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DIREITO PENAL COMUM E DIREITO PENAL ESPECIAL. DIREITO PENAL MILITAR Celio Lobão 1 A doutrina divide o direito penal em especial e comum e, dentre as diversas correntes que procuram extremá-los, destaca-se aquela exposta, no Brasil, por Frederico Marques e seguida, além de outros, por Damásio de Jesus: “O critério para essa diversificação está no órgão encarregado de aplicar o direito objetivo. Como escreve José Frederico Marques, direito comum e direito especial, dentro do nosso sistema político, são categorias que se diversificam em razão do órgão que deve aplicá- los jurisdicionalmente. Este é o melhor critério para uma distinção precisa, pelo menos no que tange ao direito penal: se a norma objetiva somente se aplica por meio de órgãos especiais constitucionalmente previstos, tal norma agendi tem caráter especial; se a sua aplicação não demanda jurisdições próprias, mas se realiza pela justiça comum, sua qualificação será a de norma penal comum.” (Damásio de Jesus, Dir. Pen., 1º vol., pág. 8, Saraiva, 1982). Prosseguindo, acrescenta que, no “Brasil, o Direito Penal militar pode ser indicado como Direito Penal especial, pois a sua aplicação se realiza por meio da justiça penal militar.” (Damásio de Jesus, opus pag. cits.). Jorge Alberto Romeiro, dentro dessa orientação, sustenta que “esse caráter especial lhe advém ainda de, em nosso país, a Constituição Federal atribuir com exclusividade aos órgãos da justiça castrense, que especialmente prevê (art. 122), o processo e o julgamento dos crimes militares definidos em lei (arts. 124 e 125, § 4º).” (Curso Dir. Pen. Mil., pág. 5, Saraiva, 1994). Noronha, na mesma linha: “A nosso ver, o melhor critério que extrema o Direito Penal comum dos outros é o da consideração do órgão que os deve aplicar jurisdicionalmente.” (Magalhães Noronha, Dir. Pen., 1º vol., pág. 12) Nessa distinção se apoiam os seguidores da doutrinária processualista que, segundo o professor Magalhães da Rocha, “não oferece critério aceitável cientificamente, tendo em vista a separação nítida dos conceitos de tipos de ilícitos e de jurisdição”. (Revista do STM, n.º 1, pág. 203) Classificar o direito penal especial em função do órgão judiciário encarregado de aplicar o direito objetivo, demonstra evidente confusão entre Direito Penal especial e Direito Processual Penal especial, talvez em razão de existir, igualmente, Direito Processual Penal comum e Direito Processual Penal especial, que se diversificam porque o “primeiro é aquele que se aplica a todos os sujeitos, regulamentado pela legislação geral, enquanto que o segundo resulta de uma legislação especial, intuitu personæ ou ratione materiæ, tendo uma esfera de aplicação limitada.” (Romeu de Campos Barros, Sistema Proc. Pen. Bras., vol. I, pág. 9, n.º 10). De forma precisa, distingue Romeu de Campos Barros: “o processo penal especial se contrapõe ao processo penal comum, apresentando modificações na estrutura do procedimento ou em razão do órgão judiciário encarregado do julgamento, ou, ainda, em função da tutela jurídica de direito material; e, finalmente, tendo em consideração a própria situação subjetiva dos sujeitos processuais.” (Romeu de Campos Barros, Sistema Proc. Pen. Bras., vol., II, pág. 206, n.º 1183). Esclarece, ainda, o mesmo autor, que “o ordenamento processual vigorante apresenta, com distinção em características próprias, tendo em vista o bem jurídico tutelado pelo direito material e a especialidade do órgão jurisdicional perante o qual se desenvolve o processo, o direito processual penal militar e o direito processual 1 Juiz Corregedor da Justiça Militar Federal aposentado

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DIREITO PENAL COMUM E DIREITO PENAL ESPECIAL. DIREITO PENAL MILITAR

Celio Lobão1

A doutrina divide o direito penal em especial e comum e, dentre as diversas correntes que procuram extremá-los, destaca-se aquela exposta, no Brasil, por Frederico Marques e seguida, além de outros, por Damásio de Jesus: “O critério para essa diversificação está no órgão encarregado de aplicar o direito objetivo. Como escreve José Frederico Marques, direito comum e direito especial, dentro do nosso sistema político, são categorias que se diversificam em razão do órgão que deve aplicá-los jurisdicionalmente. Este é o melhor critério para uma distinção precisa, pelo menos no que tange ao direito penal: se a norma objetiva somente se aplica por meio de órgãos especiais constitucionalmente previstos, tal norma agendi tem caráter especial; se a sua aplicação não demanda jurisdições próprias, mas se realiza pela justiça comum, sua qualificação será a de norma penal comum.” (Damásio de Jesus, Dir. Pen., 1º vol., pág. 8, Saraiva, 1982). Prosseguindo, acrescenta que, no “Brasil, o Direito Penal militar pode ser indicado como Direito Penal especial, pois a sua aplicação se realiza por meio da justiça penal militar.” (Damásio de Jesus, opus pag. cits.).

Jorge Alberto Romeiro, dentro dessa orientação, sustenta que “esse caráter especial lhe advém ainda de, em nosso país, a Constituição Federal atribuir com exclusividade aos órgãos da justiça castrense, que especialmente prevê (art. 122), o processo e o julgamento dos crimes militares definidos em lei (arts. 124 e 125, § 4º).” (Curso Dir. Pen. Mil., pág. 5, Saraiva, 1994). Noronha, na mesma linha: “A nosso ver, o melhor critério que extrema o Direito Penal comum dos outros é o da consideração do órgão que os deve aplicar jurisdicionalmente.” (Magalhães Noronha, Dir. Pen., 1º vol., pág. 12)

Nessa distinção se apoiam os seguidores da doutrinária processualista que, segundo o professor Magalhães da Rocha, “não oferece critério aceitável cientificamente, tendo em vista a separação nítida dos conceitos de tipos de ilícitos e de jurisdição”. (Revista do STM, n.º 1, pág. 203)

Classificar o direito penal especial em função do órgão judiciário encarregado de aplicar o direito objetivo, demonstra evidente confusão entre Direito Penal especial e Direito Processual Penal especial, talvez em razão de existir, igualmente, Direito Processual Penal comum e Direito Processual Penal especial, que se diversificam porque o “primeiro é aquele que se aplica a todos os sujeitos, regulamentado pela legislação geral, enquanto que o segundo resulta de uma legislação especial, intuitu personæ ou ratione materiæ, tendo uma esfera de aplicação limitada.” (Romeu de Campos Barros, Sistema Proc. Pen. Bras., vol. I, pág. 9, n.º 10).

De forma precisa, distingue Romeu de Campos Barros: “o processo penal especial se contrapõe ao processo penal comum, apresentando modificações na estrutura do procedimento ou em razão do órgão judiciário encarregado do julgamento, ou, ainda, em função da tutela jurídica de direito material; e, finalmente, tendo em consideração a própria situação subjetiva dos sujeitos processuais.” (Romeu de Campos Barros, Sistema Proc. Pen. Bras., vol., II, pág. 206, n.º 1183).

Esclarece, ainda, o mesmo autor, que “o ordenamento processual vigorante apresenta, com distinção em características próprias, tendo em vista o bem jurídico tutelado pelo direito material e a especialidade do órgão jurisdicional perante o qual se desenvolve o processo, o direito processual penal militar e o direito processual

1 Juiz Corregedor da Justiça Militar Federal aposentado

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penal eleitoral. Ambos são regulados por legislação especial e aplicados por uma justiça também especial.” (Romeu Campos Barros, Sistema Proc. Pen. Bras, vol. II, pág. 207, n.º 1187).

Finalmente, conclui que “a especialidade do processo pode não levar em conta a especialidade da Justiça. Assim, numa outra divisão, vamos encontrar normas de processo reguladas nas chamadas leis extravagantes, estabelecendo procedimentos especiais para determinadas infrações penais, mas que são aplicadas pela justiça comum.” (Romeu Campos Barros, Sistema Proc. Pen., opus cit., pág. 208, n.º 1189).

Logo, se a justiça especial não serve de critério único e determinante do processo penal especial porque, como vimos, na justiça comum pode, igualmente, tramitar processo penal especial, com muito mais razão não serve para extremar o Direito Penal comum do Direito Penal especial, mesmo porque, como acentua o destacado processualista, a especialização do direito processual penal militar, a exemplo do direito penal especial, resulta não somente da especialidade do órgão jurisdicional e sim, principalmente, do bem jurídico objeto da tutela penal.

Como afirma o próprio Frederico Marques, “o Direito Processual (civil ou penal) tem por objeto nuclear e principal, a jurisdição, isto é, a função que o Estado exerce para resolver um litígio ou lide. Para exercer a jurisdição penal, o juiz aplica o Direito Penal, que é assim o instrumento de que se vale para dar solução ao litígio penal. Diante disso, dúvida não pode haver de que o Direito Penal tem objeto próprio e o Direito Processual Penal, igualmente. O primeiro conceitua e estrutura juridicamente o crime e estabelece a sanção a que dá lugar a prática de ato delituoso: o segundo regula o exercício da jurisdição, para a resolução da lide. Crime, sanção penal e a respectiva ligação, eis o objeto do Direito Penal; jurisdição, processo e resolução da lide penal, eis o objeto do Direito Processual Penal.” (Frederico Marques, Trat. Dir. Proc. Pen., 1º vol., pág. 34).

Portanto, se o Direito Penal e o Direito Processual Penal têm objeto próprio, um trata do “crime, sanção penal e a respectiva ligação”, o outro, da “jurisdição, processo e resolução da lide penal”, como é possível que o último determine a classificação do primeiro como Direito Penal comum ou especial? Como diz Magalhães da Rocha, já citado, “a separação nítida dos conceitos de tipos de ilícitos e de jurisdição” torna inaceitável a corrente doutrinária supra citada.

Em face do direito positivo brasileiro, o órgão jurisdicionalmente não serve para diversificar o Direito Penal comum do especial. Tomando-se como exemplo a Lei n.º 1.802, de 5 de janeiro de 1953, editada sob a égide da Constituição de 1646, na qual os delitos nela previstos contra a vida, a incolumidade e a liberdade das autoridades das Forças Armadas, dos comandantes de unidades militares federais e estaduais (art. 6º, b, c/c o art. 42), bem como, “constituírem manterem os partidos, associações em geral ou mesmo, o particular, milícias ou organizações de tipo militar” (art. 24, c/c o art. 42), a posse, a guarda, a importação, etc., de câmera aerofotográfica, sem licença da autoridade competente (art. 28, c/c o art. 42) “demandavam jurisdição própria”, no caso, a Justiça Militar, enquanto outros, na grande maioria, delitos especiais (p. expl., subverter, por meios violentos, a ordem política e social, com o fim de estabelecer ditadura de classe social, de grupo ou de indivíduo” – art. 2º, IV)), situavam-se sob a jurisdição penal comum. Portanto, determinados crimes comuns julgados pela justiça especial e infrações penais especiais julgadas pela justiça comum!

O mesmo pode ser dito em relação ao roubo, seqüestro, incêndio (art. 28 do Dl. 898/69), além de outros, que não adquiriram a qualidade de norma penal especial, embora, em conformidade com o Ato Institucional n.º 2, de 1965, e,

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posteriormente, o art. 122, § 1º da Constituição de 1967, sua repressão demandasse jurisdição especial — Justiça Militar — e não comum.

O direito penal militar francês serve para demonstrar a falta de consistência da doutrina supra mencionada. A França extinguiu a Justiça Militar em seu território, mas autorizou sua manutenção junto às tropas estacionadas ou operando fora do território francês. Resultou a situação seguinte: a) estão sujeitos à jurisdição comum os crimes militares cometidos no território francês e aqueles cometidos por militares estacionados ou em operação em país estrangeiro; b) estão sujeitos à jurisdição especial, jurisdição militar, os crimes militares e os comuns de qualquer natureza, cometidos por militares integrantes de tropas estacionadas ou em operação em país estrangeiro ou por civis que nelas prestam serviço (conf. arts. 1º, alín. 1ª, 3, 5, 59, 60, do Cód. de Just. Militar francês).

Portanto, no direito francês, como acontece no brasileiro, o direito penal comum e o especial não se difersificam em razão do órgão que deve aplicá-los jurisdicionalmente. Lá, como aqui, a jurisdição comum aplica direito especial e a jurisdição especial aplica direito comum. Dessa forma, o critério do órgão encarregado da aplicação do direito objetivo não se presta para identificar o direito penal especial.

Expõe Esmeraldino Bandeira: “Crime comum ou de direito comum é o que consiste na violação dos deveres gerais impostos pela lei penal a todos os indivíduos, indistintamente. Crime especial é o que resulta da infração de certos deveres impostos pela referida lei a determinadas pessoas em virtude de uma situação, de um cargo ou de uma profissão; deveres que assim existem para uns e não existem para outros.”( Esmeraldino Bandeira, Dir. Just. Proc. Mil., 1º vol., pág. 17)

Dentro dessa orientação, Nelson Hungria: “Crimes comuns e especiais (ou próprios...): comuns são os que podem ser praticados por qualquer pessoa; especiais os que pressupõem no agente uma particular qualidade ou condição pessoal, que pode ser de cunho social (ex.: funcionário público, militar, comerciante, empregador, empregado, médico) ou natural (mulher, mãe, ascendente, descendente). Assim, são crimes especiais os funcionais, ou puramente militares, o crime falimentar próprio, a parede (greve), o auto-aborto, o infanticídio, o crime do art. 302, o abandono de família.” (Nelson Hungria, Comentários, vol. I, t. II, págs. 53/54).

O saudoso jurista Heleno Fragoso, seguindo Hungria, ensina de maneira concisa: “o direito penal comum é o que se aplica a todos os súditos indistintamente. Especial é o que se aplica apenas a uma classe ou categoria em que se acham. Perante nossa legislação, é Direito Penal especial o Direito Penal Militar”. (Heleno Fragoso, Lições Dir. Pen., Parte Especial, pág. 5)

O magistério de João Mendes de Almeida Júnior, sempre atual, assim distingue o crime comum do crime militar, que denomina delito próprio: “o termo comum tem como correlativo oposto o termo próprio. Assim, delictum commune, delictum proprium — eram expressões usadas pelos clássicos como correlativos opostos. Os crimes distinguem-se, como qualquer ente, quer por seus elementos essenciais, constitutivos da sua espécie, quer por condições particulares, constitutivas da sua individualidade: aqueles elementos são comuns a todos os crimes da mesma espécie, ao passo que estas condições não são comuns a todos e, aliás, são próprias de uma certa classe. Todo o crime supõe um ente humano, uma intenção dolosa, um fato punível, mas há crimes que, além desses elementos essenciais, comuns, são caracterizados por atributos próprios do agente, atributos que os distinguem e individualizam. Assim, por exemplo, ...... os crimes de deserção, indisciplina e outros puramente militares — não são crimes comuns, são próprios da classe militar, por isso

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que o homem, sem a qualidade de militar, não pode cometê-los”. (João Mendes de Almeida Júnior, O Proc. Crim. Bras., pág. 79)

Nessa linha de raciocínio, Augier et Le Poittevin: “Une infraction peut, en second lieu, être spéciale, parce qu’elle suppose la violation de devoirs qui ne sont imposés qu’à une catégorie de personnes à raison de leur état ou de leur situation. En ce sens, toute infraction prévue, soit par le Code pénal, soit par une loi applicable à tous les citoyens, constitue une infraction ordinaire; les infractions spéciales sont celles qui sont prévues par un corps de lois applicables à une catégorie de personnes déterminées.” Prosseguindo, conclui: “C’est ainsi qu’il convient de distinguer des infractions ordinaires, les crimes et délits militaires.” (Augier et Le Poittevin, Dr. Pén. Mil., pág. 24)

Ruy Barbosa, diante do direito positivo da época, ensinava que “precisar a disposição, em que se há de averbar um delito, é declarar o Código, comum ou militar, por onde se julgará. E declarar o Código é determinar o foro; porquanto nem lei militar se executa na jurisdição ordinária, nem lei ordinária na jurisdição militar.” (in Esmeraldino Bandeira, Dir. Just. e Proc. Mil., 1º vol., pág. 112) Logo, segundo o jurista emérito, somente após declarar o Código, após classificar o delito como militar, é que se efetiva a segunda operação, ou seja, a aplicação da norma objetiva “por meio de órgãos especiais constitucionalmente previstos” e não a operação contrária, a de conhecer do órgão especial para depois classificar o crime como militar ou comum!

Chegamos, portanto, à conclusão de que o critério do órgão encarregado da aplicação do direito positivo não se presta para distinguir o direito penal especial do comum. Como assinala Romeu Campos Barros, há crimes especiais que são processados e julgados na justiça comum, por determinação expressa da lei. A recíproca é verdadeira, excepcionalmente o delito comum pode inserir-se na jurisdição da justiça especial, como aconteceu com determinados crimes previstos no Dl. 898/69, na Lei 1.802/53 e ocorre no Código Penal Militar.

Numa formulação mais moderna, Venditti, citado por Jimenez y Jimenez, expõe o que se entende por lei especial: “a) Ley especial es la no contenida en el Código penal común al que, aportando sus particularismos, complementa. Esa vida separada generalmente se justifica por razones formales, de mera técnica legislativa. b) Ley penal especial es también la que se aplica predominantemente a un determinado círculo de personas dotadas de un status singular. La especialidad no se basa siempre en la condición de militar que tenga el sujeto del delito sino en la naturaleza de los bienes jurídicamente protegidos. Por eso no se puede hablar del carácter de personalidad de estas leyes que alguna vez incriminan civiles. c) Ley penal especial en cuanto que constituye una “especie” dentro de la ley general, con unos elementos especializantes que, de no existir, dejarían sin justificar la excepción y darían lugar a que se aplicase sólo la ley general.” (Jimenez y Jimenez, Introd. Der. Pen. Mil., pág. 40)

Em nosso país, a lei penal militar é aplicada por órgão especial constitucionalmente previsto, embora essa circunstância, por si só, não especialize a norma penal, pois esse mesmo órgão especial, como ficou dito anteriormente, já aplicou direito penal comum e continua a fazê-lo, ao conhecer, por exemplo, do homicídio de militar contra militar ou de civil contra militar em serviço ou em local sob administração militar. Nesses e em outros casos, a norma penal é comum, apenas a ocorrência de determinadas circunstâncias expressas no art. 9º, II e III, do CPM, como sujeito ativo e passivo militar, local do crime, época do crime, bem jurídico tutelado, transferem, da justiça comum para a justiça especializada, a competência para aplicação da norma repressiva, sem, contudo, transformá-la em norma penal especial.

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Para concluir, o Direito Penal Militar é especial em razão do bem jurídico tutelado e por aplicar-se, predominantemente, a uma classe ou categoria de indivíduos, ou seja, aos militares.

No entanto, como acentua Venditti, não se pode falar do caráter de personalidade do Direito Penal castrense, porque, excepcionalmente, aplica-se ao civil, nos casos em que assume relevância o objeto da tutela penal, v.g., bens e interesses das instituições militares relacionados com a destinação constitucional e legal das Forças Armadas como acontece, por exemplo, com o serviço militar, no crime de substituição de convocados por outrem, ou com a autoridade e a administração militar, no crime de uso de uniforme militar pelo civil.