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Diagnóstico social e esportivoDe 53 favelas cariocas

volume 2

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Diagnóstico social e esportivo De 53 favelas cariocas

volume 2

Rio de Janeiro, 2008

legado social dos Xv Jogos pan-americanosConvênio 235/2006 entre o Ministério do Esporte e

o Observatório de Favelas

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Diagnóstico social e esportivo De 53 favelas cariocas - volume 2

centro de promoção da saúde (cedaps)

coordenação-geral

Kátia Maria Braga Edmundo

Maria do Socorro Vasconcelos Lima

Wanda Lucia Branco Guimarães

coordenação técnica

Ana Paula da Costa Baptista

Daniella do Amaral Mello Bonatto

Rogéria Nunes

compilação de dados

Fransérgio Goulart

Geisa Ferreira do Nascimento

Juliana Maio de Oliveira

equipe responsável pela publicação

Alberto Aleixo de Souza · Daniella

do Amaral Mello Bonatto · Danielle

Lopes Bittencourt · Débora Santana

de Oliveira - Edson Diniz Nóbrega

Junior · Fernanda Gomes da Silva

· Kátia Maria Braga Edmundo ·

Rogéria Nunes · Wellen Lyrio de

Souza Junior

presidente da repúblicaLuiz Inácio Lula da Silva

ministro do esporteOrlando Silva de Jesus Junior

secretário-executivo do comitê de gestãodas ações governamentais dos JogosRicardo Leyser Gonçalves

observatório de favelas

coordenação

Jailson de Souza

Jorge Luiz Barbosa

coordenação-geral do projeto

Edson Diniz Nóbrega Junior

coordenação técnica do projeto

Débora Santana de Oliveira

Wellen Lyrio de Souza Junior

secretaria-executiva do projeto

Alberto Aleixo de Souza

Fernanda Gomes da Silva

Márcia Regina Spolzino Porto

consultoria de políticas sociais

José Ribamar Pereira Filho

consultoria técnica

Renato Coelho Dirk

assistente técnica

Tereza Helena Nunes Fonseca

revisão editorial

Augusto Gazir

Marianna Araujo

Vitor Monteiro de Castro

imagens

Fábio Caffé e Jaqueline Félix /

Imagens do Povo

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8 Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas

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apresentação1

A cidade do Rio de Janeiro recebeu em julho de 2007 o maior evento esportivo realizado até então no Brasil. Mais de 4.000 atletas de 42 países do continente americano participaram dos XV Jogos Pan-americanos. A cidade e o país se tornaram o centro das atenções continentais, pois nesse evento recor-des foram quebrados, novos atletas surgiram como referências para futuras gerações. Segu-ramente, o acontecimento marcou a história do esporte brasileiro.

A importância da realização de um evento grandioso como os XV Jogos Pan-ame-ricanos não se esgota e nem se limita apenas ao campo esportivo. Para acolher uma com-petição desse porte, o Rio de Janeiro recebeu recursos para a construção das instalações necessárias, investimentos que na cidade privilegiam tradicionalmente os bairros e re-giões mais favorecidos economicamente, em detrimento das que precisam de mais verbas públicas e privadas, notadamente as favelas e periferias.

Para além de uma reflexão crítica a respeito do sentido social da aplicação dos recursos, os Jogos de 2007 podem estabelecer um novo paradigma para a organização de grandes eventos, um compromisso social. O debate torna-se ainda mais pertinente quando a mesma cidade do Rio de Janeiro se prepara para sediar competições internacionais de ainda maior peso que o Pan, como será a Copa do Mundo de 2014 no Brasil.

Com o intuito de contribuir para a dis-

cussão e a construção desse novo paradigma, o governo federal, via Ministério dos Esportes e a Sepan (Secretaria Especial para o Pan), firmou uma parceira com o Observatório de Favelas para o desenvolvimento do conceito de Legado Social dos XV Jogos Pan-ameri-canos de 2007. Esse conceito evidencia algo fundamental: o papel dos Jogos em deixar um legado material e imaterial, além dos equipa-mentos esportivos, para a cidade do Rio de Janeiro, especialmente para a população dos espaços populares.

Para contribuir no desenvolvimento desse novo paradigma de grandes eventos urbanos, o Observatório de Favelas em par-ceria com o Cedaps (Centro de Promoção da Saúde) realizou estudos e pesquisas em 53 comunidades populares localizadas na cidade do Rio de Janeiro. Dessas comunidades – situ-adas nas proximidades dos locais de compe-tições do Pan –, fez-se mapas sociais, levando em consideração os serviços e instalações existentes nos locais, inclusive os esportivos, e, principalmente, a opinião dos moradores sobre o que eles avaliam como fundamental para a melhoria da sua qualidade de vida.

Os estudos e pesquisas realizados deram origem a dois relatórios diferentes. No primeiro, pesquisou-se indicadores sociais que medem a qualidade de vida nas comuni-dades. Esse primeiro relatório, publicado no segundo semestre de 2007 pelo Observatório de Favelas, mostrou o quanto ainda é necessá-rio avançar em políticas sociais para superar as

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acentuadas desigualdades no Rio de Janeiro e o quanto ainda se precisa investir nas comuni-dades populares para que elas se aproximem dos índices médios de desenvolvimento so-cioeconômico do conjunto da cidade.

No que se refere ao esporte, constatou-se o quanto os equipamentos esportivos são escassos nas favelas estudadas. Embora pro-gramas do governo federal, como o “Segundo Tempo”, e outros desenvolvidos pelo municí-pio tentem atenuar o problema, é grave o qua-dro de abandono dos espaços para a prática do esporte nas comunidades populares do Rio.

Neste segundo relatório, as informa-ções apresentadas vêm de uma série de entre-vistas realizadas com lideranças comunitárias das dezenas de favelas pesquisadas. Essas entrevistas permitiram comprovar os dados secundários do primeiro relatório com a per-cepção dos moradores em relação à qualidade de vida e moradia e às suas expectativas de legados sociais dos Jogos Pan-americanos.

Um rico painel sobre essas comuni-dades veio à tona com o este trabalho, de-monstrando o quanto que os seus moradores têm a dizer sobre si, sobre os seus espaços de moradia e sobre a cidade que habitam. Mostram, sem dúvida, os muitos direitos que lhes é justo reivindicar. Esses são temas significativos, problemas e preconceitos graves, tratados aqui por pessoas que os sofrem e que, na maioria das vezes, acabam na órbita de programas governamentais ineficazes, justamente porque tais projetos não levam em conta as diferentes realidades e vozes locais.

Assim, o que este relatório possui de mais importante é o fato de converter em informação sistematizada a percepção dos moradores das favelas sobre a sua realida-de, sobre as ações dos governos e sobre as políticas que podem ser empreendidas para melhorar a vida e a convivência na cidade do Rio de Janeiro.

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Consagrada como a “Cidade Ma-ravilhosa”, o Rio de Janeiro viveu em sua história diversas formas de intervenção ur-bana para superar os inúmeros “obstáculos” proporcionados por suas peculiaridades naturais. Localizado num sítio espraiado por montanhas espremidas entre o mar e a Baía de Guanabara, entrecortado por vales e pla-nícies alagadiças, desde o século XIX foram recorrentes os arrasamentos de morros, as canalizações e os desvios retilíneos de cursos d’água, os aterramentos de várzeas e de áreas litorâneas, tudo em nome da modernização do espaço urbano.

Se intervenções para submeter formas naturais à racionalidade técnica ocorreram em outras cidades, no Rio de Janeiro a moder-nização urbana se deu em meio à valorização do símbolo “Cidade Maravilhosa”, “bonita por natureza”. É a natureza que diferencia o Rio nos cenários nacional e internacional, marcando a identidade do carioca. Na cida-de, as formas naturais são algumas preserva-das em função do seu apelo simbólico, outras arrasadas em nome do progresso.

A valorização simbólica das paisa-gens do Rio associa-se com as distinções territoriais de ordem socioeconômica. Os íco-nes naturais que compõem a identidade do

2as históricas demandas materiais e imateriais das favelas

na produção do espaço urbano carioca

1 Concebido em 1�6� por Lúcio Costa, o plano urbanístico pretendia transformar a Barra num novo Centro empresarial da cidade. Contudo, segundo matéria publicada em O Globo, 2�/07/07, o plano não fora implantado como o planejado. A orla, por exemplo, não poderia ter prédios de mais de cinco andares. Segundo relato do arquiteto-urbanista Canagé Vilhena, a velocidade com que os grandes prédios surgem não é acompanhada pela infra-estrutura necessária.

carioca se localizam em sua imensa maioria na Zona Sul: o Corcovado, o Pão de Açúcar, as praias de Copacabana e Ipa-nema, a La-goa Rodrigo de Freitas. A Zona Sul aparece, por vezes, como a representação primaz da própria cidade.

Dinâmica similar tem a recente apro-priação da região da Barra da Tijuca pelos setores de classes alta, média e os chamados “emergentes”. Caracterizada pelas praias, pela ampla orla, onde se encontram diversos sistemas lagunares, a Barra da Tijuca vem desde a década de 1�70 sendo tomada por condomínios e mansões. Trata-se de uma área ocupada segundo um plano regulador prévio1. A abertura de túneis e de vias, a cons-trução de canais e a edificação de pontes e de viadutos incentivaram a especulação imobili-ária, na qual os incorporadores utilizaram o apelo ambiental para atrair essas populações (Geiger, Silva & Alem: 2001).

Há, entretanto, para a história do Rio de Janeiro uma outra geografia. Os morros, orlas e margens de rios e lagoas habitados pelas comunidades populares ganharam no decorrer de um século um outro significado na cidade. Eles representam territórios a se-rem negados, uma espécie de anti-símbolo que suja e enfeia a “cidade maravilhosa por

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2 Como bem demonstrou Zaluar (1��8:14-15): “A favela, vista pelos olhos das instituições e dos governos, é o lugar por excelência da desordem. (...) Ao longo deste século, a favela foi representada como um dos fantasmas prediletos do imaginário urbano: como foco de doenças, gerador de mortais epidemias; como sítio por excelência de malandros e ociosos, negros inimigos do trabalho duro e honesto; como amontoado promíscuo de populações sem moral. Com a chegada de levas de nordestinos, que traziam outra bagagem cultural, a favela também passou a ser vista como reduto anacrônico de migrantes de origem rural mal adaptados as excelências da vida urbana”.

3 Uma das principais referências é o trabalho de Abreu (1��7), Evolução Urbana do Rio de Janeiro.

4 Segundo Abreu (1994), “como bem disseram outros autores que estudaram o assunto, só a partir dos anos 1940 é que a favela ‘começa a chamar a atenção’. Há de se explicitar bem, entretanto, o que quer dizer esta frase. (...) é possível afirmar que não foi a partir dessa data que a favela se tornou visível ou incomodativa para o governo. Isto aconteceu muito antes. É a partir de 1940, entretanto, que os poderes públicos pareceram reconhecer que a favela chegou para ficar, ou seja, que uma nova geopolítica ur-bana havia se instaurado de fato na cidade. Não é de se surpreender, portanto, que só a partir de então é que a favela tenha sido ‘oficializada’, passando a fazer parte dos planos e preocupações oficiais” (p.44).

5 Apesar da taxa de crescimento da população total da cidade do Rio de Janeiro começar a diminuir a partir da década de 1�60, a proporção de moradores de favelas em relação aos demais habitantes continuou aumentando. Em 1�50, o percentual de pessoas residentes em favelas na cidade do Rio de Janeiro era de 7,13%; em 2000 passou para 18,65% (Fontes: Censos Demográficos - IBGE, IPLANRIO, IPEA – 1991/2000).

natureza”. Concebida como território da au-sência de civilidade e de urbanidade2, a favela torna-se o objeto primordial dos discursos da desordem urbana. Como ressaltam Silva e Barbosa (2005),

“não podemos esquecer que a urbanização do espa-ço carioca foi um processo violento de apropriação e transformação da natureza. Muitas formas naturais foram destruídas para deixar passar o ‘progresso’ sob a forma de edifícios, fábricas, shopping centers, túneis, avenidas, viadutos. Graves problemas ambientais persistem na cidade bonita por natureza, graças ao modelo dominante de urbanização que identificou na natureza um obstáculo” (op.cit. p.99).

Conforme demonstrado em diversos trabalhos3, pelo menos desde o final do sé-culo XIX, a população trabalhadora e pobre do Rio de Janeiro aprendeu a construir suas formas de habitação. Primeiro nos cortiços e casas de cômodos situados na área central e, no decorrer do século XX, nos subúrbios da Zona Norte, da Zona Oeste e nas favelas que se distribuíram pelos mais diferentes bairros da cidade. Somente a partir dos anos 1�40,

alarmados pela presença da favela4 por a toda paisagem urbana, os governos começaram a assumir a responsabilidade pela habitação, por meio de institutos como o Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Industriários (Iapi) e o de Aposentadorias e Pensões dos Empregados em Transportes e Cargas (IA-PETC), da Caixa Econômica Federal e do Banco Nacional de Habitação (BNH). Pode-se dizer, contudo, que os investimentos em habitação popular foram insuficientes, tanto do ponto de vista quantitativo quanto do qualitativo (Silva e Barbosa, 2005). Na metade final do século XX, as favelas continuaram a crescer e se multiplicar, mantendo um ritmo de incremento populacional bem acima da progressão do restante da cidade5.

Diante da histórica ineficiência do poder público em suprir o déficit habitacio-nal e o de infra-estrutura, a representação da favela como anti-símbolo no imaginário da urbe vai ganhando corpo, a ponto de se confundir com a própria representação da cidade. A “Cidade Maravilhosa” passa também a ser vista como a “cidade caótica” e desta contradição se nutrem os discursos e apelos discricionários em nome de um

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6 Na lógica higienista as favelas são vistas como ambientes insalubres, propícios à proliferação de doenças, e os moradores são con-siderados sujos, sem noções de higiene, carecendo de hábitos civilizados. O discurso da higiene também é o de policiar, da prática de uma meldicina urbana (Focault), é um exemplo de como a questão da saúde pode ser utilizada para controlar os indivíduos. Típico do início do século XX, esse discurso sustenta ações de cunho sanitário como as intervenções urbanísticas, mas também o desejo e a prática de remoções, uma vez que as favelas são tomadas, do ponto de vista estético e higiênico, como prejudiciais à cidade. Trata-se também de uma das grandes fontes de políticas assistencialistas e clientelistas.

7 Dentre as ações para as favelas destacam-se, de acordo com alguns autores (Parisse, 1�6�; Valladares, 1�78; Valla, 1�86; Burgos, 1998), aquelas implementadas entre 1946 e 1962, quando o assistencialismo cristão emergia com a Fundação Leão XIII, passando pela Cruzada São Sebastião, que agia como uma espécie de interlocutor dos moradores da favela junto ao Estado, e pelo SERFHA, que buscava uma cooptação mais explícita das associações de moradores. Entre 1962 e 1979, a política remocionista foi realizada por sucessivos governos. Em 1�80, até os dias de hoje, a partir da redemocratização, a dinâmica clientelista ganha força com os pequenos favores eleitoreiros de políticos fisiológicos.

8 Segundo Valla (1986),“se o Código de Obras foi por um lado o primeiro reconhecimento legal das favelas, teve como finalidade a sua limitação. Novamente surge o impedimento legal como solução do problema da habitação, pois proibia a construção de novas casas ou a realização de qualquer melhoria nas casas existentes. Simultaneamente, se oferecia como solução a substituição por núcleos de habitação do tipo mínimo e a construção de habitações proletárias”.

determinado ordenamento territorial e am-biental do espaço urbano. O pressuposto é que as favelas “só existem porque o Estado e a sociedade foram fracos e pouco incisivos na demarcação dos territórios dos pobres” (Silva e Barbosa, 2005: 100).

a remoção de favelas como ação do estado e lógica do mercado

Em quase todo o século XX, a lógi-ca da ação do poder público em relação às diferentes formas de habitação popular foi a higienista6, segundo a qual modelos de políticas públicas foram planejados e imple-mentados para resolver o “problema”7. Tal lógica quase sempre trazia consigo o desejo pela erradicação, remoção ou contenção dos espaços populares, como por exemplo:

• Na reforma urbana empreendida pelo prefeito Pereira Passos (1�02-1�06), quando os cortiços foram considerados “habitações imundas, nojentas e asquerosas pocilgas, sem ar nem luz, e sempre enchar-cadas de lodo e porcaria”, e sugeria-se o deslocamento de suas populações “para os arredores da cidade em pontos onde passem trens e bondes” (Leeds e Leeds, 1�78);

• No plano urbanístico do enge-nheiro Alfred Agache (1927), que descreve a favela como uma lepra ameaçadora para o corpo urbano (apud. Zaluar, 1��8). Não implementado, o Plano Agache propunha a transferência da população favelada para as áreas periféricas industriais, pois ela desfru-tava de uma “liberdade individual ilimita-da”, que criava problemas tanto “sob o ponto de vista da ordem social e da segurança, como sob o ponto de vista da higiene geral da cidade, sem falar da estética” (idem);

• Durante a vigência do Estado Novo, pelo Código de Obras de 1�388 e o relatório intitulado “Esboço de um plano para o es-tudo e solução do problema das favelas no Rio de Janeiro” (1�40), elaborado pelo mé-dico Vitor Tavares de Moura. Esse relatório propõe a eliminação das favelas, o controle da entrada no Rio de Janeiro de indivíduos de chamada baixa condição social, o retorno para os estados de origem, a fiscalização severa das leis que proíbem a construção de casebres, a fiscalização dos indivíduos acolhi-dos pelas instituições de amparo, campanhas educativas para os moradores de favelas, para corrigir hábitos e incentivar escolha de

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� De acordo com Leeds e Leeds (1978: 196-197), nos Parques Proletários, “a autoridade da administração sobre os moradores era total. Todos os moradores tinham carteira de identificação, que apresentavam à noite nos portões guardados, que eram fechados às 22 horas. Toda noite, às nove, o administrador dava um ‘chá’, quando ele falava num microfone aos moradores sobre os acon-tecimentos do dia e aproveitava a oportunidade para dar lições ‘morais’ que eram necessárias... Os parques eram em grande parte uma criação do Estado Novo de Vargas, que combinava controles administrativos, ‘consciência’ social governamental, retórica corporativista e a reverência da parte do proletariado”.

10 A Chisam (Coordenação de Habitação de Interesse Social da Área Metropolitana do Grande Rio), órgão federal criado em 1�68 espe-cificamente para coordenar a política de remoções, justificava as suas ações com critérios morais e higiênicos (Silva e Barbosa, 2005).

11 Segundo Valladares (1�78: 41), “os casos de conjuntos habitacionais na Zona Sul são excepcionais, sendo produto das primeiras administrações da Cohab”.

melhor moradia (Valla, 1�86). O Código de Obras e o estudo de Vitor Moura resultaram nos Parques Proletários�;

• Nos anos 1960 e 1970, quando a políti-ca de remoção de favelas ganha grande impulso com o advento da ditadura militar10, instauran-do uma era marcada pelo autoritarismo e pela supremacia das elites econômicas, capitaneadas pelo Estado (Silva e Barbosa, 2005).

Em todos esses momentos, destaca-se o debate sobre o lugar que deverá ser ocupa-do pelos trabalhadores subalternizados no espaço urbano da metrópole. Os exemplos são diversos, como o das pessoas transferidas para os Parques Proletários (1942-1944), com a promessa de que poderiam retornar para as áreas onde viviam logo que essas fossem urbanizadas, e, como isso não aconteceu, elas continuaram nos parques até serem expulsas pela especulação imobiliária (nos casos da Gávea e do Leblon). Em 1�62, com a Companhia de Habitação Popular (Co-hab), foram edificadas algumas dezenas de conjuntos habitacionais situados nas zonas Oeste e Norte11, como a Vila Kennedy (Se-nador Camará), Vila Aliança (Bangu), Vila Esperança (Vigário Geral) e Cidade de Deus (Jacarepaguá). Como resultado, entre 1�62 e 1�65, removeu-se aproximadamente 42 mil pessoas, atingindo total ou parcialmente

cerca de 27 favelas. Selecionou-se mais cla-ramente as áreas das classes altas e baixas na cidade. Entre 1�68 e 1�74, foram removidas cerca de 50 favelas, mais de �0 mil pessoas.

Quando se trata de política de ha-bitação para as classes populares no Rio de Janeiro, a tônica é considerar as favelas e periferias o lugar naturalmente reservado aos grupos sociais mais pobres (Silva e Barbosa, 2005). As remoções dessas populações tive-ram um papel central para a expansão imo-biliária vinculada ao acelerado crescimento econômico do período – o chamado Milagre (Idem). O contingente de pessoas removidas da Zona Sul, no período de 1�62 a 1�74, foi proporcionalmente muito maior do que os da Zona Norte, região que apresentava o maior adensamento de favelas da cidade.

Apenas no final da década de 1970 as intervenções públicas passaram a tratar as favelas sob uma nova ótica: a da permanência e urbanização. Além do fim do Milagre e da ascensão dos movimentos pela redemocrati-zação, Valla (1�86) cita outros sete elementos que contribuíram para essa mudança:

• a preocupação de instituições in-ternacionais, tais como Unicef, BID e Banco Mundial, com o crescimento das periferias do Terceiro Mundo;

• o crescimento das favelas como redu-tos de partidos e organizações oposicionistas;

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• o reconhecimento da gravidade do problema da favela, que cresceu 317% num período de 14 anos, ao passo que a população não-favelada alcançou apenas 44%;

• a reorganização da Federação das Associações de Favelas do Estado da Gua-nabara (Fafeg, agora Faferj) em 1�7�, com o lema “Urbanização e posse da terra”;

• a pressão da Igreja Católica, por meio da Pastoral de Favelas, marcada pela Campanha da Fraternidade (1�7�) e pela visita do papa ao Vidigal (1�80);

• a desaceleração da construção civil para a classe média em função da crise econômica;

• a percepção por parte dos grupos políticos do potencial eleitoral das favelas.

Ainda em 1�7�, o governo federal cria o Promorar (também conhecido como Projeto Rio), com o objetivo de urbanizar as favelas da Maré12, erradicar as palafitas e criar conjuntos habitacionais numa grande área próxima aterrada da Baía de Guanabara. No

Fonte: Cohab-GB (Apud. Valladares, 1978)

início da década de 1�80, o governo estadual do Rio de Janeiro desenvolveu pilotos de urbanização nas favelas do Cantagalo e Pavão-Pavãozinho. Esses projetos estabe-leceram as bases de uma metodologia13 de intervenção que viria a ser aperfeiçoada nos anos seguintes, quando as “favelas passam a ser consideradas como áreas em que, em que pese a irregularidade na forma de ocu-pação do solo, o poder público é responsá-vel pela implantação de infra-estrutura”14 (Cardoso, 2002: 4). Concomitantemente, o governo municipal desenvolve o Projeto Mutirão15, uma experiência de intervenções pontuais em 60 favelas que, utilizando mão-de-obra local remunerada, abrangia basicamente obras de pavimentação, infra-estrutura, pequenas contenções, construção de creches e centros comunitários, além de reflorestamento de encostas.

É razoável dizer que esses projetos simbolizam o início de uma remodelação das intervenções públicas em favelas. Silva e Barbosa (2005) afirmam que:

12 O Projeto Rio, desenvolvido pelo BNH, tinha o objetivo de urbanizar parte da orla da Baía de Guanabara, chegando a Penha e Caxias.

13 Segundo Cardoso (2002: 4), essa metodologia baseava-se nos seguintes elementos: a) concentrar a intervenção em obras de infra-estrutura, deixando a questão da moradia (edificação) por conta dos moradores, excetuando-se por razões técnicas abertura de ruas, implantação de equipamentos públicos e etc.; b) criar alternativas de acessibilidade e circulação internas, por uma via com dimensionamento adequado para o trânsito de veículos, via também pensada como alternativa para a distribuição dos troncos principais da infra-estrutura; c) criar alternativas de transporte de lixo e passageiros nos casos de topografia difícil; d) criar equipamentos sociais e de lazer dentro da favela.

14 Órgãos estaduais passam a implementar programas específicos de infra-estrutura para as favelas, como o Proface, desenvolvido pela Companhia de Água e Esgotos (Cedae) e o “Uma luz na escuridão”, desenvolvido pela Light.

15 Ligado à Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social, entrou em funcionamento em 1�84.

Remoções realizadas na Guanabara no período 1962-1974

Administrações Total de favelas atingidas Total de barracos removidos Total de habitantes removidosCarlos Lacerda

(1960-1965) 27 8.078 41.958

Negrão de Lima(1965-1970) mais de 33 mais de 12.782 70.595

Chagas Freitas(1970-1974) 20 5.333 26.665

Total 80 26.193 139.218

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16 O Plano Diretor da Cidade, no qual se estabelecem os princípios e objetivos de uso e ocupação do solo, diz no artigo 44: “III - não remoção das favelas”; “IV - “inserção das favelas e loteamentos irregulares no planejamento da cidade com vista à sua transfor-mação em bairros ou integração com os bairros em que se situam”. No artigo 148: “A urbanização e a regularização urbanística e fundiária serão realizadas mediante intervenções graduais e progressivas em cada favela, para maximizar a aplicação dos recursos públicos e disseminar os benefícios entre o maior número de habitantes”. No 14�: “As favelas integrarão o processo de planejamento da Cidade, constando nos mapas, cadastros, planos, projetos e legislação relativos ao controle do uso e ocupação do solo, e da programação de atividades de manutenção dos serviços e conservação dos equipamentos públicos nelas instalados”. No artigo 150: “O programa garantirá a permanência dos moradores na favela beneficiada, pela imposição de restrições ao uso e ocupação do solo e de outros instrumentos adequados”.

17 Segundo os termos do decreto n° 14.332, de 7 de janeiro de 1��5 (Apud. Cardoso, 2002).

18 O Favela-Bairro conta com US$ 600 milhões, resultantes de dois contratos assinados com o Banco Interamericano de Desenvol-vimento (BID), cada um no valor de US$ 300 milhões – sendo US$ 180 milhões do BID, e contrapartida de US$ 120 milhões da Prefeitura. O Favela-Bairro é considerado um projeto modelo do BID, que o tem como exemplo de política pública de combate à pobreza e à miséria. Atualmente, a Prefeitura negocia com o banco o terceiro contrato do programa, no valor de US$ 300 milhões. Extraído em 26/07/2007 de http://www.rio.rj.gov.br/habitat/

1� Segundo consulta em http://www.rio.rj.gov.br/habitat/, 26/07/2007.

“o processo de democratização ocorrido durante a década de 1980 deu novo impulso ao associativismo nas favelas, o que implicou a maior organização em torno de reivindicações estruturais. Paradoxal-mente, a definição histórica das favelas centrada na degradação da paisagem facilitou o aumento de reivindicações por obras de infra-estrutura. A organização popular conseguiu uma significativa ampliação do acesso regular à água, esgotos, coleta de lixo, asfaltamento e iluminação. Além disso, difundiram-se as construções de escolas, creches e postos de saúde, bandeiras centrais na busca de uma melhor qualidade de vida para os moradores. O item no qual menos se avançou foi justamente o que coloca em questão, de modo mais incisivo, as formas de apropriação e uso do espaço urbano – no caso, o acesso à titulação da propriedade” (op.cit. p. 51).

O Plano Diretor Decenal da Cidade do Rio de Janeiro16 (1��2) parece atender de forma mais contundente as demandas da po-pulação das favelas por regularização fundi-ária, infra-estrutura urbana, disponibilização de serviços públicos, arruamentos e oficiali-zação dos endereços, com o reconhecimento dos logradouros que até então nem consta-vam nos mapas oficiais. O Plano segue, em linhas gerais, os princípios estabelecidos no

âmbito do debate sobre a Reforma Urbana, incorporando os instrumentos que permitem o exercício da função social da cidade e da propriedade, segundo o disposto na Consti-tuição Federal de 1�88 (Cardoso, 2002). Ele é o documento que possibilitou, por exemplo, a implementação de programas nos moldes do Favela-Bairro, que objetiva “complemen-tar ou construir a estrutura urbana principal (saneamento e democratização de acessos) e oferecer condições ambientais de leitura da favela como bairro da cidade”17.

Um dos carros-chefe da campanha eleitoral no município do Rio em 1��3, o Fave-la-Bairro fazia parte do programa de governo de Cesar Maia, que em seu primeiro mandato enfatizava o discurso da “ordem urbana” e promovia ações de forte repercussão na mídia, como a expulsão dos camelôs das áreas centrais, o cercamento de praças públicas e a criação da Guarda Municipal. Coordenado pela Secretaria Municipal do Habitat (SMH), com recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID)18, desde o início dos trabalhos em 1��4, cerca de 556 mil moradores em 143 comu-nidades (de 500 a 2.500 domicílios) estão sendo beneficiados com projetos, obras em andamento e concluídas1�. O Favela-Bairro

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20 Entre projetos, obras em andamento e concluídas, alcança 44 comunidades, onde residem cerca de 62 mil pessoas (Idem).

21 Executado no Jacarezinho (Zona Norte), Rio das Pedras (Jacarepaguá), Rollas (Santa Cruz) e Fazenda Coqueiros (Senador Camará) (Idem).

22 Segundo informações colhidas no site da Prefeitura, em 26/07/2007, “nas áreas urbanizadas pelo Favela-Bairro, a Secretaria Municipal do Habitat vem fazendo um minucioso reconhecimento de logradouros, elaborando gabaritos, cadastrando e medindo imóveis para emissão do “habite-se” e cadastro no IPTU. A medida beneficiará inicialmente 35 comunidades e aproximadamente 119 mil pessoas” (extraído de http://www.rio.rj.gov.br/habitat/).

23 Para o autor, o PECRJ aponta “uma constelação de acordos que incorporam o Favela-Bairro como parte de estratégias” para legitimar o plano perante classes e segmentos excluídos (Idem, p.86).

24 Segundo o autor (op.cit.), essa mudança da matriz do poder social diz respeito ao peso de determinadas categorias sociais em promover mudanças na realidade política, cunhando a agenda e os espaços das decisões das elites políticas. Constituem os chamados promotores do plano estratégico, a Prefeitura, a Associação Comercial do Rio de Janeiro (ACRJ) e a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan).

25 Em “Passa-se uma casa”, Lícia Valladares (1978) ilustra exemplarmente a forma que os moradores removidos no período da ditadura militar encontraram para retomar seu modo de vida, reconstruir suas redes de relações, diminuir o custo de moradia e estar novamente inseridos próximos aos locais de trabalho. Passar a nova casa adiante e reconstruir sua morada noutra favela, mais que um protesto contra a arbitrariedade com que se deu o processo de remoção, evidenciou a importância das centralidades urbanas na vida daquelas pessoas.

se desdobrou na gestão de Luiz Paulo Conde (1��7-2000), ex-secretário Municipal de Urba-nismo e sucessor do prefeito Cesar Maia, em dois outros projetos similares: Bairrinho, nas comunidades de pequeno porte (de 100 a 500 domicílios)20 e Grandes Favelas, nas comuni-dades acima de 2.500 domicílios21.

Os componentes urbanísticos do Favela-Bairro incluem abertura e pavimentação de ruas, implantação de redes de água, esgoto e drenagem, construção de creches, praças, áreas de esporte e lazer, canalização de rios, reassentamento de famílias que se encontram em áreas de risco, contenção e reflorestamento de encostas, constru-ção de marcos limítrofes para evitar a expansão, reconhecimento de nomes de ruas, logradouros e código de endereçamento postal (CEP). O item menos contemplado e mais adiado pelo programa é justamente titulação da propriedade22.

Segundo Randolph (2001), o Favela-Bairro23 deve ser compreendido a partir de uma mudança da matriz de poder social24, que se dá na década de 1990, com a elabora-ção do Plano Estratégico da Cidade do Rio de Janeiro. O PECRJ tem por principal objetivo “a revalorização da cidade dos negócios, do ter-ceiro setor superior (serviços avançados para

as empresas, ‘business parks’ áreas de C&T, oferta cultural de qualidade etc.)”, conceben-do-a como um “bem estratégico, uma cidade para o consumo global (op.cit. p.88)”.

Há, portanto, uma clara inflexão na concepção original do Plano Diretor Decenal da Cidade (de 1��2). Deixa-se de se centrar na função social da cidade e da propriedade, para inserir-se no âmbito dos interesses territoriais dos setores empresariais (Cardoso, 2002). Não se pode dizer, assim, diante dessa nova pers-pectiva de gestão da cidade, na qual a especu-lação da terra urbana ganha um novo impulso, que a lógica da remoção/periferização das classes populares é parte do passado.

Mesmo tão questionado no que diz respeito a sua eficiência25, o modelo de (re)assentamento nas áreas periféricas conti-nua presente quando, por exemplo, atentamos para a recente criação do conjunto habitacional Nova Sepetiba26, criado pelo governo estadual. Ele traz os mesmos e profundos impactos so-fridos pela população removida nas décadas de 1�60 e 70 (redes sociais desfeitas, maior distância dos locais ou de oportunidades de trabalho, instalação de equipamentos urbanos insuficientes e de qualidade duvidosa).

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Outro exemplo são os controversos epi-sódios que marcaram o processo de qualificação urbana para a realização do Pan. Mais de uma dezena de favelas da Barra da Tijuca e Jaca-repaguá sofreram ameaças de remoção27 por parte da Prefeitura do Rio, sendo duas delas efetivamente despejadas: Arroio Pavuna e Canal do Cortado, comunidades que ocupa-vam tal região há meio século.28

A Barra da Tijuca e adjacências concentram boa parte dos investimentos públicos em novos complexos esportivos (Riocentro, Cidade do Rock, Cidade dos Esportes – no autódromo) e na Vila Pan-americana e vem direcionando os investi-mentos privados na cidade2�. O dado novo é a aberta participação do setor da construção civil nesses eventos de despejo30, aportando parte da verba necessária para compensar os moradores e viabilizar a desocupação das favelas, cuja presença fere os interesses do mercado imobiliário na região. Tais episódios emolduram o planejamento estratégico para a Barra e parecem revigorar a afirmativa de Silva e Barbosa (2005: �4):

“Por que não podemos construir uma política habitacional dirigida para a Barra da Tijuca? Só as leis do mercado devem imperar? Afinal, a Constituição brasileira estabelece – e o Es-tatuto da Cidade reforça – a função social da propriedade. Seria ingenuidade não reconhecer que há terrenos ociosos ligados à especulação de terras na Barra, alguns, até mesmo, de docu-mentação duvidosa. Enquanto isso, somente os condomínios de luxo são edificados. Diga-se, a bem da verdade, muitos deles financiados com recursos públicos. Por que, então, não pode-mos propor e praticar uma política urbana de moradas populares? Será que apenas o céu é para todos?” (op.cit., p. 101).

Tratadas ao longo da história como as principais vilãs dos problemas urbanos, as favelas sempre estiveram em evidência quando o assunto é o (des)ordenamento territorial ou ambiental da cidade. Em ge-ral, as ações protagonizadas pelo Estado parecem preferir a contenção e a remoção à urbanização e à regularização. Justa-mente neste último item elas são tratadas

26 Silva e Barbosa (2005: �5) atentam para a sobrevivência de modelos conservadores e discricionários das políticas habitacionais, sinalizada pela criação do Nova Sepetiba. Segundo eles, os imóveis estavam lá, mas em arruamentos precários. Os serviços básicos também estavam presentes, mas de qualidade questionável. Já os postos de saúde e escolas ainda faziam parte do conjunto de promessas. O transporte da região é um verdadeiro sofrimento, as empresas de ônibus não oferecem serviços regulares, sobretudo quando se trata do deslocamento para os bairros mais centrais da cidade. Como se não bastasse, o conjunto está localizado em um sítio de difícil drenagem, sujeito a inundações nas épocas de chuvas mais intensas.

27 Segundo informações de integrantes do Movimento União Popular (MUP), algumas das favelas ameaçadas de remoção foram: Beira Rio, Canal do Cortado, Servidão D, Favela 14, Vila Recreio 2, Santa Luzia, Vacaria, Vila Harmonia, Vila Nova, Restinga, Arroio Pavuna, Vila Autódromo e Canal do Anil.

28 Segundo o Instituto Pereira Passos (IPP), os anos de ocupação dessas favelas são 1�21 (Arroio Pavuna) e 1�51 (Canal do Cortado).

2� De acordo com o arquiteto-urbanista e assessor do CREA Canagé Vilhena, em O Globo (2�/07/07), “as empresas estão se deslocando para a Barra, e o Pan chama a atenção para o espaço livre do bairro. Além disso, hoje há mais possibilidade de empreendimentos hoteleiros, já que a Prefeitura aumentou o gabarito em diversos locais. A Vila Pan-americana deveria ter seis andares, passou para doze. A facilidade do desenvolvimento imobiliário não é acompanhada do desenvolvimento urbanístico”.

30 Conforme informação veiculada pelo então Secretário Municipal de Urbanismo, Alfredo Sirkis, em 29/05/2006 (www.sirkis.com.br) e em matérias da imprensa.

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à margem da legislação e da cidadania pelo próprio poder público, uma vez que a titulação dos imóveis em termos jurídicos exige dos governos os mesmos investimentos realizados nos demais bair-ros da cidade31. Tais investimentos estão concentrados nas áreas mais centrais, o que espelha a desigual distribuição de serviços e de equipamentos públicos na urbe, restan-do às favelas políticas urbanas insuficientes e de qualidade duvidosa, como será mos-trado no decorrer deste relatório.

Para os moradores das favelas, a titula-ção do imóvel e da terra é fundamental não so-mente para garantir a permanência e investi-mentos em seus territórios, mas também para uma maior inserção na economia urbana32, garantindo condições legais de apropriação e uso da urbe. Enfim, se a própria Constituição brasileira e o Estatuto da Cidade estabelecem a função social da cidade e da propriedade, a regularização fundiária deveria ser o primeiro legado social para as comunidades populares, promovendo assim o Direito à Cidade33.

31 Como indica a Secretaria Municipal de Habitat da Prefeitura do Rio, a regularização fundiária permite que moradores tenham, entre outros direitos, ruas com endereços oficiais, imóveis para referências de crédito em instituições bancárias e comerciais, cadastro no IPTU, imóvel reconhecido administrativamente e atendido pelos serviços da Prefeitura. Extraído de http://www.rio.rj.gov.br/habitat/, em 26/07/2007.

32 Exemplificando o funcionamento do “circuito inferior da economia”, tal como denominou o geógrafo Milton Santos, Silva e Barbosa (2005: 93) lembram que nas favelas “as relações de parentesco, vizinhança e reconhecimento das instituições locais são modos que formalizam contratos de aquisição de benfeitorias e a cessão de posse de imóveis. As associações de moradores há muito tempo oferecem e garantem os registros que formalizam as transações imobiliárias entre pares do local, funcionando como um cartório popular. Há, enfim, extensas redes sociais que constroem modos bastante particulares de reconhecer a posse de imóveis e terrenos”.

33 Para Lefebvre (2001) entre os direitos ao trabalho, à instrução, à educação, à saúde, à habitação, aos lazeres, à vida, figura o di-reito à cidade. Não como visita ou retorno à cidade arcaica, mas à vida urbana, à centralidade transformada e renovada, aos locais de encontros e de trocas (separados do valor de troca), aos ritmos de vida e emprego do tempo que permitem a prioridade plena do valor de uso. Em suma, o direito à cidade é o direito ao urbano e pode ser caracterizado como o “direito a não ser excluído da centralidade e de seu movimento” (p.37).

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Este capítulo apresenta o processo teórico e metodológico da pesquisa para este segundo relatório do Legado Social dos Jogos Pan-americanos. Como o objetivo do estudo era investigar a qualidade dos serviços, equipamentos e programas sociais num diversificado universo de comuni-dades populares – diferentes grandezas populacionais, localizações e aspectos so-cioambientais –, definiu-se como diretriz do trabalho valorizar as interações das pessoas com os seus territórios de moradia.

Reconhecer a percepção dos ci-dadãos em relação às condições de seus territórios é importante para a formulação e a avaliação de políticas públicas em prol dos direitos sociais e foi, sem dúvida, um procedimento inovador em nosso trabalho. Tal diretriz nos conduziu à construção – de modo teórico e prático – de metodologias que valorizam diferentes atores em suas experiências sociais objetivas e subjetivas e como produtores de conhecimento.

Para tanto, buscou-se o entendimen-to sobre determinados contextos nos quais a vida social se realiza, onde a pesquisa ganhou poder interpretativo, obteve-se informações com maior riqueza de detalhes e proporcionou a análise de realidades complexas e relevantes para a identificação das demandas sociais.

Nessa linha de trabalho, o papel destacado dos agentes locais na produ-ção de informações é princípio ético e metodológico. A participação desses agentes como pesquisadores de suas próprias comunidades mostrou-se cru-cial para o levantamento das diferentes realidades vividas e contribuiu para a articulação comunitária necessária ao desenvolvimento do estudo. A metodo-logia de elaboração deste relatório criou sujeitos co-responsáveis e co-autores dos resultados alcançados.

seleção das comunidadesAs comunidades foram selecio-

nadas para fazer parte da pesquisa do Legado Social pela proximidade dos locais das competições esportivas dos Jogos e pela proximidade dos principais eixos viários da cidade (Avenida Brasil, Linha Vermelha, Li-nha Amarela, Túnel Rebouças, Túnel Santa Bárbara e avenidas litorâneas da Zona Sul e Barra da Tijuca). Em caso de adensamento ou contigüidade de comunidades populares, ficou-se com as maiores concentrações po-pulacionais, de acordo com o Censo Demográfico 2000, IBGE.

metodologia de pesquisa3

“O cidadão é o indivíduo num lugar.”

(Milton Santos, 1��6)

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Eixos geográficos da pesquisaPara organizar a pesquisa, dividiu-se as

53 comunidades em quatro eixos geográficos: • Zona oeste i (eixo viário da Aveni-

da Brasil): Bairro Santo André, Bairro Nova Aliança, Batam, Caminho do Lúcio, Comu-nidade Parque Real, Falange, Favela Vila Brasil, Fazenda Coqueiro, Moquiço, Tibaji, Vila Catiri, Vila João Lopes, Vila Mangueiral, Vila Moretti, Vila São Miguel e Vila Vintém

• Zona oeste ii (Barra/Recreio/Ja-carepaguá – área de expansão imobiliária recente): Asa Branca, Caminho do Bicho, Canal do Anil, Cidade de Deus, Comunidade São Francisco de Assis, Creche, Dois Irmãos, Entre Rios, Fazenda Mato Alto, Fontela, Nova Esperança, Outeiro, Rios das Pedras e Vila Sapê

• Zona norte/centro: Complexo do Alemão, Conjunto Residencial Fernão Car-din, Jacarezinho, Mangueira, Maré, Morro da Coroa, Morro do Cariri, Morro do Catumbi (Mineira), Morro dos Prazeres, Morro do São Carlos, Morro do Urubu, Parque Herédia de Sá, Parque Horácio, Vila Arará, Vila Cruzeiro e Vila Proletária da Penha

• Zona sul: Cerro-Corá, Pavão-Pa-vãozinho, Rocinha, Santa Marta, Vidigal, Vila Cândido e Vila Santo Amaro

interlocução nas comunidadesA Rede de Comunidades Saudáveis

do Estado do Rio de Janeiro (RCS-RJ), consti-tuída pelo Cedaps, foi o principal canal para a interlocução nas comunidades do Diagnóstico Social e Esportivo do Legado Social dos XV Jogos Pan-americanos. A princípio, dentre as 53 comunidades envolvidas no processo, fo-

ram localizadas 18 comunidades participantes da RCS nos quatro diferentes eixos estabele-cidos. A partir daí, realizou-se consultas às entidades da RCS e foi elaborado um plano integrado para localizar organizações e/ou indivíduos de referência nos demais locais. Esse processo deu-se de forma dinâmica e articulada, obtendo como resultado o contato com todas as comunidades selecionadas.

Identificação dos interlocutores A identificação dos interlocutores par-

tiu da relação de parceria estabelecida pela RCS com organizações populares e lideran-ças comunitárias locais. Importante destacar que esse grupo de interlocutores está ligado a associações formais e/ou iniciativas infor-mais com reconhecida presença na dinâmica comunitária. São atores capazes de facilitar a inserção de pesquisadores comunitários, assim como prover informações sobre as condições locais de vida e sobre as diferentes representações na comunidade.

No que se refere ao perfil geral dos interlocutores, a maioria é do sexo feminino (59%) – fato que tem se mostrado comum em trabalhos comunitários –, com idade que varia dos 20 aos 4� anos (60% acima dos 30 anos). Quanto ao local de nascimento, a pro-porção entre os que nasceram nas comunida-des e os que não nasceram ficou equilibrada. Cabe ressaltar que algumas comunidades são relativamente recentes, e, embora alguns de seus interlocutores não tenham nascido nela, moram lá desde a sua formação. Apenas 12% mora há menos de dez anos nos lugares, e destaca-se a faixa dos que vivem há mais de 30 anos (mais de 50% do grupo).

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Em relação à atuação comunitária, apenas 14% afirmam que tem trabalho de menos de cinco anos, e 4�% militam há mais de dez anos. Outro dado relevante é que a grande maioria (80%) dos interlocutores atua a partir de vínculos institucionais. Os tipos mais recorrentes de instituições são grupos comunitários de modo geral, as associações de moradores, associações de mulheres, or-ganizações não-governamentais, instituições religiosas e projetos sociais.

seminários para os mapas falantesO Cedaps implementou como li-

nha-base para a metodologia de pesquisa a dinâmica “Construção Compartilhada de Soluções em Saúde”, composta por técnicas participativas para um processo integrado de diagnóstico local, formulação de planos de ação, sistematização e disseminação de práticas sociais. O primeiro seminário para levantamento de problemas e recursos locais com as 53 comunidades realizou-se nos dias 22 e 23 de janeiro de 2007, na Universidade Unigranrio, no Centro. O encontro contou com a presença de 52 interlocutores repre-sentando 32 comunidades.

O objetivo do seminário foi apre-sentar aos interlocutores a proposta de construção do Legado Social do Pan 2007 e a necessidade de envolvimento deles na iden-tificação das demandas comunitárias, bem como de outros representantes/ segmentos das comunidades que pudessem colaborar com a construção de uma lista de recomen-dações para ações futuras.

A técnica que norteou o trabalho, do “Mapa Falante”, visa o levantamento das

diferentes percepções sobre o território a ser conhecido. Oriunda do campo da educação popular, o Mapa Falante permite um levan-tamento dinâmico e coletivo dos principais problemas e recursos existentes a partir de uma representação gráfica do território – um mapa ou desenho, simples e objetivo, apon-tando características ambientais, humanas, sociais e institucionais, marcas do convívio social e cultural. O participante pode de fato relatar, enumerar e visualizar parceiros, re-cursos disponíveis, aparelhos institucionais que tenham representatividade, dificuldades, pontos que precisam de algum tipo de apoio e etc. Um roteiro básico guiou a construção coletiva. Foram feitas algumas perguntas centrais sobre as comunidades, e, a partir daí, o conhecimento cotidiano dos moradores pôde ser expresso e sistematizado. Em resu-mo as questões do Mapa Falante percorreram os seguintes temas:

Como resultado do primeiro semi-nário, foram elaborados 30 mapas falantes. Posteriormente, houve novas mobilizações junto às comunidades que, por motivos diversos, não compareceram ao encontro. Como resultado geral, elaborou-se mapas de 46 comunidades.

Demandas – quais são os principais proble-mas da comunidade?

Qual o principal legado a ser deixado pelo Pan na comunidade?

Identificação de representantes comunitá-rios (sujeitos/organizações locais a serem entrevistados)

O que há de positivo e de potencial na comunidade?

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Construiu-se com esse trabalho uma listagem para orientar o processo de identifi-cação dos diferentes representantes/segmen-tos das comunidades a serem entrevistados na fase de pesquisa de campo.

No dia 13 de março de 2007, foi re-alizado no Sindicato dos Administradores do Rio de Janeiro um outro encontro com interlocutores comunitários. Essa reunião buscou confirmar as informações já cole-tadas sobre os representantes das comuni-dades e a orientação para a indicação dos pesquisadores comunitários. Comparece-ram 40 interlocutores, representando 30 comunidades, que receberam as fichas de inscrição para as indicações dos candidatos a pesquisadores de campo. Nesse encontro, foi ainda apresentado e discutido o instru-mento que seria utilizado como roteiro para as entrevistas da pesquisa de campo.

representantes comunitários O universo amplo da pesquisa e os

diferentes tipos de políticas públicas a se-rem avaliadas levaram à necessidade de se aplicar questionários longos e semi-estrutu-rados. Isso exige critérios claros de seleção dos entrevistados, parâmetros estabelecidos de acordo com o grau de conhecimento dos territórios por esses sujeitos e com a represen-tatividade deles nas comunidades estudadas. Quanto mais o entrevistado fosse inserido na comunidade, mais qualificadas e abrangentes seriam as informações dele.

Como mencionado, a identificação desses sujeitos em cada comunidade teve como base as dinâmicas participativas com os chamados “interlocutores comunitários”.

A produção dos Mapas Falantes por esses interlocutores, a apresentação da metodolo-gia e dos objetivos do projeto levaram à in-dicação das pessoas ou instituições a serem entrevistadas, denominadas neste relatório como “representantes comunitários”.

Entrevistou-se representantes com uma reconhecida trajetória de militância comunitária, participantes de instituições públicas, locais, religiosas ou ONGs. Em geral, sujeitos que atuam nas áreas de saúde, educação, cultura, esportes, assistência social, direitos humanos e desenvolvem atividades junto a crianças, jovens, idosos, mulheres, sendo ainda muitos integrantes de conselhos, associações e fóruns.

O número de entrevistados por comu-nidade foi estabelecido segundo os resultados obtidos nas dinâmicas com os interlocutores. Estabeleceu-se uma quantidade mínima de entrevistas para cada favela, levando-se em conta a população de cada uma.

seleção dos pesquisadoresA indicação dos candidatos a pesqui-

sadores de campo foi feita pelos interlocuto-res e teve como requisitos morar na comuni-dade pesquisada, ser maior de 18 anos, contar com experiência em trabalhos sociais, ter o Ensino Médio ou estar o cursando, ter dispo-nibilidade de horário e contatos locais.

Os candidatos preencheram fichas de inscrição, onde tiveram que redigir um texto. Posteriormente, reunidos na sede do Cedaps, passaram por um teste de expres-são oral e habilidades comunicativas.

Na segunda etapa da seleção, os candidatos passaram pela dinâmica

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chamada “Fotografia Viva”. Eles expres-saram a sua comunidade por meio de uma representação visual ou desenho e depois expuseram o resultado, as suas intenções e idéias com aquela opção.

Ao final, a maior parte dos pesqui-sadores selecionados era do sexo feminino, na faixa etária de 18 a 2� anos, mas com expressiva presença de indivíduos acima de 30 anos. Com relação à escolaridade, ve-rificou-se que 71% possuía o Ensino Médio concluído, e outros 18% estavam na gradu-ação ou tinham nível superior completo.

o treinamento dos pesquisadoresDivididos de acordo com os quatro ei-

xos geográficos do Legado Social, os futuros pesquisadores foram reunidos para conhecer os objetivos do estudo, se familiarizar com as particularidades de uma pesquisa qualitati-va e exercitar criticamente o questionário, o instrumento de investigação.

A utilização de entrevistas semi-es-truturadas para a investigação requer uma série de cuidados para, entre outras coisas, estabelecer a imparcialidade necessária dos entrevistadores, que, aqui, também são moradores das comunidades. Em geral, ter uma postura corporal adequada à rea-lização das entrevistas (evitando gestos de aprovação, de rejeição e de desconfianças, por exemplo), encontrar a melhor maneira de formular as perguntas e ser capaz de avaliar o fôlego das respostas são compe-tências de trabalhos dessa natureza.

A primeira parte do treinamento consistiu num exercício de orientação para a realização da pesquisa, apontando os erros

mais comuns na condução desse tipo de estudo. Ainda nessa etapa da capacitação, os pesquisadores foram apresentados ao instrumento de pesquisa, o questionário, por intermédio de uma leitura detalhada de todas as perguntas e do esclarecimento dos conceitos utilizados. Em duplas, um aplicou o questionário para o outro. Assim cada um vivenciou o instrumento como entrevistador e entrevistado. Essa simu-lação possibilitou uma revisão do roteiro de entrevistas e a elaboração do Caderno de Orientações ao Pesquisador Comunitário.

Concluída as atividades de trei-namento, os pesquisadores receberam o material a ser utilizado para a realização das entrevistas: contatos dos interlocuto-res comunitários, questionário, manual de orientação, glossário de termos técnico, camiseta e boné personalizados.

o roteiro das entrevistasA realização de uma pesquisa para

avaliar a percepção das condições de mo-radia de comunidades populares exigiu uma constante revisão do roteiro de en-trevistas, para identificar os problemas na interpretação das perguntas ou mesmo em definições conceituais. Muitas inconveni-ências se revelam no momento em que o instrumento sai do plano da concepção e ganha significado na interação entrevista-dor/entrevistado. Por essa razão, o ques-tionário, o roteiro das entrevistas, deve ter flexibilidade na formalização dos temas e precisa ser muitas vezes revisto.

O roteiro das entrevistas que orientou a pesquisa de campo do Legado Social foi concebido pela equipe do Observatório de

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Distribuição de pesquisadores e entrevistados

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Favelas e discutido com o Cedaps. Depois de acordado o caráter conceitual e a forma interpretativa das perguntas e respostas, o instrumento foi apresentado, em momentos distintos, aos interlocutores comunitários e aos pesquisadores de campo, que puderam criticá-las e fazer sugestões.

Os objetivos que nortearam a cons-trução do roteiro foram: a) identificar a representatividade e as redes sociopolíticas dos representantes comunitários; b) levan-tar a presença/ausência e a qualidade dos serviços e equipamentos públicos nas comu-nidades; c) localizar as áreas consideradas mais críticas no que diz respeito às deman-das por serviços/equipamentos urbanos; d) mapear as principais atividades esportivas e culturais realizadas pelos moradores; e) averiguar a ação dos projetos/programas sociais governamentais.

O roteiro definia formas adequadas de atendimento, serviços e equipamentos urbanos, um padrão normativo para avaliar o conjunto de bens materiais e imateriais e desnaturalizar situações vividas nas comuni-dades, elemento imprescindível para balizar a condução das entrevistas e para levantar as demandas das comunidades.

entrevistas e revisão das respostasOs pesquisadores de campo conta-

ram com a intermediação dos interlocutores para apresentar o projeto aos “representan-tes comunitários” e agendar as entrevistas. A aplicação dos questionários foi realizada num período de dez dias, e os pesquisado-res, em sua grande maioria, conseguiram cumprir o cronograma. foram realizadas

330 entrevistas, num universo de 48 das 53 comunidades do legado social.

Nas comunidades Morro da Mineira, Morro de São Carlos, Santo Amaro, Man-gueira, Vila João Lopes, Creche, Falange e Parque Herédia, o processo foi mais longo por não haver representantes identificados previamente e/ou pesquisadores. Nesse último caso, adotou-se a figura dos pesqui-sadores “curingas”, jovens participantes de projetos sociais que trabalharam fora da comunidade de residência.

Cinco comunidades não foram atingi-das pela pesquisa: Vila Cândido, Cerro Corá, Vila São Miguel, Tibagi e Fernão Cardin. As duas primeiras estão no bairro do Cosme Ve-lho. Uma técnica do Cedaps as visitou e des-cobriu que a representação delas duas é feita pela associação de uma terceira comunidade, a Associação de Moradores dos Guararapes. As três comunidades são limítrofes. Não houve da associação retorno aos inúmeros contatos para a realização do trabalho.

No caso de Vila São Miguel, embora caracterizada como favela pela Prefeitura do Rio, a comunidade não se reconhece como tal. São duas ruas localizadas no bairro de Ma-galhães Bastos, que não possuem associação de moradores ou outra forma de representa-ção comunitária. Tibagi saiu do processo de pesquisa devido à falta de articulação com lideranças locais e a situação de violência que a comunidade vivia no período.

Todas as entrevistas coletadas pelos pesquisadores foram revistas pelas equipes do Cedaps e do Observatório, e os preen-chimentos inadequados e/ou inconsistentes foram refeitos após posteriores encontros com os entrevistadores.

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Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas 27

volume 2

1 A opção pela geração dos resultados pelos eixos geográficos se deve às pequenas cobertura e representatividade estatística dos dados por comunidades.

sistematização das informaçõesDigitou-se os questionários das 330

entrevistas num banco de dados específico, desenvolvido com o software SPSS (Statisti-cal Package for the Social Sciences - versão 10).

A digitação foi feita por digitadores especialistas no programa mencionado e contratados exclusivamente para essa finalidade. Ao término da digitação dos

questionários, o banco de dados passou por uma leitura crítica para evitar qual-quer aresta ou imprecisão nas informações armazenadas. Depois, os dados foram processados, cruzados e organizados sob a forma de tabelas e gráficos, gerados no programa Excel. Os resultados estão apre-sentados conforme os eixos geográficos estabelecidos pelo projeto1.

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Na década de 1�60 a cidade do Rio de Janeiro apresentou um crescimento popula-cional abaixo da média nacional. A população residente em favelas no município, no entanto, crescia, proporcionalmente, bem mais do que a população geral da cidade1. Em 1�60, os mo-radores de favelas correspondiam a 10,15% da população total do município. Em 2000, esse percentual era 18,65%. A taxa de crescimento populacional em favelas (2,4%) era três vezes maior que a da cidade (0,74%). Nas últimas décadas, deu-se o crescimento populacional de favelas já existentes, mas, principalmente, muitas novas favelas surgiram na área de expansão da cidade, a Zona Oeste.

Uma comparação direta entre os cen-sos de 1960 e 2000 mostra que o percentual dos domicílios particulares permanentes e pró-

regularização fundiária

1 Em 1�60, o crescimento da população total do município era de 3,34% ao ano, e o dos moradores de favelas, 7,08% ao ano. Em 70, as taxas encontradas foram, respectivamente, 2,57% e 5,37%. Em 80, 1,82% e 2,4�%. Em �1, 0,67% e 2,65%. E, em 2000, 0,74% e 2,40%. As informações são de censos demográficos. 2 O programa Favela-Bairro, desde 1994, beneficia cerca de 556 mil moradores de 143 comunidades. O Bairrinho alcança 44 comu-nidades, onde moram 62 mil pessoas. O Grandes Favelas é executado no Jacarezinho (Zona Norte), Rio das Pedras (Jacarepaguá), Rollas (Santa Cruz) e Fazenda Coqueiros (Senador Camará). Informações da Secretaria do Habitat, no ano de 2007.3 http://www.rio.rj.gov.br/habitat/ (26/07/2007).

4 No âmbito da Riourbe, a meta da Prefeitura é regularizar 6 mil imóveis. Desse total, cerca de 1.26� escrituras de promessa de compra e venda foram entregues nos conjuntos João Saldanha e Edson Fernandes, em Bangu.

5 Nas áreas urbanizadas pelo Favela-Bairro, a Secretaria do Habitat faz um minucioso reconhecimento de logradouros, elaborando gabaritos, cadastrando e medindo imóveis para a emissão do “habite-se” e o cadastro no IPTU. A medida beneficiará inicialmente 35 comunidades e 119 mil pessoas.

4prios dobrou fora da favela (de 36% para 72%). Nas favelas, o índice no mesmo período foi de 6�% para 81%. Mesmo assim, a regularização de imóveis nas favelas do Rio de Janeiro é o item de política pública que menos avançou na cidade nos últimos 20 anos.

Na tabela da página 2�, estão os pro-gramas de urbanização implementados pela Secretaria Municipal do Habitat nas comu-nidades do projeto Legado Social2. Segundo a Secretaria Municipal do Habitat (SMH)3, o processo de regularização fundiária vem alcançando paulatinamente os “conjuntos habitacionais” da Prefeitura construídos pela Riourbe4, as áreas do Favela-Bairro5, os loteamentos regularizados pelo Programa Mo-rar Legal e os empreendimentos onde foram reassentadas as famílias do Programa Morar

Domicílios permanentes localizados em favela e fora de favela

Condição de Ocupação Favela Fora da Favela1960 % 2000 %

TotalPróprioAlugadoOutra condição / cedidoSem declaração

100 1.495.738100 100 10069 1.081.58181 36 72 21 316.08412 59 21 8

306.609249.525

37.71719.367 98.0736 5 7

69.69047.99914.802

5.8781.011 1 –

638.528226.813374.842

30.3286.545 1– – –

1960 % 2000 %

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Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas 2�

volume 2

a percepção dos representantes comunitários a respeito da titulação de suas moradas, po-demos observar como o tema é latente nas comunidades. Em todos os eixos geográficos do Legado Social mais de 50% das respostas indicaram que a maioria das residências pos-sui apenas a documentação fornecida pela associação de moradores. Em relação aos moradores com escritura definitiva, o maior índice foi registrado no eixo Zona Sul: 15%.

No gráfico da página 30, observa-se a percepção sobre regularização fundiária dos entrevistados do eixo Zona Oeste I. Cerca de 54% apontaram a associação de moradores como a grande provedora da do-cumentação de imóveis; 23,5% assinalaram possuir declaração de um órgão público;

6 Para as 1.�82 famílias transferidas de áreas de risco e reassentadas em casas construídas pelo Morar Sem Risco, a Prefeitura promoveu a regularização da propriedade por concessão do direito real de uso. Nos 151 loteamentos atendidos e regularizados pela Prefeitura, cerca de 27,5 mil famílias já estão em condições de obter o título de propriedade dos lotes no Registro Geral de Imóveis.

Sem Risco6. Para que as famílias adquiram o direito à propriedade, a Prefeitura utiliza ins-trumentos legais disponíveis, como usucapião urbano, concessão do direito real de uso, termo de doação (áreas municipais) e transferência da propriedade por acordo entre proprietário e ocupantes. Ainda de acordo com a SMH, atualmente negocia-se com o governo federal a transferência para o município de 30 áreas da União ocupadas por favelas (urbanizadas ou em processo de urbanização) e conjuntos habitacionais. O objetivo da Prefeitura é en-tregar o título definitivo da propriedade às famílias que moram nessas regiões, muitas delas ocupadas há mais 50 anos.

Nos dados coletados pela pesquisa di-reta do Legado Social, no levantamento sobre

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30 Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas

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13,6% disseram não ter documentos; e 12,3% estavam com a posse definitiva.

No eixo Zona Oeste II, as respostas fo-ram as seguintes: 50,6% com documentação da associação de moradores, 16% com declaração de órgão público, 14,8% com registro definiti-vo, e 11,1% sem nenhuma documentação.

É interessante notar que nos eixos Zona Oeste I e II, que agrupam as comunidades mais recentes da cidade, os percentuais para escritura definitiva ou documentos de órgãos públicos são maiores que na Zona Norte e no Centro, onde as favelas são bem mais antigas. Os números para Norte/Centro são �,6% com

Favelas do Legado Social

Fontes: IBGE - Censo Demográfico 2000/Morei-IPP/Secretaria Municipal de Habitat (SMH)

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Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas 31

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32 Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas

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posse definitiva, 6,4% com declaração de órgão público, 62,4% com atestado de associação de moradores, e 12% sem papéis.

No eixo Zona Sul, encontram-se os maiores percentuais para todas as categorias de respostas, com exceção da declaração de órgão público. Cerca de 64% possuem do-cumentação da associação; 17,�%, declaração de órgão público; e 15,4% para escritura definitiva do imóvel.

Os elevados percentuais encontrados nas favelas da Zona Sul revelam a complexida-de das situações vividas nesse eixo geográfico. Por se tratarem de comunidades bem antigas e localizadas em áreas da cidade bastante valori-zadas pelo mercado imobiliário, os moradores vêm há muito tempo resistindo para permane-cer no local e regularizar as suas moradas.

Cabe salientar que, se é verdade o que o censo de 2000 indica, que 81% dos

domicílios particulares permanentes nas favelas são próprios, esses domicílios do tipo próprio não significam necessariamen-te a regularização fundiária desses imóveis. Apesar de 28 das 53 comunidades selecio-nadas para a pesquisa sejam contempladas pelos programas de urbanização da Prefeitu-ra, verifica-se a ausência de política pública consistente e contínua para responder às demandas relacionadas à habitação.

Este relatório mostra que o signifi-cado de propriedade fundiária é hoje um dos principais temas para o debate sobre política urbana, sobretudo se se tem como objetivo democratizar o uso do espaço nas grandes cidades. Apesar dos avanços nesse sentido do Estatuto da Cidade (2001) e da Constituição Federal (1�88), pouco se fez para efetivar o princípio da função social da propriedade.

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34 Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas

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A pesquisa do Legado Social levantou informações sobre o exercício do direito de viver em um ambiente salubre, ou seja, cober-to por serviços de saneamento básico, como rede de esgoto, acesso à água potável, coleta regular de lixo. Os entrevistadores também perguntaram sobre serviços de iluminação pública, arruamento e pavimentação, limpe-za das ruas e acesso à energia elétrica.

As respostas mostraram uma grande demanda por esses bens e serviços socio-ambientais. Deficiências apontadas pelos entrevistados haviam sido já constatadas na produção do primeiro relatório deste projeto, elaborado com base nos dados censitários do IBGE. Tais informações indicavam, ao mesmo tempo, um elevado percentual de domicílios atendidos pela coleta de lixo e pelo abaste-cimento de água e um número significativo de favelas sem esgoto. Esse quadro é mais comum no eixo Zona Oeste II, área de expan-são urbana e de maior concentração de obras esportivas para o Pan 2007.

A Região Administrativa da Barra da Tijuca, da qual o Eixo Zona Oeste II é parte, não contava com estruturas públicas de coleta e tratamento de esgoto. A inauguração de uma rede coletora, associada a um emissário submarino, coincidiu com os preparativos para os Jogos. No entanto, a rede está em fase de ampliação, e a estação de tratamento de esgoto do Arroio Fundo tampouco foi concluída. Essa estação poderia ter sido um

significativo legado para a região, solucio-nando inclusive os problemas de odores desagradáveis decorrentes dos dejetos no Arroio Fundo (Raeder, 2007).

coleta de esgotosEm relação ao tema esgoto na cidade

carioca, o relatório anterior do Legado Social constatou que 13,4% dos mais de um milhão de domicílios não contavam com a coleta geral de esgoto. Nas favelas aqui estudadas, a situação, proporcionalmente, é ainda mais grave. Considerando tanto o número de en-trevistados que declararam que suas favelas não eram atendidas pela rede quanto os que disseram que o esgotamento era improvisa-do, 18,4% dos representantes comunitários afirmaram que suas comunidades tinham graves problemas de saneamento básico.

Cerca de 73% dos entrevistados apontaram como necessária a ampliação da coleta ou reparos em instalações defeituosas. Note-se que serviços públicos muitas vezes tidos pelos órgãos e estatísticas oficiais como presentes em um determinado local podem apresentar problemas que impedem o acesso e o benefício de fato daquela população.

No entanto, a qualidade desse serviço deve ser devidamente avaliada a fim de que se oriente de maneira adequada o investimento pú-blico, seja para melhorar a oferta direta ou apri-morar a regulação sobre as concessionárias.

Demandas socioambientais5

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Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas 35

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Precisa de ampliação/está comprometido

Improvisado

Inexistente

Em toda a comunidade

NRNão sabe/desconhece

Precisa de ampliação/está comprometido

Improvisado Inexistente

Em toda a comunidade

NRNão sabe/desconhece

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36 Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas

volume 2

Precisa ser ampliado/está comprometido

Improvisado

Em relação à percepção dos entrevistados sobre o item esgotamento sanitário, os eixos Zona Sul, Zona Norte/Centro e Zona Oeste I apresen-taram os maiores percentuais de respostas para situação precária ou necessidade de ampliação da rede, respectivamente, �7,4%, 76% e 74%. O Zona Oeste II apresentou o maior percentual de repre-sentantes que afirmaram possuir rede de esgoto improvisada (22,2%). Foram significativos ainda os percentuais relativos à inexistência desse servi-ço nos eixos Zona Oeste I (12,3%) e II (11,1%).

Constata-se que entre os quatro eixos, o Zona Oeste II apresentou o quadro de maior precariedade ao esgotamento. Assim, a pesquisa corrobora tanto os dados secundários apresenta-dos no relatório anterior, como confirma a urgên-cia de investimentos públicos nesse setor para a Região Administrativa da Barra da Tijuca e, em especial, para as favelas localizadas na área.

coleta de lixoA percepção dos entrevistados acerca

da coleta de lixo é um claro exemplo de como a pesquisa qualitativa pode relativizar os da-

dos oficiais. Não apenas na cidade do Rio de Janeiro, mas em grande parte dos municípios brasileiros a coleta de lixo doméstico apresen-ta um índice de cobertura domiciliar elevado. De fato, entre os serviços de saneamento básico, o que é mais ofertado à população é a coleta de lixo. No entanto, a qualidade desse serviço deve ser devidamente avaliada a fim de que se oriente de maneira adequada o investimento público, seja para melhorar a oferta direta ou aprimorar a regulação sobre as concessionárias.

É relevante destacar que, no universo das favelas do Legado Social, 2/5 dos entre-vistados consideraram a coleta de lixo insu-ficiente. Serviço de competência municipal, a coleta em algumas comunidades exige a atuação de garis onde veículos motorizados não conseguem chegar.

Quando observados os dados consolida-dos por eixos, as favelas da Zona Sul foram as que apresentaram o maior percentual de entrevista-dos insatisfeitos com a coleta. De certa forma, esse

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Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas 37

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Em toda a comunidade

Inexistente

Precisa ser ampliado/está comprometido

Improvisado

NR

Em toda a comunidade

InexistenteImprovisado

NR

Precisa ser ampliado/está comprometido

Não sabe /desconhece

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38 Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas

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dado surpreende, já que a Zona Sul é tida como uma área urbana com ampla oferta de serviços públicos. Em contrapartida, nas comunidades da Zona Norte e do Centro a coleta é considerada suficiente por 57% dos entrevistados.

Destaca-se na Zona Sul da cidade, então, o contraste entre serviços da mesma natureza ofertados dentro e fora dos espaços populares, o que pode levar a efeitos negati-vos para toda a população. A deficiência na

Suficiente

Insuficiente

NRNão sabe

Suficiente

Não sabe

Insuficiente

NR

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Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas 3�

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NR

Insuficiente

Suficiente

Não sabe

Insuficiente

Suficiente

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40 Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas

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coleta de lixo em determinadas regiões pode causar problemas ambientais (assoreamento de rios, deslizamentos de terra) com potencial de afetar todo o município.

Na Zona Oeste fica clara a percepção dos entrevistados de que a coleta de lixo é suficiente (75,3% para Zona Oeste I, e 56,8% para II), mesmo se tratando de comunidades mais recentes.

abastecimento de águaOs serviços de abastecimento de água,

coleta e tratamento de esgotos são prestados no município carioca pela empresa pública estadual Cedae. A coleta de lixo, por sua vez, é responsabilidade de uma empresa pública municipal, a Comlurb.

Segundo os dados censitários apre-sentados no primeiro relatório deste projeto, a maior parte das favelas apresentava mais de �0% dos domicílios com abastecimento

de água. Cabe uma ressalva: Santo André, localizado no eixo Zona Oeste I, tinha apenas 26,7% dos domicílios com água em 2000.

Para além da ampla oferta do serviço de água, é preciso averiguar em que medida esse serviço tem sido prestado com regula-ridade pela empresa responsável. A distri-buição de água aos domicílios é vital para a salubridade dos ambientes e o bem-estar dos moradores. Não só a regularidade, mas também a qualidade da água que chega às casas é importante verificar.

A pesquisa constatou que a desi-gualdade na cobertura domiciliar da rede de abastecimento de água nas comunidades é bastante significativa. Menos de 40% dos entrevistados dos quatro eixos consideraram adequada a cobertura do serviço em toda comunidade. No eixo Zona Oeste II, somente 16% avaliou como satisfatória a cobertura; 32,1% apontou uma situação de improviso,

NR

Insuficiente

Suficiente

Não sabe

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Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas 41

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e 8,6% para a inexistência do serviço.As comunidades dos eixos Zona Sul,

com 66,7%, Zona Oeste I (55,5%) e Zona Norte/Centro (52%) registraram os maiores percentuais para rede comprometida ou necessidade de ampliação do abastecimento.

Conclui-se que, a despeito de todo cidadão ter o direito a um meio ambiente equilibrado, as desigualdades na distribuição dos serviços de saneamento básico existentes na cidade do Rio são acentuadas.

Esta pesquisa constatou a mesma

NRNão sabe

Improvisado

Em toda a comunidade

Inexistente

Precisa ser ampliado/está comprometido

NR

ImprovisadoEm toda a comunidade

Precisa ser ampliado/está comprometido

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42 Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas

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distribuição desigual de serviços apontada no primeiro relatório do Legado. O acesso a esses serviços básicos precisa ser enfatizado nas políticas públicas e atrelado ao plano de desenvolvimento da cidade.

iluminação, rede elétrica, arruamen-to e calçamento

A pesquisa com os representantes comunitários abordou a iluminação de vias públicas, a rede pública de energia elétrica

Não sabe

Improvisado

InexistentePrecisa ser ampliado/esta comprometido

Em toda comunidade

Não sabe

Improvisado

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Precisa ser ampliado/está comprometido

NR

Em toda a comunidade

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Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas 43

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e o estado do arruamento e calçamento das comunidades. A iluminação das vias tem estreita relação com a segurança, um dos maiores desafios hoje do poder público e da sociedade do Rio. Ações de caráter preven-tivo, como adequada iluminação pública, podem contribuir para a construção de uma cultura de paz no município.

Pouco menos da metade dos entre-vistados pela pesquisa considerou com-prometida a iluminação pública em suas comunidades, o que indica a deficiência do serviço nessas áreas. Para quase um terço dos entrevistados, os serviços de ilumina-ção das vias ou não existe ou precisa ser ampliado. Mais de 70% dos representantes comunitários apontaram a necessidade de intervenções para implantação ou melhorias na iluminação.

Para que haja iluminação, se faz ne-cessária uma rede de energia elétrica. Poucos

foram os que indicaram a inexistência de rede elétrica em suas comunidades, mas mais da metade respondeu que essa precisa ser ampliada ou encontra-se comprometida. Nas comunidades populares, as ligações elétricas clandestinas, conhecidas como “gatos”, devem ser abolidas, para prevenir acidentes e garantir a segurança dos mo-radores. Paralelamente, o poder público deveria criar tarifas sociais para o consumo de energia, compatíveis com a renda dos moradores de favelas e periferias.

Sobre o arruamento e o calçamento nas comunidades, a situação diagnosticada não é ruim. Há urgência na melhoria dos espaços públicos de circulação. Nove entre dez entrevistados se mostraram insatisfeitos ou mesmo denunciaram a inexistência dessa estrutura nos seus territórios.

Muitas vezes essas comunidades cons-troem por conta própria, por exemplo, a imper-

Não sabe

Outros

Inexistente

NR

Está comprometido

Precisa ser ampliado

Em toda a comunidade

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44 Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas

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NR

Está comprometido

Precisa ser ampliado

Em toda a comunidade

Não sabeNR

Precisa ser ampliado

Inexistente

Está comprometido

Em toda a comunidade

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Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas 45

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meabilização dos logradouros. Quando realiza-da sem a devida orientação técnica, essas obras podem afetar os sistemas de drenagem e facilitar

os desmoronamentos de terra e desabamentos. Obras fora dos padrões podem aumentar as possibilidades de enchentes na cidade.

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46 Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas

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A Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) estabelece os municípios como gestores dos sistemas locais de saú-de. São de responsabilidade dessa esfera de governo o cumprimento dos princípios do plano, a organização e a execução das ações e a garantia de infra-estrutura para as Unidades Básicas de Saúde (UBS). Para os grandes centros urbanos, recomenda-se a instalação de uma UBS para até 12 mil habitantes. A Atenção Básica tem a Saúde da Família como estratégia prioritária para a sua organização, de acordo com os precei-tos do Sistema Único de Saúde (SUS):

“A Atenção Básica caracteriza-se por um conjunto de ações de saúde, no âmbito indi-vidual e coletivo, que abrange a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação e a manutenção da saúde. É desenvolvida por meio do exercício de práticas gerenciais e sanitárias democráticas e participativas, sob forma de trabalho em equipe, dirigidas a po-pulações de territórios bem delimitados, pelas quais assume a responsabilidade sanitária, (...). É o contato preferencial dos usuários com os sistemas de saúde. Orienta-se pelos princípios da universalidade, da acessibilida-de e da coordenação do cuidado, do vínculo e continuidade, da integralidade, da responsa-bilização, da humanização, da eqüidade e da participação” (PNAB-2006).

No entanto, segundo a percepção dos representantes comunitários do Legado, ainda há muito a se fazer para se chegar aos parâmetros do PNAB, sobretudo em termos de investimentos e população atendida.

Ao serem consultados sobre os servi-ços de saúde, em todos os eixos geográficos do projeto as respostas mais recorrentes apontaram a inexistência e/ou a necessidade de ampliação. Com exceção do eixo Zona Sul, os maiores percentuais – todos com mais de 50% – foram para a inexistência dos serviços de saúde nas comunidades, seguidos pela necessidade de ampliação. Em todos os eixos foram pequenos os per-centuais para serviços satisfatórios.

A insatisfação com a saúde ganha no-vos contornos quando investigados os tipos de ações prestados nos espaços populares em estudo. Cada eixo geográfico tem situações e demandas próprias. Por exemplo, a distribui-ção dos postos de saúde nas comunidades é bem desigual. Enquanto no Zona Sul, 66,7% das entrevistas assinalam a presença de pos-tos, nas regiões mais periféricas esses percen-tuais são de 37% (Zona Oeste II), 20% (Zona Norte e Centro) e 16% (Oeste I).

Tendência similar se deu nas respos-tas sobre a distribuição do programa Agente Comunitário de Saúde1. Novamente foram nas comunidades da Zona Sul onde apareceu o maior percentual (46,2%) de reconhecimen-to da oferta do serviço, seguidas pelo Zona

Saúde6

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Diagnóstico Social e Esportivo de 53 Favelas Cariocas 47

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Oeste I (37%), Zona Norte e Centro (24%) e Zona Oeste II (7,4%).

Outro dado relevante diz respeito à localização onde os moradores das comu-nidades estudadas buscam atendimento médico. Mais uma vez são as comunidades do eixo Zona Oeste I as mais prejudicadas, onde 25,�% dos entrevistados disseram pre-cisar se deslocar para bairros distantes para obter serviços de saúde. No eixo Oeste II, esse percentual foi de 16%; no Zona Norte e Centro, 11,2%; e no Zona Sul, 2,6%.

Os representantes comunitários do eixo Oeste I, em suas respostas, ressaltaram que o aumento do número de postos de saúde e a melhoria da qualidade dos servi-ços evitariam o deslocamento para bairros distantes em caso de necessidade:

“A comunidade tem que se deslocar para encontrar serviços de saúde”; “a procura é em bairros distantes, pois na comunidade tem apenas o básico, clínica geral e ginecologia”; “até mesmo em bairros próximos existe a demora para ser atendido, sendo assim, faz-se necessário implantar postos de saúde 24 horas, que atendam a comunidade e bairros adjacentes”; “necessitamos da abertura de mais módulos do PSF”; “é até satisfatório pelo PSF o atendimento, mas os postos de saúde são caóticos e nunca atendem a de-manda, faltam remédios e médicos, a infra-estrutura está comprometida”.

No eixo Zona Oeste II, os comentários

priorizam a implantação/ampliação dos pro-

gramas de saúde e tratam da má qualidade e da distância dos postos de atendimento:

“A comunidade precisa de posto de saúde ou de algum dos programas de saúde existentes, já que os moradores têm que se deslocar para Vargem Grande ou para a Barra para serem atendidos”; “é preciso implantar o PSF”; “faltam postos de saúde que funcionem, pois os que tem além de serem distantes não funcionam direito”; “faltam pediatras, ginecologistas, obstetrícia, ortopedia, remédios e equipamentos técnicos”; “o acom-panhamento médico é em bairro próximo, mas por não haver certas especialidades vamos para bairros distantes”; “a espera para ser atendido é um absurdo, além disso tem que madrugar na fila, e o tratamento humano é inadequado”.

Os comentários no eixo Zona Norte e Centro mostram a grande demanda por serviços/programas de saúde preventivos dentro das comunidades, uma vez que nes-se eixo se encontram grandes conjuntos de favelas, e os moradores ficam limitados aos hospitais próximos, muitas vezes de difícil acesso e incapazes de atender a demanda:

“Precisa de atendimento médico em todas as áreas de saúde, de preferência dentro da comunidade. Por exemplo, os idosos são atendidos em hospitais distantes”; “precisamos de postos médicos, de preferência 24 horas”; “deve ser ampliado o PSF em nossa comunidade”;“mais especialidades como ginecologia, pediatria, urologia, dentistas”; “na comunidade não há serviços de saúde, as vezes os moradores se arriscam indo para comunidades

1 O programa Agente Comunitário de Saúde é uma estratégia para reestruturar o PSF (Programa Saúde da Família), criado para garantir o acesso a serviços e fortalecer vínculos comunitários. O objetivo do projeto do agente comunitário é oferecer os seviços em visitas domiciliares.

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rivais ou outros bairros”;“não temos o básico para o acompanhamento das necessidades de saúde, precisamos de uma ação de saúde preventiva”; “o atendimento ao público é péssimo, é necessário mais emergências e treinamento de cidadania para um melhor atendimento”.

No eixo Zona Sul, pede-se a imple-mentação de programas preventivos, como o Saúde da Família (PSF), e a melhoria e am-pliação dos serviços prestados pelos postos médicos dentro das comunidades:

“Ampliação do espaço físico e da equipe médi-ca do posto de saúde, com funcionamento 24 horas, para atender melhor a comunidade”; “o PSF contemplaria as expectativas por uma saúde de excelência”; “tem agentes de saúde só para tuberculose e a quantidade não atende a comunidade e as outras demandas, o aten-dimento voluntário é precário”; “o Agente Comunitário deveria ser ampliado e também

teria que ter o PSF e mais postos de saúde para atender toda a comunidade”; “falta trabalho de prevenção básica em toda área de saúde”; “o posto de saúde tem que ser ampliado, os postos particulares são precários e fazem os mora-dores de cobaias”; “não atende a demanda da comunidade, os hospitais próximos só atendem emergências da Zona Sul, atendimento médico para pobre não existe”; “não há serviços de saúde, só nas proximidades”.

A qualidade dos serviços de saúde pública é, há muito tempo, alvo das prin-cipais reclamações dos cidadãos cariocas. O acesso a um sistema de saúde eficiente é fator determinante para o exercício pleno da cidadania, para uma sociedade igualitária, com universalização de oportunidades e serviços. O conjunto de informações aqui relatadas ratifica os problemas de saúde da cidade e também destaca um dos lados mais perversos das desigualdades territoriais.

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A pesquisa do Legado Social mostrou que em todos os quatro eixos geográficos do projeto a prestação de segurança pública pelas polícias Militar e Civil foi avaliada como insatisfatório. Dos quatro eixos pesquisados, o Zona Sul apresenta a pior opinião sobre o serviço: 41% avaliam como ruim, e somente 2,6% acham bom. Se somados o percentual de entrevistados que acham ruim o ser-viço prestado com os que o acham insuficiente, ao todo 7�,5% considerou a segurança insatisfatória.

Os moradores do eixo Zona Sul rela-taram os motivos da insatisfação:

“O serviço de segurança pública é péssimo. A polícia na maioria das vezes é pior que o próprio bandido”; “o serviço de segurança é péssimo, põe

segurança pública

7os moradores em risco, os moradores se sentem ameaçados”; “os policiais não estão preparados para atuar em comunidades como a nossa”; “os policiais não respeitam os moradores, nem mesmo as crianças, trata-os como animais”.

Perguntados sobre suas demandas na área de segurança, os entrevistados enfatiza-ram a melhor formação do policial:

“Os órgãos públicos precisam dar mais condições téc-nicas, psicológicas, financeiras para seus funcionários poderem atuar nas áreas com mais necessidades”; “o posto policial precisa ser adequado para receber o policial, e este policial precisa ser preparado adequa-damente”; “o policiamento deveria ser mais sério”.

15,3%

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Nesse item da pesquisa, não se pode deixar de salientar o número significativo de pessoas que afirmaram desconhecer o tema. No Zona Sul, 15,3% assim se po-sicionaram. No eixo Zona Norte/Centro, esse percentual foi 24,8%. Para o eixo Zona Oeste II, 23,5%; e no I, 22,2%.

Apesar desta pesquisa não ter dados para concluir isso cientificamente, o número ele-vado de respostas “não sei” parece se relacionar à falta de confiança que em geral os moradores entrevistados demonstraram em relação aos agentes de segurança que atuam em suas co-munidades. Para que se reverta essa situação, é preciso que as ações policiais se façam dentro do marco legal e com respeito ao cidadão.

Para grande parte dos entrevistados do eixo Zona Norte/Centro, “não existe se-gurança pública na comunidade”. Como no eixo Sul, a falta de preparo dos policiais foi bastante citada nos depoimentos:

“Autoridades são omissas, os policiais quando entram na comunidade batem, abusam do poder e da força. Eles não têm respeito nenhum com os moradores”; “as comunidades estão entregues ao descaso, quando acontece algum policiamento é o famoso caveirão”; “a polícia comparece às vezes, mas não protege a comunidade e sim deixa os alunos e professores nervosos”.

As falas de moradores se referem a uma polícia que não está presente na comunidade, que realiza incursões de choque e repressão, encara os moradores como inimigos e desrespeita direitos. Alguns entrevistados do Zona Norte/Centro chegaram a classificar Segurança Pública com um “fantasma que assom-bra a população”. Perguntados sobre o que poderia ser feito para melhorar a segurança nas favelas, os entrevistados sugeriram a prevenção:

Bom

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“É preciso trazer projetos sociais para as comu-nidades”; “é necessário um policiamento mais cidadão, com menos arrogância com os morado-res, ou seja, mais preparados para lidar com as comunidades”; “acabar ou diminuir ao máximo a corrupção que existe nessa instituição e valorizar o servidor que está ali”.

Os maiores percentuais de mo-radores que acham bom o serviço de

segurança prestado em sua comunidade se encontram na Zona Oeste da cidade. Ainda assim, os índices são baixos: 11,1% para o eixo Zona Oeste I, e 18,5% para o eixo Zona Oeste II. Cabe destacar que as favelas localizadas na Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro são áreas onde predominam os grupos de milicianos e onde os índices de violência letal são os maiores da cidade do Rio de Janeiro.

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Ainda que o país tenha apresentado um processo de universalização do Ensino Fundamental ao longo da década de 1��0, não podemos deixar de considerar que:

“as reformas educacionais mais recentes, (...) ao incidirem sobre realidades bastante diversas, sobre grupos sociais com diferentes condições de vida e diferentes possibilidades de exercício de poder, sobre sociedades profundamente divididas nos planos econômico, social, político e cultural, nem sempre produziram resultados que levassem a uma maior democratização do acesso à educação e a uma melhor resposta da escola às necessidades vividas pelos diversos segmentos da população” (Campos e Haddad, 2005: p. 121).

Embora a Educação seja um direito social e um dever do Estado, segundo a Cons-tituição Federal e a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), as condições de acesso a um ensino de qualidade se diferem de forma drástica no Brasil e no Rio de Janeiro. As políticas sociais educacionais são fundamentais para atacar o quadro de desigualdades socioespaciais na cidade e reverter desvantagens socioeconô-micas de populações de favelas e periferias, à medida que capacitam profissionalmente, têm o potencial de despertar a consciência para outros direitos e incentivam práticas cidadãs em outras áreas, como saúde.

Vale ressaltar que neste item da pesquisa buscou-se dos entrevistados

educação8

percepções sobre a educação escolar, sem, contudo, ignorar que o processo educativo não se realiza apenas nos espaços formais, em períodos determinados.

ensino fundamental Cerca de 45% dos entrevistados

pela pesquisa do Legado Social conside-raram insuficiente o número de escolas nas suas regiões. Contudo, prevaleceu a opinião de que a situação das escolas existentes e em funcionamento é boa (30,4%) em contraposição aos 14,7% que manifestaram posição contrária.

O quadro relativo a serviços edu-cacionais mais crítico, na percepção dos re-presentantes comunitários, é o do eixo Zona Oeste II. Lá, está o maior percentual para quantidade de escolas insuficiente, 58%, se-guido dos eixos Zona Sul (51,2%), Zona Oeste I (43,2%) e Zona Norte/Centro (36,8%).

Sobre a situação das escolas em funcio-namento, ela é boa para 37,6% dos entrevista-dos do eixo Zona Norte/Centro e para 34,6% do Zona Oeste I. O resultado no eixo Zona Sul foi 20,5%, e, no Zona Oeste II, 1�,8%.

O eixo Oeste II também apresentou o maior percentual de escolas consideradas ruins (18,5%), seguido do Norte/Centro (16,8%), Sul (12,8%) e Oeste I (8,6%). O maior percentual para a categoria inexistente foi encontrado no eixo Zona Oeste I (�,�%).

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Nas comunidades do eixo Zona Sul, mais de 50% dos entrevistados ava-liaram o serviço como insuficiente, apesar dessas favelas estarem em bairros valori-zados da cidade com expressiva presença de escolas públicas e privadas. A percep-ção dos entrevistados indica, assim, um grave problema de acesso a esses serviços educacionais pelos moradores.

Em geral, todos os eixos apontaram os mesmos problemas em educação (nessa questão os entrevistados puderam assi-nalar mais de uma opção): falta de vagas nas escolas próximas, falta de professores e necessidade de mais e melhores equipa-mentos pedagógicos. Variaram, no entanto, a importância atribuída à determinada deficiência em cada eixo.

No Zona Oeste I, falta de vagas teve destaque em 40,7% das entrevistas, seguida

da falta de professores (3�,5%) e da necessida-de de equipamentos pedagógicos (34,6%).

No eixo Oeste II, falta de vagas e de professores tiveram ambos 60,5%, seguidas de insuficiência de turnos e da necessidade de equi-pamentos pedagógicos, os dois com 30,�%.

No eixo Zona Norte/Centro, as prin-cipais demandas são por mais professores (48%), mais vagas (45,6%) e equipamentos pedagógicos (34,4%).

No eixo Zona Sul, fez-se notar a falta de professores (64,1%) e a de vagas (56,4%), seguidas da falta de turmas de 5ª a 8ª série e da necessidade de equipamentos pedagógi-cos, ambos com 51,3%.

A percepção dos entrevistados comprova como estamos longe do grau desejável de acesso a serviços educacionais, de qualidade, no Rio de Janeiro. Dotar uma comunidade de educação vai além de

Bom

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construir escolas. Exige investimentos não somente na estrutura material, mas também na organização da rede e em recursos hu-manos. O resultado da pesquisa do Legado ajuda na compreensão de por que as escolas de comunidades populares apresentam ele-vados índices de distorção de série, evasão e reprovação na cidade.

Embora as demandas dos entrevis-tados variem, observa-se uma crítica con-tundente às condições do atendimento. No geral, não faltam turmas e não falta meren-da, os ciclos de formação são encontrados nas unidades de ensino das comunidades e do entorno, mas a permanência do aluno e a sua formação satisfatória só é possível num ambiente com os recursos pedagógicos devidos, professores e funcionários motiva-dos e capacitados.

ensino médioA Constituição Federal, em seu artigo

206, prevê a igualdade de condições para o acesso e a permanência na escola e, no artigo 208, assegura a oferta de ensino noturno regu-lar, adequado às condições do educando, e a progressiva universalização do Ensino Médio gratuito. Entretanto, embora a taxa de atendi-mento do Ensino Médio tenha apresentado crescimento no período 1��1-2000 em propor-ção maior que os outros níveis de ensino, ainda persiste na cidade e no país uma rede bastante incipiente para a sua oferta.

No universo de comunidades es-tudadas, a percepção sobre a situação dos equipamentos escolares para o Ensino Mé-dio acompanha, à primeira vista, a mesma tendência verificada para o Fundamental. Para 41,7% dos representantes comunitá-

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rios, as escolas são insuficientes. Contudo, a análise de outras respostas mostra diferen-ças significativas entre as opiniões sobre os dois níveis de ensino, indicando uma maior demanda por quantidade e qualidade de escolas de Ensino Médio.

O primeiro resultado contunden-te refere-se ao percentual quatro vezes maior dos que apontaram a inexistência de unidades de Ensino Médio (16,3%), em comparação com inexistência de unida-des de Fundamental. Na percepção sobre o Ensino Fundamental, mais de 50% avaliaram como bons os equipamentos existentes. No caso do Médio, esse índice caiu para 17,2%.

A análise pelos eixos geográficos de-monstra as disparidades encontradas na cida-de no acesso ao Ensino Médio, principalmente na Zona Oeste. Enquanto que na pesquisa

sobre o Fundamental os maiores percentuais estiveram nas categorias bom e insuficiente em todos os eixos, na percepção sobre o Médio a predominância é em insuficiente (46,9%) e inexistente (21%) no eixo Oeste I e insuficiente (46,�%) e ruim (22,2%) no II.

A insuficiência de escolas de Ensino Médio alcançou um percentual superior a 40% nos eixos Zona Oeste I, Oeste II e Sul. A situação mais crítica é na Oeste II, único eixo que apresentou resposta “ruim” maior do que “bom”. Na verdade, duas vezes maior. Se no Zona Sul 20,5% avaliou as escolas como boas, seguido pelo Norte/Centro (1�,2%) e Oeste I (18,5%), no eixo Oeste II o percentual foi 11,1%. A percepção de colégios ruins encon-tra-se majoritariamente no Oeste II (22,2%). Bem atrás, vêm Zona Norte/Centro (15,2%), Zona Sul (7,7%) e Zona Oeste I (7,4%).

Em relação às demandas sobre En-

Bom

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sino Médio (nessa questão o entrevistado pôde assinalar mais de uma opção), as prin-cipais foram por mais vagas nas escolas e por professores, em todos os eixos geográficos. Há de se destacar os percentuais represen-tativos para a necessidade de equipamentos pedagógicos na Zona Oeste I e na Zona Sul, turnos insuficientes na Zona Oeste II e loca-lização distante na Zona Norte/Centro.

No eixo Zona Oeste I, destacaram-se a falta de vagas (38,3%), a necessidade de mais e melhores equipamentos pedagógicos (30,�%) e a falta de professores (28,4%), sem contar o significativo percentual de localiza-ção distante das escolas (24,7%).

No Oeste II, os maiores percentuais fo-ram falta de vagas (51,�%), falta de professores (44,4%) e turnos insuficientes (37%). Cabe des-tacar que em todas as categorias de respostas os índices foram maiores que 20%.

No eixo Zona Norte/Centro, os per-centuais mais elevados foram para a falta de

vagas (38,4%), falta de professores (35,2%), localização distante (34,4%) e turnos insufi-cientes (28,8%).

Por fim, o eixo Zona Sul tem 51,3% de falta de professores, 41% de falta de vagas e 33,3% de necessidade de equipamentos pedagógicos.

crechesA educação infantil está prevista

na Constituição Brasileira, em seu artigo 208, e no artigo 4º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, aprovada em 1��6. A legislação assegura o atendimento em creche e pré-escola para todas as crianças de 0 a 6 anos de idade. Pelo observado na pesquisa, contudo, o déficit nesse atendimento é acen-tuado nas comunidades do Legado Social. As creches públicas e conveniadas foram consideradas insuficientes por 40,5% dos entrevistados e inexistentes por 25,5%.

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Mesmo que em todos os eixos geo-gráficos da pesquisa prevaleça a resposta “insuficiente”, novamente são nas comuni-dades da Zona Oeste da cidade que a falta desses equipamentos se mostra mais grave. O maior índice de creches insuficientes, por exemplo, foi na Zona Oeste II (50,6%). Se somarmos os percentuais de insuficiente e inexistente, teremos: 75% no eixo Zona Oeste I e no Oeste II, 5�% no Zona Sul e 56% no Zona Norte e Centro.

Em relação à qualidade das creches existentes nas comunidades, 23,1% das res-postas do eixo Zona Sul apontaram uma situ-ação ruim, seguido do Zona Oeste II (6,2%), Zona Norte e Centro (5,6%) e Zona Oeste I (2,5%). A percepção de que as creches são boas teve, coerentemente, o pior resultado no Sul (10,3%), seguido do Zona Oeste II (13,6%), Oeste I (16%) e Norte/Centro (27,2%).

O roteiro das entrevistas também

pedia para os representantes comunitários apontarem as suas principais demandas so-bre as creches, no caso podendo citar até mais de uma. No eixo Zona Oeste II, os maiores percentuais foram falta de vagas (54,3%), turnos que não atendem às necessidades das famílias (33,3%) e profissionais desprepara-dos (2�,6%).

No eixo Zona Norte/Centro, o per-centual mais significativo foi falta de vagas (47,2%), seguido da localização distante (17,2%) e dos turnos que não atendem às ne-cessidades das famílias (16,8%).

No eixo Zona Sul, houve elevados per-centuais para todas as categorias de respostas, excetuando localização distante: falta de vagas (64,1%), necessidade de profissionais preparados (53,8%), necessidade de equipamentos pedagógi-cos (48,7%), turnos que não atendem à necessida-de das famílias (43,6%), falta de merenda escolar (41%) e precariedade das edificações (35,9%).

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Os resultados no eixo Zona Sul não significam necessariamente que essa região tem mais desvantagens. É bastante provável que os entrevistados das comunidades lo-calizadas no entorno dos bairros mais ricos da cidade, onde os serviços costumam ser melhores, tenham um padrão de exigência maior do que os representantes de bairros mais populares, onde a desigualdade não se mostra de forma tão extrema.

Se levarmos em conta a conclusão do primeiro relatório do Legado Social sobre o papel cada vez mais destacado da mulher como provedora da família e, inclusive, chefe

da casa, a insuficiência e a falta de qualidade de creches são obstáculos para o bem-estar e o empreendedorismo dos moradores de comunidades populares.

Na educação, em geral, a falta de uma ação e de uma estrutura do Estado, ausência confirmada por esta pesquisa, que permita o acesso e a permanência de jovens em institui-ções de ensino de nível médio de qualidade, alimenta a mentalidade e a lógica social de que a esses garotos e garotas de origem po-pular cabem horizontes e perspectivas mais restritas, empregos menos qualificados, de baixa remuneração.

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Maurício Abreu (1��7:47) cita o ano de 1870 como um marco na história do Rio de Janeiro, quando os trens e bondes possibilitaram a expansão urbana. Para as camadas populares a implantação de linhas de trem foi especialmente benéfica, proporcionando maior mobilidade a esses grupos. Mesmo assim, na última década do século XIX, o sistema de transporte já estaria sobrecarregado, insuficiente para as demandas da época.

Cem anos depois, as limitações do sistema e dos meios de transporte se avo-lumam na capital fluminense. Com uma malha de trens e metrô bastante limitada e com o aumento da frota de veículos parti-culares nas ruas, os deslocamentos têm sido cada vez mais lentos. O ônibus é o principal meio de transporte público utilizado na ci-dade. Apesar do grande potencial para os transportes pela baía, essa é uma via pouco explorada, haja vista as poucas linhas de barcas existentes.

Em crescimento rápido e muitas vezes na informalidade, o transporte por motos e vans concorrem hoje com as linhas de ônibus, dividindo até os mesmos pontos. Menores, esses veículos têm acesso a luga-res onde os ônibus não conseguem chegar. Em muitas favelas cariocas, as vans e os moto-táxis são predominantes.

Nas entrevistas da pesquisa do Lega-do, houve empate entre os que se disseram

transporte9

satisfeitos com o serviço de transporte e os que se disseram insatisfeitos.

A análise dos dados pelos eixos ge-ográficos revela novos contornos. No Zona Oeste I, no entorno da Avenida Brasil, 71,6% dos entrevistados consideraram o serviço in-suficiente, seguidos do eixo Zona Sul (56,4%), Oeste II (43,2%) e Norte/Centro (38,4%).

A insatisfação dos representantes do Zona Oeste I é reflexo do sobrecarregado sistema de transporte, especialmente ônibus e trens, responsável pelo fluxo entre o Centro e as comunidades no entorno da Avenida Brasil. A precária manutenção destes meios de transporte agrava a situação e causa maior desconforto aos trabalhadores que fazem esse itinerário.

Apesar de a insatisfação ser bastante representativa no eixo Zona Oeste II, ela está bem abaixo do índice do Oeste I.

Nas comunidades populares da Zona Sul, a percepção da maioria dos entrevistados é que o sistema de transporte é insuficiente, com percentuais próximos aos encontrados no Zona Oeste II.

A situação é bem diferente no eixo Zona Norte e Centro, onde, para 60,8% dos entrevistados, o serviço é suficiente.

No caso específico do eixo Zona Norte e Centro, é possível inferir que a localização é decisiva para a oferta dos serviços de trans-porte. Destaque-se a densa circulação de pessoas e presença de negócios no Centro,

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o que leva à região diversas modalidades de transporte (ônibus, trem e metrô).

Sobre a situação do transporte no interior das comunidades, é elevado o grau de insatisfação dos moradores. Apenas 14,8% dos representantes comunitários do eixo Zona Oeste I responderam que o serviço era bom. Nas favelas da Zona Sul esse percentual aumentou para 23,1%. No Zona Oeste II, foi 33,3%, e, no Zona Norte/Centro, 45,6%.

Em geral, as reclamações falam de falta de linhas regulares dentro das comunidades e do desordenamento das linhas de Kombi e moto-táxi, que tendem a ignorar os direitos à gratuidade e, assim, aumentar o custo de vida.

A pesquisa do Legado também ava-liou a satisfação dos entrevistados com o transporte para outras áreas da cidade. Mais

uma vez, foram os representantes comunitá-rios das favelas do eixo Zona Oeste I que mais reclamaram, seguidos pelos do eixo Zona Oeste II, Zona Sul e Zona Norte/Centro. As demandas são por mais linhas para bairros distantes e mais veículos à noite.

A percepção sobre os transportes dentro e fora das comunidades mostra que a maior insatisfação com o serviço é dos entrevistados do Zona Oeste I. No Oeste II, as possibilidades de circulação pela cidade são mais abrangentes, segundo o grupo entrevistado.

No eixo a Zona Sul, 5�% dos repre-sentantes comunitários reconheceram que o transporte para outras áreas da cidade é bom. É possível concluir que a concentração de riquezas nessa área da cidade gera malhas de serviços de maior densidade.

Não sabe

SuficienteInsuficiente

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Conforme já descrito no relatório quantitativo do Legado Social, os dados sobre os equipamentos culturais da cidade até o ano de 2005, demonstram uma distri-buição bastante desigual desses recursos e serviços. A grande maioria dos museus, escolas musicais, centro culturais, teatros, cinemas, salas de espetáculos localizam-se no Centro e na Zona Sul.

Os resultados obtidos na pesquisa qualitativa do Legado com os representan-tes comunitários refletem essa desigualda-de. Para 6�,2% dos entrevistados do Zona Oeste II, esses equipamentos culturais são lá inexistentes. Para o Zona Oeste I, o percen-

cultura10

Fonte: Prefeitura do Rio de Janeiro, 2005.

tual é 67,8%, seguido do Zona Norte/Centro (45,6%) e do Zona Sul (35,�%). No Sul, impe-rou a resposta insuficiente (48,7%).

No eixo Zona Oeste I, quando per-guntado aos entrevistados que tipos de equipamentos culturais estão presentes nas comunidades, 5�,3% das respostas apontaram lanhouses, 14,8% para escolas de samba/blocos carnavalescos, 13,6% para as lonas culturais, 8,6% para centro culturais, apenas 2,5% para teatros, e nenhuma res-posta para cineclubes.

Situação ainda mais grave pôde ser observada no Zona Oeste II, onde 35,8% re-gistraram a presença de lanhouses, 21% escolas

Fonte: Prefeitura do Rio de Janeiro, 2005.

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E no eixo Zona Sul os representantes comunitários assinalaram a presença de es-colas de samba/blocos carnavalescos (74,4%), lanhouses (66,7%), teatros (30,8%), centros cul-turais (10,3%), cineclubes (5,1%), e nenhuma resposta para lonas culturais.

Logo, por todos os eixos geográficos, verificamos uma predominância do equi-

de samba/blocos carnavalescos, 4,�% centros culturais, 2,5% teatros, 1,2% cineclubes, e ne-nhuma resposta para lonas culturais.

No eixo Zona Norte e Centro, os re-sultados foram: lanhouses (5�,2%), escolas de samba/blocos carnavalescos (44,8%), centros culturais (16%), lonas culturais (6,4%), teatros e cineclubes (3,2%).

BomRuimNR

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pamento cultural lanhouses e das escolas de samba e blocos carnavalescos. O resultado mostra a demanda por diversificação de equipamentos e projetos culturais nas fave-

las cariocas, uma vez que essas atividades, nesta era de globalização, são cada vez mais definidores do processo educativo e do exercício da cidadania.

NR

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11

Com a realização dos XV Jogos Pan-americanos 2007 no Rio de Janeiro, o Brasil ganhou destaque no cenário esportivo inter-nacional. As esferas governamentais foram razoavelmente bem-sucedidas na organiza-ção dos Jogos. A participação do governo federal esteve além do financiamento (em torno de R$ 1,2 bilhão), pois praticamente todos os ministérios, várias autarquias e es-tatais se envolveram nos preparativos.

Significativos foram os investimentos para a modernização, ampliação e construção de novas instalações e complexos esportivos, deixando uma infra-estrutura que permite à cidade do Rio sediar outras competições. No entanto, ainda se tem muito por fazer para tornar realidade na cidade o preceito consti-tucional epígrafe deste capítulo.

A análise dos dados levantados por esta pesquisa demonstra que falta muito para se alcançar a universalização do acesso às prá-ticas desportivas na nossa cidade. O esporte e o lazer aparecem como uma forte demanda nas comunidades populares pesquisadas. O inventário do capital social e da infra-estru-

1 Programa do Ministério dos Esportes, em parceria com o Ministério da Educação e o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, visa possibilitar o acesso à prática esportiva dos alunos dos Ensinos Fundamental e Médio da rede pública, principalmente nas áreas que apresentam grande vulnerabilidade social.

2 Programa da Secretaria Municipal de Esporte e Lazer, que almeja desenvolver um conjunto de atividades de cunho artístico e esportivo, voltado aos adolescentes e jovens das favelas. No que se refere à prática de esportes, o programa desdobra-se em dois projetos: Gol de Placa e Germinal.

esporte“É dever do Estado fomentar práticas desportivas

formais e não formais, como direito de cada um”

(Constituição Federal, artigo 217)

tura esportiva presente nas favelas cariocas é condição fundamental para a implementação de programas comunitários esportivos e o investimento em equipamentos adequados.

É importante lembrar que no relatório quantitativo que antecede a este, no qual se buscou sistematizar um conjunto de indicado-res, dados e registros administrativos de dife-rentes fontes oficiais, constatou-se um grande déficit de programas e projetos esportivos nas favelas do Legado Social. O Programa Segundo Tempo1, por exemplo, atende apenas 15 favelas das 53 estudadas, sendo seis delas localizadas no eixo geográfico Zona Oeste I, cinco no eixo Zona Norte e Centro, duas no Zona Oeste II e outras duas no Zona Sul. Já o programa MEL2 atende 2� favelas do Legado Social (6 das 16 comunidades do eixo Zona Oeste I; 6 das 14 comunidades do eixo Zona Oeste II; 10 das 16 comunidades do eixo Zona Norte e Centro; e todas as sete comunidades do eixo Zona Sul).

O programas, dessa forma, não estão distribuídos de forma igual pelos quatro eixos geográficos do Legado. É o caso de ressaltar que grande parte dos espaços utilizados

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e Centro não significam um melhor atendimen-to nesses locais. Esse eixo geográfico abrange a Zona Norte e o Centro, que concentram cerca de 51% e 7%, respectivamente, da população mo-radora em favelas no Rio (IPP, 2000) e grandes complexos como Maré, Alemão e Jacarezinho. Logo, a demanda nesse eixo é muito grande3.

Elevados percentuais de entrevista-dos registraram a inexistência de programas e esportivos no universo das comunidades pesquisadas. Há de se chamar a atenção para o grande número de respostas “não sei”. Tal quadro demonstra o desconhecimento das ações governamentais por parte dos repre-sentantes comunitários, algo sério, dada a militância local dos entrevistados.

Nas informações distribuídas por ei-xos geográficos, a maior ou menor demanda por equipamentos acompanha a oferta de infra-estrutura esportiva nos bairros em volta das comunidades. A localização territorial é fator intrínseco à heterogeneidade nos espa-ços populares cariocas.

A pesquisa do Legado fez aos represen-tantes de cada eixo perguntas abertas sobre as atividades esportivas praticadas na comunida-de, e as respostas constituíram um ranking dos esportes mais populares.

A universalização das práticas esporti-vas é não apenas fator de desenvolvimento físico e mental, mas promotor da saúde, de integração social, parte do processo educacional. Tal con-cepção deve incentivar políticas e investimentos conjuntos de ministérios e secretarias, para criar, em diálogo com as comunidades, programas esportivos sustentáveis e efetivos para a dimi-nuição das desigualdades socioespaciais.

nesses projetos encontra-se em condições pre-cárias ou são usados de modo improvisado. A maioria das atividades se desenvolve em campos de futebol, quadras, associações de moradores, galpões, terrenos baldios e praças existentes nas comunidades ou em localida-des adjacentes. O futebol predomina.

As informações apuradas pela pes-quisa qualitativa do Legado constataram a má distribuição dos equipamentos pelos quatro eixos geográficos. Mapeou-se as principais atividades esportivas e recreativas realizadas, e averiguou-se a percepção dos entrevistados em relação aos programas oficiais.

Nos quatro eixos, a maioria dos repre-sentantes comunitários acusou a insuficiência ou a inexistência de equipamentos, condição que foi corroborada pelos menores percentuais dos que consideraram boa a oferta desse servi-ço na comunidade. Os destaques são os eixos Zona Oeste I e Zona Sul, que, além de obterem mais de 70% para inexistente e insuficiente, so-mados, têm baixo índice e avaliação positiva.

Outra indagação feita aos representan-tes comunitários diz respeito à existência nas comunidades de alguns dos principais tipos de equipamentos esportivos. Predominaram nas respostas os campos de futebol, seguido das quadras esportivas. O aspecto mais positivo foi o elevado percentual para pista de skate/patins nas comunidades da Zona Sul (41%). O mais negativo foi a ausência de pista/equipamentos de atletismo, de ciclovias e de piscinas de nata-ção nos eixos Zona Oeste I e Zona Oeste II.

Ressalte-se que os maiores percentuais para a presença de vilas olímpicas (22,4%) e de piscinas de natação (16,8%) no eixo Zona Norte

3 As 16 favelas do eixo Zona Norte e Centro agrupam 2�5.�42 moradores (Censo IBGE 2000/MOREI – IPP).

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ranking das principais atividades esportivas praticadasnas comunidades do legado social (2007)

Fonte: Entrevista aberta com os representantes comunitários, realizada pelo Observatório de Favelas e o Cedaps nos meses de abril e maio de 2007

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O presente trabalho, uma parceria do Ministério do Esporte e da Sepan com o Observatório de Favelas e o Cedaps, é a primeira iniciativa para avaliar de forma minuciosa temas importantes como educa-ção, segurança, transporte, regulamentação fundiária, cultura e esporte nos territórios populares da cidade do Rio de Janeiro, tra-dicionalmente preteridos ou esquecidos. Este diagnóstico também inova ao buscar e ana-lisar a percepção dos moradores de favelas sobre esses assuntos, sobre o que na opinião deles deveria ficar como legado social dos Jogos Pan-Americanos de 2007.

Nesse trabalho, ficou claro o quanto as comunidades pesquisadas necessitam ur-gentemente de investimentos estruturais em equipamentos, bens e serviços. Obviamente, esse quadro não era desconhecido. O que há de original neste estudo é o ponto de vista dos moradores sobre os seus principais proble-mas e demandas. Esta pesquisa qualitativa, combinada com os dados do primeiro relató-rio do Legado Social, de julho de 2007, oferece um panorama abrangentes e complexo dos espaços populares do Rio de Janeiro.

Mais do que uma simples constatação dos problemas, o objetivo deste relatório é servir de instrumento de reflexão e ação para resolver os graves problemas das co-munidades populares da cidade, melhorar os indicadores sociais, econômicos, culturais e esportivos que aqui foram tratados.

Este diagnóstico mostrou, por exem-plo, como historicamente as favelas foram

consideradas problemas para a cidade e, por isso, sofreram diversas intervenções do poder público que não consideraram as necessidades dos moradores. As políticas de remoção talvez sejam o principal exemplo desse tipo de ação. A idéia de que a favela era a responsável por todos os males da cidade alimentou por décadas práticas discricioná-rias e preconceituosas. Os programas habita-cionais não levaram em conta as demandas efetivas dos moradores de comunidades, os laços de vizinhança e as práticas sociais dessas populações.

Também por conta dessa história, a regularização fundiária e a titulação dos imóveis é hoje uma das principais reivindica-ções dos que residem em favelas, um direito raro nos espaços populares. A regularização permite às famílias o reconhecimento legal de suas moradas, o poder de exigir das esferas governamentais os investimentos realizados nos demais bairros da cidade. O tema é cru-cial para o debate sobre a democratização do uso do espaço urbano e a universalização dos serviços e equipamentos públicos de quali-dade na cidade.

Uma das mais graves conseqüên-cias da falta de regularização fundiária é o acesso restrito ao saneamento básico. Este relatório mostrou que, embora a maioria dos territórios figurem oficialmente como atendidos por esses serviços, existem mui-tos problemas em relação à qualidade desse atendimento. Um caso exemplar é o eixo geográfico Zona Oeste II desta pesquisa, que

conclusões e recomendações

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engloba a Barra da Tijuca. Essa é hoje a região da cidade que mais cresce, mas o seu esgo-tamento sanitário não tem acompanhado a expansão, o que causa enormes transtornos para a população, especialmente a que mora nas favelas da região.

No eixo Zona Sul, onde existem fa-velas mais antigas, o problema também é grave. Quando consultados sobre as condi-ções da rede de esgoto, �7% dos moradores entrevistados apontaram a necessidade de ampliação ou reforma. Isso também vale para o abastecimento de água e a coleta de lixo. Assim, se a universalização desses serviços é uma realidade, a qualidade deles é bastante questionável. Sem um saneamento básico efi-ciente, a qualidade de vida cai, e os moradores vivem sob constante ameaças à saúde.

Nesse campo, no da saúde, a situação na percepção dos entrevistados pela pesqui-sa deixa também a desejar. Foi apontada a necessidade urgente de melhorias, amplia-ção e implantação dos serviços de saúde. No eixo Zona Oeste I, por exemplo, apenas 16% das pessoas avaliaram a saúde como satisfatória. Por conta da insuficiência ou inexistência de atendimento, os moradores são obrigados a percorrer grandes distâncias para ver um médico.

O aumento do número de postos de saúde, a melhoria de sua qualidade, com mais especificidades médicas, disponibilida-de de horários e equipamentos, o incremento da saúde preventiva são demandas urgentes para os que dependem quase que exclusiva-mente do Sistema Único de Saúde (SUS).

Sobre o tema transporte, o quadro é de dificuldades, principalmente para quem mora na Zona Oeste, pela escassez de ser-

viços para outros pontos da cidade. Nas favelas quase não existem linhas regulares de ônibus – o principal meio de transporte na cidade do Rio de Janeiro – e por isso o chamado “transporte alternativo” (vans, carros particulares e motos) é amplamente usado. Entretanto, isso é feito sem fiscaliza-ção por parte das autoridades, o que põe em risco a vida dos usuários. Esses transportes alternativos também não respeitam direitos adquiridos, como a gratuidade para idosos e estudantes de escolas públicas.

A regularização desses meios de transporte poderia ser uma boa alternativa para aumentar a capilaridade e a qualidade do serviço. Tal política, contudo, deve vir acompanhada de estudos logísticos que permitam distribuir as linhas alternativas por todas as regiões da cidade, em especial as pouco servidas pelos ônibus e as favelas de difícil acesso. Além de garantir o direito básico de ir e vir dos cidadãos dos espaços populares, a regularização pode se tornar uma rica experiência de multiplicação de trabalho e renda nas favelas.

Outro tema deste trabalho diz respeito à percepção dos moradores entrevistados so-bre a educação pública. Na maioria dos casos, as respostas indicaram a insuficiência do ser-viço e problemas estruturais no Rio de Janeiro. Os maiores apontados foram a falta de vagas nas escolas, a falta de professores e a falta de investimento em material pedagógico.

Mais uma vez, a Zona Oeste da cida-de é a que mais sofre com a precariedade dos serviços. Segundo os moradores, mais do que no Ensino Fundamental, é no Médio que estão as distorções mais graves. Isso pode significar para os moradores mais jovens desses territórios

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maiores obstáculos na hora de ingressar no En-sino Superior ou no mercado de trabalho. Com baixa escolaridade, eles acabam incorporados em funções subalternas, de baixos salários, ou nem entram no mercado de trabalho formal, fenôme-no cada vez mais comum.

Sendo a educação fator importante de mobilidade social, é indispensável a execução de políticas públicas que garantam o acesso e a permanência com sucesso de jovens nos ensinos Fundamental e Médio, que permitam a ampliação das capacidades culturais e pro-fissionais desses cidadãos e superem a lógica dominante de que cabem aos garotos e garotas de origem popular empregos de baixa ou ne-nhuma qualificação profissional. Para garantir esse direito, se fazem necessários investimentos não somente na estrutura material, mas tam-bém na organização e nos recursos humanos do sistema educacional. É fundamental incluir no debate por soluções os alunos e as lideranças locais, de modo que os moradores de favelas sejam tratados como sujeitos de direitos, e não apenas como objetos de projetos, muitas vezes alheios às realidades específicas.

A situação da educação se agrava quando observada a distribuição dos equipa-mentos culturais na cidade. A grande maio-ria dos museus, escolas musicais, centros culturais, teatros, cinemas, salas de espetácu-los localizam-se nas regiões administrativas do Centro e da Zona Sul. Tal distribuição desigual se reflete no elevado percentual de respostas “inexistente” pelos entrevistados dos eixos Zona Oeste II, Zona Oeste I e Zona Norte e Centro, comparados ao Zona Sul, onde impera a categoria “insuficiente”.

Em todos os eixos geográficos, há a predominância de lanhouses e de escolas

de samba/blocos carnavalescos como equi-pamentos culturais disponíveis. Tal padrão reflete a demanda considerável pela diver-sificação de serviços e projetos culturais nas favelas cariocas. O acesso a atividades diversas dessa natureza é uma importante ferramenta para o processo educativo e o exercício da cidadania.

Quadro similar ao dos equipamentos culturais foi verificado no tema bens e in-vestimentos esportivos. De maneira geral, o futebol continua sendo a principal modalida-de esportiva nas favelas, muito pela falta de outras opções. Os campos de futebol, contu-do, se encontram em estado precário ou im-provisado, bem como as quadras que servem também para outras modalidades esportivas. Na maioria dos casos, práticas esportivas não ganham relevância por absoluta falta de infra-estrutura. Fato que é corroborado pela inexistência e/ou desconhecimento por parte dos entrevistados de vários programas e projetos nas comunidades.

O conjunto de dados demonstra que há uma imensa demanda pela universaliza-ção do acesso às práticas esportivas, mas que cada eixo geográfico apresenta situações pró-prias. Em geral, a maior ou menor demanda e potencialidade de cada eixo acompanha a oferta de infra-estrutura esportiva nos bairros ao redor das comunidades. Na Zona Sul, rei-vindicou-se a ampliação de programas para a conservação e a manutenção dos equipa-mentos, enquanto que nos demais eixos os entrevistados salientaram a necessidade de equipamentos e espaços esportivos.

Por fim, o tema mais polêmico e que diz respeito a todo o universo de comuni-dades pesquisadas é segurança pública.

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Nas entrevistas, ficou evidente a enorme preocupação e descontentamento com os serviços oferecidos pelo Estado. A maior queixa diz respeito à forma como a polícia atua nas favelas e como seus agentes abu-sam da violência.

Nesse campo, o Estado se eximiu de seu papel de manter a ordem e a proteção social em tais comunidades. Na pesquisa, ficaram claros a desconfiança dos moradores no aparelho policial e o medo das pessoas de, inclusive, tratar desse tema. Mesmo com a garantia de que suas identidades não seriam reveladas, muitas lideranças entrevistadas preferiram responder que não sabiam ou que não opinariam sobre o assunto. Dado o grau de comprometimento e atuação dos entrevistados com suas comunidades, fica

difícil creditar o alto índice de respostas “não sei” ao simples desconhecimento.

A segurança nas favelas e espaços populares é assunto-chave para pensarmos a implementação de direitos iguais numa sociedade desigual. Encontrar caminhos e soluções para o problema, consolidar uma sociedade verdadeiramente democrática, exige um debate amplo e aberto a todos os setores envolvidos.

O projeto Legado Social visa a expan-são dos direitos humanos e sociais, enfatiza a dimensão participativa da democracia a par-tir de canais de interlocução entre o governo, os movimentos sociais e os moradores das favelas cariocas. As informações e reflexões apresentadas neste relatório pretendem con-tribuir com esse processo.

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