discurso da aula de matemiitica - ipv.pt · 2011. 11. 18. · da sobre o que fazem na aula. focar a...

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Educaçà e Matemátic n044 Setembro/Outubro de 1997 0 discurso da aula de Matemiitica Lzfi Menezes A compreensã mais alargada e aprofundada das questÃμe que se relacionam com a Matemátic escolar passa, cada vez mais, pelo professor: o númer crescente de publicaçÃμ e estudos que incidem sobre o professor constitui um claro reconhecimento da importânci daquele último Neste artigo procura-se abordar uma componente central das prática do professor de matemátic na sala de aula. O estudo do discurso da aula de Matemátic constitui uma preocupa- çÃrecente dos educadores matemá ticos portugueses. O própri termo discurso causa ainda alguma estra- nheza no ãmbit da Educaçà Mate- mática A testemunhar este facto estã os problemas de traduçà que o termo discourse levantou aos autores da versã portuguesa do documento Professional Standards for Teaching Mathematics, do NCTM (1 991). Algumas noias sobre o &curso A abordagem de um tema ainda tã pouco trabalhado, como e o discurso na aula de Matemáticaparece justificar, ainda que de uma forma breve, a discussã dos diversos significados daquele termo. O discurso corresponde a um aconte- cimento estmtural, manifestado em comportamento linguistico e nã IinguÃ-stico Do ponto de vista da Pragmáticadiscurso refere o modo como os significados sã atribuÃ-doe trocados por interlocutores em contexios reais. Os enunciados, tanto oras como escritos, sã compreendi- dos por meio de referênci a um conjunto particular de ideias, valores ou convençCIes que existem fora das palavras trocadas (Stubbs, 1987). A relevãncique o NCTM (19941, nas Normas Profissionais, atribui ao discurso, leva diversos autores, de uma forma mais abrangente e tendo como pano de fundo o processo educativo, a explicitarem a forma como entendem aquele conceito. Deste modo, sugerem que o discurso se refere "5s formas de representar, pensar, falar, concordar ou discordar que professores e alunos usam nestas actividades" (p. 22). Tentando conciliar o processo de produçà de sentido com o resultado deste mesmo processo, o NCTM (1994) argumenta que '"o discurso engloba tanto a forma como as ideias sã trocadas como aquilo que as ideias veiculam'' (p. 36). Neste sentido, o termo discurso pode assumir uma acepçÃmais estática e ser entendido como o produto das múltipla realizaç6e de um conjunto de falantes, num determinado contex- to, ou, pelo contrário pode encerar uma atitude mais dinãmica e reportar- se ao própri processo de produçà de sentido, recorrendo a um determi- nado conjunto de signos linguisticos, supostamente comuns aos intedocutores - neste caso, o profes- sor e os alunos. Dependendo do suporte desses mesmos signos, o discurso pode apelidar-sede oral ou escrito. Neste artigo, embora se teça algumas consideraç6e sobre o discurso escrito da aula de Matemáti ca, à sobretudo sobre o oral que se vã centrar as atenç6es Porquà o intmse no dis- da auia & Matemática O crescente interesse pelo discurso da aula de Matemátic assenta em diversas motivaç6es A primeira, liga- -se com a centralidade da linguagem na actividade humana em geral. e na escola, em particular. Grande parte das acçeedo professor e dos alunos na aula têm de um modo directo ou indirecto, uma forte componente verbal. A linguagem assume um papel nuclear na actividade humana, ao permitir. de entre outras funç6es a comunicaçà entre as pessoas. Recorde-se que o própri termo comunicarsignifica. em termos

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  • Educaçà e Matemátic n044 Setembro/Outubro de 1997

    0 discurso da aula de Matemiitica

    Lzfi Menezes

    A compreensã mais alargada e aprofundada

    das questõe que se relacionam com a

    Matemátic escolar passa, cada vez mais,

    pelo professor: o númer crescente de publicaçõ

    e estudos que incidem sobre o professor constitui um claro

    reconhecimento da importânci

    daquele último

    Neste artigo procura-se abordar uma componente central das prática do professor de matemátic na sala de aula. O estudo do discurso da aula de Matemátic constitui uma preocupa- çà recente dos educadores matemá ticos portugueses. O própri termo discurso causa ainda alguma estra- nheza no ãmbit da Educaçà Mate- mática A testemunhar este facto estã os problemas de traduçà que o termo discourse levantou aos autores da versã portuguesa do documento Professional Standards for Teaching Mathematics, do NCTM (1 991).

    Algumas noias sobre o &curso

    A abordagem de um tema ainda tã pouco trabalhado, como e o discurso na aula de Matemática parece justificar, ainda que de uma forma breve, a discussã dos diversos significados daquele termo.

    O discurso corresponde a um aconte- cimento estmtural, manifestado em comportamento linguistico e nã IinguÃ-stico Do ponto de vista da Pragmática discurso refere o modo como os significados sã atribuÃ-do e trocados por interlocutores em contexios reais. Os enunciados, tanto oras como escritos, sã compreendi- dos por meio de referênci a um conjunto particular de ideias, valores ou convençCIes que existem fora das palavras trocadas (Stubbs, 1987). A relevãnci que o NCTM (19941, nas Normas Profissionais, atribui ao discurso, leva diversos autores, de uma forma mais abrangente e tendo como pano de fundo o processo educativo, a explicitarem a forma como entendem aquele conceito. Deste modo, sugerem que o discurso se refere "5s formas de representar, pensar, falar, concordar ou discordar que professores e alunos usam

    nestas actividades" (p. 22). Tentando conciliar o processo de produçà de sentido com o resultado deste mesmo processo, o NCTM (1994) argumenta que '"o discurso engloba tanto a forma como as ideias sã trocadas como aquilo que as ideias veiculam'' (p. 36). Neste sentido, o termo discurso pode assumir uma acepçà mais estática e ser entendido como o produto das múltipla realizaç6e de um conjunto de falantes, num determinado contex- to, ou, pelo contrário pode encerar uma atitude mais dinãmica e reportar- se ao própri processo de produçà de sentido, recorrendo a um determi- nado conjunto de signos linguisticos, supostamente comuns aos intedocutores - neste caso, o profes- sor e os alunos. Dependendo do suporte desses mesmos signos, o discurso pode apelidar-se de oral ou escrito.

    Neste artigo, embora se teça algumas consideraç6e sobre o discurso escrito da aula de Matemáti ca, à sobretudo sobre o oral que se vã centrar as atenç6es

    Porquà o intmse no dis- da auia & Matemática

    O crescente interesse pelo discurso da aula de Matemátic assenta em diversas motivaç6es A primeira, liga-

    -se com a centralidade da linguagem na actividade humana em geral. e na escola, em particular. Grande parte das acçee do professor e dos alunos na aula têm de um modo directo ou indirecto, uma forte componente verbal. A linguagem assume um papel nuclear na actividade humana, ao permitir. de entre outras funç6es a comunicaçà entre as pessoas. Recorde-se que o própri termo comunicarsignifica. em termos

  • Educaçzi e Matemátic n044 Setembm/Outubm de 1997

    etimológicos estabelecer comunidade ou pô em comum.

    O segundo motivo, relacionado com o anterior, decorre do reconhecimento da importânci da intewençà verbal do professor na aprendizagem dos alunos. A natureza dessa intewençà està intimamente relacionada com as concepçõ do professor sobre o ensino e a aprendizagem. Deste modo, a participaçà do professor no discurso da aula pode assumir a forma da exposiçà dos conteúdo - tenden- do, em grande parte das aulas. para o locutor únic -ou. pelo contrário traduzir-se na dinamizaçà da discus- s.30 entre os alunos.

    Por último a anális do discurso da aula fornece uma vasta gama de informaçõ sobre a forma como o ensino e a aprendizagem sã entendi- das pelo professor ou, ainda, sobre o modo como se processa a aprendiza- gem dos alunos. Que papel assumem professor e alunos nas interacçõ vetbais na aula? De que forma se processa a inte~ençà dos alunos na aula? Que questõe sã importantes? Quais as ideias e as formas de pensar que sã valorizadas? Qual o papel da discussão Quem vaiida o conheci- mento matemático Como se relacio- na o discurso do professor com o discurso dos alunos? Estas sã algumas das muitas perguntas as quais a anális do discurso da aula pode ajudar a dar resposta. Por este motivo, parece ser de capital impor- tânci levar os professores a reflecti- rem sobre esM dimensã das suas prática pedagógicas Este esforç de anális e reflexã serà tã mais importante quanto se sabe da forma acentuadamente espontâne que caracteriza as inte~ençõ verbais do professor, pelo carácte omnipresente da linguagem no dia-a-dia das pesso- as. Por este facto, nã causa impres- sã a atitude de alguma estranheza que a audiçà de gravaçõ ou a leitura de transcriçõ de aulas causa aos professores directamente envolvi- dos. Por tudo isto, a analise do discurso constitui um bom meio para os professores questionarem as suas prática e atà as suas própria

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    concepçõe de forma a terem uma atitude mais consciente e fundamenta- da sobre o que fazem na aula.

    Focar a atençà no discurso dos alunos pode permitir perceber aquilo que os mesmos aprendem, obter informaçõ sobre a qualidade desse saber, sobre o modo como pensam, sobre as capacidades e atitudes que estã a ser desenvolvidas.

    Em sintese, parece haver um conjunto apreciáve de razõe que motivam o interesse pelo discurso da aula de Matemática sendo umas inerentes a própri disciplina e outras de carácte mais geral.

    Papéi do professor e do aiuno no &curso

    O discurso da aula é em grande parte, um dos principais indicadores da forma como uma aula està organi- zada, dos pressupostos pedagógico que est.30 subjacentes, das opçõ que o professor faz e da natureza das aprendizagens. Poder-se-a mesmo argumentar que o discurso da aula, neste caso de Matemática funciona como uma espéci de espelho, atraves do qual se poderà obsewar uma diversidade de aspectos relacio- nados com essa mesma aula. A distinçà entre uma aula tradicional, de tipo expositivo, e uma aula em que os alunos se envobem activamente na construçà do seu própri conheci- mento, passa, em grande medida, pela qualidade do discurso. O profes- sor, enquanto principal responsáve pela organizaçà das situaçõ de aprendizagem, desempenha um papel relevante na conduçà do discurso.

    Numa aula dita tradicional, o professor tende a monopolizar o discurso, detendo a primazia sobre os alunos. O professor fala, explica, corrige; os alunos ouvem, seguem o raciocinio do professor e respondem as perguntas colocadas. As intewençõ dos alunos sã esporádica e curtas, e a interacçà predominante à professor/ aluno/professor, O padrã discursivo e o seguinte: o professor interpela o aluno: este responde e o professor avalia o teor da resposta.

    Uma aula de Matemátic que tem como referênci as orientaçõ rnais recentes para o ensino desta discipli- na pressupõ outro tipo de papel do professor no discurso da aula. Essa diferenç nã à de carácte quantitati- vo, isto é nã à de admitir que o professor, na aula tradicional e, em termos verbais, seja mais activo quando comparado com a sua presta- çà numa aula dita nã tradicional. A principal diferenç entre os papéi do professor nestes dois tipos de aulas à essencialmente qualitativa. O profes- sor que organiza a sua aula de acordo com as novas orientaçõ para o ensino da disciplina Ã-APM 1988; NCTM, 1991,1994) continua a interpretar um papel activo. No entanto, essa actividade à de uma outra natureza. Nas Normas Profissio- nais, os autores utilizam a metáfor do maestro para descrever a intewençà do professor no discurso da aula, seja endereçand aos alunos convites a intewençà na discussã ou estimu- lando-os para uma autonomia cres- cente no processo de aprendizagem. Esta metafora à particularmente feliz porque conté em si mesma a simbiose dos diferentes papéi que professor e alunos desempenham na aula de Matemática Levando mais longe a metáfora pode sustentar-se que ao professor compete orquestrar e dirigir, e aos alunos, interpretarem a Matemática de uma forma. tanto quanto possÃ-vel criativa. Sobre a forma de o professor dirigir o discur- so, o NCTM (19941 avanç com algumas sugestõe que vã no sentido da promoçà do raciocinio dos alunos, desenvolvendo as capaci- dades de comunicaçà e de resoluçà de problemas. A primeira sugestã para favorecer o discurso consiste na definiçà de tarefas que conduzam a discussã e a formulaçà de ques- tões que desafiem o pensamento dos alunos, ou seja, a valorizaçà da resoluçà de problemas em detrimen. to das propostas rnais rotineiras.

    A pergunta constitui um instrumento verbal valioso na estruturaçà do discurso do professor, tanto na aula tradicional como na dita nã tradicio- nal. A principal diferenç entre estas

  • Educaçà e Matemátic n044 Setembro/Outubru de 1997

    aulas reside no tipo de perguntas que o professor mobiliza em cada caso, nos objectivos que tem em vista e na forma como conduz as intewençõ dos alunos. Na aula tradicional, grande parte das perguntas tem como finalidade o teste de conhecimentos e o apoio ao discurso do professor. Na aula nã tradicional, a pergunta assume contornos diferentes, corporizando um carácte provocador do pensamento dos alunos e gerando a interacçà entre estes últimos Estas perguntas tê como finalidade o desenvolvimento de competência diversas nos alunos, ultrapassando em muito o mero teste de conheci- mentos. A estimulaçà do pensamen- to dos alunos passa pelo pedido de justificaçà das respostas, pela clarificaçà da argumentaçà apresen- tada e pela discussã das ideias. Por este motivo, o professor deve evitar fazer, de forma sistemática comentá rios as intewençbe dos alunos, pois estes último tenderã a demitir-se da tarefa de validaçà do conhecimento matemátic da aula. O fomento. pelo professor. das interacçõ verbais entre os alunos conduz, em primeira instância a descentraçà da autorida- de, em matéri de saber, do professor para o par professor/alunos. O poder decisóri deixa de pertencer de forma exclusiva ao professor para ser um empreendimento compartilhado. Contudo, à preciso sublinhar que esta nova atitude do professor nã o deve. nem pode, excluir de intervir no discurso na aula. Compete ao profes- sor avança com novas informaçõe que se tomam pertinentes com o decorrer da aula, com a selecçà das intewençõ dos alunos que se mostram mais adequadas 6 aula. com a gestã da participaçà dos alunos. O papel do professor neste novo discurso à muito mais exigente, porque: (i) a conduçà da aula toma- se muito mais imprevisivel, isto é o desenrolar da aula deixa de ser tã linear; (ii) a quantidade de informaçà que à partilhada à substancialmente superior (iii) o professor à chamado a ter uma atitude muito mais compreen- siva da actividade dos alunos.

    As novas orientaçõ para o ensino

    da Matemátic colocam ao professor novos desafios, que pressupõe outras tantas formas de conceber a aprendizagem e donde decorrem novos papéi para este últim e para e os alunos. O discurso, pela transversabilidade da linguagem, està presente, de uma forma mais ou menos directa, em grande parte das dimensõe da aula. Deste modo, serà importante assumir uma atitude reflexiva sobre as suas potencialida. des e implicaçõ didácticas

    Episódio

    Nesta últim secçã propõe-s a anális de transcriçõ de partes de duas aulas do 5' ano de Matemática de dois professores (Pedro e Mariana), do 2' ciclo do Ensino Básico A primeira transcriçã corresponde ao inicio de uma aula em que o Pedro pretende que os alunos desenhem, no caderno diário rectân gulos com perimetro igual a 20 cm, A segunda transcriçã corresponde 6 discussã de um problema proposto pela Mariana aos alunos. A professora sugeriu que o problema fosse resolvi- do por pares de alunos.

    Pedro

    [Os alunos, individualmente, procu- ram construir rectãngulo com 20 cm de pen'metro. O professor des- loca-se pela sala obsewando os trabalhos.] Prof. - Quem à que ainda nã con- seguiu construir nenhum? [Quatro alunos põe o braç no ar e o professor desloca-se para junto de um deles.] Prof. Quantos centimetros tem este lado? Joã - 6 cm. Prof. - Se este tem 6 cm, quanto tem o outro? [O aluno nã responde.] Prof. - Orect~nguloquantotemque ter de perimetro? Joã - 20 cm. Prof. - Se este mede 6, quanto mede este [aponta para o lado para- lelo]? Joã - 6. Prof. - Quanto à seis e seis?

    Joã - 12. Prof. - Entã quanto sobra para os outros lados [aponta no cademo diário] Joã - 8. Prof. - Entã diz là quanto mede o lado que falta? [Silêncio Prof. - Se sã iguais, quanto mede cada um? Joã - 4. Prof. - Sim senhor. Faz agora ou- tros. C..) [Depois de os alunos, no lugar, te- rem construido diversos rectângu los, o professor faz um registo no quadro negro das medidas encon- tradas. No final, o Pedro chama a atençà para a possibilidade de se poderem construirrectângulosco lados de diversos comprimentos, mantendo o perimetro.1,

    Mariana

    Os alunos, aos pares, resolvem o problema seguinte:

    Calcula o comprimentodo segmen- to azul [no desenho com "?"I de forma a que as duas figuras tenham a mesma área

    I9 m '!

    [Depois de os alunos terem estado a trabalhar, a professora convida- os a mostraraclassecomoresolve- ram o problema.1 Prof. - [Os alunos fazem ainda al- gum barulho1 Podemos começaf [Pausal Pronto, houve g ~ p o s que conseguiram resolver o problema, mas outros não Vamos là começa por ouvir as vária opiniõe e as vária maneiras como resolveram o problema. [algum barulho entre os alunos1 Podemos? [Faz uma pequena pausa e conti- nua:] Prof. - Fátima nó sabemos que estas figuras sã equivalentes e conhecemos algumas das medidas dos lados. Sabendoistotudo, como

  • à que tu pensaste? [Um outro aluno tenta falar.] Joã - Eu sei, eu sei ... Prof. . João tu vais ter oportunida- dedeexplicarcomo pensaste. Ago- ra vamos ouvir a Fátima [O aluno cala-se.] Prof. - Fátima diz-nos là [pausa] com essa informaçà que tu tinhas e que recordámo agora, como e que pensaste? Fátim - Eu fiz assim. Primeiro fui calcular a áre deste quadrado, porque nos sabÃ-amo a medida dos lados. Deu 196 m2 Depois fui calcu- lar esta parte do rectângulo [Um aluno interrompe a in te~en- $20 da colega.] Antonio - Nã estou a perceber. Prof. - [Dirigindo-se ao aluno que interrompeu a aula:] Fala com a tua colega. Fátim - '"Stõra" posso ir ao qua- dro? Prof. - Podes. maluna faz no quadro um esquema da imagem do livro e retoma a expli- caçã Fátim - Primeiro calculei este qua- drado [aponta no quadro]. Depois fui calcular a áre desta parte do rectângul [aponta mais uma vez], porque sei esta medida eesh hpon- tal, Esta áre dà 133 m2. Como diz no livro que as figuras sã equiva- lentes, esta parte tem de medir 63 [escrevenoquadro "1 96-1 33=63"1. Pronto, agora este risco azul mede 9m ... Sofia - Eu nã percebi. Prof. -Acho que a Fátim foi muito depressa. Posso colocar-te algu- mas perguntas para tentarmos per- ceber melhor como fizeste o pro- blema? Fátim -Sim. Prof. - Tu calculaste a áre deste quadrado. Atà aqui, acho que nin- guem tem dúvidas Depois foste calcular a áre de parte do rectân gulo, porque conhecias as medi- das, Agora, por que e que fizeste aquela diferença Fátim - Porque as figuras tê de ter a mesma área Dizia no livro que as figuras eram equivalentes. Ora.

    como o quadrado media 196, o rectângul també tinhademediro mesmo. Como a outra parte do rectingulo tem de áre 133, fui ver quanto faltava. [Um outro aluno interrompe.] Ricardo - Eu sei uma maneira mais facil. Prof. - Entã como e que tu resol- veste o problema?.

    A 5 a h u Uma anális comparativa do discurso das duas aulas, sem pretender ser exaustiva, permite avança com algumas conclusões O primeiro aspecto que importa realça diz respeito a natureza das intewençõ discursivas do professor e dos alunos. A Mariana tem, e fomenta nos alunos, intewençõ com um grau de elaboraçà apreciá vel, principalmente nos momentos de discussã de problemas. Esta ocupa- çà do espaç discursivo da aula, revela uma clara intençã por parte desta professora, em catalisar a comunicaçà matemátic na aula. atraves do confronto de ideias, desenvolvendo a capacidade de argumentaçh e estimulando o espirito crÃ-tic dos alunos. No caso do Pedro. registam-se intewençõ mais curtas e com um nivel de exigència em termos de operaçõ mentais, reduzido. Essas intewençõ apoiam- -se numa estrutura dialogica, mas em que os interÃ-ocutore são quase invariavelmente, o professor e o aluno. A Mariana organiza a aula de modo que o diálog entre os alunos seja um facto e com importânci significativa nas aprendizagens dos alunos. O tipo de interacçõ que cada um dos professores privilegia na aula de matemátic e os objectivos que tem no horizonte, influenciam claramente o tipo e a qualidade do discurso dos alunos. A anális das duas transcriçõ deixa antever a importãnci da pergunta enquanto instrumento organizador do discurso dos dois professores. No entanto, o recurso i pergunta e qualitativamente diferente em ambos os professores, Essa diferenç à traduzida no tipo de perguntas

    formuladas, na forma como sã contextualizadas no discurso do professor e nos objectivos que se pretendem atingir. Assim, enquanto a Mariana valoriza perguntas divergen- tes, que fazem apelo a operaçõ mentais de nivel mais elevado, o Pedro insiste em perguntas conver- gentes, que solicitam pequenas contribuiçõ dos alunos. Em relaçà as respostas dos alunos. vária questõe podem ser colocadas e analisadas ao nÃ-ve do discurso, como sejam: Que tipo de respostas sã valorizadas? Quem valida essas mesmas respostas? Relativamente a primeira questão e nitida a diferenç entre o Pedro e a Mariana. E també claro que grande parte dessa diversi- dade de situaçõ decorre do tipo de perguntas que e formulado, mas no caso da Mariana à patente a sua preocupaqã com o desenvolvimento das capacidades de comunicaçà e raciocÃ-nio Os pedidos constantes, aos alunos, para verbalizarem o seu pensamento, justificando as suas ideias e confrontando-as com as dos colegas traduzem esta valorizaçà da comunicaçà matemática A Mariana procura que as respostas dos alunos se enquadrem nesta concepçà de aula de matemática Quanto a questã da validaçà das respostas, enquanto o Pedro assume o poder decisóri em matéri de saber. a Mariana procura envolver os alunos nesta tarefa - fomentando, deste modo, o espÃ-rit critico dos alunos e responsabilizan- do-os nas suas proprias aprendiza- gens.

    Um aspecto que parece també marcar o tipo de discurso da aula e a natureza das tarefas que o professor propõe As tarefas que o professor propõ e o discurso da aula mantê uma relaçà de mutua influência uma vez que um tipo de tarefa mais problemátic conduz com maior facilidade a um tipo de discurso mais dialogico e interactivo, enquanto que as tarefas mais rotineiras. nã susci- tando grande discussão diminuem o númer de interacçõ e empobre- cem o discurso da aula.

    ( Continua na pag. 1 1 )

  • Educaçà e Matematica n044 Setembro/Outubm de 1997

    neste sentido. Finalmente, à preciso dizer que o programa representa um compromisso social, meihor dizendo um comprometimento, que significa respeitar o direito a uma formaçà matemátic que prepare os cidadão para a vida em geral e seja uma base segura para prosseguir estudos superiores.

    ... &corrente com conteúd Da discussã havida e, levadas em consideraçà as tendência intemaci- onais, nã nos parece aconse1háve propor a abordagem de uma menor quantidade de temas matemáticos nem nos parece aconselháve reduzir as orientaçõ metodologicas a meras indicaçõ sobre os aspectos cientÃ-fico a acautelar na exposiçà ou sobre os exercÃ-cio a propor. Parece- nos que revestem muita importãnci para o desenvoivimento do espÃ-rit cientÃ-fic e crÃ-tic dos jovens todas as indicaçõ que reforça a comunica- çà corrente (oral e escrita) nas aulas de Matemática as conexõe da Matemátic com outros ramos do saber, a aproximaçà a conceitos matemático e a formulaçà de conjecturas a partir da obsewaçà de modeios ou com informaçõ que o uso acertado da tecnologia pode proporcionar.

    A organizaçà do programa à feita por temas que se vã desenvolvendo ao longo dos tr6s anos do ensino secundário A vário tÃ-tulos o estudo das funçõ aparece como tema central: de facto, hà um acordo geral sobre a sua importância sobre as conexõe aue estabelece com os

    diferentes assuntos de Matemátic e com os outros ramos do conhecimen- to. O estudo das funçõ à feito sobre a definiçà e generalidades atà as noçõ de limite, continuidade e a derivaçã dos pontos de vista analÃ-tico numéric e gráfic e sobre algumas funç6e polinomiais, racio- nais e irracionais, trigonométricas exponenciais e logaritmicas. No 1 W ano, sã estudadas as funçõ polinomiais e antes desse estudo à abordado o estudo de temas de geometria sintétic e analÃ-tica O estudo da Geometria deve ser feito com utilizaçà de modelos geométri cos constmidos para resolver proble- mas realistas e o estudo das funçõe que deve ser feito també com situaçõ exploratorias, utiliza as capacidades gráfica das novas calculadoras para aprofundar o estudo gráfico como apoio seguro. para o estudo em geral das funçõ e mesmo para alguns trabalhos algébri cos.

    Considera-se que os temas tê de ser abordados obrigatoriamente, mesmo que para isso tenham de ser sacrificados alguns dos itens de conteúd considerados em cada tema. Mas també à verdade que em boas turmas, sem pô em risco a abordagem dos grandes temas, alguns itens podem ser abordados com mais profundidade (ou podem mesmo ser introduzidos novos itens aparentemente nã considerados no programa). à fundamental que os estudantes possam aprender verda- deiramente matemátic e é por isso, essencial que, sempre que possÃ-vel

    proprias conclusõe que serã comgidas pelos professores. Embora sendo importante, nã à essencial que os alunos treinem técnica e rotinas de que nã percebam o sentido e de que nã vislumbrem utilidade. à també importante que os estudantes questionem e comuni- quem sistematicamente (em poriu- guês oral e escrito) os resultados das suas reflexõe e o trabalho realizado.

    Finaimente

    O programa nã resolve, por si só qualquer problema do ensino da Matemática Mas estamos em crer que ele pode ser usado como uma boa ferramenta organizadora da leccionaçà da disciplina. E espera- mos que ele introduza alguma unifor- midade na execuçã de tal modo que possamos apreciar a situaçà nacio- nal. As Orientaçõ de Gestã do Programa jà permitiram uma avaliaçà feita sobre um programa nacional ensinado. Esperamos que o acompa- nhamento deste Programa venha a permitir, alé disso, que se possam fazer exames nacionais sobre o programa aprendido.

    Esperamos ainda que o programa e as medidas que o acompanham aumen- tem o grau de satisfaçà dos profes- sores e propiciem uma reflexã sistemátic que apoie decisõe para a melhoria do ensino, para uma mudan- ç positiva das representaçõ sociais e aumento do poder da Matemática

    Arséli Martins Escola Secundári Josà Estevã . . .

    ~- ~ -~~ ~,~ ~ ~ eles possah pensar e tirar as suas

    O discurso da d a de bÃ-8muát fmntinz~uçà aà págin 8)

    Em sÃ-ntese à possÃ-ve afirmar-se que os dois professores promovem situaçõ discursivas dispares, que tê subjacentes diferentes concep- çõ sobre o ensino e a aprendizagem da Matemática Deste modo, a anális dos discurso da aula permite aceder a essas ideias e valores que os profes- sores defendem. Nota: Artigo realizado no quadro do projecto A Didáctic na Formaçi para o Desenvolvimento Profissional

    dos Professores, apoiado pelo Instituto de Inovaçà Educacional atravé do contrato no. Pl/09/93.

    Refer6ncias Bibliográfica APM (1988). Renovaç8 do cumÃ-ul de

    MatemAtiw. Lisboa:AssociaçãodeP fessores de Matemstica.

    Menezes, L. (1 995). Concepçae eprática de professores de MatemAtica: Contdbutospara o estudo da pergunta (Tese de mestrado, Universidade de Lisboa).

    NCTM (1 991 1. Normas para o cumÃ-ul e a avaIiaç3 em Matemdtica escolar. Lis. boa: APM e IIE (Trabalho original publi. cado em 1989).

    NCiM (1 994). Normas profissionais para o ensino da Matemdtica. Lisboa: APM e IIE. (Trabalho original publicado em 1991).

    Stubbs, M. (1987). iinguagem, escolas e aulas. Lisboa: Uvros Horizonte.

    Luis Menezes ESE de Viseu