desastres naturais, - geocompanygeocompany.com.br/.../materias/43_-_desastres_naturais.pdf · 2019....

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opinião o que restou de Longarone após a cheia causada pelo transbordamento da Barragem de Vajont, em consequência da ruptura súbita da encosta do Monte Toe. Cerca de 2.500 pessoas morreram. Desastres naturais, barragens e ocupação urbana Roberto Kochen* Cidade de Longarone, a jusante da barragem de Vajont, antes da ruptura de 63 D esastres naturais ocorrem sem que seja possível prevê-los de forma confiável, e como exemplos recentes pode se ci- tar as chuvas intensas e deslizamentos catastróficos de maciços de terra que ocorreram em Angra dos Reis (2010), Petrópolis - Teresópolis - Nova Fri- burgo (2011), e no exterior os fortes terremotos no Chile (2010), Japão (2011), bem como os tsunamis da Tai- lândia (2004) e Japão (2011). No Bra- sil, felizmente a ocorrência de sismos é muito pouco frequente e de baixa in- tensidade. Tsunamis são praticamen- te inexistentes, não havendo registro desses desastres naturais na orla marí- tima brasileira desde o descobrimento. No entanto, chuvas intensas ocorrem, com frequência praticamente anual- mente, causando grandes prejuízos materiais, danos a propriedades públi- cas e privadas, e infelizmente também vítimas e mortes, como ocorreram re- centemente em Angra do~ Reis, em Niterói e na Região Serrana do Rio de Janeiro. As mudanças climáticas que vem ocorrendo no planeta, com o aquecimento global, favorecem o au- mento da evaporação nos rios, lagos e oceanos, levando a eventos pluviorné- tricos mais intensos. Embora o ser humano não possa atuar no caso de sismos e tsunamis, e no aquecimento global as medidas que têm sido adotadas tenham impacto re- duzido, as consequências e impactos de desastres naturais podem ser mitigados pela implementação de Planos de Ação de Emergência e Sistemas de Preven- ção de Catástrofes, dando ao Poder Público uma possibilidade de ação fir- me na redução dos prejuízos, danos e vítimas associados a esses eventos ex- tremos da natureza. Somando-se a isso um Sistema de Suporte a Vítimas de _." ..--.. .. ', .. '~ -,;' --..~Il,."r~ í) .. Desastres Naturais tem procedimentos que irão permitir ao Poder Público in- tervir, em tempo hábil, e minimizar da- nos e vítimas nesse tipo de ocorrência, de grande impacto para a população, principalmente na parcela de renda mais baixa. Barragens Barragens são empreendimentos de engenharia particularmente suscetíveis a chuvas intensas, que podem causar danos às suas unidades componentes (maciços de terra, estruturas de concre- to e dispositivos de descarga etc.). As fotos acima e ao lado mostram o caso da barragem de Vajont, na Itália. Em outubro de 1963, a encosta do reservatório da barragem de Vajont, Itália, rompeu subitamente. A onda de cheia resultante da ruptura matou mais de 2.500 pessoas, na cidade de Longa- rone, a jusante da barragem" www.iengenharia.org.br

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Page 1: Desastres naturais, - GeoCompanygeocompany.com.br/.../materias/43_-_desastres_naturais.pdf · 2019. 4. 23. · cas e também reavaliações sismológi-casoEmbora eventos de sismo

opinião

o que restou de Longarone após a cheia causadapelo transbordamento da Barragem de Vajont, em

consequência da ruptura súbita da encosta do MonteToe. Cerca de 2.500 pessoas morreram.

Desastres naturais,barragens e ocupação urbana

Roberto Kochen*

Cidade de Longarone, a jusante da barragem de Vajont,antes da ruptura de 63

Desastres naturais ocorrem semque seja possível prevê-losde forma confiável, e comoexemplos recentes pode se ci-

tar as chuvas intensas e deslizamentoscatastróficos de maciços de terra queocorreram em Angra dos Reis (2010),Petrópolis - Teresópolis - Nova Fri-burgo (2011), e no exterior os fortesterremotos no Chile (2010), Japão(2011), bem como os tsunamis da Tai-lândia (2004) e Japão (2011). No Bra-sil, felizmente a ocorrência de sismosé muito pouco frequente e de baixa in-tensidade. Tsunamis são praticamen-te inexistentes, não havendo registrodesses desastres naturais na orla marí-tima brasileira desde o descobrimento.No entanto, chuvas intensas ocorrem,com frequência praticamente anual-mente, causando grandes prejuízosmateriais, danos a propriedades públi-cas e privadas, e infelizmente também

vítimas e mortes, como ocorreram re-centemente em Angra do~ Reis, emNiterói e na Região Serrana do Riode Janeiro. As mudanças climáticasque vem ocorrendo no planeta, com oaquecimento global, favorecem o au-mento da evaporação nos rios, lagos eoceanos, levando a eventos pluviorné-tricos mais intensos.

Embora o ser humano não possaatuar no caso de sismos e tsunamis, eno aquecimento global as medidas quetêm sido adotadas tenham impacto re-duzido, as consequências e impactos dedesastres naturais podem ser mitigadospela implementação de Planos de Açãode Emergência e Sistemas de Preven-ção de Catástrofes, dando ao PoderPúblico uma possibilidade de ação fir-me na redução dos prejuízos, danos evítimas associados a esses eventos ex-tremos da natureza. Somando-se a issoum Sistema de Suporte a Vítimas de

_." ..--.. ..',.. '~

-,;'--..~Il,."r~í )..

Desastres Naturais tem procedimentosque irão permitir ao Poder Público in-tervir, em tempo hábil, e minimizar da-nos e vítimas nesse tipo de ocorrência,de grande impacto para a população,principalmente na parcela de rendamais baixa.

BarragensBarragens são empreendimentos de

engenharia particularmente suscetíveisa chuvas intensas, que podem causardanos às suas unidades componentes(maciços de terra, estruturas de concre-to e dispositivos de descarga etc.). Asfotos acima e ao lado mostram o casoda barragem de Vajont, na Itália.

Em outubro de 1963, a encosta doreservatório da barragem de Vajont,Itália, rompeu subitamente. A onda decheia resultante da ruptura matou maisde 2.500 pessoas, na cidade de Longa-rone, a jusante da barragem"

www.iengenharia.org.br

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No enchimento do reservatório, opé do Monte Toe ficou submerso, ge-rando a ruptura súbita. Os detritos daruptura são visíveis na parte central dafoto acima. A ruptura súbita gerou umaonda de 100 m de altura, que transbor-dou o reservatório. A barragem em sipraticamente não sofreu danos.

No caso de barragens, a Sabesp temimplementado, de forma exemplar, noEstado de São Paulo, programas deinspeção, monitoramento e avaliaçãoda segurança, tanto de suas barragenscomo daquelas que estão com conces-sionárias como a CAB -CompanhiaAmbiental do Brasil-, no Sistema Pro-dutor Alto Tietê. É fato comprovadono meio técnico nacional e interna-cional que esse tipo de programa deinspeção e monitoramento de barra-gens incrementa significativamente asegurança desses empreendimentos,eliminando fatores de risco que pre-dominam como causas de acidentes,tais como falta de manutenção de ma-ciços de terra e estruturas de concretoe a operacionalidade de dispositivos dedescarga. Necessário acrescentar queé importante realizar estudos de atu-alização hidrológica (e adequação deestruturas hidráulicas), levando-se emconsideração o aumento da intensidadede eventos pluviométricos nos últimosanos, causados por mudanças climáti-cas e também reavaliações sismológi-casoEmbora eventos de sismo tenhampouca intensidade no Brasil, nada im-pede a ocorrência de um evento maisforte em algumas regiões do país, enosso desconhecimento desse tipo dedesastre natural aumenta os riscos aeles associados.

Mapeamento de áreas de riscoeeotécnico e ocupação urbana

Os recentes eventos de desliza-mentos catastróficos em áreas de riscoe ocupação urbana (como Angra dosReis, Morro do Bumba - iterói, eRegião Serrana do Rio de Janeiro, to-dos com elevado número de mortes)colocaram o foco no risco geotécnico,

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opinião •

Barragem de Vajontno enchimento doreservatório. No centrodafoto vê-se o MonteToe, com a encostainstável visível nacicatriz branca aofundo

Vista do Reservatórioapós o deslizamento

e onda de cheiacatastrófica, que

causaram mais de 2.500mortes ajusante

Ecovias - Rupturano km 42 da RodoviaAnchieta, São Paulo,dezembro de 1999

Mapeamento,inspeção, diagnósticoe monitoramento de

imtabilidades geológico- geotécnicas ao longo de2.500 km do Gasoduto

Bolívia Brasil

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• opinião

Imagens das áreas atingidas pelas chuvas na região de Nova Friburgo - RJ

principalmente em locais com elevadadeclividade e intensidade de ocupaçãourbana e, consequentemente, elevadopotencial de ocorrência de vítimas emdesastres naturais. Algumas empresastêm empenhado recursos na avaliaçãoe mitigação de desastres naturais degrande porte, como a TBG (Trans-portadora Brasileira Gasoduto BolíviaBrasil - Gasbol), com seu programapara inspeção, mapeamento, análise eproposição de medidas corretivas paraos 2.500 km desse gasoduto que for-nece 30 milhões de rn" por dia de gásnatural para as regiões Centro Oeste,Sudeste e Sul do Brasil, sujeitos a aci-dentes de instabilidade de encostas,enchentes, alagamentos e erosões.

Imageamento satelital de áreasde risco com ocupação urbana

Com a tecnologia atualmente dis-ponível de imagens de satélite, é possívelidentificar áreas de risco, sujeitas a escor-regarnentos de encostas e enchentes, eorientar medidas de prevenção, como res-trição à ocupação dessas áreas, identifica-ção de moradias que necessitem ser remo-vidas e medidas similares. As fotos acima,feitas antes e depois da catástrofe de NovaFriburgo, ilustram bem esse aspecto.

Planos de ação de emergênciaPara enfrentar e mitigar, com sucesso,

os riscos decorrentes de desastres naturais,é necessário contar com planos multidis-ciplinares, coordenados por entes públi-cos ou privados com o objetivo de treinar,conscientizar e educar as comunidades emáreas de risco dessa região para as situaçõesde escorregamentos de encostas, enchen-tes e outras situações de emergência, comum viés social muito forte, minimizandoriscos e danos de situações de emergênciacausadas por desastres naturais.

Tais planos têm por função, entreoutras atribuições:

• Proteger as propriedades e as vidas quese encontram nas áreas de risco;

• Treinar a população que vive nessas áre-as para atuação imediata nos casos deenchentes;

• Acionar a Defesa Civil em tempo hábil;• Identificar o papel e as atividades de

cada órgão para os casos de emergên-cia; e

• Assumir o papel educativo junto à co-munidade local, a fim de orientá-ia emações preventivas

Não há como ignorar os riscos as-

Imagem posterior às chuvas (20/01/2011)mostrando os danos causados

sociados a desastres naturais e a intensaocupação urbana das últimas décadas,concentrando populações em áreas a ju-sante de barragens (sujeitas a alagamen-tos), e em áreas de risco de deslizamentoscatastróficos (como Angra dos Reis eNiterói) torna necessário atuar, por meiode entidades públicas e privadas, na iden-tificação, prevenção, redução e mitigaçãodesses riscos. Planos de inspeção, moni-toramento e avaliação da segurança debarragens são essenciais para isso, bemcomo mapeamento de áreas de riscos,principalmente aquelas com ocupaçãourbana e elevada declividade. É para issoque a engenharia deve se preparar, pormeio da implementação das melhorespráticas e técnicas, minimizando riscos,danos, e vítimas. Essa é uma missão, damaior relevância, que a engenharia bra-sileira deverá desempenhar nas próximasdécadas e para a qual todos os engenhei-ros devem se sentir convocados. In

Roberto KochenPresidente e diretor Técnico da

GeoCompany Tecnologia, Engenhariae Meio Ambiente - www.geocompany.

com.br, diretor de Infraestrutura e conse-lheiro do Instituto de Engenharia e Prol

Dr. da Escola Politécnica da USP

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