dissertação claudia cruz final

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

    CLUDIA FERREIRA DA CRUZ

    TRANSPARNCIA DA GESTO PBLICA MUNICIPAL: Referenciais Tericos e a Situao dos Grandes Municpios Brasileiros

    RIO DE JANEIRO

    2010

  • ii

    CLUDIA FERREIRA DA CRUZ

    TRANSPARNCIA DA GESTO PBLICA MUNICIPAL: Referenciais Tericos e a Situao dos Grandes Municpios Brasileiros

    Dissertao de Mestrado apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Cincias Contbeis da Faculdade de Administrao e Cincias Contbeis da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial obteno do ttulo de Mestre em Cincias Contbeis.

    Orientadora: Prof. Dr. Aracli Cristina de Sousa Ferreira (FACC/UFRJ)

    Co-Orientador: Prof. LD. Lino Martins da Silva (FAF/UERJ)

    RIO DE JANEIRO

    2010

  • iii

    FICHA CATALOGRFICA

    C957 Cruz, Claudia Ferreira da. Transparncia da gesto pblica municipal: referenciais tericos e a

    situao dos grandes municpios brasileiros / Claudia Ferreira da Cruz. Rio de Janeiro: UFRJ, 2010. 140 f. 30 cm.

    Orientadora: Aracli Cristina de Sousa Ferreira, co-orientador: Lino Martins da Silva. Dissertao (mestrado) UFRJ/FACC, Programa de Ps-Graduao em Cincias Contbeis, 2010. Bibliografia: f. 122-130.

    1. Contabilidade. 2. Gesto pblica. 3. Portais eletrnicos. 4. Municpi- os - Brasil. Gesto. I. Ferreira, Aracli de Sousa. II. Silva, Lino Martins da. III. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Faculdade de Administrao e Cincias Contbeis. IV. Ttulo

    CDD 657

  • iv

    CLUDIA FERREIRA DA CRUZ

    TRANSPARNCIA DA GESTO PBLICA MUNICIPAL: Referenciais Tericos e a Situao dos Grandes Municpios Brasileiros

    Dissertao de Mestrado apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Cincias Contbeis da Faculdade de Administrao e Cincias Contbeis da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial obteno do ttulo de Mestre em Cincias Contbeis.

    BANCA EXAMINADORA:

    ____________________________________________________________

    Prof. Aracli Cristina de Sousa Ferreira, Dr FACC/UFRJ (orientadora)

    ____________________________________________________________

    Prof. Lino Martins da Silva, LD. FAF/UERJ (co-orientador)

    ____________________________________________________________

    Prof. Pierre Ohayon, Dr. FACC/UFRJ (examinador)

    ____________________________________________________________

    Prof. Francisco Jos dos Santos Alves, Dr. FAF/UERJ (examinador)

    ____________________________________________________________

    Prof. Cludia Ribeiro Pfeiffer, Dr. IPPUR/UFRJ (examinadora)

    Aprovada em 04 de maro de 2010.

  • v

    DEDICATRIA

    Dedico este trabalho memria do meu pai, que partiu cedo demais, sem ver este e muitos outros momentos de alegria.

    Ao meu noivo Paulo Almeida Neto, que me ensinou que o tempo presente o tempo mais lindo.

    E a todos aqueles que ainda acreditam que vale a pena ser pescador de iluses.

  • vi

    AGRADECIMENTOS

    Sempre ouvi dizer que seja costumeiro agradecer no fim de jornadas, de batalhas, ao conquistar uma vitria, ao ser livrado de um perigo, entre outras situaes. Acredito que o momento que estou vivendo agora seja de vitria, mas no de fim, afinal no h ponto de chegada para quem quer alcanar o horizonte. Esse momento representa sim a concluso de uma etapa, qual sucedero muitas outras, acredito ainda mais vitoriosas.

    Rendo graas inicialmente ao Senhor da minha vida e da minha histria, que me cumulou com bnos espirituais de toda sorte, fazendo-me viver momentos marcantes e de intenso crescimento pessoal e acadmico.

    Agradeo minha famlia, pela pacincia e incentivo ante a opo de fazer Mestrado em outro Estado e estar ausente em muitos momentos de convvio e de alegrias.

    No posso deixar de agradecer tambm a compreenso dos meus amigos, que prescindiram da minha companhia e construram uma ponte de 1649 Km ligando a Bahia ao Rio de Janeiro para me incentivar a seguir em frente em busca dos meus objetivos.

    Agradeo aos amigos que fiz no Rio de Janeiro, de modo especial a Fbio Verly, Mrcia Laura Fonseca e Ilana Benic, pelos momentos compartilhados, que me fizeram compreender que essa cidade realmente maravilhosa.

    Agradeo Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), pela concesso do afastamento que possibilitou a realizao do curso, em especial ao Magnfico Reitor Jos Carlos Barreto de Santana e aos colegas da Gerncia Financeira da UEFS.

    Aos professores do curso de Cincias Contbeis da Universidade Estadual de Feira de Santana, onde vivi a primeira experincia da universidade, por suas lies que vo alm de conhecimentos tcnicos e tericos, as quais despertaram em mim o desejo de buscar mais conhecimentos na rea contbil e abraar a carreira acadmica.

    Presto um agradecimento especial a dois amigos com os quais partilhei bons momentos de crescimento acadmico, que me fizeram encontrar o valor e o prazer da pesquisa cientfica em Contabilidade: Jos Renato Sena Oliveira, amigo e companheiro de jornada e de sonhos e Josu Pires Braga que, com sua determinao e disciplina, trilha um caminho semelhante.

  • vii

    Agradeo Universidade Federal do Rio de Janeiro, que me proporcionou, na Faculdade de Administrao e Cincias Contbeis, a oportunidade de uma edificante experincia acadmica.

    Agradeo Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (CAPES) pelo apoio realizao desse Mestrado, atravs da concesso da bolsa.

    Agradeo aos colegas da turma 2008 do Mestrado em Cincias Contbeis da FACC/UFRJ pelo companheirismo, em especial Roberval Rubens Silva e Alessandra Lima Marques. Ao meu fiel companheiro do Mestrado, Angelino Fernandes Silva, pela compreenso, companheirismo e apoio incondicional, nos corredores da FACC/UFRJ e no apartamento da Rua Dois de Dezembro.

    Agradeo Prof. Aracli Cristina de Sousa Ferreira, pela confiana e incentivo durante todo o curso de Mestrado e tambm por acolher minhas idias de pesquisa, mas tambm por cortar minhas asas nas situaes em que perdi o limite do vo.

    Agradeo ao Prof. Lino Martins da Silva, por acreditar em minhas idias e por suas valiosas contribuies que foram essenciais para o aperfeioamento desse trabalho.

    Agradeo aos professores da banca de qualificao: Prof. Pierre Ohayon e Prof. Jos Ricardo Maia de Siqueira, por suas valiosas contribuies a esse trabalho. E aos professores da banca examinadora que tambm contriburam para o aperfeioamento desse trabalho.

    Agradeo tambm ao Prof. Marcelo lvaro da Silva Macedo por suas contribuies no tratamento estatstico dos dados da pesquisa.

    Agradeo Escola Brasileira de Administrao Pblica e de Empresas (EBAPE/FGV), mais especificamente coordenao do Programa de Mestrado em Administrao Pblica e tambm Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), por meio da coordenao do Programa de Mestrado em Cincias Contbeis, os quais me proporcionaram experincias acadmicas que ultrapassaram os muros da UFRJ.

    Agradeo tambm aos professores do Programa de Mestrado em Cincias Contbeis da FACC/UFRJ, os quais deixaram mais que lies de Contabilidade, de modo especial ao Prof. Jos Augusto Veiga da Costa Marques, um exmio mestre da Contabilidade, que me deu apoio, compreenso e incentivo durante o Mestrado.

    A todos aqueles que direta ou indiretamente contriburam para este trabalho, meus mais sinceros agradecimentos.

  • viii

    No deixo, todavia, de experimentar uma extrema satisfao com o progresso que penso j haver feito na indagao da verdade e de conceber tais esperanas para o futuro que, se entre as ocupaes dos homens, puramente humanas, alguma existe solidamente boa e importante,

    ouso crer que foi a que escolhi.

    Descartes

  • ix

    RESUMO

    CRUZ, Cludia Ferreira da. Transparncia da gesto pblica municipal: um estudo emprico a partir dos portais eletrnicos dos maiores municpios brasileiros. Rio de Janeiro, 2010. 139f. Dissertao (Mestrado em Cincias Contbeis). Faculdade de Administrao e Cincias Contbeis, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010.

    Nesse estudo buscou-se verificar o nvel de transparncia das informaes acerca da gesto pblica divulgadas nos portais eletrnicos dos grandes municpios brasileiros e quais caractersticas e indicadores socioeconmicos dos municpios podem estar relacionadas com o nvel de transparncia observado. A partir do pressuposto adotado de que nos municpios mais desenvolvidos encontram-se as melhores condies (econmicas, sociais, polticas, tecnolgicas) para implantar melhores portais eletrnicos e divulgar mais informaes relativas gesto pblica, foram levantadas treze hipteses relacionando o nvel de transparncia da gesto pblica (ITGP-M) com as seguintes variveis: regio, localizao, filiao partidria do gestor municipal, participao do municpio na rede Mercociudades, acessibilidade do site da e os indicadores: PIB per capita, receita oramentria, IDH-M, taxa de alfabetizao, ndice FIRJAN, IRFS/CNM, ndice de Potencial de Consumo e Dinamismo municipal. Foram analisados os sites de 96 municpios includos entre os cem mais populosos do Brasil. O nvel de transparncia da gesto pblica foi verificado a partir de um modelo de investigao construdo com base em cdigos internacionais de boas prticas de transparncia e governana, na legislao brasileira aplicvel e nas experincias de pesquisas anteriores de natureza semelhante realizadas no Brasil e no exterior. No referencial terico foram abordados os conceitos de governana aplicada ao contexto da gesto pblica e da transparncia na gesto pblica. A principal teoria usada para sustentar os achados quanto ao nvel de transparncia foi a Teoria da Agncia. Foram efetuados testes paramtricos e no paramtricos de correlao e de diferena de mdia, anlise de regresso linear mltipla e anlise de clusters. As evidncias empricas apontam para baixos nveis de transparncia, considerados incompatveis com o seu desenvolvimento socioeconmico, porm esse entendimento compatvel com os pressupostos da teoria da agncia. As evidncias analisadas sugerem que as variveis: localizao, participao em redes de integrao municipal, PIB per capita, receita oramentria, IDH-M, taxa de alfabetizao, ndice FIRJAN e Dinamismo municipal exercem influncia direta e significativa sobre o nvel de transparncia da gesto pblica municipal. As relaes entre a varivel dependente e as variveis regio, filiao partidria, acessibilidade do site, IFRS/CNM e IPC no se mostraram significativas. O modelo de regresso explica 57% das variaes no ITGP-M, atravs das variaes na receita oramentria e no dinamismo municipal. Os 96 municpios da amostra foram agrupados em dois clusters, com base no desempenho obtido nas categorias de informaes que compem o ITGP-M. Com base nos resultados apresentados, pode-se concluir o pressuposto inicial dessa pesquisa de que, no geral, existe associao entre as condies socioeconmicas dos municpios e os nveis de transparncia na divulgao de informaes acerca da gesto pblica observados nos sites dos grandes municpios brasileiros que compem a amostra desse estudo.

    PALAVRAS - CHAVE: Transparncia; Gesto Pblica; Portais eletrnicos; Municpios.

  • x

    ABSTRACT

    CRUZ, Cludia Ferreira da. Transparncia da gesto pblica municipal: um estudo emprico a partir dos portais eletrnicos dos maiores municpios brasileiros. Rio de Janeiro, 2010. 139f. Dissertao (Mestrado em Cincias Contbeis). Faculdade de Administrao e Cincias Contbeis, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010.

    This study attempts to check the transparency level of information in public administration published in the homepages of the major Brazilian cities and which characteristics and socioeconomic indicators of the municipalities may be related to the level of transparency observed. It is assumed that the more developed cities present the best conditions (economic, social, political, technological) to deploy the best homepages and disseminate information about public management. Thirteen hypotheses are considered in relation to the level of transparency of public administration (ITGP-M) with the following variables: region, location, party affiliation of the city administrator, held by the municipality on the network Mercociudades, accessibility of site and indicators: GDP per capita, budget revenue, HDI, rate literacy, index FIRJAN, IFRS/CNM, Index of Consumption Potential and municipal dynamism. The sites of 96 municipalities, were analyzed, belonging to the one hundred most populous in Brazil. The level of transparency in public administration was established from a research model based on international codes of good governance and transparency, the Brazilian legislation and the experiences of previous studies of similar nature conducted in Brazil and abroad. On theoretical concepts were related to governance applied in the context of public management and transparency in public administration. The main theory used to support the findings regarding the level of transparency was the Agency Theory. Parametric and nonparametric correlation and mean differences tests, analysis of linear regression and cluster analysis were applied. The empirical evidence points to low levels of transparency, as incompatible with their socio-economic development, but this understanding is consistent with the assumptions of the Agency Theory. The reviewed evidence suggests that the variables: location, participation in networks of local integration, GDP per capita, budget revenue, HDI, literacy rate, index and dynamism FIRJAN municipal exert direct and significant influence on the level of transparency in public management municipal. The relationship between the dependent variable and the variable region, party affiliation, accessibility of the site, IFRS/CNM and Index of Consumption Potential were not significant. The regression model explains 57% of the variations in ITGP-M, caused by changes in budget revenue and municipal dynamism. The 96 municipalities of the sample were grouped into two clusters, based on performance achieved in the categories of information that make up the ITGP-M. Based on the results, the initial assumption of this research can be confirmed, that in general, there is an association between the socioeconomic conditions of the municipalities and the levels of transparency in the disclosure of information about public management observed in sites of large municipalities as in this study.

    WORDS - KEY: Transparency, Public Management, Homepages; Municipalities.

  • xi

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 Cadeia agente-principal no Municpio .................................................................... 40

    Figura 2 Ausncia de accountability em decorrncia da assimetria informacional .............. 41

    Figura 3 Atuao da accountability na relao Estado-Sociedade ........................................ 42

    Figura 4 Elementos da governana governamental ............................................................... 48

    Figura 5 Princpios basilares da boa governana corporativa ............................................... 50

    LISTA DE QUADROS

    Quadro 1 Principais caractersticas da Agency Theory .......................................................... 36

    Quadro 2 Princpios da governana no contexto do setor pblico ........................................ 51

    Quadro 3 Informaes constantes no instrumento de investigao do ndice de Transparencia de los Ayuntamientos (ITA) ............................................................................. 72

    Quadro 4 Categorias de informaes e bases tericas ........................................................... 84

    Quadro 5 Categorias de informaes constantes do ITGP-M ............................................... 85

    Quadro 6 Critrios de pontuao dos itens peridicos do modelo de investigao .............. 86

    Quadro 7 Municpios da amostra conforme a formao dos clusters ................................. 112

  • xii

    LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 Amostra da pesquisa ............................................................................................... 80 Tabela 2 Estatstica descritiva dos subitens do instrumento de coleta de dados ................... 97 Tabela 3 Estatsticas descritivas das variveis dependente e independentes......................... 99 Tabela 4 Frequncias absolutas e relativas .......................................................................... 101 Tabela 5 Frequncias absolutas e relativas .......................................................................... 101 Tabela 6 Teste de Kruskal-Wallis para diferena de mdia do ITGP-M por regies onde se localizam os municpios ......................................................................................................... 103 Tabela 7 Anlise da Varincia: ITGP-M vs. Regio ........................................................... 103 Tabela 8 Teste de Kruskal-Wallis para diferena de mdia do ITGP-M por localizao dos municpios .............................................................................................................................. 104 Tabela 9 Anlise da Varincia: ITGP-M vs. Localizao dos municpios .......................... 104 Tabela 10 Teste de Kruskal-Wallis para diferena de mdia do ITGP-M de acordo com a filiao partidria do gesto municipal (prefeito) .................................................................... 105 Tabela 11 Anlise da Varincia: ITGP-M vs. Filiao partidria do gestor municipal (prefeito) ................................................................................................................................. 105 Tabela 12 Diferena de mdias (teste paramtrico e no-paramtrico) .............................. 107 Tabela 13 Coeficientes de correlao (teste paramtrico e no-paramtrico) ..................... 108 Tabela 14 Resumo do modelo de regresso ........................................................................ 109 Tabela 15 Teste ANOVA para o modelo de regresso ....................................................... 110 Tabela 16 Coeficientes do modelo de regresso ................................................................. 110 Tabela 17 Distribuio dos clusters..................................................................................... 112 Tabela 18 Disposio dos municpios em relao varivel qualitativa regio aps a formao dos clusters ............................................................................................................. 113 Tabela 19 Disposio dos municpios em relao varivel qualitativa localizao aps a formao dos clusters ............................................................................................................. 113 Tabela 20 Disposio dos municpios em relao varivel qualitativa filiao partidria aps a formao dos clusters .................................................................................................. 114 Tabela 21 Disposio dos municpios em relao varivel qualitativa participao na rede Mercociudades de integrao municipal aps a formao dos clusters ................................. 114 Tabela 22 Disposio dos municpios em relao varivel qualitativa acessibilidade do site aps a formao dos clusters .................................................................................................. 114 Tabela 23 Mdia das variveis de natureza quantitativa por cluster e no geral .................. 115 Tabela 24 Centrides das variveis em cada cluster e no conjunto .................................... 115

  • xiii

    LISTA DE SIGLAS UTILIZADAS

    ANOVA Anlise da varincia

    ASES Avaliador e Simulador de Acessibilidade de Stios

    CF Constituio Federal

    CFC Conselho Federal de Contabilidade

    CNM Confederao Nacional de Municpios

    CO Centro-oeste

    COSO Committee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission FINBRA Banco de dados Finanas do Brasil

    FIRJAN Federao das Indstrias do Estado do Rio de Janeiro

    FMI Fundo Monetrio Internacional

    GASB Governmental Accounting Standards Board

    IAO ndice de Abertura Oramentria IBGC Instituto Brasileiro de Governana Corporativa

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    IDH-M ndice de Desenvolvimento Humano Municipal IFAC International Federation of Accountants IFDM ndice Firjan de Desenvolvimento Municipal INTOSAI International Organization of Supreme Audit Institutions IPC ndice de Potencial de Consumo IPSAS International Public Sector Accounting Standards

    IRFS ndice de Responsabilidade Fiscal, Social e de Gesto dos municpios ITGP-M ndice de Transparncia da Gesto Pblica Municipal LC Lei Complementar

    LRF Lei de Responsabilidade Fiscal

    N Norte

  • xiv

    NE Nordeste

    OECD Organisation for Economic Co-operation and Development PDT Partido Democrtico Trabalhista

    PIB Produto Interno Bruto

    PMDB Partido do Movimento Democrtico Brasileiro

    PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios

    PNUD Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento

    PP Partido Progressista

    PSB Partido Socialista Brasileiro

    PSDB Partido da Social Democracia Brasileira

    PT Partido dos Trabalhadores

    RGF Relatrio da Gesto fiscal

    RREO Relatrio Resumido da Execuo Oramentria

    S Sul

    SE Sudeste

    SPSS Statistical Package for the Social Sciences STN Secretaria do Tesouro Nacional

    TCU Tribunal de Contas da Unio

    TIC Tecnologias de Informao e Comunicao

    TSE Tribunal Superior Eleitoral

    UF Unidade da Federao

  • xv

    SUMRIO

    1 INTRODUO ................................................................................................................... 17 1.1 CARACTERIZAO DO PROBLEMA ................................................................................... 20

    1.2 OBJETIVOS ....................................................................................................................... 21

    1.2.1 Geral ....................................................................................................................... 21

    1.2.2 Especficos .............................................................................................................. 22

    1.3 JUSTIFICATIVA ................................................................................................................. 22

    1.4 DELIMITAO DO ESTUDO ............................................................................................... 24

    1.5 ESTRUTURA DO TRABALHO ............................................................................................. 25

    2 REFERENCIAL TERICO .............................................................................................. 27 2.1 TEORIA DA AGNCIA ....................................................................................................... 27

    2.1.1 Conceito e Pressupostos ........................................................................................ 27

    2.1.2 Histrico da Agency Theory .................................................................................. 31

    2.1.3 Assimetria informacional e problemas decorrentes da relao de agncia ..... 33

    2.1.4 Teoria da Agncia na Gesto Pblica .................................................................. 36

    2.2 GOVERNANA CORPORATIVA NA GESTO PBLICA ........................................................ 42

    2.2.1 Consideraes iniciais............................................................................................ 42

    2.2.2 Tendncias tericas da governana na Gesto Pblica ...................................... 52

    A Teoria da Escolha Pblica (Public Choice Theory) ................................................... 52

    A Teoria dos Ciclos Polticos (Political Budget Cycles Theory) .................................... 54

    A Teoria do Agir Comunicativo de Habermas ............................................................... 56

    2.3 TRANSPARNCIA NA GESTO PBLICA ............................................................................ 59

    2.3.1 Consideraes iniciais............................................................................................ 59

    2.3.2 Gesto fiscal transparente .................................................................................... 63

    2.3.3 Instrumentos de Transparncia da Gesto Pblica ........................................... 69

  • xvi

    2.3.4 Estudos com abordagem na transparncia de informaes de interesse pblico a partir de portais eletrnicos ....................................................................................... 73

    3 METODOLOGIA................................................................................................................ 79

    3.1 TIPOLOGIA DA PESQUISA .................................................................................................. 79

    3.2 PERFIL DA AMOSTRA DA PESQUISA .................................................................................. 79

    3.3 COLETA DE DADOS .......................................................................................................... 82

    3.4 CONSTRUO DO NDICE DE TRANSPARNCIA DA GESTO PBLICA MUNICIPAL (ITGP-M) ......................................................................................................................................... 82

    3.5 VARIVEIS, PROXIES E HIPTESES ................................................................................... 87

    3.6 TCNICAS DE ANLISE DOS DADOS .................................................................................. 93

    3.7 LIMITAES DO ESTUDO ................................................................................................. 94

    4 APRESENTAO DOS RESULTADOS ......................................................................... 97 4.1 O NVEL DE TRANSPARNCIA DA GESTO PBLICA MUNICIPAL ..................................... 97

    4.2 TESTES DE DIFERENA DE MDIAS ................................................................................ 102

    4.3 TESTES DE CORRELAO ............................................................................................... 107

    4.4 ANLISE DE REGRESSO ............................................................................................... 109

    4.5 ANLISE DE CLUSTERS ................................................................................................... 111

    5 SNTESE E CONSIDERAES FINAIS ...................................................................... 117 REFERNCIAS ..................................................................................................................... 122

    APNDICES .......................................................................................................................... 131

  • 17

    1 INTRODUO

    O presente estudo tem o propsito de abordar a questo da transparncia na divulgao de informaes acerca da gesto pblica por meio dos portais eletrnicos dos grandes municpios brasileiros. A transparncia na evidenciao dos atos e das contas da gesto pblica uma questo que encerra relevncia social e que ganhou maior notoriedade no Brasil a partir da edio da Lei Complementar n 101/2000. Porm a transparncia da gesto pblica ainda encontra-se em um estgio incipiente em decorrncia da divulgao de tais informaes se dar em um ambiente poltico e cultural marcado por ideologias e interesses diversos (SILVA, 2009, p. 340).

    Em diversos momentos da histria das sociedades, no mbito de atuao do Estado pde-se verificar que nem sempre houve alinhamento entre os interesses dos governantes e dos governados. Essa constatao encontra evidncias tambm no Brasil. Com efeito, a sociedade brasileira em diversas oportunidades presenciou conflitos de interesses na relao entre Estado e sociedade.

    Os conflitos observados entre Estado e sociedade podem ser compreendidos a partir dos pressupostos da Teoria da Agncia (Agency Theory). Essa teoria se desenvolveu a partir de problemas tpicos de organizaes privadas, porm os pressupostos da Teoria da Agncia tm sido largamente utilizados para validar pesquisas com foco nas organizaes do setor pblico (Slomski et. al., 2008, p. 32). A Teoria da Agncia baseia-se nas relaes contratuais que so comuns nas organizaes e preconiza que sempre haver conflitos na relao entre os

    gestores dos recursos organizacionais (agentes) e o proprietrio dos recursos (principal).

    Uma das razes dos conflitos considerados no mbito da Teoria da Agncia a assimetria informacional. De acordo com esse conceito, entre os atores que compem as organizaes, h grupos que possuem informaes mais privilegiadas do que outros. No mbito do setor pblico, a assimetria informacional pode ser visualizada quando o principal (sociedade) no tem pleno acesso s informaes acerca da atuao dos agentes (governantes eleitos). Segundo Slomski (2005, p. 32), essa informao imperfeita origina incertezas no que tange utilizao dos recursos pblicos de forma eficiente em defesa dos interesses da coletividade.

    Considera-se que a disponibilizao de informaes transparentes, tempestivas e relevantes acerca da gesto pblica e da alocao dos recursos pblicos por parte dos

  • 18

    governantes constitui um ato de responsabilidade na prestao de contas e que a literatura denomina de accountability (Silva, 2009, p. 341). Porm estudos realizados no Brasil (AKUTSU e PINHO, 2002; PINHO, 2006; SANTANA JNIOR, 2008, PAIVA e ZUCCOLOTTO, 2009) e no exterior (JUSTICE, MELITSKI e SMITH, 2006; HERAWATY e HOQUE, 2007; STYLES e TENNYSON, 2007; PREZ, BOLVAR e HERNNDEZ, 2008).tm constatado que h dficit de accountability na gesto pblica, nos diferentes nveis governamentais. Uma pesquisa realizada por Grau (2000) em pases latino-americanos revelou que na maioria deles o acesso livre a informaes da administrao pblica no era permitido e ainda que nos poucos pases em que tais informaes eram acessveis no havia nenhum dispositivo punitivo quando o acesso informao era negado.

    Tanto no setor privado como no setor pblico, h uma tendncia para a crescente demanda por prestao de contas e transparncia, bem como uma crescente conscincia da necessidade de se estabelecer controles, tendo em vista o equilbrio das instituies. A governana e outros assuntos relacionados tornaram-se, explcita ou implicitamente, questes importantes para as empresas, governo, polticas e, por ltimo, mas no menos relevante, para

    o pblico em geral (SLOMSKI et. al., 2008; SILVA, 2009). Essa um das razes por que os princpios de governana tm sido postos em prtica, tanto no setor privado como do setor pblico.

    Esforos no sentido de introduzir uma efetiva transparncia nos atos da administrao, com destaque para acompanhamento da elaborao, execuo e prestao de contas do oramento esto sendo gradativamente implementados no Brasil, inclusive com iniciativas de regulao prpria por parte de diversos municpios (MATIAS-PEREIRA, 2006). Alm disso, j esto em vigor dispositivos legais (Lei Complementar n. 101/2000, Lei Complementar n 131/2009 e Lei n 9.755/1998) que obrigam as entidades pblicas a divulgar relatrios peridicos com os resultados da aplicao dos recursos pblicos previstos nos instrumentos oramentrios, cujo objetivo promover o acompanhamento por parte da sociedade da aplicao dos recursos pblicos e responsabilizar os gestores que descumprirem as normas.

    A Constituio Federal promulgada em 1988 (BRASIL, 1988) dispe no art. 37 os princpios aos quais os entes pblicos (Unio, Estados, Distrito Federal e Municpios) devem obedecer, quais sejam: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficincia. A obedincia integralidade desses princpios pressupe a adoo de uma poltica eficaz de divulgao dos atos praticados. Isso suscita o entendimento que a transparncia no constitui

  • 19

    um mero sinnimo de abertura, mas deve considerar as exigncias de simplicidade, compreensibilidade e acessibilidade.

    Grau (2005) defende que o desenvolvimento de estratgias de informao e, em geral, a transparncia da gesto pblica constituem requisitos indispensveis para o exerccio do controle social sobre os atos da administrao pblica, assegurando ainda que a transparncia nos atos da administrao pblica , ao mesmo tempo, agente de democracia, de eficincia e de mudana e sustentao de polticas, por permitir aos atores sociais conhecer, opinar e fiscalizar todas as fases que compem o processo oramentrio.

    No entanto, Tesoro (2001 apud Grau, 2005) alerta que a verdadeira transparncia no se limita a permitir o acesso a determinadas informaes dispostas, muitas vezes, de acordo com a convenincia do gestor pblico, mas deve ensejar que qualquer cidado obtenha e interprete as informaes de modo a compreend-las completamente.

    Conforme afirma Slomski (2005), a sociedade tem convivido com o avano dos meios de comunicao, associado abertura de mercado, precedido de diversas transformaes em quase todos os segmentos, dentre os quais pode-se incluir a administrao pblica.

    A rede mundial de computadores (Internet) tem realizado significativas mudanas no processo de comunicao humana, de modo que as formas tradicionais de comunicao atualmente contem com o auxlio de recursos tecnolgicos que permitem que a distncia geogrfica se torne um conceito relativo. A difuso desse recurso tecnolgico que, na opinio de Oliveira e Martinez (2007) tem papel preponderante como meio de propagao de informao e conhecimento em diversas reas, alm de acesso mltiplo e massivo, j permite que o mesmo seja utilizado complementarmente, inclusive por recomendao legal (Lei Complementar n. 101/2000, Lei Complementar n 131/2009 e Lei n 9.755/1998), para divulgao de informaes dos atos da administrao pblica.

    Diante dessa realidade, os cdigos internacionais de boas prticas de governana na gesto pblica com destaque para os cdigos elaborados pela Organisation for Economic Co-operation and Development (OECD), pelo Fundo Monetrio Interancional (FMI) e pela International Federation of Accountants (IFAC), alm de sugerir as aes que se traduzem em boas prticas, tambm tm apontado a Internet como meio de comunicao com potencialidade de disponibilizar informaes de forma tempestiva e transparente aos diversos atores sociais.

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    Este trabalho buscou fazer um estudo da divulgao em meio eletrnico de informaes acerca da gesto pblica por parte dos grandes municpios brasileiros. Segundo Styles e Tennyson (2007, p. 64), os municpios de maior porte tendem a apresentar maior nvel de divulgao de informaes acerca da gesto municipal. Pinho (2006) tambm assume o pressuposto que nos municpios mais desenvolvidos encontram-se as melhores condies (econmicas, sociais, polticas, tecnolgicas) para implantar melhores portais eletrnicos. Esse estudo assume ainda que o municpio o ente federativo mais prximo dos cidados e ao qual esses recorrem para suprir as principais demandas sociais.

    1.1 CARACTERIZAO DO PROBLEMA

    Diversos estudos tm sido realizados com o objetivo de investigar a transparncia na divulgao de informaes no mbito do setor pblico, tanto no Brasil como no exterior, entre os quais se destacam: no Brasil Akutsu e Pinho (2002), Lock (2003), Bufoni et. al. (2005), Pinho (2006), Oliveira, Silva e Moraes (2008), Santana Jnior (2008), Souza et. al. (2008), Paiva e Zuccolotto (2009), entre outros; e no exterior Icerman e Sinason (1996), Welch e Wong (2001), Justice, Melitski e Smith (2006), Herawaty e Hoque (2007), Styles e Tennyson (2007) e Prez, Bolvar e Hernndez (2008).

    A maior parte desses estudos utilizou modelos de investigao da transparncia elaborados com base na literatura sobre governana e transparncia. Nesse estudo, o modelo de investigao utilizado diferencia-se pela abrangncia dos itens relacionados, ao considerar no apenas informaes fiscais contidas nos relatrios financeiros, mas tambm informaes de natureza qualitativa que, em princpio, so mais facilmente compreendidas pelos cidados. E ainda o estudo tem como objeto de anlise os municpios por considerar que esse ente federativo tem maior proximidade dos cidados, o que potencializa o interesse da coletividade nas informaes sobre a gesto dos recursos pblicos sob responsabilidade dos gestores municipais.

    A partir do exposto e do avano do uso da Internet como tecnologia de comunicao e divulgao de informaes concernentes administrao pblica, a presente pesquisa norteada pelas seguintes questes: Qual o nvel de transparncia das informaes acerca da gesto pblica divulgadas nos portais eletrnicos dos grandes municpios brasileiros? A partir da verificao do nvel de divulgao de informaes sobre a gesto pblicas pelos

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    municpios, espera-se encontrar diferentes nveis de divulgao. Os estudos que objetivam investigar a transparncia na divulgao de informaes no mbito do setor pblico, que tm sido realizados no Brasil como no exterior, a partir dos nveis observados, buscam identificar que fatores diferenciam uma unidade de outra. A partir da, delineia-se a questo: Que caractersticas e indicadores municipais podem estar relacionadas com o nvel de transparncia das informaes acerca da gesto pblica divulgadas nos portais eletrnicos municipais?

    A partir das constataes alcanadas por pesquisas de finalidades semelhantes e da literatura sobre governana pblica e transparncia, foram selecionadas as seguintes caractersticas dos municpios: Regio, Localizao, Filiao partidria do gestor municipal, participao do municpio em redes de integrao municipal, acessibilidade do site da prefeitura municipal e os indicadores: PIB per capita, receita oramentria, ndice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M), Taxa de Alfabetizao, ndice Firjan de Desenvolvimento Municipal (IFDM), ndice de Responsabilidade Fiscal, Social e de Gesto dos municpios (IRFS), ndice de Potencial de Consumo (IPC) e Dinamismo municipal.

    Uma vez que a maior parte das pesquisas anteriores com objetivos semelhantes encontrou relaes positivas entre os nveis de transparncia e diversos indicadores socioeconmicos, o pressuposto inicial que os municpios mais estruturados em termos sociais e econmicos tendem a apresentar maior evidenciao e maior transparncia de informaes acerca da gesto pblica divulgadas em seus portais eletrnicos.

    1.2 OBJETIVOS

    A partir da contextualizao e formalizao do problema de pesquisa, o estudo apresenta os seguintes objetivos:

    1.2.1 Geral

    Verificar o nvel transparncia das informaes acerca da gesto pblica divulgadas nos portais eletrnicos dos grandes municpios brasileiros e, a partir dessa verificao, identificar quais caractersticas podem estar associados divulgao e transparncia dessas informaes.

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    1.2.2 Especficos

    Identificar na literatura os instrumentos que podem ser associados a uma gesto pblica transparente;

    Verificar o nvel de divulgao de informaes acerca da gesto pblica nos portais eletrnicos dos maiores municpios brasileiros;

    Relacionar possveis fatores de influncia para uma maior ou menor transparncia na divulgao dos atos da gesto pblica municipal;

    Estimar um modelo de regresso linear mltipla que possa explicar a variao do nvel de divulgao eletrnica de informaes acerca da gesto pblica por parte dos municpios;

    Agrupar os municpios da amostra de acordo com o desempenho observado no nvel de divulgao das informaes concernentes gesto pblica.

    1.3 JUSTIFICATIVA

    Muito embora haja recomendao em textos legais no Brasil (Lei Complementar n. 101/2000, Lei Complementar n 131/2009 e Lei n 9.755/1998) acerca do uso de portais eletrnicos para divulgao de informaes acerca da gesto pblica, as informaes concernentes ao planejamento, execuo e prestao de contas do oramento das diversas esferas governamentais no so disponibilizadas com uniformidade na rede mundial de computadores, de modo que se pode observar portais com uma significativa quantidade de relatrios e outras informaes gerenciais e outros com reduzida evidenciao e poucas informaes (CRUZ, SILVA e SANTOS, 2009). Esse fato sugere uma investigao mais profunda da quantidade de informaes divulgadas e de quais fatores podem influenciar uma maior ou menor divulgao.

    As pesquisas que tm sido realizadas no Brasil com vistas a investigar a transparncia da gesto, tanto em municpios como em outros nveis de governo, em geral tm se resumido transparncia fiscal. Tais pesquisas tm investigado itens que j so de divulgao

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    obrigatria previstas na legislao pertinente. A despeito da relevncia das informaes fiscais, esse estudo entende, a partir das recomendaes de cdigos internacionais de transparncia e governana, que importante verificar a divulgao de informaes quantitativas e qualitativas em reas de grande interesse social, que no so contempladas nos relatrios fiscais previstos na legislao.

    O modelo de investigao proposto no presente estudo, alm de contemplar informaes relacionadas gesto fiscal, abrange tambm informaes quantitativas e qualitativas em reas de grande interesse social, informaes sobre as possibilidades e formas de participao popular e controle social divulgadas nas homepages dos municpios, alm de uma avaliao do site quanto acessibilidade do contedo. Por isso, considera-se que poder servir de referencial para pesquisas futuras, alm de instrumento de anlise por parte das prefeituras, atravs das secretarias ou assessorias de comunicao, quanto ao contedo que tm posto disposio da populao.

    A amostra contempla 96 municpios, considerados de grande porte, que se caracterizam por serem os mais populosos municpios brasileiros e que respondem por mais da metade (60%) da riqueza produzida no pas.

    O crescimento do uso da Internet em todo mundo e, de forma notvel no Brasil, fez desse meio de comunicao um recurso de grande valia para as organizaes. Silva e Moreira (2006) asseguram que, embora ainda haja muito espao para expanso, a Internet j se consolidou como instrumento de comunicao organizacional no setor pblico, porm necessrio que os gestores pblicos empreendam esforos para disponibilizar um contedo que favorea a participao popular e controle social, alm de adotar medidas que garantam a acessibilidade do contedo. A partir desse contexto, esse estudo tambm encontra relevncia por contribuir na identificao do nvel de informaes que so divulgadas nos portais dos municpios, a partir do modelo de investigao proposto.

    Portanto, este estudo foi motivado precipuamente pelo entendimento de que h carncia de estudos que investiguem a transparncia da gesto pblica municipal em meios eletrnicos e que contemplem variveis outras que no apenas as relacionadas gesto fiscal. Espera-se que as contribuies apresentadas possam, juntamente com os dados obtidos na pesquisa emprica, servir de referncia para que outros estudos venham a ser desenvolvidos acerca da temtica.

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    1.4 DELIMITAO DO ESTUDO

    A pesquisa abordou a questo da transparncia na divulgao de informaes acerca da gesto pblica por meio dos portais eletrnicos dos municpios brasileiros. Com base na literatura sobre governana pblica e transparncia, na legislao aplicvel e tambm na experincia de trabalhos anteriores, as informaes constantes no modelo de investigao compreendem os seguintes categorias: informaes gerais sobre o municpio, gestor municipal e vereadores; legislao municipal e instrumentos de planejamento municipal; informaes financeiras, relatrios contbeis e fiscais; informaes sobre a interao com os cidados e com a sociedade; anlise do portal do municpio; e informaes quantitativas e qualitativas sobre a gesto, que abrangem as seguintes reas: poltica tributria, administrao, licitaes e compras, segurana pblica, educao, cultura, esporte e lazer, habitao e urbanismo, sade, saneamento bsico, gesto ambiental, atividades econmicas (indstria, comrcio, servios e agricultura), trabalho e transportes.

    Como consta no modelo de investigao utilizado, apresentado como apndice nessa pesquisa, as categorias de informaes que compem o ndice de transparncia no foram avaliadas quanto sua maior ou menor relevncia para que um determinado municpio seja identificado com mais ou menos transparente. Conforme explicitado na metodologia do trabalho, o atendimento aos itens do modelo de investigao foi considerado a partir de uma lgica binria, ou seja, a existncia de determinado item acarretou a pontuao 1 e a no existncia a pontuao 0. Assim, o ndice de transparncia de cada municpio obtido a partir do somatrio dos pontos registrados. As informaes constantes no modelo de investigao foram agrupadas em categorias com base na especificidade das informaes e tambm para propiciar uma anlise qualitativa das informaes divulgadas nos portais eletrnicos dos municpios.

    Na hiptese de questionamento quanto possibilidade de identificar o nvel de transparncia na divulgao de informaes relativas gesto pblica nos portais eletrnicos dos municpios, Pereira (2004, p. 29) assegura que tudo na natureza passvel de mensurao, basta identificar qual numerus adequado a essa tarefa. Esse autor acrescenta que se atribui a Galileu a afirmao de que se deve medir o mensurvel e transformar em mensurvel o que, primeira vista, no for.

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    Dos 5.564 municpios existentes no Brasil, conforme contagem da populao realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica IBGE (2007), foi feito um recorte dos 100 maiores em termos populacionais. Esse critrio foi adotado basicamente por dois motivos: esses municpios abrigam mais de 40% da populao brasileira e so responsveis por 60% do Produto Interno Bruto (PIB) do pas; e tambm, conforme verificado em pesquisas anteriores (PAIVA e ZUCCOLOTTO, 2009), muitos dos municpios de menor porte no possuem homepage prpria, o que implicaria na excluso de um nmero considervel de municpios da amostra inicial.

    A aplicao do instrumento de coleta de dados foi feita exclusivamente na homepage oficial dos municpios que compem a amostra desse estudo. Os registros se limitaram s ocorrncias apresentadas no contedo dos sites existentes nos endereos constantes no domnio1 dos municpios. Dessa forma, quando da existncia de links2 que remetiam a contedos que estavam fora do domnio do municpio, esses no foram considerados.

    1.5 ESTRUTURA DO TRABALHO

    O trabalho est estruturado em cinco captulos, distribudos da seguinte forma:

    O primeiro captulo, denominado Introduo, apresenta o detalhamento do projeto de pesquisa desenvolvido, com a evidenciao do problema de pesquisa, os objetivos geral e especficos, as premissas nas quais o trabalho se baseia e a justificativa, alm da delimitao do estudo.

    No segundo captulo apresentado o referencial terico da pesquisa, que foi dividido em trs partes: a primeira aborda a Teoria da Agncia, seu conceito, pressupostos e histrico, alm das discusses sobre assimetria informacional e problemas decorrentes da relao de agncia e sobre a aplicao dos pressupostos da teoria da agncia na gesto pblica. A segunda parte trata da governana corporativa na gesto pblica e as tendncias tericas que tm sido mais recorrentes em pesquisas na rea, alm da Teoria da Agncia, a Teoria da Escolha Pblica, a Teoria dos Ciclos Polticos e a Teoria do Agir Comunicativo de Habermas. A terceira parte do referencial terico trata da transparncia na gesto pblica, da gesto fiscal

    1 Domnio o endereo do site do municpio que contenha o nome ou a sigla do municpio ou outra

    caracterstica que o identifique, cujo endereo seja associado pgina oficial do municpio. 2 Link um texto ou figura visualizado em uma homepage, capaz de remeter o usurio para outro documento ou

    pgina a partir de um clique.

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    transparente, cita alguns dos instrumentos de transparncia da gesto pblica e apresenta alguns estudos com abordagem em avaliao de transparncia a partir de portais eletrnicos.

    O terceiro captulo contm a metodologia do trabalho, a qual contempla a classificao da pesquisa, o perfil da amostra da pesquisa, a apresentao da coleta de dados e de como se deu a construo do ndice de transparncia da gesto pblica municipal (ITGP-M) e a descrio das variveis, proxies e hipteses, os procedimentos estatsticos realizados e as limitaes do estudo.

    No quarto captulo so apresentados os resultados obtidos a partir da pesquisa emprica, inicialmente com uma anlise qualitativa do ndice de transparncia no geral e por categorias de informaes e, em seguida so apresentados os resultados dos testes estatsticos realizados. O captulo 5 traz as consideraes finais e recomendaes para futuras pesquisas.

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    2 REFERENCIAL TERICO

    2.1 TEORIA DA AGNCIA

    2.1.1 Conceito e Pressupostos

    Em decorrncia da baixa complexidade das transaes realizadas nas organizaes, antes do surgimento das grandes corporaes, os papis de propriedade e gesto eram assumidos por uma s pessoa. Nesse cenrio, no havia oportunidade de surgir conflitos de interesses entre proprietrio e gestor dos recursos organizacionais. Porm, em decorrncia da expanso das grandes corporaes e, consequentemente, do aumento da complexidade das transaes geralmente realizadas por elas, os papis de propriedade e gesto no poderiam mais ser assumidos por uma nica pessoa.

    Desse novo cenrio, surge a necessidade de o proprietrio delegar a outra parte tarefas e responsabilidades pela gesto da organizao e de seus recursos. Em decorrncia dessa necessidade, o proprietrio dos recursos organizacionais delega as tarefas no pressuposto de que o indivduo que assumir a gesto trabalhar de acordo com os interesses do proprietrio. Entretanto, em decorrncia de fatores como as formas de avaliao de desempenho utilizadas pela empresa, o gestor, ao tomar decises, pode optar por alternativas que no estejam totalmente alinhadas com os interesses da organizao, bem como seu(s) proprietrio(s). Os conflitos de interesse que geralmente surgem em decorrncia dessa separao de papis entre proprietrios e gestores so responsveis por alguns problemas comuns nas organizaes. Tais problemas podem ser analisados e compreendidos a partir de uma linha terica conhecida como Teoria da Agncia ou do Agenciamento (Agency Theory).

    Em linhas gerais, a teoria da agncia tem seus pressupostos baseados na relao contratual em que o proprietrio (o principal) encarrega outra parte (o agente) de desenvolver alguma atividade em seu interesse, por meio da delegao de alguma forma de poder de deciso. Os precursores da teoria da agncia tinham como objetivo esclarecer as relaes contratuais entre os elementos de uma organizao, tendo em vista que esses elementos so motivados preponderantemente por interesses individuais.

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    A Teoria da Agncia foi concebida para resolver especificamente dois problemas que podem ocorrer numa relao de agncia. O primeiro problema de agncia surge quando (a) h conflito entre os objetivos do principal e do agente e (b) difcil ou excessivamente custoso para o principal monitorar as reais aes do agente. A questo aqui que o principal no pode verificar se o agente tem se comportado de modo apropriado. O segundo problema refere-se ao compartilhamento de risco que surge quando principal e agente tm atitudes diferentes em relao ao risco. Nesse caso, o problema que principal e agente podem preferir diferentes alternativas devido s suas diferentes preferncias ao risco (EISENHARDT, 1989, p. 58).

    De acordo com Eisenhardt (1989, p. 58), a unidade de anlise da teoria da agncia o contrato que orienta a relao entre principal e agente; j o foco da teoria consiste em estabelecer o contrato mais eficiente para dirigir a relao principal-agente. Tais contratos podem ser de naturezas distintas, formalmente estabelecidos ou no, de acordo com as relaes entre as partes do mesmo. Assim, pode-se admitir que as relaes existentes em uma organizao so sempre orientadas por contratos, os quais constituem elementos essenciais para garantir relaes equilibradas nas organizaes.

    A Teoria da Agncia tem sido largamente utilizada como marco terico em pesquisas acadmicas de vrias reas do conhecimento das cincias sociais e comportamentais, tais como: cincias contbeis, economia, finanas, marketing, cincia poltica, psicologia, sociologia e administrao. Mais especificamente, a teoria da agncia tm sido aplicado na investigao de fenmenos organizacionais, tais como: mecanismos de remunerao, implementao e diversificao de estratgias, relaes entre diretores, estrutura de propriedade e de financiamento, inovao e outros (EISENHARDT, 1989).

    Para Bonavides (1995 apud Slomski, 2005), a teoria da agncia figura entre as principais teorias modernas que procuram explicar os fundamentos da sociedade. Martinez (1998) acrescenta que nas trs ltimas dcadas as hipteses implcitas na Teoria do Agenciamento tm sido amplamente abordadas em pesquisas empricas. Isso favoreceu a consolidao dessa teoria como um referencial e instrumento relevante para o desenvolvimento do conhecimento nas reas onde aplicvel.

    A teoria da agncia tem nas relaes contratuais o seu sistema de referncia. Nesse contexto, a firma considerada como um conjunto de contratos que se intercalam e relacionam em vrios sentidos e entres diferentes partes da organizao. A partir desses contratos definem-se as relaes entre partes distintas e independentes. Ressalta-se, no entanto, que os contratos cujas relaes e implicaes se busca compreender a partir da Teoria

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    do Agenciamento no so necessariamente formalizados, mas pelo contrrio, podem muitas vezes se referir a contratos tacitamente concebidos.

    Embora a unidade de anlise da teoria da agncia seja as relaes contratuais, foi a partir da concepo de firma que suas premissas foram desenvolvidas. Segundo a concepo de Coase (1937, p. 388), a firma pode ser definida como um locus no qual o suprimento e a alocao de recursos so executados no por mecanismos de mercado, mas por autoridades que atuam nesse locus. Essa concepo baseia-se no modelo de empresa de controle concentrado, em que propriedade e gesto no so separadas. Na viso desse autor, essas atividades de suprimento e alocao de recursos so assumidas pela firma sempre que seu custo de mercado for superior.

    Em oposio essa concepo e com base nas grandes corporaes de controle pulverizado, Jensen e Meckling (1976, p. 310), no trabalho seminal da teoria da agncia, defendem que a essncia da firma no a autoridade, mas as relaes de contrato que se estabelecem interna e externamente. Em conformidade com esse entendimento, Fama (1980, p. 289), v a firma como um conjunto de contratos que se estabelecem entre os fatores de produo, em que cada fator motivado por seus prprios interesses.

    Os contratos de que tratam a Teoria da Agncia podem ser caracterizados com base na definio de Brousseau (1993 apud Slomski, 2005) na qual o contrato considerado um acordo por meio do qual as partes (agente e principal) se obrigam uns para com os outros a ceder ou se apropriar, realizar ou no determinadas atividades.

    Os contratos, em geral, so concebidos com a funo de estabelecer regras para a relao, o que implica na definio de direitos e deveres que cabem s partes envolvidas. Brousseau (1993 apud Siffert Filho, 1996, p.104) defende que os contratos so necessrios em decorrncia de alguns problemas que so comuns nas firmas (organizaes), entre os quais: dificuldade de tomar decises, ao mesmo tempo, compatveis e timas; oportunismo dos agentes; e risco e incerteza da atividade econmica.

    A partir dessas relaes de contrato, surge a denominada relao de agncia, que Jensen e Meckling (1976, p. 311) definem da seguinte forma:

    Ns definimos uma relao de agncia como um contrato pelo qual uma ou mais pessoas (o principal) contrata outra pessoa (o agente) para executar algum servio em seu nome, envolvendo a delegao de alguma autoridade para tomada de deciso ao agente. Se ambas as partes da relao so maximizadores de utilidade, h boas

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    razes para acreditar que o agente nem sempre agir conforme os melhores interesses do principal (traduo livre).

    Conforme a definio dos autores, para se caracterizar uma relao de agncia necessrio se identificar alguns requisitos:

    as partes do contrato: principal e agente, em que a esse ltimo delegado poder ou autoridade para tomar decises em nome e/ou de acordo com os interesses do primeiro;

    possibilidade de maximizao de utilidade: uma vez que so partes relacionadas, mas independentes, possuem interesses distintos que podem gerar conflitos.

    Hitt et. al. (1999 apud Slomski et. al., 2008, p. 32) acrescentam que uma relao de agncia se estabelece quando uma parte delega responsabilidades pela tomada de decises a uma segunda parte por uma determinada compensao.

    Com a relao de agncia caracterizada, os problemas tm incio quando um agente toma decises que geram resultados conflitantes com os interesses do principal. Dessa forma, a relao principal-agente pode dar origem ao oportunismo administrativo, que Slomski et. al. (2008, p. 33) definem como atitudes ou comportamentos desleais em relao organizao decorrentes de interesses pessoais. Esse oportunismo fundamenta-se em duas premissas da teoria da agncia: a inexistncia de agentes perfeitos e a impossibilidade de elaborar contratos completos que limitem e monitorem todas as aes dos agentes.

    Martinez (1998), ao tratar de relao de agncia, caracteriza as figuras do principal e do agente como sujeitos ativo e passivo, respectivamente, sendo que a relao presume que o agente realizar algo pelo principal em troca de uma contraprestao como suposta compensao.

    A teoria da agncia trata de problemas resultantes dos conflitos de interesse que emergem numa relao de contrato, formal ou informal, quando as partes contratantes possuem informao assimtrica ou h presena de interesses. O principal objetivo dessa teoria explicar como as partes contratantes efetuam seus contratos de forma a minimizar os custos associados aos problemas de informao assimtrica e incerteza. A teoria da agncia tambm ressalta a existncia do mercado e de mecanismos institucionais capazes de completar os contratos para reduzir aqueles problemas (ROZO, 2003).

    Conforme entendimento do autor referenciado, observa-se que os pressupostos da teoria da agncia tm potencialidade de explicar os fenmenos que se referem s relaes contratuais em diferentes tipos de organizaes. Tais organizaes podem ser tanto de

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    natureza privada como pblica e diversas pesquisas divulgadas no Brasil e no exterior tm confirmado essa tendncia.

    Lambright (2008, p. 209), tendo por base estudiosos da Agency Theory, tais como Jensen e Meckling (1976), Arrow (1984), Eisenhardt, (1989), Jensen (1994), Coats (2002), entre outros, enumerou os principais pressupostos da teoria da agncia:

    a) agente e principal so motivados por objetivos pessoais e recompensas concretas, que geralmente tm um valor financeiro determinvel;

    b) os problemas de agncia tm origem quando h conflito entre os objetivos do principal e do agente e quando difcil ou de alto custo monitorar as aes do agente;

    c) agente e principal so vistos como maximizadores de utilidades e os agentes tm racionalidade limitada e podem agir de forma oportunista. O oportunismo aqui referido diz respeito falta de sinceridade e honestidade na realizao de transaes, geralmente imbudas de autointeresse e astcia.

    d) os desdobramentos dos problemas de agncia podem ser compreendidos por meio dos conceitos de seleo adversa e risco moral.

    Eisenhardt (1989, p. 59) afirma que, apesar de haver pesquisadores que questionem os pressupostos da teoria da agncia, essa tem revelado capacidade de explicar uma diversidade de fenmenos que ocorrem nas organizaes que podem ser tratados como relaes contratuais de agncia.

    2.1.2 Histrico da Agency Theory

    De acordo com Santos (2004), a Teoria da Agncia, tal como divulgada atualmente, tem seu mrito creditado ao trabalho de Jensen e Meckling (1976), porm algumas de suas premissas j tinham sido relatadas por Adolf A. Berle e Gardiner C. Means no livro The modern corporations and private property, publicado em 1932. Nessa oportunidade os referidos autores trataram dos conflitos de interesse que so comuns em estruturas onde h separao entre propriedade e gesto. Para essa autora, a obra citada considerada o marco da Teoria do Agenciamento.

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    Considerada uma das novas teorias sobre a organizao econmica, cujos estudos se desenvolvem em termos de contratos, a Agency Theory tem sua origem nos estudos desenvolvidos na rea da economia da informao (MARTINEZ, 1998). Na Teoria da Agncia a informao vista como uma commoditie que possui valor e preo num mercado imperfeito, em decorrncia principalmente da existncia de assimetria de informaes. Segundo Goldsmith e Eggers (2006, p. 131) a relevncia da informao nas organizaes est diretamente relacionada ao acesso e defendem que melhor acesso informao gera melhores decises, que, por sua vez, reduzem riscos.

    A Teoria da Agncia desenvolveu-se sob duas abordagens principais: a Teoria Positivista e a Teoria do Principal-Agente (EISENHARDT, 1989; MARTINEZ, 1998). A primeira abordagem tem foco na identificao das situaes em que o principal e o agente provavelmente tero conflitos de objetivos; as variveis consideradas relevantes na influncia das relaes contratuais so a estrutura de capital da empresa, o grau de especializao dos seus ativos, os custos de informao e os mercados dos fatores de produo; essa linha apresenta um perfil mais retrico, que revelado pelo carter pragmtico de seus argumentos (MARTINEZ, 1998).

    Por sua vez, a abordagem da Teoria do Principal-Agente enfatiza a diviso dos resultados, que se desdobra em uma diviso dos riscos entre as partes envolvidas no contrato; a anlise nessa linha busca evidenciar, por meio de abordagens quantitativas, os efeitos da integrao dos fatores tpicos dos contratos entre o principal e o agente: estrutura de preferncia das partes contratantes; natureza da incerteza e a estrutura de informaes da organizao e do seu ambiente. Estudos baseados nessa linha conduzem a concluses voltadas a solues de equilbrio, atravs da anlise dos benefcios entre as diferentes estruturas de informaes e seus custos (MARTINEZ, 1998).

    Apesar de adotarem nfases distintas para compreender as relaes contratuais, as duas vertentes concordam que a unidade de anlise da Teoria da Agncia o contrato entre o principal e o agente. Segundo Albuquerque et. al. (2007), as abordagens possuem entendimentos semelhantes no que tange s pessoas, s informaes e organizao. A principal diferena entre as linhas tericas consiste no tratamento matemtico. Os estudiosos de orientao positivista dirigem esforos para identificar situaes provveis de existncia de conflitos nos objetivos do principal e do agente. Isso cria a necessidade de identificao de mecanismos de governana capazes de limitar o comportamento dos agentes. Dessa forma, a linha Positivista no adota o rigor matemtico caracterstico da teoria do Principal-Agente.

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    Nesse estudo, optou-se por utilizar a linha Agente-Principal da Agency Theory, pois para subsidiar o objetivo da pesquisa fez-se necessrio abordar as situaes em que os interesses dos agentes (governantes) no estivessem em consonncia com os interesses do principal (cidados), situao que gera uma lacuna informacional.

    2.1.3 Assimetria informacional e problemas decorrentes da relao de agncia

    No campo cientfico o surgimento das teorias tem uma motivao comum que resolver problemas relacionados a fenmenos que ocorrem em reas especficas ou ainda reas que se inter-relacionam. A teoria da agncia constitui uma linha terica multidisciplinar que surgiu com o objetivo de compreender os problemas de correntes da relao de agncia, ou seja, derivados dos conflitos de interesses entre partes envolvidas em um contrato no mbito de uma organizao.

    Segundo Hendriksen e Van Breda (1999, p.139):

    O trabalho mais recente na rea de teoria de agency tem-se concentrado nos problemas causados por informao incompleta, ou seja, quando nem todos os estados so conhecidos por ambas as partes e, assim, certas consequncias no so por elas consideradas. Tais situaes so conhecidas como assimetrias informacionais.

    Na concepo de Nossa, Kassai e Kassai (2000), uma caracterstica inerente s relaes principal e agente a necessidade de tomada de decises, as quais influenciam os interesses de ambas as partes. Um exemplo o desempenho de uma organizao que interessa ao principal e significativamente influenciado pelas decises dos agentes. Esses autores acrescentam que entre os diversos desafios enfrentados pelo principal nas relaes de agenciamento destaca-se a necessidade de monitorar as aes do agente.

    A assimetria informacional decorre da impossibilidade que o principal tem de observar todas as aes do agente, conforme corrobora Akdere e Azevedo (2006, p. 47), ocorre assimetria de informao quando a capacidade do principal de monitorar o comportamento e o trabalho do agente limitada, restringida ou interrompida por fatores que s so conhecidos pelo agente.

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    No entendimento de Slomski et. al. (2008, p. 36), ocorre assimetria informacional quando gestores dispem de informaes privilegiadas que se referem organizao em que atuam, de maneira que de outros stakeholders (partes interessadas) subtrada essa prerrogativa em decorrncia de sua no participao direta na gesto dos recursos organizacionais dos quais so proprietrios ou interessados. Essa situao pode ser exemplificada a partir de um contexto empresarial em que os administradores tm maiores informaes sobre reas estratgicas da empresa, tais como: estrutura de custos, posio competitiva, oportunidades e riscos de investimentos, entre outras.

    A existncia de assimetria informacional no se d apenas pela incapacidade do principal de monitorar o comportamento e o trabalho do agente, mas tambm em decorrncia dos interesses conflitantes. O agente recebe poder e autoridade para gerir recursos organizacionais que no so de sua propriedade, porm desenvolve interesses relacionados organizao que podem entrar em conflito com os interesses dos proprietrios (principal) e da prpria organizao. Devido ao poder que recebeu de gerir os recursos, o agente, ao tomar decises, pode optar por alternativas que lhe favoream mais, em detrimento dos interesses do principal. Como os resultados do trabalho do agente ser avaliado em relatrios de desempenho e outras informaes a serem analisadas pelo principal, o agente tende a revelar informao incompleta ou assimtrica. A quantidade e o tipo de informao revelada pelo agente a priori deve favorecer a sua permanncia como agente, o que assegura tambm a defesa dos seus interesses.

    A literatura sobre Agency Theory (Fama, 1980; Jensen & Meckling, 1976) quando aborda a questo da assimetria informacional, destaca dois problemas que decorrem do primeiro: a seleo adversa e o risco moral.

    O risco ou perigo moral (moral hazard) diz respeito falta de esforo por parte do agente que tem origem na incapacidade do principal de controlar todas as aes do agente. E a seleo adversa (adverse selection) est relacionada ao problema de acesso s informaes pelo principal acerca da atuao do agente. Segundo esse conceito, h uma quantidade desigual de informaes entre as partes e o principal no tem condies de avaliar se as aes do agente so as mais favorveis ou no maximizao dos seus interesses.

    De acordo com Lambright (2008, p. 210), a seleo adversa ou informao oculta se refere a uma situao em que um agente tem informaes relevantes que o principal no tem,

    as quais tm potencialidade de fazer alguma diferena numa tomada de deciso. O principal no tem como saber se o agente tomou as decises que melhor contribuem para os interesses

  • 35

    do principal. Em se tratando de risco moral, a referida autora utiliza tambm o termo ao oculta para fazer referncia dificuldade que o principal tem de observar e avaliar todas as aes do agente.

    Partindo dos conceitos relacionados aos problemas de agncia, Martinez (1998) corrobora a existncia de desafios para o principal a partir da necessidade de monitorar as atividades do agente. Segundo esse autor, os conceitos de seleo adversa e risco moral so cenrios prejudiciais observao e de julgamento do comportamento dos agentes por parte do principal.

    Diante da necessidade de monitorar as aes dos agentes em cenrios desfavorveis, Martinez (1998) definiu quatro principais momentos crticos que demandam ateno especial numa relao de agncia:

    criao: estruturar uma relao principal-agente que, mediante um contrato eficiente, assegure que as atitudes do agente sejam em defesa dos interesses do principal.

    controle: encontrar mecanismos que acompanhem o desempenho do agente, com vistas a assegurar que os interesses do principal sejam defendidos, que as melhores aes sejam realizadas, evitando a ocultao de informaes relevantes.

    desempenho: mensurar o desempenho do agente e criar mecanismos para verificar o esforo implementado pelo agente;

    concluso: encontrar os melhores mecanismos que assegurem que o rompimento da relao entre o principal e agente ocorra de modo harmonioso, evitando riscos de confrontos entre o agente e o principal em momentos posteriores.

    Entre os objetivos do desenvolvimento da teoria da agncia est, a partir da compreenso das implicaes das relaes contratuais, identificar mecanismos capazes de reduzir os conflitos de interesses presentes nas relaes de agncia. Conforme a recomendao de Martinez (1998) a relao de agncia possui momentos relevantes em que mecanismos de governana podem ser adotados com vistas a tornar a relao menos conflituosa e desgastante.

    At ento, os conceitos apresentados fazem referncia teoria da agncia de modo geral, que costuma remeter realidade das organizaes privadas e com finalidades lucrativas. O Quadro 1 apresenta as principais idias associadas teoria da agncia.

  • 36

    Quadro 1 Principais caractersticas da Agency Theory Item Caractersticas Idias chaves As relaes entre principal-agente devem refletir uma organizao

    eficiente (equilbrio) de informaes e de riscos entre as partes. Unidade de anlise Contratos celebrados expressa ou tacitamente que envolvem a

    delegao de atividades de uma parte (principal) a outra (agente). Hipteses humanas Interesses pessoais; racionalidade; averso ao risco. Hipteses Conflito de metas parciais entre as partes (principal e agente);

    Eficincia como critrio de efetividade; Assimetria de informaes entre principal e agente; Agente responsvel pelas atividades delegadas pelo principal.

    Problemas contratuais Agency (risco moral e seleo adversa); compartilhamento de riscos. Problemas dominantes

    Conflito entre os objetivos e disposio de assumir riscos do principal e do agente; Assimetria informacional; Dificuldade de monitoramento das aes do agente pelo principal.

    Custos de agency Despesas de estruturao; Despesas de monitoramento (sistemas de informaes, auditoria); Despesas de cobertura de seguros; Custo de oportunidade (Residual Loss).

    Restries s atividades dos agentes

    Altrusmo; reputao; controles burocrticos e do cliente.

    Fonte: Adaptados de Eisenhardt (1989).

    Embora se admita que a Teoria da Agncia fornea bases para a compreenso de relaes contratuais e seus desdobramentos, existem algumas limitaes a esta abordagem (LAMBRIGHT, 2008, p. 210). Entre essas limitaes, a autora referenciada cita que a teoria admite que as organizaes e as pessoas so motivadas principalmente por incentivos financeiros. Essa limitao poderia comprometer a capacidade de explicao de fenmenos que no envolvem variveis relacionadas com incentivos financeiros.

    2.1.4 Teoria da Agncia na Gesto Pblica

    De acordo com as idias do filsofo francs Jean-Jacques Rousseau expressas na obra clssica Do Contrato Social, o Estado surgiu para encontrar uma forma de associao que defenda e proteja, com toda a fora comum, a pessoa e os bens de cada associado ou, em outras palavras, para fazer face aos conflitos que so comuns na convivncia social. Segundo Rousseau, em um territrio com a presena da instituio Estado, os indivduos alienam seus direitos e liberdades em favor do Estado. Ao abrir mo dos seus direitos e liberdades em favor do Estado, os indivduos, tcita e livremente, aderem a um contrato social, o qual pressupe que a existncia do Estado se destina a promover o bem comum da coletividade (ROUSSEAU, 1996, p. 20).

  • 37

    O Estado, segundo Dallari (2003), uma ordem jurdica soberana que tem por fim o bem comum de um povo situado em determinado territrio. Esse fim maior de promoo do bem comum pode ser desdobrado em diversas funes. Segundo Stiglitz (2000 apud Matias-Pereira, 2006, p. 35), as funes bsicas do Estado so: promover a educao, fomentar a tecnologia, oferecer suporte ao setor financeiro, investir em infraestrutura, prevenir a

    degradao ambiental e promover o desenvolvimento sustentvel e criar e manter uma rede de seguridade social. evidente que em cada Estado, dependendo das formas de governo e da diviso administrativa do territrio, essas funes e seus desdobramentos so organizadas sob responsabilidade de diversos entes governamentais.

    Ao tratar do Estado como uma entidade abstrata, Chtelet e Pisier-Kouchner (1983, p. 77) enumeram os seguintes pontos como caractersticos do Estado:

    soberano e est encarregado de representar ou expressar a coletividade; possui um quadro jurdico e administrativo, que define suas regras, organizando as formas da existncia social: e se constitui na instncia governamental que, em ltima anlise, toma decises referentes aos negcios.

    Na concepo de Filellini (1994, p. 173):

    O Estado corresponde a uma idia de como a sociedade deve se organizar: legitimando e balizando pela lei, o uso da fora em relao aos seus prprios integrantes e atribuindo essa prerrogativa estritamente ao Estado, em seus representantes. Esse o chamado contrato social.

    Dessa forma, com o objetivo de auferir benefcios maiores da convivncia em sociedade, os indivduos organizam-se politicamente (territrio, populao, soberania e poder poltico) de tal forma que o interesse particular de alguns no prevalea sobre o bem-estar social comum maioria (SANTANA JNIOR, 2008, p. 29).

    por meio do governo (conjunto de rgos que exercem o poder poltico e que determinam a orientao poltica de uma sociedade) que o Estado exerce suas funes. Por meio da gesto pblica, funes relacionadas gerncia pblica nos negcios do governo (SANTANA JNIOR, 2008, p. 12), baseada em dispositivos legais, os governos criam condies para que as funes primordiais do Estado sejam executadas com vistas promoo do bem comum.

  • 38

    Entretanto, a execuo pelo Estado das atividades para as quais foi criado exige a disponibilidade de recursos financeiros. Nesse ponto, o cidado chamado a contribuir compulsoriamente, por meio de tributos, para a manuteno da estrutura da mquina administrativa governamental, bem como para a realizao dos investimentos nas reas de sua competncia que considerar mais prioritrias (educao, sade, saneamento bsico, transporte, infraestrutura, segurana pblica, tecnologia e outras).

    Santana Jnior (2008, p. 30), porm, alerta que a partir do momento em que os cidados so compungidos a pagar tributos, tambm passam a cobrar do Estado, por meio dos seus governantes e gestores pblicos, o cumprimento do contrato social. Com o isso, os cidados objetivam garantir que os recursos provenientes dos seus tributos (impostos, taxas, contribuies de melhoria e contribuies sociais) estejam sendo empregados de maneira eficiente, eficaz e efetiva.

    De modo anlogo ao que acontece em uma organizao privada com fins lucrativos, em que se verifica a existncia de uma rea de competio entre o principal (proprietrios ou acionistas) contra a assimetria informacional externa gerada pelo agente (administradores, diretores e gerentes), no mbito do setor pblico a mesma competio pode ser encontrada em diversos nveis (HEALD, 2003, p. 750). Os cidados (no papel de principal, porque so proprietrios dos recursos pblicos e, portanto, financiadores das atividades governamentais), no conseguem monitorar todas as aes do gestor pblico (agente, que recebeu por delegao o poder de gerir os recursos), que detm muito mais informao sobre os riscos, oportunidades e resultados na gesto do que o principal. Portanto, no ambiente estatal/governamental h condies para se caracterizar uma relao de agncia, o que permite que alguns problemas nesse ambiente possam ser analisados e compreendidos luz da Teoria da Agncia.

    Entre as inmeras aplicaes, a teoria da agncia tem sido amplamente utilizada por pesquisadores da rea de administrao pblica como base para a compreenso das relaes contratuais no mbito do setor pblico (LAMBRIGHT, 2008, p. 210).

    Slomski et. al. (2008, p. 131) tambm apresenta a Teoria da Agncia como umas das tendncias tericas fundamentais para estudos que tm como foco a gesto pblica. Como justificativa, os autores defendem que a anlise do conceito de relao de agncia permite admitir que as entidades pblicas possam ser vistas sob a perspectiva da Teoria do Agenciamento. Isso porque, ao observar o Estado e suas entidades sob o conjunto de contratos que representam, pode-se verificar claramente a existncia de uma relao de agncia, em

  • 39

    razo da existncia de trs premissas bsicas sugeridas por Siffert Filho (1996 apud Slomki et. al., 2008, p. 133), quais sejam:

    1) o agente (gestor pblico) dispe de vrios comportamentos possveis a serem adotados; 2) a ao do agente afeta o bem-estar de ambas as partes; 3) as aes do agente dificilmente so observveis pelo principal (cidados), o que leva existncia de assimetria informacional (informational asymmetry).

    As premissas sugeridas por Siffert Filho fazem referncia aos elementos necessrios para existncia de conflito na relao Estado-sociedade. Os gestores pblicos, que representam o Estado na gesto dos recursos financeiros disponibilizados pela sociedade, possui diversas possibilidades de comportamento Albuquerque et. al. (2007) afirmam que em muitos casos pode-se observar que os planos de governo nem sempre esto em consonncia com os anseios da coletividade, pois o gestor, mesmo na figura de representante do povo, dotado de certo nvel de autonomia na gerncia dos recursos financeiros.

    Segundo Slomski et al. (2008, p. 133), ao admitir a existncia de assimetria informacional entre agente e principal, surge a necessidade de avaliar se o agente (gestor pblico) sempre tomar as decises que maximizem os interesses do principal (cidados). A partir das premissas da teoria da agncia, pode-se admitir que no papel de agente, o gestor pblico possui interesses pessoais que podem estar relacionados sua condio de gestor e ainda que podem conflitar com os interesses dos cidados.

    A autonomia que o gestor pblico possui para escolher entre as alternativas de aplicao dos recursos pblicos, pode gerar insatisfao por parte da coletividade quando as reivindicaes sociais em reas prioritrias no so contempladas no oramento pblico. Nesse contexto, surge a necessidade da criao de mecanismos de governana que assegurem uma prestao de contas responsvel (accountability) dos atos da gesto pblica por parte dos gestores nos mais diversos nveis governamentais.

    A Figura 1 apresenta as possibilidades de existncia de relao de agncia e, consequentemente, de problemas de assimetria informacional no mbito municipal.

  • 40

    1 Estgio Cidado

    (principal) Prefeito (agente)

    2 Estgio

    Prefeito (principal)

    Secretrio (agente)

    3 Estgio

    Secretrio (principal)

    Diretor de rea (agente)

    4 Estgio

    Diretor de rea (principal)

    Servidor Pblico (agente)

    Figura 1 Cadeia agente-principal no Municpio Fonte: Slomski (2005, p. 33)

    O art. 1 da Constituio Federal prev a existncia de quatro entes federativos: Unio, Estados, Municpios e o Distrito Federal, todos dotados de autonomia poltica, administrativa e financeira. Como pode ser observado na Figura 1, no mbito municipal podem existir relaes de agncia em diversas esferas. O mesmo pode ser observado nos demais nveis de governo, observando a estrutura administrativa e hierrquica de cada ente. Esse estudo tem como objeto de estudo os municpios e, entre os estgios apresentados na Figura 1, se detm no primeiro estgio que trata da relao entre o gestor pblico eleito no mbito municipal (prefeito) e os muncipes.

    Marques (2007, p. 12) assegura que o conceito de governana corporativa estreitamente associado com accountability (responsabilidade em prestar contas), constituindo mais do que um princpio, uma exigncia das boas prticas de governana. Mello (2006) acrescenta que as exigncias relativas prestao de contas costumam variar de acordo com a natureza da entidade envolvida. A organizao do setor pblico, por essncia, comprometida com a garantia da integridade do que faz, no deve ter uma postura reativa, mas preventiva. Dessa forma, a entidade pblica no deve aguardar at seus dirigentes serem investigados, mas agir de forma a evitar o comportamento antitico na organizao.

    A discusso em torno dos problemas de agncia no contexto do setor pblico, de acordo com Albuquerque et. al. (2007), encontra na assimetria informacional o seu maior desafio, mas tambm que mais facilmente pode ser compreendido do ponto de vista didtico. Esses autores creditam assimetria informacional a mais relevante causa do distanciamento entre Estado e sociedade.

    A assimetria informacional no contexto do setor pblico e considerando o primeiro estgio entre os propostos por Slomski (2005, p. 33), ou seja, cidados (agente) e gestor eleito

  • 41

    (principal) tem consequncias danosas para a sociedade e para a legitimidade da ao do Estado. Essas consequncias decorrem de situaes concretas que podem ser exemplificadas por ineficincia dos canais de comunicao, insatisfao popular com a prestao de servios pblicos e falta de polticas pblicas que incentivem o exerccio da cidadania.

    Desse cenrio, surge um conflito informacional, no qual o agente (Estado) no cria mecanismos de comunicao eficiente com o principal (sociedade), devido aos rudos observados no processo (assimetria informacional). Albuquerque et. al. (2007) apresentam como mediadora do conflito informacional verificado a accountability, cujos atributos (transparncia, clareza e tempestividade) contribuem para a aproximao dos cidados com o Estado.

    A Figura 2 a seguir constitui uma ilustrao de que na presena de assimetria informacional e sem os atributos da accountability, o ciclo que representa o fluxo de informaes entre Estado e sociedade descontinuado.

    Estado

    Prestao de Contas

    Sociedade

    Recursos Financeiros

    Accountability

    Assimetria Informacional

    4

    12

    3

    Figura 2 Ausncia de accountability em decorrncia da assimetria informacional Fonte: Adaptado de Albuquerque et. al. (2007)

    Slomski (1999, p. 30) considera que a relao entre o Estado, representado pelos governantes eleitos e a sociedade, representada pelos cidados pode ser analisada em analogia a uma empresa de capital aberto e disperso, em que os acionistas (principal) investem recursos na organizao que sero administrados por executivos profissionais. Tomando como exemplo a estrutura poltica de um municpio, os cidados (principal) investem recursos ao Estado (agente), representado pelo gestor municipal e pela equipe de governo que, de acordo com um planejamento, os emprega em aes que, teoricamente, tm como fim ltimo beneficiar toda a sociedade.

    O governo possui a incumbncia de gerir os recursos, empregando-os na manuteno da estrutura estatal e na gerao de benefcios sociedade, por meio dos servios pblicos, e

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    da gesto desses recursos deve prestar contas. Quando na prestao de contas, as informaes no so apresentadas de forma clara, transparente e tempestiva, tem-se dficit de accountability e, consequentemente, assimetria informacional, causando distanciamento entre sociedade e Estado.

    A Figura 3 ilustra que na presena de accountability por parte do gestor pblico na gesto dos recursos pblicos arrecadados por meio dos tributos e convertidos em obras e servios pblicos no h assimetria informacional, o que contribui para a aproximao entre Estado e sociedade e favorece o exerccio da cidadania.

    A Figura 3 apresenta os efeitos da accountability na relao entre o Estado e a sociedade.

    Prestao de Contas

    Sociedade

    Administrao Pblica

    Processos Licitatrios

    Accountability

    Aproximao entre Estadoe Sociedade

    4

    12

    3

    Figura 3 Atuao da accountability na relao Estado-Sociedade Fonte: Adaptado de Albuquerque et. al. (2007)

    Conforme se pode observar na ilustrao, quando h accountability por parte do gestor pblico na gesto dos recursos pblicos arrecadados por meio dos tributos e convertidos em obras e servios pblicos no h assimetria informacional, o que contribui para a aproximao entre Estado e sociedade e favorece o exerccio da cidadania.

    2.2 GOVERNANA CORPORATIVA NA GESTO PBLICA

    2.2.1 Consideraes iniciais

    Nos ltimos anos, diversos pases, tanto desenvolvidos quanto em desenvolvimento, tm reavaliado o papel do governo na sociedade. Essas reavaliaes tm origem nas crises de

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    legitimidade por que passaram alguns desses pases (TIMMERS, 2000, p. 6) e tambm na cobrana por parte da sociedade por uma maior responsabilidade dos gestores pblicos em relao ao uso dos recursos pblicos (BARRET, 2001). Para Ryan e Ng (2000) a ateno dedicada governana corporativa no mbito do setor pblico uma tendncia mundial.

    As discusses que se sucederam deram origem a estudos que buscam relacionar e adaptar conceitos relativos governana ao contexto do setor pblico. De acordo com Timmers (2000, p. 5) pode-se admitir que at muito recentemente, as autoridades governamentais se concentravam na formulao de polticas e, quando necessrio, em gerenciar crises e incidentes; porm nos ltimos anos, a ateno foi visivelmente deslocada para o aperfeioamento da gesto em um contexto cada vez mais amplo, que se estende desde o controle de processos at a tomada de decises polticas. O autor acrescente que, por tratar-se do setor pblico, a transparncia desses processos adquire um papel fundamental. Essas mudanas verificadas no mbito do setor pblico tm sido analisadas a partir dos princpios e conceitos relacionados governana corporativa.

    Em termos gerais, a governana corporativa refere-se ao processo em que as

    organizaes so direcionadas e controladas e as responsabilidades so gerenciadas e tem como princpios basilares a transparncia, a integridade e a accountability. A governana tem como foco as estruturas e processos de tomada de deciso, prestao de contas, controle e comportamento dos gestores das organizaes (IFAC, 2001).

    Segundo o IFAC Study n 13 (2001), estudos realizados pelo Banco Mundial em 1999 concluram que h evidncias empricas em relao governana, no sentido de que existe uma forte relao causal entre a adoo de boas prticas de governana e a melhoria de indicadores sociais e econmicos, tais como maior renda per capita, menor mortalidade infantil e maiores ndices de alfabetizao. De acordo com Watson (2004), embora grande parte do debate sobre a governana corporativa tenha se concentrado no contexto de organizaes privadas com fins lucrativos, os princpios so to importantes, se no mais, no setor pblico. O International Federation of Accountants IFAC (2001) assegura que uma governana eficaz tambm essencial para construir e manter confiana nas entidades do setor pblico, ou ainda para que tenham legitimidade; e essa, efetivamente, constitui um elemento necessrio para que as entidades do setor pblico sejam eficazes na consecuo dos seus objetivos.

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    Segundo Barret (2001, p. 3), necessrio reconhecer a existncia de uma srie de fatores que indicam tanto a necessidade como a importncia da adoo de prticas de governana corporativa em organizaes do setor pblico. Entre outros fatores o autor cita:

    precariedade