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Page 1: DIREITOS, DIREITOS. HUMANOS À PARTE? A EDUCAÇÃO … · à mera instrução unidirecional. É necessária sua aproximação com os Direitos Humanos no ... O papel da escola tradicional

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DIREITOS, DIREITOS. HUMANOS À PARTE? A EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS.

Autor: Bruno Alves de Sousa1 [email protected]

Professora-orientadora: Theresa Rachel Couto Correia2 [email protected]

Resumo

A educação é o principal ingrediente para produção do conhecimento. Não se limita, portanto,

à mera instrução unidirecional. É necessária sua aproximação com os Direitos Humanos no

tocante concretização fática destes. O compromisso da educação com a difusão desses

direitos é fundamental para a construção coletiva de uma nova realidade social.

Palavras- chave: Cidadania, Direitos Humanos e Educação.

Abstract

The education is the main ingredient to the knowledge production. It is not only based in

instructions. It´s necessary approach the Human Rights concerning to its effectivity in

practice. The commitment of the education with the dissemination of these rights is

fundamental to the collective construction of a new social reality.

Key-words: Citizenship, Human Rights and Education

1. Introdução.

Conceituar a educação em direitos humanos é, sem dúvida, um grande desafio.

Principalmente por abranger dois termos de caráter abstrato, quais sejam educação e direitos

humanos. Seria simplista traduzi-la tautologicamente como “uma educação voltada para os

direitos humanos”, pois não contemplaria a discussão sobre o modelo educacional mais

adequado, o enfoque direcionado à matéria e, primordialmente, o objetivo dessa interação.

1 Aluno da Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará (UFC) e membro do Núcleo de Assessoria Jurídica Comunitária (NAJUC), projeto de extensão da Universidade Federal do Ceará. 2 Professora da disciplina “Direitos Humanos e Acesso à Justiça” da Faculdade de Direito da UFC, Doutora em Direito Internacional e Integração Econômica pela UERJ, Bolsista de Pós- doutorado do programa PRODOC/CAPES da Pós-Graduação em Direito da UFC.

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É de fundamental importância ressaltar a opção terminológica pela preposição em à revelia da

preposição para, visto que nenhum processo educacional dialógico e humanista deve

intencionar um objetivo imediato, implicitamente sugerido no emprego desta e não daquela

palavra. Deve-se priorizar a discussão política, a construção coletiva e o cultivo de um senso

de responsabilidade a fim de que tal processo conduza a uma verdadeira transformação social

nunca antes vista.

O papel da escola tradicional tem sido a preparação intelectual dos educandos para que

assumam a posição correspondente na sociedade. O ensino é moldado previamente, sem

qualquer discussão metodológica com os destinatários desse suposto conhecimento, que é,

aliás, transmitido unilateralmente. Urge uma escola com viés transformador, preocupada em

lapidar o senso crítico dos sujeitos da educação, em articular saber popular e saber escolar e

em disseminar a cultura do diálogo e, sobretudo, da democracia.

2. Da educação que temos à educação que queremos.

O processo educativo compreende muito mais que a mera instrução, ou seja, o simples

repasse irrefletido de informações a serem concebidas como verdades. Abrange o alvorecer

das potencialidades artístico-culturais e das sensibilidades humanas. Educação lato sensu se

faz com afeto e com partilha de sentimentos, frustrações e anseios.

O Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, política pública cujo objetivo principal

dentre outros é contribuir para a efetivação de compromissos assumidos com relação à

educação em direitos humanos no âmbito dos instrumentos e programas internacionais e

nacionais, concebe que a educação é “tanto um direito humano em si mesmo, como um meio

indispensável para realizar outros direitos, constituindo-se em um processo amplo que ocorre

na sociedade”.

Por essa razão é relevante que esteja consagrado no diploma superior do ordenamento pátrio o

direito à educação. O debate que envolveu parcela significativa da sociedade civil à época da

elaboração da Constituição Brasileira de 1988 também levantou essa questão. Através de

emendas populares, as diversas associações defendiam suas propostas. A Emenda n. 49, por

exemplo, foi emitida pela Confederação de Professores do Brasil e por outras entidades e

propôs que “a educação, baseada nos princípios da democracia, da liberdade de expressão, da

soberania nacional e do respeito aos direitos humanos, é um dos agentes do desenvolvimento

da elaboração e reflexão critica da realidade, visando à preparação para o trabalho e a

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sustentação da vida”. Tal proposta resultou de deliberações do Fórum da Educação na

Constituinte em Defesa do Ensino Público Gratuito.

O texto aprovado na Constituição Federal foi o seguinte:

Art.205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e

incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa,

seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Apesar de estar bem aquém das aspirações populares, apresenta algumas semelhanças com o

dispositivo referente à educação na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Constata-se,

todavia, que mesmo o mandamento constitucional efetivamente aprovado não encontra

ressonância na prática. Aquela “visão bancária” da educação, há muito explanada por Paulo

Freire3, continua bastante atual. Segundo a teoria, “ o ‘saber’ é uma doação dos que se julgam

sábios aos que julgam nada saber. Doação que se funda numa das manifestações instrumentais

da ideologia da opressão- a absolutização da ignorância (...) segundo a qual esta se encontra

sempre no outro”.

Esse modelo tradicional pode ser comparado, fazendo as devidas ressalvas literárias, ao

adotado nas Unidades de Condicionamento do Estado, presentes na antológica obra de Aldous

Huxley Admirável Mundo Novo4. Segundo o Diretor da Unidade, tal concepção objetiva “o

espírito que julga, e deseja, e decide constituído por essas coisas sugeridas. Mas todas essas

coisas sugeridas são aquelas que nós sugerimos, nós! (...) Que o Estado sugere”. Percebe-se

que ao educando não é cabível discutir os métodos. Ele apenas reproduz conceitos e espera

bons resultados em avaliações. Tal prática mostra-se antiquada, pois supõe uma sociedade

estática que, de fato, não existe. Mesmo assim, essa concepção parece ainda ter uma adesão

de boa parte dos profissionais da educação, dos estabelecimentos de ensino e, mormente, dos

responsáveis diretos pela promoção das políticas públicas nacionais de educação, eivadas de

vícios próprios da sociedade da era neoliberal: a crença cega no modelo competitivo de ensino

e o desprezo por práticas pedagógicas que primem pela formas coletivas de (re) construção do

saber, havendo perfeita sintonia do saber acadêmico com o saber popular.

3 Professor referência em estudos da Pedagogia por publicações sobre o método de alfabetização para pequenos agricultores nordestinos, que leva o seu nome. Entre suas obras, destacam-se: Pedagogia do Oprimido, Pedagogia da Autonomia, Pedagogia da Esperança e outras. 4 Obra de ficção de Aldous Huxley escrita em 1932 sobre um futuro dominado por uma sociedade totalitária que

controla o saber científico.

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A função do educador é, conforme nos legou o epistemólogo J. Piaget5, estimular as relações

entre os educandos com dinâmicas do grupo, levando o aluno à plena autonomia e

preparando-o para a democracia. As atividades coletivas integram, fortalecem a prática

educativa participativa e fomentam o diálogo.

No modelo transformador, não a figura do educador e do educando, mas a do educador-

educando e do educando- educador, pois todos são igualmente aprendizes das realidades. Em

uma esclarecedora passagem de Pedagogia do Oprimido, consta que: “Ninguém educa

ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens se educam entre si, mediatizados pelo

mundo”6, numa demonstração inequívoca de que educação pressupõe construção coletiva,

participação ativa7.

A escola tem se mostrado alheia às discussões do contexto social circundante. Criou-se um

cotidiano escolar apartado da realidade, um “mundo auto-referido que ignora o cotidiano

social”8. Essa instituição tem favorecido a manutenção do status quo e acentuado as

profundas desigualdades sociais, especialmente na América Latina, quando poderia ser a

principal liderança na humanização do ensino e na difusão da cidadania. Em virtude disso,

defende-se outra escola. Uma escola democrática, que esteja também disposta a aprender com

o mundo e, inclusive, com quem sequer se escolarizou.

3. A contribuição dos direitos humanos para o despertar da consciência crítica.

A consciência universal sobre a importância dos direitos humanos e dos povos chegou a uma

nitidez nunca antes atingida. Nunca se proclamaram tão alto esses direitos e nunca foram tão

sistematicamente violados como nos nossos tempos. A reflexão dos uruguaios Aguirre e

Mosca9 é bastante lúcida. Não carece de maiores explicações. Há realmente um abismo entre

5 Epistemólogo do século XX que propiciou importantes contribuições para a Psicologia, como a descoberta de que o desenvolvimento mental tem como fulcro um construtivismo dialético, com bases biológicas. 6 Pensamento similar ao de Gramsci: “A relação entre professor e aluno é uma relação ativa, de vinculações recíprocas, e que, portanto, todo professor é sempre aluno e todo aluno, professor”(Concepção Dialética da História). 7 Sobre participação, ver O Que é Participação? de Juan Bordenave. Os conceitos de “fazer parte”, “ser parte”, “tomar parte” e “ter parte” estão dispostos numa interessante gradação de participação. 8 BARBOSA, Maria de Fátima, CANDAU, Vera Maria, MACIEL, Andréa Gasparini, MARANDINO, Martha, SACAVINO, Susana Beatriz. Oficinas Pedagógicas de Direitos Humanos. 4ª edição. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995. p. 110 9 Ver MOSCA, J. J. & AGUIRRE, L. P. Direitos Humanos: pautas para uma educação libertadora. Petrópolis, RJ: Vozes, 1990.

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a teoria e a prática. Por quê? Como solucionar esse disparate? O caminho passa naturalmente

pelo processo educativo, contudo não se restringe a ele.

Está evidenciado que não foi suficiente a luta histórica pela aprovação da Declaração

Universal dos Direitos Humanos em 1948. Esse marco na cronologia histórica do século XX

não representou grandes mudanças nas sociedades. Mais e mais direitos são descobertos,

reivindicados e até positivados10 em diplomas internacionais assinados por uma gama de

países, enquanto antigos direitos são sistemática e diuturnamente violados.

“Não é suficiente que estejam declarados e escritos. Devemos torná-los realidade em nós

mesmos e nos nossos povos”, comentam os escritores uruguaios. Esse excerto traz à discussão

um elemento importante: o juízo de co-responsabilidade de todos para a promoção e o alcance

dos direitos humanos, que se ultima com a felicidade.

Numa suave crítica ao modelo tradicional de ensino-aprendizagem, Dornelles expõe que para

a concretização dessas garantias “é fundamental a conquista de espaços democráticos nos

quais os princípios dos direitos humanos passem a povoar a existência das pessoas”11, isto é, a

vivência deve ser um componente do aprendizado.

“Propor os Direitos Humanos como horizonte significa que o fundamento moral da

convivência é deslocado. Já não se trata daquilo que está antes e que é preciso defender, mas

daquilo que está depois e que se há de construir”12. É particularmente interessante a

observação de Perez Esquivel no tocante ao fenômeno de violação dos direitos fundamentais.

Sob tal ótica, vislumbra-se uma luta em prol da construção futura de uma nova conjuntura,

deixando de lado o caquético debate encimado da leitura fria e hermética dos artigos da

Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Na área dos direitos humanos, apesar de outras correntes defenderem o contrário, ainda há

novos direitos a serem conquistados, pois a realidade é dinâmica. Contemporâneos a esses

novos direitos, estarão antigos estigmas e marginalizações a serem superadas no curso da

história. No caso brasileiro, em especial, existem direitos que simplesmente precisam ser

cumpridos, afim de que as maiores populares gozem de melhores condições de vida.

10 Diz-se positivado daquilo passou a constar como lei (Direito Positivo). 11

Cit. DORNELLES, J. R. W. O Que São Direitos Humanos. São Paulo: Brasiliense, 1989. 12 Cit. ESQUIVEL, Perez. Trabalho apresentado na Conferência Internacional sobre “La Transición a um Nuevo Orden Internacional”. México, 1981, in: ALDUMATE, J. (org.). Direitos Humanos. Direitos dos Pobres. Rio de janeiro: Vozes, 1990.

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4. Educação e direitos humanos: uma aproximação necessária.

Preliminarmente, conforme Mosca e Aguirre muito bem elucidaram, deve-se indagar

“Podemos educar para os Direitos Humanos? Talvez alguns respondam, rapidamente que sim.

Nós- a partir da experiência histórica- achamos que não é impossível, mas tampouco é fácil.

Inicialmente é necessário conhecer os direitos e admitir que o seu conhecimento não se limite

ao mero enunciado dos 30 artigos da Declaração Universal, mas que implica no

descobrimento e na prática de certas atitudes complexas e exigentes”13.

Boa parte dos próprios educadores não foi educada em direitos humanos. Há um

desconhecimento grosseiro da legislação e mesmo da viabilidade prática de se ensinar (na

verdade de se discutir) Direitos Humanos na escola. Seria necessário então que, inicialmente,

os professores passassem por uma espécie de auto-educação no intuito de refletir, por

exemplo, sobre possíveis atitudes autoritárias na sala de aula.

Não é toda e qualquer forma de educação que se amolda para os objetivos da educação em

direitos humanos. Certo tipo de educação é necessário para que se aprenda a pensar de forma

autônoma e solidária na transformação da sociedade. Seguramente, deve ser amparada por

uma perspectiva dialógica e inclusiva, sem desperdiçar a contribuição de qualquer pessoa.

Afinal, na sagaz conclusão dos referidos autores uruguaios: “Todos somos especialistas do

humano, ou indigentes”. Nunca se deve perder de vista os objetivos de uma educação.

Discutindo pedagogicamente o modelo adequado de educação em direitos humanos e o know-

how, Sime ilustra com a defesa de três pedagogias: da indignação, da admiração e das

convicções firmes14.

Acerca da primeira, assevera que “(...) deve ser uma pedagogia da indignação e não da

resignação. Não queremos formar seres insensíveis e sim capazes de se indignar e de se

escandalizar, diante de toda forma de violência, de humilhação. A atividade educativa deve

ser o espaço onde expressamos e partilhamos esta indignação através de sentimentos de

rebeldia pelo que está acontecendo”. Eis a visão de educação lato sensu, compromissada

ideologicamente com a humanidade.

13 Cit. MOSCA, J. J. & AGUIRRE, L. P. Direitos Humanos: pautas para uma educação libertadora. p.19 14 Ver SIME, L. Derechos Humanos y Educación. In: Educar em Derechos Humanos: Reflexiones a partir de La Experiencia. Peru: Comisión Episcopal de Acción Social e outros, 1991.

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A educação em direitos humanos não deve, em hipótese alguma, ser neutra. Deve estar do

lado dos mais indefesos e oprimidos, que não passam de população amostral para as

estatísticas. Nas palavras de Sime, é preciso “transformar nossa cólera em denúncia e não em

silêncio”.

Em relação à segunda, diz ser “(...) um convite a criar espaços para partilhar a alegria de

viver. Alegramo-nos porque vamos descobrindo que existem pequenos germens de uma nova

cotidianidade, porque nos admiramos de como mudamos e de como outros mudaram ou

querem mudar”. Explora a motivação enquanto motor da transformação, o gosto pelas

pequenas coisas da vida, ao passo que se amplia a conscientização por parte dos animadores

da causa humana de sua inserção nos rumos da história.

A última, por sua vez, tem como eixo central a vida cotidiana e trabalha a dimensão ética da

educação. Por fim, a educação em direitos humanos prescinde da prática desses no cotidiano.

Com base nesse expediente teórico, assevera-se que é necessário desempenhar essas

atividades de cunho cumulativamente informativo e emotivo, uma vez que diz respeito à

formação integral do indivíduo, recorrendo, pois, aos apelos de ordem racional e sensível.

Para isso, a forma mais aconselhável de difusão dessa prática tanto nos meios formais de

educação quanto nos informais seria através da realização de oficinas pedagógicas.

Seriam as oficinas os espaços de identificação, questionamento e reconstrução do

conhecimento segundo as mais diversas óticas. Uma aula de História, por exemplo, seria

apartada da visão tradicional da polarização professor- alunos. Em seu lugar, poder-se-ia

ambientar a sala de aula como uma plenária em que todos tivessem direito de voz e pudessem

expressar suas impressões sobre determinado assunto que conheceram não nas páginas de um

livro, mas que vivenciam na própria pele. A aula sobre escravidão no Brasil não

necessariamente deveria reverenciar a sacra figura da Princesa Isabel como libertadora dos

escravos. Poderia começar com uma indagação: somos realmente livres? Por que um dia se

falou em liberdade? O papel do professor seria desenvolver nos educandos a motivação para o

debate, com questões em nada alheias às suas realidades históricas. Seria a gestação de uma

tomada de consciência coletiva.

Nesse sentido, é válido lembrar ainda que as dinâmicas de grupo devam permear os mais

diversos espaços de discussão. O propósito é criar nos educandos um senso de coletividade,

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de companheirismo sadio e de respeito ao outro, independente das divergentes convicções

pessoais.

Deve-se pensar numa ambientação espacial que sinalize a abertura para o franco debate. A

sala de aula com as cadeiras enfileiradas não proporcionam tal sensação. Por isso, a

disposição das cadeiras em círculo passa a impressão de que todos têm igual relevância, visto

que todos eqüidistam do centro em igual distância e ninguém está no centro das atenções. O

professor tem mera “participação enzimática” no processo.

Conclusões

A educação contribui imensamente na sensibilização para a causa dos Direitos Humanos

desde que seja pautada pelo coletivismo, pelo apego à reflexão crítica da realidade, pela

dessacralização da figura do professor como o detentor do conhecimento e dos alunos como

meros “depósitos” a se encher com determinadas informações numa relação alienante.

Privilegia a participação ativa e a constante interação entre a teoria e a prática.

Falar de direitos humanos sem que se vivencie na prática a sua incidência é infrutífero.

Igualmente ineficaz é tentar dialogar com crianças e adolescentes durante a sensibilização-

reflexão em Direitos Humanos sem ter o devido cuidado de considerá-los sujeitos de direitos

e deveres e de contextualizá-los enquanto tais. Afinal, eles também são portadores de direitos

e deveres.

A educação em direitos humanos não é monopólio das escolas, mas de demais instituições

como a família, as agremiações políticas, as organizações-não-governamentais, entre outras.

Qualquer atividade ou gesto desenvolvido em prol da disseminação dos Direitos Humanos,

mínimos que pareçam, são de grande valia. É válido lembrar o ensinamento de Leonardo

Boff15 quando se refere às mínimas atitudes do cotidiano que contribuem para a paz mundial:

“Eis a força invencível do pequeno”16.

15 Escritor, teólogo, professor de teologia por mais de vinte anos em Petrópolis com os franciscanos. São alguns de seus livros publicados: O despertar da águia, Jesus Cristo Libertador e A águia e a galinha, uma metáfora da condição humana. 16 BOFF, Leonardo. Ética e Moral: a busca dos fundamentos. p. 96

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