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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE BELAS-ARTES Didática do Desenho Aplicada à Animação João Lopes da Silva Dissertação MESTRADO EM DESENHO 2016

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE BELAS-ARTES

Didática do Desenho Aplicada à Animação

João Lopes da Silva

Dissertação

MESTRADO EM DESENHO

2016

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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE BELAS-ARTES

Didática do Desenho Aplicada à Animação

João Lopes da Silva

Dissertação orientada pelo Professor Doutor António Pedro Ferreira Marques e

coorientada pelo Professor José Miguel Ribeiro

MESTRADO EM DESENHO

2016

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Agradecimentos

Ao meu orientador e ao meu coorientador, pela disponibilidade e partilha de

conhecimentos.

À professora Magda Cordas, ao professor Pete Symons e aos meus colegas Leo

Bridle e kayvon Darabi-Fard, por me disponibilizarem material, tempo e

conhecimento.

Aos meus pais e irmão, por me terem apoiado nos estudos assim como em

tudo o que tenho tentado alcançar.

À minha noiva Filipa, por ter insistido comigo nos dias em que ficava

preguiçoso.

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"Se não souberes desenhar esquece. És como um ator sem braços nem pernas."

Art Babbit

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Resumo

Esta dissertação deve ser encarada como o reflexo de um conjunto de

aprendizagens que culminaram no Mestrado em Desenho da Faculdade de Belas-

Artes de Lisboa, encontrando-se organizada em quatro capítulos: 1) metodologia;

2) revisão da literatura / enquadramento teórico; 3) observação e análise dos

dados; e 4) apresentação de resultados.

A investigação desenvolvida no âmbito desta dissertação visou atingir os

seguintes objetivos: averiguar e evidenciar a presença do desenho no processo

produtivo da animação; identificar as limitações/dificuldades de animadores com

pouca formação em desenho; e encontrar exercícios de desenho que ajudem a

resolver essas mesmas dificuldades/limitações.

Face às características e objetivos deste projeto de investigação, foi seguida

uma metodologia de natureza qualitativa, recorrendo também a uma

multiplicidade de técnicas e instrumentos de recolha de dados (observação,

entrevista, questionário e análise documental).

A concretização desta investigação e a análise dos resultados permitiu verificar

a importância do ensino do desenho na área da animação, nomeadamente através

da realização de uma série de exercícios, contribuindo para a formação de

melhores animadores e, consequentemente, para a melhoria de resultados na

animação.

Palavras-chave

Didática do Desenho; Animação; Betty Edwards.

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XI

Abstract

The following Dissertation should be considered as the reflex of a group of

learnings which culminated in the Drawing Master’s degree, from the University of

Fine Arts in Lisbon, which has been organized in three main chapters: 1)

methodology; 2) revision of Literature/ theoretical setting; 3) observation and data

analysis; and 4) presentation of the project results.

The investigation developed, concerning the dissertation, envisioned reaching

the following objectives: verifying and making evident the presence of drawing in

the production process of animation; identifying limitations/difficulties inherent to

animators with basic drawing foundation; finding drawing exercises that help

resolve those same difficulties/ limitations.

Considering the characteristics and objectives of this investigational project, it

was opted to follow a method of qualitative nature, recurring also to a multiplicity

of techniques as well as instruments of data gathering (observation, interviewing,

and questionnaire and document analysis).

The conclusion of the investigation and result analysis, allowed the verification

of the importance of drawing teaching for the animation proficiency, mainly

through the production of a series of exercises, contributive to the establishment

of better animation practitioners and, consequently, to the improvement of

general results in the animation practice.

Keywords

Teaching of drawing; Animation; Betty Edwards

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Índice geral

Introdução ...................................................................................................................................................................... 1

Capítulo I – Metodologia ........................................................................................................................................... 3

1. Caracterização do tipo de pesquisa ........................................................................................................ 5

2. Técnicas e instrumentos de recolha de dados ................................................................................... 6

3. Procedimentos de análise de dados ....................................................................................................... 7

Capítulo II – Revisão da literatura / enquadramento teórico ................................................................... 9

1. O imperativo do desenho .......................................................................................................................... 11

2. O domínio do desenho para animação ................................................................................................ 43

Capítulo III – Observação e análise dos dados .............................................................................................. 77

1. Resultados do questionário realizado aos pofissionais de animação ................................... 79

2. Utilização de Método da Lateralidade de Betty Edwards ............................................................ 91

Capítulo IV – Apresentação de resultados ................................................................................................... 103

Referências bibliográficas .................................................................................................................................. 111

Anexos ........................................................................................................................................................................ 113

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Índice de imagens

Imagem 1 – Técnicas e instrumentos utilizados na recolha de dados ................................................ 7

Imagem 2 – Desenho elaborado por uma criança de três anos ............................................................ 12

Imagem 3 – Autorretrato elaborado por uma criança de oito anos ................................................... 13

Imagem 4 – Autorretrato elaborado por um adulto ................................................................................. 13

Imagem 5 – Competências globais do desenho .......................................................................................... 15

Imagem 6 – Dois hemisférios do cérebro humano ................................................................................... 16

Imagem 7 – Ilusão vaso-cara ............................................................................................................................. 17

Imagem 8 – Enunciado para preferência na mão ....................................................................................... 17

Imagens 9 e 10 – Imagem invertida de Einstein ....................................................................................... 18

Imagem 11 – Desenho do compositor Igor Stravinsky, elaborado por Picasso ............................ 19

Imagem 12 – Posicionamento correto do aluno na realização do exercício .................................. 20

Imagem 13 – Exercício executado de forma demasiado rápida pelo aluno .................................... 21

Imagem 14 – Exercício executado à velocidade recomendada ........................................................... 21

Imagem 15 – Moldura de enquadramento ................................................................................................... 23

Imagem 16 – Posicionamento da mão para a execução do exercício ................................................ 23

Imagem 17 – Linha de contorno desenhada diretamente na moldura de enquadramento ..... 23

Imagem 18 – Preparação da folha para o desenho ................................................................................... 24

Imagem 19 – Traços principais transferidos na moldura de enquadramento para o papel .... 25

Imagem 20 – Resultados obtidos por alunos de Betty Edwards ........................................................ 25

Imagem 21 – Unidade base sugerida por Betty Edwards ...................................................................... 27

Imagem 22 – Desenho demonstativo por Betty Edwards ..................................................................... 27

Imagem 23 – Avistamento de proporções ................................................................................................... 29

Imagem 24 – Avistamento de ângulos relativamente à constante horizontal .............................. 29

Imagem 25 – Paquímetro .................................................................................................................................... 30

Imagem 26 – Goniómetro ................................................................................................................................... 30

Imagem 27 – Unidade marcada diretamente na moldura de enquadramento ............................. 31

Imagem 28 – Medição da figura humana utilizando como unidade base a altura da cabeça . 31

Imagem 29 – Medição da altura da porta relativamente à unidade base ........................................ 32

Imagem 30 – Colocação da mão para obter a unidade base .................................................................. 32

Imagem 31 – Desenho em perspetiva (por um aluno de Betty Edwards) ...................................... 33

Imagem 32 – Desenho com o erro do ‘crânio cortado’ ........................................................................... 34

Imagem 33 – Desenho do crânio com a proporção correta .................................................................. 34

Imagem 34 – Proporções da cabeça ............................................................................................................... 35

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Imagem 35 – Enquadramento da cabeça (de perfil) na moldura de enquadramento ................ 35

Imagem 36 – Unidade base descrita por Betty Edwards ........................................................................ 36

Imagem 37 – Método utilizado para visualizar espaços negativos no perfil do rosto ................ 37

Imagem 38 – Resultado final do exercício realizado por um aluno .................................................. 38

Imagem 39 – Desenho de John Singer Sargent, damdo uso à matéria de luzes e sombras ..... 39

Imagem 40 – Posicionamento do aluno com a luz a incidir de um dos lados................................. 40

Imagem 41 – Acetato vermelho ........................................................................................................................ 40

Imagem 42 – Desenho das formas feraisluz/sombra .............................................................................. 42

Imagem 43 – Resultado final obtido por um aluno de Betty Edwards no final da formação . 43

Imagem 44 – Desenho usando como unidade base a distância entre a incisura jugular e o

topo da cabeça ........................................................................................................................................................... 45

Imagem 45 – Medição de uma figgura inclinada ....................................................................................... 46

Imagem 46 – Medição da figura na horizontal ........................................................................................... 46

Imagem 47 – Medição de formas perspetivadas ....................................................................................... 47

Imagem 48 – Exemplo de torço simplificado .............................................................................................. 48

Imagem 49 – Desenho do corpo humano em formas simplificadas .................................................. 49

Imagens 50 e 51 – Model sheets de personagens mostrando a construção através de formas

simplificadas .............................................................................................................................................................. 49

Imagem 52 – Animação no seu modo simplificado e em arte final ................................................... 50

Imagem 53 – Representações da caixa do torço e cintura em torção ............................................... 50

Imagem 54 – Corpo humano simplificado, desenhado em diferentes perspetivas ..................... 51

Imagem 55 – Identificação das articulações ............................................................................................... 52

Imagem 56 – Uso da sombra para acentuar a profundidade ............................................................... 53

Imagem 57 – Utiluização de pontos pivô para manter a proporção .................................................. 53

Imagem 58 – Rebatimento para encontrar proporções .......................................................................... 54

Imagem 59 – Rotação do crânio do personagem Scar (Rei Leão, 1994) .......................................... 54

Imagem 60 – Integração dos personagens da série Os Simpsons (1989) num cenário em

profundidade ............................................................................................................................................................. 55

Imagem 61 – Desenho ilustrativo do avanço e recuo das formas em escorço .............................. 55

Imagem 62 – Ciclo de andamento .................................................................................................................... 56

Imagem 63 – Representação do peso da figura a partir do centro ..................................................... 57

Imagem 64 – Personagem Shere Khan animada por Milt Kahl no filme Livro da Selva (1967)

.......................................................................................................................................................................................... 57

Imagem 65 – Exemplos de desenho do gesto ............................................................................................. 59

Imagem 66 – Exemplos de desenho do gesto ............................................................................................ 60

Imagem 67 – Demonstração do uso correto da linha de ação para acentuar o movimento ... 60

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Imagem 68 – Comportamento da linha de ação durante uma sequência de movimentos ...... 61

Imagem 69 – Poses reais do gesto aplicadas às poses para animação ............................................. 62

Imagem 70 – Movimento da saia provocado pelo movimento do corpo ........................................ 63

Imagem 71 – Reação do manto à movimentação da personagem ...................................................... 63

Imagem 72 – Divisão do corpo do animal em três partes ..................................................................... 65

Imagem 73 – Divisão da cabeça do animal em três partes ................................................................... 65

Imagem 74 – Esqueleto simplificado ............................................................................................................. 65

Imagem 75 – Sequência fotográfica por Eadweard Muybridge .......................................................... 66

Imagem 76 – Desenhos rápidos de animais ................................................................................................ 67

Imagem 77 – Desenhos de Tiepolo .................................................................................................................. 69

Imagem 78 – Desenho de um aluno de Bournemouth com base no estilo de Tieplo .................. 69

Imagem 79 – Aplicação do estilo de Tiepolo na aula de desenho nu ................................................. 69

Imagem 80 – Cenário do filme A Princesa Mononoke (1997) de Hayaomiyazaki ........................ 72

Imagem 81 – Cenário do filme Pinóquio (1940) de Walt Disney ......................................................... 72

Imagem 82 – Quadro de Rubens, apresentando uma composição triangular ............................... 73

Imagem 83 – Estudo da composição do quadro Anunciação de Leonardo Da Vinci .................. 73

Imagem 84 – Estudos de composição a partir dos filmes O Gigante de Ferro e Tarzan (1999)

.......................................................................................................................................................................................... 74

Imagem 85 – Imagens do diário gráfico do professor Peter Parr ...................................................... 76

Imagem 86 – Desenho do filme Viagem a Cabo Verde (2010) de José Miguel Ribeiro .............. 76

Imagem 87 – Anos de experiência profissional dos inquiridos .......................................................... 79

Imagem 88 – Nível académico dos inquiridos............................................................................................. 80

Imagem 89 – Presença da componente de desenho na formação dos inquiridos........................ 80

Imagem 90 – Nível de autoavaliação dos inquiridos ............................................................................... 81

Imagem 91 – Funções exercidas pelos inquiridos enquanto profissionais de animação .......... 82

Imagem 92 – Dificuldades sentidas pelos inquiridos ............................................................................... 84

Imagem 93 – Importância, ou não, do desenho para o animador moderno segundo os

inquiridos .................................................................................................................................................................... 86

Imagem 94 – Limitação do nível de desenho no desempenho profissional dos inquiridos ..... 89

Imagem 95 – Situação profissional dos inquiridos .................................................................................. 89

Imagem 96 – Utilização, ou não, de um diário gráfico pelos inquiridos .......................................... 90

Imagem 97 – Prática, ou não, de desenho ao vivo pelos inquiridos .................................................. 90

Imagem 98 – Exercício 1: Autorretrato de pré-instrução desenhado pela aluna ........................ 92

Imagem 99 – Exercício 2: Vaso-cara desenhado pela aluna .................................................................. 93

Imagem 100 – Exercício 3: Desenho invertido desenhado pela aluna ............................................ 94

Imagem 101 – Exercício 4: Contorno cego desenhado pela aluna .................................................... 95

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XVIII

Imagem 102 – Exercício 5: Desenho de contorno da mão desenhado pela aluna ........................ 96

Imagem 103 – Exercício 6: Cadeira desenhada pela aluna através das formas negativas ...... 97

Imagem 104 – Exercício 7: Porta e canto desenhados pela aluna em perspetiva ....................... 99

Imagem 105 – Exercício 8: Retrato de perfil desenhado pela aluna .............................................. 100

Imagem 106 – Exercício 9: Autorretrato desenhado pela aluna ...................................................... 101

Imagens 107 e 108 – Autorretrato inicial e autorretrato final desenhados pela aluna ........ 102

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Dissertação – Mestrado em Desenho

1

Introdução

As técnicas modernas de animação, na sua maioria digitais, têm vindo a

demonstrar uma evolução acentuada e, muitas vezes, pode até parecer que estão

a substituir totalmente os métodos operativos tradicionais. No entanto, o desenho

continua a estar bastante presente no processo de produção de filmes ou de

séries animadas, nem que seja nos processos de pré-produção, como o

storyboard e a criação de personagens. A falta de formação em desenho, no caso

de muitos profissionais de animação, limita a qualidade e a versatilidade do

trabalho.

Este trabalho de dissertação tem como objetivos averiguar algumas das

dificuldades sentidas pelos profissionais de animação que apresentam pouca ou

nenhuma formação em desenho e procurar demonstrar métodos que permitam

ensinar estes profissionais a desenhar, desde a formação de base mais geral, até

a uma formação mais orientada do desenho para animadores. Com este trabalho

ir-se-ão estudar, recuperar e criar interesse nos métodos de ensino e

aprendizagem do desenho na animação tradicional, integrando este conhecimento

nas práticas modernas do cinema de animação em prol de uma progressão no

trabalho do animador e dos outros profissionais envolvidos na produção de

animação que pretendam melhorar o seu conhecimento no desenho.

O estudo desenvolvido parte da seguinte questão-problema: de que maneira o

ensino do desenho favorece o desenvolvimento dos futuros animadores?

Pretende-se, deste modo, averiguar a importância do desenho no desempenho do

animador e no processo de animação propriamente dito, procurando investigar as

práticas/exercícios de desenho mais imprescindíveis à animação.

Da problemática em estudo decorrem algumas questões orientadoras e às

quais se procura dar resposta:

De que maneira está presente o desenho no processo da produção de

animação?

Quais as limitações/dificuldades de animadores com pouca formação em

desenho?

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João Lopes da Silva

2

Como podem ser combatidas essas mesmas limitações/dificuldades?

Que tipologias de exercícios são aplicadas no ensino do desenho para

animadores? E qual a importância desses exercícios para a animação?

Por sua vez, as questões definidas dão origem a uma série de objetivos:

Averiguar e evidenciar a presença do desenho no processo da produção da

animação;

Identificar as limitações/dificuldades de animadores com pouca formação

em desenho;

Encontrar exercícios de desenho que combatam essas mesmas

dificuldades/limitações.

Tendo em conta a problemática a ser explorada, em que está envolvida a

importância da didática do desenho aplicada à animação, esta dissertação aplica

uma metodologia de natureza qualitativa, mais concretamente uma metodologia

de estudo de caso, pelo que se tornou imprescindível o recurso a uma

multiplicidade de técnicas de recolha de dados (observação, entrevista,

questionário e análise documental).

Esta dissertação encontra-se estruturada em quatro capítulos: 1) metodologia;

2) revisão da literatura / enquadramento teórico; 3) observação e análise dos

dados; e 4) apresentação de resultados.

Com este estudo espera-se, acima de tudo, poder construir novas

competências em desenho de animação. Espera-se também que esta dissertação

traga resultados proveitosos e que possa ser alvo de importantes reflexões,

conduzindo a um melhor desempenho profissional e a uma recuperação de

algumas técnicas remotas de desenho para animação, que favoreçam um

desempenho mais qualificado.

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Dissertação – Mestrado em Desenho

3

Capítulo I

Metodologia

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João Lopes da Silva

4

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Dissertação – Mestrado em Desenho

5

Capítulo I

1. Caracterização do tipo de pesquisa

Tendo em conta a problemática, questões e objetivos que orientam este

projeto de investigação, a opção metodológica tendeu a apoiar-se num paradigma

interpretativo, que visa compreender e descrever significados. Assim, e segundo

Bogdan e Biklen (1994), numa investigação será mais coerente a adoção de uma

perspetiva interpretativa centrada num critério de mudança, procurando alcançar

objetivos que se relacionam com tomadas de decisão práticas e com a

implementação de inovações ou melhorias, no caso do presente estudo, ao nível

da formação, em desenho, para animadores profissionais. Optou-se, assim, por

uma investigação de natureza qualitativa, pretendendo contribuir para uma

produção de novos conhecimentos e para a melhoria da prática pessoal, tratando-

se de animadores e diretores de animação.

Não sendo propriamente um estudo de caso, o desenvolvimento do projeto

proposto beneficia de alguns aspetos atribuídos a este método de investigação

qualitativa, que se concentra sobre o estudo de um determinado contexto, uma

unidade particular que pode ser uma pessoa ou um grupo (como no caso deste

projeto), um acontecimento específico, uma organização ou comunidade. O

estudo de caso acarreta um conhecimento profundo da realidade investigada,

recorrendo por isso a diferentes métodos e técnicas de recolha de dados. Ainda de

acordo com Serrano (2004), o estudo de caso assume-se como uma modalidade

de investigação adequada para estudos exploratórios e compreensivos e que têm

como grande objetivo a descrição de uma situação, a explicação de resultados a

partir de uma teoria e a identificação das relações entre causas e efeitos.

Considerando que este trabalho contempla a área da formação artística, mais

precisamente o desenho de animação, o suporte teórico utilizado tem como ponto

de partida a apreciação de unidades curriculares de desenho, integradas em

cursos superiores de animação, em escolas nacionais e internacionais. Em

Portugal, foi relevante o papel das seguintes escolas: Escola Superior de

Tecnologia e Gestão de Portalegre, Universidade Lusófona, Universidade do

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João Lopes da Silva

6

Algarve, epi_ e Restart. Fora do país merecem destaque a Arts Univercity

Bournemouth, em Inglaterra, The Animation Workshop, na Dinamarca e Ecole de

l´image Gobelins, em França.

O estudo prévio dos conteúdos e da bibliografia associada aos programas das

unidades curriculares remete-nos para a importância de alguns autores e

professores, assim como para o exercício de micro didáticas especificas.

A informação iconográfica advém maioritariamente da consulta de artigos e de

livros elaborados pelos autores evidenciados nas unidades curriculares, assim

como da recolha de desenhos de alguns alunos, em consequência dos exercícios

específicos realizados durante a experiência de ensino aprendizagem em

animação.

2. Técnicas e instrumentos de recolha de dados

No que respeita à recolha de dados, deu-se privilégio a técnicas baseadas na

observação (observação participante e notas de campo), na conversação

(entrevista e inquérito) e na análise de documental (análise de desenhos,

exercícios…) (ver imagem 1). Assim, e segundo Larrote (2003), as técnicas de

observação são centradas na perspetiva do investigador que observa diretamente

o fenómeno em estudo; as técnicas baseadas na conversação são centradas na

perspetiva dos participantes e enquadradas na esfera de diálogo e interação; e a

análise de documentos é centrada na perspetiva do investigador implicando

pesquisa e leitura de elementos escritos como fonte de informação.

Técnicas Instrumentos

Observação

Observação participante

Notas de campo

Conversação

Entrevista (ver anexo 1)

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Dissertação – Mestrado em Desenho

7

Inquérito (ver anexo 2)

Análise documental

Desenhos

Exercícios de desenho

Imagem 1 – Técnicas e instrumentos utilizados na recolha de dados

3. Procedimentos de análise de dados

Já no que se refere à análise de dados, esta assume-se como o processo de

averiguação e organização de todos os dados que foram reunidos através das

diferentes técnicas de recolha de dados, tendo como objetivo promover a

compreensão dos mesmos. De acordo com Bogdan e Biklen (1994) esta análise

envolve: “a organização dos dados, a sua divisão em unidades manipuláveis, a

procura de padrões e, finalmente, a decisão sobre o que vai ser transmitido aos

outros” (p. 205).

Numa investigação qualitativa, a fase correspondente à análise e interpretação

dos dados exige do investigador um grande respeito por determinados

procedimentos que assegurem que as perceções, as observações, os relatos e

leituras das situações se enquadram dentro de alguns limites de correspondência

(Denzin & Lincoln, 2000), impondo-se assim o recurso a critérios de validade

externa e interna. Os primeiros - critérios de validade interna - visam assegurar a

consistência dos valores medidos com vários instrumentos e os segundos -

critérios de validade externa - garantir que os instrumentos medem de facto o que

se pretende, bem como assegurar o grau de representatividade das conclusões

em termos de realidade empírica.

Neste sentido, recorreu-se a uma triangulação de dados, ou seja, ao uso de

uma variedade de fontes sobre o assunto que se pretendia a estudar, por forma a

estudá-los e compará-los entre si, promovendo a sua validade (Sousa, 2005). O

recurso a esta triangulação de dados torna certamente esta investigação mais

consistente e permite uma melhor compreensão da problemática em estudo.

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João Lopes da Silva

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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Capítulo II

Revisão da literatura / enquadramento teórico

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Dissertação – Mestrado em Desenho

11

Capítulo II

1. O imperativo do desenho

De um modo geral, o aluno vocacionado para a frequência de um curso de

Animação já apresenta algum conhecimento sobre desenho e uma predisposição

para as Artes em geral. No entanto, nunca é demais fazer uma nova iniciação ao

desenho, pois grande parte destes alunos revela alguma imaturidade no que toca

à prática do desenho, com rigor e objetividade. Estes alunos estão muitas vezes

presos a um modo de registo convencional, demonstram pouco conhecimento

sobre desenho de observação, ainda não aprenderam a ver mais e melhor,

provêm de um ambiente que, geralmente, não propicia grandes conhecimentos de

anatomia artística e comparada, nem de desenvolvimento criativo da forma.

Assim, numa fase inicial da aprendizagem muitos educadores e profissionais de

animação consideram imperativo o ensino do desenho e nada mais que o

desenho, passando o ensino da animação propriamente dito para segundo plano.

Em Animation Survival Kit (2001), Richard Williams faz referência a um

episódio que vivenciou na adolescência, durante uma visita aos estúdios da

Disney, na Califórnia. Este relata o conselho que recebeu de Richard Kelsey, um

antigo diretor artístico dos estúdios Disney. Richard Kelsey disse-lhe: “Esquece a

animação, vai e aprende a desenhar, e eu não estou a falar de cartoons, aprende

a desenhar…” (2001, p.25), reforçando a ideia do desenho enquanto exercício

fundamental para os animadores, em especial para animadores tradicionais. Mas

como se ensina um animador a desenhar? Quais as metodologias mais

apropriadas a seguir?

A ação de desenhar corresponde a um ato natural para o ser humano

(Nicolaides, 1941). Desde muito cedo, no nosso desenvolvimento mostramos esse

impulso, pois se dermos uma folha a uma criança e um meio que lhe permita

marcar o papel, esta vai logo riscar de forma espontânea deixando a sua marca e

atribuindo significados aos riscos (é a mãe, é o pai, o cão, o tio…) por muito

básicos e abstratos que sejam (ver imagem 2). Na maioria dos casos verificamos

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João Lopes da Silva

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este entusiasmo pelo desenho até à pré-adolescência, aprimorando os traçados

dentro de um certo grau de aparência figurativa, onde já se conseguem identificar

vários sinais alusivos à realidade percetiva. Joana Quinn, uma das mais

conceituadas animadoras e realizadoras, faz referência a este facto, afirmando

que

As crianças muito jovens desenham da sua imaginação, mas quando atingem os

oito nove anos tem um conhecimento sofisticado da física do mundo à sua volta e

desenham a partir de factos. Utilizam símbolos para representar objetos, por

exemplo, um homem com uma coroa na sua cabeça é um rei. (Wells,Quinn & Mills,

2009, p.47)

Imagem 2 – Desenho elaborado por uma criança de três anos

No entanto, por esta altura a maioria das pessoas começa a sentir uma certa

frustração em relação ao desenho por não conseguir progredir, por si só, por não

conseguir aproximar-se mais do real e não poder ir muito além de um nível de

desenho de expressão infantil. “Considere o desenho de um profissional de

negócios reformado e verifique que é espantosamente similar ao desenho de uma

criança de oito anos” (Wells et al. 2009, p.47) (ver imagens 3 e 4). Esta frustração

leva a que a maioria dos indivíduos abandone o desenho para sempre,

estagnando neste nível até à idade adulta e concluindo para si que não tem “jeito

para o desenho” e que de qualquer maneira não é uma competência essencial

para a sua vida e para as suas pretensões futuras.

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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Imagem 3 – Autorretrato elaborado por uma criança de oito anos

Imagem 4 – Autorretrato elaborado por um adulto

Os indivíduos que persistem no ato de desenhar, depois da idade em que a

maioria das pessoas abandona o desenho, são sobretudo aqueles que evidenciam

um talento natural para desenhar. Estes sujeitos são elogiados, no seu quotidiano

com frases como “Desenhas tão tem, gostava tanto de ter jeito!” ou “Como é que

consegues fazer isso? Eu nem consigo fazer uma linha direita!”. Estes comentários

ao longo do tempo levam-nos a acreditar que quem desenha é detentor desse

dom especial, uma espécie de bênção que privilegia poucas pessoas.

Contudo, muitos dos mais conceituados docentes de desenho, como por

exemplo Kimon Nicolaides e Betty Edwards, defendem que a capacidade de

desenhar não é algo exclusivo de indivíduos especialmente dotados para as Artes,

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João Lopes da Silva

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que de alguma maneira encontraram a fórmula para saber desenhar, ou que já

nasceram predestinados geneticamente. Segundo estes autores, o desenho é tão

natural com a capacidade de falar, ler e escrever, mas, tal como nestas áreas, só

é possível progredir através de um processo de ensino aprendizagem.

Seguindo este raciocínio, ficam, portanto, algumas questões por responder. O

que estão a fazer mal os sujeitos que gostariam de evoluir no desenho, mas não

aparentam ter esse dom? Por outras palavras, sendo o desenho uma valência

ensinável então como se ensina alguém a desenhar? Com que exercícios? O que

escassa a estas pessoas que parece evidenciar-se de uma forma tão natural num

raro grupo de iluminados? Segundo Nicolaides (1941), desenhar corretamente

prende-se com aprender a ver corretamente, pois

Aprender a desenhar não se prende com artifício ou técnica, não tem nada a com

estética ou conceção prende-se somente com o ato de observar corretamente e

com isto refiro-me ao contacto físico com todo o tipo de objetos através de todos

os sentidos. (p.xi)

O mesmo autor defende também que

O impulso de desenhar é tão natural como o impulso de falar, regra geral,

aprendemos a falar através de um processo simples de prática, cometemos muitos

erros quando temos dois e três anos de idade. Mas sem estes primeiros esforços

em compreender a fala, seria uma loucura tentar estudar gramática ou

composição. (Nicolaides, 1941, p.xii)

Tanto o método de Kimon Nicolaides, como o método posterior de Betty

Edwards são amplamente utilizados no ensino do desenho nos diversos cursos de

animação por todo o mundo, como podemos verificar na bibliografia constante no

nos programas das unidades curriculares de cursos de formação inicial, nos quais

o desenho é lecionado.

Na fase inicial da generalidade dos cursos de animação e não só, são

geralmente efetuados exercícios específicos, presentes nestes dois métodos, assim

como em outras didáticas do desenho, que visam desbloquear esta possível

estagnação na evolução de alunos iniciantes, ajudando o aluno a adquirir, ou

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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reforçar, um conjunto de competências que o permitam aprender a observar

corretamente.

1.1. Introdução ao desenho através do método da lateralidade:

Drawing on the right side of the brain

Em Drawing on the Right Side of the Brain (2008), Betty Edwards sugere que o

desenho requer cinco competências básicas para a representação de um objeto,

pessoa ou paisagem. Embora o desenho seja o principal tributário, estas

competências são mais do domínio da perceção e podem ser enunciadas do

seguinte modo: 1) perceção dos limites; 2) perceção dos espaços; 3) perceção

das relações; 4) perceção de luz e sombra; e 5) perceção do todo (ver imagem 5).

Imagem 5 – Competências globais do desenho

Os resultados apresentados no livro de Betty Edwards mostram a evolução de

alguns alunos, com base num seminário intensivo de desenho, durante cinco dias.

A autora põe em destaque os resultados obtidos, comparando um desenho de

autorretrato, realizado no início da ação de formação, com outro autorretrato

realizado na fase final do percurso de aprendizagem.

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João Lopes da Silva

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Betty Edwards assenta o seu método de ensino na teoria do cérebro bipartido.

Nesta teoria, os dois hemisférios do cérebro desempenham funções distintas e

revelam diferentes formas de perceção, sendo o lado esquerdo do cérebro

associado ao pensamento verbal e analítico e o lado direito às representações

visuais e percetivas (ver imagem 6). Segundo a autora, o lado esquerdo do

cérebro interfere na abordagem do desenho para a maioria das pessoas, sendo

essa uma das grandes barreiras para que possam evoluir no aperfeiçoamento das

suas capacidades artísticas. Geralmente, as pessoas sem formação artística

analisam verbalmente o objeto que pretendem desenhar. O objetivo dos exercícios

é, portanto, “ter acesso ao lado direito predominantemente visual, apresentando-

lhe tarefas que o modo-esquerdo rejeita” (Edwards, 2008, p.xx).

Imagem 6 – Os hemisférios do cérebro humano

1.1.1. Exercício 1: A ilusão de Rubin

Para despontar esse conflito da transição do lado esquerdo para o lado direito

do cérebro, Betty Edwards sugere um exercício que utiliza uma das ilusões de

ótica desenvolvidas pelo psicólogo Edgar Rubin - o vaso cara (ver imagem 7) -

uma ilusão que apresenta ao observador uma escolha mental entre duas

interpretações corretas: a silhueta de um vaso ou o perfil de duas faces humanas

paralelas.

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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Imagem 7 – Ilusão vaso-cara

O aluno deve, portanto, copiar o perfil da face de um dos lados do desenho,

dependendo da mão dominante (ver imagem 8). De seguida, volta a passar por

cima dessa linha nomeando as partes por onde vai passando (testa, nariz, boca,

queixo). Terminada esta tarefa, o aluno deve dirigir a sua atenção para o lado

oposto, para desenhar o perfil simétrico. Chegando à testa ou ao nariz, Betty

Edwards afirma que podemos sentir-nos confusos ou em conflito. O propósito

deste exercício é fazer com que o aluno se auto observe, enquanto tenta

solucionar o problema criado por esta nova situação.

Imagem 8 – Enunciado para preferência na mão

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João Lopes da Silva

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A autora diz que, neste exercício, a maioria dos alunos sente muita dificuldade

e até uma paralisação na progressão do desenho. Mas diz que é exatamente esse

o objetivo do exercício, ou seja, que cada sujeito sinta, em primeira mão e na sua

própria mente, esse bloqueio. Ao sugerir que os alunos fossem nomeando as

partes, Betty Edwards está, supostamente, a apelar ao lado mais verbal; quando

pede que completem o desenho, com a forma simétrica, o aluno é levado a fazer

a transição para o lado mais visual, espacial e não-verbal, ou seja, o lado que

avalia as relações de tamanho, ângulos, curvas e formas. É esta transição que

causa essa perplexidade momentânea. O exercício obriga o aluno a encontrar

soluções para evitar uma consequente paralisação, obrigando-o a mudar de

estratégia e acedendo a outra forma de visualizar.

1.1.2. Exercício 2: Desenho com a página invertida

Gerado o conflito entre os lados do cérebro no primeiro exercício, Betty

Edwards sugere mais um exercício de cópia que vai, por sua vez, facilitar o

trabalho do cérebro, provocando a ação direta do hemisfério direito. Invertendo

simplesmente o objeto ou imagem que motiva o registo, o lado mais analítico é

colocado entre parênteses. Esta autora sugere que objetos que nos são familiares,

quando virados ao contrário, tornam-se difíceis de reconhecer para o nosso

cérebro, o que nos retira a familiaridade com os termos que identificam as

diferentes formas que os constituem. Assim, bloqueando o lado verbal, torna-se

mais fácil analisar o espaço, as formas, a luz e as sombras (ver imagens 9 e 10).

Imagens 9 e 10 – Imagem invertida de Einstein

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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O exercício consiste em desenhar uma reprodução do desenho de Picasso que

retrata o compositor Igor Stravinsky, rodando a imagem para baixo e mantendo

esta posição até ao final do registo, para não se anular o objetivo do exercício –

evitar nomear partes familiares, como as mãos ou os olhos, e focar apenas estas

partes como formas (ver imagem 11).

Imagem 11 – Desenho do compositor Igor Stravinsky, elaborado por Picasso

De acordo com Betty Edwards, os alunos normalmente ficam impressionados

com a sua própria performance neste exercício. Explica ainda que “Por motivos

não muito claros o sistema verbal rejeita a tarefa de ´ler´ e nomear imagens

viradas de cima para baixo.” Todavia o lado visual não parece importar-se com

esta particularidade, pois “o lado direito é livre da interpretação do seu padrão

verbal.” (Edwards, 2012).

Pode dizer-se que o objetivo deste mesmo exercício é evitar o conflito

encontrado no exercício anterior, pois “Quando o modo esquerdo desiste

voluntariamente, o conflito é evitado e o modo direito toma rapidamente o

controlo da tarefa que é apropriada para ele: desenhar uma imagem percebida.”

(Edwards, 2008, p.61).

Porém, a realidade percetiva não se dispõe de cima para baixo e, no dia-a-dia,

não podemos simplesmente inverter os objetos, os seres ou as paisagens que

pretendemos desenhar. Para aprender a desenhar, segundo Betty Edwards, o

aluno tem que aprender a ver como um artista e, para tal, deverá procurar

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João Lopes da Silva

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adquirir as cinco competências básicas do desenho mencionadas anteriormente

(perceção dos limites, dos espaços, das relações, de luz e sombra e perceção do

todo).

Como tal, os exercícios seguintes servem para ensaiar esses cinco

componentes básicos do desenho, de modo a que o aluno os assimile e no seu

conjunto lhe permitam adquirir as competências do desenho como um todo.

1.1.3. Exercícios 3 e 4: Perceção dos limites

A primeira competência é a perceção dos limites, ou seja, a chamada linha de

contorno que delimita as formas visuais. Para adquirir esta competência, Betty

Edwards sugere um primeiro exercício, proposto anteriormente por Kimon

Nicolaides no seu livro The Natural way to Draw (1941), que “o hemisfério

esquerdo provavelmente não vai gostar” (Edwards, 2012). O exercício consiste em

desenhar todas as rugas da palma da mão semifechada (de modo formar mais

rugas) durante cinco minutos, colocando um cronómetro ou temporizador a

marcar esse período, para evitar que os alunos estejam preocupados com a

passagem do tempo que é uma função, segundo a autora, do hemisfério esquerdo

(ver imagem 12).

Imagem 12 – Posicionamento correto do aluno na realização do exercício

O aluno deve colocar a ponta do lápis sobre folha de desenho e voltar a face

para o lado oposto para observar lentamente a mão que vai desenhar. Assim, vai

desenhar este ´mapa´ das rugas da mão sem nunca olhar para a folha, até

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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acabar o tempo. Começa-se a desenhar a partir de uma qualquer ruga na mão

seguindo as rugas com o olhar, lentamente linha após linha, coordenando sempre

o movimento milimétrico dos olhos com o movimento da ponta do lápis. Para tal,

“O lápis deve apenas gravar o que está a ver - nem mais nem menos - e no

momento que estiver a ver. A mão e o lápis funcionam como um sismógrafo

gravando apenas a sua real perceção.” (Edwards, 2012). O exercício é feito

sempre coordenando o movimento do lápis com o da mão, tentando não acelerar

o movimento, nem fazendo pausas, mantendo sempre um movimento a uma

velocidade lenta constante (ver imagens 13 e 14).

Imagem 13 – Exercício executado de forma demasiado rápida pelo aluno

Imagem 14 – Exercício executado à velocidade recomendada

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João Lopes da Silva

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Ao realizar esta experiência, o cérebro poderá começar por sentir um grande

conflito associado à ânsia de que não vai ser um “desenho bom”, e o aluno pode

até sentir um grande desconforto, mas com o passar dos minutos é suposto

começar a sentir-se mais confortável e realmente focado e interessado na

complexidade de linhas que está a percecionar. Neste momento, estamos,

segundo Betty Edwards, a atravessar para o lado direito, o lado visual, e

começamos realmente a desenhar.

A importância deste exercício é muitas vezes questionada pelos alunos, até

porque consideram que o resultado final não vai seguramente ser um bom

desenho. A razão apresentada pela instrutora é que, ao executá-lo, este exercício

provoca a renúncia do lado esquerdo do cérebro, permitindo ao aluno desenhar

sem o preconceito de que está a desenhar um ´aglomerado de rugas´, em vez de

nomear e rapidamente descartar estas rugas complexas, o aluno mantem-se

focado e interessado nelas e consegue percecioná-las de um novo modo. Permite

também transformar a capacidade de perceção e, a partir deste ponto, “começar a

ver como o artista vê” (Edwards, 2012).

Betty Edwards aprofunda mais esta matéria da linha de contorno com um

segundo exercício, o qual ajuda a capacidade do aluno de abordar o desenho de

observação. Neste exercício vai-se compreender como traduzir os traços do

mundo tridimensional como o vemos, na superfície plana de uma folha de papel.

Usando uma moldura de enquadramento, o aluno vai desenhar as linhas de

contorno da própria mão diretamente na moldura (ver imagem 15). Começa-se

por equilibrar a moldura na mão semifechada que vai provocar formas

sobrepostas e numa perspetiva aparentemente complicada de desenhar (ver

imagem 16). De seguida, inicia-se o desenho com uma caneta de feltro ou de

acetato sobre a superfície de um plástico transparente, mantendo a mão bem fixa,

assim como a cabeça, e mantendo um olho fechado. Desenha-se somente e

exatamente os contornos da mão como os estão a ver. No final do desenho,

colocamos a moldura sobre uma folha branca para ver o resultado (ver imagem

17).

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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Imagem 15 – Moldura de enquadramento

Imagem 16 – Posicionamento da mão para a execução do exercício

Imagem 17 – Linha de contorno desenhada diretamente na moldura de enquadramento

Ao desenhar os contornos da mão exatamente como os vemos, devemos ser

capazes de fazer uma representação convincente da nossa mão tridimensional,

numa superfície bidimensional como era o objetivo desta prática. Um truque

sugerido consiste em manter um olho fechado durante a execução do desenho,

pois ao faze-lo evitamos ver a imagem em dois pontos de vista, visto que a nossa

visão é binocular, o que provoca a nossa capacidade de ver em profundidade.

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João Lopes da Silva

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Assim, a imagem que estamos a percecionar mantem um único ponto de vista, ou

seja, fica plana, o que torna mais fácil a sua representação no papel.

No seguimento desta introdução do aluno às linhas de contorno em perspetiva,

o aluno vai fazer o seu primeiro “desenho verdadeiro” (Edwards, 2012). Assim, a

partir da base que se obteve na moldura de enquadramento com o exercício

anterior, o aprendiz vai transferir e aprofundar o desenho da mão para o papel.

Começa-se o desenho por copiar o interior da moldura de enquadramento que foi

utilizada anteriormente, preenche-se com uma leve tonalidade cinza e divide-se

este campo onde vamos desenhar em quartos, com um traço horizontal e vertical

a passar pelo centro, como está presente na moldura (ver imagem 18).

Imagem 18 – Preparação da folha para o desenho

Dá-se então o início ao desenho propriamente dito, copiando para a folha o

desenho que estamos a ver no plástico. Define-se pontos estratégicos usando a

grelha que desenhámos no papel para servir de referência, encontrando pontos do

nosso desenho que coincidam com os traços horizontais e verticais que fizemos

para dividir a folha. Assim, reduzimos a margem de erro e podemos começar a

ligar estes pontos copiando os traços um a um, questionando sempre “Neste

quarto da folha onde fica este ponto? E neste outro onde fica este ponto?”,

medindo sempre em relação à nossa referência a localização de cada linha e de

cada ponto, ligando de ponto em ponto, até completar a transferência do desenho

do exercício anterior para a nova base em papel (ver imagem 19).

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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Imagem 19 – Traços principais transferidos da moldura de enquadramento para o papel

Este primeiro esboço, proporciona uma boa base para o desenho final,

permitindo que na próxima etapa o aluno consiga dedicar a sua atenção aos

detalhes mais complexos da sua mão. Nesta fase, reposiciona-se a mão na pose

do exercício anterior ao lado do desenho. O aluno vai fechar um olho, de novo

para evitar a possível confusão da visão binocular, e foca um ponto na mão por

onde irá começar a desenhar os detalhes da mesma.

Mais uma vez, Betty Edwards insiste em se evite nomear as formas que está a

visualizar (nomes como unha, dedo, palma...), lembrando que o aluno continua a

observar simplesmente contornos, espaços, formas e relações. Por sua vez, a

instrutora sugere que neste exercício o aluno inclua uma ligeira indicação de tom,

carregando nas formas que observa como sendo mais escuras e apagando com a

borracha formas que aparecem mais iluminadas (ver imagem 20).

Imagem 20 – Resultados obtidos por alunos de Betty Edwards

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João Lopes da Silva

26

O que acontece com este exercício é que, como o aluno desenha o que vê no

visor de enquadramento, o desenho adquire uma aparência tridimensional

autêntica.

1.1.4. Exercício 5: Perceção dos espaços

Compreendida a primeira competência do desenho, a perceção dos limites, a

autora passa para uma segunda competência sobre a perceção do desenho: a

perceção dos espaços, designado no domínio do desenho por espaço negativo.

Mas porque é importante compreender os espaços negativos no desenho? Betty

Edwards justifica esta abordagem segundo duas razões principais. Primeiro, o uso

dos espaços torna o desenho mais fácil, pois não conhecemos nenhuma referência

verbal sobre os espaços, o que permite ao desenhador escapar à linguagem, ver

os espaços com clareza e desenhá-los de forma correta. Em segundo, um uso

coerente dos espaços negativos melhora a composição ao unificar os espaços e as

formas. Se for concebida aos espaços negativos a mesma importância que ao lado

positivo, aos elementos do sujeito ou objeto que vamos desenhar, todas as partes

funcionam juntas para criar uma imagem unificada.

Para compreender melhor esta matéria, é sugerido um exercício com uma

cadeira como modelo. A escolha da cadeira prende-se com o facto de ser um

objeto muito familiar e sobre o qual temos bastantes associações verbais e

conhecimento prévio, o que pode obrigar o cérebro a basear-se no conhecimento

que tem sobre o objeto (a cadeira) e a confundir-se quando o observa,

bloqueando o acesso ao nosso lado mais visual. No entanto, quanto aos espaços

negativos da cadeira não temos qualquer género de vocabulário associado e, no

fundo, são formas bastante simples de representar. Representar corretamente

estas formas simples que rodeiam a cadeira vai permitir ao aluno, ainda que

inconscientemente, desenhar a cadeira.

Volta-se a recorrer ao visor de enquadramento para executar este exercício,

como forma de encontrar uma composição que seja do agrado do aluno. De

seguida, desenhando diretamente no suporte de enquadramento, marca-se um

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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dos espaços negativos da cadeira para servir de referência para o posicionamento

global do objeto (ver imagem 21). O aluno vai transferir esta referência para o

papel, medindo com a mira e usando os traços horizontais e verticais que

preparou anteriormente no papel. Com base nesta referência no papel e no objeto

observado, o aluno começa a desenhar estas formas simples uma por uma

sempre tendo em atenção os tamanhos, as proporções e os ângulos destas

formas negativas que rodeiam o objeto, até completar o desenho. O aluno pode,

então, completar o desenho desenhando os detalhes que compõe a cadeira, já

com a forma definida pelos espaços negativos, dando de novo ligeiros

apontamentos de luz e sombra e, se escolher, até desenhar um pouco o cenário

de fundo da cadeira (ver imagem 22).

Imagem 21 – Unidade base sugerida por Betty Edwards

Imagem 22 – Desenho demonstrativo por Betty Edwards

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João Lopes da Silva

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Com este exercício Betty Edwards diz que os alunos começam a observar

espaços negativos em tudo no seu cotidiano. Sugere até que o aluno “pratique o

observar dos espaços negativos na rotina diária” pois esta prática diária ajuda a

“colocar as capacidades percetuais no modo automático preparada para ser

integrada numa habilidade aprendida que o aluno passa a possuir” (Edwards,

2008, p.132).

1.1.5. Exercícios 6 e 7: Perceção das relações

Assimilados os dois primeiros princípios, seguimos para a terceira componente

necessária para continuar a assimilar o desenho como um todo: a perceção das

relações “ver e desenhar relações”, sendo que nesta temática o aluno vai

aprender a desenhar com perspetiva e com proporções.

Para Joanna Quinn “A perspetiva é um bom exemplo do conflito entre o lado

esquerdo e o direito do cérebro e o porquê de tantas pessoas serem más a

representar a perspetiva.” (Wells et al. 2009, p.47) e fornece um exemplo

Desenhe uma mesa em perspetiva e as pernas mais longe vão ser um pouco mais

pequenas, mas o lado lógico do cérebro (o esquerdo) vai tentar prevenir que

desenhe isso pois ele sabe que as pernas devem ter o mesmo comprimento para

que a mesa funcione. (ibidem, p.47)

Betty Edwards afirma que “Os alunos de desenho que aprendem tudo exceto

como avistar relações criam um grande handicap no seu desenho e incorrem

constantemente em erros desconcertantes em proporção e perspetiva.” (Edwards,

2008, p.139). Ainda sugere que “este problema é uma praga para estudantes

novos no desenho assim como para alguns alunos bastante avançados” (ibidem,

p.139).

Encontrar relações, aprender a aferir os ângulos dos objetos e as suas

proporções é certamente um atributo relativamente complicado de aprender, no

entanto é extremamente importante. A perceção das relações constrói-se em duas

etapas – a medição de proporções e a perceção de ângulos - sendo que as

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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proporções encontram-se relacionadas entre si enquanto os ângulos avistam-se

relacionados segundo duas constantes: a vertical e a horizontal (ver imagens 23 e

24). Apesar destes ângulos e proporções muitas vezes não obedecerem às

proporções do mundo real dos objetos, devem-se desenhar exatamente como os

vemos, ou seja, planificados na moldura de enquadramento. Para os alunos

iniciantes de desenho, Betty Edwards sugere dois instrumentos auxiliares: para

ajudar a encontrar as proporções sugere o paquímetro (ver imagem 25) e para

ajudar a encontrar os ângulos um goniómetro (ver imagem 26).

Imagem 23 – Avistamento de proporções

Imagem 24 – Avistamento de ângulos relativamente à constante horizontal

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João Lopes da Silva

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Imagem 25 - Paquímetro

Imagem 26 - Goniómetro

Seguimos para exercícios práticos e explicativos de como encontrar estas

proporções e ângulos e consequentemente assimilar a aprendizagem da perceção

das relações.

Ajustando a moldura de enquadramento ao vão de uma porta, procura-se o

enquadramento que mais interessante para o exercício, desde que contenha a

porta completa. Como no exercício do espaço negativo, marca-se o topo da porta

diretamente no visor (ver imagem 27). Esta medida vai servir como unidade base,

a partir da qual se vão comparar todas as proporções. Imagine a unidade base

como a medida “um”, servindo de escala. Por exemplo, no desenho da figura

humana a altura da cabeça é muitas vezes usada como unidade base e o individuo

é medido a partir dessa altura. Uma, duas, três, quatro cabeças … até à base

obtendo um desenho proporcional (ver imagem 28). Transfere-se esta unidade

base para a folha, estimando o tamanho e a posição para que seja proporcional à

moldura de enquadramento.

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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Imagem 27 – Unidade marcada diretamente na moldura de enquadramento

Imagem 28 – Medicação da figura humana utilizando como unidade base a altura da cabeça

Segurando o lápis ou uma ferramenta auxiliar, o aluno vai começar a medir as

proporções relativas à unidade base (ver imagem 29). O processo de medir em

desenho usando um lápis ou outra ferramenta auxiliar não vai proporcionar

medidas exatas, porém é uma ferramenta prática para encontrar uma proporção

aproximada. Depois de nos posicionarmos em frente ao nosso tema, esticamos o

braço posicionando o lápis na horizontal ou na vertical, consoante o que se queira

medir, ou seja, a largura ou altura. Imaginando a unidade base como sendo o

topo da porta, coloca-se na horizontal. Alinha-se o topo do lápis com o extremo

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João Lopes da Silva

32

esquerdo ou direito da aresta que estamos a medir, consoante a mão que se está

a usar. Mantendo o polegar na parte de trás do lápis com a mão fechada, alinha-

se com o outro extremo da aresta que o aluno escolheu como a unidade base. A

porção do lápis, entre o topo e a unha, no campo de visão sobreposto à aresta do

topo da porta, fica gravada na memória como sendo “uma unidade”. Vai ser esta

porção que vai agora medir o resto da porta (ver imagem 30).

Imagem 29 – Medição da altura da porta relativamente à unidade base

Imagem 30 – Colocação da mão para obter a unidade base

Mantendo o braço esticado e bloqueado, roda-se o lápis na vertical. Descendo

desde o topo até à base, vai-se contando um, dois, três, dependendo da altura da

porta que se está a desenhar. A altura vai ser x vezes a largura. Memorizada esta

medida ir-se-á transferi-la para o papel, desenhando a aresta vertical da porta,

escalada em proporção com a unidade base. O aluno acabou de comparar a

proporção da largura com a altura da porta, no mundo real, exatamente como o

observou e conseguiu também transferir esta informação para o papel.

De seguida, o aluno vai aprender a observar os ângulos deste mesmo motivo,

recordando que os ângulos são avistados relativamente às constantes horizontal e

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Dissertação – Mestrado em Desenho

33

vertical. Para obter estas medidas, alinha-se um dos braços do goniómetro,

alinhado com o nosso campo de visão como se fez com o lápis para encontrar as

proporções. Alinhamos um dos braços do instrumento na vertical, ou horizontal,

com a base no vértice da aresta em que queremos encontrar o ângulo. De

seguida, inclina-se o outro braço do goniómetro até que este esteja coincidente

com a aresta que observamos perspetivada. Esta medida que obtemos é dos

ângulos como os vemos. Podemos com o goniómetro passar esta medida obtida

diretamente para o papel. Assim, a aresta que estamos a observar vai estar

representada no papel em perspetiva exatamente como a estamos a ver no

mundo real. Passo a passo, comparando proporções e obtendo os ângulos vai-se

construindo o desenho. Conciliando as outras competências adquiridas em

exercícios anteriores, vai-se entrando de forma mais profunda na capacidade de

visualização e obtendo resultados sólidos e convincentes de tridimensionalidade

(ver imagem 31).

Imagem 31 – Desenho em perspetiva (por um aluno de Betty Edwards)

No seguimento das competências ensinadas até ao momento, e como forma

de aprofundar a matéria da perceção das relações, Betty Edwards sugere que o

aluno aplique os conhecimentos obtidos, no desenho de um retrato, a partir de

um modelo visto de perfil. Segundo a autora, o erro mais comum cometido por

alunos iniciantes no desenho do retrato é o que ela chama de erro do ´crânio

cortado´ (ver imagens 32 e 33). Por motivos não muito claros, os alunos iniciantes

veem o topo da cabeça mais pequeno do que ele é na realidade, talvez por

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João Lopes da Silva

34

prestarem mais atenção às feições das pessoas e, portanto, visualizam-nas e

desenham-nas maiores. Mais uma vez, concluímos que não podemos estar

dependentes daquilo que pensamos e que vemos, tendo sempre que tirar as

medidas diretamente no modelo e usando os métodos de medição de proporções

do exercício anterior, confiando no que medimos.

Imagem 32 – Desenho com erro do ´crânio cortado´

Imagem 33 – Desenho do crânio com a proporão correta

A autora indica algumas proporções chave para evitarmos esta má

interpretação das proporções do crânio no próximo exercício de desenho do

retrato de perfil:

1) A medida entre a altura da vista e a base do queixo é igual à medida entre a

altura da vista e o topo do crânio;

2) A medida entre a altura da vista e a base do queixo, é igual à medida entre o

ângulo externo do olho e a parte de trás da orelha (Edwards, 2012) (ver imagem

34).

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Dissertação – Mestrado em Desenho

35

Imagem 34 – Proporções da cabeça

Estas medidas podem ser memorizadas pelo aluno, pois variam muito pouco

de sujeito para sujeito. Começa-se então o exercício do retrato de perfil. O aluno

deve preparar a folha onde vai desenhar com o formato da moldura de

enquadramento, dando uma tonalidade cinza à área retangular que define para o

desenho e dividindo suavemente em quartos com uma linha horizontal e vertical a

meio deste formato. Pede-se ao modelo para se colocar de perfil e usa-se a

moldura de enquadramento para encontrar a composição desejada, desde que

englobe a cabeça toda que vamos desenhar (ver imagem 35). Em seguida, o

aluno vai escolher a sua unidade base, ou seja, uma medida conveniente que

sirva de guia para as proporções enquanto desenhamos. Uma boa unidade base

para começar o desenho, segundo Betty Edwards, pode ser à medida que vai

desde o plano dos olhos até à base do queixo (ver imagem 36).

Imagem 35 – Enquadramento da cabeça (de perfil) na moldura de enquadramento

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João Lopes da Silva

36

Imagem 36 – Unidade base descrita por Betty Edwards

Marca-se a base e o topo da unidade base diretamente na moldura de

enquadramento e transfere-se esta informação para a folha, como nos exercícios

anteriores, colocando a unidade base na folha na mesma posição relativa à que se

obteve na moldura de enquadramento. Desta forma, garante-se que se respeitam

as proporções e que o enquadramento na folha será igual ao que foi visualizado

na moldura de enquadramento.

Depois, é pedido ao aluno que use o espaço negativo em frente do perfil e, em

vez de desenhar o perfil propriamente dito, desenhe o contorno desta forma

negativa, aplicando, deste modo, a informação anterior (ver imagem 37).

Seguindo a forma negativa, o aluno vai-se deparando com ângulos do rosto, como

o ângulo do nariz. Avistando-o com o goniómetro com um braço preso na

constante horizontal, inclina-se o braço adjacente até que este coincida com o

ângulo do nariz e marca-se esta medida no papel. Desenha-se o olho relativo à

curva mais interior no topo do nariz, verificando o ângulo da pálpebra relativa à

horizontal. Prossegue-se desenhando a frente do perfil continuando como espaço

negativo, sempre verificando os ângulos e as proporções quando a linha é

interrompida ou muda de direção.

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Dissertação – Mestrado em Desenho

37

Imagem 37 – Método utilizado para visualizar espaços negativos no perfil do rosto

Tomando a unidade base, estabelece-se a proporção da largura do perfil a

partir do ângulo externo do olho até à nuca e marca-se essa medida na folha. De

seguida, avista-se a altura máxima do crânio a partir da altura do olho e marca-se

esta medida, em proporção, na folha. Sabemos, à partida, que se escolhermos

como unidade base a altura do olho até ao queixo, que essa medida vai coincidir

com a distância do olho ao topo do crânio, variando muito pouco entre indivíduos.

Com estas marcas encontradas e traduzidas no papel, adquirimos informação

suficiente para desenhar o espaço negativo do contorno do crânio, deste a testa

até à nuca.

Com o lápis na vertical em frente dos olhos, vai-se bloquear a forma negativa

entre a nuca e a base do pescoço e desenha-se esta forma na posição equivalente

no papel. Assim, através destes processos de medida, vai-se encontrando os

vários elementos que compõem a cabeça e aos poucos vai-se completando o

desenho. Como nos exercícios anteriores, o aluno deve aproveitar para dar

algumas indicações de luz e sombra, apagando com a borracha formas que lhe

pareçam mais claras e carregando sombreando as formas que lhe pareçam mais

escuras.

Uma parte que pode ser desafiante para os alunos é quando estes são

confrontados com as formas complexas do cabelo. Para desenhar cabelo, Betty

Edwards aconselha o aluno a cerrar parcialmente os olhos para não se prender

com detalhes e para que consiga ver também onde estão as maiores zonas de

brilho e sombra. “Não desenhes cabelo a cabelo. Tenta dar o carácter do cabelo

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João Lopes da Silva

38

em geral, no seu todo. Através da luz, brilho e sombra.” (Edwards, 2012). O aluno

é encorajado a procurar algum detalhe no cabelo, principalmente onde este faz a

fronteira com a cabeça e a desenhar até alguns dos cabelos individuais, mas

apenas aqueles que realmente consegue ver.

Ao finalizar esta prática o aluno já vai estar a usar as três primeiras

competências do desenho com alguma confiança (ver imagem 38).

Imagem 38 – Resultado final do exercício realizado por um aluno

1.1.6. Exercício 8: Perceção de luzes e sombras

Nos exercícios precedentes, Betty Edwards já vinha gradualmente encorajando

os alunos a incluir nas práticas um pouco desta matéria que se vai agora

aprofundar. A perceção de luzes e sombras acrescenta grande qualidade ao

desenho na ilusão de tridimensionalidade de algo que está representado numa

superfície plana.

No dia-a-dia estamos cientes de luzes e sombras, mas como as luzes e sombras

mudam constantemente enquanto nos movemos ou enquanto a fonte de luz muda

elas não são observadas de um modo totalmente consciente pelo lado esquerdo do

cérebro. Nós não nomeamos sombras. (Edwards, 2012)

Ao desenhar as formas das sombras e luzes exatamente como as vemos,

alguém que visualize o desenho não vai ver estas formas. Em vez disso, o

observador vai perguntar-se como se conseguiu representar o tema de uma forma

tão tridimensional (ver imagem 39). Para Betty Edwards “O mais importante em

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Dissertação – Mestrado em Desenho

39

desenhar retratos é evitar o sistema de símbolos, que discutimos anteriormente,

as luzes e sombras vão ajudar o aluno nisso.” (Edwards, 2012). Afastamo-nos

deste sistema de símbolos porque, como foi dito anteriormente, não nomeamos

estes espaços mais escuros ou mais claros. Por exemplo, desenhando as formas

de luz e sombra que rodeiam a boca, a própria boca vai surgir no desenho, assim

como quando se desenhava as formas negativas que rodeavam a cadeira

inadvertidamente está-se a desenhar a cadeira.

Imagem 39 – Desenho de John Singer Sargent, pondo em evidência a relação de luzes e sombras

Para se incluir a matéria das luzes e sombras no portfólio, o aluno vai nesta

fase fazer um segundo autorretrato, depois de no início da instrução ter feito o

primeiro autorretrato com o intuito de se aperceber do nível de desenho pré-

instrução em que se encontrava. A autora volta a pedir a preparação de um

formato de tonalidade cinza, com a grafite no papel, dividido em quartos, onde se

vai inserir o desenho. O aluno vai posicionar-se em frente a um espelho com um

foco de luz (como um candeeiro de pé) a incidir sobre um dos lados do rosto, para

criar uma composição mais definida de luz e sombra sobre o rosto (ver imagem

40). Ao encontrar no espelho uma composição de luz e sombra que lhe agrade,

seja uma vista de frente ou de três quartos do rosto, a autora sugere que o aluno

coloque uma folha de acetato vermelha colada ao espelho, para ajudar o aluno a

ver-se de forma objetiva. O acetato vai mascarar os detalhes do rosto que ainda

não interessam nesta altura e permite que o aluno consiga ver a formas gerais de

luz e sombra. Mantem-se este acetato vermelho junto ao espelho até que se

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João Lopes da Silva

40

esteja pronto para trabalhar com formas mais pequenas de luz e sombra, bem

como terminar pormenores (ver imagem 41).

Imagem 40 – Posicionamento do aluno com a luz a incidir de um dos lados

Imagem 41 – Acetato vermelho

O aluno vai observar o reflexo no espelho, procurando espaços negativos e

pontos interessantes de formas de luz e sombra, tentando suprimir a linguagem,

sobretudo, críticas verbais da face e feições. A autora diz que a tarefa pedida pode

ser difícil de conseguir por obrigar a um novo uso do espelho, que não é verificar

e corrigir, mas refletir de imediato a imagem de um modo quase impessoal. Está a

ser pedido ao aluno que tente ver a imagem diante de si, como se estivesse a

observar uma simples “natureza morta” ou a fotografia de alguém desconhecido.

Durante o curso de Betty Edwards, é sempre lembrado ao aluno que evite

ligar-se à linguagem e ao conhecimento prévio que tem de termos que

identifiquem o objeto desenhado, por esta identificação supostamente despertar o

lado mais verbal do cérebro (o lado que se está a tentar suprimir, adormecer)

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Dissertação – Mestrado em Desenho

41

para dar espaço ao lado direito, o lado da perceção e consecutivamente mais

capacitado para perceção do desenho.

O processo repete-se: é pedido ao aluno que escolha uma unidade base, que

podendo repetir a mesma que já foi usada no desenho do retrato de perfil,

marcando o topo e a base desta medida no acetato vermelho. De notar que o

espelho nesta situação está a fazer o papel da moldura de enquadramento.

Transfere-se novamente esta unidade base, à escala, comparando as proporções

do tamanho da folha em relação às encontradas no espelho, na mesma posição.

Identificam-se, através de observação, as maiores formas de luz, notando onde

estas se localizam relativamente à unidade base e aos quartos do formato.

Betty Edwards inicia o desenho apagando com a borracha zonas da mancha

cinzenta e provocando o aparecimento, através da superfície branca do papel, por

baixo do tom, das formas gerais de luz que identificou. De acordo com a autora,

nesta fase inicial é importante “ignorar quaisquer formas pequenas ou cantos,

estamos a tentar ver apenas as formas maiores de luz e sombra” (Edwards,

2012). Depois de identificadas as formas de luz e sombra maiores, é sugerido que

o aluno apague a base cinza da grafite à volta da cabeça, fazendo sobressair a

mesma no papel, deixando este tom de cinza como meio-tom na escala de claro

escuro do desenho (ver imagem 42). O aluno tem, neste momento, a base do

desenho assegurada, com as secções principais de luz e sombra apontadas, e vai

começar a trabalhar o desenho, “empenhando-se em detalhes de rebordos,

espaços, relações de luzes e sombras de menos grandeza” (Edwards, 2012).

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João Lopes da Silva

42

Imagem 42 – Desenho das formas gerais luz/sombra

Ao finalizar, o aluno terá adquirido um desenho onde usou todas as

capacidades cognitivas adquiridas nas lições precedentes, acrescentando uma

maior ideia de volume, tridimensionalidade e sensação de aproximação ao real

(ver imagem 43).

Imagem 43 – Resultado final obtido por um aluno de Betty Edwards no final da formação

Como a autora explicou, a quinta capacidade de perceção do desenho - a

perceção do todo - não requer instrução, pois supostamente surge

automaticamente aliada às instruções das outras quatro componentes do

desenho.

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Dissertação – Mestrado em Desenho

43

2. O domínio do desenho para animação

O desenho para animação requer algumas preocupações em aspetos

específicos como, por exemplo, demonstrar um propósito; servir a ação, não

depende propriamente do estilo de desenho. Deanna Marsigliese, animadora e

professora, ressalta a importância do desenho relatando a sua experiência

pessoal:

Eu desenvolvi as minhas capacidades artísticas ao desenhar constantemente e por

trabalhar com pares, instrutores e colegas talentosos. Eu não acredito que o

desenho para a animação esteja preocupado com qualquer estilo em particular. Os

desenhos de animação são definidos pelo seu propósito: de demonstrar vida,

história, movimento. Cada desenho deve dar a sentir que faz parte de uma

sequência contínua, demonstrando um sentido de força, direção, peso, clareza e,

claro, emoção. Independente do estilo de desenho de alguém, o desenho para

animação envolve dinâmicas, contendo um sentido de energia e vida. (Marsigliese,

citada por Wells, Quinn & Mills, 2009, p.184)

Durante a era dourada da Disney, os animadores que trabalhavam nas grandes

produções, como o Pinóquio e o Dumbo, definiram um conjunto de princípios que

ainda hoje estão em vigor, conhecidos como os princípios chave da animação,

sendo um destes princípios o desenho sólido. Desta forma, o domínio da técnica

do desenho era muito valorizado pelos antigos mestres da animação.

Grim Natwick, cuja carreira começou, em Nova Iorque, em 1924, disse: “Deves

aprender a desenhar o melhor possível, antes de começar a animar”, pois “quanto

melhor desenhares mais fácil será para ti (a animação). Terás de desenhar o

personagem em todas as posições e de todos os ângulos.” (Natwick, citado por

Thomas & Johnston, 1981, p.68). Mais tarde, o animador Mark Davis afirmou

também que “Desenhar é como fazer uma performance: um artista é um ator que

não é limitado pelo seu corpo, apenas pela sua habilidade e, talvez, experiência.”

(Davis, citado por Thomas & Johnston, 1981, p.68), reforçando assim a ideia do

desenho como “segunda natureza do animador” (Williams, 2001, p.23). Quanto

maior for o domínio nesta matéria, menos esforço será necessário para desenhar

a personagem e maior será a disponibilidade para pensar a ação e a performance

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João Lopes da Silva

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do personagem, sendo que o animador é como um ator, como disse Mark Davis,

que interpreta o seu papel através dos personagens que anima, comunicando

através do desenho (Davis, citado por Thomas & Johnston, 1981).

Também Milt Kahl, um dos principais animadores em toda a história da

animação Disney, destaca como imprescindível a importância do desenho:

Não creio ser possível tornar-se um animador de primeira linha, sem se ser um

excelente desenhador. Deve-se tentar conhecer o todo da figura, conhecer a figura

humana o melhor possível para que se possa detetar a identidade de alguém em

particular, a diferença, o porquê de uma pessoa ser diferente de uma outra

qualquer. (Kahl, citado por Williams, 2001, p.24)

Milt prossegue, defendendo que:

A capacidade de desenhar e conseguir manipular os objetos, assim como ter a

capacidade e o conhecimento que permitam caricaturar e exagerar na direção

correta e enfatizar a diferença entre as coisas, é sempre essencial. O desenho será

muito mais sólido se conseguir retratar as diferenças. Necessita deste background

do desenho figurativo para resolver as contingências do registo. Todos os

animadores deviam ter este background e infelizmente não o têm! Nunca é

demais. Se procuramos caricaturar ou satirizar temos que dominar a versão

correta. Serve como ponto de partida e fornece o contraste. (Kahl, citado por

Willians, 2001, p.24)

No caminho para um maior domínio da figura animada, muitos dos cursos de

formação existentes dedicam bastante tempo ao domínio e conhecimento da

figura humana, nomeadamente através de aulas de modelo vivo. Focam-se,

essencialmente nos seguintes aspetos: ensino da estrutura do corpo e

simplificação geométrica, proporções, ensino de princípios básicos de

antropometria, osteologia e miologia, fisiologia do movimento. A capacidade de

captar ações, movimentos e expressões dinâmicas da figura humana (com o

desenho do gesto) constitui um fator primordial da animação. No desenho de

modelo vivo, o aluno tem a oportunidade de adquirir conhecimento da realidade

percetiva, aproximando-se da “versão correta” mencionada anteriormente por Milt

Kahl.

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Dissertação – Mestrado em Desenho

45

2.1. Medição e anatomia

A representação da figura humana sofreu várias alterações ao longo da história

da arte, pois os ideais de diferentes épocas foram definindo sucessivos cânones de

representação. No entanto, quando hoje desenhamos o modelo, os formulários

existentes não substituem os métodos de correta medição e observação do

natural, como nos exemplos dados por Betty Edwards.

No desenho da figura humana a unidade base mais frequente de medida é,

como foi referido anteriormente, a cabeça. De acordo com o tratado de anatomia

artística produzido por Paul Richer, o homem médio mede sete cabeças e meia,

sendo que o torso corresponde á altura de quatro cabeças, que vai desde o topo

do crânio até ao púbis, assim como as pernas correspondem igualmente a quatro

cabeças desde a planta dos pés até á articulação do fémur com a bacia. A altura

corresponde a sete cabeças e meia total, em vez de oito, visto que entre a base

do ísquion e o topo da extremidade do fémur coincide uma altura de meia cabeça

entre as duas porções.

Apesar de a cabeça ser a unidade base mais usual, pode fazer sentido utilizar

outra medida padrão. Na imagem 44, por exemplo, a unidade base usada é a

distância entre a incisura jugular e o topo da cabeça.

Imagem 44 – Desenho usando como unidade base a distancia entre a incisura jugular e o topo da

cabeça (Gordon, 2004, p.126).

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É óbvio que um modelo não permanece continuamente na posição vertical.

“Esta figura tem cerca de cinco cabeças de comprimento. As medidas que definem

a localização da sínfise púbica (duas cabeças para baixo e duas cabeças para

dentro a partir da vertical) permitem-lhe definir a curva do movimento.” (Gordon,

2004, p.130) (ver imagem 45).

Imagem 45 – Medição de uma figura inclinada

No desenho do modelo pode fazer mais sentido obter as medidas através de

uma linha horizontal que atravesse o objeto desenhado, como é o caso da figura

reclinada. “Sobre essa linha poderá então estruturar o comprimento da figura

relativamente à medida da cabeça, assim como a profundidade da figura”.

(Gordon, 2004, p.131) (ver imagem 46).

Imagem 46 – Medição da figura na horizontal

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Dissertação – Mestrado em Desenho

47

As medidas em perspetiva do corpo são difíceis de aferir. Aliás, Nicolaides diz

“Se tentar recorrer somente à vista, elas podem na verdade induzir em erro.”

(1941, p.6). A imagem 47 exemplifica como medir elementos em perspetiva,

utilizando os pontos onde as formas se sobrepõem para obter a medida de

referência.

Imagem 47 – Medição de formas perspetivadas

Louise Gordon refere que “o conhecimento anatómico pode ser usado para dar

ênfase a certos pormenores, força e subtileza, jovialidade, ou para conferir

realismo.” (Gordon, 2004, p.9). “O conhecimento anatómico pode contribuir para

a compreensão daquilo que é visto por nós e ajuda-nos a ver mais, para que se

possa estabelecer uma maior intimidade e uma maior liberdade.” (Putney, 1979

citado por Gordon, 2004, p.9).

O professor Pete Symons, diretor do curso de Animação no Arts University

Bournemouth, justifica a importância de adquirir este conhecimento anatómico.

Symons não pretende que os alunos memorizem os nomes de cada osso e

músculo, mas que, quando deparam com formas complexas, como as subtilezas

da articulação do joelho, percebam o que se passa no seu interior, na estrutura

por debaixo da pele.

Walt Stanchfield considera a anatomia como “essencial para qualquer desenho”

(Stanchfield, 2009, p.10): em qualquer personagem ou ação desempenhada, a

essência deve permanecer constante, mesmo que a ação representada seja

exagerada ou caricaturada. O mesmo autor dá mesmo um exemplo: “Um cotovelo

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João Lopes da Silva

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é um cotovelo, apenas dobra de uma determinada maneira e tem as suas

limitações. Podem ser tomadas algumas liberdades, mas a realidade até de um

cartoon deve ser mantida ou perderá a plausibilidade e credulidade.” (ibidem,

p.10).

2.2. Formas simplificadas

A figura humana, assim como qualquer outra forma, pode ser simplificada (v.g.

através de cilindros, cubos e esferas) que no seu conjunto formam uma espécie

de manequim, sendo a construção deste manequim a parte mais importante do

desenho figurativo. Esta estrutura de base vai provir o desenho de um sentido de

massa, substância e profundidade. Resumir as formas do corpo a um conjunto de

figuras geométricas simples cria a base do desenho em proporção, um esqueleto

que se vai trabalhar sobrepondo os detalhes. Todas as partes do corpo podem ser

simplificadas: o torço, a cintura, as pernas, os braços, a cabeça, as mãos e os pés.

As formas simplificadas como as da imagem 48 servem de auxílio para perceber

onde cada elemento encaixa, esteja visível ou invisível do ponto de vista a partir

do qual se observa o modelo (ver imagem 48).

Imagem 48 – Exemplo de torço simplificado

Nas aulas iniciais de modelo nu, na Faculdade de Bournemouth em Inglaterra,

os alunos aprendem a desenhar o modelo desta maneira simplificada, o que lhes

permite começar a compreender a estrutura e funcionalidades do corpo (ver

imagem 49).

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Dissertação – Mestrado em Desenho

49

Imagem 49 – Desenho do corpo humano com as formas simplificadas

Perceber a simplificação do corpo serve também para exercitar a simplificação

de personagens e, mais tarde, vai ajudar na criação de modelos de personagem

(model sheet). As mais conhecidas personagens do mundo da animação são

construídas a partir de formas simplificadas, uma fórmula que serve como

referência para todos os animadores desenharem o personagem com os mesmos

padrões. (ver imagens 50 e 51).

Imagens 50 e 51 - Model sheets de personagens mostrando a construção através de formas

simplificadas

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João Lopes da Silva

50

Para Stanchfield “As formas simples são o que o animador usa enquanto anima

o personagem. Quando estas formas básicas estão a funcionar, os detalhes

podem ser acrescentados.” (2009, p.16) (ver imagem 52).

Imagem 52 – Animação no seu modo mais simplificado e em arte final

Qualquer figura em ação incorpora algum género de torção ou rotação.

Identificar as partes do corpo como formas simplificadas pode servir de ajuda na

visualização de torções ligeiras na imagem 53. Nesta mesma imagem, surgem

alguns exemplos da caixa do torço e da caixa da bacia, simplificadas em cubos,

mostrando a rotação e a torção em várias poses.

Imagem 53 – Representações da caixa do torço e cintura em torção

No exemplo do torço, enquanto este roda, os músculos de um lado contraem-

se, enquanto os músculos do lado oposto contrabalançam esticando e alongando-

se. Pensar o corpo em tubos e cubos facilita também a colocação do personagem

em perspetiva como se pode ver na imagem 54.

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Dissertação – Mestrado em Desenho

51

Imagem 54 – Corpo humano simplificado, desenhado em diferentes perspetivas

2.3. Escorço

Dar às formas a ilusão de avanço e recuo na folha, dar a ideia de

tridimensionalidade e profundidade e desenhar elementos sobrepostos pode ser

confuso e difícil para o aluno. Brune Hogarth indica nove princípios do escorço que

ajudam a resolver a figura em profundidade e que servem para “auxiliar a

compreensão da forma e reforçar o entendimento do espaço” (Hogarth, 2003,

p.223).

Segundo Hogarth, ao longo da história foram sendo investigadas formas de

produzir a ilusão de tridimensionalidade no desenho, ou seja, maneiras de fazer as

formas avançar ou recuar. “Os princípios ilusionísticos de luz e sombra para

produzir volume, a perspetiva linear e a figura em escorço constituem grandes

progressos no caminho de soluções para a conversão da profundidade.” (Hogarth,

2003, p.223). Perceber como a figura funciona com formas avançadas em relação

a outras sobrepostas e em perspetiva, dominar a ilusão de profundidade é, para

Hogarth, imperativo antes de pensar em “exagerar, distorcer ou inventar novas

perceções do real” (ibidem, p.223).

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João Lopes da Silva

52

Os nove princípios de Hogarth (2003) para auxiliar a representação da figura

humana em escorço são:

1) Sobrepor formas para retratar o avanço ou recuo de uns elementos em relação

a outros. Segundo Hogarth “as formas vão parecer avançar ou retroceder no

espaço, independentemente do tamanho ou configuração, se o contorno da

forma for claramente intercetado ou sobreposto por outra” (Hogarth, 2003,

p.224).

2) As formas cilíndricas, quando desenhadas em profundidade, tendem a ficar

simplesmente circulares, sendo que a largura da forma se mantém inalterada,

mas o comprimento encolhe em profundidade.

3) Na representação do escorço, encontrar os posicionamentos das várias

articulações, para depois completar com as formas que as ligam (ver imagem

55).

Imagem 55 – Identificação das articulações

4) Aumentar a compressão das formas, acentuando o afunilamento, para produzir

uma ilusão de profundidade.

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Dissertação – Mestrado em Desenho

53

5) Hogarth diz que “formas que são sombreadas tendem a produzir uma recessão

na profundidade do plano” (Hogarth, 2003, p.230); logo as formas sombreadas

auxiliam na ilusão da profundidade (ver imagem 56).

Imagem 56 – Uso da sombra para acentuar a profundidade

6) Utilizar elipses perspetivadas recorrendo à articulação como ponto pivô, pois

estas elipses ajudam a manter as formas proporcionais em várias posições,

como na imagem 57. Esta imagem sugere até uma ideia de movimento que

conota animação.

Imagem 57 – Utilização de pontos pivô para manter a proporção

7) Rebater a figura em escorço para obter o perfil, como mostra a imagem 58,

que permite proporcionar a partir da verdadeira grandeza. Esta prática

assemelha-se à usada para desenvolver os model-sheets de personagens que

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João Lopes da Silva

54

servem para os animadores conhecerem os personagens em todas as

perspetivas (ver imagem 59).

Imagem 58 – Rebatimento para encontrar as proporções do escorço

Imagem 59 – Rotação do crânio do personagem Scar (Rei Leão, 1994)

8) “Procurar a perspetiva para manter a proporção correta em vistas profundas

da figura” (Hogarth, 2003, p.238); integrar a figura na perspetiva correta

ajudará, mais tarde, a colocar, de forma convincente, personagens num

cenário com profundidade de campo (ver imagem 60).

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Dissertação – Mestrado em Desenho

55

Imagem 60 – Integração dos personagens da série Os Simpsons (1989) num cenário em

profundidade

9) Associar a articulação ao membro que avança. Quando duas formas se dobram

em escorço, elas apresentam duas direções opostas, uma que avança outra

que recua. A articulação que liga as duas formas deve ser desenhada sobre a

forma que avança. (ver imagem 61).

Imagem 61 – Desenho ilustrativo do avanço e recuo das formas em escorço

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João Lopes da Silva

56

Conseguir perceber a figura em escorço - e desenhá-la bem - amplia o número

de ângulos que o animador utiliza para colocar os seus personagens.

2.4. Equilíbrio e peso

Outro aspeto a ter em conta quando se desenha a figura humana, e não só, é

o equilíbrio. Uma figura em equilíbrio é uma figura cujo peso está distribuído

igualmente seja qual for a ação. Richard Williams diz: “O andar é um processo de

cair e equilibrar no momento certo. Nós tentamos evitar cair enquanto

avançamos.” (Williams, 2001, p.102). O equilíbrio é uma parte essencial no

desenho de qualquer figura e sem ele a figura vai parecer estranha e pouco

natural (ver imagem 62). Para se manter de pé, o ser humano tem sempre que

estar em equilíbrio numa luta constante com a gravidade.

Imagem 62 – Ciclo de andamento

Para Stanchfield,” a força da gravidade é um dos mais importantes princípios

da animação. Tudo tem um determinado peso e vai atuar e reagir de acordo.”

(2009, p.11).

No desenho da figura é importante manter a ideia de equilíbrio, assim como

dar a entender a distribuição do peso para se manter esse equilíbrio, ou seja, a

força que esse peso está a exercer.

Na ótica de Nicolaides, “o peso é a essência da forma” (1941, p.32). O próprio

Nicolaides, propõe alguns exercícios que se focam na componente do peso do

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Dissertação – Mestrado em Desenho

57

modelo. Um dos exercícios é tentar representar o peso do modelo de dentro para

fora, a partir do interior do corpo até à superfície. Neste exercício o aluno vai

concentrar-se no peso que as diferentes partes do corpo suportam, intensificando

a mancha nas zonas com mais peso aparente. No final, o aluno obtém um

desenho em que a linha de contorno é inexistente assim como a representação de

luz e sombra, que são elementos da superfície do modelo: a pose do modelo é

descrita simplesmente pelo peso da forma a partir do seu centro (ver imagem 63).

Imagem 63 – Representação do peso da figura a partir do centro

Na imagem animada, é importante acentuar o peso do personagem para

proporcionar credibilidade ao movimento. Uma pena a cair vai comportar-se de

maneira diferente de um elefante, o embate no chão vai ser diferente. Quando

Richard Williams pergunta a Milt Kahl como conseguiu que o Tigre, no filme Livro

da Selva (1967), pesasse tanto (ver imagem 64), Milt respondeu que sabia onde

estava o peso em todos os desenhos: “Sei onde está o peso em todos os

momentos do personagem. Sei onde está, de onde vem, por onde está a passar e

para onde está a ser transferido.” (2001, p.256).

Imagem 64 – Personagem Shere Khan animada por Milt Kahl no filme Livro da Selva (1967)

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João Lopes da Silva

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2.5. Desenho do gesto

O gesto, ou seja, a captura do movimento, é imprescindível em animação. No

ensino do desenho, nos cursos de Animação, é mesmo um conteúdo bastante

aprofundado. Para Nicolaides a melhor estratégia para ensinar alguém a desenhar

consiste em “desenhar incessantemente, furiosamente, dolorosamente desenhar”

(1941, p.13).

Em estudos com mais tempo de observação, o aluno adquire uma maior

compreensão da estrutura do modelo; nos estudos mais rápidos, como é o caso

do desenho do gesto, o aluno “considera a função de ação, vida ou expressão”

(Nicolaides, 1941, p.13). No desenho do gesto o aluno vai desenhar não o que o

objeto de estudo é, mas sim o que está a fazer. No caso do desenho do modelo,

por exemplo se este se inclinar para apanhar algo, vai-se desenhar exatamente

essa torção. Walt Stanchfield considera que

Existem apenas alguns princípios do desenho, mas um ínfimo número de aspetos

de personalidade e gestos. Fazer “hole in” depois de aprender as estruturas do

corpo é perder a excitação e a satisfação em usar essa informação para contar a

história da vida através das nuances do gesto. O nosso interesse é no gesto, que é

o veículo usado para encaixar um personagem no papel que foi chamado para

atuar. Desenhamos de várias maneiras, cães, ratos, corujas, elefantes, gatos,

pessoas, etc., cada um com carácter destinto com formas corporais e gestos

corporais destintos. (2009, p.45).

As diferentes expressões do gesto dão individualidade a cada personagem, são

um veículo de comunicação da intenção dos personagens com a audiência através

do “acting” da sua linguagem corporal.

Nicolaides sugere alguns exercícios que aplicam o desenho do gesto. No

exercício de introdução é pedido ao modelo para tomar uma pose bastante ativa

durante um minuto ou menos e mudar sem pausa para a próxima pose. Em

alternativa para quem não tem acesso a um modelo é sugerido que se desloque

para um local onde existam pessoas em movimento, como num parque ou campo

de desportos, pois, como diz Nicolaides, estes locais “oferecem uma oportunidade

para estudar o gesto” (1941, p.14).

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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No enunciado do exercício é explicado que, enquanto o modelo está em pose

ou em movimento, “desenha-se, deixando o lápis deslizar pela folha, quase á

vontade, impelido pelo sentido da ação que se observa. Desenha-se rapidamente

e continuamente com linhas ininterruptas, do topo à base, sem tirar o lápis do

papel. O lápis deve vaguear, reportando o movimento”. O mais provável é que,

nas primeiras tentativas, o resultado obtido não demostre nada que se aproxime

da forma da figura; contudo, esse não é o objetivo do exercício. “Deve-se

desenhar, não o que o objeto aparenta, nem o que é, mas o que está a fazer”.

(Nicolaides, 1941, p.15).

Neste género de desenho (ver imagens 65 e 66) é esperado que, nos primeiros

segundos, o aluno consiga obter logo toda a estrutura da pose, sem se preocupar

com o modo de iniciar o desenho, pois deve desenhar toda a figura ao mesmo

tempo. Nas palavras de Stanchfield, “por vezes enquanto observo ou desenho um

combate de boxe, noto que os músculos do meu braço se contraem perante

determinadas ações.” (2009, p.58), explicando, assim, que todas as pessoas

conseguem sentir experiências musculares mentalmente. Isto vai de encontro a

um dos objetivos defendidos por Nicolaides no exercício do desenho do gesto,

quando diz que “deve-se confiar na sensação, responder com os músculos perante

aquilo que o modelo está a fazer, enquanto se observa, e deixar o lápis recordar

essa resposta automaticamente, sem pensar.” (1941, p.17)

Imagem 65 – Exemplos de desenho do gesto

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João Lopes da Silva

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Imagem 66 – Exemplos de desenho do gesto

Peter Parr é um dos mais conceituados formadores de animação do Reino

Unido; segundo ele, “uma única linha deve definir as caraterísticas do sujeito, se

este é otimista, pessimista ou resoluto.” (Parr em Wells et al., 2009, p.62). Esta

linha, que de acordo com Parr define a atitude da pose do sujeito, é conhecida no

mundo da animação como a linha de ação. A linha de ação é a base do gesto do

personagem e a linha orientadora da performance. É uma linha imaginária que

atravessa a totalidade da ação principal da figura. Preston Blair diz que o

animador deve “planear a figura e os seus detalhes para acentuar esta linha” pois

“ao fazê-lo fortalece o efeito dramático” (1960, p.5). Afirma ainda que “A primeira

coisa a desenhar quando se representa a figura é a linha de ação, depois constrói-

se por cima disso” (ibidem, p.5) (ver imagens 67 e 68).

Imagem 67 – Demonstração do uso correto da linha de ação para acentuar o movimento

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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Imagem 68 – Comportamento da linha de ação durante uma sequência de movimentos

No desenho do gesto não é só importante observar o movimento que a figura

está a executar, sendo fundamental também entender o impulso, a causa que

vem de dentro do modelo e que provoca a pose que se observa. Esta ideia de

empatia para com a ação do modelo é importante no desenho de animação, visto

que o animador enquanto “ator”, através dos seus personagens, procura

transmitir essa empatia para com os seus personagens; daí a importância da pose

transmitir intenção. Stanchfield considera que “estar ciente dos vários gestos,

emoções e linguagem corporal em geral, e a habilidade de capturá-los no desenho

é um passo vital para se ser um bom animador.” (2009, p.57). Na mesma linha de

pensamento, Eric Larson, outro dos grandes animadores da Disney, menciona que

“como nós (animadores) somos desafiados a trazer ´os desenhos à vida´ no ecrã,

os nossos personagens animados, humanos, animais ou inanimados, devem ser

sinceros e governados por maneirismos e características credíveis.” (Larson, citado

por Stanchfield, 2009, p.57). A imagem 69 mostra como se pode partir de

referências reais do gesto para informar as poses dos personagens animados.

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João Lopes da Silva

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Imagem 69 – Poses reais do gesto aplicadas às poses para animação

Existe gesto tanto nos personagens como nos acessórios que estes empunham,

sendo que vão assumir um comportamento, uma reação consoante o gesto do

corpo principal. Normalmente o corpo do personagem serve como catalisador da

ação, enquanto estes elementos vão ser ação sobreposta e secundária, como é o

caso do vestuário. Assim, é importante para o animador entender como se

comporta o vestuário, até porque desenhar o modelo com roupa é uma parte

importante do desenho da figura e também no estudo do gesto. As roupas não

vão ter vida própria, vão estar sempre a reagir ao “acting” do modelo e vão até

enaltecer o gesto. Diz Stanchfield que “um desenho realmente sólido, expressivo,

brilhante é um desenho onde o vestuário está a fazer o que o corpo está a

provocar que ele faça” (2009, p.61). Este mesmo autor esclarece também que o

animador deve procurar sempre as razões lógicas para o vestuário apresentar

determinadas formas e estas razões vão estar sempre ligadas ao gesto do corpo.

Para além disso, as linhas do vestuário devem ser desenhadas com um intuito

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Dissertação – Mestrado em Desenho

63

lógico e não como um simples apontamento aleatório. As imagens 70 e 71 são um

exemplo de como manusear roupa em animação.

Imagem 70 – Movimento da saia provocado pelo movimento do corpo

Imagem 71 – Reação do manto à movimentação da personagem

Stanchfield faz a ponte do desenho do gesto com a animação explicando que

um plano animado se assemelha a uma série de desenhos do gesto, apesar do

desenho para animação poder conter algumas caraterísticas que o dissociam do

desenho parado.

Um desenho de animação poderá ter alguma ação sobreposta, algum

arrastamento, algum squash e stretch (forma espalmada e esticada, termos

usados em animação) e uma postura que pode estar em desequilíbrio, ou uma

vista que seria evitada ou ajustada nom desenho parado. Mas basicamente os

extremos numa cena de animação são desenho gestuais criados para preencher as

necessidades da história. (Stanchfield, 2009, p.69)

No desenho do gesto o mais importante é que o aluno deve insistir na prática,

pois, como argumenta Nicolaides, “o gesto é intangível. Não pode ser entendido

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João Lopes da Silva

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sem sentimento, e não tem de ser exatamente a mesma coisa para uns e para

outros. Para o descobrir requer prática. Aprende-se mais sobre o gesto através do

desenho do que qualquer outra coisa que se possa dizer” (1941, p.26).

2.6. Estudo de animais

Se é importante para o animador entender a figura humana e os seus

comportamentos, também é igualmente aconselhável um estudo aprofundado da

figura animal. Como foi referido anteriormente, os animadores são chamados a

dar vida a todo o género de personagens, desde pessoas, animais e até objetos

inanimados, justificando, de este modo, o estudo destes elementos (Eric Larson).

Segundo Ken Hultgren, animador em várias produções conhecidas, como A

Bela Adormecida (1959), e criador do livro The Art of Animal Drawing (1993), “a

construção é a fundação de todo o desenho. Um conhecimento detalhado em

anatomia, como saber o número exato de vértebras na coluna vertebral de um

veado, não é tão importante como conhecer a estrutura geral e a flexibilidade da

coluna vertebral em animação” (Hultgren, 1993, p. v), aplicando-se o mesmo

princípio para a parte muscular. A generalidade dos animais quadrúpedes tem

uma estrutura básica semelhante e é essencial conhecê-la, pelo que Hultgren

deixa algumas sugestões de construção para desenhar animais, começando por

sugerir que o aluno divida o corpo em três partes: membros posteriores, ventre e

membros anteriores (ver imagem 72). Sendo esta uma divisão natural, vai auxiliar

o aluno a trabalhar as proporções corretamente, podendo também ser aplicada à

maioria dos crânios, como está exemplificado na imagem 73. É também

fundamental que o aluno se familiarize com os pontos pivô e a mecânica do

esqueleto, o que aumenta as possibilidades de expressão nas poses dos animais

desenhados (ver imagem 74).

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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Imagem 72 – Divisão do corpo do animal em três partes

Imagem 73 – Divisão da cabeça do animal em três partes

Imagem 74 – Esqueleto simplificado

Estudar as estruturas básicas do animal, as suas formas simplificadas, permite

ao animador analisar corretamente a ação dos animais em movimento. Assim,

como no estudo da figura humana, é importante conhecer os aspetos elementares

da anatomia dos animais para que se possa compreender as possibilidades da

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João Lopes da Silva

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locomoção, da mesma maneira que a capacidade de criar uma pose convincente

está ligada ao entender da ação.

Os animais em movimento são muito difíceis de registar a olho nu. Algumas

posições destes em locomoção eram desconhecidas antes do cinema e também da

pesquisa exaustiva de Eadweard Muybrigde que, com o seu sistema de fotografias

em sequência, mostrou ao mundo algumas das poses extremas que os animais

atingem quando em movimento (ver imagem 75). Hoje em dia, com a capacidade

de acesso a vídeos com alta definição e em câmara lenta, somos capazes de

apreender estas poses e consequentemente explorar as possibilidades reais dos

animais em movimento.

Imagem 75 – Sequência fotográfica por Eadweard Muybridge

Desenhar corretamente animais em todas as posições, sem condicionalismos e

recorrendo à memória, implica criar uma base de conhecimento sólido da

estrutura, do movimento e da atitude destes animais, que passa obrigatoriamente

pela observação do real. Joanna Quinn explica que “o ponto de partida para mim

quando animo um animal é desenhá-lo ao vivo, visito um zoo, vejo documentários

de vida selvagem e compilo referências fotográficas.” (Quinn et al., 2009, p.129).

Desta forma, as primeiras abordagens do personagem são sempre interpretações

realistas para que consiga perceber quais os componentes que constituem o

animal - o peso, a maneira como se mexe, particularidades do seu aspeto –

seguindo-se, então, o exagero das formas e caraterísticas, a caricatura. Este

método de Quinn está de acordo com a ideia do designer de personagens David

Colman, com um vasto portfolio de animais, quando este afirma que “a pessoa

tem que entender o real para o poder caricaturar” (2007, p.7). Colman enfatiza a

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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importância de se observar e interagir com animais ao natural, pelo que o aluno

deve fazer um trabalho extra, deslocando-se para jardins zoológicos, quintas e

qualquer lugar que lhe permita ter contato direto com o objeto de estudo.

No desenho de animais ao vivo, o desenho do gesto adquire grande relevo,

pois, como lembra Hultgren, “os animais estão constantemente a mudar de

posição” (1993, p.vi), pelo que se deve ser capaz de apanhar a essência da pose

em segundos e a partir daí trabalhar a forma e a atitude do animal. Para Colman

existem três ingredientes chave para capturar o gesto - observar, pensar e

desenhar (ver imagem 76):

1) Observar o movimento

2) Pensar como as partes estão a comportar-se e a mover-se umas em relação às

outras, como o animal ocupa o espaço e posiciona os seus membros

distribuindo o seu peso.

3) Desenhar executando esses princípios de observação da forma mais simples

possível com um número mínimo de linhas, encontrando a coerência do tema.

(2007, p.14)

Imagem 76 – Desenhos rápidos de animais

Quando é solicitado ao animador que execute uma animação de animais,

raramente é pedido que estes tenham um comportamento cem por cento animal.

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João Lopes da Silva

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De um modo geral, os personagens animais existentes no mundo da animação

são antropomórficos, ou seja, são dotados de caraterísticas humanas. O nível de

antropomorfismo destes personagens varia bastante, sendo que alguns são

praticamente humanos: muitas vezes andam sobre duas patas, conseguem falar,

vestem roupa humana, têm empregos, assim como outros que apesar de a sua

fisionomia ser praticamente animal, detém algumas qualidades subtis de

personalidade humana, o que ajuda a criar empatia para com a audiência. Estudar

o real não é dispensável, pois ajuda a preservar os principais fatores de identidade

do animal, seja pela anatomia de superfície ou pela fisiologia do movimento. Ao

observar, desenhar e estudar, o animador está a capturar a essência do animal.

Estas caraterísticas vão passar para a ação do personagem e vão ajudar a que o

espetador continue a acreditar que está a ver um animal apesar deste não se

comportar totalmente como um animal real.

2.7. Aprender com os Mestres e adaptação de estilos

Como sugere a célebre citação de Picasso, “os bons artistas copiam, os

grandes artistas roubam”. Estudar o desenho a partir dos grandes Mestres,

conseguir “roubar” parte da sua sabedoria derivada de anos de estudo e integrá-la

no nosso próprio desenho pode ser uma importante alavanca na evolução da

técnica e uma ferramenta que proporciona uma maior versatilidade no estilo de

desenho do animador. Uma parte das competências do animador, que não deve

ser descurada, é a capacidade que este deve ter para se adaptar aos estilos das

diferentes produções, para alargar o leque de projetos com diferentes abordagens

gráficas. No entanto, este é somente um dos benefícios que o aluno adquire ao

estudar os grandes Mestres do desenho.

Na Arts University Bournemouth é praticado um exercício nas primeiras quatro

semanas do curso de Animação que é precisamente o “Artist Studies”. Neste

exercício o aluno escolhe um artista conhecido, como Degas ou Da Vinci, estuda o

seu estilo e tenta aplicar esse estilo a tudo o que desenhe durante uma semana,

nas aulas de modelo nu, na rua, em autorretratos, em cenários, tudo. Na semana

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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seguinte, o aluno escolhe um novo artista, de preferência bastante diferente, e

assim sucessivamente durante quatro semanas (ver imagens 77, 78 e 79).

Imagem 77 – Desenhos de Tiepolo

Imagem 78 – Desenho de um aluno de Bournemouth com base no estilo de Tiepolo

Imagem 79 – Aplicação do estilo de Tiepolo na aula de desenho nu

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João Lopes da Silva

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Pete Symons, diretor do curso, afirma que este exercício ajuda os alunos a

perceber o que é um desenho de boa qualidade e a aprender a partir de artistas

que passaram toda a sua vida a desenvolver uma capacidade que o aluno apenas

começou a ensaiar. Segundo este professor, com esta prática o aluno explora

métodos de trabalho diferentes do seu, o que vai alargar o seu portfólio de estilos

e abordagens na criação de imagens. Isto proporciona a oportunidade do aluno se

afastar de algum estilo de desenho em que tenha estagnado e também para

perder algum receio de se apropriar do trabalho de outros para influenciar o seu

trabalho. Symons reforça que estamos a lidar com estudantes, portanto, estando

a estudar devem conseguir ter acesso a uma galeria e ver o trabalho em primeira

mão, o que é mais vantajoso. No entanto, o professor adverte que o aluno deve

ter em conta que não é um exercício de cópia, pois, para Symons, a cópia é algo

fácil, mas que não ajuda de maneira nenhuma o aluno se este não conseguir

posteriormente aplicar a forma como o artista trabalha e pensa o seu próprio

desenho. Ao observar um destes mestres do desenho, percebe-se como o artista

chegou a um determinado resultado, como usa a linha ou o tom, como lida com

os materiais, como a lápis, o pastel ou o carvão (Barber, 2008, p.320).

De acordo com o mesmo professor, no exercício do Artist Studies o que se

procura avaliar é a influência direta do estudo de determinado artista escolhido no

trabalho do aluno e a compreensão dos métodos e marcas utilizadas, do raciocínio

associado aos desenhos, reforçando que não se trata de uma boa cópia. No final

das quatro semanas, momento em que é avaliado o exercício, segundo Symons o

que é mais evidente no trabalho dos alunos é um alargamento do uso de

materiais e de grafismos. Barber acrescenta que “eventualmente, depois de muita

prática vais aperceber-te de que consegues julgar exatamente quão pesadas,

leves, compridas ou curtas as tuas marcas devem ser para alcançar um efeito

específico” (2008, p.321). Para o professor Symons este trabalho de pesquisa não

termina aqui, pois os alunos devem também começar a pensar por eles próprios,

sobre o que observar a seguir.

O exercício do Artist Studies é uma prática que pode servir de auxílio na

carreira do animador, pois, de acordo com Symons, se os alunos tiverem a

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Dissertação – Mestrado em Desenho

71

capacidade de seguir determinado artista conseguem trabalhar com um realizador

e produzir um trabalho para o estilo da produção e ainda ser parte integrante do

processo criativo de desenvolvimento de estilos. Estes alunos vão ter uma boa

compreensão, não só de estilos de artistas, mas também a capacidade de produzir

uma boa criação de imagem como animadores e ilustradores. Esta versatilidade é

fundamental para o animador, pois como diz Colman, “o mais provável é cada

produção ter um look inteiramente diferente da seguinte, portanto ser capaz de se

adaptar rapidamente é uma necessidade.” (2007, p.101).

2.8. Composição de cenários e layout informado pelo diário gráfico

Além dos personagens, existe um outro elemento que compõe a parte visual

de um filme da animação: o cenário. Em animação o cenário ajuda a enquadrar o

personagem e suporta a ação, pelo que nunca deve sobrepor-se à mesma. Ollie

Jonhston e Frank Thomas referem que o trabalho do artista de cenário “pode ser

dramático, surpreendente, poderoso, ou emocionante, mas deve na mesma ser

apenas um background da ação” (Jonhston & Thomas, 1981, p.248). O cenário

deve ser planeado de forma a não interferir negativamente ou distrair o espetador

da personagem animada (ver imagens 80 e 81). Formas demasiado complexas e

detalhadas no meio do cenário, onde está a decorrer a ação, ou cores muito fortes

num determinado elemento, são tudo fatores que podem distrair e desviar a

atenção do espetador. Cada plano de animação deve ter uma intenção, deve

introduzir novos elementos, valorizando a narrativa. O cenário deve ajudar a

complementar a narrativa e não pode provocar distração, o que não significa que

seja menos consequente tecnicamente. Para produzir cenários para animação é

importante obter alguns conhecimentos de composição, para que assim o aluno

consiga obter imagens equilibradas e com boa leitura, bem como aprender o que

acrescentar na imagem e o que deixar de fora. Segundo Barber, “a composição é

intelectualmente e emocionalmente desafiante e muitas vezes revela a visão, ou

falta dela, do artista” (2008, p.294).

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João Lopes da Silva

72

Imagem 80 – Cenário do filme A Princesa Mononoke (1997) de Hayao Miyazaki

Imagem 81 – Cenário do filme Pinóquio (1940) de Walt Disney

Os grandes mestres do Renascimento praticavam uma abordagem geométrica

na composição das suas obras, dispondo os elementos do quadro segundo

padrões geométricos que determinavam as relações de equilíbrio, de harmonia e

de ritmo da composição. Dividiam a área da imagem em quadrados, triângulos ou

circunferências e enquadravam os elementos compositivos nestas formas

geométricas (ver imagens 82 e 83). De acordo com Barber, esta forma de compor

pode “funcionar de forma brilhante, mas, por vezes, se o artista optar por uma

composição demasiado complicada, pode roubar expressão à obra.” (Barber,

2008, p.294).

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Dissertação – Mestrado em Desenho

73

Imagem 82 – Quadro de Rafael, apresentando uma composição triangular

Imagem 83 – Estudo da composição do quadro “Anunciação” de Leonardo Da Vinci

Ao compreender a composição, o aluno vai melhorar substancialmente o seu

trabalho em equilíbrio e harmonia, mas o que faz uma boa composição pode ser

um conceito um pouco difícil de entender. Gombrich (2005) sugere que a maioria

das pessoas, quer sejam desenhadores ou não, já experienciou, em primeira mão,

esta tentativa de organizar uma composição para obter um resultado satisfatório,

que faça sentido para o gosto da pessoa. Segundo o mesmo,

Qualquer pessoa que tenha tentado arranjar um conjunto de flores, baralhar e

alternar as cores, adicionar um pouco aqui e retirar dali, experimentou a estranha

sensação de balancear formas e cores sem ser capaz de dizer exatamente que

género de harmonia é que está a tentar alcançar. (ibidem, p.33)

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João Lopes da Silva

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até que provavelmente por mero acaso, a composição que tem à sua frente,

depois de muito mudar, faz sentido na sua visão estética, deixando-o satisfeito.

Em animação, assim como na banda desenhada, muitas vezes usa-se um

processo semelhante de tentativa e erro na escolha da melhor composição para

cada plano que vai aparecer no ecrã. O artista de layout, ou seja, aquele que cria

os cenários e a disposição do espaço onde o personagem animado vai atuar (Hart,

1997) desenha vários esboços pequenos, conhecidos por thumbnails, onde

explora, através de um método bastante rápido, várias possibilidades de

enquadramento para o mesmo plano, partindo depois para a concretização da

composição final, aquela que faça sentido na visão do aluno. Para Barber este

método de thumbnails “oferece várias oportunidades para avaliar a imagem final”

(Barber, 2008, p.295) (ver imagem 84).

Imagem 84 – Estudos de composição a partir dos filmes O Gigante de Ferro e Tarzan (1999)

Tanto na figura humana em aulas de modelo nu ou na rua, no dia-a-dia, como

nos animais de pesquisa em jardins zoológicos ou outros locais onde existam os

animais que se quer estudar, no percurso de ensino do desenho para animação e

não só, é muito aconselhada a interação com o objeto no seu estado natural, o

que se aplica tanto para os elementos que vão ser animados, os personagens,

como para os ambientes com que os personagens vão interagir. Um método de

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Dissertação – Mestrado em Desenho

75

pesquisa muito utilizado pelos alunos e profissionais de animação, neste caso os

artistas de layout, é a prática do desenho no diário gráfico. Os alunos podem e,

segundo a maioria dos professores, devem usar estes cadernos como veículo para

explorar o mundo e buscarem as referências do real para enriquecer o seu

trabalho. O professor Peter Parr sublinha a importância de manter um diário

gráfico: “O diário gráfico pode ser tão privado ou publico como tu desejares. O

facto de teres um, que é visitado regularmente, permitindo que tu observes,

recordes, traduzas, fantasies e te divirtas, é um testemunho da tua dedicação” e

prossegue

No meu diário gráfico, eu gosto de tentar vários meios de desenho, dos mais

convencionais aos mais fora do comum e numa larga variedade de técnicas para

interpretar o que vejo. Olho, penso e vejo, antes de começar a desenhar. Que

materiais melhor se enquadram com o tema? Devo tentar inovar? O diário gráfico

é um sítio importante para alargar ou preservar o conhecimento na tua busca de

desenvolvimento da capacidade de desenhar. Sê recetivo na tua exploração da

natureza, arte e artistas, escultores ou animadores no teu livro; é o jornal do teu

desenvolvimento como artista. Providencia-te com meios para gravar pensamentos

e observações, para te ajudar a construir um recurso que vai informar o teu

trabalho. (Parr, citado por Quinn et al.,2009 p.103)

Compreende-se, portanto, que o material que se regista no diário gráfico

servirá para desenvolver todo o trabalho e o animador pode usá-lo sem medo de

falhar, para registar como funcionam determinadas texturas, ou elementos, desde

pormenores a vistas gerais em infinitas possibilidades de perspetiva e em outras

abordagens gráficas, que incluem a abordagem do movimento (ver imagem 85).

Gera-se, então, o material que auxilia no desenvolvimento não só da capacidade

de desenho como informa e enriquece o trabalho de animação. Existem, inclusive,

alguns filmes que utilizam o diário gráfico quase diretamente na narrativa. Em

Portugal, existe o exemplo relativamente recente do filme de animação Viagem a

Cabo Verde (2010), do realizador José Miguel Ribeiro, no qual em vários

momentos do filme surgem imagens que parecem ser diretamente tiradas do

diário gráfico do realizador, conferindo um aspeto documental ao filme (ver

imagem 86).

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João Lopes da Silva

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Imagem 85 – Imagens do diário gráfico do professor Peter Parr

Imagem 86 – Desenho do filme Viagem a Cabo Verde (2010) de José Miguel Ribeiro

Para concretizar um layout do plano, equilibrado, claro e apelativo, o aluno

deve ter em consideração o modo de desenhar os elementos que definem o

mundo do personagem, efetuando a sua pesquisa gráfica; deve, também,

considerar a interação do personagem com esse ambiente, em escala e

perspetiva; finalmente, deve entender como dispor os elementos que compõem o

cenário com o objetivo de criar uma composição equilibrada visualmente, de

acordo com a intenção da narrativa no plano. Como afirma Hart, o layout “ajuda a

criar e estabelecer o ambiente, atmosfera, época, local, escala, padrões de ação,

luz, ângulo da câmara e estilo da cena.” (1997, p.130) e, para ele, o primeiro pré-

requisito para alguém ser um artista de layout é a capacidade de desenho, logo de

seguida acompanhada de conhecimento de perspetiva, composição e design. Mas,

tudo tem a sua génese no desenvolvimento da capacidade de desenho.

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Dissertação – Mestrado em Desenho

77

Capítulo III

Observação e análise dos dados

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João Lopes da Silva

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Dissertação – Mestrado em Desenho

79

Capítulo III

1. Resultados do questionário realizado aos profissionais de

animação

Os resultados do questionário que se segue baseiam-se nas respostas dadas

por 25 profissionais de animação, a residir em Portugal. Este questionário

procurou averiguar o nível de desenho destes profissionais, através de uma

autoavaliação, bem como encontrar aspetos do desenho para animação em que

os animadores apresentem maior dificuldade. Procurou, também, verificar se a

empregabilidade e as funções desempenhadas no âmbito da produção estão

ligadas ao nível de desempenho no desenho e formação. Finalmente, procurou

averiguar os hábitos de prática frequente de desenho e a importância que estes

profissionais conferem ao desenho na sua atividade.

1.ª Pergunta: Há quantos anos trabalha, ou quantos anos trabalhou, como

profissional de animação? (ver imagem 87)

Anos de experiência: Número de indivíduos:

Menos de 1 ano 0

Entre 1 a 3 anos 7

Entre 3 a 5 anos 10

Entre 5 a 10 anos 3

Mais de 10 anos 5

Imagem 87 – Anos de experiência profissional dos inquiridos

Analisadas as respostas dos profissionais de animação questionados, verifica-se

que 28% tem entre 1 e 3 anos de experiência na área, 40% entre 3 e 5 anos,

12% entre 5 e 10 anos e 20% mais de 10 anos de experiência.

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João Lopes da Silva

80

2.ª Pergunta: Qual a sua formação académica? (ver imagem 88)

Nível académico: Número de indivíduos:

3.º Ciclo 0

Ensino Secundário 9

Licenciatura 12

Mestrado 4

Doutoramento 0

Imagem 88 – Nível académico dos inquiridos

De acordo com as respostas obtidas, verifica-se que os profissionais de

animação inquiridos são, na sua maioria, licenciados, representando 48% dos

inquiridos. No entanto, um número significativo de profissionais – 36% – concluiu

a sua formação académica com o Ensino Secundário. Apenas os restantes 16%

dos inquiridos obtiveram o nível de Mestre.

3.ª Pergunta: A sua formação tinha uma grande componente de desenho? (ver

imagem 89)

Resposta: Número de indivíduos:

Sim 13

Alguma 6

Não 6

Imagem 89 – Presença da componente de desenho na formação dos inquiridos

Embora 36% dos profissionais de animação questionados não tenha

frequentado o Ensino Superior, muitos referem que a sua formação apresentava

uma grande componente de desenho no currículo. Dos inquiridos, 54%

frequentaram cursos com grande componente de desenho e 24%

obtiveram alguma formação nesta matéria. Os restantes 24% dos profissionais

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Dissertação – Mestrado em Desenho

81

não obtiveram formação académica em desenho, embora trabalhem como

profissionais de animação.

4.ª Pergunta: Qual considera ser o seu nível de desenho? (ver imagem 90)

Nível de autoavaliação: Número de indivíduos:

Fraco 1

Médio 12

Bom 10

Muito Bom 2

Imagem 90 – Nível de autoavaliação dos inquiridos

A questão procurou perceber como se avaliam os profissionais de animação em

relação ao seu próprio nível de desenho. Verifica-se que a maioria, 48% no

total, consideram o seu nível de desenho como sendo “Médio”; no

entanto, um grande número, 40% dos inquiridos, mais concretamente, confia o

suficiente na sua capacidade de desenho para o considerar “Bom”. Dentro do

grupo de inquiridos, apenas um indivíduo avaliou o seu nível de desenho como

“Fraco”, ao passo que dois outros indivíduos avaliam o seu desempenho como

“Muito Bom”.

Esta questão vem complementar a questão anterior, considerando que, apesar

de seis inquiridos indicarem não ter obtido formação académica em desenho, na

questão seguinte apenas um deles considera o seu desenho como “Médio”, sendo

que quatro o consideraram como “Bom” e um como “Muito Bom”. Este grupo

representa 40% dos inquiridos que se avaliam como “Bons” e metade dos” Muito

Bons”.

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João Lopes da Silva

82

5.ª Pergunta: Quais das seguintes funções já desempenhou como profissional de

animação? (ver imagem 91)

Funções: Número de indivíduos:

Animador tradicional (Papel) 10

Animador 2d digital 23

Animador 3d digital 3

Animador de Volumes 2

Realizador 7

Diretor de animação 6

Modelling 3

Concept Artist 11

Storyboard Artist 12

Layout Artist 9

Intervalista 15

Clean-up 10

Edição 10

Efeitos especiais 10

Outros/as 2

Imagem 91 – Funções exercidas pelos inquiridos enquanto profissionais de animação

De acordo com a tabela, a função mais desempenhada pelo grupo de

profissionais questionados é a de animador 2d digital, com 92% dos

inquiridos. Em seguida, está a função de intervalista com 60% dos inquiridos. O

animador executa, geralmente, as poses principais da ação, pontos-chave que

definem o movimento; o intervalista, por sua vez, preenche as posições

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Dissertação – Mestrado em Desenho

83

intermédias da ação. Dependendo da produção, muitas vezes, o animador

acumula as duas funções.

Por outro lado, as funções que menos inquiridos desempenharam foram a de

animador de volumes (apenas dois indivíduos), a de animador 3d digital (três

indivíduos) e modelling (também com três indivíduos).

A questão procurou averiguar o fator mais relevante, no número de funções

que o profissional foi chamado a desempenhar na sua carreira em animação.

Sendo assim, cinco indivíduos, correspondendo a 20% dos inquiridos, assinalaram

8 ou mais funções, ou seja, mais de metade das disponíveis no questionário. O

fator mais relevante para esta polivalência aparenta ser a experiência, sendo que,

dentro deste grupo, três assinalaram mais de 10 anos a trabalhar na indústria, um

assinalou entre 5 e 10 anos e apenas um inquirido demonstra ter entre 3 a 5 anos

de experiência. No entanto, fatores como a formação em desenho e o nível de

desenho autoavaliado também são relevantes na investigação, pois, de acordo

com o resultado do inquérito, quatro destes cinco profissionais de animação

revelam ter formação em desenho e o individuo que revelou não ter adquirido

formação em desenho avalia-se como “Muito Bom” na quarta questão, referente

ao nível de desenho.

Dentro das funções apresentadas, as que, à partida, exigem maior capacidade

de desenho são: animador tradicional em papel, que foi assinalada por dez

profissionais; concept artist, assinalada por onze; storyboard artist, assinalado por

doze; layout artist, assinalado por nove; intervalista (no caso das técnicas

tradicionais em papel), assinalado por quinze e clean-up (arte final dos

personagens) assinalada por dez profissionais.

6.ª Pergunta: Indique o nível de dificuldades que sente nas diferentes situações

sendo que 1 indica nenhuma dificuldade e 5 muita dificuldade. (ver imagem 92)

Sinto dificuldade em: Total de pontos: Média

-Manter o personagem proporcional no

decorrer da ação.

60 2,4

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João Lopes da Silva

84

-Mudar drasticamente a expressão no

personagem durante a ação.

45 1,8

-Mover o personagem em

profundidade/perspetiva.

67 2,68

-Desenhar poses inexistentes numa livraria

de movimentos ou no model-sheet (no

caso da animação digital 2d).

58 2,32

-Animar personagens quadrúpedes (quatro

patas).

72 2,88

-Adaptar a um estilo gráfico de uma

produção.

55 2,2

-Fazer squash e stretch (encolher e esticar)

do personagem, mantendo a sua

proporção global.

39 1,56

-Desenhar as keys (poses principais da

ação) em pequenos thumbnails (desenhos

pequenos) para planear a ação.

43 1,72

-Desenhar um storyboard. 65 2,6

-Animar efeitos e elementos extra (fluidos,

fogo, fumos).

77 3,08

-Preparar um layout. 49 1,96

Imagem 92 – Dificuldades sentidas pelos inquiridos

A questão procurava averiguar quais as tarefas dentro da animação e do

desenho que provocam maior dificuldade de resolução aos profissionais

questionados. Para tal, foi pedido aos profissionais que atribuíssem um valor, de

um a cinco, representativo da dificuldade que conferem a cada tarefa apresentada

na questão, sendo “1” nenhuma dificuldade e “5” muita dificuldade.

Os inquiridos apresentam maior dificuldade em animar efeitos especiais

e outros elementos, como o fogo, a água ou fumos, com um total de 77

pontos. Em seguida, a animação de quadrúpedes apresenta um total de 72

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Dissertação – Mestrado em Desenho

85

pontos, sendo encarada também como uma das mais difíceis. Mover personagens

em perspetiva também demonstra um elevado grau de dificuldade, com 67 pontos

no total.

Dentro das opções, os profissionais de animação afirmam ter menor dificuldade

em aplicar squash e stretch nos personagens, mantendo a sua proporção global

constante (39 pontos no total). As tarefas que evidenciam menor dificuldade são

associadas, na sua maioria, à manipulação do personagem, sendo que os

profissionais inquiridos consideraram mais simples desenhar as keys (poses

principais da ação) em pequenos thumbnails (desenhos pequenos) para planear a

ação, num total de 43 pontos. Este resultado fica muito próximo da opção “mudar

drasticamente a expressão no personagem durante a ação” que obteve 45 pontos.

A preparação de um layout foi também considerada relativamente fácil para os

animadores, obtendo 49 pontos.

A opção relativa à “adaptação a um estilo gráfico de uma produção”, num

total de 55 pontos, demonstrou ser de dificuldade média para os inquiridos, assim

como o desenho de poses inexistentes numa livraria de movimentos ou no model-

sheet (no caso da animação digital 2D), que obteve 58 pontos. Esta tarefa pode

ser a mais demonstrativa de alguma falta de prática no desenho por parte do

profissional de animação. Quando o animador está dependente de uma livraria

para obter uma pose, limita a capacidade de manipulação de objetos e o resultado

na animação.

Por sua vez, “manter o personagem proporcional no decorrer da ação”, com 60

pontos, demonstrou ser de dificuldade média. Já com um considerável nível de

dificuldade, apresenta-se a opção “desenhar um storyboard”, com 65 pontos. O

storyboard é, de um modo geral, executado por profissionais que demonstram um

nível de desenho bastante desenvolvido, juntamente com uma boa capacidade de

síntese e clareza no desenho.

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João Lopes da Silva

86

7.ª Pergunta: Considera o desenho como fundamental para qualquer animador

moderno? Dê uma breve Justificação. (ver imagem 93)

Sim: Não:

16 9

Imagem 93 – Importância, ou não, do desenho para o animador moderno segundo os inquiridos

Apesar das técnicas modernas de animação serem na sua maioria digitais,

uma grande maioria dos inquiridos continua a considerar o desenho

como fundamental para estes profissionais, apresentando 64% do total das

avaliações, em detrimento dos 36% que não consideram o desenho fundamental.

Dentro do conjunto de questionados que assinalou “Sim” na questão obtiveram-se

algumas das seguintes justificações:

“Sem dúvida, no caso do 2D, seja tradicional (papel) ou digital, o desenho é

fundamental; sem o desenho, o animador é limitado nas opções que tem e todo o

resultado final sofre as consequências. No caso do 3D, o desenho acaba sempre

por ser uma mais-valia, ainda que não seja fundamental.”

“Apesar de existirem softwares que nos permitem animar sem desenhar, a boa

noção de desenho permite animar com volumes e proporções certas; permite,

também, uma boa construção anatómica, uma imagem equilibrada com uma

distribuição equilibrada dos personagens no espaço, permite desenhar

personagens.”

“O desenho é fundamental para perceber volumes, perspetivas, linhas de ação

e outros elementos essenciais para o desempenho de uma animação; quanto mais

rico for o nível de desenho, mais rica e facilmente efetuada poderá ser a

animação.”

“Quase tudo se baseia no desenho. É possível não se ser um desenhador bom

e ser bom animador com as ferramentas digitais ou em grande parte da animação

de volumes; mas, nesta área a noção de desenho é essencial, muitas vezes, até

para casos tão simples como comunicar com os colegas ideias ou intenções para o

seu trabalho ou para o dos outros.”

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Dissertação – Mestrado em Desenho

87

“Atualmente há inúmeras produções de animação que vieram de pessoas que

não sabem desenhar (o chamado desenho clássico) como por exemplo Adventure

Time, David O’reilly, etc. e não têm menos sucesso que outras produções em que

o desenho tem um papel mais forte (Disney, etc.) São, sim, animações destinadas

a outros públicos-alvo: televisão e curta-metragens. Mas um animador, para estar

à altura de qualquer produção, tem de dominar conceitos de desenho –

perspetiva, volume, força e peso. Por isso, sim é fundamental, por mais moderno

que seja o estilo.”

“O desenho é a forma mais básica de um animador captar a essência de um

movimento e transmitir expressão de forma rápida e eficaz. Uma vez que o

trabalho de um animador é dar vida ao(s) desenho(s) e pensar na forma mais

criativa de o fazer, uma compreensão profunda de anatomia, força, distribuição de

peso, movimento, postura, silhueta, atitude, personalidade, dinamismo, etc.,

constitui uma ferramenta imprescindível para se conseguir uma maior qualidade e

fluidez no trabalho.”

Por sua vez, dentro do grupo de questionados que assinalou o desenho como

não sendo fundamental para o animador moderno, obtiveram-se algumas das

seguintes justificações:

“Hoje em dia a maioria das produções são 3D e 2D digital, em que o animador

move marionetas construídas previamente; não necessita tanto de saber desenhar

como de conhecer os princípios de animação... timing, etc.”

“Embora não considere o desenho fundamental para qualquer animador, é, na

maior parte dos casos, uma mais-valia, no sentido em que ajuda a desenvolver

capacidades de visualização e síntese.”

“Em 3D ou StopMotion, por exemplo, parece-me que a componente de

desenho é dispensável, embora possa contribuir positivamente nalguns aspetos.”

“O desenho é muito importante na animação 2D, mas, com os softwares de

animação digital existentes atualmente (tanto em 3D como em 2D), o desenho já

não é o fator mais importante para um animador conseguir um bom desempenho

profissional.”

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João Lopes da Silva

88

“É uma vantagem o animador desenhar, mas não é fundamental; o

fundamental será adquirir os conhecimentos necessários para aplicá-los mediante

as suas capacidades de desenho ou conciliar esses conhecimentos com uma outra

técnica que não exija tanto de desenho, como, em muitos casos, a animação

digital ou de volumes.”

“Diria que é fundamental se não conhecesse pessoas que não desenham muito

bem nem têm o hábito de praticar o desenho e que animam melhor que outras

pessoas que podem desenhar mais e melhor. Talvez dependa das pessoas. No

meu caso acho que é fundamental.”

Embora um conjunto considerável de profissionais não considere o desenho

como sendo fundamental, quase todos admitem que saber desenhar é uma mais-

valia. Um dos profissionais considera que o animador moderno “não necessita

tanto de saber desenhar como de conhecer os princípios de animação...timing,

etc.”; no entanto, um dos princípios básicos da animação é precisamente

“desenho sólido”. O conjunto de profissionais que assinalou afirmativamente ou

negativamente desenvolveu justificações semelhantes, admitindo menor

necessidade, ao nível da execução de desenho, em animação digital. O conjunto

que respondeu “sim” considera ser essencial ter noções de desenho, enquanto o

conjunto que respondeu “não” afirma não ser fundamental, embora seja uma

mais-valia. Em relação aos animadores tradicionais, é unânime considerar-se o

domínio do desenho como fundamental.

Dentro dos questionados que responderam afirmativamente, nota-se

uma maioria de animadores com mais anos de profissão e com mais

escolaridade. Dentro dos oito inquiridos com mais de 5 anos de experiência,

apenas 2 consideraram o desenho prescindível e, no conjunto de quatro inquiridos

com nível de mestre, nenhum considerou o desenho como dispensável.

Os testemunhos demonstram ainda uma tendência de separar o desenho

analógico, tradicional do desenho digital. A questão procurava perceber se o

desenho continuava a ser fundamental para o animador, no entanto algumas

respostas reportaram o desenho digital para outra área, como não sendo

desenho. O passado e o presente complementam-se. As crianças quando

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Dissertação – Mestrado em Desenho

89

aprendem a escrever, aprendem desenhando as letras no papel, no entanto a

escrita no computador não deixa de ser escrita.

8.ª Pergunta: O seu nível de desenho é limitativo, no seu desempenho

profissional? (ver imagem 94)

Sim: Não:

12 13

Imagem 94 – Limitação do nível de desenho no desempenho profissional dos inquiridos

Enquanto a questão anterior procurava determinar a relevância dada ao

desenho no desempenho profissional dos profissionais de animação, a presente

questão procurava averiguar se o desempenho profissional dos inquiridos é

limitado, ou não, pelo seu nível de desenho. Num total de 48%, os

profissionais admitiram que o seu desempenho profissional seria melhor

caso obtivessem um maior domínio no desenho. Os restantes 52%

consideram que o seu nível de desenho é suficiente para as suas funções

e não reconhecem qualquer limitação.

9.ª Pergunta: Neste momento encontra-se empregado na área? (ver imagem 95)

Sim: Não:

13 12

Imagem 95 – Situação profissional dos inquiridos

A questão procurava obter uma ligação entre a empregabilidade dos

profissionais de animação em Portugal e a sua formação e nível de desenho. No

momento da realização do inquérito, quase metade dos sujeitos estariam ou

desempregados ou a trabalhar noutra área, representando 48%.

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90

10.ª Pergunta: Mantém um diário gráfico? (ver imagem 96)

Sim: Não:

15 10

Imagem 96 – Utilização, ou não, de um diário gráfico pelos inquiridos

A seguinte questão procurava perceber os hábitos de desenho dos profissionais

de animação. Percebe-se que, dentro dos inquiridos, a maioria mantém o

hábito de desenhar num diário gráfico, exercitando assim o desenho de

forma regular. Contudo, 40% admite não manter qualquer prática de diário

gráfico.

11.ª Pergunta: Pratica o desenho ao vivo? (ver imagem 97)

Sim: Não:

17 8

Imagem 97 – Prática, ou não, de desenho ao vivo pelos inquiridos

O objetivo desta questão é complementar da questão anterior e procurou

averiguar o impacto dos hábitos de desenho nos profissionais de animação,

relativamente ao desempenho profissional. Nesta questão, 68% dos

participantes afirmaram praticar desenho ao vivo.

No conjunto das duas questões, seis sujeitos responderam negativamente às

duas questões, outros seis responderam de forma afirmativa a uma das questões

e os restantes 13 indicaram “sim” nas duas respostas.

Outras conclusões resultantes do questionário:

Os resultados deste questionário mostram que o profissional de animação, na

sua maioria, confere grande importância ao nível de competência no desenho,

para um bom desempenho profissional. Apesar de nem todos indicarem o desenho

como fundamental para o animador moderno, quase todos concordam que, nas

técnicas bidimensionais de animação, o desenho é indispensável. Esta importância

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foi ainda mais evidente quando se observa os hábitos de desenho dos

profissionais, com a maior parte dos inquiridos a demonstrarem hábitos regulares

de prática do desenho, através de um diário gráfico ou do desenho ao vivo.

Quanto às dificuldades demonstradas por este grupo de animadores, pode-se

concluir que demonstram maior conforto a desenhar, manipular e animar figuras

humanas. Por sua vez, quando são confrontados com formas menos familiares,

como animar animais quadrúpedes ou manipular outros elementos (como água,

fumo ou fogo) apresentam maior grau de dificuldade. Justifica-se, assim, um

estudo mais aprofundado nestas categorias, por parte dos profissionais.

De acordo com os resultados obtidos, conclui-se que o fator mais relevante no

nível de empregabilidade dos profissionais de desenho é a experiência. Todos os

profissionais questionados, com mais de 5 anos de trabalho, encontravam-se

empregados na área, no momento do questionário. Estes profissionais também

demonstraram um nível geral de desenho superior.

2. Utilização do Método da Lateralidade de Betty Edwards

Um dos principais objetivos desta investigação consistia em averiguar a eficácia

do método de ensino do desenho introduzido por Betty Edwards, como ponto de

partida para alunos e profissionais de animação que não demonstrem grande

talento para o desenho e que procurem começar a desenhar.

Os resultados da investigação foram obtidos através da aplicação do método

da lateralidade de Betty Edwards, junto de uma aluna com expressão gráfica

infantil, sem qualquer hábito de prática de desenho de observação, que realizou

os nove exercícios, propostos num vídeo tutorial pela autora.

2.1. Exercício1: Autorretrato pré-instrução

Para dar início à formação, foi pedido à aluna que reproduzisse um

autorretrato (ver imagem 98). O primeiro exercício procurava, assim, averiguar o

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nível de desenho da aluna no início da formação, para depois servir como termo

de comparação no final do percurso.

Imagem 98 – Exercício 1: Autorretrato de pré-instrução desenhado pela aluna

Como se pode verificar, a aluna executou um registo estereotipado que se

integra no padrão comum de pessoas sem formação em desenho, não estando,

por isso, familiarizada com as técnicas de observação direta.

A aluna começou por desenhar os olhos, não recorrendo a nenhuma técnica de

medição, limitando-se a desenhar, de memória, a forma convencional do olho

feminino, acentuando bastante as pestanas e a simetria dos ângulos. O mesmo

critério verifica-se na representação do resto da figura.

Segundo o testemunho da aluna, encontrou especial dificuldade em

autorrepresentar-se, focando a atenção em pormenores, por vezes sentidos como

imperfeições, o que lhe provocou um sentimento de insegurança e de

desconforto.

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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2.2. Exercício 2: Vaso-Cara

De acordo com Betty Edwards, o exercício tem como objetivo tornar evidente o

conflito entre o lado esquerdo (mais lógico e verbal) e o lado direito do cérebro

(mais percetivo). Foi pedido à aluna que copiasse uma matriz pré-preparada do

exercício, nomeando as partes do rosto ao mesmo tempo que executava o registo.

A aluna reproduziu posteriormente a face direita da figura, em simetria com a face

esquerda, repetindo o nome dos vários elementos do perfil (testa, nariz…) (ver

imagem 99).

Imagem 99 – Exercício 2: Vaso-cara desenhado pela aluna

Betty Edwards prevê que os alunos fiquem bloqueados num determinado ponto

do desenho e, de facto, a aluna manifestou mais dificuldade na representação do

nariz. A aluna referiu que este bloqueio provocou um elevado grau de ansiedade,

ficando com o braço a tremer, ao ponto de querer reiniciar o exercício. Na

segunda tentativa optou por desenhar o perfil da face de baixo para cima, o que a

ajudou na concretização do desenho. A aluna também admitiu que a melhor

solução foi desistir de nomear as partes.

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Quanto ao resultado final, notam-se algumas diferenças mais evidentes no arco

da testa, no entanto, no geral, não sentimos grande discrepância.

2.3. Exercício 3: Desenho invertido

O exercício consiste em copiar um desenho, que retrata o compositor Igor

Stravinsky, em posição invertida (ver imagem 100). Betty Edwards acredita que o

cérebro tem mais dificuldade em reconhecer símbolos familiares, como um rosto,

quando se trata de uma imagem invertida. Deste modo, o aluno pode desenhar

sem que o lado esquerdo do cérebro verbalize e identifique os elementos que

reproduz, deixando o lado direito tomar o controlo, para desempenhar as suas

tarefas de perceção do espaço.

Imagem 100 – Exercício 3: Desenho invertido desenhado pela aluna

Na concretização do exercício, a aluna diz ter sentido maior dificuldade nas

linhas que se sobrepõem em zonas mais complexas, como as mãos. A aluna

revela ainda que o condicionalismo de não nomear a zona das mãos e da face foi

mais difícil do que na resolução da parte inferior do desenho, onde as linhas não

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lhe suscitavam qualquer familiaridade com formas conhecidas, facilitando o

processo de desenho.

É notório na figura desenhada que a aluna perdeu um pouco a noção das

proporções, o que resultou num afunilamento mais acentuado do desenho na

parte da cabeça. No entanto, no geral, a figura ficou bem resolvida,

principalmente na base e, apesar da complexidade, na zona das mãos.

2.4. Exercício 4: Contorno cego

Neste exercício vão ser introduzidas competências de observação no desenho,

mais especificamente a perceção dos limites. É pedido à aluna que desenhe as

pregas da própria palma da mão, semifechada, sem nunca olhar para o desenho,

mantendo os olhos fixos na mão (ver imagem 101). A razão para este exercício,

segundo Betty Edwards, é facilitar a transição para o lado direito do cérebro. Os

contornos das mãos semifechadas criam formas bastante abstratas que não

permitem uma descrição verbal, o que provoca a rejeição do lado esquerdo do

cérebro e a tomada de controlo do hemisfério direito, o mais vocacionado para o

desenho.

Imagem 101 – Exercício 4: Contorno cego desenhado pela aluna

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Segundo o testemunho da aluna, é fácil desenhar neste método, pois são

simplesmente linhas que se estão a reproduzir. A aluna confirma, também, que

enquanto executava o exercício, perdeu a noção de passagem do tempo. A

perceção da passagem do tempo, segundo Betty Edwards, é uma valência do lado

esquerdo, o que favorece a ideia de que a aluna estaria a funcionar,

maioritariamente, com o lado direito do cérebro.

2.5. Exercício 5: Desenho de contorno da mão

Este exercício continua a aprofundar a aprendizagem da perceção dos limites.

Para Betty Edwards, este será o primeiro “desenho verdadeiro” que aluno

concretiza e o primeiro em que irá utilizar a moldura de enquadramento, como

auxiliar do desenho (ver imagem 102).

Imagem 102 – Exercício 5: Desenho de contorno da mão desenhado pela aluna

O resultado final do exercício demonstra ainda algumas fragilidades na

construção do desenho. A aluna revelou alguma dificuldade em manter a moldura

de enquadramento estável em cima da mão enquanto desenhava o contorno

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diretamente na moldura. A segunda dificuldade foi passar o contorno da moldura

para o papel, pois embora tenha passado alguns pontos-chave para o papel,

revelou ainda algumas dificuldades em copiar as direções das linhas de contorno.

O exercício demonstrou uma ligeira evolução no nível de desenho, ainda que

faltasse alguma sugestão de volume e subtileza nas formas.

2.6. Exercício 6: Espaço negativo

O exercício explora a segunda componente de perceção do desenho, a

perceção dos espaços. É pedido à aluna que desenhe uma cadeira, no entanto,

deve obter a forma da cadeira através das formas negativas que envolvem o

objeto (ver imagem 103). A ideia será a aluna desenhar um objeto que lhe seja

muito familiar, recorrendo às formas negativas, com as quais não detém nenhum

género de ideia pré-concebida.

Imagem 103 – Exercício 6: Cadeira desenhada pela aluna através das formas negativas

A aluna demonstrou especial dificuldade na concretização deste desenho. A

primeira dificuldade foi transferir a medida, desenhada na moldura de

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enquadramento, em proporção para o papel, visto que a moldura no papel estaria

numa escala maior. Neste passo, a aluna necessitou de uma orientação mais

dirigida para as relações de escala.

Por outro lado, como a cadeira estava muito próxima, o que criava um efeito

de perspetiva bastante acentuado. Os espaços negativos da base estariam a ficar

demasiado pequenos, no desenho, em relação ao ponto de vista; daí a aluna ter

começado a revelar alguma ansiedade e frustração, prejudiciais ao

desenvolvimento do exercício. A solução encontrada foi sugerir-lhe que marcasse

os espaços negativos, quase todos, diretamente na moldura de enquadramento,

em vez de medi-los na folha, a partir da unidade base. De seguida, transferiu o

desenho dos espaços para o papel, ampliando a escala. Para finalizar, a aluna

optou por usar a informação dos espaços negativos para desenhar alguns

pormenores de volume, no interior, e finalizar a cadeira.

Neste exercício, optou-se por facilitar o trabalho da aluna, pois estaria com

dificuldades em visualizar as proporções e esse aspeto iria ser abordado no

exercício seguinte.

2.7. Exercício 7: Perceção das relações, desenho em perspetiva

O exercício tem como objetivo a observação e reprodução de um elemento

tridimensional, de forma proporcional e perspetivada (ver imagem 104). Para a

realização deste exercício, o aluno terá que aprender a ver proporções e ângulos,

a partir do seu ponto de vista, no objeto que vai desenhar, e conseguir registar e

transferir a informação para o papel.

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Imagem 104 – Exercício 7: Porta e canto desenhados pela aluna em perspetiva

A aluna revelou alguma facilidade em resolver o desenho e em alcançar um

resultado satisfatório. O primeiro passo foi assinalar o topo da porta, no interior da

moldura, e transferir esta medida para a página, como unidade base. Neste

exercício, a aluna mostrou muito mais facilidade em transferir a linha, numa

escala maior (ao contrário do que tinha acontecido no exercício anterior). De

seguida, como lhe foi sugerido, usou a medida do topo para medir, com o auxílio

do lápis, a altura da porta e assinalou os valores no papel. Depois, iniciou o

processo da medição dos ângulos. Recorrendo a duas réguas, uma assente na

constante horizontal, a aluna foi, aos poucos, medindo e assinalando os diversos

ângulos das formas observadas. Ao obter a base geral do desenho, a aluna não

revelou grande dificuldade em completar as formas restantes, sentindo maior

dificuldade apenas no momento em que desenhou o puxador da porta.

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2.8. Exercício 8: Retrato de perfil

Este exercício dá continuidade à aprendizagem da perceção das relações,

usando como objeto de estudo o rosto humano, visto de perfil. É, portanto,

pedido aos alunos que desenhem o rosto de um modelo de perfil. Os alunos são

instruídos sobre as dimensões padrão do rosto, comuns na maioria das pessoas,

que poderão usar como referência quando medirem as proporções do rosto do

modelo (ver imagem 105).

Imagem 105 – Exercício 8: Retrato de perfil desenhado pela aluna

O exercício revelou uma grande evolução na prática do desenho, por parte da

aluna. Durante o processo de aprendizagem, enquanto a aluna desenhava, o

orientador ia perguntando: “Onde está à altura dos olhos em relação à orelha?”;

“Onde se posiciona a boca, em relação à altura dos olhos e a base do queixo?”.

Com este género de instruções a aluna foi medindo e alterando os erros que ia

cometendo, enquanto ia construindo toda a estrutura craniofacial. Aos poucos, a

aluna foi-se mostrando mais à vontade com o processo de construção do

desenho, necessitando cada vez menos de instruções. No final, obteve-se um

resultado bastante satisfatório em relação ao ponto de partida.

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2.9. Exercício 9: Autorretrato

Este exercício aborda, de uma forma mais aprofundada, a temática da

perceção de luz e sombra. Consiste no desenho de um segundo autorretrato,

recorrendo à observação, identificação e reprodução de manchas de luz e sombra,

que no seu conjunto reproduzem o rosto (ver imagem 106). Para além de

familiarizar a aluna com a relação luz/sombra, o segundo autorretrato serve

também como termo de comparação entre o nível de desenho no início da

formação e o nível de desenho no final da aplicação do método.

Imagem 106 – Exercício 9: Autorretrato desenhado pela aluna

Na realização deste exercício, a aluna revelou bastante dificuldade em medir e

manter a proporcionalidade das formas do próprio rosto. Demonstrou também

dificuldade em observar as formas de luz e sombra e em transferi-las de forma

proporcional para o desenho, o que resultou em bloqueios momentâneos por

parte da aluna, obrigando a uma intervenção por parte do orientador. Ficou

também demonstrada uma maior facilidade, por parte da aluna, em pensar e

executar o desenho através da linha, como no exercício anterior, do que através

da mancha.

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Apesar de alguns erros nas proporções do rosto, o desenho ficou bem resolvido

e a aluna demonstrou uma acentuada evolução técnica, visível na representação

das formas, mais consentâneas com a realidade percetiva (ver imagens 107 e

108).

Imagens 107 e 108 – Autorretrato inicial e autorretrato final desenhados pela aluna

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Capítulo IV

Apresentação de resultados

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Capítulo IV

A investigação teve como ponto de partida a seguinte problemática: De que

maneira o ensino do desenho favorece o desenvolvimento dos futuros

animadores? Procurou-se, deste modo, averiguar a importância do desenho no

desempenho do animador e no processo de animação propriamente dito,

procurando investigar as práticas/exercícios de desenho mais relevantes para o

desenvolvimento do profissional de animação.

Da problemática em estudo surgiram as seguintes questões orientadoras:

De que maneira está presente o desenho no processo da produção de

animação?

Quais as limitações/dificuldades de animadores com pouca formação em

desenho?

Como podem ser combatidas essas mesmas limitações/dificuldades?

Que tipologias de exercícios são aplicadas no ensino do desenho para

animadores? E qual a importância desses exercícios para a animação?

Quanto à primeira questão - “De que maneira está presente o desenho no

processo da produção de animação?” - a investigação sugere, através do

questionário efetuado aos profissionais de animação, que o desenho permanece

presente nos processos da produção. Praticamente todos os inquiridos, mesmo os

profissionais com menos anos de trabalho na área, desempenham ou

desempenharam funções com uma forte componente de desenho, como

animadores 2D digital, animadores tradicionais, artistas de storyboard, etc.

Contudo, muitas vezes, os profissionais não reconhecem algumas técnicas digitais

como técnicas de desenho, estabelecendo uma distinção entre o desenho

analógico e o desenho digital ou vetorial. Muito animadores afirmam mesmo que

não consideram o desenho como fundamental para o animador moderno. No

entanto, verifica-se que se referem apenas a um modelo tradicional de desenho,

associado a plataformas tradicionais de animação, esquecendo-se que o conceito

de desenho abrange o próprio desenho vetorial.

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O desenho continua a fazer parte da produção, tanto nos processos

tradicionais como nos digitais. Existem diversas fases na realização de um filme

que implicam sempre desenho: a conceção dos personagens, a pesquisa do

aspeto gráfico do filme, o storyboard. Mesmo no caso de produção 3D, ou de

animação de volumes, o desenho continua a ser a ferramenta de base.

Já no que respeita à segunda questão - “Quais as limitações/dificuldades de

animadores com pouca formação em desenho?” - o questionário também sugere

algumas conclusões. Não se pode afirmar que um animador não possa exercer a

sua profissão sem saber desenhar, pois mesmo Richard Williams admite conhecer

muitos animadores 3D que não desenham. O animador 3D recebe, muitas vezes,

o personagem já construído e pronto a animar, como uma marioneta, e o mesmo

se aplica a animadores de volumes. Contudo, estes animadores não conseguem

fazer parte do processo de criação e conceção destes personagens e devem

cingir-se a animá-los.

De acordo com os resultados obtidos no questionário, os animadores com

maior percentagem de empregabilidade seriam, na sua maioria, os que

apresentavam mais experiência e capacidade de desenho. Um animador que

demonstre uma maior capacidade para desenhar pode integrar diversas fases da

produção, pois as suas limitações prendem-se com a assimilação das ferramentas

de uma determinada produção.

Por sua vez, os profissionais de animação com pouca formação em desenho

estão limitados em vários aspetos do seu trabalho. Como se verificou

anteriormente, o animador é chamado a atuar através dos seus personagens. As

fragilidades no desenho limitam o número de ângulos e poses, em que o animador

consegue desenhar o personagem, limitando a performance.

No questionário, os animadores que revelaram menos experiência de desenho,

revelaram também bastante dificuldade em desenhar poses inexistente numa

biblioteca de poses de um personagem (no caso da animação 2D digital). Acresce

que esses animadores manifestam dificuldade na adaptação a estilos gráficos

diferentes. Como foi explicado por Pete Symons, a capacidade de adaptar o estilo

de desenho, permite ao animador adaptar-se a diferentes exigências gráficas,

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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corresponder melhor à intenção do realizador e, ainda, integrar a equipa de

desenvolvimento do estilo gráfico da produção. Ter uma boa capacidade de

desenho ajuda, também, o animador quando é chamado a animar elementos que

não lhe são familiares: o desenho serve como método de pesquisa do

comportamento de animais ou elementos não orgânicos, líquidos ou gasosos, que

requerem muita observação, para serem reproduzidos de forma convincente.

Pode concluir-se, desta forma, que o animador consegue exercer a sua

profissão sem conhecimentos profundos de desenho; no entanto, fica limitado no

seu campo de ação. Também se conclui que o animador, com um nível baixo de

experiência gráfica, fica dependente dos seus pares para o desempenho integral

da sua profissão. Continua a ser aconselhável, como indicou Williams, que o

desenho constitua uma segunda natureza para o animador.

As duas últimas, questões - “Como podem ser combatidas essas mesmas

limitações/dificuldades?” e “Que tipologias de exercícios são aplicadas no ensino

do desenho para animadores? E qual a importância desses exercícios para a

animação?” - mobilizaram uma grande parte do trabalho de investigação.

O estudo procurou detetar soluções para alunos e profissionais de animação

que procurassem evoluir no desenho, ou, até mesmo, para indivíduos que

quisessem aprender a desenhar, mas que não possuíssem nenhum género de

formação gráfica ou aparente talento. O método escolhido para introduzir o

desenho foi o método da lateralidade do cérebro, defendido por Betty Edwards,

por estar presente nas bibliografias das unidades curriculares para principiantes

em diversos cursos de animação, a nível global, e por ser um método de curta

duração. O método revelou ser bastante eficaz em sujeitos sem qualquer prática

de desenho, como se comprovou no caso presente. A aluna envolvida neste

estudo conseguiu ascender a um nível de aproveitamento que certamente

facultará o acesso a um patamar técnico mais dirigido para o desenho de

animação.

Quanto ao desenvolvimento do desenho, orientado para o cinema de

animação, é importante o estudo aprofundado da figura humana, não só em

termos de construção anatómica, mas de atitude e ação. Alguns exercícios são

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sugeridos por diversos autores, sendo dada relevância a Kimon Nicolaides e Walt

Stanchfield (mais associado à animação), com diversos exercícios e métodos de

estudo da figura humana em movimento. Para o estudo da figura humana, o

aluno deverá procurar também frequentar sessões de desenho ao vivo e modelo

nu, assim como executar estudos de campo no exterior. Deverá neste estudo

incluir tanto poses de longa duração, como poses rápidas e mesmo figuras em

movimento permanente.

A representação de animais deve também receber a mesma atenção que a

figura humana. Idealmente, o aluno deve deslocar-se a locais onde seja possível

desenhar animais ao vivo. Como foi referido, o animador é chamado a animar

todo o género de personagens. Criar uma ampla base de conhecimento de

estruturas e de atitudes ajuda o animador a diminuir as suas limitações

profissionais.

Para combater o problema de adaptação, que o animador poderá manifestar

em relação a um determinado estilo, ou a incapacidade de mudar a própria

linguagem gráfica, foi sugerido um exercício de “estudo de artistas”. Este exercício

obriga o aluno a estudar e a tentar aplicar o registo de um determinado artista

durante uma semana, mudando de artista ao fim dessa semana e repetindo o

processo durante pelo menos quatro semanas. Ao fim das quatro semanas, o

animador terá construído um portefólio com um vasto leque de registos que

ganha em capacidade de desenho e de adaptabilidade.

No entanto, um filme de animação não é constituído somente por

personagens, pelo que o estudo de ambiências para cenários de animação

também é importante. Para os profissionais que procuram desenvolver esta

valência foi sugerido que recorressem a estudos de campo, como o diário gráfico,

para enriquecer o trabalho e torná-lo mais convincente. O uso do diário gráfico é

muito aconselhado por profissionais e instrutores de animação, em todas as

componentes referidas, desde a figura humana até aos cenários. O diário gráfico

serve para informar o trabalho do animador, como método de pesquisa e registo

do mundo real.

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Respondendo à questão central da investigação - “De que maneira o ensino

do desenho favorece o desenvolvimento dos futuros animadores?” pode concluir-

se que, segundo os resultados obtidos no questionário realizado aos profissionais

de animação, os animadores com maior capacidade de desenho encontram uma

maior facilidade de empregabilidade na área. Existe, portanto, uma preferência,

no mercado por animadores que dominam o desenho, que são capazes de

desempenhar um maior número e uma maior variedade de funções. Neste

sentido, o aluno que ambiciona tornar-se animador, ou trabalhar na área criativa

da produção de animação, deve aprender a dominar o desenho para assim

conseguir “falar” esta linguagem fundamental.

O estudo permite concluir que o ensino do desenho, desde o início da

formação do profissional de animação, é fundamental, independentemente da

direção profissional que o aluno tencione seguir na sua carreira. Ensinar

animação, diretamente num software 3D, pode-se comparar ao ensino da escrita,

diretamente no computador. Quando as crianças aprendem a escrever, aprendem

desenhando as letras, e depois de se familiarizem com cada uma, aprendem a

juntá-las para formar palavras, para posteriormente construírem frases. Só

quando dominam totalmente a gramática é que passam para o computador. O

desenho é para o animador a ferramenta de base, o ponto de partida da

aprendizagem. O domínio da técnica do desenho não é impeditivo do aluno

aprender a dominar softwares 3D ou a animar volumes, no entanto, as noções de

movimento e de estrutura são desenvolvidas através da observação do real e o

desenho serve esse propósito de registo do real, quer do movimento quer das

atitudes. O ensino da animação, a partir do desenho, proporciona uma análise

próxima e detalhada de cada “frame” de um determinado movimento, pois ter-se-

á que descrever cada um dos momentos da ação. Se o aluno estiver confortável

com o desenho, conseguindo desenhar todos esses instantes da ação, poderá

empenhar-se muito mais na performance do personagem, sem limitações,

permitindo que o personagem transmita muito mais intencionalidade e vida, sem

que o espetador questione se é real ou não o que está a ver.

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https://www.youtube.com/watch?v=ctkRwRDdajo

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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Anexos

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João Lopes da Silva

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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Anexo 1 – Entrevista ao Professor Pete Symons (Coordenador do

Curso de Animation Production, no Arts University Bournemouth)

1. About the artist, studies, I remember we were introduced to this

exercise in quite an early stage. As a teacher do you notice that

beginning students tend to be stuck in a certain genre of drawing, and

this exercise helps them unblock their development?

Artist studies help students understand what good quality drawing is and to learn

from artists who have spent all their lives developing a skill the students have only

just started to learn. Often we get students to look at artists who work differently

from them to broaden their portfolio of styles and approaches to image making.

So yes it is a very effective way of, as you say, unblocking any genre of drawing

they may be stuck in and to not be shy of appropriating the work of others to

influence what they do. They are students so they should be studying and if they

can go to a gallery and see the work first hand all the better. It is study not copy,

copy is easy but does not help if the student cannot then use the way the artist

works and thinks in their own drawing.

2. What are the main goals of the exercise?

See above.

3. How do you assess it? For example, do you evaluate more the

improvement of the student, or the general drawing skill?

Evidence of a direct influence on the students work that is clearly from the study

of the artist along with an understanding of the mark making and thinking behind

the drawings. It is not about a good copy unless the student can show the above.

4. At the end of the 4 weeks of artist studies, what is generally the most

notorious improvement in students work?

A breadth of ,use of materials and mark making apparent in their own work as

long as quality studies where they have clearly understood the materials surfaces(

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João Lopes da Silva

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paper) and mark making possibilities derived from the study of the artist, they

should also be starting to think for themselves about who to look at next .

5. Do you believe animators who practice this exercise regularly gain an

advantage in adapting better to different productions, different tasks?

Yes if they can mimic the artist they can work with a director and produce work to

the style of the production and also be part of the creative process of developing

styles because they will have a good understanding of not only artist styles but

good image making by animators and illustrators too.

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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Anexo 2 – Questionário aos profissionais de animação

Este questionário surge no âmbito da minha dissertação de mestrado cujo

tema é “Didática do Desenho Aplicada à Animação”. O questionário pretende

averiguar as dificuldades encontradas por um profissional de animação com pouca

formação em desenho.

Preencha nos quadrados com um (x) nas opções que se apliquem a si em cada

questão à exceção da segunda parte da questão 7. O questionário será anónimo e

deverá ser preenchido e encaminhado no formato word para o e-mail

[email protected]. Agradeço a sua participação.

Início:

1.ª - Há quantos anos trabalha, ou trabalhou, como profissional de animação?

2.ª - Qual o seu nível de formação?

Até 9º ano

Secundário

Licenciatura

Mestre

Doutorado

Outro

Menos de 1 ano

De 1 a 3 anos

De 3 a 5 anos

De5 a 10 anos

Mais de 10 anos

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3.ª - Esta formação tinha uma grande componente de desenho?

Sim

Alguma

Não

4.ª - Considera o seu desenho:

5.ª - Quais destas funções já desempenhou, como profissional de animação?

Animador tradicional (Papel)

Animador 2d digital

Animador 3d digital

Animador de Volumes

Realizador

Director de animação

Modelling

Concept Artist

Storyboard Artist

Layout Artist

Intervalista

Clean-up

Edição

Efeitos especiais

Outros/as

Fraco

Médio

Bom

Muito Bom

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Dissertação – Mestrado em Desenho

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6.ª - Indique o nível de dificuldade que sente nas diferentes situações, sendo que

1 indica nenhuma dificuldade e 5 muita dificuldade.

Sinto dificuldade em: 1 2 3 4 5

-manter o personagem proporcional no decorrer da ação.

-mudar drasticamente a expressão no personagem durante a ação

-mover o personagem em profundidade/perspectiva

-desenhar poses inexistentes numa livraria de movimentos ou no

model-sheet (no caso da animação digital 2d)

-animar personagens quadrúpedes (quatro patas)

-adaptar a um estilo gráfico de uma produção

-fazer squash e stretch (encolher e esticar) do personagem, mantendo

a sua proporção global?

-desenhar as keys (poses principais da ação) em pequenos thumbnails

(desenhos pequenos) para planear a ação

-desenhar um storyboard

-animar efeitos e elementos extra (fluidos, fogo, fumos)

-preparar um layout

7.ª - Considera o desenho como fundamental para qualquer animador moderno?

Sim

Não

Dê uma breve justificação:

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

__________________________________________________________________

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8.ª - O seu nível de desenho é limitativo no seu desempenho profissional?

Sim

Não

9.ª - Neste momento encontra-se empregado na área?

Sim

Não

10.ª - Mantem um diário gráfico?

Sim

Não

11ª- Pratica o desenho ao vivo?

Sim

Não

Questionário concluído.

Obrigado pelo seu testemunho.