diferenciação de produto e segmentação de mercado: · pdf file2 1....

16
1 Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: Casados com Separação Total de Bens? Autoria: Vinícius Silva Pereira, Vidigal Fernandes Martins, Carlos Roberto Souza Carmo Resumo: O objetivo deste trabalho é identificar as relações que separam e unem os conceitos de segmentação de mercado e diferenciação do produto num ambiente de concorrência imperfeita. Analisando os conceitos de diferenciação e segmentação ficou claro a existência de quatro grupos teóricos. Os quatro grupos teóricos são analisados e ao final propõe-se uma classificação destes dois conceitos que se baseia numa perspectiva concorrencial, mais imperfeita e menos restritiva para explicar diferenciação e segmentação em que tanto a diferenciação do produto, como a segmentação de mercado são estratégias não só possíveis, como desejáveis, podendo ser utilizadas simultaneamente. Palavras-chave: diferenciação de produto; segmentação de mercado; estratégias de marketing

Upload: buikien

Post on 07-Feb-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: · PDF file2 1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em estratégia de

 

1

Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: Casados com Separação Total de Bens?

Autoria: Vinícius Silva Pereira, Vidigal Fernandes Martins, Carlos Roberto Souza Carmo

Resumo: O objetivo deste trabalho é identificar as relações que separam e unem os conceitos de segmentação de mercado e diferenciação do produto num ambiente de concorrência imperfeita. Analisando os conceitos de diferenciação e segmentação ficou claro a existência de quatro grupos teóricos. Os quatro grupos teóricos são analisados e ao final propõe-se uma classificação destes dois conceitos que se baseia numa perspectiva concorrencial, mais imperfeita e menos restritiva para explicar diferenciação e segmentação em que tanto a diferenciação do produto, como a segmentação de mercado são estratégias não só possíveis, como desejáveis, podendo ser utilizadas simultaneamente. Palavras-chave: diferenciação de produto; segmentação de mercado; estratégias de marketing

Page 2: Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: · PDF file2 1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em estratégia de

 

2

1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em

estratégia de marketing. Devido sua importância para a literatura mercadológica, vários trabalhos e debates têm sido produzidos sobre esses dois temas desde seus surgimentos no início do século passado (SNELLMAN, 2000).

Apesar de se ter quase um século de debate sobre os temas, eles são tratados de maneira isolada, o que não representa a realidade do gestor de marketing. São poucas as pesquisas que têm tratado a diferenciação do produto e a segmentação de mercado de forma simultânea no sentido de estabelecer relações de interdependência e separação entre estes dois conceitos.

Pesquisas mais recentes sobre as temáticas estão preocupadas em utilizar de teorias econômicas, comportamentais e de relacionamento para por meio de técnicas sofisticadas de análise estatística identificar segmentos de mercado e oportunidades de diferenciação de produtos. Percebe-se que muito esforço tem sido despendido na criação de modelos de segmentação e diferenciação, sendo a maioria baseado em premissas de concorrência perfeita. Estas pesquisas tratam de objetivos louváveis que trazem uma contribuição empírica para o trabalho dos gestores de marketing. Porém, sobrepõem técnica à teoria ao desconsiderar os aspectos isolacionistas e interativos entre diferenciação e segmentação em suas análises e ao considerar premissas de um mercado que pouco se aderem à realidade.

Dois dos poucos trabalhos que abordam conjuntamente a segmentação de mercado e a diferenciação de produto num ambiente de concorrência imperfeita, menos restritivo, e que incitam diferenças e dependência entre os conceitos de diferenciação e segmentação, são os trabalhos de Smith (1956) e Dickson e Ginter (1987). Porém, estes dois trabalhos além de antigos não colocam um ponto final na discussão, pois são divergentes entre si no que tange a integração dos conceitos. Afinal, o que vem primeiro numa estratégia de marketing: a segmentação do mercado ou a diferenciação do produto? Diferenciação e segmentação ocorrem simultaneamente? Qual a relação entre estes dois termos?

Neste ponto, é necessário preencher esta lacuna para que trabalhos de cunho mais empírico, como aqueles que vêm sendo produzidos, possam ter uma maior sustentação teórica. Assim, o objetivo deste trabalho é identificar as relações que separam e unem os conceitos de segmentação de mercado e diferenciação do produto num ambiente de concorrência imperfeita, menos restritivo.

2. A trajetória de dois conceitos Shaw (1912) em sua obra seminal traz o conceito de diferenciação de produto para a

área de estratégia, o que mais tarde, na década de 1950, influenciaria nas teorias de segmentação de mercado. Desde o início é percebido a relação imbricada entre diferenciação de produto e segmentação de mercado. Os estudos em segmentação de mercado e diferenciação de produto surgem da mesma matriz teórica, qual seja, a teoria microeconômica. Cronologicamente, na década de 1910 surgem os primeiros estudos de diferenciação do produto como estratégia, e no final dos anos de 1950, com as pesquisas em motivação, nasce a teoria de segmentação de mercado. A partir de então ambos os conceitos vem avançando e sendo influenciados por outras teorias, como a teoria do comportamento do consumidor que se inicia por volta de 1960 e o marketing de relacionamento cujo início se deu na década de 1990. Outro fator importante são os avanços computacionais da década de 1980 que permitiram avanços metodológicos às temáticas, ao suportar técnicas de análise estatística que envolvem alta capacidade de processamento (SNELLMAN, 2000).

Page 3: Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: · PDF file2 1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em estratégia de

 

3

Os princípios da segmentação de mercado remontam a teoria econômica e a diferenciação do produto em concorrência monopolista. As abordagens clássica e neoclássica e as teorias de concorrência perfeita e monopólio puro foram desafiadas Chamberlin (1961) e sua teoria da concorrência monopolista. Chamberlin (1961) explica que o mercado de cada concorrente é único em algum grau, e que isso era devido ao fenômeno conhecido como diferenciação do produto. Ele explicou que uma classe de produto é diferenciada quando há qualquer base para distinguir os produtos de vendedores diferentes. Descreve a diferenciação do produto como um controle sobre a oferta, no sentido de que apenas um vendedor oferece um produto com nome e identidade únicos.

O surgimento dos conceitos de diferenciação do produto e a vantagem possibilitada por essa diferenciação foram cruciais para o desenvolvimento da teoria da segmentação de mercado. O reconhecimento da demanda em função de um conjunto de fatores que não só o preço, como as imperfeições do mercado, foi essencial. Os pesquisadores notaram que as preferências dos consumidores não eram homogêneas, mas existiam diferenças na demanda causadas por diferenças de gostos, desejos e localização dos compradores (SNELLMAN, 2000). Estas imperfeições no mercado percebidas foram cruciais para a criação do conceito de segmentação de mercado, ou seja, a visualização de que a demanda poderia ser quebrada em diversas demandas menores para atender melhor aos clientes, de acordo com as características: demográficas, do produto, do comportamento do consumidor, psicográficas e de relacionamento (SNELLMAN, 2000).

Na mesma época, Smith (1956) é o primeiro que discute simultaneamente a segmentação do mercado e diferenciação do produto como estratégias alternativas. Smith (1956) propôs que os ofertantes devem diferenciar seus produtos e segmentar, não necessariamente nessa ordem, para obter lucro. A possibilidade de auferir lucros aos comerciantes e demais interessados tornou essas duas estratégias pontos centrais em nos estudos em marketing. Pesquisadores então começaram a estudar as razões por trás das diferenças na demanda. Os estudos começaram a identificar formas de segmentar e diferenciar, auxiliada pela evolução da teoria de microeconomia, sociologia e psicologia aplicada.

Durante a década de 1960, houve um aumento no interesse pela teoria do comportamento do consumidor. Esta abordagem fez grandes contribuições às estratégias de segmentação e diferenciação. Os conceitos de comportamento do consumidor, segmentação de mercado e diferenciação de produto estão intimamente relacionados. Alguns pesquisadores ainda classificam a segmentação do mercado e a diferenciação do produto como uma dimensão ou categoria de pesquisa de comportamento do consumidor (Sheth, 1967). O foco dos estudos passou a ser as características externas da pessoa orientadas para a compreensão do comportamento do consumidor. Pesquisas em motivação incentivaram a encontrar razões para o comportamento do consumidor de cunho de personalidade e estilo de vida, o que definiu as bases para a segmentação psicográfica.

Após a década de 1970, com os avanços de processamento de dados e metodológicos, pesquisadores têm desenvolvido novos critérios estatísticos para a técnica de segmentação. Análises de cluster, fatorial e outras técnicas estatísticas de agrupamento começaram a predominar nos estudos de segmentação. Análises de regressão multivariadas, utilização de equações estruturais e séries temporais, simulações assistidas por computadores, começaram a predominar nos estudos de diferenciação do produto (SNELLMAN, 2000).

Durante os anos de 1990, novos avanços surgiram a partir do campo do marketing de relacionamento. Gummesson (1994) discute uma série de diferentes tipos de relacionamentos que uma empresa pode ter com ex-clientes, colaboradores, investidores, fornecedores, mídia e governo. A empresa deve identificar as relações mais importantes com as diferentes partes, seja para segmentar seu mercado ou para diferenciar seus produtos. Novos critérios de

Page 4: Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: · PDF file2 1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em estratégia de

 

4

segmentação como a fidelidade e rentabilidade, formam o rol de novas características descobertas para se segmentar. Nas pesquisas em diferenciação alguns pesquisadores como Reichheld (1996) sugeriram que a empresa deve também identificar funcionários leais. Reichheld (1996) argumenta que os funcionários leais são necessários para manter os clientes fiéis e que a empresa deve tentar identificar os candidatos empregados que são susceptíveis de serem leais com a finalidade de criar uma diferenciação do produto ou serviço da empresa.

3. Dois conceitos que continuam em construção Como pode ser visto na seção anterior, desde os seus surgimentos até os dias atuais,

diferenciação do produto e segmentação do mercado ainda são dois conceitos nebulosos que ao mesmo tempo possuem uma interseção entre si, que os une, e uma identidade única, que os separa. Esta seção traz os principais autores que tratam dessas separações e interseções.

Shaw (1912) foi um dos pioneiros a descrever a diferenciação de produto como uma estratégia de marketing. Para o autor antes de tudo a diferenciação de produto é uma estratégia. Conceitua diferenciação de produto como a forma de encontrar as vontades humanas dos clientes mais precisamente do que a concorrência. O resultado é uma “edificação da demanda” para o produto e seus fornecedores (ofertantes). O autor discute a necessidade de tratar cada região geográfica como um problema separado de distribuição, ao enfatizar a importância do reconhecimento dos contornos do mercado econômico e social e a necessidade também de tratar estes contornos como problemas de marketing separados.

Chamberlin (1961) define a diferenciação de produto como a forma de distinguir as mercadorias e/ou serviços de uma empresa (ofertante) em relação às demais, considerando como base a importância atribuída pelo comprador, o que leva a uma preferência. O autor reconhece que as diferenças nas preferências do comprador resultam em um conjunto de curvas de demanda diferentes. A heterogeneidade na oferta, produtos, preços, e vantagens observadas no mercado não foram, em sua opinião, o resultado do conhecimento imperfeito ou outras “fricções” de mercado, mas uma reflexão das tentativas infrutíferas e bem sucedidas dos fabricantes para adaptar seus produtos às necessidades e gostos de diferentes compradores. O que Chamberlin (1961) expõe converge com o conceito de Shaw (1912) e apenas coloca uma ênfase maior nas necessidades do consumidor, ou seja, da necessidade de a diferenciação do produto ser orientada para o mercado.

Porter (1974) também considerou a diferenciação do produto como dependente das necessidades do consumidor. Como Chamberlin (1961), ele reconheceu que a diferenciação do produto pode estar baseada na percepção. A percepção pode se dar pelas características físicas (tangível) e não físicas (intangível) de diferentes produtos. Ou seja, Porter (1974) detalha mais criteriosamente a questão das características do produto, dando a elas duas dimensões: uma mais facilmente percebida pelo cliente e outra nem tanto, apesar desta última igualmente compor o processo decisório do consumidor.

Shaw (1912), Chamberlin (1961) e Porter (1974), consideram que apesar de relevante a diferenciação de mercado é uma estratégia complementar. A estratégia principal, por assim dizer, seria a segmentação de mercado, qual seja a divisão do mercado de acordo com as distintas elasticidades de preço da demanda. Neste contexto, para este grupo de autores a diferenciação do produto é um complemento ou um meio de se implantar a estratégia de segmentação de mercado, ou seja, a diferenciação do produto leva a segmentação.

De outro lado, Samuelson (1976), em seu principal texto econômico considera que a posição do fornecedor é a maior causa da demanda do mercado segmentado. Ele admitiu que a diferenciação de produto pudesse ser uma resposta genuína as necessidades de diferentes consumidores, mas acreditava que maior parte da diferenciação de produto é artificial. Artificial porque para Samuelson (1976), a diferenciação é conseguida pelos esforços de

Page 5: Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: · PDF file2 1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em estratégia de

 

5

publicidade e propaganda que distorcem as preferências e consequentemente a demanda do consumidor, o que é esperado dado a não-homogeneidade dos produtos.

Samuelson (1976) corrobora a idéia de Smith (1956), que em seu artigo clássico descreve a diferenciação do produto como uma tentativa de alterar a forma da curva de demanda preço-quantidade enfrentando o fornecedor individual usando publicidade e promoção.

Smith (1956) e Samuelson (1976) tratam a diferenciação como a flexão da demanda com a vontade de ofertar. Ela é uma tentativa de mudar ou alterar a inclinação da curva de demanda para ajustar a oferta de mercado de um fornecedor individual. É o resultado do desejo de estabelecer uma espécie de equilíbrio no mercado, trazendo um ajustamento da demanda do mercado para as condições de fornecimento favoráveis para o vendedor. A partir de um ponto de vista de estratégia, diferenciação do produto é garantir uma medida de controle sobre a demanda de um produto por publicidade ou promover as diferenças entre um produto e os produtos de vendedores concorrentes. É basicamente o resultado dos desejos dos vendedores em estabelecer posições de mercado firmes e/ou isolar os seus negócios do preço da concorrência. Neste aspecto a diferenciação tende a ser caracterizada pelo uso pesado de publicidade e promoção e resultam em preços que são um pouco acima do equilíbrio de mercado perfeitamente competitivo.

Já a segmentação para Smith (1956) e Samuelson (1976) está baseada em desenvolvimentos do lado da demanda do mercado e representa um ajuste mais racional e preciso dos produtos e do esforço de marketing para o consumidor ou às necessidades de uso. Na linguagem do economista, segmentação é desagregadora em seus efeitos e tende a trazer reconhecimento de vários tipos de demanda onde apenas uma era reconhecida antes. Segmentação do mercado consiste em visualizar um mercado heterogêneo (que se caracteriza por demandas divergentes) como uma série de pequenos mercados homogêneos em resposta as diferentes preferências de produtos entre importantes segmentos de mercado. É utilizada para obter uma maior satisfação das necessidades dos clientes que são variadas. Como a diferenciação, a segmentação muitas vezes envolve o uso substancial de publicidade e promoção. O papel da publicidade e promoção é o de informar segmentos de mercado da disponibilidade de bens ou serviços produzidos ou apresentar produtos ou serviços capazes de satisfazer as necessidades do segmento com precisão. Nestas circunstâncias, os preços tendem a ser um pouco mais perto de um mercado de concorrência perfeita. Assim, a segmentação de mercado é essencialmente um merchandising estratégico, merchandising sendo usado aqui em seu sentido técnico, representando o ajustamento das ofertas de mercado para o consumidor ou as necessidades de uso.

Diante dos conceitos de diferenciação e segmentação apresentados, Samuelson (1976) e Smith (1956) rechaçam a idéia de complementaridade. Para os autores, as estratégias de segmentação e diferenciação podem ser utilizadas simultaneamente, pois são independentes, mas são mais comumente aplicadas na sequência, em resposta às mudanças nas condições de mercado.

Portanto, Smith (1956) e Samuelson (1976) diferem do ponto de vista de Shaw (1912), Chamberlin (1961) e de Porter (1974), pois estes últimos autores incluem a alteração das características físicas (especificação do produto), e apontam a criação de diferenças intangíveis (imaginárias) quando nenhuma diferença real existe, incluindo os dispositivos da marca e habilidade da publicidade, que é rotulada por Lancaster (1990) de “pseudo-diferenciação”. Segundo Lancaster (1990) a pseudo-diferenciação corresponde a uma diferença imaginária criada, por exemplo por uma habilidade de promoção da empresa, sem que o produto de fato tenha sido realmente modificado, ou seja, uma diferenciação de produto por meio de promoção.

Page 6: Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: · PDF file2 1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em estratégia de

 

6

Percebe-se atualmente nos textos contemporâneos, que a inconsistente e confusa definição no tratamento de diferenciação de produto estão enraizados principalmente nas diferenças entre os pontos de vista expressados por Smith (1956) e Samuelson (1976) e aqueles de Shaw (1912), Chamberlin (1961) e Porter (1974).

Entre estes dois extremos, navegam outros autores. Dois grupos de autores se destacam: (a) o grupo de Rosen (1974), Lancaster (1990), Hauser et all (1981, 1983, 1984), e Sölnner e Rese (2001) e (b) o grupo de Dickson e Ginter (1987).

Rosen (1974) e Lancaster (1990) contribuíram para o desenvolvimento de uma teoria de demanda econômica na qual os produtos são vistos como múltiplos pacotes compostos de diversas características. Os autores reconhecem a preferência dos consumidores e visualiza a diferenciação de produtos como a variedade na característica oferecida por produtos alternativos. Rosen (1974) considera que a diferenciação de produto e estratégia de segmentação de mercado é uma consequência da existência de segmentos de mercado. Rosen (1974), Lancaster (1990) e outros aplicaram suas teorias de demandas hedônicas para analisar as condições competitivas e desenvolver ótimas condições teóricas. Na aplicação de marketing destas estruturas para posicionamento do produto, principalmente, pela estratégia de segmentação de mercado estão os estudos de Hauser e Simmie (1981), Hauser and Shugan (1983), e Hauser e Gaskin (1984).

Na tangência da discussão proposta pelo grupo, Sölnner e Rese (2001) ressaltam a importância do papel dos competidores na elaboração das estratégias de segmentação de mercado, defendendo ser este uma aplicação mais confiável de segmentação. Mais confiável, segundo os autores, porque o conceito inicial de segmentação aborda apenas aspectos relacionados às necessidades dos consumidores, deixando de considerar aspectos ligados aos competidores. Ao considerar os competidores as respostas dos concorrentes e a sustentabilidade do segmento são incorporadas na análise estratégica, o que parece ser uma abordagem mais completa.

Dickson e Ginter (1987) retomam os pontos trazidos por cada corrente de autores e propõem uma solução. Propõem que a diferenciação do produto e a segmentação do mercado claramente não são alternativas estratégicas de gestão. Isso porque uma estratégia de diferenciação de produto pode ser procurada com ou sem uma estratégia de segmentação de mercado, mas uma estratégia de segmentação de mercado pode apenas ser procurada quando a diferenciação do produto já existe ou quando acompanhada por uma estratégia de diferenciação de produto complementar. Ou seja, a diferenciação do produto não depende da segmentação, porém a segmentação depende da existência da diferenciação.

Neste sentido o Dickson e Ginter (1987) mostram que a discussão de Smith (1956), sobre a segmentação de mercado como uma alteração do produto para melhor atender às necessidades de um segmento, pode ser entendida como a uma combinação entre a diferenciação de produto e a segmentação de mercado.

Diante de conceitos e interações tão opostas e complementares, faz-se necessário a criação de um quadro teórico para resumir as divergências entre diferenciação de produto e segmentação de mercado e a interação entre estes conceitos. A Figura 1 apresenta essa tentativa.

Page 7: Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: · PDF file2 1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em estratégia de

 

7

Autores Conceito de

diferenciação Conceito de segmentação

Interação entre os conceitos

Grupoi

Shaw (1912), Chamberlin

(1961) e Porter (1974)

Distinguir as mercadorias e/ou serviços de uma

empresa (ofertante) em relação às demais,

considerando como base a importância atribuída pelo

comprador

Divisão do mercado de acordo com as

distintas elasticidades de

preço da demanda.

A diferenciação do produto é um

complemento ou um meio de se implantar a

estratégia de segmentação de mercado

Orientados para a

segmentação

Smith (1956) e Samuelson

(1976)

Uma tentativa de mudar ou alterar a inclinação da curva de demanda para

ajustar a oferta de mercado de um

fornecedor individual

Visualizar um mercado

heterogêneo (que se caracteriza por

demandas divergentes) como

uma série de pequenos mercados

homogêneos em resposta as diferentes

preferências de produtos entre

importantes segmentos de

mercado

O diferenciador visa garantir uma camada do

bolo de mercado, enquanto aquele que

emprega segmentação do mercado se esforça para assegurar uma fatia (um

pedaço de várias camadas).

Estratégias de segmentação e

diferenciação podem ser utilizadas

simultaneamente, mas são mais comumente

aplicadas na seqüência, em resposta às mudanças nas condições de mercado

Orientados para a

segmentação e

diferenciação

Rosen (1974), Hauser et al (1981, 1983,

1984), Lancaster (1990),

Sölnner e Rese (2001)

A variedade na característica oferecida

por produtos alternativos

Processo de formação de grupos

de clientes que vivenciam um

problema semelhante e que reagem da mesma

forma aos estímulos do mercado

A diferenciação de produto e estratégia de

segmentação de mercado é uma conseqüência da existência de segmentos de mercado e da reação

dos demais competidores

Orientados para a

concorrência

Dickson e Ginter (1987)

A percepção pelo consumidor que difere o produto de uma empresa

com o de um concorrente, seja por características

tangíveis ou não, incluindo o preço.

Heterogeneidade na função da demanda

de mercado que pode ser

desagregada em segmentos com

distintas funções de demanda

A diferenciação do produto não depende da segmentação, porém a

segmentação depende da existência da diferenciação

Orientados para a

diferenciação

Figura 1. Divergências da interação e dos conceitos de diferenciação de produto e segmentação de mercado. Fonte: Elaboração própria (2012)

Pelo quadro fica claro a existência de quatro grupos de autores que tratam, cada um a

sua maneira, da interação e dos conceitos entre diferenciação de produto e segmentação de mercado. Nota-se que os conceitos de diferenciação e segmentação em alguns grupos divergem radicalmente como é o caso dos grupos ‘orientados para a segmentação’ e ‘orientados para a segmentação e diferenciação’. Neste caso os conceitos de diferenciação e segmentação são opostos um ao outro.

Outro ponto a ser ressaltado é a presença de duas formas de tratamento das estratégias de segmentação e da diferenciação. Alguns autores tendem a valorizar o papel da

Page 8: Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: · PDF file2 1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em estratégia de

 

8

segmentação e desvalorizar o papel da diferenciação, enquanto outros tendem a fazer o oposto, ou seja, valorizar o papel da diferenciação frente a segmentação de mercado.

4. Diferenciação do produto e concorrência

Grande parte da confusão gerada nos estudos de segmentação de mercado e

diferenciação do produto pode ser atribuída aos pressupostos adotados pelos pesquisadores quanto à realidade econômica, mais especificamente do ambiente em que se dá a concorrência.

Segundo Sheth (1985), teorias de concorrência em microeconomia têm sido geralmente baseadas nas realidades da época em que foram desenvolvidas. Por exemplo, na fase pré-industrial quando a economia era dominada pelo setor agrícola, teorias de concorrência eram baseadas em premissas de produtos homogêneos e, portanto, a intensidade da concorrência era baseada no número de ofertantes no mercado. Desde então a concorrência passou a ser baseada na quantidade de competidores em uma determinada indústria. A teoria da firma apresenta algumas nomenclaturas para classificar a concorrência segundo este critério: monopólio (único competidor), oligopólio (concentrado em poucos competidores) e concorrência perfeita (grande número de pequenos competidores).

Com a emergência da era industrial, foi descoberto por vários economistas que a concorrência também era uma função do produto ou diferenciação tecnológica (SHETH, 1985). Por exemplo, economistas como Chamberlin (1961) sugere que a diferenciação de produto (real ou psicológica) cria certo grau de poder de monopólio para o competidor mesmo quando há um grande número de competidores na indústria. As teorias tradicionais de concorrência não conseguiam explicar essa realidade, sendo necessário afrouxar os determinantes da concorrência para incluir tanto o número de competidores quanto o grau de diferenciação do produto. Isto leva a uma nova forma de realidade competitiva rotulada de concorrência monopolística. A Figura 2 mostra a estrutura de concorrência na era industrial.

Diferenciação do produto Alta Baixa

Baixo Monopólio

Diferenciado Monopólio

Médio Oligopólio

Diferenciado Oligopólio

Número de competidores

Alto Concorrência Monopolística

Concorrência Perfeita

Figura 2. Estrutura de concorrência na era industrial. Fonte: Adaptado de Sheth (1985)

Neste ponto, esta seção destaca duas formas de se perceber a realidade competitiva: (a)

teoria clássica e neoclássica e (b) escola de Chicago e economia dos custos de transação. As teorias clássica e neoclássica assumem que a demanda é homogênea para todos os

produtos da indústria. Ou seja, embora os consumidores possam preferir diferentes quantidades de cada produto da indústria, seus gostos e preferências são assumidos como idênticos no que diz respeito às características do produto desejado. Presume-se também que os consumidores tenham informação perfeita e gratuita sobre a disponibilidade, características, benefícios e preços de todos os produtos (MORGAN; HUNT, 1995).

Neste sentido, a motivação do consumidor é o interesse próprio ou a maximização da utilidade. O objetivo da empresa é a maximização do lucro ou, em versões mais sofisticadas, a maximização da riqueza, ou seja, a maximização do valor presente líquido dos lucros futuros. Atuando sob condições de informação perfeita e gratuita, a teoria neoclássica centra-se na

Page 9: Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: · PDF file2 1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em estratégia de

 

9

empresa de produção de um único produto, utilizando os recursos de capital, trabalho e, às vezes terra. Esses fatores de produção "são assumidos como homogênea e perfeitamente móveis, ou seja, cada unidade de trabalho ou equipamento de capital é considerado como idêntico com outras unidades e pode fluir de empresa para empresa, sem restrições. O papel da gestão é responder às mudanças no ambiente por meio da determinação da quantidade de produto a produzir e executar uma função de produção que é idêntico em todas as empresas em cada setor (MORGAN; HUNT, 1995).

Concorrência na teoria neoclássica, então, é cada empresa em uma indústria (1) a curto prazo, o ajuste da quantidade de produto produzido na reação às mudanças de preço de mercado do seu produto e dos preços (custos) dos seus recursos e outros insumos e (2) no longo prazo, ajustando a escala de sua fábrica. Portanto, o ambiente da empresa estritamente determina a sua conduta. Em particular, todas as empresas em uma indústria vão produzir, inexoravelmente, à taxa de produção no qual o custo marginal é igual à receita marginal (preço do produto no mercado). No curto prazo, em que os recursos, tais como instalações e equipamentos são relativamente fixos, cada empresa irá incorrer em ganhos ou perdas, dependendo se o preço for superior ou inferior ao custo médio total de produção da quantidade de maximização do lucro (MORGAN; HUNT, 1995).

No entanto, no equilíbrio de longo prazo em um mercado perfeitamente competitivo, todos os recursos são variáveis e cada empresa produz a quantidade que a preço de mercado iguala no longo prazo ao custo marginal, que se equivale ao custo médio de longo prazo mínimo. A posição de equilíbrio de longo prazo é uma situação em que as empresas da indústria não têm nem lucro, nem prejuízo, apenas um lucro contábil igual à taxa de retorno obtida em outras indústrias perfeitamente competitivas (MORGAN; HUNT, 1995).

Tais pressupostos das teorias clássicas e neoclássicas de concorrência perfeita foram contestados por não conseguirem explicar a gama diversificada de empresas em economias de mercado, que era uma realidade visível. Uma empresa com lucros acima da média da indústria é a evidência de que há imperfeições do mercado e da existência de "poder de mercado”, pois em concorrência perfeita lucros anormais no longo prazo são iguais a zero. A concorrência perfeita implica em numerosas e pequenas empresas cada uma em sua indústria, com cada uma produzindo um único produto, a uma quantidade ditada pelo tamanho das plantas mais eficientes. Mas, o que podia ser presenciado era que muitas indústrias em economias de mercado eram caracterizadas por algumas empresas de grande dimensão que produzem diversos produtos (MORGAN; HUNT, 1995).

Para a teoria clássica e neoclássica de competição perfeita a diferenciação do produto é vista como uma perturbação de curto prazo do equilíbrio de mercado. Ao se introduzir um recurso inovador ou maiores níveis de qualidade para um produto, gera-se uma imperfeição que perturba o equilíbrio e move o sistema para longe de um estado ideal (FISHER; GRILICHES; KAYSEN, 1962). Os pressupostos da demanda dos consumidores homogêneos e idênticos fazem com que os consumidores não percebam as diferenças nos produtos e as competências específicas das empresas.

Então, mesmo que uma empresa venha a diferenciar seu produto por meio de novos atributos incorreria em despesas extras de produzir um produto diferente, superior ao produto padrão, mas não poderia cobrar um preço maior por ele, pois essa diferença não será percebida. Além disso, mesmo se a diferença for percebida pelo consumidor, uma empresa que produz um produto superior e recebe um preço mais alto por ele, gera uma imperfeição momentânea no mercado que move o mercado fora do estado ideal do equilíbrio, mas volta ao equilíbrio no longo prazo (MORGAN; HUNT, 1995).

Teorias da concorrência monopolista e oligopolista, mesmo dentro da abordagem clássica e neoclássica, poderiam ter servido como ponto de partida para superar as deficiências explicativas da teoria da concorrência perfeita, pois afrouxam algumas de suas

Page 10: Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: · PDF file2 1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em estratégia de

 

10

premissas fundamentais. Chamberlin (1961) é um dos primeiros a afrouxar as premissas neoclássicas, criando o conceito de concorrência monopolística. O autor reconheceu a existência dos efeitos da diferenciação de produto. Porém, a importação teórica dos trabalhos de Chamberlin (1961) para os neoclássicos é a de que imperfeições existem, mas não são desejáveis.

Pelo fato de a concorrência perfeita da teoria clássica e neoclássica ter pressupostos muito rígidos, ela não conseguia conceber as ineficiências do mercado, ou seja, as falhas de mercado. Tais falhas são provocadas por comportamentos distintos.

Diante deste cenário, duas escolas de economistas têm tentado explicar a diversidade de empresas. Em primeiro lugar, os economistas da escola de Chicago modificam a hipótese de que as empresas são idênticas, por reconhecer as diferenças de competência específica da empresa (DEMSETZ, 1973, STIGLER, 1951, 1964). Para eles "os indivíduos não são todos iguais, as equipes que compõem as empresas comerciais não são iguais, e consequentemente, a eficácia das empresas é diferente" (MCGEE 1975 p. 101). Portanto, as grandes empresas podem existir por causa das diferenças na eficiência de produção. No entanto, os economistas de Chicago ainda aderem à crença neoclássica que os ganhos superiores baseados nas diferenças de eficiência serão disputados e, em longo prazo o equilíbrio será restaurado. Portanto, o desempenho superior sustentado permanece suspeito (DEMSETZ 1973; STIGLER, 1966). Além disso, os economistas de Chicago reconhecem que possibilidade de ganhos superiores resultantes da diferenciação do produto (CONNER, 1991).

Economia dos Custos de Transação também critica a visão neoclássica. Coase (1937) apontou mais de meio século atrás, que as empresas podem evitar custos de pesquisa e negociação de contratos e custos de produção de alguns de seus insumos. Assim, cada empresa expande suas operações até que o custo marginal de produção de uma entrada na indústria seja igual ao preço de mercado. Na verdade, essa extensão da concorrência perfeita, explica não só a existência de grandes empresas na indústria, mas também a existência de pequenas empresas.

Estendendo as idéias de Coase (1937), Williamson (1981) acredita que a corporação pode ser entendida como o produto de uma série de inovações organizacionais que tiveram o objetivo e o efeito de economizar em custos de transação, onde esses custos incluem a toda a negociação, acompanhamento, execução e os outros custos necessários para assegurar que os bens e serviços contratados entre e dentro das empresas estejam próximos (ALSTON e GILLESPIE 1989, p. 193).

Os trabalhos de Williamson (1975, 1981), identificam as circunstâncias em que a fuga de uma empresa dos custos de transação de mercado são críticos. Se todo o comportamento humano é devido a maximização do auto-interesse e das empresas é a maximização dos lucros, então todas as empresas vão buscar lucros pelo oportunismo. Na verdade, sem o pressuposto do oportunismo, o estudo da organização econômica é inútil, porque o oportunismo é a violação do engano orientado de promessas implícitas ou explícitas sobre o comportamento de uma função adequada ou necessária (JOHN, 1984), que vai se materializar sempre produzindo um produto diferente, um “trunfo” para transações específicas, isto é, um ativo cujo valor depende significativamente de ser utilizado em conjunto com outro ativo específico. De acordo com a economia de custos de transação, portanto, a segmentação de mercado e a diferenciação do produto existem por causa do medo de oportunismo do mercado (CONNER, 1991).

Page 11: Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: · PDF file2 1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em estratégia de

 

11

5. Diferenciação e segmentação juntas para entender a concorrênciaii

Segundo Sheth (1985) a teoria da concorrência ancorada na diferenciação do produto e

no número de competidores está se tornando obsoleta. Ela está sendo substituída pelas novas realidades da era pós-industrial. Os novos determinantes da estrutura competitiva parecem ser ancorados em dois determinantes: diferenciação e segmentação de mercado. Ademais, isto está criando novas e diferentes tipos de estrutura de concorrência, as quais os rótulos tradicionais tais como monopólio, oligopólio e concorrência monopolística não tem relevância. Portanto, precisa-se de uma nova tipologia de estrutura competitiva baseada nesses novos e emergentes determinantes da estrutura competitiva.

Sheth (1985) sugere que a teoria tradicional da firma assume que a intensidade da concorrência é proporcional ao número de competidores em uma indústria não é realista. Então sugere quatro tipos de estrutura competitiva sobre a diferenciação de produto e segmentação de mercado, a saber: (a) mercado de commodities, (b) mercado fragmentado, (c) mercado diferenciado e (d) mercados segmentados. A Figura 3 mostra essa categorização.

Segmentação de Mercado

Alta Baixa

Alta Mercados

Fragmentados Mercados Diferenciados

Diferenciação do Produto

Baixa Mercados

Segmentados Mercados de Commodities

Figura 3. Estrutura de competição na era pós-industrial. Fonte: Adaptado de Sheth (1985)

(a) mercado de commodities Numa indústria caracterizada pela homogeneidade de tecnologias e mercados, a

estrutura competitiva mais propensa a emergir é a de mercado de commodities. O mercado de commodities refere-se a realidade de certa quantidade de competidores que produzem uma alta e racionalizada de produtos e os promove para seus consumidores de forma não diferenciada. A força motriz no mercado de commodities é a eficiência em custos e economia de escala com respeito a produção e operações de marketing. É possível que as economias de escala podem favorecer a um único competidor na indústria resultando numa situação tradicional de monopólio. No entanto, não há barreiras a entrada ou saída presumida e portanto é possível que um competidor mais eficiente em custos entre no mercado e sucessivamente compita contra o monopólio.

Então eficiência em custo e economias de escala são as forças motrizes no mercado de commodities. É postulado que somente três ou quatro competidores mantenham a lucratividade, pois é inviável a divisão da capacidade total da indústria em mercados menores.

A questão estratégica fundamental no mercado de commodities é o market share. Portanto, estratégias competitivas são desenhadas e executadas para proteger ou ganhar uma grande fatia do mercado. Isto inclui aquisições e fusões, concorrência por preço e proteção de mercado.

Neste cenário competitivo tanto a diferenciação de produto quanto a segmentação de mercado são baixas e decorrentes da reação dos demais concorrentes.

(b) mercado fragmentado

Page 12: Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: · PDF file2 1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em estratégia de

 

12

É um mercado caracterizado por necessidades heterogêneas e meios heterogêneos de satisfazer essas necessidades, resultado em mercados fragmentados de muitos especialistas quem fornecem para um segmento de mercado único. Mercados fragmentados refletem a realidade de um grande número de competidores cada qual controlando uma pequena fatia de mercado e conseguem reter seus clientes e a lealdade da marca. Cada competidor tem alguma diferenciação do valor adicionado ou da tecnologia e promovem seus produtos seletivamente para um segmento alvo por meio de um programa de marketing altamente especializado.

A força motriz dos mercados fragmentados é a ultra-especialização ou nichos. De fato, é geralmente vantajoso objetivar uma participação de mercado menor ao invés de uma participação de mercado maior. Ultra-especialização é necessária para sobreviver e crescer em mercados fragmentados.

As forças estratégicas em mercados segmentados são foco e expertise ao invés de participação de mercado e eficiência em custo. Portanto, é altamente desejável descentralizar a organização que permite cada unidade a autonomia de fragmentar nichos de um mercado total.

Nesse cenário, tanto a diferenciação do produto como a segmentação de mercado são elevados para dar respostas às mudanças nas condições de mercado, e podem ser utilizadas simultaneamente.

(c) mercado diferenciado Mercados diferenciados são a estrutura de concorrência mais comum em uma indústria

onde as necessidades de mercado são homogêneas mas há presença de bens substitutos que podem satisfazê-las. Mercados diferenciados referem-se a uma realidade na qual um grande número de competidores provém tecnologias e produtos especializados para o mercado com programas de marketing similares ou mesmo idênticos.

A força motriz na estrutura de mercados diferenciados são a pesquisa e desenvolvimento e grande quantidade de produtos proprietários. Economias de escala e eficiência de custos são menos críticas na geração de vantagem competitiva. Portanto, a questão estratégica é significativamente diferente no mercado de diferenciação e no mercado de commodities.

As estratégias básicas para o sucesso nesses mercados seriam aquisições de pesquisa e desenvolvimento e expertise única do processo produtivo.

Nesse cenário, a diferenciação é alta e a segmentação é baixa, e a diferenciação do produto não depende da segmentação, porém a segmentação depende da existência da diferenciação.

(d) mercados segmentados Mercados segmentados são característicos em indústrias que utilizam tecnologias

universais e versáteis, mas estão atentos as necessidades heterogêneas de mercado. Referem-se a uma realidade na qual certa quantidade de competidores oferecem uma tecnologia comum mas versátil para diferenciar segmentos de mercado em uma aplicação baseada na diferenciação. Em geral, competidores praticam programas de marketing altamente especializados para cada segmento, embora sua pesquisa e desenvolvimento e manufatura sejam mais integrados.

A força motriz dos mercados segmentados é a aplicação baseada na segmentação e a customização. Um competidor capaz de ofertar programas de marketing únicos incluindo força de vendas especializada e produtos customizados ou serviços é mais propenso a sobreviver e crescer nesta estrutura competitiva. Enquanto a participação de mercado é um objetivo importante, ele é alcançado menos pela eficiência de custos e mais pelo valor adicionado dos serviços de customização para cada segmento.

Page 13: Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: · PDF file2 1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em estratégia de

 

13

A questão estratégica que paira sobre os mercados segmentados é a segmentação de mercado, expansão de mercado e enfoque sistêmico total.

Nesse cenário, a segmentação é alta e a diferenciação é baixa, e a diferenciação do produto é um complemento ou um meio de se implantar a estratégia de segmentação de mercado.

Adotando-se a classificação de Sheth (1985), este trabalho propõe um enquadramento

dos grupos de autores da Figura 1, para que se possa entender as diferentes lógicas atribuídas aos conceitos de diferenciação e segmentação e a forma como interagem. A Figura 4 mostra como a diferenciação e a segmentação se interagem, formando os diferentes grupos.

Segmentação de Mercado

Alta Baixa

Alta Orientados para a

segmentação e diferenciação

Orientados para a diferenciação Diferenciação do

Produto

Baixa Orientados para a

segmentação Orientados para a

concorrência

Figura 4. Diferenciação, segmentação e concorrência. Fonte: Elaboração própria.

Pelas descrições dos diferentes tipos de mercado formados ao se levar em conta a diferenciação do produto e a segmentação de mercado, o conceito de mercado de commodities foi atribuído ao grupo ‘orientados para a concorrência’; o conceito de mercados fragmentados foi atribuído ao grupo ‘orientados para a segmentação e diferenciação’; o conceito de mercados diferenciados foi atribuído ao grupo ‘orientados para a diferenciação’; e o conceito de mercados segmentados para o grupo ‘orientados para a segmentação’.

6. Considerações Finais

O trabalho inicia mostrando que a diferenciação do produto e a segmentação de

mercado são dois temas amplamente discutidos, porém juvenis quando analisados em conjunto ou até mesmo separados. Poucas são as pesquisas que têm tratado a diferenciação do produto e a segmentação de mercado de forma simultânea no sentido de estabelecer relações de interdependência, causalidade e separação entre estes dois conceitos.

Na sequência apresentou-se a cronologia dos dois temas que apresentam o mesmo “útero materno”, a teoria microeconômica e como numa relação familiar o primogênito, diferenciação, influencia o irmão mais novo, segmentação. Desde o início é percebido a relação imbricada entre diferenciação de produto e segmentação de mercado. Depois de seus nascedouros, passam a conviver juntos, ou nem tanto assim, e a serem influenciados por outras teorias, como a teoria do comportamento do consumidor e o marketing de relacionamento.

Além de classificar os principais trabalhos sobre o tema, procurou-se entender quais são as relações que geram essa miscelânea, que separam e unem os conceitos de segmentação de mercado e diferenciação do produto. Encontrou-se que grande parte da confusão gerada nos estudos de segmentação de mercado e diferenciação do produto pode ser atribuída aos

Page 14: Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: · PDF file2 1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em estratégia de

 

14

pressupostos adotados pelos pesquisadores quanto a realidade econômica, mais especificamente do ambiente em que se dá a concorrência.

Teorias de concorrência em microeconomia têm sido geralmente baseadas nas realidades da época em que foram desenvolvidas. A teoria clássica e neoclássica adota pressupostos de concorrência perfeita que implica em numerosas e pequenas empresas cada uma em sua indústria, com cada uma produzindo um único produto, a uma quantidade ditada pelo tamanho das plantas mais eficientes. Atuando sob condições de informação perfeita e gratuita, a teoria neoclássica centra-se na empresa de produção de um único produto, utilizando fatores de produção homogêneos e perfeitamente móveis, determinando a quantidade de produto a produzir em cada mercado. Para a teoria clássica e neoclássica de competição perfeita a diferenciação do produto é vista como uma perturbação de curto prazo do equilíbrio de mercado. Assim, num ambiente de economia clássica e neoclássica a estratégia de diferenciação não é bem vinda por ser inócua em longo prazo (dado que numa concorrência perfeita a perturbação causada pela diferenciação no mercado no longo prazo volta ao equilíbrio), o que não ocorre com a segmentação, que é facilitada pela premissa da perfeita mobilidade de recursos, permitindo com que as empresas atuem em diferentes mercados, ajustando as quantidades para cada mercado. Nesses casos, tende-se a valorizar a segmentação de mercado e desvalorizar a diferenciação de produto.

Os economistas da escola de Chicago modificam a hipótese de que os indivíduos e as empresas são idênticas, o que consequentemente abre campo para a utilização da estratégia de diferenciação do produto. No entanto, os economistas de Chicago ainda aderem à crença neoclássica que os ganhos superiores baseados nas diferenças de eficiência serão disputados e, em longo prazo o equilíbrio será restaurado.

A Economia dos Custos de Transação (ECT) relaxam mais ainda os pressupostos clássicos e neoclássicos, introduzindo o conceito de oportunismo que se materializa na produção de um produto diferente, um “trunfo”. Ademais, pela ótica da ECT, segmentar pode gerar mais custos de transação do que diferenciar um produto, por envolver mais transações a ação de redirecionar recursos para outro mercado. Neste momento a estratégia de diferenciação é supervalorizada em detrimento da segmentação de mercado.

Contudo, novas realidades da era pós-industrial afrouxam de vez as premissas clássicas e neoclássicas. Os novos determinantes da estrutura competitiva parecem estar ancorados na própria diferenciação do produto e segmentação de mercado. Adotando por base o trabalho de Sheth (1985) que sugere quatro tipos de estruturas competitivas sobre a diferenciação de produto e segmentação de mercado, classificou-se o grupo de autores que tratam dos mesmos conceitos para enquadrar as diferentes lógicas atribuídas aos conceitos de diferenciação e segmentação e a forma como interagem.

Sob o ponto de vista da classificação sugerida por este trabalho, que baseia-se numa perspectiva concorrencial, mais imperfeita e menos restritiva para explicar diferenciação e segmentação, chega-se ao seguinte ponto: tanto a diferenciação do produto, como a segmentação de mercado em ambientes menos restritivos são estratégias não só possíveis, como desejáveis, podendo ser utilizadas simultaneamente. Ou seja, não há uma ordem necessária que deva ser seguida na implementação das estratégias de diferenciação e segmentação. Cada estratégia é capaz de se sustentar sozinha, pois são distintas e independentes. Mas sugere-se que ambas sejam adotadas conjuntamente para que se possa competir de uma forma mais eficiente. Neste ponto, uma orientação para a diferenciação e segmentação, conforme sugerem os estudos de Smith (1956) e Samuelson (1961), seriam mais adequados a realidade pós-industrial e estaria mais próxima às práticas dos gestores de marketing que atuam num ambiente concorrencial repleto de falhas de mercado.

Page 15: Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: · PDF file2 1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em estratégia de

 

15

7. Referências

ALSTON, Lee J.; GILLESPIE William. Resource Coordination and Transaction Costs: A Framework for Analyzing the Firm/Market Boundary, Journal of Economic Behavior and Organization, 11 (2), 191-212, 1989.

CHAMBERLIN, Edward H. The Origin and Early Development of Monopolistic Competition Theory. The Quarterly Journal of Economics, Vol. 75, No. 4 (Nov.), pp. 515-543, 1961.

COASE, R. H.. The Nature of the Firm, in Readings in Price Theory, G.J. Stigler and K.E. Boulding, eds. Chicago: Irwin, 331-51, 1937.

CONNER, Kathleen. A Historical Comparison of Resource-Based Theory and Five Schools of Thought Within Industrial-Organization Economics: Do We Have a New Theory of the Firm?, Journal of Management, 17 (March), 121-54, 1991.

DEMSETZ, H.. Industry Structure Market Rivalry and Public Policy," Journal of Law and Economics, 16, 1-9, 1973.

DICKSON, P. R.: GINTER, J. L. Market segmentation, product differentiation, and marketing strategy. The Journal of Marketing. v. 51, n.2, p. 1-10, Apr. 1987.

FISHER, F.; GRILICHES, Z.; KAYSEN, C. The Cost of Automobile Model Changes Since 1949, Journal of Political Economy, 70 (October), 433-51., 1962.

GUMMESSON, Evert. Making relationship marketing operational. International Journal of Services Industry Management, 5(5), 5-20, 1994.

HAUSER, John R.; GASKIN, Steven P., Application of the 'Defender' Consumer Model. Marketing Science, 3 (Fall), 327-51, 1984.

HAUSER, John R.; SHUGAN, Steven M. Defensive Marketing Strategies. Marketing Science, 2 (Fall), 319-60, 1983.

HAUSER, John R.; SIMMIE, Patricia. Profit Maximizing Perceptual Positions: An Integrated Theory for the Selection of Product Features and Price. Management Science, 27 (January), 33-56, 1981.

MORGAN, Robert M; HUNT, Shelby D.. The Comparative Advantage Theory of Competition Source: The Journal of Marketing, Vol. 59, No. 2 (Apr.), pp. 1-15, 1995.

JOHN, George, An Empirical Investigation of Some Antecedents of Opportunism in a Marketing Channel, Journal of Marketing Research, 21 (August), 278-89, 1984.

LANCASTER, Kelvin. The Economics of Product Variety: A Survey. Marketing Science, Vol. 9, No. 3 (Summer), pp. 189-206, 1990.

PORTER, Michael E. Consumer Behavior, Retailer Power and Market Performance in Consumer Goods Industries. The Review of Economics and Statistics, Vol. 56, No. 4 (Nov.), pp. 419-436, 1974.

Page 16: Diferenciação de Produto e Segmentação de Mercado: · PDF file2 1. Introdução Diferenciação do produto e segmentação de mercado são conceitos centrais em estratégia de

 

16

REICHHELD, F.F. (1996):”Learning from Customer Defections”, Harvard Business Review, March-April, pp.56-69

ROSEN, Sherwin. Hedonic Prices and Implicit Markets: Product Differentiation in Pure Competition, Journal of Political Economy," 82 (January/February), 34-55, 1974.

SAMUELSON, Paul A. Economics. New York: McGraw-Hill Book Company, 1976.

SHETH, Jagdish .N.. A Review of Buyer Behaviour, Management Science, Vol.13, No.12, pp. -718-756, 1967.

SHETH, Jagdish .N.. New determinants of competitive structures in industrial markets, in Spekman, R.E. and Wilson, D.T. (Eds), A Strategic Approach to Business Markets, American Marketing Association, Chicago, IL, pp. 1-8, 1985.

SHAW, Arch W. Some Problems in Market Distribution. Quarterly Journal of Economics (August), 703- 65, 1912.

SMITH, Wendell. Product Differentiation and Market Segmentation as Alternative Marketing Strategies. Journal of Marketing, 21 (July), 3-8, 1956.

SNELLMAN, Kaissa. From one segment to a segment of one: the evolution of market segmentation theory. Working paper, Swedish School of Economics and Business Administration, 2000.

SÖLLNER, A.; RESE, M. Market segmentation and the structure of competition: Applicability of the strategic group concept for an improved market segmentation on industrial markets. Journal of Business Research, v. 51, p. 25- 36, 2001.

STIGLER, George J., A Theory of Oligopoly, Journal of Political Economy, 72 (1), 44-61, 1964.

STIGLER, George J.. The Division of Labor is Limited by the Extent of the Market, Journal of Political Economy,5 9 (3), 185-93, 1966.

WILLIAMSON, Oliver. The Modern Corporation: Origins, Evolution, Attributes, Journal of Economic Literature, 19 (December), 1537-68, 1981.

                                                            i Cabe ressaltar que a taxonomia criada para os grupos respeitou os conceitos e relacionamentos criados pelos autores de cada grupo. Assim, o grupo “orientados para a segmentação” deve ser interpretado a luz do que seus autores entendem por diferenciação e segmentação. ii Essa seção do trabalho é baseada no trabalho de Jagdish N.Sheth (1985).