidas e até mesmo cauterizadas (1 Tim. 4:2; 1 Cor. 8:7), para as quais a luz é trevas, e as trevas são luz (Isa. 5:20). Um psicopata pode estripar vítimas indefesas e achar isso um comportamento perfeitamente normal. Índios e nativos antropófagos podem matar impiedosamente e devorar seus semelhantes sem o mínimo escrúpulo.

Revelação Divina. Não, a religião cristã não se baseia num critério tão subjetivo e sujeito à falha como a razão ou a consciência, mas na revelação específica e definida de Deus em Sua Palavra escrita. Ora, se Deus escreveu toda a Bíblia pela intermediação de homens santos inspirados pelo Seu Espírito, foi mais escrupuloso com relação àquele que seria o código moral pelos qual os seres humanos pautariam sua conduta: os Dez Mandamentos (onde está inserido

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o sábado). Teve o cuidado de outorgá-los pessoalmente, proferindo-os com Sua própria voz e escrevendo-os com Sua própria mão em tábuas de pedra.

Apesar disso, quase a totalidade dos povos do mundo, de todas as épocas, crentes ou não, concordam, ainda que inconscientemente às vezes, com a necessidade de um dia semanal para repouso e práticas religiosas, embora possam divergir quanto a que dia seja este. Por que é tão difundida essa intuição?

Necessidade Física e Espiritual. A resposta é simples: Deus projetou uma pausa semana para interrompermos a rotina maquinal do cotidiano a fim de considerarmos o propósito da vida. Ao fazer isso inseriu em nossa fisiologia um ritmo semanal capaz de governar a alternância de trabalho e descanso. Mas não é somente a necessidade biológica do organismo humano de descanso que explica esse ritmo setenário. Existe também uma necessidade moral e espiritual da mente humana de um dia para se curvar perante o seu Deus Criador.

O único dia que realmente satisfaz este requisito material e espiritual é o sábado. Para a humanidade que vive um ritmo de vida tão frenético e desequilibrado como homem, o sábado, como subtração ao ciclo excessivamente absorvente dos interesses terrenos, representa uma volta semanal ao Éden e à retomada da consciência de que tudo é obra de Deus. O sábado é um oásis no tempo para descanso físico e mental, união familiar e social, ensino bíblico e meditação e refrigério espiritual. — VER OBJEÇÕES 19, 20, 31 E 101 (SÁBADO NÃO MORAL).

OBJEÇÃO NO. 18: O DECÁLOGO ERA UMA LEI ADAPTADA SOMENTE À CULTURA ISRAELITA

ARGUMENTO: Êxodo 20:10, 17, onde se fala de escravos e animais como meio de transporte, é forte prova de que os Dez Mandamentos se destinavam somente à cultura israelita em sua fase agropastoril. Era uma lei meramente nacional e local, com referências específicas a condições culturais e sociais judaicas. Não pode ser aplicada aos cristãos da atualidade.

RESPOSTA: Um princípio hermenêutico reza que todo mandamento ou “texto bíblico deve ser considerado normativo para qualquer pessoa de qualquer sociedade em todas as épocas, a menos que a própria Bíblia restrinja o público”

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(J. Robertson McQuilkin, Understanding and Applying the Bible, pág. 245.) E a Bíblia não faz isso com relação ao Decálogo.

Se seguirmos o raciocínio vicioso de que revelação de Deus aos israelitas deve ser rejeitada pelo fato de ter sido adaptada e acomodada às condições e circunstâncias de tempo e de lugar em que eles viviam, teremos que rejeitar não só a Bíblia, mas a própria religião cristã, já que ambas procedem dos judeus. A razão da escolha dos judeus reside meramente no fato de serem na época o povo que tinha as condições necessárias para ser porta-voz de Deus na Terra. Foi por isso que foram escolhidos para receber e comunicar a verdade divina a outras nações (Deut. 28:9-10; 7:6). Do ponto de vista espiritual, não “há distinção entre judeu e grego, uma vez que o mesmo Deus é Senhor de todos”. Rom. 10:12

Princípios Intemporais. Além disso, “os princípios morais incorporados no Decálogo, a saber, lealdade, adoração, reverência, santidade, respeito aos pais, pureza, honestidade, veracidade e contentamento, são princípios que transcendem fronteiras raciais, lingüísticas e culturais. A aplicação destes princípios pode variar no tempo, mas sua verdade essencial é intemporal.

“O décimo mandamento condena cobiçar ‘a casa do teu próximo; . . . nem o seu servo, nem a sua serva, nem o seu boi, nem o seu jumento” (Êxo. 20:17). Obviamente hoje a maioria das pessoas não cobiça mais o animal do seu próximo, mas seus automóveis, barcos, piscinas etc. Isto significa que a forma de cobiça mudou, embora seu princípio subjacente continue o mesmo. Se as pessoas de hoje não fossem mais cobiçosas, falsas, desonestas ou desleais etc., então ficaria óbvio que os princípios do Decálogo que condenam esses pecados não seriam mais relevantes. Mas isto está bastante longe da verdade. A experiência nos diz que, se já houve um tempo em que a orientação moral dos Dez Mandamentos fosse necessária, esse tempo é hoje” (Samuele Bacchiocchi, The Sabbath in the New Testament)

A lei de Deus aplica-se não somente a lugares e raças, a dias e estações, a condições e circunstâncias, mas também em relação aos séculos. Adapta-se tanto a um povo agrícola, como a um povo comercial, industrial ou cibernético. Seu significado transcende o tempo, o espaço e a liturgia. É universal. — VER OBJEÇÕES 13 , 23 E 34 (SÁBADO COMO INSTITUIÇÃO JUDAICA).

OBJEÇÃO No. 19: O SÁBADO NÃO É MANDAMENTO MORAL

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ARGUMENTO: O sábado não é mandamento moral. Todos os outros nove estabelecem regra para a conduta humana (Êxodo 20). O sábado, não, é apenas uma forma exterior e regular de culto.

RESPOSTA: Em todos os debates sobre o sábado, um ponto de discussão recorrente é se a observância desse dia é uma questão moral ou não. Para alguns, a idéia de abster-se do trabalho nada tem que ver com a moralidade ou a ética. Para entendermos o assunto, precisamos, portanto, definir primeiramente moralidade. Vamos fazê-lo partindo de uma premissa bíblica básica.

Amor a Deus e ao Próximo. Perguntado sobre qual era o maior dos mandamentos, Jesus respondeu que era o amor supremo a Deus e acrescentou que este era o princípio sobre o qual se apoiava toda a lei moral (Mat. 22:36-40). Concluímos desta declaração de Jesus que o mais elevado tipo de moralidade é o amor a Deus

O Dr. Albert Barnes, notável comentarista presbiteriano, afirma: “As leis dos judeus estavam geralmente divididas em morais, cerimoniais e judiciais. As leis morais são as que emanam da natureza das coisas, e não podem, por conseguinte, ser mudadas — tais como o dever de amar a Deus e a Suas criaturas. Estas não podem ser abolidas, pois jamais poderá ser correto odiar a Deus ou aos nossos semelhantes. Dessa natureza são os Dez Mandamentos; e estes nosso Salvador nunca aboliu nem substituiu” (Notes, Explanatory and Practical, ond the Gospel, vol. I, pág. 65).

A Inclusão no Decálogo. O próprio fato de ter Deus incluído o sábado do sétimo dia na lei dos Dez Mandamentos é forte evidência de que este sábado não pertencia ao sistema cerimonial. Agora perguntamos: O sábado é parte integrante dos Dez Mandamentos? Sim (Êxo. 20:8-11). O sábado diz respeito ao nosso amor a Deus? Sim. Provamos nosso amor a Deus quando adoramos a Deus no dia por Ele estabelecido? Sim (1 João 5:3). Provamos nosso amor ao próximo quando o liberamos no sábado do compromisso de trabalho que ele tem conosco? Sim. Neste caso, a adoração a Deus é uma questão moral. É uma expressão de nosso amor a Deus; também é uma expressão de nossa misericórdia e amor para com nossos familiares, hóspedes, empregados e animais, na medida em que permitimos que “tomem alento” no dia do Senhor (Êxo. 23:12). Visto dessa perspectiva, portanto, o sábado é um mandamento moral, visto requerer tempo exclusivo para adoração e serviço a Deus.

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Cristo Contrastou o Sábado com a Lei Cerimonial. O próprio Cristo diferenciou o sábado de qualquer preceito cerimonial quando declarou: “Se o homem pode ser circuncidado (rito cerimonial) em dia de sábado (mandamento moral), para que a lei de Moisés (código cerimonial) não seja violada, por que vos indignais contra mim, pelo fato de eu ter curado, num sábado (mandamento moral), ao todo, um homem?” João 7:23. Note como Cristo dissocia o sábado de práticas cerimoniais, no caso específico: a circuncisão. Paulo faz parecido quando estabelece o seguinte contraste: “A circuncisão não significa nada, e a incircuncisão também nada é; o que importa é obedecer aos mandamentos de Deus” 1 Cor. 7:19, NVI.

Karl Barth e muitos outros teólogos se referem ao quarto mandamento como o mais importante do Decálogo precisamente pelo fato de tratar da adoração, pois reconhecem ser a adoração a fonte de toda moralidade. — VER OBJEÇÕES 17, 20, 31 E 101 (SÁBADO NÃO MORAL).

OBJEÇÃO No. 20: O SÁBADO É PARCIALMENTE MORAL E PARCIALMENTE CERIMONIAL

ARGUMENTO: O mandamento do sábado contém um elemento cerimonial (a especificação do sétimo dia) e um elemento moral (o princípio do repouso de um dia em sete). Êxodo 20:8-11. Quando Jesus morreu o aspecto cerimonial do sábado foi abolido, ao passo que a parte moral foi transferida para o domingo, que lembra a criação nova, inaugurada com a Ressurreição de Cristo.

RESPOSTA: Esta fissão arbitrária e artificial do sábado em duas partes — uma moral e uma cerimonial — baseia-se mais em ficção do que em fatos. Apesar de sua popularidade, desconsidera as seguintes evidências em favor de um sábado inteiramente moral:

O Hidibrismo Sabático é de Origem Humana. A distinção é artificial e jamais foi ensinada ou sequer sugerida pela Bíblia. Foi introduzida somente trezentos anos depois de Cristo, com o fim específico de dar sanção teológica à legislação imperial de Constantino que ordenava o repouso no domingo. O principal expositor e defensor dessa teoria foi Tomás de Aquino em sua famosa Summa Theologica. Os reformadores do século dezesseis adotaram essa doutrina tomista, produto do escolasticismo, a qual passou a quase todos os protestantes históricos, pentecostais, neopentecostais e independentes de nossos dias.

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O Sábado é Anterior à Lei Cerimonial. Quando o sábado foi criado (Gên. 2:2-3) não havia lei cerimonial, porquanto o homem ainda não havia pecado. Como poderia então ser o sábado um mandamento cerimonial, quer na íntegra quer parcialmente? A razão pela qual o sábado deve ser observado — a criação dos céus e da terra — é uma razão cósmica que jamais aparece relacionada a nenhum preceito cerimonial, cultural ou nacional. Diferentemente de um preceito cerimonial, o sábado não inclui aspectos rituais como sacrifícios. Meramente convida a humanidade a repousar de suas atividades seculares e santificar o dia apontado por Deus. É memorial; não cerimonial.

O Sábado é Parte Integrante do Decálogo. O sábado foi inserido no coração do decálogo, um código de preceitos exclusivamente morais e éticos. É absurda a idéia de que Deus deu a Seu povo apenas nove mandamentos morais e inseriu no meio deles um preceito de natureza dúplice, tornando o Decálogo uma espécie de lei híbrida. Note o que Deus diz a respeito do Decálogo: “Porque nada falei a vossos pais, no dia em que os tirei da terra do Egito, nem lhes ordenei coisa alguma acerca de holocaustos ou sacrifícios” (Jer. 7:22). “É digno de nota que nenhum destes mandamentos, ou parte deles, pode . . . ser considerado cerimonial. Todos são morais e, conseqüentemente, de eterna obrigação” (Adam Clarke, Clarke’s Commentary, vol. 1, sobre Êxo. 20). Broadus e Strong são da mesma opinião.

O Sábado é Duplamente Moral. O sábado não é apenas um mandamento inteiramente moral, mas duplamente moral, visto que estabelece não somente o nosso dever para com Deus (como os três primeiros preceitos) nem somente o nosso dever para com nosso próximo (como os seis preceitos depois dele): mas ambos os deveres: ordena-nos não somente santificar o nosso sétimo dia em honra a Deus, mas também permitir, misericordiosamente, que nosso próximo também o faça. Fala de um comportamento ético entre o homem e Deus e entre homem e homem. É por isso que o mandamento do sábado tem sido chamado de “a dobradiça” das tábuas da lei, pois mantém juntas as duas tábuas e os dois lados das relações humanas. — VER OBJEÇÕES 17, 19, 31 E 101 (SÁBADO NÃO MORAL).

OBJEÇÃO No. 21: SOMOS INCAPAZES DE GUARDAR OS MANDAMENTOS

ARGUMENTO: Ser humano algum é capaz de observar todos os Dez Mandamentos.

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RESPOSTA: Esta declaração é verdadeira, somente no caso de a pessoa tentar fazer isso em sua própria força, independentemente de Cristo, pois Ele mesmo declarou: “Sem Mim, nada podeis fazer”. João 15:5 (cf. Rom. 7:14-19). Os que seguem a Cristo, contudo, podem dizer: “Tudo posso nAquele que me fortalece.” Fil. 4:13.

Com o poder capacitador do Santo Espírito de Deus, é possível observar todos os mandamentos de Deus, inclusive o sábado. “Deus fez o que a lei não pôde fazer porque a natureza humana era fraca. Deus condenou o pecado na natureza humana, enviando o Seu próprio Filho, que veio na forma da nossa natureza pecaminosa a fim de acabar com o pecado [transgressão da lei, 1 João 3:4]. Deus fez isso para que as ordens justas da lei pudessem ser plenamente cumpridas por nós, que vivemos de acordo com o Espírito de Deus e não de acordo com a natureza humana.” Rom. 8:3-4, NTLH.

Jesus deu a entender que é possível observarmos os mandamentos quando afirmou: “Se me amais, guardareis os meus mandamentos”. João 14:15.Experimente colocar a primeira frase deste versículo na frente de cada preceito do Decálogo e verá que, com Cristo, os Dez Mandamentos são na verdade não dez ordens proibitivas, mas Dez Promessas de vitória sobre o pecado (ver quadro). É como concluiu João: “Porque este é o amor de Deus: que guardemos os seus mandamentos; ora, os seus mandamentos não são penosos”. 1 João 5:3. O que Deus manda, torna-o possível pela Sua graça.

OBJEÇÃO No. 22: O SÁBADO É INVENÇÃO DOS JUDEUS

ARGUMENTO: O sábado mencionado na Bíblia é invenção dos judeus, e não do Senhor.

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DEZ MANDAMENTOS OU DEZ PROMESSAS?

Se me amares, Não terás outros deuses diante de Mim...Se me amares, Não farás para ti imagens de escultura...Se me amares, Não tomarás Meu nome em vão...Se me amares, Lembrar-te-ás do sábado para o santificar...Se me amares, Honrarás pai e mãe.Se me amares, Não matarás.Se me amares, Não adulterarás.Se me amares, Não furtarás.Se me amares, Não levantarás falso testemunho.Se me amares, Não cobiçarás nada do teu próximo.

— Êxodo 20: 3-17 justaposto a João 14:15.

RESPOSTA: Esse é um argumento sem suporte bíblico. Multiplicadas vezes nas Escrituras, o sábado é chamado, não de o sábado dos judeus, mas de o “sábado do Senhor Teu Deus”, como por exemplo, no fraseado do próprio quarto mandamento (Êxo. 20:8-11). É, portanto, antibíblico qualificá-lo de “sábado dos judeus” ou “sábado judaico”.

A Bíblia é inequívoca sobre a origem do sábado: ele foi criado por Deus e a Ele pertence (Isa. 58:13; Êxo. 31:13). Foi abençoado e santificado quando Deus lançou os alicerces do mundo, milhares de anos antes de existir a nação hebraica (Gên. 2:2-3). Na verdade, o termo “hebreu” só aparece na Bíblia em Gênesis 14:13, mais de 20 séculos após a criação do mundo. Como poderia o invento ter aparecido antes do inventor?

O Novo Testamento procede com a mesma coerência O evangelista Lucas, por exemplo, não obstante ser o único escritor bíblico gentio, fala da “nação judaica”, do “povo judaico”, da “terra dos judeus” e da “sinagoga dos judeus” (Atos 10:22; 12:11; 10:39; 14:1), mas nunca do “sábado dos judeus”, ainda que mencione este dia repetidas vezes em seus escritos. O apóstolo João, que era judeu, também se refere diversas vezes a coisas peculiarmente judias. Faz menção, entre outras coisas, da “festa dos judeus” e da “multidão dos judeus” (João 12:9; 2:13; 11:55). Nunca menciona, porém, o “sábado dos judeus”, embora se refira a esse dia diversas vezes.

A Bíblia, portanto, não diz em parte alguma que o sábado foi invenção dos judeus. Ao contrário, afirma que foi Deus quem fez o sábado (Êxo. 16:29). — VER OBJEÇÃO 04 (INVENÇÃO DO SÁBADO).

OBJEÇÃO No. 23: O SÁBADO ERA SOMENTE PARA OS JUDEUS

ARGUMENTO: O sábado foi uma instituição mosaica dada exclusivamente aos judeus. Moisés afirma em Êxodo 31:16-17 que o sábado seria um sinal perpétuo apenas nas suas gerações.

RESPOSTA: Algumas pessoas sinceras, mas sem suficiente informação bíblica, costumam afirmar que o sábado foi feito somente para os judeus, e até fazem uma dicotomia entre o sábado judaico como coisa velha e ultrapassada e o sábado cristão (domingo) como algo novo e em voga. Essa afirmação, porém, carece de base.

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Para começar, a expressão “sábado judaico” é um equívoco doutrinário, sem nenhum respaldo bíblico ou teológico. O quarto mandamento afirma que o sábado pertence ao Senhor, e não aos judeus (Êxo. 20:8). Seu verdadeiro nome não é sábado judaico, mas “sábado bíblico.”

É verdade que a necessidade de preservar a identidade judaica — principalmente em tempos críticos — inspirou em muitos judeus um ponto de vista exclusivista e nacionalista a respeito do sábado. Devemos, porém, lembrar que a Bíblia, e não a tradição, é o critério para se aferir a verdade. E a Bíblia, que é a régua da verdade, mostra que o sábado foi destinado a ter aplicação universal. Provamo-lo com os seguintes argumentos:

A Razão Para Se Guardar o Sábado é Cósmica. A razão mencionada, tanto no mandamento (Êxo. 20:11) como na própria passagem em tela (Êxo. 31:16-17), para nos lembrarmos deste dia é que nele Deus “descansou” após ter criado o mundo. E a criação do mundo certamente não é uma razão judaica, mas cósmica, universal e, como tal, aplicável a todos os seres humanos. Filo, famoso filósofo judeu, não somente afirmava que o sábado se originara na criação, mas também o dizia universal, chamando-o de "o aniversário do mundo". — M'Clatchie, Notes and Queries, Vol. 4, pág. 99. Já Martin Buber, também filósofo judeu, afirmou que o sábado tinha “suas raízes na origem do próprio mundo”, sendo, portanto, “propriedade comum de todos.”

O Sábado é Anterior aos Judeus. Quando o sábado foi instituído, na criação do mundo, não havia judeu nem gentio, norte-americano nem brasileiro, mas somente Adão, o representante do gênero humano (Gên. 2:1-3; Atos 17:26). O judeu só veio a existir no cenário mundial 2.500 anos após a criação, com Judá, o filho de Jacó que se tornou pai da família ou nação judaica (Gên. 29:35). Pelo fato de toda a família humana dever sua existência ao ato criativo divino, “a obrigação de aceitar o mandamento do sábado como memorial do poder criador de Deus repousa sobre toda a raça humana” (SDA Encyclopedia.

O Sábado Foi Confiado em Depósito aos Judeus. Visto que Israel desempenhava papel vicário perante as outras nações do mundo, os judeus receberam o sábado formalmente porque eram os representantes nacionais do gênero humano. Foram escolhidos por Deus como depositários dos oráculos de Deus (Deut. 5:5-7; Atos 7:38), instrumento de divulgação de sua vontade e salvação a pessoas de todas as raças, credos e nacionalidades (Deut. 28:9-10; 7:6). Não é isso o que lemos em Atos 7:38, que os israelitas receberam as “palavras vivas para no-las transmitir” — a nós cristãos, que vivemos sob o novo

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testamento? A Escritura é clara: “Primeiro do judeu, mas também do grego.” Rom. 1:16.Ora, se Israel era, naquele momento, o legítimo povo de Deus, a quem deveria o Senhor revelar os Seus propósitos? A quem deveria confiar Sua lei? Aos egípcios? Aos assírios? Não, mas necessariamente aos Seus representantes na Terra: os israelitas.

O Sábado Foi Feito Para a Humanidade. Não bastassem esses fatos históricos, a própria Escritura diz claramente que "o sábado foi feito por causa do homem [anthropon, “ser humano”, “humanidade" (Mar. 2:27; cf. Mat. 4:4), ou seja, para a raça humana]. Jesus não disse "o sábado foi feito por causa do judeu". Portanto a obrigação de observá-lo pertence tanto a judeus como a gentios.

Fugindo dessa argumentação, outros concordam que o sábado tenha sido feito realmente para o homem, mas alegam que sua observância só foi dada a Israel. Esta idéia também é infundada e sem nenhuma base escriturística. O fato de os judeus terem recebido, na qualidade de representantes da humanidade, a ordem de observar suas leis (inclusive o sábado) em várias ocasiões (Êxo. 20:1, 2; Deut. 5:1,2,12-15; 4:8,10-13,44; Êxo. 34:27, 28; Eze. 20:10-12; Rom. 9:4), não deve levar ninguém a concluir que esse dia tenha ficado limitados aos judeus. Se persistirmos obstinadamente no raciocínio de que não temos a obrigação de observar o sábado só porque Deus determinou que os judeus guardassem o sábado, cairemos no absurdo de concluir que também não devemos aceitar a Bíblia nem Jesus Cristo. Quase toda a Bíblia foi escrita por judeus, e a maior parte dela se dirige especialmente aos judeus. O Sermão da Montanha, o Discurso do Monte das Oliveiras e a Grande Comissão foram todos proferidos a judeus. Todos os profetas foram judeus, inclusive o próprio Cristo. Ele mesmo chegou a dizer: "a salvação vem dos judeus" (João 4:22). Os judeus eram depositários das leis divinas e deviam ensinar as outras nações a obedecer a Deus (Núm. 9:14; 15:16; Isa. 56:6-7).

O Sábado Visava Também aos Gentios. O próprio mandamento que ordena o sábado afirma especificamente que não só os judeus deviam descansar, mas também o estrangeiro que estivesse dentro de suas portas (Êxo. 20:10; Isa. 56:6, 7; cf. Núm. 9:14; 15:16). Embora os gentios não fossem obrigados a obedecer ao código cerimonial, o código moral, no qual o sábado estava incluso, foi dado por Deus a Israel para que este não somente o guardasse, mas também ensinasse outras nações a guardá-lo (Deut. 5:5-7; Atos 7:38).

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Outra prova de que o sábado não se limita aos judeus, mas estende-se também aos gentios é a profecia de Isaías, na qual ele prediz que “os estrangeiros” haveriam de guardar o “sábado” na nova dispensação. Indiretamente o profeta insere o sábado dentro da categoria da lei moral quando o aplica profeticamente aos gentios na dispensação evangélica (depois que o código cerimonial foi abolido) e na Nova Terra (onde sem dúvida não haverá leis cerimoniais). Isa. 56:1-3, 7. Na verdade, todo aquele que aceita a Cristo torna-se judeu espiritual, convertendo-se em herdeiro da promessa (Gál. 3:29; Rom. 2:28, 29)

O Sábado Será Observado na Nova Terra. A Bíblia ensina também que na nova Terra, onde haverá pessoas de todas as raças e nacionalidades, o sábado será observado (Isa. 66:22, 23). Será que só judeus vão se salvar? Para não restar sombra de dúvida, Salomão declara solenemente que guardar os mandamentos de Deus (um dos quais é o sábado) é dever, não só dos judeus, mas “de todo homem" (adam, entenda-se gênero humano). Ecles. 12:13.

Em vista desses e de outros argumentos, vemos que o sábado não foi dado exclusivamente aos judeus, mas a toda a raça humana. Sua instituição não se prende a nenhum fator circunstancial de tempo, lugar ou povo. — VER OBJEÇÕES 13, 18 E 34 (SÁBADO COMO INSTITUIÇÃO JUDAICA).

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LEVÍTICO

OBJEÇÃO No. 24: NÃO HÁ NA BÍBLIA AS EXPRESSÕES “LEI MORAL” OU “LEI CERIMONIAL”

ARGUMENTO: O fato de não encontramos na Bíblia as expressões “lei moral” e “lei cerimonial” prova que essa idéia não está presente na Palavra de Deus.

RESPOSTA: Não devemos falsear a verdade. O fato de não encontrarmos na Bíblia os adjetivos “moral” e “cerimonial” não destrói o fato de existirem leis dessa natureza no livro de Deus. Também não encontramos as palavras “trindade”, “encarnação”, “ascensão”, “milênio” etc., mas é certo que o conceito destas verdades está contido na página das Escrituras.

Existem na Bíblia muitos fatos que, em jargão teológico, são designados por termos técnicos não encontrados na Escritura. O próprio termo “Bíblia’ constitui um exemplo. Podemos folhear qualquer versão bíblica em português, de Gênesis a Apocalipse, sem encontrar a palavra “Bíblia” como parte integrante do texto sagrado.

“A Bíblia não tem sistemática. Ela apenas descreve e enuncia, sem preocupação de esquematizar e catalogar artigos de fé. Somente o estudo, a análise, a comparação determinam a sua coordenação doutrinária” (A . B. Christianini, Subtilezas do Erro, pág. 75). O que se busca na Bíblia são fatos, e não terminologias! — VER OBJEÇÃO 25 (LEI MORAL E CERIMONIAL).

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OBJEÇÃO No. 25: A BÍBLIA NÃO DISTINGUE LEI MORAL E CERIMONIAL

ARGUMENTO: Não existe na Bíblia diferença entre lei moral e cerimonial. Essa divisão artificial é invenção dos defensores do sabatismo.

RESPOSTA: Embora a palavra "lei" seja na Bíblia termo numeroso (ocorre 451 vezes) e polissêmico (abrange uma variedade muito grande de sentidos), um estudo mais acurado revela que — excetuando-se as acepções objetivas do termo que servem para indicar as Escrituras do AT como um todo e o Pentateuco — quer em conjunto quer individualmente — as leis de Deus ali apresentadas podem ser divididas basicamente em três categorias: moral, cerimonial e civil.

A Lei dos Dez Mandamentos. Na primeira categoria encontramos o Decálogo (Êxo. 20:1-19), lei magna que estabelece os parâmetros para o restante das leis. Assim como a Constituição Brasileira estabelece os parâmetros pelas quais as leis adicionais devem ser promulgadas, assim também os Dez Mandamentos estabelecem os parâmetros para todo o conjunto de leis divinas. Esta lei foi dada ao povo diretamente e verbalmente por Deus. Posteriormente Moisés recebeu esta lei gravada pelo próprio Deus em tábuas de pedra. Uma vez em Êxo. 31:18 e novamente em Êxo. 34:2,28.

A Lei Levítica. A segunda categoria tem que ver com as leis levíticas (Lev. 1:1-27:33), entregues a Moisés na “tenda da congregação” e que esboçavam o sistema sacrifical, os deveres sacerdotais e as observâncias exigidas do povo. Consistiam elas em prefigurações, tipos e sombras que apontavam para Cristo. A Bíblia é clara. Ao referir a este código, diz: “Esta é a lei do holocausto, da oferta de manjares, da oferta pelo pecado, da oferta pela culpa, da consagração e do sacrifício pacífico.” Lev. 7:37.

A Lei Judicial ou Civil. A terceira categoria abrange todos os regulamentos civis usados para governar a nação de Israel na qualidade de corpo político (Êxo. 20:21-24:43). Deus comunicou essas leis a Moisés privativamente na nuvem sobre o Monte Sinai. Tinham por objetivo regulamentar a maneira como o povo devia interagir uns com os outros numa sociedade civilizada. Essas leis foram escritas posteriormente por Moisés num livro chamado “livro da aliança”. É óbvio que Deus não conferiu ao “livro da aliança” a mesma solenidade do Decálogo. Essas leis civis perderam o sentido quando se desmantelou a nação teocrática de Israel, e o Israel espiritual o substituiu (Mat. 21:43). Durante a era cristã, a

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teocracia judaica foi substituída pelos governos nacionais (Mat. 22:21; Rom. 13:1-7).

CONTRASTE ENTRE AS LEISTIPOS DE LEI SUJEITOS À LEI DURAÇÃO DA LEI

MORAL Todos os seres humanos EternaCERIMONIAL Todos os crentes do AT Da queda de Adão até

CristoCIVIL Todos os israelitas e

estrangeiros residentesDesde Moisés até a dispersão dos judeus

© The Last Days

Código Moral e Código Cerimonial. Esses três tipos de lei podem ser agrupados em dois grandes códigos: o moral e o cerimonial.

As leis morais são aquelas que prescrevem as obrigações para com Deus e com o próximo. Envolvem tanto o Decálogo, que expressa seus princípios básicos, bem como as outras leis secundárias da mesma natureza que o pormenorizavam. Por serem uma transcrição exata do caráter de Deus, os princípios desta lei são eternos e nunca perdem a validade, estando hoje em vigor sobre todos os homens como o esteve no AT.

As leis cerimoniais são aquelas instituídas para que a morte, em vez de sobrevir instantaneamente ao transgressor da lei moral, fosse transferida para uma vítima que devia prefigurar a grande e perfeita oferenda do Filho de Deus. Essas leis regulavam o sistema de rituais de adoração pré-cristã. Por consistirem de símbolos que apontavam figuradamente para Cristo, para Seu sacrifício e sacerdócio, essas leis (que poderíamos chamar de proto-evangélicas), com seus sacrifícios e ordenanças, deviam ser cumpridas pelos hebreus até que o tipo encontrasse o antítipo, na morte de Cristo, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. Então cessariam (Col. 2:14-17; Heb. 7:12).

Distinção Bíblica. Note como, em 1 Coríntios 7:19, Paulo deixa transparecer bem essa distinção: “A circuncisão [lei cerimonial (ver Atos 15:5)] não significa nada, e a incircuncisão também nada é; o que importa é obedecer aos mandamentos de Deus [lei moral]." (NVI)

E também em Rom. 2:25, onde sugere que a obediência à lei cerimonial só tinha valor se a moral fosse obedecida: “Porque a circuncisão tem valor se praticares a lei; se és, porém, transgressor da lei, a tua circuncisão já se tornou

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incircuncisão.” Em 1 Cor. 9:21, na versão BLH, Paulo diz com todas as letras que vivia fora da “Lei de Moisés”, mas que obedecia à “Lei de Deus”.

Compare ainda Efésios 2:15 e Romanos 3:31. Na primeira passagem o apóstolo diz que a morte de Cristo anulou ou tornou inoperante (katargeo) a lei; na segunda passagem diz que a fé não anula, antes estabelece a lei. O contraste entre as afirmações é nítido. Ou Paulo está-se contradizendo ou está falando de duas leis diferentes: a cerimonial e a moral, respectivamente.

O profeta Samuel, já no AT, reconheceu essa mesma distinção, quando afirmou: “Tem, porventura, o Senhor tanto prazer em holocaustos e sacrifícios [lei cerimonial] quanto em que se obedeça à sua palavra [lei moral]? Eis que o obedecer [lei moral] é melhor do que o sacrificar [lei cerimonial], e o atender [lei moral], melhor do que a gordura de carneiros [lei cerimonial].” 1 Sam. 15:22.

E o profeta Miquéias também: “Agradar-se-á o Senhor de milhares de carneiros, de dez mil ribeiros de azeite? Darei o meu primogênito pela minha transgressão, o fruto do meu corpo, pelo pecado da minha alma (lei cerimonial)? Ele te declarou, ó homem, o que é bom e que é o que o Senhor pede de ti: que pratiques a justiça, e ames a misericórdia, e andes humildemente com o teu Deus (lei moral).” Miq. 6:7-8. Nessa última expressão o profeta sumaria as duas tábuas do Decálogo: andar humildemente com Deus equivale à primeira tábua; praticar a justiça e amar a misericórdia corresponde à segunda tábua.

Reconhecimento Denominacional. Como se vê, o nítido contraste entre esses dois sistemas não é invenção dos ASD. Está na Bíblia. Os judeus o reconheciam. Muito antes de os adventistas do sétimo virem à existência em 1844, os católicos já o criam assim (Catholic Enciclopédia, art. “Moral Aspect of Divine Law”). Os teólogos e redatores de credos e confissões de fé das igrejas protestantes históricas também reconheciam a diferenciação das leis bíblicas acima enunciadas. Só para citar algumas: a Segunda Confissão Helvética (1566), os 39 Artigos de Religião da Igreja da Inglaterra (1571), Artigos de Religião da Irlanda (1615), Declaração de Savoya da Igreja Congregacional (1658), Confissão de Fé de Westminster (1647), Confissão Batista (1688), Os 25 Artigos da Igreja Metodista (1784) etc. etc. etc. A maioria dos teólogos coerentes concorda neste ponto.

Muitos procuram confundir esses dois sistemas legais, usando os textos que falam do

código cerimonial para provar que o código moral foi abolido; mas isto é perversão das

Escrituras. Elas são diferentes tanto em matéria, como em teor e substância. A Bíblia

reconhece claramente essa distinção. Se não, vejamos no quadro abaixo:

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Lei Moral Lei CerimonialExistia antes da queda do homem (Rom. 4:13-15)

Dada após a Queda (Gen. 3:21; 4:4; Heb. 10:1)

Entregue por Deus a Moisés (Êxo. 31:18)Entregue por Moisés aos levitas (Deut. 31:25-26)

Dada no Monte Sinai Dada no tabernáculo (Lev. 1:1)Escrita pelo próprio Deus (Êxo. 31:18; 32:16; Deut. 9:10)

Escrita por Moisés (Êxo. 24:4; Deut. 31:9; Nee. 8:1; Atos 15:5)

Proferida pela voz de Deus (Êxo. 20:1-22; Deut. 4:12-13).

Anunciada por Moisés (Êxo. 24:3; Deut. 4:44-45)

Escrita em tábuas de pedra (Êxo. 31:18; Deut. 4:13; 19:10)

Escrita em um livro (Êxo. 24:4-7; Deut. 31:24)

Uma lei distinta e completa (Deut. 5:22) Uma lei adicional (Efés. 2:15).Depositada por Moisés "dentro da arca" (Êxo. 40:20; Deut. 10:5; 1 Reis 8:9)

Depositada pelos levitas "fora da arca" (Deut. 31:26; 2 Reis 22:8)

Sob os cuidados de Deus no Shekinah Sob os cuidados do sacerdoteFoi uma exigência legal primária (Êxo. 20; Deut. 5)

Foi uma exigência legal secundária

Contém um sábado semanal (Êxo. 20:8-11)

Continha sábados anuais (Lev. 23:24,27,32,39; 23:32)

Denominada "Lei de Deus" no seu sentido estrito (Sal. 1:2; 19:7)

Denominada "Lei de Moisés" no seu sentido estrito (Nee. 8:1; Atos 15:5)

Chamada "Lei Real" (Tia. 2:8) Chamada lei de ordenanças (Col. 2:14; Efés. 2:15)

É "lei da liberdade" (Tia. 2:10-12; 1 João 5:3; Sal. 119:45)

É "jugo de escravidão" (Gál. 5:1-3; cf. Atos 15:10)

Trata da conduta humana (Êxo. 20:3-17) Trata de matéria cerimonial e ritual (Lev. 23; Heb. 9:1,9,10; Heb. 10:1-10)

Imposta sobre toda humanidade (Ecles. 12:13)

Imposta apenas sobre os judeus (?)

Revela o pecado (Rom. 3:20; 7:7; 1 Cor. 15:56; 1 João 3:4)

Prescreve ofertas para o pecado (Lev. 4:2-3; Gál. 3:19). (Para modus operandi, ver Lev. 3-7)

Sua violação ainda constitui pecado (1 João 3:4)

Já não há pecado em quebrantá-la (Efés. 2:15; Col. 2:14)

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A pena para a violação era a morte Não há pena capitalOs apóstolos deram ordem para guardá-la (1 Cor. 7:19; Tia. 2:12)

Os apóstolos não deram ordem para guardá-la (Atos 15:24; versão Trinitária)

É perfeita (Sal. 19:7; Tia. 1:25) Nada aperfeiçoou (Heb. 7:19)É santa, justa e boa (Rom. 7:12) Coisa alguma santificou (Heb. 7:19)É espiritual (Rom. 7:7, 14) Era carnal (Heb. 7:16; 9:10)É eterna (Mat. 5:18) Era temporária (Heb. 10:1)Estabelecida pela fé em Cristo (Rom. 3:31)

Anulada pela fé em Cristo (Efés. 2:5)

Engrandecida por Cristo (Isa. 42:21; Sal. 40:8 e Heb. 10:7-9)

Ab-rogada por Cristo (Heb. 7:18-19)

É a nosso favor (Rom. 7:12; Sal. 19:7,9,10)

Era contra nós (Col. 2:14)

É uma lei “boa” (Rom. 7:16) Era uma lei “não boa” (Eze. 20:25)Deve ser gravada no coração e na mente (Jer. 31:33; Heb. 8:10).

Foi encravada na cruz (Col. 2:14-1).

Não pode ser mudada (Luc. 16:17) Foi mudada (Heb. 7:12)Seremos julgados por ela (Tia. 2:12; Rom. 2:12; Ecles. 12:12-13)

Não seremos julgados por ela (Col. 2:16)

O cristão que guarda essa lei é bem-aventurado (Tia. 1:25)

O cristão que guarda essa lei não é abençoado (Gál. 5:1-6)

Contém um sábado de duração eterna (Isa. 66:23)

Continha sábados temporários (Col. 2:14-17)

Chamada de “mandamentos do Senhor” (Lev. 4:2-3)

Chamada de “lei do holocausto etc.” (Lev. 7:37)

Tem um nome específico: “Dez Mandamentos” (Êxo. 34:28)

Não tem nome

Foi dirigida num nível individual: “(Tu) não farás” (Êxo. 20)

Foi dirigida à coletividade nacional (Êxo. 20:22; 21:1)

Cada conjunto de leis tinha seu lugar e sua função específica no esquema divino das coisas. As leis levíticas prefiguravam Jesus e claramente perderam o sentido depois da cruz.

As leis civis aplicavam os amplos princípios dos Dez Mandamentos à organização do antigo Israel como nação. Tratavam de propriedade, casamento, divórcio, escravidão, herança, guerra, usura, fuga, empréstimos, crimes,

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imoralidades e cominação de penas. Embora este código tenha se tornado inoperante quando o antigo Israel deixou de ser uma nação e embora não tenha sido restabelecido no Estado moderno e não teocrático de Israel, ainda assim os princípios fundamentais de justiça e eqüidade envolvidos ainda continuam válidos.

Os Dez mandamentos são intemporais e imutáveis, pois não se baseiam em circunstâncias, povos ou sistemas. Transcendem essas relações terrenas, encontrando sua única base no trono de Deus. São a própria definição do governo moral de Deus, que é universal em seu escopo e aplicação. — VER OBJEÇÃO 24 (LEI MORAL E CERIMONIAL).

NÚMEROSOBJEÇÃO No. 26: A BÍBLIA NÃO FAZ DIFERENÇA ENTRE SÁBADO MORAL E

CERIMONIAL

ARGUMENTO: Não existe distinção entre o sábado do Decálogo e os outros sábados. O quarto mandamento é um preceito cerimonial, pois as outras festas também continham sábados que podiam cair em qualquer dia da semana.

RESPOSTA: A afirmativa em questão é infundada. A Bíblia faz, sim, nítida distinção entre sábado moral e cerimonial. O próprio Deus estabelece uma linha divisória entre esses sábados anuais e o sábado semanal e mostra que possuem naturezas diferentes, quando diz: "Além dos sábados [semanais], que serão guardados em honra do Deus Eterno, façam também essas festas [sábados anuais] e apresentem essas ofertas além das ofertas de costume, das ofertas para pagarem promessas e das ofertas que são apresentadas de livre e espontânea vontade ao Deus Eterno." Levítico 23:38, BLH.

O Sábado Moral. Chamamos em linguagem teológica de sábado moral o dia santo que, estabelecido por Deus no fim da semana criativa como memorial da criação (Gên. 2:1-3), ocorre a cada sétimo dia da semana. Este dia foi prescrito como dia de repouso solene e perpétuo pelo quarto mandamento da Lei Moral de Deus, isto é, a lei dos Dez Mandamentos (Êxo. 20:8-11). Por ter caráter ético e universal, ainda hoje está em vigor.

Os Sábados Cerimoniais. Em adição aos sábados semanais, existia um sistema de sete festas anuais esparsos ao longo do calendário litúrgico judaico (também chamadas “festas fixas” por oposição ao sábado, Eze. 44:24), as quais,

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pelo fato se serem celebradas no mesmo espírito do sábado semanal, eram chamadas também de sábados: os sábados cerimoniais.22 Estes feriados religiosos ocorriam em dias fixos do ano (mas não da semana), “cada qual em seu dia próprio” (Lev. 23:37), celebrando importantes acontecimentos na história da nação israelita. Estes feriados sabáticos eram ordenanças que constavam, não na lei moral de Deus, mas no código cerimonial. Apontavam para Cristo e Sua morte no Calvário, e por isto foram abolidos na cruz.

Cada um desses sete sábados cerimoniais — além dos sábados do Senhor — constituía uma "santa convocação" (reunião de caráter religioso) e era um dia de suspensão do trabalho servil, um dia de descanso, palavra que no hebraico é shabbat, a mesma que se usava para se referir ao sétimo dia da semana. Eram, por essa razão, também chamados de sábados23, embora não estivesse diretamente a ele vinculados nem ao ciclo semanal.24

O sábado (ou descanso) moral caía sempre no sétimo dia de cada semana. Já os sábados (descansos) cerimoniais, pelo fato de sua contagem depender do início do ano religioso, que por sua vez se baseava no calendário lunar, podiam corresponder a qualquer dia da semana. Prova disso é Lev. 23:24. “Fala aos filhos de Israel, dizendo: No mês sétimo, ao primeiro do mês, tereis descanso solene, memorial, com sonidos de trombetas, santa convocação.”

Quando coincidia de um feriado destes cair num sábado semanal, aquele dia era chamado de "grande sábado" (cf. João 19:31).

22 “O nome sábado podia ser aplicado a qualquer época sagrada como tempo de cessação de trabalho.” (J. Skinner, Hasting's Biblie Dictionary, art. “Sabbath”).23 Whitaker’s Revised BDB.24 Além dos sábados anuais, cada sete anos havia um ano sabático, durante o qual não se trabalhava a terra (25:3-7). Cada 50 anos proclamava-se um jubileu, que durava um ano, durante o qual as propriedades voltavam a seus donos originais.

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Por terem caráter ritualístico e geografia localizada, tipificavam realidades futuras, e deixaram de vigoraram quando o tipo encontrou o antítipo . (Nisto

Cremos, págs. 335-336).

Distinções Nítidas. Ao passo que o sábado semanal foi ordenado no encerramento da semana da criação tendo em vista toda a humanidade, os sábados anuais eram parte integrante do sistema judaico de ritos e cerimônias instituídas no Monte Sinai, e tinha em vista exclusivamente o povo hebreu do Antigo Testamento.

Entre os dias solenes do calendário judaico, nenhum ultrapassava o sábado semanal em importância e influência na vida quotidiana. Ele tinha primazia sobre os outros, por isso é citado em primeiro lugar, adiante das festas (Lev. 23:3). Havia mesmo uma distinção nos requisitos para o sábado semanal regular e os sábados cerimoniais ou "santas convocações" relacionados com as festividades (Lev. 23:2). De modo geral o sábado semanal era mais restritivo; não se podia fazer nenhum trabalho pesado ou leve (exceto no santuário). Ele era chamado de “o sábado do repouso solene” (Êxo. 31:15), “dia de repouso completo” (Lev. 23:3, EPA). Nesse dia até mesmo ajuntar lenha ou acender no fogo era proibido (Núm. 15:32-36; Êxo. 35:3). Também se restringiam as viagens (Êxodo 16:29) e o preparo de comidas, que devia ser feito na sexta-feira (Êxo. 16:23). Já nos sábados cerimoniais, com exceção do Dia da Expiação, apesar de não poder haver trabalho pesado ("trabalho servil", heb. abodah, "de escravo"), negócios ou atividades comerciais, permitia-se cozinhar, fazer preparativos para as festividades e outros trabalhos leves. (Êxodo 12:16; Levítico 23:7, 8, 21, 35, 36). Este ponto de vista é respaldado pela maioria dos biblicistas imparciais.

Portanto, os sábados morais eram diferentes dos cerimoniais tanto no tempo da instituição

quanto na aplicação e na posição dentro do código mosaico.

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ASSOCIADOS ÀS SEIS FESTAS ANUAIS JUDAICAS ESTAVAM SETE SÁBADOS CERIMONIAIS

1. O primeiro dia da Festa dos Pães Asmos (Êxo. 12:15-16; Lev. 23:6, 7, 11; Núm. 28:17-18), celebrado em 15 de abibe ou nisã (primeiro mês). Começava com a lua nova de março ou abril.

2. O sétimo dia da Festa dos Pães Asmos (Êxodo 12:15 a 16; Lev.23:8; Núm. 28:25; Deut.16:8) em 21 de abibe ou nisã (primeiro mês)

3. O dia da Festa das Semanas, Festa da Colheita ou Pentecostes (Lev. 23:15, 16, 21; Núm.28:26) celebrado no dia 6 de sivã (terceiro mês). Começava com a lua nova de maio ou junho.

4. O dia da Festa das Trombetas (Lev. 23:24-25; Núm. 29:1), celebrado no 1° de tisri (sétimo mês). Era dia de ano novo no calendário civil. Começava com a lua nova de setembro ou outubro.

5. O Dia da Expiação (Lev. 16:29, 31; 23:27-32; Núm. 29:7), celebrada em 10 de tisri (sétimo mês).6. O primeiro dia da Festa dos Tabernáculos (Êxo. 23:16; Lev. 23:34, 35, 39; Núm. 29:12),

celebrada em 15 de tisri (sétimo mês).7. O oitavo dia da Festa dos Tabernáculos (Lev. 23:36, 39; Núm. 29:35), celebrado em 22 de tisri

(sétimo mês).

Sábado Moral Sábado CerimonialFoi instituído na Criação (Gên. 2:1-2) Foi decretado no Sinai (2.500 anos

depois da criação)É uma divisão do tempo (Gen.2:1-3; Deut.5:12-14; Mar. 2:27).                 

Não divide o tempo, mas estabelece assembléias (Gen.1:14; Ex.35:23; Lev.23:38; Deut.16:16; Num.28:25-26).

Não está ligado a nenhum corpo celeste (Gen.1:1-3; Ex.16:4-26).

Cada festa era calculada usando a Lua e às vezes o sábado (Gen.1:14; Ex.12: 1-2; Lev.23:15-16).

Baseia-se no ciclo semanal Baseia-se nas fases da LuaDeus descansou Deus não descansouGuardado cada semana Guardado uma vez por anoEra um memorial (de um ato passado) Era uma sombra (de um ato futuro)Era apenas um (Guardado 52 vezes por ano)

Eram sete (Guardados sete vezes por ano) Números 28:16, 17; 29:7; Êxodo 23:16).

São abençoados e santificados por DeusDeus os chama de "meus sábados" (Lev. 19:30)

Deus chama de "vossos sábados" (Levítico 23:, 38, 32)

São classificados de sábados do Senhor (Êxodo 16:23)

São classificados de "os seus sábados." (Oséias 2:11; Isaías 1:13).

É um sinal eterno (Êxo. 31:16,17) Devia cessar (Osé. 2:11; Dan. 9:27)É um sinal entre Deus e seus Filhos (Ezequiel 20:12, 20).

Era um sinal entre Deus e Israel

Aponta para a Criação (Êxo. 20:8-11) Apontava para o Salvador (Col. 2:17)Deus repouso nesse dia (Gên. 2:2-3) Os judeus repousavam nesses dias(Independente do Templo25 Conectado ao TemploEra observado tanto por judeus como por estrangeiros (Mar. 2:27)

Eram observados apenas por judeus

Era chamado "o sábado" (Lev. 23:3) Cada um era chamado "um sábado" (Lev. 23:24; 32; 39)

Abstenção de toda espécie de trabalho (Êxo. 12:16).

Abstenção apenas de trabalho servil (Êxo.12:15-16; Êxo.20:8-11; Núm.28:9; Lev.23:1-3; Luc.13:11-16; 14:1-5).

25 John L. McKenzie, Dicionário Bíblico, art. “Sábado”.

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Observado em qualquer parte do mundo.

Observados apenas dentro dos limites da Palestina e Jerusalém (Deut. 16:1-7; Êxo. 12:47-49)

Pena de morte para o transgressor (Êxo. 31:13-15; 35:23)

Apenas excomunhão para o transgressor (Êxo. 12:15; Núm. 9:1-13)

Continuam para sempre (Isa. 66:22-23) Foram abolidos (Col. 2:16)

DEUTERONÔMIOOBJEÇÃO No. 27: O DECÁLOGO ERA A ALIANÇA SINAÍTICA

ARGUMENTO: O Decálogo integrava o antigo concerto ou aliança sinaítica, conforme Deuteronômio 4:12-13 (cf. Êxo. 34:27-28; 2 Crôn. 5:10; 6:11). Esta foi

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substituída pela nova aliança. (Jer. 31:31-34). Não precisamos, portanto, mais guardar os Dez Mandamentos, inclusive o sábado.

RESPOSTA: Embora o Decálogo esteja intimamente relacionado com a aliança, não é a própria aliança, como querem os dispensacionalistas. Uma aliança, concerto ou pacto é um acordo que se estabelece entre duas pessoas. Este acordo toma como base alguma lei, que normatize as cláusulas deste acordo. A lei é o instrumento externo que permite estabelecer os termos do pacto e dizer se as partes estão cumprindo ou não os deveres do acordo. Não faz nenhum sentido o acordo confundir-se com a própria lei.

Temos provas conclusivas de que a aliança que desapareceu não consistia nos Dez Mandamentos.

1. O Decálogo, inclusive o sábado, já existia antes de a antiga aliança ter sido celebrada no Sinai (Gên. 26:5; Êxo. 16:28; 18:16, 20; Deut. 4:13). Abraão, que viveu cerca de 500 anos antes do Sinai, já conhecia e obedecia aos mandamentos (Gên. 26:5). Trinta dias antes dos filhos de Israel chegarem ao Monte Horebe, onde a aliança foi feita, Deus os censurou por se recusarem a guardar Suas leis (Êxo. 16:28).

2. A antiga aliança consistia em promessas divinas e humanas, não em mandamentos (Êxo. 24:7; cf. Heb. 8:6).

3. A antiga aliança era defeituosa, continha promessas fracas, envelheceu e caducou (Heb. 8:7-8,13). Nenhum desses adjetivos se aplica a perfeita e eterna lei de Deus. As promessas humanas eram falíveis, ao passo que os Dez Mandamentos eram perfeitos (Heb. 8:7; cf. Rom. 7:12, 14).

4. A aliança foi feita com relação (“a respeito de”) ao Decálogo, mas não era idêntica a ele (Êxo. 24:7-8). Referindo-se aos Dez Mandamentos, Deus disse a Moisés: “Escreve estas palavras, porque, segundo o teor destas palavras, fiz aliança contigo e com Israel” (Êxo. 34:27-28). Não foi a lei em si, mas sobre a guarda da lei — o teor das palavras” — que a antiga aliança foi estabelecida. “A antiga aliança não era a lei dos Dez Mandamentos, mas um acordo feito entre Deus e o povo a respeito da guarda dos Seus mandamentos. ‘Se obedecerdes, vivereis’, foi a promessa de Deus. A isto o povo respondeu: ‘Tudo que o Senhor tem dito, faremos e Lhe obedeceremos.’ Êxo. 24:7. Esse foi o acordo, a aliança. Era a respeito dos Dez Mandamentos, mas não era a lei dos Dez mandamentos em si. A lei era apenas o assunto” (William H. Branson, Drama of the Ages, pág. 359).

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5. Moisés referiu-se ao bezerro de ouro como “o vosso pecado, o bezerro que tínheis feito” (Deut. 9:21). Note que o bezerro em si não era o pecado, mas o pecado tinha que ver com o bezerro. Semelhantemente, a antiga aliança não era a lei, mas por estar a ela intimamente relacionada era chamada, por metonímia, de aliança.

6. Romanos 9:4 prova que tanto a antiga como a nova aliança não se confundem com a lei. Paulo diz ali que pertence aos israelitas “a adoção de filhos, e a glória, e as alianças, e a lei, e o culto, e as promessas” (ACF). Observe que a lei é mencionada aqui como algo à parte das alianças (plural). Paulo se refere às alianças e à lei como entidades distintas. A antiga aliança encerrou-se na cruz, mas os Dez Mandamentos não (Mat. 5:17-20; Rom. 3:31.).

7. Para provar definitivamente que a lei não é a antiga aliança, substituamos as palavras em Romano 3:31: “Anulamos, pois, a antiga aliança (lei) pela fé? Não, de maneira nenhuma! Antes, confirmamos a antiga aliança (lei)”. É óbvio que a antiga aliança e a lei não são a mesma coisa! (Joe Crews, Answers to Difficult Bible Texts). — VER OBJEÇÕES 102 E 115 (ANTIGA ALIANÇA).

OBJEÇÃO No. 28: A LEI DE DEUS NÃO FOI DADA AOS JUDEUS PRÉ-MOSAICOS

ARGUMENTO: A lei não poderia ter sido dada antes do Sinai, pois Deuteronômio 5:3 afirma que Deus estabeleceu a aliança com os israelitas daquela geração, e não com os antepassados deles.

RESPOSTA: Esta passagem nada diz quanto a não ter existido a lei antes de ser dada no Sinai. Afirma apenas que Deus não estabeleceu a aliança dos Dez Mandamentos com os “pais” daquela geração de israelitas em vias de entrar na Terra Prometida. A expressão “pais” não denota necessariamente todos os antepassados até Adão, mas é empregada com freqüência para referir-se aos ascendentes de uma, duas ou três gerações anteriores (ver Jos. 24:14; Eze. 20:18, 24, 27, 30). O Senhor, de fato, não estabeleceu aliança com os “pais” que haviam nascido e morrido no Egito, antes do Êxodo. Mas certamente o fez com os antepassados mais remotos, pois diz a Escritura: “Vós sois os filhos dos profetas e da aliança que Deus estabeleceu com vossos pais, dizendo a Abraão: Na tua descendência, serão abençoadas todas as nações da terra.” Atos 3:25.

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Isso não significa, porém, que a lei ou a aliança não existissem antes de Abraão. Na verdade, desde que Deus colocou o homem sobre a Terra, implantou-lhe no coração e mente a Sua lei, para que pudesse andar segundo a Sua vontade. Não deixou o homem por milhares de anos em desconhecimento da conduta moral dele exigida. Desde os dias de Adão já existia a aliança e a lei que lhe servia de alicerce. Note o que disse o profeta: “Mas eles transgrediram a aliança, como Adão; eles se portaram aleivosamente contra Mim”. Osé. 6:7. Os israelitas do tempo do profeta haviam transgredido a aliança da mesma maneira como Adão o transgredira: pela violação da Lei. Êxo. 13:9 e 16:4 falam da lei existindo pouco antes do Sinai. — VER OBJEÇÕES 14, 32, 82 E 98 (LEI SÓ NO SINAI).

OBJEÇÃO No. 29: O SÁBADO É APENAS UM MEMORIAL DA LIBERTAÇÃO DO EGITO

ARGUMENTO: O mandamento do sábado é repetido em Deuteronômio 5:14-15 tendo como base, não a criação, mas a libertação do povo de Israel do cativeiro egípcio. Isso prova que o sábado a partir do Êxodo ficou sendo obrigação só dos judeus. Não passa de um memorial do livramento dos israelitas.

RESPOSTA: Temos diversas razões para crer que o sábado é na verdade, primariamente, um memorial da criação.

O Sábado é Anterior ao Cativeiro Egípcio. Quando Deus libertou Israel da escravidão egípcia, o sábado já funcionava como memorial da criação (Gên. 2:1-3) É assim que ele aparece nas tábuas da lei, escritas pelo próprio dedo de Deus (Êxo. 20:8-11). Ao ser entregue a lei no Sinai, porém, apenas poucos da presente congregação tinham idade suficiente para compreenderem a tremenda solenidade da ocasião. Como deveriam logo passar o Jordão e tomar posse da Terra Prometida, Deus desejou recapitular-lhes as reivindicações de Sua lei e estipular-lhes a obediência como condição de prosperidade. Essa foi a razão pela qual a lei foi repetida por Moisés.

Não é Uma Repetição Literal. “É preciso entender que o propósito de Deuteronômio era fornecer uma paráfrase seletiva da lei de Deus, revelada a Moisés nos livros anteriores: Êxodo, Levítico e Números. Não era intenção que o último livro do Pentateuco constituísse uma repetição ipsis litteris do texto dos outros quatro, mas uma aplicação homilética, de exortação do seu ensino a uma nova geração que atingira a maioridade durante os quarenta anos de

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peregrinação no deserto” (Gleason Archer, Enciclopédia de Dificuldades Bíblicas, pág. 156).

O propósito deste discurso de Moisés não foi fornecer uma recitação exata da lei, mas, conforme o próprio nome do livro indica (Deuteronômio significa “segunda lei”) fazer uma recapitulação e explicação adicional da lei. Sob a inspiração do Espírito Santo, ele apresenta as implicações e aplicações da lei à nova realidade da nação, prestes a entrar na Terra Prometida, com a intenção de impressionar o povo com a importância de observar fielmente tudo quanto lhes fora ordenado fazer (ver procedimento paralelo em Deut. 24:17, 18).

Um Novo Aspecto. É certo que, quando Moisés repete a lei, faz uma alteração intencional no quarto mandamento, talvez com a intenção de acrescentar um novo aspecto da observância do sábado. No Egito, em virtude da opressão e do ambiente idólatra, a observância do sábado tornara-se não somente esquecida, mas impraticável. Visto que os israelitas foram libertados do cativeiro para terem condições de observar a lei de Deus (Sal. 105:43-45) e particularmente o sábado, selo da lei, seria apenas óbvio esperar que a lembrança desse cativeiro fosse dada como um incentivo adicional para observância do sábado na Terra Prometida.

Razão Secundária. Note, porém, que o livramento do Egito não é a razão original para justificar a observância do sábado, mas uma razão secundária, uma motivação agradecida. Não era prática incomum Deus reportar-se à libertação do cativeiro egípcio como um incentivo para Israel obedecer a outros mandamentos (Lev. 19:33-34; Deut. 24:17-18; Lev. 11:45). Os israelitas, por exemplo, também receberam ordens para não ser desonestos no peso e na medida, por que o Senhor os havia tirado da terra do Egito (Lev. 19:35-37). Devemos por isso concluir que antes de serem libertados do Egito, era lícito ser desonesto ou que o preceito da honestidade só era exigido dos judeus? É claro que não. Assim também o sábado já devia ser observado antes do Êxodo. Sendo, porém, próprio da psicologia humana celebrar os aniversários associando a determinados dias à lembrança de acontecimentos passados, adicionou-se ao sábado um segundo motivo para sua observância. Esse segundo motivo, porém, não entra em conflito com o motivo anterior. Em Êxodo a ênfase é no Deus da aliança, enquanto em Deuteronômio a ênfase é no povo da aliança.

O sábado, portanto, além de ser um memorial da criação, devia ser a partir de agora um memorial do livramento do cativeiro. E como o Egito constitui símbolo da escravidão do pecado, assim deve o sábado ser observado por toda alma

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salva, como memorial da redenção desse cativeiro pelo grandioso poder de Deus em Jesus Cristo. A razão para lembrarmos deste dia repousa sobre duas obras de Deus: uma retrospectiva — a Criação — e uma prospectiva — a Redenção.

JOSUÉOBJEÇÃO No. 30: O DIA LONGO DE JOSUÉ FEZ O SÁBADO PERDER-SE NO

TEMPO

ARGUMENTO: O milagre do dia longo de Josué alterou o ciclo semanal, fazendo o sábado perder-se no tempo (Josué 10:13). Portanto os sabatistas hoje não têm certeza do dia que guardam.

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RESPOSTA: Aparentemente o que Deus fez naquela memorável batalha de Israel contra os cinco reis amorreus, em Gibeão, foi retardar a velocidade média da órbita, obtendo como resultado o prolongamento da duração do dia ou é possível que tenha feito com que a luz do sol se refletisse por meio de algum “espelho” cósmico, de forma que isso resultasse num prolongamento da parte clara do dia.

Qualquer que tenha sido a causa real do miraculoso prolongamento do dia (provocado pela detenção do Sol segundo a perspectiva fenomenológica do autor) e sem querer entrar no mérito de alterou de maneira alguma o ciclo semanal, porque na realidade não se perdeu nem se ganhou nenhum dia calendar. “O Sol, pois, se deteve no meio do céu e não se apressou a pôr-se, quase um dia inteiro.” Note que a Bíblia diz “quase”. Não foi um dia inteiro. Deus operou um milagre encompridando aquela terça-feira para que o Seu povo destruísse completamente o inimigo, mas o dia continuou sendo terça-feira, em nada alterando a seqüência semanal, pois o sol não se pôs, e os dias da semana são contados na Bíblia de um pôr-do-sol ao outro.

Terça-feira não passou a ser quarta nem, por efeito dominó, o sábado converteu-se em domingo. O que se verificou ali foi somente uma terça-feira mais longa. Teria havido uma perda ou ganho real, se — e somente se — tanto a parte escura quanto a parte clara do dia tivessem sofrido alteração. A única alteração foi o tempo claro do dia, que ficou maior, segundo alguns, com a duração de quase 36 horas de sol.26 Não existe, portanto, nenhuma dificuldade aqui, já que o ciclo semanal foi mantido intacto. — VER OBJEÇÕES 119 E 129 (SÁBADO PERDIDO NO TEMPO).

2 REISOBJEÇÃO No. 31: O SÁBADO É CERIMONIAL COMO A LUA NOVA

26 O rumor de que cientistas, usando computadores da NASA para checar posições planetárias, teriam descoberto um dia inteiro faltando na história não passa de um mito urbano.

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ARGUMENTO: O fato de o sábado ser usado em conjunção com as luas novas em 2 Reis 4:23 é prova de que o sábado era apenas uma ordenança cerimonial.

RESPOSTA: A linha de raciocínio seguida pela objeção é a seguinte: Se o sábado era uma festa semanal; a Lua nova, por ser o primeiro dia do mês, era a festa mensal. Caso admitamos a perpetuidade do sábado, para sermos coerentes, precisamos aceitar o fato de que a Lua nova também é um preceito moral. Não sendo isto possível, resta apenas a opção de encarar tanto o sábado como o novilúnio mandamentos cerimoniais empregados pelos judeus para marcar o fim da semana e o início de cada mês. Este é um argumento falacioso, apesar de sua sutileza. Vejamos por que:

Contigüidade Não Significa Similaridade. O fato de o sábado formar um duo com a Lua Nova não prova nada a respeito da natureza do sábado. O serem dois mandamentos mencionados paralelamente nas Escrituras não significa que tenham a mesma natureza legal. Não vale aqui o provérbio: “Dize-me com que andas e te direi quem és”. Em Amós, por exemplo, a transgressão do sábado é classificada juntamente com as “balanças enganosas” e falsos pesos e medidas (Amós 8:5). E desonestidade certamente não é uma questão cerimonial! Em Lev. 19:3 o sábado é emparelhado com o quinto mandamento, e já em Lev. 19:30 o sábado aparece junto com a ordem para reverenciar o santuário. Como se pode ver, não encontramos nesses mandamentos duplos nenhum padrão definido de paralelismo.

Associação Não Significa Alteração de Natureza. O fato de o sábado ter sido instituído durante a semana da criação estabelece claramente que ele não é cerimonial. O fato de ter sido depois associado com leis cerimoniais e sacrifícios, por também fazer parte da lei pactual, não torna o sábado cerimonial, ou seja, a natureza do sábado não é alterada por causa de sua associação com regulamentos cerimoniais. Quando as leis cerimoniais cessaram, o sábado permaneceu, visto não ser parte integrante do sistema ritul.

Flagrantes Distinções. Além disso, são bem distintas as diferenças entre o sábado e a Lua nova. O sábado é anterior à Lua nova — foi instituído antes do pecado, no final da semana criativa. Deus descansou no sétimo dia, e não numa Lua nova! O sábado é um mandamento moral, pertencente ao Decálogo; celebra-se a cada semana. Já a Lua nova foi instituída depois do pecado, como ordenança cerimonial, para ser celebrada no primeiro dia de cada mês (Sam. 20:5, 24, 27),

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com abstenção de trabalho, é verdade, mas não de maneira tão rigorosa quanto no sábado do sétimo dia. Seu único destaque é o maior número de sacrifícios. Enquanto o sábado é um dia de descanso e adoração, a Lua nova era apenas uma festa religiosa e civil secundária, cujo objetivo era somente sinalizar os dias de festa cerimoniais (Eclo. 43:6). Daí seu nome em hebraico Rosh Hodesh, “Cabeça do Mês”.

Motivo da Menção Paralela. Se têm naturezas tão diferentes, por que então o sábado e a Lua nova são mencionados tantas vezes emparelhados? Simples. Porque tanto a Lua nova como o sábado eram dias de oferendas e assembléias solenes de periodicidade mais freqüente que as festas anuais (2 Crôn. 2:4; Isa. 1:13; Osé. 2:11; Amós 8:5). Assim como a semana era contada de um sábado a outro, o mês era contado de um plenilúnio a outros. Ezequiel 46:1 deixa bem claro que eram duas ocasiões (uma semanal e outra mensal) de reunião religiosa. Nesses dias ofereciam-se sacrifícios adicionais (Núm. 28:11-14), tocavam-se as trombetas (Núm. 10:10; Sal. 81:3), suspendiam-se os trabalhos servis (Amós 8:5) e era costume freqüentar-se a casa dos profetas para ouvir a Palavra de Deus ser lida e explicada (2 Reis 4:23; Eze. 46:1, 3). Havia, porém, uma diferença crucial entre ambos: diferentemente do sábado moral, a Lua nova, por ser o começo natural de uma divisão do tempo, era observado como feriado religioso. Não constituía, pois, dia de repouso solene. — VER OBJEÇÕES 17, 19, 20 E 101 (SÁBADO NÃO MORAL).

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OS SETE PROPÓSITOS DO SÁBADO

(Charles Hodge, Systematic Theology, In Three Volumes, Vol. III, págs. 321-348)

(1) Comemorar a obra da criação;(2) Preservar o conhecimento do único Deus verdadeiro;(3) Dar um sentido espiritual à vida humana;(4) Prover tempo para instrução religiosa e culto público a Deus;(5) Prover tempo para comunhão com o Criador;(6) Garantir repouso recuperativo para seres humanos e animais;(7) Distinguir o povo de Deus dos outros povos da Terra.

NEEMIASOBJEÇÃO No. 32: O DECÁLOGO SÓ VEIO À EXISTÊNCIA NO SINAI

ARGUMENTO: Os levitas discursando em Neemias 9:14 confirmam que os mandamentos, inclusive o sábado, só vieram à existência no Sinai. Portanto, o sábado faz parte apenas da aliança judaica.

RESPOSTA: Mais um caso de eisegese, isto é, de interpretar a Bíblia atribuindo-lhe as idéias do próprio leitor. A própria passagem de Neemias sinaliza na direção de que o Decálogo era uma legislação pré-mosaica. O texto não diz que Deus fez o sábado no Sinai, mas simplesmente que fez Israel conhecer o sábado naquela ocasião pela mão de Moisés. A razão é clara: pois haviam se esquecido grandemente dele durante sua permanência no Egito. O verbo hebraico para “conhecer” (yada’) na frase “o Teu santo sábado lhes fizeste conhecer”, dá a entender que a lei de Deus, inclusive o sábado já existiam e eram conhecidos antes da outorga da lei, o que está em plena concordância com Gên. 2:2-3; Êxo. 16:23, 18:16 e 18:20. Realmente, na legislação decretada no Sinai, nem tudo foi criado desde a raiz; muitos usos e costumes já introduzidos na prática social foram ratificados ou revalidados pela aprovação divina.

Este argumento, ao invés de diminuir a importância do sábado, vem só provar a distinção deste mandamento, pois o próprio fato de o sábado ser o único mandamento do Decálogo especificamente mencionado pelos levitas constitui prova adicional de que eles consideravam o quarto mandamento como tendo importância excepcional dentro do código moral. Segundo os rabinos, “o sábado sobrepujava todos os mandamentos da Tora” (ver Nee. 10:31-33; 13:15-22).

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Cinco Fases da Lei Moral. Na verdade, a lei de Deus tem origem mais remota do que imaginamos. Podemos falar da eterna lei de Deus como tendo cinco fases:

1. Antes da Criação. A lei de Deus existia antes de o homem ser criado. Era ela que regia (e ainda rege) os anjos e os habitantes dos mundos não caídos (Heb. 1:7, 14; Sal. 104:4). Estava, porém, adaptada à condição de seres santos. O fato de Lúcifer ter pecado no Céu é prova de que havia Lei ali. Como sabemos disto se não havia registro escrito formal da Lei? Por uma dedução muito simples: a Bíblia diz que onde não há lei não pode haver transgressão (Rom. 4:15), pois pecado é a transgressão da lei (1 João 3:4). Se o pecado foi imputado, é porque havia lei (Rom. 5:13). Lei e pecado são conceitos paralelos e coexistentes.

2. No Éden. Quando Deus criou o homem, não deixou ao cargo deste a tarefa de estabelecer seus próprios padrões morais. Inseriu na mente de nossos primeiros pais a Lei Moral, adaptada aos seres humanos. Seguindo o mesmo raciocínio anterior, concluímos também que havia lei no Éden, pois Adão e Eva não somente pecaram, mas introduziram o pecado no mundo (Isa. 43:27; Rom 5:12). Seu pecado básico foi a violação da propriedade alheia. E se eles pecaram é prova concludente de que a lei de Deus existia também antes da Queda (Rom. 5:12).

3. Após a Queda. Com a entrada do pecado, a imagem de Deus no ser humano ficou danificada e corrompida a sua mente. A lei precisou tornar-se mais específica: suas funções foram ampliadas, seus princípios sistematizados. Nenhum de seus preceitos, porém, foi subtraído. Os princípios da justiça continuaram imutáveis e continuarão imutáveis pelos séculos da eternidade. Deram-se apenas preceitos adicionais adequados ao estado caído da humanidade e os já existentes foram apresentados de maneira mais explícita. Instituiu-se o sistema cerimonial de sacrifícios, para que a pena de morte, em vez de cair instantaneamente sobre o transgressor, fosse transferida para uma vítima prefiguradora da oferenda futura do Filho de Deus. O certo é que Adão e Eva, depois de saírem do Éden, transmitiram fielmente essa informação a seus descendentes. Como sabemos disto? Seguindo aquela mesma linha de raciocínio:

1. Se Abel e seu irmão ofereciam sacrifícios (Gên. 4:4), é porque existia a Lei, visto que a única finalidade do sistema sacrifical era expiar o pecado.

2.Se Caim pecou cometendo homicídio, é porque depois da expulsão do Paraíso a Lei continuou em vigor (Gên. 4:7).

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3. Se os homens do tempo de Noé pecaram, é porque a Lei era conhecida no mundo antediluviano (Gên. 6:5-7; 11-13).

4. Se os homens de Sodoma eram maus e grandes pecadores contra o Senhor” (Gên. 13:13; 18:20) e se Abimeleque rei de Gerar que, depois de ter lançado mão de Sara, foi impedido de adulterar (Gên. 20:6,9), é porque existia Lei no tempo de Abraão.

5. Se Jó oferecia holocaustos pelos prováveis pecados de seus filhos, é porque existia Lei no tempo dos patriarcas (Jó 1:4-5).

6. Se Jacó achava que estava sendo perseguido pelo sogro porque havia pecado e se Tamar, a nora de Judá, foi acusada de adultério, é porque existia Lei no tempo de Jacó (Gên. 31:36; 38:24).

7. Se José, ao ser seduzido pela mulher de Potifar, não quis pecar contra Deus (fornicação e adultério); e se seus irmãos pediram perdão pelo pecado cometido contra ele (tentativa de homicídio) (Gên. 39:9; 50:17), é porque havia Lei no tempo de José.

8.Se Moisés, na sua juventude, sentiu-se esmagado pelo sentimento de culpa após ter matado um feitor (Êxo. 2:11-14), é porque havia Lei no tempo do cativeiro egípcio.

Cinco Passagens Irrefutáveis. Não bastassem todas essas deduções lógicas e práticas extraídas da história pré-sinaítica, a Bíblia apresenta cinco passagens claras, mostrando — às vezes de maneira tácita, às vezes de maneira expressa — que havia leis, estatutos e mandamentos antes do Sinai:

(1) Gênesis 26:5 afirma que Abraão “obedeceu à Minha voz [a de Deus], e guardou o Meu mandado, os Meus preceitos, os Meus estatutos e as Minhas leis.” (Gên. 26:5). Não resta dúvida de que as “Minhas leis” do tempo de Abraão eram as mesmas “Minhas leis” repromulgadas no Sinai.

(2) Êxodo 13:9, onde é dada a recomendação de a “lei do Senhor” estar na boca dos israelitas.

(3) Êxodo 15:26, onde Deus promete alguns meses antes de chegarem ao Sinai: “Se ouvires atento a voz do Senhor, teu Deus, e fizeres o que é reto diante dos Seus olhos, e deres ouvido aos Seus mandamentos, e guardares todos os Seus estatutos, nenhuma enfermidade virá sobre ti, das que enviei sobre os egípcios; pois Eu sou o Senhor, que te sara.

(3) Êxodo 16:28 onde Deus reclama: Até quando recusareis guardar os Meus mandamentos e as Minhas leis?”

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(4) Em Êxodo 18:16 quando Moisés recomenda: “Quando tem alguma questão, vem a mim, para que eu julgue entre um e outro e lhes declare os estatutos de Deus e as Suas leis”.

(5) Em Êxodo 18:20 quando Deus instrui Moisés a respeito do povo: “Ensina-lhes os estatutos e as leis e faze-lhes saber o caminho em que devem andar e a obra que devem fazer”.

À vista de todas essas evidências, concluímos que a lei não foi algo que surgiu somente no Sinai. No Céu, no Éden, no mundo antediluviano e no período patriarcal ou mesmo durante o cativeiro egípcio e nas peregrinações no deserto anteriores à aliança sinaítica, a lei existia e era conhecida, na sua íntegra, pelos descendentes fiéis de Adão, desde o princípio do mundo. O que Deus fez no Sinai foi apenas registrar oficialmente algo que já estava implantado no coração, na mente e na consciência do homem. — VER OBJEÇÕES 14, 28, 82 E 98 (LEI SÓ NO SINAI).

OS DEZ MANDAMENTOS NO SINAI OS DEZ MANDAMENTOS ANTES DO SINAI

Primeiro Mandamento (Êxo. 20:3) Gên. 35:2 (A família de Jacó possuía deuses estranhos)Jos. 24:2 (Os antepassados de Abraão serviam a outros deuses)

Segundo Mandamento (Êxo. 20:4-6) Gên. 31:19 (Labão adorava ídolos)Terceiro Mandamento (Êxo. 20:7) Heb. 12:16 (Esaú era profano).Quarto Mandamento (Êxo. 20:8-11) Gên. 2:2-3; Êxo. 16 (Descanso sabático

associado com o maná)Quinto Mandamento (Êxo. 20:12) Gên. 9:20-27 (Noé amaldiçoou o

desrespeito filial de Cam)Gên. 27:19 (Jacó enganou o próprio pai)

Sexto Mandamento (Êxo. 20:13) Gên. 4:8-16 (Caim cometeu homicídio)Gên. 4:23 (Lameque assassinou um homem)Êxo. 2:11-14 (Moisés matou um egípcio)

Sétimo Mandamento (Êxo. 20:14) Gên. 4:19 (Lameque praticou bigamia)Gên. 39:9 (José decidiu não fornicar)Gên. 38:24 (Tamar foi acusada de

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adultério)Oitavo mandamento (Êxo. 20:15) Gên. 27:35-36 (Jacó apoderou-se por

fraude dos direitos espirituais e materiais do irmão)Gên. 31:19 (Raquel furtou os ídolos paternos)

Nono Mandamento (Êxo. 20:16) Gên. 12:11-13 (Abraão mentiu para o Faraó)Gên. 20:2 (Abraão mentiu para Abimeleque)Gên. 26:7 (Isaque mentiu para os homens de Gerar)Jó 1:22; 2:10 (Jó não pecou com os lábios)

Décimo Mandamento (Êxo. 20:17) Gên. 3:6 (Eva cobiçou uma árvore que pertencia a Deus)Gên. 20:9 (Abimeleque cobiçou a mulher de Abraão).

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ISAÍASOBJEÇÃO No. 33: DEUS ABORRECE O SÁBADO

ARGUMENTO: Isaías 1:13 é uma prova concludente de que o sábado é um mandamento cerimonial, pois Deus não pode abominar princípios morais.

RESPOSTA: Deus está mesmo dizendo que aborrece o sábado? Para fins de coerência, a resposta só poder ser Não, visto que o próprio profeta, mais adiante afirma haver uma bênção para aquele que chamar ao sábado santo e deleitoso (Isa. 58:13). E em Gên. 2:1-3 está escrito que Ele abençoou e santificou este dia. Jó 38:7 diz que os anjos cantaram de júbilo quando o sábado foi instituído. O sábado tradicionalmente não era um dia apropriado para jejum (Jubileu 50:12 e Judite 8:6). Ao contrário, era um dia de “alegria, um daí de refrigério espiritual e reverente adoração”.27 Como, pois, um dia criado para ser bênção e alegria se tornaria depois uma coisa abominável (to‘ebah), seja no sentido ético, seja no sentido ritual?

Não o Dia, Mas o Abuso. A aparente contradição mostra que o problema aqui não são os dias em si. O que Deus aborrecia, naquele momento, não eram as Luas novas nem os sábados, mas as práticas realizadas nesses dias ou com relação a esses dias. Note como o próprio verso se auto-explica quando diz: “Não posso suportar iniqüidade associada ao ajuntamento solene.” Os judeus haviam reduzido a observância dessas solenidades a práticas exteriores, formalistas, hipócritas, destituídas de sentido e eficácia espiritual (2 Tim. 3:5; cf. Amós 8:5). Para Deus, o ritual e a cerimônia perdem o significado toda vez que falta a justiça, a misericórdia, o arrependimento e a fé (1 Sam. 15:22). Foi isso que Deus falou a Saul por intermédio de Saul: “O Senhor, o que quer? Holocaustos e sacrifícios, ou obediência à Sua Palavra? A obediência vale mais que o sacrifício”. 1 Sam. 15:22, CNBB.

Esta passagem, portanto, nada diz quanto à abolição do sábado na dispensação cristã. Trata-se de uma repreensão divina dirigida ao povo judeu. As 27 Walter A. Elwell, ed., The Evangelical Dictionary of Theology, pág. 964.

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ofertas, luas novas, sábados e ajuntamentos solenes de Israel não eram, em si mesmos, uma abominação, mas se tornaram abomináveis ao Senhor por causa da iniqüidade do povo. A oração, por exemplo, que, em si mesma, não é abominável, pode, sob certas circunstâncias, tornar-se uma abominação: “O que desvia os ouvidos de ouvir a lei, até a sua oração será abominável.” Prov. 28:9. Assim como esta passagem não oferece margem para objeção contra a oração, também Isaías 1:13 não sugere que a observância do sábado, em si mesma, seja abominável.

OBJEÇÃO No. 34: OS SÁBADOS SÃO APENAS PARA OS DESCENDENTES DE JACÓ

ARGUMENTO: O preceito do sábado se aplica exclusivamente à casa de Jacó, ou seja, aos israelitas (Isaías 58:13-14).

RESPOSTA: Este texto não dá suporte ao ponto de vista. Primeiro porque o sábado foi criado pelo menos 2.300 anos antes de Jacó existir (Gên. 2:1-3). Segundo porque o significado único que o profeta messiânico tinha em vista ao escrever a passagem em questão era o de que a promessa feita à casa de Jacó — de liberdade, prosperidade e vitória (cf. Deut. 32:13) — seria também outorgada aos outros observadores do sábado, independentemente de sua etnia ou nacionalidade. Isto se harmoniza com um provérbio de livre curso entre os antigos judeus: o de que o Decálogo foi dado no deserto, e não na Palestina, para mostrar que Sua lei se destinava a todos os povos e épocas.

Ainda que o preceito do quarto mandamento tenha sido dirigido exclusivamente aos israelitas, isso não anula sua universalidade. Não importa a que povo Deus Se dirija quando proclama Suas leis, o que importa é se o que disse é moralmente normativo. E o sábado semanal o é (Êxo. 20:8-11). Aliás, o próprio fato de ele ser o sétimo dia já confirma isto, visto que o número sete simboliza universalidade.28 No sermão da montanha, Cristo também se dirige exclusivamente a judeus. Significa isso que os princípios universais ali expostos pelo Mestre devam ficar limitados somente aos judeus? É claro que não. — VER OBJEÇÕES 13, 18 E 23 (SÁBADO COMO INSTITUIÇÃO JUDAICA).

28 Summa Theologica, *Q 102.

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OBJEÇÃO No. 35: A PROFECIA DO SÁBADO ERA SÓ PARA A CANAÃ TERRESTRE

ARGUMENTO: Os sabatistas costumam citar Isaías 66:23 como prova de que o sábado será observado na Nova Terra. Mas, se é assim, o profeta faz alusão também no mesmo versículo às Luas novas. Significa isto que a Festa da Lua nova (um mandamento cerimonial) também será observada na nova Terra? A profecia tanto do sábado como da Lua nova não se refere apenas à Canaã Terrestre?

RESPOSTA: Neste versículo Isaías fala de pessoas se reunindo sistematicamente em Canaã para adorar a Deus em duas ocasiões: no primeiro dia de cada mês (Lua nova) e no sétimo dia de cada semana (sábado). Emprega essas reuniões de periodicidade mensal e semanal, porque para o profeta, elas eram emblema da estabilidade da vida religiosa. Mas a pergunta que se impõe é: de que Canaã o profeta está falando? Da terrestre ou da celeste?

Duas Canaãs. De ambas. Note que ele fala dos “novos céus e da nova terra” tanto no contexto da restauração da Jerusalém terrena (Jer. 3:16-17) e do reagrupamento dos judeus “dentre todas as nações ... ao Meu santo monte, a Jerusalém” (Isa. 66:20) após o cativeiro babilônico, quanto da Terra renovada após o milênio. Isto significa que a descrição de toda carne vindo adorar “de uma Lua Nova à outra e de um sábado a outro” possui dupla aplicação: refere-se, em primeiro lugar, à ansiada restauração política de Jerusalém e de seus serviços religiosos; e, em segundo lugar, aponta para a restauração desta Terra no tempo do fim. Portanto, podemos dizer que Isa. 66:23 é uma profecia que teve cumprimento primário no passado e terá um cumprimento secundário ainda no futuro. Refere-se tanto à Canaã Terrestre como à Celeste.

Dualidade Profética. Não devemos ver nisso algo extraordinário. Não era incomum os profetas bíblicos misturarem a descrição de acontecimentos históricos prestes a ocorrer em determinado ponto geográfico com acontecimentos futuros de dimensões cósmicas, pelo fato de se prestarem aqueles ao papel de tipificarem estes. As declarações proféticas às vezes se aplicam a cumprimentos duais.

Jesus, por exemplo, em seu discurso do cap. 24 de Mateus, refere-se tanto à destruição de Jerusalém ocorrida no ano 70 como à destruição do mundo no dia da Sua vinda. Noutra ocasião (Mat. 17:11-12) faz uma aplicação dupla do “Elias”

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que precede a vinda do Messias como referindo-se primeiramente a João Batista e em segundo lugar ao povo remanescente de Deus dos últimos dias. O próprio Isaías utiliza esse recurso mais de uma vez. Em Isaías 13:6, por exemplo, anuncia a proximidade do Dia do Senhor relacionando-o com a destruição de Babilônia pelos medos. Os estudiosos da Bíblia chamam essa capacidade dos profetas de divisarem em acontecimentos históricos localizados cumprimentos parciais de realizações escatológicas de proporções globais, de “dualidade profética” ou “perspectiva profética”.

É exatamente isso o que se verifica com Isa. 66:23. O profeta fala de dois momentos históricos diferentes, dentro dos quais insere um mandamento cerimonial (Lua nova) e um mandamento moral lado a lado. Qual, porém, destes elementos se aplica apenas a Israel nacional e qual haverá de continuar na nova Terra?

Festas de Luas Novas Não Se Aplicam à Nova Terra. Ao fazer a distinção entre as funções históricas e escatológicas da descrição de Isaías, fica evidente que a referência a Luas novas no seu aspecto ritualístico não se aplica à Nova Terra, pois a função primária da Lua Nova era ajudar o antigo Israel a calcular o tempo de suas festas anuais e essa função deixou de existir quando Cristo morreu. É possível, contudo, que em seu aspecto cronológico, as Luas novas da típica Canaã Terrestre sejam uma indicação referencial de tempo29 para as reuniões mensais que os remidos realizarão na Canaã Celeste, tempo em que visitarão a Nova Jerusalém para participarem da árvore da vida, que produz seu fruto de “mês em mês” (Apoc. 22:3). Isso concorda com 1 Sam. 20:5, de onde se depreende que a Lua nova era uma ocasião de banquete.

O Sábado é Eterno. Quanto ao sábado, este subsistirá para sempre. Primeiro porque se trata de uma lei moral, e as leis morais são eternas. Segundo porque, se ele foi feito por causa do homem, conforme afirmou Jesus, enquanto existir homem, existirá sábado. Terceiro porque foi criado antes da Queda, quando o mundo era perfeito. Todos guardarão o sábado na Nova Terra como sinal de eterno reconhecimento de que Cristo restaurou o paraíso edênico que havia criado.

29 Em heb. khodesh não significa apenas “Lua nova”, mas também “mês”, “mensal”, “primeiro dia do mês”. A Lua foi designada no princípio, antes de haver Festas de Lua Nova, junto com o Sol e as estrelas com o objetivo de “fazerem separação entre o dia e a noite” e servirem de “sinais, para estações, para dias e anos”. Gên. 1:14. Semelhantemente, servirá na nova Terra como referencial cronométrico para as reuniões mensais, assim como o Sol indicará, em seu sexto ocaso, a chegada do sábado.

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Ao falar para os judeus sobre a questão do divórcio, Jesus expôs o princípio de que tudo quanto foi instituído por Deus no princípio, isto é, antes da Queda, reflete a perfeição divina, pelo que não pode perder sua função e aplicabilidade. O mesmo princípio atesta que tudo quanto foi afetado pelo pecado deve ser restaurado (Mat. 19:8). Ora, se a Terra renovada há de ser uma retomada da história edênica, temporariamente interrompida por causa do pecado, o sábado está incluso neste princípio, pois foi criado antes da Queda, e certamente será guardado na Nova Terra, quando estiver completada a “restauração de todas as coisas” (Atos 3:21). Afinal de contas, o Éden era uma miniatura do Céu encravada neste planeta. Pois Sua "obra é perfeita" (Deut. 32:4); e "tudo quanto Deus faz durará eternamente". Ecles. 3:14.

Em resumo, a festividade da Lua nova não será guardada na Nova Terra. Mas o sábado, sim. Do mesmo modo que o sábado foi guardado no Éden antes da entrada do pecado, assim será observado eternamente na nova Terra, depois da restauração (Isa. 66:22-23). Enquanto céus e Terra durarem, há de continuar o sábado como sinal do poder do Criador. Quando o Éden florescer novamente na Terra, o santo e divino dia de repouso será honrado por todos debaixo do Sol. "A cada semana e a cada mês”, os habitantes da glorificada nova Terra virão prostrar-se diante de Deus para O adorar. Isa. 66:23 (BV). — VER OBJEÇÃO 31 (LUA NOVA).

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OSÉIASOBJEÇÃO No. 36: O ANTIGO TESTAMENTO PREDISSE A ABOLIÇÃO DO

SÁBADO

ARGUMENTO: Oséias 2:11 prediz a abolição de todas as solenidades, inclusive do sábado do sétimo dia.

RESPOSTA: Pretende-se que esta passagem seja o anúncio da abolição, supressão e extinção de todo o cerimonialismo judaico, inclusive do sábado semanal na nova dispensação. Antes, porém, de tirarmos conclusões apressadas, precisamos analisar o contexto histórico desta declaração.

Refere-se ao Cativeiro Babilônico. Um exame cuidadoso da passagem provará que esta profecia aponta não para a dispensação cristão, mas sim para o exílio babilônico. Na verdade, a condição aqui descrita teve seu cumprimento pleno na destruição de Israel pelos babilônios por volta do século VII a.C. Precedentes históricos dão conta que, desde os dias de Salomão, os judeus vinham observando as formas religiosas sem a necessária contrição de coração. Haviam erigido imagens de escultura de deuses pagãos no Templo de Deus em Jerusalém. Isto aborreceu grandemente ao Senhor (Isa. 1:11-19). O pecado e a alegria não podem permanecer juntos muito tempo. Se Israel não eliminasse o pecado de sua alegria, Deus retiraria a alegria de seu pecado. E foi isso que aconteceu. O Senhor retirou Sua proteção de Judá e permitiu que Babilônia prevalecesse contra ele. Com o templo destruído, e exilados para uma terra distante e pagã, os judeus ficaram impossibilitados de celebrar suas festas religiosas: as Luas novas, os sábados e as solenidades (Lam. 2:6-7).

Refere-se à Impossibilidade de Celebrar as Festas. Por que o impedimento? Por um simples motivo: essas festas só podiam ser celebradas em Jerusalém por estarem intimamente relacionadas com o templo, e tanto Jerusalém como o templo estavam destruídos.

Percebe-se claramente que o que o profeta está predizendo aqui não é a abolição do sábado semanal nem de qualquer outro tipo de sábado ou serviço religioso, mas apenas a impossibilidade temporária de celebrarem os cativos os sábados cerimoniais, já que estes não podiam ser celebrados em terra estrangeira. O sábado semanal não tem como os cerimoniais, essa limitação geográfica. Sua base é o tempo e não o espaço. Nesta condição, para os judeus

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que estavam em Babilônia não havia nenhum impedimento temporal para observarem o sábado semanal, a não ser a própria condição escrava.

Outra forte evidência de que Oséias não está tratando aqui da abolição do sábado semanal, é o fato de ter sido o desrespeito do reino do norte para com os sábados morais o principal motivo apontado para o cativeiro babilônico. Os rabinos costumavam dizer: “Jerusalém não teria sido destruída, se os sábados do Senhor não tivessem sido profanados”. Pelo menos duas passagens confirmam esse ponto de vista: Nee. 13:15-18; Jer. 17:21-22 e 27.

Além do mais, essa interrupção foi temporária já que, após os setenta anos de cativeiro babilônico, a observância das festas foi plenamente restaurada com a retomada dos serviços do templo reedificado (2 Crôn. 36:21; Nee. 13:15-22). Tanto isto é verdade que no tempo de Jesus, oito séculos depois de Oséias, todas as festas e solenidades judaicas eram celebradas regularmente, como se deduz com fartura do relato dos Evangelhos.

A única interpretação racional para o verso é assumir que ele esteja aludindo à cessação dos holocaustos do Templo de Jerusalém, os quais eram oferecidos nas datas sagradas do calendário religioso de Israel. Com a destruição do santuário israelita pelos exércitos da Babilônia, os sacrifícios deixaram de ser oferecidos e as cerimônias não mais eram realizadas, o que se encaixa perfeitamente com a idéia central da passagem em consideração.

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PARTE DOIS:O SÁBADO E O NOVO TESTAMENTO

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OS EVANGELHOSOBJEÇÃO No. 37: A TRADIÇÃO JUDAICA DESACREDITOU O SÁBADO

ARGUMENTO: O sábado não pode ser um preceito divino se sua observância leva muitas vezes as pessoas a se tornarem legalistas, como foi o caso dos judeus da época de Cristo. Este fator, portanto, desacredita a validade e valor do sábado na dispensação cristã.

RESPOSTA: O fato de os judeus no passado — ou mesmo de pessoas no presente — terem tornado a observância do sábado algo odioso pelos seus excessos não desacredita o quarto mandamento. Um preceito divino não perde o valor pelo fato de ter sido pervertido por alguns ou mesmo por muitos ou todos. Mesmo porque o problema não estava no sábado em si, mas na interpretação legalista que os judeus lhe impingiam. É como preceitua uma antiga máxima latina: Abusus non tolitit usum (o abuso não impede o uso).

Somente a aplicação deste princípio bastaria para refutar o argumento e encerrar a discussão. Mas, tendo em vista que, ao estudarmos as objeções levantadas contra o sábado a partir de passagens do Novo Testamento, precisamos compreender o pano de fundo histórico da tradição judaica relativa ao sábado, aproveitamos a oportunidade para explicar desde quando e por que motivo os judeus da época de Cristo adotaram atitudes tão fanáticas. Compreender isso é essencial para entender a questão do sábado no NT e na igreja primitiva.

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Desde Quando? “Foi durante o período compreendido entre Esdras e a era cristã que o espírito de legalismo judaico floresceu. Formularam-se inúmeras restrições e regras para a condução da vida sob a lei. Grandes princípios foram perdidos de vista na massa de detalhes insignificantes” (International Standard Bible Encyclopedia, art. “Sabbath”). A tendência para a observância rigorosa do sábado iniciada durante e depois do Exílio (Ezequiel, Esdras e Neemias) tornou-se particularmente pronunciada durante o período intertestamental. Durante esse período, foi surgindo gradualmente uma alteração na compreensão do propósito do sábado. O judaísmo começou paulatinamente a dividir-se em dois grupos. Enquanto em outras partes da diáspora prevalecia uma atitude mais liberal com relação à observância do sábado, na Palestina e na Mesopotâmia predominou uma atitude mais rígida e legalista.

Por Quê? Após voltarem do cativeiro babilônico e entenderem que sua nação havia sido levada cativa em resultado direto da violação da lei de Deus, em especial do sábado (Jer. 17:21, 22, 27; Eze. 20:12, 13, 16; 22:26) — os setenta anos de cativeiro fora o castigo pelos 420 anos (desde os dias de Salomão até o tempo de Nabucodonosor) de profanação do sábado — os judeus tomaram a firme decisão de não mais voltar a cometer o mesmo erro. Além disso, para protegê-lo de influências frouxas gentias. Foi nessa época também que surgiram as sinagogas.

Nesta conformidade, as autoridades religiosas, em seu zelo sem entendimento, desenvolveram um maciço conjunto de regulamentos elaborados que detalhavam meticulosamente o que eles consideravam permitido e não permitido no sábado. Presumiram que uma obediência mecânica à tradição oral impediria automaticamente a violação da lei escrita. Fizeram isso com tanto exagero que o resultado foi um conjunto de regulamentos opressivos, extremistas e legalísticos, que chegavam ao cúmulo de condenar até a maneira convencional de observar o sábado estipulada e aprovada por Deus. O espírito do sábado, que era de alegria30, passou a ser de tristeza.

Rigorismo. Para se ter uma idéia de como o sábado se tornou paradoxalmente distorcido pela burocracria escravizanteão posso suportar iniqüidade associada ao ajuntamento solene da legislação rabínica, ao tempo dos macabeus, judeus fiéis deixavam-se massacrar pelos sírios em vez de lutar no sábado pela própria vida (1 Mac. 2:35-38). Sob a influência desse fanatismo, elaboraram dois volumosos tratados (Shabbath e Erubin) que codificavam todos

30 Smith’s Bible Dictionary, art. “Sabbath”.

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os atos proibidos no sábado: 39 principais, que se subdividiam em minutíssimas e infinitas restrições. No sábado, por exemplo, era proibido cuspir no chão (pois era o mesmo que arar a terra), andar sobre a grama (pois era o mesmo que moer gramínea), usar sandálias pregadas com prego (pois era carregar peso) nem se podia retirar uma pulga (pois era o mesmo que caçar). Não se podia encanar um osso fraturado nem enfaixar uma entorse. Carregar tinta suficiente para escrever duas letras do alfabeto. Nem mesmo uma lâmpada podia ser acesa (The Zondervan Pictorial Bible Dictionary).

Podemos classificar os abusos do sábado em pelo menos três categorias: 01) Guardavam o sábado apenas exteriormente, sem permitir que a mente e o coração fossem santificados pelas bênçãos daquele dia; 02) Acrescentaram regras e regulamentos humanos (cerca de 1.500) ao sábado no esforço de impor sua observância; 03) Finalmente, fizeram do sábado um clube exclusivo para separá-los das outras nações. Perderam de vista, com bem o observou Jesus, os preceitos mais importantes da Lei: a justiça, a misericórdia e a fé. Mat. 23:23.

Foi nessa atmosfera religiosa de exigências descabidas e fanáticas que Jesus veio ensinar e pregar. Sem esse pano de fundo histórico, muitas pessoas chegariam hoje a conclusões errôneas sobre a maneira como Jesus agia em relação ao sábado e falava sobre ele em seus vários confrontos com os líderes religiosos de Seu tempo.

OBJEÇÃO No. 38: O NOVO TESTAMENTO DÁ POUCA IMPORTÂNCIA AO SÁBADO

ARGUMENTO: O Novo Testamento fala muito pouco sobre o sábado. Era, sem dúvida, um assunto de somenos importância.

RESPOSTA: Este argumento revela ignorância supina das Escrituras. Existe, efetivamente, no Novo Testamento inúmeras indicações tanto implícitas como explícitas do prestígio do sábado. É quase impossível alguém ler esta segunda parte da Bíblia, e não encontrar o conceito do sábado, que é ali citado pelo nome, nada mais nada menos, que 60 vezes. Somente nos Evangelhos a palavra “sábado” é mencionada 50 vezes, quantidade superior à referida em todo o Pentateuco. O espaço incomum e a atenção dedicada nos evangelhos àquilo que Jesus disse sobre o sábado e o que nele realizou indicam a grande importância dada à

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observância do sábado em suas respectivas comunidades no tempo em que eles foram escritos.

OBJEÇÃO No. 39: O MANDAMENTO DO SÁBADO NÃO É RATIFICADO NO NOVO TESTAMENTO

ARGUMENTO: Não encontramos no Novo Testamento nenhum versículo reordenando a guarda do sábado, portanto ele não é obrigatório na dispensação cristã. Se Deus queria que os cristãos observassem o quarto mandamento, tê-lo-ia revalidado no Novo Testamento como o fez com os outros nove mandamentos.

RESPOSTA: A conclusão deste argumento (conhecido como argumento das “Escrituras Silenciosas” ou argumentum a silentio) não é válida por pelo menos três razões:

Silêncio Não Significa Negação. Primeiramente, porque se apóia numa falsa premissa: a de que silêncio signifique negação. Sabemos que o fato de um mandamento anteriormente estabelecido não ser ordenado explicitamente não prova sua abolição. Ao contrário, em alguns casos pode até mesmo significar aceitação implícita. Repare que também não existe repetição ad litera do mandamento do dízimo no NT. O segundo mandamento, que proíbe a confecção de imagens, jamais é mencionado no Novo Testamento. Significa isso, porém, que os cristãos não devem dizimar ou que estão liberados para a prática da idolatria? De maneira nenhuma! Neste caso, o silêncio pressupõe validade. Assim também acontece com o sábado.

Apesar disso, mesmo que as menções ao sábado sejam de caráter acidental (como era de se esperar de um mandamento que não está sob contestação), elas apresentam vigoroso testemunho em favor da obrigatoriedade implícita do sábado, já que o mencionam como procedimento natural de Jesus e dos discípulos. Sempre que os escritores do NT mencionam o sábado, não deixam transparecer rejeição. Além disso, pelo menos uma vez é dito que alguns de seus discípulos, inclusive Sua mãe, repousaram conforme o quarto mandamento (Luc. 23:54).

Os Dez Mandamentos Não São Revalidados no NT. Em segundo lugar, porque este argumento se escora noutra premissa defeituosa: a de que todos os dez mandamentos, com exceção do quarto, são revalidados no NT. Isso faria do

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A PALAVRA SÁBADO APARECE 60 VEZES NO NOVO TESTAMENTO

Sabbata — “sábado" — Usado 20 vezes (Mat. 12:1, 5, 10,11,12; 28:1; Mar. 1:21; 2:23,24; 3:2,4; Luc. 4:16,31; 6:2,9;13:10; Atos 13:14; 16:13; 17:2; Col. 2:16).Sabbaton — "sábado" — Usado 39 vezes (Mat. 12:2, 5, 8; 24:20; Mar. 2:27-28; 6:2; 16:1; Luc. 6:1,5,6,7; 13:14,14,15,16; 4:1,3,5; 23:54,56; João 5:9,10,16,18; 7:22,23; 9:14,16; 19:31; Atos 1:12; 13:27,42,44; 15:21; 18:4).Prosabbaton — "dia anterior ao sábado" — Usado 1 vez (Mar. 15:42).

Decálogo um Nonálogo. Na verdade, nenhum dos mandamentos foi revalidado no NT — nem precisavam ser, porquanto Deus jamais os aboliu. Os escritores do NT não viam Cristo como novo Legislador, mas nas funções de Profeta, Sacerdote e Rei. Para eles, o Messias não vinha formular novas leis, mas revelar a verdadeira intenção espiritual das leis divinas já existentes (Mat. 5:17-18; Luc. 16:17; Rom. 8:4; João 7:14; 14:24; Mat. 7:12). Deus Pai é o Legislador, enquanto Cristo é nosso advogado (Tia. 4:12; 1 João 2:1).

Se o mandamento do sábado não é explicitamente repetido no Novo Testamento, nem por Jesus nem pelos apóstolos, é pela mesma razão por que os outros nove, apesar de serem mencionados, não são revalidados — porque o Decálogo era algo tomado como certo. O Novo Testamento não é um livro de novas leis. Não promulga novas leis morais, mas assume as do AT (Rom. 7:12). “Quando a Bíblia dá uma ordem explícita e não a anula posteriormente, esta deve ser aceita como a vontade revelada de Deus e como mandamento que tem por fim moldar nosso comportamento individual e coletivo na forma dessa instrução.” (J. Robertson McQuilkin, “Limits of Cultural Interpretation”, Journal of the Evangelical Theological Society 23:119, Junho de 1980.)

Comunidade Sabatista. Além disso, Jesus e os apóstolos viveram e ensinaram numa sociedade observadora do sábado. A prática da observância do sábado era coisa consabida. O historiador judeu Flávio Josefo escreveu: "Grande parte da própria humanidade tem sentido grande inclinação para seguir nossas observâncias religiosas; pois não há cidade dos gregos nem dos bárbaros nem de qualquer outra nação, a quem o nosso costume de abster-nos do trabalho no sétimo dia não haja chegado. . . Assim como o próprio Deus permeia todo o mundo, assim tem nossa lei atravessado todo o mundo." (Contra Apion, 2:39, 40). Atos 15:21 confirma o que o sábado era uma doutrina divulgada em todo o império em virtude das sinagogas. Era supérfluo tentar apresentar provas a favor daquilo de que ninguém duvidava. Portanto, se o mandamento do sábado não é explicitamente ordenado no Novo Testamento, é porque fazer isto era insistir no óbvio, chover no molhado (Samuele Bacchiocchi, The Sabbath in the New Testament, cap. 10, “Questions About the Sabbath in the New Testament”).

OS DEZ MANDAMENTOS NA BÍBLIAOS DEZ MANDAMENTOS NO ANTIGO

TESTAMENTO

OS DEZ MANDAMENTOS NO NOVO TESTAMENTO

Primeiro Mandamento (Êxodo 20:3) Mat. 4:10; 6:33; 22:37-38; 23:9; Marc. 12:29, 32; Luc. 4:8; Atos 5:29; 14:14-15;

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18:13; Rom. 3:29; 6:16; 16:26; 1 Cor. 8:4-6; 2 Cor. 6:16; Gál. 2:19; 4:8-9; Col. 3:23-24; 1 Tess. 1:9; 2 Tess. 2:4; 1 Tim. 2:5; Heb. 1:8,

12; 12:28; 1 Ped. 2:17; Apoc. 14:7Segundo Mandamento (Êxodo 20:4) Mat. 6:21; 6:24; 19:21, 24; Marc. 10:21; Luc.

12:34; 18:22; João 4:24; Atos 17:29; Rom. 1:23; 2:22; 1 Cor. 6:9; 10:7, 14; Efés. 5:5;

Col. 3:5; 1 Tess. 1:9; 1 Ped. 4:3; 1 João 5:21; Apoc. 14:9; 22:15.

Terceiro Mandamento (Êxodo 20:7) Mat. 5:33-37; 6:9; 7:21-23; Luc. 11:2; João 17:26; Rom. 2:24; Fil. 2:6; Fil. 2:10; 1 Tim. 1:13, 20; 6:1; Tia. 5:12; Apoc. 13:5-6; 17:3.

Quarto Mandamento (Êxodo 20:8) Mat. 12:8; 12:1-14;. 24:20; 27:62; 28:; Mar. 2:27-28; 15:42; 16:1; Luc. 6:5;

23:54, 56; João 19:31; Atos 14, 42-44; 16:13; 18:3-4; Heb. 4:4-6, 9, 10.

Quinto Mandamento (Êxodo 20:12) Mat. 15:4, 9; 19:19; Marc. 3:35; 7:10; 10:19; Luc. 8:19-21; 18:20; Ef. 6:1-4; Col. 3:15; 1 Tim. 3:4-5; 5:4; Tito 1:6; 2:4; 1 João 5:1;

Apoc. 19:7.Sexto Mandamento (Êxodo 20:13) Mat. 5:21-26; 18:14; Mat. 19:18; Mar. 10:19;

Luc. 18:20; Rom. 13:9; Gal. 5:15; Tia. 2:10-12; 8:11; 1 João 3:14-15; Apoc. 22:15

Sétimo Mandamento (Êxodo 20:14) Mat. 5:27, 33-37; 19:9, 18; Mar. 10:5-12; 10:19; Luc. 16:18; 18:20; Rom. 2:22; 7:2-3; 13:9; 1 Cor. 5:1; 6:9, 15-20; 7:2-9; 7:10-16; 7:25-28; 7:39; 10:8; 1 Tess. 4:3-4; Col. 3:5; 1 Tim. 3:2; Tito 1:6; Heb. 13:4; Tia. 2:11; 2 Ped. 2:14; Judas 7; Apoc. 2:21; 14:4; 17:2;

18:23.Oitavo Mandamento (Êxodo 20:15) Mat. 19:18; Mar. 10:19; Luc. 18:20; Rom.

2:21; Rom. 13:9; 1 Cor. 6:9-10; Ef. 4:28; Tito 2:10; Tia. 2:11.

Nono Mandamento (Êxodo 20:16) Mat. 5:33-37; 19:18; Mar. 10:19; Ef. 4:25; Luc. 18:20; Rom. 13:9; Col. 3:9; 1 Tess. 2:3-6; 2 Tim 3:13; Tito 3:2; Tia. 2:12, 22; 4:11;

5:12; 1 João 2:21, 26; Apoc. 3:9; 21:27; 22:15.

Décimo Mandamento (Êxodo 20:17) Mat. 19:21; Mar. 10:21; Luc. 12:15; 18:22; Rom. 7:7; 13:9; 1 Cor. 10:6; Col. 3:5; Efés.

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5:3-5; Tia. 1:14-15; 1 Tim. 6:9; 1 João 2:4; Judas 11.

OBJEÇÃO No. 40: JESUS TRANSGREDIA O SÁBADO

ARGUMENTO: Jesus é nosso exemplo em todas as coisas. Se Ele transgredia o sábado, também podemos fazê-lo.

RESPOSTA: Os evangelhos relatam numerosos incidentes em que Jesus é acusado de violar a lei do sábado. Mas Jesus nunca — e esse nunca é absolutamente exato — profana a santidade desse dia. Esta é uma interpretação arbitrária dos episódios sabáticos registrados nos evangelhos. O que os defensores desse ponto de vista não conseguem ver é que a maneira “inusitada” de Jesus observar o sábado tinha por fim não anular, mas esclarecer a intenção divina do quarto mandamento.

Discussões Sobre O Modus Faciendi. As confrontações entre Ele e os fariseus era sempre sobre a forma pela qual o sábado devia ser guardado sábado (o que era ou não permissível), e nunca sobre se ele deveria ser guardado ou não. Jesus jamais questionou o princípio de descanso deste dia ou da validade deste dia, visto ter sido Ele mesmo que o criou como descanso para a humanidade (ver 1 Cor. 8:6; Heb. 1:1-2; João 1:3). O que Ele atacava e criticava abertamente não era o mandamento em si, mas o formalismo dos judeus, formalismo que muitas vezes obscurecia o verdadeiro espírito deste e de outros mandamentos de Deus (Mat 5:21-22, 27-28; 9:13; 12:7; 23:1-39). E esse esclarecimento era urgentemente necessário para o quarto mandamento, cujo significado e função foram obscurecidos por mais de 1.500 regulamentos rabínicos que normativazam sua observância.

Uma prova disso é que todas as vezes que Cristo ou Seus discípulos foram acusados de violar o sábado Ele defendeu a própria conduta e/ou a de Seus discípulos apelando para as Escrituras (Mat. 12:3, 5) e demonstrando assim que suas ações estavam em harmonia com a intenção divina do sábado. Uma defesa nunca é destinada a admitir a acusação.

Rejeitava o Fanatismo, não o Sábado. Conforme bem o explica O Novo Dicionário da Bíblia, na pág. 1422: “Foi contra essa sobrecarga aos mandamentos, pelas tradições humanas, que nosso Senhor se insurgiu. Suas observações não eram dirigidas contra a instituição do sábado como tal nem

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contra o ensino do Antigo Testamento. Mas Ele se opunha aos fariseus, que, com seu legalismo exarcebado e exigências esdrúxulas, deixavam a Palavra de Deus sem efeito em razão de suas pesadíssimas tradições orais." Em última análise, o que Cristo violava não era o sábado, mas o casuísmo e as tradições fanáticas dos fariseus. Por isso era acusado – injustamente, diga-se de passagem — de ser transgressor do sábado.

Uma leitura objetiva dos pronunciamentos feitos por Jesus acerca do sábado, como um dia de se fazer o bem (Mat. 12:12), de salvar a vida (Mar. 3:4) e de mostrar misericórdia (Mat. 12:7) mostra de maneira inequívoca que a intenção de Cristo era explicar o sábado mais claramente e não de anulá-lo. (Para tratamento detalhado de cada dos episódios em que Jesus parece transgredir o sábado, consulte a explicação específica examinando a objeção que lhe for pertinente.)

OBJEÇÃO No. 41: O DOMINGO É AUTORIZADO EM OITO PASSAGENS NEOTESTAMENTÁRIAS

ARGUMENTO: Existem no Novo Testamento oito passagens que provam a mudança do sábado para o domingo (Mat. 28:1; Mar. 16:2, 9; Luc. 24:1; João 20:1, 19; Atos 20:7; 1 Cor. 16:2).

RESPOSTA: Os textos acima referidos não provam com raciocínio convincente o ponto de vista. Eis as razões:

Não Existe a Palavra “Domingo” na Bíblia. Para começar, a palavra “domingo” não aparece em nenhum lugar da Bíblia (nos textos originais, é bom frisar, já que muitas versões bíblicas modernas estão sendo adulteradas). A locução “primeiro dia da semana”, sim. Esta é encontrada oito vezes no Novo Testamento. Seis destes relatos se referem à mesma ocasião: ao dia da ressurreição de Cristo. É fincando pé nessas oito passagens bíblicas, subsidiadas por considerações de ordem geral, que os defensores do domingo acalentam a ilusão de provar a mudança do sábado para o domingo. Nada mais distante da verdade. As oito menções do "primeiro dia da semana” são usadas pelos apóstolos apenas com o propósito de referenciar o tempo. Em contrapartida, o sábado é mencionado nas Escrituras 56 vezes, e sempre com a implicação de observância expressa.

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Usado Apenas Como Referência Cronológica. Um exame rápido e circunstanciado nos quatro Evangelhos mostra claramente que o primeiro dia da semana é mencionado apenas incidentalmente como parte da cronologia da morte e ressurreição de Cristo — uma mera referência circunstancial. Elas não outorgam nenhum título sagrado a esse dia. Não dizem que Cristo repousou neste dia nem que o abençoou ou santificou. Não estabelecem preceito ou ordem quanto à sua observância. As outras passagens também referentes ao primeiro dia da semana, mencionadas nas epístolas, também atribuir-lhe nenhum título de santidade ou caráter especial.

Nenhuma Ordem Para Santificar o Domingo. Um exame honesto dessas oito ocasiões em que a locução “primeiro dia da semana” aparece na Bíblia mostra que nem Cristo nem os apóstolos ordenaram a santificação desse dia. Tanto católicos como protestantes sinceros reconhecem isto. O cardeal James Gibbon, por exemplo, afirmou categoricamente: “Você pode ler a Bíblia de Gênesis a Apocalipse e não vai encontrar nenhuma só frase autorizando a santificação do domingo. As Escrituras impõem a observância religiosa do sábado” (The Faith of Our Fathers, pág. 89). Por sua vez, McClintock e Strong, protestantes, são da mesma opinião: “É preciso confessar que não existe no Novo Testamento nenhuma lei referente ao primeiro dia” (Cyclopedia of Biblical, Theological and Ecclesiastical Literature, vol. 9, pág 196, artigo: "The Sabbath"). — Para tratamento detalhado de cada uma das oito passagens, consulte a explicação específica examinando a objeção que lhe for pertinente.

MATEUSOBJEÇÃO No. 42: JESUS CUMPRIU A LEI POR NÓS

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ARGUMENTO: Cristo afirmou que a lei não passaria até que tudo fosse cumprido (Mateus 5:17-18). Quando Ele, na cruz, disse: ‘Está consumado”, tudo foi cumprido. Desde então não nos achamos mais na obrigação de guardar a lei, inclusive o sábado.

RESPOSTA: A afirmação de que, ao cumprir a lei moral, Cristo ab-rogou a lei não está em harmonia com o contexto lingüístico nem bíblico da declaração de Cristo. É uma dialética vesga.

Fora do Contexto Lingüístico. Não está em harmonia com o contexto lingüístico, porque ignora o sentido da palavra cumprir tanto na língua portuguesa como no grego, que é de “tornar efetivas as prescrições de alguma coisa”. Jamais o verbo “cumprir” apresenta em ambas as línguas o sentido de "anular" ou "destruir". Examinamos a passagem mais de perto:

“Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas; não vim para revogar, vim para cumprir. Porque em verdade vos digo: até que o céu e a terra passem, nem um i ou um til jamais passará da Lei, até que tudo se cumpra.”

Note que as versões Almeida empregam a palavra “cumprir” duas vezes no mesmo versículo para traduzir dois verbos gregos de sentido totalmente diferente. É este trocadilho que acaba dando, até mesmo inintencionalmente, um sentido desencaminhador à passagem.

A palavra empregada por Cristo para o primeiro “cumprir” é plerosai, derivada de pleroo, que quer dizer "realizar, efetivar, tornar pleno, encher até a capacidade máxima”, “tornar completo em todos os pormenores”, “confirmar", termo que o mesmo tradutor verte noutras partes com o sentido de “suprir” (Fil. 4:19, “aterrar” (Luc. 3:5), “cheio” (Rom. 1:29; Mat. 13:48; João 12:3), “completar” (Fil. 2:2; 1 João 1::4). Plerosai, portanto, nada tem que ver com “destruir” (kataluo), como em Mateus 26:21 (Thayer’s Greek Lexicon, “Fulfill”; ver também Vine's Expository New Testament Dictionary, vol. 1, págs. 163,281,358; vol. 2, págs. 339; vol. 3, pág. 344; vol. 4, pág. 105).

Jesus empregou aqui a palavra “cumprir” com o mesmo sentido em que a usou em Mat. 3:15, isto é, “encher a medida da exigência da lei”, ou seja, perfeita conformação com a vontade de Deus. Assim traduz a Edição Pastoral: “Não vim abolir, mas dar-lhes [à Lei e aos Profetas] pleno cumprimento”. A idéia não é de cessação da vigência, mas de satisfação plena do propósito que Deus tinha em vista, como em Mat. 3:13. Na verdade, ao dizer que veio cumprir a lei, Jesus estava dizendo que veio obedecer à lei de Deus na íntegra, ilustrando-a e

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explicando-a por meio de seus preceitos e exemplos (Isa. 42:21). Veio também mostrar a intenção e aplicação espiritual da lei de Deus (John R.W. Stott, The Bible Speaks Today, p. 72). O restante do capítulo evidencia que esta é a interpretação correta da palavra.

Já a palavra usada para o segundo “cumprir” é ginomai, que significa “passar” (Thayer’s). Jesus estava querendo dizer que somente depois que tudo passasse (deixasse de existir; acabasse; desaparecesse) é que a lei de Deus seria alterada. A construção grega empregada por Ele apresenta uma forma negativa bastante enfática, um adágio semítico semelhante aos provérbios populares de nossa língua, os quais revelam ironicamente que algo nunca vai ocorrer, como “dia de São Nunca”, “quando galinha criar dentes” ou “para as calendas gregas”.31 Uma mudança na lei moral seria tão impossível quanto uma mudança no caráter de Deus, que é imutável (Mal. 3:6). Os princípios da lei moral são tão permanentes quanto o próprio Deus.

Fora do Contexto Bíblico. A interpretação não está em harmonia com o contexto bíblico porque nega o significado que Cristo tinha em vista. Essa interpretação incorre, por assim dizer, no pecado de tornar Cristo contraditório, pois no versículo 17 Ele diz que não veio “revogar” a lei, mas no versículo 18 desdiz o que disse ao afirmar que depois de cumpri-la, essa lei vai passar! Não, nosso Salvador não era incoerente. O que Ele quis dizer quando afirmou que veio cumprir, foi que veio viver em harmonia com a lei, em obediência aos Dez Mandamentos.

Tanto é certo que essa é a interpretação correta que, para evitar qualquer possível má interpretação de suas palavras, no verso seguinte (19), Ele faz uma severa advertência: “Todo aquele que desobedecer a um desses mandamentos, ainda que dos menores32, e ensinar os outros a fazerem o mesmo, será chamado menor no reino dos céus; mas todo aquele que praticar e ensinar estes mandamentos será chamado grande no reino dos céus” (NVI).

Entendemos, portanto, que Jesus cumpriu a lei, de três maneiras diferentes: (1) Obedeceu à lei nos seus mínimos detalhes e no mais amplo sentido, mediante uma vida de perfeita obediência; (2) realizou as profecias do Antigo Testamento concernentes ao Messias; (3) deu sentido completo e contemporâneo às Escrituras Hebraicas mediante Seus ensinos (Isa. 42:21).

31 Baruque 3:32.32 Mandamentos “menores” do ponto de vista dos escribas que, por sua própria conta e risco, classificavam os mandamentos em escala de importância. Para Deus todos os seus mandamentos morais são iguais e permanentemente obrigatórios.

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Nunca, porém, Ele anulou o Decálogo. Não poderia ter afirmado isso de maneira mais clara do que o fez em Mateus 5:18: “A lei de Deus é mais real e duradoura que as estrelas no céu e a terra debaixo dos seus pés. Muito depois de as estrelas se apagarem e a Terra se desgastar, a Lei de Deus permanecerá viva e ativa.” Mat. 5:18, The Message.

OBJEÇÃO No. 43: NO SERMÃO DA MONTANHA JESUS INVALIDOU A LEI

ARGUMENTO: Ao fazer, em Mateus 5:21-45, o contraste entre o que foi dito aos antigos e o que Ele está dizendo agora, Jesus substituiu todas as leis do AT.

RESPOSTA: Na verdade, ao apresentar dentro do Seu mais famoso sermão esta série de seis antíteses (ver os versos 22, 28, 32, 34, 39, 44), o objetivo de Jesus não é invalidar as Escrituras judaicas e a lei nela contida, mas mostrar como nossa justiça deve exceder a dos escribas e fariseus. Jesus não está contrapondo o Seu ensino agora com aquilo que foi ensinado aos antigos, mas contrastando, por meio de exemplos e complementações, a interpretação externalista feita pelos escribas, intérpretes e expositores oficiais da lei com a interpretação correta da lei feita por Ele mesmo. Note que o que Jesus questiona não é a Lei em si, mas a interpretação enviesada que lhe davam os teólogos judeus. Tanto isso é verdade que, para evitar esse mal-entendido, no verso 17, Ele previne seus ouvintes: “Não penseis que vim destruir a lei...”33

Interpreta o Verdadeiro Sentido. Visto ser Ele próprio o Autor das leis do Antigo Testamento, era a única autoridade capaz de ajuizar o verdadeiro sentido delas. Sua intenção, portanto, não era anular a lei nem substituí-la por outra, mas revelar o propósito final e o significado mais profundo dessas leis, soterradas pelo lixo das tradições e interpretações rabínicas, restaurando-lhe o brilho e beleza original. Ampliou o significado da lei, propositadamente restringida pelos fariseus para aumentar sua permissividade.

Uma Lei Espiritual. A lei de Deus é uma lei espiritual (Rom. 7:14). Diferentemente das leis humanas, que só abrangem os atos públicos, os Dez Mandamentos alcançam nossos pensamentos, desejos e emoções mais secretas. Os judeus perderam isso de vista. E durante o sermão da Montanha, o que Jesus fez foi enfatizar essa dimensão espiritual da lei, mostrando que a transgressão começa no coração (Mat. 5:21, 22, 27, 28; Mar. 7:21-23). Pregou uma justiça que

33 J. W. McGarvey and Philip Y. Pendleton, The Fourfold Gospel.

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sobrepujava a dos fariseus (Mat. 5:20), satisfazendo todas as exigências dos mandamentos.

Ele mostrou que a lei contra o homicídio vai além do assassínio material; inclui também a ira e o ressentimento injustificados; a lei contra o adultério vai além do ato físico; abrange também a atitude mental: as intenções e os desejos impuros; a lei que ordena amar o próximo vai além daqueles que concordam comigo; estende-se também a meus inimigos. No ensino de Cristo a lei é espiritualizada, radicalizada e maximizada além de sua mera forma. Jesus mostra que a lei não é só ação, mas também disposição do coração.

É como muito bem o afirmou Spurgeon, “Jesus não veio para mudar a lei, mas sim para explicá-la, e justamente esta circunstância mostra que ela permanece; visto não haver necessidade de explicar o que é abolido” (The Perpetuity of the Law of God, pág. 4). Jesus não aboliu a lei, mas a tradição a respeito dela.

OBJEÇÃO No. 44: O SÁBADO É APENAS SÍMBOLO DO REPOUSO EM CRISTO

ARGUMENTO: O sábado é apenas um símbolo do repouso que a alma encontra em Cristo (Mateus 11:29). Não precisamos, portanto, observá-lo.

RESPOSTA: O Salvador diz: “Vinde a Mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e Eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o Meu jugo e aprendei de Mim, porque sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para a vossa alma. Porque o meu jugo é suave, e o meu fardo é leve.” Mat. 11:28-30.

É Símbolo. Duas vezes neste convite Jesus promete repouso aos que vêem a Ele e dEle aprendem. A palavra usada aqui para “descanso” é anapausis, a mesma comumente empregada na Septuaginta para referir-se ao “repouso” do sábado. Talvez por isso alguns tenham sido levados a fazer essa associação de idéias. É verdade que o sábado é um sinal do repouso da alma, concedido por Cristo ao cansados e oprimidos pelo pecado. Como o sábado era o sinal que distinguia Israel quando eles saíram do Egito para entrar na Canaã terrestre, assim é ele o sinal que agora distingue o povo de Deus ao saírem eles do mundo para entrar no repouso celestial.Talvez represente também o repouso do verdadeiro sábado, o jugo suave e fardo leve de Cristo em contraste com o fardo pesado e o jugo áspero imposto pelos rabinos. A figura aqui empregada não era desconhecida dos ouvintes de Cristo, pois os rabinos também costumavam

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referir-se à lei como um “jugo”, não porque fosse uma carga, mas uma maneira de viver disciplinada a que os seres humanos deviam submeter-se (Mishnah Aboth 3. 5; Berakoth 2. 2).

É Realidade. Ainda que o sábado possa ser símbolo (e não sombra!) de nosso repouso em Cristo, isto, porém, não anula a realidade intrínseca do sábado (Luc. 23:56). A Bíblia também ensina que o casamento é símbolo do relacionamento entre Cristo e Sua igreja (Efés. 5:31-32, 2 Cor. 11:2), mas nem por isso os cristãos entendem que o casamento tenha perdido a validade na era cristã. E a analogia não pára por aí: o casamento é uma instituição irmã do sábado, pois ambos remontam ao Éden e ambos são chamados “dignos de honra” (ver Isa. 58:13; Heb. 13:4)

É Requisito. Mesmo aqueles que vão a Cristo para obter repouso, depois de obter o alívio que Sua graça proporciona, precisam submeter-se ao Seu jugo. Primitivamente, o jugo era a barra carregada nos ombros da pessoa com fardos suspensos em ambas as pontas (ver Isa. 9:4) ou canga de madeira colocada no pescoço de dois animais de tração para puxar implementos agrícolas ou carroça (ver Núm. 19:2; Deut. 21:3; 1 Sam. 1:7). Em ambos os casos, o propósito original do jugo não era tornar a carga mais pesada e difícil, senão mais leve e fácil de transportar. Figuradamente, o jugo de Cristo não é outra coisa senão a vontade divina resumida na lei de Deus e detalhada no Sermão do Monte. Isto significa que, se estivermos debaixo da disciplina de Cristo, não será difícil obedecer à lei, visto que Seu jugo é suave e Ele estará conosco, debaixo desse jugo, nos ajudando a tracionar os fardos.

OBJEÇÃO No. 45: JESUS E OS DISCÍPULOS VIOLARAM O SÁBADO

ARGUMENTO: Jesus e Seus discípulos violaram o sábado quando, ao passarem por uma seara, colheram espigas e comeram para saciar a fome (Mateus 12:1-8).

RESPOSTA: Esse episódio, narrado nos Evangelhos sinópticos (Mat. 12:1-8; Mar. 2:23-28; Luc. 6:1-5), precisa ser entendido corretamente. Vamos por partes:

Sem Desjejum Matinal. O sábado, segundo a ordenança bíblica, era um dia em que não se preparava comida. Todas as refeições do sábado deviam ser preparadas na sexta-feira, chamada por isso mesmo de o dia da preparação (Êxo. 16: 23). Após o culto de recepção do sábado, logo após o pôr-do-sol, as famílias judaicas tomavam o jantar. Mas depois disso ninguém comia mais nada

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até a hora do almoço, no dia seguinte, depois de voltarem da sinagoga. A ausência do “café-da-manhã” talvez explique a atitude dos discípulos. 34

Colheram Espigas Pequenas. Indo eles a caminho da sinagoga ou voltando dela quem sabe, no sábado de manhã, sentiram fome. Como a vereda por que seguiam passava por dentro de um campo de cereais, demoraram-se um pouco ali, onde colheram algumas espigas. As espigas não eram de milho, como seria fácil de supor para nossa cultura americana, onde este cereal domina; mas pequeninas espigas de trigo ou cevada.

Apenas Para Abrandar a Fome. Os discípulos apanharam algumas espigas, não porque estivessem fazendo a colheita de produtos agrícolas, mas apenas para satisfazer a fome. Esse era um ato perfeitamente aceitável às leis humanitárias entregues por Deus a Israel. Não constituía furto, pois a legislação previa que, se alguém estivesse com fome, poderia entrar nos campos cultivados e abastecer-se do que lhe fosse acessível. Recomendava-se inclusive ao dono da seara que deixasse porções de seu campo sem ser segado nem voltasse para colher o que caísse, a fim de que os pobres e viajantes pudessem comer o que restasse. Estes podiam arrancar as espigas com as mãos, mas não meter a foice nem fazer o transporte de grande quantidade (Deut. 23:25; Lev. 19:9, 10; 23:22).

Aparente Violação. Lucas acrescenta o detalhe de que, antes de comê-las, os discípulos as esfregaram as sementes de cereal nas mãos para retirar-lhes a casca (Lucas 6:1). Alguns fariseus acompanhavam o pequeno grupo de discípulos e ao verem tal cena ficaram horrorizados. Segundo a tradição supersticiosa dos escribas, arrancar as espigas era “colheita”; descascá-las friccionando nas mãos era “debulha”; soprar as cascas era “peneiramento” — e essas atividades eram proibidas (para eles) no sábado.35

Nenhuma Violação Real. Segundo a lei de Deus, porém, nenhuma dessas ações constituía violação do sábado. Tanto é que, ao ser abordado pelos fariseus, Jesus trouxe à memória o episódio em que Davi e seus companheiros famintos, fugindo dos exércitos do rei Saul, entraram na Casa de Deus, no tempo do sumo sacerdote Abiatar, e comeram os pães da proposição, os quais não era lícito comer, senão aos sacerdotes. Fizeram isso e ficaram sem culpa à vista de Deus, pois entrou em ação o princípio da misericórdia. Embora aqueles pães sagrados tivessem a função exclusivamente litúrgica e só pudessem ser comidos pelos sacerdotes no recinto do santuário, não estaria de acordo com os princípios divinos da misericórdia deixar uma pessoa padecer de fome não permitindo que 34 Henry Daniel-Rops, A Vida Diária nos Tempos de Jesus, pág. 224.35 Alfred Edersheim, Life and Times of Jesus.

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se servisse daqueles pães (1 Sam. 15:22). A lógica de Jesus é a seguinte: se a Davi fora lícito saciar a sua fome utilizando-se excepcionalmente de um objeto sagrado, então era lícito aos discípulos, pela mesma razão, colherem algumas espigas no tempo sagrado. Entrou em ação aí a superior lei da necessidade.

Observância Supersticiosa. Jesus chama de Seus discípulos de "inocentes" e, por tabela, faz referência a todos aqueles que, em boa consciência, santificam o sábado sem formalismo, legalismo ou exageros. Os judeus do tempo de Cristo aplicavam a lei do descanso aos atos mais triviais da vida, proibindo muitas obras de necessidade e misericórdia. Sua observância do sábado chegava a ser mesmo supersticiosa!

Este episódio sabático nos mostra que Jesus Cristo entendeu e explicou a verdadeira intenção do sábado: que foi criado para ser não somente um dia de repouso dos trabalhos servis, mas também uma bênção e benefício para toda a humanidade. A necessidade humana é mais importante que os requerimentos rituais ou as tradições humanas. Mesmo porque a intenção por trás de toda lei divina não é privar da vida, mas assegurá-la (B. W. Johnson, The People's New Testament). — VER OBJEÇÕES 47, 62 E 64 (JESUS VIOLANDO O SÁBADO).

OBJEÇÃO No. 46: OS SACERDOTES LEVITAS VIOLAVAM O SÁBADO

ARGUMENTO: Se os sacerdotes levíticos violavam o sábado no templo e ficavam sem culpa (como afirma Jesus em Mateus 12:5), então o sábado não era moral, mas cerimonial, tendo em vista que, se fosse moral, sua violação não poderia em nenhum caso ficar sem culpa. Seguindo esse raciocínio, concluímos que a transgressão de quem trabalha no sábado atualmente é nenhuma.

RESPOSTA: O sábado no santuário era, de fato, um dia muito movimentado. Apresentava-se uma oferta queimada especial junto com as ofertas de cereais e de bebida, além do regular e diário "holocausto contínuo" (Núm. 28:9-10). Os pães da preposição eram trocados no primeiro compartimento, e uma nova turma de sacerdote assumia seus deveres (Lev. 24:5-9; 1 Crônicas 9:32; 2 Crônicas 23:4) Os deveres sacerdotais não eram reduzidos no sábado. Até mesmo se circundavam meninos no sábado, se o oitavo dia de vida destes caía nesse dia. Em tempos posteriores, os judeus tinham um ditado: "Não existe sábado para o santuário", querendo dizer que os deveres sacerdotais não sofriam

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solução de continuidade nesse dia e que os sacerdotes possuíam imunidade para realizarem suas tarefas no sábado (The Temple, A. Edersheim, pág. 152).

Foi com certeza essa prática que levou Jesus a afirmar em Mateus 12:5 que o sábado era “profanado” pelos sacerdotes (pelo fato de realizarem serviços associados aos sacrifícios), embora estes ficassem sem culpa. Por que ficavam sem culpa embora trabalhassem mais intensamente?

Natureza Redentiva dos Trabalhos. A resposta está na natureza redentiva de seu trabalho aos sábados, destinado a prover perdão e salvação aos necessitados pecadores. Porque a misericórdia sobrepunha-se ao sacrifício.

O próprio Jesus sabia que matar animais e esfolá-los, manipular fogo e oferecer holocaustos, trocar pães no sábado ou fazer circuncisão no sábado não era violar este santo dia (Lev. 24:8 e Núm. 28:9; João 7:23), pois se tratava de uma obra redentora, um empreendimento espiritual. Muitas atividades que por si mesmas eram comuns, tornavam-se santas no sábado, já que contribuíam para a salvação das pessoas. O mesmo trabalho, feito em negócios seculares, seria pecado, mas a obra dos sacerdotes era realizada no serviço de Deus. Estavam praticando os ritos que apontavam ao poder redentor de Cristo, e seu trabalho achava-se em harmonia com o desígnio do sábado.

Ocorre o mesmo hoje quando uma ambulância carregando um paciente grave ou um carro de bombeiros indo apagar um incêndio ultrapassa o sinal vermelho. A lei do trânsito, que foi feita para a preservação da vida, pode ser violada sem culpa nesta emergência. É o princípio ético do minima de malis, ou seja, dos males, o menor.

Também Serviço Redentor. À semelhança dos sacerdotes, os discípulos também estavam empenhados no serviço de Deus, e o que era necessário à realização dessa obra redentora, era perfeitamente lícito fazer no dia de sábado. A profanação do sábado não era real, mas apenas aparente. O quarto mandamento não era violado, pois o preceito moral não proíbe toda espécie de trabalho, mas apenas o trabalho secular. “A obra servil realizada nas coisas santas não é obra servil” (John Lightfoot, A Commentary on the NT).

Ao proferir estas palavras, Jesus queria ensinar, aos discípulos e aos adversários, a lição de que o serviço de Deus está acima de tudo. O objetivo da obra de Deus, neste mundo, é a redenção do homem; portanto, tudo quanto é necessário que se faça no sábado no cumprimento dessa obra, acha-se em perfeita harmonia com o mandamento do sábado. É, por conseguinte, lícito fazer bem aos sábados (Mat. 12:2; Mar. 3:4).

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OBJEÇÃO No. 47: JESUS TRANSGREDIU O SÁBADO AO REALIZAR CURAS E EXORCISMOS

ARGUMENTO: Os vários episódios de cura e exorcismos registrados nos Evangelhos provam que Jesus violou o sábado.

RESPOSTA: Os críticos do sábado, não encontrando nenhum fundamento bíblico para a adoção do domingo como dia de repouso, citam torcidamente episódios que aparentemente mostram Jesus violando o sábado. Esses textos, porém, quando analisados segundo as regras da boa hermenêutica, provam à saciedade que Jesus, longe de violar o sábado, o guardou conforme o critério divino.

Antigas Interpretações Patrísticas. Essas conclusões, contudo, não se fundamentam numa análise do que Cristo realmente fez ou disse a respeito do sábado, mas em antigas interpretações patrísticas, cuja literatura praticava um “antijudaísmo de diferenciação” a fim de evitar que medidas repressivas e punitivas dirigidas contra os judeus por parte dos romanos não atingissem os cristãos.

Motivação Farisaica. Por que então, em diversas ocasiões, Jesus, ao fazer curas, entrou em confronto com os fariseus sobre o que era e o que não era lícito fazer no sábado? Os rabinos judeus criam que o sábado era um símbolo, um paradigma da vida no mundo porvir, portanto tudo que não pudesse ser feito no ‘olam ha-ba (o mundo messiânico porvir) não devia ser feito no sábado. Pelo fato de não haver doença nem morte no ‘olam ha-ba, os judeus eram proibidos de chorar pelos mortos no sábado, realizar funerais ou até mesmo visitar os doentes. Foi provavelmente este conceito que motivou a oposição dos fariseus a que Cristo realizasse curas no sábado, já que no novo mundo não haveria curas (Cliford Goldstein, A Pause for Peace, pág. 87).

O regulamento farisaico dizia ser proibido dar ajuda alguém que estivesse enfermo no sábado a não ser que a vida da pessoa estivesse ameaçada. Segundo o ponto de vista do Salvador, porém, o sábado era um dia bastante apropriado para a prática do bem. Os fariseus haviam perdido de vista a dimensão humanitária do sábado.

Sete Casos de Cura. Os evangelhos registram sete casos de cura no sábado, sendo seis públicos e um (a sogra de Pedro) em privado. Eis a lista circunstanciada:

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(1) A cura do endemoninhado na sinagoga de Cafarnaum (Mar. 1:21-28; Luc. 4:31-37). Nesta ocasião, ninguém censurou a Jesus como transgressor do sábado.

(2) A cura da sogra de Pedro (Mar. 1:29-31; Luc. 4:38-39), nesse mesmo dia, na casa desta, sem nenhum constrangimento. Não houve discussão.

(3) A cura do paralítico no Tanque de Betesda em Jerusalém (João 5:1-16). É lícito no sábado fazer as obras de Deus. Era isto que Cristo fazia ao curar o enfermo.

(4) A cura do homem da mão ressequida na sinagoga (Mat. 12:9-14; Mar. 3:1-6 e Luc. 6:6-11). Mais uma vez não há qualquer desafio contra o mandamento do sábado propriamente dito. Visto que o grande objetivo por detrás da lei é a salvação e restauração do homem, a cura foi justificada.

(5) A cura da mulher encurvada por 18 anos na sinagoga (Luc. 13:10-17). Jesus respondeu ao indignado chefe da sinagoga que aquilo que fizera fora um ato de misericórdia e também uma destruição de uma obra de Satanás. Não existe nenhum indício de que o sábado estivesse sendo questionado. A única controvérsia levantada foi sobre o modo como os fariseus o guardavam.

(6) A cura do homem hidrópico (Luc. 14:1-6), na residência de um dos principais dos fariseus. Jesus explica aos peritos na lei que curar doentes é um tanto ato de misericórdia quanto tirar um animal de um poço. O silêncio deles sugere que concordavam em que Jesus não estava desafiando a lei do sábado.

(7) A cura do cego de nascença no Tanque de Siloé (João 9:1-14). Cristo não fala qualquer palavra em Sua defesa. Mas, ao responder à pergunta dos discípulos no v. 2, declara que a cura no sábado foi “para que se manifestem nele as obras de Deus”.36

Não Houve Violação Real do Sábado. Em todos esses casos Jesus não oferece indício de haver transgredido o sábado segundo o critério de Deus, pois realizava no sábado milagres e não o trabalho comum. Se transgrediu alguma coisa, foi apenas as restrições equivocadas impostas pelos fariseus. Não era errado fazer obras de caridade, ensinar a verdade (Lucas 4:31, 32), curar doentes (Lucas 4:38-41), libertar endemoninhados (Lucas 4:33-36) etc. Jesus sabia que nessas situações o espírito e o intento da lei não eram violados. O Mestre entendia o propósito real do sábado. Mas pelo fato de Sua conduta não se

36 Henry H. Halley, Manual Bíblico, pág. 475.

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conformar com os regulamentos farisaicos, era considerado transgressor do sábado.

Aos olhos de Deus, porém, Jesus cumpria o sábado perfeitamente. Ele próprio reconhece: "Eu tenho guardado os mandamentos de Meu Pai e no Seu amor permaneço”. João 15:10.Jesus nos mostra o exemplo de que todo dia é dia de viver no espírito e propósito da lei de Deus, que é o amor.Se houvesse violado um dos mandamentos de Deus (até mesmo um cerimonial), teria pecado (1 João 3:4), e Jesus nunca pecou. Ele viveu uma vida sem pecado para poder ser um sacrifício perfeito, o Salvador de toda a humanidade (1 Ped. 2:22; Efés. 5:2; 1 João 4:14). Ele o Pai estavam de acordo (João 4:34; 5:19, 30).

Um Dia Para Salvar, Curar e Libertar. Ao realizar curas no sábado, Jesus não lançou o sábado por terra, mas sim enriqueceu seu significado e função ao cumprir sua tipologia messiânica. Isto fez, não somente ao anunciar sua missão redentora como o cumprimento das promessas de libertação do tempo sabático (Luc. 4:18-21), mas também por meio de Seu programa de reformas sabáticas.

Longe de anular o sábado, Jesus demonstrou que o sábado é um dia apropriado para prestar auxílio a alguém, confortando e aliviando os que se acham em necessidade. Jesus enfatiza aqui que o sábado representa um tempo oportuno para libertação do cativeiro e visitação de doentes e idosos. Dá uma interpretação humanitária ao sábado. Cuidar das necessidades básicas da vida humana ou animal não viola o quarto mandamento.

Jesus guardou a lei tanto na vida como na morte. O único dia inteiro em que Ele passou em repouso no sepulcro de José foi o sábado. Campbell Morgan chama atenção para o fato de que Cristo pôs em risco, não só todo o Seu ministério, mas também Sua própria vida (Mat. 12:9-13; João 5:1-9) para mostrar a maneira correta de observar o sábado. Aliás, do ponto de vista humano, Cristo foi para a cruz porque Se opôs às tradições farisaicas acerca do sábado. Não o transgrediu, senão que os libertou de distorções antiescriturísticas. Realizou sete milagres no sábado, tornando-o um dia para celebrar a redenção de Deus (Paul K. Jewett, The Lord's Day: A Theological Guide to the Christian Day of Worship, pág. 42).

Em cada milagre de cura realizado no sábado o pensamento básico é o mesmo: “É lícito fazer bem ao sábado”. — VER OBJEÇÕES 45, 62 E 64 (JESUS VIOLANDO O SÁBADO).

OBJEÇÃO No. 48: JESUS NÃO MENCIONOU O SÁBADO PARA O JOVEM RICO

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ARGUMENTO: Quando Jesus recomendou ao moço rico que guardasse os mandamentos, não mencionou o mandamento do sábado (Mateus 19:16-22). Isto prova que o sábado foi abolido.

RESPOSTA: O argumento não procede e chega mesmo a ser contraproducente, pois acaba chamando a atenção para o fato de que, nesta passagem Jesus expôs a observância dos mandamentos como uma condição para entrar na vida eterna (v. 17).

Silêncio Acerca de Coisas Já Estabelecidas Não Significa Rejeição. O fato de Jesus ter ordenado ao jovem rico que guardasse os mandamentos e ter mencionado alguns, mas não ter citado o quarto, não prova que o estava desobrigando de observar o sábado. Será que o fato de Jesus haver citado o sexto, o sétimo, o oitavo, o nono e o quinto mandamento (Mateus 19:18-19), mas ter omitido o mandamento que nos proíbe a prática da idolatria, é prova de que este mandamento não mais existe e que estamos livres para adorar ídolos? Não, pois João nos aconselha: “Filhinhos, guardai-vos dos ídolos” (1 João 5:21).

O Motivo Por Detrás da Ação. Jesus tinha um bom motivo em focalizar somente os mandamentos que mencionou. Como bom religioso judeu, o jovem rico estava acostumado a observar o sábado. Era costume dos fariseus exaltarem os quatro primeiros preceitos do Decálogo como mais importantes do que os seis últimos. A dificuldade deste moço influente, portanto, não consistia nos mandamentos da primeira tábua (os quatro primeiros que dizem respeito ao amor a Deus), mas os da segunda tábua (os seis últimos que falam do amor ao próximo).

Foi por isso que Jesus foi direto ao ponto nevrálgico da questão. Não usou de meias palavras, mas aplicou o dedo no centro da ferida. O problema daquele jovem não era a idolatria, o desrespeito à Divindade nem mesmo a transgressão do repouso sabático. Tudo isso ele fazia. Seu problema era o egoísmo, a cobiça, a falta de amor ao próximo. Jesus quis-lhe ensinar que ninguém pode amar a Deus sem amar a Seus filhos (nosso próximo).

Remédio Específico. Portanto, ao omitir alguns mandamentos que não vinham ao caso, Jesus não estava abolindo-os, mas apenas sendo específico, aplicando o remédio certo para o doente certo e na dose certa. "Se alguém afirmar: Eu amo a Deus, mas odiar a seu irmão, é mentiroso, pois quem não ama a seu irmão, a quem vê, como pode amar a Deus, a quem não vê. Ele nos deu

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este mandamento: Quem ama a Deus, ame também o seu irmão.” 1 João 4:20, 21, NVI.

Portanto, ao invés de provar a abolição dos mandamentos, este episódio só vem confirmar duas coisas: (1) que o discipulado cristão inclui o cumprimento dos mandamentos, pois o Mestre, depois de recomendar ao jovem que guardasse os mandamentos, conclui: “depois, vem e segue-me” (Mat. 19:21); (2) que, para ser perfeito (gr. teleios, “alvo, fim”), isto é, aspirar à vida eterna, é preciso guardar os mandamentos do Decálogo (Mat. 19:17-19).

OBJEÇÃO No. 49: JESUS SUBSTITUIU O DECÁLOGO PELOS DOIS GRANDES MANDAMENTOS

ARGUMENTO: Jesus substituiu o Decálogo pelos dois grandes mandamentos: “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento. O segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Destes dois mandamentos dependem toda a Lei e os Profetas” (Mateus 22:37-40; cf. Marcos 12:28-31). São estes os únicos mandamentos a que os cristãos estão sujeitos.

RESPOSTA: Na verdade Jesus não substituiu o Decálogo nem o encurtou, mas apenas o sintetizou por meio desses dois preceitos sintéticos, que abrangem o comprimento, a largura, a profundidade e a altura da lei de Deus. O Novo Testamento afirma repetidas vezes que os princípios morais do Decálogo continuam válidos para os cristãos (ver Mat. 5:17-48; 15:3-9; 19:17-19; 22:36-40; Rom. 3:31; 7:12,14; 8:4; 13:8-11; 1 Cor. 7:19; 15:56; Efés. 6:1-3; 1 Tim. 1:8-11; Apoc. 11:19; 12:17; 15:5.)

Versão Resumida. É verdade que Jesus, ao ser perguntado qual era o grande mandamento da Lei, respondeu que de dois preceitos dependiam toda a lei e os profetas: (1) amar a Deus sobre todas as coisas; (2) amar ao próximo como a si mesmo. (Mat. 22:36-40; cf. Mat. 7:12). Esse mandamento duplo não constituía novidade nem eram da autoria de Jesus, não pelo menos naquele momento. O Mestre estava apenas repetindo o que se encontrava em Deuteronômio 6:4-5 e Levítico 19:18, enunciado aquilo que Ele mesmo ditara a Moisés.

A chave para entender o problema é o versículo 40: “Destes dois mandamentos dependem toda a Lei e os Profetas.”. A expressão “A lei e os

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profetas” era um idiomatismo hebraico para designar a Bíblia dos tempos de Jesus, ou seja, o Antigo Testamento. O verbo grego empregado por Jesus para "depender" é kremannumi, que significa, entre outras coisas, "resumir, sumariar".

Não Eram Maiores. Jesus, portanto, não estava dizendo que esses dois preceitos eram maiores e mais importantes que o Decálogo nem que foram dados em substituição a ele, mas que eram, por assim dizer, a súmula e a substância do Decálogo. “Esses dois preceitos abrangem os dez, em seu sentido mais amplo, não podendo ser considerados exclusão de um jota ou til dos mesmos.” (C. H. Spurgeon, The Perpetuity of the Law of God, pág. 5). Como sabemos disto? A própria Escritura nos diz que amar ao próximo e a Deus é sinônimo de guarda dos mandamentos (cf. 1 João 5:2 e 3; Rom. 13:9-10).

“A essência da Lei de Deus é amar a Deus supremamente e aos outros como a si mesmo” (Thomas, Paul Simmon, Um Estudo Sistemático de Doutrina Bíblica, pág. 190). Uma exposição dos dois grandes princípios aqui enunciados: amor a Deus e amor ao homem. Toda a Escritura . . . depende desses dois mandamentos como uma porta depende do sustento de duas dobradiças . Elas constituem o coração das Escrituras. Isto implica que todos os mandamentos levam a este sumário ou dele derivam” (Brink).

Forma Concisa. Na verdade esses dois preceitos são uma forma concisa de referir-se ao Decálogo (Rom. 13:10). Os quatro primeiros mandamentos (Êxodo 20:3-11), colocados na primeira tábua, apresentam o dever do homem para com Deus; os seis últimos (Êxodo 20:12-17), colocados na segunda tábua, mostram o dever do homem para com o seu semelhante. Amor é o princípio que permeia toda a lei, de sorte que o "cumprimento da lei é o amor." Romanos 13:10. É impossível obedecer de maneira aceitável sem amor no coração. Quem ama não desobedece (João 14:15). Portanto, o grande mandamento da lei é a lei toda. Note, subsidiariamente, que só se resume algo que existe e que está em vigor.

OBJEÇÃO No. 50: O DOMINGO É MENCIONADO NO NOVO TESTAMENTO —

I(MADALENA E MARIA VÃO AO SEPULCRO)

ARGUMENTO: Devemos guardar o domingo como dia de repouso e adoração, pois foi nesse dia que Jesus ressuscitou (Mateus 28:1-15). Neste dias as duas mulheres foram ao sepulcro.

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RESPOSTA: Esta é a primeira passagem neotestamentária em que o primeiro dia da semana é mencionado. Eis o coração da passagem: “No findar do sábado, ao entrar o PRIMEIRO DIA DA SEMANA, Maria Madalena e a outra Maria foram ver o sepulcro”. Mat. 28:1.

Três coisas precisam ser mencionadas a respeito desse texto. Em primeiro lugar, ele não fala da santidade do domingo nem menciona nenhum culto. Diz apenas que, depois do sábado (gr. opse dé sabbáton), já na madrugada (gr. epiphosko) do primeiro dia da semana, as mulheres foram à tumba com o propósito de ungir o corpo do Mestre. Essas mulheres eram observadoras do sábado, pois esperaram que o sábado acabasse para realizar um trabalho: o de ungir o corpo de Jesus. Em segundo lugar, o texto sugere, ainda que veladamente, que o sábado continuava a ser o dia mais importante da semana, pois é esse dia que Mateus toma como parâmetro temporal para introduzir a narração dos eventos do primeiro dia: “no findar do sábado...” Em terceiro lugar, dos evangelistas, Mateus só menciona o primeiro dia da semana uma vez (o texto acima referido). Embora seu evangelho fosse o mais popular da igreja primitiva e o mais citado pelos primeiros escritores cristãos, nada diz sobre o primeiro dia da semana suplantar ou substituir o sábado, conquanto o tenha escrito tão tardiamente quanto entre os anos 60 e 80 d.C., época em que, na suposição dos dominicalistas, já se haveria consolidado a observância do domingo. (Para discussão mais ampla, ver Objeção 69).

MARCOSOBJEÇÃO No. 51: O SER HUMANO É MAIS IMPORTANTE QUE O SÁBADO

ARGUMENTO: Jesus afirmou que o sábado foi feito por causa do homem, e não o homem por causa do sábado (Marcos 2:27). Isto significa que o bem-estar de uma pessoa é superior ao repouso sabático.

RESPOSTA: Entendem alguns que a afirmação contida em Marcos 2:27 denote que o homem não se deve submeter à observância desse dia, como se o repouso sabático fosse algo imposto arbitrariamente para restringir a felicidade humana. Este, porém, é um raciocínio vicioso. Com esta memorável afirmação, Cristo não

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pretendia abolir o mandamento original do sábado. Repare que a Bíblia também foi escrita por causa do homem, mas nem por isso foi abolida. E a igreja também, e a salvação também...

Em Benefício do Homem. A intenção de Jesus ao declarar o que declarou neste versículo era apenas realçar o propósito original do sábado, que é assegurar restauração física, mental e espiritual para os seres humanos. O homem foi criado no sexto dia, e o sábado no sétimo. O homem, portanto, antecede o sábado, que foi feito em função do homem, isto é, para atender suas necessidades de repouso físico, mental e moral. Não para ser um fardo intolerável, como a tradição judaica o havia tornado com suas exigências e restrições descabidas. Deus não criou o homem porque tinha um dia de repouso e precisava de alguém para guardá-lo. Mas providenciou um dia de descanso para o homem que criara, pois sabia que este era finito, limitado e mortal e precisaria de um período regular de descanso para o corpo e para a mente e para crescimento moral e espiritual.

Evidência irrefutável disto é o uso da preposição grega dia, traduzida "por causa de", que pode significar também "para o bem de", “para benefício de”. O sentido evidente é que o sábado foi estabelecido para o bem-estar físico, moral e espiritual dos seres humanos. Todas as coisas estabelecidas por Deus têm o propósito de abençoar e beneficiar a humanidade. "Tudo isso é por amor de vós." 2 Cor. 4:15. A lei dos Dez Mandamentos, da qual o sábado é uma parte, foi dada por Deus a Seu povo como uma bênção. "O Senhor nos ordenou", disse Moisés, "que fizéssemos todos esses estatutos, para temer ao Senhor nosso Deus, para o nosso perpétuo bem, para nos guardar em vida." Deut. 6:24; cf. 4:5-8. A observância adequada do sábado, portanto, longe de restringir a felicidade humana, faz é garanti-la.

OBJEÇÃO No. 52: JESUS É SENHOR DO SÁBADO

ARGUMENTO: Jesus é maior do que o sábado, portanto o sábado não teria restrição sobre Cristo que poderia fazer nesse dia o que bem entendesse (Marcos 2:28). Ele poderia fazer o que quisesse e permitir que outros o fizessem sem ser culpados.

RESPOSTA: Alguns acham que a expressão "Senhor do sábado" (Mateus 12:8) empregada por Jesus, significava que Ele, em Seu caráter messiânico, tinha

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poder sobre o sábado para mudá-lo ou aboli-lo, e escolher um novo dia. Não resta dúvida que Jesus, sendo Deus, é onipotente e teria poder para mudar ou abolir o sábado, se quisesse. Mas a questão é: Ele fez isso?

Criador do Sábado. Não há nenhum versículo bíblico que responda a essa questão afirmativamente. Pelo contrário, a palavra usada aqui para “Senhor” é kyrios, e revela que Jesus é o Instituidor do sábado, e não o Destruidor dele. (Ver Atos 17:24 para fraseado paralelo). A afirmação de Jesus, de ser o Senhor do sábado, equivalia, portanto, a uma afirmação de divindade. O sábado pertence a Cristo, pois "todas as coisas foram feitas por Ele, e sem Ele nada do que foi feito se fez". João 1:3. Cristo foi o agente ativo na criação do Universo (Heb. 1:2; Col. 1:16-17). Uma vez que Ele fez todas as coisas, criou também o sábado. Este foi por Ele posto à parte como lembrança da criação. Mostra-O como Criador. É por isso que Jesus Se chama a Si mesmo de Senhor do sábado (Mat. 12:8, Mar. 2:28). Este é o dia de Cristo — o dia do Senhor (Apoc. 1:10).

Autoridade Para Definir a Observância Correta. Sendo Jesus o Senhor do sábado, Ele tinha autoridade de lidar soberanamente com as leis acerca do sábado, inclusive a de determinar o que era e o que não era apropriado de se fazer naquele dia. Os fariseus estavam-se excedendo em suas prerrogativas (v. 24). É evidente que o que está em questão aqui não é o poder de Jesus para abolir o sábado, mas o poder para determinar a forma pela qual esse dia deve ser observado. Se Jesus se houvesse conformado a essas tradições humanas, teria dito que as autoridades humanas têm poder para definir como se deve obedecer aos mandamentos de Deus. Ao dizer essa frase aos fariseus, Jesus estava simplesmente querendo dizer: "Olhem, Eu mesmo criei o sábado, quando descansei no último dia da semana da criação. Eu, mais do que ninguém, tenho o direito de determinar qual a maneira certa de observar o sábado."

Além disso, a expressão sugere que a verdadeira observância do sábado só se efetua quando nos comprometemos pessoalmente com o Senhor do sábado, nosso descanso soteriológico.

O duplo papel de Cristo, como Criador e Redentor, torna óbvia a razão pela qual Ele reivindicou ser o “Senhor do sábado”. "Ao assim falar, Ele [Jesus] não estava depreciando a importância e a significação do sábado, nem de forma alguma estava em contravenção contra a legislação do Antigo Testamento. Ele estava simplesmente apontando para a verdadeira significação do sábado no que diz respeito ao homem, e indicava Seu direito de falar, visto que Ele mesmo era o Senhor do sábado." O Novo Dicionário da Bíblia, pág. 1422.

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OBJEÇÃO No. 53: LEI DE DEUS E LEI DE MOISÉS SÃO A MESMA COISA

ARGUMENTO: Não existe essa distinção entre lei de Deus e lei de Moisés, como querem os sabatistas. Essas são expressões permutáveis. Veja por exemplo, Marcos 7:10, onde o quinto mandamento é classificado como lei de Moisés e Mateus 15:4, onde o mesmo mandamento é classificado a lei de Deus. E Lucas 2, onde a circuncisão e os sacrifícios são indistintamente chamados de Lei de Moisés (v. 22) e Lei do Senhor (vv. 23 e 24).

RESPOSTA: A dificuldade é apenas aparente. Tanto Deus como Moisés outorgaram esses mandamentos. No processo de outorga da lei (não só da lei moral como da cerimonial e civil), Deus atuou como o autor da mensagem (Isa. 33:22; Tia. 4:12), e Moisés, que a transmitiu, como o Seu mensageiro (Nee. 8:14; 9:14). É por isso que tanto a expressão "Lei de Deus" como a expressão "lei de Moisés" às vezes são usadas de maneira intercambiável. Mas possuem sentido lato e sentido estrito.

Sentidos da “Lei de Deus”. Em seu sentido estrito, Lei de Deus significa os Dez Mandamentos, a lei moral, pois foi o Senhor quem a escreveu diretamente. Em seu sentido lato, lei de Deus abrange todas as categorias de leis escritas na Bíblia, já que Ele é, em última análise, a Fonte e Autor de todas elas, embora Moisés tenha sido o intermediário humano na promulgação dessas leis (ver Nee. 8:14; Atos 7:38, 53). Não deve ser causa de admiração, por exemplo, ouvir Lucas falar de ordenanças cerimoniais como a “lei do Senhor “ (Luc. 2:23,39).

Sentidos da “Lei de Moisés”. Em seu sentido estrito, Lei de Moisés significa a lei cerimonial, pois foi Moisés que as escreveu diretamente, ainda que sob a orientação divina (Esd. 3:2; Luc. 2:22). Em seu sentido lato, lei de Moisés abrange todos os escritos de Moisés, e, por conseguinte, todas as leis neles contidas, seja moral, cerimonial, civil, militar etc. (Esd. 7:6; Luc. 24:44; Atos 28:23). Limitou-se, porém, a escrever somente o que Deus lhe ordenou; portanto não é autor nem inventor de nenhuma lei no sentido rigoroso da palavra.

Moisés Foi o Mediador. É verdade que os Dez Mandamentos foram escritos pelo próprio Deus em tábuas de pedra, mas também é verdade que foram entregues ao povo por intermédio de Moisés (Gál. 3:19; Deut. 5:23-27). Quanto às outras leis (cerimonial, civil, judicial, dietética etc.), elas foram ditadas por Deus, enquanto Moisés, numa função semelhante à de um secretário executivo,

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as transcrevia num livro. Note que Deus está sempre no papel principal, e Moisés como coadjuvante. É por isso que muitas vezes a Bíblia usa a expressões Lei de Deus e Lei de Moisés de maneira permutável. Ora cita a lei cerimonial como Lei de Deus (Lucas 2:24), pois foi Ele quem a instituiu; ora cita a lei moral como Lei de Moisés, pois ela, além de ter sido mediada por Moisés, está registrada na Lei, isto é, no cinco livros de Moisés (Pentateuco). Os cinco primeiros livros de Moisés também são chamados “Livro da Lei de Moisés”, mas também “Livro da Lei do Senhor” (Nee. 9:3). Esse intercambiamento de termos, porém, não anula o fato de que há uma lei moral e uma lei cerimonial (2 Reis 21:8). Em geral chamamos a lei moral de lei de Deus, e chamamos a lei cerimonial lei de Moisés. (Nee. 9:13-14).

Diferenciação Bíblica. Toda a Bíblia trata essas leis de forma diferenciada, a começar do próprio Moisés, mediador das ditas leis. “Então vos anunciou Ele a sua aliança que vos ordenou cumprir, os dez mandamentos, e os escreveu em duas tábuas de pedra. Também o SENHOR me ordenou ao mesmo tempo que vos ensinasse estatutos e juízos, para que os cumprísseis na terra a qual passais a possuir.” Deut. 4:13-14, ACF. Note como Moisés claramente separa os Dez Mandamentos, que Deus “vos ordenou” dos estatutos e juízos que “me ordenou” ensinasse ao povo.

Mas não é só Moisés que admite isso. Em 2 Reis 21:8 a distinção é outra vez estabelecida. “...contanto que tenham cuidado de fazer segundo (1) tudo o que (Eu = Deus) lhes tenho mandado e (2) conforme toda a lei que Moisés, meu servo, lhes ordenou.”

Daniel foi inspirado a fazer a mesma distinção: “Sim, todo o Israel transgrediu a Tua lei (de Deus), desviando-se, para não obedecer à Tua voz; por isso, a maldição e as imprecações que estão escritas na Lei de Moisés, servo de Deus, se derramaram sobre nós, porque temos pecado contra ti.” Dan. 9:11. A lei de Deus e a Lei de Moisés não são, portanto, a mesma coisa.37

OBJEÇÃO No. 54: O DOMINGO É MENCIONADO NO NOVO TESTAMENTO — II

(MADALENA, MARIA E SALOMÉ VÃO AO SEPULCRO)

37 Joe Crews, Feast Days and Sabbaths.

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ARGUMENTO: Devemos guardar o domingo como dia de repouso e adoração, pois foi nesse dia que Jesus ressuscitou (Marcos 16:1-2). Neste dia as três mulheres foram ao sepulcro.

RESPOSTA: Esta é a segunda passagem neotestamentária em que o primeiro dia da semana é mencionado. “Passado o sábado, Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, e Salomé, compraram aromas para irem embalsamá-lo. E, MUITO CEDO, NO PRIMEIRO DIA DA SEMANA, ao despontar do sol, foram ao túmulo.”

Estes versos não falam nada sobre a santidade do domingo nem mencionam nenhum culto. Mostram apenas que o primeiro dia da semana é precedido pelo sábado. Mostram também que aquelas mulheres, ciosas observadoras do quarto mandamento, deixaram passar o sábado para poder comprar (nenhuma compra era lícita no sábado) os aromas com a intenção de embalsamar o corpo do Senhor na manhã do primeiro dia, coisa que não fariam se o domingo tivesse sido consagrado como dia de descanso, visto que comprar e embalsamar cadáveres era trabalho servil, impróprio para um dia santo. (Para discussão mais ampla, ver Objeção 69).

OBJEÇÃO No. 55: O DOMINGO É MENCIONADO NO NOVO TESTAMENTO — III

(CRISTO APARECE A MADALENA)

ARGUMENTO: Devemos guardar o domingo como dia de repouso e adoração, pois foi nesse dia que Jesus ressuscitou (Marcos 16:9). Neste dia Cristo apareceu a Madalena.

RESPOSTA: Esta é a terceira passagem neotestamentária em que o primeiro dia da semana é mencionado. “Havendo ele ressuscitado de manhã cedo NO PRIMEIRO DIA DA SEMANA, apareceu primeiro a Maria Madalena, da qual expelira sete demônios.” Mar. 16:9.

Novamente não há neste versículo nenhuma idéia de transferência do sábado para o domingo nem se menciona o primeiro dia como dia de repouso. A passagem diz apenas que a ressurreição aconteceu na madriguada do domingo e neste dia Jesus apareceu a Madalena. Embora escrito mais de 25 anos depois da cruz, o evangelho de Marcos nada sugere no sentido de que o domingo tenha substituído o sábado. (Para discussão mais ampla, ver Objeção 69).

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LUCASOBJEÇÃO No. 56: JESUS SÓ GUARDOU O SÁBADO PORQUE ERA JUDEU

ARGUMENTO: Jesus só guardou o sábado porque era judeu e tinha que se submeter à lei (Lucas 4:16). Os cristãos foram libertados deste fardo.

RESPOSTA: É curioso como alguns, percebendo ser infundada a objeção de que Jesus violou o sábado, logo se saem com a idéia de que Jesus só guardou o sábado porque era judeu.

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Jesus Era Sabatista. É verdade que Jesus observava o sábado (Mar. 6:2; Luc. 4:16, 31; 13:10). Esta é a primeira passagem, cronologicamente falando, que lança luz sobre a vida pré-ministerial de Cristo. Mostra que antes de ingressar em Sua grande missão, era seu costume freqüentar a sinagoga aos sábados. Sua participação nos serviços eclesiásticos revela o endosso que deu a esse dia como dia de adoração. E note que isto é registrado não em Mateus, um evangelho distintivamente judeu, mas em Lucas, um evangelho distintivamente gentio. Jesus guardava o sábado não apenas como Filho de Davi, mas como Filho do homem.

Não Tradicionalista. Admitir, porém, que Jesus guardou o sábado apenas por formalidade, para cumprir uma tradição, imposição ou costume cultural é um argumento ridículo. Tivesse Jesus nascido no Brasil, com 83% de sua população católica (Almanaque Abril 2002 — Brasil), em vez de na Palestina, ainda assim Ele teria observado o sábado do sétimo dia. Por quê? Porque Sua missão, como Redentor, incluía, entre outras coisas, obedecer aos mandamentos de Deus, e não à tradição local ou universal dos homens (Sal. 40:8). Teria observado o sábado também porque foi esse o dia em que Ele, como Criador, antes de Sua encarnação, descansou quando terminou de lançar os fundamentos de nosso mundo (Gên. 2:2-3; João 1:10; Col. 1:15-16).

E ainda porque deveria, em questões morais, colocar diante de nós Seu exemplo perfeito. A vida que Ele viveu neste mundo, devemos nós vivê-la, mediante Seu poder, e sob as Suas instruções. A Escritura é inequívoca: “Aquele que diz que permanece nEle, esse deve também andar assim como Ele andou.” 1 João 2:6; cf. 1 Ped. 2:21.

Imitadores de Cristo. Ora, se Cristo era fiel observador do sábado (Luc. 4:16), devemos também imitar o nosso Salvador nesta prática. Pedro diz que devemos seguir Seus passos (1 Ped. 2:21). A isto alguém objetaria que, se fôssemos seguir a Jesus em tudo, então deveríamos tornar-nos celibatários, pois Jesus não se casou; e orar somente no Monte das Oliveiras, pois era ali que Ele tinha o costume de orar; ou usar túnicas e capas, à moda oriental, e não calças e camisas conforme o costume ocidental. Ora, esta objeção não tem fundamento. A imitação de Jesus que a Bíblia ordena diz respeito às atitudes éticas e morais. O mandamento de imitar Jesus não é invalidado pelas ressalvas de natureza cultural, cerimonial e messiânica. Paulo diz que devemos ser seus imitadores, como também ele era de Cristo (1 Cor. 11:1; 1 Tess. 1:6). O próprio Jesus

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recomenda: “Eu vos dei o exemplo, para que, como Eu vos fiz, façais vós também”. João 13:15.

OBJEÇÃO No. 57: A LEI E OS PROFETAS VIGORARAM ATÉ JOÃO

ARGUMENTO: Jesus diz em Lucas 16:16 que a lei e os profetas vigoraram até João. Desde então a lei perdeu a vigência, inclusive o sábado.

RESPOSTA: Jesus não disse: “A Lei e os Profetas vigoraram até João; desde esse tempo, o sábado deixou de viger”, mas “desde então, vem sendo anunciado o evangelho do reino de Deus.” A conclusão fica por conta das pressuposições do objetor. Além disso, a passagem não está bem traduzida. A palavra “vigoraram” (ou “duraram” na ARC) não existe no texto grego original. Foi acrescentada pelo tradutor para completar o sentido, como, aliás, evidência o próprio fato de se achar ela gravada em tipos itálicos na Versão Almeida Revista e Corrigida. No original está simplesmente, conforme traduziu a tradução da CNBB: “Até João [Batista], a Lei e os Profetas."

Passagem Paralela. O que Lucas queria dizer? Examinemos a passagem sinóptica paralela de Mat. 11:13, e esclarecemos a lacuna: "Porque todos os Profetas e a Lei profetizaram até João”.

Jesus não estava querendo dizer que a lei moral (e até mesmo a cerimonial) só esteve em vigor até João Batista e que depois daí só o evangelho devia ser pregado. Mesmo porque, anos depois de João Batista ter morrido, Jesus afirmou a vigência da lei quando afirmou para o jovem rico que, se ele quisesse entrar na vida, a condição estipulada era guardar os mandamentos (Mat. 19:17). Disse noutra ocasião que, enquanto houvesse céu sobre nossa cabeça e solo sob nossos pés, a lei não passaria (Mat. 5:18).

Também não quis dizer que, depois de João, não haveria mais função profética. Profetas houve-os e muitos nos tempos apostólicos (ver Atos 2:17-18; 19:6; 21:9-10; 1 Cor. 14:29,32 etc.). Não, a expressão "a lei e os profetas" era uma locução bastante utilizada pelos judeus para designar às escrituras canônicas do Antigo Testamento (Expositor's Bible Commentary, Vol. 8, p. 142).

Além disso, a preposição “até” (gr. mechri) de modo algum implica que a “lei e os profetas” (as Escrituras do AT de maneira geral ou a Lei de Deus de maneira específica) perderam seu valor ou força quando João começou a pregar. Ao

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contrário, em outras passagens a palavra é empregada para mostrar força e aplicação contínuas (ver Mat. 28:15 e Rom. 5:14).

Profetizar da Primeira Vinda. Portanto, o que Jesus quer dizer aqui é que, até João iniciar seu ministério, os únicos escritos sagrados disponíveis eram o Antigo Testamento. O ministério deste profeta foi a linha divisória entre o Antigo e o Novo Testamentos.

Note a maneira bastante nítida como A Bíblia Viva traduz o verso: “Até quando João Batista começou a pregar, as leis de Moisés e as mensagens dos profetas eram a orientação que vocês tinham. Mas João trouxe a Boa Nova de que o Reino de Deus chegaria logo.” Até a pregação do reino de Deus pelo Batista, esses escritos predisseram a primeira vinda do Messias pela palavra, símbolos e sistema sacrifical (João 1:45). A partir de João, portanto, já não era preciso profetizar (falar disto como uma coisa futura), pois o Messias já estava entre eles (Mar. 1:15). Os profetas só podem profetizar até suas palavras se cumprirem, pois a partir daí já não é profecia: torna-se história. Desde João Batista, as profecias veterotestamentárias deixaram de ser predições para se tornarem fatos históricos (cf. Mat. 3:2). A partir de então, seria adicionado o Novo Testamento, que já não se ocuparia com profecias concernente à primeira vinda do Messias, mas com a implantação do reino de Deus. Luz adicional e supletiva começaria a brilhar sobre o caminho da salvação. O que fora dito pelos profetas, seria confirmado agora pelo próprio Messias (Heb. 1:1-2).

OBJEÇÃO No. 58: OS DISCÍPULOS NÃO GUARDAVAM O SÁBADO

ARGUMENTO: Não existe passagem no Novo Testamento provando explicitamente que os discípulos de Jesus eram guardadores do sábado.

RESPOSTA: Existe. Além do registro de 84 vezes, só no livro de Atos, em que os discípulos realizaram cultos no sábado, temos em Lucas 23:54-56 a passagem mais direta do Novo Testamento sobre o assunto. Vemos ali as mulheres discípulas de Jesus (inclusive a própria mãe do Salvador) interrompendo os preparativos do sepultamento de Seu Mestre, feito às pressas na tarde de sexta-feira, descansando conforme o quarto mandamento e pretendendo retomar seus afazeres no “primeiro dia da semana” (Luc. 24:1).

Observância Ciosa do Sábado. Esta passagem nos mostra o respeito que as discípulas tinham pelo quarto mandamento. Longe de terem aprendido na

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convivência com Jesus a desrespeitar o sábado, guardavam-no piedosamente. Aliás, elas eram tão ciosas da lei que se mostraram mais estritas do que o próprio Mixná, que declara: “Todas providências em favor do morto podem ser feitas [no sábado], ele pode ser ungido com óleo e lavado” (Shabbath 23:5).

Trabalho Comum no Domingo. Além disso, a atitude dessas mesmas discípulas, já sob a vigência do Novo Testamento, revelam que ignoravam qualquer instituição do domingo como dia de santificação e repouso, visto que, “passado o sábado”, isto é, depois de posto o sol, nas primeiras horas do domingo, “Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, e Salomé, compraram aromas para irem” embalsamar Jesus de manhã cedo (Mar. 16:1). Note que, no domingo, elas não só fizeram esta transação comercial, mas, ainda por cima, “foram ao túmulo” com a intenção de executar um trabalho que, em boa consciência, não acharam correto realizar no sábado.

O Ensino de Jesus. “Esta circunstância é um argumento forte, ainda que indireto, contra os que dizem que Jesus aboliu o quarto mandamento. Nem nesta passagem, nem em alguma outra se encontra expressão alguma onde se possa basear esta opinião. Nosso Senhor atacou, com freqüência, as tradições humanas que estavam em voga, no Seu tempo, com referência à observância do sábado. Também procurou eliminar as superstições que existiam com referência a este santo dia, mostrando que as obras de necessidade e de misericórdia não quebram o quarto mandamento. Mas nunca ensinou que se não devia guardar o sábado e, segundo a passagem que temos em vista, Seus discípulos eram tão escrupulosos em guardar o quarto mandamento como qualquer outro judeu fiel. Isso prova que Jesus lhes havia ensinado a santificar esse dia” (J. C. Ryle, Commentary on Luke, Lucas 23:56). — VER OBJEÇÕES 45 E 127 (DISCÍPULOS VIOLANDO O SÁBADO).

OBJEÇÃO No. 59: O DOMINGO É MENCIONADO NO NOVO TESTAMENTO — IV

(AS MULHERES VÃO AO SEPULCRO)

ARGUMENTO: Devemos guardar o domingo como dia de repouso e adoração, pois foi nesse dia que Jesus ressuscitou (Lucas 24:1). Neste dia as mulheres foram ao sepulcro.

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RESPOSTA: Esta é a quarta passagem neotestamentária em que o primeiro dia da semana é mencionado. Vale a pena ligá-la ao último verso do capítulo anterior, dada sua conexão lógica. “Então, se retiraram para preparar aromas e bálsamos. E, no sábado, descansaram, segundo o mandamento. Mas, NO PRIMEIRO DIA DA SEMANA, alta madrugada, foram elas ao túmulo, levando os aromas que haviam preparado.” Luc. 24:1.

Examinada assim a passagem em seu contexto imediato, percebe-se perfeitamente que os primeiros crentes cristãos davam muita importância ao sábado. Pois começaram os preparativos para embalsamar Jesus ainda na sexta-feira à tarde, mas não conseguindo seu intento, deixaram tudo de lado ao pôr-do-sol, para guardar o sábado, “conforme o mandamento [Êxo. 20:8-11], e só retomaram a tarefa inconclusa no domingo, muito cedo. Novamente nada de repouso. Pelo contrário, o que se percebe é o notável contraste entre a santidade do sábado e a secularidade do domingo. Lucas, que escreveu seu evangelho na mesma época que o de Mateus, nunca sugere que o domingo substituiu o sábado. Na única passagem registrada em seu evangelho menciona, à semelhança de Mateus, o primeiro dia apenas para datar o acontecimento da ressurreição. É curioso o fato de ele, sendo o único escritor não-judeu da Bíblia, ter registrado um incidente que revela fiel observância do sábado por parte das discípulas de Cristo e estabelece o domingo como um dia comum de trabalho. (Para discussão mais ampla, ver Objeção 69).

OBJEÇÃO No. 60: JESUS CELEBROU A SANTA CEIA NO DOMINGO DA RESSURREIÇÃO

ARGUMENTO: Jesus celebrou a Ceia do Senhor com os dois discípulos no domingo da ressurreição, comemorando este evento singular (Lucas 24:13-32). Isso fez do domingo o sábado cristão.

RESPOSTA: O encontro com os dois discípulos (ver também Mar. 16:12) na tarde de Sua ressurreição é utilizado pelos defensores do domingo como “prova” de que Jesus celebrou a santa ceia com eles neste dia em comemoração de Sua ressurreição. Alguns até chegam ao cúmulo de dizer que a expressão “Dia do Senhor” (kyriakê hemera), empregada em tempos pós-apostólicos para referir-se ao domingo, tenha-se originado da expressão “Ceia do Senhor” (kyriakón deipnon).

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Se repararmos, porém, no contexto, veremos que não ocorreu nem uma coisa nem outra. O texto diz simplesmente que, após ter caminhado com Cléopas e o outro discípulo (provavelmente Lucas) para Emaús, Jesus sentou-Se à mesa com eles e, “tomando ele o pão, abençoou-o e, tendo-o partido, lhes deu” (Luc. 24:30).

Na verdade, temos razões para crer que a passagem descreve nada mais nada menos que um jantar hospitaleiro, uma simples e frugal ceia noturna bem à moda oriental. As evidências são as seguintes:

Posição Comum Para a Refeição. A narrativa diz que Jesus Se sentou à mesa (gr. kataklino, “reclinar-se para comer”). A expressão denota que as pessoas ficavam numa posição semi-deitada em divãs, com a cabeça apoiada no braço esquerdo, posição comum para as refeições diárias.

Bênção e Distribuição Comuns. Abençoar a refeição (em reconhecimento de que o alimento é um dom de Deus) e distribuí-la era um procedimento usual e necessário na preparação para comer-se em grupo. Geralmente a honra de distribuir a comida era do convidado, e não do anfitrião. Por isso Jesus tomou a iniciativa, e não porque estivessem oficiando os emblemas sagrados.

Refeição Comum. A frase “partir o pão” é um idiomatismo judaico comum para “alimentar-se.” Sempre que ela aparece desacompanhada da menção do vinho ou fora do contexto de atividades religiosas, jamais é empregada na Bíblia para significar a observância da Ceia do Senhor. Quer dizer simplesmente “tomar refeição”. É isto que ocorre nos seguintes textos: a) Mateus 14:19 diz que Jesus partiu os pães (junto com peixes) para a multidão de cinco mil homens; b) Mateus 15:36 e Marcos 8:6,19 dizem que Jesus partiu os pães (junto com peixes) para a multidão de quatro mil homens; c) Atos 2:46 diz que os discípulos partiam o pão de casa em casa diariamente, diferentemente da ceia do senhor que não era nem numa base diária nem em domicílio; d) Atos 20:7 diz que os crentes de Trôade reuniram-se para partir o pão: uma espécie de jantar comunitário em homenagem a Paulo; e) Atos 27:33-35 diz que Paulo partiu o pão para marinheiros inconversos que estavam famintos. Ora, a Ceia do Senhor não é para incrédulos nem é dada com o propósito de matar a fome.

As únicas passagens em que essa expressão é usada especificamente para a Ceia do Senhor são Mat. 26:26; Mar. 14:22; Luc. 22:19; 1 Cor. 10:16; 11:24. É possível que Atos 2:42, 46 e 20:26 incluam tanto a Ceia do Senhor como as refeições comunitárias.

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Nenhum Vinho. Nenhum vinho foi abençoado ou servido, mesmo porque o jantar foi abruptamente interrompido no momento em que os discípulos reconheceram o Senhor pela maneira como fracionava o pão (v. 35).

A Promessa de Cristo. Se Cristo houvesse participado realmente de qualquer ceia com os discípulos após a ressurreição, o Mestre poderia com justiça ser acusado de incoerência ou contradição, já que prometeu em Lucas 22:16, ao estabelecer a Ceia do Senhor, que jamais voltaria a participar dela senão quando ela se cumprisse no reino de Deus e Ele a bebesse com eles no reino de Seu Pai (Mat. 26:29; Mar. 14:25). Estaria Jesus faltando com a palavra voltando a participar da ceia apenas três depois de haver prometido isto? Certamente que não.

Comer e Beber Comuns. Pedro, falando em nome dos discípulos, descreve claramente o que aconteceu tanto com os discípulos em Emaús quanto posteriormente na ocasião em que Jesus, na presença dos dez, comeu peixe assado e um favo de mel: “Nós ... comemos e bebemos com Ele, depois que ressurgiu dentre os mortos”. Atos 10:42. Não houve, portanto, uma santa ceia, mas comida e bebida comum e normal para confirmar a realidade corpórea da ressurreição.

Símbolo da Morte, e Não da Ressurreição. Ainda que Jesus realmente tivesse celebrado a eucaristia com os discípulos, isso não provaria que a ceia do Senhor foi a principal razão para a observância do domingo. Primeiro porque o motivo dominante enfatizado tanto por Cristo ao instituir a ceia, como por Paulo ao dar instruções sobre a maneira de celebrá-la, não é a ressurreição de Jesus, mas Sua morte expiatória (ver Mat. 26:28; Mar. 13:24; Luc. 22:15, 17, 19). Paulo declara explicitamente que, todas as vezes que participarem dos emblemas sagrados, os cristãos anunciam “a morte do Senhor, até que ele venha” (1 Cor. 11:26). A literatura pós-testamentária também não relaciona uma coisa com a outra (Didaquê, cap. 9, 10, 14; Epístola aos Coríntios de Clemente, cap. 24-27). Não é, portanto, a ressurreição de Cristo, mas Seu sacrifício e parousia que a Ceia do Senhor pretende comemorar.

Segundo porque 1 Coríntios 11:18, 20, 23, 33 e 34 dão a entender que não havia época nem dia fixo para a Ceia do Senhor. Ela podia ser realizada em qualquer dia da semana, do mês ou do ano. Jesus, que instituiu a ordenança, por exemplo, fez isso numa quinta-feira, e não num domingo.

Expressões Desconexas. Quanto à alegação de que Ceia do Senhor e Dia do Senhor são expressões irmãs, não há a menor evidência. Se a locução

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adjetiva “do Senhor”, bem conhecida de Paulo (ele a utiliza em 1 Cor. 11:20 para qualificar a ceia), estivesse em uso corrente no primeiro século, ele certamente a teria aplicado ao domingo. E ele não faz isso, Nessa mesma epístola se refere a este dia simplesmente pela designação judaica de “primeiro dia da semana” — ou literalmente, “primeiro dia depois do sábado” (1 Cor. 16:2).

À luz das evidências acima, temos que concluir que ver neste episódio a celebração de uma ceia com propósitos dominicais é distorcer a simplicidade da narrativa e violentar o contexto. Tanto no relato de Emaús como no encontro com os dez, o que Jesus fez foi consumir alimento comum, não para instituir uma adoração eucarística dominical, mas para demonstrar a realidade de sua ressurreição corporal. Segundo o Novo Testamento, a ceia não era celebrada num dia semanal específico nem se entendia o ritual como comemorativo da ressurreição.

JOÃOOBJEÇÃO No. 61: DESDE CRISTO VIVEMOS POR GRAÇA E NÃO POR LEI

ARGUMENTO: João ensina que a lei for dada por intermédio de Moisés, mas a graça e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo (João 1:17). Isto significa que a lei e o sábado nela contido caducaram.

RESPOSTA: Muitos interpretam esse texto como dando a entender que a morte de Cristo introduziu a graça para tomar o lugar da lei. Cometem tríplice erro neste caso.

O Evangelho Não é Exclusividade Neotestamentária. Erram primeiramente ao conceber a idéia equivocada de que lei a graça revelam aspectos opostos da natureza divina. Segundo eles, a lei revelaria o aspecto irado e severo de Deus enfatizado no AT; enquanto a graça revelaria Seu lado misericordioso e amorável enfatizado no NT. Na verdade, graça e evangelho são conceitos encontradiços no AT. Paulo afirma em Heb. 4:1-2 que as boas novas foram anunciadas aos israelitas recém-libertos do Egito e, em Gál. 3:8-9, que o evangelho foi preanunciado a Abraão e ainda em Rom. 4:3-6, diz que homens como Abraão e Davi foram justificados pela fé.38

Jesus Não Aboliu a Lei. Erram em terceiro lugar porque concluem de maneira falaciosa que a morte de Jesus modificou, anulou ou diminuiu a lei dos

38 Henry A. Virkler, Hermenêutica Avançada, pág. 104.

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Dez Mandamentos, quando isso na verdade não ocorreu, pois o próprio Jesus afirmou que não veio “revogar a lei” (Mat. 5:17). Há no NT cerca de cinqüenta provas diretas de que o Decálogo permanece em vigor .

A Graça Não Anula a Lei. Em segundo lugar, erram porque fazem parecer que a lei e a graça são sistemas contraditórios e antagônicos, quando na verdade são conceitos harmônicos e complementares (Sal. 85:10). Lei e graça não trabalham em competição, mas em perfeita cooperação. A lei aponta o pecado; a graça salva do pecado. A lei é a vontade de Deus; a graça é o poder para fazer a vontade de Deus. A graça, portanto, não anula a lei, mas capacita aquele que foi agraciado por ela a cumpri-la. A conjunção adversativa “mas”, presente na versão portuguesa e que sugere forte contraste entre a lei e a graça, não existe nos originais — foi interpolada por tradutores tendenciosos. Somente a “graça barata”, segundo Bonhoeffer, é contrária à lei.39

Antes de Cristo Havia Graça. Em terceiro lugar erram quando sugerem que antes de Cristo não havia graça nem verdade, pois a graça tem existido desde o início do mundo (Apoc. 13:8; Sal. 103:17-18). Paulo fala da “graça que nos foi dada em Cristo Jesus, antes dos tempos eternos.” 2 Tim. 1:9. Abraão foi salvo pela graça (Gál. 3:8; Rom. 4:3). Jeremias fala da “graça no deserto” (Jer. 31:2). Noé achou graças aos olhos do Senhor (Gên. 6:8) e Davi foi salvo pela fé (Rom. 4:6), e assim aconteceu com muitas personagens bíblicas. Em matéria de salvação, todas as pessoas de todas as épocas sempre estiveram debaixo da graça. No Céu só haverá uma classe de salvos: os remidos pelo sangue de Cristo (Apoc. 5:9).

Note o que diz o pastor Mark Finley: “Tanto no Antigo Testamento como no Novo Testamento, a salvação é pela graça, por meio da fé. Deus não pode ter dois métodos de salvação. Tito 2:11 afirma: ‘porque a graça de Deus se tem manifestado trazendo salvação a todos os homens.’ No Antigo Testamento, as pessoas eram salvas por meio do Cristo que havia de vir. Cada cordeiro sacrificado apontava para a vinda do Messias (Gên. 3:21; 22:9-13). No Novo Testamento, as pessoas são salvas pelo Cristo que há de voltar. Numa circunstância, a fé apontava [para a frente] para a cruz; na outra, a fé olhava para trás, para a cruz. Jesus é o único meio de salvação. Atos 4:12” (Estudando Juntos: Manual de Referência Bíblica, pág. 36).

Em Cristo Há Plenitude de Graça. O que João quis então dizer com “graça e verdade”? Por “graça”, quis dizer que, embora ela existisse no passado, foi

39 Dietrich Bonhoeffer, O Custo do Discipulado, cap. 1.

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revelada agora em “plenitude” na pessoa de Jesus, sem ser eclipsada pela interpretação legalista dos rabinos com relação ao sistema mosaico. Por “verdade”, quis dizer que em Cristo se cumpriram as sombras de todos os tipos e cerimônias do AT. O tipo encontrara o antítipo; a sombra, a realidade. Em nenhum momento, porém, João sugere que a lei ou o sábado foram abolidos. — VER OBJEÇÃO 85 (A GRAÇA ANULANDO A LEI).

OBJEÇÃO No. 62: JESUS VIOLOU O SÁBADO AO CURAR O PARALÍTICO DE BETESDA

ARGUMENTO: Jesus quebrou o sábado ao curar o paralítico do tanque de Betesda (João 5:1-11).

RESPOSTA: É fundamentando-se no relato da cura do paralítico de Betesda que alguns supõem tenha Jesus violado o sábado. Examinado com calma, porém, veremos que Jesus não pecou, nem quanto ao fato de curar o homem nem quanto ao fato de mandá-lo carregar seu leito.

É Lícito Fazer Bem aos Sábados. Não pecou quanto ao fato de curar o homem, pois, conforme já vimos, é perfeitamente “permitido praticar o bem no sábado” (Mat. 12:12, TEB). E o que Ele fez naquele dia foi um grande ato de misericórdia ao libertar um desamparado filho de Deus que sofria de paralisia havia 38 anos!

O Leito Não Era Carga Pesada. Mas o que dizer da ordem para o homem carregar sua cama no sábado? Dois dos profetas bíblicos falam contra carregar cargas no sábado (Jer. 17; Nee. 13). O leitor apressado da Bíblia, influenciado pelo conceito ocidental dessa peça de mobiliário, pode chegar a conclusões equivocadas. A cama, ou leito, usado pelos mendigos ou doentes bem como pelos pobres e viajantes daquela época e naquela parte do mundo não era o móvel como o conhecemos hoje: uma grande e pesada peça de madeira ou ferro guarnecida com colchão. A palavra grega que João usa para "leito" é krabbatos, que significa apenas "esteira", "tapete" ou "colchonete”. Algo leve, pequeno e portátil, que podia ser enrolado e facilmente transportado debaixo do braço ou a tiracolo. Às vezes a própria capa era usada para forrar o chão à guisa de cama (Mar. 10:50; Atos 12:7, 8; Deut. 22:12). — VER OBJEÇÕES 45, 47 E 64 (JESUS VIOLANDO O SÁBADO).

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OBJEÇÃO No. 63: DEUS NÃO PÁRA DE TRABALHAR NO SÁBADO

ARGUMENTO: Jesus declarou que não suspendia Suas atividades no sábado seguindo o exemplo de Seu Pai (João 5:17). Com estas palavras, o Mestre defende os que trabalham no sábado.

RESPOSTA: O que pretendeu Cristo dizer quando, ao defender-se formalmente contra a acusação de violar o sábado, afirmou: “Meu Pai trabalha até agora, e Eu trabalho também.” Esta declaração tem sido alvo de muita especulação. Muitos acham que Deus esteja trabalhando há seis mil anos em atividades criativas, de modo que ainda não experimentou o repouso sabático da criação.

Interpretação Extra-Bíblica. Essa interpretação originou-se com o filósofo judeu helenístico Filo, que defendia a idéia da criação contínua. É estranha não somente aos ensinos do Evangelho de João, mas também a toda a Bíblia. Esta ensina que as obras criativas de Deus foram realizadas num tempo passado já concluído (Gên. 1:1; João 1:3).

Interpretação Bíblica. A que tipo de trabalho então se refere Jesus, trabalho em que tanto Ele como o Pai estavam empenhados? Indicações conclusivas apontam que a expressão se refere não à atividade criadora, mas mantenedora e redentora. O Pai não realiza uma ininterrupta obra criadora capaz de anular a observância do sábado, mas uma obra mantenedora e, por intermédio do Filho, uma obra salvadora. Não é isso que diz o Salmo 74:12? “Ora, Deus, meu Rei, é desde a antiguidade; Ele é quem opera feitos salvadores no meio da terra.” Ou o próprio João? “A obra de Deus é esta: que creiais naquele que por ele foi enviado.” João 6:29.

A própria palavra grega usada neste verso reforça este ponto de vista. Ao afirmar Jesus que o “Pai trabalha até agora”, serve-se da palavra grega ergazestai, usada no Evangelho de João para descrever a “obra salvadora” de Deus, e não Sua obra criadora.

Obra Mantenedora. Deus é a fonte da vida, e esta não pode ser desligada, nem mesmo no sábado. Se somente por um momento Deus cochilasse, todo o Universo deixaria de existir. O Pai está constantemente empenhado na preservação da vida e no governo harmonioso do Universo, tendo sempre em vista o benefício de Suas criaturas.40 A Bíblia Life Application, comentando este verso, diz: "Se Deus parasse com toda espécie de trabalho no sábado, a natureza

40 B. W. Johnson. The New Testament Commentary: Vol. III—John.

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entraria em caos, e o pecado assolaria o mundo. Embora Gênesis 2:2 diga que Deus descansou no sétimo dia, isto não significa que Ele tenha parado de fazer o bem.” “As leis da natureza não conhecem feriado.”41

Obra Redentora. Quando Cristo, no sábado, fazia obras de misericórdia, também não violava o ideal divino. Embora não violasse o mandamento divino nem desprezasse o dia que Ele mesmo estabeleceu na semana da criação (ver João 1:1-3; Col. 1:16; Gên. 2:2, 3), sua missão redentiva não conhecia repouso. É como se Ele dissesse: “Aos sábados estou empenhado na mesma atividade salvadora que o Pai, e isto é perfeitamente permitido.” E para não deixar dúvidas quanto à natureza do trabalho que realiza, explica em que consistem: ressuscitar mortos, curar, perdoar etc. (Luc. 4:18; Atos 10:38). É verdade que Deus descansou ao completar a criação, mas por causa do pecado, Ele ainda está trabalhando para realizar a sua restauração e cura. E o mandamento decerto não impede o trabalho de salvação espiritual e física de almas. — VER OBJEÇÃO 08 (DEUS NÃO SE CANSA).

OBJEÇÃO No. 64: JOÃO AFIRMA QUE JESUS VIOLAVA O SÁBADO

ARGUMENTO: O apóstolo João diz claramente que Jesus somente violava o sábado (João 5:18).

RESPOSTA: Alguns comentaristas entendem que estas expressões refletem o ponto de vista do autor, de que Jesus realmente estava anulando o sábado. O contexto, porém, revela claramente que se tratava do ponto de vista dos acusadores de Jesus. Na verdade, João emprega aqui um recurso literário que a gramática classifica como discurso indireto livre, caracterizado pela ausência do verbo dicendi e no qual o autor insere elementos da fala direta da personagem nos termos em que teriam sido proferidas.

Opinião Farisaica Apenas. Neste sentido, a declaração reflete apenas a opinião dos escribas e fariseus registrada pelo evangelista (ver João 9:16). Jesus não quebrava o sábado do Senhor, mas apenas o sábado dos fariseus. Ou seja, violava o sábado apenas conforme o juízo equivocado deles. Na verdade, Jesus não quebrou o sábado na opinião de Deus, nem João era desse parecer. O Mestre deixa isso bem claro quando afirma que os judeus O estavam julgando segundo a aparência, e não conforme a reta justiça (João 7:23-24). Outra evidência de que

41 NIV Bible Commentary.

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Jesus não fez nada ilícito para ser objeto do ódio dos judeus é João 15:25: “Odiaram-Me sem motivo.”

Os que afirmam que Cristo aboliu a lei, ensinam que Ele violou o sábado e justificou os discípulos em assim fazer, colocam-se assim na mesma atitude adotada pelos astutos judeus. Contradizem dessa maneira o testemunho do próprio Cristo, que declarou: "Tenho guardado os mandamentos de Meu Pai, e permaneço no Seu amor”. João 15:10. Nem o Salvador nem Seus seguidores violaram a lei do sábado. Cristo era um vivo representante da lei. Nenhuma transgressão de seus santos preceitos se encontrou em Sua vida. O próprio nome pelo qual é chamado em João 1:1 — o Verbo (gr. Logos, a Palavra) — mostra que Ele era a personificação dos Dez Mandamentos (ou “as dez palavras”, deka logous). Olhando a uma nação de testemunhas ansiosas por uma oportunidade para O condenar, pôde dizer, sem contradição: "Quem dentre vós Me convence de pecado?" João 8:46.

Se Jesus tivesse quebrado o sábado ou qualquer outro mandamento da lei, não poderia ter sido o Cristo de Deus, pois uma das funções do Messias profetizadas por Isaías era a de que Ele haveria de engrandecer a Lei e torná-la gloriosa (Isa. 42:21). Na verdade Jesus não transgrediu a lei; antes, ampliou grandemente seu significado ao mostrar-nos, por exemplo, que os mandamentos dizem respeito não somente à ação, mas também à intenção: ira injustificada equivale a homicídio (Mat. 5:21-22) e cobiça sexual é adultério mental e emocional (vv. 27-28). Tanto o exemplo como o ensino de Jesus ressaltaram a vigência do espírito e da letra dos Dez Mandamentos. O salmista profetizando falou da lei como estando no coração de Jesus (Sal. 40:8; Heb. 10:7-9). Sua própria missão consistiu em “tirar o pecado [a transgressão da lei] do mundo”. João 1:29.

Jesus Guardava os Mandamentos do Pai. Os que afirmam que Cristo aboliu a lei ou violou o sábado e justificou Seus discípulos em assim fazer, adotam a mesma atitude dos astutos judeus. Contradizem dessa maneira o testemunho do próprio Cristo, que declarou: “Tenho guardado os mandamentos de Meu Pai, e permaneço no Seu amor”.J oão 15:10. Nem o Salvador nem Seus seguidores violaram a lei do sábado. Cristo era um vivo representante da lei. Nenhuma transgressão de seus santos preceitos se encontrou em Sua vida. Olhando a uma nação de testemunhas ansiosas por uma oportunidade para O condenar, pôde dizer, sem contradição: "Quem dentre vós Me convence de pecado?" João 8:46. — VER OBJEÇÕES 45, 47 E 62 (JESUS VIOLANDO O SÁBADO).

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OBJEÇÃO No. 65: O SÁBADO NÃO É PONTO DE SALVAÇÃO

ARGUMENTO: Para obter a salvação a única coisa que precisamos fazer é crer (João 6:28-29). Uma pessoa não vai perder a salvação porque não guardou o sábado. O sábado não é ponto de salvação.

RESPOSTA: É verdade que a observância do sábado não salva ninguém. Aliás, nenhum mandamento tem poder salvador. Se alguém devesse observar o sábado ou qualquer outro dia para ser salvo, então a salvação já não seria pela graça mediante a fé, mas por obras. E isto fere frontalmente todos os princípios soteriológicos encontrados na Palavra de Deus. A observância do sábado, portanto, jamais foi e jamais será a base para a salvação de quem quer que seja. Desde Adão até o presente, as pessoas sempre têm sido salvas da mesma maneira: pela graça mediante a fé.

Unicamente Pela Fé. Isto ocorre porque a salvação é um dom, e não uma conquista humana. Ninguém será salvo pelo que fez de bom, assim como também não se perderá pelo que fez de ruim ou pelo bem que deixou de fazer. A salvação depende unicamente da reação sincera do pecador ao Calvário, do apoderar-se, mediante a fé, dos méritos salvadores da morte expiatória de Cristo. Crer é o ato fundamental da vida cristã. Somente isto é essencial para alguém se salvar.

Salvos De Quê? Para Quê? A questão, porém, é: Somos salvos de que e para quê? Não resta dúvida. Somos salvos dos nossos pecados: “Ela dará à luz um Filho e Lhe porás o nome de Jesus, porque Ele salvará o seu povo dos pecados deles.” Mat. 1:21. Se somos salvos dos pecados (transgressão da lei), então somos salvos para a obediência. Jesus salva as pessoas dos seus pecados, e não nos seus pecados. Não é isto que diz Heb. 5:9? Cristo Se tornou “o Autor da salvação eterna para todos os que Lhe obedecem.” Isso é ilustrado na própria experiência do antigo Israel: a nação só recebeu a lei, depois de ter sido liberta do cativeiro egípcio. No Egito não teriam condições de obedecer a Deus. A analogia vale para a dimensão espiritual. Somente depois de salvos do cativeiro do pecado, é que a lei entra na nossa experiência. Isso acontece porque quem é escravo do pecado não pode obedecer a Deus. Depois que as cadeias são quebradas, Deus nos conduz ao Sinai.

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O fato de a salvação ser pela graça não invalida os mandamentos em geral nem o sábado em particular. A salvação é por graça, mas o discipulado é questão de obediência. A verdadeira fé, a fé justificadora, sempre “atua por amor”. Gál. 5:6. Primeiro cremos, depois agimos, e agimos por amor. Visto que o “cumprimento da lei é o amor” (Rom. 13:10), a fé que atua por amor é a fé que cumpre a lei. Ou seja, a verdadeira fé leva à obediência. Obediência a todos os mandamentos de Deus, inclusive o sábado. Esta é a única maneira de permanecer no amor de Deus (João 15:10).

Os Desobedientes Ficarão de Fora. Se não fazemos isso, decaímos da graça. Não há segurança nem repouso nem justificação na transgressão da lei. Nem pode o homem esperar ter paz com Deus, mediante os méritos de Cristo, se ao mesmo tempo continua em pecado. Aliás, “o que desvia os ouvidos de ouvir a lei, até a sua oração será abominável.” Prov. 28:9. O próprio Cristo advertiu que muitos, pensando que são cristãos, deixarão de entrar no reino porque não fizeram a vontade de Seu Pai. O motivo principal de sua exclusão do reino é terem praticado a iniqüidade. Curiosamente a palavra grega utilizada por Jesus para “iniqüidade” (anomia) é a mesma empregada por João para “quebrantamento da lei” (1 João 3:4, ACF). Não nos iludamos: Deus não vai salvar a quem não se submete a Seu governo.

OBJEÇÃO No. 66: A CIRCUNCISÃO ERA MAIS IMPORTANTE QUE O SÁBADO

ARGUMENTO: A circuncisão era mais importante que o sábado, porque podia ser feita neste dia. Se a circuncisão pode ser feita no sábado, também podemos trabalhar no sábado (João 7:22).

RESPOSTA: Precisamos entender o contexto situacional da declaração. João 7:21-24 registra o episódio em que Jesus, defendendo-se das acusações que contra ele faziam os fariseus, usou o exemplo da circuncisão. Afirmou que, se alguém podia ser circuncidado no sábado para cumprir a lei cerimonial e isto não quebrantava a lei moral, então era-Lhe perfeitamente lícito curar uma pessoa no sábado.

Definição de Circuncisão. A circuncisão era um rito religioso que consistia na remoção cirúrgica do prepúcio de uma criança recém-nascida judaica do sexo masculino no seu oitavo dia de vida. Entre os hebreus, este rito iniciatório significava a admissão daquela criança na comunidade do povo escolhido de

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Deus e era sinal da submissão às exigências da aliança. Também era um pré-requisito para a participação do ritual da Páscoa (Êxo. 12:48).

Ato Redentor. De acordo com o Mixná, se o oitavo dia de vida da criança caísse no sábado, a circuncisão e todas as coisas a ela necessárias podiam ser realizadas naquele dia sem constituir transgressão (Shabbath 18:3; Do Talmude, pág. 641). Isto era permitido porque a circuncisão era um ato redentor que mediava a salvação da aliança. À semelhança dos sacrifícios de animais, a circuncisão era um mandamento cerimonial, uma atividade religiosa e não uma obra servil, e como tal podia ser realizada no sábado. Note, porém, que a circuncisão é uma exceção, e não uma regra. De acordo com os rabinos, “o sábado excede em peso todos os mandamentos da Torá” (j. Nedarim 38b).

Licitude da Cura. Jesus não está dizendo nem que está certo nem que está errado fazer a circuncisão no sábado. Ele não entra no mérito da questão. Seu ponto não é este. A lógica do Mestre é a seguinte: Se os judeus achavam lícito mutilar um único membro do corpo no sábado (segundo o cálculo judaico o corpo era composto de 248 partes) para salvar uma pessoa, por que então ficavam zangados por Ele curar nesse mesmo dia todo o corpo de uma pessoa enferma. "Por que vos indignais contra mim, pelo fato de eu ter curado, num sábado, ao todo, um homem?" João 7:22, 23. Ao dizer isto, denunciou a incoerência deles em valorizar mais o formalismo religioso do que a justiça e a misericórdia (Strack e Billerbeck, Kommentar zum Neuen Testament, vol. 2, pág. 488).42

OBJEÇÃO No. 67: O NOVO MANDAMENTO DE CRISTO SUBSTITUIU O DECÁLOGO

ARGUMENTO: Quando João se refere aos Dez Mandamentos ou à Lei de Moisés, ele usa a palavra grega nomos (velha lei), mas quando escreve sobre os ensinos ou mandamentos de Jesus, geralmente emprega a palavra grega entolé (nova lei). Fazendo assim ensina que Cristo substituiu os mandamentos antigos por um novo: o amor (João 13:34-35).

RESPOSTA: Esse argumento não suporta um exame minucioso. Eis as razões:Subordinação, e Não Oposição. Não há relação de oposição entre nomos e

entole, mas de subordinação. Enquanto nomos é o termo genérico para lei em geral, entole é usado especificamente para os preceitos, ou seja, os itens ou

42 SDABC.

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subdivisões da lei. Em Mateus 5:19, entole é empregado para designar os mandamentos do Decálogo enquanto em Efésios 2:15 a mesma palavra é utilizada para referir-se aos preceitos cerimoniais. (Vine’s Expository Dictionary).

O Filho Contra o Pai? O mesmo João que escreveu esta passagem em seu evangelho nos relembra em sua primeira carta que mostramos nosso amor a Deus quando guardamos os Seus mandamentos (1 João 5:2-3). E aqui, embora ele esteja usando a mesma palavra (entole), está se referindo certamente aos mandamentos de Deus, e não aos de Cristo (seguindo o raciocínio do objetor). Seria o caso de perguntar: Pai e Filho estão divididos, cada Um com seus próprios mandamentos? Claro que não. Quando Jesus recomenda a observância dos mandamentos, Ele sempre está falando do Decálogo (Mat. 7:21; 19:16-19); Luc. 18:18-20). Há perfeita unidade de pensamento e ação entre o Pai e o Filho (João 17:12; 14:9-10; 10:30).

Mandamento Não Original. Quanto à originalidade o mandamento, é preciso dizer alguma coisa. Há duas palavras na língua grega para “novo”: neos (que significa novo nunca visto antes) e kainós (que significa novo somente para a ocasião). Acontece que João usa kainós. Diz ele: “E agora, senhora, peço-te, não como se escrevesse mandamento novo, senão o que tivemos desde o princípio: que nos amemos uns aos outros.” (2 João 5; cf. 1 João 2:7). A que “princípio” o apóstolo se refere? Ao tempo de Moisés. O mandamento de amar ao semelhante não era novo em si mesmo. Pertencia às instruções dadas pelo Senhor por meio de Moisés (Lev. 19:18). O mandamento do amor ao próximo não é novo quanto à existência, mas unicamente quanto à forma, pois é apresentado sob novo aspecto. “O mandamento era novo no sentido de que fora dada uma nova demonstração de amor, um modelo perfeito de amor que os discípulos agora eram ordenados a imitar. Por Sua revelação do caráter do Pai, Jesus havia apresentado aos homens um novo conceito do amor de Deus. O novo mandamento ordenava que as pessoas conservassem uns com os outros a mesma relação mútua que Jesus havia cultivado com eles e com a humanidade em geral. Enquanto o velho mandamento ordenava aos homens amar o próximo com a si mesmo, o novo insistia em que era preciso amar como Jesus havia amado. Havia uma nova significação. O novo era, na verdade, mais difícil do que o antigo, embora a graça para cumpri-lo fosse livremente fornecida” (Seventh-day Adventist Bible Commentary, João 13:34).

Um Motivo, e Não Um Mandamento. Em última análise, é necessário ressalvar que na verdade o amor não é um mandamento, mas um motivo. Ele

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não diz o que devo fazer, mas como devo fazer. O amor me constrange a fazer a vontade do Amado, mas o que me mostra a vontade do Amado é a Lei. O amor, portanto, não é uma substituição da Lei, mas o cumprimento dela (Horatius Bonar, God's Way of Holiness, págs. 77- 78). — VER OBJEÇÕES 106, 113 E 116 (JESUS SUBSTITUIU A LEI).

OBJEÇÃO No. 68: O DOMINGO É MENCIONADO NO NOVO TESTAMENTO — V

(MADALENA VAI AO SEPULCRO)

ARGUMENTO: Devemos guardar o domingo como dia de repouso e adoração, pois foi nesse dia que Jesus ressuscitou (João 20:1). Neste dia Madalena foi ao sepulcro.

RESPOSTA: Esta é a quinta passagem neotestamentária em que o primeiro dia da semana é mencionado. “No PRIMEIRO DIA DA SEMANA, Maria Madalena foi ao sepulcro de madrugada, sendo ainda escuro, e viu que a pedra estava revolvida.” João 20:1.

Esta passagem foi escrita sessenta anos após a ressurreição de Cristo. Apesar disso, não apresenta nenhum indicio de que se houvesse operado uma transferência no dia de repouso. O autor do Evangelho, o discípulo amado, que vivera tão perto do Mestre parece jamais ter ouvido falar de uma comemoração da ressurreição nos dias de domingo. (Para discussão mais ampla, ver Objeção 69).

OBJEÇÃO No. 69: O DOMINGO É MENCIONADO NO NOVO TESTAMENTO — VI

(JESUS SE ENCONTRA COM OS DISCÍPULOS)

ARGUMENTO: Devemos guardar o domingo como dia de repouso e adoração em homenagem à ressurreição de Cristo, pois os apóstolos assim o fizeram dando-nos o exemplo (João 20:19).

RESPOSTA: Esta é a sexta passagem neotestamentária em que o primeiro dia da semana é mencionado. “Ao cair da tarde daquele dia, O PRIMEIRO DA SEMANA,

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trancadas as portas da casa onde estavam os discípulos com medo dos judeus, veio Jesus, pôs-se no meio e disse-lhes: Paz seja convosco!” João 20:19.

O versículo demonstra claramente que os discípulos se haviam reunido, não para celebrar um culto nem para comemorar a ressurreição, mas por medo dos judeus. Além disso, essa reunião não aconteceu realmente no domingo, mas na segunda-feira, já que domingo à noite, segundo o cômputo judaico que faz começar os dias com o ocaso do sol, é na realidade segunda-feira.

A RESSURREIÇÃO NÃO É RAZÃO VÁLIDA PARA SANTIFICAR O DOMINGONão resta dúvida de que Cristo ressuscitou no primeiro dia da semana. Todos

os evangelhos dão conta disso (Mat. 28:1-15; Mar. 16:1-11; Luc. 24:1-12; João 20:1-18). A ressurreição é uma das mais sublimes e gloriosas verdades do evangelho. Este fato, contudo, não constitui razão válida para observar o domingo como memorial da ressurreição de Cristo. Eis as razões:43

Nenhuma Ordem ou Menção. Em parte alguma do Novo Testamento se ordena explícita ou implicitamente que o dia da ressurreição de Cristo deva ser celebrado num domingo semanal. Isso surpreende em vista das instruções explícitas dadas pelo Mestre com respeito a outras práticas como batismo, Ceia do Senhor ou lava-pés. Se o santo sábado tivesse sido transferido para o domingo, certamente Mateus, Marcos e João — todos judeus cujos antepassados haviam observado o sábado por mais de mil anos — não teriam ficado em silêncio sobre isso. O que se percebe é que, tanto para Jesus como para Seus discípulos, o domingo continuou a ser o que sempre foi para os profetas do Antigo Testamento: um dia comum de trabalho (Eze. 46:1)! Esta não é a maneira de Deus legislar. Quando Ele institui uma coisa, faz sempre uma declaração formal a esse respeito.

Nenhuma Relação do Evento Com o Dia. Segundo porque querer que o evento da ressurreição determine a escolha do domingo como dia de repouso faz tanto sentido como querer santificar a sexta-feira em memória da morte do Salvador ou celebrar o dia 25 de dezembro em honra de Seu nascimento. No entanto, em nenhuma parte do NT se ordena que o dia da ressurreição deva ser memoralizado por meio de um dia; ao contrário, a ordenança do batismo é que foi dada em honra de Sua morte, sepultamento e ressurreição (Rom. 6:3-4). E a 43 No capítulo 3 de sua dissertação doutoral From Sabbath to Sunday, Samuele Bacchiocchi apresenta no terceiro capítulo sete indicações que desacreditam o suposto papel desempenhado pela ressurreição de Cristo na mudança da observância do sábado para o domingo.

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ceia é o símbolo (1 Cor. 11:26). Além disso, conforme Riesenfeld observa, “dizer que o domingo é observado porque Jesus ressuscitou nesse dia”, conforme S. V. McCasland convincentemente afirma, “é realmente um petitio principii, pois uma celebração como essa podia realizar-se tanto mensalmente como anualmente e ainda assim continuar sendo a observância de um dia específico ("The Origin of the Lord’s Day," JBL 49 (1930): 69).

Nenhum “Dia da Ressurreição”. No Novo Testamento o domingo nunca é chamado de “dia da ressurreição”, mas simplesmente de “primeiro dia da semana”. A expressão “dia da ressurreição” não aparece na literatura cristã senão no início do quarto século. A ausência dessa designação denota que durante os três primeiros séculos da era cristã o domingo não era visto como celebração semanal da ressurreição de Cristo (H. Riesenfeld, "Sabbat et Jour du Seigneur," in A. J. B. Higgins, ed., N.T. Essays: Studies in Memory of T. W. Manson, pág. 212). 

Nenhum Encerramento do Ministério Terreno de Cristo. A ressurreição no domingo não assinala o término do ministério terreno de Cristo. Este terminou com Sua morte na tarde de sexta-feira quando Ele bradou: “Está consumado” (João 19:30) e repousou no túmulo conforme o mandamento. Note que o repouso divino marca o término tanto da criação como da redenção. Quando Cristo completou Sua obra de criação, memoralizou esse acontecimento descansando no sétimo dia. Esse descansou significou completude e realização. No fim do Seu ministério terrestre, ao encerrar Sua obra redentora na sexta-feira à tarde, Jesus repousou no túmulo. Esse descanso indicou que Ele havia consumado a obra de redenção da humanidade. O “está muito bom” da Criação fundiu-se com o “está consumado” da Redenção, visto que o Autor e Consumador descansou em ambas as ocasiões. Quando ressuscitou no primeiro dia da semana, fê-lo para iniciar uma nova obra: seu ministério no santuário celestial Atos 1:8; 2:33). Como o primeiro dia da criação, o primeiro dia desse novo ministério pressupõe trabalho em vez de repouso.

Nenhum Convite Para Repouso e Adoração. As palavras proferidas por Cristo no dia de Sua ressurreição são mais um convite ao trabalho do que ao repouso ou à adoração. Ele não disse: Vinde e adorai ... Vamos dedicar este dia à celebração da minha ressurreição”. Ao contrário, disse às mulheres: “Ide avisar a meus irmãos que se dirijam à Galiléia e lá me verão.” Mat. 28:10, e depois: “Ide . . .Fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho

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ordenado.” Mat. 28:19-20. Ele mesmo, ao se abordado por Maria, ainda nos arredores do túmulo, logo após Sua ressurreição, instruiu Sua discípula que não O detivesse, pois ainda não havia ascendido ao Céu, o que fez naquele mesmo dia: empreendeu uma longa viagem de ida e volta ao Céu (João 20:17).

Nenhuma Ceia do Senhor Comemorando a Ressurreição. A Ceia do Senhor, que muitos cristãos consideram o coração da celebração dominical da ressurreição de Cristo, foi inicialmente celebrada à noite de diferentes dias da semana (1 Cor. 11:18, 20, 33) e era considerada comemoração do sacrifício e Segundo Advento de Cristo, e não de Sua ressurreição. Paulo explica que, ao comermos o pão e bebermos do cálice, anunciamos a “morte do Senhor, até que Ele venha” (1 Cor. 11:26).

Nenhum Domingo de Páscoa Celebrando a Ressurreição. A Páscoa judaica, que muitos cristãos hoje observam no Domingo da Páscoa como celebração da ressurreição, foi observada pelos cristãos durante pelo menos um século depois da morte de Jesus, não num domingo (costume adotado a partir do Concílio de Nicéia em 325), mas em qualquer dia da semana em que caísse a data de 14 de nisã. Isto implica que não se atribuía nenhum significado especial ao dia da semana em que a Páscoa judaica era celebrada. Além disso, os documentos mais antigos mostram que a Páscoa era uma celebração mais da paixão/morte do que da ressurreição de Cristo (Para maiores detalhes, ver From Sabbath to Sunday).

A Ressurreição Não Foi a Razão Dominante. As primeiras referências explícitas à observância cristã do domingo, encontradas nos escritos de Barnabé (c. 135) e Justino Mártir (c. 150), mencionam a ressurreição apenas como razão secundária para a observância do domingo. A razão principal apresentada por Barnabé é o significado escatológico do “oitavo dia”, que, alega ele, representa “o começo de um outro mundo”. A razão principal apresentada por Justino é a comemoração da inauguração da criação: “porque é o primeiro dia em que Deus, transformando as trevas e a matéria prima, criou o mundo.” Outros escritos abordam especulações de natureza cósmica e escatológica sobre o significado o oitavo dia. Esses testemunhos mostram que a ressurreição de Cristo não era vista inicialmente como a justificativa primária para a observância do domingo.

Estas sete razões parecem suficientes para desacreditar a idéia de que a ressurreição de Cristo no primeiro dia da semana constituiu a principal razão para a adoção da observância do domingo em vez do sábado. “Nada há, na idéia

141

da ressurreição, que produzisse necessariamente a observância do domingo como dia de adoração” (P. Cotton, From Sabbath to Sunday, pág. 79).

OBJEÇÃO No. 70: JESUS REALIZOU UM CULTO DOMINICAL COM OS DEZ DISCÍPULOS

ARGUMENTO: João 20:19-23 relata a primeira reunião dominical com todos os discípulos após a ressurreição. Nela, saudou-os e soprou sobre eles o Espírito. Por este ato Jesus substituiu o sábado pelo domingo.

RESPOSTA: Das oito ocorrências da expressão “primeiro dia da semana” na Bíblia, esta é uma das mais utilizadas para promover a adoração dominical. Os textos paralelos são Marcos 16:13 e Lucas 24:33-49. Vamos examiná-la cuidadosamente, pois esta é a primeira aparição de Jesus aos discípulos reunidos no cenáculo e muitos acreditam que esse encontro tenha sido um culto religioso com o propósito de celebrar a ressurreição.

A Ênfase no Sábado. A primeira coisa que João faz ao narrar o acontecimento é situá-lo no tempo: “Ao cair da tarde daquele dia, o primeiro da semana”. A expressão primeiro dia da semana em grego é: mia ton sabbaton — “o primeiro [dia] depois do sábado”. A palavra sabbaton pode significar tanto sábado como semana. Note que a ênfase é posta no sábado, e não no domingo. É o sábado que serve de referencial para os outros dias da semana, inclusive o primeiro dia. devido à sua importância no pacto da lei, emprestou seu nome para representar a semana inteira de sete dias (Lev. 23:15-16).

Se a reunião ocorreu “ao cair da tarde" (gr. opsios, “noitinha”), ocorreu na parte escura do domingo, ou seja, na segunda-feira, segundo a maneira bíblica de computar o tempo. Uma evidência adicional em favor desta tese é que, naquela tarde, depois de terem encontrado a Jesus na aldeia de Emaús, os dois discípulos voltaram à Jerusalém, para contar isso aos outros. Essa aldeia onde Jesus Se revelara aos dois distava “de Jerusalém sessenta estádios” (Luc. 24:13), ou seja, aproximadamente 11 quilômetros. Ora, se os dois partiram dali quando o dia já havia declinado, só poderiam ter chegado a Jerusalém depois do pôr do sol. Jesus, portanto, apresentou-Se aos discípulos domingo à noite, ou, seja na segunda-feira.

Horário Romano. Se é assim, por que João diz que essa entrevista teve lugar no ‘primeiro dia da semana’. É que João emprega aqui o horário romano e não o

142

judaico. Esse evangelista, por exemplo, diz que era quase “a hora sexta” (João 19:14) quando Jesus compareceu perante Pilatos, enquanto Marcos diz que Cristo foi crucificado à “hora terceira” (Mar. 15:25). Desta aparente discrepância, ressalta que João emprega o horário romano, enquanto Marcos e, bem assim, Mateus e Lucas, utilizam o horário judaico. Portanto, se houve qualquer celebração, esta se realizou na segunda-feira, e não no domingo.

Lugar do Encontro. Onde estavam os discípulos reunidos? Não numa igreja ou sinagoga, mas num cômodo num dos bairros de Jerusalém, pelo simples fato de todos ali residirem (Atos 1:13).

Que faziam? Celebravam um culto religioso em honra à ressurreição? Não, pois não havia crido na ressurreição de Jesus. Mesmo depois de Maria os ter avisado do acontecimento, “não creram” (Mar. 16:11). Tampouco acreditaram no relato dos dois que O haviam visto em Emaús (Mar. 16:12-13). Realizavam não num culto público, mas estavam escondidos, a portas fechadas; não para realizar um culto, maspara fugir à perseguição e ao escárnio e por medo dos judeus, que haviam terminado de crucificar seu Mestre. O estado geral de ânimo era de perplexidade, pranto, incredulidade, tristeza, temor (Mar. 16:5, 8, 10, 11; Luc. 24:4, 5, 11, 17, 25, 37, 41). E quando o Salvador apareceu aos onze, eles, “surpresos e atemorizados, acreditavam estarem vendo um espírito” (Luc. 24:37). Então Jesus “censurou-lhes a incredulidade e dureza de coração, porque não deram crédito aos que o tinham visto já ressuscitado” (Mar. 16:14). Certamente esta não foi uma reunião nem dominical nem religiosa!

A Saudação. O fato de Jesus ter-lhe dito: “Paz seja convosco!” não é indicação de culto. Esta era uma forma oriental costumeira de saudação entre os judeus (Luc. 10:5), proferida sempre que se encontravam ou se despediam, em qualquer dia normal da semana (John Gill’s Expositor).

O Jantar. O fato de os ter encontrado à mesa, sugere apenas que o encontro coincidiu com hora do jantar, e não que fosse uma celebração de santa ceia. Jesus comeu com eles, não pão e vinho (emblemas utilizados na ordenança), mas peixe assado e mel (Luc. 24:38-43), comida comum, e o fez com a exclusiva finalidade de mostrar aos discípulos que não era um fantasma.

O Sopro do Espírito. O fato de ter soprado sobre eles, concedendo-lhes o Espírito Santo44 (João 20:22) não tem a menor relação com o dia de repouso. Foi apenas o cumprimento preliminar e parcial do que o próprio Cristo lhes

44 Este foi o cumprimento preliminar e parcial da promessa dos caps. 14: 16-18; 16: 7-15. O derramamento pleno veio cerca de 50 dias depois, no Pentecostés (Atos 2).” 5 SDABC.

143

prometera caps. 14:16-18; 16:7-15, a fim de capacitá-los para a grande obra que haveriam de realizar doravante. Mesmo porque o cumprimento pleno só lhes sobreveio 50 dias depois, no Pentecostes (Atos 2).

OBJEÇÃO No. 71: JESUS REALIZOU UM SEGUNDO CULTO DOMINICAL COM OS ONZE DISCÍPULOS

ARGUMENTO: João 20:26-29 relata a segunda reunião dominical com todos os discípulos após a ressurreição. Por este ato Jesus confirmou a substituição do sábado pelo domingo.

RESPOSTA: É verdade que este segundo encontro com os discípulos no cenáculo ocorreu “oito dias” depois do primeiro, o que, pela contagem inclusiva, nos leva ao domingo seguinte, provavelmente à noite, ou seja, segunda-feira novamente.

Alguns têm conferido significado especial ao fato de este segundo encontro de Jesus com os discípulos ter ocorrido no primeiro dia da semana. Argumentam que a insistência de Jesus em aparecer especificamente neste dia segunda vez assinalou o início da observância do domingo como memorial da ressurreição. Se fosse este, porém, o propósito da reunião, era de se esperar alguma menção a respeito deste importante fato. Mas não há a menor evidência disto.

Como na primeira ocasião, as portas estão fechadas novamente. Não para um culto (secreto?), mas por temor dos judeus (v. 19). A reunião realizou-se no domingo à noite, que, de acordo com o sistema de contagem judaica, já era segunda-feira. A saudação é a mesma da ocasião anterior.

Como Bacchiocchi bem o destaca, “a menção da aparição de Cristo ‘oito dias depois’ (João 20:26), supostamente no domingo seguinte ao da Sua ressurreição, dificilmente pode sugerir um costume regular de observância do domingo, pois o próprio João explica a razão: a ausência de Tomé na aparição anterior (v. 24)” (Samuele Bacchiocchi, From Sabbath to Sunday).

144

ATOS DOS APÓSTOLOSOBJEÇÃO No. 72: O PENTECOSTES CAIU NO DOMINGO

ARGUMENTO: Cristo decidiu honrar o domingo trazendo a vitória e o aniversário da igreja no primeiro dia da semana. O Pentecostes do ano 31 d.C. caiu num domingo. Isto prova que a igreja cristã já nasceu guardando o domingo (Atos 2:1-2)

RESPOSTA: O dia da semana em que caía o Pentecostes dependia da data da Páscoa. Esta era celebrada sempre em 14 de nisã (março-abril). O dia subseqüente à Páscoa, o décimo quinto dia do mês, marcava o início da Festa dos Pães Asmos e no décimo sexto dia um molho dos primeiros frutos (da colheita da cevada) era movido diante do Senhor (Lev. 23:5-11). Do décimo sexto dia deste mês, contavam-se então sete semanas e um dia, 50 dias pela contagem inclusiva, e chegava-se ao dia de Pentecostes, conhecido também como Festa das Primícias (da colheita do trigo), ou Festa das Semanas, em virtude das sete semanas que se lhe interpunham (Lev. 23:15-16).

Ocorrendo sempre no 50° dia depois de 16 de nisã, ou seja, 50 dias depois da apresentação do molho das primícias, o Pentecostes caía sempre em 6 de sivã (maio-junho). A data era a mesma cada ano, mas o dia da semana mudava.

Visto que no ano 31 d.C. a Páscoa e a crucificação de Jesus caíram numa sexta-feira (dia 14), o primeiro dia da Festa dos Pães Asmos caiu num sábado semanal (dia 15) e o oferecimento do molho das primícias ter acontecido, segundo o prescrito, ‘no dia imediato ao sábado” (Lev. 23:10-12), ou seja, no domingo, dia em que Jesus ressuscitou, pela contagem inclusiva, o Pentecostes caiu também coincidentemente num domingo.

Como sabemos? Se contarmos 49 dias, tomando como ponto de partida aquele 16 de nisã (ressurreição de Cristo), chegaremos ao dia da festa das semanas (conhecida na língua grega como Pentekoste, que quer dizer "qüinqüaségimo [dia]”) em que o Espírito Santo desceu sobre a igreja. Confira no quadro:

DIA DE PENTECOSTES

Domingo Segunda Terça Quarta Quinta Sexta Sábado

145

         14 de nisã

PáscoaCrucifixão

15 de nisã1° dia dos

Pães AsmosSábado

cerimonial

16 de nisãPrimícias

Ressurreição1

17 de nisã2

18 de nisã3

19 de nisã4

20 de nisã5

21 de nisã7° dia dos

Pães AsmosSábado

cerimonial6

22 de nisãFim da

semana 1 7

23 de nisã 8

24 de nisã 9

25 de nisã 10

26 de nisã 11

27 de nisã 12

28 de nisã 13

29 de nisãFim da

Semana 214

1° de Iyyar 15

2 de Iyyar 16

3 de Iyyar 17

4 de Iyyar 18

5 de Iyyar 19

6 de Iyyar 20

7 de IyyarFim da

semana 321

8 Iyyar 22

9 Iyyar 23

10 Iyyar 24

11 Iyyar 25

12 Iyyar 26

13 Iyyar 27

14 IyyarFim da

semana 428

15 de Iyyar 29

16 de Iyyar 30

17 de Iyyar 31

18 de Iyyar 32

19 de Iyyar 33

20 de Iyyar 34

21 de Iyyar

Fim da semana 5

35

22 de Iyyar 36

23 de Iyyar 37

24 de Iyyar 38

25 de Iyyar 39

26 de Iyyar 40

27 de Iyyar 41

 28 de Iyyar

Fim da semana 6

146

42

29 de Iyyar 43

30 de Iyyar 44

1 de sivã 45

2 de sivã 46

3 de sivã 47

4 de sivã 48

5 de sivãFim da

semana 749

6 de sivãPentecost

esSábado

cerimonial50

 

O fato, porém, de o Pentecostes e o derramamento do Espírito Santo sobre os crentes em Jerusalém terem caído num domingo não atribui nenhuma santidade a este dia. Mesmo porque, se tomarmos por base o calendário judaico, toda vez que a Páscoa (14 de nisã) ocorre numa sexta-feira, o qüinqüaségimo dia depois do movimento do molho, em 16 de nisã (domingo), Pentecostes não pode cair noutro dia a não ser o domingo.

Agora, se o fato de o Pentecostes cair no primeiro dia da semana fosse algo importante ou indicação de que o Espírito Santo tinha a intenção de honrar o domingo como um novo dia de repouso em lugar do sábado judaico, Ele teria dito isto claramente para ser consignado no registro bíblico. As Escrituras, no entanto, ficam inteiramente em silêncio em relação a uma coisa nova como esta. A lógica e o contexto dizem que a semelhança não passou de mera coincidência.

OBJEÇÃO No. 73: PAULO SÓ IA ÀS SINAGOGAS NO SÁBADO PARA EVANGELIZAR OS JUDEUS

ARGUMENTO: Paulo freqüentava as sinagogas no sábado, não porque observasse esse dia, mas para ter oportunidade de evangelizar os judeus que estariam reunidos naquele dia. No NT jamais se diz que os cultos cristãos se realizavam no sábado.

RESPOSTA: Embora haja inúmeras passagens bíblicas mostrando que Paulo presidiu cultos no sábado do sétimo dia, é insustentável o argumento de que as reuniões das quais Paulo participava aos sábados nas sinagogas eram apenas por conveniência evangelística. Eis as razões:

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1. Nas sinagogas visitadas por Paulo havia um misto de judeus e gentios prosélitos. Além disso, os cristãos convertidos tanto do judaísmo como do paganismo, os quais não possuindo a princípio templos próprios, também se reuniam nas sinagogas (ver Atos 13:14-15,42-44; 18:4).

2. No caso específico de Atos 13 são justamente os gentios que rogam a Paulo que venha ensinar-lhes no sábado seguinte. Ora, por que Paulo, sendo apóstolo dos gentios, esperou sete dias para pregar aos gentios? Não era mais fácil dizer-lhes: “Vocês não precisam esperar até o próximo sábado. Voltem amanhã, no domingo. Este é o novo dia de guarda para os gentios cristão”? A resposta para essas perguntas só pode ser uma: tanto judeus como gentios eram observadores do sábado!

3. Os habitantes da cidade onde ocorreu o incidente — Antioquia — eram em sua esmagadora maioria cristãos na época de Paulo. Tanto é que Lucas hiperboliza: “No sábado seguinte, afluiu quase toda a cidade para ouvir a palavra de Deus.” Atos 13:44. Isso mostra que catorze anos após a ressurreição, os discípulos ainda guardavam o sábado.

4. Nas cidades em que não havia sinagoga nem os discípulos dispunham de uma igreja cristã onde adorar, Paulo às vezes saía para o campo, onde sabia encontrar pequenos grupos de crentes adorando no sábado bíblico (Atos 16:13).

5. Quando Paulo circuncidou Timóteo (um preceito do código cerimonial), ele diz claramente que fez aquilo por causa dos judeus (Atos 16:3). Nunca diz isso, porém, a respeito da observância do sábado.

6. Gieseler afirma em sua Church History, vol I, pág. 93 que “os cristãos gentios também observavam o sábado”.

OBJEÇÃO No. 74: OS DEZ MANDAMENTOS ERAM UM FARDO INSUPORTÁVEL

ARGUMENTO: Pedro afirma em Atos 15:10 que os Dez Mandamentos fora um jugo insuportável para os judeus do passado, o qual não devia ser colocado sobre os cristãos. Paulo diz em Gál. 5:1 que era um “jugo de escravidão”.

RESPOSTA: Jugo, ou canga, era o nome da peça de madeira que se assentava sobre a cabeça dos bois para atrelá-los a uma carroça ou arado. Em sentido figurado, a palavra denota sujeição imposta. Ao falar de um jugo de um jugo insuportável, Pedro não está se referindo à lei dos Dez Mandamentos, como

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deduzem alguns apressadamente, mas aos preceitos da lei cerimonial (Clarke’s Commentary). Temos pelo menos três razões para crer assim:

Primeiro, a Bíblia diz que, para as pessoas de coração e entendimento renovados, os mandamentos de Deus “não são penosos” ou “pesados” noutra versão (1 João 5:3). Em vez de lei de escravidão, Tiago chama os Dez Mandamentos de lei da liberdade.

Segundo, o contexto da passagem deixa claro que o apóstolo estava participando de um concílio apostólico (O Concílio de Jerusalém), onde o tema principal da discussão era não a vigência da lei de Deus, mas sim se a ordenança cerimonial da circuncisão para adultos devia ou não ser imposta aos gentios (Atos 15:5).

Terceiro, Jesus já havia empregado expressão semelhante antes de Pedro ao referir-se à tradição dos fariseus (Mat. 23:4) e Paulo emprega fraseologia quase idêntica tempos depois ao advertir os gálatas para de novo não se submeterem “a jugo de escravidão” dos rituais judeus (Gál. 5:1). É claro que, por esta designação, ele não está se referindo à lei, mas ao legalismo.

Portanto o que Pedro chama de jugo insuportável aqui não é a lei dos Dez Mandamentos, mas o código cerimonial, tornado nulo e vão pela crucifixão de Cristo. Não que as exigências cerimoniais, conforme originalmente planejadas por Deus, fossem em si mesmas intoleráveis. Eles se tornaram um fardo insuportável por dois motivos: (1) os judeus haviam convertido esses ritos em obras de salvação, os quais se tornaram escravidão (Atos 15:9-11; Gál. 2:16; 5:4-6); (2) os judeus perverteram essas leis rituais agregando-lhes numerosas exigências legalistas e radicais rabínicas (Mar. 7:1-13).

Havia, e há, porém, uma outra maneira, sutil, pela qual o próprio Decálogo pode-se tornar fardo ou jugo: quando o procuramos guardar sem a graça de Cristo. Nesse caso, porém, o que pesa não é a lei (o jugo) em si, mas o legalismo, o esforço de ganhar a salvação por méritos próprios (Mat. 23:4). Neste caso, o que é “jugo de escravidão” não é a lei, mas a condição resultante do uso errado da lei (cf. Gál. 5:4). A lei, sem Cristo, é jugo; mas nEle, é leve e suave (Mat. 11:29-30).

OBJEÇÃO No. 75: O SÁBADO NÃO É “COISA ESSENCIAL”

ARGUMENTO: Ao estipular o que os gentios deviam fazer, os apóstolos reunidos no Concílio de Jerusalém não mencionaram o sábado entre as “coisas essenciais”

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exigidas deles. Isto prova que a observância do sábado não era mais necessária (Atos 15:28-29).

RESPOSTA: Este raciocínio peca por falsa inferência, ou seja, por extrair do versículo conclusões enganosas. O fato de o sábado não ter sido mencionado entre as coisas “essenciais”, não pressupõe que o sábado fosse coisa acessória ou secundária, mesmo porque, para desespero dos defensores do “sábado cristão”, o domingo também não consta da lista apostólica.

Controvérsia Sobre a Circuncisão. Precisamos entender o contexto para não sermos desencaminhados. Acontece que, na época de Paulo, alguns da seita dos fariseus, que se haviam convertido ao cristianismo, foram-se da Judéia para Antioquia e começaram a ensinar aos cristãos vindos da gentilidade que estes precisavam circuncidar-se e guardar as outras leis cerimoniais mosaicas para serem salvos (Atos 15). Paulo e Barnabé não concordaram com essa doutrina. Outros, porém, eram favoráveis. Surgiu uma controvérsia. Então os representantes da igreja subiram à Jerusalém, onde estava na época localizada a sede da obra, para estudarem este assunto com os líderes da sede da igreja. Depois de examinarem a questão, os apóstolos e anciãos concluíram que as leis cerimoniais não deviam mais ser exigidas, mas somente as “coisas essenciais” (v. 28).

Coisas Necessárias. As “coisas essenciais” não eram, como a princípio se pode supor o absolutamente necessário ou indispensável, ou ainda a totalidade das obrigações dos gentios, no que diz respeito à sua carreira cristã. Se assim fosse, então os demais mandamentos da lei de Deus, por também não terem sido incluídos na carta-circular, seriam igualmente desnecessários, raciocínio que, se desenvolvido, leva a conclusões absurdas. Além disso, a palavra “essencial”, empregada pela versão Almeida Atualizada, não é uma tradução precisa. O termo grego empregado aqui é epanagkes, que significa “o necessário” ou “as coisas necessárias”. Segundo Strong, epanagkes trata-se presumivelmente de um composto (epi + anagke) que sugere “uma necessidade imposta pelas circunstâncias”.

Isto confere com o contexto, que revela ter sido esta uma decisão essencialmente prática. Sob as condições do momento, a liderança da igreja decidiu não perturbar aqueles que, dentre os gentios, se convertiam a Deus (v. 19) com assuntos embaraçosos e de somenos importância, para que não desanimasse de seguir a Cristo. Exigiram deles apenas o básico — somente

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aquilo que a lei mosaica exigia dos gentios para viverem em meio aos israelitas (Lev. 17 e 18) — a saber, que se abstivesse de três coisas que os vindos do paganismo estavam muito habituados a praticar, mas que eram costumes inconsistentes com os princípios do cristianismo e especialmente odiosos para os judeus: (1) idolatria: contaminações dos ídolos, (2) sexolatria: relações sexuais ilícitas e (3) gastrolatria: carne de animais sufocados com o sangue. Essas três orientações se equiparam com o segundo, o sétimo e o sexto mandamentos, respectivamente.

Note que os outros sete mandamentos do Decálogo, inclusive o sábado, não são mencionados em Atos 15. Estavam os apóstolos querendo insinuar que os cristãos, a partir dali, podiam ter outros deuses além do Senhor, tomar o nome de Deus em vão, desonrar pai e mãe, furtar, levantar falso testemunho e cobiçar as coisas alheias? Naturalmente que não! Ora, se o concílio de Jerusalém não anulou esses mandamentos, por que teria anulado somente o mandamento do sábado? Não faz o menor sentido.45

Observe, adicionalmente ainda, que a decisão não mencionou nada a respeito de o domingo substituir o sábado nem de o sábado ser abolido. Esse assunto não foi abordado simplesmente porque observar o sábado era ponto pacífico.

OBJEÇÃO No. 76: O CONCÍLIO DE JERUSALÉM ABOLIU O SÁBADO

ARGUMENTO: O Concílio de Jerusalém rompeu definitivamente com a lei mosaica ao isentar da circuncisão os crentes gentios. É admissível supor, portanto, que o mesmo concílio tenha desobrigado os gentios da observância do sábado (Atos 15:20).

RESPOSTA: Contrariando a muitos críticos do sábado, o Concílio de Jerusalém (c. 49 ou 50 d.C.) não isentou os gentios da Lei em geral nem do sábado em particular. Eis as razões:

Autoridade Conciliar. Em primeiro lugar, concílios religiosos não possuem autoridade espiritual para anular leis divinas. Somente Deus pode fazer isso, e Ele o faz de cima para baixo, mediante o Seu Espírito (Mat. 27:51; Atos 15:28).

Lei Cerimonial Desrecomendada. O que o concílio recomendou descontinuar, em obediência à vontade do Espírito, não foi a observância da lei moral, como alguns poderiam supor, mas do sistema cerimonial, com

45 “Questions & Answers”, Tomorrow’s World, September-October, 2001, pág. 15.

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especialidade a ordenança da circuncisão, principal ponto de discórdia entre judeus e gentios naquela conjuntura.

Ofensa Maior. Se os gentios foram instruídos pelo Concílio a abster-se de um ato aparentemente inofensivo (pelo menos para os pagãos), como comer alimento oferecido aos ídolos, para não ofender a suscetibilidade dos cristãos judeus (Rom. 4:13), dificilmente teriam recebido instrução para ignorar a observância do sábado, o que constituiria uma ofensa infinitamente maior.

Preceitos Morais. Todas as três coisas de que os cristãos se deviam abster eram de natureza moral. Abster-se da contaminação dos ídolos é uma expressão que reprova qualquer espécie de idolatria, sendo o equivalente do primeiro e do segundo mandamentos que ordenam não ter outros deuses diante do Senhor nem curvar-se perante ídolos (Êxo. 20:3). Abster-se das relações sexuais ilícitas é uma clara alusão mandamento que ordena “Não adulterarás” (Êxo. 20:14) e que inclui toda espécie de imoralidade sexual. Abster-se do consumo de carne morta por sufocamento, isto, é com o seu sangue, obedece ao princípio moral de saúde que proíbe o uso de sangue (Gen. 9:5; Lev. 13:17; 17:10-10-16; Deut. 12:16, 23-25); emparelha-se, portanto, com o sexto mandamento que diz para não matar (Êxo. 20: 13). Ora se, por ocasião do concílio, ainda era pecado violar o primeiro, o segundo, o sétimo e o sexto mandamento, é porque certamente transgredir o quarto mandamento também continuava a sê-lo.

Tementes a Deus. A maioria dos gentios visados pelo Concílio era os “tementes a Deus” que haviam sido anteriormente instruídos na fé judaica em geral e na observância do sábado em particular (Atos 10:2; 13:42-44; 14:1). Portanto, foi somente o fato de eles já observarem o sábado que tornou desnecessário para o Concílio de Jerusalém entrar no mérito desse assunto (cf. versículo 21). Na verdade, segundo o testemunho de Filo e de Tertuliano, o costume de guardar o sábado havia sido aceito não somente por gentios tementes a Deus, mas até mesmo por gentios pagãos sem qualquer interesse em tornar-se judeus.

Moisés Era Lido nas Sinagogas. Por que só mencionou essas proibições? O versículo 21 responde: “Porque Moisés tem, em cada cidade, desde os tempos antigos, os que pregam nas sinagogas, onde é lido todos os sábados”. Percebeu? Não havia necessidade de entrar em maiores detalhes sobre a lei moral, porque Moisés (isto é, os cinco livros que ele escreveu) era pregado nas sinagogas todos os sábados. Judeus e cristãos ouviam ali a lei de Deus ser lida e explicada todo o sábado, portanto não precisavam de instruções adicionais. Os apóstolos só

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mencionaram os aspectos da lei em que os pagãos mais incorriam em transgressão e que por isso mesmo poderiam ser mais ofensivos aos irmãos judeus: idolatria, sexolatria e gastrolatria.

O Presidente do Concílio Recomenda Obediência Integral. Outra evidência fortíssima de que este concílio não aboliu o sábado é a de que próprio Tiago, que a presidiu a assembléia, alguns anos mais tarde ordena solenemente a obediência à lei moral, afirmando que quem viola um dos mandamentos se torna culpado de todos (Tia. 2:8-12). O próprio Paulo, muitas vezes citado como antinomista, é descrito no livro de Atos mais adiante observando o sábado e estimulando outros pelo seu exemplo a observar esse dia, e isto muitos anos depois do concílio de Atos 15 (ver Atos 17:2-3). O Novo Testamento mostra tanto judeus como gentios guardando o sábado; em Atos 13:42-44, vemos toda uma cidade se reunindo no sábado para ouvir Paulo pregar.

À luz dessas considerações, entendemos que o Concílio de Jerusalém, não obstate ter liberado os cristãos gentios das leis cerimoniais, jamais os isentou da guarda dos Dez Mandamentos ou da observância do sábado.

OBJEÇÃO No. 77: O DOMINGO É MENCIONADO NO NOVO TESTAMENTO — VII

(PAULO CELEBRA A CEIA DO SENHOR)

ARGUMENTO: Paulo presidiu um culto dominical em Trôade, no qual houve pregação da Palavra e celebração da Ceia do Senhor. Este é um forte indício de que o sábado foi substituído pelo domingo. (Atos 20:7-12).

RESPOSTA: Esta é a sétima passagem neotestamentária em que o primeiro dia da semana é mencionado. Eis o texto: “No PRIMEIRO DIA DA SEMANA, estando nós reunidos com o fim de partir o pão, Paulo, que devia seguir viagem no dia imediato, exortava-os e prolongou o discurso até à meia-noite.” Atos 20:7.

Examinemos passo a passo o contexto da passagem. Paulo estava de viagem para Jerusalém, a fim de chegar a tempo à festa de Pentecostes (19:21; 20:16). Era sua terceira viagem missionária. A caminho, ele e seus companheiros detiveram-se na cidade portuária de Trôade, onde passaram toda uma semana (v. 6).

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O Motivo da Parada em Trôade. Por que pararam aí? Sem dúvida pelas exigências do navio e seu carregamento, para darem assistência espiritual aos cristãos que havia naquela localidade ou, o que é mais provável, por ambas as coisas. Ao que parece, Paulo havia fundado uma igreja ali em sua primeira viagem missionária. Por que demoraram então sete dias? Não para esperar pelo culto regular de domingo, a fim de poder contar com o maior número de irmãos, como afirmam muitos defensores do domingo. Pelo contrário, esperaram pelo sábado (o sétimo dia), pois este era o dia oficial de culto da primitiva igreja cristã (ver Atos 21:4, 27; 28:14).

Reunião Informal Após o Sábado. A reunião ocorreu, segundo Lucas, “no primeiro dia da semana” ou, mais literalmente, conforme o grego, “no primeiro [dia] depois do sábado”, pois a “palavra sabbath é muitas vezes usada após numerais com o significado de semana (M. R. Vincent, Word Studies in the New Testament, Acts 20:7). Ou seja, depois do pôr-do-sol, findo o sábado e tendo já descido a noite (a parte escura do domingo), Paulo e seus companheiros entraram no acordo de que eles prosseguiriam de madrugada para Assôs de navio, enquanto Paulo seguiria por terra na manhã seguinte (vv. 7, 13). A versão bíblica The New English Bible, reza “no sábado à noite”.

Tencionando aproveitar o máximo da companhia do apóstolo, a pequena igreja reuniu-se com Paulo e seus companheiros no cenáculo para uma reunião de despedida. No antigo Oriente o cenáculo era um pavimento superior de casa residencial usado comumente para propósitos sociais. O fato de um jovem estar sentado na janela desse compartimento parece sugerir fortemente que a reunião não era de natureza tão formal como num culto (v. 9).

Sistema Judaico. Não procede a alegação de que Lucas, sendo gentio e escrevendo a outro gentio (o romano Teófilo), se tenha servido do sistema romano de demarcar o tempo. Os evangelhos sinóticos, inclusive Lucas (escrito ao mesmo destinatário), sempre fazem uso do sistema judaico de computar o tempo. É o mesmo Lucas que utiliza expressões alheias à contagem romana como “vigílias da noite” (Luc. 2:8), “pôr-do-sol” (Luc. 4:40), “hora sexta” e “hora nona” (Luc. 23:44), “hora terceira” (Atos 2:15), “hora nona” (Atos 3:1; 10:3), “hora sexta” (Atos 10:9) e “hora terceira” (Atos 23:23).Ceia Santa ou Jantar Comum? Alguns acham que a expressão "partir o pão" (klasai arton) se refira à ordenança da comunhão. Esta é uma interpretação temerária. Neste caso, a celebração da ceia entre o pôr do sol da noite de sábado e o nascer do sol da manhã de domingo constituiria (no entender dos dominicalistas) reconhecimento

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do domingo como o sábado cristão. Embora na literatura pós-apostólica, essa expressão seja uma designação técnica para a ceia do Senhor, este não era o significado ou uso comum nos tempos do NT. Segundo E. W. Bullinger em seu livro Figures of Speech Used in the Bible, págs. 839, 840, a expressão partir o pão "significa distribuir alimento e é usada para referir-se às refeições . . . Os leitores [originais das cartas do Novo Testamento] não podiam ter outra idéia ou sentido em sua mente." Partir o pão era simplesmente tomar refeições (ver Luc. 24:30, 35 e Atos 27:35). A palavra “pão” (gr. artos) muitas vezes é usada na Bíblia figurativamente, uma figura conhecida como sinédoque que substitui a idéia mais ampla (alimento) por uma palavra de significado menos abrangente (pão). A idéia de culto de santa ceia não está, portanto, necessariamente implícita na frase. Mesmo porque, não foi servido o outro emblema que acompanha o pão, a saber, o vinho nem se procedeu ao lava-pés (João 13:1-15; 1 Tim. 5:10). Ainda que isto houvesse acontecido, o fato não confere nenhuma distinção ou sacralidade a esse dia. Em primeiro lugar porque o costume dos discípulos era partirem o pão "todos os dias" (e não num dia exclusivo) de casa em casa (Atos 2:46), e não no domingo. Mesmo porque, se a celebração da Ceia do Senhor devesse ser feita num dia específico, e significasse isso que esse dia deveria a partir de então ser honrado como dia santo, devemos lembrar-nos que nosso Senhor, nosso exemplo em todas as coisas, quando instituiu este rito, escolheu a noite de quinta-feira (que já era sexta), e não o domingo. E Paulo ao instruir os coríntios a respeito da maneira de celebrar a Ceia do Senhor, ao falar sobre o tempo repete quatro vezes a frase “quando vos reunirdes” (gr. sunerkomenon, 1 Cor. 11:18,20,33,34), implicando assim, pela semântica grega, tempo e dias indeterminados.

O principal objetivo dessa reunião não era a fração do pão. “A passagem não é absolutamente convincente [como prova da guarda do domingo], porque a partida iminente do apóstolo era o motivo para reunir a pequenina igreja em uma ceia fraternal” (Augusto Neander, The History of the Christian Religion and Church, vol. 1, pág. 337). Admitindo-se que a fração do pão fosse mesmo um jantar-refeição, a reunião teria mais o caráter de confraternização, “que servia a um fim duplo: era um elo de fraternidade e meio de sustento para os necessitados” (Willinston Walker, História da Igreja de Cristo, pág. 32).

Pregação ou Diálogo? Enquanto jantavam, Paulo começou a conversar de maneira informal, respondendo perguntas e esclarecendo dificuldades (gr. dialegomai, “conversar”) e, ao que parece, enquanto falava, não teve condições

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de comer. Tantas eram as coisas a dizer que se excedeu e quando perceberam já era meia-noite (Mais uma evidência de que não se tratava de um culto semanal regular, mas de uma reunião extraordinária). O certo é que, à meia-noite, a pregação foi interrompida por um acidente: o jovem que estava sentado na janela, vencido pelo sono, cochilou, caiu do terceiro andar e morreu. Todos desceram bastante aflitos. Paulo os tranqüilizou e, depois de ressuscitar Êutico, subiram novamente para o cenáculo onde foi posto o seu jantar e o apóstolo comeu. Em seguida, Paulo continuou a falar até o amanhecer.

Viagem Dominical. Por volta das cinco ou das seis da manhã (porque naquela latitude e naquela época do ano era o horário do amanhecer), o navio em que Paulo e seus companheiros deviam prosseguir viagem estavam prestes a zarpar e os irmãos apressaram-se a subir a bordo. O apóstolo, porém, preferiu tomar o caminho mais perto, por terra. Partiu a pé para Assôs, a aproximadamente 31 km de distância, onde deveria tomar o navio, reunindo-se a seus companheiros. Levando-se em conta a distância, deve ter passado a maior parte do domingo na estrada. Se o primeiro dia da semana tivesse substituído o sábado como dia de descanso, Paulo não teria empreendido viagem nesse dia, profanando-o pela longa caminhada nem seus companheiros teriam viajado 104 km pela costa do Mar Egeu.

Dia Seguinte ou Manhã Seguinte? Alguns acham que a expressão “no dia imediato” (gr. epaurion), seria mais bem traduzida “no dia seguinte”. Neste caso, Paulo teria seguido viagem, não na manhã de domingo, mas somente na manhã de segunda-feira. O argumento não tem base. O sentido básico de epaurion, segundo Strong, é “de manhã” ou “na manhã seguinte”. De fato, aurion deriva-se de eós, que significa “alvorada”.

Segundo a maioria o dr. Horatio B. Hackett, professor de Novo Testamento Grego, do Seminário Teológico de Rochester, em seu Commentary on Acts, págs. 221 e 222, Paulo “esperou pelo término do sábado judaico, . . . realizou seu último serviço religioso com os irmãos de Trôade ... no sábado à noite e conseqüentemente seguiu viagem no domingo de manhã.”

Não, a lógica diz que “Paulo e seus amigos não podiam, como bons judeus, iniciar uma viagem no sábado; fizeram-na tão cedo quanto foi possível, a saber, na madrugada do ‘primeiro dia’— tendo o sábado expirado ao pôr-do-sol” (Moffat, The Moffat New Testament Commentary [Acts], pág. 187). Tanto Paulo como seus companheiros, celebraram o sábado entre os irmãos deixando para viajarem no primeiro dia da semana.

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Os versículos seguintes relatam que, no dia seguinte à reunião registrada em Atos 20:7 (segunda-feira), Paulo reuniu-se a seu grupo e zarparam para Mitilene (Atos 20:13, 14). No dia seguinte (terça-feira) passaram defronte de Quios (vers. 15). No próximo dia (quarta-feira) passaram por Samos (vers. 15) e no dia depois deste (quinta-feira) chegaram a Mileto (vers. 15). Ora, se o critério de santidade de um dia é o fato de nele realizar-se uma reunião, então teríamos que deduzir que a quinta-feira se tornou o dia de repouso da cristandade porque na quinta-feira seguinte o mesmo apóstolo, estando em Mileto, celebrou ali também uma reunião com os presbíteros de Éfeso (ver Atos 20:14-18). Isto não faz sentido. Uma reunião religiosa no domingo, na quinta-feira ou em qualquer outro dia da semana certamente não faz desse dia um substituto para o sábado do sétimo dia ou um dia de adoração e repouso cristão.

MAR EGEU Trôade

ÁSIA MENOR 30 km (Percurso de Paulo)

104 km (Percurso do navio)

A reunião de Atos 20:7-12, portanto, não tem valor de prova para uma observância regular do domingo. A ocasião, o lugar e a maneira como o encontro se realizou são todos indícios de uma reunião excepcional, e não de um costumeiro culto de domingo.

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ROMANOSOBJEÇÃO No. 78: OS GENTIOS NÃO TINHAM LEI

ARGUMENTO: Paulo ensina que os gentios não tinham lei (Romanos 2:14). Isso prova que a lei do Sinai foi dada somente a Israel e não a outras nações.

RESPOSTA: Esse argumento falha redondamente em duas posturas:Os Gentios Também São Pecadores. Por um lado, insinua que os gentios

(não-judeus) não são pecadores. Pois concluir que os gentios não precisam de lei, é o mesmo que admitir que eles não pecam. Isso fere frontalmente a hamartiologia bíblica, que afirma e reafirma contundentemente: “Não há homem que não peque”. 1 Reis 8:46; 2 Crôn. 6:36; Ecles. 7:20. O próprio Paulo desfaz o mal-entendido quando afirma que “tanto judeus como gregos (gentios), estão debaixo do pecado” (Rom. 3:9; cf. Rom. 3:23). Se estão debaixo do pecado, é porque transgridem a lei (1 João 3:4).

Deus Também é Deus dos Gentios. O argumento falha por outro lado ao sugerir que Deus é parcial, já que impõe leis sobre alguns seres humanos e não sobre outros. Isso vai de encontro ao ensino bíblico de que Deus só possui um padrão para julgar os seres humanos: Sua santa lei (Sal. 119:172; Ecles. 12:13-14; Tia. 2:12). Ela será a norma pela qual o caráter e vida dos homens serão

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aferidos no juízo. Deus não faz distinção de pessoas. “É, porventura, Deus somente dos judeus? Não o é também dos gentios? Sim, também dos gentios.” Rom. 3:29. Portanto, todas as pessoas, excetuando-se os inimputáveis, recebem de uma maneira ou de outra o conhecimento da vontade de Deus, pois Ele não é injusto para exigir que alguém obedeça a uma ordem que não emitiu.

Lei Secundária. Se é assim, então o que Paulo quer dizer quando afirma que os gentios não possuíam lei? Embora os gentios não possuíssem um código externo de conduta moral específica e positivamente revelado como os judeus (Deut. 4:8) e pouco ou nada soubessem de teologia escrita, Paulo atesta que eles não foram deixados em total ignorância. Deus Se revelou a eles por meio da Natureza e da consciência (Rom. 1:19, 20, 32; 2:15). Essas coisas funcionavam para eles como leis secundárias. Uma espécie de lei interior.

Consciência. Não era incomum naquele tempo encontrar entre as nações não israelitas, como não o é hoje encontrar entre pessoas não filiadas a nenhuma igreja, homens e mulheres que, sob a influência do Espírito Santo, nutrem princípios morais, cultivam espírito de bondade e até mesmo servem a Deus ignorantemente. Muitas leis justas nas sociedades pagãs refletem esse impulso moral ou imperativo categórico46, originalmente instalado no antepassado delas, Adão (Atos 10:35). Conquanto ignorantes da lei escrita de Deus, ouviram Sua voz a falar-lhes por meio da Natureza, e fizeram aquilo que a lei requeria. Suas obras testificam que o Espírito Santo lhes tocou o coração, e são reconhecidos como filhos de Deus. Outros, por outro lado, cauterizaram a consciência e enveredaram por caminhos tortuosos. O fato de não terem tido uma revelação externa da vontade de Deus não os isenta, porém, de responsabilidade (ver Lucas 12:47-48). A falta de luz maior não dá direito a ninguém de pecar contra a luz menor.

Portanto, o que Paulo está ensinando aqui é a incontestável verdade de que os gentios, embora não possuíssem a lei escrita externamente como os judeus, certamente a tinham inscrita interiormente em sua natureza moral. Não tinham revelação especial, mas dispunham da revelação geral.

OBJEÇÃO No. 79: NINGUÉM É JUSTIFICADO PELA PRÁTICA DA LEI

ARGUMENTO: Paulo ensina que ninguém é justificado pela prática da lei (Romanos 3:20). Portanto não precisamos da lei nem, conseqüentemente, do sábado.

46 Immanuel Kant, Crítica da Razão Prática.

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RESPOSTA: É certo que a função da lei não é justificadora (nem para judeus nem para gentios), mas diagnosticadora, conforme o próprio Paulo faz questão de explicar na segunda parte do versículo, ao apresentar a razão de haver dito na primeira parte que a lei não justifica ninguém: “... Pois a função da Lei é [apenas] dar consciência do pecado” (EPA). Ou seja, a lei mostra apenas onde erramos. Não pode, contudo, consertar o erro. Não é remédio para o pecado, mas apenas o termômetro que o denuncia. Os crentes fiéis do AT sabiam disso: que ninguém pode alcançar justificação diante de Deus baseando-se na obediência à lei (Sal. 143:2).

Antes da Justificação. O fato de a lei não ter poder para perdoar o pecado significa, porém, que ela não tem outra utilidade ou que estejamos autorizados a transgredi-la? Não. Assim como o termômetro não pode curar uma infecção, embora possa ter muita utilidade na detecção da febre dela decorrente, assim também a lei não tem poder para perdoar o pecador, embora seja útil para aponta-lhe os pecados, a fim de que ele reconheça a necessidade de Alguém poderoso para salvar. Neste primeiro momento, antes da justificação, a lei funciona como reveladora da vontade de Deus, diagnosticadora do pecado e agente de conversão. É ela quem encaminha o pecador para o Evangelho.

Depois da Justificação. Se a lei não pode salvar, por que então é necessário observá-la depois de estarmos salvos? Jesus responde: “Olha que já estás curado; não peques mais [não voltes mais a transgredir a lei], para que não te suceda coisa pior.” João 5:14. Paulo faz uma pergunta retórica parecida em Rom. 6:1. “Que diremos, pois? Permaneceremos no pecado, para que seja a graça mais abundante?” Ou seja, a graça nos dá licença para desobedecer à lei? Ele mesmo responde: “De modo nenhum! Como viveremos ainda no pecado [transgressão da lei], nós os que para ele [já] morremos?” Verso 2. Neste segundo momento, após a justificação, a lei passa a funcionar como norma de conduta, restritora do mal e canalizadora de bênçãos. O Evangelho encaminha os regenerados de volta à Lei, estimulando-os às boas obras que Deus planejou para eles (Efés. 2:10). Em última análise, podemos até dizer que é a lei que ajuda a pessoa justificada a conservar sua justificação: “Porque os simples ouvidores da lei não são justos diante de Deus, mas os que praticam a lei hão de ser justificados.” Rom. 2:13 (cf. Tia. 1:25).

Em ambos os casos, tanto antes da conversão, como depois dela, a lei sempre é útil. Como se vê, portanto, é infundada a idéia de que, pelo fato de não sermos

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justificados pela lei, ela pode ser descartada. O próprio Lutero, paladino da causa da justiça pela fé do séc. XVI, reconheceu que “nossa fé em Cristo liberta-nos não das obras, mas da falsa opinião sobre elas.” — VER OBJEÇÕES 80, 81, 97 E 107 (A FÉ ANULANDO A LEI).

OBJEÇÃO No. 80: VIVEMOS PELA LEI DA FÉ, E NÃO PELA LEI DAS OBRAS

ARGUMENTO: Paulo ensina que vivemos pela lei da fé e não pela lei das obras (Romanos 3:27). Isto significa que não estamos mais na obrigação de guardar a lei em geral nem o sábado em particular.

RESPOSTA: Existe aqui um pequeno equívoco a respeito dessas duas locuções. Paulo não está dizendo que “lei das obras” equivale a Decálogo nem que “lei da fé” corresponde a Evangelho. Ele não está fazendo um contraste lei e evangelho, mas discorrendo sobre duas maneiras de se obter a salvação, uma certa e outra errada, uma que dá margem para orgulho e outra que não dá, a saber, justificação pelas obras e justificação pela fé. Deduzimos isto do próprio contexto e do fato de a palavra “lei”, no grego (nomos), vir desacompanhada do artigo “a”. Quando isto acontece, notadamente nos escritos de Paulo, sabe-se que o termo “lei” está sendo usado no sentido de um princípio.

Lei das Obras. À luz desta perspectiva, “lei das obras” (legalismo) é o princípio segundo o qual a justiça seria obtida pela obediência à lei. Esse princípio, segundo o raciocínio seguido pelo apóstolo, não excluiria a jactância, pois se alguém pode reivindicar justificação e justiça com base nos atos que praticou em conformidade com a lei, este alguém recebe a salvação como algo a que tem direito; pode, portanto, orgulhar-se e gabar-se desta proeza (ver Rom. 4:2; Efés. 2:9). De acordo com esta hipótese, não haveria necessidade de graça.

Lei da Fé. Em contrapartida, “lei da fé” é o princípio evangélico segundo o qual a justificação e a justiça são obtidas mediante a fé. A pessoa que aceita pela fé humildemente o que Deus proveu não tem de que se orgulhar, pois recebeu o que não merecia, pela livre agência da graça de Deus.

Jactância Excluída. Visto que todos pecaram e falharam em estabelecer sua própria justiça pelas obras da lei, a única maneira de ser justificado é depender inteiramente da graça de Deus. Isto fecha a porta para toda jactância, pois a justificação pela fé nada mais é senão a obra de Deus ao lançar a glória do

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homem no pó e fazer pelo homem aquilo que ele por si mesmo não pode fazer. — VER OBJEÇÕES 79, 81, 97 E 107 (A FÉ ANULANDO A LEI).

OBJEÇÃO No. 81: A JUSTIFICAÇÃO NÃO DEPENDE DA OBSERVÂNCIA DA LEI

ARGUMENTO: Paulo enfatiza que a justificação é “pela fé independentemente das obras da lei” (Romanos 3:28; cf. Gál. 2:16). Portanto, não devemos sentir-nos na obrigação de observar a lei em geral nem o quarto mandamento em particular. A guia do Espírito é suficiente.

RESPOSTA: Concordamos em gênero, número e grau com a declaração paulina. A base de nossa justificação não é a obediência à lei, mas os méritos de Cristo (Gál. 5:4; Rom. 5:18-19). O perdão de Deus não pode ser comprado pela prática de boas obras. Deve ser recebido gratuitamente pela fé no sacrifício expiatório de Cristo. Portanto, neste sentido, a obediência à lei nada tem que ver com a justificação.

Justificados Para Boas Obras. Antes, porém, de nos precipitarmos rumo à conclusão de que a pessoa justificada está isenta de obedecer à lei ou de praticar boas obras, é preciso entender que justificar significa tornar justo ou reto. A justiça é a prática do bem. A fé que realmente justifica, por conseguinte, é a fé que capacita o homem a ser cumpridor da lei.47 Paulo enfatiza repetidas vezes o lugar das boas obras na vida cristã (1 Tim. 5:10; 6:18; 2 Tim. 3:17; Tito 2:7, 14; 3:8; etc.), embora deixe igualmente claro que essas boas obras não compram a justificação (ver Rom. 4:2, 6; 9:32; 11:6; Gál. 2:16; 3:2, 5, 10; Efés.. 2:9; 2 Tim. 1:9). “Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas.” Efés. 2:10. “Porque Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar, segundo a Sua boa vontade.” Fil. 2:13. “Fiel é esta palavra, e quero que, no tocante a estas coisas, faças afirmação, confiadamente, para que os que têm crido em Deus sejam solícitos na prática de boas obras.” Tito 3:8. Embora o homem não seja justificado por fé e obras, mas somente pela fé, esta é certamente uma fé que obra. Ele é, portanto, embora não seja justificado por obras, é certamente justificado para obras.

47 Millard J. Erickson, Introdução à Teologia Sistemática, pág. 412.

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Método e Norma. Não podemos ignorar o fato de que Paulo enfatiza aqui não somente o método da salvação, que é justiça pela fé independentemente das obras da lei, mas também a norma da salvação, que é justiça manifesta na obediência aos mandamentos de Deus pela fé em Jesus. Ignorar essa distinção é acusar Paulo falsamente de promover a justificação da pecado em vez de a justificação do pecador.

O Exemplo de Abraão. Considere o exemplo de Abraão. O fato de ele ter sido justificado pela fé não o liberou de obedecer aos mandamentos de Deus (Rom. 4:3; Tia. 2:20-23). A obediência espontânea à Lei é não somente o fruto natural da salvação (Rom. 2:13; 7:22, 25; 8:1-4; João 8:32-36), mas também a prova de nossa transformação, porque a fé salvadora “atua pelo amor” (Gál. 5:6), que é o cumprimento da lei (Rom. 13:10). A verdadeira fé, que estabelece a Lei de Deus em nosso coração (Rom. 3:31), distingue-se da falsa fé, que até os demônios possuem, pois é desacompanhada da obediência (Tia. 2:8-17; 1:22-25).

O próprio Paulo entendia que a justificação somente pela fé não pretendia liberar uma pessoa da obediência à lei, porque, depois de afirmar que a lei não nos pode salvar e mostrar o verdadeiro papel dela, que é revelar o pecado (Rom. 7:7), mais adiante explica que o dom divino da salvação por Jesus destina-se a capacitar-nos a cumprir "os preceitos da lei" (Rom. 8:4). Afinal de contas, Cristo não é “ministro do pecado”. (Gál. 2:17) nem justificação é licença para pecar. — VER OBJEÇÕES 79, 80, 97 E 107 (A FÉ ANULANDO A LEI).

OBJEÇÃO No. 82: O REGIME DA LEI COMEÇOU NO SINAI

ARGUMENTO: Paulo dá entender que a lei só começou a existir no Sinai (Romanos 5:13).

RESPOSTA: Romanos 5:13 diz: “Porque até ao regime da lei havia pecado no mundo”. Ou seja, antes de a lei ser dada, já existia pecado no mundo.

Alguns contendem que a expressão “até o regime da lei” (no original não existe a palavra “regime”, mas somente “até a lei”), significa que durante o período entre Adão e Moisés (v. 5:14), não existiu lei. Se entendermos assim, porém, a lógica do versículo fica prejudicada. Ocorre uma contradição de termos. Se não havia lei, também não podia havia pecado, já que “onde não há lei, também não há transgressão” (Rom. 4:15) e “o pecado não é levado em conta quando não há lei”.

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O significado da declaração paulina, portanto, é claro: A lei não existiu antes do Sinai apenas em sua forma escrita. Guiadas pela transmissão oral da lei (Jó 22:22; 23:12), as pessoas eram punidas por transgredir qualquer dos dez mandamentos antes do Sinai, evidenciando-se assim que a lei existia e o pecado era imputado. — VER OBJEÇÕES 14, 28, 32 E 98 (LEI SÓ NO SINAI).

OBJEÇÃO No. 83: CRISTO JÁ OBEDECEU À LEI POR NÓS

ARGUMENTO: Paulo afirma que Cristo já obedeceu à lei perfeitamente por nós (Romanos 5:19). Portanto, não precisamos mais obedecer à lei em geral nem o sábado em particular.

RESPOSTA: Uma coisa não anula a outra. A obediência representativa e pactual de Cristo como o segundo Adão não impede a obediência individual de Seus representados na aliança. O paralelismo sugere apenas que, assim como os homens se tornaram pecadores por causa da transgressão de Adão, assim são constituídos justos pela obediência de Cristo. Visto que a ênfase neste contexto recai sobre a justificação e não sobre a santificação (Rom. 5:16 e 18), o objetivo principal de Paulo parece ser o de ensinar que os homens se tornam justos mediante os resultados do ato redentor de Cristo, sem levar em contas os esforços pessoais deles, assim como se tornaram pecadores como resultado da desobediência de Adão. Este pensamento, porém, não pode ser separado do fato de que, assim como a desobediência de Adão resultou numa vida de transgressão para seus descendentes, assim também a obediência de Cristo produz vidas de obediência em todos os que vivem unidos a Ele pela fé (SDA Bible Commentary, vol. 5).

OBJEÇÃO No. 84: A LEI SOMENTE AGRAVA A SITUAÇÃO DO PECADO

ARGUMENTO: Paulo afirma que a lei veio agravar a situação do pecado (Romanos 5:20).

RESPOSTA: Ao outorgar a lei no Sinai, Deus pretendia não aumentar ou multiplicar o pecado já existente no mundo, mas que os homens, por meio duma nova revelação dEle e de Seu caráter e vontade, numa lei escrita com perfeita clareza, discernissem melhor a terrível malignidade do pecado e, assim, o seu

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próprio estado desesperador. O propósito primário da lei, portanto, não era intensificar a ofensa, mas revelar a norma da justiça.

Intensifica o Senso de Malignidade. Em decorrência, porém, da tendência humana herdada ou adquirida para o mal, a lei acabou ressaltando o senso da malignidade do pecado, num sentido específico com Israel e num sentido geral com a humanidade. Isso aconteceu porque, enquanto no Egito, rodeado de idolatria e pecado, Israel se esquecera de Deus e perdera de vista Seus reclamos. Pecados odiosos passaram a ser vistos como coisa normal, devido à freqüência e impunidade com que eram praticados. Quando a lei foi formalmente declarada, acabou produzindo esse efeito porque passou a proibir determinados atos pecaminosos que até aquele tempo não haviam sido reconhecidos ou classificados como tais. Continuar na prática desses pecados tornava-se a partir daí transgressão premeditada. “A Lei sobreveio para dar plena consciência da falta.” (EPA).

Além disso, visto que a lei, por ser espiritual e santa, proíbe a complacência pecaminosa, acaba inevitavelmente por despertar oposição em corações rebeldes, tornando-se assim ocasião de provocação de pecado e multiplicação de transgressão. Se o coração do homem fosse santo e houvesse disposição para proceder corretamente, a lei não teria tal tendência.

Isto, porém, apresenta um aspecto positivo, visto que, enquanto alguém não se convence de que é pecador, não consegue reconhecer sua necessidade do Salvador (SDA Bible Commentary, vol. 5).

OBJEÇÃO No. 85: ESTAMOS DEBAIXO DA GRAÇA E NÃO DA LEI

ARGUMENTO: Paulo afirma que os cristãos já não estão sujeitos à lei, pois vivem debaixo da graça (Romanos 6:14). Portanto, é desnecessário obedecer à lei, inclusive o sábado.

RESPOSTA: Romanos 6:14 talvez seja o texto paulino mais freqüentemente utilizado como evidência de que os cristãos foram desobrigados da observância da Lei. A interpretação comum é a de que os cristãos já não se acham debaixo dos Dez Mandamentos como regra de conduta, pois seus valores morais procedem agora do princípio do amor revelado por Cristo. Apesar de sua aparente piedade, porém, esta é uma interpretação viciosa do texto bíblico. Eis as evidências:

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O Tema do Capítulo Não é a Lei. Não há nada no contexto imediato sugerindo que Paulo esteja tratando da Lei propriamente dita. Tanto no contexto imediato como no remoto de todo o capítulo, o que Paulo faz é contrastar o domínio do pecado com o poder da graça de Cristo. Não faria sentido algum referir-se à lei como algo mal e nocivo.

A Interpretação Leva a Absurdos. Interpretar a expressão “debaixo da lei” com o sentido de “sob a dispensação da lei mosaica” implicaria que os crentes que viveram sob a dispensação judaica não foram receptores da graça. Essa idéia é inteiramente absurda. Além do que, conforme John Murray perspicazmente observa, “o estar desobrigado da lei mosaica como dispensação não põe a pessoa automaticamente sob o regime da graça”.

A Lei Não é Descartada. O próprio Paulo, depois de afirmar com todas as letras que não estamos debaixo a lei, mas da graça, pergunta: “E daí? Havemos de pecar [transgredir a lei] porque não estamos debaixo da lei, e sim da graça? De modo nenhum!” (v. 15). Nos termos mais enfáticos possíveis, Paulo declara que o fato de o cristão não utilizar a lei como meio de salvação não significa que esteja desobrigado de obedecê-la (Rom. 2:13; 3:31; 7:12; e 8:4).

O Significado de “Debaixo da Lei”. Ora, se estar sob a graça não nos isenta de guardar a lei, o que Paulo então quer dizer quando afirma que os cristãos não estão mais debaixo da lei?

Visto que “debaixo da graça” significa sob o imerecido favor de Deus (sem mérito), o contraste com “debaixo da lei” pressupõe a idéia de tentar ficar sob o favor de Deus por merecimento. Noutras palavras, a expressão debaixo da lei significaria nos escritos paulinos simplesmente “legalismo”. Segundo essa interpretação coerente, o contrário de “graça” não é “lei”, mas “legalismo”. Usando essa perspectiva, o judeu messiânico David Stern em seu livro Novo Testamento Judaico traduziu nomos, não por “lei”, mas por “legalismo”: “Porque o pecado não terá autoridade sobre vós; porque não estais debaixo do legalismo, mas da graça.”

Outra interpretação possível, que não exclui a primeira, é a de que “debaixo da lei” signifique sob o desfavor de Deus ou sob a condenação pronunciada pela Lei. Assim, em Rom. 6:14, Paulo ensina que os crentes não devem ser controlados pelo pecado (cf. Rom. 6:1-2, 6, 11-13) porque a graça de Deus os libertou do domínio do pecado e da condenação da Lei. Neste caso, a antítese sugere que “debaixo da lei” significa simplesmente que os cristãos não se acham mais “sob o domínio do pecado e, conseqüentemente “sob a condenação da lei”

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porque a graça de Cristo os libertou de ambas as coisas. Isso fica bem claro quando lemos Rom. 3:19. ‘Ora, sabemos que tudo o que a lei diz, aos que vivem na lei o diz para que se cale toda boca, e todo o mundo seja culpável perante Deus.’ Aqui Paulo equipara o estar sob a lei com ‘ser culpável perante Deus’.

Sob a Condenação da Lei. Em outras palavras, os que se acham debaixo a lei são aqueles que são culpados de transgredi-la (seja por legalismo, seja por antinomismo) e que, por isso mesmo, se acham sob a condenação dela. Esse é o motivo por que os cristãos não estão debaixo da lei. Pelo poder da graça, eles não mais a transgridem, portanto não são réus de juízo.

“À luz dessas considerações, concluímos que, longe de rejeitar a autoridade da Lei, Paulo ensina que os crentes não devem transgredir a Lei simplesmente porque a graça de Deus os libertou do pecado, pois ‘uma vez libertados do pecado, fostes feitos servos da justiça’ (Rom. 6:18). Somente a mente pecaminosa ‘não se submete à lei de Deus (Rom 8:7). Mas os cristãos têm a mente do Espírito, que os capacita a cumprir os justos preceitos da Lei (Rom. 8:4). Assim, os cristãos não se acham mais ‘debaixo a lei’, no sentido de que a graça de Deus os libertou do domínio do pecado e da condenação da lei, mas ainda estão “sob a Lei” no sentido de estarem sob a obrigação de pautarem a vida pelos princípios morais dela” (Samuele Bacchiocchi, The Sabbath Under Crossfire, cap. 5, “Paul and the Law”). — VER OBJEÇÃO 61(A GRAÇA ANULANDO A LEI).

OBJEÇÃO No. 86: A LEI ESTÁ MORTA

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16 FATOS SOBRE A GRAÇA

1. Deus é gracioso (Êxo. 34:6). 2. Seu trono é descrito como um trono de graça (Heb. 4:16). 3. No Antigo testamento o que serviram a Deus estavam sob graça (Sal. 84:11; Prov. 3:34). 4. Noé (Gên. 6:8), Ló (Gên. 19:18-19), Moisés (Êxo. 33:13; 34:9) e Gideão (Juí. 6:17) estavam todos sob a graça. 5. Os israelitas no deserto estavam sob graça (Jer. 31:2). 6. Os judeus pós-exílicos estavam sob a graça (Esd. 9:6-8). 7. A graça tem sido oferecida a todos os homens (Tito 2:11). 8. A salvação vem somente pela graça mediante a fé (Efés. 2:8). 9. Não há diferença entre judeu e gentio; todos devem ser justificados pela graça (Rom. 3:22-24, 29, 30). 10. Somos justificados pela graça, não por obras (Tito 3:5-7). 11. Alguns, contudo, transformam a graça em libertinagem (Jud. 4). 12. Graça não significa licença para pecar (Rom. 6:15). 13. A graça nos ensina a renegar a impiedade, a viver sensata, justa e piedosamente e a ser zelosos de boas obras (Tito 2:11-14). 14. A graça é o poder de Cristo (2 Cor. 12:9). 15. A graça nos liberta do domínio do pecado (Rom. 6:14). 16. Nunca se deve desprezar o poder da graça da Deus (Heb. 10:29).

ARGUMENTO: Paulo ensina em Romanos 7:1-6 que a união com Cristo implica em libertação da lei. Isso significa que os cristãos não precisam mais guardar os Dez Mandamentos, nem o sábado.

RESPOSTA: Esta passagem de Romanos é conhecida como a alegoria do casamento, e é popularmente empregada por muitos antinomistas para ensinar que os cristãos não estão mais sob a obrigação de guardar a lei de Deus. Na verdade, porém, ela ensina exatamente o oposto do que se pretende. É só ler com cuidado todo o capítulo 7 e 8 de Romanos e entender a simbologia ali empregada.

Alegoria. Paulo está ilustrando aqui a mudança de status espiritual de alguém que se libertou do cativeiro do pecado ao unir-se a Cristo. Quatro figuras principais são empregadas em sua ilustração: uma mulher casada, seu primeiro marido, seu segundo marido e a lei conjugal.

Dos versos 1 a 3 Paulo apresenta o quadro. Uma mulher está casada com um marido mau, que a maltrata e vive jurando-a de morte. Ela deseja se libertar dessa situação, mas não pode porque está presa a ele pelo compromisso conjugal. Enquanto o marido estiver vivo, ela deve ser sua esposa. Se o deixar, estando ele ainda vivo, e se unir a outro homem, será considerada adúltera. Mas se ele vier a morrer, a viúva ficará legalmente desobrigada desse compromisso. Pode casar-se novamente sem ser acusada de adultério. Pois as leis do casamento não mais se aplicam a ela.

Aplicação. Dos versos 4 a 6 Paulo compara essa lei conjugal à experiência do cristão. A mulher ligada a seu primeiro marido representa aí o pecador, escravo de um marido mau, símbolo de sua própria natureza pecaminosa, e não da lei, como muitos imaginam. Por que a natureza pecaminosa é comparada com um marido ruim? Porque, enquanto o pecado tiver domínio sobre nossa vida, sentiremos o peso da condenação da lei. Esta nos condenará à morte, pois o “salário do pecado é a morte.” O problema não está com lei, que é boa, mas com a natureza humana, que é má. Enquanto esta natureza estiver viva, não poderemos unir-nos a Cristo. Por isso precisamos crucificar nossa natureza pecaminosa (Rom. 6:3-7). Só assim a ligação será dissolvida, e o pecador ficará livre para unir-se a Cristo. Em nenhum momento, porém, a alegoria sugere que ficamos desobrigados da lei quando nos convertemos a Cristo. São várias as evidências que provam isto.

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Não um Legicídio. Repare em primeiro lugar que, a despeito da interpretação popular desta passagem, quem morre não é a lei, mas nossa velha natureza pecadora48 (v. 4). Se assim fosse, todo o argumento sobre o adultério ficaria sem sentido. Não pode haver adultério sem que exista a lei que o proíbe. Não faria também o menor sentido a mulher destruir o código civil para ficar livre do marido. Na realidade quem morre é o primeiro marido, que simbolizava “o velho homem do pecado” e morre na hora da conversão (rom. 6:6). Esta morte para a lei do pecado (marido: natureza não convertida) foi provocada por meio do “corpo de Cristo”, isto é, por Sua morte. O livramento realizado por Cristo anulou a condenação da lei (sentença de morte). Mas note que a morte de Cristo cancela apenas a penalidade da lei, e não a lei em si. Pedro diz que Ele mesmo carregou “em Seu corpo, sobre o madeiro, os nossos pecados”. 1 Ped. 2:24. Paulo diz que Cristo provou “a morte por todo homem”. Heb. 2:9.

A Lei Não Muda. O unir-se a Cristo também não altera a lei. A mulher ficou livre do primeiro marido, mas não da lei, pois, quando casa novamente, fica ligada ao segundo marido como estava ligada ao primeiro. A lei que dizia que era adultério casar estando o primeiro marido vivo continua em vigor dizendo que é adultério casar terceira vez estando vivo o segundo marido. Mesmo depois que o marido morre, a lei continua a dizer a mesma coisa sobre o novo casamento. Assim também o pecador ficou livre da condenação, mas não da lei. Note que a lei não mudou; o que mudou foi a relação da mulher para com ela. Antes era mulher casada, agora é mulher viúva; e não há nenhum impedimento legal para uma viúva contrair novas núpcias. A diferença agora é que esse marido é bom, e não será para ela nenhum sofrimento obedecê-lo.

Fruto Para Deus. Uma terceira evidência de que a lei não foi anulada é o resultado que se espera de nossa união com Cristo: “que frutifiquemos para Deus”. (v. 4). Antes, nosso fruto era para a morte, obras da carne (v. 5) — pecado ou transgressão da lei. Mas agora, crucificados com Cristo, nosso fruto é para a vida, fruto do Espírito. A sentença de morte da lei foi satisfeita pelo sacrifício de Jesus, e o novo casamento com Cristo traz obediência pelo amor.

O Contexto. Uma última evidência de que não ficamos desobrigados da lei é o próprio contexto imediato onde Paulo afirma que a lei é santa e o mandamento santo, justo e bom (Rom. 7:12. Afirma ainda que a lei é espiritual (Rom. 7:14) e novamente que com a mente serve a lei de Deus (Rom. 7:25). Essas declarações

48 Jamieson, Fausset and Brown’s Commentary.

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revelam claramente que, para Paulo, a lei não havia morrido, mas que continuava bem viva como padrão ético da conduta cristã.

Como se vê, o apóstolo não está ensinando aqui a abolição dos Dez Mandamentos. O argumento principal de Paulo nesta ilustração é o de que a morte dissolve a obrigação legal. Assim como a morte do marido libera a esposa desse casamento, para que possa legalmente casar-se de novo com outro homem, assim a crucifixão do cristão com Cristo libera-o do domínio do pecado e da morte, para que possa entrar em nova união espiritual com seu Salvador ressurreto.

OBJEÇÃO No. 87: CRISTO É O FIM DA LEI

ARGUMENTO: Paulo diz claramente que os Dez Mandamentos tiveram seu término em Cristo (Romanos 10:4). Estamos, portanto, liberados da observância da lei, inclusive do sábado.

RESPOSTA: Na sintaxe grega o termo “lei” (telos) está na posição de ênfase. Esta palavra tem sido interpretada pelo menos de quatro maneiras diferentes: (1) Cristo é a abolição da lei; (2) Cristo é a meta ou propósito da lei; (3) Cristo é o cumprimento da lei; (4) que Cristo é a terminação da lei como meio de salvação.

Fim Cronológico. A primeira interpretação, chamada fim cronológico e defendida pelos antinomistas, deve desde logo ser descartada por lhe faltar embasamento bíblico. Cristo jamais ensinou que viera ab-rogar a lei (Mat. 5:17). De resto, o próprio escritor da epístola aos Romanos (cap. 3:31) é taxativo em afirmar que a fé não anula a lei; antes, a estabelece.

Fim Teleológico. A segunda interpretação, chamada fim teleológico, é possível, já que possui apoio bíblico e lingüístico. Apoio bíblico, porque Paulo nos ensina em Gál. 3:24 que “a lei nos serviu de aio para nos conduzir a Cristo”. Apoio lingüístico, porque, embora a palavra telos seja tradicionalmente traduzida como “fim” na maioria das versões portuguesas, o termo encerra na verdade um duplo sentido: além de “término” ou “fim”, também pode ser usado com a acepção de “propósito” ou “objetivo” (William Arndt e Wilbur Gingrich, A Greek-English Lexicon). É assim que o traduz a versão inglesa de Murdock do NT siríaco: “Porque o Messias é o alvo da lei”. O fim da lei é Cristo, mas Cristo não é o fim da lei.

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Fim Executório. A terceira interpretação, chamada fim executório, também é praticável. Neste caso o fim da lei é seu cumprimento. O próprio Jesus afirmou em Mat. 5:17 que viera cumprir a lei. E de fato Cristo cumpriu toda a justiça e, como cabeça da humanidade (segundo Adão), mostrou ao homem que ele pode fazer a mesma obra, satisfazendo todas as intenções éticas da lei.

Fim Soteriológico. De todas, porém, é a quarta interpretação, chamada fim soteriológico, a que parece ajustar-se melhor ao contexto do versículo, já que o que Paulo está discutindo neste capítulo (ver v. 3) é o contraste entre a forma pela qual Deus justifica o homem, que é pela fé, e a forma empregada pelo próprio homem, que é a tentativa fracassada de justificarem-se por meio da obediência à lei. Romanos 10.4 deve ser entendido a partir da perspectiva da polêmica de Paulo contra o legalismo judaico: Cristo, para aquele que crê, põe um fim a esta maneira errônea de buscar a justiça pelas obras da lei. Cristo, para o crente, é o fim do legalismo. Usando a frase de Furnish: Cristo “escreve ‘finis’ ao triste espetáculo da tentativa humana de obter vida através das obras da lei”.

Só Um Método de Salvação. Romanos 10:4 não está sugerindo, porém, que “nos tempos do AT, a justiça podia ser obtida por meio da lei e que, com a vinda de Cristo, a fé substituiu a lei como meio de justificação. Desde a queda de Adão, Deus tem revelado somente uma forma pela qual os homens podem ser salvos: pela fé no Messias vindouro (Gen. 3:15; 4:3-5; Heb. 11:4; cf. Rom. 4). Tampouco deve a passagem ser tomada no sentido de que Cristo é a terminação da lei como tal e de que, daí em diante, os homens não se acham mais sob a obrigação de obedecer à lei de Deus. O que Cristo veio pôr um fim foi a lei como meio de justificação. O propósito de Deus em proclamar Suas leis a Israel foi revelar-lhes a pecaminosidade deles (Rom. 3:20) e a necessidade que tinham de um Salvador (Gál. 3:24). Mas os judeus haviam pervertido o propósito divino e usado as leis, tanto a moral como a cerimonial, como meios de estabelecer a própria justiça pelas tentativas de obediência legalista. Cristo veio pôr um fim a este uso abusivo e equivocado da lei e encaminhar novamente para a fé. Essa fé não anula a lei, antes a confirma (ver Rom. 3:31), possibilitando os homens a cumprirem seus requisitos (ver cap. 8:4)” (SDA Bible Commentary).

Concluímos, portanto, que a palavra fim apresenta, em Romanos 10:4, dupla acepção: por um lado é “alvo” ou “finalidade”; e por outro, “término” ou “fim”. Alvo no sentido em que Cristo culmina e realiza a finalidade da lei, visto que graças a Ele se consegue a obediência a Deus. Término no sentido em que Cristo põe fim à justificação por obras da lei (legalismo) e à condenação da lei. Neste

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sentido, Cristo corresponde a ambas, pois Ele é tanto o alvo da lei (Gál. 3:24; 4:1-7) como o fim da lei como método de salvação (Rom. 6:14). Nunca, porém, o fim da lei como norma de comportamento. — VER OBJEÇÕES 94, 100, 108 E 109 (JESUS ABROGOU A LEI).

OBJEÇÃO No. 88: O NOVO TESTAMENTO NÃO FIXA UM DIA DE GUARDA

ARGUMENTO: Conforme Romanos 14:5-6, é irrelevante observar um dia determinado como não observar nenhum. Depois de Jesus, cada um é livre para guardar o dia que quiser, seja sábado, domingo ou qualquer outro?

RESPOSTA: Essa postura se baseia num constructo teológico falso e numa interpretação viciosa da passagem bíblica.

Teologia Falsa. A teologia é falsa (1) porque ignora o ensino claro e abundante de outras partes da Escrituras que dizem ser o sábado a escolha de Deus (mais 150 de textos). Foi neste dia que o Criador descansou, e por isso abençoou e santificou esse dia, separando-o dos outros da semana.49 O sábado é um sétimo do tempo, assim como o dízimo é um décimo da renda. Ambos são sagrados e pertencem a Deus. O homem não pode lançar mão deles impunemente. (2) Também é falsa porque supõe que os padrões morais de Deus não sejam absolutos, mas relativos. Segundo o raciocínio de quem assim pensa, o Decálogo não deveria chamar-se Dez Mandamentos, mas Dez Sugestões.

Quem acha, porém, que Deus não é detalhista escrupuloso e minucioso naquilo que ordena, recomendamos a leitura da história da oferta de Caim (Gên. 4:3-5), de Nadabe e Abiú (Lev. 10:1-2), de Saul e os amalequitas (1 Sam. 15:3, 8, 9, 13-15, 26), do profeta desobediente (1 Reis 13:8-24) e de Ananias e Safira (Atos 4:34-35; 5:1-11). Foi por profanar o sábado que toda uma geração de israelitas pereceu no deserto, uma cidade foi destruída e toda uma nação foi levada a cativeiro (Eze. 20:12-13; Jer. 17:27; Nee. 13:17-18). O sábado não é uma questão de opinião humana pessoal, mas um mandamento de Deus (Êxo. 20:8-11). Em 1 Cor. 7:25 Paulo deixa claro que onde não existe mandamento, podemos e devemos usar nosso parecer, mas quando ele existe e é bastante claro, não nos resta desculpa. Deus proíbe o trabalho no sábado, mesmo em circunstâncias difíceis (Êxo. 34:21).

49 Note que a respeito dos seis dias da semana, Deus disse serem “bons”, mas somente ao sábado chamou dia santo e bendito (Gên. 1:10, 12, 18, 21, 25, 31; 2:2-3)

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Corrente de Dez Elos. Se guardar qualquer dia em lugar do sábado já é inaceitável, guardar só nove mandamentos, eliminando-se o quarto, é insuficiente. Tiago diz que "qualquer que guarda toda a lei, mas tropeça em um só ponto, se torna culpado de todos. Porquanto, aquele que disse: Não adulterarás também ordenou: Não matarás. Ora, se não adulteras, porém matas, vens a ser transgressor da lei." (Tia. 2:10). Os dez preceitos da lei são como uma corrente de dez elos; formam um todo inseparável. Cada preceito remete a todo o conjunto; eles se condicionam reciprocamente, formando uma unidade orgânica. Se se rompe um elo, a corrente toda se rompe. Transgredir um mandamento é infringir todos os outros. Seguindo o raciocínio deste meio-irmão de Jesus, diríamos: "Aquele que disse: Não terás outros deuses diante de Mim, também ordenou: Lembra-te do sábado para o santificar. Ora, se não tens outros deuses diante do Senhor, porém violas o sábado, vens a ser transgressor da lei." Obedecer a uma regra não nos desobriga de outra (cf. Lev. 19:3, 30: 26:2).

Interpretação Viciosa. A interpretação de Romanos também é viciosa porque não somente ignora a análise léxico-sintática da passagem mas também o seu contexto histórico-cultural e contextual. Em primeiro lugar, não leva em conta o fato de que nem o sábado nem o domingo são mencionados na passagem. Em segundo lugar, ignora a análise léxico-sintática quando afirma que alguns crentes consideravam todos os dias iguais. A palavra “iguais” não se encontra no original grego, mas foi acrescentada por Almeida (na versão Revista e Corrigida vem em itálico). E o verbo grego usado pelo apóstolo dos gentios para os verbos “fazer diferença” e “julgar” é o mesmo: krino, que significa “estimar”, “prezar”, “apreciar”. Se fizéssemos, portanto, uma tradução literal da primeira parte do versículo 5, teríamos um sentido mais claro: “Um [irmão] preza mais um dia que o outro; enquanto o outro [irmão] preza todos os dias.”

Em terceiro lugar, faz vista grossa ao contexto histórico-cultural e contextual. Para a maioria dos comentaristas sérios, esse texto nada tem que ver com o quarto mandamento nem com dias de adoração. Não fala de sábado nem de domingo. Fala simplesmente de um dia comum da semana. Esse ponto de vista pode ser confirmado pelo próprio termo grego krino, que jamais é empregado no sentido de observar um dia santo. Semelhantemente, no versículo 6, a palavra phroneo (que traduz o verbo “distinguir” do versículo 6) nunca é empregada para referir-se à observância de dias santos.

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Interpretações Possíveis. A que dias Paulo então se está referindo? Não sabemos ao certo. Existem, porém, três possíveis interpretações que, além de aceitas pela maioria dos comentaristas, não comprometem a validade do sábado:

1) Dias Cerimoniais. Segundo o Seventh-day Adventist Bible Commentary, o que Paulo discute aqui é a observância dos dias cerimoniais judaicos, que estavam sendo causa de dissensão e confusão entre os crentes, não só de Roma, mas também da Galácia (Gál. 4:10-11) e de Colosso (Col. 2:16-17). Alguns crentes haviam deixado de celebrar as festas judaicas e estavam condenando quem ainda as celebrava. O conselho de Paulo é o seguinte: Aqueles crentes cuja fé os capacitou a deixarem imediatamente todos os feriados cerimoniais não devem desprezar aqueles cuja fé é menos forte e ainda os observam. Nem, por sua vez, devem os últimos criticar os que lhes parecem permissivos. Em questões de consciência, a alma deve ser deixada livre. Ninguém deve controlar o espírito de outro, julgar por outro ou prescrever-lhe o dever. Deus dá a toda alma liberdade de pensar e seguir suas próprias convicções. Cada um de nós dará contas de si mesmo a Deus. Rom. 14:12. Dadas as circunstâncias, Paulo achava melhor permitir que os vários elementos da lei cerimonial judaica morressem de morte natural e gradualmente, conforme a mente e a consciência se iluminassem. (SDA Bible Commentary, vol. 6, pág. 635).

2) Dias de Jejum. Visto que o versículo está encaixado entre versículos que tratam de comida e bebida, alguns comentaristas acham que o que está sendo discutido no versículo 5 são dias fixos para abstinência e jejum entre os cristãos de Roma. Alguns jejuavam em determinados dias (“faz diferença entre dia e dia”) por crerem que havia nesses dias justiça inerente, enquanto outros achavam que o jejum podia ser feito em qualquer dia da semana (“julga todos os dias iguais”). Essa prática diferenciada estava provocando contendas entre eles.

Este segundo ponto de vista parece concordar com as fontes históricas. O Megillath Ta’anith menciona que os judeus naquele tempo tinham o costume de jejuar na segunda e na quinta-feira, pois achavam um mérito particular nesse dias (Luc. 18:12). O apoio para este ponto de vista é fornecido pelo contexto, que trata da abstinência de carne e vinho (Rom. 14:2, 6, 21) e pela Didaquê (cap. 8) que recomenda os cristãos jejuarem na quarta e na sexta em vez de na segunda e na quinta-feira como os “hipócritas” (i.e., os judeus), para deles se diferençarem. Neste caso, os dias aí mencionados se refeririam a prática de abstinência e de jejum em datas fixas regulares (Everett F. Harrison, The Expositor's Bible Commentary, vol. 10, pág. 146; ver Raoul Dederen, "On

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Esteeming One Day Better Than Another", Andrews University Seminary Studies 9 [janeiro, 1971]: 16-35.).

Qualquer que tenha sido, porém, a razão por que Paulo escreveu isto, uma coisa é certa: esta passagem nada tem que ver com o sábado. Nada tinha que ver com transgressão da lei de Deus. Em momento algum o apóstolo dá a entender que a observância do sábado do sétimo dia é opcional. Ele mesmo observava o sábado com regularidade (Atos 13:14 e 44; 16:33; 17:1 e 2; 18:4). Paulo defendia os Dez Mandamentos, apresentando-os como a norma de justiça para os cristãos justificados (Rom. 3:31; 7:7, 12 e 14; 8:3 e 4). Ele nunca deu a entender que algum desses mandamentos fosse de natureza cerimonial e temporária, ou que tenha sido invalidado.

Jejuar ou não jejuar determinado dia da semana, estimar dias comuns sobre outros e continuar celebrando ou não festividades judaicas é questão de foro íntimo, de escolha e de conveniência pessoal. Não, porém, a observância do sábado, pois se trata de uma ordem expressa de Deus. E quando Deus diz sábado, não quer dizer domingo nem sexta-feira. O Senhor espera que tenhamos discernimento espiritual suficiente para fazer diferença entre o sagrado e o comum, entre o santo e o profano (Eze. 22:26). Não são os sabatistas que fazem diferença entre o sábado e os outros dias da semana: é Deus (Gên. 2:3).

1 CORÍNTIOS

OBJEÇÃO No. 89: O DOMINGO SUBSTITUIU A PÁSCOA JUDAICA

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ARGUMENTO: O domingo, sendo comemorativo da ressurreição, substituiu a Páscoa judaica (1 Coríntios 5:7-8).

RESPOSTA: Este argumento, além de inconsistente, é inteiramente destituído de apoio bíblico ou histórico. Vejamos porque:

A Páscoa Tipificava a Morte de Cristo. A observância da Páscoa hebraica na igreja primitiva não guardava nenhum vínculo com a ressurreição. Celebrava a morte, e não a ressurreição do Salvador, já que o sacrifício do cordeiro pascal era uma sombra da morte de Cristo (1 Cor. 5:7). João Batista reconheceu isto quando disse: “Eis o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo.”

A Páscoa Era Comemorada Anualmente. A observância da Páscoa hebraica era uma celebração que devia ser comemorada anualmente, todo 14 de nisã; e não semanalmente, todo domingo.

A Páscoa foi Substituída pela Ceia do Senhor. Em substituição à Ceia Pascal, Cristo instituiu a Ceia do Senhor, e não a observância do domingo (Mat. 26:18-30). Visto que após Sua morte não seria necessário matar mais cordeiros nem comer cordeiros pascais assados, pois Cristo, nossa Páscoa, seria morto por nós, em Sua última ceia pascal com os discípulos, Jesus substituiu o sangue do cordeiro pelo vinho como emblema do Seu sangue derramado por nós, o corpo assado do cordeiro pelo pão sem fermento como símbolo do Seu corpo quebrado em nosso favor. Os discípulos continuaram a celebrar a Ceia do Senhor como um memorial (1 Cor. 11:24) da morte de Cristo.

OBJEÇÃO No. 90: PAULO NÃO ESTAVA MAIS DEBAIXO DA LEI

ARGUMENTO: Em 1 Coríntios 9:20 Paulo afirma que procedia como judeu entre os judeus, a fim de ganhar os judeus, embora ele mesmo não vivesse debaixo da lei.

RESPOSTA: Antes de entrarmos no mérito da questão e descobrirmos qual era a lei debaixo da qual Paulo não mais estava, será oportuno examinarmos alguma coisa sobre a o estilo de vida desse apóstolo.

Paulo Era Profundo Conhecedor do Judaísmo. Sabemos pelas Escrituras que Paulo era bem versado nos costumes judaicos, visto que, antes de aceitar a Jesus, pertencera à seita dos fariseus e fora membro do Sinédrio (Atos 23:6; 26:5; Fil. 3:5-6). Este conhecimento da cultura hebraica utilizou-o Paulo

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proveitosamente ao realizar suas campanhas evangelísticas entre seus patrícios. Mas não era só entre os judeus que Paulo demonstrava tato, prudência e sabedoria em adaptar-se. Em 1 Cor. 9:20-22. Paulo apresenta a maneira como se comportava entre dois principais grupos de pessoas: (1) os sem-lei, isto é, os gentios, chamados assim porque não tinham revelação escrita de Deus (Rom. 2:12); e (2) os súditos da lei, isto é, os judeus (CNBB).

Paulo Procurava Adaptar-se a Seus Ouvintes. Para comunicar mais eficazmente o evangelho, Paulo evitava as esquisitices exteriores. Com os gentios agia como gentio e como judeu agia como judeus. Com os gentios, concordava com eles tanto quanto possível, com a exceção naturalmente de não violar a lei moral de Deus.

Com os judeus, adaptava a pregação cristã a eles e dava a entender se conformava a seus costumes, para não ofendê-los desnecessariamente, desde que, é claro, isto não envolvesse violação de princípios (Atos 16:3; 18:18; 21:20–26; 23:1–6). E agora a questão que se impõe aqui é saber se a observância do sábado semanal era para Paulo apenas uma estratégia evangelística e o que ele tinha em vista quando escreveu a frase “embora não esteja eu debaixo da lei”.

Paulo Não Estava Debaixo da Lei Cerimonial. Quanto à frase “embora não esteja eu debaixo da lei”, examinemo-la. A expressão hypo nomon que a versão Almeida ora traduz por “sob o regime da lei”, ora por “debaixo da lei” não é ponto pacífico entre os comentaristas bíblicos. Talvez seja de ajuda descobrir primeiro a que lei Paulo está se referindo. Referências paralelas indicam tratar-se da lei cerimonial: Ele observava a distinção alimentar dos judeus, guardava suas festas e chegou a circuncidar Timóteo (Atos 16:3). Ao que parece, Paulo estava querendo dizer que, embora não fosse mais observador da lei cerimonial, agia como se fosse, para poder evangelizar os que ainda o eram. Embora acreditasse que as leis cerimoniais e as observâncias rituais não estavam mais em vigor para os cristãos, não as violava desnecessariamente, para não suscitar preconceitos nem combatividade. Apressa-se, porém, em reconhecer que, porém, na qualidade de cristão (o que está sob a lei de Cristo) a permanência da lei moral de Deus, conforme se vê claramente no verso 21.

Paulo Estava Debaixo da Lei Moral. A Nova Tradução na Linguagem de Hoje captou de maneira muito precisa a idéia desses dois versículos: “Quando trabalho entre os judeus, vivo como judeu a fim de ganhá-los para Cristo. Não estou debaixo da Lei de Moisés [lei cerimonial]; mas, quando trabalho entre os judeus, vivo como se estivesse debaixo da Lei para ganhar os judeus para Cristo.

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Assim também, quando estou entre os não-judeus, vivo fora da Lei de Moisés [lei cerimonial] a fim de ganhar os não-judeus para Cristo. Isso não quer dizer que eu não obedeço à Lei de Deus [lei moral], pois estou, de fato, debaixo da lei de Cristo [sou cristão].” 1 Cor. 9:20-21.

Portanto, a lei sob o regime da qual Paulo não mais estava não era a lei moral dos Dez Mandamentos, mas as leis cerimoniais. Não obstante, agia como se ainda obedecesse às leis rituais para não suscitar preconceitos ou empecilhos na evangelização dos judeus.

OBJEÇÃO No. 91: O JESUS RESSURRETO APARECEU DEZ VEZES NO DOMINGO

ARGUMENTO: Depois de Sua ressurreição, Cristo apareceu aos discípulos cerca de dez vezes sempre aos domingos (1 Coríntios 15:6) Isto prova que Ele santificou este dia.

RESPOSTA: Uma das razões teológicas mais comuns apresentadas para explicar a origem da guarda do domingo são a ressurreição e/ou as aparições de Jesus no primeiro dia da semana. Tendo já tratado da ressurreição em lugar próprio, concentrar-nos-emos agora nas aparições.

Dez Aparições. Os Evangelhos e 1 Coríntios conjugados descrevem dez aparições de Jesus durante os quarentas dias em que ficou na Terra, entre Sua ressurreição e ascensão. Ei-las na ordem cronológica em que aconteceram.

1. A primeira aparição foi à Maria Madalena (Mat. 28:1-8; Mar. 16:1-8; Luc. 24:1-12; João 20:1-10), no túmulo, em Jerusalém, no domingo pela manhã.

2. A segunda aparição foi às outras mulheres — Maria, mãe de Tiago, Salomé e Joana (ver Mar. 16:1; Luc. 24:1, 10) — que haviam levado especiarias para embalsamar-lhe o corpo (Mateus 28:9, 10), no mesmo local, ainda no domingo pela manhã.

3. A terceira aparição foi a Simão Pedro (Luc. 24:33-35; 1 Cor. 15:5) em Jerusalém, ao que parece também na manhã do primeiro dia.

4. A quarta aparição foi aos dois discípulos (Cléopas e seu companheiro) no caminho para Emaús (Luc. 24:13-32; Mar. 16:12), na tarde daquele mesmo dia.

5. A quinta aparição foi aos dez apóstolos (na ausência de Tomé; cf. João 20:24-25), no cenáculo (Mar. 16:14; Luc. 24:33-48; João 20:19-23; 1 Cor. 15:5), na noitinha do domingo. Tecnicamente, para todos os efeitos, essa reunião

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ocorreu na segunda-feira, que, segundo o cômputo bíblico, começa ao pôr-do-sol de domingo (Lev. 23:32; Nee. 13:19)

6. A sexta aparição foi aos onze discípulos, no cenáculo, desta vez com a presença de Tomé entre eles (João 20:26-29), oito dias depois da ressurreição, num domingo à noite, isto é, também numa segunda-feira (ver item 5). Oito dias aí dificilmente pode sugerir regularidade, pois o evangelho explica por que Jesus teve que voltar: a ausência de Tomé na aparição anterior (João 20:24)

7. A sétima aparição foi aos sete discípulos, na Galiléia, junto do mar de Tiberíades (João 21:1-23), sem especificação de tempo, a não ser a expressão "depois disto", isto é, depois das seis aparições. Se fosse no domingo, comprometeria os dominicalistas, já que os discípulos estavam pescando.

8. A oitava aparição foi a aproximadamente 500 pessoas num monte da Galiléia (Mat. 28:16; Mar. 16:7; 1 Cor. 15:6). Sem especificação de tempo.

9. A nona aparição foi a Tiago (1 Cor. 15:7), também sem especificação do dia da semana. Não sabemos se na Galiléia ou em Jerusalém.

10. A décima aparição foi aos 11 discípulos perto de Betânia (Luc. 24:50), de onde ascendeu ao Céu, do Monte das Oliveiras, quarenta dias depois de sua ressurreição (25 de iyyar), que, segundo o calendário, caiu naquele ano (31) numa quinta-feira (Mar. 16:19, 20; Luc. 24:50–52; Atos 1:4–12). Confira pelo quadro:

Domingo Segunda Terça Quarta Quinta Sexta Sábado1° dia 2° dia 3° dia 4° dia 5° dia 6° dia 7° dia8° dia 9° dia 10° dia 11° dia 12° dia 13° dia 14° dia15° dia 16° dia 17° dia 18° dia 19° dia 20° dia 21° dia22° dia 23° dia 24° dia 25° dia 26° dia 27° dia 28° dia29° dia 30° dia 31° dia 32° dia 33° dia 34° dia 35° dia36° dia 37° 38° 39° 40°

Um Padrão Irregular. Conforme vimos, as aparições de Jesus não seguem um padrão regular que justifique a instituição de uma celebração regular semanal no domingo. O Senhor apareceu a indivíduos e grupos, não apenas no domingo, mas em ocasiões, lugares e circunstâncias diferentes. Em nenhuma dessas ocasiões deu Ele ordem implícita ou explícita de santificar o domingo como dia de culto. Essas repetidas aparições pós-ressurreição destinavam-se

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apenas a convencer os discípulos e outros da realidade da ressurreição, dar-lhes a oportunidade de familiarizar-se com seu Mestre em Seu corpo glorificado e permitir a Jesus que os preparasse para a tarefa de proclamar as boas novas da salvação ao mundo.

Não tem, portanto, fundamento bíblico a alegação de que Jesus mudou o sábado para o domingo por ter-Se encontrado com Seus discípulos sempre aos domingos. O único domingo em que temos provas concludentes de que Jesus Se reuniu com Seus discípulos foi no dia de Sua ressurreição, chamado nas Escrituras simplesmente de "o primeiro dia da semana”.

Nenhuma Ordem. Se por um lado os textos que se referem ao domingo revelam a importância do acontecimento, por outro não fornecem indicação nenhuma a respeito de um dia particular da semana para comemorá-la. Aliás, nos escritos do NT, o domingo jamais é chamado de “dia da ressurreição”. Esta é uma expressão que surgiu posteriormente.

“Tomadas separadamente, talvez, ou mesmo todas em conjunto, essas passagens se nos afiguram não muito adequadas para provar que a dedicação do primeiro dia da semana ao propósito acima mencionado [dia de repouso em honra da ressurreição] fosse matéria de instituição apostólica, ou mesmo uma prática apostólica” (William Smith, Dicionário da Bíblia, pág. 356).

OBJEÇÃO No. 92: O DOMINGO É MENCIONADO NO NOVO TESTAMENTO — VIII

(PAULO RECOMENDA COLETA DE OFERTAS)

ARGUMENTO: Paulo recomenda que se façam coletas regulares a cada domingo na igreja (1 Coríntios. 16:2). Isto é uma indicação peremptória de que a solenidade do sábado foi transferida para o domingo.

RESPOSTA: Esta é a oitava passagem neotestamentária em que o primeiro dia da semana é mencionado. “NO PRIMEIRO DIA DA SEMANA, cada um de vós ponha de parte, em casa, conforme a sua prosperidade, e vá juntando, para que se não façam coletas quando eu for.” 1 Cor. 16:2.

Muitos vêem neste texto uma indicação implícita de uma reunião dominical cristã regular. Como nos outros sete versículos, porém, esta passagem nada revela sobre a fantasiosa mudança do sábado para o domingo. Examinemos o contexto, e veremos que é exatamente assim.

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Oferta Beneficente. Na primavera do ano 55 ou 56 d.C., perto do fim de sua terceira viagem missionária, Paulo, escrevendo à Igreja de Corinto, recomendou aos crentes (instruções semelhantes foram dadas às igrejas da Macedônia e da Galácia) um plano de arrecadação capaz de garantir uma contribuição expressiva à campanha em favor dos irmãos carentes da Judéia (ver Gál. 2:10; 2 Cor. 9:2; Atos 11:27; Rom. 15:26).

Podemos identificar quatro características neste plano, conforme esboçado no versículo 2: A oferta devia ser posta de parte periodicamente (“no primeiro dia da semana”), pessoalmente (“cada um de vós”), particularmente (“em casa”) e proporcionalmente (“conforme a sua prosperidade”), para que não se fizessem coletas quando Paulo chegasse. Note que a passagem nada diz sobre um repouso religioso no primeiro dia da semana. Senão, vejamos:

Apenas Um Dia de Contabilidade Doméstica. Em primeiro lugar, a expressão "cada primeiro dia da semana" no grego é kata mian sabbatou ("cada primeiro [dia] depois do sábado") . . . Corinto era uma cidade grega, onde a lei e o calendário romano eram a norma. 50 Se Paulo não houvesse ensinado a doutrina do sábado aos crentes coríntios, esta frase não teria sentido. Por que, então, Paulo recomenda o primeiro dia? Porque os irmãos da Ásia Menor, sendo observadores do sábado, costumavam empregar o primeiro dia da semana para planejarem atividades seculares, pagarem contas, providenciarem gastos e ajustarem outros itens do orçamento. Esse dia de contabilidade doméstica era, portanto, um dia oportuno para fazerem a destinação da oferta. Sendo assim, o que Paulo fez foi instruir os santos a tratar de assuntos seculares nesse dia (1 Cor. 16:2).

Paulo Teria Usado a Expressão “Dia do Senhor”. Em segundo lugar, se Paulo considerasse o primeiro dia da semana como dia de culto cristão, é muito provável que o tivesse designado com a expressão “dia do Senhor”, pois era familiarizado com a locução adjetiva “do Senhor” (1 Cor. 11:20) e esta é a única vez em que ele menciona este dia em suas epístolas.

A Quantia Era Guardada em Casa. Em terceiro lugar, a quantia devia ser posta à parte, não na tesouraria da igreja, mas na própria casa do irmão, onde as dádivas ficavam acumuladas até a chegada de Paulo. Embora a tradução Almeida Revista e Corrigida omita a palavra "casa", ela existe no original (gr. par hauto, “consigo mesmo, isto é, em casa” (Dicionário Grego de Greenfield). A versão Atualizada corrige esse lapso. Não existe evidência (como querem alguns)

50 F. D. Nichol, Answers to Objections, págs. 218-219.

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de que o verbo "juntar", no gr. theasaurizon, seja o mesmo termo usado para o gazofilácio, espécie de cofre colocado à entrada do pátio do templo em Jerusalém. Segundo Strong, a idéia traduzida pelo verbo é apenas de "juntar, acumular, reservar, reunir". Comentando a primeira epístola aos coríntios, The Cambridge Bible For Schools and Colleges diz que Paulo “fala aqui de um costume que havia naquele tempo, de se colocar uma pequena caixa ao lado da cama, dentro da qual se depositavam as ofertas, depois de se fazer oração”. E conclui: “não podemos inferir desta passagem que os cristãos se reuniam no primeiro dia da semana".

Levantamento de Fundos Extradordinário. Ainda que a oferta fosse levada para a igreja, isto não provaria nada. Primeiro porque a tradição religiosa, pelo menos segundo a escola de Shammai, proibia claramente a coleta de ofertas na sinagoga no sábado, pois se acreditava que isso diminuía a santidade deste dia. As ofertas eram trazidas ao templo ou coletadas de casa em casa durante a semana (ver notas de rodapé 7 da página 91 de From to Sabbath to Sunday). Por analogia, se o domingo houvesse substituído o sábado, como dia de descanso, as regras para o repouso logicamente seriam as mesmas. Segundo porque o versículo primeiro é bem claro: a coleta (gr. loguía) não era para o pregador, nem para a igreja, nem para fins evangelísticos, mas para os santos de Jerusalém fustigados pela fome. Portanto, um levantamento de fundos de natureza excepcional.

Coleta de Artigos. Embora a maior parte das traduções deixe implícita a idéia de que a “coleta” significava dinheiro, alguns comentaristas bíblicos vêem na palavra coleta não somente a recolha de valores monetários, mas também a colheita de frutos da horta e do campo. Entendem que o pedido incluiria também alimento, roupa etc. Isso parece concordar com o versículo 3, onde é dito que ele enviaria homens aprovados para levar as ofertas para Jerusalém. Se isto fosse apenas oferta monetária, não precisaria mais de uma pessoa para transportá-las. Se esta interpretação estiver correta (não estamos concordando com ela), fazer a coleta laboriosa desses gêneros no domingo só viria a reforçar a secularidade do primeiro dia da semana.

Oferta Proporcional. A expressão "conforme a sua prosperidade" não significa uma porcentagem, tal como os 10% prescritos no AT, mas presumivelmente apenas proporcionalidade. Paulo está falando de ofertas, e não de dízimos, dois sistemas bem distintos nas Escrituras (Nee. 10:37; Mal. 3:8). Ao fazer um balanço semanal de suas contas no primeiro dia da semana (alguns

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sugerem que o primeiro dia da semana era dia de pagamento), o crente verificaria seus lucros e daria uma oferta proporcional. Paulo, portanto, sugere o primeiro dia da semana mais por razões práticas do que por razões teológicas.

A oferta planejada e executada com antecedência evitaria que, quando Paulo viesse, fosse obrigado a sair de casa em casa recolhendo ofertas minguadas e feitas de improviso. Conforme se vê, não se menciona aí nenhum ajuntamento para propósitos religiosos, nenhum cântico, nenhuma oração, nenhuma pregação. Afirmar que isto é o relato de uma coleta num culto dominical é ler a Bíblia com uma indevida interpretação pessoal.

********O que se percebe em todas as oito passagens neotestamentárias referentes

ao primeiro dia da semana pode ser resumido no seguinte: (1) Os textos não contêm nenhuma menção da mudança do sábado para o domingo; (2) eles fazem escrupulosa distinção entre o sábado do quarto mandamento e o primeiro dia da semana; (3) eles não aplicam nenhum título sagrado ao primeiro dia da semana; (4) eles não mencionam o fato de Cristo haver repousado nesse dia, ato essencial para fazer do domingo Seu sábado; (5) eles não relatam nenhum ato de retirada da bênção de Deus do sétimo dia para colocá-lo no primeiro; (6) eles não mencionam que Cristo tenha jamais tomado em seus lábios o primeiro dia da semana! (7) eles não preceituam em favor da observância do primeiro dia nem insinuam modo pelo qual o primeiro dia da semana pudesse receber a autoridade do quarto mandamento (John Andrews, History of the Sabbath).

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2 CORÍNTIOS OBJEÇÃO No. 93: A LETRA DA LEI MATA

ARGUMENTO: Paulo ensina em 2 Coríntios 3:6-11 que meramente o guardar a lei não salvará ninguém, pois a letra da lei mata.

RESPOSTA: O principal interesse de Paulo em 2 Coríntios é defender seu ministério do ataque dos falsos mestres. Ao fazer isso, o apóstolo expõe nesta passagem a crucial diferença entre os ministérios da antiga e da nova aliança, descrevendo o primeiro como um ministério da letra exercido pelo sacerdócio judaico e o segundo como um ministério do Espírito (v. 6), exercido pelos ministros cristãos, dos quais ele era um representante. É dentro desse contexto polêmico e apologético que devemos interpretar o que ele diz sobre a lei.       

Já se vê, de saída, que o transitório aqui não é a lei, mas o ministério ou ofício dos levitas. O “ministério da morte”, que é o mesmo “ministério da condenação” mencionado por Paulo no versículo 9, não é o Decálogo, pois não existe nele nenhum mandamento que mande matar; pelo contrário, há um que proíbe. Nem foram os Dez Mandamentos criados para condenar ninguém. O contraste é, pois, entre a antiga e a nova aliança, e não entre a Lei e o Evangelho.

Glória Menor e Glória Maior. Paulo lança mão de dois argumentos para demonstrar a superioridade da segunda aliança. O primeiro argumento diz que a nova aliança é superior à antiga em glória, assim como o brilho do Sol é superior ao da Lua. Note que Paulo não considera mau o antigo ministério. Ao contrário, descreve-o como glorioso (verso 7), mas com a ressalva de que o novo é ainda mais glorioso. O primeiro é inferior porque sua glória era transitória, como o

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reflexo da glória de Deus no rosto de Moisés. O segundo é superior porque reflete a glória de Cristo, glória que pertence a Ele por natureza (2 Cor. 3:11). É uma glória permanente (2 Cor. 3:11), capaz de ser comunicada aos redimidos.

Letra e Espírito. O segundo argumento usado para indicar a superioridade da nova aliança é o de que a antiga aliança é “da letra” ao passo que a nova é “do Espírito”. A letra mata, e o Espírito vivifica. Conseqüentemente, o ministério da antiga aliança é um ministério de morte (v. 6), enquanto o ministério da nova aliança é um ministério de vida.51

Se as palavras “letra” e “espírito” não significam lei e evangelho, como supõem alguns, que significam? Letra e espírito representam duas atitudes que adotamos ante a leitura de qualquer texto. Neste caso específico, a Lei de Deus. Significam, ademais, duas formas de obediência.

Guardar a letra da lei significa limitar-se somente ao sentido claramente expresso pela escrita. É sinônimo de adaptar-se apenas exteriormente à forma dos princípios da verdade expressos na lei. Uma pessoa pode, por exemplo, ler o sétimo mandamento, e achar que só viola este mandamento se praticar a ação de adulterar, quando o sentido da lei é mais amplo e abrange também a intenção de adulterar (Êxo. 20:14; cf. Mat. 5:28). Guardar a letra da lei pode significar também obediência somente por obrigação, e não por amor.

Essas duas coisas — amesquinhamento dos reclamos da lei e obediência servil — aconteceram com o judaísmo, que perdeu de vista o sentido da verdadeira religião, reduzindo-a um sistema de cerimônias formais e maquinais destituídas de vida e incapazes de comunicar vida — uma verdadeira nomolatria! Isto aconteceu porque o mais fundo que a impotente força humana conseguiu introduzir a lei foi dentro dos olhos. Para todos os efeitos, a lei ficou escrita apenas exteriormente em tábuas de pedra.

Guardar o espírito da lei, em contrapartida, significa entender a lei em sua dimensão espiritual e amorosa, apreendendo não somente o amplo sentido da Lei, mas sua motivação de amor. Isso só acontece quando o poder capacitador do Espírito Santo interioriza a lei dentro dos recessos da alma. Neste caso, a Lei é escrita internamente nas tábuas de carne do coração do crente.

Dois Tipos de Obediência. Nossa atitude para com a lei de Deus determina se estamos estabelecendo individualmente com Deus uma aliança da letra ou do Espírito. Credos oficiais, teologia teórica e formalismos cúlticos não têm podem para salvar os homens do pecado. O que Deus requer, ao obedecermos a Seus 51 Angel Manuel Rodríguez, The "Letter" of the Law. Biblical Research Institute.

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mandamentos, não é simplesmente a ação correta, mas a ação correta com a motivação correta; obediência como produto de um correto relacionamento com Deus, obediência tanto literal quanto espiritual. Somente quando a obediência é resultado natural do amor a Deus e ao próximo é que tem valor à vista de Deus. Isto pode ser apropriadamente representado pela parábola do bom samaritano. O sacerdote e o levita guardavam a letra da lei, mas o samaritano o espírito da lei. Aqueles passaram de largo para não ajudar seu próximo, embora professassem guardar a lei. O jovem rico é outro exemplo de observância literal, mas não espiritual da lei. Dizia-se guardador de todos os mandamentos, mas não amava seu próximo (Mat. 5:17-22).

No Sermão da Montanha Cristo mostrou que a obediência à letra da lei sem o espírito não consegue satisfazer o padrão de justiça divino, pois a lei é espiritual (Rom. 7:12, 14). Isto não significa, porém, que o “espírito” da lei elimina a necessidade da “letra”. O fato, por exemplo, de Jesus ter dito a Seus seguidores que o sexto mandamento proíbe a ira (Mat. 5:22), não lhes dá licença para violar a letra do mandamento cometendo homicídio. O espírito de cada mandamento não exclui obviamente a sua letra; pelo contrário, amplia-lhe o sentido.

Que Significa a Frase “a Letra Mata”? Ao dizer que o ministério da antiga aliança era ministério de morte, Paulo não está descrevendo a natureza da lei, mas a função da lei separada de Cristo. O ministério da antiga aliança tornou-se morta quando se separou do Messias. Pelo fato de a obediência apenas literal e formal não satisfazer o padrão de justiça da Lei, que é espiritual e se baseia no princípio ético do amor, o legalista é incapaz de obediência e é tido, a despeito de sua elevada profissão de piedade, na mesma conta de um pecador comum. Ao revelar o pecado em sua verdadeira luz como transgressão dos mandamentos de Deus, a Lei mata visto que expõe o transgressor da Lei à condenação da morte (Rom. 6:23; 5:12; Eze. 18:4; Prov. 11:29). É neste sentido que Paulo diz que a letra mata. Seu ministério é um ministério de condenação (v. 9), pois condenação é a conseqüência de quebrar a lei.

Não que a letra da lei, isto é, seu registro escrito, seja mau. Foi Deus quem o deu. Sua intenção era a de que a letra fosse o meio de alcançar o alvo maior que era o estabelecimento do “espírito” da lei no coração dos judeus. Infelizmente, como um todo, os israelitas falharam em traduzir a “letra” da lei no “espírito” da lei, ou seja, numa viva experiência religiosa de salvação pessoal do pecado mediante a fé no sacrifício provido pelo Messias. Embora seja ordenada para a vida, traz escravidão e morte para os que a transgridem.

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Que Significa a Frase “o Espírito Vivifica”? Em contrapartida, o Espírito concede vida ao internalizar os princípios da Lei de Deus no coração do crente e capacitar o crente a viver de acordo com a “justa exigência da Lei”. Rom. 8:4. Quando Cristo é pregado e as pessoas crêem nas promessas divinas feitas em Cristo, o Espírito entra no coração daquele que crê, motivando-o a observar a Lei de Deus e assim tornando a Lei viva no coração dele. Seu ministério é um ministério da justiça (v. 9), pois justiça é o resultado de obedecer à lei.

O próprio Paulo sabia por experiência própria o que era ser morto pela letra e vivificado pelo Espírito. Antes de sua conversão, era um legalista: ‘Quanto à lei, fariseu, quanto ao zelo, perseguidor da igreja; quanto à justiça que há na lei, irrepreensível’. Fil. 3:6. disso, ao mesmo tempo, ‘era blasfemo, e perseguidor, e insolente’. 1 Tim. 1:13), ou seja, era transgressor da Lei sob condenação divina. Sua conformidade exterior com a Lei servia apenas para cobrir a corrupção interior de seu coração. Foi em Paulo conseguiu conformar-se à Lei de Deus, não apenas exteriormente, na letra, mas também interiormente, no espírito, ou conforme ele diz, para servir ‘em novidade de espírito e não na caducidade da letra’.” Rom. 7:6.

À luz dessa análise, concluímos que nesta passagem Paulo não está negando o valor da Lei como norma para a conduta cristã. A preocupação do apóstolo é esclarecer a função da lei com referência à redenção de Cristo e ao ministério do Espírito. Ele faz isto contrastando o ministério da Lei com o do Espírito. A Lei mata no sentido em que revela o pecado em sua verdadeira luz como transgressão dos mandamentos de Deus e expõe o transgressor à condenação da morte (Rom. 6:23; 5:12; Eze. 18:4; Prov. 11:29).. Em contrapartida, o Espírito concede vida ao capacitar o crente a internalizar os princípios da lei de Deus no coração e a viver de acordo com “o justo reclamo da Lei”. Rom. 8:4 (Samuele Bacchiocchi, The Sabbath Under Crossfire, cap. 5, “Paul and the Law”).

OBJEÇÃO No. 94: CRISTO ABOLIU O ANTIGO TESTAMENTO

ARGUMENTO: Paulo ensina em 2 Coríntios 3:14 que Cristo aboliu o Antigo Testamento. Isso prova que a lei e o sábado — elementos da dispensação vétero-testamentária — findaram na cruz.

RESPOSTA: O argumento apresentado por alguns, de que Paulo aqui deprecia o Antigo Testamento e o Decálogo não tem fundamento. Eis as razões:

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O AT Ainda Está em Vigor. O próprio Paulo, quando escreve aos cristãos gentios, afirma repetidas vezes a validade do Antigo Testamento e dos Dez Mandamentos na nova dispensação (Rom. 8:1-4; 2 Tim. 3:15-17) chegando mesmo a afirmar que nada anunciara “senão o que os profetas e Moisés disseram haver de acontecer “. Atos 26:22. Deus falou a Seu povo em ambos os testamentos (Heb. 1:1-2). Mesmo porque Cristo e os apóstolos não dispunham de outra Bíblia senão o Antigo Testamento.

Tradução Inadequada. Essa interpretação equivocada talvez tenha sido favorecida pela antiga versão Almeida Revista e Corrigida, que traduz inadequadamente 2 Cor. 3:14: “Mas os seus sentidos foram endurecidos; porque até hoje o mesmo véu está por levantar na lição do Velho Testamento, o qual foi por Cristo abolido.”

A estrutura da frase, conforme impressa nesta versão, dá a entender que o que Cristo aboliu foi o Antigo Testamento. Note, porém, como o sentido fica mais claro na Almeida Revista e Atualizada, mais fiel ao original grego: “Mas os sentidos deles se embotaram. Pois até ao dia de hoje, quando fazem a leitura [dos livros] da antiga aliança (palaias diathekes), o mesmo véu permanece, não lhes sendo revelado que, em Cristo, [o véu] é removido.”

O Pentateuco. A antiga aliança a que Paulo se refere aqui é, sem dúvida, o Pentateuco (e não ao Antigo Testamento), pois é nessa porção da Bíblia hebraica que os termos da aliança foram declarados. Efésios, porém, dá a entender que a Bíblia deve ser recebida como um todo, ao afirmar que os cristãos são “edificados sobre o fundamento dos apóstolos (Novo Testamento) e dos profetas (Antigo Testamento).

As Escrituras Hebraicas só vieram a receber o epíteto de Antigo Testamento no segundo ou terceiro século. Na época de Jesus e de Paulo eram conhecidas por diversas expressões “Escrituras”, “Palavra de Deus”, “a lei”, “os profetas”, “as leis e os profetas” e “oráculos de Deus”, mas nunca “Velho Testamento”, locução usada pela primeira vez por Tertuliano, pai da teologia ocidental latina52

(160-230 d.C.).Remoção do Véu. O que foi removido por Cristo, entretanto, não foi o

Pentateuco (Mat. 5:17), mas o véu, que encobria a mente dos judeus quando liam essa seção dos escritos sagrados, conforme se depreende da forma masculina “removido”. Véu aí é uma metáfora que indica a incapacidade espiritual de reconhecer as grandes verdades espirituais e o objetivo espiritual da

52 Tony Lane, Pensamento Cristão, vol. 1, págs. 23-27.

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economia mosaica. Paulo diz que 1.500 anos depois do Sinai e 30 anos depois da morte de Cristo os judeus ainda eram obtusos em compreender a natureza e a obra do Messias. Liam no Pentateuco sobre os sacrifícios, mas não conseguiam relacioná-los a Cristo, único objetivo destes.

Cegueira mental semelhante acomete alguns cristãos de nossos dias quando lêem o NT e não conseguem compreender que Cristo não aboliu a lei. À semelhança do salmista, devem eles orar: "Desvenda os meus olhos, para que veja as maravilhas da Tua lei" (Sal. 119:18).

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GÁLATASOBJEÇÃO No. 95: PAULO ESTAVA MORTO PARA A LEI

ARGUMENTO: Paulo afirma enfaticamente em Gálatas 2:19 que morreu para a lei. Isto significa que repudiou a lei como um todo, inclusive o sábado.

RESPOSTA: A frase “Eu morri para a lei” não significa, como pode parecer à primeira vista, que a lei de Deus não tinha mais importância para Paulo ou que ele a havia repudiado como um todo. Antes, significa apenas que Paulo já não via a lei como meio de salvação. Morrera para ele toda esperança de ser salvo pela lei. Na verdade, ele morrera, não para a lei, mas para o legalismo, pois o Espírito de Deus o mudara em outro homem.

No passado, quando fariseu, havia esperado alcançar salvação pela meticulosa observância de todos os reclamos da lei. Fora este o objetivo de sua vida. Agora, que fora crucificado com Cristo, o verdadeiro propósito da lei ficara claro para ele. Reconheceu que não poderia esperar ajuda daquela fonte. Descobriu que a função da lei é ética, e não soteriológica. É por isso que afirma estar morto para a lei. Ou seja, abandonou o sistema legal como meio de salvação (pois entendeu que sua salvação vinha somente do sacrifício expiatório provido pela morte de Cristo na cruz). Isto não quer dizer que a lei não tinha valor para ele como norma de conduta. Ele mesmo confessa: Embora eu viva “fora da Lei de Moisés . . . Isso não quer dizer que eu não obedeço à Lei de Deus, pois estou, de fato, debaixo da lei de Cristo.” 1 Cor. 9:21. Ou seja, a justificação pela graça mediante a fé não torna desnecessária a obediência à lei (Rom. 6:1-2).

OBJEÇÃO No. 96: OS SABATISTAS ESTÃO SOB MALDIÇÃO DIVINA

ARGUMENTO: Paulo afirma em Gálatas 3:10 que todos quantos pretendem guardar a lei (inclusive o sábado) estão debaixo de maldição.

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RESPOSTA: Depois de afirmar que os que são das obras da lei estão debaixo de maldição, Paulo faz uma citação via Septuaginta de Deut. 27:26 para justificar sua asserção. O texto hebraico da passagem veterotestamentária é bem mais claro: “Maldito aquele que não confirmar as palavras desta lei, não as cumprindo”.

Maldição Para os Desobedientes. Repare que a lei pode ser acompanhada tanto de bênção como de maldição: bênção para quem obedece (Deut. 28:1-14), mas maldição para quem desobedece (Deut. 27:15-26; 28:15-68). A lei exige obediência perfeita. O menor desvio é suficiente para fazer o transgressor incorrer na ira de Deus (Rom. 4:15; Efés. 5:6). Assim sendo, a maldição repousa não sobre quem obedece à lei, mas sobre quem desobedece. Neste caso, quem incorre em maldição é quem não cumpre a lei (inclusive o sábado), e não quem pela graça de Cristo foi capacitado a cumpri-la. A maldição é a transgressão da lei.53

Bênção Para os Obedientes. A Bíblia não deprecia as boas obras. Provérbios 29:18 declara que aquele “que guarda a lei, esse é feliz”. Isaías 56:2 corrobora isso quando afirma: “Bem-aventurado [isto é, abençoado, bendito, feliz] o homem que faz isto, e o filho do homem que nisto se firma, que se guarda de profanar o sábado e guarda a sua mão de cometer algum mal”. (cf. Sal. 10:11; 119:1). E Tiago ecoa no NT: “Mas aquele que considera, atentamente, na lei perfeita, lei da liberdade, e nela persevera, não sendo ouvinte negligente, mas operoso praticante, esse será bem-aventurado no que realizar.” Tia. 1:25. O próprio Paulo exalta as boas obras como fator de felicidade (Tito 3:8; 1:16; 1 Tim. 6:17-18; Col. 1:10; Efés. 2:10).

Maldição Para os Legalistas. Se é assim, por que Paulo afirma que os que são das obras da leis estão debaixo de maldição? A palavra-chave para entender o versículo é “obras da lei”. A expressão "obras da lei" significa, na fraseologia paulina, legalismo ou "busca da justificação por meio das obras”. Portanto, Paulo está dizendo que malditos são os legalistas, e não os obedientes. Por que os legalistas são malditos? Porque a única maneira de ser considerado justo perante Deus é pela fé. Quem tenta obedecer à lei de Deus pelas suas próprias forças, sem a ajuda de Cristo, ou quem confia na própria obediência à lei como coisa meritória, não consegue atingir o padrão de Deus (Atos 13:39; Gál. 3:11; 2:16). Se não consegue, é classificado na mesma condição do transgressor, pois “quem

53 E. J. Waggoner, Glad Tidings.

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não obedece sempre a tudo o que está escrito no Livro da Lei está debaixo da maldição de Deus”. Daí a maldição. Na verdade, quando guardamos os mandamentos passamos da morte para a vida (João 5:2; 1 João 3:14).

Salvação Pela Fé. É preciso que se diga que o método de salvação utilizado por Deus não mudou. Abraão foi justificado pela fé (Rom. 4:13-18). Os que vivem na dispensação cristão continuam sendo salvos pela graça mediante a fé. Quem tenta salvação pela obediência à lei, conforme Gálatas 5:3, está separado de Cristo e cai da graça. Note, porém, que Paulo fala, não contra a lei em si, pois a considerava santa e isto 25 anos depois da morte e ressurreição de Cristo (Rom. 7:12), mas contra o método de justificação. O problema, portanto, não estava em obedecer à lei, mas em fazer isso esperando salvar. Em 1 Timóteo 1:8 Paulo lança mais luz sobre o assunto quando afirma que a "lei é boa, se alguém dela se utiliza de modo legítimo." Qual a forma legítima de utilizar a lei? Com o propósito para o qual foi dada: como (1) diagnose do pecado, (2) padrão de conduta e (3) norma de juízo. Jamais como método de salvação.

Concluímos, portanto, que um salvo em Jesus Cristo guardar o sábado, bem como os demais mandamentos de Deus, com a motivação correta, como forma de conduta ética, não é utilizar a lei de forma ilegítima. Na verdade é o que Deus espera que ele faça. A todo pecador que se converte, Cristo diz: "Vai, e não peques mais" (João 5:14; 8:11). Ou seja, vá e não transgridas mais a lei, pois "pecado é a transgressão da lei (anomia)" (1 João 3:4, ARA). Quem faz isso, é bem-aventurado, bendito e feliz.

OBJEÇÃO No. 97: O JUSTO VIVERÁ DA FÉ, E NÃO DA LEI

ARGUMENTO: Paulo afirma em Gálatas 3:11-12 que o justo viverá da fé, e não da lei, porque a lei não justifica ninguém.

RESPOSTA: Paulo está certo. Errada é a interpretação tortuosa que os antinomistas dão ao que Paulo diz. Ao lermos a recorrente declaração “o justo viverá pela fé” (Rom. 1:17; Heb.10:38), é imprescindível compreender qual a extensão do significado da palavra “justo”.

Quem São os Justos? Ser justificado pela fé é ser declarado justo pela fé. A Bíblia diz que “toda injustiça é pecado”. 1 João 5:17. Diz também que pecado “é a transgressão da lei”. 1 João 3:4. Portanto, toda injustiça é transgressão da lei. E, por conseguinte, toda justiça é obediência à lei. Concluímos, portanto, que

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justo é aquele que obedece à lei, e que, portanto, ser justificado é o mesmo que ser capacitado a ser guardador da lei. Esta é a única forma de Deus salvar o pecador

Como Se Tornar Justo. A desobediência à lei produz ira. A única maneira de escapar à ira ou maldição é ser obediente. Como não podemos ser cumpridores da lei perante Deus por meio das obras devido à nossa natureza pecaminosa, o único meio aceitável é graça mediante a fé. “Com o coração se crê para justiça”. Rom. 10:10. E não se pense que esta doutrina — da fé como meio de salvação — seja exclusividade do NT, pois a encontramos também no AT (Hab. 2:4). Os santos da Antigüidade também foram salvos pela fé. Aliás, este é o único método de salvação válido.

A Lei Não Procede da Fé. A Lei só oferece a vida eterna mediante a condição de perfeita obediência. Obras, e somente obras, é o que a lei aceita, não importa o método. Mas o ser humano em seu estado pecaminoso, após a Queda, é incapaz de obedecer 100%. Cristo foi o único que cumpriu plenamente a justiça da lei. Quando aceitamos Cristo pela fé, Cristo passa a viver em nós. Então Sua obediência em nós nos torna justos. A partir de então recebemos poder para obrar justiça. — VER OBJEÇÕES 79, 80, 81 E 107 (A FÉ ANULANDO A LEI).

OBJEÇÃO No. 98: A LEI SÓ VIGOROU DESDE O SINAI ATÉ CRISTO

ARGUMENTO: Paulo ensina em Gálatas 3:19 que a lei foi adicionada por causa do pecado. Portanto não é anterior ao Éden. Diz também que a lei só foi ordenada “até que viesse o Descendente [Cristo]”. Ora, se foi até Jesus, já não é mais depois dEle.

RESPOSTA: Esta passagem e toda a linha de raciocínio de Paulo daqui em diante até o versículo 25 têm sido muitas vezes interpretada de maneira equivocada para dar a entender que todos os códigos legais do AT terminaram no Calvário. Esta é uma exegese vesga. Leva a conclusões absurdas, contrárias não somente à teologia paulina, mas a toda Bíblia.

Para interpretarmos corretamente o versículo, precisamos responder a três perguntas: (1) de que lei Paulo está falando? (2) que querem dizer as palavras “adicionar” e “transgressão” no contexto? (3) a vinda de Cristo poria um fim à lei? Vamos por partes:

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De que lei Paulo está falando? Muitos acreditam que a lei “adicionada por causa da transgressão” de que fala Gál. 3:19 seja a lei cerimonial. Isto é verdade, mas não é somente ela. Inclui-se aqui também a lei moral. É certo que a lei cerimonial, diferentemente da moral, passou a existir depois do pecado. Mas foi no Sinai que foram “adicionados” ambos os códigos. Portanto ambos devem ser lidos aqui. Em Gálatas, Paulo trata tanto da lei moral como da cerimonial.

Que quer dizer a palavra “adicionar”? A resposta se encontra no exame do contexto histórico e lingüístico. O contexto nos diz que Abraão, 600 anos antes de Moisés, já era conhecedor da lei de Deus, pois ela fora a base da aliança feito entre Deus e o patriarca (Deut. 9:9; 4:13). Os patriarcas tinham a lei moral escrita no coração e conheciam os elevados padrões morais de Deus. Também possuíam de forma embrionária as leis de sacrifícios rituais. Era, porém, uma revelação inespecífica e rudimentar.

Seiscentos anos depois a lei foi, conforme diz a versão Almeida, “adicionada” [à aliança feita com Abraão]. O verbo grego para “adicionar” é prostithemi, que, segundo Strong, significa “acrescentar”, “enviar novamente”, “dar mais”, “aumentar”, “falar mais”. Repare que a idéia básica é a de que as leis foram apresentadas de maneira mais explícita e em maiores detalhes. Foi exatamente isso o que aconteceu no Sinai: a lei foi comunicada como um todo e registrada por escrito e pormenorizados os seus princípios em inúmeras e minuciosas aplicações.

Por que foi necessário detalhar a lei? “Por causa da transgressão”, responde Paulo. Numa leitura superficial o sentido é ambíguo. Essa resposta pode significar tanto que a lei foi dada para restringir as transgressões (que é a função natural da lei) como que a lei foi dada para tornar as transgressões conhecidas. Visto que Paulo escolheu a palavra “transgressão” (parabasis) em vez de “pecado” (hamartia) neste contexto, a segunda opção é a mais coerente. Em Romanos, Paulo afirma que “pela lei nos tornamos conscientes do pecado” (3:20). Ou seja, a lei revela o pecado como transgressão da lei. Certa versão inglesa traduz assim: “para tornar o erro uma ofensa legal”. Ou seja, foi preciso registrar a lei sob a forma escrita e pormenorizá-la para identificar e especificar os variados tipos de pecados e “mostrar aos homens quanto eles são culpados de quebrar as leis de Deus”. (BV).

Pelo fato de os israelitas terem perdido durante o cativeiro egípcio a compreensão e a consciência dos padrões morais de Deus e mesmo as idéias mais rudimentares de sacrifícios e terem, graças ao ambiente idólatra e imoral

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em que nasceram e viveram a maior parte de sua vida, suas consciências cauterizadas, anestesiadas e insensibilizadas para o pecado, foi preciso que Deus revelasse suas leis de maneira mais vívida e concreta no Sinai, para que se conscientizassem de que eram pecadores e de que precisavam de salvação (Rom. 7:7, 13). Note como a BLH traduz a primeira parte deste versículo: “Então, por que é que foi dada a Lei? Ela foi dada para mostrar as coisas que são contra a vontade de Deus.” Ou seja, para servir de padrão moral aferidor entre o certo e o errado. Ora se a lei apresentada no Sinai de maneira mais sofisticada para detalhar o pecado, esta é uma prova axiomática de que a lei já existia, pelo menos em forma simples, pois é impossível haver transgressão onde não haja lei (Rom. 4:15).

A lei devia durar somente até a vinda de Cristo? A frase “até que viesse o Descendente” não significa que a lei de Deus como norma de conduta ou código de ética e moralidade era temporária e que se tornaria inválida pela vinda de Cristo, o Filho da promessa. Antes, significa que Israel devia ser mantido sob a tutela da lei (v. 23) até que a provisão de Deus para a salvação pela fé fosse revelada na primeira vinda de Cristo. Paulo se refere aqui particularmente ao sistema cerimonial, que prefigurava a Cristo. Embora seja também verdade que a lei moral visava também levar o homem a Cristo, pois lhes revelava a pecaminosidade e assim a necessidade de purificação dos pecados. Com a vinda de Cristo, as leis cerimoniais, por sua própria natureza temporária, desapareceram. A lei moral, porém, por sua própria natureza permanente e sua função diagnosticadora do pecado, será sempre necessária para reconduzir a Jesus todos quantos se afastam da senda da justificação e da obediência. — VER OBJEÇÕES 14, 28, 32 E 82 (LEI SÓ NO SINAI).

OBJEÇÃO No. 99: NÃO ESTAMOS MAIS SOB A TUTELA DA LEI

ARGUMENTO: Paulo ensina em Gálatas 3:23-25 que a lei era temporária, ou seja, que devia vigorar apenas até à vinda do Descendente, isto é, de Jesus. Logo, com a primeira vinda de Jesus, a Lei caducou e não precisamos mais obedecê-la.

RESPOSTA: Leiamos o texto: “Mas, antes que viesse a fé, estávamos sob a tutela da lei e nela encerrados, para essa fé que, de futuro, haveria de revelar-se. De maneira que a lei nos serviu de aio para nos conduzir a Cristo, a fim de que

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fôssemos justificados por fé. Mas, tendo vindo a fé, já não permanecemos subordinados ao aio.”

Significado de Fé. Não devemos entender a palavra “fé” aqui literalmente, isto é, no seu sentido subjetivo. Estará Paulo acaso afirmando que antes de Cristo não havia fé, todos eram incrédulos? Certamente que não. Os santos da antiga dispensação viveram pela fé retroativa no Cristo que havia de manifestar-Se. Mediante uma figura de linguagem (metonímia), o apóstolo fala de “antes [do regime] da fé [cristã]” como o tempo em que Cristo ainda não havia encarnado, durante o qual ainda não se havia revelado claramente o mistério de como Deus pode salvar os homens pela fé (1 Tim. 3: 16; ver com. João 1: 17; Gál. 3: 14, 19). A Bíblia Viva diz: “Até à vinda de Cristo. . .” Antes desse tempo, os judeus vivam somente sob a tutela da lei, isto é, sob a jurisdição, guarda e proteção de todo o sistema legal judaico.

Significado de Aio. Para explicar a função tanto da lei moral como da cerimonial (é dos dois códigos que Paulo está falando) antes de Cristo, Paulo a compara a um aio. Na Grécia antiga, o aio ou pedagogo (no gr. paidagogos, “tutor”, guardião” de crianças) não era o professor (didaskalos), mas o escravo do pai de família que tinha a função de acompanhar diariamente o menino à escola até alcançar a maioridade, protegê-lo de danos e garantir que este não negligenciava sua instrução entregando-se à dissipação e a brincadeiras. Se o garoto tentava fugir, o aio o trazia de volta ao caminho, e tinha até autorização para discipliná-lo, se fosse o caso, empregando métodos físicos de correção. Na arte grega ele é geralmente representado com uma vara na mão.

Papel do Tutor. O papel do aio é uma ilustração apropriada para descrever os aspectos teleológicos da Lei. Mas em que sentido as leis moral, cerimonial e civil nos serviram de aio para conduzir a Cristo? Funcionaram como guardiãs, supervisoras e preparadoras morais do povo escolhido do AT. Quando Deus retirou os israelitas do cativeiro egípcio, deu-lhes, além do Decálogo para se conscientizarem da malignidade do pecado, leis cerimoniais e religiosas destinadas a demonstrar o plano divino para o perdão de pecados deles. Essas leis, na verdade, tinham a função de proteger e guiar o povo até o dia da libertação espiritual por meio de Jesus Cristo. As leis cerimoniais serviam para conduzir a Cristo no sentido de que apontavam simbolicamente para Ele. A lei moral servia — e a ainda serve — para conduzir a Cristo na medida em que força o pecador a recorrer a Ele para perdão de pecados.

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Não Mais Debaixo do Aio. O que Paulo quer dizer quando afirma que, “tendo vindo a fé, já não permanecemos subordinados ao aio” (verso 25)? Com a vinda do Salvador, algumas mudanças ocorreram no tocante a essas leis. Com respeito às leis cerimoniais, elas cessaram na cruz, pois Cristo tomou o lugar dos sacrifícios animais. Com respeito às leis civis, também perderam seu significado pela simples razão de que Israel deixou de existir como nação, sendo substituído pelo Israel espiritual. Com respeito à lei moral, o Decálogo, esta não mais se destaca sobre duas tábuas de pedra, como algo separado do homem. Os justificados pela fé em Cristo se convertem em novas criaturas (2 Cor. 5:17) e têm a lei de Deus escrita em sua mente e coração (Heb. 8:10, de forma que a justiça da lei é cumprida neles (Rom. 8:4). É por isso que Paulo utiliza uma figura muito adequada quando declara que já não estamos “debaixo de aio”. O filho adulto faz voluntariamente o que antes fazia por medo do pedagogo.

Lei Moral Continua em Vigor. É difícil imaginar que Paulo esteja anunciando a abolição do Decálogo, a grande Lei moral de Deus, quando esse mesmo escritor em outras partes declara que a lei foi dada por Deus (Rom 9:4; 3:2), foi escrita por Deus (1 Cor 9:9; 14:21; 14:34), contém a vontade de Deus (Rom 2:17,18), dá testemunho da justiça de Deus (Rom 3:21) e está de acordo com as promessas de Deus (Gal 3:21).. Enquanto o pecado estiver presente na natureza humana, será preciso a lei para expor a malignidade do pecado (Rom. 3:20) e revelar a necessidade de um Salvador (SDA Bible Commentary, vol 6).

Levando em conta as considerações acima, concluímos que os comentários negativos de Paulo a respeito da Lei devem ser entendidas à luz da natureza polêmica dos Gálatas. Nesta epístola, o apóstolo procura neutralizar o dano causado pelos falsos mestres, que estavam exaltando a Lei, especialmente a circuncisão, como meio de salvação. Ao refutar a perversa e excessiva exaltação da lei, Paulo é forçado a depreciá-la até certo ponto.

OBJEÇÃO No. 100: JESUS VEIO RESGATAR OS CRISTÃOS DA LEI

ARGUMENTO: Paulo diz claramente em Gálatas 4:4-5 que Jesus veio isentar os cristãos da obediência à lei.

RESPOSTA: Esta é uma falsa dedução. O texto diz: “Vindo, porém, a plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei, para

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resgatar os que estavam sob a lei, a fim de que recebêssemos a adoção de filhos”. Jesus veio resgatar-nos, não da lei, mas de sob a lei.

A locução “sob a lei” no original reza literalmente “sob lei” (sem artigo). À primeira vista pode parecer que Paulo está se referindo à condenação da lei moral, mas essa idéia é descartada tanto pelo contexto imediato como pelo remoto. Cristo não nasceu sob a condenação da lei, pois não era pecador (v. 4). Ninguém, no senso normal, desejaria estar sob a condenação do Decálogo (v. 21). A referência, portanto, só pode ser à jurisdição do sistema legal judaico. Os que estavam sob a lei eram os judeus, que viviam sob o regime do sistema legal judaico (Rom. 6:14). Cristo veio resgatar a estes, mas de quê?

Resgatados não da lei, mas do legalismo; da dependência legalista dos tipos do sistema cerimonial, que se haviam tornado um regime de escravidão semelhante à escravidão da superstição pagã. O contexto imediato sugere que a lei a que Paulo faz referência aqui é a lei cerimonial, ao falar do valor transitório dos ritos judaicos nos versículos 8-11. O raciocínio dessa metáfora paulina é o seguinte: Assim como, para ser adotado com todos os direitos de um filho legítimo da família, um escravo precisava primeiro ser comprado pelo dono da casa, assim também Deus, para conceder aos judeus a adoção de filhos na família de Deus, resgatou-os (exagorazo) do domínio da lei mosaica pagando o preço desse resgate com sua morte vicária.

Cristo, portanto, não veio resgatar as pessoas da obediência à lei, mas do legalismo, ou seja, da busca ilegítima da salvação pela obediência à lei. — VER OBJEÇÕES 87, 94, 108 E 109 (JESUS ABROGOU A LEI).

OBJEÇÃO No. 101: O SÁBADO É UM RUDIMENTO FRACO

ARGUMENTO: Paulo ensina em Gálatas 4:8-11 que o sábado, à semelhança de outras festas judaicas, é um rudimento fraco, pobre e escravizador. Deus nos libertou dessa escravidão.

RESPOSTA: Alguns entendem que, com a frase “guardais dias, e meses, e tempos, e anos”, Paulo esteja falando tanto dos sábados semanais, como das Luas novas e dos sábados cerimoniais.

Nenhuma Referência ao Sábado. Não há, contudo, base escriturística para se crer que “os dias” mencionados pelo apóstolo se refiram ao sábado do sétimo dia. Paulo não está aqui ensinando os gálatas a rejeitarem o sábado. Primeiro

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porque ele mesmo observava este dia (Atos 13:42-44; 16:13; 17:2; 18:4). Certamente ensinou esta doutrina a seus conversos, dentre os quais estavam os gálatas, confirmados em sua segunda viagem missionária (Atos 18:23).

Segundo porque a própria Bíblia, nos seus 65 outros livros, nunca fala do sábado do sétimo dia com esta linguagem depreciativa. O sábado semanal foi instituído na criação (ver Gên. 2:1-3; cf. Êxo. 20:8-11), antes da entrada do pecado no mundo e 2.500 anos antes da inauguração do sistema cerimonial no Monte Sinai. Se a observância do sábado semanal submete o ser humano à escravidão, então o próprio Criador Se tornou escravo quando descansou no primeiro sábado que houve neste mundo. Esta conclusão, porém, é absurda.

Festividades Judaicas. Descartada a hipótese do sábado semanal tanto pela lógica como pelo contexto, resta-nos somente a opção de que o que Paulo tinha em vista, ao usar a palavra “dias”, aqui eram os sete sábados anuais e as luas novas do sistema cerimonial (ver Lev. 23; Núm. 10:10; 28:11-15). O termo pode se referir também aos dias especificados para jejum entre os judeus — segundas e quintas-feiras (R. Dederen, On Esteeming One Day Better than Another, Andrews University Seminary Studies, Janeiro de 1971, págs. 16-35; Didaquê 8:1).

Esses preceitos cerimoniais foram, porém, prescritos por Deus para funcionarem numa base temporária. Deviam vigorar somente “até o tempo da reforma” (Heb. 9:10) ou a morte de Cristo na cruz (Gál. 4:10; Heb. 9:8-12). Os judaizantes não entendiam isto e queriam forçar os cristãos gentios a se submeterem ao obsoleto sistema cerimonial. Ao que parece, os crentes da Galácia, que haviam se libertado da escravidão do paganismo, buscavam agora se submeter escrupulosamente ao cerimonialismo judeu, sem perceber que tanto um como outro sistema era uma tentativa inútil de alcançar a justificação pelas obras. Ao compelirem os convertidos gálatas a guardarem essas leis obsoletas, os cristãos judeus estavam na realidade eclipsando a Cristo e Sua obra expiatória. É por isso que Paulo os classifica como “rudimentos fracos e pobres”.

Segundo a Enciclopédia Adventista, “as declarações de Paulo a respeito da observância de dias devam provavelmente ser entendidas dentro do contexto de um legalismo judaizante incrustado numa veneração aberrante e sectária de anjos e corpos celestiais” (SDA Encyclopedia, art. “Sabbath”). — VER OBJEÇÕES 17, 19, 20 E 31 (SÁBADO NÃO MORAL).

OBJEÇÃO No. 102: A LEI DA ANTIGA ALIANÇA ERA PARA ESCRAVIDÃO

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ARGUMENTO: Paulo ensina em Gálatas 4:22-24 a lei dada no Sinai (na qual estava contida o sábado) era para escravidão

RESPOSTA: Paulo utiliza aqui o relato histórico dos dois filhos mais preeminentes de Abraão — Ismael e Isaque — como alegoria para ilustrar o contraste entre a religião judaica e a religião cristã. A religião judaica ensinando a salvação pela lei mediante as obras, e o cristianismo ensinando a salvação pela graça mediante a fé. O apóstolo não emprega a figura de Abraão gratuitamente, mas como um contra-argumento contra os legalistas que estavam perturbando os crentes gálatas, pois aqueles se jactavam do fato de serem descendentes de Abraão (Mat. 3:9). Jesus ao debater com os fariseus sobre o mesmo assunto (João 8) negou que eles fossem descendentes espirituais de Abraão. A passagem trata da mesma questão, a não ser no particular de que o método argumentativo de Paulo é levemente diverso. Em vez de negar que os legalistas são descendentes de Abraão, Paulo relembra a seus oponentes que Abraão teve dois filhos.

Há duas diferenças principais entre esses filhos. A primeira é que eles nasceram de mães diferente (v. 22). Um, de mulher livre; o outro, de mulher escrava. Isto, de acordo com a lei antiga, também afetava o status do filho. A segunda diferença era a maneira como haviam sido concebidos. Ismael fora concebido inteiramente por meios naturais. No caso de Isaque, sua concepção foi um milagre (Expositor’s Bible Commentary).

A Antiga Aliança e os legalistas. Deus afirmou a Abraão que ele teria um filho com Sara, sua esposa legítima. Mas porque Sara era estéril e estava agora em idade avançada, Abraão não creu na possibilidade da promessa e tomou para si uma concubina. Tentou fazer as coisas pelo esforço e engenho humano. Isso exemplifica bem a idéia de justiça própria da antiga aliança: “faremos”. A concubina se chamava Agar, uma escrava egípcia. E os filhos de uma mulher escrava eram sempre escravos, ainda que o pai fosse livre. Portanto, tudo quanto Agar podia gerar eram escravos. Assim, todos os que tentam observar a lei pelas próprias forças não o conseguem e, por conseguinte, tornam-se escravos da culpa. Agar representa a antiga aliança e seu filho Ismael, os legalistas.

A Nova Aliança e os fideístas. Quando Isaque nasceu de Sara, foi o milagre da graça. Deus realmente fez surgir vida sobrenatural de um útero morto. Isto representa o milagre regenerador da graça que torna a obediência possível sob a nova aliança. Esta não depende das fracas promessas humanas, mas da infalível

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garantia de Deus. “Porque esta é a aliança que firmarei com a casa de Israel, depois daqueles dias, diz o Senhor: na sua mente imprimirei as minhas leis, também sobre o seu coração as inscreverei; e eu serei o seu Deus, e eles serão o meu povo.” Heb. 8:10. Apenas por um milagre da graça de Deus pode a lei ser guardada. Sara representa a nova aliança e seu filho Isaque, os fideístas.

Note que o que Paulo questiona aqui não é a lei em si, mas a atitude para com a lei. Ele faz a distinção entre a religião natural feita pelo homem e a religião sobrenatural feita por Deus. A religião das obras — judaísmo — corresponde ao nascimento natural de Ismael, pelo esforço humano. A religião da fé — o cristianismo — corresponde ao nascimento sobrenatural de Isaque, pelo Espírito. Note que ambos os filhos possuem o mesmo pai (Abraão). O que faz a diferença é a mãe.

Neste arranjo, Agar, a mulher escrava, simboliza a antiga aliança, promulgada no Sinai, enquanto seu filho, Ismael, simboliza o judaísmo com sede na Jerusalém terrena. Esta é uma forma de religião. Por outro lado, Sara, a mulher livre, simboliza a nova aliança promulgada no Calvário, enquanto seu filho, Isaque, simboliza o cristianismo com sede na Jerusalém celeste. Os transgressores dos mandamentos são os que operam sob a antiga aliança. Os verdadeiros filhos de Abraão são os que obedecem pela fé.

As leis entregues por Deus no Sinai não tinham a intenção de escravizar ninguém, nem mesmo a cerimonial. Mas a atitude legalista do povo judeu transformou essas leis em escravidão. Paulo recorre, portanto, a essa alegoria para estabelecer a diferença entre a escravidão do legalismo e a liberdade da fé em Cristo. Mais uma vez ele nada fala contra a lei, mas contra o legalismo. — VER OBJEÇÕES 27 E 115 (ANTIGA ALIANÇA).

OBJEÇÃO No. 103: QUEM GUARDA O SÁBADO ESTÁ OBRIGADO A GUARDAR TODA A LEI

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Agar, a mulher escrava — Sara, a mulher livreIsmael, nascimento natural — Isaque, nascimento

sobrenaturalAntiga aliança — Nova aliançaJerusalém terrena — Jerusalém celesteJudaísmo — CristianismoMonte Sinai — Monte CalvárioLegalistas — Fideístas

ARGUMENTO: Para a mentalidade judaica, a Lei se constituía uma unidade indivisível (Gálatas 5:3), ainda que fossem vários os elementos nela contidos (moral, ritual, civil, penal, familiar, econômico, social, dietético, higiênico). Portanto, quando foi abolida a lei, foi abolida como um todo. Mas se alguém quiser guardar parte dela, fica na obrigação de obedecer a todo o sistema legal.

RESPOSTA: A que lei Paulo se refere em Gál. 5:3? O apóstolo emprega o termo nomos (lei) pelo menos 110 vezes em suas epístolas, mas não de maneira uniforme. A mesma palavra é usada para referir-se a coisas tão diversas quanto à lei cerimonial (Gál. 4:21; Rom. 7:22, 25; 1 Cor. 9:9), a todo o Antigo Testamento (1 Cor. 14:21; Rom. 3:19,21), à vontade de Deus escrita no coração dos gentios (Rom. 2:14-15), ao princípio governante da conduta (Rom. 3:27), às más inclinações (Rom. 7:21) e à guia do Espírito (Rom. 8:2). Às vezes Paulo chega mesmo a usar o termo, duma maneira extremamente pessoal, para referir-se ao próprio Deus, como em Rom. 3:19.

A Lei da Circuncisão. Nossa preocupação imediata é saber à qual dessas acepções Paulo está se referindo em Gálatas 5:3. A lógica manda buscar no contexto a resposta. Qual o assunto do capítulo? Circuncisão. Ora, se Paulo está discorrendo sobre circuncisão, logo só pode estar-se referindo à lei na qual este preceito está contido, a saber, no código cerimonial, já que nenhum mandamento do Decálogo prescreve a circuncisão (Atos 15:5; 1 Cor. 7:19).

O pano de fundo histórico fornece evidência adicional. Os judaizantes estavam subvertendo as igrejas da Galácia, ensinando que os cristãos deviam circuncidar-se para obter o favor de Deus. O argumento paulino é o seguinte: Se a circuncisão ainda está em vigor, então os holocaustos, as libações, as ofertas e as festas (que também fazem parte do sistema ritualístico) também estão. O que Paulo está querendo dizer é que a lei cerimonial não reconhece seletividade: ou é tudo ou é nada. Aquele que aceita a circuncisão, expressa desse modo sua crença em todo o sistema cerimonialístico e concorda em submeter-se a todas as suas exigências do “pacote”. Do contrário, a lei coloca o homem sob maldição, se ele negligencia apenas um de seus reclamos (ver cap. 4:10; 5:2-3).

Como se vê, o texto de Paulo nada tem que ver com o sábado semanal, que faz parte de outro código inteiramente diverso, qual seja, a lei moral, sumariada nos Dez Mandamentos.

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OBJEÇÃO No. 104: QUEM PROCURA GUARDAR A LEI FICA DESLIGADO DE CRISTO

ARGUMENTO: Quem procura guardar a lei, rompeu relações com Cristo e decaiu da graça (Gálatas 5:4).

RESPOSTA: Decair da graça significa situar-se fora do alcance do favor divino, já que obter o favor divino pela observância da lei e recebê-lo mediante a graça são mutuamente excludentes. Isso não quer dizer, porém, que observar a lei é cair da graça. Uma tradução moderna soluciona a dificuldade quando traduz o versículo de maneira mais clara: “Vós, que procurais a vossa justificação na Lei, rompestes com Cristo: Decaístes da graça” (CNBB). Repare que o errado não é guardar a lei, mas procurar guardar a lei de maneira ilegítima, ou seja, legalisticamente. O próprio versículo sinaliza nesta direção: Desliga-se de Cristo não quem procura guardar a lei como norma de conduta, mas quem procura guardar a lei como forma de justificação.

Ainda que a lei específica mencionada neste capítulo seja a cerimonial (pois o ponto principal da dificuldade aí é a circuncisão), admitimos que o princípio também é válido para a lei moral. Sempre que alguém procura saldar nossa dívida para com Deus pela guarda da lei (BV), decai da graça. Esses dois métodos de obter justificação são mutuamente exclusivos. Adotar o legalismo significa negar a fé e rejeitar a graça. A relação da aliança exige fé absoluta da parte do crente. Não há outra maneira de ir ao Pai senão por Cristo (João 14:6; cf. Atos 4:12).

OBJEÇÃO No. 105: OS GUIADOS PELO ESPÍRITO NÃO PRECISAM DE LEI

ARGUMENTO: Paulo ensina que os que são guiados pelo Espírito não precisam mais da lei (Gálatas 5:18). Assim sendo, não há necessidade de Decálogo nem de sábado.

RESPOSTA: Essa é uma exegese não somente obtusa, mas também blasfema. Acusa o Espírito de Deus de induzir os homens à desobediência e à desordem. De maneira nenhuma! Paulo está simplesmente advertindo aos gálatas de que o Espírito Santo jamais leva os homens a buscar salvação pelo legalismo. Conforme já vimos ninguém é justificado pela prática da lei. O fato de a lei moral, porém,

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não servir como meio de salvação, não significa que não sirva como norma de conduta e código de ética. O fato de um martelo não servir para serrar madeira não significa que não sirva para cravar pregos na mesma madeira.

“Um exame do contexto em que a lei foi dada fornece pistas concernentes ao seu propósito. Primeiro, a lei foi dada no contexto de uma aliança graciosa. Deus havia feito um pacto com Abraão, pacto que a doação da lei nunca revogou (Gál. 3:17). Segundo, Deus graciosamente tirou Israel do Egito e tomou providências para o sustento do povo com maná e com outros milagres durante sua peregrinação no deserto. Terceiro, a lei foi dada depois de Israel, como um corpo de crentes, haver-se comprometido a servir ao Senhor (Êxo. 19:8). Portanto, a lei foi dada, não como um meio de justificação, mas como uma diretriz para viver depois do que Israel se comprometeu a servir ao Senhor” (Henry A. Virkler, Hermenêutica Avançada, pág. 105).

Os que se submetem a uma religião legalista estão em guerra com o Espírito, pois pretendem fazer o que somente Ele pode fazer: converter o homem e capacitá-lo a obedecer a Deus. Isso não quer dizer que o Espírito Santo seja contrário à lei. Muito pelo contrário, é Ele quem nos capacita a estar em harmonia com a vontade de Deus, expressa na Sua santa lei (Eze. 36:26-27 e Heb. 10:15-16). O resulado é a produção do “fruto do Espírito”, contra o qual não há lei, isto, é condenação (Gál. 5:22-23). Os que não andam no Espírito, mas na carne, são os transgressores da lei, conforme se vê no extenso catálogo de práticas pecaminosas alistado em Gál. 5:19-21, chamadas “obras da carne”, práticas estas que excluem a pessoa do reino de Deus. A vida no Espírito não é nem legalismo nem licença para pecar (ver João 14:15-17; Atos 5:32); 1 João 3:24).

OBJEÇÃO No. 106: A LEI DE CRISTO SUBSTITUIU A LEI DE DEUS

ARGUMENTO: Paulo ensina que a Lei dos Dez Mandamentos foi substituída pela Lei de Cristo (Gálatas 6:2). Isto desobriga os cristãos do sábado.

RESPOSTA: Lei de Cristo e Lei de Deus não são expressões antagônicas. O versículo está sendo interpretado erroneamente. Jamais foi intenção de Jesus estabelecer um novo código moral. Ele não viria à Terra para promulgar uma lei diferente e contrária à lei de Seu Pai. Não absolutamente! O que Ele fez foi

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esclarecer o espírito da lei, reformulando numa nova estrutura frasal certos princípios já existentes, mas que haviam sido esquecidos e negligenciados.

O Mandamento do Amor Mútuo. A expressão “lei de Cristo” é uma referência ao único mandamento formalmente promulgado por Cristo: o de amar-nos uns aos outros como Ele nos amou (João 13:34; 1 João 4:21). Quando amamos nosso próximo, ajudamos a levar as cargas dele, isto é, consideramos os seus problemas como se fosse nossos. Isto, como se vê, não é um preceito contrário aos Dez Mandamentos, mas perfeitamente harmônico com eles, visto que o princípio básico do Decálogo é o amor (ver Luc. 24:44; Rom. 13:10). Não há dicotomia entre lei e amor.

Resumo dos Mandamentos. A Lei Moral foi resumida em dez preceitos: O Decálogo (Êxo. 20:3-17). O Decálogo, por sua vez, foi condensado em dois grandes mandamentos: Amor a Deus e a amor ao próximo (Mar. 12:29-31); e esses dois foram ainda sintetizados em um só princípio: amor (Rom. 13:10). Esta era a lei de Cristo. “O único mandamento formal que nosso Senhor deu a Seus discípulos enquanto esteve na Terra foi ‘amar uns aos outros’ (ver João 13:34). . . . Assim, ‘a lei de Cristo’ é a epítome dos Dez Mandamentos, pois quando cumprimos essas leis, estamos amando de fato a Deus e ao homem (ver Mat. 22:34-40)” (SDA Bible Commentary).

Numa Única Palavra. “Quando o Filho de Deus sumariou a lei de Seu Pai, os Dez Mandamentos, fê-lo numa única palavra: Amor. A lei de Deus é a lei do amor. E podemos facilmente entender porque. Deus é amor. Nós também devíamos sê-lo, pois fomos feitos à Sua imagem. Ele quer que sejamos como Ele. Foi por isso que nos deu Sua lei. Ela nos diz em termos práticos o que significa amar, e como podemos provar nosso amor.

“Mas Jesus também nos disse que este amor deve ter duas dimensões: amor a Deus e amor ao homem. Um amor é vertical, o outro, horizontal. Foi como se Ele apanhasse as duas tábuas de pedra do Monte Sinai e escrevesse ‘Ame a Deus’ na primeira e ‘Ame ao Homem’ na segunda. Em outras palavras, Ele disse: Se você amar a Deus de todo o seu coração, alma e entendimento, você não terá outros deuses, não fará imagens de escultura, não tomará o nome de Deus em vão nem violará Seu sábado; e se você amar seu próximo como a si mesmo, não desonrará seus pais, não matará, não cometerá adultério, não roubará, não cometerá adultério, não roubará, não dirá falso testemunho nem cobiçará. Portanto há duas espécies de amor que Deus requer de nós em Sua lei: amor a

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Ele e amor aos nossos semelhantes” (Peter H. Eldersveld, Of Law and Love, págs. 75–79). — VER OBJEÇÃO 116 (MANDAMENTOS DE CRISTO).

EFÉSIOSOBJEÇÃO No. 107: SOMOS SALVOS PELA FÉ, NÃO PELA LEI

ARGUMENTO: Paulo afirma em Efésios 2:8 que somos salvos pela graça, mediante a fé. Isto elimina a necessidade de guardarmos a lei, inclusive o sábado.

RESPOSTA: Paulo não está querendo insinuar aqui que no AT as pessoas eram salvas pelas obras e que no NT são salvas pela graça. Desde o Gênesis até o Apocalipse, o método de Deus salvar o homem foi sempre o mesmo: pela graça mediante a fé.

Dom Gratuito. A salvação é um “dom gratuito” (Rom. 6:22), não condicionado a nenhum mérito humano. É uma expressão da atitude espontânea de amor da parte de Deus. No processo da salvação, podemos dizer que Deus toma a iniciativa de salvar quem não merece ser salvo: estende graciosamente através do abismo a mão poderosa com a dádiva (perdão, justificação e santificação) e nós, pelo impulso do Espírito, estendemos pela fé nossa mão vazia e impotente em direção à dádiva, crendo que receberemos o que Deus está ofertando. O preço da salvação é sempre o sangue de Cristo. As maiores e melhores boas obras que possamos fazer não entram nesse preço, nem mesmo como parte mínima.

Requer Obediência. A graça, porém, não nos isenta da obediência à lei de Deus. Pelo contrário, a existência da graça é uma das maiores provas de que a Lei está em vigor. Foi por causa de nossas transgressões da lei que a graça se

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tornou necessária, tanto para perdão de nossos pecados como para capacitação da obediência (Rom. 5:20). Ainda que as obras não sejam causa da salvação, são com certeza efeito delas (ver Rom. 3:31). A fé não anula a obediência. Pelo contrário, confirma a lei (Rom. 3:31). A verdadeira fé se manifesta em boas obras. Embora não seja um substituto da fé, a obediência é uma conseqüência natural e necessária da fé. Pelo fruto se conhece a árvore. A árvore é minha profissão de fé; o fruto são minhas ações. Se minha fé é genuína, meu fruto será obediência à lei. O fruto, no entanto, é posterior à árvore. Não é a maçã que faz da árvore de que surgiu uma macieira; é a árvore que faz seu fruto ser maçã. Portanto o fato de sermos salvos pela graça mediante a fé, sem as obras da lei, não significa que estejamos autorizados a transgredir a lei. — VER OBJEÇÕES 79, 80, 81 E 97 (A FÉ ANULANDO A LEI).

OBJEÇÃO No. 108: CRISTO ABOLIU OS MANDAMENTOS

ARGUMENTO: Paulo afirma em Efésios 2:14-15 que Cristo aboliu os mandamentos.

RESPOSTA: É verdade. Resta somente perguntar: Mandamentos de que lei? Duas Leis. Paulo fala da lei às vezes de maneira positiva e às vezes de

maneira negativa. Nesta passagem diz que Cristo “aboliu” a lei, mas em Romanos 3:31 diz que Ele a “estabelece”. Em Romanos 7:6 declara que fomos “libertados da lei”, mas seis versículos adiante afirma que “a lei é santa, e o mandamento santo, justo e bom” (Rom. 7:12). Em Romanos 3:28 ensina que “o homem é justificado pela fé, independentemente das obras da lei”, mas em 1 Coríntios 7:19 mostra que o que realmente importa é guardar os mandamentos de Deus.

Em vista dessa aparente contradição, concluímos o seguinte: ou Paulo estava louco quando escreveu suas epístolas e não estava falando coisa com coisa, ou (o que é mais provável) ele estava falando de duas leis diferentes: uma que foi abolida e outra que continua em vigor.

O segundo ponto de vista parece ser o mais racional, além de contar com o apoio da lingüística. Efetivamente Paulo reconhece em seus escritos a existência de um duplo sistema de leis religiosas: a lei cerimonial e a lei moral (1 Cor. 7:19).

Esclarecido este primeiro ponto. Descubramos agora qual foi a lei que Cristo aboliu. O primeiro conceito que precisamos admitir é o de que a Bíblia é

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intérprete de si mesma. O segundo conceito é o contido em Amós 3:7, segundo o qual Deus não fará coisa alguma sem antes revelar Seus segredos a Seus servos os profetas.

Não Se Refere ao Decálogo. Conforme o primeiro princípio, o próprio contexto da passagem é de grande ajuda. Comecemos lendo a passagem: “Porque ele é a nossa paz, o qual de ambos fez um; e, tendo derribado a parede da separação que estava no meio, a inimizade, aboliu, na sua carne, a lei dos mandamentos na forma de ordenanças, para que dos dois criasse, em si mesmo, um novo homem, fazendo a paz." Note que a expressão-chave para compreendermos a passagem é “parede de separação.” Qual foi a parede de separação que Jesus derribou com Sua morte? Se lermos atentamente Atos 15:1-10 e Mateus 27:51 teremos forçosamente que admitir que foram os aspectos cerimoniais e tipológicos da Lei que Jesus aboliu, a lei que ordenava a circuncisão (ver Gál. 5:1-3) e sacrifícios cruentos no Templo. Essas obrigações cerimoniais criavam uma parede (mesotoichon) de separação (phragmos)entre judeus e gentios, exatamente como o muro literal no Templo, que separava o pátio dos gentios do pátio dos judeus, destruído na queda de Jerusalém em 70 d.C.54

Vale a pena lembrar que a inimizade, mencionada por Paulo (v. 16), não foi criada pelo sistema cerimonial em si, mas pela interpretação que os judeus deram a ele, pelos acréscimos de regulamentos e pelas atitudes hostis e exclusivistas que eles adotaram como resultado e que serviram em muito para descaracterizar e até anular os preceitos divinos. Degenerou num sistema de salvação pelas obras.

Esta passagem, portanto, não fala do Decálogo, pois este nada contém que exija a separação entre judeu e gentio. A expressão "lei dos mandamentos na forma de ordenanças" que Cristo aboliu na Sua carne, isto é, não sacrifício do Seu corpo na cruz, deve ser entendida aqui, não como se referindo aos Dez Mandamentos, pois eles não prescrevem ordenanças (circuncisão, purificações, ou ritos sacrificais) nem erguem muro de separação entre pessoas, pois sendo de natureza moral não são discriminatórios, mas aplicáveis a toda a humanidade.

Refere-se à Lei Cerimonial. Conforme o segundo princípio, é razoável concluir que Deus revelaria aos Seus servos os profetas o que exatamente cessaria na cruz. Visto que os profetas do NT vieram depois de Cristo, temos que examinar o AT para encontrar o que cessou na cruz. Encontramos a resposta em Daniel 9:27, onde uma profecia referente ao Messias prediz que “na metade da

54 Josefo usa essas duas palavras gregas para referir-se à balaustrada do templo

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semana [na última semana profética de 490 anos, isto é, no ano 31 d. C., quando Jesus foi crucificado], fará cessar o sacrifício e a oferta de manjares.” A palavra “sacrifício” vem da palavra hebraica zebach, que significa “matar . . . um animal” (Strong’s 2077). A expressão “oferta de manjares” vem da palavra hebraica minchah, que significa “oferta sacrifical (geralmente incruenta e voluntária)” (Strong’s 4503).

“A lei abolida ou substituída por Cristo foi . . . evidentemente a lei cerimonial dos judeus, e não a lei moral (ver Rom. 3:31). Ao remover isto, Jesus removeu aquilo que se tornara ocasião de amargos ressentimentos entre judeus e gentios.” (The Pulpit Commentary sobre Efés. 2:15).

Como se pode ver, ambas as evidências nos mostram claramente que a única coisa que devia ser abolida na cruz seriam os sacrifícios e ofertas de manjares, elementos integrantes da lei cerimonial.55 Não devemos acrescentar mais nada a essa lista, sob pena de incorrermos em maldição (Deut. 4:2; Apoc. 22:18).

A lei cerimonial era transitória e devia cessar quando o verdadeiro “Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo” fosse imolado na cruz, como sacrifício perfeito, uma única vez para remissão de nossos pecados. Foi essa a lei que Cristo aboliu. — VER OBJEÇÕES 87, 94, 100 E 109 (JESUS ABROGOU A LEI).

COLOSSENSESOBJEÇÃO No. 109: OS DEZ MANDAMENTOS FORAM CRAVADOS NA CRUZ

55 F. W. Grosheide, Die Brief Van Paulus Aan De Efeziers, pág. 45.

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ARGUMENTO: Paulo ensina em Colossenses 2:14 que todas as leis do AT, inclusive o sábado, foram cravadas na cruz. Os cristãos estão, portanto, liberados da obrigação de observar a lei em geral e o sábado em particular. A decisão de guardar qualquer dia é pessoal, e ninguém deve condenar alguém por agir assim.

RESPOSTA: Apesar de sua antiguidade e popularidade, o ponto de vista de que Paulo ensina a abolição da lei nesta passagem não tem fundamento. Sustentamos que a lei cravada na cruz foi a lei cerimonial. Eis as evidências contrárias:

Nenhuma Alusão à Lei Moral. O "escrito de dívida" (v. 14) que foi inteiramente “apagado” (exaleipho) e encravado na cruz não se refere aos Dez Mandamentos. Esse procedimento não tem base contextual, lógica, teológica nem lingüística.

Não tem base contextual porque não existe em todo o contexto da carta a mínima alusão à lei moral nem à sua síntese: os Dez Mandamentos. Não tem base lógica porque não faria o menor sentido Deus, para perdoar pecados, destruir na cruz a lei que condena o pecado. Seria o mesmo que alguém passar um cheque numa vultosa quantia e, impossibilitado de resgatá-lo, tentar destruir o banco! Não tem base teológica porque contradiz todo o princípio da analogia da fé, segundo o qual as verdades da fé são coesas entre si.

Não tem base lingüística porque a palavra grega traduzida como "escrito de dívida" é keirographon (“certificado de débito”)56, termo que ocorre somente em Colossenses 2:14 e apresenta não um sentido legal, mas comercial. Trata-se de um registro de débito assinado com o próprio punho, equivalente ao que poderíamos chamar hoje de uma nota promissória (Moulton-Milligan, The Vocabulary of the Greek New Testament, pág. 687).

Diversas Alusões à Lei Cerimonial. O ponto de vista que parece estar mais em harmonia com o contexto subseqüente é o de que a passagem esteja se referindo à lei mosaica. Eis as evidências favoráveis.

Em primeiro lugar a similaridade deste texto com o fraseado de Efés. 2:15 e a natureza paralela dessas duas epístolas sugere fortemente que o “escrito de dívida” é a mesma “lei dos mandamentos na forma de ordenanças”. Mesmo porque a palavra dogmata, traduzido “ordenanças”, se refere às diversas leis e preceitos do sistema legal judaico que terminaram na cruz.

56 Bauer-Arndt-Gingrich Greek-English Lexicon, pág. 880.

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Em segundo lugar o escritor afirma que o que foi cravado na cruz foi o registro de nossos pecados. Visto que o sistema de lei que permitia os pecados ficarem registrados no santuário era o cerimonial com seus sacrifícios cruentos, entende-se por extensão que o que foi encravado na cruz foram as leis cerimoniais judaicas. O termo grego favorece esta interpretação, já que o mandamento do sábado não foi escrito por mão humana com papel e tinta (Êxo. 24:4-7; Deut. 31:24), mas pela mão de Deus em pedra (Êxo. 31:18; Deut. 19:10). E constituiria tarefa ingente cravar duas placas de pedra numa cruz, mas não papiro ou pergaminho, material utilizado como suporte de escrita para o código cerimonial.

Em terceiro lugar, a lei que era contra nós e nos prejudicava, não pode ser a moral, pois é considerada santa, justa e boa (Rom. 7;12). A única lei bíblica que era contrária a nós, porque continha “maldições e imprecações”, segundo Dan. 9:11, era a Lei de Moisés ou Lei Cerimonial. Não que Deus tivesse criado essa inimizade aqui descrita por Paulo. Foi a interpretação errônea dessa lei por parte dos judeus, junto com os acréscimos tradicionalistas a ela feitos e as atitudes hostis e exclusivistas que eles adotaram em decorrência, que fizeram da lei cerimonial um fardo insuportável para os judeus e um obstáculo intransponível para os gentios. Na verdade acabaram fazendo os rituais degenerarem num programa de salvação pelas obras (SDA Bible Commentary).

Em quarto lugar, o versículo 16 esclarece qual o conteúdo deste escrito de dívida: comidas, bebidas, festividades, Luas novas e sábados prefigurativos. Em que código constavam esses preceitos? O código cerimonial, sem dúvida. No Decálogo só há preceitos morais e éticos; nenhuma ordenança ritual.

Em quinto lugar, o pano de fundo histórico lança luz adicional sobre o assunto: “A igreja de Colossos (a exemplo das de Galácia, Éfeso, Roma e outras) enfrentava dissensões internas em virtude da ação conservadora dos elementos judaizantes, isto é, judeus que aceitavam o evangelho, ingressavam na igreja, mas conservavam práticas do judaísmo e pretendiam impô-las aos cristãos vindos do gentilismo. Entre estas práticas estava a observância da lei cerimonial, notadamente os dias de festa (Páscoa, Pentecostes, Dia da Expiação, Festa de Tabernáculos, Luas novas e outras). Também a circuncisão e a implicação com as carnes sacrificadas aos ídolos pelos pagãos, e que os judeus não admitiam fossem consumidas pelos cristãos. Como é natural, no passo que estamos considerando, Paulo quis dizer aos cristãos de Colossos que estas ordenanças e festividades foram riscadas ou cravadas na cruz. Tendo vindo Cristo, a Realidade,

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automaticamente cessaram os tipos e ‘sombras’ que para Ele apontavam” (. B. Christianini,Subtilezas do Erro, pág. 120)

Essa foi a lei que Cristo cravou na cruz. Esse era o registro que "nos era prejudicial"; e não a Lei que a Escritura mesmo afirma ser "santa, justa e boa" (Rom. 7:12). Concordam com essa interpretação comentaristas de primeira água como Adam Clarke, Albert Barnes, Dwight L. Moody, C. I. Scofield, entre outros.

É como o declarou John Wesley, fundador do metodismo, em seu sermão 25: "Esse ‘escrito de dívida’ [a lei cerimonial] nosso Senhor cancelou, removeu e encravou em Sua cruz (Col. 2:14). Mas, a lei moral, contida nos Dez Mandamentos e cuja observância foi encarecida pelos profetas, Ele [Cristo] não a anulou. Sua vinda não teve por propósito revogar parte alguma dessa lei. Esta é uma lei que nunca pode ser ab-rogada. . . . A lei moral funda-se num alicerce inteiramente diferente da lei cerimonial ou ritual. . . . Cada parte desta lei tem que permanecer em vigor sobre toda a humanidade, por todas as idades, sem depender de tempo ou lugar, ou quaisquer outras circunstâncias propensas à troca, senão da natureza de Deus e a natureza do homem, e sua insubstituível relação mútua" (Sermons on Several Occasions, vol. I, págs. 221-222). — VER OBJEÇÕES 87, 94, 100 E 108 (JESUS ABROGOU A LEI).

OBJEÇÃO No. 110: O SÁBADO ERA UMA SOMBRA

ARGUMENTO: Paulo dá a entender em Colossenses 2:16-17 que o sábado era uma instituição cerimonial, juntamente com as festas e as luas novas, e, portanto, apenas uma sombra, um tipo, que deixou de ter valor com a vinda de Cristo.

RESPOSTA: Leiamos o texto: "Ninguém, pois, vos julgue por causa de (1) comida [brosis] e (2) bebida [posis], ou (3) dia de festa [heorte, festa anual], ou (4) Lua nova [noumenia, festa mensal], ou (5) sábados [sabbaton, festa semanal], porque tudo isso tem sido sombra das coisas que haviam de vir”. Esta é a única vez, de todas as suas epístolas, em que Paulo menciona o sábado pelo nome.

Estaria ele realmente afirmando que o sábado semanal, a par das outras quatro práticas mencionadas no versículo, era uma coisa obsoleta e não mais necessária? Embora, à primeira vista, esta passagem pareça servir de suporte para a tese anti-sabatista, não era essa a intenção original de seu autor, como se

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demonstrará a seguir. Além disso, se essa interpretação for verdadeira, então a própria guarda do domingo também fica comprometida, já que o texto é abrangente: inclui na categoria de “sombra” não só o sábado, mas todos os dias.

A Linguagem de Paulo. Antes de analisarmos o texto em questão, é preciso relembrar uma advertência bíblica a respeito do estilo de escrever de Paulo: Nos escritos do apóstolo “há certas coisas difíceis de entender, que os ignorantes e instáveis deturpam, como também deturpam as demais Escrituras, para a própria destruição deles” (2 Ped. 3:15-16). A Bíblia não está afirmando que Paulo escreve coisas erradas, mas que o estilo literário dele é erudito, complexo e cheio de figuras de linguagem. Isso dá margem para que muitas vezes os textos paulinos aparentem dizer uma coisa quando, na verdade, o pensamento do autor é inteiramente diferente.

A Atitude de Paulo Para Com o Sábado. Em segundo lugar, devemos investigar na Bíblia qual a atitude de Paulo para com o sétimo dia, antes nos atirarmos para a conclusão de que ele está ensinado aqui a abolição do sábado. As Escrituras mostram claramente que esse não era um dia comum para o "apóstolo dos gentios". Em várias partes do livro de Atos, Paulo é encontrado descansando do trabalho semanal e adorando a Deus no dia de sábado (Atos 13:14, 42 e 44; Atos 17:2; Atos 16:13 e 18:1-4. Seria incoerente Paulo ensinar uma coisa e praticar outra. Portanto ele não pode estar dizendo que o sábado semanal é uma sombra.

Figura de Linguagem. Qual foi então a real intenção de Paulo ao escrever Col. 2:16-17? O contexto não deixa dúvida: ensinar aos crentes de Colosso, que estavam sendo vítima de ataques de judeus legalistas, que o sistema cerimonial judeu fora abolido com todos os seus elementos (manjares, libações e sacrifícios). A maneira como ele faz isso é que é sui generis. Depois de mencionar literalmente no versículo 16 as duas primeiras categorias de ofertas cerimoniais — manjares e libações (“comida e bebida” no texto) — o apóstolo lança mão de uma figura de chamada metonímia57 para introduzir a terceira categoria: os sacrifícios. Trocando o continente pelo conteúdo, Paulo enumera a tríade de festas do calendário judaico, quando na verdade quer-se se referir não às festas em si, mas aos sacrifícios realizados nestes dias.

57 Figura de retórica que consiste no uso de uma palavra fora do seu contexto semântico normal, por ter uma significação que tenha relação objetiva, de contigüidade, material ou conceitual, com o conteúdo ou o referente ocasionalmente pensado (Houaiss).

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A expressão trina “dias de festa, lua nova ou sábados” não foi cunhada por Paulo. Moisés é o autor deste hebraísmo (Núm. 28 e 29). Foi do livro de Números que os demais escritores bíblicos se serviram para usar, posteriormente, a expressão encontrada em Colossenses 2:16. Em todas elas, sem nenhuma exceção, a enumeração nada tem que ver à guarda desses dias em si, mas está sempre associada aos sacrifícios estipulados para estes dias. Pode-se perceber isto mais claramente nas seguintes passagens: 1 Crôn. 23:31; 2 Crôn. 2:4; 8:12-13; 31:13; Esd. 3:4-5; Nee. 10: 31-33; Isa. 1:13-14; Eze. 45:17; 46:1, 3, 4, 6, 9, 11 e 12; Osé. 2:11.

Todas as vezes que esses períodos sagrados são mencionados, o que se vê é uma progressão cronológica nas ofertas peculiares a cada festividades seja na ordem crescente, seja na decrescente: sacrifícios semanais (no sábado, 28:9-10), sacrifícios mensais (luas novas, 28:11-15) e sacrifícios anuais (Páscoa, Pães Asmos, Pentecostes, Expiação e Tabernáculo, 28:16-29:40; cf. Lev. 23). O foco, porém, nunca é o da obrigatoriedade do descanso nestes dias santos, mas a estipulação da qualidade e da quantidade dos animais que deveriam ser sacrificados nessas ocasiões.

Palavra-Chave. Prova adicional de que Paulo não estava se referindo ao sábado em si, mas aos aspectos rituais a ele relacionados é a palavra-chave sombra (skia, por oposição a soma, “corpo”), no verso 17. Paulo afirma ali que comida, bebida e os sacrifícios realizados nos dias santos, luas novas e sábados “são sombras das coisas vindouras”. Outra vez ele lança mão de uma figura de linguagem. Para mostrar que os sacrifícios do sistema cerimonial já haviam perdido sua função, Paulo utiliza a metáfora de um corpo projetando sombra. Uma sombra não tem substância nem valor ou vida. Sua existência depende de algo substancial (o corpo projeta a sombra). A sombra anuncia que a pessoa que a projeta logo chegará. Mas quando o corpo chega, a sombra já não interessa. Assim, “sombra” descreve bem os diversos elementos da lei cerimonial, já que essas coisas apontavam para o sacrifício de Cristo em realidade. O texto paralelo de Heb. 10:1, que utiliza fraseologia idêntica ao contrastar sombra e corpo é mais uma evidência de que a idéia focal de ambas as passagens são sacrifícios: “Ora, visto que a lei [cerimonial] tem sombra dos bens vindouros, não a imagem real das coisas, nunca jamais pode tornar perfeitos os ofertantes, com os mesmos sacrifícios que, ano após ano, perpetuamente, eles oferecem” (cf. 10:10).

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Não Pode Ser o Sábado. Neste sentido, Paulo dificilmente estaria aqui se referindo ao sábado em si, visto que o sábado do sétimo dia não é sombra de nada, mas realidade. Embora haja no sábado um sentido prefigurativo indireto, uma alusão ao descanso da graça (Heb. 4:9-10; Mat. 11:28-30), ele não aponta essencialmente não para um evento futuro, mas para um evento no passado: a criação do mundo em seis dias (Gên. 2:2-3; Êxo. 20:8-11). Não é cerimonial, mas memorial. Não é prefiguração, mas posfiguração.

À vista do exposto, devemos concluir que o objetivo de Paulo em Colossenses 2:16 era mostrar a presente ineficácia dos holocaustos, das ofertas de manjares e das libações oferecidas nos dias santificados, pois essas coisas eram apenas "sombra (prefiguração) das coisas que haviam de vir, porém o corpo (a realidade simbolizada pelos sacrifícios de animais) é de Cristo". Esse texto nada tem que ver com o repouso sabático. O fato de os "holocaustos" não serem mencionados explicitamente na passagem de Colossenses causa certa confusão no seu entendimento, mas eles devem ser subentendidos por metonímia (ver 1 Crôn. 23:31 para fraseado completo).

Embora a seqüência de termos e a evidência lingüística possam dar a impressão de que Paulo esteja falando dos sábados semanais, a forma retórica desta passagem não deve ter precedência sobre a lógica, o contexto e os fatos claramente estabelecidos em outras partes da Bíblia de que os tipos e símbolos que vigoraram até Cristo não incluem o sábado do Decálogo. Há aproximadamente 150 referências ao sábado nas Escrituras. A única aparentemente contrária ao sábado é Col. 2:16. Sete vezes as Escrituras nos advertem de que “pela boca de duas ou três testemunhas toda palavra será estabelecida” (ver Núm. 35:30; Deut. 19:15; 2 Cor. 13:1; Heb. 10:28). Portanto não podemos varrer 149 evidências como a uma teia de aranha, por causa de uma única passagem mal interpretada. É preciso estar sempre atento à analogia da fé, ou seja, à coesão das verdades da fé entre si e no projeto total da revelação.

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1 TIMÓTEOOBJEÇÃO No. 111: A LEI SÓ É PARA O MALFEITOR

ARGUMENTO: Paulo ensina em 1 Timóteo 1:9 que a lei é somente para o malfeitor. Neste caso, o cristão, ao ser justificado pela fé, já não está na obrigação de obedecer à lei, inclusive o sábado.

RESPOSTA: A pressuposição básica por parte de Paulo neste verso é de que as leis, à semelhança da polícia, não são feitas para as pessoas corretas, mas para as erradas. Alguns interpretam mal isto e acabam concluindo que o justo não precisa de lei. Não é bem assim, porém. O apóstolo não está ensinando que o cristão está desobrigado de obedecer aos Dez Mandamentos (ver Rom. 3:31). Jesus não veio liberar os homens da observância da lei moral, mas mostrar-lhes a possibilidade de obediência e dotá-los do poder necessário para a vitória sobre o pecado.

Embora a principal função da lei seja definir o pecado e convencer as pessoas de que elas são pecadoras e de que precisam de um Salvador, a lei também serve para regular a conduta. Assim como a polícia tem a função não somente de reprimir o crime, mas também de o prevenir, a lei atua na profilaxia do pecado. Neste sentido, a lei também é para os justos. Não para condená-los, porque a lei não condena quem anda retamente, mas para balizar-lhes o caminho a fim de que não se desviem. Embora para os malfeitores a lei represente condenação, para os justos é parâmetro comportamental. Gera paz e sabedoria (Sal. 119:165; 111:10).

Tanto isto é verdade que nos versículos subseqüentes, Paulo apresenta uma série de pessoas condenáveis à vista da lei: “transgressores e rebeldes, irreverentes e pecadores, ímpios e profanos, parricidas e matricidas, homicidas, impuros, sodomitas, raptores de homens, mentirosos, perjuros e para tudo quanto se opõe à sã doutrina.” vv. 9,10. Porque são condenáveis? Pelo simples fato de serem transgressores dos mandamentos. Os atributos dessas pessoas

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mostram visivelmente que a atitude delas se enquadra na desobediência à lei de Deus.

HEBREUSOBJEÇÃO No. 112: O SÁBADO FOI APENAS UM SÍMBOLO DE NOSSO

REPOUSO EM CRISTO

ARGUMENTO: O autor de Hebreus ensina no capítulo 4 desta epístola que o repouso do sábado foi apenas um símbolo de nosso repouso-salvação em Cristo. Quando a realidade deste repouso se cumpriu, o símbolo perdeu a vigência.

RESPOSTA: Sim, o repouso semanal do sábado serve, entre outras coisas, para ilustrar nosso repouso espiritual em Cristo: o repouso da graça. Para outros comentaristas, o capítulo 4 de Hebreus parece também apontar para o repouso cósmico que ocorrerá por ocasião da posse do reino de Deus. Estas funções simbólicas do sábado, contudo, não negam sua observância literal. Pelo contrário, até a enaltecem. Temos pelo menos duas razões para crer assim:

O Símbolo Precisa da Realidade Experiencial. Em primeiro lugar, o contexto mostra que Paulo não estava tentando convencer os cristãos hebreus a guardar o sábado, pois isso eles já faziam. Sua grande preocupação era levá-los a dar ao repouso físico (sabbatismos) uma amplitude maior, a saber, reconhecê-lo como símbolo do repouso espiritual (katapausis). Ora, este paralelo traçado por Paulo entre a observância literal do sábado e a experiência da salvação, longe de depreciar o sábado, só vem confirmar a importância do repouso literal. Afinal de contas, como pode o crente experimentar o repouso redentor

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AS FUNÇÕES DA LEI

A lei possui, segundo a Bíblia, sete propósitos ou funções:1) É revelador da vontade de Deus para a humanidade (Tia. 2:10; Mat. 19:17)2) É a base da aliança divina (Êxo. 20:1-24:8; Deut. 9:9)3) É padrão de julgamento (Sal. 119:172; Ecles. 12:13-14)4) É diagnóstico do pecado (Rom. 3:20; 7:7)5) É agente de conversão (Sal. 19:7; Gál. 3:24)6) É instrumento de libertação (Sal. 119:45; Tia. 2:8; 1:25).7) É redutor de maldições e doador ... (Sal. 89:31-32; Prov. 3:33; Lev. 26; Deut. 28)— Nisto Cremos, pág. 315-318.

simbolizado pelo ato de repousar no sábado (Heb. 4:9, gr. sabatismos58), se descarta a real experiência do repouso físico no sábado? É somente por meio da experiência provida pelos símbolos que conceitualizamos as realidades espirituais e delas nos apropriamos.

Se o cumprimento de um simbolismo espiritual tornasse desnecessária a observância física de uma ordenança, então não seria só o sábado que perderia o sentido, mas também o batismo e a ceia do Senhor. O batismo memorializa a morte de nossa velha natureza, enquanto o pão e o vinho da Ceia do Senhor são símbolos de nossa redenção pela morte expiatória de Cristo. Isto significa que devemos rejeitá-los? Evidentemente que não! Conservar o repouso sabático como símbolo de nosso repouso redentivo em Cristo e ao mesmo tempo negar sua observância real constituiria flagrante contradição. Assim sendo, o sábado também não deve ser descartado pelo fato de ser um símbolo do repouso espiritual da salvação.

O Repouso Permanece. Em segundo lugar, o autor de Hebreus afirma explicitamente que “resta um repouso [sabático] para o povo de Deus”. Heb 4:9. É como disseram Jamieson, Fausset e Brown, em seu monumental Commentary on the Whole Bible, “este verso ainda estabelece indiretamente a obrigação do sábado” (pág. 449). A permanência do sábado se deve ao fato de sua função simbólica ser necessária para ajudar o crente a conceitualizar e experimentar a realidade das três maravilhosas realizações divinas: criação, redenção e restauração final. A atual experiência do repouso sabático capacita o crente a apropriar-se da realidade tanto da criação-redenção passada como da restauração-reunião futura. Descartar um símbolo tão vital como esse significa privar os cristãos do mais eficiente veículo provido por Deus para entendermos e experimentarmos Seu amor criativo, redentivo e restaurativo (Samuele Bacchiocchi, The Sabbath in the New Testament, cap. 10, “Questions About the Sabbath”). — VER OBJEÇÃO 05 (SÁBADO SIMBÓLICO).

OBJEÇÃO No. 113: O SACERDÓCIO DE CRISTO EXIGE UMA NOVA LEI

ARGUMENTO: Hebreus 7:12 diz claramente que “quando se muda o sacerdócio, necessariamente há também mudança de lei.” Ora, se o sacerdócio levítico foi substituído pelo jesuânico, isto significa que a lei mudou, inclusive o sábado, que agora é o domingo.

58 Liddell e Scott, Lexicon.

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RESPOSTA: Concordamos com a afirmação. Mas perguntamos: que lei foi mudada, já que o termo “lei” é tão polissêmico na Bíblia? Não poderiam ser as Escrituras do Antigo Testamento, pois elas não podem ser anuladas (João 10:35). Não poderia ser o Pentateuco, porque Jesus confirmou sua vigência (Mat. 5:17). Não poderia ser a lei moral, pois esta é imutável (João 3:17). Que lei então foi abolida por Cristo?

“Mandamento Carnal”. Examinemos as características, apresentadas por Paulo no contexto, que nos permitem identificar a lei que foi mudada. A primeira pista se encontra no verso 16, onde ele denomina esta lei de "lei do mandamento carnal". O verso 10 afirma que esta lei consistia em manjares e bebidas, e várias abluções e justificações da carne". Em Hebreus 9:22 admite que essa lei está relacionada com a purificação pelo sangue. Em Hebreus 10:1 reconhece que essa lei era "sombra dos bens futuros". E em Hebreus 10:3 afirma que ela consistia em sacrifícios.

Que lei apresenta esses componentes? O bom senso e a teologia nos dizem que a lei mencionada por Paulo nos capítulos sete, oito, nove e dez de Hebreus, não é a lei moral dos Dez Mandamentos. A única lei que foi mudada, pois se relacionava com o sacerdócio levítico, foi a lei cerimonial (Heb. 7:11). Era esta lei que prescrevia que somente quem pertencesse à tribo de Levi podia ministrar no tabernáculo, e que somente os filhos de Aarão podiam ser sacerdotes (Núm. 25:13). Caso se fosse escolhido um sacerdote de outra tribo, seria necessário mudar a lei e estabelecer-se uma nova ordem de coisas (cap. 8:13).

Santuário Celestial. Hebreus 9:24 afirma que o santuário terrestre foi substituído pelo santuário celestial onde Cristo, nosso sumo sacerdote, compare “agora, por nós, diante de Deus.” Jesus era da tribo de Judá, e não de Levi, logo as leis do sacerdócio foram mudadas. O sacerdócio levítico, com efeito, cessou com a morte de Cristo. Jesus passou a oficiar como nosso sacerdote no santuário celestial naquele mesmo ano (31 d.C.). Ora, quando João teve uma visão do santuário celestial, quase sessenta anos depois da morte de Cristo, viu Jesus vestido como sacerdote e, dentro do Templo, a arca da aliança. Nenhum crente judeu da antiguidade podia pensar na arca sem pensar nos Dez Mandamentos, que estavam dentro dela contidos. O que isto sugere? Muito simples: a arca da aliança representa o trono de Deus que repousa em justiça (os Dez Mandamentos) e misericórdia (propiciatório). Isto sugere que os princípios do Decálogo continuam sendo o fundamento do governo de Deus (Heb. 9:24) e que

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“nas últimas horas da Terra, a grande lei moral de Deus será o centro da mente e da vida de todos os que servem a Deus em espírito e verdade” (SDA Bible Commentary, vol. 7, pág. 806). Portanto, a lei que foi mudada, não foi a dos Dez Mandamentos, mas, sim, a lei do sacerdócio. Os versos 13 a 19 deixam isso bem claro. — VER OBJEÇÕES 67, 106 E 116 (JESUS SUBSTITUIU A LEI).

OBJEÇÃO No. 114: A LEI NADAO APERFEIÇOOU

ARGUMENTO: A lei nada aperfeiçoa (Hebreus 7:19). Isto significa que não era uma lei perfeita e que não tinha poder para salvar. Era, portanto, inútil.

RESPOSTA: Note que Paulo não está afirmando que a lei é imperfeita, mas “que nunca aperfeiçoou coisa alguma”. A tensão é entre o ser e o fazer. A lei é perfeita na função para a qual foi criada, qual seja, para ser espelho moral. Você quebraria um espelho porque ele não consegue limpar seu rosto? Não; seria absurdo esperar que um espelho funcionasse como esponja, pois ele não foi fabricado com esse propósito. Assim acontece com a lei. Sua função não é salvar, mas apontar o Salvador e depois servir de norma para a avaliação do caráter dos salvos.

O fato de a lei não ter em si mesma nenhum poder para salvar não significa que a salvação estivesse inacessível às pessoas do Antigo Testamento. A perfeição era possível, sim, mas pelo mesmo método usado até hoje para alcançá-la — pela graça mediante a fé em Jesus. E a lei desempenhava — e ainda desempenha — importante papel nessa consecução: ela nos conduz a Cristo (Gál. 3:24). Depois, serve de norma de conduta para o redimido.

OBJEÇÃO No. 115: A ANTIGA ALIANÇA FOI REVOGADA

ARGUMENTO: Jesus guardou o sábado porque viveu sob a antiga aliança. A nova aliança efetivada pela Sua morte anulou a antiga. Visto que os Dez Mandamentos, dentro dos quais estava o sábado, eram o núcleo da antiga aliança (Hebreus 9:4), ao anular o antigo pacto, Jesus nos libertou da Lei Mosaica em geral e do quarto mandamento em particular (Hebreus 7:18-19).

RESPOSTA: Encontramos mais de 330 vezes nas Escrituras o termo “aliança” (“concerto”, na ARC). O assunto é tão importante que forneceu os títulos para as

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duas principais divisões da Bíblia. (Antigo Testamento que significa Antiga Aliança, e Novo Testamento que significa Nova Aliança). Dada a confusão reinante no meio evangélico, em sua grande maioria, de mentalidade dispensacionalista59 ou nova-aliancista, precisamos, pois, entender o assunto corretamente.

Definição de Aliança. Antes de entrarmos neste fascinante assunto, precisamos saber o que é uma aliança. Se bem que haja muitos tipos e formas, uma aliança pode ser definida como um acordo feito entre duas partes e que se baseia em promessas mútuas. Através dos séculos Deus tem lidado, de tempos em tempos, com Seu povo com base em alianças. Algumas vezes Ele estabeleceu pactos com indivíduos e algumas vezes com nações.

Aliança de Obras. A primeira aliança feita com o homem foi uma aliança de obras. Nessa aliança a vida eterna foi prometida a Adão e à sua descendência, sob a condição de completa obediência (Gên. 2:16-17; cf. Rom. 10:5; Mat. 19:17). O homem tinha plenas condições de cumprir esse pacto, pois não possuía natureza pecaminosa. Era santo e perfeito. Cristo e o Pai haviam, porém, estabelecido antes da criação uma aliança alternativa para fazer com o homem, caso ele viesse a cair em pecado (Efés. 1:4; Heb. 6:18). Esta aliança entraria em vigor no momento em que surgisse o pecado, embora só viesse a ser formalmente ratificada pela morte de Cristo na cruz.

Aliança de Graça. Adão realmente quebrou a aliança de obras quando desobedeceu a Deus (Osé. 6:7). Tornando-se o homem, pela Queda, incapaz de, em sua própria força, alcançar a vida eterna por meio da obediência à lei de Deus, o Senhor anulou a aliança de obras e estabeleceu a segunda aliança comumente chamada de aliança da graça. Fez isso com o segundo Adão, Cristo, novo representante da raça humana (Sal. 89:3; cf. Rom. 5; 1 Cor. 15:45-47), que se tornou fiador dessa aliança (Heb. 7:22).

Segundo esta aliança eterna, que deve vigorar até o fim, o Senhor oferece gratuitamente aos pecadores vida e salvação por meio da fé no sacrifício expiatório de Cristo. Já não é por obras, mas por graça mediante a fé. Embora Cristo tenha concordado em ser o substituto do homem, não veio morrer por eles imediatamente após o pecado. Conforme o estabelecido no plano da redenção, Ele só deveria tomar a forma humana e efetuar Sua missão na plenitude do tempo, ou seja, 4.000 anos depois de Adão. Mesmo assim Deus não deixou a raça humana na ignorância desta futura operação resgate. Logo que o pecado 59 Os dispensacionalistas interpretam a antiga e a nova aliança como representando dois diferentes planos de salvação para dois povos diferentes — Israel e a Igreja

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entrou no mundo, apresentou a nossos primeiros pais a aliança da graça. Contou pessoalmente a Adão que um de seus Descendentes seria o Messias, o Salvador da humanidade. Deus, através de Seu Filho, perdoaria pecados, ouviria orações, imputaria justiça, ressuscitaria da sepultura, garantiria o dom da vida eterna e estaria com eles para sempre (Gên. 3:15).

Para que os descendentes de Adão não esquecessem desta promessa, Deus instituiu, ainda no Éden, pelo menos em forma embrionária, o sistema sacrifical. Cada vez que alguém pecava devia realizar um ritual simples, mas de grande importância espiritual: confessar seus pecados e transmiti-los simbolicamente para um animal pela imposição de mãos na cabeça deste, sacrificá-lo e oferecê-lo em holocausto a Deus. Conforme esse ritual, uma vítima inocente substituía o pecador numa morte expiatória. Era encenado em poucos e impressivos movimentos a morte do verdadeiro Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. É por isso que se diz que Cristo é o “Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo”. Apoc. 13:8. Essa aliança, porém, só seria ratificada no futuro. Os que viveram antes da encarnação de Cristo, viveram por uma fé retroativa.

Renovação da Aliança da Graça no AT. Infelizmente a humanidade rejeitou essa aliança, tanto antes quanto depois do Dilúvio (Gên. 6:1-8; 11:1-9). Quando Deus ofereceu a aliança novamente, fê-lo por meio do pacto pós-diluviano com Noé e sua descendência (Gên. 9:9ss). Mas os descendentes de Noé também quebraram o acordo. Deus tornou a renovar Sua aliança, desta vez com Abraão, na promessa: “nela [no teu Descendente] serão benditas todas as nações da terra”. Gên. 22:18 (cf. Gên. 15:18; Atos 3:25-26). Esta promessa apontava para Cristo, no qual Abraão creu para o perdão dos pecados. Foi esta fé que lhe foi atribuída como justiça. Abraão e seus descendentes entraram nessa aliança pela circuncisão. Esta aliança, feita originalmente a Adão na fundação do mundo, e renovada posteriormente com Noé, Abraão, Jacó (Sal. 105:10), não sofreu, contudo, alteração. Os termos dessa aliança eterna (Jer. 3:20-21) jamais foram mudados ou suplantados. Não foram feitos somente entre Deus e os israelitas, mas entre Deus “e a Terra”. Gên. 9:13. Embora muitas outras alianças coadjuvantes ou secundárias tenham sido estabelecidas através da antiga dispensação, a singela providência de salvação pela fé permanece em vigor através de todas as eras para toda a humanidade.

Perversão da Aliança da Graça. Os descendentes de Abraão que foram escravizados no Egito perderam em grande parte o conhecimento de Deus e dos

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princípios da aliança abraâmica. Ao libertá-los do cativeiro, desejou Deus renovar com Israel no Sinai a aliança eterna estabelecida com Abraão. Moisés foi o mediador desta aliança. As pessoas entravam nessa aliança também pela circuncisão e ela foi ratificada pelo sangue de animais (Êxo. 24:8).

Paulo chama de “primeira aliança” (Heb. 9:1) o concerto de graça que Deus quis estabelecer com Israel no Sinai. Israel, porém, não compreendendo a fraqueza e pecaminosidade do próprio coração, perverteu esse concerto, transformando-a numa aliança de obras (Gál. 4:22-31; cf. Êxo. 24:7-8). Em vez de aceitarem a salvação pela fé no Messias, tentaram “estabelecer sua própria justiça” através das “obras da lei” (Rom. 9:30 a 10:4). Passaram a viver de acordo com a letra, não de acordo com o Espírito (2 Cor. 3:6). Entraram em condenação e escravidão. Assim perverteram a aliança do Sinai. Séculos depois, quando rejeitaram a Jesus como o Messias, os judeus anularam definitivamente a aliança com Deus, pondo fim à sua condição especial de povo escolhido (Dan. 9:24-27). Esta forma pervertida, designada pelo escritor de Hebreus como “antiga aliança”, precisava ser substituída por uma nova. Na verdade, os profetas do AT haviam predito essa renovação (Jer. 31:31-33).

Renovação da Aliança da Graça no NT. Esta de fato foi substituída por uma nova e superior aliança (ver Heb. 8:6-13). Deus fez uma nova aliança com os cristãos, o novo Israel espiritual, pela mediação de Cristo (Heb. 8:8; 9:15-17). Chama-se segunda aliança, mas na verdade é a antiga feita com Adão, Noé, Abraão, Jacó, Davi e toda a linhagem dos redimidos, apresentada em sua plena dimensão. (Jer. 11:10). Embora a aliança de Deus e Suas promessas permanecessem as mesmas, Ele escolheu um novo povo. O Israel espiritual ocupou o lugar da nação judaica (Gál. 3:27-29; 6:15-16). O sangue de Cristo ratificou a nova aliança (1 Cor. 11:25). As pessoas entram nessa aliança pelo batismo (Col. 2:11-12). Por meio dessa aliança Deus promete fazer aquilo que o Israel antigo quis fazer pelos seus próprios esforços e fracassou — obedecer a Deus pela fé. Como faz isso? Introduzindo pela graça a lei no interior do crente e a escrevendo em seu coração (Jer. 31:31-33). A mesma promessa feita a Adão (Gên. 3:14-15).

Ambas as Alianças Eram Por Graça. Incorre em grave erro que supõe que, no AT, as pessoas eram salvas pela obediência aos mandamentos de Deus, enquanto que no NT as pessoas são salvas pela fé em Cristo. Não, ambas as alianças eram por graça. Israel foi que entendeu errado.

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A bem da verdade, não existem duas alianças de graça, mas apenas duas dispensações60 da mesma aliança. A dispensação judaica é conhecida como primeira aliança e a dispensação cristã como segunda aliança (Heb. 8:7 e 13). Na verdade, tratava-se de uma só aliança eterna (Sal. 105: 10; 111:9; Isa. 24:5; Heb. 13:20), que não podia ser modificada nem anulada (Isa. 54:10; Sal. 89:34; Jer. 33:25).

Mesmo porque, se isto fosse verdade, abrir-se-ia um precedente para se questionar a coerência e justiça de Deus. Implicaria que Deus tem duas maneiras radicalmente diferentes de salvar o ser humano: com base na obediência humana na antiga aliança e com base na graça divina na nova aliança. Isto insinuaria que Deus aprendeu com a experiência de Seu povo escolhido, os judeus, que os seres humanos não conseguem obter a salvação por si mesmos porque tendem a desobedecer. De modo que Ele finalmente resolveu reformular a antiga aliança, criando uma nova segundo a qual a salvação é oferecida pela fé. Se essa idéia fosse verdadeira, isso faria Deus mutável e sujeito a aprender por ensaio e erro. A verdade, porém, é que Jesus é o mesmo ontem, hoje e sempre” (Heb. 13:8). A salvação sempre foi, tanto na antiga quanto na nova aliança, um dom divino e não uma conquista humana.

“O que estava errado? Apenas isto: O povo não podia cumprir a parte que tocava no acordo. A falta estava com eles. Possuíam mente carnal e não podiam estar sujeitos a uma lei santa e espiritual. Estavam procurando estabelecer sua própria justiça por seus próprios esforços, não compreendendo que sem o auxílio divino nada podiam fazer. Quando procuraram vestir-se com sua própria justiça, encontraram-se cobertos apenas por imundos trapos do pecado” (William H. Branson, Drama of the Ages, pág. 359).

Distinção Pactual. A principal diferença entre a antiga e a nova aliança, portanto, não é de métodos de salvação, mas de sombra versus realidade. A antiga aliança era típica; e a nova, antitípica (Heb. 9:9). Quando Cristo veio, foram revogados (Heb. 7:18), tornados antiquados (Heb. 8:13) ou abolidos (Heb. 10:9) todos os serviços levíticos relacionados com a antiga aliança. Alguns têm interpretado essas declarações como indicativas de que Cristo, pela Sua vinda, ab-rogou todas as leis do Antigo Testamento, inclusive o sábado. Esta interpretação ignora que essas declarações tratam do sacerdócio e serviço

60 Na teologia cristã, uma ordem divinamente estabelecida que prevalece em determinado período da história humana, ex.: dispensação mosaica (The New Oxford Dictionary of English).

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levítico da antiga aliança e não dos princípios da lei moral de Deus, que inclui o quarto mandamento.

Não São os Dez Mandamentos. Milhões de pessoas acreditam que a lei dos Dez Mandamentos estava contida nesta antiga aliança que desapareceu e que, portanto, os cristãos estão dela desobrigados. Mas será que está é uma posição bíblica? Não, o Decálogo não é a aliança. Ainda que a arca que receptava as tábuas da lei contendo os Dez Mandamentos fosse designada de “a arca da aliança” (Heb. 9:4), isso não quer dizer que a aliança se confundia com o Decálogo. Além disso, a arca também era chamada, alternativamente, de “arca do Senhor”, “arca de Deus” e “arca do testemunho”. (Jos. 3:13; 1 Sam. 4:11; Núm. 7:89). Chamava-se, contudo, “arca da aliança”, porque continha os termos. A propósito, João viu por volta do ano 100 d.C. a arca da aliança original no Céu, onde Jesus intercede por nós (Apoc. 11:19). Este é um argumento fortíssimo contra a abolição do Decálogo. Se os Dez mandamentos não estavam mais em vigor na dispensação cristã, por que o apóstolo viu o móvel celestial onde eram guardadas as tábuas da lei? Se não há lei, qual a razão da existência do seu receptáculo? Se a lei existe, nela está inserido o sábado, que continua sendo o sinal desta aliança eterna (Êxo. 31:16). — VER OBJEÇÕES 27 E 102 (ANTIGA ALIANÇA).

DIFERENÇAS ENTRE AS DUAS ALIANÇASAntiga Aliança Nova Aliança

Firmado no Sinai Firmado no CalvárioChamado de antiga aliança Chamado de nova aliançaChamado primeira aliança Chamado segunda aliançaEra temporário Era eternoConfirmado com sangue de animais Confirmado com o sangue de CristoEra falho Era perfeitoEstabelecido sobre a promessa do povo Estabelecido sobre a promessa divinaNão tinha mediador Tem MediadorNão fazia provisão para o perdão dos pecados

Faz provisão para o perdão dos pecados

Sob ela, a lei foi escrita em tábuas de pedra

Sob ela, a lei é escrita no coração

Condições: obedece e vive; desbodece e morre

Condições: Arrepende-te e serás perdoado; crê e serás salvo.

SEMELHANÇAS ENTRE AS DUAS ALIANÇAS

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Ambos são chamados aliançasAmbos foram ratificados com sangueAmbos foram feitos com base na lei de DeusAmbos foram feitos com o povo de DeusAmbos foram estabelecidos sobre promessas

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OS SETE SIGNIFICADOS ESPIRITUAIS DO SÁBADO:

1. É memorial da criação (Gên. 2:1-3)2. É símbolo de redenção (Deut. 5:15)3. É sinal de santificação (Êxo. 31:13; cf. Eze. 20:12,20)4. É sinal de lealdade (Apoc. 14:12 e 9)5. É ocasião de companheirismo (Gên. 3:8)6. É sinal de justificação pela fé (Heb. 4:9-10)7. É símbolo de descanso em Cristo (Mat. 11:29).

1 JOÃOOBJEÇÃO No. 116: OS MANDAMENTOS DE CRISTO NÃO SÃO OS MESMOS

DO DECÁLOGO

ARGUMENTO: Os mandamentos citados pelo apóstolo em 1 João 2:3-6 não se referem aos mandamentos do Decálogo, nos quais se acha incluído o sábado. A ordem é para guardarmos os “mandamentos” de Cristo.

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QUINZE FATOS INTERESSANTES SOBRE O QUARTO MANDAMENTO

1. É o mandamento de enunciado mais extenso: Temos duas palavras para o homicídio, o roubo, o adultério e poucas para o 1º, 3º, 5º, 9º mandamentos. Temos, no entanto, 98 palavras para o quarto preceito, que abrange um terço do Decálogo.

2. É o único mandamento que explica a razão por que devemos obedecer aos outros nove: porque Deus é o Criador. Ele distingue o Deus verdadeiro dos deuses falsos. Neste sentido, é um sinal de fidelidade a Deus e um antídoto contra a idolatria.

3. A observância do sétimo dia nega a alegação de Satanás de ser o príncipe deste mundo, porque o sábado é o monumento memorial da criação e testemunha de que Jesus é o Senhor desta Terra e tudo quanto nela contém.

4. É o único mandamento que alerta a humanidade sobre os riscos de esquecimento do preceito: “Lembra-te.”Ao estabelecer o sábado, Deus sabia de seu extraordinário valor para benefício do homem e sabia também que muitos dele descuidariam. Sabia que Satanás faria tudo que estivesse a seu alcance para que os homens esquecessem o sábado. Sabia que, com o tempo, os homens ignorariam a obrigação deste mandamento. Foi por estas razões que chamou atenção especial para este mandamento.

5. É o único mandamento que repudia a evolução, talvez por isso seja tão odiado por Satanás.6. Fica bem no meio das duas tábuas, no eixo e coração dos Dez Mandamentos, sendo

particularmente revelador do caráter divino.7. É o único memorial que associa os três fundamentos basilares da fé cristã: Criação, Queda e

Redenção.8. Assim como a lei de Deus ocupa posição central no concerto (Êxo. 34:27), assim o sábado,

posicionado no próprio coração da lei, ocupa lugar de destaque no concerto.9. É dos Dez Mandamentos o mais freqüentemente mencionado no Pentateuco (Êxo. 16:23; 20:8–11;

23:12; 31:12–17; 34:21; 35:1–3; Lev. 19:3; 23:1–3; 26:2; Deut. 5:14, 15).10. Liga como uma ponte o Céu e a Terra, servindo para dividir as obrigações para com Deus das

obrigações para com o homem.11. É o primeiro de dois mandamentos enunciado na forma positiva. O outro é o quinto mandamento.12. No texto hebraico original, o centro dos Dez Mandamentos é a frase: “o sétimo dia é o sábado.” 13. Karl Barth afirma: “o mandamento do sábado explica todos os outros mandamentos ou todas as

outras formas de um mandamento. Assim deve ser colocado na cabeça.” (Church Dogmatics, III, pág. 53).

14. O sábado desempenhava papel importantíssimo na fé do povo de Deus do AT. “Pode-se dizer sem exagero”, escreveu o ensaísta judeu Ahad Ha-‘Am, “que mais do Israel guardar o sábado, foi o sábado que guardou Israel.”

15. Segundo as profecias de Apoc. 12-14, o sábado será o ponto especialmente controvertido nos dias que precedem a volta de Jesus. A igreja remanescente de Deus será distinguida pela observância dos mandamentos de Deus (Apoc. 12:17), que inclui o mandamento do sábado. Ao mesmo tempo os poderes religiosos apóstatas exaltarão um falso sábado e exigirão lealdade a ele. Os homens serão então chamados a decidir-se entre o sábado do Senhor e o sábado substituto, ou primeiro dia da semana. A observância do sábado se tornará outra vez uma prova distintiva e constituirá um sinal ou selo dos verdadeiros adoradores.

RESPOSTA: A afirmativa em questão não procede. Existem fundadas razões para crermos que “mandamentos de Deus” e “mandamentos de Cristo” não são expressões antônimas, mas sinônimas:

(1) Sendo Jesus Cristo a segunda pessoa da Divindade, Deus Filho, Seus mandamentos não poderiam ser contrários aos mandamentos de Deus Pai. A própria teologia ortodoxa sustenta que o “Anjo do Senhor” que apareceu a Moisés sarça ardente (Êxo. 3:2) e no Monte Sinai (Atos 7:30) era o próprio Jesus. Não há, portanto, disparidade entre os mandamentos de Cristo e os mandamentos de Deus. O próprio Cristo afirmou: “Eu e o Pai somos um.” João 10:30 (ver João 17:22). E, tanto quanto saibamos, a Divindade não está dividida entre Si.

(2) Na mesma epístola, um pouco mais adiante (5:2-3) e seguindo a mesma linha de raciocínio, João menciona explicitamente os “mandamentos” como provenientes de Deus, lançando por terra assim o argumento de que este apóstolo fazia a distinção que os críticos do Decálogo pretendem estabelecer.

(4) Em 1 João 3:23 o apóstolo nos dá o resumo dos mandamentos de Cristo: “Ora, o Seu mandamento é este: que creiamos em o nome de seu Filho, Jesus Cristo, e nos amemos uns aos outros, segundo o mandamento que nos ordenou”. Ora, crer em Jesus é amar a Deus, súmula da primeira tábua do decálogo; amar ao próximo é resumo da segunda tábua. Mais uma vez ele equipara mandamentos de Cristo e mandamentos de Deus.

(5) Os mandamentos de Cristo realmente pareciam coisa nova para os judeus, mas só pelo fato de estes haverem esquecido, por suas práticas legalistas, os princípios espirituais da lei.

Em última análise, mandamentos de Deus e mandamentos de Cristo são a mesma coisa. O sábado, portanto, permanece. — VER OBJEÇÕES 67, 106 E 113 (JESUS SUBSTITUIU A LEI) E 106 (LEI DE CRISTO).

APOCALIPSEOBJEÇÃO No. 117: O DIA DO SENHOR É O DOMINGO

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ARGUMENTO: A expressão “dia do Senhor”, usada por João em Apocalipse 1:10, indica claramente que, perto do final do primeiro século, o domingo havia-se tornado o dia do Senhor. Até hoje essa é a expressão regular para domingo no grego moderno.

RESPOSTA: A locução adjetiva “Dia do [pertencente ao] Senhor” (kuriaké hemera) é encontrada apenas uma única vez em toda a Bíblia: Apoc. 1:10. Não deve ser confundida com a locução genitiva “dia do Senhor” (hemera kuriou ou hemera tou kuriou), usada para referir-se ao dia da volta de Cristo e equivalente ao yom YHWH do AT (Atos 2:20; 1 Cor. 5:5; 2 Cor. 1:14; 1 Tess. 5:2; 2 Tess. 2:2; 2 Ped. 3:10). A língua portuguesa, como a maioria das línguas analíticas modernas, não é capaz de fazer essa distinção sutil existente no grego. O inglês, graças a seu genitivo saxônico, encontrou uma solução para a dificuldade usando a construção Lord’s Day (Dia Senhorial) para a primeira e the Day of Lord (Dia do Senhor) para a segunda.

Essa expressão singular tem sido interpretada de, pelo menos, quatro maneiras diferentes: (1) domingo, (2) domingo da Páscoa, (3) vinda de Jesus e (4) sábado. Assumindo que a expressão se refira, conforme a interpretação mais consistente, não a um período escatológico de tempo, mas a um dia da semana (ao dia em que João teve a visão), que dia seria esse?

O Domingo. A opinião prevalecente nos círculos evangélicos afirma ser o domingo o dia do Senhor. A expressão é termo comum nos escritos dos pais da igreja para designar o primeiro dia da semana, sendo também no grego moderno termo técnico usado para designar o domingo. Essa é a razão porque muitos teólogos sustêm que kyriakê heméra nesta frase seja uma referência ao domingo. Segundo eles, João não somente recebeu sua visão neste dia, mas também o reconheceu como o “sábado cristão”, provavelmente pelo fato de Jesus haver nesse dia ressuscitado dentre os mortos.

O Método Histórico. Uma forte razão para rejeitarmos esse ponto de vista é o reconhecido princípio do método histórico, segundo o qual uma alusão só deve ser interpretada por meio de evidência anteriores a ela ou contemporâneas a ela, e não por dados históricos de um período posterior. E a expressão "dia do Senhor", usada para designar o domingo, não suporta este princípio, pois este dia não chamado por esse nome quando foi escrito o Apocalipse. Ou seja, o escritor definitivamente não pensava no primeiro dia da semana quando escreveu esta frase.

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João e o Primeiro Dia. Se a expressão já fosse conhecida no fim do primeiro século, quando o Evangelho e o Apocalipse de João foram escritos, era de se esperar que o apóstolo empregasse a mesma expressão em ambos os livros. No entanto, ao referir-se ao domingo em seu Evangelho, ele utiliza apenas a expressão “primeiro dia da semana”. Portanto, o fato de a expressão “dia do Senhor” ocorrer apenas no Apocalipse de João e não em seu evangelho — onde o primeiro dia é explicitamente mencionado junto com a ressurreição (João 20:1) e as aparições de Jesus (João 20:19, 26) — sugere que o “dia do Senhor” de Apocalipse 1:10 dificilmente poderia referir-se ao domingo.

A Tradição Humana. Como se vê, essa correspondência entre a expressão “dia do Senhor” e o domingo não se baseia em evidências internas do livro de Apocalipse ou do resto do NT, mas basicamente em três testemunhos patrísticos do segundo século: Didaquê 14:1, Epístola de Ignácio aos Magnésios 9:1 e o Evangelho de Pedro 35 e 50. Dos três, somente no livro apócrifo o Evangelho Segundo Pedro, datado da segunda metade do segundo século, o dia da ressurreição de Cristo é designado pela primeira vez pelo termo técnico kyriaké ("do Senhor”). Como este documento foi escrito pelo menos 75 anos depois de João ter escrito o Apocalipse, não pode ser invocado como prova de que a frase "dia do Senhor" no tempo de João referia-se também ao domingo. Sendo a língua um organismo vivo e dinâmico, não é de admirar a rapidez com que certas palavras mudem de sentido com o tempo. Como João não define qual o “dia do Senhor”, o significado desta locução só pode ser mais bem determinado neste caso recorrendo-se às Escrituras do que à literatura posterior.

A Verdade Bíblica. Em toda a Bíblia só existe um dia reconhecido tanto pelo Antigo como pelo Novo Testamento como o dia especial do Senhor: o sábado. Nenhum outro dia da semana é reclamado nas páginas sagradas por Deus como de Sua exclusiva propriedade. São doze as passagens em que Deus chama o sábado de “Meu santo dia” e o “santo dia do Senhor” (ver Êxo. 16:23; 20:10; 31:13; Lev. 19:30; 23:3; Isa. 58:13-14 Eze. 20:12, 13, 16, 20, 21, 24; Mar. 2:27) e uma em que Jesus afirma ser “Senhor do sábado” (Mar. 2:28). As declarações de Cristo encontradas nos evangelhos não contêm a expressão “dia do Senhor”, mas os sinóticos registram uma parecida: kyrios tou sabbáton, “Senhor do sábado” (Mat. 12:8; Mar. 2:28; Luc. 6:5). Temos, portanto, fundadas razões para crer que o dia em que João teve suas gloriosas visões apocalípticas foi, não um domingo, mas um sábado. É como disse Timothy Dwight, em sua Theology:

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Explained and Defended (1823): “O sábado cristão [domingo] não está nas Escrituras, nem foi chamado assim pela Igreja primitiva.”

OBJEÇÃO No. 118: NÃO HAVERÁ SÁBADOS NA NOVA TERRA

ARGUMENTO: Não havendo noite para marcar os limites do início ou do fim do dia (“duma tarde a outra tarde”), será impossível guardar o sábado na Jerusalém Celeste (Apocalipse 21:25).

RESPOSTA: A Bíblia não nos fornece elementos suficientes para conhecermos em detalhe este assunto, mas as escassas referências nos garantem que a sucessão de dias e noites não sofrerá solução de continuidade na Terra renovada, pois João viu os redimidos vindos de grande tribulação ficarem diante do trono de Deus servindo-O “de dia e de noite” no Seu santuário (Apoc. 7:14-15). Além disso, Gên. 8:22 promete que enquanto houver terra, não deixará de haver noite e dia.

Nova Jerusalém. A santa cidade, de fato, não terá período de trevas, porque será iluminada pela glória de Deus, por isso não precisará do Sol (Isa. 60:19; Apoc. 21:23). Isto não significa necessariamente que o Sol e a Lua não vão existir. Diz apenas que os remidos não vão precisar dessas coisas para lhes dar claridade. O fulgor da presença de Deus excederá em glória as fontes de luz naturais (Isa. 60:19, 20).

Ainda que o Sol não existisse, isso não seria problema para a contagem do tempo. Lembremo-nos de que, na semana da criação, o Sol só veio à existência no quarto dia. Mesmo sem a luz do Sol, aparentemente, nos três dias anteriores houve tarde e manhã (Gên. 1:1-19).

Alternação de Dia e Noite. O certo é que haverá, na Nova Terra, alternação de dia e de noite, conforme denotam as seguintes passagens:

1. “Criará o Senhor, sobre todo o monte de Sião e sobre todas as suas assembléias, uma nuvem de dia e fumaça e resplendor de fogo chamejante de noite ...” (Isa. 4:5).

2. “A luz da lua será como a do sol, e a do sol, sete vezes maior, como a luz de sete dias ...” (Isa. 30:26).

3. Jeremias afirma que as ordenanças do Sol e da Lua serão para sempre (Jer. 31:35-36).

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4. O apóstolo João, descrevendo a cidade santa, fala do “levante” e do “poente” (Apoc. 21:13, ARC). Ou seja, os pontos da esfera celeste situados respectivamente do lado do nascer e do ocaso dos astros. Diz ainda que a árvore da vida dará seu fruto de “mês em mês”. Apoc. 22:2. Ora se há mês, é porque há dia e há semana.

4. O próprio Isaías diz que "de uma Lua nova a outra (mensalmente) e de um sábado a outro (semanalmente), toda carne (pessoa) virá adorar" ao Senhor (Isa. 66:23).

Ainda que não houvesse astros, o sábado continuaria a existir, já que o ciclo semanal não depende de nenhum corpo celeste. Até o quarto dia da criação, quando o Sol, a Lua e as estrelas foram trazidos à existência, os dias foram marcados sem o auxílio desses corpos produtores de luz.

Logo, nenhuma dificuldade terão os habitantes da Nova Jerusalém para conhecer o início e o fim do sábado, mesmo porque estarão junto a Deus, o Criador deste descanso. O sábado é uma solenidade eterna. Será observada por todos na Nova Terra, como um eterno reconhecimento de Cristo como Criador, Mantenedor, Redentor e Recriador do Céu e da Terra.

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O SÁBADO E OUTRAS QUESTÕES

O SÁBADO E A CIÊNCIAOBJEÇÃO No. 119: O SÁBADO EXTRAVIOU-SE NO TEMPO

ARGUMENTO: Decorridos quase seis mil anos desde a criação, perdeu-se o cômputo do tempo, de modo que, devido a condições adversas coadjuvadas pelas várias mudanças de calendário, já não podemos saber ao certo qual seja atualmente o sétimo dia da semana.

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RESPOSTA: Esta é uma falácia que tem tranqüilizado a muitos na desobediência ao quarto mandamento. Se isto, porém, constituísse uma dificuldade real para o sabatista, sê-lo-ia também para os defensores do domingo. Mas não é este o caso, conforme veremos. O sábado não se perdeu no tempo nem sofreu solução de continuidade. Eis dez provas positivas que identificam o verdadeiro sábado hoje:

1. PROVA NÚMERO UM: BÍBLICAA Bíblia revela claramente que o ciclo semanal jamais se extraviou no tempo.

Ainda que em diferentes ocasiões tenha havido dificuldades, o ciclo semanal de sete dias permaneceu intacto através do relato bíblico. Senão vejamos:

a) Na criação (Gên. 2:2-3). b) Na época do Dilúvio (Gên. 7.4, 10; 8.10-12). c) Entre os patriarcas (Gên. 29. 27-28). d) Durante o cativeiro egípcio (Êxo. 15:26).e) Depois do Êxodo (Êxodo 16).f) No período dos juízes (Juí. 5:32). g)No tempo dos profetas (2 Reis 4:23; Isa. 53:2; Jer. 17:21; Eze. 46:1;

Amós 8:5 etc.).h) Durante o cativeiro babilônico (Nee. 9:13-15; 10:31; 13:15-22; Jer.

17:17-24; Nee. 13:15-18). i) No período interbíblico (ver Josefo, Livro XII, cap. VI; e 1 Mac. 2:32-38).j) No tempo de Cristo (Luc. 23:52-54, 55; 24:1-2).

O fato, porém, de em alguns períodos a Bíblia não mencionar o sábado pelo nome, como da Criação ao Êxodo ou de Moisés a Davi, não prova que o dia de repouso não tenha existido. Também os evangelhos omitem a vida de Cristo dos 12 aos 30 anos, mas isto não é prova de que Cristo não tenha existido naquele intervalo de sua vida.

2. PROVA NÚMERO DOIS: JUDAICAO povo judeu tem observado o sábado do sétimo dia desde o tempo de

Abraão, e ainda hoje o observa. Por volta do ano 70 d.C., expulsos de seu território, os judeus dispersaram-se pelo mundo até restabelecerem na Palestina

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um Estado judaico em maio de 1948, quando foi proclamado o Estado de Israel. Se o sábado se houvesse perdido no tempo, os judeus que migraram para a China estariam observando um dia, e os que foram para a Europa estariam observando outro. Mas não foi isso que aconteceu. Em toda parte, em todos os países da Terra onde existem judeus, os encontramos, durante a Idade Antiga, Média, Moderna e Contemporânea, sempre observando o mesmo dia da semana: o sábado. Pense bem: Toda uma raça, milhões de indivíduos reunidos ou espalhados em várias partes do mundo, livres ou escravos, têm feito um minucioso registro de sua festa sabática, semana após semana, com calendário ou sem calendário, com templo ou sem templo, durante mais de 4.000 anos. Seria praticamente impossível para eles perderem, como um povo, a contagem do tempo. Se analisarmos o ciclo semanal do calendário judaico, veremos que ele se encontra em exata coincidência com o de outros povos, no que diz respeito aos dias da semana.

3. PROVA NÚMERO TRÊS: LINGÜÍSTICANas línguas mais antigas, como o siríaco, o árabe, o assírio, o hindustâni, o

armênio, o persa, o turco, o malaio etc, o último dia da semana é chamado ou de sábado ou de dia de repouso. Um mapa semanal elaborado pelo Dr. londrino William Mead Jones com a cooperação de competentes lingüísticas mostra que 162 idiomas ou dialetos reconhecem a mesma ordem dos dias da semana e mais de 140 línguas do mundo a palavra usada para o sétimo dia é tem o mesmo sentido: sábado; o que é um forte testemunho tanto da conservação do sábado através dos séculos como da sua universalidade. (Ver Quadro 00)

4. PROVA NÚMERO QUATRO: RACIONALUma pessoa pode, talvez, acordar algum sábado pela manhã e pensar que é

sexta-feira e assim ficar esperando até o domingo para guardar seu sábado. Mas para o sábado ficar perdido, não apenas uma pessoa, mas todas as outras pessoas de sua rua, bairro, distrito, cidade, estado e país, bem como todas as pessoas de todos os outros países e ilhas do mundo teriam que acordar naquela mesma manhã com a mesma alucinação. Você acha que isso é possível?

5. PROVA NÚMERO CINCO: ASTRONÔMICAOs registros astronômicos e datas mais antigas concordam matematicamente com os cômputos dos astrônomos de hoje, de que o ciclo semanal jamais foi

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alterado em tempo algum. Os astrônomos modernos são unânimes em afirmar que, no mínimo, nenhum tempo se perdeu nos últimos 3.000 anos. “A raça humana jamais perdeu a seqüência setenária dos dias da semana, e o sábado desses últimos tempos chega até nós a partir de Adão, através dos séculos, sem um único lapso” (Dr. Totten, professor de astronomia da Universidade Yale). “A divisão da semana vem inalterável em milhares de anos” (M. Anders Donner, professor de Astronomia da Universidade de Helsinqui, Report on the Reform of the Calendar, 17 de agosto de 1926, pág. 51). O motivo é simples: “A semana é um período de sete dias, que não possui nenhuma relação com os movimentos celestes, circunstância à qual ela deve sua inalterável uniformidade” (Encyclopedia Britannica, art. “Calendar”).

6. PROVA NÚMERO SEIS: ARQUEOLÓGICARecentes descobertas de um calendário da antiga Babilônia, conforme visto

em inscrições nos tijolos entre as ruínas do palácio real, dão conta de que o ciclo semanal se baseava na divisão do tempo em semanas de setes dias (Easton's Revised Bible Dictionary).

7. PROVA NÚMERO SETE: CALENDAR A mudança do calendário juliano para o gregoriano conservou a ordem do

ciclo semanal.

8. PROVA NÚMERO OITO: REFERENCIALQualquer obra de referência digna de confiança (enciclopédias, dicionários,

almanaques, manuais dirá que o sábado é o sétimo dia da semana. O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa define o sábado como o “o sétimo dia da semana que tem início no domingo”. A célebre Encyclopedia Britannica diz: “o sétimo dia da semana”. Merriam Webster´s Collegiate Dictionary desce a pormenores quando define a palavra sabbath: “o sétimo dia da semana observado desde o anoitecer de sexta-feira até o anoitecer de sábado como dia de repouso e adoração por judeus e alguns cristãos”.

9. PROVA NÚMERO NOVE: ECLESIÁSTICADispomos da história da verdadeira igreja de Deus através dos séculos desde

Adão até hoje. Ele foi sempre uma igreja observadora do sábado, ainda que não

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tenha sido reconhecida como remanescente de Deus em algumas épocas de perseguição, marginalidade e clandestinidade (Apoc. 12:6).

10. PROVA NÚMERO DEZ: DIVINASe Deus é onisciente, como cremos que seja, seria absurdo supor que Ele

tenha exigido a observância de um dia, mas tenha permitido que este dia se extraviasse através dos tempos. Teria Deus abençoado e santificado um dia (Gên. 2:1-3), ordenado que fosse observado para sempre e depois permitido que se perdesse no tempo a ponto de ninguém mais poder guardá-lo? Não faz o menor sentido. Alguém que é maior dos líderes civis, militares ou eclesiásticos garantiu: "Enquanto a Terra durar, sementeira e sega, frio e calor, verão e inverno, dia e noite não cessarão”. Gênesis 8:22

Semana após semana, mês após mês, ano após ano, o sábado, com a precisão das estrelas, surge na Terra a cada sétimo pôr-do-sol. O sábado que hoje guardamos é, sem a menor sombra de dúvida, o dia de repouso originalmente estabelecido por Deus na criação. — VER OBJEÇÕES 30 E 129 (SÁBADO PERDIDO NO TEMPO).

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OBJEÇÃO No. 120: A MUDANÇA DO CALENDÁRIO ALTEROU O SÁBADO

ARGUMENTO: O calendário mudou tantas vezes que é impossível saber exatamente quando cai o sábado do sétimo dia.

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A PALAVRA SÁBADO

Praticamente quase todos os idiomas do mundo, inclusive os mais antigos, dão testemunho de uma semana de sete dias e se referem ao sétimo dia como o sábado.

NOME DO IDIOMA SÉTIMO DIAAfegão ShambaAlemão SamstagÁrabe AssabtArmênio ShapatAssírio SabatuBabilônio SabatuBohemio SobotaBornu (África Central) SibtaBúlgaro SubbotaCurdo ZambaEspanhol SábadoEtíope SanbatFrancês Samedi (dia sábado)Grego SabbatonHebraico ShabbathHindustani ShambaHúngaro SzombatInglês SabbathItaliano SabbatoLatim SabbatumLituano SubataMaba (África Central) SabMalaio Ari-Sabtu (dia sábado)Maltês IssibtPersa SambimPolonês SobotaPortuguês SábadoPrussiano SabáticoRomeno SabatRusso SubbotaSérvio SubotaSiríaco antigo ShabbathoTurco Yom-es-sabt (dia o sábado)Urdu Shamba

Dezenas de outros idiomas da Ásia, África, Europa e Oriente Próximo reconhecem o sétimo dia como o “dia do repouso”, “sábado” em variantes lingüísticas reonhecíveis. Para maiores detalhes, ver The Chart of the Week, preparada pelo Dr. William Meade Jones, em mais de 160 idiomas.

(c) Ampliado a partir de Family Heritage Books 1998

RESPOSTA: A objeção demonstra deconhecimento da questão. É bem sabido hoje que o sábado prossegue cumprindo o mesmo ciclo usado por Adão ou por Jesus quando esteve na Terra. Sempre caiu no sétimo dia da semana do nosso calendário. Jamais se perdeu no tempo. Contrariamente às errôneas concepções populares, as mudanças do calendário foram poucas (Não nos referimos, é claro, a reformas localizadas ou apenas simbólicas, como é o caso do calendário positivista, o da Revolução Francesa e outros assemelhados) e não afetaram em nada os dias da semana. Afetaram apenas a data. Examinemos a história:

O Calendário Judaico. O calendário judaico vem usando o ciclo semanal, desde os primitivos tempos bíblicos, por mais de 5.700 anos, e consigna o sábado. Ainda que os calendários das demais nações do Antigo Oriente fossem dessemelhantes quanto aos meses ou anos, eram, contudo, idênticos ao hebraico na divisão semanal.

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O Calendário Juliano. O calendário romano mais antigo é provavelmente o de Rômulo. Supunha um ano de 305 dias fracionado em 10 meses, a contar de março. Numa, sucessor de Rômulo, acrescentou dois meses, aumentando o ano civil para 365 dias. Quando Júlio César tornou-se imperador romano, pouco antes do nascimento de Jesus (101-44 a.C.) teve que ajustar o calendário civil ao astronômico, pois o inverno segundo o calendário astronômico estava adiantado em 90 dias. Assessorado pelo famoso astrônomo alexandrino Sosígenes, o imperador determinou, no ano 47, que esses 90 dias fossem retirado do calendário civil e ordenou que o sistema lunar fosse abandonado em favor do solar. Este calendário juliano tinha doze meses de duração arbitrária e um ano regular de 365 dias, que começam em 1° de janeiro. Também introduziu o uso de anos bissextos pela adição de um dia extra a cada quatro anos, para compensar a fração extra de um dia na duração do ano trópico. Isto aconteceu em 45 a.C. A ordem setenária dos dias da semana, porém, não foi alterada. Tanto é que no tempo de Cristo e dos apóstolos, os dias da semana judaica correspondiam exatamente aos dias da semana romana.

O Calendário Gregoriano. Desde o século treze os astrônomos começaram a detectar a inexatidão do calendário Juliano, que na realidade tinha alguns minutos a mais que o verdadeiro ano solar. Foram feitas propostas de retificação, mas o assunto não foi levado a sério. Em fins do século dezesseis a questão veio novamente à tona. Redescobriu-se que o ano juliano era um pouco mais longo do que o ano solar. Na verdade, o ano não tem apenas 365 dias e 6 horas como supunha o calendário juliano, mas 365 dias, 5 horas, 48 minutos e 46 segundos. Uma divergência de 11 minutos e 14 segundos por ano não parece ser grande, mas acumulada ano após anos, durante dezessete séculos, resultou num excedente de dez dias no calendário juliano. Isto fez com que, em 1582, o equinócio vernal ocorresse (11 de maço) dez dias antes do que havia ocorrido no tempo do Concílio de Nicéia em 325 d.C. A discrepância acumulada atrapalhava a determinação correta da data da Páscoa. Era interesse da igreja tomar alguma providência.

Em 1582, o papa Gregório XIII, aconselhado por astrônomos, em particular por Cristóvão Clávio e Luigi Lílio, depois de muito estudo, decidiu revisar o calendário anulando esses dez dias. Esta mudança não afetou a ordem dos dias da semana, só as datas dos dias do mês. Obtido o acordo dos principais soberanos católicos e, pela bula Inter Gravissimas, de 24 de fevereiro, o pontífice decretou a reforma do calendário, que passou, em sua homenagem, a chamar-se

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gregoriano. (Standard Encyclopedia of Worlds Knowledge, tomo 5, art. “Calendar”, pág. 360).

O novo calendário foi adotado em outubro de 1582. O dia 04 de outubro (quinta-feira) foi seguido do dia 15 de outubro (sexta-feira): Ou seja, alterou-se o dia do mês, mas não o dia da semana. A fim de evitar que esse problema voltasse a acontecer, o calendário gregoriano acrescentou um dia extra ao mês de fevereiro a cada quatro anos, conhecido como ano bissexto ou bissêxtil (366 dias), para compensar a incomensurabilidade entre os períodos de translação e rotação da Terra. Os países latinos (Espanha, Portugal e Itália) aceitaram o novo calendário imediatamente. A França esperou até dezembro daquele ano. Metade da Alemanha o adotou em 1583, enquanto a outra metada esperou até 1700, ano em que os Países Baixos, Suécia e Dinamarca também o adotaram. A Inglaterra não o aceitou até 1752. O restante dos países do mundo foi aceitando gradativamente, mas de tal modo que só o dia do mês era ajustado, e não os da semana. De sorte que em todos esses anos, quando era sábado na Espanha era sábado na Inglaterra. Os números ou datas do mês eram diferentes, mas os dias da semana permanciam os mesmos. No Brasil, então colônia de Portugal, que na época estava sob domínio da Espanha, o calendário gregoriano entrou em uso em 1582 (Enciclopédia Barsa, verb. “Calendário”). O calendário gregoriano está agora em uso geral na maior parte do mundo.

Outubro de1582

Domingo Segunda Terça Quarta Quinta Sexta Sábado

  1 2 3 4 15 16

17 18 19 20 21 22 23

Testemunho da Astronomia. W. J. Eckert, diretor do Observatório Naval, disse: "A troca do calendário Juliano para o Gregoriano, não afetou o ciclo semanal. Este ciclo não tem sido alterado pelos registros conhecidos".

“Pode-se dizer com segurança que nem um dia se perdeu desde a Criação e que, apesar de todas as mudanças de calendário, não houve interrupção no ciclo semanal” (Dr. Frank Jeffries, membro da Sociedade Real Astronômica e Diretor de Pesquisa do Observatório Real, em Greenwich, Inglaterra)

“Não houve nenhuma mudança em nosso calendário nos séculos passados que tenha afetado de qualquer modo o ciclo da semana” (James Robertson,

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Diretor das Efemérides Americanas, Departamento da Marinha, Observatório Naval dos EUA, Washington, D.C., 12 de março de 1932).

Além do calendário gregoriano, existem diversos outros sistemas calendares ainda em uso. Três dos mais antigos são o judaico, o muçulmano e o chinês. Embora possa divergir com o gregoriano na data, coincidem no dia da semana,

A Semana é Independente. Por que essa mudança não afetou o ciclo semanal? Porque, diferentemente do ano, do mês e do dia, a semana constitui uma unidade de tempo artificial, um ciclo independente, sem qualquer relação com as lunações e movimentos de translação e rotação da Terra.61 “A semana de sete dias não tem base astronômica. É possível que tenha se originado no Oriente Médio ou na Bíblia” (Compton's Interactive Encyclopedia, art. “Calendar”). Os três movimentos celestiais: a rotação diária de nosso globo em seu eixo, o circuito mensal da Terra pela Lua e a revolução anual da Terra e da Lua dependem dos astros, mas não existe nada nos ciclos normais da natureza que governe uma semana de sete dias. — VER OBJEÇÕES 30 E 119 (SÁBADO PERDIDO NO TEMPO).

OBJEÇÃO No. 121: O SÁBADO NÃO PODE SER GUARDADO POR CAUSA DOS FUSOS HORÁRIOS

ARGUMENTO: É impossível todos os habitantes da Terra guardarem o sábado num mundo esférico, pois quando são 18 horas de sexta feira em Brasília já são seis da manhã em Tóquio, mas ainda 13 horas na Califórnia. Isto significa que, quando os sabatista brasileiros começam a celebrar o sábado, já seus irmãos japoneses estarão doze horas adiante dentro desse período e seus irmãos norte-americanos cinco horas antes de chegar esse período.

RESPOSTA: Ocorre com essa objeção o mesmo que ocorre com a objeção da perda da contagem semanal através dos séculos. Pois se o sábado não pode ser observado num mundo esférico com muitas zonas de tempo, tampouco o pode o domingo. A despeito de tudo isso, ainda é possível guardar o sábado num mundo esférico. A explicação é a seguinte:

Os Fusos Horários. Vivemos num mundo em que o tempo é rotacional, isto é, onde um dia é medido pela revolução do planeta em torno de seu eixo, em relação ao Sol. Isso faz com que o planeta apresente diferentes horários à 61 Encyclopedia Britannica, art. “Week”. Cf. W. O. Carver, Sabbath Observance, págs. 34-35.

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medida que o astro-rei caminha em torno da linha dos pólos. A partir da linha de Greenwich, adotada por convenção como o meridiano zero, o Sol avança na razão de quatro minutos para cada grau de longitude em direção a leste. Isto significa que a cada intervalo de 15 graus temos uma hora completa. À vista disso, o tempo solar médio local vai depender do lugar do planeta onde estamos. Se estivermos em determinado momento em Sydney, na Austrália, pode ser meio-dia de sábado para nós, enquanto no Brasil naquele mesmo momento ainda é dez da manhã de sexta-feira, pois a diferença de fuso horário é de 14 horas.

Sábado Local. É com base nesse fenômeno que a objeção alega ser impossível a humanidade guardar concomitantemente o sábado em todo o planeta, visto que o dia não começa ao mesmo tempo em todas as partes do mundo. Quem assim argumenta se esquece de um detalhe crucial: O mandamento não ordena que o sábado seja guardado simultaneamente em todos os lugares da Terra. Simplesmente ordena que os seres humanos guardem o sétimo dia, quando este dia chegar para eles. Este sétimo dia pode chegar mais cedo ou mais tarde, dependendo do lugar do planeta em que estejamos. Mas o certo é que ele chega. E a obrigação moral de guardá-lo só é imposta quando ele chega para mim. A semana no Japão é de sete dias como no Brasil, e os dias são também de 24 horas. Não devemos perder de vista o fato de que o tempo é um fenômeno localizado. O Senhor aceita toda a obediência de cada criatura que Ele fez, de acordo com as circunstâncias do tempo no mundo caracterizado pelo nascer e pelo pôr-do-sol. Os rabinos da época de Cristo conheciam o fenômeno dos fusos horários e conviviam com ele muito bem. Há até um caso citado por Edersheim, de uma cidade, Tibérias, que começava a observância do sábado meia hora mais cedo do que em Jerusalém, e da cidade de Séforis, nas proximidades de Nazaré, que o fazia meia hora depois.62 Como se vê, a observância do tempo sagrado deve ser local e não universal. “É o sábado do Senhor, onde quer que habiteis”. Lev. 23:3b, CNBB. — VER OBJEÇÕES 122 E 123 (IMPOSSIBILIDADE DE GUARDA).

OBJEÇÃO No. 122: O SÁBADO NÃO PODE SER GUARDADO POR CAUSA DA LINHA INTERNACIONAL DE DATA

ARGUMENTO: Quando viajamos em redor da Terra, perdemos ou ganhamos um dia. Isso constitui um sério impedimento à observância exata do sábado.

62 Alfred Edersheim, The Temple.

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RESPOSTA: Linha internacional de data é a linha imaginária que corta o globo em ziguezague do norte para o sul, coincidindo aproximadamente com o antimeridiano de Greenwich, através do Oceano Pacífico, Kiribati, Samoa Ocidental e Tonga. A linha de data é necessária porque a Terra é dividida em 24 zonas de tempo de uma hora (de 15° de longitude cada) que configuram um dia inteiro. Por convenção internacional, esse meridiano determina a mudança de data civil em todo o planeta. Cada novo dia calendar começa no meridiano 180°. Visto que a Terra gira no sentido do leste, quando as pessoas viajam na direção do oeste ou do leste, precisam acrescentar ou diminuir um dia à sua contagem do tempo quanto ultrapassam essa linha. Isso acontece porque o tempo em nosso planeta é rotacional.

Ganho e Perda Aparentes. O problema pouco freqüente da linha de data, porém, não constitui dificuldade para a observância do sábado. Devemos entender que a perda ou ganho de um dia não é real, mas apenas aparente. A questão aí não é de ganho ou perda de tempo, mas de contagem. Quer você altere a data para o dia anterior ou posterior à sua partida, a hora no entanto é a mesma nas duas zonas. Os viajantes que chegam às ilhas do Pacífico, vindos do oriente ou do ocidente, devem adotar o dia das pessoas que habitam essas ilhas. É preciso lembrar-nos de duas coisas importantes, ao considerarmos a questão da linha internacional de data:

As Revoluções Marcam os Dias. "São as revoluções da Terra que assinalam os dias, não o número de vezes que se viaja ao redor dela." Arnaldo B. Christianini, Subtilezas do Erro, pág. 155. Imagine dois irmãos gêmeos, um viajando em direção a oeste em redor do mundo e o outro em direção a leste. Se um realmente perdesse um dia e outro ganhasse um dia, então depois de uma volta ao mundo, um estaria dois dias mais velho que seu irmão. Se eles fossem capazes de viajar num veículo tão rápido que pudesse dar 3.650 viagens ao redor do planeta, à noitinha um deles teria idade suficiente para ser pai do outro! Isto é ridículo, mas ilustra o absurdo a que leva esse raciocínio.

Dias Não Simultâneos. Num planeta redondo e giratório, como o nosso, o sétimo dia não pode ser observado simultaneamente em todos os pontos do globo. O princípio da observância do sábado consiste em observar o sétimo dia quando ele chega na parte da Terra onde nos encontramos. "A qualquer país que cheguemos em nossas viagens, encontramos todas as pessoas ali . . . de perfeito acordo quanto aos dias da semana. . . Perguntai-lhes, individual ou

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coletivamente, quando chega o sétimo dia da semana, e todos darão a mesma resposta. Não importa se alguém está no Pólo ou no Equador, nem se viaja por mar ou por terra, nem se se dirige para o Oriente ou para o Ocidente; o dia é determinado espaço de tempo absolutamente fixo em qualquer parte da superfície da Terra." F. D. Nichol, Objeções Refutadas, pág. 31.

OBJEÇÃO No. 123: O SÁBADO NÃO PODE SER GUARDADO NOS PÓLOS

ARGUMENTO: Se o sábado começa e termina no pôr-do-sol, conforme Lev. 23:32, não é possível guardar esse dia nos pólos, já que nessas regiões há meses inteiros em que não se vê o Sol (inverno) e meses inteiros em que o Sol nunca se põe (verão).

RESPOSTA: Alguns acham que a dificuldade de se guardar o sábado nas regiões polares seja uma evidência de que o sábado era apenas instituição local, passível de ser guardado apenas numa nação com um território tão reduzido como a Palestina, país próximo do equador, onde a distinção entre o dia e a noite era e ainda é bem definida. Visto não haver, nos pólos, pôr-do-sol que indique quando se deve começar e acabar a guarda do sábado, seria de fato uma dificuldade para um observador do sábado que ali habitasse (Levítico 23:32). Esta, porém, é uma dificuldade mais aparente do que real. Não invalida o princípio do pôr-do-sol ao pôr-do-sol.

Adaptações da Regra. Notemos em primeiro lugar que o quarto mandamento não desce a pormenores a respeito da regra. Esta ausência no quarto mandamento de instruções precisas sobre a maneira e o tempo exatos da observância do sábado mostra a sabedoria divina em formular um princípio que pudesse ser adaptado a diferentes culturas e localizações geográficas.

Repare que Levítico 23:32 não diz que o sábado devia ser guardado em toda a extensão da Terra seguindo apenas o critério do ocaso do sol. O parâmetro do pôr-do-sol é uma regra geral (mesmo porque a densidade demográfica dos pólos é comparativamente insignificante, e a esmagadora maioria da humanidade vive em relativa proximidade do equador, em regiões que possuem dias e noites bem definidos). A regra, porém, pode comportar exceções, ou melhor dizendo, aproximações e adaptações. Neste sentido, a solução para as regiões polares é ampliar o significado do pôr-do-sol (método normativo do início e término do sábado) para que inclua os fenômenos de transição de tempo naturalmente

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observáveis característicos dessas regiões, tais como “o fim do crepúsculo”, “a diminuição da luz” e “o momento em que o sol se encontra mais próximo da linha do horizonte.”

Observância do Sábado no Ártico. Pessoas que vivem nas latitudes temperadas estão acostumadas ao fato de que o ocaso do sol varia de 15h00 ou 16h00 no inverno a 21h00 ou 22h00 no verão. Nos lugares mais próximos do Círculo Ártico (ou Antártico), a variação é similar, embora varie de meio-dia no solstício de inverno a meia-noite no solstício de verão. Nas regiões abaixo do Círculo Ártico, porém, nunca há um período de 24 horas de trevas nem de 24 horas de sol e sempre que o sol se põe na sexta-feira é o início do sábado.

Instruções Cronológicas. Várias recomendações têm sido sugeridas para os observadores do sábado que vivem em regiões árticas. A prática mais recomendada por uma equipe de peritos sabatistas é a de que “durante o período invernoso quando não há pôr-do-sol, o sábado seja iniciado e terminado na mesma hora que começou e terminou quando o último pôr-do-sol ocorreu”.

Outras alternativas aceitáveis, durante o inverno quando não há pores-de-sol, são

(a) Guiar-se pelo fim do crepúsculo (ou início da escuridão) conforme indicado pelas tabelas astronômicas;

(b) Guiar-se pelos cômputos astronômicos para o momento em que o sol estiver mais próximo do horizonte ou em seu zênite, na sexta-feira, até que volte a este ponto no sábado;

(c) Iniciar e encerrar o sábado durante o período invernoso quando não há pôr-do-sol no norte do Círculo Ártico no mesmo tempo indicado pelos calendários de pôr-do-sol no sul do Círculo Ártico ("Time for Beginning the Biblical Seventh-day Sabbath", Associação Geral dos Adventistas do Sétimo Dia [7 de julho de 1977], pág. 8-9). Portanto, como se vê, embora o ciclo de pôr-do-sol mude nas regiões polares, a contagem do sábado não se perde.

OBJEÇÃO No. 124: O DIA COMEÇA À MEIA-NOITE, E NÃO NO OCASO DO SOL

ARGUMENTO: O dia começa cientificamente à meia-noite e não no ocaso do Sol. É assim que se conta a passagem do tempo em todo o mundo.

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RESPOSTA: É verdade que, em quase todas as nações do mundo, atualmente, o dia civil começa à meia-noite, hora local. Isto não significa, porém, que o costume de registrar a duração do dia a partir da meia-noite de um meridiano de referência seja científica, correta ou aprovada por Deus. Iniciar o dia à meia-noite é apenas uma convenção humana. Deus, que é o Criador dos corpos celestes e que os pôs em movimento para sinalizar a passagem do tempo (Gên. 1:14), conta os dias de uma maneira diferente: de uma tarde a outra.

O Pôr-do-sol é a Demarcação Divina. Segundo a Bíblia, o Sol, ou “o luzeiro maior”, é o astro encarregado de sinalizar os dias. (Gên. 1:14). Isto está de acordo com a ciência que reconhece ser o dia uma volta completa da Terra em torno de si mesma. A indicação natural de quando se fecha esse circuito de 24 horas é obviamente o pôr-do-sol, e não a meia-noite, conforme abundante e explícita evidência bíblica. De acordo com o relato do Gênesis, os dias começam e terminam na hora em que escurece. Ao definir quando se devia guardar um dos sábados anuais, o Dia da Expiação, Deus fixou um princípio que se aplica também ao sábado semanal: “de uma tarde a outra tarde” (Lev. 23:32; cf. Dan. 8:14, 26). Outra forte evidência bíblica adicional é Juí. 19:9, onde se diz claramente que o dia acaba ao entardecer e no entardecer. É exatamente esta a demarcação do dia estabelecida por Deus, ao regular o começo do dia quando criou o tempo na semana da criação.63

Os Romanos Mudaram. Qualquer enciclopédia dirá, qualquer livro de história confirmará, que sempre foi costume encerrar-se e iniciar-se os dias ao pôr-do-sol até alguns anos depois de Cristo. O livro Sunday in Roman Paganism, de Leo Odom, traz exaustivas provas de que os romanos começaram a iniciar o dia à meia-noite a partir do início da era cristã. Esse fato explica a aparente discrepância entre João 19:14 (onde Pilatos apresenta Jesus aos judeus na hora sexta) e Mar. 15:25 (onde o mesmo fato é dado como tendo acontecido na terceira hora). Mesmo assim, até o oitavo século, o domingo era observado no pôr-do-sol (Charlemagne, Capitularia ([Leis] Capitulárias), in Monumenta Germaniae Historica: Leges, Vol. 1, págs.. 57, 71.

“O método de calcular o domingo de pôr-do-sol a pôr-do-sol continuou a ser observado em alguns lugares até o décimo sétimo século, mas, em geral, a contagem de meia-noite a meia-noite tem sido adotada desde a Idade Média” (The Catholic Encyclopedia, art. “Sunday”).

63 The New Schaff-Herzog Encyclopedia of Religious Knowledge.

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Roma importou da Mesopotâmia a meia-noite para início do dia, desde o oitavo século antes de Cristo; a cristandade adotou a prática universalmente desde o estabelecimento do calendário gregoriano. Como se vê, os cristãos herdaram do paganismo, não somente o primeiro dia da semana — o dia do Sol — como dia de guarda, mas também o método de computar o dia (Dan. 7:25). Na observância de um dia falso, como o domingo, um método falso de computar o tempo não influi nem contribui. Mas na observância do verdadeiro dia do Senhor — o sábado do sétimo dia — deve-se adotar o método bíblico, divino, para não incorrermos no pecado de profanar a quarta parte do tempo sagrado e santificar a quarta parte do tempo comum.

A Meia-Noite Não é Prática. Não bastassem todos esses argumentos, ainda temos um: a passagem do dia à meia-noite também não é uma opção prática nem facilmente mensurável. Diferentemente do método divino que utiliza o fenômeno natural do ocaso do Sol como indicação física da passagem do dia, não existe na natureza nenhum referencial para assinalar a chegada da meia-noite. A Lua não se põe nem nasce à meia-noite. Sem contar o inconveniente que é ficar acordados até altas horas, se quisermos dar as boas-vindas ao novo dia. Não; os métodos divinos são sempre e definitivamente os melhores.

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O SÁBADO NA HISTÓRIAOBJEÇÃO No. 125: A IGREJA APOSTÓLICA DE JERUSALÉM MUDOU O

SÁBADO PARA O DOMINGO

ARGUMENTO: Acredita-se de maneira geral que a Igreja Apostólica de Jerusalém encabeçou o movimento para abandono da observância do sábado e adoção da observância do domingo. Sendo a Igreja de Jerusalém a igreja mãe da cristandade era a única dotada de autoridade para efetuar uma mudança dessa natureza.

RESPOSTA: Uma acurada investigação histórica mostra que a adoção da observância do domingo não foi promovida pela igreja de Jerusalém por iniciativa apostólica para comemorar a ressurreição de Cristo, mas na Igreja de Roma, centro de gravidade do cristianismo do segundo século, em resultado do concurso de diversas circunstâncias.

Segundo o Dr. Samuele Bacchiocchi, essa mudança ocorreu em resultado de uma determinada combinação de circunstâncias. Podemos citar pelo menos três delas.

Medidas Antijudaicas Estatais. Em Roma, a capital do Império, desenvolveram-se fortes sentimentos antijudaicos, os quais se tornaram ainda mais fortes com o passar do tempo. De tempos em tempos romanos adotavam medidas políticas e econômicas de caráter repressivo contra os judeus. O imperador Cláudio, por exemplo, por volta de 54 d.C., expulsou os judeus de Roma, inclusive os cristãos judeus Aqüila e Priscila (Atos 18:2). Naquela época, não se fazia distinção entre judeu e cristão, e ambos sofreram igualmente sob Cláudio.

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Durante a década de 60 d.C., o sentimento antijudaico culminou na destruição de Jerusalém e do templo em 70 d.C. O imperador Vespasiano aboliu o sumo sacerdócio e o Sinédrio e proibiu a adoração no Templo. Com essas medidas pretendia conter o ressurgimento do nacionalismo judeu.

O principal fator que contribuiu para mudança do sábado para o domingo foram as extremas medidas repressivas adotadas pelo imperador Adriano contra a religião judaica em geral e o sábado em particular como reação à Segunda Revolta Judaica contra Roma, conhecida como revolta de Barkosheba (132-135 d.C.)64. Segundo historiadores da época, mais de dois milhões de judeus foram executados somente na Palestina entre as duas guerras (70 e 135 d.C.). Jerusalém se converteu numa colônia romana. Os judeus (inclusive os judeus cristãos) foram expulsos do país. Adriano promulgou uma série de medidas proibindo a prática do judaísmo e a observância do sábado em todo o império.

Como resultado dessa revolta, os judeus ficaram desacreditados por todo o Império Romano, segundo se depreende dos comentários antijudaicos de escritores residentes ali como Sêneca, Pérsio, Petrônio, Quintiliano, Marcial, Juvenal e Tácito. Nos escritos desses residentes de Roma ridicularizava-se os aspectos sociais e culturais do judaísmo, especialmente a observância do sábado e a circuncisão, como exemplos de superstição degradante.

Fuga da Perseguição. Para evitar a perseguição que se seguiu aos judeus, encontramos os cristãos romanos cada vez mais preconceituosos com relação a qualquer identificação com eles. Reagindo às medidas repressivas do Estado, os cristãos romanos fizeram o que era conveniente: adotaram a posição de acomodação com o Império Romano e começaram a praticar o que se chamou de antijudaísmo de diferenciação, uma espécie de apartheid entre cristãos e judeus. Não querendo ser confundidos com os judeus pelas autoridades imperiais, abandonaram algumas práticas que tinham em comum com os judeus e desenvolveram uma nova identidade que rompia seus laços com o judaísmo.

Fizeram isso principalmente alterando a data e a forma de observar duas festas judaicas características: o Sábado e a Páscoa. Mudaram o sábado semanal para o domingo, adotado por ser o dia mais popular da semana planetária romana. Alteraram também o dia da celebração da Páscoa judaica, de 14 de nisã (que podia cair em qualquer dia da semana) para o primeiro domingo (fixo) depois da lua cheia do equinócio de março.

64 Hiley H. Ward, Space-Age Sunday.

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Busca da Popularidade. Mas a perseguição foi apenas um fator. Diferentemente das igrejas orientais, a Igreja de Roma era composta em grande medida de crentes gentios (Rom. 11:13). Isto desde cedo foi um fator diferenciador entre cristãos e judeus. O desejo de aceitação e popularidade foi igualmente responsável pela indiferença que logo se transformou em apostasia. A Igreja percebeu rapidamente a vantagem de se comprometer com o paganismo. E as vantagens da popularidade que viriam com o influxo de novos membros do mundo pagão? Para tornar seu convite mais interessante, por que trazer para a igreja alguns dos populares costumes pagãos? Tal fusão de costumes não iria fazer com que os pagãos se sentissem à vontade na Igreja? Por que não adotar o dia pagão de festança? Assim foi feito. Assim começou a erosão gradual da pureza da igreja primitiva.

Para consolidar a separação entre cristãos e judeus e favorecer a aproximação entre cristãos e pagãos, a Igreja de Roma lançou mão de outros expedientes de natureza teológica, social e litúrgica: começou a disseminar pela pena65 e pela voz que o sábado era apenas uma instituição judaica,

Foi Sixto, o bispo ou ‘papa’ da igreja cristã de Roma, quem começou o processo que levou à transferência do dia de adoração do sábado para o domingo. Ele convenceu os cristãos a celebrar a ressurreição no domingo. O outro ato importante aconteceu em 200 d.C. quando o papa Victor procurou reforçar a observância anual do domingo da ressurreição pela excomunhão de todos quantos não seguissem o plano. No ano 321 Constantino promulgou a primeira lei ordenando o descanso no sábado. No ano 386 Teodósio I proibiu litígios no domingo. Teodósio II, no ano 425, proibiu atividades esportivas e funcionamento de circos e teatros no domingo. E o terceiro Sínodo de Orleans, em 538, proibiu toda espécie de trabalho rural. Enquanto isso o sábado era rebaixado, como um dia de jejum e tristeza, dia em que era terminantemente celebrar a Ceia do Senhor.66 Estas medidas são discutidas com maior profundidade no capítulo 6 de From Sabbath to Sunday, de Samuele Bacchiocchi.

Substituição Gradual. À medida que o sábado ia sendo gradualmente denegrido, o domingo era promovido como substituto prático. Por que o domingo, e não qualquer outro dia da semana? Sem dúvida devido à popularidade e influência que a veneração do Sol por parte dos pagãos mitraístas do império trazia consigo. Era a escolha lógica e faria os cristãos distintos dos 65 Foi por essa época que apareceu um gênero de literatura “cristã” contra os judeus (“Adversus Judaeos”). Os pais da igreja adotaram o preconceito antijudaico dos romanos, veiculando-o em seus escritos.66 Mark A. Finley, The Almost Forgotten Day, págs. 44-46.

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judeus e mais parecidos com os romanos. Os líderes da igreja, porém, precisam de uma justificativa racional e “cristã” para a adoção do domingo. Não encontrando na Bíblia nada que pudesse apoiar seu ponto de vista, inventaram as razões infundadas de Cristo haver ressuscitando também nesse dia. “Mas, estranho como possa parecer, nenhum autor do segundo e terceiro séculos jamais citou um único texto bíblico como prova da autorização de ser observar o domingo em lugar do sábado. Nem Barnabé, nem Inácio, nem Justino, nem Irineu, nem Tertuliano, nem Clemente de Roma, nem Clemente de Alexandria, nem Orígenes, nem Cipriano, nem Vitorino, nem qualquer outro autor que tenha vivido próximo ao período em que Jesus vivera, conhecia qualquer instrução a respeito, deixada por Jesus ou por qualquer texto bíblico.”

Os vários bispos de Roma, por ser esta cidade a capital do Império e estarem eles mais em sintonia com as atitudes do mundo romano, adquiriram poder e preeminência na igreja. Pressionaram os outros bispos a aceitar o domingo, no que foram bem-sucedidos. Evidência disto é que, por diversos séculos, os cristãos da Ásia continuaram a guardar o sábado, ou o sábado e o domingo juntos.

Do segundo ao quinto séculos, à medida que crescia a influência do domingo, os cristãos continuaram a observar o sábado em praticamente todos os lugares do Império. Sócrates, historiador do quinto século, escreveu: “Praticamente todas as igrejas do mundo celebram os sagrados mistérios no sábado, todas as semanas, embora as igrejas cristãs de Alexandria e Roma, por conta de algumas tradições antigas, tenham deixado de fazê-lo”.

No quarto e quinto séculos, muitos cristãos adoravam tanto no sábado quanto no domingo. Hermias Sozomen, outro historiador desse período, escreveu: “O povo de Constantinopla e praticamente de todos os demais lugares, reúnem-se no sábado, bem como no primeiro dia da semana, costume este nunca observado em Roma ou Alexandria.” Essas referências indicam a liderança de Roma no processo de abandono do sábado como dia de guarda.

Mesmo em Roma uns poucos continuaram a fazer isso por algum tempo. Foram, porém, mortos. O poder dos bispos de Roma cresceu. Cristãos dali obtiveram a aprovação dos imperadores. E quando o novo dia de guarda ganhou, no quarto século, reconhecimento oficial e sanção sob Constantino, tudo acabou para aqueles que buscavam permanecer fiéis aos ensinos da Palavra de Deus. Foram impostas primeiro as leis dominicais de natureza civil, depois vieram as de caráter religioso.

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O processo de mudança do sábado67 para o domingo não se iniciou, portanto, logo após a morte de Jesus, pela autoridade apostólica da Igreja de Jerusalém, visando comemorar a ressurreição de Cristo; mas cerca de cem anos depois da morte de Cristo e trinta e cinco anos após a morte do último apóstolo, pela autoridade da Igreja de Roma, com o propósito de facilitar a identificação e integração dos cristãos com os costumes e ciclos do Império Romano.

OBJEÇÃO No. 126: OS PRIMITIVOS CRISTÃOS COSTUMAVAM REUNIR-SE AOS DOMINGOS

ARGUMENTO: Os primitivos cristãos tinham o costume de reunir-se no domingo.

RESPOSTA: É verdade que os primitivos cristãos passaram a realizar cultos no primeiro dia da semana em honra da ressurreição de Cristo. A introdução desse feriado religioso dominical, porém, não substituiu a observância do sábado como dia santo. Ambos os dias foram observados, lado a lado, durante séculos: o sábado como um mandamento bíblico e o domingo apenas como feriado religioso não ordenado pelas Escrituras e que não prescrevia abstenção de trabalho.

“Primitivamente reuniam-se [os cristãos] no domingo de manhã, porque o domingo não era um dia feriado, mas sim um dia de trabalho normal como os demais. . . . Partilhavam de uma merenda religiosa e em seguida retornavam ao seu trabalho, para os labores da semana” (The Watchamn Examiner, 25 de outubro de 1956).

“Até o segundo século [cem anos depois de Cristo] não encontramos em nossas fontes a menor indicação de que os cristãos assinalavam o domingo por qualquer espécie de abstenção do trabalho” (W. Rordorf, Sunday, pág. 157).

“O antigo sábado permaneceu e foi observado pelos cristãos da Igreja do Oriente [na área próxima à Palestina], durante mais de trezentos anos após a morte do Salvador” (Prof. E. Brerwood, Learned Treatise of the Sabbath, pág. 77).

O fato, porém, de os primitivos cristãos reunirem-se aos domingos não prova que o sábado moral tivesse sido substituído. Pelo contrário, a não ser em Roma,

67 A Bíblia revela que a observância do domingo como instituição cristã tem sua origem no ‘mistério da iniqüidade’ (2 Tess. 2:7), o qual já se encontrava em operação nos dias de Paulo. Por meio das profecias de Daniel 7, Deus revelara que ia se levantar um poder religioso que iria “mudar os tempos e a lei”. Dan. 7:25. A mudança fora, portanto, profetizada, com séculos de antecedência. Mas não foi só a mudança que foi profetizada: Isa. 56 e 58 prediz também a restauração do sábado nos últimos dias por meio de um remanescente.

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a observância do sábado era bastante difundida.68 Costumamos hoje também ter outros dias da semana além do sábado e do domingo como cultos oficiais da igreja, mas nem por isto esses outros dias se tornam dias santos. Mesmo porque tradições e costumes, ainda que cristãos, não podem anular um mandamento explícito de Deus.

OBJEÇÃO No. 127: OS PRIMITIVOS CRISTÃOS NÃO GUARDAVAM O SÁBADO

ARGUMENTO: Não há evidências históricas de que os primitivos cristãos guardavam o sábado.

RESPOSTA: Embora alguns eruditos presumam que a fuga dos cristãos, de Jerusalém para Pela, bem como o impacto psicológico da destruição do templo no ano 70 d.C. tenha desabituado os cristãos palestinos dos costumes judaicos inclusive da observância do sábado, esta suposição é desacreditada pelos documentos históricos.

Testemunhos Históricos da Época. Tanto Eusébio quanto Epifânio, primitivos historiadores cristãos, nos informam que a igreja de Jerusalém, após o cerco de Jerusalém no ano 70 até o reinado de Adriano em 135 d.C., era composta e administrada por judeus convertidos, “zelosos em insistir na observância literal da lei” (Eusébio, Historia Ecclesiastica 3, 27, 3; cf. 4, 5, 2-11; Epifânio, Adversus Haereses 70, 10, Patrologia Graeca 42, 355-356).

A existência da observância do sábado também é atestada pelas primeiras referências pós-testamentária à observância do domingo. Barnabé, em sua epístola (130-138 d.C.) sugere que o domingo começou a ser observado em adição (e não em substituição) ao domingo. Justino Mártir, escrevendo de Roma por volta de meados do segundo século, diferencia dois tipos de observadores do sábado (Dialogue with Trypho 47). Outro documento conhecido como Martírio de Policarpo, datado de 120 d.C., relata que a morte desse mártir ocorreu num “dia da festa de sábado” (8:1). Encontramos outra evidência histórica num sermão do teólogo alexandrino do terceiro século Orígenes (Homily 23, on Numbers, Patrologia Graeca 12, 749-750.

68 O Papiro Oxyrhynchus (c. 200-250 d.C.) diz: “A menos que façam do sábado um sábado real, não verão ao Pai”. Pt.1, p. 3, Logion 2, versos 4-11. Igualmente na Constituição dos Santos Apóstolos (Ante-Nicene Fathers, vol 7, pág. 413), do terceiro século, diz: Guardarás o sábado, por causa dAquele que cesso Sua obra de criação, mas não cessou Sua obra de providência. É um descanso para a meditação da lei.”

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A evidência mais concludente em favor da existência da observância do sábado na primitiva cristandade é fornecida pela seita judaico-cristã dos nazarenos. A maioria dos eruditos considera estes cristãos como descendendo diretamente da primitiva comunidade de Jerusalém, os quais, de acordo com o historiador palestiniano Epifânio, bispo de Salamis (c. A. D. 315-403), conservou a observância do sábado até o quarto século (J. Danielou, The Theology of Jewish Christianity, pág. 56).

Na verdade tanto os escritos do Novo Testamento69 como a primitiva literatura cristã contêm indicações implícitas e explícitas da existência da observância do sábado no primeiro século.

Testemunhos Históricos Posteriores. A maioria dos historiadores da igreja reconhece esse fato. Examinemos o que dizem alguns a respeito do assunto ao escreverem sobre o período coberto desde o primeiro até o quarto século:

1. “A primeira igreja cristã, estabelecida em Jerusalém pela autoridade apostólica, tornou-se em sua doutrina e prática um modelo para a maior parte das que foram fundadas no primeiro século. . . . Todos os cristãos concordavam em celebrar o sétimo dia da semana em conformidade com os convertidos judeus” (Hugh Smith, History of the Christian Church, págs. 50,51,69).

2. “Os primitivos cristãos tinham grande veneração pelo sábado, e costumavam passar o dia em devoção e sermões. E não é de duvidar-se que tenham derivado essa prática dos próprios apóstolos como a esse respeito se lê em vários textos” (Dr. T. H. Morer, Dialogues on the Lord’s Day, pág. 189).

3. “O sábado constituía um forte vínculo que os unia com a vida de todo o povo e, ao santificar o sábado, seguiam não somente o exemplo, mas também o mandamento de Jesus” (Geschichte des Sonntag, págs. 13-14).

4. “Praticamente todas as igrejas do mundo celebram os sagrados mistérios [Ceia do Senhor] no sábado de cada semana, embora os cristãos de Alexandria e Roma, por conta de algumas tradições antigas, tenham deixado de fazê-lo” (Sócrates Scholasticus, Ecclesiastical History, livro 5, cap. 22 in Nicene and Post-Nicene Fathers, vol. 2, pág. 132. [Escrito pouco depois de 439 d.C]).

5. Eusébio, falando a respeito do cerco de Jerusalém por volta do ano 70 A.D., diz: "Então a semente espiritual de Abraão fugiu para Pella, do outro lado do Jordão, onde encontraram um lugar seguro de refúgio e onde podiam servir a seu Mestre e guardar o Seu sábado” (Eusebius's "Ecclesiastical History, b, 3, cap. 5).

69 Jesus guardava o sábado (Luc. 4:16); Maria e as outras santas mulheres guardavam o sábado (Luc. 23:54-56); os discípulos guardavam o sábado (Mat. 24:20); Paulo guardava o sábado (Atos; 13:14; 17:2; 18:4); João Evangelista guardava o sábado (Apoc. 1:10).

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6. “Os primitivos cristãos tinham grande veneração pelo sábado e passavam o dia em devoção e sermões. Não é de se duvidar que tenham adquirido esta prática dos próprios apóstolos, conforme aparenta de vários textos para o propósito” (Dialogues on the Lord’s Day, pág. 189 [Londres:1701], Dr. T. H. Morer).

7. “Os antigos cristãos eram muito cuidadosos na observância do sábado ou sétimo dia. . . . É claro que todas as igrejas orientais bem como a maior parte do mundo, observava o sábado como uma festa. . . . Atanásio semelhantemente nos diz que eles realizavam suas assembléias religiosas no sábado, porque estivessem infectados com o judaísmo, mas para adorar Jesus, o Senhor do sábado; Epifânio diz o mesmo” (Antiquities of the Christian Church, Vol. II. Book XX, chap 3, Sec. 1 66.1137, 1138).

8. “Os cristãos primitivos realmente guardavam o sábado dos judeus. . . Isto continuou até o tempo do Concílio de Laodicéia” (The Whole Works of Jeremy Taylor, vol. IX, pág. 416).

9. “Desde o tempo dos apóstolos até o Concílio de Laodicéia, realizado por volta do ano 364, a santa observância do sábado judaico continuou, como se pode provar pelo testemunho de muitos autores: sim, apesar do decreto contrário do concílio” (Sunday a Sabbath, John Ley, pág. 163 [Londres: 1640]).

10. “Durante alguns séculos, os cristãos viveram o domingo apenas como dia do culto, sem poderem juntar-lhe também o significado específico de descanso sabático. Só no século IV é que a lei civil do Império Romano reconheceu o ritmo semanal, fazendo com que, no dia do sol, os juízes, os habitantes das cidades e as corporações dos diversos ofícios parassem de trabalhar" (João Paulo II, Carta Apostólica Dies Domini, 64).

Como se vê, portanto, os primitivos cristãos não guardavam o domingo. Foi somente no ano 364, quase três séculos depois de Cristo e dos apóstolos, que o domingo adquiriu prestígio dentro de um cristianismo já infectado pelo paganismo. — VER OBJEÇÕES 45 E 127 (DISCÍPULOS VIOLANDO O SÁBADO).

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OBJEÇÃO No. 128: A PALAVRA DOMINGO SIGNIFICA “DIA DO SENHOR”

ARGUMENTO: A palavra “domingo” vem de Dominica, termo latino que significa “dia do Senhor”. Essa é uma evidência histórica de que o domingo é o dia do Senhor.

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QUARENTA FATOS A RESPEITO DO DOMINGO

1. O primeiro fato que se registra na Bíblia a respeito do domingo, o primeiro dia da semana, é que se trata de um dia comum de trabalho (Gên. 1:1-5). Esta determinação veio do próprio Criador. Se Deus fez a Terra no primeiro dia da semana, será um ato de impiedade trabalhar aos domingos?

2. Deus ordenou que os homens trabalhassem no primeiro dia da semana ao incluir esse dia no pacote de “seis dias” de trabalho (Êxo. 20:8-11). É errôneo obedecer a esta ordenança de Deus?

3. Nenhum dos patriarcas jamais guardou o domingo (Êxo. 20:8-11).4. Nenhum dos santos profetas jamais guardou o domingo.5. Por mandato expresso de Deus, Seu povo usou o primeiro dia da semana como um dia comum de trabalho

durante pelo menos 4.000 anos.6. Deus mesmo inclui o domingo dentro do conjunto dos seis dias de trabalho (Eze. 46:1).7. Deus não descansou neste dia.8. Deus nunca abençoou este dia.9. Cristo não descansou neste dia.10. Jesus foi carpinteiro (Mar. 6:3) e trabalhou em sua oficina até os 30 anos de idade. Guardou o sábado, mas

trabalhou os seis dias da semana, como todos admitem. Fez muito trabalho pesado aos domingos.11. Os apóstolos trabalharam no domingo durante toda a vida.12. Os apóstolos nunca descansaram neste dia.13. Cristo nunca abençoou o domingo.14. O domingo jamais foi abençoado por nenhuma autoridade divina.15. Jamais foi santificado.16. Jamais foi dada nenhuma lei bíblica para impor a observância do domingo, daí não ser transgressão trabalhar

nesse dia. Porque “onde não há lei, também não há transgressão”. Rom. 4:15; João 3:4.17. O Novo Testamento não proíbe em parte alguma trabalhar nesse dia.18. Não existe nenhuma penalidade na Bíblia para a violação do sábado.19. Não se promete nenhuma bênção aos que observam o domingo.20. Não existe regulamento algum quanto à forma pela qual devia ser observado. Seria esse caso, se Deus

quisesse que o observássemos?21. A Bíblia nunca o chama de o repouso de cristão.22. Nunca o chama de sábado.23. Nunca o chama de dia do Senhor.24. Nem mesmo de dia de descanso.25. Jamais aplica a ele algum título sagrado. Por que haveríamos de chamá-lo santo?26. Chama-o simplesmente de “primeiro dia da semana”.27. Jesus nunca o mencionou em nenhum sentido. O nome deste dia nunca passou por Seu lábios, até onde o

mostram os registros.28. A palavra domingo jamais aparece na Bíblia.29. Nem Deus, nem Cristo, nem os homens inspirados jamais disseram uma palavra inspirada em favor do domingo

como dia santo.30. O primeiro dia da semana só é mencionado oito vezes em todo o Novo Testamento (Mat. 28:1; Mar. 16:2, 9; Luc.

24:1; João 20:1, 19; Atos 20:7; 1 Cor. 16:2).31. Seis destes relatos se referem à mesma ocasião.32. Paulo instruiu aos santos a que tratassem de assuntos seculares nesse dia (1 Cor. 16:2).33 Em todo o Novo Testamento só temos o registro de uma reunião (a Páscoa) celebrada nesse dia, e esta ocorreu

à noite (Atos 20:5-12).34. Não existe nenhuma menção de que hajam celebrado alguma outra reunião antes ou depois daquela.35. Não era o costume reunir-se nesse dia.36. Não houve nenhuma exigência de partir o pão nesse dia.37. Só temos um registro de que se haja feito algo nesse dia (Atos 20:7).38. Isso aconteceu à noite, passada a meia-noite (versos 7-11).Jesus celebrou a Páscoa na quinta-feira à noite (Luc.

22) e os discípulos, durante algum tempo, a celebravam todos os dias (Atos 2:42-46).39. A Bíblia não diz em parte alguma que o primeiro dia da semana comemora a ressurreição de Cristo. É uma

tradição de homens, que invalida a lei de Deus (Mat. 15:1-9). Segundo o ensino bíblico, o que comemora o sepultamento e ressurreição de Jesus é o batismo (Rom. 6:3-5).

40. Finalmente, o Novo Testamento guarda completo silêncio a respeito de qualquer mudança do dia de repouso ou de qualquer intenção de santificar o primeiro dia da semana.

— De um folheto da Review and Herald Publishing Association, de 1885.

RESPOSTA: É verdade que a palavra portuguesa domingo no latim significa “dia do Senhor” (dies dominicu) Isso acontece não somente com o português, mas com todas as línguas românicas (francês dimanche; italiano domenica; espanhol domingo; romeno duminica etc.).

Rótulo Falso. Dizer, porém, que o fato de o primeiro dia ter recebido esse nome seja uma prova de sua santidade faz tanto sentido como afirmar que um frasco com cianureto perderá sua letalidade porque alguém, por engano ou má fé, afixou no vasilhame um rótulo com a inscrição “suco de laranja”. Pelo contrário, a atitude de falsa propaganda torna o conteúdo da garrafa dez vezes mais perigoso, aumentando sensivelmente as chances de uma sinistra fatalidade (Prov. 14:12). Ocorre o mesmo com o domingo, que parece ser o equivalente do sábado na dispensação cristã, mas que não passa na verdade da marca dos poderes das trevas no paganismo cristianizado.

Batizado em Roma. O primeiro dia da semana (é dessa maneira desimportante que a Bíblia a ele se refere oito minguadas vezes) recebeu o nome “domingo” durante o Império Romano. Para os primitivos romanos, dominica (“Dia do Senhor”) era um dia, não em homenagem a Deus, mas ao imperador romano deificado. Os romanos entendiam a expressão “dia do Senhor” como “dia do imperador ou dia imperial”, pois esse era o “senhor” a quem serviam.

O papa Silvestre (314-335) foi o primeiro dentre os romanos a ordenar que os nomes dos dias, que antes eram chamados de acordo com os nomes de seus próprios deuses, isto é, dia do Sol, da Lua, de Marte, de Mercúrio, de Vênus e de Saturno, devessem se chamar pelos números ordinais acrescidos do sufixo “-feira” (do lat. feria, dia comum), a saber, primeira feria, segunda feria, terça feria, quarta feria, quinta feria, sexta feria, porque no início do Gênesis está escrito que Deus havia numerado os dias e não denominado; conservou o nome hebraico de sábado para o sétimo dia, mas ordenou que o descanso fosse transferido para o primeiro dia, o qual chamou de dominica ou domingo (Rabanus Maurus, De Clericorum Institutione (Da Instituição da Cleresia), livro. 2, cap. 46).

Somente muito tempo depois de ter sido adotado pelos cristãos é que o termo passou a ser empregado para referir-se ao dia que Cristo supostamente teria santificado. Um insidioso erro lexicográfico!

OBJEÇÃO No. 129: OS PAIS DA IGREJA DERAM TESTEMUNHO DA SANTIDADE DO DOMINGO

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ARGUMENTO: Os escritos dos pais da igreja são uma prova de que os primitivos cristãos guardavam o domingo, em vez do sábado.

RESPOSTA: Não encontrando na Bíblia provas de que o sábado do quarto mandamento foi mudado para o domingo, os defensores do primeiro dia, na ânsia de confirmar este ponto de vista, geralmente lançam mão dos escritos extrabíblicos, notadamente dos primeiros pais da igreja. A questão é: Servem esses escritos como regra de fé e prática para o povo de Deus? Antes de respondermos, precisamos analisar três questões:

Quem Foram os Pais da Igreja? Chamam-se “pais da igreja” os bispos, teólogos e outros mestres cristãos que, a partir do ano 95 d.C., começaram a ser designados carinhosamente por esse epíteto. Os escritos deles foram muitas vezes empregados pelos seus sucessores como um tribunal de apelação, principalmente no que diz respeito a pontos controvertidos de fé e prática. Classificam-se, de maneira simplificada, em dois grupos: os antenicenos (que viveram antes do Concílio de Nicéia, em 325 d.C.) e os nicenos e pós-nicenos (que viveram durante ou depois deste concílio)

Título Mal Aplicado. Discordamos do título “pais” da igreja. Os únicos que mereceriam talvez com justiça este nome seriam os apóstolos (Efés. 2:20). E tanto estes como o próprio fundador da igreja (Cristo), segundo consta, eram observadores do sábado. Além disso, o próprio Jesus advertiu a Seus discípulos: “A ninguém sobre a terra chameis vosso pai; porque só um é vosso Pai, aquele que está nos céus.” Mat. 23:9. Ou seja, somente Deus é o critério e a autoridade absoluta para definir verdade. Nenhum ser humano deve ter autoridade sobre a consciência dos homens em questão de fé e obediência (John Gill’s Expositor).

No entanto é o testemunho desses “pais” que é mais freqüentemente invocado para a sacralização do domingo por parte de católicos, evangélicos em geral e até mesmo por protestantes fundamentalistas. O que a maioria dos protestantes não sabe é que muitos destes líderes da igreja foram filósofos pagãos que, ao se converterem, trouxeram consigo, para o cristianismo, muitas das velhas concepções do mundo. Ou seja, saíram do paganismo, mas o paganismo não saiu deles. Corromperam até certo ponto o cristianismo introduzindo nele filosofia grega. Muitos estavam contaminados com o gnosticismo. Alegorizavam e espiritualizavam as Escrituras. Foram também essas “autoridades” que fabricaram doutrinas antibíblicas, tais como a

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transubstanciação (Inácio e Justino Mártir), oração pelos mortos e sinal-da-cruz (Tertuliano) e a pré-existência da alma (Justino Mártir e Orígenes), somente para citar algumas.

Em Que Época Viveram os Pais da Igreja? Esses “pais” viveram numa época em que a apostasia já se achava em franca operação. Paulo advertiu que, depois de sua morte, entrariam na igreja cristã "lobos cruéis", que não poupariam o rebanho (Atos 20:29). Ele chegou mesmo a dizer que, mesmo em sua época, já estava em franca operação o “mistério da iniqüidade” (2 Tess. 2:7). A história eclesiástica nos mostra que, a partir do segundo século as verdades bíblicas começaram rapidamente a ser distorcidas, dentre as quais certamente se achava a do sábado (Jesse L. Hurbult, The Story of the Christian Church, pág. 41).

Que Dizer de Seus Escritos? O corpo de escrito desses pais da igreja, redigido geralmente em grego ou latim, é conhecido como literatura patrística ou patrologia (gr. ou lat. pater, “pai”). Levando-se em conta a formação desses homens e a época em que viveram, e considerando que todo escritor reflete em seus escritos algo de sua maneira de pensar e de seu tempo, é preciso muita cautela e critério ao examinar-lhes os escritos. Eles não são expositores bíblicos tão ortodoxos como se imagina. Não duvidamos que tais documentos contenham muitos elementos históricos dignos de consideração, mas, do ponto de vista doutrinário, seguem geralmente os tempos e as tendências de seus dias. Em questões doutrinárias, os escritos de alguns pais da igreja são suspeitos e, portanto, indignos de confiança. Os anais primitivos da igreja revelam tendência para a ficção e a lenda. Sem contar que muitos desses escritos que supomos originais foram submetidos a “fraudes piedosas” durante os tempos medievais.

“Devemos ter muita cautela ao citarmos os pais como prova de doutrinas evangélicas, porque quem os conhece bem sabe que em muitos desses assuntos eles vacilam” (Adam Clarke, Comentário Sobre Provérbios 8).

“Há pouquíssimos deles cujas páginas não estejam repletas de erros: erros de método, erros de fato, erros históricos, de gramática e mesmo de doutrina” (Frederico W. Farrar, The History of Interpretation, págs. 162-165).

Exame das Provas Testemunhais70

70 Seventh-day Adventist Encyclopedia, art. “Sunday”; John N. Andrews, The History of the Sabbath, cap. 13; A.H. Lewis, A Critical History of the Sabbath and the Sunday in the Christian Church, cap. 3.

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Analisemos agora os testemunhos pró-domingo propriamente ditos, dos pais ante-nicenos. Podemos dividir estes textos patrísticos primitivos em duas categorias: os espúrios e os autênticos.

REFERÊNCIAS PATRÍSTICAS ESPÚRIAS OU INCERTAS

Inácio (110-115)

Inácio, considerado discípulo do apóstolo João, bispo de Antioquia da Síria no tempo de Trajano, e mártir em Roma (c. 20-107), é apontado como o primeiro pai

primitivo a indicar o domingo como dia do Senhor. A citação é de sua Epístola aos Magnesianos, cap. IX, par. 1:

Examinemos mais de perto este autor e sua obra:(1) A crítica não confirma que Inácio fosse discípulo de João.(2) Diversos escritores e eruditos alegam que as epístolas de Inácio são

espúrias (Dr. Killen, Ancient Church, Seção 2, Cap. 3, págs. 413-414). Das quinze cartas atribuídas a ele, oito são absolutamente falsas, e as restantes são duvidosas, cheias de intercalações e acréscimos (Encyclopedia Britannica). Estes documentos “logo se tornaram tão interpolados, cortados e mutilados, que hoje é quase impossível descobrir com certeza qual é o verdadeiro Inácio da história ou o falso Inácio da tradição” (Phillip Schaff, History of the Christian Church, vol. 2, pág. 660).

(2) Os escritos estão eivados de absurdos e heresias. Em sua epístola aos Filipenses, por exemplo, afirma que se torna assassino de Cristo quem não jejua no sábado ou no domingo (13:3); noutra, defende a transubstanciação, considerando herege quem admite apenas o simbolismo na Ceia do Senhor (Epístola aos Filadelfianos, 4; Epistola aos Esmirnenses 7:1); e noutra ainda, exalta a autoridade do bispo acima da de César, chegando ao cúmulo de afirmar que quem não o consulta segue a Satanás (Epístola aos Filadelfianos, 4:1; Epístola aos Esmirnenses 9:1).

(3) A citação em tela é confessadamente duvidosa: não se sabe se procede mesmo de Inácio ou se foi interpolação. Também é ambígua. No único texto latino existente (uma tradução do décimo terceiro século) dessa carta falta a

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“Aqueles que estavam presos à antiga ordem das coisas chegaram à posse de uma nova esperança, não mais guardando o sábado, mas vivendo de acordo com dia do Senhor” (The Ante-Nicene Fathers, tradução de Walke, vol. 1, pág. 62).

palavra “dia”. No texto grego mais digno de confiança que serve da base para as traduções a frase reza assim:

meketi sabbatizontes alla kata kyriaken zoontes (não mais sabatizando, mas de acordo com o (?) do Senhor vivendo).

Visto que a leitura fica truncada, alguns tradutores, por entenderem que o genitivo “do Senhor” se referia à expressão “dia do Senhor”, inseriram fraudulentamente a palavra “dia” para completar o sentido da frase. Uma adulteração grosseira que vem sendo repetida impensadamente pelos defensores do domingo. Contudo, a maioria dos estudiosos acha que essa interpolação destoa por inteiro do contexto, primeiro porque em toda a epístola não há mínima referência ao dia de adoração, e segundo porque ninguém vive de acordo com um dia, mas de acordo com um princípio de ação, orientação de vida ou exemplo. "O mais provável é que o texto grego genuíno da Epístola aos Magnesianos (cap. 9), atribuída a Inácio, bispo de Antioquia do início do segundo século, contenha a frase kata kuriakenzoen zoen zontes, “vivendo de acordo com a vida do Senhor”. (Seventh-day Adventist Encyclopedia, art. “Sunday”)71, conforme o traduz devidamente a idônea obra de Migne, Patrologia Graeca, vol. 5, pág. 669 e outras versões críticas originais, como o mais antigo manuscrito grego (Codex Mediceus Laurentinus). Por ser resultado de uma adulteração grosseira, esta evidência é inteiramente destituída de valor.

Plínio, o Jovem (104)Outra referência freqüentemente citada em favor do domingo é uma carta de

Plínio, então governador romano da Bitínia e do Ponto, escrita em 112 d.C., ao imperador Trajano, onde se menciona que os cristãos se reuniam “em determinado dia fixo antes do alvorecer” para a celebração de determinados ritos religiosos. (Coleman's Ancient Christianity, págs. 35-36). O “determinado dia” (stato die), porém, não é identificado. O termo ‘stato’, que é particípio de sisto, significa ‘designado, estabelecido’ e não implica necessariamente um dia periódico fixo, quando usado com referência a tempo. A reunião então podia acontecer periodicamente, mas não forçosamente no mesmo dia.

A referência pode ser tanto ao sábado como ao domingo, como lembra Coleman (Ancient Christianity, págs. 35-36.) Se, porém, os santos ou eleitos mencionados na carta foram os que se converteram por meio dos esforços de Pedro, conforme aparece em 1 Ped. 1:1-2, então é possível que o “determinado dia fixo” seja o sétimo dia da semana, pois era este o dia que o apóstolo

71 Cyclopedia Biblical Literature, art. “Lord’s Day”.

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comumente observava (W. B. Taylor, em Historical Commentaries, cap. I, seção 47; W. B. Taylor, Obligation of the Sabbath, pág. 300.).

Quanto à idéia de que os mártires do tempo de Plínio serem provados pela pergunta Dominicum servasti (“Guardas o dia do senhor”), é pura invenção (Win Domville, Examination of the Six Texts, págs. 258-261, 263-265).

Barnabé (150-175)Esse Barnabé teria sido supostamente o primo do evangelista Marcos e o

companheiro levita de Paulo, conhecido pelo nome de José Barnabé (Atos 4:36; Col. 4:10). Chama-se também pseudo-Barnabé porque o nome era um pseudônimo. Ele teria escrito uma epístola católica, entre 130 e 138 d.C., onde afirmava:

Analisemos o autor e sua obra:(1) A autoridade doutrinária de Barnabé é suspeita. A carta é a miúdo referida

como pseudo-Barnabé porque foi evidentemente escrita muito tempos depois do que se alega e por outro Barnabé que não o companheiro de Paulo (Neander’s Church History, pág. 407). Acredita-se que foi forjada por volta de 130 d.C. por alguém de Alexandria, no Egito (Kitto, Cyclopedia Biblical Literature, art. “Lord’s day”).

A epístola é apócrifa e foi desautorizada até por outros pais da igreja como Eusébio, Jerônimo e Agostinho. Eusébio, o primeiro dos historiadores da igreja, classifica esta epístola no catálogo dos escritos espúrios: “Entre os espúrios devem ser contados tanto os livros chamados ‘Os Atos de Paulo’ bem como o chamado ‘Pastor’ e o “Apocalipse de Pedro.’ Além desses livros, inclua-se também a chamada ‘Epístola de Barnabé’ e o que se intitula ‘As Instituições dos Apóstolos.’” — Ecclesiastical History, Livro 111, Cap. XXV).

(2) Essa destrambelhada epístola está cheia de disparates científicos, cronológicos e históricos. Diz, por exemplo, que a lebre cada ano o lugar da concepção (10:6); que a hiena muda de sexo anualmente (10:7) e que a doninha concebe pela boca (10:8). Afirma que Abraão conhecia o alfabeto grego, centenas de anos antes da invenção deste abecedário (9:8) e alegoriza a Bíblia, comparando a circuncisão ao “oitavo dia” da semana, quando a semana só

263

“Nós guardamos o dia oitavo com alegria, no qual também Jesus ressurgiu dos mortos.” (The Ante-Nicene Fathers, Cap. XV, p. 147.)

possui sete dias e quando o corte do prepúcio só ocorria uma vez na vida enquanto o dia de guarda ocorre semanalmente (15:8-9). ) Ensina também o valor meritório das obras para a salvação (19).

Por essas e por outras razões, o valor desse testemunho é nulo.

Didaquê (150-157)

O Didaquê ou Ensino dos Doze Apóstolos supostamente diz na maioria das traduções:

Esse tratado que presumivelmente pertence ao mesmo período (150 d.C.) ensina o batismo por aspersão (ver cap. 7, Roberts e Donaldson, The Ane-Nicene Fathers, vol. 7, pág. 379). O texto original impõe a ação de realizar algumas coisas “de acordo com o (?) Senhorial do Senhor” (kata kuriaken den kyriou), o que não faz o menor sentido. Obviamente o texto grego está danificado. Os tradutores geralmente traduzem a frase assim: “o dia Senhorial do Senhor” adicionando a palavra dia na tradução supondo que a referência seja ao domingo. Ora isso não passa de mera adivinhação!

Teófilo (162)

Teófilo, bispo de Antioquia, é citado pelo Dr. Justin Edwards, em Sabbath Manual, pág. 114, como tendo dito: “Tanto o costume como a razão nos desafiam a honrar o dia do Senhor, visto que foi nesse dia que nosso Senhor Jesus completou Sua ressurreição dos mortos.”.

Essa é uma citação apócrifa, forjada para dar a impressão de que o dia do Senhor é uma instituição apostólica. Teófilo jamais empregou o termo “dia do Senhor”. Em seus escritos ele nem mesmo meciona o primeiro dia da semana.

Dionísio (170)

Numa de suas cartas (escrita a Soter, bispo de Roma por volta de 170 d.C.), da qual resta apenas fragmento, Dionísio, bispo de Corinto, escreveu: “Passamos hoje o santo dia do Senhor, no qual lemos tua epístola” (citado em Eusébio,

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“Mas a cada dia do Senhor vós deveis vos reunir, partir o pão e dar graças após confessardes vossas transgressões.” (“The Teaching of the Twelve Apostles”, cap. 14 in the Ante-Nicene Fathers, 7:381).

História Eclesiástica, livro 4, cap. 23). O contexto não revela a que dia se refere à expressão “o santo dia do Senhor.” Pode referir-se tanto ao sábado como ao domingo.

Melito de Sardes (177)

Melito escreveu vários livros agora perdidos, cujos títulos foram preservados por Eusébio72. Um deles, chamado na versão inglesa On the Lord’s Day (“Sobre o Dia do Senhor”) é muitas vezes apresentado pelos dominicalistas como prova de que era um tratado sobre a observância do domingo. Diga-se a bem da verdade, porém, que a palavra “dia” jamais fez parte do título deste livro de Melito. Era um discurso sobre algo pertencente ao Senhor — Ho Peri Kyriakes Logos — mas a palavra essencial hemera (dia) está faltando. Talvez fosse um tratado sobre a vida de Cristo, pois Inácio emprega um fraseado parecido: kuriaken zoen, “vida do Senhor”.

REFERÊNCIAS PATRÍSTICAS AUTÊNTICASJustino Mártir (140-150)

Grego de cultura e nascimento, é com Justino, apologeta do segundo século, que se encontra a primeira referência autêntica, não interpolada, a respeito da observância dominical regular entre os primeiros cristãos. Esta Apologia é geralmente considerada como tendo sido escrita em Roma em 155 d.C.

Façamos um breve exame dos fatos:(1) Justino, como os outros, também é indigno de confiança. Apesar de

convertido ao cristianismo, nunca deixou de ser um filósofo pagão (Benjamin G. Wilkinson, Our Authorized Bible Vindicated, pág. 16). Era seguidor do quiliasmo ou milenarismo, doutrina herética segundo a qual os predestinados, depois do juízo final, ficariam ainda mil anos na Terra, no gozo das maiores delícias. Ensinava, entre outros desconchavos e invencionices, que os anjos celestiais comem maná (Camelini, pág. 274), que os ensinos de Platão e de Cristo são

72 Ecclesiastical History, book iv. chap. xxvi.

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“Reunimo-nos todos no dia do sol, porque é o primeiro dia em que Deus extraindo a matéria das trevas, criou o mundo e, nesse mesmo dia Jesus Cristo, nosso Salvador, ressuscitou dentre os mortos.” — Justino Mártir, First Apology, 1, 67.

totalmente idênticos (II Apologia) e que Deus criou o Sol para ser adorado (Apologia Sobre o Fim).

(2) A palavra domingo, que consta aí três vezes, era inteiramente desconhecida em meados do segundo século. Onde se lê “domingo”, no original de Justino diz, reveladoramente, apenas o seguinte: “dia do Sol”: “No chamado dia do Sol. . . “ Vê-se aí que até meados do segundo século, não há menção do domingo como um dia semanal sagrado. Note-se também que as reuniões dominicais mencionadas tanto por Justino como por outros pais, eram apenas para cultos religiosos e não como dia de descanso. O domingo não se confundia com o sábado, e aquele não foi considerado dia de repouso obrigatório senão depois do sexto século.

Se a citação de Justino prova alguma coisa, prova apenas que em sua época os cristãos estavam adotando práticas pagãs, e nada mais.

Pseudo-Pedro

É a primeira referência em que a expressão “dia do Senhor” é aplicada ao domingo. O fragmento de um falso Evangelho de Pedro, datado talvez de cerca de 155-180 d.C. refere-se duas vezes ao dia da ressurreição (nas seções 9 e 12) de Cristo como “o dia do Senhor”. Este documento não prova absolutamente que o domingo seja o dia do Senhor. Serve apenas para atestar que naquela época o “mistério da iniqüidade” já se achava em plena operação.

Clemente (190-220)

Em suas Miscelâneas (tomo 5, cap. 14), Clemente de Alexandria (perto do fim do segundo século) alega que Platão, o filósofo grego pagão, havia predito o estabelecimento do “dia do Senhor” no décimo volume de sua obra intitulada A República. (Na verdade, Platão fala da alma dos mortos partindo “no oitavo [dia]” depois de “cada grupo ter passado sete dias nos prados” em sua viagem através dos céus planetários em direção ao lugar onde escolherão o tipo de vida para a próxima reencarnação.). Em outro lugar (Miscelâneas, tomo 7, cap. 12), Clemente diz que os cristãos guardam “o dia do Senhor, quando eles abandonam uma má inclinação e assumem aquela do gnóstico, glorificando em si a ressurreição do Senhor.”

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Segundo a Encyclopedia Britannica, Clemente “é o primeiro a trazer toda a cultura grega e todas as especulações das heresias cristãs para corroborar a exposição da verdade.” — Art. “Clement of Alexandria.

Tremenda foi a contribuição deste “pai” da igreja para a depravação do cristianismo. Encontramos em seus escritos insanáveis incoerências: além de cometer erros crassos nas citações bíblicas que faz (às vezes chegando mesmo a citar passagens inexistentes), ainda afirma que os gregos se salvam pela sabedoria que possuem (Stromata 6:11), que Abraão era versado em astronomia e aritmética e que Platão era profeta evangélico (Stromata 5:14). Farrar menciona que ele punha em pé de igualdade livros apócrifos e canônicos.

Tem mais: Ele não somente cria que não fosse errado adorar os corpos celestes, mas chegava mesmo a ensinar que haviam sido criados para este fim. Pagão enrustido, não admira, pois, que fosse favorável à guarda do dia do Sol.

Pseudos Paulo e Pedro

O apócrifo Atos de Paulo (180-200 d.C.) diz que Paulo orou no sábado à medida que o dia do Senhor está vindo. O apócrifo Atos de Pedro, escrito ao redor de 200 d.C., fala de Pedro realizando suas reuniões de pregação no “dia do Senhor”, o dia subseqüente ao sábado.

Assim a locução “dia do Senhor” parece ter estado em uso nos anos de encerramento do segundo século, embora seja provável que ainda não estivesse plenamente estabelecido por aquele tempo. Os eruditos geralmente consideram autênticas essas referências ao domingo como “dia do Senhor”.

Tertuliano (160-220)

Quintus Septimus Florens Tertullianus, de Cartago, foi importante teólogo, polemista, moralista e iniciador do latim eclesiástico. Ele escreveu no início do século terceiro:

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“Nós (os cristãos) nada temos com o Sábado, nem com outras festas judaicas, e menos ainda com as celebrações dos pagãos. Temos nossas próprias solenidades: O Dia do Senhor (On indolatry 14).

Esse mesmo autor, nessa mesma Apologia, escreve: “Outros... pensam que o Sol é o deus dos cristãos, porque é sabido que adoramos em direção a Leste e festejamos o dia do Sol.”

Tertuliano talvez seja o que mais heresias ensinou. Era montanista, isto é, adepto da heresia fundada por Montano (séc. II), originário da Frígia, que professava uma encarnação do Espírito Santo e extremo rigorismo moral. Confessa num de seus escritos regozijar-se com os tormentos dos ímpios no inferno (Às Sombras, cap. 30); afirma que os animais oram (Orando). Defende o purgatório, a oração pelos mortos, o sinal-da-cruz e outros despautérios doutrinários (Orando).

Ele mesmo diz a respeito dessas práticas: “Se, para estas e outras regras, vós insistis sobre uma positiva determinação da Escritura, nada encontrareis. A tradição vos será apresentada como originadora destas práticas, o costume as fortaleceu e a fé as pôs em prática.” — Tertuliano, De Carona, seção 4.

Irineu (180-200)

Irineu, bispo de Lyon, era grego nascido na Ásia Menor. Teria dito em 167 d.C. que o dia do Senhor [domingo] era o sábado cristão. Suas palavras são:

Entre outras coisas, ensina a imortalidade da alma (Contra Heresias, livro III, cap. 63) e a transubstanciação (Idem, livro V, cap. 2). Defende a supremacia de Roma, sob a alegação de que a Igreja tem mais autoridade que a Palavra de Deus (Contra Heresias, livro III, cap. 4, par. 1-3). Diz que os “animais imundos” da Bíblia são os judeus (Contra Heresias, livro III, cap. 8, par. 4). Defende a doutrina antibíblica do purgatório (Contra Heresias, livro IV, cap. 27, par. 2) e afirma que Jesus morreu aos cinqüenta anos de idade (Contra Heresias, livro II, cap. 22, par. 6). Como se pode ver, não é digno de confiança.

Bardesanes (180-200)

Também chamado Bardaisan ou Bar Daisan, Bardesanes era natural de Edessa, na Síria. Defensores do domingo atribuem a ele a seguinte frase.

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“O mistério da ressurreição do Senhor não pode ser celebrada noutro dia senão no dia do Senhor”.

Esta citação, porém, não tem fonte. Quase todas as obras de Bardesanes se perderam, a não ser fragmentos de seus Hinos à Alma, inseridos no apócrifo Atos de S. Tomé e Sobre a Fatalidade, conservado por Eusébio.

Tanto quanto sabemos, ele foi destacado líder do gnosticismo sírio. Misturava influência cristã com ensinos gnósticos, principalmente astrologia e mitologia caldaica. Negava a criação do mundo, de Satanás e do mal por Deus, atribuindo-as a uma hierarquia de divindades. Um consumado herege!

Quanto à frase, ela não prova nada. E ainda que se pudesse provar que os cristãos do terceiro século se reuniam no primeiro dia da semana, isto não denota que Cristo ou os apóstolos sancionaram tal prática.73

Conclusões. Depois de analisar essas citações (poderíamos mencionar outras, porém não merecem ser consideradas, pois datam do terceiro e quarto século, tempo em que já a apostasia se consumara), chegamos à conclusão de que, embora os católicos aceitem esses escritos apócrifos e pseudepígrafos como tendo igual ou quase igual autoridade que os livros canônicos da Bíblia, e muitos protestantes acreditem que os escritos desses homens reflitam fielmente a história, as doutrinas e as observâncias da igreja nas épocas primitivas, isso está a centenas de anos-luz da verdade.

O testemunho dos pais apostólicos a respeito do domingo é fragmentário, ambíguo e indigno de confiança, quer por serem falsificados, adulterados ou enrustidos de delírios e fábulas74, quer por apenas serem a constatação de uma prática pagã já estabelecida. Para falar a verdade, não encontramos neles nenhum traço da observância do domingo até meados do segundo século. Conforme bem o afirmou Sir William Domville, “nenhum escritor eclesiástico dos três primeiros séculos atribuiu a origem da observância do domingo a Cristo ou aos apóstolos.” — Examination of the Six Texts," págs. 6-7. (Supplement). Ainda que isto houvesse acontecido, o testemunho de escritos humanos jamais será prova canônica! Jamais podemos abandonar um claro “assim diz o Senhor” pela tradição de pais, doutores ou concílios de igreja, ainda mais quando esta é confusa, apócrifa e contraditória.

73 John Kiesz, Sunday History Through the Ages.74 Ephraim Pagitt, Christianographia, part. II, pág. 59.

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“Num dia, o primeiro da semana, nós nos reunimos.” — Do Destino.

OBJEÇÃO No. 130: NÃO FOI CONSTANTINO NEM O PAPA QUE TRANSFERIRAM O SÁBADO PARA O DOMINGO

ARGUMENTO: O sábado não foi mudado para o domingo por Constantino nem pelo papa como dizem os sabatistas. Foi uma transição gradual recomendada por Cristo e os apóstolos.

RESPOSTA: Conforme já provamos em lugar próprio, nem Jesus nem os apóstolos mudaram o dia de repouso. Isto é questão liquidada. Examinemos agora os outros dois argumentos.

O Decreto de Constantino. Quanto ao argumento de que o imperador romano Constantino Magno foi o autor da mudança do sábado para o domingo, jamais ensinamos isso oficialmente.

Não resta dúvida, porém, de que, na esfera civil, esse imperador devoto do deus-Sol contribuiu grandemente para que o domingo se tornasse dia de guarda, ao promulgar a primeira de todas as leis dominicais, em 7 de março de 321 D.C. Embora esta seja a primeira, outras cinco leis dominicais foram expedidas por Constantino

Temos, porém, que fazer aqui uma distinção entre a observância voluntária do domingo e a observância imposta por lei. O edito de Constantino não era de caráter religioso, mas civil. Impunha juridicamente um novo dia de descanso, embora não proibisse o antigo. Tecnicamente falando, não foi ele que estabeleceu o “sábado cristão”. O domingo já era venerado por seus súditos pagãos, adoradores do Sol; e, desde o segundo século, os cristãos já reverenciavam o domingo em homenagem à ressurreição de Cristo. Reuniam-se de manhã no primeiro dia da semana para a “festa da ressurreição”, mas, depois de uma rápida merenda, voltavam aos afazeres costumeiros. (Note-se, porém, que o domingo não era guardado, observado nem santificado). Foi Constantino,

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TEXTO ORIGINAL DO EDITO DE CONSTANTINO“Que os magistrados e as pessoas que residem nas cidades, bem como os comerciantes, repousem no venerável dia do sol. Aos moradores do campo, porém, conceda-se atender livre e desembaraçadamente aos cuidados de sua lavoura, visto suceder freqüentemente não haver dia mais adequado à semeadura e ao plantio das vinhas, pelo que não convém deixar passar a ocasião oportuna e privar-se a gente das provisões deparadas pelo Céu. Outorgada nas Nonas de Março, sendo Crispo e Constantino cônsules, cada um, pela segunda vez.” — Codex Justinianus of Justinian, Lib. III, Tit. 12, 3 citado in History of the Christian Church, Philip Schaff, Vol. III, pág.380.

depois de sua suposta conversão,75 que oficializou o domingo como dia santo, ajuntando-lhe o significado específico de descanso, na esperança de unir os interesses em conflito do paganismo e cristianismo. — Michael Collins e Matthew A. Price, História do Cristianismo, págs. 58-59.

Testemunhos Históricos. Eis os testemunhos de fontes insuspeitas que confirmam este fato:

“A mais antiga documentação da observância do domingo como imposição legal é o edito de Constantino, em 321 d.C., que decreta que todas as cortes de justiça, os habitantes das cidades e o comércio em geral, devessem repousar no domingo (venerabilii die Solis), excetuando-se apenas os que se empenham em trabalhos agrícolas.” (Encyclopedia Britannica, nona edição, art. “Sunday”).

“Constantino o Grande baixou uma lei para todo o império (321 d.C.) estatuindo que o domingo fosse guardado como dia de repouso em todas as cidades e vilas; mas permitindo que os camponeses prosseguissem em seus trabalhos” (Encyclopedia Americana, art. “Sabbath”).

“Inquestionavelmente, a primeira lei, quer eclesiástica quer civil, pela qual se sabe haver sido ordenada a observância do repouso naquela época, é o edito de Constantino, em 321 d.C.” (Chamber Encyclopedia, art. “Sabbath”).

"Ele [Constantino]... ordenou a celebração cívica do domingo, porém não como 'dies dominis' (dia do Senhor), mas sim como 'dies solis', (dia do Sol), o que se podia unir com seu culto a Apolo” (Dr. Schaff, Ancient Church History, III períodod, pág. 464).

Em resumo, a grande contribuição de Constantino na observância do domingo foi desenvolver e dar força de lei para estabelecê-la. Pode ser considerada a lei original do domingo e o modelo seguido por todas as leis dominicais posteriores (cf. W. W. Hyde, Paganism to Christianity in the Roman Empire, pág. 257).

O Decreto de Laodicéia. Quanto ao argumento de que a Igreja Católica não mudou o sábado para o domingo, isto sim ensinamos (Dan. 7:25). Já na época de Constantino os bispos da igreja, inspirados pela ambição e sede de poder, começaram a exercer influência crescente sobre o Estado. De tempos em tempos celebravam vastos concílios nos quais o sábado de Deus era pouco a pouco

75 Segundo Eusébio (pág. 61), o imperador converteu-se após um sonho, no qual via uma cruz estampada contra o Sol, com a frase escrita em latim: “Com este sinal vencerás”. A respeito da natureza dessa conversão, diz o bispo Arthur Cleveland Coxe: "Foi uma conversão política. Nessa condição foi aceita, e Constantino foi pagão até quase morrer. E quanto ao seu arrependimento final, abstenho-me de julgar" (Elucidation 2, of "Tertullian Against Marcion," book 4). Pouco antes de morrer mandou estrangular a mulher e o filho mais velho sob acusação de conspiração, sendo batizado apenas no leito de morte.

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rebaixado, enquanto o domingo era na mesma proporção exaltado. O derradeiro golpe veio do Concílio de Laodicéia (encerrado em 364 d.C.). Foi este um decreto de natureza eclesiástica, que não somente ordenou o descanso no domingo, mas também proibiu a observância do sábado sob pena de excomunhão76. E nisto obteve pleno apoio da legislação civil. Foi aí que se emitiu a primeira lei dominical eclesiástica.

Testemunhos Históricos. A maioria dos historiadores fidedignos tradicionalmente confirma isso:

Eusébio, bispo de Cesaréia, um dos articuladores intelectuais da dominicalização, confessa: “Todas as coisas . . . que era dever fazer no sábado, essas NÓS transferimos para o dia do Senhor [domingo]” (Commentary on the Psalms, citado em Cox’s Sabbath Literature, vol. 1, pág. 361).

“A observância do Dia do Senhor (Domingo, para ele) tomou o lugar da observância do Sábado não em virtude do preceito [o quarto mandamento], mas por instituição da Igreja [Católica]” (Tomás de Aquino (1274), Suma Teológica, Perg. 122, art. 4, II, 1947, ET, pág. 1702).

“O sábado do sétimo dia ... foi solenizado por Cristo, pelos apóstolos e pelos cristãos primitivos, até que o Concílio de Laodicéia, de certo modo, aboliu sua observância ... O Concílio de Laodicéia (364 d.C.) ... primeiro estabeleceu a observância do dia do Senhor” (William Prynne, Dissertation on the Lord’s Day, págs. 33, 34 e 44).

A própria Igreja Católica, a principal envolvida, o admite abertamente. Trento Gaspare de Fosso, arcebispo de Reggio, teria declarado no Concílio de Trento (1545-1563): “O sábado, o mais glorioso dia da lei, foi modificado para o dia do Senhor [domingo]. . . . Estes e outros assuntos semelhantes não foram abolidos em virtude dos ensinamentos de Cristo (pois Ele declarou que viera cumprir a lei, 76 Prynne, "História dos Concílios", vol. I, par. 39, cânon 16, assim se refere a esse caso: "O sábado do sétimo dia foi observado por Cristo, pelos apóstolos e pelos primeiros cristãos até que o Concílio de Laodicéia, a certos respeitos, como que aboliu a sua observância. O Concílio de Laodicéia resolveu em primeiro lugar impor a observância do dia de domingo, e, em seguida, proibiu sob anátema a observância do sábado".

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TEXTO ORIGINAL DO CÂNONE 29“Os cristãos não devem judaizar nem permanecer ociosos no sábado, mas sim trabalhar neste dia. O

Dia do Senhor [domingo], porém, dever ser por eles especialmente honrado. Se forem, entretanto, encontrados judaizando, serão desligados [anathema, “excomungados”] de Cristo.” — Citado em Charles Joseph Hefele, A History of the Councils of the Church, vol. 2, pág. 316.

e não para destruí-la), mas foram alterados pela autoridade da igreja” (Mansi, Sacrorum Conciliorum, 33:529-530).

“Observamos o domingo em lugar do sábado porque a Igreja Católica, no Concílio de Laodicéia (364 d.C.) transferiu a solenidade do sábado para o domingo” (The Converts Catechism, Peter Geirmann, pág. 50 [livro abençoado pelo papa Pio X]).

“Foi a Igreja Católica que, pela autoridade de Jesus Cristo, transferiu este repouso [o sábado bíblico] para o domingo . . . Assim a observância do domingo pelos protestantes é uma homenagem que eles prestam à autoridade da Igreja [Católica]” (Mons. Louis Segur, Plain Talk About the Protestantism of Today, pág. 213).

“Ela [a Igreja Católica romana] subverteu o quarto mandamento, dispensando o sábado da Palavra de Deus e substituindo-o pelo domingo, como dia santificado” (N. Summerbell, History of the Christians, pág. 418).

Não Um Concílio Sem Importância. Alguns tentam minimizar a autoridade deste concílio, alegando que não passou de uma assembléia local, sem amplitude, realizada no Oriente (no que hoje é a Turquia) e não em Roma. Essas alegações, porém, não têm fundamento.

Primeiro porque o fato de o concílio ter-se realizado em Laodicéia nada depõe contra a sua autoridade, já que os primeiros concílios e concílios gerais ecumênicos e importantes da igreja romana realizaram-se no Oriente, como os dois de Nicéia (em 325 e 787), os quatro de Constantinopla (em 381, 553, 681 e 889) e o de Calcedônia (em 551). Com exceção do concílio de Éfeso em 431, só a partir de 1123 é que os concílios romanos são instalados em cidades européias. Além disso, em Roma propriamente dita só se realizaram os cinco concílios de Trento e o do Vaticano em 1870.

Segundo porque a história e os fatos desmentem que Laodicéia tenha sido um concílio local como desinformadamente se afirma. Essa assembléia foi legal e plenamente confirmada pelo concílio geral de Calcedônia, sendo aí aceitas, ratificadas e oficializadas todas as suas decisões e cânones, inclusive o famigerado Cânon 29, que ordena a guarda do domingo e prescreve excomunhão para os que “sabatizarem”. Essa medida foi, sem dúvida, de aplicação universal.

À vista de todas essas evidências, a inevitável conclusão a que chegamos é a de Constantino pôs o ovo que o papado chocou, ou seja, a igreja apostatada em conluio com o Estado foi responsável pela mudança do dia de repouso. O sábado

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é, portanto, filho do papado. A mudança, porém, não foi resultado de um ato instantâneo, mas de um longo e gradual processo de quase vinte séculos, que envolveu a influência mútua de alguns fatores políticos, sociais, pagãos e religiosos. Depois desse, outros concílios foram realizados.

Em quase todos eles o sábado era rebaixado um pouco mais, enquanto o domingo era exaltado. Por fim a festividade pagã veio a ser honrada como instituição divina, enquanto o sábado foi declarado relíquia do judaísmo, e amaldiçoada sua observância. “O que começou como uma ordenança pagã acabou como regulamento cristão; e uma longa série de decretos imperiais, durante o quarto, quinto e sexto séculos, impuseram com crescente rigor a abstinência do trabalho no domingo” (Huttan Webster, Rest Days, págs. 122-123, 210).

Isto, porém, não anula o fato de que, historicamente, o império e o papado tenham sido as duas instituições mais influentes no processo, e que coube a este oficializar eclesiasticamente a mudança legislada por aquele.

O SÁBADO E SUA OBSERVÂNCIAOBJEÇÃO No. 131: TANTO FAZ GUARDAR O SÁBADO COMO O DOMINGO

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ARGUMENTO: Não há diferença real entre a observância do sábado ou do domingo. Tudo não passa de uma questão de nomes e números diferentes.

RESPOSTA: Embora muitos cristãos sinceros possam pensar que não faz diferença o dia que santificamos, na verdade a discussão entre sábado e domingo não é apenas uma questão de nomenclatura ou numeralidade, mas de autoridade, significado e experiência.

Autoridade porque, enquanto a observância do sábado se baseia num mandamento bíblico explícito e específico (Gên. 2:2-3; Êxo. 20:8-11; Mar. 2:27-28; Heb. 4:9), a observância do domingo procede de uma tradição eclesiástica questionável, derivada de uma interação de fatores sociais, políticos, pagãos e religiosos.

Significado porque, enquanto o sábado, conforme o testemunho bíblico, soleniza dois fatos históricos de importância capital para a humanidade: criação e da redenção do mundo. Já a justificação teológica para a observância do domingo, segundo a primitiva literatura cristã, é a criação da luz no primeiro dia da semana (símbolo cósmico-escatológico do mundo renovado tipificado pelo oitavo dia) e a ressurreição de Cristo no primeiro dia da semana. Acontece que nenhum desses significados históricos a posteriori atribuídos ao domingo exige necessariamente a observância de um dia semanal como tempo de repouso e adoração ao Senhor nem o foi ordenado implícita ou explicitamente pelas Escrituras.

Experiência porque, enquanto a observância do domingo começou e tem, em grande parte, permanecido fechado num horizonte restrito de um dia parcial de adoração, limitando-se na maioria dos casos a apenas uma ou duas horas de culto na igreja e dedicando, em boa consciência, o restante do tempo a trabalho ou a mero descanso, lazer ou diversão; a essência da observância do sábado é consagração integral do tempo ao Senhor sob a forma de repouso e adoração, quer na igreja, quer fora dela. Celebrar o sábado significa mais do que ir à igreja por tradição ou nascimento. Significa consagrar 24 horas ao Senhor e entrar no repouso de Deus (Heb. 4:10). O sábado foi instituído por Deus; o domingo é uma instituição eclesiástica.

Essas três considerações mostram claramente que existe, sim, uma diferença real entre o sábado e o domingo. Enquanto o sábado é um dia santo fixado por Deus, o domingo não passa de um simples feriado estabelecido pelo homem. Um é o cumprimento de uma obrigação religiosa; o outro, a santificação do tempo. O

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domingo, portanto, não preenche nem de longe os requisitos do quarto mandamento (Samuele Bacchiocchi, The Sabbath in the New Testament, cap. 10, “Questions About the Sabbath”).

OBJEÇÃO No. 132: OS PASTORES SABATISTAS TRABALHAM NO SÁBADO

ARGUMENTO: Como pode um pastor sabatista “descansar no Senhor” no sábado quando trabalha mais neste dia do que nos outros dias da semana e ainda por cima recebe salário?

RESPOSTA: É verdade que, para os pastores sabatistas, o sábado talvez seja o dia mais fatigante da semana. Neste sentido, não observam o aspecto de repouso do quarto mandamento. Sucede com eles o mesmo que acontecia com os sacerdotes judeus, cujo trabalho no sábado era intensificado em virtude dos sacrifícios adicionais prescritos para aquele dia (Núm. 28:9-10; Lev. 24:8-9). No entanto, da perspectiva de Jesus, embora eles violassem o quarto mandamento, ficavam sem culpa. Mat. 12:5.

Trabalho Espiritual. Por que ficavam sem culpa? Porque o trabalho que realizavam naquele dia não era de natureza servil ou temporal, mas religiosa. Realizavam, como realizam os ministros de hoje que oficiam no sábado, uma obra de redenção e misericórdia. Fazem a obra de Deus. Ao atender às necessidades espirituais de sua congregação, um pastor permite ao povo experimentar o repouso divino do perdão e da salvação. Embora fiquem privados os ministros do relaxamento físico concedido pelo sábado, refrigeram a alma com a satisfação repousante advinda do fato de atender às necessidades físicas e espirituais do povo de Deus. Afinal de contas, o sábado não é apenas um dia para repouso físico, mas para atuar redentoramente em favor do semelhante (Samuele Bacchiocchi, The Sabbath in the New Testament, cap. 10: “Questions about Sabbathkeeping”).

OBJEÇÃO No. 133: ALGUNS SERVIÇOS “ESSENCIAIS” NÃO PODEM PARAR NO SÁBADO

ARGUMENTO: Se todos parassem de trabalhar no sábado, o mundo viraria um caos. Com a polícia e os bombeiros de folga, os ladrões invadiriam todas as casas, incêndios não poderiam ser apagados etc.

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RESPOSTA: A primeira coisa de que temos de nos lembrar ao respondermos a essa objeção é que o mundo em que vivemos não é mais o mundo perfeito que Deus criou. Se o fosse, todos seriam observadores não só do sábado, mas de todos os mandamentos de Deus, e não haveria coisas como hospitais, presídios, funerárias, delegacias de polícia, cemitérios nem subversões na natureza ou no ser humano. Como vivemos, porém, num mundo ferido pelo pecado, somos obrigados a conviver com coisas como violência, acidentes, incêndios, desastres, enfermidades, atentados à moral, à ordem ou à segurança pública.

Atendimento a Emergências Permitido. Isto exige adaptações. Ocupações, profissões ou ofícios encarregados de solucionar emergências dessa natureza não devem sofrer solução de continuidade; precisam estar funcionando vinte e quatro horas por dia e sete dias por semana, já que essas dificuldades não escolhem lugar nem hora para acontecer. Tampouco deixam de ocorrer no sábado. Existem nas Escrituras diversos textos mostrando claramente que serviços de grande utilidade social podem ser motivos legítimos para a dispensa do preceito do repouso sabático (ver Nee. 13:19-21; Mat. 12:11, 12; Mat. 12:5.). Segundo as diretrizes bíblicas, entendemos que, além da atividade espiritual de ministros evangélicos e das obras espirituais, humanitárias e assistenciais, que são plenamente permitidas no dia do Senhor, existem alguns serviços civis inadiáveis, como médicos, polícia, bombeiros etc. que podem, com algumas restrições, ser realizados no sábado sem constituir violação do quarto mandamento.

Há nisto um precedente. No antigo Israel e durante o tempo de Cristo, por exemplo, era lícito não só aos sacerdotes oficiarem no templo aos sábados, mas também aos guardas vigiarem o templo e seus arredores e aos soldados circularem pelas ruas protegendo a vida e a propriedade (2 Reis 11:19; Nee. 4:22-23; 13:15-21; cf. Mat. 27:62-66).

Porém Com Restrições. Como vivemos numa sociedade cuja maioria não é observadora do sábado (diferentemente do que acontecia a Israel), sugerem-se algumas recomendações para a prática dessas atividades no dia de sábado:

Os observadores do sábado devem, na medida do possível, procurar isenção do trabalho no sábado mediante alterações de escalas e plantões, isso existirem outras pessoas que, pelo fato de não guardarem o sétimo dia, podem realizar esse trabalho rotineiramente sem escrúpulos de consciência77. 77 Isto não é o mesmo que shabbas goy ou sabbath goy (goy, “gentio”), nome iídiche dado ao não judeus empregado pelos judeus ortodoxos a realizar pequenos serviços proibidos

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Quando não for possível a dispensa, os guardadores do sábado devem ir ao trabalho, mas restringir seu dever ao mínimo essencial necessário.

Ao receber o pagamento, deve calcular a fração paga pelo trabalho realizado no sábado e doá-la à igreja, destiná-la aos pobres ou a qualquer outro fim beneficente, para que não se configure trabalho remunerado.

Se possível, devem procurar outro meio de ganhar a vida, já que patrões ou chefes ímpios podem aproveitar-se das circunstâncias para forçar os observadores do sábado a transgredi-lo gratuita e desnecessariamente (Samuele Bacchiocchi, The Sabbath in the New Testament, cap. 10: “Questions about Sabbathkeeping”).

OBJEÇÃO No. 134: OS SABATISTAS POSSUEM HOSPITAIS QUE FUNCIONAM AOS SÁBADOS

ARGUMENTO: Nem mesmo os sabatistas observam o sábado devidamente, pois possuem instituições médicas que funcionam aos sábados.

RESPOSTA: É verdade que os sanatórios e hospitais sabatistas — diferentemente dos restaurantes, indústrias de alimento e outras instituições denominacionais — não fecham aos sábados. Isto acontece porque doença e dor não fazem distinção entre dia santo e dia comum. As necessidades dos doentes e sofredores precisam ser atendidas independentemente do dia da semana em que ocorram. Neste aspecto, as instituições médicas sabatistas do sétimo dia seguem em suas praxes e práticas o exemplo de Cristo, que, ao curar os doentes no sábado, mostrou-nos que é correto aliviar o sofrimento neste dia (Luc. 13:14).

Cláusulas de Exceções. Apesar de funcionarem no sábado, no entanto, essas instituições seguem as cláusulas de exceções, reservas, restrições e ressalvas prescritas pelo princípio bíblico de observância do sábado em organizações dessa natureza, para que não se perca o senso de santidade deste dia.

1) Realizam no sábado apenas os serviços essenciais e emergenciais, evitando-se as terapêuticas e operações usuais que possam ser adiadas, sem negligência dos pacientes, rebaixamento do nível de excelência dos tratamentos ou falta de simpatia; e alimentando os pacientes e os funcionários com o mínimo trabalho possível.aos judeus no sábado.

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2) Fecham os setores administrativos e contábeis nesse dia. Cobram pelos serviços médicos prestados durante os sábados taxas reduzidas destinadas somente a cobrir os custos operacionais. Afinal, o propósito dessas casas de saúde não é comercial, mas médico-missionário.

3) Quando é preciso admitir ou dar alta a pacientes no sábado, fazem preparativos para receber pagamento de contas antes ou depois do sábado, já que seus setores administrativo e comercial são fechados no sábado.

4) Suspendem no sábado todo trabalho de rotina que possa ser adiado e postergam diagnósticos e serviços terapêuticos facultativos, criando uma atmosfera de relaxamento, onde os funcionários possam interagir mais livremente e plenamente com os pacientes, aconselhando-os e compartilhando com eles seu amor cristão.

5) Fazem um rodízio de funcionários aos sábados para que todos contribuam de algum modo, a seu turno, mas para que alguns não precisem estar de serviço todo sábado, a ponto de não disporem de tempo para repouso e assistência aos cultos devocionais (Sabbath Observance: Guidelines, George W. Reid).

OBJEÇÃO No. 135: NÃO PRECISAMOS DO SÁBADO, POIS TEMOS O FINAL DE SEMANA

ARGUMENTO: Se a finalidade do sábado é garantir repouso físico, não precisamos dele hoje como dia de repouso, pois a maioria das pessoas trabalha apenas cinco dias por semana, tendo o final de semana para desfrutar de descanso e lazer.

RESPOSTA: É verdade que, devido às conquistas tecnológicas e trabalhistas, a jornada semanal de trabalho diminuiu, e o homem moderno goza de crescente disponibilidade de tempo e lazer. Convém, porém, deixar claro que o final de semana ou qualquer outro dia semanal de folga não possui a dimensão espiritual do sábado.

Mais do Que Lazer. O sábado do sétimo dia é mais do que descanso e lazer. Aliás, este aspecto físico é apenas secundário e incidental. Como os outros estatutos do Decálogo, o quarto mandamento é essencialmente espiritual (Êxo. 31:13).78 Se ele tivesse sido estabelecido apenas para atender necessidades físicas, sociais e econômicas, já teria perdido sua utilidade visto que a maioria

78 J. J. Taylor, The Sabbatic Question, págs. 32–34.

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das pessoas de hoje pode desfrutar de dois ou mais dias de descanso e relaxamento por semana. Não, o sábado não é apenas um feriado ou um fim de semana. Trata-se de um dia de repouso centrado em Deus e não uma centrada no eu. Seu verdadeiro propósito é capacitar-nos, por meio do repouso físico, a entrar no repouso de Deus (Heb. 4:10).

Tempo É Vida. Nossa vida é medida pelo tempo, e o modo como o empregamos é forte indício de onde se centralizam nossos interesses. Não temos tempo para aqueles que nos são indiferentes, mas dedicamos tempo para aqueles a quem amamos. Mostramos que amamos a Deus quando separamos um sétimo de nosso tempo para devoção exclusiva a Ele.

Somos convidados a descansar no sábado, não apenas porque ele foi feito para nosso benefício, mas também por causa dAquele que nos criou. Note que, embora o sábado tenha sido feito para a humanidade (Mar. 2:27-28), Ele pertence a Deus (Êxo. 20:10; Mar. 2:28).

“Deus não precisa do nosso repouso sabático nem de nosso trabalho semanal. O que Ele precisa é de um coração, mente e alma sensíveis, dispostos a experimentar a realidade da Sua presença, paz e repouso. Por intermédio do sábado, Deus nos convida a entrar nesta experiência especial.

“O ato de repousar para Deus no sábado é um ato de adoração importantíssimo porque denota a consagração total de nossa vida a Deus. É um ato de adoração que não se esgota num culto de igreja de uma hora de duração, mas que perdura por vinte e quatro horas” (Samuele Bacchiocchi, The Sabbath in the New Testament).

OBJEÇÃO No. 136: OBSERVAR O SÁBADO É LEGALISMO

ARGUMENTO: Não devemos observar o sábado, porque isso é legalismo.

RESPOSTA: Podemos adotar basicamente duas atitudes errôneas para com a lei de Deus. A primeira se chama legalismo, que pode ser definida como a “tentativa de obter a salvação por meio de esforços individuais”. (J. L. Shuler, God’s Everlasting Sign, pág. 90). O legalista procura obter a salvação pela observância da lei. Este tem sido o fundamento de todas as religiões falsas. Nisto consistiu a falha dos judeus do tempo de Cristo. O segundo erro, não menos perigoso que o primeiro, chama-se antinomismo (gr. “oposição à lei”) e consiste em rejeitar a lei como norma de conduta na experiência cristã. O antinomista crê que a fé em

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Cristo nos isenta da obediência à lei de Deus. Neste erro prevarica a esmagadora maioria dos cristãos atuais. Legalismo e antinomismo são dois enfoques errôneos; dois extremos que se devem evitar.

Obediência Não é Legalismo. Essa definição inicial de termos aniquila por si só o argumento muito popular de que qualquer forma de obediência à lei de Deus constitui legalismo. Nada mais distante da verdade. A obediência espiritual e amorosa às leis de Deus, inclusive o sábado, não é legalismo, pois o próprio Jesus nos ensina: “Se me amais, guardareis os meus mandamentos” e noutro lugar “Se queres, porém, entrar na vida, guarda os mandamentos” (João 14:15; Mat. 19:17). O legalismo é uma distorção da obediência. Portanto, só se configura legalismo quando o motivo e propósito da obediência é desvirtuado, fazendo com que a lei de Deus funcione de uma maneira que Ele jamais pretendeu, ou seja, como método de salvação.

O Sábado Combate o Legalismo. Observar o sábado por amor a Deus, como regra de conduta procurando com isso desenvolver (e não obter) nossa salvação, não é negação da graça (Fil. 2:12). Pelo contrário, uma compreensão e experiência corretas do sábado podem ser o mais poderoso antídoto contra o legalismo, pois se há uma lição que o sábado enfaticamente nos ensina é a de não “trabalhar” por nossa salvação, mas cessar todas as nossas obras e descansar em Deus a fim de que Ele opere em nós tanto o querer como o efetuar. A observância externa do sétimo dia corresponde a uma experiência íntima de justificação e santificação do crente.

Ao guardamos o sétimo dia não estamos tentando tornar-nos justos por nós mesmos. Ao contrário, observamos o sábado como resultado de nosso relacionamento com Cristo, nosso Criador e Redentor. Guardamos o sábado porque amamos o Senhor. Jesus disse: “Se me amais, guardareis os meus mandamentos” (João 14:15). Observar o sábado assim, como efeito da salvação, não é legalismo. Jesus combateu o legalismo dos fariseus; e Paulo, o dos judaizantes. Nunca, porém, atacaram a legítima observância da lei. A Lei de Deus e o Evangelho de Cristo nunca estão dissociados.

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CONCLUSÃO

Não é de hoje nem de ontem que o universo protestante lida com controvérsias e polêmicas. Não podia ser de outra forma, já que recebemos dos reformadores o legado de não submetermos nossa fé a nada além daquilo que as escrituras ensinam (1 Cor. 6:4). Daí o conhecidíssimo lema protestante de “sola escriptura”. Entretanto, há certos fatos polêmicos que geram não poucas divergências dentro do contexto religioso cristão, e divergências de tal monta que chegam a implicar e ser o divisor de águas entre o ortodoxo e o herético. Um desses fatos tem a ver com o sétimo dia da semana comumente conhecido como sábado.

Luteranos crêem que Cristo cumpriu o mandamento do sábado, encerrando assum sua observância e substituindo-o com uma experiência existencial de salvação-repouso disponível a todos os crentes da atualidade. Para outros, como católicos e calvinistas, Cristo cumpriu e abrogou apenas o aspecto cerimonial do mandamento sabático, ou seja, a observância do sétimo dia, mas conservou o aspecto moral: o princípio de observar um dia em sete da semana. Neste caso, substituiu o sábado pelo domingo, por ter acontecido neste dia a ressurreição de Cristo. Por outro lado, pequena parcela da cristandade defende que o domingo é um dia de origem pagã e que o verdadeiro dia de repouso continua sendo o sábado do sétimo dia. Visto, grosso modo, a questão pode parecer um tanto quanto trivial. Não é.

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Foi nesta conformidade que o presente estudo, de sabor um tanto enciclopédico, assumiu o propósito de resolver um problema que trazia em seu núcleo uma pergunta norteadora fundamental para a cristandade: Continua o sábado bíblico sendo válido como o dia verdadeiro de repouso e adoração para a cristandade?

Entendemos que o exame dessa questão, na medida em que promovia a resolução de pontos obscuros, traria significativa contribuição teórica para a clarificação dessa doutrina bem como para a modificação de posturas diante da realidade abarcada. Daí a razão de termos elegido este tema, visto que a discussão sábado/domingo nos parecia de importância capital para a própria razão de ser do cristianismo.

A princípio a ideia central era saber quem tinha razão, mas, em face da esmagadora evidência que demonstrou a falácia dos pontos de vista contrários, assumiu-se como propósito da obra defender e justificar o sábado do sétimo dia dos ataques movidos contra ele, tanto dentro como fora da Bíblia, por parte de cristãos católicos e protestantes observadores do domingo, mostrando que as razões apresentadas em oposição ao sabatismo, eram de validade fragorosamente contestável. Daí o tom apologético que perpassa toda a obra.

De modo indireto, logrou-se também esclarecer algumas idéias errôneas a respeito do sábado e dos sabatistas. Os resultados obtidos na pesquisa confirmaram em cheio nossa hipótese, revelando que as objeções, embora engenhosas, não eram consistentes com o ensino bíblico nem com a lógica, tampouco encontram apoio na História e na Ciência.

Não eram essas objeções consistentes com o ensino bíblico, porque, como bem o sintetizou Harold Lindsell toda uma pesquisa indutiva numa só frase: “Não há nada nas Escrituras que exijam de nós a observância do domingo como dia santo em vez do sábado” (Christianity Today, 5 de novembro de 1976). As pretensas razões bíblicas aduzidas baseadas em passagens fora do contexto ou mal-interpretadas foram desmentidas neste trabalho pela saudável hermenêutica da própria Escritura, que varreu os equívocos um após outro. Nem Jesus, nem os profetas, nem Paulo, nem os apóstolos aboliram o sábado ou transferiram sua observância para outro dia.

Não eram as objeções consistentes com a lógica, porque nenhum dos argumentos levantados contra a santidade atual do sábado segue raciocínio rigoroso e conseqüente (dedução, indução, hipótese, inferência e outras

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operações intelectuais) que conclua legitimamente pela veracidade dessa premissa.

Também não encontraram as objeções apoio na História, porque não existem evidências de santificação semanal do domingo por parte dos cristãos antes do segundo século. Pelo contrário, as evidências indicam que por volta da metade desse século alguns cristãos observavam voluntariamente o domingo como dia de adoração, não como dia de repouso, em homenagem à ressurreição de Cristo neste dia. A substituição do sábado pelo domingo como dia de adoração, dentro da cristandade, ocorreu gradualmente por influência da igreja de Roma, quando esta começou a paganizar-se. Apesar disso sempre houve, em toda a Era Cristã, uma linhagem de fiéis que se manteve leal ao ensino bíblico, mesmo em meio a circunstâncias desfavoráveis, inclusive com risco de morte.

Não encontraram ainda as objeções apoio na Ciência, porque não existe nenhuma dificuldade real de o sábado ser observado de um pôr-do-sol a outro, em qualquer parte do planeta e em qualquer tempo terrestre, ainda que se leve em conta suas mudanças de calendário, seus fusos horários, suas longas noites e dias polares, a rotação do planeta etc.

Não encontraram finalmente as objeções apoio na impossibilidade de observância do sábado num mundo pós-moderno e numa sociedade plural e complexa, porque é perfeitamente possível santificar esse dia como dia de repouso físico, mental e espiritual, do contrário Deus não o teria feito para suprir uma necessidade humana específica fundamental. “O sábado foi feito por causa do homem” (Mar. 2:27). Tudo depende de agir-se nos casos excepcionais, segundo os legítimos critérios da Bíblia, do equilíbrio e do bom senso.

Analisadas as amplas evidências fornecidas, a conclusão final a que se chega é que, a despeito do que se pensa, os sabatistas da atualidade não inventaram o quarto mandamento. Receberam este ensino diretamente das Escrituras (Gên. 2:1-2; Êxo. 16:23-29; 20:8-11; Luc. 23:56) ou indiretamente de algum grupo de observador do sábado anterior a eles próprios, os quais, por sua vez, constituíram mais um elo na longa cadeia de observância sabática iniciada por Adão no Éden e levada avante pela linhagem dos fiéis filhos de Deus espalhados pela Terra através dos séculos — hebreus, judeus, primitivos cristãos, nazarenos, ebionitas, nestorianos, valdenses, lolardos, morávios, cátaros, albigenses, batistas do sétimo dia, adventistas do sétimo dia e outros.

Na realidade, o sábado continua sendo de direito o dia de repouso e adoração estabelecido por Deus na criação por um ato tríplice e ordenado em

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toda a Bíblia para a cristandade, e somente não o é de fato devido a desvios culturais e históricos que ocorreram a partir do início do segundo século da era cristã no embrião do cristianismo emergente, num caso raro de má formação congênita.

Nossa intenção, ao registrar por escrito as conclusões a que chegamos depois de analisar meticulosamente essas objeções à luz da Bíblia e da História, não foi a de criticar nem ferir. O trabalho não pretende ser instrumento de polêmica nem de acusação contra quem quer que seja. Visa apenas vindicar um mandamento divino suplantado pela tradição humana.

Diante dessa realidade, espera-se o leitor, após a leitura do trabalho, estabeleça em seu coração o sincero propósito de reexaminar convicções e, se preciso for, reconsiderar pontos de vista. Em nossa experiência cristã, não serão poucas as vezes em que precisaremos ajoelhar-nos debaixo da figueira, como fez Natanael, para pedir a Deus que nos esclareça a verdade (João 1:48).

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