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DENILSON DA SILVA FEITOSA AUTOFORMAÇÃO DO GESTOR DEMOCRÁTICO: DIÁLOGO INTERDISCIPLINAR COM AS PRÁTICAS VIVENCIADAS Universidade Cidade de São Paulo UNICID SÃO PAULO 2009

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DENILSON DA SILVA FEITOSA

AUTOFORMAÇÃO DO GESTOR DEMOCRÁTICO:

DIÁLOGO INTERDISCIPLINAR COM AS PRÁTICAS VIVENCIADA S

Universidade Cidade de São Paulo UNICID

SÃO PAULO 2009

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DENILSON DA SILVA FEITOSA

AUTOFORMAÇÃO DO GESTOR DEMOCRÁTICO: DIÁLOGO INTERDISCIPLINAR COM AS PRÁTICAS VIVENCIADA S

Dissertação apresentada como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação, junto à Universidade Cidade de São Paulo – UNICID –, sob orientação da Profª. Drª. Celia Maria Haas.

Universidade Cidade de São Paulo UNICID

SÃO PAULO 2009

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F331a Feitosa, Denilson da Silva

Autoformação do gestor democrático: diálogo interdisciplinar com as práticas vivenciadas / Denilson da Silva Feitosa. São Paulo, 2009.

97 f.; 30 cm. Bibliografia Dissertação (Mestrado) – Universidade Cidade

de São Paulo. Orientador: Profª. Drª. Celia Maria Haas.

1. Gestão democrática. 2. Autoformação. 3. Participação 4. Interdisciplinaridade 5. Autonomia l. Haas, Celia Maria. II. Título.

CDD. 371.2

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COMISSÃO JULGADORA

_______________________________________

Profª. Drª. Silvia Regina Rocha Campos Brandão

____________________________________

Profª. Drª. Margarete May Berkenbrock Rosito

____________________________________

Profª. Dra. Celia Maria Haas

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Dedico este trabalho, (in memoriam) à minha mãe, Antonia e meu pai,

Angelito, pelo exemplo de vida; e

Aos demais integrantes de minha família, que muito me incentivaram na

trajetória pessoal e profissional, sempre em busca da ética em todos os campos de

atuação, sobretudo na docência.

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AGRADECIMENTOS

Meu profundo agradecimento aos professores do Programa de Pós-

Graduação: Mestrado em Educação, da Universidade da Cidade de São Paulo –

UNICID, pelos ensinamentos transmitidos, especialmente à Profª. Drª. Celia Maria

Haas, pela sensibilidade, escuta e competente orientação, possibilitando a

consolidação deste trabalho;

Aos colegas de turma e do grupo de pesquisa com quem aprendi e troquei

ricas experiências; e

Aos funcionários – e ex-funcionários – do Colégio Dom Amando e da Casa de

Abrigo, que me permitiram escrever com ânimo, revelando-me situações da gestão

democrática em benefício da minha prática como gestor.

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"O diálogo é o encontro amoroso dos

homens que, midiatizados pelo mundo, o

'pronunciam', isto é, o transformam, e,

transformando-o, o humanizam para a

humanização de todos".

Paulo Freire

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RESUMO

FEITOSA, Denilson da Silva. Autoformação do gestor democrático: diálogo

interdisciplinar com as práticas vivenciadas. Dissertação (Mestrado em Educação) -

Universidade da Cidade de São Paulo – UNICID, São Paulo, 2009.

Este trabalho tem por objetivo investigar as possibilidades e limites da atuação do gestor comprometido com a gestão democrática proposta pelas políticas públicas, atuação, esta, pautada na trajetória pessoal e profissional do investigar, na qual se buscou identificar o percurso vivido que motivou a autoformação de um gestor comprometido com transformação dos espaços institucionais em espaços educativos, com a participação de todos os envolvidos: professores, funcionários administrativos, pais, alunos e comunidade. Para tanto, parte da descrição da trajetória pessoal e profissional do pesquisador que atuou e atua na área da educação, em seus vários segmentos, como professor de Educação Artística, Coordenador de Pastoral, Vice-diretor do Ensino Médio e Diretor Geral e na área social, como diretor de um abrigo, para, na seqüência, mergulhar nas reflexões teóricas com a contribuição de Alonso (1976), Bordenave (1994), Fazenda (1999; 2002), Gadotti e Romão (1997), Josso (2004; 2006), Libâneo (2006), Pineau (2003) e Quintás (2004), bem como nas indicações das políticas púbicas de educação, estabelecendo um diálogo interdisciplinar o qual aponta a formação de gestor democrático em seu aspecto contínuo e comprometido com o projeto de transformação da educação, impondo atenção constante para as mudanças pessoais e profissionais exigidas por esta escolha. Pode-se destacar, ainda, que a autoformação do gestor encontra como fonte de amadurecimento as relações interpessoais desenvolvidas de acordo com a própria existência, desvelando o fato de que a democracia se concretizará no trabalho participativo do dia a dia. Portanto, é na vida pessoal e profissional que se dá a construção de um gestor comprometido em administrar com humildade e democracia as Instituições Educativas.

Palavras-chave : Gestão Democrática. Autoformação. Participação. Inter-

disciplinaridade. Autonomia.

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ABSTRACT

FEITOSA, Denilson da Silva. Manager of democratic self-education: dialogue with

the Interdisciplinary practices experienced. Thesis (Masters) - Universidade da

Cidade de São Paulo – UNICID, São Paulo, 2009.

This work has as objective to investigate the possibilities and limits of a compromised manager performance of to the democratic management proposal for the public politics. Based on professional and personal trajectory to investigate, in which one searched to identify the lived passage that had motivated the self-development of a manager compromised to transformation of the institution and educative spaces, with the participation of all the involved ones: administrative professors, employees, parents, pupils and community. For in such a way, part of the description of the personal and professional trajectory of the researcher that acted and acts in the area of education in some segments, as professor of Artistic Education, Evangelic coordinator, Vice- and general principal of High school and in the social area as manager of a shelter, for the sequence diving in the theoretical reflections with the contribution of Alonso(1976); Bordenave (1994); Fazenda (1999;2002) Gadotti and Romão (1997); Josso (2004;2006), Libâneo (2006); Pineau (2003) and Quintas (2004), and of the indications of the public politics of education establishing an interdisciplinary dialogue which points that the formation of democratic manager continuous and is compromised to the project of transformation of the education and imposes a constant attention for the personal and professional changes demanded by such choice. It can be detached despite the self-development of the manager, finds as maturing source the concrete life of the interpersonal relations that will be developed in elapsing of the proper existence, also developing that the democracy will be materialize in the day to day participative work. Therefore, it is in the personal and professional life that the construction of a compromised manager shows itself in managing with humility and democracy in the Educative Institutions.

Keywords: Managing democratic, self-development, participation, interdisciplinary

and Autonomy.

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LISTA DE ABREVIATURAS

CDA ................. Colégio Dom Amando

CEE ................. Conselho Estadual de Educação

CME ................. Conselho Municipal de Educação

CNE ................. Conselho Nacional de Educação

CRECA ............ Centro de Referencia da Criança e do Adolescente

CSC ................. Congregação de Santa Cruz

DRE ................. Delegacia Regional de Educação

ECA ................. Estatuto da Criança e do Adolescente

LDBEN ............. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC ................. Ministério da Educação

OFM ................. Ordem dos Frades Menores

SEE ................. Secretaria Estadual de Educação

SME ................. Secretaria Municipal de Educação

SUAS ............... Sistema Único de Assistência Social

ULBRA ............. Universidade Luterana do Brasil

UNG ................. Universidade Guarulhos

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Pág. Figura 1 - Mapa do Estado do Pará (a) ....................................................... 28 Figura 2 - Divisão geográfica do Brasil ........................................................ 43 Figura 3 - Mapa do Estado do Pará (b) ....................................................... 48 Figura 4 - Colégio Dom Amando – Santarém/PA ........................................ 49 Figura 5 - Casa de Abrigo Nossa Senhora Auxiliadora ............................... 51 Figura 6 - Mapa da Região Metropolitana de São Paulo ............................. 53 Quadro 1 - Distribuição dos funcionários ...................................................... 55 Figura 7 - Organograma anterior do Colégio Dom Amando ........................ 64 Figura 8 - Organograma atual do Colégio Dom Amando ............................ 65 Figura 9 - Reunião com os Funcionários ..................................................... 66 Figura 10 - Reunião com os Coordenadores ................................................. 67 Figura 11 - Convite para reunião ................................................................... 72

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SUMÁRIO

Pág

INTRODUÇÃO ................................................................................................. 10 CAPÍTULO 1 - AUTOFORMAÇÃO DO GESTOR ............... ............................ AUTOFORMAÇÃO DO GESTOR14

1.1 Interdisciplinaridade Como Prática na Gestão Democrática................ 23

1.2 O Contexto Passado ........................................................................... 27

1.3 O Contexto da Autoformação .............................................................. 47 CAPÍTULO 2 - PRÁTICAS DA GESTÃO DEMOCRÁTICA ...... ..................... PRÁTICAS DA GESTÃO DEMOCRÁTICA56

2.1 A Construção da Gestão Democrática ................................................ 62

2.2 A Construção Democrática no Colégio Dom Amando ......................... 63

2.3 A Construção Democrática no Abrigo ................................................. 70 CAPÍTULO 3 - A GESTÃO DEMOCRÁTICA: O QUE DIZEM AS

POLÍTICAS PÚBLICAS DE EDUCAÇÃO .................... ....................... A GESTÃO DEMOCRÁTICA: O QUE DIZEM AS POLÍTICAS PÚ77

3.1 Participação da Escola na Gestão Democrática .................................. 79 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................. ............................................... 91

REFERÊNCIAS ............................................................................................... 95

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INTRODUÇÃO

O Projeto inicial, apresentado para o Curso de Mestrado em Educação, em

2007, tinha como foco o Diretor Escolar comprometido com a Gestão Democrática,

como estabelecido nas políticas públicas de educação.

As indagações ainda não eram claras, mas havia a intenção de investigar,

cuidadosamente, as questões que envolvem as práticas de um dirigente que optou

por administrar os espaços escolares democraticamente, com o envolvimento de

todos os que, direta ou indiretamente, o auxiliavam na instituição educacional.

No segundo semestre de 2007, continuava a dúvida quanto ao tema da

pesquisa. Entretanto, uma coisa era certa, estava mantida a intenção de investigar

os alcances e limitações da gestão democrática. Ao ser questionado a respeito do

problema de pesquisa, propus trabalhar minha trajetória de diretor do colégio Dom

Amando e de gestor da Casa de Abrigo Nossa Senhora Auxiliadora, fundado na

obra de Marie-Christine Josso, intitulada Experiência de Vida e Formação, editada

em 2004, com a possibilidade de esmiuçar o tema a partir da história de vida, fato

que avolumou as dúvidas, já que havia o preconceito e a resistência em voltar o

olhar investigativo com respaldo nessa metodologia.

Ao ler o livro, uma nova possibilidade de investigar foi descoberta e o projeto

ganhou força e sentido, facilitando o início dos trabalhos. Daí em diante o projeto

tomou novo fôlego e a escrita fluiu, tornando cada vez mais claro o problema de

pesquisa e o procedimento metodológico.

Assim, decidi centralizar a pesquisa na trajetória de vida de um gestor escolar

e de abrigo, buscando, no passado, recortes de momentos significativos da

autoformação.

O objeto de pesquisa consiste em investigar a partir do resgate da história de

vida de um gestor escolar nas práticas da gestão democrática propostas pelas

políticas públicas de educação, identificando as possibilidades e os limites da gestão

democrática revelados na história de vida.

Para complementação do trabalho, pretendo, ainda: conceituar gestão

democrática de acordo com as políticas de educação; identificar os pressupostos

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teóricos e práticos da gestão democrática; discutir sobre os limites e possibilidades

da gestão democrática; e estudar a importância da autoformação para a prática da

gestão democrática.

Ao refletir sobre a gestão democrática nas políticas públicas procuro, também,

identificar o tratamento dispensado ao gestor e, ao mesmo tempo, reconhecer que a

formação do sujeito gestor se realiza no processo de amadurecimento e nas

relações construídas nessa trajetória.

As teorias de Josso, Fazenda, Mello e Rosito permitiram constatar o fato de

que a formação não se dá apenas através de livros e teorias, mas que a nossas

histórias de vida podem dar um novo sentido à gestão democrática, ou melhor, ao

gestor pesquisador.

Assim, esta investigação molda-se na perspectiva da história de vida, no que

tange ao percurso metodológico, portanto consiste numa pesquisa qualitativa.

Segundo Bogdan e Biklen (1994), a investigação qualitativa tem como fonte direta

de dados o ambiente natural, constituindo-se o investigador seu principal

instrumento.

Ao resgatar a trajetória vivida busquei verificar a importância da formação e

autoformação do gestor escolar e o ato de mergulhar nessa história de vida significa

a busca da compreensão do processo de construção da ação coletiva e

comprometida de todos os atores institucionais. Referendando a contribuição dos

relatos na construção da formação e da autoformação Josso (2006) afirma que:

Os relatos de histórias de vida permitem confirmar uma constatação importante para legitimar a importância das práticas de explicação e de desenvolvimento de projetos de formação: o caráter extremamente heterogêneo das motivações, necessidades e desejos que dinamizam o investimento de estudantes adultos e profissionais em formação contínua (JOSSO, 2006, p. 27).

Os relatos dos funcionários e ex-funcionários do Colégio Dom Amando

fizeram-me acreditar que minha administração é desenvolvida de maneira

democrática, vez que reconheço a importância da participação para um trabalho de

autonomia nas atividades propostas.

Os relatos foram solicitados para alguns funcionários do colégio Dom Amando

que trabalhavam como liderança na minha equipe gestora, após meu desligamento

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como gestor. Foi um exercício de auto avaliação e buscava conhecer o que os

funcionários que tinham trabalhado comigo tinham aprendido. Inicialmente não era

material para a pesquisa, mas após a caracterização do projeto como um resgate de

experiências vividas para compreender o processo auto formativo de um gestor

comprometido com práticas de gestão democrática, verificou-se a possibilidade de

aproveitar a fala de companheiros de trabalho. Nessa direção mais alguns

depoimentos forma recolhidos (informar quantos e quem) e a partir do material

existente, fiz alguns recortes de parágrafos para reconhecer e legitimar como foi

construída a gestão democrática no Colégio Dom Amando, na perspectiva dos

funcionários que atuavam na instituição no período.

Utilizo a história de vida para melhor compreender a minha formação e

verificar como construí uma relação de respeito e autonomia na formação dos

funcionários com os quais tive contado como gestor.

A pesquisa utilizou, pois, os seguintes procedimentos:

a) A compreensão do conceito de gestão democrática dialogando com

teóricos, construindo, assim, um referencial de análise sobre a prática da

democracia na escola;

b) A interdisciplinaridade como nova atitude de conhecimento, obtido em

outras áreas, para a compreensão da necessidade de aprender com

humildade;

c) A descrição de minha história de vida profissional entrelaçada com minha

vida familiar, religiosa e profissional, para a construção de um

administrador comprometido com a gestão democrática; e

d) A participação como critério de formação do gestor comprometido com a

busca da autonomia da escola e da formação de um sujeito responsável

pela mudança da sociedade, propostas nas atuais políticas públicas para a

educação.

Para referenciar a discussão sobre gestão democrática, vários autores foram

considerados, entre eles estão Gadotti e Romão (1997), Luck (2002), Cury (2007) e

Fazenda (2002), que ensejaram importantes reflexões a respeito da conceituação de

gestão democrática e interdisciplinaridade.

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Ao me debruçar sobre a minha história de vida, reconheço a presença

marcante da religiosidade em todo o percurso formativo. Portanto, acredito na

necessidade de incluí-la como instrumento de análise e construção teórica do gestor

democrático.

No primeiro capítulo, trato do contexto histórico de minha formação como

gestor, recordando os momentos importantes de transformação da criança em um

adulto que preza os valores humanos, o respeito e a coletividade. O diálogo

interdisciplinar se evidencia ao reconhecer que a formação é realizada de acordo

com o amadurecimento e com o respaldo que as políticas dão aos

encaminhamentos pedagógicos e gerenciais do cotidiano escolar.

No segundo capítulo, são abordadas as práticas da gestão democrática

vivenciadas no papel de um diretor de escola e de abrigo que reconhece o exercício

conjunto de suas atividades, com espírito democrático e participativo.

Finalizando, o terceiro capítulo traz uma reflexão sobre a gestão

democrática nas políticas públicas para identificar o papel da escola e do gestor na

transformação da sociedade.

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CAPÍTULO 1 - AUTOFORMAÇÃO DO GESTOR

O propósito deste capítulo é situar a minha formação e como atuei na

qualidade de formador nos trabalhos que desenvolvi como diretor de escola e do

abrigo.

Refazer o itinerário percorrido nas diversas fases de minha vida permite-me

compreender o percurso do viajante em busca de sua identidade profissional.

Conforme Josso (2004, p. 58):

[...] um sujeito que empreende uma viagem ao longo da qual ela vai explorar o viajante, começando por reconstituir o itinerário e os diferentes cruzamentos com os caminhos de outrem, as paragens mais ou menos longas no decurso do caminho, os encontros, os acontecimentos, as explorações e as atividades que permitem ao viajante não apenas localizar-se no espaço-tempo do aqui e agora, mas ainda, compreender o que o orientou, fazer o inventário da sua bagagem, recordar os seus sonhos, contar as cicatrizes dos incidentes de percurso, descrever as suas atitudes interiores e os seus comportamentos. Em outras palavras, ir ao encontro de si visa a descoberta e a compreensão de que viagem e viajante são apenas um.

Recordar me faz voltar a um passado de vários momentos bons, embora

tenha, por outro lado, momentos de tristes lembranças que, contudo, não podem ser

esquecidos, porém, aproveitados para compreender que a vivência faz parte do

processo de amadurecimento pessoal e profissional do ser humano.

A formação inicial do gestor é feita na universidade, mas se aprende com a

experiência do cotidiano escolar. Um aspecto relevante para uma prática ética e

comprometida é a formação espiritual, pois nela está a condição de um diálogo de

acolhimento.

Esta experiência cotidiana é que faz a grande diferença na autoformação do

gestor, em que aprendi, conforme aponta Pineau (2003, p. 153): “a formação impõe-

se então como uma função vital essencial a ser exercida permanentemente. Isto é,

um exercício que deverá continuar por toda a nossa vida”.

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Pineau conceituou ainda auto-, hetero- e ecoformação:

Compreender esta dialética de emancipação/autonomização – dentro de uma problemática de formação permanente – ocasionou a fabricação dos conceitos auto-, hetero-, eco-formação. Autoformação: Ela cataliza as pesquisas nos ensaios de compreensão da autonomização dos protagonistas, graças à usurpação de seu poder de formação. Heteroformação: que com freqüência vem em primeiro lugar para designar este pólo social em contraponto ao pólo individual. Ecoformação: assume importância com o movimento ainda restrito de educação para o meio ambiente (PINEAU, 2003, p. 155-158).

Tomo consciência das minhas próprias referências como gestor

comprometido com o trabalho e com minha formação pessoal e profissional e quanto

mais percebo esse compromisso, mas cuido e invisto na autoformação. Deste modo,

crio condições de promover e gerenciar a formação dos outros. Passada esta etapa

vem o momento da interpretação, reflexão de todos estes momentos e seleção do

que realmente vai me ajudar e vejo que tudo que recebemos tem uma motivação: o

sujeito é que deve selecionar o que vai ajudá-lo na formação. Por derradeiro,

percebo que a formação permanente terá como propósito a mudança do ambiente

em que estou inserido.

A autoformação é importante na construção de um projeto de gestão

democrática e destaca a importância do diretor, atrelado à sua conduta na

construção coletiva do projeto pedagógico, que deverá ser lembrado e tornar-se

objeto de reflexão em cada etapa da atividade.

A formação ao longo da vida é então o produto de transações complexas entre pólos materiais, sociais e orgânicos, alternando momentos formais, racionais, nítidos, distintos, com momentos experienciais, sensíveis, mas opacos, confusos. Estas transações formativas são permanentes, significando que elas se desenrolam tanto a cada instante como ao longo da vida (PINEAU, 2003, p. 162).

Continuando na busca de sua autoformação, o gestor procura cursos de

especialização em gestão financeira, gestão pedagógica e outros, com o objetivo de

aperfeiçoar a competência técnica para administrar com eficiência a instituição que

dirige. A autoformação é importante na construção do coletivo.

No ano de 1999, fui convidado pelo diretor do Colégio Dom Amando,

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instalado em Santarém/Pará, para assumir o cargo de Vice-Diretor do Ensino Médio.

Pois bem, aceitei o desafio.

O trabalho foi difícil, pois o diretor tomava todas as decisões, isoladamente, e

eu não participava dessas deliberações. Percebi o quão estressante era o trabalho

sem autonomia, pois todas as medidas a serem tomadas já vinham esquadrinhadas

pelo diretor-geral.

Certo dia, duas secretárias e o diretor repreendiam o professor de História,

que entrara no recinto da Secretaria sem autorização. A cena criou grande mal-

estar, levando-me a, discretamente, questionar o diretor sobre o fato e adiantar-lhe:

“nunca me chame atenção na frente de ninguém, porque ouvirá o que não quer.”

Tínhamos, como membro da Congregação, os mesmos direitos, portanto, queria

respeito e autonomia para realizar o meu trabalho. A partir desse momento, o

tratamento tornou-se respeitoso e as tarefas foram a mim delegadas.

O fato remete a Silva (2006, p. 77), ao afirmar:

Se existe o sujeito humano, existe também a experiência humana, que é prática com significado para quem a realiza. Se existe o significado, existe a cultura, com suas diversas possibilidades de compreender o real, residindo aqui a possibilidade de uma relativa autonomia do sujeito diante da situação; não há a fatalidade mas a possibilidade de escolher entre alternativas que se mostrem viáveis e críveis.

A experiência do ser humano está em sua própria existência como pessoa, e

que se desenvolve através de sua valiosa cultura, no decorrer de cada momento

vivido e relembrado na sua trajetória de vida.

Em 2002, o diretor viajou para os Estados Unidos, deixando-me a

incumbência de conduzir as atividades do colégio. De início, fiquei apreensivo e

contei com o auxílio do vice-diretor do Ensino Fundamental, por conta de seus quase

vinte anos de trabalho, acreditando que conduzisse as atividades gestoras com certa

tranquilidade. Porém, com o passar dos dias, percebi que seu método de trabalho

era autocrático e radical.

Com os funcionários não havia diálogo, tampouco suas ideias eram

respeitadas. Surgiram diversas reclamações, e, por conta disso, decidi assumir

efetivamente a direção, ainda que com pouca experiência na área pedagógica e

administrativa, visto que era formado em Letras. É certo que nenhuma graduação

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prepara o diretor, mas, a experiência na atividade escolar é que constrói o bom

gestor.

Dei a notícia à secretária, orientando-a no sentido de que todos os problemas

deveriam ser trazidos ao meu conhecimento, centralizando em mim as decisões.

Cientifiquei, também, o vice-diretor que assumiria efetivamente a direção do colégio

até ordem em contrário da mantenedora.

Em 2002, matriculei-me no curso de Pós-Graduação com enfoque na

Administração Educacional. Foi um momento importante para a minha experiência

como gestor, pois as disciplinas eram direcionadas a uma gestão democrática e, à

medida que aprendia algo novo, colocava-o em prática.

Comecei a conversar com os funcionários e a delegar funções aos

coordenadores, para que assim eu pudesse ter mais tempo para estudar e conhecer

os mecanismos administrativos e pedagógicos da escola. Essas medidas foram os

meus primeiros contatos com gestão.

Afinal, descobri que atuo vivenciando a função de administrador escolar, pois,

como afirma Dias (2004, p. 222):

A escola tem objetivos a atingir e compete ao diretor assumir a liderança para assegurar a consecução desses objetivos. O planejamento, a organização do trabalho, a coordenação dos esforços, a avaliação de resultados fazem parte do seu dia-a-dia de trabalho; enquanto ele se envolve com estas atividades, está desempenhando sua função de administrador

Fiquei bastante apreensivo e com receio de cometer alguns erros, mas fui

perseverante e procurei, através da oração e da experiência com palestras dirigidas

aos jovens nas escolas do Estado, fortalecer-me, buscando, a cada dia,

desenvolver o trabalho dedicado à minha formação.

Na prática, reconheço o papel fundamental que tem o gestor como sendo a

pessoa que dirige de acordo com o seu projeto de educação. Descubro uma

categoria fundamental na gestão democrática, que é a visão de conjunto, conforme

Libâneo (2006, p. 332):

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O diretor não pode ater-se apenas às questões administrativas. Como dirigente, cabe-lhe ter uma visão de conjunto e uma atuação que apreenda a escola em seus aspectos pedagógicos, administrativos, financeiros e culturais.

A visão de conjunto será sempre um aspecto a ser lembrando pelo diretor,

coordenador, enfim, o gestor. Sua atuação terá um grande avanço quando perceber

que todos os setores deverão estar interligados na proposta pedagógica do Colégio

ou Abrigo.

Em 2005, senti a necessidade de fazer mais um curso de especialização.

Dessa vez busquei aprendizado na área de Gestão Financeira, para conhecer um

pouco da estrutura financeira da instituição em que atuava. A turma era, em sua

maioria, composta por pessoas formadas em Contabilidade e Administração, mas,

ainda assim, obtive êxito.

Fui humilde em colocar para a turma que tinha feito um curso na área de

humanas, e eles foram bastante cooperativos, ajudando-me quando manifestava

dificuldade em alguns conceitos contábeis e/ou administrativos.

Ao terminar o curso, no final do ano de 2005, percebi que tinha sido muito

importante para minha formação como gestor, pois descobri que não precisamos

saber tudo, mas devemos ter a noção, ainda que superficial, para que possamos

contratar pessoas competentes para determinados cargos e, no mínimo,

acompanhar as ações financeiro-administrativas, não como especialistas, tampouco

como leigos, todavia com uma visão macro do processo administrativo.

Em 2007, dei início ao curso de Mestrado e continuei a pesquisar sobre a

gestão democrática. Em agosto de 2007, comecei o trabalho de vice-gestor de uma

Casa de Abrigo numa cidade da Região Metropolitana de São Paulo, deparando-me,

novamente, com a forma autocrática e radical de gestor.

Uma vez mais estive diante do autoritarismo na forma de coordenar. Estas

memórias reacendem minha história de vida, marcada pelo compromisso com a

gestão democrática, como afirma Josso (2004):

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[...] a sua história, constitui uma prática de encenação do sujeito que torna-se [sic] autor ao pensar a sua vida na sua globalização temporal, nas suas linhas de força, nos seus saberes adquiridos ou nas marcas do passado, assim como na perspectivação dos desafios do presente entre a memória revisitada e o futuro já atualizado, porque induzido por essa perspectiva temporal. Numa palavra, é entrar em cena um sujeito que se torna autor ao pensar na sua existencialidade (JOSSO, 2004, p. 60).

Sei que se não acreditar naquilo que faço, todo o trabalho de gestão

democrática será em vão, portanto, é essencial acreditar no trabalho de formação

coletiva e que o gestor deve oferecer autonomia e liberdade para o seu colaborador

desenvolver as atividades, buscando sempre estar presente, sem interferir no

processo individual e coletivo, mas direcionando para que o trabalho ocorra com

sucesso.

Ao resgatar e prática de gestão, reconheço a importância de partilhar e

contribuir com o público a experiência vivida nesses anos de gestor em que busquei

utilizar a gestão democrática na minha atividade como administrador.

Toda a prática de gestão democrática que procuro vivenciar nas minhas

ações é advinda, evidentemente, da minha criação. Desde o nascimento até os dias

de hoje, venho me formando como pessoa, como educador, como sujeito e diretor,

sempre pensando na formação coletiva, cujo objeto central é a participação e a

responsabilidade de cada um, pois a administração com competência carece de um

encontro criativo entre as pessoas.

Sobre este aspecto, Quintás (2004, p. 144) observa:

O encontro significa muito mais do que açhar-se [sic] em proximidade, justapor-se, chocar-se, dominar-se e manejar-se. O encontro implica entreverar o próprio âmbito de vida com o de outra realidade que reage ativamente diante da minha presença.

Este encontro torna-se simbólico e verdadeiro quando é feito com respeito à

presença do outro, levando-se em conta sua existência, fazendo com que ele se

torne ativo e consciente do seu papel de sujeito.

O nosso ambiente é envolvido por objetos e pessoas que, juntas, de forma

ética, podem se transformar num meio eficaz de mudar o ambiente familiar e

profissional. Existem três formas de realidade:

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[...] os objetos, os sujeitos e os âmbitos. Os objetos. São realidades objetivas. Essas realidades podem ser medidas, pesadas, agarradas com a mão, situadas no espaço, dominadas, manejadas. Os âmbitos são delimitados como objetos, mas se abrem a outras realidades; podem ser afetados pela ação de outros seres e, ao mesmo tempo, exercem um influxo sobre eles. Entre os âmbitos de realidade, destacam-se alguns por seu grande poder de iniciativa, que lhes permite tomar decisões lúcidas e livres, fazer projetos, produzir obras literárias e artísticas... por essa razão, recebem o nome de sujeitos (QUINTÁS, 2004, p. 49-52).

O objetivo é procurar a transformação dos sujeitos de sorte que tenham

iniciativa própria. A transformação acontecerá, gradativa e diariamente, pela reflexão

criativa que permite perceber que sou instrumento de mudanças, minhas e dos

outros.

Quintas (2004, p. 19) aponta para o fato de que

a criatividade costuma ser entendida como a capacidade de dar origem a uma realidade nova e arrojada. E esta realidade nova é um fato consumado de ações que deverão ser praticadas de maneiras ousadas para dar origem a um novo modo de atitudes éticas.

E o encontro de mudanças de atitudes é o principal objetivo visando à

elevação da pessoa humana para ser especial e única. Isto só acontece quando se

tem a reciprocidade de atitudes, sem manipulação. Este encontro cheio de

comprometimento com outro é observado por Quintás (2004, p. 54):

A elevação de meros objetos à condição de âmbitos torna possível o encontro. 'Encontrar' é colaborar, é ser capaz de entreverar dois campos de iniciativas, duas fontes de possibilidades. Enquanto uma realidade for vista por mim como mero objeto, posso possuí-la, manejá-la, pesá-la, delimitá-la, mas não posso encontrar-me com ela, porque o encontro requer reciprocidade, oferecimento mútuo de possibilidades para realizar ações cheias de sentido.

As ações cheias de sentido serão trilhadas no meu percurso de gestor, pelas

minhas atitudes éticas, as quais trago como concepção cristã, ou seja, meu irmão

como sendo imagem e semelhança do criador.

Percebo que o êxito no trabalho não é apenas uma conquista individual, mas

resultado do esforço do grupo, pois, isoladamente, não há como desenvolver o

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trabalho que é de todos. É conveniente reconhecer que o outro é também importante

no trabalho.

A participação exige uma atitude de mudança que significa ruptura de uma

passividade individual em relação a um comprometimento de mudança e, também,

mudar o outro de objeto passivo a âmbito. Nas palavras de Quintás (2004, p. 138):

Aquele que tem suficiente perspicácia para vê-los como âmbitos tende a respeitá-los pelo que são e pelo que são chamados a ser. Esse respeito se traduz imediatamente em colaboração. Eis, aqui, o caminho pelo qual deve se orientar a vida social se quiser ter qualidade ética.

Construo minha formação cristã e profissional partindo do princípio de que me

formo a cada momento em que aceito as interferências positivas ou negativas

acerca do meu trabalho, isto é, aceitando que este encontro só será possível se fizer

com que as pessoas passem a participar do processo de gestão como sujeitos

respeitados e valorizados, considerando que são seres únicos.

[...] o encontro só é possível entre âmbitos, não entre objetos... Se o encontro é um entreveramento de âmbitos e se o homem é 'um ser de encontro', adquire um especial interesse para a vida determinar se podemos transformar os objetos em âmbitos (QUINTÁS, 2004, p. 125).

Esta mudança de objetos a âmbito é meu principal objetivo no trabalho de

gestão democrática, em que coloco minha fragilidade, humildade, esperança em um

mundo diferente, em que a participação é o foco central do trabalho que procuro

desenvolver. Não podemos nos esquecer de procurar também a formação

acadêmica para a nossa autoformação.

Tanto no Colégio quanto na Casa de Abrigo procuro desempenhar as

atividades em conjunto, exercitando a participação de todos e fazendo com que os

colaboradores tenham sentimento de responsabilidade pelo êxito das atividades,

enfatizando que juntos construímos o trabalho.

Relembro meus dizeres anteriores, em que relatei minha história de vida, para

me situar e fortalecer na prática de gestor democrático, que busco através de

experiências familiares, religiosas, escolares e agora na casa de abrigo como

coordenador, as contribuições na minha formação, de meus funcionários, crianças e

adolescentes na prática do gestor democrático.

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Continuando a busca da autoformação, o gestor procura cursos de

especialização em gestão financeira, gestão pedagógica e outros, com o objetivo de

aperfeiçoar a competência técnica para administrar com eficiência a instituição que

dirige. A autoformação é importante na construção do sujeito gestor.

Fazenda (2002) oferece uma bela ilustração sobre o grande valor do resgate

da história de vida.

A memória retida, quando ativada, relembra fatos, histórias particulares e a projeção dos fatos – um professor competente, quando submetido a um trabalho com memória, recupera a origem de seu projeto de vida, o que fortalece a busca de sua identidade pessoal e profissional, sua atitude primeira, sua marca registrada (FAZENDA, 2002, p. 25).

Esta atitude deverá ser característica de toda a ação desempenhada pelo

professor, como, também, todo aquele que busca e acredita que sua marca

registrada é sua própria história quando é relembrada e colocada como seu projeto

de vida para a mudança de comportamento.

Despertar para a pesquisa é momento significativo na vida do pesquisador

que aprende que todo seu passado faz parte de uma caminhada de aprendizado. E

o olhar atento a cada momento vai se tornando uma descoberta cheia de atitude de

abertura ao novo que surgirá através do aprofundamento na experiência vivida pelo

gestor.

De acordo com Fazenda (2002, p. 29): "olhar o que não se mostra e alcançar

o que ainda não se consegue. Isso envolve uma nova atitude de aprendiz-

pesquizador, o que aprende com sua própria experiência pesquisando".

Convém, sempre, lembrar que somos eternos aprendizes, que devemos

valorizar cada experiência vivida e lembrarmos, especialmente, que somos capazes

de contribuir com a nossa própria formação.

Estar aberto a aprender é uma atitude pela qual eu, como formador, devo

primar, buscando novas formas de ensinar com prazer, para que isto se torne uma

experiência rica em tolerância e humildade, seja para quem aprende, seja para

quem ensina. Aprender e aprender-me na experiência vivida – exercício de

tolerância e de humildade próprios de uma generosidade que inaugura a educação

do amanhã (FAZENDA, 2002).

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Portanto, o conceito de autoformação surgiu após um momento de busca da

construção, reconstrução e organização da minha história de vida pessoal e

profissional. Diante disso, Monteiro (2002) afirma:

Um aprofundamento na direção da autoformação, com base na história de vida a fim de melhor compreender o desenvolvimento profissional se faz necessário no sentido de contribuir para que nós, professores, percebemos que estamos, continuamente, nos tornando professores, ou seja, autoformando-nos como pessoas profissionais.

Aqui, me deparo com um conceito de autoformação em que o professor é o

exemplo, mas vale ressaltar que toda a construção da autoformação é destinada a

todos que desejam fazer uma reflexão sobre sua prática profissional, trazendo sua

contribuição, relembrado o passado e colocando sua prática no presente para

contribuir com o futuro.

1.1 Interdisciplinaridade Como Prática na Gestão De mocrática

Inscrevi-me, no primeiro semestre de 2007, na disciplina Interdisciplinaridade

e Educação, sobre a qual pensava saber tudo. Fui surpreendido com várias

descobertas valiosas no decorrer dos estudos e a mais importante foi saber de que

somente através da humildade é que se pode chegar ao limite da busca de outros

conhecimentos.

Em relação a este aspecto, Fazenda (2002) afirma:

Humildade é conhecer os próprios limites. Aceitar que sabe algo de modo imperfeito, incompleto, que, a qualquer momento, pode ser questionado, reformulando e mesmo superado. E, nessa atitude, estar sempre à procura de novos elementos para esforçar, esclarecer o que se julga saber (FAZENDA, 2002, p. 64).

Esta atitude permite descobrir que o homem é um ser em constante

aprendizado, imperfeito e não é dono da verdade.

A história de vida passa por uma trilha interdisciplinar que, sabidamente, é o

caminho vivido pelo autor que buscará a construção teórica de suas ações. Portanto,

busco, através de minha experiência gestora, como coordenador e sujeito, delinear

meu perfil democrático.

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Na busca da compreensão de minha trajetória de gestor democrático, destaco

a importância da interdisciplinaridade como uma das características principais da

formação do gestor, pois, conforme aponta Fazenda (2002, p. 15):

A trilha interdisciplinar caminha do ator ou autor de uma história vivida, de uma ação conscientemente exercida a uma elaboração teórica arduamente construída. Tão importante quanto o produto de uma ação exercida é o processo e, mais que o processo, é necessário pesquisar o movimento desenhado pela ação exercida, somente com a pesquisa dos movimentos das ações exercidas poderemos delinear seus contornos e seus perfis.

A pesquisa vai se tornando fonte de descobertas das ações que serão

assumidas como fonte de formação. Ao buscar a interdisciplinaridade, refiz a

caminhada outrora vivenciada, isto é, voltei para o meu passado e resgatei valores

que me fizeram chegar a gestor de uma escola com mais de mil alunos e, hoje, à

coordenação de uma casa de abrigo com vinte crianças e adolescentes.

Esta caminhada não se desenvolveu instantaneamente, mas foi repleta de

alegrias e algumas decepções que, na realidade, são ingredientes para se construir

uma trajetória de sucesso.

A humildade é um ato de força, de quem se priva demonstrar sua superioridade, procurando valorizar o próximo que necessita de valorização ou de brilho, o que não conseguiria se o primeiro fizesse valer sua superioridade. A postura sábia de humildade é fazer-ser humildade, passar por menor, resultando em proveito para outrem, para a sociedade e até para si. (FAZENDA, 2002, p. 63).

Toda a participação no projeto comum deverá ser interligada pelo ideal de

convivência fraterna, em que a preocupação primeira é o outro, e não eu mesmo.

Desta forma, o sujeito vai se formando através da experiência angariada no dia a

dia, dos erros e acertos que fazem parte da ação do gestor. Convém lembrar que

aqui estão todos os envolvidos no trabalho, desde os que fazem parte diretamente

do trabalho – funcionários – como indiretamente – voluntários, familiares,

vendedores etc. – que desenvolvem alguma participação no processo de gestão.

Neste aspecto, afirma Fazenda (2002, p. 12):

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Todo projeto interdisciplinar competente nasce de um lócus bem delimitado; portanto, é fundamental contextualizar-se para poder conhecer. A contextualização exige que se recupere a memória em suas diferentes potencialidades, resgatando, assim, o tempo e o espaço no qual se aprende.

A aprendizagem consciente se dá através do resgate da memória, situando o

espaço e o tempo vivido, colocando no contexto em que se passou toda sua história

de vida.

Reconheço que a prática interdisciplinar se aprende no cotidiano vivido pelo

pesquisador. Como na afirmativa de Fazenda (2002, p. 14):

Muito mais que acreditar que a interdisciplinaridade se aprende praticando ou vivendo, os estudos mostram que uma sólida formação à interdisciplinaridade encontra-se acoplada às dimensões advindas de tal prática em situação real e contextualizada. Conhecer o lugar de onde fala é condição fundamental para quem necessita proceder ou desenvolver uma atitude interdisciplinar na prática cotidiana.

Todas as pessoas trazem de suas famílias uma bagagem muito grande de

informações e vivências culturais arraigadas, próprias da terra natal. A partir daí, são

adquiridas, com a caminhada pessoal, mais informações e conhecimentos que se

transformam em aprendizado.

A humildade é uma atitude de grande sabedoria para quem a pratica na sua

vida pessoal e profissional.

O processo interdisciplinar desempenha papel decisivo para dar corpo ao sonho de fundar uma obra de educação à luz da sabedoria, da coragem e da humildade. Mas o processo de metamorfose pelo qual passamos, e que fatalmente conduzirá a um saber mais livre, mais nosso, mais próprio e mais feliz, é um processo lento, exige uma atitude de espera, não uma espera passiva, mas vigiada. Alterar violentamente o curso dos fatos não é próprio de uma educação que abraça a interdisciplinaridade. Ela exige que provemos aos poucos o gosto da paixão por formar até nos embebedarmos dela, porém o sentido que um trabalho interdisciplinar desperta e para o qual não estamos preparados é o da sabedoria, de aprender a intervir sem destruir o construído (FAZENDA, 2002, p. 18).

Os vínculos significativos devem ser retomados dando a verdadeira

importância do passado para se construir um processo formativo presente, o que se

consegue com a sabedoria de sempre aprender sem destruir o que já foi construído.

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O processo de autoformação e interdisciplinaridade pressupõem um momento

de mudança, de espera comprometida, de uma aprendizagem permanente, de

interações, trocas de experiências, atitudes de humildade e tolerância.

Interdisciplinaridade é uma nova atitude diante da questão do conhecimento, de abertura à compreensão de aspectos ocultos do ato de aprender e dos aparentemente expressos, colocando-os em questão. (FAZENDA, 2002, p. 11).

A atuação do gestor, hoje, não significa apenas delegar tarefas, assinar

documentos, admitir ou demitir funcionários, mas desenvolver um olhar profundo e

observador a tudo o que está ao redor, refletindo o que se está vivendo para

transformar a velha prática em uma nova atitude.

Diante desta reflexão sobre gestão democrática, interdisciplinaridade e

história de vida, descobri que a confiança mútua requer um esforço muito grande

para a concretização da educação comprometida com as políticas públicas e com a

democracia neste país.

Uma atitude, construída com base na confiança mútua, significa a concretização de uma relação dialógica e pressupõe os aspectos: a parceria, a generosidade que leva à humildade, a dúvida, a espera, a sintonia, o resgate da beleza de aprender e viver, a poesia, a espiritualidade, o respeito ao outro, transformando a obrigação de aprender em naturalidade, o medo frente ao novo na alegria de conhecer, a submissão na liberdade, o ser passivo em agente do saber (FAZENDA, 2002, p. 85).

Somos aqueles que detêm o saber e este saber exige o compromisso de

agente de liberdade, que deve deixar de ser mero ouvinte, passivo, para se tornar

ativo na própria transformação e na dos colaboradores.

Assim, os compromissos da formação aludem, necessariamente, a contextos sociais, culturais, pessoais que se imbricam, estabelecendo relações de recíproca influência e determinação, superando-se a ilusão tanto do subjetivismo estéril como da onipotência do social. Formação significa a construção de sínteses complexa e multifacetadas, que articulam permanentemente o individual e o social, o biológico e o cultural (FAZENDA, 2002, p. 136).

A construção do conhecimento dá-se através do movimento de ir e vir,

sabendo que esta mudança só ocorrerá se o interessado estiver aberto a aprender

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com o outro, pois a troca de informações com o parceiro é um processo que dura a

vida inteira e que a cada dia é possível descobrir um novo jeito de ensinar e

aprender.

Com o enfraquecimento da visão cartesiana e disciplinar de mundo, podemos, por intermédio de parcerias, gerar um movimento em busca da compreensão da totalidade da realidade, onde a construção de conhecimento ocorre num contínuo ir e vir, interconectando o individuo, que aprende consigo mesmo, com os seus pares e com o medo à sua volta. Aprender passa a ser o produto de parcerias e trocas, em um processo ininterrupto que dura toda a vida (FAZENDA, 2002, p. 160).

A gestão democrática é construída através da parceria entre os sujeitos,

buscando conhecimento histórico, familiar e profissional para solidificar a

autoformação do sujeito gestor democrático. "A parceria que se estabelece com os

sujeitos entre si e com o conhecimento histórico e socialmente construído é

fundamental na prática interdisciplinar" (FAZENDA, 2002, p. 161).

As práticas não devem ser isoladas, mas contextualizadas e compreendidas.

Levo, pois, em conta o modo como me formei gestor e como posso contribuir com a

formação de outras pessoas, considerando a mudança pessoal construída de forma

reflexiva e gradativa no momento em que percebo as mudanças no meu ambiente

de trabalho.

1.2 O Contexto Passado

Viajando pelo meu passado, percebo que lá começou a ser delineado o

concreto, pelas minhas lembranças adormecidas até o presente momento. Talvez a

explicação do meu interesse pela gestão democrática tenha surgido na minha

formação familiar, religiosa e profissional. O passado, portanto, não poderia ser

esquecido. A pesquisa interdisciplinar parte do velho, analisando-a em todas as suas

potencialidades, conforme Fazenda (2002). Potencialidades estas que serão

descobertas no dia a dia do gestor.

Nasci aos 06 de junho de 1966, às 21h, na cidade de Santarém, Estado do

Pará (figura 1). São poucas as lembranças dos primeiros anos de vida. Recordo-me

que morava na Cidade de Santarém e minha família mudou-se para a cidade de Boa

Vista do Lago, pois, com o falecimento de meu avô paterno, meu pai tornou-se o

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responsável pela fazenda, que tinha plantações de cana-de-açúcar, café, frutas,

além de cabeças de gado.

Figura 1 - Mapa do Estado do Pará (a)

Foram momentos bons: brinquei muito, jogando futebol. Eu era incumbido,

por minha mãe, de buscar água para abastecer o pote, o que era uma verdadeira

festa, pois aproveitava para tomar banho no igarapé. A nossa casa era um sobrado:

na parte de baixo, havia uma sala de visita, um quarto que abrigava uma pequena

mercearia para atender os colonos, uma cozinha com um fogão à lenha e um jirau

para lavar as louças. A mesa das refeições era bastante grande, pois sempre havia

trabalhadores que ficavam para o almoço ou jantar.

No ano de 1972, estava eu com seis anos de idade. Não me recordo o mês,

mas estávamos arrumando nossa mudança em um caminhão e fomos para a

cidade: chegamos a Santarém e nos instalamos em uma casa na Avenida Marechal

Rondon, no bairro de Aparecida.

O motivo que levou a família a seguir de mudança para a cidade de Santarém

foi a situação constrangedora a que foi submetida minha irmã, Reni, pois sua

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professora não permitiu que ela saísse para suas necessidades fisiológicas. Minha

irmã, em sua inocência, não conseguiu se controlar e acabou por se molhar toda, na

sala de aula.

Meu pai, aborrecido com o fato, resolveu levar toda família para a cidade:

nessa época, já éramos sete irmãos, Rosimar, Rosicleide, Renir, Joaquim, Denílson,

Sebastião e Jairzinho. Em Santarém, morávamos próximo à casa de minha avó

paterna, Rosa Alves Feitosa, cuja residência era na Rua Presidente Vargas. Meus

pais nos orientavam a que, todos os dias, tomássemos a bênção de vovó. Era

costume da família.

Esse fato marcou minha vida, pois aprendi através da singeleza do ato, a

pedir a bênção como forma de respeito e valorização da experiência dos familiares

mais velhos e manter os laços familiares. Família esta que, até hoje, nos mantém

unidos pelo respeito, carinho e responsabilidade, exemplo de que nossos pais nos

educaram com simplicidade.

Neste sentido, a afirmação de Mello (1999), mostra que a viagem interior é

uma busca da própria identidade:

A descrição de um momento vivido remete a uma viagem que facilita novas descobertas e uma visão diferente do ato de conhecer: surge a dimensão subjetiva. Esta dimensão é antes de tudo, uma viagem interior, de busca da própria identidade e de explicação metafórica em forma própria de escrita e expressão dos atos de conhecimento (MELLO, 1999, p. 51).

Através da busca do autoconhecimento, percorro o mundo interior, em que

procuro descobrir como se deu minha formação como pessoa. Isto vai se

constituindo experiência de vida.

Iniciei minha alfabetização em 1973, na escola de Dona Helena, que morava

próximo de casa. Éramos várias crianças que estudávamos na mesa da cozinha; às

vezes, em dia de prova, ela solicitava a seu filho que nos vigiasse enquanto

preparava o almoço da família, característica marcante da simplicidade do ambiente

de aprendizagem.

Foram momentos de grande alegria e descoberta das letras e da escrita.

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Tinha muita vontade de aprender a ler, pois via minhas irmãs mais velhas lendo

livros de histórias e me sentia mal com a falta de conhecimento.

Nesse período em que iniciei a alfabetização, ainda não existia a integração

da cultura no exercício de educação participativa. Portanto, no passado tive uma

alfabetização sem reflexão.

Sobre o fato, porém, Fazenda (2002, p. 174) declara:

A alfabetização, hoje, supõe: o respeito aos padrões culturais de vida e de aprendizagem da população envolvida, a possibilidade de essa população expressar a sua cultura; o acesso ao conhecimento de outros padrões culturais, formas de vida etc., que permita uma leitura crítica de sua própria realidade; o exercício de uma educação participativa em que a população possa interagir na formulação dos projetos a ela destinados.

Educação participativa envolve a interação entre todos, que se fará através da

própria realidade.

No ano de 1974, minha mãe transferiu-me para uma escola mais próxima de

casa, cuja professora era uma moça evangélica que mantinha uma escolinha no

quintal de sua casa. Aprendi a ler e a escrever, com bastante dificuldade, mas

consegui.

Em 1977 – na 3ª. série – passei para Escola Aparecida, hoje uma escola do

Estado do Pará. Lá, conheci a professora Zilma, minha primeira paixão de criança.

Ainda hoje, lembro-me do anel que usava em sua mão esquerda e, às vezes, com

seus dedos grandes, jogava giz nos alunos que conversavam.

Havia uma lição na cartilha que se constituía objeto de leitura oral todas as

semanas e, quando não realizada corretamente, era repetida na semana seguinte.

Em meio à leitura, eu sempre tropeçava na palavra “borboleta” e não havia meio de

pronunciar. Eu lia muito bem, mas, quando chegava nessa palavra, emperrava e o

máximo que eu conseguia articular era: “barboleta”. E lá vinha a professora:

“Denilson, na próxima semana você voltará a esta lição”.

Não me lembro, exatamente, quantas vezes retomei a leitura desse texto,

mas, certo dia, passei de lição... Ou a professora resolveu me passar.

Freire (1987, p. 60) revela que:

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Se o educador é o que sabe, se os educandos são os que nada sabem, cabe àquele dar, entregar, levar, transmitir o seu saber aos segundos. Saber que deixa de ser de 'experiência feito' para ser de experiência narrada ou transmitida.

Hoje, percebo o quanto falhamos com o método de ensinar, achando que

somos detentores do saber e que, como educadores, somos dotados de razão e da

certeza de que somos corretos e inatingíveis, sem levar em conta o que o nosso

aluno traz de conhecimento. A aprendizagem era transmitida através da repetição,

em que o aluno era apenas um receptor passivo sem possibilidade de manifestar

sua experiência em sala de aula.

Gusdorf (1970, p. 224) aponta a falta de relação de afetividade entre

professor e aluno, ao observar:

Todo conhecimento do outro implica uma intimidade, consciente ou não, e mobiliza as capacidades emotivas do ser humano. A afeição, a amizade amorosa, têm um valor pedagógico imenso, à margem dos caminhos e meios das técnicas usuais. O trabalho, o êxito ou fracasso escolar, inscrevem-se muitas vezes nesta perspectiva apaixonada em que o aluno se esforça por todos os meios de que dispõe para atrair a atenção do mestre, por forçar a sua estima, por conquistar a sua afeição.

Na relação aluno-professor, os discentes eram considerados apenas um

depósito incumbido de receber as informações passadas sem reflexão. Fundado na

experiência de escola, percebo que não havia interação, cumplicidade e partilha: era

mero número, limitado a assimilar as informações que o mestre repassava sem o

devido esclarecimento do porquê daquele conteúdo.

Na 4ª série, a professora Helena era uma senhora muito séria e rígida. A

tabuada era o tema mais difícil para mim. Sempre tive dificuldade em operar

números. Nas aulas de matemática a tabuada sempre era cobrada, e um

determinado dia da semana era reservado para a cobrança do exercício. Num grupo

de aproximadamente seis crianças, ficávamos em fila na frente da turma e dessa

forma a professora perguntava a operação; aquele que errava, levava um "bolo" de

palmatória do colega que, na sequência, acertasse o resultado.

Diante da dificuldade, percebi que uma forma de saber os resultados era

contar nos dedos, mas quando a conta era muito grande não havia tempo suficiente

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para resolvê-la. Era motivo de terror quando errávamos e de alegria quando

acertávamos. Levei muito “bolos” de palmatória e, até hoje, sou péssimo em

tabuada.

Vivenciei a experiência de receber toda a informação escolar sem a

necessária parada para a reflexão sobre o porquê de estudar aquele determinado

conteúdo. Para o professor, entretanto, ficava claro, pois, naquele momento, seu

papel era repassar o conhecimento que ele já havia recebido sobre o assunto.

Freire (1987, p. 60) oferece uma bela consideração sobre a educação

bancária em que o professor era o que detinha o saber e o aluno nada sabia:

Na medida que esta visão 'bancária' anula o poder do criador dos educandos ou o minimiza, estimulando sua ingenuidade e não sua criticidade, satisfaz aos interesses dos opressores: para estes, o fundamental não é o desnudamento do mundo, a sua transformação.

As práticas vivenciadas nesse período escolar tinham os aspectos

enfatizados pelo autor, que é a experiência do professor como o centro de toda a

aprendizagem, o aluno era considerado apenas um ser que estava ali para receber

os conhecimentos sem questionamentos.

Outras memórias não-escolares, mas familiares, ajudaram-me na questão da

autonomia, tornando-me apto a resolver as pequenas coisas do dia a dia.

Assim como a escola tem o papel da educação formal, a família deve se

constituir no alicerce para que esta formação seja pautada numa aprendizagem

única, que é a formação humana, sem apartar-se do vínculo afetivo.

Em determinada época, meu pai trabalhava como frentista num posto de

gasolina denominado Mocorongo, no bairro da Prainha, em Santarém. Seu turno de

trabalho durava o dia inteiro, o que o permitia folgar o dia seguinte – trabalhava dia

sim, dia não. Mamãe preparava seu almoço, para que eu e minha irmã, Reni, o

levássemos a papai. Era distante de casa e nós íamos a pé.

Ficava aborrecido com essas tarefas, pois tudo me era ordenado fazer, como

as compras no centro da cidade, comprar pão, comprar carne, peixe, acompanhar

minha avó para retirar ficha no INSS para se submeter à consulta médica, portanto,

a mim cabia resolver os pequenos problemas do dia a dia de nossa família.

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Habituado, pois, a essas tarefas desempenhadas quando garoto, desenvolvi

minha personalidade com autonomia, o que me possibilita resolver problemas sem

precisar que ninguém o faça por mim. No grupo de pesquisa em que tive que

retomar minha história de vida, descobri que todas as tarefas desempenhadas

quando criança, em função do quê, muitas vezes, ficava chateado com meus pais,

fizeram de mim um sujeito com segurança e determinação para resolver toda sorte

de problemas.

Josso (2004) contribui para melhor entendimento, quando afirma:

O processo de caminhar para si apresenta-se, assim, como um projeto a ser construído no decorrer de uma vida, cuja atualização consciente passa, em primeiro lugar, pelo projeto de conhecimento daquilo que somos, pensamos, fazemos, valorizamos e desejamos na nossa relação conosco, com outros e com o ambiente humano e natural (JOSSO, 2004, p. 59).

Nunca deixamos de aprender. Estamos em constante aprendizado e sempre

em busca de novos conhecimentos. O primeiro passo é o conhecimento de nós

mesmos, depois, saber o que pensamos, fazemos e desejamos de nós, do outro e

da natureza.

Uma das coisas que mais me alegrou foi aprender a ler e a escrever. A

matemática eu ia levando, mas a leitura era um prazer que me fazia viajar pelo

mundo da imaginação e o primeiro livro que li foi Peter Pan. O conhecimento ia se

fortalecendo através das relações interpessoais que eu ia desenvolvendo através

dos ambientes que vivi e vivo ainda hoje.

Nessa escola, o estudo seguia apenas até a 4ª. série. Depois, fui transferido

para a Escola Pedro Álvares Cabral, um tanto longe de minha casa: caminhava

cerca de 45 minutos. Um amigo chamado Paulo, que morava próximo, passava em

casa todos os dias para irmos juntos à escola. Às vezes escondia-me, pois ele

chegava muito cedo. As aulas iniciavam às 14h e, às vezes, 12h30min ele chegava

a minha casa. Este fato marcou e ainda marca minha vida em relação ao horário

desperdiçado em momentos que não são formativos, pois saindo mais cedo de casa

perdia alguns momentos na rua, com brincadeiras que poderiam ter me levado à

delinquência.

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Devido à distância de casa ao colégio, reclamava a meu pai, para que

comprasse uma bicicleta, porém queria uma nova. Quando finalmente comprou, era

uma bicicleta já usada, que mandou reformar. Não gostei, mas tive que usá-la para

que ele não se aborrecesse comigo. Descobri, assim, a vaidade sobressaindo em

minha personalidade, pois não queria saber se naquele momento meu pai tinha

condições financeiras. Queria apenas mostrar aos colegas a tal bicicleta nova.

Além de trabalhar no posto de gasolina, meu pai também vendia cana para

fazer garapa nas lanchonetes da cidade. A entrega era às quartas-feiras,

justamente o dia da semana em que era transmitido o seriado intitulado As Panteras,

na TV Globo. Ficava sentido com meu pai, pois perdia o filme que adorava. Mas

também tinha suas alegrias. Além de meu pai, ia meu irmão Joaquim, às vezes

meus amigos, e sempre éramos brindados com o lanche patrocinado por papai:

garapa com pastel.

Fui um aluno normal, que não levava muito a sério os estudos. Minhas notas

variavam de cinco a sete, pois não havia muita preocupação em estudar para

melhorar as notas. Meu amigo Paulo era um dos melhores alunos da sala, só tirava

boas notas – nove e dez. Às vezes tinha uma ponta de inveja dele, mas também não

fazia por onde melhorar. Vez por outra colava dos colegas, principalmente nas

provas de matemática e ciências. Tinha certa facilidade em aprender, mas a

preguiça e falta de motivação não faziam de mim um aluno exemplar.

Tinha noção do meu potencial de aprendizagem, mas devido à falta de

motivação, que partisse da família ou da escola, não havia desafios que me

despertassem a vontade de mostrar o que realmente sabia, especialmente pelo fato

de que, em Santarém, não havia curso superior. Na cidade havia apenas escolas até

o nível de Ensino Médio. Para cursar a universidade, o interessado era obrigado a

se deslocar para Manaus ou Belém.

Eu não gostava das aulas de Educação Física, mas sempre ao sair da escola,

íamos ao Rio Tapajós para brincar e nadar. Tinha receio de que minha irmã

Rosimar, responsável pelos irmãos menores, descobrisse que, após a aula, íamos

ao rio tomar banho, sem autorização. Nesse período, minha mãe foi morar no

Palhal do Una com meu pai, pois ele tinha comprado um terreno e um carro – um

"Pau-de-Arara" – utilizado para transportar os colonos para a cidade.

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Lembro-me que, diversas noites, minha mãe rezava conosco. Ameaçava com

seu chinelo para que não fizéssemos algazarra durante a oração. Rezávamos o

terço ou somente o Pai Nosso ou a Ave Maria. Eu gostava e ficava na expectativa de

que um dos meus irmãos não conseguisse permanecer de joelhos ou risse para que

mamãe lhe desse uma chinelada. A coisa caminhava bem, até que eu mesmo não

aguentava e acabava rindo.

Volto a lembrar sobre a religiosidade que o povo do Norte traz em sua cultura,

caracterizadas pelas orações, a reza do terço e as procissões em homenagem aos

Santos. Esses momentos ficaram gravados em minha memória. Meus pais, oriundos

do Nordeste... Minha mãe, um modelo de fé. A religiosidade era e continua sendo

marcante em toda minha trajetória pessoal.

Desde pequeno eu ia às festas no interior. Minha Tia Lourdinha era solteira, à

época, e minha avó materna não permitia que saísse desacompanhada. Minha Tia

vivia na cidade e pedia para que minha mãe me deixasse acompanhá-la. Durante o

dia de sábado brincava com meus primos e à noite me arrumava para a festa, mas

não deixavam crianças entrar para dançar. Era preciso esperar até altas horas para

que o salão fosse liberado e, assim, eu pudesse entrar e dançar.

Tia Lourdinha era professora da 1ª. série. Quando eu ficava em sua casa, ela

me levava para sua classe. Eu gostava muito, pois me era solicitado ajudar a corrigir

e ensinar a leitura a seus alunos, nas tarefas de classe. Nesse momento comecei a

sentir vontade de ser professor.

Os dias que eu passei com meus avós maternos, foram determinantes, pois

aprendi a valorizar os laços familiares e a participar das atividades religiosas que

aconteciam na comunidade. Gostava muito de participar das celebrações e sempre

era convidado a ler. Sentia-me realizado e importante, pois sabia ler, enquanto que

as crianças e demais adolescentes da comunidade estavam atrasados nos estudos,

tendo concluído apenas a 4ª série do antigo primário, hoje, o Ensino Fundamental.

O resgate de minhas experiências de adolescente permitiram-me a

descoberta da importância da cultura local, especialmente a familiar. "Educar e

ensinar é, sobretudo, permitir um contato com a cultura, na acepção mais geral do

termo; trata-se de um processo em que a própria experiência cultural do professor é

dominante (SÁCRISTAN, 1995, p. 67).

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Descobri que podia ajudar crianças em seus deveres escolares, o que me fez

perceber o quanto podia ser útil na tarefa de educar.

No terreno que meu pai comprou no Palhal do Una, havia uma usina de

beneficiar arroz, uma taberna e um caminhão "Pau-de-Arara", onde ele carregava

passageiros e eu o ajudava com as tarefas nos finais de semana. A nossa casa era

muito movimentada: passavam pessoas que iam para comprar mercadorias para

suas casas e às vezes iam vender arroz. Tinha também, perto de casa, um campo

de futebol. Gostava de jogar bola com meus vizinhos e depois da bola tomar banho

no igarapé.

Família é um espaço educativo em que se aprendem conceitos que jamais

são esquecidos, sempre são lembrados e colocados em prática nas atividades

educativas.

A história de vida é outra maneira de considerar a educação. Já não se trata de aproximar a educação da vida, como nas perspectivas da educação nova ou da pedagogia activa, mas de considerar a vida como espaço da educação. A história de vida passa pela família (DOMINICÉ, 1988, p.140).

A educação formal não poderá ser trabalhada sem a família, pois é no seio

familiar que se aprendem os conceitos básicos daquilo que servirá de suporte para o

desenvolvimento das disciplinas.

Aos domingos, gostava de ir aos cultos, especialmente porque fazia as

leituras bíblicas e explicava o evangelho do dia. Descobri que gostava muito de

participar das atividades religiosas.

Não gostava de brigar, por conta disso, meus irmãos me batiam e eu não

revidava, apenas chorava. Decidi partir também para a briga, então ninguém mais

podia olhar de cara feia que eu agredia. Percebi nesse momento que não queria

mais ser considerado um menino bonzinho. Queria ser respeitado.

Certo dia, minha mãe foi à cidade e fiquei com meu irmão, Joaquim, na

colônia. De madrugada, quando meu pai nos acordou para irmos à cidade, não

havia água no pote. Obviamente, nos mandou buscar água no igarapé. Fiquei com

medo, mas tínhamos que ir, senão, apanhávamos.

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Buscar água no igarapé naquele horário provocou muito medo, pela escuridão

e pelo risco de apanhar. Foi uma experiência traumática, mas de cunho educativo na

ótica de meu pai que, por ignorância, só conhecia aquela forma de orientar os filhos.

Meu primo, João Maria casou-se com Júlia e foram morar próximo de nossa

casa. Quando ele viajava, eu dormia em sua casa para fazer companhia a Júlia.

Nessa época, completei quinze anos e minha prima preparou meu primeiro bolo de

aniversário. Senti-me feliz, pois, até então, não me sentia amado. Às vezes quando

alguém brigava comigo, tinha vontade de fugir e ir morar com outras pessoas, por

achar que ninguém gostava de mim. Na fase de adolescência, é comum acreditar

que ninguém nos considera verdadeiramente e queremos fugir por qualquer motivo

e deixar de pertencer à família.

Em 1982, estava eu na 8ª. série, resolvi fazer o magistério. Meu pai não

gostou da ideia, entretanto, apresentei minhas argumentações. Se todas as pessoas

pensassem como ele, quem seriam, hoje, os professores dos nossos filhos? Mesmo

com a resistência de meu pai, resolvi fazer o curso, estudando pela manhã e

trabalhando no período da tarde num supermercado. Nesse momento de minha

vida, tive de ser firme na minha escolha, ao optar pela carreira docente, pois sabia

que não era uma profissão valorizada como deveria ser.

Rosito (2007, p. 292) afirma:

As pessoas buscaram entender o itinerário de formação, localizando as atividades, acontecimentos, pessoas significativas, as escolhas, os desejos, interpretar o que foi significativo e formador na sua vida. Foram instigadas a pensar nas interpretações e escolhas que fizeram, questionar os pressupostos construídos para o conhecimento de si e do mundo.

A construção do conhecimento é feita de acordo com a rotina diária, ocasião

em que são vivenciados todos os acontecimentos, desde os mais importantes de

nossas vidas aos insignificantes, mas ficam gravados no subconsciente e emergem

em momentos inesperados para a nossa formação.

Eu saía da Escola e rumava para o trabalho. O curso ajudou-me na decisão

de partir para o magistério. Fiz estágio na Escola Barão do Rio Branco, de 1ª. a 4ª.

série. Foi gratificante a experiência, pois descobri o quanto era bom passar um

pouco de conhecimento a outras pessoas.

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No final de 1984, conheci Airla, uma amiga de minha Irmã, Reni, formada em

Letras. Ela me explicou sobre o curso e achei interessante. E, assim, decidi fazer o

curso. Entretanto, em Santarém não havia faculdade. Quem pretendesse iniciar um

curso superior deveria rumar para Belém ou Manaus.

A socialização de tudo que estamos aprendendo e ensinando nos remete ao

papel de facilitador do conhecimento adquirido no decorrer de toda a nossa vida:

A formação assemelha-se a um processo de socialização, no decurso do qual os contextos familiares, escolares e profissionais constituem lugares de regulação de processos específicos que se enredam uns nos outros, dando uma forma original a cada história de vida (DOMINICÉ, 1988, p. 60).

Esta forma torna-se original quando descobrimos o nosso potencial,

valorizando tudo o que aprendemos.

Ao terminar o Magistério, não consegui emprego na cidade, como professor.

Decidi, então, fazer uma experiência em outra cidade. Tinha um sonho de conhecer

e morar em Belo Horizonte. Até hoje não sei o motivo, mas, de qualquer modo,

passei a economizar o salário do supermercado. Com o dinheiro da demissão,

imaginei fazer a viagem e, depois, conseguiria um emprego na cidade grande.

Todavia, no ano de 1985, minha Irmã, Rosicleide, casou-se com um jovem da cidade

de Manaus e quase toda a minha família foi ao casamento. No retorno, minha mãe

trouxe a notícia de que Rosicleide teria me convidado para morar com ela e o

marido.

Não sei como minha mãe descobriu minha intenção de sair de Santarém.

Pensei bastante e decidi fazer esta experiência, pois estaria mais perto de casa. Em

Belo Horizonte, além de não conhecer ninguém, começaria do nada, enquanto que

em Manaus teria o respaldo de minha Irmã e minha família estaria mais perto.

Minha Irmã morava perto de uma igreja católica chamada Perpétuo Socorro.

Várias vezes senti vontade de fazer parte da comunidade. Um dia conversei sobre o

assunto com uma senhora, conhecida da família de meu cunhado, que me levou a

uma reunião de jovens e, assim, iniciei minha participação comunitária.

Em Manaus, deixei de lado a vocação para o magistério, fiz cursinho e prestei

vestibular para Contabilidade. Não passei e decidi arranjar um emprego, pois

minhas economias estavam por um fio. Uma amiga da minha irmã marcou uma

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entrevista com o gerente do Banco Francês e Brasileiro, o que resultou no minha

admissão como "Office-boy".

Comecei a trabalhar e gostei do ambiente. Aprendi muitas coisas, pois

quando estava sem serviço, colocava-me à disposição de outros setores. Diante

disso, no terceiro mês de trabalho fui convidado para a função de auxiliar no setor de

cobrança. Aceitei e procurei estar sempre disponível e disposto a ajudar meus

colegas de trabalho.

Com o salário razoável de bancário, esqueci a carreira do Magistério.

Trabalhei aproximadamente três anos. Nesse período, os bancos começaram a

enxugar a folha de pagamento e passaram a demitir vários funcionários. Permaneci

no meu setor, com minha chefe. Em 1987, minha Irmã deu à luz a primeira filha,

Zeina, o que trouxe minha mãe a Manaus, oportunidade em que solicitou o meu

retorno a Santarém, por sentir a minha falta. O pedido ficou em minha cabeça,

principalmente por ter descoberto minha falta de vocação para a vida de bancário.

Continuei trabalhando no banco e participando da Pastoral da Juventude na

Igreja. O trabalho comunitário deixava-me realizado, feliz por estar ajudando na

catequese infantil.

Em 1989, entretanto, pedi demissão do Banco Francês e Brasileiro e retornei

a Santarém. Foi um momento triste por deixar Manaus, mas que superei em

Santarém, pois a maioria dos meus familiares estava lá.

Em Santarém, meu cunhado era proprietário de uma olaria, em que os

funcionários trabalhavam no sistema de produção. Fui convidado para gerenciá-la. A

olaria estava situada na periferia da cidade, portanto, os funcionários eram jovens,

que, em grande parte, havia deixado os estudos e não queria retornar ao banco

escolar. Era comum se meterem em brigas de bairro, envolvendo-se com “gangues”.

Fazia meu trabalho com responsabilidade. Era um emprego diferente do

banco, pois o público com quem me relacionava era bastante diferente, constituído

de pessoas que tinham uma vida difícil com suas famílias e se metiam em confusão

com a polícia, em razão de furtos e brigas.

Retomei o trabalho na igreja. O Padre Luiz Pinto convidou-me para coordenar

o grupo de jovens da Igreja Aparecida. O trabalho de coordenar a equipe foi uma

experiência muito rica, pois descobri que o trabalho realizado em parceria facilita o

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andamento das atividades. Tanto no trabalho de gerenciamento da olaria quanto na

coordenação do grupo de jovens tive despertado o sentimento de coletividade, em

que percebi a importância do respeito e a valorização do trabalho de cada integrante

do grupo.

Em 1990, a Universidade Luterana do Brasil (ULBRA) instalou-se em

Santarém e organizou seu primeiro vestibular. Decidi me inscrever para o curso de

Letras. Fiquei feliz com a aprovação e com a possibilidade de frequentar o curso

desejado de longa data.

No primeiro semestre de 1991, iniciei minhas aulas. Que alegria em poder

retomar os estudos e principalmente em um curso com o qual eu sonhava desde a

época do Ensino Médio. Fiz amizade com pessoas maduras e simpáticas, enfim,

uma turma diversificada e responsável em relação aos estudos.

Estava a cada dia mais feliz com o curso, principalmente com a Profª.

América, de Português, que, coincidentemente, ministrara essa matéria no meu

primeiro ano do curso de Magistério. Ela me incentivou a ingressar na área da

educação. Ficava encantado com suas aulas, tornando-me confiante em optar pela

carreira de professor.

Relembrar todos estes momentos faz-me perceber que há diferentes

maneiras de compreender o percurso da autoformação, buscando momentos em

que nos formamos e formamos.

Nas palavras de Rosito (2007, p. 289):

Resgatar as histórias dos sujeitos significa compreender que há diferentes percursos de aprendizagem e ensino, vivenciar a (re)construção do conceito de gestão a partir da experiência de cada um, buscando nas memórias os momentos formativos que não são visíveis, tampouco conscientes, mas se manifestam na atitude e decisões tomadas no cotidiano.

O que sobressai é percebido nas atitudes de construção das mudanças

formativas.

As decisões tomadas no cotidiano muitas vezes impressionam pelas atitudes

coerentes e formativas, desenvolvidas no âmbito profissional, não-visíveis, que

começam a aparecer sempre que precisamos tomar atitudes coletivas.

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Ficava um pouco decepcionado pelo fato de estar trabalhando numa área que

não guardava relação com o que estudava, mas, ainda assim, continuei.

No segundo semestre, houve mais duas turmas de graduação, uma de Letras

e outra de Pedagogia. Na turma de Pedagogia, reencontrei Alberto Bentes, que

estudara comigo no Magistério, embora houvesse abandonado o curso no segundo

ano. Ele viera morar em Campinas, pois havia ingressado numa Congregação

Religiosa de nome Irmãos de Santa Cruz (CSC). Fiquei interessado e comecei a

indagar sobre a irmandade. No dia seguinte, ele me levou alguns panfletos da

fundação contendo explicações mais precisas sobre o trabalho realizado pelos

Irmãos de Santa Cruz.

Li, atentamente, sentindo-me atraído pelas palavras e pelo trabalho dessa

congregação, sobretudo quanto à abordagem de que os irmãos eram “educadores

na fé”, o que me chamou a atenção e me instigou a descobrir o que tinha por trás

daquela frase.

No "folder" havia uma frase chamativa: “Vem e segue-me. Eis o Senhor Jesus

a nos chamar". Este apelo tocou-me, estimulando-me a doar minha vida ao trabalho

em prol dos necessitados:

Para muitos dentre nós na Congregação de Santa Cruz a missão se expressa na educação da juventude nas escolas, colégios e universidades. Para outros a missão como educadores realiza-se em paróquias e ministérios. Onde quer que trabalhemos, ajudamos os outros não só a reconhecerem e desenvolverem seus talentos, mas também a descobrirem aspirações mais profundas dos seus corações. Também nos damos conta de que temos muito a aprender daqueles a quem fomos chamados a ensinar, qualquer que seja a nossa obra missionária (CONGREGAÇÃO, 1988a. p. 22).

Meu amigo, Alberto, percebeu meu interesse e convidou-me para iniciar um

acompanhamento vocacional externo, um encontro por mês realizado no Colégio

Dom Amando, mantido pela Congregação de Santa Cruz. Os encontros tiveram

início em agosto de 1991, realizados em dias de semana, o que me levava a

inventar mentiras ao patrão e familiares para sair mais cedo, de sorte que ninguém

percebesse que pretendia ser religioso.

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No colégio, fiquei feliz em saber que podia tornar-me um religioso e atuar na

área de educação, que era meu sonho. Os meses se passavam e continuei firme

nos encontros, apresentando meu pedido para tornar-me postulante.

Conforme as Constituições de Santa Cruz sobre formação e postulantado:

Essa etapa constitui-se de um ano de experiência de vida comunitária com religiosos e outros candidatos, que permite enxergar com mais realismo a perspectiva de vida religiosa na Congregação de Santa Cruz. Os aspectos fundamentais dessa experiência são: vida comunitária em situações de trabalho, lazer, oração e estudos (CONGREGAÇÃO, 1988b. p. 54).

Minha família e amigos ficaram sabendo da minha intenção de ser religioso

de Santa Cruz, porém ninguém acreditava, uma vez que sempre gostei de festas e

badalações. Continuei, pois, firme em minha decisão. Em dezembro, viajei em férias

a Manaus para me despedir da família e dos amigos que conquistei quando lá

residi.

Em final de dezembro, ainda em Manaus, o Irmão Ronaldo Hein ligou-me

para falar da decisão da Congregação de que o postulantado seria em São Paulo.

Voltei para Santarém e comecei minha preparação para a viagem, que seria

no final de janeiro de 1992. Foram momentos de alegria e tristeza, pois percebi,

nesse momento, o quanto havia conquistado minha família e meus amigos. A

maioria pensava que era apenas "fogo de palha" e logo desistiria. Viajamos de barco

até Belém, e depois de ônibus para São Paulo.

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Figura 2 – Divisão geográfica do Brasil

Vi-me deixando família, cidade, amigos e emprego para iniciar uma nova

etapa em minha vida, que é a vida religiosa. Tomei a consciência de que estava

fazendo uma viagem, em que buscaria, através da Igreja Católica, uma nova forma

de vida, a minha vocação cristã. Posso afirmar que, através das experiências

vividas, tomei a consciência de que me tornei sujeito.

Indentifico-me com a descrição de Josso (2004), ao tomar consciência de

como nos formamos:

O que está em jogo neste conhecimento de si mesmo não é apenas compreender como nos formamos por meio de um conjunto de experiências, ao longo da nossa vida, mas sim tomar consciência de que este reconhecimento de si mesmo como sujeito, mais ou menos ativo ou passivo segundo as circunstâncias, permite à pessoa, daí em diante, encarar o seu itinerário de vida, os seus investimentos e os seus objetivos na base de uma auto-orientação possível, que articule de uma forma mais consciente as suas heranças, as suas experiências formadoras, os seus grupos de convívio, as suas valorizações, os seus desejos e o seu imaginário nas oportunidades socioculturais que soube aproveitar, criar e explorar, para que surja um ser que aprenda a identificar e a combinar constrangimentos e margens de liberdade (JOSSO, 2004, p. 58).

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O conhecimento adquirido no itinerário vivido pelo sujeito, através da

experiência e o reconhecimento de si mesmo como sujeito ativo, fará com que ele

seja convidado, a partir daí, a autoformar-se e levar o grupo no qual convive a esta

autoformação, valorizando o aprendizado.

Em São Paulo, morei no bairro do Jaguaré, na Zona Oeste, e frequentei um

ano do curso de Filosofia e Teologia na Faculdade da Assunção, na Praça da Sé.

No início, sentia-me perdido com as matérias, mas depois comecei a gostar dos

colegas e das disciplinas.

De algum modo, o ato de escrever obrigou-me a buscar mais leituras e

exercitar a escuta. Foi um ano de mudanças em minha vida, em que descobri que

tinha tempo de me preparar para estudar: antes trabalhava e estudava. Agora, só

tinha a obrigação de estudar, rezar, além de alguns afazeres domésticos.

No final de 1992, voltei a Santarém para fazer o noviciado. Cheguei em

dezembro, período dos festejos em homenagem a Nossa Senhora da Conceição,

padroeira da cidade, e confraternizações de final de ano. Fomos morar na Rua do

Norte. O noviciado é um período de reflexão e estudo sobre a vida religiosa. Nessa

terceira etapa da formação não se pode estudar outros assuntos que não estejam

voltados à área de formação.

Nessa fase, o noviço passará um ano completo e intensivo para comprovar sua capacidade de viver segundo as constituições da Congregação de Santa Cruz. Os elementos essenciais de sua formação serão: Espiritualidade, Teologia da Vida Religiosa, Vida Comunitária, Missão Apostólica (CONGREGAÇÃO, 1988b, p. 55).

É um ano de oração e leituras espirituais, em que o noviço se prepara para

receber seus primeiros votos. Passei momentos de dúvida, pois minha família e

meus amigos são de Santarém e me cobravam mais a presença em momentos

familiares e sociais. Entretanto, na qualidade de noviço, já havia atividades

programadas. Enfim, cheguei ao final do ano e me consagrei a Deus pelos votos da

obediência, da pobreza e da castidade.

Em janeiro, retornei a São Paulo para continuar meus estudos e a formação

de juniorista, cuja etapa também segue alguns princípios.

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A formação do pós-noviciado permitirá aos jovens professos, aprofundarem e amadurecerem sua experiência de vida para chegarem a sua autoidentificação como religioso de Santa Cruz. Principais aspectos: Experiência de opção preferencial e evangélica pelos pobres na América Latina (CONGREGAÇÃO, 1988b, p. 58).

Em São Paulo, não consegui a transferência para a continuidade do meu

curso de Letras, iniciado na ULBRA. Fiquei decepcionado. Retornei ao curso de

Filosofia e Teologia na Faculdade da Assunção, mas não estava satisfeito.

Conversei com um amigo que me aconselhou a procurar a Universidade Guarulhos

(UNG), para fazer a transferência do curso.

Iniciei as aulas em fevereiro, feliz com o retorno ao curso de Letras. A turma

era pequena, mas acolhedora.

A cada dia descobria que estava na área certa. Muitas leituras, escrita. Não

lembro bem quando, mas tivemos um concurso de poesias e contos, fiquei em

segundo lugar com um conto e percebi o quanto gostava de escrever. Após esse

período, tivemos de encerrar uma disciplina com um livro de poesia e contos. Este

foi meu primeiro livro.

Na vida religiosa ia razoavelmente bem. O nosso formador era muito

autoritário, passei a discutir com ele e, nessas discussões, percebia que estava me

tornando uma pessoa demasiadamente crítica, não recebia tudo sem antes

questionar e, mais ainda, quando percebia estar com a razão. Começou então certa

querela entre aqueles que não concordavam com o jeito autoritário e outros que o

defendiam.

Foram momentos de tensão. Gostava muito da vida religiosa, mas não queria

me tornar um religioso apático e parado no tempo. Acreditava que para ser um bom

religioso não precisava apenas rezar, mas fazer o bem e acreditar em nossos ideais

de justiça e solidariedade, pois a própria definição de oração é: orar e ação.

Portanto, comecei a ser mais crítico.

Estávamos, nesse período, discutindo acerca da junção dos irmãos com os

padres. Há, pois, os irmãos de Santa Cruz e os Padres de Santa Cruz. Não

concordava, como ainda não concordo, com a decisão. Minha defesa estava na

percepção de que os padres estavam só fazendo as reuniões devido ao pedido dos

superiores que eram excessivamente autoritários e queriam manipular as nossas

opiniões.

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A pessoa, por sua própria natureza, é dotada de direitos naturais, isto é, que não dependem da forma cultural que a sociedade assume, estando entre este o direito à existência, o direito à liberdade pessoal e o direito de procurar a perfeição da vida moral (SILVA, 2006, p. 84).

Todos têm o direito natural à vida. Hoje existem vários direitos adquiridos e

conquistados por diversos grupos do mundo, e o direito à vida e à liberdade pessoal

levará à justiça e à ética.

Percebi, através dessa mudança de comportamento que antes era submisso

e agora era um sujeito crítico, com personalidade e vontade própria.

Nas reuniões, esse assunto era discutido e comecei a escrever sobre o que

percebia na casa de formação, em que éramos tratados de modo diferente pelo

formador que nos considerava inferiores aos seus seminaristas.

Em 1996, foram canceladas as reuniões dos dois distritos para a junção em

comum. O formador ficou muito aborrecido, pois sabia que eu estava à frente dessa

decisão da paralisação. Em março, ele, juntamente com o responsável pela

formação no Brasil, decidiu que eu deveria sair da casa de formação. A justificativa

fundava-se na idéia de que eu era um elemento que dificultava a caminhada do

grupo de junioristas e o futuro de Santa Cruz.

Senti-me muito mal, quis sair, mas meu superior pediu que pensasse bem e

relevasse minha decisão, pois a Congregação tinha muita esperança em minha

vocação.

A vida religiosa é uma instituição bastante antiga e tem como principal

objetivo manter-se nos padrões de hierarquia da igreja.

Como afirma Silva (2006, p. 74):

[...] nas organizações marcadamente burocratizadas, o sujeito é ocultado, tudo faz crer que a instituição move-se por si própria; os indivíduos têm uma relação com a instituição de tal forma que parece mais ser esta quem os acolhe e dirige do que aqueles que lhe dão vida.

Existem, ainda hoje, diversas instituições que não deixam o sujeito ter vida

própria. Querem transformar pessoas em objetos manipulados. Com isto, o sujeito é

considerado número sem valor, desconsiderando que se trata de um ser pensante,

com vida.

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Retornei a Santarém. No início, senti-me péssimo, pois estava concluindo

meu curso de Letras e já tinha formado um grupo de amigos em São Paulo. Por

outro lado, em Santarém, estavam todos os meus familiares.

Voltei a estudar na Ulbra, embora estivesse obrigado a muitas adaptações,

devido à diferença de grade curricular. Gostei disso, pois todos os dias tinha aula em

sala diferente e comecei a fazer muitos amigos: onde passava nos corredores era

cumprimentado, por alunos do curso de Letras e até do curso de Direito.

Substituí uma professora que estava de licença-saúde numa escola do

Estado e voltei a sonhar com a carreira na área da educação.

Em 1998, iniciei minhas atividades na área educacional do Colégio Dom

Amando, em Santarém, como professor de Educação Artística para cinco turmas de

primeiro ano do Ensino Médio.

1.3 O Contexto da Autoformação

É fundamental conhecer a história do Colégio Dom Amando e um pouco da

história da Santa Cruz, da qual faço parte. O propósito é de ao adentrar na história

do Colégio e da Congregação, estabelecer um diálogo com a história de vida e

ampliar as possibilidades de entender como uma criança de família simples e

grande, do interior do Pará, pode se tornar um gestor com compromisso tão

fortemente estabelecido com as práticas democráticas.

O Colégio Dom Amando, localizado na cidade de Santarém/PA, é um colégio

com mais de sessenta anos de tradição, sendo um dos mais antigos e respeitados

da Região Norte do país.

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Figura 3 – Mapa do Estado do Pará (b)

O Colégio é mantido pela Congregação dos Irmãos de Santa Cruz que, além

desse estabelecimento, administra e mantém outros colégios iguais ao Dom

Amando, localizados nos Estados Unidos e em São Paulo (Colégio Notre Dame), na

Região Sudeste.

A instituição teve sua fundação à margem Sul do Rio Amazonas, quando um

jovem prelado via um dos seus sonhos se realizar. Cerca de um quilômetro do

centro do pequeno porto ribeirinho de umas 8.000 almas, as paredes do novo

Hospital de São José mostraram que o sonhador, Dom Anselmo Pietrulla, tinha

sonhos grandes.

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Figura 4 – Colégio Dom Amando – Santarém/PA

O hospital foi fundado com a bênção no dia 13 de julho de 1930, ao mesmo

tempo em que o mundo caía na Grande Depressão. O hospital prosperou nas mãos

dedicadas das Irmãs da Imaculada Conceição, que estavam em Santarém havia

mais de vinte anos, e pelo segundo prelado, Dom Amando Bahlmann.

Uma década se passava e o mundo caminhava para a 2ª. Guerra Mundial. Os

Estados Unidos necessitavam de borracha e se ofereceram para construir hospitais

e manter a saúde pública da população e dos trabalhadores imigrantes da borracha.

O povo aproveitaria os recursos estrangeiros, profissionais e financeiros, quando

chegou a oferta do governo americano para comprar o seu hospital simples. Dom

Anselmo, gentil, mas, firmemente, recusou. Enquanto o novo hospital público estava

sendo iniciado em 1942, Dom Anselmo fechou o seu.

Ele teve outro sonho, tão grande quanto difícil, a exemplo do primeiro. As

jovens tinham um excelente ginásio sob os olhos das Irmãs da Imaculada

Conceição. Chegava a hora de criar um para rapazes, também.

O Bispo encontrou um missionário alemão, Frei Rogério Voges, da Ordem

dos Frades Menores (OFM), que estava disposto a ajudar, e recrutou mais dois na

Alemanha, Isidoro e Rodolfo. Os outros professores seriam encontrados na Prelazia.

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Começou a perceber o tamanho dos obstáculos que teria no caminho. Uma

escola secundária teria de seguir os padrões do Colégio Dom Pedro I, instalado no

Rio de Janeiro e modelo para todo o Brasil. Antes de aceitar o primeiro aluno, a

escola deveria estar completa: com laboratório de ciências, biblioteca e professores

licenciados para todas as disciplinas, incluindo línguas clássicas e modernas,

ciências exatas e sociais, português e artes. Uma pessoa menos arrojada teria

recuado. Dom Anselmo, entretanto, abriu sua escola no dia 14 de março de 1943,

com duas turmas de primeira série ginasial.

Após vários anos, os Franciscanos descobriram como o Ministério da

Educação, que exigia muito tempo e energia, entrou em conflito com o Ministério

Sacerdotal, e sentiram a pressão de todos os lados, especialmente das

comunidades abandonadas das margens do Rio Amazonas e Tapajós. Sem outra

solução em vista, Dom Anselmo apelou aos Irmãos Maristas, ainda que não

tivessem mostrado interesse à época da inauguração do Colégio.

Outra vez eles não deram esperança. Finalmente, ele soube do trabalho

educacional dos Irmãos de Santa Cruz, nos Estados Unidos. Fez seu primeiro

contato e apelo. Logo voltou a notícia de que o Irmão William Mang, CSC, o Vice-

Provincial, estava viajando ao Brasil e queria se encontrar com o Bispo de Belém.

Nesse encontro chegariam a um acordo e no mesmo ano viriam alguns Irmãos. Em

dezembro, 1951, chegaram os Irmãos Richard Grejczyk, Paul Schaefer, Genard

Green e James Walter. Os Franciscanos tinham concordado em trabalhar com os

Irmãos por um ano, mas, conforme as conversas, logo que o ano escolar iniciou, os

padres sumiram, deixando um molho de chaves para os quatro que mal falavam

português.

O ano de 1961 destacou-se, pois marcou a abertura do curso colegial. Pela

dedicação e serviços aos jovens, os Irmãos podiam ler os sinais das mudanças nas

necessidades do povo. Em 1967, o curso colegial abriu as portas às jovens que

queriam estudar ciências humanas, biológicas ou matemáticas. O ginásio aceitou

meninas no ano seguinte.

Em 1970, em resposta a um pedido dos adultos do bairro, os Irmãos

ofereceram quatro salas à noite, abrindo-se o primário, que iniciou com 140 alunos,

jovens e adultos. Todos os professores eram voluntários, alunos do colégio, e a

diretora era uma jovem líder, única professora formada.

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Desde a chegada dos Irmãos, o número de alunos e salas de aula aumentou.

Seus campos e quadras estavam ocupados o dia todo e noite adentro. As salas e a

área coberta eram usadas nos finais de semana, tudo a serviço da comunidade.

Numa pesquisa recente entre os alunos, quando indagados sobre o que eles

gostaram mais do Colégio Dom Amando, a resposta mais frequente foi: disciplina.

Além de lecionar e administrar o seu Colégio, os Irmãos têm servido aos

jovens e à comunidade de muitas maneiras. Eles já lecionaram em outras escolas,

religiosas e públicas; organizaram e orientaram uma variedade de movimentos e

clubes juvenis; promoveram encontros e retiros para adultos e jovens; serviram nos

conselhos diocesanos; dirigiram a Catequese Escolar e assumiram a formação de

seminaristas para a diocese e de religiosos para a Congregação de Santa Cruz.

É sempre com carisma e o propósito de educar na fé que os irmãos de Santa

Cruz vêm desempenhando importante papel na educação brasileira, através de

conduta ética e disciplina, o que se constitui num diferencial em relação a outras

instituições.

Figura 5 – Casa de Abrigo Nossa Senhora Auxiliadora

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A Figura 5 apresenta a Casa de Abrigo Nossa Senhora Auxiliadora, localizada

em São Paulo, no bairro da Vila Anastácio, Região Oeste da Capital, para

entendermos melhor a trajetória de um gestor na busca de sua formação de sujeito.

A Casa da Criança Nossa Senhora Auxiliadora é um Abrigo para crianças e

adolescentes de ambos os sexos, que abrange a faixa etária de zero a 17 anos e 11

meses, com funcionamento ininterrupto, 24 horas, diariamente. Tem capacidade

para atendimento a vinte educandos.

A instituição coloca, à disposição, um serviço de proteção social especial de

alta complexidade, previsto no Sistema Único de Assistência Social (SUAS), com a

finalidade de acolher crianças e adolescentes cujas famílias ou responsáveis

encontram-se temporariamente impossibilitados de cumprir sua função de cuidado e

proteção.

Este serviço foi implantado em 31 de março de 1997 e funciona como

moradia transitória até que seja viabilizado o retorno à família de origem e/ou

extensa, ou inserido em família substituta, cujo procedimento se dá através da Vara

da Infância e da Juventude.

Há, também, crianças e adolescentes abrigados por determinação judicial, na

faixa etária de zero a 17 anos e 11 meses, em regime de co-educação, grupos de

irmãos, priorizando a convivência familiar e comunitária.

Também serão abrigadas crianças e adolescentes encaminhados pelos

Centros de Referência da Criança e do Adolescente (CRECA), por determinação do

Poder Judiciário e requisição do Conselho Tutelar. Nestes casos deve haver

comunicação às autoridades competentes, conforme prescreve o Estatuto da

Criança e do Adolescente (ECA), em, no máximo, 48 horas.

Conforme dispõe o artigo 93 do ECA,

As Entidades que mantenham programas de abrigo poderão, em caráter excepcional e de urgência, abrigar crianças e adolescentes sem previa determinação da autoridade competente, fazendo comunicação do fato até o 2º dia útil imediato (BRASIL, 1990).

A abrangência do atendimento prioriza crianças e adolescentes cuja família

pertença ao Distrito/Região da Sub-Prefeitura da Lapa, estendendo para área que

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pertence à Região Episcopal e Vara da Infância e Juventude também da Lapa

(órgão fiscalizador). No caso de haver vagas, o Abrigo atende crianças e

adolescentes de outras regiões da Cidade quando a demanda for maior que a oferta.

Figura 6 – Mapa da Região Metropolitana de São Paulo

A instituição oferece abrigamento provisório para, no mínimo, vinte e, no

máximo, vinte e duas crianças e adolescentes de zero a 17 anos e 11 meses, em

situação de risco pessoal e social que tiveram seus direitos violados, como nos

casos de: violência física, sexual, psicológica ou negligência; abandono; ameaça de

morte; maus tratos; exploração de trabalho infantil; órfãos; portadores de

necessidades especiais, saúde, de comprometimento psiquiátrico ou deficiências.

A transitoriedade é a tônica do atendimento, mas há situações cuja

necessidade de abrigamento se prolonga.

A missão é, pois, oferecer às crianças e adolescentes atendidos,

oportunidade para que compreendam de forma crítica a realidade em que vivem e os

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valores humanos, tornando-se responsáveis pela construção de sua própria história

e protagonistas de um mundo melhor.

São estes os princípios e valores estabelecidos:

a) Ética e formação cristã como norteadores da ação;

b) Ecumenismo;

c) Competência na prestação dos serviços;

d) Interação família–escola–comunidade;

e) Trabalho comunitário e participativo; e

f) Considerar a história de cada criança e adolescente.

Considerando que crianças e adolescentes são seres em desenvolvimento, a

educação é encarada como um processo dinâmico e deve envolver todas as

dimensões da vida humana.

A educação serve para que possa haver a socialização. Existem dois tipos de

educação: a formal que é feita dentro das salas de aula e a informal que acontece

na rotina do dia a dia, em casa, na relação com o outro e com o mundo. Esta

educação é assegurada por lei, como se pode observar no ECA, em seu artigo 53:

“A criança e o adolescente têm direito à educação visando o pleno desenvolvimento

de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e para o trabalho” (BRASIL,

1990).

A educação é fundamental na vida das crianças e adolescentes devido a sua

fase de transição e constante desenvolvimento. A escola deve ser a continuidade da

educação recebida em casa, portanto, o educador deve estar sempre em busca de

meios para que a educação seja, acima de tudo, um momento de prazer e

descobertas, interessante e estimulante.

Educar é formar agentes de mudança, com capacidade para agir no mundo

com criatividade, espírito crítico, comprometidos com o próximo, na construção da

paz e da justiça e que acreditem numa sociedade mais humana e democrática.

A equipe do abrigo é composta por 17 funcionários, a saber:

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Quadro 1 – Distribuição dos funcionários

Qtde Função Escolaridade Atribuições Legais

01 Gerente de Serviço Nível Superior

Responsável pela gestão dos serviços de Proteção Social Especial de Alta Complexidade que possuem funcionamento ininterrupto e institucionalizado. É o guardião da Casa.

01 Assistente Técnico Nível Superior

Oferece suporte técnico ao gerente de serviço no trabalho desenvolvido pela proteção social especial de alta complexidade.

01 Técnico Nível Superior

Oferece atenção aos usuários, suas famílias, comunidade e órgãos públicos, de acordo com a programação estabelecida e com as necessidades pessoais e sociais destes.

10 Orientador Socioeduca-tivo

Nível Superior / Nível Médio

Oferece atividades de orientação social e educativa junto aos usuários, de acordo com a programação e orientação técnica estabelecida.

01 Cozinheira Ensino Fundamental/ Nível Médio

Responsável pela preparação de refeições, lanches, segundo o cardápio estabelecido e pelo controle e organização geral da cozinha e despensa.

03 Agente Operacional

Ensino Fundamental/ Nível Médio

Executa serviços de higienização, limpeza, arrumação e manutenção, auxilia na preparação de refeições, zela e vigia o espaço físico do serviço.

Assim, na constante procura da concretização dos objetivos e das propostas,

a Casa da Criança propõe, através das pessoas envolvidas no processo educativo,

proporcionar aos educandos a formação necessária ao desenvolvimento de suas

potencialidades, como elemento de sua autorrealização, preparando para o trabalho

e exercício consciente da cidadania, capacitando-os à expressão com liberdade,

responsabilidade, determinação, sendo solidários, capazes de aceitar e superar as

diferenças culturais e sociais.

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CAPÍTULO 2 - PRÁTICAS DA GESTÃO DEMOCRÁTICA

Neste capítulo é possível reconhecer que toda a prática de gestão

democrática bem-sucedida ocorreu no momento de autoformação, em que, como

gestor escolar ou de abrigo, busquei resgatar minha formação, fruto do aprendizado

com os livros, professores e funcionários, resultando na lida com sabedoria e

respeito, elevando a pessoa a um sujeito comprometido com sua função.

As qualidades pessoais não podem ficar de fora da formação contínua do

sujeito, em que busca recordar todas as experiências boas e, por vezes, até as

ruins, para mudança de postura.

A respeito disso, Menezes (1972, p. 121) resume as qualidades de um diretor

bem-sucedido:

[...] resumidamente afirmar que a administração do ensino considera diretor bem sucedido [sic] aquele que reúne qualidades pessoais como iniciativa, criatividade, cultura geral e especializada, dedicação exclusiva à direção e bom relacionamento humano; qualidades de liderança e disciplina; preparo administrativo para planejar, organizar, coordenar e controlar serviços, material e pessoal; formação pedagógica para orientar e avaliar a aprendizagem e o trabalho docente. Entretanto, o instrumento de medida dessas características é desatualizado e seu preenchimento é mal- orientado.

A partir da gestão democrática, tem-se uma formação voltada ao coletivo e o

trabalho em função do outro, ou seja, as pessoas que estão ao redor.

Nesse ponto, o lado efetivo deve ser explorado, pois trabalhamos com seres

humanos que necessitam de motivação e incentivo para desempenharem com

sucesso suas atividades.

É com este intuito que Valerien (1997, p. 152) afirma que a função do diretor:

[...] aparece em uma nova perspectiva global: a de provocar a melhoria do bom funcionamento da escola; a de encontrar soluções para os problemas que se colocam localmente para a implementação de novas finalidades educacionais; e a de introduzir a inovação para melhorar a qualidade e a eficácia do ensino.

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O gestor deverá buscar sempre a eficácia e a inovação, por isso é

conveniente a sua preocupação em estar sempre atento às mudanças do

comportamento humano e à evolução da sociedade.

Aqui, recordo que a busca de melhorar o trabalho como diretor foi constante,

sempre procedi a autoavaliação no tocante às decisões e sempre busquei me

comprometer com a equipe para que o sucesso fosse do grupo, não apenas meu,

pois o trabalho que tento desenvolver será sempre pensado no coletivo e no

compromisso de melhorar a qualidade e a eficácia.

Valerien (1997, p. 165) alerta que:

A qualificação e a motivação do diretor de escola são hoje a dimensão que mais atenções requer, não só porque o diretor é o pólo integrador de todos os demais, mas também porque é o elemento determinante da eficácia da ação educativa.

Diante disto, coloco-me como elemento que poderá fazer a diferença em

qualquer ambiente de atuação gestora, o que me remete novamente à importância

de gerir com qualidade sem ignorar a motivação de todos os envolvidos.

Na condição de humildade do gestor, há que se evitar a arrogância, portanto,

como se diz na gíria do administrador, não se deve deixar que a importância do

cargo "suba para a cabeça". O trabalho coletivo tem eficácia quando se tem noção

de que o resultado positivo deve ser atribuído à equipe e não apenas ao gestor.

Como, em alguns casos, o diretor atua apenas como aplicador de leis e

regras, Alonso (1976, p. 155) alerta sobre o senso crítico em relação ao seu papel:

O diretor não pode ser visto hoje como mero aplicador de leis ou provedor de recursos materiais para a escola, deve antes ser pensado como criador de novas atitudes, o estimulador do progresso e o mediador na solução de problemas e dificuldades dos vários elementos da escola. O equilíbrio da organização escolar deve ser o objetivo máximo da ação administrativa do diretor.

As escolas em que estudei os primeiros anos, em que as diretoras eram

vistas como a autoridade da instituição, impondo medo aos alunos, fez-me crescer

acreditando nesta postura de gestão. Eu tinha medo até de passar perto da sala da

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diretora. Ademais, no colégio em que atuei como diretor, presenciei vários alunos

com esse mesmo comportamento.

Alonso (1976, p. 11-12) insiste nesta questão:

[...] ação do diretor, complexo de fatores materiais e humanos, interligados de algum modo e sobre o qual o diretor deve agir, desencadeando a ação grupal, orientando-a de modo convergente e controlando-a a fim de assegurar-se de que os propósitos gerais estão sendo atingidos.

Esta interligação entre o diretor e a ação grupal assegura que todos os

envolvidos sejam orientados para um mesmo resultado, comprometido com a

gestão, democraticamente, respeitando as possibilidades de mudança.

Valerien (1997) diz que não deve haver preocupação apenas com os

envolvidos internos, mas, inclusive, com os envolvidos externos:

O diretor de escola deve saber explorar, de forma sistemática, todos os recursos que o meio próximo de sua escola pode proporcionar. É um verdadeiro trabalho de investigação e de relações públicas a que terá de se dedicar, a fim de conhecer as organizações e as pessoas com quem a escola terá interesse em estabelecer laços de cooperação (VALERIEN. 1997, p. 139).

Esta cooperação nas relações públicas e as parcerias não podem ser

descartadas, pois quanto mais pessoas envolvidas no trabalho, mais se fortalecem

as parcerias.

São quatro tópicos que Alonso apresenta relativamente à tarefa de direção:

De maneira geral, as pesquisas efetuadas sobre o comportamento de diretores levou à conclusão de que o diretor, para conseguir resultados satisfatórios, precisa saber: a) comunicar-se de modo formal e informal com os membros do seu grupo; b) tomar decisões dentro de critérios mais racionais; c) manter o 'moral' alto do grupo, atentando para as mudanças necessárias; d) liderar o grupo, levando os membros da organização a aceitarem e mesmo desejarem a mudança (ALONSO, 1976, p. 157-158).

Estes conselhos são fundamentais para a lembrança de que a comunicação é

essencial ao grupo. Comunicar-se, formal ou informalmente, com clareza possibilita

a ação eficaz.

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As tomadas de decisão quando baseadas em critérios adequados, levando

em conta a participação do grupo, possibilita realizar as mudanças necessárias, de

sorte que todos estejam cientes do papel de cada um na organização.

Há que se estar atento às mudanças no cenário educacional e atentar a

fatores relacionados especialmente à infraestrutura do prédio e àqueles relacionados

ao pessoal.

A autoridade é decorrente das atitudes. É desnecessário, pois, impor a

autoridade formal atinente ao cargo. Alonso (1976, p. 16) observa:

[...] um diretor de escola ocupa uma posição formal que confere autoridade sobre todos os membros da unidade escolar. O limite da sua autoridade se encontra, entretanto, adstrito àquela escola onde atua. Existe ainda a autoridade decorrente da pessoa e de suas qualidades do cargo, mas que nem sempre ocorre.

Com minha história de vida, descobri o dom de administrar

democraticamente. Acreditando que, ao se criar condições de realização de um

trabalho verdadeiramente participativo, o envolvimento de todos no processo é algo

que acontece naturalmente.

Não é necessário lembrar, a cada minuto, quem é o diretor. A autoridade do

gestor comprometido emerge de acordo com as qualidades pessoais e profissionais,

que variam conforme as ações voltadas à participação.

A responsabilidade adquirida no processo de amadurecimento do grupo

envolvido com o objetivo da escola é que se torna o diferencial. Silva (2000) aborda

sobre o papel coordenador como aspecto importante para o sucesso em qualquer

ambiente de trabalho:

[...] o trabalho do dirigente será, em grande parte, coordenar os objetivos dos envolvidos, procurando fazer com que se compatibilizem com o objetivo do empreendimento sob sua responsabilidade (SILVA, p. 2000, p. 41).

A responsabilidade e o envolvimento dos integrantes do grupo não são

adquiridos de imediato, são frutos de reuniões, sempre motivando os envolvidos,

falando de valores, para que o trabalho flua com o empenho de todos, alertando que

sem a dedicação de cada um, não haverá resultado positivo.

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Portanto, cada integrante da equipe deve ater-se à sua função, seja na

cozinha, na limpeza ou na secretaria, as tarefas devem ser realizadas com amor,

dedicação e compromisso com o outro.

Este trabalho de conquista deve ser feito pelo gestor comprometido com o

coletivo. Haverá momentos de conflitos, tristezas, mas que não devem ser

empecilho para a gestão participativa, em que todos participam e desenvolvem um

trabalho de qualidade.

Tanto no Colégio quanto na Casa de Abrigo, procuro destacar o respeito e a

valorização do trabalho de todos, levando em consideração a dimensão cultural na

sua individualidade.

Na prática, reconheço o papel fundamental que tem o gestor como aquele

que dirige conforme seu projeto de educação e que está ligado não apenas às

tarefas burocráticas, mas a todos os aspectos da instituição. Convém destacar a

liderança, conforme aponta Libâneo (2006, p. 232):

O diretor não pode ater-se apenas às questões administrativas. Como dirigente: cabe-lhe ter uma visão de conjunto e uma atuação que apreenda a escola em seus aspectos pedagógicos, administrativos, financeiros e culturais.

A liderança faz parte do processo em que o gestor, diretor ou coordenador

desempenha sua atividade com sabedoria e prudência, procurando usá-la em

benefício do grupo.

No ambiente acolhedor em que as ações devem estar voltadas ao trabalho

em equipe, em que a preocupação individual deve estar voltada em favor do

coletivo, o direcionamento e as conquistas da participação de todos no processo de

gestão democrática visa à participação efetiva do grupo. Conforme Bastos (2002, p.

110):

[...]a gestão democrática faz parte de um processo coletivo e totalizante, cujo requisito principal é a participação efetiva de todos. É óbvio que somente a prática reiterativamente vivenciada no cotidiano demonstrará o conteúdo de uma gestão dessa natureza.

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A importância do diretor está, portanto, atrelada à sua conduta na construção

coletiva do projeto pedagógico, o qual deverá ser lembrado e considerado objeto de

reflexão em cada etapa da execução das atividades. Tanto no Colégio quanto na

Casa de Abrigo procuro desempenhar as atividades em conjunto, exercitando a

participação de todos de modo que se sintam responsáveis pelo êxito das

atividades, enfatizando que o trabalho deve ser realizado em conjunto. Ferreira

(2006) afirma que só através do exercício da democracia é que se terá a

participação de todos:

A direção se constrói e se legitima na participação, no exercício da democracia e na competência da construção coletiva do projeto pedagógico que reflita o projeto de homem e da sociedade que se quer. Um processo de gestão que construa coletivamente um projeto pedagógico de trabalho tem já, na sua raiz, a potência da transformação (FERREIRA, 2006, p, 113).

O homem e a sociedade que queremos são a resposta da atuação do gestor

neste processo de democracia que, acima de tudo, contribui para a formação do

sujeito coletivo que almejamos.

Aqui, retomo o trabalho de construção coletiva das minhas atividades, seja na

área educacional, seja na social, cujas decisões sempre são tomadas em conjunto,

para que todos sintam a responsabilidade e sejam participantes do processo de

construção coletiva. A direção aprende muito neste processo de gestão. Hora (1994,

p. 106) enfatiza que da construção da escola participativa vai emergir um espírito

democrático e de colaboração:

O aprendizado da direção, que ocorre no processo de construção desta escola, evidencia-se nas ações que ali estão sendo desenvolvidas com professores, alunos, funcionários, pais e comunidade, e reflete-se na adoção da postura crítica, solidária e despojamento, aliada à decisão de imergir no espírito democrático e participativo.

O espírito democrático, porém, exige coordenação e capacidade de se

organizar para decidir. Libâneo (2006, p. 316) acrescenta, pois, relativamente ao

conceito de organização:

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Organizar significa dispor de forma ordenada, dar uma estrutura, planejar uma ação e prover as condições necessárias para realizá-la. Assim, a organização escolar refere-se aos princípios e procedimentos relacionados à ação de planejar o trabalho da escola, racionalizar o uso de recursos (materiais, financeiros, intelectuais) e coordenar e avaliar o trabalho das pessoas, tendo em vista a consecução de objetivos).

Em se tratando de organização, procuro desenvolver as atividades,

acompanhando o processo com dedicação para uma avaliação segura e

planejamento adequado.

2.1 A Construção da Gestão Democrática

Sabe-se que a gestão é construída nas ações e mudanças cotidianas. Neste

encontro, o gestor é o formador. Para Cury (2007, p. 493):

GESTÃO é um termo que provém do latim e significa: levar sobre si, carregar, chamar a si, executar, exercer, gerar. Trata-se de algo que implica o sujeito e um dos substantivos derivado deste verbo nos é muito conhecido. Trata-se de gestatio, ou seja, gestação isto é: o ato pelo qual se traz dentro de si algo novo e diferente: um novo ente. Ora, o termo gestão tem sua raiz etimológica em ger que significa: fazer brotar, germinar, fazer nascer. Da mesma raiz provêm os termos genitora, genitor, gérmen.

O desafio de gerir um trabalho com sucesso está no enfrentamento das

mudanças, sem negá-las, reconhecendo-as ao mesmo tempo em que se mantém

olhar atento às evoluções do cotidiano institucional, aceitando o encargo de estar

sempre preparado para gerir, gestar, criar novas formas de tocar as ações

necessárias para a realização dos objetivos institucionais.

Aqui, destaco o conceito fundamental, que é o conceito de gestão

democrática e, dentre inúmeras lições, convém salientar:

A gestão democrática não é processo simples de curtíssimo prazo, mas também não é tão complexo ou irrealizável, de prazo interminável. Significa dizer que ela se constituirá numa ação, numa prática a ser construída na escola (ROMÃO; PADILHA, 1997, p. 96).

A gestão nada mais é do que o gerenciamento de todas as ações

desempenhadas na figura do diretor, coordenador ou gerente de serviço, em que a

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tarefa primordial é a construção de uma equipe empenhada em desenvolver um

trabalho de participação coletiva.

Com minha formação religiosa, sempre realizei um trabalho voltado ao

respeito pelo ser humano, ciente de que precisa ser ouvido e respeitado.

Há que se oferecer autonomia tanto aos funcionários quanto às crianças e

aos adolescentes. Muitos ainda não entenderam a forma com que desenvolvo

minhas ações, mas acredito que serão bem-sucedidos ao constatarem que o

trabalho de cada um está sendo realizado com responsabilidade e sem fiscalização.

Isto se dá através da orientação e integração de todos os membros envolvidos na

atividade.

[...] o homem é pessoa dotada de alma e corpo, podendo conhecer, decidir e responsabilizar-se. Para exercer essas suas possibilidades deve realizar um trabalho de humanização porque não é espontânea nem automática a utilização dessas potencialidades (SILVA, 2006, p. 82).

Com o diálogo e o envolvimento coletivo um novo jeito de administrar e uma

realidade democrática foram estabelecidas, envolvendo o encontro das pessoas e a

solução dos conflitos, visando sempre à autoridade compartilhada.

Antes disto, porém, o gestor deve se sentir sujeito dessa prática democrática

e participativa, em que é necessário conhecer a visão de homem e de sujeito de

relações, lembrando que o trabalho é realizado por seres humanos e devem ser

conduzidos ao senso de responsabilidade pela tomada de decisão, sentindo-se

ativos e não meros executores de atividades direcionadas sem reflexão de suas

ações.

2.2 A Construção Democrática no Colégio Dom Amando

Nesta seção, que trata da construção democrática do Colégio e do Abrigo,

constam alguns relatos de funcionários e ex-funcionários, cuja manifestação compõe

o caminho através do qual busco as contribuições dos que fizeram e fazem parte da

formação do gestor. Estes relatos foram realizados livremente e cada um pôde

escrever o que lhe despertou e sensibilizou positivamente.

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O Colégio Dom Amando sobreviveu a inúmeras crises econômicas e

financeiras, mas continua sendo considerado o melhor da região Oeste do Estado

do Pará, sempre à frente da concorrência.

Mantem-se de acordo com o contexto social, político econômico e financeiro

do país, sem, contudo, apartar-se de sua filosofia de educação, de seus princípios

éticos e morais e, principalmente, de seus objetivos institucionais.

No entanto, como ocorre em toda empresa com algum tempo no mercado,

houve momentos em que o Colégio Dom Amando passou por dificuldades, e

algumas delas diretamente relacionadas à administração e ao controle orçamentário.

Com a evolução da sociedade, o avanço tecnológico e o advento da

globalização, houve-se por bem repensar a administração, pois o crescimento da

empresa não permite que uma única pessoa faça todo o controle administrativo e

técnico.

O caminhar do Colégio Dom Amando não foi diferente. Cabe, portanto,

demonstrar a estrutura administrativa que outrora se empregava:

Figura 7 – Organograma anterior do Colégio Dom Amando

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O organograma constante da Figura 7 oferece uma organização com as

seguintes características:

a) Uma única pessoa faz todas as análises e toma as decisões;

b) Não há níveis hierárquicos – todos prestam contas apenas ao diretor;

c) O orçamento é de conhecimento exclusivo do Diretor, pois não se tem

como falar de orçamento a grupos que se misturam nas áreas de atuação;

d) Os departamentos não são setorizados e não se sabe o quanto se recebe

e o quanto se pode gastar.

Decidi trabalhar com outra estrutura e optei pela divisão e setorização dos

departamentos. Desta forma, poderia haver interação entre os setores e

departamentos, para se traçarem coerentemente as metas a serem cumpridas,

visando à obtenção de melhor resultado. Foi o que houve, o organograma da

administração do Colégio Dom Amando foi, então, modificado.

Figura 8 – Organograma atual do Colégio Dom Amando

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Com esta nova proposta de organização, a administração do Colégio Dom

Amando manteve o controle orçamentário através da redução de custos e aumento

da renda. Todavia, a situação agravou-se em 1999, com o protecionismo aos

inadimplentes, porém, mesmo com a queda de receita, foi desenvolvido um trabalho

em equipe, com reuniões envolvendo os professores e funcionários, visando à

redução de gastos e à orientação aos pais para que pagassem em dia as suas

mensalidades.

Figura 9 – Reunião com os funcionários

Segue o depoimento de uma professora sobre a forma como era realizado o

trabalho com os alunos do CDA:

Cheguei a coordenar, por quatro anos, a feira Cultural do CDA,

em sua gestão. Ele sempre confiou em mim e na equipe que

trabalhava, dando-nos todas as condições necessárias para

construir conhecimento junto à comunidade estudantil.

Obtivemos bons resultados com ele à frente, o grupo sentia-se

com a responsabilidade de desenvolver trabalhos e obter bons

resultados. Isso era espontâneo.

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O trabalho caminhou bem: as matrículas aumentavam ano a ano e as

instalações físicas estavam sendo reformadas, procurando oferecer um aspecto

mais moderno e mais humano à escola. Dividi o colégio por setores e, para cada um

deles, escolhi um coordenador que fora orientado a manter contato direto com a

direção.

Figura 10 – Reunião com os Coordenadores

Fazíamos reuniões periódicas com uma psicóloga, a fim de que, por meio

desse acompanhamento especializado, tivéssemos uma indicação dos níveis de

motivação e autoestima da equipe gestora. O resultado era visível. Todos

trabalhavam com garra, determinação e sentiam-se valorizados no desempenho de

suas funções.

É bom ouvir o que o outro tem a dizer. Este exercício é importante para o

gestor preocupado com um trabalho consciente e comprometido.

A Orientadora Educacional do Colégio Dom Amando escreveu um relato

acerca da figura do líder e o sucesso da instituição, sobre o qual convém que

façamos uma reflexão:

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O sucesso de uma instituição perpassa pela figura do líder

como gestor, o qual tem por tarefa desenvolver um trabalho

que proponha desafios à equipe técnica que o cerca, sem

deixar de lado a segurança e o conforto dessa equipe. O

trabalho desenvolvido nos anos de 2003 a 2006, pelo Irmão

Denílson da Silva Feitosa, no colégio Dom Amando, teve como

pilar o bem-estar dos sujeitos inseridos no sistema educacional.

Dessa forma, pôde-se consolidar uma visão ampliada do futuro

das novas gerações, norteadas pelos valores cristãos e sociais

que possibilitaram a formação integral do indivíduo.

Os obstáculos existem, mas não podem ser empecilhos que resultem na

desistência da implantação de uma administração pautada na prática da justiça e

igualdade através da conscientização do gestor democrático.

Trarei um relato de uma ex-professora de Língua Portuguesa do Colégio Dom

Amando, para ilustrar a atuação do diretor.

Crescimento institucional: o CDA, durante a gestão de Denilson

Feitosa, enfrentava dificuldades financeiras e precisava

crescer. Para tal, a principal medida foi o investimento em

reestruturação do espaço com otimização e ampliação de

salas, bem como a capacitação de pessoal com cursos de

formação, incentivo à participação em eventos e,

principalmente, melhoria das relações interpessoais.

Convém ratificar a importância da boa comunicação. Sabidamente, uma

organização com falha na comunicação levará o grupo a desencontros e

dificuldades na condução do trabalho preciso e de sucesso.

A consciência de um trabalho coletivo é relatada pela professora de

matemática como a chave da ação democrática:

a) administração: não era "tocada" por uma pessoa, mas por

uma equipe, portanto, tratava-se de uma equipe gestora e não

de um gestor;

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b) problemas: eram encarados como sintomas e as causas

eram buscadas por todos, em conjunto. A saída era sempre

encontrada, porque não buscávamos o culpado, mas os fatores

que favoreceram o surgimento daquele sintoma.

O trabalho em equipe é direcionado ao coletivo, em que a preocupação é com

o desenvolvimento das atividades no seu todo.

Conforme o relato da Coordenadora de Informática do Colégio Dom Amando

(CDA), é possível perceber como foi desenvolvida a autonomia das equipes. Foi

constatado pelos funcionários que a Direção escolar realizou um trabalho eficaz,

visando à solução de problemas, atuou de forma participativa com os professores e

coordenadores dos setores através de reuniões para encontrar a melhor solução,

proporcionando autonomia aos coordenadores para agir em determinadas situações,

evitando sobrecarga de trabalho, mas com responsabilidade como integrante da

instituição.

O trabalho era realizado de maneira autônoma, e, relativamente à autonomia,

segundo Barroso (1996, p. 17):

É um conceito relacional (somos sempre autónomos de alguém ou de alguma coisa) pelo que a sua acção se exerce sempre num contexto de interdependência e num sistema de relações. A autonomia é também um conceito que exprime certo grau de relatividade: somos mais, ou menos, autónomos; podemos ser autónomos em relação a umas coisas e não o ser em relação a outras. A autonomia é, por isso, uma maneira de gerir, orientar, as diversas dependências em que os indivíduos e os grupos se encontram no seu meio biológico ou social, de acordo com as suas próprias leis.

Portanto, o papel do gestor é sempre entender o que há de melhor para o

bem de todos, tendo em mente que sua presença é para melhorar o ambiente

escolar, isto é, fazer com que todos sejam participantes, desde o porteiro, pais,

alunos, professores aos funcionários. Em razão disso, através da investigação,

procurei aliar a teoria à prática da gestão democrática a partir da história de vida do

gestor escolar.

Para se construir a gestão democrática na instituição, é necessário estar

aberto ao diálogo com os parceiros e colaboradores.

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2.3 A Construção Democrática no Abrigo

Convidado a assumir a direção do abrigo, passei dias em conflito com meus

ideais de gestão democrática, pois queria continuar um trabalho coletivo, queria a

participação de todos, mas sabia que a atividade na escola é bem diferente da rotina

do abrigo, mas não desisti. Aceitei e coloquei em prática o que havia vivenciado na

escola.

Notei que os funcionários não tinham autonomia. Esperavam e comunicavam

tudo que estivesse fora dos padrões determinados pelo gestor. Até mesmo a

mudança de um móvel era realizada apenas com a permissão da Coordenação. Eu

não concordava com essa prática, pois gosto de trabalhar com autonomia e

liberdade, de sorte que as pessoas possam expor, à vontade, as suas idéias.

No final do mês de agosto, assumi a gestão da casa e, junto com os

funcionários, iniciei o trabalho coletivo, conversando e respeitando a opinião de

cada um. Foi um trabalho demorado, pois as mudanças são lentas e não aparecem

de imediato, mas valeu a pena.

Com a experiência em escola, procurei desenvolver momentos de formação

com os funcionários. Sempre trazia uma reflexão em que se buscava valorizar o

outro como sendo importante para o trabalho desenvolvido pela equipe.

A equipe tem dezessete integrantes, sendo um gestor, uma psicóloga, uma

assistente social, dez educadores sociais, três operacionais e uma cozinheira, para

atender a vinte crianças e adolescentes.

Quando se olha apenas o número de funcionários, de crianças e

adolescentes atendidos no abrigo, pode-se pensar que é um trabalho fácil. Mas, no

dia a dia, as coisas se complicam, pois o gestor tem a parte administrativa e

pedagógica da casa, o que requer planejamento diário para que o objetivo não se

perca. "A direção é princípio e atributo da gestão, por meio da qual é canalizado o

trabalho conjunto das pessoas, orientando-as e integrando-as no rumo dos

objetivos" (LIBÂNEO, 2006, p. 318).

Acreditar que através da gestão democrática o diretor tem a função de

conduzir toda a equipe a se tornar co-responsável, num ambiente de colaboração e

harmonia, é um trabalho árduo. Deverá, pois, estar aberto às mudanças de perfil de

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funcionários, ciente de que, nem sempre, é possível trabalhar com pessoas que têm

o mesmo ideal.

Deste modo, a equipe sentiu-se respeitada, valorizada e o trabalho caminhou

com resultados positivos, pois a equipe estava motivada e os integrantes dispostos a

assumir as respectivas funções.

Como afirma Silva (2006), os seres humanos precisam aprender a se

autoconhecer:

[...] o homem é pessoa, dotada de alma e corpo, podendo conhecer, decidir e responsabilizar-se. Para exercer suas possibilidades deve realizar um trabalho de humanização, porque não é espontânea nem automática a utilização dessas potencialidades (SILVA, 2006, p. 82).

Pouco a pouco, então, construí referenciais pedagógicos e administrativos

apoiados, sobretudo, na prática vivenciada no dia a dia da gestão democrática, com

a qual buscava e busco todos os dias compreender e vivenciar de modo que se

encaminhe para o sujeito comprometido.

Remediar os conflitos entre funcionários é um dos aspectos que acredito ser

muito importante na construção da gestão. No mês de maio de 2009, houve vários

problemas com os funcionários, fruto de bisbilhotices, falta de compromisso com o

trabalho coletivo, enfim, pairava um clima de difícil convivência. Conversei com

minha assistente de coordenação e decidimos fazer uma reunião com a presença de

todos os funcionários.

A estratégia adotada foi não "bater de frente" nesse primeiro momento em

que estaríamos reunidos.

Elaborei um convite, abrindo com um pensamento para reflexão e depois

apresentei os horários.

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Figura 11 – Convite para reunião

No segundo momento, preparei a pauta da reunião em que o objetivo estava

em destaque:

a) Vídeo: Assuma Responsabilidade;

b) Reflexão sobre o vídeo;

c) Cada um deve fazer uma autoavaliação sobre seu trabalho;

d) Motivo da reunião;

e) Objetivo: Abordar sobre a importância da comunicação, do trabalho em

equipe e do planejamento em conjunto.

Terceiro momento: A reunião aconteceu de forma planejada. Deixei bem claro

que estávamos nos reunindo para refletir sobre nossas ações e que não deveríamos

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atribuir culpa a ninguém, mas realizar uma autoavaliação e mudar a forma de

trabalho.

Após a reflexão, vieram à tona todas as reclamações de forma bastante

tranquila, sem acusações, mas destacando que nossas ações podem ajudar a

desenvolver um trabalho muito eficaz, no Abrigo, e a preocupação principal é a

criança e o adolescente com os quais trabalhamos, portanto, não devemos deixar

que nossas ações negativas ponham em risco o resultado do trabalho. Cada

integrante da equipe tem a necessária autonomia para realizar sua atividade de

forma bastante responsável e ajudar o companheiro em caso de dificuldade.

A reunião foi finalizada com a orientação para que refletissem sobre os

aspectos discutidos, sem qualquer pretensão de encontrar culpados, lembrando que

a mudança depende de cada um de nós, como equipe.

Uma educadora manifestou-se a respeito da tomada de decisão, observando

que:

O coordenador foi claro e objetivo, assim, enfatizou que

devemos ser autônomos e decisivos, assumindo nossas

responsabilidades seja ela por atitudes tomadas ou não.

Porque a responsabilidade pelo futuro de nossas crianças e

adolescentes depende de cada um de nós.

A estratégia foi empregada para:

a) amenizar os ânimos, pois, muitas vezes, o funcionário está pronto para

ofender o colega de trabalho ou então atribuir culpa a outro. Com este

procedimento faço, primeiramente, uma reflexão sobre o trabalho de cada

um e, depois, conduzo a avaliação do trabalho do grupo, evitando, assim,

conflitos na equipe;

b) intensificar a formação de educadores e consolidar a prática mais humana

e adequada às necessidades específicas e peculiaridades dos educandos;

c) desenvolver um projeto de desabrigamento e construir projetos de vida

com nossos adolescentes, visando à preparação de jovens sem

possibilidades de retorno à família de origem e/ou inserção em família

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substituta, contemplando a formação da identidade individual e

comunitária, com a elaboração de planos e metas para a autonomia,

profissionalização e inclusão no mercado de trabalho;

d) construir um plano pedagógico para auxiliar no desenvolvimento cognitivo e

aprendizagem formal de nossas crianças e jovens, detectando suas

principais necessidades e maiores dificuldades no processo de

aprendizagem; e

e) estabelecer um projeto de fortalecimento de vínculos, através de grupos de

apoio e orientação para pais e familiares, buscando constituir e fortalecer a

parceria entre abrigo e família.

Reconheço que são tarefas difíceis, pois necessitam de amadurecimento,

controle de ações e precisamos estar sempre voltados à escuta do outro, por isso a

definição traz a palavra genitora. A lembrança remete, pois, à minha mãe, que

sempre soube compartilhar, ouvir e, sabiamente, tomar as decisões.

Este crescimento não deve ser imposto, mas trabalhado de acordo com os

anseios e as deliberações de todos. O gestor saberá, então, usar sua sabedoria

para uma tomada de decisão democrática, sempre visando ao bem comum, ou seja,

visando à sociedade democrática em que todos participam das deliberações.

Uma administração concreta também se faz com crescimento individual,

como afirma Cury (2007), posto que a sociedade só crescerá se tiver seu objetivo

claro e voltado ao indivíduo como um ser de valor concreto.

Voltada para um processo de decisão baseada na participação e na deliberação pública, a gestão democrática expressa um anseio de crescimentos dos indivíduos como cidadãos e do crescimento da sociedade enquanto sociedade democrática. Por isso a gestão democrática é a gestão de uma administração concreta (CURY, 2007, p. 494).

Como afirma Antunes (2005, p. 30), a democratização da gestão implica a

população como sendo ator principal dessa tomada de decisão, respeitando,

sobretudo, seus direitos e interesses:

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A democratização da gestão implica o acesso da população à educação, mas também a participação desta na tomada de decisões que dizem respeito a seus interesses. Isso pressupõe distribuição do poder centralizado do Estado para as instâncias da base da pirâmide estatal.

No percurso de minha trajetória de gestor, em que busquei através do outro a

razão pra administrar e gerir minha atividade, seja no colégio ou na casa de abrigo,

com a preocupação de me formar e formar com quem trabalho, busquei o equilíbrio

e força de colocar em prática o ensinamento de Ferreira (2006):

[...] nossa prática de gestão, comprometida com a formação de homens e mulheres brasileiros fortes e capazes de dirigir seus destinos, os da nação e os do mundo, tem que possuir a força do conhecimento-emancipacão que possibilita o equilíbrio da afetividade nas relações, a competência em todas as atividades e a riqueza firme do caráter que norteia nossas ações (FERREIRA, 2006, p. 113).

Ao pensar em autonomia, apresento uma citação de Alonso para embasar a

tarefa do grupo, em que a ação deve ser orientada para a eficiência, e o objetivo

comum deverá representar a tarefa.

[...] administração se apresenta como a ação orientada para a eficiência e se concretiza na efetivação de um certo tipo de tarefa proposta que deve representar o objetivo comum do grupo. O seu aparecimento está ligado à complexidade social e à divisão do trabalho e irá determinar, por sua vez, o aparecimento de estruturas mais complexas na organização (ALONSO, 1976, p. 28).

Portanto, sempre acreditei e continuo acreditando que toda ação deverá ser

pensada e planejada para o trabalho coletivo, pois a organização e a motivação são

fundamentais para que todos trabalhem com responsabilidade.

O domínio de suas competências relativamente às relações humanas é

inevitável para a superação dos conflitos que podem aparecer no trabalho de um

gestor, e este preparo, ou formação, não se adquire da noite para o dia, mas com

trabalho diferenciado, sempre buscando a formação continuada, pois são inúmeros

os conflitos a serem solucionados. Se não houver preparo, o trabalho perecerá.

Não podia deixar de escrever sobre a motivação que, para mim, é a mola

mestra do trabalho. A qualidade do trabalho está voltada ao desempenho individual

e coletivo. Um gestor motivador levará todo o grupo a trabalhar mais feliz e

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comprometido com a instituição. Sempre busco motivar meu colaborador. Todos os

dias procuro passar por todos os setores. Cumprimento a todos. Deste modo, eu os

motivo, tornando-os importantes para o andamento do trabalho. Lembro o

funcionário que, sem ele, o trabalho pode parar ou pode ser desempenhado de

qualquer jeito, o que não queremos. Queremos, sim, um trabalho eficiente.

A motivação é a chave que abre a porta para o desempenho com qualidade em qualquer situação, tanto no trabalho, como em atividades de lazer, e também em atividades pessoais e sociais. Compreender a dinâmica geral da motivação é fundamental para a gestão eficaz (LUCK, 2002, p. 46).

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CAPÍTULO 3 - A GESTÃO DEMOCRÁTICA: O QUE DIZEM AS POLÍTICAS

PÚBLICAS DE EDUCA ÇÃO

Refletir sobre a gestão democrática nas políticas públicas tem como propósito

identificar o papel da escola e do gestor na transformação da sociedade e, ao

mesmo tempo, reconhecer que a formação do sujeito gestor se realiza no processo

de amadurecimento na vida concreta do trabalho e nas relações construídas nessa

trajetória.

A escola tem um papel fundamental na mudança de comportamento e atitude

diante da situação política do país. Seu papel é participar das mudanças para a

melhoria e qualidade de vida de todo cidadão. Esta contribuição será feita de modo

democrático nas relações de poder e, com isto, haverá o envolvimento de todos os

que estudam e trabalham na educação. Nas palavras de Gadotti e Romão (1997a, p.

16):

em relação à escola, ela contribui para a democratização das relações de poder no seu interior e, consequentemente, para melhoria da qualidade do ensino. Todos os segmentos da comunidade podem compreender melhor o funcionamento da escola, conhecer com mais profundidade todos os que nela estudam e trabalham, intensificar seu envolvimento com ela e, assim, acompanhar melhor a educação ali oferecida.

O envolvimento das pessoas que participam do processo educativo fará a

diferença, pois a escola vai contribuir de forma eficaz no seu papel de educar e

conscientizar cada um sobre seus direitos e deveres para a vida em sociedade.

Este conhecimento se dará no engajamento de cada um, isto é, conhecer o

funcionamento da escola para que não se embase em suposições, mas numa crítica

construtiva para o melhor desenvolvimento do papel que escola exerce na

comunidade.

Hoje, há uma busca por mudança, no sentido de que as pessoas sejam mais

conscientes dos seus direitos e deveres. Nesta linha, Paro (2003, p. 25) permite uma

reflexão sobre democracia:

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A democracia, enquanto valor universal e prática de colaboração recíproca entre grupos e pessoas, é um processo globalizante que, tendencialmente, deve envolver cada indivíduo, na plenitude de sua personalidade. Não pode haver democracia plena sem pessoas democráticas para exercê-la.

O autor define democracia como uma prática de colaboração recíproca entre

grupos, que só vai ocorrer se tivermos pessoas com tais características. Sabe-se o

quanto é importante o trabalho de base e a insistência, desde crianças, no papel de

cidadão, e da responsabilidade por si e pelos outros.

A democracia seria a forma mais adequada de se conseguir uma organização

voltada aos interesses da população, entretanto, o que notamos, muitas vezes, é a

preocupação individual, embora a democratização esteja sendo discutida na maioria

dos países. Esta democratização, como escreve Luck (2002, p.10), está

acontecendo em todo mundo:

[...] a democratização do ensino está acontecendo em toda parte da Terra. Estas tendências são alimentadas por uma busca mundial para uma participação maior em todos os aspectos do gerenciamento governamental e por um corpo crescente de pesquisa científica que confirma que gestores que ativamente procuram resolver conflitos, promover consenso e envolver participantes nos processos decisórios, conseguem os melhores resultados, seja na escola, seja em qualquer outro tipo de organização social.

Não convém esquecer que a efetivação, numa escola democrática, ocorre

com a participação de todos, mediante a compreensão do papel de sujeito político.

Portanto, como afirmam Gadotti e Romão (1997a, p.16): “A participação possibilita à

população um aprofundamento do seu grau de organização e uma melhor

compreensão do Estado, influindo de maneira mais efetiva no seu funcionamento”.

A participação coletiva e a superação dos condicionantes deve ser um só

processo, isto é, a caminhada deverá ser feita continuamente. A cada vitória, todos

são vencedores.

A gestão democrática nas políticas públicas de educação visa à construção

da autonomia e à descentralização. Seria, sim, um novo modelo de administrar uma

realidade que, como escrevem Gadotti (1997, p. 36), a gestão democrática é atitude

e método, em que ambas as palavras não podem ser separadas para a definição de

exercício da democracia.

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A gestão democrática é, portanto, atitude e método. A atitude democrática é necessária, mas não é suficiente. Precisamos de métodos democráticos de efetivo exercício da democracia. Ela também é um aprendizado, demanda tempo, atenção e trabalho.

O aprendizado democrático requer métodos e não é um trabalho fácil. Requer

tempo e atenção para o seu desenvolvimento.

A preocupação maior com a gestão democrática está na atuação do gestor,

pois, dificilmente, o olhar se volta para a sua formação. Muitos continuam atuando

sem preparação adequada para gerir o trabalho coletivo.

Para o exercício da democracia é necessária a mudanças pedagógica,

administrativa, estrutural e financeira, para o fortalecimento da autonomia e

capacidade técnica da escola de modo a construir coletivamente seu projeto político-

pedagógico e, assim, assegurar uma educação de qualidade, comprometida com o

social.

3.1 Participação da Escola na Gestão Democrática

Não é objetivo enveredar para a eficácia das políticas públicas, mas trazer à

tona o desafio que consiste na preocupação com a educação e a gestão

democrática, pois só através da boa escola é que se obtêm cidadãos

comprometidos. Portanto, a escola é o lugar em que se exercita a democracia.

A gestão democrática da escola é um passo importante no aprendizado da democracia. A escola não tem um fim em si mesma. Ela está a serviço da comunidade. Nisso, a gestão democrática da escola está prestando um serviço também à comunidade que a mantém (GADOTTI, 1997, p. 35).

Nas palavras dos autores, a escola tem um papel de relevância social muito

importante que se destaca no cenário educacional, vez que a transformação do

sujeito se dará de maneira comprometida com a comunidade e a escola.

A gestão democrática não constitui um desafio fácil, contudo, é perfeitamente

possível. Ela é um compromisso de quem toma decisões, de quem tem consciência

coletiva e se compromete com a educação e, neste caso, com a grande maioria das

crianças, adolescentes e jovens do país.

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Por conta dos vários movimentos em âmbito nacional é que as políticas

públicas se solidificam, portanto, por meio das conquistas relevantes, reconhecidas

como direitos para o bem de todos, trazendo à democracia seu verdadeiro

significado.

No Brasil não podia ser diferente. Surgiram e vêm surgindo movimentos de

amadurecimento político, como: A Semana de Arte Moderna; Escola Nova, Lei

Francisco Campos; e, como não podia faltar, o Manifesto dos Pioneiros da

Educação. "O manifesto teve impacto político particularmente transcendental e

até hoje é referência obrigatória para uma visão de educação pública

comprometida com a promoção e a defesa dos interesses nacionais" (SANDER,

2005, p. 98).

Tivemos avanços e entraves na descentralização da educação. Alguns

momentos bastante eficazes em que as tomadas de decisões em prol do coletivo

foram de relevância para o Brasil. A escola tem o desafio de formar para a liberdade,

desenvolvendo a consciência crítica.

A gestão democrática da educação, no contexto da Constituição de 1988,

continua sendo um desafio a educadores, diretores e intelectuais que trabalham no

ensino. Esta prática exige um empenho de toda a sociedade para mudar o modelo

imposto de administração autocrática.

Há mais de dez anos Estados e Municípios vêm desenvolvendo experiências de sucesso no campo da gestão democrática do ensino público. Depois da promulgação da Constituição Federal de 1988, que instituiu a 'gestão democrática do ensino público' (Art. 206, inciso VI), o debate se intensificou e alguns Estados já sancionaram suas leis que dispõem sobre o tema, mesmo antes de uma regulamentação nacional (GADOTTI; ROMÃO, 1997a, p. 16).

Percebe-se um avanço nas discussões acerca da educação, mas ainda falta

comprometimento mais consistente e consciente sobre o papel do cidadão.

Esse compromisso é visto como verdadeira forma de comunicação humana,

que supera as estruturas de poder autoritário e permeia as relações sociais e as

práticas educativas a fim de construir, em conjunto, a escola, a sociedade e todos os

espaços coletivos, enfim, uma nova sociedade solidaria e humana.

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A descentralização da educação constitui-se numa forma de oferecer

autonomia aos municípios para que assumam de forma democrática o papel de

facilitadores, entre os Estados e o Distrito Federal:

Os vários sistemas de ensino – federal, estadual e municipal – têm uma organização que articula as instituições-meio, as gestoras do sistema, e as instituições-fim: as escolas, as unidades escolares em que ocorre o ensino. A relação entre os órgãos gestores e as instituições escolares pode acontecer de forma democrática, participativa ou autoritária (LIBÂNEO, 2006, p. 236).

Com esta autonomia, os municípios e estados têm a interligação com a União

para desenvolverem uma educação de qualidade e comprometida com as políticas

públicas.

Constata-se, com referência às políticas públicas, que estamos bem

documentados e ajustado pelas normas, especialmente em se tratando de divisão

de organização político-administrativa.

Em todas as esferas existem órgãos específicos que desenvolvem as

políticas de educação:

a) Federais : Ministério da Educação (MEC); Conselho Nacional de Educação (CNE); b) Estaduais : Secretaria Estadual de Educação (SEE); Conselho Estadual de Educação (CEE); Delegacia Regional de Educação (DRE) ou Subsecretaria de Educação; c) Municipais : Secretaria Municipal de Educação (SME); Conselho Municipal de Educação (CME) (LIBÂNEO, 2006, p. 236, grifo nosso).

Estes órgãos são, no Brasil, os responsáveis pelas políticas públicas de

educação para a organização dos sistemas de modo democrático.

O Brasil vem, ao longo dos anos, desenvolvendo uma política voltada à

descentralização da educação unificada, mas não há como esquecer que o pais tem

dimensões continentais, com enorme diversidade de culturas locais. Portanto, o

modelo único de gestão deverá ser respeitado em cada região. Como afirmam

Gadotti e Romão (1997b, p. 137), "O novo modelo de gestão democrática a ser

construído deverá ser adequado às características locais pelas próprias

comunidades escolares".

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Cabe, aqui, a observação de Arendt (1998, p. 21-22) sobre a definição de

política:

A política baseia-se na pluralidade dos homens. A política trata da convivência entre diferentes. A política organizada de antemão, a diversidades absolutas de acordo com a igualdade relativa e em contrapartida as diferenças relativas. A política refere-se às formas de organização da vida em sociedade.

Esta definição faz acreditar que as políticas devem ser organizadas em

benefício da sociedade, cujo objetivo é o coletivo, logo, o bem-estar de todos.

O bom hábito de participação cidadã é fazê-la através da gestão

compartilhada, quanto ao do gestor é prestar contas e ouvir a sociedade civil para,

juntos, planejarem ações democráticas.

Novamente, nota-se a preocupação com a administração voltada ao coletivo,

em que todos os envolvidos se sintam responsáveis pelo processo democrático da

escola.

A democracia participativa é um exercício em que todos têm o dever de

cobrar sobre o processo de mudança, sempre atrelado ao cumprimento da lei.

Ao conceituar o termo participação Bordenave (1994) diz que três idéias

fazem complementam seu significado: fazer parte, tomar parte e ter parte:

[...] seria então aquela em que os cidadãos sentem que, por 'fazerem parte' da nação, 'tem parte' real na sua condução e por isso seu ambiente na construção de uma era nova na sociedade da qual 'sentem parte' (BORDENAVE, 1994, p. 23).

A democracia participativa, para Bordenave (1994), é aquela em que os

sujeitos, ao se sentirem incluídos em um grupo social, têm parte real na sua

condução e por isto se sentem responsáveis na execução, no planejamento e na

construção de uma sociedade atuante.

Fazer parte do ambiente de construção democrática será o diferencial na

democracia, em que cada um faz, tem e sente, como sujeito de mudança. E a

participação se transforma conforme o grupo.

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A democracia participativa promove a subida da população a níveis cada vez mais elevado de participação decisória, acabando a divisão de funções entre os que planejam e decidem lá em cima e os que executam e sofrem as conseqüências e as decisões cá embaixo (BORDENAVE, 1994, p. 34).

A participação segundo o autor é uma necessidade do sujeito em ser

respeitado e se fazer presente nas políticas públicas e ensina a conviver com as

diferenças e com os conflitos, estabelecendo parecerias que garantam os interesses

individuais e coletivos de grupos, criando, assim, uma convivência harmoniosa e

aceitação de si mesmo e do outro, enquanto sujeitos da construção da história.

A riqueza com que aprendemos com o outro é um valor inestimável, pois o

respeito e a contribuição de cada um ao doar-se ao grupo são valorizados como

aspectos importantes ao crescimento do trabalho do gestor. Com isto, percebe-se

que todos são capazes de administrar e gerir suas vidas com êxito. Portanto, o

conhecimento adquirido através deste processo de gestão democrática levará a

fortalecer suas competências.

Pensar a participação em todos os momentos do planejamento da escola, de

execução e de avaliação, significa não fazê-lo de modo limitado aos convites à

comunidade para eventos ou para contribuir na manutenção e conservação do

espaço físico, embora os dois momentos sejam importantes para se conseguir a

participação de todos.

A palavra chave é a flexibilidade de se trabalhar com a diversidade de

culturas, consideradas as dimensões territoriais do país. Não há como conceber uma

lei única para todos os estados e municípios em relação à gestão democrática do

ensino.

A lei da Gestão Democrática do Ensino Público deve ser uma lei com o máximo de flexibilidade porque as realidades no país são tão diversas que não se pode estabelecer uma norma jurídica rígida considerando as dimensões geográficas intercontinentais do Brasil (GADOTTI; ROMÃO, 1997b, p. 137).

A valorização e o respeito ao ser humano deve ser trabalhados na escola

como exercício de cidadania para fortalecer e criar mecanismos de defesa na

construção democrática.

É um direito do cidadão fazer parte, tomar parte e ter parte na gestão

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democrática na escola e na comunidade. Cabe, pois, ao poder público o dever de

facilitar a participação e viabilizar, facilitar as informações e mobilizar a população

para que a participação aconteça, efetivamente.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), Lei Federal nº.

9.394, de 20 de dezembro de 1996, tem como princípio a gestão democrática do

ensino público e, mais uma vez, volta-se a discutir e dar prioridade a outra forma de

administração da escola pública. Outra prioridade é a comunidade, isto é, a família

como participante desse processo de ensino, estabelecendo o conjunto escola,

família e comunidade.

Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino publico na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: I – participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II – participação das comunidades escolar e local em Conselhos de Escola ou equivalentes (GADOTTI; ROMÃO, 1997a, p. 16).

A gestão democrática, desde a Constituição de 1988 e da LDBEN, é

considerada um direito garantido, que deve ser conquistado por todos que acreditam

que só através do compromisso coletivo haverá resultados, não só na área de

educação, mas em todas as áreas sociais, com esforço e crédito na opção pela

democracia participativa e crítica do cidadão brasileiro.

Decorrente da Constituição Federal, o Estatuto da Criança e adolescente

(ECA) também é importante mecanismo formal de garantia do acesso à educação

de zero a dezoito anos, bem como garantia de participação no seu processo de

ensino formal, que incentiva a criança e o adolescente à liberdade de opinião e

expressão.

A participação de todos nesse processo é fundamental para a implantação da

gestão democrática, pois os profissionais e a comunidade devem trabalhar juntos

para o planejamento e direcionamento, a fim de dar novo rumo à educação.

O trabalho de um gestor escolar comprometido com a democracia vai se

fortalecendo, dia a dia, através de seu exemplo no desempenho do papel de

facilitador, coordenando a equipe de modo participativo.

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As pessoas se responsabilizam e tomam consciência de sua importância no

processo de mudanças pessoais e políticas quando se sentem importantes e

valorizadas como sujeito.

Silva (2000, p. 46) observa que é perfeitamente possível o sucesso com a

adesão do sujeito:

Um dirigente que busque administrar mudanças que contem com a adesão real e duradoura das pessoas envolvidas, provavelmente terá mais êxito se atentar para a dimensão aqui considerada: a dimensão cultural constitutiva de todo ser humano.

Nesta adesão o papel do coordenador é fator de suma importância na

formação democrática, o que se dará em todas as formas de trabalho em que a

dimensão coletiva é respeitada.

O fortalecimento e o crescimento da equipe se darão na formação conduzida

pelo gestor, visando sempre à participação de todos, desde o mais humilde

funcionário até o gestor.

A responsabilidade é de todos. Luck (2002) afirma que o desenvolvimento da

equipe é uma dimensão básica do estilo de gestão participativa. Tanto no colégio em

que fui diretor e agora na casa de abrigo, procuro fortalecer a equipe, pois descobri,

através dos anos, que se não houver um tempo para nos formar e formar a equipe, o

trabalho será inócuo, pois haverá pessoas limitadas a desenvolver sua função, sem

compromisso ético com o trabalho:

O desenvolvimento de equipe é uma dimensão básica do estilo de gestão participativa. O diretor eficaz é um líder que trabalha para desenvolver uma equipe composta por pessoas que conjuntamente são responsáveis por garantir o sucesso da escola (LUCK, 2002, p. 45).

Luck (2002) afirma, ainda, que a direção se constrói com a participação no

exercício da democracia coletiva, portanto, o trabalho de um gestor comprometido

com a equipe terá mais sucesso e eficácia no aspecto coletivo. Procuro desenvolver

minhas competências voltadas à construção coletiva. Por vezes, é difícil conseguir a

adesão de todos, mas sempre se pode retroceder em algumas decisões para o bem

do grupo.

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Convém lembrar que estou fazendo uma retomada da minha experiência

como diretor de escola e, hoje, na direção de uma Casa de Abrigo, em São Paulo. O

foco é o trabalho de valorização e motivação da equipe, para que seus integrantes

estejam envolvidos e sejam responsáveis em suas atividades. Se o gestor

democrático tiver um olhar diferente, saberá motivar e valorizar o trabalho do outro,

respeitando as potencialidades de cada elemento da equipe.

Conforme afirma Luck (2002), todos os envolvidos são responsáveis pelo

trabalho, cujo resultado será a satisfação do cliente:

Em organização democraticamente administrada – inclusive escolas – os funcionários são envolvidos no estabelecimento de objetivos, na solução de problemas, na tomada de decisões, no estabelecimento e manutenção de padrões de desempenho e na garantia de que sua organização está atendendo adequadamente às necessidades do cliente (LUCK, 2002, p. 15).

O cuidado de ouvir o que outro tem a dizer é fundamental para a formação do

gestor, pois ele não detém todos os saberes. A humildade de buscar a ajuda no

outro é que o torna capaz de resolver os conflitos.

O gestor, com sua autoridade, deve conduzir o trabalho de modo participativo.

Valerien (1997, p. 149) afirma, com convicção, que a divisão das tarefas deverá ser

feita com a participação de todos:

Papel do diretor [...] A Autoridade, englobando a objetividade, a compreensão, a tomada de decisão, a organização do trabalho em grupo conduzindo à divisão de tarefas e responsabilidades, e, essencialmente, a maior participação das pessoas envolvidas no trabalho escolar.

Essa autoridade integra o conjunto de competências do diretor, e deverá ser

conduzida de forma democrática para as tarefas e as responsabilidades, sempre

com o intuito de fazer com que todos os envolvidos realizem suas atividades

conscientemente, não só no trabalho em escola, mas em todos os ambientes em

que haja pessoas envolvidas.

Como dizem Gadotti e Romão (1997a, p. 17-18), a gestão democrática

tornou-se, hoje, condição necessária da reforma educacional brasileira.

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Percebe-se que estas mudanças estão acontecendo em alguns estados, de

maneira mais eficaz e, em outros, discretamente. Mas as influências positivas estão

acontecendo.

Como movimento histórico-social, a gestão democrática já vem exercendo influência positiva sobre a educação brasileira como um todo: sobre a estrutura e o funcionamento dos sistemas: 'colaboração' entre os sistemas e comunicação direta da administração com as escolas; sobre a organização do trabalho na escola: autonomia, projeto político-pedagógico e avaliação compartilhada (escola e sistema); sobre o órgão de gestão da educação: plano estratégico de participação, canais de participação (ampliação do acesso à informação) e, por isso, transparência administrativa; sobre a qualidade de ensino: formação para a cidadania (cria possibilidades de participar da gestão pública); sobre a definição e acompanhamento da política educacional: o aumento da capacidade de fiscalização da sociedade civil sobre a execução da política educacional se não tem extinguido, pelo menos tem diminuído os lobbies corporativistas (GADOTTI; ROMÃO, 1997a, p. 17-18).

Os tópicos apresentados por Gadotti e Romão (1997a) são relevantes ao

trabalho que a escola vem desenvolvendo para efetivar a gestão democrática. A

formação para a cidadania criará um sujeito comprometido e participativo na gestão

pública.

Por essa razão a educação tem papel importante na política pública, pois

a participação na gestão da escola proporcionará melhor conhecimento do funcionamento da escola e de todos os seu atores; proporcionará um contato permanente entre professores e alunos, o que leva ao conhecimento mútuo e , em consequência, aproximará também dos alunos dos conteúdos ensinados pelos professores (GADOTTI, 1997, p. 35).

É um verdadeiro desafio viver a gestão democrática, mas a escola vive o

processo de democratização que parte da própria sociedade, entretanto, a

democratização da escola depende mais de nós do que dos políticos. Logo, a

condição fundamental para a transformação da democracia política em democracia

participativa é o envolvimento de todos os setores da sociedade.

Uma administração sólida é obtida com desenvolvimento individual, como

afirma Cury (2007), pois a sociedade só crescerá se tiver seu objetivo claro e voltado

ao indivíduo como um ser de valor concreto:

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Voltada para um processo de decisão baseada na participação e na deliberação pública, a gestão democrática expressa um anseio de crescimentos dos indivíduos como cidadãos e do crescimento da sociedade enquanto sociedade democrática. Por isso a gestão democrática é a gestão de uma administração concreta (CURY, 2007, p. 494).

De acordo com Antunes (2005), a democratização da gestão implica na

participação da sociedade como ator principal, respeitando, sobretudo, seus direitos

e interesses:

A democratização da gestão implica o acesso da população à educação, mas também a participação desta na tomada de decisões que dizem respeito a seus interesses. Isso pressupõe distribuição do poder centralizado do Estado para as instâncias da base pirâmide estatal [...] (ANTUNES, 2005, p. 30).

Na trajetória de gestor, em que busquei, através do outro, a razão pra

administrar e gerir a instituição – colégio ou casa de abrigo – com a preocupação de

me formar e formar aqueles com quem trabalho, o foco principal foi a manutenção do

equilíbrio e a intenção de colocar em prática o ensinamento de Ferreira (2006, p.

113):

[...] nossa prática de gestão, comprometida com a formação de homens e mulheres brasileiros fortes e capazes de dirigir seus destinos, os da nação e os do mundo, tem que possuir a força do conhecimento-emancipacão que possibilita o equilíbrio da afetividade nas relações, a competência em todas as atividades e a riqueza firme do caráter que norteia nossas ações.

A atitude do grupo encontra respaldo em Alonso (1976), ao observar que a

ação deve ser orientada para a eficiência, e o objetivo comum deverá sempre

representar a tarefa:

[...] administração se apresenta como a ação orientada para a eficiência e se concretiza na efetivação de um certo tipo de tarefa proposta que deve representar o objetivo comum do grupo. O seu aparecimento está ligado à complexidade social e à divisão do trabalho e irá determinar, por sua vez, o aparecimento de estruturas mais complexas na organização [...] (ALONSO, 1976, p. 28).

Portanto, toda ação deve ser pensada e planejada para o trabalho coletivo,

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pois a organização e a motivação são fundamentais para que todos trabalhem com

responsabilidade. Além disso, proporcionar esclarecimento sobre os objetivos, metas

e estrutura organizacional da instituição favorece a interação entre professores,

alunos e pais. A escola possibilitará o envolvimento da comunidade escolar para a

obtenção de melhores resultados.

Daí, a responsabilidade do gestor em criar um ambiente que estimule o

aprendizado e a participação de todos no processo educativo.

Escrever e falar de políticas públicas em educação é algo de certa

complexidade, pois o papel de cidadão e sujeito é participar do processo

democrático, que exige envolvimento nos movimentos sociais, para consolidar o

direito da sociedade.

A convocação é bem clara e enfatiza a necessidade de compromisso e

participação de todos os que estão envolvidos na educação:

Percebe-se que o Estado já está bastante avançado na luta por uma

educação democrática e tem como atores os próprios sujeitos do processo

educativo.

Com esta convocação, percebe-se que há uma preocupação em continuar o

projeto de democratização, que, para continuar evoluindo, necessitará da

participação efetiva da comunidade escolar.

Os movimentos sociais constituem luta constante por melhorias não só na

área de educação, mas em todos os campos sociais do país e os resultados

alcançados até o momento são a participação coletiva em plenárias realizadas com

intuito de possibilitar a autonomia do Estado e Municípios na parte administrativa,

financeira e pedagógica da escola, cujo resultado provém do trabalho coletivo.

Este trabalho está sendo um marco para Estado, voltado à melhoria da

qualidade de ensino, enfatizado no sentido de que o trabalho deve ser discutido,

tornando-se objeto de compromisso de todos, especialmente os que estão

envolvidos na escola, como os professores, pais e alunos. Portanto, a participação

de todos os seguimentos da escola é conveniente para o processo de adesão à

gestão democrática.

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Por derradeiro, cabe destacar os dizeres de Barroso (1996, p. 186) ao alertar

sobre o fato de que a autonomia almejada da escola é um trabalho de todos os

envolvidos, internos ou externos:

A autonomia da escola não é a autonomia dos professores, ou a autonomia dos pais, ou a autonomia dos gestores. A autonomia, neste caso, é o resultado do equilíbrio de forças, numa determinada escola, entre diferentes detentores de influência (externa ou interna), dos quais se destacam: o governo os seus representantes, os professores, os alunos, os pais e outros membros da sociedade local.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A construção e a reconstrução das práticas de gestão democrática nas

relações que desenvolvi e desenvolvo no meu cotidiano profissional serão sempre

aspectos relevantes para a autonomia dos envolvidos nas instituições em que atuei

e atuo, pois é através do retorno ao passado que descobri uma nova forma de viver

o presente. Portanto, é o reconhecimento do valor da experiência.

Continuo na busca da autoformação, cujo objetivo é a minha formação e

daqueles que atuam comigo, visando democracia e trabalho voltado para o coletivo.

Percebi que, através deste estudo, tornei-me sujeito com criticidade acurada,

marcada pelo compromisso com a ética, considerando, sobretudo, que formo e sou

formado, diariamente, ao escutar e valorizar o meu colaborador.

Já construí muito, embora saiba que o trabalho ainda é intenso, todavia, levo

adiante o meu compromisso, respaldado nas informações e conhecimentos

assimilados com humildade, conduzido pela complexidade do mundo, divisado por

suas possibilidades e dificuldades.

Como sujeito comprometido com a democracia, minha atitude é de um

formador que tem no outro a possibilidade de aprendizado, colocando em prática a

postura interdisciplinar, cuja construção se deu de maneira partilhada com meus

colegas de trabalho.

Ao fazer o resgate da prática de gestão, reconheço a importância de partilhar

e contribuir com o público a experiência assimilada nesses anos de gestor em que

busquei utilizar a gestão democrática na prática do cotidiano escolar.

Ao tentar compreender e apropriar-me das minhas vivências familiares,

religiosas e profissionais, fui me aprofundando e descobrindo o quanto estas

experiências estavam latentes em mim, mas, ao mesmo tempo, me faziam perceber

o quanto foram e são importantes para o meu crescimento pessoal.

No decorrer da pesquisa, fui me conhecendo e reconhecendo os limites e as

relações que desenvolvi ao longo da minha trajetória, que me permitem construir

novos níveis de consciência.

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Percebo que descobri e (re)criei espaços formativos, isto é, lugares que

conheci, investiguei, problematizei, reconhecendo os limites e as possibilidades de

mudanças, que estão inteiramente ligados ao meu processo formativo.

Os movimentos de reflexão foram fruto das ações pautadas na escuta do

outro: funcionários, pais e alunos da escola e do abrigo. A diferença de conduta

repercute em todo o processo formativo, em que o sujeito aprende e o grupo

percebe o quanto está sendo valorizado e respeitado.

O respeito foi conquistado pela humildade, com a consciência de que nada se

faz sozinho. O trabalho em parceria é necessário para o comprometimento do grupo

que se torna responsável, assume o compromisso e leva em frente o trabalho

buscando bons resultados.

Assim, a cada dia vivo nesta busca constante de aprender com outro o

verdadeiro sentido do trabalho democrático, deixando de lado o modo de persuadir e

manipular as idéias, mas buscar o bem comum.

Enfim, tenho a possibilidade de ser sujeito da minha história e continuar

acreditando na minha formação e, com isto, tornar-me exemplo formativo.

Ao relembrar os movimentos de minha vida, percebo que estive na busca

constante das minhas raízes, desde a infância, recordando momentos de lazer,

momentos religiosos e escolares, cujas lembranças não podem ser esquecidas,

devido à importância que tem para quem as vivenciou, possibilitando reconhecer o

papel de formador de sua própria vida.

A relevância do resgate da história de vida, como eixo metodológico da

pesquisa, mostra o caminho percorrido para me tornar um gestor democrático,

comprometido com a ética e a humildade nas relações interpessoais no ambiente de

trabalho.

Revivendo o passado, descobri o quanto a família contribuiu, e ainda

contribui, na trajetória do menino nascido em Santarém, que jamais imaginou que

estaria, hoje, em São Paulo, concluindo o curso de Mestrado em Educação,

sobretudo por ser oriundo de uma família humilde e sem posses. Enfim, estou aqui e

quero, neste momento, destacar a importância de todas essas vivências para o

amadurecimento pessoal e profissional e a contribuição destes fatores para a minha

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formação. Assim, meu projeto de vida traz um movimento de recuperação de tudo

aquilo que vivi e vivo nos dias de hoje.

Considero-me capaz de mudanças no ambiente de trabalho, consciente da

necessidade de transpor as barreiras do comodismo, através do comprometimento

com o outro, ignorando o aspecto individual e destacando o coletivo como principal

objetivo do trabalho.

As lembranças no decorrer da pesquisa fizeram-me refletir também sobre os

momentos tristes, pois fazem parte da formação e ressurgem como obstáculos,

provocando o nascimento de um novo sujeito, consciente de suas ações

modificadas pelo tempo.

Desta forma, compreendo que todos os momentos alegres e tristes já vividos

marcaram a trajetória de vida, destacando as mudanças ocorridas, visíveis na minha

prática profissional, em que a valorização do ser humano é ponto culminante e

facilitador para a obtenção de ambiente acolhedor e motivador, o que vem

comprovar que a empatia, a aproximação, o afeto e o respeito são fatores

preponderantes para o resultado pretendido.

De modo geral, a autoformação é um processo dinâmico, uma construção

permanente, complexa, que exige reflexão sobre as ações praticadas no campo

profissional e pessoal.

No decorrer deste movimento de gerir democraticamente percebe-se que

muitas vezes temos momentos de grandes conflitos de opiniões diversas, mas isto

faz parte do trabalho, pois não queremos pessoas que só dizem sim e concordam

com tudo que o gestor diz.

O ponto-chave de todo trabalho coletivo é delegar poderes, pois capacitar,

mediar e orientar são a "essência da função" gestora . O gestor deve dedicar grande

parte de seu tempo na interação com sua equipe.

O processo de autoformação tem início quando o sujeito-gestor toma

consciência da capacidade de construir a si próprio e os que o cercam.

Ao investir em si mesmo, é possível abrir espaço maior de transformação, dos

limites, visando à mentalidade formativa.

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Como afirma Fazenda (1999, p. 43), acerca da atitude interdisciplinar, “[...]

algo que não pode ser apenas explicado, porém, vivido, que não pode ser apenas

analisado, porém, sentido, que não pode ser apenas refletido, porém, intuído.”

É importante perceber que a construção não nasce instantaneamente, mas é

fruto de um processo de amadurecimento e reflexão, inspirado na história de vida,

fundado na capacidade individual, nas teorias cientificas e suas implicações, nos

valores, conotações, religiosidade, laços afetivos etc.

Ademais, é importante lembrar que as práticas participativas não acontecem

em situação ideal, na qual o sujeito é neutro e consciente do seu papel social, mas

dotado de personalidade própria, resultante de sua trajetória de vida, eivado de

características culturais, religiosas e políticas diferentes, específicas.

A inclusão dos funcionários nas tomadas de decisões se faz de modo

participativo, valorizando o sujeito na gestão democrática, pois a democracia se

conquista através da participação.

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