dissertacao carreiras de tiro

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CARREIRAS DE TIRO:INTRODUO AOS PRINCPIOS, TCNICAS E DISPOSITIVOS CONDUCENTES SUA OPTIMIZAO

Jos Pedro Pais de Oliveira Fernandes Basto

Dissertao para a obteno do Grau de Mestre em

Engenharia Militar

JriPresidente: Professor Doutor Antnio Alberto do Nascimento Pinheiro Orientador IST: Professor Doutor Joo Paulo Janeiro Gomes Ferreira Orientador AM: Tenente-Coronel Engenharia Joo Antnio Sequeira de Almeida Vogais: Professor Doutor Jorge Manuel Calio Lopes de Brito Tenente-Coronel Engenharia Albano Manuel Claro Azevedo da Silva

Maio de 2008

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AGRADECIMENTOSA dissertao que se apresenta consiste da soma de um conjunto de esforos, sem os quais, o do autor no teria igualvel valor. O autor sente, dessa forma, que a manifestao de reconhecimento pelo contributo prestado, deve ser formalmente partilhada, expressa pelo desejo de aduzir os mais sinceros agradecimentos:

Ao TCor Joo Sequeira de Almeida pela permanente e total disponibilidade, revelada desde o primeiro contacto, pela resposta clere a todas as solicitaes, pela boa disposio e pacincia demonstrados ao longo de todo o processo de resoluo da dissertao, pela dedicao, esprito de sacrifcio e camaradagem revelados, no obstante feriados, fins de semana e frias, pelo afvel apoio, e pelo exemplo que representa enquanto Engenheiro Militar e Oficial do Exrcito. Ao Prof. Joo Ferreira pela forma humilde, sincera e dedicada com que abordou o tema, bem como pela motivao constante e pela autonomia que concedeu ao autor, tendo revelado um inesmitvel esprito crtico face a todos os assuntos, e pela disponibilidade revelada em prol da apresentao do trabalho. Ao Prof. Albano Neves e Sousa, professor do IST, pela forma descontrada e interessada como prestou esclarecimentos relativamente temtica da acstica, pela sugesto e cedncia de bibliografia. Ao TCor Adriano Firmino, desempenhando funes no Comando de Instruo e Doutrina do Exrcito, pela forma aberta e interessada com que abordou o trabalho do autor, materializada na forma afvel e disponvel como o recebeu em vora, e pela cedncia de bibliografia. Graciete, base de apoio pessoal incontornvel e incondicional, agradece a compreenso nas ausncias, a motivao nos momentos difceis, e a dedicao sempre presente, dia aps dia. famlia e amigos.

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RESUMOO estudo das infra-estruturas de tiro compreende a necessidade de reconhecer e avaliar os fenmenos abrangidos pela segurana, impacte ambiental e consequncias, para a sade no trabalho, do rudo e da contaminao pelo chumbo. Caracterizadas a natureza, a forma como se desenvolvem e as consequncias desses fenmenos nas carreiras de tiro e nos seus utilizadores, foram introduzidos os princpios, tcnicas e dispositivos, cuja adopo conduz optimizao dos conceitos de carreira de tiro exterior e interior. A anlise crtica de infraestruturas existentes permitiu realar a importncia da abordagem adoptada. Ao nvel da segurana, verificou-se a necessidade de adequar as condies de desenfiamento, atravs de dispositivos pra-balas concebidos para o efeito, diafragmas, muros ou paredes laterais em plataformas de tiro cobertas e fixas. Quanto ao rudo, verificou-se ser indispensvel envolver as plataformas de tiro com materiais absorventes acsticos, a obrigatoriedade da utilizao de protectores de ouvidos e, nas carreiras de tiro interiores, garantir o isolamento sonoro. A respeito da contaminao pelo chumbo, verificou-se, nas carreiras de tiro exteriores, a necessidade de controlar a disseminao de chumbo pelos recursos naturais e, nas interiores, de adequar os sistemas de ventilao. Verificou-se transversalmente a importncia da implementao de planos de sade, higiene e segurana. Os resultados revelam a urgncia de aprofundar as mudanas j sentidas no paradigma que norteou a concepo das carreiras de tiro nos sculos XIX e XX e de reestruturar os manuais e regulamentos em vigor. O novo paradigma ser vlido quer na concepo de infra-estruturas de raiz, quer na beneficiao das existentes.

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ABSTRACTThe study of firing ranges involves the identification and assessment of the different phenomena regarding safety requirements, environmental issues and occupational safety and health hazards regarding noise and lead exposure. After describing the source, means of propagation and effects of those phenomena on firing ranges and on its users, the different methods and technologies for optimization of outdoors and indoors firing ranges are presented. Concerning safety, the need to include adequate bullet traps, safety baffles, side walls and steady covered firing lines on the range layout is pointed out. Regarding noise control, the need for surrounding firing lines with sound barriers and treating them acoustically, and implementing the use of hearing protection devices was identified. On indoors firing ranges the sound isolation requirements must be met. Regarding lead exposure, the main protection systems consist of lead management practices, on outdoor firing ranges, and of well-designed ventilation systems, on indoor firing ranges. The major relevance of implementing health, hygiene, and safety plans was showed both for indoor and outdoor firing ranges. The results presented showed the urgent need to deepen the paragon enhancements already felt on the planning and construction of the 20 century firing ranges. This new paragon will be applicable both on new firing range sites and on the improvement of older ones.th

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PALAVRAS-CHAVECarreira de tiro Segurana Desenfiamento Controlo de rudo Chumbo

KEYWORDSFiring range Safety Range layout Noise Control Lead

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CONTEDOAGRADECIMENTOS ....................................................................................................... I RESUMO .................................................................................................................... III ABSTRACT ..................................................................................................................V PALAVRAS-CHAVE ....................................................................................................VII KEYWORDS ...............................................................................................................VII CONTEDO ................................................................................................................IX LISTA DE FIGURAS ....................................................................................................XIII ABREVIATURAS ........................................................................................................ XV NOMENCLATURAS .................................................................................................... XV

CAPTULO 1 INTRODUO............................................................................. 1 CAPTULO 2 ENQUADRAMENTO TERICO .................................................. 32.1 RESENHA HISTRICA ............................................................................................. 3 2.2 CONCEITOS ........................................................................................................... 52.2.1 DEFINIO DE CT............................................................................................................ 5 2.2.2 CLASSIFICAO DAS CT .................................................................................................. 7 2.2.3 CONSTITUIO DA CT...................................................................................................... 82.2.3.1 ZONA DE SERVIOS E ZONA DE TIRO INFRA-ESTRUTURAS .........................................................9 2.2.3.2 ZONA PERIGOSA ....................................................................................................................10

CAPTULO 3 ASPECTOS CRTICOS ............................................................. 133.1 ASPECTOS DE SEGURANA BALSTICA ................................................................. 133.1.1 TRAJECTRIAS E FEIXE DE DISPERSO........................................................................... 13 3.1.2 RICOCHETES ................................................................................................................. 14 3.1.3 EFEITOS DE PENETRAO DOS PROJCTEIS ................................................................... 15 3.1.4 DESENFIAMENTO ........................................................................................................... 15

3.2 RUDO................................................................................................................. 163.2.1 FONTE DE RUDO ........................................................................................................... 16 3.2.2 MEIO DE TRANSMISSO ................................................................................................. 19 3.2.3 ZONAS DE RECEPO .................................................................................................... 20 3.2.4 DISPOSIES REGULAMENTARES ................................................................................... 21 3.2.5 PERDA DE AUDIO E EFEITOS FISIOLGICOS DO RUDO ................................................ 23 3.2.6 IMPACTE AMBIENTAL ...................................................................................................... 25

3.3 EXPOSIO AO CHUMBO ..................................................................................... 253.3.1 FONTES DE CONTAMINAO........................................................................................... 26 3.3.2 FORMAS DE ADMISSO AO ORGANISMO .......................................................................... 27 3.3.3 DISPOSIES REGULAMENTARES ................................................................................... 28 IX

3.3.4 EFEITOS FISIOLGICOS DA CONTAMINAO .................................................................... 29 3.3.5 IMPACTE AMBIENTAL CONTAMINAO DOS RECURSOS NATURAIS ................................. 303.3.5.1 EROSO ................................................................................................................................31

3.4 EQUIPAMENTOS GERAIS ...................................................................................... 323.4.1 SISTEMAS DE ALVOS...................................................................................................... 32

CAPTULO 4 CT EXTERIORES ...................................................................... 354.1 SEGURANA ....................................................................................................... 354.1.1 DISPOSITIVOS DE DESENFIAMENTO ................................................................................ 354.1.1.1 ESPALDO FRONTAL E CMARA PRA-BALAS............................................................................35 4.1.1.2 DIAFRAGMAS .........................................................................................................................38 4.1.1.3 TRAVESES DIAFRAGMAS INFERIORES .....................................................................................40 4.1.1.4 ESPALDES E MUROS LATERAIS ..............................................................................................41 4.1.1.5 OUTROS DISPOSITIVOS DE DESENFIAMENTO ..............................................................................43

4.1.2 PLATAFORMA DE TIRO ................................................................................................... 444.1.2.1 CONDICIONAMENTO ACSTICO ................................................................................................45

4.1.3 LEITO DA CT ................................................................................................................. 46 4.1.4 LINHA DE ALVOS E ABRIGO DE MARCADORES................................................................... 47

4.2 RUDO................................................................................................................. 494.2.1 IMPLANTAO................................................................................................................ 51 4.2.2 BARREIRAS ACSTICAS ................................................................................................. 51 4.2.3 EQUIPAMENTOS DE PROTECO INDIVIDUAL AUDITIVA .................................................... 53

4.3 EXPOSIO AO CHUMBO ..................................................................................... 544.3.1 CONTAMINAO DOS RECURSOS NATURAIS TCNICAS DE INTERVENO ...................... 554.3.1.1 CONTROLO E RETENO DE PROJCTEIS ..................................................................................55 4.3.1.2 LIMITAO DA MOBILIDADE DO CHUMBO....................................................................................56 4.3.1.3 EXPURGO E RECICLAGEM DE PROJCTEIS ................................................................................58

4.4 EQUIPAMENTOS GERAIS ...................................................................................... 584.4.1 SISTEMAS DE ALVOS...................................................................................................... 58

4.5 CASO DE ESTUDO CT EXTERIOR DE 50 M........................................................... 594.5.1 DESCRIO SUMRIA .................................................................................................... 594.5.1.1 NOTA HISTRICA ...................................................................................................................59 4.5.1.2 INFRA-ESTRUTURAS................................................................................................................59

4.5.2 ANLISE CRTICA ........................................................................................................... 624.5.2.1 ANLISE ................................................................................................................................62 4.5.2.2 PROPOSTAS DE INTERVENO .................................................................................................63

CAPTULO 5 CT INTERIORES ....................................................................... 675.1 DISPOSIES CONSTRUTIVAS .............................................................................. 67 5.2 SEGURANA: DISPOSITIVOS DE DESENFIAMENTO ................................................. 685.2.1 DISPOSITIVOS PRA-BALAS ............................................................................................ 68

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5.2.2 DIAFRAGMAS ................................................................................................................. 725.2.2.1 TECTO ..................................................................................................................................73 5.2.2.2 PAREDES LATERAIS E LEITO DA CT ..........................................................................................75

5.2.3 BORRACHA BALSTICA ANTI-RICOCHETE ......................................................................... 75

5.3 RUDO................................................................................................................. 765.3.1 CONDICIONAMENTO ACSTICO ....................................................................................... 77

5.4 EXPOSIO AO CHUMBO ..................................................................................... 795.4.1 SISTEMA DE VENTILAO ............................................................................................... 795.4.1.1 SISTEMA DIRECTO VS SISTEMA FECHADO .................................................................................81 5.4.1.2 SOLUES DE INSUFLAO .....................................................................................................82

5.4.2 PLANOS DE SADE, HIGIENE E SEGURANA.................................................................... 83

5.5 CONSIDERAES GERAIS .................................................................................... 855.5.1 SISTEMAS DE ALVOS...................................................................................................... 85 5.5.2 ILUMINAO .................................................................................................................. 86 5.5.3 SEPARADORES DOS POSTOS DE TIRO............................................................................. 86

5.6 CONSIDERAES APLICVEIS A TODAS AS CT ...................................................... 87 5.7 CASO DE ESTUDO CT INTERIOR 25 M................................................................. 885.7.1 DESCRIO SUMRIA .................................................................................................... 885.7.1.1 NOTA HISTRICA ...................................................................................................................88 5.7.1.2 INFRA-ESTRUTURAS................................................................................................................88

5.7.2 ANLISE CRTICA ........................................................................................................... 915.7.2.1 ANLISE ................................................................................................................................91 5.7.2.2 PROPOSTAS DE INTERVENO .................................................................................................93

CAPTULO 6 CONCLUSES.......................................................................... 95REFERNCIAS ........................................................................................................... 97 ANEXO A TABELAS DE EFEITO DE PENETRAO DE PROJCTEIS ................................ I ANEXO B NVEIS DE PRESSO SONORA E ESPECTROS DE FREQUNCIAS .................... V

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LISTA DE FIGURAS

Figura 3.1- Comprimentos de onda............................................................................................. 18 Figura 4.1 - Cmara pra-balas e abrigo dos marcadores dos alvos......................................... 37 Figura 4.2 - Desenfiamento atravs de diafragmas pra-balas inclinados a 25 com e sem sobreposio no plano horizontal................................................................................................ 39 Figura 4.3 - Seco de diafragma inferior mista ......................................................................... 40 Figura 4.4 - Regra no side gap.................................................................................................... 42 Figura 4.5 - Pala da plataforma de tiro........................................................................................ 44 Figura 4.6 - Influncia do modelo da cobertura da plataforma de tiro quanto reflexo das ondas sonoras ............................................................................................................................. 46 Figura 4.7 - Abrigo para marcadores dos alvos com paradorso................................................. 48 Figura 4.8 - Efeito de uma barreira acstica na propagao das ondas sonoras ...................... 52 Figura 4.9 - Fotografia da cobertura da plataforma de tiro, vista do interior............................... 60 Figura 4.10 - Fotografia do gap existente entre a pala da plataforma de tiro e o primeiro diafragma, vista de um posto de tiro. .......................................................................................... 61 Figura 5.1 - Representao esquemtica e fotografia do dispositivo de deteno, deflexo e recolha de projcteis do tipo veneziana ...................................................................................... 70 Figura 5.2 - Representao esquemtica da instalao de lminas de borracha pra-balas e fotografia de lminas de borracha pra-balas instaladas em avanado estado de desgaste. ... 71 Figura 5.3 - Representao esquemtica da instalao de caixa vertical de granulado de borracha pra-balas e fotografia de um espaldo inclinado de granulado de borracha. ......... 72 Figura 5.4 - Fotografia da zona de tiro de uma CT interior ......................................................... 74 Figura 5.5 - Fotografia da grelha de insuflao. ......................................................................... 90 Figura 5.6 - Fotografia do sistema de projeco dos alvos e de iluminao, vista dos alvos para a plataforma de tiro, e fotografia do leito e diafragmas superiores, vista de um posto de tiro. .. 91

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ABREVIATURASCT Carreira de Tiro IT Infra-estrutura de Tiro ZP Zona Perigosa

NOMENCLATURASCAPS Centro de Anlise e Processamento de Sinais EPA Environmental Protection Agency. EUA Estados Unidos da Amrica DSHEFS Division of Surveillance, Hazard Evaluations and Field Studies MT-38-2 Caracterizao e Tcnica das Infra-Estruturas de Tiro, Manual Tcnico NASR National Association of Shooting Ranges NEHC Navy Environmental Health Center NIOSH National Institute for Occupational Safety and Health NRA National Rifle Association NSSF National Shooting Sports Foundation RAD-38-1 Regulamento Administrativo das Infra-Estruturas de Tiro RGR Regulamento Geral do Rudo. RTFSCCT Regulamento Tcnico e de Funcionamento e Segurana das Carreiras e Campos de Tiro, 2007 ETL Engineering Technical Letter NEHC-TM Navy Environmental Health Center Technical Manual CFR Code of Federal Regulation MIL-HBDK Military Handbook

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CAPTULO 1 INTRODUOAps a publicao dos primeiros regulamentos contendo determinaes sobre a instruo de tiro com armas portteis pelo Exrcito Portugus, em finais do sculo XVIII, foi dado um grande e valioso impulso construo de Carreiras de Tiro (CT), a maioria das quais veio a ser instalada em locais onde ainda hoje se encontram. A sua implantao cuidava particularmente a proximidade aos quartis e a existncia de uma zona de segurana retaguarda do espaldo frontal e nos flancos da CT. Com o decorrer dos anos, as localidades existentes nas proximidades dos quartis foram estendendo os seus limites urbanos, o que levou, em muitos casos ao envolvimento desses quartis e respectivas CT. Este facto veio a originar prejuzo para a segurana das populaes e, simultaneamente, presso sobre os terrenos urbanizveis, o que levou extino ou transferncia de muitas dessas CT (Nogueira, 1999). A expresso desta realidade a extino da CT de Pedrouos, Lisboa, em 1891 (Nogueira, 1999), a permuta dos terrenos das CT do Regimento de Artilharia n 5, sito na Serra do Pilar, Vila Nova de Gaia, que permitiu a construo da ponte ferroviria de S. Joo, em 1984, e, mais tarde, a cedncia dos terrenos onde se haviam construdo as novas CT em 1990/91 para construo da via de acesso Ponte do Infante D. Henrique, em 2003, e a muito actual transio dos terrenos da CT de Sete Fontes, em Braga, do Ministrio da Defesa para o Ministrio da Sade, visando a construo do novo Hospital Distrital de Braga. Outros fenmenos que vieram a ter reflexos nas CT foram o processo de profissionalizao vivido no Exrcito, que culminou com o fim do Servio Militar Obrigatrio, em 2004, e a organizao do actual dispositivo de foras. Estes vieram alterar substancialmente os encargos da instruo de tiro do Exrcito, deixando muitas das infra-estruturas existentes necessitadas de intervenes profundas, devido manuteno pouco cuidada de que foram alvo nos ltimos anos, tendo contribudo para tal, tambm, a alterao dos quadros orgnicos das unidades, onde as seces de tiro foram extintas, passando os assuntos do tiro a integrar rgos com outras tarefas prioritrias e sem meios para responder s exigncias de manuteno das Instalaes de Tiro (IT). A conjugao destes factos fez vir a debate a urgncia em promover uma reorganizao territorial das CT. Nesta se insere a necessidade de avaliar e reconhecer todos os fenmenos decorrentes da prtica de tiro, luz das exigncias actuais. Esta necessidade to vlida no que respeita ao melhoramento das infra-estruturas existentes, como na concepo de infraestruturas de raiz e, no menos, no destino a ser dado aos terrenos onde outrora estiveram implantadas CT. Hoje, a sustentabilidade econmica dessas infra-estruturas deve ir alm do tradicional conceito de segurana, alcanando incontornavelmente a considerao dos impactes ambientais provocados quer pelo rudo, quer pela contaminao dos recursos naturais por resduos txicos associados prtica de tiro, nomeadamente o chumbo. No que respeita a segurana, no deve 1

revestir-se somente dos aspectos tradicionalmente associados balstica, mas igualmente aos que esto ligados sade e segurana no trabalho. Imbuda deste alento, a presente dissertao promove o objectivo de reunir um conjunto de informaes dispersas, constituindo-as num corpo de disposies descritivas destinado a dar uma directiva s aces de planeamento, concepo e projecto de carreiras de tiro. Para o efeito, a metodologia que a sustenta traduziu-se no reconhecimento e exame cuidadoso dos diferentes aspectos de cada quesito e na introduo aos princpios, tcnicas e dispositivos, cuja adopo resultar num aproveitamento mais completo e racional das infra-estruturas de tiro. A presente dissertao organiza-se em cinco captulos, para alm do presente, do modo que a seguir se descreve: Captulo 2 Enquadramento Terico: Apresenta uma breve sntese histrica e so introduzidos os conceitos gerais sobre Carreiras de Tiro. Pretende-se clarificar os termos especficos sobre esse assunto, esclarecendo quais os elementos que constituem estas infra-estruturas. Captulo 3 Aspectos Crticos: Introduz as questes crticas da concepo de Carreiras de Tiro, descrevendo e caracterizando os aspectos que lhe dizem respeito, e apresentando o estado actual do conhecimento. Captulos 4 e 5 Carreiras de Tiro Exteriores e Interiores: Apresentam os princpios, tcnicas e dispositivos, cuja adopo deve conduzir optimizao de Carreiras de Tiro Exteriores e Interiores. Ao longo dos dois captulos, so sugeridos critrios relevantes para a avaliao comparativa. No final de ambos, apresentado um breve estudo de caso, enfocando a aplicao das disposies que figuram nos respectivos captulos. Captulo 6 Concluses: Sistematiza as principais concluses, apontando propostas de desenvolvimento de outros trabalhos para o futuro.

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CAPTULO 2 ENQUADRAMENTO TERICO 2.1 RESENHA HISTRICAA histria da guerra encerra milhares de anos, podendo ser contada desde as origens da Humanidade. Podem destacar-se os inmeros fenmenos sociais, polticos, econmicos e tecnolgicos que esta desencadeou. Alis, at praticamente ao final do sculo XIX, os principais desenvolvimentos tecnolgicos feitos pelo Homem devem-se, na sua gnese, indstria da guerra. Como refere o Major General Fuller, a necessidade de combater conduziu rapidamente os homens para invenes cuja finalidade particular era permitir-lhes vencer. A descoberta da plvora e o subsequente desenvolvimento das armas de fogo um dos captulos fundamentais da histria do armamento e da guerra. A origem das armas de fogo obscura (Canby, 1965). Cr-se que os chineses j possuam plvora no sc. XI, tendo sido introduzida no ocidente pelos rabes no sc. XIII. O mais antigo documento a mencionar o canho um documento redigido em rabe; data de 1304 (Fuller, ). A partir do sc. XIV, a meno a armas de fogo na Europa ganha alguma consistncia. Ainda segundo Fuller ( ), os progressos das armas de fogo foram rpidos. Nos finais do sculo XV, todos os tipos de armas de fogo estavam inventados ou previstos, pelo menos sob forma rudimentar (Canby, 1965). A partir do sculo XVI, [a plvora] revolucionou no somente os mtodos de combate, mas ainda os hbitos e em consequncia a prpria civilizao. (...) durante o sculo XVI que assistimos ao nascimento dos exrcitos organizados, [e] ao desenvolvimento da corrida aos armamentos (Fuller, ). Embora seja com o surgimento da arma de fogo que a importncia das CT vive o seu maior crescendo, cr-se que a sua utilizao j seria corrente antes desse acontecimento. Segundo Nogueira (1999), barreira a designao mais antiga dos locais utilizados para a aprendizagem e treino respeitante aos exerccios de pontaria e disparo com armas. Essa designao remonta aos sculos XIV e XV, e apesar do surgimento das armas de fogo, esta no se ter alterado at aos finais do sculo XVIII. Refere Lemos (1945) que no segundo quartel do sculo XVIII, se utilizaram as barreiras para exerccios de alvo. Tal parece comprovar a anterior afirmao. Embora no se possa fazer prova, existem referncias existncia de mais do que uma barreira em Lisboa, nomeadamente para o tiro de artilharia, sendo que a ltima se localizaria na encosta da Nossa Senhora do Monte, sendo provvel que a rua ainda hoje denominada da Bombarda, seja reminiscncia daquela primitiva escola de artilharia (Nogueira, 1999). A actual Rua da Bombarda situa-se na freguesia dos Anjos.1 1 1

1

Data desconhecida

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Na sua origem, o termo barreira poderia estar relacionado, segundo Nogueira (1999), com o possvel aproveitamento de uma encosta ou talude existente no terreno que pudesse servir como espaldo para a deteno das setas ou virotes. Conclui-se que a conteno dos disparos e a absoro dos seus impactos num determinado permetro , originalmente, a caracterstica fundamental das infra-estruturas de treino do tiro. Havia, pois, que acautelar a segurana desses locais, completa. Carreira de tiro uma designao que s surge no sculo XIX, e cuja referncia decorre dos primeiros elementos legislativos portugueses sobre instruo de tiro e infra-estruturas correspondentes. Apresenta-se uma breve sntese da evoluo histrica destes: 1863 Regulamento para execuo da instruo de tiro, primeiro diploma regulamentar sobre tiro e infra-estruturas de tiro. 1881 Regulamento de Tiro para as Armas Portteis 1890 - Regulamento para os exerccios de tiro de indivduos da classe civil nas Carreiras Militares, diploma elaborado pela Secretaria de Estado da Guerra promovendo o tiro pela populao civil. 1892/1894 Regulamento de Tiro para as Armas Portteis 1898 Estatutos da Unio dos Atiradores Portugueses 1902 Regulamento de Tiro Nacional, dando continuidade ao diploma de 1890. 1902/1903 Regulamento de Tiro de Infantaria 1907 Construo das Carreiras para o Tiro Civil, com vista difuso da instruo militar preparatria. 1908/1909 Instrues para os exerccios de tiro elementar 1909 Instrues provisrias para o tiro civil 1913 Regulamento para Instruo de Tiro com Armas Portteis 1916 Remodelao do Regulamento de Tiro Nacional 1916 Criao da Federao Portuguesa de Tiro 1945 Publicao da obra Classificao e Construo de Carreiras de Tiro, pelo Major de Infantaria e Engenheiro do IST Manuel de Sande Lemos, obra de referncia para o tema. 1964 Publicao do manual Elementos para Classificao e Construo das Carreiras de Tiro, pela Direco da Arma de Infantaria (DAI) 1971 Normas para Elaborao de Projectos de Carreiras de Tiro, organizadas pela DSFOE Direco de Servios, Fortificaes e Obras do Exrcito em colaborao com DAI. 1988 Aprovao do Regulamento Administrativo (RAD-38-1) Infra-Estruturas de Tiro

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1989 Aprovao do Manual Tcnico (MT-38-2) Caracterizao e Tcnica das InfraEstruturas de Tiro 2005 Aprovao do Regime Jurdico das Armas e suas Munies (Lei n. 05/2006, de 23 de Fevereiro) 2007 Aprovao do Regulamento Tcnico e de Funcionamento e Segurana das Carreiras e Campos de Tiro (RTFSCCT)

2.2 CONCEITOS2.2.1 DEFINIO DE CTNo Exrcito portugus doravante apenas referido como Exrcito os normativos que regem as IT so o regulamento administrativo RAD-38-1, juntamente com o manual tcnico MT-38-2. Em termos de civis, aqueles regulamentos no so aplicveis, vigorando o RTFSCCT. Segundo o RAD-38-1, as IT destinadas execuo da instruo de tiro militar, so agrupadas de acordo com a sua finalidade para o adestramento militar, e dividem-se em: Carreiras de tiro; Pistas de tiro de combate; Campos de tiro; Teatros de treino de tiro; Salas didcticas para a instruo preliminar de tiro; Salas didcticas para simuladores de mssil. Segundo o mesmo regulamento, so CTs construes permanentes destinadas execuo do tiro sobre alvos terrestres ou areos, com armas portteis de tiro tenso e cano estriado (espingarda, metralhadora, pistola e pistola-metralhadora), utilizando projcteis inertes, de calibres normais (at 12,7 mm, exclusive) ou reduzidos, nomeadamente: Espingardas automtica e de repetio; Metralhadoras com bip e trip; Pistola e pistola-metralhadora; em todas ou algumas das seguintes modalidades de tiro: Tiro de preciso; Tiro de pontaria instintiva; Algumas modalidades de tiro de combate.

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O RAD-38-1 define ainda que as condies de utilizao das CT, quanto ao tipo de armamento, s modalidades de tiro e distncia mxima de tiro, dependem das caractersticas arquitectnicas de construo de cada CT. O RTFSCCT menos incisivo na definio das IT, dirigindo o enfoque para outro aspecto de relevo, o tipo de munio. Distingue para tal dois tipos de IT: Campos de tiro; Carreiras de tiro. De acordo com este regulamento, CT deve considerar-se como a instalao, interior ou exterior, funcional e exclusivamente destinada prtica de tiro com arma de fogo carregada com projctil nico. Esta definio consonante com a presente no RAD-38-1, uma vez que o tipo de armas listadas so de projctil nico. de destacar a classificao em instalao interior e instalao exterior. Por oposio, campo de tiro deve considerar-se como a instalao exterior, funcional e exclusivamente destinada prtica de tiro com arma de fogo carregada com munio de projcteis mltiplos, de acordo com o RTFSCCT, por exemplo, armas de caa. Por sua vez, esta definio discordante da presente no RAD-38-1, uma vez que este entende por campo de tiro extenso de terreno (...) onde se pode executar tiro com armas de tiro tenso ou curvo, ou msseis balsticos ou guiados, (...) em condies prximas do combate. Para efeito da presente dissertao, o conceito de campo de tiro dever ser concordante com a definio do RTFSCCT, embora no se pretenda abordar especificamente as exigncias funcionais e restries impostas a estes, ainda que muitas das consideraes feitas para as CT lhes sejam aplicveis. Ser ainda de interesse referir que a generalidade dos documentos dos EUA definem dois tipos de IT, que concordam com o RTFSCCT: Shotgun Firing Range armas de munio com projcteis mltiplos; Rifle/Pistol Firing Range armas de projctil nico. A relevncia desta anotao justifica-se apenas face ao facto de os EUA serem um dos pases com maiores referncias nesta rea, o que se deve, em parte, ao grande desenvolvimento da indstria do armamento junto da sociedade civil.2

2 Faa-se notar que o RTFSCCT, no se aplica s IT pertencentes s Foras Armadas e foras e servios de segurana. Porm, considerou-se de interesse para o trabalho desenvolvido sobrepor este regulamento com os demais, que regem as IT que se constituem como excepo.

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2.2.2 CLASSIFICAO DAS CTDe acordo com o RAD-38-1, as CT podem ser classificadas sob diversos aspectos. Para que melhor se compreenda o desenvolvimento da presente dissertao, e como se poder demonstrar adiante, destaca-se a que se refere ao tipo de construo para prover segurana externa. Ser essa que nos servir de fio condutor. Estrutura-se, em consonncia com o RAD38-1, da seguinte forma: CT Abertas quando so a cu aberto, sem coberturas destinadas a impedir a sada dos projcteis. Dispem apenas de um espaldo frontal simples para intercepo e reteno dos projcteis disparados. CT Fechadas dispem de muros ou espaldes em redor do leito. Desenvolvem-se a cu aberto, sem cobertura superior destinada a impedir a sada de projcteis e distinguemse das CT abertas pelos espaldes ou muros laterais de intercepo e reteno de projcteis. Este tipo o mais comum no Exrcito Portugus. CT Cobertas dispem de paredes laterais e de uma cobertura, com espessura suficiente para impedir a sada dos projcteis. No se desenvolvem a cu aberto. Podem considerar-se ainda, pelo RAD-38-1, outras duas classificaes, no que respeita ao tipo de construo, a CT Tubular e a CT Mista. A primeira define-se quando, a cada linha de tiro corresponde um corredor fechado nos lados e por cima, enquanto a segunda prev parte do leito a cu aberto e outra parte coberta. Como se fez destacar da definio de CT do RTFSCCT, este classifica-as em: CT Interior e CT Exterior, consoante possuam ou no tectos e paredes estruturalmente integrais e fixos. Apesar da pouca especificidade da classificao patente no RTFSCCT, a sobreposio das duas poder ser traduzida no seguinte: CT Exteriores CT Aberta e Fechada; CT Interiores CT Coberta. Esta classificao ser a utilizada doravante na presente dissertao, uma vez que a abordagem s questes referentes s CT abertas e fechadas essencialmente comum. Nos documentos de referncia das Foras Armadas dos EUA, nomeadamente os do Departamento da Fora Area, a classificao das CT face aos aspectos da construo e da segurana externa, dividem-se em CT non-contained, partially contained, fully contained (ETL 06-11), traduzindo uma classificao respeitante conteno de projcteis. As primeiras no encontram par na classificao presente no RAD-38-1 e RTFSCCT, e no dizem respeito a infra-estruturas propriamente ditas, uma vez que no consideram a existncia de qualquer dispositivo de conteno. Dessa forma, no se considera relevante estudar este tipo de CT. As segundas devem fazer-se corresponder com as CT exteriores, embora a sua definio esteja particularizada s CT cujos tiros directos (ver 3.1.1) so totalmente contidos. As terceiras, 7

devem fazer-se corresponder com as CT Interiores, e caracterizam-se pela conteno total de tiros directos e de ricochetes (ver 3.1.2). Ainda de acordo com o RAD-38-1 e o MT-38-2, podem as CT classificar-se conforme a/o: Distncia de tiro 25, 50, 100, 200 ou 300 metros; Desenfiamento vertical livres, desenfiadas ou intermdias/mistas; Localizao das origens de tiro mvel, fixa ou mista;3

Tipo de armamento ou modalidade de tiro pistola, metralhadora, ou outro, ou pontaria instintiva, tiro de combate, por exemplo.

2.2.3 CONSTITUIO DA CTA CT constitui-se fisicamente por trs zonas distintas, as duas primeiras referentes a infraestruturas necessrias para a prtica do tiro e a terceira constituda por um espao tridimensional envolvente. Conforme o RAD-38-1, designam-se: Zona de Servios a zona adjacente CT propriamente dita e que inclui, total ou parcialmente, (a) edifcios para instalao de secretaria e gabinetes, alojamento do pessoal pertencente ao quadro orgnico ou, por vezes, do pessoal das unidades utilizadoras da CT, arrecadaes de material e oficina de alvos e sanitrios; (b) local ou parque de estacionamento de viaturas; (c) estradas ou caminhos de acesso rea da CT. uma zona de apoio actividade de tiro, garante do funcionamento organizado da CT, integrado com as restantes actividades inerentes ao tiro, como manuteno geral do armamento, manuteno geral das instalaes, entre outras; Zona de Tiro a zona correspondente CT propriamente dita, onde se executa o tiro e inclui os seguintes elementos comuns a todos os tipos de CT: leito da CT; () plataformas de tiro; () linhas de alvos; dispositivos de desenfiamento; equipamentos diversos; sistemas de iluminao e de abastecimento de gua. a zona onde se efectua o tiro, propriamente dito, da qual fazem parte, tambm, os dispositivos que lhe garantem a segurana e proteco; Zona Perigosa a uma zona tridimensional na circunvizinhana da CT, definida em funo das suas caractersticas, onde se prev a possibilidade de ocorrer um impacto de um projctil, ou de fragmentos provenientes de munies, disparados na CT, pressupondo determinadas condies de fogo.

3 A classificao segundo a origem de tiro normalmente traduz-se na localizao dos atiradores relativamente aos alvos, surgindo normalmente dois tipos: origem de tiro fixa e linha de alvos mvel e origem de tiro mvel e linha de alvos fixa. Este ganha algum relevo no que respeita a concepo do desenfiamento, sendo normalmente utilizado o primeiro tipo nas CT Fechadas (Nogueira, 1999).

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O RTFSCCT define igualmente estas trs zonas distintas, embora as designe de forma diferente. A sobreposio deste regulamento com o RAD-38-1 compreende que a zona de servios seja designada por rea de apoio, a zona de tiro por rea de tiro e a zona perigosa por zona de segurana. Faa-se destacar, ainda, a definio de rea de segurana presente no RTFSCCT: trata-se da rea fechada e resguardada, localizada contiguamente linha de retaguarda das CT, destinada verificao e manuseamento de armas de fogo. No deve ser confundida com a zona de segurana ou zona perigosa. Ainda, por linha de retaguarda deve entender-se rea longitudinal existente imediatamente atrs dos postos de tiro, destinada ao recuo dos atiradores finda a sesso de tiro, bem como presena de formadores e assistentes. A linha de retaguarda corresponder plataforma de tiro, como se ir fazer notar adiante.

2.2.3.1 ZONA DE SERVIOS E ZONA DE TIRO INFRA-ESTRUTURAS A expresso da zona de servios ser maior ou menor, conforme as necessidades funcionais exigidas, podendo constituir-se pela mais simples arrecadao ou oficina, ou por uma infraestrutura completa, onde se poder considerar incluir, alm das supracitadas, as seguintes instalaes: oficinas de manuteno e limpeza de armas, salas de instruo de tiro, instalaes de ar condicionado e ventilao, instalaes elctricas, acessos, parques de estacionamento, ou quaisquer outras cuja existncia se verifique necessria. A zona de tiro o espao central da infra-estrutura, em funo do qual a zona de servios deve ser desenvolvida. Dos elementos cuja presena comum a todas as CT, fazem-se sobressair os seguintes: leito da CT, plataformas ou estaes de tiro, linhas de alvos e respectivos sistemas de alvos. Em conformidade com o RAD-38-1, leito da CT a faixa de terreno entre a plataforma de tiro mais recuada e o espaldo final, onde se estabelecem as linhas de tiro, cada uma das quais definida pelo local da plataforma onde se coloca o atirador, pelo alvo respectivo e pelo espaldo final. Quando um atirador dispara para um [ou mais] alvos, dispostos lateralmente, ter-se- de ter, ento, em considerao, um sector de tiro, em vez de linha de tiro. Para compreender completamente esta definio, deve definir-se: plataforma de tiro, linhas/sectores de tiro e linha de alvos. De forma intuitiva, plataforma de tiro a faixa disposta transversalmente ao eixo da CT, onde se instala uma linha de atiradores para fazer fogo sobre os alvos, e linha de alvos a faixa da CT onde se instalam, contiguamente ou de forma dispersa, os alvos. Linha de tiro uma linha imaginria definida pelo local da plataforma onde se coloca o atirador e pelo respectivo alvo. Em caso de mltiplos alvos, define-se como sector de tiro.

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Os dispositivos de desenfiamento so parte integrante da zona de tiro. Destinam-se a interceptar, reter e absorver os projcteis nas suas trajectrias directas (), e os ricochetes formados no solo, ou noutras superfcies de modo a evitar-se a sua sada para o exterior [da zona de tiro]. Podem ainda dispor-se de elementos que pretendam limitar a amplitude do feixe de trajectrias dirigidas sobre os alvos, pela limitao dos sectores de tiro, horizontalmente e verticalmente, designados de limitadores de pontaria. A zona de tiro deve ser provida de adequados sistemas de iluminao, nomeadamente orientados para a iluminao das plataformas de tiro e linhas de alvos (ver 5.5.2), e poder ou no ser considerada a disposio de um local para assistncia de pblico ou de um jri, com especial interesse para o desenvolvimento de campeonatos de tiro desportivo.

2.2.3.2 ZONA PERIGOSA Componente passiva da CT, constitui-se como elemento de segurana, segundo classifica Lemos (1945) ao referir que para segurana das populaes, tropas e bens de qualquer natureza, devero existir servides militares nas circunvizinhanas das CT (), designadas por zonas perigosas. A Zona Perigosa (ZP) de uma CT constitui-se por uma Zona Perigosa de Superfcie (ZPS) e uma Zona Perigosa Vertical (ZPV). De acordo com o RAD-38-1, as suas definies constam do seguinte: Zona Perigosa (ZP) o espao tridimensional estabelecido a partir de toda a largura da plataforma de tiro mais recuada, () acrescida, se necessrio, de uma determinada extenso para ambos os flancos. Considera-se que esse espao pode ser atingido pelos projcteis ou fragmentos provenientes das armas localizadas na CT. A definio da ZP pressupe determinadas condies de fogo, excluindo grosseiros erros humanos ou imperfeies do sistema da arma/munio altamente improvveis. No interior da ZP no devero permanecer, por razes de segurana, pessoal, equipamento, navios e aeronaves no autorizados. Zona Perigosa de Superfcie (ZPS) consiste da projeco sobre a superfcie do terreno ou aqutica de todo o espao tridimensional da ZP. Divide-se em duas reas: rea de disperso e rea de ricochetes. A primeira define a rea dentro da qual esto contidos todos os impactos directos. A segunda define a rea, fora da rea de disperso, que pode ser atingida pelos projcteis, aps estes terem ricocheteado. Prev, ainda, em sobreposio ou justaposio com a ZPS, que se estabelea uma rea de proteco auditiva: faixa de terreno onde o pessoal obrigado a usar protectores ou tampes de ouvidos, durante os perodos em que se produzem os rudos provocados pelo disparo das armas de fogo.

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Zona Perigosa Vertical (ZPV) consiste do espao areo cujo contorno vertical o limite da ZPS e cuja altitude vai desde o nvel do solo at altura de segurana caracterstica de cada arma e munio. A configurao das ZPS definida por diversos factores, que se podem agrupar da seguinte forma: os da ordem do funcionamento da IT, os da ordem da concepo da IT e os da ordem do terreno confinante e envolvente. No que respeita ao funcionamento, fundamental definir as caractersticas do armamento a utilizar, bem como as suas propriedades balsticas, nomeadamente o seu alcance. As condies de execuo de tiro devem ser tambm aqui consideradas e sero abordadas em detalhe adiante. A concepo da IT ser condicionante para a definio da ZPS, como demonstrado pela sua classificao. Porm, esta dependncia recproca, pois a ZPS possvel deve ser base decisria para concepo de CT Exteriores ou CT Interiores. Quanto s condicionantes exteriores, define o RAD-38-1 e o RTFSCCT que dentro das ZPS no devem encontrar-se quaisquer tipos de construo, estradas e caminhos que possam ser frequentados por pessoas, animais ou veculos, linhas-frreas, linhas de alta tenso, linhas telefnicas, ou outros bens que possam ser danificados. Segundo o RAD-38-1 o trnsito de pessoas nestas reas deve ser condicionado e controlado e sempre que possvel, as extenses de terreno correspondentes s ZPS, () devero ser propriedade [da entidade que explora a IT]. Sempre que tal condio no se verifique, a queda de projcteis deve ser precedida da obteno de autorizao escrita de quem seja legtimo possuidor dos terrenos, determina o RTFSCCT. O RAD-38-1 estabelece ainda, em volta dos lugares habitados, uma zona complementar de segurana, limitada por uma curva afastada de 500 metros do contorno esquemtico daqueles lugares, () [sobre a qual] a zona perigosa no se deve, em princpio, [sobrepor].

2.2.3.2.1 CONDIES DE EXECUO DE TIRO Na determinao e aplicao das ZP s CT, pressupe-se que se exerce um elevado padro de controlo e disciplina de fogo, sem os quais a ZP corresponde Zona de Energia Total (ZET) espao tridimensional em volta de uma posio de tiro que pode ser atingido pelos projcteis () de uma dada arma quando disparada em qualquer direco. O padro de controlo e disciplina de fogo pressuposto das definies de ZP, ZPS e ZPV compreende, pelo RAD-38-1, que todas as disposies respeitantes ao armamento constantes dos respectivos manuais de instruo so estritamente cumpridas, admitindo-se, portanto, que o pessoal que vai executar o tiro, qualquer que seja a fase de instruo em que se encontre,

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conhece o funcionamento do material e as suas normas de utilizao e segurana, inclusive como reagir perante as diversas situaes que se lhe possam deparar. Exige ainda que a execuo do tiro [seja] dirigida apenas por pessoal devidamente autorizado e de acordo com os regulamentos em vigor e que todo o tiro [seja] observado, no s quando a tcnica de tiro o determine, mas tambm para verificar constantemente os seus efeitos e detectar, de imediato, qualquer anomalia, seja qual for a causa que a determine.

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CAPTULO 3 ASPECTOS CRTICOSA segurana de uma IT abrange o conjunto de medidas destinadas a permitir a execuo de tiro com os sistemas de armamento autorizados, a partir de plataformas de tiro ou de posies das armas devidamente estabelecidas, sem perigo para o pessoal e animais, nem danos em instalaes e bens de qualquer natureza, quer no interior, quer no exterior dos limites dessa IT. Desta forma, o RAD-38-1 compreende duas componentes de segurana: interior e exterior. Orientado para a situao patente no Exrcito Portugus data da sua aprovao, 1989, o presente regulamento foca-se fundamentalmente nos aspectos balsticos da penetrao de projcteis e ricochetes, e tambm, embora em menor extenso, nos aspectos acsticos da propagao do rudo. Porm, hoje, a dimenso completa da segurana numa infra-estrutura deste cariz extravasa estes aspectos. Segundo o ETL 06-11, documento de referncia sobre concepo de CT da fora area dos EUA, alm das questes balsticas, devem ser particularmente estudadas as questes de controlo de rudo e dos perigos resultantes da utilizao de munies com chumbo. Tambm o mais recente RTSFCCT, de 2007, prev que se assegure o tratamento dos metais provenientes dos disparos e se capacite as infraestruturas de condicionamento acstico. Estes aspectos acabam por estar abrangidos indirectamente pelo RAD-38-1, que define medidas de segurana como aquelas que se destinam a eliminar todos os riscos para pessoas e bens resultantes das actividades de tiro.

3.1 ASPECTOS DE SEGURANA BALSTICA3.1.1 TRAJECTRIAS E FEIXE DE DISPERSOSob o aspecto da segurana, o RAD-38-1 define que as trajectrias provenientes do accionamento dos sistemas de armas correspondem ou resultam de duas condies distintas: os tiros directos e a formao de ricochetes. Os tiros directos so aqueles em que o projctil segue a sua trajectria normal, desde a boca da arma, at ao ponto de chegada sem sofrer qualquer ressalto. Ricochetes so ressaltos que os projcteis sofrem no solo ou noutras superfcies em que embatam, com desvio da sua trajectria inicial. As novas trajectrias designam-se por trajectrias de ricochete. Os tiros directos compreendem: tiros normais, tiros errados e tiros fortuitos. Os primeiros tiros normais e tiros errados so aqueles em que o projctil incide no alvo ou nas suas imediaes, sofrendo desvios relativamente pequenos, que podem ser imputados s armas e munies ou, sobretudo, a erros cometidos pelos atiradores, embora sendo conhecedores das tcnicas de tiro. Os ltimos tiros fortuitos ou selvagens so os disparados de forma imprevista e inopinada com qualquer direco e elevao e que resultam normalmente do no cumprimento da disciplina de fogo na CT. As trajectrias de tiros normais e tiros errados

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devem ser compreendidas segundo o conceito de feixe de disperso de trajectrias (RAD-381). Sobre o feixe de trajectrias, o referido regulamento afirma que quando um atirador dispare uma srie de tiros nas mesmas condies de pontaria sobre um mesmo alvo, verifica-se que as trajectrias obtidas se dispersam em redor da que se poder chamar trajectria mdia dirigida ao ponto mdio do respectivo agrupamento. O conjunto das trajectrias formadas nessas condies constitui o feixe de disperso de trajectrias. As suas dimenses dependem de: arma utilizada (recuo, vibrao, aquecimento e uso do cano, formao de ferrugem, deficincias do aparelho de pontaria, entre outras), munies (tolerncias de fabrico quanto a dimenses e carregamento, variaes da natureza da plvora como o seu estado higromtrico e temperatura), condies atmosfricas, e erros na tcnica de tiro e modalidade praticada (MT-38-2). Para efeito de quantificao, podem desprezar-se as caractersticas das munies, considerar condies atmosfricas favorveis pratica de tiro, e que so cumpridos os padres de controlo e disciplina de fogo. Assim, a dimenso do feixe de trajectrias depender apenas do tipo de arma e da modalidade de tiro. Para a presente dissertao, consideram-se as dimenses do feixe de disperso da espingarda automtica G3, por ser a arma com maior alcance utilizada nas CT do Exrcito. Para outros tipos de armas, as dimenses do feixe de disperso a adoptar dever ser obtido atravs de ensaios experimentais. Segundo o MT-38-2 admitem-se os seguintes desvios: Tiro de preciso: at 8 em elevao, at 5 em direco (horizontalmente); Tiro instintivo: at 14 em elevao, at 9 em direco (horizontalmente). A considerao destas duas modalidades de tiro justificada pelo reflexo directo nas trajectrias que do tiro resultam, quando se alteram as condies de execuo. Segundo o RAD-38-1, a formao de ricochetes mais provvel durante a execuo de tiro instintivo, do que quando se pratica tiro de preciso, uma vez que, naquela modalidade de tiro, as pontarias so feitas em movimentos rpidos, sem utilizao do aparelho de pontaria e os disparos so executados em srie e com muita rapidez.

3.1.2 RICOCHETESQuando um projctil, animado de energia restante suficiente, embata em qualquer meio resistente e no penetre nele, nem se desintegre, poder descrever no ar uma ou mais trajectrias secundrias a que se d o nome de trajectrias de ricochete.

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Uma das caractersticas mais evidentes das trajectrias de ricochete o seu carcter aleatrio. Deve-se esse facto, grande variabilidade dos factores que influenciam a definio da nova trajectria: ngulo de incidncia, caractersticas de resistncia e deformabilidade dos materiais das superfcies de incidncia. So ainda elementos que potenciam a formao de ricochetes influenciando tambm a definio da sua trajectria, a tenso da trajectria inicial/directa, a velocidade do projctil, a sua forma e composio. O ricochete tanto mais provvel quanto o ngulo de incidncia do projctil se aproxime dos 0. Quando este se aproxima dos 90 a probabilidade de penetrao do projctil aumenta, embora dependendo das caractersticas das superfcies de incidncia. Segundo o MT-38-2 o ngulo mximo de ricochete, em campo aberto, de 45 ou 30, quer em elevao, quer em direco, conforme a superfcie de incidncia seja considerada dura (chapa metlica, muro de beto ou massas rochosas) ou no dura (massas de terra no rochosa ou arvoredo). Admitindo as consideraes construtivas que reduzem a formao de ricochetes adoptadas, o MT-38-2 admite que o mximo ngulo de ricochete que se poder formar em CT estar entre os 20 e 30.

3.1.3 EFEITOS DE PENETRAO DOS PROJCTEISOs efeitos de penetrao de projcteis para diferentes tipos de munies encontram-se resumidos, para diferentes tipos de munies, nas tabelas do Anexo A Tabelas de Efeitos de Penetrao de Projcteis.

3.1.4 DESENFIAMENTODesigna-se por desenfiamento de uma IT o conjunto de disposies destinadas a deter os projcteis e absorver a sua energia cintica. Dispositivos de desenfiamento, como referido em 2.2.3.1 so os elementos arquitectnicos cuja funo interceptar os projcteis (detendo-os e absorvendo-os), nas suas trajectrias directas ou depois de ricochetearem. De acordo com o RAD-38-1, so considerados as seguintes componentes: Desenfiamento Vertical visa deter e absorver os projcteis cujas trajectrias estejam contidas em planos verticais, que passem pela boca da arma e pelo seu ponto de chegada. Divide-se em desenfiamento vertical superior e inferior. O primeiro destina-se a deter e absorver o maior nmero de projcteis directos. O segundo, a evitar a formao de ricochetes no leito ou noutras superfcies abaixo da linha de mira. Desenfiamento Lateral visa deter os projcteis cuja trajectria se desvie para os flancos.

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3.2 RUDOSom uma perturbao fsica, perceptvel pelo ouvido humano, que se propaga atravs de um meio elstico. No ar, esta perturbao causada por variaes de presso acima e abaixo do valor esttico de presso atmosfrica. Esta oscilao de presses traduz-se num fenmeno peridico que se designa por onda sonora, e caracterizado por um espectro de frequncias. O rudo som indesejado ou som de natureza aleatria, cujo espectro no apresenta quaisquer frequncias distintas. normalmente composto por sons de vrias origens, prximas e distantes, provenientes de diferentes direces. A exposio ao rudo o efeito integrado, sobre um determinado perodo de tempo, de diferentes nveis sonoros com vrias origens e duraes. Esta integrao inclui ainda a ponderao especfica de nveis sonoros que ocorram em perodos cujo efeito sonoro no ambiente seja mais ou menos significativo, como por exemplo, durante os perodos de repouso. Controlo do rudo a tecnologia da obteno de nveis de rudo aceitveis. A sua aceitabilidade exige a formulao de duas questes: Aceitvel sob que condies, e aceitvel para quem? As respostas s mesmas dependem das consideraes econmicas e operacionais envolvidas em cada caso. A transmisso de rudo um sistema composto por trs elementos: origem ou fonte, meio de transmisso e receptor. O estudo de um problema de rudo deve partir da caracterizao da origem ou fonte de rudo, do meio de transmisso, e da definio do critrio de aceitabilidade permitido ou desejado no receptor. Estes trs elementos no so independentes (Beranek, 1971), encerrando em si um aspecto estatstico que no pode ser desprezado, pois as variveis das quais dependem so inmeras, como a variao no tempo, as condies atmosfricas e geomtricas, entre outras (Harris, 1979). Alm do fenmeno fsico, o som apresenta uma forte componente sensorial, cuja percepo se remete a cada indivduo separadamente, podendo esta ser designada por incomodidade. Esta componente tem um carcter subjectivo elevado no estando necessariamente relacionado com ndices fsicos, mas com os graus de aceitao ou rejeio da fonte de rudo, como demonstram estudos citados pela CTCT e pela NRA (2004).

3.2.1 FONTE DE RUDOO rudo provocado pelo disparo de uma arma de fogo apresenta trs componentes: detonao, chicotada e silvo. A detonao a componente de maior intensidade sonora. Deve-se exploso que ocorre dentro do cano da arma [Centro de Anlise e Processamento de Sinais da Universidade Tcnica de Lisboa (CAPS), 1985]. A chicotada e o silvo ocorrem durante o

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deslocamento do projctil ao longo da sua trajectria, e devem-se essencialmente velocidade de deslocamento do projctil. So apenas perceptveis por quem estiver prximo do plano de tiro e afastado da arma. Embora o som da chicotada e silvo seja particularmente violento, produzindo uma impresso muito viva e depressiva (Ramos, 1970), para o efeito de condicionamento acstico da CT ser desprezado em detrimento da detonao. Embora no tenham sido encontrados estudos sonoros que o comprovem, a inexistncia de referncias chicotada e silvo nas publicaes sobre CT, leva a crer que a sua componente acstica desprezvel face da detonao. A detonao a expanso e reinflamao brusca dos gases a que se pode chamar exploso que seguem um projctil, quando este sai pelo cano da arma. Esta exploso provoca uma grande deslocao da massa de ar circundante, comprimindo as camadas adjacentes. A compresso transmitida ao exterior da arma sobretudo a partir da boca do cano da arma. So as subsequentes compresses e descompresses das sucessivas camadas de ar que formam uma onda sonora esfrica. No que respeita s CT, uma descrio completa dos nveis sonoros provocados pelos disparos de armas de fogo exige a medio e interpretao dos seus espectros de frequncias, nveis de presso sonora e a variao de ambos com o tempo. (NRA, 2004). O rudo provocado pela detonao do tipo impulsivo de elevada intensidade, curta durao, da ordem das dezenas de milissegundos, e amplo contedo espectral (CAPS, 1985). De acordo com o mesmo estudo e com o ETL 06-11, os nveis sonoros produzidos a curta distncia (da ordem dos 20 cm) da boca da arma so muito elevados, podendo atingir os 160 dB. A composio espectral das detonaes varia de arma para arma, e tambm de disparo para disparo. Para a mesma arma e munio, pode variar 3 a 4 dB, variando tambm o tempo de durao do pico sonoro, devido s propriedades fsico-qumicas das munies. A composio do rudo na CT pressupe ainda a existncia de mltiplas linhas de tiro, ou seja, mltiplos atiradores, cujos disparos muito dificilmente so simultneos. A sobreposio da energia sonora devida a este factor, para o rudo de tipo impulsivo, cuja durao da ordem dos milissegundos, resulta invariavelmente numa sequncia de impulsos, cujo efeito aumenta o pico sonoro mximo inicial em cerca de 4 a 5 dB, nas componentes de mdia e alta frequncia.5 4

Atravs da anlise dos espectros de banda de oitava do estudo do CAPS (1985), pode-se dizer que a detonao apresenta uma distribuio espectral ampla, com energia desde as baixas

Segundo o RGR, rudo impulsivo constitudo por um ou mais impulsos de energia sonora, tendo cada um uma durao inferior a 1 segundo e separados por mais de 0,2 segundos, considerando-se que se verifica esta condio quando a diferena entre o pico de nvel de presso sonora, e o nvel sonoro contnuo equivalente, ponderado A, medidos num intervalo de tempo representativo de durao superior a 5 minutos, igual ou superior a 20 dB. 5 Convm recordar que geralmente aceite que o ouvido humano apenas detecta um aumento do nvel sonoro de 3 dB, o qual corresponde duplicao da intensidade da fonte sonora.

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frequncias, cerca dos 20 Hz, at s mais altas, prximas dos 20000 Hz. No que respeita s mdias e altas frequncias, desde os 200 Hz at aos 20000 Hz, verifica-se um decaimento regular, suave a curta distncia (2 m) e mais acentuado a mdia distncia (50 m). Este fenmeno justifica-se pela atenuao da onda sonora devida divergncia geomtrica e absoro pelos elementos envolventes (ver 3.2.2). A divergncia geomtrica, juntamente com o efeito mais pronunciado dos elementos absorventes nas mdias distncias, justifica o decaimento mais acentuado nestas, enquanto que os fenmenos de reflexo existentes nos elementos mais prximos da zona de disparo podem justificar o menor decaimento nas curtas distncias. Na zona das baixas frequncias, entre os 20 Hz e os 200 Hz, observa-se uma predominncia de energia em frequncias abaixo dos 50 Hz, estendendo-se at aos 10 Hz. Segundo o CAPS (1985), esta energia provm da deslocao da massa de ar resultante da exploso, podendo caracterizar-se como um efeito local traduzido pela formao e posterior destruio da onda de choque, observvel a curtas distncias apenas. Porm, a anlise dos espectros de frequncias por banda de oitava do CAPS (1985), traduz-se numa atenuao mais elevada das curtas para as mdias distncias das frequncias abaixo dos 200 Hz, do que das mdias e altas frequncias. Seria de esperar o inverso, uma vez que, as baixas frequncias se caracterizam por uma menor atenuao pelos elementos construtivos, pelo reduzido mascaramento por frequncias mais elevadas e pela capacidade de percorrer longas distncias com pequenas perdas de energia devidas atenuao atmosfrica ou do solo (Sousa, 2002). Alm disso, a absoro sonora conferida pelos elementos convencionais mais pronunciada nas elevadas frequncias. No existindo motivo aparente que justifique este facto, o estudo das baixas frequncias carece de aprofundamento, embora no seja desprezvel a sua contribuio para a anlise do espectro de rudo da detonao, especialmente tratando-se de nveis de presso sonora superiores a 100 dB, aos quais as frequncias inferiores a 20 Hz tambm so audveis (Sousa, 2002). Alm disso, os comprimentos de onda associados s baixas frequncias, aproximadamente entre os 2 e os 10 metros, so da mesma ordem de grandeza de elementos construtivos presentes em CT, podendo provocar vibraes nas estruturas (Sousa, 2002) (ver Figura 3.1), sugerindo uma avaliao mais aprofundada deste assunto.Comprimento de onda em metros

Frequncia em Hertz

Figura 3.1- Comprimentos de onda (Referncia: Harris, 1971)

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A anlise dos resultados deste estudo tambm permite concluir que em CT interiores ocorre um reforo do pico mximo de presso sonora, cujas reflexes na envolvente fechada aumenta os picos em 10 dB, e que o valor do pico sonoro mximo inicial da detonao no depende da CT, mas to somente da munio utilizada. O Anexo B apresenta os nveis de presso sonora e espectros de frequncias por banda de oitava do rudo produzido pela detonao.

3.2.2 MEIO DE TRANSMISSOO meio de transmisso do rudo nas CT areo. A detonao traduz-se numa perturbao da presso atmosfrica, que transmitida envolvente em ondas esfricas. A radiao deste tipo de onda isotrpica, ou seja, tem as mesmas caractersticas em todas as direces. Assim, num campo teoricamente infinito, a distribuio da energia sonora depende apenas da distncia, ocorrendo um decrscimo da presso sonora, com o aumento desta (Beranek, 1971; Harris, 1991). Este fenmeno designa-se por divergncia geomtrica e corresponde a uma diminuio de 6 dB por duplicao da distncia, em regime linear.6

O nvel sonoro de rudo ao propagar-se num campo aberto, atravs da atmosfera, geralmente diminui com o aumento da distncia entre a origem e o receptor. Alm da divergncia geomtrica, as condies de absoro e/ou reflexo de energia sonora e as condies atmosfricas, principalmente o vento, temperatura e humidade relativa, tm grande efeito na propagao do som (Harris, 1991). As condies de absoro e/ou reflexo da energia sonora podem provocar a atenuao ou o reforo do campo sonoro. Segundo Beranek (1971) e Harris (1991), podem considerar-se os seguintes mecanismos cuja actuao se traduz em absoro ou reflexo de energia acstica: absoro do ar, absoro do solo, barreiras sonoras, edifcios, vegetao, etc. No que respeita s condies atmosfricas, a propagao do som em distncias inferiores a cerca de 100 m essencialmente independente destas. Porm, para distncias superiores, as condies atmosfricas tornam-se relevantes. O fenmeno de refraco que ocorre devido aos gradientes de vento e temperatura tem um efeito muito importante, especialmente nas frequncias mais elevadas, podendo provocar divergncias da ordem dos 20 dB (Harris, 1991). O fenmeno de refraco traduz-se da seguinte forma: durante o dia, a temperatura do ar diminui com o aumento da altitude ao solo, condio conhecida como temperature lapse;

6 A distribuio da energia sonora pode caracterizar-se pela intensidade acstica, grandeza que descreve a energia acstica radiada por unidade de tempo e por unidade de rea de radiao, para determinada frequncia, densidade do ar, e velocidade de propagao. A velocidade de propagao, em regime linear, depende das caractersticas do meio de transmisso. Para nveis sonoros superiores a 130-140 dB, a velocidade de propagao depende tambm da prpria presso acstica, e traduz-se num regime no linear. As frentes de onda com maior energia propagam-se mais rapidamente, gerando-se uma distoro da onda inicial e eventual formao de ondas de choque. Com o afastamento da fonte, atingem-se nveis de presso para os quais o comportamento passa a ser linear.

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durante a noite, a situao inverte-se, ao que se designa por inverso de temperatura. Estes fenmenos provocam uma curvatura na propagao do som, cuja concavidade voltada para baixo durante o dia, e para cima durante a noite. Podem ser entendidos analogamente ao que ocorre quando a propagao do som ocorre contra ou a favor do vento, respectivamente (Beranek, 1971; Harris, 1991). Assim, as condies de propagao do rudo em condies de inverso de temperatura e/ou a favor do vento so mais desfavorveis atenuao do rudo. Por estes motivos, devem ser estas as condies a adoptar para a avaliao da propagao do rudo: Direco do vento dentro de um ngulo de 45 cuja mediatriz a direco formada pelo centro da fonte de rudo e o centro da rea especificada, com vento a soprar da fonte para o receptor; Velocidade do vento entre, aproximadamente, 1 e 5 m/s, medidos a uma altitude entre os 3 e os 11 m acima do solo; Propagao (em qualquer direco horizontal) sob condies de inverso de temperatura (Harris, 1991; NRA, 2004). Quando, ao invs de um campo aberto, a propagao ocorre em espao limitado, a onda sonora ir sofrer alteraes que decorrem da existncia de limites fsicos. Nestes, parte da energia acstica proveniente da detonao ser reflectida, outra parte absorvida, e ainda uma terceira parte ser transmitida para o exterior (Harris, 1991). No caso limite do espao fechado, pode estabelecer-se um campo reverberante , resultante da sobreposio das ondas sonoras reflectidas em todas as superfcies confinantes, em todas as direces, cujo nvel de presso sonora poder ser superior ao nvel de presso sonora da fonte de rudo, e cuja diminuio da intensidade do campo sonoro mais demorada (Beranek, 1971; CAPS, 1985; Harris, 1991).7

3.2.3 ZONAS DE RECEPOAs zonas de recepo de rudo correspondem a uma rea na qual ocorrer uma alterao do ambiente sonoro durante o funcionamento da CT. Ao nvel da segurana interior, tem-se a zona de disparo e sua vizinhana interior ou zona de recepo interior, onde se encontra todo o pessoal inerente ao funcionamento da CT. Ao nvel da segurana exterior, tem-se toda a zona confinante exterior ou zona de recepo exterior, alvo de poluio sonora. Esta ltima confina ou inclui, em alguns casos, reas pblicas ou privadas (CAPS, 1985).

7 Pode-se dizer que se estabelece um campo reverberante quando se observam os mesmos nveis sonoros em qualquer ponto de um determinado espao fechado. A avaliao do campo reverberante pode ser estabelecida pelo tempo de reverberao. Por tempo de reverberao, deve entender-se: perodo de tempo (em segundos) durante o qual o nvel de presso sonora dentro de um espao fechado diminui 60 dB, aps interrupo da fonte, para uma determinada frequncia.

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A zona de recepo exterior pode estender-se alm dos limites de propriedade da CT, dando origem frequentemente a queixas sobre os nveis de rudo incomodativos. A distncia at qual o rudo poder ser audvel com incomodidade para o receptor depende de todos os factores que caracterizam o meio de transmisso, embora, no existindo qualquer dispositivo de condicionamento acstico, seja grande a probabilidade de que essa distncia possa atingir valores da ordem dos 1000 m (NRA, 2004). Em ambas as zonas de recepo de rudo, devem ser consideradas duas ordens de efeitos provocados pelo rudo nos indivduos receptores: efeitos objectivos e efeitos subjectivos. Os efeitos objectivos podem traduzir-se em efeitos fisiolgicos, a curto prazo e/ou a longo prazo e so devidos exposio a elevados nveis sonoros, acima do limiar da dor. Os efeitos subjectivos traduzem-se geralmente em incomodidade, actuando como poluio sonora, e podendo originar queixas ou reclamaes (CAPS, 1985; Harris, 1991; NRA, 2004).

3.2.4 DISPOSIES REGULAMENTARESO Regime Legal Sobre a Poluio Sonora [Regulamento Geral do Rudo (RGR)] aplica-se (...) s actividades ruidosas, permanentes e temporrias, susceptveis de causar incomodidade (art. 1 do RGR). As actividades ruidosas susceptveis de causar incomodidade podem ser submetidas ao regime de avaliao de impacte ambiental ou a um regime de parecer prvio, como formalidades essenciais dos respectivos procedimentos de licenciamento, autorizao ou aprovao (art. 2 do RGR). No que respeita zona de recepo de rudo interior, o art. 1. do Decreto-Regulamentar n. 9/92 de 28 de Abril, que estabelece o quadro geral de proteco dos trabalhadores contra os riscos decorrentes da exposio ao rudo durante o trabalho, prev o seguinte: Valor limite da exposio pessoal diria: 90 dB(A); Valor limite do pico de presso sonora: 140 dB. Na plataforma de tiro, o rudo ambiente no deve exceder os 85 dB(A) [Acordo de Padronizao da Organizao do Tratado do Atlntico Norte (STANAG) n. 2899; ETL 06-11], devendo ser consideravelmente inferior a este valor, no sentido de melhorar as condies de comunicao dentro da CT (ETL 06-11). Quando se verificar que os valores de nveis sonoros excedem os valores limite definidos e, se atravs do recurso a medidas tcnicas de proteco colectiva, de organizao do trabalho e de proteco individual, no for possvel atenuar a severidade da exposio dos trabalhadores ao rudo, obrigatria a utilizao de protectores de ouvidos, adequados, devendo esta

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obrigatoriedade ser devidamente assinalada (art. 2. e art. 5. do Dec-Reg n. 9/92 de 28 Abril). No que respeita zona de recepo de rudo exterior, o art. 4. do RGR distingue dois tipos de zonas de exposio ao rudo: zonas sensveis e zonas mistas. As primeiras so vocacionadas para usos habitacionais, bem como para escolas, hospitais, espaos de recreio e lazer, e outros equipamentos utilizados como locais de recolhimento. Nestas zonas, o rudo est limitado exposio a um nvel sonoro contnuo equivalente, de 55 dB(A), em perodo diurno (das 7 s 22 horas), e de 45 dB(A), em perodo nocturno (das 22 s 7 horas). As segundas zonas so vocacionadas para outras utilizaes, para alm das previstas na definio das zonas sensveis. Estas zonas esto limitadas exposio a um nvel sonoro contnuo equivalente, de 65 dB(A), em perodo diurno (das 7 s 22 horas), e de 55 dB(A), em perodo nocturno (das 22 s 7 horas). Esta classificao determina limites para nveis sonoros contnuos. No que respeita a nveis sonoros de rudo do tipo impulsivo, prev o MT-38-2, que o grau de incomodidade ocasionado por um rudo do tipo impulsivo com um determinado nvel equivalente o mesmo que para um rudo contnuo com um nvel equivalente aumentado de 12 dB (A), segundo estudos levados a cabo sobre a incomodidade comparativa provocada por rudos dos tipos contnuo e impulsivo. Assim, os limites determinados pelo RGR devem ser diminudos de 12 dB(A), passando a traduzir-se no seguinte: Zonas sensveis: limitao do nvel sonoro contnuo equivalente, de 43 dB(A), em perodo diurno (das 7 s 22 horas), e de 33 dB(A), em perodo nocturno (das 22 s 7 horas); Zonas mistas: limitao do nvel sonoro contnuo equivalente, de 53 dB(A), em perodo diurno (das 7 s 22 horas), e de 43 dB(A), em perodo nocturno (das 22 s 7 horas). A classificao de zonas como sensveis implica a proibio da instalao e do exerccio de actividades ruidosas de carcter permanente, nas quais se incluem as CT. A sua instalao nas zonas classificadas como mistas exige que o valor do rudo provocado pela actividade ruidosa no exceda o rudo ambiente de fundo em mais de 5 dB(A) durante o perodo diurno e 3 dB(A) durante o perodo nocturno, considerando as correces tonal (de + 3 dB) ou impulsiva (de + 3 dB) do rudo, somadas ao rudo provocado pela actividade ruidosa (art. 8 RGR). Desta forma, uma vez que o rudo produzido em CT do tipo impulsivo e no apresenta caractersticas tonais, e que se esperam nveis de utilizao da CT superiores a 8 horas dirias (o art. 8 prev correces favorveis a actividades com duraes inferiores), pode definir-se que o valor do rudo provocado pela actividade ruidosa no deve exceder o rudo ambiente de fundo em mais de 2 dB(A) no perodo diurno, e 0 dB(A) no perodo nocturno. No existe no RGR qualquer prescrio particular para actividades de tiro. Tambm o RTSFCCT apenas limita as actividades de tiro em CT exteriores ao perodo compreendido entre as 9 e as 20 horas, excepto em CT interiores devidamente insonorizadas. A 22

insonorizao que exigida traduz-se nos seguintes termos: Nas CT interiores, assegurada uma insonorizao que evite reverberaes no espao externo adjacente. Deve ser sublinhado que as imposies regulamentares so todas estabelecidas em dB(A), excepto o valor limite de pico de presso sonora. que, embora a escala ponderada A seja referida capacidade da sensao auditiva do ser humano na frequncia de 1000 Hz, onde esta mxima, a sua correlao com a resposta humana em termos de incomodidade na zona das baixas frequncias fraca (Sousa, 2002), o que pode ser ilustrado pelo facto de um aumento significativo do nvel de presso sonora nas baixas frequncias se poder traduzir num pequeno aumento do nvel de presso sonora ponderado A (Sousa, 2002). Tendo em conta o amplo espectro de frequncias apresentado pelo CAPS (1985), deve ser acautelado o efeito de mascaramento das baixas frequncias.

3.2.5 PERDA DE AUDIO E EFEITOS FISIOLGICOS DO RUDOOs efeitos do rudo na audio podem ser divididos em trs categorias: trauma acstico, elevao temporria do limiar auditivo (TTS) e elevao permanente do limiar auditivo (PTS). O trauma acstico, traduzido por uma leso orgnica imediata do ouvido, provocado por um nvel de energia sonora excessivo (Harris, 1991). Normalmente ocorre numa nica exposio, ou relativamente poucas exposies a nveis sonoros muito elevados. o que pode ocorrer, por exemplo, numa exploso. A elevao do limiar auditivo corresponde a uma diminuio da acuidade auditiva, aps a exposio ao rudo. O seu valor corresponde diferena entre os nveis do limiar auditivo antes e depois da exposio. Como foi categorizada, pode ser temporria ou permanente. A primeira reversvel, enquanto que a segunda irreversvel. Esta pode ser resultado de trauma acstico ou do efeito cumulativo de exposies repetidas durante longos perodos ou ao longo de vrios anos (Harris, 1991). Os factores dos quais depende a TTS so vrios e interdependentes. Devem salientar-se o nvel sonoro de exposio, a durao da exposio, o espectro de frequncias e, ainda, o padro temporal de exposio. Para a presente dissertao, destacam-se os efeitos da exposio ao rudo de tipo impulsivo. Este tipo de rudo caracteriza-se por ter um pico de elevado nvel sonoro de curta durao. Segundo Harris (1991) e Beranek (1971), as caractersticas acsticas do rudo impulsivo, cujos efeitos podem afectar a audio so: pico de presso sonora, durao do impulso, tempo de elevao, tempo de decrscimo, direco da variao de presso, nmero de impulsos numa determinada exposio, a taxa de repetio dos impulsos e o nvel de rudo ambiente. Num espao reverberante, o rudo impulsivo provoca maior TTS do que num campo aberto. O nvel de presso sonora crtico aproximadamente 130 dB, sendo aceitvel 140 dB, se este se 23

referir ao rudo produzido por uma arma de fogo. Se as restantes variveis foram consideradas constantes, a TTS aumenta proporcionalmente com aumento do nvel de presso sonora do pico. Alm disso, aumenta aproximadamente em proporo directa com a durao da exposio. Tratando-se de rudo impulsivo, proporcional ao nmero de impulsos (em vez do perodo total de tempo de exposio), embora, para iguais perodos de exposio, os seus efeitos sejam menores do que os efeitos de uma exposio a um nvel sonoro equivalente contnuo (Harris, 1991). Deve destacar-se ainda que o de limite de silncio efectivo, que se traduz no nvel de presso sonora cujo valor no provoca nem retarda a recuperao da TTS, seja qual for o durao da exposio, est entre os 70 e 80 dB(A) (valores referentes exposio a rudo contnuo). Cr-se que a relao entre a TTS e a PTS resida no facto de os processos fisiolgicos que as originam serem similares, diferindo apenas em grau. Alm disso, a relao entre as propriedades fsicas do rudo e o desenvolvimento de PTS similar observada no desenvolvimento da TTS (Harris, 1991). Os efeitos fisiolgicos da exposio ao rudo podem ser divididos em efeitos de curto prazo e de longo prazo. Os primeiros podero no permanecer alm do momento do estmulo ou persistir apenas por perodos de tempo mensurveis em minutos ou, em casos excepcionais, em horas. Os segundos podero persistir por perodos de tempo superiores a vrios dias ou semanas (Harris, 1991), considerando-se permanentes se no apresentarem recuperao at cerca de trs semanas (Beranek, 1971). Os efeitos de longo prazo so geralmente atribudos a estmulos repetidos que geram respostas de curto prazo e cujo efeito cumulativo. Enquanto os efeitos de curto prazo so geralmente claros, os efeitos de longo prazo so-no muito menos, essencialmente devido interferncia que outros factores podem ter na sua avaliao, em perodos de tempo muito grandes. Desta forma, os estudos desta natureza baseiam-se em estruturas multicausais, com mais do que uma varivel. Alm disso, so estudos cuja observao e interpretao contm alguns obstculos, e cuja transposio do laboratrio para a realidade pode por vezes ser desadequada. Os efeitos de curto prazo podem incluir alteraes do estado de tenso muscular, irregularidade do sistema respiratrio, e alteraes cardiovasculares, traduzidas pela alterao do ritmo cardaco e pela diminuio do dimetro de vasos sanguneos nas zonas perifricas do organismo. So ainda considerados efeitos de curto prazo a dilatao das pupilas, alteraes ao estado de equilbrio, motilidade gastrointestinal e reaces bioqumicas e endocrinolgicas (Harris, 1991). No que respeita particularmente ao rudo impulsivo, verifica-se que nveis de presso sonora de 90 a 105 dB, provocam uma diminuio drstica da presso arterial diastlica, bem como do ritmo cardaco (Harris, 1991).

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O rudo pode provocar tambm distrbios do sono. A exposio a nveis sonoros elevados durante o perodo diurno de actividade tem efeitos subsequentes nos perodos de repouso, que podem incluir insnia e fadiga. A exposio ao rudo durante os perodos de repouso, mesmo com nveis sonoros inferiores, provoca maiores reaces do que em perodos de actividade (Harris, 1991). Todos estes efeitos so, primariamente, de ordem fisiolgica. Pensa-se, porm, que os seus efeitos cumulativos os podero tornar psico-patolgicos. Vrios estudos referem que o rudo um dos factores de stress mais proeminente no local de trabalho. Existem indicaes que apontam a exposio ao rudo como factor de risco para a sade, podendo causar hipertenso, doena coronria, e alteraes bioqumicas. No que respeita especialmente s doenas cardiovasculares, a longo prazo, o stress provocado pelo rudo uma das suas causas (Harris, 1991).

3.2.6 IMPACTE AMBIENTALSegundo NRA (2004), as CT devem ser classificadas como parques de rudo. De acordo com o apresentado at aqui, pode concluir-se que: os nveis sonoros produzidos nestas infraestruturas facilmente ultrapassam os limites definidos na lei (ver 3.2.1 e 3.2.2); facilmente se estendem a zonas de recepo de rudo relativamente afastadas da prpria fonte (ver 3.2.2); e os seus efeitos nas zonas vizinhas podem traduzir-se em incomodidade (ver 3.2.3) ou em prejuzo da sade (ver 3.2.5). Assim, a sujeio aos regimes de avaliao de impacte ambiental ou de parecer prvio sua instalao (ver 3.2.2) deve ser cuidadosamente conduzida, tendo em conta o uso do territrio previsto pela lei, e enquadrada pelos planos municipais de reduo do rudo (art. 6. do RGR). A NRA (2004) defende ainda que podem ser conduzidos estudos acerca do impacte econmico da instalao da CT nas zonas prximas, bem como da opinio da comunidade local acerca do rudo, permitindo perceber a aceitao do projecto pela comunidade e delinear estratgias de actuao perante esta.

3.3 EXPOSIO AO CHUMBOA utilizao do chumbo conhecida desde a Antiguidade, tendo sido os Romanos e os Gregos que descobriram as suas propriedades txicas (Barsan, et al, 1996). O chumbo um elemento natural que pode ser encontrado sob variadas formas, tratando-se de um metal txico e pesado. Embora na sua forma metlica tenha uma baixa reactividade, os elementos de chumbo que constituem as vrias composies qumicas utilizadas nas munies so muito

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facilmente absorvveis pelo organismo humano [National Association of Shooting Ranges (NASR), 2005]. A sistematizao do problema da exposio ao chumbo em CT deve abordar os seguintes processos: fonte de contaminao, forma de admisso ao organismo, elementos sujeitos contaminao e respectivo critrio de admissibilidade. Alm do chumbo, as munies podem conter outros metais ou compostos txicos. Normalmente ocorre a formao de grandes quantidades de monxido de carbono, xidos de azoto [Anania, et al, 1975; Naval Environmental Health Center Technical Manual (NEHC-TM) 6290.99-10] e libertao de plvora no queimada (NEHC-TM6290.99-10). Os primeiros apresentam um risco inferior, face contaminao pelo chumbo, e uma vez que a implementao de medidas quanto ao chumbo resolver, por simpatia, a exposio a esses gases, o estudo desses no ser aprofundado. No que respeita acumulao de plvora queimada, poder aumentar os riscos de incndio (NEHC-TM6290.99-10), mas, pela mesma razo dos primeiros, o seu estudo no ser aprofundado.

3.3.1 FONTES DE CONTAMINAOAs munies das armas de projctil nico (ver 2.2.2) so constitudas pelo projctil propriamente dito, ou bala, e o estojo ou invlucro. O projctil constitudo por um material denso, tradicionalmente, chumbo. Este pode estar totalmente exposto, ou encamisado, total ou parcialmente. As munies utilizadas para fins militares so do tipo encamisada, designadas comummente por full metal jacket. A capa externa, designada de camisa metlica, composta, em geral, por ligas de cobre e zinco. Deve ressalvar-se o facto de esta designao no implicar a inexistncia de chumbo exposto, uma vez que alguns tipos de munio no tm a base do projctil, que est voltada para o interior do invlucro, encamisada. o caso das munies de 9 mm utilizadas em algumas pistolas em uso nas Foras Armadas e foras de segurana. O estojo ou invlucro aloja o fulminante e a carga propulsora (ou propelente). O fulminante o elemento iniciador explosivo, que faz deflagrar a carga propulsora. A carga propulsora a carga principal, que propulsiona o projctil. Normalmente a mistura explosiva que constitui o fulminante contm sais e nitratos metlicos muito sensveis, frequentemente compostos de chumbo. A carga propulsora constituda por um composto de plvora. Desta forma, pode concluir-se que munies so a fonte de chumbo principal nas CT . Porm as fontes de contaminao no esto relacionadas to directamente com as munies, uma8

8 O desenvolvimento de munies sem chumbo uma tecnologia emergente. Por exemplo, existem projcteis compostos por outros materiais, nomeadamente as munies frangveis, cujo projctil cermico, sendo pulverizado quando ocorre o impacto. Simultaneamente existem fulminantes compostos por outros qumicos, embora ainda no se tenham conseguido resultados positivos no que respeita a sua estabilidade em armazenamento, o que provoca muitas falhas de tiro. Alm disso, este tipo de munies ainda tem custos muito elevados. (NASR, 2005)

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vez que s as munies no encamisadas permitem contacto directo com o chumbo. Podem definir-se os seguintes processos, os quais se constituem em fonte de contaminao: Combusto da carga propulsora - os gases produzidos atingem elevadas temperaturas e provocam vaporizao de chumbo do projctil; Expelio do projctil pelo cano da arma - os gases propulsores do projctil so tambm expelidos pelo cano da arma, em todas as direces. A expanso destes pode provocar a formao de ondas de choque que perturbam o ar na zona de respirao do atirador; Devido sua densidade, pelo efeito da gravidade, todas as partculas no volteis expulsas pelo cano da arma, iro assentar rapidamente, cobrindo as superfcies prximas do atirador com finas partculas de chumbo segundo o termo original, lead dust; Todos os dispositivos de desenfiamento, bem como o prprio leito da CT, alojam e interceptam projcteis, constituindo-se em fonte de chumbo e partculas de chumbo (NSSF, 1997; NEHC 2002; NRA, 2004; NASR, 2005).

3.3.2 FORMAS DE ADMISSO AO ORGANISMOA contaminao pelo chumbo designa-se, normalmente, por envenenamento por chumbo, fazendo parte da classe de envenenamento por metais pesados. Pode ocorrer pela inalao de partculas ou gases, e pela ingesto de partculas contaminadas por chumbo acumuladas em superfcies com as quais o atirador est em contacto (Barsan, et al, 1996; NASR, 2005). A absoro gastrointestinal de cerca de 10% da dose ingerida (podendo ascender a 50% em crianas), e potenciada pela deficincia de ferro, clcio e zinco no organismo. A absoro pela via respiratria depende do volume de partculas inaladas e do seu tamanho. Uma parte da dose ingerida eliminada pelo sistema renal e outra absorvida. Em condies normais, 5 a 10% da dose ingerida entra no sistema linftico, 80 a 90% acumula-se nos ossos, e o restante nos tecidos moles principalmente rins e crebro. O perodo de semi-vida do chumbo no sangue e tecidos moles de 24 a 40 dias, e nos ossos de 104 dias (Kasper, et al, 2004). Os efeitos nocivos sade surgem normalmente a longo prazo, uma vez que os nveis de chumbo acumulados nos ossos e nos tecidos iro libertar chumbo no organismo sucessivamente, mesmo aps a exposio (Barsan, et al, 1996; NRA, 2004; NASR, 2005). Em CT, a principal forma de admisso atravs da inalao de partculas de chumbo libertadas no ar durante a execuo do tiro e acumuladas nas superfcies da CT, prximas e afastadas. Poder ainda ocorrer por ingesto indirecta, atravs do contacto de partes do corpo ou de vesturio com alimentos ou gua, e em muito pequena extenso atravs da absoro pela pele (NRA, 2004; NASR, 2005).

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3.3.3 DISPOSIES REGULAMENTARESO Decreto-Lei n. 274/89, de 21 de Agosto de 1989, consagra a Directiva do Conselho n. 82/605/CEE, de 28 de Julho de 1982, relativa proteco dos trabalhadores contra os riscos resultantes da exposio ao chumbo, e aplica-se s empresas e estabelecimentos que desenvolvam actividades cujo exerccio seja susceptvel de originar a exposio dos trabalhadores ao chumbo metlico e aos seus compostos inicos. Considera-se que pode existir um risco de absoro de chumbo na utilizao de munies contendo chumbo em espaos fechados. (art. 1). O art. 2 do presente diploma define o seguinte: Nvel de aco: valor de concentrao de chumbo no ar nos locais de trabalho fixado em 75 g/m , referido a oito horas dirias e a 40 horas por semana; Valor limite de concentrao de chumbo: valor de concentrao de chumbo no ar nos locais de trabalho que no deve ser ultrapassado, fixado em 150 g/m , referido a oito hor