direito civil - direitos reais - 2013

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1 DIREITOS REAIS – INTRODUÇÃO 1. Conceito O direito real ou direito das coisas vem a ser um conjunto de normas que regem as relações jurídicas concernentes aos bens materiais ou imateriais suscetíveis de apropriação pelo homem 1 . 2. Teorias sobre a distinção entre direitos reais e pessoais 2.1 teoria unitária realista: procura unificar os direitos reais e obrigacionais a partir do critério do patrimônio, considerando que o direito das coisas e o direito das obrigações fazem parte de uma realidade mais ampla, que seria o direito patrimonial; entretanto, a diversidade de princípios que os orientam dificultam a sua unificação num só sistema; 2.2 teoria dualista ou clássica (mostra-se mais adequada à realidade); partindo- se da concepção dualista, pode-se dizer que o direito real apresenta características próprias que o distinguem dos direitos pessoais ou obrigacionais; 3. Diferenças entre direitos reais e pessoais DIREITOS REAIS DIREITOS PESSOAIS Cabimento Numerus Clausus Numerus apertus Quanto ao sujeito de direitos Tem apenas sujeito ativo Possui sujeito ativo e passivo Quanto à ação Contra quem detiver a coisa. Possui efeito erga omnes. Ação pessoal contra um determinado indivíduo. Quanto ao objeto Coisas corpóreas e incorpóreas. Determinado. Prestação. Pode ser determinável. 1 Conceito baseado na definição de Clóvis Beviláqua.

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Page 1: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

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DIREITOS REAIS – INTRODUÇÃO

1. Conceito

O direito real ou direito das coisas vem a ser um conjunto de normas que

regem as relações jurídicas concernentes aos bens materiais ou imateriais

suscetíveis de apropriação pelo homem1.

2. Teorias sobre a distinção entre direitos reais e pessoais

2.1 teoria unitária realista: procura unificar os direitos reais e

obrigacionais a partir do critério do patrimônio, considerando que o

direito das coisas e o direito das obrigações fazem parte de uma realidade

mais ampla, que seria o direito patrimonial; entretanto, a diversidade de

princípios que os orientam dificultam a sua unificação num só sistema;

2.2 teoria dualista ou clássica (mostra-se mais adequada à realidade);

partindo-se da concepção dualista, pode-se dizer que o direito real

apresenta características próprias que o distinguem dos direitos pessoais

ou obrigacionais;

3. Diferenças entre direitos reais e pessoais

DIREITOS REAIS DIREITOS PESSOAIS

Cabimento Numerus Clausus Numerus apertus

Quanto ao sujeito de

direitos

Tem apenas sujeito

ativo

Possui sujeito ativo e

passivo

Quanto à ação Contra quem detiver a

coisa. Possui efeito

erga omnes.

Ação pessoal contra um

determinado indivíduo.

Quanto ao objeto Coisas corpóreas e

incorpóreas.

Determinado.

Prestação. Pode ser

determinável.

Quanto ao limite limitado ilimitado

Quanto ao modo de gozar

o direito

Supõe exercício direto

entre o titular e a

coisa.

Exige intermediário.

Quanto ao abandono Pode haver. Não pode haver.

1 Conceito baseado na definição de Clóvis Beviláqua.

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Quanto ao direito de

seqüela e preferência

Pode haver. Não pode haver.

Quanto à posse Pode haver. Não pode haver.

Quanto à extinção Conserva-se até que

haja uma situação

contrária em proveito

de outro titular.

Extingue-se pela

inércia.

Quanto à usucapião Se adquire por meio da

usucapião.

Não se adquire por meio

de usucapião.

4. Princípios dos direitos reais

4.1 - princípio da aderência, especialização ou inerência – estabelece um

vínculo ou uma relação entre o sujeito e a coisa, não dependendo da

colaboração de nenhum sujeito passivo para existir.

Nos direitos pessoais, o vínculo obrigacional existente entre credor e

devedor confere ao primeiro o direito de exigir a prestação prometida.

4.2 - princípio do absolutismo (Eficácia Erga Omnes) – os direitos reais

exercem-se "erga omnes" (contra todos), que devem abster-se de molestar o

titular; surge daí o direito de sequela (ou "jus persequendi"), isto é, de

perseguir a coisa e de reivindicá-la em poder de quem quer que esteja (ação

real), bem como o direito de preferência (ou "jus praeferendi").

Os direitos obrigacionais, por não estabelecerem vínculos dessa natureza,

resolvem-se em perdas e danos e não se exercem contra todos, mas em face de

um ou alguns sujeitos determinados (ação pessoal).

4.3 - princípio da publicidade ou da visibilidade – os direitos reais sobre

imóveis só se adquirem depois da transcrição no Registro de Imóveis, do

respectivo título; sobre móveis, só depois da tradição; sendo oponíveis

"erga omnes", faz-se necessário que todos possam conhecer os seus titulares

para não molestá-los; a transcrição e a tradição atuam como meios de

publicidade da titularidade dos direitos reais.

Os pessoais ou obrigacionais seguem o princípio do consensualismo:

aperfeiçoam-se com o acordo de vontades.

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4.4 - princípio da taxatividade – o número dos direitos reais é limitado,

taxativo (são somente os enumerados na lei - "numerus clausus").

No direito das obrigações não há essa limitação; existe um certo número de

contratos nominados, previstos no texto legal, podendo as partes criar os

chamados inominados; basta que sejam capazes e lícito o objeto; assim,

contrapõe-se à técnica do "numerus clausus" a do "numerus apertus", para a

consecução prática do princípio da autonomia da vontade.

4.5 - princípio da tipificação ou tipicidade – os direitos reais existem de

acordo com os tipos legais; são definidos e enumerados determinados tipos

pela norma, e só a estes correspondem os direitos reais, sendo pois seus

modelos.

Nos obrigacionais, ao contrário, admitem-se, ao lado dos contratos típicos,

os atípicos, em número ilimitado.

4.6 - princípio da perpetuidade – a propriedade é um direito perpétuo, pois

não se perde pelo não-uso, mas somente pelos meios e formas legais:

desapropriação, usucapião, renúncia, abandono etc.

Já os direitos obrigacionais, pela sua natureza, são eminentemente

transitórios: cumprida a obrigação, extinguem-se; não exigido o seu

cumprimento dentro de certo lapso de tempo, prescrevem.

4.7 - princípio da exclusividade – não pode haver dois direitos reais, de

igual conteúdo, sobre a mesma coisa; no caso do usufruto, por ex., o

usufrutuário tem direito aos frutos enquanto o nu-proprietário conserva o

direito à substância da coisa; no condomínio, cada consorte tem direito a

porções ideais, distintas e exclusivas.

4.8 - princípio do desmembramento – conquanto os direitos reais sobre

coisas alheias tenham possivelmente mais estabilidade do que os

obrigacionais, são também transitórios; desmembram-se do direito matriz,

que é a propriedade, constituindo os direitos reais sobre coisas alheias;

quando estes se extinguem, o poder que residia em mão de seus titulares

(como no caso de morte do usufrutuário) retorna novamente às mãos do

proprietário (princípio da consolidação).

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5. Características dos direitos reais

5.1 Direito de Sequela

É o vínculo de subordinação da coisa e da pessoa. Esse vínculo vem

alicerçado em dois princípios:

- Princípio da aderência: segundo o qual o titular do direito real pode ir

atrás do bem aonde quer que ele se encontre (princípio positivo);

- Princípio da ambulatoriedade: segundo o qual todos os ônus da coisa (ex.

tributos, despesas condominais) a acompanham (princípio negativo).

5.2 Privilégio

O crédito real não se submete à divisão, tendo em vista a existência de

ordem entre os credores. Aquele que primeiro apresentar o crédito será o

credor privilegiado.

5.3 Prescrição Aquisitiva

Somente no direito real a passagem do tempo poderá gerar aquisição de

direitos.

5.4 Bem certo, determinado e existente

Em decorrência do princípio da veracidade registral, o bem deve ter

características de certo, determinado e existente.

6. Classificação dos Direitos Reais

1ª CLASSIFICAÇÃO

6.1 Direito real sobre coisa própria

O único direito real sobre coisa própria é a propriedade, que confere o

título de dono ou domínio. Normalmente, a propriedade é ilimitada ou plena,

conferindo poderes de uso, gozo, posse, reivindicação e disposição.

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6.2 Direito real sobre coisa alheia

É o desmembramento do direito real sobre coisa própria. Poderá somente ser

temporário, visto que, dentro do princípio da elasticidade, a coisa tende a

voltar à situação original, que é a propriedade plena. Divide-se em três

grupos:

Direito real de fruição: é o desmembramento em relação ao uso da coisa.

Pode ser enfiteuse, servidão, usufruto, uso e habitação.

Direito real de garantia: é o desmembramento em relação à disposição da

coisa (limita o direito de dispor da coisa). Se não cumprida a obrigação

principal, o credor irá dispor da coisa. Pode ser hipoteca, penhor e

anticrese.

Direito real de aquisição: é o desmembramento do direito de aquisição. O

titular transmite a propriedade para terceiros, paulatinamente. Pode ser

compromisso irretratável de compra e venda, e alienação fiduciária em

garantia.

2ª CLASSIFICAÇÃO

a) Propriedade: Direito de posse, uso, gozo e disposição.

b) Posse: Exteriorização do domínio.

c) Enfiteuse: Direito de posse, uso, gozo e disposição sujeitos à restrição

oriunda de direito alheio.

d) Direitos reais de garantia: penhor, hipoteca e anticrese.

e) Direito real de aquisição: promessa irrevogável de venda e alienação

fiduciária.

f) Direito de usar e gozar do bem sem disposição: usufruto, uso, habitação,

servidão e enfiteuse.

g) Direito limitado a certas utilidades do bem: servidão, uso e habitação.

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POSSE

1. Teorias quanto ao conceito e seus elementos constitutivos

- Significados impróprios

- Teoria subjetiva de Savigny – posse é o poder de uma pessoa sobre uma

coisa, com a intenção de tê-la para si; ela se caracteriza pela conjugação

do elemento objetivo "corpus" (é a mera possibilidade de exercer um contato

físico com a coisa, tendo sempre a coisa a sua disposição; assim, não o

perde o dono do veículo que entrou no cinema e deixou-o no estacionamento)

e o elemento subjetivo "animus" (é a vontade de ser proprietário).

Vemos que a teoria subjetiva, extremamente importante no século XIX, pecou

em não conseguir desatrelar a posse da propriedade, pois só considerava

possuidor o sujeito que tinha intenção de se tornar o proprietário, o que,

como será demonstrado não é verdade.

Para esta teoria são meros detentores: o locatário, o comodatário, o

depositário, o mandatário, etc.

Vide o confronto dos arts. 1.204 e 1.223 do CCB/02.

- Teoria objetiva de Ihering (é a adotada, em regra, pelo Direito Civil

Brasileiro) – tem posse aquele que age em relação à coisa como se fosse

proprietário, mesmo que não o seja, independentemente da intenção; para a

caracterização da posse basta o elemento objetivo "corpus" (não significa

contato físico com a coisa, mas sim conduta de dono); considera o elemento

subjetivo "animus" como já incluído no elemento objetivo "corpus"; posse é

a exteriorização da propriedade, a visibilidade do domínio, o uso econômico

da coisa; ex.: material de construção próximo a obra, indica posse; maço de

cigarro próximo a obra, não indica posse.

Para o direito brasileiro, para que haja posse, além dos elementos

constitutivos apontados por Ihering, deve conter na relação possessória,

como ato jurídico que é:

a) sujeito capaz (pessoa natural ou jurídica);

b) objeto (coisa corpórea ou incorpórea – ex. propriedade intelectual);

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c) uma relação de subordinação entre o sujeito e o objeto, um ter da coisa

por parte do sujeito.

A critica que pode ser feita a teoria objetiva diz respeito ao fato de o

possuidor ser protegido, em alguns casos, em detrimento do próprio

proprietário, ante o fato de a posse ser independente da propriedade.

Ihering assume a critica, informando que é o preço que se paga pela

autonomia da posse. O intruso, portanto, muitas vezes pode ser protegido em

prejuízo do verdadeiro proprietário.

2. Conceito

1. É a detenção de uma coisa em nome próprio;

2. É a conduta de dono (Ihering - cuja teoria o Direito Civil Brasileiro

acolheu = Teoria objetiva;

3. Considera-se possuidor "todo aquele que tem de fato o exercício, pleno,

ou não, de algum dos poderes inerentes ao domínio, ou propriedade" (art.

1.196). Os arts. 1.198 e 1.208 complementam o conceito de posse.

3. Posse e detenção

- Há situações em que uma pessoa não é considerada possuidora, mesmo

exercendo poderes de fato sobre uma coisa; isso acontece quando a lei

desqualifica a relação para mera detenção, como faz no artigo 1.198.

- Embora, portanto, a posse possa ser considerada uma forma de conduta que

se assemelha à de dono, não é possuidor o servo na posse, aquele que a

conserva em nome de outrem ou em cumprimento de ordens ou instruções

daquele em cuja dependência se encontre (fâmulos da posse).

- O possuidor exerce o poder de fato em razão de um interesse próprio; o

detentor, no interesse de outrem - exemplos de detenção: caseiros e todos

aqueles que zelam pela propriedade em nome do dono, soldado em relação às

armas no quartel, preso em relação às ferramentas com que trabalha (tais

servidores, não têm posse e não lhes assiste o direito de invocar, em nome

próprio, a proteção possessória; são chamados de "fâmulos da posse"; embora

não tenham o direito de invocar, em seu nome, a proteção possessória, não

se lhes recusa, contudo, o direito de exercer a autoproteção do possuidor,

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quanto às coisas confiadas a seu cuidado, consequência natural de seu dever

de vigilância);

- Não induzem posse, também, os atos de mera permissão ou tolerância (art.

1.208). Ex: permissão para passar pelo jardim do vizinho e garagem

emprestada;

- Não há posse de bens públicos (CF - proibi o usucapião especial), o uso

do bem pelo particular não passa de mera detenção consentida.

4. Objeto da posse :

a) Bens corpóreos, salvo as que estiverem fora do comércio, ainda que

gravadas com cláusula de inalienabilidade;

b) Coisas acessórias se puderem ser destacadas da principal sem alteração

de sua substância;

c) Coisas coletivas;

d) Direitos reais de fruição: uso, usufruto, habitação e servidão (há

dúvida quanto à enfiteuse);

e) Direitos reais de garantia: penhor, hipoteca e anticrese.

f) Direitos pessoais patrimoniais ou de crédito. (vide o que diz Maria

Helena Diniz)

5. Natureza Jurídica

Não é pequena a controvérsia sobre essa natureza, podendo ser apresentados

os seguintes pensamentos, divididos em três correntes principais.

Uma primeira corrente proclama ser a posse um fato. Entre os defensores

dessa tese está o jurista Clovis Beviláqua, que afirma ser a posse mero

estado de fato, protegida em atenção à propriedade, por sua manifestação

exterior. Modernamente, Silvio Rodrigues sustenta a mesma orientação.

A segunda corrente defende a tese de que a posse é um direito e tem como um

de seus grandes defensores Ihering. O jurista alemão afirma que direito é

todo interesse juridicamente protegido. Por estar a posse amparada por lei,

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ela é um direito. Na verdade, a posse é um estado de fato com proteção

jurídica. Ademais, o exercício possessório também é uma situação de fato.

Entre os adeptos de que a posse é um direito, ainda surge a dúvida se é um

direito pessoal ou direito real. Não são poucos os que afirmam ser a posse

um direito real, por gerar oponibilidade erga omnes. Outros dizem que é um

direito pessoal, pela ausência de registro.

Uma terceira corrente defendida por Savigny, afirma que a posse é

simultaneamente um fato e um direito. Segundo essa visão, a existência da

posse independe de qualquer regra de direito, mas é direito na medida em

que produz efeitos jurídicos. Como direito, a posse estaria entre os

direitos pessoais.

1. ESPÉCIES DE POSSE

1.1 Quanto à extensão da garantia possessória (art. 1.196 e 1.197):

- direta (ou imediata) – é a exercida diretamente pelo possuidor sobre a

coisa.

- indireta (ou mediata) – é aquela que o proprietário conserva, por ficção

legal, quando o exercício da posse direta é conferido a outrem, em virtude

de contrato ou direito real limitado.

- ex.: o locatário, o depositário e o usufrutuário exercem a posse direta;

o proprietário a posse indireta.

- uma não anula a outra; ambas coexistem no tempo e no espaço e são

jurídicas ("jus possidendi"), não autônomas, pois implicam o exercício de

efetivo direito sobre a coisa;

- o possuidor direto e o indireto podem invocar a proteção possessória

contra terceiros, mais só este pode adquirir a propriedade em virtude do

usucapião.

1.2 Quanto à simultaneidade do exercício da posse – Composse (arts. 1.199):

Composse: situação pela qual duas ou mais pessoas exercem, simultaneamente,

poderes possessórios sobre a mesma coisa. Art. 1.199. Ex: adquirentes de

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coisa comum, marido e mulher em regime de comunhão de bens ou co-herdeiros

antes da partilha.

Qualquer dos possuidores pode valer-se dos interditos possessórios ou da

legítima defesa;

Não confundir com concorrência de posses (posses de naturezas distintas,

ex. posse direta e indireta sobre um mesmo bem);

Composse pro-diviso: há uma divisão de fato para a utilização pacífica

do direito de cada um. Aqui, exercendo os possuidores poderes apenas sobre

parte da coisa definida, e estando tal situação consolidada há mais de ano

e dia, poderá cada qual recorrer aos interditos contra aquele composse que

atentar contra tal exercício. Em relação a terceiros, qualquer composse

poderá impedir sua atitude, como ocorrem nos condomínios.

Composse pro-indiviso: todos exercem o direito de possuidor ao mesmo

tempo sobre a totalidade da coisa;

1.3 Q uanto aos vícios objetivos :

a. justa – é a não violenta, clandestina ou precária, ou seja, a adquirida

legalmente, sem vício jurídico externo.

b. injusta – é aquela que se reveste dos vícios acima apontados; mesma

viciada, porém, será justa, suscetível de proteção em relação às demais

pessoas estranhas ao fato.

c. violenta ("vi") – é a que se adquire pela força física ou violência

moral.

d. clandestina ("clam") – é a que se estabelece às ocultas daquele que tem

interesse em conhecê-la.

e. precária ("precario") – é quando o agente nega-se a devolver a coisa que

lhe foi emprestada com a condição de ser restituída assim que o

proprietário a solicitar; é a que se origina do abuso de confiança, por

parte de quem recebe a coisa com o dever de restituí-la (esta posse é justa

na sua origem e se torna injusta no ato da remessa de devolver a coisa).

- ex.: o invasor de um imóvel abandonado deterá a posse violenta se

expulsar à força o antigo ocupante; se nele penetrar furtivamente, terá a

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posse clandestina; se ficou de guardá-lo, mas nele se instalou sem

autorização do dono, terá a posse precária.

- a violenta e a clandestina, convalescem e se tornam justa uma vez cessada

a violência ou a clandestinidade.

- a precária não convalesce, jamais se tornará justa.

Princípio geral sobre o caráter da posse: Pelo art. 1.203 do CCB há

presunção juris tantun de que a posse guarda o mesmo caráter de sua

aquisição, salvo, se. p. ex. o adquirente a título clandestino ou violento

provar que sua clandestinidade ou violência cessaram há mais de ano e dia,

caso em que a posse passa a ser reconhecida (art. 1.208), já o mesmo não se

pode dizer do vício da precariedade.

1.4 Q uanto à subjetividade :

a. de boa-fé – é quando o possuidor ignora o vício ou o obstáculo que lhe

impede a aquisição da coisa ou do direito possuído (art. 1.201); o

possuidor pensa que a coisa lhe pertence ou não conhece os vícios da posse

- ex.: pessoa que adquire uma coisa furtada, desconhecendo esse detalhe;

quando o possuidor está convicto de que a coisa, realmente, lhe pertence,

ignorando que está prejudicando direito de outrem.

b. de má-fé – quando o possuidor tem conhecimento do vício da posse; é

aquela em que o possuidor tem ciência da ilegitimidade de seu direito de

posse, em razão de vício ou obstáculo impeditivo de sua aquisição (art.

1.202).

Toda posse de má-fé é injusta, mas nem toda posse injusta é de má-fé.

artigo 497 CC – "não induzem posse os atos de mera permissão ou

tolerância, assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou

clandestinos, senão depois de cessar a violência, ou a clandestinidade".

A importância da distinção entre a posse de boa-fé e a de má-fé, implica

na indenização por benfeitorias, exercício do direito de retenção e

indenização no caso de deterioração da coisa.

A posse de boa-fé conserva esta característica até o momento em que o

possuidor toma conhecimento do vício inicial à aquisição da posse.

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A maioria da jurisprudência entende que o possuidor toma conhecimento do

vício na citação ou na contestação; a minoria acha que é na sentença.

1.5 Q uanto à sua idade :

- nova – é a de menos de ano e dia.

- velha – é a de ano e dia ou mais.

- não se deve confundir posse nova com ação de força nova, nem posse velha

com ação de força velha: - para se saber se a ação é de força nova ou

velha, leva-se em conta o tempo decorrido desde a ocorrência da turbação ou

do esbulho; se o turbado ou esbulhado reagiu logo, intentando a ação dentro

do prazo de ano e dia, contando da data da turbação ou do esbulho poderá

pleitear a concessão da liminar (art. 924, CPC), por tratar-se de ação de

força nova; passado esse prazo, no entanto, o procedimento será ordinário,

sem direito a liminar, sendo a ação de força velha; é possível, portanto,

alguém que tenha posse velha ajuizar ação de força nova, ou de força velha,

dependendo do tempo que levar para intentá-la, contado o prazo da turbação

ou do esbulho, assim como também alguém que tenha posse nova ajuizar ação

de força nova ou de força velha.

1.6 Q uanto aos seus efeitos :

- "ad interdicta" – é a que pode ser defendida pelos interditos ou ações

possessórias, quando molestada (ameaçada, turbada, esbulhada ou perdida),

mas não conduz ao usucapião; o possuidor, como o locatário, por ex., vítima

de ameaça ou de efetiva turbação, tem a faculdade de defendê-la ou de

recuperá-la pela ação possessória adequada até mesmo contra o proprietário.

- "ad ucucapionem" – é a que se prolonga por determinado lapso de tempo

estabelecido na lei, deferindo a seu titular a aquisição do domínio; ao fim

de um período de 10 anos entre presentes e de 15 entre ausentes, aliado a

outros requisitos, como o ânimo de dono, o exercício contínuo e de forma

mansa e pacífica, além do justo título e boa-fé, dá origem ao usucapião

ordinário (art. 1.242); quando a posse, com essas características,

prolonga-se por mais de 20 anos, a lei presume o justo título e a boa-fé,

deferindo a aquisição do domínio pelo usucapião extraordinário (art.

1.238).

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1.7 O utras classificações :

- natural – é a que se constitui pelo exercício de poderes de fato sobre a

coisa - ex.: A vende sua casa a B, mas continua no imóvel como inquilino;

não obstante, B fica sendo possuidor da coisa (posse indireta), mesmo

jamais tê-la ocupado fisicamente.

- civil ou jurídica – é a que assim se considera por força da lei, sem

necessidade de atos físicos ou materiais; é a que se transmite ou se

adquire pelo título.

AQUISIÇÃO E PERDA DA POSSE

1. Objetivo

Justifica-se a fixação da data da aquisição da posse por assinalar o início

do prazo da prescrição aquisitiva e do lapso de ano e dia, que distingue a

possa nova da velha.

2. modos de aquisição (art. 1.204):

O legislador, ao contrário do que fez no antigo CC, que se esqueceu do fato

de haver adotado a teoria de Ihering, deixou de lado o rol taxativo dos

modos de aquisição e dispôs no art. 1.204:

“Adquire-se a posse desde o momento em que se torna possível o exercício,

em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade”.

1. Aquisição originária :

a) Conceito: não há relação de causalidade, entre a posse atual e a

anterior; é o que acontece quando há esbulho, e o vício, posteriormente,

convalesce.

b) Modos: arts. 1.196, 1.204 e 1.263.

2. Aquisição derivada :

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a) Conceito: requer existência de posse anterior, ou seja, transmitida ao

adquirente. Ex. herança.

b) Modos:

b.1. Tradição

Pressupõe um acordo de vontades, um negócio jurídico de alienação, quer a

título gratuito, como na doação, quer a título oneroso, como na compra e

venda.

- real – quando envolve a entrega efetiva e material da coisa.

- simbólica – quando representada por ato que traduz a alienação, como a

entrega das chaves do apartamento vendido.

- ficta – no caso do constituto possessório, que ocorre, por ex., quando o

vendedor, transferindo a outrem o domínio da coisa, conserva-a, todavia em

seu poder, mas agora na qualidade de locatário.

b.2. Apreensão

a) Apropriação unilateral de coisa “sem dono” (foi abandonada ou não é de

ninguém);

b) Coisa retirada de outrem sem permissão;

b.3. Exercício de direito

Ex. servidão. Se constituída pela passagem de um aqueduto por terreno

alheio, p. ex. adquire o agente a sua posse se o dono do prédio serviente

permanece inerte pelo prazo de um ano e dia.

(vide art. 1.379)

b.2. Constituto possessório, art. 1.267, parágrafo único

Noção: No constituto possessório, aquele que detém a posse direta não é

mais proprietário da coisa, possuindo-a em nome de outrem.

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Subentende-se a tradição quando o transmitente continua a possuir pelo

constituto possessório; quando cede ao adquirente o direito à restituição

da coisa, que se encontra em poder de terceiro; ou quando o adquirente já

está na posse da coisa, por ocasião do negócio jurídico.

b.3. Acessão

Através da qual a posse pode ser continuada pela soma do tempo do atual

possuidor com o de seus antecessores.

- Sucessão: O sucessor universal continua de direito a posse do seu

antecessor

Art. 1.206. A posse transmite-se aos herdeiros ou legatários do possuidor

com os mesmos caracteres.

- União: sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para

os efeitos legais.

2.1 Quanto à origem

Distinguem-se os modos de aquisição da posse em originários e derivados.

* Se o modo de aquisição é originário, a posse apresenta-se isolada dos

vícios que anteriormente a contaminavam; já o mesmo não acontece com a

adquirida por meios derivados. De acordo com o art. 1.203 essa posse

conservará o mesmo caráter de antes. Exceção: art. 1.207, 2ª parte, pois

faculta ao sucessor singular unir a sua posse à de seu antecessor, para os

efeitos legais.

2.2 Quem pode adquirir a posse (art. 1.205, I e II):

- a própria pessoa que a pretende, desde que capaz;

- não sendo capaz, poderá adquiri-la se estiver representada ou assistida

por seu representante;

- por meio de procurador ou mandatário, munido de poderes específicos;

- por terceiro, mesmo sem mandato, dependendo de ratificação;

- pelo "constituto possessório".

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3. Perda:

Parece inútil a enumeração feita pelos arts. 1.223 e 1.224 dos meios pelos

quais se perde a posse; se esta é a exteriorização do domínio e se é

possuidor aquele que se comporta em relação à coisa como dono, desde o

momento em que não se comporte mais dessa maneira, ou se veja impedido de

exercer os poderes inerentes ao domínio, a posse estará perdida; o CC,

todavia, preferiu especificar, casuisticamente, a perda da posse, mas a

enumeração não pode ser considerada exaustiva:

3.1 Da posse da coisa:

a - pelo abandono – dá-se quando o possuidor renuncia à posse,

manifestando, voluntariamente, a intenção de largar o que lhe pertence,

como quando atira à rua um objeto seu.

b - pela tradição – só acarreta a perda da posse quando envolve a intenção

definitiva de transferir a coisa a outrem, como acontece na venda do

objeto, com transmissão da posse plena ao adquirente.

c - pela perda da própria coisa – quando for impossível encontrá-la, de

modo que não se possa mais utilizá-la economicamente. Ex: alguém que deixa

uma joia cair no fundo do mar.

d - pela destruição da coisa – porque se tornou inaproveitável ou

inalienável.

e - pela sua inalienabilidade: por ter sido colocada fora do comércio por

motivo de ordem pública, de moralidade, de higiene ou de segurança

coletiva, não podendo ser, assim, possuída por impossibilidade de exercer

os poderes inerentes ao domínio de forma exclusiva. Há autores que

discordam com esta questão.

f - pela posse de outrem – ocorre ainda que a nova posse tenha-se firmado

contra a vontade do primitivo possuidor, se este não foi manutenido ou

reintegrado em tempo oportuno; o desapossamento violento por ato de

terceiro dá origem à detenção, viciada pela violência exercida; com o

convalescimento desse vício, surge a posse, embora injusta, que se firmará

pelo decurso do prazo de ano e dia.

g - pelo constituto possessório.

Page 17: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

17

3.2 - Da posse dos direitos

- impossibilidade de seu exercício (art. 1.196). ex. quando se perde o

direito de posse de uma servidão de passagem se o prédio dominante ou

serviente foi destruído;

- pelo desuso (art. 1.389, III), ex. o desuso de uma servidão predial por

10 anos consecutivos gera o fim do direito à posse.

3.3 - Da posse para o ausente (aquele que não se acha presente) (art.

1.224): quando tem notícia da ocupação, abstém-se de retomar a coisa ou,

tentando recuperá-la, é violentamente repelido.

EFEITOS DA POSSE

1. Conceito. São as conseqüências jurídicas produzidas pela posse em

virtude de lei ou norma jurídica e a distinguem da mera detenção.

2. Espécies

Orlando Gomes reconhece sete efeitos da posse:

1. O uso dos interditos (ou ações) possessórias: este é o principal efeito

da posse.

2. Direito à percepção dos frutos;

3. Indenização por benfeitorias;

4. Retenção pela indenização da benfeitorias úteis e necessárias;

5. "jus tollendi" (direito de retirar) das benfeitorias voluptuárias;

6. Direito de usucapir;

7. Indenização pelo esbulho ou turbação.

8. Ainda há o efeito da responsabilidade pela deterioração e perda da coisa

(Maria Helena Diniz).

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18

* alguns efeitos são produzidos por todos os tipos de posse e outros só

pelas posses de boa-fé.

2.1 Uso dos Interditos

- finalidade: defender a posse.

- modos de proteção (defesa) possessória conferida ao possuidor:

- conceito de turbação (perturbação da posse) – é todo fato injusto ou todo

ato abusivo que venha aferir direitos alheios, impedindo ou tentando

impedir o seu livre exercício; é todo ato que embaraça o livre exercício da

posse.

- conceito de esbulho (perda total da posse) – é o ato pelo qual uma pessoa

é despojada, injustamente, daquilo que lhe pertence ou estava na sua posse,

por violência, por clandestinidade, e por abuso de confiança. Pode ocorrer

o esbulho pacífico: quando o compromissário comprador deixa de pagar as

prestações avençadas, pode-se ajuizar ação de rescisão contratual, cumulada

com ação de reintegração de posse. Neste caso a ação correrá no

procedimento comum.

1ª DEFESA – USO DE FORÇA

O possuidor pode manter ou restabelecer a situação de fato pelos seus

próprios recursos:

A - legítima defesa – quando o possuidor se acha presente e é turbado

(perturbação da posse) no exercício de sua posse, pode reagir, fazendo uso

da defesa direta.

B - desforço imediato – ocorre quando o possuidor, já tendo perdido a posse

(esbulho), consegue reagir, em seguida, e retomar a coisa (autotutela,

autodefesa ou defesa direta); é praticado diante do atentado já consumado,

mas ainda no calor dos acontecimentos; o possuidor tem de agir com suas

próprias forças, embora possa ser auxiliado por amigos e empregados,

permitindo-se-lhes, ainda, se necessário, o emprego de armas; o guardião da

coisa não tem o direito de invocar, em seu nome, a proteção possessória,

mas tem o direito de exercer a autoproteção (autodefesa) do possuidor ou

representado, consequência natural de seu dever de vigilância.

Page 19: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

19

- requisitos para o uso da força: reação imediatamente após a agressão,

devendo ela limitar-se ao indispensável à manutenção ou restituição da

posse (art. 1.210, §1º, 2º parte); os meios empregados devem ser

proporcionais à agressão.

* também é crime tipificado no artigo 161, II, CP.

2ª DEFESA – AÇÕES POSSESSÓRIAS

Características das ações possessórias:

1. Legitimidade ativa e passiva:

Legitimidade ativa:

- Exige-se a posição de possuidor para a propositura dos interditos, mesmo

sem título;

- Não cabem ao detentor;

- Se possui apenas o direito, mas não a posse, não poderá utilizar os

interditos, salvo o sucessor, que deve provar apenas a posse de seu

antecessor. Art. 1.207. O sucessor universal continua de direito a posse do

seu antecessor; e ao sucessor singular é facultado unir sua posse à do

antecessor, para os efeitos legais.

- Possuidores diretos e indiretos têm ação possessória contra terceiros, e

também um contra o outro.

Legitimidade passiva:

- autor da ameaça, turbação ou esbulho o seu representante;

- terceiro que recebeu a coisa esbulhada sabendo que o era (má-fé);

- herdeiro a título universal ou causa mortis;

- pessoa jurídica de direito público ou privado autora do ato molestador

A ação pode ser proposta contra o autor do ato molestador como contra quem

ordenou a sua prática, ou contra ambos.

Page 20: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

20

2. Cumulatividade de pedidos de naturezas diversas

O artigo 921 do CPC permite que o autor, na inicial da ação possessória,

cumule o pedido possessório com o de condenação em perdas e danos,

cominação de pena para o caso de nova turbação ou esbulho e desfazimento de

construção ou plantação feita em detrimento de sua posse.

3. Caráter dúplice das ações possessórias

Não é necessária a reconvenção. Se o réu se julgar ofendido em sua posse,

poderá formular na própria contestação os pedidos que tiver contra o autor.

Art. 922, CPC. É lícito ao réu, na contestação, alegando que foi o ofendido

em sua posse, demandar a proteção possessória e a indenização pelos

prejuízos resultantes da turbação ou do esbulho cometido pelo autor.

4. Fungibilidade dos Interditos:

Art. 920, CPC. A propositura de uma ação possessória em vez de outra não

obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal

correspondente àquela, cujos requisitos estejam provados.

Tal fungibilidade só poderá ocorrer entre as três ações possessórias em

sentido estrito: manutenção (turbação), reintegração (esbulho) e interdito

proibitório (ameaça). Há autores que pensam diferente.

5. ônus da prova compete ao adversário do possuidor, quando for contestado

o direito deste.

6. O possuidor goza, processualmente, da posição mais favorável.

Espécies (sentido estrito):

Ações possessórias por excelência: só servem para defender a posse do

possuidor; as outras ações que também defendem a posse somente serão

possessórias se intentadas pelo possuidor.

a) ação de manutenção de posse – é o meio de que se pode servir o possuidor

que sofrer turbação a fim de se manter na sua posse.

Page 21: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

21

b) ação de reintegração de posse – é a movida pelo esbulhado, a fim de

recuperar a posse perdida em razão de violência, clandestinidade ou

precariedade.

A manutenção e a reintegração de posse apresentam características e

requisitos semelhantes; a diferença está apenas em que o "possuidor tem

direito a ser mantido na posse em caso de turbação e reintegrado no de

esbulho" (art. 926, CPC).

São requisitos para a propositura das referidas ações :

1°) prova da posse,

2°) prova da turbação (manutenção) ou do esbulho (reintegração)

praticado pelo réu,

3°) prova da data da turbação (manutenção) ou do esbulho (reintegração).

Até ano e dia: procedimento especial com pedido de liminar. Após:

procedimento ordinário, não perdendo, contudo, o caráter possessório. *O

prazo de ano e dia é de decadência: portanto, fatal e peremptório.

4°) na ação de manutenção da posse, necessita o autor provar, a sua

posse atual (apesar de ter sido molestada, ainda a mantém, não a tendo

perdido para o réu).

Soluções para a contagem dos prazos nos casos de mais de um ato devolutivo:

- O prazo de ano e dia não corre enquanto o possuidor defende a posse,

restabelecendo a situação de fato anterior à turbação, ou ao esbulho.

- não se contam os atos preparatórios; conta-se do último ato integrativo

da "vis inquietativo";

- diversos atos de turbação, sem nexo entre eles, cada um gera direito a

uma ação;

- atos sucessivos com nexo de causalidade entre eles, existem duas

correntes: conta-se do primeiro ato / conta-se do último ato (é a melhor).

c) interdito proibitório – é a proteção preventiva da posse ante a ameaça

de turbação ou esbulho; incumbe ao autor provar a sua posse atual, a ameaça

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de turbação ou esbulho por parte do réu e justo receio de que seja

efetivada;

Efeitos: proibição da prática de um ato em que é imediato a liminar e

quanto a pena o efeito só é verificado depois da sentença.

Outras ações que pode ser consideradas possessórias

Serve para defender a posse tanto do possuidor como do proprietário:

d) ação de dano infecto – é uma medida preventiva utilizada pelo possuidor,

que tenha fundado receio de que a ruína ou demolição, ou vício de

construção do prédio vizinho ao seu, venha causar-lhe prejuízos, para

obter, por sentença, do dono do imóvel contíguo, caução que garanta a

indenização de danos futuros.

e) ação de nunciação de obra nova (ou embargo de obra nova) – visa impedir

a continuação de obra que prejudique prédio vizinho ou esteja em desacordo

com regulamentos administrativos.

f) ação de imissão na posse – é utilizada quando o autor da ação é

proprietário da coisa, mas não possuidor, por haver recebido do alienante

só o domínio, pela escritura, mas não a posse; como nunca teve esta, não

pode valer-se dos interditos possessórios.

g) embargos de terceiro – é o processo acessório que visa defender os bens

daqueles que, não sendo parte numa demanda, sofrem turbação ou esbulho em

sua posse, ou direito, por efeito de penhora, depósito, arresto, seqüestro,

venda judicial, arrecadação, arrolamento, inventário, partilha ou outro ato

de apreensão judicial.

h) qualquer problema versando sobre a posse de imóveis de valor menor de 40

salários mínimos (art. 3°, IV, L. 9.099/95).

- RESUMO: a posse pode ser perturbada de três formas: pelo esbulho (perda

da posse), pela turbação (tentativa de esbulho), ou pela ameaça de agressão

iminente; daí a "ação de reintegração de posse" para o esbulhado, a "ação

de manutenção de posse" para o turbado, e a "ação de interdito proibitório"

para o ameaçado; cabe medida liminar provisória no esbulho e na turbação,

se o fato tiver menos de um ano e dia; no interdito proibitório não há

medida liminar; o possuidor turbado pode exercer a legítima defesa da

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posse, e o esbulhado pode usar de esforço para restituir-se na posse por

sua própria força, contanto que o faça logo; incluem-se também na defesa da

posse, como meios particularizados ou específicos, as "ações de nunciação

de obra nova" (é a que compete ao proprietário ou possuidor, para impedir

que a edificação de obra nova em imóvel vizinho lhe prejudique o prédio),

de "embargos de terceiro" (cabem a quem, não sendo parte no processo,

sofrer penhora, arresto, arrecadação ou outros tipos de apreensão judicial

de coisa) e "ação de dano infecto" (cabe contra vizinhos, no caso de ruína

ou de mau uso da propriedade).

2.2 percepção dos frutos ("factum perceptio")

- Teoria objetiva (é a acolhida pelo nosso Código Civil)

- conceito de frutos: são utilidades que a coisa periodicamente produz,

cuja percepção se dá sem detrimento de sua substância.

Classificação de frutos quanto à sua origem:

- naturais – são os que se renovam periodicamente, devido à força orgânica

da própria natureza - ex.: frutas das árvores, as crias dos animais etc.

- industriais – são os que surgem em razão da atuação do homem sobre a

natureza - ex.: a produção de uma fábrica.

- civis – são as rendas produzidas pela coisa, em virtude de sua utilização

por outrem que não o proprietário - ex.: juros, aluguéis.

Quanto ao seu estado:

- pendentes – são os que ainda estão unidos à coisa que os produziu (a

coisa principal).

- percebidos – são os que já foram colhidos (separados da coisa que os

produziu).

- estantes – são aqueles que estão armazenados para venda.

- percepiendos – são os que deviam ter sido, mas ainda não foram colhidos.

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24

- consumidos – são os que não existem mais porque foram utilizados pelo

consumidor.

- Teoria subjetiva

- conceito de frutos: são riquezas normalmente produzidas por um bem

patrimonial (ex.: uma safra - época da colheita), ação do homem sobre à

natureza, os rendimentos de um capital; esta teoria dá maior destaque ao

aspecto econômico dos frutos.

a) Possuidor de boa-fé tem direito à:

- frutos percebidos (CC, art. 1.214);

- despesas da produção e custeio dos frutos pendentes e dos colhidos

antecipadamente, que deverão ser restituídos (CC, 1.214 e parágrafo único);

b) Possuidor de má-fé:

- não tem direito aos frutos;

- responde por todos os prejuízos que causou pelos frutos colhidos e

percebidos e pelos que por culpa sua deixou de perceber;

- tem direito às despesas de produção e custeio dos frutos;

2.3 indenização das benfeitorias e direito de retenção

Benfeitorias: São obras ou despesas efetuadas numa coisa para conservá-la -

"necessárias"; melhorá-la - "úteis" ou embelezá-la - "voluptuárias";

Retenção: é o direito que tem o devedor de uma obrigação de reter o bem

alheio em seu poder, para haver do credor da obrigação, as despesas feitas

em benefício da coisa.

Possuidor de boa-fé:

- tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis;

- levantar as voluptuárias, se lhe não forem pagas;

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- pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis, poderá exercer o direito

de retenção.

Possuidor de má-fé:

- serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias;

- não lhe assiste o direito de retenção;

- nem o de levantar as voluntárias

Art. 1.222. O reivindicante, obrigado a indenizar as benfeitorias ao

possuidor de má-fé, tem o direito de optar entre o seu valor atual e o seu

custo; ao possuidor de boa-fé indenizará pelo valor atual.

2.4 responsabilidade pela deterioração e perda da coisa

Possuidor de boa-fé:

- não responde pela perda ou deterioração da coisa, a que não der causa;

Possuidor de má-fé:

- responde pela perda, ou deterioração da coisa, ainda que acidentais,

salvo se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela na posse do

reivindicante.

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26

PROPRIEDADE – NOÇÕES GERAIS

1. Conceito

“Direito de propriedade é o direito que a pessoa física ou jurídica tem,

dentro dos limites normativos, de usar, gozar e dispor de um bem, corpóreo

ou incorpóreo, bem como de reivindicá-lo de quem injustamente o detenha”.

(Maria Helena Diniz)

2. Elementos constitutivos

- "jus utendi" (direito de usar) – é a faculdade de o dono servir-se da

coisa e utilizá-la da maneira que entender mais conveniente, podendo

excluir terceiros de igual uso - ex.: morar numa casa, dirigir um carro

etc.

- "jus fruendi" (direito de gozar ou usufruir) – é o poder de perceber os

frutos naturais e civis da coisa e aproveitar economicamente os seus

produtos - ex.: apanhar uma fruta de uma árvore em sua propriedade.

- "jus abutendi" ou "jus disponendi" (direito de dispor) – é o direito de

dispor da coisa, de transferi-la ou aliená-la a outrem a qualquer título;

envolve o poder de consumir o bem, de dividi-lo ou gravá-lo - ex.: vender,

distribuir, doar a coisa.

- "reivindicatio" (direito de reivindicar) – é o direito de reaver a coisa,

de reivindicá-la das mãos de quem injustamente a detenha; ele envolve a

proteção específica da propriedade, que se perfaz pela "ação

reivindicatória".

3. Caracteres da propriedade

- é ilimitado ou absoluto, no sentido de se encontrar a propriedade liberta

dos encargos que a constrangiam desde os tempos feudais, quando o que

lavrava o solo tinha o dever de pagar foro ao fidalgo; hoje, o proprietário

tem amplo poder sobre o que lhe pertence.

- é exclusivo, no sentido de poder o seu titular afastar da coisa quem quer

que dela queira utilizar-se (tal noção não se choca com a de condomínio,

pois cada condômino é proprietário, com exclusividade, de sua parte ideal).

Page 27: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

27

- é irrevogável ou perpétua, porque não se extingue pelo não-uso; não

estará perdida enquanto o proprietário não a alienar ou enquanto não

ocorrer nenhum dos modos de perda previstos em lei, como a desapropriação,

o perecimento, o usucapião etc.

- é elástica, porque a propriedade pode ser distendida ou contraída no seu

exercício, conforme se lhe adicionem ou subtraiam poderes destacáveis.

4. Objeto da propriedade

a) Bens corpóreos móveis ou imóveis (CC, arts. 1.299 e 1.232, Cód. de

mineração, art. 84 e CF, art. 176);

b) Bens incorpóreos (bens imateriais) (CC, arts. 649 a 673, revogados pela

Lei n. 5.988/73 que, por sua vez, foi revogada pela Lei n. 9.610/98; CF,

art. 5º, XXIX e XXVII)

5. Espécies de propriedade

a) Quanto à extensão do direito do titular:

- Propriedade plena: quando todos os elementos constitutivos se acham

reunidos na pessoa do proprietário.

- Propriedade restrita: quando se desmembram um ou alguns de seus poderes

que passam a ser de outrem.

b) Quanto à perpetuidade do domínio

- Propriedade perpétua: é a que tem duração ilimitada.

- Propriedade resolúvel: é a que encontra no seu próprio título

constitutivo uma razão de sua extinção, ou seja, as próprias partes

estabelecem uma condição resolutiva. Ex. retrovenda. (CC, Art. 505. O

vendedor de coisa imóvel pode reservar-se o direito de recobrá-la no prazo

máximo de decadência de três anos, restituindo o preço recebido e

reembolsando as despesas do comprador, inclusive as que, durante o período

de resgate, se efetuaram com a sua autorização escrita, ou para a

realização de benfeitorias necessárias).

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28

6. Propriedade Resolúvel:

Conceito: diz-se que a propriedade é resolúvel quando o título de aquisição

está subordinado a uma condição resolutiva ou ao advento do termo. Nesse

caso, deixa de ser plena, passando a ser limitada.

Causas de resolução:

O CC trata de casos de resolução da propriedade em dois artigos, que

estabelecem exceções ao princípio de que o direito de propriedade é

perpétuo e irrevogável: pelo advento de uma condição ou pelo surgimento de

uma causa superveniente;

- No art. 1.359, a causa da resolução encontra-se inserta no título ("ex

tunc");

- No art. 1.360, o elemento que resolve a relação jurídica é superveniente

("ex nunc");

Dispõe o art. 1.359 que, resolvido o domínio pelo implemento da condição ou

pelo advento do termo, entendem-se também resolvido os direitos reais

concedidos na sua pendência, e o proprietário em cujo favor se opera a

resolução pode reivindicar a coisa do poder de quem a detenha;

a) Causa incerta:

- A condição ou termo referidos constam do título constitutivo da

propriedade, de tal forma que o terceiro que a adquiriu não poderá alegar

surpresa;

Por ex ., se alguém adquirir um imóvel em cuja escritura existia um pacto de

retrovenda, não poderá reclamar se o primeiro alienante exercer o seu

direito de retrato ante do prazo de 3 anos (art. 505); neste caso, resolve-

se o domínio do terceiro, e o primeiro alienante poderá reivindicar o

imóvel.

b) Causa superveniente:

- O art. 1.360 cuida de outra hipótese; dispõe, com efeito, que, "se,

porém, a propriedade se resolver por outra causa susperveniente, o

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29

possuidor, que o tiver adquirido por título anterior à resolução, será

considerado proprietário perfeito, restando à pessoa em cujo benefício

houve a resolução ação contra aquele cujo domínio se resolveu para haver a

própria coisa, ou seu valor";

Por ex., se alguém receber um imóvel em doação e depois o alienar, o

adquirente será considerado proprietário perfeito se, posteriormente, o

doador resolver revogar a doação por ingratidão do donatário (art. 557);

embora permitida a revogação, não pode ela prejudicar direitos adquiridos

por terceiros; como se trata de causa superveniente, o adquirente não podia

prevê-la; o doador, neste caso, só poderá cobrar do donatário o valor da

coisa, porque esta continuará pertencendo ao adquirente de boa-fé.

7. Propriedade Aparente

Ocorre com aquele que adquire onerosamente e com boa-fé a propriedade de

quem não é dono, aqui resguarda-se a aquisição a non domino.

Tal proteção à aparência de direito foi recepcionada pelo Código Civil de

2002, no âmbito do direito das sucessões, quando abraçou a teoria da

aparência, legitimando a aquisição onerosa e de boa-fé, de imóvel

pertencente a herdeiro aparente, ressalvando-se as aquisições gratuitas,

nos estritos termos do art. 1.817 do Código Civil de 2002.

A teoria da aparência deve ser prestigiada no sistema registrário, mesmo

nas hipóteses de nulidade absoluta do registro, não é de se descartar a

boa-fé do adquirente do direito inscrito, pautada na aparência e na

presunção de legitimidade do registro. Por outro lado, quanto maior a

segurança do registro, menor a necessidade da aplicação da teoria da

aparência.

Afrânio de Carvalho (1998:177) expõe que "se o alienante não é o verdadeiro

proprietário e a lei legitima a aquisição pelo terceiro de boa-fé, fá-lo no

intuito de proteger a boa-fé do adquirente, a bem da circulação

imobiliária, em cujo interesse não cogita de indagar se o imóvel pertencia

à parte contrária ou a terceiro".

Em vários arestos reconhece o STJ o princípio da aparência, em proteção ao

terceiro de boa-fé, mas o erro deve ser escusável, conforme se infere de

seus julgados.

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30

Um dos fundamentos da convalescença do registro nulo, mas titularizado na

boa fé, está que a propriedade atenderá sua função social, como prevê o

art. 5.º, XXIII, da Constituição Federal, desde que efetivamente haja uso

racional do domínio. A transferência da propriedade do proprietário

verdadeiro e displicente para o proprietário aparente e diligente configura

uma espécie de expropriação forçada. Dentre as obrigações inerentes à

propriedade está seu zelo e guarda.

1. Responsabilidade civil do proprietário

a) responde objetivamente ou subjetivamente pelos prejuízos, se houver nexo

de causalidade entre o dano causado pela coisa e sua conduta;

b) responde subjetivamente por danos causados por animais de sua

propriedade, porque há presunção júris tantum de que tem obrigação de

guardá-los e fiscalizá-los;

c) responde pelos prejuízos causados por coisa que ante sua periculosidade

deve ser controlada por ele. O automóvel, trem e avião podem causar dano

tanto aos seus condutores e passageiros, caso em que a responsabilidade é

contratual, como a estranhos, sendo, então, sua responsabilidade delitual.

A responsabilidade das estradas de ferro pertence ao domínio

extracontratual no que concerne aos danos que a exploração de suas linhas

acarreta aos proprietários marginais. Quanto às aeronaves, a

responsabilidade das companhias de navegação aérea é regida pela teoria do

risco ou responsabilidade objetiva.

d) Responde pelos danos ocasionados por coisas não perigosas.

Função social da propriedade

A Inclusão da Função Social no Direito de Propriedade

O evolucionar histórico dos institutos da propriedade e de sua função

social acabaram por desaguar, juntamente com o Direito Civil em geral, em

seara Constitucional. Destarte, o Código Civil deixa o centro das atenções

no estudo do tema trazido à baila, cedendo lugar às normas superiores, o

que decorre do princípio de supremacia da Constituição.

Tal fenômeno pôde ser observado na Constituição do México de 1917, que

inseria em seu art. 27 que "A Nação terá, a todo tempo, o direito de impor

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31

à propriedade privada as determinações ditadas pelo interesse público

[...]".

Também a Constituição da Alemanha de 1919 - Constituição de Weimar trouxe,

em seu art. 153 que "A propriedade obriga e seu uso e exercício devem ao

mesmo tempo representar uma função no interesse social".

No Brasil, a ideação arrolada entrou em nosso cotidiano jurídico com a

Constituição de 1946, dada a interrupção do Estado Novo, pois, embora

houvesse disposição constitucional acerca da regulação legal da

propriedade, a vontade do regime ditatorial prevalecia em todas as

ocasiões. Somente em 1967, apareceu textualmente a função social, como

princípio de ordem econômica.

Atualmente, nossa Lex Fundamentalis, além de inserir a função social da

propriedade no capítulo concernente a direitos e garantias individuais,

plasma-o como princípio de ordem econômica, subdividindo seus efeitos

conforme seja a propriedade urbana ou rural, o que configura uma inovação

da Constituição vigente.

Neste contexto, foi desenhado o novo Código Civil, em especial seu art.

1.228, ao prever, em parágrafos inovadores, a função social da propriedade.

De lapidar redação, o § 1.º estabelece que "O direito de propriedade deve

ser exercido em consonância com suas finalidades econômicas e sociais e de

modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei

especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o

patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das

águas." Também digno de transcrição o § 2.º: "São defesos os atos que não

trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados

pela intenção de prejudicar outrem."

Tais disposições vêm conformar-se de acordo com os princípios fundamentais

da nova Lei Civil, em especial o Princípio da Socialidade. Nas palavras do

ilustre coordenador-geral da Comissão Revisora e Elaboradora do Código

Civil, Professor Miguel Reale, em seu artigo "Visão geral do novo Código

Civil",

"é constante o objetivo do novo Código no sentido de superar o manifesto

caráter individualista da Lei vigente, feita para um país ainda

eminentemente agrícola, com cerca de 80% da população no campo. Hoje em

dia, vive o povo brasileiro nas cidades, na mesma proporção de 80%, o que

representa uma alteração de 180 graus na mentalidade reinante, inclusive em

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32

razão dos meios de comunicação, como o rádio e a televisão. Daí, o

predomínio do social sobre o individual".

Vemos aí claramente a inserção da propriedade nas limitações exigidas pelo

bem da sociedade, o que não deixa de afigurar-se como uma manifestação mais

palpável da própria publicização do Direito Civil.

Em suma, pauta-se claro que a propriedade deverá direcionar-se para o bem

comum, qualquer que seja a propriedade. Sempre haverá função social da

propriedade, mais ou menos relevante, porém a variável instala-se no tipo

de destinação que deverá ser dado ao uso da coisa.

Outro ponto importante consubstancia-se em considerar-se a função social i)

como um objetivo ao direito de propriedade, ou seja, algo que lhe é

exterior, ou ii) um elemento desse mesmo direito, um requisito intrínseco

necessário à sua própria existência. A doutrina mais atual, à qual nos

filiamos, inclina-se a aceitar que a função social da propriedade é parte

integrante da propriedade: em não havendo, a propriedade deixa de ser

protegida juridicamente, por fim, desaparecendo o direito. No mesmo

sentido, manifesta-se José Afonso da Silva (1999,286): "a função social se

manifesta na própria configuração estrutural do direito de propriedade,

pondo-se concretamente como elemento qualificante na predeterminação dos

modos de aquisição, gozo e utilização dos bens".

Sendo assim, reiteramos que não há que se falar em propriedade sem que tal

direito esteja imbuído de uma destinação - ou função - social, elemento

este integrante e necessário para sua própria existência. Qualquer

tentativa de utilizar-se deste direito para fins egoísticos e danosos à

coletividade deverá ser prontamente cerceada.

Limitações ao direito de propriedade

1. Fundamentos das limitações à propriedade:

Encontra-se no primado do interesse coletivo ou público sobre o individual

e na função social da propriedade, visando proteger o interesse público

social e o interesse privado, considerado em relação à necessidade social

de coexistência pacífica.

Page 33: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

33

2. Natureza

Trata-se de obrigação propter rem, porque tanto o devedor como o credor são

titulares de um direito real, pois ambos os direitos – o de credor e o de

devedor – incidem sobre a mesma coisa, só que não são oponíveis erga omnes

nem interessam a terceiros.

3. Espécies

a) Restrições à propriedade em virtude de interesse social

Pressupõem a idéia de subordinação do direito de propriedade privado aos

interesses públicos e às conveniências sociais. São restrições

imprescindíveis ao bem-estar coletivo è a própria segurança da ordem

econômica e jurídica do país.

a.1 - restrições constitucionais. Ex: art. 5º, XXII, XXIV, 182, §§3º e 4º,

I e II, 184, 185, 177, etc.

a.2 - restrições administrativas. Ex: normas de proibição de demolição de

monumentos históricos; normas de proteção à lavoura, à indústria, ao

comércio, à economia popular; normas de finalidade urbanísticas; Código de

mineração; Código Florestal; normas ambientais; zoneamento ambiental rural,

etc.

a.3 - limitações à propriedade rural. Ex. Estatuto da Terra.

a.4 - limitações de natureza militar. Ex: Lei 6.634/79, que dispõe sobre a

faixa de fronteira;

a.5 - restrições em razão de lei eleitoral. Ex. art. 135, §3º, Código

Eleitoral.

“Funcionarão as mesas receptoras nos lugares designados pelos juizes

eleitorais 60 (sessenta) dias antes da eleição, publicando-se a designação.

§ 3º A propriedade particular será obrigatória e gratuitamente cedida para

esse fim”.

Page 34: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

34

b) Restrições à propriedade em virtude de interesse privado

Inspiram-se no propósito de coexistência harmônica e pacífica de direitos,

fundando-se no próprio interesse do titular do bem ou de terceiros, a quem

este pretende beneficiar, não afetando, dessa forma, a extensão do

exercício do direito de propriedade; caracteriza-se por sua bilateralidade

ante o vínculo recíproco que estabelece.

b.1 - servidões prediais;

b.2 - limitações impostas pela Lei do Inquilinato;

b.3 - limitações impostas pelas normas referentes ao condomínio (art. 1.327

a 1.330 e 1.336, CC);

b.4- limitações impostas pela Lei 6.766/79, que dispõe sobre o Parcelamento

do Solo Urbano;

b.5 - Art. 548. É nula a doação de todos os bens sem reserva de parte, ou

renda suficiente para a subsistência do doador;

b.6 - Art. 550. A doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice pode ser

anulada pelo outro cônjuge, ou por seus herdeiros necessários, até dois

anos depois de dissolvida a sociedade conjugal;

b.7 - relações de direitos de vizinhança:

A limitação privada do direito de vizinhança será estudada mais adiante

Várias são as medidas defensivas da propriedade

1. AÇÃO REIVINDICATÓRIA: quando o proprietário for totalmente privado de

seu bem.

- Ela tem caráter essencialmente dominial e por isso somente pode ser

utilizada pelo proprietário, por quem tenha "jus in re";

- esta ação é uma consequência do direito de sequela do proprietário; (CPC,

art. 95)

Page 35: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

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- Nesta ação o autor deve provar o seu domínio, oferecendo prova inconcussa

da propriedade, com a respectiva transcrição, e descrevendo o imóvel com

suas confrontações, bem como demonstrar que a coisa reivindicada encontra-

se na posse do réu;

1.1 três, portanto, os pressupostos de admissibilidade de tal ação:

a) titularidade do domínio, pelo autor, da área reivindicanda (comprovada

através da transcrição imobiliária, se for bem imóvel, em seu nome ou da

cadeia sucessória, pela apresentação de títulos aquisitivos registrados

durante o período no qual um dos transmitentes adquirira a coisa por

usucapião, ainda que não tivesse justo título nem boa fé, já que usucapir

somam-se as posses, se a do proprietário atual for havida de possuidores há

mais de quinze anos (CC, art. 1.238);

b) a individuação da coisa (é uma descrição atualizada do bem, com os

corretos limites e confrontações, de modo a possibilitar a sua correta

localização);

c) a posse injusta do réu (o proprietário vai retomar a coisa não de

qualquer possuidor ou detentor, mas daquele que a conserva sem causa

jurídica).

1.2 natureza jurídica: é ação real que compete ao senhor da coisa.

a) legitimidade ativa: compete a reivindicatória ao senhor da coisa, ao

titular do domínio; em se tratando de ação real imobiliária, é

indispensável a outorga uxória para o seu ajuizamento.

b) legitimidade passiva: a ação deve ser endereçada contra quem está na

posse ou detém a coisa sem título ou suporte jurídico;

- ao possuidor direto, citado para a ação, incumbe a nomeação à autoria do

proprietário;

- pode, assim, ser movida contra o possuidor sem título e o detentor,

qualquer que seja a causa pela qual possuam a coisa;

- pode também ser endereçada contra aquele que deixou de possuí-la com

dolo, isto é, transferindo-a para outro com a intenção de dificultar ao

autor sua vindicação.

Page 36: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

36

- A boa-fé não impede a caracterização da injustiça da posse, para fins de

reivindicatória;

1.3 Efeito: fazer com que o possuidor restitua a coisa com todos os seus

acessórios. Se impossível essa devolução por ter perecido a coisa, o

proprietário terá o direito de receber o valor da coisa se o possuidor

estiver de má-fé.

Jurisprudência: Esta ação é imprescritível, porém se a coisa

reivindicada já foi usucapida pelo possuidor, não mais poderá ser proposta

pelo antigo proprietário que perdeu seu domínio.

2. AÇÃO NEGATÓRIA – é cabível quando o domínio do autor, por um ato

injusto, esteja sofrendo alguma restrição por alguém que se julgue com um

direito de servidão sobre o imóvel ou qualquer outra turbação na posse; é

frequentemente usada para solucionar conflito de vizinhança.

3. AÇÃO DE DANO INFECTO – tem caráter preventivo e cominatório, como o

interdito proibitório, e pode ser oposta quando haja fundado receio de

perigo iminente, em razão de ruína do prédio vizinho ou vício na sua

construção; precavendo-se, o autor obtém que a sentença comine ao réu a

prestação de caução que o assegure contra o dano futuro; pode ser proposta

também nos casos de mau uso da propriedade vizinha que prejudique o

sossego, a segurança e a saúde do proprietário ou inquilino de um prédio.

4. AÇÃO DECLARATÓRIA: poderá ser proposta para dissipar dúvidas sobre o

domínio.

5. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR PREJUÍZO CAUSADO POR ATO ILÍCITO: Ex: perda da

casa em razão de sua destruição por caminhão desgovernado.

6. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR PREJUÍZO CAUSADO POR ATO LÍCITO: Ex:

proprietário que sofre limitação em sua propriedade por interesse social ou

por desapropriação.

Orlando Gomes: faz jus à indenização quando a propriedade é diminuída em

virtude de acontecimento natural, como no caso de avulsão. (CC, 1.251)

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37

AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE IMÓVEL

1. Conceito : consiste na personalização do direito num titular.

2. Classificação:

2.1. Aquisição originária: quando não há transmissão de um sujeito para

outro, como ocorre na acessão natural e no usucapião; a propriedade passa

ao patrimônio do adquirente livre de quaisquer limitações ou vícios que

porventura a maculavam (manchavam).

2.2. Aquisição derivada: Dá-se quando houver transmissibilidade, a

título singular ou universal do domínio por ato causa mortis (direito

hereditário) ou inter vivos (transcrição). Quando resulta de uma relação

negocial entre o anterior proprietário e o adquirente, havendo, pois, uma

transmissão do domínio em razão da manifestação de vontade; a transmissão é

feita com os mesmos atributos e eventuais limitações que anteriormente

recaíam sobre a propriedade, porque ninguém pode transferir mais direitos

do que tem; ela exige, também, comprovação da legitimidade do direito do

antecessor.

A) ACESSÃO (aquisição originária)

1. Conceito: É o modo originário de aquisição da propriedade, criado por

lei, em virtude do qual tudo o que se incorpora a um bem fica pertencendo

ao seu proprietário (CC, 1.248);

Predomina o princípio segundo o qual "a coisa acessória segue a principal";

Com relação as suas consequências, aplica-se também o princípio que "veda o

enriquecimento sem causa": o legislador entendeu mais conveniente atribuir

o domínio da coisa acessória também ao dono da principal, para evitar o

estabelecimento de um condomínio forçado e indesejado, porém, ao mesmo

tempo, procurou evitar o enriquecimento indevido, possibilitando ao

proprietário desfalcado o recebimento de uma indenização;

2. Requisitos: conjunção entre duas coisas até então separadas; caráter

acessório de uma dessas coisas, em confronto com a outra.

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3. Classificação

a) físicas ou naturais – a união ou incorporação da coisa acessória à

principal é decorrente de acontecimentos naturais, sendo acessão de imóvel

a imóvel.

- formação de ilhas em rios não-navegáveis (pertencem ao domínio

particular) – acúmulo de areia e materiais levados pela correnteza; as que

se formam no meio do rio distribuem-se na proporção das testadas dos

terrenos até a linha que dividir o álveo (ou leito) do rio em duas partes

iguais; as que se formam entre essa linha e uma das margens consideram-se

acréscimos aos terrenos fronteiros desse mesmo lado.

- aluvião – acréscimo paulatino de terras, às margens de um rio, por meio

de lentos e imperceptíveis depósitos ou aterros naturais ou de desvios das

águas; esses acréscimos pertencem aos donos dos terrenos marginais, segundo

a regra de que o acessório segue o principal.

- avulsão – é o inesperado deslocamento de uma porção de terra por força

natural violenta, soltando-se de um prédio para se juntar a outro; quando é

de coisa não suscetível de união natural, aplica-se o disposto quanto às

coisas perdidas, que devem ser devolvidas ao dono, caso contrário, o

acréscimo passa a pertencer ao dono da coisa principal; se o proprietário

do prédio desfalcado reclamar, dentro do prazo decadencial de um ano, o

dono do prédio aumentado, se não quiser devolver, pagará indenização

àquele.

- abandono de álveo (ou leito) – o Código de Águas define o álveo

abandonado como "a superfície que as águas cobrem sem transbordar para o

solo natural e ordinariamente enxuto"; é, em suma, o leito do rio; o álveo

abandonado de rio público ou particular pertence aos proprietários das duas

margens, na proporção das testadas, até a linha mediana daquele; os limites

dos imóveis confinantes não sofrem modificação se o curso d’água que serve

de divisa vem a ser alterado.

ver legislação contida no Código de Águas.

b) industriais ou artificiais – a união ou incorporação da coisa acessória

à principal é decorrente do trabalho humano, sendo acessão de móvel a

imóvel (CC, 1.253 a 1.259)

Page 39: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

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- construção de obras ou plantações – a regra básica esta consolidada na

presunção de que toda construção ou plantação existente em um terreno foi

feita pelo proprietário e à sua custa; trata-se, entretanto, de presunção

vencível, admitindo prova contrária.

- sementes, plantas ou materiais próprios e terreno alheio – boa-fé (recebe

indenização do valor das sementes, plantas ou materiais); má-fé (perde o

direito de indenização e deve repor as coisas no estado anterior e a pagar

os prejuízos, ou deixar que permaneça a seu benefício e sem indenização).

- sementes, plantas ou materiais alheios e terreno próprio – boa-fé

(indeniza valor das sementes, plantas ou materiais); má-fé (indeniza valor

das sementes, plantas ou materiais + perdas e danos).

- sementes, plantas, materiais e terreno alheios – boa-fé (recebe

indenização do valor das sementes, plantas ou materiais); má-fé (perde o

direito à indenização e deve repor a coisa no estado anterior + art. 1.257,

CC).

Somente se aplica às construções e plantações, que são acessões

industriais ou artificiais, e não às benfeitorias, que não são coisas

novas, mas apenas acréscimos ou melhoramentos em obras já feitas.

Quando o valor do terreno é inferior ao da construção ou plantação que

foi levantada de boa-fé, entendem alguns injusta a regra que determina a

sua perda em favor do dono do solo; na jurisprudência vem sendo acolhido o

entendimento de que, se a construção invade terreno alheio em parte mínima

e não lhe prejudica a utilização, o invasor não deve ser condenado a

demoli-la, mas apenas a indenizar a área invadida, segundo seu justo valor,

como uma espécie de desapropriação no interesse privado.

B) USUCAPIÃO

1. conceito: é modo originário de aquisição da propriedade e de outros

direitos reais suscetíveis de exercício continuado (entre eles, as

servidões e o usufruto) pela posse prolongada no tempo, acompanhada de

certos requisitos exigidos pela lei.

2. objeto: bens móveis e imóveis do domínio particular.

Page 40: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

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3. pressupostos:

a) coisa hábil ou suscetível de usucapião: posse (somente a "ad

usucapionem", que é a que contém os requisitos exigidos pelo art. 550; a

"ad interdicta", justa, dá direito à proteção possessória, mas não gera o

usucapião):

b) com ânimo de dono – toma todas as atitudes para não perdê-la e conservá-

la.

c) mansa e pacífica – exercida sem oposição; quando o possuidor não é

molestado, durante todo o tempo estabelecido na lei, por quem tem legítimo

interesse, ou seja, o proprietário; todavia, se este tomou alguma

providência na área judicial, visando a quebrar a continuidade da posse,

descaracterizada fica a "ad usucapionem"; providências extrajudiciais não

significam, verdadeiramente, oposição.

d) contínua – sem interrupção; o possuidor não pode possuir a coisa a

intervalos, sendo necessário que a tenha conservado durante todo o tempo e

até o ajuizamento da ação de usucapião.

e) decurso do tempo

f) justo título – refere-se a uma posse hábil para ensejar o pedido de

usucapião.

g) boa-fé – o possuidor ignora o vício ou o obstáculo que lhe impede a

aquisição da coisa ou do direito possuído; costuma ser atrelada ao justo

título, embora se trate de realidade jurídica autônoma; o art. 490, §

único, estabelece presunção "juris tantum" de boa-fé em favor de quem tem

justo título; deve ela existir no começo da posse e permanecer durante todo

o decurso do prazo; se o possuidor vem a saber da existência do vício,

deixa de existir a boa-fé, não ficando sanada a mácula.

RESUMO: os três primeiros são indispensáveis e exigidos em todas as

espécies de usucapião; o justo título e a boa-fé somente são reclamados no

usucapião ordinário; preambularmente, é necessário verificar se o bem que

se pretende usucapir é suscetível de prescrição aquisitiva, pois nem todos

se sujeitam a ela, como as coisas fora do comércio e os bens públicos (não

sofrem prescrição).

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4. espécies de usucapião de bens imóveis:

a) extraordinário (art. 1.238, CC) – requisitos:

- posse de 15 anos (regra) ou 10 anos (se o possuidor houver estabelecido

no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de

caráter produtivo);

- exercida com ânimo de dono;

- de forma contínua (ininterrupta), mansa e pacífica;

- dispensa do justo título e da boa-fé.

b) ordinário (art. 1.242, CC) – requisitos: posse de 10 anos (regra) ou de

05 (se o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro

constante do respectivo cartório, cancelada posteriormente, desde que os

possuidores nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado

investimentos de interesse social e econômico);

- exercida com ânimo de dono;

- de forma contínua (ininterrupta), mansa e pacífica;

- além de justo título e boa-fé.

c) especial

c.1) rural (ou "pro labore") – preceitua o art. 1° da Lei n. 6.969/81 e

art. 1.239, CC.: "todo aquele que, não sendo proprietário rural nem urbano,

possuir como sua, por 5 anos ininterruptos, sem oposição, área rural

contínua, não excedente de 25 hectares (o art. 191 da CF aumentou a

dimensão da área rural suscetível dessa espécie de usucapião para 50

hectares, tendo o § único proibido expressamente a aquisição de imóveis

públicos por usucapião), e a houver tornado produtiva com seu trabalho e

nela tiver sua morada, adquirir-lhe-á o domínio, independentemente de justo

título e boa-fé, podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença,

a qual servirá de título para transcrição no Registro de Imóveis";

excepcionalmente, o seu art. 2° inclui as terras devolutas (espécies de

bens públicos) entre os bens usucapíveis.

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c.2) urbano (ou pró moradia ou "pro misero") – constitui inovação trazida

pela atual CF, estando regulamentado em seu art. 183, bem como art. 1.240,

CC: "aquele que possuir como sua área urbana de até 250 M2, por 5 anos,

ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua

família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro

imóvel urbano ou rural";

- não se aplica à posse de terreno urbano sem construção, pois é requisito

a sua utilização para moradia do possuidor ou de sua família; acrescentam

os §§ 2º e 3º, que esse "direito não será reconhecido ao novo possuidor

mais de uma vez" e que os "imóveis públicos não serão adquiridos por

usucapião"; o título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao

homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente de estado civil (§ 1°);

- essa espécie de usucapião não reclama justo título nem boa-fé, como

também ocorre como o usucapião especial rural.

D) Da Usucapião prevista no art. 1.240-A e seus requisitos (Usucapião

familiar)

Art. 1240-A (CC). Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e

sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até

250m² (duzentos e cinqüenta metros quadrados) cuja propriedade divida com

ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua

moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não

seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1º O direito previsto no caput não será reconhecido ao mesmo possuidor

mais de uma vez.

§ 2º Vetado.

O art. 1.240-A traz como requisitos para utilização desta modalidade de

usucapião:

Tempo: 2 anos.

Continuidade: ininterrupta e sem oposição.

Modalidade de posse: direta, com exclusividade e para sua moradia ou de sua

família.

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Área limite: imóvel urbano – terreno ou apartamento de até 250m² (duzentos

e cinquenta metros quadrados).

Condição dos cônjuges ou companheiros: separado de fato.

Condição do co-titular que pretende usucapir o bem: possuir co-propriedade

(existência de meação), não possuir outro bem imóvel, não ter requerido o

mesmo direito anteriormente.

Condição do co-titular que perderá sua meação: ter saído do lar, não

contribuir com a manutenção do bem, tampouco buscar exercer direito sobre o

mesmo no prazo de 2 anos a contar da separação de fato.

5. ação :

O possuidor com posse "ad usucapionem" pode ajuizar ação declaratória,

regulada pelos arts. 941 a 945 do CPC e 1.241 do CC, sob o título de "ação

de usucapião de terras particulares", no foro da situação do imóvel, que

será clara e precisamente individuado na inicial; deve o autor, além de

expor o fundamento do pedido, juntar planta da área usucapienda (art. 942,

CPC);

- a sentença que julgá-la procedente será transcrita, mediante mandado, no

registro de imóveis (Cartório de Registro de Imóveis - CRI), satisfeitas as

obrigações fiscais (art. 945, CPC);

- intervirá obrigatoriamente em todos os atos do processo o MP;

- Legitimidade ativa: a propositura da ação de usucapião somente é

permitida a quem tem posse atual do imóvel;

* se o usucapiente, depois de consumado o usucapião, sofre esbulho e perde

a posse, terá de recuperá-la pela ação publiciana, uma espécie de

reivindicatória sem título, para poder, assim, ajuizar a ação de usucapião

e obter uma sentença favorável, que lhe servirá de título, malgrado já se

tenha tornado dono desde o momento do exaurimento do lapso prescricional

(art. 1.238, CC), sendo a sentença de natureza meramente declaratória.

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C) AQUISIÇÃO PELO REGISTRO DO TÍTULO NO REGISTRO DE IMÓVEIS : (art. 1.227,

CC) – aquisição derivada

No direito brasileiro não basta o contrato para a transferência do domínio;

por ele, criam-se apenas obrigações e direitos; o domínio, porém, só se

transfere inter vivos pela tradição, se for coisa móvel (art. 1.267), e

pelo registro do título, se for imóvel (art. 1.245);

- A relação dos atos sujeitos à transcrição encontra-se na Lei de Registros

Públicos (art. 167 da Lei n° 6.015/73); a lei anterior sujeitava alguns

atos, como os transmissivos da propriedade, à transcrição, e outros, como a

hipoteca, à inscrição; a atual e o Novo Código Civil usa apenas a expressão

"registro", que engloba os antigos atos de transcrição e inscrição.

- O registro só produz efeitos a partir da data em que se apresentar o

título ao oficial do Registro e este o prenotar no protocolo;

C.1 - Princípios:

1. Princípio da Unitariedade Matricial.

Entende-se por este princípio a impossibilidade da matrícula conter mais do

que um imóvel em sua descrição, bem como da abertura de matrícula de parte

ideal de imóvel, consoante interpretação do artigo 176, § 1º, inciso I da

Lei 6.015/73. A expressão "cada imóvel" contida no referido artigo 176 da

Lei 6.015/73 significa unidade territorial com continuidade de área,

contornos definidos e individualizada de outras glebas.

Dessa forma, é expressamente vedada a abertura de matrícula envolvendo

parte ideal de imóvel, o que era possível no sistema das transcrições, onde

se era transcrito o título que muitas vezes envolvia parte ideal de imóvel,

devendo ser recomposto o imóvel todo para se abrir a matrícula, ou mais

claramente, segundo o Conselho Superior da Magistratura, referida

recomposição "é semelhante à feitura de uma colcha de retalhos, reúne as

expressões aritméticas das partes e os seus titulares atuais: é físico-

jurídica" (Apel. Cível nº 003183-0).

Ultimamente esse princípio tem sofrido muitas críticas, principalmente no

tratamento dos chamados terrenos de marinha2, onde muitas vezes encontramos

2 "terrenos de marinha são faixas de terra de 33 m de profundidade, contados horizontalmente, a partir da linha do preamar médio de 1831, para o interior das terras banhadas pelo mar – sejam continentais, costeiras ou de ilhas – ou pelos rios e lagos que sofram a influência das marés, entendendo-se como tal a oscilação periódica

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45

matrículas abrangendo dois imóveis (parte alodial e parte terreno de

marinha). O Professor e Advogado MARCELO TERRA defende uma nova

reformulação do princípio da unitariedade matricial, principalmente com

relação à definição de imóvel, que deve abranger também o conceito

econômico como ocorre em outros países, bem como da possibilidade da

matrícula abranger dois ou mais imóveis, desde que respeitada uma

finalidade como, por exemplo, um empreendimento imobiliário.

2. Princípio da Instância ou Solicitação

Entende-se por este princípio que a iniciativa de requerer a prática de

determinado ato registrário deve partir da parte interessada ou pela

autoridade, não podendo o oficial registrador praticar atos de ofício que

onerem de qualquer forma a parte interessada, consoante artigo 13 da Lei de

Registros Públicos. Assim sendo, todos os títulos que forem apresentados à

qualificação do oficial deverão conter expressa ou implicitamente a

autorização para se proceder os atos requeridos.

Existem exceções ao referido princípio, sendo permitido ao Oficial

Registrador, por exemplo, a correção de atos por ofício em erros evidentes

(art. 213, § 1º da Lei 6.015/73), averbações de alteração de denominação de

logradouros públicos, abertura de matrícula para imóveis transcritos desde

que contenham os elementos necessários etc.

3. Princípio da publicidade

A publicidade é uma das características do Registro de Imóveis, não se pode

admitir que um registro tenha eficácia "erga omnes" (contra todos) e ao

mesmo tempo seja negada informação ao público em geral. No Registro de

Imóveis a publicidade dos atos por ele praticados é garantida não somente

pela própria Lei 6.015/73, como também por norma constitucional (artigo 5º,

inciso XXXIII, CF), devendo ser fornecida certidão para qualquer parte que

a solicite, independentemente de identificação.

4. Princípio da Fé Pública.

É íntima a ligação do princípio da fé pública com o da publicidade, razão

pela qual muitos autores entendem englobarem um único princípio. Com

efeito, para que a publicidade tenha o atributo necessário para gerar a

em seu nível de águas, em qualquer época do ano, desde que não inferior a 5 cm, e decorrentes da ação das marés (art. 2º, e parágrafo único, do Dec.-lei 9.760, de 5.9.46)" (Celso Antônio Bandeira de Mello, "Os terrenos de marinha aforados e o poder municipal", artigo na RT 396/22).

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46

segurança exigida às relações jurídicas, é preciso outorgar-lhe presunção

de veracidade para garantir-lhe a eficácia.

Entende-se pelo princípio da fé pública na presunção de veracidade que têm

os atos de determinados funcionários públicos (sentido lato) por eles

realizados ou praticados em sua presença, sempre no exercício de suas

respectivas funções.

Transportado o princípio para o Registro de Imóveis, podemos dizer que o

conteúdo da matrícula é uma verdade jurídica, devendo-lhe ser outorgada

presunção de veracidade, lembrando sempre que referida presunção é relativa

no direito brasileiro, como exposto em maior detalhe no item V.

Ressalte-se que caso o registro não exprima a verdade, poderá o prejudicado

proceder sua retificação (artigos 860 do Código Civil, e 212 e 213 da Lei

6.015/73).

5. Princípio da legalidade

Uma vez protocolizado o título deve o oficial registrador qualificá-lo,

observando-se não somente a legislação registrária, mas outras leis

especiais sem, contudo, perder de vista que a análise do titulo deverá

ater-se tão somente aos aspectos extrínsecos do título. Deve aplicar os

princípios, observar se o título encontra-se no rol taxativo do artigo 167,

se não contraria a moral e os bons costumes, dispositivo de lei federal

cogente como o regime de bens etc, salientando-se que a legalidade e a

observância dos demais princípios devem ser exigidos nos título judiciais,

sendo limite, a atividade jurisdicional, não devendo o oficial registrador

discutir, por exemplo, pretensa inobservância do processo legal.

6. Princípio da Prioridade

Os títulos apresentados para registros são recepcionados e recebem uma

numeração cronológica após lançados no livro de protocolo, esse ato é

denominado prenotação ou protocolização. O oficial registrador tem trinta

dias para efetuar o registro do título, sendo que em caso de

desqualificação, deverá devolve-lo à parte em quinze dias, para que esta

possa satisfazer as exigências. Nesse período (30 dias), o título

apresentado recebe uma prioridade com relação a qualquer outro título

envolvendo o mesmo imóvel, de sorte que somente perderá esse direito no

caso da não satisfação das exigências e consequente término do prazo.

Page 47: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

47

O princípio da prioridade determina que, no confronto de direitos

contraditórios submetidos simultaneamente à qualificação, os registros

seguem a ordem de prenotação dos respectivos títulos. Dessa forma, uma vez

protocolizado um título envolvendo determinado imóvel, nenhum outro

apresentado posteriormente, envolvendo o mesmo imóvel, poderá ser

registrado no prazo de trinta dias. Caso ocorra a apresentação de títulos

em datas diversas, tendo por objeto, porém, o mesmo imóvel, o que foi

apresentado primeiramente terá preferência sobre o segundo, ocorrendo o que

denomina-se títulos contraditórios, ou seja, títulos que têm por objeto

direitos que não podem coexistir ou cuja força depende da ordem de ingresso

no Registro de Imóveis.

            

7. Princípio da Especialidade

De origem doutrinária, esse princípio foi emprestado dos direitos reais de

garantia na referência à especialização da hipoteca. Afrânio de Carvalho,

com a clareza que lhe é peculiar, afirma que "o princípio de especialidade

significa que toda inscrição deve recair sobre um objeto precisamente

individuado".

A doutrina divide o princípio da especialidade em três classes:

a) a denominada especialidade objetiva que concerne ao objeto da situação

jurídica que é o imóvel com todas suas características que acabamos de

discorrer;

b) a chamada especialidade subjetiva, que diz respeito às pessoas titulares

de direitos ou poderes enunciados na situação jurídica, principalmente à

completa identificação; e

c) a especialidade do fato jurídico exprimindo-se sua natureza, extensão às

condições que houver, seu valor.

Contudo, somente os dois primeiros foram aceitos e amplamente difundidos em

razão da maior aplicação ou relevância registrária.

8. Princípio da Continuidade

Page 48: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

48

O princípio da continuidade, que se apoia no de especialidade, quer dizer

que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma

cadeia de titularidades à vista da qual só se fará a inscrição de um

direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular.

Assim, as sucessivas transmissões, que derivam umas das outras, asseguram

sempre a preexistência de imóvel no patrimônio de transferente. Ao exigir

que cada inscrição encontre sua procedência em outra anterior, que assegure

a legitimidade da transmissão ou da oneração do direito, acaba por

transformá-la no elo de uma corrente ininterrupta de assentos, cada um dos

quais se liga ao seu antecedente, como o seu subsequente a ele se ligará

posteriormente. Graças a isso o Registro de Imóveis inspira confiança ao

público.

O princípio da continuidade ou do trato sucessivo tem alcance puramente

formal, ou seja, visa a conseguir que o histórico registral de cada imóvel

seja autêntico e completo, tomando-se necessária uma continuidade entre os

lançamentos inerentes a esse mesmo imóvel. A análise a ser realizada é

subjetiva, ou seja, deve observar o encadeamento dos titulares dos

respectivos direitos reais.

São dois os principais artigos da Lei 6.015/73 que tratam do referido

princípio:

Art. 195. Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do

outorgante, o oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título

anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do

registro.

Art. 237. Ainda que o imóvel esteja matriculado, não se fará registro que

dependa da apresentação de título anterior, a fim de que se preserve a

continuidade do registro.

9. Princípio da Disponibilidade

Trata-se de corolário do princípio da continuidade. Alicerça-se o princípio

da disponibilidade em uma primeira análise, na máxima "ninguém poderá

transmitir o que não possui" - nemo dat quod sine non habet - nemo plus jus

transfere. Assim sendo, na transferência de domínio deve-se sempre

respeitar a exata propriedade do alienante, principalmente em seus aspectos

quantitativos, por exemplo: figurando na matrícula determinada pessoa

proprietária da parte ideal de cinqüenta por cento do imóvel, deverá a

Page 49: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

49

mesma, na transmissão, comparecer alienando essa mesma parte ideal, que

corresponde ao direito a ela correspondente.

Mas não é só, o princípio da disponibilidade é aplicado também nos

parcelamentos e apurações de remanescente de imóveis. Com efeito, nessas

hipóteses é preciso respeitar sempre a área total do imóvel primitivo a fim

de que a transcrição ou matrícula possa ser esgotada e, por conseguinte,

encerrada, afastando-se eventuais sobreposições.

Essa análise, outrora, era feita somente nos aspectos quantitativos, ou

seja, mero cálculo aritmético da área total do imóvel até proceder-se seu

esgotamento, todavia, após o advento da Lei 6.015/73, passou-se à uma

análise qualitativa ou geodésica, observando-se todas as características do

imóvel, tais como medidas lineares, área total, confrontações e distância

da próxima esquina.

10. Princípio da Obrigatoriedade (CC, 1.227 e 1.245)

Art. 1.227. Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos

por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro

de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos

expressos neste Código.

Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do

título translativo no Registro de Imóveis.

§ 1o Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a

ser havido como dono do imóvel.

11. Princípio de retificação (Lei 6.015, arts. 213 e 216, CC, art. 1.247)

Art. 1.247. Se o teor do registro não exprimir a verdade, poderá o

interessado reclamar que se retifique ou anule.

C.2 - principais livros do registro de imóveis

Os livros do Registro de Imóveis podem ser divididos em três grupos:

Principais, internos e classificadores, cumprindo observar que tratam-se

livros cuja utilização é obrigatória, nos termos das Normas de Serviço da

Corregedoria Geral da Justiça. Para fins do curso de direito, estudaremos

apenas os principais

Page 50: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

50

Livros principais.

- Livro de Recepção de Títulos: Neste livro são relacionados exclusivamente

todos os títulos que foram recepcionados para exame e cálculo dos

respectivos emolumentos a requerimento escrito e expresso do interessado;

- Livro n. 1 - Protocolo: Somente são cadastrados neste livro os títulos

prenotados, ou seja, uma vez recepcionados entram em uma fila de

precedência, de modo que possuem preferência para registro com relação a

eventuais títulos que sejam recepcionados posteriormente, é o chamado

princípio da prioridade, contido no artigo 186 da Lei de Registros Públicos

(6.015/73). A prenotação do título terá validade de 30 (trinta) dias e

somente poderá ser prorrogada em casos excepcionais;

- Livro n. 2 - Registro Geral: É o principal livro do Registro Imóveis.

Será destinado à matrícula dos imóveis e ao registro ou averbação dos atos

não atribuídos ao Livro 3;

- Livro n. 3 - Registro Auxiliar: O Livro n. 3 será destinado ao registro

dos atos que, sendo atribuídos ao Registro de Imóveis por disposição legal,

não digam respeito diretamente a imóvel matriculado, por exemplo: cédulas

de crédito rural, de crédito industrial, de crédito à exportação e de

crédito comercial; as convenções de condomínio; o penhor de máquinas e de

aparelhos utilizados na indústria, instalados e em funcionamento, com os

respectivos pertences ou sem eles; as convenções antenupciais; os títulos

que, a requerimento do interessado, forem registrados no seu inteiro teor,

sem prejuízo do ato praticado no livro n. 2; transcrição integral da

escritura de instituição do bem de família, sem prejuízo do seu registro no

Livro n. 2; tombamento definitivo de imóvel etc.;

- Livro n. 4 - Indicador Real: O Livro n. 4 será o repositório das

indicações de todos os imóveis que figurarem no Livro n. 2, devendo conter

sua identificação e o número da matrícula;

- Livro n. 5 - Indicador Pessoal: O Livro n. 5, dividido alfabeticamente,

será o repositório dos nomes de todas as pessoas que, individual ou

coletivamente, ativa ou passivamente, direta ou indiretamente, inclusive os

cônjuges, figurarem nos demais livros, fazendo-se referências aos

respectivos números de ordem;

Page 51: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

51

- Livro de Registro de Aquisição de Imóveis Rurais por Estrangeiros: Todas

as aquisições de imóveis rurais por estrangeiros deverão ser obrigatória e

trimestralmente comunicadas ao INCRA e à Corregedoria Geral da Justiça.

- Livro de Registro das Indisponibilidades: Destina-se ao registro dos

ofícios da Corregedoria Geral da Justiça ou dos interventores e liquidantes

de instituições financeiras em intervenção ou liquidação extrajudicial,

comunicando a indisponibilidade dos bens de diretores e ex-administrados

das referidas sociedades.

* Ressalte-se que os mandados judiciais que não contêm previsão legal

específica para ingresso no registro imobiliário, mas que determinem a

indisponibilidade de qualquer bem imóvel, deverão ser recepcionados no

Livro 1 - Protocolo, ficando a prenotação prorrogada até solução definitiva

da pendência judicial (Prov. CG 17/99).

C.3 - roteiro da tramitação do título no registro de imóveis

Não há qualquer dispositivo legal, nem normativo, disciplinando a

tramitação interna do título no Registro de Imóveis, todavia, para efeitos

didáticos apresentamos um roteiro prático adotado por alguns Oficiais de

Registro de Imóveis da Capital, sendo sua maior vantagem o escalonamento do

serviço, de sorte que o título é analisado por várias pessoas, diminuindo

consideravelmente a margem de erro e aumentando o debate jurídico entre os

escreventes.

            

1. Recepção.

A primeira análise que o Registro de Imóveis faz do título ocorre na

recepção da serventia, procedendo-se um exame preliminar para que não se

cometam erros que possam afetar direitos de terceiros. Com efeito, apesar

da análise ser superficial, deve a recepção observar se o imóvel objeto do

título pertence à circunscrição do Registro de Imóveis, se o título é hábil

para ter acesso à serventia, pois muitas vezes é apresentado por meio de

cópia e não poderá ter sua prioridade garantida (artigo 186 da Lei

6.015/73).

As Normas de Serviço da Egrégia Corregedoria Geral da Justiça recomendam

que se proceda a exame prévio dos títulos, para verificação da presença dos

requisitos mínimos do ato pretendido, já no momento da apresentação,

Page 52: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

52

devolvendo-se, se for o caso, independentemente de qualquer outra

providência (item 8, Capítulo XX), contudo, na insistência do apresentante

deverá o título ser protocolizado para qualificação.

Outro cuidado que deve ter a recepção é na forma que o título terá acesso

ao Registro de Imóveis, ou seja, se para prenotação e registro ou exame e

cálculo das custas e emolumentos, pois grandes consequências poderão

ocorrer na sua escolha.

No primeiro caso, para prenotação e registro, deve ser exigido depósito

prévio das custas e emolumentos, outorgando ao título prioridade de

registro nos termos dos artigos 11, 12 e 186 da Lei de Registros Públicos,

devendo o título ser qualificado no máximo em quinze dias e registrado em

trinta dias (contados da apresentação);

No segundo, a situação é diversa, não há necessidade de depósito prévio,

devendo o título ser qualificado em trinta dias, porém, não é aplicado o

princípio da prioridade.

Ressalte-se que a regra é que o título seja prenotado, excepcionalmente é

admitida a protocolização para exame e cálculo, que dependerá de

requerimento escrito e expresso do interessado, que deverá ser arquivado.

2. Contraditório.

Superada a primeira fase, o título é encaminhado a um setor que o

cadastrará e procederá todas as buscas necessárias nos indicadores,

principalmente no controle de títulos contraditórios onde será observado se

há outro título envolvendo os mesmos imóveis, bem como no livro de

indisponibilidade, sendo que na ocorrência de algum dos casos, será feita a

anotação pertinente no título para posterior verificação.

Neste setor também são impressos e atualizados os livros de protocolo e

recepção de títulos.

3. Extrato.

Page 53: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

53

Nesta oportunidade é feito um resumo ou extrato do título que após impresso

é submetido à conferência e verificação, nesta fase preliminar é realizada

pesquisa pelo digitador ou datilógrafo do registro anterior, anexando-se ao

título cópia da matrícula original.

4. Conferência.

Várias são as funções da conferência, a primeira consiste na análise do

extrato em cotejo com o título, conferindo se aquele corresponde de forma

fiel a este, observando-se a redação e erros de digitação e gramaticais.

Posteriormente, o conferente analisa a legalidade do título da forma mais

ampla, ou seja, se o título está incluso no rol do artigo 167 da Lei

6.015/73; se foi observada a forma prescrita em lei (artigos nºs 215 e 221

do Código Civil) no caso de escritura pública ou instrumento particular; o

recolhimento dos tributos incidente sobre os imóveis (artigo 31, inciso XI,

da Lei 8.935/94); nesta fase, também, é feita uma análise da formalidade ou

requisitos extrínsecos do título, como por exemplo: as assinaturas das

partes, numeração de folhas em títulos judiciais, reconhecimentos de firma,

certidões de órgãos complexos etc.

Por derradeiro será feito o cálculo das custas e emolumentos e o título

submetido à verificação.

5. Verificação.

A verificação é setor do Registro de Imóveis que aplica mais profundamente

os princípios da continuidade, disponibilidade e especialidade, entre

outros, pois analisa o título através do extrato com a matrícula ou

transcrição, observando eventuais divergências que deverão ser dirimidas

antes do registro.

Neste setor também é observada a ocorrência de títulos contraditórios e

indisponibilidade de bens, onde são tomadas as medidas pertinentes para

cada caso.

6. Devolução.

Page 54: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

54

Sendo o título desqualificado, ou seja, havendo exigência de qualquer ordem

deverão ser formuladas de uma só vez, por escrito, de forma clara e

objetiva, em papel timbrado do cartório, com identificação e assinatura do

servidor responsável, lembrando sempre que o apresentante muitas vezes é

leigo na área de registros públicos, devendo ser evitado o excesso de

termos jurídicos.

7. Numeração e Registro.

Estando apto para registro ou superadas as exigências, o título será

submetido à numeração, que corresponde na admissão para inclusão do título

nos livros 2 ou 3. Nesta fase o extrato será corrigido se tiver algum erro

e o ato será impresso e transportado para o respectivo livro, sendo o

título encerrado com acompanhamento da certidão talão que resumirá as

custas e emolumentos devidos, procedendo-se, ao final, a microfilmagem

total dos títulos.

Os indicadores real e pessoal serão, nesta oportunidade, atualizados,

devendo as custas devidas ao Estado serem recolhidas no dia subsequente ao

ato praticado e a contribuição para aposentadoria semanalmente.

C.4 - Procedimento de Dúvida

Conceitua-se dúvida registrária na acepção material como sendo "o juízo,

emitido pelo registrador no exercício de suas funções, obstando a uma

pretensão de registro; em acepção formal: o procedimento de revisão

hierárquica do juízo administrativo de objeção a uma pretensão de

registro"3.

Procedimento: Não se conformando o apresentante (suscitado) com a exigência

do Oficial Registrador poderá requerer a declaração ou suscitação de dúvida

ao Oficial Registrador (suscitante), que remeterá ao Juízo competente para

dirimi-la, acompanhada de sua razões, procedendo-se a notificação e

intimação do suscitado para impugná-la no prazo de quinze dias, observando-

se que é dever do Oficial encaminhar ao juízo competente as dúvidas

levantadas pelos interessados, nos termos do artigo 30, XIII, da Lei

8.935/94.

Decorrido o prazo, apresentada ou não a impugnação, os autos serão

remetidos ao representante do Ministério Público que atuará como fiscal da

3 Algumas Linhas sobre a Dúvida no Registro de Imóveis, Benedito Silvério Ribeiro e Ricardo Henry Marques Dip, Contribuição aos Estudos do XV Encontro Nacional de Oficiais de Registro de Imóveis, Espírito Santo – 1988.

Page 55: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

55

lei (custus legis) emitindo parecer no prazo de dez dias, retornando os

autos ao Juízo competente para prolação de sentença, sendo que a prenotação

ficará suspensa até final solução (artigos 198 e seguintes da Lei

6.015/73). Irresignado com a decisão de primeiro grau, poderá o suscitado

recorrer no prazo de quinze dias para o órgão competente através de

apelação, que será recebida nos efeitos devolutivo e suspensivo, função

essa que no Estado de São Paulo é exercida pelo Conselho Superior da

Magistratura, órgão do Poder Judiciário composto pelo Presidente do

Tribunal de Justiça, Vice-Presidente e Corregedor-Geral da Justiça.

Salienta-se que a intervenção do Ministério Público é obrigatória, sob pena

de nulidade (artigo 200 da Lei 6.015/73), lembrando o Advogado e Ex-Juiz de

Direito da 1ª Vara de Registros Públicos GILBERTO VALENTE DA SILVA a

importância da intervenção do parquet pois o registrador não pode recorrer

da sentença de improcedência da dúvida.

Questão interessante ocorre no artigo 199 da Lei de Registros Públicos que

exige a condição de "interessado" para que a dúvida seja impugnada,

diversamente do artigo 198 que menciona a condição de apresentante para

requerer sua declaração. O interesse deve ser direto ou indireto, ter-se-á

o primeiro quando a impugnação for realizada por aquele cujo nome será

feito o registro; o segundo ocorre quando pelo registro seu direito será

atingido.

A jurisprudência tem admitido, por economia processual, outra forma de

suscitação de dúvida, a chamada "dúvida inversa", procedimento pelo qual o

requerimento é apresentado diretamente ao juízo competente que abre vista

dos autos ao oficial registrador para prenotação e resposta, seguindo o

procedimento previsto na Lei de Registros Públicos.

Somente o registro em sentido estrito pode ser objeto de suscitação de

dúvida (artigo 167, inciso I, da Lei 6.015/73), segundo orientação do

Conselho Superior da Magistratura de São Paulo.

Nos casos de averbação (artigo 167, II, da Lei 6.015/73), o procedimento

correto seria o de "providências administrativas", com competência recursal

da Corregedoria Geral da Justiça, que é residual em se tratando de

Registros Públicos, todavia, não possui as mesmas características da

dúvida, pois não prorroga a prenotação até o dissenso ser dirimido.

Page 56: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

56

Ressalte-se que o procedimento de dúvida tem natureza puramente

administrativa, dessa forma: Não há contraditório entre partes

interessadas, mas apenas dissenso entre o requerente e o serventuário; não

configura causa no sentido constitucional; não enseja coisa julgada

material mas mera preclusão administrativa; não se aplicam totalmente as

formas e institutos do Código de Processo Civil, que somente é utilizado

subsidiariamente, assim, por exemplo, o agravo de instrumento, perícia,

intervenções de terceiros e o recurso especial não podem ser utilizados no

procedimento de dúvida, o que não ocorre com os embargos declaratórios, bem

como alguns dos requisitos da petição inicial contidos no artigo 282, que

são aceitos, observando-se que tanto para a impugnação da dúvida, como para

se interpor recurso, será necessária a constituição de advogado, nos termos

do artigos 1º da Lei 8.906/94 e 36 do Código de Processo Civil.

O Conselho Superior da Magistratura tem decidido que formuladas várias

exigências quando da apresentação do título pelo Oficial Registrador, não

pode o suscitado, no curso do procedimento de dúvida, concordar nem atender

algumas delas, pois descaracterizaria o dissenso com o Oficial, que deve

ser total, caracterizando potencial prejuízo para terceiros interessados

detentores de títulos contraditórios.

A reiteração da dúvida é admitida desde que se supere o motivo

anteriormente reconhecido ou que se tenha alterado a jurisprudência a

respeito das questões tratadas.

D) DIREITO HEREDITÁRIO (assunto pertencente ao "direito das sucessões"):

É modo de aquisição da propriedade imóvel, porque, aberta a sucessão, o

domínio da herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros; o inventário é

feito em função do princípio da continuidade do registro de imóveis, para

que o herdeiro ali figure como titular do direito de propriedade; todavia,

a aquisição desse direito dá-se simplesmente em razão do falecimento do "de

cujus", quando então se considera aberta a sucessão.

FORMAS DE AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE MÓVEL

1. Usucapião ordinária de coisa móvel – Art. 1260 do Código Civil

Page 57: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

57

“Aquele que possuir coisa móvel como sua, contínua e incontestadamente,

durante três anos, com justo título e boa-fé, adquirir-lhe-á a

propriedade.”

A usucapião é modo originário de aquisição de bens móveis, dando

juridicidade a situações fáticas que se alongam no tempo.

Requisitos: Posse mansa e pacífica, ininterrupta, sem oposição exercida com

animus domini pelo prazo de três anos, justo título ainda que viciado ou

irregular, boa fé e sentença judicial declaratória da aquisição do domínio

por usucapião.

2. Usucapião extraordinária de coisa móvel – Art. 1261 do Código Civil

“Se a posse da coisa móvel se prolongar por cinco anos, produzirá

usucapião, independentemente de título ou boa-fé”

Neste caso os requisitos são os mesmos apontados acima com exceção do prazo

que será de cinco anos e do justo título e da boa fé, pois há presunção

juris et de jure.

OBS: Segundo o Art. 1262 do Código Civil, aplica-se à usucapião das coisas

móveis o disposto nos arts. 1243 e 1244

3. Da ocupação

“Art. 1.263. Quem se assenhorear de coisa sem dono para logo lhe adquire a

propriedade, não sendo essa ocupação defesa por lei.”

A ocupação é aquisição de coisa móvel ou semovente, sem dono, por não ter

sido apropriada “res nullius”, ou por ter sido abandonada “res derelictae”,

não sendo essa apropriação defesa por lei.

O Código civil de 1916 enumerou em seu art. 593 as chamadas coisas sem

dono. Artigo que não foi recepcionado pelo código de 2002

“Art. 593 - São coisas sem dono e sujeitas à apropriação:

I - os animais bravios, enquanto entregues à sua natural liberdade;

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58

II - os mansos e domesticados que não forem assinalados, se tiverem perdido

o hábito de voltar ao lugar onde costumam recolher-se, salvo a hipótese do

Art. 596;

III - os enxames de abelhas, anteriormente apropriados, se o dono da

colmeia, a que pertenciam, os não reclamar imediatamente;

IV - as pedras, conchas e outras substâncias minerais, vegetais ou animais

arrojadas às praias pelo mar, se não apresentarem sinal de domínio

anterior.”

Acreditamos ter deixado o legislador propositalmente de fora tal

dispositivo para que seja aplicado as leis específicas como o código de

caça Lei 5197/67, Decreto lei 221/67 proteção e estímulos a pesca e lei

7653/88 da proteção a fauna.

São suscetíveis de ocupação:

Res derelictae – Coisa sem dono porque foi abandonada pelo seu

proprietário, que, intencionalmente, quis se desfazer dela, logo, poderá

ser licitamente adquirida mediante ocupação(RT 481:351). São coisas sem

dono e sujeito a apropriação: Os animais bravios e selvagens entregues a

sua natural liberdade desde que não protegidos por lei especial, os animais

domesticados ou mansos, salvo se os donos ainda estiverem a sua procura.

Res Nullius - A coisa de ninguém, por não ter sido nunca apropriada, pode

ser adquirida por ocupação, não sendo esta defesa em lei.

Outras formas de aquisição da propriedade móvel

1. Do achado do tesouro

Tesouro é o depósito de coisas preciosas, oculto, sendo desconhecido o seu

dono.

Se encontrado um tesouro em local alheio, ele será dividido em partes

iguais entre o dono deste e o descobridor, porém, se um destes se apossar

de todo o tesouro, ter-se-á furto relativo à metade que não lhe pertence,

podendo ser cobrado judicialmente pelo prejudicado. (CC art. 1264)

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59

O proprietário do local onde foi encontrado o tesouro, será considerado seu

dono se:

a) O tesouro for encontrado por ele em seu próprio imóvel;

b) O tesouro for encontrado por empregado seu, o qual tinha a incumbência

de procurá-lo;

c) O tesouro for achado por pessoa que invadiu sua terra em busca de

riqueza, intencionalmente e sem sua autorização e/ou determinação. (CC

art.1265)

O tesouro sendo encontrado em imóvel aforado (contrato bilateral, onde o

proprietário pleno cede a outrem o domínio útil de determinada área,

mediante pagamento ou frutos) deverá ser partilhado entre quem o encontrou

e o enfiteuta (pessoa que toma por aforamento o imóvel, sobre o qual tem o

domínio útil), ou será deste ultimo se for encontrado por si próprio. (CC

art. 1266)

2. Da tradição

O contrato entre as partes não basta para transferir o domínio, sendo

necessário que o ato de vontade constante neste, se complete com outra

solenidade, a tradição que é a entrega do bem móvel do alienante ao

alienatário, ocorrendo assim a transferência do domínio, em razão do

contrato firmado entre as partes. Se o bem for imóvel, ocorrerá a tradição,

através da transcrição no Registro Imobiliário.

Gerando o contrato apenas um direito pessoal entre as partes, é através da

tradição que o alienatário passa a ter direito real sobre a coisa. Porém,

sendo a tradição ato complementar do negócio jurídico, este deve obedecer

os seguintes requisitos: agente capaz; objeto lícito, possível e

determinável; e forma prescrita ou não em lei (CC art. 104), pois, se é

ineficaz o negócio jurídico e se feita por quem não era proprietário, a

tradição não pode ganhar eficácia.

A tradição pode ser:

a) real: que é a entrega material da coisa;

Page 60: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

60

b) simbólica: que é ato representativo da transferência, em que não há real

entrega do objeto, mas de coisa a ele equivalente, por exemplo a entrega

das chaves do automóvel.

c) ficta: ocorre pelo constituto possessório (quando o possuidor do bem

móvel que o possui em nome próprio passa a possuí-lo em nome alheio) quando

o alienante, em vez de entregar a coisa vendida, a retém por um outro

título, por exemplo, como locatário.

Uma outra tradição fictícia, é a “traditio brevi manu” (quando o possuidor

do bem móvel o possuía em nome alheio passa a possuí-lo em nome próprio) é

a tradição das coisas que se encontra em mãos de terceiro, como por

exemplo, o caso de venda de prédio alugado.

Se o transmitente não for o proprietário da coisa móvel, a tradição não

terá o efeito de transferir o domínio, constituindo crime de estelionato

(CP art. 171, § 2º), salvo se o bem, oferecido ao público, em leilão ou

estabelecimento mercantil, for transferido em circunstância tal que ao

adquirente de boa-fé pareceu ser a coisa alienada pertencente ao alienante,

ou seja, por exemplo, que o comprador tinha a boa-fé de que o bem móvel era

de propriedade do vendedor, quando na realidade este não era proprietário.

Mas se o adquirente estava de boa-fé e se o alienante vier a adquirir

posteriormente a propriedade da coisa, a transferência será revalidada e

operado o efeito da tradição, desde o momento da celebração da alienação.

Caso a tradição for baseada em ato negocial nulo (CC art. 166, incisos I a

VII), esta não terá o condão de operar a transferência da propriedade da

coisa móvel.

3. Da especificação

Especificação é o modo de adquirir a propriedade mediante transformação de

coisa móvel em espécie nova, em virtude do trabalho ou da indústria do

especificador, desde que não seja possível voltar a forma anterior.

A propriedade da coisa nova será:

a) Do especificador se a matéria-prima aplicada for total ou em parte sua,

desde que não possa voltar a forma anterior;Ex. cana de açúcar e açúcar ou

caldo de cana.

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61

b) Do dono da matéria-prima, se for possível voltar a forma anterior. Ex.

madeira e cadeira.

Se toda a matéria-prima for de outrem, a propriedade da coisa nova será:

a) Do especificador de boa-fé, quando não puder voltar à forma anterior;

b) Do dono do material, se o especificador estiver de má-fé e desde que não

se possa voltar à forma anterior;

c) Do dono da matéria-prima, se puder voltar à forma anterior;

d) Do especificador, podendo ou não voltar à forma anterior, estando ou não

o especificador de boa-fé, desde que o preço da mão-de-obra seja maior que

o da matéria-prima;

e) Do especificador exclusivamente, sendo a especificação obra de arte ou

literária, se seu valor exceder consideravelmente o da matéria-prima

alheia.

Poderão receber indenização por perdas e danos, todos aqueles que forem

lesados pela transformação de coisa móvel em espécie nova feita, com

matéria-prima alheia, e somente não caberá indenização ao especificador que

utilizou-se de material de outrem através da má-fé.

4. Da confusão, da comissão e da adjunção

Quanto ao título acima, que traz “comissão”, trata-se na verdade de

comistão.

Conceitos:

a) Confusão: é a mistura de coisas líquidas, sendo impossível separa-las;

b) Comistão: é a mistura de coisas sólidas ou secas, sendo impossível

separá-las;

c) Adjunção: é a justaposição de uma coisa à outra, de modo que não mais se

torne possível destacar a acessória da principal, sem deterioração.

Se ocorrer uma das hipóteses acima, deve-se observar se existe ou não a

possibilidade de separar as coisas misturas, sem ameaça de deterioração.

Page 62: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

62

Não havendo a possibilidade de deterioração da coisa, poderá proceder-se a

separação, devolvendo-se a cada um dos donos da matéria-prima o que lhe

pertencia, sendo que as despesas da separação correrá por conta de quem deu

causa a mistura.

A mistura feita por terceiro sem o consentimento dos donos da matéria-

prima, a lei determina que:

a) Se as coisas puderem ser separadas, sem deterioração, cada proprietário

continuará a ter domínio sobre a mesma coisa que lhe pertencia antes da

mistura;

b) Se for impossível ou custosa a separação, o todo permanecerá sem a

separação, onde cada proprietário terá um quinhão proporcional ao valor do

bem com que entrou para a mistura;

c) Se uma das coisas for considerada principal em relação às outras, o

domínio será do dono da coisa principal, devendo este, indenizar os outros.

Caso a mistura ocorra de má-fé por uma das partes, poderá a outra parte:

a) Ser proprietário do seu quinhão proporcional;

b) Renunciar à que lhe pertence, mediante recebimento de indenização a que

tem direito.

PERDA DA PROPRIEDADE IMÓVEL

As modalidades da perda da propriedade abaixo, podem ocorrer tanto para

bens móveis como imóveis.

Modos voluntários:

a) Alienação é a forma de extinção subjetiva do domínio, em que o titular

desse direito, por vontade própria, transmite a outrem seu direito sobre a

coisa; é a transmissão de um direito de um patrimônio a outro; essa

transmissão pode ser a título gratuito, como a doação, ou oneroso, como a

compra e venda, troca, dação em pagamento. (CC, art. 1.275, I, parágrafo

único).

Page 63: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

63

- decorre do “jus disponendi”, em que o titular, por sua vontade própria,

transfere a coisa ou direito a outrem, através de negócio jurídico

bilateral (contrato), onerosa ou gratuitamente, bem móvel por meio da

tradição, ou bem imóvel por meio da transcrição, que é o registro no

cartório imobiliário competente;

- existe negócio bilateral, pois o adquirente deve aceitá-lo;

- vigora o princípio de que ninguém transfere mais direitos do que possui;

- enquanto não ocorrer a tradição e a transcrição, o negócio jurídico fica

no plano dos direitos obrigacionais;

b) Renúncia é um ato unilateral, pelo qual o proprietário declara,

expressamente, o seu intuito de abrir mão de seu direito sobre a coisa, em

favor de terceira pessoa que não precisa manifestar sua aceitação. (CC,

art. 1.275, II, parágrafo único).

- é um ato unilateral, é irrevogável e não se presume, pelo qual o

proprietário declara, expressamente, sua intenção de abrir mão de seu

direito sobre a coisa em favor de terceira pessoa, que não precisará

manifestar sua aceitação;

- é sempre possível, desde que não prejudique terceiros;

- para bens imóveis exige-se a transcrição no cartório de registro

imobiliário competente e para bens móveis declaração do titular para

conhecimento de terceiros;

c) Abandono é o ato unilateral em que o titular do domínio se desfaz,

voluntariamente, do seu imóvel, porque não quer mais continuar sendo, por

várias razões, o seu dono; é necessário a intenção abdicativa; simples

negligência ou descuido não a caracterizam. (CC, art. 1.275, III e 1.276,

§§ 1º e 2º)

- é um ato unilateral em que o titular do domínio se desfaz,

voluntariamente, do sem bem móvel ou imóvel porque não mais deseja

continuar sendo seu dono;

Page 64: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

64

- para o ato de abandono, é necessário o poder de dispor, ou seja, quem não

possui poder de dispor, quem não é dono ou não possui capacidade civil, não

pode abandonar;

- é necessário que o titular da propriedade tenha a voluntariedade em

abandonar o bem, com a intenção de não mais a ter para si, pois a simples

negligência ou descuido em relação ao bem não o caracteriza;

- Conforme art. 1276 do Código Civil, havendo intencional abandono do

imóvel pelo seu proprietário, não estando na posse de outrem, será ele

arrecadado como bem vago, passando três anos depois, à propriedade do

Município ou do Distrito Federal, sendo imóvel urbano, da União se imóvel

rural. Caso esteja na posse de outrem, este poderá requerer a propriedade,

obedecendo os requisitos do usucapião.

Modos involuntários:

a) Como não há direito sem objeto, com o perecimento do imóvel extingue-se

o direito; esse perecimento pode decorrer de ato involuntário, se

resultante de acontecimentos naturais, ou de ato voluntário do titular do

domínio, como no caso de destruição. (CC, art. 1.275, IV)

b) Requisição é o ato pelo qual o Estado, em proveito de um interesse

público, constitui alguém, de modo unilateral e autoexecutório, na

obrigação de prestar-lhe um serviço ou ceder-lhe, transitoriamente, o uso

de uma coisa, obrigando-se a indenizar os prejuízos que tal medida,

efetivamente, acarretar ao obrigado. (CC, art. 1.228, §3º, 2ª parte; CF,

art. 5º, XXV, 139, VII).

c) desapropriação:

1. Conceito: um direito do Estado que se traduz em procedimento regido pelo

Direito Constitucional-Administrativo, visando à imposição de um sacrifício

total, por justa causa, de determinado direito patrimonial, particular ou

público – respeitada a hierarquia -, tendo como finalidade a aquisição pelo

Poder Público ou de quem, delegadamente, cumpra o seu papel, por intermédio

de indenização que há de ser prévia e justa, efetuado o pagamento em

dinheiro, com as ressalvas constitucionais expressas 4.

4 FREITAS, Juarez. Estudos de Direito Administrativo. 2.ª Ed. São Paulo: Malheiros, 1995, pg. 84.

Page 65: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

65

2. Conseqüência: com a desapropriação, o bem passará à dominialidade

pública, perdendo sua categoria de bem privado - na maioria dos casos -,

sujeitando-se, assim, ao regime jurídico de direito público. Logo, a

definição do momento em que se consuma a desapropriação, com a incorporação

do bem à Fazenda Pública, é questão que apresenta relevância jurídica como

marco delimitador da aquisição de propriedade pelo expropriante, e

consequente perda para o expropriado.

3. Requisitos

Para que a expropriação não esteja fadada ao insucesso, incorrendo em

ilegitimidade, é de vital importância que sejam preenchidos os seus

requisitos constitucionais. Destarte, no que calha ao art.5º, XXIV, da

Constituição Federal do Brasil, os pressupostos para que haja uma

desapropriação hígida e idônea, a serem honrados pela Administração

Pública, são os seguintes: a necessidade pública, a utilidade pública, o

interesse social e o pagamento de justa ou prévia indenização.

Primeiramente, no que diz respeito à necessidade pública, esta se faz

presente quando, em casos de urgência, o Estado se vê na obrigação de

integrar determinado bem, antes pertencente ao particular, ao patrimônio

público, para que seja resolvida uma problemática iminente que exige, desde

logo, o uso do bem desapropriado.

Quanto à utilidade pública, esta se configura quando da conveniência da

transmissão de um dado bem privado ao domínio público, mesmo que seja

dispensável. Entretanto, a doutrina é muito dividida, longe de ter uma

opinião unânime formada, no tocante à possibilidade do termo utilidade

pública abarcar tanto o significado dele próprio como o da necessidade

pública e do interesse social. Neste diapasão, discorre o jurista Celso

Ribeiro Bastos:

Convém salientar que a distinção que outrora se fazia entre esses dois

conceitos já não tem relevância jurídica. É que o Decreto-lei n. 3.365/41

não mais se refere às hipóteses de necessidade pública anteriormente

previstas no Código Civil (art. 590, § 1º). Define, no seu art.5º, tanto as

hipóteses de utilidade pública, quanto as de necessidade pública previstas

na legislação civil acima referida, sob a denominação única de utilidade

pública".

Page 66: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

66

Para alguns doutrinadores a tripartição (utilidade pública, necessidade

pública e interesse social) elaborada pela Carta Magna é de grande valia,

eis que destaca melhor os casos da desapropriação, evitando confusões ou

interpretações equivocadas. Em compensação, a outra parte da doutrina

estabelece que a utilidade pública unifica, por si só, os três requisitos

supra. A verdade é que a polêmica está mantida, até porque é cristalino que

não há um consenso entre os diversos juristas que tratam do assunto.

Já o interesse social acontece quando o Poder Público vislumbra a redução

das disparidades sociais, normalmente, em questões relativas à função

social da propriedade. O Estado visa o melhor aproveitamento da propriedade

particular, quando da expropriação da res, em prol do interesse coletivo,

ou até mesmo de classes sociais necessitadas. Cumpre salientar que os bens

expropriados por interesse social não são transferidos ao patrimônio

público, mas aqueles que a lei concede o direito de recebimento e uso

destes (isto é, coletividade ou categorias da sociedade que merecem o

amparo especial da Administração).

Derradeiramente tem-se a justa e prévia indenização, esta que também pode

ser paga na forma de títulos especiais da dívida pública ou da dívida

agrária.

            

4. Sujeitos da Relação

A relação jurídica expropriatória tem como seus sujeitos necessários o

expropriado (sujeito passivo) e o expropriante (sujeito ativo). Não se pode

esquecer que, nas questões atinentes à desapropriação de propriedade feita

com vistas ao favorecimento de terceiros — como é o caso da desapropriação

confiscatória — existe, também, a figura do beneficiário, o qual seria um

voluntário ou terceiro interessado na lide.

 Aquele que é concedido o direito subjetivo de intervir na propriedade, com

o fim de desapropriar, poder este que emana de leis ordinárias e,

precipuamente, da Constituição Federal, é dado o nome de sujeito ativo.

Num plano universal, ter idoneidade para exercer o papel de sujeito ativo

sugere três estirpes de competência, a saber: competência para legislar

sobre a matéria, para promover a desapropriação e para desapropriar. A

única pessoa que detém legitimidade para figurar no pólo ativo da lide, no

que se refere à competência para legislar sobre a desapropriação, é a União

Federal. Esta colocação é respaldada pelo disposto no art. 22, II, da Magna

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67

Carta, ao regrar que "compete privativamente à União legislar sobre

desapropriação".

Sobre a competência para promover a desapropriação (oportunizada no art.

3º, do Decreto-lei 3.365), Bandeira de Mello aduz ser o mesmo que efetivar

a desapropriação, ou seja, praticar os atos concretos para efetuá-la

(depois de existente uma declaração de utilidade pública expedida pelos que

têm poder para submeter um bem à força expropriatória), além da União,

Estados, Municípios e Distrito Federal, as autarquias, os estabelecimentos

de caráter público em geral, ou que exerçam funções delegadas do Poder

Público e os concessionários de serviço, quando autorizados por lei ou

contrato.

Quanto à competência para desapropriar, em outros dizeres, para imitir-se

na posse de uma propriedade por meio de força expropriatória, são

reconhecidos como aptos à prática da declaração de interesse social ou

utilidade pública de um bem imóvel a União, os Estados, os Municípios e o

Distrito Federal.

Em segundo plano, apresenta-se o sujeito passivo da expropriação. Legítimo

para tal é o expropriado, isto é, aquele que pode vir a ter seu bem imóvel

retirado do seu patrimônio através de ato administrativo, podendo ser

pessoa privada ou pública, jurídica ou física.

5. Modalidades de desapropriação:

a) De início, exsurge em nosso ordenamento a desapropriação clássica ou

ordinária, em que se evidencia a supremacia do interesse público sobre o

particular, realizada mediante indenização prévia, justa e em dinheiro,

tendo como pressupostos a utilidade pública, a necessidade pública, e o

interesse social.

Tem fundamento no art. 5º, XXIV5, da CF, sendo que os referidos

pressupostos, ou melhor, as hipóteses que se configuram como de necessidade

ou utilidade pública, ou de interesse social, são definidos na legislação

ordinária. Destacam-se o Decreto-lei nº 3.365/1941, que dispõe sobre os

casos de desapropriação por utilidade pública, englobando aí os casos de

necessidade pública (art. 5º), e a Lei 4.132/1962, que define os casos de

desapropriação por interesse social.

5 “XXIV-A lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição”.

Page 68: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

68

b) A CF ainda contempla a desapropriação extraordinária, que é realizada

quando o bem particular, que está sendo desapropriado, não está cumprindo a

sua função social. Nesta, há indenização, mas não será prévia, nem em

dinheiro. Cuida-se de desapropriação com caráter sancionatório,

verificando-se em duas hipóteses.

A primeira delas é a que consta do art. 182, § 4º, III6, da CF, denominada

de desapropriação urbanística. Essa forma expropriatória é prevista como a

que pode ser adotada a título de penalização ao proprietário do solo urbano

que não atender a exigência de promover o adequado aproveitamento de sua

propriedade ao plano diretor municipal, estando o imóvel subutilizado ou

não utilizado. Assim, o Poder Público municipal, mediante lei específica,

poderá promover essa desapropriação, observada a gradação imposta no art.

8.º 7 da Lei 10.257/2001 (Estatuto da Cidade), sendo o pagamento da

indenização feito mediante títulos da dívida pública, com prazo de resgate

de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o

valor real da indenização e os juros legais.

A outra hipótese de desapropriação extraordinária, quando a propriedade não

esteja cumprindo a sua função social, é prevista nos arts. 1848 a 186 da CF,

denominada pela doutrina de desapropriação rural. Tem o objetivo de

permitir a perda da propriedade de imóveis rurais para fins de reforma

agrária. A indenização será paga em títulos da dívida agrária, com cláusula

de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a

partir do segundo ano de sua emissão, sendo que as benfeitorias úteis e

necessárias serão indenizadas em dinheiro. Possui disciplina na Lei

8.629/1993, e ainda na Lei Complementar 76/1993.

6 “§ 4º. É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:I - parcelamento ou edificação compulsórios;II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais”. (G.n)7 “Art. 8º Decorridos cinco anos de cobrança do IPTU progressivo sem que o proprietário tenha cumprido a obrigação de parcelamento, edificação ou utilização, o Município poderá proceder à desapropriação do imóvel, com pagamento em títulos da dívida pública”. (G.n)8 “Art. 184. Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja

cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.

§ 1º. As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro.§ 2º. O decreto que declarar o imóvel como de interesse social, para fins de reforma agrária, autoriza a União a propor a ação de desapropriação.(...)”. (G.n)

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69

c) Há, por fim, a desapropriação prevista no art. 2439 da CF, chamada de

desapropriação confiscatória, por não conferir ao expropriado direito

indenizatório. A perda da propriedade nesse caso tem como pressuposto a

utilização da propriedade para cultura ilegal de plantas psicotrópicas.

Após a expropriação, conforme o procedimento disciplinado na Lei 8.257/91,

são essas áreas destinadas a assentamento de colonos com vistas ao cultivo

de produtos alimentícios e medicamentosos.

d) Cumpre mencionar, ainda, a nova figura trazida pelos §§4.º e 5.º10 do

art. 1.228, CC/2002, que vem sendo denominada por alguns doutrinadores como

desapropriação judicial, na qual há a perda da propriedade diante posse

ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de

pessoas, mediante o pagamento de indenização. Embora não se confunda com a

usucapião, que não requer contrapartida econômica, essa nova figura também

não se identifica por completo com a desapropriação propriamente dita, que

tem como expropriante o Poder Público, passando o bem à dominialidade

pública (embora posteriormente possa ter destinação diversa). Assim, sua

disciplina será dada pelo direito privado, em que pese o seu caráter

coletivo, pois se verificará no interesse particular, dos possuidores.

6. Procedimento expropriatório:

Em linhas gerais, a desapropriação, enquanto procedimento, possui duas

fases, a declaratória e a executiva, sendo que esta última pode ser

processada tanto pela via administrativa/extrajudicial, como pela via

judicial.

a) A fase declaratória se consubstancia na indicação da necessidade ou

utilidade pública, ou do interesse social do bem a ser expropriado. Há,

assim, uma manifestação compulsória de vontade do Poder Público, submetendo

determinado bem ao regime de expropriação.

Os efeitos jurídicos da declaração de utilidade pública e interesse social

são três:

9 “Art. 243. As glebas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas serão imediatamente expropriadas e especificamente destinadas ao assentamento de colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei”. (G.n)10

“§ 4o O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante.   § 5o No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores”.

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1) o direito de as autoridades expropriantes penetrarem no imóvel, mas que

não se confunde com a imissão provisória na posse (artigo 7.º do Dec.-lei

n. 3.365/1941);

2)a fixação do estado do bem, incluindo as benfeitorias nele existentes, o

que gera efeitos no cálculo de indenização

3)e o início da contagem do prazo de caducidade da declaração.

b) Já na fase executória, serão adotadas medidas necessárias à

implementação da desapropriação, visando à aquisição do bem pelo Poder

Público. Havendo concordância do proprietário sobre o valor da

desapropriação, o procedimento se encerrará na via

administrativa/extrajudicial. Entretanto, de regra, há o prolongamento pela

fase judicial, através de ação movida pelo Estado em face do proprietário.

Nesta ação, portanto, discutir-se-á a justa indenização. É possível que

durante o seu curso o juiz conceda a imissão provisória na posse (art. 1511

do Decreto-lei 3.365/1941), quando for o caso.

Interessa, por fim, destacar que pode haver a desapropriação indireta,

quando o Poder Público deixa de observar o procedimento legal,

administrativo ou judicial, ocupando o bem em caráter definitivo. Caberá ao

proprietário, se não o impedir no momento oportuno, deixando que a

Administração lhe dê destinação pública, pleitear a indenização por perdas

e danos, que corresponderá à justa indenização da desapropriação legal.

7. Momento consumativo da desapropriação:

Vista a extensão do instituto, observa-se que para definir o momento da

consumação da desapropriação, e consequente aquisição da propriedade,

surgiram várias posições doutrinárias e jurisprudenciais, as quais

defendiam que ocorria a consumação:

a) Pelo decreto declaratório da utilidade pública;

b) Com a expedição do mandado de imissão na posse;

c) Pela sentença;

11 “Art. 15. Se o expropriante alegar urgência e depositar quantia arbitrada de conformidade com o artigo 685 do Código de Processo Civil, o juiz mandará imiti-lo provisoriamente na posse dos bens”. (OBS.: Atualmente, arts. 826 a 838 do CPC/1973)

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71

d) Com o registro da sentença no Cartório de Imóveis;

e) Com o pagamento da indenização.

Moraes Salles12 esclarece que essa diversidade de entendimentos originou-se

da má redação do Decreto 4.956/1903, que regulava a matéria antes do

advento do Decreto-lei 3.365/1941.

Segundo o citado autor, Ruy Barbosa entendia que, embora a aprovação das

plantas não cessasse a propriedade em todos os seus elementos, já implicava

na indisponibilidade jurídica sobre o bem. Todavia, a desapropriação se

concretizava no momento em que era editado o decreto de aprovação dos

planos e plantas relativos às obras que seriam executadas pelo Poder

Público ou por seus concessionários.

Entretanto, o princípio da previedade da indenização, que esteve presente

em todas as nossas constituições, revelava que o decreto de aprovação não

poderia importar em desapropriação. Ademais, essa declaração do Poder

Público é apenas ato-condição que precede à transferência do bem13, não

tendo qualquer efeito sobre o direito de propriedade, tanto que, se o

processo expropriatório parasse nessa fase, deixando caducar o decreto

expropriatório, não haveria desapropriação. Isto porque poderiam

desaparecer os motivos que embasaram o decreto em questão.

Há também as correntes que buscaram observar a consumação dentro do

processo judicial, no caso de não haver acordo.

Para os que consideram haver a consumação com a imissão na posse, diz-se

que somente com tal ato despontaria para o expropriante o domínio do bem

expropriado, aperfeiçoando-se ou complementando-se. Referem-se à imissão

definitiva do art. 2914 do Decreto-lei 3.365/1941. Todavia, refuta-se tal

doutrina ao argumento de que o domínio é antecedente à posse, a não ser em

casos excepcionais, como no usucapião. Para a maioria, o elemento posse é

irrelevante para fixar o momento da perda da propriedade15. De fato, posse e

propriedade são institutos absolutamente distintos.

12 SALLES, José Carlos de Moraes. Ob. Cit., p. 511.13 Hely Lopes apud COSTA, Maria Isabel Pereira da. A transferência do domínio do bem imóvel para o poder expropriante no processo judicial. Revista AJURIS n.º 47 - 1989, pág. 146.14 “Art.29. Efetuado o pagamento ou a consignação, expedir-se-á, em favor do expropriante, mandado de imissão de posse, valendo a sentença como título hábil para a transcrição no registro de imóveis”.(G.n.)15 COSTA, Maria Isabel Pereira da. Ob. Cit., p. 149/150.

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72

Dentre os que entendem que é a sentença que transfere o domínio, cita-se

Eurico Sodré e Manoel de Oliveira Franco Sobrinho16. Aquele defendia tal

posição por ser a sentença de adjudicação que permitiria a extração da

respectiva carta a ser transcrita no registro de imóveis, meio pelo qual se

operava a tradição solene. Todavia, o referido autor entendia que a

desapropriação era modo derivado de aquisição da propriedade.

Quanto à corrente que atribui a consumação à transcrição da sentença ou

acordo no registro competente, foi adotada por Pontes de Miranda e Calmon

de Passos17. Todavia, sendo a desapropriação um modo originário de

aquisição, não há que se subordinar à transcrição do título translativo,

seja sentença ou acordo, posto que a transcrição é modo derivado de

aquisição da propriedade, reclamando uma relação de causalidade,

representada por um fato jurídico, entre o adquirente e o alienante.

Por fim, resta a posição hoje aceita pela ampla maioria da doutrina, que

tem como momento consumativo da desapropriação o pagamento da indenização.

Sustenta-se que é o pagamento da indenização que dá ensejo à consumação da

desapropriação, acarretando a aquisição da propriedade pelo expropriante e

a perda pelo expropriado18.

Afirma Moraes Salles que há a consumação da desapropriação com o pagamento

ou o depósito judicial da indenização fixada pela sentença ou estabelecida

em acordo19.

Impende ressaltar que o pagamento se refere ao valor fixado na sentença do

art. 2420 do Decreto-lei 3.365/1941, pois somente pela justa indenização há

a substituição do bem no patrimônio do expropriando, o que demarca

precisamente o momento em que a desapropriação se consuma21.

Ressalta-se, ainda, que mesmo quando há acordo na fase administrativa da

desapropriação, dispensando o ajuizamento do feito expropriatório, esse

acordo versará unicamente sobre o valor da indenização a ser paga ao

expropriando e não sobre a desapropriação, que é sempre ato unilateral da

16 SALLES, José Carlos de Moraes. Ob. Cit., p. 506/507 e 518, respectivamente.17 A Transferência da Propriedade para o Domínio do Expropriante no Curso da Ação de Desapropriação. Revista Brasileira de Direito Processual. Vol. 31 – 1.º Bim. de 1982, p. 63.18 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Ob.cit., p. 765.19 SALLES, José Carlos de Moraes. Ob. Cit., p. 520.20 “Art. 24. Na audiência de instrução e julgamento proceder-se-á na conformidade do Código de Processo Civil. Encerrado o debate, o juiz proferirá sentença fixando o preço da indenização.Parágrafo único Se não se julgar habilitado a decidir, o juiz designará desde logo outra audiência que se realizará dentro de dez dias a fim de publicar a sentença”.21 Ebert Chamoun apud SALLES, José Carlos de Moraes. Ob. Cit., p. 515.

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Administração e, portanto, compulsório. Apenas será consubstanciado em

escritura pública (se o bem desapropriado for imóvel de valor superior ao

estabelecido no art. 108 do CC/2002 (maior que 30 salários mínimos), mas

essa escritura pública não será “desapropriação amigável”, e sim composição

amigável sobre o preço22.

A indenização assume tamanha relevância face ao dispositivo constitucional

que reza: “a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por

necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e

prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta

Constituição” (art. 5.º, XXIV). Nos exatos termos do referido dispositivo,

não pode haver desapropriação sem o pagamento prévio da justa indenização

ao expropriado.

Esse entendimento se aplica, então, as hipóteses em que há uma indenização,

quais sejam as desapropriações clássica/ordinária e extraordinária.

Já para a desapropriação confiscatória (art. 243 da CF/88), que tem como

uma de suas características não comportar indenização, sua consumação resta

explícita no art. 1523 da Lei 8.257/1991, havendo a incorporação ao

patrimônio da União após o trânsito em julgado da sentença no procedimento

judicial estabelecido na referida Lei. Todavia, a doutrina ressalva que,

embora o art. 243 se refira à “expropriação”, na verdade essa hipótese

cuida-se de verdadeiro confisco e não de desapropriação24.

Quanto à desapropriação indireta, leciona Maria Sylvia que o que ocorre

nessa hipótese é, na realidade, a afetação do bem. Tendo em conta que a

simples afetação do bem a um fim público não constitui forma de

transferência da propriedade, também deve haver a indenização para que se

consume a transferência do imóvel. Isto porque, há a aplicação analógica do

art. 3525do Decreto-lei 3.365/1941, pelo que, uma vez dada a destinação

pública ao imóvel, com sua consequente incorporação, este não poderá ser

objeto de reivindicação, cabendo ao particular pleitear a indenização.

22 SALLES, José Carlos de Moraes. Ob. Cit., p. 479.23

“Art. 15. Transitada em julgado a sentença expropriatório, o imóvel será incorporado ao patrimônio da União.

Parágrafo único. Se a gleba expropriada nos termos desta lei, após o trânsito em julgado da sentença, não puder ter em cento e vinte dias a destinação prevista no artigo 1º, ficará incorporada ao patrimônio da União, reservada, até que sobrevenham as condições necessárias àquela utilização “.24 SALLES, José Carlos de Moraes. Ob. Cit., p. 89; e DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 16.ª ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 167.25 “Art. 35. Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reivindicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos”.

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74

Entretanto, se não o faz em tempo hábil, verificando-se a prescrição,

restará ao Poder Público regularizar a propriedade pela usucapião26.

Afirma a referida autora: “O que ocorre, com a desapropriação indireta, é,

na realidade, a afetação, assim entendido ‘o fato ou a manifestação de

vontade do poder público, em virtude do que a coisa fica incorporada ao uso

e gozo da comunidade’ (cf. Marienhoff, 1960:152-153); acrescente-se que se

trata de afetação ilícita, porque atinge bem pertencente a particular;

lícita é apenas a afetação que alcança bens já integrados no patrimônio

público, na qualidade de bens dominicais, para passá-los à categoria de uso

comum do povo ou de uso especial”27.

8. Registro do Imóvel Expropriado:

A transcrição é forma derivada de aquisição da propriedade imobiliária, por

meio da publicidade do ato translativo junto ao Registro de Imóveis.

Como visto, a extração da carta de sentença de desapropriação é instrumento

hábil para se efetuar a transcrição no registro de imóveis. Também a

escritura é título hábil a transcrição da propriedade no caso do acordo

entre as partes.

Porém, por se entender que a desapropriação é um modo originário de

aquisição da propriedade, esta se efetiva independentemente da

regularização no registro de imóveis.

Todavia, a transcrição é levada a efeito, segundo Serpa Lopes e Seabra

Fagundes, para que se dê maior publicidade à desapropriação, haja

continuidade do registro, fique constando do Registro de Imóveis a extinção

da propriedade anterior e se cientifique - a todos a que possa interessar -

o término dos direitos reais incompatíveis com a desapropriação28.

Raimundo Viana29 igualmente assevera que, na desapropriação, “a finalidade

desse registro é muito mais para documentar a saída do bem do domínio

privado, do que a testificação da aquisição ou o momento da consumação

desta. (...) apenas para evitar negócios irregulares envolvendo o bem, com

possibilidade de sérios prejuízos para terceiros de boa-fé”.

26 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Ob. Cit., p. 178.27 Idem.28 SALLES, José Carlos de Moraes. Ob. Cit., p. 523. 29 “Do Registro na Desapropriação”. RF 298/373.

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75

Assim, consumada a expropriação pelo pagamento da indenização, cabe ao

expropriante regularizar o registro do imóvel expropriado, cuidando-se,

portanto, de momentos distintos, sendo esta regularização de grande

utilidade, mas não essencial à desapropriação.

9. Bens Inexpropriáveis

           

Extremamente reduzido se comparado ao de bens expropriáveis, o rol de bens

não suscetíveis de expropriação não abarca muitos casos.

1)Os direitos personalíssimos (o direito à honra, à liberdade, à cidadania,

à vida, à imagem, à alimentação e o direito de autor, v.g.) constituem

exemplos de bens que não podem ser retirados da propriedade de seus donos

em razão de não terem conteúdo patrimonial algum.

2)Também não se encontram entre os bens passíveis de desapropriação a moeda

corrente do próprio País (dinheiro) e as pessoas (concessionárias de

serviços públicos, fundações e empresas), eis que são desapropriáveis os

bens ou certos direitos que estas detêm, e não elas. Exemplificando, não há

falar em desapropriação — ou até extinção — de uma empresa, mas sim, em

expropriação possível de suas ações.

           

3)Outro caso típico de impossibilidade de expropriação é o relativo à

desapropriação de propriedade produtiva ou de pequena e média propriedade

rural, in casu, respeitando o indicado pela Lei. O supedâneo jurídico vem

do descrito no art. 185, da Lei Fundamental, que assim explicita:

São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária:

I – a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que

seu proprietário não possua outra;

II – a propriedade produtiva.

Portanto, desapropriada será somente aquela propriedade, localizada na zona

rural, que não satisfazer plenamente a sua respectiva função social, salvo

nas duas hipóteses do artigo retro, podendo, ainda, receber tratamento

especial a res, conquanto sejam honrados os requisitos que competem à

função social.

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76

DIREITOS DE VIZINHANÇA

1. Introdução

- emana da lei;

- atribui direitos e deveres recíprocos (sinalagmáticos);

- são obrigações propter rem;

- acompanha a propriedade e transmite ao seu sucessor;

2. Do uso anormal da propriedade

2.1. Espécies de atos nocivos

- Art. 1.277. O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de

fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à

saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha.

Podem ser: ilegais, abusivos e lesivos

- Ilegais: ilícitos. Obrigam a reparação do dano. Ex: atear fogo no prédio

vizinho;

- abusivos: Ex: barulho excessivo. “Teoria do abuso de direito” – art. 187.

(Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao

exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico

ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes).

- lesivos: causa dano ao vizinho, embora não esteja fazendo uso anormal da

propriedade e tenha, inclusive, alvará para funcionamento. Ex. empresa cuja

fuligem esteja prejudicando o meio ambiente.

- Os atos ilegais e abusivos estão contidos no art. 1.277 (uso anormal da

propriedade);

- O art. 1.277 confere ao proprietário e ao possuidor o direito de fazer

cessar o abuso da propriedade.

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77

- Para se verificar a anormalidade do uso da propriedade observa-se:

a) a extensão do dano ou incômodo causado;

b) a zona onde ocorre o conflito, bem como os usos e costumes locais;

c) a anterioridade da posse, pois em princípio não teria razão para

reclamar quem construísse nas proximidades de estabelecimentos barulhentos

ou perigosos.

- Exemplos do art. 1.277:

a) segurança: atividades explosivas e inflamáveis;

b) sossego: ruídos exagerados;

c) saúde: gases tóxicos e depósito de lixo.

P.S: o decoro não está incluso no art. 1.277, por isso uma prostituta não

pode ser impedida de residir em um imóvel se não estiver perturbando o

sossego dos demais moradores.

2.1 Soluções para a composição dos conflitos

- Só gerarão reclamações os abusos intoleráveis pelo homem comum;

- Se o dano for intolerável deve o juiz:

1º) exigir a implantação de medidas que diminuam o dano a um nível

tolerável. Ex: instalação de filtro de poluição;

2º) determinar a cessação da atividade se esta for de interesse particular

caso as medidas acima não resolverem o problema.

P.S: Se for atividade de interesse social o juiz não determinará a cessação

da atividade e sim determinará o pagamento de indenização ao vizinho. Art.

1.278.

Art. 1.278. O direito a que se refere o artigo antecedente não prevalece

quando as interferências forem justificadas por interesse público, caso em

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78

que o proprietário ou o possuidor, causador delas, pagará ao vizinho

indenização cabal.

2.1.1 Ação cominatória:

Se imporá ao réu a obrigação de se abster da prática dos atos prejudiciais

ao vizinho, ou a de tomar as medidas adequadas para a redução do incômodo,

sob pena de pagamento de multa diária, com fulcro nos arts. 287, 461, § 4º

e 644 do CPC.

Se já há dano consumado, cabível a ação de reparação de danos.

2.1.2 Caução de Dano Infecto:

Art. 1.280. O proprietário ou o possuidor tem direito a exigir do dono do

prédio vizinho a demolição, ou a reparação deste, quando ameace ruína, bem

como que lhe preste caução pelo dano iminente.

Vizinho ameaçado pode forçar a reparação, exigindo que a outra parte preste

em juízo caução pelo dano iminente.

3. Das árvores limítrofes

Art. 1.282. A árvore cujo tronco estiver na linha divisória, presume-se

pertencer em comum aos donos dos prédios confinantes.

Art. 1.284. Os frutos caídos de árvore do terreno vizinho pertencem ao dono

do solo onde caíram, se este for de propriedade particular.

Se for de propriedade pública: os frutos pertencem ao proprietário.

4. Da passagem forçada

É assegurado ao proprietário de prédio que se achar encravado, sem acesso a

via pública, nascente ou porto, o direito de, mediante pagamento de

indenização, constranger o vizinho a lhe dar passagem, cujo rumo será

judicialmente fixado, se necessário. (art. 1.285)

- contra o vizinho contíguo e, se necessário, contra o vizinho não

imediato;

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79

- o encravamento deve ser natural e absoluto;

- não se considera encravado o imóvel que tenha outra saída, ainda que mais

difícil e penosa;

- Havendo vários imóveis para saída, o juiz escolherá o que irá sofrer

menor dano com a imposição do encargo;

- Diferença com a servidão de passagem:

Passagem forçada decorre da lei, enquanto a servidão, geralmente, decorre

do contrato. Trata-se de um direito real sobre coisa alheia, onde o

proprietário não encravado deseja apenas uma saída mais cômoda;

5. Dos limites entre prédios

Ação demarcatória: quando há confusão de limites na linha divisória. Art.

946/966, CPC.

Art. 1.297. O proprietário tem direito a cercar, murar, valar ou tapar de

qualquer modo o seu prédio, urbano ou rural, e pode constranger o seu

confinante a proceder com ele à demarcação entre os dois prédios, a

aviventar rumos apagados e a renovar marcos destruídos ou arruinados,

repartindo-se proporcionalmente entre os interessados as respectivas

despesas.

6. Do direito de construir

O proprietário, tem em tese e basicamente, a liberdade de construir o

que quiser em sua propriedade, encontrando limitações nos direitos dos

vizinhos e regulamentos administrativos, art 1.299 CC. O proprietário que,

ao construir, causa dano ao seu vizinho, é obrigado a repará-lo.

Levando em conta o caráter urbanístico, as posturas municipais podem

determinar a autuar dos prédios em determinados bairros, impedindo a

construção de edifícios muito elevados em bairro residencial, ou ainda,

proibir a construção de fábricas ou estabelecimentos comerciais em tais

bairros.

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80

Art. 1.299. O proprietário pode levantar em seu terreno as construções que

lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos

administrativos.

- todo proprietário é obrigado a ressarcir o dano que a construção causar

ao seu vizinho;

- Ação de indenização por danos causados a vizinhos: responsabilidade

objetiva: prova do dano e do nexo.

- Responsabilidade do dono da obra e do engenheiro, construtores e

arquitetos que a executa: solidária.

Art. 1.301. É defeso abrir janelas, ou fazer eirado, terraço ou varanda, a

menos de metro e meio do terreno vizinho.

§ 2o As disposições deste artigo não abrangem as aberturas para luz ou

ventilação, não maiores de dez centímetros de largura sobre vinte de

comprimento e construídas a mais de dois metros de altura de cada piso.

P.S: A jurisprudência tem-se admitido a abertura de janelas a menos de

metro e meio, quando entre os prédios existe muro alto. Também tem-se

entendido que portas podem ser abertas, pois o artigo não refere a elas.

Súmula 120 STF: Parede de tijolos de vidro translúcido pode ser levantada a

menos de metro e meio do prédio vizinho, não importando servidão sobre ele.

O proprietário lesado pode, no lapso de ano e dia após a conclusão da

obra, exigir que se desfaça janela, sacada, terraço ou goteira sobre seu

prédio, esgotado esse prazo, não poderá construir sem atender ao disposto

no art. 1.301 CC, nem impedir, ou dificultar, o escoamento das águas da

goteira, com prejuízo para o prédio vizinho, art. 1.302 CC.

Art. 1.303. Na zona rural, não será permitido levantar edificações a menos

de três metros do terreno vizinho.

Parede-meia é aquela que, separa dois prédios, pertence em comum aos

donos deles.

Page 81: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

81

A parede-meia pode ser utilizada pelo vizinho até a meia espessura, art.

1.306 CC. Mas essa utilização fica subordinada a três condições:

a) que não ponha em risco a segurança e a separação dos prédios;

b) que, tratando-se de armários ou obras semelhantes, não correspondam a

outras, da mesma natureza, já existentes, do lado oposto;

c) que seja dado aviso prévio ao vizinho.

Qualquer vizinho pode altear parede divisória e até mesmo reconstruí-la,

para que possa suportar o alteamento, arcando com todas as despesas,

inclusive com as de conservação, salvo se o outro proprietário vizinho vier

a adquirir meação, também, na parte aumentada, caso em que cada um arcará

com a metade dos dispêndios, art. 1.307 CC.

Ilicitude da instalação de objetos suscetível de causar dano ao prédio

sem anuência de seu dono. A lei proíbe que seja construído, encostado na

parede do vizinho ou na parede-meia, fornos de forja ou fundição,

fornalhas, aparelhos higiênicos, fossos, canos de esgoto, depósito de sal

ou quaisquer substâncias corrosivas ou suscetíveis de produzir infiltrações

daninhas, exceto as chaminés ordinárias e os fornos de cozinha, art 1.308

CC.

Em sua defesa, tem o prejudicado ação de nunciação de obra nova, se a obra

estiver em meio. Se já houver sido concluída, pode ocorrer apenas ameaça de

prejuízo eventual, podendo o prejudicado exigir caução de dano infecto

(ação de dano infecto), já, se o incômodo for presente e atual, pode o

prejudicado ou exigir que a obra não seja utilizada ou que se proceda à sua

demolição.

A lei não permite que o proprietário construa em seu terreno obras que

venham a poluir ou inutilizar, para uso ordinário, a água de poço ou fonte

alheia a elas preexistentes, art. 1.309 CC.

Ninguém poderá efetivar escavações, canais, regos, ou sulcos em seu

terreno que tirem ao poço ou à fonte ou nascente de outrem a água

necessária ao uso doméstico ou à cultura. Ilícito será secar, cortar, ou

minguar a fonte do vizinho ao fazer escavações em terreno próprio que venha

a impedir a secção do curso d’água subterrâneo, art 1.310 CC.

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Todo aquele que infringir as normas ao direito de construir, arts. 1.299

a 1.313 CC, será obrigado a demolir as construções ilícitas, respondendo,

ainda, por perdas e danos, art 1.312 CC. O prejudicado poderá se valer da

ação demolitória, dentro do prazo decadencial de ano e dia (art. 1.302 CC),

o magistrado só ordenará a demolição se for impossível a conservação ou

adaptação da obra aos regulamentos administrativos e quando contiver

vícios insanáveis. Estando a obra em fase de construção, a ação cabível

será a de nunciação de obra nova (art. 934, CPC). O infrator, de qualquer

modo, deverá pagar uma indenização por perdas e danos (arts. 402 a 404,

CC), pedido esse que poderá ser acumulado a qualquer daquelas ações.

7. Uso do prédio vizinho

Por vezes precisa um proprietário, para proceder à recuperação ou limpeza,

construção ou reconstrução de sua de sua casa, esgoto, goteiras, aparelhos

higiênicos, poços ou fontes nelas existentes, ou ainda, apoderar-se de

coisa suas, inclusive animais que aí se encontrem casualmente, ingressar na

propriedade vizinha, art. 1.313 CC.

Art. 1.313. O proprietário ou ocupante do imóvel é obrigado a tolerar que o

vizinho entre no prédio, mediante prévio aviso, para:

I - dele temporariamente usar, quando indispensável à reparação,

construção, reconstrução ou limpeza de sua casa ou do muro divisório;

II - apoderar-se de coisas suas, inclusive animais que aí se encontrem

casualmente.

8. Dos limites entre prédios e do direito de tapagem

A proximidade de prédios pode sempre levantar questões relativas aos

limites entre os imóveis. A questão tem importância para determinar o

âmbito de utilização da coisa pelo proprietário, e ao Estado, interessa

estes limites estejam definidos, para se ter a paz social, para o exercício

do poder de polícia e para a tributação.

O proprietário tem o direito de cercar, murar, valar ou tapar de qualquer

modo o seu prédio rural ou urbano, para que possa proteger, dentro de

limites, a exclusividade de seu domínio, desde que observe as disposições

regulamentares e não cause dano ao vizinho. (CC art. 1297)

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Para ação demarcatória, a legitimidade ativa deve ser alargada para aqueles

cuja a titularidade esteja muito próxima à do proprietário, como o

enfiteuta, o usuário, o locatário. Esta ação vem disciplinada nos artigos

946 a 966 do CPC, não se restringe à simples demarcação, mas também a

exigir a repartição de despesas com a atividade material.

A ação demarcatória visa:

a) Levantar linha divisória entre prédios;

b) Abrir novamente rumos apagados;

c) Renovar marcos destruídos ou arruinados.

Existem dois tipos de ação demarcatória:

a) Simples: tem por finalidade a sinalização de limites, ou seja, fixar,

restabelecer ou aviventar (abrir novamente) os marcos da linha divisória de

dois prédios vizinhos;

b) Qualificada: ocorrerá quando se cumular o pedido de fixação de rumos e

aviventação dos que já existem com o de restituição de glebas indevidamente

ocupadas pelo dono do prédio confinante, se o interessado não quiser, antes

de mover esta ação, recorrer diretamente aos interditos possessórios.

De acordo com o artigo 1.298 do Código Civil, sendo confusos os limites

na área contestada na ação demarcatória, o juiz deverá definir a linha

divisória, de acordo com o procedimento processual constante nos artigos

950 a 966 do Código de Processo Civil, ou seja, baseado em parecer técnico

e nos títulos constitutivos dos direitos dos litigantes, que deve ser

juntados com a petição inicial.

Se for impossível a exata fixação dessa linha divisória, deverá:

a) Decidir conforme as posses de cada um, dando preferência à melhor posse

que é a justa, ou seja, a mais antiga e à não viciada;

b) Ante a impossibilidade de prova da posse, repartir-se-ão as terras

contestadas em partes iguais ou proporcionais à linha de testada dos

prédios confinantes;

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c) E se mesmo assim, não possibilitar uma divisão cômoda, adequada ou

economicamente útil por ser prédio indivisível, por exemplo, adjudicar-se-á

a um deles, mediante indenização ao proprietário prejudicado. (CC art.

1298)

CONDOMÍNIO TRADICIONAL OU COMUM (é disciplinado no "Código Civil")

1) conceito: quando os direitos elementares do proprietário (art. 1228)

pertencerem a mais de um titular, existirá o condomínio ou domínio comum

de um bem.

- Não há conflito com o princípio da exclusividade, pois entende-se que o

direito de propriedade é um só e incide sobre as partes ideais de cada

condômino (co-proprietário ou comunheiro - dono juntamente com outrem).

Perante terceiros, cada comunheiro atua como proprietário exclusivo do

todo.

- O condomínio geral (tradicional ou comum) é disciplinado no CC (1.341 e

ss), bem como o condomínio edilício ou em edificações (art. 1.331 e ss).

2) classificação:

2.1) quanto à origem:

- convencional – é o que se origina da vontade os condôminos, ou seja,

quando duas ou mais pessoas adquirem o mesmo bem.

- eventual ou incidente – é o que resulta da vontade de terceiros, ou

seja, do doador (aquele que doa) ou testador (faz testamento), ao

efetuarem uma liberalidade a várias pessoas.

- legal ou forçado – é o imposto pela lei, como no caso de paredes,

cercas, muros e valas.

2.2) quanto à forma:

Page 85: Direito Civil - Direitos Reais - 2013

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- "pro diviso" – apesar da comunhão de direito, há mera aparência de

condomínio, porque cada condômino encontra-se localizado em parte certa e

determinada da coisa, agindo como dono exclusivo da porção ocupada; a

comunhão existe juridicamente mas não de fato - ex.: condomínio em

edifícios de apartamentos.

- "pro indiviso" – não havendo a localização em partes certas e

determinadas, a comunhão é de direito e de fato.

- transitório – é o convencional ou o eventual, que podem ser extintos a

todo tempo pela vontade de qualquer condômino.

- permanente – é o legal, que perdura enquanto persistir a situação que o

determinou; não pode extinguir em razão de lei ou de sua natureza

indivisível - ex.: paredes divisórias, condomínio forçado.

2.3) quanto ao objeto:

- universal – quando abrange todos os bens, inclusive frutos e rendimentos - ex.:

comunhão hereditária.

- particular – incide sobre coisa determinada - ex.: muro divisório.

3) direitos e deveres dos condôminos:

Com relação aos direitos, dispõe o art. 1.314 que cada condômino pode:

I – usar livremente da coisa conforme seu destino, e sobre ela exercer todos os

direitos compatíveis com a indivisão;

II – reivindicá-la de terceiro;

III – defender a sua posse e

IV - alhear a respectiva parte indivisa, ou gravá-la".

Quanto ao inciso I - pode o condômino exercer sobre a coisa todos os direitos

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compatíveis com a indivisão, não podendo impedir que os demais consortes utilizem-

se também de seus direitos, na proporção da cota de cada um e de acordo com a

destinação do bem.

- Tratando-se de imóvel, pode nele instalar-se, desde que não afaste os demais

consortes.

- O direito de usar livremente da coisa comum, no entanto, não permite ao

condômino alterá-la sem o consenso dos outros (art. 1.314). Não pode alterar a

substância da coisa, nem o modo como é tradicionalmente usada.

- Cada consorte responde aos outros pelos frutos que percebeu da coisa comum e

pelo dano que lhe causou (art. 1.319). Ex: Se o imóvel é urbano e estiver ocupado

por um dos condôminos, podem os demais exigir-lhe pagamento de aluguel. Se estiver

locado a terceiro, tem o condômino direito de pedi-lo para uso próprio.

- Nenhum condômino pode, sem prévio consenso dos outros, dar posse, uso ou gozo da

propriedade a estranhos (art. 1.314), pois uso autorizado pela lei é o pessoal.

Quanto ao inciso II - pode cada condômino reivindicar a coisa que esteja em poder

de terceiro.

- Aplica-se o art. 1.827: "Art. 1.827. O herdeiro pode demandar os bens da

herança, mesmo em poder de terceiros, sem prejuízo da responsabilidade do

possuidor originário pelo valor dos bens alienados”.

- Como o direito de reivindicar é deferido ao proprietário, o condômino só pode

propor ação reivindicatória contra terceiro, e não contra outro condômino, porque

este também é proprietário e oporia ao reivindicante direito igual.

- Contra outro condômino só pode caber a possessória.

Quanto ao inciso III - o condômino, como qualquer outro possuidor, poderá defender

a sua posse contra outrem.

Quanto ao inciso IV - pode cada consorte, ainda, alhear a respectiva parte

indivisa ou gravá-la.

- O primeiro direito (alhear) sofre a restrição contida no art. 504, que prevê o

direito de preempção ou preferência em favor dos demais condôminos.

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- O preterido poderá, "depositando o preço, haver para si a parte vendida a

estranhos, se o requerer no prazo de seis meses"; conta-se esse prazo da data em

que teve ciência inequívoca da venda (STF, RTJ, 57:322 e 59:591).

- O segundo direito (gravar) significa que o condômino pode gravar sua parte

indivisa. Pode, portanto, dá-la em hipoteca.

- Vide art. 1.420, §2º: “A coisa comum a dois ou mais proprietários não pode ser

dada em garantia real, na sua totalidade, sem o consentimento de todos; mas cada

um pode individualmente dar em garantia real a parte que tiver”.

- O dever de concorrer para as despesas de conservação da coisa, na proporção de

sua parte, bem como a responsabilidade pelas dívidas contraídas em proveito da

comunhão, é imposto ao condômino nos arts. 1.316 a 1.318.

4) extinção do Condomínio: o Código Civil procura facilitar a extinção do

condomínio, que é tido por todos como fonte de atritos e desavenças. Assim, a

"todo tempo será lícito ao condômino exigir a divisão da coisa comum" (art.

1.320).

- Se os condôminos fizerem um pacto de não dividi-la, a avença (acordo) valerá

apenas por 5 anos, suscetível de prorrogação ulterior (§ 1º).

- Se "a indivisão (condomínio) for condição estabelecida pelo doador, ou testador,

entende-se que o foi somente por 5 anos" (§ 2º). A requerimento de qualquer

interessado e se graves razões o aconselharem, “pode o juiz determinar a divisão

da coisa comum antes do prazo” (§ 3º).

- A divisão é o meio adequado para se extinguir o condomínio em coisa divisível.

Ela pode ser amigável (só admissível por meio de escritura pública e se todos os

condôminos forem maiores e capazes) ou judicial (quando um dos condôminos for

menor ou incapaz, ou se não houver acordo).

- Pela divisão, cada condômino terá o seu quinhão devidamente individualizado.

- A ação de divisão é imprescritível, podendo ser ajuizada a qualquer tempo. Esta

ação é meramente declaratória e não atributiva da propriedade (art. 980, CPC): os

condôminos já eram proprietários; a divisão apenas declara e localiza a parte de

cada um.

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88

- Se a coisa é indivisível, o condomínio só poderá extinguir-se pela venda da

coisa comum.

Reconstrução

Deliberando-se pela reconstrução do edifício, o condômino que não se interessar,

poderá alienar a sua cota-parte a outro condômino, mediante avaliação judicial.

alienação

deliberando-se pela venda, o condômino terá preferência em relação a terceiros,

devendo o valor obtido pela venda ser repartido entre os condôminos na proporção

da fração ideal respectiva.

desapropriação

Havendo a extinção do condomínio por desapropriação, a indenização deverá ser

repartida entre os condôminos, proporcionalmente à cota-parte de cada um. De todo

o exposto, podemos concluir que o condomínio em geral mereceu destaque no novo

código civil.

A despeito disso, algumas situações, por exemplo, relativas à inadimplência dos

condôminos, exigirão o pronunciamento do judiciário para que sejam pacificadas.

Entretanto, todos os aspectos, brevemente analisados, devem ser enfrentados desde

já, por nós, profissionais do direito, para que em breve, toda a matéria possa

estar pacificada.

5) administração do Condomínio:

- se os condôminos resolverem que a coisa deve ser administrada, por maioria

escolherão também o administrador, que poderá ser estranho ao condomínio (art.

1.323).

- Deliberarão ainda, se o desejarem, a respeito do regime de administração,

remuneração do administrador, prestação de contas etc.;

- Presunção: O condômino que administrar sem oposição dos outros presume-se

representante comum.

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- Os poderes conferidos ao administrador são de simples administração. Não pode

praticar atos que exijam poderes especiais, tais como alienar (vender) a coisa,

receber citações etc. Pode, entretanto, alienar (vender) coisas que ordinariamente

se destinam à venda, como frutos ou produtos de propriedade agrícola.

- Para que ocorra a venda, basta a vontade de um só condômino.

- Só não será vendida se "todos concordarem que se não venda" (art. 1.320 e

1.322); neste caso, a maioria deliberará (decidirá) sobre a administração ou

locação da coisa comum.

- A maioria será calculada não pelo número, senão pelo valor dos quinhões, e as

deliberações (decisões) só terão validade quando "tomadas por maioria absoluta,

isto é, por votos que representem mais de meio do valor total" (art. 1.325, § 1°).

Atribuições do síndico

Como administrador, é de sua competência:

1. Convocar assembleia;

2. Representar ativa e passivamente, em qualquer juízo ou fora dele, em qualquer

instância e repartição, praticando os atos em defesa dos interesses comuns;

3. Comunicar imediatamente à assembleia a existência de qualquer procedimento,

seja administrativo ou judicial;

4. Cumprir e exigir o cumprimento à convenção, ao regimento interno e às

deliberações assembleares;

5. Zelar pelas partes comuns e prover os condôminos dos serviços necessários;

6. Cuidar do orçamento anual da receita e despesa;

7. Cobrar a taxa condominial e as multas devidas;

8. Prestar contas à assembleia anualmente, ou sempre que necessário;

9. Contratar o seguro da edificação;

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90

colaboradores do síndico

Em assembleia, pode ser investidos terceira pessoa com poderes de representação

para substituir o síndico em seus impedimentos. Pode o síndico, com autorização

assemblear e desde que permitido pela convenção, delegar total ou parcialmente os

poderes de representação e de certas funções administrativas.

destituição do síndico

 A assembleia em convocação especial, pelo voto da maioria absoluta, poderá

destituir o síndico que praticar irregularidades, não prestar contas, ou não

administrar convenientemente o condomínio.

Peculiaridades relevantes:

a) despesas e dívidas do condomínio- pagamento de despesas da coisa comum

Em relação às despesas e dívidas do condomínio, cada consorte é obrigado a

concorrer, na proporção de sua parte, para as despesas de conservação

(demarcação, reparação, remuneração de vigilante, impostos e taxas) ou de

divisão do bem (custas judiciais, honorários advocatícios, operações de

agrimensura) e suportar, na mesma razão os ônus a que estiver sujeito, isto

porque todos deles tiram proveito da coisa, repartindo os seus frutos.

A maioria das convenções existente antes do advento do Novo Código Civil

tratava do condômino inadimplente e dentre as implicações refletidas,

algumas delas já previam a perda do direito de voto por ocasião das

deliberações da assembleia, àquele que não estivesse em dia com o pagamento

de suas cotas condominiais. Hoje, mesmo sem previsão na Convenção

Condominial, o inadimplente não poderá votar, enquanto se encontrar nesse

estado.

b) isenção do pagamento

Pode o condômino eximir-se do pagamento das despesas e dívidas, renunciando

à parte ideal. Se os demais condôminos assumem as despesas e as dívidas, a

renúncia lhes aproveita, adquirindo a parte ideal de quem renunciou, na

proporção dos pagamentos que fizerem. Se não há condômino que faça os

pagamentos, a coisa comum será dividida (Código Civil, art. 1.316).

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91

Entendemos que a divisão da coisa para pagamento de despesas e dívidas,

apenas se opera no caso de ser destacável e desde que possa gerar frutos.

Por exemplo, se todos os condôminos deixarem de contribuir, o pátio de

estacionamento poderá ser locado para terceiros. Ou, havendo uma boa área

de lazer, essa também poderá gerar renda. Enfim, a parte comum precisa ter

qualidades intrínsecas que a façam produzir frutos. Entretanto, as dívidas

precisam estar bem caracterizadas como dívidas e despesas úteis e

necessárias ao condomínio.

             

c) débito contraído por todos

Se a dívida for contraída por todos os consortes, sem discriminação da

responsabilidade de cada um deles e sem estipulação da solidariedade, cada

condômino responderá, individualmente, pelo quantum correspondente à sua

quota-parte na coisa comum, e, assim, o débito será cobrado e pago.30

d) dívidas contraídas por um em proveito de todos

            

A dívida contraída por um condômino em proveito de todos e durante o

condomínio, obriga pessoalmente o contratante, mas esse poderá

regressivamente cobrar dos demais.

e) inadimplemento da contribuição

         

Aquele que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios

previstos na Convenção e se não previstos ficará sujeito aos juros de 1% ao

mês, sem prejuízo da multa de 2% sobre o débito.

f) agravantes no inadimplemento

O condômino que realizar obras que comprometam a segurança da edificação,

que alterar a cor ou a sua forma externa (em edifício), e mais, que der à

sua parte estranha destinação, tirando o sossego, a salubridade e a

segurança dos demais condôminos, ou que utiliza-la de maneira prejudicial

aos bons costumes, pagará multa prevista no ato constitutivo ou na

convenção, não superior a 05 (cinco) contribuições mensais e ainda arcará

com as perdas e danos apuradas.

30 Levenhagen, Código Civil, cit., v. 3, p. 185-6; M. Helena Diniz, Curso, cit., v. 4, p. 153.

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Caso não haja previsão para aplicação dessa multa, a sua cobrança em

assembléia geral e por deliberação, dependerá do voto de 2/3 dos condôminos

restantes (entenda-se dos presentes).

"Se o condômino apresentar infrações reiteradas de seus deveres, poderá,

havendo deliberação de 3/4 dos condôminos, ser condenado a pagar multa

correspondente até ao quíntuplo do valor pago para as despesas

condominiais, conforme a gravidade das faltas, e, além disso, as perdas e

danos que forem apurada".

"Se o condômino, em razão de sua reiterada conduta anti-social, causar

impossibilidade de vida em comum com os demais condôminos, deverá pagar

multa equivalente ao décuplo do valor da taxa condominial, até ulterior

deliberação assemblear".31

g) reincidência no inadimplemento

Se o condômino apresentar infrações reiteradas de seus deveres, poderá,

havendo deliberação de ¾ dos condôminos, ser condenado a pagar multa

correspondente até ao quíntuplo do valor pago para as despesas

condominiais, conforme a gravidade das faltas, e, além disso, as perdas e

danos que forem apuradas.32

g) incompatibilidade de convivência

Se o condômino, em razão de sua reiterada conduta anti-social, causar

impossibilidade de vida em comum com os demais condôminos, deverá pagar

multa equivalente ao décuplo do valor da taxa condominial, até ulterior

deliberação assemblear.33

h) locação de garagem

Há direito de preferência dos condôminos, em condições iguais, à locação do

abrigo para veículos em relação a estranhos, deliberada por um deles.34

i) unidade autônoma e parte comum – inseparáveis

Os direitos de cada condômino às partes comuns são inseparáveis de sua

fração ideal. Por isso, o condômino não pode alienar, nem gravar, bens em

separado.

31 M. Helena Diniz, Código Civil Anotado, p.826, Ed. Saraiva, 10a. Ed.32 M. Helena Diniz, Código Civil Anotado, p.826, Ed. Saraiva, 10a. Ed.33 M. Helena Diniz, Código Civil Anotado, p.826, Ed. Saraiva, 10a. Ed.34 AASP, 1.915:95, 1.936:9; RT, 407:327, 420:206.

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93

j) parte acessória – alienação

O condômino pode alienar a sua parte acessória a outro condômino.

Entretanto, se for permitido em convenção poderá alienar a terceiro, salvo

se a assembléia geral dos condôminos se opuser.

k) parte comum – uso exclusivo – despesas

O condômino que gozar com exclusividade de uma parte comum, deverá arcar

com todas as despesas dela decorrentes.

l) obras voluptuárias

A realização de obras voluptuárias depende do voto de 2/3 dos condôminos.

m) obras úteis

A realização de obras úteis depende do voto da maioria dos condôminos.

n) obras necessárias

As obras necessárias independem de autorização dos condôminos e o síndico

ou qualquer condômino poderá levá-la a efeito. Aquele que ordenou a sua

realização deverá convocar de imediato a assembléia. Havendo urgência que

represente alto custo, será necessária a convocação de assembléia pelo

síndico ou condômino, para aprovação prévia.

o) reembolso das despesas

O condômino que realizar obras ou reparos necessários será reembolsado das

despesas que efetuar, não tendo direito à restituição das que fizer com

obras ou reparos de outra natureza, embora de interesse comum (Código

Civil, art. 1.341, § 4º).

p) novas construções

A construção de outro andar ou de outro edifício no mesmo terreno, depende

da aprovação unânime dos condôminos.

q) terraço de cobertura – despesas

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As despesas com a conservação do terraço de cobertura, que deve estar

previsto na constituição do condomínio são de responsabilidade do

proprietário e não podem ser executadas de forma a danificar as unidades

inferiores.

r) débitos condominiais – responsabilidade

Os débitos condominiais acompanham o imóvel e devem ser cobrados do

proprietário atual. Assim, quem adquire um imóvel, responde por toda a sua

dívida em relação ao condomínio.

s) seguro

É obrigatório o seguro de todo a edificação contra o risco de incêndio ou

destruição, total ou parcial (Código Civil, art. 1.346). Havendo o sinistro

a indenização será dividida entre os condôminos na proporção de sua cota-

parte.

t)   casos que exigem aprovação de 2/3 dos votos

A alteração em convenção ou no regimento interno depende da aprovação de

2/3 dos votos dos condôminos.

u) aprovação unânime

A mudança de destinação do edifício ou da unidade imobiliária, assim como,

de novas construções depende da aprovação unânime dos condôminos.

v)    deliberações em primeira e segunda convocação

As decisões poderão ser tomadas em primeira convocação, por maioria dos

votos dos presentes que precisam representar pelo menos a metade das

frações ideais, desde a matéria não dependa de quorum especial. Em segunda

convocação, para decisão de matéria que não exija quorum especial, a

assembléia poderá decidir por maioria dos votos dos condôminos presentes.

z)     convocação de todos os condôminos

Para que as decisões assembleares tenham validade jurídica, todos os

condôminos devem ser convocados.

CONDOMÍNIO EM EDIFICAÇÕES OU HORIZONTAL

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Caracteriza-se o sistema pela apresentação de uma propriedade comum ao

lado de uma privativa; cada condômino é titular, com exclusividade, da

unidade autônoma (apartamento, escritório, garagem) e de partes ideais das

áreas comuns (terreno, estrutura do prédio, corredores etc.).

1) natureza jurídica: prevalece o entendimento de que o condomínio não tem

personalidade jurídica; entretanto, está legitimado a atuar em juízo,

ativa e passivamente, representado pelo síndico (art. 12, IX, CPC), em

situação similar à do espólio e da massa falida.

2) elementos constitutivos: todo condomínio em edificações deve ter,

obrigatoriamente:

2.1) o ato de instituição – é previsto no art. 1.332 CCB/02 e pode

resultar de ato entre vivos ou testamento, com inscrição obrigatória no

Cartório de Registro de Imóveis, contendo a individualização de cada

unidade;

2.2) a "Convenção de Condomínio" – é um documento escrito, no qual se

estipulam os direitos e deveres de cada condômino.

- poderá ser feita por escritura pública ou particular;

- a utilização do prédio é por ela regulada;

- difere dos contratos em geral porque estes obrigam somente as partes

contratantes, enquanto a Convenção sujeita a todos os condôminos, atuais

ou futuros;

- pode conter outras normas aprovadas pelos interessados, além das

obrigatórias, desde que não contrariem a lei;

- objetiva estabelecer regramento para o bom aproveitamento do edifício

por todos e para que haja tranqüilidade interna;

- deve ser elaborada pelos proprietários, promitentes compradores ou

cessionários de direitos;

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96

- qualquer alteração posterior da Convenção reclama o "quorum" de 2/3 das

frações ideais, também deliberada em assembléia;

- a modificação da destinação originária das unidades autônomas, bem como

mudanças na fachada do prédio, nas frações ideais, nas áreas de uso comum

e outras, exige unanimidade de votos;

2.3) o Regulamento (Regimento Interno) – complementa a Convenção;

geralmente, contém regras minuciosas sobre o uso das coisas comuns e é

colocado em quadros, no andar térreo, próximo aos elevadores ou à

portaria, fixados na parede.

3) estrutura interna do Condomínio: o condomínio é composto de:

- unidades autônomas – pode consistir em apartamentos, escritórios,

garagens, casas em vilas particulares, não se reclamando número mínimo de

peças ou metragem;

- exige o CCB que cada unidade tenha saída própria para a via pública e a

designação especial, numérica ou alfabética;

- pode o proprietário de cada unidade alugá-la, cedê-la ou gravá-la, sem

que necessite de autorização dos outros condôminos e estes não têm

preferência na aquisição, ao contrário do que acontece no condomínio

comum, como é previsto no art. 504 do CCB;

- se, no entanto, uma mesma unidade pertencer a dois ou mais

proprietários, aplicam-se-lhes as regras do condomínio comum, tais como as

referentes a administração, venda da coisa comum e pagamento de despesas e

dívidas;

- P.S: vide art. 1339, §2º: É permitido ao condômino alienar parte

acessória de sua unidade imobiliária a outro condômino, só podendo fazê-lo

a terceiro se essa faculdade constar do ato constitutivo do condomínio, e

se a ela não se opuser a respectiva assembléia geral.

- para efeitos tributários, cada unidade autônoma será tratada como prédio

isolado;

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97

- áreas comuns (estão enumeradas no art. 3° da Lei n° 4.591/64 e 1.331,

§2º do CCB) – são elas insuscetíveis de divisão e alienação, separadas da

respectiva unidade;

- quanto a sua utilização, dispõe o art. 19 da referida lei que cada

consorte poderá "usar as partes e coisas comuns, de maneira a não causar

dano ou incômodo aos demais condôminos ou moradores, nem obstáculo ou

embaraço ao bom uso das mesmas partes por todos";

- para usá-las com exclusividade, só com anuência da unanimidade dos

condôminos;

- a fachada do edifício é propriedade de todos, assim, o condômino não

pode alterá-la, a menos que obtenha o consentimento de todos os consortes

(art. 10, § 2° da lei);

- a utilização do condomínio sofre limitações impostas pela lei e

restrições previstas nas Convenções:

- além da norma genérica do art. 1.277 do CC, proibindo o uso anormal da

propriedade, o art. 1.336, IV, do CC, considera dever do condômino não

utilizar as suas partes de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e

segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.

- O art. 10, III, da Lei 4.591/64, traz idêntica limitação, reproduzindo

aquele dispositivo, mas acrescentando que o condômino não pode destinar

sua unidade a utilização diversa da finalidade do prédio; assim, se é

residencial, não podem existir escritórios, gabinetes dentários etc.;

- com relação à manutenção de animais no prédio, deve haver disposição

pertinente na Convenção; se omissa, não poderá, em princípio, ser

censurada;

- se a Convenção vedar somente a presença de animais que causem incômodo

aos vizinhos ou ameacem sua segurança, as questões que surgirem serão

dirimidas em função da prova dessas duas situações de fato;

- se a proibição for genérica, atingindo animais de qualquer espécie,

poderá mostrar-se exagerada na hipótese de um condômino possuir um animal

de pequeno porte e inofensivo.

- por essa razão têm os tribunais exigido a demonstração de que o animal,

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de alguma forma, prejudica a segurança, o sossego ou a saúde dos

condôminos;

- as cláusulas restritivas e proibitivas da Convenção devem ser, assim,

interpretadas em consonância com as normas legais referentes aos

condomínios, especialmente os arts. 10 e 19 da Lei n° 4.591/64 e 1.277 e

1.366, IV, do CC.

1- Direitos reais sobre coisa alheia

1.1- Enfiteuse:

O antigo Código Civil começava por ela, sabem por quê? Porque a enfiteuse é o menos limitado dos direitos reais limitados, ela é quase um direito pleno, ou seja, o foreiro enfiteuta é quase proprietário, falta pouco para ser proprietário.

Havia até uma expressão jocosa, que dizia que o enfiteuta tem em suas mãos todos os direitos e poderes da propriedade, menos a propriedade. Ele age como se fosse o proprietário pleno, e o leigo é incapaz de distinguir se você é enfiteuta ou proprietário.

Por isso se dizia que a enfiteuse é o mais pleno dos direitos reais limitados. Ela tem as suas origens na idade média, por isso é muito combatida atualmente, ela trás o ranço medieval.

Ela surgiu indiscutivelmente na idade média, quando se dava uma extraordinária importância a propriedade das terras. Só tinha poder político e econômico quem fosse proprietário de terra.

Os barões feudais eram importantes e respeitados exatamente porque eram proprietários das terras. Esses barões tinham grandes extensões de terras e naquela época não tinham como torná-las produtivas, não tinham como guardá-las eficazmente.

Eram enormes extensões e que freqüentemente eram invadidas pelas tribos bárbaras, vejam que o MST é bem mais antigo do que se supõe.

As propriedades desses barões feudais eram freqüentemente invadidas e eles precisavam manter custosos exércitos particulares, para proteger as suas terras porque não queriam perdê-las, sob pena de se enfraquecerem politicamente.

Tinham que manter a terra sem o que perderiam os seus prestígios, não tinham recursos para tornar a terra produtiva, plantá-la, etc, tinham que manter exércitos onerosos para vigiar as fronteiras nos limites das suas terras.

E essas terras economicamente nada produziam para eles, só produziam despesas em troca de poder político. Haveria uma solução muito simples, bastaria vender as terras, só que isso não interessava aos barões feudais, porque se fizessem isso deixariam de ser barões feudais.

Eles não podiam alienar as terras e estava sendo muito difícil conservá-

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las! A situação não é muito diferente dos latifundiários de hoje, é exatamente igual.

Os senhores feudais diante deste desafio, tiveram uma idéia genial! Até então só se conhecia a propriedade plena, o que fizeram os juristas medievais? Dividiram pela 1ª vez a propriedade, o domínio pleno foi dividido em domínio direto e útil.

O domínio direto permanecia na mão do proprietário da terra o barão feudal, o domínio útil era transferido à 3º. Se vocês quiserem usar uma linguagem matemática, poderão adotar a seguinte fórmula:

TEM QUE TER NA ENFITEUSE: DOMÍNIO PLENO = DOMÍNIO DIRETO + DOMÍNIO ÚTIL.

O domínio útil se transferia ao foreiro, e o domínio direto permanecia em mãos do aforador. A enfiteuse também é conhecida como aforamento, ou embasamento.

E os nomes são: aforador e foreiro ou enfiteuta, ou embasado. Mas os nomes mais conhecidos na linguagem comum são aforador, e foreiro.

Como isso funcionou? Muito simples! Dividiu-se o domínio, o proprietário transferia à 3º o domínio útil que permitia ao 3º usar e gozar a terra, como se fosse o seu proprietário, mas mediante pagamento de uma quantia anual, chamado cânon ou foro.

E porque se chama domínio útil? Porque o titular do domínio útil que é o foreiro, é quem vai tirar da terra as suas utilidades econômicas, porque é quem pode usar e gozar a terra.

Daí o nome domínio útil, quer dizer, as utilidades econômicas da terra são percebidas pelo foreiro, mediante o pagamento de uma quantia anual. Com isso os senhores feudais resolveram o seu problema.

Reparem que as terras até então, nada lhes rendiam passaram a render em cânon, uma quantia anual. Por outro lado ficaram dispensados da tarefa de guardar a terra, porque os foreiros é que tinham interesse em evitar as invasões.

Eram os foreiros que iam guardar os limites da enfiteuse. E em 3º lugar, os senhores feudais não perderam o seu prestígio, porque proprietários continuavam sendo eles.

Esse domínio útil era quase igual à propriedade, porque permitia ao foreiro usar e gozar a coisa, como se fosse proprietário, ele plantava, construía. Passava aos herdeiros.

O direito ao domínio útil transferia-se causa mortis como qualquer bem de herança. Morrendo o foreiro, passavam a ser foreiros os seus herdeiros.

Como se não bastasse, era perfeitamente possível alienar o domínio útil, exigindo-se apenas que se oferecesse a preferência para adquiri-la o aforador.

O foreiro está agindo como se fosse proprietário, pode usar e gozar a coisa, transfere a propriedade aos herdeiros, pode alienar o domínio útil, gratuito ou onerosamente, pode vender e doar o domínio útil. O foreiro é quase o proprietário.

Ele tem todos os poderes da propriedade, menos a propriedade e como se não bastasse, a enfiteuse é perpetua para o foreiro. O aforador não pode

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resilir o contrato de enfiteuse, a não ser em situações excepcionais, previstas na lei.

O aforador não pode renunciar, isso não existe! A não ser nas hipóteses previstas em lei, como por ex: o foreiro deixar de pagar o foro para 3 anos consecutivos, ou se o foreiro morrer não deixando herdeiros, ou se o foreiro abandonar o imóvel, mas isso tudo está previsto em lei.

Fora isso, a enfiteuse é perpetua, para o aforador! Veremos que para o foreiro ao contrário, ela não é perpétua, porque havia um artigo no cód. que assegurava ao foreiro o direito potestativo, de após 10 anos de enfiteuse, de comprar o domínio direto.

Ele podia compelir o proprietário a lhe alienar o domínio direto e aí ele se tornava proprietário pleno. Vejam que situação estranha! O aforador só podia denunciar a enfiteuse nas hipóteses previstas na lei e que eram muito restritas.

Já o foreiro tinha o direito potestativo de adquirir o domínio direto, após 10 anos de contrato enfitêutico. A enfiteuse também só se admitia para imóveis que ainda não estivessem plantados ou construídos.

E por uma razão óbvia, porque ela foi criada para otimizar economicamente, as terras ociosas.

Só podem ser objetos de enfiteuse os imóveis, o ACC dizia expressamente, os que ainda não fossem plantados ou construídos, porque o objetivo da enfiteuse era permitir uma utilização econômica para a terra, até então ociosa.

Se ela já era plantada ou construída não havia razão social ou econômica, para dividir a propriedade. A enfiteuse pode ser publica ou particular no Brasil.

A pública é aquela que se estabelece sobre os imóveis públicos, principalmente os terrenos de Marinha, e seus acrescidos. Uma grande parte dos terrenos de Marinha no Brasil são hoje objetos de enfiteuse.

Os que moram à beira mar, na verdade não são proprietários daqueles imóveis, são apenas titulares de domínio útil que pagam foro à União. A Enf. pública é a que se refere aos imóveis públicos, e a sua constituição é regida pelo dec. 9760/46, que não foi revogado pelo NCC.

Já a enfiteuse particular, é a que se estabelece sobre imóveis particulares, nada impede que o proprietário de um terreno estabeleça uma enfiteuse sobre ele.

O Brasil tem 2 grandes aforadores particulares, em 1º lugar a Mitra Episcopal, a Igreja é a maior aforadora particular, é incalculável o patrimônio da Igreja e que é dado em enfiteuse.

E por uma razão obvia! Era uma tradição da sociedade brasileira, nos séculos XVIII e XIX, as pessoas ricas proprietárias de terras, doar bens em troca de garantia de entrada no céu! Era uma espécie de purgação de pecados.

Essas pessoas não esqueciam de fazer testamento, doando parte de suas terras à Igreja. Também era muito freqüente quem não tivesse herdeiros necessários, doar os seus imóveis à Igreja.

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Com isso a Igreja tornou-se proprietária de uma enorme extensão de terras e não tem como otimizá-las economicamente. A Igreja não poderia virar uma imobiliária a comprar e vender terras, alugar etc.

A solução que a Igreja encontrou já que não podia vender as terras, foi dá-las em enfiteuse, conservando o domínio direito, já que não podia vender as terras porque eram de Deus!

E o 2º grande aforador é a família imperial, os Orleans e Bragança, quem tem casa aqui em Petrópolis está cansado de saber disso, porque o acordo que foi feito entre a República e a Casa Real, incluiu a conservação das propriedades da família imperial em Petrópolis.

A República não desapropriou essas terras, ela permitiu que a família imperial, as mantivesse, foi um dos itens do acordo. Porque aqui no Brasil tudo se faz com acordo, graças da Deus!

Esse é o grande milagre brasileiro, todos os grandes problemas políticos brasileiros, foram resolvidos em acordos. Em outros países são resolvidos com muito sangue, aqui se resolve nos acordos.

A independência americana foi conquistada com mar de sangue, todos os países sul americanos conquistaram sua independência com muito sangue, também a independência dos países africanos!

A República foi um grande acordo a lei Áurea também, não se disparou um tiro! Os grandes dramas nacionais foram resolvidos na conciliação.

Voltando, a família real conservou as terras em Petrópolis e não podendo administrá-las diretamente até porque foram para o exílio, tiveram essa idéia genial. Deram essas terras em aforamento.

Em Botafogo há várias ruas que são enfitêuticas, como a Barão de Olinda, rua Bambina, pertencem a uma família portuguesa antiga, e os herdeiros deram os imóveis em enfiteuse.

Vejam que a enfiteuse particular é menos freqüente do que a enfiteuse pública e é essa que não pode mais ser constituída daqui por diante, permanecendo apenas as antigas.

A enfiteuse se constitui mediante contrato por escritura pública, já que se trata de direito real sobre imóveis, e que é levado ao RGI obrigatoriamente.

Aí aparece uma figura pouco conhecida pelos advogados, muito distorcida, que muita gente pensa que é imposto, uma taxa e não tem nenhuma natureza tributária, o laudêmio não é imposto pago pelo foreiro, muito menos uma taxa.

E não se confunde com o foro, que é aquela quantia anual que o foreiro paga ao aforador pelo domínio útil. O Laudêmio é uma compensação financeira que o foreiro paga ao aforador, quando aliena o domínio útil, não tendo o aforador exercido o direito de preferência.

Como lhes disse, quando o foreiro resolve alienar onerosamente o domínio útil, tem que oferecer a preferência ao aforador. Pode interessar ao aforador adquirir o domínio útil?

Claro, pois ao adquirir o domínio útil, o aforador estaria extinguindo a enfiteuse. Ao adquirir o domínio útil ele unifica a propriedade, por isso o foreiro tem que oferecer a preferência ao aforador.

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Se o aforador não se interessar pela compra do domínio útil, o foreiro pode alienar à 3º, pelas mesmas condições oferecidas ao aforador. E aí o foreiro pagará ao aforador, um percentual sobre esse valor da venda, que se chama laudêmio.

Então o laudêmio, é uma compensação, paga pelo foreiro ao aforador para não ter exercido o direito de preferência, o foreiro lhe pagará o laudêmio, que é um percentual sobre o valor da venda do domínio.

E a cada alienação onerosa do domínio útil, se pagará um novo laudêmio, se houver 20 alienações onerosas de domínio útil, 20 laudêmios serão pagos. O que interessa ao aforador é o laudêmio, porque o foro costuma ser uma ninharia.

No silêncio não se estabelecendo desde logo no contrato de enfiteuse o valor do laudêmio, na enfiteuse particular ele é 2,5% na publica é de 5% sobre o valor do domínio útil.

É evidente que na alienação gratuita não há que se falar em laudêmio, por ex; na sucessão causa mortis os herdeiros não pagarão laudêmio ao aforador porque estão recebendo o domínio útil gratuitamente.

Da mesma maneira se você doar o domínio útil, não vai pagar laudêmio, que é só na alienação onerosa, na compra e venda. O Supremo também já decidiu que também nas fusões ou nas cisões não se pagará laudêmio.

Então digamos que uma empresa tem o domínio útil de um imóvel e resolve incorporar esse domínio útil a uma 3ª empresa que ela está ingressando, não paga laudêmio.

Da mesma maneira se uma empresa é titular de um domínio útil de 1 terreno, e depois resolve cindir a empresa criando 2 novas e transferindo esse terreno a uma das 2 empresas cindidas, não há laudêmio, isso é uma decisão do Supremo, porque ele não considera isso uma alienação onerosa.

Isso é que é o laudêmio, como lhes falei, o ACC estabeleceu um artigo que garante ao foreiro o direito potestativo de remir o foro, ele pode compelir o aforador a lhe transferir o domínio direto, é há uma fórmula matemática para calcular esse valor.

Ele terá que pagar 10 foros e 2,5 laudêmios. Calcula-se o valor do domínio útil e calcula-se 2,5 laudêmios, como se houvesse 2 alienações e uma meia, e mais 10 foros.

E é essa a quantia que o foreiro terá que entregar ao aforador para adquirir o domínio pleno. Aí dirão vocês: então tudo que é foreiro deve ter comprado o domínio pleno? Garanto a vocês que isso é raríssimo!

Fui advogado 33 anos e não me lembro de ter feito uma escritura de remissão de foro, rarissimamente os foreiros se interessavam para adquirir o domínio pleno, e vou dizer por quê.

Ora o foreiro agia como se fosse proprietário, sabia que o domínio útil passava para os filhos era perpétuo podia ser vendido, que interesse tem o foreiro de gastar dinheiro? Só para dizer que é proprietário pleno?

O brasileiro raciocina com o bolso, vai gastar um dinheirão só para dizer que é proprietário pleno? Não mudaria nada, iria continuar usando, gozando passando para os filhos, podendo vender.

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Por isso é que este dispositivo não despertou grande interesse entre os foreiros, o Clóvis Beviláqua imaginou que isso ia provocar uma febre de aquisições de domínio pleno e que praticamente as enfiteuses desapareciam, porque todos os foreiros iriam adquirir o domínio direto.

A enfiteuse pública não permite isso, porque os bens públicos são inalienáveis, se o foreiro pudesse adquirir o domínio direto, o bem passaria a ser alienado. O foreiro de um terreno de Marinha não pode compelir a União, a lhe transferir a propriedade plena mesmo depois de 30, 40 anos de enfiteuse.

Esse direito de remir o foro, só é concedido à enfiteuse particular, mas nada impede que por uma autorização legislativa, a União seja autorizada a alienar o domínio direto, quando não interessa mais a União manter esses imóveis, mas tem que 1º desafetar.

Tem-se que 1º desafetar, tem que se fazer uma lei desafetando o domínio direito e ai permitindo a alienação foreira, isso já foi feita em algumas regiões.

Conheço bem essa questão da enfiteuse pública, porque durante 4 anos fui procurador federal, atuei no SPU que é o órgão que administra as enfiteuses públicas. Bens públicos são da União, ao Estado, e o Município.

No final de Botafogo, há imóveis que tem uma parte que é foreiro à União e outra ao Estado. Há imóveis em Botafogo, que tem a seguinte conformação: isso aqui é terreno de Marinha é da União, depois vem uma extensão que é foreira ao Estado, porque essa propriedade foi doada ao Estado.

Se tem uma parte de imóvel que paga uma parte do foro à União, um foro ao Estado, e o que sobre é que é pleno. E como se chama essa parte de propriedade plena? Chama-se ALODIAL.

Não é nenhum absurdo pagar-se 2 foros, e pode-se pagar 3 se uma 3ª parte pertencer ao Município. E isso se deve as antigas sesmarias que foram doadas ao Estado. A situação fundiária no Brasil é muito complicada!

O foreiro tem o direito potestativo de adquirir o domínio direto, já o aforador só pode extinguir a enfiteuse, nos casos que estavam expressamente previstos no ACC.

O COMISSO, o que era? Era exatamente quando o foreiro deixava de pagar o foro por 3 anos consecutivos, ocorria então o comisso. A AÇÃO DE COMISSO É A AÇÃO QUE CABE AO AFORADOR CONTRA O ENFITEUTA PARA RESCINDIR A ENFITEUSE POR FALTA DE PAGAMENTO DO FORO.

Mas só se admite a ação de comisso, quando o inadimplemento é de 3 prestações consecutivas. Enquanto não se vencer o 3º foro devido, o aforador não pode propor a ação de comisso.

Uma outra hipótese é quando o foreiro morre sem deixar herdeiros, aí o aforador tem preferência sobre o Estado, não é o Estado que vai herdar o domínio útil.

Se o foreiro não tem herdeiros quem vai receber o domínio útil, é o aforador, é natural que assim seja. Uma outra hipótese é quando o foreiro deixa de pagar os impostos, que são por conta do foreiro.

Se o foreiro deixa de pagar esses impostos o aforador poderá promover ação de rescisão de contrato enfitêutico. Da mesma maneira, se o foreiro

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abandona o imóvel, ou deixa perecer ou deteriorar-se, também se aliena o domínio útil ao aforador.

São hipóteses expressamente elencadas na lei, só nelas é que o aforador poderá rescindir o contrato enfitêutico, daí se dizer que a enfiteuse é perpétua, porque só muito raramente poderá ser extinta por iniciativa do aforador.

A enfiteuse vinha sofrendo um ataque cerrado! Se é instituto com inimigos mortais é a enfiteuse, a uma porque se dizia que é um instituto muito antigo, o que é uma bobagem porque o casamento é muito mais antigo e infelizmente ninguém propõe a sua extinção!

A propriedade também é muito mais antiga, e ninguém sugeriu no Brasil abolir a propriedade. O outro argumento sim ainda admite, pois a enfiteuse tem o ranço medieval da dominação do homem pelo homem.

O aforador é um castelão, um senhor feudal que exercia o poder de vida e morte sobre os seus vassalos! Por outro lado a enfiteuse cheira mal, porque o aforador ganha dinheiro sem trabalhar só explorando a terra que é trabalhada pelo foreiro, e ele pode ficar na praia!

Isso no direito moderno soa mal! Você não precisa ir trabalhar e aquele que trabalha a sua terra é que lhe paga! O laudêmio é criticadíssimo no ponto de vista ético!

O laudêmio é acusado de uma imoralidade, alguém que ganha sem ter feito nada, porque o foreiro alienou o domínio útil, então vou ganhar dinheiro se não contribui em nada por isso, é considerado um enriquecimento imoral sem causa justa, que não representava o trabalho do aforador.

As criticas a enfiteuse eram terríveis! Outro inconveniente era a sua PERPETUIDADE, ou seja, muitos proprietários de terras ociosas não se sentiam motivados a constituí-la com receio de que viessem a perder a terra se o foreiro exercesse o seu direito de adquirir o domínio direto após 10 anos.

Ficavam assustados com as dificuldades que teriam, caso resolvessem recuperar o domínio pleno, isso era muito difícil! Muitos proprietários de terras preferiam deixá-las ociosas.

A enfiteuse tinha todos esses inconvenientes: um ranço medieval, uma lembrança da época da dominação do homem pelo homem, do senhor feudal e os seus vassalos, e essa perpetuidade que também era muito prejudicial.

Por isso é que finalmente se aboliu a enfiteuse particular no NCC e substituiu-se pela superfície, que guarda com a enfiteuse uma enorme afinidade. Costumo dizer que a superfície é a enfiteuse com roupas novas.

1.2- Direito de Superfície :

Aquele vestido antigo da enfiteuse com babados, brocardos e rendas, foi transformado num modelito moderno que é a superfície! Um leigo apreciando as duas é capaz de dizer que é a mesma coisa, veremos que há diferenças fundamentais.

Em 1º lugar, a superfície não pode ser perpétua, há proibição expressa. Superfície perpétua é nula! Só pode ser constituída por tempo determinado pelo NCC!

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O proprietário só pode conceder a outrem o direito de construir ou plantar no seu terreno por tempo determinado, completamente diferente da enfiteuse que é perpetua.

Em 2º lugar, há uma diferença fundamental! Na enfiteuse tudo que o foreiro acedeu ao solo, as construções que ele fez, uma vez extinta a enfiteuse por ex: na ação de comisso o aforador tem que indenizar o foreiro para todas as benfeitorias e acessões feitas, na superfície não!

Tudo que o superficiário aceder à superfície, terminado o prazo da superfície, passa ao patrimônio do proprietário sem direito a 1 centavo de indenização ou retenção. Essa é outra diferença extraordinária!

3ª diferença, na enfiteuse como lhes falei, a alienação onerosa do domínio útil, implica no pagamento do laudêmio ao aforador.

Na superfície é nula a cláusula que obriga o superficiário a pagar o percentual ao proprietário, caso aliene o direito de superfície. É nula!

Os que alegavam que o laudêmio era uma imoralidade lograram uma grande vitória. Na superfície é proibido sob pena de nulidade estabelecer um percentual a ser pago ao proprietário, pela alienação onerosa do direito de superfície.

Com isso se modernizou a superfície, não há hipótese alguma aquela possibilidade do superficiário adquirir a propriedade plena após um certo tempo, isso não existe na superfície!

Mesmo que se constitua a superfície para 50 anos, não pode o superficiário ao final desse prazo, forçar o proprietário a alienar o domínio pleno, a superfície sempre retornará ao proprietário do imóvel.

No prazo do contrato de superfície, o superficiário poderá alienar o direito onerosa ou gratuitamente, mas no prazo! Se fiz o contrato de superfície para 20 anos, nada impede que 3 anos depois que o superficiário venda o seu direito de superfície, mas pelos 17 anos que faltam.

Também se o superficiário morrer o direito de superfície se transmite aos herdeiros, mas pelo prazo que faltar. Se o contrato de superfície era de 20 anos e 3 anos depois o superficiário morre, os herdeiros herdarão o direito de superfície pelos 17 anos que faltavam para completar o prazo.

Vejam que se modernizou a enfiteuse. Só que o direito de superfície, está hoje previsto no NCC, mas o estatuto da cidade antecipou-se e também incluiu o direito de superfície e isso gerou uma discussão que está empolgando a doutrina atual.

O estatuto da cidade disciplina a superfície de modo um pouco diferente do NCC. Estão surgindo discussões se o NCC teria revogado o Estatuto da Cidade no capitulo que trata da superfície.

Vamos às diferenças: no NCC é expresso dizer que o contrato de superfície só pode ser celebrado por tempo determinado. Art: 1369. O Estatuto das Cidades diz claramente que ele pode ser constituído por tempo determinado ou indeterminado, só não pode ser perpétuo, mas pode ser por tempo indeterminado.

O que significa dizer que se é por tempo indeterminado, a qualquer momento o proprietário poderia resilir o contrato de superfície, o que acho uma temeridade. Prefiro a redação do NCC que dá mais estabilidade ao contrato.

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Essa é a 1ª diferença, enquanto o EC permite a contratação da superfície por tempo determinado ou indeterminado, o NCC só alude ao tempo determinado.

Outra diferença fundamental, o NCC no PU do art. 1369, diz que o direito de superfície não autoriza a obra do subsolo, ou seja, só autoriza usar a superfície para plantar ou construir.

E as obras no subsolo só se forem indispensáveis ao uso da superfície, como por ex: se vou construir uma casa, tenho que fazer os alicerces que ficam no subsolo. Mas não poderia fazer uma garagem subterrânea, porque estaria usando o subsolo.

Repito, pelo NCC só autoriza o superficiário a usar a superfície que fica sobre o solo. O Estatuto das Cidades diz expressamente que a superfície inclui o solo, o subsolo e a coluna de ar que lhe fica acima.

Posso ceder apenas o ar que fica acima do meu terreno e o 1º contrato desse tipo, foi feito no Leblon, saiu nos jornais. Um condomínio tinha na sua frente uma casa e por cima da casa os condôminos viam a praia e o ar. Temerosos de que essa casa pudesse ser vendida e ali fosse construído um espigão tirando a vista, ao invés de constituir uma servidão de vista, eles fizeram um contrato de superfície para 50 anos da coluna de ar que fica sobre esse terreno.

E com isso quem comprar o terreno não vai poder construir um edifício, porque estaria usando a superfície aérea do imóvel. Antigamente se faria uma servidão de vista, agora foi possível fazer um contrato de superfície da coluna de ar acima do terreno.

Isso pelo NCC é impossível, fica restrito ao solo. A seguinte polêmica estourou. O NCC revogou o EC e por isso deve prevalecer as regras do NCC e tudo que está no EC, teria sido derrogado?

Uma corrente diz que sim, que o NCC teria tacitamente derrogado o EC no capítulo da superfície. A uma porque é posterior e estabeleceu regras conflitantes e a duas porque teria exaurido a matéria tratada na lei anterior pelo EC. Essa é uma corrente tem grandes defensores.

Eu por hora até o momento, prefiro me filiar à 2ª corrente que é defendida para aquele que, na minha opinião, é o grande pai do direito de superfície no Brasil que é o extraordinário Prof. e jurista Ricardo Lyra.

Assim, Ricardo Lyra em sua tese de mestrado foi do direito de superfície, e como tenho por ele grande admiração e respeito, sigo a orientação dele, porque acho a mais correta. Ele acha que são 2 sistemas diferentes, o Estatuto das Cidades disciplinará a superfície dos terrenos urbanos e o NCC para os terrenos que não são urbanos.

Porque a cidade hoje é um micro sistema próprio. Na cidade é interessante que se possa usar a superfície aérea, o subsolo, mas a matéria é profundamente polemica e vocês podem aderir a qualquer uma dessas posições.

Vamos hoje encerrar o estudo da superfície a luz do NCC e não do Estatuto da Cidade. A concessão da superfície pode se dar de maneira onerosa ou gratuita.

De maneira onerosa, o pagamento da utilização da superfície pode se dar de uma só vez, ou parceladamente. Pode-se diluir o preço da utilização da

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superfície pelo próprio tempo do contrato.

Se o contrato é de 20 anos, esse preço poderia ser diluído nesses 20 anos, e aí esse pagamento se aproximaria do foro, como se fosse o foro da enfiteuse.

Mas também, nada impede que seja pago de uma só vez ao se constituir o contrato de superfície. Mas também pode ser gratuita. O proprietário do imóvel pode conceder a outrem a utilização da superfície gratuitamente.

Qual seria a vantagem para o proprietário? Depois incorporar ao seu patrimônio todas as acessões e benfeitorias que o superficiário tenha feito.

Tal como acontece na enfiteuse, caberá ao superficiário o pagamento de todos os impostos e taxas que recaiam sobre o imóvel embora ele só tenha o direito à superfície, mas os impostos que gravam o imóvel, correrão por conta do superficiário.

E nisso há semelhança com a enfiteuse, da mesma maneira, se o superficiário não pagar os impostos e taxas, isso traduzirá uma violação do contrato de superfície ensejando a sua rescisão.

Também só pode ser objeto de superfície o imóvel que não esteja plantado ou construído e aí é mais uma identidade com a enfiteuse. Tanto na enfiteuse quanto na superfície só podem ser objetos aqueles imóveis que ainda não estejam plantados ou construídos. Porque o objeto do direito de superfície é exatamente otimizar social e economicamente os imóveis que estejam ociosos. Se o imóvel já em aproveitamento econômico, não há porque dá-lo em superfície.

Aí há uma diferença muito grande entre o direito brasileiro e o português em que se admite a superfície para cisão. O que seria? É quando já temos num imóvel por ex: um prédio construído e o proprietário do imóvel resolve destacar a superfície, cedendo o seu uso ao superficiário. Que passaria a explorar esse prédio já construído podendo por ex: ampliá-lo, receber os aluguéis, mas reparem o prédio já estaria construído, já haveria uma construção que seria destacada da propriedade plena, e transferida ao superficiário, retornando ao proprietário apos o prazo do contrato.

Isso é que se chama constituição da superfície para cisão, o que, entretanto, no direito brasileiro, não foi admitido porque no nosso direito é preciso que o imóvel não esteja plantado ou construído.

Esse direito de superfície pode ser cedido à 3ºs, seja onerosa ou gratuitamente, mas é claro que o superficiário só poderá ceder os seus direitos à 3ºs pelo prazo que restar no contrato.

Se o contrato for para 20 anos e já passaram 10, o superficiário só pode ceder o seu direito de superfície por mais 10 anos. E a grande diferença entre a enfiteuse e a superfície nesse particular, é que na superfície não há a figurado laudêmio.

Ou seja, o superficiário mesmo tendo alienado onerosamente o seu direito de superfície a 3º, nada terá que pagar como compensação ao proprietário. Não há laudêmio no direito de superfície.

Também pela morte do superficiário o direito se transfere aos herdeiros pelo prazo que restar ao contrato, os herdeiros sucederão ao superficiário

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falecido pelo tempo que faltar ao contrato.

Se o superficiário resolver ceder onerosamente o seu direito à 3ºs, terá que oferecer a preferência ao proprietário e vice versa. Há, portanto, um direito de preferência recíproco.

O objetivo é enfeixar o domínio pleno nas mãos do superficiário ou do proprietário. Também é claro que o superficiário não poderá dar a superfície destinação diversa daquela que se ajustou no contrato.

Se é para construir, ou para agricultura etc. A mudança da destinação enseja o rescisão do contrato, para infração contratual, para que se mude a destinação da superfície, é preciso a concordância expressa do proprietário.

A grande questão que traz uma certa perplexidade aos leigos, é que expirado o prazo da superfície, tudo aquilo que o superficiário acresceu ao imóvel se transferirá gratuitamente ao patrimônio do proprietário.

As acessões, as benfeitorias, tudo que o superficiário agregar com seu investimento ao imóvel, passará à propriedade do proprietário do imóvel sem direito de qualquer indenização ou retenção.

Aí é diferente da enfiteuse, o foreiro tem direito à indenizar-se das acessões e benfeitorias feitas, uma vez extinta a enfiteuse, mas o superficiário não! A não ser que voluntariamente o proprietário se obrigue a indenizar.

A lei não proíbe isso, mas isso terá que ser expresso, pois no silêncio do contrato de superfície, essas acessões e utilidades econômicas serão transferidas gratuitamente ao proprietário.

E esse é o grande atrativo da superfície para os proprietários. Dirão Vocês: mas só um louco assinará um contrato de superfície, sabendo que tudo aquilo que agregar ao imóvel, passará ao proprietário sem indenização. Que benefício econômico teria o superficiário?

Isso vai depender do tempo do contrato de superfície, a experiência já está mostrando, que os contratos de superfície serão na maioria esmagadora das vezes, celebrados para prazos longos que compensem o investimento do superficiário.

Isso é uma questão de matemática financeira, o superficiário terá que calcular com cuidado, não é coisa para principiante nem para amador, isso é coisa para profissional, ele tem que ver o que pretende construir na superfície, quanto dispenderá para construir ou plantar e qual será o tempo que precisará para recuperar esse investimento e ainda ter lucro.

O prazo do contrato de superfície vai ter que ser calculado pelas partes com bastante cuidado, porque isso pode acarretar enorme prejuízo ao superficiário, que pode construir no imóvel e depois perder para o proprietário tudo que construiu, sem ter tido tempo de recuperar o investimento e ainda ter lucro.

Há prazos de superfície fixados em 30, 50 anos de acordo com aquilo que o superficiário pretende agregar ao imóvel. Por isso se estabeleceu que essas acessões passam gratuitamente ao proprietário, para motivar a concessão da superfície.

O que se quer socialmente, é que os imóveis não fiquem ociosos por isso que digo que a superfície tem enorme densidade social. Se bem entendido e

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absorvido o instituto pela sociedade brasileira, pode mudar o perfil urbano e rural.

Muitos imóveis urbanos que são mantidos vazios servindo de abrigo para mendigos e malfeitores ou para acumular lixo, muitos desses imóveis que não tem nenhuma utilidade social, porque os seus proprietários não tem recursos ou interesse para construir, esses imóveis podem agora ser otimizados econômica e socialmente, graças ao direito de superfície.

O proprietário não corre o risco de perder a propriedade como acontece na enfiteuse. Eu lhes expliquei que podendo o foreiro após 10 anos, adquirir compulsoriamente o domínio direto, muitos proprietários resistiam a idéia de constituir enfiteuse temerosos de que viessem a perder a propriedade .

Já isso não ocorrerá com a superfície, jamais! E acredito que muitos proprietários conhecendo melhor esse novo instituto, se animarão a conceder a superfície à 3ºs., que possam construir nesses imóveis tornando-os socialmente mais úteis.

O mesmo pode ocorrer no campo. A reforma agrária poderia se fazer, na minha opinião, graças ao direito de superfície, é o art. 1375 que considero talvez o mais importante de todos os do direito de superfície.

Pois aí está a essência do instituto, esse direito do proprietário de adquirir as acessões feitas pelo superficiário gratuitamente. Em caso de desapropriação, a indenização será paga proporcionalmente.

Uma parte ao proprietário que corresponder à propriedade sem a superfície, e ao superficiário se pagara a indenização que corresponder ao direito de superfície.

E finalmente o art. 1377 veio permitir a concessão da superfície de imóveis públicos o que é também muito importante! E ai o direito de superfície se aproxima da figura da concessão.

E aqui no Rio de Janeiro já tivemos o 1º contrato de superfície celebrado entre o Município do RJ e uma empresa espanhola para construir a garagem subterrânea na Cinelândia.

Foi para contrato de superfície, e não para concessão. O Município cedeu por 50 anos a superfície daquela área para que a superficiária ali construísse uma garagem e a explorasse por 50 anos, findo esse prazo toda aquela obra passará ao domínio público sem qualquer indenização.

Também é uma maneira eficiente dos municípios promoverem essas obras, principalmente de garagens subterrâneas, sem dispender verba pública. O art. 1377 permite isso, mas é claro, remete a matéria à lei especial.

Vejam o que se confirma o que lhes falei na ultima aula, de que a superfície nada mais é do que a enfiteuse modernizada. Quanto aos bens públicos, a enfiteuse continua existindo e ela é diferente da enfiteuse particular.

Porque quanto aos bens públicos, o foreiro não tem como compelir à União ou o Estado a lhe alienar o domínio direito. Ou seja, ainda que a enfiteuse publica, já perdure para 50 anos não pode o foreiro adquirir compulsoriamente o domínio direto.

Mas, nada impede que o poder público aliene ao foreiro o domínio direto, desde que ele seja previamente desafetado, a lei pode desafetar o domínio direito para que a União, Estado ou Município, aliene ao foreiro o domínio

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direto. Mas como o domínio direto integra o patrimônio público, ele só pode ser alienado depois de desafetado. Vocês sabem que a desafetação é uma autorização legislativa para que o executivo aliene o bem.

Também não há a menor dúvida na doutrina que a enfiteuse dos imóveis públicos continua em pleno vigor não foi modificada pelo NCC, a extinção das enfiteuses só se refere à particular e não a pública que é regida para lei especial.

1.3- Da servidão

O 2º dos direitos reais limitados e que também se exercem sobre coisa alheia é a SERVIDÃO, no ACC se falava servidão predial. Antigamente se falava em servidões prediais, para destingi-las das servidões pessoais que eram o usufruto, o uso e a habitação.

Só que essa palavra servidão pessoal sempre foi muito combatida pela doutrina moderna, porque tem o ranço de dominação do homem pelo homem. Servidão pessoal é como se alguém fosse servo de outro, o que não mais se admite no século XXI.

Então, aboliu-se a expressão servidão pessoal, e conseqüentemente não havia mais necessidade alguma de se falar em servidão predial porque agora toda e qualquer servidão só pode ser predial.

Essa é a explicação de se ter abolido a palavra predial, e aparecer apenas “DAS SERVIDÕES”.

NAS SERVIDÕES TEMOS SEMPRE UM PRÉDIO A QUE CHAMAMOS DE DOMINANTE E UM OUTRO A QUE CHAMAMOS DE SERVIENTE.

O QUE É SERVIDÃO? É QUANDO SE TIRA DO PRÉDIO SERVIENTE UMA UTILIDADE EM BENEFÍCIO DO PRÉDIO DOMINANTE.

Um dos prédios serve ao outro, para valorizá-lo para torná-lo mais útil, daí porque a servidão serve ao prédio e não a uma pessoa. O prédio serviente fica gravado, a servidão é um ônus, um gravame que recai sobre o prédio serviente.

Obs! É fundamental que você s anotem isso! A servidão não recai sobre o proprietário do prédio serviente, senão seria uma servidão pessoal, A SERVIDÃO GRAVA O PRÉDIO E NÃO AS PESSOAS!

Ela representa um gravame que onera o prédio serviente em benefício do prédio dominante, é claro que por via oblíqua servindo ao prédio dominante, o seu proprietário se beneficia, mas por via oblíqua.

Porque o benefício é o prédio, essa utilidade pode ser de várias espécies, pode ser uma passagem pelo prédio serviente que torna mais fácil chegar-se a rua, pode ser a preservação de uma vista para o mar, pode ser a passagem de água pelo prédio serviente. São inúmeras as possibilidades de constituição de servidão, mas é sempre uma utilidade.

Daí se presume que é pressuposto inafastável das servidões, que o prédio dominante e o serviente sejam de proprietários diferentes. Caso contrário se pertencerem a mesma pessoa, não há necessidade nenhuma de se constituir servidão, porque o proprietário de ambos os prédios retira de ambos, as utilidades que bem entender.

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Tanto que uma das causas de extinção das servidões é a confusão, ou seja, quando o prédio dominante e o serviente passam a pertencer a mesma pessoa, isso por si só extingue a servidão.

Assim por ex: se o proprietário do prédio dominante adquire o prédio serviente ou vice-versa, a servidão se extingue.

Se o proprietário do prédio serviente herda a propriedade do dominante que pertencia a seu pai, extingue-se a servidão, portanto não há servidão se os 2 imóveis pertencem a mesma pessoa. Isso é condição sine qua non que os 2 prédios pertençam a pessoas diferentes.

Também reparem que o NCC fala em prédio, que está aí usado no sentido técnico romano de imóvel não é de construção.

Quando se fala em prédio dominante e prédio serviente, não estamos nos referindo a um edifício como os leigos imaginam, porque na linguagem das ruas prédio seria sempre um edifício, um terreno baldio jamais seria um prédio.

Isso não é verdade, prédio que os romanos chamavam de predium, é o imóvel seja ele construído ou não. Prédio é o solo, um terreno baldio sem qualquer acessão é um prédio.

Assim como aquele que tem um edifício de 50 andares, e quando aqui o NCC fala (art. 1378) “A servidão proporciona utilidade para o prédio dominante e grava o serviente que pertence a diverso dono”.

Quando se fala em prédio pode ser um terreno sem qualquer acessão como pode ter construções e reparem que ficou aqui bem claro, no 1378 que a servidão serve ao prédio dominante e grava o serviente que tem que pertencer a dono diverso. Só nessa definição do art 1378, aparece o conceito claro do que é uma servidão.

E essa servidão se constitui ou para declaração de vontade ou para testamento, está sujeito a registro no RGI. Ou seja, a servidão se constitui para contrato de servidão em que o proprietário do prédio dominante, ajusta com o do prédio serviente a utilidade que o gravará ou então ela se constitui para testamento.

Essa constituição é em princípio onerosa, mas nada impede que seja gratuita, se o proprietário do prédio serviente for amigo ou parente do dominante, e resolver conceder-lhe uma utilidade gratuitamente.

Isso é um ato de liberalidade que a lei não poderia impedir, mas o espírito é que seja oneroso, nem poderia deixar de ser já que o prédio serviente fica onerado e isso reduz o seu valor venal, e, portanto, o proprietário do prédio serviente tem que ser ressarcido pela diminuição patrimonial que a servidão acarreta.

A remuneração deve ser ajustada como as partes bem entenderem de uma só vez, ou parceladamente, em suma: O NCC não entra nessa discussão que fica adstrita à autonomia da vontade.

As partes acertarão como melhor lhes convier, a remuneração da servidão. É muito comum que os alunos confundam as obrigações de não fazer, com as servidões.

Por ex: celebram os proprietários de imóveis vizinhos uma obrigação pela qual um deles se obriga a não impedir a passagem do vizinho pelo seu

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terreno, ou então celebram os proprietários de imóveis vizinhos, uma obrigação negativa pela qual, um dos proprietários se obriga a não construir no seu terreno, para não tirar a vista do vizinho. E aí estamos diante de uma obrigação de não fazer. Não impedir a passagem do vizinho pelo seu terreno, não construir no seu terreno para não tirar a vista do vizinho, não impedir a passagem da água pelo seu terreno para que ela possa abastecer o vizinho. ISSO SERIA UMA OBRIGAÇÃO NEGATIVA.

Imaginemos agora que os vizinhos constituam uma servidão de passagem, que permite ao proprietário de um dos prédios passar pelo do outro, ou então celebrem e constituam uma servidão de vista que impede o proprietário do prédio serviente de construir acima de uma determinada altura, e aí os alunos perguntam que diferença pode haver entre uma hipótese e outra? São rigorosamente a mesma coisa.

Tanto no 1º ex: quanto no 2º, o proprietário não poderia ser impedido de passar no terreno do outro. Tanto na obrigação negativa quanto na servidão. A diferença que para os leigos é nenhuma, para nós é abissal.

Porque em 1ª lugar as obrigações negativas traduzem relações pessoais e conseqüentemente são relativas só obrigando as partes que dela participa.

Isso significa dizer que se aquele proprietário que se obrigou a não impedir a passagem do vizinho, alienar o seu imóvel o adquirente pode perfeitamente obstar essa passagem.

Ele não está obrigado a respeitar essa obrigação da qual não participou, as obrigações como vocês estão cansados de saber não são oponíveis erga omnes.

Ao contrário, elas são relativas aos que dela participam então o proprietário que é o devedor da obrigação de não fazer, pode alienar o bem e o adquirente não está obrigado a respeitá-lo.

Também pode num determinado momento impedir a passagem, pagando perdas e danos ao credor. Se o proprietário que é o devedor da obrigação negativa, arrepende-se e proíbe a passagem pelo seu terreno, pagará perdas e danos pelo inadimplemento da obrigação negativa.

Já servidão é direito real, e direito real é dotado de seqüela, adere ao prédio e é oponível erga omnes portanto se o proprietário do prédio serviente aliená-lo à 3º o adquirente fica obrigado a respeitar a servidão, porque ela adere ao imóvel, como se fosse uma cicatriz e é oponível a todos os demais membros da sociedade.

Essa é que é a diferença entre a obrigação negativa de não fazer, não tirar a vista, não impedir a passagem, não impedir o curso d’água e a servidão de passagem, ou servidão de vista, ou servidão de aqueduto.

Por isso é que as servidões sendo direitos reais que recaem sobre imóvel desafiam registro no RGI, até para proteção de 3ºs adquirentes do imóvel serviente que poderiam ser surpreendidos com a servidão.

Também não será difícil perceber que a servidão está umbilicalmente ligada à otimização econômica dos imóveis. A servidão tem sempre um interesse econômico, ela torna mais valioso o prédio dominante e deprecia o prédio serviente, daí a sua essência ser onerosa mediante indenização do serviente.

Essas servidões podem ser APARENTES ou NÃO APARENTES, isso é muito

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importante! Isso é fundamental distinguir se a servidão é aparente ou não aparente.

APARENTE é aquela que deixa traços visíveis, podem ser percebidas para nossos sentidos, deixa vestígios, marcas. O ex. mais claro de servidão aparente é a servidão de passagem.

Que é uma das mais freqüentes, é aquela que assegura ao proprietário do prédio dominante, passar pelo prédio serviente, servidão deixa marca no caminho, uma trilha, uma estrada.

A olho nu pode-se perceber que há uma servidão de passagem, muitas vezes ela é murada, cercada. Já servidão não aparente é aquela que não se percebe pelos nossos sentidos. O ex. perfeito é a servidão de vista.

Imaginemos 2 prédios num aclive, e aí o proprietário do prédio superior, teme que o do inferior construa um edifício em seu terreno tirando-lhe a vista para o mar, então constituem uma servidão de vista gravando o prédio inferior.

Só que isso não fica marcado com barbante ou corda, para que as pessoas que passem pela rua saibam que há uma servidão de vista. Ninguém vai adivinhar que entre aqueles prédios há uma servidão de vista. Isso é uma servidão aparente.

Ou uma servidão de aqueduto, mas subterrâneo, que se canaliza água que passa a 1 metro de profundidade, quem passa pela rua não sabe que está passando numa servidão de aqueduto.

Qual é a importância prática dessas servidões? É que a servidão não aparente só se constituem mediante o registro no RGI. Enquanto não se registra o título constitutivo da servidão no RGI, não há servidão.

Eu constitui com o meu vizinho de baixo, uma servidão de vista que é a não aparente, o contrato já está assinado e a indenização já foi paga, mas ainda não há servidão porque ainda não foi registrado no RGI. Portanto as servidões não aparentes constituem-se pelo registro.

Já as aparentes não se constituem pelo registro, e sim pelo contrato, o registro é apenas para torná-la oponível erga omnes. Isso é exatamente porque mesmo não registrada a servidão, sendo ela aparente quem fosse adquirir o imóvel poderia percebê-la.

Mas as não aparentes como não podem ser percebidas pelos sentidos, ad cautelam só se consideram nascidas com registro do título. Uma outra conseqüência pratica importantíssima, só as servidões aparentes podem ser adquiridas pela USUCAPIÃO.

Por uma razão obvia! Uma servidão de passagem pode ser adquirida pela usucapião, aliás, está aqui no art. 1379: “O exercício incontestado e continuo de uma servidão aparente para 10 anos nos termos do art. 1242 autoriza o interessado a registrá-la em seu nome”.

Se eu há 10 anos passo pelo terreno do vizinho, que nunca obstaculizou essa passagem está cansado de saber que passo pelo seu terreno, após 10 anos posso adquirir por usucapião a servidão.

Não estou interessado em usucapir o terreno do vizinho e sim da passagem que uso de maneira incontestável, e sem oposição há 10 anos. Mas como a servidão não aparente não é perceptível, como o proprietário do terreno pode saber que estou usando a servidão?

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Ele não teria como resistir a esse uso, porque ele não se percebe pelos sentidos, por isso é que é importante essa distinção entre as servidões aparentes e não aparentes.

Há uma diferença no modo de constituir-se e também, uma diferença da possibilidade de adquirir-se pela via da usucapião. Também se divide as servidões em CONTINUAS E DESCONTINUAS.

Essa classificação já não é tão importante, a anterior sim por seus efeitos práticos. CONTINUA é a servidão de aqueduto, a água está correndo mesmo que o proprietário do prédio dominante não a esteja utilizando. A DESCONTINUA é aquela que só tem utilidade quando o titular a usa, como é a servidão de passagem. Só se percebe a servidão de passagem quando alguém está passando.

Também muita gente confunde a servidão de passagem com a passagem forçada. Qual a diferença? 1ª passagem forçada é direito de vizinhança, portanto relação pessoal, obrigacional.

Passagem forçada é um dos direitos de vizinhança e vocês sabem que os direitos de vizinhança traduzem relações obrigacionais, são obrigações propter rem .

Basta essa diferença para não nos permitir confundir a passagem forçada com a servidão de passagem. São diametralmente opostas, enquanto um é um direito obrigacional, que liga proprietários de imóveis vizinhos quando um deles é encravado, e o outro é um direito real. A outra diferença fundamental é que a passagem forçada, só se estabelece em beneficio de proprietário ou possuidor de prédio encravado, que é aquele que não tem acesso à rua, porto, ou fonte.

Para a doutrina clássica, só haveria prédio encravado quando fosse absolutamente impossível o acesso à rua, porto ou fonte senão passando para outro imóvel.

Mas a doutrina moderna já abranda esse rigorismo encarando como prédio encravado, aquele que tem acesso à rua, mas de tal maneira perigoso, ou exigindo esforço sobre humano, que se equivaleria a não ter essa passagem.

Isso é uma evolução da doutrina, mas que ainda não é admitido para todos. Os tradicionalistas continuam admitindo como prédio encravado só aqueles que em hipótese alguma tem acesso direto à rua, senão passando para imóveis vizinhos.

Já a servidão de passagem não exige que o prédio dominante seja encravado, ambos podem ter frente para a rua e ainda assim se estabelecer uma servidão de passagem de um a favor de outro.

Essa é a 2ª e importante diferença, enquanto a passagem forçada é reservada aos prédios encravados, a servidão de passagem não exige isso. E a última e também importante diferença, é que a passagem forçada se estabelece para sentença judicial.

Há uma ação de passagem forçada na qual o proprietário do prédio encravado, não conseguindo amigavelmente com os vizinhos, esse direito de passagem propõe a ação e o juiz por sentença, constitui a passagem forçada, inclusive nomeando um topógrafo para traçar os rumos da passagem forçada.

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É constituição judicial, enquanto a servidão de passagem se constitui para atos inter vivos, contrato ou para testamento, mas sem qualquer interferência judicial.

Então vejam que não é possível confundir a passagem forçada, com a servidão de passagem embora a 1ª vista para os leigos não haja qualquer diferença.

O titular da servidão, evidentemente pode utilizá-la integralmente fazendo inclusive as obras necessárias à sua conservação e uso.

Por ex. uma servidão de passagem, caberá ao proprietário do prédio dominante traçá-la fazendo as despesas necessárias para marcá-la e também terá que arcar com as despesas de conservação.

Em beneficio que lhe é concedido pelo prédio serviente, não seria justo que o proprietário do prédio serviente ainda tivesse que despender recursos para conservar a servidão.

Todas as obras de conservação, portanto da servidão cabem ao proprietário do prédio dominante, se ela servir a vários prédios dominantes, o que é perfeitamente possível, essas despesas de conservação serão rateadas entre os proprietários dos prédios dominantes.

Evidente que tudo isso é regra dispositiva, também nada impede que num excesso de liberalidade, o proprietário do prédio serviente ainda se obrigue a conservar a servidão, é problema dele! mas no silêncio do titulo, as despesas de conservação e constituição, são do prédio dominante.

É evidente também que o titular da servidão exerce posse, sobre a servidão. Servidão como sendo um direito real é suscetível de posse, o proprietário do prédio dominante é o possuidor da servidão.

E como possuidor poderá se valer de todos os interditos possessórios, para defender essa posse, inclusive contra o proprietário do prédio serviente se for este o turbador ou esbulhador.

Já o proprietário do prédio serviente tem a posse indireta, portanto ao se constituir a servidão, desdobra-se a posse ficando a direta com o proprietário dominante e a indireta com o serviente.

Conseqüentemente se o proprietário do prédio serviente ou alguém, a seu mando, impedir o uso da servidão. Imaginemos que numa servidão de passagem, em que o proprietário do prédio venha a murá-la ou colocar uma porteira, um cadeado.

O do prédio dominante valer-se-á da ação de reintegração de posse. Se ele não ficar impedido inteiramente de usar a passagem, mas tiver essa passagem dificultada, imaginemos que o dono do prédio serviente, coloque obstáculos, que dificultam a utilização da passagem ou espalhe no terreno meia dúzia de pit bulls treinados para atacar qualquer pessoa que passe para ali.

Isso é uma turbação aí caberia uma ação de manutenção, como também cabe interdito proibitório se houver uma ameaça de turbação da posse da servidão. Também é obvio que essas servidões são constituídas nos limites exatos das necessidades do prédio dominante.

Ou seja, uma servidão de passagem deve ter a largura estritamente necessária para o fim a que se destina 2º a utilização econômica dos

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imóveis, se é um imóvel rural se ali se planta, é preciso que ela tenha uma largura um pouco maior.

Se é um imóvel urbano baste que passe a pessoa, ou um automóvel, em outras palavras a filosofia é reduzir ao mínimo necessário, ônus sobre o prédio serviente. Também não se pode mudar a destinação da servidão, constituída para um determinado fim, não pode ser modificada.

Também diz o art. 1386, que as servidões são indivisíveis, ainda que se aliene o prédio serviente e se divida o prédio serviente, essa servidão continuará onerando as diversas frações em que se dividiu o prédio serviente.

Por ex. numa servidão de passagem o prédio serviente é uma fazenda muito extensa que é dividida em 4 glebas, isso é inteiramente irrelevante para o prédio dominante, ela continuará sobre as 4 glebas que resultaram da divisão.

Os casos de extinção das servidões estão aqui enunciadas no NCC. Pode ser rescindido o contrato como já falei, se houver uma mudança na destinação, se não houver a conservação da servidão.

Quando houver cessado a utilidade da servidão, se ela não representa mais qualquer utilidade ou comodidade para o prédio dominante aí o proprietário do prédio serviente pode pedir o cancelamento da servidão.

Pode ser pelo abandono, o não uso. Se o proprietário do prédio dominante não usa a servidão por 10 anos contínuos, ele a perderá. Vejam que as servidões aparentes podem ser obtidas para usucapião como também podem se perder pelo oposto, o não uso.

A servidão de passagem que o proprietário do prédio dominante não use há 10 anos contínuos, o proprietário do prédio serviente pode pedir o seu cancelamento. A confusão é também causa muito freqüente de extinção das servidões.

É quando os 2 prédios, o dominante e o serviente passam a pertencer a mesma pessoa. Há algumas ações que são típicas das servidões, isso pode cair em prova.

O examinador pode lhes perguntar o que uma ação confessória ou o que é uma ação negatória. São ações típicas das servidões, assim como a ação redibitória e a ação estimatória são típicas dos vícios redibitórios.

Uma ação confessória é para que se obtenha do juiz uma sentença que reconheça ou declare a existência de uma servidão. Há uma dúvida quanto à existência da servidão, é aí o proprietário do prédio dominante, propõe a ação confessória, para que se reconheça a existência da servidão. É como se fosse uma ação declaratória.

Já a negatória é o oposto, geralmente é proposta pelo proprietário do prédio serviente para que se declare que não há mais a servidão, ela se extinguiu. A ação confessória e a negatória têm objetivos diametralmente opostos.

1.4- Direito de habitação – usufruto e uso:

Quanto às servidões estas eram as observações a fazer. Chegamos então a 3 direitos reais muito importantes, que são o USUFRUTO, O USO E A HABITAÇÃO.

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Também são freqüentemente confundidos principalmente pelos leigos, por isso vamos com muito cuidado estudar o usufruto e depois compará-lo com o uso.

Já perguntei isso em prova e é muito freqüente a resposta segundo a qual no usufruto, o usufrutuário poderia usar e gozar a coisa, podendo alugá-la enquanto que no uso só poderia usar e não gozar. ISSO NÃO É VERDADE!

Tanto o usufrutuário quanto o usuário podem não só usar a coisa em seu próprio benefício como retirar dela as suas utilidades econômicas. Tanto o usufrutuário de um imóvel pode alugá-lo à 3ºs recebendo os aluguéis quanto o usuário.

Então fica realmente muito difícil quem não tem intimidade com o direito, distinguir entre usufruto e uso, porque o usuário pode exercer sobre a coisa, todos os direitos que o usufrutuário também pode exercer, qual seria a única diferença?

É que o usufruto não se constitui em razão das necessidades econômicas do usufrutuário, ou seja, mesmo que o usufrutuário possa prescindir desse beneficio, ele se manterá.

Imaginemos que eu tenha constituído um usufruto sobre um imóvel meu, em beneficio de um amigo que está enfrentando dificuldades, então para ajudá-lo, constituo um usufruto, para que esse meu amigo como usufrutuário, possa retirar dele todas as utilidades econômicas, inclusive os seus frutos civis podendo alugá-los.

Imaginemos que 1 ano depois eu leia no jornal que esse meu amigo usufrutuário desse imóvel, ganhou 30 milhões de reais, foi o único vencedor da mega sena acumulada.

Reparem que ele agora é um milionário, com uma situação econômica infinitamente melhor que a do nu-proprietário, mas isso é absolutamente irrelevante.

O nu-proprietário não pode extinguir o usufruto sob a alegação de que o usufrutuário já não mais precisa daquela coisa para retirar proveitos econômicos.

Se esse usufruto foi instituído de maneira vitalícia, ele continuará após a morte, do usufrutuário apesar dele ser milionário.

Já o uso é instituído exclusivamente tendo em vista as necessidades econômicas do usuário e de sua família e neste ex. se fosse apenas um direito de uso e não o usufruto, ganhando o usuário a mega sena, no dia seguinte, o proprietário poderia cancelar o direito de uso.

Essa é a única diferença, no resto é rigorosamente igual, o usuário pode agir em relação à coisa com os mesmos direitos que são conferidos ao usufrutuário.

Já a habitação é diferente! Como nós veremos, só permite ao seu titular, residir em um imóvel e não pode cedê-lo seja onerosa ou gratuitamente a ninguém.

O direito real de habitação só confere ao seu titular o direito de residir no imóvel e é para residência, não pode nem ter destinação comercial, industrial.

E se o titular desse direito desocupar o imóvel ou cedê-lo à 3º

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automaticamente se extinguirá o direito de habitação. Comecemos a estudar como faz o NCC pelo usufruto.

Para que entendamos o que é o usufruto, teremos que recordar aqueles 3 poderes que se confere ao proprietário. O de usar a coisa que lhe pertence, o poder de extrair dessa coisa utilidades econômicas e o poder de dispor da coisa que lhe permite aliená-la onerosa ou gratuitamente. Além desses 3 poderes a propriedade ainda confere ao proprietário a faculdade de reivindicar a coisa, o direito de reivindicar a coisa das mãos de quem indevidamente a detenha.

No usufruto, 2 desses poderes são destacados de uma coisa pelo proprietário e transferidos a uma 3ª pessoa, ou seja, no usufruto destacam-se da propriedade, os poderes de usar e gozar a coisa que são transferidos à 3ºs.

Daí chamar-se usufruto, o titular desse direito pode usar e gozar de uma coisa alheia que não lhe pertence. Daí se deduz que dos poderes inerentes ao domínio, o usufrutuário só não tem o de dispor da coisa, já que ela não lhe pertence.

Mas ele detém os poderes de usar e gozar dos quais se despe o proprietário. Daí porque o proprietário que destaca da coisa esses poderes transferindo-os ao usufrutuário, passa a ser chamado nu-proprietário e a propriedade que era até então plena, passa a se chamar nua propriedade.

O leigo pensa que nu-proprietário é um proprietário despido que se exibe na janela escandalizando os passantes! Na verdade ele é um proprietário despido, mas não de suas vestimentas e sim dos poderes inerentes à propriedade.

Ele se despe desses poderes para transferi-lo ao usufrutuário, não é difícil perceber que a propriedade que era plena passa a ser limitada para o nu-proprietário, porque ele já não tem mais os poderes de usar e gozar.

Por outro lado, também é evidente que o usufrutuário não tem a propriedade, não é proprietário e esse direito se exerce sobre coisa alheia porque a coisa não é do usufrutuário, continua pertencendo ao nu-proprietário, portanto o usufruto se exerce sobre uma coisa alheia que pertence ao nu-proprietário.

Mas também é obvio que ao se constituir o usufruto ocorre também um desdobramento da posse, em todas essas figuras que vocês estão vendo, desdobra-se a posse.

Por quê? Porque o usufrutuário passa a ser o possuidor direito da coisa dada em usufruto, enquanto que o nu-proprietário conserva a propriedade limitada e a posse indireta.

Daí resulta que tanto o usufrutuário quanto o nu-proprietário, poderão se valer dos interditos possessórios para defender essa posse contra 3ºs. E o usufrutuário pode se valer dos interditos para defender a posse direta contra nu-proprietário se esse vier a turbá-lo, esbulhá-lo.

Isso significa que o usufrutuário pode defender a posse contra 3ºs independente da participação do nu-proprietário, ele não precisa da presença do nu-proprietário ao seu lado no pólo ativo para agilizar um interdito possessório que esteja violando essa posse direta.

Da mesma maneira, o nu-proprietário também pode isoladamente defender essa

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posse, como possuidor indireto. Como também tanto o usufrutuário, quanto o nu-proprietário podem em litisconsorte ativo defenderem a posse.

O usufruto é um direito extremamente amplo, e pode se estabelecer sobre coisas móveis e imóveis. Pode ser objeto de usufruto um automóvel, uma casa, um computador, um terreno.

Pode se estabelecer entre bens corpóreos e incorpóreos. Há usufrutos de direitos, de ações numa empresa. Tem gente que pensa que só imóveis podem ser dados em usufruto, quando direito pode ser dado em usufruto.

Pode ser instituindo sobre uma universalidade de bens ou sobre uma fração ideal de bens, como pode ser instituído sobre um bem determinado.

Pode haver usufruto de todos os bens do nu-proprietário ou de metade dos bens, ou 1/3 dos bens como pode haver usufruto do imóvel da rua tal, n. tal, um bem determinado.

Como se não bastasse o usufruto pode ser instituído para toda a vida do usufrutuário o que é bastante freqüente e é chamado usufruto vitalício, que só se extinguirá com a morte do usufrutuário.

Como pode ser por tempo determinado, por ex. 10, 20 anos, extinguindo-se automaticamente pelo simples advento do termo final. Vejam quanta liberdade se dá para a constituição do usufruto! Sobre bens moveis, imóveis, corpóreos, incorpóreos sobre frações ideais de bens, sobre bens determinados, para toda a vida do usufrutuário, por tempo determinado.

Há uma grande flexibilidade para se constituir o usufruto, uma coisa é certa, o usufruto tem sempre caráter personalíssimo! Ele se constitui em razão da pessoa o usufrutuário, tem um cunho pessoal.

O que se pretende com a constituição do usufruto é beneficiar ou proteger a pessoa do usufrutuário, permitindo-lhe retirar de uma coisa do nu-proprietário suas utilidades econômicas, com as quais proverá o seu sustento ou de sua família.

Por isso que a morte do usufrutuário extingue para si só, o usufruto não se transmitindo aos seus herdeiros, a não ser que o nu-proprietário expressamente o estabeleça.

AGORA, A MORTE DO NU-PROPRIETÁRIO NÃO EXTINGUE O USUFRUTO, O QUE EXTINGUE O USUFRUTO É A MORTE DO USUFRUTUÁRIO, É ISSO É AUTOMÁTICO, OS HERDEIROS NÃO TEM NENHUM DIREITO, A MANTER O USUFRUTO APÓS A MORTE DO USUFRUTUÁRIO.

E se for de imóvel e eles continuarem a residir nele, o nu-proprietário poderá retirá-los pela via possessória, que é para preservar esse caráter pessoal que se reveste o usufruto.

Quando o usufruto se constitui sobre imóvel o que é muito freqüente, é obvio que ele terá que ser registrado no RGI, até para que no caso de alienação da nua-propriedade, o adquirente não seja surpreendido.

Ao contrário do que muitos imaginam o nu-proprietário não está impedido de alienar o imóvel, só que ele só pode alienar a nua propriedade, porque ninguém pode alienar mais do que tem.

O nu-proprietário não tem uma propriedade plena, ele tem uma propriedade limitada, ou seja, uma nua propriedade, isso ele pode alienar, posso adquirir a nua propriedade, tenho que saber que terei que respeitar o usufruto.

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O usufruto quando se tratar de imóveis tem que ser registrado, também nada impede que se constitua um usufruto em beneficio de uma única pessoa, de um único usufrutuário o que é mais comum, mas também nada impede que a mesma coisa seja dada em usufruto a mais de uma pessoa.

E neste caso os quinhões podem ser iguais ou desiguais. Posso dar um imóvel em usufruto a 3 pessoas, cabendo o usufruto ½ do imóvel a um, e ¼ a cada um dos usufrutuários, como pode se 1/3 para cada um.

No silêncio do título constitutivo havendo vários usufrutuários, presume-se que os quinhões sejam iguais. Também havendo vários usufrutuários, o nu-proprietário ao constituir o usufruto, pode estabelecer o direito de acrescer entre os usufrutuários.

Mas o direito de acrescer para os usufrutuários deve vir expresso, porque no silencio do titulo havendo vários usufrutuários, não há direito de acrescer.

O que significa que se morrer um dos usufrutuários, a sua cota retornará ao nu-proprietário e a proporção que os usufrutuários morram, o nu-proprietário vai adquirindo a propriedade plena de cada uma dessas frações.

Até que morrendo o último, o nu-proprietário recuperará a propriedade plena, mas o direito de acrescer tem que ser expresso, o nu-proprietário então estabelece que morrendo um usufrutuário, a sua cota se dividirá entre os usufrutuários remanescentes.

E assim sucessivamente, a cada usufrutuário que morra, o seu quinhão se repartirá entre os remanescentes. E o nu-proprietário só recuperará a propriedade plena quando morrer o último usufrutuário.

Tudo isso comprova o que lhes falei, da grande flexibilidade que alei confere, para as partes instituírem o usufruto. Aqui no art. 1335, diz que os títulos de credito podem ser objetos de usufruto.

Posso conceder à 3º usufruto de títulos de credito, para que ele receba os rendimentos daí decorrentes. Animais podem ser objetos de usufruto, qualquer bem pode ser objeto de usufruto.

Qualquer bem econômico pode ser objeto de usufruto, sendo imóvel é obrigatório registro no RGI, não sendo registra-se no cartório de títulos e documentos.

O nosso tempo se esgotou e na aula que vem ainda será dedicada ao usufruto, prazer em vê-lo Com uma rapidíssima recordação, lhe dissemos que o usufruto é um direito real que se exerce sobre coisa alheia, direito real limitado de uso e fruição, e que no usufruto, o proprietário de uma coisa que pode ser móvel ou imóvel pode ser uma universalidade ou uma fração ideal de bens.

O proprietário dessa coisa destaca da propriedade os poderes de usar e fruir a coisa, transferindo a uma 3ª pessoa que é o usufrutuário, enquanto que esse proprietário passa a ser o nu-proprietário porque está despido de alguns dos poderes inerentes à propriedade.

Também lhes falei que o usufrutuário, passa a ser o possuidor direto da coisa podendo se valer dos interditos possessórios, para defender essa posse direta inclusive o do nu-proprietário, se este vier a turbar a sua posse.

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O nu-proprietário é o possuidor indireto da coisa, portanto, no usufruto, há o desdobramento da posse tal como acontece na locação, no comodato.

Falei que esse usufruto pode se constituir de maneira vitalícia só se extinguindo com a morte do usufrutuário, ou por tempo determinado, pode ser conferido a um único usufrutuário ou a vários, quando então poderá haver ou não, o direito de acrescer entre os usufrutuários.

Mas esse direito de acrescer só existirá se expressamente previsto no título constitutivo do usufruto. O direito de acrescer significa que morrendo um dos usufrutuários o seu quinhão da coisa, se acrescerá aos demais.

Os direitos do usufrutuário estão nos arts. 1394 a 1399, fundamentalmente ele tem direito à posse, ao uso, à administração e percepção dos frutos, por isso eles se estabelecem.

Esses frutos podem ser naturais, industriais ou civis por isso é que se eu constituo um usufruto sobre um imóvel, o usufrutuário pode alugá-lo para perceber os frutos civis desse imóvel, os aluguéis.

Esse usufruto pode recair em títulos de créditos, quando caberá ao usuário perceber os seus rendimentos. Se o usufruto recai sobre animais semoventes, pertencerão ao usufrutuário, as crias dos animais.

Em suma: os direitos do usufrutuário estão aqui definidos, assim como os deveres nos arts. 1400 a 1409. Entre esses deveres que estão aqui explicitados e são auto-explicativos.

Mas, o principal é velar pela conservação da coisa, porque extinto o usufruto a coisa terá que ser devolvida no estado em que se encontrava antes ressalvado apenas os danos decorrentes do tempo. Também incumbe ao usufrutuário pagar todos os impostos e taxas que recaem sobre a coisa, também terá que devolver ao nu-proprietário quando se extinguir o usufruto, os frutos pendentes.

E a extinção do usufruto está elencada no art. 1410. Em 1º lugar, pela renúncia ou morte do usufrutuário, isso ressalta o caráter pessoal do usufruto. A morte do usufrutuário extingue o usufruto, o que já não ocorre com a morte do nu-proprietário, os herdeiros deste, terão que respeitar o usufruto.

Até o término do prazo se for temporal ou até a morte do usufrutuário se vitalício. Mas nada impede que o usufrutuário renuncie ao usufruto, entendendo que não mais precisa do beneficio dele decorrente, só que a renuncia tem que ser expressa.

Se for imóvel, averbada no RGI. Pelo termo de sua duração que só se aplica é óbvio, ao usufruto para tempo determinado e não ao vitalício. Pela extinção da pessoa jurídica em favor de quem foi estabelecido, ou pelo decurso de 30 anos.

Isso aí é uma mudança, o ACC dizia que o usufruto instituído em favor de pessoa jurídica sem prazo determinado, extinguir-se-ia com 100 anos, e agora baixou para 30 anos.

Pela cessação do motivo que o origina, vou dar ex. que falaremos a seguir. O usufruto legal se extingue pela cessação da causa, como por ex: os pais têm o usufruto sobre os bens dos filhos menores, quando os filhos atingem

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a maioridade cessa esse usufruto.

Esse é o ex: clássico nessa hipótese, extinção de usufruto pela cessação do motivo de que se origina. Se o examinador lhes pedir um ex: é esse. É a extinção do usufruto legal, concedido aos pais sobre os bens dos filhos menores, e que cessará quando os filhos se tornarem capazes.

Pela destruição da coisa, de que adiantaria manter o usufruto, se a coisa pereceu e não pode mais gerar qualquer fruto. Pela consolidação, chama-se consolidação, quando o usufrutuário se transforma em proprietário da coisa.

Imaginemos que o nu-proprietário seja o pai do usufrutuário e que o usufrutuário seja o seu único herdeiro. Morrendo o pai, o usufrutuário seu único herdeiro, herdará a nua-propriedade e aí ela se converterá em propriedade plena, porque ela se consolidará em mãos do usufrutuário. Isso é que se chama consolidação.

Por culpa do usufrutuário se por ex. ele não pagar os impostos e encargos deteriorar a coisa por culpa sua, não fazer os reparos e as obras de conservação, tudo isso pode levar a extinção do usufruto, por culpa do usufrutuário. E finalmente pela inércia do usufrutuário, ou seja, o não uso da coisa.

Falemos agora do usufruto legal, porque até agora falávamos do usufruto convencional, que é aquele que se estabelece livremente entre o proprietário e o usufrutuário.

Ele pode se constituir para atos inter vivos, que é muito freqüente, ou para testamento, mas também existe o usufruto lega que é instituído para lei, independente da vontade das partes.

O ACC tratava de 2 usufrutos legais, o 1º era o chamado usufruto vidual, que se concedia ao cônjuge sobrevivente, quando o regime de bens não era da comunhão universal.

O art. 1611 do ACC dizia que não sendo o regime de bens o da comunhão universal, o cônjuge sobrevivente teria o usufruto de ¼ dos bens do cônjuge falecido, se tivesse ele deixado descendentes comuns ou não comuns. Quer dizer, com o próprio cônjuge viúvo, ou com outra pessoa.

Isso se o regime de bens não fosse o de comunhão universal, por quê? Porque se o regime fosse o da comunhão universal, o cônjuge sobrevivente teria ½ dos bens, como propriedade plena seria meeiro.

E sendo meeiro, pode perfeitamente dispensar esse benefício, não ficaria à míngua de recursos, não ficaria dependendo da caridade alheia. Ora, se o regime não fosse o da comunhão de bens, o cônjuge poderia nada herdar e para ter como sobreviver a lei lhe conferia o usufruto de ¼ dos bens.

Se o cônjuge falecido não tivesse descendentes, mas tivesse ascendentes, o sobrevivente teria o usufruto de ½ dos bens do falecido, aí aumentava o percentual do usufruto, se só houvesse ascendentes.

A lei 8971, também estabelecia isso para o companheiro sobrevivente, embora tecnicamente não se pudesse falar nesse caso em usufruto vidual, porque a palavra vidual vem de viuvez.

E entre companheiros não há viuvez, mas para analogia como o espírito era o mesmo falava-se, embora arranhando a semântica e a técnica, em usufruto vidual entre companheiros.

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O NCC EXTINGUIU ESSA FIGURA NÃO HÁ MAIS QUE SE FALAR EM USUFRUTO VIDUAL.

A razão atual é porque o NCC diz que o cônjuge sendo o regime o da separação ou da comunhão parcial, só havendo a inventariar bens exclusivos do falecido, o cônjuge agora concorre à herança, com os descendentes e os ascendentes, não ficará à míngua de recursos.

Ao contrário, receberá uma parte da herança na qualidade de herdeiro necessário, e concorrendo com os ascendentes e os descendentes. Inclusive o cônjuge fica em posição melhor que os descendentes, porque se os descendentes são comuns, ou seja, são do falecido e do sobrevivente, o cônjuge terá garantido uma parcela mínima de ¼ da herança.

E os outros ¾ é que serão divididos igualmente entre os filhos, se tiver 10 filhos, o cônjuge receberá ¼ da herança, e os ¾ é que serão partilhados entre os 10 filhos. Portanto o cônjuge ficará com uma parcela maior que os descendentes.

Isso é uma mudança extraordinária do NCC! E se o cônjuge concorrer com os ascendentes qualquer que seja o regime de bens, aí terá ½ da herança, cabendo a outra ½ aos ascendentes do cônjuge falecido.

Por isso não há mais a menor necessidade, de se estabelecer o usufruto vidual, a discussão está em torno dos companheiros, porque o NCC nada fala no capítulo que fala da união estável.

E a doutrina majoritária tem entendido que o NCC revogou a lei 8971, que criava o usufruto vidual para os companheiros. É razoável o entendimento porque também o companheiro, concorre agora a herança como meeiro de todos os bens adquiridos na constância da união.

Essa figura do usufruto legal, o vidual desapareceu com o NCC, mas havia uma outra espécie de usufruto legal que se mantém no NCC, portanto não digam que desapareceu o usufruto legal, ele continua existente.

É o usufruto que se confere aos pais sobre os bens dos filhos menores, claro que estamos nos referindo aos bens particulares dos filhos menores. É o caso dos menores abonados que tem patrimônio próprio, o que é perfeitamente possível.

Imaginemos que um avô muito rico tenha feito um testamento, beneficiando um neto que acabou de nascer, logo depois o avô morre e esses legados são transferidos ao legatário que é o neto de 1 ano.

Esse neto passa a ter patrimônio próprio, os bens não foram deixados para os seus pais, foram deixados para ele. Esses bens passam a ser de propriedade exclusiva do filho menor, não se confundindo com o patrimônio dos pais.

Só que evidente que o menor não poderia administrar esses bens! Confia-se à administração desses bens aos pais e o usufruto para que os pais possam tirar desses bens os frutos, os proveitos econômicos para usá-los na criação do menor.

E isto está aqui reproduzido no art. 1689 que diz: “O pai e a mãe enquanto no exercício do poder familiar”, (é só durante o poder familiar, se eles estão destituídos do poder familiar, já não serão usufrutuários dos bens dos filhos menores), I- São usufrutuários dos bens dos filhos; II- Têm a administração dos bens dos filhos menores sob sua autoridade.

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Evidentemente que alcançada a maioridade tornando-se os filhos capazes, cessa o usufruto legal e aí a propriedade se consolida de forma plena nas mãos dos filhos.

Então não se esqueçam dessa figura do usufruto legal que se mantém em relação aos pais e os bens dos filhos menores, durante o poder familiar e também não se esqueçam que o usufruto vidual desapareceu em virtude dessas modificações do direito sucessório, na ordem de vocação hereditária.

Falemos agora do USO que como dizia San Tiago Dantas, o uso é um usufruto menor. Todos os direitos que o usufrutuário tem, também os terá o usuário.

Tudo que o usufrutuário puder fazer em relação à coisa, também poderá fazê-lo o usuário. Por isso o usuário tem a posse, a administração e pode retirar da coisa todas as suas utilidades econômicas.

O usuário pode usar a coisa exclusivamente em seu proveito, pode alugar, ceder a coisa à 3º onerosamente para retirar os seus frutos civis e por isso muita gente não consegue vislumbrar a diferença entre o usufruto e o uso.

Tanto o usufrutuário quanto o usuário, podem perfeitamente ceder à posse da coisa à 3º mediante remuneração. A diferença é que o usufruto não é instituído em razão direta das necessidades do usufrutuário.

O que significa dizer, que ainda que o usufrutuário já prescinda do benefício, não poderá o nu-proprietário, só por essa razão, pedir a extinção do usufruto. Claro que, se o usufrutuário tiver uma boa formação ética e percebendo que não mais precisa do beneficio, renunciará a ele, mas isso é iniciativa dele.

O nu-proprietário não pode pedir em juízo a extinção do usufruto, só sob a alegação que o usufrutuário enriqueceu, tornou-se muito mais forte economicamente. Principalmente no usufruto vitalício que persistirá até a morte do usufrutuário, ainda que ele se torne a pessoa mais rica da cidade.

Já o uso é estabelecido em razão do usuário e de sua família, o uso é para prover as necessidades de sobrevivência do usuário e de sua família, o que significa dizer que passando o usuário a prescindir desse beneficio, ele poderá ser extinto.

Há uma parte da doutrina que diz que, por ex: se o usuário alugar a coisa para R$ 5000,00, e ele se verificar que para o seu sustento bastam R$ 1000,00, ele só teria direito a R$ 1000,00 e os R$ 4000,00 restantes, seriam do nu-proprietário.

Portanto no uso é sempre preciso examinar se ainda é necessária a manutenção desse direito real para a subsistência do usuário, e de sua família.

Essa é a única diferença, tanto que o NCC diz que se aplicam ao uso, as mesmas regras do usufruto no que couber. Esse “no que couber” é exatamente para fazer essa distinção.

O NCC diz no art. 1412, que “avaliar-se-ão as necessidades pessoais do usuário, conforme sua condição social e o lugar onde viver”, olha como o NCC foi cauteloso, deixando mais uma vez ao juiz, discricionariedade para fixar esse valor.

Isso vai depender da condição social do usuário e do lugar onde ele vive,

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porque todos nós que temos um mínimo de experiência da vida, sabemos que as despesas de subsistência dependem muito disso.

Elas não são iguais para todos, embora não há nenhum ranço elitista no que vou lhes dizer, porque é uma contingência da vida em sociedade capitalista como a nossa, quem está num extrato social mais elevado, na pirâmide social tem custos mais elevados do que quem está na base dessa pirâmide.

Quanto mais se sobe na pirâmide social, mais se gasta para a sobrevivência, surgem novas necessidades, que uma pessoa que está na base da pirâmide não tem que não são luxo, mas são inerentes àquela condição.

Para outro lado o lugar em que a pessoa vive, também influi. Viver no RJ e SP exige muito mais despesa do que quem vive numa pequena cidade do interior, sem diversões nem tentações, sem bingo!

Por isso é que o NCC com extrema sensibilidade para a realidade social disse isso. Olha mais uma vez, a questão da discricionariedade! O NCC não poderia dizer “provado que o usuário tenha uma despesa superior a R$ 1000,00, extingue-se o uso.”

Porque R$ 1000,00 poderia ser uma miséria para uns e não para outros, o NCC ao contrário foi muito genérico.

A seguir o NCC ainda faz outra recomendação ao juiz no § 2º, ao dizer: “ As necessidades da família do usuário compreendem as de seu cônjuge dos filhos solteiros e das pessoas de seu serviço doméstico.

OBS: e obviamente o companheiro, isso é mais um defeito do NCC, como o projeto foi anterior ao instituto da União Estável, varias vezes ele só fala em cônjuge não houve o cuidado de acrescer o companheiro, que deverá ser suprido pela doutrina e jurisprudência. Filho é obvio não interessa mais o estado do filho, pode ser natural, adulterino, o mais engraçado é que o NCC repetindo o texto do anterior, fala em filho solteiro não fala capaz, ou incapaz.

O que importa é que morem com os pais, e se insiram nas despesas da família, e hoje é cada vez maior os filhos maiores e solteiros que moram com os pais. Quanto às pessoas do serviço doméstico, elas também se inserem nas despesas da família.

E finalmente o art. 1413 se limita dizer que se aplica ao uso as mesmas regras do usufruto, não é preciso dizer mais nada. Quanto ao usufruto e ao uso, vale a pena fazer um comentário ligado à locação.

É muito freqüente que o usuário e o usufrutuário aluguem a coisa exatamente para tirar proveito da coisa e aí o legitimado único para alugar o imóvel é o usufrutuário, o contrato de locação feito pelo nu-proprietário, é nulo!

Sabem por quê? Porque o nu-proprietário não dispõe da posse, ele é possuidor indireto, possuidor indireto não dispõe da posse. Quem pode dispor da posse é o possuidor direito.

Só quem pode alugar o imóvel é o usufrutuário, jamais o nu-proprietário, é como se fosse uma locação non dominum, mas não possuidor, o contrato é nulo, o nu-proprietário não está legitimado para receber aluguéis.

Aquele crédito de aluguéis não pertence ao nu-proprietário, mas ao usufrutuário, também só o usufrutuário e mais ninguém além dele está legitimado para ocupar o pólo ativo da ação de despejo.

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O nu-proprietário não pode despejar o locatário enquanto o usufruto estiver vigorando. Quem assina o contrato de locação como locador é o usufrutuário, quem recebe os aluguéis e dá quitação, é o usufrutuário e quem pode despejar o inquilino e pedir a extinção do contrato é o usufrutuário.

Agora, extinto o usufruto qualquer que seja a causa, ou pela renuncia, ou decurso do tempo, pela morte do usufrutuário, em suma: extinto o usufruto qualquer que seja a causa, o nu-proprietário poderá denunciar a locação, ainda que ela esteja vigorando para tempo determinado.

Ainda que faltem 4 anos, para terminar a locação, o nu-proprietário não estará obrigado a respeitá-lo, pode denunciar imediatamente a locação, notificando o locatário concedendo-lhe um prazo para desocupação voluntária de 90 dias, mesmo vigorando o prazo determinado.

E para uma razão obvia, o nu-proprietário não participou da relação contratual e como os contratos são relativos aos contratantes não se pode compelir o nu-proprietário, do qual não participou, porque quem fez o contrato foi o usufrutuário.

E o ex: daquilo que se chama erroneamente de denuncia vazia. Erroneamente porque não é nem denuncia nem vazia, é um caso de resilição unilateral. Chama-se vazia porque não se precisa declinar o motivo pelo qual está se dissolvendo o contrato, mas não é vazia porque a causa é a extinção do usufruto.

Mas há uma exceção, há uma hipótese do nu-proprietário não poderá denunciar a locação, pelo simples fato de se ter extinto o usufruto. É se o nu-proprietário anuiu expressamente com a locação feita pelo usufrutuário.

Ou seja, se no contrato de locação celebrado pelo usufrutuário, o nu-proprietário comparece e manifesta expressamente a sua anuência, é evidente que pelo princípio da boa-fé, o nu-proprietário não pode extinguir a locação, se ainda estiver vigorando para tempo determinado.

Mas quando for para tempo indeterminado, ele poderá denunciar pelas outras causas previstas em lei. Sabem por quê? É que se o nu-proprietário concordou com a locação, é como se ele próprio a tivesse feito.

Mas essa concordância tem que ser expressa. Há questões que já chegaram aos tribunais, interessantíssimas! Num dos casos, o nu-proprietário figurou como testemunha da locação, dizia lá “testemunha”, e aí extinguiu-se o usufruto, o nu-proprietário denunciou o contrato e o locatário alegou que ele anuiu com o contrato para tê-lo firmado como testemunha. Entendeu o tribunal, que isso não era uma concordância expressa, o que não significa dizer que anuiu a locação.

Num outro caso em que atuei como advogado, quem assinou o contrato de locação foi a usufrutuária, mas representada para sua procuradora que era sua filha e nua-proprietária.

Isso acabou em embargos infringentes, perdi em 1º grau, reformei a decisão por 2 a 1 no 2º grau e nos embargos confirmaram o voto majoritário e concederam o despejo, foi muito discutido, mesmo nos embargos foi concedido para 3 a 2!

Era o caso de uma senhora muito idosa que doou o apartamento à filha única, que ficou sendo a nua-proprietária e a senhora a usufrutuária, mas

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como esta era muito idosa, a sua procuradora era a filha e na condição de mandatária ela fez o contrato de locação.

Lá aparecia locadora, fulana de tal, proprietária a filha, e o locatário. Ai mãe morreu a filha denunciou a locação, o locatário sustentou que havia anuência, porque foi a própria nua-proprietária quem fez o contrato e o assinou como procuradora.

Eu ganhei, porque disse que a lei fala em concordância expressa e no caso, ela manifestou a vontade apenas como mandatária da locadora, para que houvesse anuência ela teria que assinar 2 vezes o contrato.

Assinaria como locadora por procuração antes do seu nome e em baixo assinaria sem a procuração, aí ela estaria anuindo com o contrato. Acredito que hoje eu perderia a causa, se ela fez o contrato como mandatária, pelo princípio da boa-fé objetiva, ela estaria anuindo com a locação, senão não poderia fazer o contrato.

E há uma outra hipótese em que o nu-proprietário não pode denunciar a locação é se a propriedade se consolida na mão dele. A hipótese é a seguinte: o usufrutuário alugou o imóvel no curso da locação, ele herda ou compra a nua-propriedade.

Ora, como vai denunciar a locação se foi ele mesmo quem fez quando era usufrutuário? Seria uma imoralidade! Estão aí as 2 hipóteses em que o nu-proprietário, mesmo depois de extinto o usufruto, não pode despedir o locatário.

1ª se ele anuiu expressamente com a locação e 2ª se a propriedade se consolidou em suas mãos. O mesmo ocorre com o usuário, exatamente o mesmo! Ele pode alugar o imóvel, mas extinto o uso, o nu-proprietário, poderá denunciar a locação.

1.4.2 - Habitação:

Passemos agora a HABITAÇÃO, em direito há umas famosas trindades! Já repararam que há umas figuras jurídicas que aparecem sempre juntas e sempre de 3 em 3? 1º: calúnia, injúria e difamação, 2º: usufruto, uso e habitação e 3º: penhor, hipoteca e anticrese.

Como dizia San Tiago Dantas, o uso é o usufruto menor e a habitação, menor ainda. Há várias diferenças entre o usufruto, o uso e a habitação. A 1ª é que o usufruto e o uso podem recair sobre bens moveis e imóveis, sobre títulos de crédito.

Mas a habitação só recai sobre imóvel e assim mesmo residencial, não há direito de habitação sobre coisas móveis como por ex: computador.

Outra diferença é que o direito de habitação só confere a seu titular o direito de morar para fins residenciais, não há direito de habitação por exercer o comércio do imóvel.

Tanto que se o titular desse direito não estiver residindo no imóvel, ele perde esse direito, extingue-se o direito. Ele jamais poderá emprestar o imóvel em comodato à 3º, muito menos alugá-lo, basta isso por extinguir o direito de habitação, isso é uma diferença enorme!

Por isso esse direito de habitação é muito mais restrito do que o usufruto e o uso. ESSE DIREITO DE HABITAR É GRATUITO, o titular do direito de habitação residirá gratuitamente no imóvel, não só ele como sua família, o

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direito é intuitu familiae.

Aplicam-se à habitação diz o NCC, as mesmas regras do usufruto no que couber. O direito de habitação aparece no livro das sucessões e no direito de família, esse direito está sempre ligado a idéia do cônjuge ou companheiro.

O art. 1611 do ACC que tratava do usufruto vidual, também estabelecia o direito real da habitação só que agora quando o regime fosse o da comunhão universal de bens!

Se o regime não era o da comunhão universal, o cônjuge sobrevivente tinha o usufruto vidual, e já expliquei que era para ele não ficar sem condições de sobrevivência.

Mas se ao contrário o regime era o do comunhão universal, ele não tinha direito ao usufruto vidual, já que teria ½ dos bens.

Mas em compensação se o regime era o da comunhão universal, o cônjuge sobrevivente tinha o direito real da habitação sobre o imóvel em que o casal residia desde que seja o único a inventariar desta natureza.

Sabem por que se criou isso? Vocês vão entender! Imaginem vocês que o marido morre deixando viúva e 3 filhos, o único bem a inventariar era esse imóvel ou então era esse imóvel automóvel, dinheiro, lojas, galpão etc.

Mas de imóvel residencial só tinha esse, era onde o casal morava. Como o regime era de comunhão universal ½ do apartamento é da viúva, e a outra ½ era dos herdeiros.

Esse apartamento era partilhado ½ da viúva e ½ dos herdeiros, que poderiam fazer os herdeiros no dia seguinte ao término do inventário? Pedir a extinção do condomínio.

É e um direito potestativo dos condôminos num condomínio voluntário pedir a sua extinção. E como seria a extinção do condomínio sendo a coisa indivisível? Pela alienação judicial.

O que aconteceria com a viúva? Estaria na rua, não teria onde morar. É verdade que ela poderia comprar com a parte dela outro imóvel, mas haveria a quebra psicológica ao ter que deixar o imóvel onde residia, o que poderia ser dramático!

O legislador preocupado com essa situação do viúvo ou da viúva, que tivesse que sair do imóvel residencial onde o casal habitava, conferiu o direito real de habitação.

O que significa dizer que o viúvo ou viúva teria o direito de continuar a residir gratuitamente no imóvel sem pagar nada aos herdeiros, mas enquanto mantivesse a viuvez! O ACC era taxativo, se o viúvo voltasse a se casar ou constituísse uma união estável, perderia o direito real de habitação.

Também se houvessem outros imóveis residenciais a serem inventariados, não haveria direito real de habitação, porque seria viável o viúvo habitar em outro imóvel que lhe coubesse na partilha.

A lei 8971/94 ao tratar dos direitos sucessórios dos companheiros, não falava do direito real de habitação, só falava do usufruto vidual. Mas a lei 9278/96 incluiu o direito real de habitação para o companheiro, ou companheira.

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Isso até suscitou uma grande polêmica doutrinária que até hoje não se esclareceu. Uma corrente doutrinaria sustentava esse dispositivo da lei 9278 era inconstitucional.

O que se sustentava é que a Constituição mandava conferir aos companheiros os mesmos direitos que se confere aos cônjuges. Não se pode conferir ao companheiro mais direito do que tenham os cônjuges, ou direitos que os cônjuges não tenham.

E por uma razão clara! O ideal da sociedade brasileira continua sendo o casamento, a família legítima continua sendo o ideal da sociedade, portanto é um princípio programático da Constituição, incentivar a conversão da união estável em casamento.

Isso é uma regra programática da Constituição, o Estado deve incentivar a conversão da família concubinária em legitima. Ora, se você conferir mais direito aos companheiros do que aos cônjuges, estaríamos fazendo inverso do comando constitucional, estaríamos incentivando a não casar, porque casando perderia direitos!

Raciocinem, o direito real de habitação, só era conferido ao cônjuge sobrevivente quando o regime de bens era o de comunhão universal, isso significava dizer que na comunhão parcial, nem pensar em direito real de habitação.

O ACC era taxativo! Só se confere direito real de habitação pelo ACC quando o regime de bens é o da comunhão universal. Só que a lei 9278/96 conferia o direito real de habitação aos companheiros, e na união estável o regime é o de comunhão parcial de bens!

A lei criou para o companheiro um direito que é negado ao cônjuge. O cônjuge casado pela comunhão parcial, não tem direito real de habitação, o companheiro tem!

Isso nunca foi esclarecido! Ninguém se dignou a ir ao supremo, para discutir, essa dúvida nunca ficou esclarecida, e atualmente a tendência é entender que essas leis foram revogadas.

Quais são as novidades que agora o NCC traz em relação ao direito real de habitação? Ele está mantido para os cônjuges e os companheiros, também quanto ao único imóvel residencial em que os cônjuges e os companheiros residirem.

MAS HÁ UMA NOVIDADE IMPRESSIONANTE, NÃO HÁ MAIS A VINCULAÇÃO À MANUTENÇÃO DA VIUVEZ! SIGNIFICA DIZER QUE O CÔNJUGE MANTERÁ O SEU DIREITO REAL DE HABITAÇÃO MESMO VOLTANDO A SE CASAR.

Estão ai os comentários do direito real de habitação, e suas restrições comparando com o usufruto e o uso.

Chegamos agora a outro direito real importantíssimo! Esse falaremos com muito empenho porque ele aparece pela 1ª vez no NCC. Não é que ele tenha sido criado no NCC, ele já existia antes, mas não no NCC.

1.4.3 - Direito real do promitente comprador ou direito real de aquisição:

É a 1ª vez que o CC inclui no rol dos direitos reais, É O DIREITO REAL DO

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PROMITENTE COMPRADOR, O CHAMADO DIREITO REAL AQUISITIVO, OU DIREITO REAL DE AQUISIÇÃO.

Não foi o NCC que o criou, esse direito surgiu há muito tempo no decreto lei 58/37. Só que esse direito real do promitente comprador de imóvel, referia-se apenas aos promitentes compradores de lotes de terreno, os loteamentos.

Não se aplicava a quem prometesse comprar casa, galpão, ou apartamento. Esse direito era exclusivo dos promitentes compradores de lotes de terreno. Foi uma lei importantíssima! Na minha opinião tão importante socialmente falando, quanto o CDC, a lei do inquilinato e o NCC.

Que são leis paradigmáticas, leis de grande conteúdo social! O que acontecia naquela época é era dramático erro o seguinte: Com a revolução de 1930 que 2º sociólogos e historiadores foi a maior de todas, porque as outras revoluções tinham mais cunho político, queria-se mudar governantes etc.

Mas a revolução de 30 foi uma revolução social e econômica o se queria mudar era o modelo econômico e político brasileiro, daí se chamar a velha republica e a nova republica depois de 1930.

Foi a revolução de 30 que iniciou um processo de industrialização no Brasil, que até então era primaria, alicerçada exclusivamente na agricultura não se produzia nenhum produto industrializado no país.

E nem havia interesse nisso, porque os dominadores do poder eram os aristocratas rurais, os fazendeiros de MG, os cafeicultores de SP. Era a república do “café com leite” porque num dos quadriênios se elegia o presidente pelos pecuaristas mineiros e no seguinte pelos cafeicultores paulistas, era um acordo!

Os presidentes estavam a serviço dos proprietários rurais, atendiam aos interesses dos proprietários rurais e o governo revolucionário de 30 veio para mudar essa situação, e com isso começou a industrializar o país para diminuir o poder político dos fazendeiros.

O processo de industrialização traz em qualquer país do mundo, uma conseqüência inevitável, o crescimento das cidades e o êxodo rural, isso é inevitável.

As fábricas se estabelecem nas periferias urbanas e não nos confins dos campos, porque é preciso escoar a produção e preciso estrada, é preciso mão de obra e isso se tem junto à cidade e não no campo.

Não se vê fábrica isolada na floresta amazônica, se vê fábrica nas periferias das grandes cidades médias. Com o processo de industrialização com a criação da Siderúrgica Nacional, passou-se a fabricar aço no Brasil, as populações rurais que viviam do trato da terra, começaram a migrar para as cidades atraídas pela miragem do emprego nas fábricas, que era o sonho de todo trabalhador, o emprego na fábrica era muito mais ameno do que o trato na terra.

O que era uma ilusão, o emprego na fábrica exige mão de obra com o mínimo de qualificação o que não era o caso do campo. Empregar um industriário analfabeto com as mãos calosas era difícil!

Esse foi um dos fatores também de favelização dessas cidades, essas pessoas não tinham como arranjar colocação e também não pretendiam plantar milho e cana na cidade.

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Chegavam do campo e a 1ª coisa que faziam antes mesmo do emprego, era procurar um lugar para construir uma casinha e aí os especuladores que sempre aparecem, começaram a lotear essas periferias urbanas, cuja terra não valia nada não tinha nenhum serviço, não tinha luz, rua, gás, nem água era só solo!

Dividiam isso em milhares de pequenos lotes e prometiam vender esses lotes para preços bem convidativos e com o pagamento parcelado a perder de vista em 20 anos.

E esses infelizes rurícolas prometiam comprar esses lotes, quase todos analfabetos assinavam com o dedão, uma exploração total! Eles compravam esses lotes, construíam ali seus barracos, arranjavam um empreguinho e começavam a pagar as prestações.

Só que com o tempo esses loteamentos começaram a valorizar, porque a cidade começava a inchar e aqueles loteamentos que estavam à 2km do centro, tempos depois, já estavam colados no centro.

Os prefeitos começaram a estender os serviços urbanos a esses loteamentos, instalando luz, ruas, água encanada, transporte, transformando o local num bairro.

Um lote que fora comprado para 3 contos de reis, já estava valendo 15 daí a 2 ou 3 anos, porque valorizou com as instalações. Aí o que acontecia? Os promitentes vendedores tinham todo o interesse em recuperar esses lotes, porque recuperando, poderiam revendê-lo a 15!

Eles começaram a dificultar o pagamento das prestações, muitos desapareciam propositadamente transferiam seu escritório para que quando os promitentes compradores chegassem e não os encontrassem, pensassem que foram bafejados pela sorte, achando que o vendedor sumiu e que jamais seriam cobrados!

O promitente vendedor esperava juntar 10 meses de prestações não pagas entravam com pedido de rescisão de contrato, naquele tempo não havia nenhuma lei, obrigando 1º a notificar, era sumário!

Não interessa a purgação de mora, porque não havia nenhuma lei que garantisse o direito de purgar mora, eles retomavam esses lotes aos milhares! Ora, porque o promitente comprador não pagava porque foi induzido a isso, ora, porque realmente estavam desempregados, não tinham como pagar. Essa situação tomou ares de drama urbano, isso acontecia milhares de vezes, os promitentes compradores desses lotes que depois de regarem a terra com o suor e sangue de seu sacrifício, perdiam esses imóveis, inclusive não podendo recuperar o que haviam pagos até então.

A situação ficou tão dramática que o presidente Getúlio Vargas que era o “pai do povo”, foi o 1º presidente que se preocupou com o povo, enquanto os outros presidentes se preocupavam em garantir os privilégios da aristrocacia rural.

Então Getúlio em pleno estado novo, ditador absoluto, fechou o Congresso e passou a legislar através de decretos-leis monocraticamente. Um desses decretos-lei foi o 58/37 no inicio do Estado novo.

O que fez esse dec. lei? Mudou tudo! Criou esse direito real de aquisição do promitente comprador, passou a exigir que esses loteamentos só pudessem

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ser comercializados quando registrados no RGI foi a 1º coisa.

Depois se verificava que muitos desses loteamentos nem eram dos promitentes vendedores não estavam registrados, tinham que registrar. Nesse registro, tinha que conter a planta do loteamento com a descriminação dos lotes, foi o precursor do memorial descritivo, que depois surgiu na lei 4591/64.

É a mesma coisa, o loteador para lançar o loteamento, tinha que 1º registrar no RGI o titulo de propriedade e o projeto. Apresentava uma minuta de compromisso de compra e venda.

E todos tinham que obedecer àquele modelo, não se admitia que se modificassem as condições, eles eram impressos, foi o precursor do contrato de adesão.

Veja a importância desse decreto lei! Tenho para esse decreto o maior entusiasmo! Algumas leis são paradigmáticas, como a lei das estradas de ferro, em 1912 também é extraordinária, são leis que mudam o comportamento.

O loteador só podia vender os lotes para aquele modelo, 3º o dec. 58 tornou irrevogável o compromisso, porque muitos loteadores diziam que não iam outorgar a escritura definitiva, devolviam as parcelas pagas. O decreto tornou irrevogável o loteador não podia desistir do negócio porque o imóvel se valorizou.

E ai é que veio mais importante criou-se a figura da adjudicação compulsória, estabelecendo que, completado o pagamento do preço, se o promitente vendedor se recusasse a outorgar a escritura definitiva, o promitente comprador podia lhe mover uma ação de adjudicação compulsória.

E vejam como essa lei foi premonitória, pioneira, a lei já dizia pelo rio sumaríssimo, quem fala hoje em rito sumário pensando que foi conquista da reforma do CPC, está enganado! Rito sumário está do dec. 58/37.

Exatamente como é hoje, a 1ª audiência logo, o juiz já mandava citar para comparecer a audiência, tinha que dar a sentença em 30 dias em rito sumário, sendo que o decreto ainda falava no superlativo.

E a sentença do juiz adjudicando o lote ao comprador, servia de titulo aquisitivo e era levado ao Registro. Com isso, meus amigos, a exploração dessa população indefesa acabou.

Os promitentes compradores de lotes passaram a ter uma extraordinária proteção e podiam invocar esse direito real de adquirir o imóvel, era direito real porque era direito dotado de seqüela, ele aderia ao lote.

Isso teve um resultado estrondoso, socialmente foi extraordinário. Tive várias vezes esses compromissos em mãos quando era advogado da Associação dos proprietários.

Esse compromisso era particular, impresso. O loteador só preenchia o nome do comprador, o valor, a metragem. Uma vez registrado, tinha força de escritura pública, tanto que se registrava no RGI. O comprador pegava aquele papel da loteadora, ia para o registro público.

E mais ainda, esse decreto 58, foi quem pela 1ª vez, tornou obrigatória a notificação premonitória do comprador para constituí-lo em mora, com o prazo de 15 dias para pagar os atrasados.

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Tudo isso surgiu nesse decreto, ele está no meu rol das leis mais importantes já feitas nesse país!

Até hoje se adota esse sistema, tanto que isso é uma exceção, na promessa de compra e venda de imóvel, não há mora ex re mesmo que se estabeleça o termo final do pagamento do preço não há mora ex re, a mora é sempre ex persona.

O vendedor do imóvel só pode pedir a rescisão do contrato, depois de notificar o comprador para constituí-lo em mora. É irrelevante dizer que estava previsto o dia do pagamento da parcela. Não sendo paga a parcela no dia a mora é ex persona.

Nada disso havia antes do dec. 58 só que esse decreto só se aplicava em loteamento, porque o drama social estava aí. Aquilo era o ponto nevrálgico, aqueles loteamentos transformavam-se em barris de pólvora porque a revolta era compreensível dos que perdiam as suas casas.

O tempo foi passando e o decreto produzindo os seus efeitos, ele criou o direito real de aquisição, criou o rito sumario para as ações de adjudicação, a mora ex persona, tudo isso foi criação do decreto 58.

Só que com o passar do tempo se percebeu que a mesma situação poderia ocorrer com adquirentes de imóveis já construídos, casas já feitas apartamentos, inclusive conjuntos populares!

E percebeu-se que já era necessário estender essa proteção a quem adquirisse imóvel loteado ou não! E aí surgiu o decreto 745 que já é da década de 60, quase 30 anos depois!

O decreto 745 não fez nada além do que estender a proteção do Decreto 58 ao compromisso de compra e venda de qualquer imóvel loteado ou não. A lei do parcelamento do solo urbano, também foi muito importante porque manteve esse mesmo sistema.

São leis importantíssimas, o dec. 58, o dec. 745, a lei do parcelamento do solo urbano. Mas agora tudo isso se cristaliza e se consolida com o NCC.

Agora chegamos ao ápice da pirâmide, é o NCC quem inclui entre os direitos reais, o direito do promitente comprador, e tanto faz ele não faz qualquer distinção, se é comprador de lote, de edifício, de casa é irrelevante.

E o diz o NCC “mediante promessa de compra e venda”, com a evolução do tempo o termo compromisso foi substituído para promessa, é só uma questão semântica.

“Em que não se pactuou o arrependimento”, observação importante, a lei não aboliu o direito de arrependimento e nem poderia porque esse direito decorre da autonomia da vontade.

É claro que se insere na promessa de compra e venda o direito de arrependimento, não há direito real de aquisição. O direito real de aquisição decorre da irrenunciabilidade da promessa.

A lei diz que no silêncio da promessa ela se presume irrenunciável, não precisa dizer que o compromisso é irrevogável, o que a lei diz é que para se arrepender tem que ser expresso.

No silêncio da promessa a presunção é que ela é irrevogável, conforme o art. 1417, o NCC consagra definitivamente o instrumento particular como hábil, para promessa de compra e venda, não precisa mais fazer para

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instrumento público.

Há uma razão de ser, a lei exige o instrumento público para a aquisição do domínio, mas a promessa de compra e venda não transfere o domínio, ela gera o direito real a adquirir o domínio, mas não é hábil para si só transferir o domínio.

Por isso é não há necessidade de instrumento público, a lei só exige instrumento público para contrato translativo de domínio, e lhes pergunto: A promessa de compra e venda transfere o domínio? Claro que não! Ela gera apenas uma obrigação de celebrar o contrato de compra e venda, mas não transfere o domínio.

Essa é a razão de ser, de se permitir a forma particular de promessa de compra e venda, pode ser até uma cobertura da Vieira Souto prometida a vender para 5 milhões de reais, que pode ser feita até numa folha de bloco!

A escritura de compra e venda tem que ser para instrumento público. Continuando o art. 1417: “celebrada para instrumento publico ou particular, e registrada no cartório do RGI, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel”.

Para encerrar a aula de hoje, vou me permitir um comentário que está agitando a doutrina. Quando foi feito o projeto do NCC em 75, esse dispositivo era avançadíssimo, porque 1º admitia a forma particular para promessa, e 2º garantia o direito real de aquisição, qualquer que fosse o imóvel.

Só que ele nasceu requentado e até significa um retrocesso, com esse artigo estamos andando para trás, e ao invés de proteger o promitente comprador do imóvel nós estamos prejudicando.

Havia uma súmula do STJ que era seguida com tranqüilidade pela jurisprudência, dizendo que não era necessário o registro no RGI, para conferir direito real de aquisição.

O STJ admitia a adjudicação compulsória independente do registro de imóvel, através da súmula 239, que é claríssima, pois diz que não se condiciona o registro da promessa ao RGI.

Agora lhes proponho um exercício hermenêutico, leiam o art.1417, e lhes pergunto como ficará essa súmula? Passa a ser contra legem se não for revogada, porque está claríssimo no NCC que só haverá direito real de aquisição se a promessa estiver registrada no RGI.

O projeto nasceu muito antes dessa súmula, a 1ª hipótese é o STJ revogar a súmula, 2ª o STJ e a jurisprudência se “lixarem” e continuar aplicando contra legem não será a 1ª nem será a ultima.

A jurisprudência contra legem é a mola propulsora da mudança legislativa, é ela que leva o legislador a mudar a lei. Tenho essa esperança, se o NCC se baseia a função social, a boa fé, tudo isso leva a conduzir à súmula 239 que está dentro da função social.

Os juízes vão ter que ter coragem de decidir assim, decidir contra legem e fundamentar muito bem na sentença. O NCC é principiológico, e um dos princípios é a da função social, o princípio está acima da norma.

A norma manda registrar, mas o principio diz que não precisa e a maioria dos juízes para comodidade preferem decidir de acordo com a lei, e não

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precisa explicar nada.

O que na verdade hoje existe, é que o promitente comprador de imóvel tem na minha opinião 3 opções para obter o domínio. 1º pode propor ação de adjudicação compulsória invocando o direito real de aquisição previsto no NCC.

2º ele pode se valer do artigo 464 do NCC, porque a promessa de compra e venda é um contrato preliminar e o art. 464 permite que a parte prejudicada pelo arrependimento da outra, possa pedir ao juiz uma sentença que confira definitividade.

Mas também exige registro no RGI, não havendo registro ainda resta uma ultima esperança bem mais frágil, que seria a execução de obrigação de fazer, em que se pediria ao juiz uma sentença que fizesse às vezes da vontade prometida emitir.

Aí o caminho é bem mais longo, porque seria uma ação pessoal, mas haveria ainda essa última esperança, trilhar esse caminho muito mais pedregoso, mas que pode levar ao final com muito maior esforço ao mesmo resultado.

A mais eficaz é a adjudicação compulsória, para a qual se mantém o rito sumário, ainda que seja de uma cobertura em Ipanema, além do rito sumário, a sentença é o titulo aquisitivo.

A outra é a ação do 464, que seria uma ação de rito ordinário, e a pior de todas e essa outra de obrigação de fazer com fixação de astrenti até que o devedor da obrigação resolva cumpri-la emitindo a vontade que teria que emitir.

Vamos aos direitos reais de uso e fruição que são direitos reais limitados, e que se exercem sobre uma coisa alheia. O ultimo desses direitos reais é o direito do promitente comprador de imóvel.

Desde 1937 se reconhece esse direito com o decreto lei 58, só que esse decreto só conferiu esse direito, ao promitente comprador de lote de terreno, que poderiam obter compulsoriamente o domínio, caso o promitente vendedor se recusasse a outorgar a escritura definitiva, pela via da adjudicação compulsória.

A sentença prolatada na adjudicação Compulsória, era o titulo aquisitivo de domínio que se levava a registro no RGI. Esse decreto também conferiu aos compromisso de compra e venda de imóveis, natureza irrevogável, para que as partes pudessem se arrepender seria preciso uma clausula expressa.

No silêncio do compromisso, (naquele tempo não se falava promessa de compra e venda e sim compromisso), quanto ao direito de arrependimento, a presunção era que o compromisso era irrevogável.

É evidente que não se confunde a clausula de irrevogabilidade com a de rescindibilidade, são coisas completamente diferentes. Quando se diz que o compromisso é irrevogável, significa dizer, que ele não pode ser objeto de resilição unilateral.

Nenhuma das partes poderia desistir de celebrar o negócio, isso é que se chama cláusula de irrevogabilidade, também chamada irretratabilidade, ela veda o arrependimento, e por isso impede a resilição unilateral do compromisso.

Isso não tem nada a ver com a rescindibilidade que diz respeito ao inadimplemento das obrigações assumidas no compromisso. É claro que, se o

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promitente comprador deixar de pagar as parcelas do preço, o vendedor poderá pedir a rescisão do compromisso.

Seria um absurdo que em nome da irrevogabilidade, pudesse o comprador não pagar mais nada, remanescendo o contrato. O fato do compromisso ser irrevogável, não impede que o promitente vendedor peça a rescisão da promessa, caso o promitente comprador se torne inadimplente.

Esse decreto também criou a obrigatoriedade de se interpelar premonitoriamente, o promitente comprador, para constituí-lo em mora, mesmo que a obrigação fosse com tempo determinado para o pagamento.

O vendedor só poderia ingressar com a ação de rescisão de compromisso, provando que interpelou o promitente comprador, para constituí-lo em mora, concedendo o prazo de 15 dias para a emenda da mora.

A partir do decreto 58, não mais era possível ao vendedor ingressar com a ação de rescisão, sem interpelar premonitoriamente o comprador, e sem lhe dar a oportunidade de purgar a mora.

A mora passou a ser sempre ex persona, em se tratando de compromisso de compra e venda de imóvel. O decreto também permitiu que esses compromissos fossem celebrados para instrumento particular, ao qual se conferia a mesma força de documento público, desde que o documento particular seguisse o modelo que estava registrado no RGI.

Outra novidade! Esse decreto 58 obrigava o registro prévio de um memorial para o lançamento de um loteamento que depois veio a ser copiado, na lei de incorporações.

O memorial descritivo de que trata a lei de incorporações, é rigorosamente tirado desse decreto 58 que também exigia que o loteador 1º registrasse no RGI, o plano de loteamento, com o registro dos títulos de propriedade, a planta do loteamento e a cópia do compromisso que seria adotado.

Todas as novidades desse decreto visavam a proteger o promitente comprador. Na década de 60 o decreto 745, ampliou essa proteção a todo e qualquer promitente comprador de imóvel, seja ele loteado ou não.

Outras leis se seguiram como a lei do parcelamento do solo, todas elas se orientando no sentido da proteção do promitente comprador de imóvel. E a jurisprudência foi se ampliando a ponto de surgir a súmula 277 do STJ, que estabelece que a Adjudicação compulsória, prescinde do prévio registro do RGI.

Também há muito já se firmara a jurisprudência, de que seria possível a adjudicação compulsória com instrumento particular de compra e venda. A jurisprudência vinha dispensando o instrumento público, para a promessa de compra e venda de imóvel.

Vejam como era nítida a evolução tanto da lei quanto da jurisprudência, no sentido de fortalecer o promitente comprador de imóvel, isso se justifica pela enorme densidade social de que se reveste, o contrato de compra e venda de imóvel.

O NCC avançou ainda mais no sentido dessa proteção, mas para outro retrocedeu. Ele avançou quando incluiu agora expressamente entre os direitos reais, o direito real do promitente comprador de imóvel.

É claro que dá outro status! Agora é um direito elencado no NCC no rol dos direitos reais que são tipificados. Antes esse direito real estava em

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outras leis, mas não no NCC.

Também o NCC deixa claro que essa promessa de compra e venda de imóvel pode se revestir da forma particular, isso era uma construção jurisprudencial, mas agora está expresso no NCC que é irrelevante a forma que se revista a promessa de compra e venda.

O lamentável retrocesso é que o NCC alude expressamente à necessidade da promessa estar registrada no RGI, o que a súmula 277 já dispensava, neste particular houve um retrocesso.

Se aplicarmos o texto do NCC não há a menor dúvida, de que a adjudicação compulsória depende do prévio registro da promessa no RGI. Há um confronto entre a súmula 277 e o NCC que estão em rota de colisão.

Ou a súmula será revogada, ou a jurisprudência continuará aplicando-a formando uma jurisprudência contra legem.

A ação que cabe ao promitente comprador é a adjudicação compulsória, para qual se confere o rito sumario, que é cogente, obrigatório independente do valor do imóvel. O rito aí não é em razão do valor, mas da matéria.

Não é ratione valorem, mas ratione materiae, e é de propósito é porque se entende que esse conflito de interesses é muito denso no ponto de vista de interesse social.

E quanto mais cedo se obtiver a prestação jurisdicional, e se conquistar a propriedade melhor para o equilíbrio social. Por isso se atribuiu o rito sumário nas ações de adjudicação compulsória.

Não podemos nos esquecer que o NCC também fortaleceu em muito, os contratos preliminares e é óbvio que uma promessa de compra e venda é um contrato preliminar, não se resta a menor dúvida quanto a isso.

A promitente de compra e venda não é titulo translativo de domínio, dela não emerge a propriedade, ela não é titulo hábil para transferir domínio. Dela emerge apenas uma obrigação pessoal, uma obrigação de fazer.

As partes se obrigam a celebrar um contrato definitivo, mas ele ainda não é um contrato definitivo. A obrigação que emerge de 1 contrato preliminar é uma obrigação de fazer que consiste em emitir vontade celebrando contrato definitivo.

Não se pode registrar uma promessa para transferir o domínio. A promessa confere 1 direito real de aquisição ao promitente comprador, mas não confere o domínio como ocorre na compra e venda, que levada a registro, é hábil para transferir o domínio.

O NCC fortaleceu e muito os contratos preliminares, no ACC não dedicava uma única palavra, não havia nenhum artigo que falasse nos contratos preliminares e a sua execução provisória.

Por isso, a não ser no caso do compromisso de compra e venda de imóvel, não havia como compelir efetivamente à parte a celebrar o contrato definitivo, restando apenas a parte prejudicada, reclamar perdas e danos.

O NCC ao tratar dos contratos preliminares, lhes emprestou uma força como se vê no art. 464.

Esse artigo é importante, ele estabelece que se o contrato preliminar contiver os requisitos de validade do contrato definitivo, e se ele não

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contiver clausula de arrependimento, e estiver registrado no RGI, a parte poderá notificar a outra, para que num prazo que lhe for concedido , venha a firmar o contrato definitivo.

E se a outra parte recusar-se a fazê-lo, a parte prejudicada poderá pedir ao juiz uma sentença que confira definitividade ao contrato preliminar.

A parte inocente ao invés de pedir perdas e danos, pedirá ao juiz uma execução compulsória do contrato preliminar, que para sentença se converterá como se fosse um milagre, no contrato definitivo.

É por isso que o NCC diz que os contratos preliminares, terão que conter todos os requisitos de validade do contrato definitivo, a não ser quanto à forma que não precisa ser igual. Exatamente porque ele pode vir a se tornar o contrato definitivo.

Mas reparem que também aí o NCC retrocedeu um pouco, porque ele colocou como requisito essencial para que possa se obter essa sentença de definitividade, que o contrato preliminar esteja registrado no registro de títulos e documentos, se o contrato se referir a um bem móvel, e no RGI se for imóvel.

É expressa a exigência de que o contrato preliminar esteja registrado, o que também não é uma saída para os promitentes compradores de imóveis que não tenham o titulo preliminar registrado.

Muitos disseram que se não pudessem obter a adjudicação compulsória porque a promessa não está registrada, requereriam a sentença de definitividade com base no art. 464 mas também não pode, porque esse artigo também exige o registro do título preliminar.

Acho que neste ponto enfraqueceu-se a posição do promitente comprador de imóvel, à luz da jurisprudência que já vinha sendo consagrada.

Só restaria ao promitente comprador de imóvel que não tivesse a sua promessa registrada, uma última esperança a de obter a escritura definitiva através da ação de execução de fazer.

Aí o promitente comprador que é credor de uma obrigação de fazer, por isso fiz questão de lhes dizer que de um contrato preliminar, nasce uma obrigação de fazer como qualquer outro, consistente em emitir vontade.

E essa obrigação de fazer hoje tem uma execução específica, o promitente vendedor é devedor de uma obrigação de fazer, da qual o credor é o promitente comprador, ele poderia se valer da execução especifica dessa obrigação de fazer, que é um caminho mais difícil de trilhar.

Esses eram os comentários que ainda faltavam para falar sobre o direito real do promitente comprador.

Respondendo ao aluno: A doutrina ainda não se consolidou, não há nenhuma referencia ao dec. 58, na parte final do NCC. O que se entende é que ele não exauriu inteiramente o tema, então só ficariam revogados, os dispositivos do dec. 58, que colidam com o NCC.

Na verdade não há nem colisão entre o dec. 58 e o NCC, porque o decreto também exigia o registro no RGI. O que colidiu foi a jurisprudência do STJ que dispensou o registro.

2. Direitos Reais de Garantias:

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2.1. INTRODUÇÃO

Com isso podemos começar a lhes falar, SOBRE OS DIREITOS REAIS DE GARANTIA QUE NÃO SE CONFUNDEM C/OS DIREITOS REAIS DE USO E FRUIÇÃO.

O nome é sintomático, direitos reais de garantia, o que eles visam é garantir o pagamento de uma obrigação, o titular desses direitos, não está interessado em extrair da coisa suas utilidades econômicas.

Ele não está pretendendo usar a coisa, gozar a coisa tal como acontece com o usufrutuário, o superficiário, não está interessado na substância da coisa, no corpo da coisa.

Não pretende retirar seus frutos, seus benefícios econômicos, tal como acontece com os titulares dos direitos reais de uso e fruição. O que o titular desses direitos reais de garantia está interessado é no valor da coisa e não na sua substância.

E porque tem interesse no valor da coisa e não na sua substância? É porque não sendo paga a obrigação o credor poderá excutir a coisa dada em garantia, parado produto da alienação judicial realizar seu crédito

O que interessa ao titular desses direitos, não é o corpo da coisa e sim o seu valor. Esses direitos reais de garantia tradicionalmente eram 3, e apareciam no ACC eram o PENHOR, A ANTICRESE E A HIPOTECA.

Essa ordem tinha uma razão de ser, era uma ordem cronológica. O penhor surgiu em Roma 1º que a anticrese e a hipoteca. Por isso é que o penhor tem precedência no elenco do ACC.

Depois surgiu a anticrese, e só muito depois, quase 6 séculos é que surgiu a hipoteca, que é o mais novo dos direitos reais de garantia entre os romanos. O ACC em homenagem à tradição histórica manteve essa ordem cronológica, que agora se rompeu.

O NCC fala em penhor, hipoteca e anticrese, mas é porque a anticrese quase desapareceu do direito. Ela foi eliminado do projeto do Des. Hebert Chamoun. Ele achou que anticrese estava em franco desuso e não havia nenhuma necessidade de incluí-la no rol dos direitos reais, portanto a eliminou.

Só que nas discussões finais, resolveu-se ressuscitar a anticrese que já estava morta no projeto e aí incluíram num último item e por isso que ela foi incluída.

Foi salva aos 45 minutos do 2º tempo, entendeu-se que se bem não faz, mal também não e que deve ficar lá como mais uma opção, embora raramente utilizada pelas partes!

Só que o NCC embora não tenha dito expressamente, criou um outro direito real de garantia que é a alienação fiduciária, embora ela não apareça no elenco do art. 1225.

Onde vai aparecer? No capitulo da propriedade porque ela é uma forma de propriedade, mas com escopo de garantia, por isso o NCC quando tratou da propriedade como o maior e mais pleno de todos os direitos reais, ele incluiu um capitulo da propriedade fiduciária.

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Porque que lhes afirmo que a Alienação fiduciária, é um direito real de garantia? Porque a propriedade fiduciária é constituída com o único propósito de garantir o pagamento de uma obrigação, não tem nenhum outro propósito.

Só se faz uma alienação fiduciária para garantir o pagamento de uma obrigação, portanto é obvio que a alienação fiduciária é um direito real de garantia.

O fato dela não estar no elenco do art. 1225, não quer dizer que ela não seja um direito real de garantia, porque ela aparece na disciplina da propriedade como sendo uma das suas modalidades, mas com escopo de garantia.

Tanto que o nome técnico desse direito é alienação fiduciária em garantia. Podemos dizer que no NCC temos 4 direitos reais de garantia, o penhor, a hipoteca, a anticrese e a alienação fiduciária de garantia. Qual a vantagem dessas garantias comparando-as com as chamadas garantias pessoais? Como vocês já sabem a ponte que liga a economia ao direito, chama-se hoje crédito.

A sociedade moderna vive de crédito, a sociedade moderna vive de crédito, todos nós dependemos de crédito para adquirir os bens que nos interessa, os consumidores precisam de crédito para adquirir os bens que precisa.

Todos nós dependemos de crédito, os consumidores, os fornecedores, os industriais, etc. A economia moderna respira crédito, o pilar de sustentação dessa ponte que liga a economia ao direito, chama-se garantia do crédito.

Só se concede crédito, se o credor tiver uma garantia pelo menos razoável de que conseguirá realizá-lo, recebê-lo. Só um suicida econômico consideraria um crédito, sem um mínimo de certeza de que o reaveria.

Daí porque todos os sistemas jurídicos, mesmo os mais primitivos, procuraram criar mecanismos de reforço do crédito. Os romanos no seu direito primitivo chegaram a estabelecer que o devedor inadimplente, seria sacrificado no holocausto à deusa das obrigações.

Ele pagava com a vida o inadimplemento da obrigação, depois pagava com a liberdade tornando-se escravo do credor inadimplido, até que finalmente a lex paetelia papiria estabeleceu que o mecanismo de garantia do pagamento das obrigações, recairia no patrimônio do devedor.

Reparem que mesmo os sistemas mais primitivos, de antes de Cristo já se preocupavam em criar mecanismos de garantia dos créditos, para proteger os credores. Essas garantias se dividiam em 2 grandes grupos.

Há 2 espécies de garantia de dividiam em 2 grandes grupos, o 1º grupo inclui as chamadas garantias pessoais, as chamadas pomposamente de garantias fidejussória.

São garantias representadas para uma pessoa que se comprometa com o credor a lhe pagar o que lhe deve outra pessoa se ela não o fizer. É um 3º que se obriga com o credor a lhe pagar a obrigação do devedor se esse não o fizer.

Por isso é que a garantia se chama pessoal, ela repousa sobre uma 3ª pessoa que não é o devedor, é o caso da fiança, do aval, do abonador da

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fiança. É muito interessante lembrar que nestas garantias se estabelecem relações jurídicas distintas. Há uma relação jurídica principal que se estabelece entre o credor e o devedor. Dessa relação não faz parte o fiador, essa relação liga apenas o credor e o devedor, e essa é apenas a relação principal.

O fiador não participa dessa relação. E há uma 2ª relação que é acessória que está ligada à principal que se estabelece entre o credor e o fiador, e da qual não faz parte o devedor, portanto são 2 relações distintas que os leigos não percebem.

Os leigos pensam que a fiança traduz uma relação triangular em que num dos vértices é o credor, o outro vértice é o devedor e o outro vértice é o fiador. Não é isso!

As relações são distintas e tanto isso é verdade que a fiança pode ser concedida à revelia do devedor sem que o devedor saiba, porque ele não participa dessa relação acessória que se estabelece entre credor e fiador.

Claro que sendo acessória ela segue a sorte da principal, o que significa dizer, que se a principal for nula ou anulável, a acessória o será, se extinguir-se a obrigação principal, extinguir-se-á a acessória, mas são distintas.

Outra observação interessante, essas obrigações traduzem um fenômeno estranhíssimo, porque elas constituem obrigações que só contém a responsabilidade, são desprovidas de débito.

As obrigações se decompõem em débito e responsabilidade. O debitum é o dever primário, o dever principal, é o que o devedor se obriga e a obrigatio é o dever secundário, é a responsabilidade que nasce para o devedor caso ele não pague a obrigação.

E aí passa a responder pelos prejuízos causados ao credor. Ora na fiança, no aval, em todas as garantias fidejussórias o devedor que é o fiador, não tem débito, ele não deve nada ao credor.

O debito é do afiançado do devedor, o fiador tem responsabilidade, tanto que o credor pode acestar a sua pretensão de cobrança em face do fiador embora ele não tenha débito.

O devedor invoca a obrigatio, a responsabilidade que o fiador assumiu. Essas são as garantias pessoais que são representadas para pessoas, que podem ser naturais ou jurídicas que se comprometem a pagar dívidas de outrem, se o devedor não o fizer.

Só que essas garantias pessoais não são tão eficientes e por isso não são muito prestigiadas quando se trata de obrigações de valor culposo, porque tem sérios inconvenientes, como são pessoais elas se extinguem com o desaparecimento do garantidor.

Basta que morra o fiador, para a garantia exaurir-se como para milagre. A responsabilidade do fiador pelo pagamento, não se transmite aos herdeiros, a não ser quanto às prestações que já estivessem vencidas até o momento em que o fiador morreu.

Mas as vincendas as que se vencem após a morte do fiador, os seus herdeiros já estarão exonerados. Como se não bastasse o garantidor, que é o fiador, o avalista fique tão insolvente quanto o devedor, e ai também a garantia se esvai.

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Do que adianta cobrar do fiador, se ele também está insolvente. Em 3º lugar há uma série de dispositivos no NCC que exoneram o fiador, que se estende ao aval.

Por ex: se credor conceder moratória ao devedor, exonera-se o fiador, se o credor celebrar novação sem anuência do fiador, exonera-se o fiador, se o credor celebrar novação sem anuência do fiador exonera-se o fiador, se o credor praticar algum ato que iniba o fiador de depois sub-rogar-se todos os seus direitos, isso exonera o fiador.

Se a fiança estiver vigendo para prazo indeterminado, hoje o NCC diz no art. 835 que o fiador poderá se exonerar mediante uma simples remessa de uma carta ao credor, e depois de 60 dias estará exonerado.

Se houver qualquer modificação na relação obrigacional para agravar a responsabilidade do devedor sem a anuência do fiador, ele estará exonerado. Como vocês estão vendo essas garantias pessoais não são tão eficazes, e por isso ficam reservadas em geral as obrigações de menor importância econômica.

O 2º grupo de garantias são as chamadas garantias reais, e qual a diferença? É que enquanto nas garantias pessoais, a garantia representada para uma outra pessoa natural ou jurídica, que se obriga perante o credor a pagar a obrigação do devedor se esse não fizer, as garantias reais, são representadas para uma coisa e não para uma pessoa.

E que coisa é essa? É uma coisa que o devedor ou 3º para ele aloca à serviço do credor, para que o credor possa se valer de seu valor, para se ressarcir do inadimplemento.

O credor se serve daquela coisa que foi alocada a seu serviço pelo devedor ou para 3º para levar essa coisa à praça ou a leilão e do produto da alienação judicial retirar o seu crédito.

Por isso que lhes falei que nesses direitos reais o seu titular, tem interesse é no valor da coisa, e não na sua substância. Essas garantias têm maior efetividade do que as pessoais e por isso nas obrigações de maior valor costuma ser preferida ou então cumuladas com as pessoais.

E isso atrai muito os credores isso lhes confere um privilégio extraordinário sobre os quirografários porque 1º do produto da alienação, se retirará integralmente o crédito do credor privilegiado e se sobrar é que se pagará aos quirografários.

Outra característica dos direitos reais é que eles aderem a coisa, eles seguem a coisa para onde quer que ela vá, esses direitos são ambulantes porque são dotados de seqüela.

Em princípio nada impede a cumulação das garantias, nada impede, claro que há exceções, a lei do inquilinato não permite duplicidade de garantia, mas é uma exceção.

A regra geral é que o credor possa exigir varias garantias naturais e reais, nada impede que o credor exija um fiador que é uma garantia fidejussória e uma hipoteca que é uma garantia real.

Quando as obrigações são de maior valor, geralmente o credor prefere uma garantia real que é mais eficaz porque confere ao credor algumas vantagens que as pessoais não tem.

Não é a toa que os credores que tem garantia real são chamados credores

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privilegiados, credores preferenciais, o que já não ocorre com os credores que têm garantia pessoal.

Observem que não é preciso que a coisa que recaia a garantia seja do devedor, normalmente é, mas a lei não exige isso. Por ex: se eu sou o devedor, nada impede que o meu pai, que não é o devedor garanta ao credor o pagamento da minha obrigação com uma hipoteca sobre um imóvel dele, que não é o devedor.

Por isso que lhes disse que a garantia real é representada para uma coisa oferecida pelo devedor ou alguém para ele. Nada impede, portanto que um 3º ofereça uma coisa em garantia real.

Mas isso é raro! Normalmente a coisa sobre a qual recai o direito de garantia, pertence ao próprio devedor. Vamos ver as características dessas garantias reais que as distinguem das pessoais.

A 1ª já falei, as garantias reais são representadas para uma coisa enquanto as pessoais para uma pessoa. Uma outra característica desses direitos reais de garantia, é que eles conferem ao credor o beneficio da preferência.

Os credores preferenciais, daí o nome recebem antes dos credores quirografários, que são aqueles que não tem garantia real, é o chamado benefício da preferência.

O que significa dizer, é que se o devedor alienar à coisa à 3º o que ele pode fazer isso não prejudica o credor, nada impede que o devedor que entregou uma coisa em garantia ao credor, possa aliená-la.

Porque isso não trás o menor prejuízo ao credor, porque como esse direito real de garantia adere à coisa, o credor poderá excuti-la nas mãos de quem estiver mesmo que ela já pertença à 3º.

O credor irá buscá-la onde tiver, para levá-la à praça ou a leilão. Essa ambulatoriedade do direito real de garantia é da maior importância prática para os credores. Uma outra característica é a publicidade desses direitos reais.

Os contratos dos quais emanam esses direitos reais, são estipulados através de contratos, chamados contratos com efeitos reais, porque estabelecem direitos reais de garantia.

Contratos de hipoteca, de anticrese, esses contratos são dotados de publicidade e oponibilidade “erga omnes” se, se trata de coisa dada em garantia de um bem imóvel, o contrato de penhor tem que ser levado ao registro de títulos e documentos, se é um imóvel como na hipoteca, ao RGI.

E por isso eles se tornam públicos e oponíveis erga omnes por isso é que o titular pode excutir o bem, mesmo que já esteja no domínio de 3ºs. E quem compra um bem sobre o qual recai uma garantia real, sabe que está adquirindo uma propriedade limitada e pode vir a perder o bem se excutido pelo credor.

Um outro princípio característico desses direitos reais de garantia, é o principio da especificação. São 2 princípios, o da especificação e o da discriminação.

São fundamentais, o que significa dizer, que os contratos que fazem nascer essas garantias reais, são obrigados a discriminar a obrigação a que ele se refere.

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Para se constituir uma hipoteca, um penhor e uma anticrese é preciso descrever minuciosamente no contrato a obrigação que lhes visam garantir. Com o seu valor, data de vencimento, juros, o indexador.

A obrigação garantida tem que estar discriminada minuciosamente. Não pode haver uma referência genérica, como por ex: José dá em hipoteca, o seu imóvel da rua tal a João, para garantir todas as suas dívidas.

Esse contrato de hipoteca é nulo, nasce morto! Porque não está dizendo quais as dívidas, nem os juros, nem a forma de pagamento, ou seja, especificamente nada.

O mesmo direito real pode garantir várias obrigações entre as partes, mas cada uma tem que estar discriminada e tem que dizer minuciosamente qual é a coisa dada em garantia.

Se for imóvel tem que descrever a metragem, o título aquisitivo, os confrontantes, metragens, cadeia dominial. Se for móvel como no caso do penhor, também tem que descrever a coisa da maneira mais precisa e se for uma máquina, um equipamento elétrico-eletrônico, o seu nº de caracterização, o seu modelo. Esses são os princípios da especificação e da discriminação.

Uma outra característica dos direitos reais e essa talvez seja o seu grande defeito, é o princípio da vedação do pacto comissório e sobre isso não há exceção, o direito brasileiro, não abre mão desse princípio.

O que vem a ser a proibição desse pacto comissório? Esse pacto seria uma clausula que permitisse ao credor incorporar definitivamente a coisa dada em garantia ao seu patrimônio, se o devedor não pagasse.

O credor não pode ser, para iniciativa exclusiva sua, transferir o domínio da coisa dada em garantia para o seu patrimônio, caso o devedor não pague a obrigação.

Ele é obrigado a excutir o bem a levar a leilão ou à praça, e só poderá se valer do produto da venda e não da própria coisa. Vocês vão ver que há exceções, o credor pode adjudicar a coisa, mas em leilão, na hora de excutir o bem.

O credor pignoratício, não pode ligar para o devedor e dizer: “como a sua dívida venceu ontem e você não pagou, aquele anel que você me entregou em penhor, passa a ser meu”. Isso não existe, não há exceção, o credor garantido com garantia real é obrigado a alienar a coisa, porque ele só pode se valer do produto da alienação. E é isso que tira dessas garantias reais, grande parte da sua eficácia, porque isso dificulta e retarda a realização do crédito. É isso que tirou da hipoteca, do penhor e da anticrese, grande parte de seu interesse prático. Os credores internacionais chamam isso de custo Brasil, a dificuldade, o tempo que se leva por excutir judicialmente um bem. Não se vedou o pacto comissório por acaso, há uma razão técnica por isso.

É em homenagem ao principio da execução menos onerosa para o devedor. Se o credor for obrigado a excutir o bem, sempre haverá a possibilidade de se obter um lance superior ao valor da dívida. Nesse caso o que sobejar, terá que ser devolvido ao devedor.

Se o credor pudesse ficar com a coisa sem excutir o bem, jamais haveria um

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saldo a favor do devedor, a vedação peremptória sem a menor exceção do pacto comissório, se deve a isso, e em respeito a esse princípio que está acima da lei, de que a execução se fará da maneira menos onerosa ao devedor.

Mesmo na alienação fiduciária se veda o pacto comissório o credor fiduciário, uma vez consolidada a propriedade em suas mãos, fica obrigado a prestar contas em juízo, para dizer para quanto vendeu.

Se houver saldo é do devedor, mesmo na alienação fiduciária, que não precisa promover público leilão, mas tem que vender a coisa. Essa é outra característica marcante dos direitos reais a vedação do pacto comissório.

Várias razões contribuíram para que esses direitos reais de garantia entrassem em decadência. A 1ª é a vedação do pacto comissório, o 2º grande fator que era o privilegio foi se perdendo no decorrer do tempo, começaram o foi o aparecimento dos credores mais privilegiados.

No início quando esses direitos foram criados eles eram privilegiados recebiam 1º que tudo. Depois foram surgindo leis que conferiram a outros credores maiores preferências.

E hoje a ordem de preferência, traz em 1º lugar os créditos trabalhistas, depois a Fazenda, a Previdência, e aí sim vem os credores hipotecários, pignoratícios, anticréticos, só ganham dos quirografários.

Não faltava mais nada, o dia em que igualarem com os quirografários, não têm mais nenhuma razão de ser. Na prática o credor hipotecaria leva 5 anos para levar o bem à praça e depois que conseguem, não sobra nada para eles.

Porque os demais credores se atiram sobre o produto como antigos piratas e retiram cada um deles o seu quinhão e freqüentemente não sobra nada para o credor hipotecário.

Tudo isso está contribuindo para que esses direitos reais de garantia que gozaram de tanto prestigio no passado, hoje estejam em franca decadência. E foi isso que fez nascer a alienação fiduciária que elimina muito desses inconvenientes.

Mas não conseguiu eliminar o da vedação do pacto comissório, mas pelo menos essa alienação, no caso da Alienação Fiduciária é muito mais célere.

Alienação Fiduciária surgiu na década de 60, porque ninguém mais agüentava os inconvenientes da hipoteca do penhor e da anticrese e isso vinha impedindo que a economia brasileira se inserisse numa economia de 1º mundo.

Meus amigos, uma economia de 1º mundo só existe se amparada num eficiente mercado de capitais. Sem isso ela é primária é o mercado de capitais que nas economias modernas giram freneticamente, trocam de mãos em instantes, os investimentos se sucedem.

No decorrer de 1 dia numa operação de bolsa podem capitais trocarem de mãos 20 vezes! Com um simples toque de computador. O Brasil não tinha até a década de 60 um mercado de capitais.

Em 64 o governo militar imaginou criar o mercado de capitais para inserir a economia brasileiro no 1º mundo. Os gurus do governo Castello Branco eram economistas.

Os Advogados e juristas ficaram relegados a um plano secundarissímo, eram

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os tecnocratas econômicos que mandavam no governo. Foi então que se criou a lei de mercado de capitais tal como temos hoje.

Só que para criar um mercado de capitais, perceberam os economistas que assessoravam o governo, que era preciso também uma garantia maior para os investidores, principalmente estrangeiros.

Como se iria captar esses capitais estrangeiros, senão se oferecesse aos investidores, mecanismos mais eficazes de garantias de seus investimentos?

Como se poderia atrair um investidor americano, dizendo que uma hipoteca que lhe for conferida para garantir o seu investimento, levaria 5 anos para ele recuperá-lo?

Foi por isso que surgiu a alienação fiduciária nessa época, e tinha que surgir na lei que criou o mercado de capitais no seu art. 66, rompendo a tradição da hipoteca, penhor e anticrese.

É claro que não eliminou esses direitos reais, veio trazer mais um que foi a alienação fiduciária. O detalhamento foi feito pelo decreto 911, que criou os procedimentos a serem adotados pelo credor, caso o devedor não pagasse a obrigação.

Foi aí que surgiram os mecanismos da busca e apreensão com liminar, a consolidação da propriedade em mãos do credor, a alienação da coisa diretamente no mercado sem precisar praça, editais.

Só que no início só poderia ser objeto de alienação fiduciária, coisa móvel, em 97 é que alienação fiduciária em garantia foi estendida aos imóveis, embora ainda não tenha pego no mercado, para uma série de circunstâncias.

E agora o NCC é que então consolidou a alienação fiduciária em garantia, incluindo-a nas modalidades de propriedade, que é aquela que se estabelece com finalidade de garantir o pagamento de uma obrigação.

Ainda para inspiração dos economistas era preciso dotar esse novo direito real de garantia de uma coercibilidade maior para levar o devedor a pagar, é por isso que a lei de alienação fiduciária admite a prisão civil do devedor.

A prisão civil do devedor fiduciário era considerada vital para que o sistema funcionasse, pois não há ameaça mais aterrorizadora do que perder a liberdade.

Ameaçado pela prisão civil o devedor faria tudo que pudesse para pagar livrando-se dessa aterrorizante sanção. Hoje a jurisprudência dominante, seria no sentido de não se admitir essa prisão civil porque seria na visão da maioria, inconstitucional.

É por isso que a alienação fiduciária começa a entrar em decadência, a mesma que atingiu a hipoteca, o penhor e a anticrese. Já se começa a falar no mercado financeiro da necessidade de criar outro direito real, porque a alienação Fiduciária perderá grande parte da sua importância se fixada definitivamente a idéia de não se poder prender o devedor fiduciário.

Há quem afirme e com razão que eliminar do sistema, a possibilidade de prender civilmente o devedor fiduciário é melhor acabar com a alienação fiduciária.

Já começam os economistas a provocar os juristas, para que eles criem um

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outro direito real de garantia porque esse também vai se tornar ineficaz.

2.2. DO PENHOR

Como já falamos, o NCC fiel a tradição cronológica, começa pelo penhor. Em princípio como regra geral, o penhor é um direito real de garantia que recai sobre as coisas móveis.

Falo em princípio, porque essa não é uma regra absoluta, admite exceções, os chamados penhores especiais, recaem sobre bens imóveis, mas são exceções.

A regra geral é que o objeto do penhor seja uma coisa móvel, o que também caracteriza o penhor distinguindo nitidamente da hipoteca, é que no penhor a posse da coisa empenhada é transferida ao credor.

É evidente que a propriedade continua em mãos do devedor, mas a posse direta é transferida ao credor ficando o devedor como possuidor indireto. Isso permite tanto ao credor quanto ao devedor, defender essa posse contra ingerências de 3ºs.

Porque tanto o credor quanto o devedor, são possuidores da coisa empenhada sendo o credor o possuidor direto e o devedor o possuidor indireto. Porque que se transfere a posse da coisa empenhada ao credor?

Porque aí é que está a verdadeira garantia do credor, se a coisa móvel empenhada continuasse na posse do devedor, seria muito fácil ao devedor alegar mais tarde que ela havia se extraviado, ou que havia sido furtada ou roubada ou que se destruíra, e com isso se perderia a garantia.

Portanto a garantia do credor está exatamente na posse direta da coisa empenhada, o credor tem a coisa sob o seu poder físico, sob as suas vistas. Nada impede que o credor transfira à 3º, a posse dessa coisa e a sua guarda.

Por ex: se é um anel de brilhante, o credor pode por motivo de segurança confiá-lo à guarda de um banco, depositando num cofre de um banco. Mas a regra geral, é que a posse direta fique em mãos do credor.

Também é obvio que paga a obrigação, o credor se obriga a devolver a coisa ao devedor. Não se trata de propriedade resolúvel, porque o credor não tem a propriedade da coisa empenhada, o que ele tem é apenas a posse direta, tanto que se retorna ao devedor é apenas a posse direta e não a propriedade que sempre foi do devedor.

O penhor se estabelece através de contrato salvo nas hipóteses de penhor legal que estudaremos adiante e que independe de contrato escrito. Mas o penhor convencional, que é aquele que se estabelece livremente entre o credor e o devedor, depende de contrato.

E em se tratando de coisa móvel como é a regra geral, esse contrato pode ser lavrado em instrumentos particular. Só nos penhores especiais que recaem sobre imóveis, se exigirá instrumento público.

Quando o objeto do penhor for uma coisa móvel e essa é a regra geral, o instrumento pode ser particular, mas terá que ser levado obrigatoriamente ao cartório de registro de títulos e documentos para que possa valer erga omnes contra 3ºs.

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Não sendo registrado, o penhor não é oponível à 3ºs, é o registro que dá PUBLICIDADE E OPONIBILIDADE ERGA OMNES ao penhor.

Quando se trata de penhor especial que recai sobre bem imóvel, o contrato terá que ser levado a registro no RGI e não mais no de título e documentos.

Nesse contrato como não poderia deixar de ser, terá que ser indicada minuciosamente a obrigação garantida, o seu valor, o seu vencimento, a forma de pagamento, o indexador da correção se houver, eventuais multas moratórias, tudo que diga respeito à obrigação garantida, terá que constar minuciosamente no contrato de penhor.

Também é obrigatório constar no contrato de penhor a descrição minuciosa do objeto do penhor, da coisa empenhada. Se for um veículo com todas as suas especificações, uma máquina terá que ter a sua numeração aludindo-se também ao seu estado de conservação, e atribuindo-se à coisa, um valor de mercado.

Não precisa ser um valor matemático, não é preciso fazer-se uma perícia de avaliação. As partes atribuirão à coisa empenhada, no próprio contrato de penhor, um valor equivalente ao de mercado, no momento em que se celebra o contrato.

Uma outra diferença entre o penhor convencional que tenha para objeto uma coisa móvel e o que tenha para objeto uma coisa imóvel, é que no penhor que recai sobre imóveis, a posse continua com o devedor.

Portanto só se transfere ao credor, a posse da coisa empenhada, quando ela for móvel. Em se tratando de imóvel como ocorre com o penhor agrícola, o industrial, o penhor pecuário, aí a posse continua com o devedor.

Ora, se o credor tem a posse direta da coisa, ele agirá como sendo possuidor com todos os direitos decorrentes da posse, ele pode defender essa posse contra 3ºs utilizando-se dos interditos possessórios.

Ele pode apropriar-se dos frutos da coisa, colhida durante o período da posse. Ele poderá reter a coisa não a devolvendo ao devedor, enquanto não for indenizado pelo devedor, das despesas que teve que fazer para conservar a coisa.

Imagine que o penhor é representado por um animal semovente um cavalo de corrida, durante o período do penhor, o credor teve que cuidar do cavalo, tratá-lo, alimentá-lo.

E essas despesas de preservação e conservação da coisa empenhada, são indenizáveis ao credor e se o devedor não quiser pagá-las, o credor poderá reter essas coisas.

Em compensação o credor sendo possuidor direto da coisa, responderá perante o devedor, para todos os danos que ela venha a sofrer por culpa sua.

Portanto se a coisa se deteriorar ou perecer por culpa do credor, ele terá que indenizar o devedor, podendo compensar essa indenização com o valor da obrigação.

Aí é possível fazer a compensação entre o dano sofrido pela coisa ou o seu perecimento e o valor da dívida. Também é interessante observar que o credor tem a posse direta da coisa empenhada, mas não pode usá-la durante o período do penhor, não pode usá-la em seu benefício.

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Se é um automóvel ele não pode circular no veiculo, para atender as suas necessidades pessoais. Se é um anel de brilhante ele não pode exibi-lo no dedo numa festividade.

E se estiver fazendo a não ser com autorização do devedor, se o credor estiver usando em seu proveito a coisa empenhada e ela vier a perecer ou a se deteriorar, mesmo sem culpa do credor, ainda que decorrente de um fortuito, ele responderá pelo equivalente às perdas e danos perante o devedor, porque ele não pode usar a coisa, a não ser com a concordância expressa do devedor.

Enquanto a obrigação não é integralmente paga, o credor não pode ser constrangido pelo devedor para devolver a coisa, aliás, esse é um dos princípios gerais que informam os direitos gerais de garantia.

O princípio da indivisibilidade da garantia, o ex: é o seguinte: imagine que a dívida é de R$ 50.000,00, e para garanti-la o devedor entregou ao credor 3 anéis de brilhante cuja soma atinge R$ 60.000,00.

Então temos 3 anéis de brilhantes que garantem o pagamento de uma dívida de R$ 50.000,00. Imaginemos que o devedor tenha pago a metade da dívida, já pagou R$ 25.000,00, mas ele não pode constranger o credor a lhe devolver um dos anéis.

A não ser que o credor concorde, porque é o principio geral da indivisibilidade da garantia, até que seja pago o ultimo centavo, o credor não pode ser compelido a devolver as coisas empenhadas proporcionalmente, à parte que já foi paga.

Também é claro, que não se pode admitir e isso é uma vedação absoluta, que o credor incorpore a coisa empenhada a seu patrimônio, diretamente pelo simples fato do devedor não ter pago.

Significa dizer que o credor é obrigado a excutir o bem, levar ao leilão, é obrigado a promover a alienação judicial do bem empenhado. Já lhes expliquei que o direito brasileiro, veda o pacto comissório.

Levando a coisa empenhada a leilão, pelo menos em tese será possível obter um lance maior que a dívida, quando então o que sobejar será devolvido ao devedor.

Por isso é que não se permite que o credor incorpore diretamente a coisa ao seu patrimônio, não promovendo a execução e a alienação judicial. Nada impede se as partes estiverem de acordo, que se promova a alienação particular da coisa, a chamada venda amigável.

Se o contrato expressamente autorizar, ou se o devedor consultado pelo credor autorizar, não é preciso fazer a alienação judicial, mas não havendo essa autorização do contrato ou não havendo acordo entre as partes, o credor terá que promover a execução.

Também é um direito do credor ser ressarcido dos prejuízos que sofreu em razão de vícios ocultos da coisa empenhada. Vou dar um ex: que já caiu numa prova de magistratura.

O problema que caiu na prova foi o de uma vaca que foi dada em penhor e que estava contaminada pela brucelose, que é uma doença contagiosa que não pode ser detectada a olho nu.

Em razão disso todo o rebanho do credor, também se contaminou e veio a se

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perder e o credor exigiu indenização do devedor, pelo prejuízo que sofreu, em razão desse vício oculto que a coisa empenhada apresentava.

Aí estão os direitos do credor, a seguir o NCC fala sobre os deveres do credor, sobre os quais já lhes falei que é guardar a coisa como se sua fosse, para devolvê-la ao devedor quando paga a obrigação, no mesmo estado em que a recebeu.

O credor é como se fosse o guardião da coisa, ele também tem que defender a posse da coisa, quando turbada ou ameaçada para 3ºs e tem que restituir a coisa ao devedor, com todos os frutos e acessões, uma vez paga a dívida.

Inclusive ele terá que compensar os frutos de que se apropriou durante o período do penhor, nas despesas e conservação da coisa.

Se ele fez despesas de conservação da coisa, no momento em que a coisa é devolvida ao devedor, o credor tem direito a ser indenizado dessas despesas de conservação, terá que imputar e compensar, os frutos que se apropriou.

Tecnicamente esses frutos seriam do devedor que é o proprietário da coisa.

Vejamos quais são as causas de extinção do penhor, em 1º lugar, extinguindo-se a obrigação, isso é óbvio porque o único objeto do penhor é garantir o pagamento de uma obrigação que lhe é subjacente e que tem que estar descrita no contrato de penhor.

Uma vez paga a obrigação ou extinta, inclusive pela prescrição, extingue-se também o penhor. Não há a menor razão para se manter o penhor, se a obrigação garantida não mais exista qualquer que seja a causa da extinção da obrigação.

Os direitos reais de garantia são sempre acessórios, estão umbilicalmente ligados à obrigação subjacente que é a obrigação garantida. Tudo que atingir a obrigação, afeta o direito real de garantia.

Se a obrigação se extingue, também se extinguirá o penhor. O perecimento da coisa empenhada por motivos também óbvios extingue o penhor, de que adiantaria manter o penhor se a coisa que o representa não mais existe, pereceu.

Uma outra hipótese é a renúncia do credor, por ex: essa renúncia pode ser expressa ou tácita, um ex: clássico de uma renuncia tácita, é quando o credor devolve ao devedor a coisa empenhada sem ter sido paga a obrigação.

O simples fato do credor devolver ao devedor a coisa empenhada sem que a obrigação tenha sido paga, importa em renuncia à garantia, mas não em remissão da dívida.

É outra coisa, o credor estará abrindo mão da garantia ao devolver a coisa empenhada ao devedor, mas ele não está perdoando o devedor, não está remitindo o devedor.

Só que ele deixa de ser credor pignoratício, privilegiado para se converter voluntariamente em credor quirografário porque ele renunciou a garantia devolvendo a coisa empenhada ao devedor.

Também pode-se extinguir o penhor pela confusão, ou seja confundindo-se na mesma pessoa as figuras do credor e devedor. Ex: o devedor era filho do credor, que como garantia do pagamento lhe deu o seu automóvel.

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Aí morre o credor, e o devedor era o seu único e universal herdeiro, aí operou-se a confusão! E como a confusão extingue a obrigação sem pagamento, também não haveria porque se manter o penhor.

Também se extingue o penhor, pela adjudicação judicial, ou pela remissão ou pela venda da coisa empenhada quando autorizada pelas partes, vamos examinar cada uma delas.

Eu lhes disse que o direito brasileiro veda o pacto comissório, mas nada impede a adjudicação da coisa pelo credor. Quando isso se verifica? É quando a avaliação judicial da coisa, que é obrigatória para se levá-la a leilão, mostra que seu valor é inferior à dívida.

Portanto, as chances de se obter um lance maior do que a divida são remotíssimas, porque a avaliação judicial revela que o valor da coisa, já é inferior ao valor da obrigação.

Nesta hipótese, assegura-se ao credor o direito de adjudicar judicialmente a coisa, ele requer ao juiz aí sim, que a coisa seja incorporada ao seu patrimônio, mas isso importa em quitação geral do devedor.

Se o credor preferir adjudicar judicialmente a coisa a ele não poderá pretender cobrar do devedor eventual diferença, terá que dar quitação.

Se não fizer isso ele deixa a coisa ir à leilão, recebe o lance maior que foi obtido, e aí sim poderá cobrar como credor quirografário, a diferença.

Mas se ele preferir adjudicar a coisa, incorporando ao seu patrimônio, ele terá que dar quitação ao devedor. Isso é uma opção do credor, quem vai decidir se é melhor adjudicar judicialmente a coisa, ou deixá-la ir a leilão para depois cobrar a diferença, é o credor. Também pela remissão, ou seja, pelo perdão da dívida, aí sim, o credor não está apenas renunciando a garantia, agora está perdoando o devedor, remitindo e aí se extingue o penhor.

Ou então, quando se aliena amigavelmente a coisa. Extinto o penhor seja pelo pagamento da obrigação ou para uma das causas a que nos referimos, promove-se o cancelamento no registro de títulos e documentos.

Também não se esqueçam daquelas 2 modalidades de penhor, o convencional que é exatamente este que acabamos de lhes falar, que é o ajustado livremente entre o credor e o devedor, e o penhor legal que independe de contrato, decorre da lei. Há 2 situações que a lei confere penhor, a determinadas pessoas, queiram ou não as partes. Em 1º lugar os hospedeiros de hotel os donos de hotel ou fornecedores de posada ou alimentos.

Quer dizer, os hospedeiros e o ACC falava nos estalajadeiros, mas essa expressão não mais aparece no NCC, porque as estalagens, não mais existem, mas os hospedeiros e a todos que se assemelhem a eles, como os moteleiros.

E os donos de estabelecimentos que concedem pousada ou alimentos, tem o penhor sobre as bagagens dos objetos pessoais dos hóspedes ou de seus consumidores ou fregueses, para garantir o pagamento das diárias ou dos bens consumidos.

Quando nos hospedamos num hotel automaticamente as nossas bagagens e bens pessoais estão empenhados, em favor do dono de hotel, como garantia do pagamento das diárias e despesas ali feitas.

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Muitos brasileiros não sabem disso! O dono do hotel pode reter as bagagens dos hóspedes se estes não pagarem as diárias no momento de se retirarem do hotel.

Não é nenhum ato arbitrário ou violento como muitos hóspedes imaginam, e alguns chegam a chamar a policia imaginado que o hospedeiro está cometendo um ato ilegal.

Quando ao contrário, é o exercício regular de um direito legitimo, porque as bagagens estão empenhadas. É claro que o dono do hotel não pode simplesmente ficar com as bagagens do hospede, incorporando-as ao seu patrimônio.

Ele terá que promover aquilo que se chama a homologação de penhor legal que é um procedimento judicial disciplinado no CPC, é um dos exemplos de jurisdição voluntária.

O dono do hotel terá que tirar a nota das despesas, anexar a tabela de preços, e requerer ao juiz a homologação do penhor legal. O juiz manda citar o devedor que é o hospede, para que ele diga as razões porque não pagou ou para que ele pague.

Não acolhendo as razões do hóspede, o juiz mandará que se aliene as bagagens e objetos do hospede em leilão. Do produto da alienação, o hospedeiro retirará o seu crédito e o que sobejar será entregue ao hóspede.

Isso tudo está disciplinado no CPC, isso esclarece alguns comportamentos que o leigo não entendem bem. Reparem que quando nos hospedamos num hotel, a 1ª coisa que o dono quer saber, é se temos bagagens.

E isso o deixa mais tranqüilo. Em 2º lugar reparem que nenhum hotel deixa o hóspede no momento de sair do hotel, levar as próprias bagagens, o que faz o hospede pensar que é uma gentileza.

Dizem sempre que o funcionário irá apanhá-las no quarto, e quando as apanham,colocam próximo à portaria sob os olhos do dono do hotel, para esperar o hóspede pagar a conta.

E se o hóspede não paga, imediatamente o dono manda o seu funcionário levar as bagagens para um quarto fechado. E isso acontece também com todos os objetos pessoais como jóias e dinheiro.

Porque tudo isso está em penhor legal em favor do dono do hotel, ou do estabelecimento onde se alberga ou fornece alimentos. É o que diz o art. 1467.

A 2ª hipótese de penhor legal é a que se confere aos locadores sobre os móveis do locatário, como garantia do pagamento dos aluguéis e encargos.

Se o locatário não paga os aluguéis, o locador pode se valer de seus móveis e seus bens pessoais, fazendo exatamente igual ao hospedeiro, tem que promover a homologação do penhor legal.

É interessante notar que essa garantia não se estendeu à locação do imóvel urbano, regida pela lei 8245/91. Esse penhor legal em favor dos locadores é praticamente inexistente.

Só se aplicaria as hipóteses de imóveis urbanos que não estejam subsumidas à lei do inquilinato. Ao tratar das garantias da locação, a Lei do

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Inquilinato não incluiu o penhor legal, que talvez para os locadores isso seria a melhor solução.

Mas a LI não o incluiu, porque imaginou que isso suscitaria conflitos até violentos, dificilmente um locatário, não reagiria ao fato de não poder tirar seus móveis, panelas e roupas de dentro de casa.

O relacionamento entre locadores e locatários, sempre foi um pouco hostil e se ainda houvesse o penhor legal, o legislador ficou temeroso que isso desaguasse freqüentemente nas delegacias, nos hospitais e quem sabe, nos cemitérios!

Mas à luz do NCC há um penhor legal em favor dos locadores e que recaem sobre os móveis dos locatários. Reparem que o art. 1471 diz: “Tomado o penhor requererá o credor, ato continuo a sua homologação judicial”.

E essa homologação judicial, está regulada nos arts. 874 a 876 do CPC. O devedor pode evitar esse penhor legal e a sua homologação, prestando caução idônea, que obviamente substituirá o penhor.

A seguir o NCC disciplina aquelas hipóteses de penhores especiais, começando pelo penhor rural. A 1ª característica do penhor rural, é que ele poderá recair sobre imóveis, e por isso se constitui através de instrumento público obrigatório, e o registro desse penhor, se fará também obrigatoriamente no RGI.

Ele fica averbado à margem da matricula do imóvel. O que também caracteriza esses penhores é a possibilidade de se extrair uma cédula pignoratícia que representa esse penhor, é como se fosse o contrato do penhor.

Ele não é 1 contrato, terá que ser lavrado escritura pública, ele é um resumo do contrato, representa um contrato por isso se chama cédula pignoratícia.

Aliás essa expressão pignoratícia vem de pignus que era como se chamava o penhor em Roma. Até hoje permanece essa expressão. Qual a vantagem dessa cédula pignoratícia?

É que é de grande interesse prático para as partes, e essa cédula tem que conter os requisitos essenciais para o contrato de penhor, ou seja, o valor da dívida, o bem empenhado, o vencimento, a forma de pagamento, os indexadores de correção.

Tudo isso constará da cédula pignoratícia que representa o penhor, a vantagem é que essas cédulas se equiparam à títulos de crédito e o credor poderá endossá-las fazendo-as circular no mercado, isso trouxe uma grande mobilidade econômica ao mercado.

O credor pode realizar antecipadamente o seu crédito, endossando a cédula à 3º que se interesse em adquirir esse crédito.

Então, se o credor estiver precisando de dinheiro e não puder aguardar o vencimento da obrigação, ele pode endossar essa cédula à um 3º, que comprará o seu crédito, evidentemente com deságio. Com isso se rompe o princípio da relatividade dos contratos, ou seja, o contrato de penhor especial, ele circula livremente no mercado com qualquer título de crédito, mediante endosso.

Também estabelece o NCC, um prazo máximo para os contratos de penhor rural, 3 anos para o penhor agrícola e 4 para o pecuário, porque há 2

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espécies de penhor rural.

O penhor rural pode ser agrícola e o prazo máximo é de 3 anos ou pecuário de 4 anos, mas admite o NCC a sua prorrogação, averbando-se à margem do RGI a prorrogação que tem que resultar do consenso das partes.

Também se assegura ao credor o direito de examinar o estado que se encontram as coisas empenhadas, o estado da plantação, da colheita, da criação. O art. 1442 elenca quais os bens que podem ser objetos de penhor agrícola.

Que são máquinas e instrumentos de agricultura, colheitas pendentes ou em vias de formação, frutos acondicionados ou armazenados, lenha cortada e carvão vegetal, animais do serviço ordinário de estabelecimento agrícola.

Não confundam com o penhor pecuário, aqui são os animais que tem uso ordinário na atividade agrícola como por ex: o cavalo que puxa a charrete. Tudo isso se inclui no penhor agrícola inclusive colheitas pendentes ou em vias de formação, o quer dizer, mal feita a plantação.

Portanto é tudo que diga respeito à produção agrícola do devedor o que servirá de garantia ao seu credor, isso é muito usado nos meios rurais.

Os agricultores brasileiros geralmente não tem capital de giro para financiar a sua plantação a sua colheita e é freqüentíssimo que obtenham empréstimos dando em garantia em penhor a própria colheita, os próprios implementos agrícolas.

O penhor pecuário segue as mesmas regras e o NCC diz quais são os bens que podem ser objetos de penhor pecuário, são os animais que integram a atividade pastoril, agrícola ou de laticínio.

As vacas leiteiras podem ser objetos de penhor pecuário é claro que empenhados os animais, não poderá o devedor aliená-los a não ser com expressa concordância do credor e mediante substituição dos mesmos.

Também o devedor terá que substituir os animais empenhados que tenham morrido, da mesma maneira pode se emitir a cédula pignoratícia ao penhor pecuário que também pode ser endossada.

O Outro penhor especial é o penhor industrial e mercantil que se difere do rural porque agora recai sobre máquinas, instalações industriais.

Uma novidade do NCC é o penhor de direitos e títulos de crédito, que está regulado no art. 1451 e seguintes, e o penhor de veículos, são 2 novidades. O penhor de veículos a rigor, não se justificava porque veículos são coisas móveis.

Mas é que os veículos têm tanta utilidade em certos casos valor econômico relevante, que se justificam a disciplina própria inclusive quanto à questão do registro de órgãos de controle que são os DETRANS.

Também é possível emitir cédula pignoratícia no penhor de títulos e de veículos que será sempre obrigatoriamente, averbado nos órgãos próprios. Só se admite o penhor de veículos para prazo máximo de 2 anos, prorrogável uma única vez, pelo mesmo prazo.

E o devedor não pode alienar o veículo sem a expressa autorização do credor e por isso é que esse penhor é averbado no Detran, os documentos de propriedade do veículo para proteger o adquirente de boa-fé.

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No certificado de propriedade do veículo, constará obrigatoriamente que ele é objeto de penhor para que, eventual adquirente não venha a ser surpreendido pela excussão do bem posterior à aquisição.

O ACC após disciplinar o penhor, tratava da anticrese, porque essa era a ordem que o direito romano seguia. 1º criou-se o penhor depois a anticrese e só muitos séculos depois surgiu a hipoteca.

2.3. DA ANTICRESE:

O NCC mudou a ordem, porque a anticrese não figurava no projeto original pelo seu desuso. Em razão disso o redator do livro de direito das coisas, Prof. Herbert Chamoun, achou melhor eliminar a anticrese.

Nos debates parlamentares, houve emendas apresentadas salvando a anticrese, e por isso ficou após a hipoteca. Ela foi salva no último momento, como uma opção a mais.

O que distingue o penhor da anticrese, é que, enquanto o penhor como regra geral recai sobre coisas móveis, a anticrese é privativa dos imóveis. Não é possível dar ao credor em garantia anticrética, um veículo, uma coisa móvel.

É sempre necessariamente um imóvel, essa é a 1ª diferença. Mas qual seria a diferença entre a anticrese e a hipoteca? Porque com o penhor é fácil perceber, enquanto o penhor recai sobre coisas moveis, a anticrese recai sobre coisas imóveis.

Mas a hipoteca também recai sobre imóveis como regra geral, embora excepcionalmente, possa recair sobre bens móveis como navios e aeronaves. Não haveria então, diferença entre a anticrese e a hipoteca já que em ambos os casos o objeto é o imóvel.

Mas há diferença e marcante! É que na hipoteca, o que garante o credor é o valor do imóvel, se o devedor não pagar a obrigação, o credor excutirá o imóvel levando-o à praça.

O imóvel é alienado judicialmente, para que do produto da arrematação se retire o crédito, devolvendo-se ao devedor o que sobrar. Portanto a garantia do credor é representada pelo próprio imóvel, o seu valor.

Mas na anticrese o que garante o credor são os seus frutos civis o credor apropriar-se-á dos frutos civis compensando com o seu crédito até abatê-lo inteiramente.

Não é o valor da coisa que garante o credor, e sim os seus frutos e rendimentos que serão apropriados pelo credor, abatendo-se a dívida, até que ela seja extinta. Assim por ex: se dou um apartamento meu em garantia anticrética ao meu credor, ele receberá os aluguéis que irá deduzindo o seu crédito, até liquidá-lo.

É por isso que há outra diferença marcante, enquanto o credor hipotecário pode levar o imóvel hipotecado à praça, alienando-o judicialmente, o credor anticrético não pode fazê-lo. Não há como se levar à praça, o imóvel que está garantido o crédito em anticrese.

O credor já tem que saber que não poderá pracear o imóvel, e é por isso que a anticrese caiu em desuso, isso retira muito a efetividade da garantia. O credor não se sente garantido, não podendo levar o imóvel à

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praça.

Perguntarão vocês: Mas se no prazo da obrigação e conseqüentemente da anticrese, não se lograr completar o pagamento da dívida? Imaginemos que o imóvel tenha ficado desocupado, imaginemos que o locatário não tenha pago os aluguéis, que seriam alocados ao pagamento da dívida, em suma: Venceu-se a obrigação, decorreu o prazo da anticrese e ainda há um saldo remanescente em favor do credor.

Digamos que a divida era de R$ 100,000,00 e só foram apropriados R$ 70.000,00 de frutos civis desse imóvel, restando R$ 30.000,00, que garantia terá o credor se ele não pode como lhes falei, levar o imóvel à praça?

Mas ele terá a garantia representada pela retenção do imóvel, o credor poderá reter o imóvel para um prazo máximo de 15 anos que se reduziu muito, pois no ACC era de 30 anos, para que durante esse período, completasse o pagamento da obrigação.

Findo esses 15 anos, (art. 1423) se não tiver sido completado o pagamento da dívida, azar do credor! A garantia se esvai, embora nada impeça que se constitua uma nova anticrese, mas aí terá que ser um novo contrato.

Isso cai muito em prova; essa diferença, essa informação de que o credor anticrético não está legitimado para levar o bem à praça só lhe restando o direito de retenção.

Há 2 sistemas para se operacionalizar a anticrese. No 1º sistema o devedor transfere ao credor, a posse do imóvel como se fosse um penhor, o credor passa a ser o possuidor direto do imóvel anticrético, passando a administrá-lo diretamente.

É o credor que estará legitimado para alugar o imóvel, receber os aluguéis, dar quitação, ele pode despejar o locatário que não paga o aluguel, em suma: praticar todos os atos necessários à realização dos frutos, inclusive está legitimado para figurar como locador, no contrato de locação.

Ele é o próprio locador, se no contrato anticrético se transferiu a ele a posse direta, e se ele é o locador é ele quem está autorizado para receber, dar quitação e despejar o locatário.

Esse contrato anticrético como se refere à imóvel, é obrigatoriamente celebrado por instrumento público, TERÁ QUE SER REGISTRADO NO RGI, pois se trata de 1 ônus real.

E se o devedor for casado, dependendo agora do regime de bens, o cônjuge terá que anuir porque se trata de ônus real que recai sobre o imóvel. No ACC independia do regime de bens.

SE O CASAMENTO FOR COM ABSOLUTA SEPARAÇÃO DE BENS, O MARIDO PODE DAR O SEU IMÓVEL EM ANTICRESE INDEPENDENTE DA ANUÊNCIA DO CÔNJUGE QUE SÓ A ELE PERTENCE.

E aí o credor passa a ser o possuidor direto do imóvel anticrético, podendo administrá-lo como se seu fosse. Esse sistema tem uma grande vantagem sobre o credor, ele lhe dá muito maior segurança.

Porque é o credor quem vai recebendo diretamente os frutos e abatendo-os da dívida. Essa é a grande vantagem desse 1º sistema que é o mais usado nos poucos casos de anticrese.

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Isso dá mais garantia ao credor, já que a anticrese não entusiasma os credores, mas com essa garantia de ser o próprio credor que irá administrar o imóvel recebendo diretamente seus frutos e rendimentos, fortalece muito o credor.

Mas tem um grande inconveniente, o credor terá que se envolver com o locatário, que nem sempre é bom, é trabalhoso. O credor vai ter que celebrar contrato de aluguel, receber, cobrar etc.

Como se não bastasse, há um outro inconveniente nesse sistema é que o credor passa a responder por danos que o imóvel venha a sofrer por culpa sua ou dos locatários que ele admitiu.

O credor tem que conservar o imóvel, realizar obra de manutenção, o que também desencoraja os credores, que embora atraído pela maior garantia do sistema, acabam desistindo pelo trabalho e o desafia que esse sistema representa.

O outro sistema permite que a posse permaneça com o devedor que a cada mês prestará contas ao credor, aí é o próprio devedor que aluga o imóvel que celebra os contratos, recebe os aluguéis dá quitação, despeja os locatários, cabendo-lhe apenas a cada mês prestar contas entregando ao credor os frutos percebidos.

Claro que isso enfraquece a posição do credor porque nem sempre essas informações ou contas do devedor, são verídicas, pode haver uma fraude. O devedor diz que recebeu menos de aluguel que efetivamente recebeu, pode combinar com o inquilino receber para fora, aluga para 100, mas dá recibo de 80!

O que é desvantagem de um sistema é a vantagem do outro, e vice versa. O 1º sistema dá maior garantia ao credor, mas lhe dá muito trabalho, o 2º sistema não lhe dá trabalho algum, mas diminui a garantia.

As partes são livres para decidir a esse respeito, a lei não impõe nem um sistema nem outro, cada um resolve como melhor lhe aprouver. Também nada impede que o mesmo imóvel, seja dado em garantia anticrética ou hipotecaria ao mesmo credor, ou a outro credor.

Por ex: o devedor pode dar ao mesmo credor, um imóvel em anticrese e hipoteca, para quê? Para que o credor vá abatendo as dívidas com os frutos civis.

Mas se eventualmente vencida a obrigação, esses frutos não forem suficientes, remanescendo um saldo devedor, o credor ao invés de reter o imóvel, executará a hipoteca.

Ele aí passa para a 2ª garantia, há uma duplicidade de garantias que a lei não veda. Só excepcionalmente a lei veda a duplicidade, como é o caso da lei do inquilinato.

A LI elenca 3 modalidades de garantia que o locador poderá exigir do locatário, mas ele terá que escolher uma das 3, jamais poderá cumulá-las. Há uma vedação expressa quanto a isso.

No mais nada impede que o credor se assegure com quantas garantias quiser, e aí está um ex: o credor pode exigir do devedor que tem um imóvel, esse imóvel em anticrese e em hipoteca.

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Se até o vencimento da dívida os frutos civis forem suficientes para liquidá-la, a hipoteca também se extingue ao contrário houver um saldo, o credor executará a hipoteca.

Também nada impede que sejam a credores diferentes, um credor pode ter o imóvel em anticrese e o outro em hipoteca. É evidente que eles têm que saber, pois em ambos os casos terá que estar registrado no RGI. Se eu aceitar a hipoteca estando o imóvel que me foi hipotecado dado em anticrese à outro, sei que ao executar a hipoteca quem adquiriu o imóvel terá que respeitar a anticrese, é direito oponível erga omnes.

Como a anticrese é direito real de garantia e esses direitos reais são dotadas de seqüelas e são oponíveis erga omnes, levado a praça o imóvel que está também hipotecado, o adquirente não pode ignorar que há uma anticrese, terá que respeitá-la.

Por isso não é muito provável que se consiga alienar esse imóvel em praça pública, mas a lei não veda essa possibilidade de dupla garantia. O que pode ocorrer é que se liquide a anticrese como produto da alienação hipotecaria, quando isso é possível.

Quando o saldo da dívida garantida pela anticrese é pequeno, tira-se do produto da alienação hipotecaria o suficiente para liquidar também a anticrese, e com isso o adquirente do imóvel, receberá a propriedade plena, livre.

Respondendo ao aluno: O § 2º do art. 1506, está sendo questionado, esse dispositivo diz: “ quando a anticrese recair sobe bem imóvel” há quem diga que a anticrese é possível por ex: sobre um veículo, isso confronta com o art. 1506.

O art. 1506 que define o que é anticrese diz: “Pode o devedor ou outrem para ele com a entrega do imóvel ao credor ceder-lhe o direito”. Na verdade foi um equívoco de redação, deve prevalecer não só a tradição desde os romanos, como a redação do artigo 1506.

Porque senão diria um bem, se o NCC admitisse a anticrese sobre bens móveis, ao invés de imóvel. De fato foi um defeito de redação, jamais poderia ter dito “quando recair sobre imóvel” o que leva a crer que poderia não cair sobre imóvel.

Com isso também examinamos a anticrese, como vocês vêm é justificável o pouco uso da anticrese, porque não é uma garantia eficaz, além de gerar mil e um problemas para o credor, quando a posse do bem lhe é transferida.

2.4 DA HIPOTECA:

Desses 3 direitos reais de garantia, a grande vedete é a HIPOTECA, talvez seja o mais praticado, embora o penhor também o seja, mas há uma diferença, é que o penhor fica restrito as obrigações de pequeno valor econômico.

Já nas obrigações de maior vulto econômico, os credores preferem a hipoteca. O penhor pignoratício mais conhecido no Brasil é a CEF que tem toda uma carteira exclusivamente dedicada à empréstimos de dinheiro, garantidos para penhor.

Quando a obrigação não é de muito valor o credor se contenta com o penhor,

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mas quando é de maior valor ele vai querer uma hipoteca porque os imóveis tradicionalmente, tem maior valor.

A hipoteca dos 3 direitos clássicos de garantia é a mais procurada e a sua característica é que ela recai sobre bens imóveis ao contrário do penhor.

Mas assim como acontece com o penhor que excepcionalmente pode recair sobre imóveis, a hipoteca excepcionalmente pode recair sobre bens móveis, como é o caso dos navios e das aeronaves.

A grande diferença entre o penhor e a hipoteca, é que no penhor a posse da coisa empenhada é transferida ao credor, e aí é que está a sua verdadeira garantia, mas na hipoteca, a posse do imóvel hipotecado a posse permanece como devedor.

Na hipoteca não se transfere ao credor nem a propriedade nem a posse do imóvel hipotecado. Dirão vocês então qual a garantia do credor? A garantia do credor é o registro da hipoteca no RGI e isso inibe a sua alienação, não impede, mas inibe.

Nada impede que o devedor aliene o imóvel hipotecado, o NCC tem um dispositivo interessantíssimo, que não constava do ACC, que diz que é nula a cláusula que impeça ao devedor de alienar o imóvel hipotecado.

Embora o NCC admita uma cláusula, que diga que se o devedor resolver alienar o imóvel hipotecado considera-se antecipadamente vencida a dívida.

Isso se admite, mas será nula uma cláusula que vede peremptoriamente que o devedor, aliene o imóvel hipotecado.

De todos os 3 direitos reais de garantia clássicos, a hipoteca é o mais recente. Os romanos 1º idealizaram o pignus, o penhor depois inventaram a anticrese, e só muito depois surgiu a hipoteca.

A grande distinção entre a hipoteca e o penhor, é que em 1º lugar o penhor como regra geral, recai sobre coisas móveis embora excepcionalmente possa recair sobre imóveis.

Enquanto que a hipoteca como regra geral recai sobre as coisas imóveis, e excepcionalmente sobre coisas móveis. A 2ª grande diferença entre o penhor e a hipoteca é que no penhor, salvo raras exceções, a posse da coisa empenhada se transfere ao credor.

Portanto o devedor demite-se da posse, e a transfere ao credor que passa a ser o possuidor direto da coisa empenhada, enquanto que na hipoteca a posse do imóvel hipotecado continua com o devedor.

Na hipoteca não se transmite nem a posse nem a propriedade. Uma outra diferença entre a hipoteca e a anticrese, porque tanto a anticrese quanto a hipoteca referem-se à imóveis.

Mas já lhes disse na aula passada que na hipoteca o que garante o credor é o valor do imóvel, e não sendo paga a obrigação, o credor poderá excutir o imóvel levando-o à praça.

Enquanto que na anticrese não há esse direito, o credor anticrético não pode levar o imóvel à praça, só lhe restando direito de retenção, pelo prazo máximo de 15 anos.

A hipoteca também pode ser convencional ou legal. A convencional é aquela estabelecida livremente, entre o credor e o devedor para garantir o

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pagamento da obrigação.

Mas há casos em que a lei faz recair sobre imóveis de determinadas pessoas, uma hipoteca em favor de outras e a isso se chama hipoteca legal, que é a estabelecida obrigatoriamente por lei, em favor de determinadas pessoas.

Essa hipoteca convencional como se refere a imóveis, tem que ser estabelecida como instrumento público obrigatoriamente, a escritura pública é da essência, da substância da hipoteca.

Como se não bastasse e referindo-se à imóvel, a hipoteca também exige a anuência do cônjuge do devedor, dependendo do regime de bens. É claro que na separação absoluta, se o imóvel hipotecado é do marido, não será necessária a anuência do cônjuge.

Mas fora isso se o bem é comum, a hipoteca terá que contar com a anuência do cônjuge. Também como se refere à imóvel terá que ser registrado no RGI, para que tenha força contra 3ºs.

Como se trata de um contrato de garantia, esse contrato de hipoteca também chamado de cédula hipotecária, tem que discriminar a dívida minuciosamente, tem que constar o valor da obrigação garantida, o seu vencimento, modo de pagamento, as taxas de juros, os índices de correção, as multas moratórias.

Tudo isso tem que estar referido no contrato de hipoteca, e mais do que isso, é preciso constar também a descrição minuciosa do imóvel hipotecado, suas metragens confrontantes. Ao contrário do que muitos imaginam, nada impede que o imóvel hipotecado, pertença à 3º que não seja o devedor.

A regra geral, é que o imóvel hipotecado, pertença ao devedor, mas nada impede que um 3º voluntariamente ofereça um imóvel seu, em hipoteca para garantir o pagamento de uma obrigação da qual ele não é o devedor. E isso não se confunde com fiança, esse 3º não é fiador do devedor, ele apenas está fornecendo um imóvel que garantirá o pagamento.

É preciso coragem! Oferecer um imóvel seu em hipoteca a um credor de outra pessoa, mas a lei permite é o princípio da disponibilidade dos bens. O pai por ex: pode entregar um imóvel seu em hipoteca, para permitir que o filho obtenha um financiamento, um empréstimo.

O filho não tem imóvel e o credor só lhe empresta o dinheiro se ele der um imóvel em hipoteca, então pai para ajudar um filho pode dar um imóvel seu, para garantir a dívida do filho. O NCC começa especificando quais seriam os bens que podem ser objetos de hipoteca. Em 1º lugar os imóveis e seus acessórios, embora não seja obrigatório que os acessórios, sejam abrangidos pela hipoteca.

Pode-se hipotecar o solo e não os acessórios, as acessões, mas isso terá que ficar expressamente discriminado, no silêncio do contrato de hipoteca, ela recai sobre os acessórios do solo.

Se hipoteco uma fazenda, presume-se que o ônus recaia sobre seus arados, seus tratores, seus currais e tudo mais que for acessórios do solo. Em 2º lugar o domínio direto, e o domínio útil o que evidentemente é da enfiteuse.

Vocês sabem que domínio direto é o que remanesce nas mãos do proprietário, do aforador. E o aforador pode entregar o domínio direto em hipoteca a um

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credor seu, sem que isso afete o foreiro.

Da mesma maneira o foreiro pode hipotecar o seu domínio útil que a ele pertence. Tanto o domínio direto quanto o domínio útil, podem ser objetos de hipoteca. O NCC silencia quanto à superfície.

E há uma explicação talvez, é porque no domínio útil e no direto a enfiteuse é perpétua enquanto que na superfície é temporária, talvez por isso o legislador não incluiu a superfície entre os bens que poderiam ser objetos de hipoteca.

Uma forte corrente doutrinária entende que é possível pelo prazo que durar a superfície, ou seja, se fiz um contrato de superfície para10 anos, posso hipotecar a superfície, digamos para garantir uma dívida de 2 anos.

Também podem ser objetos de hipoteca as estradas de ferro, e isso inclui as estações, os equipamentos como: as locomotivas, os vagões, os trilhos tudo que se exige para o funcionamento de uma estada de ferro, pode se dar em hipoteca.

Inclusive se diz que em caso de hipoteca de estrada de ferro, o registro se fará na estação inicial da estrada. Também podem ser dados em hipoteca, os recursos naturais a que se refere o art. 1230 independente do solo, ou uma jazida de mármore, uma mina de ouro.

A mina e a jazida podem ser objetos de hipoteca independente do solo, estou hipotecando a jazida de mármore mas não o solo em que ela está inserida.

E FINALMENTE OS NAVIOS E AS AERONAVES QUE CONSTITUEM AS EXCEÇÕES PORQUE SÃO BENS MÓVEIS. A RIGOR NAVIOS E AERONAVES DEVERIAM SER OBJETOS DE PENHOR E JAMAIS DE HIPOTECA, MAS AS CARACTERÍSTICAS DOS NAVIOS E AERONAVES, AS SUAS ESPECIFICIDADES, EXIGEM QUE SE ABRA ESSA EXCEÇÃO.

Em 1º lugar, pelo valor dos bens móveis muito superior ao da maioria dos imóveis. Um transatlântico que é uma verdadeira cidade valem todos os apartamentos da Vieira Souto somados.

Para outro lado o volume físico desses bens, tornaria quase impossível que os credores ficassem com a sua posse. Onde o banco guardaria o QUEEN MARY II se lhe fosse dado em penhor?

Seria um problema seriíssimo para o credor, arranjar um lugar para guardar esses bens que foram dados em garantia, em penhor e há uma outra razão, esses bens quando parados, porque o credor no penhor não pode usar os bens, ele se deteriora, não produzam receita.

O próprio credor tem o maior interesse que o devedor continue usando o navio, a aeronave para gerar receita. Essas 3 razões levaram o legislador em boa hora, a abrir essa exceção e permitir a hipoteca sobre navios e aeronaves.

Por isso muito aluno acha que navio e aeronave são bens imóveis, não é não! é bem móvel, mas chamam-se peculiares, porque são bens móveis mas com algumas características dos imóveis. E entre elas aí está uma, eles podem ser objetos de hipoteca.

E o NCC diz que as hipotecas dos navios e aeronaves será regida para lei especial. Também terá que ser feita para escritura pública e terá que ser levada a registro, a um registro próprio, chamado cartório marítimo onde

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se registram os títulos de propriedade e os gravames que recaiam sobre navios e aeronaves.

O art. 1475 é uma excelente novidade, veio esclarecer uma duvida que sempre remanescia entre os leigos, havia uma tendência entre os leigos de supor que o devedor não poderia alienar o imóvel hipotecado.

Os leigos chegam a vislumbrar um estelionato, um ato ilícito, se o devedor vendesse por ex: ou doasse o bem hipotecado. Porque os leigos têm a tendência de supor que o bem hipotecado passa a pertencer ao credor.

É evidente que não! O devedor continua detentor da propriedade do bem hipotecado e se ele é titular da propriedade, pode aliená-lo, só não pode alienar o que não tem, mas se o devedor tem a propriedade, ele pode alienar.

Mas o ACC nada dizia sobre isso, portanto era muito freqüente que os leigo imaginassem que o devedor hipotecante não poderia alienar o imóvel, o NCC esclareceu isso dizendo que é NULA a cláusula que proíbe ao proprietário alienar o imóvel hipotecado.

Isso seria um intolerável cerceamento do poder de disponibilidade que emana da propriedade, seria uma cláusula abusiva, o credor impedir o devedor de alienar o imóvel hipotecado.

Dirão vocês: Mas isso não prejudica o credor? De jeito algum! Porque como a hipoteca é um direito real de garantia, ele é dotado de seqüela, ele adere ao imóvel e é oponível erga omnes .

Portanto se o devedor não pagar a obrigação, o credor excutirá o bem NAS MÃOS DE QUEM ESTIVER, ele promoverá a excussão do bem, o seu praceamento, a sua alienação judicial, mesmo já pertencendo à 3ºs.

Nós alienamos o que temos e no limite do que temos. O devedor hipotecário tem uma propriedade, mas gravada com a hipoteca, e é isso que ele aliena, uma propriedade limitada, ou seja, gravada pelo ônus da hipoteca.

Quem quiser suportar esse ônus, compra o imóvel, mas sabendo que pode vir a perdê-lo, se o alienante não pagar a obrigação garantida pela hipoteca.

Por isso é que a alienação do imóvel hipotecado, não traz qualquer prejuízo ao credor, ora se não traz prejuízo ao credor porque não reduz a garantia, seria abusiva a cláusula que veda essa alienação.

A doutrina sempre entendeu isso, nunca houve a menor divergência, mas o ACC não dizia, agora está dito com todas as letras que é nula essa cláusula que impede o devedor de alienar o imóvel hipotecado.

O adquirente também não pode alegar boa-fé, se a hipoteca estiver registrada, se não estiver não é oponível a ele, mas se ela está registrada, o adquirente não pode alegar boa-fé, que ignorava porque o registro público é necessário à alienação.

Se você compra um imóvel sem se dar ao trabalho de examinar a sua titularidade no RGI, está cometendo uma negligência imperdoável e deve suportar os prejuízos daí decorrentes.

A mais elementar cautela que se exige de alguém que se prepara para comprar um imóvel, é extrair uma certidão de ônus reais, para saber quem é o titular da propriedade e se ela é plena ou limitada.

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Agora, o § único do art. 1475 permite, entretanto, uma cláusula que considere antecipadamente vencida a obrigação, caso o devedor aliene o imóvel hipotecado, portanto nula é a cláusula que veda a alienação, mas é valida a cláusula que cria um novo caso de antecipação do vencimento.

O que é natural, porque se o devedor vai alienar o imóvel, o lógico é que então aproveite o produto da alienação para pagar a obrigação que está garantida para aquele imóvel.

Antecipando-se o vencimento, se permite que no momento da alienação, já se liquida a obrigação, mas isso também tem que ficar expresso, quero deixar bem claro, o simples fato do devedor alienar o imóvel hipotecado, não acarreta o vencimento antecipado da obrigação, é preciso que isso esteja expressamente previsto no hipoteca.

Esse art. 1475 é importantíssimo e não confundam a cláusula que veda a alienação, com a cláusula que antecipa o vencimento. A 1ª é nula, a 2ª é válida.

Outra característica que os leigos ignoram, é que nada impede que você dê o mesmo imóvel em hipoteca ao mesmo credor ou a credores diferentes, sem o menor problema, isso não é estelionato.

Então você faz uma 1ª hipoteca em favor de José, depois uma 2ª em favor de João, uma 3ª em favor de Maria, outra em favor de José que era o 1º. Em suma: pode fazer quantas hipotecas quiser sobre o mesmo imóvel, em favor do mesmo credor ou de credores diferentes.

Mas é evidente que desde que o imóvel garanta o pagamento em favor de todas essas obrigações. Por ex: tenho uma cobertura na Vieira Souto no valor R$ 3.000.000,00, posso dar essa cobertura em hipoteca para garantir uma obrigação de R$ 100.000,00, uma 2ª para garantir R$ 50.000,00, uma 3ª para garantir R$ 70.000,00.

Tudo isso está incluído no valor do imóvel, só que essas hipotecas sobre o mesmo imóvel, têm que ser obrigatoriamente numeradas. Tem que dizer expressamente: “Dou em 1ª hipoteca”, depois, em “2ª hipoteca”, e tem que inclusive enumerar as anteriores.

Sabem por quê? Porque há uma ordem de prioridade de pagamento, é óbvio. O 1º credor tem preferência sobre os demais, não se pode executar a 2ª hipoteca, sem que a 1ª esteja paga, a não ser que eu o devedor esteja insolvente.

Se o devedor está insolvente, todas as hipotecas se consideram antecipadamente vencidas, e aí se estabelece o concurso de credores, mas o pagamento é prioritário, 1º se paga ao 1º credor, depois ao 2º e assim sucessivamente.

Inclusive o Registro fará menção ao nº da hipoteca, e o oficial não registrará uma 3ª, sem que as 2 primeiras estejam registradas. Se a obrigação garantida pela 1ª hipoteca estiver vencida, e o credor não promover a cobrança, o 2º credor ou o 3º ou sucessivos, podem depositando o valor da obrigação, executar a sua hipoteca.

Eles têm que garantir as anteriores, prestando caução idônea, depositando o valor. O adquirente do imóvel hipotecado, também pode evitar o praceamento do bem, pagando ao credor a obrigação, e depois regredindo contra o alienante.

Imaginem que eu tenha comprado o imóvel hipotecado, confiando que o

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devedor vai pagar a obrigação, só que para grande surpresa minha, ele não paga, tenho conhecimento que o que me vendeu o apartamento, não pagou a obrigação de seu credor.

Não me interessando que o imóvel seja praceado, poderei pagar essa obrigação ao credor, como 3º interessado e depois regredirei contra o alienante.

É um caso de sub-rogação automática, o adquirente do imóvel hipotecado que paga a obrigação do alienante ao credor hipotecário, se sub-roga automaticamente nos direito do credor hipotecário.

Também assegura o NCC o direito do adquirente do imóvel hipotecado, abandonar o imóvel ao credor, pode não interessar mais ao adquirente o imóvel, ele pode abandonar, é o que diz o art. 1479.

Como se trata de 1 direito real, veda-se peremptoriamente o pacto comissório, o que significa dizer que o credor hipotecário, não pode em hipótese alguma, incorporar o imóvel ao seu patrimônio, pelo simples fato do devedor não ter pago a obrigação.

Isso é impossível, o credor não pode incorporar o imóvel ao seu patrimônio, alegando que o devedor não cumpriu a obrigação. Já lhes expliquei porque que o direito brasileiro, impede o pacto comissório, obrigando o credor a excutir o bem, a promover a alienação judicial do bem.

É para tornar a execução menos onerosa para o devedor, porque levando-se um bem a leilão ou a praça, sempre haverá a possibilidade de se obter um lance de valor superior a dívida, e nesse caso o excesso será devolvido ao devedor.

Ora, se o credor pudesse incorporar o bem diretamente ao seu patrimônio sem lhe promover a execução, jamais haveria excesso, jamais haveria a diferença.

Na hipoteca o credor tem que promover a execução hipotecaria, e como se trata de uma ação real referente à imóvel, é obrigatória a citação do cônjuge do réu.

Essa ação de execução termina com o praceamento do imóvel e cabe ao CPC, disciplinar como isso ocorrerá. O NCC apenas estabelece as regras materiais sobre a hipoteca. O procedimento para se excutir o imóvel é do CPC.

E cabe ao CPC disciplinar como isso ocorrerá, o NCC apenas estabelece as regras materiais sobre a hipoteca, o procedimento por excutir o imóvel é o do CPC, o NCC se limita a dizer que o credor é obrigado a levar o imóvel à praça.

Há hipóteses em que o imóvel pode perfeitamente incorporar-se ao patrimônio do credor, o que a lei veda é que ele o faça diretamente, mas é possível a adjudicação do imóvel.

A adjudicação é um ex: de que o imóvel acaba incorporando-se ao patrimônio do credor, porque o devedor não pagou, como isso ocorre? É quando a avaliação do imóvel que é obrigatoriamente feita antes de proceder-se à praça, o juiz manda avaliar o imóvel.

Avaliação judicial é feita por avaliador judicial e aí a avaliação estabelece um valor inferior a dívida, ou seja, a dívida é de R$

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100.000,00 e o avaliador diz que vale R$ 80.000,00.

Ora, a experiência forense mostra que nessas praças raramente se obtém o valor de mercado do imóvel, todos sabem disso! É difícil conseguir o valor real, quanto mais o valor acima do de mercado do imóvel.

Ora se o imóvel está avaliado em valor abaixo da dívida é praticamente um sonho imaginar que vai se obter um lance de valor superior a dívida. É remotíssima a possibilidade de se obter um lance que permita um saldo a favor do devedor.

O que pode fazer o credor? E não é obrigado a fazer isso, é uma opção do credor, ele adjudica o imóvel, mas aí é obrigatório a quitar a dívida, se ele aceitar o imóvel para valor inferior a dívida, ele é obrigado a dar quitação.

Não pode pretender depois cobrar a diferença, porque aí é para não prejudicar o devedor, porque o devedor poderia dizer, que se o imóvel fosse a leilão, talvez chegasse aos R$ 100.000,00!

Se o credor optar pela adjudicação, é só é possível a adjudicação se a avaliação for inferior a dívida, o credor terá que quitar o devedor não podendo lhe cobrar a diferença.

Agora, nada impede que o credor prefira levar o imóvel à praça, obter um lance maior, e aí sim, poderá cobrar a diferença, só que agora como credor quirografário.

O credor tem 2 opções, quando a avaliação é inferior ao valor da obrigação, adjudicar o imóvel dando quitação ao devedor, ou levá-lo a praça, recolher o que for possível obter, e cobrar a diferença como credor quirografário.

O que garante o credor é o valor do imóvel, por isso é que se avalia o imóvel antes de levá-lo à praça, e também na escritura de hipoteca, esqueci de dizer, tem que obrigatoriamente constar uma avaliação previa do imóvel, que não precisa ser feita para avaliador judicial.

O próprio credor e o devedor com a experiência de mercado, atribuem ao imóvel um valor na escritura de hipoteca, mas isso não quer dizer que é obrigatório, porque o valor que vai presidir a praça é o da avaliação judicial, antes que ela se realize.

Nessa 1ª praça, não se admite a alienação para valor inferior à avaliação, então se ela é de R$ 80.000,00, não se admitirá nenhum lance que seja inferior a esse valor.

Aí realiza-se uma 2ª praça (isto tudo está no CPC), e se dizia antigamente que se podia arrematar para qualquer valor. Isso levava o leigo a supor que poderia dar R$ 1,00 para um imóvel que vale R$ 100.000,00.

O CPC atual diz que mesmo em hasta pública, não se pode alienar para preço vil e preço vil, é o inferior a 50% ao valor de mercado. Na 2ª praça, o imóvel vale R$ 80.000,00, o lance maior que se conseguiu foi de R$ 30.000,00.

A alienação seria nula se o juiz homologar isso, porque o preço é vil, sabe o que resta ao credor? Resta reter, prorrogar a hipoteca, o que pode fazer para mais 20 anos até que o imóvel se valorize, ou então pede um reforço de garantia.

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Se o imóvel não alcança o valor, o credor pode prorrogar a hipoteca e o NCC fala no prazo de 20 anos.

Uma outra hipótese em que o credor pode ficar com o imóvel, (a 1ª é com a adjudicação) a 2ª é exercendo o direito de preferência. O credor terá um direito de preferência sobre o 3º arrematante.

Digamos que um estranho ofereceu R$ 110.000,00 pelo imóvel que garante uma divida de R$ 100.000,00. Aí o imóvel interessa ao credor para alguma circunstância, só que aí terá que devolver R$10.000,00 ao devedor.

Para não prejudicar ao devedor, mas é um direito de preferência do credor, arrematar o imóvel, pelo maior lance, ele pode ter um interesse especial pelo imóvel, para morar, instalar ali um negócio.

Por isso é que o juiz só homologa a praça, depois de expirado o prazo de até 24 horas depois da praça, para que o credor manifeste o seu direito de preferência. É o que diz o § único do art. 1480 do NCC. São 3 figuras que aparecem muito na execução, hipotecaria. É a adjudicação do bem, a arrematação do bem pelo credor pelo direito de preferência ou a remição.

O que significa remir a hipoteca? É quando o executado ou 3º antes da praça, deposita o valor da dívida. Suspende-se imediatamente a praça, não há nenhum interesse em levar o imóvel à praça, se já foi paga a obrigação.

Isso é que se chama remir a hipoteca, mas tem que ser feita até o momento da realização da praça. Essas são as observações sobre a hipoteca convencional, e eu os remeto ao CPC onde com muito maior detalhamento, se estabelece esse procedimento todo.

A minha experiência diz que isso tudo é uma dolorosa via crucis, é o que os credores internacionais chamam de custo Brasil, e pode levar 4 ou 5 anos, até que se consiga levar o imóvel à praça.

Porque a ação de execução tem aquela infinidade de recursos, o devedor pode ir interpondo recursos, e com isso prolongar para quase 5 anos, e nem sempre consegue levantar o produto da arrematação.

Porque como lhes falei antes dos credores hipotecários, há outros credores mais preferenciais, como os empregados pelos seus créditos trabalhistas, a Fazenda, pelos impostos a previdência pelas contribuições atrasadas, o que sobrar é do credor hipotecário.

Por isso é que esses direitos reais perderam muito de seus interesses. Os credores não se sentem mais atraídos para esses direitos para causa de todos esses inconvenientes, dos quais o maior de todos e o da obrigatoriedade de se promover a execução judicial.

Falemos agora, da hipoteca legal, que como lhes falei é aquela imposta para lei, vocês vão observar pela simples leitura desses dispositivos, que essa hipoteca legal é estabelecida sempre, para proteger determinadas pessoas, cujos bens estão confiados à guarda, ou administração de outrem.

A hipoteca legal visa sempre garantir credores de determinadas obrigações, ou então pessoas cujos bens estão confiados à guarda de 3ºs.

Diz o art. 1489: “ A lei confere a hipoteca: I- à s pessoas de direito publico interno sobre os imóveis pertencentes aos encarregados da cobrança, guarda ou administração dos respectivos fundos e rendas”.

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São os auditores, os conferentes em suma, todos aqueles que são responsáveis pelo recolhimento de rendas, ou administração de fundos ou rendas, tem que dar em hipoteca legal os seus imóveis.

Isso é porque se eles se apoderarem de bens públicos cuja guarda lhes competia, a Fazenda Pública se valerá dos imóveis que lhes estão hipotecados.

Em 2º lugar cabe hipoteca legal aos filhos, claro que aos filhos menores, sobre os imóveis do pai ou da mãe, que passaram a outras núpcias, antes de se fazer o inventário do casal anterior.

Se o pai ou a mãe ficou viúva e alienar esses imóveis, podem prejudicar os filhos que são herdeiros, ou então se, se casarem novamente, também diminui a herança porque podem casar num regime de bens, em que o novo cônjuge possa ter participação nesses imóveis.

Enquanto não se fizer o inventário e a partilha, confere-se hipoteca legal em benefício dos filhos do 1º leito, é evidente que depois de feito o inventário e a partilha não há que se falar em hipoteca legal.

III- Ao ofendido ou aos seus herdeiros, sobre os imóveis do delinqüente, se o autor do crime que causou um dano a vítima possuir imóveis esses imóveis estão garantindo o ofendido ou seus herdeiros, quanto ao recebimento da indenização. Os imóveis do autor do crime, ficam legalmente hipotecados a vítima ou aos seus herdeiros, como garantia do pagamento da indenização.

IV- Ao co-herdeiro para garantia do seu quinhão, ou torna da partilha, sobre o imóvel adjudicado ao herdeiro reponente.

Confere-se hipoteca a um dos herdeiros, para garantia de seu quinhão. Isso é na hipótese de 1 dos herdeiros, adjudicar um imóvel do monte, ele comprar o imóvel para ele, e terá que repor em dinheiro a parte dos outros.

Só que ele já comprou o imóvel, já adjudicou que garantia que terão os seus herdeiros, que receberão as suas partes? A garantia é a hipoteca legal, sobre esse imóvel adjudicado.

Enquanto o herdeiro reponente não paga o quinhão dos outros, o imóvel que ele adjudicou fica hipotecado aos demais herdeiros, como garantia de seus quinhões.

A idéia é sempre a mesma que lhes falei garantir determinadas pessoas. Se um dos herdeiros adjudicar um imóvel do inventário, enquanto ele não der em dinheiro a parte dos outros correspondente a esse imóvel, o imóvel fica hipotecado aos demais herdeiros.

E se o reponente não entregar em dinheiro, o quinhão, eles levarão o imóvel à praça.

V- Ao credor do imóvel arrematado, para garantia do pagamento do restante do preço da arrematação. Isso é o seguinte: Sou o credor e promovi uma execução hipotecária, aí um 3º arremata o imóvel, mas não deposita integralmente o preço, enquanto não se complementar o preço, o imóvel fica hipotecado ao credor.

Se o arrematante só depositou 20%, enquanto ele não depositar os 80% restantes, o imóvel fica hipotecado ao credor, que é o autor da ação.

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A seguir o NCC, trata do registro das hipotecas, que são regras administrativas de procedimento registral, toda essa seção III, trata do registro de hipoteca.

Como já lhes falei se há varias hipotecas, elas tem que ser registradas na ordem, c/a numeração de cada uma, o vencimento de cada uma. Por ex: O § do art. 1493 diz que o nº de ordem determina a prioridade, e esta a preferência entre as hipotecas.

Ele não pode registrar uma 2ª sem antes estar registrada a 1ª, não pode executar a 2ª sem antes ter pago a 1ª. As hipotecas legais, também dependem do que se chama especialização de hipoteca legal, que é um procedimento de jurisdição voluntária também disciplinado no CPC.

Há lá um capítulo dedicado à jurisdição voluntária, a especialização da hipoteca legal. O que significa isso? Significa ir ao RGI e declarar quais são os imóveis que estão recaindo a hipoteca legal, isso é o que se chama especializar.

Que é dizer o garantidor é aquele que está obrigado apagar é o caso dos pais, da Fazenda Publica, das vitimas do criminoso. Só que na pratica isso é letra morta.

São muitos raros os casos de especialização de hipoteca legal, voluntariamente ninguém faz isso. Geralmente é a pessoa em favor de quem se estabelece essa hipoteca é que promove a ação para compelir o outro a especializar a hipoteca.

Por isso houve até sugestões de acabar com a figura da hipoteca legal e além disso havia uma hipoteca judicial, essa acabou pela sua inutilidade.

A hipoteca judicial foi extinta no NCC, havia no ACC, era determinada pelo juiz na sentença para garantir o cumprimento da sentença.

Mas houve vozes e bastante atuantes, sugerindo também se extinguir a hipoteca legal deixando que a hipoteca fosse apenas a convencional que é a que normalmente é praticada.

Vejamos as hipóteses de extinção da hipoteca. Em 1º lugar pela extinção da obrigação principal, isso é inerente a qualquer direito real de garantia, da sua própria essência.

Como o nome está dizendo, eles garantem o pagamento de uma obrigação, se ela já foi extinta, não há mais nenhuma utilidade de se manter o direito real de garantia, qualquer que seja a causa da extinção.

Seja o pagamento, a prescrição, a remissão do credor, qualquer que seja a causa da extinção da obrigação principal, acarreta automaticamente a extinção da hipoteca.

II- Pelo perecimento do imóvel, para uma razão óbvia, não há direito sem objeto, se o objeto também pereceu, não há porque se manter vivo o direito. Perecendo o objeto também perece a hipoteca.

Aí meus amigos, é preciso distinguir, no caso de hipoteca de navio ou aeronave pode perecer inteiramente o objeto, navio afunda, avião cai. SE O AVIÃO EXPLODIU AO CHOCAR-SE COM O SOLO, A HIPOTECA QUE SOBRE ELE RECAIA, DESAPARECE.

Mas quando se trata de imóvel propriamente dito, uma casa, o perecimento

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da casa não importa no perecimento do objeto, o solo ainda remanesce, o solo não perece.

Aí não haveria extinção da hipoteca, se a casa que se referia a hipoteca destruiu-se num incêndio, porque remanesce sobre o solo. O que houve então foi uma redução do valor da garantia.

É evidente que o solo puro, não vale tanto quanto o solo com uma acessão, com uma casa. O que pode fazer o credor? Pode notificar o devedor para que reforce a garantia, reconstitua a garantia oferecendo um outro imóvel em hipoteca, ou outro bem em penhor, ou fiança etc.

O credor reduzindo-se a garantia pelo perecimento parcial da coisa pode interpelar o devedor, para que no prazo que lhe for assinalado, reforce a garantia, ou a substitua.

E aí se o devedor não o fizer isso importará em vencimento antecipado da obrigação. A 3ª causa de extinção da hipoteca, é a resolução da propriedade.

Celebrada a hipoteca posteriormente a isso, resolve-se a propriedade. Imaginemos que tenha sido feita a doação de um imóvel a um donatário, que se tornou proprietário desse imóvel em razão da doação. Na qualidade de proprietário, ele dá o imóvel em hipoteca ao credor, só que 6 meses o doador revoga a doação, pela ingratidão do donatário, operou-se a resolução da obrigação, para fato superveniente.

Pela RENÚNCIA do credor evidente a hipoteca é uma garantia, portanto um direito patrimonial e nada impede que o credor para qualquer circunstância resolva renunciar a garantia, convertendo-se voluntariamente em credor quirografário.

É um ato de arrebatada loucura! Mas nada impede porque é matéria disponível, de interesse patrimonial só que essa renúncia há de ser expressa. O simples fato do credor não cobrar ou não executar a hipoteca após o vencimento, não significa que ele está renunciando a garantia.

Poderá fazê-lo enquanto a prescrição não ocorrer, então a renúncia a hipoteca tem que ser expressa, não se pode presumir pela demora do credor em excutir o bem.

Pela REMIÇÃO, se o devedor paga a obrigação, poderá fazê-lo até o momento da 2ª praça aí se extingue a hipoteca, porque aí extinguiu a obrigação principal.

Aí se denota perfeitamente a diferença entre remissão (ss), e a remição (ç), aqui estamos nos referindo a remição c/ç, lá no nº I (art.1499) que diz: “Pela extinção da obrigação”, é remissão (c/ss é sempre perdão), é a que aparece na religião católica na oração do Credo “remissão dos pecados”.

Já aqui no nº V do art. 1499, é remição (ç), e é exatamente o oposto, o pagamento. A remição que representa o perdão do devedor dá origem ao verbo remitir, devedor remitido é o devedor que foi perdoado.

Quando se diz que o credor remitiu o devedor, é sinal que o credor perdoou a dívida. Já remição (c/ç) que representa o pagamento da dívida, dá origem ao verbo remir.

Devedor remido é aquele que pagou, remitido é o que não pagou, mas foi

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perdoado.

Finalmente extingue-se a hipoteca, pela arrematação ou adjudicação. As 2 figuras provocam a extinção. ARREMATAÇÃO é quando é feita para3º em praça publica, ali o imóvel é arrematado, a quem der o maior lanço.(é como está na lei).

Mas também a ADJUDICAÇÃO, sobre a qual já falei que é quando o credor prefere adjudicar o imóvel quitando a obrigação, quando a avaliação é inferior ao valor da obrigação.

A leitura do NCC também mostra todo um sistema que se idealizou para proteger o credor hipotecário. Por ex: se um credor quirografário penhora o imóvel hipotecado, não se poderá levar o imóvel à praça, sem antes notificar-se o credor hipotecário.

Sabem por quê? Para que ele possa exercer o direito de preferência, para que possa habilitar-se. Porque quando o imóvel hipotecado é penhorado para um outro credor ao invés do devedor, considera-se antecipadamente vencida a obrigação.

Você tem que notificar o credor hipotecário de que aquele imóvel vai ser arrematado para um outro credor, porque no momento em que ele for arrematado, 1º vai receber o credor hipotecário.

Então há todo um sistema que visa a proteger o credor hipotecário, por isso é que os credores garantidos para garantia real são chamados credores privilegiados, eles tem o privilegio que a lei lhes confere.

E finalmente o NCC termina com a disciplina especifica das estradas de erro, como já lhes falei, elas abrangem todos os equipamentos de uma estrada de ferro, e o seu registro se fará no RGI do local em que estiver a estação inicial da ferrovia.