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CÂMARA DOS DEPUTADOS
DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO
NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES
TEXTO COM REDAÇÃO FINAL
COMISSÃO ESPECIAL - PL 203/91 - POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOSEVENTO: Audiência pública N°: 001232/01 DATA: 30/10/01INÍCIO: 14h44min TÉRMINO: 17h49min DURAÇÃO: 03h05minTEMPO DE GRAVAÇÃO: 03h08min PÁGINAS: 78 QUARTOS: 19REVISORES: CONCEIÇÃO, ZILFA, ELIANA, WALDECÍRIA, PATRÍCIA MACIEL, TATIANASUPERVISÃO: SEM SUPERVISÃOCONCATENAÇÃO: CLÁUDIA LUIZA
DEPOENTE/CONVIDADO – QUALIFICAÇÃOSÉRGIO HABERFELD – Presidente da Associação Brasileira de Embalagens — ABRE.ANDRÉ VILHENA – Diretor-Executivo do Compromisso Empresarial para a Reciclagem —CEMPRE.JOSÉ ROBERTO GIOSA – Diretor de Reciclagem da Associação Brasileira de Alumínio —ABAL.WASHINGTON NOVAES – Jornalista do jornal O Estado de S.Paulo e da TV Cultura.
SUMÁRIO: Debate sobre a reciclagem de embalagens e de resíduos sólidos.
OBSERVAÇÕESHá exibição de imagens.
CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - PL 203/91 - Política Nacional de ResíduosCE - PL 203/91 - Resíduos de Serviços de SaúdeNúmero: 001232/01 Data: 30/10/01
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O SR. PRESIDENTE (Deputado José Índio) – Havendo número regimental,
declaro abertos os trabalhos da presente reunião.
Como foi distribuída cópia da ata da 14ª Reunião Ordinária desta Comissão
Especial, realizada no dia 23 de outubro de 2001, indago dos Srs. Parlamentares se
há necessidade de leitura da ata.
O SR. DEPUTADO DR. BENEDITO DIAS – Sr. Presidente, solicito que seja
dispensada a leitura da ata.
O SR. PRESIDENTE (Deputado José Índio) – Está dispensada a leitura.
Em discussão a ata. (Pausa.)
Não havendo quem queira discuti-la, coloco-a em votação.
Os Deputados que a aprovam permaneçam como se encontram.
Aprovada.
Expediente.
Comunico a V.Exas. o recebimento dos Ofícios nº 335/01, do Deputado
Rubens Furlan, justificando sua ausência desta reunião, e 355/01, da Chefia de
Gabinete do Deputado Marcos Afonso, justificando a ausência do Parlamentar no
período de 29 de outubro a 9 de novembro, devido à visita oficial que fará ao Estado
do Acre.
Ordem do Dia.
A presente reunião divide-se em duas partes: a primeira está destinada a
ouvir, em audiência pública, os Srs. Sérgio Haberfeld, Presidente da Associação
Brasileira de Embalagens — ABRE; André Vilhena, Diretor-Executivo do
Compromisso Empresarial para a Reciclagem — CEMPRE; João Bosco Silva,
Presidente da Associação Brasileira de Alumínio — ABAL, representado hoje pelo
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Sr. José Roberto Giosa, Diretor de Reciclagem; e o jornalista Washington Novaes,
do jornal O Estado de S.Paulo e da TV Cultura.
A segunda parte desta reunião se destina à apreciação dos requerimentos
pautados.
Neste momento, chamo os senhores convidados para comporem a Mesa, a
fim de darmos início à audiência pública.
Para o melhor andamento dos trabalhos, esclareço aos Srs. Deputados que
adotaremos os seguintes critérios: cada convidado disporá de vinte minutos para sua
exposição inicial, não podendo ser aparteado nessa fase. Encerrada a exposição, os
Deputados interessados em interpelar os convidados deverão fazê-lo estritamente
sobre o assunto da exposição, pelo prazo de três minutos, tendo cada convidado
igual tempo para responder. Aos Deputados são facultadas a réplica e a tréplica pelo
prazo de três minutos. Os Deputados que desejarem participar dos debates deverão
inscrever-se junto à Secretaria da Comissão.
Convido os Srs. Sérgio Haberfeld, André Vilhena, José Roberto Giosa e
Washington Novaes a comporem a Mesa.
Para dar início à audiência pública de hoje, concedo a palavra ao Sr. Sérgio
Haberfeld, Presidente da Associação Brasileira de Embalagens — ABRE.
O SR. SÉRGIO HABERFELD – Sr. Presidente, Deputado José Índio, Sr.
Relator, Deputado Emerson Kapaz, Sras. e Srs. Deputados, minhas senhoras e
meus senhores, é realmente uma honra participar desta reunião e falar um pouco
sobre a Comissão Especial de Resíduos Sólidos.
Antes de tudo, apresento-me de forma breve: sou Presidente do Conselho de
Administração da empresa Dixie Toga, considerada a maior fabricante de
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embalagens do País; também sou Presidente da Associação Brasileira de
Embalagens — CAABR; Presidente da União Latino-Americana de Embalagem e da
Organização Mundial de Embalagem. Portanto, embalagem é a área em que tenho
atuado desde 1965.
Inicialmente, mostrarei algumas transparências. Tenho feito apresentações
como esta em várias partes do mundo. Cheguei hoje pela manhã da Alemanha, e
um dos assuntos discutidos na reunião foi meio ambiente. Estive, na semana
anterior, em Istambul, na Turquia, onde também a questão ambiental foi abordada.
Então, o assunto está muito em voga. Nos países adiantados isso já ocorre há
algum tempo e nos países em desenvolvimento ou subdesenvolvidos da África a
questão tem aparecido mais agora.
A todos os lugares aonde vou levo estas transparências. O ideal seria
imaginar o mundo sem fábricas, sem transportes, sem embalagens e, de
preferência, sem pessoas, porque tudo seria extremamente natural e não haveria
depredação nenhuma. Como isso não é possível, vou falar um pouco sobre
embalagens e qualidade de vida.
(Apresentação de transparências.)
O consumo per capita de embalagem no Japão é de 460 dólares por ano;
nos Estados Unidos é de 311; e, no Brasil, está em torno de 50 dólares. Estou
equalizando o dólar na base de 2,5 para 1, visando mostrar o potencial de
crescimento que ainda temos. Claro que nunca chegaremos à posição do Japão, por
exemplo, onde até ovo de galinha é embalado em caixa de cartolina, com janela de
filme plástico transparente para se dar de presente. Então, ainda temos muito a
evoluir, se tomarmos por base esses números.
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Se observarmos os países em desenvolvimento, verificaremos que mesmo aí
ainda temos como crescer. Tiraria daí a Argentina, porque o dólar naquele país, para
mim, é totalmente fictício. A Tailândia gasta 76 dólares per capita com embalagens;
a Coréia do Sul gasta 95 dólares. O Brasil ainda tem, ao menos, a possibilidade de
crescimento em direção a esses países.
Muitas vezes, devido à falta de conhecimento das pessoas, ouvimos dizerem
que a função da embalagem é proteger da luz, de gases, odores, sabores e
impactos físicos e aumentar a vida útil do produto. Sempre dou o exemplo de uma
cidade chamada Samara, que fica mil quilômetros ao sul de Moscou, considerada
desenvolvida. A cidade tem 1,5 milhão de habitantes e um supermercado apenas.
Toda a comercialização de alimentos é feita na periferia da cidade. O pessoal entra
na cidade, distribui os produtos na calçada, e os cidadãos levam para casa o que
conseguem embrulhar num pedaço de papel que levam consigo. No fim do dia, os
produtores vão embora e voltam no dia seguinte para a mesma rotina.
Então, proteção e facilidade de transporte do produto até a casa do
consumidor são as funções principais da embalagem. As outras são forma e
estrutura, maquinabilidade, armazenamento, manuseio e aproveitamento do
produto.
O que a embalagem faz? Acondiciona, transporta, vende, preserva, facilita o
manuseio, informa, mantém as propriedades físicas e naturais dos produtos e luta
contra o desperdício. O grande problema que ainda podemos ver no mundo inteiro
— e vou entrar nessa questão um pouco à frente —, inclusive no Brasil, é a
quantidade de alimentos que se perdem por falta de embalagem. Essa é uma
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constante nos países menos desenvolvidos, onde mais se perdem alimentos e
outros produtos por falta de embalagem.
Embalagem é parte de um produto, como os recursos naturais, ou seja,
consumo e energia. Também é sempre importante dizer que a embalagem é feita
sob encomenda, como um terno. Cada produto exige certas especificações para que
se mantenha fresco na prateleira e no transporte até atingir o consumidor.
Um dos pontos para o qual sempre chamo atenção — e esse aspecto fica
bastante claro em todos os lugares — é que a embalagem deve proporcionar
economia financeira e ambiental superior ao seu custo. É o mais importante. Não
adianta fazer embalagem de ouro para transportar algo que vale muito menos, já
que não há necessidade de gasto supérfluo.
Outra questão bastante discutida é o descarte difuso das embalagens. Não há
solução, a meu ver, para o meio ambiente, no que diz respeito às embalagens —
estou falando especificamente de embalagem e não de resíduos sólidos de
embalagem —, sem envolvimento da população, da esfera governamental e dos
empresários. O peso dos três é exatamente igual, como um banco de três pés. Se
um é mais curto ou mais comprido, o banco tomba.
Segundo a experiência de países ultradesenvolvidos como a Alemanha e a
Suíça, cada embalagem colocada separadamente num saco diferente, de cor
diferente, é recolhida pelo lixeiro, que é público, de forma separada. O dono da casa
pode pagar multa bem alta se misturar produtos e usar o saco de cor errada. Ele
paga por esse saco quando vai comprar o produto. Portanto, a população deve ser
educada para isso.
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No Brasil, com seus 8 milhões de quilômetros quadrados, 78% da população
estão concentrados em centros urbanos, e o transporte, na maior parte, é terrestre.
Destaco esse aspecto porque muitos abordam a questão da queima do lixo. Por
exemplo, a Dinamarca queima a maior parte do lixo e transforma a queima em
energia para aquecer domicílios e fazer fábricas funcionarem, mas é um país
minúsculo, com distâncias curtas e totalmente plano. Nesse caso, fica muito mais
fácil. Em países do tamanho do nosso, como Estados Unidos, Canadá e Rússia, são
necessários vários sistemas trabalhando paralelamente.
E as realidades regionais são distintas. Nos Estados do Sul, por exemplo,
Curitiba, Florianópolis e outras cidades têm sistemas perfeitos de coleta, reciclagem
e reutilização do lixo, que funcionam em países desenvolvidos. Por outro lado, em
regiões menos ricas, de realidades diferentes, o sistema funciona de outra forma. A
maioria dos Municípios nem tem coleta de lixo, que é colocado num buraco, em
qualquer lugar, ou queimado a céu aberto. Tendo o País de 20 milhões a 50 milhões
de miseráveis — os números são diferentes, dependendo de quem está tentando
vendê-los —, há problemas bastante complexos de recolhimento do lixo.
Segundo estudo feito pela FAO, Organização das Nações Unidas para a
Agricultura e Alimentação, cerca de 40% dos alimentos plantados são perdidos
antes de serem consumidos, por diversos problemas: transporte, distância e
embalagem.
No Brasil, treze milhões de reais em alimentos hortifrutícolas são perdidos no
supermercado, por ano, e mil toneladas de alimentos frescos são perdidas
diariamente nas feiras livres, sendo 80% reaproveitáveis.
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Quanto à indústria recicladora, temos a indústria de embalagens, as unidades
industriais independentes para reciclagem no mercado têxtil, automobilístico, de
utensílios domésticos e de peças injetadas. Todos esses produtos necessitam de
reciclagem. Alguns são reciclados nas áreas mais desenvolvidas; outros
simplesmente são jogados ou flutuam nos rios, enfim, perdem-se no espaço.
O que temos feito? A Associação Brasileira de Embalagem criou o Excess
Channel, canal extremamente moderno da Internet para reaproveitamento de
resíduos, por meio da comercialização desse material.
As empresas têm procurado copiar um pouco o que é feito no mundo. Por
exemplo, o ISO 14000, a produção limpa, a redução do consumo de energia e de
recursos naturais e a redução do peso das embalagens.
No Brasil, podemos verificar algo bastante interessante: podemos discutir por
horas os números e as porcentagens, como em todos lugares aonde vou; sempre
existem discussões sobre números, já que estão sendo freqüentemente
reestudados. O Japão está fazendo a reestruturação de todos os seus números. No
Brasil, a reciclagem do alumínio está em 73%; do papelão ondulado, 72%; de lata de
aço, 40%; de papel, 38%; de vidro, 38%; de plásticos em geral, 26%.
Há ainda aqui uma figura que só existe em áreas de desenvolvimento. Como
disse, há duas semanas estava em Istambul, na Turquia, onde vi grande quantidade
de catadores. São os famosos catadores que temos aqui. No meu tempo, eram
chamados garrafeiros ou retalheiros, enfim, são os que recolhem lixo. Hoje em dia
concentram a atividade, obviamente, nos produtos que têm maior valor unitário,
porque vivem disso e chegam a ganhar 500 e até 600 reais por mês, dinheiro com o
qual sustentam suas famílias. Segundo a Associação de Papel, há 300 mil
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catadores. Já ouvi falarem em um milhão de catadores. Defendo o número mais
conservador, de 300 mil, conforme pesquisa da indústria de papel.
Há novidade na Europa: a Alemanha deixou de lado a reciclagem, porque
teve um grande problema. Discuti sobre isso com um dos pais da reciclagem. O que
está acontecendo? Há material demais para reciclar e não há o que fazer com o
material já separado e entregue para ser reciclado. Estão tentando empurrar isso
para algum país que esteja disposto a aceitar. Já chegaram a empurrar para a
Indonésia e para países menos desenvolvidos, porque realmente havia excesso de
certos materiais recicláveis. Em outros casos, tentam importar material para reciclar,
caso típico, de que soube na semana passada, da Comunidade Européia em
relação ao PET. Ela tem excesso de produtos que usam PET reciclável, mas não
tem o produto em quantidade suficiente para usar nos produtos.
Agora, utilizam produtos com pesos menores: quanto menor o peso do
produto, melhor para o meio ambiente, porque será necessária menos energia para
criá-lo. Essa é a razão de estarem utilizando alumínio nas peças dos automóveis, o
que os torna extremamente leves. Menos energia é necessária para gerar produtos
mais leves.
No Brasil, já houve grande redução no peso de embalagens desde os anos
80. No peso dos plásticos houve redução de até 50%, com novas tecnologias; no
peso do vidro, 35%; do alumínio, 30%; das latas de aço, 27%; e do papelão, de até
12,5%.
Também é muito interessante chamar a atenção para as particularidades e
prioridades de cada país. Tendo em vista que na Europa e no Japão falta espaço,
dá-se muito valor ao que se faz com o lixo. Nos Estados Unidos, o grande problema
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são os poluentes da atmosfera. Então, para se montar uma fábrica de embalagem
no norte dos Estados Unidos não se paga pela fábrica ou pelas máquinas, mas por
uma cota de poluição da atmosfera. No entanto, nos Estados do sul, menos
desenvolvidos, como o Mississipi, é mais fácil instalar uma fábrica: não há restrição
quanto à poluição já que se quer atrair mão-de-obra. São aspectos diferentes,
dependendo da situação de cada país.
A prioridade brasileira tem sido a valorização do produto reciclado, o incentivo
à cadeia recicladora, o saneamento básico, a vontade política, a educação ambiental
e a responsabilidade compartilhada entre Poder Público, setor produtivo e
sociedade. Para mim, é o básico. Temos estudado, junto com vários órgãos, a
melhor maneira de difundir a necessidade de preservação do ambiente, fazendo um
trabalho conjunto. Inegavelmente, a indústria tem papel sério e tem que participar
ativamente, ajudando nesse trabalho e fazendo com que o produto seja reciclado,
reutilizado de acordo com as possibilidades. Sozinha, no entanto, não resolve o
problema.
A preocupação que tenho é sobre o que acontecerá no momento em que se
criar, por exemplo, novo imposto. Vinte por cento das empresas vão pagar e tentar,
de uma forma ou de outra, agir corretamente, mas os outros 80% entrarão na
informalidade, na ilegalidade, como hoje em dia ocorre, por necessidade de
sobrevivência. E isso não resolve o problema maior, que é realmente melhorar o
ambiente em que vivemos.
Para encerrar, ninguém duvida de que precisamos de embalagem. O Brasil
precisa delas para transportar e acondicionar os produtos, a fim de dar condições
melhores de higiene e limpeza aos alimentos. Por outro lado, também não podemos
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negar que precisamos participar ativamente de um processo de melhoria da
qualidade de vida, o que inclui o meio ambiente, para que não aconteça conosco o
que aconteceu com a Alemanha Oriental. Após a queda do Muro de Berlim,
verificaram-se os danos causados do outro lado do muro pelos comunistas, que
destruíram lagos, árvores, represas e queimaram carvão a céu aberto. Agora, o
custo de recuperação é muito maior do que se tivessem prevenido esses
acontecimentos.
Muitíssimo obrigado, mais uma vez, pela oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Deputado José Índio) – Nós é que agradecemos, Sr.
Sérgio Haberfeld.
Agora, concedemos a palavra ao Sr. André Vilhena, Diretor-Executivo do
Compromisso Empresarial para a Reciclagem.
O SR. ANDRÉ VILHENA – Muito obrigado, Sr. Presidente, demais
companheiros da Mesa e da platéia, para nós é um prazer estar aqui falando sobre
resíduos sólidos. Nós que atuamos na área de resíduos sólidos no Brasil sabemos
quanto é importante a atividade desenvolvida por esta Casa. Esperamos trazer hoje
algumas contribuições e informações, que é basicamente nossa linha de atuação,
para que de alguma forma possamos abrir a discussão e ficar à disposição para tais
informações.
(Apresentação de slides.)
O CEMPRE — Compromisso Empresarial para a Reciclagem, é uma
associação empresarial. Somos mantidos por quinze empresas do setor privado e,
basicamente, nossa linha de atuação é pesquisa e difusão de informações sobre
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gerenciamento de resíduos sólidos e de lixo, incluídas a coleta seletiva e a
reciclagem.
A missão do CEMPRE é promover o conceito de gerenciamento integrado do
lixo sólido municipal — por favor, não se preocupem porque não vamos entrar em
detalhes técnicos sobre o gerenciamento integrado do lixo —; promover a
reciclagem pós-consumo, pois realizamos a reciclagem pós-industrial ou pré-
consumo, mas especialmente esta última; e, finalmente, difundir a teoria dos três
erres: redução, reutilização e reciclagem.
Somos conhecidos internacionalmente como uma entidade bastante
“ecumênica” — entre aspas —, pois temos representantes dos mais diversos
setores, o que, com certeza, enriquece muito o trabalho desenvolvido em pesquisa e
difusão de informações pela associação.
Dividimos nossa apresentação basicamente em duas etapas, pensando um
pouco no prognóstico e no diagnóstico que gostaríamos de ver no futuro, com a
melhoria contínua do gerenciamento dos resíduos sólidos no Brasil.
Com alguns dados, acredito, V.Exas. já estão familiarizados. Em relação à
geração de lixo no Brasil, por exemplo, a Grande São Paulo gera cerca de 15 mil
toneladas de lixo por dia, cinco vezes o que produz o Uruguai por dia. Isso dá uma
idéia da dificuldade de gerenciar resíduos sólidos nesses espaços relativamente
reduzidos.
A maior parte do lixo sólido urbano no Brasil é composto por matéria orgânica.
Muitos desconhecem isso. É claro que, ao se tirar a média em um país como o
Brasil, vários pontos ficam fora da curva, mas nunca abaixo de 50% e nunca acima
de 80%. A maior parte, em peso, dos resíduos sólidos urbanos do Brasil é composta
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por resíduo orgânico. Infelizmente, é aquele que tem menor aproveitamento, menor
índice de reciclagem, o que, no caso do Brasil, basicamente, é a compostagem.
Além disso, é aquele que emociona menos nas discussões de que temos
oportunidade de participar. Hoje, com certeza, o resíduo orgânico é o que gera maior
impacto ambiental entre todos os existentes, justamente por se decompor
rapidamente e ser muito rico em carga orgânica.
Temos exemplos clássicos no Brasil de contaminação de cursos d’água que
abastecem grandes centros urbanos, já prejudicados, já impactados justamente pela
decomposição acelerada de matéria orgânica existente nos famosos lixões, que se
acabam formando de forma clandestina e até como única opção existente.
O IBGE promete para o final deste ano dados atualizados sobre o destino do
lixo no Brasil. Esses, infelizmente, são os dados mais recentes que temos, do início
dos anos 90. Mas sabemos que mudaram: a expectativa é de que a quantidade de
resíduos sólidos urbanos pós-consumo que estejam indo para lixões ou vazadouros
a céu aberto ainda seja a maior parte, algo em torno de 60%. Vamos ver os números
do IBGE.
O setor de reciclagem, se é que podemos chamá-lo assim, considera que a
reciclagem evoluiu no Brasil, principalmente para alguns tipos de materiais, mais do
que outros, e que hoje estaríamos reciclando algo em torno de 4% dos resíduos
sólidos urbanos. Sabemos que é muito difícil obter esses números com precisão,
portanto, têm alta carga de aproximações.
Falando um pouco do destino final do lixo, este é o cenário do Brasil, na
maioria dos casos. Como bem expôs o Dr. Sérgio Haberfeld, alguns Municípios já
fazem o gerenciamento de forma correta, inclusive a destinação adequada dos
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resíduos sólidos pós-consumo, com depósito em aterros sanitários, controle
ambiental e jamais nestas áreas que estamos vendo por aí: os lixões.
Aqui temos impactos ambientais por contaminação de solo, lençol freático,
cursos d’água etc.; os impactos sociais, porque muitas pessoas se alimentam nos
lixões, vivem da separação dos materiais para serem vendidos à cadeia de
reciclagem com baixo valor agregado.
E justamente falando do valor agregado, temos os impactos econômicos
negativos. Por quê? Quando o lixo chega à fase em que deveria ser transformado
em matéria-prima e reintroduzido no ciclo produtivo, perde, por estar muito
misturado, valor agregado ou comercial. Quando falamos de papel e plástico, então,
a queda do valor é extremamente significativa devido a essa mistura em grandes
quantidades com resíduos orgânicos.
Quanto à conscientização da população, este é o cenário, infelizmente,
comum no Brasil e para o qual vale a pena chamar a atenção. Ao mencionarmos
política de resíduos sólidos, é importante, antes de destacar coleta seletiva e
reciclagem, darmos atenção ao gerenciamento do lixo no Brasil, que passa pela
disposição final, nunca em lixões e sempre em aterros sanitários, e também pela
coleta regular do lixo, pela conscientização da população de que o lixo tem de ir
primeiramente para a lata do lixo.
Este é um cenário típico. Encontramos nestas situações os mais diversos
tipos de materiais: plásticos, pneus, sofás-camas. Isso se deve ao baixo índice de
conscientização da população.
Esta transparência também mostra um problema associado: os esgotos. E
não vamos entrar em detalhes sobre isso. Muitas vezes, há mistura de canais
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pluviais com canais de esgoto, lixo e tudo, o que acaba, de alguma forma, sendo
impactante.
Estes dados mostram a diversidade do lixo no Brasil, em virtude das
características socioeconômicas e culturais da população brasileira. E já reforço aqui
o que o Dr. Sérgio Haberfeld falou em relação à necessidade de uma política
nacional e até mesmo de políticas estaduais que possibilitem soluções para o
gerenciamento do lixo, adequadas a peculiaridades locais e regionais. E que não
criemos mecanismo que venha a engessar e a dificultar as adaptações locais. A
política do setor em países continentais como o Brasil, o Canadá e os Estados
Unidos deve permitir esta flexibilização: adaptações a realidades locais.
Aqui há um dado sobre geração de lixo, relacionando o Brasil com países de
Primeiro Mundo. São índices utilizados pelas Nações Unidas até para medir o grau
de desenvolvimento de um país. Hoje, associa-se o grau de desenvolvimento de um
país à quantidade per capita de lixo gerado. Sabemos que essa tendência deve se
reverter, porque devemos dar atenção à redução da geração de lixo e de resíduos
no nosso dia-a-dia. Então, a tendência é que o país trabalhe para equacionar e
diminuir a geração dos resíduos na medida em que se desenvolve.
Este é um dado importante, também sobre as questões básicas do
gerenciamento do lixo. A maior parte do lixo sólido urbano do Brasil vai para lixões
— conforme já dissemos —, e cerca de 30% dos Municípios brasileiros não têm
nenhum sistema de limpeza urbana, ou seja, sua população não é atendida com
nenhum serviço de limpeza urbana. E mais de 65% dos Municípios brasileiros não
atendem 100% da população com o serviço básico de limpeza urbana e coleta
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regular de lixo. Sabemos o que acarreta a ausência da coleta regular de lixo para a
população.
Então, falaremos sobre o desperdício. O Dr. Sérgio Haberfeld já falou sobre
as causas do alto índice de desperdício no Brasil. Temos aí o exemplo clássico
estudado pelo CETEA, instituto de Campinas. Foi examinado o tomate, do qual há
desperdício muito grande, em função da utilização inadequada de embalagens ou
simplesmente pela falta delas. No caso do tomate, ainda se utiliza a embalagem tipo
“k”. Não é do meu tempo, mas parece que, na Segunda Guerra Mundial, era usada
para acondicionar querosene. Quer dizer, é uma situação completamente distorcida.
E isso preocupa porque, se temos, em muitas situações, déficit de utilização de
embalagens, significa que a tendência é de crescimento da utilização de
embalagens. E precisamos encontrar caminhos para dar melhor destino a esse tipo
de resíduo.
A coleta seletiva, ao contrário do que muitos imaginam, acontece no Brasil e
de forma bastante eficiente em alguns Municípios. A entrega voluntária, ou seja, a
utilização de contêineres em locais estratégicos é uma das dinâmicas, quando a
população é sensibilizada e conscientizada para, de forma voluntária, colaborar.
Sabemos que, quanto maior a participação voluntária da população em um
programa de coleta seletiva, menores são os custos totais.
Outra metodologia de coleta seletiva em curso no Brasil é a porta a porta.
Porto Alegre, Curitiba, São José dos Campos, Santo André e Jundiaí fazem a coleta
seletiva porta a porta com muita eficiência. E o grau de sensibilização da população
desses Municípios é extremamente elevado. Esse trabalho foi feito ao longo do
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tempo. Então, tempo é necessário nesse processo de mudança de hábitos e de
comportamento da população.
Não é possível falar em coleta seletiva, em Política Nacional de Resíduos
Sólidos sem contemplar a figura do catador, que também já foi mencionada. Hoje,
efetivamente, principalmente para os setores de alumínio e papelão, o catador é um
agente econômico. Além de existir o componente social, porque se gera
oportunidade de emprego, resgata-se a cidadania das pessoas que, muitas vezes,
estavam à margem da sociedade. Elas giram a economia e passam a se organizar
cada vez mais. Não defendemos, em hipótese alguma, catador de lixão, mas
somente catadores que trabalhem de forma organizada, em cooperativas, com
condições de segurança e higiene.
Trouxe aqui dois números sobre a quantidade atual de catadores de rua no
Brasil. São números que variam bastante. Em 1999, durante o Programa Brasileiro
de Reciclagem, foi feita uma pesquisa e identificou-se cerca de 200 mil catadores de
rua ou de cooperativas. Este ano ocorreu aqui em Brasília um seminário nacional de
catadores. E a estimativa da Cáritas — organização de cunho religioso — é de que
hoje existam cerca de 500 mil catadores de rua ou de cooperativas.
Fazemos, inclusive, um trabalho de apoio a essas cooperativas, para que se
tornem empreendimentos, para que o catador melhore a produtividade do seu
trabalho. E aqui está o exemplo de uma cooperativa que atingiu grau de maturidade
tal que já consegue comercializar plásticos em grande quantidade diretamente com
a indústria, auferindo, com isso, maiores lucros.
Aqui está o exemplo de uma cooperativa montada a partir do fechamento de
um lixão. Quando falamos em fechar um lixão, muitas vezes, isso significa impacto
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social, porque pessoas vivem da separação daqueles materiais. E, simplesmente,
corta-se aquela atividade, aquela fonte de sustento. Então, para que esse processo
seja feito de forma mais suave, sugerimos que sejam adotados procedimentos como
este que aí está, ou seja, removem-se as pessoas do lixão, constroem-se galpões
de triagem, enfim, uma estrutura logo ao lado que permita a eles trabalharem em
condições de segurança e de higiene mais favoráveis, mantendo ainda seu ofício,
que é trabalhar na separação de materiais.
É importante dizer inclusive que a Força Sindical possui números recentes
mostrando que eles tinham cem mil candidatos a uma vaga e não conseguiam
preenchê-las por problema de qualificação e ofertavam dez mil vagas que não eram
preenchidas porque não havia gente qualificada, infelizmente, para preenchê-las.
Então, a coleta seletiva aparece como uma oportunidade para uma parte da
população brasileira que infelizmente, por motivos históricos, acabou ficando com
dificuldade de inserção no mercado de trabalho, tal qual o conhecemos hoje.
Portanto, gostaria de chamar a atenção para isso.
Podemos ver nesta cooperativa como é uma atividade com mão-de-obra
intensiva, com geração de empregos e rendas para grande parte da população,
principalmente essa que tem dificuldade de inserção no mercado de trabalho. Aqui
outro exemplo. Podemos passar.
Temos uma atividade de pesquisa sobre programas de coleta seletiva no
Brasil. Acompanhamos dados técnicos, econômicos e sociais. Este ano estamos
compilando novos dados e esperamos, já no primeiro semestre de 2002, atualizar
essa pesquisa, que chamamos de Ciclosoft.
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Infelizmente, com a descontinuidade, muitas vezes com a mudança na
administração das prefeituras, temos situações do tipo: programas que estavam
sendo desenvolvidos simplesmente param; e, em outras situações, não tínhamos
nada e passamos a ter. Então, a descontinuidade administrativa, como dizia o
saudoso Vicente Matheus, “é uma faca de dois legumes”, tanto pode ser para bem
como para mal.
O fato é que, em 1994, tínhamos cerca de 81 Municípios no Brasil
desenvolvendo programas de coleta seletiva de uma forma razoavelmente
organizada. Em 1999, esse número foi de 435, ou seja, houve um crescimento em
torno de 60%, que pode ser um número animador, por um lado, mas por outro, se
considerarmos que temos 5.504 Municípios, é ainda um índice muito baixo. A nossa
expectativa é de que vamos fechar o ano de 2001 com algo em torno de 200
Municípios utilizando programas de coleta seletiva de forma organizada no Brasil.
Quando se fala de uma política estadual ou nacional de resíduos sólidos não
se pode desconsiderar também essa realidade atual do mercado de sucatas
estabelecido no Brasil. Então, temos a atuação dos catadores de forma autônoma;
em cooperativa, temos a atuação dos pequenos, médios e grandes sucateiros, que
hoje movimentam grandes quantidades também de materiais recicláveis; nos
grandes centros, principalmente São Paulo e Rio de Janeiro, temos uma atividade
bastante intensa dessa classe. Por exemplo, no bairro residencial e comercial Itaim
Bibi, em São Paulo, onde moro, antes de passar o caminhão da Prefeitura de coleta
regular de lixo, observa-se nitidamente toda a atividade desenvolvida pelos
sucateiros. Então, é efetivamente uma realidade hoje no Brasil, e eles desviam
quantidades significativas que acabariam indo para os aterros.
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Finalmente, os projetos da indústria de reciclagem que aí existem. Apesar das
dificuldade com os números, esforçamo-nos bastante para consegui-los, e esses
números com certeza são os que se aproximam mais da realidade nacional. E aí
precisamos ter atenção, porque o viés da reciclagem no Brasil, apesar de, claro,
querermos que seja cada vez maior, de forma mais acentuada, é positivo. Então,
hoje temos alguns materiais, como papelão, alumínio, alguns tipos de plástico com
crescimento significativo de índice de reciclagem. A própria embalagem longa vida,
que até bem pouco tempo atrás era pouco reciclada ou quase nada, já atinge
patamares de 15% de índice de reciclagem. E observamos que, no caso do resíduo
orgânico, gerado em maior quantidade, que traz maior impacto ambiental, é o que
possui menor índice de recuperação, e, volto a dizer, é aquele menos citado em
discussões em qualquer fórum.
Um detalhe importante: hoje, na Europa, o índice de reciclagem de plásticos,
por exemplo, permanece estagnado em torno de 20%. Normalmente, os países que
consideram e apresentam índices maiores de reciclagem de plásticos incorporam a
reciclagem energética, mencionada anteriormente. No Brasil, hoje, ainda não temos
a recuperação energética do lixo para alguns tipos de materiais, o que, de alguma
forma, alavancaria índices de reciclagem, já que a recuperação energética é
considerada um tipo de reciclagem, para alguns tipos de materiais.
Aqui há alguns dados sobre o posicionamento do Brasil na reciclagem de
aparas de papel em relação ao mundo, mostrando que nós, em termos de país em
desenvolvimento, temos uma posição relativamente boa, enquanto reciclagem de
papel e papelão, podendo ainda melhorar.
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Aqui há alguns dados que certamente o Sr. José Roberto Giosa vai
apresentar, estou roubando um pouco da apresentação dele; são dados da ABAL
sobre a evolução da reciclagem de alumínio no Brasil, que hoje é um caso de
sucesso mundial, estando sempre nas posições de liderança até em relação a
países de Primeiro Mundo, dividindo com o Japão a posição de liderança.
Outro dia, inclusive falamos sobre isso, e chegou um fax de Hong Kong
dizendo: não, nós reciclamos 98% aqui em Hong Kong. Mas, enfim, é sempre um
dos primeiros.
A reciclagem de embalagem PET, no Brasil, também apresenta um viés de
crescimento. É claro que o PET sofre um pouco em relação ao crescimento do seu
índice de reciclagem em função do consumo aparente dele que tem crescido muito
no Brasil nos últimos anos. Como o índice de reciclagem é relativo, é relativo a quê?
Ao consumo aparente. Acaba que o índice de reciclagem, apesar de, em termos
totais, quantitativos, a reciclagem ter crescido significativamente, não cresce tão
rápido quanto gostaríamos.
Em relação à reciclagem de vidro, também percebemos uma evolução na
execução de diversos programas no âmbito municipal, executado por entidades de
diversos setores, que têm permitido se recuperar uma quantidade maior também de
vidro, com índice no patamar de 42%.
Esses dados são relacionados a espaços geográficos, índices muito difíceis
de ser obtidos, e explico por quê. Por exemplo, hoje o Estado que mais recicla
plástico PET no Brasil é o Rio de Janeiro, e não há nenhum reciclador instalado lá.
Então, há um movimento hoje muito grande de sucatas, inclusive no âmbito de
América Latina e para outros continentes.
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Estivemos, na semana passada, em Porto Alegre, que hoje está exportando
500 toneladas/mês de PET pós-consumo na forma de flakes ou fardos para a
Europa, China e Taiwan. Há também movimentação entre países latinos, e isso, do
ponto de vista da reciclagem, é muito saudável, porque começamos a perceber que
o lixo começa a ser valorizado, deixando de ser algo de valor desprezível e passa a
ser encarado como um insumo, como matéria-prima com um novo ciclo produtivo.
Aqui temos alguns dados sobre pneus — acredito que esse tema já foi
abordado nesta Comissão —, mas chamo a atenção para um aspecto que nos
preocupa. Temos visto com freqüência a tendência de se tratar o lixo de forma
segregada. Então, vamos criar uma lei ou uma resolução para pneus, pilhas,
embalagens, lâmpadas totalmente desconectadas de um todo. Isso, com certeza,
baseado em experiência internacional, do ponto de vista econômico e energético, é
totalmente desaconselhável. Já está comprovado, temos inclusive que trabalhar
essa questão do ponto de vista numérico, que o gerenciamento integrado de todas
as frações encontradas no lixo conjuntamente trazem maior benefício, não só
econômico, mas também ambiental. Vimos isso com freqüência.
Muitas vezes, em alguns debates, vamos falar sobre política nacional de
resíduos sólidos e, de repente, a discussão é sobre política nacional de embalagem.
Vamos num outro evento falar sobre política nacional de resíduos sólidos e a
discussão gira em torno da política nacional de pneus. Então, é muito importante
que uma política nacional de resíduos sólidos trabalhe todos os tipos de materiais
encontrados nos lixos de forma integrada. Do ponto de vista do mercado de sucata
— se tiver alguém presente do mercado de sucata, algum sucateiro ou reciclador,
sabe bem o que estou dizendo —, até para se trabalhar com folga e com certa
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serenidade no mercado, é fundamental se trabalhar com todos ou pelo menos com a
maior gama possível de materiais.
Aqui alguns dados da Associação Brasileira da Indústria Química sobre a
reciclagem de plásticos. Hoje, o Brasil está reciclando algo em torno de 15% —
voltando a lembrar que o Brasil só tem reciclagem mecânica de plástico.
Aqui um dado interessante sobre a coleta seletiva e o envolvimento do
catador. A prefeitura de Salvador fez um cômputo e divulgou que, só nos quatro dias
de Carnaval, em Salvador, registrou-se um movimento de 270 mil reais com coleta
de latinhas de alumínio, movimentando cerca de 150 toneladas. O Sr. José Roberto
Giosa pode me corrigir, se eu estiver errado, pois não tenho esse dado.
Aqui um índice da ABIVIDRO sobre o desperdício com a não-reciclagem de
vidro, hoje, na Grande São Paulo: algo em torno de 9 mil reais por dia. Aqui, outro
dado da Associação Brasileira da Indústria Química sobre desperdício de 330 mil
reais por dia. Essa questão do desperdício em relação ao lixo varia de 1,5 bilhão, e
já ouvi falar até em 10 bilhões de reais por ano.
Enfim, são dados também bastante discutidos, mas hoje, com certeza, o
Brasil, diferentemente do Uruguai e da Argentina, já possui escala para trabalhar a
reciclagem. Essa é uma vantagem muito grande que temos em relação a outros
países. Agora, quando falamos em escala, novamente ressaltamos a importância de
atender e respeitar as peculiaridades regionais do nosso País.
Então, vemos com freqüência, como bem citou o Dr. Sr. Sérgio Haberfeld,
menções de programas que funcionam bem na França, na Alemanha, na
Dinamarca, etc. Ótimo, são programas que, apesar de seus custos elevados — é
uma sociedade que está disposta a pagar — podem funcionar muito bem lá. Mas
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não acreditamos que uma política de resíduos sólidos que funcione na Finlândia
possa ser copiada e vá funcionar, na íntegra, num país como o Brasil. De cara,
existe a questão dos custos. Por exemplo, lá o programa alemão voltado para
embalagem custa 4 bilhões de dólares por ano, valor extremamente elevado.
Observamos alguns aspectos interessantes. Estivemos no Canadá no ano
passado apresentando o que é feito no Brasil no que se refere à coleta seletiva e à
reciclagem. Não sei se V.Exas. sabem, mas lá algumas províncias têm metodologias
diferenciadas de coleta seletiva. Por exemplo, algumas adotam o sistema de
cobrança de taxa para dar algum valor ao retorno da embalagem. As províncias que
adotaram esse sistema têm um índice de coleta seletiva inferior ao de Ontário, por
exemplo, que adota a coleta seletiva voluntária, com conscientização da população.
Como isso se traduz em números? Por exemplo, no caso da Província de
British Columbia, o que está acontecendo? Como a coleta seletiva baseada na taxa
é muito cara, eles estão com receio de que o número maior de consumidores leve de
volta sua embalagem, porque isso não inviabilizaria economicamente o programa
instalado de coletiva seletiva.
É um contra-senso, cria-se um mecanismo com boa intenção para incentivar
a coleta seletiva e agora está com medo de que aumente a participação da
população, o que inviabilizaria economicamente aquele sistema criado. Então, viram-
se hoje numa situação de sinuca de bico. Aí têm que retroceder e reconsiderar uma
série de aspectos. E hoje as províncias de Ontário e outras que não adotaram esse
sistema já estão muito na frente.
Terminando a apresentação, temos algumas propostas. Primeiro, sobre o
gerenciamento do lixo: ter muita atenção pois na política nacional é necessário
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contemplar antes da coleta seletiva e da reciclagem a coleta regular do lixo;
segundo, um projeto de reciclagem para funcionar tem que estar calcada neste
exemplo que estamos apresentando, essa correntinha aí. Então, todos os elos
dessa corrente têm de ser trabalhados na mesma hora e com a mesma intensidade,
para que não haja rompimento em nenhuma fase do processo.
Não adianta investir demais na coleta seletiva, na conscientização da
população, ter uma ultra-segregação de materiais reciclados, se não existe o
segundo elo da corrente: capacidade instalada, tecnologia para transformar aquilo
que sempre coletou e separou; e também o terceiro: mercado para inserção daquilo
que se transformou, o produto reciclado. Porque é justamente o desenvolvimento
desse mercado que vai viabilizar o investimento em tecnologia e capacidade
instalada, refletindo na coleta seletiva, aumentando o valor agregado, o que era lixo
passou a ser material reciclado.
Apresentamos a esta Comissão algumas propostas para alavancar a
reciclagem no Brasil. A questão do crédito, de financiamentos para as cooperativas
de sucateiros, recicladores. Hoje uma cooperativa com a aquisição de uma prensa
hidráulica de 15 toneladas deixa de ser inviável e passa a ser viável
economicamente. Mas muitas vezes ela tem dificuldade em adquirir esse
equipamento que custa cerca de 10 mil reais.
Criar linhas de crédito, de financiamento também para o pequeno e médio
reciclador; prazos de carências mais dilatados, taxas de juros mais acessíveis,
apesar de sabermos da complexidade desse tema. Enfim, dar tratamento
diferenciado à atividade de reciclagem. Parece que a Caixa Econômica Federal está
lançando linha de crédito para cooperativas de catadores.
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Eliminação dos incentivos fiscais. Hoje, sem exceção, todos os materiais
sofrem com esse problema. Do ponto de vista estadual, a questão do ICMS, do
ponto de vista federal, a questão do IPI — está aí o exemplo dos plásticos, a
bitributação baixou tudo para 5%, agora voltou para 15% o reciclado. E para cada
tipo de material existem hoje no Brasil gargalos. Precisamos eliminá-los e partir para
a criação de incentivos fiscais. Não podemos mais trabalhar pensando em criação
de taxas. Ninguém agüenta mais pagar taxa neste País. Então, por que não criar
outra linha de raciocínio: em vez de criarmos taxas, oferecermos incentivos
diferenciados para quem trabalhar em prol da reciclagem?
Investimento, pesquisa e desenvolvimento em diversos setores; capacitação
de mão de obra — isso é importantíssimo, precisamos de ações fortes em âmbito
nacional para capacitar tecnicamente todo o pessoal, principalmente aqueles que
trabalham com limpeza urbana municipal —; e a questão da educação ambiental
que, sem dúvida, é o maior gargalo.
Apresento uma sugestão. Quando reforçamos a importância das cooperativas
de catadores, frisamos sempre o seguinte: a coleta seletiva não vai ser feita só com
catadores, isso é impossível, é apenas uma parte do processo.
Também para o caso do reaproveitamento energético do lixo — até em
função da convergência hoje de opiniões de que nossa matriz energética é
deficitária e que, a curto prazo, a solução será as usinas termoelétricas, portanto,
vamos queimar gás —, por que não queimar uma pequena fração do lixo que tenha
poder calorífico para isso e recuperá-la do ponto de vista energético? Volto a repetir,
não é todo o lixo, apenas uma fração que seja economicamente interessante. Assim,
geraríamos energia elétrica, calefação.
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Aqui há alguns dados sobre o aproveitamento energético. Hoje, a indústria
açucareira já está trabalhando inclusive em coordenação com outros setores,
pensando, por exemplo, no reaproveitamento energético do bagaço da cana e tantos
outros resíduos gerados em quantidade no Brasil.
A questão dos aterros, em substituição aos lixões, com proteção de lençol
freático, proteção de solo etc. Voltando à questão da incineração com controle
ambiental, não adianta fazer a queima, poluir a atmosfera, jogar cinza no rio, no solo.
Tem de haver um controle ambiental rigoroso, e já existe tecnologia mundial para
isso.
Quanto à inovação tecnológica, temos uma série de sugestões, inclusive a
oportunidades de novos investimentos, novos negócios. Do ponto de vista
ambiental, já falamos sobre as vantagens da reciclagem: economia de energia, de
matéria-prima, making money, novas oportunidades de negócio, a questão social,
com exceção dos catadores, é muito importante. Uma política nacional de resíduos
sólidos deve contemplar essa questão social, hoje premente no Brasil.
Só acreditamos que podemos melhorar a questão do gerenciamento no Brasil
com uma ação articulada entre o poder público, o setor empresarial e principalmente
o cidadão. Por exemplo, existe hoje uma discussão sobre a taxa do lixo. É
importante separarmos o valor pago para o lixo em detrimento de outros tipos de
serviços oferecidos pelo Município. Agora, precisamos pensar também que qualquer
proposta de coleta seletiva, de programa de reciclagem só terá êxito se a população
estiver conscientizada de que deve participar por um motivo muito maior do que
custo, taxa, valores a ela impostos ou cobrados. Nós que trabalhamos com
informação sentimos isso no dia-a-dia: a necessidade de conscientizar, de mudar
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hábitos, de informar. O Poder Público e os setores empresarial e industrial podem ter
grande participação, mas se o cidadão não estiver conectado a tudo isso e motivado
a participar, qualquer proposta de coleta seletiva ou programa de reciclagem tenderá
ao fracasso. Aí teremos efetivamente uma lei muito boa no papel, mas que, na
prática, acabará não sendo cumprida, não porque não se queira, mas porque muitas
vezes simplesmente não se pode cumprir.
Os caminhos têm de estar baseados na sustentabilidade técnica, econômica
e social. Sustentabilidade econômica é muito importante. Muitas vezes observamos
com freqüência algumas pessoas da área que apresentam propostas, metodologias
sem base econômica. Elas apenas se apóiam numa proposta técnica com forte
conotação ambiental, e a solidez econômica acaba sendo desconsiderada ou tendo
uma importância inferior. Sabemos que para que a coleta seletiva e a reciclagem
possam avançar e ser perenes no Brasil só com sustentabilidade econômica. Todos
aqueles índices de reciclagem no Brasil que mostramos, necessariamente, apóiam-
se em realidade de mercado. Se ainda não foram os índices de muitas situações que
gostaríamos de alcançar, pelo menos até hoje conseguimos ir respeitando uma
realidade de mercado. Portanto, são índices que dificilmente jogamos para baixo. A
tendência é sempre ir para cima.
Se alguém ainda não conhece o CEMPRE e quiser saber um pouco mais
sobre a entidade ou sobre informações de que dispomos, esse é o nosso endereço
eletrônico.
Mais uma vez agradecemos a Comissão Especial o convite para fazer esta
apresentação. Mais uma vez, renovamos nossa predisposição em colaborar com
informações que estiverem ao nosso alcance e, mesmo que não, comprometemo-
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nos a ir buscá-las para que possamos, de alguma forma, apoiar o importantíssimo
trabalho desenvolvido por esta Comissão da Câmara dos Deputados.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Deputado José Índio) – Agradecemos ao Sr. André
Vilhena a participação e concedemos a palavra ao Sr. José Roberto Giosa,
representante da Associação Brasileira de Alumínio — ABAL.
O SR. JOSÉ ROBERTO GIOSA – Em primeiro lugar, gostaria de me
apresentar. Meu nome é José Roberto Giosa, sou Coordenador da Comissão de
Reciclagem da Associação Brasileira de Alumínio e também Diretor de uma empresa
de reciclagem.
O mais importante desta nossa reunião hoje, uma seqüência de várias outras,
é que, pela primeira vez, estamos discutindo de forma consistente neste País uma
política nacional. Assisti ao nascimento, ao féretro e velei o cadáver de três
programas brasileiros de reciclagem que o Governo Federal tentou lançar nos
últimos quatro anos. Nenhuma dessas iniciativas deram resultado porque
começaram de uma maneira extremamente burocrática e distante da realidade,
além, evidentemente, da falta de vontade política de levá-las adiante.
Esse assunto é por demais importante para ficar relegado a uma série solta
de projetos de lei muitíssimos bem-intencionados. Temos 10 anos de experiência em
programa de reciclagem. Acredito que esse é o único programa de reciclagem de
embalagem permanente neste País. Temos uma experiência muito rica que
certamente poderá ser aproveitada, envolvendo propostas que estão no relatório
preliminar do Sr. Relator, como a de remunerar na cadeia o esforço do consumidor e
a de educação. Damos uma média de 200 palestras em escolas de 1º, 2º e 3º
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Graus, além de fornecer material para tanto. Temos um telefone à disposição do
público que, em 1981, quando foi inaugurado, recebia duas ligações por dia. Hoje,
são 250 ligações gratuitas por dia. A esmagadora maioria não trata de reciclagem de
alumínio, mas, sim, de outros tipos de embalagem, de lixo urbano, até de
reclamações sobre o uso ou a expansão dos lixões, algo que hoje incomoda
terrivelmente a sociedade. Então, a oportunidade vem até um pouco atrasada, mas
antes tarde do que nunca.
(Apresentação de transparências.)
Darei um panorama da indústria, o que fazemos, tecerei alguns comentários
e, para não ficar só na crítica, no final, há sugestões da indústria para resolver o
problema.
O alumínio está presente na vida de todos nós, das mais diversas maneiras
possíveis, da lata até o caixilho de janela. A lata teve o grande mérito principalmente
de democratizar o mercado de sucata, porque acabou o controle de matéria-prima.
Um resumo da indústria: só em empregos diretos, gera 48 mil empregos, fatura 6,7
bilhões e tem participação no PIB nacional de 1%. É extremamente positiva na sua
relação comercial. O Brasil produz aproximadamente 1 milhão e 400 mil toneladas
de alumínio primário e exporta cerca de 800 mil toneladas por ano. Então, a previsão
este ano entre importações e exportações é fechar com 1 bilhão e meio de dólares a
balança comercial deste ano contra 1 bilhão e 200 milhões ano passado. Somos
3,6% da pauta de exportações do País. Onde está esse alumínio? Reparem ali que
os 29% do que é produzido vão para embalagens. A grande participação em
embalagens são das latas de alumínio muito usadas em cerveja, refrigerantes,
sucos. Eletricidade, 10%. A maioria dos cabos de transmissão de energia elétrica é
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confeccionada com alumínio. A indústria de transportes, 20%. Por exemplo, toda
arquitetura do metrô é feita de alumínio, caminhões, ônibus, elevadores, construção
civil, que é um grande usuário, os caixeiros de alumínio, forrações, portas, janelas,
etc.
Quantos somos? Somos a única entidade de classe no Brasil que tem uma
Comissão de Reciclagem montada há dez anos para tirar uma radiografia do setor.
O número é bastante expressivo porque começamos com duas indústrias, em 1991,
e hoje temos 32, das quais 27 estão operando em padrões ambientais acima das
exigências básicas. Por exemplo, em Pindamonhangaba, São Paulo, temos três
grandes indústrias que operam acima dos padrões de exigência da CETESP?
São 2 mil empresas de pequeno, médio e grande porte e cooperativas
envolvidas na cadeia de reciclagem de alumínio. Não estou falando só de lata. Um
bloco de motor, por exemplo, é feito de alumínio. A Fiat usa em seus motores 23%
de alumínio. Por isso, quando você liga um carro da Fiat, sente aquele cheiro de
cerveja, pois 23% provêm de latas de alumínio. (Risos.)
Em relação às pessoas envolvidas na cadeia de reciclagem, o Sr. André
Vilhena lembrou que há uma “chutometria” feroz, uma briga de dados com a
realidade. De onde tiramos os 150 mil? Há seis anos fazemos um mapeamento de
onde estão os catadores, quem são, qual o perfil socioeconômico deles.
Trabalhamos também em cooperação com algumas prefeituras. Com a COMLURB,
por exemplo, em 1996 e 1997, montamos as quatro primeiras cooperativas da
cidade. Hoje há cerca de 150 mil pessoas espalhadas no País que recebem entre
dois e quatro salários mínimos mensais apenas na atividade de coleta. Temos hoje
inscritos no nosso programa de reciclagem 16 mil instituições — escolas públicas,
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igrejas, Exército, Marinha, Aeronáutica, os Dragões da Independência, que, aqui em
Brasília, são grandes recicladores, para quem não sabe.
Trocamos as embalagens de alumínio e uma das nossas indústrias
associadas, desde março, além do alumínio, coleta também a embalagem PET, com
números muito interessantes. Já trocamos, por exemplo, 64 mil equipamentos, que
vão de uma bola de futebol até uma máquina copiadora de mesa. Só de
microcomputadores foram 14 mil, o dobro do que o Estado e o Município no Rio de
Janeiro já fizeram até hoje pelas escolas, notadamente as públicas. Somos hoje o
segundo maior comprador de ventilador de teto do Brasil. Perdemos para a Casa e
Vídeo, mas acho que neste verão vamos superá-la, trocando ventilador por
embalagem.
Em 1991, o Brasil coletou 4 mil toneladas de latinhas de alumínio e, no ano
passado, 104 mil toneladas. O faturamento desta indústria é hoje de 300 milhões de
dólares por ano.
Como estamos em relação aos outros países, considerando sucata, de modo
geral, descaracterizando apenas a lata? A média mundial é de 34%. O Brasil
registrou, no ano passado, quase a meta mundial. Reparem que estamos acima de
países como o Canadá, que tem um índice tão baixo porque é a energia elétrica
mais barata do mundo e como o alumínio é eletrointensivo a energia elétrica é um
grande fio condutor desta capacidade de reciclagem. Reparem também que, nos
Estados Unidos, pioneiros na produção de alumínio em larga escala, a taxa de
reciclagem de sucata é bastante alta. São cerca de 8 mil empresas nos Estados
Unidos dedicando-se à reciclagem.
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Aí está um comparativo entre Brasil, Estados Unidos e Japão, desde 1991.
No ano passado, por exemplo, chegamos a 78%, que é o índice oficial. O índice não
oficial é de 87%. O que chamamos de não oficial? Aquelas fundações de fundo de
quintal que coletam latas de alumínio para fazer, por exemplo, utensílios domésticos
como garfos, conchas, alguns tipos de pratos e aquela lança para fazer portão
fazem parte do chamado consumo informal da economia subterrânea na aquisição.
Os Estados Unidos, pioneiros mundiais em reciclagens de latas de alumínio
— foram eles que inventaram a lata, em 1963, e que começaram a reciclagem, em
1968 — têm 62%. O Japão, que hoje tem a liderança entre os países que não
possuem leis específicas obrigatórias para reciclagem, tem 81%.
Quanto ao consumo de energia, no ano passado, em 2000, para produzir 229
mil toneladas de alumínio secundário, também chamado de reciclado, houve
economia de 3.962 gigawatts de energia elétrica. O que significa isso, traduzindo em
números? Essa economia proporcionada pela reciclagem é suficiente para manter
uma cidade de 1,5 milhão de habitantes, como Campinas, por exemplo, durante um
ano, considerando o consumo de uma residência média com 4 pessoas.
O alumínio primário consome 14,7 megawatts ou 14 mil e 700 quilowatts de
energia para se fazer uma tonelada de alumínio primário. O que é isso? O minério
chamado bauxita, de onde se extrai a alumina, vira alumínio, que é transformado em
produto final. A reciclagem desta mesma tonelada de um produto final de alumínio
gasta de 500 a 700 quilowatts de energia, o que significa uma economia direta de
95%, fato reconhecido.
Quando teve início o racionamento de energia, por exemplo, o Governo
Federal, por meio do Comitê de Gestão, em dez dias liberou a indústria recicladora
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de alumínio das cotas de um racionamento, porque é um absoluto contra-senso
punir a indústria primária, por exemplo, que é eletrointensiva e, juntamente, punir a
indústria secundária, que economiza muita energia elétrica. Então, em duas
semanas, o Governo concedeu isenção do racionamento a doze grandes indústrias
que tinham medidas confiáveis de consumo de energia. Com isso, a produção neste
período aumentou 10%.
Em termos de participação no consumo, na geração de energia no Brasil, o
alumínio primário consome 4,5% de toda energia gerada no País, e o alumínio
secundário menos de 0,5%.
Falando do principal usuário de alumínio no País, que é a indústria de latas,
ela tem hoje quatro grandes indústrias instaladas no Brasil. Com sete fábricas, tem
uma capacidade instalada de 11,9 bilhões de latas por ano. No ano passado, a
produção foi de 9 bilhões de latas. O consumo per capita no Brasil é de 54 latas por
habitante, com um detalhe: o Brasil é o terceiro mercado mundial de refrigerantes,
atrás dos Estados Unidos e do México, e é o quarto mercado mundial de cervejas.
Temos 2 mil empregos diretos nessas indústrias. Elas faturam acima de 800 milhões
de dólares por ano. Os investimentos, em onze anos que a lata existe no Brasil,
chegam a quase 1 bilhão de dólares.
Para onde vai esse alumínio? No mercado de bebidas, por exemplo, a cerveja
é o grande mercado da lata e deve fechar este ano com 28% do total. O vidro
retornável representa 67,5%, saindo de uma participação, em 1995, de 88%; em
1999, de 72%. A participação tem sido decrescente. O vidro one way tem-se
mantido praticamente estável.
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Este é o retrato da utilização final. Reparem, lá em cima, em milhões de litros
por ano. O brasileiro bebe 9 bilhões de litros de cerveja por ano. O número citado
pelo André, 150 toneladas, referia-se ao carnaval de 11 dias, em Salvador, e não de
4 dias.
A Festa do Peão de Boiadeiro de Barretos, por exemplo, é a segunda maior
do mundo, perdendo apenas para a de Las Vegas. Lá, bebe-se 1 milhão e 800 mil
latas durante uma semana de festa. Quando a Prefeitura nos chamou para montar
uma coleta especial para aquele evento, numa área de 54 alqueires, instalamos
quatro touros mecânicos. Quem quisesse montar no touro deveria contribuir com 5
latinhas. Como metade dos participantes da festa está bêbada e a outra metade a
caminho de ficar bêbada, ejeta-se um infeliz no touro mecânico a cada dois
segundos e ele sai para coletar mais cinco latas. (Risos.) Todas as latas foram
trocadas em Barretos por 22 cadeiras de rodas, que, ao final do evento, foram
doadas pelo clube organizador para o asilo da cidade e para o Educandário São
Benedito.
O Brasil consome, por ano, 12 bilhões e 300 milhões de litros de refrigerante.
O grande mercado de embalagens é de PET, que tem 75%. Reparem que esse
percentual tem-se mantido quase estável de 1999 para cá, mas em 1994 o PET
tinha 4% do mercado de refrigerante e ganhou a preferência do consumidor.
Nós costumamos dizer que o PET não é uma embalagem perfeita.
Dependendo de quem olhar e do prisma por que analisar a embalagem, será
considerada melhor ou pior.
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As latas representam 11% do mercado, porcentagem praticamente estável; o
vidro retornável, 10%; e outros tipos de embalagens de bebida, entre as quais se
inclui, por exemplo, a Tetra Pak, 3,7%.
Especificamente sobre a Política Nacional de Resíduos, devo dizer algo
importante: a indústria pratica a política dos três erres — redução, reaproveitamento
e reciclagem — há muito tempo, por uma questão de economia.
Em 1976, por exemplo, com um quilo de alumínio faziam-se 45 latinhas; em
2000, com a mesma quantidade de alumínio faziam-se 76 latinhas. Houve um ganho
de produtividade de 69%. Por quê? Porque a indústria tem que ser competitiva. Há
uma absoluta necessidade da competição pela preferência do consumidor, e a
indústria tem que se tornar cada vez mais competitiva, e o mais importante, ao final
do seu ciclo de vida, tem que ter, na relação custo/benefício, um real benefício para
a sociedade, e não para as empresas que produzem a lata, o alumínio ou o perfil de
alumínio.
Qual é a nossa posição? É de absoluto apoio à implementação de uma
política efetivamente nacional que respeite, como disseram os Srs. Sérgio e André,
as peculiaridades do País.
Nós, por exemplo, coletamos latas no interior do Piauí. A Prefeitura leva
essas latas até Teresina; uma transportadora as leva, de graça, até Recife, e outra
transportadora as leva até São Paulo, onde está a fundição. Em locais onde há uma
rede de coleta organizada, por menor que seja, nós incentivamos a coleta. Onde há
uma cooperativa, como no Rio de Janeiro e em Belo Horizonte, nós até passamos a
tecnologia, sem a obrigação de que aquela cooperativa venda o produto do seu
esforço para a empresa.
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Darei a V.Exas. um exemplo interessantíssimo: hoje o preço da sucata de
alumínio é absolutamente transparente. Há um preço de rua, de Norte a Sul do País,
e o fato de ele ser intensamente divulgado evita a exploração das cooperativas pelas
grandes sucateiras. A esmagadora maioria das grandes sucateiras é grande
sonegadora também. Então, a indústria não pode concorrer com quem sonega diária
e diretamente.
No mês passado, numa investigação rápida, nós descobrimos, por exemplo,
seis grandes quadrilhas atuando com notas frias. O dono de uma dessas empresas
disse com a maior tranqüilidade: “Tudo frio, não. A empresa é quente; o resto é frio.
A nota é fria, a guia do imposto é fria”.
Por que isso existe? Por causa da bitributação em toda a cadeia de sucata.
Não estou me referindo de novo só ao alumínio. A nossa contribuição, em dez anos,
trouxe alguns ensinamentos preciosos. Nessa área não faltam iniciativas, mas
“acabativas”, ações que tenham começo, meio e fim. Há dez anos nós fazemos
palestras em escolas, o que é fundamental.
O nosso primeiro objetivo deve ser convencer as pessoas de que elas devem
fazer aquilo. Eu ouvi de uma freira, no interior de São Paulo, quando nós fomos
entregar uns equipamentos, algo importante: “A palavra comove, mas o exemplo
arrasta”. Então, em vez de gastarmos tinta e papel fazendo seminários sobre os
benefícios e as vantagens da reciclagem, nós aprendemos fazendo. Erramos muito
nesses dez anos, mas a nossa experiência é extremamente valiosa.
A palavra reciclagem apareceu no dicionário pela primeira vez em 1979, no
Webster. No Brasil ela começou a ser utilizada a partir de 1993, logo depois da Eco
92. Quem se lembra da Eco 92? Poucas pessoas. Qual foi o resultado prático do
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compromisso assumido pelo Brasil naquela época? Nenhum. Qual foi o resultado
visível disso? É algo que se perdeu no tempo; ficou na memória de alguém.
A implantação de uma política de resíduos não é obrigação apenas da
indústria, do Poder Público ou da população. É uma obrigação conjunta de todos os
envolvidos na cadeia. Nós, o Sr. André e o Sr. Sérgio estamos em perfeita sintonia
com relação a isso.
Segundo aspecto: esta política deve respeitar a liberdade de escolha do
general mercado. Quem escolhe o que é melhor para si é o consumidor; não é uma
ordem de cima ou um conchavo de escritórios ou de laboratórios que traz a definição
do que o consumidor prefere. Ele tem que ser soberano para escolher o que achar
melhor, e a indústria tem que estar capacitada para encantar o consumidor e atender
às suas necessidades.
Os resíduos derivados de embalagens estão classificados no relatório
preliminar como resíduos especiais. Na verdade, nós entendemos que eles deveriam
ser considerados resíduos urbanos. Afinal de contas, as embalagens representam
menos de 1% de todo o lixo doméstico recolhido no País. Se for criada uma
categoria especial, alguém vai pagar a conta. Quem? Todos nós nesta sala e o
restante da população brasileira.
Os resíduos sólidos urbanos coletados e passíveis de reciclagem devem ser
tratados da forma adequada, não é transformar a miséria em sucata suja prensada.
Isso deve ser tratado adequadamente. A esse respeito, há um dado importante: se o
percentual de coleta de qualquer sucata de alumínio fosse de 100%, a indústria teria
condições de absorver todos os 100%. Existe capacidade instalada para isso.
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Darei um exemplo interessante para os senhores: até 1996 havia, no Brasil,
cinco prensas específicas para a reciclagem de latas, todas importadas. Hoje
existem 220, aproximadamente. Três indústrias da região de Ribeirão Preto, em São
Paulo, uma delas em concordata, que produzia grade para arado de trator, mudou o
seu perfil, aproveitando que tinha uma ferramentaria, uma dobradora de chapas. Ela
mudou a sua composição e hoje produz prensas hidráulicas com um comando
numérico melhor do que a importada, por um terço do valor.
Até hoje nós entregamos amassadores de latas para as escolas. Elas se
inscrevem pelo telefone e recebem, em troca de uma fita virgem, uma fita de vídeo e
um amassador de latas. Quando o amassador quebra, a escola é obrigada a
devolver o quebrado para ganhar um novo. O saco onde a lata volta também é
reciclado. Até o material usado no transporte vira lenha e é utilizado para gerar
energia na olaria e na indústria de ferro gusa. Portanto, o exemplo é fundamental.
Mas por que esse programa deu certo? Porque ele é permanente. Por que as
campanhas de trânsito não dão certo no Brasil? Porque não adianta mostrar um
sujeito saindo da geladeira durante quinze dias. Isso agride as pessoas e chama a
atenção da população naquele momento. E depois? E o day after?
Quem sabe qual é a real importância de se contaminar o lençol freático? Nós
só aprendemos, no Brasil, da pior forma possível. Estamos vendo o exemplo
daquela multinacional de derivados de petróleo na região de Paulínea, Campinas.
Aquilo é um absurdo gigantesco. Qualquer pessoa ligada a essa questão sabia que
aquilo existia.
Qual é o cuidado que se tem com as embalagens de herbicida? Nenhum.
Está nos jornais de hoje que a Secretaria de Agricultura de São Paulo interditou 40
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fazendas no Vale do Paraíba porque as vacas estão com varíola, que é uma
zoonose transmitida para a mão de quem faz a ordenha. Há 600 pessoas com
varíola numa das áreas mais desenvolvidas do maior Estado da Federação.
Portanto, informação nunca é demais. O exemplo da informação permanece
se for sustentado por uma educação continuada. Não existem fórmulas mágicas
para tratar desse assunto. Existe um trabalho de base contínuo, permanente e
retificador.
Nós, por exemplo, cometemos, no início, o erro de chamar o lixo de sucata. É
material reciclável. Ele era acondicionado em sacos pretos utilizados para o lixo
doméstico urbano.
O PET recebe muitas críticas. Nós iniciamos, há cinco meses, a coleta nos
supermercados do Rio de Janeiro, num projeto-piloto, quase sem publicidade. Um
dos postos está instalado num supermercado na Tijuca. Quando nós abrimos o
posto, recebíamos mil latinhas de alumínio e 400 garrafas PET por dia. Dois meses
depois passamos a receber, por dia, 11 mil garrafas PET. Isso derruba outro mito: o
de que o brasileiro não liga para essas coisas. Liga, sim. Dê a ele um canal confiável
de participação, com credibilidade, que ele adere. O brasileiro morre de medo de ser
enganado, embora perca dinheiro num show não realizado ou com um carro de
segunda mão sem garantia. Dizemos a ele que algo funciona e continuará
funcionando e, se tiver dúvida, poderá ligar para o telefone tal. O mais importante é
que até agora isso foi feito sem um centavo de incentivo fiscal e de subsídio de
qualquer espécie.
A gestão compartilhada e integrada dos resíduos sólidos deve ser local. A
realidade da Prefeitura de Tambaú, no Nordeste, é muito diferente da de Frederico
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Westphalen, no interior do Rio Grande do Sul. Este País é continental. Existem
vários brasis num só.
Quais são as nossas recomendações finais? O Poder Público e a iniciativa
privada devem estimular a reciclagem através de educação ambiental para todos,
não só para criança. A educação ambiental tem que ser dada nas universidades. Se
você pedir uma definição de meio ambiente aos estudantes universitários, poucos
saberão fazê-lo de forma adequada.
As Prefeituras têm pouquíssima ou nenhuma informação sobre isso. Esta é a
grande verdade. Não existe vontade política de investir recursos na esmagadora
maioria das Prefeituras. Ando mais do que notícia ruim, visito muitas Prefeituras,
isso demora, como todo processo de mudança de hábito. Além disso, essa política
tem que ser continuada. Não adianta fazer uma coisa mágica, aprovar na Câmara
dos Vereadores um projeto instituindo a coleta seletiva. Cadê o mercado para essa
coleta seletiva na seqüência? Se não houver condições de se sustentar sozinho, não
adianta, vira paternalismo puro e simples. Tem que haver uma economia na cadeia
que permita a sustentação do projeto.
Incentivos fiscais e isenção tributária. Se a lata de alumínio é vendida como
um produto e já paga IPI, por que a sucata tem que pagar ICMS e IPI de novo? Não
só latas, outras embalagens também. Hoje, a tendência é reduzir o peso das
embalagens, trabalhando-se com monomaterial. Algum incentivo deveria ser dado
não só para a indústria, mas também para as cooperativas e para as indústrias de
reciclados. Não estou falando só das produtoras de embalagens. Existe uma forte
capacidade empreendedora neste País. Somos empreendedores por natureza.
Existe informação técnica adequada para isso. Existem fontes de informações
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confiáveis e acessíveis, o que falta é o estímulo. Se parte do dinheiro jogado fora
com o desperdício fosse canalizado para tornar mais eficiente a atividade
econômica, geraríamos mais empregos.
Critica-se que há mais de 150 mil pessoas que vivem de catar lata. Graças a
Deus, existe uma fonte de geração de renda. Na maioria das vezes não é emprego
formal, mas geração de renda. Essa indústria que começa gerando renda em baixo
traz emprego direto em cima. Como disse, são 104 mil toneladas de latas, cerca de
220 mil toneladas de alumínio recicladas por ano. A escala é o primeiro fator que
garante a sustentabilidade, quando existem cinco toneladas não adianta.
Há um outro exemplo claro de escala. Quando começamos a utilizar o
amassador de latas, importávamos de Taiwan por 14 dólares cada um. Hoje é feito
em Catanduva, no interior de São Paulo, com plástico reciclado e custa 4 reais. A
indústria contratou 30 empregados novos apenas para fazer a produção desse
material.
O desenvolvimento de novas tecnologia. O IPT, em São Paulo, junto com a
Politécnica está desenvolvendo um trabalho de reciclagem de alumínio com uso de
plasma muito interessante, tecnologia totalmente nova. Sabe qual é o financiamento
que eles recebem? Trinta e cinco mil reais por ano. Estou falando da Politécnica. Se
falarmos da Universidade Estadual do Ceará ou do Rio Grande do Norte,
sentaríamos e choraríamos.
Esses números foram recebidos por nós na sexta-feira. A sexta edição do
Seminário Internacional de Reciclagem registrou números muito interessantes. Por
exemplo, a diretiva européia para embalagens e resíduos possui metas em peso: o
reaproveitamento tem que ser maior do que 50% e menor do que 65%, em três
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anos. Reciclagem de materiais de modo geral: maior do que 25% e menor do que
45%; reciclagem por material; do plástico, 15%. Quanto a papel, metais e vidro,
vamos ver como se comportaram na prática, em 1998, quando houve a última
medição.
Reparem as metas da Europa: eram 15% para alumínio e aço; a Bélgica
reciclou 66%, a Alemanha, 83%; a Itália, 7%; a Holanda, 79%; e o Reino Unido,
23%. Vidro: 15% de meta, todos superaram. Existe um mercado estabelecido para
esses materiais há mais de 10 anos. Além do que é uma mistura de lei obrigando as
indústrias a fazerem alguma coisa e consciência. Na Europa, por não haver uma
forma clara do melhor reaproveitamento do plástico, grande parte ainda é exportado
ou queimado. A Alemanha é um exemplo, pela legislação; a Bélgica está dentro
também; os outros estão bastante abaixo. Transportar essa tecnologia para cá,
esquece. Temos de pegar lá o que pode ser adaptado aqui.
Dou um exemplo interessante: implantamos o Programa de Reciclagem no
Brasil, na Argentina e no Chile em 1996. Tivemos de fazer uma total readaptação,
em Santiago do Chile. Os alcaides são uma espécie de entendentes municipais que
concentram um grande poder de arregimentação, em que se misturam delegacia de
polícia, Igreja, juizado de menores e ouvidoria. Em vez de trabalhar com as escolas,
trabalhamos com os alcaides. O resultado foi muito bom.
Na Argentina, ao contrário, para trabalhar com as escolas passava-se por
uma burocracia típica peronista, justicialista, como eles dizem lá. Algo inacreditável.
É uma desfaçatez total. Para fazer alguma coisa com a escola teria que se pagar
quatro pedágios. Conclusão: tangenciamos o problema e fizemos com a Cáritas. A
Igreja Católica, na Argentina, é um poder muito forte, muito mobilizado, tem uma
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rede beneficente espalhada em todo o país, e o que é mais importante, tem a
credibilidade da população. A Cáritas é quem encaminha as pessoas que têm
problemas legais, atende ao pobre e ao miserável. Lá, trocamos lata por fralda, leite
em pó, comida de bebê. Por que não?
Na verdade, o que fazemos é bancar o banco central da lata e agora do PET.
Damos conversibilidade para esses materiais. Estranhamos quando chegam pedidos
de cadeiras de rodas. Por que as escolas querem cadeiras de rodas? Percebemos
que o perfil havia mudado. Havia muito mais entidades beneficentes envolvidas
nisso. Ficamos com receio, sem divulgar, começamos a trocar. No primeiro mês
foram mais de 200 cadeiras de rodas. Conclusão: o fabricante também vende. É
aquela história, a palavra e o exemplo. Hoje eles nos dão desconto de 45%. Não dá
esse desconto, por exemplo, quando um órgão do Governo compra essa cadeira de
rodas. Ele dá o desconto e ainda faz cadeiras especiais, quando é o caso, com a
roda maior, com assento menor, etc.
Conseguimos envolver outras indústrias nesse projeto não só porque é uma
maneira de escoar o produto mas também porque a causa é nobre. Se posso trocar
o que se chama de lixo por alguma coisa de utilidade muito grande, por que não
fazê-lo? Muitas vezes há uma visão caolha de que o Estado deveria prover isso.
Concordo plenamente. Haja vista que o Estado não provê por n razões. Então, por
que não transformar o lixo em algo muito mais útil?
As nossas propostas para incrementar: aplicação da taxa de reciclagem do
produto como fator progressivo de redução de impostos. Seria nomeada uma
entidade independente para avaliar, por exemplo, qual a quantidade de matéria
plástica reciclável na garrafa de refrigerante de plástico. O imposto seria
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decrescente, quanto maior for o uso do material reciclado, sem coibir o caráter
voluntário da coleta e reciclagem.
No posto de troca de lata e PET da Barra da Tijuca, 60% dos vales são
doados. É a maior incidência de pessoas com o menor número de embalagens.
Cada pessoa leva em média, a cada vez que vai lá, cinco embalagens, lata ou
garrafa PET, que é o consumo doméstico. A pessoa vai porque está consciente de
que aquilo é importante. Num bairro de classe média alta, a pessoa não pega o vale
de 5 ou 10 centavos, coloca-o numa urna e, no final do mês, é doado para uma
instituição de caridade da região, para se beneficiar duplamente. E prestam-se
contas.
Outra coisa que esse negócio nos ensinou: a maior malandragem do Brasil é
ser honesto, porque não tem concorrência. É triste mas isso é verdadeiro. A primeira
coisa que aprendemos no depósito é ter uma balança honesta. Para quê vamos
roubar um miserável? Se nosso negócio só é bom se roubarmos o miserável, então,
o negócio não presta. Pronto, acabou. A credibilidade é como cristal: trincou, joga
fora. E hoje o País precisa acreditar nas coisas.
Segundo ponto: isenção de ICMS para sucata em âmbito nacional acaba com
toda essa ciranda de sonegação de impostos. Todos perdem com a sonegação de
impostos. A Secretaria da Fazenda do Estado e o Estado perdem arrecadação, e a
sociedade também.
Criação de linha de financiamento específica para as empresas de reciclagem
através do BNDES. Esse assunto é tratado há seis anos com o BNDES e até hoje
nem resposta tivemos. O assunto é sempre considerado muito importante, mas
resultado prático não há nenhum. Falo um pouco em tom de desabafo porque estou
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nisso há dez anos e meio. Já vi cobra bater palma, elefante voar, mas não vi
acontecerem as coisas mais elementares. Existem ótimas idéias espalhadas no País
sobre tratamento, coleta e disposição de resíduos urbanos, assim como existem
muitas experiências adaptadas para a realidade de cada lugar que são um grande
sucesso. Em vez de ser coibido, isso deveria ser estimulado. Quanto não se
economiza, por exemplo, com uma experiência bem sucedida de coleta seletiva ou
com tratamento adequado de aterros sanitários?
Muito obrigado pela atenção. Desculpem-me o tom de desabafo, mas a
platéia me impeliu a isso. A primeira vez que fui chamado para falar sobre
reciclagem no Rio de Janeiro, numa conhecida universidade, em abril de 1991, havia
apenas uma pessoa na platéia. Como o cachê era alto, fiz a palestra, fui aplaudido
de pé e, na hora de sair, o sujeito disse: “O senhor não pode ir embora agora porque
sou o próximo palestrante”. (Risos.) Hoje temos aqui um público seleto, o que me
deixa muito mais gratificado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado José Índio) – Agradeço ao Dr. José Roberto
Giosa a participação.
Concedo a palavra ao jornalista Washington Novaes, a quem esta Comissão
agradece a presença.
O SR. WASHINGTON NOVAES – Boa tarde a todos. Agradeço ao Presidente
da Comissão, Deputado José Índio, ao Deputado Emerson Kapaz, Relator deste
projeto, e à Comissão de Política Nacional de Resíduos Sólidos o convite.
Suponho que esse convite deva-se ao fato de, na qualidade de jornalista,
estar há muitos anos trabalhando nessa questão e também pelo fato de haver
tratado mais diretamente da questão de resíduos como Secretário de Meio Ambiente
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do Distrito Federal, em 1991 e 1992, e por haver dirigido um instituto em Goiânia,
que criou um projeto de desenvolvimento comunitário que inclui coleta seletiva,
implantação de uma usina de reciclagem e transformação de materiais, dirigido por
uma cooperativa de moradores.
Inicialmente, creio que é preciso afirmar bastante categoricamente que o
projeto que está em discussão tem muitos méritos porque cria uma base de
discussão para esse grave problema que o Brasil enfrenta na questão de resíduos
sólidos. É evidente que se pode avançar ainda mais nesse projeto, dependendo das
discussões que a sociedade levar adiante e dos pactos que for capaz de fechar.
Peço-lhes desculpas por não ter trazido um material mais preparado, mas fui
avisado com muito pouco tempo de antecedência e os compromissos não
permitiram isso. Quero iniciar lembrando que a situação brasileira em matéria de
resíduos sólidos é muito grave. Como já foi dito, as estatísticas brasileiras, embora
precárias, nos falam em 130 mil toneladas de resíduos por dia, considerando apenas
os chamados resíduos domiciliares. Há algumas estimativas que indicam que pelo
menos 20% dos resíduos brasileiros sequer são coletados. Eles vão degradar as
periferias das grandes cidades, comprometer as áreas de proteção permanente e
degradar a bacia hidrográfica.
A situação brasileira só não é muito mais grave porque temos essas centenas
de milhares de catadores, carrilheiros, qualquer que seja a dominação que se dê,
que exercem um papel altamente meritório e importante para a sociedade, embora
seja uma categoria que não tem proteção legal alguma, não tem registro, plano de
saúde, nada. É absolutamente desprotegida e vive de sua própria vontade. Mesmo
nas cidades brasileiras que mais avançaram em matéria de coleta seletiva, os
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catadores têm uma função importantíssima. Quero lembrar, por exemplo, que em
Curitiba, apresentada como a Capital brasileira da reciclagem, a Prefeitura coleta
apenas 20% dos materiais coletados na coleta seletiva, os 80% restantes são
coletados por catadores e não pelo sistema público.
O projeto em discussão nesta Comissão, como disse, tem muitos méritos, a
começar pelo de obrigar os Municípios brasileiros a terem planos de gerenciamento
de resíduos urbanos e resíduos especiais. Na verdade, são raríssimos os Municípios
brasileiros que hoje têm alguma coisa nessa direção, a tal ponto que para aterros
realmente adequados, segundo estatísticas do Ministério do Meio Ambiente, apenas
11% do total dos resíduos domiciliares são encaminhados.
Um segundo ponto fundamental do projeto parece ser a obrigatoriedade do
retorno de certos tipos de embalagens e produtos, como bebidas, pneus,
agrotóxicos, produtos tecnológicos e resíduos perigosos. Também importante é o
aspecto de consagrar o princípio do poluidor pagador, embora o faça em parte ou
com algumas restrições, assim como a possibilidade de cobrar taxas pela coleta e
gerenciamento de resíduos, embora isso implique a resolução de um conflito com o
Judiciário. O Judiciário brasileiro, até hoje, só tem permitido a cobrança de taxa ou
de tarifa por serviço medido, ou seja, caso se meça a quantidade de lixo produzida
pelo cidadão, pela indústria, pelo escritório ou por quem quer que seja.
O sistema público brasileiro não tem sido capaz de medir a quantidade de lixo
produzida em cada origem. Mais grave ainda, com a generalização da tendência de
privatização dos serviços de coleta e disposição do lixo, independentemente de ser
a favor ou contra a privatização, os sistemas de informações sobre a coleta e a
geração de lixo estão gradativamente fugindo ao serviço público. O serviço público
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não tem mais informações. Essas informações estão nas mãos das empresas que
gerenciam e executam a coleta e a disposição do lixo. Essas empresas, na verdade,
não têm interesse no que deveria ser o primeiro objetivo de uma política de resíduos
sólidos: a redução da quantidade dos resíduos produzidos, a redução do lixo. E não
têm interesse porque todas ganham por tonelada recolhida, então não há interesse
em que haja redução do lixo.
Outro ponto importante do projeto parece ser o que cria fundos municipais
com recursos orçamentários, taxas ou tarifas, empréstimos e também cria um fundo
federal, ao qual destina 5% das verbas do setor de saneamento. Talvez seja
discutível a origem desse recurso, na medida em que o setor de saneamento tem
carências tão ou mais graves que o setor de resíduos no Brasil. Neste momento está
em discussão no Congresso um projeto nacional de saneamento. As estatísticas
nessa área são terríveis, basta lembrar que 50% da população brasileira não são
servidos por rede de esgoto, e dos esgotos coletados no Brasil, no máximo 10%
recebem alguma forma de tratamento. Portanto, dos 50% que são coletados só 5%
desses esgotos do Brasil recebem alguma forma de tratamento. A situação é
dramática, com reflexos gravíssimos em várias áreas, principalmente na área de
saúde.
Creio que se pode fazer também algumas observações sobre o projeto, com a
intenção de colaborar no avanço dessas discussões e na incorporação de outros
pontos. Creio que falta ênfase no que deva ser o primeiro ponto de uma política
nacional de resíduos sólidos, que é a redução dos resíduos. Não podemos deixar de
pensar que é necessário reduzir os resíduos e que há caminhos para isso. Aliás,
vamos falar sobre esses caminhos mais adiante.
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Segundo: parece-me que o projeto não generaliza a questão do poluidor-
pagador. Há setores que ficam fora dessa obrigação de ser responsabilizado pela
destinação dos resíduos que produz.
A questão das taxas ou tarifas já mencionei. É preciso resolver o conflito com
o Judiciário ou então equipar os sistemas públicos para que eles sejam capazes de
trabalhar pelo sistema de volume medido de resíduos. Caso contrário, o Judiciário
vai derrubar essa taxa, como tem feito sistematicamente ao longo dos últimos anos,
exatamente porque não se tem a avaliação do volume por gerador de resíduos.
Creio que também se deveria pensar muito na questão da incineração que é
contemplada em alguns lugares do projeto. A incineração tem uma primeira
contradição, que é exatamente a sua contradição com o objetivo de reduzir o lixo e
evitar o desperdício. Se vai incinerar, vão ser desperdiçados materiais. Em segundo
lugar, o sistema de incineração, pode gerar contradições sérias, como gera na
Alemanha, por exemplo. A Alemanha instalou um grande sistema de incineração de
lixo, e hoje não tem lixo suficiente para movimentar todo o sistema. Então, há um
estímulo indireto à criação de mais resíduos para que eles possam movimentar as
usinas de incineração.
Creio que também seria preciso definir com mais clareza no projeto a
obrigatoriedade de responsabilizar o gerador de resíduos hospitalares e
semelhantes pela sua destinação, assim como os resíduos da construção civil, os
resíduos do comércio e os resíduos da indústria, como se faz em quase todo o
mundo.
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Também se poderia perguntar por que é que os fundos mencionados no
projeto só devam ter recursos públicos, e não deveria ser. Deveria ser aberto a
outras fontes de financiamento também.
Creio que é preciso maior rigor com os resíduos de origem rural,
principalmente da pecuária em geral, da suinocultura e da avicultura. Eles são um
grave problema no mundo todo. O mundo todo está adotando políticas
extremamente sérias. O Brasil já enfrenta alguns problemas muitos graves nessa
área, principalmente nos Estados do Sul, em especial em Santa Catarina. É
exatamente por causa da legislação menos severa que estão se transferindo para o
Brasil grandes empreendimentos nesta área e que significam uma possibilidade
muito forte de degradação do solo e de recursos hídricos.
Gostaria de lembrar aqui algumas observações que têm sido feitas por um
dos grandes especialistas nesta área, que é o Dr. Cícero Leite, que trabalha muito
com essa questão. Um porco em idade adulta gera quatro vezes mais fezes do que
um ser humano e com uma demanda bioquímica de oxigênio 25 vezes mais alta,
porque uma grande parte desses resíduos saem praticamente intactos, porque ele é
alimentado durante muito tempo.
Então, projetos como esses, que estão sendo instalados no Brasil, de 500 mil,
700 mil porcos por ano, gera resíduos equivalentes ao de uma cidade de 3 milhões
de habitantes. Se não houver pré-tratamento disso, haverá graves conseqüências
para o solo e para as bacias hidrográficas.
Em relação à legislação sobre matéria de resíduos, o Brasil está muito atrás
da maioria dos países europeus e da América do Norte. Uma das razões pelas quais
fui chamado aqui, suponho que seja o fato de haver feito recentemente para a TV
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Cultura de São Paulo cinco documentários, de uma hora cada, sobre a questão dos
resíduos em sete países europeus, Estados Unidos, Canadá e em alguns Estados
brasileiros.
Vou mencionar algumas das coisas que estão sendo feitas em vários países,
sem significar exatamente que isso signifique afirmar que seja possível transplantar
simplesmente a experiência, mas ela precisa ser considerada.
A primeira delas é que o Brasil deveria olhar com atenção o que está
acontecendo no mundo, em função do esgotamento de aterro sanitários e da
dificuldade de encontrar outras áreas para implantar aterros.
Citarei um exemplo aqui e dois de fora. O Município de São Paulo, que está
produzindo 14 mil toneladas de lixo por dia, está ameaçado: dentro de dois a três
anos não terá mais onde depositar resíduos. Um dos aterros se esgota este ano e o
outro tem mais dois ou três anos de vida, porque vai ter que receber os resíduos que
vão para o primeiro também. Isso provavelmente significará um custo brutal, porque
teremos que encontrar uma outra área, certamente muito longe de São Paulo, o que
exigirá tempo de implantação. Implantar um aterro é tarefa muito difícil, importa
custos econômicos brutais.
Nos Estados Unidos, o grande aterro de Nova Iorque está sendo fechado este
ano. Ele recebe 12 mil toneladas por dia. O lixo, já no ano passado, quando
estivemos lá para documentar, começava a ser transportado para um local a 600
quilômetros de distância. O transporte era feito por caminhão, a um custo de 30
dólares por tonelada, mais 30 dólares por tonelada para a deposição; portanto, 60
dólares por tonelada. Se Nova Iorque tiver que transportar todo o seu lixo nessas
condições, haverá acréscimo de despesa perto de 300 milhões de dólares por ano.
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Toronto tem um aterro que recebe 2,8 milhões de toneladas por ano e que
está sendo fechado também. Toronto só encontrou solução levando o lixo para um
local a 800 quilômetros de distância, para depositar nos fundos de uma antiga mina
de ouro abandonada. Para isso, precisará criar um comboio ferroviário que viajará
800 quilômetros todos os dias para levar e para trazer. O custo também será brutal,
cerca de 100 milhões de dólares por ano.
Hoje se falou muito aqui em coleta seletiva. É possível ver o que e como está
sendo feito em vários lugares, porque os caminhos são bastante diferenciados. Nos
Estados Unidos, a cidade que mais recicla resíduos é São Francisco: 42,5% dos
resíduos domiciliares que produz. A separação dos resíduos nas residências e nos
escritórios é obrigatória. Segundo a Prefeitura de São Francisco, exatamente pelos
custos implicados, porque cada família paga cerca de 14 dólares por mês pela coleta
seletiva, há tendência para a economia, que tem significado para cada família uma
redução de cerca de 2 mil dólares por ano no seu gasto com embalagem.
Chicago recicla 35% e proibiu a incineração por causa dos problemas
ambientais, não consegue resolver os problemas. Para a incineração, a separação
total do lixo orgânico é obrigatória, pela dificuldade de manter a temperatura mínima
exigida, para que não se emitam dioxinas nem furanos, que são altamente tóxicos, e
a mistura com o lixo orgânico sempre impede que se atinja essa temperatura. As
tecnologias capazes de garantir essas temperaturas são bastante caras. Então,
Chicago proíbe a incineração e recicla 35% dos seus resíduos domiciliares.
Exemplo interessante pode ser o de uma cidade norte-americana que tem
cerca de 200 mil habitantes. Charlotesville implantou uma usina de compostagem
que produz um fertilizante para a agricultura, misturando lodo de estações de
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tratamento de esgoto com restos de poda. E é uma cidade que consegue grande
aceitação para esse composto, que é disputado pelos agricultores, porque há um
controle absoluto quanto à não-presença de mercúrio nos lodos das estações de
tratamento. E isso é feito porque a cidade só tem cinco indústrias que utilizam metais
pesados, e elas têm um controle rigoroso.
Nova Iorque tem um exemplo a que o Brasil deveria prestar atenção,
relativamente à questão de lixo hospitalar. Não temos ainda, praticamente no Brasil
inteiro, a coleta seletiva prévia nos estabelecimentos hospitalares e semelhantes.
Tudo é considerado lixo hospitalar, tudo é misturado e tudo é incinerado, quando a
ciência já diz, há muito tempo, que realmente perigoso no lixo hospitalar é o material
de quimioterapia e os materiais perfurocortantes, capazes de produzir uma via de
entrada na pele para patógenos que possam existir. O hospital Beth Israel, em Nova
Iorque, separa todo o lixo de cozinha e todo o lixo administrativo, reduzindo seu lixo
hospitalar propriamente dito a pouco mais de 10% do total. Também separa o lixo
hospitalar em 5 modalidades diferentes, dando a ele destinação diversa. Com isso, o
hospital conseguiu economizar, a partir da introdução desse sistema, 1 milhão de
dólares por ano na administração do seu lixo.
No Canadá, uma cidade chamada Guelph poderia ser um bom exemplo para
as cidades brasileiras. Tem 200 mil habitantes e coleta, de forma seletiva, todo o seu
lixo domiciliar e comercial. A usina para a qual vai o lixo depois de separado custou
36 milhões de dólares canadenses. Ela recicla 350 toneladas de lixo seco por dia e
mais 170 toneladas de lixo úmido, além de gerar energia a partir da queima dos
gases que vêm da parte aterrada.
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O Canadá tem uma política extremamente interessante de subsídio à
produção industrial do que eles chamam de composteira. São recipientes de plástico
nos quais é possível fazer a compostagem do lixo orgânico e do lixo de jardim das
residências. Em média, cada composteira recicla pelo menos 200 quilos de lixo por
ano. Por isso, essas composteiras recebem subsídio. O preço de mercado delas,
que seria de 100 dólares canadenses, cai até para 20 dólares e, em certos casos,
até para 12 dólares. A economia que elas produzem é enorme. Elas economizam
400 mil toneladas de lixo por ano, que deixam de ir para aterro ou para usinas de
compostagem.
A Europa toda tem várias legislações regendo a matéria de resíduos: a
legislação da Comunidade Européia, a legislação nacional de cada país, a legislação
provincial dentro de cada país e a legislação local. Isso gera situações diferentes em
cada país, mas todas elas, como alguns daqueles números mostraram aqui,
bastante à frente da nossa situação.
Vamos falar, por exemplo, de Berlim, um dos exemplos mais citados por
causa do dual system ou do ponto verde, como é chamado o sistema de
separação. O usuário doméstico paga pelo lixo indiferenciado, que é o lixo não-
separado, pelo lixo orgânico, pelo papel e pelo papelão que ele gera como resíduo.
Ele paga, em média, em Berlim, cerca de 100 marcos alemães por mês, ou seja,
cerca de 125 reais por mês para dar destinação a esse lixo. O restante é pago por
um sistema nacional das empresas produtoras de embalagem, que criaram uma
associação e um fundo nacional, ao qual estão vinculadas 18 mil empresas alemãs.
A informação que me foi dada — já foi mencionado aqui um número diferente
— é de que a arrecadação no ano passado foi de 4,1 bilhões de marcos. Desse
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total, 3,9 bilhões foram aplicados na coleta dos materiais pelos quais esse fundo é
responsável em toda a Alemanha e 200 milhões de marcos foram aplicados em
educação ambiental.
Cada empresa paga, de acordo com o número, o volume e o peso das suas
embalagens. Isso já as levou a reduzir significativamente tanto as dimensões quanto
o peso das suas embalagens, a ponto de que, desde 1991, quando o sistema foi
implantado, a redução nas embalagens na Alemanha ter atingido 15%, o que
significa 1,3 milhão de toneladas por ano. Ao todo esse sistema promove a
reciclagem de 6 milhões de toneladas: 75% de vidro; 70% de papel, papelão e
metais; 60% de plásticos.
A partir de 2005, na Alemanha, não será permitido enviar nenhum tipo de lixo
para aterro sem pré-tratamento. Nenhum tipo. Hoje, dois terços do lixo orgânico vão
para a compostagem e aterro. E as 53 usinas de incineração queimam 14 milhões
de toneladas por ano. Berlim também instalou um sistema de reciclagem de entulhos
da construção civil. Há uma destinação obrigatória, criada por lei, e as empresas são
obrigadas a encaminhá-lo e pagam por esse trabalho. A usina que funciona em
Berlim reciclou ano passado cem mil toneladas e custou 15 milhões de marcos para
ser implantada.
Talvez o país que mais tenha avançado na questão de resíduos seja a
Dinamarca, que pela conjugação de população e território tem uma situação
bastante difícil. É o país com políticas mais atuantes em matéria de redução de lixo,
a ponto de proibir a utilização de embalagens metálicas para cerveja, refrigerante e
embalagem de plástico para leite. Em todos esses casos há o retorno às
embalagens de vidro, que podem ser reutilizadas em média trinta vezes e podem ser
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recicladas em média durante setenta anos. O consumo de matérias-primas na
Dinamarca para embalagem, em função disso, caiu 25% em uma década.
Hoje, Copenhague, que aterrava 80% dos seus entulhos há dez anos, recicla
90%. Vinte e cinco por cento dos materiais de construção na Dinamarca são
reciclados.
A Suécia tem um sistema exemplar de reciclagem de sucatas de carros, que
no Brasil estão se transformando em grave problema degradador de paisagem. Na
Suécia, é obrigatória a reciclagem de, pelo menos, 85% do peso de cada veículo.
Em 2015, a obrigatoriedade chegará a 95%.
A Holanda enfrenta com maior rigor a questão de resíduos rurais. Tem mais
porcos do que habitantes. Tem 14 milhões de porcos para aproximadamente dez
milhões de habitantes. A Holanda até o ano que vem reduz em 25% o seu plantel de
porcos. Isso será obrigatório através de legislação que reduz a área mínima em cada
propriedade por animal e a área que cria outras exigências.
Temos de fazer no Brasil como em todos os lugares do mundo um sério
esforço para reduzir o uso de materiais. Queria relembrar aqui o relatório do
Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, publicado no início deste ano,
intitulado “The Living Earth Report 2000”, que nos diz o seguinte: “Considerando
apenas o consumo de alimentos, de energia e de recursos naturais, já estamos
excedendo a capacidade de reposição da biosfera em 42,5%. Esse déficit aumenta
2,5% ao ano”.
Lembra o relatório que, se cada habitante da Terra consumir no mesmo nível
de norte-americanos ou de europeus, precisaremos de três planetas como o nosso e
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não de apenas um. Já estamos em situação extremamente difícil e temos de
trabalhar para que ela situação não se agrave.
Então, é preciso reduzir a utilização de recursos. É preciso reutilizar. É
preciso reciclar. É preciso economizar. Uma política nacional de resíduos sólidos
tem uma influência decisiva nesse sentido. Além disso, se o Brasil for capaz de fazer
políticas competentes e articular a questão dos resíduos com a questão social, de
forma a gerar postos de trabalho para que as pessoas que já trabalham na coleta de
materiais trabalhem também na reciclagem, será possível dar grande avanço em
matéria de políticas sociais e de geração de renda. Já há países como o Senegal,
em que quase 30% dos postos de trabalho vêm da área de reciclagem e da
reutilização de materiais.
Agradeço mais uma vez ao Sr. Presidente o convite para aqui comparecer. E
evidentemente continuo à sua disposição.
O SR. PRESIDENTE (Deputado José Índio) – O jornalista Washington
Novaes deu uma demonstração da dimensão do problema que compete a esta
Comissão solucionar. Portanto, ao Relator passo a palavra.
O SR. DEPUTADO EMERSON KAPAZ – Sr. Presidente, senhores
expositores, demais membros da Comissão, vou fazer algumas observações sobre
as exposições feitas, para aproveitarmos não só a presença dos expositores, mas
também a contribuição e a experiência do jornalista Washington Novaes, acumulada
ao longo de tantos anos e tantas viagens.
Quem não teve oportunidade de ver seus documentários, exibidos pela TV
Cultura, deveria solicitá-los porque são de excelente qualidade e servem para nos
orientarmos neste Brasil.
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Minha primeira observação acerca das exposições diz respeito à grande
preocupação dos expositores em particularizar os problemas do Brasil em relação ao
resto do mundo, que é diferente, pois há políticas direcionadas à reciclagem de
resíduos. Nossa realidade é outra. O jornalista Washington Novaes mostrou
claramente a distância que estamos dos outros países. Portanto, talvez não
precisemos ter receio de conseguir implementar no Brasil o que está sendo feito lá
fora.
A distância é muito grande, mas temos de nos preocupar em avançar de
forma organizada. É óbvio que uma lei não vai resolver tudo e que não vamos
conseguir solucionar os problemas onde o mercado ou o sistema econômico não
opere. Seria importante receber mais algumas sugestões.
Como o Dr. Sérgio Haberfeld tem vasta experiência internacional, gostaria
que ele nos desse algumas explicações adicionais sobre o funcionamento do setor
de embalagens e sobre as restrições que ele sofre na Europa e nos Estados Unidos.
Sabemos que em alguns países a restrição serve mais como contribuição ao setor.
Há algum fundo ou mecanismo de parceria estabelecido entre o setor de
embalagens e o sistema de coleta?
No Brasil — o jornalista Washington Novaes levantou essa preocupação —, o
Fundo Federal que se pretende criar, provavelmente, receberá recursos do Banco
Mundial ou do Banco Interamericano de Desenvolvimento. Em várias palestras e
debates dos quais tenho participado sempre perguntam se o Fundo Federal não
poderia receber também recursos da iniciativa privada, por meio de alguns
mecanismos para que, de uma forma ou de outra, pudesse também financiar
treinamento, preparação de mão-de-obra, parceria com coletas seletivas,
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estabelecer mecanismos de parceria entre Prefeituras e cooperativas, desde que
estivessem aliadas ao processo seletivo do lixo. Ou seja, poderiam ser criadas
muitas alternativas, desde que se permitisse algum tipo de contribuição. Isso é
viável? Se for feito de forma que não seja viável, o preço final do produto aumentará.
O setor tem estudado alternativas? Talvez pudéssemos aprofundar esse debate com
representantes do próprio setor de embalagens, considerando a sua grande
responsabilidade e, ao mesmo tempo, porque tem demonstrado vontade de
contribuir. Seria interessante discutir o assunto.
Outra pergunta ao Dr. José Roberto Giosa: como o setor de embalagem,
tanto de alumínio quanto a ABRE, vêem o já arraigado conceito de retornabilidade
na Europa?
No Brasil falamos demais em reciclagem, mas sabemos que muitos setores
não dão o mesmo exemplo dado pela área do alumínio. Como é visto o conceito de
retornabilidade? Ele pode ser trabalhado? No nosso relatório falamos muito em
algumas cadeias específicas de distribuição e em valorizar a retornabilidade versus
a reciclagem. Como o setor e a ABRE vêem essa questão?
Quero ainda fazer algumas perguntas sobre o setor de alumínio. Reitero que
para nós ele é grande exemplo, além de ser muito interessante. Todo o alumínio
resultante de reciclagem de latas é usado somente para produzir latas? Existe
alguma possibilidade de esse alumínio ser usado em outras finalidades ou só na de
reciclagem de latas? Se não fosse a reciclagem, o preço da embalagem de alumínio
seria competitivo? Considerando o gasto de energia e todo o envolvimento no
processamento, a competitividade da lata de alumínio está hoje diretamente ligada
ao alto índice de reciclagem no Brasil? Vocês têm algum tipo de medição de
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reciclagem nas embalagens tipo Tetra Pak flexíveis ou multicamadas? É feita
reciclagem dessas embalagens? Vocês consideram a energia envolvida no balanço
ambiental? Analisam o ciclo de vida da embalagem de alumínio? Sabemos que uma
coisa é produção, outra é ciclo de vida.
Quero expor algumas idéias ao Dr. Washington Novaes e também lhe fazer
perguntas: na Dinamarca é proibido o uso de embalagens metálicas para bebida;
naquele país é considerado o efeito que provoca o combustível gasto na busca do
material? Há alguma possibilidade de usarem embalagens metálicas ou recicláveis,
ou apenas embalagens retornáveis? Se analisarmos o ciclo de vida do material
empregado, teremos de contar com o gasto de combustível que a retornabilidade
provoca. Deve-se fazer essa avaliação. Existe esse tipo de estudo nos países onde
a retornabilidade é maior? Pela sua experiência, jornalista Washington Novaes, esse
gasto é considerado nesses países?
Tenho ainda algumas observações a fazer em defesa do relatório. Trata-se de
relatório preliminar, mas estamos aprofundando o debate para lançar provavelmente
uma versão mais atualizada que inclua todas as propostas aqui apresentadas.
O jornalista Washington Novaes levantou algumas preocupações que já
fazem parte da nossa avaliação. Quanto ao princípio poluidor e pagador, temos
tomado cuidado de estabelecer onde e como aplicá-lo, pois ele não pode ser
generalizado. Gostaríamos de receber sugestões para poder amplia-lo.
Com relação à incineração, fui visitar uma usina de compostagem de cimento
para aprender como se faz o aproveitamento dos resíduos sólidos nas fábricas de
cimento no Brasil. Como elas são regionais e só usam resíduos perigosos, podemos
estabelecer um mecanismo somente para reaproveitamento de resíduos perigosos,
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não para os passíveis de reciclagem. Já estamos tentando introduzir esse
mecanismo no relatório.
A responsabilidade sobre os resíduos dos serviços de saúde também está
sendo estudada.
No que concerne aos resíduos sólidos das áreas rurais, o relatório está fraco,
vamos ter de melhorá-lo. Existem exemplos de tratamento de embalagem de
agrotóxicos no Brasil que queremos aproveitar e colocar no relatório.
De forma geral, é importante que se entenda que estamos recebendo
sugestões e desenvolvendo-as. Insisto que é muito importante para nós que os
palestrantes que vêm à Comissão tragam permanentemente propostas, porque
estamos trabalhando nesse relatório tempo integral. Quando as audiências públicas
terminarem, teremos condições de preparar nova versão ou — quem sabe?— o
substitutivo final.
Sr. Presidente, eram essas as minhas observações.
O SR. PRESIDENTE (Deputado José Índio) – Os Deputados Fernando
Gabeira e Ronaldo Vasconcellos também gostariam de fazer indagações.
Concedo a palavra ao Deputado Fernando Gabeira.
O SR. DEPUTADO FERNANDO GABEIRA – Sr. Presidente, muito obrigado.
Não participo desta Comissão, mas, dada a importância dos palestrantes e o meu
interesse pelo tema, pedi ao Partido dos Trabalhadores que me indicasse como
suplente para que dessa forma pudesse contribuir com as outras Comissões em que
trabalho.
Sr. Presidente, parece que há consenso de que não se deve tratar
separadamente os resíduos sólidos e que é necessária uma política geral para o
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setor. Só tratamos esse assunto separadamente porque tivemos de correr do
prejuízo. No caso dos pneus, tivemos de enfrentar não só um lobby muito poderoso
como uma importação violentíssima. No caso do PET, minha intenção era levantar a
questão e mostrar que o PET não reciclado traz muitos problemas nas grandes
cidades, não só do Rio de Janeiro e São Paulo, durante as enchentes. O ideal seria
que o projeto retivesse o espírito da responsabilidade por todo o ciclo do produto.
Algumas questões muito importantes foram abordadas, uma delas pelo Dr.
José Roberto Giosa. Como vamos trabalhar a visão de liberdade no mercado, de
liberdade do consumidor de maneira adequada? Acredito que é necessário garantir
a liberdade do consumidor. E nós já derrubamos vários projetos que já surgiram na
Comissão de Meio Ambiente. Mas eles reaparecem e projetos que definem cotas,
são problemáticos. Teríamos de reexaminar essa questão.
Se vamos manter liberdade do mercado e do consumidor das latinhas de
alumínio, vamos ter de rever a estrutura tarifária da energia no Brasil. Não é possível
falar de liberdade de mercado para o consumidor da latinha se o grande produtor do
alumínio desfruta de tarifas inferiores, às vezes, à tarifa paga pelo consumidor
domiciliar. Teremos que fazer um estudo nesse sentido para podermos precisar um
pouco mais tudo isso. Eu sou contra a idéia de cotas.
Ficou pendente uma questão: são as embalagens resíduos especiais ou não?
qual o choque de conceito que há entre o relatório e a afirmação de S.Sa.
O SR. DEPUTADO EMERSON KAPAZ – Permite-me V.Exa. fazer um
comentário importante a esse respeito?
Essa questão deixou margem à dúvida no relatório preliminar porque
destacamos resíduos urbanos e resíduos especiais, incluindo embalagens como
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resíduos especiais. O relatório deixa entender que, como é feita coleta somente de
lixo urbano e de resíduos urbanos, a coleta de outros resíduos, considerados
especiais, como as embalagens, por exemplo, não seria feita pela Prefeitura local,
mas por terceiros. Essa dúvida já está sendo esclarecida no relatório. Resíduo
especial não significa resíduo perigoso. As embalagens de alumínio seriam um
resíduo especial diferente do resíduo urbano.
O relatório faz duas classificações: resíduos urbanos e especiais, ou seja,
resíduos de mineração, industriais, tóxicos, tecnológicos, rurais e de embalagem. A
dúvida que será esclarecida é esta: a da embalagem. A coleta da embalagem, que
faz parte do lixo comum do usuário, será feita pela Prefeitura, através da coleta
normal.
O SR. DEPUTADO FERNANDO GABEIRA – Vou prosseguir, Sr. Relator,
depois discutiremos mais. A questão do lixo hospitalar já foi abordada. Tive
oportunidade de trazer dois cientistas de Niterói, que trabalham especificamente com
essa matéria. Fomos ao Ministro da Saúde, na época o Ministro Dr. Adib Jatene,
para mostrar que o lixo hospitalar não é tão perigoso quanto se pensa. Podemos
desmistificar o lixo hospitalar. Uma das possibilidades de faze-lo é determinar a
coleta seletiva, selecionada com precisão.
O problema do lixo hospitalar foi impulsionado pelo lobby dos incineradores
na Câmara dos Deputados. Tramitou aqui projeto que obrigava todas as cidades
com determinado número de habitantes a ter um incinerador de grande dimensão.
Isso foi desfeito com o tempo. Esse debate que agora está se revelando sempre foi
muito delicado nesta Casa, porque envolveu uma série de interesses que vamos ter
de abordar.
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Foi muito importante termos avançado no estudo da questão dos resíduos da
área rural, especificamente onde há criação de suínos. Tive oportunidade de ver em
Santa Catarina o estrago que algumas áreas sofreram. Não sei se há um relatório de
impacto ambiental para instalação de criatório de suínos. Tenho a impressão que
não há, mas vamos ter que implementar isso. Não é possível criar suínos sem antes
fazer o relatório de impacto ambiental. Encontraremos grande pressão na Comissão
de Agricultura porque a idéia dos seus membros é aumentar a criação, a
produtividade, a área, mas não é possível deixarmos que se comprometa o lençol
freático. É um problema coletivo. Teríamos que nos deter um pouco, talvez fazer
uma viagem a Santa Catarina para examinar a situação in loco e depreender o
estudo da situação, com algumas coordenadas para fortalecer o Relatório.
Outro aspecto muito importante, que se depreende das informações trazidas
pelo Sr. Washington Novaes, é a necessidade de regulamentar a produção do
catador. Tenho projeto em gestação que regulamenta a profissão de prostituta. É
importante, foi aprovado agora na Alemanha. São funções sociais desmerecidas,
mas temos de avançar e decidir encara-las.
Acredito que para se definir toda a política num só relatório vai precisar
envolver múltiplas dimensões. Mas não devemos recuar diante disso. Se há essa
oportunidade, por que não fazer? Temos de propor para o País uma política com
essas dimensões e que, no meu entender, tem de passar pela redução de resíduos.
Hoje há consumidores educados na Europa, ou nos Estados Unidos, que rejeitam o
excesso de embalagem em suas compras. Eles não aceitam muita embalagem. O
próprio consumidor faz pressão e exige que a embalagem seja adequada ao produto
que ele vai utilizar.
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Se, de um lado, existem problemas relativos aos temas que apresento, de
outro, é necessário termos a preocupação de não privilegiarmos nenhum setor da
produção, termos de ter uma visão eqüidistante desses setores, temos de tratá-los
com absoluta justiça.
O SR. PRESIDENTE (Deputado José Índio) – Concedo a palavra ao
Deputado Ronaldo Vasconcellos.
O SR. DEPUTADO RONALDO VASCONCELLOS – Sr. Presidente, quero
tentar entender melhor a questão levantada pelo Deputado Fernando Gabeira sobre
tema abordado pelo Dr. Giosa.
Particularmente, não concordo com isso. Entendi, ao analisar o Relatório
preliminar do Deputado Emerson Kapaz, que os resíduos industriais seriam de
responsabilidade de quem os produz, os fabricantes, e também dos importadores.
Entendi também que quem pariu Mateus que o embale. Quero ouvir explanações do
nobre Deputado, pois estamos aqui num debate que espero seja produtivo.
O Relator, Deputado Emerson Kapaz, pode nos esclarecer sobre o processo
de degradação, ou sobre a cadeia de degradação, ou disposição de quem produz
cadeiras, geladeiras, móveis, sem entrar no tema das embalagens. Não estou
falando, Deputado Emerson Kapaz, das embalagens, mas de produtos que
utilizamos no dia-a-dia: cadeiras, mesas, estofados, entre outros.
Gostaria de saber a posição do Dr. Giosa, Diretor da ABAL, e também do
Deputado Emerson Kapaz. A priori, fico com a posição do Relator.
Faço um apelo ao ilustre jornalista Washington Novaes, que tanto nos ajudou
quando fizemos a definição da ANA — Agência Nacional de Água, juntamente com o
Professor Paulo Afonso Leme Machado, para que participe conosco dos trabalhos
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desta Comissão, que talvez se encerre daqui a dois meses, quando o Relator
entregará o seu relatório, dando suas idéias, suas sugestões, mesmo que sejam
pontuais e, às vezes, não contextualizadas como vimos hoje.
Assisti a pelo menos dois vídeos elucidativos e educativos da TV Cultura
sobre esse tema e gostaria de solicitar ao Presidente José Índio que, se possível,
obtenha-os para podermos estudar mais o assunto focalizado. O Relator Emerson
Kapaz fez o mesmo pedido.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado José Índio) – Já requisitamos à TV Cultura
as fitas e, naturalmente, teremos que repassá-las a todos, para que tenham a
oportunidade de se aprofundar no seu teor.
Deveria passar de imediato a palavra aos expositores, para que eles
respondam aos questionamentos dos Deputados, mas também gostaria de fazer
uma pergunta ao jornalista Washington Novaes, quanto ao seu artigo “Aqüífero
Guarani”. S.Sa. afirmou que havia possibilidade de contaminação dessas bacias
hidrográficas a qualquer momento. Mas, numa decisão gratificante, no decorrer da
discussão do Orçamento, a bancada paulista votou, com muita sabedoria, dentro
daquilo que podiam propor alguns poucos os recursos destinados aos comitês de
bacias, que devem ser olhadas com tanta preocupação quanto a que temos com
relação ao resíduos, problema tratado por esta Comissão.
Não há muita conscientização, principalmente, por parte dos nossos
Governantes da dimensão do problema, mas, graças a Deus, atualmente, sentimos
que esse assunto tem preocupado a um número cada vez maior de pessoas. Neste
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sentido, congratulamo-nos por esta Casa ter criado esta Comissão Especial e por
verificarmos que muita gente se interessa por esses problemas.
Acredito que, em determinado momento, outro tema, o saneamento, vai se
juntar ao que ora discutimos, pois se trata também de problema abrangente, objeto
de outra Comissão Especial nesta Casa, que está em plena evolução. A minha
expectativa é a de que cheguemos a um entendimento para que as duas Comissões
façam um relatório mais completo.
Concedo a palavra aos senhores expositores. Inicialmente, ao Sr. Sérgio
Haberfeld.
O SR. SÉRGIO HABERFELD – Serei bastante breve e objetivo. Em primeiro
lugar, respondendo à pergunta do Deputado Emerson Kapaz, a indústria tem
interesse em colaborar no trabalho de diminuição de resíduos, de ser pró-ativa. Não
tenho dúvidas. Em nome da Associação Brasileira de Embalagens e da maior parte
dos setores ligados a nós, é importante que tudo caminhe positivamente. Tenho
viajado pelo mundo inteiro, da mesma forma que o jornalista Washington Novaes,
para aprender sobre o conheço o assunto.
Tornei-me amigo pessoal de um homem que participou da criação da ASD,
Duo System Deutschland, hoje com 76 anos. Estive em sua casa, em Berlim,
falando de pontos hoje considerados negativos, a fim de não repeti-los. Hoje, eles
vêem os erros que cometeram.
Acreditamos que a indústria tem de ter uma participação efetiva na solução do
problema e luto a favor disso. É claro que quanto mais sofisticado for o sistema
maiores serão as exigências. Por exemplo, na Alemanha, existem estudos sobre
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modificações de embalagens que não estragam o meio ambiente, mas há um custo
para o consumidor. Não tenho agora os valores, mas posso consegui-los.
Antes da queda do Muro de Berlim, o consumidor alemão ocidental tinha a
vida mais fácil, não tinha o desembolso de caixa para trazer o Leste para dentro do
país. Estava disposto a pagar mais por melhor qualidade de vida, queria respirar ar
melhor; queria viver sem nenhum lixo na rua; queria que a pasta de dente, por
exemplo, não tivesse a caixinha de papelão, só a embalagem primária. Enfim, tudo
isso tem um custo. Fora algumas exceções, as embalagens tem uma finalidade.
Obviamente, para mudar isso, haverá um custo que o consumidor acabará pagando,
querendo ou não. Mesmo que a empresa diga que pode absorver tal custo, sabemos
que, quando ele ocorre, acaba sendo repassado para o consumidor. Há estudos
sobre eles na Alemanha e na Suíça, ou seja, onde a pessoas estão dispostas a
pagar por melhor qualidade de vida melhor. Não há dúvida de que no Brasil, onde
esse processo se inicia, existe interesse da indústria, que está disposta a colaborar e
temos certeza de que colaborará porque essa é uma necessidade do País, o povo
quer melhor qualidade de vida.
O SR. PRESIDENTE (Deputado José Índio) – Na seqüência, concedo a
palavra ao Sr. André Vilhena.
O SR. ANDRÉ VILHENA – Não foi feita nenhuma pergunta específica a nós.
Então, faço duas observações: a responsabilidade pelo resíduo industrial, prevista
na nossa legislação, é da indústria. Hoje, a indústria que tem posicionamento pró-
ativo em relação ao meio ambiente desenvolve sistema de gestão ambiental
trabalhando a destinação correta do resíduo que gera sua produção.
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Quanto ao ponto verde, a Fundação Getúlio Vargas fez uma avaliação
preliminar do custo no Brasil, do sistema alemão, respeitadas nossas características,
obviamente muito diferentes de um país como a Alemanha. A estimativa inicial é de
que o custo seria de 9 bilhões de reais por ano para desenvolver programa parecido
com o desenvolvido na Alemanha. Não sei se a Fundação Getúlio Vargas foi
convidada para expor nesta Comissão, mas podemos inclusive indicar pessoas que
possam dar mais informações sobre isso.
O SR. PRESIDENTE (Deputado José Índio) – Concedo a palavra ao Sr. José
Roberto Giosa.
O SR. JOSÉ ROBERTO GIOSA – Aproveitando a honrosa presença do 3º
Vice-Presidente da Comissão, Deputado Dr. Benedito Dias; do Deputado Celso
Russomanno e do jornalista Washington Novaes, procurarei responder às perguntas
feitas pelo Sr. Relator.
Em primeiro lugar, quanto à indagação a respeito do alumínio reciclado, se o
metal serve somente para latas, a resposta é não. Hoje, do total reciclado 60%
voltam para as latas e 40% aproximadamente vão para outras aplicações. Por
exemplo, os desoxidantes, gotas de alumínio indispensáveis na produção de aço,
servem para acalmar o banho de aço. É indispensável jogar essas gotas, que pesam
300 gramas cada uma, nos altos fornos das siderúrgicas. Elas contribuem não só
para desoxidar, tirar o excesso de oxigênio da produção de aço, mas também para
proteger o banho de aço, sobretudo em relação a possíveis explosões, para
segurança do trabalho.
Essa sucata é muito utilizada também para produzir ligas automotivas. Como
eu disse, os blocos de motores da Fiat são compostos em até 25% com sucata de
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lata. O eixo do caminhão Ford Cargo tem 15% de alumínio. O resfriador, trocador de
calor dos caminhões turbo, esses em que vemos escrito a palavra intercooler,
também há alumínio. Rodas de ônibus, e principalmente de caminhões, também têm
até 10% dessa liga de alumínio.
Mede-se o sistema de reciclagem, de embalagens multicamadas? Não.
Quando se referiu a embalagens multicamadas, creio que o Deputado estava se
referindo às do tipo Tetra Pak, a única que é composta por três materiais: alumínio
plástico e papel. Há um sistema tecnologicamente aprovado, para fazer a
recuperação desses materiais. Não se mede nem o percentual do que é recuperado,
nem o percentual do que é reciclado, segundo a própria Tetra Pak.
Também temos multicamadas no caso do PET. Há algumas embalagens que
têm, externamente ao contato com o produto, duas ou três camadas de PET
reciclado, e uma camada interna de resina virgem. Isso é regulado por lei, uma vez
que há uma portaria da vigilância sanitária que proíbe o uso de PET reciclado em
contato com o produto.
Outra pergunta: o ciclo de vida da embalagem é positivo no resultado final?
Sem dúvida. O CETEA, do Instituto de Tecnologia de Alimentos de Campinas, está
terminando um trabalho a respeito. Não haveria sentido em se estimular a
reciclagem de um produto se, no final das contas, a relação custo/benefício fosse
negativa. O resultado é positivo, e não só quanto à economia de energia elétrica,
que, como disse, é de 95% em relação ao produto primário. Isso paga a conta e
ainda sobra um bom troco, principalmente neste momento. Portanto, no balanço do
ciclo de vida, a reciclagem ainda é altamente positiva. Esse estudo está sendo
terminado agora pelo CETEA, contratado pelo setor.
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Se o preço da embalagem da lata de alumínio seria competitivo se não fosse
a reciclagem. Sem dúvida. Citei, como exemplo, o fato de que até 1976, com um
quilo de alumínio, faziam-se 42 latas; hoje, fazem-se 76 latas. Em dólares, o preço
do milheiro da lata vendida para a indústria caiu 37% de 1990 a 1999. Hoje, o Brasil
pratica o preço um dólar acima do preço internacional. Quando falo preço
internacional, refiro-me ao mercado americano, que consome, por ano, 101 bilhões
de latas. Agora, com o recente aumento do produto feito pelo produtor americano
sobre o milheiro de latas, até o próximo carnaval o milheiro de latas de alumínio no
Brasil estará sendo vendido ao produtor de bebida pelo mesmo preço do milheiro de
latas do produtor americano. A reciclagem só acentua a competitividade da lata,
porque o produtor de lata ou de qualquer outro produto de alumínio sabe que se não
houver competitividade ele está fora do mercado. A lei do mercado é a lei da selva:
fica quem tem mais condições de competir.
Voltando à questão da embalagem retornável, digo que é muito interessante a
observação feito. Participo da atividade há alguns anos, e por isso, permito-me um
comentário: em 1997 e começo de 1998, foi apresentado o Projeto de Lei nº 2.272,
do então Deputado José Carlos Vieira, de Santa Catarina, que propunha, com todas
as letras, uma reserva de mercado para embalagem retornável. Aqui, vamos ser
francos. Qual é a única embalagem retornável que existe para cerveja e
refrigerante? É o vidro. Por esse projeto de lei, propunha-se, naquela época, uma
reserva de mercado, ou seja, 80% de todas as embalagens, para cervejas, sucos,
chás, isotônicos, leite, água benta e pinga, teriam que ser de vidro. E de onde saiu
esse percentual? Na época, a lata de alumínio tinha exatamente 20% do mercado
de cerveja. As emendas apresentadas a esse projeto de lei foram redigidas com a
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visível intenção de colocar toda a tropa de bode na sala para, depois, tirar e ficar a
embalagem de cerveja. O vidro tinha 96% do mercado de cerveja; hoje, tem 75%.
Sempre vai existir o vidro no mercado de cerveja, assim como de refrigerante.
Sempre! É uma embalagem que o consumidor gosta e aprecia. O que acontece é
que o perfil do consumidor e do ponto de venda mudou. Hoje, 62% de toda a cerveja
e refrigerante vendidos no País são vendidos através do auto-serviço.
O Deputado Fernando Gabeira observou muito bem: será que o consumidor
quer, pelo menos nos grandes centros, voltar a usar o engradado de cerveja, descer
do carro e levar ao mercado? Quem assume, no final das contas, o custo do
depósito, do manuseio, da quebra e da armazenagem dessa garrafa? E tem ocorrido
outra coisa. Recentemente, três grandes empresas foram condenadas em quatro
ações cíveis, porque as garrafas estouraram na mão do consumidor. Um ficou cego,
outro cortou a mão. Por quê? Quem é que fiscaliza o número de viagens retornáveis
que a garrafa pode dar? Ninguém fiscaliza. Há outras prioridades. E o cisalhamento,
o desgaste ocorrido na dobra da garrafa, pelo contato físico de uma garrafa com
outra, com as estradas maravilhosas que temos — o Ministro Eliseu Padilha que me
perdoe —, reduz o tempo de vida útil da embalagem. Quem viaja pelo interior repara
que, em bares e restaurantes afastados dos grandes centros, há uma marca enorme
na garrafa, no ponto de contato entre as embalagens, o que as torna extremamente
vulneráveis.
Não somos contra embalagem de vidro, porque o consumidor é a favor, mas
sim contra uma reserva de quota. Agora, no art. 115 do relatório preliminar, aparece
um percentual de retornabilidade, que está em branco. O Deputado fez da maneira
correta, no meu ponto de vista, ou seja, deixou em branco, para ser decidido. Mas,
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por que reservar uma quota? E o que é retornabilidade? A lata de alumínio ou a
garrafa PET podem ser retornáveis para a reciclagem. O conceito de retornabilidade
teria que ser explicitado. Claro que o relatório é preliminar, e o Relator vai,
certamente, traçar algumas definições importantes.
Outra coisa importante: há uma vaga idéia de que a embalagem retornável é
extremamente mais eficiente e mais econômica. Para lavar cada litro de produto
retornável embalado gastam-se seis litros de água, com soda cáustica; para cada
litro de produto embalado em embalagem descartável gastam-se três litros de água,
sem soda cáustica. Claro que se trata apenas de um dado. Estou lembrando da
água, porque hoje o ponto fraco de todos nós na discussão cotidiana é a água, o
recurso mais importante da Terra, porque se vai esgotar em pouco tempo, e nós, no
Brasil, somos privilegiados em tê-lo. Será que há definição adequada para essa
soda cáustica? Não há. Sabemos que não há, por uma série de razões, o que não
elimina as características positivas desta ou daquela embalagem, de que o
consumidor gosta. Por que o consumidor hoje prefere o PET? Quem dá festa em
casa, por exemplo, leva uma garrafa PET. O preço é conveniente, e a sonegação
torna o preço mais conveniente ainda para o consumidor final. Agora, trata-se de
embalagem apropriada para determinado uso. A última pesquisa nacional de análise
de domicílio feita pelo IBGE mostrou que o número de singles, pessoas que moram
sozinhas, cresceu, no Rio e em São Paulo, 39% em quatro anos. O consumidor que
mora sozinho, que vai, em média, quatro vezes por mês ao supermercado, não faz
compra de mês, mas sim a sua dose necessária. Reparem que hoje há presunto e
queijo fatiados, em dose individual. O que come essa consumidor? Ele não leva para
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casa uma garrafa de PET de dois litros, mas, sim, uma lata. Mas quando ele
encontra com os amigos num bar ou em outra ocasião, prefere uma garrafa.
Então, há mercado para tudo. Somos escancaradamente a favor da
concorrência. É um princípio da indústria, e as indústrias que estão aqui
representadas também adoram. Acho que quem deve decidir é o consumidor, e, se
for estabelecida uma quota, que se faça um balanço, uma análise do ciclo de vida de
cada embalagem e suas vantagens.
O Sr. Washington Novaes lembrou bem o caso da Dinamarca, país sui
generis. Portugal também foi aqui citado como exemplo de mercado de bebida. O
tamanho do mercado português de cerveja é menor que o de Campinas. Entre 1997
e 1999 foram fixados índices de retornabilidade para o mercado português. Nenhum
foi cumprido; nenhum foi sequer aferido. Portanto, país com aquela dimensão
geográfica não serve como exemplo quando comparado com o Brasil.
O Deputado Fernando Gabeira, referendo-se à tarifa do alumínio primário,
disse que o produto não deve ser subsidiado. Concordamos com ele. Por isso é que
a indústria está investindo pesadamente, com atraso, em autogeração. Esse é o
caminho da indústria. Para atender à produção de alumínio primário, foi estabelecido
um subsídio, para as Regiões Norte e Nordeste, as mais pobres, como uma
tentativa, primeiro, de internalizar a industrialização do País, entre Maranhão e Piauí.
Hoje, a ALBRAS têm um subsídio que é decrescente a cada ano, porque ela tem
que ser competitiva. O Brasil tem a terceira maior reserva mundial de bauxita.
Vamos ser um grande player nesse mercado. E além da tarifa tem que ser
considerado o outro lado da história. Mostrei o balanço da indústria — 1,5 bilhão de
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dólares positivo. Vamos tirar daí o percentual da produção de 1 milhão e 400 mil
toneladas, que são 370 mil com tarifas subsidiadas, e não o total.
O nobre Deputado Ronaldo Vasconcellos, de Minas Gerais, falou a respeito
da responsabilidade na cadeia. O Sr. Sérgio foi claro e repiso a sua posição: todos
têm que pagar. A indústria de bebida tem que ser responsabilizada; o produtor da
embalagem tem que ser responsabilizado, e, mais ainda, o produtor do insumo da
embalagem, ou seja, a indústria que produz a chapa de alumínio, a indústria que
produz a barrilha, a indústria que produz a resina PET. E o varejo, também. Todos
têm que dar sua contribuição. Tem que haver distribuição equânime, porque, afinal
de contas, como o próprio nome diz, trata-se de uma cadeia. Para o bem ou para o
mal, estamos todos amarrados. A nossa posição, como indústria de alumínio, é
absolutamente clara: toda a cadeia produtiva de qualquer tipo de produto que gere
alguma embalagem tem de ser responsável. Tem de haver uma responsabilidade
solidária nessa cadeia. E, principalmente, temos de criar mercado para a reciclagem.
Não basta obrigar o consumidor a reciclar.
Reparem que estou em campanha. Tenho até um slogan: “Se você é bonita e
gostosa, vote em Giosa”. Vou me lançar candidato.
Finalmente, abordo a questão do resíduo especial ou perigoso. O resíduo
pode ser, segundo o texto do Relator — e isso precisa ser clarificado —, especial e
perigoso. Um dos pontos que determina que o resíduo é perigoso é a sua
inflamabilidade. Por esse critério, uma embalagem Tetra Pak, além de ser especial,
pode ser perigosa. A embalagem de PET, por exemplo, além de ser especial, pode
ser perigosa por causa da toxidade e da inflamabilidade. Essas coisas tem de ficar
mais claras. Embalagem é eminentemente um resíduo urbano. Se passar a ser um
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resíduo especial, vamos fazer a delícia das empresas de coleta de lixo, que, aliás, é
um setor que tradicionalmente não cheira muito bem. E, afinal de contas, se houver
uma taxa para resíduo especial, quem vai pagar a conta, cara pálida? Todos nós?
Ou a Prefeitura vai ter uma fonte alternativa de receita, que não vai para o seu cofre,
mas, sim, para o cofre das empresas que fazem a limpeza pública? E mais: quem
vai medir quanto de embalagem foi reciclado? Se as Prefeituras não conseguem
controlar nem quantos metros de rua são varridos, como vão controlar o que é
depositado como embalagem?
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado José Índio) – Com a palavra o jornalista
Washington Novaes.
O SR. WASHINGTON NOVAES – Respondendo ao Deputado Emerson
Kapaz, não conheço esses estudos sobre a influência do combustível, no retorno, e
que resultado poderia produzir. Mas acho que há fatores dos dois lados. Por
exemplo, se na lata o retorno pode ser menor, porque o vidro é mais pesado, em
compensação o vidro tem maior dimensão. Em geral, a embalagem de vidro carrega
maior volume e, portanto, deve produzir número menor de retorno. Mas não conheço
esse estudo.
Isso me leva a entrar um pouco na questão dos custos ambientais,
insistentemente abordados aqui. Acho que não só na questão de resíduos, mas em
todas as questões, no Brasil, é preciso introduzir a questão dos custos ambientais,
sejam eles quais forem, para que o cidadão, o consumidor, possa decidir. Ele
precisa saber quanto custa cada coisa. Na verdade, direta ou indiretamente ele já
está pagando essa conta, mas ele precisa saber quanto custa, para que possa
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tomar decisões adequadas ao seu bolso, à sua vida, ao seu meio ambiente e ao seu
País de um modo geral.
Foi mencionado que os custos de promoção de um sistema de coleta seletiva
igual ao da Alemanha chegariam a 9 bilhões ao ano. Não ponho isso em dúvida,
mas fico me perguntando porque tenho ouvido com insistência que a produção do
setor de embalagens representa 1% do PIB brasileiro. Quer dizer, o retorno custaria
quase mais que a produção. Mas não tenho essa informação.
Quanto aos suínos, precisamos lembrar o seguinte: é preciso cuidado nessa
regulamentação, porque o problema não está só na instalação industrial do
frigorífico. Vamos pegar o exemplo dos grandes projetos que estão sendo instalados
no Brasil. Em geral, eles têm uma instalação central, industrial, de transformação.
Agora, cada instalação dessas trabalha com centenas de granjas produtoras. Então,
a poluição é difusa, diluída, e é preciso encontrar um sistema capaz de controlar isso
em todas as fases do processo e não apenas no final, na produção industrial.
Também quero fazer uma observação que me escapou ao longo da minha
exposição. Estranhei um pouco que no projeto se mencione apenas a coleta seletiva
para cidades com mais de 100 mil habitantes. E me pergunto qual seria a razão
disso e se tal seria legalmente possível, ou seja, se é possível discriminar-se entre
cidadãos e direitos. Pergunto-me por que não se estabelecer um sistema geral.
Finalmente, quanto ao apelo que foi feito, na medida em que for possível, com
as minhas atribuições, estou à disposição da Comissão.
O SR. PRESIDENTE (Deputado José Índio) – Gostaria de agradecer aos
senhores expositores, aos Parlamentares e a todos a presença. Realmente houve
um aproveitamento muito bom do que aqui foi abordado.
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Dado o adiantado da hora e o início da Ordem do Dia no plenário da Câmara
dos Deputados, vamos encerrar nossos trabalhos. Temos ainda alguns
requerimentos a apreciar, mas até por falta de quorum não poderemos colocá-los
em votação.
Declaro encerrados os trabalhos de hoje, antes convocando a próxima
reunião para o dia 20 de novembro, às 14h30min, uma vez que 15 de novembro é
feriado e que dificilmente no dia 13, véspera de feriado, haveria quorum suficiente
para a reunião.
Está encerrada a reunião.