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Instituto Superior de Educaçaçãodo Vale do Juruena Prof. Dr. Claudio Silveira Maia Av. Gabriel Muller, 1065– Modulo 01 – Juina – MT – CEP 78320-000 www.ajes.edu.br [email protected] Todos os direitos reservados aos autores dos artigos contidos neste material didático. De acordo com a Lei dos Direitos Autorais 9610/98. 1 Instituto Superior de Educação do Vale do Juruena Pós-Graduação Lato Sensu em GESTÃO ESCOLAR COM ÊNFASE NA DIREÇÃO, COORDENAÇÃO E SUPERVISÃO ESCOLAR Disciplina: DIDÁTICA DO ENSINO SUPERIOR Professor: Dr. Cláudio Silveira Maia

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Instituto Superior de Educaçaçãodo Vale do Juruena

Prof. Dr. Claudio Silveira Maia

Av. Gabriel Muller, 1065– Modulo 01 – Juina – MT – CEP 78320-000 www.ajes.edu.br – [email protected]

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Instituto Superior de Educação do Vale do Juruena

Pós-Graduação Lato Sensu em GESTÃO ESCOLAR COM ÊNFASE NA DIREÇÃO, COORDENAÇÃO E SUPERVISÃO ESCOLAR

Disciplina: DIDÁTICA DO ENSINO SUPERIOR

Professor: Dr. Cláudio Silveira Maia

Instituto Superior de Educaçaçãodo Vale do Juruena

Prof. Dr. Claudio Silveira Maia

Av. Gabriel Muller, 1065– Modulo 01 – Juina – MT – CEP 78320-000 www.ajes.edu.br – [email protected]

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Ementa: Abordar histórica e criticamente o ensino-aprendizagem de nível superior; considerar as ferramentas do ensino e do aprendizado contemporâneos; avaliar as estruturas do plano de ensino e do planejamento educacional, bem como as condições materiais e humanas implicadas nos programas de ensino superior.

SUMÁRIO

PLANEJAMENTO DE ENSINO.....................................................................................................REGINA BARROS LEAL

DIDÁTICA E EDUCAÇÃO CORPORATIVA..............................................................................ELIANE M. G. BIANCHI

DORMI ALUNO(A)... ACORDEI PROFESSOR(A)............................................................CUNHA; BRITO & CICILLINI

A IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO DIDÁTICO-PEDAGÓGICA E A CONSTRUÇÃO DE UM NOVO PERFIL PARA DOCENTES UNIVERSITÁRIOS................................................................GRAZIELA G. PACHANE; ELISABETE M. DE A. PEREIRA

DO ENSINO DE CONTEÚDOS AOS SABERES DO PROFESSOR.......................................................ISABEL A. LELIS

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Planejamento de ensino: peculiaridades significativas

REGINA BARROS LEAL Universidade de Fortaleza, Brasil

Planejar e pensar andam juntos. Ao começar o dia, o homem pensa e distribui suas atividades no tempo: o que irá fazer, como fazer, para que fazer, com o que fazer etc. Nas mais simples e corriqueiras ações humanas, quando o homem pensa de forma a atender suas metas e seus objetivos, ele está planejando, sem necessariamente criar um instrumental técnico que norteie suas ações. Essas observações iniciais estão sendo expressas, apenas para chamar atenção sobre o aspecto cotidiano da ação de planejar e como o planejamento faz parte da vida. Aquele que não mais planeja, talvez já tenha robotizado suas ações, portanto, quem sabe, não tem a consciência do que está fazendo, nem se ainda pode construir alguma coisa. Alguns até dizem: “Nem preciso mais pensar, vou fazendo o que me mandam fazer... Eu não necessito planejar, já vou fazendo, porque sei onde vai dar...”. E assim por diante. Nessa circunstância, parece estar presente a alienação do homem como sujeito, na medida em que assume a atitude de dominado, fazedor dócil e outras tantas denominações que podem ser imprimidas no sujeito, quando este se torna objeto nas mãos de outrem. Todavia, o objetivo deste estudo não é discutir tais questões, muito embora elas estejam presentes nas atividades habituais do homem. O planejamento é um processo que exige organização, sistematização, previsão, decisão e outros aspectos na pretensão de garantir a eficiência e eficácia de uma ação, quer seja em um nível micro, quer seja no nível macro. O processo de planejamento está inserido em vários setores da vida social: planejamento urbano, planejamento econômico, planejamento habitacional, planejamento familiar, entre outros. Do ponto de vista educacional, o planejamento é um ato político-pedagógico porque revela intenções e a intencionalidade, expõe o que se deseja realizar e o que se pretende atingir. Mas o que significa planejamento do ensino e suas finalidades pedagógicas?1 O que é o planejamento docente? O plano de aula? O projeto de disciplina? A programação semestral? O projeto pedagógico? Esses conceitos, atualmente, foram redefinidos, não só por conta da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, mas também como resultante do novo modelo de sociedade, onde alguns denominam de sociedade aprendente, outros, sociedade do conhecimento 2. O que é importante, do ponto de vista do ensino, é deixar claro que o professor necessita planejar, refletir sobre sua ação, pensar sobre o que faz, antes, durante e depois. O ensino superior tem características muito próprias porque objetiva a formação do cidadão, do profissional, do sujeito enquanto pessoa, enfim de uma formação que o habilite ao trabalho e à vida. Voltemos a questão inicial. O que significa o planejamento de ensino? Por que o professor deve planejar? Quais os procedimentos, os instrumentos, as técnicas, os métodos, os recursos e as finalidades pedagógicas do planejamento de ensino? Um ato político pedagógico? Uma carta de intenção? Uma reflexão sobre o saber fazer docente? Antes de desenvolver algumas dessas questões, é imprescindível afirmar que existem diferentes abordagens sobre o assunto. Tais abordagens se diferenciam pela forma como tratam a temática, todavia se afinam quantos aos seus elementos constitutivos. Assim considerado, arrisca-se afirmar que o planejamento do ensino significa, sobretudo, pensar a ação docente refletindo sobre os objetivos, os conteúdos, os procedimentos metodológicos, a avaliação do aluno e do professor. O que diferencia é o tratamento que cada abordagem explica o processo a partir de vários fatores: o político, o técnico, o social, o cultural e o educacional.

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É essencial enfatizar que o planejamento de ensino implica, especialmente, em uma ação refletida: o professor elaborando uma reflexão3 permanente de sua prática educativa. Assim o planejamento de ensino tem características que lhes são próprias, isto, particularmente, porque lida com os sujeitos aprendentes, portanto sujeitos em processo de formação humana. Para tal empreendimento, o professor realiza passos que se complementam e se interpenetram na ação didáticopedagógica. Decidir, prever, selecionar, escolher, organizar, refazer, redimensionar, refletir sobre o processo antes, durante e depois da ação concluída. O pensar, a longo prazo, está presente na ação do professor reflexivo4. Planejar, então, é a previsão sobre o que irá acontecer, é um processo de reflexão sobre a prática docente, sobre seus objetivos, sobre o que está acontecendo, sobre o que aconteceu. Por fim, planejar requer uma atitude científica do fazer didático-pedagógico. Mas como planejar? Quais as ações presentes e como proceder do ponto de vista operacional, uma vez que é entendido que o planejamento é um processo, um ato político-pedagógico e, por conseguinte não tem neutralidade porque sua intencionalidade se revela nas ações de ensino. O que se pretende desenvolver? O cidadão que se deseja formar? A sociedade que se pretende ajudar a construir? Em primeiro lugar, as fases, os passos, as etapas, as escolhas, implicam em situações diversificadas, que estão presentes durante o acontecer em sala de aula, num processo de idas e vindas. Contudo, para efeito de entendimento, indica-se a realização de um diagnóstico aqui compreendido como uma situação de análise; de reflexão sobre o circunstante, o local, o global. Nesse contexto didáticopedagógico: averiguar a quantidade de alunos, os novos desafios impostos pela sociedade, as condições físicas da instituição, os recursos disponíveis, nível, as possíveis estratégias de inovação, as expectativas do aluno, o nível intelectual, as condições socioeconômicas (retrato sócio-cultural do aluno), a cultura institucional a filosofia da universidade e/ou da instituição de ensino superior, enfim, as condições objetivas e subjetivas em que o processo de ensino irá acontecer. Planejamento de ensino: peculiaridades significativas Tal atitude do docente o encaminhará para uma reflexão de sua ação educativa naquela instituição e a partir desse diagnóstico inicial, relacionando com o projeto da universidade, poderá desenvolver uma prática formativa. De posse do Projeto de Ensino oficial5, o docente irá elaborar sua programação, adaptando-a às suas escolhas, inclusive, inserindo a pesquisa nos exercícios didáticos. Caso a instituição de ensino superior não apresente o projeto da disciplina, o professor deverá elaborar observando os seguintes componentes: a) EMENTA DA DISCIPLINA. Ementa é um resumo dos conteúdos que irão ser trabalhados no projeto. b) OBJETIVOS DE ENSINO. Elaborá-los na perspectiva da formação de habilidades a serem desenvolvidas pelos alunos: habilidades cognitivas, sociais, atitudinais etc. Há níveis diferenciados de objetivos: objetivo geral, alcançável longo prazo; objetivo específico, o qual expressa uma habilidade específica a ser pretendida. Este deve explicitar de forma clara a intenção proposta. Os objetivos variam quanto ao nível, conforme o projeto. Por exemplo; no Projeto da disciplina: objetivo geral e objetivos específicos para cada unidade do Projeto; no plano de aula pode comportar mais de um objetivo específico, dependendo do número de sessões (exemplo: 02 sessões no período da noite, horários A e B). É importante frisar que irá depender da estrutura pedagógica da instituição, a forma de elaborar projetos e planos. Há bastante flexibilidade, contanto que no projeto de ensino ou plano de aula, estejam presentes os seus elementos constitutivos. Portanto, não existem modelos fixos. Destaca-se ainda, que os objetivos, de uma maneira geral, para deixar claro a ação pretendida, devem iniciar com o verbo no infinivo porque irá indicar a habilidade desejada. Caso o professor desejar indicar

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outra habilidade no mesmo objetivo, deve usar o outro verbo no gerúndio. Exemplo: Avaliar as condições socioeconômicas do Nordeste, indicando os fatores determinantes da região. A formulação de objetivos está diretamente relacionada à seleção de conteúdos. c) CONTEÚDOS (saber sistematizado, hábitos, atitudes, valores e convicções) 6. Quais são os conteúdos de ensino? Quais os saberes fundamentais? O professor deverá, na seleção dos conteúdos, considerar critérios como: validade, relevância, gradualidade, acessibilidade, interdisciplinaridade, articulação com outras áreas, cientificidade, adequação. Além do conhecimento da ciência, o professor, por exercer uma função formadora, deve inserir outros conteúdos: socialização, valores, solidariedade, respeito, ética, política, cooperação, cidadania, etc. d) METODOLOGIA (procedimentos metodológicos). Metodologia é o estudo dos métodos. Metodologia de ensino significa o conjunto de métodos aplicados a situação didáticopedagógica. Método de ensino é o caminho escolhido pelo professor para organizar as situações ensinoaprendizagem. A técnica é a operacionalização do método. No planejamento, ao elaborar o projeto de ensino, o professor antevê quais os métodos e as técnicas que poderá desenvolver com seu aluno em sala de aula na perspectiva de promover a aprendizagem. E, juntamente com os alunos, irão avaliando quais são os mais adequados aos diferentes saberes, ao perfil do grupo, aos objetivos e aos alunos como sujeitos individuais7. Nesse processo participativo o professor deixa claro suas possibilidades didáticas e o que ele pensa e o que espera do aluno como sujeito aprendente, suas possibilidades, sua capacidade para aprender, sua individualidade. Quando o professor exacerba um método ou uma técnica, poderá estar privilegiando alguns alunos e excluindo outros, e, mais ainda, deixando de realizar singulares experiências didáticas que o ajudariam aperfeiçoar sua prática docente e possibilitar ao aluno variadas formas de aprender. Ainda arriscar a trabalhar o saber de diferentes formas, percorrendo criativos trajetos em sala de aula. O medo de mudar, às vezes, impede o professor de arriscar novos caminhos pedagógicos. Daí o significado didático-pedagógico na formação do professor. Os paradigmas das experiências anteriores podem ser as referências de muitos professores. Assim posto, é válido para o docente buscar novas técnicas, desbravar novos caminhos, numa investida esperançosa de quem deseja fazer o melhor, do ponto de vista metodológico e didático8. Tal atitude implica em estudar sobre a natureza didática de sua prática educativa. Donald Schon tem sido uma referência teórico-metodológica dos profissionais que atuam na área de formação de professores por afirmar que os bons profissionais utilizam um conjunto de processos que não dependem da lógica, da racionalidade técnica, mas sim, são manifestações de sagacidade, intuição e sensibilidade artística. Schon orienta para que se observe estes professores para averiguarmos como desenvolvem suas práticas, como fazem e o que fazem, para colhermos lições para nossos programas de formação. (O saber fazer-docente, 2002) 9. O professor deve refletir didaticamente sobre sua prática, pensar no cotidiano sobre o saberfazer em sala de aula, para não escorregar na mesmice metodológica de utilização dos mesmos recursos e das invariáveis técnicas de ensino. É importante que o professor estude sobre essa temática, uma vez que há uma diversidade metodológica que pode ser trabalhada em sem sala de aula e/ou numa situação didático-pedagógica. Exemplo: exposição com ilustração, trabalhos em grupos, estudos dirigidos, tarefas individuais, pesquisas, experiências de campo, sociodramas, painéis de discussão, debates, tribuna livre, exposição com demonstração, júri simulado, aulas expositivas, seminários, ensino individualizado. f) RECURSOS DE ENSINO. Com o avanço das novas tecnologias da informação e comunicação-NTIC, os recursos na área do ensino se tornaram valiosos, principalmente do ponto de vista do trabalho do professor e do aluno, não só em sala de aula, mas como fonte de pesquisa. Ao planejar, o professor deverá levar em conta as reais condições dos alunos, os

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recursos disponíveis pelo aluno e na instituição de ensino, a fim de organizar situações didáticas em que possam utilizar as novas tecnologias, como: datashow, transparências coloridas, hipertextos, bibliotecas virtuais, Internet, E.mail, sites, teleconferências, vídeos, e outros recursos mais avançados, na medida em que o professor for se a aperfeiçoando10. g) AVALIAÇÃO. A avaliação é uma etapa presente quotidianamente em sala de aula, exerce uma função fundamental, que é a função diagnóstica. O professor deverá acolher as dificuldades do aluno no sentido de tentar ajudá-lo a superá-las, a vencê-las. Evitar a função classificatória, comparando sujeitos entre sujeitos. A avaliação deverá considerar o avanço que aquele aluno obteve durante o curso. Há muito que estudar sobre avaliação11. Um das dicas é a de realizar as articulações necessárias para que se possa promover testes, provas, relatórios, e outros instrumentos a partir de uma concepção de avaliação que diz respeito ao aluno como sujeito de sua aprendizagem12, uma vez que planejar é uma ação dinâmica, interativa, e acontece antes de se iniciar o processo de ensino, durante e depois do processo. É uma ação reflexiva, que exige do professor permanente investigação e atualização didático-pedagógica. Bibliografia ALARCÃO, I.: Formação reflexiva dos professores, Estratégias de Supervisão, Porto Editora, 1996. CARVALHO, A. D.: Novas metodologias em educação, Coleção Educação, São Paulo, Porto Editora, 1995. CASTRO, Amélia A.: O professor e a didática, Revista Educação, Brasília, 1981. CUNHA, Maria Isabel: O bom professor e sua prática, Campinas, Papirus, 1989. FREIRE, Paulo: Pedagogia da autofobia: saberes necessários à prática educativa, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1997. GARCIA, M. M.ª: A didática do ensino superior, Campinas, Papirus, 1994. GENTILI, P. A. A.: Qualidade total na educação, Ed. Mundo Novo, 1995. GODOY: A didática do ensino superior, São Paulo, Iglu, 1998. LEITE, D., y MOROSINI, M. (orgs.): Universidade futurante: Produção do ensino e inovação, Campinas, Papirus, 1997. LIBÂNEO, José Carlos: Didática, São Paulo, Cortez, 1994. MERCADO, Luiz Paulo Leopoldo: Formação continuada de professores e novas tecnologias, Maceió, EDUFAL, 1999. MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoltte et.: Aprendizagem da docência: processos de investigação e formação, São Carlos, EdUFSCar, 2002. MORRISA, W.: O ensino superior: teoria e prática, Rio de Janeiro, Zahar, 1972. MORAES, V. R. P.: Melhoria do ensino e capacitação docente, Porto Alegre, Editora da Universidade, 1996. OLIVEIRA, M. R. N. S. (orgs): Confluências e divergências entre didática e currículo, Campinas, Papirus, 1998, 176 pp. NÓVOA, Antônio (coord.): Os professores e sua formação, 2.ª ed., Lisboa, Nova Enciclopédia, 1994. PERRENNOUD, Philippe: Dez competências para ensinar, Porto Alegre, Artmédicas, 2002. PIMENTA, S. G.: A didática como mediação na construção da identidade do professor: uma experiência de ensino e pesquisa na licenciatura, in PIMENTA, S. G.: O estágio na formação de professores: unidade teoria e prática, São Paulo: Cortez, 1995, pp. 37-69. SANTANNA, I. M.: Didática: aprender a ensinar, São Paulo, Loyola, 1989. SAVIANI, D.: Tendências e correntes da educação brasileira, in MENDES, D. T.: Filosofia da educação brasileira, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1983, pp. 19-47. SEVERINO, A. J.: Interdisciplinaridade: para além da filosofia do sujeito. São Paulo, Vozes, 1996. TUGENDHAT, E.: Lições sobre Ética, Petrópolis, Vozes, 1996. VASCONCELOS, Celso dos S.: Construção da disciplina consciente e interativa na sala de aula e na escola, 3a ed., Libertad, 1994. _____. A construção do conhecimento em sala de aula, São Paulo, Libertad, 1994.

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VEIGA, Ilma (coord.): Panejamento do ensino numa perspectiva crítica de educação, in LOPES, Antonia: Repensando a Didática, Campinas, Ed. Papirus, 2.a ed. 1 É interessante ler VASCONCELOS, Celso: Planejamento. Projeto de Ensino Aprendizagem e Projeto Político Pedagógico, São Paulo, Libertad, 1999. GANDIM, Danilo: Planejamento como prática educativa, São Paulo, Edições Loyola, 1985. 2 Recomenda-se, para uma reflexão mais aprofundada sobre as mudanças ocorridas neste modelo de sociedade, a leitura de MERCADO, Luiz Paulo Leopoldo: Formação continuada de professores e novas tecnologias, Maceió, EDUFAL, 1999. 3 Sobre o conceito de reflexão indicamos a leitura de ALARCÃO, I.: Formação reflexiva dos professores. Estratégias de Supervisão, Porto Editora, 1996. 4 SCHON, Donald A.: Formar professores como profissionais reflexivos, in NÓVOA, Antônio (coord.): Os professores e sua formação, Lisboa, Don Quixote, 1992. 5 Um modelo de Projeto de Ensino encontra-se nesta coletânea de texto, como anexo. É apenas um modelo, mas contém os elementos essenciais a um projeto pedagógico. 6 Ver como Libâneo classifica os conteúdos de ensino. Muito embora seja um livro para o ensino fundamental, é interessante a forma como trata a questão, ultrapassando os limites de que os conteúdos de ensino se resumem ao saber sistematizado. LIBÂNEO, José Carlos: Didática, São Paulo, Cortez, 1994. Põe-se em evidência que há uma nova tendência que enfatiza a formação de competências e habilidades dos alunos. 7 A postura da construção do conhecimento, segundo Celso Vasconcelos (1996), implica na mudança de paradigma pedagógico, qual seja, ao invés de dar o raciocínio pronto, de fazer para e pelo aluno construir a reflexão tomando por base a metodologia dialética, onde o professor é mediador da relação educando e o objeto de conhecimento. 8 Arriscamos indicar uma bibliografia na área do Ensino Superior sobre metodologia, técnicas, enfim, meios para mediar os saberes. GARCIA, M. M.ª: A didática do ensino superior, Campinas, Papirus, 1994. ABREU, Maria Célia, e MASETTO, Marcos Tarcísio: O professor universitário em aula, São Paulo, MG, 1986. MOREIRA, Daniel (org.): Didática do ensino superior. Técnicas e Tendências, São Paulo, Pioneira, 1997. SILVEIRA, Regina B. L.: A didática e a questão da qualidade de ensino, in Revista de Humanidade, 7(5), 1990. BORDENNAVE, Juan Diaz: Estratégias de ensino aprendizagem, Petrópolis, Vozes, 1980. LEAL, Regina B.: Memorial em dinâmica de grupo, Fortaleza, Edições Dezessete e Trinta, 2001. CASTRO, Amélia A.: O professor e a didática, Revista Educação, Brasília, 1981. 9 Pesquisa realizada na Universidade de Fortaleza: “O ‘saber-fazer competente’ dos professores para além do olhar da escola ou a prática docente: saberes revelados no cotidiano escolar”. Professora coordenadora: Regina Barros Leal. Professoras orientadoras: Mônica Mota Tassigny, Grace Troccoli, Josenilde Costa. Orientandas: alunas da disciplina de Prática de Ensino e Didática. 10 Recomenda-se a leitura de LEVY, Pierre: As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na era da informática. Rio de Janeiro, 1993. 11 O professor deverá conhecer os procedimentos e instrumentos de avaliação, suas funções. Recomendamos a leitura de VASCONCELOS, Celso dos S.: Avaliação: concepção dialética libertadora do processo de avaliação escolar, in Cadernos Pedagógicos de Libertad, vol. 3, São Paulo, Libertad, 1995. LUCKESI, Cipriano Carlos: Avaliação da aprendizagem escolar: estudos e proposições. 2.a ed., São Paulo, Cortez, 1995. HOFFMAN, Jussara M.ª: Avaliação: Mitos e desafios, uma perspectica construtivista, Porto Alegre, Mediana, 1993. HOFFMAN, Jusasara: Avaliação mediadora: uma prática em construção da pré-escola à universidade, Porto Alegre, Mediana, 1993. 12 Indica-se a leitura de Indica-se a leitura de PETRAGLIA, Isabel: Edgar Morin: a educação e a complexidade do saber, São Paulo, Vozes, 1995. SEVERINO, A. J.: Interdisciplinaridade: para além da filosofia do sujeito, São Paulo, Vozes, 1996.

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Didática e Educação Corporativa: reflexões sobre o gestor educador e o cuidado empresarial com a educação continuada.

ELIANE MARIA PIRES GIAVINA BIANCHI Universidade de São Paulo

[email protected] Resumo Este artigo tem como objetivo conduzir uma reflexão sobre as práticas didáticas presentes na educação corporativa. O aumento expressivo das universidades corporativas como resposta a mudanças no cenário econômico e a deficiência existente na educação formal fazem com que essas entidades tenham um papel importante na educação continuada de nossa população. A preocupação com estratégias de ensino e de aprendizagem é fundamental para que os profissionais consigam desenvolver competências importantes ao seu próprio desenvolvimento, contribuir para o crescimento das empresas e, conseqüentemente, o progresso das nações. Um caso de educação corporativa, em uma empresa de soluções de informação, é utilizado para suportar o processo de reflexão. De forma não conclusiva, percebe-se que a corporação apresenta um rico potencial para a utilização de recursos técnicos de ensino e aprendizagem. Porém, o papel de um dos principais atores, o gestor, ainda não foi totalmente transformado em gestor educador. Este novo papel da liderança é fundamental para garantir a viabilização e consolidação da educação corporativa como instituição complementar para a educação contínua. Palavras-chave: educação, educação corporativa, educação continuada, didática, didática em educação corporativa. Abstract This paper has the objective of driving a reflection on the didactic practices present in the corporate education. The expressive increase of corporate universities as answer to changes in the economic scenery and to the existent deficiency in the formal education, transformed those entities in important players in the continued education process of our population. Concerns with teaching and learning strategies are fundamental and contribute in assuring professionals´ competencies development, their support for companies´ growth and, consequently, the progress of the nations. A case of corporate education, in a company of information solutions, is used to support the reflection process. Non-conclusively, this study points to a great potential inside the corporate universities for teaching and learning techniques usage. Therefore, the role of one of its key actors - the leader - was not completely transformed into the educating leader. This new leadership role is fundamental to consolidate and sustain the corporate university as a complementary institution on continued education. Key words: education, corporate education, continuing education, didactic, didactic practices in corporate education. 1 Introdução.

A educação corporativa pode ser vista como um modismo por algumas pessoas, talvez por ter surgido na prática empresarial antes de ser teorizada na academia, como outros modelos e instrumentos de gestão da administração.

A expansão da educação corporativa no Brasil veio responder a duas situações: o aumento da competitividade global e a fragilidade e precariedade da educação tradicional. Por um lado, o aumento da competitividade pressionou empresas a terem maior velocidade, maior inovação, preocupação com qualidade e produtividade; além de adotarem técnicas de gestão

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para atender a esses requisitos como o trabalho em grupo, a participação e o aumento da comunicação interna. Por outro lado, o histórico de pouca continuidade nos estudos, leva para as organizações pessoas com deficiências básicas. Nem mesmo a expansão de cursos técnicos profissionalizantes, conseguiu responder às crescentes demandas do mercado.

Com isso, a organização opta pela educação corporativa como forma de desenvolver seus recursos e talentos e buscar competitividade sustentada. O papel dessas entidades é o de desenvolver competências críticas empresariais e humanas fundamentais, priorizando a comunicação, a colaboração, a capacitação técnica, o raciocínio crítico e a liderança (MEISTER, 1999). Seu objetivo não é substituir a educação básica tradicional, mas realizar o processo de educação continuada com foco na renovação do conhecimento, dada a sua rápida obsolescência e, no desenvolvimento de novas atitudes e habilidades requeridas pelo mercado de trabalho.

Em alguns casos, uma organização estabelece uma parceria com uma instituição de ensino para pensar sua estratégia de educação e realizar seus programas. Em outros, seus recursos internos são responsáveis pelo planejamento, execução, avaliação e controle das atividades. Será que os recursos internos de uma organização têm a mesma preocupação ou o preparo dos educadores das entidades de ensino? A liderança das organizações suporta e serve de exemplo ao processo de aprendizagem? Quais as estratégias de ensino mais adequadas a esta nova realidade? Será que o aprendizado é aferido?

Muita bibliografia existe sobre didática no ensino superior tradicional, mas esta abordagem ainda é pouco explorada na educação corporativa. Assim, entender o quê as organizações entendem por educação, quais recursos de ensino e aprendizagem elas utilizam, os novos papéis de seus atores, a processo de avaliação do aprendizado, pode contribuir para aprofundar nosso conhecimento sobre educação continuada, focalizando especialmente a contribuição das empresas ao desenvolvimento humano, no novo cenário econômico.

Para tal, é traçado um referencial teórico focalizando dois temas principais: a educação e a didática. Entender o papel da educação corporativa dentro de um cenário de educação mais amplo é necessário, já que esta nasceu para participar do processo educacional como um todo. Com relação à didática, faz sentido analisar a didática no ensino superior tradicional como subsídio para a discussão de seu uso e aplicabilidade na corporação. Didática neste trabalho será abordada como sendo os princípios, recursos e técnicas de ensino, habilidades do educador, processo de aprendizagem e aferição de aprendizado. Um estudo de caso exploratório é utilizado para auxiliar, do modo empírico, a reflexão sobre práticas didáticas na educação corporativa.

Com este trabalho, espera-se iniciar uma reflexão centrada no aluno (estudante/funcionário) como paciente de um processo educativo contínuo e realizado por múltiplas entidades. Um pano de fundo importante é a compreensão da missão principal tanto da entidade de ensino tradicional quanto da corporação, entendendo as mesmas como parcerias no desenvolvimento sustentado das nações. 2 Educação: base para o desenvolvimento humano.

Para que serve a educação? Ioschpe (2004) utiliza esta pergunta para explicar que a educação teve significados distintos através dos tempos. Foi, contudo, com a Revolução Industrial e uma ampla reforma eleitoral na Inglaterra que se consolidou o processo compulsório de educação, base do sistema escolar atual. Ainda segundo Ioschope, existem duas visões distintas sobre o processo educacional: de um lado pedagogos, educadores e filósofos vêem a educação como um uma ferramenta de libertação e, por outro, empresários e trabalhadores a interpretam como instrumento de adestramento, isto é, de preparação para o trabalho e manutenção da ordem. Percebe-se, contudo, que a educação está por trás do desenvolvimento humano, seja na forma de um valor ou transformada em um requisito prático.

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A educação é também um fenômeno político, argumenta Niskier (2001) uma vez que a política é a totalização do conjunto de experiências vividas em uma sociedade. A educação deve estar focada em fenômenos da realidade, amparada pelo conhecimento científico e alinhada à realidade social na qual está inserida.

Eventualmente, vários termos são usados para se referir à educação: são eles treinamento, instrução, ensino e educação. É importante o esclarecimento de cada um deles (MANNHEIM e STEWART, 1974). Treinamento refere-se ao exercício ou prática real realizada por uma pessoa. Melhora-se a habilidade, mas sem o uso da improvisação ou do julgamento. Para qualquer vocação, é necessário o treinamento. Instrução é a transmissão do conhecimento, o foco está no que está sendo comunicado e não em quem comunica ou quem recebe. O ensino pode ser confundido com a instrução, mas ensino pressupõe uma relação entre quem ensina e quem aprende. Além do processo de transmissão, o ensino pressupõe e está preocupado com a compreensão. A educação é um termo bastante mais abrangente que os anteriores. A educação modifica a natureza do aluno, isto é, através de transmissão de conhecimentos e valores contribui para a formação do caráter, da personalidade e modifica comportamentos.

Assim, no processo de educação, pode-se utilizar o treinamento, a instrução e o ensino. As mudanças que acontecem no indivíduo são de caráter duradouro. A escola é uma parte do processo de educação que começa quando um indivíduo nasce e o acompanha na vida toda.

2.1. A educação no Brasil Dado o caráter contínuo, político, econômico e social da educação, é fundamental

entender a evolução da educação no Brasil. Souza (2005) constata que Portugal, enquanto colonizador do Brasil prestou muito pouca atenção a temas como a educação e instrução pública. O mesmo não aconteceu em outras colônias das Américas: a Harvard College foi criada em 1636, 16 anos após a chegada dos colonizadores a Massachusetts e, a Universidad de San Marco foi criada em Lima, no Peru, pelos espanhóis, em 1551. Uma conseqüência desse processo, no Brasil, é que em 1995, 16% da sua população acima de 15 anos ainda era analfabeta.

Brandão (2003) reporta o que aconteceu com a o ensino superior ao longo da história do Brasil. O cunho filosófico e religioso que pautava a educação jesuítica somente foi modificado no século XIX, quando a corte portuguesa foi transferida para o Brasil. O foco da reforma foi formar burocratas, profissionais liberais e profissionais ligados à produção de bens, com forte influência francesa. A República velha viabilizou a expansão das entidades de ensino superior, mas foi a partir da Era Vargas que as grandes mudanças aconteceram culminando com o modelo atual: expansão das universidades públicas e privadas; novas leis de diretrizes da educação e criação do Ministério da Educação.

Em função dessa história, o tom político foi sempre muito forte. Se, de um lado, a grande

expansão do ensino se deu sob regimes autoritários, de outro, efetivamente ajudou o desenvolvimento econômico do país.

O tamanho e a diversidade do país, bem como a complexidade de gestão de um sistema de educação descentralizada trazem uma série de conseqüências em termos de qualidade e abrangência do ensino, preparo de docentes, pesquisa científica e o ensino continuado. Mas, e quanto ao alinhamento deste processo de ensino à modernidade?

Quando se fala de modernidade, se fala em racionalização e subjetivação (ÉBOLI, 1999), e não necessariamente o que vem depois da Idade Moderna. A modernidade está pautando o cenário macroeconômico atual com a globalização, a inovação, a competitividade e aumento exponencial do conhecimento. É um processo complexo e multidimensional. Na dimensão cultural compreende a ética, a valorização do ser humano e o espírito de liberdade. Na dimensão política é a afirmação da democracia e a preocupação com a cidadania. Na dimensão social entende o sujeito como parte do movimento social, em um ambiente de justiça. Na dimensão administrativa persegue uma preocupação com a eficácia por meio de projetos, a visão de futuro e a esperança. Na dimensão econômica, visa prosperidade e lucro, mas subordina os objetivos

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econômicos aos sociais. E, finalmente, na dimensão tecnológica, pressupõe inovação sempre, sem menosprezar a criatividade do ser humano.

Souza (2005) desenvolveu uma visão para a educação brasileira. Mesmo sem intencionalmente alinhar sua visão a esta visão de modernidade, ela o está. O sistema educacional brasileiro, segundo ele, deve levar em conta a sociedade do conhecimento em um mundo global, a cidadania e os valores éticos. Os dois principais focos de sua visão são: o desenvolvimento da capacidade de aprender e a criação de condições para a educação permanente. A escola deve ter em mente questões como a socialização, o uso do conhecimento acumulado, o desenvolvimento de habilidades de pensamento, a crítica e raciocínio e a formação do caráter. Além disso, um indivíduo deve alternar idas-e-vindas entre a academia e o mercado de trabalho, além de tirar proveito de recursos como a educação a distância e novas tecnologias aplicadas à educação. Enquanto esta visão não se consolida plenamente, a Universidade Corporativa tem muito a contribuir.

2.2. A Educação corporativa: seu papel na sociedade e no mercado de trabalho. A expansão da educação corporativa no Brasil veio responder a duas situações: o aumento

da competitividade global e a fragilidade e precariedade da educação tradicional. Com relação à questão da educação tradicional, o histórico exposto anteriormente exemplifica a problemática atual. Embora suportado por boa visão e com novas conquistas, o sistema educacional brasileiro, ainda está distante de ser um modelo educacional completo: com suporte à formação integral e educação continuada disponível e com qualidade.

Com relação ao ambiente competitivo atual, algumas forças sustentaram o aparecimento do fenômeno Universidade Corporativa (MEISTER (1999), ÉBOLI (2004)). A organização se tornou mais flexível, está mais enxuta para ter capacidade de responder mais rapidamente ao mercado, num ambiente empresarial turbulento. Com isso, das pessoas são demandados novos comportamentos. A economia do conhecimento vem requisitando maior conhecimento por parte dos trabalhadores e, o conteúdo intelectual dos cargos também aumentou. O conhecimento se torna obsoleto muito rapidamente, exigindo um aprendizado contínuo. A segurança vitalícia de emprego foi substituída por possibilidade de aprendizado oferecida pelos empregadores, garantindo assim, a não depreciação desses trabalhadores. È necessário preparar as pessoas para atuar no cenário global.

Allen (2002) consolidou uma definição para Universidade Corporativa: “uma entidade educacional que funciona como uma ferramenta estratégica desenhada para auxiliar uma organização na consecução de sua missão através da condução de atividades que cultivem o aprendizado, conhecimento e a sabedoria individual e organizacional” (tradução livre da autora). A Educação Corporativa difere dos tradicionais programas de treinamento corporativos

em vários aspectos. Primeiro, ela foca em desenvolver competências críticas do negócio, isto é, preocupa-se com competências que agregam valor a produtos e serviços e são difíceis de serem imitadas. As competências críticas são traduzidas em competências humanas, isto é, como as pessoas atuarão na consecução dessas competências críticas (FLEURY, 2002). Em segundo lugar, a EC se preocupa com o aprendizado coletivo e fortalecimento da cultura organizacional. Em terceiro, atua nas necessidades do negócio, e não nas necessidades individuais. E, em quarto, adota o conceito de educação inclusiva, seu foco de atuação segue sua cadeia de valor e, em alguns casos, atende a comunidade também.

Com esse enfoque, fica evidente que a Educação Corporativa não vem competir com a educação tradicional, e pode fazer uma boa parceira com esta no desenvolvimento do papel de educação do indivíduo.

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Um sistema de educação corporativa está pautado por uma série de princípios, isto é, bases filosóficas e fundamentos que norteiam seu desenvolvimento. Éboli (2004) consolidou sete (7) princípios conforme a figura 11.

Estes princípios, assim como a visão para a educação no Brasil desenvolvida por Souza (2005), sustentam a visão de modernidade e contribuem para a construção da organização moderna. 3 Didática: viabilizando o aprendizado. O termo didática vem do grego e significa a arte de ensinar (GIL, 2006). Ao longo dos anos, com a evolução da visão de educação, a didática passou a considerar o aluno como o sujeito da aprendizagem. Caberia ao professor, colocar o aluno em situações em que fosse mobilizada sua atividade global. O professor passa a ser quem mobiliza e viabiliza o processo de aprendizagem, e não sujeito do mesmo. Didática é um termo relacionado a vários outros: educador, aluno, aprendizado, planejamento, conteúdo, estratégias e técnicas de ensino, recursos, avaliação e ética. Discutir didática significa discutir todos estes termos abordando seus significados e correlações. Para este trabalho, é utilizada uma visão mais estratégica dos termos, com ênfase em importância e efetividade, sem a pretensão de abordar em detalhes questões como técnicas de ensino e o passo a passo dessas várias atividades e processos.

3.1. Professor ou educador? Vários autores discutem a questão semântica dos termos professor e educador, e há uma

grande diferença entre eles. O professor está muito preocupado em ensinar, é o centro do processo, com sua especialidade e conhecimento (GIL, 2006). O educador está preocupado em incentivar o aluno a expressar suas idéias, e a buscar formas de se desenvolver. Como dizem Werner e Bower (1984): “educar deixa de ser a arte de introduzir idéias na cabeça das pessoas, para fazer brotar essas idéias”. Esse “novo” educador deve desenvolver competências e habilidades para ser eficaz em seu trabalho.

Perrenoud (2000) desenvolveu dez (10) competências fundamentais para o educador, em ambiente acadêmico. Os focos destas competências estão na forma de relacionamento com os alunos, no envolvimento do educador com a entidade de ensino e com as famílias dos alunos e, a preocupação com seu autodesenvolvimento. Sobre relacionamento com os alunos, a ênfase é no significado da aprendizagem, na contínua análise de sua progressão e no entendimento e respeito do grupo aprendiz foco. O educador deve estar envolvido com a instituição, desenvolvendo trabalhos com outros docentes e participando de questões como análise de recursos e planejamento da instituição. Bastante ênfase é dada à questão de autodesenvolvimento. O educador deve estar aberto a novas tecnologias, buscar atualização constante e fazer um balanço contínuo de suas competências. Questões éticas, principalmente ligadas à responsabilidade, justiça e diversidade são focos contínuos de atenção. Sant´Anna (1979) propõe nove (9) habilidades técnicas para o ensino, com foco tático. As habilidades giram em torno do conteúdo, da forma de fazer perguntas, da criação do estímulo para o aprendizado, da conclusão de ciclos e processos, do uso de exemplos, do uso de realimentação e

1 Fonte: adaptada de Éboli: Educação corporativa no Brasil: mitos e verdades -2004 Figura 1: os setes princípios de sucesso da educação corporativaCompetitividadePerpetuidadeConectividadeDisponibilidadeCidadaniaParceriaSustentabilidadeSete princípios de sucesso da Educação CorporativaElevar o patamar de competitividade por meio da consolidação das competências críticas.Transmissão da herança cultural, perpetuando a existência da empresa.Comunicação e interação, relacionamento com públicos internos e externos.Atividades e recursos educacionais de fácil uso e acesso.Estimular o exercício da cidadania individual e corporativa.Estabelecimento de parcerias internas (gestores) e externas (instituições de ensino superior.Ser um centro gerador de resultados para a empresa.

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reforços, da preocupação com a integração entre os conteúdos e com a sua própria forma de comunicação.

Gil (2006) reporta um trabalho de Elaine McEwan que determina traços que definem um educador eficaz. Esses traços estão divididos em três (3) categorias: pessoais (paixão, visão realista e positiva e, liderança), ligados a resultado pretendido (atenção permanente, estilo, persuasão e eficácia instrucional) e ligados a sua vida intelectual (conhecimento teórico, sabedoria mundana e capacidade intelectual).

Pode-se perfeitamente integrar as competências, habilidades e traços de eficácia dos três autores para compor o que seria o educador ideal: comportamentos, recursos de trabalho e foco no resultado. Chama bastante a atenção no perfil desenvolvido, o foco na própria pessoa do educador. Mesmo sendo o conhecimento um aspecto importante do aprendizado, é a figura e a postura do educador que fazem a diferença no desenvolvimento de outra pessoa, especialmente quando se considera o aluno maduro.

3.2. Quem é o aluno adulto? Existem vários trabalhos de pesquisa que resultaram em classificações e tipificação dos

alunos universitários (do mundo acadêmico americano). Algumas delas levam mais em conta o ponto de vista emocional, outras o padrão de engajamento em atividades. Esses processos sempre criaram modelos com muitos tipos, quase sempre perto de dez (10), o que só reforça a diversidade em comportamento e atitude presente em um grupo de aprendizado. Se por um lado a diversidade enriquece, trazendo várias perspectivas distintas, por outro ela dá mais trabalho, já que vai exigir do educador preparo para lidar com diferenças de opinião, com várias experiências acumuladas e com expectativas de vida também distintas.

O aluno adulto precisa fazer correlações, perceber aplicabilidade do aprendizado, tem maior senso de urgência já que está entre o mundo acadêmico e o mundo profissional, é mais crítico. Este perfil complexo e diverso do aluno adulto propõe aos educadores um maior desafio no exercício de sua profissão.

3.3. Como acontece a aprendizagem? A aprendizagem acontece quando é verificada uma mudança de comportamento do

indivíduo. E, ela acontece durante toda a vida de uma pessoa. Gómez (2000) reporta dois tipos de teorias de aprendizagem: as associacionistas e as mediacionais.

Na categoria associacionista estão agrupadas todas as teorias que associam estímulos e respostas provocados e determinados somente por condições externas; é o processo de condicionamento. A categoria mediacional inclui todas as teorias que consideram processos internos do indivíduo associados aos processos externos. Nesta categoria estão Jean Piaget que considera a maturidade e o desenvolvimento cognitivo no processo de aprendizagem das crianças e David Ausubel com a aprendizagem significativa (vinculação substancial de novas idéias e conceitos com a bagagem cognitiva do indivíduo) focada no adulto. Os processos educacionais estão mais pautados nas teorias mediacionais, que incluem processos internos dos indivíduos. Porém, como cada indivíduo é diferente do outro, seu processo de aprendizagem também será único. Existem vários fatores que interferem no processo de aprendizagem. No campo cognitivo estão as competências intelectuais e a criatividade. Mas, além disso, motivação, idade, sexo, ambiente social, hábitos de estudo e memória podem interferir no processo de aprendizado, como reporta Gil (2006).

3.4. Planejamento e conteúdo: aspectos fundamentais para qualquer processo

educacional. Olhando a questão educação de forma bastante abrangente, e levando-se em conta a

modernidade, as questões de planejamento e conteúdo são muito relevantes. Zabala (2002) reforça a questão da modernidade quando questiona que modelo de cidadãos nós queremos desenvolver e as implicações em planejamento e definição do conteúdo educacional que vamos fazer.

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O planejamento ocorre em vários níveis: o planejamento educacional de uma nação, o planejamento institucional realizado por uma instituição de ensino, o planejamento curricular de cursos, o planejamento do ensino realizado para uma disciplina e um educador específico ou o plano de aula (GIL, 2006). Os níveis mais macro influenciam os níveis mais específicos. No caso de alunos adultos, é importante que eles entendam a cascata do processo de planejamento para compreender o propósito de uma disciplina dentro de um curso, módulo ou de um processo de aprendizagem. O que mais o impactará, no curto prazo, é o aspecto mais tático que se traduz em conteúdo, técnicas e recursos de aprendizagem. Com relação aos conteúdos em processos de aprendizagem é preciso atentar para alguns pontos. Primeiro é preciso definir conteúdo. O mundo acadêmico utiliza os termos: conceito, procedimento e atitude para se referir à palavra conteúdo. Esta visão está bastante próxima da visão de competência desenvolvida no mundo organizacional: conhecimento, habilidade e atitude. Concluí-se, portanto, que o mais importante não é a denominação, mas o significado. Nos dois modelos o que importa é: saber o quê, para saber fazer e saber ser. Deve-se ligar uma teoria ou conceito a uma ação e a uma necessidade interna do indivíduo, gerando motivação para o aprendizado, segundo o conceito de motivação de Archer (1997).

Também, é necessário atentar para o aluno. Um conteúdo precisa ter significância para o aluno, isto é, estar relacionado às suas experiências. Precisa também ser útil e aplicável. Em um ambiente de aprendizagem em grupo, pode-se ter que adaptar um conteúdo planejado em função de diversidade do grupo. Quem direciona a adequação ao tempo é o aluno, isto é, seu processo de aprendizagem. É importante o educador atentar para a relação: tempo, volume de conteúdo e eficácia do aprendizado. Moreira (2003) ainda reflete que conteúdos diferentes requerem capacidades diferentes do aluno e que o educador deve estar atento para não deixar haver a sobrecarga, isto é, não ir além das capacidades do aluno, inibindo o processo de aprendizagem.

3.5. Técnicas e recursos de ensino Existe um número muito grande técnicas e recursos disponíveis para o ensino. A

utilização de cada uma delas depende do que se espera do processo de aprendizagem, do estilo do educador e do conteúdo a ser abordado.

É importante o uso variado de técnicas quando se pensa em um aluno passando por um processo contínuo de aprendizado. Porém, é necessário entender o que cada uma dessas técnicas pode viabilizar, suas vantagens e desvantagens. Algumas valem ser abordadas, sem a pretensão de exaurir todo o arsenal de técnicas, para exemplificar a decisão de escolha pelas mesmas.

A aula expositiva é uma exposição contínua de um conferencista na qual o aluno pode ter a oportunidade de fazer perguntas, mas de forma geral escuta e toma notas. É um processo mais simples para um docente e interessante quando o aluno está tendo sua primeira experiência com aquele conteúdo. Contudo, não se levam em conta a diversidade da audiência e o desenvolvimento de habilidades intelectuais.

O ensino em pequenos grupos aparentemente deixa o aluno mais satisfeito além de viabilizar o uso maior de raciocínio. O aprendizado acontece no nível individual, viabilizado pelo processo cooperativo do grupo. O educador é um facilitador do processo de aprendizagem. É observada uma série de vantagens no processo do grupo: desenvolvimento de habilidades de comunicação (alunos e professores), desenvolvimento de competências intelectuais e sociais e crescimento pessoal dos atores. Em termos de modalidade existem os seminários (grupos de discussão), método do caso (situação para discussão que demanda solução de problemas), jogos de empresa (simulação longitudinal de uma empresa para tomada de decisão e aferição de resultados), entre outros. Nestes processos, é requerido um papel bastante abrangente do educador, demandando muitas das competências, habilidades e traços identificados anteriormente.

Conceituada no mundo organizacional, a técnica de aprendizagem em ação é realizada ao longo do exercício do trabalho (PINTO, 1994). O processo é de apresentação de um trabalho, seguido de execução monitorada do mesmo por parte do aprendiz e posterior avaliação. Uma vantagem é que a parte prática fica muito evidenciada, além de fortalecer o

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desenvolvimento de habilidades de comunicação e competências sociais. No ambiente acadêmico, esta técnica pode ser encontrada em laboratórios e oficinas. O uso da tecnologia não vai substituir o professor, mas vai requerer deste um preparo diferenciado e atualização (ÉBOLI, 2004). Mesmo com a tecnologia viabilizando a educação fora da sala de aula (MEISTER, 1999), o tutor, professor ou educador é fundamental para preparar o material neste novo formato, suportar e auxiliar o processo de aprendizagem do aluno e realizar o processo de avaliação do aprendizado. Para o preparo do material, Gil (2006) reforça que são necessárias novas competências tecnológicas por parte do professor. Além disso, o tempo dedicado ao preparo desses materiais pode ser maior, já que além de tirar proveito dos recursos tecnológicos, o material deve ser renovado com maior freqüência. A tecnologia favorece a aprendizagem individualizada diz Godoy (2003). Porém, ela pode ser utilizada para suportar o aprendizado de grupos, moderando a interação e o processo de trabalho do mesmo. Por parte do aprendiz, acesso à tecnologia e familiaridade com a mesma são fundamentais.

3.6. Avaliação do aprendizado.

A avaliação do aprendizado é um processo crítico, pois demanda tempo, foco e critérios por parte do educador e é fonte de ansiedade por parte dos alunos. A avaliação deve ser entendida como parte integrante do processo de aprendizagem (GIL, 2006). Donald Kirkpatrick desenvolveu em 1952 sua dissertação sobre avaliação de um treinamento de supervisores. Mesmo centrado no mundo organizacional, seu modelo é interessante e pode ser transportado para o mundo acadêmico. Ele define um processo de avaliação em quatro (4) níveis: reação, aprendizado, comportamento e resultado (KIRKPATRICK, 1998).

A avaliação de reação é realizada pelos alunos sobre o curso ou processo de aprendizagem. Segundo o autor, as pessoas devem gostar de um processo de aprendizagem para depois tirar algum proveito dele. A avaliação de aprendizado deve ser realizada de forma muito objetiva, através de uma prova, por exemplo. Pode ser interessante realizar este tipo de avaliação antes e depois da exposição do aluno ao processo de aprendizagem, para medir sua evolução. O terceiro nível proposto por seu processo de avaliação é o comportamento. Deve ser realizado algum tempo depois do processo de aprendizagem acontecer para verificar se efetivamente houve a mudança de comportamento por parte do aprendiz. O quarto nível é bastante difícil de ser realizado e tem por objetivo verificar o resultado efetivo daquele processo de aprendizagem, preferencialmente, com indicadores qualitativos ou quantitativos claramente definidos.

Aplicar este modelo no mundo acadêmico pode ser interessante, e é exeqüível. Não se deve, contudo, esquecer da realimentação contínua durante o processo de aprendizagem, entre alunos e, entre professor e aluno. As avaliações pontuais não podem substituir a interação contínua que gera possibilidades de mudanças de comportamento efetivas e no momento correto.

4 Um caso prático: como estão as práticas didáticas na Educação Corporativa? O objetivo de utilizar um caso prático foi o de iniciar o processo de reflexão a partir de uma situação real. 4.1 Metodologia de trabalho.

A decisão foi de trabalhar com um caso único, de forma intrínseca. Não por se tratar este caso de um exemplo revelador e definido, mas por ele contribuir com informações para o processo de reflexão (YIN, 1981). Com isso, as reflexões são de caráter exploratório, não conclusivo (COOPER, 2003). O caso é a experiência vivida pela autora nos anos de 2001 a 2004 enquanto atuou como executiva de Recursos Humanos com a responsabilidade de introduzir e gerir a

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Universidade Corporativa de uma empresa canadense, atuante na área de comunicação, que iniciou suas operações na região em 2000. Foram utilizados documentos de trabalho discutidos, utilizados e apresentados no Brasil, Argentina e Estados Unidos da América, bem como a memória da autora. Para elaboração do relato, o foco é o Brasil, que representa a melhor contextualização para as reflexões propostas.

4.2. A Empresa. A empresa atua na área de comunicação, mais especificamente soluções integradas de

informação. Atua globalmente em vários ramos de informação: educação, saúde, ciência, financeira, jurídica, impostos, informações regulamentais, entre outros.

A partir de 2000, estabeleceu suas operações na América Latina quando foram adquiridas empresas no Brasil e em outros países dessa região.

Por característica do próprio negócio, o processo de expansão se dava por aquisição de empresas familiares locais. Os desafios eram o de caracterizar a qualidade de produtos de forma global e migrar seus produtos para soluções eletrônicas. Isto seria realizado através de uma complexa mudança cultural centrada na busca pelo resultado e no valor do capital humano.

A primeira empresa adquirida no Brasil representava a plataforma para o crescimento no mercado latino americano. Em 2000, essa empresa contava com mais de 1.000 funcionários e vinha de uma gestão centralizada em seus ex-donos. A estrutura em silos, não viabilizava a troca de informações. Pouco esforço no treinamento e desenvolvimento das pessoas havia sido realizado antes do processo de compra. Os produtos periódicos deveriam ser transformados em soluções integradas de informação. Assim, a implantação da Universidade Corporativa na região vinha responder a uma série de demandas incluindo, principalmente, a transformação cultural para viabilizar as mudanças.

4.3. A implantação da Universidade Corporativa no Brasil. A UC (Universidade Corporativa) foi estruturada buscando desenvolver as demandas do

negócio e tendo como pano de fundo o momento cultural da empresa no Brasil. O modelo americano de cursos oferecidos sob demanda foi substituído por um modelo de cursos específicos e obrigatórios. O planejamento das atividades era feito anualmente em função das demandas do negócio, do resultado dos processos de avaliação individual e das pesquisas de clima. Iniciado pela área de recursos humanos, as propostas eram validadas pelos gestores locais e negociadas com a matriz da empresa nos EUA. O objetivo era garantir aderência ao negócio e sintonia com a filosofia da UC no mundo. O processo de planejamento sugeriu os focos apresentados na figura 22, para os anos de 2001 a 2004. Devido a grandes demandas de desenvolvimento, o planejamento sustentava a estratégia do negócio em processo de cascata, iniciando pelo preparo da liderança com posterior envolvimento todas as pessoas e desenvolvimento dos conhecimentos e competências funcionais específicas. Em 2004, o modelo de funcionamento da UC no Brasil estava consolidado e em funcionamento.

4.4. O modelo da Universidade Corporativa: UC no Brasil. O modelo de atuação da UC não foi definido prioritariamente, surgiu ao longo dos quatro

(4) primeiros anos de atuação. O modelo final acabou sendo o de pilares, isto é, focos específicos de desenvolvimento e bases comuns de suporte aos funcionários.

2 Figura 2: focos da Universidade Corporativa, desenvolvimento gerencial institucional, equipes de venda, integração dos funcionários.desenvolvimento gerencial institucional e individual, políticas corporativas de T&D, conhecimentos específicos, conhecimento de produtos.desenvolvimento gerencial institucional e individual, gestão do conhecimento, essência da empresa, competências, pilar de consultoria e universidade de vendas.desenvolvimento gerencial, pilares funcionais, gestão do conhecimento, essência da empresa, responsabilidade social.2001200220032004. Fonte: desenvolvido pela autora para conferência de RH da organização em 2003.

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A gestão da UC era realizada pelos profissionais de recursos humanos direcionados para a área de desenvolvimento. Existia a parceria com instituições externas (acadêmicas ou consultorias) para o desenvolvimento dos programas específicos e parceria com a área de tecnologia para o suporte ao ambiente de gestão do conhecimento e de cursos mediados por tecnologia. A estrutura consolidada de funcionamento da UC ficou como apresentada na figura 33.

O pilar liderança de negócios e de pessoas era direcionado ao grupo executivo (gerentes e diretores) e a supervisão. Para o grupo executivo eram realizados encontros semestrais de trabalho sobre planos de negócio (preparação e revisão). Esses planos se transformavam em planos específicos que cada gestor conduzia com sua equipe e reportava em reuniões semanais de acompanhamento. O grupo da liderança devia se envolver com as decisões de negócio e envolver sua equipe nas execuções.

O modelo de competências era a base para os trabalhos formais de desenvolvimento deste grupo de profissionais. Seminários específicos eram ministrados para essa população pela FGV (Fundação Getúlio Vargas), cursos de extensão ou mestrado fornecidos sob demanda e, alguns executivos participavam do programa de desenvolvimento corporativo nos EUA com parceria da Wharton School of University of Pensilvânia. Liderança de pessoas era uma competência priorizada em função da evolução cultural da organização. Além de um processo corporativo com o conceito de Motivação e Liderança Eficaz desenvolvido com consultoria parceira, processos de coaching eram fornecidos a pessoas que sentissem necessidade e vissem a utilidade desta ferramenta. Partia-se, também, do pressuposto que boa liderança de pessoas é realizada a partir de um preparo individual. O programa Os sete hábitos das pessoas eficazes do Covey Institute foi o suporte ao preparo individual adotado.

A universidade de vendas foi estruturada em função de demandas críticas do negócio: a área de vendas estava dispersa por todo o país, atuando na venda direta; os produtos tinham atualização freqüente e, novos produtos (em diferentes formatos) eram lançados como estratégia de consolidação da empresa no mercado. A solução encontrada foi à aprendizagem mediada por tecnologia. Cursos em formato eletrônico deveriam ser realizados pelos vendedores e, em reuniões semanais, os supervisores de vendas faziam o acompanhamento do processo de aprendizagem e amarravam os conteúdos a metas e processos de trabalho. Além disso, convenções anuais de vendas ajudavam a manter o comprometimento dos profissionais além de possibilitar uma comunicação única, fundamental em grandes equipes. Para a supervisão de vendas, workshops trimestrais ajudavam na sua formação de agente de negócio e gestor de pessoas.

O currículo da área de atendimento especializado foi desenvolvido para auxiliar o desenvolvimento dos profissionais que prestavam assessoria a clientes, um dos negócios da empresa. Advogados, contadores, muitos com títulos de mestres e doutores, realizavam assessoria legal e tributária via telefone ou em reunião de trabalho. Não só era preciso conhecimento profundo dos assuntos, mas também empatia, capacidade de análise de problemas e habilidades de comunicação. Em função do alto grau de preparo destes profissionais, foi elaborado um modelo centrado neles próprios: eram os consultores-tutores.

Um novo consultor recebia uma integração de três meses para iniciar os trabalhos. A partir daí, um processo de aprendizagem diário era estabelecido. Ciclos de leitura, palestras e discussão dos conteúdos eram coordenados pelos consultores mais experientes. Temas comportamentais eram facilitados por entidades externas. O espaço de aprendizagem também era ocupado com projetos desenvolvidos pelos próprios profissionais da área para solução de questões críticas identificadas. A grade mensal de aprendizagem era discutida entre a UC e a área de consultoria.

O pilar de competências funcionais abordava todos os profissionais não atendidos pelos pilares anteriores. Os profissionais realizavam atividades para autodesenvolvimento. Estas atividades podiam ser: cursos e-learning disponibilizados pela empresa; seminários de gestão de

3 Figura 3: modelo de funcionamento da Universidade Corporativa.

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projetos ou sobre o processo produtivo ou cursos específicos em entidades credenciadas. Para participar desses cursos específicos, os funcionários negociavam com seu gerente e com a UC. Um aspecto inovador era que, a empresa era parceira no investimento em 50%, mas atuava com parceria decrescente, isto é, no início do curso pagava 25% e, de forma crescente, realizava sua parceria de 50%. Com isso, entendia-se a real disposição ao aprendizado por parte do funcionário.

Também fazia parte do processo de desenvolvimento individual o Learning Center, um espaço físico com vários recursos: livros de gestão ou ficção, DVDs, produtos próprios e de concorrentes, acesso a computadores e mesas de estudo ou trabalho. A proposta era sinalizar ao funcionário a valorização da busca pelo aprendizado e do desenvolvimento. A gestão do conhecimento era realizada de forma aplicada. Uma plataforma global para depósito e busca de conhecimento era utilizada, mas para facilitar a adaptação das pessoas a esta nova filosofia, utilizava-se a plataforma como suporte a projetos. Alguns projetos multifuncionais foram realizados com a parceria de equipes em outras localidades do mundo. A plataforma de gestão do conhecimento bem como o recurso de teleconferência servia para criar grupos virtuais de trabalho. A gestão do conhecimento era uma filosofia tratada além do suporte tecnológico. Reuniões e fóruns de discussão eram propostos para debater temas ou projetos em andamento como forma de aumentar as possibilidades de aprendizagem e desenvolver competências individuais. A essência empresarial funcionava como base para o comprometimento dos funcionários. Além do processo de integração do novo funcionário várias outras iniciativas eram realizadas para discutir e consolidar valores e celebrar as conquistas. Duas atividades merecem destaque: a gincana da solidariedade que desenvolvia equipes de trabalho através da arrecadação de itens para entidades carentes e a celebração de valores – reconhecimento trimestral de processos ou projetos em grupo que reforçasse um valor empresarial elegido pela UC.

4.5. As práticas didáticas utilizadas na gestão da UC traziam o resultado esperado? Em termos de planejamento e definição de conteúdo, pode-se dizer que o processo tinha

consistência e aderência a estratégia do negócio. A comunicação deste processo também era realizada extensivamente. Porém, nem sempre, os profissionais compreendiam, uma vez que ainda tinham em mente um modelo de treinamento focado nas necessidades individuais de cada um.

Com relação a técnicas e recursos de ensino, o modelo da UC era bastante completo, valorizando as mais variadas técnicas. Percebia-se que, quanto mais baseado no autodesenvolvimento, menos eficaz era o processo de aprendizagem. A cultura da empresa ainda não estava consolidada favorecendo o processo de autocontrole. Na área de vendas, embora o modelo de negócio seguisse para produtos on-line, a pré-disposição dos profissionais para se engajarem nos cursos mediados por tecnologia, muitas vezes era pequena, prejudicando inclusive resultados empresariais.

Favorecia-se a aplicabilidade do aprendizado e as correlações entre aprendizado e uso na prática. O aluno, muitas vezes, não valorizava a oportunidade de aprendizagem e não entendia que sua sobrevivência no mundo corporativo dependia de sua disponibilidade para novas experiências e da atualização ou desenvolvimento de novas competências.

Um grande desafio da UC era a sensibilização dos gestores para seu papel de educador. Poucas vezes eles valorizavam o papel de líder de projeto, tutor ou palestrante. O gestor educador era um papel que poucos desenvolviam, dependendo de seu estilo pessoal. A falta de cobrança formal em avaliações de desempenho talvez dificultasse a apropriação deste novo papel por parte destes líderes.

Em termos de avaliação, sempre se tinha a avaliação de reação dos programas e no caso da consultoria fazia-se a avaliação de aprendizagem. Com relação ao comportamento, as avaliações individuais de desempenho tentavam cumprir este papel. Quanto ao resultado, para questões mais operacionais como atendimento ao cliente na consultoria ou efetividade de conversão de vendas, o processo de avaliação era realizado e apontava para resultados positivos. Quando se tratava de

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liderança ou questões mais ligadas a mudanças de comportamento, o processo não era formalmente medido e talvez, pouco valorizado. Ainda havia muito por fazer em termos de avaliação.

Em termos gerais, conclui-se que a UC estava alinhada aos sete princípios de sucesso da educação corporativa, mais desenvolvida em alguns (competitividade, perpetuidade, disponibilidade, cidadania e parceria) e ainda caminhando de forma embrionária nos outros (sustentabilidade e conectividade). No que se refere às questões táticas de técnicas e recursos, ou mesmo de planejamento e atenção ao conteúdo, a UC apresenta boas práticas didáticas. Questões críticas e estratégicas como o papel dos gestores e alunos, fundamentais para o sucesso do modelo ainda deixavam a desejar. Muito se tinha a percorrer na sensibilização do aluno (fruto do processo de mudança cultural) e no desenvolvimento do gestor educador. 5. Reflexões sobre práticas didáticas na Educação Corporativa

A UC é somente um exemplo do que acontece nas Universidades Corporativas. Em seu livro Educação Corporativa no Brasil: mitos e verdades, Éboli (2004) reporta mais 21 casos de universidades corporativas com alguns de seus programas e recursos. Pode-se inferir novamente que questões táticas podem estar bem equacionadas. Nestes relatos, a questão dos papéis de líderes e aprendizes não é abordada. Assim, como na academia, parece crítica o desenvolvimento dos novos papéis no processo de educação, tanto o de educador e educando, quanto o de gestor e funcionário, requeridos pela modernidade.

No caso da corporação, delegar a função de educador para um instrutor ou professor contratado minimiza os ganhos de mudança sustentada de comportamento. O profissional também precisa entender que a educação é um processo contínuo, demandante e que ele é o ator principal deste processo. Por melhor equacionadas que estejam às questões táticas nas práticas didáticas corporativas, elas não conseguem sozinhas, sustentar um bom modelo educacional. Éboli (2005) reforça vários papéis que o líder na corporação deve ter com relação à educação corporativa. Além de visionário, patrocinador e controlador do processo, ele deve atuar como especialista desenvolvendo novos programas com seu conhecimento específico. Também deve atuar como professor nos programas educacionais e ser um eterno aprendiz demonstrando vontade de aprender, sensibilizando os demais. O papel de comunicador constante das vantagens do processo de aprendizagem contínua reforça os anteriores.

Não adianta a boa técnica se os atores principais não estiverem alinhados e focados na aprendizagem contínua. 6. Considerações Finais

A educação corporativa veio para ficar e estabelecer parceria com a academia no processo de educação continuada. Pode ser que práticas didáticas no nível tático estejam sendo bem utilizadas contribuindo para a melhoria do processo de aprendizado. No caso destas práticas, pode até ser que a universidade corporativa seja mais rica do que a academia, em função da possibilidade de aplicação imediata do aprendizado.

Porém, muito pouco se investiga sobre o desempenho dos principais atores: o gestor e os funcionários. Sem a devida sensibilização e valorização dos papéis, em especial o do gestor, os benefícios deste processo de educação não serão maximizados.

Novas pesquisas devem ser realizadas focalizando as práticas didáticas e, em especial, analisando o desempenho dos gestores em seus vários papéis para se chegar a uma visão mais conclusiva sobre o bom desempenho didático da universidade corporativa.

Se a educação é a base do desenvolvimento e ela serve para mobilizar as pessoas em busca do desenvolvimento, não adiantam só os recursos. È fundamental a sensibilização, engajamento e comprometimento dos atores para o desenvolvimento sustentado das nações. Referências Bibliográficas

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DORMI ALUNO (A)... ACORDEI PROFESSOR (A): INTERFACES DA FORMAÇÃO PARA O EXERCÍCIO DO ENSINO SUPERIOR

CUNHA, Ana Maria de Oliveira – [email protected] BRITO, Taita Talamira Rodrigues – [email protected] CICILLINI, Graça Aparecida – [email protected] GT: Políticas de Educação Superior / n. 11 Agência Financiadora: CNPQ DORMI ALUNO (A): DIALOGANDO COM AS BASES DA PESQUISA O ensino superior no Brasil pode ser considerado como algo recente se comparado a história da universidade no mundo, principalmente nos países da Europa que já vivenciaram essa realidade desde o final do século XII. Mas, ao mesmo tempo em que este ensino é recente, ele tangencia crises que são características da realidade do ensino superior de uma maneira geral, inclusive para aqueles países onde a tradição desse nível de ensino é uma característica marcante, como é o caso da Espanha, França, Inglaterra e Alemanha. O questionamento sobre a finalidade da universidade – sua crise de identidade, a dicotomia entre sua função de profissionalizar e produzir conhecimento, a crise de autonomia perante o estado, a sua organização interna perante às demandas externas são alguns dos elementos que independente do tempo de vida das instituições se fazem presentes no cotidiano de cada uma delas. O sistema de formação superior público brasileiro, desde seus primeiros passos, inaugurou uma série de desafios para se legitimar perante a sociedade. Nascido de iniciativas privadas e isoladas, ele passa a fazer parte do cenário público num período de uma era populista e de lá para cá vem enfrentando vários desafios para se manter como um bem público e a serviço da Ciência e do Desenvolvimento Social. Para Chamilian, em estudo apresentado em 2003, o ensino superior no Brasil apresenta-se hoje com uma estrutura de proporções consideráveis, se formos comparar à sua realidade de 40 anos atrás. Esse aumento de oferta ocorreu especialmente pela atuação majoritária da iniciativa privada, que viu no ensino superior um mercado lucrativo a ser explorado. O poder público, por sua vez, tendo alcançado o momento forte de expansão na década de 60 e na primeira metade dos anos 70, retraiu os investimentos para a oferta de vagas e cursos de graduação e concentrou sua ação no investimento à pesquisa, favorecendo a implementação de cursos de pós-graduação. Essa falta de incentivo à graduação, se deu pelo desinteresse do governo militar pela formação profissionalizante do ensino superior devido ao seu interesse na ampliação da formação técnica secundária – mais popular e com retorno financeiro mais rápido para a nação. O investimento do setor privado no ensino superior trouxe, segundo Pimenta e Anastasiou (2002), um aumento do número de docentes, que no período de 1950 a 1992, passou de 25 mil para um milhão, numa ordem de 40 vezes mais o número de docentes que ora existiam. Essa explosão de professores acarreta, dentre outras coisas, a ausência de uma compreensão mais complexa sobre as origens desse professor universitário, o que pensa, como interage no seu espaço profissional consigo e com os seus pares. Isso porque, os professores em sua maioria são oriundos dos mais variados cursos, distantes, diga-se de passagem, de uma preparação para a vida acadêmica que a universidade exige. O convívio com essa realidade tem suscitado vários debates e trabalhos de pesquisa sobre esse personagem que atua na formação superior em nosso país. Entre os anos de 2003 a 2005 através de financiamento do CNPq, um projeto de pesquisa intitulado “Desenvolvimento profissional e docência universitária: entre saberes e práticas” foi desenvolvido por um grupo de pesquisadoras do Núcleo de Saberes e Práticas Educativas – NUPESPE, tendo como objetivo investigar como o docente universitário desenvolve-se profissionalmente, que

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saberes e práticas envolvem sua atuação, ou seja, quem são, o que pensam e o que sabem fazer os profissionais que atuam no contexto da Universidade Federal de Uberlândia. Para tanto, o olhar dos investigadores pautou-se na figura e fala desses profissionais para, inicialmente, desvelar pontos relacionados à sua visão de competência profissional frente às limitações e às condições de trabalho e, a seguir, focalizar seus fazeres educativos. O trabalho foi realizado com docentes universitários em efetivo exercício e integrantes da carreira do magistério superior, que passaram a configurar o universo de sujeitos desta investigação. Os colaboradores, que atuam em 33 cursos de graduação oferecidos pela UFU (bacharelados e licenciaturas), foram reunidos por área do conhecimento, conforme classificação do CNPq. Para a obtenção dos dados, foram utilizadas fontes primárias da UFU; questionários visando à coleta de informações sobre identificação, formação acadêmica, atividades profissionais e culturais dos docentes; entrevistas semi-estruturadas. Para um total de professores de 889 efetivos, foram distribuídos 869 questionários, tendo sido recolhidos 368. As informações obtidas por meio dos questionários foram tabuladas e submetidas a tratamento estatístico. As entrevistas, realizadas por amostragem num total de 37, foram transcritas e categorizadas em dois grandes blocos: a formação e a prática docente. Para a análise, os grupos que constituem as oito áreas do conhecimento foram reorganizados em três grandes áreas. O primeiro grupo reuniu as Áreas de Ciências Exatas e da Terra e das Engenharias; o segundo grupo reuniu as Áreas de Ciências Biológicas, da Saúde e Agrárias; e o terceiro agrupou as Áreas de Ciências Sociais Aplicadas, Humanas e a Área de Lingüística e Artes. Este artigo tem como propósito apresentar dados referentes as áreas de Ciências Biológicas, da Saúde e Agrárias enfocando questões relacionadas à formação inicial e continuada de seus professores com a finalidade de discutir as nuanças dessa formação anunciada em seus depoimentos. Nesse grupo, foram distribuídos 328 questionários, tendo sido recolhidos 140 respondidos. Para as entrevistas selecionou-se 16 docentes que se encontravam em diferentes níveis da carreira universitária (auxiliar de ensino, assistente, adjunto e titular), do sexo feminino e masculino, e que possuíam formação inicial diferenciada. Através de entrevistas orais temáticas semidiretivas, foram registrados os depoimentos dos professores. As fontes orais representam uma possibilidade real de troca de experiências, de diálogo, de registro, preservação e crítica da prática docente. Esperamos que reflexões advindas da análise desses dados possam contribuir para a definição de políticas institucionais voltadas para a formação do professor universitário, mediante apresentação de propostas que de fato respeitem as peculiaridades e singularidades da formação para o ensino superior. A formação do professor universitário tem possibilitado vários debates sobre as condições pelas quais esses atores ingressam na carreira acadêmica. Dos aspectos que vem sendo apontados nos trabalhos em torno da temática, como a formação desse profissional, a prática docente, a carreira, a história de vida profissional e as políticas públicas sobre tal profissão, a formação é o aspecto que, nesse momento para nós, tem suscitado maiores reflexões. Isso devido ao contexto no qual os professores universitários são/não são preparados para o exercício de sua profissão. A carreira docente instituída na academia brasileira, supõe quatro níveis iniciais de formação para o ingresso e progressão na vida acadêmica: o professor Auxiliar, o Assistente, o Adjunto e o Titular. O primeiro na condição de possuir apenas a graduação (em alguns casos uma especialização); o segundo, o título de mestre e o terceiro o título de doutor, e o último além do doutorado, necessita ter uma vasta produção para sua titularidade. Nessa organização, percebemos que a primeira condição para o ingresso no magistério superior é a formação inicial numa área específica do conhecimento. Isso implica afirmar que a universidade propõe para além da formação para a profissão liberal ou a licenciatura para a Educação Básica, a formação para o engajamento na carreira acadêmica – o que nos remete a

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uma outra questão: os cursos formam, ou tem tido a pretensão de formar professor para o retorno desses formandos docentes? Aparentemente não. E as causas podem repousar em diversas variáveis. Segundo Nogueira (1989) uma das causas dessa realidade pode estar associada à reforma universitária de 1968 que estabeleceu como princípio norteador, para o desenvolvimento da Universidade brasileira, a indissociabilidade entre ensino e pesquisa. Este princípio, formal e obrigatório, acabou por transformar todos os professores universitários em professores pesquisadores. Com a implementação dos cursos de pós-graduação, procura- se oferecer uma das vias pelas quais esse tipo de professor pesquisador poderia ser formado. Argumenta-se, então, que tais cursos teriam como objetivo a formação do professorado competente para atender à expansão do ensino superior, assegurando, ao mesmo tempo, a elevação dos níveis de qualidade. De fato, no que diz respeito às Universidades, e também a muitas instituições isoladas de ensino superior, os cursos de pós-graduação tornaram-se, de lá para cá, a principal fonte de formação do professorado do ensino superior. É com esse caráter que se recomenda, por exemplo, a criação da disciplina Metodologia do Ensino Superior como uma disciplina pedagógica na pós-graduação. Mas, paralelamente, estes cursos têm também como objetivo o estímulo ao desenvolvimento da pesquisa científica, por meio da preparação adequada de pesquisadores (CHAMLIAN, 2003), objetivo esse que acaba sendo a principal meta da pós-graduação. Mais recentemente, no início de 1999, visando a formação de professores para o ensino superior, uma medida adotada pela Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior (CAPES), tornou obrigatório o estágio supervisionado na docência como parte das atividades dos bolsistas de mestrado e de doutorado sob sua tutela, apontando para a necessidade de alguma formação de caráter pedagógico para aqueles que, realizando cursos de pós-graduação, tem na atividade docente em nível superior um campo de trabalho possível. A quase ausência da formação pedagógica para o professor do ensino superior vem delegar um peso muito grande ao papel da experiência na constituição da prática docente do profissional que atua nesse nível de ensino. Pimenta e Anastasiou (2002) participam da opinião de que os professores, quando chegam à docência na Universidade, trazem consigo inúmeras e variadas experiências do que é ser professor. Experiências que lhes possibilitam dizer quais eram bons professores. Espelham-se nos professores que foram significativos em suas vidas, isto é, que contribuíram para a sua formação pessoal e profissional. Na maioria das vezes não se identificam como professores, uma vez que olham o ser professor e a Universidade do ponto de vista do ser aluno. O desafio, então, que se impõe é o de colaborar no processo de passagem de professores que se percebem como ex-alunos da Universidade para ver-se como professor nessa instituição. Isto é, o desafio de construir a sua identidade de professor universitário, para o qual os saberes da experiência não bastam. Sobre o rito de passagem de aluno a professor da Universidade, Tardif, Lessard e Lahye (1991) consideram que no exercício cotidiano de sua função, o professor defronta-se com vários limites concretos que não são previsíveis e passíveis de uma definição acabada. O docente desenvolve então, habilidades pessoais, tais como capacidade de improvisação, macetes, gestos, atitudes e estilos que possibilitam vencer as barreiras e construir uma maneira própria de ensinar. Para Tardif, (2002), os saberes do profissional docente que servem de base para o ensino provêm de diferentes fontes, tais como: a formação inicial e continuada de professores, do currículo e do espaço do conhecimento das disciplinas a serem ensinadas, da experiência na profissão, da cultura pessoal profissional, da aprendizagem com os pares, entre outras. No processo de ensinar e de aprender, considera que cabe ao professor o papel central, visto que mobiliza e produz saberes durante o exercício de sua profissão. Para isso, deve ter a capacidade de saber adequar-se metodologicamente, vendo o ensino não de forma meramente técnica, mas como um conhecimento em processo de construção. Como cada professor possui uma bagagem de conhecimentos advindos de um

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processo individual de construção, de formação e de desenvolvimento profissional, esta influencia o seu fazer pedagógico e manifesta-se em significados distintos no ato de educar. Sobre o saber da experiência Candau (1997) afirma que o professor dialoga com as disciplinas e realiza sua prática. Dessa forma os saberes da experiência fundam-se no trabalho cotidiano e no conhecimento de seu meio. São saberes que brotam da experiência e são por ela validados. Incorporam-se à vivência individual e coletiva sob a forma de habitus e de habilidades, de saber fazer e de saber ser. Se antes a profissão de professor calcava-se no conhecimento objetivo, no conhecimento das disciplinas, em muito semelhantes às outras profissões, hoje, apenas dominar esse saber é insuficiente, uma vez que o contexto das aprendizagens não é mais o mesmo. Imbernóm (2001) afirma que hoje a atividade de ensinar requer uma nova formação inicial e permanente, pelo fato de o educador dever exercer outras funções, tais como a motivação, a luta contra a exclusão social, participação, animação de grupo, relações com estruturas sociais e com a comunidade. Frente a esta nova imposição, pensar a formação do professor enquanto apropriação profissional supõe a combinação de diferentes estratégias de formação e uma nova concepção do papel do professor, o que não pode ser feito sem o envolvimento concreto dos docentes. A produção e a apropriação profissional do professor supõem mais do que um curso preparatório, visto que os conhecimentos adquiridos em um curso de formação inicial são insuficientes para que ele desempenhe satisfatoriamente suas tarefas no âmbito escolar. Conforme Pimenta; Anastasiou (2002), nos processos de formação de professores, é preciso considerar a importância dos saberes das áreas de conhecimento (ninguém ensina o que não sabe), dos saberes pedagógicos (pois o ensinar é uma prática educativa que tem diferentes e diversas direções de sentido na formação do humano), dos saberes didáticos (que tratam da articulação da teoria da Educação e da teoria de ensino para ensinar nas situações contextualizadas), dos saberes da experiência do sujeito professor (que dizem do modo como nos apropriamos do ser professor em nossa vida). Esses saberes se dirigem àssituações de ensinar e com elas dialogam, revendo-se, redirecionando-se, ampliando-se e criando. No entendimento das autoras acima citadas, a construção da identidade com base numa profissão inicia-se no processo de efetivar a formação na área. Assim, os anos passados na Universidade já funcionam como preparação e iniciação ao processo identitário e de profissionalização dos profissionais das diferentes áreas. Quando passam a atuar como professores no ensino superior, no entanto, fazem-no sem qualquer processo formativo e mesmo sem que tenham escolhido ser professor. Se for oriundo da área da Educação ou Licenciatura, teve oportunidade de discutir elementos teóricos e práticos relativos à questão do ensino e da aprendizagem, ainda que direcionado a outra faixa etária de alunos, com objetivos de formação, diferenciados da formação profissional universitária. Todavia, como ocorre na maioria dos casos, sendo de outro quadro profissional, trará consigo um desempenho desarticulado das funções e objetivos da Educação Superior. Sobre essa questão, Fernandes (1998) discute que é interessante registrar que para trabalhar na escola básica e no ensino médio, exige-se a formação pedagógica, mas o professor que atua no ensino superior não precisa desse saber, que por sua vez, é legitimado pela Universidade na existência dos cursos de Licenciatura, uma contradição que se gesta na própria concepção de conhecimento e Ciência que funda seu projeto sóciopolítico-cultural. A ausência de conhecimentos na chamada área das Ciências humanas e sociais que auxiliariam o professor a compreender e interpretar suas práticas empobrece o projeto sócio político cultural vigente na Universidade. Essa carência que poderia ser resolvida na pós-graduação, não o é, pois nesse espaço, prioriza-se a formação do pesquisador. Dessa forma, a formação do professor de ensino superior está assentada na pesquisa, conforme os padrões de qualidades determinados pela pós-graduação stricto sensu. Os programas de doutorado e mestrado são configurados numa forma que privilegia a especialização, numa ênfase ao conhecimento e

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numa preparação para a pesquisa. Fernandes (1998) analisa que não se trata de negar a importância da pesquisa para o aprofundamento de seu campo científico, mas sim de situá-la em sintonia e interpenetração com outras dimensões, tão necessárias e complexas para construção da identidade do ser professor. Ainda são poucos os estudos que têm sido feitos sobre a formação pedagógica e a prática cotidiana do professor universitário. Esse fato, de certa forma, revela o pouco valor dado à formação pedagógica desse professor. Nessa lógica, o professor vem fazendo sua formação de pós-graduação, construindo uma competência técnico-científica, reconhecida e legitimada pelos seus pares e alunos. No âmbito institucional, acredita-se estar contemplada a formação pedagógica pelo fato de, no curso de Pós-graduação, haver uma disciplina da área pedagógica. ACORDEI PROFESSOR (A): DANDO VOZES AOS SUJEITOS Nas entrevistas os professores abordaram sobre sua formação enfocando: a opção pela docência, as influências sofridas, sua trajetória profissional, sua formação inicial que suscitou questões como a carência da formação pedagógica e ainda a formação para a docência na pós-graduação. Alguns entrevistados mencionaram a aprendizagem advinda da experiência. Abordaram ainda sobre o que é ser professor, e apontaram os conhecimentos necessários para exercer a docência, onde enfatizaram a necessidade de atualização que traz para a discussão a formação continuada. Esses diversos aspectos serão ilustrados pelos depoimentos dos professores e discutidos com base nas leituras realizadas. Embora tenhamos recolhido um rico e representativo material empírico, em função do espaço disponível para o artigo, iremos apresentar apenas uma amostra do material coletado. Sobre a opção profissional, é interessante observar, que enquanto alguns passaram a exercer a profissão docente, como decorrência de suas atividades de pesquisa, como alunos na pós-graduação, outros decidiram ser professor universitário, ainda na graduação, entretanto, enfatizam que nunca pensaram em atuar no ensino básico. Em suas palavras:

A partir do momento que eu comecei o curso de Biologia, assumi que não ia ser professora de Biologia no ensino fundamental ou médio. A minha opção era ser professora universitária, principalmente pelo vínculo que existe entre o ensino e a pesquisa e eu gosto da pesquisa, eu gosto da formação de pesquisador, então, a minha meta era essa, desde o momento que eu assumi que ia ser professora. Se eu não tivesse sido professora universitária, eu teria sido frustrada.

Os professores, quando chegam à docência na Universidade, trazem consigo inúmeras e variadas experiências do que é ser professor (PIMENTA e ANASTASIOU, 2002; CANDAU, 1997; TARDIF, 2002). Essas experiências que muitas vezes guiaram sua opção profissional, vão guiar suas escolhas pedagógicas e até mesmo seu relacionamento com os alunos. Os entrevistados falaram das influências positivas em sua carreira e destacaram a importância da escola pública em sua formação, conforme suas avaliações:

Não tive influência da família não, mas do ensino médio sim, onde tive bons professores. Eu tive grandes privilégios, venho daquele ensino público de qualidade estudei em escola pública a minha vida inteira, na minha época ainda era grupo escolar, ginasial e colegial. Naquela época, a escola pública era excelente. Oriento-me na Didática dos professores, nas aulas que me mantinham atentas, nas ferramentas que utilizavam, são essas que eu busco imitar, com certeza.

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Quando os entrevistados falaram de sua trajetória, alguns elementos comuns puderam ser identificados, tais como: afinidade com a atividade docente, aulas em cursinhos, para se manterem enquanto estudantes universitários, envolvimento com professores na faculdade, pós-graduação, oportunidade de prestar concurso.

Minha história com o ensino vem desde o primário, sempre tive facilidade de ajudar os colegas. Eu já fazia alguma coisa no quadro explicando para os alunos, na ausência do professor. Depois durante a graduação eu dei aulas no cursinho como uma forma de auto-sustentação e depois convivendo aqui na Universidade, com professores, vendo a carreira, já desenvolvendo alguns trabalhos com eles, eu fui ficando cada vez mais ligado com a área docente, o que contribuiu para meu aproveitamento durante a graduação. Surgiu a oportunidade, eu fiz o concurso e estou há mais de quinze anos na carreira.

Pérez Gómez (1995) questiona a idéia de que a formação inicial tenha como produto, um profissional pronto para atender às necessidades concretas da sala de aula. Corroborando essa idéia, foi uníssono na voz dos professores, que a formação inicial não dá conta da complexidade da atividade docente, e que o desenvolvimento profissional carece de mecanismos de formação continuada. Sobre a formação inicial e continuada, os professores se manifestaram destacando a carência da formação pedagógica, mesmo nos cursos de licenciatura. Nesse sentido é possível afirmar que a universidade não considera a possibilidade de seu aluno voltar como professor?

O docente universitário não se prepara para ser docente universitário, ele se prepara para ser pesquisador, para o trabalho docente não existe uma preparação, na maioria dos cursos. Eu ainda acho que na nossa carreira, na área de Biologia, têm até um pouquinho dessa formação, tem um pouquinho de instrumentação, você sabe um pouquinho, você sabe planejar, você tem um pouquinho de formação pedagógica de estrutura didática, agora, você vê, as engenharias, a Medicina que são professores que formaram num curso exclusivamente de Bacharelado, eles não têm nenhuma formação, no sentido de ser um professor.

A consciência da necessidade da preparação pedagógica ficou evidente nas entrevistas, bem como a ausência dessa formação na graduação e na pós-graduação. Na maioria das instituições de ensino superior, incluindo as Universidades, embora seus professores possuam experiência significativa e mesmo anos de estudos em suas áreas específicas, predomina o despreparo e até um desconhecimento científico do que seja o processo de ensino/aprendizagem, pelo qual passam a ser responsáveis a partir do instante em que ingressam na sala de aula. Geralmente os professores ingressam em departamentos que atuam em cursos aprovados, em que já estão estabelecidas as disciplinas que ministrarão. Aí recebem ementas prontas, planejam individual e solitariamente. Os resultados obtidos, não são objeto de estudo ou análise individual no curso ou departamento. Não recebem qualquer orientação sobre processos de planejamento, metodológicos ou avaliatórios, não tem de prestar contas, fazer relatórios, como acontece normalmente nos processos de pesquisa, estes, sim, objeto de preocupação e controle institucional (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002). Continuando essa análise, as autoras avaliam que os pesquisadores dos vários campos do conhecimento (historiadores, químicos, filósofos, biólogos, cientistas políticos, físicos, matemáticos, artistas, etc) e os profissionais das várias áreas (médicos, dentistas, engenheiros, advogados, economistas, etc.) adentram o campo da docência no ensino superior como decorrência natural dessas suas atividades e por razões e interesses variados. Se os professores

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trazem consigo imensa bagagem de conhecimentos nas suas respectivas áreas de pesquisa e de atuação profissional, na maioria das vezes nunca se questionaram sobre o que significa ser professor. Do mesmo modo, as instituições que os recebem já dão por suposto que o são, desobrigando-se, pois, de contribuir para torná-los. Assim, sua passagem para a docência ocorre naturalmente, dormem profissionais e pesquisadores e acordam professores! Não sem traumas nem sem, muitas vezes, ocasionar danos aos processos de ensino e aos seus resultados. Os docentes ilustram a falta de formação pedagógica apontando algumas saídas, entre as quais a formação continuada, que deveria incluir cursos de Metodologia do Ensino Superior para os professores recém contratados, bem como para os antigos.

Falta uma formação pedagógica para o docente, nós temos dificuldades, a gente às vezes acaba aprendendo mais na experiência, e isso não é o correto. A gente teria que ter alguma formação pedagógica com profissionais da Pedagogia. Esse deveria ser um dos focos do mestrado. O problema da pesquisa é importante, mas eu acho que o mestrado deveria ter um foco grande na formação docente. O aluno deve aprender a pesquisar, a desenvolver pesquisa, mas não a fundo ainda, o que deve acontecer no doutorado. Um curso de Metodologia do Ensino Superior por mais esquisito que possa ser, é muito importante, principalmente aqui onde nós nos formamos em Medicina e vamos ser professor. O fato de ser um bom médico não garante que você seja um bom professor e vice-versa. À medida que você estuda com mais profundidade e reflete o seu papel, muita coisa muda.

A expectativa de que a formação para a docência será realizada na pós-graduação stricto sensu vem provocando um aumento significativo da demanda por esses cursos e o crescimento de sua oferta, especialmente na área da Educação, uma vez que se nota uma ausência da formação para a docência superior nos programas de pós-graduação das demais áreas. Por outro lado, a não exclusividade da formação nesse nível, expressa na lei, tem provocado um crescimento da oferta de cursos de pós-graduação lato sensu (especialização) ou mesmo a introdução neles da disciplina denominada Metodologia do Ensino Superior ou Didática do Ensino Superior, especificamente voltada à formação docente (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002). A idéia de que a preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado não se concretiza na prática, como testemunha o discurso dos entrevistados, pautado em suas experiências.

Acho que infelizmente o mestrado principalmente na área de biológicas, não te prepara para ser professor. Acredito que saí da faculdade mais ou menos pronta e quando eu fui fazer mestrado, aprendi a fazer pesquisa e uma série de coisas e procedimentos laboratoriais, mas a formação acadêmica para ser professor, eu não tive no mestrado não. E isso é um contra-senso, é um mestrado e você sai, não tem didática, não tem uma situação real enquanto aluno de mestrado não, você dorme aluno e acorda professor. Então você não tem um preparo, uma experiência de assumir uma turma durante o mestrado. O mestrado deu-me mais maturidade em relação a saber conduzir os experimentos, orientar aluno, mas no convívio na sala de aula, isso não. Na Universidade você não é só professor, você é pesquisador e tem que fazer uma série de outras coisas. Então nessa parte de formação, que não seja didática, foi muito importante o mestrado. Doutorado resolve isso, não. Não tem nada, nenhum preparo em Ciências Biológicas, no sentido de preparar um docente para o ensino superior.

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A falta de qualquer vivência em ensino, que fuja de suas atividades como aluno, vem ocasionar uma experiência, que pode refletir de forma negativa na constituição do ser professor. Um zelo da Universidade, com seus futuros docentes, poderia se concretizar, na forma de uma preparação para os iniciantes, que envolvesse além de aspectos particulares da realidade da Instituição, uma preparação pedagógica. Os docentes falaram de sua experiência de enfrentar a situação de ensino, sem nenhuma preparação prévia.

Uberlândia ofereceu vagas para 43 novos docentes, e fez concurso nas suas várias áreas. Então a gente imagina que seria interessante para esses docentes que estão entrando, uma capacitação que mostrasse aspectos da formação, do planejamento, do conteúdo, que mostrasse a ele um pouco da história da instituição, um pouco da dinâmica do seu grupo de trabalho e um pouco de Metodologia do Ensino Superior em termos gerais. Acho que na hora de capacitar pra docência tinha que ser a Pró Reitoria de Graduação. Então acho que no caso especifico da UFU, seria fundamental que a Pró Reitoria de Graduação junto com a Pró Reitoria de Recursos Humanos, organizasse uma Educação continuada voltada para a qualidade da docência, de técnicas, ou seja, lá o que for, para todos os professores ingressantes, e aberto aos professores que já são efetivos, pra que esses também pudessem se qualificar.

A importância do conhecimento pedagógico é lembrada pelos entrevistados ao elencar os conhecimentos necessários para o exercício da atividade de ensinar, embora priorizem os conhecimentos específicos. Se antes a profissão docente calcava-se no conhecimento objetivo, no conhecimento das disciplinas, em muito semelhantes às outras profissões, hoje, apenas dominar esse saber é insuficiente. Numa análise de Zabalza (2004), o perfil ideal do professor universitário, em geral, remete à condição de pessoa com grandes conhecimentos em sua disciplina, e que sabe explicá-los com clareza e convicção aos seus alunos. Entretanto outros aspectos devem ser considerados. Nóvoa (1995) parte do princípio de que os professores, independentemente do nível de ensino em que atuam, devem diagnosticar o contexto de trabalho, tomar decisões, atuar e avaliar sua atuação, para reconduzi-las, no sentido adequado. Fortalecendo essa discussão, Zabala (1998) aponta que para desenvolver a docência é preciso dispor de marcos interpretativos e que a melhoria da prática educativa, assim como a melhoria em qualquer ação humana, passa pelo conhecimento e pelo controle das variáveis que nela intervem. E porque considera que o processo de ensino-aprendizagem seja extremamente complexo, defende que os professores tenham à disposição e utilizem referenciais que os ajudem a planejar avaliar e interpretar o que acontece na sala de aula. Em seus depoimentos, os professores mostraram-se conscientes de todas essas implicações para o êxito da atividade de ensinar.

Conhecimentos da docência, sem dúvida nenhuma, incluem conhecimentos específicos e da parte pedagógica, eu realmente não consigo entender como a gente poderia trabalhar para formar esse docente, mas eu acho que a formação que está sendo feita nos cursos superiores não está formando nem o docente do curso universitário nem o docente do ensino básico. Percebo que existe uma grande deficiência na formação do professor, por falta de visão social, formação geral, visão cultural, enfim, preocupação com a sociedade.

Dentro da discussão dos conhecimentos necessários para exercer a docência a necessidade de atualização, frente ao crescimento e mutabilidade do conhecimento científico,

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às mudanças de contexto, às novas necessidades da sociedade, foi lembrada pelos professores como um objetivo importante e que exige dedicação e sacrifícios.

Se for pensar nos conhecimentos da área que você tem responsabilidade, é claro que tem que ter toda a formação de terceiro grau, pós-graduação, sempre tem que estar atualizando em termos de participação de eventos de estar sempre lendo, pesquisando pra realmente esses conhecimentos serem atualizados e sempre melhorados para que você possa formar o graduando da melhor maneira possível. Mas é claro que não podemos ficar somente na área especifica. Temos sempre que estar a par de outros assuntos porque isso também faz parte da Educação. Para formar o aluno dentro da concepção mais ampla, conhecimentos das áreas sociais, humanas, são necessários, não basta a parte técnica, especifica. Você precisa estar sempre muito atualizado naquilo que estiver ministrando. E é nos estudos de pós-graduação que se busca essa atualização, é onde se adquire o hábito de se manter atualizado.

A necessidade de atualização reforça a importância da formação continuada. Pacca (1994) argumenta que todo profissional, qualquer que seja sua área de atuação, deve aperfeiçoar-se ou atualizar-se, não só para manter-se em dia com as novas tendências que se apresentam continuamente, como também para satisfazer exigências próprias de realização pessoal. No mesmo sentido, Carvalho (1992) comenta que em toda profissão existe a necessidade de aperfeiçoamento contínuo, pois a quantidade de novas informações geradas é muito grande. Em educação, principalmente entre os professores que estão em sala de aula, essa necessidade se faz premente. Essa constatação tem favorecido iniciativas que valorizam a formação continuada ou em serviço, mediante cursos, seminários, disciplinas de pós-graduação lato sensu, palestras, estágios, etc. No entanto, essas iniciativas não constituem regra geral, pois há certo consenso de que a docência no ensino superior não requer formação no campo do ensinar. Para ela, seria suficiente o domínio de conhecimentos específicos, pois o que a identifica é a pesquisa e/ou o exercício profissional no campo. Mesmo porque, diz o dito popular, “quem sabe faz” e “quem não sabe ensina” (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002). DORMINDO E ACORDANDO PROFESSOR (A): INTERFACES DA REALIDADE DOCENTE Discutir sobre o universo formativo do professor do ensino superior e levantar algumas soluções a respeito dos problemas que circundam esse grupo, não tem sido tarefa fácil, diríamos até que é paradoxal frente à realidade da Educação no Brasil. A forma como o ensino superior tem sido apontado pelas políticas públicas Nacionais e Internacionais, sua mercantilização, condicionam muitas vezes a conduta dos professores que assumem a formação e a auto-formação na academia. O diálogo com as entrevistas e com o referencial teórico permitiu-nos algumas considerações sobre como os docentes das áreas Agrárias, Biológicas e da Saúde preparam-se para o exercício da docência. A formação acadêmica que tais professores vêm recebendo não tem sido satisfatória. Isso porque na formação inicial, assim como no mestrado e no doutorado, não existe uma preocupação para formação de um docente que poderá vir assumir uma sala de aula universitária. O que vem sendo reverenciado na formação, principalmente nos cursos stricto sensu é o ideal de pesquisador, pois na formação inicial, a ênfase quando no ensino, é para atender à demanda da Educação Básica. A consciência dos nossos sujeitos de pesquisa sobre a sua situação e dos demais colegas, apontam para a idéia de que eles refletem sobre sua condição, e na ausência de maiores referenciais teóricos, terminam por reconhecer e assumir práticas de seus antigos

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professores. Práticas assistidas e representadas nas suas ações como docentes. Isso porque nesse mesmo quesito eles apontam que o engajamento em atividades de pesquisa na pós- graduação, ou mesmo em projetos, enquanto aluno da graduação, foi na maioria das vezes o responsável pela opção pela docência. “Dormi aluno (a) e acordei professor (a)”, é a frase que, de certa forma, resume a situação de despreparo que os professores que atuam nas áreas investigadas vivenciam na sua trajetória profissional, principalmente nas profissões liberais. A interface dormir e acordar, representa também as possibilidades de diálogos que podem/devem ser tecidas no fazer-se professor. A formação inicial da maioria dos professores se deu através de instituições públicas, o que revela que o problema da formação está justamente no lócus de exercício desses professores, dessa forma a solução também está na prática política dentro das instituições. E é nessa ótica que muitos apontam a formação continuada como uma possibilidade de se manter atualizado frente ao seu campo de conhecimento, ou dialogar com aspectos pedagógicos que permeiam sua realidade profissional que se tornam momentos tensivos frente a suas limitações formativas. Assim, é consensual que a formação inicial não dá conta da complexidade que envolve a atividade docente do professor do ensino superior, como também os cursos stricto sensu posteriores a essa formação não ajudam a resolver esse problema. Um entrevistado chegou a sugerir que a preocupação maior do mestrado deveria ser a formação do professor para o ensino superior e não a formação do pesquisador na área específica, a qual poderia acontecer no doutorado. Instituir cursos sobre Metodologia e Didática no Ensino Superior também se mostrou como uma opção entre os entrevistados para tentar amenizar as lacunas encontradas nesse quesito. Por fim, gostaríamos de registrar que os problemas pertinentes à formação para a docência no ensino superior coexistem junto a tantos outros que se entremeiam no universo do professor. No entanto, a consciência de que as ausências são presenças no universo formativo dos docentes, já existe. Os depoimentos colhidos e apresentados nesse trabalho, são uma forma de materializar tal consciência. Acordar professor universitário é um ritual de passagem, portanto requer cuidados específicos que respeitem essa singularidade. 5-REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CANDAU, Vera Maria F. Formação continuada de professores: tendências atuais. In: CANDAU, Vera Maria (org.). Magistério: construção cotidiana. Petrópolis: Vozes, 1997. CARVALHO, A. M. P.; GIL PEREZ, D. As pesquisas em ensino influenciando a formação de professores. v.14, p.247-252, 1992. CHAMLIAN, H. C. Docência na Universidade: professores inovadores na USP. Cadernos de Pesquisa, n.118, p.41-64, 2003. FERNANDES, C. M. B. Formação do Professor Universitário: tarefa de quem? In: MASETTO, M. (Org.) Docência Universitária. Campinas, Papirus, 1998. p.95-112. IMBERNÓN, F. A Educação no Século XXI: os desafios do futuro imediato. Porto Alegre: Artmed, 2001. NOGUEIRA, M. A. Universidade, crise e produção do saber. IN: BERNARDO, M. (org.). Pensando a educação. São Paulo: UNESP, 1989. p. 36-37. NÓVOA, A. (Org.). Profissão professor. Porto: Porto, 1995. PACCA, J. L. A. A Atualização do Professor de Física do Segundo Grau: uma proposta. (Tese de Livre Docência) São Paulo: Universidade de São Paulo, 1994. 124 p. PÉREZ-GOMES, A. O pensamento prático do professor: a formação do professor como profissional reflexivo. IN: NÓVOA, A. Os professores e a sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992. p.93-114.

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PIMENTA, S. G.; ANASTASIOU, L. G. Docência no ensino superior. São Paulo: Cortez, 2002. TARDIF, M. Saberes Docentes e Formação Profissional. Petrópolis: Vozes, 2002. ZABALA, A. A Prática Educativa: como ensinar. Porto Alegre: ArtMed, 1998. ZABALZA, M. A. O ensino universitário: seu cenário e seus protagonistas. Trad.: Ernani Rosa. – Porto Alegre: Artmed, 2004.

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Revista Iberoamericana de Educación (ISSN: 1681-5653) A IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO DIDÁTICO-PEDAGÓGICA E A

CONSTRUÇÃO DE UM NOVO PERFIL PARA DOCENTES UNIVERSITÁRIOS

Graziela Giusti Pachane Elisabete Monteiro de Aguiar Pereira

Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Brasil INTRODUÇÃO Quando se fala em “formação de professores”, vem-nos à cabeça o processo de formação para a docência na educação básica (ensino fundamental e, no máximo, médio). Dificilmente a abordagem de formação de professores estende-se para a formação de professores universitários, como se a formação específica para o magistério nesse nível fosse algo supérfluo, ou mesmo, desnecessário. No entanto, uma das críticas mais comuns dirigidas aos cursos superiores diz respeito à didática dos professores universitários, ou seria melhor dizer, à falta dela. Tal fato pode ser constatado tanto através da literatura específica da área, como através de conversas com alunos em diferentes tipos de instituição e em diferentes cursos. Relatos de que o professor sabe a matéria, porém não sabe como transmiti-la ao aluno, de que não sabe como conduzir a aula, não se importa com o aluno, é distante, por vezes arrogante, ou que não se preocupa com a docência, priorizando seus trabalhos de pesquisa, são tão freqüentes que parecem fazer parte da “natureza”, ou da “cultura”, de qualquer instituição de ensino superior. Ao mesmo tempo, amplia-se cada vez mais a exigência de que os professores universitários obtenham os títulos de mestre ou doutor. No entanto, é questionável se esta titulação, do modo como vem sendo realizada, possa contribuir efetivamente para a melhoria da qualidade didática no ensino superior. Os programas de pós-graduação, de maneira geral, tendem a priorizar em suas atividades a condução de pesquisas, tornando-se responsáveis, mesmo que não intencionalmente, por reproduzir e perpetuar a crença de que para ser professor basta conhecer a fundo determinado conteúdo ou, no caso específico do ensino superior, ser um bom pesquisador. Numa breve retrospectiva da história das universidades – de maneira geral e, mais especificamente, das brasileiras –, é possível observar que a formação exigida do professor universitário tem sido restrita ao conhecimento aprofundado da disciplina a ser ensinada, sendo este conhecimento prático (decorrente do exercício profissional) ou teórico/epistemológico (decorrente do exercício acadêmico). Pouco, ou nada, tem sido exigido em termos pedagógicos. Acreditamos que possam existir pelo menos três fatores contribuindo para que, na cultura universitária, a tarefa de ensinar – e conseqüentemente a formação pedagógica dos professores – sejam relegadas a segundo plano. Em primeiro lugar, a formação para a docência universitária constituiu-se historicamente como uma atividade menor. Inicialmente, havia a preocupação com o bom desempenho profissional, e o treinamento profissional, acreditava-se, poderia ser dado por qualquer um que soubesse realizar bem determinado ofício. Acreditava-se (como alguns ainda hoje acreditam) que “quem soubesse fazer, saberia automaticamente ensinar”, não havendo preocupações mais profundas com a necessidade do preparo pedagógico do professor (MASETTO, 1998, p. 11). Posteriormente, com a crescente aproximação das universidades do modelo humboldtiano, voltado à produção de conhecimentos, a preocupação com a formação de professores para o magistério superior centrou-se na preparação para a condução de pesquisas e, da mesma maneira, o pedagógico continuou a ser negligenciado, como se as

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atividades realizadas com os alunos de graduação não se configurassem como produção de conhecimento, mas, simplesmente, repetição do que já havia sido realizado por outros. Em segundo lugar, também decorrência dessa ênfase na condução de pesquisas, os critérios de avaliação de produtividade e qualidade docente concentram-se, hoje, na produção acadêmica destes professores. Ou seja, ensino e pesquisa passam a ser atividades concorrentes, e como os critérios de avaliação premiam apenas a segunda, uma cultura de desprestígio à docência acaba sendo alimentada no meio acadêmico, comprometendo, como ressalta Pimentel (1993, p. 89), a almejada indissociabilidade ensino-pesquisa-extensão. É possível, portanto, concluir que a prática usual nas universidades concorre para esta desvalorização do ensino, transmitindo em sua cultura valores díspares para as duas atividades (ensino e pesquisa). Finalmente, observamos a inexistência de amparo legal que estimule a formação pedagógica dos professores universitários. A título de exemplo, é válido mencionar que a legislação brasileira sobre educação, mais especificamente a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) é omissa em relação à formação pedagógica do professor universitário. Num acompanhamento detalhado dos diversos momentos de discussão da LDB (cf. SAVIANI, 1998, p. 144), é possível observar-se que na proposta inicial do então senador Darcy Ribeiro, a preocupação com a formação pedagógica dos professores universitários era contemplada: art. 74 – A preparação para o exercício do magistério superior se faz, em nível de pósgraduação, em programas de mestrado e doutorado, acompanhados da respectiva formação didático-pedagógica, inclusive de modo a capacitar o uso das modernas tecnologias do ensino. No entanto, num processo de “enxugamento” do texto da LDB – além, é claro, das pressões feitas por diversos setores da sociedade cujos interesses podem ser contrariados com a exigência de maior capacitação docente –, omitiu-se do texto final a necessidade de formação pedagógica do professor universitário, configurando-se o texto final como segue: “Art. 66 - A preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado.” Assim, não encontrando amparo na legislação maior, a formação pedagógica dos professores universitários fica a cargo dos regimentos de cada instituição responsável pelo oferecimento de cursos de pós-graduação, refletindo, e ao mesmo tempo regulamentando, a crença na não necessidade d e que esta formação seja oferecida. A FORMAÇÃO DE PROFESSORES UNIVERSITÁRIOS NO CONTEXTO INTERNACIONAL Embora tenhamos nos centrado aqui na descrição da situação brasileira, o processo de ênfase na produção acadêmica – assim como o maior estímulo à pesquisa, em detrimento do ensino – não ocorre, apenas no Brasil, porém é um fenômeno que pode ser observado internacionalmente. Citando um texto publicado pelo American Council on Education, no qual se lê que “o professor universitário é o único profissional de nível superior que entra para uma carreira sem que passe por qualquer julgamento de pré-requisitos em termos de competência e de experiência prévia no domínio das habilidades de sua profissão”, Balzan (1997, p. 7) ressalta que: “as afirmações acima refletem não somente preocupação com a questão da qualidade do ensino superior, como evidenciam tratar-se de um fenômeno que ultrapassa as fronteiras dos Estados, adquirindo um nível de abrangência mundial e

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características extremamente complexas, dadas as realidades vigentes em países situados em diferentes níveis de desenvolvimento sócio-econômico e multiplicidades de culturas construídas ao longo da história.” Marcelo García, professor da Universidade de Sevilha, menciona que na Espanha os programas de doutoramento funcionam como uma espécie de formação inicial de professores universitários no seu papel ou função de investigação. Em relação à formação pedagógica dos professores universitários, observa o panorama atual não é muito favorável, sendo que, até hoje, não existiu uma tradição de formação pedagógica, sendo que os “professores jovens sempre foram deixados sós, exceto talvez por um breve curso de iniciação” (MARCELO GARCÍA, 1999, p. 248). Nesse mesmo sentido, Benedito, Ferrer e Ferreres (1995), num estudo bastante amplo a respeito do ensino superior na Espanha constatam que “a formação de professores universitários não tem contado, até agora, com um respaldo legislativo como ocorre com os outros níveis educativos”. Salientam ainda que, ao consultar-se o Handbook of Research on Teacher Education de 1990 – a grande compilação de tudo o que ocorre na área nos EUA e em seu âmbito de influência – no intuito de buscar indícios, pesquisas, tomadas de posição sobre a formação universitária, depararam-se com uma surpresa “não encontramos nada” (p. 149). Donald Kennedy, ex-reitor da Universidade de Stanford, publicou um livro, denominado “Academic Duty”, no qual reuniu os resultados de diversas palestras ministradas a pós-graduandos, futuros professores universitários, acerca dos problemas e desafios enfrentados pelos professores universitários. Nele, enfatiza a relevância de trabalhos dessa natureza, mencionando que nos Estados Unidos, muito freqüentemente, pouca atenção é dada para as responsabilidades que os estudantes de doutorado terão futuramente com o ensino, já que eles são pressionados a finalizar sua dissertação ou a dar apoio aos programas de seus orientadores. O autor salienta, ainda, que os professores em treinamento recebem pouca ou nenhuma preparação para a gama de desafi os profissionais e pessoais que vão enfrentar como membros efetivos do corpo docente (KENNEDY, 1997, p. 30). Tais aspectos são também apresentados por Serow (2000) ao discutir os resultados da pesquisa que conduziu nos Estados Unidos sobre a docência no ensino superior: “um ponto de concordância entre os entrevistados era de que a pesquisa excedeu em importância o ensino no sistema de gratificações, e que pesquisas amparadas por fundos externos e publicações em meios apropriados se tornaram essenciais não apenas para promoção e efetivação no cargo, mas também para manter a estima aos olhos de seus pares.” (p. 453) De acordo com um dos professores entrevistados pelo autor, qualquer um que não realizasse o tipo correto e a quantidade adequada de pesquisa nunca seria aceito como um “membro de carteirinha” do corpo docente. O ensino também foi descrito por ele como tendo pouco status tanto com os chefes das faculdades como entre aqueles que administravam as universidades. Serow esclarece que isso não significa, necessariamente, que o ensino e a orientação sejam de todo negligenciados. Ao longo de sua pesquisa, pôde constatar que o ensino representa um importante peso na avaliação docente, porém, somente quando é considerado ruim. De acordo com um professor sênior de uma faculdade de engenharia por ele entrevistado: “Se você dá aula razoavelmente boas, isso é o que é esperado. Se não, o departamento pode usar isso contra você. (...) A ênfase mudou-se de ‘quão bom professor é ele’ para ‘quantas queixas nós tivemos dele?’ (...) Através do patrocínio de prêmios pedagógicos, bolsas para inovações didáticas e outros incentivos, a real intenção dos administradores era a de evitar ramificações de ensino ruim, através de uma diminuição das pressões de estudantes, pais, alunos recém-formados e legisladores” (SEROW, 2000, p. 453-454).

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Podemos perceber, portanto, que o problema que aqui nos propomos a discutir não é isolado no Brasil. Autores que discutem a formação de professores em outros países abordam a mesma problemática, destacando não só o desprestígio do ensino em relação à pesquisa e a falta de formação de seus professores universitários, como também, enfatizando a necessidade de que tal situação seja revertida e que maior atenção seja dada à formação pedagógica do (futuro) docente do ensino superior. FORMAÇÃO PEDAGÓGICA DO PROFESSOR UNIVERSITÁRIO: UMA NECESSIDADE Como mencionamos, a formação do docente universitário tem se concentrado na sua crescente especialização dentro de uma área do saber. De acordo com Vasconcelos (1998, p. 86), há “pouca preocupação com o tema da formação pedagógica de mestres e doutores oriundos dos diversos cursos de pós-graduação do país. A graduação tem sido ‘alimentada’ por docentes titulados, porém, sem a menor competência pedagógica”. Tal constatação nos leva a um questionamento acerca da correlação entre a crescente especialização oferecida pelos cursos de pós-graduação e a melhoria da qualidade docente dos professores universitários. Marcelo García (1999, p. 244), fazendo referência a trabalhos realizados por Aparício e Felman, ressalta que, em diversas investigações, a correlação encontrada entre a produção científica dos professores e a avaliação que seus alunos fazem deles tem sido muito baixa (em torno de 0,21), concluindo as relações entre produtividade científica e eficácia docente são escassas, ou como refere Felman (1987, apud Marcelo García, 1999), são essencialmente independentes uma da outra. A esse respeito, Pimenta e Anastasiou (2002, p. 190-196) observam que a formação atualmente oferecida aos pós-graduandos separa-os de qualquer discussão sobre o pedagógico, desconsiderando, inclusive, que os elementos-chave do processo de pesquisa (sujeitos envolvidos, tempo, conhecimento, resultados e métodos) não são os mesmos necessários à atividade de ensinar, e elaboram uma comparação entre as características dos elementos constituintes de cada atividade. QUADRO 1 Elementos constituintes das atividades de pesquisa e ensino, segundo Pimenta e Anastasiou (2002, p. 190-196): Pesquisa, Ensino, Sujeitos envolvidos Em geral o trabalho é realizado individualmente; pode haver momentos de trabalho em grupo, mas o pós-graduando, em geral, trabalha apenas ligado a seu orientador. O professor está constantemente envolvido com outros sujeitos: seus pares institucionais (chefias e colegas docentes), alunos, comunidade, etc. Tempo Habitualmente é previsto em blocos, conforme o projeto, e comporta alterações justificadas, submetendo-se, dessa forma, a certa flexibilidade. O processo de ensino em geral tem de se adequar ao período letivo, não havendo flexibilidade, constituindo-se um permanente desafio a adequação temporal dos cronogramas curriculares. Resultados obtidos Os resultados dizem respeito aos conhecimentos gerados sobre o tema proposto após o término da pesquisa, que podem levar à confirmação da teoria existente ou à revisão total ou parcial do referencial científico existente. O ensino deve proporcionar novas elaborações e novas sínteses aos professores e aos alunos, ampliando a herança cultural e propiciando ao aluno uma apreensão qualitativamente superior dos quadros teóricos e da própria realidade.

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Conhecimentos Os conhecimentos constituem-se em sínteses provisórias geradoras de novas propostas de trabalho. Trata-se, em geral, do trabalho com o conhecimento já existente e sistematizado, a ser “apropriado” pelo aluno sob a orientação do professor. Método É definido ao se propor o problema, tendo em vista a estreita relação entre o objeto, o campo do conhecimento e a metodologia a ser trabalhada. Depende, inicialmente, da visão de ciência, de conhecimento e de saber escolar do professor. Considerando as diferenças entre as atividades de pesquisar e ensinar, as autoras concluem que não seja difícil compreender por que ser um reconhecido pesquisador, produzindo acréscimos significativos aos quadros teóricos existentes, não é garantia de excelência no desempenho pedagógico e, conseqüentemente, por que os programas de pós-graduação não oferecem, necessariamente, melhoria na qualidade docente: como a pesquisa e a produção de conhecimentos são objetivos da pós-graduação, os docentes, quando participam desses programas, sistematizam e desenvolvem habilidades próprias ao método de pesquisa, deixando de lado o desenvolvimento das características necessárias para o desenvolvimento do ensino. Assim, podemos perceber que os cursos de formação, quando voltados exclusivamente para a realização de pesquisas, não atendem às necessidades específicas dos professores no tocante a suas atividades de docência. Ou seja, a qualificação oferecida pelos cursos de pós-graduação, como atualmente estruturados, possibilitam aos professores a titulação, porém, a maior titulação não significa, necessariamente, melhoria na qualidade docente. É válido ressaltar que os próprios pós-graduandos criticam o despreparo pedagógico com que iniciam seu trabalho em sala de aula, como levantado por Macedo, Paula e Torres (1998, p.1). Ainda a respeito da falta de preparo pedagógico dos futuros professores universitários, Kennedy (1997) introduz uma observação bastante interessante. Segundo o autor, a vasta maioria dos doutorados acadêmicos são produzidos em universidades, mas grande parte dos professores nelas formados irá lecionar em instituições de ensino superior bastante diferentes daquelas onde foram titulados. Dessa forma, “chegam ao trabalho com poucas noções sobre como realizar a transição de aprendiz experiente para professor novato, ou mesmo sobre o que é esperado deles como profissionais” (p. 30). Embora Kennedy esteja se referindo à situação das instituições de ensino superior americanas, o que ocorre no Brasil não é diferente. Aqui, também, grande parte dos professores universitários é titulada em universidades, prioritariamente em instituições públicas (estaduais ou federais), pelas quais não serão necessariamente contratados. Assim, embora muitos professores sejam formados, ou titulados, em instituições universitárias, com tradição em pesquisa, o mercado de trabalho que para eles se abre é, muitas vezes, em instituições não-universitárias, com tradição em ensino. Tendo em vista as recentes políticas de expansão e flexibilização do sistema de ensino superior brasileiro, essa situação de diferenciação entre instituições voltadas predominantemente ao ensino ou à pesquisa, e conseqüentemente a discrepância entre a formação oferecida ao pós-graduando e as tarefas a serem exercidas em sua futura atuação como professor, torna-se mais acentuada. O Brasil tem vivenciado um período de diversas alterações no sistema de ensino superior, que englobam, além do crescimento destacado anteriormente, a expansão e flexibilização do sistema, mudanças na estrutura curricular (diretrizes curriculares), alterações nos critérios de ingresso nas IES, exigência de titulação do corpo docente, processos sistemáticos de avaliação, tanto em âmbito institucional como nacional, entre outros indicadores, muitos dos quais decorrentes da introdução de novas tecnologias na educação. Esse processo, no entanto, não tem se dado de modo proporcional entre os diferentes tipos de

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instituição existentes no país, havendo uma diferenciação cada vez maior entre os programas que incentivam a pesquisa e programas que priorizam o ensino (Gamboa, 1999; Saviani, 1998). Como observado por Pimenta e Anastasiou (2002, p. 141), as oportunidades de emprego vêm aumentando com a expansão das instituições particulares de ensino em todo o território nacional, o que pode ser observado por uma análise dos dados estatísticos divulgados recentemente pelo MEC/INEP (Pachane, 2003), expansão esta que não é acompanhada de um processo de profissionalização, nem inicial nem continuada (PIMENTA e ANASTASIOU, 2002, p. 128-129). Para as autoras, o conhecimento deste sistema é de extrema importância pois as condições de trabalho dos professores são bastante diversas entre os diferentes tipos de IES brasileiras e, dependendo do tipo de instituição ao qual o professor se vincula, um tipo de produção diferente será exigido dele, seja ela relativa a atividades de docência, de extensão ou pesquisa, cabendo lembrar que a docência estará presente em todos. A este movimento de expansão desigual entre os diferentes tipos de IES brasileiras alia-se outro: o processo de flexibilização do sistema (diversificação da oferta), diferenciação que tende a se aprofundar, refletindo a adequação do sistema em face do crescimento da demanda e dos novos perfis profissionais exigidos pelo mercado. Aponta-se, hoje, para a necessidade de criação de cursos mais curtos e/ou voltados a novas especialidades, sejam elas decorrentes de abordagens interdisciplinares, do avanço da ciência e da tecnologia, da flexibilização dos campos do saber ou das necessidades criadas pelo gerenciamento de sistemas de novas tecnologias. Questiona-se, inclusive, qual a formação que o ensino superior deve oferecer e a quais interesses deve atender. Paralelamente a estas mudanças, o sistema educacional tem observado um movimento no sentido de democratização do acesso ao ensino superior, como é possível de ser observado nos resultados do Censo da Educação Superior A expansão do número de vagas, e a conseqüente ampliação do acesso ao ensino superior, proporciona uma maior heterogeneidade do público que se dirige às instituições de ensino superior. Este abre-se a parcelas da população a quem a possibilidade de graduação era, anteriormente, dificultada. Hoje, portanto, é necessário ao professor saber lidar com uma diversidade cultural que antes não existia no ensino superior, decorrente do ingresso de um público cada vez mais heterogêneo. Um público que pode, por um lado, não estar tão bem preparado, tanto emocional quanto intelectualmente, para o ingresso no ensino superior; um público talvez mais jovem, mais imaturo, e, por vezes, pouco motivado e comprometido com sua aprendizagem, tendo em vista que o ensino superior hoje não é mais garantia de um emprego estável no futuro, mas um público que pode, por outro lado, ser muito mais exigente quanto à qualidade do curso oferecido, tendo em vista especialmente o alto grau de competitividade do mercado de trabalho (MILLAR, 1996, BRIDGES, 1995; SANTOS, 1997; RIBEIRO JÚNIOR, 2002). Além disso, os professores passam a ter necessidade de aprender a lidar com turmas cada vez mais numerosas, pois a baixa correlação do número de alunos por professor, antes tomada como índice de qualidade de um curso, hoje passa a identificar a “ineficiência do sistema”. É necessário destacar também que o ensino superior, por muito tempo considerado ponto terminal da educação e voltado à formação profissional, tem agora para si outras funções e, dependendo do ponto de vista que adotarmos, configura-se apenas como um primeiro passo rumo a um processo de “lifelong learning” (educação permanente), fenômeno que vem ocorrendo não apenas no Brasil. Tais constatações nos levam a uma preocupação em relação à formação dos professores para atuar no ensino superior e que culminam nos questionamentos propostos por Morosini (2000, p. 11): “quem são (serão) esses novos professores? Estarão preparados didaticamente?”.

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Atualmente, a preocupação com a aferição da eficiência do sistema educativo, seja através do sistema nacional de avaliação ou de programas de avaliação institucional, começa a desvelar as precariedades e os pontos positivos da área e por influenciar, direta ou indiretamente, o trabalho dos professores. Como destaca Morosini (2000, p. 13), embora o sistema nacional de avaliação não estabeleça normas de capacitação didática do docente, há uma íntima relação entre o desempenho didático do professor e o desempenho do aluno e, dessa forma, sugere que tais avaliações, mesmo não incidindo diretamente na qualidade docente, indiretamente, afetam-na. A partir dos pontos até aqui abordados, podemos concluir que o professor universitário não se forma, hoje, para atuar necessariamente em uma universidade, porém, num complexo sistema de ensino superior, que envolve diferentes instituições e tipos de cursos. Mas, mais que isso, além de preparar-se para agir neste meio, para trabalhar com o novo perfil de alunos que chegam ao ensino superior, como também com o novo perfil exigido dos egressos do ensino superior, acreditamos que seja necessário a este professor conhecer esta realidade e saber entendê-la e analisá-la, ou seja, torna-se necessário que o professor desenvolva estratégias que permitam a ele refletir sobre sua docência e o contexto mais amplo no qual ela se acha inserida. Vimos até aqui destacando o trabalho dos professores universitários em termos da docência (ensino de graduação e pós-graduação) e da realização de atividades de pesquisa (trabalho na pós-graduação, orientação de alunos, condução de pesquisas próprias, publicações, participação em encontros científicos, etc.). No entanto, não podemos reduzir as tarefas dos professores somente a estas duas dimensões. Benedito, Ferrer e Ferreres (1995) ressaltam que a própria docência tem sido vista com excessivo reducionismo ao ser identificada somente com as atividades que os professores realizam quando estão na sala de aula com seus alunos (p. 170). Os autores apontam que as funções que fazem parte do trabalho do professor universitário são, principalmente, as seguintes: o estudo e a pesquisa; a docência, sua organização e o aperfeiçoamento de ambas; a comunicação de suas investigações; a inovação e a comunicação das inovações pedagógicas; a orientação (tutoria) e a avaliação dos alunos; a participação responsável na seleção de outros professores; a avaliação da docência e da investigação; a participação na gestão acadêmica; o estabelecimento de relações com o mundo do trabalho, da cultura etc.; a promoção de relações e intercâmbio departamental e interuniversitário, e a contribuição para criar um clima de colaboração entre os professores (BENEDITO, FERRER e FERRERES, 1995, p. 119). Pimenta e Anastasiou (2002, p. 39), por sua vez, lembram que, para além da docência, espera-se dos professores seu envolvimento na administração e gestão em seus departamentos, na universidade, tomando decisões sobre currículos, políticas de pesquisa e financiamento, não apenas no seu âmbito, mas também no âmbito dos sistemas públicos estaduais, do sistema nacional de educação e das instituições científicas de fomento, de políticas de pesquisa, de ensino e de avaliação, aspectos que, de maneira geral, não são contemplados num processo de formação profissional do docente do ensino superior. MUDANÇAS NO MUNDO CONTEMPORÂNEO E SEU REFLEXO NO ENSINO SUPERIOR Até aqui, analisamos um pouco das mudanças que vêm se processando no contexto que podemos chamar de “intrínseco” ao ensino superior. No entanto, as modificações não se processam isoladamente do contexto social, político e econômico mais amplo no qual as IES se acham envolvidas. As mudanças que vêm ocorrendo no mundo contemporâneo, assim como das mudanças nos campos das diversas ciências, inclusive da educação levam, elas também à necessidade de se repensar a formação atualmente oferecida aos futuros professores

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universitários e mesmo àqueles que já exercem suas funções. Temos hoje configurado um processo de mudanças no contexto global no qual se inserem as instituições de ensino superior, mudanças relacionadas, em especial, ao avanço científico-tecnológico, a alterações na organização do trabalho (processo produtivo), à sociedade de informação, aos processos de globalização da economia e a alterações na relação dos sujeitos com o conhecimento (MORAES, 1997; RIBEIRO JÚNIOR, 2002). Tais mudanças acabam por afetar, direta ou indiretamente, a organização das IES, assim como o trabalho realizado em seu interior. Em complementação às alterações e aos questionamentos suscitados pelas mudanças decorrentes da “nova ordem mundial” e dos avanços tecnológicos, as instituições de ensino superior encontram-se imersas em um outro processo de mudanças, não desvinculado dos outros dois. Como apontado por diversos autores (Santos, 1997; Kuhn, 1991; Pimentel, 1993; Cunha, 1998; Leite et al., 1998; Pereira, 2002, entre outros), vivemos um período de transição em que crenças absolutistas e de neutralidade da ciência, assim como de diversos pressupostos da modernidade, que vigoraram como verdades absolutas durante muito tempo, passam a ser questionados. As “verdades” passam a ser vistas como sínteses provisórias, o saber é historicizado e relativizado e a divisão entre disciplinas estanques é questionada. A confiança do homem na razão é abalada e, conseqüentemente, todo o trabalho realizado dentro das instituições universitárias. A reestruturação na forma como se concebe o saber, a influência dos aspectos tecnológicos e toda uma reestruturação na organização social clamam, portanto, por mudanças na estruturação e nos objetivos do ensino superior, eminentemente marcados pelo paradigma moderno. Conseqüentemente, o trabalho a ser realizado pelo professor universitário sofre também alterações. Torna-se necessário ao professor pensar numa nova forma de ensinar e aprender que inclua a ousadia de “inovar as práticas de sala de aula, de trilhar caminhos inseguros, expondo-se e correndo riscos, não se apegando ao poder docente, com medo de dividi-lo com os alunos e também de desvencilhar-se da racionalidade única”, pondo em ação outras habilidades que não apenas as cognitivas. Torna-se necessário, ainda, que os professores passem a pensar-se como “participantes do desvelamento do mundo e da construção de regras para viver com mais sabedoria e mais prazer” (CASTANHO, 2000, p. 87). Não se pode mais entender o professor como “detentor do saber”, nem o ensino como transmissão de um conhecimento pronto e acabado. O modelo pelo qual se pautava a organização do ensino superior não dá mais conta da complexidade do momento que vivenciamos e é constantemente impulsionado a mudanças. Neste contexto, professores e alunos passam a construir conjunta e continuamente o conhecimento, embasados nas teorias e na revisão constante destas, nos questionamentos e nas leituras da realidade e do presente histórico (PEREIRA, 2002, p. 42). A indissociabilidade ensino-pesquisa, a perspectiva de produção de conhecimento e a autonomia de pensamento, o incentivo à criticidade e à criatividade, a flexibilização de espaços, tempos e modos de aprendizagem, a emergência da interdisciplinaridade, a necessidade de integração teoria e prática, a necessidade de separação de dicotomias (teoria/prática, forma/conteúdo entre outras), a necessidade de domínio de novas habilidades decorrentes de avanços tecnológicos (como uso de realidade virtual), o resgate da ética, a incorporação da afetividade, a ênfase ao posicionamento político do professor e a centralização do processo educativo na aprendizagem do aluno, entre outros fatores que aqui poderíamos enumerar, alteram profundamente o perfil necessário ao professor numa instituição de ensino superior e nos chamam a atenção para a necessidade de que estes professores, ou futuros professores, estejam conscientes desses processos nos quais se acham envolvidos. Percebemos, portanto, que as características necessárias aos professores universitários hoje, extrapolam – e muito – os limites do conhecimento aprofundado da

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matéria de sua especialização e a aquisição de habilidades necessárias à condução de pesquisas, e seguem-se a dimensões muito mais amplas, que nos levam a argumentar em favor da importância da formação pedagógica do professor universitário. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao longo do texto, apresentamos alguns aspectos que, em nossa opinião, influenciam a ampliação do consenso quanto à importância da formação pedagógica do professor universitário e justificam a necessidade de que esta formação seja tomada de forma mais efetiva. Entre estes aspectos, destacamos: 1) expansão do ensino superior; 2) diversificação do sistema de ensino superior; 3) instituição de um Estado Avaliativo; 4) mudança do perfil do aluno ingressante no ensino superior; 5) mudança no perfil esperado do egresso do ensino superior (e conseqüentemente do papel a ser desempenhado por estas instituições e seus professores); 6) mudanças no paradigma científico e pedagógico; 7) crescente percepção/conscientização dos próprios docentes a respeito da necessidade de formação para a atuação como professores no ensino superior; 8) emergência de um novo perfil de professor universitário, o que poderá se refletir na exigência de sua formação pedagógica e 9) a baixa correlação entre a formação atualmente oferecida em cursos de pós -graduação e a melhoria da qualificação do professor para o exercício da docência no ensino superior. Ao considerarmos todos os dados apresentados no presente capítulo em conjunto com as críticas dirigidas à falta de didática dos docentes universitários, como apresentada em diversos estudos (Balzan, 1988; Cunha, 1989; Comvest, 1996; Masetto, 1998; Pachane, 1998; Leite et al., 1998, entre outros), podemos concluir que o panorama do ensino superior hoje aponta, cada vez mais, para a necessidade de formação pedagógica de seus professores, podendo até vir a se constituir numa exigência do sistema educacional. Tendo em conta que a visão da preparação para a docência no ensino superior como algo desnecessário vem se constituindo historicamente e que os critérios de avaliação docente têm se concentrado na produtividade acadêmica, a tentativa de promover a valorização da atividade docente e do ensino de graduação, e conseqüentemente da formação pedagógica do professor universitário, a nosso ver, necessita passar pela mudança na cultura acadêmica, que atribui valores díspares a cada uma das atividades constituintes do fazer universitário. Dessa maneira, a valorização do ensino e da formação pedagógica do professor universitário demandaria, em primeiro lugar, a alteração do modo como as questões pedagógicas são entendidas e tratadas na universidade, superando a crença de que para ser bom professor basta conhecer profundamente e conseguir transmitir com clareza determinado conteúdo, ou, no caso mais específico do ensino superior, ser um bom pesquisador. Como concluem Benedito, Ferrer e Ferreres (1995) as exigências que neste momento se colocam ante o desenvolvimento das novas titulações e a implantação de planos de estudo modernos, flexíveis e relacionados com o mundo do trabalho, assim como o fato de que a profissão docente se exercita em um contexto espaço-temporal determinado, com umas pessoas determinadas, que exigem uma adaptação particular àquelas condições e características pelas quais é necessário preparar o docente, constituem-se em razões mais que suficientes para considerar que “a docência universitária é importante e a formação de seus profissionais já não admite demora” (p. 186-187). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BALZAN, Newton César. A didática e a questão da qualidade do ensino superior. Cadernos Cedes (22). São Paulo: Cortez, 1988.

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Educação & Sociedade, ano XXII, nº 74, Abril/2001 43

DO ENSINO DE CONTEÚDOS AOS SABERES DO PROFESSOR: MUDANÇA DE IDIOMA PEDAGÓGICO?

ISABEL ALICE LELIS4 RESUMO: Este trabalho tem o objetivo de decifrar algumas das tendências da produção intelectual sobre formação de professores nos últimos vinte anos no Brasil, chamando a atenção para os “idiomas pedagógicos” que tiveram impacto entre os educadores. No mapeamento da literatura especializada, alguns autores/textos foram tomados como exemplares por representarem lógicas de pensamento marcantes a respeito do papel da teoria e da prática na formação docente. Do balanço efetuado, o que se verificou foi a ruptura de um idioma pedagógico, passando-se de uma pedagogia marcadamente conteudista sob a hegemonia de uma razão teórica para uma perspectiva que aponta para uma epistemologia da prática. Palavras-chave: formação docente, idioma pedagógico, ensino de conteúdos, saber do professor, relação teoria/prática. Assistimos na última década ao aparecimento de uma literatura internacional bastante fértil no campo da formação de professores, em especial sobre os conhecimentos incorporados e atualizados pelos professores em seus processos de vida, de trabalho e de formação. Sob matrizes diversas, o que parece ser consenso é a valorização da prática cotidiana como lugar de construção de saberes. Em que pese a fertilidade da produção acadêmica há, contudo, zonas de sombra que precisam ser desvendadas, se considerarmos os desafios de uma escola de massa e o lugar que nela desempenha o trabalho do professor, especialmente em sociedades como a nossa que não equacionaram o problema da desigualdade social e escolar. Se é verdade que a problemática específica do saber escolar e do saber docente, enquanto tal, só muito recentemente passou a se constituir em objeto de pesquisa no Brasil, também é verdade que velhos temas já trabalhados desde a década de 1980 reapareceram travestidos com nova roupagem, sugerindo um retorno a questões que não foram ainda equacionadas pelas políticas e práticas de formação de professores como, por exemplo, os conhecimentos de que devem ser portadores os professores e que se atualizam na ação pedagógica. Uma hipótese é a de que esse retorno não parece significar mera reprodução de perspectivas de análise já formuladas em outros contextos, mas redimensionamento de questões que estão no centro da problemática do trabalho docente como, por exemplo, o papel da teoria e da prática nos processos de formação de professores, os modos como os professores se relacionam com os saberes. Neste movimento, o que parece estar em questão é o processo de produção de discursos com impacto no campo intelectual e que “exprimem maneiras diversas de definir quais são os ‘problemas’ e consequentemente o leque de soluções disponíveis para combatê-los” (Almeida e Perosa, 1999, p.1). Dentro dos limites do texto, é nossa intenção analisar algumas das tendências do debate sobre formação de professores nessas últimas duas décadas no Brasil, buscando entender as lógicas de pensamento que fundamentaram e ainda fundamentam algumas propostas presentes na literatura educacional. Trabalhamos na perspectiva de que, sob determinadas condições de produção, foram elaborados “idiomas pedagógicos” sobre a formação e trabalho docente na perspectiva de responder aos desafios

4 Professora e pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira e diretora do Departamento de Educação da PUC-Rio. E-mail: [email protected]

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postos aos sistemas públicos de ensino. Trata-se de uma tentativa de reconstruir, de certa forma, uma trajetória intelectual nas continuidades e rupturas que apresenta. Em uma pedagogia dos conteúdos, qual a relação do professor com o saber? Em contrapartida à segunda metade dos anos de 1970, marcada pela crítica ao papel da escola na reprodução da estrutura de classes, florescem trabalhos voltados para o conhecimento dos fatores intra-escolares, como mecanismos de exclusão dos setores populares, considerando-se a “rede de expectativas e contradições que permeiam a prática pedagógica” (Souza, 2000, p. 43). Sob diferentes ângulos, é analisada a situação do magistério na tentativa de encontrar explicações para as precárias condições de funcionamento dos sistemas públicos de ensino, expressas em altas taxas de exclusão escolar, principalmente entre segmentos das camadas populares. Em um texto que se tornou referência no campo dos educadores, Mello (1982) parte do caráter mediador da escola1 para estudar as representações e expectativas do professor face à escola, ao aluno e aos papéis que desempenha. Trabalhando sobre o conceito de “representação” de Moscovici,2 bastante utilizado na investigação educacional, a autora busca dar conta tanto da forma singular como um corpo de idéias se processa no indivíduo, respeitando a sua contextura psicológica autônoma, como das condições sociais reais de sua produção (Lelis e Nunes, 1999). A tese central de Mello passa, nesse momento, pela defesa da competência técnica do professor vista como mediação através da qual se realizaria o sentido político da educação escolar. Nestes termos, a competência técnica envolveria tanto o domínio dos conteúdos de ensino pelo professor como o seu entendimento a respeito das relações entre os vários aspectos da escola, incluindo-se o peso da formação sobre o modo como percebe a organização da escola e os resultados de sua ação. Bem diversa da tendência tecnicista dos anos de1970,3 Mello denuncia ainda a lógica subjacente à organização do trabalho no interior da escola que acabara por fazer com que o professor perdesse seus instrumentos de trabalho: do conteúdo (saber) ao método (saber fazer), restando uma técnica sem competência. Na busca por mapear as causas da precariedade da prática docente, estaria a dificuldade do professor em se perceber como parte do problema do ponto de vista das deficiências de sua formação (Mello, 1982). De certa forma, essa tese provoca impacto e gera um debate intelectual, na medida em que faz emergir uma polêmica em torno do significado de uma suposta concepção universal sobre competência, acima dos interesses de classe. Independente das críticas recebidas,4 o texto de Mello torna-se paradigmático e representa uma forma de pensar o trabalho docente no que ele era mas também no que deveria ser, surgindo com força a noção de que a escola e, nela, o professor teriam um papel chave na transmissão do saber elaborado, sistematizado, erudito de forma a garantir à população a possibilidade de expressar de maneira elaborada os conteúdos da cultura popular que correspondem a seus interesses (Saviani, 1985). Trabalhando nas diferenças entre o cientista e o professor do ponto de vista da relação com o saber, Saviani5 ajuda-nos a entender a constituição de um idioma pedagógico, onde o professor seria transmissor do saber e não produtor: Enquanto o cientista está interessado em fazer avançar a sua área de conhecimento, em fazer progredir a ciência, o professor está mais interessado em fazer progredir o aluno. O professor vê o conhecimento como um meio para o crescimento do aluno; enquanto para o cientista o conhecimento é um fim, trata-se de descobrir novos conhecimentos na sua área de atuação. (Saviani, 1985, p.19) Nessa perspectiva, o conhecimento viria de “fora para dentro”, tendo uma dimensão instrumentalizadora do ponto de vista político social. Ao professor, caberia a organização dos processos, de métodos, de modo a garantir a apropriação pelos alunos. (...) um professor de história ou de matemática; de ciências ou estudos sociais, de comunicação e expressão ou literatura brasileira etc., tem cada um, uma contribuição específica a dar em vista da democratização da sociedade brasileira, do atendimento aos interesses das camadas populares,

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da transformação estrutural da sociedade. Tal contribuição se consubstancia na instrumentalização, isto é, nas ferramentas de caráter histórico, matemático, científico, literário, etc. que o professor seja capaz de colocar de posse de alunos. (Saviani, 1982, p. 83) No horizonte de pensar a formação do educador, Saviani afirmava a necessidade de que o curso de Pedagogia fornecesse uma fundamentação teórica que permitisse uma ação coerente, o desenvolvimento de uma consciência aguda da realidade em que os futuros professores iriam atuar e uma instrumentalização técnica que permitisse uma ação futura eficaz (Saviani, 1980, p. 60). Como forma de garantir o cumprimento dessas finalidades, cada disciplina do curso de Pedagogia deveria ser trabalhada de modo que os alunos chegassem a uma teoria geral de educação “no nível atitudinal (‘o que o educador precisa viver’), no nível crítico-contextual (‘o que o educador precisa fazer’), no nível cognitivo (‘o que o educador precisa saber’), no nível instrumental (‘o que o educador precisa fazer’)” (Saviani, 1980, p. 61). Sua proposta conferia ao conhecimento científico e à reflexão filosófica uma centralidade enquanto instrumentos-chave, capazes de transformar positivamente os atributos negativos do senso comum6 em elementos característicos de uma consciência crítica (Bonamino, 1989). Em uma filosofia da educação que se afirmava radical, rigorosa e de conjunto, Saviani encontrava o fermento para uma educação revolucionária. Analisando o pensamento político pedagógico de Saviani, Bonamino chama a atenção para o caráter problemático do papel emancipador conferido ao saber elaborado, dada a natureza iluminista que poderia estar contida nessa formulação: a escola não educa a consciência social apenas através dos conteúdos críticos devidamente seqüenciados e dosados que transmite. A consciência da criança não se desenvolve tão somente através de conceitos que ela assimila em seu contato com os detentores da cultura elaborada, mas as condições para o desenvolvimento desta consciência crítica são criadas pela participação da criança na experiência social coletiva, a qual se compõe, em parte, das experiências práticas que a escola propicia através de sua organização interna e do sentido que assumem suas relações internas. (Bonamino, 1989, p. 205-206) Em que pese o investimento intelectual por pensar uma pedagogia crítico-social dos conteúdos7 e, nela, o papel do educador,8 o que deve ser registrada é a influência desta tese sobre o campo dos educadores, provocando “discursos sobre teoria”, expressões de um “abstracionismo pedagógico”, “na obsessiva preocupação em descrever a escola e explicar os problemas educacionais a partir de hipotéticas relações do processo educativo com outros processos socioeconômicos” (Azanha, 1992, p. 46), em um claro superdimensionamento da teoria em detrimento da empiria. Do ponto de vista da prática de pesquisa, os anos de 1980 ficaram a nos dever, em termos do conhecimento sobre as práticas pedagógicas efetivas que estavam acontecendo na sala de aula. Fiorentini et al. (1998) reforçam essa crítica ao afirmarem que as pesquisas sobre ensino e formação de professores passaram a priorizar o estudo de aspectos políticos e pedagógicos amplos. Os saberes escolares, os saberes docentes tácitos e implícitos e as crenças epistemológicas, como destaca Linhares (1996), seriam muito pouco valorizados e raramente problematizados ou investigados tanto pela pesquisa acadêmica educacional como pelos programas de formação de professores. (Fiorentini et al., 1998, p. 314) Na busca por efetuar um balanço da pedagogia crítico-social dos conteúdos, Libâneo (1999), quinze anos depois, procura atualizar o “conteudismo”, chamando a atenção para as interpretações equivocadas que esvaziavam a abordagem, na identificação mecânica entre “conteúdo” e “matéria”: conteúdos são os conhecimentos sistematizados, selecionados das bases das ciências e dos modos de ação acumulados pela experiência social da humanidade e organizados para serem ensinados na escola; são habilidades e hábitos, vinculados aos conhecimentos, incluindo métodos e procedimentos de aprendizagem e de estudo; são atitudes

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e convicções envolvendo modos de agir, de sentir e de enfrentar o mundo.9 Mesmo alargando-se o sentido do que entendemos por “pedagogia dos conteúdos”, permanece o desafio de pensar nas relações que o professor estabelece com os saberes, considerando-se que na ação prática, saberes de diferentes ordens (entre os quais situam-se os conteúdos de ensino) são por ele mobilizados. Considerando-se que uma pedagogia fundada em conteúdos tinha como justificativa a transformação política da escola e da sociedade e colocava como necessidade o recurso aos conhecimentos universais, ao que assistimos foi “o florescimento de um discurso de culpabilização do professor, dramaticamente similar ao discurso de culpabilização dos alunos que florescera nos anos 60 e 70” (Almeida e Perosa, 1999, p. 5). Para as autoras, é neste quadro que a formação de professores torna-se um problema a ser resolvido fora dos espaços desvalorizados da formação regular. À maneira dos programas de educação compensatória da década de 70, as práticas de formação dos professores serão também definidas como oportunidade para o professor “compensar” a má formação recebida nos cursos regulares. (Idem, p. 6) Na crítica à formação de professores, o primado da lógica relacional No interior do debate sobre a formação de professores, vão sendo aprofundados os problemas crônicos enfrentados pelas instituições formadoras: falta de articulação entre teoria e prática educacional, entre formação geral e formação pedagógica, entre conteúdos e métodos. Em texto escrito em 1983, Candau e Lelis trabalham a relação teoria e prática no sentido de identificar, nas práticas de formação de especialistas e professores, as concepções que estariam informando aquela relação. Denunciando a perspectiva positivista que caracterizaria a dicotomia entre teoria e prática, muito presente nos currículos dos cursos, as autoras buscam na filosofia da práxis formulada por Vazquez (1977) um recurso para pensar uma visão de unidade entre os dois pólos na perspectiva de uma teoria revigorada, porque formulada a partir das necessidades da realidade educacional: A teoria em si não transforma o mundo. Pode contribuir para sua transformação, mas para isto tem que sair de si mesma, e, em primeiro lugar, tem que ser assimilada pelos que vão ocasionar, com seus atos reais, efetivos, tal transformação. Entre a teoria e a atividade prática transformadora se insere um trabalho de educação das consciências, de organização de meios materiais e planos concretos de ação: tudo isso como passagem indispensável para desenvolver ações reais e efetivas. Nesse sentido, uma teoria é prática na medida em que materializa, através de uma série de mediações, o que antes só existia idealmente, como conhecimento da realidade ou antecipação ideal de sua transformação. (Vazquez, 1977, p. 206) Se essa via hoje parece ser problemática, dada a supervalorização da teoria em detrimento da atividade cotidiana prática, considerando-se a infinitude do real e dos processos de expansão e de revisão do conhecimento, postos pelo fim do leninismo e a derrocada da União Soviética entre outros acontecimentos, o tema da práxis (que não se confunde com prática utilitária) pode ainda ajudar a pensar as relações entre conhecimento científico, prática social e saber docente, apesar da distância de tempo e dos novos desafios para a formação de professores no Brasil, até porque hoje somos menos arrogantes quanto ao poder da teoria na explicação e transformação do real. Considerando que até a primeira metade da década de 1980, a literatura educacional produzida está bastante marcada pela influência do marxismo nas leituras efetuadas por Kosik, Gramsci, Vazquez, entre outros, assistimos na segunda metade dessa década ao esforço de pensar a formação de professores para além das categorias de classe social, trabalho manual e trabalho intelectual, infra-estrutura e superestrutura, até porque o pessimismo pedagógico não havia estimulado a elaboração de trabalhos que apontassem “formas de organização escolar e práticas de sala de aula que pudessem favorecer a aprendizagem dos alunos de origem social desfavorecida” (Mello, 1993, p. 116).

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Alguns textos são expressões desse esforço por superar uma perspectiva conteudista stricto sensu como, por exemplo, a reflexão desenvolvida por Candau (1997) em torno aos novos rumos dos cursos de licenciatura.10 Trabalhando sobre algumas experiências desenvolvidas em unidades responsáveis pelo ensino da física, da história/geografia e da língua portuguesa, integrantes de instituições de ensino superior e médio de prestígio no Rio de Janeiro, Candau (1997) chama a atenção para os obstáculos que as universidades brasileiras precisam enfrentar na função de preparar consistentemente os professores para os sistemas de ensino: separação entre atividades de ensino e pesquisa, predomínio da lógica disciplinar em detrimento de uma prática interdisciplinar, supervalorização do lugar ocupado pelas faculdades de Educação em detrimento das unidades responsáveis pelo conteúdo específico. Pensando alternativas para os cursos de licenciatura, Candau defende o primado do conteúdo específico sobre o conteúdo pedagógico na formação do professor: A competência básica de todo e qualquer professor é o domínio do conteúdo específico. Somente a partir deste ponto é possível construir a competência pedagógica. Esta afirmação não implica a existência de uma relação temporal de sucessão, e sim de uma articulação epistemológica. É a partir do conteúdo específico, em íntima articulação com ele, que o tratamento pedagógico deve ser trabalhado. Enquanto as unidades específicas não assumirem como responsabilidade própria a formação de professores, muito pouco poderão fazer as unidades de educação. O que se propõe é uma nova concepção e uma reestruturação das relações de poder presentes nas licenciaturas. Do ponto de vista conceitual, parte-se do conteúdo específico para trabalhar a dimensão pedagógica em íntima relação com ele. Assume-se que a liderança deve ser da área específica com a colaboração íntima das unidades de educação. A responsabilidade deverá ser partilhada intimamente, mas o primado é da área de conteúdo específico. Somente a partir desta mudança de eixo, que suscitará certamente muitas resistências, será possível construir uma nova perspectiva para os cursos de licenciatura. (Candau, 1997, p. 46) Essa tomada de posição é importante porque revela a importância de se investir no saber disciplinar, sem o qual não se efetiva a atividade de transmissão de conhecimento, mesmo considerando-se que o que ensinar teria a primazia sobre o como ensinar. Levando-se em conta que, até então, a formação de professores vinha sendo analisada no plano político-pedagógico em sentido mais genérico, a proposta é provocadora, nesse momento, por duas razões. Primeiro, por deslocar o “centro de gravidade” da formação de professores para as unidades específicas, obrigando-nos a pensar em uma outra lógica que articula saber disciplinar e saber pedagógico, sugerindo que a natureza da formação é multidisciplinar e, portanto, mais complexa do que se supunha nas análises anteriores. Significou pensar o saber do professor como sendo proveniente de duas fontes (Tardif, Lessard e Lahaye, 1991) – conhecimento do conteúdo e conhecimento pedagógico –, embora sem a clareza do significado e do conteúdo do que se estava nomeando como conteúdo pedagógico. A segunda razão está na defesa da interdisciplinaridade ao enfatizar uma integração interna que, partindo do conteúdo específico em direção ao pedagógico, garantisse a articulação a partir de núcleos temáticos (Candau, 1997). Considerando que a formação de professores em cursos de licenciatura se constituiu historicamente em um esquema onde predominava uma total separação entre formação geral e formação pedagógica, a idéia de núcleos temáticos parece promissora, pois pode vir a romper com os “guetos” institucionais, muito fortes na estrutura universitária até hoje. E, mais, ao introduzir a dimensão epistemológica como eixo instituinte da formação de professores na premissa de que “o domínio consistente de uma área específica supõe uma adequada compreensão da construção do seu objeto, dos diferentes enfoques metodológicos possíveis e suas respectivas bases epistemológicas, de sua lógica e sua linguagem” (idem, p. 46).

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Mesmo se considerarmos que a afirmação do primado do conteúdo específico sobre o conteúdo pedagógico poderia estar representando a hierarquização entre os campos do conhecimento, derivando-se o pedagógico de uma ciência básica, o trabalho teve o mérito de chamar a atenção para as relações de poder existentes no interior da universidade entre os que pesquisam e os que ensinam, destacando a importância e a necessidade da investigação sobre o ensino no horizonte da superação de uma visão intuitiva ou meramente política sobre a transmissão/apropriação do conhecimento. Partindo da idéia de que a universidade de pesquisa admitiu formar professores como “espécie de tarifa que ela paga para poder fazer ciência em paz” (Menezes, 1986, p. 120), pensar a formação prévia de professores pela via da pesquisa empírica, na ótica disciplinar, representou um avanço, se considerarmos as resistências e problemas com que nos defrontamos institucionalmente na universidade. Considerando ainda que perspectivas de análise têm uma história, identifico nesse trabalho coordenado por Candau (1997), com os problemas que provoca – de natureza epistemológica, política, pedagógica – o fermento para pensar as políticas de formação de professores sem o “discurso sobre a teoria” tão freqüente entre os educadores. No balanço efetuado, contudo, com algumas exceções, chegamos à década de 1990 sem avançarmos sobre o conhecimento dos processos de ensino, de formação, presos a uma concepção de competência que pouco avançou sobre quem são os professores, o que sabem, o que não sabem, como ensinam, como aprendem, que problemas enfrentam no cotidiano de sua prática profissional. Talvez porque hoje sabemos que sabemos menos e essa consciência nos fez menos arrogantes, mas mais cuidadosos em definir, indicar um projeto para formação de professores, sem as fórmulas teóricas abrangentes que invadiram o campo da educação até bem pouco tempo. O significado da prática cotidiana na constituição dos saberes do professor Na perspectiva de que “a constituição de um grupo de incompetentes implica a constituição simultânea de um grupo de competentes” (Almeida, 1999, p. 6), assistimos, desde meados da década de 1980, à expansão de programas de formação continuada no pressuposto de que, através de conhecimentos provenientes da universidade, os docentes se equipariam de ferramentas teórico-metodológicas que lhes permitiriam refletir e modificar suas práticas (Lelis e Nunes, 2000). Sob a forma de cursos de rápida duração, de oficinas, esses cursos representaram a cisão entre os conhecimentos universitários e os saberes dos professores pois, salvo exceções, partiam (e chegavam) a uma perspectiva fragmentada do conhecimento, ao estabelecerem uma fratura entre a teoria (que passou a discurso) e a prática (substituída pela técnica) (Kramer, 1995). Herdeiros de uma pedagogia centrada na transmissão do saber elaborado, representaram um modelo “clássico” de formação, fundado na hegemonia teórica enquanto a explicação do real, sendo a teoria confundida com a verdade (Brandão, 1992), com o agravante de se fazer discurso sobre a teoria. Entretanto, na contramão desta tendência, sofremos também o impacto de uma literatura internacional que nos chegou nos primeiros anos da década de 1990, trazendo novos aportes à formação de professores. Seja pela via da ênfase na relação entre dimensão pessoal, profissional e organizacional da profissão docente (Nóvoa, 1992),11 seja pela via de que o saber docente provém de várias fontes e de que a prática cotidiana faz brotar o “saber da experiência” (Tardif, Lessard e Lahaye, 1991),12 ou ainda do habitus profissional como “gramática geradora de práticas” (Perrenoud, 1993),13 a fecundidade dessas propostas está, de um lado, na forte crítica à razão instrumental e, de outro lado, na valorização da prática individual e coletiva como lugar de aprendizagem dos conhecimentos necessários à existência pessoal, social e profissional (Dominicé, 1990). De certa forma, é o texto de Tardif, Lessard e Lahaye em 1991 que vem complexificar a lógica conteudista, ao afirmar que a relação dos docentes com o saber não se reduz à transmissão de conhecimentos já constituídos, sendo a prática, expressão de múltiplos saberes, incorporados

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em âmbitos, tempos, espaços de socialização diversos. Este texto contribuiu para a demarcação de um novo idioma pedagógico na consciência de que a prática profissional está marcada por uma trama de histórias, culturas que ultrapassam a dimensão pedagógica stricto sensu. Ou seja, sob ângulos diversos, estes autores ajudaram a pensar a constituição dos saberes dos professores, em um pauta diversa de uma pedagogia centrada no saber elaborado, ao refletirem sobre os limites da formação prévia e, nela, dos conhecimentos acadêmicos na constituição do saber docente; ao afirmarem a centralidade da instituição escolar enquanto locus de formação do magistério; ao revelarem a força da experiência escolar passada enquanto aluno no desenvolvimento da prática pedagógica; e, finalmente, ao assinalarem o caráter de improvisação a marcar o trabalho docente. De certa forma, esta produção efetuou a “curvatura da vara”, ao conferir à prática uma instância de produção do saber profissional, de outra latitude se comparado ao papel do conhecimento que provém da universidade. Ao problematizarem uma perspectiva centrada no saber acadêmico, estimulam o redimensionamento do sentido da teoria, tomando-a muito mais como hipótese, sendo a verdade considerada como processo, provisória e parcial (Brandão, 1992). Considerando que ainda não temos uma tradição em pesquisa acumulada sobre os saberes do professor, sobre a experiência cotidiana como lugar de construção de saberes, e que vivemos em um momento de clara hegemonia do projeto neoliberal no campo da educação, algumas questões colocam-se como desafiadoras: Que cuidados precisamos tomar para não privilegiarmos em excesso a realidade intra-escolar, micro-social, e perdermos com isto dimensões contextuais do trabalho docente no plano político social mais amplo? Como evitar o superdimensionamento do pedagógico, indiferente às diferenças sociais de gênero, classe social e etnia, tão fortes em nosso país? Como lidar com a dimensão cognitiva articulando-a à esfera das culturas com seus ritos, símbolos e mitos? Ou seja, trabalhar com a prática, social e profissional, como espaço de constituição dos saberes do professor, implica não perder de vista o universo cultural dos diferentes agentes sociais que fazem histórica e culturalmente a escola. Mas há ainda outras questões trazidas por este idioma pedagógico. Que cuidados precisamos tomar para não resvalarmos para um praticismo em migalhas, na relativização quanto ao lugar ocupado pela teoria? Sob que critérios operaremos com a prática profissional, de modo a torná-la um espaço de construção de saberes rigorosos sem serem rígidos? Como o saber do mundo da experiência sensível pode ser transposto para uma razão que se quer dialógica e processual? Se estas questões podem contribuir como bússolas em nossas pesquisas, certamente será a experiência prática e concreta, com a ajuda das lições do passado, que nos ajudará a buscar novos objetos, novos problemas, novos idiomas pedagógicos. Notas 1. A autora utiliza a categoria da mediação para se referir a “processos de fatos existentes na realidade objetiva, que são ações recíprocas, a trama das relações que ocorrem entre partes, forças, fenômenos de uma totalidade” (p. 24). 2. Para Mello (1982), Moscovici deixa claro que as representações não constituem apenas o reflexo, invertido ou não da realidade de um objeto social, sendo diferentes das imagens, tal como estas últimas são entendidas em psicologia social. O que dá especificidade às representações “é que em cada ator singular elas se constituem pela mediação de sua subjetividade, a qual configura um modo próprio de se apropriar, reelaborar e praticar idéias” (p. 40). 3. Para Lelis, no tecnicismo, a preocupação estava voltada para a mera instrumentalização técnica, estando a formação de professores orientada pelo domínio de comportamentos e habilidades observáveis e mensuráveis ( p. 44).

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4. A polêmica instalada expressou-se em dois textos publicados em Educação & Sociedade, números 14 e 15, provocados pela tese de Mello (1982): um primeiro, de Nosella (1983), problematizando a competência técnica como momento prévio do compromisso político, e um segundo, de Saviani (1983), comentando o texto de Mello (1981) e respondendo a Nosella na perspectiva de mediar um conflito em torno à função política da escola e sua mediação pela via da competência técnica. 5. Para Gadotti, a pedagogia dos conteúdos foi desenvolvida no Brasil por Dermeval Saviani, Guiomar Namo de Mello, José Carlos Libâneo e Carlos Roberto Cury, apoiados por autores como Georges Snyders, Makarenko, Bernard Charlot, Bogdan Suchodolski e Mario Manacorda; situa-se como uma das vertentes da pedagogia progressista (p. 92). 6. Para Saviani (1980), “passar do senso comum à consciência filosófica significa passar de uma concepção fragmentária, incoerente, desarticulada, implícita, degradada, mecânica, passiva, simplista a uma concepção unitária, coerente, articulada, explícita, original, intencional, ativa e cultivada” (p. 5). 7. A Pedagogia Crítico Social dos Conteúdos é um movimento que nasce da reunião de intelectuais em torno da Ande. Para Libâneo, um dos seus principais ideólogos, o nome PSCS tem sua inspiração na leitura de A mistificação pedagógica, de Bernard Charlot, obra com forte penetração entre os educadores. 8. O tema da formação do educador mobilizou o campo intelectual, expressando-se sobre a forma de publicações, encontros, seminários do norte ao sul do país, desde o início dos anos de 1980. Representava a oposição tanto ao especialista em conteúdo como ao técnico em educação (Pereira, 2000). 9. Entrevista de Libâneo, concedida por e-mail a alunos do programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira, em maio de 1999. 10. A pesquisa Novos Rumos da Licenciatura foi desenvolvida no período de 1985-1987 e contou com equipe constituída pelas professoras do Departamento de Educação da PUC-Rio Vera Maria Ferrão Candau (coord.), Menga Lüdke, Ana Waleska P. C. de Mendonça, Rosina Wagner e Yara Wall e alunos da pós-graduação. 11. Antonio Nóvoa foi um dos propulsores da tendência ao uso de histórias de vida na pesquisa sobre formação de professores, especialmente a partir da chegada, em 1992, da obra Vidas de professores, por ele coordenada. 12. Este artigo foi traduzido por Léa Paixão e publicado em 1991 na revista Teoria e Educação nº 4. Deve ser considerado um trabalho inaugural no campo do saber docente no Brasil, expressão de um programa de pesquisa que reúne pesquisadores de várias universidades canadenses, como Maurice Tardif, Clermont Gauthier, Claude Lessard, Danielle Raymond, entre outros. 13. Nosso primeiro contato com o pensamento de Philippe Perrenoud deu-se através do livro Práticas pedagógicas, profissão docente e formação: Perspectivas sociológicas, publicado pela Dom Quixote, em 1993.

FROM TEACHING THE CONTAINS TO TEACHER’S KNOWLEDGE: A CHANGE OF THE PEDAGOGIC IDIOM?

ABSTRACT: This work has the objective of to decipher a few tendencies of the intellectual production about teacher’s education in the last years in Brazil, bringing the attention to the “pedagogic idioms” which caused impact among educators. In “mapping” specialized literature, a few authors/texts were taken as examples for they represented the logic of thought, markly about the significance of the theory and practice in the teacher’s education. From the balance made, what was noticed, was a rupture from a pedagogy markly with contains to an epistemology of practice.

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Instituto Superior de Educaçaçãodo Vale do Juruena

Prof. Dr. Claudio Silveira Maia

Av. Gabriel Muller, 1065– Modulo 01 – Juina – MT – CEP 78320-000 www.ajes.edu.br – [email protected]

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