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6 RBCE - 110 a américa latina e a crise internacional Dessa vez foi diferente? A América Latina e a crise subprime em perspectiva comparada Ramiro Albrieu A crise financeira internacional que se desencadeou após a quebra do Lehman Brothers marcou um “antes” e um “depois” na economia global. A turbulência foi de tal magnitude que afastou a economia mundial da trajetória de alto crescimento, pela qual vinha transitando, para colocá-la, de maneira abrupta, em outra cujas características distintivas são o baixo crescimento e a incerteza financeira e monetária. A América Latina não ficou imune à débâcle, embora o traço verdadeiramente novo da crise tenha sido positivo: diferentemente de outros episódios de instabilidade global, dessa vez a região não sofreu um colapso produtivo (BID, 2009). Contudo, um olhar mais detido é capaz de mostrar desempenhos heterogêneos, que estão relacionados com a forma de inserção internacional e a vulnerabilidade macroeconômica de cada país antes da crise. DESEMPENHO MACROECONÔMICO COMPARADO Uma forma de avaliar os impactos e o alcance da crise de 2008-2009 é utilizar como medida de comparação outros eventos com características similares ocorridos anteriormente na região. No caso da América Latina, isso faz sentido, dado que é uma região que, por um lado, tem mostrado historicamente uma dinâmica macroeconômica muito sensível às perturbações de origem externa e, por outro, tem recebido choques globais de magnitude nas últimas décadas (ver Izquierdo et al., Ramiro Albrieu é pesquisador-adjunto do Centro de Estudos de Estado e Sociedade (CEDES). Email: [email protected].

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Page 1: Dessa vez foi diferente? A América Latina e a crise subprime em … · 2012-06-26 · a américa latina e a crise internacional ... das sub-regiões LAN e LAS a choques globais não

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a américa latina e a crise internacional

Dessa vez foi diferente? A América Latina e a crise subprime em perspectiva comparadaRamiro Albrieu

A crise financeira internacional que se desencadeou após a quebra do Lehman Brothers marcou um “antes” e um “depois” na economia global. A turbulência foi de tal magnitude que afastou a economia mundial da trajetória de alto crescimento, pela qual vinha transitando, para colocá-la, de maneira abrupta, em outra cujas características distintivas são o baixo crescimento e a incerteza financeira e monetária. A América Latina não ficou imune à débâcle, embora o traço verdadeiramente novo da crise tenha sido positivo: diferentemente de outros episódios de instabilidade global, dessa vez a região não sofreu um colapso produtivo (BID, 2009). Contudo, um olhar mais detido é capaz de mostrar desempenhos heterogêneos, que estão relacionados com a forma de inserção internacional e a

vulnerabilidade macroeconômica de cada país antes da crise.

DESEMPENhO MACrOECONôMICO COMPArADO

Uma forma de avaliar os impactos e o alcance da crise de 2008-2009 é utilizar como medida de comparação outros eventos com características similares ocorridos anteriormente na região. No caso da América Latina, isso faz sentido, dado que é uma região que, por um lado, tem mostrado historicamente uma dinâmica macroeconômica muito sensível às perturbações de origem externa e, por outro, tem recebido choques globais de magnitude nas últimas décadas (ver Izquierdo et al.,

ramiro Albrieu é pesquisador-adjunto do Centro de Estudos de Estado e Sociedade (CEDES). Email: [email protected].

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2008). Assim sendo, podemos utilizar como instrumento de comparação os episódios de instabilidade regional relacionados com a crise da dívida externa de 1982 e com a crise nos países emergentes nos anos 1990 (cujos momentos-chave foram a crise asiática em 1997 e a crise da Rússia em 1998). Como se observa no Gráfico 1, o desempenho macroeconômico da região no episódio atual foi muito bom em comparação aos episódios do passado: não só o impacto foi menor, como também a recuperação mostrou-se mais rápida.

No entanto, esse quadro geral esconde certas heterogeneidades importantes, que ficam mais evidentes quando se realiza uma desagregação por sub-regiões. Em Albrieu e Fanelli (2010), buscamos captar as divergências presentes na América Latina (LAC) dividindo a região em dois grandes grupos ou sub-regiões: os países da América do Sul (LAS) – ricos em recursos naturais – e os demais países (LAN), cuja inserção é mais dependente de fatores como as remessas internacionais e a “maquila”.

O contraste entre ambas as regiões é evidente. Nos países do grupo LAS a recuperação pós-crise é mais rápida e mais robusta do que nos países do grupo LAN, mais ligados à evolução do nível de atividade e de emprego nos Estados Unidos, por meio de exportações industriais e remessas (ver

Gráfico 2). Embora os dois grupos estejam se comportando muito melhor do que no período de instabilidade dos anos 1980, não se pode afirmar o mesmo quando utilizamos os anos 1990 como padrão de comparação. No caso do grupo LAN os desequilíbrios nos Estados Unidos induziram impulsos recessivos de maior

magnitude do que os associados à instabilidade dos anos 1990. De fato, essa sub-região apresentou uma capacidade de recuperação importante naqueles anos. Isso contrasta, sobremaneira, com a evolução das quatro principais economias da sub-região LAS (Argentina, Brasil, Colômbia e Venezuela): o PIB desses países teve uma

Gráfico 1 EvOLuçãO DO PIB REAL DA AméRICA LAtINA Em tRêS EvENtOS DE tuRBuLêNCIA GLOBAL

Fonte: Elaboração própria, com base em dados do Banco Mundial e do FMI.

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Gráfico 2 - AEvOLuçãO DO PIB REAL DA AméRICA LAtINA DO SuL (LAS) Em tRêS EvENtOS DE tuRBuLêNCIA GLOBAL

Fonte: Albrieu e Fanelli (2010). Nota: LAS: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Peru, Uruguai e Venezuela. As previsões de crescimento foram extraídas do FMI.

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queda de 5%, em média, em função da instabilidade nos países emergentes no fim do século passado, e levou três anos para eles recuperarem os níveis de atividade anteriores à crise.

Essa heterogeneidade não só se fez presente durante a crise,

como também ao longo da expansão do período 2003-2008 (ver Gráfico 3). Entre 2003 e 2008, o PIB global dos países da sub-região LAN expandiu-se a taxas próximas a 6,5% ao ano, enquanto que nos países do grupo LAS a expansão atingiu 8% a.a.. Durante a crise, o PIB dos países do

Gráfico 2 - BEvOLuçãO DO PIB REAL DA AméRICA LAtINA DO NORtE (LAN) Em tRêS EvENtOS DE tuRBuLêNCIA GLOBAL

Fonte: Albrieu e Fanelli (2010). Nota: LAN: Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua, Panamá, e República Dominicana.

Gráfico 3 - ADINâmICA DE CRESCImENtO NA REGIãO E SuAS DIvERGêNCIAS (DIStRIBuIçãO DAS tAxAS DE CRESCImENtO)

PRé-CRISE (méDIA DO PERíODO 2003-2007)Fonte: Albrieu e Fanelli (2010).

Notas: Idem Gráfico 2.

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América do Sul

O desempenho macroeconômico da América Latina no episódio atual foi muito bom em comparação aos episódios do passado: o impacto foi menor e a recuperação mostrou-se mais rápida

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grupo LAN contraiu-se 3%, ao passo que nos países do sul expandiu-se 0,6%. Essa divergência, tanto em épocas de recessão como de expansão – com o ingrediente de uma maior uniformidade entre os países do sul em comparação com os países do norte –, nos dá uma noção dos diferentes níveis de êxito dos países da região para se adaptar às novas características do crescimento global do início do século XXI.

Em suma, esses fatos sugerem que na América Latina talvez haja mais diferenças do que semelhanças. O grau de vulnerabilidade macroeconômica das sub-regiões LAN e LAS a choques globais não é o mesmo, assim como sua forma de inserção no comércio e nas finanças internacionais; ambos os fatores cumprem certamente um papel determinante na explicação das diferenças no desempenho macroeconômico. Vale a pena, portanto, examinar as características dos

choques globais que afetaram a região e a capacidade de resposta de cada país em função de sua vulnerabilidade macroeconômica.

A CrISE subpRime E O decoupling QUE NãO ACONTECEU

Uma rápida olhada nos eventos associados ao canal financeiro

mostra que a região não se manteve alheia às turbulências globais associadas à crise subprime, mesmo que em muitos casos o efeito direto tenha sido relativamente pequeno, tendo em vista o subdesenvolvimento financeiro que caracteriza a região. No entanto, as duas economias de maior tamanho e dinamismo em termos de inovação financeira – Brasil e México – tiveram problemas em função da exposição cambial de grandes empresas aos mercados de derivativos. Um canal de contágio mais generalizado se deu através de aumentos no custo do financiamento externo, os quais foram expressivos nos primeiros meses da crise [ver Gráfico 4, Painel (b)]. Os governos latino-americanos, que no início de 2008 pagavam por seus passivos uma taxa entre dois e três pontos percentuais acima da taxa que paga o Tesouro norte-americano, viram triplicar essa

Gráfico 3 - BDINâmICA DE CRESCImENtO NA REGIãO E SuAS DIvERGêNCIAS (DIStRIBuIçãO DAS tAxAS DE CRESCImENtO)

CrISE (2009)Fonte: Albrieu e Fanelli (2010).

Notas: Idem Gráfico 2.

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Gráfico 4 O CONtáGIO DA CRISE SuBPRImE NA AméRICA LAtINA

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MSCI LAC

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(B) FINANCIAmENtO ExtERNO (muDANçA NOS PASSIvOS COm BANCOS ESTrANgEIrOS / EMISSõES DE MErCADO)

(C) VOLUME DAS EXPOrTAçõES

(D) PREçOS DO COméRCIO ExtERIOR (PREçO DAS ExPORtAçõES / tERmOS DE TrOCA)Fonte: Albrieu e Fanelli (2010).

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Preços das exportações

Termos de troca

Quanto ao comércio, a crise reduziu drasticamente a entrada de divisas em função das vendas externas: a América Latina teve uma queda de 23%, em média, das receitas relativas às exportações em 2009

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taxa nos meses seguintes. Dentro do grupo LAC71 a pior evolução foi observada na Venezuela e na Argentina. Neste último país, os prêmios de risco se igualaram àqueles imediatamente anteriores à crise de 2001-2002, enquanto que na Venezuela essa variável se manteve sistematicamente acima dos 1000 pontos básicos. Por outro lado, embora o impacto da crise tenha sido claramente notado no restante dos países do LAC7, uma vez transcorrido o período de maior turbulência nos países desenvolvidos o risco soberano iniciou uma trajetória descendente, em consonância com o movimento dos países emergentes de forma geral.

A piora nas condições financeiras externas também se fez sentir sob a forma de racionamento: muitos países da região perderam acesso aos mercados internacionais. Por um lado, os empréstimos dos bancos internacionais caíram aproximadamente 40% no último trimestre de 2008 com relação ao mesmo período de 2007. Esse efeito se fez sentir, particularmente, nos países da América Central (que estão agrupados junto ao México na sub-região da América Latina do norte),2 onde os sistemas financeiros são intensivos em bancos e a penetração estrangeira é alta. Por outro lado, os mercados de dívida também entraram em

colapso com a crise global: se no primeiro semestre de 2008 foram emitidas obrigações por US$ 40 bilhões, na segunda metade do ano esse valor foi de apenas US$ 18 bilhões (Swiston, 2010). Na etapa de recuperação, os mercados se recompuseram com relativa rapidez, embora a reação do financiamento bancário tenha sido mais demorada.

Quanto ao comércio, a crise reduziu drasticamente a entrada de divisas em função das vendas externas. A América Latina teve uma queda de 23%, em média, das receitas relativas às exportações em 2009. O impacto não foi pequeno: representa a maior queda desde a Grande Depressão (entre 1931 e 1932, as exportações sofreram uma redução da ordem de 40%).3 O colapso deveu-se tanto a uma queda nas quantidades, que caíram 11% (ver Gráfico 4, Painel (c)), como nos preços, que explicam os 11% restantes da queda nas receitas totais (ver Gráfico 4, Painel (d)).

MEDINDO OS ChOQUES EXTErNOS

Novamente recorremos à comparação com as turbulências do passado para avaliar o desempenho da região na crise subprime. A pergunta, então, é: esses choques externos foram similares aos

vivenciados no início dos anos 1980 e no fim dos anos 1990? Começaremos analisando como se comparam os choques de comércio desencadeados pelos eventos de 2008-2009 com os observados no passado.

Para avaliar a magnitude das perturbações do comércio internacional, recorremos aos desvios em relação à taxa de crescimento de longo prazo das quantidades exportadas, utilizando observações do crescimento do volume exportado com frequência anual para o período 1980-2009. O valor limite para discriminar um choque excepcionalmente forte ou fora do normal é um desvio-padrão: quando a evolução num dado período fica acima de um desvio-padrão, considera-se que há um boom de comércio real, e, quando fica abaixo, considera-se que existe um crash. Uma forma adicional de caracterizar a importância do choque é avaliar o grau do “derrame” através da região e das sub-regiões. Diremos que o crash ou o boom é generalizado quando afeta mais de 25% dos países de cada grupo/subgrupo. O Gráfico 5 mostra a evidência analisada: as linhas pontilhadas indicam um desvio-padrão.

A evidência indica claramente que houve um choque negativo de comércio excepcionalmente forte associado à crise subprime. Como observado no Gráfico 5, Painel (b), situações similares

1 LAC 7: Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, México, Peru e Venezuela. 2 Ver Albrieu e Fanelli (2010).3 Díaz, Alejandro (1985).

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de “anormalidade” não eram registradas desde o início dos anos 1980. Note-se, por outro lado, que, da mesma forma que no caso da década perdida, o crash foi generalizado: um amplo conjunto de economias de ambas as sub-regiões foi afetado.

Ao comparar a importância do choque no caso das sub-regiões sob análise, observa-se um fato similar: ambas as sub-regiões experimentaram crashes de

comércio real significativos, assim como tinha acontecido nos anos 1980. Um ponto interessante é que no período de instabilidade dos anos 1990 o comércio internacional da região rica em recursos naturais (LAS) recebeu um castigo maior (ver Gráfico 5, Painéis (c) e (d)). Provavelmente esse fato explica, em parte, o melhor desempenho relativo do nível de atividade na sub-região LAN nos anos 1990.

Gráfico 5 ChOQUES COMErCIAIS NEgATIVOS EXCEPCIONAIS NA AméRICA LAtINA

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Ao comparar a importância da crise no caso das sub-regiões em análise, observa-se um fato similar: ambas experimentaram crashes de comércio real significativos, assim como ocorreu nos anos 1980

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O que ocorreu com os termos de troca? O Gráfico 6 aplica a técnica já explicada para a detecção do crash de comércio real ao caso dos termos de troca. Novamente, para a América Latina em seu conjunto, a situação atual, por sua magnitude e sua sincronia entre os países, remete ao início dos anos 1980; sendo assim, não houve crashes de termos de troca. No caso da sub-região LAS, no entanto, devemos agregar um episódio do fim dos anos 1990. Por outro lado, é interessante notar uma clara diferença na última década: enquanto que nos países do sul cresceu a volatilidade dos choques externos de preços, na sub-região LAN ocorreu justamente o contrário. Além do mais, a profunda diferença nos perfis de comércio exterior refletiu-se em 2009: quando eclode a crise, os termos de troca se movem em direções opostas.

Quão importantes foram os choques de origem financeira associados à crise subprime, quando avaliados sob uma perspectiva de longo prazo? Uma forma de esclarecer essa questão é analisar se existiu ou não uma situação de saída brusca de capitais que colocasse a região no caminho de um sudden stop, segundo a definição de Calvo et al. (2008). O Gráfico 7 apresenta evidências nesse sentido. O indicador apresentado calcula a evolução da entrada líquida de capitais definida como a diferença entre a variação de reservas e o saldo da balança

(C) LAS

(D) LANFonte: Albrieu e Fanelli (2010). Notas: Idem Gráfico 2.

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Gráfico 6 cRAsh DE PREçOS DO COméRCIO NA AméRICA LAtINA

(A) AméRICA LAtINA

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(B) PROPORçãO DE PAíSES ONDE SE REGIStRA O EvENtO

(C) LAS

(D) LANFonte: Albrieu e Fanelli (2010) Notas: Idem Gráfico 2

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Um choque macroeconômico de determinada magnitude e características pode ter uma incidência muito diferente, dependendo do grau de vulnerabilidade da economia que o recebe

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comercial. O gráfico também mostra a proporção de países que experimentaram um sudden stop como uma forma de medir a amplitude regional do fenômeno.

Do Gráfico 7 é possível concluir que para a região como um todo os choques financeiros dos anos 1980 e 1990 foram mais severos do que o atual: embora nos três eventos registra-se uma reversão nos fluxos de capitais regionais, a magnitude foi muito menor no caso da crise subprime. De fato, a despeito de a reversão ter sido significativa, o fenômeno não chega a constituir um sudden stop para a região em seu conjunto, haja vista que o montante de saída não se localiza abaixo do limite mínimo. Isso se deve ao fato de que, como apontado acima, uma vez passado o primeiro impacto, os capitais tenderam a retornar à região no segundo semestre de 2009. Isso contrasta com o ocorrido no início dos anos 1980 e fins dos anos 1990, quando as reversões se constituíram, de fato, em sudden stops. A despeito disso, duas economias da América do Sul – Bolívia e Peru – e uma da América Central – El Salvador – experimentaram um sudden stop, enquanto que outras duas do sul – Argentina e Venezuela – registraram saídas de capitais previamente à crise internacional. Embora tais fatos sejam observados tanto na sub-região LAN como na LAS, a reversão é mais pronunciada na América do Sul (Painéis (c) e (d) do Gráfico 7). Enquanto que nesta última região a reversão faz

com que os fluxos líquidos de capital se tornem negativos, não ocorre o mesmo no grupo LAN. O que é certo, no entanto, é que a reversão é bastante generalizada. O alcance regional do fenômeno é similar aos eventos dos anos 1990 (embora não comparável ao dos anos 1980). A ocorrência de sudden stops em várias economias se reflete no Painel (b), que mostra a proporção de economias sofrendo o fenômeno em cada sub-região.

AVALIANDO A vuLNERABILIDADE MACrOECONôMICA DA rEgIãO

Um choque macroeconômico de determinada magnitude e características pode ter uma incidência muito diferente, dependendo do grau de vulnerabilidade da economia que o recebe. Portanto, tão importante quanto caracterizar

os choques é avaliar os fatores de risco que atuam como determinantes do grau de vulnerabilidade (Edwards, 2007; CEPAL, 2008; Ocampo, 2009). No caso específico dos choques externos, as pesquisas apontam que a vulnerabilidade se relaciona com um conjunto de indicadores relativos aos fronts fiscal, externo e financeiro (ver CEPAL, 2008). Nesse sentido, examinaremos nesta seção uma série de indicadores regionais que se associam com a vulnerabilidade. Iremos considerar, obviamente, o período prévio à ocorrência dos choques externos, já que a vulnerabilidade deve ser avaliada em termos ex ante.

A literatura sobre choques externos financeiros identifica como dois fatores de risco-chave a relação dívida pública/PIB e a sua proporção em dólares norte-americanos. Como pode ser observado

Gráfico 7 ChOquES FINANCEIROS NEGAtIvOS ExCEPCIONAIS NA AméRICA LAtINA

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no Gráfico 8, os níveis da dívida pública seguiram uma trajetória descendente nos anos anteriores à crise, de maneira que, no momento da ocorrência do episódio de instabilidade global, as obrigações fiscais representavam em torno de 35% do PIB. Nos anos 1990, a dívida pública era, em média, superior a 40% do PIB.

Na sub-região LAS o processo de redução do endividamento foi bastante pronunciado, em particular na Argentina, Bolívia, Chile, Peru e Uruguai. Não obstante, como em geral se partiu de níveis relativamente altos de endividamento (em parte fruto da crise do fim dos anos 1990), isso não se traduziu em níveis de dívida pública particularmente baixos. Na sub-região LAN observa-se uma dinâmica similar. Em particular, países como Honduras e Costa Rica entraram na crise atual com uma robustez que não haviam tido no passado. Um fato adicional muito positivo é que os níveis de endividamento não explodem em consequência da instabilidade induzida pelo choque externo, o que contrasta significativamente com o ocorrido em episódios anteriores. Destaque-se, sobretudo, o caso da LAS, em que explodem os níveis de endividamento como consequência da instabilidade dos anos 1990.

Um fato que provavelmente explica a melhora do comportamento pós-choque da dívida pública é o menor grau de dolarização. A dolarização da dívida reduziu-se sensivelmente na região.

Gráfico 7 ChOquES FINANCEIROS NEGAtIvOS ExCEPCIONAIS NA AméRICA LAtINA

(B) PROPORçãO DE PAíSES ONDE SE REGIStRA O EvENtO

(C) LAS

(D) LANFonte: Albrieu e Fanelli (2010) Notas: Idem Gráfico 2

0

5

10

15

20

25

30

35

40

1981

1984

1987

1990

1993

1996

1999

2002

2005

2008

LAN

LAS

-6.0

-4.0

-2.0

0.0

2.0

4.0

6.0

8.0

1981

1984

1987

1990

1993

1996

1999

2002

2005

2008

-8

-6

-4

-2

0

2

4

6

8

1981

1984

1987

1990

1993

1996

1999

2002

2005

2008

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Gráfico 8 vuLNERABILIDADE FISCAL NA AméRICA LAtINA DívIDA PúBLICA DO GOvERNO CENtRAL (% PIB)

(A) AméRICA LAtINA (CRISE DOS ANOS 1990 / CRISE subpRime / CrISE DOS ANOS 1980)

(B) LAS

(C) LANFonte: elaboração própria, com base nos dados da CEPAL e Albrieu e Fanelli (2010).

Notas: Idem Gráfico 2.

20.0

40.0

60.0

80.0

t-3 t-2 t-1 t t+1

Crise dos anos 1990

Crise subprime

Crise dos anos 1980

20.0

40.0

60.0

80.0

t-3 t-2 t-1 t t+1

20

40

60

80

t-3 t-2 t-1 t t+1

No início dos anos 1990 a proporção da dívida dos governos latino-americanos denominada em moeda estrangeira era entre 70% e 75% da dívida total. Em 2008, entretanto, essa proporção reduziu-se para 50% (ver Cowan et al., 2006).

O que ocorreu no front externo? O Gráfico 9 mostra a evolução da vulnerabilidade externa utilizando como indicador a posição internacional líquida do investimento financeiro. Esse indicador é definido como a diferença entre os ativos financeiros e os passivos financeiros externos da economia em seu conjunto. No passado, as crises estiveram acompanhadas de uma alta fragilidade externa, refletida em obrigações financeiras líquidas que representavam, aproximadamente, 20% do PIB. Dessa vez, no entanto, a região, em média, ingressou na crise subprime com uma posição credora líquida em relação ao resto do mundo da ordem de alguns pontos percentuais do PIB.4

Por trás dessa melhora estão presentes dois fatores. De um lado, os níveis de endividamento externo reduziram-se sensivelmente na região no período 2003-2008, passando de 38% do PIB para 21% do PIB. Por outro lado, os governos latino-americanos implementaram medidas de

4 No que diz respeito aos indicadores de vulnerabilidade baseados em fluxos, a evidência sobre a trajetória da balança comercial mostra um quadro similar ao estoque da dívida líquida: as melhoras são sensíveis na América do Sul, mas não na sub-região LAN. Para os países da América Central isso não é outra coisa senão a expressão de sua anemia exportadora e da excessiva dependência em relação às remessas provenientes dos Estados Unidos. Mas também é o caso de uma economia grande, como a do México, cujo volume de exportações cresceu apenas 3% ao ano no período de bonança (2003-2007).

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“blindagem” contra choques financeiros.

As estratégias de autosseguro desse tipo foram motivadas pelo desejo de evitar a exposição a episódios de sudden stop e de contágio como os ocorridos, entre 1997 e 2002, em vários países da Ásia, Rússia e América Latina. Os instrumentos privilegiados pelas estratégias de autosseguro foram a geração de fortes superávits de conta corrente e a acumulação de reservas. De fato, entre 2002 e 2008 as reservas internacionais da região passaram de 13% para 17% do PIB, a despeito do fenomenal crescimento registrado no PIB regional.

A parte inferior do Gráfico 9 (Painéis (b) e (c)) mostra que existem diferenças entre as sub-regiões em análise. Uma das principais é que a melhora na posição financeira líquida foi muito mais pronunciada na LAS. A sub-região LAN mostra indicadores de vulnerabilidade que a tornam mais exposta. É preciso ter em conta, no entanto, que as médias regionais tendem a ocultar as assimetrias. Destaque-se, nesse sentido, que as duas maiores economias da região possuem níveis de exposição externa mais altos do que a média. O México, por exemplo, ostentava uma posição de dívida líquida de 25% do PIB no início da crise. O Brasil também era devedor líquido, apesar da forte acumulação de reservas. Em ambos os casos, boa parte do endividamento

líquido provém não do setor público, como no caso da crise dos anos 1990, mas do balanço do setor privado. O que se pode dizer acerca dos riscos financeiros? Num contexto de baixo desenvolvimento financeiro, existe um número de fatores de risco

que a literatura põe em primeiro plano: o crescimento desmedido (boom) nos empréstimos5 e o nível de dolarização dos depósitos, que pode se traduzir num descompasso entre ativos não transacionáveis e passivos em dólares.

Gráfico 9 vuLNERABILIDADE ExtERNA NA AméRICA LAtINA POSIçãO LíquIDA DO INvEStImENtO FINANCEIRO (% PIB)

(A) AméRICA LAtINA (CRISE DOS ANOS 1990 / CRISE subpRime / CrISE DOS ANOS 1980)

(B) LAS

-50%

-30%

-10%

10%

30%

50%

t-3 t-2 t-1 t t+1

Crise dos anos 1990

Crise subprime

Crise da dívida

-50%

-30%

-10%

10%

30%

50%

t-3 t-2 t-1 t t+1

5 Obviamente, sendo uma região subdesenvolvida financeiramente, a expansão do crédito deveria ser, em princípio, bem-vinda. O chamado de alerta, no que tange à vulnerabilidade, decorre do fato de que muitas vezes as expansões rápidas de crédito são difíceis de compatibilizar com melhorias na regulação e na supervisão, capazes de evitar a formação de bolhas e a má alocação do crédito.

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A vulnerabilidade em decorrência de um aumento exagerado do crédito parece relevante na região. A participação percentual do crédito no total do PIB aumentou substancialmente entre 2005 e 2008, e se encontra acima dos registros das crises

anteriores. Isso é relevante porque, como se observa no Painel (a) do Gráfico 10, as crises sistematicamente terminam em reversões financeiras massivas e contrações de crédito.

A desagregação por sub-regiões permite localizar geograficamente uma maior vulnerabilidade na sub-região LAN. Ausente em boa medida do boom de crédito dos anos 1980, nessa oportunidade o crédito expandiu-se rapidamente na sub-região, em função de uma maior participação de instituições estrangeiras no sistema financeiro doméstico, e no momento da chegada da crise subprime, ele se encontrava claramente acima dos registros das crises anteriores. Na América do Sul, por sua vez, o crédito expandiu-se também nesses anos, principalmente no Brasil e Venezuela, encontrando-se, contudo, em melhores condições do que nas crises anteriores.

Por último, no que diz respeito à dolarização e, consequentemente, ao risco de descasamento, a evidência mostra uma redução modesta, ainda que bastante generalizada, na vulnerabilidade. A dolarização do crédito seguiu uma trajetória descendente na etapa da bonança, passando de 35% para 30% nos momentos anteriores à crise. Nos períodos de instabilidade dos anos 1990, a situação foi oposta: a dolarização cresceu acentuadamente antes do colapso. Ao analisar esse fenômeno em termos sub-regionais, vemos que, embora seja generalizado, é mais pronunciado nas economias da América do Sul. Em particular, na Argentina e na Bolívia a redução da vulnerabilidade financeira tem sido muito acentuada. Nos demais países da região, como

(C) LANFonte: elaboração própria, com base nos dados da CEPAL e Albrieu e Fanelli (2010).

Notas: Idem Gráfico 2.

-50%

-30%

-10%

10%

30%

50%

t-3 t-2 t-1 t t+1

Gráfico 10 vuLNERABILIDADE FINANCEIRA NA AméRICA LAtINA CRéDItO AO SEtOR PRIvADO (% PIB)

(A) AméRICA LAtINA (CRISE DOS ANOS 1990 / CRISE subpRime/ CrISE DOS ANOS 1980)

20%

30%

40%

50%

t-3 t-2 t-1 t t+1

Crise dos anos 1990

Crise subprime

Crise da dívida

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Uruguai e Peru, em contrapartida, a dolarização persiste.

REFLExõES FINAIS: A rEgIãO NA rODA DA FORtuNA

A crise subprime e seus efeitos sistêmicos e ainda persistentes

nos indicam que a região continua muito dependente dos vaivéns da economia global. Não obstante, e diferentemente do ocorrido nas turbulências das últimas décadas, nessa ocasião o comércio tem sido o principal canal de contágio para a região, em vez das finanças. A bonança do comércio internacional e o maior

dinamismo das transações sul-sul num mundo com novos motores de crescimento global oferecem uma boa explicação para isso.

Com relação ao impacto da turbulência, parece que dessa vez foi diferente: a região esteve mais bem preparada para enfrentar a turbulência global na comparação com os episódios de início dos anos 1980 e de finais dos anos 1990. Gozamos do “privilégio da normalidade”: uma má notícia trouxe uma desaceleração ou recessão leve, mas não uma crise macroeconômica.

De forma específica, detectamos o seguinte:

A incidência da vulnerabilidade fiscal tem sido muito menor do que no passado. Embora a situação não seja homogênea entre os países, é certo que a região parece ter aproveitado os anos de bonança dos anos 2000 para fortalecer sua posição fiscal.

A vulnerabilidade externa da região evoluiu positivamente no período imediatamente anterior à crise, embora as heterogeneidades existam e devam ser levadas em conta: a região LAN não logrou reduções sensíveis na frente externa, e as maiores potências regionais apresentam uma situação bastante vulnerável.

Os indicadores de fragilidade financeira nos mostram que tem havido melhorias nos últimos anos, e isso certamente contribuiu para que não ocorressem na

20%

30%

40%

50%

t-3 t-2 t-1 t t+1

Gráfico 10 vuLNERABILIDADE FINANCEIRA NA AméRICA LAtINA CRéDItO AO SEtOR PRIvADO (% PIB)

(B) LAS

(C) LANFonte: Albrieu e Fanelli (2010).

Notas: Idem Gráfico 2.

20%

30%

40%

50%

t-3 t-2 t-1 t t+1

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região fenômenos de corrida bancária ou, ainda pior, crises gêmeas, como foi o caso em alguns países nos anos 1990.

O que podemos dizer sobre o futuro? O crescimento da China e das economias asiáticas está modificando sensivelmente o conjunto de restrições e oportunidades para a região. Isso é verdadeiro para a sub-região LAS, que tem se beneficiado com a maior demanda por seus recursos naturais. Nesse novo contexto, a América Latina parecer ter a oportunidade de participar do grupo de economias emergentes, cujas perspectivas de crescimento são superiores às que se apresentam para o mundo desenvolvido.

É preciso ter em conta, não obstante, as assimetrias e

heterogeneidades que existem na região. A realidade que se vive na América Central e no México é, em boa medida, oposta à que se percebe nos países da América do Sul. Embora em ambas as regiões o menor volume de comércio tenha afetado os balanços de pagamentos, a dinâmica dos termos de troca comercial foi divergente: o boom de 2007-2008 não se fez sentir na sub-região LAN, enquanto que o crash de 2009, percebido em LAS, foi sentido como uma sensível melhora em LAN. Em suma, o boom de recursos naturais e a maior dependência da demanda asiática são próprios da região LAS; na América Central e no Caribe, as conexões com as economias ricas – em particular com os Estados Unidos – continuam de fundamental importância. Para fixar as ideias:

em 1990, aproximadamente 46% das exportações da Comunidade Andina e 40% das exportações do Mercado Comum Centro-americano tinham como destino os Estados Unidos; em 2009, esses percentuais passaram para 17% e 37%, respectivamente.

Existem indícios, inclusive, de que as heterogeneidades nas oportunidades de crescimento poderiam se aprofundar no mundo pós-crise, como sugere a maior divergência nas taxas de crescimento dos principais sócios comerciais de cada sub-região. Isso faz acender as luzes amarelas na sub-região LAS: o perigo de contrair uma doença holandesa é cada vez mais alto. Em LAN, por sua vez, o alerta é de cor vermelha: provavelmente está na hora de repensar o modelo de integração com o mundo.

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