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Gramado – RS De 30 de setembro a 2 de outubro de 2014 Estudos em Design | Revista (online). Rio de Janeiro: v. 23 | nº. 1 [2015], p. 61 – 73 | ISSN 1983-196X A FÁBRICA MÍNIMA: tecnologias digitais para a produção local e customizada de artefatos físicos Alexandre Monteiro de Barros Universidade Federal do Rio Grande do Sul [email protected] Natalia Schmitt Silveira Universidade Federal do Rio Grande do Sul [email protected] Resumo: Este artigo aborda a aplicação das tecnologias de fabricação digital para uma produção local, customizada e sob demanda de artefatos físicos, em contraste com a atual produção global e em série contemporânea, especificamente mobiliário, luminárias e utensílios domésticos. Esta aplicação define um novo modelo de produção que implica em novas formas de projetar, produzir e comercializar os artefatos e pode contribuir significativamente com a sustentabilidade ambiental no design de produto. É apresentado o desenvolvimento e a aplicação real de um modelo de produção estruturado com as características acima mencionadas, permitindo descrever aspectos relevantes e indicar futuras questões a serem investigadas e aperfeiçoadas. Palavras-chave: design de produto, fabricação digital, design sustentável, ecodesign, artefatos físicos

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  • Gramado RS

    De 30 de setembro a 2 de outubro de 2014

    Estudos em Design | Revista (online). Rio de Janeiro: v. 23 | n. 1 [2015], p. 61 73 | ISSN 1983-196X

    A FBRICA MNIMA: tecnologias digitais para a produo local e customizada de artefatos fsicos

    Alexandre Monteiro de Barros Universidade Federal do Rio Grande do Sul [email protected] Natalia Schmitt Silveira Universidade Federal do Rio Grande do Sul [email protected]

    Resumo: Este artigo aborda a aplicao das tecnologias de fabricao digital para uma produo local, customizada e sob demanda de artefatos fsicos, em contraste com a atual produo global e em srie contempornea, especificamente mobilirio, luminrias e utenslios domsticos. Esta aplicao define um novo modelo de produo que implica em novas formas de projetar, produzir e comercializar os artefatos e pode contribuir significativamente com a sustentabilidade ambiental no design de produto. apresentado o desenvolvimento e a aplicao real de um modelo de produo estruturado com as caractersticas acima mencionadas, permitindo descrever aspectos relevantes e indicar futuras questes a serem investigadas e aperfeioadas.

    Palavras-chave: design de produto, fabricao digital, design sustentvel, ecodesign, artefatos fsicos

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    1. INTRODUO

    Atravs das tecnologias de fabricao digital, o modelo de produo tradicional,

    baseado na manufatura em srie, na economia de escala e na localizao globalizada pode ser complementado ou parcialmente substitudo por novos modelos que sejam mais eficientes em relao ao meio ambiente e a sociedade sob determinados aspectos. Conforme Gershenfeld (2012), as tecnologias de fabricao digital envolvem a habilidade de transformar dados em coisas e coisas em dados. Pesquisas de ponta esto explorando a aplicao das tecnologias de fabricao digital para os mais diversos fins e em diferentes escalas, desde nano at macros componentes com possibilidades de auto-replicao, montagem auto-suficiente e comunicao integrada (GERSHENFELD, 2012). Em paralelo, as tecnologias j consolidadas vm se tornando mais acessveis para mdios e pequenos produtores, para grupos de pesquisas acadmicos e, em alguns casos, para consumidores em geral, permitindo investigar sua aplicao em novos modelos de produo de artefatos fsicos.

    Com relao aos aspectos de sustentabilidade ambiental, as tecnologias de

    fabricao digital apresentam vantagens para a confeco de determinados artefatos quando comparadas aos processos tradicionais de manufatura. Os equipamentos de manufatura podem ser leves, padronizados e altamente flexveis, em contraste com equipamentos pesados, diversificados e de difcil reconfigurao (DEMAT, 2013). Em muitos casos h um menor consumo de energia, uma reduo no numero de equipamentos e no projeto possvel aplicar lgicas de montagem e desmontagem mais eficientes e adaptveis (GONDIM, 2010). Constata-se uma crescente oferta de materiais para as tecnologias de fabricao digital que so provenientes de fontes renovveis ou com baixa emisso de resduos para seu processamento, como os biopolmeros e os materiais naturais.

    Embora pesquisas sobre novos modelos de produo utilizando os recursos de

    fabricao digital j datem de mais de uma dcada (STEFFEN & GROS, 2003), sua real aplicao ainda limitada e pouco difundida. Um fator para este cenrio pode ser a dificuldade de estabelecer os padres de fabricao, como por exemplo, uma base de materiais genricos com propriedades idnticas ou facilmente adaptveis para diferentes regies geogrficas. Outros fatores podem estar relacionados com a viabilidade econmica, o desconhecimento por parte dos consumidores ou ainda a compreenso destas tecnologias por parte de designers e pequenos produtores, o que faz necessrio comunicar, refletir e propor novos enfoques sobre as mesmas. Este artigo rene uma fundamentao terica sobre novos modelos de produo relacionados com as tecnologias digitais e apresenta a aplicao de um modelo especfico que utiliza estas tecnologias para produzir e comercializar mobilirio e equipamentos complementares atravs de uma rede colaborativa de designers independentes associados a uma empresa privada. Atravs da aplicao deste modelo, foi possvel levantar um conjunto de questes para discusso e investigao. Espera-se que a partir deste trabalho outras iniciativas como esta possam ser replicadas, ampliadas e aperfeioadas, rumo a uma produo e consumo mais sustentvel em relao ao meio ambiente e a sociedade como um todo.

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    2. MODELOS DE PRODUO

    Observa-se que no panorama global da produo de mobilirio, a organizao

    industrial caracterizada pela presena de grandes empresas especializadas em linhas especficas de produtos, dedicando-se a produzir commodities, ou seja, produtos padronizados baseados no preo. Embora as tecnologias computacionais contribuam para o aumento do nvel de produtividade nas indstrias, estas tecnologias no so totalmente exploradas, pois a flexibilidade na linha de produo ainda limitada pela organizao industrial vigente. A produo em larga escala permite atingir um alto nvel de qualidade e uma considervel reduo nos custos dos produtos, mas por outro lado este tipo de produo est associado a uma fabricao padronizada e pouco flexvel, ao contrrio da produo artesanal, onde possvel concentrar esforos em sries menores ou produtos nicos com alto grau de customizao.

    A produo artesanal do mobilirio diminuiu gradualmente de escala e

    importncia ao longo do sculo XX, pois pequenas empresas no se encontravam aptas para competir com grandes indstrias que so baseadas na economia de escala e no custo da produo (STEFFEN e GROS, 2003). Entretanto, Mitchell e Watt (2009) sugerem que a produo em massa e as grandes fbricas vo perder importncia frente a novos modelos de produo que retomem os padres de fabricao do passado, ou seja, em menor escala e adaptado as necessidades individuais dos consumidores. Isto decorre das deficincias apresentadas pelos modelos de produo em escala industrial. As fbricas so orientadas para produzir grandes quantidades de um mesmo tipo de produto, no lidando bem com pequenas quantidades de forma eficiente, apresentando pouca flexibilidade. Ademais, este modelo de produo gera uma enorme quantidade de estoque, pois no atende uma demanda individual ou de pequenos lotes, e necessita de amplo espao para armazenar, distribuir e comercializar seus produtos.

    Outra importante questo a localizao deste modelo de indstria, que

    migrou seu capital para regies que apresentavam menores custos de mo de obra e insumos, no importando a proximidade com o mercado consumidor, pois o alto volume de produo viabiliza o transporte das mercadorias sem agregar um custo que v prejudicar sua competitividade, mas quando confrontada a fornecer produtos customizados esbarra no fator tempo e custo de transporte (MITCHELL e WATT, 2009). Raymond (2009) observa dois tipos de fbricas de mobilirio capazes de prosperar no futuro considerando a produo domstica dos produtos. Ambas devem seguir um slido plano de negcios, com nfase nos consumidores. Embora um modelo seja baseado na alta produtividade, com baixo custo de produo e poucas variedades de produtos, contrastando com a opinio de Mitchell e Watt (2009), o outro modelo so as fbricas de mdio porte, com produtos altamente customizveis e uma linha de produo flexvel, modelo em consenso com Steffen e Gros (2003) e Mitchell e Watt (2009). O principal recurso para este modelo de produo so os sistemas de informao aplicados no projeto e na produo dos produtos.

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    A incorporao da informao de maneira automatizada nos processos de

    produo um dos principais fatores que permite propor novas lgicas para produo do mobilirio e ao mesmo tempo expandir a capacidade de atuao das fbricas para outros segmentos. Neste contexto, possvel agrupar um conjunto de atributos genricos para o modelo de produo do mobilirio e organiz-los com relao a perodos temporais bsicos, conforme colocado no quadro 1. No captulo seguinte se abordam questes relacionadas com as tecnologias digitais que so importantes para a compreenso e aplicao dos novos modelos de produo.

    Quadro 1 - Atributos das fbricas

    Fonte: Elaborado pelos autores, com base na pesquisa realizada

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    3. TECNOLOGIAS DIGITAIS

    Conforme Schindler (2007) o processo para a produo de artefatos fsicos

    envolve trs parmetros essenciais: (I) informao, (II) energia e (III) material, e possvel verificar trs ondas na forma de combin-los ao longo da histria da humanidade, cada uma definindo um conjunto de tecnologias especficas. A primeira onda define a tecnologia de ferramenta manual, a segunda define a tecnologia de ferramenta mquina e a terceira define a tecnologia de ferramenta informacional. Estas ondas no delimitam perodos especficos, mas sobrepem-se no decorrer do desenvolvimento dos processos de produo. A tecnologia de ferramenta manual caracterizada pelo uso da energia, do material e do processamento da informao por um operador humano. A tecnologia de ferramenta mquina o uso da energia e do processamento de material por uma mquina que substitu operaes fsicas repetitivas enquanto controlada por um operador humano. A tecnologia de ferramenta informacional o uso de energia, de material e o processamento da informao por uma mquina para substituir operaes humanas fsicas e intelectuais (SCHINDLER, 2007). A fabricao digital engloba a produo de artefatos fsicos atravs de modelos computacionais e est associada com a tecnologia de ferramenta informacional para materializao dos artefatos.

    As novas tecnologias computacionais podem ser aplicadas nos processos de

    projeto e de produo para equilibrar o descompasso existente entre a produo artesanal e a produo industrial de mobilirio. Conforme Steffen e Gros (2003), com centros de usinagem por controle numrico computadorizado e cortadoras laser, as pequenas e mdias empresas esto habilitadas a utilizar as mesmas ferramentas tecnolgicas das grandes indstrias. Do mesmo modo, a lgica da produo industrial pode ser ajustada para atender uma demanda cada vez mais especfica e varivel. A figura 1 classifica diferentes sistemas de manufatura em relao aos atributos de produtividade e flexibilidade, onde se observa que os sistemas com equipamentos controlados numericamente so altamente flexveis, mas com pouca ou razovel produtividade.

    Figura 1 Relaes gerais entre sistemas de manufatura

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    Fonte: Adaptado de Schodek (2005).

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    As mquinas universais de CNC se enquadram em trs sistemas distintos de

    fabricao: os sistemas subtrativos, envolvendo o corte e a usinagem dos materiais, os sistemas aditivos, envolvendo a deposio e solidificao de material em camadas e os sistemas formativos, baseado em moldes dinmicos e menos difundido que os sistemas anteriores. Conforme Sass, Michaud e Cardoso (2007), a materializao dos artefatos atravs de sistemas subtrativos com mquinas por controle numrico computadorizado feita em quatro passos, que se iniciam com um (I) modelo tridimensional que traduzido para (II) um conjunto de componentes que so posicionados (III) em forma bidimensional para a produo (CNC) e, posteriormente, (IV) montado mo.

    Steffen e Gros (2003) estruturaram um novo modelo de produo orientado

    para a produo flexvel, sob demanda e customizada utilizando as tecnologias digitais. Estes autores propem um cenrio de produo virtual onde os produtos sejam formulados e resultem num conjunto de dados virtuais aptos para a materializao atravs de mquinas de CNC. Os Editores de produto so responsveis por operar um diretrio e comercializar os produtos. O co-desinger integra compradores e projetistas para gerar o mobilirio customizado. Galeria de produto expe exemplos materiais de mobilirio e constitui a interface fsica entre comprador e produtor. A tecnofbrica o local onde as mquinas de CNC manipulam a matria-prima e materializam os artefatos, podendo estar localizadas ao lado da galeria de produto ou em outras regies mais favorveis (STEFFEN e GROS, 2003). A figura 2 demonstra as relaes entre estes agentes e elementos, bem como suas atividades no cenrio de produo virtual.

    Figura 2 Cenrio da produo virtual

    Fonte: Adaptado de Steffen e Gros (2003) A seguir ser apresentado o desenvolvimento e aplicao de um novo modelo

    de produo em acordo com a fundamentao terica descrita acima. Esta aplicao possibilitou desenvolver uma sistematizao metodolgica (BARROS, 2011), a qual se pretende avanar e complementar a partir de novos trabalhos.

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    4. ESTRUTURAO E APLICAO DO MODELO DE PRODUO Para estruturar e aplicar um novo modelo de produo orientado para a

    manufatura sob demanda, flexvel e customizada, os processos de projeto, de produo e de comercializao foram formatados com as caractersticas e atividades descritas a seguir como parte de um projeto paralelo de uma empresa privada que possua os equipamentos relacionados com as tecnologias de fabricao digital. Esta experincia foi estruturada em oito meses e posteriormente aplicada por vinte e oito meses, gerando mais de 40 produtos entre mobilirios e acessrios complementares projetados por quatro grupos de designers.

    4.1 Processo de Projeto

    Inicialmente, designers foram selecionados e convidados a desenvolverem

    mobilirios e equipamentos complementares como luminrias e organizadores de bancada, utilizando os recursos disponveis na empresa. Os recursos disponveis so listados no tpico seguinte, e esto relacionados com os processos de produo. Como principal requisito de projeto, os artefatos deveriam contemplar as estratgias de sustentabilidade ambiental para o design de produto, em acordo com Manzini e Vezzoli (2009). As principais estratgias relacionavam-se com a utilizao de materiais de baixo impacto ambiental, conexes facilmente reversveis, acabamentos atxicos e embalagens reduzidas. Para demonstrar e auxiliar o desenvolvimento dos novos produtos seguindo estes critrios foi organizado uma base de modelos precedentes conforme Barros (2011). Durante o projeto, uma extensa etapa de experimentao foi necessria at obter configuraes satisfatrias dos produtos a serem produzidos. A partir das configuraes selecionadas foi gerada uma base informacional com:

    Diagramas e modelos digitais do projeto de cada artefato, incluindo modelos geomtricos e modelos construtivos. Em alguns casos foram desenvolvidos modelos paramtricos associados aos demais.

    Propriedades qualitativas e quantitativas organizadas em uma tabela principal com conexo para outras tabelas complementares e com o sistema de comercializao virtual.

    Imagens digitais de documentao e divulgao dos produtos. As fotos de divulgao foram produzidas em estdio por fotgrafo profissional.

    Prottipos fsicos de produo para orientar os processos de acabamento e montagem dos produtos e suas respectivas embalagens.

    Determinadas propriedades desta base informacional eram diretamente

    conectadas com o sistema de comercializao e distribuio dos produtos descritos no item 4.3, como preo, medidas e peso, entre outras. A figura 3 contm exemplos desta base informacional, apresentado um modelo construtivo (plano de usinagem bidimensional) e imagens digitais para divulgao de um produto desenvolvido. A figura 4 ilustra um trecho da tabela com propriedades qualitativas e quantitativas.

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    Figura 3 Modelo construtivo e imagens de divulgao de um produto. Fonte: Elaborado pelos autores.

    Figura 4 Organizao das propriedades qualitativas e quantitativas

    Fonte: Elaborado pelos autores.

    4.2 Processos de Manufatura

    A principal tecnologia de fabricao disponvel para os designers consistia em

    uma fresadora guiada por controle numrico computadorizado (CNC) capaz de cortar e rebaixar lminas, chapas e placas (Figura 5). Deste modo, os arquivos digitais de projeto eram automaticamente transferidos para o equipamento de acordo com a demanda proveniente do sistema de comercializao desenvolvido. Uma base de materiais foi criada e suas principais propriedades previamente analisadas antes de serem disponibilizadas para os designers, facilitando a resoluo de questes de ordem tcnica. Aps a usinagem dos materiais era necessrio realizar processos de acabamentos e montagem, bem como preparar os produtos para a sua distribuio. Os produtos acabados eram embalados e recebiam etiquetas com seus respectivos cdigos para serem encaminhados aos clientes.

    Figura 5 Banco de materiais e Fresadora CNC Fonte: Elaborado pelos autores.

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    4.3 Processos de Comercializao e Distribuio Em paralelo ao desenvolvimento inicial dos produtos pelos designers

    convidados, uma empresa especializada na confeco de sistemas de comercializao virtual (loja online) foi contratada para elaborar um sistema com determinadas caractersticas seguindo um modelo desenvolvido por um designer grfico. Inicialmente, o sistema de comercializao foi elaborado para funcionar em computadores pessoais em softwares de navegao na internet, contando com um domnio prprio. O sistema contava com dois mdulos principais. O primeiro mdulo era de acesso restrito (interno), permitindo cadastrar e configurar uma extensa variedade de dados dos produtos, acompanhar e operar as etapas de venda e produo dos artefatos e manejar os dados dos clientes. O segundo mdulo era a interface externa, ou seja, consistia no site da loja virtual onde era possvel visualizar, selecionar e comprar os produtos, assim como realizar um cadastramento na modalidade cliente, efetuar pagamentos e acompanhar os pedidos efetuados.

    A customizao dos artefatos era restrita a parmetros e propriedades bsicas.

    Posteriormente, deveriam ser includos parmetros avanados de customizao neste sistema, entretanto a experincia foi finalizada antes desta etapa e deve ser aplicada em trabalhos futuros. Aps a visualizao e seleo dos produtos e suas principais caractersticas, a efetivao da aquisio mediante confirmao de pagamento gerava uma ordem de produo para a rea de manufatura conforme descrito no item 4.2. A figura 4 apresenta um exemplo de tela do site.

    Figura 4 Sistema de comercializao virtual desenvolvido

    Fonte: Loja Pino

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    5. DISCUSSO Importantes questes foram identificadas e so discutidas a seguir. A rede

    colaborativa de designers compreendeu a proposta e se obteve resultados expressivos no design dos produtos elaborados. Dois produtos foram premiados em concursos de nvel nacional e ademais os designers puderam incluir novos produtos nos seus portflios, observando que cada designer desenvolveu cerca de oito produtos especficos em um curto perodo de tempo como uma atividade paralela.

    A base informacional estruturada neste trabalho difere dos padres

    tradicionais das indstrias. Normalmente, a base informacional composta por extensos detalhamentos do produto a ser materializado que no so transferidos diretamente do projeto para a produo, necessitando de agentes intermedirios que realizem tarefas manuais baseadas na interpretao e transposio da informao. No modelo apresentado, a transferncia direta entre projeto e produo viabiliza o desenho de produtos mais complexos e elimina a necessidade dos agentes intermedirios, facilitando a operao deste tipo de negcio. Ademais, as tecnologias digitais necessitam de indivduos com maior grau de capacitao o que resulta em uma melhor remunerao dos agentes diretos envolvidos em todos os processos.

    Embora com limitada possibilidade de customizao dos artefatos, a

    estruturao deste novo modelo de produo deve permitir a adoo de nveis mais elaborados de customizao na medida em que se avanar na integrao das ferramentas utilizadas. A integrao entre os parmetros de configurao de modelos paramtricos com o sistema de comercializao pode permitir que os usurios possam alterar automaticamente algumas propriedades do produto para este ser produzido de acordo com as suas necessidades, incluindo o usurio como participante do processo de projeto. Constata-se a necessidade dos designers em captar as habilidades para manipular a matria-prima prpria dos arteses do passado e, deste modo, incorporar estratgias anlogas ao projeto virtual dos artefatos. Para isso, necessrio resgatar caractersticas especiais utilizadas por eles, como as conexes baseadas em encaixes, as superfcies entalhadas, as geometrias diferenciadas e outras propriedades que so difceis de reproduzir atravs do modelo de produo tradicional.

    Recentemente, iniciativas que compartilham caractersticas em comum com o

    modelo de produo apresentado esto emergindo e se consolidando em diversos pases, principalmente impulsionados pelos laboratrios de fabricao digital (fablab). Os fab labs concentram todos os recursos que estes novos modelos de produo necessitam e so pontos de experimentao que permitem desenvolver artefatos de forma livre e independente, sem necessidade de vnculo com uma empresa especifica, embora este vnculo tambm possa ocorrer e ser positivo para ambos os agentes, conforme constata Avogadro e Tesone (2013). Dispositivos eletrnicos de cdigo aberto, que so facilmente configurveis tambm vm permitindo ampliar a rea de experimentao das propostas existentes, especialmente com equipamentos interativos e conectados a aplicativos online. Novas pesquisas so necessrias para compreender e aprimorar cada etapa dos processos aqui apresentados.

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    6. CONCLUSO

    Alternativas ao modelo de produo seriada de artefatos fsicos em larga

    escala e pouco customizveis so possveis de serem estruturadas e aplicadas em razo das tecnologias digitais integrarem novos modos de projetar, produzir e comercializar estes bens. A equiparao tecnolgica entre pequenos e grandes produtores abre caminho para empreender em segmentos antes restritos as grandes corporaes. A fbrica mnima, um modelo de produo local, baseado nas tecnologias digitais, utilizando materiais de baixo impacto ambiental e conectado a uma rede colaborativa de designers pode ser uma opo favorvel em relao s questes de sustentabilidade e constitui tema relevante para futuras pesquisas e investigao no campo do design.

    AGRADECIMENTOS

    A CAPES (Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior) e a

    FAPERGS (Fundao de Amparo a Pesquisa do Rio Grande do Sul) pela concesso de bolsa de pesquisa. Ao professor Dr. Benamy Turkienicz. REFERNCIAS

    AVOGADRO, E. TESONE, J. Industrias a Medida. Revista IF. Centro Metropolitano de Diseo. Buenos Aires. 2013. n. 08. p. 32-35. Acesso em 10 de maro de 2014. Disponvel em: BARROS, A. M. de. Fabricao digital: Sistematizao metodolgica para o desenvolvimento de artefatos com nfase em sustentabilidade ambiental. 2011. 102 f. Dissertao (Mestrado em Design) Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Escola de Engenharia. Faculdade de Arquitetura. Programa de Ps-Graduao em Design. DEMAT. Dematerialise the Machine Tools and Manufacturing Systems. 2013 Acesso em 15 de junho de 2013. Disponvel em: GERSHENFELD, N. How to Make Almost Anything: The Digital Fabrication Revolution. 2012. Foreign Affairs v.91. Acesso em 10 de maro de 2014 Disponvel em: GONDIM, C. Critrios para seleo de conexes em mobilirio orientado para adaptabilidade. 2010. 147 f. Dissertao (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Escola de Engenharia. Faculdade de Arquitetura. Programa de Ps-Graduao em Design. HAROUNI, L. A Primer on 3D Printing. TED Talks, 2012. Acesso em 10 de maro de 2014. Disponvel em:

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