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1 DESCOMPLICANDO O TORTUOSO CAMINHO PARA CHEGAR AS TERRAS DEVOLUTAS NA BAHIA: A UTILIZAÇÃO DE FERRAMENTAS DA GEOTECNOLOGIA NO PROCESSO DE ESTIMATIVA DE TERRAS PÚBLICAS NO ESTADO Rafaela dos Santos Moreira Universidade Federal da Bahia - UFBA [email protected] Guiomar Inez Germani Universidade Federal da Bahia - UFBA [email protected] Resumo Este artigo pretende compartilhar as experiências metodológicas traçadas nos esforços em estimar as Terras Devolutas da Bahia. Acreditando ser este um passo importante no processo de distribuição de terras dentro dos limites da ação do Estado, além de trazer à tona a discussão sobre a barreira estrutural que se constitui a estrutura da propriedade para a democratização da terra. A utilização de ferramentas da Geotecnologia surge então como uma alternativa eficiente que proporciona resultados eficientes, já que possibilita uma representação computacional do espaço. Palavras-chave: Terras Devolutas. Geotecnologias. Reforma Agrária. Introdução O presente trabalho se insere no contexto das pesquisas desenvolvidas pelo Grupo Integrado de Pesquisa “A Geografia dos Assentamentos Rurais” – Projeto GeografAR/IGeo/UFBA – que ao longo da sua história vem desenvolvendo suas análises sobre a Questão Agrária no campo baiano. Esses esforços encontram na análise espacial a materialização das ações resultantes do conflito de interesses de classes – ponto de partida para a compreensão da realidade. No campo, tais ações são protagonizadas diretamente pelos sujeitos que lutam pela permanência ou pelo acesso à terra, que se defrontam com a estrutura da propriedade privada da terra engendrada pelos modos de produção sobre a égide do capital. A evidência da disputa pelo território e da demanda por terras pelos movimentos sociais do campo impôs ao Projeto então uma necessidade prática de dimensionar as Terras Públicas do estado da Bahia. Nesse sentido, surge o projeto de pesquisa desenvolvido pelo GeografAR intitulado “Continuando no Tortuoso Caminho para se Chegar às

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DESCOMPLICANDO O TORTUOSO CAMINHO PARA CHEGAR AS

TERRAS DEVOLUTAS NA BAHIA: A UTILIZAÇÃO DE FERRAMENTAS DA GEOTECNOLOGIA NO PROCESSO DE ESTIMATIVA DE TERRAS

PÚBLICAS NO ESTADO

Rafaela dos Santos Moreira Universidade Federal da Bahia - UFBA

[email protected]

Guiomar Inez Germani Universidade Federal da Bahia - UFBA

[email protected]

Resumo

Este artigo pretende compartilhar as experiências metodológicas traçadas nos esforços em estimar as Terras Devolutas da Bahia. Acreditando ser este um passo importante no processo de distribuição de terras dentro dos limites da ação do Estado, além de trazer à tona a discussão sobre a barreira estrutural que se constitui a estrutura da propriedade para a democratização da terra. A utilização de ferramentas da Geotecnologia surge então como uma alternativa eficiente que proporciona resultados eficientes, já que possibilita uma representação computacional do espaço. Palavras-chave: Terras Devolutas. Geotecnologias. Reforma Agrária.

Introdução

O presente trabalho se insere no contexto das pesquisas desenvolvidas pelo Grupo

Integrado de Pesquisa “A Geografia dos Assentamentos Rurais” – Projeto

GeografAR/IGeo/UFBA – que ao longo da sua história vem desenvolvendo suas

análises sobre a Questão Agrária no campo baiano.

Esses esforços encontram na análise espacial a materialização das ações resultantes do

conflito de interesses de classes – ponto de partida para a compreensão da realidade. No

campo, tais ações são protagonizadas diretamente pelos sujeitos que lutam pela

permanência ou pelo acesso à terra, que se defrontam com a estrutura da propriedade

privada da terra engendrada pelos modos de produção sobre a égide do capital.

A evidência da disputa pelo território e da demanda por terras pelos movimentos sociais

do campo impôs ao Projeto então uma necessidade prática de dimensionar as Terras

Públicas do estado da Bahia. Nesse sentido, surge o projeto de pesquisa desenvolvido

pelo GeografAR intitulado “Continuando no Tortuoso Caminho para se Chegar às

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Terras Devolutas na Bahia” apoiado pelo CNPq, com o intuito de dimensionar as terras

devolutas do estado por município.

Entendemos que este é um passo importante no processo de distribuição de terras

dentro dos limites da ação do Estado, além de trazer à tona a discussão sobre a barreira

estrutural que se constitui a estrutura da propriedade para a redemocratização da terra.

Nesse sentido, Germani (2010: 04) afirma que,

[...]Esta temática contribuirá para entender, um pouco mais, o papel do Estado, através de suas políticas de regularização fundiária, dos movimentos sociais e a (re)produção do espaço, eixo analítico do Projeto GeografAR.

Sabemos que esse não é um caminho fácil, já que os processos históricos de

regularização fundiária dificultam a identificação dessas terras, permanecendo a maioria

delas indeterminadas e não individualizadas. Isso não significa dizer que tais terras não

tenham sido ocupadas por posseiros ou apropriadas individualmente por grileiros.

É nessa característica de indeterminação das Terras Públicas (e/ou Devolutas) e na sua

importância para as políticas de reforma agrária do Estado que reside o principal desafio

enfrentado pelo Projeto.

Esse desafio encontrou nas ferramentas da Geotecnologia um auxílio técnico que serve

de suporte as análises espaciais, especialmente as que estão ligadas ao dimensionamento

e localização no espaço.

Neste trabalho, situaremos rapidamente o contexto da pesquisa, como também alguns

resultados e experiências, em especial, as experiências adquiridas com a utilização das

ferramentas da Geotecnologia na estimativa de Terras Públicas/Devolutas da Bahia por

município.

Terras Públicas e Devolutas

Ao contrário do que o senso comum costuma naturalizar e banalizar a existência, a

propriedade privada nem sempre esteve presente nas relações sociais, durante a história

da formação da sociedade brasileira. Vide o exemplo dos índios e das diversas

comunidades tradicionais que se desenvolveram, conseguindo resistir na medida do

possível, às pressões da expansão do capital no campo.

As diversas formas de propriedade nas quais a estrutura agrária do Brasil esteve

assentada historicamente foram desde sempre determinadas pela forma como, em um

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dado estágio de desenvolvimento das forças produtivas, homens e mulheres estiveram

organizados para galgarem sua reprodução social. Marx e Engels (1845) nos explicam

que “cada novo estágio da divisão do trabalho determina, igualmente, as relações dos

indivíduos entre si no tocante à matéria, aos instrumentos e ao produto do trabalho.”

Queremos dizer com isso que o surgimento das Terras Públicas e Devolutas no Brasil

está diretamente ligado com o desenvolvimento da propriedade privada. E compreender

a problemática nos remete ao movimento histórico das condições que fizeram com que

um recurso da natureza (a terra) passasse a fazer parte do jogo das mercadorias, sendo

apropriado privadamente e acumulado nas mãos de poucos privilegiados.

Breve histórico do desenvolvimento da propriedade da terra no Brasil

A colonização portuguesa no Brasil se inicia sem um expressivo povoamento do

território pelos colonizadores, se efetivando basicamente a partir dos escambos

praticados entre estes e as comunidades primitivas que habitavam o território. Como o

maior interesse da metrópole era a obtenção do pau-brasil, acabou se respeitando a

propriedade comunal já exercida pelos nativos, principal mão-de-obra utilizada no

extrativismo.

A preocupação efetiva da Coroa Portuguesa em ocupar a colônia aparece

posteriormente, como uma necessidade de impor a soberania da Metrópole sobre as

investidas de outras nações no território.

A saída encontrada por Portugal foi o povoamento das terras vinculado ao processo da

produção do açúcar, que se constituía em uma atividade atrativa economicamente para

os investimentos empenhados na ocupação.

Segundo afirma Germani,

Desta forma, o novo período que se iniciava caracterizou-se por alterar suas relações com os indígenas e com a terra. O escambo foi dando espaço à escravidão do índio e as terras começaram a ser divididas e a ter donos. (GERMANI, 2006, p. 120).

A produção foi organizada no modelo plantation, tendo como suas características

principais o latifúndio, a monocultura de cana-de-açúcar, a mão-de-obra escrava, a

produção voltada para exportação e a introdução de técnicas avançadas de cultivo

(STEDILE, 2005, p. 20-21).

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Em relação à propriedade da terra desta época, Stedile afirma que,

[...] a forma adotada pelos europeus foi o monopólio da propriedade de todo o território pela Monarquia, pela Coroa. [...] Porém, para implantar o modelo agroexportador e estimular os capitalistas na produção das mercadorias necessárias para a exportação, a Coroa optou pela “concessão de uso” com direito à herança. (STEDILE, 2005, p. 21).

Vale ressaltar que além de plenos poderes oferecidos aos donatários (nome dado aos

que recebiam as concessões), também era exigido, em contrapartida, que se mantivesse

a capitania cultivada, em produção, mesmo que para isso concedesse o uso de parte dela

à terceiros - segundo era regulamentado pela Lei das Sesmaria. A punição pelo

descumprimento da Lei era a perda completa sobre o controle da propriedade.

(GUIMARÃES, 2005, p. 58-61)

O processo desencadeado posteriormente, que combinou as concessões desordenadas de

sesmarias ao aumento da ocupação das terras pela produção de gêneros alimentícios

para o consumo interno (que legitimava a pequena posse), passou a ameaçar o

monopólio da propriedade da terra. Por isso, em 1822, junto com a Independência, é

extinta a Lei de Sesmaria no Brasil.

Trinta anos se passaram para que um novo marco legal viesse regulamentar sobre a

propriedade no Brasil: é a tão citada entre os estudos sobre o assunto, Lei de Terras, de

1850. A partir desta Lei, ficam proibidas aquisições de terra por outro título que não

fosse o de compra, e caso os possuidores não registrassem suas terras dentro do prazo

estipula pelo Governo, essas passariam a integrar o seu patrimônio, sendo consideradas

desta forma como terras devolutas.

Resumidamente, este artifício legal preparou o Brasil para a transição do sistema

escravista de mão-de-obra, e o início do trabalho assalariado. Impedindo, aos que não

tinham condições de pagar pela terra, que tivessem acesso a ela, estavam garantidos os

privilégios da propriedade latifundiária e o monopólio da terra.

O tortuoso caminho para chegar as terras devolutas na Bahia

A continuidade da alta concentração de terra está na base das tensões e conflitos que

historicamente marcam o campo brasileiro (GERMANI, 2010, p. 6). Na Bahia, os

indicies de concentração fundiária, calculados a partir do Indicie de Gini, demonstram

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numericamente a desigualdade sócio-espacial que está no seio da Questão Agrária

baiana.

Tabela 1 - Índice de Gini. Bahia. 1920 a 2006

Ano Índice de Gini 1920 0,734 1940 0,784 1950 0,794 1960 0,779 1970 0,795 1975 0,805 1980 0,821 1985 0,835 1995/1996 0,829 2006 0,838 Fonte: IBGE: Censo Agropecuário 1920 a 2006 Elaboração: Projeto GeografAR, 2010

A realidade explicitada nos números tem na instituição da propriedade privada a sua

maior proteção. Porém, o direito a propriedade esbarra na função social da terra, que

também é prevista por lei. Ou seja, a sua utilização está condicionada ao bem-estar

coletivo, cabendo ao Estado fazer cumprir seu interesse social.

Por isso se configura de suma importância para os movimentos sociais que pautam na

ação do Estado uma superação da concentração fundiária, a identificação das Terras

Devolutas, para que possam ser arrecadadas e destinadas à Reforma Agrária.

A estimativa é de que 55% do território baiano sejam constituídos de Terras Devolutas,

que não estão identificadas e localizadas (GERMANI, 2010, p. 14). Chegar a uma

estimativa dessas terras por município requer o desenvolvimento de uma metodologia

que dê conta de remontar esse complexo “quebra-cabeça”.

O projeto de pesquisa desenvolvido pelo GeografAR intitulado “Continuando no

Tortuoso Caminho para se Chegar às Terras Devolutas na Bahia”, com o intuito de

dimensionar as terras devolutas do estado por município, vem adotando três estratégias

principais: a metodologia proposta no II Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA); a

trajetória histórica da propriedade da terra engendrada pelo direito; e as informações dos

movimentos sociais em conflito pela/na terra.

A aproximação com o método utilizado no II PNRA, que consiste em excluir da área

total do município as terras de dominialidade comprovada, foi fundamental para o

avanço da estimativa por município. Além das áreas já utilizadas, como terras

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cadastradas pelo INCRA, as unidades de conservação (UC) com dominialidade pública,

terras indígenas, arrecadadas, públicas e as posses acima de 100 ha, foram adicionadas a

nossa análise a exclusão das estradas, rios e áreas urbanas.

Optou-se por experimentar a adoção das ferramentas da Geotecnologia para o

tratamento dessas informações. Inicialmente, o trabalho se concentrou no tratamento das

informações geo-referenciadas das unidades de conservação do estado tendo a intenção

de expandir as experiências bem sucedidas para as demais informações que se

encontram mapeadas e disponíveis em meio digital.

Aplicabilidade das Geotecnologias para o Estudo

Acreditando ser a espacialização das Terras Públicas de dominialidade já comprovada

uma componente importante para chegar a estimativa das Terras Devolutas por

município, a utilização de ferramentas da Geotecnologia se apresenta como uma

alternativa que proporciona resultados eficientes, já que possibilita uma representação

computacional do espaço.

Isso significa dizer que as possibilidades de cruzamento de dados geográficos para a

análise espacial de um estudo aumentam por meio das tecnologias de informação, assim

como permitem a realização de análises complexas de grandes extensões territoriais,

diminuindo o tempo e os gastos para tal.

No caso da Bahia, o estado possui um banco de dados de informações geográficas geo-

referenciadas que vem crescendo a medida que também crescem os interesses em

localizar, mensurar e tipificar no território os seus recursos. Os órgãos públicos

estaduais, por exemplo, tem a sua disposição informações oficiais mapeadas para

promover análises ambientais, planejamentos urbanos e de políticas governamentais. A

iniciativa privada, por sua vez, tem gerado um grande acervo de informações mapeadas

as quais o acesso é muito restrito ou oneroso.

Segundo Fortes, Castañeda Filho e Augusto,

Atualmente, no Brasil, a informação geoespacial é, em grande parte, produzida, mantida e adquirida por organizações públicas em todas as esferas do governo. Entretando, no que se refere a todo esse imenso volume de IG, é difícil para os usuários saberem o que está disponível, onde a informação pode ser encontrada, quem são seus mantenedores e como pode ser acessada. (FORTES, CASTAÑEDA FILHO E AUGUSTO, 2011, p.485-486).

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Informações geo-referenciadas do estado que já existem mapeadas, como rodovias,

hidrografia, limites municipais, unidades de conservação, terras indígenas e

quilombolas, assentamentos de reforma agrária, etc. são de grande utilidade para o

presente estudo, pois registram as dimensões (planas ou lineares) espacializadas de

grande parte dos objetos de dominialidade já comprovada.

Considerar a construção de um sistemas de informações geo-referenciadas (SIG) para o

tratamento das informações citadas anteriormente, através do Geoprocessamento,

aparece como uma possibilidade adequada para a nossa escala de estudo (o território

dos municípios baianos).

Câmara e Davis (2001) definem o Geoprocessamento como “a disciplina do

conhecimento que utiliza técnicas matemáticas e computacionais para o tratamento da

informação geográfica...”. Sendo assim, o geoprocessamento apresenta um enorme

potencial para descomplicar este tortuoso caminho que estamos trilhando.

A experiência inicial, com o tratamento das informações geo-referenciadas das unidades

de conservação, foi possível através da obtenção destas informações junto ao Instituto

do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (INEMA). Esse material foi elaborado pela

Superintendência de Estudos Sociais e Econômicos (SEI). As informações das UCs

federais estão disponíveis para download no site do Ministério do Meio Ambiente

(MMA) 1

Metodologia de Tratamento dos Dados

O método de exclusão, similar ao adotado no II PNRA consiste, num primeiro

momento, em identificar as terras com dominialidade já conhecida e comprovada. O

levantamento das terras com dominialidade já comprovada focou, num primeiro

momento, as Unidades de Conservação (UCs) que possuem dominialidade determinada

por legislação, segundo mostra a tabela abaixo.

Tabela 2 - Tipos de Unidades de conservação e dominialidade. Tipo Dominialidade Grupo das Unidades de Proteção Integral I Estação Ecológica Posse e domínio público. As áreas particulares

em seus limites serão desapropriadas de acordo com o que dispõe a lei.

II Reserva biológica Posse e domínio público. As áreas particulares em seus limites serão desapropriadas de acordo

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com o que dispõe a lei. III Parque Nacional Posse e domínio público. As áreas particulares

em seus limites serão desapropriadas de acordo com o que dispõe a lei.

IV Monumento Natural Pode ser constituído por áreas particulares, desde que seja possível compatibilizar os objetivos da unidade com a utilização da terra e dos recursos naturais do local pelos proprietários.

V Refúgio da Vida Silvestre

Pode ser constituído por áreas particulares, desde que seja possível compatibilizar os objetivos da unidade com a utilização da terra e dos recursos naturais do local pelos proprietários.

Grupo das Unidades de Uso Sustentável I Área de Proteção Ambiental

Constituído por terras públicas ou privadas

II Área de Relevante Interesse Ecológico

Constituído por terras públicas ou privadas

III Floresta Nacional Posse e domínio público. As áreas particulares em seus limites serão desapropriadas de acordo com o que dispõe a lei.

IV Reserva Extrativista É de domínio público com uso concedido às populações extrativistas tradicionais. As áreas particulares incluídas em seus limites devem ser desapropriadas de acordo com o que dispõe a lei.

V Reserva de Fauna Posse e domínio público. As áreas particulares em seus limites serão desapropriadas de acordo com o que dispõe a lei.

VI Reserva de Desenvolvimento Sustentável

É de domínio público sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites devem ser, quando necessário, desapropriadas de acordo com o que dispõe a lei.

VII Reserva Particular de Patrimônio Natural

É uma área privada, gravada com perpetuidade, com o objetivo de conservar a diversidade biológica.

Fonte: Sistema Nacional de Unidades de conservação (SNUC), 2000 Elaboração: Projeto GeografAR, 2010

Para dinamizar o trabalho, optou-se pela utilização das ferramentas de

geoprocessamento no tratamento de informações espaciais geo-referenciadas, no

formato shapefile, coletas nos órgãos públicos. A base para o cálculo das áreas

municipais foram as informações espaciais de limites municipais do IBGE.

No caso das Unidades de Conservação, as informações espaciais referentes às UCs

estaduais foram conseguidas junto ao INEMA, através de ofício entregue à

Coordenação de Gestão da Informação (COINF). As informações das UCs federais

estão disponíveis para download no site do Ministério do Meio Ambiente (MMA)2

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Os dados das áreas das unidades de conservação não estão organizados por município, e

a maioria das unidades abrange mais de um município (figura 01). Tais informações

foram então trabalhadas no software de SIG ArcGIS 9.3 (ArcMap) para se chegar aos

fragmentos da UC correspondentes ao domínio de cada município. A partir daí foi

calculada a área de cada fragmento da UC por município.

Figura 1

Fonte: Projeto GeografAR, 2012.

Nesta ilustração podemos ver o exemplo da Área de Relevante Interesse Ecológico

(ARIE) Nascente do Rio de Contas – unidade de conservação de dominialidade pública-

cuja área abrange dois municípios: Abaíra e Piatã.

Detalhamento dos Procedimentos

As etapas a seguir foram executadas utilizando o software de SIG ArcGis 9.3 (ArcMap),

trabalhando com as bases na mesma estrutura de dados e no mesmo sistema de

coordenadas (UTM, fuso 23S ou 24S, Datum SAD 1969).

a) Individualização das feições de cada município, exportando-as da base original

dos Limites Municipais do IBGE - essa etapa é fundamental para que o programa

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consiga extrair da área total da unidade de conservação, a parte que intercepta cada

município;

b) O fragmento municipal se encontra no mesmo sistema de coordenadas que a

base originária (coordenadas geográficas em décimos de grau). É importante converter o

sistema de coordenadas para coordenadas planas, que oferecem maior consistência para

cálculos de área;

c) O passo seguinte consiste em fragmentar, da feição total de cada unidade de

conservação (UTM, Datum SAD 1969), a parte que intercepta a área do município. Para

isso, se utiliza a ferramenta clip (recortar) do Arc Toolbox;

d) Teremos como resultado desse último procedimento o fragmento da unidade de

conservação correspondente a área do município. É este o fragmento que terá sua área

calculada, através da ferramenta calculate geometry (calcular geometria). Não é preciso

converter o sistema de coordenadas do fragmento, pois este já “herdou” do arquivo

original o mesmo sistema de coordenadas.

Resultados e Perspectivas

Analisar informações espaciais em meio computacional por meio das Geotecnologias

pode ser considerado uma contribuição para chegar a estimativa das Terras Devolutas

por município. Mas como em qualquer análise virtual da realidade, também possui suas

limitações.

As áreas encontradas pelos cálculos baseados no SIG, às vezes não coincidem com a

área informada nos decretos de criação das Unidades de Conservação, além da

representação computacional as vezes apresentar algum deslocamento em relação aos

limites reais. Ao mesmo tempo, até os limites reais não são tão precisos.

Mesmo com a ausência de algumas informações, como algumas informações espaciais

geo-referenciadas das unidades de conservação municipais, estima-se que o estado da

Bahia possua, em área pública de unidade de conservação, um total de 741.893,91 ha.

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A perspectiva é de implementar esta metodologia aplicada às Unidades de Conservação

em outras informações espaciais geo-referenciadas de terras com dominialidade

comprovada. Sabemos que existem informações espaciais geo-referenciadas de estradas,

corpos hídricos, terras indígenas, assentamentos de reforma agrária, áreas urbanas, etc.

Estas informações, como as unidades de conservação, não estão organizadas por

município e o que aparece acessível ao público na maioria dos casos são suas áreas

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totais ou por trecho (no caso das rodovias), não existindo uma sistematização dessas

áreas por município.

Reconhecemos assim a importância da utilização da técnica na otimização das análises

espaciais, especialmente com o surgimento das Geotecnologias. E acreditamos que os

resultados obtidos podem superar as expectativas da estimativa e dimensão das Terras

Devolutas, e chegar até sua espacialização e localização.

Notas ________ 1http://www.mma.gov.br/sitio/index.php?ido=conteudo.monta&idEstrutura=119&idConteudo=10967&id

Menu=11813.

2http://www.mma.gov.br/sitio/index.php?ido=conteudo.monta&idEstrutura=119&idConteudo=10967&id

Menu=11813.

Referências

CÂMARA, Gilberto; DAVIS, Clodoveu. Introdução à ciência da informação. São José dos Campos: INPE, 2001. FORTES, Luiz Paulo S.; CASTAÑEDA FILHO, Rafael M.; AUGUSTO, Moema Jose de C. Panorama da infraestrutura nacional de dados espaciais. In.: Bahia análise & dados. vol. 21, n. 2. Salvador: Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI), 2011. p. 481-489. GeogafAR – A Geografia dos Assentamentos na Área Rural. Leitura Geográfica da Estrutura Fundiária da Bahia. Banco de Dados. Salvador, 2010. Disponível em: www.geografarufba.br. GERMANI, Guiomar Inez. Continuando no tortuoso caminho para chegar às terra devolutas na Bahia. Projeto de Pesquisa. Salvador: GeografAR/IGEO/UFBA/CNPq, 2010. ___________. Condições históricas e sociais que regulam o acesso a terra no espaço agrário brasileiro. In.: GeoTextos. vol. 2, n. 2. Salvador: Edufba, 2006. p. 115-174. GUIMARÃES, Alberto Passos. Quatro séculos de latifúndio – 1963. In.: STEDILE, João Pedro. A questão agrária no Brasil: O debate tradicional – 1500-1960. São Paulo: Expressão Popular, 2005. p. 35-77. MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã. São Paulo, 1998. STEDILE, João Pedro. A questão agrária no Brasil: O debate tradicional – 1500-1960. São Paulo: Expressão Popular, 2005.