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DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II Prof. Rogério Sanches _______________________________________________________________________________________________________2010 1 DIREITO PENAL ESPECIAL Aula 01-15 - 09/09/2010 HOMICÍDIO Conceito: é a injusta morte de uma pessoa praticada por outrem. Homicídio, segundo Nelson Hungria, nada mais é senão o tipo central de crimes contra a vida. É o ponto culminante na orografia dos crimes (“o ponto mais alto da montanha”). É o crime por excelência. Prevê nosso Código várias modalidades do crime , a saber: a) O art. 121, caput traz o homicídio doloso simples; b) O § 1.º traz o homicídio doloso privilegiado; c) O § 2.º traz o homicídio doloso qualificado; d) O § 3.º traz o homicídio culposo; e) O § 4.º traz as majorantes de pena; f) O § 5.º traz o perdão judicial. E o homicídio preterdoloso, onde se encontra? R- No art. 129, § 3.º. É sinônimo de lesão corporal seguida de morte. Não vai a júri porque não é doloso contra a vida, mas tal é amplamente criticado pela doutrina. O homicídio é o tipo normal da doutrina causalista, ou seja, apenas têm elementos objetivos. O homicídio é um crime comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa, sozinha ou em concurso.

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DIREITO PENAL ESPECIAL Intensivo II

Prof. Rogério Sanches _______________________________________________________________________________________________________2010

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DIREITO PENAL ESPECIAL

Aula 01-15 - 09/09/2010

HOMICÍDIO

Conceito: é a injusta morte de uma pessoa praticada por outrem.

Homicídio, segundo Nelson Hungria, nada mais é senão o tipo central de crimes contra a

vida. É o ponto culminante na orografia dos crimes (“o ponto mais alto da montanha”).

É o crime por excelência.

Prevê nosso Código várias modalidades do crime , a saber:

a) O art. 121, caput traz o homicídio doloso simples;

b) O § 1.º traz o homicídio doloso privilegiado;

c) O § 2.º traz o homicídio doloso qualificado;

d) O § 3.º traz o homicídio culposo;

e) O § 4.º traz as majorantes de pena;

f) O § 5.º traz o perdão judicial.

E o homicídio preterdoloso, onde se encontra?

R- No art. 129, § 3.º. É sinônimo de lesão corporal seguida de morte. Não vai a júri porque

não é doloso contra a vida, mas tal é amplamente criticado pela doutrina.

O homicídio é o tipo normal da doutrina causalista, ou seja, apenas têm elementos

objetivos.

O homicídio é um crime comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa, sozinha ou

em concurso.

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A doutrina questiona se irmãos xifópagos (ligados pelo mesmo apêndice) podem ser

sujeito ativo de homicídio.

A primeira coisa que se tem que notar é se é possível a separação cirúrgica desses irmãos.

A doutrina tem dois posicionamentos:

1. A primeira corrente afirma que o irmão que teve a intenção de realizar o homicídio

deve ser absolvido. Isso porque deve-se evitar o recolhimento prisional de um

inocente, ou seja, do outro irmão. Conflitando o interesse do Estado ou da

sociedade com o da liberdade individual, esta é que tem de prevalecer.

(Euclídes da Silveira).

2. A outra corrente afirma que o irmão que teve a intenção de realizar o homicídio

deve ser condenado. Porém, só cumpre a pena se o outro irmão vier a praticar um

outro crime. Entende que deve ser evitada a ofensa do princípio da personalidade

da pena, ou seja, a pena não pode passar da pessoa do condenado

(Flávio Monteiro).

Aníbal Bruno e Basileu Garcia discutiam se extraterrestre podia ser sujeito ativo ou passivo

de homicídio.

Pode ser sujeito passivo de homicídio o ser humano, ou seja, qualquer pessoa nascido de

mulher.

No caso dos irmãos xifópagos, Cezar Roberto Bittencourt traz a doutrina acerca do tema.

O agente atira e quer matar apenas um deles, mas pelo fato de haver só um coração, os

dois morrem. Nesse caso, o agente queria matar apenas um, mas matou os dois. Com

relação ao que o agente quis matar, pratica homicídio doloso. Já com relação ao outro

irmão, o qual o agente não queria matar, tem-se dolo de segundo grau. Assim, responde

pelo segundo irmão por homicídio, porém, com dolo de segundo grau.

Há um concurso formal impróprio, já que se tem uma única com dois resultados e com

desígnios autônomos.

Para Magalhães Noronha o Estado é vítima, ao lado da pessoa humana do crime de

homicídio, pois tem interesse na conservação da vida humana, condição de existência

do próprio Ente Estatal.

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Se a vítima for o Presidente da República, o Presidente do Senado ou da Câmara dos

Deputados ou do Supremo Federal?

O art. 29 da Lei de Segurança Nacional , Lei nº7.170/83, diz que, nesse caso, a pena é de

reclusão de 15 a 30 anos. Lei nº 7.170 / 1983 Art. 26 - Caluniar ou difamar o Presidente da República, o do Senado Federal, o da Câmara dos Deputados ou o do Supremo Tribunal Federal, imputando-lhes fato definido como crime ou fato ofensivo à reputação. Pena: reclusão, de 1 a 4 anos. Art. 29 - Matar qualquer das autoridades referidas no art. 26. Pena: reclusão, de 15 a 30 anos.

Assim, o crime pode ser homicídio (art. 121 do CP) ou crime previsto na Lei de Segurança

Nacional.

Se o agente pratica o crime sem motivação política, responde pelo art. 121 do CP. Mas se

há motivação política, responde pelo art. 29 da Lei de Segurança Nacional.

No caso do art. 121 do CP, há júri e no caso do art. 29 da LSN o julgamento é feito pelo

juízo monocrático, porque é crime contra a segurança nacional e não doloso contra a

vida.

Art. 121. Matar alguém: Pena - reclusão, de seis a vinte anos.

Esse artigo pune o fato de se tirar a vida de alguém. É a vida extra-uterina.

Se se tira a vida intra-uterina de alguém, se pratica aborto. Mas se a vida é extra-uterina,

se pratica homicídio ou infanticídio.

A linha divisória que separa o aborto do homicídio ou infanticídio é representada pelo

início do parto. Há três correntes que tratam do início do parto:

A primeira corrente entende que o parto tem início com o completo e total

desprendimento do feto das entranhas maternas (Alfredo Molinário);

Para a segunda corrente, o parto tem início desde as dores do parto (Soler).

A terceira corrente entende que o parto se inicia com a dilatação

do colo do útero (Magalhães Noronha).

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Em tese, tem prevalecido a terceira corrente, mas há mulheres que precisam fazer

cesariana porque não têm dilatação. Assim, não se pode dizer qual corrente prevalece.

Para que haja um homicídio, a vida deve ser viável, ou seja, existe homicídio mesmo que

se trate de vida não viável? Eutanásia é crime?

Para que haja crime não é necessário que se trate de vida viável (vitalidade, capacidade

de vida autônoma), bastando a prova de que a vítima nasceu viva e com vida estava no

momento da conduta criminosa do agente. No Brasil, a eutanásia é crime.

O crime de homicídio pode ser praticado de forma livre, podendo ser praticado por ação

ou omissão, por meios diretos ou indiretos.

Assim, o homicídio pode ser punido por dolo direto ou eventual, não exigindo do agente

qualquer motivação específica. Dependendo do motivo, da finalidade, pode-se estar

diante de um privilégio ou qualificadora, mas não deixando o homicídio de ser doloso. O

motivo pode interferir na pena, mas não no crime.

Consumação do crime de homicídio:

Com a morte (delito material ou de resultado naturalístico). Esta ocorre, de acordo com a

Lei 9.434/97 (Art. 3º), quando há a cessação da atividade encefálica.

Art. 3º A retirada post mortem de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano destinados a transplante ou tratamento deverá ser precedida de diagnóstico de morte encefálica, constatada e registrada por dois médicos não participantes das equipes de remoção e transplante, mediante a utilização de critérios clínicos e tecnológicos definidos por resolução do Conselho Federal de Medicina. § 1º Os prontuários médicos, contendo os resultados ou os laudos dos exames referentes aos diagnósticos de morte encefálica e cópias dos documentos de que tratam os arts. 2º, parágrafo único; 4º e seus parágrafos; 5º; 7º; 9º, §§ 2º, 4º, 6º e 8º, e 10, quando couber, e detalhando os atos cirúrgicos relativos aos transplantes e enxertos, serão mantidos nos arquivos das instituições referidas no art. 2º por um período mínimo de cinco anos. § 2º Às instituições referidas no art. 2º enviarão anualmente um relatório contendo os nomes dos pacientes receptores ao órgão gestor estadual do Sistema único de Saúde. § 3º Será admitida a presença de médico de confiança da família do falecido no ato da comprovação e atestação da morte encefálica.

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É possível a tentativa no crime de homicídio, pois é crime plurissubisistente, que admite o

fracionamento da execução em vários atos.

Mas isso ocorre mesmo no caso de dolo eventual?

Para a maioria da doutrina sim. Isso porque querer ou aceitar o crime, ambos denotam a

vontade do agente.

O homicídio simples é hediondo?

Pode ser, quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio. Art. 1.º da Lei

8.072/90:

A chacina é um exemplo de grupo de extermínio.

Mas quantas pessoas devem compor o grupo de extermínio?

A primeira corrente afirma que devem ser três pessoas, não se confundindo com

bando ou par.

A segunda corrente afirma que grupo deve ser equiparado a bando, ou seja, deve

haver no mínimo quatro pessoas.

Paulo Rangel afirma que homicídio praticado em atividade de extermínio não pode ser

qualificado como homicídio simples. Assim, na prática tal é inalcançável.

Esse homicídio com grupo de extermínio era chamado por Mirabete de homicídio

condicionado, porque há uma condição necessária para que se torne hediondo.

Homicídio Privilegiado:

É caso de diminuição da pena sendo direito subjetivo do condenado.

Art. 121 (...) § 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, ou juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.

Há nesse dispositivos três privilegiadoras, causas de diminuição de pena:

a) praticar o crime impelido por motivo de relevante valor social:

Relevante valor social significa matar para atender a interesse da coletividade.

A doutrina elenca como exemplo o fato e se matar um traidor da pátria ou perigoso

bandido que aterroriza a comunidade.

O valor aqui deve ser relevante. Caso não seja relevante, não há o privilégio.

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b) matar impelido por motivo de relevante valor moral:

Significa matar alguém para atender interesse particular, porém ligado aos sentimentos de

compaixão, misericórdia ou piedade.

Ex: eutanásia. Inclusive, está na exposição de motivos do CP.

“o projeto entende significar o motivo que, em si mesmo, é aprovado pela moral prática,

como, por exemplo, a compaixão ante o irremediável sofrimento da víitima (caso do

homicídio eutanásico)” item 39.

O valor aqui deve ser relevante. Caso não seja relevante, não há o privilégio.

Não se pode confundir eutanásia (antecipação da morte natural) com ortotanásia, termo

que indica hipótese em que paciente com doença irreversível, irrecuperável, deixa de ser

submetido a suporte artificial de vida (interrompe-se sobrevida artificial).

Para o MP de SC a ortotanásia é crime também.

c) homicídio emocional:

Requisitos:

domínio de violenta emoção:

Domínio não se confunde com a mera influência. O domínio é uma mera

atenuante. A diferença está relacionado ao grau, já que o domínio é mais

absorvente. A influência é mais passageira. A mera influência é uma circunstância

atenuante d epena do Art. 65, inciso III, alínea “c” do CP.

reação imediata:

Reação sem hiato temporal. Até quando a reação se considera imediata? Qual o

hiato temporal? A doutrina entende que é a reação sem intervalo, sem hiato

temporal. A jurisprudência resolveu fazer a seguinte conclusão: será considerada

imediata qualquer reação sob o domínio de violenta emoção.

injusta provocação da vítima:

Não significa crime, a vítima pode praticar um ato que não necessariamente

configura crime. Ex.: adultério – marido que colhe a esposa em flagrante adultério.

A injusta provocação da vítima pode ser dirigida contra terceiros. O agente

homicida não precisa ser a pessoa provocada. Ex: matar o estuprador da filha.

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Comunicabilidade do privilégio:

O privilégio se comunica com autores e partícipes? Ex: o homem para matar o estuprador

da filha pede ajuda do vizinho. Este responde também por homicídio privilegiado?

Para se responder a essa pergunta deve-se decidir se as privilegiadoras são circunstâncias

ou elementares. Depois, se são subjetivas ou objetivas.

Circunstâncias são dados que agregados ao tipo penal, influenciam na pena;

elementares são dados que agregados ao tipo penal influenciam na tipificação.

Ex: a violência na subtração é um dado elementar, já que acrescentado ao tipo muda-o

de furto para roubo. Já no homicídio a interferência é só na pena.

Assim, no homicídio estamos a tratar de circunstâncias. Nos termos do art. 30 do CP, as

circunstâncias só se comunicam se forem objetivas.

Art. 30 - Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime. Circunstância subjetiva é aquela relacionada ao estado anímico do agente, motivo do

crime ou condição pessoal do sujeito; é circunstância objetiva quando relacionada ao

meio/modo de execução.

O privilégio é circunstância subjetiva, ou seja, é incomunicável a coautores e partícipes.

No caso do vizinho do pai que matou o estuprador, responde por homicídio sem o

privilégio.

O privilégio no homicídio (§ 1.º do art. 121 do CP) é uma faculdade do juiz ou direito

subjetivo do réu? Prevalece que é direito subjetivo do réu, sendo discricionário do juiz

apenas o quantum da redução da pena, que pode variar de um sexto a um terço.

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Homicídio qualificado: § 2° Se o homicídio é cometido: I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe (abjeto, ignóbil, vil – espelha, muitas vezes, ganância); II - por motivo fútil; III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum; IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido; V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime: Pena - reclusão, de doze a trinta anos.

O homicídio qualificado é sempre crime hediondo.

São cinco qualificadoras:

a) motivo torpe:

I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe;

É uma qualificadora subjetiva.

Motivo torpe é o motivo vil, ignóbil, repugnante e abjeto. Em apertada síntese, é o

homicídio mediante ganância, pois quase sempre está ligada a ela.

É o chamado homicídio mercenário por mandato remunerado.

O legislador faz aqui uma interpretação analógica. O legislador começa com exemplos e

encerra de forma genérica, fazendo com que o juiz encontre outros casos que com o

exemplo se assemelha (caso de interpretação analógica).

O homicídio é um crime monossubjetivo, ou seja, pode ser praticado por uma ou mais

pessoas. Mas existe uma exceção, que é o caso do homicídio mercenário, que é

plurissubjetivo. Significa dizer que só pode ser praticado por pluralidade de agentes.

Necessariamente se tem o mandante e o executor.

A qualificadora incide apenas para o executor ou também para o mandante?

Prevalece na jurisprudência que estamos diante de uma elementar subjetiva

comunicável. É a posição do STJ. Assim, responde pela qualificadora mandante e

executor (também chamado de “sicário”).

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Mas a doutrina moderna diz que é uma circunstância subjetiva incomunicável. Ex: torpeza

é ganância. O pai não tem coragem de matar o estuprador da filha e contrata alguém.

Ele não age por ganância, logo não deve responder pela torpeza.

O CESPE entende que a posição que deve ser seguida é a do STJ.

1ª Corrente: trata-se de elementar subjetiva comunicável ao mandante (esta

corrente é a que prevalece inclusive nos tribunais superiores);

2ª Corrente: trata-se de circunstancia subjetiva incomunicável ao agente (Rogério

Greco). HABEAS CORPUS Nº 99.144 - RJ (2008/0015031-9) EMENTA HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO MEDIANTE PAGA. EXCLUSÃO DEQUALIFICADORAS. INVIABILIDADE. PAGA OU PROMESSA DERECOMPENSA. COMUNICABILIDADE. RECURSO QUEIMPOSSIBILITOU A DEFESA DA VÍTIMA. REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. 1. No homicídio mercenário, a qualificadora da paga ou promessa derecompensa é elementar do tipo qualificado e se estende ao mandante e ao executor. 2. Para se excluir a qualificadora do recurso que impossibilitou adefesa da vítima é indispensável o revolvimento do materialfático-probatório, o que é vedado na via do habeas corpus . 3. Ordem denegada.

A paga ou promessa de recompensa é necessariamente de natureza econômica?

Prevalece que a paga ou recompensa só pode ser de natureza econômica.

Mas o crime pode ser de outra natureza torpe. Ex: matar modelo concorrente da outra

mediante promessa se sexo. Esse exemplo não cai na paga ou promessa de recompensa,

mas continua sendo torpe, porque cai na parte final do inciso.

O ciúme e a vingança configura torpeza? Depende do que os motivou.

b) motivo fútil:

É uma qualificadora subjetiva.

Fútil: o móvel do crime apresenta real desproporção entre o delito e a sua causa moral.

É a pequeneza do motivo.

Ex: briga de trânsito.

Não se pode confundir motivo fútil com motivo injusto. Injusto todo crime é. A injustiça é

própria de qualquer delito.

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A ausência de motivos qualifica o crime?

a primeira corrente diz que se o motivo fútil qualifica, também qualifica o crime

com ausência de motivos, com mais razão ainda. Ora, se o motivo pequeno

qualifica, o que dirá matar sem motivo algum.

Essa corrente prevalece na jurisprudência.

a segunda corrente afirma que motivo fútil não se confunde com ausência de

motivos. Assim, se se quiser abranger a ausência de motivos, está-se fazendo uma

analogia in malam partem, já que o dispositivo legal não prevê o homicídio

cometido por ausência por motivos (Cezar Roberto Bitencourt).

AULA 02-15 EM 17/09/2010

c) meio cruel:

III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou

cruel, ou de que possa resultar perigo comum;

É uma qualificadora objetiva.

Aqui, também há uma interpretação analógica, já que o legislador dá exemplos e

termina o inciso de forma genérica.

O crime com emprego de veneno é chamado de venefício. Veneno é a substância,

biológica ou química, animal, mineral ou vegetal, capaz de perturbar ou destruir as

funções vitais do organismo humano.

Magalhães Noronha entende que o açúcar para o diabético é um veneno. Ainda,

qualquer substância a que a vítima seja alérgica.

Só incide a qualificadora do veneno se este for ministrado insidiosamente, sem que a

vítima saiba.

O agente chega no bar, coloca a arma na cabeça da vítima e manda ela tomar um

veneno. O homicídio é simples ou qualificado?

R - Não há a qualificadora do emprego de veneno, mas incide a que dificultou a defesa

da vítima. Logo, continua o homicídio sendo qualificado, mas por outro motivo que não o

emprego de veneno.

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d) modo surpresa

IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou

torne impossível a defesa do ofendido;

É uma qualificadora objetiva.

Aqui, o legislador também utilizou da interpretação analógica.

Traição: é ataque desleal, repentino e inesperado (Ex.: atirar na vítima pelas costas

ou durante o sono).

Emboscada: pressupõe ocultamento do agente que ataca avítima com surpresa.

Denota essa circunstância maior covardia e perversidade por parte do

delinquente.

Dissimulação: significa fingimento, disfarçando o agente a sua intenção hostil,

apanhando a vítima desatenta e indefesa.

A premeditação qualifica o crime de homicídio?

R – Não. A premeditação, por si só, não qualifica o homicídio.

Matar criança de tenra idade ou idoso, gera essa qualificadora?

R - Não, porque o que qualifica é o recurso utilizado pelo agente. A idade da vítima não é

um recurso do agente, mas uma qualidade dela.

Assim, a idade da vítima, tenra ou avançada, por si só, não qualifica o crime, pois não é

recurso procurado ou utilizado pelo agente.

e) fim especial:

V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime:

É uma qualificadora subjetiva.

Aqui, é o caso do homicídio qualificado pela conexão. O agente mata pensando em

outro crime.

Há os seguintes tipos de conexão:

teleológica: o agente mata para assegurar a execução de crime futuro.

consequencial: o agente mata para assegurar vantagem, impunidade ou

ocultação de crime passado, pretérito.

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Exs: agente mata segurança de modelo para estuprá-la. É o caso de homicídio

qualificado pelo conexão teleológica.

Mas se o agente, depois de estuprá-la, a mata, é o caso de homicídio qualificado pela

conexão consequencial.

O Brasil pune a conexão ocasional (por ocasião de outro crime)?

R- Não significa matar para assegurar crime, mas matar por ocasião de um crime, sem

vínculo finalístico entre o homicídio e o outro crime. A conexão ocasional não qualifica o

homicídio.

Para qualificar o crime pela conexão teleológica ou consequencial, o crime tem que ser

ou ter sido praticado pelo homicida, ou seja, deve ter a mesma pessoa cometido os dois

crimes?

R - Tal não é imprescindível. Pode-se matar para assegurar o cometimento de crime futuro

que será cometido por outrem. Não se precisa reunir a autoria dos dois crimes na mesma

pessoa.

Para incidir a conexão teleológica, o crime futuro deve necessariamente ocorrer?

R - O que qualifica o homicídio nesse caso não é a ocorrência do crime futuro, mas a

finalidade que levou o agente a alguém. Assim, dispensa-se a ocorrência do crime futuro

para qualificar o homicídio. Aliás, se ocorrer o crime futuro, haverá concurso material de

crimes.

Se o agente mata para assegurar a execução de uma contravenção penal, não incide

esta qualificadora, mas podem incidir outras, como o motivo fútil ou o motivo torpe.

É correta a expressão “homicídio dupla ou triplamente qualificado”?

R - Não, o homicídio ou é simples ou qualificado. Este, pode ter a incidência de várias

qualificadoras.

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No caso de incidirem várias qualificadoras, há divergência na doutrina:

uma corrente entende que as demais qualificadoras devem incidir como

circunstâncias judiciais desfavoráveis na fixação da pena base (Art. 59 do CP).

outra corrente entende que as demais qualificadoras devem ser utilizadas como

agravantes de pena, pois todas estão previstas no artigo 61 do CP(as mais recentes

decisões do STF estão de acordo com esta corrente).

O juiz usa uma qualificadora para aplicar a pena do homicídio qualificado e, quanto às

demais, adota uma das duas correntes acima explicadas.

Homicídio Qualificado Privilegiado:

É possível desde que a qualificadora seja objetiva. O homicídio qualificado quando

privilegiado desde de ser Hediondo para a maioria.

O § 1º traz as privilegiadoras:

Motivo de relevante valor social,

Motivo de relevante valor moral e a

Emoção.

O § 2º traz qualificadoras e prevê cinco qualificadoras:

Motivo torpe – subjetiva (ligada ao motivo)

Motivo fútil – subjetiva (ligada ao motivo)

Meio cruel – objetiva (ligada ao modo de execução)

Modo surpresa – objetiva (ligada ao modo de execução)

Fim especial – subjetiva (ligada ao motivo)

Vimos que o que está grifado é objetivo e o resto é objetivo. E vocês vão aplicar a

lei da física que diz que os iguais se repelem. Os opostos se atraem. Então, só é possível

homicídio qualificado privilegiado se a qualificadora for de natureza objetiva.

Qualificadora de natureza subjetiva não coexiste com privilégio.

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Homicídio Culposo: Art. 121, § 3.º: § 3º Se o homicídio é culposo: (Vide Lei nº 4.611, de 1965) Pena - detenção, de um a três anos.

Admite a suspensão condicional do processo porque é infração de médio potencial

ofensivo.

Ocorre homicídio culposo quando o agente, com manifesta imprudência negligência ou

imperícia, deixa de empregar a atenção ou diligência de que era capaz, provocando,

com sua conduta, o resultado morte, previsto (culpa consciente) ou previsível (culpa

inconsciente), porém jamais querido ou aceito.

Existe no direito penal compensação de culpas?

R- Não, mas não existe a culpa concorrente da vítima pode atenuar a responsabilidade

do agente.

Homicídio culposo na direção de veículo automotor: Homicídio culposo na direção de veículo automotor não se ajusta mais ao art. 121,

§ 3º. Agora é o art. 302, do CTB. Isso é de 1997.

CTB - Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor: Penas - detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

Eu aplico o CTB se o agente estiver na direção do veículo automotor. Não basta o

veículo ser o instrumento do crime. Ele tem que estar dando direção ao veículo, mesmo

que motor esteja desligado.

Eu peguei um caso de um rapaz que empurrava o seu carro, porque acabou a

gasolina, depois ele viu que tinha uma ladeira. O carro matou uma pessoa. Ele respondeu

pelo CTB, porque estava dando movimento e direção ao carro, mesmo com o motor

desligado.

Outro caso que o delegado colocou no CTB: a pessoa colocou o carro na ladeira,

não acionou corretamente o freio de mão, voltou da padaria, não encontrou o carro. O

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carro parou na cabeça de um mendigo que morreu. O delegado indiciou no 302, do CTB.

Está certo? Não! Ele não estava dando direção ao carro. Ele mal acionou o freio de mão.

É o art. 121, do Código Penal.

Olha por que é importante fazer essa diferença. O art. 121, § 3º, do Código Penal

(homicídio culposo) tem uma pena que varia de 1 a 3 anos. Reparem que permite até

suspensão condicional do processo. Agora, o art. 302, do CTB que pune igualmente o

homicídio culposo, porém na direção de veículo automotor, tem uma pena que varia de

2 a 4 anos. Não admite mais suspensão condicional do processo. O delegado, quando

falou que aquele senhor que mal acionou o freio de mão praticou o art. 302 estava

retirando a possibilidade de suspensão condicional do processo. Por isso, corrigimos no

momento do oferecimento da denúncia.

Agora, pergunto: dois crimes idênticos, com o mesmo resultado, justificam uma

pena mais severa no CTB? Isso é inconstitucional ou não é? Tem uma minoria que

defende a inconstitucionalidade por falta de proporcionalidade. Para essa minoria, que

diz que as penas são proporcionais, o desvalor do resultado no Código Penal tem o

mesmo desvalor do CTB. O desvalor do resultado é o mesmo. Se é assim, por que tem

consequências tão diferentes? Logo, inconstitucional, fere o princípio da

proporcionalidade. Se você olhar o crime só sob esta ótica, você vai concordar com isso.

Mas não é a ótica correta porque o crime não é constituído só de resultado. Antes de ter

resultado, ele tem conduta. Se você olhar o desvalor da conduta, logo perceberá que o

desvalor da conduta é diferente. A conduta é muito mais perigosa no transito do que fora

dele, merecendo uma pena menor. A conduta é potencialmente mais lesiva do que fora

do transito. Assim, o que justifica a diferença de pena não é o desvalor do resultado, mas

o desvalor da conduta. E isso é o que prevalece. Se você olhar só o desvalor do resultado,

vai ser obrigado a concordar com a inconstitucionalidade por falta de

proporcionalidade. Se você lembrar do desvalor da conduta, encontra a razão para a

diferença de penas.

A pena é de detenção de dois a quatro anos, mais proibição ou suspensão para dirigir

veículo automotor.

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O § 4.º do Art. 121 traz o homicídio majorado: § 4o No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conseqüências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos. (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)

A primeira parte do dispositivo só traz majorantes para o homicídio culposo, não podendo

ser aplicadas ao homicídio doloso.

A segunda parte traz majorantes restritas ao homicídio doloso, não podendo ser aplicadas

ao homicídio culposo.

Majorantes do homicídio culposo:

No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de

inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de

prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conseqüências do seu ato, ou

foge para evitar prisão em flagrante.

1. Se o crime resulta de inobservância de regra técnica para o exercício arte, ofício ou

profissão (é a NEGLIGÊNCIA PROFISSIONAL):

Essa majorante não se deve confundir com imperícia, porque na imperícia o agente não

domina as técnicas para o exercício de profissão, arte ou ofício. Na causa de aumento, o

agente domina a regra, mas deixa de empregar no caso concreto. Há, pois, um erro

profissional.

Ex: mulher chega no hospital com problema no lado esquerdo e o médico opera o lado

direito. Há homicídio culposo majorado. Difere do caso do pediatra que faz uma lipo,

quando não domina essa técnica (que é caso de imperícia).

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Há duas correntes:

Homicídio culposo e erro profissional: 1ª Corrente: Ocorrência do bis bis in idem pois a neglkigencia esta servindo

duas vezes em prejuízo do réu, uma como modalidade de culpa e outra como causa especial de aumento de pena (STF: HC 95078-RJ, julgado em 10/03/09) – Supremo recentíssimo: há sete meses achou que tem bis in idem.

2ª Corrente: Não ocorrência do bis in idem, pois a inobservância de regra

técnica não é a essência do crime culposo. STJ: HC 63929-RS, julgado em 13/03/07.(prevalece esta corrente)

2. omissão de socorro:

O agente deixa de prestar socorro à vítima, podendo fazê-lo. Nesse caso, não incide o

art. 135 do CP, para não gerar bis in idem.

Não incide a majorante quando a vítima já está morta ou quando o agente não tem

condições de prestar o socorro, mediato ou imediato.

Ex: se o agente fosse prestar socorro iria ser linchado.

Não exclui a majorante o fato de o agente achar que o socorro é inútil.

O STF, recentemente, decidiu acerca dessa matéria. Se o autor do crime, apesar de reunir

condições de socorrer a vítima (ainda viva), não o faz, concluindo pela inutilidade da

ajuda em razão da gravidade da lesão provocada, não escapa do aumento de pena do

art. 121, § 4.º. Vide, HC 84.380/MG do STF.

HC 84.380/MG EMENTA: Habeas Corpus. 2. Homicídio culposo agravado pela omissão de socorro. 3. Pedido de desconsideração da causa de aumento de pena prevista no art. 121, § 4o, do Código Penal, para que se opere a extinção da punibilidade, em face da conseqüente prescrição da pretensão punitiva, contada pela pena concreta. 4. Alegação de que, diante da morte imediata da vítima, não seria cabível a incidência da causa de aumento da pena, em razão de o agente não ter prestado socorro. Alegação improcedente. 5. Ao paciente não cabe proceder à avaliação quanto à eventual ausência de utilidade de socorro. 6. Habeas Corpus indeferido

3. Não diminuir as consequencias do ato:

A doutrina afirma que se o agente não tente diminuir as consequencias do ato, na

verdade, há omissão de socorro e vice-versa.

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4. Fuga para evitar o flagrante:

A doutrina afirma que incide essa majorante porque o agente demonstra, ao fugir do

flagrante, insensibilidade moral, ausência de escrúpulo, bem como prejudica a

investigação.

Há doutrina moderna que entende ser essa majorante inconstitucional, já que proíbe o

agente de não produzir prova contra si mesmo, o que seria suficiente para demonstrar a

não recepção desse dispositivo pela CF/88. Aqui,ocorre o mesmo caso do bafômetro,

quando não é o agente obrigado a fazer prova contra si próprio.

Causas de aumento do homicídio doloso (art. 121, ¢ 4.º, segunda parte): Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos. (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)

Para incidir a majorante do homicídio doloso, é imprescindível que o homicida conheça a

idade da vítima, sob pena de responsabilidade penal objetiva. Se ele não conhece, é um

erro de tipo que desaparece na majorante.

Aqui, não importa se o homicídio é doloso simples, privilegiado ou qualificado.

Quando o crime é praticado contra a pessoa menor de quatorze anos ou pessoa maior

de sessenta anos.

Nem sempre o momento em que o crime é praticado coincide com o momento do

resultado.

Se o crime é praticado quando a vítima tem menos de quatorze anos e morre quando já

tem mais dessa idade, incide esse aumento?

R- O crime se considera praticado no momento da conduta (teoria da atividade – Art. 4º

do CP). Logo, é nesse momento que se tem que analisar a idade da vítima. Assim se o

crime foi praticado quando a vítima era menor de quatorze anos, incide a majorante,

ainda que tenha a vítima falecido quanto já completara 14 anos.

Para incidir o aumento, é imprescindível que o agente conheça a idade da vítima, para

seja evitada a responsabilidade penal objetiva.

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Art. 121, § 5.º:

Perdão judicial: § 5º - Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as conseqüências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária. (Incluído pela Lei nº 6.416, de 24.5.1977)

Não se aplica aos casos de homicídio doloso.

Perdão judicial é o instituto pelo qual o juiz, não obstante a prática de um fato típico e

antijurídico por um sujeito comprovadamente culpado deixa de lhe aplicar, nas hipóteses

taxativamente previstas em lei, o preceito sancionador cabível, levando em consideração

determinadas circunstâncias que concorrem para o evento.

É uma hipótese de falta do interesse estatal em punir.

O perdão judicial é uma causa extintiva da punibilidade que, diferentemente do perdão

do ofendido, é unilateral.

Princípio da Bagatela Imprópria: apesar de relevante lesão ao bem jurídico tutelado a

pena é desnecessária. O perdão judicial é um caso típico de bagatela imprópria, a pena

é desnecessária (caiu na magistratura do MS 3ª fase).

Perdão Judicial Perdão do Ofendido Causa Extintiva de Punibilidade

É Ato Unilateral (não precisa ser aceito) É Ato bilateral (precisa ser aceito) Cabe nas hipóteses taxativas previstas em lei

Cabe nas hipóteses de ação penal de iniciativa privada

Quem deve comprovar as circunstancias que demonstram a falta de interesse de punir do

Estado é da defesa. Se o ônus da prova é da defesa, aqui não se aplica o princípio do in

dubio pro reu. Se o juiz tem dúvida deve condenar.

É possível o perdão judicial mesmo que o agente não conheça a vítima, desde que, em

havendo o crime, concorra as circunstância que concluam que a pena é desnecessária.

Ex: condutor de bicicleta que atropela a criança, mata e fica o agente tetraplégico.

Qual pena pode dar o juiz que o evento já não tenha dado, que é justamente ter ficado o

agente tetraplégico?

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Qual a natureza jurídica da sentença concessiva do perdão judicial?

a primeira corrente diz que é condenatória.

a segunda corrente diz que é declaratória extintiva da punibilidade.

O interesse prático é o seguinte:

Se é condenatória, há a interrupção da prescrição e serve como título executivo

judicial. Para Capez se ela é condenatória, pressupõe devido processo legal, não

pode ser concedida na fase de inquérito.

Já se for declaratória extintiva da punibilidade, não há interrupção da prescrição.

Se for declaratória extintiva da punibilidade deve-se interpor um processo de

conhecimento, pois não serve como título executivo judicial. Mas se é declaratória

extintiva da punibilidade, tal pode ser reconhecido a qualquer tempo, inclusive

durante o inquérito.

O professor discorda de Capez, porque o perdão judicial é reconhecimento de culpa,

logo não importa se é adotada a primeira ou a segunda corrente, sendo indispensável o

devido processo legal, não podendo, sob quaisquer hipóteses, ser concedido o perdão

judicial já na fase de inquérito.

O juiz pode absolver o acusado por qualquer motivo extintivo da punibilidade, menos no

caso do perdão judicial. Isso porque sumariamente estaria o juiz reconhecendo a culpa

do acusado. Inclusive, o art. 397 do CPP não traz a possibilidade de absolvição sumária no

caso de perdão judicial.

Prevalece a segunda corrente, que diz que a sentença do perdão judicial é declaratória

da extinção da punibilidade. Aliás, a súmula 18 do STJ trata do tema: Súmula: 18 A SENTENÇA CONCESSIVA DO PERDÃO JUDICIAL E DECLARATORIA DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE, NÃO SUBSISTINDO QUALQUER EFEITO CONDENATORIO.

Mas deve-se ressaltar que o CP adotou a primeira corrente, sendo a sentença

condenatória.

Art. 120 - A sentença que conceder perdão judicial não será considerada para efeitos de reincidência. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

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Esse artigo só tem razão de existir se a sentença for condenatória. Assim, o artigo 120 deve

ser interpretado da seguinte maneira: a sentença que conceder perdão judicial, apesar

de condenatória, não será considerada para efeitos de reincidência.

Se a intenção do legislador fosse de ser a sentença declaratória, não haveria a

necessidade do art. 120, pois a sentença declaratória não gera reincidência.

Cabe perdão judicial no homicídio culposo previsto no art. 302 do CTB?

Se houver expressa previsão legal, sim. O perdão judicial constava do art. 300 do CTB, o

qual foi vetado pelo Presidente da República.

As razões do veto, entretanto, remetem as razões do perdão judicial do CTB para o CP.

Logo, se aplica o art. 121, § 5.º do CP ao art. 302 do CTB. Aplica-se, pois, o perdão judicial

ao homicídio culposo previsto no CTB.

É possível homicídio qualificado privilegiado?

O privilégio está no § 1.º do art. 121, enquanto que as qualificadoras estão no § 2.º.

As causas de privilégio são três: motivo de valor social, motivo de valor moral ou domínio

de violenta emoção.

Os privilégios são todos subjetivos.

Já as qualificadoras são cinco: motivo torpe, motivo fútil, modo surpresa e fim especial.

São subjetivas o motivo torpe, fútil e fim especial, sendo o meio cruel e o modo surpresa

objetivos.

Logo, é possível homicídio qualificado privilegiados, desde que as qualificadoras sejam

objetivas. Logo, jamais haverá homicídio qualificado privilegiado se se tratar de motivo

torpe, fútil ou fim especial.

Quando a qualificadora é incompatível com o privilégio este é quem predomina,

devendo as qualificadoras serem afastadas. Isso ocorre porque os jurados votam primeiro

o privilégio. Ao reconhecerem, automaticamente, afastam as qualificadoras objetivas.

Em síntese, se o homicídio for qualificado pelo meio cruel ou modo surpresa, podem incidir

os privilégios do § 1.º do art. 121 do CP.

O homicídio qualificado privilegiado é hediondo?

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- a primeira corrente diz que é hediondo, pois a Lei 8.072/90 não o excepciona.

- a segunda corrente entende que não é crime hediondo, pois o privilégio, sendo

subjetivo, prepondera sobre a qualificadora, objetiva. Essa corrente trabalha com uma

analogia in bonam partem, com o artigo 67 do CP:

Art. 67 - No concurso de agravantes e atenuantes, a pena deve aproximar-se do limite

indicado pelas circunstâncias preponderantes, entendendo-se como tais as que resultam

dos motivos determinantes do crime, da personalidade do agente e da reincidência.

(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

O art. 67 do CP fala em agravantes e atenuantes, preponderando a subjetiva. Se é feita a

analogia, deve-se substituir as agravantes por qualificadoras e atenuantes por privilégio.

Logo, sendo a qualificadora objetiva e o privilégio subjetivo, prevalece este.

Prevalece essa segunda corrente no STF e no STJ.

Participação em suicídio:

Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça:

Pena - reclusão, de dois a seis anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de um a três

anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave.

Parágrafo único - A pena é duplicada:

Aumento de pena

I - se o crime é praticado por motivo egoístico;

II - se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de

resistência.

Suicídio é a eliminação voluntária e direta da própria vida. Nelson Hungria dizia que era

imprescindível a vontade direta de o agente querer se despedir da vida.

Suicídio não é crime. Logo, a tentativa de suicídio não induz qualquer pena ao agente.

Esse dispositivo pune a participação no suicídio mediante induzimento, instigação ou

auxílio.

É um crime comum, não se exigindo qualidade especial do agente.

A induz B a auxiliar C a se suicidar. C efetivamente morre. Qual o crime que foi praticado

por A? B, por óbvio, pratica o crime de participação em suicídio. A é participe do crime

previsto no art. 122 do CP.

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A conduta de A é acessória e a de B a principal.

O sujeito passivo do crime de participação em suicídio é qualquer pessoa capaz.

Se a vítima for um incapaz, o crime será o de homicídio e não de participação em

suicídio. Isso porque a incapacidade passa a ser tratada como instrumento do crime.

É também imprescindível que a vítima seja determinada. Logo, quando o agente induz o

suicídio de pessoas indeterminadas o há crime, pois o fato é atípico.

Ex: banda de rock que faz música induzindo o suicídio. Se um fã que ouve a música e se

suicida não há crime, pois o fato é atípico. Isso porque suicídio não é crime, logo não se

pode falar em apologia ao crime.

O art. 122 do CP possui três núcleos: induzir, instigar ou auxiliar.

Induzir: o agente faz nascer na vítima a vontade e a ideia mórbida.

Instigar: o autor reforça a vontade mórbida que já existe.

Auxiliar: prestar assistência material para o cometimento do crime. Ex: emprestar a corda

ou dar o veneno.

Nas duas primeiras hipóteses, tem-se o que é chamado pela doutrina de participação

moral. Já na terceira há participação material no suicídio de outrem.

Se o agente induz, auxilia e instiga a pessoa a se matar, pratica um só crime, já que se

trata de um crime plurinuclear ou de ação múltipla. Assim, se praticado mais de um

núcleo dentro de um mesmo contexto fático, o crime continua sendo único. O juiz é quem

irá considerar a pluralidade de núcleos na fixação da pena base.

Existe auxilia por omissão?

- a primeira corrente entende que, dizendo o tipo “prestar-lhe auxílio”, quer abranger

somente as condutas comissivas, ou seja, não existe o crime por omissão.

- a segunda corrente entende que é possível o auxílio por omissão, desde que o omitente

tenha o dever jurídico de evitar o resultado. É a chamada omissão imprópria. É a corrente

que prevalece.

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O auxílio é sempre comportamento secundário, acessório, cooperação secundária.

Jamais o auxílio pode se misturar com a execução da morte. Se o auxílio passar a ser a

própria execução, o crime será de homicídio e não de participação em suicídio.

Se o agente auxilia uma pessoa a se matar e esta, quando da execução do crime, se

arrepende e demonstra isso ao agente. Se este não socorrer a vítima, o crime é de

homicídio, ficando absorvido o crime de participação em suicídio.

Art. 146, § 3.º, II:

Não se considera constrangimento ilegal a coação para se evitar o cometimento do

suicídio.

§ 3º - Não se compreendem na disposição deste artigo:

II - a coação exercida para impedir suicídio.

O crime do art. 122 é punido a título de dolo, tão somente, não podendo incidir a

modalidade culposa.

O dolo pode ser direto ou eventual.

E se o pai, negligentemente, deixa veneno de rato próximo da filha que sabia ter

tendência ao suicídio. Nesse caso, há duas correntes:

- o auxílio culposo deve ser tratado como homicídio culposo.

- a segunda corrente, que é a que prevalece, diz que responderá, conforme o caso, por

omissão de socorro, senão fato atípico

Consumação do crime de participação em suicídio:

Há três correntes acerca do tema:

Doutrina clássica (Nelson

Hungria)

Doutrina moderna

(Mirabete)

Cezar Roberto Bittencourt

O crime se consuma quando

o sujeito induz instiga ou

auxilia. Mas a punibilidade

depende da morte da vítima,

onde a pena é de dois a seis

anos ou da lesão grave na

vítima, onde a pena é de um

Quando o agente induz,

instiga ou auxilia alguém a

se matar, não consuma o

crime, apenas o executa.

Somente no caso da morte

ou lesão grave é que o

crime se considera

Quando o agente induz,

instiga ou auxilia alguém a

se matar, não consuma o

crime, apenas o executa. A

consumação depende da

morte, cuja pena é de dois

a seis anos. Se ocorrer lesão

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a três anos. Esses resultados

não consumam o crime,

apenas condicionam a

punibilidade. Há a chamada

condição objetiva de

punibilidade.

consumado. A consumação

depende da morte ou da

lesão corporal. É o resultado

naturalístico necessário para

a consumação.

grave, cuja pena é de um a

três anos, há tentativa.

agente induz a vítima a se

matar e ela morre: art. 122

consumado, com pena de

dois a seis anos e punível o

crime.

agente induz a vítima a se

matar e ela morre: art. 122

consumado com pena de

dois a seis anos.

agente induz a vítima a se

matar e ela morre: art. 122

consumado, com pena de

dois a seis anos e punível o

crime.

agente induz a vítima a se

matar e ela sofre lesão grave:

art. 122 consumado, com

pena de um a três anos,

sendo punível o crime.

agente induz a vítima a se

matar e ela sofre lesão

grave: art. 122 consumado

com pena de um a três

anos.

agente induz a vítima a se

matar e ela sofre lesão

grave: art. 122 tentado,

com pena de um a três

anos, sendo punível o

crime. Diz que é uma

tentativa sui generis.

agente induz a vítima a se

matar e ela não morre e não

sofre lesão grave: art. 122

consumado, mas não punível.

agente induz a vítima a se

matar e ela não morre e

não sofre lesão grave: fato

atípico.

agente induz a vítima a se

matar e ela não morre e

não sofre lesão grave: fato

atípico.

Para essa corrente, o crime

não admite tentativa, sendo

esta juridicamente impossível.

Para essa corrente, o crime

não admite tentativa, sendo

esta juridicamente

impossível. É um crime

material plurisubsistente que

não admite tentativa.

Para essa corrente, há a

possibilidade de tentativa,

desde que haja lesão

corporal.

Essa corrente erra porque

chama de condição objetiva

Essa corrente erra porque

diz que o fundamento se

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de punibilidade dois

resultados que fazem parte do

dolo do agente.

encontra no próprio artigo

quando fala que da

tentativa resulta lesão

corporal. Ora, mas o

suicídio não é crime, então

como cabe tentativa?

Em primeira fase, deve-se adotar a doutrina moderna. Na segunda fase, deve-se elencar

as três correntes.

Duelo americano, roleta russa ou ambicídio:

Duelo americano: há duas armas, com apenas uma carregada. Em dado momento,

cada um dos agentes pega uma arma e, ao mesmo tempo, atira na própria cabeça. O

sobrevivente responde pelo art. 122. Se cada um atirasse na cabeça do outro o crime

seria de homicídio.

Roleta russa: há apenas um arma e o tambor possui apenas um projétil. O agente que

sobrevive responde pelo art. 122.

Ambicídio: é o pacto de morte. Um dos agentes inicial o modo de execução (liga a

torneira, por exemplo em crime de morte por afogamento). Se o agente que ligou a

torneira sobrevive, praticou o art. 121, porque praticou um ato executório.

No mesmo exemplo, quem praticou o ato executório morre e o outro agente sobrevive.

Este pratica o crime do art. 122 do CP.

Se ambos os agentes não morrerem, o que praticou atos executórios pratica tentativa de

homicídio. O agente que não praticou o ato executório, responde pelo art. 122 se o outro

agente sofreu lesão grave. Se não sofreu sequer lesão grave o fato é atípico.

Participação:

É possível a participação no crime de participação em suicídio?

R: SIM. Quem pratica os verbos do caput do art. 122 é o partícipe do crime. Quem

responde por ele não é agente que se suicida, mas sim o partícipe, que será considerado

autor do crime.

Majorantes: § único do art. 122

I – se o crime é praticado por motivo egoístico;

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II – se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de

resistência.

Observações finais:

1. Não constitui constrangimento ilegal a coação exercida para impedir suicídio (art. 146,

§3º, II).

2. É possível auxílio por omissão?

R: SIM. Correntes:

1ª Corrente: A expressão “prestar-lhe auxílio” indica que só se admite conduta

comissiva.

2ª. Corrente: É possível auxílio por omissão, desde que omitente tenha o dever de

evitar o resultado (omissão imprópria). Posição de Nelson Hungria e é a que prevalece.

3. O auxílio deve ser sempre acessório, isto é, cooperação secundária, pois quando o

“auxílio” intervém nos atos executórios o agente “colaborador” responderá por homicídio.

O colaborador não pode haver intervir nos atos executórios, ex.: puxar o banquinho.

4. Responde por homicídio (art. 121) e não em participação em suicídio (art.122) aquele

que depois de auxiliar a vítima, não a socorre diante de seu arrependimento.

Se prestar auxilio a um menor de 14 anos, se falará em homicídio e não em participação

em suicídio. Incidirá essa causa de aumento de pena quando o menor a que se refere o

art. 122, p. único, II é o que tem entre 14 e 18 anos.

ALTERAÇÃO 2009

“Diminuída” é ≠ de “suprimida”. Se a vitima tem diminuída a capacidade de resistência,

se fala em participação em suicídio. Se sua capacidade de resistência é suprimida, fala-se

em homicídio.

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INFANTICÍDIO

Art. 123. Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após:

Pena – detenção, de dois a seis anos.

Quando eu digo que o infanticídio nada mais é do que o homicídio acrescido de

elementos especiais, significa que a relação entre os dois é uma relação de gênero-

espécie. É aqui que vocês enxergam muito bem o Princípio da Especialidade. A relação

do infanticídio para o homicídio é de norma especial derrogando norma geral.

Compreenderam? O que eu quero saber é o seguinte: como chamam esses elementos

que tornam o infanticídio especial quando comparados ao homicídio? Isto que está

listado são elementos que acrescidos ao matar alguém torna o infanticídio especial em

relação ao homicídio. Como chamam essas elementares especiais que tornam o

infanticídio especial quando comparadas ao homicídio? Já caiu em concurso: “quais são

as especializantes do art. 123?” quando ele perguntou isso, ele queria saber o quê, no art.

123, é especial em relação ao art. 121.

Duas observações óbvias, que caem em concurso:

1. Infanticídio não é crime hediondo, por mais hedionda que seja a forma que a

mãe matou o próprio filho. Mesmo que praticado com crueldade, não é

hediondo.

2. É também, a exemplo dos arts. 122 e 121, o infanticídio é crime doloso contra a

vida: vai a júri.

*Nada mais é que um homicídio privilegiado – trata-se do principio da especialidade.

*Principio da especialidade: a norma especial prevalece sobre a norma geral quando

possuir todos os seus elementos, além de outros especializantes.

* Elementos que especializam o infanticídio:

é o crime da parturiente,

praticado contra o nascente ou neonato,

durante o parto ou logo após (elemento temporal),

sob a influência do estado puerperal (elementar)

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29

* Sujeito Ativo: somente a mãe (a parturiente durante o parto ou logo após)pode ser

sujeito ativo do crime. Trata-se, portanto de um crime próprio.

*Admite Concurso de agentes?

1ª Corrente: Não admite. O estado puerperal é elemento personalíssimo,

incomunicável. Não admite concurso de agentes. Conclusão: não admite

concurso de agentes. Sabe quem inventou isso? Nélson Hungria. Por que você diz

que ele inventou? Primeiro porque não existe elemento personalíssimo. O CP

reconhece ou o emento objetivo ou o subjetivo. Elemento personalíssimo não

existe. Invenção dele. Por isso que hoje prevalece a segunda corrente.

2ª Corrente: Admite. O estado puerperal é elemento subjetivo do tipo comunicável

nos termos do art. 30, do CP. Conclusão: admite concurso de agentes. Essa

corrente viu bem: o elemento não é personalíssimo. É subjetivo. Sabe quem adota?

Nélson Hungria. Nas últimas edições do seu livro, ele reconhece que inventou e

abandonou a primeira corrente. Hoje prevalece que é perfeitamente possível

concurso de agentes. Art. 30 - Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo

quando elementares do crime.

Olha o que vai cair no seu concurso. São três situações:

1ª Situação – Parturiente e médico executam o verbo matar. Por qual crime

respondem? Eu preciso dizer que ela está no estado puerperal? Não. Eu estou

falando do art. 123, não vou ficar falando estado puerperal a vida inteira. Vocês

já sabem que ela está sob a influência desse estado. A mulher pratica

infanticídio. E o médico? Infanticídio. Pelo art. 123, na condição de coautor.

Se você entende que ele reponde por homicídio, vocês estão adotando a

primeira corrente, que entende que o estado puerperal é incomunicável e aqui

é comunicável. Essa primeira situação não cai em concurso.

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2ª Situação – A parturiente auxiliada pelo médico pratica, sozinha, o verbo

matar. Por que crime respondem? Ela responde por infanticídio. O médico, que

de qualquer modo concorreu para o resultado, responde pelo art. 123, agora na

condição de partícipe. Isso também não cai na sua prova. O que vai cair é a

terceira situação.

3ª Situação – Médico, auxiliado pela parturiente pratica, sozinho, o verbo matar.

E agora? Por que crimes respondem? O médico responde por homicídio porque

quem matou não estava sob influencia do estado puerperal. E ela?

Ela concorreu de qualquer modo para o homicídio, e também deveria

responder por homicídio, porém, na condição de partícipe. Comparem a

segunda situação com terceira. Se ela mata, responde por homicídio

privilegiado, se ela só auxilia, responde por homicídio. Então, é melhor, ao invés

de auxiliar, matar logo. Isso que eu acabei de colocar é o que está

tecnicamente correto, mas gera uma incoerência. Você punir o mais com

menos e o menos com mais. Isso é o que está tecnicamente correto, mas para

evitar essa incoerência, temos duas correntes:

1ª Corrente: Para que não haja esta incoerência, os dois respondem pelo

art. 123. Eu fico puto com essa primeira corrente porque a incoerência não

era com relação ao médico. Era só com relação à parturiente. Ele acabou

se beneficiando. (prevalece esta corrente)

2ª Corrente: O médico responde pelo art. 121 e ela responde pelo art. 123

por razões de política criminal. Se a incoerência é só com relação a ela,

vamos corrigir com relação a ela. O médico continua respondendo pelo

art. 121.

Vejam que eles criaram uma exceção pluralista à teoria monista aqui. A primeira

corrente trabalha com o monismo. A segunda corrente trabalha com a exceção pluralista

à teoria monista (vimos isso no intensivo I). Qual prevalece? É a primeira corrente. E foi a

resposta certa na polícia civil em SP.

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* Sujeito passivo: é o próprio filho, abrangendo o nascente ou o recém-nascido ou

neonato. Assim, também é um crime próprio quanto ao sujeito passivo.

O crime do art. 123 é portanto bipróprio.

* A mãe mata outra criança pensando ser o seu filho, responderá por infanticídio?

R- Sim. É infanticídio apesar de não ser o próprio filho, pois aconteceu erro sobre a pessoa.

O agente responde considerando-se as condições da vitima virtual. Erro sobre a Pessoa § 3º - O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime.

Matar o próprio filho é um crime de execução livre. Ou seja, pode ser praticado por ação

ou omissão. Por meios diretos ou indiretos. Ação ou omissão, meios diretos ou indiretos.

Circunstância elementar de tempo – Você tem que matar o próprio filho durante ou logo

após o parto. Agora, preste atenção. Se for antes do parto, o crime é de aborto. Se for

muito depois do parto, o crime é o do art. 121. Então, para que você tenha o delito de

infanticídio é imprescindível que você obedeça essa baliza: durante ou logo após o parto.

Para que seja infanticídio tem que ser durante ou logo após.

Olha que importante que eu vou falar: durante o parto, todo mundo sabe

reconhecer. Mas até quando dura o logo após? Enquanto perdurar o “logo após”, você

tem o art. 123. Para que não haja dúvida a doutrina e a jurisprudência dizem o seguinte: o

logo após perdura enquanto perdurar o estado puerperal. Varia conforme o caso. O caso

concreto dirá. Vai depender de perícia. Os peritos vão dizer se ela estava ou não sob

estado puerperal.

Sob influência do estado puerperal – é outra elementar importantíssima. O que é estado

puerperal? E olha a pergunta do MP/RJ (1ª fase): o que é estado puerperal e no que se

diferencia no puerpério?

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“Estado puerperal: é o estado que envolve a parturiente durante a expulsão da criança

do ventre materno, trazendo profundas alterações psíquicas e físicas, transformando a

mãe (deixando-a sem plenas condições de entender o que está fazendo).” Mirabete

chega a dizer que o estado puerperal não é nem uma frieza de espírito, espírito cruel,

nem uma imputabilidade. É um meio termo.

“Puerpério: é o período que se estende do início do parto até a volta da mulher às

condições pré-gravidez.”

Vocês anotaram que a terceira elementar é “sob influência do estado puerperal”.

Isso significa que:

“É imprescindível o nexo entre o estado puerperal e a morte, porque nem sempre

esse estado gera vontade mórbida. Para configurar o art. 123, é imprescindível a relação

de causa e efeito entre o estado puerperal e o crime, pois nem sempre tal estado produz

perturbações psíquicas na parturiente. Essa necessária relação de causa e efeito está na

exposição de motivos do Código Penal. “O Brasil adotou o critério fisiopsicológico.”

MP/SP (fase oral): Antepenúltimo concurso. O estado puerperal não é um caso de

inimputabilidade ou semi-imputabilidade? A parturiente não mereceria medida de

segurança?

Resposta: dependendo do grau de desequilíbrio fisiopsíquico ela pode ser equiparada a

inimputável ou semi-imputável. Nucci diz que ela, pelo menos, semi-imputável é. O estado

dela é, pelo menos, de semi-imputabilidade. Dependendo do grau de desequilíbrio

fisiopsíquico ela pode ser tratada como inimputável.

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Olha outra pergunta boa que caiu em concurso: qual é a diferente do art. 123

(infanticídio) para o 134, § 2º, do CP, que é o abando no de recém-nascido com resultado

morte? Exposição ou Abandono de Recém-Nascido

Art. 134 - Expor ou abandonar recém-nascido, para ocultar desonra própria: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos. § 2º - Se resulta a morte: Pena - detenção, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.

Paga cesta básica. Uma mãe que abandona seu filho recém nascido paga cesta básica.

É mais grave você chamar um senhor de idade de velho babão. Você, mãe, que

abandonou seu filho recém nascido, por causa de desonra própria (para ocultar uma

gravidez), terá direito a sursis.

O infanticídio é punido a título de dolo, direto ou eventual. Vocês já sabem que o

crime do art. 123 é punido a título de dolo. Não se pune a modalidade culposa. Se é

assim, que crime pratica a parturiente que, sob a influencia do estado puerperal sufocou

o filho durante a amamentação, matando o recém-nascido. Tem jurisprudência sobre isso.

Diferente dos irmãos xifópagos. Que crime pratica essa mãe que, culposamente, sufocou

o filho? Pode ser o art. 123? Não, porque o art. 123 não pune a modalidade culposa.

1ª Corrente: “O fato é atípico, vez que inviável, na hipótese, atestar a

ausência da prudência normal em mulher desequilibrada psiquicamente.”

Então, não tem como você atentar a falta de diligência normal de uma

mulher que está em franco desequilíbrio fisiopsíquico. Damásio adota essa

corrente. Essa corrente é minoritária.

2ª Corrente: “Suprimir a vida de alguém, independentemente do momento

cronológico, com manifesta negligência, tipifica homicídio culposo.” Ou

seja, ela vai responder por homicídio culposo, pouco importa se durante ou

logo após o parto, pouco importa se houve desequilíbrio fisiopsíquico.

Bittencourt, Hungria, Magalhães Noronha. (prevalece esta corrente)

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O CP (art. 26) adota o critério biopsicológico. Deve-se verificar se, ao tempo da ação ou

omissão, o agente era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato. Não basta

o fato do agente possuir uma deficiência mental para considerá-lo inimputável.

Não se pune o crime de infanticídio a titulo culposo. Se a mãe, estando sob a influência do

estado puerperal, mata o filho culposamente (ex.: asfixia na amamentação), responderá

por homicídio culposo (nada impedindo a aplicação do perdão judicial).

O julgamento no júri pode ser realizado sem a presença do réu quando se tratar de crimes

afiançáveis. Assim, considerando que o infanticídio é um crime afiançável, se a mãe não

comparecer ao julgamento, o mesmo não será suspenso (art. 451 § 1º do CPP)

AULA 03 EM 23/09/2010

Eu começo perguntando uma coisa: o certo é aborto ou abortamento? Tem gente que

não vê diferença alguma. Porém, corretamente, a medicina legal diz: não é aborto, é

abortamento. Abortamento é a conduta. O aborto é o resultado da conduta. O resultado

de um abortamento é o aborto. Para essa corrente, é tão errado chamar abortamento

de aborto como chamar homicídio de um crime de cadáver. O cadáver não é crime. É o

resultado do crime que se chama homicídio. Então, você falar em aborto ao invés de

abortamento, está trocando a ação pelo seu produto.

Conceito: “É a interrupção da gravidez com a destruição do produto da concepção.”

O que protegemos aqui? Protege-se a vida intra-uterina e vai a júri, por ser crime

doloso contra a vida.

Pergunto: quando a mulher já se considera grávida? É aqui que a coisa pega. Caiu

não MP/MG. Com a fecundação, ela já está grávida ou é imprescindível a nidação? São

conceitos de biologia. O que é fecundação? É o encontro do espermatozóide com o

óvulo. Isso é fecundação. O óvulo fecundado depositado na parede do útero é nidação.

Se você interromper a fecundação para a nidação você praticou abortamento? Se você

evitar que da fecundação venha a nidação, você praticou abortamento? São duas

opões: nidação ou fecundação. Se você acha que é com a fecundação, vocês

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conhecem a pílula do dia seguinte? Essa pílula você tomou e espera que a medicina

faça a parte dela. Se você acha que é com a fecundação, essa pílula passa a ser

abortiva.

No direito (eu não vou falar da medicina porque esses aí batem na tecla da

fecundação), prevalece que a gravidez se dá com a nidação. Se você olha do ponto de

vista técnico não está correto. A religião, por exemplo, bate na tecla fecundação.

Para fins de direito penal, é com a nidação.

Tem uma contravenção penal que a gente não imagina que existe que é anunciar

meios abortivos. Isso é contravenção. Art. 20, do DL 3688/41:

Anúncio de meio abortivo

Art. 20 - Anunciar processo, substância ou objeto destinado a provocar aborto:

Pena - multa.

A Lei das Contravenções tinha que ser revogada! Totalmente m*. Tem gente que

diz que essa lei fere o princípio da ofensividade porque é tudo ridículo. Os fatos são

ridículos e as penas mais ridículas ainda.

2. CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA DE ABORTO

2.1. Abortamento natural – A doutrina fala do aborto natural. É a interrupção

espontânea da gravidez, normalmente causada por problemas de saúde da gestante.

Obviamente que o aborto natural é fato atípico.

2.2. Abortamento acidental – Vejam que estou falando abortamento, mas estou

escrevendo aborto porque estou sendo fiel ao código que fala em aborto. Vocês, na

prova, coloquem aborto e entre parêntesis, abortamento. “Decorrente de quedas,

traumatismos e acidentes em geral.” Também é um fato atípico.

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2.3. Abortamento criminoso – Está nos arts. 124 a 127, do CP.

2.4. Abortamento legal ou permitido – Está nos art. 128 do CP.

2.5. Abortamento miserável ou econômico-social – Praticados por razões de miséria,

incapacidade financeira para sustentar vida futura. No Brasil, esse aborto é permitido?

Não. É crime.

2.6. Abortamento honoris causae – Realizado para interromper gravidez adulterina

(extramatrimonial). É crime.

2.7. Abortamento eugênico ou eugenésico – Muito importante esse tipo de aborto.

“Praticado em face dos comprovados riscos de que o feto nasça com graves anomalias

psíquicas ou físicas.” Este é crime? Deixa o ponto de interrogação. Vamos explicar isso no

final da aula, em especial o abortamento do feto anencefálico (aliás, foi dissertação da

magistratura em SP).

3. FORMAS DE ABORTAMENTO CRIMINOSAS

Aborto Provocado pela Gestante ou com Seu Consentimento Art. 124 - Provocar Aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque: Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos. Aborto Provocado por Terceiro Art. 125 - Provocar Aborto, sem o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos. Art. 126 - Provocar Aborto com o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. Parágrafo único - Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de 14 (quatorze) anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.

O art. 124 pune o auto-aborto ou o consentimento para que outro lho provoque.

É infração de médio potencial ofensivo (Pena mínima não superior a um ano

admitindo suspensão condicional do processo).

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O art. 125 pune o aborto praticado por terceiro SEM consentimento válido da

gestante – forma mais grave, única inafiançável. É infração de grande potencial

ofensivo (é o único crime de aborto inafiançável).

O art. 126 pune o aborto praticado por terceiro COM consentimento válido da

gestante – Se o consentimento for inválido, cai no art. 125. É infração de médio

potencial ofensivo (pena mínima não suplanta um ano admitindo suspensão

condicional do processo).

Há um exceção pluralista da teoria monista quando se vê o Art. 124 e o Art. 126

(mesmo caso da corrupção passiva e corrupção ativa).

Vocês têm a topografia do aborto no caderno. Vamos analisar cada uma das três

figuras, mas, pelo menos, o geral, vocês já tem na cabeça.

3.1. Aborto Provocado pela Gestante ou com Seu Consentimento – art. 124

Aborto Provocado pela Gestante ou com Seu Consentimento Art. 124 - Provocar Aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque: Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos.

Nós temos duas condutas punidas no art. 124.

Quem é o sujeito ativo? Quem pode praticar o art. 124?

Somente a gestante.

Se é somente a gestante, estou diante de um crime próprio ou de mão própria

(comum, não é, exige condição pessoal do agente). Qual a diferença do próprio e o de

mão própria? Os dois exigem qualidade especial, mas qual a diferença entre eles? Vamos

ver a diferença:

Crime Comum Crime Próprio Crime de Mão Própria

Não exige qualidade especial do agente

Exige qualidade especial do agente

Exige qualidade especial do agente

Admite coautoria e participação

Admite coautoria e participação

Só admite participação

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Eu perguntei se o crime do art. 124 é próprio ou de mão própria. A resposta vai

depender se ele admite coautoria ou somente participação. Vamos anotar porque há

divergência.

1ª Corrente: Cezar Roberto Bittencourt – O crime é de mão própria. Só admite

participação. O terceiro potencial co-autor responde pelo art. 126 e não pelo art. 124.

Então, não tem como ter co-autoria no art. 124.

2ª Corrente: Luiz Régis Prado – O crime é próprio. Admite co-autoria, mas pune

cada autor por tipo diverso. Cada autor responde por um crime. Isso é exceção

pluralista à teoria monista. E exceção pluralista à teoria monista é exceção de

concurso de agentes ou não é? Então, a segunda corrente diz: é claro que admite

coautoria. É que o tipo penal é que vai ser diferente para cada um dos autores.

É a exceção pluralista à teoria monista. Caiu exatamente isso no TJ/PR.

Era exatamente essa a resposta que vocês tinham que dar. Foi segunda fase e

vocês tinham que colocar as duas correntes. Mas prevalece a primeira corrente.

Quem é a vítima do auto-aborto ou do consentimento da gestante para que outro

lho provoque? Duas correntes:

1ª Corrente: “Não sendo o feto titular de direitos (salvo aquele expressamente previstos

na lei civil), a vítima do art. 124 é o próprio Estado.”

2ª Corrente: Sujeito passivo é o feto. Quando eu falo feto, falo feto em sentido amplo.

Tem algum interesse prático saber se o Estado é vítima ou se o feto é vítima?

Gravidez de gêmeos. Se você adota a primeira corrente, na interrupção da gravidez de

gêmeos, o crime é um só. Se você adota a segunda corrente, concurso formal de delitos.

E é exatamente a segunda corrente que prevalece. Então, essa discussão tem interesse

prático na gravidez de gêmeos.

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E quais são as condutas punidas no art. 124, do CP? Ele pune duas condutas:

Autoaborto – Aqui a gestante pratica nela mesma manobras abortivas, seja de

maneira física, química. Interessa que ela interrompe sua própria gravidez.

Consentir para que outro lho provoque – O terceiro que prova esse abortamento

vai responder pelo art. 126. Exceção pluralista à teoria monista.

Não tem muita coisa para comentar aqui. Isso é muito tranquilo. Eu apenas quero

saber de vocês agora: o art. 124 é punido a título de dolo ou culpa? O Brasil só pune o

aborto doloso. Não importa a forma. Não se pune modalidade culposa. O art. 124 só é

punido a título de dolo, direto ou eventual.

Exemplo de dolo eventual no aborto: tem um exemplo famoso de Nelson Hungria

que despenca em prova: gestante suicida. Ela não morre, mas interrompe a gravidez.

Para Nelson Hungria, ela agiu com dolo eventual no abortamento do feto.

Se a conduta é praticada, não para interromper a gravidez, mas para acelerar,

antecipar o nascimento, não existe aborto. A pessoa agride a gestante visando à

antecipação do nascimento. Não é aborto. É lesão corporal. Nós vamos estudar isso. É

uma lesão corporal, inclusive, qualificada pela antecipação do parto.

Consumação - Quando o crime se consuma? A maioria responde assim: o crime se

consuma com a morte do feto, com a destruição do produto da concepção. Cuidado

porque essa resposta é incompleta. O crime se consuma com a morte da vida

intra-uterina, mesmo que ocorra fora, desde que decorrente das manobras abortivas.

O crime se consuma com a morte do feto, mesmo que fora do ventre materno.

“O crime se consuma com a morte do feto, pouco importando se esta ocorre

dentro ou fora do ventre materno, desde que decorrente das manobras abortivas.

Trata-se de crime plurissubsistente, admitindo a tentativa.”

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Prestem atenção. Três situações:

1ª Situação – A gestante praticou manobra abortiva e destruiu a vida ainda no

seu ventre. Que crime ela praticou? Aborto. Com manobras especiais, ela

consegue interromper a gravidez, matando o feto no interior do seu ventre.

Aborto.

2ª Situação – Ela praticou manobras abortivas, o feto é expulso com vida, mas

morre logo depois, em razão das manobras anteriores. Que crime ela praticou?

Aborto.

3ª Situação (que é a que cai) – Ela pratica manobras abortivas, o feto nasce

com vida, ela renova a execução e tira a vida daquele feto que nasceu com

vida. Que crime ela praticou? Não é mais aborto porque quando nasceu com

vida, só seria aborto se ele morresse em razão das manobras abortivas. Se ela

renovou a execução, a exceção dela agora está recaindo sobre vida

extra-uterina. Se for assim, o crime é de homicídio ou infanticídio. Depende do

caso concreto. Nesse caso, absorve a tentativa de abortamento? Prevalece

que sim.

3.2. Aborto Provocado por Terceiro – art. 125

Aborto Provocado por Terceiro Art. 125 - Provocar Aborto, sem o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos.

Prestem atenção: o art. 125 já não está punindo mais a gestante. O art. 125 está

punindo o terceiro provocador. A gestante é punida no art. 124. Cuidado!

Quem pode praticar o art. 125? Quem pode provocar aborto sem o consentimento

da gestante? O tipo exige alguma qualidade ou condição especial do agente? Não.

Trata-se de crime comum. Não precisa ser médico, nada! Qualquer pessoa pode

praticar.

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Quem é a vítima? É a gestante? A gestante (que não consentiu) e o feto são

vítimas. Estou diante de um crime de dupla subjetividade passiva.

O que se está punindo? Estamos punindo aqui, um tipo objetivo: a interrupção da

gravidez sem consentimento da gestante. Esse não consentimento. Esse dissentimento da

gestante pode ser um dissenso real, onde ela, efetivamente não consente ou então, um

dissenso presumido, art. 126, §único do Código Penal. Não consentimento da gestante

pode ser real (ela efetivamente não consentiu) ou presumido, hipótese em que ela até

consente, mas é um consentimento que a lei ignora. Hipótese do art. 126, § único:

Parágrafo único - Aplica-se a pena do artigo anterior, se

a gestante não é maior de 14 (quatorze) anos, ou é alienada

ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante

fraude, grave ameaça ou violência.

Nessas hipóteses você aplica a pena do art. 125: dissenso presumido.

Jurisprudência que despenca em concurso: “quem desfere violento pontapé no

ventre de mulher sabidamente grávida pratica o crime do aborto (art. 125).” Isso é

tranquilo na jurisprudência.

Gestante menor de 14, gestante alienada, consentimento obtido mediante fraude,

grave ameaça ou violência – São as hipóteses do dissenso presumido. Essas circunstâncias

têm que fazer parte do dolo do agente. Ele tem que saber que a menor tinha menos de

14 anos para responder pelo art. 125. Se ele não sabia que ela tinha menos de 14 anos,

ele não vai responder. Para responder pelo art. 125, com o dissenso presumido ele tem

que conhecer as qualidades da vítima ou das condições do consentimento.

O crime do art. 125 é punido a título de dolo, apenas e tão-somente.

Que crime pratica alguém que atira para matar mulher grávida? Ele sabe que está

grávida. Atira para matar mulher que sabe que está grávida. A mulher o traiu, engravidou,

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ele quer se vingar matando a mulher que sabe que está grávida. Ele pratica dois crimes

em concurso formal: homicídio e aborto.

Momento consumativo: não precisa nem perder tempo. O crime se consuma com

a destruição do produto da concepção e admite tentativa.

3.3. Aborto Provocado por Terceiro com Consentimento da Gestante

Art. 126 - Provocar Aborto com o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

O art. 126 pune a mesma coisa do art. 125, com a diferença que aqui ele tem o

consentimento válido da gestante.

Quem é o sujeito ativo? Qualquer pessoa (crime comum).

Quem é o sujeito passivo? A gestante não é. Ela consentiu. Ela vai responder pelo

art. 124. Ela não é vítima. A única vítima do art. 126 é o feto.

Conduta – Interrupção da gravidez. O que o artigo pune? Interrupção da gravidez

com o consentimento válido da gestante. A gestante consentiu e, durante as manobras,

ela se arrepende. Você não dá ouvidos ao arrependimento dela e prossegue. Que crime

você pratica? Ela consentiu. Ela vai até uma clínica para realizar o abortamento. Durante

as manobras, ela fala: para, não quero mais. E ele não para. Que crime ele praticou? Ele

praticou o art. 125 (sem o consentimento da gestante). A partir do momento que ela se

arrepende, você prosseguir, art. 125. E a gestante que se arrependeu? Quase nenhuma

doutrina fala disso, mas você não pode esquecer que o arrependimento só lhe beneficia

se eficaz. Mas eu, particularmente, acho que você tem que tomar cuidado com o

momento do arrependimento porque eu vejo isso mais como desistência voluntária. Mas é

discutível.

O crime só é punido a título de dolo. Não se pune a modalidade culposa.

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E quando se consuma? Mesma coisa: é crime material, se consuma com a morte do feto,

admitindo a tentativa.

O aborto é um crime fácil. Até aqui, nenhuma novidade. Antes de partirmos para

os arts. 127 e 128, um apitada de jurisprudência:

O aborto criminoso pode ser o art. 124, o art. 125 e o art. 126.

1ª Situação – Namorado que leva namorada para praticar o abortamento – Ele

é partícipe de qual crime? Ele é partícipe do art.124.

2ª Situação – Namorado convence namorada a praticar o abortamento. Que

crime ele praticou? Partícipe do art. 124.

3ª Situação – É a que cai. Namorado paga médico para realizar abortamento

com consentimento da namorada. Que crime ele praticou? Aqui a

jurisprudência diz: se ele pagou o médico, ele é partícipe do art. 126. Ele está

pagando o terceiro provocador. Ele está induzindo o terceiro provocador. Ele

está realizando conduta sem a qual o abortamento não ocorreria. Ele está

pagando terceiro provocador. Na verdade, ele participou do dois: arts. 124 e

126. Como não pode responder pelos dois, responde pelo mais grave.

Parágrafo único - Aplica-se a pena do artigo anterior, se

a gestante não é maior de 14 (quatorze) anos, ou é alienada

ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante

fraude, grave ameaça ou violência.

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Dado Analisado Art. 125 do CP Art. 126 do CP

Pune Aborto provocado por terceiro SEM o consentimento da gestante

Aborto provocado por terceiro COM o consentimento da gestante

Pena 3 a 10 anos 1 a 4 anos

Sujeito Ativo Crime Comum Crime Comum

Sujeito Passivo Gestante + o feto (delito de dupla subjetividade passiva)

Somente o feto (a gestante responde pelo Art. 124).

Conduta Punida Provocar o aborto SEM o consentimento

Provocar o aborto COM o consentimento

Tipo Subjetivo Pune-se o dolo (*) Pune-se o dolo

Consumação Morte do feto. Morte do feto.

Tentativa Admite – é delito plurissubsistente.

Admite – é delito plurissubsistente. Obs.: analisar o seu Parágrafo Único (**)

Se no meio do procedimento a gestante que consentiu se arrepende, o terceiro

provocador responde pelo Art. 125 do CP e a gestante responde pelo Art. 124 porque o

arrependimento dela foi ineficaz. O arrependimento tem que ser eficaz.

(*) “Quem desfere violento pontapé no ventre de mulher sabidamente grávida pratica o

crime de aborto havendo, pelo menos, dolo eventual.”

(**) Dissenso Presumido (o agente vai responder pelas penas do Art. 125) Parágrafo único - Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de 14 (quatorze) anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.

É imprescindível que estas condições da vítima ou circunstancias do consentimento

devem fazer parte do dolo do agente para se evitar a responsabilidade penal objetiva.

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3.4. Aborto Provocado por Terceiro com Consentimento da Gestante – art. 127

Caiu para delegado/DF (2ª fase)

Forma Qualificada Art. 127 - As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em conseqüência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.

O Art. 127 é chamado de qualificadora pelo legislador mas ele trás duas causas

de aumento de pena.

O aborto será majorado quando? Aborto majorado quando a gestante sofre

lesões graves ou lhe sobrevém a morte. Vamos a alguns detalhes:

O art. 127 só se aplica aos arts. 125 e 126, aos dois anteriores. E por que as

majorantes do art. 127 não se aplicam no caso do art. 124? O aborto majorado só ocorre

se ocorrer ao Art. 125 ou 126. Das duas uma: ou ela sofreu lesões graves e o direito penal

não pune a autolesão. Então, o art. 127 jamais se aplica ao art. 124. Por quê? Ou ela

morreu e não tem 124 ou se sobreviveu, sofrendo lesões graves, o direito brasileiro não

pune a autolesão. Detalhe importante: se eu falei que o art. 127 não se aplica ao art. 124,

não se aplica nem à gestante e nem aos partícipes da gestante. Não aumenta a pena

nem da gestante e nem do namoradinho que convenceu a gestante. Se não se aplica

para o principal, também não se aplica para o acessório.

Detalhe importante: nessas duas hipóteses, haja lesão grave ou morte, estamos

diante da figura do preterdolo. São resultados culposos. Dolo no abortamento, culpa na

lesão grave. Dolo no abortamento, culpa na morte. Crime preterdoloso ou

preterintencional. O aborto qualificado é crime preterdoloso ou preterintencional. O

aborto majorado é crime preterdoloso ou preterintencional.

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Pergunto: para incidir a majorante do art. 127 é dispensável ou indispensável a

interrupção da gravidez? Tem que ocorrer a morte do feto ou não, ele pode incidir sem a

morte do feto, basta, por exemplo, que a gestante sofra lesão grave? É dispensável a

morte do feto ou indispensável?

A resposta está no próprio art. 127: “se em consequência do aborto”, opa, aí ocorreu a

morte do feto. “Ou dos meios empregados para provocá-lo”. Aqui não ocorreu a morte

do feto, mas os meios geraram a morte da gestante ou sua lesão grave.

Em resumo: a morte do feto é dispensável.

Caiu para Delegado/DF: Provoca-se dolosamente as manobras abortivas. A gestante

morre culposamente, mas o feto não. Que crime praticou o terceiro provocador?

O terceiro provocador, negligentemente, provoca a morte da gestante sem lograr

interromper a gravidez. O feto nasce com vida. Qual crime ele pratica? Você já sabe que

o art. 127 se aplica independentemente do abortamento, basta a gestante sofrer lesão

grave ou morte. Aqui ela morreu. E agora?

1ª Corrente: Capez. Tratando-se de crime preterdoloso, não se admite tentativa.

Conclusão: ele vai responder por aborto majorado consumado. Sabe o que essa

corrente faz? Ela usa o mesmo raciocínio da súmula 610 do Supremo para o

latrocínio. A súmula diz que o latrocínio é consumado mesmo que a subtração seja

tentada. Aqui, essa corrente está falando: o aborto é consumado mesmo que a

morte do feto seja tentada. Seria dizer: há crime de aborto, quando o homicídio se

consuma, ainda que não realize o agente o abortamento. Olha o que diz a súmula:

STF Súmula nº 610 - DJ de 31/10/ - HÁ CRIME DE LATROCÍNIO, QUANDO O HOMICÍDIO SE CONSUMA, AINDA QUE NÃO SE REALIZE

O AGENTE A SUBTRAÇÃO DE BENS DA VÍTIMA.

HÁ CRIME DE ABORTO MAJORADO QUANDO O HOMICÍDIO SE CONSUMA, AINDA QUE NÃO SE

REALIZE O ABORTO.

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2ª Corrente: Rogério Greco. Mesmo se tratando de delito preterdoloso, admite a

tentativa quando a parte frustrada do crime é dolosa. Vocês já viram isso no

Intensivo I. Vocês não podem esquecer que o aborto majorado é um crime

preterdoloso. Há o aborto que é doloso seguido de morte que é culposa. Jamais

haverá tentativa quanto à morte culposa, mas é perfeitamente possível a tentativa

quando o que fica frustrado é a parte dolosa. Então ele responde por aborto

majorado, porém, tentado. Essa segunda corrente foi a resposta correta pra

delegado/DF. Questão boa. Prevalece a segunda corrente.

3.5. Aborto Legal ou Permitido – art. 128

Art. 128 - Não se pune o Aborto praticado por médico: Aborto Necessário I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante; Aborto no Caso de Gravidez Resultante de Estupro II - se a gravidez resulta de estupro e o Aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

É isso que vai cair na sua prova. O art. 128 traz o aborto legal ou permitido e tem

duas hipóteses:

Inciso I – Aborto necessário ou terapêutico

Inciso II – Aborto sentimental, humanitário ou ético.

Para a maioria da doutrina (eu não falei que é unânime), hipóteses especiais de

exclusão da ilicitude. Por quê? O aborto necessário é uma forma de estado de

necessidade e o aborto sentimental, uma forma especial de exercício regular de direito.

Luiz Flávio Gomes diz que se no inciso I é hipótese de estado de necessidade e o

inciso II é hipótese de exercício regular de direito, esse inciso II, na verdade, exclui a

tipicidade, porque ele trabalha com tipicidade conglobante. LFG fala: o inciso I, sim, é

forma especial de exclusão da ilicitude. O inciso II não porque eu já tirei o exercício

regular de direito da ilicitude há muito tempo. Exclui a tipicidade. Essa tese do LFG, se

vocês tiverem que comentar o art. 128 é importante colocar. Vocês estão demonstrando

que dominam tipicidade conglobante.

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a)Abortamento Necessário ou Terapêutico (Art. 128 inciso I)

1º Requisito – Praticado por médico.

2º Requisito – Perigo de vida da gestante.

3º Requisito – Inevitabilidade do meio abortivo. Impossibilidade do uso de outro

meio para salvá-la.

Que crime pratica se o abortamento necessário foi realizado por enfermeiro ou

farmacêutico? Tem crime? Eu não vou aplicar o art. 128 porque o art. 128 é só para

médico. Mas vou aplicar o art. 24 (estado de necessidade de terceiro). Cuidado! O fato

de não ser médico não significa que responde pelo crime. Eu não aplico ao Art. 128, mas

ele tem como estudo o próprio art. 24, estado de necessidade. Cuidado! Tem que haver

perigo de vida da gestante. Não basta risco à sua saúde.

O comportamento abortivo tem que ser inevitável. Não basta ser o meio mais

prático, mais eficaz. Tem que ser eficaz e inevitável. Se o médico utilizou o abortamento

por ser o mais cômodo, vai responder pelo crime.

Detalhes importantes:

Dispensa consentimento da gestante. Ela não precisa consentir. Mesmo diante

do dissentimento dela, o médico tem que salvar a sua vida.

Dispensa autorização judicial – Acreditem: o juiz não sabe mais que o médico.

Se o médico diz que a vida dela corre risco, não é o médico que tem que dizer

se o juiz acertou ou não acertou. Não existe interesse e necessidade. Ele não

tem que pedir autorização.

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b) Abortamento Sentimental, Humanitário ou Ético

1º Requisito – Praticado por médico.

2º Requisito – Gravidez resultante de estupro.

3º Requisito – Consentimento da gestante ou do seu representante legal.

E se foi praticado por enfermeiro ou profissional de enfermagem? Tem crime? Aqui

tem crime porque a vida dela não corria risco. Não havia exercício regular de direito

porque o direito é do médico, não dele. Qualquer pessoa que não seja médico, responde

pelo crime. Não é direito de ninguém mais realizar esse abortamento. Não adianta falar

em estrito cumprimento porque a lei não impõe esse dever. É só para médico!

A gravidez tem que ser resultante de estupro. Antes se discutia se abrangia também

o atentado violento ao pudor. Hoje se discute isso? Não porque hoje, estupro e atentado

violento ao pudor é tudo estupro em sentido amplo: abrange atos libidinosos diversos da

conjunção carnal. Agora, eu estou falando do art. 213, do CP, que abrange o antigo

atentado violento ao pudor.

Detalhe importante: abrange o estupro de vulnerável. Abrange o art. 217-A. O

próprio artigo diz: quando incapaz, consentimento do representante legal. Então,

abrange também o estupro de incapaz. É o estupro do 213, que abrange o atentado

violento ao pudor e o estupro de vulnerável todos admitem o abortamento permitido.

Lei 12.015-2009 Antes Depois

De acordo com a maioria abrage o atentado violento ao pudor (analogia in bonam partem)

Abrange expressamente porque o atentado violento ao puder é comportamento caracterizador de estupro.

Dispensa autorização judicial. Você não controla a jurisprudência do STF exigindo,

pelo menos o B.O. Absurdo. Onde que a lei exige B.O.? Autorização judicial já seria

absurdo. Imagina! O MP discorda e recorre. Acabou! Autorização judicial não se exige

mesmo, mas onde que o Supremo arrumou B.O.? Vocês vão encontrar julgados do

Supremo exigindo B.O. para o médico praticar isso. Isso já caiu 4 vezes em concursos

públicos. Todas as bancas negaram posição do Supremo. O médico que exija alguma

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formalidade que não necessariamente um B.O. Pede uma declaração firmada em

cartório, alguma coisa. Mas exigir B.O. é ridículo.

Caiu recentemente em concurso se é necessária a condenação pelo crime de

estupro. Dá para ter cinco filhos. Não precisa autorização judicial, muito menos uma prova

de condenação por estupro.

c) Abortamento de Feto Anencefálico

A dissertação da magistratura/SP (último concurso) foi abortamento anencefálico.

Aliás, tem sido uma constante. Os concursos públicos que têm dissertação, a tendência é

explorar penal especial e legislação penal especial. Penal especial tem sido a tendência

porque não há mais o que perguntar.

É espécie de aborto eugênico. Para vocês entenderem bem este aborto, o que

precisam conceituar em primeiro lugar? O que vem a ser anencéfalo?

“Anencéfalo é embrião, feto ou recém-nascido que, por malformação congênita

não possui uma parte do sistema nervoso central, faltando-lhe os hemisférios cerebrais e

tem uma parcela do tronco encefálico.”(Maria Helena Diniz)

Quando estou falando em abortamento do feto anencefálico estou falando do

abortamento de um feto que apresenta essas características físicas.

Esse abortamento é crime, não é crime, é permitido não é permitido, e aí? É isso o

que o examinador queria saber. Essa dissertação eu começaria pelo conceito e depois

desenvolveria do jeito que vou fazer com vocês, sob o ponto de vista legal, sob o ponto

de vista doutrinário e jurisprudencial.

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*Sob o ponto de vista legal:

O que diz a lei sobre o abortamento do feto anencefálico? Analisando nosso direito

posto, este abortamento não é permitido. Vocês não podem esquecer que as hipóteses

de abortamento permitido estão no art. 128, do Código Penal. Dentre as hipóteses, vocês

não vão encontrar o abortamento do feto anencefálico.

Observação, para não vir pergunta nesse sentido: “Rogério, mas e se a gestante

corre risco de vida?” Aí tudo bem, você está praticando o abortamento porque ela corre

risco de vida. Uma coisa não necessariamente implica na outra.

“Logo, no Brasil, é crime. A exposição de motivos expressamente proíbe o

abortamento do feto anencefálico.”

Se você tem alguma dúvida, você vai lá ver. Existe projeto de lei autorizando, no

entanto, ainda está em fase de projeto de lei. Então, um juiz legalista (que trabalha com o

direito posto e mais nada), jamais vai autorizar o abortamento do feto anencefálico, ele

vai dizer: “esse abortamento não está permitido e é crime. A exposição de motivos

claramente proíbe apesar de haver projeto de lei e projeto de lei não tem eficácia

jurídica e nem social.”

*Sob o ponto de vista doutrinário:

Você vai encontrar doutrina dizendo que o abortamento do feto anencefálico é

hipótese de exclusão da culpabilidade para a gestante. Inexigibilidade de conduta

diversa. É inexigível de uma gestante de feto anencefálico conduta diversa. Quando

percebe que vai dar à luz um recém-nascido com vida extrauterina inviável é inexigível

dela conduta diversa. Quem adota essa corrente? Cezar Roberto Bittencourt.

A doutrina, com base em estudos da medicina chega a dizer que feto

anencefálico não tem vida intrauterina. Logo, não morre juridicamente. Por quê? Ela está

ligando vida à atividade encefálica. Por conta da anencefalia, a doutrina diz: não tem

vida intrauterina, logo, você não pode matar aquilo que já está morto.

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Um terceiro argumento da doutrina diz que a questão diz respeito à saúde e direito

da mulher. Isso significa, em apertada síntese que, quem tem que decidir é a gestante e

não o legislador, e não a coletividade e o Estado. A questão diz respeito à saúde e direito

da mulher.

Então, a doutrina quando fala do abortamento do feto anencefálico busca excluir

a culpabilidade da gestante com a inexigibilidade de conduta diversa, diz que o feto

anencefálico não tem vida intrauterina, logo, não morre juridicamente e a questão diz

respeito à saúde e ao direito da mulher, não da coletividade e do Estado.

*Sob o ponto de vista jurisprudencial:

A jurisprudência admite, desde que:

1. Somente para as anomalias que inviabilizem a vida extrauterina.

2. Deve estar a anomalia devidamente atestada em perícia médica

3. Prova do dano psicológico da gestante.

Na defensoria pública já caiu isso. O candidato teve que falar quais os argumentos

para possibilitar a interrupção de um feto anencéfalo. Somente nesses três casos. São três

requisitos cumulativos, que a jurisprudência tem autorizado a interrupção da gravidez.

O Supremo foi chamado a se manifestar e está analisando a arguição de

descumprimento de preceito fundamental – ADPF n.º 54. E nesta ADPF o Supremo já fez

algumas audiências públicas para colacionar argumentos pro e contra. Então, o STF tem

no seu colo uma ADPF para autorizar ou não o abortamento do feto anencefálico.

O Ministro Marco Aurélio tem uma decisão emblemática nessa ADPF, em sede

liminar. Ele, liminarmente autorizou, mandou suspender todo e qualquer processo crime

que envolva esse tipo de abortamento, detonou. E tem uma expressão dele que chamou

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a atenção de todos, inclusive, das bancas de concurso. E vocês vão anotar e vão ver que

o ministro mais ou menos lançou esses requisitos da jurisprudência:

“Diante de uma deformação irreversível do feto, há de se lançar mão dos avanços

médico-tecnológicos postos à disposição da humanidade, não para simples inserção, no

dia a dia, de sentimentos mórbidos, mas justamente, para fazê-los cessar.”

Essa expressão do Ministro Marco Aurélio foi explorada por todos os jornais e

também por bancas de concurso. Ele está dizendo que a medicina não vai trazer o

sentimento mórbido “matar”. Ela vai evitar o sofrimento maior. Em nenhum momento, em

sala de aula eu vou me posicionar a favor ou contra, mesmo porque envolve sentimentos

religiosos. Mas, na audiência pública, teve uma mulher que usou uma expressão que me

fez refletir. Não estou dizendo que eu concordo, nem que discordo, não estou dizendo

nada. Mas ela, por questões pessoais, quis seguir com a gravidez e deu à luz ao feto

anencefálico que viveu minutos. E ela falou. Eu, ao contrário das outras mães, não

preparei um berço. Eu já preparei o caixão. Eu escutei aquilo e começo a perceber que é

algo muito mais particular, da gestante, da família, do que do próprio Estado. Cada um

com a sua consciência. A audiência pública é riquíssima em doutrina, em conhecimentos

técnicos. Se vocês puderem acessar a TV Justiça. Acho que ela disponibilizou as principais

discussões dessa audiência pública. Se vocês puderem, adquiram, acessem e assistam.

Vocês têm vários argumentos para se posicionar a favor ou contra o abortamento

do feto anencefálico. Eu vou dar a matéria como encerrada.

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LESÃO CORPORAL

(art. 129 do CTB)

TOPOGRAFIA DO ART. 129

Art. 129, caput: Lesão dolosa leve.

Art. 129, § 1º: Lesão dolosa grave – Cuidado que aqui temos a primeira pegadinha em concurso porque o § 1º não traz somente a lesão dolosa grave. Vocês vão ver que ele também tem lesão preterdolosa grave. O candidato tem o vício de imaginar que o preterdolo só está no § 3º, na lesão seguida de morte. Não! O § 1º também tem o preterdolo.

Art. 129, § 2º: Lesão dolosa gravíssima – É a segunda pegadinha em concurso. Também no § 2º tem preterdolo. Ela também pode ser preterdolosa. Vocês vão ver daqui a alguns minutos que algumas modalidades dos §§ 1ºe 2º, necessariamente são preterdolosas.

Art. 129, § 3º: Lesão seguida de morte (esta genuinamente preterdolosa, é onde o crime preterdoloso melhor se explica – é o conhecido homicídio preterdoloso).

Art. 129, §§ 4º e 5º: Lesão dolosa privilegiada

Art. 129, §6º: Lesão culposa

Art. 129, §7º: Majorantes

Art. 129, §8º: Perdão judicial Art. 129, §§ 9º, 10 e 11: Violência doméstica e familiar (aqui não é só contra a mulher)

1. Bem jurídico tutelado:

Fase oral da magistratura do Paraná: Qual é o bem jurídico tutelado?

O bem jurídico tutelado é a INCOLUMIDADE PESSOAL (é a saúde, sob os aspectos

corporal/físico, fisiológico e mental). O item 42 da Exposição de Motivos do Código Penal

traz essa previsão. Um desmaio, portanto, pode ser tido como lesão corporal. Portanto, o

bem jurídico tutelado não é só a integridade física.

2. Sujeito ativo:

Quem pode praticar lesão corporal? Qual é o sujeito ativo?

O crime de lesão corporal é comum, ou seja, pode ser praticado por qualquer

pessoa, não exigindo nenhuma condição especial do agente.

Pequena parcela da doutrina afirmando que, nos parágrafos 9º, 10 e 11 o crime é

próprio, pois exigem uma relação entre os sujeitos. Não é que prevalece.

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E se for Policial Militar quem ofende a incolumidade pessoal?

R: Discutia-se na doutrina se o PM iria responder só por lesão, ou só por abuso de

autoridade, ou lesão e abuso em concurso material (artigo 69), ou lesão e abuso em

concurso formal (artigo 70). Prevalece que o policial militar responde por lesão corporal e

abuso de autoridade, em concurso MATERIAL (artigo 69 do CP), até porque crimes tutelas

bens jurídicos diversos.

Quem julga a lesão corporal e quem julga o abuso no caso retro?

R: A jurisprudência é pacífica no sentido de só a lesão corporal vai para a Justiça

Militar, ao passo que a Justiça Comum processa e julga o abuso de autoridade (haverá

separação de processos). Vide súmula 172 do STJ.

Súmula 172 do STJ: COMPETE À JUSTIÇA COMUM PROCESSAR E JULGAR MILITAR POR

CRIME DE ABUSO DE AUTORIDADE, AINDA QUE PRATICADO EM SERVIÇO.

3. Sujeito passivo:

Em regra, o SUJEITO PASSIVO é comum (qualquer pessoa). Excepcionalmente a

vítima é própria. As duas hipóteses em que o legislador exige uma condição especial da

vítima são:

i) artigo 129, parágrafo 1º, IV (aceleração de parto);

ii) artigo 129, parágrafo 2º, V (aborto culposo).

Em ambas as hipóteses, a vítima deve ser gestante.

Nos parágrafos 9º e seguintes o sujeito passivo pode ser homem ou mulher. Quem só

protege a mulher é a Lei Maria da Penha, o CP pune os dois. As medidas protetivas só

protegem a mulher, mas a lesão corporal protege os dois.

§ 9o Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. § 10. Nos casos previstos nos §§ 1o a 3o deste artigo, se as circunstâncias são as indicadas no § 9o deste artigo, aumenta-se a pena em 1/3 (um terço). § 11. Na hipótese do § 9o deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência.

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Tratando-se de vítima não maior de 14 ou se maior de 60 anos, a pena é

aumentada, segundo o artigo 129, parágrafo 7º.

§ 7º - Aumenta-se a pena de um terço, se ocorrer qualquer das hipóteses do art. 121, § 4º. Artigo 121: § 4o No homicídio culposo (LESÃO CORPORAL CULPOSA), a pena é aumentada de 1/3 (um

terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conseqüências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio (DOLOSA A LESÃO), a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos.

Que crime pratica uma pessoa que convence outra a se lesionar?

Em regra, a auto-lesão não é considerada como crime, haja vista que, para a

conduta ser assim considerada seus efeitos devem transcender ao próprio autor.

O direito penal não pune a autolesão. Entretanto, deve-se considerá-la quando tiver

por motivo atingir fim criminoso (fraudar seguro, por exemplo).

De acordo com o art. 184 do CPM constitui crime lesionar o próprio corpo com o

objetivo de se tornar inabilitado para o serviço militar.

Ao se convencer um incapaz a ferir o próprio corpo, este não cometerá crime, mas

quem o induziu pratica lesão corporal na condição de autor mediato.

Tentativa de dar um soco, no que a vítima desvia e, entretanto, escorrega, cai e

quebra o braço. Por que crime responderá o autor?

R: Responderá por lesão corporal consumada. Vide artigo 13, parágrafo 1°, a

contrário senso. A fratura é concausa relativamente independente superveniente, que não

por si só produziu o resultado. Logo, o resultado será imputado ao autor do soco.

Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe

deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. Superveniência de causa independente § 1º - A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando,

por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou.

O “não por si só” está na mesma linha de desdobramento causal normal. A queda e

a fratura são eventos previsíveis.

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MP/RO: que crime pratica uma pessoa que convence um doente mental a

“estuprar” uma cabra? R: é crime ambiental (maus tratos).

4. Núcleos do tipo:

O crime é ofender a incolumidade pessoal de outrem.

O “ofender” pode ser praticado por ação ou por omissão, direta ou indiretamente.

Haverá lesão corporal quando alguém causa enfermidade em outrem ou agrava

enfermidade já existente.

É dispensável ou indispensável dor para se consumar a lesão corporal?

R: A dor é dispensável. Exemplo: provocar desmaio em alguém é lesão corporal e,

desmaio não tem dor. A dor pode influenciar na fixação da pena pelo juiz.

Cortar cabelo contra a vontade da vítima é lesão corporal (concurso de Delegado da

Polícia Civil do Rio de Janeiro)?

R: A jurisprudência diverge. Uma primeira corrente entende que constitui crime de lesão

corporal desde que a ação provoque alteração desfavorável no aspecto exterior do

indivíduo, considerando os padrões sociais médios. A segunda corrente entende que não

é caso lesão corporal, mas tão-somente injúria real. A duas correntes estão corretas, tudo

depende do ânimo do agente. Há ainda correntes que entendem ser o fato atípico ou

furto (se o cabelo tiver valor econômico – Flávio Monteiro de Barros).

A pluralidade de ferimentos gera a pluralidade de crimes?

R: A pluralidade de ferimentos no mesmo contexto fático não desnatura a unidade do

crime (o crime continua único). O juiz, entretanto, considerará a pluralidade de ferimentos

na fixação da pena-base.

Se a vítima consente na lesão, haverá crime? O consentimento do ofendido exclui o crime

quando?Concurso da magistratura de São Paulo.

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Consentimento do ofendido como descriminante supralegal:

1 – O dissentimento não pode integrar o tipo, senão não se terá sequer fato típico.

2 – A vítima deve ser capaz.

3 – O consentimento deve ser dado de maneira livre e consciente.

4 – O consentimento deve recair sobre BEM DISPONÍVEL.

5 – O consentimento deve ser manifestado antes e durante a execução.

6 – Deve haver manifestação expressa. Há doutrina, entretanto, que já admite

manifestação tácita.

A integridade da pessoa é bem indisponível?

R: A doutrina clássica ou tradicional entende que a incolumidade pessoa é um bem

indisponível. Se adotarmos essa corrente, a pessoa que coloca brinco ou piercing, ainda

que com autorização da pessoa, comete lesão corporal.

Por isso, que a doutrina moderna (CEZAR ROBERTO BITENCOURT) prefere trata a

incolumidade pessoal como um bem relativamente disponível. Será disponível quando a

lesão for leve e não contrariar a moral e os bons costumes. Assim, o consentimento do

ofendido exclui a ilicitude.

A doutrina moderna tem amparo legal, é a lei 9.099/95 que, corroborando com

entendimento de que a lesão leve é bem relativamente disponível, transformou o crime

de lesão leve de ação pública incondicionada em ação pública condicionada a

representação.

Qual a diferença entre o crime de lesão corporal e a mera contravenção penal de vias

de fato?

R: As vias de fato trata-se de uma contravenção penal, e consiste na violência

empregada contra a vitima sem acarretar-lhe qualquer dano corporal. Sendo que, para

os garantistas, esta conduta não deveria ser tipificada.

Na contravenção penal não existe, e sequer é a intenção do agente, dano à

incolumidade pessoal da vítima.

De acordo com o art. 88 da Lei 9.099/95, quando a lesão corporal for de natureza

leve, a integridade corporal é considerada um bem disponível.

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Concurso da segunda fase da Magistratura da Bahia: Como interpretar a

intervenção médica, cirúrgica ou reparadora, sob a ótica da teoria geral do delito

(crime)? Por que o médico não responde por lesão corporal?

Há seis maneiras de se analisar a conduta do médico:

1 – Porque não há tipicidade (posição de BENTO DE FARIA).

2 – Porque não há dolo caracterizador do delito (atipicidade por outro fundamento –

o dolo do médico é de curar. É a posição de FRANCISCO DE ASSIS TOLEDO – autor muito

adotado nos concursos mineiros).

3 – Porque o médico tem o consentimento do ofendido como causa supra legal de

exclusão da ilicitude (CEZAR ROBERTO BITENCOURT). A integridade física é bem

relativamente disponível.

4 – Porque o médico está amparado na discriminante do exercício regular de direito,

ou, em caso de urgência, estado de necessidade (posição da doutrina clássica).

5 – Porque o médico está amparado pela teoria da imputação objetiva (LUIZ FLÁVIO

GOMES). Não há criação ou incremento de risco proibido.

6 – Porque o comporta a aplicação da teoria da tipicidade conglobante

(ZAFFARONI). O comportamento do médico é um ato normativo.

Conclusão: Lesões desportivas, cirurgias transexuais, transplantes de órgãos e

cirurgias, para a doutrina tradicional, a conduta é considerada como típica, adequando-

se ao art. 129 do CPB, porém não é ilícita. Ocorre, porém, que, de acordo com a teoria da

imputação objetiva, teoria mais moderna, um resultado só pode ser atribuído a um

agente quando ele cria um risco proibido, sendo, pois, esta conduta considerada como

atípica. Ademais, de acordo com Teoria da Tipicidade conglobante de Zaffaroni, não se

pode considerar típica uma conduta fomentada ou ordenada pelo direito.

5. Consumação:

Quando é que se consuma a lesão corporal?

R: Cuida-se de crime material, que se consuma com a efetiva ofensa à incolumidade

pessoal da vítima. Lembrando que dispensa a dor.

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6. Tentativa

Primeira fase da magistratura de São Paulo: o crime admite tentativa?

R: É possível a tentativa nas lesões dolosas, não na preterdolosa ou culposa.

AULA 01/10/2010

7. Análise do art. 129:

A) LESÃO CORPORAL LEVE Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:

Pena - detenção, de três meses a um ano.

Quando uma lesão será considerada leve?

A natureza leve da lesão nos é dada por exclusão (quando não for grave, gravíssima

ou seguida de morte). Cuida-se de crime de menor potencial ofensivo, cuja ação penal

depende de expressa manifestação do ofendido (art. 88 da 9.099/95).

A lesão corporal leve é um crime qualificado pelo resultado, não se enquadrando

em nenhumas das hipóteses arroladas nos §§ do art. 129 do CPC.

Quero saber, admite flagrante? Sim ou não? Pergunta de concurso. Infração penal

de menor potencial ofensivo admite flagrante? Claro que admite! O autor dos fatos

escapa do auto de prisão em flagrante se ele se compromete a comparecer no juizado.

Isso significa que se ele não se compromete, instaura-se, inclusive, o auto de prisão em

flagrante. Cuidado com isso! O candidato desavisado tem a mania de pensar que

infração de menor potencial ofensivo não admite flagrante. Admite captura, admite

condução à delegacia e admite auto de prisão em flagrante se ele não se comprometer

a comparecer no Juizado. Se ele se compromete a comparecer, ele só evita o auto de

prisão em flagrante. Eu já ouvi policial falar: “é doutor, bateu nela e eu não posso prender

em flagrante.” E eu falei: “e eu não posso prender o senhor em flagrante porque não

existe prevaricação culposa ou por ignorância.” Que absurdo! Claro que admite

flagrante, condução à delegacia e, na delegacia, se ele se compromete a comparecer

no Juizado, evita a terceira fase do flagrante, que é a lavratura do auto. Só isso. Idem

para o desacato, etc. O policial fala: “me xingou, não posso fazer nada.” Como não??

Prende em flagrante.

*Crime qualificado pelo resultado – é aquele em que o legislador, após uma conduta

típica com todos os seus elementos acrescenta-lhe um resultado cuja ocorrência irá

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provocar o agravamento da pena. Uma das espécies de crime qualificado pelo resultado

é o crime preterdoloso (dolo no antecedente e culpa no conseqüente).

Aplica-se o PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA?

R: Sim. Tem doutrina aplicando o princípio da insignificância também a lesão dolosa

(beliscões, arranhões etc). Heleno Fragoso e Pierangeli, admitem o princípio da

insignificância excluindo a tipicidade. O professor, entretanto, só entende possível na

lesão culposa.

Obs.: Injúria real – um simples tapa na cara, aquele em que na verdade não se quer

machucar a pessoa, mas somente reduzir sua condição constitui o crime de injúria real

(vide art. 140 § 2.º do CPB).

B) LESÃO CORPORAL DE NATUREZA GRAVE

Traz hipóteses de dolo e de preterdolo. Aqui, diferentemente da leve, o legislador diz

o que é lesão grave.

§ 1º Se resulta:

I - incapacidade para as ocupações habituais, por mais de 30 (trinta) dias; II - perigo de vida; III - debilidade permanente; IV - aceleração de parto: Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos. O § 1º traz quatro incisos indicadores de lesão corporal de natureza grave. Eu vou

analisar cada um deles separadamente. Só para vocês perceberem, pela pena significa

que estou diante de qualificadora. O § 1º é qualificadora. Não é causa de aumento.

Deixa de ser de menor potencial ofensivo (1 a 5 anos), mas continua admitindo suspensão

condicional do processo.

I - Incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias;

Por ocupações habituais, deve-se entender como qualquer atividade corporal

rotineira, não necessariamente ligada à ocupação lucrativa ou à trabalho, devendo ser

lícita, ainda que imoral.

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Prostituta pode ser vítima de lesão corporal de natureza grave se ela não puder

exercer o comércio corporal rotineiro?

R: Sim, já que a prostituição é um exercício de atividade lícita, ainda que imoral.

Já o ladrão que fica impossibilitado de roubar não pode ser vítima.

Um bebê de 6 meses pode ser vítima dessa lesão?

R: Pode sim, se não consegue fazer atividade rotineira, como, por exemplo,

“mamar”.

A mulher foi espancada e, por razões de vergonha, passa 30 dias sem sair de casa.

Pergunta-se: a lesão foi grave?

R: Não, porque ela não estava incapacitada para sua ocupação habitual em razão

da lesão, mas sim pela vergonha da lesão. Assim, simples vergonha de praticar a

ocupação habitual não qualifica o crime.

Para configurar essa qualificadora, deve-se ficar incapacitado por MAIS de trinta dias. Por

isso, nessa lesão faz-se necessário um exame pericial complementar para comprovar a

incapacidade, devendo ser um exame realizado por meio de diagnostico, não podendo

o médico se valer de adivinhações. A ausência do exame complementar poderá suprida

pela prova testemunhal. Para saber se você ficou ou não incapacidade para as

ocupações habituais por mais de 30 dias, quando chegar o 30º dia você tem que fazer

nova perícia. No dia da lesão, nós atestamos a materialidade com uma primeira perícia

que não tem poderes divinatórios. Ela não tem como adivinhar se você vai ficar mais de

30 dias incapacitado. Então, o que o médico legista faz? Determina o retorno decorridos

trinta dias e vai fazer nova perícia para saber se está ou não apto a voltar para as

ocupações habituais. Então, vou precisar de duas perícias. A primeira e a segunda,

chamada de complementar. Isso está onde? Art. 168, §2º do CPP: CPP Art. 168 – § 2o Se o exame tiver por fim precisar a classificação do delito no art. 129, § 1o, I, do Código Penal, deverá ser feito logo que decorra o prazo de 30 (trinta) dias, contado da data do crime. § 3o A falta de exame complementar poderá ser suprida pela prova testemunhal.

Cuida-se de prazo penal (computo o primeiro dia e excluo o último dia) ou

processual penal (excluo o dia do início e computo o dia final)?

Esse prazo é para tipificar crime, sendo, portanto, prazo penal, devendo ser contado

o dia do início. Supondo que a lesão foi cometida em 10/1/09, o exame complementar

deve ser realizado em 10/2/09 (logo após o 30º dia, então logo após o dia 09/02/09).

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Cuida-se de crime a prazo. Outro exemplo de crime a prazo (concurso do Ministério

Público Federal) é a apropriação indébita de coisa achada.

II - perigo de vida;

Perigo de vida é a probabilidade séria, concreta e imediata do êxito letal,

devidamente comprova por perícia. Estamos no campo do perigo concreto e não no

campo do perigo abstrato. Ou seja, não se presume perigo de vida pelo simples local da

lesão, nem mesmo na cabeça. Só haverá essa qualificadora quando se comprovar que a

gravidade da lesão resultou perigo efetivo e concreto à vida da vítima.

A caracterização do perigo de vida vai depender da análise do caso concreto.

Essa qualificadora é necessariamente preterdolosa. Este perigo de vida só pode ser

provocado a título culposo, jamais a titulo de dolo. Dolo na lesão e culpa no perigo de

vida. Se o agente assume o risco de matar a vítima deixa de ser lesão corporal grave e

passa ser homicídio tentado.

III - debilidade permanente de membro, sentido ou função;

Membro: braços, antebraços, mãos, pernas, coxas, etc.).

Sentido: visão, audição, tato, paladar e olfato.

Função: atividade própria ou natural de um órgão (respiratória, circulatória,

digestiva, etc.).

Debilidade é enfraquecimento funcional, é diminuição da capacidade funcional.

Permanente significa recuperação incerta e por tempo indeterminado e não

perpétuo.

A perda de um órgão duplo (ex.: olho) caracteriza lesão corporal grave e não

gravíssima.

A perda de dedos da mão ou de um dente, para caracterizar a lesão grave, vai

depender se a perícia comprovar a debilidade permanente.

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RECURSO ESPECIAL Nº 609.059 - MG (2003/0210912-9) EMENTA PENAL. LESÃO CORPORAL GRAVE. PERDA DE DENTE. FUNDAMENTAÇÃO DO LAUDO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. POSSIBILIDADE DE TRATAMENTO ODONTOLÓGICO. IRRELEVÂNCIA. DEBILIDADE PERMANENTE DA FUNÇÃO MASTIGATÓRIA CONFIGURADA. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO PARCIALMENTE E, NESSA PARTE, IMPROVIDO. 1. Impede o conhecimento do recurso especial a falta de prequestionamento da questão federal. 2. Constatada mediante laudo pericial a debilidade permanente da função mastigatória em razão da perda de canino superior esquerdo, é irrelevante, para fins de tipificação penal, a possibilidade de restauração mediante tratamento odontológico, pois, para o reconhecimento da gravidade da lesão, não é preciso que ela seja perpétua e impassível de tratamento. 3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido.

Se a utilização de prótese suprir a incapacidade haverá exclusão da qualificadora?

R: A existência de prótese não descaracteriza a qualificadora. Não importa que o

enfraquecimento possa se atenuar ou se reduzir com aparelhos de prótese. É a posição

majoritária.

Não havendo perícia, deve ser entendido como lesão leve (“in dúbio pro reo”).

IV - aceleração de parto:

O feto nasce com vida, porém de forma prematura. Para evitar responsabilidade

penal objetiva, é necessário que o autor saiba ou que pudesse saber que a vítima era

gestante.

Para incidir essa qualificadora o agente não quer, nem assume o risco do aborto.

Se o feto nasce sem vida e morre logo após o nascimento passa a ser crime de lesão

corporal gravíssima (art. 129,§2º).

Em nenhuma das hipóteses o agente agressor quer ou assume o risco do aborto.

Ademais, para o agente responder por este crime é imprescindível que ele tenha

consciência da gravidez da vítima ou que pudesse saber disso para evitar a

responsabilidade objetiva.

Pena - reclusão, de um a cinco anos.

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C) LESÃO CORPORAL GRAVÍSSIMA

§ 2º - Se resulta: I - incapacidade permanente para o trabalho; II - enfermidade incurável; III - perda ou inutilização de membro, sentido ou função; IV - deformidade permanente; V - aborto. Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos.

No parágrafo 1º a lei denomina lesão grave. Já a expressão LESÃO CORPORAL DE

NATUREZA GRAVÍSSIMA não é de origem legal, mas sim doutrinária, a fim de diferenciar do

§ 1º . Denominação exigida no concurso de Delegado da Polícia Civil de São Paulo.

Atualmente essa denominação gravíssima foi adotada pelo legislador (vide art. 1º,

§3º da lei 9.455/97 – Lei de Tortura). Lei nº 9.455/1997 Art. 1º Lei de Tortura § 3º Se resulta lesão corporal de natureza grave ou gravíssima, a pena é de reclusão de quatro a dez anos; se resulta morte, a reclusão é de oito a dezesseis anos.

A infração é de médio potencial ofensivo e a ação é Ação Penal Pública

Incondicionada

§ 2° Se resulta:

I - Incapacidade permanente para o trabalho;

O parágrafo primeiro falava em ocupações habituais. No parágrafo segundo fala

em trabalho. Ademais, o inciso I do parágrafo anterior falava por mais de 30 dias; aqui,

fala-se incapacidade permanente.

Para incidir essa qualificadora, deve-se ficar inválido para o trabalho em geral, ou

basta que fique incapacitado para o trabalho que se exercita?

R: Prevalece que se deve ficar incapacitado para todo e qualquer tipo de trabalho.

O professor, particularmente, discorda. Critica já que, na prática, se adotar a primeira

corrente, tal inciso ficará quase que sem utilidade. MIRABETE também adota essa segunda

corrente (basta a incapacidade para trabalho anteriormente exercido).

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II - enfermidade incurável;

Cuida-se de alteração permanente da saúde em geral por processo patológico.

Cuida-se de transmissão intencional de doença para a qual a medicina ainda não

encontrou cura segura. Essa doença não pode ter natureza letal.

No Brasil, a transmissão intencional da AIDS configura tentativa de homicídio, porque

essa doença tem natureza letal; agora, manter relação com dolo de perigo, configura o

artigo 131 (periclitação da vida ou da saúde). Vide HC 9378/RS, do STJ – há dolo eventual. HABEAS CORPUS Nº 9.378 - RIO GRANDE DO SUL (1999/0040314-2) EMENTA HABEAS CORPUS. TENTATIVA DE HOMICÍDIO. PORTADOR VÍRUS DA AIDS. DESCLASSIFICAÇÃO. ARTIGO 131 DO CÓDIGO PENAL. 1 .Em havendo dolo de matar, a relação sexual forçada e dirigida à transmissão do vírus da AIDS é idônea para a caracterização da tentativa de homicídio. 2.Ordem denegada.

Obs.: a vítima não está obrigada a submeter-se a intervenção cirúrgica arriscada a

fim de curar-se da enfermidade.

III - perda ou inutilização do membro, sentido ou função;

O parágrafo primeiro inciso III (grave) falava em debilidade, isto é, enfraquecimento.

A lesão gravíssima fala em perda ou inutilização, isto é, inexistência de capacidade

funcional.

Na perda, o membro é destacado do corpo (amputação ou até a mutilação). Na

inutilização, o membro fica no corpo sem qualquer função.

A perda de um testículo caracteriza debilidade (lesão grave). Tratando-se de órgãos

duplos, para que seja gravíssimo, deve haver a perda dos dois. Assim, no caso de se

perder apenas um, a lesão é grave.

E se o lesão deixou impotente (a impotência pode ser instrumental ou “generandi”)?

Ambas as impotências são de natureza gravíssima.

IV - deformidade permanente;

Consiste no dano estético, aparente, considerável, irreparável pela própria força da

natureza e capaz de provocar impressão vexatória (desconforto para quem olha e

humilhação para quem a sustenta).

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O que é impressão vexatória? “Desconforto para quem olha, humilhação para a

vítima que a ostenta.”

A doutrina entende que idade, sexo, condição social e profissão influenciam na

qualificação dessa lesão (NELSON HUNGRIA). É diversamente apreciável uma cicatriz no

rosto de uma mulher e uma cicatriz no rosto de um homem.

Pouco importa o local da lesão desde que seja visível a quem quer que seja.

A Argentina e a Itália condicionam que essa deformidade seja no rosto ou em local

sempre exposto. No Brasil, não há essa restrição.

E se cirurgia plástica reparar essa deformidade?

R: A doutrina diz que mesmo sendo possível a cirurgia plástica, continua a

qualificadora, uma vez que a vitima não pode ser compelida a fazê-la. Agora, se a vítima

procura espontaneamente a cirurgia, desaparecerá a qualificadora.

O que é vitriolagem?

R: É uma lesão corporal gravíssima provocando uma deformidade permanente

causada por ácido sulfúrico.

V - aborto:

O agente age de maneira necessariamente preterdolosa - dolo na lesão e culpa no

aborto. Se agir com dolo no aborto, responderá pelo artigo 129 c/c artigo 125.

Art. 127 do CP Art. 129, § 2º, V Aborto qualificado pela lesão grave Lesão grave qualificada pelo aborto Dolo no aborto e ulpa na lesão grave Dolo na lesão grave e culpa no aborto

Para evitar responsabilidade penal objetiva é necessário que o agente saiba ou

pudesse saber que a vítima estava gestante.

É possível coexistência de qualificadoras? É sim possível. No parágrafo 1, prevê-se

pena de 1 a 5 anos. No parágrafo 2, prevê-se pena de 2 a 8 anos.

É possível a vítima ficar incapacitada para as ocupações habituais (Art. 129,§1º,I) e

ter deformidades permanentes( Art. 129, §2º, V)? É possível sim.

Deve-se, entretanto, aplicar a de natureza mais grave, servindo a outra como

circunstância judicial desfavorável.

Pena - reclusão, de dois a oito anos.

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D) LESÃO CORPORAL SEGUIDA DE MORTE (HOMICÍDIO PRETERDOLOSO):

§ 3° Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzi-lo: Pena - reclusão, de quatro a doze anos.

Cuida-se de homicídio preterdoloso ou preter-intencional. Não quis o resultado e

nem assumiu o risco de produzi-lo. Exclui-se o dolo direto e o dolo eventual.

São elementos dda figura criminal em estudo (lesão corporal seguida de morte):

(i) Há conduta dolosa dirigida à lesão corporal.

(ii) Há resultado culposo mais grave, qual seja, a morte.

(iii) Há nexo causal entre conduta e resultado.

O resultado deve ser culposo; se proveniente de caso fortuito ou força maior,

responderá somente pela lesão.

Vias de fato seguida de morte configura homicídio culposo (exemplo do empurrão,

em que se cai e bate a cabeça, levando ao óbito).

Tratando-se de delito preterintencional (preterdoloso) não admite a tentativa.

E) DIMINUIÇÃO DE PENA

§ 4° Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode (cuida-se de dever-poder) reduzir a pena de um sexto a um terço.

O § 4º traz a lesão corporal privilegiada abrangendo todas as hipóteses anteriores. O

privilegio alcança qualquer uma das modalidades anteriores. O privilégio se aplica ao

caput, o privilégio se aplica ao § 1º, o privilégio se aplica ao § 2º e ao § 2º. Se aplica a

qualquer uma das lesões dos §§ anteriores. Você pode ter lesão leve privilegiada, lesão

grave privilegiada, lesão gravíssima privilegiada e lesão seguida de morte privilegiada.

Só para que não haja dúvida, trata-se de direito subjetivo do réu, não faculdade

do juiz. A discricionariedade do juiz diz respeito somente ao quantum da redução.

Motivo de relevante valor social: o agente age no interesse de uma coletividade.

Motivo de relevante valor moral: o agente age no seu interesse, ligado ao sentimento

de compaixão, misericórdia ou piedade.

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F) SUBSTITUIÇÃO DA PENA

§ 5° O juiz, não sendo graves as lesões (SÓ SE APLICA AO “CAPUT”, HIPÓTESES DE LESÃO LEVE), pode ainda substituir a pena de detenção pela de multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis: I - se ocorre qualquer das hipóteses do parágrafo anterior; II - se as lesões são recíprocas.

Os incisos I e II são alternativos e não cumulativos.

A lei 9.714/98 fez com que esse parágrafo perdesse a utilidade, pela nova

metodologia de substituição das penas (alterou o Art. 44 do CP permitindo a aplicação

de multa substitutiva, isoladamente, para a pena de um ano de privação de liberdade).

G) LESÃO CORPORAL CULPOSA

§ 6° Se a lesão é culposa: Pena - detenção, de dois meses a um ano.

É infração de menor potencial ofensivo com ação pública condicionada a

representação.

Lesão Dolosa Lesão Culposa Leve – “caput” Leve – § 6º o juiz considera na fixação da

pena base (Art. 59 do CP) Grave - § 1º Grave - § 6º o juiz considera na fixação da

pena base (Art. 59 do CP) Gravíssima - § 2º Gravíssima - § 6º o juiz considera na fixação

da pena base (Art. 59 do CP)

A gravidade da lesão, em sendo culposa, não terá interesse. Sempre irá se ajustar ao

parágrafo 6, independentemente da gravidade – leve, grave ou gravíssima. A gravidade

da lesão só interfere na tipicidade quando a lesão for dolosa (poderá configura “caput”,

parágrafo 1 ou parágrafo 2).

Entretanto, a gravidade na lesão culposa irá influenciar na quantificação da pena.

A lesão culposa na direção de veículo automotor deixou o CP e foi para o Código

de Trânsito Brasileiro (artigo 303). A pena será de 6 meses a dois anos. O artigo 129,

parágrafo 6, tem pena que varia de 2 meses a 1 ano. Já o artigo 303 da lei 9.503/97 tem

pena de 6 meses a 2 anos. Foi “atropelado” o princípio da proporcionalidade.

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Lesão Culposa CP Art. 129, § 6º CTB Art. 303

Pena: de 2 meses a 1 ano Pena: 6 meses a 2 anos Desvalor do resultado é igual mas o desvalor da conduta é menos perigosa

Desvalor do resultado é igual, mas o desvalor da conduta é MAIS perigosa

Há minoria que diz ser inconstitucional, já que o desvalor do resultado é idêntico em

um ou outro tipo. Para rebater essa corrente, deve-se destacar que o crime deve ser

observado também sob a ótica do desvalor da conduta (no trânsito colocam-se mais

vidas em perigo).

Há quem compare o Art. 303 do CTB com o crime de lesão corporal dolosa leve para

defender a inconstitucionalidade do Art. 303 do CTB.

H) AUMENTO DE PENA

§ 7º - Aumenta-se a pena de um terço, se ocorrer qualquer das hipóteses do art. 121, § 4º. § 4o No homicídio culposo (LESÃO CULPOSA), a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício (ERRO PROFISSIONAL), ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conseqüências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante (QUESTIONA-SE A SUA CONSTITUCIONALIDADE, JÁ QUE NINGUÉM É OBRIGADO A PRODUZIR PROVA CONTRA SI). Sendo doloso o homicídio (LESÃO), a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos (NÃO É QUALQUER IDOSO – JÁ QUE NÃO ABRANGE O IDOSO COM IDADE IGUAL A 60 ANOS).

§ 8º - Aplica-se à lesão culposa o disposto no § 5º do art. 121 (perdão judicial). § 5º - Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as conseqüências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária.

Vide súmula 18 do STJ – a sentença é declaratória extintiva da punibilidade.

A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da

punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório.

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I) VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

A vítima pode ser homem ou mulher, se mulher poderá se valer das medidas

protetivas da Lei Maria da Penha.

§ 9o Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos.

Traz uma lesão leve qualificada, ou seja, uma qualificadora quando se tratar de

lesão dolosa leve. Significa que, havendo violência doméstica, em vez de se aplicar o

“caput”, aplica-se o parágrafo 9 do artigo 129. Deixa de ser crime de menor potencial

ofensivo (a pena máxima suplantou 2 anos) para ser de médio potencial ofensivo.

§ 10. Nos casos previstos nos §§ 1o a 3o deste artigo, se as circunstâncias são as indicadas no § 9o deste artigo, aumenta-se a pena em 1/3 (um terço).

Traz causa de aumento para lesão grave, gravíssima e seguida de morte, quando se

tratar de violência doméstica, aumentando a pena de 1/3.

§ 11. Na hipótese do § 9o deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência.

Traz causa de aumento para o parágrafo 9, em caso de violência contra as pessoas

lá indicadas, desde que deficientes. A pena aumenta-se de 1/3.

Quando é que se dá a violência doméstica e familiar, nos termos dos parágrafos 9,

10 e 11?

Vide parágrafo 9.

Primeira hipótese: contra ascendente, descendente ou irmão. Pouco importa

se o parentesco é natural ou civil.

Esses parentes precisam coabitar? A maioria da doutrina entende que

dispensa coabitação.

Segunda hipótese: contra cônjuge ou companheiro.

Terceira hipótese: contra (OU) quem conviva ou tenha convivido o agente.

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GUILHERME DE SOUZA NUCCI entende essa terceira hipótese como

circunstância que deve que ser agregada às outras duas hipóteses.

ROGÉRIO SANCHES, entretanto, entende como hipótese autônoma.

Exemplo dado por FLÁVIO MONTEIRO DE BARROS: república de estudantes.

No caso do que “tenha convivido”, a agressão deve estar atrelada ao

convívio pretérito.

Quarta hipótese: contra quem se prevalece das relações domésticas de

coabitação ou de hospitalidade.

Vide parágrafo 10 (trás majorantes para o caso da lesão dos §§ 1º a 3º do Art. 129).

Determina a aplicação de causa de aumento de 1/3 da pena sobre o

parágrafo 9º (qualificadora), quando o resultado da violência gerar lesão grave,

gravíssima ou seguida de morte.

Vide parágrafo 11 (trás majorantes do Art. 129, §9º).

Determina a aplicação de causa de aumento de 1/3 da pena sobre o

parágrafo 9º (qualificadora), quando a pessoa for portadora de necessidades especiais.

Exige condição especial da vítima. O conceito de pessoa portadora de necessidades

especiais está previsto nos artigos 3º e 4º do Decreto nº 3.298/99, que regulamentou a

Lei nº 7.853/89.

Bittencourt discorda entendendo que deve ser analisado o caso concreto.

Decreto nº 3.298/99 Art. 3º Para os efeitos deste Decreto, considera-se: I - deficiência - toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano; II - deficiência permanente - aquela que ocorreu ou se estabilizou durante um período de tempo suficiente para não permitir recuperação ou ter probabilidade de que se altere, apesar de novos tratamentos; e III - incapacidade - uma redução efetiva e acentuada da capacidade de integração social, com necessidade de equipamentos, adaptações, meios ou recursos especiais para que a pessoa portadora de deficiência possa receber ou transmitir informações necessárias ao seu bem-estar pessoal e ao desempenho de função ou atividade a ser exercida. Art. 4º É considerada pessoa portadora de deficiência a que se enquadra nas seguintes categorias: I - deficiência física - alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções; II - deficiência auditiva - perda parcial ou total das possibilidades auditivas sonoras,

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variando de graus e níveis na forma seguinte: a) de 25 a 40 decibéis (db) - surdez leve; b) de 41 a 55 db - surdez moderada; c) de 56 a 70 db - surdez acentuada; d) de 71 a 90 db - surdez severa; e) acima de 91 db - surdez profunda; e f) anacusia; III - deficiência visual - acuidade visual igual ou menor que 20/200 no melhor olho, após a melhor correção, ou campo visual inferior a 20º (tabela de Snellen), ou ocorrência simultânea de ambas as situações; IV - deficiência mental - funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como: a) comunicação; b) cuidado pessoal; c) habilidades sociais; d) utilização da comunidade; e) saúde e segurança; f) habilidades acadêmicas; g) lazer; e h) trabalho;

V - deficiência múltipla - associação de duas ou mais deficiências.

OBS.: Os parágrafos 9, 10 e 11 não exigem que a vítima seja mulher.

PAROU AQUI EM 01/10/2010

Lesão corporal seguida de morte

§ 3° Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado,

nem assumiu o risco de produzi-lo:

Pena - reclusão, de quatro a doze anos.

É um crime genuinamente preterdoloso ou preterintencional. O resultado não é alvo do

dolo direto, assim como não advém do dolo eventual.

Se o resultado morte não foi querido, não há dolo direito; se não foi aceito, não há dolo

eventual. O art. 129 exige ao menos a culpa, logo é preterdoloso.

Requisitos da lesão corporal seguida de morte:

É também chamado de homicídio preterdoloso.

a) conduta doloso visando ofender a incolumidade pessoal de alguém;

b) resultado morte culposo:

Se o resultado for proveniente de caso fortuito ou força maior, não se pode imputar o

resultado ao agente. Responderá apenas por lesão corporal.

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c) nexo causal entre conduta e resultado.

Ex: agente dá soco em alguém dentro de uma boite, ela cai em cima de garrafa e morre.

O soco foi visando machucar a vítima. Mas era previsível pelo local. Assim, responde o

agente por lesão corporal seguida de morte.

Ex: cubano que deu chute no juiz na olimpíadas na modalidade de takendoo. O cubano

chutou a cabeça do árbitro não para matar. Se o árbitro tivesse caído e batesse a

cabeça num prego do tatame. O resultado não foi ao menos culposo, pois ninguém iria

prever que em um tatame houvesse um prego virado para fora. Assim, não responde por

lesão seguida de morte.

Ex: agente dá empurrão na vítima, ela cai, bate a cabeça e morre, havendo uma morte

culposa. O empurrão é mera vias de fato. Assim, vias de fato seguida de morte é o caso

de homicídio culposo, com pena de um a três anos, ficando absorvida a contravenção

penal.

Art. 129, § 4.º:

Diminuição de pena

§ 4° Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral

ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o

juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço.

Essa hipótese lembra o homicídio privilegiado. Aqui, ocorre a lesão corporal privilegiada.

O § 4.º aplica-se a todos os §§ anteriores, ou sejam, pode ser privilegiada a lesão leve,

grave, gravíssima ou seguida de morte.

Trata-se de direito subjetivo do réu. Preenchidos os requisitos, o juiz é obrigado a reduzir a

pena. a discricionariedade do juiz só diz respeito ao quantum da redução, que varia de

1/6 a 1/3.

No mais, tudo o que se aplica ao homicídio privilegiado se aplica à lesão privilegiada.

Substituição da pena

§ 5° O juiz, não sendo graves as lesões, pode ainda substituir a pena de detenção pela de

multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis:

I - se ocorre qualquer das hipóteses do parágrafo anterior;

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II - se as lesões são recíprocas.

O § 5.º traz uma hipótese de substituição da pena. É exclusiva da lesão leve, ou seja, do

caput do art. 129 do CP.

Mas não basta ser a lesão leve, deve ser leve e privilegiada ou as lesões são recíprocas.

Lesão corporal culposa

§ 6° Se a lesão é culposa: (Vide Lei nº 4.611, de 1965)

Pena - detenção, de dois meses a um ano.

A lesão corporal culposa tem a mesma sistemática do homicídio culposo, com a única

diferença do resultado.

OBS: quando a lesão é culposa, não importa se é leve, grave ou gravíssima, sempre se

ajustando ao § 6.º do art. 129.

No caso de lesão dolosa a natureza da lesão pode gerar as penas do caput, § 1.º ou § 2.º.

No caso da lesão culposa, a natureza sempre vai desembocar no § 6.º, não importando

se é leve, grave ou gravíssima. O juiz considera a natureza ou gravidade da lesão na

fixação da pena base.

Ex: Lars Grael que perdeu uma perna em face de acidente de lanha pilotada por um

piloto alcoolizado. Embora a lesão tenha sido gravíssima, o autor incorreu no § 6.º do art.

129.

OBS: se o crime ocorrer na direção de veículo automotor, o crime será o previsto no art.

303 do CTB.

O art. 129, § 6.º do CP é caso de lesão culposa e a pena é de 2 meses a 1 ano; o art. 303

do CTB também traz caso de lesão culposa e a pena é de 6 meses a 2 anos.

Há quem entenda que pelo fato de o desvalor do resultado ser o mesmo, a pena do art.

303 é inconstitucional. Fere o princípio da proporcionalidade.

Se se olhar o desvalor da conduta, ambos são distintos. O desvalor da conduta justificaria

penas diferentes.

A tese da inconstitucionalidade é muito usada em provas da defensoria pública.

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A lesão corporal dolosa de natureza leve tem pena de 3 meses a 1 ano. Seria melhor para

o réu alegar que a conduta foi dolosa. Assim, quando se compara lesão culposa no

trânsito e lesão dolosa leve, fica difícil defender a falta de proporcionalidade.

Na prática, ainda não se tem conhecimento de tribunal que pronunciou a

inconstitucionalidade da pena da lesão culposa no trânsito.

Aumento de pena

§ 7º - Aumenta-se a pena de um terço, se ocorrer qualquer das hipóteses do art. 121, § 4º.

(Redação dada pela Lei nº 8.069, de 1990)

Vide comentários sobre o art. 121, § 4.º.

§ 8º - Aplica-se à lesão culposa o disposto no § 5º do art. 121.(Redação dada pela Lei nº

8.069, de 1990)

Quando a lesão é culposa admite-se o perdão judicial. Vide comentários acerca do

perdão judicial quando do estudo do crime de homicídio.

Violência domestica e familiar:

§ 9o Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou

companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o

agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: (Redação dada

pela Lei nº 11.340, de 2006) Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos. (Redação

dada pela Lei nº 11.340, de 2006)

Esse dispositivo se refere ao caput do art. 129.

A doutrina afirma que esse dispositivo se trata de crime comum, mas o professor pensa

que é crime bi-próprio, pois exige uma relação domestica ou familiar ou de intimidade

entre sujeito ativo e passivo.

A vítima necessariamente deve ser mulher? Não. A vítima pode ser homem ou mulher.

Se é caso de violência domestica ou familiar e a vítima é homem, está protegido pelo art.

129, § 9.º do CP; se a vítima é mulher está protegida pelo mesmo art. 129, § 9.º e ainda

pela Lei Maria da Penha. Isso é a prova de que essa lei, ao alterar o § 9.º do art. 129 previu

a possibilidade de que o homem possa ser vítima de violência domestica ou familiar.

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Para configurar lesão no âmbito doméstico e familiar é imprescindível que seja praticada

contra:

a) ascendente, descendente ou irmão:

Pouco importa se o parentesco é legítimo ou ilegítimo. Ora, a CF afirma que existe

parentesco, natural ou não. Assim, pouco importa se houve adoção.

A coabitação fica dispensada nesse caso.

b) cônjuge ou companheiro:

A união estável é abrangida em razão da proteção do companheiro.

Incide a qualificadora ainda que diante de separação de fato.

c) pessoa com quem conviva ou tenha convivido o agente:

Se trata de um terceiro grupo de vítimas ou é apenas um complemento dos grupos

anteriores?

Nucci não analisa a alínea “c” como autônoma, sendo um complemento das anteriores.

A maioria entende que trata-se de um terceiro grupo de vítimas, independente dos

anteriores.

Ex: república de estudantes, amantes. Basta que a agressão seja em razão da

convivência presente ou passada.

d) prevalecendo o agente das relações domesticas, de coabitação ou de hospitalidade:

São abrangidos os empregados domésticos, as visitas etc.

A pena do § 9.º é de 3 meses a 3 anos. É o caso de lesão leve que deixou de ser de menor

potencial ofensivo. Não é possível transação penal, sendo objeto de inquérito policial.

§ 10. Nos casos previstos nos §§ 1o a 3o deste artigo, se as circunstâncias são as indicadas

no § 9o deste artigo, aumenta-se a pena em 1/3 (um terço). (Incluído pela Lei nº 10.886,

de 2004)

Aplicam-se os comentários do § 9.º. Mas deve-se ressaltar que incide a majorante do

aumento de 1/3 da pena.

§ 11. Na hipótese do § 9o deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime

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for cometido contra pessoa portadora de deficiência. (Incluído pela Lei nº 11.340, de 2006)

O que significa ser a pessoa portadora de deficiência?

A expressão portadora de deficiência deve ser interpretada de acordo com os artigos 3.º

e 4.º do Decreto 3.298/99, que regulamentou a lei 7.853/89.

Ação penal nos crimes de lesão corporal:

Em regra, a ação penal é pública incondicionada.

Exceções:

a) Lesão dolosa leve (art. 129, caput):

A ação é pública condicionada. Art. 88 da Lei 9.099/95.

Art. 88. Além das hipóteses do Código Penal e da legislação especial, dependerá de

representação a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais leves e lesões

culposas.

b) Lesão culposa (art. 129, § 6.º):

Também se aplica o art. 88 da Lei 9.099/95.

No caso de violência doméstica e familiar, qual a ação penal?

Se a vítima for homem, deve-se diferenciar o art. 129, § 9.º do art. 129, § 10., onde se tem

lesão grave, gravíssima ou seguida de morte.

Se a vítima for homem e a lesão for grave, gravíssima ou seguida de morte, a ação é

pública incondicionada.

No caso do § 9.º do art. 129, se a vítima for homem, a lei não impede a aplicação da lei

9.099/95, logo pode-se aplicar o art. 88 dessa lei, ou seja, será a ação penal pública

condicionada. Assim, não importa a pena, mas sim a gravidade da lesão.

Se a vítima for mulher, no caso do art. 129, § 10.º, ou seja, lesão grave, gravíssima ou

seguida de morte, a ação é pública incondicionada.

Se a vítima for mulher, no caso do art. 129, § 9.º, apesar de ser lesão leve, o art. 41 da Lei

Maria da Penha veda a aplicação da lei dos juizados. Mas há duas correntes:

- a primeira corrente afirma que é caso de ação penal pública incondicionada. Traz os

seguintes argumentos:

A lei 11.340/06 veda a aplicação do art. 88 da Lei 9.099/95.

Trata-se de grave violação dos direitos humanos da mulher, incompatíveis com

outra espécie de ação penal.

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A vontade da mulher pode estar viciada diante do temor de nova agressão.

Defendem essa corrente LFG e Maria Berenice Dias.

- a segunda corrente entende que a ação penal é pública condicionada. Traz os

seguintes argumentos:

Quando a lei Maria da Penha veda a aplicação da lei 9.099/95, na verdade, não

quer admitir medidas despenalizadoras (transação penal, v.g), exteriores à vontade

da vítima, não abrangendo a representação.

O estupro é uma das formas mais graves de violação dos direitos humanos da

mulher e a pena é perseguida mediante queixa.

Eventuais pressões para que a vítima mulher se retrate da representação ofertada,

serão detectadas em audiência própria.

Essa segunda corrente é defendida por Damásio de Jesus e Ronaldo Batista Pinto, além

do próprio professor.

Em 2008, o STJ adotava a primeira corrente. Já em 2009 está adotando a segunda

corrente. Duas decisões do ano passado afirmaram que a ação é pública

incondicionada. Mas há uma decisão de 2009 em que o STJ entendeu que a ação é

pública condicionada à representação. Ressalte-se que todas essas três decisões são da

mesma Turma.

OMISSÃO DE SOCORRO

Omissão de socorro

Art. 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança

abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e

iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

Parágrafo único - A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal

de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.

O crime de omissão de socorro traduz uma norma de solidariedade humana. O bem

jurídico tutelado é a segurança do indivíduo, protegendo-se a vida e a saúde humana.

O sujeito ativo é comum, ou seja, pode o crime ser praticado por qualquer pessoa. Não

precisa, pois haver relação entre o sujeito ativo o passivo. Se houvesse relação de

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dependência entre vítima e agente, este seria garantidor, podendo responder por

homicídio e não por omissão de socorro.

O crime de omissão de socorro admite co-autoria?

Estar-se diante de um dever genérico de agir, ou seja, atinge a todos indistintamente.

Logo, não é possível co-autoria, sendo cada omitente autor do crime de omissão de

socorro.

Se houver quatro pessoas olhando a vítima agonizando e um delas resolve socorrer a

vítima, não há crime para os outros três agentes, pois se está diante de obrigação

solidária, ou seja, quando um agente cumpre a sua obrigação desonera os demais.

É possível omissão de socorro a distância, ou seja o autor do crime de omissão de socorro

deve estar presente no local?

- a primeira corrente afirma que a presença do sujeito ativo é indispensável, conclusão

extraída da natureza do delito (omisso). Adotada por Cezar Roberto Bittencourt. É a

corrente que predomina.

- a segunda corrente afirma que a presença do sujeito ativo é dispensável. Se tinha

condições de se deslocar ao local do perigo, haverá crime em caso de omissão. Damásio

adota essa tese.

Sujeito passivo no crime de omissão de socorro:

A vítima não é comum, mas sim própria: “à criança abandonada ou extraviada, ou à

pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo”. Só pode ser

vítima quem ostentar essas qualidades.

Magalhães Noronha fez a seguinte indagação: e se o sujeito passivo recusar o socorro? A

pessoa que consente e não socorre, pratica o crime? Sim, pois o bem protegido é

indisponível, pois independe do consentimento da vítima. Assim, mesmo que haja

oposição da vítima, deve-se insistir no socorro, desde que não haja risco para a pessoa

que vai socorrer.

O crime de omissão de socorro consiste em deixar de:

a) prestar assistência:

Há uma omissão de uma assistência imediata, ou seja, pessoal.

b) não pedir socorro da autoridade competente:

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Há uma omissão de assistência mediata.

É uma assistência subsidiária. Só se pode requerer socorro da autoridade competente

quando não possa fazê-lo. Se o fizer por mera comodidade, o crime será cometido.

Em ambos os casos o agente não pratica ação imposta pelo dever genérico. Está-se

diante de uma inação, ou seja, o agente não pratica a ação devida.

“Possível fazê-lo sem risco pessoal”: dessa expressão do tipo pode-se extrair o seguinte:

- se houver risco pessoal, não há crime. Isso porque não se preenche o tipo penal,

havendo atipicidade.

- risco meramente patrimonial ou moral não exclui a tipicidade, mas, dependendo do

caso, pode excluir a ilicitude. Ex: Camões salvando a obra e deixando as pessoas em

perigo.

É imprescindível que o omitente não tenha sido o causador doloso ou culposo do perigo.

Se assim o for, passa a ser garante ou garantidor. Não terá mais o dever genérico de agir,

mas sim o dever jurídico de evitar o resultado. Art. 13, § 2.º, “c” do CP:

§ 2º - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para

evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:(Incluído pela Lei nº 7.209, de

11.7.1984)

c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado. (Incluído

pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

O crime de omissão de socorro é punível a título de dolo. Mas quando é a sua

consumação? O crime se consuma com a omissão geradora de perigo.

Está-se diante de um crime de perigo. Mas o perigo é abstrato ou concreto? No perigo

abstrato não há necessidade de se demonstrar o perigo, pois presumido absolutamente

por lei. No perigo concreto precisa-se comprovar o perigo. No caso do crime de omissão

de socorro, se for omissão de socorro a criança abandonada ou extraviada, o perigo é

abstrato; se for pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo, o

crime é de perigo concreto, precisando ser comprovado.

OBS: há doutrinadores que questionam a constitucionalidade dos crimes de perigo

abstrato. LFG afirma que esses crimes não foram recepcionados pela CF. O STF também

assim entende. Os argumentos são os seguintes:

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- pune-se o agente sem se ter certeza da existência do perigo, ferindo o princípio da

lesividade ou da ofensividade.

- o perigo é absolutamente presumido por lei, ou seja, o réu não pode provar em sentido

contrário. Logo, fere-se o princípio da ampla defesa.

O crime de omissão de socorro admite tentativa?

Não, pois é crime omissivo próprio. É um crime unisubsistente, não podendo a execução

ser fracionada.

Parágrafo único - A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal

de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.

Está-se diante de majorante preterdolosa ou preterintencional. O agente age com dolo

na omissão e culpa na morte ou lesão grave.

O crime de omissão de socorro do CP é a geral, mas ainda há os crimes de omissão de

socorro no CTB e no Estatuto do Idoso.

No caso do CTB, a omissão de socorro é uma majorante do crime de homicídio culposo

na direção de veículo automotor.

Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor:

Penas - detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e suspensão ou proibição de se obter a

permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

Parágrafo único. No homicídio culposo cometido na direção de veículo automotor, a

pena é aumentada de um terço à metade, se o agente:

III - deixar de prestar socorro, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à vítima do

acidente;

Art. 303. Praticar lesão corporal culposa na direção de veículo automotor:

Penas - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e suspensão ou proibição de se obter a

permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

Parágrafo único. Aumenta-se a pena de um terço à metade, se ocorrer qualquer das

hipóteses do parágrafo único do artigo anterior.

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Art. 304. Deixar o condutor do veículo, na ocasião do acidente, de prestar imediato

socorro à vítima, ou, não podendo fazê-lo diretamente, por justa causa, deixar de solicitar

auxílio da autoridade pública:

Penas - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, ou multa, se o fato não constituir

elemento de crime mais grave.

Parágrafo único. Incide nas penas previstas neste artigo o condutor do veículo, ainda que

a sua omissão seja suprida por terceiros ou que se trate de vítima com morte instantânea

ou com ferimentos leves.

Art. 302 ou 303, majorados quando:

a) omitente for condutor:

b) omitente for condutor envolvido em acidente de trânsito:

c) omitente for condutor envolvido em acidente de trânsito, culpado pelo acidente.

Se o omitente for condutor envolvido em acidente de trânsito, culpado pelo acidente e

cometer infração de socorro, responde pelo art. 302 ou 303 do CTB.

Os casos do art. 304 são os seguintes:

a) omitente condutor:

b) omitente condutor envolvido em acidente:

c) omitente condutor envolvido em acidente, não culpado.

Se se tiver um omitente condutor não envolvido em acidente, aplica-se o art. 135 do CP.

Omissão de Socorro no Estatuto do Idoso:

Art. 97. Deixar de prestar assistência ao idoso, quando possível fazê-lo sem risco pessoal,

em situação de iminente perigo, ou recusar, retardar ou dificultar sua assistência à saúde,

sem justa causa, ou não pedir, nesses casos, o socorro de autoridade pública:

Pena - detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.

Parágrafo único. A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal

de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.

O art. 135 do CP é a norma geral, cedendo espaço para o Estatuto do Idoso, o qual, por

sua vez, cederá espaço para o CTB, se a omissão ocorreu no caso de acidente de

trânsito.

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Aula 06/10/2010

RIXA

Art. 137 - Participar de rixa, salvo para separar os contendores: Pena - detenção, de quinze dias a dois meses, ou multa. Parágrafo único - Se ocorre morte ou lesão corporal de natureza grave, aplica-se, pelo fato da participação na rixa, a pena de detenção, de seis meses a dois anos.

Conceito:

É uma briga perigosa entre mais de duas pessoas, agindo cada uma por sua conta e

risco, acompanhada de vias de fato ou violências recíprocas.

Quando se fala em duas ou mais pessoas deve-se ter o mesmo para dois ou mais grupos.

Ex: TUF contra cearagay não é rixa, mas sim lesão corporal, porque os grupos são

determinados e nãos mais que dois. Mas se a briga envolve as duas e a Falange, aí

haverá rixa, porque há mais de dois grupos envolvidos.

Mas pode haver rixa dentro da própria torcida, quando mais de duas pessoas brigam

entre si.

Agora com a Lei nº 10.671/2003 – Estatuto do Torcedor (Art. 41-B) incluído pela

Lei nº 12.299/2010 isto é crime:

Lei nº 10.671/2003 – Estatuto do Torcedor Art. 41-B. Promover tumulto, praticar ou incitar a violência, ou invadir local restrito aos competidores em eventos esportivos: (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010). Pena - reclusão de 1 (um) a 2 (dois) anos e multa. (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010). § 1o Incorrerá nas mesmas penas o torcedor que: (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010). I - promover tumulto, praticar ou incitar a violência num raio de 5.000 (cinco mil) metros ao redor do local de realização do evento esportivo, ou durante o trajeto de ida e volta do local da realização do evento; (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010). II - portar, deter ou transportar, no interior do estádio, em suas imediações ou no seu trajeto, em dia de realização de evento esportivo, quaisquer instrumentos que possam servir para a prática de violência. (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010). § 2o Na sentença penal condenatória, o juiz deverá converter a pena de reclusão em pena impeditiva de comparecimento às proximidades do estádio, bem como a qualquer local em que se realize evento esportivo, pelo prazo de 3 (três) meses a 3 (três) anos, de acordo com a gravidade da conduta, na hipótese de o agente ser primário, ter bons antecedentes e não ter sido punido anteriormente pela prática de condutas previstas neste artigo. (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010). § 3o A pena impeditiva de comparecimento às proximidades do estádio, bem como a qualquer local em que se realize evento esportivo, converter-se-á em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta. (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010). § 4o Na conversão de pena prevista no § 2o, a sentença deverá determinar, ainda, a obrigatoriedade suplementar de o agente permanecer em estabelecimento indicado pelo juiz, no período compreendido entre as 2 (duas) horas antecedentes e as 2 (duas) horas posteriores à realização de partidas de entidade de prática desportiva ou de competição determinada. (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010).

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§ 5o Na hipótese de o representante do Ministério Público propor aplicação da pena restritiva de direito prevista no art. 76 da Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995, o juiz aplicará a sanção prevista no § 2o. (Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010).

O bem jurídico primário (direto) protegido pelo art. 137 do CP é a incolumidade da pessoa

humana. O bem jurídico secundário (indireto) é a ordem e a paz pública. Tal consta do

item 48 da Exposição de Motivos do CP.

Sujeito ativo do crime de rixa:

É crime comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa. Necessariamente, também

será sujeito passivo. É sempre sujeito passivo.

Sujeito passivo:

A vítima também é comum. Nem sempre é sujeito ativo somente os “briguentos”,

podendo ser um pedestre, que é vítima, mas não sujeito ativo do crime de rixa.

Rogério Grecco entende que é um crime sui generis, onde o sujeito ativo também é

sujeito passivo em virtude das mútuas agressões (posição minoritária na doutrina).

Em momento algum se afirma que o sujeito passivo só pode ser o contendor.

Pode ser um pedestre, por exemplo.

Quanto ao concurso de agentes, o crime de rixa é de concurso necessário ou

plurissubjetivo.

É monossubjetivo quando o crime pode ser praticado por uma ou mais pessoas.

Será plurissubjetivo quando só pode ser praticado por número plural de pessoas. É o crime

de concurso necessário.

Qual espécie de crime plurissubjetivo é a rixa?

Os crimes plurissubjetivos se dividem em três espécies:

a) de condutas paralelas:

As condutas auxiliam-se mutuamente. Ex: quadrilha ou bando.

b) de condutas contrapostas (umas contra as outras):

Ex: rixa.

c) de condutas convergentes:

As condutas buscam-se umas as outras. Ex: bigamia e antigo adultério.

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O crime consiste em participar de rixa. A participação pode ocorrer de duas maneiras:

a) material:

O agente toma parte na luta. É o que a doutrina chama de partícipe da rixa.

b) moral:

O agente induz, incentiva a briga, sem dela tomar parte. É um partícipe do crime de

rixa.

É dispensável o corpo a corpo? Assim, é possível rixa a distância?

É possível rixa a distância, dispensando o corpo a corpo. Ex: arremesso de objetos.

Para ser rixa é necessário que a briga seja acompanhada de vias de fato ou violência

recíproca. Não há o crime de rixa quando só existem agressões verbais.

Crime de rixa é punido a título de dolo. Assim, não precisava que o tipo penal trouxesse a

expressão “salvo para separar os contendores”.

Tipo Subjetivo: é o dolo (direto / eventual) sendo a vontade consciente de tomar parte na

luta ou incentivar os briguentos.

Consumação:

O crime se consuma com a efetiva troca de agressões geradora de perigo. Mas o perigo

é abstrato ou concreto?

Prevalece que se trata de crime de perigo abstrato, ou seja, o legislador presume o perigo

presumidamente. Mas o STF e LFG têm entendido que crime de perigo abstrato não foi

recepcionado pela CF sendo, para eles, crime de perigo concreto (minoria da doutrina).

Para eles o crime de perigo abstrato fere o Princípio da Ofensividade ou da Lesividade e o

Princípio da Ampla Defesa.

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O crime de rixa admite tentativa?

Para a maioria o crime é unisubsistente (não admite fracionamento na execução), não

admitindo tentativa.

Porém, Nelson Hungria admitia tentativa no crime de rixa. Ex: rixa ex proposito ou de

surgimento combinado. Se mais de duas pessoas combinam rixa entre si e a polícia

impede, fica configurada a tentativa.

Assim, para Hungria a tentativa é possível no caso de rixa previamente combinada.

Para a grande maioria da doutrina, essa tentativa caracteriza meros atos preparatórios.

É possível legítima defesa no crime de rixa?

Deve-se distinguir duas situações:

a) Pessoa não participante da luta: suponha que A, B e C estão brigando um contra o

outro, cada um por sua conta e risco. Essa briga toma proporções e chega perto de D.

Este começa a repeli-la. D age em legítima defesa. Assim, é possível legítima defesa no

crime de rixa quando atinge terceira pessoa não participante do tumulto.

b) Pessoa participante da luta: suponha que A, B e C estão brigando com socos e

pontapés; de repente, A saca de uma arma e C percebe a desproporcionalidade no

comportamento de A e o mata. Nesse caso, C poderá alegar legítima defesa no que

concerne ao homicídio, mas não poderá fazê-lo com relação ao crime de rixa.

Parágrafo único - Se ocorre morte ou lesão corporal de natureza grave, aplica-se, pelo fato da participação na rixa, a pena de detenção, de seis meses a dois anos.

Se da rixa resultar morte ou lesão grave em um contendor?

Nesses casos, há três sistemas discutindo a punição:

a) Sistema da Solidariedade Absoluta:

Se da rixa resultar lesão grave ou morte, todos os participantes respondem pelo evento

lesão ou morte (homicídio), independentemente de se apurar o real autor do resultado.

b) Sistema da Cumplicidade Correspectiva:

Se da rixa resultar lesão grave ou morte e não sendo apurado o seu autor, todos os

participantes respondem pelo resultado lesão grave ou morte (homicídio), sofrendo,

entretanto, pena intermediária a do autor e do participe desses crimes.

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c) Sistema da Autonomia:

A rixa é punida por si mesma, independentemente do resultado agravador (morte ou

lesão grave), o qual, se ocorrer, somente qualificará o crime. Apenas o causador da lesão

grave ou morte, se identificado, responderá também por esses crimes dos artigos 121

(homicídio) e 129 (lesão) do CP. Foi o sistema adotado pelo CP (Art. 137, Parágrafo Único

do CP).

Suponha que A, B, C e D participam de uma rixa. C sofre lesão grave, não se tendo

apurado o causador dessa lesão. A, B e D respondem pelo crime de rixa qualificada. C,

que foi quem sofreu a lesão, também responde por rixa qualificada e mesmo tendo

sofrido a lesão, concorreu para que a rixa tenha sido mais perigosa.

Suponha que no mesmo exemplo, C morre e o causador da morte de C tenha sido B. A e

D respondem por rixa qualificada. Há duas correntes para o crime de B:

1. B responde por rixa qualificada e homicídio:

É a corrente que prevalece. B responde por rixa qualificada pelo maior perigo da

luta e por homicídio pela morte. Não se considera a mesma circunstância.

2. B responde por rixa simples e homicídio:

Com B respondendo por rixa simples evita-se o bis in idem.

Suponha que A, B, C e D estão numa luta que caracteriza rixa. As 19:00 horas C abandona

a briga e as 20:00 horas D morre e não foi identificado o autor do homicídio.

C responde por rixa qualificada porque de qualquer modo, com sua conduta anterior,

contribuiu para o maior perigo da luta. Isso porque há causalidade simples. Com o

comportamento anterior, C criou o risco do resultado. Aplica-se a teoria da equivalência.

Suponha que A, B, C e D se contendem. As 20:00 horas D morre. No seu lugar, entra E.

E responderá por rixa simples, pois entrou depois do resultado morte de D.

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CRIMES CONTRA A HONRA

Serão estudados três crimes contra a honra, mais precisamente calúnia, difamação e

injúria. Antes, porém, deve ser lembrado que os crimes contra a honra tem o CP como

estatuto geral, além de leis especiais.

Eu tenho leis especiais também assim fazendo. Por exemplo:

Código Brasileiro de Telecomunicações também protege a honra contra esses tipos de crime.

Código Eleitoral que também protege a honra contra calúnia, difamação e injúria. E com uma observação importante: no Código Eleitoral, os crimes contra a honra são de ação pública incondicionada.

Código Penal Militar – também protege a honra. Lá vocês vão encontrar calunia, difamação, injúria.

Lei de Segurança Nacional – Também protege a honra. Lei de Imprensa (na ADPF 130 o STF julgou não trecepcionada pela CF/88)

Ressalte-se que os arts. 20, 21 e 22 que tratam dos crimes contra a honra na Lei de

Imprensa estão suspensos pela ADPF 130. O STF afirmou que esses artigos serão suspensos e

que se houver crimes contra a honra por meio da imprensa, devem ser aplicadas as

disposições do CP.

Conclui-se, pois que deve ser aplicado o CP apenas nos casos em que não forem

aplicados os casos previstos em lei especial.

Calúnia Difamação Injúria Art. 138 Art. 139 Art. 140 Imputar fato criminoso determinado sabidamente falso.

Imputar fato desonroso determinado, em regra não importando se verdadeiro ou falso.

Atribuir qualidade negativa.

Ofende a honra objetiva, que é a reputação do sujeito, ou seja, o que os outros pensam dele.

Ofende a honra objetiva. Ofende a honra subjetiva, que é a dignidade, o decoro, a autoestima do sujeito, o que o sujeito pensa dele próprio.

Alguém diz que fulano é ladrão. Qual crime comete?

R - Injúria. Não se está atribuindo fato ao sujeito, mas uma qualidade negativa.

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Alguém diz que fulano assaltou o BB. Qual crime comete?

R - Calúnia, porque lhe foi atribuído fato determinado que constitui crime.

Alguém afirma que fulana foi vista na esquina rodando bolsinha. Qual crime comete?

R - Atribui-se fato determinado, desonroso àquela pessoa. Como o fato não constitui

crime, há difamação.

Alguém afirma que Fulano estava apontando jogo do bicho. Qual crime comete?

R - Atribui-se fato determinado. Mas o fato é crime? Não, é contravenção. Logo, se se

imputa contravenção penal a alguém não há calúnia, mas sim difamação.

Alguém afirma que viu militar beijando de maneira lasciva colega de farda nas

dependências do quartel. Qual crime comete?

R - Ato sexual dentro do quartel é crime, previsto no CPM. No caso, há calúnia.

Uma pessoa falou que a outra era jogadora do jogo do bicho. A pessoa se sentiu

ofendida e interpôs queixa, descrevendo o fato e pedindo as penas por crime de calúnia.

Essa queixa deve ser recebida ou não? A vítima descreveu nos fatos o crime de

difamação, mas pediu a condenação por calúnia. O juiz deve receber a queixa e na

hora de aplicar a pena deve condenar por difamação aplicando a emendatio libelli.

Mas pela Teoria Social da Ação, o jogo do bicho foi revogado pelos costumes, logo

deveria a queixa ser rejeitada porque o fato era atípico. Essa é uma posição minoritária.

Os crimes contra a honra são crimes de dano ou de perigo?

R - Prevalece na doutrina que se trata de crime de dano, que dispensa, no entanto, o

resultado naturalístico, sendo formal. É crime de dano porque o agente age com vontade

de ofender, mas o crime se consuma mesmo que a vítima não se sinta ofendida.

É possível concurso de calúnia com difamação e injúria?

R - Em contextos fáticos distintos, é possível.

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Mas é possível o concurso de crimes contra a honra no mesmo contexto fático?

R – Há três correntes:

a primeira corrente afirma que é possível continuidade delitiva, pois ofende o

mesmo bem jurídico.

a segunda corrente afirma que aplica-se o princípio da consunção, ou seja, o

crime mais leve fica absorvido pelo crime mais grave. A injúria fica absorvida

pela calúnia, por exemplo.

a terceira corrente afirma que é possível concurso de delitos desde que se

relativas a honras diversas, objetiva e subjetiva. Assim, não seria possível

concurso entre calúnia e difamação, sendo possível concurso entre calúnia e

injúria e difamação e injúria.

Não há uma corrente predominante, mas em concursos, normalmente, se adota a

segunda corrente.

CALÚNIA:

Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente DETERMINADO fato definido como crime: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa. § 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga. § 2º - É punível a calúnia contra os mortos. Exceção da verdade § 3º - Admite-se a prova da verdade, salvo: I - se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível; II - se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no nº I do art. 141; III - se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível.

Sujeito ativo:

Trata-se de crime comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa, salvo por pessoa

que desfruta de imunidade, como por exemplo, senadores; deputados federais;

deputados estaduais; vereadores, nos limites do município que exerce a vereança.

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O advogado pratica calúnia no exercício de sua profissão?

R - O art. 7.º, § 2.º do Estatuto da OAB afirma que a imunidade é apenas para injúria e

difamação. Assim, advogado não possui imunidade profissional para o crime de calúnia.

§ 2º O advogado tem imunidade profissional, não constituindo injúria, difamação ou desacato puníveis qualquer manifestação de sua parte, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora dele, sem prejuízo das sanções disciplinares perante a OAB, pelos excessos que cometer.

Sujeito passivo:

Qualquer pessoa pode ser vítima de calúnia, mesmo o desonrado. A jurisprudência

entende que até a prostituta pode ser vítima de calúnia.

O menor de 18 anos e o louco podem ser vítimas de calúnia?

R – Há duas correntes sobre o tema:

A primeira corrente afirma que o menor e o louco não praticam crime. Logo, não

podem ser vítimas de calúnia, mas sim de difamação.

A segunda corrente afirma que a lei exige imputação de fato definido como crime,

ou seja, fato típico. Logo, sabendo que o menor e o louco praticam fato típico,

podem ser vítimas de calúnia. É a corrente que o STJ adota, ainda que

indiretamente. Entende que o menor podem ser vítima de denunciação caluniosa.

Pessoa jurídica pode ser vítima de calúnia?

a primeira corrente afirma que pessoa jurídica não pratica crime, nem pode ser

responsabilizada penalmente. Logo, pessoa jurídica não pode ser vítima de calúnia.

a segunda corrente entende que a pessoa jurídica pratica crime ambiental,

podendo ser responsabilizada penalmente. Logo, pessoa jurídica pode ser vítima

de calúnia.

a terceira corrente afirma que pessoa jurídica não pratica crime, mas pode ser

responsabilizada penalmente em caso de infrações ambientais. Logo, para essa

corrente pessoa jurídica não pode ser vítima de calúnia.

a quarta corrente, defendida por Mirabete, entende que pessoa jurídica não pode

ser vítima de nenhum crime contra a honra, porque o CP só protege a honra da

pessoa física.

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No STJ, prevalece a terceira corrente, não podendo pessoa jurídica ser vítima de calúnia.

Mesmo o desonrado pode ser vítima de calúnia.

O morto pode ser vítima de calúnia?

R - O § 2.º do art. 138 afirma que é punível calúnia contra as mortos. Logo, ele não é

vítima. Basta imaginar que se pudesse ser vítima, ele próprio teria que interpor a

queixa-crime. A vítima á a família do morto, que tem interesse na manutenção de seu

bom nome e preservação de sua memória. Art. 138 (...)

§ 2º - É punível a calúnia contra os mortos.

É crime a auto-calúnia?

R - É crime de auto-acusação falsa, ou seja, a auto-calúnia é crime contra a

administração da justiça e não crime contra a honra. Auto-acusação falsa

Art. 341 - Acusar-se, perante a autoridade, de crime inexistente ou praticado por outrem:

Pena - detenção, de três meses a dois anos, ou multa.

Crime contra a honra do Presidente da República pode configurar crime contra a

segurança nacional. Mas deve haver motivação política para que esse crime seja

configurado, que é a especializante do crime.

Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

Conduta: Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato determinado definido como

crime.

Meios de execução:

A calúnia é crime de execução livre, ou seja, pode ser praticado implícita ou

explicitamente. Pode ser praticado por palavras, escritos, gestos etc.

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OBS: se a imputação falsa referir-se a contravenção penal, não há crime de calúnia, mas

sim difamação.

Só há calúnia quando a falsidade é objetiva ou quando há falsidade subjetiva?

R - Haverá calúnia quando o fato imputado jamais ocorreu (falsidade que recai sobre o

fato) ou, quando real o acontecimento, não foi a pessoa apontada o seu autor (falsidade

que recai sobre a autoria do crime).

A honra é um bem disponível ou indisponível, ou seja, se a vítima consentir em ser

caluniada, há crime?

Hoje é pacífico que a honra é um bem disponível, ou seja, se a vítima consente em ser

caluniada, não há crime.

Uma pessoa diz que outra roubou um banco. Fulano não falou, mas espalha a notícia.

Que crime pratica? Calúnia, prevista no § 1.º do art. 138:

Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa. § 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga. Tipo Subjetivo:

A calúnia é punível a título de dolo (vontade consciente de ofender a honra).

O caput pune o dolo direto e o dolo eventual. Já o § 1.º só pune o dolo direto e não o

eventual. Essa conclusão é extraída da expressão “sabendo falsa a imputação”.

Mas nas duas hipóteses, é imprescindível a vontade efetiva de ofender a honra

(tenha o animus ofendenti). Algumas conclusões podem ser extraídas:

não há dolo no animus jocandi, que é a brincadeira, ainda que de mau gosto;

não há dolo no animus consulendi, que é a intenção de aconselhar.

não há dolo no caso do animus narrandi, que é a intenção de apenas narrar o

fato, próprio de uma testemunha.

não há dolo no animus corrigendi, que é a intenção de meramente corrigir;

não há dolo no animus defendendi, que é a intenção de apenas defender o

direito.

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Consumação do crime de calúnia:

A consumação está ligada ao tipo de honra ofendida. A calúnia trata da honra objetiva,

que é a reputação, ou seja, o que terceiros pensam da vítima. Assim, o crime se consuma

quando terceiros tomam conhecimento da calúnia, independentemente do efetivo dano

à reputação da vítima. Isso porque o crime é meramente formal.

O crime de calúnia admite tentativa? É crime unisubsistente ou plurisubsistente?

Em regra, não, mas é possível, na forma escrita como na carta caluniadora receptada.

Assim, se a carta for interceptada pela vítima sem que terceiros dela tomem

conhecimento.

Imagine que A manda um telegrama a C, caluniando B. Porém, antes do telegrama

chegar a C, B o intercepta. A calúnia é tentada ou consumada? O crime se consuma,

porque o terceiro que materializou o telegrama já tomou conhecimento do seu conteúdo.

O mesmo ocorre no caso do fonograma.

§ 3º - Admite-se a prova da verdade, salvo: I - se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível; II - se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no nº I do art. 141; III - se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível.

Admite-se à defesa provar a verdade acerca da imputação?

R - Sim, pois o § 3.º do art. 138 prevê a exceção da verdade.

Assim, a regra é que o querelado pode fazer prova da verdade, por meio da exceção da

verdade. Trata-se de incidente processual, forma de defesa indireta, através da qual o

acusado de ter praticado calúnia pretende provar a veracidade do que alegou.

A procedência da exceção da verdade redunda na absolvição do acusado, mas em

qual fundamento o juiz o absolverá?

R - Se a vítima prova que o fato não é falso, desaparece uma elementar do tipo, que é a

falsidade. Logo, o juiz absolver o acusado por atipicidade da conduta.

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Mas há três hipóteses em que a lei não permite ao acusado fazer prova da verdade, a

saber:

1. Se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi

condenado por sentença irrecorrível:

Ex.: “A” imputou a “B” o exercício arbitrário das próprias razões contra “C”.

“B”, sentindo-se caluniado, entrou com a queixa. “A” pode provar esse exercício

arbitrário das próprias razões? Não! Só “C” pode porque o crime é de ação penal

privada. Se “C” quer o silêncio, “A” não pode desrespeitar.

A razão da presente proibição consiste em não permitir ao caluniador provar a

verdade dos fatos no lugar da vítima, real titular do direito de perseguir a verdade.

AULA DE 20/10/2010

2. Se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no nº I do art. 141:

É o caso do Presidente da República do Chefe de Governo estrangeiro.

Razões políticas e diplomáticas justificam essa ressalva.

3. Se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por

sentença irrecorrível:

Ex: A diz que B roubou C. B foi processado, mas absolvido pelo roubo. B interpõe

uma queixa-crime por calúnia. A não pode tentar provar a ocorrência do roubo.

Isso porque B já foi absolvido. Logo, permitir a exceção da verdade nesse caso seria

exumar a coisa julgada. Seria uma espécie de “revisão criminal pro societate”.

As ressalvas do art. 138, § 3.0 foram recepcionadas pela CF?

Há doutrina e jurisprudência minoritárias afirmando que essas ressalvas não foram

recepcionadas pela CF porque ofendem o princípio a garantia da ampla defesa.

Se o constituinte garante a defesa sem ressalvas, o legislador ordinário não poderia

restringir as hipóteses de defesa.

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Imagine que Collor, na época em que era Presidente, sofreu calúnia de um cidadão.

Mesmo estando ele em processo de impeachment, não caberia exceção da verdade?

No caso, cabe exceção de notoriedade, prevista no art. 523 do CPP: CPP Art. 523. Quando for oferecida a exceção da verdade ou da notoriedade do fato imputado, o querelante poderá contestar a exceção no prazo de dois dias, podendo ser inquiridas as testemunhas arroladas na queixa, ou outras indicadas naquele prazo, em substituição às primeiras, ou para completar o máximo legal.

Consiste a exceção de notoriedade na oportunidade facultada ao réu de demonstrar

que suas afirmações são de domínio público, mostrando-se impossível macular a honra

objetiva (logo é crime impossível). Logo a sua finalidade é provar a notoriedade da

imputação.

Não há como desonrar aquilo que já é de domínio público.

A exceção de notoriedade não encontra as ressalvas previstas no CP.

DIFAMAÇÃO:

Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato (DETERMINADO) ofensivo à sua reputação: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa. Exceção da verdade Parágrafo único - A exceção da verdade somente se admite se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções.

Não basta imputar um fato, devendo ser este determinado.

É infração penal de menor potencial ofensivo, logo, vai para transação penal.

Sujeito ativo:

Trata-se de crime comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa, salvo aqueles que

desfrutam de imunidades, que são os senadores, deputados federais e estaduais,

vereadores nos limites em que exercem a vereança e o advogado (no exercício

profissional – Art. 7º , §2ºdo Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil), que detém

imunidade profissional. No caso do advogado, é imprescindível o nexo entre a difamação

e a sua profissão.

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Sujeito passivo:

Qualquer pessoa pode ser vítima do crime de difamação.

Pessoa jurídica pode ser vítima de difamação:

1ª Corrente: (STF e STJ) entende que pessoa jurídica possui honra objetiva, tendo

reputação a ser respeitada, respondendo ser vítima de difamação.

É a corrente que prevalece.

2ª Corrente: (Mirabete), afirma que o CP protege apenas a pessoa física, não

podendo a pessoa jurídica ser vítima de crimes contra a honra.

Morto pode ser vítima de difamação?

R – Não. Morto não pode ser vítima de nenhum crime.

Mas é punível a difamação contra os mortos?

R - Não é punível a difamação contra os mortos. Além disso, a previsão legal desse tema

está na lei de imprensa, a qual não foi recepcionada por decisão do STF na ADPF 130.

O art. 139 difere do art. 138 porque o fato aqui deve ser desonroso. Logo, aplica-se as

disposições comuns a ambos.

O art. 138 punia a calúnia por quem caluniava e por quem propagava a calúnia. No caso

da difamação, entende a maioria que quem propaga também difama. Essa forma de

difamar está implícita no caput do art. 139. Assim, propalar e divulgar fato desonroso não

deixa de ser também uma difamação.

O crime de difamação é punível a título de dolo, sendo imprescindível a vontade de

ofender. É imprescindível o animus diffamandi”. Logo, nos casos abaixo não há crime:

- não há dolo no animus jocandi, que é a brincadeira, ainda que de mau gosto;

- não há dolo no animus consulendi, que é a intenção de aconselhar.

- não há dolo no caso do animus narrandi, que é a intenção de apenas narrar o fato,

próprio de uma testemunha.

- não há dolo no animus corrigendi, que é a intenção de meramente corrigir;

- não há dolo no animus defendendi, que é a intenção de apenas defender o direito.

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O crime de difamação se consuma no momento em que terceiros tomam conhecimento

da imputação desonrosa independentemente do dano à reputação da vítima

(é um delito formal). É também de execução livre podendo ser executado por palavras,

gestos, escritos, etc..

Imputar fato previsto como contravenção penal sabidamente falso caracteriza

difamação e não calúnia porque calúnia é imputar a alguém CRIME sabidamente falso.

O crime de difamação admite tentativa?

R - Sim, na difamação por escrita, ou seja, no caso de carta difamatória interceptada

pela vítima.

Quando a desonra é por telegrama ou por fonegrama um terceiro toma conhecimento

do conteúdo no momento em que ele é ditado, logo, o crime se consuma neste

momento neste caso.

O crime de difamação admite a exceção da verdade?

R - Em regra, não, porque não importa se o fato imputado é verdadeiro ou falso.

Mas há um caso que admite. Está previsto no parágrafo único do art. 139: CP - Art. 139

Exceção da verdade

Parágrafo único - A exceção da verdade somente se admite se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções.

Admite-se a exceção se a ofensa é propter oficium (exercício das funções).

Cabe exceção da verdade quando a difamação é contra Presidente da República?

Calúnia contra Presidente não cabe exceção da verdade. Tem proibição expressa.

E difamação contra Presidente da República, cabe exceção da verdade? EU andei

dizendo que o Presidente anda trabalhando bêbado e ele entra com uma queixa-crime

contra mim. Eu posso provar a exceção da verdade, provando que ele trabalha

bêbado? A lei diz que se for funcionário público, eu posso entrar com a exceção da

verdade. Mas e sendo Presidente da República, eu posso ou não? Não posso.

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“A exposição de motivos do Código Penal, no seu item 49, alerta que a exceção da

verdade na difamação não alcança Presidente da República ou chefe de governo

estrangeiro em visita ao país pelas mesmas razões do art. 138, § 3º, II, do CP.”

O problema é que a exposição de motivos do Código Penal não é lei. É uma

interpretação doutrinária. Por isso tem gente que discute. Isso no CP. A exposição de

motivos no CPP é lei.

A procedência da exceção da verdade no crime de calúnia gera absolvição do

acusado, sob o fundamento da atipicidade.

No caso da difamação, a procedência da exceção da verdade também, gera

absolvição, mas sob o fundamento da excludente especial da ilicitude. É uma

modalidade especial de exercício regular de um direito.

Ressalte-se que na difamação também cabe exceção de notoriedade. Não se precisa

provar que o fato é verdadeiro, bastando se provar que o fato é notório.

INJÚRIA:

Injúria

Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa. § 1º - O juiz pode deixar de aplicar a pena: I - quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria; II - no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria. § 2º - Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes: Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência. § 3o Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência: (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003) Pena - reclusão de um a três anos e multa. (Incluído pela Lei nº 9.459, de 1997)

É infração de menor potencial ofensivo.

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Sujeito ativo:

Qualquer pessoa, salvo os detentores de imunidades, lembrando que o advogado possui

essa imunidade, desde que haja o nexo com o seu mister profissional.

É possível a autoinjúria?

R – Em regra não existe o delito de autoinjúria, salvo quando a expressão injuriosa

ultrapassa a órbita da personalidade do indivíduo. Ex: sou corno. Alguém está passando

chifre, então a expressão sai da órbita da personalidade própria do indivíduo;

filho de uma meretriz – injuria a genitora.

Sujeito Passivo:

Quem pode ser vítima de injúria?

R - Qualquer pessoa capaz de entender o caráter injurioso da expressão. Se a pessoa não

tiver capacidade de entender o conteúdo da expressão, trata-se de crime impossível.

Pessoa jurídica não pode ser vítima de injúria, porque não possui honra subjetiva, ou seja,

não possui dignidade, decoro.

Morto pode ser vítima de injúria?

R - Morto não pode ser vítima de crime.

Resumo de ofensa contra os mortos:

Art. 138 – Calúnia – é punível – vítimas são os familiares

Art. 139 - Difamação – não é punível.

Art. 140 – Injúria – não é punível.

Mas é punível injúria contra os mortos?

R - Não é punível no CP, mas é punível na Lei de Imprensa, mas o dispositivo desta foi

suspenso pelo STF na ADPF 10.

O art. 140 pune o fato de atribuir qualidade negativa a alguém.

O crime é de execução livre, podendo ser praticado por ação ou por omissão.

Exemplo de injúria por omissão: recusar um comprimento com intenção de ofender a

dignidade ou o decoro.

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É um crime de execução livre. O que significa isso? Pode ser praticada por palavras, por

escritos, por gestos. Pode ser praticado por ação ou omissão. Isso já caiu em concurso:

“dá um exemplo de injúria por omissão.” É o único exemplo que tem. Toda a doutrina dá

o mesmo exemplo. É o único exemplo de injúria por omissão: não retribuir cumprimento. A

pessoa vai te cumprimentar, você não retribui como forma de humilhá-la na frente das

pessoas. É interessante o exemplo.

Vocês repararam que, ao contrário da calúnia e da difamação, à injúria não se

atribui fato. Portanto, cuidado! Essa é a observação mais importante da aula no que diz

respeito à injúria. Vocês viram que imputar determinado fato criminoso é igual à calúnia.

Vocês viram que imputar determinado fato desonroso é igual à difamação. E agora viram

que atribuir qualidade negativa é injúria. Cuidado! No seu concurso vai cair: que crime

configura imputar fato indeterminado a alguém? Fato genérico, um fato vago a alguém?

Que crime configura? Vejam: não pode configura calúnia porque na calúnia o fato tem

que ser determinado. Não pode configurar difamação porque na difamação o fato,

igualmente, tem que ser determinado. Só sobrou injúria. Cuidado! Então, vejam que a

imputação de fato pode, sim, ser injúria, desde que indeterminado, genérico, vago ou

impreciso. Aí pode. Aí é injúria. Vocês entenderam por que eu insistia no código de vocês

para vocês acrescentarem nos arts. 138 e 139 a palavra DETERMINADO em “fato”? Porque

se for fato indeterminado é injúria, se assemelha a qualidade negativa. Entenderam essa

observação?

Agora, o que cai em concurso: diferencie injúria absoluta de injúria relativa.

Já ouviram falar disso? Isso tem em dois livros: no de Manzini (caro) e no meu, que copiei

de Manzini.

Injúria absoluta – É aquela expressão que é injuriosa em qualquer lugar em

qualquer momento, em qualquer lugar e contra qualquer pessoa. “Injúria

absoluta: a expressão tem por si mesma e para qualquer um significado

ofensivo constante e unívoco.” Há um gesto que é universal. É uma injúria

absoluta.

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Injúria relativa – É aquela expressão que será injuriosa dependendo do

momento, do local ou da pessoa. “Injúria relativa: a expressão assume

caráter ofensivo se proferida em determinadas circunstâncias de forma, tom,

modo, tempo, lugar, pessoa, etc.”

Isso caiu em concurso. Até porque já dá para perceber que a absoluta é mais

severamente punida porque a ofensa parece ser mais clara.

Importante: a língua apresenta pelo menos 3 diferenças internas:

Espaço Geográfico: as variações diatópicas;

Camada Sociocultural: as variações diastráticas;

Modalidade de Expressão Utilizada pelo Agente: as variações diafásicas.

O delito é punido a título de dolo. Dolo com a vontade de ofender a honra

subjetiva. É o animus injuriandi. Então, você quando diz aquilo para vítima, você diz para

ofender a honra subjetiva dela, para ferir a dignidade, o decoro da pessoa. No mais, é

só lembrar do que falamos da calúnia e da difamação. Estão lembrados do animus

jocandi, criticandi, narrandi, consulendi, etc.? Tudo isso exclui o dolo.

Agora quando o crime de injúria se consuma? Isso caiu em concurso.

Nós vimos na aula passada que o momento consumativo do crime contra a honra está

umbilicalmente ligado à modalidade de honra que ele protege. A calúnia e a difamação

protegem a honra objetiva, então se consumam quando terceiros tomam conhecimento.

Já injúria protege a honra subjetiva. Se consuma quando a vítima toma conhecimento,

dispensando efetivo dano à sua dignidade ou decoro (honra). É crime formal.

Então, a vítima tomou conhecimento da expressão injuriosa, o crime se consumou.

Dispensa o efetivo dano. Basta a potencialidade. O crime é formal.

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A pergunta que caiu em concurso: cabe tentativa de injúria?

1ª Corrente: “Não se admite tentativa na injúria.” Para essa corrente é

impossível. Essa corrente entende assim: se a pessoa da vítima é quem

deve representar ou ingressar com a queixa-crime, no momento em que ela

representa ou ingressou com a queixa-crime, ela mostrou que tem

conhecimento, por essa razão, o crime estará sempre consumado. Tem farta

doutrina neste sentido, mas não está certo.

2ª Corrente: Para essa corrente, quando a injúria é plurissubsistente, admite a

tentativa. O que significa injúria plurissubsistente? A sua execução admite

fracionamento. Quando a execução da injúria admite fracionamento,

admite tentativa. O exemplo é o seguinte: eu ofendo um aluno. Antes dessa

ofensa chegar ao conhecimento do aluno, ele morre. Esse fato não chegou

ao conhecimento do aluno por circunstâncias alheias à minha vontade.

O erro da primeira corrente é confundir possibilidade de tentativa com a

possibilidade de condenação por tentativa quando a vítima ingressa com a ação penal.

Uma coisa não tem nada a ver com a outra. É claro que se e vítima integrou com a

queixa-crime, ela tomou conhecimento e o crime está consumado. Mas haverá casos em

que a vítima não tomou conhecimento do crime por circunstâncias alheias à vontade do

agente e o crime já existe na forma tentada, inclusive correndo prescrição. Esse exemplo

é claro. Eu ofendi o aluno. O crime já está na forma tentada, correndo, inclusive,

prescrição. O aluno, antes de tomar conhecimento morre. Pronto! É um crime de injúria

tentado, que a família eventualmente vai querer processar, mas vai processar na forma

tentada.

Zaffaroni admite até a tentativa da injúria verbal. Você fala: “ô seu filho da ...” e

nesse momento alguém coloca a mão na sua boca e não deixa você terminar. Zaffaroni

diz que se você vai xingar, menosprezar, achincalhar alguém, no momento de fazer isso,

se alguém tampa a sua boca, para Zaffaroni é tentativa, mesmo na forma verbal.

Ele entende que houve o fracionamento da execução.

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Se o agente imputar fato determinado previsto como crime, é caso de calúnia; se o

agente imputar fato determinado que não é crime mas desonroso, é difamação; mas se

se imputar fato genérico, impreciso, vago, indeterminado, o crime é de injúria.

Na injúria não se admite exceção da verdade e não se admitem exceções. Então:

Calúnia: Regra –admite exceção da verdade/Excepcionalmente – não admite

Difamação: Regra – não admite exceção da verdade/Excepcionalmente –

admite

Injúria: Regra – não admite exceção da verdade/Excepcionalmente – não

admite

Agora eu quero saber se é possível exceção de notoriedade na injúria. Eu não

tenho como provar que você é um idiota, mas eu posso provar que é público e notório

que todos te acham um idiota?

Calúnia: Cabe exceção de notoriedade na calúnia

Difamação: Cabe exceção da notoriedade na difamação

Injúria: Não cabe exceção de notoriedade.

E por que não cabe exceção de notoriedade na injúria? Foi exatamente essa a

pergunta de defensor/ES. Teve gente que não sabia nem o que era exceção de

notoriedade. Não é possível na injúria? Por quê? Vamos ao art. 523, do CPP:

Art. 523 - Quando for oferecida a exceção da verdade ou da notoriedade do fato imputado, o querelante poderá contestar a exceção no prazo de 2 (dois) dias, podendo ser inquiridas as testemunhas arroladas na queixa, ou outras indicadas naquele prazo, em substituição às primeiras, ou para completar o máximo legal.

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São duas as razões penas quais não se admite exceção da notoriedade na injúria:

1ª Razão: A injúria ofende a honra subjetiva, incompatível com a

notoriedade, que está ligada à honra objetiva.

2ª Razão: Na injúria, atribuem-se qualidades, não se imputam fatos. A

exceção da verdade ou notoriedade é atribuída ao fato. E quais são os

crimes praticados mediante imputação de fato? Só a calúnia (fato

criminoso) e difamação (fato desonroso) admitem exceção de notoriedade.

Essa era a resposta correta na prova de defensor/ES do ano retrasado.

Voltando ao art. 140, CP, desta vez ao § 1º. CP – Art. 140 § 1º - O juiz pode deixar de aplicar a pena: I - quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria; II - no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.

Qual é a natureza jurídica do § 1º quando diz que o juiz pode deixar de aplicar a

pena? É perdão judicial e isso é importante porque se é perdão judicial, é ato unilateral.

Dispensa concordância do perdoado. A natureza jurídica desse dispositivo, pois, é de

perdão judicial. Dispensa a concordância de quem é perdoado. Só o perdão do ofendido

tem que ser aceito. O perdão do juiz você não tem que aceitar. Ele é imposto.

O juiz pode deixar de aplicar a pena, significa que é direito subjetivo do réu ou

faculdade do juiz perdoar? Hoje é tranquilo. Cuidado! Sempre que você vê pode, guarda

como “poder-dever”. Significa que, preenchidos os requisitos, o juiz deve perdoar. Esse

“pode”, na verdade, é um “Poder-dever”.

São duas as hipóteses em que cabe o perdão judicial

Primeira hipótese: A provoca B. B retruca e, com isso, realiza uma retorsão com

injúria.

Segunda hipótese: A também provoca B e B devolve a provocação com a

injúria.

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Nas duas hipóteses A provocou e B respondeu. Qual é a diferença?”

R- É que na primeira hipótese, a provocação é diversa de uma injúria.

Já na segunda hipótese, consiste numa injuria. A primeira hipótese é um tapa seguido de

uma injúria. A segunda hipótese é uma injúria seguida de uma injúria. Se você não fica

com esse esquema na cabeça, você não entende. Na primeira hipótese, A provocou. Ele

provocou de qualquer modo, menos com injúria (um tapa no rosto, por exemplo). Já na

segunda situação, ele provoca com injúria e recebe injúria de volta. É importante saber

isso? É, porque o perdão judicial, na primeira hipótese é só para B. Agora, cuidado! Na

segunda hipótese, o perdão judicial é para os dois. A e B são perdoados. Então, na

primeira hipótese, se o juiz for perdoar alguém, só pode perdoar a B, que foi quem

praticou a injúria em retorsão. Na segunda hipótese, o perdão do juiz alcança os dois,

quem provocou com injúria e quem retorquiu com injúria. Isso é Nélson Hungria puro, e ele

seguido por toda doutrina e jurisprudência.

Agora, vamos para o § 2º, muito fácil, tranquilo, mas vai ser importante quando eu

for falar da ação penal. Olha o que ele diz:

CP – Art. 140 § 2º - Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa, além da pena correspondente à violência.

Aqui, eu tenho a chamada injúria real. Injúria real, nada mais é, do que um injúria

mediante violência ou vias de fato. Reparem, então, que a violência ou a vias de fato são

meio. A injúria é o fim. Ele usa a violência para ofender a dignidade. Ele usa a vias de fato

para ofender a dignidade. Nélson Hungria diz: mais do que a integridade física, o agressor

quer atingir a alma. Mais do que o corpo, atinge-se a alma. A intenção dele não é ferir o

seu corpo, mas a sua dignidade, seu decoro. Exemplos: puxões de orelha, de cabelo,

cuspir em alguém, tapa na cara (exemplo de injúria real de jurisprudência).

Qual é a consequência da injúria real? Detenção de 3 meses a 1 ano, além da

pena correspondente à violência. Vamos extrair algumas conclusões:

Se for injúria real com vias de fato, a vias de fato fica absorvida. Reparem que a

soma da pena ocorrerá apenas quando houver violência.

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Antes de estudar a segunda conclusão, eu quero saber o seguinte: quando ele diz

que você vai responder também pelo crime correspondente à violência, qual é o

concurso de crimes que ele está exigindo aqui? Concurso Material.

Todo mundo concorda com isso? É o que prevalece na doutrina, mas eu vou dar minha

humilde opinião que isso não está correto. Essa expressão “além da pena correspondente

à violência” significa, para a doutrina, que o legislador quer, entre a injúria real e a lesão

corporal, por exemplo, concurso material. Mas isso não está certo.

Olha que importante: temos concurso material quando duas condutas produzem

dois resultados. Aí eu tenho soma das penas. Eu não tenho dúvida de que ele está

exigindo soma das penas, eu não tenho dúvida de que ele está exigindo dois resultados.

A minha dúvida é se houve duas condutas. Não houve duas condutas! Então, como é

que você está dizendo que houve concurso material? “Ah, Rogério, porque tem dois

resultados e somam as duas penas.” Mas tem um concurso, que eu não vou falar o nome,

em que você tem uma conduta, produzindo dois resultados com soma das penas: é o

concurso formal imperfeito. Então, quando a doutrina diz que é concurso material,

esquece porque não é concurso material. Eu não tenho duas condutas! Eu tenho uma

conduta produzindo dois resultados com soma de penas e isso é concurso formal

impróprio, imperfeito, com desígnios autônomos, acabou. Vocês anotaram que prevalece

concurso material! Mas não está correto, porque não há duas condutas para defender

concurso material.

Para defensoria pública: como criticar o art. 140, § 2º? Você deixaria seu assistido

sofrer essa pena correspondente à violência? Quando ele diz além da pena

correspondente à violência significa o quê? Qual é a pena da injúria simples? 1 a 6 meses

ou multa. Agora, vejam: na injúria real, o que acontece? Por conta da violência ou vias

de fato, a pena passou a ser de 3 meses a 1 ano. Isso significa que a violência gerou uma

qualificadora. Como pode a violência gerar uma qualificadora e, ao mesmo tempo,

soma das penas? Isso significa que você está considerando a violência duas vezes em

desfavor do réu. Bis in idem. Só tem no meu livro isso. Você está usando a violência para

qualificar o crime e, sem seguida, usa a mesma violência para somar as penas. Bis in idem.

Isso é só para quem for prestar defensoria pública. É tese típica de defensoria pública.

Você enxergar o bis in idem aqui você se diferencia tranquilamente. Vamos supor que

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você consiga incluir o bis in idem aqui, você detonou! Vamos para o último parágrafo da

injúria.

CP Art. 140 § 3º - Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência. Pena - reclusão de um a três anos e multa.

Tenho certeza absoluta que vai cair esse crime. A Lei 12.033 mudou a ação penal

para esse crime. Então, é certeza absoluta que vai cair. Por isso, eu quero analisar com

calma. Nós temos aqui o que a doutrina chama de injúria qualificada pelo preconceito. É

o que o Ratinho chama de racismo. Pergunto: é racismo? Não. Qual é a diferença do

racismo? Vocês estão lembrados da historinha que contei no semestre passado? Vocês

não podem confundir injúria preconceito com racismo. Vocês viram isso comigo semestre

passado. Injúria-preconceito está no art. 140, § 3º, do CP e o racismo está na Lei 7.716/89.

Injúria Preconceito Art. 140 § 3º Racismo Imperfeito

Racismo da Lei 7.716/89

Atribuição de qualidade negativa Segregação ou incentivo Prescritível Imprescritível Afiançável Inafiançável Lei 12.033/09 : antes – A privada; depois Ação Pública Condicionada

Ação Pública Incondicionada

Na injúria preconceito o agente atribui qualidade negativa à vítima. Diferente do

racismo. No racismo, o agente segrega a vítima, appartaid social, em razão de sua raça,

cor, etc. No primeiro caso, ele usa a cor para atribuir à vítima qualidade negativa. No

segundo caso, ele usa a cor para separar a vítima do convívio social (appartaid social).

Então, no jogo de futebol, o jogador chamar o outro de macaquito ele atribuiu qualidade

negativa ou segregou do convívio social? Atribuiu qualidade negativa, injúria

preconceito. Diferente de falar: “você não joga no meu time porque você é negro”, aí é

racismo porque você está realizando verdadeira segregação (appartaid).

Isso é muito importante porque tem consequências diversas. No caso da injúria

preconceito, o crime é prescritível. Já no caso do racismo, o crime é imprescritível. Na

injúria preconceito o crime prescreve. No racismo, não. É uma das duas hipóteses de

imprescritibilidade previstas na Constituição. A injúria preconceito é afiançável. Já o

racismo é inafiançável. Vocês têm essa tabela do semestre passado, mas já está

desatualizada porque na tabela do semestre passado eu falei que a injúria preconceito

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era de ação penal privada. Pessoal, acabou! A injúria preconceito agora, com a Lei

12.033/09 é de ação penal pública condicionada. Quem tem essa tabela do semestre

passado já está desatualizada.

E o racismo? É de ação penal pública incondicionada. Não tem como errar mais.

Vai cair essa tabela, por conta da Lei 12.033/09, que vamos aprofundar daqui a pouco.

Compreenderam?

Vejam que o art. 140, § 3º fala ainda em condição de pessoa idosa. “Seu velho

babão!” Pena de 1 a 3 anos. É mais grave que rixa com morte. Você tem raiva de um

idoso? Não xinga de velho babão, pratique uma rixa e mate o idoso, porque a pena é só

de 6 meses a 2 anos. Se você chamar de velho babão, 1 a 3 anos. Então, não xinga. Pega

e mata numa rixa, você paga cesta básica. É a proporcionalidade do nosso legislador.

A pergunta que eu quero fazer, ligada ao § 3º do art. 140, pergunta mega thunder

blaster blaster é a seguinte: o art. 140, § 1º permite perdão judicial na injúria quando o

outro provocou. É possível perdão judicial na injúria quando a injúria é injúria preconceito?

A pessoa deu um tapa na sua cara e você devolve o tapa com uma injúria fazendo

referência à cor dela. Você pode ser perdoado? Você viu que é perfeitamente possível

perdão judicial na injúria quando ela está retribuindo uma provocação, mas essa

retribuição pode ser com injúria preconceito? Tem alguma proibição? Anote o seguinte:

“Para a maioria, o perdão judicial não alcança a injúria preconceito.

Fundamentos:”

a) “A posição topográfica do perdão judicial permite concluir não se aplicar ao § 3º.”

Se o legislador quisesse perdoar a injúria preconceito, ele colocaria o perdão

judicial como parágrafo de encerramento. Mas dizem que posição topográfica

não é interpretação e se é, é uma interpretação pobre.

b) “A injúria preconceito consiste em violação séria à honra da vítima, ferindo uma

das metas fundamentais do Estado Democrático de Direito, logo, incompatível

com o perdão judicial.”

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Vocês têm dois fundamentos para negar perdão judicial para a injúria preconceito.

Com isso, nós terminamos a injúria, vamos para as disposições finais.

DISPOSIÇÕES FINAIS – Art. 141, do CP

Art. 141 - As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido:

Vamos parar por aqui e fazer algumas observações.

1ª Observação: O art. 141 não traz qualificadora. Ele traz causa de aumento

de pena a ser considerada pelo juiz na fixação da pena definitiva, na

terceira fase de aplicação da pena, no critério trifásico.

2ª Observação: É uma majorante aplicada a todos os crimes do capítulo:

injúria, difamação e calúnia. O art. 141 aumenta a pena de qualquer crime

contra a honra descrito no capítulo. Nenhum dos crimes escapa do

aumento quando preenchidos os requisitos.

Vocês vão ver que só esse aumento na calúnia, já faz ela deixar de ser de menor

potencial ofensivo. O art. 141 c/c a calúnia já faz o crime sair do juizado especial e ir para

o juízo comum. Caluniar uma pessoa é crime de menor potencial ofensivo, salvo se

funcionário público. Caluniar funcionário público aí já não é mais de menor potencial

ofensivo. Quer ver a importância do 141? Aumenta-se de 1/3 em quais hipóteses?

I - contra o Presidente da República, ou contra chefe de governo estrangeiro;

Eu não preciso explicar muito, só fazer algumas observações. Por que nesse caso,

do Presidente da República, a pena aumenta de 1/3? Isso porque se você ofende o

Presidente da República, você ofende toda a nação. Ofender o Presidente da república

é ofender todos os cidadãos. Ofenderam o Lula, sinta-se ofendido também. E por que

aumenta a pena quando você ofende chefe de governo estrangeiro? “Ah, Rogério

porque aí você ofende todos os cidadãos do mundo.” Não! Ofendendo o chefe de

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governo estrangeiro você pode estremecer relações internacionais da qual o Brasil

participa. Relações internacionais pátrias.

Agora vejam, cuidado. Aqui eu tenho que lembrar que, se houver motivação

política contra o Presidente da República, você está fora do Código Penal. Você está na

Lei de Segurança Nacional.

II - contra funcionário público, em razão de suas funções;

É a segunda hipótese que gera aumento de 1/3. Não basta ofender o funcionário

público. A ofensa tem que ser propter oficium (em razão de suas funções). Aí, sim, gera o

aumento de 1/3. Por que tem esse aumento? Isso, diz a doutrina, é porque você prejudica

o andamento da vida funcional dele.

Qual o conceito de funcionário público? Está no art. 327:

Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.

Esse é o funcionário público típico (sentido amplo).

§ 1º Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública.

O § 1º traz o funcionário público por equiparação. Pergunto: o aumento só incide

quando o funcionário é o típico do caput? Aumenta-se de 1/3 quando o funcionário é só

equiparado? Mirabete entende que aumenta a pena bastando ser funcionário público,

não importa se típico ou atípico, se próprio ou equiparado. A pena é aumentada, não

importando se o funcionário está no caput ou no § 1º. Eu particularmente discordo. Nós

estamos diante de uma causa de aumento de pena. A interpretação deve ser sempre

restritiva. Mas Mirabete e, parece que hoje, a jurisprudência se inclina nesse sentido: o

funcionário público, sempre que referido no Código Penal, é o caput mais o § 1º. Eu,

particularmente, acho que caput + parágrafo primeiro é só para funcionário público

sujeito ativo, que é o conceito de funcionário público sujeito ativo. Vamos para a próxima

majorante: art. 141, III, que traz mais de uma causa de aumento.:

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Diferença entre crime contra a honra de funcionário público e desacato (Caui na 1ª fase

do MPF e 2ª fase do MP de MG):

Crime contra a Honra de Servidor Público Desacato O servidor está ausente, fora do local da ofensa.

O servidor está no local da ofensa, presente, vendo e/ou ouvindo.

III - na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria.

A primeira parte fala em crime praticado na presença de várias pessoas.

O que é isso? O que são várias pessoa? Mais de uma? Mais de duas?

R - Bento de Faria entende que várias pessoas são mais de uma. Nélson Hungria, junto

com a maioria, discorda. Para ele há que ter, pelo menos, três. É óbvio que nesse mínimo

de 3 pessoas, não vou computar coautores, partícipes e pessoas que não conseguem

entender o que está sendo dito, pessoas que não conseguem compreender a expressão

ofensiva.

E a vítima, é computada? Pergunta de concurso.

R - Em regra, não, salvo quando ela é testemunha de um outro crime contra a honra.

Quem traz essa questão é Noronha. Vamos imaginar que A ofende B, C, D e E. Na ofensa

de A contra B, eu não computo B, vítima. Mas comuto C, D e E, que, nesse caso, são

testemunhas. Na ofensa de A contra C, é claro que não computo C, mas vou computar B,

D e E, que são testemunhas. E por aí vai. Vejam que essa questão já caiu em concurso:

quando há pluralidades de vítimas e as vítimas são testemunhas das outras vítimas, aí

serão computadas como testemunhas. Vejam que aqui ele vai responder por 4 crimes

contra a honra majorados. A próxima causa de aumento, também do inciso III, é certeza,

vai cair em concurso:

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III - na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria.

Eu costumava dizer o seguinte: é uma calúnia por meio de alto-falantes, em

palanques. Mas eu dizia que esse crime não abrange a imprensa porque crime contra a

honra por meio da imprensa tem lei especial. E agora? Agora acabou. Agora crime

contra a honra por meio da imprensa é crime contra a honra do Código Penal,

mais o art. 141, III. Eu vejo muita gente comemorando, falando: crime contra a honra lá na

Lei de Imprensa era mais severamente punido. Agora melhorou. Melhorou nada!

Agora, crime contra a honra por meio da imprensa sempre vai sofrer o aumento do

art. 141, III, 2ª parte. A Lei de Imprensa não foi recepcionada. Então, crime contra a honra

por meio de imprensa cai aqui, no art. 141, III, 2ª parte. Vai ter candidato que nem vai se

tocar. Que vai colocar calúnia, difamação e injúria e vai esquecer de ver que hoje, a

imprensa, gera, inevitavelmente, o aumento do art.141, III, 2ª parte. Vamos para o inciso

IV:

IV – contra pessoa maior de 60 (sessenta) anos ou portadora de deficiência, exceto no caso de injúria. O inciso VI aumenta a pena de 1/3 se o crime é praticado contra pessoa maior de

60 anos ou portadora de deficiência. Exceto no caso de injúria. Por que excepciona a

injúria? Porque a injúria já tem uma qualificadora, que é a injúria preconceito, evitando-se

o bis in idem. Ele tem que saber que a pessoa é maior de 60 ou portador de deficiência.

O dolo dele tem que atingir todas as circunstâncias, ano só do inciso IV, mas as anteriores.

O dolo do agente tem que abranger todas essas circunstâncias, condições e qualidades.

Parágrafo único - Se o crime é cometido mediante paga ou promessa de recompensa, aplica-se a pena em dobro.

Volto a dizer: causa de aumento de pena. Não é qualificadora. Você vai dobrar a

pena na terceira fase. É uma causa de aumento. Você não vai aplicar o critério trifásico

já com a pena em dobro. Tem gente falando em qualificadora? Sim. Eu, particularmente,

acho que é causa de aumento de pena e isso é tranquilo. É o que a doutrina chama de

ofensa mercenária. O parágrafo único traz o que a doutrina chama de ofensa

mercenária (ofensa por dinheiro). O agente age mediante torpeza.

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PAROU AQUI EM 20/10/2010

O art. 142 traz hipóteses de exclusão do crime.

Exclusão do Crime Art. 142 - Não constituem injúria ou difamação punível:

O art. 142 só é aplicável para injúria ou difamação. Eu sei que isso está explícito,

mas na hora de você fazer a prova, vai esquecer que o art. 142, diferente do art. 141 que

traz majorantes, traz exclusão de crimes e só exclui crime de injúria ou difamação. Não se

aplica para calúnia. Ou seja, a calúnia, jamais será beneficiada pelas hipóteses do art.

142. Na sua prova, o examinador vai colocar: injúria, difamação ou calúnia. Esqueça a

calúnia. A calúnia não está abrangida pelo art. 142.

A segunda observação, antes de explicar os incisos é: qual a natureza jurídica do

art. 142, do CP?

1ª Corrente: Causa especial de exclusão da ilicitude. Quem adota? Damásio.

2ª Corrente: Nós estamos diante de uma causa de exclusão da punibilidade.

Quem adota essa segunda corrente? Noronha.

3ª Corrente: Trata-se de causa de exclusão do elemento subjetivo do tipo, isto é,

da especial intenção de ofender. Quem adota?

Eu coloquei na lousa, exatamente na ordem de preferência. Ou seja, prevalece a

primeira. Agora, olha só: nós já podemos trabalhar uma quarta corrente. Damásio

entende que as três hipóteses configuram ou o estrito cumprimento de um dever legal ou

o exercício regular de um direito. E se ele tem razão, no que tange a ser estrito

cumprimento de um dever legal ou exercício regular de um direito, eu posso aplicar aqui

qual teoria? Tipicidade conglobante. Podemos acrescentar uma quarta corrente:

4ª Corrente: Para os adeptos da tipicidade conglobante, estamos diante de causa

de atipicidade.

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A tipicidade conglobante tem caído em concurso. Vamos agora analisar as três

hipóteses de exclusão do crime:

I - a ofensa irrogada em juízo, na discussão da causa,

pela parte ou por seu procurador; (IMUNIDADE JUDICIÁRIA)

Estamos diante da imunidade judiciária. Caiu recentemente em concurso. O inciso

I, que traz a imunidade judiciária, abrange a parte e seu procurador. E advogado? O

advogado, vocês já estudaram comigo. Vocês viram que ele está imune, não graças ao

art. 142, mas graças ao art. 7.º, § 2º, do Estatuto da OAB. O advogado também está

imune, mas o dispositivo para esse não é o art. 142. Antes do Estatuto até era, mas agora

o estatuto é norma especial e vocês têm que citar norma especial.

E o MP? A imunidade do MP está no art. 41, V, da Lei 8.625/93.

E o juiz? Vai na Lei Orgânica da Magistratura que você não vai encontrar nada. Na

discussão da causa, tem imunidade a parte, tem imunidade o procurador, tem imunidade

o advogado, tem imunidade o MP. E o juiz? Dizem que o juiz é um expectador de pedra.

A doutrina diz que o juiz também tem imunidade e ele vai usar o art. 23, do CP (estrito

cumprimento do dever legal) o juiz dá a sentença e quando passa a adjetivar pessoas e

comportamentos estará no estrito cumprimento do dever legal. Quando o juiz chama o

estuprador de tarado, não vai responder por injúria porque ele entende que, assim

agindo, está no estrito cumprimento de um dever legal. O juiz também está imune, mas

ele não tem ma norma especial. Será aplicado o art. 23, do CP. Questão boa de

concurso. Caiu recentemente.

A jurisprudência entende que essa imunidade do inciso I é relativa. Quando ficar

inequívoca a intenção de difamar ou injuriar, ele vai responder. Apesar de não estar

escrito isso aí, está implícito. É imprescindível que ele haja no exercício da função, no

estrito cumprimento do dever legal. Se qualquer destes personagens extrapola, se

excede, o excesso será punido.

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II - a opinião desfavorável da crítica literária, artística ou

científica, salvo quando inequívoca a intenção de injuriar ou

difamar;

O inciso II traz a chamada imunidade literária, artística ou científica. Vejam que o

inciso II é muito claro: salvo quando inequívoca a intenção de injuriar ou difamar. A crítica

literária, artística ou científica tem uma imunidade relativa. Ela tem que agir como crítica.

Se eu percebo que aquela crítica, na verdade, está camuflando uma verdadeira

intenção de injuriar ou difamar, vai responder pelo crime.

III - o conceito desfavorável emitido por funcionário

público, em apreciação ou informação que preste no

cumprimento de dever do ofício.

O inciso III traz a chamada imunidade funcional. A imunidade do inciso I é relativa

(o excesso é punido). A imunidade do inciso II é relativa (quando inequívoca a intenção

de ofender, vai responder pelo crime). E a do inciso III? É absoluta ou relativa? Nélson

Hungria e Fragoso defendem que esta imunidade é absoluta, ilimitada, irrestrita. Não é o

que prevalece: funcionário público também será e deverá ser punido pelo excesso. Essa

imunidade não agasalha quando presente o excesso. Sabe por quê? Se a sua imunidade

é importante, a honra é constitucionalmente protegida. Nós temos um embate

importante aqui e esse embate só é resolvido entendendo-se que o excesso será. O que

estiver no âmbito do exercício da função, não, mas o excesso será punido. Então, você

consegue preservar a imunidade e a honra.

Há um parágrafo único que diz:

Parágrafo único - Nos casos dos ns. I e III, responde pela

injúria ou pela difamação quem lhe dá publicidade.

Já caiu isso em concurso. Terceiros que dão publicidade para a injúria e para a

difamação respondem pelo crime na imunidade judiciária e na imunidade funcional. Na

crítica literária, não. Se uma crítica literária criticou um artista, é claro que o fez

publicamente e se pode divulgar essa crítica para qualquer um. Agora, a opinião judicial,

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a opinião funcional, não. Estas têm que ficar restrita ao processo. Quem divulgar vai

responder. Se eu, Rogério, ao pedir a condenação de um estuprador eu o chamo de

tarado e alguém fala “fulano é tarado, estava no processo”, você que está falando isso é

você que vai responder, eu não.

Terminamos o art. 142, vamos ao art. 143, que trata da retratação.

Retratação

Art. 143 - O querelado que, antes da sentença, se retrata

cabalmente da calúnia ou da difamação, fica isento de pena.

Primeira coisa: o que significa retratação? O querelado quer dizer o acusado na

ação privada. Retratação significa confissão? Não. É muito mais do que isso. Retratar-se é

desdizer o que disse, retirar o que disse, trazer a verdade novamente à tona. Somente

quando o querelado (acusado) retirar o que disse, devolver a verdade ao mundo, é que

ele tem direito à isenção de pena. A retratação é uma causa extintiva da punibilidade

unilateral. Dispensa concordância da parte contrária. Ela é analisada pelo juiz. Se o juiz

entende que houve retratação e foi sincera, não precisa nem ouvir a parte contrária. É

uma causa extintiva da punibilidade unilateral. Dispensa concordância da parte

contrária. Agora presta atenção: ela extingue a punibilidade, mas não impede a

consequência cível. A retratação isenta o querelado de pena, mas não isenta de

responsabilidade civil. Se você caluniou alguém e se retratou, tudo bem. Você está isento

de pena, mas vai responder pelos danos morais eventualmente causados. A isenção é só

penal, não traz reflexos extrapenais. A retratação só é possível na calúnia e na

difamação. Não existe retratação extintiva da punibilidade na injúria. Você pode

devolver a verdade na calúnia e na difamação e está isento de pena. Na injúria, mesmo

que retire o que disse, responderá pelo crime.

Olha que interessante. Presta atenção que vai cair: a retratação só abrange

calúnia e difamação. A Lei de Imprensa abrangia também injúria, mas não foi

recepcionada. Isso significa que a injúria não admite retratação jamais. Nem mesmo por

meio da imprensa.

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Quem tem que se retratar? O querelado, que é o acusado na ação penal privada.

Não existe retratação extintiva em ação penal pública, mesmo se houver crime contra a

honra. Não existe retratação em crime contra a honra em crime de ação pública. Só

extingue a punibilidade em crime de ação privada. Então, se a calúnia ou difamação for

de ação privada, existe retratação extintiva. Se for de ação pública, não adianta querer

se retratara que não extingue a punibilidade. A lei é clara: querelado. Não fala do

denunciado.

Agora eu pergunto: até quando o querelado pode se retratar para ver extinta a

sua punibilidade? A lei é clara: antes da sentença. Mas que sentença? Se ele se retratar

antes da sentença, ele está isento de pena. Pergunto: existe retratação extintiva da

punibilidade em grau de recurso? Essa sentença é decisão do juiz de primeiro grau ou é

termo atécnico abrangendo qualquer decisão ainda não transitada em julgado?

Prevalece que a retratação tem que ocorrer até a sentença de primeiro grau. Não existe

retratação extintiva em grau de recurso. Se você for condenado, não adianta querer se

retratar no tribunal. Não extingue mais a sua punibilidade. É o que prevalece. Eu não

concordo, mas é o que prevalece.

Pergunto: a retratação do querelado se estende a eventuais coautores ou

partícipes que não se retrataram? Vamos imaginar que três pessoas caluniaram a outra.

Só uma se retratou. A lei é clara: o querelado fica isento de pena. O querelado! Dá para

perceber que a retratação aqui é incomunicável. É só do querelado. É uma circunstancia

subjetiva incomunicável. Se liga à pessoa do querelado e não ao fato. É só para quem se

retrata. Não se estende aos demais coautores e partícipes.

Vamos para o art. 144, que traz um dispositivo interessante:

Art. 144 - Se, de referências, alusões ou frases, se infere

calúnia, difamação ou injúria, quem se julga ofendido pode

pedir explicações em juízo. Aquele que se recusa a dá-las ou, a

critério do juiz, não as dá satisfatórias, responde pela ofensa.

Que figura é essa que o art. 144 traz?

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Pedido de explicações – “Medida preparatória e facultativa para o oferecimento

da queixa quando, em virtude dos termos empregados, não se mostra evidente a

intenção de ofender a honra, gerando dúvidas.”

Você está em dúvida: será que ele quis ou não quis ofender? Isso é muito comum

naquelas injúrias relativas. Peça explicações em juízo. Vou dar um exemplo. Eu chego e

disso: “o Renato é flex”. Eu estou querendo que ele é versátil ou estou querendo dizer que

ele bebe todas ou que ele é bicombustível? Ele pode pensar que eu quis ofendê-lo. O

Renato pode pedir explicações: “juiz, o Rogério falou que eu sou flex. Chama o Rogério

para ele se explicar.”

É uma medida preparatória e facultativa. O que significa isso? Pede explicações

quem vê necessidade. O pedido de explicações não interrompe ou suspende o prazo

decadencial. Vai você pedir explicações em juízo e fica esperando 6 meses as

explicações... Quando elas vierem, decaiu do direito. Então, é uma medida facultativa.

Sendo facultativa, pede quem quer. Isso não interfere no prazo decadencial que

continua correndo. O pedido de explicações não interrompe ou suspende o prazo

decadencial.

Vocês viram que o pedido é facultativo. E as explicações são obrigatórias? Pede

quem vê necessidade. E a quem são pedidas as explicações ele é obrigado a dá-las? Se

ele não explica, presume-se a ofensa? Lendo o final do dispositivo, parece que se não

quiser responde é como se tivesse ofendido. Mas, não. O pedido é facultativo e a

resposta também. Pelo silêncio, não se conclui a infração penal. Nós não podemos

presumir a ofensa em razão do silêncio. Você tem que analisar o fato concretamente. O

juiz não pode concluir: “eu até achava que não tinha nada, mas como ele não

respondeu, agora vai ser processado.” Não! Você tem que analisar o fato

concretamente. O silêncio na resposta não gera presunção. Se ele resolver não explicar, o

ofendido que ingresse com a ação penal e o juiz tem a liberdade de rejeitar, absolver ou

condenar. O silêncio não tem como presumir o crime, muito menos a condenação. O juiz

não pode te obrigar a dar explicações. Temos um caso em que o juiz intimou a pessoa

para explicar em juízo na presença dele. O Supremo concedeu habeas corpus por ser

constrangimento ilegal. Obrigar uma pessoa a se explicar é constrangimento ilegal

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passível de habeas corpus. Ele não está obrigado a explicar. A vítima é que faz o que

achar por bem fazer.

Como fazer esse pedido em juízo? Qual o rito? Pede para quem? Para o juiz? Qual

juiz? A Lei de Imprensa trazia o rito. Mas o que aconteceu com ela? Foi abolida. Então,

qual é o rito? É o mesmo rito das notificações judiciais.

Vamos para o último artigo:

Art. 145 - Nos crimes previstos neste Capítulo somente se

procede mediante queixa, salvo quando, no caso do Art. 140, §

2º, da violência resulta lesão corporal.

O art. 145 trata da ação penal. Certeza que vai cair. O parágrafo único dizia:

Parágrafo único - Procede-se mediante requisição do

Ministro da Justiça, no caso do nº I do Art. 141, e mediante

representação do ofendido, no caso do n.º II do mesmo artigo.

Agora, o parágrafo único teve acrescentado pela Lei 12.033 o quê?

Parágrafo único. Procede-se mediante requisição do

Ministro da Justiça, no caso do inciso I do caput do art. 141

deste Código, e mediante representação do ofendido, no caso

do inciso II do mesmo artigo, bem como no caso do § 3º do art.

140 deste Código. (Alterado pela L-012.033-2009)

Eu vou fazer uma tabela:

AÇÃO PENAL NOS CRIMES CONTRA A HONRA

ANTES da Lei 12.033/09 DEPOIS da Lei 12.033/09

Regra: ação privada Regra: ação privada

Exceções (havia 3): Exceções (agora 4):

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Injúria real com lesão que passava a

ser ação pública incondicionada. *

Crime contra a honra do Presidente

da República ou chefe estrangeiro:

ação penal pública condicionada à

requisição do Ministro da Justiça.

Crime contra a honra de funcionário

público em razão da sua função:

ação penal pública condicionada à

representação. **

Injúria real com lesão que passava a

ser ação pública incondicionada. *

Crime contra a honra do Presidente

da República ou chefe estrangeiro:

ação penal pública condicionada à

requisição do Ministro da Justiça.

Crime contra a honra de funcionário

público em razão da sua função:

ação penal pública condicionada à

representação. **

Injúria preconceito – agora é de ação

penal pública condicionada

* Nem toda injúria real é exceção. Somente a injúria real com lesão. Injúria real com vias

de fato cai na regra. Tem um livro que escreve que injúria real é sempre de ação pública.

Está errado! Só a injúria real com lesão é que cai na exceção! Injúria real com vias de fato

está na regra. Olha a pergunta sacana em concurso: “injúria real é de ação pública.”

Verdadeiro ou falso? Falso. Injúria real com lesão é de ação pública. Injúria real com vias

de fato é de ação privada.

** Aqui tem uma observação. Vocês perceberam que crime contra a honra de

funcionário público depende de representação, desde que propter oficium. Olha o que

acontecia e não era incomum. Um delegado era ofendido em razão de sua função. Foi

chamado de corrupto. O que o delegado tinha que fazer? Ele representava. Essa

representação gerava um inquérito que ia parar nas mãos do promotor. O promotor

olhava e dizia que o delegado não foi ofendido na honra, que foi uma coisa à toa e

requer o arquivamento, aplicando o princípio da insignificância. O delegado procurava o

promotor: “teve um preso que me chamou de corrupto, eu representei. O que deu aquele

inquérito?” Eu arquivei porque não achei que você tivesse sido ofendido na sua honra.

“Mas a honra é minha, a dignidade é minha, o decoro é meu. Como é que você pode

saber se fui ofendido na minha honra?” Sabe o que esses funcionários públicos

começaram a fazer? Ao invés de representar, entravam com queixa-crime, mesmo nesta

hipótese. E os tribunais começaram a aceitar. Inclusive tem um julgado que diz: “ninguém

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pode ter a sua honra refém do Ministério Público.” Bateu no Supremo, o que o Supremo

fez? Súmula 714.

STF Súmula nº 714 - DJ de 13/10/2003 –É concorrente a

legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do Ministério

Público, condicionada à representação do ofendido, para a

ação penal por crime contra a honra de servidor público em

razão do exercício de suas funções.

A Súmula 714 deu ao funcionário público um direito de opção. Ele vai escolher se

ele quer queixa, ou se ele quer representação. Direito de opção.

Agora, olha só a pergunta que caiu em concurso! Pergunta muito boa: o servidor

opta pela representação. O MP arquiva. Ele pode entrar com a queixa? Isso aconteceu.

Não posso falar a cidade porque tem unidade nossa. O juiz e o promotor se

desentenderam. E eles começaram a não se dar por causa disso. O juiz soltou um

estuprador de uma criança de 8 anos. O juiz entendeu que ele era primário, de bons

antecedentes e que crime hediondo cabe liberdade provisória, soltou o estuprador. O

promotor ficou puto. Deu uma semana, o estuprador foi preso novamente estuprando

outra criança. O promotor fez assim no flagrante: “flagrante formalmente em ordem,

senhor Juiz, aguardo a vinda dos autos principais, que o senhor durma com essa.” Você

não soltou? Então está aí: mais uma criança estuprada. Aí começou uma rusga entre eles.

Aí deu uma briga. Esse juiz se sentiu ofendido numa manifestação do promotor e

representou o promotor criminalmente para o Procurador-Geral: “o promotor praticou

crime contra a minha honra e eu estou representando. Processe o seu promotor.” O

Procurador-Geral olhou e falou: estrito cumprimento de um dever legal. Arquivou. Esse juiz

fez o quê? Não existe o art. 28 em foro de prerrogativa. Ele, então, recorreu para o

Colégio de Procuradores que fez o quê? Manteve o arquivamento. Aí o juiz foi no dia do

recurso. Sentou lá para ver qual seria a decisão. Por unanimidade, insistiram no

arquivamento contra o promotor. Aí o Procurador-Geral falou: “o juiz está presente, boa

tarde. O senhor optou por representar, agora não pode entrar com queixa-crime porque

a opção por uma via torna a outra preclusa.”

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É por isso que eu conto a história! Para vocês lembrarem! Não é para lembrar só da

história. Olha que interessante: a opção pela representação torna preclusa a queixa-

crime. Essa é a posição do STF. Anotem o julgado: HC 84659-9. O Supremo decidiu

exatamente isso: se você optou pela representação, a queixa-crime está preclusa. É uma

preclusão lógica e consumativa. As duas. Questão boa! Caiu no TJ/SC.

Olha que interessante: eu tenho como vítima um funcionário público. Vocês

acabaram de ver que ele, funcionário público pode preferir a queixa ou representação.

Se ele preferir a representação, não cabe perdão do ofendido como causa extintiva da

punibilidade. Mas se ele preferiu a queixa, cabe perdão do ofendido que nunca teve

cabimento em casos como esse. Se ele preferir a representação, não cabe perempção.

Se ele preferir a queixa, é possível perempção que nunca se admitiu num caso como

esse. Se ele preferir a representação, não cabe retratação do acusado como causa

extintiva. Se ele preferir a queixa, cabe retratação do querelado como causa extintiva.

Então, prestem atenção! Por que o juiz, no caso que eu dei, preferiu a representação?

Para não correr risco de perempção e para não admitir a retratação do acusado como

causa extintiva da punibilidade. Ele não é bobo. É juiz! Ele sabe isso. Então, por que esse

juiz não entrou com a queixa-crime? Ele não quis arriscar uma perempção, ele não quis

arriscar o promotor se retratar e ter extinta a punibilidade. Ele falou: “eu quero ir até o fim.”

Se ele optasse pela queixa, um erro dele poderia gerar perempção porque o promotor,

vendo que a coisa estava perdida, poderia se retratar.

E como ficou agora, com a Lei 12.033/09? Ficou igualzinho, praticamente. A regra

está mantida. As exceções estão mantidas. Porém, acrescentamos uma quarta exceção:

o art. 140, § 3º, do CP, a chamada injúria preconceito, agora é de ação penal publica

condicionada. Ela era de ação privada. Agora é pública condicionada. Então, qual foi a

mudança trazida por essa lei? Está aqui: limita-se à introdução da quarta exceção.

Pergunto: essa mudança é retroativa ou irretroativa? A injúria aconteceu antes da

lei, mas o processo só vai ser inaugurado depois da lei. Ele vai ser inaugurado com queixa

(o que era antes) ou com denúncia (o que é hoje)? A pessoa injuriou por preconceito

antes. O inquérito só está relatado depois. Relatado com base na lei nova, eu tenho que

pedir ao promotor para denunciar, ou eu continuo entrando com queixa? E aí? Retroage

ou não retroage?

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Você vai encontrar gente dizendo o seguinte: ação penal? Queixa ou denúncia?

Isso é matéria processual, eu aplico o tempus regit actum. É a lei vigente ao tempo da

inicial. Se a lei vigente ao tempo da inicial é denúncia, então é denúncia e acabou.

Então, tem uma primeira corrente que vai defender o tempus regit actum, é dizer, a lei

vigente ao tempo do ato processual. Se a lei vigente ao tempo do ato processual é

denúncia, então a denúncia deve ser a inicial. Mas essa corrente não está correta.

A ação penal está umbilicalmente ligada ao direito de punir. Você transformado

de ação privada para ação pública, você está retirando do acusado causas extintivas da

punibilidade que a situação atual não tem e a anterior tinha. Ou seja, você está

prejudicando o acusado. É uma retroatividade maléfica. Ação privada tem renúncia, tem

perdão, tem perempção. Nada disso tem na ação pública. Então transformar de ação

privada para ação pública é você retirar do acusado três causas extintivas da

punibilidade. Se você faz isso, você está ampliando do direito de punir do Estado. Então, a

retroatividade é maléfica. Não pode retroagir. Os fatos pretéritos continuam dependendo

de queixa. Isso vai cair com certeza!

SEQUESTRO E CÁRCERE PRIVADO

Art. 148. Privar alguém de sua liberdade, mediante seqüestro ou cárcere privado:

Pena – reclusão, de um a três anos.

Bem jurídico tutelado: direito de ir e vir.

Sujeito ativo: crime comum (qualquer pessoa).

Sujeito passivo: qualquer pessoa, inclusive aquelas que não andam sozinhas ou precisam

de ajuda de terceiros ou aparelho para se locomoverem.

Se a vítima é Presidente da República, do Senado, da Câmara ou do Supremo, o crime é

contra a segurança nacional, se houver motivação política.

A liberdade de ir e vir é um bem disponível.

Tipo: privar a liberdade de locomoção de alguém.

Seqüestro: privação sem confinamento. Ex: sítio.

Cárcere privado: privação com confinamento. Ex: cômodo.

Considera-se a diferença entre tais delitos no momento da fixação da pena, sendo o de

cárcere privado mais grave.

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Crime de execução livre: ação ou omissão (médico que não concede alta para paciente

já curado), violência, grave ameaça, fraude ou qualquer outro meio, dispensando a

movimentação da vítima.

OBS: art. 148 – dolo, sem finalidade especial.

a) art. 148 + redução à condição análoga de escravo = art.149.

b) art. 148 + vantagem econômica = art. 159.

c) art. 148 + fazer justiça

O tempo da privação influencia na consumação?

1ª corrente (Majoritária): O tempo mais ou menos longo da privação não interfere na

consumação, mas pode interferir no quantum da pena.

2ª corrente: a consumação depende de privação por tempo juridicamente relevante.

É perfeitamente admissível a tentativa.

§ 1º A pena é de reclusão, de dois a cinco anos [QUALIFICADORAS]:

I – se a vítima é ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro do agente ou maior

de sessenta anos [SE A VÍTIMA FOI SEQUESTRADA COM 60 ANOS E FOI LIBERTADA COM MAIS

DE 60 ANOS, A QUALIFICADORA INCIDIRÁ];

II – se o crime é praticado mediante internação da vítima em casa de saúde ou hospital

[INTERNAÇÃO FRAUDULENTA OU SIMULADA];

III – se a privação da liberdade dura mais de quinze dias [PRAZO PENAL];

IV – se o crime é praticado contra menor de dezoito anos [O DOLO DO AGENTE DEVE

ABRANGER TAL CONDIÇÃO E MESMO QUE A VÍTIMA TENHA SIDO SEQUESTRADA COM

MENOS DE 18 ANOS, SE ATINGIU A MAIORIDDAE NO CÁRCERE, A QUALIFICADORA

INCIDIRÁ];

Aula 13 11/05/2009

V – se o crime é praticado com fins libidinosos. (Incluído pela Lei nº 11.106, de 2005)

Antes da Lei 11.106/2005: essa qualificadora configurava rapto violento ou rapto

consensual. Com o advento dessa lei, o rapto consensual foi abolido, ou seja, houve

abolitio criminis.

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Já o rapto violento se transformou em qualificadora do delito de sequestro e cárcere

privado. Assim, ao rapto violento ocorreu o princípio da continuidade normativo-típica,

fenômeno que não se confunde com a abolitio criminis.

Abolitio criminis: Princípio da continuidade normativo-

típica

Revogação formal Alteração formal

Revogação material Manutenção material

A intenção do legislador é não mais

considerar o fato criminoso.

A intenção do legislador é manter o

caráter criminoso do fato.

É um fenômeno de “mudança de

roupagem”.

Ex: Sedução e adultério que foram

revogados, tanto formal como

materialmente.

Lei 6.368/76. O que era tráfico nessa

lei passou a ser tipificado pela Lei

11.343/06. Teve alterada a forma, mas

a matéria continuou criminosa.

Antes da Lei 11.106/05 Depois da Lei 11.106/05

Art. 219 do CP Art. 148, § 1.º, V

Pena de 2 a 4 anos Pena de 2 a 5 anos

Ação penal privada. Ação penal pública incondicionada

Quem começou a pratica o advento antes da Lei 11.106/05, mas termina o crime depois

da sua vigência, aplica-se a súmula 711 do STF, ou seja, sofre os efeito da última lei, ainda

que mais gravosa.

Súmula nº 711 �A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime

permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da

permanência.

E se o seqüestrador sequestrou uma pessoa e a libertou antes da Lei 11.106/05, mas o

processo só foi instaurado na vigência da Lei? Nesse caso, verifica-se que o fim do

sequestro se deu antes da vigência da lei penal mais gravosa. Aplica-se a pena velha,

pois caso contrário estar-se-ia retroagindo maleficamente.

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Ainda, o processo se inicial mediante denúncia ou queixa? Isso porque antes da lei

11.106/05, o crime era de ação penal pública; depois, passou a ser de ação pública

incondicionada.

- a primeira corrente entende que a aplica-se a regra de processo penal, ou seja, tempus

regit actum. A lei vigente ao tempo do ato processual previa que a ação era pública

incondicionada. Assim, apesar de o fato ter sido praticado e encerrado antes da lei

11.106/05, o ato processual inaugural ocorre na vigência da lei nova, sendo esta a norma

que deve regrar a inicial. Aplica-se o tempus regit actum, ou seja, terá que ser

apresentada denúncia e não queixa.

O professor discorda. Se se disser que é denúncia, o agente que praticou o crime na

vigência da lei anterior, havia decadência, o que não mais ocorre. Quando o crime foi

prticado, existia perdão do ofendido, perempção, o que não mais ocorre. Assim, aplicar a

lei nova para esse fato no que concerne à ação, seria ampliar o direito de punir do

Estado, quando na lei antiga havia limitações ao direito de punir do Estado, como a

decadência, a perempção ou o perdão do ofendido.

- a segunda corrente, portanto, afirma que a aplicação da lei nova a fatos praticados no

passado, retira do caso hipóteses de extinção da punibilidade (decadência, renúncia,

perdão do ofendido e perempção), ampliando o direito de punir do Estado. Logo, deve

ser mantida a queixa.

Ainda não há decisão jurisprudencial nesse sentido.

Art. 148 (...) § 2º - Se resulta à vítima, em razão de maus-tratos ou da natureza da

detenção, grave sofrimento físico ou moral:

Pena - reclusão, de dois a oito anos.

É possível a convivência das qualificadoras do § 1.º e do § 2.º juntas? Não, aplica-se

apenas o § 2.º como qualificadora. O § 1.º serve como circunstância judicial desfavorável.

Redução a condição análoga à de escravo

Art. 149. Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a

trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de

trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida

contraída com o empregador ou preposto: (Redação dada pela Lei nº 10.803, de

11.12.2003)

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Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

(Redação dada pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

§ 1o Nas mesmas penas incorre quem: (Incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

I – cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de

retê-lo no local de trabalho; (Incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

II – mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou

objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho. (Incluído pela

Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

§ 2o A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido: (Incluído pela Lei nº 10.803,

de 11.12.2003)

I – contra criança ou adolescente; (Incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

II – por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem. (Incluído pela Lei nº

10.803, de 11.12.2003)

Esse crime também é chamado pela doutrina de plágio.

Por que o crime não se chama “redução à condição de escravo”, tão somente?

Escravo é uma situcao de direito que o Brasil não reconhece, logo não se pode levar

alguém a ser reduzido a uma condição não reconhecida pelo País.

Assim, a escravidão é uma situação de direito em virtude da qual o homem perde a

própria personalidade, tornando-se coisa. Como o Brasil não ampara essa situação, pune-

se no art. 149 a redução do homem à condição análoga de escravo.

O bem jurídico tutelado aqui ampara duas correntes, ou seja, liberdade individual e

organização do trabalho.

- a primeira corrente entende que o bem jurídico tutelado é a liberdade individual.

Argumentam a posição topográfica do art. 149 do CP, que está no capítulo dos crimes

contra a liberdade individual. Ainda, a exposição de motivos do CP é clara ao dizer que

esse crime ofende o status libertis e o status dignitatis.

Para essa corrente, a competência é da justiça comum estadual.

- a segunda corrente entende que o bem jurídico tutelado é a organização do trabalho

(bem jurídico primário) e a liberdade individual (bem jurídico secundário).

O tipo está equivocadamente introduzido no CP, já que é crime contra a organização do

trabalho.

Para essa corrente, a competência é da justiça comum federal.

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A segunda corrente ignora a posição topográfica do tipo e a exposição de motivos do

CP. Ainda, crime contra a organização do trabalho não induz a competência da JF, por si

só. Por fim, o STJ afirma que crimes contra a organização do trabalho que não atinjam os

trabalhadores coletivamente considerados terão a competência na Justiça Comum

Estadual e não na JF.

No RE 398.041/PA, o STF discute a competência para julgar esse crime. Há três votos

dizendo que a competência é da Justiça Estadual e outros três que a competência é da

JF. Outros três votos afirmam que se o crime atingir trabalhadores individualmente

considerados, a competência é da justiça estadual; se atingir os trabalhadores

coletivamente considerados, a competência é da JF.

O sujeito ativo desse crime de redução à condição análoga de escravo pode ser

qualquer pessoa, logo é crime comum.

A vítima também pode ser qualquer pessoa, logo é crime bi-comum.

Rogério Grecco afirma que o crime não é bi-comum, mas sim bi-próprio, ou seja, o sujeito

ativo tem que ser o empregador e a vítima o empregado.

Assim, para ele, a condição de trabalho entre os sujeitos torna o crime próprio.

O que se pune no crime é a escravização de fato da pessoa humana.

É crime de execução livre ou vinculada, ou seja, pode ser praticado de qualquer modo

ou apenas nos modos que a lei prevê?

Antes da Lei 10.803/03 Depois da Lei 1.803/03

Execução livre. Execução vinculada, só podendo ser

praticado nas cinco hipóteses

previstas no art. 149, o que para

muitos representa um retrocesso.

Se esse crime é praticado mediante sequestro, este fica absorvido. Esse pensamento é

adotado inclusive pelos doutrinadores que afirmam que se trata de crime contra a

organização do trabalho. Isso é ima incoerência, pois tratam-se de bens jurídicos distintos.

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131

É dispensável ou indispensável maus tratos ao empregado? Eventual sofrimento ou

eventuais maus tratos servirão para o juiz na fixação da pena-base, não sendo

indispensáveis, ou seja, o crime não pressupõe o sofrimento ou os maus tratos.

O consentimento do empregado exclui o crime?

No delito de sequestro, estudou-se que a liberdade individual é bem disponível. Sabendo

que o bem jurídico do crime de condição análoga a de escravo é a liberdade individual,

mesmo assim o bem é indisponível. Isso pelo grau de sujeição do agente. Não se trata de

mera restrição ou privação da liberdade individual. Nesse crime, está-se mantendo

alguém à condição análoga de escravo, sendo o grau de submissão deveras elevado.

O crime de redução à condição análoga de escravo é punível a título de dolo. Mas só

dolo ou dolo com finalidade especial? No caso do § 1.º há o dolo com a finalidade

especial, o que não ocorre com o caput, onde há apenas o dolo.

A finalidade especial é justamente manter o trabalhador no local de trabalho.

A consumação desse crime ocorre a partir do momento em que há a escravização de

fato. Trata-se de um crime permanente, ou seja, enquanto perdurar a escravização de

fato, o crime se protrai no tempo.

Assim, sempre que se depararmos com um crime permanente:

- a prescrição só começa a correr depois de cessada a permanência;

- súmula 711 do STF. Se durante a permanência sobrevier lei nova, esta será sempre

aplicada, ainda que mais gravosa;

- o flagrante pode ocorre a qualquer tempo da permanência.

Esse crime admite tentativa? A doutrina afirma que se trata de crime plurisubsistente, logo

admite tentativa. Mas é de difícil ocorrência na prática.

§ 2o A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido: (Incluído pela Lei nº 10.803,

de 11.12.2003)

I – contra criança ou adolescente; (Incluído pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003)

II – por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem. (Incluído pela Lei nº

10.803, de 11.12.2003)

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O § 2.º é um caso de majorantes, causas de aumento de pena. no caso do idoso, a pena

não aumenta, pois o inciso I não o alberga. O próprio caput do artigo já integra o idoso.

O dolo do agente deve abranger essa circunstância, ou seja, o agente deve saber que se

trata de criança ou adolescente.

No caso do inciso II, deve-se lembrar que não abrange o preconceito sexual nem

econômico.

O art. 149 não deve ser confundido com os arts. 206 e 207:

Aliciamento para o fim de emigração

Art. 206 - Recrutar trabalhadores, mediante fraude, com o fim de levá-los para território

estrangeiro. (Redação dada pela Lei nº 8.683, de 1993)

Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos e multa. (Redação dada pela Lei nº 8.683, de

1993)

Aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional

Art. 207 - Aliciar trabalhadores, com o fim de levá-los de uma para outra localidade do

território nacional:

Pena - detenção de um a três anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.777, de

29.12.1998)

§ 1º Incorre na mesma pena quem recrutar trabalhadores fora da localidade de

execução do trabalho, dentro do território nacional, mediante fraude ou cobrança de

qualquer quantia do trabalhador, ou, ainda, não assegurar condições do seu retorno ao

local de origem. (Incluído pela Lei nº 9.777, de 29.12.1998)

§ 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço se a vítima é menor de dezoito anos,

idosa, gestante, indígena ou portadora de deficiência física ou mental. (Incluído pela Lei

nº 9.777, de 29.12.1998)

Nesses dois artigos, não há o dolo de escravização da pessoa humana.

CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO

FURTO:

Furto

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Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

§ 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno.

§ 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir

a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente

a pena de multa.

§ 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor

econômico.

Furto qualificado

§ 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:

I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;

II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;

III - com emprego de chave falsa;

IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.

§ 5º - A pena é de reclusão de três a oito anos, se a subtração for de veículo automotor

que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior. (Incluído pela Lei nº

9.426, de 1996)

Bem jurídico tutelado:

- a primeira corrente, capitaneada por Nelson Hungria, afirma que o art. 155 tutela tão

somente a propriedade.

- a segunda corrente, defendida por Magalhães Noronha, afirma que o art. 155 protege a

propriedade e a posse.

- a terceira corrente, que é a dominante, afirma que o art. 155 protege a propriedade, a

posse e a detenção legítimas.

Ex: A foi vítima de furto praticado por B. Este foi vítima também de um furto praticado por

C, que levou a coisa subtraída de A. Quem é a vítima do furto cometido por C? B não

pode ser vítima, porque a sua posse, detenção e propriedades não eram legítimas. A

vítima continua sendo A, que era o legítimo proprietário da coisa.

Sujeito ativo:

O tipo não existe qualidade especial do agente, logo pode ser praticado por qualquer

pessoa. Mas deve-se atentar para o fato de que o crime não pode ser praticado pelo

próprio dono da coisa, porque o tipo fala em “coisa alheia”.

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Se houver subtração de coisa própria em poder de terceiro, o proprietário pratica qual

crime? Pode configurar exercício arbitrário das próprias razões, ou do art. 345 ou do art.

346.

Art. 345 - Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima,

salvo quando a lei o permite:

Pena - detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à

violência.

Parágrafo único - Se não há emprego de violência, somente se procede mediante

queixa.

Art. 346 - Tirar, suprimir, destruir ou danificar coisa própria, que se acha em poder de

terceiro por determinação judicial ou convenção:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.

Se esse crime for praticado por funcionário público, pode-se aplicar o art. 312, § 1.º, desde

que tenha se valido da condição de funcionário.

§ 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do

dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio

ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.

Assim, no caso do funcionário público, deve-se atentar para o fato de que a subtração

tenha sido facilitada ou não pela qualidade de funcionário. Se se valeu, aplica-se o §

1.º do art. 312. Se não se valeu, praticando o crime como qualquer pessoa, há crime de

furto comum.

Subtrair condômino, co-herdeiro ou sócio, apoderando-se de coisa comum, o crime é o

do art. 156 do CP:

Furto de coisa comum

Art. 156 - Subtrair o condômino, co-herdeiro ou sócio, para si ou para outrem, a quem

legitimamente a detém, a coisa comum:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.

§ 1º - Somente se procede mediante representação.

§ 2º - Não é punível a subtração de coisa comum fungível, cujo valor não excede a quota

a que tem direito o agente.

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O furto do art. 156 somente se procede mediante representação, ou seja, é crime de

ação penal pública condicionada.

Sujeito passivo:

A vítima é o proprietário, possuidor ou detentor do bem, podendo ser até mesmo uma

pessoa jurídica.

Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Subtrair é o apoderamento, que pode ser direto (manual) ou indireto (indireto, ex:

valendo-se de animais) de coisa alheia móvel.

O que se entende por coisa?

É o objeto economicamente apreciável. E as coisas que tem interesse moral ou

sentimental, emocional (diário de adolescentes, por exemplo)? A doutrina moderna

afirma que coisas sem valor econômico, mas de relevante interesse sentimental ou moral,

podem ser objeto material do crime de furto. Essa posição começou a ser defendida

ainda por Hungria.

Homem, ser humano vivo, é coisa? O homem vivo não poder ser objeto material de furto.

Pode ser objeto material de sequestro, cárcere privado etc., mas não de furto. No caso do

cadáver, em regra, não, salvo se o cadáver estiver destacado para uma finalidade

específica de interesse econômico, como servindo a alunos de medicina na faculdade,

por exemplo.

Sabendo que deve ser a coisa alheia, coisa de ninguém pode ser objeto material de

furto? Não, pois não tem detentor, proprietário ou possuidor.

E a coisa abandonada, pode ser objeto material do furto? Coisa abandonada já tece

proprietário, não mais sendo. Como não é alheia, não pode ser objeto material do furto.

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E a coisa perdida? Não deixou de ser alheia. Mas apesar de ser alheia, não há subtração,

mas sim apropriação. Logo, é crime de apropriação indébita de coisa achada, art. 169,

parágrafo único, inciso II e não crime de furto.

Parágrafo único - Na mesma pena incorre:

Apropriação de coisa achada

II - quem acha coisa alheia perdida e dela se apropria, total ou parcialmente, deixando

de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor ou de entregá-la à autoridade competente,

dentro no prazo de quinze dias.

Os crimes que dependem de lapso temporal são chamados de crime a prazo.

Coisa pública de uso comum, que a todos pertence, pode ser objeto material de furto?

Ex: água do mar, areia da praia etc. Não pode ser objeto material de furto, salvo se

destacada da sua origem para uma finalidade econômica particular. É o caso dos artistas

das praias que utilizam a areia da praia para fazer desenhos diversos. Se esses desenhos

com areia da praia forem roubados, esse artista será vítima de crime de furto.

Concluindo: o artista que tira de areia da praia não comete furto. Mas se faz o desenho

para vender e alguém o rouba, é vítima de crime de furto. Mas atente que dependendo

da quantidade de areia retirada, pode-se cometer crime ambiental.

Quem, por exemplo, tira os óculos da estátua de Drummond não pratica furto, mas sim

crime de dano ao patrimônio público.

Deve-se subtrair coisa alheia, a qual deve ser móvel. O sentido de coisa móvel aqui é o

mesmo que no direito civil?

Não. O direito penal afirma que é móvel aquilo que pode ser transportado de um local

para outro, sem perder a sua identidade.

O gado pode ser objeto material de furto. É o furto abigeato.

Subtrair coisas do interior de uma sepultura, configura qual crime?

- a primeira corrente entende que responderá o agente pelo art. 210 ou 211 do CP, pois

esses objetos não pertencem a ninguém, ou seja, não configuram coisa alheia.

Violação de sepultura

Art. 210 - Violar ou profanar sepultura ou urna funerária:

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Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.

Destruição, subtração ou ocultação de cadáver

Art. 211 - Destruir, subtrair ou ocultar cadáver ou parte dele:

Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.

- a segunda corrente entende que se a intenção do agente é subtrair e não profanar ou

vilipendiar cadáver, o crime é de furto. É a corrente dominante.

O crime de furto é punido a título de dolo. Mas deve ser o dolo acrescido da finalidade

especial de apoderamento definitivo.

Se o agente age com animus de uso não há crime. É por isso que furto de uso é atípico.

Não há o dolo exigido pelo tipo. O furto de uso possui os seguintes requisitos:

- intenção, desde o início, de uso momentâneo da coisa;

- coisa não consumível pelo uso;

- restituição imediata e integral à vítima.

Se for furtado um veículo e este é entregue, mas com o tanque de combustível vazio?

Nesse caso, há doutrina e jurisprudência entendendo que não há furto porque a coisa

não foi devolvida integralmente. Mas deve-se olhar a coisa principal, que é o carro. Assim,

apesar de haver corrente negando o furto de uso quando o veículo é restituído com o

tanque vazio, hoje vem prevalecendo que o desfalque patrimonial deve atingir a coisa

principal e não o mero acessório.

Furto famélico é crime?

Furto famélico é igual a estado de necessidade, desde que:

- que o fato seja praticado para mitigar a fome;

- que seja o único e derradeiro recurso do agente (inevitabilidade do comportamento

lesivo);

- que haja a subtração de coisa capaz de diretamente contornar a emergência (deve-se

subtrair comida e não outro bem, que será vendido para se comprar a comida);

- a insuficiência dos recursos adquiridos pelo agente ou impossibilidade de trabalho.

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Pode o empregado que recebe salário praticar furto famélico? Sim, desde que seus

recursos sejam insuficientes. Ex: pai de família que ganha um salário mínimo e tem que

sustentar mulher e cinco filhos.

Quem furta caminhão de comida e dá à comunidade, pode alegar estado de

necessidade de terceiros, em tese, mas desde que sejam observados todos os requisitos

acima elencados.

Furto de remédio não é furto famélico, mas também pode caracterizar estado de

necessidade.

Consumação do crime do furto:

a) contrectatio: a consumação ocorre pelo simples contato entre o simples contato entre

o agente e a coisa alheia, dispensando o seu deslocamento.

b) amotio: dá-se a consumação quando a coisa subtraída passa para o poder do

agente, independentemente de deslocamento ou posse mansa e pacífica.

c) ablatio: a consumação ocorre quando o agente, depois de apoderar-se da coisa,

consegue deslocá-la de um lugar para outro.

d) ilatio: a coisa deve ser transportada pelo agente, mantendo-se a posse mansa e

pacífica.

O STF e o STJ adotam a teoria da amotio, ou seja, a coisa subtraída deve passar para o

poder do agente, independentemente de deslocamento ou possa mansa e pacífica.

Com base nessa teoria, pode-se condenar a empregada que subtrai as jóias da patroa e

as esconde no sofá. Mesmo que não consiga tirar as jóias da casa, há a consumação do

crime de furto.

Crime de furto e tentativa:

Plenamente possível a tentativa, já que se trata de crime plurisubsistente.

Casos específicos:

a) batedor de carteira que coloca a mão no bolso da vítima, que não traz nada consigo.

Nesse caso, para Hungria, trata-se de tentativa.

Já Cezar Roberto Bittencourt diferencia duas situações:

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- se a vítima trazia algo em outro bolso, trata-se de tentativa; se não trazia nada em

qualquer dos bolsos, trata-se de crime impossível.

b) vigilância eletrônica em estabelecimento comercial torna o crime impossível?

Prevalece que a vigilância constante (eletrônica ou não) em estabelecimentos

comerciais, não torna, por si só, o crime impossível, devendo ser analisado o caso

concreto. O juiz deve analisar a absoluta ou relativa ineficácia do meio. Se absoluta,

crime impossível; se relativa, tentativa.

§ 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno.

O § 1.º traz causa de aumento de pena (majorante) e não qualificadora.

Repousa noturno é o período em que, à noite, pessoas se recolhem para o descanso

diário. Esse período varia de acordo com o costume. É o costume interpretativo servindo

ao direito penal. Na capital, pode ser um período, o qual será substancialmente diferente

do período nas cidades do interior.

Para incidir essa majorante, o crime deve colocar em risco o local em que as pessoas

repousam, não bastando ser praticado de madrugada, tão somente.

Dois casos:

Uma casa com o carro parado do lado de fora: é furto simples.

Uma casa com o carro parado na garagem: furto majorado pelo repouso noturno. Nesse

caso, houve perigo ao local em que a pessoa repousa.

Mas as pessoas necessariamente devem se encontrar no imóvel e repousando?

Cezar Roberto Bittencourt diz que o imóvel deve estar habitado e com os moradores

repousando. Hungria diz que se os moradores estiverem em uma festa na casa, não incide

a majorante.

Já o STF e o STJ, além de Noronha entendem que o furto deve ser contra imóvel, ainda

que não habitado.

A majorante do § 1.º se aplica no furto qualificado do § 4.º do art. 155 do CP?

§ 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:

I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;

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II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;

III - com emprego de chave falsa;

IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.

Prevalece que não, pois a posição topográfica do § 1.º do art. 155 restringe o aumento ao

caput.

§ 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir

a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente

a pena de multa.

Trata-se do furto privilegiado, que é causa especial de diminuição de pena.

Também é chamado de furto mínimo.

Aula 14 18/05/2009

O furto privilegiado é um direito subjetivo do acusado e não uma faculdade do juiz, desde

que preenchidos os seus requisitos.

Requisitos do furto privilegiado:

- primariedade do criminoso: é requisito de ordem subjetiva. Para que seja o réu primário

basta que não seja reincidente. Essa questão é pacífica no STF. Pode, pois, o agente ter

várias condenações no passado; se não for reincidente será primário.

- pequeno valor da coisa furtada: requisito de ordem objetiva.

Há um teto específico para ser a coisa de pequeno valor? Sim, até um salário mínimo.

Mister que se afirme que esses dois requisitos são cumulativos, ou seja, faltando um deles

não há que se falar no privilégio.

Já que existe furto privilegiado, é possível se aplicar o princípio da insignificância diante do

privilégio?

Prevalece o entendimento que pode a insignificância ser aplicada, pois incide sobre a

tipicidade. Logo, a insignificância e o privilégio coexistem. O privilégio diminui a pena e a

insignificância exclui a tipicidade.

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Decidiu o STJ que o privilégio não se confunde com a insignificância. Para a aplicação do

princípio da insignificância, é imprescindível a ínfima lesão ao bem jurídico tutelado, não

se confundido com pequeno valor, lesivo ao bem jurídico (ainda que pequeno o valor, é

lesivo ao bem jurídico). Essa decisão do STJ é de 12/05/2009.

É possível furto privilegiado se qualificado?

- a primeira corrente entende que não é possível privilegiar a forma qualificada. A posição

topográfica do § 2.º do art. 155 demonstra ser aplicável somente às formas anteriores, não

alcançando a qualificadora (posterior). A gravidade da qualificadora é incompatível com

as benesses do privilégio.

- a segunda corrente afirma que, assim como se admite a figura do homicídio qualificado

privilegiado, é possível também o furto qualificado privilegiado.

O STF adotava a primeira corrente. A segunda turma da corte passou a adotar a segunda

corrente (HC 96.843, de abril de 2009).

O STJ adota a primeira corrente.

§ 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor

econômico.

Trata-se de uma cláusula de equiparação. A energia genética, mecânica, térmica e

radioatividade também podem ser inseridas nesse § 3.º.

Energia genética é o sêmen de um animal, por exemplo.

Ex: Dois vizinhos tinham cachorros da mesma raça sendo que um era macho e a outra

fêmea. O dono do macho não quis cruzar os animais porque o sêmen era muito valioso. O

dono da cadela, à noite, faz com que a cadela entre na casa do vizinho e cruze com o

cachorro. O sêmen do cachorro foi subtraído, logo, houve furto de energia genética.

Inclusive, no caso o furto foi qualificado, tendo em vista que a cadela rompeu obstáculo

para entrar na casa onde estava o macho.

Subtração de sinal de TV a cabo: sujeito compra a assinatura com direito a um ponto da

TV a cabo, mas coloca vários em toda a casa. Essa conduta é tida como furto?

- a primeira corrente afirma que sinal de TV a cabo não é energia, não se aplicando a

cláusula do § 3.º. A energia se consome, se esgota, diminui, e pode terminar, ao passo

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que sina de televisão não se gasta, não se diminui. Corrente adotada por Cezar Roberto

Bittencourt.

- a segunda corrente entende que sinal de TV a cabo é uma forma de energia, se

encaixando no § 3.º do art. 155 do CP. Corrente adotada por Nucci e STJ.

Essa mesma discussão existe quando se trata de sinal de telefonia. Bittencourt afirma que

sinal de telefonia não é energia, enquanto Nucci entende o contrário.

Não se deve confundir furto de energia elétrica com estelionato para ocultar a energia

que o sujeito possui.

No caso do furto, o agente não está autorizado a consumir a coisa; o agente se vale de

ligação clandestina;

Já no estelionato, o agente está autorizado a consumir a coisa; a ligação é legítima; o

agente se vale de artifício para provocar resultado (consumo) fictício, alterando o

medidor de energia, por exemplo. É o caso do famoso gato.

Furto qualificado

§ 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:

I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;

II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;

III - com emprego de chave falsa;

IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.

Destruição de rompimento de obstáculo à subtração da coisa:

A qualificadora só incide se a violência ocorre contra a coisa que está entre o agente e a

coisa visada. Se a violência for contra a própria coisa visada, não incide a qualificadora.

A violência deve incidir sobre objetos que dificultam a subtração da coisa visada.

Ex: o agente quebra o vidro de um veículo para subtrair o próprio veículo: não incide a

qualificadora, porque a violência se deu contra a própria coisa.

Ex: quebra-se o vidro para levar o guarda-chuva. Nesse caso, há furto qualificado, pois a

violência se deu contra obstáculo que impedia que o agente chegasse a coisa.

A doutrina moderna só admite a qualificadora se a coisa visada vale mais que o

obstáculo subtraído. Essa posição surgiu em contraposição a esse exemplo e outros do

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mesmo jaez, ante o lógico absurdo que há nos casos em que o obstáculo vale mais que a

coisa.

Assim, para incidir a qualificadora, o obstáculo deve valer mais que a coisa.

O rompimento do obstáculo deve ocorrer antes, durante ou após a subtração, mas

sempre antes da consumação. Se o rompimento ocorre depois da consumação, há o

crime de dano, além do de furto, por óbvio.

Ligação direta no carro pode ser configurada como rompimento de obstáculo?

Prevalece que não, mas há jurisprudência em sentido contrário. Inclusive, há

jurisprudência que entende ser chave falsa.

Mera remoção de telhas para que o agente entre no imóvel?

Não, porque o agente não tornou a coisa inservível. Mas o crime pode ser qualificado

pela escalada, mas não pelo rompimento de obstáculo.

Sujeito que desativa alarme do carro, pode o crime ser qualificado pelo rompimento de

obstáculo?

Não, porque o obstáculo não se tornou inservível.

II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;

Há quatro hipóteses de qualificadoras.

Abuso de confiança:

Pode o criminoso captar propositadamente a confiança da vítima, também, valer-se da

confiança já existente.

Trata-se de confiança familiar, de trabalho, de amizade etc.

Para incidir essa qualificadora, não basta ter a confiança, sendo imprescindível que haja

facilidades na execução em razão da confiança que o agente desfruta. Essa questão é

pacífica na jurisprudência.

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OBS: A mera relação de emprego não induz à qualificadora abuso de confiança, sendo

imprescindível o especial vínculo de lealdade ou fidelidade entre a vítima e o agente.

Qual a diferença do crime de apropriação indébita para o furto qualificado com abuso

de confiança?

Furto com abuso de confiança Apropriação Indébita

O agente não tem a posse, mas mero

contato com a coisa.

O agente exerce a posse em nome

de outrem.

Existe dolo antecedente à posse da

coisa.

Há dolo superveniente à posse da

coisa.

Mediante fraude:

Existe uma região nebulosa entre furto mediante fraude e estelionato.

Furto mediante fraude Estelionato

O agente emprega a fraude para

facilitar a subtração da coisa.

O agente emprega a fraude, mas

para fazer com que a vítima lhe

entregue a coisa espontaneamente.

A fraude serve para retirar a vigilância

da vítima sobre a coisa, facilitando a

subtração.

A vítima enganada entrega a posse

desvigiada.

A coisa sai da vítima e vai para o

agente de forma unilateral.

A coisa sai da vítima e vai para o

agente de forma bilateral.

Questões práticas:

Dois homens, trajados como funcionários da Telemar foram à casa de uma senhora e

disseram que o telefone estava com problema. Enquanto um mostrava o pseudo

problema, o outro leva os objetos da casa.

Nesse caso, houve emprego de fraude, servindo esta para retirar a vigilância da vítima

sobre as coisas. Logo, houve furto mediante fraude.

Sujeito sai da boite e passa no guarda-volumes e requer bolsa que não a sua. A bolsa sai

do agente de forma bilateral, logo houve engano da pessoa que entregou a coisa,

havendo estelionato.

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Agente vai a mercantil, esvazia garrafa de água, colocando vinho branco caríssimo. Para

a água, mas sai levando o vinho. Nesse caso, há furto qualificado mediante fraude. A

mulher do caixa pensou que estava entregando água. Logo, a coisa não saiu da vítima

de forma bilateral, mas sim unilateral.

Falso test-drive é furto mediante fraude ou estelionato?

A coisa saiu da vítima para o agente de forma bilateral, mas a coisa era vigiada e não

desvigiada. Logo, prevalece que se trata de furto mediante fraude. Há jurisprudência

afirmando que se trata de estelionato.

Quem afirma que é estelionato, esquece que a posse é vigiada. Ora, se não há posse

desvigiada não há que se falar em estelionato.

Jovem que vai na loja, experimenta roupas e sai com elas, servindo como disfarce o

casaco. Trata-se de furto mediante fraude, porque a posse das roupas era vigiada.

Auxiliar vítima no caixa eletrônico e trocar o cartão Magnético.

Trata-se de furto mediante fraude, tendo em vista que a coisa sai da vítima para o agente

de forma unilateral, além de ser a posse vigiada.

Furto mediante escalada:

É o uso e via anormal para ingressar no local onde se encontra a coisa visada. Qualquer

via anormal gera escalada, não importando se o agente sobe um muro ou cava um

túnel.

A jurisprudência exige não só a via anormal, mas o desforço incomum do agente.

Suponha que o agente, para tomar as dependências de um imóvel, salta muro de um

metro. Não há desforço incomum, logo não é o furto qualificado pela escalada.

Furto de fio de cobre pode ser qualificado pela escalada? A via normal para se furtar pó

fio de cobre é subindo no poste. Logo, não há via anormal utilizada, logo não se trata de

furto qualificado mediante escalada. Mas se os fios forem furtados de helicóptero haverá

furto qualificado pela escalada.

O furto mediante escalada prescinde ou imprescinde de perícia?

- primeira corrente: não deixando vestígios, a perícia é dispensável, prescindível.

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- segunda corrente: exigindo um desforço incomum do agente, a perícia é indispensável

para atestá-lo. É a corrente que o professor adota, mas não há consenso jurisprudencial a

respeito do tema.

Destreza:

É a peculiar habilidade física ou manual permitindo ao agente praticar o crime sem que a

vítima perceba que esteja sendo despojada de seus bens.

Para existir a qualificadora, a pessoa deve trazer a coisa junto ao seu corpo. Essa

exigência é pacífica na jurisprudência. É o famoso furto do “batedor de carteira”.

Se terceiros percebem que o batedor está retirando a carteira da vítima, ainda assim

incide a qualificadora da destreza?

Sim, pois basta que a vítima não perceba para gerar essa qualificadora.

III - com emprego de chave falsa;

Emprego de chave falsa:

Chave é todo instrumento, com ou sem forma de chave, destinado a abrir fechaduras.

Ex: chave micha, arame, grampo, gazua etc.

A chave verdadeira obtida fraudulentamente configura chave falsa?

Noronha entende que chave verdadeira obtida fraudulentamente é chave falsa. É uma

corrente minoritária.

OBS: prevalece que ligação direta não é chave falsa. Mas há jurisprudência em sentido

contrário.

OBS: quando se fala em chave, a interpretação deve ser progressiva, porque a maioria

dos veículos modernos são abertos por dispositivo magnético. Quem conseguir fraudar

esse dispositivo incide na qualificadora.

IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.

Para gerar essa qualificadora, os participes são computados? Se houver um executor e

um partícipe, há a incidência dessa qualificadora?

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- a primeira corrente entende que não são computados os partícipes, mas somente os

executores. Se A, conluiado com B, subtrai e B só instiga, não há a incidência da

qualificadora. Corrente adotada por Nelson Hungria.

- a segunda corrente entende que concurso de pessoas é o gênero, do qual são espécies

co-autores e partícipes, logo, conta-se o partícipe para que incida essa qualificadora. No

exemplo acima, haveria o concurso de agentes. Essa é a corrente que prevalece.

Ainda, devem ser computados os inimputáveis ou pessoas de identidade desconhecida.

Basta, pois, a prova de que duas pessoas participaram do delito para que incida a

qualificadora.

Mas se o furto for praticado por quadrilha ou bando a qualificadora não deve ser

aplicada, para que não haja o bis in idem. Ignora-se a qualificadora, uma vez que a

quadrilha ou bando já está consumada.

§ 5º - A pena é de reclusão de três a oito anos, se a subtração for de veículo automotor

que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior. (Incluído pela Lei nº

9.426, de 1996)

Para incidir essa qualificadora, é indispensável que o veículo ultrapasse os limites de um

Estado ou do nosso País. Tem, pois, como essa qualificadora ser tentada?

Não, tendo em vista que o furto já estava consumado. Caso a polícia prenda o carro na

fronteira, o juiz deve considerar essa circunstância na fixação da pena base.

Damásio afirma que se o veículo foi furtado e se o autor está partindo para outro Estado,

ao cruzar a fronteira e ser pêgo, há a tentativa de furto.

Mas essa corrente peca porque desconsidera a teoria da amotio quanto ao momento da

consumação do crime, que é a teoria adotada pelo STF e STJ.

Maximiliano Furer afirma que não estaria incluso o DF, tendo em vista que o DF não é

Estado. É um posicionamento isolado, porque nem a CF diferencia Estado do DF. O

legislador penal utilizou Estado unidade da Federação.

A e B subtraem um veículo. C transporta o veículo para outro Estado. A e B praticam crime

de furto qualificado pelo § 5.º. Se C estava mancomunado com A e B responde também

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pelo art. 155, § 5.º do CP. Mas se C não estava agindo em concurso com A e B, responde

por receptação se tinha conhecimento da origem ilícita do veículo.

Se C, conhecendo a origem ilícita, age para assegurar o crime dos demais agentes,

responde por favorecimento real (art. 349).

Art. 349 - Prestar a criminoso, fora dos casos de co-autoria ou de receptação, auxílio

destinado a tornar seguro o proveito do crime:

Pena - detenção, de um a seis meses, e multa.

Se C desconhecia a origem ilícita o fato para ele é atípico.

É possível que haja a incidência das qualificadoras dos §§ 4.º e 5.º ao mesmo tempo.

O § 4.º é punível com reclusão de dois a oito anos e o § 5.º com pena de três a oito anos.

Nesse caso, o juiz deve aplicar a qualificadora mais grave, que é a do § 5.º. A

qualificadora do § 4.º deve ser aplicada como circunstancia judicial desfavorável, de

acordo com o art. 59 do CP.

ROUBO:

Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou

violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade

de resistência:

Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.

§ 1º - Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência

contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a

detenção da coisa para si ou para terceiro.

§ 2º - A pena aumenta-se de um terço até metade:

I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;

II - se há o concurso de duas ou mais pessoas;

III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal

circunstância.

IV - se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro

Estado ou para o exterior; (Incluído pela Lei nº 9.426, de 1996)

V - se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade. (Incluído pela

Lei nº 9.426, de 1996)

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§ 3º Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de reclusão, de sete a quinze

anos, além da multa; se resulta morte, a reclusão é de vinte a trinta anos, sem prejuízo da

multa. (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996) Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90

Bem jurídico tutelado:

Patrimônio e liberdade individual da vítima, logo é crime complexo, formado da fusão de

dois ou mais tipos penais com dois ou mais bens jurídicos tutelados.

Sujeito ativo:

Pode ser qualquer pessoa, salvo o próprio proprietário da coisa.

Se o proprietário roubar coisa sua em poder de terceiro caracteriza o crime de exercício

arbitrário das próprias razões. Assim, não existe roubo de coisa própria.

No caso de exercício arbitrário das próprias razões, o crime é de ação incondicionada,

por conta da violência ou grave ameaça.

Sujeito passivo:

É o proprietário, possuidor ou detentor da coisa, bem como a pessoa contra quem se

dirige a violência ou grave ameaça, ainda que desligada da lesão patrimonial. Isso

justamente porque o crime de roubo é um crime complexo.

Ex: posto de gasolina é vítima de roubo, mediante grave ameaça ao frentista. A vítima é

tanto o posto de gasolina (pessoa jurídica, representada pelo sócio-gerente ou quem lhe

faça as vezes) e o frentista. Este não entra no rol de testemunhas. Assim, se já se tem oito

testemunhas e o frentista é arrolado, assim o é como vítima.

Conduta:

Devem ser especificadas duas espécies de roubo simples, a do caput (roubo próprio) e a

do § 1.º (roubo impróprio):

Roubo simples próprio:

Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou

violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade

de resistência:

Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.

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150

Há aqui um comportamento antecedente e outro subsequente.

No roubo próprio se empresa violência, grave ameaça ou qualquer outro meio

(comportamento antecedente) para subtrair (comportamento subsequente).

Por qualquer outro meio entende-se uma violência imprópria. Ex: boa noite cinderela, ou

seja, uso de psicotrópicos; hipnose.

§ 1º - Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência

contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a

detenção da coisa para si ou para terceiro.

Trata-se do roubo simples impróprio. Também há dois momentos, antecedente e

subsequente.

No roubo simples impróprio, primeiro há a subtração, para, depois, empregar a violência

ou grave ameaça, visando assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa.

No roubo próprio, a violência pode ser imprópria. Já no roubo impróprio não há violência

imprópria.

O roubo impróprio pressupõe o prévio apoderamento da coisa.

A doutrina afirma que o roubo impróprio é um furto que se transforma em roubo pelas

circunstâncias.

Ex: agente que subtrai a televisão e quando está saindo da casa chega o dono, o qual é

agredido pelo agente do crime.

Suponha que o agente, para roubar a televisão, coloca arma na cabeça do dono da

casa. Há roubo próprio.

Mas se o agente, quando ia roubar a televisão, aparece o dono; o agente agride o dono

da casa e foge. Nesse caso, há furto tentado mais crime contra a pessoa (lesão corporal

ou homicídio), em concurso material. Não há roubo impróprio porque o agente não havia

se apoderado da coisa previamente.

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151

A expressão “logo depois de subtrair a coisa”: a interpretação que se dá é que a violência

ou a grave ameaça só é admissível somente até a consumação do furto.

A violência ou a grave ameaça só incide até a consumação do furto; ocorrendo

posteriormente, trata-se de crime autônomo.

A jurisprudência é pacífica no sentido de não admitir a incidência do princípio da

insignificância no roubo, nem próprio nem impróprio.

Ainda, a jurisprudência não admite se emprestar o privilégio do furto, ou seja, se o agente

é primário e a coisa de pequeno valor, mesmo assim não se empresta o privilégio do furto.

O crime de roubo só é punível a crime de dolo.

No roubo próprio, há um dolo acrescido de finalidade especial: “para si ou para outrem”.

No caso do roubo impróprio, o dolo é o seguinte: “subtrair a coisa a fim de assegurar a

impunidade do crime ou a detenção da coisa”.

Roubo de uso é crime?

O roubo é formado pelo furto mais o crime de constrangimento ilegal.

- para a primeira corrente é crime, previsto no art. 157 do CP. É a posição do STF e STJ.

- a segunda corrente afirma que é crime de constrangimento ilegal. É a posição de

Rogério Grecco. Nesse caso, o fato não seria atípico. Sabendo que o roubo é um crime

complexo formado de furto e constrangimento ilegal, o roubo de uso faz desaparecer o

furto e a pessoa é punida por constrangimento ilegal. Logo, para a minoria, roubo de uso

é constrangimento ilegal. É a tese a ser defendida em concursos para a Defensoria

Pública.

Aula 15 25/05/2009

Consumação/Tentativa:

Para se saber quando o crime de roubo se consuma, deve-se indagar se se trata do roubo

próprio ou do roubo impróprio.

Consumação no roubo próprio:

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152

Consuma-se com o apoderamento violento da coisa, dispensando posse mansa e

pacífica. É a posição do STF e do STJ, os quais adotaram a teoria da amotio.

O roubo próprio admite tentativa, uma vez que é um delito plurisubsistente.

Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou

violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade

de resistência:

Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.

Consumação no roubo impróprio:

A consumação ocorre com o emprego da violência ou grave ameaça. Também é a

posição do STF e STJ, não havendo discrepância na doutrina.

O roubo impróprio admite tentativa?

- a primeira corrente entende que não admite tentativa, pois ou a violência é

empregada, e tem-se a consumação, ou não é empregada, e o que se tem é um crime

de furto. É a corrente majoritária entre os doutrinadores clássicos, como Marques,

Noronha, Hungria, dentre outros.

- a doutrina moderna entende que admite tentativa, como na hipótese em que o agente,

após apoderar-se do bem, tenta empregar violência ou grave ameaça, mas é contido. É

a corrente adota por Mirabete, Nucci, Bittencourt, dentre outros.

Art. 157 (...)

§ 1º - Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência

contra pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a

detenção da coisa para si ou para terceiro.

Causas de aumento de pena:

§ 2º - A pena aumenta-se de um terço até metade:

I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;

II - se há o concurso de duas ou mais pessoas;

III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal

circunstância.

IV - se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro

Estado ou para o exterior; (Incluído pela Lei nº 9.426, de 1996)

V - se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade. (Incluído pela

Lei nº 9.426, de 1996)

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153

Esse dispositivo não traz qualificadoras, mas sim majorantes.

I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;

Para incidir a majorante do emprego de arma, é imprescindível o emprego efetivo da

arma no roubo, ou basta o porte ostensivo, de modo a ameaçar a vítima?

- a primeira corrente afirma que para incidir o aumento é imprescindível o efetivo

emprego da arma na subtração violenta. Não basta o porte ostensivo. Corrente adotada

por Bittencourt.

- a segunda corrente entende que para incidir o aumento basta o porte ostensivo. É a

posição de Luiz Régis Prado.

A jurisprudência está dividida quanto a esse assunto, mas há uma leve tendência para a

segunda corrente.

O que é arma?

Essa expressão gera indisfarçável controversa. Pedaço de madeira com prego é arma?

Gargalo de garrafa é arma?

- a expressão arma, para alguns autores, deve ser tomada no seu sentido próprio. Quando

isso ocorre, estamos abrangendo apenas instrumento fabricado com finalidade bélica. Ex:

revólver. A expressão arma é usada no sentido restrito. É a corrente que deve ser utilizada

nos concursos da Defensoria Pública.

- a segunda corrente adota a expressão no sentido impróprio, abrangendo todo

instrumento com ou sem finalidade bélica, porém capaz de servir ao ataque ou defesa.

Para a segunda corrente, uma faca de cozinha, por exemplo, é arma. A expressão arma

é usada no sentido amplo. É a corrente que prevalece na doutrina e na jurisprudência.

Para incidir o aumento, a arma deve ser apreendida e periciada? Prevalece o

entendimento que não, bastando a prova que a arma foi utilizada no crime. Mas há

Ministros do STF que pensam de forma contrária.

Arma de brinquedo (simulacro de arma de fogo):

Até 2002, a resposta era que gerava o aumento, por conta da súmula 174 do STJ:

Súmula: 174�No crime de roubo, a intimidação feita com arma de brinquedo autoriza o

aumento da pena. (Cancelada)

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154

A súmula 174 foi cancelada em 24/10/2001. Assim, a arma de brinquedo gera roubo,

porém não mais majorado.

Quais os argumentos que fundamentaram o cancelamento?

- a súmula 174 ofendia os princípios da lesividade ou da ofensividade, uma vez que o risco

era presumido.

- arma de brinquedo não cria o risco proibido, ou seja, o risco advindo de uma arma de

brinquedo não desencadeia o resultado que se busca impedir, ou seja, há a aplicação

da teoria da imputação objetiva.

Assim, a arma de brinquedo gera o risco, mas este é incapaz de causar o resultado que se

busca evitar com aumento de pena.

Arma verdadeira desmuniciada ou inapta para disparos gera o aumento de pena?

Essa arma gera o mesmo risco de uma arma de brinquedo. O cancelamento da súmula

174 fortaleceu a doutrina que dizia que arma verdadeira ou inapta não gera aumento.

Mas o STF decidiu já em 2009 que arma verdadeira desmuniciada ou inapta é suficiente

para gerar o aumento. O professor entende que é uma contradição da corte.

É possível a denúncia por quadrilha ou bando armada mais roubo com emprego de

arma?

- a primeira corrente entende que não é possível, pois nesse caso haveria um bis in idem.

Corrente adotada por Nucci. Defensível em concursos da Defensoria.

- é possível, pois não configura bis in idem. Isso porque se tem bens jurídicos diversos. Além

disso, se tratam de crimes independentes. Por fim, na quadrilha, pune-se o fato de ela ser

armada. Já no roubo o que é punido o emprego de arma, que são duas coisas distintas,

portanto, não gerando o bis in idem. A segunda corrente é adotada pelo STF, mas essa

questão ainda não foi analisada pela nova composição da corte.

II - se há o concurso de duas ou mais pessoas;

Nesse concurso de duas ou mais pessoas, computam-se os partícipes ou apenas os

executores. Computam-se os partícipes, inimputáveis ou concorrente não identificado.

Hungria entende de forma diversa, mas a sua posição é isolada. Logo, em provas da

Defensoria deve-se adotar a sua tese.

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155

Pode-se haver o concurso de quadrilha ou bando mais roubo majorado pelo concurso de

pessoas?

- a primeira corrente entende que se trata de bis in idem, pois se pune a pluralidade de

pessoas duas vezes. Corrente adotada por Nucci.

- a segunda corrente entende que não se trata de bis in idem, pois os tipos são

independentes, os bens jurídicos são diversos e na quadrilha se pune a reunião, enquanto

no roubo, a execução. É a posição do STF. Mas essa matéria ainda não foi adotada pela

nova composição da corte.

III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal

circunstância.

Só há o aumento quando a vítima está transportando os valores de alguém. Se os valores

são da vítima, não há o aumento.

O que são valores? Quando nasceu essa majorante, uma doutrina e pequena

jurisprudência afirmava que se tratava apenas de valores bancários, ou seja, carro forte.

Mas hoje prevalece que se trata de qualquer tipo de valores. Ex: engradados de bebida,

carga de cigarros, de medicamentos etc.

Para se evitar uma responsabilidade penal objetiva, a vítima deve saber que a vítima

estava transportando valores.

IV - se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro

Estado ou para o exterior; (Incluído pela Lei nº 9.426, de 1996)

Essa matéria foi vista na aula 14.

V - se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade. (Incluído pela

Lei nº 9.426, de 1996)

Havia doutrina que colocava o sequestro relâmpago nesse inciso.

O agente, para subtrair ou garantir o sucesso empreitada, restringe a liberdade de

locomoção da vítima.

Não se deve confundir o art. 157, § 2.º, V com o art. 157 c/c 148.

No roubo (art. 157, § 2.º, V ), a privação ocorre por tempo suficiente para garantir a ação

do agente, ou seja, é uma privação necessária.

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156

Ex: A coloca arma em B, saindo com seu veículo, deixando-o em rodovia e largando-o em

seguida.

Já no roubo em concurso com o sequestro (art. 157 c/c 148.), a privação ocorre por

tempo desnecessário para a ação do agente. Esse crime continua vigente mesmo com o

advento do novo sequestro relâmpago.

Ex: A coloca arma em B, subtrai seu carro, levando-o no porta-malas. Nesse tempo,

pratica inúmeros roubos com o motorista preso no porta-malas.

O § 2.º do art. 157 diz que a pena deve ser aumentada de um terço até a metade. O juiz

de se basear em que para fixar o aumento? O STF decidiu que quanto mais circunstâncias

majorantes, mais próximos da metade. Assim, como há cinco circunstâncias, quanto mais

houver, mais se aproxima da metade. O STJ entende de forma diversa. Exige a

imprescindibilidade do aumento, que não decorre necessariamente da quantidade de

circunstâncias.

Roubo qualificado:

§ 3º Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de reclusão, de sete a quinze

anos, além da multa; se resulta morte, a reclusão é de vinte a trinta anos, sem prejuízo da

multa. (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996) Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90

Diferentemente do § 2.º, aqui há a incidência de qualificadora.

Há duas partes nesse dispositivo. Somente a segunda parte é chamada de latrocínio,

sendo apenas este considerado como crime hediondo - se resulta morte, a reclusão é de

vinte a trinta anos, sem prejuízo da multa.

Ainda, os resultados qualificadores (lesão grave e morte) podem advir de dolo ou culpa.

Assim, pode haver latrocínio doloso e latrocínio preterdoloso, sendo os dois considerados

hediondos.

A lei afirma que “se da violência resulta”. Assim, não incide o § 3.º se a morte decorre da

grave ameaça.

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157

Para que haja qualificadora, é imprescindível que a violência seja empregada durante o

assalto (fator tempo) e em razão dele (fator nexo). Faltando um desses fatores, não há

que se falar nessa qualificadora.

Ex: A assaltou banco há duas semanas. É reconhecido pelo gerente e o mata. A morte foi

em razão do assalto, mas não durante ele. Nesse caso, responderá A não por latrocínio,

mas sim por homicídio e roubo.

OBS: o co-autor que participa do roubo armado responde pelo latrocínio, ainda que o

disparo tenha sido efetuado apenas pelo comparsa. Também é desnecessário saber qual

dos co-autores desferiu o tiro, respondendo todos pelo fato. É a posição do STF.

Assaltante que mata outro para ficar com o produto do crime, pratica qual delito?

Responde por roubo mais homicídio qualificado pela torpeza, não se caracterizando

latrocínio.

Morte acidental de assaltante. Ex: assaltante mira a vítima, mas por erro na execução

mata comparsa. Nesse caso, aplica-se o art. 73 do CP, respondendo por latrocínio. É caso

de aberratio ictus.

No roubo qualificado, tem-se violência, com lesão grave ou morte, para subtrair. O fim,

portanto, é o patrimônio e não a vida. O meio é retirar a vida do agente. Por conta disso,

latrocínio não vai a júri, já que é crime contra o patrimônio qualificado pela morte. É o que

reza a súmula 60 do STF:

Súmula 603 �A competência para o processo e julgamento de latrocínio é do juiz singular

e não do Tribunal do Júri.

Mas se a intenção do agente é matar o agente e, depois da morte, ele resolve subtrair o

seu patrimônio? Nesse caso, há homicídio seguido de furto.

Consumação do latrocínio:

O latrocínio é formado pela subtração mais a morte.

Suponha que o agente conseguiu levar o veiculo, dando o tiro, mas não o mata por

circunstâncias alheias à sua vontade. Nesse caso, há latrocínio tentado.

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158

Mas atente para a súmula 610:

Há crime de latrocínio, quando o homicídio se consuma, ainda que não se realize o

agente a subtração de bens da vítima.

O resultado final do latrocínio é sempre a vida e não o patrimônio. Se a vítima morreu, o

latrocínio é consumado, ainda que a subtração seja tentada.

Nos concursos da Defensoria, não se utiliza a súmula 610 do STF. Ela deve ser criticada

com veemência. Rogério Greco afirma que o latrocínio é a subtração mais morte, que

são elementos do tipo. O art. 14, I do CP diz o seguinte:

Art. 14 - Diz-se o crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Crime consumado (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

I - consumado, quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição

legal; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Logo, a súmula diz que o crime é consumado mesmo não estando reunidos todos os

elementos do crime.

Tem-se um carro com um passageiro e com o motorista. Para levar o carro, mata-se o

passageiro e o motorista. Quantos crimes de latrocínio cometeu o agente?

A jurisprudência afirma que há um crime de latrocínio, devendo o juiz considerar a

pluralidade de mortes na fixação da pena base. É a tese que deve ser defendida em

concursos para a Defensoria. Isso porque havia apenas um patrimônio. É a corrente

adotada por Cezar Roberto Bittencourt.

Já nos concursos do MP, costuma-se trabalhar a tese do concurso formal. Cada morte

gera um crime de latrocínio.

Há, ainda, uma minoria que afirma que se trata de continuidade delitiva.

Se se tem um latrocínio, este pode ser majorado pelo emprego de arma, concurso de

agentes, transporte de valores ou qualquer outra majorante do § 2.º do art. 155?

As majorantes do § 2.º só se aplicam ao caput e ao § 1.º, não se estendendo ao 6 3.º. Isso

não impede o juiz de considerar essas majorantes na fixação da pena base.

EXTORSÃO:

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159

Art. 158 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de

obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça

ou deixar fazer alguma coisa:

Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.

§ 1º - Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma,

aumenta-se a pena de um terço até metade.

§ 2º - Aplica-se à extorsão praticada mediante violência o disposto no § 3º do artigo

anterior. Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90

Bem jurídico tutelado:

O art. 158 é o constrangimento ilegal como meio e violação patrimonial como fim. A

diferença do art. 158 para o art. 146 é exatamente a finalidade especial, que é a lesão

patrimonial. A extorsão é, pois, um constrangimento ilegal com finalidade de lesão

patrimonial.

Logo, há dois bens jurídicos tutelados: incolumidade pessoal da vítima (art. 146) e o

patrimônio. Um bem jurídico é lesado pelo crime meio e o outro é lesado pelo crime fim.

Sujeito ativo:

Qualquer pessoa, tendo em vista que se trata de crime comum.

OBS: se o sujeito ativo for funcionário público, poderá haver o delito de concussão.

Sujeito passivo:

A vítima no delito de extorsão é aquele que suporta diretamente a violência ou a grave

ameaça e que pode ser, eventualmente, pessoa diversa do titular do bem atacado

(também vítima). Nem sempre a vítima da lesão patrimonial coincide com a vítima da

grave ameaça.

A conduta típica consiste em constranger com violência e com grave ameaça e com o

fim de enriquecimento ilícito. A violência pode ser a física ou a moral.

Esse crime não se confunde com o roubo, onde o crime é subtrair mais violência física ou

moral, com o fim de enriquecimento ilícito.

Roubo Extorsão

O ladrão subtrai. O extorsionário faz com que se lhe

entregue.

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Há a busca de vantagem imediata. Há a busca de vantagem mediata.

Dispensa a colaboração da vítima A colaboração da vítima é

indispensável.

Assim, se alguém coloca arma na cabeça do outro e diz “passa a carteira”, é crime de

roubo, tendo em vista que a busca da vantagem é imediata, bem como nesse caso não

era necessária a colaboração da vítima, porque diferença não faz se o assaltante coloca

a arma e recebe a carteira ou coloca a arma e pega a carteira do bolso.

Mas há jurisprudência que ignora a terceira característica.

O fato de desses dois crimes não se coincidirem não impede o concurso de delitos. Ex: A

subtrai carro de B e pede o cartão com a senha do banco. Nesse caso, há o roubo do

carro e a extorsão pelo cartão. Mas há jurisprudência no sentido de que um crime

absorve o outro, tendo em vista que o bem jurídico tutelado é o mesmo. É a tese que

deve ser usadas na Defensoria.

O crime de extorsão é punido a título de dolo, mas com finalidade especial, que é a

indevida vantagem econômica.

Se a vantagem buscada com o constrangimento é devida, não há extorsão, mas sim

exercício arbitrário das próprias razões.

Se a vantagem visada não é econômica, mas sim moral, o crime é o de constrangimento

ilegal.

Se a finalidade é sexual, haverá estupro ou atentado violento ao pudor.

O crime de extorsão é material, formal ou de mera conduta?

- a primeira corrente entende que trata-se de crime material, sendo imprescindível a

obtenção da indevida vantagem econômica.

- trata-se de crime formal, dispensando a obtenção da indevida vantagem econômica

(se houver a indevida vantagem econômica, será mero exaurimento do crime). É a

corrente que prevalece. Inclusive, é o que reza a súmula 96 do STJ:

Súmula: 96� O crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da

vantagem indevida.

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Se o crime é formal, se consuma com o constrangimento, começando a correr o prazo

prescricional, pouco importando quando se consuma o enriquecimento indevido. Ainda,

essa questão se assoma importante por conta da possibilidade da lavratura do flagrante.

No concurso da DPU, o crime foi tido como de mera conduta. Por conta disso, a

jurisprudência já vem adotando o entendimento de que essas questões podem ser

anuladas pelo judiciário.

Tentativa:

O crime de extorsão admite tentativa, uma vez que é formal, ou seja, a execução pode

ser fracionada em vários atos. Ex: carta extorsionária interceptada.

§ 1º - Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma,

aumenta-se a pena de um terço até metade.

No que concerne à majorante do emprego de arma, aplicam-se as disposições que

foram estudadas no crime de roubo.

Já a primeira majorante diz respeito ao fato de a extorsão ser cometida por duas ou mais

pessoas. No caso do roubo, a hipótese era de concurso de duas ou mais pessoas.

Por haver utilizado a expressão concurso, o legislador quis abranger o partícipe. Já no

caso do 6 1.º do art. 158 não há a possibilidade do partícipe, logo estes não são

computados nessa majorante.

No mais, tudo o que foi estudado no roubo se aplica ao crime de extorsão praticado por

duas ou mais pessoas.

§ 2º - Aplica-se à extorsão praticada mediante violência o disposto no § 3º do artigo

anterior. Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90

Da mesma forma, aplicam-se as disposições do § 3.º do art. 157 do CP.

Crime de sequestro relâmpago:

§ 3o Se o crime é cometido mediante a restrição da liberdade da vítima, e essa condição

é necessária para a obtenção da vantagem econômica, a pena é de reclusão, de 6

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(seis) a 12 (doze) anos, além da multa; se resulta lesão corporal grave ou morte, aplicam-

se as penas previstas no art. 159, §§ 2o e 3o, respectivamente. (Incluído pela Lei nº 11.923,

de 2009)

O § 3.º do art. 158 foi acrescentado pela Lei 11.923/09. Essa Lei, na ementa, tipifica o crime

de sequestro relâmpago.

A ementa tem duas infelicidades, a saber:

- chamar um crime de sequestro relâmpago, ou seja, trazer o vulgar, o popular, para a lei.

Seria a mesma coisa que mudar o nome do homicídio para “zerar alguém”.

- o segundo erro é esquecer que sequestro relâmpago é gênero, o qual tem como

espécies o art. 157, § 2.º, V; art. 159. Assim, o legislador não tipificou todo tipo de sequestro

relâmpago no art. 158, § 3.º.

Mas antes dessa lei, o delito de “sequestro relâmpago” ora configurava roubo majorado,

ora extorsão mediante sequestro.

Assim, a extorsão mediante sequestro deixou de ser crime hediondo. Logo, se alguém foi

condenado pelo art. 159 do CP, essa norma retroage.

A pena do sequestro relâmpago deveria ser a mesma do roubo majorado pela privação

da liberdade, mas não é. A pena do sequestro relâmpago e de 06 a 12 anos. A do roubo

majorado é de 04 a 10 anos.

A doutrina já reclama dizendo que as penas diversas entre o roubo majorado e o

sequestro relâmpago fere o princípio da proporcionalidade, porque as condutas são

quase idênticas.

O § 3.º do art. 158 aplica as penas da extorsão mediante sequestro se do crime resulta

lesão corporal ou morte. Assim, o sequestro relâmpago não é crime hediondo, salvo se

houver morte.

Art. 157, § 2.º, V Art. 158, § 3.º Art. 159

O agente subtrai com

violência.

O agente constrange com

violência.

O agente seqüestra.

A colaboração da vítima é

dispensável.

A colaboração da vítima é

indispensável.

A colaboração da

vítima é dispensável,

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163

porque a vantagem

depende de terceira

pessoa, como o familiar,

por exemplo.

Não é crime hediondo,

salvo se resulta morte.

Não é hediondo, salvo se

resulta morte.

É sempre hediondo.

Pena: 04 a 10 anos Pena: 06 a 12 anos

Ex: agente coloca arma na cabeça da vítima e pede o cartão e a senha, privando a

vítima de sua liberdade até zerar as contas. Mas Rogério Greco afirma que o crime é o

previsto no art. 157, § 2.º, V, tendo em vista que a vantagem é imediata e não mediata.

Ainda, afirma ele que a vantagem da extorsão é futura, o que não ocorre nesse caso. Por

isso, afirma que o crime é de roubo qualificado.

Como o crime de roubo tem pena menor, é a tese da Defensoria.

Quando se fala em privação da liberdade da vítima, pode-se estar diante dos seguintes

crimes: art. 157, § 2.º; art. 158, § 3.º ou art. 159.

Ressalte-se que nada impede o concurso entre esses crimes, entendendo a jurisprudência

do STJ que se trata de concurso material. Ex: rouba o relógio e pede a senha.

LFG entende que se trata de concurso formal próprio.

Em síntese:

A Lei 11.923/09 trouxe o sequestro relâmpago com duas infelicidades: tipificar o gênero e

o nomen iuris do delito.

O crime de sequestro relâmpago não é hediondo, salvo se ocorrer morte.

Trouxe uma clara desproporção entre as penas, o que já é questionado pela doutrina,

Pode perfeitamente haver o concurso de delitos.

No crime de sequestro relâmpago, o agente não pode restringir a liberdade da vítima por

mais tempo do que o necessário para obter a vantagem ilícita.

EXTORSÃO MEDIANTE SEQUESTRO:

Art. 159 - Seqüestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer

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vantagem, como condição ou preço do resgate: Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90

Pena - reclusão, de oito a quinze anos.. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de 25.7.1990)

§ 1o Se o seqüestro dura mais de 24 (vinte e quatro) horas, se o seqüestrado é menor de

18 (dezoito) ou maior de 60 (sessenta) anos, ou se o crime é cometido por bando ou

quadrilha. Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90 (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)

Pena - reclusão, de doze a vinte anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de 25.7.1990)

§ 2º - Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90

Pena - reclusão, de dezesseis a vinte e quatro anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de

25.7.1990)

§ 3º - Se resulta a morte: Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90

Pena - reclusão, de vinte e quatro a trinta anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de

25.7.1990)

§ 4º - Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade,

facilitando a libertação do seqüestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços.

(Redação dada pela Lei nº 9.269, de 1996)

Bem jurídico tutelado:

Liberdade de locomoção da vítima e patrimônio.

O crime de extorsão mediante sequestro é sempre hediondo, não importando se simples

ou qualificado.

Sujeito ativo:

Trata-se de crime comum, logo pode ser qualquer pessoa.

Sujeito passivo:

A vítima é tanto a pessoa privada na liberdade de locomoção como aquela privada no

patrimônio. Nem sempre são a mesma pessoa. Ex: sequestra-se uma pessoa e exige-se o

resgate do familiar.

Pessoa jurídica pode ser vítima? Não se tem como privar a liberdade da pessoa jurídica.

Mas pode ser vítima quanto à lesão patrimonial. Ex: seqüestra-se Silvio Santos e requer-se

resgate do Banco Pan Americano.

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Agente sequestra animal de estimação e requer resgate. Nesse, não se trata de extorsão

mediante sequestro, porque o tipo fala em sequestrar pessoa. Caso se trate de animal, o

crime é de extorsão, previsto no art. 158 do CP.

Sequestrar:

Se o crime não foi praticado mediante sequestro, mas sim mediante cárcere privado. Este

tem confinamento, aquele não. O art. 159 utiliza a expressão sequestrar em sentido amplo,

abrangendo cárcere privado.

O cárcere privado é a espécie de sequestro mais comum.

O crime não exige a remoção da vítima de um local para o outro. Ex: sequestro de Silvio

Santos, que foi seqüestrado na cozinha de casa.

Qualquer vantagem como condição de resgate:

O art. 158 fala em indevida vantagem econômica. Já o art. 159 fala em qualquer

vantagem. Significa que abrange a d indevida vantagem. Se a vantagem é devida, tem-

se o crime de exercício arbitrários das próprias razões mais sequestro. Ainda, só pode

abranger vantagem econômica, até porque está o crime no capítulo dos crimes contra o

patrimônio.

A jurisprudência afirma que essas duas são elementares subjetivas implícitas no tipo penal.

Isso porque o crime é punido a título de dolo com essas finalidades especiais.

Consumação:

Prevalece que o crime se consuma com a privação da liberdade. O enriquecimento

(pagamento do resgate) é mero exaurimento do crime.

Ainda, trata-se de crime permanente, uma vez que a consumação se protrai no tempo.

O tempo de privação de liberdade é importante para a consumação. Prevalece que não

interfere na consumação, mas sim na fixação da pena.

É crime plurisubsistente, logo é perfeitamente admissível a tentativa. O agente tenta privar

a pessoa da liberdade, mas não consegue.

Aula 16 01/06/2009

Page 166: Direito Penal Especial - Rogério Sanches

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166

§ 1o Se o seqüestro dura mais de 24 (vinte e quatro) horas, se o seqüestrado é menor de

18 (dezoito) ou maior de 60 (sessenta) anos, ou se o crime é cometido por bando ou

quadrilha. Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90 (Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)

Pena - reclusão, de doze a vinte anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de 25.7.1990)

O § 1.º possui três qualificadoras.

Se o sequestro dura mais de 24 horas:

O prazo é contado em horas e não em dia. Assim, se a vítima ficar seqüestrada 24 horas e

um segundo já incide a qualificadora, mesmo que o sequestro já tenha sido pago. Isso

porque o resgate é mero exaurimento do crime.

Se o seqüestrado é menor de 18 ou maior de 60 anos:

Essa condição do seqüestrado deve estar no dolo do seqüestrador, para que se evite a

responsabilidade penal objetiva.

Se a vítima foi seqüestrada com 17 anos e o sequestro terminou com 18, mesmo assim

incide a qualificadora, ou seja, deve a idade incidir em qualquer momento do sequestro.

Se o crime é cometido por bando ou quadrilha:

A jurisprudência não aplica o art. 288 do CP, para que seja evitado o bis in idem.

§ 2º - Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90

Pena - reclusão, de dezesseis a vinte e quatro anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de

25.7.1990)

§ 3º - Se resulta a morte: Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90

Pena - reclusão, de vinte e quatro a trinta anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de

25.7.1990)

O art. 157, § 3.º diz que se da violência resulta lesão grave ou morte. Já o § 2.º do art. 159

diz que se do fato resulta lesão grave ou morte.

Significa que se no roubo somente a violência geradora dos resultados configurava a

qualificadora, no art. 159, § 2.º, basta que do fato resulte a lesão, seja da violência ou da

grave ameaça.

Page 167: Direito Penal Especial - Rogério Sanches

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167

Esses resultados devem recair sobre o sequestrado ou pode recair sobre terceira pessoa

(segurança do sequestrado, policial que invade cativeiro etc.)?

Prevalece que só haverá a incidência da qualificadora se ela atinge a pessoa do

sequestrado. Se atingir terceira pessoa, tem-se concurso material do art. 159 mais lesão

corporal ou homicídio. Capez sustenta essa posição. O Professor discorda, no entanto.

§ 4º - Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade,

facilitando a libertação do seqüestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços.

(Redação dada pela Lei nº 9.269, de 1996)

Trata da delação premiada:

Antes da Lei 9.269/96 Depois da Lei 9.269/96

Se qualquer dos associados denunciar

às autoridades, fazia jus à delação

premiada.

Se qualquer dos concorrentes

denunciar faz jus à delação

premiada.

Só era cabível quando praticada por

quadrilha ou bando.

Admite-se delação premiada no

concurso de agentes.

Há três requisitos para a delação premiada: o crime deve ser cometido em concurso;

deve-se comunicar às autoridades e facilitar a libertação do sequestrado. Todos esses

requisitos são cumulativos.

Mais do que delação premiada, exige-se que seja eficaz, ou seja, que se facilite a

libertação do sequestrado.

Na eventualidade de ter sido pago o resgate, este não precisa ser recuperado para a

concessão da delação premiada. Não é requisito, pois se assim o fosse deveria estar

expresso no tipo.

O prêmio na delação premiada é de um a dois terços, sendo direito subjetivo do

sequestrador que colaborou com a libertação do sequestrado.

O juiz dosa a redução da pena proporcionalmente ao maior ou menor auxílio prestado

pelo sequestrador que colaborou com a libertação do refém.

ESTELIONATO

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168

Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou

mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:

Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.

§ 1º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor o prejuízo, o juiz pode aplicar a

pena conforme o disposto no art. 155, § 2º.

§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem:

Disposição de coisa alheia como própria

I - vende, permuta, dá em pagamento, em locação ou em garantia coisa alheia como

própria;

Alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria

II - vende, permuta, dá em pagamento ou em garantia coisa própria inalienável, gravada

de ônus ou litigiosa, ou imóvel que prometeu vender a terceiro, mediante pagamento em

prestações, silenciando sobre qualquer dessas circunstâncias;

Defraudação de penhor

III - defrauda, mediante alienação não consentida pelo credor ou por outro modo, a

garantia pignoratícia, quando tem a posse do objeto empenhado;

Fraude na entrega de coisa

IV - defrauda substância, qualidade ou quantidade de coisa que deve entregar a

alguém;

Fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro

V - destrói, total ou parcialmente, ou oculta coisa própria, ou lesa o próprio corpo ou a

saúde, ou agrava as conseqüências da lesão ou doença, com o intuito de haver

indenização ou valor de seguro;

Fraude no pagamento por meio de cheque

VI - emite cheque, sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado, ou lhe frustra o

pagamento.

§ 3º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade

de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência.

Bem jurídico tutelado:

Inviolabilidade patrimonial.

Sujeito ativo:

É crime comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa.

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169

Se for fraude praticada por comerciante antes ou depois da falência em prejuízo de

credores, não incide o CP, mas sim o art. 168 da nova lei de falências:

Art. 168. Praticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a

recuperação judicial ou homologar a recuperação extrajudicial, ato fraudulento de que

resulte ou possa resultar prejuízo aos credores, com o fim de obter ou assegurar vantagem

indevida para si ou para outrem.

Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.

Aumento da pena

§ 1º A pena aumenta-se de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço), se o agente:

I - elabora escrituração contábil ou balanço com dados inexatos;

II - omite, na escrituração contábil ou no balanço, lançamento que deles deveria constar,

ou altera escrituração ou balanço verdadeiros;

III - destrói, apaga ou corrompe dados contábeis ou negociais armazenados em

computador ou sistema informatizado;

IV - simula a composição do capital social;

V - destrói, oculta ou inutiliza, total ou parcialmente, os documentos de escrituração

contábil obrigatórios.

Contabilidade paralela

§ 2º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até metade se o devedor manteve ou

movimentou recursos ou valores paralelamente à contabilidade exigida pela legislação.

Concurso de pessoas

§ 3º Nas mesmas penas incidem os contadores, técnicos contábeis, auditores e outros

profissionais que, de qualquer modo, concorrerem para as condutas criminosas descritas

neste artigo, na medida de sua culpabilidade.

Redução ou substituição da pena

§ 4º Tratando-se de falência de microempresa ou de empresa de pequeno porte, e não

se constatando prática habitual de condutas fraudulentas por parte do falido, poderá o

juiz reduzir a pena de reclusão de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) ou substituí-la pelas

penas restritivas de direitos, pelas de perda de bens e valores ou pelas de prestação de

serviços à comunidade ou a entidades públicas.

Violação de sigilo empresarial

Como e vislumbra, o estelionato da nova lei de falências é bem mias grave que o previsto

no CP.

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Sujeito passivo:

O STF afirma que a vítima do art. 171 é tanto a pessoa lesada no patrimônio quanto a

pessoa enganada pelo agente, ainda que não tenha sido lesado patrimonialmente. Isso

se reflete no rol de testemunhas, porque ambos são vítimas e com isso, não se computam

no rol arrolado pelo MP.

OBS: a vítima do estelionato deve ser capaz; se for incapaz, o crime será o do art. 173 do

CP:

Abuso de incapazes

Art. 173 - Abusar, em proveito próprio ou alheio, de necessidade, paixão ou inexperiência

de menor, ou da alienação ou debilidade mental de outrem, induzindo qualquer deles à

prática de ato suscetível de produzir efeito jurídico, em prejuízo próprio ou de terceiro:

Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.

Assim, fraude contra incapaz não admite suspensão condicional do processo.

OBS: a fraude deve visar vítima determinada. Se a vítima for incerta, se trata de crime

contra a economia popular (lei 1.521/51). Exs: adulteração de balança, adulteração de

taxímetro, adulteração de bomba de combustível etc.

OBS: a adulteração de combustível é tratada na lei 8.176/91, art. 1.º:

Art. 1º Constitui crime contra a ordem econômica:

I - adquirir, distribuir e revender derivados de petróleo, gás natural e suas frações

recuperáveis, álcool etílico hidratado carburante e demais combustíveis líquidos

carburantes, em desacordo com as normas estabelecidas na forma da lei;

II - usar gás liquefeito de petróleo em motores de qualquer espécie, saunas, caldeiras e

aquecimento de piscinas, ou para fins automotivos, em desacordo com as normas

estabelecidas na forma da lei.

Pena - detenção de um a cinco anos.

Elementos estruturais do estelionato:

a) emprego de fraude:

b) obtenção de vantagem ilícita:

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171

c) em prejuízo alheio:

Se faltar qualquer desses elementos não há estelionato, pelo menos consumado.

O emprego da fraude serve para duas coisas:

- induzir a vítima em erro:

Quando se induz alguém em erro, o agente é quem cria na vítima a falsa percepção da

realidade.

- manter a vítima em erro:

A vítima já está enganada e o agente não desfaz o engano percebido.

Artifício:

Encenação material mediante uso de objetos ou aparatos aptos a enganar. Ex: bilhete

premiado, disfarces, crachás etc.

Ardil:

É a conversa enganosa.

Qualquer outro meio fraudulento:

Silêncio, por exemplo. É perfeitamente possível, pois, o estelionato por omissão. O silêncio

é muito utilizado para manter a vítima em erro.

Vantagem ilícita:

Se o agente empresa a fraude para obter vantagem lícita, é configurado o crime de

exercício arbitrário das próprias razoes.

A vantagem ilícita é necessariamente econômica?

Prevalece que a vantagem deve ser de natureza econômica, tendo em vista que se trata

de crime contra o patrimônio. Inclusive, é a posição do STF.

Bittencourt discorda, afirmando que qualquer vantagem configura o estelionato. Alguns

ministros do STF concordam com ele.

Em prejuízo alheio:

Uso de cola eletrônica configura estelionato?

A cola eletrônica visando fraudar o processo de seleção não configura estelionato por

ausência de vítima certa e prejuízo econômico determinado. Para o STF é fato atípico.

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Mesmo se há mais de três pessoas ainda não se caracteriza quadrilha ou bando, tendo

em vista que nesse crime o fim visado deve ser ilícito e a cola eletrônica é fato atípico.

O que ocorre se a vítima também age de má-fé? Fraude bilateral, portanto,

descaracteriza o estelionato?

- a primeira corrente afirma que o tipo não exige boa-fé da vítima. Logo, a sua má-fé não

descaracteriza o crime. É a posição do STF.

- a segunda corrente afirma que o legislador não pode amparar a má-fé da vítima. Logo,

se também agiu com fraude, desaparece o crime. É a posição de Nelson Hungria.

É muito comum se praticar fraude com o uso de documentos falsos. Responderá pelo

estelionato ou falsidade documental?

Há três correntes a respeito:

- a primeira corrente afirma que o agente responde por estelionato e falsidade

documental, em concurso material de delitos. Responde pelos dois crimes porque há bens

jurídicos diversos que são tutelados. É caso de concurso material porque há duas

condutas produzindo dois resultados. É a corrente adotada pelo STJ.

- o agente responde pelos dois crimes, estelionato e falsidade documental, mas em

concurso formal. O agente responde pelos dois crimes, uma vez que os bens jurídicos são

diversos. O concurso é formal porque há apenas uma conduta dividida em vários atos, a

qual produz dois resultados. É a posição do STF.

- a terceira corrente afirma que o agente responde pelo crime de falsidade documental,

o qual absorve o estelionato, ou seja, o crime mais grave absorve o menos grave.

Ressalte-se que se o falso se exaure no estelionato, o agente responde somente pelo

crime patrimonial. A doutrina entende que se trata de uma quarta corrente, mas não é.

Na verdade, se trata da súmula 17 do STJ, o qual adota a primeira corrente com uma

observação. Assim, o STJ entende que o agente responde pelos dois crimes em concurso

material, salvo se o falso se exaure no estelionato.

Súmula: 17�Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, e

por este absorvido.

Ex: agente falsifica uma folha de cheque e compra dada mercadoria. Responde o

agente pelo estelionato, porque o falso se exauriu no estelionato. Mas se ao invés do

cheque se trata de cartão de crédito, a súmula não deve ser aplicada, porque o falso do

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cartão não se exaure, continuando o agente com a potencialidade lesiva, que é o

cartão falsificado, o qual está apto a ser usado novamente.

Dolo no estelionato:

O dolo no estelionato é a intenção de enganar.

Na modalidade “induzir em erro” há dolo seguido de fraude (o dolo é anterior à ação); já

na modalidade “manter em erro”, o dolo nasce no mesmo momento da fraude, sendo o

dolo concomitante à ação.

O dolo do estelionato é acrescido do elemento subjetivo do tipo? Sim, porque o dolo é

obter a vantagem para si ou para outrem.

Se o agente emprega a fraude só para prejudicar a vítima, apenas por raiva dela não há

crime, porque ausente o elemento subjetivo do tipo.

Consumação:

O estelionato é crime de duplo resultado, ou seja, não basta a vantagem, deve-se haver

também o prejuízo alheio. Logo, ambos são necessários.

Se faltar a vantagem por circunstâncias alheias à vontade do agente o crime não se

consuma, havendo tentativa.

O agente emprega a fraude e consegue obter da vítima um título de crédito, mas não

obtém a vantagem por circunstâncias alheias à sua vontade. Há estelionato consumado

ou tentado?

- a primeira corrente entende que, considerando que a obrigação assumida pela vítima

com a emissão do título já é um proveito adquirido pelo estelionatário, trata-se de crime

consumado.

Essa corrente se equivoca no momento em que não lembra que a vantagem deve ser de

natureza econômica, ou seja, enquanto esta não existir, o crime é tentado.

- a segunda corrente entende que enquanto o título não é convertido em valor material,

não há efetivo proveito do agente, podendo configurar tentativa. É a corrente que

prevalece.

§ 1º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor o prejuízo, o juiz pode aplicar a

pena conforme o disposto no art. 155, § 2º.

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O art. 155, § 2.º trata do furto privilegiado ou furto mínimo, exigindo:

- primariedade;

- pequeno valor da coisa subtraída.

Já o art. 171, § 1.º exige:

- primariedade;

- pequeno valor do prejuízo (e não da coisa).

§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem:

Disposição de coisa alheia como própria

I - vende, permuta, dá em pagamento, em locação ou em garantia coisa alheia como

própria;

Alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria

II - vende, permuta, dá em pagamento ou em garantia coisa própria inalienável, gravada

de ônus ou litigiosa, ou imóvel que prometeu vender a terceiro, mediante pagamento em

prestações, silenciando sobre qualquer dessas circunstâncias;

Defraudação de penhor

III - defrauda, mediante alienação não consentida pelo credor ou por outro modo, a

garantia pignoratícia, quando tem a posse do objeto empenhado;

Fraude na entrega de coisa

IV - defrauda substância, qualidade ou quantidade de coisa que deve entregar a

alguém;

Fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro

V - destrói, total ou parcialmente, ou oculta coisa própria, ou lesa o próprio corpo ou a

saúde, ou agrava as conseqüências da lesão ou doença, com o intuito de haver

indenização ou valor de seguro;

Fraude no pagamento por meio de cheque

VI - emite cheque, sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado, ou lhe frustra o

pagamento.

O § 2.º do art. 171 traz os subtipos do estelionato. Como forma equiparada, o § 2.º

continua exigindo nas suas seis figuras fraude, vantagem indevida e prejuízo alheio.

§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem:

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Disposição de coisa alheia como própria

I - vende, permuta, dá em pagamento, em locação ou em garantia coisa alheia como

própria;

O objeto material do estelionato é coisa alheia, recaindo a fraude sobre ela.

Sujeito ativo:

Pode ser qualquer pessoa, já que se trata de crime comum.

E se o condômino vende a coisa indivisa, como se só dele fosse, silenciando sobre o

condomínio, sobre a co-propriedade, incide nesse estelionato? Sim.

Sujeito passivo:

A vítima é o proprietário que viu coisa sua passando para outrem e o terceiro que agiu de

boa-fé adquirindo a coisa. É, pois, crime de dupla subjetividade passiva. As vítimas são,

pois, o adquirente de boa-fé e o real proprietário.

Esse estelionato pune quem vende, permuta, dá em pagamento, em locação e em

garantia, coisa alheia como própria.

Esse rol de ações é taxativo ou exemplificativo? Absolutamente taxativo. Qualquer

inclusão seria fruto de analogia.

Sendo rol taxativo, o compromisso de compra e venda está abrangido? Não, mas pode

configurar o art. 171, caput.

Consumação:

Esse crime é punido a título de dolo. A consumação ocorre com a obtenção da

vantagem em prejuízo alheio. É, pois, crime de duplo resultado.

Se a coisa alheia for móvel, para o crime se consumar precisa haver a tradição? Se se

tratar de imóvel, é necessário haver o registro?

Dispensa a tradição, no caso de coisa móvel e o registro, no caso de coisa imóvel.

Esse crime admite tentativa, já que se trata de crime plurisubsistente.

O furtador que vende o carro furtado como se fosse dele, pratica quantos crimes?

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- a primeira corrente afirma que há o crime previsto no art. 155 (sendo estelionato post

factum impunível). É a corrente que prevalece. Há dois crimes protegendo dois bens

jurídicos e o estelionato é a concretização da vantagem patrimonial iniciada com o furto.

- a segunda corrente afirma que o agente responde pelo art. 155 e art. 171, na forma do

art. 69 do CP. É a corrente adotada por Francisco de Assis Toledo.

Se o agente, depois que vendeu coisa alheia como se fosse sua, a compra regularizando

a propriedade?

Efetivada a alienação está consumado o estelionato, ainda que o agente regularize o

domínio. Pode haver no máximo arrependimento posterior, previsto no art. 16 do CP.

§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem:

Alienação ou oneração fraudulenta de coisa própria

II - vende, permuta, dá em pagamento ou em garantia coisa própria inalienável, gravada

de ônus ou litigiosa, ou imóvel que prometeu vender a terceiro, mediante pagamento em

prestações, silenciando sobre qualquer dessas circunstâncias;

Aqui o agente vende, permuta, dá em pagamento ou em garantia coisa própria e não

coisa alheia. A grande diferença, portanto, para o inciso I é a coisa ser própria do

estelionatário.

Sujeito ativo:

O crime é próprio, ou seja, só pode ser praticado pelo dono da coisa.

O sujeito passivo á o adquirente de boa-fé.

Suponha que o agente possui um carro que é objeto de litígio ou imóvel gravado com

cláusula de inalienabilidade. O agente não omite essa informação. Nesse caso, o fato é

atípico. Isso porque o agente não silenciou sobre essas circunstâncias. É, pois,

imprescindível que o agente, no momento da venda, silencie sobre o litígio que há sobre

a coisa.

Consumação:

O crime é de duplo resultado (vantagem + prejuízo).

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§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem:

Defraudação de penhor

III - defrauda, mediante alienação não consentida pelo credor ou por outro modo, a

garantia pignoratícia, quando tem a posse do objeto empenhado;

A coisa empenhada, normalmente, fica na posse do credor. Excepcionalmente, a coisa

empenhada fica na posse do devedor. O inciso III pune o devedor que aliena sem

consentimento do credor a coisa.

Sujeitos ativo e passivo:

O devedor no contrato pignoratício.

A vítima é o credor.

Assim, estamos diante de um crime bi-próprio.

Em que consiste a conduta do sujeito passivo?

O agente defrauda a garantia, alienado ou, por exemplo, destruindo a coisa que serve

como garantia.

Consumação:

O crime se consuma com o duplo resultado.

Há jurisprudência minoritária afirmando que o inciso III é formal, ou seja, não há

necessidade de obtenção de vantagem. Assim, a consumação ocorreria com a mera

defraudação, sem a necessidade de obtenção da vantagem.

O agente defrauda coisa empenhada, que configura a conduta punida pelo art. 171, §

2.º, III.

Mas se o agente defrauda coisa penhorada há a configuração de que crime?

Se gera a insolvência do devedor, o crime é o do art. 179 do CP:

Fraude à execução

Art. 179 - Fraudar execução, alienando, desviando, destruindo ou danificando bens, ou

simulando dívidas:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.

Parágrafo único - Somente se procede mediante queixa.

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Mas se o agente, ao defraudar a coisa penhorada, não gera a insolvência do devedor,

trata-se de fato atípico. O agente é considerado depositário infiel, não mais passível nem

de prisão civil.

§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem:

IV - defrauda substância, qualidade ou quantidade de coisa que deve entregar a alguém;

Sujeitos ativo e passivo:

Qualquer pessoa juridicamente obrigada a entregar a coisa a alguém.

O sujeito passivo é o destinatário da coisa, aquele que a recebe.

Substância é a essência da coisa. Exemplo de defraudação da substância da coisa: o

agente substitui diamantes por vidro.

A qualidade é o atributo da coisa. A doutrina afirma que exemplo típico é entregar arroz

de segunda como se fosse de primeira.

Suponha que A leva a TV para o conserto e as peças são substituídas. Que crime comete

o agente?

No art. 171, § 2.º, IV, o sujeito ativo é qualquer pessoa fora da atividade comercial. Se

agente estiver no exercício da atividade comercial, o crime será o do art. 175 do CP:

Fraude no comércio

Art. 175 - Enganar, no exercício de atividade comercial, o adquirente ou consumidor:

I - vendendo, como verdadeira ou perfeita, mercadoria falsificada ou deteriorada;

II - entregando uma mercadoria por outra:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.

§ 1º - Alterar em obra que lhe é encomendada a qualidade ou o peso de metal ou

substituir, no mesmo caso, pedra verdadeira por falsa ou por outra de menor valor; vender

pedra falsa por verdadeira; vender, como precioso, metal de ou outra qualidade:

Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.

§ 2º - É aplicável o disposto no art. 155, § 2º.

Esse art. 175 continua vigente diante do CDC da Lei 8.137/90, que pune crimes nas

relações de consumo?

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A vacatio do CDC foi maior do que a da Lei 8.137/90, a qual começou a ter vigência

antes do CDC. Por isso, a doutrina afirma que o art. 175 do CP não mais é aplicável,

havendo divergência doutrinária sobre qual dessas leis é aplicável.

Consumação:

É crime de duplo resultado.

Se a coisa defraudada é produto alimentício, aplica-se o art. 272 do CP:

Art. 272 - Corromper, adulterar, falsificar ou alterar substância ou produto alimentício

destinado a consumo, tornando-o nociva à saúde ou reduzindo-lhe o valor nutritivo:

(Redação dada pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)

Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.677,

de 2.7.1998)

§ 1º-A - Incorre nas penas deste artigo quem fabrica, vende, expõe à venda, importa, tem

em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo a

substância alimentícia ou o produto falsificado, corrompido ou adulterado. (Incluído pela

Lei nº 9.677, de 2.7.1998)

§ 1º - Está sujeito às mesmas penas quem pratica as ações previstas neste artigo em

relação a bebidas, com ou sem teor alcoólico. (Redação dada pela Lei nº 9.677, de

2.7.1998)

Modalidade culposa

§ 2º - Se o crime é culposo: (Redação dada pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)

Pena - detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.677, de

2.7.1998)

Mas se a coisa é produto destinado a fins terapêuticos ou fins medicinais, é crime

hediondo, passando a ser o previsto no art. 273 do CP:

Falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins

terapêuticos ou medicinais (Redação dada pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)

Art. 273 - Falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos

ou medicinais: (Redação dada pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)

Pena - reclusão, de 10 (dez) a 15 (quinze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.677,

de 2.7.1998)

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§ 1º - Nas mesmas penas incorre quem importa, vende, expõe à venda, tem em depósito

para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo o produto falsificado,

corrompido, adulterado ou alterado. (Redação dada pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)

§ 1º-A - Incluem-se entre os produtos a que se refere este artigo os medicamentos, as

matérias-primas, os insumos farmacêuticos, os cosméticos, os saneantes e os de uso em

diagnóstico. (Incluído pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)

§ 1º-B - Está sujeito às penas deste artigo quem pratica as ações previstas no § 1º em

relação a produtos em qualquer das seguintes condições: (Incluído pela Lei nº 9.677, de

2.7.1998)

I - sem registro, quando exigível, no órgão de vigilância sanitária competente; (Incluído

pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)

II - em desacordo com a fórmula constante do registro previsto no inciso anterior; (Incluído

pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)

III - sem as características de identidade e qualidade admitidas para a sua

comercialização; (Incluído pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)

IV - com redução de seu valor terapêutico ou de sua atividade; ((Incluído pela Lei nº

9.677, de 2.7.1998)

V - de procedência ignorada; (Incluído pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)

VI - adquiridos de estabelecimento sem licença da autoridade sanitária competente.

(Incluído pela Lei nº 9.677, de 2.7.1998)

Modalidade culposa

§ 2º - Se o crime é culposo:

Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.677, de

2.7.1998)

§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem:

Fraude para recebimento de indenização ou valor de seguro

V - destrói, total ou parcialmente, ou oculta coisa própria, ou lesa o próprio corpo ou a

saúde, ou agrava as conseqüências da lesão ou doença, com o intuito de haver

indenização ou valor de seguro;

É pressuposto desse crime o contrato de seguro, vigente e válido. Sendo vigente o

contrato, mas inválido, há absoluta ineficácia do meio, sendo o crime impossível.

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181

Sujeitos ativo e passivo:

O sujeito ativo é o seguro e o passivo a seguradora. É crime bi-próprio.

Consumação:

Esse delito é formal, ou seja, consuma-se com o emprego da fraude, independentemente

do recebimento da indenização.

Esse delito admite tentativa, sendo crime plurisubsistente.

§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem:

Fraude no pagamento por meio de cheque

VI - emite cheque, sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado, ou lhe frustra o

pagamento.

Fraude no pagamento por meio de cheque:

Há duas maneiras de se praticar esse crime, a saber:

- emissão de cheque sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado.

- frustrar o pagamento:

O agente emite cheque encerrando, em seguida, a conta corrente.

Nos dois casos é indispensável a má-fé. É o que reza a súmula 246 do STF:

Súmula 246�Comprovado não ter havido fraude, não se configura o crime de emissão de

cheque sem fundos.

O agente que emite cheque de conta já encerrada, pratica qual crime? Art. 171, caput.

Sujeitos ativo e passivo:

É o emitente do cheque.

O sujeito passivo é aquele que recebe o cheque.

O endossante pode ser sujeito ativo?

- a primeira corrente entende que o endossante não emite o título de crédito, podendo

responder como partícipe do inciso VI ou como autor do estelionato previsto no caput do

art. 171. É a corrente adotada por Nucci e a que prevalece.

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182

- a segunda corrente entende que a expressão “emitir” deve ser tomada no sentido

amplo, abrangendo o comportamento do endossante, ou seja, o endosso. É a corrente

adotada por Magalhães Noronha.

Que crime configura a emissão de cheque pós-datado?

A emissão de cheque pós-datado sem suficiente provisão de fundos junto ao banco

sacado desnatura o cheque, deixando de ser ordem de pagamento à vista, revestindo-se

de promessa de pagamento (mera garantia de crédito – fato atípico).

Se o cheque já foi emitido com o agente sabendo que não teria provisão de fundos,

responde pelo art. 171 caput.

Se o emitente do cheque repara o dano antes do recebimento da denúncia, qual a

consequência?

Aplica-se a súmula 554 do STF, ou seja, extingue a punibilidade.

Súmula 554 �O pagamento de cheque emitido sem provisão de fundos, após o

recebimento da denúncia, não obsta ao prosseguimento da ação penal.

Essa súmula extingue a punibilidade de quem emitiu o cheque sem provisão de fundos. o

crime também pune quem frustra o pagamento. A súmula não abrange essa segunda

parte, mas a jurisprudência a aplica para quem frustra o pagamento e repara o dano

antes do recebimento da denúncia.

A emite cheque sem fundo em SP, mas o cheque só foi recusado em BH. De quem é a

competência? o crime se consumou em SP, pois houve o prejuízo e a vantagem. Pela

regra do art. 70 do CPP SP seria competente. Mas nesse caso é aplicada a súmula 521 do

STF, que afirma que o foro competente é o da recusa do pagamento. É, pois, uma

exceção ao art. 70 do CPP.

Súmula 521 �O foro competente para o processo e julgamento dos crimes de estelionato,

sob a modalidade da emissão dolosa de cheque sem provisão de fundos, é o do local

onde se deu a recusa do pagamento pelo sacado.

Essa súmula não se aplica para a figura da “frustração do pagamento”. Há jurisprudência,

nesse caso, que estende, mas não é a que prevalece, diferentemente do que ocorre com

a súmula 554.

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183

Frustrar pagamento dado em dívida de jogo é crime?

Não, tendo em vista que dívida de jogo não é exigível. É o que reza o art. 814 do NCC:

Art. 814. As dívidas de jogo ou de aposta não obrigam a pagamento; mas não se pode

recobrar a quantia, que voluntariamente se pagou, salvo se foi ganha por dolo, ou se o

perdente é menor ou interdito.

Se o direito civil não pune, quem dirá o direito penal, o qual é subsidiário. Mas há

jurisprudência em sentido contrário, embora minoritária.

Aula 17 08/06/2009

(art. 171)

§ 3º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade

de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência.

O § 3.º não é caso de qualificadora, mas sim uma causa de aumento de pena. É, pois, um

crime majorado e não qualificado, pois na terceira fase da aplicação da pena é que

haverá a incidência dessa majorante.

Aumenta-se a pena de 1/3 nos estelionatos cometidos em face do Banco do Brasil?

A competência é da Justiça Estadual e o Banco do Brasil é entidade de direito privado,

logo não incide essa majorante. Estelionato contra a CEF incidiria o aumento, por se tratar

de empresa com regime de direito público.

Estelionato em face da autarquia de previdência social gera essa majorante. É o que reza

a súmula 24 do STJ:

Súmula: 24�APLICA-SE AO CRIME DE ESTELIONATO, EM QUE FIGURE COMO VITIMA

ENTIDADE AUTARQUICA DA PREVIDENCIA SOCIAL, A QUALIFICADORA DO PAR-3, DO ART.

171 DO CODIGO PENAL.

Mesmo a súmula afirmando que se trata de qualificadora, é caso de majorante, causa de

aumento de pena.

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Pessoa que pratica estelionato contra a autarquia da previdência social é crime

instantâneo de efeitos permanentes ou crime permanente? Essa discussão repercute na

consumação do crime, no início do prazo prescricional, no flagrante, se sobrevier lei nova

etc.

Natureza do estelionato previdenciário:

- a primeira corrente, STJ, entende que o delito é permanente, admitindo flagrante a

qualquer tempo, fluindo o prazo prescricional somente depois de cessada a

permanência.

- a segunda corrente, STF, entende que o delito é instantâneo, de efeitos permanentes,

aplicando-se a regra do artigo 111, I do CP, ou seja, a prescrição começa a correr da

primeira fraude e obtenção da primeira vantagem em prejuízo do ente autárquico.

Deve ser analisada a súmula 107 do STJ, uma vez que nem sempre a fraude de

documentos previdenciários gera a competência da justiça federal.

Súmula: 107�COMPETE A JUSTIÇA COMUM ESTADUAL PROCESSAR E JULGAR CRIME DE

ESTELIONATO PRATICADO MEDIANTE FALSIFICAÇÃO DAS GUIAS DE RECOLHIMENTO DAS

CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIARIAS, QUANDO NÃO OCORRENTE LESÃO A AUTARQUIA

FEDERAL.

Além da competência da Justiça Estadual, não incidirá a causa de aumento do § 3.º do

ar.t 171.

RECEPTAÇÃO:

Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio,

coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira,

receba ou oculte: (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

Receptação qualificada (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

§ 1º - Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar,

remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou

alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, coisa que deve saber ser produto

de crime: (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

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185

§ 2º - Equipara-se à atividade comercial, para efeito do parágrafo anterior, qualquer

forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercício em residência. (Redação

dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

§ 3º - Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor

e o preço, ou pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida por meio

criminoso: (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa, ou ambas as penas. (Redação dada

pela Lei nº 9.426, de 1996)

§ 4º - A receptação é punível, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor do

crime de que proveio a coisa. (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

§ 5º - Na hipótese do § 3º, se o criminoso é primário, pode o juiz, tendo em consideração

as circunstâncias, deixar de aplicar a pena. Na receptação dolosa aplica-se o disposto no

§ 2º do art. 155. (Incluído pela Lei nº 9.426, de 1996)

§ 6º - Tratando-se de bens e instalações do patrimônio da União, Estado, Município,

empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista, a pena

prevista no caput deste artigo aplica-se em dobro. (Incluído pela Lei nº 9.426, de 1996)

Natureza jurídica:

Delitos principais não pressupõem outros para a sua existência. Já os delitos acessório, por

óbvio, pressupõem outros para existirem. A regra é que os crimes sejam principais.

Exemplos de delitos acessórios: receptação, favorecimento pessoal (art. 348 do CP),

favorecimento real (art. 349 do CP) e lavagem de dinheiro (art. 5.º da lei 9.613/98).

Quadrilha ou bando é crime acessório? Não, porque se trata de crime principal, não

dependendo de qualquer outro para existir.

Bem jurídico tutelado:

É o patrimônio. Noronha afirma que está sendo tutelada, outrossim, a administração da

justiça, de forma secundária. Isso porque a atuação da justiça fica embaraçada pela

atuação do receptador, que embaraça a atuação quando da investigação.

Sujeito ativo:

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186

Trata-se de crime comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa, salvo o

concorrente do crime pressuposto, do crime anterior.

Ex: A e B roubam um carro. Se um quer comprar a parte do outro não responderá por

receptação. Assim, não pode o autor ou o partícipe do crime antecedente responder

como sujeito ativo na receptação.

Existe receptação de coisa própria?

Sim, mas desde que a coisa esteja na legítima posse de terceiro.

Assim, excepcionalmente, pode figurar como sujeito ativo o proprietário do bem, caso o

objeto esteja na posse legítima de terceiro.

Ex: sujeito teve veículo penhorado e alguém o furta do depositário. Caso o proprietário

adquira o veículo, estará cometendo receptação, tendo em vista que o bem estava na

legítima posse de terceiro.

Sujeito passivo:

A vítima da receptação é a mesma do crime pressuposto, ou seja, a receptação

perpetua a ilicitude.

Tipo objetivo:

O caput do art. 180 tem que ser dividido em duas partes:

a) receptação própria: adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito

próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime.

Na receptação própria, há basicamente dois personagens: o receptador e aquele que

adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que

sabe ser produto de crime.

É indispensável, pois, ajuste entre autor do crime antecedente e o receptador?

Não. Muito pelo contrário, é dispensável, prescindível, ajuste prévio entre o autor do crime

antecedente e o receptador.

Ex: pessoa furta relógio e, ao fugir, dispensa o relógio. Se o receptador pegar o relógio,

estará cometendo o crime de receptação, tendo em vista que pega a coisa sabendo ser

produto de crime. É um exemplo de Magalhães Noronha.

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187

A receptação se dá sempre por título injusto?

Não. Há a cobrança de uma dívida justa.

Ex: o advogado que recebe honorários consistentes em coisa que sabe ser produto de

crime.

b) receptação imprópria: influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte.

Há o autor do crime anterior, o terceiro de boa-fé e intermediário, sendo este que será

punido pela receptação imprópria.

Não se pune o receptador, mas sim o intermediário. É a mediação criminosa. É aquela

pessoa que se coloca entre o autor do crime pressuposto e o terceiro de boa-fé. Ele terá

que influir para que terceiro de boa-fé adquira a coisa.

E se o terceiro adquirente age de má-fé e não de boa-fé, ou seja, sabe que a coisa é

produto de crime?

O terceiro de má-fé responde por receptação própria, e aquele que instiga

(intermediário) responde como partícipe desse crime de receptação própria.

É possível receptação de receptação, ou seja, receptação em cadeia?

A furta veículo e o vende para B, este sabendo se tratar de produto de crime; B vende

para C, este também sabendo se tratar produto de crime e assim por diante.

É, pois, possível receptação em cadeia, desde que mantida a má-fé, ou seja, que a coisa

conserve seu caráter delituoso.

Se na cadeia de receptação, caso um sujeito aja de boa-fé não há mais crime, mesmo

que os participantes posteriores estejam de má-fé.

Para Nelson Hungria, logo, é indispensável que a coisa conserve seu caráter criminoso.

Existe receptação de coisa produto de contravenção penal?

Não, pois seria analogia incriminadora, in malam partem.

O crime pressuposto é necessariamente contra o patrimônio?

Não. Receptação de coisa produto de crime contra a Administração Pública. Adquirir

coisa produto de peculato, por exemplo.

É possível receptação de coisa produto e contrabando ou descaminho:

Não. Isso porque essa receptação tem tipo especial, previsto no art. 334 do CP.

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188

Quando Noronha afirma que é possível receptação de contrabando ou descaminho,

assim o faz antes da redação do art. 334 do CP.

A receptação abrange coisa, produto de ato infracional?

- a primeira corrente entende que não há crime, pois o artigo 180 exige crime anterior.

Adolescente, portanto, não pratica crime. Corrente adotada por Heleno Fragoso.

Críticas a essa corrente: produto de crime é a mesma coisa que dizer fato produto como

crime, e aí se inclui o ato infracional.

- a segunda corrente entende que há crime, pois quando o art. 180 fala em crime, quer

dizer fato previsto como crime, ou seja, fato típico. Adolescente, pois, pratica fato típico.

Corrente adotada por Magalhães Noronha, sendo majoritária.

É possível receptação de coisa imóvel?

- a primeira corrente entende que sim. Isso porque o legislador disse apenas coisa, não

limitando à coisa móvel. Se o legislador quisesse restringir, ele o faria expressamente, como

o fez no caso do furto (Fragoso).

- a segunda corrente limita o crime à coisa móvel. É a posição de Nelson Hungria e

Magalhães Noronha. Assim o fazem com base nos verbos nucleares, ou seja, o crime de

receptação deve preceder coisa que se locomova. É a corrente majoritária, bem como a

posição do STF.

O Prof. discorda dessa corrente.

Ex: uma pessoa doa-lhe um apartamento (produto de crime) por você ter salvado a vida

dela. E depois de doado, você vende esse apartamento para outra pessoa, que compra-

o sabendo do ocorrido.

Se a coisa produto do crime foi alterada, transformada ou adulterada existe receptação?

Ex: derretem a taça do mundo e fazem medalhas. Se quem adquire as medalhas sabe da

transformação, pratica perfeitamente receptação.

Assim, não importa seja a coisa genuína, transformada ou alterada, adquirindo o agente

sabendo ser produto de crime, há receptação.

Tipo subjetivo:

O caput do art. 180 pune o crime a título de dolo.

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189

A expressão “que sabe” é indicativa apenas de dolo direto ou de dolo direto e dolo

eventual? Prevalece que essa expressão é indicativa apenas de dolo direto.

E isso significa que em caso de dúvida pode configurar receptação culposa - §3º, art. 180.

OBS: É imprescindível que o agente aja em proveito próprio ou alheio, ou seja, a terceira

pessoa deve ser diferente do autor do crime antecedente.

E é justamente isso que diferencia a receptação do favorecimento real (art. 349), porque

neste o autor do crime age em proveito do autor do delito antecedente.

Nelson Hungria coloca a seguinte situação: pessoa recebe carro de boa-fé e

posteriormente é informado saber que é produto de crime. A pessoa finge que tomará as

providencias, mas não o faz. Pratica qual crime?

- a primeira corrente afirma que o dolo superveniente não gera o crime, pois o dolo deve

ser concomitante ao momento da aquisição. É a corrente majoritária.

- mas Nelson Hungria entende que o dolo superveniente configura o crime, nesse caso.

Consumação da receptação própria:

Ocorre com a prática de qualquer um dos núcleos, incluindo-se a coisa na esfera de

disponibilidade do agente.

OBS: aqui há algumas modalidades permanentes – os núcleos transportar, conduzir ou

ocultar.

Cabe pois flagrante, mormente quando a consumação se protrai no tempo, como no

caso do núcleo ocultar.

É perfeitamente possível a tentativa, como por exemplo no núcleo “tentar adquirir”. O

crime é, pois, plurisubsistente.

Consumação da receptação imprópria:

A coisa não precisa entrar na disponibilidade do terceiro de boa-fé. Trata-se de crime

formal, logo consuma-se com a mera influência, com o mero ato de influir, pouco

importando se terceiro de boa-fé adquiriu, recebeu ou ocultou a coisa.

Tentativa:

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190

A maioria da doutrina diz que a receptação própria admite tentativa, mas a imprópria

não. O professor não concorda com a maioria da doutrina.

Receptação imprópria – consuma com o mero ato de influir. A carta interceptada antes

de atingir seu destino é uma hipótese de tentativa de receptação imprópria. Assim, seria

possível para a minoria receptação imprópria quando praticado por escrito.

Receptação qualificada:

§1º do art. 180, CP: sempre cai em concurso!

§ 1º - Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar,

remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou

alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, coisa que deve saber ser

produto de crime: (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

Esse crime não é mais comum, mas sim crime próprio, ou seja, só pode ser praticado por

quem está no exercício do atividade comercial ou industrial. Isso justifica a qualificadora,

porque tem mais possibilidades de passar a coisa a terceiros de boa-fé.

Abrange comerciante de fato, ambulante, clandestino, a vizinha que vende produtos de

beleza?

Sim, esses comerciantes praticam receptação qualificada. Isso porque o §2º traz uma

cláusula de equiparação:

§ 2º - Equipara-se à atividade comercial, para efeito do parágrafo anterior, qualquer

forma de comércio irregular ou clandestino, inclusive o exercício em residência. (Redação

dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

O § 1.º aumenta a pena daquele pratica o crime no exercício da atividade comercial. Ex:

padeiro compra um carro produto de crime. Sofre o aumento se compra carregamento

de presunto produto de crime para vender na padaria.

O art. 180, caput, fala em coisa “que sabe” e o §1º fala em coisa “que deve saber”. A

expressão “deve saber” é indicativa de quê?

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191

- a primeira corrente entende que é indicativa apenas de dolo eventual e, por isso, é

inconstitucional, porque o delo direto é punido com pena de 01 a 04 anos e o dolo

eventual com pena de 03 a 08 anos, ferindo o princípio da proporcionalidade. É a

corrente do STF (HC 92.525, Rel. Min. Celso de Melo). Vide informativo 500.

- a segunda corrente entende que é indicativa de dolo direto e eventual. Não teria

sentido punir o dolo direto sem punir o dolo eventual. Logo, o dispositivo é constitucional.

A 2.ª Turma do STF acaba de adotar a segunda corrente (HC 97.344).

Consumação:

O crime se consuma com a prática de qualquer um dos núcleos. Mas alguns núcleos são

permanentes (ocultar, transportar, ter em depósito)

Tentativa:

É crime plurisubsistente, logo admite tentativa.

Receptação culposa:

§ 3º - Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor

e o preço, ou pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida por meio

criminoso: (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa, ou ambas as penas. (Redação dada

pela Lei nº 9.426, de 1996)

Trata-se de infração de menor potencial ofensivo.

Esse crime é comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa e a vítima é a mesma

do delito antecedente.

Há três maneiras de se praticar o crime de receptação culposa. Há, pois, três elementares

indicativas de negligência:

- adquirir a coisa que por sua natureza deve presumir-se obtida por meio criminoso. Ex:

quadro de Van Gogh vendido informalmente.

- adquirir a coisa que pela desproporção no preço, deve presumir-se obtida por meio

ilícito;

- não a essência ou o valor, mas a condição de quem o oferece. Ex: menor de 18 anos

quer vender carro informalmente.

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Admite-se a emendatio libelli nesse crime? Não. O MP deve realizar a mutatio libelli. Se

durante a instrução ficar descaracterizada uma causa surgindo outra, deve ser feita a

mutatio libelli.

Se for aplicada a emendatio libelli, será ferido o princípio da ampla defesa. O promotor

deve aditar a inicial.

Essas causas do § 3.º são alternativas e não cumulativas, ou seja, havendo uma delas,

haverá a receptação culposa.

Consumação:

Quando a coisa passa para a esfera de disponibilidade do agente.

Tentativa:

É crime culposo, logo não admite tentativa.

z

§ 4º - A receptação é punível, ainda que desconhecido ou isento de pena o autor do

crime de que proveio a coisa. (Redação dada pela Lei nº 9.426, de 1996)

A receptação é crime acessório. Logo, pressupõe outro para a sua existência. Mas não é

um crime acessório quanto à punibilidade. Esta é, pois, independente e principal.

É crime de existência acessória, mas de punição independente. Mesmo que isento de

pena o autor do crime antecedente, a receptação será punida.

É crime independente na punição.

§ 5º - Na hipótese do § 3º (receptação culposa), se o criminoso é primário, pode o juiz,

tendo em consideração as circunstâncias, deixar de aplicar a pena (perdão judicial). Na

receptação dolosa aplica-se o disposto no § 2º do art. 155 (privilégio). (Incluído pela Lei nº

9.426, de 1996)

há dois benefícios para duas espécies de receptação diferente.

A primeira parte traz o benefício do perdão judicial. Só é cabível na receptação culposa.

Tem como pressupostos a primariedade e a natureza levíssima da culpa, pouco

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193

importando o valor da coisa. Assim, cabe perdão judicial em caso de receptação

culposa de uma BMW.

Já a segunda parte do § 5.º traz o benefício do privilégio. É cabível em caso de

receptação dolosa.

Perdão judicial Privilégio

Receptação culposa Receptação dolosa

Primariedade do agente Primariedade do agente

Natureza levíssima da culpa (e não

pequeno valor da coisa) – não

importa o valor da coisa que você

adquiriu.

Pequeno valor da coisa – aqui

interessa o valor da coisa.

OBS: abrange a receptação qualificada (§ 1.º do art. 180)? É possível, pois, receptação

qualificada privilegiada?

Sim, desde que preenchidos os requisitos. É a posição pacífica dos tribunais.

Antes, havia duas correntes:

1ª corrente: não existe privilégio se a receptação está qualificada, porque a gravidade da

qualificadora é incompatível com o privilégio.

O professor não concorda, porque a lei não diferenciou e não cabe ao interprete fazê-lo.

2ª corrente: é possível privilégio na receptação qualificada, porque a lei não diferenciou.

Se a lei quisesse ela teria feito isso (como fez expressamente no § 6º - que limitou ao caput

a majorante)

§ 6º - Tratando-se de bens e instalações do patrimônio da União, Estado, Município,

empresa concessionária de serviços públicos ou sociedade de economia mista, a pena

prevista no caput deste artigo aplica-se em dobro. (Incluído pela Lei nº 9.426, de 1996)

Não se aplica o § 6.º à receptação qualificada. Isso porque seria analogia in malam

partem.

O § 6.º não é qualificadora, mas sim causa de aumento de pena.

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IMUNINDADES PATRIMONIAIS:

Art. 181 – IMUNIDADE ABSOLUTA OU ESCUSA ABSOLUTÓRIA:

Art. 181 - É isento de pena quem comete qualquer dos crimes previstos neste título, em

prejuízo:

I - do cônjuge, na constância da sociedade conjugal;

II - de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou

natural.

Qual é a natureza jurídica dessa escusa absolutória?

- a primeira corrente entende que é causa de extinção da punibilidade (doutrina

moderna). É a corrente majoritária.

- a segunda corrente entende que é causa de exclusão da punibilidade (doutrina

clássica). É a posição de Frederico Marques.

Extinção: o direito de punir existiu e foi extinto.

Exclusão: o direito de punir sequer existiu.

I - do cônjuge, na constância da sociedade conjugal;

Cônjuge separado de fato tem imunidade?

Sim, porque continua havendo a sociedade conjugal. Na sociedade de fato, ainda

perduram todos os deveres do casamento, salvo da coabitação.

O convivente, na união estável está abrangida pela imunidade?

Sim, pois é caso de analogia in bona partem. Isso porque a constituição já equipara o

cônjuge ao convivente.

II - de ascendente ou descendente, seja o parentesco legítimo ou ilegítimo, seja civil ou

natural.

Não abrange irmãos, colaterais em geral e nem o parentesco por afinidade.

Art. 182 – IMUNIDADE, ESCUSA RELATIVA

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195

Aqui a doutrina critica a expressão imunidade, porque o art. 182 não traz nenhuma

isenção de pena, mas apenas modifica a ação penal (de pública incondicionada para

pública condicionada). E assim prefere chamar este artigo de CAUSA ESPECIAL DE

MODIFICAÇÃO DA AÇÃO PENAL. Essa colocação foi feita por Cezar Roberto Bittencourt.

Art. 182 - Somente se procede mediante representação, se o crime previsto neste título é

cometido em prejuízo:

I - do cônjuge desquitado ou judicialmente separado;

Cônjuges divorciados têm alguma imunidade?

Até a separação judicial eles têm imunidade absoluta (abrangendo a separação de

fato). Da separação judicial até o divórcio tem imunidade relativa. Após o divórcio não

tem imunidade alguma.

II - de irmão, legítimo ou ilegítimo;

Irmão é caso de imunidade relativa!

III - de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita.

Tio que furta sobrinho tem imunidade relativa desde que eles coabitem. Não significa que

o furto tem que ocorrer no local onde eles coabitem.

Art. 183 - Não se aplica o disposto nos dois artigos anteriores:

I - se o crime é de roubo ou de extorsão, ou, em geral, quando haja emprego de grave

ameaça ou violência à pessoa;

Violência contra a coisa não se aplica à imunidade, apenas na violência contra a pessoa

que impede a imunidade.

II - ao estranho que participa do crime.

A imunidade é personalíssima, não se estende a um estranho que participa do crime.

III - se o crime é praticado contra pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta)

anos. (Incluído pela Lei nº 10.741, de 2003)

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196

Foi acrescentado pelo Estatuto do Idoso. É a única hipótese que o CP lembrou do idoso

com idade IGUAL a 60 anos. Todos os outros falam no idoso como sendo maior de 60

anos.

Se a vítima é mulher e é furtada em seu ambiente doméstico e familiar, aplica-se essa

imunidade?

O art. 7º, IV, Lei 11.340/06 diz:

Art. 7o São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção,

subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho,

documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os

destinados a satisfazer suas necessidades;

Essa simples previsão impede a aplicação da imunidade da mulher que é vítima?

Maria Berenice Dias, como base no art. 7º, IV, da Lei Maria da Penha, veda a imunidade

da mulher para o caso de furto no ambiente doméstico e familiar. Ela diz: a exemplo do

que já ocorre com o idoso.

OBS: só que no caso do idoso tem previsão legal. E no caso da mulher não tem previsão.

Então o que ela fez foi analogia in malan partem, o que não está correto!!!

Assim, não se pode querer tirar da escusa os crimes na Lei Maria da Penha.

CRIMES SEXUAIS:

Estupro

Art. 213 - Constranger mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça:

Parágrafo único.(Revogado pela Lei n.º 9.281, de 4.6.1996)

Pena - reclusão, de seis a dez anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de 25.7.1990)

Bem jurídico tutelado:

O art. 213 tutela a liberdade sexual da mulher.

Sujeito ativo:

Homem. É, pois, crime próprio.

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197

O TJ/SC perguntou se a mulher poderia ser sujeito ativo de crime de estupro. A mulher

pode ser co-autora, se pratica a violência para um homem ter a conjunção carnal.

Também, poderá ser partícipe quando induz, instiga ou auxilia de qualquer outro modo o

homem a constranger mulher à conjunção carnal.

A mulher pode, ainda, ser autoria mediata do crime de estupro. Isso ocorre quando se

vale de um homem incapaz para a prática do delito.

OBS: LFG discorda. Para ele, mulher não pode ser autora mediata do crime de estupro.

Isso porque o autor mediato deve reunir as condições do autor imediato. Nesse caso,

responderá por mero constrangimento ilegal.

Assim, LFG discorda, pois o autor mediato deve reunir as qualidades especiais do sujeito

ativo próprio.

O TJ de Santa Catarina entende como a maioria da doutrina e não como LFG.

A mulher, por fim, pode ser autora imediata do crime de estupro. Isso ocorre quando se

adota a teoria do domínio do fato. Autor imediato é quem tem o domínio do fato

criminoso. Se é a pessoa que orquestra o crime, é tão autora imediata quanto o homem

que manteve a conjunção carnal.

Existe estupro entre marido e mulher?

Nelson Hungria entende que não, pois está no exercício regular de um direito.

Mas há dois argumentos contrários:

- Lei Maria da Penha, art. 7.º, III:

Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar,

a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação,

ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer

modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que

a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação,

chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos

sexuais e reprodutivos;

A mulher tem, pois, plena liberdade sexual, inclusive no seu ambiente doméstico e familiar.

- art. 226 do CP:

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Art. 226. A pena é aumentada:(Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)

II – de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge,

companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro

título tem autoridade sobre ela; (Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)

Sujeito passivo:

Mulher. É crime bi-próprio, uma vez que tanto o sujeito ativo como o passivo são próprios.

A lei exige alguma qualidade dessa mulher? Prostituta pode ser vítima de estupro?

Basta ser mulher. A mais desbragada prostituta pode ser vítima do crime de estupro.

Transexual pode ser vítima do crime de estupro?

Transexual é aquele quem possui uma dicotomia físico-psíquica. O transexual se considera

mulher, mas anatomicamente é homem. Não se trata de hermafrodita. Ex: Roberta Close.

O transexual pode ser vítima de estupro, desde que tenha realizado operação de

mudança de sexo, tendo ainda alterado os seus registros, ou seja, deve ser juridicamente

uma mulher. É a posição de Rogério Greco.

Hermafrodita pode ser vítima de estupro?

O hermafrodita possui partes de ambos os sexos.

Para ser vítima do estupro, depende do sexo preponderante. Qual o sexo preponderante,

o biológico (mais aparente) ou o psicológico? Que discute a matéria afirma que é sexo

psicológico.

Se uma mulher violentar um homem, qual crime pratica?

Se a mulher, com violência, obriga o homem a praticar apenas a relação sexual normal

sem “tocar em nada”, apenas em relação “pênis-vagina”, o crime é de constrangimento

ilegal.

Caso o homem “toque” na mulher, além da relação normal, é caso de atentado violento

ao pudor.

Aula 18 15/06/2009

Conduta punida:

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Constranger mulher mediante violência ou grave ameaça, visando conjunção carnal. O

verbo nucelar nuclear é “constranger” (obrigar, coagir, forçar) , que é o núcleo típico.

A violência ou a grave ameaça são os meios de execução. A violência é a física, ou seja,

o efetivo emprego de força física; já a grave ameaça é a promessa de mal injusto e

grave.

A conjunção carnal é o resultado do crime de estupro. É a cópula natural.

Para haver estupro não basta constranger, mas sim constranger com violência ou grave

ameaça. O constrangimento mediante ameaça não gera o crime de estupro.

Ameaça é grave: a doutrina empresta ao caso o homem médio. Se é grave a ameaça

ao homem médio, é grave a ameaça para a vítima. Mas esse era o posicionamento da

doutrina clássica. A doutrina e a jurisprudência atuais costumam analisar a vítima no caso

concreto. Ex: dependendo da idade ou grau de instrução da vítima, pode a ameaça ser

ou não grave.

Assim, dependendo da idade e grau de instrução da vítima, local e tempo do crime, a

ameaça pode ou não ser grave.

Ex: ameaça meio dia em avenida é uma coisa, mas ameaça na mesma avenida às três

da manha é outro completamente distinta.

Que crime configura a cópula vestibular ou coito vulvar?

É a esfregação do pênis na vagina, sem introdução, ainda que parcial. Configura, pois,

atentado violento ao pudor. Note-se que nesse caso é possível ejaculação com gravidez.

Admite, pois, o abortamento sentimental previsto no art. 128, II, de acordo com a

jurisprudência.

No caso do coito interfêmora, que crime configura?

É a introdução do pênis entre as coxas da mulher. Configura o crime de atentado violento

ao pudor. Note-se que nesse caso é possível ejaculação com gravidez. Admite, pois, o

abortamento sentimental previsto no art. 128, II, de acordo com a jurisprudência.

O crime de estupro é punido a título de dolo. Mas esse dolo deve ser acrescido de

alguma finalidade especial, ou seja, existe elemento subjetivo do tipo:

- a primeira corrente, majoritária, afirma que o crime é punido a título de dolo,

dispensando qualquer finalidade especial do agente. É a corrente adotada por Capez.

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- a segunda corrente afirma que o crime é punido a título de dolo, acrescido de uma

finalidade especial, que seria constranger mulher à conjunção carnal. Mirabete adota

essa corrente.

- a terceira corrente afirma que o crime é punido a título de dolo, mas a finalidade

especial é a satisfação da própria lasciva. Essa corrente peca porque o art. 213 em

momento algum fala em satisfação da lasciva. Há jurisprudência adotando essa corrente,

mas é extremamente minoritária.

O crime de estupro se consuma com a introdução, ainda que parcial, do pênis na vagina.

O crime de estupro admite tentativa?

Sim. Se a violência foi empregada e o agente não conseguiu a introdução por

circunstâncias alheias à sua vontade, há a tentativa.

Imagine que A e B estupram C. Em primeiro momento, A pratica conjunção carnal,

enquanto B emprega a violência. Em segundo momento, A e B invertem os papéis.

Quantos crimes há? Por qual crime responde cada um dos agentes? É o caso da “curra”.

- a primeira corrente (Fragoso) entende que A e B respondem por um crime de estupro,

qualificado (majorado) pelo concurso de agentes. Art. 226, I do CP:

Art. 226. A pena é aumentada:(Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)

I – de quarta parte, se o crime é cometido com o concurso de 2 (duas) ou mais pessoas;

(Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)

- a segunda corrente afirma que A e B respondem por dois crimes de estupro, ora como

autor, ora como partícipe do outro. Esses estupros são qualificados pelo concurso de

agentes. É a corrente adotada majoritariamente pela jurisprudência.

O estupro é sempre um crime hediondo. É a posição do STF e do STJ.

Existe estupro em continuidade delitiva?

1ª corrente: sim, desde que em face da mesma vítima.

2ª corrente: sim, ainda que em face de vítimas diversas.

Antes de 1984 prevalecia a 1ª corrente. Depois de 1984 prevalece a 2ª corrente. Hoje

prevalece a 2ª corrente por causa do art. 71, parágrafo único do CP.

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201

ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR:

Art. 214 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou

permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal: Vide Lei nº

8.072, de 25.7.90

Parágrafo único. (Revogado pela Lei n.º 9.281, de 4.6.1996

Pena - reclusão, de seis a dez anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de 25.7.1990)

Estupro Atentado violento ao pudor

Bem jurídico tutelado: liberdade

sexual.

Bem jurídico tutelado: liberdade

sexual.

Sujeito ativo: homem Sujeito ativo: comum, homem ou

mulher.

Sujeito passivo: mulher Sujeito passivo: homem ou mulher.

Conduta: constranger mulher,

mediante violência ou grave

ameaça, a fim de praticar conjunção

carnal.

Conduta: constranger não mais

mulher, mas sim alguém, mediante

violência ou grave ameaça, visando

a praticar ou permitir que nele(a) se

pratique ato libidinoso diverso da

conjunção carnal.

Tipo subjetivo: dolo, sem finalidade

especial, para a doutrina dominante.

Tipo subjetivo: dolo, sem finalidade

especial, para a doutrina dominante.

Consumação: com a introdução,

ainda que parcial.

Consumação: o crime se consuma

com a prática do ato libidinoso

visado. A maioria da doutrina admite

tentativa.

O crime de atentado violento ao pudor é plurinuclear, pois o agente pode ele próprio

praticar os atos libidinosos ou pode obrigar a vítima a permitir que com ela se pratique o

crime.

Obrigar a vítima a praticar: o agente tem o comportamento passivo e a vítima tem o

comportamento ativo. Ex: o agente obriga a vitime a praticar sexo oral nele.

Obrigar a vítima que nela se pratiquem: o agente tem o comportamento ativo e a vítima

tem o comportamento passivo. O agente pratica sexo oral na vítima.

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202

Mas se no contexto fático, o agente tem as duas condutas acima descritas. Quantos

crimes pratica? Como o crime é de ação múltipla, tal não desnatura a unidade fática do

crime. Assim, se praticados no mesmo contexto fático, não desnatura a unidade do crime.

Mas o juiz considera as duas condutas realizadas na fixação da pena.

O atentado violento ao pudor prescinde ou imprescinde de contato físico entre agente e

vítima? O contato físico entre agente e vítima é dispensável para que o crime se

configure?

Sim. Ex: obrigar a vítima a se masturbar. É um exemplo de Mirabete. Há jurisprudência

nesse sentido, ou seja, é prescindível o contato físico.

Mas o MP de São Paulo entendeu que se não há contato físico caracteriza-se mero

constrangimento ilegal. É a corrente minoritária. Se não há contato físico, para essa

corrente caracteriza-se o crime de constrangimento ilegal.

Como se diferencia o atentado violento ao pudor tentado do estupro consumado? Deve-

se entrar no animus do agente.

O sujeito, no mesmo contexto fático, estupra a mulher e pratica com ela sexo anal.

Quantos crimes pratica?

- a primeira corrente entende que é o crime do art. 213, ficando absorvido o art. 214.

- segunda corrente entende que responde pelo art. 214, ficando absorvido o art. 213.

- a terceira corrente entende que é o crime do art. 213 e do art. 214 em concurso

material;

- a quarta corrente entende que é o crime do art. 213 e do art. 214 em concurso formal.

- a quinta corrente entende que responde pelos dois crimes em continuidade delitiva.

A posição que prevalece no STF e no STJ é que o agente responde pelos dois crimes em

concurso material. Era unânime essa posição, mas Eros Grau suscitou uma divergência

que não foi aceita.

O crime de atentado violento ao pudor, assim como o estupro, também é sempre crime

hediondo.

Formas qualificadas

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Art. 223 - Se da violência resulta lesão corporal de natureza grave: Vide Lei nº 8.072, de

25.7.90

Pena - reclusão, de oito a doze anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de 25.7.1990)

Parágrafo único - Se do fato resulta a morte:

Pena - reclusão, de doze a vinte e cinco anos. (Redação dada pela Lei nº 8.072, de

25.7.1990)

Essas duas qualificadoras só se aplicam aos arts. 213 e 214 do CP, que são as únicas

formas de crimes sexuais com violência.

A qualificadora são preterdolosas. Assim, o art. 223 só se aplica se os resultados forem

culposos.

Se o agente age com dolo na morte, o crime é de estupro simples mais homicídio. Ex:

maníaco do parque.

O concurso será material ou formal, a depender do caso concreto.

A lesão grave deve ser decorrente da violência. A morte pode ser decorrente da

violência ou não, ou seja, deve advir do fato, ainda que de mera grave ameaça. Ex: se o

agente droga a mulher para facilitar a sua conduta e ela morre, incide a qualificadora.

O agente, tentando estuprar a vítima, acaba, culposamente, ceifando a sua vida. Qual

crime pratica?

- a primeira corrente (Mirabete) entende que o agente responde por estupro consumado

qualificado. Ele afirma que não existe tentativa em crime preterdoloso. Ainda, afirma que

a consumação do art. 223, parágrafo único, não depende o estupro, mas sim da morte (a

lei afirma que “se do fato resulta morte”).

- a segunda corrente (Rogério Greco) afirma que o agente responde por estupro tentado

qualificado. Ele diferencia o estupro, que é o antecedente doloso, da morte, que é o

antecedente culposo. Se o agente não conseguiu o estupro por circunstancias alheias à

sua vontade, está na esfera da tentativa; se da tentativa adveio a morte, incide a

qualificadora. Ficou frustrado o evento doloso, logo responde por estupro tentado e, em

havendo a morte, incide a qualificadora.

A jurisprudência prefere a primeira corrente, mas tecnicamente, a correta é a segunda.

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204

A qualificadora, obviamente, mantém o crime hediondo.

Presunção de violência

Art. 224 - Presume-se a violência, se a vítima: Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90

a) não é maior de catorze anos;

b) é alienada ou débil mental, e o agente conhecia esta circunstância;

c) não pode, por qualquer outra causa, oferecer resistência.

São hipóteses de presunção de violência ou violência ficta, ou seja, não há efetivo

emprego de força física, o legislador é que presume a violência.

a) não é maior de catorze anos;

No dia do aniversário a vítima não é maior ou menor de 14 anos. Assim, a presunção só

desaparece no dia seguinte ao décimo quarto aniversário.

Essa presunção é absoluta ou relativa?

É cada vez mais crescente a doutrina que afirma que a presunção é relativa. Mas o STJ

afirma que a presunção é absoluta.

O erro do agente quanto à idade da vítima, gera erro de tipo. Desaparece a presunção,

logo, o próprio crime. Aqui, não importa se o erro é evitável ou inevitável.

O agente, pois, deve saber que a vítima era menor de 14 anos.

Assim, a parte final da alínea “b” aplica-se à alínea “a”. Isso para se evitar a

responsabilidade penal, objetiva.

b) é alienada ou débil mental, e o agente conhecia esta circunstância;

Alienada ou débil mental: doença ou deficiência mental, não necessariamente

espetacular, pelo menos aparente, reconhecível por qualquer leigo em psiquiatria (Nelson

Hungria).

A presunção no caso da alínea “b” é absoluta.

c) não pode, por qualquer outra causa, oferecer resistência.

Exs: uso de psicotrópicos, embebedar a vítima.

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205

E se o agente consegue manter conjunção carnal com a vítima mediante fraude?

Presume violência?

Se o meio é a fraude (irmão gêmeo se passe por outro), não se presume a violência, ou

seja, se configura o art. 215 ou 216 conforme o caso.

Posse sexual mediante fraude

Art. 215. Ter conjunção carnal com mulher, mediante fraude: (Redação dada pela Lei nº

11.106, de 2005)

Pena - reclusão, de um a três anos.

Parágrafo único - Se o crime é praticado contra mulher virgem, menor de 18 (dezoito) e

maior de 14 (catorze) anos:

Pena - reclusão, de dois a seis anos.

Atentado ao pudor mediante fraude

Art. 216. Induzir alguém, mediante fraude, a praticar ou submeter-se à prática de ato

libidinoso diverso da conjunção carnal: (Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)

Pena - reclusão, de um a dois anos.

Parágrafo único. Se a vítima é menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (quatorze) anos:

(Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos. (Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)

Os crimes previstos no art. 224 continuam hediondos.

O art. 9.º da Lei dos Crimes Hediondos diz o seguinte:

Art. 9º As penas fixadas no art. 6º para os crimes capitulados nos artigos 157, § 3º, 158, § 2º,

159, caput e seus §§ 1º, 2º e 3º, 213, caput, e sua combinação com o art. 223, caput e

parágrafo único, art. 214 e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único,

todos do Código Penal, são acrescidas de metade, respeitado o limite superior de 30

(trinta) anos de reclusão, estando a vítima em qualquer das hipóteses referidas no art. 224

também do Código Penal.

o estupro e o atentado violento ao pudor terão a pena aumentada de metade se a

vítima se encontra nas hipóteses do art. 224. Mas aplica-se o aumento de pena se o crime

sexual foi praticado com violência presumida?

- a primeira corrente entende que o aumento aplica-se independentemente da espécie

de violência.

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206

- a segunda corrente afirma que o aumento aplica-se somente quando se tratar de

violência real, pois se a condição da vítima já serviu para presumir a violência, não pode

servir também como aumento, configurando bis in idem. É a corrente do STJ. Mas há

jurisprudência de 2008 do STJ (Ministros Arnaldo Esteves e Laurita Vaz) entendo que se

aplica a primeira corrente. Mas hoje prevalece a segunda.

ASSÉDIO SEXUAL

Assédio sexual (Incluído pela Lei nº 10.224, de 15 de 2001)

Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento

sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou

ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. (Incluído pela Lei nº

10.224, de 15 de 2001)

Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 10.224, de 15 de 2001)

Parágrafo único. (VETADO) (Incluído pela Lei nº 10.224, de 15 de 2001)

Assedio sexual: é a importunação sexual de alguém, prevalecendo-se o agente da sua

condição se superior hierárquico ou ascendente em relação à vítima. Em síntese, é a

insistente importunação de pessoa em posição privilegiada, que usa dessa vantagem

para obter favores sexuais de um subalterno.

Bem jurídico tutelado:

A liberdade sexual da vítima. A doutrina afirma que há um bem jurídico secundário, que é

a liberdade do exercício de trabalho e o direito de não ser discriminado.

Sujeito ativo:

Trata-se de crime próprio, logo só pode ser praticado por superior hierárquico ou pessoa

em posição de ascendência sobre a vítima.

Sujeito passivo:

O subordinado ou pessoa sujeita à ascendência. É, pois, um crime bi-próprio.

Pode haver assedio sexual hétero ou homossexual. A lei não faz menção ao sexo do

sujeito passivo e ativo.

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207

O assedio sexual tem uma finalidade sexual, sendo praticado pelo superior para com o

subordinado. Mas se o assédio for entres dois subordinados ou por subordinado em

relação ao superior hierárquico? Nesse caso, não se trata de assédio sexual, podendo

configurar constrangimento ilegal (art. 146) ou importunação ofensiva ao pudor (art. 61 da

Lei das Contravenções Penais).

Assédio ambiental nada mais é senão o assédio sexual, pouco importando se praticado

entre dois subordinados, entre subordinado e superior etc. É o que ocorre na Espanha, por

exemplo.

Assédio moral: é o constrangimento laboral sem finalidade sexual, não importando se

praticado entre dois subordinados, dois superiores etc.

O art. 216-A possui uma ação típica, que é constranger. O constrangimento deve ser

praticado sem violência ou grave ameaça, caso contrário, será crime de estupro ou

atentado violento ao pudor.

É possível assédio sexual de professor para aluno, de bispo para sacerdote, sacerdote

para coroinha?

Para se responder a essa pergunta, deve-se saber o que é superior hierárquico e

ascendência.

- a primeira corrente afirma que superioridade hierárquica retrata uma relação laboral no

âmbito público; ascendência a mesma relação, porém no campo privado. Ambas

pressupõem relações inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. Por essa

corrente, não é possível assédio sexual entre professor e aluno, uma vez que não há

relação de emprego, a qual existe entre professor e a faculdade, por exemplo. Defendida

por Nucci.

- a segunda corrente afirma que superioridade hierárquica é condição decorrente de

relação laboral, pública ou privada; a ascendência decorre de mera relação de domínio,

influencia ou temor reverencial, dispensando relação laboral. Para esta corrente, há a

possibilidade de assédio sexual entre professor e aluno. Corrente adotada por Luiz Régis

Prado.

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208

O crime de assédio sexual é punido a título de dolo. Esse dolo tem finalidade especial

(com o fim de obter vantagem ou favorecimento sexual).

É crime de assédio sexual constranger, por exemplo, a secretária para praticar ato sexual

com o filho do agente?

Prevalece que haverá assédio sexual, pouco importando se a vantagem é para o agente

ou se este agiu para favorecer terceiros. A vantagem ou favorecimento pode ser para si

ou para outrem.

Consumação:

- a primeira corrente afirma que o crime se consuma com o ato constrangedor,

independentemente da obtenção da vantagem sexual. Logo, seria crime formal ou de

consumação antecipada. É a corrente que prevalece.

- a segunda corrente observa que o delito é a insistente importunação. O crime é

habitual, sendo indispensável a reiteração de atos. Dispensa, ainda, a obtenção da

vantagem.

Essa discussão reflete na possibilidade da tentativa. Se se adota a segunda corrente não

se admite tentativa. Mas se se adota a primeira corrente, é possível tentativa no caso do

bilhete interceptado.

Crime de Assédio Sexual # da Contravenção Penal de Importunação Ofensiva ao Pudor

(art. 61)

Art 61: “importunar alguém em lugar público ou acessível ao público, de modo ofensivo

ao pudor”.

Ex. de importunação ofensiva ao pudor: moça passando para o prédio em construção e

ouve “aí gostosa” ou andar de ônibus em pé e a pessoa que está atrás fica encostando.

Beijo roubado: jurisprudência diverge.

Tem gente falando que é atentado violento ao pudor (crime hediondo)

Não, é importunação ofensiva ao pudor.

Diferenças

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209

Assédio Sexual

Sujeito ativo: Crime bipróprio – superior e subordinado.

Pode ser praticado em qualquer lugar, público ou particular, desde que haja nexo

com a relação laboral..

Contravenção Penal Importunação Ofensiva ao Pudor

Sujeito ativo: Contravenção Penal comum: pode ser praticado pro qualquer pessoa.

Exige elemento espacial: praticado em lugar público ou acessível ao público.

A majorante do art. 226 se aplica ao art. 216-A com uma observação: a majorante do

preceptor ou empregador da vítima (no inciso II) não se aplica, pois senão terá bis in

idem. Ser preceptor ou empregador já é elementar do assédio sexual; não pode ser

elementar e majorante ao mesmo tempo.

Ação Penal do Assédio Sexual segue o art. 225.

CORRUPÇÃO DE MENORES:

Art. 218 - Corromper ou facilitar a corrupção de pessoa maior de 14 (catorze) e menor de

18 (dezoito) anos, com ela praticando ato de libidinagem, ou induzindo-a a praticá-lo ou

presenciá-lo:

Pena - reclusão, de um a quatro anos.

Bem jurídico tutelado:

Tutela-se a moral sexual do menor com idade entre 14 e 18 anos.

O menor age com plena liberdade. Afeta-se a moral do menor. Logo, esse crime não

tutela a liberdade sexual do menor.

Sujeito ativo:

É crime comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa.

Sujeito passivo:

A vítima tem que ser qualquer pessoa com idade maior de 14 e menor de 18 anos.

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A vítima deve ser pessoa do sexo masculino ou feminino, maior de 14 e menor de 18 anos.

Na magistratura de São Paulo foi perguntado se apenas são esses os requisitos. É

imprescindível que a vítima não esteja corrompida. Se já está depravada sexualmente é

crime impossível.

É, pois, o único crime do CP em que se exige que a mulher seja honesta.

Por que o legislador exige vítima com idade, no mínimo, maior de 14 anos? Porque, se

igual ou menor de 14 anos, em regra, se caracteriza o crime de estupro.

Vítima com 13 anos?

- se o agente praticou atos de libidinagem, o crime será o do art. 213 ou do art. 214.

- se o agente a induziu a praticar o ato, o crime é o do art. 213 ou 214 do CP.

- se o agente apenas a induziu a presenciar o ato, qual crime pratica? Em regra, é fato

atípico.

Mas deve-se atentar para os novos crimes de pedofilia, previstos na Lei 11.829/08. Traz

alguns tipos em que podem ser enquadrados esse fato, mas em princípio é fato atípico.

Ex: art. 241 do ECA:

???????????????

O art. 218 pune dois comportamentos: corromper ou facilitar a corrupção.

Corromper: é a corrupção efetiva, física.

Facilitar a corrupção: é a corrupção potencial ou moral.

Ato de libidinagem: é o gênero, do qual são espécies ato libidinoso e conjunção carnal. O

ato de libidinagem é o meio para o agente atingir a corrupção da vítima. Ex: introduzir

adolescente dessa idade em zoofilia, sadomasoquismo, lesbianismo (o lesbianismo e a

viadagem vem sendo criticados pela doutrina, uma vez que os doutrinadores baitolas não

os consideram corrupção sexual).

OBS: o art. 218 do CP circunscreve-se ao âmbito sexual (depravação sexual da vítima).

Corrupções ou facilitações de outras naturezas, subsumem-se a outros tipos penais, com

por exemplo na lei 2.252/54.

Esse delito é punido a título de dolo. Mas é acrescido de finalidade especial?

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211

A maioria entende que é dolo acrescido da finalidade querer depravar a vítima. Nucci.

Damásio entende de forma diversa, afirmando que não há finalidade especial.

Consumação:

- a primeira corrente entende que é crime material, logo só se consuma com a efetiva

corrupção sexual da vítima (Bittencourt, Damásio e Delmanto).

- a segunda corrente entende que é crime formal, logo consuma-se com a prática dos

verbos nucleares, dispensando efetiva depravação da vítima (Hungria). STF e STJ adotam

essa corrente.

- a terceira corrente afirma que, na modalidade “corromper”, o crime é material. Já na

modalidade “facilitar a corrupção” o crime é formal. Há julgados no STJ nesse sentido.

Não importa a corrente adotada, o crime admite tentativa.

Art. 226:

Esses crimes sexuais estão sujeitos às causas de aumento do art. 226 do CP:

Art. 226. A pena é aumentada:(Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)

I – de quarta parte, se o crime é cometido com o concurso de 2 (duas) ou mais pessoas;

(Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)

II – de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge,

companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro

título tem autoridade sobre ela; (Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)

III - (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005)

No caso do inciso II, deve-se atentar para o bis in idem. Logo, a qualidade de “preceptor

ou empregador da vítima” não devem ser aplicados aos crimes de assédio sexual.

AÇÃO PENAL:

Ação penal

Art. 225 - Nos crimes definidos nos capítulos anteriores, somente se procede mediante

queixa.

§ 1º - Procede-se, entretanto, mediante ação pública:

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I - se a vítima ou seus pais não podem prover às despesas do processo, sem privar-se de

recursos indispensáveis à manutenção própria ou da família;

II - se o crime é cometido com abuso do pátrio poder, ou da qualidade de padrasto, tutor

ou curador.

§ 2º - No caso do nº I do parágrafo anterior, a ação do Ministério Público depende de

representação.

Regra do art. 225: ação penal de natureza privada.

Exceções:

a) vítima pobre:

Ação penal pública condicionada à representação.

Como se comprova a pobreza? Por declaração perante a autoridade. É o caso do

conhecido atestado de pobreza. Este faz prova relativa. Assim, se a defesa na instrução

comprova que a vítima não era pobre, anula-se o processo por ilegitimidade de parte,

havendo muitas vezes a decadência.

Se a vítima contrata um assistente de acusação, tal conduta faz desaparecer a pobreza?

Por si só, não elide a pobreza. Mas deve ficar comprovado que o advogado não cobrou

pelo serviço.

O MP continua legitimado em estados aparelhados com Defensoria Pública?

Ha dois argumentos que comprovam a legitimidade do MP:

- a ação é pública e de acordo com o art. 129, I da CF/88 o legitimado é o MP.

- haveria uma hipótese em que a Defensoria Pública estaria no pólo passivo e no pólo

passivo. Há, pois, incompatibilidade.

Essa é a posição do STJ e a mais recente do STF (STF, HC 92.932).

b) abuso do poder (tutela, abuso do poder familiar etc):

A ação penal é pública incondicionada.

c) violência real:

Súmula 608 do STF, ou seja, a ação é pública incondicionada:

Súmula 608 �No crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é

pública incondicionada.

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d) resultado lesão grave ou morte:

A ação penal é pública incondicionada.

OBS: nos crimes com grave ameaça a ação é privada.

OBS: no caso de violência presumida, por si só, é caso de ação privada.

QUADRILHA OU BANDO:

Art. 288 - Associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de

cometer crimes:

Pena - reclusão, de um a três anos. (Vide Lei 8.072, de 25.7.1990)

Parágrafo único - A pena aplica-se em dobro, se a quadrilha ou bando é armado.

Bem jurídico tutelado:

A paz pública. Aqui é o caso da lei tentando impedir a reunião de pessoas para

finalidades criminosas.

Sujeito ativo:

É crime comum, logo pode ser praticado por qualquer pessoa, desde que associada a

mais três pessoas. Logo, é crime plurissubjetivo, que só pode ser praticado por número

plural de agentes.

O crime plurissubjetivo admite três espécies:

- de condutas paralelas;

- de condutas convergentes;

- de condutas contrapostas.

O crime de quadrilha ou bando é plurissubjetivo de condutas paralelas, ou seja, uns

ajudando aos outros.

OBS: no número mínimo de quatro pessoas deve-se computar os inimputáveis e eventuais

pessoas não identificadas.

Bittencourt discorda, seguindo Bento de Faria. Argumenta que o inimputável, no mais das

vezes, não adere conscientemente à quadrilha. Mas é uma posição minoritária.

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Nucci, por sua vez, afirma que deve ser analisado o caso concreto. Quer dizer que

apenas a avaliação do caso concreto permitirá concluir se o inimputável aderiu

conscientemente à quadrilha ou se foi manipulado.

Ex: criança de seis anos, com certeza, será manipulada. Mas menor de 17 anos, mesmo

sendo inimputável, não pode se dizer que foi manipulado.

Sujeito passivo:

A coletividade. Isso faz da quadrilha ou bando um crime vago.

Elementos do art. 288:

a) associação:

É uma vinculação sólida quanto à estrutura e durável quanto ao tempo. Não se exige

aqui a perpetuidade, mas se distingue de um mero concurso de agentes, reunião

ocasional.

É possível uma pessoa associar-se a mais de uma quadrilha?

A minoria nega. A maioria admite. O agente responderá por todas as associações em

concurso material. Corrente capitaneada por Noronha.

Ex: associação para roubo a bancos e para o tráfico de drogas.

b) pluralidade de agentes:

No mínimo 04 pessoas. Dispensa, no entanto, hierarquia, umas pessoas conhecerem as

outras. Assim, é possível o art. 288 mesmo que os associados não se conheçam

pessoalmente. Ex: Orkut. Delegado que prende pessoas de uma comunidade do Orkut

que pregava o racismo.

c) A associação envolvendo pluralidade de agentes deve ter como finalidade uma série

indeterminada de crimes.

Os crimes necessariamente devem ser dolosos, logo, não existe quadrilha ou bando para

a prática de crimes culposos ou preterdolosos.

Ainda, não existe quadrilha ou bando para contravenção penal. Logo, incorreto dizer

“quadrilha ou bando para a prática de jogo do bicho”.

Para haver quadrilha ou bando, é imprescindível que primeiro se reúnam para depois

deliberarem os crimes.

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Art. 288 – requisitos:

- reunião de mãos de três pessoas:

- deliberar os crimes.

Se a ordem é invertida, não há o crime de quadrilha ou bando, mas sim concurso de

agentes.

Aula 19 25/06/2009 Prof. Gustavo Junqueira

Tipo subjetivo da quadrilha ou bando:

Consciência e vontade de se associar para praticar crimes. Conforme Bittencourt, o

“laranja”, que é chamado para um ato pela quadrilha, não a integra pelo falta do

elemento subjetivo.

A ideia lato sensu quadrilha é a associação de mais de três pessoas para cometerem

crimes indeterminados. Há quem entenda que essa indeterminação tem que ser total.

Se quatro pessoas se organizam para praticar dois ou três crimes, teoricamente tal não

configura quadrilha, pois o número de crimes é determinado.

A quadrilha ou bando é um crime plurissubjetivo, que é aquele de concurso necessário. A

quadrilha seria um crime plurissubjetivo de condutas paralelas, porque todos buscam o

mesmo fim.

O crime de quadrilha é permanente, ou seja, a consumação se protrai no tempo de

acordo com a vontade do sujeito.

Ressalte-se que a saída de um integrante pode alterar a permanência, mas não afasta a

consumação anterior.

Consumação e tentativa:

O crime se consuma com a expressão sensível do liame subjetivo. A consumação, pois,

pode ocorrer mesmo que nenhum crime seja praticado.

Na adesão de um novo membro, também o crime se consuma na manifestação sensível

de sua associação.

É possível tentativa?

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216

Prevalece que não. A doutrina, quase que de forma unânime, afirma que não é possível

mesmo no caso de cartas, quando quatro pessoas escrevem simultaneamente.

Ressalte-se que não é necessário que um membro conheça o outro.

O crime de quadrilha é vago, que é aquele que ofende a entidade sem personalidade. É

um crime contra a sociedade, contra a coletividade.

Não há quadrilha na associação para a prática de contravenções penais.

O crime continuado, para a maioria da doutrina, não afasta a quadrilha. Entendimento

de Noronha, Fragoso, Costa Junior. Entendem o crime continuado como ficção.

Em posição contrária, Hungria, Delmanto e Bittencourt, entendendo que seria apenas um

crime, não havendo, pois, o crime de quadrilha.

O membro da quadrilha só responde pelos crimes praticados por esta quando teve

efetiva colaboração.

Há quem afirme que se o autor apenas fez parte da ideação da quadrilha não deve

responder. Mas é uma posição muito minoritária.

Concurso material da quadrilha com roubo em concurso de pessoas:

- a posição majoritária entende que responde, pois são bens jurídicos diferentes, e no

momento em que se praticou o roubo já estava consumado o crime de quadrilha (STF HC

70.843).

- não responde o agente, pois haveria bis in iden, com a dupla desvaloração pelo fato do

crime ter sido praticado por mais de uma pessoa (STF, HC 61.859-6). É a posição de

Rogério Greco.

Quadrilha armada (art. 288, parágrafo único):

Parágrafo único - A pena aplica-se em dobro, se a quadrilha ou bando é armado.

Mas todos os participantes precisam estar armados?

Para Hungria e Noronha, basta que um membro esteja armado para que possa incidir a

causa de aumento de pena.

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217

Para Bento de Faria, a maioria deve estar armada.

A posição majoritária é a de Heleno Cláudio Fragoso, o qual afirma que a aferição

depende da razoabilidade sobre a natureza da arma e as circunstâncias do fato.

O mesmo sujeito pode pertencer a duas quadrilhas?

Prevalece que sim. Para Noronha, responderá por concurso material.

Quadrilhas especiais:

a) lei de crimes hediondos:

se a quadrilha visa a prática de crimes hediondos, o art. 8.º da Lei 8.072/90 prevê pena de

três a seis anos.

Art. 8º Será de 3 (três) a 6 (seis) anos de reclusão a pena prevista no art. 288 do Código

Penal, quando se tratar de crimes hediondos, prática da tortura, tráfico ilícito de

entorpecentes e drogas afins ou terrorismo.

Parágrafo único. O participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou

quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois

terços).

O parágrafo único traz o caso de delação eficaz ou premiada:

- deve ser de membro da quadrilha

- deve provocar seu desmantelamento

Não basta o quadrilheiro confessar que pertence a uma quadrilha. Tem que confessar e

dedurar os outros. Se confessou, tem direito de uma atenuante do art. 65. Para ter a

redução de pena, tem que desmantelar.

Quanto mais eficaz a colaboração no desmantelamento, maior a redução de pena

(para o juiz saber se é de 1/3 ou 2/3).

Quadrilha ou Bando fora do CP:

Regra geral: art. 288 do CP. Princípio da Especialidade:

- Crimes na Lei de Segurança Nacional – art. 16 da Lei 7.170/83. É uma quadrilha ou bando

especial. Há divergência se precisa de 4 pessoas ou não.

- Lei de Genocídio - Lei 2.889/56, art. 2o. Associarem-se 4 pessoas para a prática de

genocídio.

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218

- Lei de Drogas Lei 11.343, art. 35 (aqui não é quadrilha, mas associação pois exige 02 ou

mais pessoas) e art. 35, parágrafo único.

Art. 35. Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou

não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1o, e 34 desta Lei:

Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.200 (mil

e duzentos) dias-multa.

Parágrafo único. Nas mesmas penas do caput deste artigo incorre quem se associa para

a prática reiterada do crime definido no art. 36 desta Lei.

A associação na Lei de Drogas se satisfaz com apenas duas pessoas. Essa associação

deve ser estável ou permanente, apesar da redação da lei.

CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA

FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO:

Art. 297 - Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento

público verdadeiro:

Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.

§ 1º - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo,

aumenta-se a pena de sexta parte.

§ 2º - Para os efeitos penais, equiparam-se a documento público o emanado de entidade

paraestatal, o título ao portador ou transmissível por endosso, as ações de sociedade

comercial, os livros mercantis e o testamento particular.

§ 3o Nas mesmas penas incorre quem insere ou faz inserir: (Incluído pela Lei nº 9.983, de

2000)

I – na folha de pagamento ou em documento de informações que seja destinado a fazer

prova perante a previdência social, pessoa que não possua a qualidade de segurado

obrigatório;(Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

II – na Carteira de Trabalho e Previdência Social do empregado ou em documento que

deva produzir efeito perante a previdência social, declaração falsa ou diversa da que

deveria ter sido escrita; (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

III – em documento contábil ou em qualquer outro documento relacionado com as

obrigações da empresa perante a previdência social, declaração falsa ou diversa da que

deveria ter constado. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

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219

§ 4o Nas mesmas penas incorre quem omite, nos documentos mencionados no § 3o,

nome do segurado e seus dados pessoais, a remuneração, a vigência do contrato de

trabalho ou de prestação de serviços.(Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Bem Jurídico Tutelado:

Fé Pública. Fé pública que deve ter um documento público ou equiparado. Tutela então

a autenticidade dos documentos públicos ou equiparados.

Sujeito ativo: qualquer pessoa. Crime comum. Atenção, se for funcionário público

prevalecendo-se do cargo, a pena pode ser majorada nos termos do § 1o desse artigo.

§ 1º - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo,

aumenta-se a pena de sexta parte.

O crime admite concurso de agentes.

Vítimas:

- Primária: o Estado, a Coletividade.

- Secundariamente, qualquer pessoa prejudicada pela falsificação, particular vítima da

conduta delituosa do agente.

Conduta Punida:

Tem sempre que recair sobre o mesmo objeto material, qual seja documento público

verdadeiro.

Qual a diferença entre “falsificar no todo”, “falsificar em parte” e “alterar”?

A conduta punida do art. 297 é:

Falsificar: é contrafazer.

o No todo criar o documento.

o Em parte acrescenta dizeres, símbolos, aproveitando-se dos espaços em

branco.

Alterar o objetivo do agente é dar sentido diverso para documento verdadeiro, já

existente, rasurando-o, substituindo, suprimindo letras ou palavras. Não se aproveita

espaços em banco.

Ex: em uma Carteira de Identidade, o nome do pai está em branco, o da mãe está

preenchido e tem a data de nascimento.

Se é acrescentado o nome do pai, está falsificando o documento em parte

(aproveita espaço em branco)

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220

Se há mudança na data de nascimento, altera.

Se cria o espelho do RG, falsifica no todo (pois criou o documento).

Documento é toda a peça escrita que condensa graficamente o pensamento de

alguém, capaz de provar fato ou ato juridicamente relevante.

Se não for dotado de relevância jurídica, não é documento para fins penais.

Documento é somente coisa móvel ou é possível ser documento um bem imóvel? O

muro da prefeitura é documento público?

Documento só coisa móvel. Não é documento nem coisa imóvel, nem veículo.

Escrito anônimo não é documento. Escritos em muros também não é documento Isso é

tranqüilo na jurisprudência.

Adulterar chapa identificadora de veículo (sinal de identificação de veículo automotor)

não configura o 297 e sim o art. 311 (tem crime especial) do CP.

311 – adulterar ou remarcar número de chassi ou qualquer sinal identificador de veículo

automotor, de seu competente ou equipamento.

ATENÇÃO:

Adulterar documentos emitidos por órgãos militares configura o art. 311 do Código

Penal Militar?

311 – falsificar no todo ou em parte, documento público ou particular, ou (...)”

Só é crime militar se a falsificação atentar contra o patrimônio militar.

Se a falsificação não atenta contra o patrimônio militar, é crime comum.

Documento Público emitido por Órgão Federal, de quem é a competência para julgar

o crime?

1o. corrente (é a que prevalece na jurisprudência) se o documento público federal

falsificado atentou contra patrimônio Estadual ou Municipal: Competência Estadual.

2a. corrente a competência é sempre da Justiça Federal. Assim decidiu a Ministra

Ellen Gracie há 2 meses, inclusive reformando uma decisão do TRF da 4a região.

Tipos de documentos públicos:

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221

Documento formal e substancialmente público: emanado de agente público no exercício

de suas funções e seu conteúdo diz respeito a questões inerentes ao interesse público.

Documento formalmente público, mas substancialmente privado: o conteúdo do

documento é de interesse privado, apesar de emanado de agente público. Atos

praticados por tabeliães;

Documento particular que tem certidão cartorária, seja reconhecendo firma, sendo

autenticando o documento, isso torna o documento particular um documento público?

O documento continua documento particular, mas qualquer falsidade em cima da

chancela cartorária (ou seja o adesivo) aí é crime do art. 297. Assim, a parte relativa

a certificação oficial (o adesivo posto pelo cartório) é documento público (apesar

de não transformar todo o documento particular em público).

Se a conduta recair sobre o documento teremos o delito do art. 298 do CP,

falsificação de documento particular.

O objeto material do crime é documento. Mas não qualquer documento, e sim público.

O que torna o documento público? É aquele formalmente confeccionado/expedido de

uma forma determinada em lei por um órgão público, por funcionário público.

É o funcionário público. Pode ser funcionário público equiparado? Essa discussão não

importa pois o art. 327, “caput” fala em documento público e o art. 327, §1o. fala em

documento equiparado a público.

Obs.: Documento a lápis mesmo que emanado de funcionário público não gera o delito,

em face da insegurança produzida.

E se substituir a fotografia do RG por outra fotografia: pega carteira funcional e troca de

foto. Isso é falsidade de documento público (297) ou falsa identidade (307)?

A mera substituição de fotografia somente gera o delito de falsa identidade.

Crítica: Mas o delito do art. 307 é subsidiário, logo a substituição fere um elemento

integrante do documento, concorrendo assim para um crime mais grave.

A maioria da doutrina entende que é falsidade de documento público.

A falsificação tem que se apta a iludir. A falsificação grosseira gera crime impossível.

Alterar documento público inválido é crime?

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222

Mirabete e Fragoso é crime sempre, pois dispensa-se a validade. A lei não fala

nada.

Corrente Majoritária depende.

o Se o documento for anulável (nulidade relativa) existe o crime enquanto

assim não declarado (ou seja, o documento não for anulado).

o Se o documento for nulo (nulidade absoluta) não há crime.

IMPORTANTE: em regra o art. 297 depende de perícia.

Mirabete traz um caso óbvio de dispensa de pericia, é o caso de substituição de

fotografias. Exemplo: coloco minha foto no RG do Ronaldinho Gaúcho.

Art. 297, §2o documentos públicos por equiparação

“Para os efeitos penais, equiparam-se a documento público o emanado de entidade

paraestatal, o título ao portador ou transmissível por endosso, as ações de sociedade

comercial, os livros mercantis e o testamento particular”.

Quem trabalha em entidade estatal é funcionário público por equiparação. Assim:

o Funcionário público faz documento público.

o Funcionário público equiparado faz documento público equiparado.

Pode ser sociedade de economia mista ou empresa pública.

Documento Público por equiparação:

Título ao portador transmitido por endosso: assim, cheque é documento público por

equiparação, ainda que emitido por banco privado. O mesmo para letra de

câmbio, nota promissória.

Depois de 06 meses o cheque não pode mais ser transmissível por endosso, deixa

assim de ser documento público por equiparação?

Depois de 06 meses apenas admite a cessão civil. Aqui perde a equiparação e

passa a ser documento particular, o CP somente equipara a público enquanto

transmissível por endosso (Hungria).

Ações: as ações das sociedades comerciais (seja ação preferencial ou não

preferencial). Como a lei não restringe, abrange as duas preferenciais ou não

preferenciais.

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223

Livros Mercantis (diário, caixa, de duplicatas): abrange os de natureza obrigatória

como também os livros mercantis facultativos. Como a lei não restringe, o interprete

não pode fazê-lo, assim abrange os livros facultativos e obrigatórios.

Testamento Particular: o testamento particular, para ser documento público, precisa

aguardar a morte do testador ou pode ter o crime do art. 297 ainda que o testador

esteja vivo? Existe o crime ainda que o testador esteja vivo.

E o codicilo?

Resposta: não abrange o codicilo que é semelhante ao testamento, mas a lei não

admite analogia, esta analogia seria in mallam partem.

A falsificação tem que estar apta a iludir / enganar alguém. A falsificação grosseira é

crime impossível.

O crime de falsificação de documento público é punido a título de dolo, sem a lei exigir

qualquer finalidade especial animando a conduta do agente.

Consumação o crime do 297 se consuma com a falsificação ou alteração

potencialmente lesiva, pouco importando o posterior uso do documento. Dispensa o uso

efetivo desse documento falso. Logo consumação: falso ou alteração. Dispensa o uso.

Se o documento for usado? Depende de quem usou.

o Se quem usou o documento falso for o próprio falsificador, o uso fica

absolvido. É o pos factum impunível. Absorve o 304 do CP.

o Se quem usa o documento falso é o terceiro, não participante do falso, o

terceiro responde pelo crime 304 do CP.

É possível tentativa de falsificação de documento público?

Doutrina: teoricamente sim, difícil na prática.

- Tipo Subjetivo

É punido a título de dolo, mas sem qualquer finalidade especial. Dependendo da

finalidade especial muda o crime.

- Consumação

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224

O crime se consuma com a prática de qualquer dos dois núcleos, falsificar ou adulterar,

bastando a potencialidade lesiva (a possibilidade de ofender alguém). Se houver o

efetivo uso do documento falso será o que?

R: Depende de quem usou:

1ª situação: se o usuário é o próprio falsificador, o artigo 304 do CP fica absorvido, estando

diante de um “post factum impunível”.

2ª situação: se o usuário é terceira pessoa que não concorreu de qualquer modo na

falsificação responde pelo artigo 304 do CP e o falsificador pelo artigo 297 do CP.

Tentativa: sim, é um crime plurisubsistente, que é aquele crime que pode ter sua execução

fracionada em vários atos.

** (AGU) Qual é o local competente para o processo de julgamento do crime do artigo

297 do CP? É o local do uso ou do dano?

R: A competência é o do local onde ocorreu a falsificação, pois é o lugar da

consumação (art. 70 do CP).

Mas qual a jurisdição competente?

R: Não é o objeto material do crime, mas o sujeito passivo da infração que dá ao fato

delituoso os traços característicos que o enquadram nas atribuições da Justiça Federal.

(ex.: falsifica a carteira de trabalho, assim somente será competência da JF se periclitar

algum órgão federal, senão será competência da justiça estadual). A propósito as

súmulas 62,104 e 107 do STJ:

Súmula: 62

Compete a justiça estadual processar e julgar o crime de falsa anotação na carteira de

trabalho e previdencia social, atribuido a empresa privada.

Súmula: 104

Compete a justiça estadual o processo e julgamento dos crimes de falsificação e uso de

documento falso relativo a estabelecimento particular de ensino.

Súmula: 107

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225

Compete a justiça comum estadual processar e julgar crime de estelionato praticado

mediante falsificação das guias de

recolhimento das contribuições previdenciarias, quando não ocorrente lesão a autarquia

federal.

Alguns sites jurídicos disseram que o STF negou essa súmula 107, mas não foi. É que

segundo Rogério, os acusados estavam tentado prejudicar empresa pública federal.

Nas mesmas penas incorrem os agentes que cometerem:

§ 3o Nas mesmas penas incorre quem insere ou faz inserir: (Incluído pela Lei nº 9.983, de

2000)

I – na folha de pagamento ou em documento de informações que seja destinado a fazer

prova perante a previdência social, pessoa que não possua a qualidade de segurado

obrigatório;(Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

II – na Carteira de Trabalho e Previdência Social do empregado ou em documento que

deva produzir efeito perante a previdência social, declaração falsa ou diversa da que

deveria ter sido escrita; (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

III – em documento contábil ou em qualquer outro documento relacionado com as

obrigações da empresa perante a previdência social, declaração falsa ou diversa da que

deveria ter constado. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Esses §3º e §4º estão no tipo errado, pois são falsidades de idéias, portanto falsidade

ideológica, tipificado no artigo 299 do CP.

Isso é importante, pois sendo uma falsa idéia dispensam perícia, como já dispensa o artigo

299 do CP.

Princípio da especialidade: dependendo do fim especial do artigo 297 muda o crime. A

regra geral é incidir no artigo 297 do CP. Hipóteses especiais:

1ª – Artigo 348 do Código Eleitoral: para fins eleitorais. (ex.: falsifiquei meu título de eleitor

para prestar concurso ou tirar passaporte não é crime eleitoral; somente será se tiver fins

eleitorais, como para votar, para domicílio eleitoral, aí será o artigo 348).

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O “para fins eleitorais” é uma especializante.

2ª – Artigo 2º da Lei 7.492/86 (Lei dos crimes contra o sistema financeiro nacional):

3ª – Artigo 311 do CPM:

Art. 311. Falsificar, no todo ou em parte, documento público ou particular, ou alterar

documento verdadeiro, desde que o fato atente contra a administração ou o serviço

militar:

Deve atentar contra a administração ou serviço militar.

4ª – Lei 8137/90

Falsificação de documento particular:

Art. 298 - Falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento

particular verdadeiro:

Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.

Artigo 297 Artigo 298

Bem jurídico: fé pública Bem jurídico: fé pública concernente

aos documentos particulares

Sujeito Ativo: crime comum, sendo que

se o sujeito ativo é funcionário público

prevalecendo-se do cargo, gera uma

majorante

Sujeito passivo: Imediato é o Estado

Sujeito Ativo: é crime comum, mas o

fato de ser funcionário público não

existe aumento

Sujeito passivo: imediato é o Estado

Condutas:

- falsificar (no todo ou em parte)

Condutas:

- falsificar (no todo ou em parte)

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- Alterar

Objeto material: documento público ou

equiparado

- Alterar

Objeto material: documento particular

Tipo subjetivo: punido a título de dolo

sem fim especial animando o agente

Tipo subjetivo: punido a título de dolo

sem fim especial animando o agente

Consumação: prática dos núcleos +

possibilidade de dano

- admite tentativa

Consumação: prática dos núcleos +

possibilidade de dano

- admite tentativa

No restante não há qualquer diferença para o artigo 297 do CP. O Documento particular:

(Nelson Hungria) documento particular é o que não é público ou equiparado a público.

O conceito de documento particular se extrai por exclusão.

** O fato de o documento ser endereçado a uma autoridade pública o torna público?

R: Não, essa circunstância não o transforma em documento público (ex.: assim, toda

petição seria documento público).

Resumindo: as únicas diferenças são a majorante do funcionário público e objeto

material.

Princípio da Especialidade:

1ª – Artigo 349 do Código Eleitoral: exige o para fins eleitorais;

2ª – As mesmas do artigo 297 do CP.

Falsidade ideológica:

Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar,

ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o

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fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente

relevante:

Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de

um a três anos, e multa, se o documento é particular.

Parágrafo único - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se

do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-

se a pena de sexta parte.

- Bem jurídico tutelado: continua a ser a fé pública.

Enquanto a falsidade material (artigo 297 e 298) envolve a forma do documento (sua

parte exterior), a ideológica diz respeito ao seu conteúdo (um juízo inverídico). É um falso

ideal.

- Sujeito Ativo: qualquer pessoa juridicamente obrigada a declarar a verdade.

Há a majorante do § único no caso de funcionário público praticar o crime

prevalecendo-se do cargo.

- Sujeito Passivo: imediato será o Estado, mas podemos ter o particular como sujeito

passivo mediato.

- Condutas:

**é possível falsidade ideológica por omissão? R: Sim, sendo o primeiro núcleo do artigo

299 (Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar).

## Sendo o documento verdadeiro e somente a sua idéia falsa, dispensa-se perícia. Mas

cuidado, esta falsidade também tem que ser apta a iludir, pois se for um conteúdo (idéia

ou dado) inconcebível, será crime impossível. (ex.: Derci Gonçalves tirando RG e dizendo

que nasceu em 1970).

## Jurisprudência: se a idéia inserida no documento, apesar de falsa, esta sujeita

necessariamente à fiscalização da autoridade, crime impossível.

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**Que crime configura o abuso do papel em branco assinado?

R: Tem que se diferenciar a posse, se quem preencheu tinha a posse legítima, ou seja, o

subscritor confiou ao agente o documento, será falsidade ideológica. Mas se a posse era

ilegítima, responderá pelo artigo 297 ou 298 do CP, a depender se documento público ou

particular.

- Tipo Subjetivo: o artigo 299 é punido a título de dolo. Porém, com o fim de prejudicar

direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante.

Deve estar presente essa finalidade especial, senão não há crime. (Ex. de caso que o

Rogério pegou: duas mulheres bateram de carro, sendo que combinaram no outro dia e

em outra circunscrição de registrar essa ocorrência. Não há falsidade ideológica, pois elas

não agiram com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar verdade

juridicamente relevante).

- Consumação: prática de qualquer um dos núcleos potencialmente lesivos.

Em regra admite tentativa, mas não admite na forma omissiva, pois é unisubsistente.

- Parágrafo único - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se

do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-

se a pena de sexta parte.

Assim, a majorante é se o funcionário público, prevalecendo-se do crime, falsifica ou

altera assentamento de registro civil. Assim, nas hipóteses do artigo 29 da Lei de Registros

Públicos será caso de Falsidade Ideológica com majoração (artigo 299, § único). (Mas é

somente no caso de assento no registro civil?!)

Todavia, nos artigos 241 e 242 do CP há hipóteses especiais:

No caso do artigo 241 é a de promover registro civil de pessoa inexistente.

Art. 241 - Promover no registro civil a inscrição de nascimento inexistente:

Pena - reclusão, de dois a seis anos.

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No artigo 242 do CP temos a chamada adoção à brasileira:

Parto suposto. Supressão ou alteração de direito inerente ao estado civil de recém-

nascido

Art. 242 - Dar parto alheio como próprio; registrar como seu o filho de outrem; ocultar

recém-nascido ou substituí-lo, suprimindo ou alterando direito inerente ao estado civil:

(Redação dada pela Lei nº 6.898, de 1981)

Pena - reclusão, de dois a seis anos. (Redação dada pela Lei nº 6.898, de 1981)

- Princípio da Especialidade:

**Artigo 66 da lei 9605/98: traz uma falsidade ideológica especial, sendo que a falsidade

ideológica na lei de crimes ambientais é crime próprio, pois somente pode ser praticada

por funcionário público;

** Artigo 9º da Lei 7492/86: falsidade em documento comprobatório de investimento, etc.

** Artigo 350 do Código Eleitoral: para fins eleitorais.

Aula 20 29/06/2009

CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA EM GERAL

A matéria consta do título XI do CP, que é o de encerramento desse diploma.

Constituição plástica é uma teoria de Raul Machado Horta. Falava que a CF brasileira era

plástica. Isso porque os arts. Da CF eram elencados por ordem de importância. Poor isso

que os direitos e garantias fundamentais da CF/67 que estavam nos artigos finais dessa CF,

ficaram no art. 5.ª da nova CF/88.

Se se for emprestar essa expressão de Raul Machado Horta para o direito penal, podemos

dizer que o CP é plástico. Assim, os crimes contra a Administração Pública estão no último

título. Significa o descaso do legislador para com esses crimes.

O capítulo I traz os crimes praticados por funcionários públicos. São os chamados crimes

funcionais, que vão dos arts. 312 ao 327.

O capítulo II são os crimes praticados por particulares contra a Administração Pública em

geral (arts. 328 a 337-A).

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No capítulo II-A, acrescentado pela lei 9.983/2000, temos os crimes contra a Administração

Pública estrangeira. Mas compete ao Brasil tutelar a Administração Pública estrangeira? O

capítulo II-A, na verdade, traz os crimes contra a regularidade da transação comercial

internacional. Estão nos arts. 337-B até o art. 337-D. Também, é muito pouco cobrado em

concursos públicos.

O capítulo III traz os crimes contra a Administração da Justiça (arts. 338 a0 359 do CP).

Por fim, no capítulo IV, há os crimes contra as finanças públicas (arts. 359-A ao 359-H). Esse

capítulo IV apenas é cobrado em concursos em áreas extremamente técnicas. Logo, não

será objeto de estudo no presente curso.

Portanto, no presente curso e, para fins de concursos públicos, serão estudados os

Capítulos I e III, devendo ser feita uma breve leitura do capítulo II, já que de fácil

compreensão.

Título XI. Capítulo I:�DOS CRIMES PRATICADOS�POR FUNCIONÁRIO PÚBLICO�CONTRA A

ADMINISTRAÇÃO EM GERAL:

O sujeito ativo, em regra, necessariamente deve ser funcionário público. Na realidade, é o

servidor público, uma vez que não mais existe a figura do funcionário público em nosso

ordenamento.

O sujeito passivo constante é a Administração Pública em geral, podendo concorrer com

ela o particular.

Há doutrina que prega que alguns crimes contra a Administração Pública deveriam ser

tipificados como hediondos.

No entanto, apesar de o nosso legislador ter sido bastante relapso com esses crimes, há

dois momentos que se dá bastante ênfase aos crimes contra a Administração Pública em

geral. Tratam-se dos arts. 7.º, I, “c”

Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: (Redação dada

pela Lei nº 7.209, de 1984)

I - os crimes: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço; (Incluído pela Lei nº 7.209,

de 1984)

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Assim, os crimes funcionais tão sujeitos à extraterritorialidade incondicionada. Esses crimes,

pois, são punidos pela lei brasileira onde quer que sejam praticados.

Ainda, o art. 33, § 4.º do CP condiciona a progressão de regime à reparação dano

causado à Administração Pública.

§ 4o O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime

do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à

devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais. (Incluído pela Lei nº

10.763, de 12.11.2003)

Sempre que o legislador condiciona algum benefício à reparação do dano, faz alguma

ressalva.

Deve-se, pois, fazer uma analogia em bonam partem. Assim, se o agente comprovar a

impossibilidade de reparar o dano, está dispensado do cumprimento desse requisito

objetivo para a progressão do regime.

Há duas espécies de crimes funcionais, a saber:

1) Crimes funcionais próprios ou propriamente dito:

Faltando a qualidade de servidor do agente, o fato passa a ser um indiferente penal. É

uma hipótese de atipicidade absoluta.

Ex: corrupção passiva, prevista no art. 317 do CP; art. 319 do CP.

2) Crimes funcionais impróprios:

Faltando a qualidade de servidor do agente, o fato deixa de configurar crime funcional,

gerando crime comum. É uma hipótese de atipicidade relativa.

Ex: concussão. Se cometido por não funcionário, vira extorsão. Peculato, que pode virar

estelionato, furto, apropriação indébita etc.

Quem pode ser funcionário público para fins penais?

O normal seria o direito penal buscar o conceito de servidor público no direito

administrativo. Há duas correntes elencadas pelos administrativistas, o amplo e o estrito.

Mas isso não pode ser aplicado pelo direito penal, uma vez que deve valer em penal

sempre o princípio da taxatividade. Logo, os penalistas deram um conceito de funcionário

público para fins penais.

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Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora

transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.

§ 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em

entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada

ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública.

(Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Conceito de funcionário público:

O art. 327, caput traz o funcionário público típico ou propriamente dito. Funcionário

público é aquele que exerce cargo, emprego ou função pública, ainda que

transitoriamente e sem remuneração.

Quem exerce cargo é o estatutário; emprego é o celetista; quem exerce função não

necessariamente exerce um cargo, exerce um emprego e muitas vezes está no exercício

de um dever para com a Administração Pública, ainda que transitoriamente e sem

remuneração. Ex: jurado e mesário.

Mas e o administrador judicial, antigo síndico, é considerado funcionário público para fins

penais?

Não exerce cargo nem emprego público. Está no exercício de um múnus público, ou seja,

exerce um encargo público, logo não é funcionário público para fins penais.

Outros exemplos de encargo público: inventariante dativo tutor ou curador dativo.

Ressalte-se que função é igual a dever e encargo é o mesmo que favor.

Encargo público é, pois, um favor para a Administração Pública.

E o advogado dativo?

O Professor entende que é caso de encargo público, pois supre a falta do defensor

público, mas o STJ o equipara. Logo, o advogado dativo é funcionário público para fins

penais. Vide RESP 902.037/SP.

O estagiário é funcionário público para fins penais?

Sim, pois ligado à função pública.

Ex: o estagiário do juiz trabalhava como conciliador dos juizados especiais. Falava, pois, às

partes onde se deveria depositar o dinheiro das transações. Sendo que dava a sua

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própria conta corrente para depósito. Respondeu, pois, como se funcionário público para

fins penais fôra.

Conselheiro Tutelar: também é funcionário público para fins penais, nos termos do artigo

135 do ECA;

O § 1.º do art. 327 do CP traz a espécie do funcionário público atípico ou por

equiparação.

§ 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em

entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou

conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública. (Incluído

pela Lei nº 9.983, de 2000)

O que houve em 2000 para que houvesse a alteração desse artigo foi a política da

desestatização, que é bem diferente da privatização. Ou seja, houve a terceirização dos

serviços público, daí o porquê do advento da lei 9.983, a qual incluiu a segunda parte do

§ 1.º do art. 327 do CP.

É o caso das entidades paraestatais, empresas contratadas ou conveniadas para a

execução de atividade típica da Administração Pública.

Detalhe é que a empresa deve ser contratada para exercer atividade típica da

administração pública. (ex.: Lula contrata Buffet para receber presidente de outro país,

sendo que o garçom furta uma estátua, mas nesse caso será atividade atípica, não sendo

equiparado. No exemplo de santa casa que passa a receber verba pública, seus

funcionários serão equiparados).

O § 2.º do art. 327 do CP traz uma majorante, ou seja, causa de aumento de pena.

§ 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos

neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou

assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista,

empresa pública ou fundação instituída pelo poder público. (Incluído pela Lei nº 6.799, de

1980)

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A majorante é de 1/3 se a pessoa exerce cargo em comissão, função de direção ou

assessoramento em órgão da Administração Pública direta, sociedade de economia

mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público.

Esse rol é taxativo ou exemplificativo? E as autarquias?

O legislador esqueceu da autarquia, logo não pode ser ela incluída, pois seria caso de

analogia in Malan partem.

O Presidente da República, um governador ou um prefeito podem escapar desse

aumento de pena ou inevitavelmente sofrerão esse aumento?

O STF, no caso de Jáder Barbalho, por 6 votos a 5, entendeu que se enquadram no

aumento. Por isso, o caso de Jáder Barbalho não prescreveu.

Ressalte-se que Marco Aurélio entendeu que os chefes do Executivo presentam a

Administração Pública, ou seja, são a própria administração. No seu voto, alegou que isso

era um contorcionismo à época para punir Jáder Barbalho, pois aumentou a sua pena,

não incidindo a prescrição.

PECULATO:

Há seis tipos de peculto:

1) Peculato apropriação (art. 312, caput, primeira parte do CP):

2) Peculato desvio (art. 312, caput, segunda parte do CP):

3) Peculato Furto (artigo 312, §1º):

4) Peculato culposo (artigo 312, §2º):

5) Peculato Estelionato (artigo 313):

6) Peculato Eletrônico (artigo 313. A – B, Lei 9.983/00):

Peculato próprio: é gênero, do qual são espécies o peculato apropriação e peculato

desvio. É o peculato do caput do art. 312.

Já o peculato impróprio é sinônimo de peculato furto.

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Peculato próprio:

Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem

móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em

proveito próprio ou alheio:

Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.

O bem jurídico tutelado é a moralidade administrativa, o patrimônio da Administração

Pública secundariamente ou mesmo o patrimônio do particular.

Sujeito ativo:

É o funcionário público no sentido amplo do artigo 327 do CP. Trata-se de crime próprio.

Pode praticar o crime em concurso com outras pessoas, inclusive com quem seja estranho

aos quadros da Administração Pública. Ex: A é funcionário público e B particular. A se

apropria de coisa pertencente à Administração Pública induzido por B. Qual crime

praticaram? A praticou o crime de peculato apropriação (art. 312 do CP). Para se saber

qual crime praticou B, deveria ser perguntado se tinha ciência da qualidade de A como

funcionário público. Se tinha, responde também pelo art. 312. Mas se B ignorava a

condição pessoal de A, responde por apropriação indébita (art. 168 do CP).

Diretor de sindicato é funcionário público para fins penais? Ele pratica peculato se se

apropriar dos bens do sindicato?

O diretor do sindicato é funcionário público? Exerce cargo público? Não, assim como não

exerce emprego ou função pública. Logo, não é funcionário típico. Mas pode ser

equiparado? Também, não, porque o sindicato não é ente paraestatal, empresa

contratada ou conveniada. Logo, não é funcionário público típico ou atípico.

Mas responde por peculato por conta do art. 552 da CLT:

Art. 552 - Os atos que importem em malversação ou dilapidação do patrimônio das

associações ou entidades sindicais ficam equiparados ao crime de peculato julgado e

punido na conformidade da legislação penal. (Redação dada pelo Decreto-lei nº 925,

de 10.10.1969)

A equiparação aqui não foi subjetiva, já que não equiparou o sujeito, mas sim o fato.

Logo, é uma equiparação objetiva.

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237

O artigo 552 da CLT teve a redação do DL nº 925/69, que é da época da Ditadura, em

que a intervenção estatal nos sindicatos era total. Com a CF/88, ficou proibida a

intervenção estatal nos sindicatos, de modo que há doutrina e jurisprudência concluindo

que o artigo 552 da CLT não foi recepcionado pela CF. (O TRF da 4.ª Região e alguns

doutrinadores sustentam essa tese - Sérgio Pinto Martins).

Mas essa não é a posição do STJ, que tem insistido na recepção do artigo 552 da CLT (

Vide conflito de Competência 31.354/SP).

E se o sujeito ativo for prefeito municipal?

Antes de se analisarem as disposições do CP, deve-se atentar para as disposições do DL

201/67, que é norma especial. Trata-se da aplicação do princípio da especialidade.

Sujeito passivo:

O sujeito passivo imediato é a Administração Pública em geral. Mas o particular pode ser

vítima, uma vez que pode muito bem haver apropriação de bem de particular.

Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem

móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em

proveito próprio ou alheio:

Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.

Tipo penal:

O art. 312 pode ser dividido em duas partes:

Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem

móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em

proveito próprio ou alheio:

Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.

Tipo do peculato apropriação (primeira parte do art. 312):

a) apropriar-se:

Significa apoderar-se de coisa de que tem posse. Significa inverter posse, agindo

arbitrariamente como se dono fosse.

b) funcionário público (apropriar-se o funcionário público): deve ser o funcionário público

entendido como no art. 327 do CP.

c) dinheiro, valor, ou qualquer outro bem móvel:

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Trata-se de coisa capaz de ser transportada de um local para o outro sem perder a

identidade. Não se deve confundir com o bem móvel do direito civil/

d) pública ou particular:

Se particular, o dono da coisa é vítima secundária.

e) de quem tema posse:

V - de que tem a posse:

Por posse, pode-se entnder a mera detenção?

A primeira corrente entende que a expressão posse é utilizada no sentido amplo,

abrangendo a detenção. O legislador penal não foi técnico, diferenciando posse de

detenção. Inverter mera detenção configura o crime do art. 312, caput.

A segunda corrente entende que a posse não se confunde com a detenção. Havendo

mera detenção, o crime será de peculato-furto.

Quando o legislador penal quer abranger a detenção ele o faz expressamente, como no

caso do art. 168, por exemplo. Inverter mera detenção, pois, configura o crime de

peculato furto.

O TRF da 1ª Região queria saber qual a posição do STJ, sendo que ele adota a segunda

corrente. Para o Professor, é a correta, pois no artigo 168 fala em posse e detenção, sendo

que se aqui não falou em detenção, é porque não queria abrangê-la.

f) em razão do cargo:

Significa que deve ser uma posse funcional, com nexo funcional. Não basta ser uma posse

por ocasião do cargo, mas em razão dele. Deve estar entre as atribuições do agente a

posse da coisa.

Não se confunde com “por ocasião do cargo”.

g) para si ou para outrem:

Peculato desvio (art. 312, segunda parte):

No peculato desvio somente muda o item “a”, que ao invés de apropriar é desviar, dar

destino diverso à coisa, sendo o restante semelhante ao peculato apropriação.

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239

Há doutrinadores que criticam essa distinção entre peculato apropriação e peculato

desvio. Mesmo assim, no Brasil, deve haver essa diferenciação.

Elemento subjetivo:

O crime de peculato é punido a título de dolo, sendo imprescindível a vontade de

apoderamento definitivo.

O TRF da 5.ª Região perguntou se constitui crime de peculato se o agente agir com

animus de uso.

Deve-se, no caso, distinguir coisa consumível e não consumível. A doutrina e a

jurisprudência preferem, no entanto, usar a expressão coisa fungível e infungível.

Assim, se a coisa for consumível, ou seja, com o uso é consumida, não tendo como restituí-

la ao status quo ante, há crime. Mas se a coisa for não consumível, ou seja, pode ser

restituída ao status quo ante não há crime. Na segunda hipótese, há o chamado

peculato de uso.

OBS: mão-de-obra não é coisa. Assim, prefeito que usa mão-de-obra em seu favor não

pratica peculato. Mão-de-obra é serviço.

Deve-se atentar para o art. 1.º, II do DL 201/67:

Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do

Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores:

Il - utilizar-se, indevidamente, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços

públicos;

Aqui, não importa se a coisa é consumível ou não consumível. Ou seja, a mera utilização

da coisa é crime se cometido por prefeito municipal. Logo, para o prefeito, peculato de

uso é crime.

Essa conduta não é crime para governadores e presidente da república porque tal DL

201/67 foi feito na época da ditadura para os prefeitos nomeados. Logo, alguns

doutrinadores questionam se esse crime foi recepcionado ou não pela CF/88.

*Aplica-se o princípio da Insignificância ao Peculato ???

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240

Resposta: STF decidiu que não se aplica o princípio da insignificância nos crimes contra a

administração pública, pois mais que o patrimônio, também se fere a moralidade

administrativa. Fere a administração em sua moral. (Para o professor deve ser analisada

com Cautela tal decisão).

Consumação do peculato apropriação:

O crime se consuma a partir do momento em que o funcionário público se apropria da

coisa agindo como se dono fosse, ou seja, no momento em que passa a externar os

poderes de proprietário da coisa.

Consumação no peculato desvio:

Ocorre no momento em que o funcionário altera o destino normal da coisa.

Ambos os crimes admitem a tentativa, logo são crimes plurissubsistentes.

O princípio da insignificância é aplicável ao crime de peculato ou em qualquer crime

contra a Administração Pública?

- a primeira corrente considerando que o bem jurídico tutelado é a moralidade

administrativa, mostra-se incompatível o princípio da insignificância. É a corrente adotada

pelo STJ.

- a segunda corrente entende que o princípio da insignificância é princípio de aplicação

geral, incidindo também nos crimes contra a Administração Pública. É a corrente do STF.

Mas não admite o princípio da insignificância irrestritamente. Ex: o STF nos crimes contra a

fé pública entende que a bagatela não é aplicável.

Peculato furto ou impróprio:

§ 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do

dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio

ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.

O bem jurídico tutelado e a moralidade administrativa.

O sujeito ativo é o funcionário público no sentido amplo do art. 327 do CP.

O sujeito passivo é a Administração Pública em geral, podendo o particular ser vítima

secundária.

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Tipo objetivo:

No art. 312, caput, o funcionário público tem uma posse, que é legítima e, por ter uma

posse legítima, é que apropria-se. Já no § 1.º, o funcionário não tem posse. Como não tem

posse, não pode se apropriar, logo subtrai ou concorre para que seja subtraído.

Justamente por não ter posse é que o peculato é chamado de impróprio.

Somente a subtração facilitada é que gera o peculato impróprio. Caso não seja

facilitada, trata-se de furto comum.

Tipo subjetivo:

O crime é punido a título de dolo, mais a intenção de apoderamento definitivo.

Consumação:

Aplicam-se as disposições do furto. Prevalece a teoria da amotio. Dispensa-se, pois, posse

mansa e pacífica. É, pois, perfeitamente possível a tentativa.

Peculato Culposo:

§ 2º - Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem:

Pena - detenção, de três meses a um ano.

Trata-se do único crime funcional culposo. O agente atua com negligência.

O bem jurídico tutelado é a moralidade administrativa.

O sujeito ativo é o funcionário público em sentido amplo e o passivo é a Administração

Pública em geral, podendo com ela concorrer o particular.

Tipo objetivo:

Pune o fato de o agente concorrer culposamente para o crime de outrem. Mas que crime

de outrem?

- a primeira corrente entende que crime de outrem só pode ser o que está no § 1.º ou no

caput do art. 312. Aqui, faz uma interpretação topográfica. É a corrente majoritária, mas o

professor discorda.

- a segunda corrente, no entanto, não limita. O crime de outrem pode ser qualquer crime,

inclusive um furto. Ora, se o tipo não restringe, não cabe ao intérprete fazê-lo.

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Logo, se ele concorre culposamente para um crime de furto (por particulares) ele não

responde por nada. Ex. Deixa a porta aberta e o particular comete um furto.

Apesar do agente concorrer para o crime de outrem não existe concurso de pessoas

quando há heterogeneidade nos elementos subjetivos. Cada um responde por um crime.

Quem subtraiu responde por um crime e quem participou de um crime culposo responde

pelo seu crime.

Atenção: Não é concurso de pessoas. Não há participação culposa em crime doloso ou

participação dolosa em crime culposo. Cada agente responderá pelo seu crime, um pelo

peculato culposo e outro pelo peculato doloso.

Crime é punido a título de culpa.

Tipo subjetivo:

É punido a título de crime.

E o único crime funcional culposo.

Consumação:

O crime se consuma no momento em que se aperfeiçoa o delito de outrem.

Não cabe tentativa, uma vez que o crime é culposo.

Benefício legal para o peculato-culposo:

§ 3º - No caso do parágrafo anterior (Peculato culposo), a reparação do dano, se

precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de

metade a pena imposta.

É beneficio Exclusivo do Peculato Culposo.

OBS: É uma Causa Extintiva da Punibilidade na parte especial do CP.

O Divisor de águas é a sentença irrecorrível.

Se houver reparação do dano anterior à sentença penal condenatória irrecorrível, é

extinta a punibilidade.

Mas se a reparação do dano for posterior à sentença condenatória irrecorrível, há

diminuição na pena. quem faz essa diminuição é o juiz da execução. Logo, é um caso em

que este altera a pena do juiz da condenação.

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E se o peculato é doloso?

1ª Corrente: Até o recebimento da inicial aplica-se o art. 16 do CP – arrependimento

posterior.

Se for posterior ao recebimento da inicial haverá apenas atenuante de crime (art. 65, CP).

2ª Corrente: Tem doutrina e jurisprudência que não admite arrependimento posterior para

peculato doloso eis que é considerado um crime não patrimonial, mas ofensivo a

moralidade pública.

Peculato mediante erro de outrem ou Peculato Estelionato:

Art. 313 - Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo,

recebeu por erro de outrem:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

O bem jurídico tutelado é a moralidade administrativa.

O sujeito ativo é o funcionário público, no sentido amplo do art. 327 do CP.

O sujeito passivo é a Administração Pública em geral (sujeito imediato), com ela podendo

concorrer o particular enganado (sujeito mediato).

Tipo objetivo: apropriar-se de coisa recebida por erro de outrem.

A doutrina chama de peculato estelionato, mas seria melhor etiquetado como “peculato

por erro de outrem.

a) 312 caput – terá posse em razão do cargo. Posse legítima.

b) 312, §1o – não tem posse e precisa subtrair para tê-la.

c) 313, caput – terá posse, mas esta será ilegítima, fruto de erro de outrem ou engano.

Para configurar o erro tem que ser espontâneo, se o erro foi praticado pelo funcionário

público teremos o delito de estelionato.

Art. 312, caput: Art. 312, § 1º: Art. 313:

o agente tem posse

legítima.

o agente não tem posse.

o agente tem posse

ilegítima em virtude de erro

de outrem. O agente

percebe o erro e nada faz

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244

se apropriando da coisa

como se dono fosse.

OBS: Só tipifica o crime se o erro é espontâneo. Se foi provocado (o funcionário público é

quem induziu outrem a erro) trata-se de estelionato comum (art. 171).

Assim, se o erro foi provocado pelo próprio funcionário público, trata-se de estelionato.

Tipo subjetivo: o crime é punido a título de dolo, mais apoderamento definitivo.

A consumação ocorre quando o agente, percebendo erro de outrem, não o desfaz

agindo como se dono fosse.

A doutrina admite a tentativa.

Peculato Eletrônico (arts. 313-A e 313-B):

Art. 313-A. Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar

ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados

da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem

ou para causar dano: (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000))

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

Modificação ou alteração não autorizada de sistema de informações (Incluído pela Lei nº

9.983, de 2000)

Art. 313-B. Modificar ou alterar, o funcionário, sistema de informações ou programa de

informática sem autorização ou solicitação de autoridade competente: (Incluído pela Lei

nº 9.983, de 2000)

Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de

2000)

Parágrafo único. As penas são aumentadas de um terço até a metade se da

modificação ou alteração resulta dano para a Administração Pública ou para o

administrado.(Incluído pela Lei nº 9.983, de 2000)

313-A 313-B

sujeito ativo: Funcionário autorizado a Sujeito Ativo: Funcionário Público em

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245

manejar o sistema de dados da

Administração Pública.

sentido amplo (art. 327 do CP).

SERVIDOR NÁO AUTORIZADO =

PARTICULAR. Pratica o ART. 297/299

Admite concurso podendo ser particular.

Sujeito Passivo: Administração Pública em

geral e, eventualmente, o particular

lesado pelo comportamento do agente,

Sujeito Passivo: Administração Pública em

geral.

Condutas puníveis:

Inserir ou facilitar a inserção de dados

falsos ou alterar ou excluir dados corretos.

O comportamento do agente recai sobre

dados que é o objeto material do delito.

O sistema permanece.

Condutas puníveis:

Modificar ou alterar o sistema ou

programa que armazena os dados.

(objeto material do crime)

O sistema é modificado ou destruído. A

conduta não mais recai apenas sobre os

dados.

Tipo subjetivo:

O crime é punido a título de dolo, mais o

fim especial, que é o fim de obter

vantagem indevida para si ou para

outrem ou para causar dano.

Há dolo específico (dolo mais elemento

subjetivo do tipo).

Tipo subjetivo:

Dolo direto: não exige qualificação

especial do agente.

Consumação: trata-se de crime formal ou

de consumação antecipada. Consuma-

se, pois, independentemente do dano.

Consuma-se com as ações de inserir,

alterar, excluir. A vantagem ou o dano é

mero exaurimento.

Rui Stoco entente que o crime é de mera

conduta, no que O Professor discorda eis

que existe resultado naturalístico descrito

no tipo.

Consumação: trata-se de crime formal.

Há doutrina entendendo que é de mera

conduta. O Professor discorda.

Importante: Se for de mera conduta não

admite tentativa.

OBS: se houver dano, aplica-se o

parágrafo único.

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246

Admite tentativa Admite tentativa.

São delitos diferentes do Peculato.

Pontos de Convergência com o Peculato.

1- Praticado por funcionário público;

2- Contra a Administração em Geral;

3- Bem jurídico tutelado é a moralidade administrativa;

4- Posição topográfica.

Exemplo: Diretor do DETRAN tira a multa do amigo e coloca para o inimigo, ou exclui a

multa de seu amigo.

Sujeito ativo: Funcionário público Autorizado a manejar o sistema de dados. É possível o

Concurso de Agentes.

Funcionário Público não autorizado. Exemplo: Promotor entra no sistema de dados do

DETRAN e exclui uma multa sua. Por ser funcionário público não autorizado praticará o

delito de Falsidade Ideológica, art. 299, parágrafo único. (mesmo crime que o particular

praticaria)

Falsidade ideológica

Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar,

ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o

fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente

relevante:

Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de

um a três anos, e multa, se o documento é particular.

Parágrafo único - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se

do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-

se a pena de sexta parte.

Documentos virtuais, dados, são documentos para efeitos penais. Interpretação

Progressiva (Ruy Stocco) não sendo analogia in mallam partem.

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247

Sujeito passivo: Primário é a Administração

Sujeito passivo: Secundário é o particular lesado.

Conduta punida: Insere, facilita a inserção ou exclui indevidamente dados corretos do

sistema público.

Objeto Material: Dados. A conduta criminosa recai sobre os dados.

*No art. 313-A o agente Preserva o Sistema, apenas alterando seus Dados.

Punido a titulo de Dolo: O Dolo é acrescido do elemento subjetivo do tipo ,ou seja, o

antigo Dolo Especifico.

Elemento subjetivo do tipo: com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem

ou para causar dano.

Consumação: Com a simples pratica de qualquer dos núcleos, independentemente do

proveito ou dano visado. É um Crime Formal ou de Consumação Antecipada por

dispensar o resultado naturalístico. Ocorrendo o resultado naturalístico teremos mero

exaurimento.

Tentativa: é Admissível.

(Ruy Stocco) É um crime de mera conduta. Rogério discorda pois o tipo descreve um

resultado naturalístico.

OBS: Crime de Mera Conduta não admite Tentativa.

Modificação ou alteração não autorizada de sistema de informações (Incluído pela Lei nº

9.983, de 2000)

Art. 313-B. Modificar ou alterar, o funcionário, sistema de informações ou programa de

informática sem autorização ou solicitação de autoridade competente: (Incluído pela Lei

nº 9.983, de 2000)

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 9.983, de

2000)

Parágrafo único. As penas são aumentadas de um terço até a metade se da modificação

ou alteração resulta dano para a Administração Pública ou para o administrado.(Incluído

pela Lei nº 9.983, de 2000)

Sujeito Ativo: Conceito amplo do art. 327 do CP, qualquer funcionário público.

Sujeito Passivo Primário: Administração Pública

Sujeito Passivo Secundário: eventual particular lesado pela conduta do agente

Conduta: Modificar ou alterar o próprio Sistema ou Programa, não somente Dados.

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248

Objeto Material: Recai sobre Sistema ou Programa que armazena os Dados. Atinge o

Software.

Dolo: O dolo é simples. Sem elemento subjetivo específico.

*É crime formal, não interessa o proveito.

Tentativa é admissível.

OBS: Faltou proporcionalidade na aplicação das penas do art. 313-A e art. 313-B. O crime

mais grave depende do caso concreto. Logo, não poderia haver crimes com penas tão

diferentes.

Aula 21 06/07/2009

CONCUSSÃO:

Art. 316 - Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função

ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida:

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.

O crime de concussão nada mais é senão uma extorsão qualificada pela qualidade de

funcionário público.

Dois são os bens jurídicos tutelados:

O primário é a moralidade administrativa. O bem jurídico secundário é o patrimônio do

particular constrangido pelo agente.

Sujeito Ativo:

a) funcionário Público no exercício da função:

b) funcionário público fora da função (férias, licença) desde que atuando em razão dela;

c) particular na iminência de assumir a função pública, atuando em razão dela:

Aqui, um particular pode praticar o crime sozinho, em a presença de um funcionário

público a ele associado.

Na iminência de assumir quer dizer que apenas faltam procedimentos burocráticos para a

assunção ao cargo.

Ex: é a Carteirada com o Diário Oficial.

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O crime Admite Concurso de Pessoas.

E se o concussionário é um fiscal de rendas, qual crime pratica?

Se o sujeito ativo da exigência for Fiscal de Rendas o crime será o do art. 3o, II, da Lei

8.137/90, por ser crime especifico e especial contra a ordem tributária. (Princípio da

Especialidade).

A concussão do art. 316 do CP é um crime funcional contra a Administração Pública. Já a

concussão do art. 3.º, II da Lei 8.137/90, é um crime funcional contra a ordem tributária.

Se o sujeito ativo for militar, o crime será o do art. 305 do Código Penal Militar (Princípio da

Especialidade), cuja competência é da Justiça Militar, estadual ou federal, dependendo

do caso.

OBS: Jurado pratica concussão pois é funcionário publico para fins penais.

Sujeito passivo:

A vítima primária é a Administração Pública em geral. Já a vítima secundária é o indivíduo

constrangido pelo funcionário público.

Conduta Punida:

Exigir para si ou para outrem, direta ou indiretamente, vantagem indevida.

Exigir:

Não se confunde com mero pedido. Havendo mero pedido, o crime é de corrupção

passiva. A conduta é intimidativa, coercitiva. Normalmente, se tem atrelado a promessa

da prática de algum mal futuro em caso de não atendimento.

Para si ou para outrem:

O “para outrem” pode ser o próprio ente público.

Direta ou indiretamente:

Na conduta direta tem-se a exigência pessoal. Na indireta, por exemplo, tem-se a

exigência por interposta pessoa.

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250

Explicita ou implicitamente:

Explicita é a exigência clara e a implícita é a exigência velada.

*É imprescindível que o funcionário público, ao exigir, faça crer que o poder em razão de

seu cargo cause medo em terceiro. Há aqui o chamado metus publicae potestatis (medo

do Poder Público).

Para configurar o crime é imprescindível que o mal pretendido esteja entre as suas

atribuições, tem que ter competência, poder para praticar o mal colocado, atrelado

contra o terceiro. Se o mal não está entre as suas atribuições (atribuições do cargo para

realizar o mal prometido) o crime será de Extorsão Comum, art. 158.

É extorsão e não Concussão a pessoa fingir-se funcionário público.

A Exigência Direta pode ser Explicita ou Implícita, velada.

A exigência Indireta se vale de interposta pessoa, que em princípio será co-autora ou

partícipe do crime.

A vantagem tem que ser indevida. Prevalece que a vantagem pode ser de qualquer

natureza. Patrimonial ou não Patrimonial, inclusive sexual. Mas essa matéria não é

pacífica, havendo entendimento jurisprudência minoritário em sentido contrário.

Para si ou para outrem:

Direta ou indiretamente: Pelo próprio funcionário público ou por interposta pessoa.

Explicita ou implicitamente: A lei não fala. A doutrina lembra que a exigência explicita é a

clara. A implícita é a velada.

E se a Vantagem for devida?

Não é exercício arbitrário das próprias razoes, porque se trata de um crime praticado por

particular contra a administração da justiça.

Aqui, se a vantagem devida for uma contribuição social ou tributo, o crime pode ser o de

excesso de exação.

Art. 316 (...)

§ 1º - Se o funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber

indevido, ou, quando devido, emprega na cobrança meio vexatório ou gravoso, que a lei

não autoriza: (Redação dada pela Lei nº 8.137, de 27.12.1990)

Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 8.137, de

27.12.1990)

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251

Se a vantagem devida não é tributo ou contribuição social, o crime é o de abuso de

autoridade.

OBS: é imprescindível que o agente tenha atribuição, poder ou competência para

concretizar o mal que agregou ao delito.

Dispensa a vítima sentir-se intimidada, bastando a potencialidade.

OBS: o sujeito ativo tem que ter competência para concretizar o mal anunciado, sem isso

não haverá crime.

OBS: Configura extorsão a pessoa simular um cargo que não ocupa. A simulação de

cargo (seja por particular ou por funcionário publico) não é concussão, mas extorsão.

Ex:

- Delegado de polícia promete denunciar a vítima. O delegado não pode denunciar.

- Promotor promete condenar a vítima. O promotor não pode condenar, mas apenas

denunciar.

- Agente que simula um cargo que não tem.

OBS: Médico contratado pelo SUS pode praticar a concussão, já que é funcionário

público para fins penais. Quando o médico cobra adicionais indevidos para realizar uma

cirurgia configurará qual crime?

Resposta: Atenção: Médico atendendo pelo SUS, que exige pagamento por

procedimento (cirurgia, por exemplo): Jurisprudência divergente. Há julgados entendendo

que é concussão ou extorsão.

Médico que exige dinheiro para realizar cirurgia = art. 316 CP, ou seja, crime de

concussão.

Médico que solicita dinheiro para realizar cirurgia = 317 CP, ou seja, corrupção passiva.

Médico que emprega fraude, induzindo a erro (engana) o paciente, afirmando que o SUS

não cobre o procedimento, (simula ser devida a contribuição extra) = 171 CP, ou seja,

estelionato.

O crime de concussão é punido a título de dolo, mais a finalidade especial, consistente no

enriquecimento ilícito. O enriquecimento aqui é em sentido amplo, frise-se.

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252

O crime de concussão formal, pois se consuma com a mera exigência, dispensando a

obtenção da vantagem indevida. A obtenção da vantagem indevida é mero

exaurimento do crime, devendo ser considerada na fixação da pena.

O crime dispensa, inclusive, a vítima sentir-se intimidade. Consuma-se independentemente

da vítima constrangida sentir-se intimidada.

Competência:

Prevalece na jurisprudência, inclusive STJ, que a competência é da Justiça Estadual.

Tentativa:

É possível na carta concussionária interceptada, ou seja, na forma escrita.

Para Nelson Hungria, a carta interceptada é mero ato preparatório (corrente minoritária).

Para que haja o flagrante é necessário que a prisão seja no momento da exigência, logo

após ou logo depois (situação que faz presumir que ocorreu o crime). Se após um tempo

(02 meses) não é flagrante, pois é mera fase de exaurimento do crime.

CORRUPÇÃO PASSIVA:

Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que

fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar

promessa de tal vantagem:

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 10.763,

de 12.11.2003)

§ 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou

promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica

infringindo dever funcional.

§ 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de

dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem:

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253

Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.

A Pena do crime de Corrupção é mais Grave que a do crime de Concussão. Pune-se mais

gravemente um crime menos grave. Faltou respeito ao princípio da proporcionalidade por

parte legislador.

O verbo do art. 316 é exigir. O do art. 317 é solicitar. Porém, a pena é maior. Já existe

doutrina dizendo que essa incongruência fere o Princípio da Proporcionalidade. Tese

muito defendida em concursos para a Defensoria Pública.

Ex: prefeito, para aprovar loteamento, exigia 10% dos lotes. Nesse caso, trata-se de crime

de concussão.

O bem jurídico tutelado é a moralidade administrativa.

OBSERVAÇÕES:

1- O Sujeito Ativo é o mesmo da Concussão;

Funcionário Público no exercício da função;

Funcionário público fora da função (férias, licença) desde que em razão dela;

Particular na iminência de tomar posse no cargo público.

Ex: É a Carteirada com o Diário Oficial.

2 – Se o sujeito ativo for Fiscal de Rendas, o crime será contra a ordem tributária, art. 3o, II,

Lei 8.137/90. (princípio da especialidade).

3 – Sujeito ativo militar:

Nesse caso, o CPM, no art. 308, só pune “receber” ou “aceitar” promessa, não punindo a

solicitação. Assim, o PM responderá pelo CP, sendo a competência da justiça comum,

estadual ou federal, dependendo do caso.

Importante: Se o agente for policial militar, o crime será o do art. 308 do CPM, pois há os

verbos “receber” e “aceitar” a promessa, mas não tem o verbo “solicitar”. Se o verbo é

solicitar (PM) o crime é o do art. 317 CP.

Em síntese, caso o militar “solicite” a vantagem, praticado crime previsto no art. 317 do

CP, sendo a competência da Justiça Comum, pois os “solicitar” não é crime militar, mas

sim crime comum.

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4- Se for testemunha, perito não oficial, tradutor, intérprete ou contador não oficial o crime

será o do art. 342, §1o, CP.

Art. 342. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito,

contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial,

ou em juízo arbitral: (Redação dada pela Lei nº 10.268, de 28.8.2001)

Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.

§ 1o As penas aumentam-se de um sexto a um terço, se o crime é praticado mediante

suborno ou se cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em

processo penal, ou em processo civil em que for parte entidade da administração pública

direta ou indireta.(Redação dada pela Lei nº 10.268, de 28.8.2001)

Sujeito passivo:

- imediata ou primária: a administração em geral;

- mediata ou secundária: pode ser um particular constrangido pelo agente, desde que o

particular não seja autor de corrupção ativa.

Importante: O crime de corrupção passiva não pressupõe a corrupção ativa. Nem sempre

diante de um corrupto há um corruptor. No caso da corrupção ativa há o mesmo evento,

com condutas diferentes = Exceção pluralista da Teoria Monista.

O Sujeito Passivo é a administração pública. Pode o particular constrangido ser vítima ou

responder pelo crime de corrupção ativa.

OBS: Na corrupção ativa, art. 333, só pune o “oferecer” ou “prometer”, não pune o “dar”.

Dar não é crime, sendo vítima o particular. Vítima da Solicitação.

Veja-se quadro explicativo.

Art.317 Art.333

Solicitar (corrupção parte do

Funcionário)

Não pune do “dar”

Receber (corrupção parte do Corruptor,

particular).

Oferecer

Aceitar Promessa (corrupção parte do Prometer

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255

Corruptor, particular).

O “dar” não é crime. Se a parte apenas deu a vantagem será a vítima do crime. O motivo

é porque o art. 333 só pune o corruptor quando este tem a iniciativa. A corrupção não se

iniciou por ato do particular, mas sim do funcionário público.

A corrupção ativa no Código Eleitoral também pune o verbo “dar”. Art. 299 do Código

Eleitoral.

Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro,

dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou

prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita:

Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa.

Art. 317 –

Corrupção

Passiva

(corrupto)

Art. 333 –

Corrupção Ativa

(corruptor)

Art. 337-B Corrupção

ativa praticada por

Funcionário Público

Estrangeiro

Art. 342, §1º –

Corrupção

Ativa –

Testemunha

Art. 299

Código

Eleitoral

Solicitar (é

anterior)

Dar (é posterior

houve solicitação

anterior) logo, é

vítima = não é

crime. Por isso no

tipo não há o

verbo dar.

Dar é crime. Dar é crime Dar é

crime

Receber

(alguém

antes

ofereceu)

Oferecer Oferecer Oferecer Oferecer

Aceitar

promessa

(alguém

Prometer Prometer Prometer prometer

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antes

prometeu)

Assim, o verbo “dar” só não é crime no caso do art. 333 do CP.

Segundo Rogério, há projeto de lei na iminência de aprovação para incluir o núcleo “dar”

nas elementares do art. 333. Se acrescentar o dar no tipo do art. 333 será irretroativo.

Concurso de Pessoas:

Perfeitamente possível.

Condutas do art. 317:

- solicitar:

A corrupção parte do corrupto.

- receber:

A corrupção parte do corruptor.

- para si ou para outrem:

“para outrem” pode ser, inclusive, a própria Administração Pública. Ex: juíza que solicitou

vantagens para informatizar o cartório.

- direta ou indiretamente:

Repete-se o mesmo da concussão.

- explícita ou implicitamente:

- vantagem indevida:

A vantagem pode ser de qualquer natureza, inclusive moral ou sexual.

- aceitar promessa de tal vantagem:

A corrupção também parte do corruptor.

Tipo Subjetivo:

Dolo + finalidade específica.

Corrupção passiva própria e imprópria:

a) própria:

O ato comercializado infringe dever funcional, é ilegítimo, pois, o ato. Ex: solicitar

vantagem para facilitar fuga de preso.

b) imprópria:

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O ato comercializado é legítimo, não infringindo o dever funcional. Ex: solicitar vantagem

para votar com o governo. É o caso do Mensalão.

Art. 317, § 1º. – É uma majorante e não qualificadora.

Se há a concretização do que foi comercializado (omissão ou ação) a pena é majorada.

Ex. pessoa pede dinheiro para retardar uma citação. Se receber e retardar a diligência,

incide a majorante.

§ 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou

promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica

infringindo dever funcional.

IMPORTANTE: Não incide a majorante quando o ato comercializado configurar crime

autônomo. Há concurso de crimes e não incide a majorante.

Se o funcionário público solicita, recebe ou aceita a promessa, fica configurado o art. 317,

caput. Mas se não somente solicita, aceita ou recebe, mas retarda ou deixa de praticar

ou praticado ato de ofício infringindo o seu dever funcional, o crime é o do § 1.º, ou seja,

a pena é aumentada de 1/3.

Quando a concretização do ato comercializado configura delito autônomo, não se pode

aplicar o delito autônomo mais o aumento, sob pena de se incorrer em bis in idem.

Ex: funcionário quer R$ 100.000,00 para excluir as multas do sistema do DETRAN. Se as

multas forem excluídas é caso de crime autônomo (art. 313-A). Responde-se, pois, pelo

art. 317 mais o art. 313-A, sem o aumento do § 1.º do art. 317.

Somente a corrupção ativa própria pode ser majorada.

Art. 317 § 2º:

§ 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de

dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem:

Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.

Trata da corrupção passiva privilegiada (“funcionário macaco gordo”).

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O art. 317, § 2.º pune os famigerados favores administrativos.

Art. 317 § 2º. Corrupção passiva

privilegiada

Art. 319 – Prevaricação.

Cede a pedido ou influência de

outrem

Espontânea (sem pedido ou influência

de ninguém, não há interferência

externa).

O funcionário não busca satisfazer

interesse ou sentimento pessoal, mas

sim busca satisfazer interesse de

outrem.

O funcionário busca satisfazer

interesse ou sentimento pessoal.

Ex: delegado não instaura inquérito porque o sujeito é seu amigo. Tal conduta configura o

crime de prevaricação.

Ex: policial rodoviário que faz vista grossa por excesso de velocidade cometido por

autoridade (juiz, promotor), pratica o crime de corrupção passiva privilegiada (art. 317, §

2.º).

A corrupção passiva privilegiada é crime material.

Corrupção passiva antecedente e consequente:

a) antecedente:

O agente primeiro solicita, recebe ou aceita a promessa para, no segundo momento,

concretizar o comportamento comercializado.

b) subsequente:

O sujeito primeiro concretiza o ato a ser, no futuro, comercializado.

Em segundo momento o agente solicita, recebe ou aceita a promessa.

As duas formas, antecedente e subsequente, configuram crime.

Na corrupção subsequente, por exemplo, promotor que faz o júri não pode receber

garrafa de whisky de presente. Cestas de fim de ano não configuram o crime.

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A corrupção ativa também pode ser antecedente ou consequente.

Na ativa antecedente, primeiro se oferece, promete para determinar a prática de um

ato.

Na corrupção ativa subsequente, primeiro se realiza o ato para, depois, oferecer ou

prometer a vantagem.

Apenas a corrupção ativa antecedente é crime. A subsequente é fato atípico.

O crime é punido a título de dolo, acrescido do elemento subjetivo, que é a “obtenção

da indevida vantagem”.

Consumação:

Nas modalidades solicitar e aceitar promessa, o crime é formal. Já na modalidade

receber, o crime é material.

Tentativa:

A doutrina afirma que só admite tentativa na modalidade solicitar por escrito.

PREVARICAÇÃO IMPRÓPRIA:

Art. 319-A. Deixar o Diretor de Penitenciária e/ou agente público, de cumprir seu dever de

vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a

comunicação com outros presos ou com o ambiente externo: (Incluído pela Lei nº 11.466,

de 2007).

Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.

A pena desse crime é pequena ao extremo. O princípio da proporcionalidade possui dois

ângulos de analise:

- para evitar o excesso, ou seja, a hipertrofia da punição.

- evitar a insuficiência da intervenção estatal, ou seja, a impunidade.

Há doutrinadores que afirmam que essa pena fere o princípio da proporcionalidade.

O segundo ângulo do princípio da proporcionalidade não permite ao juiz aplicar pena

mais grave.

Assim, enquanto a pena não for alterada pelo legislador, o juiz é obrigado a aplicar a

pena do CP, sob pena de infringência ao princípio da reserva legal.

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O bem jurídico tutelado primário é a moralidade administrativa. Já o bem jurídico

secundário é segurança interna e externa dos presídios.

O sujeito ativo é o diretor de penitenciário, o agente público. Houve um erro do legislador,

porque não pode haver um diretor de penitenciária sem que seja agente público.

Não basta ser agente público, mas sim deve ser o sujeito ativo o agente público com o

dever de vedar ao preso o acesso aos aparelhos celulares.

O tipo penal abrange o diretor de manicômio judiciário?

Diretor de manicômio não está abrangido. O alvo da lei foi evitar o celular para o preso.

Não consta medida de segurança, logo não abrande o diretor de manicômio judiciário.

O mesmo raciocínio vale para a FEBEM.

Preso que recebe o telefone celular pratica falta grave prevista no art. 50, VII da LEP.

E o particular que introduz o aparelho no ambiente carcerário? Responde por qual crime?

Por enquanto á fato atípico. Mas já há projeto de lei, com pena prevista de 1 a 4 anos.

Sujeito passivo:

O primário é o Estado. O Secundário é a coletividade, a sociedade em geral.

Condutas do art. 319-A:

- deixar:

Trata-se de crime omissivo puro.

- agente público:

- cumprir seu dever de vedar ao preso:

Deve ter o dever funcional de vedar ao preso o acesso a aparelho de comunicação.

- acesso a aparelho de comunicação com outros presos ou com o ambiente externo.

Não se trata apenas de celular, mas qualquer aparelho de comunicação.

Mas se o próprio funcionário público é quem entrega o celular? Ou se vê o preso com o

aparelho e nada faz? Se o funcionário, ao invés de apenas permitir o acesso ao aparelho,

pessoalmente entregá-lo ou deixar de retirar do preso aparelho que já está em sua posse?

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A expressão “acesso ao aparelho” deve ser interpretada considerando o seu real

alcance, abrangendo a entrega e a não retirada. É a posição de Nucci.

O crime do art. 319-A é punido a título de dolo. O art. 319 (prevaricação própria) pune o

dolo mais a satisfação do interesse pessoal.

Já o art. 319-A, que pune a prevaricação imprópria, só pune o crime a título de dolo, sem

finalidade especial. Justamente por isso que o crime se chama prevaricação imprópria.

Consumação:

Com a mera omissão do dever, sendo dispensável o efetivo acesso do preso ao aparelho.

Tentativa:

Por ser crime omissivo puro, é crime unissubsistente, logo não admite tentativa.

Procedimento em casos de crimes funcionais:

Há quatro procedimentos possíveis, os quais a seguir serão descritos.

Crime afiançável Crime

inafiançável

Crime de menor

potencial

ofensivo

O Autor possui

prerrogativa de

foro

Denúncia; defesa

preliminar (art.

514 do CPP);

recebimento da

denúncia;

procedimento

ordinário.

Denúncia;

recebimento da

denúncia;

procedimento

ordinário

Lei 9.900/95 Lei 8.038/90

Art. 514. Nos crimes afiançáveis, estando a denúncia ou queixa em devida forma, o juiz

mandará autuá-la e ordenará a notificação do acusado, para responder por escrito,

dentro do prazo de quinze dias.

Parágrafo único. Se não for conhecida a residência do acusado, ou este se achar fora da

jurisdição do juiz, ser-lhe-á nomeado defensor, a quem caberá apresentar a resposta

preliminar.

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A defesa preliminar se aplica ao particular, co-autor ou partícipe do crime?

É exclusiva de funcionário público na ativa, no momento de sua concessão. Se o servidor

já está aposentado ou já foi exonerado, não há que se falar em defesa preliminar.

E se o juiz omite a defesa preliminar, o que ocorre?

- a primeira corrente entende que é caso de nulidade absoluta, podendo ser alegada a

qualquer momento, presumindo-se o prejuízo. É a posição do STF.

- a segunda corrente entende que é caso de nulidade relativa, devendo ser alegada no

momento oportuno, comprovando-se o prejuízo.

- a terceira corrente entende que a defesa preliminar é dispensável quando a denúncia

vem acompanhada por inquérito policial. Trata-se da súmula 330 do STJ:

Súmula 330: �É desnecessária a resposta preliminar de que trata o artigo 514 do Código

de Processo Penal, na ação penal instruída por inquérito policial.

O STF já se posicionou no sentido de que essa súmula é inconstitucional. Adota a Corte Suprema a primeira corrente. Por conta disso, o STJ está analisando o cancelamento dessa súmula.