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691 ACTA AMAZONICA 32(4): 691-705. 2002. DIETA DE Retroculus lapidifer (PERCIFORMES: CICHLIDAE), UM PEIXE REOFÍLICO DO RIO ARAGUAIA, ESTADO DO TOCANTINS, BRASIL. Sandra Socorro MOREIRA*; Jansen ZUANON** INPA/CPBA – Avenida André Araújo, 2936, C.P. 478, 69083-970, Manaus, AM. Brasil * [email protected] - ** [email protected] RESUMO - Retroculus lapidifer é um ciclídeo que forrageia junto ao fundo de trechos de corredeiras dos rios Araguaia e Tocantins. Embora seja relativamente abundante, pouco se sabe sobre a biologia e ecologia dessa espécie. Este trabalho teve como objetivo conhecer a dieta de R. lapidifer, bem como analisar o grau de similaridade (Índice de Morisita) entre as dietas de exemplares dos rios Araguaia e Tocantins, e entre espécimes de R. lapidifer e R. xinguensis. Exemplares de R. lapidifer foram coletados no rio Araguaia, na cheia, vazante, seca e enchente de 2000. Nas comparações das dietas utilizou-se exemplares da Coleção de Peixes do INPA. Analisou-se 90 estômagos de R. lapidifer do rio Araguaia, 10 do Tocantins e 11 de R. xinguensis do Xingu. Utilizou-se métodos de frequência de ocorrência e volume relativo, combinados como Índice Alimentar. Houve uma predominância de formas imaturas de Chironomidae, Trichoptera e Ephemeroptera na dieta de R. lapidifer. O consumo das principais presas variou com o ciclo hidrológico, havendo um decréscimo na participação de Chironomidae na vazante e seca, compensado por um aumento no consumo de Trichoptera e Ephemeroptera. A similaridade entre as dietas de R. lapidifer dos rios Araguaia e Tocantins foi de 0,81 e entre R. lapidifer e R. xinguensis foi de 0,92, o que provavelmente reflete a predominância de Chironomidae nas dietas. Os resultados permitem caracterizar R. lapidifer como predador de formas imaturas de insetos aquáticos, que explora a abundância variável das presas ao longo do ciclo hidrológico. Palavras-chave: Retroculus, dieta, rio Araguaia, Amazônia, peixes. The Diet of Retroculus lapidifer (Perciformes: Cichlidae), a Rheophilic Cichlid Fish from Araguaia River, Tocantins State, Brazil. ABSTRACT - Retroculus lapidifer is a cichlid fish foraging at the bottom of Araguaia and Tocantins Rivers rapid stretches. Although being relatively abundant, little is known about its biology and ecology. This study was aimed to describe the diet of R. lapidifer and to analyze the degree of simi- larity (Index of Morisita) among the diets of specimens from Araguaia and Tocantins Rivers, and between specimens of R. lapidifer and R. xinguensis. Specimens of R. lapidifer were collected in the Araguaia River in four occasions from February to November 2000. INPA Fish Collection speci- mens were used for the diet similarity studies. One hundred stomachs of R. lapidifer (90 from Araguaia River and 10 from Tocantins River) and 11 stomachs of R. xinguensis from Xingu River were analyzed. Occurrence frequency and relative volume methods were used together as an Ali- mentary Index. The diet of R. lapidifer was predominantly comprised of chironomid, trichopteran and ephemeropteran immature forms. Feeding on main preys varied along the hydrologic cycle, with a decrease on the consumption of chironomids during the receding and low water level peri- ods, balanced by an increase on the consumption of trichopterans and ephemeropterans. The simi- larity between the diets of Araguaia and Tocantins Rivers R. lapidifer was 0.81, and between R. lapidifer and R. xinguensis was 0.92, probably reflecting the dominance of chironomids in the di- ets. Retroculus lapidifer can be characterized as a predator of immature aquatics insects exploiting the variable abundance of prey types along the hydrologic cycle. Key-words: Retroculus; diet; Araguaia River; Amazonia, fish.

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Page 1: DIETA DE Retroculus lapidifer (PERCIFORMES: CICHLIDAE), … · valores de IAi. Nessas análises, foram incluídos apenas os peixes capturados ... comprimento do tubo digestório e

691Dieta de Retroculus lapidifer (Perciformes: Cichlidae) ...ACTA AMAZONICA 32(4): 691-705. 2002.

DIETA DE Retroculus lapidifer (PERCIFORMES: CICHLIDAE),UM PEIXE REOFÍLICO DO RIO ARAGUAIA, ESTADO DOTOCANTINS, BRASIL.

Sandra Socorro MOREIRA*; Jansen ZUANON**

INPA/CPBA – Avenida André Araújo, 2936, C.P. 478, 69083-970, Manaus, AM. Brasil* [email protected] - ** [email protected]

RESUMO - Retroculus lapidifer é um ciclídeo que forrageia junto ao fundo de trechos decorredeiras dos rios Araguaia e Tocantins. Embora seja relativamente abundante, pouco se sabesobre a biologia e ecologia dessa espécie. Este trabalho teve como objetivo conhecer a dieta deR. lapidifer, bem como analisar o grau de similaridade (Índice de Morisita) entre as dietas deexemplares dos rios Araguaia e Tocantins, e entre espécimes de R. lapidifer e R. xinguensis.Exemplares de R. lapidifer foram coletados no rio Araguaia, na cheia, vazante, seca e enchentede 2000. Nas comparações das dietas utilizou-se exemplares da Coleção de Peixes do INPA.Analisou-se 90 estômagos de R. lapidifer do rio Araguaia, 10 do Tocantins e 11 de R. xinguensisdo Xingu. Utilizou-se métodos de frequência de ocorrência e volume relativo, combinados comoÍndice Alimentar. Houve uma predominância de formas imaturas de Chironomidae, Trichopterae Ephemeroptera na dieta de R. lapidifer. O consumo das principais presas variou com o ciclohidrológico, havendo um decréscimo na participação de Chironomidae na vazante e seca,compensado por um aumento no consumo de Trichoptera e Ephemeroptera. A similaridade entreas dietas de R. lapidifer dos rios Araguaia e Tocantins foi de 0,81 e entre R. lapidifer e R.xinguensis foi de 0,92, o que provavelmente reflete a predominância de Chironomidae nas dietas.Os resultados permitem caracterizar R. lapidifer como predador de formas imaturas de insetosaquáticos, que explora a abundância variável das presas ao longo do ciclo hidrológico.

Palavras-chave: Retroculus, dieta, rio Araguaia, Amazônia, peixes.

The Diet of Retroculus lapidifer (Perciformes: Cichlidae), a Rheophilic Cichlid Fish fromAraguaia River, Tocantins State, Brazil.

ABSTRACT - Retroculus lapidifer is a cichlid fish foraging at the bottom of Araguaia and TocantinsRivers rapid stretches. Although being relatively abundant, little is known about its biology andecology. This study was aimed to describe the diet of R. lapidifer and to analyze the degree of simi-larity (Index of Morisita) among the diets of specimens from Araguaia and Tocantins Rivers, andbetween specimens of R. lapidifer and R. xinguensis. Specimens of R. lapidifer were collected inthe Araguaia River in four occasions from February to November 2000. INPA Fish Collection speci-mens were used for the diet similarity studies. One hundred stomachs of R. lapidifer (90 fromAraguaia River and 10 from Tocantins River) and 11 stomachs of R. xinguensis from Xingu Riverwere analyzed. Occurrence frequency and relative volume methods were used together as an Ali-mentary Index. The diet of R. lapidifer was predominantly comprised of chironomid, trichopteranand ephemeropteran immature forms. Feeding on main preys varied along the hydrologic cycle,with a decrease on the consumption of chironomids during the receding and low water level peri-ods, balanced by an increase on the consumption of trichopterans and ephemeropterans. The simi-larity between the diets of Araguaia and Tocantins Rivers R. lapidifer was 0.81, and between R.lapidifer and R. xinguensis was 0.92, probably reflecting the dominance of chironomids in the di-ets. Retroculus lapidifer can be characterized as a predator of immature aquatics insects exploitingthe variable abundance of prey types along the hydrologic cycle.

Key-words: Retroculus; diet; Araguaia River; Amazonia, fish.

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692 Moreira & Zuanon

Introdução

O conhecimento da dieta depeixes é importante para a obtenção deinformações sobre as relações de umaespécie com o ambiente em que vive,considerando os aspectos biológicos,ecológicos e evolutivos. Devido aessas interações, os peixes apresentamdiversas especializações morfológicas,fisiológicas e comportamentais, que ospermitem ter uma grande plasticidadena utilização do alimento (Lowe-McConnell, 1987; Silva, 1993). Osciclídeos por exemplo, são conhecidospela grande diversidade de hábitos etáticas alimentares, que incluem desdea obtenção do alimento junto aosubstrato, até comportamentosespecializados, como a predação deovos e juvenis de outras espécies(Fryer & Iles,1972; Mckaye & Berghe,1996). Os ciclídeos sul-americanosparecem não exibir uma variedade tãogrande de táticas alimentares (e. g.,Ferreira, 1981); por outro lado,algumas delas podem estarrelacionadas à ocupação de certostipos de ambientes e micro-hábitatsespecíficos (Knöppel, 1970; Zuanon,1999).

O gênero Retroculus Eigenmann& Bray, 1894, tem sido consideradofilogeneticamente como o maisprimitivo dentre os ciclídeos sul-americanos (Kullander, 1998). Destegênero fazem parte R. lapidifer(Castelnau, 1855), R. xinguensis Gosse,1971 e R. septentrionalis Gosse, 1971.Retroculus lapidifer é um peixe reofílicocom hábitos diurnos que vive emtrechos de corredeiras dos rios Araguaia

e Tocantins (Santos et al., 1984). Ascaracterísticas morfológicas destaespécie (e. g. focinho longo e pontudo,boca subterminal, lábios carnosos,região ventral do corpo achatada enadadeiras pélvicas posicionadashorizontalmente) permitem umcomportamento alimentar especializado,de fossar profundamente o substratopedregoso com seixos e areia grossa dofundo do rio. Durante o forrageio, osindivíduos abocanham porções dosubstrato, selecionam os itensalimentares na cavidade bucal e emseguida devolvem a areia (Zuanon,1999).

Até onde se sabe, não hátrabalhos publicados sobre os hábitosalimentares de espécies de Retroculus.Além dessa carência de informações,pouco se conhece à respeito daecologia de peixes reofílicosamazônicos (e.g., Zuanon, 1999).Como se sabe, rios com corredeiras ecachoeiras são propícios para aconstrução de usinas hidrelétricas, e orepresamento desses corpos d’águaprovoca alterações bruscas noambiente. Em ambientes recémrepresados, devido à rápidatransformação na dinâmica da água, éesperada uma alteração na proporçãoentre os recursos alimentares, afetandoas interações bióticas e levando osdiferentes organismos a respostasdistintas frente às novas condições(Hahn et al., 1997). Os resultadospodem incluir desde a modificação doshábitos alimentares de certas espéciesde peixes, até a extinção local deoutras (Abujanra et al., 1999). Neilandet al. (1990), por exemplo,

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constataram uma redução nadiversidade de peixes após aconstrução de uma usina hidrelétrica,no rio Benue (Nigéria).

Nesse contexto, o presenteestudo visa contribuir para a obtençãode informações básicas sobre abiologia e ecologia de espécies depeixes reofílicos, como subsídios nasavaliações de impactos derepresamento em rios de corredeiras.Esse trabalho teve como objetivoestudar a dieta alimentar do ciclídeo R.lapidifer em um trecho do rioAraguaia, bem como verificar o graude similaridade entre as dietas daspopulações dessa espécie nos riosAraguaia e Tocantins, e em relação aR. xinguensis, do rio Xingu.

Material e Métodos

Exemplares de R. lapidifer (Fig.1) foram obtidos durante excursões aorio Araguaia, na área do ParqueEstadual do Cantão, município deCaseara, Estado do Tocantins (9º 15' S,

49º 57' W), logo a jusante da ilha doBananal (Fig. 2). Os espécimes (n =161) foram capturados com redes dearrasto e tarrafas, em quatro fasesdistintas do ciclo hidrológico: cheia(fevereiro) vazante (maio), seca(agosto) e enchente (novembro) de2000. Ao longo do trecho de coleta,foram medidos alguns parâmetrosfísico-químicos da água, como atemperatura (26,2 a 30,7ºC), pH (5,8a 8,0) e a condutividade elétrica (16a 26,5 mS/cm). Os exemplarescoletados foram imediatamentepreservados em formalina a 10%,sendo posteriormente levados para olaboratório, lavados em água correntee transferidos para frascos contendoetanol a 70%. Após a medição docomprimento padrão, os peixes foramseparados por classes de tamanho,analisados, catalogados e depositadosna Coleção de Peixes do INPA, deonde foram obtidos 10 exemplares deR. lapidifer do rio Tocantins e 11 deR. xinguensis do rio Xingu, paracomparação das dietas.

Figura 1. Exemplar de R. lapidifer do rio Araguaia.

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Dados biológicos e métodosanalíticos

Foram analisados 90 exemplaresde R. Lapidifer do rio Araguaia, sendo20 coletados durante a cheia, 14 navazante, 24 na seca e 32 na enchente.O tamanho dos exemplares variou de31 a 195 mm (73,5 mm ± 3,6). Ocomprimento-padrão dos exemplaresdos rios Tocantins e Xingu variou de52 a 87 mm (70,5 mm ± 3,9) e de 60a 175 mm (92,6 mm ± 11,9),respectivamente. Após a abertura dacavidade abdominal dos exemplares,foi verificado o grau de repleção

estomacal, para o qual foi adotada umaescala de valores de acordo com ovolume de alimento presente noestômago (Hahn et al., 1999): 0(vazio); 1 (até 25%); 2 (entre 25 e75%); 3 (acima de 75%). Os tratosdigestórios completos dessesespécimes foram retirados e medidos(mm). O conteúdo estomacal de cadaexemplar foi examinado sob lupaestereoscópica, para a triagem,identificação e estimativa do volumerelativo e frequência de ocorrência dositens alimentares. Os invertebradosencontrados foram identificados até acategoria de ordem ou família,

Figura 2. Localização geográfica dos pontos de coleta dos exemplares de R. lapidifer e R.xinguensis (1, Município de Caseara-TO; 2, UHE Tucuruí e 3, Município de Altamira-PA.)Modificado de Kullander (1988).

Rio Amazonas

Rio

Tap

ajós

Rio

Ara

guai

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Rio

To

can

tin

s

Rio

Xin

gu

1

2

3

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baseando-se em Pennak (1978). Apresença de areia e sedimento nosconteúdos estomacais foi registrada,mas estes itens não foram incluídos naanálise da dieta.

A participação dos diferentestipos de alimento na dieta foi avaliadacom uso dos métodos de freqüência deocorrência (F%) e volume relativo(V%) (Hyslop, 1980), combinados naforma de índice alimentar (IAi%;Kawakami & Vazzoler, 1980). Oprocedimento adotado na análise doconteúdo estomacal dos exemplaresdos rios Tocantins e Xingu, foi omesmo descrito para os espécimes dorio Araguaia.

O grau de similaridade entre adieta de exemplares de R. lapidifer dosrios Araguaia e Tocantins e em relaçãoaos exemplares de R. xinguensis, foiverificado por meio da aplicação doíndice de Morisita (Krebs, 1989) aosvalores de IAi. Nessas análises, foramincluídos apenas os peixes capturadosdurante o período de seca dos riosAraguaia, Tocantins e Xingu, de modoa evitar que a possível existência desazonalidade nas dietas interferissenos resultados das comparações.

Análise estatística

Para verificar a possívelexistência de diferenças no grau médiode repleção estomacal ao longo dociclo hidrológico, foi aplicado o testenão-paramétrico de Kruskal-Wallis(Teste H). A comparação da dieta deexemplares jovens e adultos de R.lapidifer foi realizada por meio deanálise de regressão. Foi realizada umaanálise de variância (α = 0,05) para

verificar o efeito do períodohidrológico sobre a proporção dosprincipais itens alimentares da dieta deR. lapidifer. Os valores médios dessesitens foram comparados a posterioripor meio do teste de Tukey (α = 0,05).O comprimento padrão e ocomprimento do tubo digestório sãoapresentados na forma de média ± erropadrão.

Resultados e DiscussãoCaracterísticas do trato digestório

de R. lapidifer

Retroculus lapidifer temintestino curto e estômago na forma desaco (Fig. 3). Padrão semelhante foiencontrado para outras espécies deciclídeos, como Cichlasomaurophthalmus da América Central(Martinez-Palacios & Ross, 1988), C.nigrofasciatum (Am. Central) e Cichlasp. (Am. Sul) (Fryer & Iles, 1972;Zihler, 1982). De um modo geral otubo digestório de ciclídeos é muitosimilar e o estômago é usualmentereduzido, comparado ao esôfago eintestino (Knöppel, 1970).

A relação média entre ocomprimento do tubo digestório e ocomprimento padrão de R. lapidifer(CTD/CP) foi de 0,83 ± 0,01, comamplitude de variação de 0,50 a 1,17.Esse resultado indica um hábitoalimentar carnívoro para R. lapidifer,pois na relação entre o hábitoalimentar e a morfologia do tratodigestório de peixes, há uma tendênciados carnívoros possuírem intestinosmais curtos quando comparados aosherbívoros (Zihler, 1982; Reis, 1997).Valores próximos a este foram

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encontrados por Casatti & Castro(1998) para alguns peixes onívoros,larvívoros e insetívoros-piscívoros decorredeiras do rio São Francisco.

O padrão de enrolamento dotrato intestinal apresentado pelosespécimes de R. lapidifer apresentouuma volta e meia (Fig. 3), podendoser considerado curto quandocomparado ao de ciclídeosherbívoros, que apresentam muitasvoltas (Fryer & Iles, 1972; Yamakoa,1985). Algumas espécies de ciclídeosamazônicos (Aequidens tetramerus,Crenicichla notophthalmus), queconsomem predominantementealimentos de origem animal, tambémapresentam intestino curto (Knöppel,1970). Outros ciclídeos carnívoroscomo Biotodoma cupido, Cichla mo-noculus e C. temensis do lago Batata,rio Trombetas-PA, apresentaram

padrão morfológico semelhante (Reis,1997). Isso reforça a indicação de queR. lapidifer tem hábito alimentarcarnívoro. Espécies carnívorasconsomem alimentos bastanteprotéicos, que são facilmentedigeridos por proteases estomacais,facilitando o processo de absorção nointestino e permitindo que este órgãotenha tamanho reduzido (Zihler,1982). Nesse sentido, as formasimaturas de insetos aquáticosconsumidas por R. lapidifer (Tab. 1)constituem alimentos facilmentedigeríveis, por apresentarem alto teorde proteína (Gysels et al., 1997),corpo mole e pouco quitinoso.

Composição da dieta de R. lapidifer

Foram encontrados 18 itensalimentares nos estômagos dosexemplares do rio Araguaia (Tab. 1),

Figura 3. Trato digestório de um exemplar de R. lapidifer (CP = 91 mm). E = esôfago; S =estômago; I = intestino; A = ânus. Escala = 5mm.

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sendo 17 de origem animal. As larvasde Diptera Chironomidae tiveramparticipação predominante, seguidasdas larvas de Trichoptera e ninfas deEphemeroptera (Tab. 1). Esteresultado demonstra que R. lapidiferpossui um hábito alimentarprincipalmente carnívoro/insetívoro,consumindo formas imaturas deinsetos aquáticos. As espécies depeixes carnívoros na Amazôniaalimentam-se de vários invertebrados,como crustáceos e insetos, entre outros(Ferreira et al., 1998). Os fragmentosvegetais encontrados em 13 estômagosanalisados, tiveram participaçãorelativa na dieta muito baixa (Tab. 1)indicando uma ingestão casual durantea predação de pequenos invertebrados.Resultado semelhante também foiencontrado para Cichlasomaurophthalmus, uma espécie de ciclídeoda América Central (Martinez-Palacios & Ross, 1988).

Chironomidae foi o item commaior freqüência de ocorrência e volumemédio nos estômagos dos peixesanalisados (Tab. 1). Embora aparticipação de Trichoptera eEphemeroptera tenha sido expressiva emtermos de freqüência de ocorrência, estesinsetos ocuparam um volume médiorelativamente pequeno nos estômagos,resultando em baixos valores de índicealimentar, comparados aos Chironomidae(Tab. 1). Larvas de Chironomidaerepresentam o grupo mais diversificadoe abundante entre os macroinvertebradosbentônicos de ambientes lacustres efluviais, provavelmente em função da suaelevada capacidade adaptativa adiferentes substratos e de sua plasticidade

alimentar (Strixino & Trivinho-Strixino,1998). Esses invertebrados são presasmuito comuns de peixes de água doce deregiões tropicais como Leporinusobtusidens (Characiformes,Anostomidae) (Andrian et al., 1994),Geophagus altifrons e Biotodoma cupido(Cichlidae) (Reis, 1997). Ninfas deEphemeroptera e Trichoptera tambémsão presas importantes para outrosgêneros da família Cichlidae, comoalgumas espécies de Teleocichla decorredeiras do rio Xingu (Zuanon, 1999).

O volume dos estômagos ocupadopelos itens autóctones foi de 61,1%,incluindo larvas de Chironomidae,Trichoptera, Ephemeroptera, Bryozoa,Simuliidae, ninfas de Odonata,fragmentos de camarão, Mollusca,fragmentos de peixes e gêmulas deesponja. Essa predominância dealimentos de origem autóctone na dietade R. lapidifer contrasta fortemente comas informações disponíveis para outrostipos de sistemas aquáticos amazônicos.Em rios com baixa produtividadeprimária, como é o caso do rio Negro eda maior parte dos igarapés amazônicosde terra firme, os peixes apresentamuma grande dependência de alimentosde origem alóctone (Lowe McConnell,1987; Goulding et al., 1988).

Variação sazonal da dieta deR. lapidifer

Apesar do grau de repleção tersido relativamente baixo durante todoo ciclo hidrológico, 95,6% dos 90estômagos analisados continhamalimento, sendo que 66 exemplares(73,3%) apresentaram grau derepleção 1; 19 (21,1%) tiveram grau

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de repleção 2 e apenas 1 (1,1%)apresentou grau de repleção 3. Issorevela que a estratégia alimentar de R.lapidifer aparentemente baseia-se emum forrageio constante ao longo dodia, não sendo usual que seu estômagofique totalmente cheio. O grau derepleção médio foi de 1,05 ± 0,05 nacheia, 1,15 ± 0,10 na vazante, 1,43 ±0,11 na seca e 1,13 ± 0,12 naenchente (Fig. 4). Houve diferençasignificativa entre os períodos dociclo hidrológico (Teste de Kruskal-Wallis, H = 7.9839; g.l.= 3; p =0,046), embora a diferença tenhaocorrido exclusivamente entre a secae a cheia (p = 0,048). Esse resultadoevidencia um aumento da quantidade

de alimento nos estômagos a medidaque diminui o nível das águas,indicando que esta espécie sealimenta com maior intensidade oueficiência no período da seca. Issopode ser explicado em função darestrição física dos corpos d’água edo aumento da densidade de espécies-presa (Goulding, 1985; Winemiller,1989), que no caso de R. lapidifer sãorepresentados pelas formas imaturasde insetos aquáticos. A inclusão deuma maior quantidade de Trichopterae Ephemeroptera na dieta de R.lapidifer nos períodos de vazante eseca, aparentemente contribuiu paraelevar o grau médio de repleçãoestomacal.

Tabela 1. Índice alimentar (I.A.), freqüência de ocorrência (%F) e volume relativo (%V) doconteúdo estomacal de exemplares de R. lapidifer do rio Araguaia, durante um ciclo hidrológico;(*I.A.< 0,01).

refidipal.R )68=n(aiaugarAoirod

snetI F% %V %A.I

eadimonorihCaretpiD 76,79 50,56 84,58

aretpohcirT 48,84 26,21 92,8

aretporemehpE 50,63 14,9 65,4

oãramacedotnemgarF 82,61 29,2 46,0

arecodalC 18,5 63,4 43,0

aozoirB 36,11 49,1 03,0

lategevotnemgarF 59,31 30,1 91,0

otesnIedotnemgarF 74,01 67,0 11,0

aretpimeH 56,4 84,0 30,0

aretponemyH 94,3 56,0 30,0

exieP 61,1 92,0 *00,0

acsulloM 61,1 71,0 *00,0

)sortuo(aretpiD 94,3 21,0 *00,0

atanodO 61,1 60,0 *00,0

aretpoeloC 33,2 90,0 *00,0

soracÁ 33,2 20,0 *00,0

ajnopseedalumêG 61,1 10,0 *00,0

eadiilumiS 61,1 20,0 *00,0

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Figura 4. Variação do grau de repleção médio dos estômagos de R. lapidifer do rio Aragauiadurante os períodos de cheia (fevereiro, n = 20), vazante (maio, n = 14), seca (agosto, n = 24)e enchente (novembro, n = 32).

A variação crescente do grau médiode repleção indica uma variação sazonalna dieta de R. lapidifer, que acompanha ociclo hidrológico. Esse padrão desazonalidade também foi observado nadieta de algumas espécies de peixes, comoCichlasoma urophthalmus (Martinez-Palacios & Ross, 1988) e Plagioscionsquamosissimus (Perciformes, Sciaenidae)(Hahn et al., 1999).

A partir da análise de variância foiverificado que a proporção deChironomidae, Trichoptera eEphemeroptera consumidos por R.lapidifer diferiu significativamente aolongo do ciclo hidrológico. Apesar dosChironomidae terem participadopredominantemente na dieta deste peixeem todos os períodos, houve umdecréscimo significativo no consumodessas presas na transição da cheia para

a seca (F0,01; 2; 72

; = 2,722; p < 0,01) e umsubsequente aumento com a elevação donível das águas (Tab. 2). Essa reduçãopode estar relacionada ao ciclo de vidaou à disponibilidade dessesinvertebrados, tendo em vista que asvariações sazonais no ambiente têmforte influência sobre as comunidadesaquáticas (Uieda & Gajardo, 1996).

Mosquitos da famíliaChironomidae são os primeirosmacroinvetebrados a colonizaremsubstratos em ambientes de corredeirasda Amazônia Central (Freitas, 1998),provavelmente devido a aspectos bio-ecológicos como alto poder de dispersão,posição basal na cadeia alimentar(explorando fungos e detritos foliares)e elevada abundância nos habitatsvizinhos (Walker, 1987).

A menor proporção de

0

0,2

0,4

0,6

0,8

1

1,2

1,4

1,6

Cheia Vazante Seca EnchentePeríodos

Gra

u de

rep

leçã

o

0

100

200

300

400

500

600

700

Nív

el d

a ág

ua d

o rio

Ara

guai

a (m

m)

grau de repleção nível da água do rio Araguaia (mm)

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Chironomidae na dieta no período deáguas baixas, pode estar relacionadacom interações tróficas interespecíficas.É possível que, com a diminuição donível das águas no rio Araguaia, as lar-vas de Chironomidae tenham ficadomais susceptíveis a outros predadoresalém de R. lapidifer, o que pode tercontribuído para uma redução daimportância relativa destesinvertebrados na dieta durante o períodode seca. Alguns autores verificaram quelarvas de Chironomidae são predadaspor Trichoptera, Ephemeroptera,Plecoptera e várias espécies decamarões, em áreas de corredeiras daAmazônia Central (Walker, 1998;Pereira & Melo, 1998; Alencar et al.,1999).

Trichoptera e Ephemeropterativeram menor participação relativa nadieta de R. lapidifer no período de cheiae enchente, e maior nos períodos devazante e seca (F

0,01; 2; 82 = 2,716; p <

0,01; F0,01; 2; 82

= 2,716; p < 0,01,respectivamente) (Tab. 2). A variação noconsumo destes invertebrados por R.lapidifer, pode também estar relacionadacom a disponibilidade destas presas noambiente em função da sazonalidade das

águas. Para Hynes (1970), a abundânciade Trichoptera e Ephemeropteramodifica-se ao longo do ano emresposta à variação de fatores ambientaisou simplesmente devido ao ciclo devida.

Durante a cheia e enchente, o vol-ume das águas no rio Araguaia se eleva,dificultando provavelmente a captura deTrichoptera e Ephemeroptera por R.lapidifer. Oliveira et al. (1997) relatamque a pluviosidade, vazão e velocidadeda água, constituem o conjunto defatores que mais influenciamnegativamente a densidade de formasimaturas de Trichoptera eEphemeroptera, em ambientes decorredeiras do Parque Ecológico deGoiânia durante o período chuvoso.

Diferença entre as dietas deexemplares jovens e adultos de R.

lapidifer

Durante os trabalhos de triagemdos conteúdos estomacais, aventou-sea hipótese de existência de consumopreferencial de certos tipos de presasao longo do desenvolvimentoontogenético de R. lapidifer.Aparentemente, havia uma maior

Tabela 2. Volume relativo médio (%) dos principais itens alimentares consumidos por R. lapidifer,durante um ciclo hidrológico. Letras iguais na mesma coluna não diferem estatisticamente en-tre si pelo teste de Tukey (a = 0,05).

)%(seratnemilasnetI

odoíreP eadimonorihC aretpohcirT aretporemehpE

aiehC A08 B3 CB5,0

etnazaV BA16 A42 B7

aceS B94 A22 A5,42

etnehcnE A07 B6 C40,0

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participação de Chironomidae nosconteúdos estomacais de exemplaresjovens e um consumo mais importantede Trichoptera e Ephemeroptera entreos indivíduos maiores, o que foitestado através de regressões linearessimples. Os testes estatísticosrealizados não evidenciaram relaçõesimportantes entre o comprimentopadrão dos exemplares de R. lapidifere os principais tipos de presasconsumidas (Chironomidae: r2 =0,041; p > 0,05; n = 90; Trichoptera:r2 = 0,100; p < 0,005; n = 90;Ephemeroptera: r2 = 0,146; p < 0,01;n = 90). Mesmo considerando apredominância de indivíduos jovensnas amostras, os resultados indicamque não há mudanças marcantes nadieta dessa espécie ao longo de seudesenvolvimento ontogenético e queeventuais diferenças observadas nosconteúdos estomacais provavelmenterefletem o uso de diferentes micro-habitats ou tipos de substratos duranteo forrageamento. Alguns autoresconsideram que muitas espécies depeixes experimentam alteraçõesgraduais em suas dietas, relacionadasprincipalmente à ontogenia (Mol,1995; Abujanra et al. 1999).

Grau de similaridade entre asdietas de R. lapidifer dos rios

Araguaia e Tocantins, e em relaçãoa R. xinguensis do rio Xingu

A comparação entre as dietas deexemplares de R. lapidifer dos riosAraguaia e Tocantins capturados noperíodo de seca resultou em um altograu de similaridade (81%), o quepoderia ser esperado pelo fato de se

tratar de amostras de uma mesmaespécie, habitando rios de uma mesmabacia hidrográfica. Alta similaridadeentre a dieta de peixes, também foiverificada para quatro espécies deLeporinus (Anostomidae) do rioParaná, Brasil (Andrian et al., 1994)bem como para ciclídeos africanos dosgêneros Xenotilapia (Gysels et al.,1997) e Serranochromis (Winemiller,1991) e para quatro espéciessimpátricas de Etheostoma (Percidae)em ambientes de corredeiras norte-americanos (Martin, 1984),

O grau de similaridade foi aindamaior (92%) entre as dietas deespécies consideradas comoequivalentes ecológicos (R. lapidifer eR. xinguensis). Essa alta similaridadeprovavelmente reflete a ocorrência deum maior número de tipos de itensalimentares em comum entre estasespécies (seis), quando comparadocom os itens compartilhados pelaspopulações de R. lapidifer dos riosAraguaia e Tocantins (quatro) (Tab. 3).Além disso, a distribuição maiseqüitativa na participação dos itensdominantes na dieta (Chironomidae,Trichoptera e Ephemeroptera) (Tab. 3)também pode ter influenciado osresultados, bem como uma maiorsemelhança entre os ambientesamostrados nos rios Araguaia e Xinguquando comparados com o rioTocantins. Alto grau de similaridade(80%) também foi verificado entre asdietas de três espécies de bagrescalictiídeos da costa do Suriname(Mol, 1995) e entre ciclídeos (88%) dolago de Valência na Venezuela(Múñez, 1986).

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Aproveitando a disponibilidadede dados sobre a dieta de R. lapidiferdurante um ciclo sazonal completo norio Araguaia, foi calculado o grau desimilaridade entre a dieta dessesexemplares em relação aos espécimesdo rio Tocantins (Tab. 3). O índiceencontrado foi de 98%, superando osvalores obtidos nas outras análises. Aocomparar o conjunto de 18 tipos deitens alimentares da dieta dosexemplares do rio Araguaia (Tab. 1),com os seis tipos encontrados para osexemplares do rio Tocantins (Tab. 3),esperava-se que o grau de similaridadediminuísse, ao contrário do queocorreu. Porém, a participação dositens com pequeno volume relativo nadieta não influenciou de formaperceptível os valores de similaridade.

O índice de similaridade aumentouaparentemente em função da maiorabundância relativa de Chironomidaena dieta de R. lapidifer do rioAraguaia na cheia, de forma análogaao observado por Gysels et al. (1997)para espécies de Xenotilapia (ciclídeosafricanos). Esse conjunto deinformações indica que Chironomidaefreqüentemente compõe grande partedos recursos alimentares de muitasespécies de peixes, eventualmenteresultando em altos valores desimilaridade entre as dietas.

Conclusões

A dieta de R. lapidifer écomposta principalmente porinvertebrados de origem autóctone,com maior participação relativa das

Tabela 3. Valores de Índice Alimentar (I.A.%) dos tipos de alimentos consumidos por R. lapidifer(rios Araguaia e Tocantins) e R. xinguensis (rio Xingu) no período de seca (*I. A.< 0,01).

snetIrefidipal.R ,

aiaugarA)42=n(

,refidipal.RsnitnacoT

)01=n(

,sisneugnix.RugniXoir

)11=n(

eadimonorihCaretpiD 06,65 64,99 04,05

aretpohcirT 58,12 91,0 37,02

aretporemehpE 26,02 - 35,61

oãramacedotnemgarF 88,0 - -

otesniedotnemgarF 20,0 - 90,0

lategevotnemgarF 10,0 - -

aretpimeH 10,0 - 10,0

aretponemyH *00,0 - -

exiep,otgarF - *00,0 -

acsulloM - - 81,0

)sortuo(aretpiD *00,0 *00,0 -

eadiroboahCaretpiD - *00,0 10,0

atanodO 10,0 - -

aretpoeloC - - 28,3

soracÁ - - 10,0

ajnopseedalumêG *00,0 *00,0 10,0

aretpoeloCedavraL - - 10,0

acartsohcnoC - - 60,3

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larvas de Chironomidae, deTrichoptera e ninfas deEphemeroptera, sendo caracterizadocomo um peixe de hábito alimentarcarnívoro/insetívoro. Não foramobservadas relações importantes entreo comprimento padrão de R. lapidifere os principais tipos de presasconsumidas, indicando não haverdiferenças marcantes entre a dieta deexemplares jovens e adultos destaespécie.

O ciclo hidrológico do rioAraguaia provavelmente influencia adieta de R. lapidifer, possibilitando umaumento da quantidade de alimentonos estômagos a medida que diminuio nível das águas, indicando que estaespécie se alimenta com maiorintensidade ou eficiência no períododa seca. A sazonalidade tambéminfluencia a composição da dieta de R.lapidifer, havendo uma tendência destaespécie em consumir maisChironomidae na enchente e cheia, euma maior participação deEphemeroptera e Trichoptera navazante e seca.

O grau de similaridade entre asdietas de R. lapidifer dos rios Araguaiae Tocantins durante a seca foi alto, oque provavelmente reflete o elevadoconsumo de Chironomidae nesseperíodo. Entre as dietas de R. lapidiferdo rio Araguaia e R. xinguensis do rioXingu no período de seca, asimilaridade foi ainda mais alta, o quepode estar relacionado à grandesemelhança entre os ambientesamostrados nos dois rios.

Em função das características da

dieta de R. lapidifer, fortemente baseadano consumo de invertebradosautóctones, pode-se prever impactosnegativos sérios sobre as populaçõesdessa espécie, provocados pelaconstrução de hidrelétricas. Fatos comoesse devem ser levados em consideraçãona avaliação de custo/benefício emprojetos para implementação debarragens na Amazônia.

Agradecimentos

Agradecemos à SEPLAN -Governo do Estado do Tocantins eNaturatins/TO, pelo financiamento aoprojeto “Estudo das espécies ícticas eopções de manejo piscícola no ParqueEstadual do Cantão - Estado doTocantins”, durante o qual foramobtidos os exemplares analisados nopresente estudo; à Coleção de Peixesdo INPA, na pessoa da Dra. Lúcia H.Rapp Py-Daniel, pela autorização deuso de exemplares do acervo; ao MSc.Adilson Hara, pelas críticas esugestões ao manuscrito; ao CNPq eao PIBIC/INPA, pela concessão dabolsa de Iniciação Científica para S. S.Moreira.

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Aceito para publicação em 13/09/2002.

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