diferenças e semelhanças entre a esquizofrenia e o transtorno bipolar

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Diferenças e Semelhanças entre a Esquizofrenia e o Transtorno Bipolar. Editor do Portal 4 de outubro de 2010 – Artigos As descrições da esquizofrenia e do transtorno bipolar (TBH) enquanto doenças mentais datam da mesma época. No final do século XIX, o psiquiatra alemão Emil Kraepelin observou que pacientes até então tratados sob a mesma condição tinham sintomas e evoluções diferentes, permitindo que fossem separados em dois grupos. O primeiro ele chamou de doença maníaco-depressiva (atualmente chamada de transtorno bipolar) e o outro de demência precoce (depois denominada por Bleuler de esquizofrenia). Para Kraepelin, a diferença fundamental entre os dois diagnósticos era que os pacientes com TBH apresentavam uma melhor evolução, com a remissão total dos sintomas e a retomada de suas atividades entre as crises, enquanto que esquizofrênicos mantinham sintomas residuais mesmo nos intervalos das crises, caracterizados principalmente por sintomas negativos, como a perda do interesse, a desmotivação, a apatia e as dificuldades de socialização e relacionamento. Esta diferença era mais marcante naquela época, em que tratamentos medicamentosos ainda não estavam disponíveis. Com o advento do lítio e dos primeiros antipsicóticos na década de 50, a distância entre o TBH e a esquizofrenia

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Esquizofrenia e Transtorno Bipolar

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Page 1: Diferenças e Semelhanças Entre a Esquizofrenia e o Transtorno Bipolar

Diferenças e Semelhanças entre a Esquizofrenia e o Transtorno Bipolar.

Editor do Portal 4 de outubro de 2010 – Artigos

As descrições da esquizofrenia e do transtorno bipolar (TBH) enquanto doenças

mentais datam da mesma época. No final do século XIX, o psiquiatra alemão Emil Kraepelin

observou que pacientes até então tratados sob a mesma condição tinham sintomas e evoluções

diferentes, permitindo que fossem separados em dois grupos. O primeiro ele chamou de

doença maníaco-depressiva (atualmente chamada de transtorno bipolar) e o outro de demência

precoce (depois denominada por Bleuler de esquizofrenia). Para Kraepelin, a diferença

fundamental entre os dois diagnósticos era que os pacientes com TBH apresentavam uma

melhor evolução, com a remissão total dos sintomas e a retomada de suas atividades entre as

crises, enquanto que esquizofrênicos mantinham sintomas residuais mesmo nos intervalos das

crises, caracterizados principalmente por sintomas negativos, como a perda do interesse, a

desmotivação, a apatia e as dificuldades de socialização e relacionamento. Esta diferença era

mais marcante naquela época, em que tratamentos medicamentosos ainda não estavam

disponíveis.

Com o advento do lítio e dos primeiros antipsicóticos na década de 50, a distância

entre o TBH e a esquizofrenia diminuiu substancialmente, a ponto de casos de TBH serem

confundidos com esquizofrenia e vice-versa. A resposta à medicação passou a influenciar o

diagnóstico, com uma tendência a diagnosticar como bipolares aqueles pacientes que melhor

respondessem e que se recuperassem com o tratamento.

A crise aguda do bipolar pode ser semelhante ao surto psicótico de um esquizofrênico,

principalmente se também ocorrerem delírios e alucinações, sendo difícil a diferenciação de

ambos os diagnósticos nesta fase, o que se torna mais fácil após o período de crise. O bipolar

costuma ter uma recuperação melhor e voltar às suas atividades de vida mais rapidamente do

que o esquizofrênico, além de não apresentar os sintomas negativos característicos deste

último. Os sintomas cognitivos também são menos impactantes no bipolar do que no

esquizofrênico.

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Embora sintomas de humor, como depressão, euforia, exaltação, raiva e irritabilidade

sejam comuns na esquizofrenia, eles são a alteração fundamental do TBH. São as variações

do humor que provocam as crises de depressão ou mania e que explicam os principais

problemas de comportamento, os delírios e as alucinações dos pacientes bipolares, enquanto o

humor, apesar de influenciar o comportamento do esquizofrênico, não é o causador dos

principais sintomas da esquizofrenia. Isto fica mais evidente ao final da crise, quando

bipolares melhoram dos sintomas com a estabilização do humor e esquizofrênicos

permanecem com delírios, alucinações e sintomas negativos, apesar do humor aparentemente

melhor.

No TBH, portanto, ocorrem episódios mais claros de humor, como a depressão, a

mania (euforia) ou os episódios mistos (mistura de características depressivas com exaltação

do humor), enquanto que na esquizofrenia, apesar das alterações de humor, o fio condutor

continua sendo as alterações do pensamento e da percepção.

Mas as coincidências entre o TBH e a esquizofrenia não param por aí. Estudos

genéticos têm demonstrado que as duas doenças podem ter uma origem comum. Alguns genes

de predisposição à esquizofrenia também estão envolvidos na causa do TBH. Já se sabe, há

algum tempo, que o TBH é mais comum em familiares de esquizofrênicos. Existiria então

uma ligação biológica entre os dois diagnósticos? Estaríamos falando de duas expressões

diferentes de uma mesma doença? Os pesquisadores ainda não conseguiram responder a essas

questões, mas é possível que haja uma ligação causal comum, com modelos de predisposição

semelhantes. Mas as diferenças clínicas e prognósticas (de evolução) são significativas para

mantê-los como dois diagnósticos distintos.

Recentemente antipsicóticos de segunda geração, medicações até então específicas

para a esquizofrenia, ganharam aprovação para o uso também em pacientes bipolares. As

alterações neuroquímicas da esquizofrenia, como o aumento da dopamina e a desregulação da

serotonina e do glutamato, também acontecem no TBH. Mas estabilizadores de humor, como

o lítio, o ácido valpróico e a carbamazepina, por exemplo, que são eficazes no TBH, não

possuem isoladamente efeito na esquizofrenia. Portanto, ainda há muito a ser pesquisado e

descoberto nesta área.

Um terceiro diagnóstico, um pouco controverso entre os psiquiatras, aponta para outro

transtorno, com características da esquizofrenia e episódios de humor semelhantes ao TBH,

como se houvesse uma sobreposição das duas doenças. Estamos falando do transtorno

Page 3: Diferenças e Semelhanças Entre a Esquizofrenia e o Transtorno Bipolar

esquizoafetivo, considerado por muitos pesquisadores como parte de um espectro das doenças

psicóticas (espectro esquizofrênico), mas que pode representar um continuum entre dois pólos

diagnósticos, a esquizofrenia e o TBH. O esquizoafetivo tem um prognóstico melhor do que o

esquizofrênico, com menos sintomas negativos, porém pior do que o bipolar. Contudo, na

prática, vemos que as possibilidades de recuperação são muito variáveis, independentes do

diagnóstico e muito mais pautadas nas qualidades individuais e no ambiente sócio-familiar.

Na tabela abaixo citamos algumas diferenças relativas entre a esquizofrenia e o TBH.

Características Esquizofrenia Transtorno Bipolar

Início do quadro Mais lento (insidioso) Mais rápido (súbito)

Delírio Mais comum o persecutório, não influenciado pelo humor

Mais comum o de grandeza, altamente influenciado pelo humor

Alucinação Comum Menos comum

Sintoma negativo Comum Não ocorre

Déficit cognitivo Comum Menos comum

Disfunção social Comum Menos comum

Tratamento medicamentoso

Antipsicóticos de primeira e segunda geração

Estabilizadores de humor e antipsicóticos de segunda geração

→ Para ler mais sobre Transtorno Bipolar clique aqui.

Fonte: http://entendendoaesquizofrenia.com.br/website/?p=3733