desenvolvimento local, tecidos produtivos e formação · desenvolvimento local nos últimos anos a...

28
Fernando Casanova Desenvolvimento local, tecidos produtivos e formação Ferramentas para a transformação Oficina Internacional del Trabajo O I T CINTERFOR 1

Upload: vuthu

Post on 08-Feb-2019

223 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Fernando Casanova

Desenvolvimento local,

tecidos produtivos

e formação

Ferramentas para a transformação

Oficina Internacional del Trabajo

O I T

CINTERFOR

1

1. A ARTICULAÇÃO ENTRE GLOBALIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL

Nos últimos anos a idéia de globalização monopolizou as discussões de políticos, acadêmicos e agentes sociais. Este processo se caracteriza pela internacionalização da economia, da política e da cultura com uma velocidade e complexidade somente comparável com a revolução industrial. Qualquer indicador referente à interação de indivíduos de diferentes países, empresas, grupos sociais, sindicatos e organizações civis, ressalta o forte e permanente avanço deste processo de vinculação internacional.1

Alguns autores afirmam que não estaríamos diante de fenômenos tão novos

historicamente. Especificamente, se assinala que, ao longo do século XX, houve experiência suficiente em matéria de globalização dos mercados (Arocena, 1997; Williamson, 1997). Se afirma que antes da Primeira Guerra Mundial, o investimento estrangeiro direto foi de aproximadamente 9% da produção mundial, enquanto que em 1991 esse mesmo índice se situou em 8,5%. Também diz-se que países como França, Alemanha ou Reino Unido mostravam em 1913 uma porcentagem do comércio exterior sobre o produto nacional similar ao destes mesmo países em 1994. Disso não se pode deduzir que a globalização fosse alta ou baixa, mas sim de uma magnitude relativa similar. O mais interessante é que depois da etapa de globalização do início do século XX, sucedeu um período fortemente protecionista que incluiu as duas guerras mundiais;2 e ainda se formula a hipótese de que as políticas protecionistas, os egoísmos nacionalistas e os delírios racistas poderiam ter derivado de uma reação defensiva diante da ameaça globalizadora.

Outros autores afirmam, ainda, que o incremento do nível de interação entre as

diferentes economias nacionais durante as últimas duas décadas do século passado não tem precedentes (Rodriguez-Pose, 2001). Mesmo se reconhecendo que a maior parte do comércio mundial e do investimento estrangeiro direto (IED) se produz entre países desenvolvidos, também nota-se, ainda, que o maior crescimento relativo, no comércio e na IED, durante os últimos anos, correspondeu aos países em vias de desenvolvimento. Simultaneamente, muitos destes países abriram suas fronteiras, passando de uma indústria de substituição de importações ou de uma economia centralmente planificada a sistemas relativamente abertos de livre mercado.

Dentro desta discussão, entendemos que, apesar dos aspectos econômicos

referentes às finanças, fluxos e mobilidade de capital serem os que geralmente se aludem como consequência da globalização, este processo é muito mais complexo e não se limita à mundialização dos mercados. Como sustenta Camdessus3, não é possível medir a globalização unicamente segundo os índices de investimento estrangeiro ou segundo as porcentagens de comércio exterior, já que não existe uma 1 Francisco, Gatto, “Globalização e Regiões. A construção de vantagens competitivas localmente específicas”, em Desenvolvimento Local na Globalização, Centro Latinoamericano de Economia Humana (CLAEH), Montevideo, 1999. 2 Carlos Zaldivar Alonso: “Para participar no debate, pulsar sobre o ícone da globalização na economia”, em O País, citado po Arocena, Madri, 1977. 3 Michel Camdessus, “Regras, instituições e estratégias para o bem comum de uma economia global”, abertura inaugural da conferência internacional “Crescimento econômico - para que futuro?”, Jacques Maritain Internationa Institute, Roma, 30 de novembro a 2 de dezembro de 1995, publicada em Estudos Sociais, N.º 88, Santiago, 1966, p. 11.

2

única dimensão globalizada, sendo a multidimensionalidade a característica mais importante deste fenômeno.

Na opinião de Bervejillo4, existem ao menos cinco dimensões que devem ser

levadas em conta ao falarmos de globalização:

- Tecnológica: a criação de um novo espaço global, dado pela coincidência da informática, as telecomunicações, o desenvolvimento de novas tecnologias de transporte, controle e gestão de processos.

- Econômica: um novo sistema financeiro transnacional, a internacionalização dos

mercados de consumo e processos produtivos e a internacionalização das empresas.

- Cultural: o desenvolvimento dos meios de comunicação de massa eletrônicos que

permitem a simultaneidade da informação.

- Político/institucional e ideológico: uma nova multipolaridade dentro de um espaço de hierarquias e domínios, assim como a construção de novas regras globais.

- Físico/ambiental: certa incerteza para determinar a futura evolução da ação

humana.

Apesar de muitas vezes se sustentar que uma das tendências da globalização é a homogeneidade (mesmos produtos, mesmas preferências, mesma cultura em qualquer parte do mundo), a realidade mostra uma forte heterogeneidade enquanto oportunidades e riscos para as localidades. Se o efeito esperado inicialmente era de uma homogeneização das pautas de consumo, culturais, econômicas e políticas, o processo se revelou, posteriormente, muito mais complexo. Efetivamente muitas empresas e territórios conseguiram se adaptar com grandes benefícios. No entanto, e paralelamente, a abertura das economias nacionais deixa as estruturas econômicas locais descobertas, com escassa ou nenhuma capacidade de competir no ambiente globalizado. Isso levou ao desaparecimento de estruturas produtivas locais, ao desemprego; e em outros casos, quando se conserva o emprego, se regenera-o para servir a economia global, deteriorando as condições de trabalho. Os trabalhadores com menores graus de qualificação encontram maiores dificuldades para serem contratados o que provoca um crescimento do setor informal e um incremento do trabalho precário. Por outro lado, as visões de que se pode perceber o processo de globalização, tanto do âmbito local como do nacional, têm, justamente, uma relação direta com as consequências que estes mesmos planos tiveram naquele processo.

Nos remetendo novamente a Bervejillo5 podemos dizer que este processo

globalizador abre oportunidades para as localidades, assim como também coloca novas ameaças.

Do ponto de vista das ameaças este autor identifica quatro manifestações: em

primeiro lugar, se encontra a ameaça de marginalização ou exclusão daquelas localidades ou áreas que não chegam a ser – ou deixam de sê-lo – atrativas e relevantes para a economia mundial; ao diminuir as proteções estatais muitas localidades enfrentam a possibilidade real de cair na estagnação, retrocesso ou 4 Bervejillo, Federico, “Territórios da Globalização. Novos processos e estratégias de desenvolvimento”, em Revista Prima N.º 4, Universidde Católica do Uruguai, Montevidéu, 1995. 5 Bervejillo, Federico, op. cit.

3

abandono. Em segundo lugar, existe a possibilidade de algumas regiões se oporem a uma integração subordinada, ao dependerem de atores globais externos, que além de não contarem com arraigo territorial, carecem de responsabilidade frente à sociedade local com a qual mantêm laços sumamente frágeis, o que lhes permite a retirada de seus investimentos atraídos por condições mais vantajosas em outros territórios. Em terceiro lugar, se destaca a possibilidade de fragmentação, desmembramento e desintegração econômica e social de certas unidades territoriais, regiões ou cidades, dependendo da diferente inscrição no sistema global; em algumas cidades esta fragmentação pode traduzir-se em uma dualização entre camadas de população globalizadas e as restantes. Finalmente, existe uma ameaça de caráter ambiental, produto da imposição de um modelo de desenvolvimento não sustentável.

A globalização também pode ser vista como uma oportunidade para o

desenvolvimento dos territórios, destacando-se duas linhas principais: em primeiro lugar, este processo permite a certos territórios um maior acesso a recursos globais relacionados com a tecnologia, capital e mercados; por outro lado, supõe para certos territórios uma revalorização dos recursos endógenos. Neste sentido, a globalização seria uma janela de oportunidades para territórios que contam com capacidades estratégicas relevantes.6

A concepção do processo globalizador como uma oportunidade implica enfrentar

o dilema global-local a partir de uma concepção bastante minoritária. Arocena7 distingue três maneiras nas quais as localidades enfrentam a problemática global-local:

- A primeira é conceber a globalização como uma ameaça que tende a eliminar as autonomias e, com elas, os atores locais ou regionais que possam oferecer resistência ao processo global; desta perspectiva, a possibilidade de desenvolvimento local se converte em um impossível constante enquanto as condições internacionais se mantiverem imutáveis.

- Uma segunda concepção vê no local a alternativa para enfrentar a ameaça

globalizadora, implantando uma espécie de “revolução antiglobal” que permita aos atores locais recuperar seu poder. Dentro deste pensamento se agrupam formas de resistência política e cultural ao processo de globalização, que podem desembocar em manifestações de tipo nacionalista ou na formulação de projetos políticos com forte ênfase no resgate e conservação dos elementos que caracterizam uma sociedade local determinada. A diferença da primeira concepção é que nesta os atores locais têm um forte protagonismo já que eles são os “encarregados” de acabar com a hegemonia global; ainda assim, ambas concepções compartem a idéia de conceber a globalização como uma ameaça.

- A terceira modalidade de relação global-local, segundo Arocena, é um pouco mais

complexa. A mesma tenta uma articulação entre o local-global concebendo a globalização como uma oportunidade e um desafio a se explorar em prol do desenvolvimento local. Neste sentido se destacam iniciativas nas quais algumas regiões procuraram adotar com maior ou menor êxito estratégias de inserção na novas lógicas globais, às vezes de um ponto de vista passivo ou funcional, e em outras apoiando-se nos aspectos característicos e peculiares das sociedades, territórios e seus tecidos produtivos, como forma de desenhar estratégias de

6 Bervejillo, Federico, op. cit. 7 Arocena, José, “Globalização, integração e desenvolvimento local. Apontamentos para a elaboração de um marco conceitual”, em Pessoa e Sociedade, ILADES, Santiago do Chile, 1987.

4

competitividade distintivas. A possibilidade de complementaridade entre globalização e desenvolvimento local é bem expressada por Girardo8 quando adverte que (...) o mercado mundial necessita cada vez mais multiplicar e diferenciar os produtos e os consumos; desta maneira, o que se produz em nível local começa a valorizar-se mais, já que se agrega a particularidade, qualidade e valor aos produtos para a competição no mercado global.

Independentemente da ponderação histórica do processo globalizador, há muitos

anos está claro que existe um interesse renovado, tanto acadêmico como político, por entender como as regiões e territórios constróem suas estratégias de inserção econômica no mercado global. No plano acadêmico, o processo se inicia com o questionamento das perspectivas neoclássicas e o novo impulso às teorias do crescimento econômico, fundamentalmente através dos enfoques do crescimento endógeno. Isso continua com as formulações agrupadas nas teorias do desenvolvimento endógeno e, mais recentemente, nos enfoques do desenvolvimento econômico local (DEL).

No plano político, a partir da possibilidade de realizar uma avaliação dos efeitos

das políticas de liberação econômica, as experiências de determinados territórios que, mediante a estratégias tão originais como peculiares quanto a suas características produtivas e sociais, conseguem evitar, com maior ou menor êxito, os efeitos mais regressivos da globalização, começam a ser vistas com grande interesse.

Tentando identificar os fatores históricos que contribuem nesta renovação do

pensamento teórico, do interesse empírico e da política regional, Hualde9 destaca as seguintes variáveis:

- A crise do Estado-nação keynesiano e o desenvolvimento de outros atores como, por exemplo, as transnacionais.

- A delegação de responsabilidades às regiões, caracterizada por uma reivindicação

entorno de suas competências e um poder maior de decisão das mesmas. Estes fenômenos se conjugariam em tendências para a descentralização e a autonomia regional.

- As críticas à política regional e industrial clássica “de cima para baixo”.

- Uma nova concepção de espaço, perante o desenvolvimento das tecnologias da

comunicação e informação.

- As novas formas organizacionais das empresas; mais flexíveis e descentralizadas.

- O papel central da aprendizagem e do conhecimento.

No que diz respeito à América Latina é evidente que nem todos os territórios visualizaram na globalização uma oportunidade de desenvolvimento. Durante a década de 90, o crescimento da América Latina e Caribe foi menor que na “década perdida”

8 Girardo, Cristina, comentários incluídos em boxes, em Hualde, A., idem 9 Hualde, Alfredo, “O território como configuração complexa nas relações entre educação e trabalho”, em Desenvolvimento local e formação, Série Ferramentas para a transformação, Cinterfor/OIT, Montevidéu, 2002.

5

dos anos oitenta. Rodríguez-Pose10 aponta que somente um número limitado de espaços parece estar tirando vantagem das novas oportunidades que o processo de globalização oferece. Em geral, as regiões mais prósperas tendem a ser aquelas que têm algo a oferecer a mercados que se expandem além do âmbito tradicional local e regional.

O mesmo autor adverte que, em termos gerais, a evidência empírica tende a

mostrar que os casos de áreas dinâmicas no mundo globalizado são relativamente excepcionais. Isto é algo que se constata tanto na comparação entre países, como no interior deles, através das diferenças que as distintas regiões e localidades mostram em sua capacidade de adaptação.

As reflexões anteriores estariam indicando que, primeiro, o processo globalizador

tende a gerar – como em momentos históricos anteriores – processos reativos, seja de resistência, seja de adaptação das sociedades locais aos novos contextos gerados. Segundo, que este processo de globalização não só não é necessariamente contraditório com o surgimento de processos de desenvolvimento endógeno em determinados territórios, como também pode, inclusive, estar encorajando-os; ainda parecendo notório que tende a questionar a vigência dos estados nacionais como os atores protagônicos per se dos processos de desenvolvimento.

Cabe perguntar-se, então, que tipos de opções restam para que as pessoas,

empresas e regiões consigam se inserir com êxito na economia globalizada, através de processos de desenvolvimento que sejam sustentáveis e gerem trabalho de qualidade. A este respeito, a primeira coisa que é necessário dizer é que não existe um modelo único para enfrentar este desafio. A diversidade na natureza de pessoas, empresas e territórios se incumbe de possibilidades de estratégias possíveis igualmente diversas.

Esta é uma das diferenças claras entre as políticas tradicionais de

desenvolvimento e as novas estratégias de desenvolvimento a nível local: enquanto as primeiras se orientam segundo padrões comuns e que se pretendiam replicáveis, as segundas são sempre tão originais, como são peculiares os territórios onde surgem.

10 Rodríguez-Pose, Andrés, O papel da OIT posta em prática estratégias de Desenvolvimento Econômico Local em um mundo globalizado, Local Economic Development Programme (LED), Documento de política, Londres, 2001.

6

2. AS DIMENSÕES DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO LOCAL

Mesmo que possa parecer paradoxal, esta etapa de globalização, integração

mundial e derrubada de fronteiras econômicas, que atualmente estamos assistindo, se converteu no contexto adequado para que os projetos de desenvolvimento local se impulsionem e se fortaleçam. Segundo Enríquez11, este resgate da identidade local atua como um mecanismo social de defesa que põe as regiões em jogo. Segundo este autor, não é casualidade, portanto, que certas iniciativas de desenvolvimento local pretendam reeditar o interesse nas estratégias de desenvolvimento praticamente abandonadas durante a década de 80.

Nos centrando no conceito de desenvolvimento, é necessário esclarecer que o mesmo se encontra em um processo de reestruturação. Logo após a Segunda Guerra Mundial e a fragmentação do mapa político, surgiu a necessidade de reconstruir ou recompor a “ordem mundial” quebrada. Esta situação originou a existência de dois modelos de reconstrução: o ocidental ou capitalista e o oriental ou socialista. Porém, estas duas ordens não chegaram a abranger a totalidade da humanidade; muitos países ficaram excluídos destas duas classificações, formando uma zona marginal dentro do sistema mundial, ou o que se denominou Terceiro Mundo.12

Diferentemente dos demais países, para o Terceiro Mundo nunca se pensou a

vontade de reconstruir ou recompor uma determinada “ordem”, mas se utilizou a palavra desenvolvimento desta maneira “(...) uma parte do mundo deveria se reconstruir e a outra deveria se desenvolver”.13 A noção de desenvolvimento implicava, então, percorrer um caminho cujo ponto de chegada era uma sociedade industrializada.

Esta situação provocou um certo enfrentamento entre as concepções de cunho puramente econômico, por um lado, e as estritamente sociais, por outro, debatendo sobre qual é o verdadeiro conteúdo do desenvolvimento. Segundo as definições mais economicistas, um país podia se considerar desenvolvido na medida que ele mesmo alcançava um crescimento econômico sem reparar nos custos sociais deste crescimento. A segunda visão – puramente social – surge em oposição à descrita e sustenta que todo crescimento econômico representa uma ameaça às condições sociais.

Em busca de uma harmonização destas duas idéias, nos últimos anos se compreendeu que é tão utópico conceber o desenvolvimento baseado unicamente em aspectos sociais como unicamente em aspectos econômicos. Apesar da eficácia e eficiência no econômico aumentarem o produto social, não necessariamente melhoram o nível de satisfação das necessidades básicas coletivas.14 Gago entende que “O

11 Enríquez, Alberto, “O desenvolvimento Regional/Local”, em Para uma delimitação conceitual do desenvolvimento regional/local, FUNDE, El Salvador. 12 Arocena, José, O desenvolvimento local: um desafio contemporâneo, CLAEH, UCUDAL, Nova Sociedade, 1ª edição, Venezuela, 1995. 13 Arocena, José, op. cit. 14 Pérez, Fernando, Os efeitos do processo de integração na fronteira Uruguai-Brasil. Oportunidades e limites para os departamentos fronteiriços, Programa de Desenvolvimento Regional (PDR), Rede de Organizações Comunitárias e Sociail do Mercosul, inédito.

7

desenvolvimento é um processo de mudança estrutural global (econômico, político, social, cultural e do meio ambiente), tendente a aumentar a qualidade de vida de todos os membros integrantes da sociedade, de forma de alcançar uma satisfação mais completa das necessidades coletivas básicas”;15 além disso, se assinala que toda política que tende a provocar o desenvolvimento deve levar em conta as realidades sociais e regionais onde se aplica. Estas realidades condicionam as decisões a tomar, assim como também a estratégia e a tática a seguir.

Quando nos referimos a desenvolvimento local, entendemos um processo no qual uma sociedade local, mantendo sua própria identidade e seu território, gera e fortalece suas dinâmicas econômicas, sociais e culturais, facilitando a articulação de cada um destes sistemas, conseguindo maior intervenção e controle entre eles.16 Para levar adiante este processo, é fundamental a participação dos agentes, setores e forças que interagem dentro dos limites de um território determinado, os quais devem contar com um projeto comum que combine: a geração de crescimento econômico, igualdade, mudança social e cultural, sustentabilidade ecológica, enfoque de gênero, qualidade e equilíbrio espacial e territorial, com a finalidade de elevar a qualidade de vida e o bem estar de seus moradores.17

Por sua vez, a denominação de estratégias de desenvolvimento econômico local

(DEL) se aplica a uma variedade de instrumentos que, em oposição à tradição das políticas centralistas de desenvolvimento, procuram animar os processos de fortalecimento das vantagens comparativas que se manifestam em determinados territórios. Para isso, as estratégias se centram mais no que se conhece como fatores “endógenos”: o tecido econômico local, os recursos humanos e o marco institucional local. Consiste, definitivamente, em trabalhar baseado em que a atividade econômica depende das condições sócio-econômicas do lugar, ao invés do contrário.

A substituição do termo “políticas” por “estratégias” não é por acaso. Isso se

vincula ao processo de revisão das concepções que, historicamente, identificaram as políticas públicas com um campo onde a prerrogativa, inclusive até o monopólio da ação, radicava no aparelho estatal, a maioria das vezes central. No novo enfoque, diferentemente, a ação pública estatal se articula com a iniciativa, recursos e capacidades dos atores sociais e privados, redesenhando o que se considera como espaço do “público”. Este último passa a ser entendido em sua concepção mais essencial e originária: a quem compete os assuntos de interesse comum e cuja gestão convoca a todos os atores envolvidos, desde sua própria identidade.

Em uma revisão dos antecedentes teóricos do enfoque DEL, Vásquez Barquero18

identifica, em primeiro lugar, os desenvolvimentos realizados através da economia pela escola de crescimento endógeno. Este surgiu em oposição ao pensamento neoclássico e sua teoria do crescimento econômico, cuja hipótese de rendimentos decrescentes o levou a reconhecer que, em última análise, o motor do crescimento econômico era o

15 Gago, Alberto, Planejamento e Desenvolvimento Regional. Curso Latinoamericano de Desertificação, Mza., novembro, 1993. 16 Podestá, Enrique, Estudo da gestão ambiental na microregião de Rosário, Programa de Desenvolvimento Local do Centro Latinoamericano de Economia Humana (CLAEH), Série Desenvolvimento Local na América Latina N.º 4, Montevidéu, 1999. 17 Enríquez, Alberto, op. cit. 18 Vásquez Barquero, Antonio, “Crescimento endógeno ou desenvolvimento endógeno?”, Cadernos do CLAEH, N.º 78-79, 2ª série, ano 22, Montevidéu, 1997 / 1-2.

8

progresso tecnológico, já que o acúmulo de capital tendia a enfraquecer a longo prazo.19

Em contraposição, as teorias do crescimento endógeno têm dado passos

importantes para reconciliar a teoria econômica com a evidência empírica. Nelas, se considera o avanço tecnológico uma variável endógena dos modelos, uma vez que se incorpora o poder de mercado das empresas nos processos de inovação e crescimento econômico.

Várias das conclusões levantadas a partir desta perspectiva são incorporadas

pelas teorias do desenvolvimento endógeno relativamente mais recentes. Tanto a perspectiva do crescimento como a de desenvolvimento endógeno compartem a visão de que os sistemas produtivos reúnem um conjunto de fatores materiais e não materiais que permitem às economias locais e regionais empreender vias diferenciadas de crescimento em função do potencial de desenvolvimento e que, portanto, existe um espaço para as políticas regionais e industriais. As taxas de crescimento da economia dos territórios e, portanto, as diferenças nos níveis de renda e produção, seriam consequência das diferenças não só nos “stocks” de capital-trabalho, mas também nos níveis educativos, na capacidade de geração de I + D e, definitivamente, no progresso econômico gerado pelas empresas e a administração pública.

O desenvolvimento econômico seria, portanto, um processo de crescimento e

mudança estrutural, no qual as formas de organização, o sistemas de relações e a dinâmica de aprendizagem têm um papel estratégico. Mas, além disso, se caracterizaria por sua dimensão territorial, não somente devido ao efeito espacial dos processos organizacionais e tecnológicos, mas também pelo fato de que cada localidade ou região é o resultado de uma história em que se foi configurando o ambiente institucional, econômico e organizacional.

Da perspectiva do desenvolvimento endógeno, ainda, o social se integra com o

econômico. A distribuição da renda e da riqueza e o crescimento econômico não são dois processos que surgem e se formam de maneira paralela, mas sim que adquirem uma dinâmica comum, devido ao fato de que os atores públicos e privados tomam decisões de investimento orientadas a resolver os problemas locais, das empresas e da sociedade. O local é um espaço em que as iniciativas dos diversos setores da sociedade organizada se tornam realidade.

Esta evolução não oculta, no entanto, a falta de um modelo teórico claramente

definido para os enfoques DEL, e que eles se inspiram, na maioria das vezes, na própria experiência, dificultando, assim, o surgimento de uma definição precisa e aceitada. Por outro lado, existe uma série de esforços orientados a determinar os aspectos ou componentes distintivos deste enfoque.

Assim, por exemplo, White y Gasser20 determinam quatro linhas básicas que

caracterizam as estratégias DEL: a) necessitam da participação e o diálogo social; b)

19 “A suposição de rendimentos decrescentes do capital, implica que a longo prazo a taxa de crescimento da produtividade tenda a zero já que o investimento se dirige a atividades cada vez menos produtivas e que, portanto, desanimam o investidor. O modelo neoclássico levaria, então, ao estado estagnado, no qual as variáveis crescem a uma taxa perto de zero”. Vásquez Barquero, Antonio, idem. 20 White, S.; Gasser, M., Local economic development: a tool for supporting locally owned and managed development processes that foster the global promotion of decent work, Departamento de Criação de Emprego e Desenvolvimento Empresarial da OIT, Genebra, 2001.

9

têm como base um território; c) implicam a mobilização dos recursos e vantagens comparativas locais; e d) são realizados e administrados localmente.

O Programa de Desenvolvimento Econômico Local da OIT utiliza, por sua vez,

uma definição que inclui estas quatro características, quando considera o DEL como “um processo de desenvolvimento participativo que fomenta os acordos de colaboração entre os principais atores públicos e privados de um território, possibilitando o planejamento e a prática de uma estratégia de desenvolvimento comum a fim de aproveitar os recursos e as vantagens competitivas no contexto global com o objetivo final de criar emprego decente e estimular a atividade econômica”.

Outro autor, cujos trabalhos são freqüentemente considerados como referência

desde o enfoque DEL, é Michael Porter, fundamentalmente a partir de sua obra La Ventaja Competitiva de las Naciones (A Vantagem Competitiva das Nações).21 A obra aborda, entre outras questões, a pergunta: por que em algumas regiões relativamente pequenas, e não em outras, há concentrações de atividade econômica exitosa? O autor observa que as empresas não surgem de forma independente, mas seu desenvolvimento obedece a um meio nacional que apoia e cultiva a competitividade.

Mais especificamente, Porter identifica quatro fatores interrelacionados que são

fundamentais para alcançar a vantagem competitiva de uma nação, região ou área local. O primeiro deles tem a ver com os fatores básicos relacionados com a dotação de recursos ou fatores em que se baseia a vantagem competitiva: terra, mão de obra e capital. A estes fatores, que são muito difíceis de replicar, Porter acrescenta um segundo, que consiste em uma exigente demanda dos consumidores locais ou nacionais, que tende a criar tradições e culturas relacionadas com a produção ou o serviço que se gera local ou nacionalmente. O terceiro fator de importância para este autor, é a cercania territorial e, mais especificamente, a criação de cluster ou agrupamentos de unidades de produção e provedores em torno de uma determinada indústria ou serviço. Finalmente, o quarto fator tem a ver com o marco institucional e com as práticas comerciais, que contribuem para criar regras do jogo claras e estáveis, importantes tanto para o investimento, como para o desenvolvimento de vantagens competitivas.

Estes quatro fatores constituem o que se passou a chamar o “diamante” da

vantagem competitiva no desenvolvimento econômico local. Por sua vez, e baseados na consideração dos mesmos, autores como Ickis,22 identificaram os obstáculos que, alternativamente, podem apresentar-se para sua plena concretização. Estes obstáculos seriam: a) a excessiva dependência dos fatores baseados em vantagens competitivas; b) o distanciamento dos consumidores (espacial, mas também e fundamentalmente, em termos de comunicação e informação); c) o desconhecimento da posição relativa em termos de mercado; e d) a inadequada integração para o avanço e a falta de cooperação na indústria. Ambos aspectos, fatores de competitividade e obstáculos potenciais, se apresentam no gráfico da página seguinte.

21 Porter, Michael E., A vantagem competitiva das nações, Vergara Editor S.A., 1991. 22 Ickis, John C., Como ganhar vantagem competitiva no desenvolvimento econômico local, Guatemala, 1998, publicado em: www.ilo.org.led

10

Fatores baseados na vantagem competitiva (terra, capital, mão de obra)

Factor conditions

O diamante das vantagens competitiva e seus obstáculos potenciais (Porter / Ickis)

Demanda dos

c

Cercania

territorial

Distanciamento

Desconhecimento

Integração inadequada

para adiante e falta de

ooperação naindústria

Dependência

de recursos

Marco institucional e

Vantagens

11

Rodriguez-Pose,23 por sua vez, realizou uma comparação entre as linhas que caracterizam as estratégias DEL e as políticas tradicionais de desenvolvimento (de cima para baixo), identificando pelo menos cinco aspectos que anulam as diferenças de entidade: Primeiro, enquanto nos enfoques tradicionais de cima para baixo, a tomada de decisões sobre onde pôr em prática as estratégias de desenvolvimento recai sobre os administradores do governo central, com apenas o envolvimento dos atores locais, as práticas do DEL favorecem o fomento do desenvolvimento baseado em utilizar o potencial econômico e a vantagem competitiva peculiar de cada espaço. Deste modo, a iniciativa acerca da estratégia de desenvolvimento a seguir é considerada ou de modo local ou com um grande apoio local. Segundo, como resultado de onde e como se tomam as decisões, as políticas tradicionais se desenharam, gerindo e pondo em prática normalmente, dos e pelos ministérios ou as agências do governo central. A intervenção dos atores locais nas estratégias DEL implica, ao contrário, um maior grau de coordenação vertical e horizontal por parte de todos os atores envolvidos.24 A terceira diferença faz referência ao tipo de planejamento adotado sobre o desenvolvimento. As políticas tradicionais tenderiam a adotar um enfoque setorial. Um dos principais objetivos destas medidas era o fomento de setores industriais concretos que contribuíram para gerar um dinamismo econômico. Por outro lado, o DEL utiliza um planejamento territorial como forma de alcançar o desenvolvimento. Deste modo, o diagnóstico das condições econômicas, sociais e institucionais particulares de cada território e a identificação do potencial econômico local são a base sobre a qual se constrói qualquer estratégia de desenvolvimento. Quarto e último, ambos enfoques se diferenciam também por sua maneira de atrair atividade econômica. Enquanto os enfoques tradicionais haviam confiado basicamente nas ajudas financeiras, pacotes de incentivos e subsídios na hora de atrair e manter atividade econômica, o DEL tende, em geral, a evitar tais incentivos e a se concentrar na melhora das condições básicas para o desenvolvimento e atração de maior atividade econômica.

Principais diferenças entre as políticas tradicionais de cima para baixo

e os enfoques de baixo para cima adotadas por DEL

Políticas tradicionais de desenvolvimento Desenvolvimento econômico local 1. Enfoque de cima para baixo no qual as

decisões sobre em que áreas se necessita intervir se tomam a partir do centro

1. Promoção do desenvolvimento em todos os territórios com a iniciativa tomada com freqüência de baixo

2. Gestão feita a partir da administração central

2. Descentralizado, coordenação vertical entre diferentes níveis de governo e coordenação horizontal entre órgãos públicos e privados

3. Enfoque setorial para o desenvolvimento 3. Enfoque territorial para o desenvolvimento

(localidade, milieu) 4. Desenvolvimento de grandes projetos

industriais a fim de fomentar outras atividades econômicas

4. Utilização do potencial de desenvolvimento de cada área, a fim de fomentar um ajuste progressivo do sistema econômico local às mudança do entorno econômico

5. Ajudas financeiras, incentivos e subsídios como principais elementos de atração para a atividade econômica

5. Previsão das condições chave para o desenvolvimento da atividade econômica

23 Rodriguez-Pose, Andrés, op. cit., pp. 9-10. 24 A coordenação vertical supõe a sincronização das instituições locais, regionais, nacionais e supranacionais ou internacionais. A coordenação horizontal compreende aos atores públicos e privados preocupados com os assuntos do desenvolvimento, Rodriguez-Pose, Andrés, idem.

12

Fonte: Rodríguez-Pose, Andrés, O papel da OIT na prática de estratégias de Desenvolvimento Econômico Local em um mundo globalizado, Local Economic Decelopment Programme (LED), Documento de política, Londres, 2001. Finalmente, e segundo Vásquez Barquero,25 as estratégia DEL se apoiam em uma combinação do desenvolvimento em três dimensões, as quais denomina hardware, software e orgware econômico. O hardware se refere à aspectos tais como as infra-estruturas básicas, redes de comunicação e transportes, assim como ao espaço industrial e a infra-estrutura com fins educativos, de saúde e cultura.

O software se refere ao desenho e implementação de estratégias integrais de desenvolvimento local. Isto inclui o diagnóstico de quais são as vantagens comparativas e as disfunções de cada espaço, assim como a articulação de quatro eixos: a melhora da competitividade das empresas locais, a atração de investimento externo, a melhora do capital humano ou a formação de mão de obra e a construção de infra-estrutura. O objetivo básico aqui é a construção de uma estratégia de desenvolvimento local equilibrada que contribui para a geração de desenvolvimento sustentável e a criação de emprego. Segundo Rodríguez-Pose, na medida que se consiga que toda atividade econômica que tenha lugar em um território dependa das condições locais e tenha base parae administrar a estratégia localmente, se pode concluir que o emprego criado será, provavelmente, de melhor qualidade que em outras alternativas de políticas de desenvolvimento. O orgware, entretanto, se refere à capacidade das instituições e organizações de planejar, pôr em funcionamento e controlar toda a estratégia de desenvolvimento. Rodríguez-Pose adverte que o desenvolvimento desta dimensão vai mais além da mera coordenação vertical e horizontal dos diferentes níveis de governo e dos atores públicos e privados, pois implica em dar um papel de mais destaque à sociedade local, a fim de incentivar e dar mais voz e mais voto no que se refere a seu próprio destino. Com todo o fortalecimento das sociedades locais, segundo este último autor, não deveria ser considerado como a meta principal ou única de qualquer estratégia DEL, e sim como um meio para conseguir o desenvolvimento sustentável, gerando emprego e um maior dinamismo econômico.

25 Vázquez Barquero, A., Desenvolvimento, redes e inovação: lições sobre desenvolvimento endógeno, Pirámede, Madri, 1999.

13

3. TERRITÓRIOS DIVERSOS, TECIDOS PRODUTIVOS ESPECÍFICOS

Apesar da existência de antecedentes centenários em matéria de interesse

pelas particularidades da economia regional,26 seu auge atual teve início a partir do começo da década de 1970 quando, nos Estados Unidos, se começa a analisar mais sistematicamente os processos de desindustrialização no norte e a conseqüente migração de fábricas para o sul e para fora do país, devido a fatores como as importações de aço, automóveis e máquinas e a maturação de serviços e incentivos para a localização industrial em outras regiões.

Um dos fenômenos que mais chamou a atenção entre os gestores e estudiosos

das políticas de desenvolvimento econômico foi a tendência dos negócios concentrarem-se em determinadas regiões, configurando clusters ou distritos industriais (industrial districts).27 O estímulo mais claro para o desenvolvimento de tal tendência estaria nas vantagens oferecidas, tanto pela concentração de provedores e serviços especializados, como de clientes e consumidores.

Cabe delatar, no entanto, que o conceito de cluster ou de distrito industrial – tal

como corresponde com os distritos industriais italianos – nem sempre é aplicável a todas as regiões e territórios, inclusive quando se está diante de um agrupamento de empresas do mesmo ramo.

Meyer Stamer,28 ao se referir aos países em vias de desenvolvimento, distingui

três tipos de clusters (com concepções de promoção específicas): de sobrevivência, fordista e transnacional. O cluster de sobrevivência pertence ao setor informal da economia e é constituído por micro-empresas de subsistência com determinadas características que se destacam: capital social modesto, grande desconfiança entre empresas, concorrência ruinosa e capacidade mínima de inovação. Entre os clusters com maior potencial de desenvolvimento, se encontram aqueles dominados por grandes empresas, criados para substituir importações na fase de industrialização e onde ainda predomina o modelo de produção fordista em grande escala. Finalmente, o cluster transnacional é o resultado da alteração nas estratégias das empresas transnacionais. Isso se deve à combinação de dois fatores: de um lado, as exigências dos países hospedes que conseguem o investimento das empresas em desenvolvimento de provedores; e de outro, da estratégia de conferir a estes provedores o status de globally preferred suppliers, apontando sua presença em todas as localizações através do mundo.

26 Já no século XIX diversos estudos do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos e os serviços de extensão de algumas universidades se ocuparam em estabelecer as vantagens comparativas para a agricultura em diversas economias regionais e estatais, animados pelos objetivos de incrementar a produtividade dos estabelecimentos e a estabilização das famílias rurais (Makusen e Schrock, 2001). 27 Um industrial district não consiste estritamente em um conjunto de terrenos com empresas de vários ramos, como se pode encontrar em alguns países da América Latina, e sim uma aglomeração industrial com um perfil restrito de especialização, como centenas de empresas que produzem calçado, por exemplo. 28 Meyer-Stamer, Jörg, “Estratégias de Desenvolvimento Local e Regional: Clusters, Política de Localização e Competitividade Sistêmica”, ILDES, Policy Paper N.º 28, Setembro, 2001. Disponível em: http://www.fes.org.br

14

Markusen identifica, além do modelo italiano, o modelo de eixo-raios (com grandes empresas no centro, como eixo), o cluster-satélite (dominado de fora) e o modelo induzido pelo Governo.29

No entanto, o conceito de distrito industrial como um espaço geográfico e social

onde, mediante diferentes configurações, se produz um importante grau de especialização econômica, abarca apenas uma parte da atual diversidade mundial em matéria de experiências econômicas regionais. Neste sentido e concentrando-se no que denomina como “regiões ganhadoras” no atual contexto de globalização, Rodríguez-Pose se refere à três categorias:30

a) Grandes regiões metropolitanas: as grandes aglomerações urbanas tanto no

mundo desenvolvido como em vias de desenvolvimento concentram muita da atividade de serviços com acréscimo de alto valor. Os serviços empresariais, financeiros, imobiliários e de seguros passam a se agrupar mais que nunca nas grandes regiões urbanas, como as sedes das grandes empresas. As economias de aglomeração resultantes desta concentração de fatores de produção estão atraindo tanto atividades de investigação e desenvolvimento como o desenho por parte das grandes metrópoles globais. Outro tanto estaria acontecendo com o investimento estrangeiro direto. No entanto, também adverte que na maioria destas grandes aglomerações urbanas em todo o planeta se sofre a aparição da economia dual, na qual a riqueza e os trabalhos altamente produtivos coexistem com graves estados de necessidade econômica e social, com um setor informal cada vez maior e com trabalhos precários e mal pagos no setor de serviços.

b) As regiões industriais intermédias: seria o segundo grupo de territórios que estaria

tirando proveito da maior mobilidade dos fatores de produção ao redor do mundo. Este tipo de área conta com vantagens de capital humano e de acessibilidade em relação às regiões mais periféricas, que se tornam destino mais atrativo para os novos investimentos industriais. A combinação de salários baixos, uma força de trabalho relativamente qualificada e sua acessibilidade aos mercados, as converte em objetivos deste último tipo de investimento. Grande parte da produção em série se concentra atualmente nestas áreas.

c) Regiões turísticas: que nos países em vias de desenvolvimento conseguiram

encontrar seu nicho de mercado na economia globalizada, conquistando um grande êxito em sua capacidade de atrair um grande número de turistas de todo o mundo ou, ao menos, estabelecer uma indústria turística relativamente próspera.

A aplicação de parte ou todas as tipologias antes expostas à região da América

Latina e Caribe acaba com diversos problemas. Em parte porque em alguns casos, elas foram construídas a partir do estudo de economias regionais nos países mais industrializados e também porque qualquer tentativa de caracterização com aspirações universais encontra dificuldades na hora de aplicar de forma mais concreta a u continente com uma heterogeneidade importante de todo ponto de vista.

Sem esgotar a totalidade de possibilidades existentes em matéria de economias

regionais e locais tem-se no continente, ao menos, os seguintes tipos de situação:

29 Markusen, Ann, Sticky Places in Slippery Space: A typology of industrial districts, Economic Geography, 1996. Disponível em: http://www.hhh.umn.edu/people/amarkusen/districts.pdf 30 Rodríguez-Pose, op. cit.

15

a) Áreas rurais tradicionais: boa parte dos países da América Latina e Caribe ainda contam com uma importante proporção de sua população localizada em áreas rurais. Nestas regiões é comum encontrar uma atividade econômica centrada na agricultura ou na criação de gado em pequena escala, com baixos níveis de produtividade e orientada, em grande medida, ao autoconsumo. É neste tipo de área onde encontra-se os mais altos índices de pobreza e necessidades básicas insatisfeitas, além das taxas mais altas de analfabetismo e condições de saúde insuficientes. Apesar de alguns casos em que este tipo de produção pode estar ligada a cadeias de produção e comercialização maiores, ele convive com estruturas arcaicas de distribuição, posse e usufruto da terra, o que inibe as perspectivas de modernização da produção e as condições de vida da população. Boa parte dos conflitos políticos e sociais, especialmente os armados, têm ou tiveram lugar nestas áreas.

b) Áreas rurais turísticas: uma parte ainda relativamente pequena das áreas rurais

latino-americanas acharam nichos de mercado na exploração de seu potencial turístico. Em alguns casos as novas oportunidades deslocam as atividades econômicas tradicionais, seja pelas previsões de maior rentabilidade, seja pela existência de uma crise produtiva prévia. Em outros, os empreendimentos turísticos não somente coexistem com as atividades econômica características da região, como se reforçam com elas. Em geral, o auge turístico destas áreas está relacionado com o acesso à atrativos naturais, ainda que também possa haver outro tipo de estímulos, como as particularidades da cultura local, a presença de restos arqueológicos, ou o próprio atrativo das atividades produtivas que se desenvolvem no local.

c) Áreas agro-industriais: a produção de grãos como arroz, cevada, soja, trigo; de

girassol, cana-de-açúcar, vide, cítricos; ou ainda criação de gado orientada à leiteria e derivados ou à produção de carne e couros de qualidade, alcança em algumas regiões da América Latina e Caribe níveis de modernas cadeias agro-industriais. A este respeito, se constatam importantes níveis de investimento e desenvolvimento tecnológico que resultam em produções de alto valor agregado, sobretudo se comparadas às áreas de produção agrícola tradicional. A distinção entre áreas rurais e urbanas, e entre população urbana e rural nestes casos, acabam sendo difusas, já que estas cadeias envolvem não apenas o que se refere à produção primária, mas também os processos de transporte, armazenamento, classificação, engarrafamento e comercialização para o mercado interno e para a exportação, com diferentes localizações nas diversas fases do processo.

d) Áreas portuárias industriais: Associado, seja à indústria pesqueira, ao movimento

de cargas, ou a ambos, um bom número de áreas portuárias latino-americanas constitui uma categoria por si só. Em certos casos, este tipo de atividade econômica determinam a configuração econômica adjacente. Em outros, especialmente quando os portos se localizam em grandes conglomerados urbanos, ou perto deles, a atividade portuária se entrelaça com outros setores de atividade com um protagonismo importante.

e) Áreas turísticas de pesca artesanal: nas bacias marítimas e fluviais de toda América

Latina e Caribe a atividade pesqueira de tipo familiar, comunitária e artesanal é uma forma de atividade econômica estendida. Em certa medida, estas localidades compartem muitas das características e problemas das áreas rurais tradicionais com as quais, por outro lado, estão estreitamente vinculadas. A produção se orienta tanto ao autoconsumo como ao abastecimento de escala reduzida aos

16

mercados locais. Apesar de um ponto de vista tecnológico podem ser consideradas atividades de baixa produtividade, as técnicas de pesca artesanais vêm sendo crescentemente valorizadas pelo manejo sustentável dos recursos naturais que elas supõe, sobretudo comparadas com as grandes industrias pesqueiras. Ocasionalmente estas áreas conseguem desenvolver seu potencial turístico que pode ser mais ou menos harmônico com a atividade econômica tradicional.

f) Áreas industriais em processo de reconversão: a partir dos impactos dos processos

de liberalização, em especial da abertura comercial, um certo número de indústria se encontra desenvolvendo esforços de adaptação às novas condições. Ainda quando tenha conseguido sobreviver e até melhorar sua posição nos mercados nacionais e internacionais, em geral teve consequências profundas em seus meios sociais e os mercados de trabalho locais. A adoção de novos enfoques de organização e gestão produtiva e a correlativa reconversão tecnológica acarretou perdas de emprego e mudanças na estrutura de qualificações da demanda de trabalho. Por outro lado, as transformações organizacionais levaram à terceirização de muitas das tarefas que antigamente se realizavam de forma interna, o que produz uma criação de um novo tipo de empregos em empresas menores, que operam como provedoras de produtos e serviços às grandes empresas.

g) Antigas áreas industriais: em outros casos, por outro lado, as antigas indústrias

que surgiram durante os períodos de substituição de importações ou ainda antes, não conseguiram sobreviver. Os casos mais antigos são, por exemplo, os da indústria de salitre ou da borracha. Entre os mais recentes, pode-se mencionar muitas indústrias do setor têxtil, do calçado, frigoríficos e curtidores. O desaparecimento destas indústrias, muitas delas em grande escala e que dominaram a vida econômica e trabalhista das regiões e cidades onde se localizavam, criaram uma situação de desemprego endêmico, migrações e falta de dinamismo econômico. Em alguns casos, o chão antigamente dedicado a fins industriais foi destinado a outros fins, como ser ofertas de turismo ou mesmo para o desenvolvimento de áreas de serviços e a incubação de pequenas empresas.

h) Áreas de fronteira: são as extensões geográficas limitadas e próximas à

demarcação internacional, onde interagem e se articulam duas sociedades e economias vizinhas. Na América Latina, estas áreas têm certas características comuns: são economias relativamente isoladas e deprimidas em relação aos principais centros urbanos, têm um baixo nível de desenvolvimento, contam com uma menor densidade populacional e possuem, em termos políticos, uma forte dependência dos principais centros de decisão. As características anteriores levaram estas áreas a desenvolverem um modus vivendi de acordo com sua realidade de distância e subdesenvolvimento onde não são estranhos o contrabando, a migração ilegal e, nos últimos anos, o narcotráfico.31

Não obstante, também existe outra realidade que se apresenta em algumas áreas de fronteira e a mesma deriva da discrepância de ofertas ou de preços, custos de produção e requerimentos legais de cada país. Em muitos casos, grandes empreendimentos industriais decidem instalar suas fábricas na fronteira do país vizinho, aproveitando, desta maneira, o tipo de câmbio e o custo da mão de obra substancialmente inferior que a de seu país. Estas situações não representam nenhum tipo de “crescimento ou desenvolvimento” para as localidades, já que em matéria econômica as utilidades destas empresas não são reinvestidas na

31 Valenciano, Eugenio, A Fronteira: Um novo rol frente à integração. A experiência no Mercosul.

17

localidade e os salários que se pagam são extremamente pequenos para ativar a economia. No que se refere a aspectos sociais, mesmo se criando novos empregos, os mesmos são de baixa qualidade e se carece de proteções sociais como, por exemplo, segurança social.

i) Áreas industriais especializadas tradicionais: por razões históricas particulares,

somadas em ocasiões de disponibilidade de determinados recursos ou matérias primas (madeiras, pedras, couros etc.) se encontram, em diversos países, determinadas localidades ou regiões que concentram um grande número de micro ou pequenas indústrias especializadas em um tipo de produção determinada (móveis, artesanatos em pedra, confecção de sapatos). Com o tempo se configurou fortes tradições coletivas que fazem da atividade econômica principal um traço distintivo da identidade regional. Em alguns momentos, estas concentrações e o capital de conhecimento que supõem, acabam sendo um atrativo para a instalação de firmas de maior porte no mesmo rótulo, ainda que com níveis tecnológicos e de projeção comerciais maiores.

j) Áreas de indústrias extrativas: aqui se agrupam diversos tipos de indústria com

características muito diferentes as quais, necessariamente, provocam configurações econômicas e dos mercados de trabalho profundamente distintas. É o caso das bacias petrolíferas, de gás natural, minerais preciosos e semipreciosos. Enquanto em alguns casos se trata de indústrias que importam um alto componente tecnológico e fortes investimentos (caso do petróleo e gás natural), em outros se trata de produções com um uso intensivo de trabalho humano. Enquanto que em alguns casos importam um alto grau de especialização e qualificação de pessoal, em outros não se requer nenhum tipo de qualificação prévia. As condições de trabalho e os graus de regularização do mercado também são muito diferentes.

k) Grandes áreas metropolitanas: México, São Paulo, Buenos Aires, Bogotá, Santiago

do Chile, são alguns exemplos de grandes conglomerados urbanos que, como anotava Rodríguez-Pose, estão tendo que concentrar muitas das atividades com alto valor agregado. Isso inclui desde indústrias modernas até serviços de diversas índoles, de origem tanto nacional como transnacional. Por seu peso demográfico e em termos de emprego, são as regiões que pautam a tendência ao crescimento do setor dos serviços. Ainda que o peso do setor informal seja claro, o que se conserva na economia tende, também, a concentrar-se nestas regiões. Constituem o mix por antonomásia em matéria tanto econômica como ocupacional.

As categorias apresentadas são apenas uma ajuda analítica que, ao deslocar-se

ao plano empírico, não podem ser mutuamente excludentes. Por sua vez, e em diferentes graus, toda região constitui um mix econômico e ocupacional.

É com base nesta última afirmação que se percebe melhor as vantagens da

análise econômica regional enquanto síntese que supera a análise setorial e os exercícios de estudo e planejamento territorial baseados em critérios político administrativos.

Cabe perguntar-se, ainda, em que medida a consideração exclusiva dos tipos de

atividade econômica que se concentram e se combinam em certas regiões constitui um fator de explicação dos processos de desenvolvimento deste nível. Alguns autores enfatizam no maior poder explicativo do enfoque ocupacional em relação ao enfoque

18

exclusivamente industrial.32 Isso se baseia na consideração de que a educação, localização e migração de pessoas com competências particulares, relacionadas com ocupações ou famílias ocupacionais, resultam mais importantes que a localização e migração de estabelecimentos produtivos, empresas e indústrias. Mesmo os aspectos estando relacionados e seja claro que as pessoas buscam e seguem as oportunidades de trabalho, o que se afirma é que, crescentemente, as pessoas escolhem localizações baseadas em determinados tipos de facilidades vantagens e preferências pessoais são as empresas que acabam seguindo os trabalhadores.

As investigações destes mesmos autores assinalam que, primeiro, a distribuição

das ocupações entre as diversas indústrias é difusa, uma vez que a estrutura ocupacional destas últimas muda com o tempo. Segundo, que as regiões se caracterizam, entre outros aspectos, por significativas configurações ocupacionais, que em certos casos tornam-se uma concentração de ocupações de especialização superior, por exemplo, a mídia nacional. Terceiro, que ao longo do tempo, um número significativo de ocupações “perdem o pé”, significando que elas possuem mobilidade e que sua presença em uma economia regional não pode ser totalmente prevista vom base em sua presença no passado.33

Se conclui, então, que a análise econômica regional, enquanto base para o

estímulo para as estratégias de desenvolvimento econômico local, deve levar em consideração não somente a presença e estrutura de atividades econômicas, como também a particular configuração ocupacional da região. Este último inclui não apenas a orientação setorial existente no mercado de trabalho, como também a composição por níveis ocupacionais (diretivos, de meios poderes, técnicos, profissionais, trabalhadores manuais, trabalhadores de serviços, empresários) e os níveis de qualificação neste mercado (desde os níveis de mais alta especialização e qualificação, até o trabalho não qualificado).

Finalmente, cabe também levar em conta que, assim como os investimentos, as

indústrias e as empresas se mobilizam mudando de território em busca de maiores vantagens, o mercado de trabalho também é dinâmico, na medida que as pessoas desenvolvem opções de trabalho, estudo e vida que, mesmo podendo estar relacionadas com as decisões das indústrias e empresas, também se baseiam em motivações e critérios próprios. Apesar que isto incorpora um grau de complexidade não menor que a tarefa de construir estratégias de desenvolvimento, também permite visualizar maiores margens para a intervenção e a modificação das condições atuais.

32 Markusen, Ann; Schock, Greg, “Occuptional Advantage: Detecting and Enhancing Occupational Mix in Regional Development”, Working Paper N.º 256, Project on Regional and Industrial Economics. University of Minnesota, USA, 2001. 33 Idem

19

4. AS ESTRATÉGIAS DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO LOCAL COMO UM NOVO ESPAÇO PARA VINCULAR FORMAÇÃO E TRABALHO

Enquanto alguns territórios conseguem empreender processos sustentáveis de desenvolvimento econômico, outros conseguem se adequar às novas condições, mesmo quando, em muitos casos, estes últimos contam com maiores vantagens comparativas para competir no mundo globalizado. A busca de uma resposta para esta questão é o que tem estimulado de forma mais forte e constante o desenvolvimento de um debate que mostra a ausência de respostas claras e únicas em relação ao que deve se fazer para conseguir o desenvolvimento de um determinado território. Nos parágrafos anteriores se viu como diferentes autores alegam quais são as dimensões mais relevantes do desenvolvimento econômico local e, mais além das particularidades de cada território ou sociedade local, identificam algumas possíveis características comuns. Assim, por exemplo, toda estratégia DEL implicará um importante grau de diálogo social, ainda que os autores que participarão dele e os acordos institucionais que o permitam serão diferentes em cada caso. Também foi visto que, ainda que se realizem esforços teóricos na ordem de classificar, e em certa medida, uniformizar conceitualmente casos empiricamente diferentes, é bastante ampla a diversidade de exemplos que faz a configuração dos tecidos produtivos e ocupacionais dos territórios. Uma característica nem sempre mencionada de forma explícita, mas sempre presente nas abordagens teóricas sobre o desenvolvimento econômico local, é a que se refere ao papel central do conhecimento. Assim como os indivíduos têm maiores oportunidades no mercado de trabalho quanto melhores seus níveis de qualificação, assim como as empresas obtêm maiores níveis de produtividade quando conseguem utilizar de maneira efetiva o conhecimento, os territórios e sociedades locais possuem mais chances quanto maior seu capital neste aspecto. Como sustenta Vázquez Barquero34, a disponibilidade e qualidade dos recursos humanos são fatores chave para o desenvolvimento de uma localidade ou região já que os mesmos têm forte repercussão sobre a produtividade do sistema empresarial, a competitividade territorial e o modelo cultural sobre o qual se edifica o processo de transformação e crescimento econômico. Desta maneira, os recursos humanos qualificados se convertem em agentes estratégicos para conseguir uma melhora na competitividade territorial. O nível médio de qualificação com que conta a população de um território pode ser considerado como uma vantagem comparativa, assim como a disponibilidade que esse mesmo território tenha de certos recursos naturais. Isto, ainda que importante, não é condição suficiente para sustentar um processo de desenvolvimento econômico local. Esta disponibilidade, relativamente maior, de conhecimento de uma área em relação a outra parece ser, na América Latina e Caribe, mais o resultado de um investimento feito centralmente em políticas de educação e formação, que de processos endógenos de geração de conhecimento. 34 Vásquez Barquero, Antonio, “Desenvolvimento dos recursos humanos”, em Política econômica local, Editorial Pirámide.

20

O fato de um território possuir uma população com maiores níveis de qualificação que outro dentro ou fora de um país, pode fazê-lo potencialmente mais atrativo para, por exemplo, receber investimentos. No entanto, também é provável que esta vantagem corra o risco de reverter-se em função de déficits que possam aparecer em outras dimensões do processo de desenvolvimento econômico local. O que aparentemente marcaria uma diferença consistente e, portanto, uma vantagem competitiva, seria a capacidade de aprender de um território. Isto coincide com todo o escrito de forma mais relacionada com as organizações produtivas, nas quais se coloca cada vez mais ênfase na dita “capacidade de aprender”. Não se trata, então, de possuir uma atividade fixa, mas de mantê-la, incrementá-la e desenvolvê-la de maneira original. Daí vários autores se referirem aos casos com êxito de desenvolvimento econômico local como “regiões que aprendem” (learning region) ou “regiões inteligentes” (smart region). Isto pode ser visto simultaneamente como um fator casual para processos de desenvolvimento endógeno e como uma característica resultante da combinação de fatores que tornam possível tanto o desenvolvimento da economia como do conhecimento. Assim, do mesmo modo que se pergunta sobre a razão de processos exitosos de desenvolvimento econômico local, autores como Hualde35 se perguntam sobre as razões que permitem que a informação e o conhecimento surjam em certas regiões e não em outras e até que ponto estas atividades deveriam acumular-se para que uma região possa se denominar como região inteligente ou região que aprende. A este respeito, Vázquez Barquero defende que as estratégias de formação podem ser pensadas de dois pontos de vista: defensivo ou ofensivo. No primeiro caso, o objetivo é reciclar a mão de obra, limitando, desta forma, a destruição de empregos. Por outro lado, quando as estratégias são de caráter ofensivo, o objetivo é formar para criar empregos de maneira que melhore a competitividade territorial. Desta maneira, a formação dos recursos humanos está vinculada à própria estratégia de desenvolvimento do território. Uma das aprendizagens obtidas a partir de determinadas concentrações de atividade econômica é que, em seus exemplos mais exitosos, estas regiões estão influenciadas por correlativas concentrações de experiência e trabalho qualificado, pela disponibilidade de educação e formação especializada e pela medida em que no território produzem e desenvolvem capacidades e conhecimento. O aspecto chave em quase a totalidade dos distritos industriais mais exitosos parece estar, por exemplo, na presença de trabalhadores com habilidades e conhecimentos apropriados para as indústrias localizadas dentro das variáveis fronteiras destas concentrações. Apesar das indústrias necessitarem de capacidades gerais, facilmente transferíveis, também demandam competências específicas que costumam ser mais escassas. Neste sentido, as empresas tendem a valorizar a disponibilidade de trabalhadores familiarizados com as operações envolvidas em seus negócios e que sejam capazes de aplicar seus conhecimentos o ambiente particular que uma concentração deste tipo gera. É evidente, portanto, que a formação é parte do “software” do desenvolvimento local e deve, necessariamente, conceber-se como um elemento estratégico. Cada vez mais, os projetos de desenvolvimento local dependem questões intangíveis – 35 Hualde, Alfredo, “O território como configuração complexa das relações entre educaçã000000000000, o e trabalho”, em Desenvolvimento local e formação, Série Ferramentas para a transformação, Cinterfor/OIT, Montevidéu, 2002, p. 47.

21

informação e conhecimento de seus trabalhadores, empresários e organizações – e menos dos recursos naturais. A esta situação deve-se somar o fato que recursos como a tecnologia e o capital financeiro podem ser transferidos instantaneamente, o que não acontece com o capital humano qualificado. Mesmo que se afirme que muitas instituições educativas e formativas não tenham reconhecido e atendido adequadamente as necessidade específicas das regiões onde se localizam, também existem muitos exemplos positivos. Diversas instituições assumiram como parte de sua missão o conhecimento adequado das necessidades de um amplo espectro de indivíduos e empresas, focalizando sua ação em responder de maneira eficaz às demandas das economias regionais. Cabe destacar, especialmente, os desenvolvimentos em matéria de atenção às necessidades da pequena e média empresa, através de uma ampla variedade de serviços. Isto os posiciona como autênticos centros de excelência em suas regiões, ao demonstrar sua capacidade para desenvolver uma formação especializada para tipos específicos de empresas. O isolamento institucional, a falta de comunicação com entidade afins e com as melhores práticas existentes são algumas das causas que reduzem as oportunidades de replicar experiências e de desenvolver esquemas de cooperação em função de objetivos comuns.

22

5. A RELAÇÃO ENTRE ENTIDADES DE FORMAÇÃO E PROCESSOS DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO LOCAL36

A formação e capacitação dos recursos humanos que um território possui não é, em absoluto, um tema menor. Os mercados de trabalho especializados dão às empresas mais opções e tornam determinadas localizações mais desejáveis, mesmo em condições de alta competência pelos recursos humanos. As empresas, geralmente, colocam em primeiro lugar a existência de um mercado de trabalho especializado, sobre outros fatores, na hora de tomar decisões em matéria de expansão ou localização empresarial. Neste sentido, é interessante nos perguntarmos sobre o trabalho que os centros de formação devem desempenhar para otimizar e capacitar os recursos humanos locais. A primeira questão se refere às competências e objetivos que têm – ou devem ter – os centros de formação, e se os mesmos devem servir à todos os estudantes e à todas as indústrias com um caráter universal ou, ao contrário, oferecer uma formação focalizada. Os centros de formação podem promover competências gerais e cursos fundamentais para um grande número de opções ocupacionais, mas não podem fazê-lo com o mesmo nível ou intensidade de aprendizagem para cada uma delas. Os centros devem sempre fazer opções em relação ao que ensinar, geralmente baseado nas necessidades das empresas, as demandas dos estudantes e os interesses de autoridades e docentes. Os centros que buscam atender prioritariamente as demandas das empresas, necessariamente elegem focalizar-se nos setores com maior desenvolvimento na região. Em geral, há poucos centros para atender às demandas de uma região. Além de promover cursos de nível geral ou básico, os centros formativos devem tomar decisões estratégicas em relação a que programas especializados oferecer. Por outro lado, e do ponto de vista estatal, a existência real ou potencial de uma demanda de grande escala oferece uma justificativa para a realização de investimentos maiores que a média em centros particulares para fortalecer sua posição dentro de territórios específicos. A missão dos centros se encontra definida pela comunidade a que servem. É certo que, especialmente em tempos de cortes orçamentais, os centros estão obrigados a justificar cuidadosamente a forma em que os recursos assinados são gastos. Porém, isso não impede que se negociem acordos entre os centros e as empresas onde se especifiquem regras e responsabilidades para as diferentes partes, e que isto resulte no estabelecimento de relações que beneficiem tanto os estudantes, como as empresas e a comunidade. Mas estes acordos devem sempre levar em conta o contexto regional específico onde estão, com todas suas peculiaridades. Em todo caso, os centros de formação sempre tem um rol a desempenhar nos processos de desenvolvimento econômico regional, e muitos deles podem assumir responsabilidades que tendem a preencher vazios existentes nos mercados de trabalho dos territórios onde operam.

36 Para a análise desta questões se tomou como base o White Paper “Cluster-Based Workforce Develpment: A Community College Approach”, elaborado por Regional Technology Strategies, INC (RTS), abril de 2003. Disponível em: www.rtsinc.org

23

Nos casos onde coexistem centros especializados com centros formativos, é

importante que estes últimos possam chegar à informação e capacidade de inovação concentrada nos centros especializados, através de redes de cooperação e intercâmbio. Se os custos associados ao desenvolvimento deste tipo de centro são muito altos, o Estado pode considerar recorrer a subvenções cruzadas; a chave está em fazer com que as comunidades formativas não compitam pelos mesmos mercados. O melhor é conseguir determinar que mercados têm sentido para que comunidades. Em algumas regiões podem existir concentrações de empresas orientadas para o mesmo tipo de produção ou serviços, mas localizadas em lugares diferentes. Nestes casos, os centros de diferentes locais podem trabalhar em colaboração. Neste esquema, todos os centros estariam aptos para usar os currículos, padrões de competência, métodos de avaliação de necessidades e conexões com a industria, desenvolvidos por qualquer outro centro. Tudo que de novo se desenvolva não é propriedade de nenhum centro em particular e pertence a todo o sistema regional de formação.

Em muitas regiões, pode não haver grupos de industrias sem a escala ou a

concentração necessária para alcançar os critérios estabelecidos para reconhecer a existência de um grau de especialização produtiva assimilável a um cluster ou outro tipo de configuração econômica regional especializada. Também podem existir atividades que não satisfaçam as expectativas depositadas na comunidade. Mas os tecidos produtivos não são “coisas”, são sistemas, com interdependências e interesses coletivos demarcados em uma economia que oferece uma forma lógica de organizar e prover serviços. Nas áreas rurais, por exemplo, os centros de formação podem desejar expandir sua área de cobertura, incluindo localidades dos arredores, buscar conexões (cordões umbilicais) para tecidos produtivos em áreas adjacentes, ou até considerar o apoio a micro e pequenas empresas e microclusters que podem representar uma configuração única de competências. Da mesma forma, em localidades com relações sistêmicas frágeis, tratar a economia como um sistema pode produzir mais benefícios que o simples trabalho com indivíduos ou empresários individuais.

Finalmente, é importante questionarmos se a especialização não limita de

alguma maneira a possível adaptabilidade dos estudantes formados, ao ponto de converter-se em uma desvantagem. Se a especialização é vista como a mais simples e efetiva forma de ensinar competências generalizáveis não representa uma ameaça. Muito da formação ministrada mediante currículos referidos a uma família ocupacional, em particular, consiste em competências gerais e transferíveis, valorizadas também por outras. Porém, as aplicações específicas que se usam no processo formativo estão relacionadas, tanto com o território e o tecido produtivo de referência, como com a eleição inicial de carreira das pessoas. Em um certo prazo, os estudantes podem ganhar experiência, complementar suas competências e, com cursos adicionais, ser capazes de transferi-las. A especialização aumenta as possibilidades de carreira ao facilitar a entrada nela, dando aos jovens experiência de trabalho e confiança para enfrentar as transformações subsequentes. De acordo com as mais recentes tendências, a educação e a formação são assumidas como um longo processo no qual, continuamente, as pessoas se requalificam para o trabalho e desenvolvem novos grupos de competências. A visão de um processo unidirecional de movimento, desde os conhecimentos fundamentais até as competências mais técnicas, está sendo rapidamente substituída pela perspectiva de processos muito mais interativos e laterais.

24

CONCLUSÕES 1. A lógica globalizadora que caracteriza o mundo atual encontra, quando se analisam

os territórios concretos (regiões, localidades), manifestações diversas do ponto de vista das respostas que produz. É assim que, simultaneamente aos efeitos de uniformização que eventualmente provoca, suscita reações e estratégias de resistência e adaptação heterogêneas. As oportunidades e riscos que a globalização implica não se distribuem por igual entre todas as zonas. Enquanto muitas empresas e territórios conseguiram adaptar-se com grandes benefícios, a abertura das economias nacionais também deixa descobertas estruturas locais com nenhuma ou escassa capacidade de competir no novo entorno.

2. Frente às diferentes experiências existentes, merecem um destaque especial

aquelas que conseguiram estratégias de inserção econômica dentro da nova lógica global, às vezes de um ponto de vista passivo ou funcional a esta lógica e, em outras ocasiões, apoiando-se nos aspectos característicos e peculiares de seus territórios, sociedades e tecidos produtivos, utilizando assim o ensaio de estratégias de competitividade distintivas.

3. Independentemente da ponderação histórica do processo globalizador, há muitos

anos é claro que existe um interesse renovado, tanto acadêmico como político, por entender como as regiões e territórios constróem suas estratégias de inserção econômica no mercado global. No plano acadêmico, o processo se inicia com o questionamento dos enfoques neoclássicos e o novo impulso das teorias do crescimento econômico, fundamentalmente através da perspectiva do crescimento endógeno. Isso continua com as formulações agrupadas das teorias do desenvolvimento endógeno e, mais recentemente, nos enfoque do desenvolvimento econômico local (DEL).

No plano político, a partir da possibilidade de realizar uma avaliação dos efeitos das políticas de liberalização econômica, começa a se ver com grande interesse as experiências de determinados territórios que, mediante estratégias tão originais como peculiares quanto suas características produtivas e sociais, conseguem aumentar com grande ou relativo êxito os efeitos mais regressivos da globalização.

4. Não existe uma resposta única de que tipo de opções resta para que as pessoas, empresas ou regiões consigam inserir-se com êxito na economia globalizada, através de processos de desenvolvimento que sejam sustentáveis e gerem trabalho de qualidade. A diversidade na natureza de pessoas, empresas e territórios se corresponde com uma diferença de estratégias possíveis igualmente diversa. Esta é uma das diferenças claras entre as políticas tradicionais de desenvolvimento e as novas estratégias de desenvolvimento a nível local: enquanto as primeiras se orientaram segundo padrões comuns e que se pretendiam replicáveis, as segundas são sempre originais, como são peculiares os territórios onde surgem.

5. A denominação de estratégias de desenvolvimento local (DEL) se aplica a uma

variedade de instrumentos que, em oposição à tradição das políticas centralizadoras de desenvolvimento, procuram animar os processos de

25

fortalecimento das vantagens comparativas que se manifestam em determinados territórios . Para isso, as estratégias se centram mais no que se conhece como fatores “endógenos”: o tecido econômico local, os recursos humanos e o marco institucional local. Consiste, definitivamente, em trabalhar sobre a base de que a atividade econômica dependa das condições socio-econômicas do lugar, em vez do contrário.

6. O desenvolvimento econômico seria, neste sentido, um processo de crescimento e

transformação estrutural, no qual as formas de organização, o sistema de relações e a dinâmica de aprendizagem possuem um papel estratégico. Mas, além disso, se caracterizaria por sua dimensão territorial, não somente devido o efeito espacial dos processos organizacionais e tecnológicos, mas pelo fato de que cada localidade ou região é o resultado de uma história na qual foi se configurando o entorno institucional, econômico e organizacional.

7. Por sua vez, a análise econômica regional, enquanto base para o estímulo para as

estratégias de desenvolvimento econômico local, deve levar em consideração não apenas a presença e estrutura de atividades econômicas, mas também a particular configuração ocupacional da região. Isto inclui não somente a orientação setorial existente no mercado de trabalho, mas também a composição por níveis ocupacionais (diretivos, poderes médios, técnicos, profissionais, trabalhadores manuais, prestadores de serviços, empresários) e os níveis de qualificação neste mercado (desde os níveis de mais alta especialização e qualificação, até o trabalho não qualificado).

Cabe também levar em conta que, assim como os investimentos, as indústrias e as empresas se mobilizam trocando de território em busca de maiores vantagens, o mercado de trabalho também é dinâmico, na medida que as pessoas desenvolvem opções de trabalho, estudo e vida que, mesmo podendo estar relacionadas com as decisões das indústrias e empresas, também se baseiam em motivações e critérios próprios. Apesar disto se incorporar num grau de complexidade não menor que a tarefa de construir estratégias de desenvolvimento, também permite visualizar maiores margens para a intervenção e a modificação das condições atuais.

8. Uma característica nem sempre mencionada de forma explícita, mas sempre presente nas abordagens teóricas sobre o desenvolvimento econômico local, é a que se refere ao papel central do conhecimento. Assim como os indivíduos têm maiores oportunidades no mercado de trabalho quanto melhores seus níveis de qualificação, e assim como as empresas obtém maiores níveis de produtividade quando conseguem utilizar de maneira efetiva o conhecimento, os territórios e sociedades locais possuem mais chances quanto maior seja seu capital neste aspecto. A disponibilidade e qualidade dos recursos humanos são fatores chave para o desenvolvimento de uma localidade ou região, já que os mesmos têm forte repercussão sobre a produtividade do sistema empresarial, a competitividade territorial e o modelo cultural sobre o qual se edifica o processo de transformação e crescimento econômico. Desta maneira, os recursos humanos qualificados se convertem em agentes estratégicos para conseguir melhoras na competitividade territorial.

9. A este respeito, as estratégias de formação podem ser consideradas a partir de

dois pontos de vista: defensivo ou ofensivo. No primeiro caso, o objetivo é reciclar a mão de obra limitando, desta maneira, a destruição de emprego. Por outro lado, quando as estratégias são de caráter ofensivo, elas têm com objetivo formar para

26

criar emprego, de maneira que melhore a competitividade territorial. Deste modo, a formação dos recursos humanos está vinculada à própria estratégia de desenvolvimento de um território. Um dos aprendizados obtidos a partir de determinadas concentrações de atividade econômica é que, em seus exemplos mais exitosos, estas estão muito influenciadas por correlativas concentrações de experiência e trabalho qualificado, pela disponibilidade de educação e formação especializada, e a medida em que produzem no território e desenvolvem capacidades e conhecimentos.

10. Em relação à missão dos centros de formação, esta sempre é definida pela

comunidade a que servem. Apesar dos centros de formação dificilmente poderem produzir processos de desenvolvimento econômico local por si mesmos, sempre têm um rol a desempenhar. Especificamente, podem assumir responsabilidades que tende a preencher vazios existentes nos mercados de trabalho dos territórios onde operam.

11. As estratégias de formação e emprego de jovens constituem uma das

preocupações centrais nas estratégias de desenvolvimento econômico local, ainda que não se tenha conseguido um consenso sobre as ferramentas mais adequadas para enfrentar este desafio. Em parte, isto tem a ver com as variações que a noção de juventude tem segundo os contextos sociais, culturais e econômicos que caracterizam os diversos territórios. É assim que toda perspectiva de desenvolvimento local deve levar em conta particularidades como: a idade média que as pessoas se incorporam à vida ativa, as idades em que normalmente as pessoas se encontram inseridas nos sistemas educativos e de formação inicial, e as idades em que a comunidade tende a esperar que os jovens comecem a desempenhar papéis adultos.

12. Na América Latina e Caribe, as políticas públicas de formação e emprego para

jovens têm acompanhado as transformações e debates suscitados entre os diferentes paradigmas da política social em geral. Durante a etapa de desenvolvimento, por exemplo, através dos programas de aprendizagem, tanto os conteúdos como a própria metodologia da formação, se determinou pelas formas de trabalho em setores produtivos e, mais especificamente, em determinadas ocupações e ofícios. Poderiam ser consideradas, até certo ponto, como ofertas especializadas, mas seu marco de referência era universal, os jovens eram formados como mecânicos, carpinteiros ou sapateiros de acordo com as características deste ofícios e ocupações. O contexto social e produtivo específico onde se aplicaria os conhecimentos adquiridos era secundário, o que se refletia na uniformidade social dos programas de formação .

13. A geração subsequente de políticas de formação e emprego juvenil diferiram em

vários aspectos das anteriores. No entanto, o que mais interessa aqui é que nã estão dirigidas de forma genérica a qualquer jovem. Buscavam atender às problemáticas daqueles setores com maiores problemas de inserção trabalhista: jovens de lares de baixa renda, com baixa escolaridade, sem formação técnica e com nenhuma ou escassa experiência de trabalho. Neste sentido foram e são programas que procuram dar uma capacitação especializada e intensiva, mediante cursos de três a quatro meses de duração e que oferecem ajuda para inserção no mercado de trabalho sendo auxiliares ou mediante práticas em empresas. A questão mais chamativa é que estas políticas, mesmo que tentaram se focalizar em determinados grupos específicos de jovens, continuaram tendo em boa medida uma oferta padronizada, apesar da diversidade dos provedores de capacitação. As

27

especificações que os programas poderiam ter em função das particularidades de determinados territórios e seus tecidos produtivos não foram incorporadas a seu planejamento e posta em prática.

14. A tendência atual em relação à políticas de emprego é, diferentemente, a de passar

do Estado Benfeitor de ação indiferenciada a um Estado que reconheça as diferenças e as especificidades. É mediante este tipo de aterrissagem das políticas nacionais no espaço local que se torna possível desenvolver neste último plano outro tipo de alternativas, construídas em um enfoque “de baixo para cima” e que integrem a atenção dos grupos juvenis com estratégias mais globais de desenvolvimento regional e local.

15. O enfoque de desenvolvimento local abre as portas a uma nova configuração das

relações entre o setor público e o setor privado, novas articulações entre os próprios serviços públicos e oportunidades para a participação e o diálogo social.

Assim, por exemplo, os centros de formação cada vez menos são considerados exclusivamente como a expressão local da institucionalidade nacional em matéria de formação profissional, e sim como um recurso próprio da comunidade e o tecido produtivo local. De lugares de onde se ministram os cursos desenhados centralmente, podem paulatinamente se transformar em centros de serviços formativos e de outro tipo, que respondem pertinente e eficazmente às necessidades da qualificação e desenvolvimento tecnológico da produção de seu ambiente.

16. As experiência apresentadas ao longo desta publicação, refletem não apenas a diversidade de estratégias existentes na atualidade (reflexo da também diversa configuração dos territórios a que se referem), mas também seu alto grau de complexidade. Falar de um “enfoque” em vez de um “modelo” não é presunçoso. Antes de que estabelecer critérios uniformes para o planejamento e implementação de estratégias de formação e emprego para jovens de base local ou regional, o que surgem são elementos de caracterização que, mais além de suas diferenças, permitem agrupar as diversas experiências dentro de um novo enfoque. Estes elementos são, entre outros, os seguintes: a) que tomam um território determinado como referência, com suas particularidades sociais, culturais e econômicas; b) que, em geral, demandam um alto grau de participação e diálogo social; c) que se orientam rumo a mobilização dos recursos e vantagens comparativas locais, em especial aquelas que se referem ao conhecimento; d) que se enquadram em estratégias mais gerais de aprimoramento da capacidade de gerir os processos de desenvolvimento por parte das sociedades locais.

28