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Revista de Cuiabá, v. 11, n. 19, jan.-jun. 2002.

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Revista de

Cuiabá, v. 11, n. 19, jan.-jun. 2002.

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃOUNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

ReitorProf. Dr. Paulo Speller

Vice ReitorProf. Dr. José Eduardo Aguilar S. do Nascimento

Pró-Reitora AdministrativaTec. Adm. Esp. Adriana Rigon Weska

Pró-Reitor de Ensino e GraduaçãoProfa. MS Maria Benício Rodrigues

Pró-Reitor de PlanejamentoProf. Dr. José Manoel Henriques de Jesus

Pró-Reitora de Ensino de Pós-GraduaçãoProfa. Dra. Flávia Maria de Barros Nogueira

Pró-Reitor de PesquisaProf. Dr. Paulo Teixeira de Souza Júnior

Pró-Reitora de Vivência Acadêmica e SocialProfª. MS. Marilda Esteves Calháo Matsubara

EDITORA UNIVERSITÁRIACoordenador

Prof. Dr. Hugo José Scheuer Werle

IMPRESSÃO: Gráfica Universitária/UFMTGerente: Pedro Brites Filho

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSOAv. Fernando Corrêa da Costa, s/nCampus Universitário – Coxipó da PonteCEP 78060-900 – Cuiabá – MTTel.: (0**65) 615-8322, Fax (0**65) 615-8325e-mail: [email protected]

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO

DiretoraJorcelina Elizabeth Fernandes

Curso de Mestrado e Doutorado em EducaçãoCoordenadorManoel Francisco de Vasconcelos Motta

Chefe do Departamento de Ensino e Organização e EscolarJurema Rosa Lopes

Chefe do Departamento de PsicologiaJosé Dirceu Cauduro

Chefe do Departamento de Teoria e Fundamentos da EducaçãoDarci Secchi

Coordenadora de Ensino de Graduação em Pedagogia (Campus Central)Angelina de Melo Vieira

Coordenador Pedagógico de Licenciaturas Parceladas (Interiorização)Genésio Marques

Coordenadora do Núcleo de Educação Aberta e a Distância (NEAD)Kátia Morosov Alonso

Chefe da Secretaria GeralManoel Messias de Souza

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Consultores ad hoc

Prof. Dr. Iván P. Santos VictoresUniversidad de Las Villas – Cuba

Profª Drª Maria Lúcia MüllerUFMT – Universidade Federal de Mato Grosso

Prof. Dr. Manoel F. Vasconcelos MottaUFMT – Universidade Federal de Mato Grosso

Profª Drª Maria Aparecida MorgadoUFMT – Universidade Federal de Mato Grosso

Prof. Walter GarciaABT – Associação Brasileira de Tecnologia

Educacional

Editora científica

Profª Drª Artemis TorresEducação, Poder e Cidadania

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Revista de Educação Pública

Publicação do Programa de Pós-Graduação em Educação daUniversidade Federal de Mato Grosso.

Cuiabá, Editora da UFMT, v. 11, n. 19, jan.-jun. 2002. 202p.

ISSN 0104-5962

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EditorNicanor Palhares Sá

Consultora EditorialMatilde A. Crudo (MTPS 10.784)

Editoração EletrônicaLedinei Gonçalo de Campos

Revisão técnica dos textos em espanholIván P. Santos Victores

Ilustração da capaAcrílica/tela – detalhe da obra “O desejo conquistado beira a cor de setembro”, da artista plástica Regina Pena.

Conselho editorial

Ana Antônia de Assis PETERSONUFMT - Cuiabá/MTBernadete A. GATTIFund. Carlos Chagas – São Paulo/SPCelso de Rui BEISIEGELUSP - São Paulo/SPChristian ANGLADEUniversity of Essex - InglaterraErmelinda M. De-Lamonica FREIREUFMT - Cuiabá/MTFlorestan FERNANDES(in memoriam)Francisco FERNÁNDEZ BUEYUniversitat Pompeu Fabra - EspanhaGermano GUARIM NETOUFMT - Cuiabá/MTJean HÉBETTEUFPA - Belém/PA Maria Inês Pagliarini COXUFMT - Cuiabá/MT

Maria de Lourdes BANDEIRAUFMT - Cuiabá/MTMartin COYUniv. Tübingen - AlemanhaMiguel Pedro Lorena de MORAESUFMT – Cuiabá/MTMoacir GADOTTIUSP - São Paulo/SPNicanor Palhares SÁUFMT - Cuiabá/MTPaolo NOSELLAUFSCar - São Paulo/SPPaulo SPELLERUFMT - Cuiabá/MTSérgio Roberto de PAULOUFMT - Cuiabá/MTWalter E. GARCIACNPq - Brasília/DF

Correspondência para envio de artigos, assinaturas e permutas:Nicanor Palhares SáEditor da Rev. de Educ. PúblicaInstituto de Educação/UFMTAv. Fernando Corrêa da Costa, s/n78060-900 - Cuiabá - Mato GrossoFax: (065) 615-8440E-mail: [email protected]: http//www.ufmt.br/revista/revista.html

Conta corrente para depósito:Banco do BrasilAgência: 3602-1Conta corrente: 170.500-8Depósito identificador: 15 40 45 1526 20 10 – 7Valor de número avulso: R$ 10,00Assinatura: R$ 20,00

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Sumário

Carta do Editor.......................................................................................9

Apresentação.........................................................................................11

Os autores.............................................................................................13

Artigos

Educação: tarefa da democracia...........................................................19Artemis Torres e Luiz Augusto Passos

Conferências

La cultura humanista en tiempos de la tecnociencia..............................31Francisco Fernández Buey

Educação e cidadania na América latina...............................................43

Miguel González Arroyo

La educación básica y la “cuestión social” contemporánea...................59Emilio Tenti Fanfani

Política e Educação...............................................................................79Maria do Carmo de Lacerda Peixoto

Mesas redondas

Educação popular: paradigmas e atoresEducação popular e diálogo intercultural ..............................................89

Ilse Scherer-Warren

Educação popular na América latina no novo milênio: impactosdo novo paradigma ...............................................................................97

Maria da Glória Gohn

A atualidade da educação popular.........................................................129

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Miguel González Arroyo

Rev. Educ. Pública, Cuiabá, v. 11, n. 19, jan.-jun. 2002.8

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Movimentos sociais e educaçãoMovimentos sociais e educação na era da informação..........................139

Ilse Scherer-Warren

Movimentos sociais e a construção da cidadania..................................147Maria da Glória Gohn

Los movimientos sociales en Europa.....................................................163Francisco Fernández Buey

Políticas públicas e educaçãoPolítica educativa: una responsabilidad estatal.....................................173

Emilio Tenti Fanfani

Política da educação superior................................................................185Maria do Carmo de Lacerda Peixoto

Documentos

Trinta anos de UFMT – memória. .........................................................195Gabriel Novis Neves

Informes da pesquisa e da pós-graduação

Dissertações defendidas (2002/1).........................................................201

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Carta do Editor

 

Este número da Revista de Educação Pública é uma ilustração de dois instrumentos de intercâmbio utilizados pelo Programa de Pós-Graduação em Educação – o Seminário Educação e a Revista.

O Seminário Educação é um evento científico anual, nacional, com participação razoavelmente massiva pela sua natureza, qual seja, a de veículo de socialização da produção científica entre educadores, em geral, pesquisadores, alunos e professores dos vários níveis de ensino. Temas nacionais e mundiais contemporâneos têm sido objeto de seus debates, além das inúmeras temáticas particulares dos Grupos de Trabalho.

A Revista de Educação Pública foi idealizada na mesma época do Mestrado, o qual era denominado, também, Mestrado em Educação Pública. Não teve apoio institucional, nesse início. Em 1989, fez-se um número experimental e, em 1992, começou-se o seu esforço de manutenção da periodicidade. Esta foi, com alguma irregularidade, praticamente milagrosa. Depois de prolongada crise dos últimos anos da UFMT e das universidades brasileiras, conseguiu-se um pequeno financiamento da FAPEMAT, que auxilia no pagamento de parte de seus custos.

Este é o quarto número temático da Revista e foi organizado com base nas contribuições de alguns convidados especiais do Seminário Educação. As sessões especiais do Seminário têm brindado cada vez mais os participantes com relevantes nomes nacionais e internacionais das ciências sociais e da educação.

A linha de pesquisa Movimentos Sociais, Política e Educação Popular, organizadora do evento, certamente, foi beneficiada pela densidade das reflexões realizadas naquela oportunidade, e, agora, pela publicação em papel, através deste número temático da Revista.

Nicanor Palhares Sá

Rev. Educ. Pública, Cuiabá, v. 11, n. 19, jan.-jun. 2002.10

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Apresentação

Este número temático da Revista de Educação Pública reúne textos de conferências e mesas redondas integrantes da programação do Seminário Educação 2000, que tive a honrosa tarefa de coordenar. O Evento é uma realização anual do Instituto de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação, na Universidade Federal de Mato Grosso. Naquele ano, o oitavo de sua existência, dispondo de know how suficiente para ousar vôos mais amplos, ele acabou assumindo definitivamente caráter nacional. Uma substantiva programação e a divulgação intensiva, inclusive, com a ajuda indispensável da internet, atraíram a Cuiabá 1.300 participantes de todos os cantos do País e, mesmo, alguns da Argentina, de Cuba e da Espanha.

A realização de um evento de tamanho porte somente foi possível porque conseguimos patrocínio do Governo de Estado, através da Secretaria de Estado de Educação (Seduc) e a Secretaria de Estado de Saúde (SES). Também a Fundação de Amparo à Pesquisa de Mato Grosso (Fapemat) e o Conselho de Desenvolvimento Centífico e Tecnológico (CNPq) responderam generosamente à nossa solicitação. Outras agências, governamentais, sindicais ou comerciais, dentro de suas possibilidades, colaboraram financeiramente ou emprestando o seu prestigioso apoio político: UNESCO; Secretaria Municipal de Educação (SME/Cuiabá); Livraria Janina; Secretaria de Estado de Turismo; – Associação de Docentes da UFMT/Seção Sindical (Adufmat); Água Mineral Natural Brunado; Água Mineral Lebrinha; Café Brasileiro; Café Quitada; De Rosso Cabeleireiros; Editora Paulus; Folha do Estado; Livraria Vogal; Livraria Vozes; Universal Turismo S/A; Viação Aérea Rio-Grandense S/A (Varig); Makro Atacadistas Ltda.

Da vasta programação do Seminário, conseguimos extrair a totalidade das conferências e algumas mesas redondas. Quando não foi possível conseguir os textos diretamente dos autores, buscamos recuperá-los através de transcrição, para o que contamos com a ajuda de Ivanildes Tavares Costa Ferreira e Rodney Mendes de Arruda, bolsistas de iniciação científica.

Por se tratar de um número especial, a formatação da Revista foi ligeiramente alterada para comportar a especificidade do material. Na seção de artigos, logo após um texto de caráter introdutório, produzido pelos organizadores, o leitor irá encontrar doze belos textos, distribuídos em duas

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grandes seções: Conferências e Mesas redondas. Há quatro textos correspondentes a todas as conferências do Evento e oito textos referentes a três mesas redondas. Tratam de um temário que se ocupa de educação popular, relação entre movimentos sociais e educação, e políticas públicas educacionais. Conseguimos também trazer para a seção de Documentos um depoimento singular e inédito do primeiro reitor da Universidade Federal de Mato Grosso, Gabriel Novis Neves, que fora apresentado no painel temático intitulado “Trinta anos de UFMT”, constante da programação do Seminário. Na última seção, reservada às notícias da Pós-Graduação, acham-se arroladas as seis dissertações defendidas no segundo semestre de 2001.

Trouxemos novamente o Biguá pantaneiro, diretamente da tela da artista plástica matogrossense Regina Penna, para ilustrar a capa e como motivo inspirador. Seu modo muito particular de buscar o alimento, mergulhando na profundidade do rio, lembra a busca intelectual, que necessita, para ser substantiva, do mergulho intenso e preciso. Ao mesmo tempo, também, da mesma forma como, na sequência do vôo, o biguá emerge das águas ligeiro e satisfeito com o alimento, a rotina da busca intelectual nos faz ou deveria fazer-nos emergir alimentados e saciados, tomando altura e distância suficientes para vislumbrarmos possibilidades de novos e generosos mergulhos.

Esperamos que o conteúdo desta Revista sirva para trazer à tona a idéia singela – e de possível realização – de que educação não é propriedade particular, mas o mais democrático dos bens que se pode oferecer às gerações futuras.

Artemis TorresSeminário Educação 2000

Coordenadora geral

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Os autores

Miguel González Arroyo – É professor titular da Universidade Federal de Minas Gerais. Graduado em Ciência Sociais e Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal de Minas Gerais. Realizou seu Doutorado em Educação na School of Education, em Stanford (USA), e Pós-doutorado na Universidade Complutense de Madri, Espanha. Pesquisador do CNPq, Secretário Adjunto de Educação da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte e Coordenador do Programa Escola Plural da Rede Municipal de Belo Horizonte. Possui muitos trabalhos publicados, inclusive, na qualidade de organizador: Da Escola carente à Escola possível (S. Paulo: Loyola); Revendo os vínculos entre educação e trabalho: elementos e materiais de formação humana (Artes Médicas); Educação: um balanço positivo para os setores populares, in: Tempo e Presença (São Paulo: CEDI); A formação, direito dos profissionais da Educação Escolar (FAE/Belo Horizonte); Subsídio para a prática educativa da supervisão educacional (Graal); A construção do conhecimento para o exercício da cidadania, Revista da CNTE; Fracasso-Sucesso: o peso da cultural escolar e do ordenamento da educação básica (Campinas: Papirus) e, recentemente, Ofício de mestre - imagens e auto-imagens (Petrópolis: Vozes).

Maria do Carmo de Lacerda Peixoto – Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Minas Gerais, Mestre em Sociologia pela Universidade de Brasília, e em Educação pela Fundação Getúlio Vargas/RJ. Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Membro do setor de planejamento da política de financiamento da Financiadora de Estudos e Projetos - FINEP (áreas Educação e Saúde), no período de 1974 a 1988. Coordenadora do GT Política da Educação Superior da ANPEd, entre 1998 e 2000. Foi professora colaboradora da Universidade de Brasília, lecionou em cursos de pós-graduação lato sensu no Rio de Janeiro e, desde 1995, é professora Adjunta da Universidade Federal de Minas Gerais, onde participa em vários colegiados e comissões acadêmicas. Sua produção bibliográfica inclui coletâneas, livro em co-autoria, capítulos de livros e muitos artigos, concentrando-se no campo temático das políticas públicas educacionais, em especial, da educação superior. Publicações mais recentes: Educação Básica e Profissional na UFMG, diagnóstico e perspectivas, em co-autoria (Imprensa Universitária da

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UFMG, 1999) e a coletânea Educação Superior: avaliação da produção científica (Imprensa Universitária da UFMG, 2000).

Maria da Glória Marcondes Gohn – Graduada em Ciências Sociais pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, professora titular de Educação na Unicamp. É Mestre em Sociologia e Doutora em Ciência Política pela USP. Realizou seu Pós-doutorado em Sociologia na New School for Social Research (USA) e Livre docência em História do Planejamento Urbano pela USP. Atua, no presente, no Grupo de Estudos sobre Movimentos Sociais, Educação e Cidadania (GEMDEC), na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Tem diversos livros e artigos publicados, entre os quais: A força da periferia, (Petrópolis: Vozes); Reivindicações populares urbanas (São Paulo: Cortez); três livros publicados pelas edições Loyola, respectivamente, Movimentos Sociais e Luta pela Moradia, História dos Movimentos e Lutas Sociais, e Teorias dos Movimentos Sociais. Recentemente, lançou pela Cortez três outros livros: Educação não-formal e cultural política, Movimentos Sociais e Educação e Os sem terra, ONGs e Cidadania. É membro, pesquisadora e consultora em diversas redes e grupos de âmbito internacional.

Luiz Augusto Passos – Licenciado em Filosofia (FASP) e Teologia (Cristo Rei/UNISINOS). Mestrado e Doutorado em Educação pela Universidade Federal de Mato Grosso. Doutorando em Educação e Currículo (PUC/SP). Pesquisador do Grupo de Pesquisa Movimentos Sociais e Educação (GPMSE) da UFMT. Docência, pesquisa e assessoria a organizações da Sociedade Civil, na perspectiva da Diversidade Étnico-cultural e Educação. Entre trabalhos recentemente publicados, todos em parceria com Michèle SATO, estão: “Biorregionalismo: identidade histórica e caminhos para a cidadania” in Educação Ambiental: repensando o espaço da cidadania. (Carlos B. LOUREIRO e Philippe LAYARGUES orgs.) São Paulo: Cortez, 2002; “Educação ambiental, o currículo nas sendas da Fenomenologia Merleaupontyana” In Sujets Choisis em Éducation Relative À L”Environnement: Dune Amérique à L’Autre (Lucie SAUVÉ, Isabel ORELLANA e Michèle SATO Dir.) Les Publication ERE-UQUAM: 2002 e “Estética da Carta da Terra: Pelo Prazer de (na Tensividade) Com-viver com a Diversidade”. In: Educação Ambiental Abordagens Múltiplas. (Aloísio Ruscheinsky e colaboradores) Porto Alegre: Artmed, 2002.

Ilse Scherer-Warren – Graduada em Ciências Sociais. Mestre em Sociologia Rural pela URGS. Doutora em Sociologia pela Universidade de Paris (França). Realizou seu Pós-doutorado em Sociologia na University of

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London (Londres/Inglaterra). Coordenadora do Programa de Pós-graduação em Sociologia Política na UFSC. Coordenadora, também, do Núcleo de Pesquisa em Movimentos Sociais (NPMS), na mesma universidade. Tem uma vasta publicação na área de movimentos sociais. Dentre os livros e artigos publicados se destacam: Redes de Movimentos Sociais (S. Paulo: Loyola); Organizações Voluntárias de Florianópolis: cadastro e perfil do associativismo civil (Insular, Florianópolis); Cidadania sem Fronteiras - ações coletivas na era da globalização (S. Paulo: Hucitec), Democratização em Florianópolis: destacando a memória dos movimentos sociais (Univali), e A Democratização Inacabável: as memórias do futuro (Petrópolis: Vozes). É membro, consultora e pesquisadora de diversas redes e grupos de pesquisa em âmbito internacional. Com destaque, a Consultoria ‘ad hoc’ ao CNPq e a CAPES.

Gabriel Novis Neves – Bacharéu em Medicina, com especialidade em Psicologia Médica e Obstetrícia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Exerceu diversos cargos públicos: Secretário de Educação (1968-1970); reitor da Universidade Federal de Mato Grosso (1971-1982) Secretário de Trabalho e Desenvolvimento Social do Governo do Estado de Mato Grosso (1983); Secretário Chefe da Casa Civil do Governo do Estado de Mato Grosso (1984); Secretário de Saúde do Governo do Estado de Mato Grosso (1984-1985). Atualmente, é membro do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso; Diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de Cuiabá (Unic). Ao longo de sua carreira como professor (desde 1967) e administrador, tem recebido várias homenagens. Entre elas, de Professor “Honoris Causa” da Universidade do Maranhão (1981); Diploma de Honra ao Mérito como Pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (INPA-CNPQ-1979); Medalha do Mérito Universitário UFMT (1995). Tem muitos trabalhos publicados, além de palestras, conferências, participações em congressos, seminários, simpósios na área de Saúde e Educação.

Francisco Fernández Buey – Licenciado e Doutor em Filosofia pela Universidade de Barcelona (Espanha). Catedrático de Filosofia Moral e Política na Universitat Pompeu Fabra, de Barcelona. Vice-decano dessa mesma Universidade, na qual já dirigiu o Departamento de Ciências Humanas e, também, o Instituto Universitário de Cultura. Foi colaborador do Prof. Dr. Manuel Sacristán (Barcelona) e do Prof. Dr. Valentino Gerratana (Istituto Gramsci/Roma) em estudos sobre Gramsci. Lecionou em El Salvador, Equador e, na Espanha, em Valladolid e Barcelona. Participou da investigação multidisciplinar de corte histórico-filosófico sobre o choque

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cultural na Europa no encontro com a cultura ameríndia no Século XVI. Titular da cátedra UNESCO - Universitat Pompeu Fabra em Estudos Interculturais, realiza fundamentação histórico-filosófica da crítica ao racismo, xenofobia e alterofobia. Entre os muitos títulos publicados destacam-se: A Barbárie: deles e dos nossos, Barcelona, Ideas y materiales para un programa ecosocialista, em colaboração com Jorge Riechmann. Marx (sin ismos), Barcelona. Ética y Filosofia Política, asuntos públicos controvertidos, Barcelona. Responsável na Espanha pelo Grupo de Pesquisa sobre Socialismo e Democracia, do Departamento de Sociologia de Nova York (EUA).

Emílio Tenti Fanfani – Licenciado em Ciência Políticas e Sociais pela Universidad Nacional de Cuyo, obteve o Diploma de Superior de Estudos e de Pesquisas Políticas na Fondation Nationale des Sciences Politiques de Paris (França). É Pesquisador Independente do CONICET e professor titular por concurso na Faculdade de Ciências Sociais da UBA. Foi docente e pesquisador em diversas Universidades na Colômbia, México, França e Argentina, países em que tem muitos artigos publicados em revistas científicas. Dentre os mais divulgados estão: El arte del buen maestro (Pax, México); Una escuela para los adolescentes (Losada: Buenos Aires); La escuela vacia. Deberes del Estado y responsabilidades de la sociedad. (Losada: Buenos Aires). La Argentina de los jóvenes (Losada: Buenos Aires). Estado y Pobreza em La Argentina. Estrategias típicas de intervención. (CEAL: Buenos Aires, 2 volumes); Estado democrático y política social, em colab. (Eudeba: Buenos Aires); El estado Benefactor. Um paradigma em crises (Miño D´Ávila Editores, Buenos Aires). Universidad y empresa, como organizador (Miño D´Ávila, Buenos Aires, 1993).

Artemis Torres – Licenciada em Filosofia pela Universidade Santa Úrsula. Mestre em Planejamento Educacional pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Doutora em Ciências da Educação pela Universitat Autònoma de Barcelona. Coordenadora da Linha de Pesquisa Movimentos Sociais, Política e Educação Popular, no Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Federal de Mato Grosso. Coordenadora do Grupo de Pesquisa Movimentos Sociais e Educação (GPMSE), da UFMT. A sua produção acadêmica, na UFMT, desde 1973, inclui, além das atividades de docência e pesquisa, também a assessoria técnica a grupos de estudo e a organizações civis. Entre as principais publicações encontram-se a coletânea Mato Grosso em Movimentos: ensaios de educação popular (Cuiabá: EdUFMT, 1994), da qual foi

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organizadora e uma das autoras; Diretores de escola: o desacerto com a democracia (IN: Em Aberto, v. 17, n. 72, Brasília, DF, 2000), em co-autoria, e Compromisso com a gestão democrática precisa de fundamentos (IN: Gestão em Rede, n. 10, p. 13-16, 1998).

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Educação: tarefa da democracia

Artemis TorresLuiz Augusto Passos

RESUMO: A centralidade da relação entre educação, poder e cidadania é o argumento na evocação da necessidade do diálogo entre Estado e sociedade civil e na convocação de todas as redes públicas, estatais ou não, para a urgente tarefa educativa de reconstrução social, com base em novos valores. Parece ser este o momento certo e estratégico de revisão do projeto societário com que um grupo minoritário da sociedade justifica sua violência material e simbólica contra o restante da humanidade. A educação tem algo a dizer, como instrumento de autocrítica e de formação de novas mentalidades e a essa tarefa precisam acorrer todos os interessados e convencidos da sua possibilidade e necessidade.

Palavras-chave: relações de poder; políticas públicas e democracia; movimentos sociais e educação.

RESUMEN: La centralidad de la relación entre educación, poder y ciudadanía es el argumento en la evocación de todas las redes públicas, estatales o no, para la urgente tarea educativa de reconstrucción social, basada en nuevos valores. Este parece ser el momento cierto y estratégico de revisión del proyecto societario con el que un grupo minoritario de la sociedad justifica su violencia material y simbólica contra el resto de la humanidad. La educación tiene algo a decir, como instrumento de autocrítica y de formación de nuevas mentalidades y a esa tarea precisan acudir todos los interesados y convencidos de su posibilidad y necesidad.

Palabras-clave: relaciones de poder; políticas públicas y democracia; movimientos sociales y educación.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 11 n. 19 jan.-jun. 2002. p. 19-29

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O Seminário Educação 2000 propôs como tema central o trinômio “Educação-Poder-Cidadania”, entendendo que esses conceitos e seu entrelaçamento fossem suficientemente capazes de representar os eixos decisivos do inadiável diálogo entre sociedade civil e Estado. O milênio que se insinuava, embora promissor, não nos privava da consciência de que essa transição, ainda que significativa, não produziria por si só milagres no planeta. Qualquer mudança qualitativa na esfera sócio-política e ambiental teria que ser protagonizada pelos setores sociais excluídos. O poder concentrado nas mãos de um grupo seletivo, que se apropriara dos Estados, em escala planetária, e manipulava a economia com táticas e estratégias projetadas para longo prazo, continuaria jogando na exclusão países inteiros, vidas, setores empobrecidos, grupos segregados dentro, inclusive, dos próprios países capitalistas centrais, afastados de qualquer decisão sobre seus destinos.

Reconhecemos a urgente necessidade da (re)construção do poder, e de um poder popular, através do fortalecimento dos movimentos sociais, das organizações não governamentais, das pastorais, dos sindicatos, dos movimentos ecológicos e de grupos étnico-raciais. Enfim, de todos os que, organizados ou buscando organizar-se em grandes redes, têm protagonizado ações contra-hegemônicas à violência do Capital e de suas formas supra-estatais e estatais, freqüentemente divorciadas da sociedade. Pulverizadamente, materializando-se em grandes encontros mundiais, entre eles o Fórum Social Mundial, há expressões extremamente ativas e promissoras de pessoas, grupos, organizações de distintos segmentos da sociedade que repensam de forma concentrada e convergente ações coletivas e cotidianas capazes de produzir nova atmosfera de valores ético-políticos e de projetar novos formatos societários.

A íntima relação entre educação, poder e cidadania, como eixo central dos debates, exige a retomada do sentido da educação como locus da construção e reconstrução da humanidade. E, ao pensar educação, pensa-se nas redes públicas – estatais ou não – que chegam a uma grande maioria de brasileiros, através do trabalho de educadores e mestres, no ofício de formar sobretudo crianças e jovens. Ela, a escola, é o núcleo intencionado da Paidéia! Mas, no Seminário Educação 2000, foram também debatidas outras formas educacionais que se desenvolvem em outros espaços, que não os escolares, onde trabalhadores organizados em sindicatos, movimentos sociais diversos – ecológicos, étnico-raciais, de opções sexuais, de gênero etc. – têm aprofundado a reflexão e a prática de

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Educação: tarefa da democracia

relações sociais capazes de apontar alternativas de convivência e de humanidade.

No transcurso deste novo e crítico tempo, a educação requer a participação de todos que queiram repensa-la e recria-la. Assim, estão incluídos como protagonistas todos os movimentos de criatividade, dinamização e impulsionamento orientados para o “empoderamento” dos que são sistematicamente excluídos das grandes decisões econômico-sócio-culturais da sociedade humana.

Chegamos a um momento muito particular que não somente requer um trabalho analítico-crítico, mas a proposição de formas de organização conseqüentes, que possam estabelecer uma interlocução da sociedade civil com o Estado. Uma interlocução que assegure equilíbrio de forças, em contraposição à forma agressiva e autista como se comporta o Estado, no Brasil. Trata-se, enfim, de criar oportunidade para nos indignarmos com nossas obsoletas práticas e nossa histórica insistência em aplicar ao campo do humano e do social os mesmos padrões positivistas de ciência, ignorando a sua complexidade, fatiando-lhe a realidade e, assim, desperdiçando toda a sua força vital.

As políticas estatais, as relações pedagógicas intencionais no dia a dia da escola se encontram cheias de exemplos dos desastres que somos capazes de provocar em nome da educação. Tenti Fanfani1 nos indica a urgente necessidade de revermos nossas concepções de escola e prática educativa:

La mejor pedagogía de la democracia es una escuela efectivamente democrática, donde los niños no sólo aprenden conceptos sino que viven experiencias, es decir, votan, toman decisiones en conjunto, se hacen responsables de las consecuencias de las decisiones que toman, argumentan, debaten, evalúan, controlan, etc. [p. 74]

Sublinha Fanfani que o pretenso discurso científico é demasiado ‘educacionista’, incapaz de envolver-se nos grandes debates das ciências humanas. Por isso, a estreiteza vigente nas práticas e relações desenvolvidas na escola, incapaz de conectar-se com as grandes transformações e dimensões novas da vida social.

A educação não é produto acabado, como comida de passarinho, pronta para ser deglutida. Ao contrário, pressupõe industriosidade pessoal 1 Com raras exceções, as citações foram extraídas de conferências e mesas redondas divulgadas nesta revista. Assim sendo, ao final da citação, apenas remeteremos o leitor à página.

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em conexão com formas simbólico-culturais coletivas, em relações a serem construídas no conflituoso diálogo com todas as dimensões da vida social. Nesse sentido, Tenti Fanfani conclama ao entendimento da educação como um quefazer no diálogo, no compartilhamento de diferentes setores e instâncias da vida que, ao final das contas, constituem o mundo no qual está instalado o sujeito da aprendizagem:

Uno no compra educación como compra un par de zapatos. La educación de los niños, al igual que su salud, no se compra "hecha". En las sociedades actuales es una tarea compartida entre el propio niño, la familia, la escuela, los medios de comunicación y los otros ámbitos de la vida social tales como la iglesia, la calle, los amigos, el club, etc. [p. 71]

Para entender as dificuldades suscitadas por esta conclamação, é necessário recordar a história da formação de nossa cultura política. A sociedade brasileira, antes mesmo da consciência de apropriação de um território comum que nos inter-relacionasse, antes de projetarmos uma história construída coletivamente numa direção própria, e antes que processos simbólico-culturais emersos da luta coletiva pela subsistência e afirmação da identidade nacional nos implicassem a todos, foi-nos impingida a condição de súditos do Estado português. Tal anterioridade de um Estado à construção da idéia de nacionalidade não interrompeu aí os seus estragos. Houve sucessivos golpes desse mesmo Estado e de suas elites, toda vez que o movimento civil popular autóctone se levantou afirmativamente, sendo esmagado na Rusga, em Palmares, em Canudos, em Cabanas, em Contestado, sem que as questões populares tivessem representação face às oligarquias. Nossa história oficial tem sido uma história da violência, da suspensão da normalidade constitucional, toda vez que setores democráticos têm proposto alternativas de poder.

O divórcio, sacramentado a ferro e fogo, entre Estado e sociedade civil, no Brasil, tem permitido um poder discricionário, parcial, arbitrário e tantas vezes antinacionalista, em conluio com formas de refreamento da economia nacional e da identidade política, de favorecimento de interesses da política econômica internacional, em detrimento dos interesses dos brasileiros. Em momentos em que a sociedade civil, como nação, chamava a si o controle do Estado e das políticas públicas, reeditaram-se alianças espúrias entre setores dominantes, no sentido de seqüestrar à sociedade nacional brasileira sua representação nos processos decisórios. Coronelismos, cartorialismos, patrimonialismos, formas de privatização do público têm criado uma tradição não apenas em espaços limitados da sociedade, mas inclusive nas instituições educacionais.

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Ilse Scherer-Warren explicita muito bem: A tradição da cultura política brasileira, predominantemente autoritária e elitista, cria enorme dificuldade para o reconhecimento dos movimentos sociais. [...] A própria mídia e o sistema político preferem tratar os movimentos, normalmente, como caso de polícia. [...] No Brasil, de fato, [a cidadania] ainda é muito frágil, e o abuso da violência do poder público contra o cidadão é a prova disto. [p. 143]

À privatização das decisões sobre os destinos da nação, legitimada por processos eleitorais, conselhos, comissões, partidos, parlamentos e outras formas indiretas de representação – sistema este em crise –, observa-se um crescente movimento de instituição e execução conseqüente de políticas públicas que atendem ao desafiador compromisso legal e moral com a transparência. Sobretudo, uma nova tarefa tem sido conferida à educação deste novo século, uma educação para a vida. Uma educação capaz de substituir a “´cultura do lucro´ existente [...] pela cultura do ser humano pleno, com direito à vida, sociedade com ética e respeito aos direitos humanos fundamentais.” (Gohn, p. 154)

Reconhecendo que a democracia plena continua e continuará sendo um ideal, temos de recuperar de alguma forma o que nos foi ensinado pela democracia ateniense, uma democracia direta, das ruas, das praças. Sair de uma democracia da baixa intensidade para uma democracia de alta intensidade. É preciso banir decididamente a ilusão de que a democracia liberal constitua o mais elevado nível de democracia real que a humanidade possa atingir. Francisco Fernández Buey nos convoca a vôos mais transgressivos. Diz ele:

“Lo que conviene es volver a preguntarse por la posibilidad de complementar democracia representativa y democracia directa también en las sociedades avanzadas y complejas del fin del siglo XX. La tradición republicana en teoría política se ha hecho siempre esta pregunta. La tradición socialista también. Y esa es ahora la pregunta de la que suele partir una teoría radical de la democracia.”2

Não é mais possível delegar a cidadania, de cada um e de cada uma, a setores que, uma vez eleitos, efetivamente representam a si, pessoalmente, ou a interesses de grupos particulares que seduzem, compram e corrompem estas formas de representação. Os processos institucionalizados legais, como os eleitorais, sejam para os cargos majoritários da nação, sejam para diretores de escolas, mostram-se

2 Francisco Fernández Buey, Ética y filosofía política. [Barcelona: Bellaterra, 2000], p. 259.

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incapazes de, por si sós, mudar o panorama da sociedade brasileira, não raro reproduzindo a grande farsa travestida pelo marketing dos que podem mais. É inútil, imaginar que a educação ou a escola, sozinhas, possam realizar a grande tarefa de transformação da sociedade; mais ainda, que possam construir a aberração de uma nação cidadã sem a sociedade. Nem os movimentos sociais, sozinhos, o farão. Tenti Fanfani reflete sobre a necessidade de transformar de alguma maneira a própria necessidade de educação em demanda, por parte dos que, tradicionalmente, têm-se mantido à margem da escola, dela não se dando conta como um direito.

“Es preciso movilizar la sociedad y las poblaciones deben ser, dejar de ser simples receptores pasivos de servicios educativos. Es preciso movilizar la sociedad acerca de la calidad, de la magnitud del problema educativo. Si las familias no perciben su propia situación como insatisfactoria y se conforman con que el niño solamente entre en la escuela, encuentre un banco y pase de grado, no va a haber calidad de la educación. [p. 178-79]

O grande sonho da modernidade ilustrada foi o de se estabelecer um pacto entre Estado e cidadão, outorgando-se ao primeiro a administração presumidamente isenta e não arbitrária dos conflitos da sociedade civil, de sorte a democratizar vida, bens e recursos que garantissem felicidade para cada indivíduo e para todos os cidadãos. Em certo sentido, os próprios ilustrados reconheceram a seu modo a grande utopia e frustração de suas teses radicais acerca dos “déspotas esclarecidos”: a de que governariam – analogicamente como os filósofos reis de Platão – com justiça, sabedoria e equidade; e que, na prática, acabaram por ceder aos particularismos, aos interesses de privilegiados e à solução de força no exercício do poder. Bem por isso, o Estado capitalista acabou recebendo de Marx outra caracterização, tão bem expressa por um folheto de comunicação do Centro de Audiovisual da diocese de Teixeira de Freitas da Bahia, que assim resume: “O Estado é o juiz de briga entre pobres e ricos, só que o juiz é comprado!...”.

Uma avaliação das políticas públicas oferece um quadro preocupante do estado lastimável a que foram sendo conduzidas, em decorrência da subserviência do Estado às grandes decisões internacionais. Na contramão dos interesses da infância, dos trabalhadores de ensino, dos pesquisadores, tem havido um desmantelamento sistemático da universidade brasileira pelo Estado, no Brasil, com impacto na educação básica, especialmente de jovens e de adultos (EJA), por subserviência às políticas afinadas com o Consenso de Washington, cujos eixos têm sido a redução dos gastos públicos, a integração com a economia mundial, a

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desregulamentação dos mercados domésticos e a privatização das empresas e serviços públicos. Maria do Carmo de Lacerda Peixoto afirma que uma das leituras de conjuntura internacional

[...] refere-se à existência de uma cultura educacional mundial comum, veiculada através de organizações internacionais (OCDE, UNESCO, Banco Mundial), que determinam o desenvolvimento dos sistemas educativos e as orientações curriculares dos Estados-nação. O segundo refere-se à existência de uma agenda globalmente estruturada para a educação, que leva à imposição de prioridades por parte de alguns Estados sobre outros [p. 85].

Houve uma retração significativa do Estado, afirma ainda Peixoto, por seu desmonte, que implicou também num espaço importante de reconquista e afirmação da cidadania. É neste sentido que se avançou no que tange às políticas públicas dos grupos ambientalistas, feministas, reivindicações de grupos ligados a AIDS, no Brasil. E o debate público tem massificado uma opinião da sociedade civil e de grupos interessados, fazendo-os avançar democraticamente, fazendo-os construir no debate e na ação conjunta, em ações e representação cidadã. Se, contudo, a política educacional articula uma educação voltada a um modelo político que se quer implantar ou se acha em curso, agressivo aos interesses da maioria da população, há espaços permeáveis à pressão para se assegurarem conquistas sociais.

Novos atores, movimentos sociais, redes têm implementado ações decisivas para a cidadania. Maria do Carmo de Lacerda Peixoto sugere, em concordância com Boaventura de Souza Santos, que, num momento de transição em que os Estados perdem o monopólio regulatório, num processo de globalização de baixa-intensidade, há possibilidades de se traçarem políticas educacionais que priorizem a cidadania ativa. Tenti Fanfani fala da perspectiva de construção de um novo pacto entre as estruturas educacionais e os setores organizados da sociedade civil:

Después de movilizar la sociedad, hay que promover un pacto educativo nacional con los grandes actores políticos y sociales. Partidos políticos, sindicatos, iglesia, todos los grupos sociales organizados que, de alguna manera, tienen interés, en el sentido amplio de la palabra, interés en las cuestiones de la educación básica [p. 179].

Nesse panorama é que os nossos sonhos educacionais só poderão deixar de ser pura utopia e ‘paixão inútil’ – parafraseando Sartre –, se forem capazes de, organizadamente e “empoderados”, mexerem na estrutura de poder vigente. Mais do que reeditar velhas utopias e pautas onde estas intervenções sejam pensadas por atacado e em nível macro, há que se

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implementar práticas cotidianas esteadas no cuidado com o local, o regional e o planetário. Cidadania se dá na luta cotidiana dos movimentos sociais e organizações civis. A escola preparadora do cidadão é o próprio embate, gerando ações contra-culturais que se oponham à pretensa naturalidade dos (des)valores que circulam na sociedade, como se fossem cestas básicas adquiridas em supermercados, para pic-nics nos fins de semana.

É inútil insistir na mera denúncia do divórcio entre sociedade civil e Estado, sem reconhecer que há muito a fazer e a construir. Há papéis complementares e importantes entre essas instâncias sociais, inclusive, na redefinição do papel do próprio Estado. Talvez fosse possível construir caminhos para a sociedade civil em clivagem aberta, em poder paralelo ao Estado. Contudo, nem sua abrangência, nem a garantia de eficácia dariam conta de atingir o conjunto de homens e mulheres que, por direito, deveriam ter assegurado o seu acesso às condições fundamentais de sobrevivência, lastro fundante da própria cidadania. Não é possível continuar pensando que nada possa ser feito com o Estado, ou que tudo deva ser feito contra ele. Wittgenstein lembrava com oportunidade que, se tudo no mundo é relativo, o homem é por sua vez o limite do mundo. Há, isso sim, que redefinir que papel caberá, nesta conjuntura, ao Estado. Sabendo-se que isso recriará pela luta no cotidiano e nas organizações, num efeito bumerangue, a sociedade civil e toda a humanidade, sem termos previamente a maquete do que daí emergirá. É, contudo, na luta direta, em atividades concretas, que a educação adquirirá o significado que queremos, para a infância que necessitamos (Arroyo), que já é ter ou – em grande parte – gestar nossa própria humanidade. Não se dissociam pensamento e ação, processo e projeto, existência pessoal e engajamento político. Acertadamente, Paulo Freire insistia que toda educação é política.

Qualquer política pública concebida por um Estado autoritário converter-se-á a curto ou longo prazo em arma mortífera contra a sociedade civil. Democracia se constrói na convivência, na participação, na própria ação. Por isso, as suas grandes ferramentas são os movimentos sociais organizados, de rua e as redes virtuais livres; as organizações dos trabalhadores, os espaços de construção cultural, as cooperativas, as associações livres, os partidos populares, as organizações de setores sistematicamente excluídos por razões étnico-raciais, de gênero, de porte de deficiências, de opções sexuais etc., não incluídas nos padrões hegemônicos.

A educação é por sua natureza o laboratório de ensaio de novas formas de ser e de nos relacionar com o mundo, com outros, outras e

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conosco mesmos. A educação é o lugar dos processos de transformação, daí ela ser chamada a dar sua contribuição onde a humanidade está subsumida, ausente, deformada, combalida, sobretudo entre os mais jovens. A academia tem por isso uma tarefa importante, ainda que certo academicismo tenha se mostrado muitas vezes alheio ao confronto cotidiano, na luta direta pela democratização da própria educação. Arroyo esboça a história da pedagogia brasileira mostrando que o movimento sindical docente foi além das propostas acadêmico-críticas. De acordo com ele, o nosso sindicalismo foi mais fundo do que a pedagogia dos estudos sociais e dos conteúdos críticos, que passou de uma escola excludente a uma escola criticamente excludente, sem mexer no essencial. Contudo, o sindicalismo acabou por lutar com mais radicalidade do que nós, na Academia. Com os PCNs,3 volta-se a um criticismo, mas não a uma cidadania crítica! Esse, o dilema [cf. p. 51].

A Educação, por sua natureza, tem um caráter criativo e de intervenção no sentido de produzir as humanidades de que se necessita socialmente. Trata-se de encontro entre as gerações, de paidéia no sentido grego, de garantir nossa continuidade por um ciclo que se alimenta de elos entre as experiências dos mais velhos com aqueles que precisam aprender a caminhar na liberdade. A educação quer a continuidade social, não apenas no sentido de reprodução física e mimética da cultura estandardizada que aí está, mas de uma nova síntese pessoal e particular do sujeito no “viver construindo” essa nova humanidade, em conexão com tudo e todos. Num sentido político, precisamente. Educação, por isso mesmo, é um processo aberto, um apelo à liberdade e à inovação, numa perspectiva da universalidade assentada no concreto, no empírico. O que é vivo e não se renova perece. Contudo, o que se vê implementado pelos processos que regulam e institucionalizam as grandes redes de escolarização de nossos países não está comprometido com a criação e renovação das humanidades, mas com o seu contrário, sua mumificação e esclerosamento.

Esta feitura, artesania do humano, hoje, tem se transferido para a ótica perversa da reprodução das desigualdades sociais. Está em curso – sob a égide do capital, da sua idolatria – o processo de ampliação do poder

3 Parâmetros Curriculares Nacionais são uma iniciativa do Ministério de Educação e Cultura, que propõe para a educação básica a fixação de conteúdos mínimos de pretensa validade para todo o território nacional.

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do Capital e do Mercado, às custas do sacrifício da humanidade. Como conseqüência, também se ampliam as relações reificadas do homem com sua produção. Trata-se já da desconstrução física e simbólica da arte e da cultura, da ética e do sentido, para que triunfe uma certa monstruosidade: uma humanidade de grandes possibilidades tecnológicas, de conhecimento, de “tecnociência”, de recursos econômicos, mas corroída ética e cordialmente por dentro de sua própria humanidade.

Na atual sociedade em crise de paradigmas, não apenas os movimentos sociais estão em crise de autodefinição, mas esta crise também impacta os Estados, que, em suas diversas roupagens, por pressões dos países capitalistas centrais e por pressões das sociedades civis, são obrigados a repensar seus papéis. Sindicatos, partidos, redes de movimentos sociais, de maneira nova, começam a apresentar os resultados da ação de uma nova consciência. Novas práticas cotidianas penetram o tecido social e modificam estruturalmente as relações, com valores novos, o de gênero, o ecológico, o político participativo, o de debate público e aquilo que Scherer-Warren tem chamado de ‘vigília cidadã’.

São chamadas ao debate todas as práticas educativas, imersas nas lutas sociais, nas lutas dos educadores, nas lutas de construção da identidade nacional, no Brasil. Luta de longa duração, mas não por isso perdida. O sonho de uma educação capaz de participar do esforço coletivo de produção de uma sociedade de homens e mulheres humanizados faz parte de um conjunto de ideais que não só precisam ser postulados como postos à prova. É importante o sonho provocativo de tecer relações na perspectiva da convivência feliz. Ela contudo resultará do entretecimento pessoal e coletivo de relações abertas, em que as diversidades e as singularidades da cada um/a se expressem e se enriqueçam em movimento social organizado e estejam referenciadas a valores reguladores construídos no diálogo de tudo com todos, favorecendo uma vivência da complexidade e da tensividade criativa, compreensiva e solidária.

A humanidade atingiu o limite de sua capacidade de suportar os grilhões da mera ilustração como recurso humanizador. Não basta a cultura científica, ainda que esta seja “un elemento sustancial de cualquier concepto renovado de ciudadanía” (Fernández Buey, p. 34). Ela deve produzir novos valores, novas éticas de convivencia. Sente-se desafiada a inventar. Há indícios dessa espécie de febre inventiva nas formas renovadas de organização coletiva, nos espaços da familia, das instituições, da cidade, da sociedade globalizada. Este é o momento da esperança.

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Conferência

La cultura humanista en tiempos de la tecnociencia1

Francisco Fernández Buey

RESUMO: A tecnociência, fusão da ciência básica ou aplicada com o poder econômico, rompe os paradigmas clássicos da ciência moderna. Mediante experimentos, gera produtos estáveis, com impactos imediatos sobre as questões ecológicas, gnoseológicas, políticas e morais. Aniquilam-se os interstícios de tempo entre a criação, teste, aplicação tecnológica e constituição de um produto. A solidão/isolamento do tecnocientista e do filósofo ou humanista tornam impossível se pronunciarem, com peso, nas implicações sociopolíticas e socioéticas e de cidadania ativa. Aponta-se um diálogo interdisciplinar, no qual a ciência reflita deontológica e politicamente sobre as suas produções e o humanismo renuncie à metafísica abstrata, sem perder contato com as duras e reais condições da vida.

Palavras-chave: tecnociência e deontologia; interdisciplinaridade e educação; filosofia da tecnociência.

RESÚMEN: La tecnociencia, fusión de la ciencia básica o aplicada con el poder económico, rompe los paradigmas clásicos de la ciencia moderna. Engendrados de los experimentos, surgen productos estables, con impactos inmediatos sobre las cuestiones ecológicas, gnoseológicas, políticas y morales. Se aniquilan los espacios de tiempo entre la creación, el test y la aplicación tecnológica y constitución de un producto. La soledad/aislamiento del tecnocientista y del filósofo o humanista resultan en la imposibilidad de intervenir razonablemente en las implicaciones sociopolíticas, socioéticas y de la ciudadanía activa. Se apunta un diálogo interdisciplinario en el que la ciencia reflexione deontológica y políticamente acerca de sus producciones y el humanismo renuncie a la metafísica abstracta, sin perder contacto con las duras y reales condiciones de la vida.

Palabras-clave: tecnociencia y deontología; interdisciplinariedad y educación; filosofía de la tecnociencia.

1 Conferência proferida em 20 de novembro, no Seminário Educação 2000, promovido pelo Instituto de Educação e pelo Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Federal de Mato Grosso.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 11 n. 19 jan.-jun. 2002. p. 31-41

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La cultura humanista em tiempos de la tecnociencia

La consolidación de la tecnociencia en la época de la globalización es el dato básico de partida a la hora de buscar un punto de vista adecuado sobre educación, poder y ciudadanía en este cambio de siglo y de milenio.

El concepto de tecnociencia expresa la fusión o integración de ciencia básica y ciencia aplicada (o aplicaciones tecnológicas de la ciencia) con el poder económico (industrial y postindustrial) en nuestras sociedades. La manifestación más conocida del vínculo entre ciencia y tecnología es lo que hoy llamamos biotecnología e ingeniería genética. Y la expresión más evidente de la existencia de un vínculo fuerte entre tecnociencia, poder político e industria es lo que ha ocurrido recientemente con el programa “Genoma Humano”, en cuya investigación competitiva concurrieron intereses propiamente tecnocientíficos e intereses económico-industriales tanto públicos como privados.

La mera existencia del complejo científico-técnico significa ya un cambio de función en lo que había sido la ciencia moderna que nace en Europa con Copérnico, Galileo y Newton.

Este cambio de función es relevante tanto desde el punto de vista metodológico como para la consideración ético-política. Y lo es por tres razones. Primera: porque en la tecnociencia se reduce al mínimo el lapso o decurso de tiempo entre descubrimiento científico y aplicaciones prácticas o tecnológicas. Segunda: porque, al reducirse ese lapso de tiempo, en la tecnociencia se hace problemático uno de los principios modernos del conocimiento científico, el de proceder por ensayo y error. Y tercera: porque el vínculo entre tecnociencia y poder económico-industrial convierte el saber en una actividad cada vez más dependiente del poder, con lo que se hace problemática la aspiración ideal a la objetividad y a la neutralidad del conocimiento científico. También por eso en los últimos tiempos el debate contemporáneo sobre la estructura y el método de la ciencia ha ido dejando paso, en las universidades y fuera de ellas, a la controversia sobre la orientación de las políticas tecnocientíficas de los estados y de las grandes empresas transnacionales.

El cambio de función de la tecnociencia contemporánea ha avivado la polémica sobre qué deben ser las humanidades y qué importancia deben de tener en la enseñanza secundaria y universitaria. En general, los profesores de lenguas clásicas, los profesores de filosofía y, en menor medida, los historiadores se han quejado amargamente de la degradación de la enseñanza reglada o institucionalizada de las humanidades así como de la escasa atención que se presta actualmente a las humanidades en los planes de estudio.

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Conferência

Pero también algunos científicos sensibles (biólogos, genetistas, ecólogos, físicos) se quejan de la escasa atención prestada a las humanidades en las carreras científicas. Hay varios ejemplos de grupos de científicos que en los últimos tiempos se han declarado a favor de la ciencia con conciencia humanística y que postulan hoy la necesidad de abrir la puerta a las humanidades en las carreras científicas. Esto es un síntoma, en mi opinión, interesante, de que al menos una parte de la comunidad científica siente ahora que el diálogo con los humanistas es un déficit en nuestro sistema de enseñanza y que este déficit ha de paliarse.

Aún así, en el debate público que actualmente se desarrolla acerca de las implicaciones éticas, jurídicas, sociales y políticas de la biotecnología y de la ingeniería genética, científicos e ingenieros, de un lado, y filósofos y humanistas, de otro, se hallan cada vez más enfrentados en torno a las limitaciones, moratorias y controles que la sociedad debería establecer respecto de determinadas investigaciones en curso, señaladamente en lo que se refiere a las patentes comerciales de seres vivos, a la producción de determinados alimentos transgénicos y a la clonación. Se puede decir a este respecto que la situación ha cambiado muy sensiblemente desde que en 1975 la Conferencia de Asilomar estableció una línea de prudencia en la investigación genética con seres vivos. Hoy en día la exigencia de moratorias en determinados campos de la investigación se ha hecho minoritaria en la comunidad científica por lo que, a medida que iban conociéndose los progresos realizados en el campo de la biotecnología, las voces más preocupadas por las consecuencias se han alzado entre filósofos, teólogos, literatos y representantes de las diferentes religiones.

El debate actual obliga a las personas razonables que entran en él a estar suficientemente informadas sobre los resultados de algunas de las investigaciones tecnocientíficas recientes. Algo parecido ocurre en otras controversias públicas que estarán en la mente de todos: sobre el aborto, sobre la eutanasia, sobre la licitud de determinados tipos de transplantes, sobre el uso de la energía nuclear para la producción de electricidad, sobre la persistencia del racismo y de la xenofobia mientras los científicos abandonan el concepto de raza, sobre la crisis ecológica y sobre la mejor manera de relacionarnos armónicamente con la naturaleza.

Mi tesis es que hoy en día no hay posibilidad de intervención razonable en el debate público sobre la mayoría de las cuestiones con implicaciones sociopolíticas y socioéticas de importancia sin cultura científica. Esto se debe a que la ciencia es ya parte sustancial de nuestra cultura general, tanto en Occidente como en Oriente, tanto en el Norte como

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La cultura humanista em tiempos de la tecnociencia

en el Sur. La mayoría de las cuestiones públicas, ético-políticas, hoy relevantes suponen o requieren cierto conocimiento del estado de la cuestión de una o de varias ciencias naturales (biología, genética, ecología, física del núcleo atómico, termodinámica, etc.). Y renunciar ahora a la cultura científica equivaldría, creo, a renunciar al sentido noble, griego, aristotélico, de la política, que es característica del zoon politikon, y que puede definirse como participación activa de la ciudadanía en los asuntos de la ciudad socialmente organizada (en un sentido amplio: de la comunidad o del estado). Cultura científica es un elemento sustancial de cualquier concepto renovado de ciudadanía.

Este reconocimiento ha de tener una implicación para las políticas educativas. A saber: si las universidades quieren propiciar la discusión pública racional sobre los grandes temas socioculturales y ético-políticos controvertidos (en sociedades en las cuales el complejo tecnocientifico ha pasado a tener un peso primordial) los humanistas y hombres de letras que se forman en ellas necesitan cultura científica para superar actitudes solo reactivas o unilaterales, basadas por lo general exclusivamente en tradiciones literarias o en las humanidades clásicas. Pero también los científicos necesitan hoy formación humanística (histórico-filosófica, deontológica, etc.) para superar el cientificismo y la fragmentación del saber que produce el especialismo.

Querría explicitar ahora un poco más este punto de vista. En la época contemporánea se ha ido llegando a la conclusión de que la ciencia, que es lo mejor que tenemos en el plano cognoscitivo, es al mismo tiempo (por su progresiva fusión con la tecnología) lo más peligroso que el hombre mismo ha creado en relación con sus costumbres y su moralidad. Esta fue ya la opinión de Albert Einstein (que además de físico y matemático era un ciudadano responsable) y de Bertrand Russell (que además de ser uno de los padres fundadores de la lógica formal contemporánea fue un filósofo moral).

Hoy sabemos bien que el principal peligro para la especie de la que formamos parte no se deriva tanto de la mala ciencia o de la falsa ciencia cuanto de la buena ciencia, de la mejor ciencia desde el punto de vista cognoscitivo o epistemológico. Lo ocurrido en Europa entre 1930 y 1950 es suficientemente revelador en este aspecto. Precisamente porque ciencia es saber en serio, ciencia es poder entre humanos y, por derivación (negativa), también contra humanos. En esto la contrautopía de Huxley en Wonderful world enseña tanto como las declaraciones de los científicos responsables y

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Conferência

preocupados por las dimensiones del propio saber en este siglo (desde Szilard y Einstein hasta Rotblat, Henri Atlan y Toraldo di Francia).

En esta ambivalencia epistemológico-moral, hoy reforzada por la fusión de ciencia y tecnología, está la fundamentación actual de un concepto trágico del saber humano: el miedo humano a la muerte, al dolor y al sufrimiento producido por las enfermedades es causa a la vez del miedo al saber (qué será de mí) y del desarrollo histórico de la ciencia, de lo que se llama progreso científico. Miedo e hybris (desmesura y soberbia) han acompañado, acompañan y acompañarán siempre las actitudes humanas respecto del saber científico: desde la medicina griega de la época de Hipócrates hasta la biotecnología actual. Esta es una idea contenida ya in nuce en algunos de los viejos mitos compartidos: desde el libro del Génesis a Prometeo, y desde Fausto a Frankenstein.

Así que una primera sugerencia para la fundamentación del humanismo que se necesita en este cambio de siglo sería la siguiente: la lectura compartida, en común y dialogada, entre científicos y hombres de letras, de textos ya clásicos como el libro del Génesis, Prometeo encadenado, El Paraíso perdido de John Milton, el Faust de Goethe, el Frankenstein de Mary Shelley, El árbol de la ciencia de Pío Baroja y El mundo feliz de A. Huxley.

Para tratar de superar los miedos contrapuestos (a la muerte y a la enfermedad, de un lado, y a los peligros implicado en la tecnociencia, de otro) hay, pues, que partir de dos datos paralelos e inseparables: la imposibilidad práctica de la renuncia a la ciencia, a la curiosidad, incluso exagerada, que impulsa la investigación científica (porque no se puede poner puertas al campo) y a la inanidad de la crítica unilateral, meramente especulativa, al conocimiento científico (porque no conviene hablar, y menos orgullosamente, de lo que no se sabe o de aquello sobre lo que no se tiene experiencia fundada). Esto debería conducir a hacer nuestra la palabra del gran poeta alemán Hölderlin: “Allí donde está el peligro puede brotar también la salvación”. O para decirlo con la expresión de un filósofo moral también amante de la ciencia.”Necesitamos la ciencia precisamente para salvarnos de la ciencia” (Russell).

La reflexión humanística, filosófica, sobre la ciencia, lo que se llama “ciencia con conciencia” (o la conciencia de lo que la ciencia es como pieza cultural) resulta ser irrenunciable para superar el miedo atávico del hombre al saber, su sospecha de que el conocimiento, en cierto modo, va contra la vida. Lo que está por ver, en este cambio de siglo, es cuál es la mejor forma de reflexionar sobre la tecnociencia contemporánea, quién es mejor amigo

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del saber: si el filósofo y el humanista graduados y licenciados o el científico que reflexiona, con conocimiento de causa, sobre sus propias prácticas, o si, tal vez, ambos juntos. Creo que deberíamos inclinarnos por la tercera opción, a sabiendas que, en cualquier caso, el carácter hoy irrenunciable de la reflexión filosófica sobre la ciencia es el fundamento de las humanidades de base científica para el cambio de siglo.

Aunque esta es una conclusión muy divulgada hoy en Europa hay que advertir, sin embargo, que cuando se trata de concretar (tanto en lo que hace a los planes de estudio como en lo relativo a otras formas institucionales de configurar la cosa) se produce todavía una curiosa asimetría: se tiende a considerar obligatoria la base científica de las humanidades (para intervenir en serio sobre los problemas públicos en discusión), pero sólo aconsejable, opcional o secundaria la base humanística (literaria, filosófica o ética) de los saberes científicos. Esta asimetría acaba tomando un carácter funcional: buena parte de la literatura reciente dedicada, por ejemplo, a la ética práctica o aplicada (Dworkin, Singer, Tugendhat, Taylor, Sterba, etc.) da mucha importancia a la información científica o científico-cultural previa a la discusión de temas como aborto, eutanasia, clonación, multiculturalismo, racismo, etc., pero, en cambio, la información humanística (histórica, filosófica, ética, etc.) es considerada todavía en los ámbitos científicos académicos como un simple apéndice curricular, como un añadido a posteriori o como mero motivo para la creación de comisiones deontológicas ad hoc. Esta asimetría representa un problema que hay que abordar y resolver.

La preocupación por la cada vez mayor separación de las letras y las ciencias, del humanista y del científico, no es nueva; se hizo ya patente hace un siglo, en el último tercio del siglo pasado en Gran Bretaña. Por entonces eran ya evidentes algunas de las consecuencias (no sólo positivas) de la revolución industrial y se estaban delineando los rasgos de lo que ahora llamamos civilización científico-técnica. Tiene interés hacer observar aquí que uno de los motivos recurrentes de la polémica sobre las “dos culturas” ha sido la organización e institucionalización de la enseñanza secundaria y universitaria. De hecho, el tema de las “dos culturas” es inseparable de la generalización de la enseñanza media y superior, de la extensión de la instrucción pública a amplios estratos de la población antes condenados al analfabetismo.

La polémica de los finales del siglo XIX se inició precisamente con una consideración acerca de la función de la universidad. Se discutía entonces si la universidad tenía que seguir manteniendo un tipo de

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formación universitaria generalista (“formar hombres capaces de comportarse civilmente entre ellos”, como dijo J. S. Mill cuando fue elegido Lord Rector de la universidad escocesa de St. Andrews) o bien, por el contrario, convertirse en sede de formaciones profesionales (de expertos abogados, médicos, ingenieros, arquitectos, etc.). Sobre todo se discutía entonces si la formación universal propuesta tenía que tener un núcleo central literario o más bien científico.

T. H. Huxley trató el asunto en una conferencia pronunciada, en 1880, en el Birmingham Science, sobre “Ciencia y cultura”. T. H. Huxley era un científico natural y difusor incansable de las ideas de Darwin. Pensaba que educar equivale a instruir el intelecto de los hombres sobre las leyes de la naturaleza. Su punto de vista era este: terminar con el monopolio de las lenguas antiguas y muertas (latín y griego) en la enseñanza superior y asignar a las ciencias naturales él puesto que les correspondía en la enseñanza secundaria y universitaria. Huxley no estaba, por lo general, en contra de la literatura, poco estudiada, por lo demás, en la Inglaterra de la época, pero prefería que se estudiara la literatura nacional inglesa a las lenguas clásicas.

Matthew Arnold, amigo de Huxley y miembro del mismo club londrinense que aquél, le contestó que los frutos de la ciencia sólo pueden beneficiar a los hombres cuando, con la ayuda de la literatura, se consigue elevar “el nivel de vida”, no sólo material sino también espiritual, de todos los hombres. En su réplica a Huxley, Arnold subrayó tres cosas que seguramente siguen siendo interesantes para nosotros. En primer lugar, que no hay que confundir “literatura” con “belles lettres”, pues literatura son también los Elementos de Euclides, los Principia de Newton y los escritos de Copérnico, de Galileo y de Charles Darwin. En segundo lugar, que no se debería permitir que los científicos de la naturaleza se reservaran el concepto de ciencia, pues también la crítica literaria y el estudio de las lenguas antiguas eran, según él, ciencias. Y en tercer lugar, que conviene recuperar el uso alemán de la palabra ciencia [Wissenschaft, ciencia totalizadora, ciencia holista o ciencia de esencias] y no hablar siempre de ciencias según el corriente significado inglés [Science es ciencia empírica, fragmentaria, analítico-reductiva] referido a las ciencias naturales.

La opinión de Arnold - que seguramente compartirían hoy no pocos científicos cultos - era que, siendo importante comprender los resultados de las ciencias naturales modernas, porque sin ello no se puede llegar a una justa comprensión del hombre y del mundo, la institucionalización de las disciplinas científicas en la universidad sólo puede proporcionar un saber

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instrumental. De aquí que rechazara la asimilación del científico al experto o especialista y mantuviera, simultáneamente, la aspiración a una “doctrina de la vida”, a un “criticism of life”, para que el hombre se comprenda a sí mismo y aprenda a orientarse en el mundo. Arnold concluía, hace más de un siglo, que este tipo de saber es lo que proporcionan precisamente la poesía, la literatura y la elocuencia. A lo que se puede añadir ahora que la evolución, en los últimos cincuenta años, de los estudios lingüísticos, filológicos e historiográficos así como el desarrollo de ciertas teorías económicas, sociológicas, psicológicas y antropológicas abonan la opinión de que es unilateral reservar el concepto de ciencia para referirse exclusivamente al conjunto de disciplinas que se ocupan de la naturaleza.

Varias de las ideas expresadas en la polémica finisecular entre T. H. Huxley y M. Arnold reaparecieron en la controversia, más conocida por más próxima a nosotros, suscitada por C. P. Snow a comienzos de la década de los 60 de este siglo. Esa última controversia no habría llegado a tener la repercusión que tuvo si no fuera porque en seguida condujo a un par de cuestiones muy conflictivas. En primer lugar, por la estimación de las responsabilidades respectivas, de literatos y científicos, en las ignorancias, intolerancias y crímenes que dieron lugar a las guerras de este siglo. Y en segundo lugar, por la propuesta de reforma de las enseñanzas secundaria y universitaria, por el proyecto de introducir cambios radicales en la instrucción pública superior de los países de habla inglesa.

Cuando se reconstruye esta otra polémica no siempre se tiene en cuenta que la crítica principal de C. P. Snow a los literatos, a la cultura humanística, no era tanto su ignorancia de los hechos científicos cuanto más bien una reprobación de carácter moral: casi todos los escritores que habían dejado huella en la literatura del siglo XX (Yeats, Pound, Elliot, Celine, etc.) fueron, en su opinión, unos “idiotas” en el plano político y la imagen del mundo que ellos encarnaron contribuyó a acelerar el proceso que condujo al mayor de los horrores, a la experiencia de Auschwitz. Ya Ruskin, Morris, Thoreau, Emerson y D. H. Lawrence habrían cerrado sistemáticamente los ojos ante la realidad económico-social precisamente porque habían sido incapaces de comprender la revolución técnica que sustentó la revolución industrial y sus consecuencias. La incapacidad para comprender el cambio de fase histórica implicado en las mutaciones técnico-científicas habría llegado, según Snow, a la difusión de las concepciones antidemocráticas en el arte y la literatura, mientras que, desde este punto de vista, los científicos naturales habrían sido, en cambio, profundamente morales. En el fondo, para Snow todo científico

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contemporáneo es un filósofo moral. Y por eso el problema vital de la civilización occidental consistiría en quitar a la formación literaria la hegemonía tradicional para asignársela a la cultura científica.

El antagonista de C. P. Snow en este caso, el escritor y crítico literario F. R. Leavis, fue menos amable en el tono de lo que lo que lo había sido Arnold con el viejo Huxley, pero sus argumentos seguían siendo, en lo esencial, los mismos. Tonos aparte, me interesa subrayar aquí un aspecto de esa respuesta. Leavis defendió en la polémica un concepto muy preciso y a la vez restrictivo de cultura. “Cultura” no es, según él, mera adquisición de nuevos conocimientos, pues la adquisición de conocimientos sin más es sólo información carente de valor; “cultura” es enriquecimiento del espíritu. Y confundir cultura con información es precisamente cosa de gentes incultas que quieren dar a la cultura un valor de uso semejante al de las profesiones. De ahí que la propuesta de Leavis en el plano institucional acabara desembocando en una opción directamente contraria a la de la reforma de la universidad en un sentido científico-técnico. La universidad, según esto, debería ser el lugar de los saberes más imprácticos, menos técnicos: el lugar para aprender las lenguas clásicas, las culturas y religiones extinguidas, la literatura y la filosofía; el lugar de un saber, en suma, inútil desde la perspectiva funcional, pero unificador y vivificador de todos los otros saberes.

Se comprende que, para superar el hiato que desde entonces se ha ido creando entre las “dos culturas”, científicos sensibles y humanistas interesados en las ciencias hayan coincidido durante la última década en proponer a las autoridades universitarias la configuración de una “tercera cultura”, esto es, una cultura-puente entre las letras y las ciencias. Querría concluir esta intervención explicando brevemente qué puede querer decir “tercera cultura” para los humanistas de la época de la tecnociencia.

El humanista de este cambio de siglo no tiene por qué ser un científico en sentido estricto, ni seguramente puede serlo ya aunque se lo proponga. Pero tampoco tiene por qué ser necesariamente la contrafigura del científico natural o el representante finisecular del espíritu del profeta Jeremías, siempre quejoso ante las potenciales implicaciones negativas de tal o cual descubrimiento científico. Si se limita a ser esa contrafigura, el literato, el filósofo, el humanista, en suma, tiene todas las chances de perder. Puede, desde luego, optar por callarse ante tales o cuales descubrimientos científicos contemporáneos y abstenerse de intervenir en las polémicas públicas sobre las implicaciones de estos descubrimientos. Solo que entonces dejará de ser un contemporáneo. Con lo cual se

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desembocaría en una paradoja lamentable pero cada vez más frecuente: la del filósofo posmoderno contemporáneo de la premodernidad (europea o americana).

Consciente de ello, el estudiante de humanidades, el estudiante de letras en este cambio de siglo podría ser también un amigo de la ciencia. Un amigo de la ciencia en un sentido parecido a como lo son, a veces, los críticos literarios o artísticos, equilibrados y razonables, de los narradores, de los pintores, de los músicos o de los cineastas. Pero la amistad exige reciprocidad. Y, por ello, el que el humanista o el estudiante de humanidades lleguen a ser amigos de las ciencias no depende sólo y exclusivamente de la enseñanza universitaria reglada o institucionalizada, ni tampoco de los planes de estudio que acaben imponiéndose en ella. Esto cuenta, desde luego. Pero tanto como los planes académicos y las reglamentaciones podría contar la elaboración de un proyecto moral con una noción de racionalidad compartida con los científicos. El sapere aude de la Ilustración no era, al fin y al cabo, una mala palabra. Ahora bien, esta palabra se tendría que complementar con otra, surgida de la autocrítica de la ciencia en el siglo XX: ignoramos e ignoraremos.. Y si ignoramos e ignoraremos, lo razonable en la época de la tecnociencia es pedir tiempo para pasar del saber al hacer. Con lo que, finalmente, quedaría para el caso: atrévete a saber porque el saber científico, que es falible, provisional y casi siempre probabilístico, ayuda en las decisiones que conducen al hacer. Ayuda también a la intervención razonable de los humanistas en las controversias públicas del cambio de siglo.

Referencias bibiográficas

ARNOLD, M. Culture and anarchy and other writings, editado por Stefan Collini. Cambridge: University Press, 1993.

ATLAN, H. A tort et à raison. Intercritique de la science et du mythe. París: Seuil, 1986.

BERLIN, I. “El divorcio entre las ciencias y las humanidades”, en Contra la corriente. Ensayos sobre historia de las ideas. México: Fondo de Cultura Económica, 1983.

EINSTEIN, A. Mis ideas y opiniones. Barcelona: Antoni Bosch Editor, 1981.

FERNÁNDEZ BUEY, F. Ética y filosofía política. Asuntos públicos controvertidos. Barcelona: Bellaterra, 2000.

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Conferência

HUXLEY, T. H. “Ciencia y cultura”, en M. Gardner, El escarabajo sagrado. Barcelona: Biblioteca Científica Salvat, 1986, vol. 1. págs. 145-162.

LEPENIES, W. Las tres culturas. México: Fondo de Cultura Económica, 1994.

POSTMAN, N. Tecnópolis. La rendición de la cultura a la tecnología. Barcelona: Círculo de Lectores, 1994.

PLUMB, J. H. (ed.). Crisis en las humanidades. Barcelona: Planeta, 1973.

RUSSELL, B. “La ciencia para salvarnos de la ciencia”, en M. Gardner, El escarabajo sagrado. Barcelona: Biblioteca Científica Salvat, 1986, vol. 2, págs. 441-450.

SILVER, L. M. Vuelta al Edén. Madrid: Taurus, 1998.

SNOW, C. P. The Two Cultures. Londres, Cambridge University Press, 1969; nueva edición, con introducción de Stefan Collini, Cambridge: University Press, 1994.

TRILLING, L. “La controversia Leavis-Snow”, en Más allá de la cultura y otros ensayos. Barcelona: Lumen, 1969, págs. 179-214.

SINGER, P. Writings on an Ethical Life. New York: The Ecco Press, 2000.

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La cultura humanista em tiempos de la tecnociencia

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Educação e cidadania na América latina1

Miguel González Arroyo

RESUMO: Debate-se o tema da cidadania no contexto educacional da América Latina, tomando o período de 50/60, 70/80, contrapondo-os à década recentemente superada: o que resta como tarefa a ser realizada por educadores? Pensar a Educação para a cidadania é repensá-la em vista dos interesses dos setores populares. Nas décadas de 50 e 60, tratava-se do acesso às condições gerais de vida. Em 70, da qualificação do capital humano, resultando na Lei 5692/71, cujos pedagogos retornam através do Banco Mundial discutindo empregabilidade e competências, em tempos de desemprego. É a matriz da inserção produtiva, do trabalho que funda a consciência política, de cidadania. Na destruição desta matriz temos perdido a infância e, com ela, a pedagogia.

Palavras-chave: educação escolar e cidadania; história da educação brasileira; educação e trabalho; pedagogia e infância.

RESUMEN: Se debate el tema de la ciudadanía em el marco educacional de América Latina. El período de los años 50/60, 70/80 es contrapuesto a la década recién superada, para verificar, desde el punto de vista histórico, qué es lo que resta como tarea para los educadores. Pensar la educación para la ciudadania es repensarla desde los intereses de los setores populares. En las décadas de los 50 y 60, se trataba del acceso a condiciones generales de vida. En los 70, de la calificación del capital humano, resultando en la Ley 5692/71, cuyos pedagogos retornan, a través del Banco Mundial, discutiendo empregabilidad y competencias, en tiempos de desempleo. Es la matriz de la inserción productiva, del trabajo que funda la consciencia politica, de ciudadanía. En la destrucción de esa matriz hemos perdido la infáncia y con ella la pedagogia.

Palabras-clave: educación escolar y ciudadanía; historia de la educación brasileña; educación y trabajo; pedagogía e infancia.

1 Conferência proferida em 21 de novembro, no Seminário Educação 2000, promovido pelo Instituto de Educação e o Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Federal de Mato Grosso.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 11 n. 19 jan.-jun. 2002. p. 43-57

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Educação e cidadania na América latina

Visto que muitos são alunos e alunas do Instituto de Educação, professores e professoras da educação básica e, também, alunos e alunas da pós-graduação, eu vou tentar colocar de tal maneira o tema, que não fique numa linha acadêmica, para que seja feita ao mesmo tempo uma análise densa, que seja levada para a prática educativa do educador da escola, como mestrandos, como formandos. Vou ver se dou conta de uma linguagem e de uma forma de tratar o tema que seja fácil de desenvolver.

Educação e cidadania na América latina... É interessante esse tema. Na semana passada, a essa mesma hora, eu estava participando do encontro do CLAES - Comitê Latino-Americano de Estudos Sociais; e exatamente esse comitê colocou educação, trabalho, cidadania em tempos de exclusão na América latina. Passei três dias, lá no encontro latino-americano, exatamente discutindo essa questão: que fronteiras se abrem hoje para a educação na América latina? Como recolocar velhos vínculos entre educação, democracia, cidadania, em tempos de discussão, em tempos de cólera, como dizia Garcia Marques?

Parece-me muito importante que, num programa de pós-graduação, de graduação, se retome essa questão, se vejam as relações sempre pensadas. Digo que é importante para vocês, educadores e educadoras que trabalham na escola, cada dia, com a infância, com a adolescência, com jovens e adultos, se colocarem essa relação “educação para a cidadania”, “educação e cidadania”. Como recolocá-la hoje? Em que bases recolocar essa relação? Para responder essas perguntas eu acho que o caminho mais acertado é o percurso histórico. Eu vou tentar mostrar como essa relação foi colocada em vários momentos da nossa história brasileira e latino-americana. Como a educação se situa? E como pensar/repensá-la aos setores populares? Afinal, a maior parte dos educadores trabalha na escola pública e com setores públicos. E a maior parte das dissertações, teses que fazemos em nossas faculdades são sobre educação para os setores populares.

Vou limitar meu percurso histórico e vou ver como se coloca essa relação, por exemplo, na década de 50/60, na década de 70/80 e, sobretudo, como ela se coloca hoje para nós, educadores, pesquisadores. Então, vamos começar pela década de 50 e 60. Nesse percurso histórico, vamos encontrar os traços, as ênfases que foram feitas, que foram dadas em cada momento, à relação entre educação e cidadania. Na década de 50/60, coloca-se uma questão muito enfática para a educação brasileira. Que papel poderia ter a educação na inserção social das camadas urbanas crescentes? É um momento de grandes migrações para a cidade, é o

Rev. Educ. Pública, Cuiabá, v. 11, n. 19, jan.-jun. 2002.44

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momento em que a cidade incha, São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Recife. As camadas populares vão crescendo, vão se espalhando, vão ocupando o espaço urbano de maneira caótica, sem transporte, sem saúde, sem emprego, sem cidadania e, nesse momento, se coloca a grande questão: como inserir as camadas populares urbanas na cidade, na cidadania? Vejam, a idéia é: como inserir, como fazer para que elas também façam parte, sobretudo do serviço social, como que elas poderão usufruir os serviços urbanos? É atrás disso que eles vão; deixam o campo porque não têm escolas para seus filhos; terão escolas na cidade? Deixam o campo porque não têm saúde para sua família; terão um posto de saúde na cidade? Deixam porque não têm emprego; terão emprego na cidade? Aí é o momento em que se coloca essa questão: é possível inserir as camadas urbanas populares nos bens básicos da cidade? E aí entra toda a luta pela inserção na escola pública.

Florestan Fernandes foi um dos líderes desse grande debate. É o momento em que construir escolas, garantir escolas para os setores populares passa a ser uma forma de garantir sua inserção. A idéia de cidadania passa pela inserção social. Insisto, cidadania como inserção social, educação como mecanismo de inserção social para os marginais, para os periféricos, para aqueles que ainda não têm o direito de participar da cidade. É muito interessante não perder de vista a idéia da cidadania como inserção nos bens, nos serviços da cidade. Ela tem um caráter material; depois, vamos ver que a cidadania tinha outras conotações mais ideológicas. Nesse momento, eu diria, o caráter da cidadania está vinculado à materialidade, à concretude de ter pão, de ter saúde, de ter escola, de ter moradia, de ter transporte, de ter trabalho. Eu diria que a cidadania se coloca no chão da produção e reprodução para se limitar à existência. É aí que se coloca a educação, a escola como um espaço de direito, espaço onde nossos filhos possam estudar.

A preocupação não é o que vão aprender na escola, a preocupação é a escola quase como um espaço ocupado, ao qual tendem. Insisto nesse ponto, isto é muito importante, isto se perdeu nas pesquisas, se perdeu no horizonte, nos vínculos entre a educação e a cidadania. Há, ainda, naquele momento, outra dimensão muito importante na década de 50/60. Não se esqueçam que estava no final o populismo, estava no momento se esgotando o modelo de pacto comunista. Eu estava aqui, na década de 60, e o que mais me impressionou foi isto. Era o esgotamento do pacto comunista criado por Getúlio Vargas. O povo não queria mais espaço, mas queria inserção social na cidade, isso estava claro. O partido que caminhava

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nessa direção era o PTB – hoje está tão distante tudo isto – passava por este canal político, e toda a evolução que existia na universidade ia nessa direção até o momento em que ressurge a educação popular, final dos anos 50, início dos anos 60.

Mas a educação popular não estava tanto olhando nos meios da cidade, para as camadas populares urbanas e sua inserção. Ela se volta mais para as camadas rurais. Muito mais excluídas, ainda, e menos inseridas, ainda, do que as camadas populares urbanas. Paulo Freire estava à frente do movimento de educação popular da época, o movimento de educação de adultos, do teatro e cultura, não se esqueçam de tudo isso. Qual é a direção nesse momento? É a idéia de educação como conscientização, politização; isto não estava presente nas lutas pela expansão da escola pública na cidade, era apenas fazer espaços públicos para todos. A educação popular radicaliza, já naquela época, a idéia da inserção, e dá a ela uma conotação mais política: conscientizar, politizar. Por quê? Porque, no próprio campo, as ligações políticas, os sindicatos tinham radicalizado a idéia da inserção, muito mais no campo do que na cidade, o campo sempre muito mais tenso do que a cidade, até hoje.

A idéia da inserção se radicaliza no campo, porque a luta é por algo mais do que luta por espaço, pela moradia, pela saúde: a luta é pela terra, e a luta pela terra sempre foi muito mais radical do que a luta por escola. Ter um pouco de terra é muito mais do que ter ou não ter escola, do que ter ou não ter imposto de renda. Eu diria que temos deixado de lado essa história do final dos anos 50 e 60, em que ela enquanto educação brasileira se encontra com ela mesma e já basta de modelo como o da Escola Nova, vindo de fora, enquanto a educação brasileira se tem que enfrentar com sua própria realidade social no campo e na cidade. Na cidade, caminha na idéia de inserção. No campo, caminha numa idéia muito mais radical, da conscientização e politização. A importância que se dá à cultura, à própria educação popular não vai existir apenas a idéia de conscientizar, mas fazê-la a partir da cultura. A educação é pensada no campo da cultura. Como descolamos hoje educação e cultura, não conseguimos encontrar seus vínculos. Naquela época, educação e cultura aparecem como algo inseparável, porque a própria idéia de inserção passa pelo campo da cultura.

Na década de 60/70, abandona-se a idéia da inserção, abandona-se a idéia da politização, se abandona a idéia da cultura e prevalece a idéia da inserção nos processos produtivos. Não se trata mais de inserir o povo na cidade, de inserir o povo no serviço social e menos ainda de inseri-lo na

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cultura nacional. Trata-se de inseri-lo com braços suficientes para o trabalho, para o desenvolvimento. Não se fala mais em educação e cidadania, educação e inserção, educação e cultura. A palavra de ordem passa a ser educação e desenvolvimento. Esta passa a ser a palavra de ordem, educação como capital humano, educação e treinamento, educação e preparação para o trabalho. A Lei 5692 é a síntese de tudo isso, um dos momentos mais tristes na história da educação brasileira!

E o interessante é que nós gritamos ‘abaixo a ditadura’ e, desde a década de 80, temos processos mais ou menos democráticos. Falamos até em gestão democrática na escola, eleições diretas para diretores, para Reitor. E tudo isso já alcançamos, mas o entulho da 5692 continua nas grades curriculares, nos currículos de formação de professores da universidade, continua nas nossas cabeças, continua na desgraçada formação dos licenciados. É uma das coisas mais negativas, na educação fundamental brasileira. Os licenciados são formados para ser tudo, menos educadores. Quem são os educadores das crianças até os 14 anos? Os licenciados? Que que é isso?! Para as pessoas adultas já eram estranhos, imaginem para uma criança de 10 anos, 11 anos, o conhecimento recortado; o mal que a educação superior faz para a educação básica. O dia em que a educação básica for ela mesma e a educação superior se afaste da educação básica, aí vamos ter educação! Trouxemos para a educação média, os modelos recortados de conhecimento da educação superior, para tristeza e deformação da nossa juventude. E tudo isso consta dentro das grades, que vêm da 5692.

Nem nós somos gente dentro de grades, essas grades curriculares que as delegacias tanto cuidam e que nossas disciplinas cumprem. Grades, disciplinas, delegacias: por que estão tão próximas das páginas policiais, por quê? Espero que, algum dia, na última página policial, de que jorra sangue, mais um crime: “menino agride professora!” Vocês já viram na rede Globo como que ela fala quando fala “aquela escola”, “aquela escola...!? Os professores não têm condição nem de disciplinar esses alunos e, com aquele salário alto que recebem, não são capazes de fazer nada!” O que é que eu quis dizer com isto? Quis dizer que não conseguimos superar essa concepção de educação. E qual é a concepção para a educação? Nesta educação não há mais espaço para a cidadania, só para a inserção produtiva, só preparar para a produção, para o trabalho, para uma boa profissão, para ser alguém produtivo. É aí que mercantilizamos a escola. Claro que, se houve algo mercantil durante esses anos, foi o enfeitar a proposta de educação com discursos progressistas. Nunca a educação foi

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Educação e cidadania na América latina

tão progressista no discurso, nas faculdades. Trouxemos para a educação média os modelos recortados do conhecimento da educação superior. E não foi suficiente trazer isso para a nossa juventude. O que vai para a universidade invadiu a própria juventude, e o pior é que invadiu até a nossa consciência. A partir dos 10 aninhos, 11 aninhos, meus filhos já tinham recortes de conhecimento: uma mochila carregada com 20 quilos, para em cada 50 minutos um professor colocar uns trocadinhos de história, de biologia, de geografia, de matemática. E, depois, ele tem 12 anos, querem que ele faça uma síntese: como querem que ele possa fazê-la?

Isso tudo está na 5622... Essa desgraça toda, cujo entulho está nas faculdades de educação, nos cursos de licenciatura, nas grades curriculares. Está não só nos cursos de formação, está nas próprias escolas. E os Parâmetros Curriculares não tiveram coragem de modificar isso. Eles colocam uma coisa linda! Se vocês lerem os Parâmetros Curriculares, na apresentação, todos aqueles objetivos são de um humanismo incrível... Trabalham tudo. Trabalham as múltiplas linguagens, trabalhar a cultura, trabalhar a criticidade, trabalhar tudo e nada ao mesmo tempo. Que bom reencontrarmos o ser humano como gente! Mas, depois, na seqüência, morre que inventou tudo aquilo, e se volta para as grades. Mas as grades curriculares continuam feitas assim. Permitimo-nos o luxo de criticar tudo, mas somos incapazes de sair das grades. Sobraram críticas nas faculdades e faltou mexer nas estruturas impostas e nas concepções impostas pela 5622. Faltou isso, o discurso crítico é muito fácil. Eu diria para vocês que este momento foi um dos mais tristes da educação brasileira e, sobretudo, insisto – como ele se alastra! – não conseguimos mudar nada, parece que ela criou uma personalidade em nós e não conseguimos tirá-la. Para não dizer que eu não falo de coisas positivas, eu diria que, como tudo que é contraditório na vida é dialético, estes são alguns campos da consciência cidadã, interessante isso, não é? Em que sentido foi o momento da consciência cidadã?

Na década de 70, aparece o novo sindicalismo, o ABC; na década de 70 aparece um novo sindicalismo dos trabalhadores da educação. Eu diria para vocês que, entre nós, a recuperação da cidadania veio pela inserção no trabalho. Na medida em que os trabalhadores foram tomando consciência de seus direitos como trabalhadores, foram tomando consciência dos seus direitos como cidadãos. Eu queria chamar atenção para o seguinte: a matriz da moderna cidadania brasileira está na fábrica: isso é muito interessante! Muitas vezes, separamos cidadania do trabalho; separamos a cidadania da construção da consciência trabalhista. Eu diria

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que a cidadania se radicaliza na matriz da inserção produtiva; cidadania e trabalho não são dois campos separados. Ao contrário, o trabalho é o campo em que a cidadania mais se radicaliza. Ninguém radicaliza mais a cidadania no mundo inteiro do que a classe trabalhadora. Quando o educador se descobriu como classe trabalhadora, radicalizou sua crítica. Os próprios professores radicalizam a cidadania não como intelectuais, mas como trabalhadores. Um ponto muito importante é não perder de vista o que se quer dizer com isto! Quero dizer que a cidadania, no final da década de 70, brota colada numa matriz material, na forma como o povo vai-se inserindo nos processos de trabalho.

Temos pensado nessas coisas, é que nós somos intelectuais, somos o mundo da cultura! Quando você chega em uma prefeitura, há lá na parede desde a cara do 1º prefeito até a cara do prefeito atual ou, quando você chega na faculdade, na diretoria, lá estão as caras dos Reitores. Retocadas. Elas não são tão bonitas, mas estão lá, na nossa galeria. Assim se enxerga o mundo: com viseiras. Daí que colocamos a cidadania no nosso mundo, o mundo da crítica e o mundo da ciência. Não, não é aí que está a cidadania, está muito mais colada aos processos de inserção material, na produção de existência, sobretudo nos processos brutais de inserção capitalista. Inclusive, na Europa, mais na Europa do que aqui, ninguém radicalizou tanto os direitos no mundo inteiro como a classe trabalhadora: acabou a classe trabalhadora, acabou o trabalho. Ora acabou o trabalho porque não tem. Os pobres radicalizam a cidadania não como intelectuais, mas como trabalhadores. Na década de setenta, a cidadania volta com uma matriz material, aquela da inserção produtiva e do trabalho. Acabou, tinha acabado o trabalho, mas agora, semana passada, está ele aí de volta! Eles têm que fazer isso para duplicar dinheiro, outros partem para a política, o aumento do militarismo. Nós, os trabalhadores da universidade, queremos a mesma coisa. E outros trabalhadores das montadoras queriam, um pouquinho, uma correção de 5%! Há vínculos muito estreitos esquecidos entre cidadania e vida produtiva; quero dizer, não podemos esquecer esse transfundo, esse subsolo material em que a cidadania se constrói.

A educação tem dificuldades de amarrar-se com esse subsolo da materialidade da construção da existência, preferimos amarrar-nos na cabecinha, ilustrar a cabeça. O que eu estou querendo destacar é que a cidadania começa na consciência dos trabalhadores. E ela não pára aí, ela vai se criando para incorporar outras dimensões que extrapolam os próprios processos de produção. Mais que buscar, tomar pé, aí! Já há nesta década, novos sindicalismos, novos canais de participação, novos partidos, enfim,

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Educação e cidadania na América latina

necessitávamos dos vínculos estreitos, a construção da cidadania relacionada com sua base material. É aí que o campo do direito se afirma no final da década de 60, o que, antes, tinha sido marginalizado. Mas é também aí o começo das lutas pelos direitos, dentro das fábricas. Depois, eles colocavam ‘diretas já’, depois de frear a cidadania pela criação da ditadura, pela marginalização dos processos de participação política... Mas tudo isso é posterior, ela se inicia no confronto com os direitos do trabalho. A dimensão mais ideológica, política é posterior, mas aqui tem manutenção muito forte, sobretudo na década de 30. Vejam, ela estava como cidadania, como participação política, não tanto cidadania como colada aos processos dos direitos de participação no mundo produtivo, nos bens de produção. Esta vai ser uma das características da década de 80.

Na década de 80, eu diria que estão colocadas essas duas matrizes. Onde a cidadania se afirma, a matriz produtiva, o direito do trabalho, os direitos do professor e da professora como trabalhador, essa é uma linha. A outra linha é mais política, a cidadania como participação política, a cidadania pela eleição do diretor, pela eleição do reitor, pela gestão democrática, esta é a outra perspectiva. E a educação, a que perspectiva se vincula? E os educadores? Onde e como inserir a cidadania nos seus vínculos com a educação? Principalmente, nessa segunda direção, na direção política, mais ligada à perspectiva de educar para a participação política. E aí precisamos nos perguntar: como educar para a participação política? Via pedagogia industrial?

É muito interessante, nós educadores, diante desse quadro, que tinha duas matrizes de concepções que geraram cidadania, duas matrizes que apontavam e geravam cidadãos, ficamos reduzidos à segunda. Ficaram reduzidas. Não houve nenhum grupo que insistisse na primeira, a do trabalho como princípio educativo. O GT Educação e Trabalho - e eu estou falando porque eu fui um dos seus fundadores, estava ligado a esta concepção - se digladiava com o grupo dos conteúdos críticos. A área da educação foi sempre marcada por esses confrontos, com a ênfase na segunda concepção da cidadania, que era mais dominante. Formamos cidadãos críticos através de conteúdos críticos para a participação, diziam eles; e nós ficamos na outra concepção de cidadania, uma cidadania que tomava o trabalho como princípio educativo, lá onde se produz e se reproduz a existência material como principio educativo da formação humana, como princípio da consciência cidadã.

Esta é uma história muito importante a ser revista, A educação na década de 80 não tinha apenas uma pedagogia crítico-social. Houve

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contraponto. Os que defendiam que, se era verdade o momento cívico que vivíamos, com a crise da ditadura, a sistemática exclusão da participação política, era necessário firmar a cidadania no campo da participação política. Havia gente mais vinculada com a outra matriz, que colocava os processos de construção de direitos, os processos de construção da cidadania muito mais colados à materialidade da produção de existência. A produção de existência na fábrica, no trabalho, nos movimentos. Não podemos esquecer essa aquisição, eu diria, tão fecunda como a outra. Faltou-nos fecundar-nos mutuamente. Houve tensões, que se explicitam nos programas dos cursos de pós-graduação. Eu diria que, em nosso programa de pós-graduação, de Belo Horizonte, estamos muito na primeira aquisição, e o programa da PUC, com a outra. É como criar, é como ter território que nem sempre são States, mas que tragam questões muito sérias para os vínculos entre educação e cidadania. Passa a dominar muito mais a idéia política, a escola circula a educação mais ideal, ilustrada, crítica.

Qual a função da escola em relação à cidadania? Não apenas dizer as mentiras, mas tomar consciência das tristes verdades. Daí o professor estará pronto para enfrentar a ditadura, o capitalismo, o militarismo. Sem crítica não há cidadania, sem consciência crítica não há cidadania. Esta é uma verdade, esta é a função da educação, fazer com que a escola seja um centro crítico, fazer dos programas uma mistura química, colocar uma ‘pitada de pimentinha crítica’. A pedagogia dos conteúdos críticos teve como limite o fato de que não tocou na estrutura. Tocou nas grades, não tocou nos conteúdos, apenas deu a eles uma ‘pitada crítica’... Eu diria que terminamos nem sendo radicais, porque para mim nunca se chega muito fundo. Era muito mais radical o nosso sindicalismo, na década de 80, do que a pedagogia crítico-social dos conteúdos, em termos de afirmação da cidadania. Observação: por que coisas lutaram os movimentos da década de 60 e de 80? Por água, esgoto, condução, moradia. Lutaram mais do que nós, na academia. A escola nem sempre é conduzida pelo social. Bom, esse é um quadro muito rico para a educação.

E a década de 80 a 90... Eu diria que, na década de 90, ainda, encontramos redutos enfatizando essa cidadania ilustrada. Ela não consegue compreender os educadores, porque é muito difícil, para um professor de matemática, colocar uma ‘pitada de criticidade’ na matemática que estava aí. A biologia crítica, muito difícil... Colocar criticidade na gramática, talvez relacionando-a à oração subordinada. Era muito difícil colocar criticidade nos 35 ou 40% da reprovação... É interessante! A pedagogia crítico-social dos conteúdos não rebaixou o índice de

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reprovação, nem nada. A escola continuou a ser tão excludente quanto era antes, mas agora ela é ‘criticamente’ excludente. Como a escola não tinha tocado na sua estrutura, na materialidade, os professores iam por outro caminho falando sobre carreira, trabalho. Colocavam as questões no campo da materialidade, mas a definição pedagógica que eles tinham da Academia os colocava no campo da criticidade. É muito interessante esse desencontro, porque estamos pagando até hoje, por causa dele. Conseqüência: a impressão que tínhamos é de que uma coisa eram as lutas trabalhistas dentro da escola e a outra coisa era o pensamento progressista dentro da escola. Isso é o que aconteceu de muito sério em nossa educação.

Na década de 90, continua reduto, enfatizando, sintetizando a cidadania ilustrada e – o mais grave – no final da década de 90, quando já pensávamos que o reduto tinha ficado tão reduto... Mas aí chegam os PCNs. E os PCNs repetem em cada página, três, quatro vezes: formar cidadãos críticos! De novo! É curioso, quando já a academia mais progressista tinha abandonado, exceto uns e outros, a idéia da pedagogia crítico-social, é o governo quem assume a pedagogia crítico-social... Curioso, isso! Os PCNs são uma mistura da década de 80 e 90: da década de 80, a pedagogia crítico-social; da década de 90, o construtivismo. Eu não sei em que isso vai dar: esse casamento do construtivismo com a pedagogia crítico-social. Eu não sei, eu vou pagar para ver! Mas os PCNs estão marcados por essas duas tendências, os PCNs falam a toda hora da cidadania crítica. Eu acho muito sério que se retoma outra vez a idéia de formar cidadãos críticos! No final da década de 90, depois de uma perda econômica na América Latina, diante de tanta exclusão e marginalização, diante da infância excluída nas ruas, diante da adolescência sem opção de trabalho, tendo no máximo a promessa de entrar na fila de desempregados. Parece que isso é muito mais fácil do que dar emprego. São contradições que nos envolvem, são contradições que nos envolvem como uma malha. Será que tem sentido retomar outra vez a idéia de educação e cidadania via criticidade?

Eu diria que os PCNs estão fora do tempo, se parecem mais com o que havia na década de 80 do que no ano 2000. Possivelmente por isso, eles ficam muito mais enfeitando as prateleiras das salas de diretoras do que orientando a prática dos professores. Eu diria para vocês que esta idéia mais crítica estaria fazendo criticismo, não cidadania crítica. Além dos PCNs, ela orienta suas baterias, hoje, para o neoliberalismo. Na década de 90, tudo era culpa do neoliberalismo. Ora, o Neoliberalismo não faz os

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estragos que faz por sua ideologia, mas pela forma da reorganização produtiva. Impressionante, fala-se pouco da escola das crianças; fala-se muito mais do Banco Mundial! Eu diria para vocês que a academia, às vezes, se deixa levar facilmente quando ela perde o pé do chão. Mas, quando ela não perde, ela não se deixa levar. Bem, esse é o quadro que eu vejo do que restou dessa ênfase na cidadania crítica e na consciência crítica.

Ontem mesmo estávamos falando sobre a escola na Baixada fluminense, em Duque de Caxias, porque eu falo de coisas que eu vivo. E lá, não conseguíamos avançar na pergunta sobre que escola para a infância da Baixada Fluminense queríamos; porque, a toda hora, os líderes sindicais colocavam a grande questão: esta pergunta só será respondida quando tivermos a gestão democrática. Ponto final. Mas que significa, neste contexto, “gestão democrática”? Significa que só nós, sindicatos, somos o único espaço legítimo para discutir estas questões. E em que sentido vamos discuti-las? No sentido de “abaixo o capitalismo!”, “abaixo o neoliberalismo!” e ponto final. E a infância mesma continua sem resolver. E eu colocava que, se num hospital onde há aidéticos, cancerosos, doentes agudos, podemos e devemos ter consciência crítica do momento em que estamos vivendo, mas, se esperarmos consciência crítica, o canceroso morre de câncer, o aidético de AIDS porque a impressão que temos é que, com a consciência crítica, tudo se resolve. E diria para vocês que está na hora de termos um pouco de senso comum, de ver que os problemas da educação estão mais embaixo. O que não dispensa consciência crítica. É necessário que se tenha, mas não é suficiente. Isso tem que ficar claro, muito claro para nós. A garantia do direito à educação é mais do que ter profissionais com consciência crítica. Eu posso saber que o neoliberalismo com seus estragos, condiciona a saúde de nossa infância, mas depois eu preciso de um saber-fazer para dar conta da saúde e conter os estragos do neoliberalismo; do contrário, morrerão.

Falta-nos algo. Faltam-nos as artes do nosso ofício, e isso está mais no subsolo. A academia discute muito sobre os condicionantes econômicos, políticos, ideológicos da educação, mas discute pouco sobre os avanços que existem nas ciências humanas e não humanas, de como se processa o conhecimento, como se processa a aprendizagem, sobre como se processa a socialização, sobre como se constroem seres humanos. Eu diria para vocês que é um pouco aí, neste subsolo, que é o subsolo duro, duro de roer, onde a maior parte das ciências sobre os seres humanos avançou. A antropologia não ficou distraída sobre a consciência, a História também não,

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Educação e cidadania na América latina

a sociologia tampouco. E eu me pergunto por que a Pedagogia é um campo tão insensível a tudo isso. Por quê? Por que será? É uma pergunta que me inquieta. Temos uma coisa muito preocupante, mas muito fecunda, ao mesmo tempo.

Eu falava que, na década de 70, vai se formando uma consciência cidadã que não tem como matriz a exclusão da participação política, mas que tem como matriz a exclusão da participação nos bens produzidos, na forma de produzi-los. Tem como base a materialidade da inserção produtiva, que é esse tomar consciência: primeiro, do direito como trabalhador que vai se ampliando para o direito como cidadão e que vincula trabalho e cidadania, não como algo de fórum separado, mas que faz parte de todo o processo de constituição dos cidadãos. Que acontece na década de 90? No final da década de 90, e estamos vivendo hoje, se inicia uma ruptura desta base material, desta matriz constitutiva desta cidadania mais radical. Isso é o mais terrível neste momento. Se o operariado do mundo inteiro tomou consciência dos direitos através das forças inumanas de sua inserção na produção, agora, nem sequer isso ele tem; agora, já não tem uma inserção técnica na vida produtiva. Aí a inserção na vida produtiva hoje é tão instável, tão temporária que não permite tudo isso. Ou seja, se deteriora a organização produtiva; há instabilidade no trabalho, o desemprego. O trabalho informal quebra toda aquela matriz que criou a consciência trabalhista, consciência de direito como trabalhador e, por extensão, dos direitos como trabalhador. Esta é a grande questão dos dias de hoje, me parece.

Quais as conseqüências para a instrução dos campos dos direitos, dos campos da cidadania, conseqüentemente, para a teoria pedagógica, para a prática pedagógica, dessa ruptura, dessa quebradeira que está aí? Isso é sério e prestamos muito pouca atenção a isso tudo. Insisto: não é à toa que o capital acaba com tudo isso, porque era aí que estava a grande luta, o campo dos direitos. E agora se troca o campo dos direitos pelo campo da Mercadoria: Direitos não! Direito a uma velhice digna depois de tantos anos de trabalho? Não! Você vai morrer trabalhando! Direito a 25 anos de professora? Que é isso? Eu já falo: até há pouco chamavam-nos de “titias”; daqui há pouco nos chamarão de “vovós”! Sim, porque com 65 anos está até hoje dando aulas, em vez de estar a cuidar dos netos; contando histórias para os netos; ou, simplesmente, vivendo a vida com dignidade, depois de tantos anos de trabalho.

Estamos num momento em que se martela toda a construção dos direitos, mas não só dos direitos construídos, mas da matriz que os gerou,

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que é a inserção no mundo produtivo tal como tínhamos até agora. Esse é o maior ataque à cidadania, podemos continuar ainda a cidadania no campo da participação política, gestão democrática, eleição para diretor, para reitor. Tudo que vocês queiram, podemos; mas a grande matriz da modernidade, da cidadania moderna está sendo quebrada. E, então, ou nós repensamos os vínculos entre educação e cidadania, aí onde está se dando essa quebradeira ou vamos ficar de fora, neste momento histórico. Durante todo um século se construiu um campo de direitos; inclusive, já na Revolução francesa, mas ela foi uma revolução burguesa, apenas discursiva. Foi o sujeito trabalhador que construiu essa matriz na concretude da história; e é isso, agora, que está sendo destruído. A minha esperança é que não vão conseguir destruir. Esta é a minha esperança. Esta é nossa esperança. Adeus ao trabalho? Adeus à classe trabalhadora? Como se fosse tão fácil dizer adeus: “Tchau, amorzinho!” Pois sim! Ela está aí. E ela aparece de muitas formas diferentes. Reaparece como classe trabalhadora; estamos vendo aí, nessa semana atrás2. E, voltam agora os técnicos da concepção instrumental da educação. Agora, não é mais para falar de educação e cidadania, nem crítica, nem de sua base material, se fala de educação-empregabilidade, educação-competências. Dizem: “Não falta emprego, falta qualidade, qualificação para o emprego”. De novo! Aqueles que dominaram o campo da educação na década de 60 com a teoria do capital humano e que, depois, não tinham lugar e se foram para o Banco Mundial, colegas nossos: Guiomar Novaes – já ouviram falar dessa senhora? - ...Voltam para serem relatores da proposta de educação velha, neste país, em tempos de desemprego: empregabilidade!... Moura Castro... todos voltam. São agora os pedagogos. O Banco Mundial é o Pedagogo. O Banco Mundial não é uma equipe de economistas que cuidam das finanças, é uma equipe de pedagogos que estão lá e, enquanto nós discutimos criticidade, ele vão por baixo. Isso é terrível. Este é o momento em que estamos.

Mas há um outro lado que me parece mais terrível que tudo isso. Não só afeta aos adultos, tudo isso está afetando de cheio a uma infância. O grave não é nosso discurso sobre cidadania, onde vamos colocá-lo. O grave é que esta infância e nossa adolescência, cúmplice de tantas histórias, desde a Grécia, a paidéia, a pedagogia, o pedagogo... Pedagogia e infância andam juntas, não tem jeito de separá-las. E o que acontece com

2 O conferencista se refere à longa greve dos Servidores Federais que precedeu o Seminário Educação.

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Educação e cidadania na América latina

nossa infância? Que acontece com a pedagogia? Nada melhor do que perguntar o que acontece com a nossa infância, para saber o que acontece com a pedagogia. Quando nos esquecemos da infância, esquecemo-nos da pedagogia. Quando um programa de pedagogia não toca na questão da infância, é o melhor atestado de que não tem nada de pedagogia. Se vocês vêm os currículos das Faculdades, nos cursos de pedagogia, falam de tudo, menos da infância. A História social da Infância? Isso é coisa da Psicologia. Aliás, é a única disciplina que ainda permanece fiel à infância. Uma fidelidade às vezes perigosa, porque nós pedagogos acabamos tendo da infância uma imagem psicologizada, o que nem sempre é um bem.

Que quero dizer com tudo isso? Que agora temos que olhar para a infância. E não adianta não querer olhar, não! Porque você vai com seu carro, pára num semáforo e a primeira coisa que você tem que fazer é apertar um botão e fechar o vidro. Quem é que chega, algum senhor? Alguma senhora importante? Não! A infância. Temos medo da infância. A infância se faz presente. Até na “cumbre” do Paraná, na semana passada, os senhores graúdos estão falando a infância. Tem mais gente falando da infância do que nós pedagogos falamos da infância. Algo que deveria ser nosso, nosso campo, deixou de ser nosso campo. Estamos agora há 10 anos do ECA. Eu tenho acompanhado os comentários dos jornais. Lembro-me de que, no dia do Estatuto da Criança e do Adolescente, eu estava lendo várias reportagens dedicadas ao assunto, nos jornais daquele dia. Fiz questão de comprar para ler. Não traziam um depoimento sequer de um pedagogo. Eram juristas, assistentes sociais, tudo isso; nenhum pedagogo sequer. E lembro-me de que, naquele dia, fui chamado para dar uma reportagem ao ESTADÃO, e eu falei, pensei, será que é sobre isso? Irão perguntar sobre o ECA? Não. Que é que eu achava sobre a proposta dos candidatos a prefeito de S. Paulo sobre aumentar o número de horas de aulas, para acabar com a violência. Desgraça! Por que essa imagem? Por que, quando vamos falar da infância, não se nos perguntam? Porque nos mesmos não vinculamos mais a pedagogia com a infância, e nosso papel de educadores da infância. Outra coisa. Ou retornamos a isso, ou estamos fora do lugar. Seremos especialistas em matemática, física, gramática, em tudo, menos pedagogos; educadores, construtores da infância. Vocês entendem por que eu tenho tanta raiva de licenciados? Dá prá entender? E, em grande parte, a violência está aí! Violência da Escola. Acompanhem os jornais, não passa uma semana que não apareça um caso de violência na escola. Que bom, é a infância que está acordando. Que nos diz que está aí! Que está em condições inumanas para a reprodução do seu tempo de

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infância. A infância negada, a infância perdida, a infância adulterada, a palavra ‘adulterada’ no sentido de que é obrigada a ser adulto quando não devia ser, a ter violência de adulto quando não deveria ter, a ter que sobreviver como adulto quando não devia ter que sobreviver como adulto. Essa adulteração, essa adulterização da nossa infância e adolescência deveria ser o foco principal de nossa preocupação. E ainda falamos que a “função social da escola é formar cidadãos”! Que beleza! Que beleza!

Acho que a grande questão que temos que colocar é se essa infância é cidadã, se é tratada como cidadã; se é possível ser cidadão com seis, sete, oito dez, doze anos, tendo que matar para viver. Isto nós temos que colocar; estas são as grandes questões. Não dizer: ‘vamos educa-los através da consciência crítica para um dia serem cidadãos. Que brincadeira de mau gosto. O problema é mais no fundo: o problema é se é possível ser humano nessa desumanidade das ruas, do trabalhador de rua, nessa desumanidade dos jovens que não têm horizontes. Isso é que temos que colocar-nos, e ainda vamos dizer para eles: “se vocês tiverem consciência crítica, tudo isso vai mudar!” Mudar o quê? Não temos tanta consciência crítica e nosso salário não muda nada. Cadê a consciência crítica da ANDES? Não só de consciência crítica se muda o mundo, nem se constroem direitos dos cidadãos. Eu digo a vocês que tudo isso nos ‘puxa’. Acho que a infância está imersa em uma materialidade tanta, que se situa no limite da brutalidade, no limite de ter que comer ou não comer, de ter que sobreviver ou não sobreviver: este é que é o limite. Ora, isso não é uma criança! E não são nem duas, nem três, nem quatro... são muitas que estão nessas circunstâncias. Outro dia, em Belo Horizonte, um adolescente de 16 anos, outro de 11 e uma criança de 9 assaltaram um ônibus e mataram o motorista. Todos eles iam à escola. Não quero dizer que a Escola tem a culpa de tudo isso, mas quero dizer como a realidade é. E para que mataram? Não tinham comido. Simplesmente, queriam o troco do ônibus. Ao invés de dar para elas: “Vá, comam...”, ainda resiste, para defender a empresa e, é claro, o suor do seu trabalho.

O que foi que eu disse: esses são os limites nos quais estamos inseridos. Eu digo para vocês: ou nós descobrimos de novo essa materialidade geradora ou destruidora das possibilidades da nossa infância ser cidadã ou estaremos fora de foco.

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La educación básica y la “cuestión social” contemporánea1

Emilio Tenti Fanfani

RESUMO: Mudança de concepção dos Estados-nação modernos, submetidos a novas lógicas de produção e intercâmbio, está por aprofundar mudanças significativas da sociedade latino-americana, com impacto na educação. Diferenciação e descentralização progressivas obrigam distintos mundos a conviverem em espaços cada vez mais heterogêneos. Uma tradição cultural anacrônica, do passado, uma engenharia política homogeneizante, do presente, geram uma clivagem de propostas educacionais utópicas, esvaziando o debate da “questão social contemporânea”. Transformar em demanda necessidades educacionais específicas requererá capacidade de convivência ampliada entre diversos, diálogo e negociação entre contrários que gere energia educativa, superação de principalismos e de dogmatismos. Isso assegurará mais e melhor qualidade de educação para todos, com maior eficiência de uso dos recursos.

Palavras-chave: educação básica, globalização e educação; políticas públicas; cidadania e controle social.

RESUMEN: El cambio de concepción de los Estados-nación modernos, sometidos a nuevas lógicas de producción e intercambio, está por profundizar cambios significativos de la sociedad latinoamericana con impacto en la educación. La diferenciación progresiva y la descentralización obligan, cada vez más, a que distintos mundos convivan en espacios cada vez más heterogéneos. Una tradición cultural anacrónica, del pasado, una ingeniería política homogeneizante, del presente, y una clivagen irreconciliable de propuestas educacionales utópicas tornan vacio el debate en torno de la “cuestión social contemporánea”. Tener en cuenta y transformar en demanda especificidades de las necesidades educacionales irá requerir a cada día capacidad de convivencia ampliada entre diversos, diálogo y negociación entre contrarios que genere energía educativa, superación de principalismos y de dogmatismos. Eso garantizará más y mejor calidad de educación para todos, con una mayor eficiencia en el uso de los recursos.

Palabras-clave: educación básica; globalización y educación; políticas públicas, ciudadanía y control social.

1 Conferência proferida em 22 de novembro, sob o título “Educação e Democracia”, no Seminário Educação 2000, promovido pelo Instituto de Educação e o Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Federal de Mato Grosso.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 11 n. 19 jan.-jun. 2002 p. 59-78

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Introducción

Desde el momento constitutivo de los estados-nación latinoamericanos se produjo una profunda diferenciación entre dos ámbitos de vida. Por una parte el mundo de la sociedad y la cultura tradicional de base rural y por el otro el emergente modo de vida urbano, industrial y relativamente integrado (comercial y culturalmente) con los grandes centros mundiales de desarrollo capitalista (Europa y los EEUU). Los sistemas educativos latinoamericanos son contemporáneos al Estado-nación moderno y tuvieron una clara misión de convertir la "barbarie" en "civilización". Esta función manifiesta permeó las instituciones y prácticas educativas en toda América Latina.

Los primeros y más grandes "éxitos" de la escuela latinoamericana se registraron en las ciudades. Donde las sociedades experimentaron procesos de desarrollo y movilidad, la escuela acompañó y facilitó estas transformaciones. Los ritmos y modalidades de inserción de las economías latinoamericanas en la estructura económica del capitalismo mundial fueron extremadamente diferenciados. Lo mismo puede decirse del desarrollo del liberalismo y la democracia política.

Los actuales procesos de globalización reforzaron las tendencias al desarrollo desigual. Por una parte los sectores urbanos ya integrados a la economía mundial estuvieron en mejores condiciones para reconvertirse a las nuevas lógicas de producción e intercambio. Los sistemas educativos fueron acompañando estas transformaciones también de un modo desigual.

Las desigualdades históricas (en términos de oportunidades de acceso, rendimiento y calidad) de la educación básica están en vías de profundizarse como resultado de las transformaciones recientes de la economía y la sociedad latinoamericanas. Los objetivos homogéneos y homogeneizadores de la vieja escuela pública de la etapa constitutiva de las repúblicas modernas contrastan cada vez más con un sistema educativo cada vez más diferenciado, segmentado y "descentrado". Dicha fragmentación, en gran medida tiene la misma morfología de la estructura de la sociedad.

En consecuencia, el problema de la educación básica no existe en forma singular, sino plural y diferenciado según el segmento social de que se trate. Muchas veces la desigualdad y la exclusión social se manifiestan y conviven con la diferenciación y exclusión espacial y territorial. Cada vez en mayor medida, distintos “mundos” conviven en el espacio cada vez más heterogéneo de los Estados nacionales latinoamericanos. Mejorar los

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La educación básica y la cuestión social contemporanea

chances de vida futura de los niños latinoamericanos requerirá de una estrategia diferenciada que tenga en cuenta la especificidad de sus problemas y necesidades educativas.

El texto que sigue tiene dos partes. En la primera se trata de proponer un argumento para entender el sentido de lo que podríamos denominar “la cuestión social contemporánea”. En la segunda se proponen algunos criterios para una política de desarrollo de la educación básica en el contexto del desarrollo social, tal como éste se presenta en la actualidad.

Problemas sociales del capitalismo

1.1. Pensar relaciones

Razones de simple sentido común, y también razones epistemológicas obligan a pensar los problemas sociales y educativos contemporáneos desde un punto de vista relacional e histórico. No existe lo social como una sustancia independiente de lo político, lo económico y lo cultural. Por otro lado, todo objeto social (la pobreza, la exclusión, la familia, el Estado, etc.) es el resultado de un proceso. Por eso toda verdadera ciencia social no puede dejar de ser histórica. El propio lenguaje que usamos para hablar de las cosas sociales, tiene su historia, que es preciso conocer. Esta perspectiva relacional e histórica es la más adecuada para captar las especificidades, las particularidades de las situaciones que debemos enfrentar en el presente.

Durante la segunda mitad del siglo pasado y las primeras décadas del presente, tanto en el campo político como en el intelectual, se instaló una preocupación por los desajustes y problemas sociales emergentes del avenimiento progresivo de la sociedad capitalista, industrial y urbana. Esta “gran transformación”, como la calificó Karl Polanyi (1992), conmovió los cimientos de la sociedad tradicional, desde aquellos que estructuraban su sistema de relaciones económicas hasta los que organizaban el mundo de la cultura y la misma “subjetividad” de los hombres.

Este proceso, que el sociólogo alemán Norberto Elías (1983) denominó “civilizatorio” es multidimensional y afecta en forma contemporánea distintas dimensiones de la vida social. Contra ciertas visiones deterministas simples e ingenuas que pregonan determinadas precedencias lógicas y temporales (“primero el desarrollo de las fuerzas y relaciones productivas, luego las relaciones sociales y después las superestructuras culturales”, etc.), estas transformaciones transcurren por caminos más complejos. Más que pensar en causas simples y lineales es

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preciso pensar en causalidades estructurales y recíprocas, ya que ciertos factores son eficientes en la medida en que actúan combinados con otros. A su vez, los efectos que producen, por lo general terminan por afectar a sus propias causas. Así, mientras algunos tienden a pensar que “el mercado” es una institución “natural” y que, en cierta medida “existe desde siempre” (y que durante mucho tiempo su funcionamiento libre fue deliberadamente interferido por la ignorancia o mala voluntad de los hombres… etc.), un análisis elemental de la historia nos obliga a reconocer que se trata de una configuración social que tiene un origen y determinadas condiciones sociales de emergencia y desarrollo que no se manifiestan de la misma manera en todo momento y en todo lugar.

1.2. Capitalismo y Estado moderno

En efecto, ¿cómo comprender la expansión de la lógica de la producción y el intercambio capitalista sin tomar en cuenta el advenimiento del Estado moderno y su monopolio de la violencia física y simbólica legítimas sobre los hombres que habitan en un territorio bien determinado? A su vez, esta “institución” (es decir sistema de reglas que estructuran las prácticas humanas en un campo determinado) si quiere traducirse en prácticas y comportamientos requiere la conformación de agentes (capitalistas, obreros, etc.) dotados de ciertas predisposiciones específicas, es decir, modos de percepción, de valoración y de acción en situaciones específicas. En otras palabras, el mercado como arreglo institucional requiere (y al mismo tiempo genera) ciertos modos de ser o, en otras palabras, una determinada subjetividad, es decir, un “código moral” o “código de comportamiento” (SEN, A., 1993).

Los procesos de desarrollo de las tecnologías de transporte y comunicación, el despliegue de las fuerzas productivas, la aparición de nuevos y más complejos modelos de división funcional del trabajo y la consecuente extensión de las cadenas de interdependencia de los hombres son procesos que se manifestaron en la conformación de un nuevo modo de producción que se caracteriza por el paso de la economía de subsistencia a una economía monetaria “de mercado”. Estas transformaciones, a su vez, son contemporáneas con el desarrollo del Estado nacional, que fue el resultado de un proceso de concentración de poder en un centro (Paris, Roma o Buenos Aires) y permitió “pacificar” territorios antes ocupados por unidades de poder menor cuyas relaciones a menudo se caracterizaban por la rivalidad y el conflicto armado.

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La educación básica y la cuestión social contemporanea

El monopolio de la violencia física legítima permitió la circulación libre de las mercancías, los hombres y la cultura en espacios territoriales más amplios que el de las viejas ciudades-estado, por ejemplo. Pero el Estado también reivindicó con éxito el monopolio del ejercicio de otro tipo de violencia legítima, el que tiene que ver con su capacidad de imponer determinados significados. El Estado, por lo general impone una lengua como lengua nacional, una historia común y un conjunto de símbolos que identifican a los ciudadanos de un país como formando parte de una unidad que los trasciende. El Estado tiene la capacidad de oficializar relaciones sociales tan relevantes como las que tienen que ver con la reproducción biológica y social de la población y las relaciones de propiedad, por ejemplo. Sólo el Estado otorga una identidad oficial (acta de nacimiento y documento de identidad, acta de matrimonio, divorcio, defunción, etc.). El Estado da (o “legaliza”) títulos oficiales, sean estos de propiedad de bienes materiales o simbólicos tan estratégicos como el conocimiento (títulos escolares).

Este Estado es una construcción social que se desarrolló en el tiempo y fue objeto de lucha y conflicto social entre intereses y proyectos contrapuestos. Es imposible pensar el mercado y la producción capitalista, en su forma contemporánea, independientemente de estas transformaciones en el plano de la política y el derecho que se manifiestan en instituciones sociales novedosas. Por último, economía y política existen en una sociedad determinada, conformada por agentes dotados de ciertas características objetivas y subjetivas, tales como condiciones de vida, propiedad, cultura, valores, etc. El capitalismo tiene y necesita de un “espíritu”, es decir, produce subjetividades y comportamientos diferentes.

1.3. La cuestión social como asunto de Estado

Las viejas formas de la “ayuda social”, basadas en la lógica de la caridad cristiana y su versión secularizada, la filantropía, se mostraron rápidamente insuficientes para responder al tamaño y complejidad de la “cuestión social” capitalista (TENTI FANFANI, E., 1989a). Estado y pobreza. Estrategias típicas de intervención. El problema social fue adquiriendo dimensiones tales que obligó a la sociedad a desplegar nuevas estrategias de intervención. El Estado asumió la función de prestar asistencia a los explotados y oprimidos, víctimas del primer capitalismo. Para ello desplegó un sistema normativo e institucional que fue creciendo paulatinamente con el tiempo. A su vez, los asalariados capitalistas progresivamente fueron adquiriendo cierta capacidad para actuar en forma colectiva en defensa de sus intereses frente a los patrones y frente al Estado. Son conocidos los

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análisis del sociólogo inglés A. Marshall acerca del progresivo desarrollo de los derechos civiles, políticos y sociales. Los obreros del capitalismo constituyeron sus propias organizaciones sociales (sindicatos) y políticas (los partidos socialistas europeos) y lograron modificar los equilibrios de poder en su propio beneficio.

1.4. El trabajo se convierte en empleo

El primer capitalismo, luego de un largo proceso de lucha y negociación, transformó el trabajo humano en empleo, es decir, en una actividad humana regulada socialmente, estructurada mediante un sistema legal sancionado y administrado por el Estado. La relación de trabajo entre el asalariado y el capitalista no se define exclusivamente en función del poder y la capacidad de presión de las partes tomadas aisladamente. Los protagonistas de esta relación contratan en el contexto de un marco legal que define derechos y deberes específicos que los contratantes deben respetar (CASTEL, R., 1996). El Estado capitalista no sólo fue desplegando una serie de leyes y reglamentos, sino que también montó un conjunto de dispositivos institucionales con recursos y competencias como para garantizar el cumplimiento de la legislación y eventualmente sancionar a los infractores eventuales (departamentos de trabajo, tribunales laborales, etc.). También en este caso, la lógica del mercado y del interés privado (de los contratantes) se complementa con un marco regulatorio y las instituciones especializadas que, entre otras cosas, se asientan en ese recurso típico del Estado que es la fuerza publica. El interés privado (de capitalistas y asalariados) y el poder del Estado se complementan para garantizar las condiciones básicas del funcionamiento regular de la producción capitalista.

El mercado de trabajo es el lugar donde se realiza la distribución primaria de la riqueza producida. Sin embargo, el Estado, a través de sus políticas, opera una segunda distribución, llamada por esta razón "secundaria" que en principio tiene como objetivo, entre otras cosas, corregir las desigualdades producidas por la distribución primaria. Este modelo hizo que se considerara verosímil y posible la realización del derecho de ciudadanía social que garantiza a todos los individuos un grado de satisfacción determinado ("una vida digna") de sus necesidades básicas, independientemente de su inserción en el mercado de trabajo.

Detrás de este modelo de organización social que se dio en denominar "welfare state" existieron condiciones objetivas de desarrollo (capitalismo nacional, Estado interventor con políticas anticíclicas de cuño keynesiano, etc.) y actores colectivos, con sus intereses, relaciones de

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fuerza, estrategias, conflictos, etc. cuya historia todavía no se conoce en forma exhaustiva.

El advenimiento del Estado benefactor en la Europa de la posguerra y su despliegue en otros continentes bajo formas más o menos análogas en varios países de América Latina marcó el punto más alto de lo que podríamos denominar el capitalismo integrador (ISUANI, E. A. y TENTI FANFANI, E., 1989b).

El trabajo asalariado pasó de ser un indicador de opresión y oprobio a una condición estamental dotada de un estatuto legal que la estabiliza y le garantiza toda una serie de contraprestaciones no sólo monetarias, sino también sociales (estabilidad en el trabajo, salario mínimo garantizado, vacaciones pagadas, cobertura de riesgos de accidentes, salud, desempleo y vejez, vivienda, formación profesional, etc.). En su momento de esplendor, a mediados de la década de los años setenta, los asalariados constituyen cerca del 80% de la población económicamente activa de la Europa continental. En esos “treinta gloriosos” años (como dicen los franceses) que van de 1945 a 1975, siempre existió un porcentaje de personas que no encontraban empleo. Pero se trataba de un desempleo funcional y en la mayoría de los casos temporal, al que la sociedad hacía frente mediante el seguro de desempleo. Para las situaciones extremas y minoritarias de exclusión social el Estado desplegaba una estrategia asistencial de emergencia.

El capitalismo desarrollado fue capaz de hacer crecer en forma relativamente continua (con sus crisis cíclicas, controladas por medidas de política económica de cuño keynesiano) el volumen de los productos y servicios producidos y una distribución más equitativa de los mismos, lograr una situación cercana al pleno empleo y desarrollar una estructura social donde la gran mayoría de los individuos alcanzaba un nivel digno de satisfacción de sus necesidades básicas. La lucha de clases se fue volviendo lucha individual por las “clasificaciones”, es decir, por escalar posiciones en esa estructura que aparecía bien diferenciada, pero potencialmente abierta para todos.

1.5. El Estado benefactor en América Latina

Algo parecido a este “mundo capitalista feliz” fue realidad en los países del occidente más desarrollado. En América Latina, en cambio, esta imagen fue más un proyecto que una realidad. La denominada etapa de sustitución de importaciones permitió el desarrollo desigual los capitalismos basados en el mercado nacional. En muchos países tales como Argentina,

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Chile, Uruguay, Brasil, México, los procesos de industrialización y urbanización alcanzaron ritmos elevados durante la década de los años sesenta. El grado de incorporación exitosa a estos procesos fue muy desigual. El desarrollismo también trajo como consecuencia la expansión del fenómeno de la marginalidad. La expansión de las favelas, villas miseria, callampas, vecindades, rancheríos, etc. en las afueras de los grandes centros urbanos e industriales fueron el signo distintivo de una época. Sin embargo, en medio de esas dificultades se pensaba que la “villa miseria” era una especie de situación transitoria, una “emergencia” social temporaria que constituía la antesala de la vida urbana formal. La ideología del progreso dominaba en el discurso ideológico de la época tanto en su versión “reformista” como “revolucionaria”. Las fuerzas portadoras de este proceso modernizador en su forma típica fueron la burguesía capitalista nacional y la clase de los asalariados urbanos organizados en sindicatos. Sus expresiones políticas no fueron sólo los partidos. Las fuerzas armadas latinoamericanas y los movimientos populares presididos por líderes carismáticos (el populismo) muchas veces fueron quienes lideraron, con mayor o menor éxito, el proceso de transformación. La fuerza del Estado fue un ingrediente fundamental en esta alianza de poderes que presidió el desarrollo del capitalismo en la América Latina de posguerra.

Sin embargo, grandes contingentes de la población de América Latina nunca se integraron en el corazón del mercado de trabajo capitalista. Los elevados índices de informalidad, precariedad, cuentapropismo y las poblaciones indígenas que viven en gran parte en economías de autosubsistencia son el testimonio del carácter desigual del desarrollo del capitalismo como modo de producción y como modo de vida. Esta población no integrada o parcialmente integrada al empleo moderno y todas sus ventajas asociadas (y que en su gran mayoría integra los rangos de la pobreza urbana y rural tradicional) permanece relativamente al margen de las crisis que periódicamente amenazan la seguridad vital de los grupos más integrados al modo de vida capitalista urbano de América Latina.

2. La “Gran Transformación” actual

Este es el mundo que se termina con las transformaciones del capitalismo actual. La apertura de los mercados nacionales, globalización de las economías, alentados por los profundos cambios en las tecnologías de la comunicación y los transportes, la internacionalización y concentración del capital en sus diversas especies (en especial la financiera y la científico-tecnológica) han producido una serie de efectos sobre las configuraciones

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políticas, sociales y culturales que acompañaron la emergencia y desarrollo de ese primer capitalismo que acabamos de describir arriba.

Hoy tenemos otro Estado y otra relación estado-sociedad, otras relaciones de fuerza entre poderes económicos, políticos y culturales, otra morfología social y nuevos dilemas de integración social. El proceso recién está en sus inicios y las sociedades tienen más conciencia de lo que se termina que de lo que está emergiendo. Por eso la moda de las etiquetas post para calificar cambios en la cultura, la economía, el Estado, etc. (sociedad postmoderna, postindustrial, etc.).

2.1. Características estructurales

En brevísima síntesis, y sin proponer un orden o estructura interpretativa, estas son algunas de las características distintivas de las transformaciones en marcha:

a) en la economía: expansión de la economía a escala planetaria, tendencia a la liberación de todas las barreras que regulaban y limitaban el movimiento del capital financiero y (en menor medida) las mercancías, introducción creciente de conocimiento científico y tecnológico en la producción de bienes y servicios, tendencia a producir nuevos productos y servicios para públicos restringidos (a diferencia de la producción de masas de tipo fordista), mercantilización progresiva de bienes y servicios, desarrollo de pequeñas unidades productivas desconcentradas, etc.;

b) en la política: constitución de centros de poder (y su concentración) en agencias supraestatales (mundiales o regionales) e incapacidad para establecer regulaciones en los movimientos financieros, privatización, delegación, descentralización, desconcentración de competencias y atribuciones del Estado nacional hacia unidades territoriales menores (provincias, municipios, etc.), debilitamiento de los agentes e instituciones políticas frente a otros poderes (económicos, comunicacionales, religiosos, etc.), reducción del Estado como productor de bienes y servicios básicos y desregulación de la economía, crisis de los sistemas de representación tradicionales (partidos, parlamentos, etc.) y en la participación ciudadana, etc.;

c) en la cultura: contradicción entre la imposición hegemónica de determinados modos de vida (la mentada “macdonaldización” del mundo) como resultado, entre otras cosas, de la globalización de las economías y las agencias de producción cultural (medio masivos de comunicación) y procesos tales como multiplicación de las ofertas culturales y fortalecimiento de formaciones culturales tradicionales y premodernos, despliegue de

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nuevas y viejas formas de irracionalismo, relativismo cultural, etc. que plantean problemas nuevos a las agencias tradicionales encargadas de la formación de la subjetividad (familia, escuela, etc.), predominio de una cultura que privilegia el egoísmo, lo privado, la lógica utilitaria y calculadora por sobre la acción colectiva, la solidaridad, lo público y el interés general, como principios estructuradores de las prácticas sociales de todo tipo (productivas, sociales, afectivas, morales, etc.

Todo cambio social obedece a una combinación de factores objetivos cuya dinámica no es sólo parcialmente planificada y calculada (por ejemplo, el desarrollo demográfico, el científico tecnológico, etc.) y de factores subjetivos que tienen que ver con actores colectivos, intereses, estrategias y equilibrios de poder. En parte, las transformaciones económicas, políticas y culturales fueron objeto de una política y un proyecto que operaron dentro de un contexto objetivo determinado.

Las políticas públicas del denominado “Washington consensus” o del “neoliberalismo” fueron posibles en virtud de una modificación significativa en los equilibrios de poder. Un dato salta a la vista: la tendencia a la fragmentación y debilitamiento de los actores colectivos clásicos, en especial, fragmentación de los actores sociales y políticos representativos de los asalariados, como resultado de las modificaciones introducidas en la producción capitalista. Hoy asistimos al fin de las grandes unidades de producción típicas del primer capitalismo, la desconcentración de la producción en unidades pequeñas, la fragmentación, particularización y diferenciación de la fuerza de trabajo en relación con la incorporación de conocimiento científico y tecnológico y la aparición de nuevas y más complejas formas de división del trabajo, etc.

Demás está decir que, mientras los asalariados disminuyen en cantidad y calidad (se diferencian por sector, calificación, función, tamaño de la empresa, localización geográfica, etc.) y se debilitan sus organizaciones representativas (sindicatos, partidos obreros, etc.), el capitalismo (en sus diferentes manifestaciones) tiende a la concentración y aumenta su capacidad relativa de determinar políticas públicas definiendo reglas y orientando recursos en función de sus intereses y proyectos. Estos cambios en las relaciones de fuerza están en la base de la implementación más o menos exitosa de muchas políticas neoliberales, tanto en los países centrales como en los periféricos, en un contexto de democracia política.

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2.2. La “cuestión social” hoy

Las nuevas configuraciones económico-sociales de la era de la globalización demuestran ser más efectivas para aumentar la producción que para distribuir la riqueza. En otras palabras vivimos tiempos en que las sociedades como un todo son más ricas, pero también más desiguales. Cada vez más ciudadanos, hombres y mujeres, viejos y jóvenes, habitantes del campo y de las ciudades quedan fuera de la economía moderna, son excluidos de los frutos del bienestar y también de las ventajas y responsabilidades de la ciudadanía política.

Cada vez se produce más riqueza con menos fuerza de trabajo y para menos consumidores. Las naciones unidas estiman que en este fin de siglo, el 20% de la población consume el 86 % de los bienes y servicios contabilizados en el PBI mundial. En palabras simples, los ricos son cada vez más ricos y los pobres son cada vez más numerosos. Pero para comprender el carácter propio de esta pobreza en relación con las pobrezas previas del capitalismo es preciso revisar los impactos de las transformaciones del modo de producción sobre la estructura y dinámica del empleo actual.

Hoy el mercado de trabajo presenta algunas novedades de peso que es preciso analizar con mayor profundidad. Entre ellas pueden citarse las siguientes:

a) El empleo se convierte en un elemento escaso en la sociedad. El indicador más evidente es la aparición del desempleo abierto de dos dígitos. Este fenómeno es más llamativo allí donde el mercado del empleo formal fue capaz de incorporar a proporciones significativas de la fuerza de trabajo, como es el caso de los países capitalistas avanzados y las sociedades latinoamericanas de mediano desarrollo. Junto con el fenómeno del desempleo abierto se manifiestan otras modalidades de inserción incompleta, tales como el subempleo (individuos que trabajan menos tiempo del que quisieran trabajar) y el desempleo oculto constituido por aquellos que, aun cuando necesitarían trabajar, se auto excluyen de la búsqueda de empleo, desestimulados por la escasa o nula probabilidad de acceder al mismo.

b) El empleo tiende a la informalización, es decir, a convertirse cada vez más en una relación social de hecho. En consecuencia, la relación laboral está cada vez más determinada por la fuerza propia de los agentes directos (en el límite, la fuerza del asalariado y el empleador particular). Demás está decir que esta desregulación produce una modificación del

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equilibrio de poder entre capitalistas y asalariados en beneficio de los primeros. Y por lo general, la experiencia enseña que la fuerza del derecho laboral tuvo un importante efecto igualador (el Estado de derecho se asienta en la igualdad de todos ante la ley).

c) La crisis de la idea de contrato colectivo de trabajo. La relación laboral tiende a reproducir las formas originales de un contrato individual entre asalariado y empleador. Los primeros tienden a perder el valor agregado de la negociación colectiva, por rama o por sector. En el límite, el capital prefiere discutir y definir las condiciones de trabajo en forma individual con cada uno de los agentes. El debilitamiento de las organizaciones representativas del trabajo está detrás de la decadencia de la idea y la práctica de la negociación y el contrato colectivo.

d) La mayoría de los nuevos empleos que generan las economías actuales son precarios, con duración predeterminada y también inestables. El puesto de trabajo en la economía formal había adquirido un carácter de estabilidad que estructuraba buena parte de la vida de los asalariados y sus familias ofreciéndoles un horizonte largo que permitía planificar proyectos, calcular recursos e inversiones del más diverso tipo (compra de bienes materiales, inversiones educativas, estrategias reproductivas familiares, etc.).

e) Los empleos se crean preferentemente en el sector de la producción de servicios personales, la mayoría de ellos muy particularizados y en pequeñas unidades productivas. La terciarización de la economía planea una serie de desafíos a los sistemas de formación de la fuerza de trabajo, en especial la educación formal. Las competencias que se requieren para desempeñar estas tareas son un mix de conocimiento técnico (muchas veces de carácter complejo) y de actitudes, capacidades y valores relacionales y comunicacionales que requieren un tiempo y recursos adecuados para su aprendizaje.

f) Por último, el mercado de trabajo tiende a privilegiar el trabajo autónomo sobre el trabajo asalariado. La autonomía supone una capacidad, por parte del trabajador, para crear su propio puesto de trabajo y garantizar cotidianamente las condiciones sociales de su reproducción. Y esto no se realiza sin poner en práctica una serie de conocimientos y orientaciones (creatividad, capacidad de iniciativa, de cálculo, de relación, negociación, etc.) cuya apropiación supone un laborioso y costoso proceso de aprendizaje.

Este cuadro incompleto y desordenado de las transformaciones del trabajo en nuestras sociedades son de tal magnitud que obligan a

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"reconvertir" a cantidades ingentes de trabajadores que se vuelven innecesarios y/o “inempleables”. Esta es la lógica que subyace a la "cuestión social" contemporánea: a) se puede aumentar la producción disminuyendo el empleo (en el límite se puede producir el doble con la mitad de los empleos actuales) y b) la inserción en el mercado de trabajo emergente requiere una reconversión de la fuerza de trabajo que ningún espontaneismo de las fuerzas del mercado puede garantizar.

3. Pedagogía e integración social

El discurso sobre la educación, en especial aquel que pretende cierta cientificidad, es demasiado “educacionista” y relativamente indiferente a los debates y avances que se registran en el ancho y dinámico campo de las ciencias humanas. Por eso predomina una visión estrecha de las cosas de la escuela, demasiado a menudo incapaz de analizarlas en relación con las grandes transformaciones que acontecen en otras dimensiones de la vida social tales como las que se describen arriba.

¿Cuáles son los grandes temas donde la cuestión escolar encuentra su razón de ser y su sentido? En términos analíticos estos son tres: a) el de la producción, el trabajo y la justicia; b) el de la libertad y la política y c) el de la construcción de la subjetividad y el sentido en las sociedades contemporáneas. En un primer momento proponemos un esquema interpretativo del contenido de cada uno de estos ejes de transformación social, luego tomaremos posición acerca de algunas “soluciones” que se ofrecen en el campo de la política educativa nacional.

3.1. Desigualdades sociales y escolares

Uno no compra educación como compra un par de zapatos. La educación de los niños, al igual que su salud, no se compra "hecha". En las sociedades actuales es una tarea compartida entre el propio niño, la familia, la escuela, los medios de comunicación y los otros ámbitos de la vida social tales como la iglesia, la calle, los amigos, el club, etc. Pero lo fundamental pasa por la relación familia-escuela. La calidad de la educación siempre depende de la cantidad y calidad de los "recursos" (en el sentido amplio del término) que la familia y la escuela invierten en el desarrollo de las generaciones jóvenes. Por lo tanto, el éxito del proceso educativo depende en gran medida de una adecuada división del trabajo pedagógico entre las principales instituciones socializadoras. Es bueno discutir y definir entonces cuáles son las responsabilidades y las articulaciones pertinentes para evitar confusiones e incumplimientos que terminan por afectar el desarrollo

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integral de nuestros niños y adolescentes. Sociedades actuales, tanto la familia como la escuela tienen responsabilidades "indelegables".

La segunda es que tanto los recursos familiares, como los escolares no están igualitariamente distribuidos en la sociedad. Hay cosas que son necesarias para el desarrollo infantil que sólo la familia puede proveer (el afecto y la atención particularizada, continua e integral, la primera educación moral, etc.) y que al ser constitutivas de la personalidad del niño son determinantes al momento de constituir su subjetividad. El amor y el cariño de un padre y una madre (o de los hermanos, abuelos, tíos, etc.), cuando por diversas razones llegan a faltar, no pueden ser provistos por un sistema burocrático de Estado (una especie de "ministerio del amor" sería impensable, mientras que un programa de comedores escolares es plausible y necesario). La educación de la familia es la educación "primera" y fundamental, porque determina los aprendizajes posteriores. La institución escolar viene "después" y tiene cada vez más un componente técnico-profesional.

En América Latina, demasiadas veces, la pobreza de las familias se encuentra con las pobrezas de la oferta escolar (TENTI FANFANI, E., 1995). Por lo general, las escuelas para los excluidos y dominados son escuelas pobres desde el punto de vista de sus equipamientos didácticos, infraestructura física y calidad de los recursos humanos que allí trabajan. Las dos pobrezas se potencian. A su vez, los maestros (muchas veces con la complicidad de las propias familias) tienden a tener bajas expectativas con respecto a las capacidades de aprendizaje de los niños que provienen de hogares carenciados. Este factor subjetivo viene a reforzar la eficacia propia de los factores estructurales. Todo tiende a conformar un círculo vicioso de la pobreza social y la pobreza de los aprendizajes escolares.

Los procesos de masificación de la escolaridad se han desarrollado en las peores condiciones en cuanto a la calidad de los insumos materiales y simbólicos que conforman la oferta escolar. El caso de la Argentina es paradigmático. Tres cifras bastan para hacerse una idea del empobrecimiento de la escuela. Entre 1980 y 1995 el número de alumnos en la educación básica creció un 65%, el número de maestros lo hizo en un 55% mientras el gasto público en educación solo subió un 13%. Pero el sistema educativo tiene una gran capacidad de mantener ciertas apariencias, en parte porque las familias (con aranceles, cuotas a la cooperadora, aportes en trabajo, etc.) y muchos maestros (inversiones en capacitación, materiales didácticos, etc.), aumentaron sus contribuciones directas al sistema educativo nacional, en un monto todavía no calculado.

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El deterioro lento y casi imperceptible de la escuela de las mayorías hará pobres a las clases populares y medias argentinas, sin que ellas se den cuenta. Las escuelas de las mayorías van perdiendo calidad como la gente pierde el pelo: sin estridencias, pero sin pausa. Los títulos se distribuyen cada vez en mayor cantidad pero ya no garantizan un conocimiento equivalente de sus portadores.

En polos extremos de la estructura social encontramos, por un lado, a los grupos más privilegiados, que son capaces de asegurar su propia reproducción social enviando a sus hijos a instituciones educativas elitistas “de excelencia”. En cambio, para los más pobres no hay “buena escuela” que alcance. En otras palabras, se requiere un mínimo de igualdad social para garantizar la igualdad de oportunidades en la escuela, y éste es un objetivo que excede a cualquier política educativa.

La fragmentación social de la oferta escolar, de no mediar correcciones fuertes, tiende a reproducir la segmentación del mercado de trabajo. Mientras en la cúspide se ubica una minoría de empleos modernos que demandan una “nueva” fuerza de trabajo dotada de una serie de características tales como creatividad, capacidad de aprendizaje permanente, iniciativa, facilidad comunicativa, predisposición para trabajar en grupo, asumir responsabilidades y tomar decisiones en forma autónoma con bajo nivel de supervisión, habilidad para argumentar, negociar, establecer alianzas, administrar conflictos, etc., en la base de la pirámide ocupacional se encuentra la mayoría de los puestos de trabajo, los cuales están ocupados por sujetos con perfiles de conocimientos y actitudes más bien tradicionales, que conformaban el curriculum de la vieja educación básica.

Ninguna reforma escolar resolverá el problema contemporáneo del trabajo. Pero una actualización de contenidos y estrategias pedagógicas puede tener un efecto constructivo, al mismo tiempo que garantizaría una mejora de la igualdad de oportunidades de las clases menos privilegiadas de acceder a los puestos de trabajo más valiosos de la sociedad.

3.2. Democracia y ciudadanía

La política se está convirtiendo en un espacio de juego cerrado. La crisis de la política es también una crisis de la relación de representación. El lenguaje de los representantes es un lenguaje hermético, un doble lenguaje: para adentro, es decir, para los colegas rivales del campo; y para afuera: para la ciudadanía, con el fin de conseguir consenso y voto. La distancia social y cultural entre representantes y representados aumenta la

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probabilidad de la decepción de la ciudadanía. Hoy la participación supone el saber hablar, saber qué decir, cómo decirlo, a quién y cuando decirlo, etc. El que no puede decir lo que siente, lo que desea o no desea, etc. no puede “hacer cosas con palabras” y por lo tanto está condenado a delegar un poder a quien sí tiene ese “don”. Y este representante, que es el que “habla en nombre de”, demasiadas veces termina usando este “capital” para satisfacer sus propios intereses. La consecuencia es la malversación de confianza, la traición, la promesa incumplida, la corrupción, etc. que degradan la democracia y constituyen el caldo de cultivo de los autoritarismos más diversos.

La primera educación democrática es la que desarrolla competencias expresivas en la mayoría de la población: el lenguaje natural (la lengua en el sentido más amplio del término) y el lenguaje simbólico (las matemáticas). La vieja escuela constituyó a la formación ciudadana en una materia del programa escolar, pero no basta aprender las “reglas” y las normas de la vida republicana (“estudiar la constitución”) para formar un ciudadano activo. La mejor pedagogía de la democracia es una escuela efectivamente democrática, donde los niños no sólo aprenden conceptos sino que viven experiencias, es decir, votan, toman decisiones en conjunto, se hacen responsables de las consecuencias de las decisiones que toman, argumentan, debaten, evalúan, controlan, etc.

3.3 El problema de la cultura y el sentido

En cuanto la formación moral, ética, estética de los individuos la escuela tiene un poder relativo, compartido con otras instituciones tales como los medios de comunicación, los consumos culturales, las iglesias, etc. Pero hay ciertas cosas básicas y fundamentales que sólo la escuela puede hacer: cosas tan elementales y al mismo tiempo tan estratégicas como enseñar a leer y escribir y enseñar matemáticas, por ejemplo. Nadie aprende a leer y escribir mirando televisión. Y tampoco aprende a entender “lo que pasa” en la sociedad y en el mundo. Borges decía que las escuelas deberían enseñar a leer los diarios. Hoy habría que agregar: a ver televisión y “usar” la rica oferta de bienes culturales cada vez más al alcance de las mayorías. Pero no basta con poner los productos de la cultura (libros, obras de arte, información, datos, máquinas, etc.) al alcance de todos para democratizar su acceso. Para encontrar un sentido a la vida es preciso interiorizar esquemas de percepción y de valoración. Ellos permiten dar sentido a hechos y acontecimientos (políticos, económicos, culturales, etc.) que de otro modo parecen incomprensibles, despojados de interés o bien

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lisa y llanamente absurdos. Un sujeto autónomo es capaz de interpretar, analizar, argumentar, demostrar, “ver relaciones e interdependencias entre” hechos y datos que parecen aislados e independientes, ir más allá de las apariencias y del presente, usar una perspectiva histórica, una idea de proceso, etc., cualidades que requieren un tiempo de aprendizaje sistemático que solo una institución como la escuela puede garantizar (TENTI FANFANI, E.; 2000).

No existen soluciones hechas para estos desafíos. Sin embargo, no faltan quienes tienen propuestas y programas para ofrecer.

3.4. La solución neoliberal

Antes que nada hay que recordar que no existen respuestas automáticas. No queda más remedio que reivindicar la política. Pero el “Estado productor” prácticamente desapareció de la escena y el “Estado que quedó” es extremadamente incapaz de cumplir con las finalidades públicas relacionadas con el interés general. No existe consenso acerca de cuáles son sus funciones ni acerca de cómo tiene que desempeñarlas.

Para combatir los efectos perversos (en términos de calidad y equidad) de la gratuidad de los servicios colectivos ofrecidos muchas veces en condiciones monopólicas, los “neoliberales” proponen la distribución de bonos o cupones para que aquellos individuos o familias con débil capacidad adquisitiva puedan “comprar” la educación en el mercado. Esta capacidad de elegir constituiría una especie de recurso en manos de los consumidores para alentar la mejora de los servicios en términos de calidad y eficiencia.

Con este procedimiento se evitaría que se aprovechen de las transferencias públicas aquellos sectores que poseen ingresos suficientes como para pagar de su bolsillo la educación que necesitan. Este mecanismo estimularía una mayor competencia entre prestadores, contribuyendo así a una mejora en la calidad de la educación ofrecida.

El prestigioso “más que economista” (economista e intelectual en el sentido amplio de la palabra) Albert Hirschman sugiere atinadamente que esta alternativa es recomendable sólo en la medida en que se den las cuatro condiciones siguientes: 1. “Cuando los gustos de los individuos varían en proporciones considerables y cuando estas divergencias son reconocidas como legítimas”; 2. “Cuando los individuos están bien informados acerca de la calidad de los bienes y servicios que desean, y cuando les es fácil comparar las diferentes opciones ofrecidas”; 3. “Cuando el volumen de estas compras es relativamente poco elevado con relación a

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su ingreso total y se reiteran lo suficiente como para que los consumidores puedan extraer provecho de su experiencia y cambiar fácilmente de proveedor”; 4.“Cuando los proveedores son lo suficientemente numerosos como para establecer una relación de competencia” (TENTI FANFANI, E., 1989b.

Cualquier lector advertido puede darse cuenta que estas condiciones son lógicas y al mismo tiempo difíciles de reunir en el caso de la educación básica nacional. En primer lugar, aquí y en cualquier parte del mundo, se considera que existen ciertos objetivos y contenidos educativos que no pueden no estar presente en todas las instituciones que constituyen la oferta educativa. Por lo general se trata de ese mínimo común denominador hecho de conocimientos y valores que es preciso desarrollar en todos los miembros de las nuevas generaciones y que tienen que ver con la formación de la ciudadanía en una sociedad democrática. Aquí las “divergencias” no son pertinentes ni legítimas. Hay ciertas cosas que no son materia de “elección”. Por otra parte, ¿quién es el que elige, la familia o los niños? “Estos no son - escribe Nadia Urbinati, una politóloga italiana que enseña en Princeton - ni propiedad de las familias ni mucho menos propiedad del Estado. La autonomía como conquista progresiva de los individuos necesita de la protección del Estado.” Más que nada, tiene la obligación de “ofrecer a todos los instrumentos y las oportunidades para que se formen su propia visión y vocación, en el respeto de sí mismos antes que de los valores y la voluntad de la familia de origen”.

¿Y qué decir de las otras condiciones puestas por Hirschman? En Argentina no existe una pluralidad de oferta, ni el servicio educativo es objeto de “compra reiterada” como para permitir un aprendizaje que haga posible la elección racional del proveedor más conveniente. Además, es obvio que no se cambia de escuela tan fácilmente como se cambia la marca de las zapatillas….

Hay que recordar que el conocimiento es un valor cuya distribución no debería estar determinada por el dinero, el poder político o la pertenencia a determinada clase social, de género, étnica, etc. El criterio principal para la distribución del conocimiento debe ser el mérito. En la base está el derecho a que cada uno tenga una oportunidad igual de expresar sus propios talentos y de formarse como ciudadano. Ni el mercado, ni la familia son suficientes para constituir al ciudadano de las repúblicas liberales y democráticas modernas.

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3.5. Las reformas necesarias

La crítica de la propuesta neoliberal no justifica ninguno de los múltiples vicios de ese elefante perezoso que es la escuela pública argentina. Pero al igual que todas las burocracias públicas la escuela tiene fallas reparables.

La historia de las reformas exitosas enseña que la clave está en buscar la “combinación óptima” de recursos y estrategias. En este sentido no hay que temer a cierta institucionalización de “la competencia”, la emulación y la capacidad de iniciativa de los maestros e instituciones. Al mismo tiempo estos “automatismos” que inducen determinados comportamientos virtuosos deben complementarse con intervenciones políticas que orientan y estructuran “el modo de hacer las cosas de la educación” hacia ciertos objetivos y metas socialmente debatidas y acordadas.

Y en este sentido hay que superar esa perversa división del trabajo político donde unos tienden a monopolizar el valor de la justicia (los “progresistas”), mientras que otros pretenden hacer lo mismo con la búsqueda de la “calidad, la excelencia y la eficiencia” en la prestación del servicio (los “conservadores”). Muchas de las transformaciones educativas en curso encuentran un obstáculo en esta tendencia al maniqueísmo y a la polarización política que lleva a adjudicar las peores intenciones a los adversarios. Dicha postura es paralizante, políticamente estéril y desmovilizadora ya que excluye hasta la posibilidad de que el otro simplemente “se equivoque”. En estas condiciones la política es una pura lucha entre fuerzas (la capacidad de imponer versus la capacidad de resistir y sabotear) totalmente despojada de toda argumentación racional, diálogo y negociación.

Más allá de las falsas antinomias se impone un objetivo común: más y mejor calidad de la educación para todos y con la mayor eficiencia en el uso de los recursos, que por definición son escasos. Sobre este consenso básico se puede desarrollar un programa de intervención y al mismo tiempo construir las alianzas que permitan generar la energía política y reunir los recursos necesarios para la gran reforma que ponga al sistema educativo nacional en condiciones de responder a los desafíos económico-sociales, políticos y culturales que deberán enfrentar las nuevas generaciones en América Latina.

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Bibliografía

CASTEL, Robert (1996). Les metamorphoses de la question sociale. Une chronique du salariat. Fayard, Paris.

ELIAS, N. (1987). Potere e civiltà. Il Mulino, Bologna.

ELIAS, N. (1998). La civilización de los padres. Norma/Universidad Nacional. Bogotá.

SEN, Amartya (1993). Codes morales et reussite economique. En: Actes de la Recherche en Sciences Sociales (Paris), N. 100, p. 58-65.

TENTI FANFANI, E. (1995); La escuela vacía. Deberes del Estado y responsabilidades de la sociedad. Losada/UNICEF, Buenos Aires, cuarta edición.

TENTI FANFANI, E.(1991) El Estado Benefactor. Ensayos sobre un paradigma en crisis. CIEPP/Miño y Dávila editores, Buenos Aires 1991 (en colab. con E. A. ISUANI y R. LO VUOLO).

TENTI FANFANI, E. (1989a). Estado y pobreza en la Argentina. Estrategias típicas de intervención. Centro Editor de América Latina, Biblioteca Política Argentina, dos volúmenes (N. 255 y 256), Buenos Aires, 209 p.

TENTI FANFANI, E. (1989b). Estado democrático y política social (En colab. con E. A. ISUANI, Susana LUMI y otros); Eudeba, Buenos Aires, 260 p.

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Política e educação1

Maria do Carmo de Lacerda Peixoto

RESUMO: Estados e sociedades, através de seus organismos intermediários, sofrem o impacto de uma mudança de paradigma. Concepções de realidade discrepantes formulam hipóteses de “saída” para a crise. Liberais, pluralistas e marxistas se defrontam com distintas tarefas para a educação. Organizações internacionais estabelecem programas e prioridades sob a pressão de Estados capitalistas centrais. Entende-se que, em face de perda do monopólio regulatório do Estado, haja novos espaços para a sociedade civil e aliados. É necessário ampliar e ocupar espaços para os quais sejam acordadas novas políticas que impliquem a participação e o controle público, em suma, a intensificação da cidadania ativa.

Palavras-chave: política educacional; globalização e educação; políticas públicas, cidadania e controle social.

RESUMEN: Estados y sociedades, a través de sus organismos intermediarios, sufren el impacto de un cambio de paradigma. Concepciones de realidad discrepantes formulan hipótesis de “salida” para la crisis. Liberales, pluralistas y marxistas se enfrentan con distintas tareas para la educación. Organizaciones internacionales establecen programas y prioridades bajo la presión de estados capitalistas centrales. Se entiende que, en face de la pérdida del monopólio regulatorio del Estado, haya nuevos espacios para la sociedad civil y aliados. Es necesario, la ampliación y ocupación de espacios para los cuales sean acordadas nuevas políticas que impliquen la participación y el control público, en suma, la intensificación de la ciudadanía activa.

Palabras-clave: política educacional; globalización y educación; políticas públicas, ciudadanía y control social.

Quero começar a abordagem da relação entre política e educação a partir da compreensão do que é a política, atividade que, vista de um modo abrangente, trata da convivência entre pessoas diferentes, que se organizam para realizar certas coisas em comum. Como os homens

1 Conferência proferida em 23 de novembro, no Seminário Educação 2000, promovido pelo Instituto de Educação e o Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Federal de Mato Grosso.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 11 n. 19 jan.-jun. 2002 p. 79-87

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dependem uns dos outros, é necessário que haja um modo de provimento da vida de todos, para tornar possível esse convívio. Como diz Hanah Arendt,2 a política existe na relação entre-os-homens, se estabelece totalmente fora dos homens, organizando, de antemão, as diversidades absolutas de acordo com uma igualdade relativa e em contrapartida às diferenças relativas. Necessária para a vida tanto do indivíduo e da sociedade, é provida através do Estado, detentor do monopólio do poder e responsável por impedir a guerra de todos contra todos.

A política realiza-se numa esfera específica da sociedade, tendo regras e funcionamento próprios. O seu “fazer” se enraíza e se realiza em determinados lugares da sociedade: sindicatos, partidos, Estados, movimentos sociais. Nas sociedades contemporâneas ela se constitui numa esfera especializada, no interior da qual se realizam e se confrontam as ideologias e os programas partidários, as intenções e os projetos dos seus membros. Supõe a existência de um homo politicus, que se comporta de acordo com metas racionais, claramente determinadas, e se associa com outros, tendo em vista empreender estratégias para atingir as metas pretendidas, partilhando concepções díspares e antagônicas.

A política se atualiza e floresce no seio do Estado-nação e, por isso mesmo, fazer política significa se ocupar principalmente com temas localizados no interior do Estado-nação. Nos países do chamado terceiro mundo, até meados deste século, a construção nacional era considerada como uma utopia e cada país idealizava suas metas no contexto de sua história particular, de sua identidade, tendo em vista a construção de seu projeto de nação. A nação se situava no futuro, era algo inacabado, sua configuração idealizada contrastava com o presente.

Há três décadas, encontram-se em xeque as formas e funções assumidas pelo Estado-nação, em conseqüência das crises enfrentadas pelo modo de produção capitalista e dos rumos traçados para sua superação, implicando no aprofundamento do grau de intervenção do Estado na sociedade, que se tornou mais hipertrofiado e complexo. Nesse contexto é que vem se situando o processo de globalização, configurando uma outra geopolítica, em articulação com os requerimentos do modo de acumulação flexível, que vai se impondo, a partir da absorção das novas tecnologias. O Estado-nação perdeu o monopólio de conferir sentido às

2 Hanah Arendt, O que é política?, Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 1998.

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ações coletivas, precisando, agora, de competir com outras instâncias e enfrentar as contradições internas ao próprio processo de globalização.

Ao longo dos anos oitenta, em conseqüência da crise do Estado-providência, a agenda de muitos países foi composta por estratégias políticas e econômicas visando a redefinição dos direitos sociais, a revalorização do mercado, a reformulação das relações do Estado com o setor privado, a adoção de novos modelos de gestão pública, preocupados com a eficácia e a eficiência. A política passou a ser feita no mercado, o que, como diz Milton Santos,3 poderia equivaler à sua própria decretação de morte, porque para ser realizada, ela supõe visão de conjunto, a consideração de todos e de tudo, do conjunto de realidades e relações existentes e não apenas dos interesses particulares, como ocorre no mercado. Assim sendo, à medida que as instituições encarregadas de cuidar do interesse geral se vêem enfraquecidas pelo favorecimento dos interesses das grandes empresas, abandona-se a noção e a prática da solidariedade, produzindo-se as condições da ingovernabilidade do Estado.

A despeito dessa situação, e dos que afirmam que com a globalização deixa de existir o Estado-nação, o que se configura é, na verdade, a instauração de um território nacional da economia internacional. Isto é, o Estado nacional detém o monopólio das normas, que regulam a eficácia de atuação dos fatores externos no seu interior e, assim sendo, a globalização acaba por não ser um elemento impeditivo para a constituição de um projeto nacional. A política continua, portanto, a ser uma prática demarcada pelas imposições nacionais, realizando-se por meio de partidos, sindicatos, governos, movimentos sociais, que possuem validade apenas no interior do Estado-nação.

Torna-se, por isso, necessário ter teorias que dêem conta da redefinição do papel do Estado e que sejam capazes de explicar os limites e possibilidades da sua ação no contexto das novas condicionantes, concebendo-o como elemento de um contexto mais amplo de condições, relações e associações políticas. Ele, dessa forma, vem perdendo centralidade, responsabilidade e visibilidade social, transferindo responsabilidades e funções para novos atores sociais, e induzindo, por processos muito diferenciados, novas representações e concepções em torno do bem comum e do espaço público, promovendo a instauração de

3 Milton Santos, Por uma outra globalização, do pensamento à consciência universal, Rio de Janeiro, Record, 2000.

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quase-mercados4 e estabelecendo relações com o terceiro setor, que evidenciam o caráter híbrido das novas formas de financiamento, fornecimento e regulação. Essas novas modalidades de espaço público não significam necessariamente diminuição do poder de atuação do Estado, em razão das tensões e contradições presentes numa fórmula política que exige um Estado limitado e, ao mesmo tempo, forte no seu poder de intervenção. A criação desse espaço não estatal a partir da complementaridade entre terceiro setor e Estado demanda, por sua vez, a busca de uma articulação entre lógicas distintas: a da reciprocidade, própria do princípio da comunidade, e a da cidadania, própria do princípio do Estado.

Na relação entre política e educação, as políticas públicas constituem-se na materialidade da intervenção do Estado, isto é, elas são o “Estado em ação”, para usar a expressão de Jobert e Muller.5 A escola e, principalmente, a sala de aula são os espaços em que se concretizam suas definições, sendo o cotidiano escolar o elo final de uma complexa cadeia, montada para dar concretude a essa política, a esse programa de ação, construído em função de decisões políticas, e refletindo as relações de poder e dominação que se estabelecem na sociedade.

As políticas públicas combinam um conjunto de elementos contraditórios, porque as decisões tomadas por seus fazedores, para defini-las e formulá-las, se apóiam em algum tipo de definição social da realidade, peculiar a determinados grupos. O processo pelo qual se define e se implementa uma política está, portanto, vinculado ao universo simbólico e cultural próprio da sociedade em que ela ocorre, articulando-se, também, ao seu sistema de dominação e ao modo como se processa a articulação de interesses sociais nesse contexto.

Tendo por base a análise da situação dos países do capitalismo avançado, podemos apresentar um breve quadro das distintas concepções e definições sociais da realidade que se fazem presentes, no campo das

4 Quase-mercados: são mercados porque substituem o monopólio do Estado por diversos fornecedores independentes e competitivos. São quase, porque distintos dos convencionais, porque competem por clientes, mas não visam necessariamente a maximização dos lucros; os consumidores podem delegar sua representação no mercado a certos agentes; o poder de compra dos consumidores não se expressa necessariamente em termos monetários. Exemplo disso é a promoção de mecanismos como publicização dos resultados escolares, abrindo espaço para a realização de pressões competitivas no sistema educativo.5 B. Jobert e P. Muller, L’Ëtat en Action, Paris, PUF, 1987.

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relações entre educação e políticas públicas. Na perspectiva neoliberal, por exemplo, o Estado é entendido como guardião dos interesses públicos, creditando-se ao mercado a capacidade de regulação do capital e do trabalho, considerando-se as políticas públicas como as principais responsáveis pelo quadro de crise. A intervenção estatal seria responsável por produzir o desequilíbrio da ordem nos planos econômico, social e moral, desrespeitando os princípios da liberdade e individualidade, valores básicos do ethos liberal capitalista.

A educação é uma função permitida a esse Estado guardião, porque a ampliação das oportunidades educacionais é considerada como um dos fatores mais importantes na regulação das desigualdades sociais, produzidas pela distribuição desigual das oportunidades educacionais. A oferta de chances educacionais, nessa perspectiva, permitiria que os mais habilidosos ascendessem socialmente, estimulados por um sistema meritocrático. Mesmo sendo considerada como função do Estado, pretende-se que os poderes públicos transfiram para ou dividam suas responsabilidades administrativas com o setor privado, estimulando-se a competição. Desse modo, as famílias teriam chance de exercitar o direito de livre escolha quanto ao tipo de educação desejada para seus filhos, pondo fim ao monopólio estatal existente na área, diminuindo o corpo burocrático, a máquina administrativa e os gastos públicos, condição para o sucesso da política pública em educação. Essa foi, por exemplo, a orientação implementada na reforma educacional inglesa da década de 80, em que foram implantados exames nacionais, tendo como um de seus objetivos tornar públicos os parâmetros de qualidade das escolas, estimulando a introdução das escolhas educacionais no cenário das relações entre educação e sociedade.

Na perspectiva da teoria liberal moderna da cidadania, por outro lado, os pluralistas consideram o Estado como responsável pela promoção do bem comum, administrando os conflitos entre grupos e atores em luta, como responsável que é pelo estabelecimento das regras de competição. Os resultados desse jogo traduzem-se nas políticas governamentais, que permitem identificar os atores e grupos com maior capacidade de acionar recursos de poder, barganhar e influenciar no processo decisório. A educação seria um dos meios de transformação das mentalidades tradicionais em direção à racionalidade, sendo o processo educativo responsável pela formação de agentes sociais e políticos, e pelo fornecimento das bases do próprio poder, por meio do acesso ao

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conhecimento e à informação, requisitos para o exercício de comportamentos e atitudes racionais.

Desse ponto de vista, as raízes das desigualdades estão postas na distribuição diferenciada do poder, resultante da falta de preparação dos indivíduos para o consumo político. Caberia à educação atenuar essas desigualdades, como uma das principais agências socializadoras da sociedade, inculcando normas, valores e atitudes nos indivíduos e possibilitando a formação de agentes sociais e políticos. Tanto a primeira quanto a segunda perspectiva superestimam o papel da educação na solução dessas desigualdades sociais, frente ao papel que outros aspectos superestruturais têm na produção das desigualdades.

Na abordagem marxista, por sua vez, o Estado capitalista é representante do “interesse geral” de grupos concorrentes e, nesse sentido, ele seria, simultaneamente, um Estado popular, racional e de classe.6

Mesmo representando interesses políticos das classes dominantes, ele comporta, nas suas próprias estruturas, um jogo de forças que permite, dentro de determinados limites, o reconhecimento dos interesses das classes subalternas, conforme a estratégia acionada pela dominação hegemônica das classes dominantes, em busca de “consentimento”. O Estado nem estaria a serviço de uma classe, nem se constituiria no instrumento de uma classe contra outra.

A política educacional seria um meio de garantir a sociabilidade da força de trabalho, segundo os parâmetros próprios do capitalismo, definindo quem pode e quem não pode tornar-se trabalhador assalariado. Conjugada a outras políticas públicas, a regulação estatal sobre a educação configura-se aqui não só como uma estratégia para regular e manter o trabalho assalariado como, ao destacar a importância da esfera pública como espaço que implica o reconhecimento dos subalternos, abre brechas para a conquista e a vigência dos direitos sociais. Assim sendo, o exercício do direito à educação, como objeto da intervenção pública do Estado, torna-se um valor que transcenderia a dimensão que lhe conferiu o ethos capitalista, mesmo que venha a se articular com as necessidades da reprodução do capital.

No que respeita à relação entre globalização e educação, por outro lado, é preciso considerar que atualmente ela tem dois pressupostos

6 Nicos Poulantzas, Poder político e classes sociais, São Paulo, Martins Fontes, 1977.

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importantes. O primeiro, refere-se à existência de uma cultura educacional mundial comum, veiculada através de organizações internacionais (OCDE, UNESCO, Banco Mundial), que determinam o desenvolvimento dos sistemas educativos e as orientações curriculares dos Estados-nação. O segundo, refere-se à existência de uma agenda globalmente estruturada para a educação, que leva à imposição de prioridades por parte de alguns Estados sobre outros. Ambos pressupostos enfatizam o papel de fatores supranacionais na configuração das políticas de educação no nível nacional, impondo a necessidade de entender como a natureza mutável da economia capitalista, que é a força principal da globalização, afeta os sistemas educativos, tendo em conta que há efeitos de mediação que se produzem no nível nacional e que não são completamente independentes do lugar e da situação de cada país em relação a essa economia global.

A aceleração da globalização econômica e as mudanças no papel do Estado produziram alterações no elenco de prioridades presentes nas expectativas frente à contribuição da educação. Enquanto na vigência do Estado-providência ela cumpria um papel de legitimação, na fase atual ela é direcionada para o processo de acumulação. Assim, a educação deve agora atuar prioritariamente no apoio ao processo de acumulação, seguido da garantia da ordem e do controle social e, por último, deve atuar na legitimação do sistema. O apoio ao processo de acumulação pode contemplar modos distintos de atuação: uma forte intervenção do Estado na promoção da pesquisa e da inovação para atender às necessidades da produção; adoção de lógicas e mecanismos de mercado na educação; contribuição para a reprodução de mão de obra especializada.

No caso brasileiro, os ensinos fundamental e médio parecem estar voltados primordialmente para o apoio ao processo de acumulação, buscando atribuir à população a escolaridade básica de que o sistema econômico necessita, em busca de maior eficiência do sistema, o que inclui a descentralização do atendimento. A isso, segue-se a ênfase na sua contribuição para a legitimação do sistema, por meio da definição de parâmetros curriculares nacionais e da busca da eqüidade no acesso à educação.

A educação profissional, por sua vez, parece atender, em primeiro lugar, ao problema político da ordem e controle social, proporcionando respostas para o desemprego dos jovens e para a escolarização prolongada de novos públicos. Num segundo plano, visa garantir a formação de mão de obra qualificada, mobilizada e disponível para os diferentes setores da economia e do mercado.

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No ensino superior, a ênfase tem sido posta no apoio ao processo de acumulação, por meio de um modelo híbrido, que conjuga o controle do Estado com estratégias de autonomia ou de auto-regulação institucional que tem levado à proposição de leis de autonomia que transferem para as instituições os detalhes da aplicação das políticas de ensino superior, bem como a sua gestão. O Estado vem adotando um ethos competitivo, passando a admitir a lógica de mercado através da importação para o domínio público de modelos de gestão privada, com ênfase nos resultados ou produtos. A avaliação é pré-requisito para a implementação de mecanismos de controle e responsabilização, no âmbito de uma cultura gerencialista.

Para concluir, gostaria ainda de observar que a política educacional articula-se ao projeto de sociedade que se pretende implantar, ou que está em curso, sendo construída pelas forças sociais que têm voz e poder de decisão e que fazem chegar seus interesses até o Estado e à máquina governamental, influenciando na formulação e implementação dos programas de ação. Para que o problema de um determinado setor da sociedade seja reconhecido pelo Estado e se torne alvo de uma política pública específica, é necessário que ele se torne socialmente questionado e amplamente discutido. Exemplos disso são os problemas relacionados à situação da mulher na sociedade, à relação entre desenvolvimento econômico e meio ambiente, entre a Aids e a saúde, em que grupos organizados e articulados que integram cada setor usaram seu poder de pressão, e lutaram para que suas demandas fossem atendidas e viessem a ser inscritas nas agendas dos governos.

Essa situação leva a perguntar como é possível pensar uma política educacional referida a um novo espaço público (não estatal), que continue a incluir, de forma privilegiada, o Estado e os valores do domínio público, mas que não possa se realizar sem a comunidade? É necessário também discutir em maior profundidade a valorização das redes (ou parcerias) entre atores coletivos e o Estado. Embora elas traduzam um eixo fundamental e inovador na elaboração e implementação das políticas públicas e educacionais, podem esconder uma nova forma de legitimação do papel do Estado numa época de retração das políticas sociais, não significando, necessariamente, a diminuição, mas, antes, a reatualização, em novos moldes, do poder de regulação do Estado.

Tudo isso implica em considerar a necessidade de instaurar uma cultura política voltada para a participação e o controle público, condição para que os programas de ação se convertam em realidade. Como afirma

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Boaventura de Sousa Santos7, a relativa maior passividade do Estado decorrente da perda do monopólio regulatório tem que ser compensada pela intensificação da cidadania ativa. Por isso mesmo, não seria o caso de aproveitar o estágio da globalização de “baixa intensidade” em que estamos, isto é, em que os Estados nacionais estão exercendo a mediação na formulação de suas políticas educativas, para lutar por políticas educacionais democráticas que priorizem a cidadania ativa?

7 Boaventura de Sousa Santos, Reinventar a democracia, Lisboa, Gradiva, 1998.

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Mesa redonda

Educação popular e diálogo intercultural1

Ilse Scherer-Warren

RESUMO: Tendo como base o conceito de educação popular como processo de construção da cidadania, demonstra-se o quanto a sociologia e a antropologia podem contribuir no reconhecimento dos contextos histórico-sociais dos atores, para busca de paradigmas hermenêuticos e de orientação política para construção do diálogo intercultural. Estabelecendo redes de comunicação entre diferenças étnico-culturais que legitimem um espaço de representação democrática, o diálogo deverá ser construído nos interstícios e vácuos (entre-lugares) do sistema, no apoio à intersubjetividade entre diversos, gestando novas universalidades, novas fronteiras, como locus de encontro entre cidadãos.

Palavras-chave: pluriculturalismo, monoculturalismo e interculturalidade; movimentos sociais e afirmação da diferença; políticas afirmativas e compensatórias.

RESUMEN: Teniendo como basis el concepto de educación popular como proceso de construcción de la ciudadanía, se demuestran las contribuciones de la sociología y de la antropología em el reconocimiento de los contextos históricos sociales de los actores, en la búsqueda de paradigmas hermenéuticos y de orientación política para la construcción del diálogo intercultural. Estableciendo redes de comunicación entre diferencias étnico-culturales que legitimem un espacio de representación democrática, el diálogo deberá ser construído en los interstícios y vacios (entre-lugares) del sistema, en el apoyo a la intersubjetividad entre diversos, gestando nuevas universalidades, nuevas fronteras, como locus de encuentro entre ciudadanos.

Palabras-clave: pluriculturalismo, monoculturalismo e interculturalidad; movimientos sociales y afirmación de la diferencia; políticas afirmativas y compensatorias.

1 Trabalho apresentado em 21 de novembro, na Mesa redonda Educação popular: paradigmas e atores, no Seminário Educação 2000, promovido pelo Instituto de Educação e o Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Federal de Mato Grosso.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 11 n. 19 jan.-jun. 2002 p. 89-95

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Partindo de algumas idéias chaves que, para mim, estão bastante associadas à questão da Educação Popular, vou fazer uma reflexão sobre a questão da Educação Popular em termos de paradigmas e atores. Educação Popular significa, em última análise, educação para a cidadania, que é o resgate da dignidade das classes populares e mais oprimidas da sociedade e a construção do sujeito através do processo educativo, seja do sujeito individual ou coletivo. É nesse sentido que eu diria que a Educação Popular deve ser historicamente referenciada. Porque o sujeito deve ser situado historicamente e os paradigmas devem considerar os contextos sociais em que se situam os sujeitos. É dentro dessa perspectiva de tentar ver as condições históricas do sujeito, dentro desses paradigmas que acho que a Sociologia pode vir a dar uma contribuição na questão da Educação Popular. E é desse “olhar” que vou tentar fazer minha reflexão.

A pergunta de fundo seria: como pensar a educação popular na sociedade contemporânea, globalizada? Os contextos multiculturais, ou seja, o encontro de diferentes culturas se faz cada vez mais acelerado pelo próprio processo de informatização e globalização do mundo. Então, como tratar o sujeito cada vez mais cultural em função destas múltiplas identidades? Como lidar com a diversidade cultural a partir do ponto de vista da educação popular?

Dessa forma, o texto proposto está organizado em três partes: 1) sobre a complexidade dos sujeitos e dos atores em contextos multiculturais; 2) sobre as mudanças paradigmáticas necessárias a partir destas questões; 3) para finalizar, como seria uma educação intercultural no contexto da Educação Popular.

1. A complexidade dos sujeitos sociais em contextos multiculturais.

Na modernidade, os sujeitos “populares” foram definidos em termos de classes sociais: proletariado–burguesia, latifundiário–camponeses, e assim por diante. Mas, na sociedade contemporânea, que é complexa, globalizada e informatizada, os novos movimentos sociais trouxeram para a cena pública uma multiplicidade de sujeitos, definidos por identidades diversas, não só de classes, mas também identidades de gênero, étnica, etária, ou de opções de conviviabilidade, como os pacifistas, ecologistas e, às vezes, definidas a partir da religiosidade e assim por diante.

Do ponto de vista da Educação Popular, torna-se necessário entender a construção de sujeitos complexos nesse cenário de construção de identidades multiculturais. Isso porque, muitas vezes, o mesmo sujeito pode ser portador de várias identidades políticas ao mesmo tempo, como,

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por exemplo, feminista, sindicalista e ecologista. É necessário entender o sujeito a partir dessa complexidade de sua identidade. E não é só isso, é necessário ver também como é feito o reconhecimento social desse sujeito na esfera pública. Esse reconhecimento de fato só poderá ser construído na medida em que se estabeleçam relações dialógicas na conviviabilidade entre os diversos sujeitos, expressões de identidades engendradas pela participação em organizações e movimentos sociais diferenciados. O reconhecimento sempre terá que ser recíproco, mútuo, construído na alteridade, no respeito à identidade cultural e social.

Para se pensar esse sujeito complexo e essa possibilidade de reconhecimento na esfera pública é que sugerimos a necessidade de se tratar também – especialmente tendo em vista o pano de fundo das questões multiculturais - a questão da cidadania num mundo multicultural, o que nos remete ao segundo ponto.

2. As mudanças paradigmáticas

Há três possibilidades de visualizar o sujeito nos contextos multiculturais:

a) a monoculturalista;b) a multiculturalista;c) a interculturalista.As visões monoculturalista e multiculturalista são ainda limitadas

para se pensar o sujeito de uma forma mais complexa. Sugiro, então, a visão interculturalista. Por quê? Porque na visão monoculturalista a identidade é vista de uma forma essencialista. Em outros termos, para esse ponto de vista, as identidades são fixas, determinadas objetivamente em cada contexto social: nasce-se negra, mulher, etc. Já para a visão construtivista, adotada pelos multiculturalistas, as identidades formam-se historicamente, torna-se mulher, como dizia Simone de Beauvoir. Tenta mostrar que essa identidade tem um contexto histórico. Mas eu diria que é necessário avançar para além destas duas visões, para uma visão dialógica, que considera que as raízes originárias de cada grupo cultural não devem ser desconsideradas, mas que as identidades são também fruto das experiências sociais, dos processos de trocas intersubjetivas, comunicativas, de negociação e busca de consensos mínimos entre indivíduos ou grupos. Nesse sentido, através da busca destas relações dialógicas, considerando tanto as raízes quanto os processos sociais continuados da historicidade dos atores, estaríamos avançando na compreensão de identidades plurais e da interculturalidade.

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Em relação aos valores que são considerados pelas diferentes abordagens, o monoculturalismo tenta vê-los de um ponto de vista universal muito abstrato. Privilegiar os valores universais, sistematicamente, significa de fato privilegiar valores dominantes em nossa cultura, os valores ocidentais (P. ex. a supremacia do sexo masculino, do branco, etc.). Legitimam-se, portanto, situações de dominação em face da emergência de expressões culturais de minorias. Por outro lado, o multiculturalismo vai relativizar estes valores, o que permite pensar alternativas para as minorias. Todavia, se se levar o relativismo ao extremo, pode-se legitimar a exclusão social, justificando inclusive a criação de guetos culturais, que reproduzem desigualdades e discriminações sociais. Por isso, do ponto de vista democrático, é necessário que o processo dialógico de construção da cidadania contemple as tensões entre os princípios de igualdade (dos monoculturalistas) e os princípios do respeito à diferença (dos multiculturalistas). Como lidar com esta tensão entre a busca da igualdade, ao mesmo tempo contemplando o direito à diferença? Esta tensão pode ser resolvida através de um processo dialógico que contemple a diversidade em níveis razoáveis e, através de políticas compensatórias e outras medidas, contribua para a superação de desigualdades históricas. Esta construção implica em valores e ações, que devem ser observados a partir de seus níveis mais moleculares do cotidiano, desde as relações afetivas, fraternais, comunitárias até aquelas desenvolvidas ao nível da esfera pública, política. É nesta altura que o princípio da justiça social coloca-se como especialmente relevante no seio das relações societárias. Justiça social que se constrói através de ações no plano da ética e da política.

Na dimensão ética encontram-se os princípios complementares da responsabilidade e da solidariedade. Ainda que muito das injustiças do presente tenha raízes de longa data, sua reprodução no presente é uma responsabilidade da humanidade. Esta responsabilidade quando assumida pelos cidadãos transforma-se em solidariedade social. Nos movimentos sociais contemporâneos, um chamamento à solidariedade humanitária tem levado indivíduos e grupos sociais a engajarem-se em ações comunitárias e de responsabilidade cidadã. Estes princípios éticos para operarem no sentido de construção de uma cidadania multicultural, devem ser associados a outros princípios, os quais têm uma expressão mais forte no plano da política.

Assim, na dimensão política, ao lado da necessidade de reconhecimento das diversidades culturais, não pode ser negligenciada a busca também de alguns valores que vão se universalizando na medida do

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próprio processo histórico. Mas, para isso é necessário que haja participação do sujeito no resgate de sua identidade, no sentido de uma inclusão participativa. A simples integração pode ser problemática, porque pode implicar na integração em si da sociedade dominante. É necessário, pois, uma forma de inclusão que inclua a participação política. Como criar mecanismos e legitimidade para a participação das minorias culturais nas esferas públicas que lhes dizem respeito? Eis a questão. Os indivíduos e grupos que não participam de processos coletivos, de intersubjetividade, base da construção identitária e da cidadania multicultural, não amadurecem em termos de autoreconhecimento ou o reconhecimento público de seu grupo numa comunidade de referência.

3. Educação intercultural no contexto da educação popular

Entro na terceira parte de minha exposição sobre a educação intercultural no contexto da educação popular. Para poder contemplar a diversidade cultural, é necessário partir de enfoques que permitam visualizar os atores em suas múltiplas identidades, perceber as tensões dos contatos multiculturais e, através de uma pedagogia crítica, tentar avançar no diálogo intercultural, desenvolvendo uma política de reconhecimento social das diferenças. É necessário também fazer uso, no momento atual, das novas tecnologias de comunicação e informação para avançar no sentido da interatividade dos atores, como, aliás, está sendo feito por vários movimentos sociais.

Gostaria de trazer alguns exemplos da prática educativa, dentro do campo da educação popular, para mostrar como está sendo introduzido esse diálogo intercultural.

Iniciamos com a questão étnica. Por exemplo, a educação étnica dentro da educação indígena, da educação afro-brasileira, dos imigrantes, em alguns locais, dos ciganos, etc. O intercâmbio entre estas diferentes experiências de educação étnica poderia ajudar a produzir o diálogo intercultural para a condição de reconhecimento social, no sentido de respeito à diversidade étnica, de conviviabilidade com a diferença e, portanto, de uma cidadania que pense a universalidade historicamente contextualizada. Volto, então, à questão da universalidade. Se, por um lado, não se deve cair num extremo relativismo em que não haja possibilidade de criar alguns valores universais, por outro lado, os valores universais devem ser considerados como contingentes e historicamente localizados. Mas em cada momento histórico, através do diálogo intercultural, há possibilidade de

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se pensar o que há de universal face à diversidade, por exemplo, as lutas de reconhecimento das diferentes etnias no mundo atual.

Em relação à educação de gênero. Gênero e política têm sido temas bastante debatidos dentro da educação de gênero, incluindo-se aí as relativas a políticas afirmativas e compensatórias. Por outro lado, o movimento negro e indígena também tem desenvolvido esse debate. Então, usar as experiências dos embates ou das políticas compensatórias e afirmativas de gênero, étnicas, dos negros, grupos indígenas, etc., poderia também possibilitar dispor de novas formas de universalidade a partir dessas diferenças.

Outra questão seria a educação em termos de religiosidade, de simbologias regionais, etc. Muitas vezes é possível trabalhar a partir das diversidades místicas, dos mitos, de resgates culturais, e a partir destas místicas se pensar o resgate das questões de cidadania. Temos, por exemplo, o caso do MST, que tem uma produção musical muito ampla. Mas poderíamos pensar muitos outros exemplos, os Raps. Outros grupos de periferia estão contribuindo para a criação de movimentos simbólicos e críticos. Há movimentos de contestação a partir dessas músicas. A partir da arte, muitas ONGs estão trabalhando para o resgate da dignidade dos cidadãos mais excluídos. Em São Paulo, por exemplo, na vila Madalena foi criada a ONG Cidade Escola Aprendiz que está redecorando toda a vila com pinturas artísticas, com a participação popular.

Educação ambiental para a paz. Neste nível se trabalha a questão ambiental, de qualidade de vida, de saúde, higiene, da segurança, etc. Mas para se pensar mais a fundo essa questão da educação ambiental, podemos chegar á conclusão de que não é possível pensar em qualidade de vida, saúde, etc, sem pensar no combate à miséria, à pobreza. A educação ambiental deveria se relacionar com a educação que tenta resgatar o indivíduo dessa situação de pobreza.

Educação face à pobreza, à exclusão (os sem terra, sem teto, sem trabalho, etc.): Como fazer em face de um dos maiores preconceitos da atualidade, seja a aporofobia, isto é, o preconceito contra os pobres, como construir a dignidade destas populações. Neste sentido é que estão as experiências de educação nos acampamentos. É necessário cruzar essa questão da pobreza com todas as outras questões, étnicas, de gênero, religiosidade, etc. Acho que existe alguma coisa que já é feita nesse sentido, a própria educação no campo, nas favelas, com os meninos e meninas de rua e até os pré-vestibulares populares que tentam dar

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oportunidades a indivíduos que jamais chegariam à universidade se não pudessem passar por essas vias. Há várias experiências nesse sentido.

Finalizando, o que gostaria de deixar marcado é a necessidade de trabalhar as interfaces dessas múltiplas experiências a fim de ampliar o diálogo intercultural, construindo-se assim um movimento em prol da cidadania e criando-se valores universais sem fronteiras. O que eu quero dizer com valores universais sem fronteiras? Isso é, que esses valores sejam construídos nos entre-lugares, como dizem os pós-coloniais. Os sujeitos se formam nos entre-lugares. O que seriam entre-lugares? Seriam valores que se originam na interface das diferenças. No diálogo com o diferente é que se pode ir formando esse movimento cada vez mais aberto à interculturalidade. Se os indivíduos, por um lado, constroem sua singularidade através das identidades específicas, seja de classe, gênero, étnicas, será, por outro lado, através do diálogo intercultural, sem negar a historicidade dos atores e as raízes, mas traduzindo-a em políticas de fronteiras, que virão a contribuir para o fortalecimento de uma sociedade civil pluralista, aberta à diversidade cultural.

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Educação popular na América latina no novo milênio: impactos do novo paradigma1

Maria da Glória Gohn

RESUMO: Na trajetória das práticas e políticas pedagógicas da educação popular na América Latina, nas últimas décadas, destacam-se as novas tendências, seus fundamentos, as novas áreas temáticas e suas práticas. Destacam-se também suas inovações no campo da educação não-formal e as articulações com a educação formal. Destacam-se finalmente a contribuição e o papel do método de Paulo Freire. As questões básicas abordadas são: o que mudou no novo paradigma? Como têm interferido na educação popular as mudanças econômicas e políticas de corte neoliberal? Como tem atuado o setor organizado da sociedade civil? Quais são as contribuições e perspectivas para a educação popular para o novo milênio?

Palavras-chave: práticas sociais; educação não formal; novos paradigmas na educação popular

RESUMEN: En la trayectoria de las prácticas y políticas pedagógicas de la educación

popular en América Latina, en las últimas décadas, se destacan las nuevas tendencias, sus fundamentos, las nuevas áreas temáticas y sus prácticas. Se destacan también sus innovaciones en el campo de la educación no-formal y las articulaciones con la educación formal. Se destacan finalmente la contribución y el papel del método de Paulo Freire. Las cuestiones básicas abordadas son: ¿qué ha cambiado en el nuevo paradigma? ¿Cómo han interferido en la educación popular los cambios económicos y políticos de corte neoliberal? ¿Cómo está actuando el sector organizado de la sociedad civil? ¿Cuáles son las contribuciones y perspectivas para la educación popular en el nuevo milenio?

Palabras-clave: prácticas sociales; educación no-formal; nuevos paradigmas en la educación popular.

1 Trabalho apresentado em 21 de novembro, na Mesa redonda Educação popular: paradigmas e atores, no Seminário Educação 2000, promovido pelo Instituto de Educação e o Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 11 n. 19 jan.-jun. 2002 p. 97-128

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Este trabalho surgiu da feliz oportunidade de representar o Instituto Paulo Freire num evento nas Filipinas sobre educação popular em Fevereiro de 2000. Conhecer uma realidade cultural tão diversa, marcada por momentos de grande mobilização popular, nas últimas décadas, e bastante influenciada pelas idéias de Paulo Freire a respeito da educação, possibilitou-me dirigir o olhar para a realidade latino-americana, em busca de alguns nexos comparativos. Como anda a questão da educação popular nos países de nosso continente, e qual o paradigma teórico-prático que informa suas práticas, são as questões iniciais deste texto.

A década de 90 foi um tempo de revisões para a educação popular (EP) na América Latina. Revisão de teorias, conceitos, metodologias, estratégias de ação, perfil de atuação dos educadores, material utilizado etc. Em suma: uma revisão paradigmática. O Congresso Internacional de Americanistas realizado em Julho de 1988 na Holanda sobre “Educação Popular na América Latina”, reuniu representantes de ONGs latino-americanas, centros de investigação e agências financeiras, e fez um balanço das experiências realizadas até então. Diagnosticou-se a necessidade de mudanças, mas também se destacou a importância da EP como espaço educativo da sociedade civil, sua presença como instrumento de organização, formação e desenvolvimento da consciência social junto a inúmeros movimentos populares que lutaram pela transformação de regimes políticos autoritários, liderados por militares ou caudilhos locais. As mudanças postuladas advinham das críticas sobre a escassa discussão teórica dos postulados das ações da EP, o não aprofundamento das mudanças operadas, o localismo das ações e seu baixo impacto ao nível nacional, assim como os efeitos do chamado “basismo” e a não avaliação das experiências.

Em 1990, realizou-se na Bolívia o segundo seminário do mesmo grupo para fazer uma avaliação crítica da trajetória da EP e identificar os desafios a serem enfrentados. Na ocasião, Mejia (1991) realizou uma análise do panorama internacional que se descortinava para os anos 90 e postulou: a necessidade de se repensar a educação popular face aos desafios da nova conjuntura; a necessidade de desideologizar suas ações apontou alguns vazios e carências que deveriam ser superados; a tarefa de se colocar, como metas, novas perspectivas. Foi enfatizada também a necessidade de se ter um outro tipo de olhar e de atuação em relação ao Estado e às políticas públicas considerando, principalmente, as mudanças no cenário político de vários países da América Latina, de ditaduras militares para regimes democráticos. Algumas experiências concretas foram

Rev. Educ. Pública, Cuiabá, v. 11, n. 19, jan.-jun. 2002.98

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relatadas e analisadas, como a realizada na Prefeitura do município de São Paulo (ver Gadotti, 1991).

Em 1995, um outro seminário foi realizado sobre a EP, desta vez em Santiago do Chile. O tema estava incorporado ao Programa de Sistematização da Educação Popular na América Latina. O novo encontro fez um balanço das alterações em curso, fruto das diretrizes estabelecidas nos seminários anteriores. Os principais temas tratados foram: a qualidade do processo educativo, a relação pedagógica e a relação com o Estado. Foi definido como sendo um dos objetivos centrais da educação popular “a geração de conhecimentos novos, que possam servir ao grupo beneficiário e lhes permitam desenvolver mudanças em suas práticas cotidianas” (Dam e Martinic, 1996). O encontro concluiu também que, em face ao surgimento de novos temas para análise, alguns conceitos chaves da EP deveriam ser redefinidos, tais como: a participação, a relação horizontal entre educador /educando, a relação comunicativa e pedagógica etc.

Analisando os três encontros, concluímos que, nos anos 90, houve um redirecionamento dos objetivos da EP que alterou o sentido de suas ações. Antes, os objetivos estavam centrados mais no contexto geral, na política, na estrutura da sociedade. Depois, os objetivos voltaram-se mais para os indivíduos em si, para sua cultura e representações. No novo paradigma, - não há algo a ser criado, a partir da animação de um agente externo - o educador ou o facilitador - em termos de uma politização que desperte o educando para suas condições concretas de vida, em termos da pobreza e suas causas, de interesses de classe explorada e oprimida, de direitos sociais básicos que lhes estão sendo negados pelas elites e outros. No novo paradigma - há algo a ser repassado - de forma competente, com conteúdo, e que deve gerar uma reação nos indivíduos de forma que ele confronte o recebido com o que possui de sua experiência anterior e visão de mundo e o reelabore. Isto significa que os indivíduos e os grupos têm de repensar e de reformular seus próprios conhecimentos e experiências.

Reitera-se um dos postulados básicos da educação popular dos anos 60-80: a importância da relação educador-educando, no processo educativo. Entretanto, o novo destaque nessa interação estará nos processos de reelaboração e reinterpretação que ocorrem na relação - é a partir deles que surgem os novos conhecimentos. Destaca-se que se trata de um processo dialógico permeado de confrontações, conflitos, tensões etc., e que isso deve ser visto como natural e não como fruto de supostos interesses antagônicos. Isso ocorre porque há o encontro de diferentes culturas e linguagens distintas. Resulta que a aprendizagem não se resume

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a mera incorporação de conhecimentos, mas sim uma reinterpretação e recontextualização. Trata-se de um processo que envolve negociações entre quem ensina e quem aprende. O professor deve ter consciência da existência deste processo de negociação cultural e garantir que se transmitam as ferramentas necessárias para que a negociação cultural se realize.

Vários pesquisadores que realizaram os chamados “balanços” da educação popular na América Latina afirmam que, no passado, a idéia central do método dialógico estava baseada em um plano no qual o conhecimento advinha basicamente das experiências passadas dos educandos e em suas idéias, de forma quase automática, sem considerar as reelaborações. Eles advogam que diálogo agora deve ser visto como um jogo de forças, em conflito e em acomodação, confrontação e acordo. Por sua vez, a relação pedagógica deve ser vista como uma relação social que sustenta os processos comunicativos que ocorrem no desenvolvimento de um projeto educativo. Assim, a pedagogia estará baseada no diálogo e na construção cooperativa de conhecimentos. Isto significa que a construção de valores passa a ter prioridade, numa perspectiva ética que busca gerar uma nova individualidade, tendo como suposto que essa nova individualidade contribua para que as pessoas se tornem mais preparadas para enfrentar a realidade em que vivem. “Através da linguagem e mediante os procedimentos comunicativos os sujeitos constroem o real e aprendem com distintos ritmos e tempos” (Dam e Martinic, 1996:11).

Os analistas/revisores da EP destacaram que cada grupo, segundo as características dos atores sociais que o compõem, assimila o conhecimento recebido de uma forma diferente, segundo sua visão de mundo, seus interesses de classe e suas especificidades culturais. A linguagem e o discurso utilizados pelos educadores também são diferentes, eles – educadores - são mais valorizados que os educandos; há, portanto, diferenças entre quem ensina e quem aprende, gerando relações de poder; a participação não é eqüitativa, não há uma horizontalidade, uma relação igualitária onde não exista nenhuma relação de poder. Apesar das diferenças e distâncias, recomenda-se que a relação a ser construída deve se basear na cooperação e no diálogo. O diálogo é confronto, mas é acordo também. Deve-se dar espaço para a construção de novos valores e de uma consciência ética.

Os balanços destacaram também que antes havia uma ênfase quase exclusiva no processo do diálogo e se ignoravam outras formas de relações que se desenvolvem fora do nível argumentativo, como as

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emocionais e as afetivas. As mulheres, sua sensibilidade, afetividade etc. são bastante citadas como exemplos de participantes dos processos educativos que ficavam à margem, ou não encontravam meios suficientes para se expressarem. A EP deve, nas novas orientações, gerar uma nova individualidade nas pessoas, de forma a prepará-las melhor para enfrentarem a nova realidade do novo milênio.

O tema do impacto dos processos educativos foi outra preocupação dominante nos balanços dos anos 90. A necessidade de ampliar a esfera da EP do nível micro, local, dos bairros, para níveis mais amplos, macro sociais, dirigidos às mudanças estruturais, passou a ser uma diretriz de trabalho. Conseqüentemente, colocou-se como uma necessidade imperiosa a profissionalização da EP. Relações de trabalho formalizadas, pessoal qualificado e investimentos na formação do educador popular completam o círculo das novas necessidades. Algumas ONGs passaram a defender, explicitamente, uma formação com ênfase não ideológica, centrada em técnicas e metodologias, facilitadoras para a obtenção - tanto de processos de geração de conhecimentos novos, como de processos de intercâmbios de idéias, de sentimentos e geradores de relações afetivas. Afirma-se que o papel atual do educador não é de um facilitador, ou simples mediador/estimulador ou animador junto ao grupo de educandos, mas sim de um professor, uma pessoa que transmite conhecimentos (embora em um estilo diferente do professor tradicional).

O papel do Estado e as lacunas nos balanços da EP

O Estado será o novo ator a entrar em cena na EP. As análises reconhecem que a EP sempre atuou sobre sua própria auto-referência; nas últimas décadas ela negou ou esteve de costas para o Estado, criticou as políticas oficiais e as iniciativas implementadas pelos governos militares ou ditatoriais civis na área da alfabetização de adultos. A EP ao buscar novos caminhos, desenvolveu a inovação e a criatividade; ela atuava à margem das práticas sancionadas oficialmente e, com isso, desenvolveu também um sistema alternativo e paralelo de educação para o país, enquanto método, metodologias e práticas. Entretanto, os especialistas da própria EP argumentam que o Estado mudou na América Latina nas últimas duas décadas. A transição política do final dos anos 70 e dos 80 levou a regimes democráticos, o sufrágio universal foi restabelecido, novas leis constitucionais foram elaboradas. Essas mudanças justificam, para os analistas da EP, que se faça uma revisão crítica das posturas negativistas da EP em relação ao Estado, e que se analise melhor seu papel como

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mediador na sociedade, seu caráter público, seu papel quanto à gestão dos serviços e equipamentos públicos. A dificuldade maior estaria em compatibilizar lógicas e práticas distintas. A máquina estatal é lenta, burocratizada, trabalha com prazos curtos e cheios de restrições; o impacto das mudanças é longo e o processo das reformas é conflituoso e carregado de impasses. As ONGs – principais agentes no desenvolvimento de programas e projetos de EP são ao contrário do Estado mais informais, meio desorganizadas, com prazos mais longos de trabalho; entretanto, elas são mais ágeis, menos burocratizadas pois são bastante desregulamentadas, mas mais eficientes em seus resultados imediatos.

O que os analistas da EP não tratam com profundidade são as mudanças que passaram a ocorrer nas práticas do Estado na América Latina, nos anos 90, como resultado de mudanças na conjuntura econômica globalizada, e as diretrizes das políticas neoliberais impostas pelos pólos hegemônicos de poder econômico internacional. Sabemos que as políticas neoliberais têm preconizado a desativação da atuação direta do Estado em várias áreas sociais preconizando que a operacionalização desses serviços, sua gestão propriamente dita, seja transferida para organismos da iniciativa privada, especialmente via parcerias com entidades do chamado terceiro setor (organizações privadas sem fins lucrativos) composto de ONGs, organizações sociais, entidades assistenciais e filantrópicas, alguns movimentos sociais, algumas empresas denominadas cidadãs, obras sociais etc.).

As entidades do terceiro setor, antes denominadas simplesmente como ONGs e articuladas às redes dos organismos da cooperação internacional, com histórico e tradição de lutas em favor dos direitos da cidadania, passaram a ser, nos anos 90, cotejadas pelas políticas oficiais. A possibilidade de acesso às escassas verbas surgiu, para o terceiro setor, via as próprias políticas públicas, pois os empréstimos do Banco Mundial, e de outros órgãos internacionais, aos países em desenvolvimento postulam e contemplam, como condição de obrigatoriedade, que o governo do país que recebe o recurso financeiro destine um percentual do volume emprestado para ações em obras sociais, a serem desenvolvidas por entidades do terceiro setor. Postula-se, portanto, o financiamento às entidades privadas desde que tenham o registro de uma fundação ou organização sem fins lucrativos, e que elas desenvolvam programas de geração de renda baseadas nos princípios da sustentabilidade, junto a comunidades carentes sócio-economicamente, ou com grupos culturais ou étnicos; ou ainda junto à indivíduos e grupos em situação de risco.

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Sabemos também que os governos da América Latina incluíram, em suas políticas de reformas, principalmente na área trabalhista, alterações ou inovações que contemplam outras formas de contrato de trabalho, como o próprio trabalho voluntário, bastante usual no terceiro setor e previsto, no Brasil, desde março de 1999, na chamada “Lei do Terceiro Setor”. Certamente que o passado de ineficácia e não aplicação integral, ou aplicação ineficiente, ou ainda os desvios, das verbas emprestadas pelas agências internacionais, para os governos locais administrarem e implementarem diretamente os programas sociais, teve um peso significativo para que essas mudanças fossem implementadas.

Resulta do cenário descrito que, de um lado, teve-se uma alteração no discurso de ambas as partes: para os governos, de “inimigas críticas”, as ONGs passaram a ser tratadas como aliadas (ainda que eles não façam alianças com qualquer uma, pois há diferenças profundas entre elas quanto aos objetivos sociopolíticos de seu projeto principal. As ONGs privilegiadas têm sido as do chamado novo terceiro setor). De outro lado, para as ONGs, os governos deixaram de ser o “inimigo” a ser combatido e passaram a destacar e enfatizar seu papel público, como pólo gerador, financiador e impulsionador/ fomentador de iniciativas sociais, em programas que buscam patrocinar ações de inclusão social dos excluídos de uma forma geral: pobres, desempregados e discriminados por sexo, etnia, cor etc. Todos falam em nome da cidadania, menos de direitos, e mais de deveres.

As alterações nas relações Estado/ONGs não foram apenas de ordem simbólica, no plano de novas representações sobre o outro. As mudanças afetaram as práticas e os discursos. As ONGs passaram a trabalhar em programas de parceria, em projetos sociais específicos, de curta duração. Os cidadãos/ militantes do passado, que atuavam junto a movimentos sociais assessorados pelas ONGs do período, se transformaram em clientes de políticas públicas administradas pelas entidades do terceiro setor. No caso de cooperativas de produção e geração de renda, muitos dos direitos sociais clássicos já conquistados pelos trabalhadores, tais como piso salarial da categoria, horário da jornada de trabalho, férias, FGTS, 13° salário etc., passaram a ser simplesmente ignorados. Muitos dizem que o contexto é de desemprego e que, portanto, os indivíduos já haviam perdido aqueles direitos (lembrando que o seguro-desemprego, praticamente, inexiste na América Latina).

Finalmente, um dos pontos mais importantes para o entendimento da nova relação Estado e ONGs do terceiro setor: a transferência de fundos públicos do Estado para os programas de parceria com a sociedade civil

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organizada. Essa transferência apresenta-se como parte de um programa de racionalização dos gastos, busca de maior eficiência e uma resposta à urgência de cortes públicos (pensando na redução do tamanho da burocracia estatal). Mas, de fato, não está havendo aumento de verbas para a área social e a transferência dos fundos somente modifica o caminho que estas despesas seguem para serem alocadas. Além disso, a transferência de fundos do Estado para entidades do terceiro setor altera a relação cidadão-Estado. Na época que o Estado alocava diretamente verbas para setores sociais, ou atendia à pressão organizada de determinados grupos ou movimentos, ele estava atendendo a SUJEITOS COLETIVOS. À medida que a verba é transferida para ser gerenciada por uma entidade da sociedade civil, o atendimento ocorre aos usuários na qualidade de CIDADÃOS INDIVIDUAIS, clientes e consumidores de serviços prestados pelas entidades do terceiro setor, que ocorrerá o atendimento. A mudança altera, portanto, a natureza e o caminho por onde as demandas são formuladas e organizadas. Outras alterações decorrentes são: enquanto agências de consumidores, as demandas passarão a se dirigir à justiça social - no caso de litígios, e não mais aos órgãos da administração estatal. Com isso há uma redução do poder de negociação dos usuários. Como resultado final se tem - não uma ampliação do espaço público dos cidadãos, mas um retraimento - havendo uma perda das fronteiras entre o público e o privado que, no limite, poderá levar a perdas de direitos sociais já conquistados.

O novo paradigma educacional e a EP

Além de espaços nas políticas públicas, a educação popular ganha nos anos 90, espaços na sociedade em geral, porque a educação como um todo ganha notoriedade; na nova conjuntura da era da globalização a educação ganha destaque e importância porque o elevado grau de competitividade ampliou a demanda por conhecimentos e informação. A educação ganha também centralidade nos discursos e políticas sociais porque eles enfatizam que competirá a ela ser um instrumento de democratização, num mercado de escolhas e oportunidades. À escola - assim como à cidade - é atribuído o espaço para o exercício da democracia, e conquista de direitos, da mesma forma que a fábrica foi o espaço de luta e conquista dos direitos sociais dos trabalhadores. O número de anos de escolarização associado à qualidade da educação recebida é apresentado como fator determinante para o acesso ao mercado de trabalho, nível de renda a ser auferido etc. (vide Gohn, 2000 a).

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No novo paradigma educacional, o processo de formação dos indivíduos deve ter quatro objetivos estratégicos. Eles se constituem nos “pilares” de sustentação para prepará-los para o mundo moderno. Eles são: ser, conhecer, conviver e fazer.

O ser – tem a ver com a competência individual. É o desenvolvimento da auto-estima, da auto-confiança, diz respeito à identidade individual; se insere no universo da capacidade do indivíduo de conduzir sua vida, de propor, de fazer auto-crítica, de ter um ideal, de estabelecer metas etc.

O conhecer – É o desenvolvimento de competências para saber o que conhecer. Inscreve-se no universo cognitivo, das habilidades didáticas (e autodidatas) dos indivíduos. Tenho que saber o que conhecer para selecionar, tenho que conhecer o que conhecer. Lidar com o conhecimento requer conhecer algo antes, para saber o que devo selecionar (na Internet, por exemplo).

O conviver – Está na esfera interpessoal, na dimensão da sociabilidade dos indivíduos, no plano das relações que ele desenvolve com o outro, com as pessoas em geral, com a cidade, a nação etc. são as múltiplas redes tecidas ao longo da vida. Muitas trajetórias individuais se explicam pela rede de relações e amizades que os indivíduos constroem e cultivam ao longo de suas vidas.

O fazer – Está no plano das competências produtivas, diz respeito às habilidades básicas, específicas e de gestão. É um objetivo importante para desenvolver a capacidade e o potencial de “empregabilidade” dos indivíduos.

Sabe-se que a economia globalizada tem necessidade de profissionais com perfil de desempenho diferente do tradicional, impondo a exigência de incorporação de novas habilidades e capacidades, e atribui-se ao setor educacional realizar este “milagre”. Nos novos códigos a educação deve contribuir para gerar um trabalhador que tenha habilidades e domínio de conhecimentos tecnológicos, habilidades de gestão e que saiba ser criativo, desenvolvendo relacionamentos estratégicos (saudáveis e produtivos), e com habilidade nos relacionamentos intergrupais, que saiba aprender a aprender. No mundo atual os indivíduos têm que ir além da aquisição/absorção de acervos de conhecimentos, eles precisam saber relatar, interpretar e analisar - dados, fatos e situações. Precisam ainda ler e decodificar linguagens gráficas (muitas delas baseadas na matemática). Precisam do inglês e da informática. Ou seja, precisa-se da educação

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básica (escolar/ formal - dada de uma outra forma) e da educação geral (sobre o mundo da vida, dada pela educação não-formal).

Competirá fundamentalmente à educação popular realizar grande parte das novas faces do processo educacional, de caráter não-formal, a ser realizada em espaços e atividades extra-escolares, em atividades não formais. Destacamos apenas que tudo isso não pode ser visto nos limites de uma lógica utilitarista, que contempla o ser humano como uma máquina produtora, usuário/consumidor de bens, numa ótica mecânica e economicista. Essas habilidades devem ser vistas como ferramentas de apoio e não como finalidades últimas.

No novo paradigma, os conteúdos universais que a Educação deve trabalhar são: conhecimentos, valores, atitudes e habilidades nos indivíduos (o antigo paradigma educacional só enfatizava o conhecimento –já acumulado, simplesmente a ser absorvido -, e não preparava os indivíduos para a vida (dados pelos três outros conteúdos). Para ter acesso ao conhecimento, é possível a via individual, mas para os demais- o papel do professor é fundamental. No desenvolvimento de valores, habilidades e atitudes, o papel do educador é fundamental porque ele é o transmissor, é vetor de conhecimentos

Os instrumentos para desenvolver aqueles conteúdos são via o aprendizado: da escrita, da leitura, do cálculo e da resolução de problemas. Enquanto os três primeiros instrumentos se relacionam diretamente com a escolaridade, a resolução de problemas se relaciona mais com o mundo da vida, com a capacidade/habilidade dos indivíduos enquanto seres humanos. O novo paradigma educacional afirma que o que a pessoa se torna, ao longo de sua vida, depende das oportunidades que teve e das escolhas que fez. Portanto, é preciso estar preparado para ver as oportunidades e fazer as escolhas. Conforme análise adiante, estes postulados bebem em matrizes do pensamento liberal que isolam os indivíduos e descontextualizam os cenários onde esses indivíduos se localizam. Não há ordens de pertencimentos.

Junto com as atividades da educação não-formal, área de atuação já clássica das ONGs, a educação formal, escolar propriamente dita, também passa a ser objeto de atenção das políticas sociais dos anos 90, nas parcerias entre as ONGs e entidades públicas/estatais, para além dos programas de educação de adultos, ou as campanhas de alfabetização do passado. Na atualidade a relação ampliou-se. As ONGs não apenas assessoram escolas públicas do ensino fundamental e básico em geral, como acompanham e avaliam as políticas de reformas educativas em curso.

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O campo da Educação popular se ampliou, ela deixou de ser algo alternativo, marginal à política estatal; ela ganhou centralidade nas políticas sociais. Mas sua natureza também se alterou, não se trata mais da EP conscientizadora do passado; suas práticas alteraram seu perfil político: de contestação à ordem, busca da igualdade via pressões e movimentos para obterem direitos sociais, passou-se a ter práticas mais legalistas, mais voltadas para incluir, ainda que precária e marginalmente, os excluídos pelo sistema econômico mais geral.

Em resumo, como diz Filmus (1999), “En este contexto y ante la incapacidad de otras políticas (trabajo, protección social, etc.) para incorporar a sectores de la población marginados, el impulso a la educación fue planteado como una de las principales estrategias de integración social” (Filmus, 1999: 8).

Cumpre destacar que a interação da EP com o Estado, ou com políticas públicas, não é nova, ela também ocorreu nos anos 60 no Brasil; e a interação produziu mudanças em ambas as partes. Nos anos 90, a não politização dos temas sociais - recomendada pelas novas diretrizes das políticas educativas públicas estatais, reorientou as ênfases dos projetos sociais, dando-lhes perfis modelados pelos projetos neoliberais.

Observa-se ainda que a revisão preconizada nas práticas da Educação Popular, nos anos 90, segue as diretrizes elaboradas na Conferência de Jomtien, na Tailândia, cujo lema foi “Educação para todos, todos pela educação”. Baseando-se em alterações reais que estavam ocorrendo no mundo do trabalho, aquela Conferência postulou várias inovações; entretanto, muitas dessas inovações também eram fundamentadas em pressupostos neoliberais. O documento final do encontro continha várias assertivas do novo paradigma para a Educação acima descrito. A Educação foi analisada centrada não apenas nas escolas, mas na sociedade também, em instituições que atuam fora da escola, principalmente as ONGs - atuando em parceria com organismos públicos. O trabalho voluntário também passou a ser destacado. Entretanto, a nova conferência mundial de Educação realizada em Dakar, em abril de 2000, não deu continuidade a vários pontos enfatizados no encontro de Jomtien, entre eles a articulação com as ONGs. Segundo Sérgio Haddad, presidente da ABONG e “único representante das ONGs brasileiras a participar do encontro oficial, a convite da Unesco, a Declaração resultante da Conferência Mundial de Educação também não trouxe novos conceitos sobre a educação para todos ou sobre as necessidades básicas da área. Para Sérgio, comparada à Declaração resultante da Conferência de

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Jomtien, Tailândia, realizada em 1990, o atual documento é “mais burocrático”, restringindo-se aos direitos básicos vinculados à escolarização formal, e com poucos compromissos de indicadores assumidos pelos Estados para implementação até 2015 (...). A Conferência atual também foi marcada pela restrição à participação das organizações da sociedade civil. Em Jomtien foram convidadas a participar aproximadamente 130 ONGs e, em Dakar, apenas cerca de 60 tiveram acesso ao encontro oficial” (Doc. Boletim n. 87 da ABONG, maio de 2000).

A restrição à participação das ONGs foi um dos temas discutidos no Fórum Paralelo de ONGs, realizado nos dias 24 e 25, também em Dakar, com a presença de aproximadamente 250 ONGs de todo o mundo. Além de um abaixo-assinado protestando contra sua exclusão da Conferência oficial, as entidades discutiram o documento preliminar oficial, fazendo críticas e propostas a ele.

Resumidamente pode-se dizer que o novo paradigma educacional traz contribuições valiosas para entendermos a inserção dos indivíduos no novo mundo do trabalho, mas ele é visto, analisado e se baseia, em premissas liberais, individualistas. O problema do trabalho/ emprego é analisado segundo a posição dos indivíduos, sua qualificação, suas oportunidades e escolhas, como se todos fossem livres. O Estado e as elites econômicas, os lobbies etc. não têm lugar neste cenário. Ao contrário do que preconizam alguns profetas do apocalipse, pode-se observar que o trabalho não está desaparecendo na sociedade atual, mas ele está mudando de perfil. O trabalho é hoje altamente seletivo e excludente. O que desaparece são os empregos, são os postos, no mercado de trabalho. Cada vez mais temos menos gente trabalhando com carteira assinada, direitos sociais etc., e os que têm estes direitos, estão trabalhando muito mais. A maioria destes “afortunados”, porque têm emprego, está sendo mais explorada, trabalhando o dobro de horas e fazendo sozinha o serviço que antes era executado por equipes. As reengenharias nos processos produtivos realizaram este milagre, que não decorre apenas da substituição do homem pela máquina, que também é uma realidade alarmante em vários setores, do moderno/avançado como o automobilístico, aos tradicionais/ atrasados como a agricultura. Mas existem também uns poucos ganhando muito, porque acumularam acervos de conhecimentos em áreas hoje estratégicas, aproveitaram oportunidades devido à alta qualificação que detêm. Ao mesmo tempo, vemos aumentarem os índices de desempregados e a massa dos sem-empregos, sem-carteiras, sem-trabalho nenhum.

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Segundo Garretón, a atual abordagem dada à educação leva a uma visão distorcida da educação e a uma simplificação da realidade, onde “modernidade é igual a modernização; educação é igual a sistema escolar e preparação para o mercado de trabalho; desenvolvimento é igual a crescimento econômico, treinamento para aquisição de conhecimento; e justiça, a igualdade socioeconômica e pluralismo sociocultural”(Garretón, 1999:88).

Entretanto, há uma coisa boa no novo paradigma da Educação - ele traz um novo papel para a arte. A educação artística dos indivíduos ocupa um lugar tão importante no novo paradigma quanto a matemática ou outra disciplina básica, afirmam alguns analistas. Isto porque a arte educa enquanto arte e não para ser artista. Educa para a criatividade. Embora muitos neoliberais estejam interessados na criatividade apenas como uma nova estratégia para gerar lucros, para elaborar novos planos de marketing, ou ainda como novas formas de fazer/ alternativo (sem carteira assinada, sem apoio de políticas públicas, sem direitos sociais regulamentados etc.), sabemos que a arte, em suas múltiplas dimensões, desenvolve o senso estético e ético também. Desenvolve o bom gosto, a sensibilidade para a beleza das formas, apura os ouvidos, o olhar; desenvolve os sentidos de uma forma geral, ajuda-nos a fazer nossas próprias escolhas, estimula e desenvolve a criatividade nos indivíduos no sentido de realização dos homens e mulheres e de suas condições como seres humanos. Ninguém nega que é preciso sair da mesmice e ser criativo. E uma das formas de se fazer isto é desenvolvendo o senso artístico. Os gregos já haviam feito a distinção entre “mímesis” (a mesmice, a imitação) e a “poíesis” (a poesia, a criatividade).

Concluindo a primeira parte deste trabalho, de mapeamento das novas orientações da EP na América Latina, e de busca de compreensão das novas orientações para uma análise crítica, resta destacar que os analistas que têm participado dos seminários afirmam que a EP não pode perder o sentido de sua “missão”: gerar sujeitos críticos. Portanto é preciso discutir seus valores e criar suportes metodológicos que combinem o cognitivo e o afetivo; as aprendizagens significativas (de conteúdos), com as aprendizagens vinculadas à vida cotidiana (o saber popular). Para eles, a EP entrou num processo de redefinição profunda e importante, que deverá adaptá-la às novas tendências sociais, políticas e pedagógicas. Para tal, é preciso dar toda ênfase ao processo de formação dos educadores, pois serão esses educadores que terão de levar à prática as novas idéias e as transformações que estão ocorrendo na EP. Serão os educadores que

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entrarão no processo pedagógico e devem gerar novas relações com os educandos (tratados, agora, pelos revisores da EP, como grupos beneficiários). Eles precisam de formação adequada, ferramentas que possam gerar um processo educativo transformador. Em síntese, para que ocorram as mudanças preconizadas à EP, é fundamental que se invista na formação do educador.

Paulo Freire e o processo de conscientização

Segundo Gadotti (1999), o método de Paulo Freire representa, na América Latina (e em outras partes do mundo também), um dos mais importantes paradigmas da educação. Quando ele surgiu, significou uma alternativa emancipatória e progressista face aos programas extra-escolares predominantes na época, patrocinados por agências norte-americanas e de outros países, com programas de extensão rural, desenvolvimento de comunidade etc. Esses programas estavam sendo desenvolvidos na América Latina desde o término da II Guerra Mundial. A obra de Paulo Freire e sua abordagem da realidade têm um caráter multidisciplinar e contempla diversas dimensões, destaca-se a do educador-político. Freire postula uma educação libertadora e conscientizadora, voltada para a geração de um processo de mudança na consciência dos indivíduos, orientada para a transformação de si próprios e do meio social onde vivem.

Inicialmente, o método estava centrado mais no tema da consciência, buscando o desenvolvimento de uma consciência crítica. Posteriormente, os temas da organização e do trabalho foram ganhando também relevância, no próprio processo de construção daquela consciência. Sabemos que o método foi aplicado originalmente em programas de alfabetização de jovens e adultos da área rural do nordeste, ampliou-se para todo o território nacional - entre junho de 1963 até o golpe militar de março de 1964; a partir dos anos 70 ele foi aplicado em várias regiões do mundo em “trabalhos de base” em geral. A bibliografia a respeito da origem e desenvolvimento do método é vasta e bastante conhecida, não é o caso e nem nosso objetivo neste texto concentrarmo-nos nestes pontos. Recordamos apenas que o método consistia em três momentos básicos: a investigação temática (busca de palavras e temas chaves no universo vocabular do(s) aluno(s) e da sociedade onde se vive); a tematização (a codificação/decodificação desses temas/palavras e seu significado social); e a problematização (busca de superação das primeiras impressões por uma visão crítica).

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Uma das maiores inovações do método de Freire, quando surgiu, e também atualmente, é o fato dele ter como base o diálogo. Nos anos 60, quando o método foi elaborado, ele era moderno e avançado para sua época, pois ele dava grande ênfase aos processos comunicativos. Este tema entrou para a agenda corrente contemporânea, entre a comunidade dos acadêmicos e dos planejadores públicos, como “obrigatório”, apenas nos anos 80, dado o avanço dos meios de comunicações e o papel da mídia. Para Freire, “o diálogo consiste em uma relação horizontal e não vertical entre as pessoas implicadas”(vide Gadotti, 1999: 9). A reflexividade - tão conclamada nas teorias dos anos 90, já estava colocada no método de Freire à medida que o oprimido só se liberta quando adquire a capacidade de refletir sobre as condições de sua própria vida, e que conquiste força autônoma para realizar seu destino histórico. A pedagogia do diálogo redefiniu a relação pedagógica à medida que redefiniu a relação professor/ aluno; educador/educando. O professor é visto por Freire como alguém ao lado do aluno, um ser que também busca e também aprende; o aluno passa a ser sujeito das ações educativas e não mais objeto, ele ganha dignidade no processo educativo.

“A criança, o jovem e o adulto só aprendem quando têm um projeto de vida onde o conhecimento é significativo para eles. Mas é o sujeito que aprende através de sua própria ação transformadora sobre o mundo. É ele que constrói suas próprias categorias de pensamento, organiza o seu mundo e transforma o mundo. [..] Todavia, o educador também não fica unicamente no saber do aluno. O professor tem o dever de ultrapassá-lo. É por isso que ele é professor e sua função não se confunde com a do aluno”, destacou Gadotti ao abordar o método de Freire. (Gadotti, 1999: 8 e 10).

As experiências de Freire no Chile e na Guiné Bissau, ao final dos anos 60 e nos anos 70, foram decisivas para a redefinição de algumas de suas concepções iniciais – que destacavam mais as ações - cultural e problematizadora - como geradoras da consciência. Freire passou a enfatizar também a importância da organização (a ação organizada), e da consciência gerada via a experiência profissional, no processo produtivo de trabalho. Ele chamou a atenção dos educadores - na primeira fase do método, quando se procura descobrir o universo vocabular do grupo – para que se atente tanto para as palavras carregadas de sentido existencial (cunho emocional) como para outras experiências típicas da vida cotidiana dos educandos, expressas por “formas de falar particulares, palavras ligadas à experiência do grupo, especialmente à experiência profissional” (Freire, 1980: 42).

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Portanto, para Paulo Freire, a conscientização não significa um ato mecânico, instantâneo, de tomada de consciência da realidade. Ela é um processo construído por momentos aonde se caminha do nível espontâneo e ingênuo para uma tomada de consciência à medida que se aproxima da realidade. Freire alerta que essa tomada de consciência ainda não é a conscientização propriamente dita, pois esta só surge por meio da análise crítica e implica um certo distanciamento dessa mesma realidade; implica em ação reflexiva, implica práxis. A conscientização é, portanto, o desenvolvimento crítico da tomada de consciência; é a consciência que se aprofunda via a imersão reflexiva na realidade. “A conscientização não pode existir fora da “práxis”, ou melhor, sem o ato ação-reflexão. (...) Por isso mesmo, a conscientização é um compromisso histórico. É também consciência histórica: é inserção crítica na história, implica que os homens assumam o papel de sujeitos que fazem e refazem o mundo. (...). A conscientização não está baseada sobre a consciência, de um lado, e o mundo, de outro; por outra parte, não pretende uma separação. Ao contrário, está baseada na relação consciência-mundo. (...) A conscientização supõe, por sua vez, o superar a falsa consciência, quer dizer, o estado de consciência semi-intransitivo ou transitivo ingênuo, e uma melhor inserção crítica da pessoa conscientizada numa realidade desmitificada” (Freire, 1980: 26 e 90).

Resulta que, na obra de Paulo Freire, a educação como ato educativo de conhecimento e como prática de liberdade é, antes de mais nada, conscientização. A educação é pensada por Freire como um ato político, ato de conhecimento e ato criador. Seu ponto de partida é a realidade dada, que precisa ser transformada. Para que ela possa ser libertadora, é vista como um processo longo; ela precisa construir nos educadores(as) uma consciência histórica, que demanda tempo. O conhecimento, como afirma Gadotti, em si mesmo, não é libertador, o será se estiver associado a um compromisso político em favor dos excluídos. Ele é uma ferramenta essencial para intervir no mundo. Para Freire, “A libertação é o fim da educação. A finalidade da educação será libertar-se da realidade opressiva. A educação visa à libertação, à transformação radical da realidade, para melhorá-la, para torná-la mais humana, para permitir que os homens e as mulheres sejam reconhecidos como sujeitos da sua história e não como objetos”. (Gadotti, 1999: 9).

Os novos postulados freireanos tiveram um papel fundamental na atividade educativa geradas pelas atividades político-organizativas nos anos 70 e parte dos anos 80. Foi um período em que, na América Latina em

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geral, e no Brasil em particular, a educação popular se tornou sinônimo de movimento social popular, pois a principal estratégia educativa utilizada nos trabalhos com as camadas populares, a conscientização, situava em uma mesma linha de objetivos a prática política e os processos de aprendizagem. E essas duas ações se articulavam em um plano de ação política. Nos anos 70, este plano teve um espaço privilegiado para seu desenvolvimento, a saber: as ações das comunidades eclesiais de base cristãs. O trabalho educativo de formação de lideranças gerou também inúmeras iniciativas populares, que contribuíram para a organização das massas populares, especialmente urbanas, tais como: bibliotecas populares, rádios comunitárias, centros culturais de bairros, grupos de teatros, inúmeros cursos de formação em centros populares e operários, boletins e uma variada gama de mídia alternativa, músicas e concursos populares etc. A educação popular era vista como parte integrante do processo organizativo das classes e camadas populares, desenvolvida pela Igreja, clero, facções políticas novas (que deram origem ao PT - Partido dos Trabalhadores), e não somente uma tarefa dos partidos e sindicatos. Em alguns casos havia tensão e conflitos entre os programas de alguns partidos de esquerda - considerados como radicais, e as novas organizações populares, mais afeitas às orientações cristãs-neomarxistas ou socialistas –libertárias (vide Gohn, 1997 a).

Segundo Torres (1994), os objetivos principais do paradigma da educação popular, nos anos 70, eram

“desenvolver nas classes mais desfavorecidas da sociedade algumas capacidades que foram consideradas necessárias para a sobrevivência que lhes ajudariam a viver de uma maneira produtiva - ou a sobreviver – dentro da ordem social existente. [...] Isso inclúi “alfabetização” que, obviamente, tem uma dimensão mais política no sentido da pedagogia de Paulo Freire (Freire, 1970); constitui uma preparação para uma ação política da população através de um programa de conscientização.[...] Nesse sentido, quero afirmar que os movimentos de educação popular fazem parte de uma subversão discreta (e freqüentemente aberta), que tem sido e – eu receio - continuará a ser confrontada na América Latina não somente com ideologias alternativas mas também com força e repressão. [...] o fracasso evidente de muitos programas de educação popular em alcançar sua meta final de organização, participação e conscientização dos despossuídos da América Latina não pode ser inteiramente atribuído às falhas endógenas deste constructo- que na realidade são muitas, como seus promotores admitem. Muitas vezes era também o resultado de intervenções violentas “externas” por parte do Estado - o exemplo clássico é o fim dos experimentos com o método Paulo Freire no Brasil e a repressão aos educadores populares após a queda de Goulart em 1964.” (Torres, 1994: 251-252 e 256)

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É bom registrar que não apenas intervenções armadas estancam processos de mobilização, organização e conscientização. Quem subvenciona e quem controla os programas tem um poder enorme de mudar o curso dos acontecimentos. Torres também sabe muito bem disso, ao afirmar:

“Existem conjunturas onde a educação popular é essencialmente uma força contra hegemônica, uma ação cultural libertadora. Porém, num outro momento histórico, a educação popular pode participar da construção de uma nova hegemonia e exercer uma ação cultural relacionada com a construção de um novo poder. Entretanto, Torres destaca que, nas duas situações, “os métodos pedagógicos e as estratégias políticas em geral, permanecem os mesmos. A diferença, porém, está na aliança política que controla o Estado, o grau de radicalização da sociedade civil, e as relações dialéticas entre organizações não-governamentais, organizações de massas, o Estado e o movimento de educação popular.” (Torres, 1994: 258)

A permanente atualidade de Paulo Freire

Gadotti destaca que o que preocupava Paulo Freire nos últimos anos era “o avanço de uma globalização capitalista neoliberal. Ele atacava o pensamento e a prática neoliberal porque estas são visceralmente contrárias ao núcleo central do pensamento de Paulo Freire: a utopia” (Gadotti, 1998: 116). Gadotti destaca ainda que, enquanto o futuro foi sempre “possibilidades” para Freire, para os neoliberais ele é uma “fatalidade”; Freire atacou o mercado porque ele se baseia na lógica do controle, oposta à lógica da liberdade; acentuou que o ato pedagógico é democrático por natureza e que a educação não pode se orientar pelos paradigmas das empresas, que dão destaque apenas à eficiência, à eficácia, sempre de olho na relação custo-benefício. Ele conclui que o paradigma empresarial ignora o ser humano e o trata como simples agente econômico. Os neoliberais buscam retirar da pedagogia sua essência política, por isso ela é uma pedagogia da exclusão, oposta à pedagogia da esperança elaborada por Freire (vide P. Freire, 1992; Gadotti, 1998: 116-118; e também Gentili, 1995).

Por tudo o que foi dito acima, o tema da cidadania ganha centralidade na obra de Freire nos anos 90. Ele contesta a cidadania liberal, e a neoliberal, e defende uma cidadania como uso pleno dos direitos e deveres pelos cidadãos, entendidos como “indivíduos no gozo dos direitos civis e políticos de um Estado” (Freire, 1993).

A questão da qualidade, tão proclamada pelas reformas neoliberais, foi tratada por Freire segundo uma ótica totalmente distinta. Para ele, a qualidade não se confunde com quantidade de conteúdos apreendidos, mas

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ela se expressa na geração de novas relações que se estabelecem entre os atores que participam do ato educativo. Ele clamou por uma nova qualidade, na educação e na vida das pessoas, para todos, a partir de um empenho também ético. Repudiou a qualidade do neoliberalismo pelo fato deste ser sinônimo de competitividade, oposta à solidariedade - tão necessária para uma nova qualidade de vida.

Outro tema da agenda dos anos 90 tratado por Paulo Freire foi o da subjetividade. Ao aprender simultaneamente a ler e a pensar criticamente, o método freireano desenvolve o hábito de pensar a prática; os indivíduos aprendem a dizer o que pensam, o que desejam, o que sonham e o que aspiram, para si e para seus entes, sua comunidade, seu país etc. O processo de conscientização que está envolto nesta nova realidade possibilita aos indivíduos e grupos vislumbrarem um mundo com liberdade, justiça e igualdade. Esses sujeitos percebem, via o confronto entre o sonho e a realidade, que vivem um cotidiano que é o oposto do que vislumbram. A dura realidade das desigualdades apresenta-se como o campo de ação a ser transformado, pois se conscientiza que essas desigualdades são construídas cotidianamente nas relações sociais existentes, especialmente nas relações que ocorrem no plano econômico, no mundo da produção propriamente dita, e no mercado financeiro em geral. Outras desigualdades são construídas ou reificadas cotidianamente, devido a valores discriminatórios que os indivíduos e grupos carregam, quanto à raça, sexo, nacionalidade, idade, etnia etc. Esses indivíduos desenvolvem uma subjetividade política, oposta à subjetividade econômica, lastreada no desejo de acesso ao mundo do consumo, cotidianamente imposta pela mídia e por todos os planos que circundam a vida na sociedade capitalista.

Partindo do fato de que a desigualdade não é um processo natural, Paulo Freire enfatiza que é preciso aguçar nossa capacidade de estranhamento, não se calar face às injustiças, desenvolver uma nova ética e uma nova racionalidade quanto aos valores a serem cultivados/preservados. A nova racionalidade a ser construída deverá estar “molhada de afetividade”(Gadotti, 1998); de solidariedade. As ações cotidianas devem expressar esses novos valores. Tudo isso está intimamente conectado ao plano da subjetividade e seus contornos políticos, assinalados acima.

Nos anos 90, Freire destaca ainda mais a dimensão cultural nos processos de transformação social e o papel da cultura no ato educacional. Além de reforçar seus argumentos em defesa de uma educação libertadora que respeite a cultura e a experiência anterior dos educandos, Freire alerta

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para as múltiplas dimensões da cultura, principalmente a cultura midiática. Ele chama atenção ao fato de que ela poderá despertar-nos para alguns temas geradores que o próprio saber escolar ignora, ou valoriza pouco, como a pobreza, a violência etc. Destaca também que a mídia trabalha e explora a sensibilidade das pessoas e por isso consegue atrair e monopolizar as atenções. Seus livros escritos nos anos 90 – de estilo mais literário - revelam um pensador preocupado com o futuro da sociedade que vivemos, dado o crescimento da violência, da intolerância e das desigualdades socioeconômicas. Ele destacará a importância da ética e de uma cultura da diversidade. O tema da identidade cultural ganha relevância na obra de Freire assim como o da interculturalidade.

Nos anos 90 Paulo Freire também ampliou o espaço para as questões ambientalistas em sua obra. Em À sombra desta mangueira ele desenvolve reflexões no plano ecológico e cria o que Gadotti denominou “uma pedagogia para o desenvolvimento sustentável”, uma ecopedagogia. Fala de uma cidadania ambiental planetária sustentada por uma ética integral de respeito a todos os seres humanos. Suas idéias sobre a ecopedagogia são a fonte de inspiração para um programa do Instituto Paulo Freire, de São Paulo, o “Carta da Terra”. É um projeto político educacional para contribuir para a criação de melhores condições e qualidade de vida, parte integrante de um programa apoiado pela ONU e é abordado segundo os princípios de uma cidadania planetária. O método Paulo Freire se faz presente: parte-se do contexto dos envolvidos no processo, de seu universo sociocultural, de sua leitura do mundo, e do seu nível de compreensão da realidade que vive. O projeto prevê a reeducação do olhar que cada um tem, ampliando-lhes a visão. A partir do que lhes falta conhecer são planificadas novas situações que provoquem a ampliação de suas experiências e de seus interesses mais imediatos. Espera-se também promover a mudança de uma visão focalista e ingênua para uma visão mais crítica, e a mudança de uma postura passiva para uma atitude ativa diante dos problemas constatados. Aplicado nas escolas, o projeto destaca a importância da organização curricular coletiva e prevê no estudo do tema gerador, além do conhecimento informativo, a formação de atitudes e valores ético-sociais. Caminha-se no sentido da problematização mais abrangente e os encontros se tornam “círculos de cultura” (vide: Projeto Carta da Terra, coord. Moacir Gadotti, 1999b).

Quanto à escola propriamente dita, nos anos 90, Paulo Freire destaca que ela deve preparar seus alunos(as) para serem cidadãos de uma sociedade planetária. Ela é uma organização local, e este deve ser o

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ponto de partida do saber a ser gerado em seu interior. Mas ela tem que ser global no sentido de ser internacional e de ter um caráter intercultural, em seu ponto de chegada, no resultado de seu processo de formação. E ao percorrer este caminho entre o local e o global, as diferenças de todas as naturezas devem ser explicitadas/conhecidas e, muitas vezes, vivenciadas. Segundo Gadotti,

“As conseqüências desse enfoque para o ensino são enormes. Trata-se de estabelecer metodologias que permitam converter as contribuições étnico-culturais em conteúdos educativos, portanto, fazer parte da proposta educativa global de cada escola. [...] o professor precisa reeducar seu olhar para a interculturalidade; precisa descobrir elementos culturais externos que revitalizem a sua própria cultura. Mas isso não é o mais problemático hoje. Basta abrir os olhos para a realidade, escutar, ouvir.“ (Gadotti, 1999: 16)

Os educadores freireanos têm buscado articular, nos anos 90, a cultura do educando e suas experiências com os ditos conhecimentos produzidos historicamente, contidos nos parâmetros curriculares nacionais.

Paulo Freire soube acompanhar as mudanças nos processos tecnológicos e seus impactos no processo educacional, sem abrir mão de seus valores e premissas fundamentais. Os ambientes interativos, preconizados desde os tempos de sua atuação no nordeste do Brasil, nos anos 50/60, passam a ser reforçados nos anos 90 desde que sejam utilizados de forma crítica.

Um destaque relevante sobre a obra de Paulo Freire é a sua utilização junto aos movimentos sociais em geral, e aos populares em particular. Sintetizando esta questão, que é longa e merece ser objeto de análise em um livro específico, nos anos 90 observam-se:

1a - a continuidade do uso do método Paulo Freire nos movimentos populares urbanos que sobreviveram dos anos 80-especialmente na luta pela moradia;

2a - a continuidade do uso do método na área da Educação, não apenas nos programas de alfabetização de adultos desenvolvidos por entidades do terceiro setor e por programas oficiais nacionais, mas também na área da educação não-formal (vide Gohn, 1999b), em trabalhos com crianças e jovens adolescentes em situação de risco.

3a - o uso do método em programas sobre o meio ambiente - nas escolas e junto às comunidades. A obra de Freire (1995) À sombra desta mangueira tem sido uma referência sobre a ecologia.

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4a - registre-se ainda a grande importância da utilização do método em programas junto a grupos de mulheres - sobre seus próprios problemas de saúde e sexualidade; sobre seu lugar na família, relações com filhos e com seu companheiro; sobre seu papel na sociedade, no sentido da igualdade de gênero; além de programas socioeducativos contra todo tipo de violência e discriminação; e a utilização dos ensinamentos de Freire sobre gênero nas escolas, a partir de seu livro Professora sim, tia não (1993b).

5a - Para finalizar este tópico, algumas linhas sobre o campo onde, talvez, o método de Paulo Freire tenha sido o mais utilizado nos anos 90, e onde ele tem produzido excelentes resultados - em termos de potencializar as ações dos educadores/educandos, assim como de impactar a sociedade e as políticas públicas. Trata-se do uso/aplicação ou readaptação do método pelo MST - Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Nos limites deste trabalho não podemos dedicar espaço para analisarmos este movimento; já o fizemos em outros textos (Gohn, 1997a, 1997b, 1999c e 2000b), assim como outros autores (João Pedro Stédile e Bernardo Mançano Fernandes –1997 e 1999; e Rosely Caldart - 1998 e 2000). Registramos apenas que o método tem sido utilizado tanto em trabalhos da educação escolar - principalmente na alfabetização e outros níveis da educação fundamental, em escolas do próprio MST, como nos cursos e demais atividades de formação de lideranças e de organização do trabalho nas cooperativas dos assentamentos; assim como na organização geral dos acampamentos - fase árdua de ‘espera’ na luta, até a obtenção do assentamento definitivo.

Considerações Gerais para uma agenda de análises futuras

Em síntese, a educação popular na América Latina, nos anos de resistência aos regimes militares e no período da transição à democracia, teve uma natureza essencialmente sociopolítica porque ela era um instrumento de mobilização e organização popular.

“Se descobre que o fator educativo fundamental não é o processo pedagógico em si, senão as ações de luta (às vezes mais espontâneas, outras vezes mais organizadas) em que o povo intervém vitalmente na história. A educação popular não é um momento prévio de tomada de consciência, após o qual se poderia passar para a ação consciente, senão que a educação popular é um processo permanente de teorização sobre a prática, ligado indissoluvelmente ao processo organizativo das classes populares.” (Jara, 1994: 95)

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Este período gerou, além de inúmeros movimentos sociais populares na sociedade civil - que tiveram um papel decisivo para a mudança do regime político vigente, uma série de técnicas e metodologias de trabalho de campo, de natureza ativa e participativa. Destacam-se: o sociodrama, o teatro de comédias e pantomimas, jogos de papéis, dinâmicas grupais; produção de audiovisuais, vídeos populares, cartazes, cartilhas, leituras coletivas de textos etc., num jeito novo e livre de “fazer política” no cotidiano questionando a ordem dominante.

Alguns pesquisadores latino-americanos, adeptos dos métodos participativos nos anos 70 e 80, reviram suas abordagens afirmando que nos anos 90 as práticas educativas de conscientização durante mais de uma década

“alimentou e provocou mudanças na forma de fazer e pensar a educação de adultos e, mais especificamente, a educação de adultos dos setores populares. [...] Tais necessidades foram concebidas como direitos dos cidadãos e deveres do Estado. [...] mas são poucos os países onde o Estado consegue responder a estas demandas. [...] A conscientização em décadas passadas, como na atualidade em algumas experiências de educação popular e investigação participativa, não oferece alternativas sobre como satisfazer tais expectativas e demandas.” (M. Gajardo, 1994: 278 e 274)

Segunda essa autora, a sobreideologização do discurso político-pedagógico impediu uma articulação entre as demandas populares por educação e outras reivindicações básicas. O fracasso de algumas experiências de conscientização é atribuído aos vazios teóricos e imprecisões conceptuais existentes. Lamenta-se pela ausência de princípios educativos que pudessem operar como elementos de coesão social e a falta de clareza quanto ao papel do Estado e da sociedade civil, e indaga-se sobre quais seriam as reivindicações possíveis e o desenho de estratégias que possibilitassem aos grupos demandatários apropriarem-se dos espaços que existem na sociedade. (Gajardo, 1994). Ou seja, a revisão da EP e a sua aproximação às políticas públicas neoliberais levaram a retomada de certas práticas onde se espera que o “desenho” ou uma “boa estratégia” de uma proposta, programa ou projeto, resolvam problemas da educação popular. No passado, essas estratégias deixaram lembranças de triste memória.

Em relação ao Estado, os mesmos analistas reconhecem sua importância como elemento chave na definição e formulação dos serviços educativos oferecidos aos setores populares; destacam que a educação – enquanto uma das ênfases centrais nas políticas e discursos oficiais, nos

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anos 90 – criou um campo de negociação, de acordos e conflitos, onde o resultado depende da força dos diversos atores que participam. É interessante observar que estas análises sobre a “governabilidade” da educação colocam-na, agora, menos como um direito e mais como um serviço; fala-se em forças dos atores, mas não se fala da força política desses atores para reverter o quadro de miséria e de exclusão social que as políticas neoliberais geraram em todo o continente latino-americano. Para que se fale de força política, deveriam ser priorizados também outros processos, tais como o da formação da consciência crítica e a organização daqueles setores. Mas, como demonstramos ao longo deste texto, todos estes conceitos estão sendo redefinidos, segundo óticas menos coletivistas e mais individualistas.

O paradigma teórico que passou a alicerçar as novas orientações é uma mistura de velho e novo. Do velho temos o retorno às teorias do interacionismo simbólico, a redescoberta do indivíduo e da psicologia social, renovada. Do novo temos as modernas teorias da comunicação, da semiótica e lingüística. O interessante deste processo será a redefinição do sentido do processo de conscientização, antes centrado na política, com P maiúsculo, utilizando metodologias mais inquisitivas, questionadoras do status quo, para um sentido da conscientização como processo de negociação de atores sociais em posições diferentes: quem ensina, quem aprende. A horizontalidade da relação é posta em questão. As novas orientações enfatizam um processo de conscientização de ordem mais psicológica - de um lado, ele está centrado nos indivíduos, em sua cultura; de outro, ele trabalha o emocional, estimulando a expressão dos desejos e aspirações. Trata-se, agora, de um processo focado numa mudança de comportamento e atitudes; de incorporação de novos valores e práticas. A metodologia de trabalho é mais problematizadora, no sentido da busca de formulação e soluções alternativas sustentáveis; a interação é estimulada para o pensar coletivo sobre “como fazer”, “como resolver” “como agir”, “como intervir a partir de um projeto, de uma idéia”. Não podemos deixar de ver a influência de algumas das idéias neoliberais nas novas diretrizes preconizadas à EP.

Sabemos que a conscientização não opera num vazio, não é um processo individual; ela ocorre por etapas, em processos de interação do indivíduo em coletivos organizados; ela é um ato político. Quando vista e trabalhada como uma relação individual, isolada, centrada apenas no educador/educando, descontextualizada de outras variáveis, tais como: os valores que informam essa relação, o ambiente onde ocorre, o contexto do

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programa dentro de um cenário mais amplo, seus objetivos etc., certamente resultará num processo bastante ineficaz do ponto de vista da conscientização propriamente dita, orientada para a mudança sociopolítica de uma dada realidade social como um todo. Estamos entendendo a conscientização como um processo transformador, que vislumbra, de um lado - mudanças estruturais que venham a promover os direitos de uma cidadania plena, isto é, a justiça social, a igualdade, a liberdade, fraternidade, solidariedade etc. e, de outro lado - um processo que atua sobre a consciência dos indivíduos propiciando-lhes compreender o universo de valores, símbolos e códigos que permeiam sua realidade imediata, decodificando-os de forma a poder estabelecer diferenças entre aqueles que contribuem para a liberdade e autonomia dos indivíduos, enquanto seres humanos, e aqueles que os oprimem e os aprisionam. Neste segundo aspecto, os analistas da EP têm razão ao destacarem que não se trata de um processo de simples absorção de conhecimentos ou informações vindos de fora para dentro; trata-se de um processo de interação entre o que o indivíduo sabe (ou o que um grupo sabe) – por herança cultural ou experiência vivenciada - e o que eles receberam como estímulo - na interação gerada no próprio processo educativo.

Talvez estejamos postulando uma volta às utopias, pois temos convicção que um ponto é necessário: uma visão integrada do processo de conscientização de forma que o processo tenha mão dupla em direção ao indivíduo e à estrutura da sociedade. Um processo que não tenha como objetivo (implícito) a integração, o ajuste, dos indivíduos, às diretrizes construídas pelos que dominam aquelas estruturas (via seus poderes: econômico, político ou cultural). Entretanto, não estamos postulando nada de novo, mas sim uma volta ao conceito de conscientização de Paulo Freire, em sua forma plena, isto é, como ele o reformulou nos anos 70/80. O próprio Freire nos alerta: “A conscientização está evidentemente ligada à utopia, implica em utopia. Quanto mais conscientizados nos tornamos, mais capacitados estamos para ser anunciadores e denunciadores, graças ao compromisso que assumimos (Freire, 1980:28).

A mudança operada na metodologia de trabalho desenvolvida pela EP nos anos 90 passou, na atuação em periferias carentes das grandes cidades, de áreas problemas para áreas temáticas específicas. Nos anos 70/80 a EP atuava sobre um leque enorme de demandas dado pelos problemas de: moradia/favelas, e loteamentos clandestinos; falta de creches e escolas fundamentais; carência de transportes públicos e asfalto; ausência de postos de saúde e de profissionais para o seu atendimento;

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absoluta falta de segurança, postos policiais ou locais próximos para a retirada de documentos; não existência de cemitérios; inexistência de varejões - postos de abastecimentos de gêneros alimentícios de primeira necessidade; além do não saneamento com esgotos etc. Nos anos 90, a atuação da EP concentrou-se em áreas temáticas específicas: produção cooperada, educação infantil, escolar, saúde das mulheres, proteção ao meio ambiente, cultura local, tradições culturais, lazer e esporte para jovens e adolescentes, programas educativos para crianças fora do horário escolar, apoio escolar etc. As novas ações são desenvolvidas com grupos sociais específicos - mulheres, crianças, jovens, idosos, comunidades indígenas, desempregados, pessoas portadoras de limitações físicas ou com doenças de risco etc. Essa mudança alterou o sentido da ação social coletiva. As ações deixaram de ser uma meta externa a ser atingida - via a pressão sobre aqueles que coordenam ou detêm o poder de decisão - nas áreas problemas, para metas que visam operar mudanças nos próprios indivíduos - para que eles revejam suas práticas e valores e se incorporem em coletivos propositivos – nas áreas temáticas. Antes, reivindicava-se e ficava-se na espera da resposta dos poderes constituídos, ou na reação dos poderes públicos face às pressões. As ações coletivas eram ativas até um certo ponto (organização, mobilização e pressão). Depois, elas se estancavam na espera. Construíam-se na heróica resistência de seus demandatários: os oprimidos. Algumas se perdiam - pelo desânimo e descrença dos demandatários - dado o não atendimento das demandas pelos poderes públicos; outras mudavam de caráter porque seus componentes/participantes escolhiam outras vias de atuação, via os partidos de esquerda ou ações conjuntas com os sindicatos. Outras ainda se transformaram em práticas emancipatórias que ainda persistem, sem perderem a radicalidade, mas organizaram-se de outra forma, aproveitando todas as oportunidades políticas que foram surgindo nas brechas e espaços da conjuntura do país.

De uma forma geral, apesar da politização geral que as ações propiciaram em passado recente, existiam muitos problemas porque os indivíduos e grupos - sob a ação da EP, permaneciam muito dependentes de seus articuladores, coordenadores e das redes que estruturavam os trabalhos. Poucos, de fato, atingiam a autonomia no pensar e no agir, ainda que, no conjunto, o resultado tenha sido grande, em termos de ganhos sociopolíticos, no sentido da conquista de espaços democráticos na sociedade civil e política. De fato, não havia horizontalidade entre os participantes - não o tipo de horizontalidade a que aludem os revisores da

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EP, centrada na relação professor/aluno, educador/educando. A não horizontalidade estava basicamente entre os que programavam as ações e os que as executavam na base. Entre os articuladores – nacionais, estaduais ou locais – e os outros membros da rede associativista. As hierarquias de poder nem sempre eram formais; usualmente, eram informais. Mas todos as conheciam e as vivenciavam.

Nos anos 90, em geral, predomina um estilo de atuação da EP em que as ações são instrumentalizadas/suportadas/estimuladas – pelos educadores da EP (com seus projetos), pelas políticas públicas (com suas diretrizes e programas), e pelos organismos financiadores internacionais (que exigem percentuais ou cotas de aplicação dos empréstimos, em projetos sociais etc.). Resulta que, independente da questão ideológica, do projeto político que informa o trabalho da EP (de orientação cristã, político-partidária, alguma seita religiosa, empresas que se autodenominam como cidadãs, ONGs apoiadas pela cooperação internacional, organizações clássicas de caráter filantrópico, caritativo ou assistencialista etc.), todos(as) tiveram que reorientar suas atividades no sentido ativo/propositivo, pois aqueles(as) que não o fizeram (ou não fazem), simplesmente, deixam de existir. A causa é uma só: acesso às verbas, aos fundos de financiamento, públicos (os principais) e alguns privados.

No novo contexto, o método de Paulo Freire continuou a ser uma referência, pois ele contém muitos dos princípios delineados nas reformulações da EP: ele destaca a cultura e a dialogicidade do ato educativo. Entretanto, sua utilização nos anos 90 ocorre - menos pela sua dimensão político-participante – que deu espaço aos movimentos populares e aos militantes de facções político-partidárias, nos anos 70-80, para realizarem um trabalho “de base”, gerador de consciências críticas no sentido pleno da transformação social, contestador da ordem social vigente; e mais pela sua dimensão de “empowerment” (empoderamento) dos indivíduos e grupos de uma comunidade – gerando um processo de incentivo às potencialidades dos próprios indivíduos para melhorarem suas condições imediatas de vida, objetivando o “empoderamento” da comunidade, isto é, a capacidade de gerar processos de desenvolvimento auto-sustentável, com a mediação de agentes externos – os novos educadores – atores fundamentais na organização e o desenvolvimento dos projetos. O novo processo ocorre, predominantemente, sem articulações políticas mais amplas, principalmente com partidos políticos ou sindicatos.

O significado e o resultado do uso da dimensão do “empowerment” não têm um caráter universal pois tanto poderá, de fato, promover e

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impulsionar grupos e comunidades – no sentido de seu crescimento, autonomia, melhora gradual e progressiva de suas vidas (material e como seres humanos dotados de uma visão crítica da realidade social); como poderá promover simplesmente a pura integração dos excluídos, carentes e demandatários de bens elementares à sobrevivência, serviços públicos, atenção pessoal etc., em sistemas precários, que não contribui para organizá-los – porque os atendem individualmente, numa ciranda interminável de projetos de ações sociais assistenciais. Vários fatores determinam a diferenciação dos dois tipos de processos e seus resultados mas o principal deles é a natureza, o caráter e o sentido do projeto social da(s) instituição(s) que promove(m) o processo de intervenção social. Estamos falando dos mediadores, das ONGs e do terceiro setor de uma forma geral, das entidades que organizam os projetos, buscam os financiamentos, fazem as parcerias – com o governos, com outras entidades e organizações do terceiro setor da sociedade civil, com os organismos da cooperação internacional e com os movimentos sociais. Esse último item é fundamental porque, dado os rumos que os movimentos tiveram nos anos 80, principalmente os de caráter popular, e seus desdobramentos nos anos 90 (alguns entrando em crise e desmobilizando-se, outros crescendo no rastro da crise por saber aproveitar as oportunidades políticas do momento), aliar-se ou fazer parceria com um movimento social, popular ou não, já é um indicador da natureza do projeto da entidade. Um outro indicador é o tipo de movimento (ou, mais precisamente, qual movimento). Esse indicador pode ser captado segundo a trajetória histórica do movimento: origem, composição social, entidades articuladoras, redes sociais a que pertence, lutas que desenvolveu, projetos que elaborou, sucessos, perdas etc.

Portanto, o pensar, o refletir criticamente via a aprendizagem gerada no processo da EP está deslocando-se de sentido, lentamente. Em geral não se tratam mais de processos de lutas - no sentido de embates político-ideológicos contra uma dada ordem sócio-política. Trata-se, agora, da luta pela sobrevivência: aprender a gerar renda, aprender a se inserir numa economia desregulamentada, num mercado de trabalho sem direitos sociais.

Neste cenário resulta que, com as mudanças da conjuntura política na economia globalizada, o perfil e o caráter da formação dos educadores(as) populares se alterou. Ser apenas “ativista”, ter um largo currículo de militância ou de compromisso com certas lutas sociais não é mais suficiente para qualificá-lo para o desempenho de suas tarefas. O novo

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educador deve ter outras qualificações, além da militância. Para poder conhecer seus educandos, suas culturas, linguagens, valores e expectativas na vida, ele deve conhecer também a comunidade onde atua, ser sensível aos seus problemas. Para isso ele tem que dominar alguns conhecimentos. O educador tem que se formar e ser informado, não apenas na relação dialógica, mas em cursos de formação específica combinados com cursos de formação geral (por isto os programas de pós-graduação estão repletos de educadores advindos das ONGs).

Quanto a Paulo Freire propriamente dito, dentre seus inúmeros legados, destacamos duas lições básicas: o da necessidade da luta contínua contra as injustiças e o da indignação diante da barbárie. Tratam-se de posturas éticas e práticas políticas, de atualidade fundamental face ao mundo de pobreza que vivemos, diante de milhares de excluídos neste planeta chamado Terra. Como tarefas, Freire deixou-nos várias. Uma delas é desenvolver a pedagogia da rebeldia, da indignação, libertadora, que a partir das várias vivências dos indivíduos e grupos, contribua para o desenvolvimento de relações sociais e humanas mais fraternas e solidárias. Termino - concordando plenamente com Gadotti: “Não pode estar superada a pedagogia do oprimido enquanto existirem oprimidos. Não pode estar superada a luta de classes enquanto existirem privilégios de classe” (Gadotti, 1999a:19).

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A atualidade da educação popular1

Miguel González Arroyo

RESUMO: A educação popular continua presente na prática diária da população oprimida e excluída, população esta que, após tantos anos da Pedagogia do Oprimido, de Paulo Freire, aumentou ainda mais no nosso país. Curiosamente, na comemoração dos quinhentos anos, Paulo Freire, educação popular não foram lembrados, como se fossem coisas do passado. Há um permanente descompasso entre Educação Popular e Educação Escolar, porque a última devotou-se a estudos de metodologias, conteúdos, processos e teorias da aprendizagem, e se esqueceu que o eixo da pedagogia de Paulo Freire é o sujeito vivo e enculturado. Qualquer pedagogia deve ser pedagogia da infância, hoje destruída, seletivamente, pela violência das condições de vida.

Palavras-chave: Educação Popular, Paulo Freire, Pedagogia da Infância.

RESUMEN: La educación popular sigue estando presente em la práctica diaria de la población oprimida y excluida. Después de tantos años de la Pedagogía do Oprimido, de Paulo Freire, esta población ha aumentado todavía más em Brasil. Curiosamente, en la comemoración de los quinientos años, Paulo Freire y la educación popular no han sido recordados, como si fuesen cosas del pasado. Hay un permanente descompás entre educación popular y educación escolar, porque la última se dedicó a estudios de metodologías, contenidos, procesos y teorías del aprendizaje, olvidando el eje de la pedagogía de Paulo Freire, que es el sujeto vivo y enculturado. Cualquier pedagogía debe ser pedagogía de la infancia, hoy destruida por la violencia de las condiciones de vida.

Palabras clave: Educación Popular, Paulo Freire, Pedagogía de la Infancia.

1 Palestra realizada em 21 de novembro, na Mesa redonda Educação popular: paradigmas e atores, no Seminário Educação 2000, promovido pelo Instituto de Educação e o Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 11 n. 19 jan.-jun. 2002 p. 129-137

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Quando eu vi esse tema, a primeira pergunta que eu me coloquei foi: por quê Educação Popular? Eu já vi vários livros agora sobre os 500 anos, os outros 500 da história da educação, em que não se falava uma palavra da Educação Popular, nem de Paulo Freire. Eu me pergunto se é possível levantar a história dos últimos 40 anos de educação popular na América latina, no Brasil, sem contar essa história. Às vezes me pergunto: por que a educação popular ficou tão distante da educação formal? Por que a educação popular não conseguiu se legitimar nos nossos programas, como teoria, como prática? Lembro-me de que, quando fizemos uma homenagem a Paulo Freire, na festa, uma aluna que estava terminando o curso de pedagogia numa de nossas faculdades, disse que, ao longo dos seus quatro anos de formação como educadora, apenas tinha lido um livrinho de Paulo Freire!

Que bom que vocês tenham escolhido esse tema, mas como tratar esse tema, como uma lembrança, como um passado? Eu insisto que a educação popular continua tão perene, tão atual quanto há 40 anos. Se Paulo Freire escreveu Pedagogia do oprimido, nós hoje continuamos como muitos oprimidos que têm sua pedagogia, continuamos com mais excluídos do que no final dos anos 60, quando ele escreveu Pedagogia da exclusão, pedagogia dos excluídos.

Eu vou tentar me colocar essas perguntas que o tema nos coloca: que paradigmas traz a educação popular para a educação? E a pergunta que eu coloco é que temos que olhar a educação popular no campo da teoria pedagógica. O popular não reduz, não marginaliza, ao contrário, insisto nesse ponto: que a educação popular, sem dúvida nenhuma, tem sido uma das áreas do pensar pedagógico que explicitou e reafirmou as grandes matrizes. A educação popular não é um método, a educação popular não é um estilo, é a volta aos paradigmas, às matrizes. Paulo Freire usava a palavra geradora da teoria pedagógica pós-clássica. Nesse sentido, no dia em que nós a coloquemos nas faculdades de educação, porque ainda a maioria não tem teoria pedagógica – qualquer faculdade de medicina tem teoria médica, faculdade de sociologia tem teoria sociológica, faculdade de antropologia tem teoria antropológica, só na área de pedagogia não se tem uma teoria pedagógica – no dia em que a educação popular ali estiver, ela retoma esses grandes paradigmas mais presentes que, apesar das modas, apesar da didática, apesar dos métodos, se mantêm como as constituintes ao longo de mais de 25 séculos, desde a Paidéia, se mantêm como os grandes paradigmas, os grandes referenciais, as grandes matrizes sobre a teoria da promoção humana.

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Eu tive a sorte de ter sido convidado a assumir a cadeira de Paulo Freire, no curso em que ele dava aula quando morreu, na PUC, em São Paulo. Então, pude convidar várias pessoas para refletir sobre o pensamento de Paulo Freire, o que, para mim, foi muito interessante. E a leitura que eu fiz foi nessa direção, não com o aumento da alfabetização de adultos de Paulo Freire, não; mas em que medida Paulo Freire – e, com ele, a educação popular – nos puxa para os grandes paradigmas, para as grandes matrizes da teoria pedagógica! Eu convido vocês a fazer isto. Eu convidaria vocês a fazer uma leitura nesta direção. Eu acredito trazer alguns pontos, alguns indicadores de por onde se poderia traçar um caminho na procura dos paradigmas educativos, pedagógicos na educação popular. Um deles e que parece de grande radicalidade é de colocar o ser humano como problema pedagógico, e não colocando problemas pedagógicos como conteúdos, como método, como parâmetros, como didática, como competências, como aprendizagens, como a alfabetização, não! Isso é muito pouco. Seria como colocar na teoria médica como cuidar da unha do pé; como o menino vai abrir a boca para se ver se tem aftas; a teoria médica é algo mais profundo, é como o ser humano é. Como o ser humano se constitui como humano, essa é a teoria pedagógica. O foco da teoria pedagógica deveria ser o ser humano enquanto humano, como um problema, os processos de sua constituição para ser humano. E isto é o cerne da teoria pedagógica: como o ser humano se constitui um problema para si mesmo.

Leiam o primeiro capítulo de Paulo Freire, a Pedagogia do oprimido, vocês vão ver algo: o ser humano se coloca a si mesmo como problema, isto está presente na Paidéia, na pedagogia de santo Agostinho; na Renascença; está presente na Ilustração, em Kant; está presente em tudo enfim, menos no cientificismo do século passado, que invadiu a pedagogia e destruiu todas estas matrizes. Paulo Freire e a pedagogia popular nos colocam que educar é humanizar; não é ensinar, não é tornar competente. Educar é compreender e entender os processos de humanização. E Paulo Freire nos faz entender os processos de desumanização, mas ainda, também, que o ser tende à humanização, a se constituir como humano, historicamente. Nem todos os processos humanos são humanos, muitos são desumanos! Pedagogia não só tem o foco dos processos de humanização, mas sobretudo para nós, em época de exclusão, e para Paulo Freire, em tempos de opressão, temos que pensar nos processos de desumanização, como um médico não pensa só na saúde, pensa também na condição: doença-saúde; humanização-desumanização. As artes delas

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são para isso, nos puxam à educação popular. Leiam no meu livro Pedagogia, Ofício de Mestre, o último capítulo em que trabalho as relações de Paulo Freire e a humanização.

O processo de constituir-nos como humanos é um processo histórico, um processo lento, cheio de contradições. Entender a historicidade conflitiva e tensa do constituir humano faz parte da teoria pedagógica e está muito presente esta dimensão na pedagogia popular, na educação popular. É algo que mais se destaca na construção e desconstrução, humanização e desumanização dos seres humanos. A pedagogia popular é para, não é algo que pode estar conciliando e que serve para todos os tempos e para todos os lugares, não! Ela não serve para lá e para cá, ela é datada como o ser humano é datado nos seus processos de construir-se ou destruir-se.

O terceiro ponto muito importante é que os processos educativos são sempre sociais, nunca individuais. Ninguém se forma sozinho, nem para Paulo Freire; ele lembra o caráter dialógico, no sentido em que o aluno dialoga com o professor, dialoga num sentido mais radical, todo o processo de construção humana, em que ele passa a dialogar com outros seres humanos, uma maneira. Um caroço de mangueira pode cair a um quilômetro de distância de outra mangueira. Se encontrar condições, vai virar uma mangueira. O ser humano não consegue ser humano, distante de outros humanos.

Todo o ato educativo é um ato de interação entre humanos, isso é uma das coisas mais radicais em Paulo Freire, é uma das matrizes mais presentes do pensamento pedagógico, desde a Paidéia. A Paidéia surge com a nova experiência da República. A Paidéia não dá conselho de como a mãe vai educar seu filho, porque é a arte de constituir-nos humanos dentro de uma própria e dentro de um processo social. A Paidéia não ensina como o mestre vai educar seu aluno. É a arte de constituir humanos dentro de uma cadeia de processos, dentro de um projeto social, político, cultural, concreto; isto é muito importante! Essa matriz, esse paradigma de que todo ser humano se constitui de algo mais. Por isso, a relação pedagógica, por excelência, é sempre uma relação entre gerações, os que já aprenderam a ser humanos, os que estão sentados aprendendo a ser humanos como aqueles iniciantes nas artes de ser humanos. O que é a escola? O que deveria ser a escola? O encontro de gerações. O que significa a palavra pedagogo/pedagogia? O encontro de alguém que já sabe caminhos com alguém que está dando os primeiros passos. Nem parasitas

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devem seguir caminhos que outros seguiram e cair nos buracos que outros já caíram, mas juntos experimentarem novos caminhos.

Eu gostei muito do filme Central do Brasil: eu diria que é um filme de teoria pedagógica; primeiro, porque tem uma criança e uma professora, que não é mais professora, que vivia já no asfalto, na Central do Brasil. Mas o mais importante desse filme é a procura, o caminho, os dois juntos e, nesse caminhar, não só ela conduz a criança às suas raízes, ao encontro com seu pai, com sua cultura, com sua terra, porque no asfalto não tinha raízes; mas ela se humaniza, a criança humaniza a própria pedagoga, eu diria que esse aspecto está extremamente destacado em Paulo Freire, na pedagogia popular, na educação popular. Insisto, é uma das matrizes mais ricas do pensamento pedagógico.

Outro ponto que parece muito importante é a ênfase na cultura. Toda ação pedagógica é ação cultural, isso está muito forte. A educação popular nasce num momento rico de cultura, nasce com uma porta para as raízes, como a criança em Central do Brasil. Parece que a pedagogia faz o mesmo percurso, vai para o campo, vai para os camponeses, não para dizer a eles para deixar de ser caboclo, deixar de ser caipirão: “Seja moderno!” Trata-se de enraizar a pedagogia na cultura. Quantas vezes análises ilustradas, racionais desprezavam Paulo Freire quando ele se voltava para o saber popular. Para Paulo Freire, a educação popular, como todo o ato educativo, tem raízes na cultura ou nunca será significativo. Enraíza-se no processo de comunicação popular, porque o ser humano está calcado na cultura: somos muito mais condicionados pela cultura do que pelo conhecimento. Nesse instante, o conhecimento nos entusiasma, nos cativa e a cultura nos parece coisa secundária.

Insisto, todo ato de formação humana se aprende, se dá na cultura. Não só aprender a cultura como tema para Parâmetros Curriculares, mas um tema da atualidade. O homem começa a ser homem enquanto sujeito de cultura, precisa significar para poder dar salto. Então, não é possível alcançar este paradigma, esta matriz? Como é possível, então, uma pedagogia sem cultura, uma escola sem cultura? Como é possível uma pegagogia em que não se toque na cultura, em que se ministram saberes que dão na telha... em que se ensina somente o necessário para dar troco na feira? Quando falamos em cultura, quando a educação popular fala de cultura, quando Paulo Freire fala em cultura, a educação popular é muito mais profunda. Que bom seria retomar os vínculos entre educação e cultura, uma das matrizes tão críticas de toda a teoria pedagógica.

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Outro ponto importante: a pluralidade dos tempos, espaço e relações, onde nos constituímos humanos. Por que é difícil incluir Paulo Freire na educação escolar? Porque ele questiona todas essas coisas mais radicais, porque ele incomoda profundamente à pedagogia escolar, porque a pedagogia escolar pensa que há educação só dentro da escola. Dentro da escola, se você não sabe ler, você não é ninguém, a pedagogia popular nos diz: “Cuidado! Cuidado!” Os processos de constituição humana devem formar os vários sujeitos culturais, sociais, críticos, especialistas. Os processos em que aprendemos a memória, em que nos identificamos em um coletivo, não acontecem só na escola. Essa é a velha visão: “Fora da igreja não há salvação, não pode ficar fora da igreja, é contra meus mandamentos!” ou “Fora da Escola não há constituição humana!” Essas são as maiores mentiras, tanto uma como a outra.

Perguntem à LDB, no primeiro Capítulo, que eu ajudei a escrever, lá encontrarão que a educação compreende o conjunto de processos formativos que acontecem na família, no trabalho, nas ações sociais, na escola e nos movimentos sociais. Só que depois está escrito: “Mas a educação escolar é outra coisa!... [Ri] Atrapalharam tudo!

A escola não dá conta dos processos de humanização, a escola tem que se entender como parte dos grandes processos educativos. A escola tem que entender que há outros tempos, outros espaços, outras relações, tão fortes na construção dos seres humanos quanto ela. E mais, a escola tem que entender que não são apenas livretes, por um lado; se aprendem a ser humanos, por outro lado, aprendem conhecimento. A pedagogia é a mesma da escola, da família, do Bairro, da fábrica, do clube, do religioso, é a mesma... Não se trata nem de saberes diferentes e nem de processos diferentes, se trata das mesmas matrizes. A Escola precisa saber que não há saberes estanques. Aprende-se na escola e na vida.

Outro ponto: a prioridade das vivências existenciais na configuração dos seres humanos, na formação dos seres humanos como sujeitos culturais, sociais, éticos, coletivos, espaciais, históricos, de memória. Paulo Freire, quando fala dos temas geradores, são temas existenciais, são temas que têm relações com experiências profundas, vividas por eles. É a terra, o tijolo, o rio são aqueles círculos que vão se amassando como sujeitos de cultura, de saber, e aí que se tem que saber outros saberes, ampliar, relacionar, inferir, gerar. Não como “trampolim para...”, mas como “constituintes de...”. Muitas vezes, fazemos isto como se Paulo Freire tivesse falado: se você quer que ele aprenda, parta desse princípio, puxa ele aqui e aí belisca. Paulo não fala nada disso, ele fala da vivência da

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cultura, das experiências mais profundas dos seres humanos, como constitutivas, como formadoras, como matrizes da formação. Esse é um ponto muito sério que eu chamaria de materialidade dos processos de formação!

O que humaniza e desumaniza? Como Paulo Freire vê tudo isso? Fala-se muito sobre os processos de humanização e desumanização, temos que entender como os fatores sociais destroem a humanidade e destroem a infância com que trabalhamos. Parece-me que um dos grandes desafios é como se darão os processos de humanização. Como se dará pedagogicamente; como será possível humanizar, apesar da desumanização? É mais cômodo apenas pensar nos projetos que humanizam para puxa-los para dentro, mais cômodo pensar na criança que chega à escola já no ponto. Eu diria que a escola popular tem interpretado de maneira escolar menino que não aprende, que é lento, enquanto problema. É muito mais profundo: o problema é que essas crianças e adolescentes estão submetidos a processos brutais de desumanização. Nós somos muitos profissionais e temos essa tarefa de tornar possível a construção de sujeitos humanos. Sobretudo, são pouquíssimas as gerações que estão chegando já no ponto, o ideal seria que todos estivessem muito bem, como nossos filhos, num clima de carinho, de cultura, de acolhimento, desenvolvimento da fala, da inteligência, dos valores. A escola nada de braçada, mas o problema é que tem... quanto? 1%, 2%! Mas há uma grande percentagem de alunos que chegam à escola que vêm realmente desumanizados e que carregam toda uma experiência de desumanização. Agora, para que produzir isso? Paulo Freire usa uma palavra muito forte: “a nossa função é recuperar a humanidade que foi roubada”.

Havia uma espoliação, o ser humano quer vincular-se a si próprio como membro da humanidade; e por que não é isso possível? Por que roubaram essa possibilidade? Aí se você pergunta “por quê?”, a resposta é dada pelo próprio Marx, que diz que são as condições materiais em que se vive a existência que roubam a humanidade. Quem fornece ou retira as possibilidades de sermos humanos não é um ditador, são fundamentalmente as condições materiais. Acho que devemos prestar mais atenção ao que Marx fala dos educadores, cuja função é ser educador nas condições concretas da vivência humana. Enquanto não temos as condições que humanizam, dificilmente poderemos recuperar a humanidade. E aí a educação se confunde com um projeto social, a educação não cita só um campo da educação, são as bases materiais que permitem ou não permitem que sejamos humanos.

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Em uma das cidades em que eu acompanho projetos educativos, estávamos discutindo algo que estava angustiando os professores, não só que as crianças não sabiam ler, mas que as crianças não queriam ler, aí não tinha nem jeito. Eu perguntei em que condições essas crianças viviam. Viviam perto de um lixão, disputando comida com os urubus, quando não estavam na escola. Peraí, como que não domina a escrita, a questão era muito mais no fundo, a questão era como fazer da escola um tempo de escola, um tempo mínimo de uma iniciação, as próprias exigências forçadas de escrita e as próprias reprovações também contribuíram para a reprovação contínua. Foi necessário ver que brotos de uma iniciação ainda havia nessa humanidade reprovada, brotos que, às vezes, se quebram diretamente, porque não tiveram tempo para continuar brotando. Um professor colocou para todos uma coisa que chamou a todos muita atenção. Constataram que essas crianças, quando entregues à comida do lixão, começavam a brincar de bola, uma boneca que encontravam começavam a brincar como meninas, como crianças. E aí começavam já a brotar esses brotos de humanismo, que ainda numa criança bate com tanta força. Aí começamos a trabalhar tudo isso na escola.

Eu acho que não podemos perder a brutalidade da condição social de pobreza, domicílio condicional a que são submetidos os oprimidos. Temos que mudar o foco. Paulo Freire não fala pedagogia do oprimido, a pedagogia que nós vamos levar para o oprimido não é essa a teoria de Paulo Freire. A educação popular não são as experiências educativas que nós levamos para educar o povo, a educação popular é a compreensão dos processos educativos que os próprios oprimidos, que os próprios desumanizados executam para se tornar mais humanos, conscientes de sua situação; é a pedagogia deles, de se entenderem como sujeitos pedagógicos e aí não cabem nas duas mãos os sem-terra, os sem trabalho, as feministas. O fazer pedagógico é um eterno refazer, porque a tarefa de formar humanos será um eterno refazer sempre e, enquanto houver crianças, temos que refazer a tarefa de dar conta delas. Vamos evitar que o movimento social da educação vire um tema para alguns que gostam de pesquisar isto. Eu acho que uma das maiores injustiças que se tem cometido contra a educação popular e para com Paulo Freire é colocá-lo num altar, acender uma vela, dizer “mas fica quieto aí e não nos incomode, que é melhor nós continuarmos pensando na pedagogia escolar como se fossem coisas separadas”.

Eu insisto muito que temos muitas lições a aprender com a pedagogia da educação popular, dos movimentos sociais, enquanto

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pedagogia; enquanto teoria pedagógica não só enquanto método, enquanto experiências. Eles nos puxam para o subsolo, o que há de mais permanente nos ofícios de mestres. Eu diria que nos falta chegarmos aí, nos faltam as artes de nosso oficio e esse oficio é algo mais insólito. É por aí que eu estou pensando e é por aí que a educação se deve puxar.

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Mesa redonda

Movimentos sociais e educação na era da informação1

Ilse Scherer-Warren

RESUMO: Resultados das relações sociais de atores individuais e coletivos, portadores de identidades diferenciadas, cujas redes se representam na esfera pública através de organizações, os movimentos sociais transcendem suas próprias mediações. Valores, concepções, práticas possuem impacto sob formas organizativas mediadoras, resignificando todas elas, respondendo à demanda global de cidadania e de transformação desejadas e legitimadas pela sociedade. No Brasil, a fragilidade da sociedade civil e o autoritarismo do Estado demandam uma reinvenção da democracia. Vigília cidadã; luta por novos direitos; reconhecimento da diversidade e da subjetividade bem como politização e socialização; novos valores a partir do cotidiano, do familiar e do comunitário.

Palavras-chave: novos movimentos sociais e informação; educação e cidadania; redes de comunidades virtuais; solidariedade e segregacionismo.

RESUMEN: Resultantes de las relaciones sociales de actores individuales y colectivos, portadores de identidades diferenciadas, cuyas redes se representan em la esfera pública a través de organizaciones, los movimientos sociales transcienden sus propias mediaciones. Valores, concepciones, prácticas poseen impacto bajo formas organizativas mediadoras, resignificándolas todas y respondiendo a la demanda global de ciudadanía y a las transformaciones deseadas y legitimadas por la sociedad. En Brasil, la fragilidad de la sociedad civil y el autoritarismo del Estado requieren una reinvención de la democracia. Vigilia ciudadana; lucha por nuevos derechos; reconocimiento de la diversidad y de la subjetividad. Además, la politización y la socialización; nuevos valores extraídos de lo cotidiano, lo familiar y lo comunitário.

Palabras-claves: nuevos movimientos sociales e información; educación y ciudadanía; redes de comunidades virtuales; solidariedad y segregacionismo.

1 Palestra realizada em 22 de novembro, na Mesa redonda Movimentos sociais e educação, no Seminário Educação 2000, promovido pelo Instituto de Educação e o Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 11 n. 19 jan.-jun. 2002 p. 139-145

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Movimentos sociais e educação

Uma primeira questão se coloca: como definir movimentos sociais na atualidade? Vamos tentar explorar essa definição.

Os movimentos sociais devem ser entendidos como uma rede que conecta sujeitos e organizações de movimentos, contemplando diversidades culturais e identidades diversas, buscando o reconhecimento social na esfera pública. O movimento social é diferente da organização dos movimentos, ou das organizações empíricas, localizadas num determinado espaço-tempo. O que observamos normalmente são as organizações. Às vezes, conseguimos observar as articulações: as redes de interação que existem de forma concreta na prática do movimento. Mas, diríamos que o movimento é o que vai além desse conjunto de organizações. Como organização, temos associações de bairros, grupos comunitários, grupos de mútua ajuda, associações de classes como sindicatos e associações profissionais, organizações não-governamentais (ONGs), organizações de defesa da cidadania, de luta pelos direitos específicos ou pela qualidade de vida (grupos de gêneros, ecologistas, grupos étnicos, de camponeses etc.).

Mas como se passa, então, desse nível de organização localizada ao movimento? Essas organizações são elos de uma rede de movimentos. Podemos começar a falar de movimento a partir da luta pela cidadania, da luta pelas transformações sociais, que vão além das reivindicações mais específicas de cada associação. Assim, o movimento transcende a prática localizada e temporal da organização e surge quando começam a se formar redes que articulam um conjunto de organizações e de movimentos. Por exemplo, o movimento ecológico é um conjunto de práticas e valores que transcendem as ONGs ou os grupos ecologistas e que têm uma repercussão mais profunda no tecido social, que vai desde a esfera do cotidiano familiar, comunitário, até a esfera pública da sociedade.

Um outro exemplo concreto bem conhecido é o MST. Podemos considerá-lo um movimento no Brasil, porque no MST há múltipla organização: acampamentos, assentamentos, grupos de coordenação e até uma ONG. Há, ainda, grupos de apoio e grupos de simpatizantes. Todavia, o MST como movimento não é nenhuma dessas organizações, mas o conjunto delas e a sua articulação. Em suma, é a rede que se estabelece entre todas essas organizações, e é justamente essa rede que possibilita ao MST ser um movimento.

Mas não podemos esquecer que existem iniciativas dos sem-terras desvinculadas do MST. Contudo, essas iniciativas têm dificuldades de se manter porque não conseguem desencadear o movimento, pois o

Rev. Educ. Pública, Cuiabá, v. 11, n. 19, jan.-jun. 2002.140

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movimento precisa justamente dessa rede mais ampla e não só de ações localizadas.

Assim, diríamos que é no conjunto de ações intercruzadas e cumulativas das múltiplas formas de organizações e práticas pela cidadania, a partir da redes de movimentos sociais, que temos conseguido fortalecer a sociedade civil e criar legitimidade na esfera pública. Todavia, no Brasil, essa sociedade civil ainda é muito frágil. Onde observamos essa fragilidade? No abuso da violência pelo poder público contra o cidadão. Por exemplo: nas agressões policiais contra o MST e nas agressões contra a manifestação “Outros 500”. Nessas agressões verificamos justamente o poder que ainda tem o Estado de atacar de forma policialesca as manifestações da sociedade civil. Porém, a sociedade civil é teimosa e continua tentando avançar.

Como se organizam, então, os movimentos sociais na sociedade globalizada, na era da informação? Poderíamos destacar muitos outros aspectos, mas observemos dois que são particularmente relevantes para pensarmos os movimentos sociais neste momento. Nesse sentido, destaco duas formas de ações coletivas, de resistência contra a dominação e de produção de novas identidades: as manifestações simbólicas massivas e as redes de comunidades virtuais.

As manifestações simbólicas massivas são as respostas que estão sendo dadas, nesse tempo de globalização, pelos movimentos sociais ao paradoxo da exclusão e inclusão social. Como exemplo, temos as manifestações públicas de grandes massas de desempregados e de trabalhadores precários. Talvez uma das primeiras grandes manifestações que surgiram nesse estilo foi na França em 1995. Depois, tivemos a marcha dos sem-terra em Brasília no ano de 1997, e, posteriormente, as grandes marchas mundiais, como Seattle e Praga; enfim, várias outras marchas que reagiram simultaneamente à carência do emprego e ao modelo que a ditava: o neoliberalismo globalizado, com suas conseqüências nas políticas sociais e nas políticas públicas. Mas elas também podem referir-se a carências mais abrangentes, como ocorre, por exemplo, no movimento dos indígenas de Chiapas e no movimento dos sem-terra no Brasil, em que, ao lado da reivindicação econômica da terra, luta-se pelo reconhecimento político e cultural. Em ambos os casos, tanto no de Chiapas, quanto no dos sem-terras, a contestação ao Estado dá-se na medida em que este é considerado como mediador dos interesses do capitalismo globalizado.

Outras formas de manifestações simbólicas são as relacionadas aos fundamentalismos religiosos, étnicos ou nacionalistas. Muitas vezes, esses

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Movimentos sociais e educação

fundamentalismos são formas de reação devido ao temor dessas populações de que sua cultura seja dissolvida dentro do mundo globalizado. O problema com o fundamentalismo é que, muitas vezes, ele assume formas segregacionistas e faz uso da violência para eliminar comunidades diferentes – as guerras étnicas e religiosas, por exemplo. Quando isso ocorre, hoje em dia, estamos frente a anti-movimentos sociais. Pois, na minha concepção, os movimentos sociais são libertários e não segregacionistas.

A segunda forma de observar as ações coletivas é através das redes de comunidades virtuais identitárias. Explicando melhor, são comunidades, porque vêm dos grupos de identidades e fazem uso de meios de comunicação tanto virtuais – como a internet –, quanto os outros meios de comunicação disponíveis nessa era de informação, reconhecendo-se mutuamente e fortalecendo-se através de apoio solidarístico. Essa é a forma que os múltiplos atores dos novos movimentos sociais têm encontrado para se articularem entre si, marcar sua presença na sociedade civil e dar continuidade ao movimento no cenário globalizado. Podemos encontrar vários exemplos de lutas, que vão desde os grupos ecologistas e feministas, até outras organizações mais emergentes que também fazem uso destas múltiplas redes libertárias. Porém, não podemos esquecer que, ao lado das inúmeras redes de movimentos libertários, também surgem redes reacionárias, como as dos neonazistas.

Por outro lado, há movimentos que combinam ou alternam as duas formas de agir coletivo mencionadas - as manifestações simbólicas de massa com as redes de comunidades solidarísticas. Por exemplo, o neozapatismo em Chiapas, que é ao mesmo tempo um movimento indígena de base e uma rede de solidariedade via internet; o Movimento Sem Terra e o Movimento Negro no Brasil, que se articulam em redes, através da mediação das ONGs nacionais e internacionais, mas que reagem também através de manifestações massivas, como foram a Marcha dos Sem Terra e a Marcha de Zumbi dos Palmares, em Brasília. São justamente esses os movimentos que têm mais se projetado e conseguido uma maior legitimidade no cenário público.

Colocaremos rapidamente, alguns aspectos do perfil dessas formas de agir. Estas formas de manifestações, tanto ativas, como virtuais, são referências históricas importantes para o movimento, pois orientam uma ética e uma política para os sujeitos situarem-se e agirem em seus contextos sociais, constituindo uma identidade, e uma cultura própria ao movimento. São canais de solidariedade entre os movimentos, mas também

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canais de solidariedade mais amplos com outros sujeitos da esfera pública. Permitem uma relativa autonomia das ações e dos elos dentro do movimento, isto é, são um conjunto de práticas sociais dispersas, com agendas e projetos próprios, mais abertas a parcerias, intercâmbios e cooperações com sujeitos e associações congêneres, ou receptivas a mobilizações em decorrência de uma afinidade ética ou política. São referências de reconhecimento da condição de sujeito e de lugar de pertencimento na sociedade, em contraposição a condições sistêmicas de exclusão ou aniquilamento dos sujeitos.

Chegamos ao último ponto, isto é, sobre o aspecto educativo dos movimentos sociais, ou como, através da invenção democrática, desenvolve-se uma educação para a cidadania. Essa seria a questão: como se pode pensar num processo educativo que contemple a própria prática da participação política no interior dos movimentos sociais?

A tradição da cultura política brasileira, predominantemente autoritária e elitista, cria enorme dificuldade para o reconhecimento dos movimentos sociais. Isso se coloca como um desafio para os participantes. A própria mídia e o sistema político preferem tratar os movimentos, normalmente, como caso de polícia. E será, justamente, através desta ação intercruzada e cumulativa das múltiplas formas de participação e organização em redes de movimento que se pode ir construindo a legitimidade, o reconhecimento de uma sociedade civil atuante. No Brasil, de fato, esta ainda é muito frágil, e o abuso da violência do poder público contra o cidadão é a prova disto. Todavia, a invenção democrática, através do associativismo civil e dos movimentos sociais, ainda que emergente, comporta processos pedagógicos relevantes, dentre os quais gostaria de mencionar:

Primeiro, o que chamaríamos de vigília cidadã. Esta perpassa as ações de organizações e dos MS e refere-se a todas as cobranças em termos da transparência de práticas públicas democráticas (governamentais e no interior do próprio associativismo), combatendo o clientelismo, o paternalismo, a corrupção, etc. De fato, este é um terreno cheio de contradições onde, através do próprio processo de vigilância, os atores dos movimentos também se re-educam em direção a uma nova cultura política, na medida em que têm um papel de reflexividade para os sujeitos que participam e para a sociedade sobre si mesma. Temos aí um processo de educação para a cidadania pela via informal de participação nos movimentos sociais.

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Movimentos sociais e educação

O segundo elemento seria a luta por novos direitos. Seja para o cumprimento e regulamentação de direitos da nova Constituição brasileira (por exemplo, o código civil brasileiro é antiquado em relação ao que a Constituição estabelece em termos de igualdade de gênero; a observação aos novos direitos dos consumidores, dentre outros), ou para a criação de novos direitos fruto de demandas dos novos movimentos sociais, como em relação à degradação ambiental, ou para políticas compensatórias para setores historicamente desprivilegiados (negros, mulheres, deficientes, etc.).

Uma terceira forma de invenção democrática seria o reconhecimento da diversidade e da subjetividade. Cada vez mais se reconhece que a igualdade só é libertadora quando ela é acompanhada do respeito às diferenças culturais ou de opções religiosas. Então, num mundo cada vez mais globalizado, no qual há o desafio da convivência multicultural, se formos praticar a democracia apesar das diferenças que se colocam cada vez mais no cenário, é necessário que se construam processos educativos interculturais que avancem na direção de uma cultura de fronteiras, onde além do respeito à diversidade, pode-se viver democraticamente com o diferente.

A outra invenção democrática seria a politização e socialização de novos valores a partir do cotidiano familiar e comunitário. Como já dizia o movimento feminista, “o pessoal também é político”. Os movimentos feministas, ecológicos e étnicos são muito emblemáticos nessa forma de fazer política. São grupos de reflexão que vão implementando no dia-a-dia novos valores, como, por exemplo, não jogar lixo no chão ou alguma coisa semelhante. Então, esses valores dos novos movimentos sociais, ou dos movimentos sociais em geral, justamente devem ser introjetados desde o cotidiano familiar do individuo até sua participação nas organizações e na esfera pública. Então, através do trabalho de educação ambiental, de conviviabilidade étnica, da desconstrução das relações patriarcais de gênero e assim por diante, vai se construindo um projeto de educação informal de novos valores a partir dos movimentos sociais.

E, por último, as participações nas políticas públicas. Aqui as possibilidades são múltiplas, mas devem ser constantemente avaliadas. É um cenário muito importante para a própria educação dos movimentos sociais. Mas por que as políticas públicas devem ser muito bem avaliadas? Para que a participação não seja usada como forma de legitimação dos interesses do poder instituído, como acontece muitas vezes em conselhos setoriais. É necessário que, nestas formas de participação, se crie competência de participar e que, através da própria prática de participação,

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se eduque o sujeito, ou digamos, que ele se auto-eduque através de sua prática de participação na esfera pública, tornando-se agente de advocacy e accountability. Em outras palavras, que se torne de fato um sujeito que vá colocar os interesses da sua comunidade, no contexto mais amplo das políticas públicas, e que vá prestar contas, ou exigir a prestação de contas do uso do dinheiro público nestas políticas.

Portanto, através da participação nos movimentos sociais há um processo informal – e às vezes formal, através de cursos, assessorias etc. – de educação para a cidadania, que merece também ser pesquisado e avaliado pelos profissionais da educação.

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Movimentos sociais e educação

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Mesa redonda

Movimentos sociais e a construção da cidadania1

Maria da Glória Marcondes Gohn

RESUMO: Este é um balanço da participação da sociedade civil brasileira na construção da cidadania, nas últimas décadas. Os movimentos sociais dos anos 70/80 contribuíram para a conquista de direitos sociais novos, inscritos na Constituição de 1988. Nos anos 90, surgiram outras formas de organização popular, mais institucionalizadas e articuladas. Registram-se também alternativas de políticas sociais voltadas à construção dos direitos e da cidadania, ao nível do poder local, incluindo questões concernentes à participação na gestão pública. Fala-se de uma nova revolução na educação, voltada para a formação não apenas para o mundo do trabalho, mas, fundamentalmente, para o mundo da vida.

Palavras-chave: movimentos sociais; sociedade brasileira; políticas sociais.

RESUMEN: Este es un balance de la participación de la sociedad civil brasileña en la construcción de la ciudadanía, en las últimas décadas. Los movimientos sociales de los años 70/80 contribuyeron para la conquista de derechos sociales nuevos, inscriptos en la Constitución de 1988. En los años 90, surgieron otras formas de organización popular, más institucionaliza-das y articuladas. Se registran también alternativas de políticas sociales volcadas a la construcción de los derechos y de la ciudadanía, al nivel del poder local, incluyendo cuestiones concernientes a la participación en la gestión pública. Se habla de una nueva revolución en la educación, interesada en la formación no solo para el mundo del trabajo, si no, fundamentalmente, para el mundo de la vida.

Palabras-clave: movimientos sociales; sociedad brasileña; políticas públicas.

1 Palestra proferida em 22 de novembro, na Mesa redonda Movimentos sociais e educação, no Seminário Educação 2000, promovido pelo Instituto de Educação e o Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Federal de Mato Grosso.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 11 n. 19 jan.-jun. 2002 p. 147-161

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Movimentos sociais e educação

I - Movimentos sociais: manifestações na atualidade

No Brasil e em vários outros países da América Latina, no final da década de 70 e parte dos anos 80, ficaram famosos os movimentos sociais populares articulados por grupos de oposição ao então regime militar, especialmente pelos movimentos de base cristãos, sob a inspiração da Teologia da Libertação. Ao final dos anos 80, e ao longo dos anos 90, o cenário sociopolítico se transformou radicalmente. Inicialmente teve-se um declínio das manifestações nas ruas, que conferiam visibilidade aos movimentos populares nas cidades. Alguns analistas diagnosticaram que eles estavam em crise porque haviam perdido seu alvo e inimigo principal - o regime militar. Na realidade, as causas da desmobilização são várias. O fato inegável é que os movimentos sociais dos anos 70/80 contribuíram decisivamente, via demandas e pressões organizadas, para a conquista de vários direitos sociais novos, que foram inscritos em leis na nova Constituição brasileira de 1988.

A partir de 1990, ocorreu o surgimento de outras formas de organização popular, mais institucionalizadas - como a constituição de Fóruns Nacionais de Luta pela Moradia, pela Reforma Urbana; Fórum Nacional de Participação Popular etc. Os fóruns estabeleceram a prática de encontros nacionais em larga escala gerando grandes diagnósticos dos problemas sociais, assim como definindo metas e objetivos estratégicos para combatê-los. Emergiram várias iniciativas de parceria entre a sociedade civil organizada e o poder público, impulsionadas por políticas estatais tais como a experiência do Orçamento Participativo, a política de Renda Mínima, bolsa/escola etc. A criação de uma Central dos Movimentos Populares foi outro fato marcante nos anos 90, no plano organizativo; ela estruturou vários movimentos populares em nível nacional tais como a luta pela moradia, assim como buscou fazer uma articulação e criou colaborações entre diferentes tipos de movimentos sociais, populares e não populares.

Nos anos 90, os conflitos sociais envolvendo lutas diretas deslocaram-se da cidade para o campo com os movimentos dos sem-terra. Dentre os vários grupos organizados que surgiram destaca-se o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), que ganhou atenção até internacional. “Ética na Política” foi um movimento do início dos anos 90 com uma importância histórica porque contribuiu decisivamente para a deposição de um Presidente da República por atos de corrupção. À medida que as políticas neoliberais avançaram foram surgindo outros movimentos sociais

Rev. Educ. Pública, Cuiabá, v. 11, n. 19, jan.-jun. 2002.148

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como: contra as reformas estatais, a Ação da Cidadania contra a Fome, movimentos de desempregados, ações de aposentados ou pensionistas do sistema previdenciário. As lutas de algumas categorias profissionais emergiram no contexto de crescimento da economia informal. Como exemplo, no setor de transportes apareceram os chamados transportes alternativos (“perueiros”); no sistema de transportes de cargas pesadas nas estradas, os “caminhoneiros”. Algumas dessas ações coletivas surgiram como respostas à crise socioeconômica, atuando mais como grupos de pressão do que como movimentos sociais estruturados. Os atos e manifestações pela paz, contra a violência urbana, também são exemplos desta categoria. Se antes a paz era um contraponto à guerra, hoje ela é almejada como necessidade a todo cidadão/cidadã, em seu cotidiano, principalmente nas ruas, enquanto motoristas vítimas de assaltos relâmpagos, seqüestro e mortes.

Grupos de mulheres foram organizados nos anos 90 em função de sua atuação na política, elas criaram redes de conscientização de seus direitos, e frentes de lutas contra as discriminações. O movimento dos homossexuais também ganhou impulso e as ruas, organizando passeatas e atos de protestos. Numa sociedade marcada pelo machismo isso é também uma novidade histórica. O mesmo ocorreu com o movimento negro, que deixou de ser quase que predominantemente movimento de manifestações culturais para ser também movimento de construção de identidade e luta contra a discriminação racial. Os jovens também geraram inúmeros movimentos culturais, especialmente na área da música, enfocando temas de protesto (vide Touraine, 1997, a respeito desses movimentos na França).

As principais mobilizações foram organizadas pelo MST e ocorreram nas cidades: passeatas, caminhadas, concentrações, acampamentos em praças públicas, ocupações de prédios públicos etc. (vide Gohn, 2000). Aos poucos, este movimento se tornou uma referência para lutas de outras categorias sociais, das camadas populares às camadas médias, e até alguns empresários - que saíram às ruas em passeatas com faixas e bonés brancos (uma das marcas emblemáticas do MST é o boné vermelho).

Deve-se destacar ainda três outros movimentos sociais importantes no Brasil nos anos 90: dos indígenas, dos funcionários públicos – especialmente das áreas da educação e da saúde; e dos ecologistas. Os primeiros cresceram em número e em organização nesta década; eles passaram a lutar pela demarcação de suas terras e pela venda de seus produtos a preços justos e em mercados competitivos. Os segundos

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organizaram-se em associações e sindicatos contra as reformas governamentais que progressivamente retiram direitos sociais, reestruturam as profissões, e arrocham os salários em nome da necessidade dos ajustes fiscais. Os terceiros, dos ecologistas, proliferaram após a conferência ECO 92, dando origem a inúmeras ONGs- Organizações Não-Governamentais. Aliás, as ONGs passaram a ter muito mais importância nos anos 90 do que os próprios movimentos sociais. Trata-se de ONGs diferentes das que atuavam nos anos 80 junto com os movimentos populares. Agora são ONGs inscritas no universo do Terceiro Setor, voltadas para a execução de políticas de parceria entre o poder público e a sociedade, atuando em áreas onde a prestação de serviços sociais é carente ou até mesmo ausente, como na educação e saúde, para clientelas como meninos e meninas que vivem nas ruas, mulheres com baixa renda, escolas de ensino fundamental etc.

A atuação do Terceiro Setor tem gerado um universo contraditório de ações coletivas: de um lado, elas reforçam as políticas sociais compensatórias ao intermediarem as ações assistenciais do governo; mas de outro lado, elas atuam em espaços associativos geradores de solidariedade e que exercem um papel educativo junto à população, aumentando sua consciência quanto aos problemas sociais e políticos da realidade (Vide Gohn, 1999).

No plano da Universidade, ocorreram duas novidades: a primeira foi o afluxo de um grande número de militantes ou ex-militantes que atuavam na assessoria aos movimentos sociais populares, aos programas de mestrado e de doutorado. Isto contribui para a criação de acervos e registros, memórias e análises dos movimentos sociais, especialmente dos que ocorreram nos anos 80. A segunda foi a criação de centros de estudos e pesquisas concernentes aos movimentos sociais e Terceiro Setor. Trata-se de duas temáticas com enfoques distintos porque os núcleos sobre os movimentos têm se dedicado mais à pesquisa acadêmica e os núcleos sobre o terceiro setor adotam a via da pesquisa aplicada. Esses últimos se constituem, na maioria dos casos, em tipos de laboratórios de experiências sobre a chamada nova economia social. Muitos deles estão articulados às faculdades de Administração e de Economia e aplicam princípios da economia de mercado para criarem ou atenderem a demandas de cooperativas e núcleos comunitários. A gestão dos novos processos produtivos - no setor público não-estatal - vai se constituindo progressivamente em um novo campo de pesquisa e de conhecimento.

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A CLACSO - Centro Latino Americano de Ciências Sociais realizou em 1999 um importante seminário onde redefiniu sua agenda de pesquisa. Os movimentos sociais passaram a ser considerados como pesquisas prioritárias de investigação, por serem reconhecidos como uma das fontes de inovações e de criatividade na sociedade. As ações de inúmeros movimentos sociais corroboram as diretrizes da CLACSO: os movimentos nos anos 90 acrescentaram outra dimensão ao patamar reivindicatório, a do diagnóstico propositivo, transformando as políticas públicas num campo privilegiado de atuação e fazendo da cidadania um direito possível para todos (vide Souza Santos, 2000).

II- Movimento pela moradia popular

Para que se entenda um pouco a trajetória dos movimentos populares nos anos 90 é importante registrar que eles não desapareceram, eles alteraram práticas e suas dinâmicas em função da mudança na conjuntura econômica e política e da nova correlação de forças. Passaram a atuar mais no plano institucional. Assim, na luta pela moradia deve-se registrar que ela tem sido a luta que conta com o maior número de assessores e organizações qualificadas, ou seja, com um corpo de especialistas e analistas e não apenas voluntários ou militantes.

Respaldado numa trajetória de mais de vinte anos de lutas, iniciada pelos movimentos das favelas, dos cortiços, dos loteamentos clandestinos populares, nos anos 70; acrescidas das lutas nas ocupações urbanas, pela construção de moradias via mutirões; movimentos contra os aumentos nas prestações do antigo BNH, por parte dos mutuários; lutas dos moradores de conjuntos precários (PROMORAR, por exemplo); de inquilinos pertencentes às camadas médias nos anos 80; até as lutas dos moradores que vivem nas ruas nos anos 90; a questão da moradia popular acumulou o maior acervo de conhecimentos, em termos de experiências concretas e em termos de conhecimento produzido, dentre todas as áreas problemas demandadas pela população.

Em 1993, foi criada a União Nacional por Moradia Popular (UNMP), rede de movimentos organizados a partir de entidades regionais existentes, na época, nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Goiás, Pernambuco, Sergipe e Alagoas; que conta com o apoio de programas pastorais da Igreja Católica, a assessoria de ONGs que trabalham sob a perspectiva da Ajuda Mútua e da Autogestão. A UNMP tem como programa central o projeto autogestionário de mutirões para a construção da casa própria e tem participado das principais ações de luta pela moradia popular,

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nos anos 90, tais como: as “Caravanas para Brasília”, O Estatuto da Cidade, a reivindicação da criação de um Fundo Nacional de Moradia Popular e do Conselho Nacional de Moradia Popular. Para atingir estes objetivos a UNMP participou em 1991 da coleta de um milhão de assinaturas para a criação de uma Lei de iniciativa popular, prevista na Constituição, e se articulou com a Central dos Movimentos Populares.

Para o Estado de São Paulo, em 1999, a estratégia foi diferente: ocupação de prédios públicos como Tribunal Regional do Trabalho - buscando dar visibilidade às reivindicações do movimento, e protesto contra a paralisação dos mutirões feitos por Covas. De uma forma geral, a posição estratégica da UNMP durante todo o período tem sido a necessidade de interlocução com o poder público apresentando projetos para a política habitacional federal.

Fórum da Reforma Urbana

A maior expressão da organização pela moradia nos anos 90 é o Fórum Nacional de Reforma Urbana – FNRU. Ele se fortaleceu após a Constituição de 1988 dado que aquela Carta contém um capítulo sobre a reforma urbana. A II Conferência Internacional sobre Assentamentos Humanos (Habitat II), realizada em 1996, em Estocolmo, projetou as atividades do Fórum para além das fronteiras nacionais e deu respaldo à luta pela moradia à medida que a aprovou como um direito humano e ser obrigação dos governos implementar este direito progressivamente.

O FNRU colocou as lutas pela moradia em um novo patamar. As bandeiras localizadas e as reivindicações parciais foram substituídas “por um ideário onde o que se pede é o direito à cidade como um todo; inclui-se não só os direitos especificamente urbanos que visam acabar com a injustiça social no espaço das cidades, mas também o direito de participação na gestão da coisa pública.” (Silva, 1991). Dentre os inúmeros instrumentos jurídicos elaborados nos anos 90 pelos movimentos e ONGs articulados ao FNRU para garantir a moradia à população destacam-se Estatuto da Cidade, o Fundo Nacional de Moradia Popular e o Conselho Nacional de Moradia Popular.

O Estatuto da Cidade foi elaborado em 1990 e aprovado pela Câmara Federal em dezembro de 1999. Vale a pena destacarmos alguns trechos do documento aprovado, nos itens que aludem à questão da gestão urbana, pois eles remetem aos temas da participação e dos conselhos. Logo no seu início, nas diretrizes gerais, preconiza-se: “gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas

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dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano” (inciso II do capítulo I). Já o capítulo II, que trata dos instrumentos da gestão urbana, menciona: “Os instrumentos previstos neste artigo que demandam dispêndio de recursos por parte do Poder Público municipal devem ser objeto de controle social, garantida a participação de comunidades, movimentos e entidades da sociedade civil” (cap. II, § 3º). O capítulo é todo dedicado às formas de gestão democrática da cidade.

No início de dezembro de 1999 realizou-se em Brasília, no espaço do Parlamento Nacional, a 1ª Conferência Nacional das Cidades que elaborou um documento denominado “Carta das Cidades”. Neste documento podemos observar que as formas colegiadas e participativas da população são reivindicadas como plataformas de uma ampla gama de movimentos e organizações de lutas sobre as questões urbanas. Destacamos naquela Carta o Tópico X, que diz:

“A democratização do planejamento e da gestão das cidades, com ênfase nos mecanismos que garantam o interesse público, o acesso à informação e o controle social sobre os processos decisórios das políticas e dos recursos públicos, nos vários níveis, assegurando a participação popular em geral, mediante a realização de orçamentos participativos, entre outros instrumentos e, em âmbito nacional, a criação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano, com efetiva participação da sociedade.”

Além das lutas do Fórum Nacional de Reforma Urbana, das conquistas jurídicas/legislativas expressas na Carta da Cidade e das conferências nacionais e internacionais, cumpre registrar também a maior experiência de gestão urbana com participação popular ocorrida no Brasil, na última década: os programas e as políticas de Orçamento Participativo, em várias cidades brasileiras, destacando-se a de Porto Alegre pela sua extensão. Naquela cidade, os Conselhos Municipais com participação popular, atuando por setor da administração, existem desde 1970. Entretanto, nos anos 90, a continuidade das diretrizes programáticas na gestão da cidade possibilitou o avanço da proposta do Orçamento Participativo, tornando-se o mesmo o “modelo” para o resto do país (a respeito da importância do fortalecimento dos movimentos sociais vide Tarrow, 1994).

III - Movimentos contra a globalização

Na América Latina, entre 1987 e 1998, o número de indigentes saltou de 63,7 milhões para 78,2 milhões. Em contrapartida, houve um

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crescimento da riqueza concentrada nas mãos de poucos. O aumento da pobreza não é um dado estatístico de ordem meramente econômica. Ele é um dado político, e como tal, tem gerado duas reações: protestos e ações inovadoras. Os protestos têm se voltado contra a globalização e as políticas neoliberais de forma inusitada: nas grandes conferências dos grupos e elites econômicas. Seattle, nos Estados Unidos, em 1999, durante a Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio foi o início dessa nova forma de protesto onde o FMI e o BIRD eram os grandes vilões. Seguiram-se em Davos/Suíça, durante o Encontro Anual do Fórum Econômico Mundial; em Washington na reunião da primavera de 1999 do FMI/BIRD; em Bancoc, durante a reunião da Unctad; no Japão, Melbourne/Austrália e Praga, em setembro de 2OOO, quando os protestos ganharam uma sigla: Ipeng- Iniciativas contra a Globalização Econômica. Acrescente-se a estes o protesto liderado por José Bové, na França, contra a rede McDonald’s. No Brasil, a versão desses protestos foi O Plebiscito sobre a dívida externa, realizado no início de setembro de 2000 e o Fórum Social Mundial, ocorrido em 2001, em Porto Alegre. Uma primeira vitória foi obtida em setembro de 2000, quando foi anunciado um esquema para o perdão da dívida de 20 países pobres, denominados em 1999 como HIPCs- Países Pobres Altamente Endividados. As ONGs que lideravam os protestos afirmaram que os países pobres gastam US$ 60 milhões por dia para o pagamento da dívida, em vez de investir em saúde e educação.

A reunião das cúpulas econômicas em Praga, no início de Outubro de 2000, gerou as maiores mobilizações deste gênero já ocorridas e os organizadores do evento tiveram que antecipar o encerramento dos trabalhos. As reações na mídia às manifestações em Praga foram de: espanto; comentários sobre a necessidade de ações mais decisivas no combate à pobreza e à desigualdade; passando pela desqualificação dos manifestantes como setores improdutivos das economias ricas, fornecido por um bando de punks, ecologistas de carteirinha nos processos internacionais, estudantes etc. Entretanto, a mídia também registrou: mobilizou-se 11 mil policiais para proteger a reunião dos burocratas. Este gesto, por si, dá indicações de que há algo errado com esses organismos internacionais que dão as políticas de globalização. Um dos slogans do protesto dizia: “Pessoas, não lucros”. Ou seja, o que se estava questionando e tentando colocar na agenda dos burocratas é a “cultura do lucro” existente, que deve ser substituída pela cultura do ser humano pleno, com direito à vida, sociedade com ética e respeito aos direitos humanos fundamentais.

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Para Faro (2000) na cultura do lucro o que se observa é:1) as pessoas são induzidas a agir apenas em função do ganho monetário, ainda que isso não faça sentido para a vida humana.

2) o valor de tudo é transformado em preço e depois em moeda.

3) as únicas coisas que afetam os arquitetos da cultura do lucro são as oscilações dos mercados, bolsas, câmbio, os índices de inflação, as taxas de juros etc.

4) a cultura do lucro busca sempre a quantificação e ela tende a destruir o que não pode ser controlado e suprimir tudo o que não gera lucro. “Até o lazer e a produção e o consumo de símbolos, palavras, sons e imagens passam a ter por objetivo reforçar o sistema de geração de lucros. O resultado é que toda beleza de coisas, pessoas e lugares se esvazia de sentido, virando alguma espécie de ‘beleza americana’”.

Ainda segundo Faro, os manifestantes de Praga querem uma cultura das pessoas e identidades. O paradigma é outro,

“o lucro só é bom quando conduz à obtenção do que não tem preço, isto é, a um conjunto de ‘bens’ não econômicos que ligue as pessoas, dispensando o uso de coação direta ou ameaça. E o que esses bens são varia de sociedade para sociedade, e pode variar ao longo da biografia dos indivíduos. Assim, uma roda de samba, uma licença poética, o ambiente de um templo, uma paisagem, um sorriso, uma peregrinação, o respeito a gerações passadas ou futuras podem não ter preço”.

O que os manifestantes pedem: que a cada indivíduo da comunidade humana seja garantida a liberdade para escolher o que dá sentido à vida. Essa liberdade para escolher o que, para cada um não tem preço. O que os manifestantes querem, portanto, é que se imponham, por meio dessas escolhas, limites não econômicos à economia de mercado”. Mas o que pedem os manifestantes só é possível por meio de políticas diferentes das atuais. O que eles querem é algo mais que direito de escolha. É o próprio direito de pensar, é a autonomia da decisão de escolha. Kant: “Não tenho necessidade de pensar, quando posso simplesmente pagar”. Faro adverte que pensar, refletir sobre o que dá sentido à existência são exercícios sem preço:

“A globalização econômica é uma política tolerante dos desvarios do capital financeiro no mundo e se tornou um meio pretenso para a propagação selvagem da cultura do lucro, em detrimento a liberdade de escolha, pelos indivíduos e comunidades, do que para eles não tem preço. Não há na política econômica administrada pelo FMI. Mecanismos institucionais de negociação plural. A lógica é exclusivamente economicista”.

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Portanto, o discurso dos manifestantes de Praga, Seattle etc. tem sentido e substância.

IV - Movimentos e conselhos municipais na área da educação

O último item deste trabalho é uma análise dos conselhos da educação dada a importância que essa área passou a ter na atualidade, no discurso e nas políticas governamentais, conferindo-se às escolas atributos que ultrapassam sua dimensão de ensino/aprendizagem para se transformarem em espaços de socialização e de prestação de serviços públicos municipais; assim como o papel que a educação passou a ter no novo paradigma do mundo do trabalho. Desde 1995, o governo federal tem elaborado programas e diretrizes nacionais que têm provocado transformações profundas, do ponto de vista organizacional, nos diferentes níveis da educação brasileira. As diversas reformas educacionais gestadas em nível federal fornecem as bases para a implementação das políticas estaduais. A rede de ensino pública dos níveis fundamental e médio, nos estados brasileiros, em sua maioria é de responsabilidade estadual e municipal, havendo, excepcionalmente, a oferta pela União Federal (alguns cursos técnicos vinculados às universidades federais públicas). Usualmente a rede de atendimento à Educação Infantil (de 0-6 anos de idade) é de responsabilidade do Município.

Na educação o princípio da democracia participativa tem orientado, nos anos 90, a criação de uma série de estruturas participativas onde se destacam diferentes tipos de conselhos (nacionais, estaduais e municipais). Esses órgãos têm ganhado, crescentemente, grande importância porque a transferência e o recebimento dos recursos financeiros, pelos municípios, estão vinculados, por lei federal, à existência destes conselhos. A lei preconiza três conselhos de gestão no nível do poder municipal, todos com caráter consultivo, ligados ao poder executivo, a saber: o Conselho Municipal de Educação, o Conselho de Alimentação Escolar e o Conselho de Acompanhamento e Controle Social (CACS), do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef). Temos ainda os Conselhos de Escola, de Classe e de Série, no interior das unidades escolares, mas eles são de outra natureza.

Os Conselhos Municipais são regulamentados por leis estaduais e federais, mas eles devem ser criados por lei municipal, sendo definidos como “órgão normativo, consultivo e deliberativo do sistema municipal de ensino”, criados e instalados por iniciativa do Poder Executivo Municipal. Eles são compostos por representantes do Poder Executivo e por

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representantes dos vários segmentos da sociedade civil local destacando-se: entidades e organizações não-governamentais prestadoras de serviços ou de defesa de direitos, organizações comunitárias, sindicatos, associações de usuários, instituições de pesquisa etc. Parte dos membros dos conselhos é eleita por seus pares e parte é escolhida pelos representantes da administração pública. Todos eles devem ser nomeados pelo prefeito municipal. Este fato confere força e legitimidade ao conselho, mas é também um ponto de fragilidade, dados os riscos que esta nomeação envolve. Por isso, a comunidade educativa que tem se reunido para debater a questão dos conselhos de representantes da sociedade civil junto ao poder público, a exemplo da iniciativa do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, enfatiza a necessidade de qualquer tipo de conselho ser eleito por vários setores da sociedade civil e política.

O Conselho Municipal compõe, em conjunto com os outros dois conselhos, a rede das escolas propriamente dita, e a Secretaria Municipal da Educação (órgão executivo), o Sistema Municipal de Ensino. Segundo a legislação, o município deve também elaborar um Plano Municipal de Ensino que estabeleça metas objetivando obter, progressivamente, a autonomia das escolas, à medida que elas forem capazes de elaborar e executar seu projeto pedagógico, garantindo a gestão democrática do ensino público.

Na tradição brasileira a tendência dominante na área da educação é restringir o universo de atores a serem envolvidos no processo educacional a um só segmento da comunidade educativa: o da comunidade escolar, composta pelos dirigentes, professores, alunos e funcionários das escolas. Quando se fala em abertura das escolas para a comunidade, os pais são os atores por excelência a serem lembrados. Em raros casos lembram-se de outras instituições, organizações ou associações, do próprio bairro ou da comunidade, que fazem articulações com a escola, como os sindicatos e as associações de docentes, e outros mais. Parte desses atores também desconhecem os espaços públicos de participação da sociedade civil nas novas políticas destinadas às áreas sociais dando-se espaço para que as próprias autoridades não cumpram as leis. Um exemplo são os Conselhos Municipais de Alimentação Escolar (COMAE), encarregados de fiscalizar as despesas com a merenda escolar e a qualidade dos alimentos. Eles são compostos por um representante do Poder Executivo, indicado pelo prefeito; um do Poder Legislativo, apontado pela mesa diretora da Câmara dos Vereadores; dois representantes dos professores, indicados pelo sindicato da categoria; dois representantes de pais de alunos, escolhidos pelas

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Associações de Pais; e um representante da sociedade local. O que se destaca na criação do COMAE é a forma como foi feita e o descaso dos representantes do poder público no encaminhamento da questão. O governo federal, por meio do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), promulgou medida provisória dando o prazo até 02/09/00 para que todos os municípios brasileiros criassem os COMAEs. O Jornal Nacional, da Rede Globo, noticiou em 29/08/00 que, até aquela data, dos 5.500 municípios brasileiros, 3.700 não haviam cumprido o prazo e estavam ameaçados de não receberem os recursos e, na maioria dos 1.800 casos onde existiam, eles foram criados antes da medida provisória. Com a pressão governamental, divulgando por meio da mídia, ameaças de suspensão do envio de verbas para a merenda escolar, houve uma corrida para a formação dos conselhos, caracterizando um processo de participação outorgada e não fruto de um processo de cidadania ativa.

Um exame sobre as propostas e programas dos sindicatos e entidades dos professores a respeito das reformas educacionais em vigência na escola pública indica-nos que eles têm conhecimento dos graves problemas que afligem o cotidiano nas escolas, e eles têm, ao menos no nível discursivo, propostas de soluções. Mas eles não são ouvidos pelos planejadores e não há canal de interlocução. Na maioria das vezes são considerados, a priori, “do contra”; exceto quando se trate de entidades “pelegas”, herdeiras do clássico clientelismo, ou super pós-modernas, composta de líderes individualistas, sem trajetória de experiência associativa anterior, e totalmente “formatados” segundo as palavras de ordem do vocabulário pseudomoderno. São os novos adesistas. Registre-se também que os sindicatos, de uma maneira geral, têm alterado muito lentamente suas práticas. Ações para intervir efetivamente em fóruns que têm decidido rumos à Educação, são poucas. Estamos referindo-nos, por exemplo, a iniciativas para participação nos Conselhos Municipais de Educação, um direito constitucional. As atribuições dos conselhos têm sido vistas pelos sindicatos como políticas para desonerar o Estado de sua obrigação com as áreas sociais; iniciativas para privatizar a educação por meio da transferência de suas responsabilidades - principalmente de ordem financeira - para a própria comunidade administrar a ‘miséria’ ou criar/tomar iniciativas para resolver os problemas via parcerias, doações, trabalho voluntário etc.

Os conselhos municipais na área da educação são ainda inovações recentes que ainda não foram apropriados pela população como espaços reais de participação. Os conselhos ligados ao Fundef, por exemplo,

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deveriam fiscalizar a correta aplicação dos recursos desse fundo e, entretanto, a mídia tem registrado denúncias de desvio dos recursos e das finalidades desse fundo. Os sindicatos preferem seus próprios canais e entre os grupos e movimentos sociais mais organizados há dúvidas quanto à eficácia de participar de tais canais institucionalizados, assim como há dificuldades para assumirem outros papéis, mais propositivos e não apenas reivindicativos. As atribuições dos conselhos têm sido vistas por vários sindicatos e movimentos sociais como parte das políticas que buscam desonerar o Estado de sua obrigação com as áreas sociais; iniciativas para privatizar a educação por meio da transferência de suas responsabilidades - principalmente de ordem financeira - para a própria comunidade administrar a ‘miséria’ ou criar/tomar iniciativas para resolver os problemas via parcerias, doações, trabalho voluntário etc. Mas na política não se pode ignorar a necessidade da busca do consenso; a participação nos conselhos gera uma convivência, estimula à manifestação do conflito, fruto das diferenças entre os pontos de vistas de distintos grupos, camadas e classes sociais, e que deve ser visto como algo natural e necessário num contexto de participação democrática.

As possibilidades dos conselhos atuarem como mecanismos democráticos de gestão social são vistas com descrédito e desconfiança pelos sindicatos dos professores da educação básica, e eles têm suas razões: são atores fundamentais para qualquer processo de reforma educacional, mas, de fato, eles não têm sido ouvidos ou consultados nas ações cotidianas elaboradas pela maioria dos poderes públicos que têm conduzido as reformas estaduais ou federal. Entretanto, ocupar espaços nos conselhos pode ser uma maneira de estar presente em arenas onde se decidem os destinos de verbas e prioridades na gestão de bens públicos; é uma forma de ser ouvido e continuar lutando para transformar o Estado pela via da democratização das políticas públicas. Eles, conselhos, devem ser espaços e mecanismos operativos a favor da democracia e de exercício da cidadania, em todo e qualquer contexto sociopolítico. Eles podem se transformar em aliados potenciais, estratégicos, na democratização da gestão das políticas sociais.

Conclusões

Claude Lefort nos adverte: “É um grave erro supor que não existem alternativas políticas. Acho que a nossa época é de desafios. A maioria deles é encontrar meios de adaptação às mudanças tecnológicas, com suas conseqüências sobre a mão-de-obra, a mobilidade extrema

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no trabalho. Essa adaptação deveria ser compatível com as exigências de integração de grandes camadas da população; isso se faz criando laços sociais e reforçando as medidas de proteção social”. (1999, Caderno 2, Cultura, Estado de São Paulo, p. D5).

No Brasil, ao contrário do que preconiza Lefort, as medidas de proteção social estão sendo flexibilizadas ou desregulamentadas; os laços sociais estão enfraquecidos pela competição e todas as modalidades de violência.

Uma sociedade civil participativa, autônoma, com seus direitos de cidadania conquistados, respeitados, e exercidos em várias dimensões, exige também vontade política dos governantes, principalmente daqueles que foram eleitos como representantes do povo, pois se trata de uma tarefa que não é apenas dos cidadãos isolados. Há que se desenvolver uma nova cultura política a respeito (vide Freire, 1995). As dificuldades de representatividade presentes nos diversos tipos de conselhos da área da educação, acrescidas da não transparência das gestões públicas - dado o fato de não publicizarem as informações, corroboram nossas afirmações. Na luta pela igualdade, a sociedade deve se organizar politicamente para acabar com as distorções do mercado (e não apenas corrigir suas iniqüidade), lutar para coibir os desmandos dos políticos e administradores inescrupulosos. A exigência de uma democracia participativa deve combinar lutas sociais com lutas institucionais e a área da educação é um grande espaço para essas ações, via a participação nos conselhos.

Concluindo, consideramos que os conselhos são parte de um novo modo de gestão dos negócios públicos - que foi reivindicado pelos próprios movimentos sociais nos anos 80, quando eles lutaram pela democratização dos órgãos e aparelhos estatais. Eles fazem parte de um novo modelo de desenvolvimento que está sendo implementado em todo o mundo - da gestão pública estatal via parcerias com a sociedade civil organizada objetivando a formulação e o controle de políticas sociais. Eles representam a possibilidade da institucionalização da participação via uma de suas formas de expressão - a co-gestão; a possibilidade de desenvolvimento de um espaço público que não se resume e não se confunde com o espaço governamental/estatal; e, finalmente, a possibilidade da sociedade civil intervir na gestão pública via parcerias com o Estado. Os conselhos ampliam o espaço público, sendo ainda agentes de mediação dos conflitos (maiores detalhes a respeito vide Gohn, 2001). Como tal, carregam contradições e contraditoriedades. Podem alavancar o processo de participação de grupos organizados como podem estagnar o sentimento de

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pertencimento de outros - se monopolizados por indivíduos que não representem de fato as comunidades que os indicaram/elegeram. Eles não substituem os movimentos de pressão organizada de massas, que ainda são necessários para que as próprias políticas públicas ganhem agilidade.

Referências bibliográficas

FREIRE, P. 1995. A Constituição de uma nova cultura política. In Villas-Boas, R. e Telles, V.S. Poder local, participação popular, construção da cidadania. São Paulo, Instituto Cajamar/Instituto Pólis/FASE e IBASE.

FARO, M. C. – “A mensagem de Praga” Jornal Brasil, p. 3, 10/10/2000.Gohn, M. G. 1999. Educação não-formal e cultura política. São Paulo, Cortez.

__________2000. Mídia, terceiro setor e MST. Petropólis, Vozes.

__________2001.Conselhos gestores e participação sociopolítica, São Paulo, Cortez (no prelo).

LEFORT, C. 1999, Caderno 2, Cultura, Estado de São Paulo, p. D5.

SANTOS, B. S. 2000. A crítica da razão indolente. São Paulo, Cortez.

TARROW, S. 1994. The Power of movements. Cambridge, Cambridge Um. Press.

TOURAINE, A . 1997. ¿Podremos vivir juntos? Buenos Aires, Fondo de Cultura Económica.

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Mesa redonda

Los movimientos sociales en Europa1

Francisco Fernández Buey

RESUMO: Apresentam-se considerações críticas a respeito da atuação dos movimentos sociais que ocuparam o cenário político com grande expressividade na Europa, a partir dos finais da década de 70, como o pacifismo, o feminismo e o ecologismo. Ao lado deles, observou-se naquele momento o crescimento de novos movimentos sociais: antiglobalização, anti-racismo e antixenofobia. Pode-se concluir que a repercussão educativa desses movimentos sociais não tenha capacidade, por si mesmos, de operar transformações globais na sociedade. Tem tido, contudo, o grande poder de mudar as mentalidades e proporcionar um novo patamar de consciência, que favoreça saltos e mudanças qualitativas na sociedade humana.

Palavras-chave: novos movimentos sociais; sociedade européia; sociedade e política.

RESUMEN: Se presentan consideraciones críticas acerca de la actuación de los movimientos sociales que ocuparon el escenario político, con gran expresividad, en Europa, a partir de finales de la década de los 70: el pacifismo, el feminismo y el ecologismo. Al lado de ellos, en aquel momento, se observa el surgimiento de nuevos movimientos sociales: anti-globalización, antirracismo y antixenofobismo. Se puede concluir que la repercusión educativa de esos movimientos sociales, aunque no posee capacidad, por si misma, de transformar la sociedad, ha tenido um gran poder para cambiar las mentalidades y proporcionar el desarrollo de una conciencia que favorezca cambios cualitativos en la sociedad humana.

Palabras-clave: nuevos movimientos sociales; sociedad europea; sociedad y política.

1 Palestra realizada em 22 de novembro, na Mesa Redonda intitulada Movimentos sociais e educação, no Seminário Educação 2000, promovido pelo Instituto de Educação e o Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 11 n. 19 jan.-jun. 2002 p. 163-171.

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Movimentos sociais e educação

Buenas tardes a todos, amigos. Eu falarei da condição dos movimentos sociais na Europa. Hablaré en español. A nivel de la concepción de los movimientos sociales en Europa introduciré algunas consideraciones críticas, no exclusivamente descriptivas.

Hasta 1975, en Europa, el principal de los movimientos sociales existentes, entendiendo movimientos sociales en la definición que dio la colega en la primera intervención, el principal de los movimientos sociales fue el movimiento obrero y sindical. La centralidad del movimiento obrero y sindical, hasta 1975, en Europa, estaba fuera de duda. Solo hubo un momento corto en que algún movimiento social nuevo discutió la centralidad del movimiento obrero y sindical. Fue entre los años 1967 y 1970, en el momento en que nacen los movimientos estudiantiles en Europa. Solo entre 1967 y 1970, el movimiento estudiantil en París, en Berlín, en Roma, en Praga, en Barcelona etc. discutió la centralidad del movimiento obrero y sindical. Y, aún en ese caso, habría que decir que la discusión de la centralidad del movimiento obrero y sindical como un movimiento social principal en Europa apuntaba, más que a una crítica, a un intento de radicalización de las políticas del movimiento obrero y sindical desde el mundo estudiantil universitario e intelectual. Pero, a partir de finales de la década de los 70, esa situación empezó a cambiar.

A finales de la década de los 70, en Europa, estaban consolidados ya los tres grandes movimientos sociales críticos y alternativos que se han desarrollado luego hasta la actualidad. Me refiero al movimiento feminista, al movimiento ecologista y al movimiento pacifista. En las discusiones de la época, se solía hablar de “nuevos movimientos sociales” para referirse a ecologismo, pacifismo y feminismo y considerar que el otro movimiento social, el movimiento obrero y sindical era el viejo movimiento. Hablando con propiedad, esto no es así.

El movimiento pacifista, aunque no como movimiento organizado, tiene un origen lejano, incluso anterior a la existencia del propio movimiento obrero. El movimiento feminista, incluso organizado, tiene un existencia casi paralela a la del movimiento obrero en Europa. Desde los principios del sufragismo, de las luchas de las mujeres en Europa, la propia consecución, el modo etc, eso ocurre casi en el momento en que empieza a existir el movimiento obrero y sindical. Flora Tristan escribe indistintamente, hacia 1847, de la lucha de clases y de la lucha de las mujeres. Hecha la atención, habría que decir que esos tres movimientos, el movimiento ecologista, el movimiento feminista y el movimiento pacifista se articulan y consolidan prácticamente en toda Europa en la década de los 80.

Rev. Educ. Pública, Cuiabá, v. 11, n. 19, jan.-jun. 2002.164

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Mesa redonda

De los tres movimientos el que más repercusión llegó a tener en la década de los 80 fue el movimiento ecologista. El que más cuajó en el conjunto de la conciencia de la población fue el movimiento ecologista. El movimiento feminista, no. El movimiento pacifista en Europa ha sido esporádico. A mediados de los años 80, tuvo una gran importancia, coincidiendo con el momento de mayor fricción en la segunda fase de la Guerra Fría. Recordarán ustedes que hacia 1985, 1984 se pasó un momento en el mundo en que parecía inminente el estallido de una nueva guerra librada con armas nucleares. Estábamos en el momento en que los Estados Unidos de Norteamérica preparaban la llamada Guerra de las Estrellas ó de las Galaxias y en el momento en que la otra parte – la URSS -- se preparaba también para una guerra.

Ese fue el momento clave del movimiento pacifista en Europa. Tanto es así que, a mediados de la década de los 80, el feminismo europeo dio un paso muy importante que fue ponerse a la cabeza del movimiento pacifista de la época. Esto ocurrió en Inglaterra, fundamentalmente, entre 1984 y 1986. Y tanta repercusión tuvo el movimiento pacifista que empezó a hablarse en la mayoría de los países europeos de eco-pacifismo. Quiere eso decir que el movimiento ecologista que había nacido a finales de los 70 tomó una dimensión estrictamente pacifista. Esto, por lo que hace a la historia hasta finales de los 80.

¿Cómo han evolucionado esos movimientos desde entonces y que repercusión han tenido en el panorama educativo europeo? Hay que decir que, en los años que van desde 1990 hasta la actualidad, en los diez últimos años, los tres principales movimientos sociales europeos se han ido perfilando en distintas corrientes y orientaciones. Yo creo que hoy en día no se puede decir que en Europa haya un movimiento ecologista unitario ó único, un movimiento feminista unitario ó único y un movimiento pacifista unitario ó único. Hay corrientes, hay tendencias, hay puntos de vista.

El feminismo europeo tiene, a mi modo de ver, en este momento, tres grandes corrientes o tendencias. La primera es lo que se llama feminismo de la diferencia, que empieza con el reconocimiento de que la diferencia de género es importante y que la diferencia crea o ha creado a lo largo de la historia valores y contra-valores femeninos y masculinos. Y que, contrariamente a lo que ha sido la lógica histórica hasta hoy, habría que reafirmar los valores femeninos que tienen que ver con el género y el desarrollo cultural.

¿Qué valores son esos? Fundamentalmente, un mejor trato con la naturaleza, una consideración más pacífica de las relaciones

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interpersonales. Es decir, el feminismo de la diferencia suele reconocer, por así decirlo, que no hay mal que por bien no venga. Es decir, que el hecho de que las mujeres hayan sido oprimidas por los varones a lo largo de la historia, de todas maneras, ha permitido la creación de un determinado tipo de valores menos agresivos, más pacíficos, o un mejor contacto con la naturaleza que vale la pena recuperar. Este es un punto de vista.

El segundo punto de vista es lo que se suele llamar en Europa feminismo de la igualdad. El feminismo de la igualdad niega que tenga importancia la diferencia de género y pone el acento, fundamentalmente, en la lucha por la igualdad de derechos que tienen dos variantes: 1) que se cumplan las leyes, es decir, lo que dicen las leyes y las constituciones de los países. En todos los países de Europa admiten la igualdad pero, en la práctica, el derecho en el trabajo, en la universidad, etc., no se suele cumplir. Las mujeres partidarias del feminismo de la igualdad suelen afirmar con razón que, incluso en el ámbito laboral, en el ámbito de las relaciones laborales, cuando un varón va a buscar trabajo a una fábrica, a una empresa, a una universidad, normalmente, solo se le pide el curriculum, pero cuando una mujer va a buscar trabajo a una fábrica, a una empresa, a una universidad, además del curriculum se le pide que demuestre lo que sabe. Y esta sigue siendo una diferencia de discriminación.

Todavía, hay una tercera corriente del feminismo europeo interesante en el movimiento actual. Es una corriente que pone el acento, fundamentalmente, en el problema del tiempo: en el problema de los tiempos para trabajar y los tiempos para cuidar. Esta es una corriente interesante y se ha desarrollado mucho, sobre todo en Italia y en los países nórdicos. Y es una corriente que argumenta así: la incorporación de las mujeres al trabajo, fuera del trabajo doméstico, al trabajo externo, el proceso de interacción de las mujeres ha creado una nueva situación interesante, pero contradictoria. ¿Por qué? Porque la incorporación de las mujeres al trabajo hace que las mujeres pasen a una situación en la cual, además de la carga anterior que tenían con el trabajo doméstico, cargan con el trabajo productivo. Es decir, el trabajo que llamamos el cuidado de la familia y, sobre todo respecto de los mayores, de los viejos, de los de más edad, en las casas, al menos en Europa, es un trabajo que hacen siempre las mujeres. El varón no ha cambiado en eso al respecto de lo que era hace 30, 40, 50 años. Probablemente, esto, en Brasil, no es un problema tan importante como en Europa. Pero Europa es una sociedad de viejos. Es una sociedad en la cual el porcentaje de viejos es altísimo. Uno de los grandes problemas de la Europa, de las sociedades europeas actuales es

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Mesa redonda

precisamente ¿cómo cuidamos a nuestros mayores? La actual población está, en Europa, con 65 años aproximadamente. La edad media normalmente de vida estaría por encima de los 80. Solo que hay un larguísimo período de tiempo en el que la carga central del cuidado de los mayores es exclusivamente de las mujeres.

Esta corriente feminista italiana, a la que he hecho referencia, explica muy plásticamente este punto de vista con una frase: “El tiempo es un perro que muerde a las mujeres”. ¿Por qué? Porque precisamente las mujeres liberadas, emancipadas, etc., con trabajo, en Europa, son seres que cada vez tienen menos tiempo. La frase más repetida entre mis mejores amigas cada vez que intentamos invitar para algo es “no tengo tiempo”. No tienen tiempo porque, además de las ocho o diez horas de trabajo correspondiente, luego está el trabajo doméstico, el trabajo que hay que hacer en casa. Además, hay que decir que, en líneas centrales, en Europa, el varón, los varones, no hacen eso. Esas serían las tres corrientes o tendencias que hay en el feminismo europeo.

En cuanto al pacifismo, yo diría que hay básicamente dos grandes tendéncias. Lo que llamaré el pacifismo accidental y lo que llamaré pacifismo radical. El pacifismo accidental consiste fundamentalmente en oponerse a tal o cual guerra o conflicto bélico con razones o argumentos exclusivamente dirigidos a ése conflicto. Ese tipo de pacifismo ha crecido mucho en Europa en los últimos diez años. El pacifismo radical es un pacifismo de principios. Es un movimiento que se opone a todo tipo de conflicto bélico, que se opone a todo tipo de guerra. Pacifismo radical es un tipo de pacifismo que se inspira, fundamentalmente, en Ghandi y el viejo Tolstoi. El pacifismo accidental es un pacifismo sobre todo declarativo, pero que suele tener bastante fuerza en los movimientos en Europa, en el momento actual. Yo diría, para caracterizar la situación, que así como a mediados de los años 80 en Europa dominaba un pacifismo radical, hoy en día está empezando a dominar un pacifismo accidental.

Por último, por lo que hace al ecologismo, creo que el ecologismo se ha convertido, en Europa, en parte de la cultura general de la población. Además de ser un movimiento importante, el ecologismo ha cuajado ya en Europa, en partidos políticos institucionalizados con representación parlamentario, por un lado, y además se ha convertido en parte de la cultura general de los hombres.

Nosotros distinguimos entre dos tipos de ecologismo: lo que podríamos llamar naturalismo o medio-ambientalismo y ecologismo social y político. El primero, el medioambientalismo, defiende fundamentalmente

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reservas naturales etc. El ecologismo social y político relaciona los problemas medioambientales con los viejos temas, por así decirlo, del movimiento obrero y sindical y cuando habla de problemas globales – no de problemas exclusivamente europeos - relaciona también el asunto económico-social con el asunto medioambiental.

Para poner un ejemplo elemental, en el debate que, actualmente, hay en Europa acerca de las reservas naturales del planeta, el ecologismo medio-ambientalista o solo naturalista está, sin más, a favor, por ejemplo, de la internacionalización del Amazonas, por la consideración de que la conciencia ecológica exige eso. El ecologismo social, ecologismo con conciencia política y social dice: sí a la internacionalización del Amazonas o de otras zonas naturales, pero también internacionalización de otras cosas. Es decir, reciprocidad respecto de eso, de los países que proponen la internacionalización. También deberíamos internacionalizar fuentes de la riqueza, de la ganancia, como el petróleo. O también deberíamos internacionalizar, si se me permite la broma, el capital. El ecologismo político y social, hoy en Europa, tiene esa orientación.

Y ahora querria decir una consideración respecto de la situación actual y otra sobre novedades. Mi consideración crítico distanciada respecto de los movimientos sociales europeos, después de estudiar esto durante cierto tiempo, es la siguiente: la mayor parte de los movimientos en Europa está oscilando, en este momento, entre la integración o institucionalización y el mantenimiento del espíritu crítico y alternativo. En Europa ocurre algo que no sé si ocurre también en Brasil. La mayor parte de los movimientos sociales está discutiendo hoy en día, un problema fundamental desde un punto de vista clave: su autonomía. ¿Hasta qué punto los movimientos sociales son y deben ser autónomos? Y cuando se dice autónomos quiere decir autónomos respecto de las instituciones del Estado y autónomos respecto de los partidos políticos existentes con representación parlamentaria. Esto es un problema importante, porque una parte de los que pasan por ser nuevos movimientos sociales, posteriores a esos tres en Europa, sobre todo aquellos que tienen que ver con las organizaciones no gubernamentales, en este momento en Europa – y este es un factor que hay que tener en cuenta – son movimientos y organizaciones directamente subvencionadas por los estados. Casi nunca estas organizaciones no gubernamentales tienen autonomía propia y se basan en el trabajo voluntario de sus afiliados y viven de su propia voluntariedad. Esto complica mucho el asunto de los movimientos sociales, porque movimientos sociales financiados por los propios estados, es decir, amamantados en las ubres del

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propio estado, difícilmente pueden conservar el espíritu crítico y alternativo. Por eso, una de las discusiones centrales en los movimientos sociales, en Europa, en este momento, es la cuestión de la autonomía, hasta que punto esos movimientos son o no son autónomos. Y nosotros distinguimos con bastante claridad qué son movimientos sociales críticos y alternativos y qué son movimientos y organizaciones creadas por el propio Estado para poner sordina a las contradicciones que existen en nuestras sociedades.

Por último, las novedades probablemente más importantes son dos: una – a una ellas se han referido las compañeras de la mesa – es el nuevo movimiento contra la globalización. Esto vale igual para Brasil que para la Europa Occidental y Central y Oriental. Esta sí que podríamos decir que es una gran novedad de los últimos tiempos en los movimientos sociales. Una gran novedad porque, por primera vez, parece haber conciencia de que, frente a la internacionalización y la globalización del capital, se necesita un tipo de movimiento que sea realmente mundial y global. Lo que se esbozó en Seattle e, inmediatamente después, en Praga, va por ahí. Tiene además la particularidad de que es uno de esos movimientos mezclados que, desde mi punto de vista, son los fuertes. En mi opinión, son mejores los movimientos sociales mezclados que los movimientos de un solo asunto. Este es bastante mezclado, es un movimiento en que intervienen ecologistas, sindicalistas, mujeres feministas, grupos muy diversos, con mucha conciencia tanto de los problemas medio ambientales como de los problemas sociales.

El otro movimiento es el movimiento antirracista y antixenófobo. Esto está creciendo en Europa, en los últimos tiempos, y es un movimiento importante en la situación en la que estamos. Porque Europa, a diferencia de Brasil, es una especie de mosaico de culturas en el cual siguen teniendo mucha importancia las identidades nacionales y las diferenciaciones de función de las comunidades nacionales. Europa no está tan acostumbrada, como Brasil, o los Estados Unidos de Norte América, a los grandes flujos migratorios. No ha tenido ningún tipo de mezcla de etnias, culturas, etc., que se ha tenido en Brasil, que se ha tenido en Estados Unidos y empieza a ser una novedad en Europa el gran flujo de los procesos migratorios en los últimos años desde el norte y centro de África al sur y al centro de Europa y desde el este de Europa hacia el centro y el oeste de Europa. Hoy empieza a haber una novedad en Francia, en Alemania, en Italia, en España. Por primera vez en nuestra historia, el porcentaje de personas procedentes de África, por ejemplo, Alcázar... [hay una interferencia de alguién, que le hace

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una pregunta, a la que el palestrante responde:] ... “No, los bárbaros seguramente somos nosotros.”

En ese contexto, voy a citar un poema muy interesante de un poeta griego Constantino Cavafis, que se intitulaba “Esperando a los bárbaros”. Los griegos están esperando a los bárbaros en la plaza, pero resulta que los bárbaros no llegan. Y la pregunta con que acaba ese interesantísimo poema de Cavafis es: ¿Qué haremos nosotros ahora sin bárbaros? [rizas] ¿Qué haríamos nosotros, los europeos, sin bárbaros? ¿Y quienes son los bárbaros? Hay una anécdota que es muy interesante, no sé cómo ven ustedes esa historia aquí en Brasil. En una parte de Europa, esa historia que empieza aproximadamente en el siglo II o III después de Cristo y acaba en el siglo VII, en una parte de Europa eso se estudia bajo el rótulo de “La invasión de los bárbaros”, el momento de la caída del Imperio Romano. Pero hay una parte de Europa donde esa parte de la historia no se llama “La invasión de los bárbaros”. Se llama “La época de las grandes migraciones”. Y esa parte de Europa, sintomaticamente, es Alemania. Y ¿por qué en Alemania la historiografía llama “época de las grandes migraciones” a lo que los romanos, los españoles, los italianos llamamos “La invasión de los bárbaros?” Porque los bárbaros eran ellos, es decir, los bárbaros de aquella época eran los alemanes. No se van a llamar a sí mismos “bárbaros”, por tanto esta es “la época de las grandes migraciones”. Y, desde el punto de vista de los alemanes, se podia decir que es la época de las grandes migraciones. No está nada claro que los germánicos fueran más bárbaros que los romanos, por lo menos si se compara una de las costumbres del pueblo en la Germania de la época con las costumbres de algunos de los emperadores romanos. Probablemente, era más bárbaro Calígula que cualquier campesino germánico, alemán de la época y, probablemente, ahora es más bárbaro alguno de los europeos que se consideran a si mismos racista y xenófobo que la mayoría de las personas que entran por el Estrecho de Gibraltar buscando trabajo en España etc.

Previsiblemente, el más importante de los movimientos sociales, en Europa, en los próximos años, va a ser el movimiento antirracista y el movimiento antixenófobo. Y esto, precisamente, porque al mismo tiempo también está creciendo en Europa mucho el racismo y la xenofobia. Entre los jóvenes es el movimiento que ha cuajado más en estos últimos años: el movimiento antirracista y el antixenófobo. Solo el racismo se ha convertido en una de las grandes organizaciones que más moviliza en Francia, en España, en Italia; está cuajando también en Alemania etc. etc. Es de esperar que, si continúan los flujos migratorios, como continuarán – porque

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Mesa redonda

no se puede poner puertas en el campo – por mucho que haya leyes, no se va a poder impedir el traslado de poblaciones, como no se puede impedir el cruzar de la frontera de Méjico, a pesar de las leyes y otros obstáculos. Si esto sigue así, lo más previsible es que este sea el movimiento de más fuerza.

Permítanme una última palabra. ¿En qué sentido se nota educativamente estos movimientos? Yo creo que, tanto el feminismo como el ecologismo, como el pacifismo, en Europa, la principal virtualidad que han tenido es justamente en las escuelas, tanto la primaria como en la secundaria, como en la universidad. No han cambiado el mundo. Ni el feminismo ni el pacifismo ni el ecologismo ha cambiado el mundo europeo, de arriba a abajo, pero sí que han cambiado las conciencias de las personas. Hoy, en la mayor parte de los países europeos, gracias a la introducción del ecologismo, el feminismo y el pacifismo en las escuelas, no se piensa ni se es como se era hace diez años, hasta el punto de que está empezándose a hablar en Europa con una preocupación bastante central – pero no deja de ser interesante – acerca de crisis de la masculinidad. Y la crisis de la masculinidad, en Europa, es un hecho, es un hecho real. Es un hecho que responde a la presión cultural del feminismo en las escuelas. Es muy posible que la crisis de la masculinidad, al menos bajo mi punto de vista, no tengamos que verlo como un hecho negativo, sino como un hecho culturalmente positivo. Si la crisis de la masculinidad quiere decir, como parece que está queriendo decir, que se viene abajo el viejo machismo europeo es decir que, para ustedes en Brasil, la imagen central de España ya no va a seguir siendo el macho torero, salimos todos ganando, sin embargo.

Muchas gracias.

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Mesa redonda

Política educativa: una responsabilidad estatal1

Emílio Tenti Fanfani

RESUMO: Na América latina, houve expansão de matrículas com perda de qualidade. Nem 5% do PIB estimado pela Unesco foi aplicado. Diminuíram-se os investimentos. Caiu o custo per capita/aluno. Ausenta-se cada vez mais o planejamento global do Estado. As escolas carecem de que a própria sociedade exija um ensino de qualidade. Requer-se um pacto educativo nacional para formulação de políticas de Estado e das condições de trabalho. São necessários recursos em volume suficiente para implementação, formação e profissionalização dos docentes – item estratégico principal, para que a escola cumpra seus fins em uma agenda mínima para a Educação.

Palavras-chave: educação escolar básica e cidadania; políticas de formação docente, condições de trabalho; autonomia.

RESUMEN: En América Latina, hubo expansión de matrículas con pérdida de calidad. Ni siquiera el 5% de PIB estimado por Unesco fue aplicado. Disminuyeron las inveresiones. Cayeron los costos per capita/alumno. Es cada vez más ausente el planeamiento global implementado por el Estado. Las escuelas carecen de que la propia sociedad exija una enseñanza de calidad. Se requiere un pacto educativo nacional para la formulación de políticas de Estado y de las condiciones de trabajo. Son necesarios recursos en volumen suficiente para laimplementación, formación y profesionalización de los docentes – item estratégico principal, para que la escuela cumpla sus fines, en una agenda mínima para la Educación.

Palabras-clave: educación escolar básica y ciudadanía; políticas de formación docente; condiciones de trabajo; autonomía.

1 Palestra proferida em 22 de novembro, na Mesa Redonda Políticas públicas e educação, no Seminário Educação 2000, promovido pelo Instituto de Educação e o Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Federal de Mato Grosso.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 11 n. 19 jan.-jun. 2002 p. 173-183.

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Buenas tardes! Nosotros vamos “abrir el fuego”, como decimos en español, espero que ustedes puedan comprender lo que “falo”, lo que digo y quiero hacer solamente algunas apreciaciones generales para provocar el debate.

Mis consideraciones de política educativa se van a referir fundamentalmente al caso argentino y, en especial, a la educación general básica. Toda la universidad, que es una problemática especial, creo que la profesora Maria do Carmo va abordar esa problemática.

Hay una expresión, que encontré en libro, que me gustó para calificar el estado de la educación básica en Itália. Ella pudo aplicar a Argentina, no sé si para Brasil también. Decía – hablando de las escuelas, las escuelas para educación básica en Italia – decía que era como un archipiélago, un conjunto, un archipiélago bastante triste, con algunas islas felices. Me parece que es un imagen que describe un poco el estado de la escuela en Argentina. Yo voy a dar tres cifras para que ustedes tengan una idea de cual es el problema de política. Del año 1980 a 1995, 15 años, la matrícula, el número de alumnos inscritos en la educación básica pré-escolar, inicial, primaria, secundaria, secundaria a la universidad. En Argentina, secundaria está en la universidad – secundaria media y secundaria superior. El número de alumnos en los niveles de la educación básica, en 15 años, aumentó 60%. Tuvimos 60% más de alumnos. Mucho más que el aumento demográfico de la población. O sea, primera conclusión: cada vez más jóvenes van a la escuela inicial, primaria y media. Si uno mira el número de profesores en ese mismo período, aumentó 55%. Pero si uno mira la inversión pública, o sea, el presupuesto, para estos niveles él aumentó solo 13%. 60% más de alumnos, 55% más de profesores y solo 13% más de presupuesto, de investimento público. Hay una desproporción, cada vez hacemos más cosas con menos recursos.

¿Qué es lo que pasa? Entonces, digo que en Argentina tenemos dos tipos de problemas que enfrentar: uno que es un viejo problema, un problema de los países pobres. Tenemos todavía niños pequeños, meninos de 4, 5 años que no van a la escuela. Y tenemos adolescentes que no van a la escuela. O sea, tenemos todavía niños, adolescentes y jóvenes excluídos de la escuela. Eso es un importante deuda que tiene la sociedad argentina. Pero también tenemos un problema con aquellos niños que van a la escuela, porque no aprienden lo que tienen que aprender, o lo que se supone que deberían aprender. Por eso, desde el año 1993, el estado ha desplegado una política de evaluación de la calidad de la educación. O sea, tenemos dos problemas: el problema cuantitativo, necesitamos incorporar al

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Políticas públicas e educação

niño al sistema educativo y jóvenes, básicamente jóvenes, y el problema cualitativo, tenemos que mejorar la calidad de la educación para aquellos niños que están en la escuela. O sea, tenemos problemas de la calidad en la agenda pública, eso es lo nuevo.

Diria yo que en casi todos los países de occidente, de Europa y la América Latina, el tema de la calidad se comienza a constituir en un problema de política pública desde mediados de la década de los 80, donde todos los estados comienzan a desarrollar, a crear instituciones de medición de la calidad de la educación. Ahora, cuando uno habla de política pública ¿a qué se está refiriendo? Se está refiriendo a un conjunto de decisiones que tienen que ver fundamentalmente con dos cosas: regulaciones, establecimiento de reglas y asignación de recursos. Una política pública, fundamentalmente, es: o regulación o asignación de recursos. Reglas y recursos que intervienen en un determinado campo de la vida social.

Diríamos que no hay ningún campo de la vida social donde no se haga sentir el peso del estado. Si ustedes piensan en Argentina, imagina en Brasil, el deporte, el fútbol. Seguro que hay reglas, leyes, hay una dirección, un departamento, secretaria del deporte, hay política científica, hay política para la mujer, para la infancia, política económica, para la producción de mina, política agraria, política turística, todos los campos de la vida social de alguna manera son interferidos, estructurados por decisiones públicas de Estado porque, cuando hablamos de política pública, hablamos de decisiones autoritarias que se imponen en la sociedad desde un lugar que se llama el Estado.

Pero uno no puede hablar de política pública sin tomar posición acerca del estado del Estado en occidente. De mañana2 algo comentábamos acerca del estado del Estado. En primer lugar, este estado como espacio institucional. Hay estados en que se han redefinido sus funciones. El Estado no actúa solo. Hay un campo que es espacio del Estado, pero existe el espacio del mercado, por ejemplo. Un montón de cosas que la gente hace en virtud del interés, de la lógica del interés, del intercambio y el espacio del mercado tiende a ampliarse y a reducir el espacio del Estado.

Se ha hablado mucho del Downsizing, del achicamiento del Estado. Aquí, no sé en Brasil. Seguro, en Argentina, esto se expresa de la década

2 O Autor se refere à sua conferência, proferida no período da manhã do mesmo dia [nota dos organizadores].

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de 90 en una caída muy fuerte del gasto público total. El gasto público total, en la década de 80, en Argentina, equivalía a más de una tercera parte del producto del PIB argentino. Hoy en día el gasto público es de 26, 27% del PIB porque el Estado se achicó. El Estado que se achicó alguién va a poder decir que es el estado económico, no el estado social; el gasto social del Estado, es decir, el presupuesto para la educación, salud, vivienda, asistencia social, se mantiene, como porcentaje del producto bruto se mantiene. Tenemos un 18% del PIB para gasto social, pero este estado gasta más del doble en la política pública de previsión social, es decir, la política de jubilaciones, pensiones, para los viejos gasta cerca de 8 a 9% del producto bruto mientras que en la educación el gasto público educativo representa 3,8% del producto bruto.

¿Pero qué es lo que pasa? Con esa cifra que yo les dí en principio, como es, cada vez aumenta la cantidad de alumnos. El gasto público per capita, o sea, por alumno, tiende a caer. El gasto público per capita por alumno universitario ha caído ante los últimos 15 años en 30%. Menos gasto público per capita, porque aumenta la cantidad de alumnos y el presupuesto no aumenta en la misma proporción. La misma caída, un poco mayor todavía, se observa en el gasto público por alumno en la enseñanza media, enseñanza secundaria y también es un nivel educativo que está en expansión y los recursos públicos no acompañan este crecimiento de la matrícula. Como no se puede hacer milagros, esta expansión se está realizando a costa de la calidad de la educación.

Entonces uno de los grandes dilemas que tenemos que resolver en nuestros países es achicar la diferencia que existe, que es cada vez mayor entre lo que los sociólogos llamamos el capital cultural incorporado en las personas, es decir, el conjunto de conocimientos efectivamente depositados, desarrollados en el cuerpo de las personas y el capital cultural institucionalizado, es decir, traducido en certificados, títulos, diplomas. Ustedes saben que el sistema educativo entrega títulos, certificados de estudio, certificado de primaria, secundaria, licenciado, doctorado, maestrado, esto se llama capital cultural institucionalizado, es una forma jurídica. Cuando el sistema educativo se masifica, la distancia que siempre existió entre el conocimiento efectivamente depositado, desarrollado en las personas, y lo que dice el diploma es cada vez mayor.

Para redondear y dar lugar al debate les voy a contar a ustedes, les voy a enunciar 4 o 5 grandes criterios de política educativa. Pero antes de hablar estos criterios de política educativa, quiero decir, repetir un poco lo de esta mañana, la frase de esta mañana: La escuela sola no puede,

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Políticas públicas e educação

siempre se pensó la educación como una gran política para favorecer la movilidad social de las personas. Pensamos que la educación es como una escalera social, a través de lo cual los individuos podían mejorar su posición en los sistemas de distribución de bienes y valores, el trabajo, el ingreso, el prestigio, el reconocimiento social. Siempre pensamos la escuela entonces como un gran factor determinante de la igualdad social.

Hoy en día, dados los problemas que atraviesan nuestra sociedad en esta etapa del desarrollo del capitalismo, la pregunta que nos tenemos que hacer es la siguiente: ¿Cuánta igualdad social es necesaria para que exista igualdad de oportunidades educativas? Necesitamos resolver una serie de problemas básicos para que nuestros niños y jóvenes estén efectivamente en condiciones de iniciar con éxito un esfuerzo de aprendizaje, un esfuerzo educativo.

Si los niños no resuelven el problema de la vivienda, viven en un contexto familiar de violencia, de agresión, si viven asinados en una pequeña habitación con 7 hermanos, no están en condiciones de desarrollar aprendizajes significativos. O sea, que la mejor política educativa sola no puede. Para efectivamente constituir a la educación en un factor de igualdad social, para que, efectivamente, la escuela ofrezca igualdad de oportunidades, de aprendizaje, es preciso que nuestra sociedad garantice la satisfacción de las necesidades básicas de la población, porque si no se establece lo que yo llamo el círculo vicioso de las pobrezas. Precisamente este estado, en estas condiciones, en toda América Latina tiende a ofrecer menos igualdad, y menos, menos oportunidades educativas y oportunidades educativas de más baja calidad a los grupos sociales más desfavorecidos, más excluidos, más dominados en la sociedad. Como que se juntan las dos pobrezas: la pobreza de las familias tiende a juntarse con la pobreza de la oferta escolar.

Yo vengo de México ahora, de evaluar unas alternativas políticas educativas que específicamente están orientadas a garantizar la educación básica para los más pobres de la sociedad mexicana, que son los pobres rurales, que viven en las sierras, en las zonas más alejadas, en las peores condiciones. Para ellos, el estado mexicano de hace 30 años ha desplegado una política educativa, una oferta educativa específica que se llama educación comunitaria que está ministrada por una organización que depende del Ministerio de Educación de la nación, pero que tiene autonomía relativa. Entonces en vez de tener un maestro para 1º, para 2º, para 3º, tiene un solo maestro la oferta educativa. En vez de tener un maestro titular o especializado con título de pedagogo, es simplemente un

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joven de la comunidad que tiene los 6 años de primaria más 3 años de secundaria, que es entrenado en 1 mes y expuesto en una comunidad pequeña, colocado allí con la obligación y la tarea de desarrollar la educación básica para estos niños.

Yo tuve la oportunidad de conocer excelentísimos jóvenes, quizá mucho mejores que muchos maestros titulados, pero también tuve la ocasión de ver que los más pobres entre los pobres, a su vez tienen los peores recursos humanos y los peores recursos físicos. Por ejemplo, pude visitar una clase escolar con instructor comunitario, que ellos llaman, para niños de trabajadores agrícolas migrantes en una gran plantación moderna de tomates, donde se desplazan miles de familia en la época de las cosechas. Y allí, en esos grandes galpones donde viven asinadas estas familias, allí estaba un instructor comunitario, en una pequeña habitación con una lámpara de luz muy pobre, con 7 niños allí cansados, habían trabajado y colaborado con su familia durante el día en la cosecha de tomate y este joven instructor comunitario apenas podía él leer, deletrear un texto. O sea, alguien me puede decir: “Bueno, es mejor que nada, este instructor comunitario que está ahí es mejor que no tener ninguna oportunidad educativa”, pero la desgracia está en que estas desigualdades, que caracterizan la sociedad, tienden a replicarse, reproducirse en la estructura de la oferta educativa. Entonces romper con este círculo vicioso de las desigualdades va a requerir algo más que política educativa. Quiero hacer esta salvedad: si no hay un mínimo de equidad social no habrá igualdad de oportunidades educativas.

Dicho esto, ¿qué es lo que se puede hacer desde la educación?, o ¿cuáles serían los criterios estructuradores de una política educativa que tenga como objetivo la equidad y la calidad? Unos amigos, esos a los que les gusta, se lanzaron a la política. Me pidieron allá en Argentina unas notas antes de la campaña electoral. Entonces me obligaron a dejar el punto de vista puramente analítico y pensar en criterio de intervención y describir las dos paginistas que les voy a comentar probablemente a ustedes.

En primer lugar: no habrá mejoramiento de la calidad de la educación si no se moviliza la sociedad, si no se despliega un tipo de política educativa mucho más amplia que la tradicional, que apunta a fortalecer la demanda, a movilizar la demanda. Si la población, si las familias no toman conciencia, no demandan calidad de educación no va a haber mejor calidad de la educación. Es preciso movilizar la sociedad en las poblaciones deben ser, dejar de ser simples receptores pasivos de servicios educativos. Es preciso movilizar la sociedad acerca de la calidad y de la

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Políticas públicas e educação

magnitud del problema educativo. Si las familias no perciben su propia situación como insatisfactoria y se conforman con que el niño solamente entre en la escuela, encuentre un banco y pase de grado, no va a haber calidad de la educación. Porque los niños que son de los sectores populares de Buenos Aires y de las grandes ciudades entran en la escuela primaria, pasan de grado, están 7 años en la escuela y no aprenden a leer y escribir. Y no aprenden las operaciones matemáticas básicas. Están en la escuela, adquieren certificados pero no desarrollan conocimiento. Si no hay la demanda de la familia, si no movilizamos a la familia para que la gente exija conocimiento, no simplemente un lugar en la escuela y un diploma, no va a haber calidad en la educación.

Segundo: promover un pacto educativo nacional para la formulación de políticas de estado. Después de movilizar la sociedad, hay que promover un pacto educativo nacional con los grandes actores políticos y sociales. Partidos políticos, sindicatos, iglesia, todos los grupos sociales organizados que de alguna manera tienen interés, en el sentido amplio de la palabra, interés en las cuestiones de la educación básica. Este pacto debería tener por lo menos una agenda con los siguientes puntos: primero, aumentar la inversión y determinar su orientación, monitoreo y evaluación del impacto, redefiniendo las responsabilidades que les competen al estado nacional, a las autoridades de los estados e incluso a los municipios.

En Argentina no tenemos todavía ninguna ingerencia de los municipios en la educación. La educación básica es completamente estadual pero no está clara la división del trabajo entre gobierno nacional y los gobiernos estaduales en materia de responsabilidad de financiamiento, dirección, orientación, asistencia técnica en materia de educación. Porque este Estado no solamente es un estado más pobre, más débil, sino que es un Estado que ha cambiado, se ha descentralizado, por lo menos esta es la tendencia de todo el mundo. Los estados centrales están abandonando la educación básica a las unidades políticas menores. Hay ya propuestas de financiar directamente a las escuelas, a las instituciones, ir más allá todavía del municipio, directamente asignar los presupuestos los recursos a las instituciones. Ustedes saben que hay también grupos ultra-liberales que están demandando ir aun mucho más allá, financiar a las familias, ni siquiera financiar a las instituciones.

No sé si en Brasil se ha discutido el tema de vaucher, de bono educativo a las familias. Esto es un tema que hay que discutir, el tema de la inversión. Ustedes saben que hay un gran debate en toda la América latina, ahí está la gente más bien ubicada en el centro-derecha del esquema

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político que dice que el problema no es del monto, de cantidad de recursos. Dicen que el problema en América Latina es de eficiencia en el uso de los recursos. Y están los sectores del polo centro, izquierda progresista que dicen que el problema es un problema de cantidad de recursos. Yo creo que hay dos problemas al mismo tiempo: hay un problema de ineficiencia y hay un problema de cantidad. Según la Organizaciones de las Naciones Unidas para la Educación y la cultura, la Unesco, los estados deberían gastar el equivalente a 6 puntos del PIB en la educación básica. No hay ningún país de América Latina que gaste ni siquiera 5% de su PIB en educación básica. Tenemos entonces que gastar más y gastar mejor en la educación básica y eso tendría que ser motivo de una política que llamamos de Estado, no política de un Secretário de Educación, de un gobierno. No, política de estado que sea una intervención a lo largo de un período de tiempo, de un horizonte temporal que vaya más allá de la duración de un ministro o de la educación de un gobierno.

Negociar nuevas condiciones de trabajo que incluyan la creación de mecanismos de acreditación profesional de los docentes. Uno de los grandes temas del pacto tiene que ser la redefinición de la profesionalidad docente. No nos se olvidemos que el sistema educativo es la variable estratégica fundamental, el factor fundamental es el maestro. Este es un servicio personal, de persona a persona. Todos los demás recursos, el edificio, el programa, la biblioteca, los instrumentos didácticos, la computadora, todo eso no vale nada si no pasa por la mediación del maestro. El recurso humano y la profesionalidad docente para mí es el elemento estratégico fundamental. Es preciso redefinir una política para los docentes, todas las reformas educativas de América Latina hicieron cambio de estructura, cambio de contenido, descentralización, cambio de la objetividad del sistema educativo.

Ha llegado el momento de una política del recurso humano, la política docente de la profesionalidad docente que articule 3 cosas al mismo tiempo: salários, formación e ingresos. Hay que mejorar, elevar el nivel de remuneración de los maestros y de los profesores. Hay que mejorar su formación, elevar, volver más compleja su formación. Hay que incorporar más conocimiento, más este desarrollo científico-técnico de la ciencia y las disciplinas de las tecnologías de la comunicación y, al mismo tiempo también, hay que cambiar las condiciones de trabajo. Las tres cosas hay que hacerlas al mismo tiempo. En Argentina la experiencia indica que no se puede hacer una cosa aislada de la otra. Si yo solamente mejoro salario, no me mejora la calidad de la educación. Si yo pretendo volver, mejorar la

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Políticas públicas e educação

calidad de la formación docente y no modifico ni las condiciones de trabajo ni los salarios, esto es también una utopía. ¿Quién va querer investir más tiempo y esfuerzo en una profesión que no ofrece ninguna recompensa? Porque, como es en Argentina, se ofrece un salario equivalente a una empleada doméstica, una persona que trabaja en una casa haciendo limpieza. Este es el salario básico de un maestro en Argentina. Entonces el pacto educativo debe desarrollar, debe acordar una política para los docentes, profesionalidad docente entonces que discuta al mismo tiempo formación, condiciones de trabajo y salario, no en forma separada, en forma integral.

Tercero: no perderse en el bosque de los contenidos y focalizar los objetivos de aprendizaje en ciertos campos prioritarios. Se sabe que a la escuela se le pide todo: que enseñe lengua, matemática, civismo, geografía, física, química, a cepillarse los dientes, a cuidarse del SIDA, a caminar por el espacio público, a cruzar la calle, a conducir un coche ... Como decía también otro colega: “De tanto cargar la barca de la escuela vamos a terminar por hundirla”. Le pedimos mucho a la escuela, los maestros se sienten sobre-exigidos. Curiosamente, paradójicamente, al mismo tiempo que son sobre-exigidos, están siendo cada vez más sub-dotados, o sea, tienen cada vez menos recursos y cada vez les pedimos más cosas, y más complejas. Es una gran contradicción.

Tendremos que definir para una educación básica ciertos objetivos centrales, estructuradores, nunca contenidos y contenidos en que hay ecología, civismo y solidaridad, el curso de derecho del niño y la antropología etc. La cantidad de contenidos es impresionante. Hay que definir critérios, objetivos básicos, por ejemplo, que para mí son el lenguaje en el sentido amplio, el lenguaje natural, ese que hablamos acá, en el sentido más amplio de la palabra, capacidades expresivas y comunicativas; y el cálculo, la lógica del cálculo. Existe un lenguaje artificial que hemos creado los hombres que es la matemática, el lenguaje matemático. El lenguaje incluso debería incluir un lenguaje extranjero, también. No nos olvidemos que estamos viviendo cada vez más en un mundo interdependiente donde en esta América Latina ya los hijos de los sectores privilegiados son bilingues, mientras que el resto de la población solamente apenas habla y a veces ni siquiera lee y escribe su propio idioma natural. Lengua, cálculo, conocimiento acerca de su propio cuerpo, de la relación con el medio ambiente, con la naturaleza que nos rodea y conocimiento acerca de la relación entre los hombres, porque vivimos en la naturaleza con los pies sobre la tierra.

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Tendremos que conocer, por lo menos para poder preservar. Todo ciudadano debería conocer ciertos princípios, no biología, química, física, sino conocimiento acerca de la lógica del funcionamiento del mundo natural que nos rodea, al que tenemos que proteger y conservar. Sino también conocimiento acerca de cual es la lógica del funcionamiento de la vida social y no economía, sociología, historia, geografía, antropología. No disciplinas, conocimiento interdiciplinario acerca de la sociedad en la que vivimos. Seguro que allí estaría expresado nuestro propio cuerpo, la relación de la naturaleza, la relación con las demás: la lengua y el cálculo, grandes principios estructuradores del currículo para no perdernos en el bosque de los contenidos, en la foresta de los contenidos.

Por último, construir una institución educativa más fuerte y democrática. Hay que fortalecer la institución. Si bien el maestro es una variable estratégica fundamental. El maestro no trabaja en el vacío. La escuela es una organización, es una institución. Hay que fortalecer la institución escolar. Hay que expandir esas siglas de felicidad, hay escuelas muy buenas. No hay ningún secreto en responder la pregunta de qué es una buena escuela. Todos nosotros sabemos y los padres, también, muchos saben lo que es una buena escuela y tenemos buenas escuelas en nuestros países, en América Latina. El problema fundamental es como hacer para difundir esas buenas escuelas, para que las buenas escuelas no sean una excepción, sean la norma, la generalidad.

Una escuela más fuerte y democrática es una escuela con recursos, con recursos tecnológicos, no solamente recursos humanos donde también la dotación física de recursos tecnológicos acompaña la formación de los agentes. No es cuestión de repartir computadoras. Es más facil distribuir computadoras a las escuelas, es más facil construir edificios, infraestructuras físicas. Si tengo dinero lo puedo hacer en un año. Más dificil es desarrollar las competencias en las personas que van a usar las computadoras. Eso lleva mucho más tiempo, como decía esta mañana. 3 Y además ni siquiera sabemos bién como se hace. O sea, es enriquecer la institución, es enriquecer también la calidad de las relaciones que se dan entre los que son miembros de la institución. Es también enriquecer la calidad de las relaciones que se dan entre profesores, entre profesores y alumnos. En Argentina, por lo menos, se dice ya: “Cada maestro es dueño

3 Ver o texto da conferência, às páginas 59-78 [nota dos organizadores].

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Políticas públicas e educação

de su aula”. Hay poca tradicción de trabajo en equipo entre el profesor de Matemática, el profesor de Lengua, el de Geografía y el de Historia. La relación es biunívoca, cada profesor con sus alumnos, poca relación entre profesores.

Los secretarios de educación son [o aparentan ser] muy generosos en conceder autonomía y decirles a los directores de escuela: “hagan ustedes, tienen libertad para hacerlo. Por esto sucede lo mismo de como sucede con las personas. O sea, esas libertades son las que los filosofos llamaban libertades negativas; es decir, libertad como ausencia de obstáculos externos. Son puras formas si no existen recursos. ¿De qué vale que yo tenga la libertad de moverme por el territorio si no tengo ni un peso para trasladarme y ni siquiera para tomar el autobus? O sea, la libertad positiva requiere recursos, la autonomía también. La autonomía de las instituciones es libertad para crear, permiso para hacer las cosas, sin tener que estar pidiéndole la autorización al supervisor o al secretario, pero también son recursos. Tienen que estar equipadas las escuelas para que la autonomía sea algo más que una palabra.

Fortalecimiento de las instituciones, definición de prioridades en materia de objetivos y contenidos, promoción de un pacto educativo nacional para una política de estado y mobilización de la sociedad. Me parece que son cuatro principios, cuatro solamente principios estratégicos estructuradores de una política que tenga como objetivo explícito el desarrollo de una oferta educativa, igualitaria y, al mismo tiempo, de calidad para el conjunto de las nuevas generaciones de los niños, en Argentina. Pero bueno, entre el dicho y el hecho hay mucho trecho. Yo creo que esto simplemente eso: es un pequeño atisvo de un programa para discutir. Vamos a tener la oportunidad hoy para poder conversar.

Muchas gracias.

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Política da educação superior1

Maria do Carmo de Lacerda Peixoto

RESUMO: A integração da economia mundial, a desregulamentação dos mercados internos e a privatização de empresas e serviços públicos impuseram ao Estado tarefas de estímulo à acumulação, à ordem e controle social. Ele passa a intervir no Ensino superior, mediante diminuição de recursos, mudança de gestão, expansão de matrículas, não reposição de vagas de docentes e funcionários. Ranqueia IFES pela avaliação nacional e controle do credenciamento. Responde à demanda social, sobretudo de interesse mercadológico, reproduzindo mão-de-obra polivalente, flexível e competitiva nos locais mais urbanizados. Conclui-se que, através do Ensino Superior, se acentuará o programa neoliberal de atendimento ao cliente, subordinado ao mercado.

Palavras-chave: Estado e políticas públicas, Gestão do Ensino Superior, Autonomia e privatização, Demandas sociais e de Mercado.

RESUMEN: La integracíón de la economía mundial, la desregulamentación de los mercados internos y la privatización de las empresas y servicios públicos impusieron al Estado tareas de estímulo a la acumulación, al orden y control social. Pasar a intervenir en la enseñanza superior, a través de la disminución de recursos, el cambio de gestión, la expansión de matrículas, la no reposición de plazas de docentes y funcionarios. Ranquear las Instituciones Federales de Enseñanza Superior (IFES) mediante la evaluación nacional y el control del credenciamento. Atender a la demanda social, sobre todo de interés mercadológico, reproduciendo mano de obra polivalente, flexible y competitiva en los lugares más urbanizados. Se concluye que, a través de la Enseñanza Superior, se acentuará el programa neoliberal de atención al cliente, subordinado al mercado.

Palabras-clave: Estado y políticas públicas, Gestión de la enseñanza superior, autonomía y privatización, Demandas sociales y de Mercado.

1 Palestra proferida em 22 de novembro, na Mesa redonda Políticas públicas e educação, no Seminário Educação 2000, promovido pelo Instituto de Educação e o Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade Federal de Mato Grosso.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 11 n. 19 jan.-jun. 2002 p. 185-193.

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Políticas públicas e educação

Ao longo dos anos oitenta, em conseqüência da crise do Estado-providência, a agenda política de grande parte dos países passou a ser composta por um conjunto diversificado de estratégias políticas e econômicas, com vista à redefinição dos direitos sociais, revalorização do mercado, reformulação das relações do Estado com o setor privado, adoção de novos modelos de gestão pública preocupados com a eficácia e a eficiência. Essas alterações de direção se deram num contexto de acelerada globalização econômica, associado ao fato de que as mudanças produzidas no papel do Estado têm alterado também as prioridades quanto ao que se espera seja a contribuição da educação.

Se, na vigência do Estado-providência, a educação cumpria um papel de legitimação do Estado, na fase atual ela atua prioritariamente direcionada para apoiar o processo de acumulação. Esse apoio caracteriza-se por uma forte intervenção do Estado na promoção da pesquisa e da inovação para atender às necessidades da produção, pela adoção de lógicas e mecanismos de mercado na educação e pela sua contribuição para a reprodução de mão de obra especializada. Como segunda prioridade, ela atua voltada para garantir a ordem e o controle social e, por último, como instância de legitimação do sistema.

Com algum atraso em relação a países como Chile, Argentina, Inglaterra, México, o Brasil ingressa, na última década do século XX, no rol dos países que promovem ajustes estruturais e fiscais e reformas orientadas para o mercado, em acordo com ou sob as recomendações de organismos como o FMI, o Banco Mundial e o BID. É nesse contexto que uma verdadeira reforma da educação superior está em andamento no Brasil, implementada sob o comando do MEC e em perfeita sintonia com as orientações estabelecidas pelo Plano Diretor da Reforma do Estado, formulado pelo antigo Ministério da Administração e Reforma do Estado.

Essas políticas estão vinculadas às propostas de ajuste neoliberal, estabelecidas no final dos anos 80, nos termos do Consenso de Washington e conforme propõe o Banco Mundial. Os eixos do Consenso são a redução dos gastos públicos, a integração com a economia mundial, a desregulamentação dos mercados domésticos e a privatização das empresas e serviços públicos.2 O Banco Mundial, por sua vez, tem como eixos de política para a educação superior a maior diferenciação das

2 Maria Clara C. Soares - Banco Mundial: políticas e reformas, in: Mirian Warde e Sérgio Haddad (orgs) – O Banco Mundial e as políticas educacionais, São Paulo, Cortez, 1998.

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instituições, incluindo o desenvolvimento de instituições privadas, a diversificação de fontes de financiamento, e a redefinição da função do Estado.

Uma característica importante do cenário internacional do ensino superior, nos últimos vinte e cinco anos, é a expansão quantitativa da matrícula. Suas origens estão situadas no crescimento demográfico; na melhoria do desempenho ocorrida nos níveis anteriores de ensino; e no crescimento econômico ocorrido em muitos países e regiões. Na América Latina, a taxa de escolarização nesse nível de ensino sextuplicou, passando de um milhão e seiscentos mil alunos para 7 milhões entre os anos de 1970 e 1988, tendo o sistema de ensino superior brasileiro, por sua vez, acompanhado fortemente esta tendência de expansão, expandindo-se as matrículas de 425 500 em 1970 para mais de um milhão e meio na década de 90.

O sistema de ensino público, por sua vez, embora tenha multiplicado por dez a capacidade de atendimento, não chegou a atingir 700 mil matrículas na metade da década (dados do MEC/SEDIAE/SEEC). A demanda excedente assim gerada configurou-se, já desde os anos 70, como um mercado propício para a expansão da iniciativa privada, que em 1994, detinha cerca de 60% do total das matrículas. Outra característica do ensino superior brasileiro a ser salientada, consiste na excessiva concentração da oferta de vagas nas regiões sul e sudeste, em contraposição a uma significativa presença do setor público nas regiões norte, nordeste e centro-oeste.

Considerando-se as taxas de crescimento da população, verifica-se que esse sistema de ensino ainda precisa se expandir muito, pois o percentual de jovens na faixa de 20 a 24 anos aí matriculados ainda está em torno dos 12%. Isso coloca o país em situação desvantajosa em comparação com outros da América Latina como Bolívia, Chile, Argentina, Venezuela, Peru e Uruguai, que atendem de 20 a 40% da demanda de sua população por ensino superior.

No primeiro mandato do governo de Fernando Henrique Cardoso o MEC produziu o seguinte o diagnóstico: a) uso dos recursos públicos federais ineficiente nesse nível de ensino; b) o modelo único de organização do ensino superior, baseado na indissociabilidade ensino, pesquisa e extensão está esgotado; c) tamanho do sistema modesto para as dimensões e necessidades do país; d) processo de credenciamento de novas instituições inadequado, gerando um sistema sem competição e de baixa qualidade; e) ensino de graduação com dois desafios a enfrentar: sua

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modernização e a estruturação de um sistema abrangente de avaliação. Diante disso, o governo decidiu definir e estimular uma linha de atuação enfatizando a expansão e a diversificação institucional, a integração de diferentes procedimentos de avaliação, credenciamento e recredenciamento, visando a produzir um sistema baseado na flexibilidade, competitividade e avaliação.

As políticas para a educação superior que vêm sendo implementadas em decorrência desse diagnóstico, têm como um dos pontos de partida a proposta do MARE, de transformar as universidades federais em organizações sociais regidas por um contrato de gestão. Essa forma de organização do espaço público em quase-mercados,3 seria responsável por promover a eficiência e a competitividade requeridas pelo sistema, procurando fazer com que ele atenda “naturalmente” às necessidades e demandas dos seus diferentes clientes, ampliando as possibilidades de escolhas dos usuários, gerando, enfim, maior eficiência produtiva.

Nesse processo, vem sendo posto em discussão o conceito de universidade e, principalmente, a natureza e a relevância social das universidades públicas, as federais em particular. O governo vem também advogando e empreendendo ações destinadas a tornar o ensino superior brasileiro cada vez mais variado, flexível e competitivo, segundo a dinâmica do mercado, mas controlado e avaliado pelo Estado.

Desse ponto de vista, as universidades federais são consideradas como serviços não exclusivos do Estado, isto é, aqueles que embora não envolvendo o poder de Estado, ele executa e/ou subsidia, porque não podem ser adequadamente recompensados no mercado por meio da cobrança de serviços. Nesse entendimento, as universidades seriam controladas de forma mista pelo mercado e pelo Estado, mediante a cobrança e a aferição dos serviços prestados.

Essa autonomia financeira que vem sendo proposta leva as universidades a assumirem um perfil organizacional mais próximo de

3 Quase-mercados: são mercados porque substituem o monopólio dos fornecedores do Estado por diversos fornecedores independentes e competitivos. São quase, porque são distintos dos convencionais: competem por clientes mas não visam necessariamente a maximização dos lucros; em alguns casos os consumidores delegam sua representação no mercado a certos agentes; o poder de compra dos consumidores não se expressa necessariamente em termos monetários. (maior controle dos Estados sobre as escolas e promoção de mecanismos como a publicização dos resultados escolares, abrindo espaço para a realização de pressões competitivas no sistema educativo.

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empresas prestadoras de serviços, subordinando-se de maneira crescente ao setor produtivo. A intenção é de que o acirramento da concorrência interinstitucional as leve a um constante processo de ajuste, em termos da racionalização das formas de gestão e da prestação de serviços adequados ao contexto local e regional, assumindo, gradativamente, uma racionalidade operacional, produtivista e competitiva, à semelhança da empresa capitalista.

Outro aspecto da reforma da educação superior consiste na diversificação de fontes de financiamento, caracterizada pela implementação da privatização ou da mercadorização da educação pública estatal, em termos de mercantilização do conhecimento. Alguns exemplos internacionais são bem ilustrativos das conseqüências dessa diversificação. Na Inglaterra, houve o contingenciamento de parte da verba destinada às universidades, condicionando-se sua liberação à contrapartida de recursos obtidos junto à iniciativa privada, via contratos de pesquisa e consultoria. As universidades tiveram que se defrontar cada vez mais com fundos especiais para ensino e pesquisa em bases competitivas, segundo critérios mercadológicos de distribuição.4 No caso do Chile, houve drástica redução do aporte fiscal para a educação superior nas décadas entre 1970 e 1990, acompanhada pela necessidade da Universidade do Chile auto-financiar mais de 2/3 do seu orçamento.5

No caso brasileiro, a proposta de diversificação das fontes de financiamento tem levado a uma crescente limitação de recursos para a manutenção e o desenvolvimento das universidades federais, resultando em alterações na configuração das suas identidades institucionais e nos seus respectivos projetos de desenvolvimento. Estudo recente produzido pelo IPEA6 mostra que as universidades federais perderam 10% do seu orçamento entre 1995 e 1998 e que seus investimentos caíram 70%, em termos reais, no mesmo período.

Com base nos índices de alunos matriculados e formados na graduação e pós-graduação, e no número de trabalhos publicados no país e

4 Gareth Williams, The market routes to mass higher education: british experience 1979-1996, Higher Education Policy, 10(3/4), 1997.5 Jayme Lavados Montes, Discurso inaugural de la Conferencia Internacional de Rectores de Universidades Estatales, Santiago do Chile, 17 de abril de 1996.6 “Universidades melhoram apesar da falta de verbas”, Valor Econômico, São Paulo, 21 de setembro de 2000.

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no exterior por seus docentes verificou, contudo, que o desempenho dessas universidades está melhorando, a despeito do corte de recursos. O que se verifica, portanto, nesse contexto de restrições orçamentárias, é que as universidades vêm sendo forçadas, cada vez mais, a obter recursos fora do Estado para sua manutenção e expansão institucional; a aumentar a produtividade tanto institucional quanto de seus docentes; a afinar seus cursos e carreiras profissionais segundo as demandas específicas e as necessidades do mercado de trabalho; a criar tecnologias mais produtivas e competitivas para as empresas; a contribuir para a resolução de problemas sociais e o desenvolvimento local e regional.

Desde o início do primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, o MEC vem tomando algumas medidas paralelas para o processo de remodelagem institucional, dentre elas, forçar o aumento de vagas nas universidades federais, sem a liberação da reposição de vagas docentes e de funcionários. Outra medida foi a adoção, em meados de 99, de novas matrizes de financiamento, conforme o desempenho das IFES nos serviços prestados à sociedade, especialmente no ensino. O impacto dessa remodelação já pode ser observado no cotidiano das instituições federais, por meio de mudanças que se processam principalmente nos seus padrões de gestão e financiamento, no trabalho acadêmico e nos mecanismos de avaliação, configurando um novo modo de pensar esse trabalho e a universidade, distanciado dos seus parâmetros históricos de trabalho.

No final do primeiro mandato FHC, o governo buscou definir e passou a estimular a expansão e diversificação do sistema, bem como a integração dos diferentes procedimentos de avaliação, credenciamento e recredenciamento, objetivando produzir um sistema baseado na flexibilidade, competitividade e avaliação. Ao lado do crescente domínio das instituições particulares no ensino superior, o governo tem buscado fazer com que a expansão desse ensino ocorra por meio de vários tipos de formatos institucionais, sem se restringir apenas à universidade.

Introduziu, assim, pelo decreto 2306/97, a figura dos centros universitários, destinados a atuarem exclusivamente no ensino, mas com autonomia para criar cursos e expandir suas vagas, arranjo esse considerado fundamental para ampliar o crescimento da oferta de vagas com qualidade, mas fora da universidade. O censo do ensino superior de 1998 evidencia já a criação de um grande número de centros universitários.

Além da distinção entre universidades de pesquisa x universidades de ensino, o decreto 2306/97 consagra a ampla diferenciação institucional que sempre esteve presente no nosso sistema de ensino, estabelecendo

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que apenas as universidades são obrigadas a associarem ensino, pesquisa e extensão. Deve ser ressaltado também que, além da diferenciação externa - por dependência administrativa, entre instituições privadas empresariais e comunitárias - um importante esforço oficial tem sido feito para produzir a diferenciação interna nas instituições de ensino superior, estimulando as universidades para que tenham plano de carreira próprio, bem como a diferenciação interna da categoria docente, por meio da gratificação de estímulo à docência.

O governo tem também atuado por meio de outros mecanismos importantes. O incentivo à flexibilização curricular, que valoriza o desenvolvimento de projetos pedagógicos mais específicos, e a regulamentação dos cursos seqüenciais, destinam-se a atender interesses regionais, combater a evasão, aumentar a participação dos setores que integram a formação, ampliar o espaço do aluno na definição de seu currículo e atender às demandas do mercado de trabalho.

As soluções e diretrizes que os detentores do poder econômico-político, nas esferas global e nacional, têm arquitetado para superar as crises do Estado de bem-estar e do Estado desenvolvimentista, como já foi dito, comprometeram a educação superior com a nova hegemonia do mercado e com as reformas minimalistas do aparelho do Estado, tanto nos países do centro como nos da periferia. Nesse contexto, temos uma nova forma de atuação do Estado, caracterizada como a emergência do Estado-avaliador, que vem adotando um ethos competitivo, através da importação para o domínio público de modelos de gestão privada, com ênfase nos resultados dos sistemas educativos e estimulando escolhas educacionais. A avaliação aparece, assim, como um pré-requisito para tornar possível a implementação de mecanismos de controle e responsabilização, no âmbito de uma cultura gerencialista no setor público.

Aspecto que ganhou grande destaque no contexto dessa reforma, a avaliação, como forma de controle e de definição de políticas que estimulem a expansão competitiva no ensino superior, corrobora a idéia de um sistema educacional competitivo. Para tanto, ela vem sendo formulada com base em critérios meritocráticos, norteados pela busca da eficiência e instituindo um sistema de incentivos e punições destinado a promover o desempenho e a produtividade.

Nesse campo, o MEC vem acumulando um grande volume de informações sobre cada IES, principalmente sobre as públicas federais, visando a implantar um sistema unificado de informações educacionais. Além do Exame Nacional de Cursos e das Condições de oferta, o governo

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tem produzido censos anuais com indicadores quantitativos globais, que fornecem estatísticas da evolução do sistema e sobre a situação particularizada de cada IES. Acrescentem-se a isso, os sistemas de acompanhamento e controle de pessoal e de aplicação dos recursos orçamentários, além das informações da GED montadas para as universidades federais.

Esse sistema está articulado à política de expansão do ensino superior, e voltado para a garantia de qualidade dos cursos e das instituições, destinado a estabelecer padrões de aferição e comparação que incentivem a competição no sistema, especialmente a financeira e que permita o atingimento das metas de desempenho estabelecidas pelo próprio governo. Esse processo tem se estruturado com base na publicação de rankings das IES, seguido ou por ameaças de fechamento de cursos ou de recredenciamento automático para os com conceitos A e B nos 3 últimos provões. Considerando-se o processo de expansão e diversificação desse sistema, cabe perguntar: como poderão vir a ser nele estabelecidos padrões efetivos de qualidade?

Esse sistema de avaliação deverá ganhar ainda maior solidez, tendo em vista a estruturação da Agência Nacional de Avaliação, cujo projeto de lei de criação encontra-se no Congresso. Contando com recursos orçamentários próprios, ela será responsável pelos censos educacionais, as pesquisas sobre os salários dos professores, e todo o sistema de avaliação, inclusive da pós-graduação, supervisionando, ainda, os cursos de graduação por meio das comissões de especialistas.

O MEC tem atuado também na implementação do ideário da chamada flexibilização curricular, conforme propôs a LDB, ao estabelecer as diretrizes curriculares para o ensino superior. Essa proposta está sintonizada com a intensificação das discussões internacionais e nacionais sobre diplomas e perfis profissionais face às mudanças da sociedade e do mundo do trabalho, visando ajustar o perfil profissional e o modelo de formação exigidos pelo “novo” paradigma de produção capitalista, expressos em dois aspectos principais: a polivalência e a flexibilidade. Compreende a identificação de habilidades cognitivas e de competências sociais requeridas no exercício das diferentes profissões e em distintos ramos de atividade, levando ao repensar do perfil profissional e dos programas de formação/qualificação/requalificação de diferentes instituições formadoras. Essa ação está conduzindo a um reformismo curricular que vem ganhando espaço em quase todas as instâncias de formação profissional.

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Como conclusão do que foi dito até aqui, é possível observar que as políticas implementadas estão acentuando quatro pressupostos fundamentais do neoliberalismo: a) o favorecimento da concorrência e do atendimento às diferentes demandas e clientelas; b) a acentuação da “naturalização” das diferenças individuais, instituindo paulatinamente um sistema meritocrático onde cada um terá o ensino superior que “possa” ter; c) a ampliação da subordinação do ensino superior ao mercado, particularmente no tocante à formação e à privatização das atividades e serviços; d) a maior explicitação da forma de funcionar do sistema do que de suas finalidades sociais.

O resultado desse processo pode ser um ensino superior ainda mais heterogêneo e desigual, se contraposto ao modelo unificado e equilibrado que se perseguia por meio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão e que pretendia constituir um sistema nacional com maior grau de integração, homogeneidade, convergência, afinado, inclusive, com o desenvolvimento econômico e social do país. É preciso buscar garantir que as instituições de ensino superior mantidas com recursos públicos, possam contribuir para o desenvolvimento do país, reduzindo as desigualdades regionais e tornando as realidades nacionais mais homogêneas e equilibradas. No caso das instituições federais de ensino superior, isso implica buscar assegurar financiamento público, autonomia, avaliação interna e externa, manutenção do sistema federal e gestão democrática.

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Políticas públicas e educação

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Apresentação

Este é o depoimento do primeiro reitor da Universidade Federal de Mato Grosso, Gabriel Novis Neves, apresentado no Painel temático “Trinta anos de UFMT”, no âmbito do Seminário Educação 2000. Para além da possibilidade de conhecermos extratos da história de uma das instituições mato-grossenses mais valiosas para a educação, a ciência e a cultura, trata-se de um depoimento que nos oferece a oportunidade de uma reflexão mais que oportuna. Estamos em tempos de crise, revisões de rota e grande turbulência das instituições públicas. Por essa razão, nós – os que postulamos uma instituição democrática e livre, modelada por seus objetivos sociais – somos levados a pensar que a batalha esteja perdida, que fomos derrotados. Mas é este momento de crise o mais fértil para nos desafiar: sem paixão e utopia, como nos conta Gabriel Novis Neves, não se concretizam os sonhos.

Artemis Torres

Trinta anos de UFMT: memória

Gabriel Novis Neves

Em nosso dia-a-dia burocrático recebemos muitos ofícios, mas aquele da Professora Artemis que acabara de chegar às minhas mãos era diferente. Vinha com uma forte mensagem daquele coração não anatômico. Vinha com a linguagem das Emoções. Aceitei este convite-homenagem e utilizei a palavra, e não a máquina, para o agradecimento.

A minha relação com a UFMT foi inicialmente de Paixão. Paixão violenta. Obsessiva. Paixão de espera. Da ansiedade. Dos resultados. Paixão que me levou à UTI, em Brasília, com alterações da minha fisiologia cardíaca. Hoje, 30 anos passados, ficou o Amor pela UFMT.

Estou aqui para contar um pouquinho do que vi nestes anos de Universidade. A nossa Universidade surgiu ainda no século das certezas e das utopias. Certeza de que um curso superior era a chave da realização do

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 11 n. 19 jan.-jun. 2002 p. 195-199.

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Homem e do seu Sucesso. Era a época da Valorização do Diploma. Vivíamos as grandes utopias do Socialismo e do Capitalismo. Os muros foram derrubados e o Capitalismo convertido em Selvageria.

Este encontro, ao abrir uma janela para o passado, está na verdade buscando vislumbrar o futuro da Instituição. Quando da implantação da Universidade, tínhamos a certeza de que teríamos que quebrar paradigmas. Que, para ser permanente, a Instituição deveria nascer sob o signo da mudança. E mudança não é moeda usual no mundo acadêmico, que é muito conservador. Sempre se propõem mudanças, desde que passem distante da instituição. A partir daquele momento, grandes interesses seriam contrariados. O ecossistema do poder estava comprometido com a implantação da UFMT. O Velho Estado Curral, oligárquico, injusto socialmente, tinha os seus dias contados... A idéia de um novo modelo de universidade tinha adeptos. O difícil foi congregar, aliciar pessoas para a empreitada.

Foi lançada no Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras, em agosto de 1972, em Brasília, a proposta da Universidade da Selva, modelo moderno de compatibilização do desenvolvimento econômico com o meio ambiente, as etnias, as desigualdades. Para viabilizar esta proposta surgiu o Projeto Aripuanã. Tínhamos então a Universidade do MEC – que atendia à burocracia oficial; a Universidade da Selva, sensibilizando e conseguindo o apoio da comunidade científica nacional e internacional; e o Projeto Aripuanã, proposta interministerial do Desenvolvimento Científico-Tecnológico-Econômico e Social da Região Amazônica, captando recursos.

Neste momento, sei que vou decepcionar alguns colegas. Até hoje, ouço que, no tempo do Gabriel, as coisas eram fáceis, havia muito dinheiro, ele tinha muita influência política e prestígio com o sistema.

A nossa Universidade nasceu no dia 10 de Dezembro de 1970. Todos sabem que, nessa data, o orçamento para o ano seguinte já está fechado. Passamos o ano de 1971 numa situação ímpar: éramos uma Universidade Federal com alunos, professores e funcionários administrativos – mas sem recursos. Conseguimos uma “ajuda” do Dr. Fragelli – governador do Estado – para pagar pessoal e os serviços básicos. Em 1971, o reitor Não Recebeu Salário! E o gabinete da Reitoria era o depósito de Material de Limpeza, ao lado da cantina do bloco do CCS. De luxo só havia um pequeno aparelho de ar refrigerado para amenizar o calor!

Na 1ª semana na Reitoria fui chamado a Brasília, como relapso, pois vencera o prazo para a entrega do orçamento Plurianual (72/73/74). Foi um momento iluminado, pois do NADA criamos um SONHO de Proposta.

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Que foi aprovada. Para conseguir recursos internacionais colocamos a nossa universidade, em 1972, no Programa MEC-BID – o ministro que trabalhou esse projeto foi Jarbas Passarinho. As Universidades Brasileiras foram agrupadas em três blocos. A nossa ficou no Grupo III, daí MEC-BID III. Apesar de jovem, a UFMT já nascia com todas as unidades funcionando, com espaço físico e outros recursos, em condições de suportar a espera para liberação dos recursos de 20 milhões de dólares. Eles só chegaram na década de 80.

No que se refere a prestígio político do reitor, pela primeira vez em público quero afirmar que possuo um troféu único: a minha cassação. Perdi o mandato de reitor durante minha segunda gestão. Fui escolhido reitor por quatro vezes. Pro tempore pelo Ministério da Educação; duas vezes eleito por unanimidade pelo Conselho Diretor; uma vez eleito por unanimidade pelo Colégio Eleitoral e, em lista sêxtupla, indicado pelo presidente da República. Desisti da eleição seguinte. Senti que era tempo para abrir novas oportunidades.

As Universidades e os reitores foram avaliados e só cinco delas obtiveram nota máxima. A nossa foi uma... A implantação da Universidade se deu na época do PROIBIDO, mas, se muita gente ficou assustada, esse medo não chegou aqui pelo Coxipó. Aqui na Universidade era permitido sonhar, criar, trabalhar, construir. Tínhamos pavor da mediocridade e um compromisso com a sociedade: tirar do papel e transformar em realidade o maior projeto do Estado: a UFMT.

Meus queridos colegas:

Trabalhamos com 3 objetivos para construir a UFMT: primeiro, com a Formação de gente. Como preparar engenheiros, médicos, agrônomos, assistentes sociais, educadores para trabalhar em uma região desconhecida? Copiar currículos de universidades famosas seria o caminho mais fácil, porém isso conduziria à alienação dos nossos jovens.

Ninguém ensina o que não sabe, falava o cacique Ceremecê. Primeiro paradigma a ser quebrado: inverter o tradicional binômio ensino-pesquisa para pesquisa-ensino. Tínhamos que pesquisar a região, colher informações mesmo empíricas, trazer estes dados para o campo universitário e transformá-los em currículos acadêmicos.

Com este propósito, tivemos que construir uma cidade-laboratório em plena selva, a 800 km de Cuiabá em linha reta, no município de Aripuanã. Foi um grande momento da nossa universidade. Uma equipe multidisciplinar executa o projeto de interesse dos ministérios da Educação,

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Interior, Planejamento, Governo de Mato Grosso. Inserimos no Currículo da nossa UFMT a construção de uma pista de pouso para aviões da FAB. Fomos atrás do conhecimento que começa e termina com a experiência. E a experiência estava na selva.

A UFMT desmistificou o Diploma como valorização da Competência. Pagamos um preço por esse Pioneirismo. Quando do reconhecimento do Curso de Letras, o Conselho Federal de Educação tentou ridicularizar a UFMT e execrar o reitor pelo crime de contar, no seu corpo docente, com um mestre que honraria qualquer universidade do Primeiro Mundo – o sábio Cesário Neto não possuía Certificado de Conclusão de Curso Superior. Shakespeare, Carlos Drumond de Andrade, Eliazar de Carvalho também jamais teriam o seu currículo aprovado pelo CFE. Sempre achamos que o melhor currículo é o exemplo do educador competente. A Universidade não é um Centro de Informação e nem Fábrica de Empregos. As obras físicas servem para alojar os Cérebros, os Educadores.

Em 1975, quando não existia uma Política de Capacitação Docente em nível de Pós-Graduação Stricto-Sensu, no Brasil, fomos convidados e aceitamos participar de uma experiência piloto que deu lugar ao Plano Institucional de Capacitação Docente. Quase fechamos a nossa jovem universidade para dar oportunidade aos nossos professores de se qualificarem, pois tínhamos bolsas ilimitadas e pessoalmente levamos, a partir de 1975, centenas de professores para Pós-Graduação Stricto-Sensu ,nos centros de Excelência existentes no Brasil. No retorno deles, foi possível criar aqui a nossa própria pós-graduação, com o reforço de profissionais de fora que para cá vieram nos ajudar.

O Segundo Objetivo do nosso Projeto foi tornar a Universidade uma Casa de Cultura. Decidimos partir do regional para o universal. Surge o Museu Rondon, de rara beleza plástica, estrategicamente localizado junto à piscina, ao lado da Oca e da Casa da Flauta, construída pelos próprios índios. O Museu Rondon não tinha compromisso com os Regimentos dos Museus Mortos. O Museu Rondon era vivo, dinâmico. Era a estratégia que a Uniselva utilizava para chamar a atenção para o problema do Índio. Dali surgiu o gravador do cacique Mário Juruna. A seguir vieram o Museu de Arte e Cultura Popular, o Núcleo de Documentação Histórica, o Zoológico, o Coral, a Orquestra Sinfônica, a Editora, a Biblioteca, o Ateliê Livre, o Cine Clube, a Escola de Samba.

O Terceiro Objetivo é que nossa Universidade fosse também um centro provocador do desenvolvimento da Região. Há 30 anos, entendíamos que não era possível se construir uma Universidade elitista,

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privilégio de alguns, isolada do dia-a-dia do povo. A Universidade teria que estar comprometida com o desenvolvimento econômico e social, com a melhoria da qualidade de vida da população. Com esta ação, as grandes decisões deste Estado passavam pela Universidade. A maior delas foi a própria Divisão do Estado. O presidente da República veio aqui e, numa sala de aula do Bloco de Tecnologia, por três horas tomou conhecimento das propostas de nossa universidade: problemas de meio ambiente, indígenas, empresários, ocupação da Região, revisão de textos escolares com relação ao planejamento.

No plano Político, antes da Anistia a UFMT já readmitia professores cassados.Era o abrigo dos excluídos – religiosos, negros, índios, pobres. Este foi o SONHO. Mas o ideal não é o Verdadeiro. Perdemos essa batalha. As conseqüências estão aí no nosso cotidiano: violência, desemprego, miséria, comprometimento do meio ambiente, falta de uma política agrária, sucateamento da Universidade.

A Universidade da Selva não existe mais. Se foi um bom modelo para a época, se as pessoas que participaram daquele trabalho sentem saudades, ótimo! Vamos lutar para construir uma Universidade melhor que a Uniselva!

Ser o primeiro Reitor foi um privilégio. Assim como Tomé de Souza, diante das dificuldades encontradas, não pude responsabilizar meu antecessor.

Muito obrigado.

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Informes da pesquisa e da pós-graduação

Apresentação

O segundo semestre de 2001 foi marcado pela divulgação dos resultados da avaliação dos Programas pela Capes. Avaliado com nota 4 (quatro), o Programa vê nesta nota o reconhecimento de todo um esforço empreendido para que ele pudesse novamente ser uma referência para a pesquisa em educação, na região Centro-Oeste. A qualidade das nossas dissertações, sem dúvida, contribuiu para este resultado.

A longa greve das IES federais, que ocorreu no segundo semestre de 2001, teve um impacto muito grande em seus Programas de Pós Graduação. Este impacto refletindo-se intensamente na produção das dissertações. No PPGE/IE/UFMT não foi diferente Neste semestre foram defendidas apenas seis dissertações. Este número ficou muito abaixo da média histórica do Programa. Média esta que tem sido de 10 a 20 dissertações por semestre. Espera-se que esta retenção seja temporária e que no próximo número da revista nossa produção possa expressar, novamente, o horizonte de crescimento real do Programa.

Manoel Francisco de Vasconcelos MottaCoordenador do Programa

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 11 n. 19 jan.-jun. 2002 p. 201-202

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Informes da pesquisa e da pós-graduação

Defesas de Mestrado realizadas em 2001/2

Título Autor(a) Professores componentes da banca Data

Por uma educação ética centrada no paradigma lipmaniano

Julieta Marizéte Pinto Calil

Dr.ª Maria de Lourdes De Lamônica Freire (UNIC)Dr.ª Maria Aparecida Morgado (UFMT)Dr. Peter Büttner (presidente)

27/07/2001

Escola pública – escolar particular: relações de poder e de controle – elementos para uma leitura das interações sociais

Maria Lindamir Driessen de Carvalho

Dr. Bernard Charlot (UP VIII)Dr. Nicanor Palhares Sá (UFMT)Dr.ª Izumi Nozaki (presidente)

31/07/2001

O movimento dos professores da Rede Estadual de Ensino no discurso jornalístico da imprensa mato-grossense no período de 1991 a 1994

Elaine Souza Resende

Dr.ª Ilse Scherer Warren (UFSC)Drª Maria Inês Pagliarini Cox (UFMT)Dr.ª Maria Aparecida Morgado (presidente)

08/08/2001

Gestão Democrática nas Escolas Municipais de Cuiabá-MT: a perspectiva de lideranças governamentais e sindicais (1986 – 1988)

José Ferraz de Araújo

Dr. Luiz Fernandes Dourado (UFG)Dr.ª Artemis Augusta Mota Torres (UFMT)Dr.ª Maria Aparecida Morgado (presidente)

13/09/2001

Emprego dos métodos de educação à distância na otimização do processo de ensino – aprendizagem

Paulo César de Souza Castro

Dr. José Adolfo Rodriguez Rodriguez (UNIC)Dr. Sérgio Roberto de Paulo (UFMT)Dr. José de Souza Nogueira (presidente)

23/11/2001

A criação do Liceu Cuiabano e a formação dos intelectuais no curso de línguas e ciências preparatórias

Maria Inês Zanelli

Dr.ª Diana Gonçalves Vidal (USP)Dr. Manoel Francisco de Vasconcelos Motta (UFMT)Dr. Nicanor Palhares Sá (presidente)

14/12/2001