dicas de estudo - thomaz napoleão

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Aprovado em 1º lugar para diplomata estudou por oito meses; veja dicas Instituto Rio Branco abriu 30 vagas para o cargo, cujo salário é R$ 13,6 mil. Thomaz Napoleão, que passou em seu 1º concurso, fala sobre a carreira. Marta Cavallini Do G1, em São Paulo 198 comentários Thomaz Napoleão é diplomata há 4 anos e estudou por oito meses, 6 horas por dia (Foto: Arquivo pessoal) Thomaz Alexandre Mayer Napoleão, de 29 anos, se tornou diplomata quando tinha apenas 25 anos. Ele passou em 1º lugar no concurso do Instituto Rio Branco em 2009, feito obtido na primeira tentativa para ingressar no órgão.

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Aprovado em 1º lugar para diplomata estudou por oito meses; veja dicas

Instituto Rio Branco abriu 30 vagas para o cargo, cujo salário é R$ 13,6 mil.

Thomaz Napoleão, que passou em seu 1º concurso, fala sobre a carreira.

Marta Cavallini Do G1, em São Paulo

198 comentários

Thomaz Napoleão é diplomata há 4 anos e estudou por oito meses, 6 horas

por dia (Foto: Arquivo pessoal)

Thomaz Alexandre Mayer Napoleão, de 29 anos, se tornou diplomata quando

tinha apenas 25 anos. Ele passou em 1º lugar no concurso do Instituto Rio

Branco em 2009, feito obtido na primeira tentativa para ingressar no órgão.

Além disso, era seu primeiro concurso público. Foram oito meses de preparação

e cerca de R$ 5 mil investidos em cursinho preparatório e material de estudo.

O Instituto Rio Branco está com inscrições abertas até o dia 9 de julho para 30

vagas de diplomata. O salário é de R$ 13.623,19. Podem se inscrever

candidatos com nível superior em qualquer área.

Desde 2011, Napoleão trabalha na Embaixada do Brasil em Islamabad, no

Paquistão. É seu primeiro posto como diplomata no exterior. “Viajo a trabalho a

cada dois ou três meses, em média, principalmente para os países dessa

região, como o Afeganistão. Além disso, utilizo meu tempo livre para viajar

extensamente pela Ásia e pelo Oriente Médio, por interesse pessoal”, conta.

Como foi a preparação

Napoleão conta que durante os estudos priorizou os temas nos quais tinha

maior dificuldade, que eram direito, economia e história do Brasil. “Essas

disciplinas concentraram 60% do meu tempo de estudos, pois minha base nas

demais matérias, línguas inclusive, já era sólida. Estudei todos os conteúdos

mais ou menos simultaneamente, o que talvez não seja estratégia eficaz para a

maioria dos candidatos”, comenta. O diplomata fala inglês, francês, russo e

espanhol. As fluências em inglês e francês vieram da adolescência, as outras,

mais tarde, segundo ele.

Não há motivo para desespero, pois o concurso é anual, de maneira ininterrupta

desde 1946, e há pouquíssima variação entre uma edição e a seguinte"

Thomaz Napoleão

Napoleão estudava cerca 6 horas por dia, inclusive nos finais de semana.

Napoleão conta que na época trabalhava em tempo integral: era assessor

internacional do Ministério da Educação. “Acordava às 6h30, estudava de 1 a 2

horas pela manhã, depois ia às 9h ao trabalho, estudava mais 1 hora durante o

almoço, voltava ao expediente à tarde e estudava mais 3 a 4 horas à noite,

entre aulas no cursinho e leituras em casa. Procurava não dormir muito tarde,

após as 23h, pois um bom repouso diário era fundamental para manter essa

rotina exigente. No entanto, nunca tive metas de disciplinas claramente

organizadas: simplesmente sabia os assuntos que deveria priorizar, e adaptava

meu tempo livre de maneira correspondente.”

Napoleão conta que leu, total ou parcialmente, de 100 a 120 livros para o

concurso. Mas durante a preparação, ele não deixou o lazer de lado. “Fiz alguns

sacrifícios, mas não em excesso. Reduzi o ritmo de viagens, baladas e outros

programas sociais, e mantive namorada durante a maior parte da preparação.

Um erro muito comum entre candidatos é se dedicar única e exclusivamente ao

concurso, abrindo mão do lazer, do exercício e da vida social para respirar

estudos dia e noite. Com raras exceções, é uma péssima escolha: aumenta a

ansiedade e o estresse, e com isso diminui a produtividade dos estudos.

Disciplina não significa autoflagelo”, diz.

Para ele, o que determina a aprovação é a condição psicológica na hora da

prova. “Dificilmente alguém estará calmo e relaxado se tiver passado 100% do

seu tempo entre livros, de maneira obsessiva, sem nunca descansar e

descontrair. Não somos máquinas.”

O concurso é uma espécie de maratona, uma prova de resistência, não uma

corrida de velocidade"

Thomaz Napoleão

Ao ser questionado sobre o “segredo” do seu sucesso, ele cita quatro fatores.

Primeiro, sua formação acadêmica e experiência profissional anteriores, que

facilitaram a preparação. Em segundo lugar, o fato de ser “um leitor compulsivo

e um estudante entusiasmado”. “Pode parecer óbvio, mas quem encarar o

estudo como um sacrifício, e não como um prazer, dificilmente terá chances”,

diz.

Outro fator é a facilidade com línguas estrangeiras, por ter estudado em

escolas americanas e canadenses, em São Paulo, e por ter feito mestrado na

França. “Graças a isso, obtive a maior nota do concurso em inglês e em francês,

embora não fosse muito forte em espanhol.” E, por último, a atitude psicológica

no momento das provas, mesclando uma grande dose de frieza e autocontrole

com um bom tempero de autoconfiança e otimismo. “O formato do concurso,

muito longo, desgastante e extremamente competitivo, favorece os candidatos

mais calmos e metódicos, o que condiz com minha personalidade. O concurso é

uma espécie de maratona, uma prova de resistência, não uma corrida de

velocidade.”

Para quem pretende fazer o concurso, Napoleão aconselha o candidato a fazer

uma pesquisa criteriosa sobre o que realmente faz um diplomata brasileiro.

“Um pouco de autoconhecimento é necessário: você quer mesmo passar o resto

da vida adulta se mudando de cidade e país a cada dois ou três anos, e está

pronto para os sacrifícios pessoais que isso implicará? A diplomacia é uma

carreira interessantíssima, mas não é para todos”, alerta.

Instituto Rio Branco, que forma diplomatas (Foto: Divulgação)

No começo dos estudos, ele aconselha o candidato a identificar os pontos fortes

e fracos entre as matérias do concurso, e, segundo ele, a melhor maneira de

fazer isso é resolver algumas provas anteriores e testar o desempenho.

O passo seguinte é escolher o curso preparatório mais adequado, seja ao vivo

ou à distância (aulas telepresenciais). “Pesquise bastante, compare horários e

preços, informe-se sobre cada professor e converse com outros candidatos.

Teoricamente é possível passar sem cursinho, mas esse não é o caso de 95%

dos aprovados nos últimos anos. Seria irresponsável recomendar que alguém se

prepare sozinho”.

“O resto é manter a disciplina regular de estudos, priorizar os assuntos que

efetivamente serão cobrados - não caia na tentação de perder tempo com

conteúdos saborosos, mas inúteis para a prova, atenha-se ao edital e siga os

conselhos de professores experientes - e permanecer tranquilo e paciente

durante a preparação.”

Para Napoleão, embora todos os conteúdos sejam importantes, as duas

matérias claramente decisivas do concurso são português e política

internacional. Segundo ele, a primeira fase tem numerosas questões de

gramática e interpretação textual; a segunda etapa, sobretudo a redação, é

uma das barreiras mais difíceis do concurso; e na terceira fase, discursiva, é

impossível ser aprovado sem escrever muito bem. Já os temas de política

internacional, na prática (não no edital), representam mais de metade de todas

as questões (inclusive em línguas estrangeiras) da terceira e da quarta fases;

nos últimos anos, a redação (segunda fase) também tem versado sobre

assuntos políticos, mais que literários.

Para Napoleão, a terceira fase, com seis provas escritas, em dias alternados, é

a mais exaustiva, pois contempla, ao todo, 24 horas de questões discursivas

complexas (quatro horas para cada uma das seis matérias). “Mas não é

necessariamente a mais difícil. Fiquei mais preocupado com a segunda etapa, a

prova discursiva de português e redação, cuja banca [Cespe/UnB] tem a

reputação de ser especialmente rigorosa”, diz.

Dificilmente alguém estará calmo e relaxado se tiver passado 100% do seu

tempo entre livros, de maneira obsessiva, sem nunca descansar e descontrair.

Não somos máquinas”

Thomaz Napoleão

Para quem está prestando o concurso há anos e não passa, Napoleão indica

paciência, disciplina e dedicação. “Na maioria dos casos, o concurso é um

projeto de longo prazo e o mais frequente é que a aprovação venha após 2 a 4

anos de estudos específicos, embora haja exceções. Alguns de meus colegas no

Instituto Rio Branco conseguiram a aprovação após 6 ou 7 anos de tentativas”,

afirma.

Napoleão explica que para quem chegou perto da aprovação em concursos

anteriores não faz sentido desistir, mas se nunca conseguiu se aproximar da

nota de corte da primeira fase, após várias tentativas, é aconselhável rever os

planos. “O número de candidatos altamente qualificados é estruturalmente

superior ao número de vagas disponíveis, e sempre será, pelo simples fato de

que o Brasil é um país enorme, mas dotado de um serviço diplomático pequeno.

Não quero azedar os sonhos de ninguém, mas muitas frustrações seriam

evitadas se mais pessoas fossem realistas.”

Nesse caso, ele indica o concurso para oficial de chancelaria do MRE, “que é um

pouco menos exigente e também permite um estilo de vida semelhante ao do

diplomata, com iguais oportunidades de conhecer o mundo e lidar com temas

interessantes”.

“Os aspirantes que de fato têm chance de sucesso devem persistir em seus

planos, sem perder a calma. Devem identificar as deficiências de seus

programas de estudo, se possível após consultar professores e outros

candidatos, para compensá-las. Muitas vezes a diferença entre a aprovação e a

reprovação, principalmente na primeira fase do concurso, é um detalhe banal:

uma noite de insônia, uma cólica, um 'branco' sobre um único tema de

economia, uma briga recente com a namorada ou qualquer outro azar que

provavelmente não se repetiria no ano seguinte. Não há motivo para

desespero, pois o concurso é anual, de maneira ininterrupta desde 1946, e há

pouquíssima variação entre uma edição e a seguinte. Isso significa que o estudo

é cumulativo: as leituras feitas para o concurso de 2012 continuarão úteis em

2015, na maioria dos casos.”

Além da bibliografia recomendada e de apostilas e provas anteriores, Napoleão

acha importante que o candidato se mantenha atualizado por meio de jornais,

revistas e internet, na parte de atualidades em geral. “A prova de política

internacional requer conhecimento aprofundado das atuais ações e campanhas

da diplomacia brasileira; a prova de direito pode se debruçar sobre

controvérsias jurídicas e tratados internacionais recentes; e a prova de

geografia cobra diversas questões socioeconômicas de atualidade”, exemplifica.

Vida de diplomata

Segundo ele, a diplomacia é uma carreira extremamente versátil: é possível

trabalhar com temas políticos, comerciais, ambientais, consulares,

humanitários, culturais e de desarmamento, entre outros. Em Islamabad, ele

conta que lida basicamente com assuntos políticos, como o acompanhamento

do conflito no Afeganistão, o equilíbrio nuclear entre Índia e Paquistão, a

consolidação da democracia paquistanesa e o combate ao terrorismo, e de

cooperação, como assistência humanitária prestada pelo Brasil a refugiados e

vítimas de catástrofes naturais e capacitação técnica em setores como

agricultura e segurança alimentar.

Entre a aprovação no concurso e a ida a Islamabad, ele fez o curso de formação

no Instituto Rio Branco, que dura três semestres e é a etapa inicial e obrigatória

da carreira. Ele também trabalhou na Secretaria de Planejamento Diplomático,

unidade que assessorava o então ministro das Relações Exteriores Celso

Amorim.

O formato do concurso, muito longo, desgastante e extremamente competitivo,

favorece os candidatos mais calmos e metódicos"

Thomaz Napoleão

Napoleão, que é da cidade de São Paulo, se graduou em 2005 em relações

internacionais e em 2006 em jornalismo. Ele ainda tem mestrados em

segurança internacional, concluído em 2008, em Paris, na França, e em

diplomacia, em 2011, no próprio Instituto Rio Branco.

O diplomata conta que, diferentemente da maioria dos aspirantes à carreira,

não passou muitos anos sonhando com a diplomacia. “Achava que o Itamaraty

era excessivamente hierarquizado, elitista ou conservador. Desfiz essas ideias

preconcebidas após conversar com amigos que já haviam ingressado no

ministério que disseram que a carreira diplomática havia evoluído muito nas

últimas décadas”, diz.

Ele conta que durante quase toda a vida acadêmica, sua ambição era trabalhar

nas Nações Unidas ou em outros organismos internacionais, ou em ONGs

dedicadas à resolução de conflitos e à ação humanitária, ou até ser

correspondente internacional em zonas de conflitos. “Somente mudei de ideia

ao final do mestrado, quando morava na França, e consultei alguns amigos,

parentes e professores que conheciam o Itamaraty.”

Napoleão conta que uma das vantagens da carreira é a possibilidade de

conciliar diversas rotinas extraprofissionais. Segundo ele, muitos diplomatas são

também acadêmicos ou artistas, escritores, fotógrafos, cineastas, poetas ou

pintores, por exemplo. Napoleão trabalha ainda como professor de política

internacional em um curso preparatório para a diplomacia e pretende fazer

doutorado em relações internacionais, para posteriormente lecionar em

universidades. “Sou também fotógrafo e organizo exposições e ensaios

ocasionais.” Ele inclusive mantém um de fotografias

(http://napoleaophoto.com).

Festival de monges budistas no Butão fotografada pelo diplomata, no início

do ano (Foto: Thomaz Napoleão)

Segundo Napoleão, os diplomatas mudam de país a cada 2 ou 3 anos,

normalmente. Há um sistema de rotação entre postos, que combina as

preferências pessoais e profissionais de cada diplomata com as necessidades

políticas e administrativas do Itamaraty. “Procura-se, de modo geral, alternar

postos ‘confortáveis’, cidades desenvolvidas, estáveis, seguras e cultural ou

geograficamente próximas do Brasil, com ‘desafiadores’, países em

desenvolvimento, às vezes turbulentos, onde a infraestrutura é mais precária e

o choque cultural será maior. Mas ninguém é forçado a servir em qualquer lugar

contra sua vontade”, explica.

Napoleão sonha em trabalhar em vários países, principalmente no Oriente

Médio e na África, além da Rússia. “Sempre gostei muito de viajar, de negociar

e debater, de aprender línguas estrangeiras, de estudar temas políticos e de

enfrentar choques culturais. Gosto muito do sentimento de representar o Brasil

no exterior, é uma grande honra. É evidente que a diplomacia era a profissão

ideal para mim.”

De acordo com Napoleão, a presença de mulheres e afrodescendentes no

Itamaraty ainda é insuficiente. Na sua turma, havia cerca de 25% de mulheres

e 10% de afrodescendentes. “A presença feminina, infelizmente, ainda é

pequena no Itamaraty, mas hoje várias de nossas principais embaixadas e

missões são chefiadas por mulheres. Da mesma forma, o Itamaraty sempre foi

majoritariamente branco, mas a participação de negros vem crescendo, em

parte graças a políticas de ação afirmativa lançadas no governo Lula”, diz.