desafios, perseverança e superação: uma história de luta no semiárido

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Desafios,perseverançaesuperação: UmahistóriadelutanoSemiárido BoletimInformativodoProgramaUmaTerraeDuasÁguas Ano8nº1829 Junho/2014 Carnaíba Dizem que as mais belas histórias estão bem diante dos olhos; permeando os acontecimentos do cotidiano; oriundas da gente simples do dia-a-dia. Para vê-las, no entanto, é preciso sensibilidade. A história que contaremos agora é sobre desafios e perseverança. É, acima de tudo, sobre superação. Nascida e criada no município de Tavares, no Sertão paraibano, a agricultora Joselita Ramos da Silva Brás, 40 anos, mora há 23 na comunidade de Jatobá, em Carnaíba, Sertão do Pajeú pernambucano. “Me mudei para cá logo depois que casei, em 1991, quando tinha 17 anos. No início, era muito difícil. A gente não tinha nenhum apoio de governos, nem de ONGs. Não tínhamos condições nem de ter uma alimentação mais ou menos digna”, recorda dona Fia, como é conhecida por todas e todos. Passadas duas décadas, a história da agricultora de olhar firme e sorriso tímido, mãe de cinco filhas e filhos, é bem diferente: junto com o marido, seu Aluísio Brás de Souza, de 46 anos, dona Fia foi contemplada pela Diaconia, através do Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2), gerenciado pela Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA), com uma cisterna-calçadão capaz de armazenar 52 mil litros de água da chuva. Outra conquista que transformou o dia-a-dia do casal foi o biodigestor sertanejo, recebido no início de 2013. A tecnologia social possibilita a produção de biogás através da fermentação do esterco animal. “Isso aqui é uma maravilha! Eu não imaginava que podia substituir pelo gás, que a gente só usava quando podia comprar. Na época, pagávamos 38 reais. Eu só comprava duas vezes por ano. Cozinhava queimando lenha mesmo, que eu pegava lá no alto da serra”, recorda dona Fia, que também possui uma cisterna de placas, que armazena até 16 mil litros de água potável para beber e cozinhar, e um poço amazonas. “Agora, tenho água encanada em casa e posso irrigar minhas plantinhas”, conta a agricultora. Paraibana de Tavares, dona Fia chegou ao Pajeú em 1991 Biodigestor sertanejo da família foi entregue no início de 2013

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Nascida e criada no município de Tavares, no Sertão paraibano, a agricultora Joselita Ramos da Silva Brás, 40 anos, mora há 23 na comunidade de Jatobá, em Carnaíba, Sertão do Pajeú pernambucano. Junto com o marido, seu Aluísio Brás de Souza, de 46 anos, foi contemplada pela Diaconia, através do Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2), gerenciado pela Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA), com uma cisterna-calçadão e um poço amazonas.

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Page 1: Desafios, perseverança e superação: uma história de luta no Semiárido

Desafios,�perseverança�e�superação:�Uma�história�de�luta�no�Semiárido

Boletim�Informativo�do�Programa�Uma�Terra�e�Duas�Águas

Ano�8��nº�1829Junho/2014�

Carnaíba�

Dizem que as mais belas histórias estão bem diante

dos olhos; permeando os acontecimentos do

cotidiano; oriundas da gente simples do dia-a-dia.

Para vê-las, no entanto, é preciso sensibilidade. A

história que contaremos agora é sobre desafios e

perseverança. É, acima de tudo, sobre superação.

Nascida e criada no município de Tavares, no Sertão

paraibano, a agricultora Joselita Ramos da Silva Brás,

40 anos, mora há 23 na comunidade de Jatobá, em

Carnaíba, Sertão do Pajeú pernambucano. “Me

mudei para cá logo depois que casei, em 1991,

quando tinha 17 anos. No início, era muito difícil. A gente não tinha nenhum apoio de governos,

nem de ONGs. Não tínhamos condições nem de ter uma alimentação mais ou menos digna”,

recorda dona Fia, como é conhecida por todas e todos.

Passadas duas décadas, a história da agricultora de olhar firme e sorriso tímido, mãe de cinco

filhas e filhos, é bem diferente: junto com o marido, seu Aluísio Brás de Souza, de 46 anos, dona Fia

foi contemplada pela Diaconia, através do Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2), gerenciado

pela Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA), com uma cisterna-calçadão capaz de armazenar

52 mil litros de água da chuva. Outra conquista que transformou o dia-a-dia do casal foi o

biodigestor sertanejo, recebido no início de 2013. A tecnologia social possibilita a produção de

biogás através da fermentação do esterco animal.

“Isso aqui é uma maravilha! Eu não imaginava que

podia substituir pelo gás, que a gente só usava

quando podia comprar. Na época, pagávamos 38

reais. Eu só comprava duas vezes por ano. Cozinhava

queimando lenha mesmo, que eu pegava lá no alto

da serra”, recorda dona Fia, que também possui uma

cisterna de placas, que armazena até 16 mil litros de

água potável para beber e cozinhar, e um poço

amazonas. “Agora, tenho água encanada em casa e

posso irrigar minhas plantinhas”, conta a agricultora.

Paraibana de Tavares, dona Fia chegou ao Pajeú em 1991

Biodigestor sertanejo da família foi entregue no início de 2013

Page 2: Desafios, perseverança e superação: uma história de luta no Semiárido

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Articulação Semiárido Brasileiro – Pernambuco

As tecnologias sociais que a família possui são para a

própria sobrevivência e também para a produção de

alimentos voltados a comercialização externa.

“Acordo todos os dias às cinco da manhã para cuidar

dos meus bois, das minhas galinhas e da minha roça”,

diz. Na área da agricultora encontra-se o plantio de

coentro, alface, milho, tomate-cereja, acerola e

banana. Tudo produzido de forma orgânica, ou seja,

sem a utilização de agrotóxicos. “Os meninos

reclamam que a plantação dá muito trabalho, mas eu

digo que não existe coisa mais prazerosa que ir pra

roça e trazer aquele balaio de fartura”, conta. “Planto cheiro verde e gosto de conservar o bom

paladar da minha panela”, revela a agricultora, que participa do grupo de mulheres da Associação

do Barreiro e do Projeto Semiá, desenvolvido pela Diaconia em parceria com a agência de

cooperação inglesa Tearfund e financiado pela União Europeia.

Através de treinamentos, apoio a grupos produtivos e implantação de unidades de produção

agroecológica, o projeto viabiliza mais oportunidades de trabalho e renda para mulheres e jovens

do Semiárido brasileiro, incentivando a produção, beneficiamento e comercialização de produtos

da agricultura familiar. “Eu acho muito, muito importante o trabalho da Diaconia, que tem, pra

mim, um significado muito especial. Eu diria até que me faltam palavras pra falar do

agradecimento e da gratidão que tenho. Costumo dizer que a equipe Diaconia tem sido como um

anjo na minha vida. Chegou num momento de necessidade, quando a gente precisava de apoio

pra trabalhar e ter uma condição mais digna de vida. Tem trazido tecnologia que a gente não

conhecia, e, graças a Deus, a vida tem melhorado”, agradece.

A forte agricultora muda o semblante quando lembra

da filha Maria Ângela, assassinada em setembro de

2012, aos 19 anos, pelo próprio namorado, que não

se conformava com o fim do relacionamento. “Era

uma menina muito meiga, sonhadora e que mais me

incentivava a fazer as coisas. Seu sonho foi

interrompido aos 19 anos”, conta, emocionada. Um

tímido sorriso, no entanto, retorna à face quando fala

da fé inabalável que possui. “Eu acredito demais em

Deus. Deus é primordial e jamais me abandonou. Eu

não sou muito de gostar das coisas fáceis, de receber

pronto. Eu prefiro conquistar, lutar pelo aquilo que

quero. É mais prazeroso. Tenho isso porque venci um desafio e é bom vencer desafios. Minha vida

inteira tem sido um desafio. Minha vida diária é um desafio, uma luta. Mulher não é sexo frágil. Eu

acho que a prova tá aí, todos os dias”, afirma.

Agricultora aponta a serra onde buscava lenha para cozinhar

Dona Fia e um dos filhos, o pequeno Natanael, de oito anos

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