democracia, formação e gestão escolar

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Cleonara Maria SchwartzGilda Cardoso de AraujoPaulo da Silva Rodrigues

(Orgs.)

VITÓRIA2010

escola de gestores da educação básica

democracia, Formação e gestão escolar:Reflexões e Experiências do Programa Nacional

Escola de Gestores da Educação Básica no Estado do Espírito Santo

Page 4: Democracia, Formação e Gestão Escolar

© GM Gráfica e Editora Ltda.Todos os direitos reservados. A reprodução de qualquer parte da obra,

por qualquer meio, sem autorização do editor, constitui violação da LDA 9.610/98

EditoraçãoEdson Maltez Heringer

[email protected] | 27 8113-1826

ImpressãoGM Gráfica e Editora

[email protected] | 27 3323-2900

Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)(Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil)

E74 Escola de gestores da educação básica : democracia, formação e gestão escolar : reflexões e experiências do Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica no Estado do Espírito Santo / Cleonara Maria Schwartz, Gilda Cardoso de Araujo, Paulo da Silva Rodrigues (orgs). — Vitória: GM, 2ª edição - 2010.

212 p. ; 20 cm. Inclui bibliografia. ISBN 978-85-99510-57-5

1. Educação – Espírito Santo (Estado). 2. Escolas – Organização e administração. 3. Ensino fundamental. I. Schwartz, Cleonara Maria. II. Araujo, Gilda Cardoso de. III. Rodrigues, Paulo da Silva.

CDU: 37.07/.09

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Sumário

Apresentação ................................................................................................................................... 7

O Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica no Espírito Santo: reflexões sobre os desafios da formação continuada de diretores .................................... 9 Gilda Cardoso de Araujo Cleonara Maria Schwartz

Programa Escola de Gestores: um olhar sobre as práticas curriculares e avaliativas ............................................................................. 25 Wagner dos Santos

Programa Nacional Escola de Gestores: o gênero textual mensagem como artefato tecnológico potencializador da educação a distância ............................. 41 Elane Nardotto Rios

Projeto Político Pedagógico: reflexões para a construção de uma escola participativa .............................................................................. 57 Paulo da Silva Rodrigues

Gestão democrática na escola pública: ação sócio-pedagógica que se faz ao caminhar ..................................................................... 69 Aurelina Sandra Barcellos de Oliveira Carlos Cezar Gonçalves da Rocha Dagilza Lopes Sant’Ana Lessi Nunes de Moraes Braz Maria Madalena Loureiro

O compromisso da gestão democrática na garantia de acesso e permanência do aluno na escola ......................................................................... 85 Deuza Lorencini Barros José Francisco Barbosa Maria Julia de Medeiros Mangaravite

FUNDEB e gestão democrática: formação dos conselhos e controle social dos recursos ............................................................................... 97 Maria de Lourdes Mendes Gava Maristela Wassoler

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A participação popular do Conselho Escolar na gestão democrática ..........................109 Adriana Alves dos Santos Maria Cristina Silva de Santana Sara Santos Mercier

Políticas públicas de combate à evasão escolar na Educação de Jovens e Adultos – EJA – nas escolas da rede municipal de Vitória ..............................125 Isabel Cristina Ribeiro Chagas Leila dos Santos Vieira Marly Siqueira Soraya Luana Rodrigues Souza

Formação continuada em contexto: forjando ações colaborativas entre professor de educação especial e de ensino regular para garantia de acesso, permanência e educação com qualidade a educandos com necessidades educacionais especiais ...............................................................................................................145 Dinéa Guiomar Loureiro da Silveira Eloisa Elena Corteletti Erller Maria Raquel Marques Valle

A “evasão” da família no espaço escolar ................................................................................167 Andréa Zamprogno Caser Denise Pinheiro Quadros Vânia Neves M. Espíndula Vivian Ferrari Bremenkamp

Ambiente escolar democrático combatendo a indisciplina ............................................181 Grace Luz Dias Maria do Carmo Pereira Butkowsky Maria José Gomes de Souza Marilia Lucia Pansini

Formação continuada de professores no âmbito escolar ................................................195 Deneci Nascimento Secchim Helio Pettene Janete Bindaco Akisaski Silva Marilene de Souza Duarte Marlene Martins Rosa Patrocino

Sobre os autores ..........................................................................................................................207

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7DEMOCraCIA, FORMAçãO E GESTãO ESCOLAR

Apresentação

O Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica Pública, coordenado pela Secretaria de Educação Básica/Ministério da Educação e Cultura SEB/MEC, faz parte das ações do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) e surgiu da necessidade de se construir processos de gestão escolar compatíveis com a proposta e a concepção da qualidade social da educação, baseada nos princípios da moderna administração pública e de modelos avançados de gerenciamento de instituições públicas de ensino, buscando assim, qualificar os gestores das escolas da educação básica pública, a partir do oferecimento de cursos de educação a distância.

O objetivo do referido programa é formar gestores especialistas (lato sensu), efetivos das escolas públicas da educação básica, incluindo aqueles de educação de jovens e adultos, de educação especial e de educação profissional, contribuindo com a qualificação do gestor escolar na perspectiva da gestão democrática e da efetivação do direito à educação com qualidade social.

A meta estabelecida para a primeira etapa deste programa foi a formação de 4.000 cursistas nos 10 estados que fizeram parte do Projeto Piloto do Programa Escola de Gestores. Os estados que participaram da primeira etapa foram: Santa Catarina, Ceará, Pernambuco, Bahia, Piauí, Rio Grande do Norte, Mato Grasso, Espírito Santo, Rio Grande do Sul e Tocantins. A partir de 2007, o programa foi ampliado para os demais estados da federação.

Esta publicação é resultado do desenvolvimento do programa no Estado do Espírito Santo e apresenta 13 artigos de profissionais da educação, dentre os quais, estão coordenadores, professores e alunos que participaram dessa experiência piloto, proporcionada pela parceria SEB/MEC e a Universidade Federal do Espírito Santo.

Os textos estão organizados a partir da experiência vivenciada por profissionais que assumiram a responsabilidade de implementar esta proposta desafiadora, que é oferecer uma educação de qualidade através da modalidade de educação a distância, e de trabalhos de conclusão do curso, apresentados pelos alunos como requisito parcial para obtenção do título de especialista em gestão escolar, que foram indicados pelas bancas examinadoras para publicação.

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8 ESCOLA DE GESTORES DA EDUCAçãO BáSICA

Dentre os trabalhos apresentados pelos alunos, destacamos aqueles que abordam temáticas importantes, que precisam ser colocadas em discussão no ambiente escolar, tais como: a elaboração do projeto político-pedagógico, gestão democrática participativa, qualidade do ensino, políticas públicas de educação, formação continuada, conselho escolar, entre outras vivenciadas no cotidiano da escola.

É preciso ressaltar que os textos dos alunos, indicados para publicação pelas respectivas bancas, passaram por um novo processo de seleção. Esse processo ficou sob a responsabilidade dos organizadores deste livro, que estabeleceram critérios com a finalidade de selecionar os dez artigos que agora, também fazem parte desse livro.

A educação à distância se apresenta como uma nova maneira de nos relacionarmos com o conhecimento e – a partir de estratégias diferenciadas, de um trabalho integrador, profissionais competentes, alunos comprometidos, materiais didáticos específicos, meios de comunicação e outros recursos necessários –, poderá ser mais uma modalidade de ensino que possibilita a produção do conhecimento, a qualificação de profissionais, o acesso às tecnologias, a informação significativa e a mediação de professores efetivamente preparados para a sua utilização inovadora.

Esta publicação se torna importante no cenário das políticas de formação de gestores por propiciar a reflexão e o diálogo sobre a experiência dos profissionais envolvidos diariamente na realização do programa, e sobre as reflexões dos dirigentes/cursistas. Assim é um material que apresenta contribuições tanto da universidade quanto das escolas e sistemas de ensino.

Esperamos que esta contribuição seja útil para ressignificar tanto as políticas educacionais voltadas para a formação de gestores quanto a própria prática dos gestores nas unidades de ensino.

Gilda Cardoso de AraujoPaulo da Silva Rodrigues

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9DEMOCraCIA, FORMAçãO E GESTãO ESCOLAR

O Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica no Espírito Santo:

reflexões sobre os desafios da formação continuada de diretores

Gilda Cardoso de AraujoCleonara Maria Schwartz

“É mais fácil cultuar os mortos que os vivosmais fácil viver de sombras que de sóis

é mais fácil mimeografar o passadoque imprimir o futuro

não quero ser tristecomo o poeta que envelhece

lendo maiakóvski na loja de conveniêncianão quero ser alegre

como o cão que sai a passear com o seu dono alegresob o sol de domingo

nem quero ser estanquecomo quem constrói estradas e não anda

quero no escurocomo um cego tatear estrelas distraídas

quero no escurocomo um cego tatear estrelas distraídas”

(Zeca Baleiro – Minha Casa)

É mais fácil mimeografar o passado do que imprimir o futuro

Em maio de 2007 teve início, na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), o Curso de Especialização em Gestão Escolar, um dos 10 (dez) projetos pilotos inserido no Programa Nacional Escola de Gestores da

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Educação Básica (PNEGEB) da Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação. O início foi marcado por muitas dificuldades, desafios e incertezas, entre os quais destacamos:1. como evitar a armadilha de o curso cair na banalização da mera

certificação?2. de outro lado como compatibilizar a modalidade do ensino à distância

com a qualidade e com o cotidiano atribulado dos gestores/cursistas do programa, evitando evasão massiva?

3. como conduzir o curso de modo que os seus conteúdos fossem significativos para o gestor e chegassem ao “chão da escola”?

4. como transformar a distância em redes e outras possibilidades de reflexão e de construção de conhecimento sobre o cotidiano da gestão escolar?

5. como articular universidade, secretarias de educação, superintendências de educação com metas e esforço comuns para a formação dos gestores/cursistas?

A letra da música “Minha Casa” do compositor Zeca Baleiro traduz bem esse quadro de dificuldades, desafios e incertezas que se apresentou no início e no decorrer do curso, tomado pela equipe como um grade desafio. A principal dificuldade foi, talvez, superar muitos (pré)-conceitos em relação à modalidade de ensino à distância (EAD). A equipe se dispôs, como diz trecho da música da epígrafe, “a não ser estanque, como quem constrói estradas e não anda”. Reconhecíamos que o PNEGEB nessa modalidade nos desafiava a (re)pensar e (re)programar nossos saberes e competências como docentes de uma universidade.

Nessa direção os pilares do trabalho docente deveriam se assentar em três aspectos essenciais: a) centralidade na aprendizagem, com foco na autonomia e responsabilidade dos cursistas, na perspectiva de uma formação comprometida e integrada numa comunidade de aprendizagem (com os outros cursistas e com a própria comunidade escolar); b) interação entre professores da UFES, professores de turma, professores assistentes, alunos entre si e com os outros, na perspectiva de consolidar grupos de discussão com capacidade de reflexão crítica e sistematização sobre a mesma e; c) inclusão digital para possibilitar o acesso de todos aos conteúdos e atividades do curso.

Aparentemente simples no enunciado, esses três pilares são complexos quanto à sua operacionalização, levando-se em conta as necessárias relações

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do processo de formação, via curso de especialização, com o MEC/SEB, com as instâncias administrativas da UFES, com a equipe do curso, com os sistemas de ensino, com as escolas e com os cursistas. É exatamente sobre essa operacionalização complexa que incidirá nossa análise.

É mais fácil viver de sombras que de sóis: o PNEGEB

O Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica (PNEGEB) tem por objetivo principal contribuir com a formação de gestores educacionais da escola pública em articulação com outros programas federais - como os Programas Conselhos Escolares, Pró-Conselho, dentre outros. - bem como, fundamentalmente, em articulação com as instituições públicas de ensino superior e sistemas de ensino estaduais e municipais.

Desde janeiro de 2006, o Programa vem sendo coordenado pela Secretaria de Educação Básica (MEC/SEB), contando com a colaboração da Secretaria de Educação à Distância (SEED) e do Fundo de Fortalecimento da Escola – FUNDESCOLA\FNDE.

No ano de 2006, 10 (dez) universidades federais foram convidadas a integrar programa, especialmente na oferta de um Curso de Especialização em Gestão Escolar (Lato Sensu). O critério para participar da experiência piloto do PNEGEB, via curso de especialização, foi a participação, dos 10 estados onde estas universidades estavam situadas, no Programa Nacional Escola de Gestores implementado em caráter experimental em 2005, sob a coordenação do Instituto Nacional Estudos e Pesquisas Pedagógicas Anísio Teixeira (INEP) que realizou um projeto-piloto de formação continuada de dirigentes, por meio de um curso de 100 horas, sob a responsabilidade das secretarias estaduais de educação, utilizando o suporte tecnológico do e-Proinfo. (MEC/SEB, 2007).

Ao propor o formato de curso de especialização, o Ministério da Educação demonstrava a intenção de romper as barreiras entre as distintas esferas de governo e assumir um papel protagonista na elaboração e implantação de uma política nacional de formação de gestores, pois o curso, suas diretrizes e sua proposta curricular induziam a uma articulação entre agências formadoras (universidades federais e sistemas de ensino) que atuavam de maneira fragmentada, bem como rompia com o ciclo da dissociação entre teoria e prática. (AraUJO, 2008)

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Do ponto de vista dos princípios, as diretrizes do Curso de Especialização em Gestão Escolar do PNEGEB se configuram a partir do tripé: gestão democrática, qualidade do ensino e direito à educação. Do ponto de vista normativo, além da Constituição Federal de 1988 e da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, as diretrizes se apóiam no que está prescrito no Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado pela Lei nº 10.172/2001. Vale destacar que o PNE enfatiza a importância da gestão democrática nas unidades de ensino e apresenta como uma das metas para a gestão “Estabelecer, em todos os estados, com a colaboração dos municípios e das universidades, programas de curta duração de formação de diretores de escolas, exigindo-se, em cinco anos, para o exercício da função, pelo menos essa formação mínima”. Do ponto de vista curricular, o Curso de Especialização em Gestão Escolar do PNEGEB adotou como princípios a interdisciplinaridade, a metodologia de resolução de problemas e estratégias de ensino-aprendizagem que dialogassem com o “chão da escola”, particularmente no que se refere à elaboração, acompanhamento e avaliação do Projeto Político-Pedagógico.

A proposta curricular previa a utilização da modalidade EAD, inicialmente mediante o suporte tecnológico da plataforma e-proinfo, que já havia sido utilizada na formação continuada de gestores pelas Secretarias de Educação que fizeram parte do projeto-piloto em 2005. Entretanto, a concepção de organização de conteúdos de forma não modular, mas sim interdisciplinar, fez com que a SEB, seus consultores1 e os representantes das 10 (dez) universidade que participariam da experiência piloto do Curso de Especialização pensassem num suporte tecnológico mais interativo. Sendo assim, após longas discussões e construção de consensos, o suporte adotado foi a plataforma e-learning conhecida como Moodle.

Os conteúdos do curso foram estruturados, com base nas duas diretrizes, em três eixos vinculados entre si: a) o direito à educação e a função social da escola básica; b) políticas de educação e a gestão democrática da escola; c) Projeto Político-Pedagógico e Práticas Democráticas na Gestão Escolar. Por sua vez, esses eixos constituíram seis salas virtuais denominadas Salas Ambientes, além de um ambiente introdutório à plataforma Moodle e ao Curso de Especialização.

1 Os consultores eram integrantes do Grupo de Trabalho Estado e Política Educacional da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd) e da Associação Nacional de Política e Administração da Educação (ANPAE).

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No projeto do Curso de Especialização, a estrutura curricular interdisciplinar, a partir das salas ambientes, está apresentada da seguinte forma:

Fonte: MEC/SEB - Diretrizes Nacionais do Curso de Especialização Em Gestão Escolar (2007).

Como pode ser notado, a Sala Ambiente Projeto Vivencial (PV) com uma carga horária de 120h (das 400 h a serem cumpridas pelos cursistas) possui vinculação com as demais salas. Ela foi pensada, ao mesmo tempo, como um espaço de convergência para os conteúdos das outras salas ambientes e como um espaço de articulação do curso. Nessa Sala Ambiente, a proposta de ensino-aprendizagem é a elaboração de um projeto de intervenção na escola que incida na formulação, implantação e avaliação do projeto político-pedagógico da instituição educativa. Esse projeto constitui o Trabalho de Conclusão do Curso.

As Salas Ambientes Fundamentos do Direito à Educação (FDE), Políticas e Gestão na Educação (PGE) e Planejamento e Práticas de Gestão Escolar (PPGE) têm, cada uma, 60 horas, e apresentam uma proposta de aprofundamento sobre as temáticas que constituem as diretrizes do curso (gestão democrática, direito à educação e qualidade do ensino). A Sala Ambiente Tópicos Especiais (TE), com 30 horas, é a que permite flexibilidade e reflexão sobre questões localizadas (escolas) ou locais (região). Já a Sala Ambiente Oficinas Tecnológicas (OT), também com 30 horas, tem por

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objetivo a utilização das Tecnologias da Informação na Educação. Além dessas, o projeto inclui uma Sala Ambiente denominada Introdução ao Ambiente Moodle, com 40 horas presenciais. Como o nome indica, a referida sala foi pensada como espaço de introdução ao Curso e ao seu suporte tecnológico, sendo o único pré-requisito para a realização do curso e para o aceso aos conteúdos e tarefas das demais Salas Ambientes.

Quanto aos profissionais responsáveis para operacionalizar o curso nas 10 (dez) unidades da federação, o MEC/SEB sugeria um quadro composto por: a) coordenação geral (dois profissionais, um coordenador e um vice) com professores permanentes do quadro da universidade; b) coordenação de assistência (um profissional da secretaria de estado e outro que representasse os municípios via a União de Dirigentes Municipais de Educação-UNDIME); c) coordenação de sala ambiente (seis professores da universidade, cada qual responsável por uma sala ambiente, exceto a de Introdução ao Ambiente Moodle); d) suporte tecnológico (dois profissionais, para manutenção e assistência do ambiente Moodle); e) Professores de Turma (professores da universidade ou estudantes de pós-graduação em educação, no total de dez para cada Sala Ambiente, sendo que cada turma teria seis professores e o curso sessenta professores de turma no total); f) Professores Assistentes (professores dos sistemas de ensino parceiros – estadual e municipais- que dariam orientações presenciais nos dez pólos a serem definidos por cada estado) e; f) apoio técnico-administrativo que atuaria dando suporte a coordenação, professores e alunos do curso.

Para a operacionalização do Curso de Especialização em Gestão Escolar, foram descentralizados 37 (trinta e sete) milhões para dez universidades públicas ofertarem o curso de pós-graduação a quatro mil gestores, sendo que a cada uma foi destinado 370 (trezentos e setenta) mil reais para formar 400 (quatrocentos) gestores cada. Esse montante configura uma per capita de R$ 925,00 (novecentos e vinte e cinco reais) por cursista. De acordo com o Programa, essa verba deveria ser utilizada para o pagamento de profissionais vinculados à universidade (professores, funcionários e alunos), para o aluguel de equipamentos e espaços e compra de material de consumo. Os coordenadores de assistência e professores assistentes vinculados aos sistemas de ensino (estadual e municipais) receberiam de outra fonte, que em princípio não estava definida, mas no decorrer do curso, ficou estabelecida que a remuneração seria via bolsa do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

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Com esses objetivos, princípios, diretrizes, bases legais e curriculares e aporte de recursos, o Curso de Especialização em Gestão Escolar inserido no Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica teve início nas 10 (dez) universidades federais selecionadas para participar da experiência piloto: Santa Catarina, Ceará, Pernambuco, Bahia, Piauí, Rio Grande do Norte, Mato Grosso, Espírito Santo, Rio Grande do Sul e Tocantins.

Não quero ser triste como o poeta que envelhece: a implantação do curso de especialização em gestão escolar na Ufes

O início dos trabalhos relativos à implantação do Curso de Especialização em Gestão Escolar no âmbito da Universidade Federal do Espírito Santo foi marcado por desinformação, impasses, críticas e debates. Essa afirmação deve-se ao fato de que notamos uma desarticulação interna na UFES, pois tomamos conhecimento das atividades e das reuniões do MEC/SEB, equipe de consultores e representantes das 10 universidades tardiamente e pelos representantes dos parceiros institucionais, que vieram cobrar nossa posição quanto à oferta do curso no mês de setembro de 2006.

Diante da ciência de que havia um grupo trabalhando a implantação do curso em dez universidades, que estávamos entre essas instituições e que havia uma demanda e uma pressão da Secretaria de Estado da Educação e da UNDIME-ES, que até então desconhecíamos, buscamos informações sobre o curso, ao mesmo tempo em que solicitamos fóruns e espaços de discussão sobre o mesmo nas instâncias do Centro de Educação.

O primeiro debate foi no Conselho Departamental onde havia indicação de rejeição quanto à implantação do curso, mas a deliberação desse Colegiado foi pela ampliação do debate, com a convocação de um Fórum do Centro de Educação, especificamente para discutir a matéria.

O impasse se colocava muito mais em decorrência da forma como chegaram as informações até os profissionais do Centro de Educação, o que fazia muitos associarem o curso com “pacotes”, imposição, ingerência do MEC na universidade. Agravando essa percepção havia, também, a questão da modalidade do curso (EAD) e o quantitativo de cursistas a serem atendidos. De outro lado, um entendimento que a desinformação fora resultado de nossa desarticulação

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interna e que estava colocada uma demanda de atendimento que deveria transcender todas as outras questões, inclusive a própria desconfiança em relação à modalidade. Sendo assim, o Fórum deliberou pela oferta do curso, definindo a composição de sua coordenação geral no início do mês de outubro de 2006.

Mesmo com a coordenação definida, não estava claro o que era preciso fazer e, como se aproximava o final do ano e os recursos precisavam ser descentralizados, recebemos, em novembro de 2006, uma visita técnica de profissionais do MEC/SEB que se reuniu e trabalhou por dois dias com o Conselho Departamental, com a Reitoria da UFES e com a coordenação do curso. Ao final desses dois dias de atividade, o Plano de Trabalho da UFES, solicitando a descentralização dos R$ 370.000,00 (trezentos e setenta mil reais) foi elaborado.

De imediato, a coordenação montou o processo de solicitação de autorização para a oferta do curso ao Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão da UFES. O processo foi apreciado e votado em caráter de urgência ainda em novembro de 2006. Ainda nesse mês, especificamente no dia 29 de novembro, foi publicado o Edital para a seleção dos cursistas. Os critérios para a seleção dos candidatos foram definidos com a coordenação de assistência (SEDU e UNDIME). Além dos critérios estabelecidos nas Diretrizes do Curso, em nível nacional, decidimos que no processo de seleção na UFES não seriam realizadas provas ou entrevistas.

A especificidade da forma de seleção estabelecida pela parceria SEDU/UNDIME/UFES, foi que a mesma se realizou mediante a análise da ficha de inscrição do candidato, em que deveria constar o diagnóstico da escola quanto aos seguintes indicadores: a) tipo de escola (urbana ou rural), b) número de turnos, c) número de alunos, taxa de aprovação, taxa de reprovação e taxa de distorção idade-série, d) tecnologias presentes na escola, e) desempenho da escola na Avaliação Nacional do Desempenho Escolar (Prova Brasil), f) elaboração, implantação e avaliação do Projeto Político-Pedagógico da escola.

A classificação se deu a partir dos indicadores escolares apresentados na ficha de inscrição, tendo prioridade os candidatos oriundos de escolas que apresentaram indicadores em desvantagens quanto à gestão escolar e à qualidade de ensino, pois acreditávamos que os princípios e as diretrizes do curso não se coadunavam com uma lógica meritocrática e sim com uma lógica de atendimento aos gestores de instituições públicas de ensino com maior nível de dificuldades.

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Na ocasião da publicação do Edital, já contávamos com todas as coordenações, inclusive as de Salas Ambientes, compostas. Durante o período compreendido entre as atividades de preparação/regularização do curso até o momento da solenidade de abertura acumulamos muitas reflexões e questionamentos sobre o significado dessa proposta de formação no cenário estadual. Reflexões e questionamentos pautados pela dimensão do desafio de oferecer um curso com qualidade (que é uma das marcas distintivas da universidade federal) na modalidade EAD para 400 diretores de escolas no Espírito Santo.

Sabemos que a educação à distância, melhor denominada de ensino à distância, já que a educação é um fenômeno social muito mais complexo que a utilização das tecnologias de informação e comunicação, vem se configurando como uma das principais políticas dos organismos internacionais, especialmente do Banco Mundial, da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e mais recentemente da Organização Mundial de Comércio (OMC), para a ampliação da educação superior nos países periféricos com diversificação dos cursos e das fontes de financiamento.

Dada essa injunção, frequentemente temos sido expectadores de um processo que, a nosso ver, tem uma linha tênue (quase invisível, por vezes) separando a mera certificação em massa de contingentes de profissionais apartados da possibilidade de dar prosseguimento aos estudos de uma formação continuada que leve em conta as reais necessidades da sociedade brasileira e que tenha compromisso com os processos de transmissão e construção do conhecimento. Consideramos que esses aspectos constituem o cerne do ensino ou da educação institucionalizados.

Por outro lado, também sabemos que a modalidade EAD tem um potencial integrador para a educação, uma vez que pode – segundo os atores sociais, seus movimentos e a correlação de forças políticas e pedagógicas que estabelecem - articular espaço, técnica e tempo no sentido de uma política de inclusão social que supere a lógica simplista da certificação sem qualidade.

Desse conjunto de reflexões e questionamentos aqui apresentados de forma muito simplificada, resultou a configuração de uma equipe responsável pela oferta do curso no Estado do Espírito Santo que não se propôs a fazer apologia, tampouco “demonizar” a EAD. Começamos a admitir que precisávamos conhecê-la, para contribuir, quem sabe, para a sua melhoria

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e qualificação. No contexto dessas reflexões, tínhamos claro que nos esforçaríamos para que a proposta do curso, no âmbito da UFES, realmente incidisse sobre a qualidade do ensino como um direito social de cidadania. Dessa forma, a equipe aceitou o desafio que essa lógica controversa do mundo globalizado nos impõe. E foi justamente com esse espírito crítico e reflexivo que toda a equipe do Programa na UFES dialogou com o Ministério, com os parceiros institucionais, com os colaboradores e alunos para transcendermos o risco da mera certificação em massa.

Assim operacionalizando as medidas necessárias para a oferta do curso e refletindo sobre sua proposta, além de mudarmos os critérios de seleção, como já expusemos, também procedemos, fundamentalmente, a modificações importantes no quadro de profissionais sugeridos pelo MEC quanto ao número e ao papel dos professores de turma. Vale destacar que a sugestão do MEC/SEB era uma equipe constituída por 60 (sessenta) professores de turma, 6 (seis) coordenadores de salas ambientes, 2 (dois) profissionais de suporte tecnológico, 3 (três) profissionais de apoio administrativo e 10 (dez) professores assistentes, além da coordenação de assistência (SEDU e UNDIME) e da coordenação geral. Isso significaria o envolvimento de, no mínimo, 83 profissionais para ministrar o curso.

Avaliamos que essa composição incorria do risco de fragmentação dos conteúdos e atividades das Salas Ambientes, além de comprometer a atratividade de alunos de pós-graduação para o trabalho, visto que os recursos eram escassos. Decidimos que a remuneração de todos os profissionais envolvidos no projeto deveria ser praticamente a mesma, com uma diferença de apenas R$ 400,00 (quatrocentos reais) entre a coordenação geral e as demais funções. Além disso, discutia-se a possibilidade de haver 2 professores assistentes nos pólos presenciais por turma (o que, de fato, ocorreu mais tarde, quando o curso estava em andamento), o que faria a equipe do curso ter aproximadamente 100 profissionais. Diante dessas ponderações, definimos que a organização e a composição do pessoal envolvido no curso seguiria o estabelecido no Quadro 1:

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Quadro 1 – Distribuição da equipe no organograma do curso

Pessoal envolvido QuantidadesCoordenação Geral 1Vice-coordenação 1Coord. de Sala Ambiente 6Professores de Turma 10Prof. Assistente de Turma 20Coord. de Assistência 2Técnico Administrativo 1Apoio Téc. Administrativo 2Suporte Tecnológico 2

A aula inaugural do curso aconteceu, em março de 2007, no Teatro Universitário da UFES, com a presença de todos os alunos selecionados. A primeira atividade foi a noite, com a apresentação do projeto do MEC aos cursistas. Já a segunda atividade foi realizada no outro dia pela manhã, com a exposição aos cursistas de como seria a operacionalização do curso no âmbito da UFES. Durante a organização da aula inaugural do curso, nos demos conta da dimensão de um dos maiores desafios que enfrentaríamos durante todo processo: a inclusão digital. Ao buscarmos, nas fichas, informação sobre conta de correio eletrônico para comunicar a data e o local da solenidade, constatamos que a maioria dos cursistas não possuíam e-mail. Fizemos uso massivo de telefonemas, cartas, telegramas, com auxílio da coordenação de assistência (SEDU e UNDIME) para localizar os cursistas.

A tecnologia não foi uma dificuldade apenas dos cursistas. Entre a aula inaugural e o efetivo funcionamento do curso decorreram quase 3 (três) meses, porque os conteúdos e atividades, bem como a plataforma Moodle, não foram disponibilizados de imediato por questões organizacionais e operacionais do MEC/SEB.

Uma dessas questões incidia diretamente na oferta do Curso de Especialização em Gestão Escolar: a formação dos profissionais (coordenações, professores, suporte, apoio técnico administrativo) para utilização do Moodle. O MEC/SEB contratou uma empresa para formar os profissionais vinculados às universidades. O curso também era na modalidade EAD e foi mal aceito/compreendido pelos

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profissionais, pois se avaliava que era pouco prático e com metodologias/estratégias de ensino-aprendizagem muito monótonas. Assim, poucos profissionais da equipe do Espírito Santo concluíram essa formação.

Quando o MEC/SEB disponibilizou a plataforma Moodle com os conteúdos e atividades do curso, tomamos a iniciativa de realizar, nos dias 10 e 11 de maio de 2007, um curso presencial sobre a plataforma Moodle, com a participação de toda a equipe do curso e com a parceria da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, que disponibilizou uma Professora formada em Ciências da Computação que também integrava o PNEGEB naquele estado. No entanto, observamos que grande parte de nossos colaboradores possuíam dificuldades de lidar com softwares básicos (editores de textos, editores de fotos, identificação de arquivos, identificação de drives de discos, etc); requisitos pré-necessários para a utilização da plataforma. Diante do “medo” da plataforma e de seus recursos, tivemos que afirmar mais uma vez o desafio da solidariedade e da construção coletiva, acentuando que haveria as mesmas dificuldades e sentimentos no momento de apresentar a plataforma aos alunos, o que estaria a cargo dos professores assistentes.

Entre março e o final de maio, quando efetivamente teve início o curso, houve uma grande desistência. Alguns por circunstâncias alheias ao curso outros pelo “receio” da plataforma e do nível de exigência das atividades. Imediatamente lançamos novo Edital para preenchimento de vagas e formação de banco de reservas. Sendo assim, tivemos que repetir a formação introdutória ao ambiente, pelo menos, até o mês de agosto de 2007.

Essa foi apenas uma das medidas para contornar outro grande desafio: o da evasão. Outras medidas foram encontros presenciais nos pólos com os professores assistentes, visita dos professores de turma aos pólos, incentivo à formação de grupos de diretores e a recomendação explicitada em várias reuniões: “nenhum a menos”. Essa recomendação era dirigida especialmente aos professores assistentes, que tinham contato mais direto e freqüente com os cursistas.

Desse modo, o curso transcorreu com essas e outras dificuldades, sempre contornadas presencialmente nos pólos ou nos encontros presenciais chamados pela Coordenação Geral. Houve três encontros presenciais centralizados (na Universidade Federal do Espírito Santo). Além dos encontros centralizados, houve a defesa pública dos Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC) descentralizada por pólo (10 bancas compostas por um professor da UFES, o

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professor da turma e o professor assistente) momento em que toda a equipe do curso se deslocou para aos municípios dos pólos.

É importante ressaltar que tivemos uma profícua parceria com a SEDU e a UNDIME-ES e foi graças a essa parceria que obtivemos bons resultados, em que pese às condições iniciais adversas.

O curso transcorreu de maio de 2007 a agosto de 2008. De uma matrícula inicial de 400 gestores (com o segundo Edital e formação do banco de reserva), finalizamos a primeira turma com 317 (trezentos e dezessete) aprovados, 50 (cinqüenta) reprovados e 33 (trinta e três) desistentes, o que mostra que as estratégias contra a evasão foram eficazes. Os momentos presenciais centralizados e as defesas de TCC foram registrados em mídia eletrônica por meio da produção de dois DVDs.

Esses momentos presenciais centralizados, os registros em DVD, os deslocamentos dos professores e este livro só foram possíveis com a diminuição de custos com a equipe de professores de turma (de 60 para 10) e com o acompanhamento da gestão dos recursos, o que nos possibilitou, com 19 (dezenove) mil advindos de aplicação financeira, solicitar re-orçamentação e incluir o recurso durante a vigência do programa/curso na universidade que foi também estendida de 12 para 18 meses.

Não quero ser alegre como cão que sai a passear com seu dono: a relação MEC/IFES

Se a parceria institucional com a SEDU (Secretaria de Estado da Educação) e com a UNDIME-ES foi profícua e decisiva para os bons resultados do curso, o mesmo não se pode afirmar quanto ao MEC/SEB.

Primeiro observamos que, no período de realização do curso, houve uma extrema instabilidade e rotatividade na equipe responsável pela coordenação geral do curso no âmbito do MEC/SEB, o que dificultou muito o trabalho dos coordenadores do curso nas IFES. Desconhecimento das especificidades das IFES e algumas medidas de imposição e de ingerência foram e são (pois continuam) extremamente desgastantes.

Pensamos que o papel da coordenação do MEC/SEB deva ser o de facilitador do processo das IFES e não o de fiscalização ou de imposição com medidas que não possuem razoabilidade técnica nem política na condução de um programa dessa magnitude.

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Também é importante ressaltar que a instabilidade e a rotatividade não foram impedimentos para a realização de muitas reuniões em Brasília com a coordenação geral do PNEGEB e as coordenações das 10 (dez) IFES. Entretanto, avaliamos que essas reuniões não qualificaram os PNEGEB, tendo em vista que muitas vezes significaram retomadas de debates e decisões de reuniões anteriores.

Atualmente o Curso de Especialização em Gestão Escolar foi adotado como uma das medidas do Plano de Ações Articuladas (PAR) dos municípios brasileiros com o indicativo de contribuir para a melhoria da qualidade do ensino ao contribuir com a qualidade da gestão escolar. Assim, o MEC/SEB tem buscado informações sobre quantos cursistas por município foram atendidos pelo programa e estabeleceu, como um dos critérios de seleção dos cursistas, a observações dos menores Índices de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) por escola e por município.

Ocorre que essa vinculação do Curso de Especialização em Gestão Escolar ao PAR, ao IDEB ou a melhoria da qualidade do ensino não é direta e nem linear, uma vez que desconsidera o fato de a modalidade de escolha de dirigentes escolares no Brasil e no Espírito Santo ter por característica a extrema rotatividade na função de diretor, haja vista que a direção das escolas, com exceção do Estado de São Paulo, é por indicação política ou por eleição. No desenvolvimento do curso no Estado do Espírito Santo pudemos observar que muitos profissionais concluíram o curso sem que estivessem atuando na direção de escolas, como no início.

Outra questão que precisa ser considerada é que não há indicadores efetivos sobre a relação do curso com mudanças na gestão das escolas, o que requereria – mais que um trabalho de avaliação do curso (que já existe) – uma pesquisa sobre a atuação dos egressos no espaço escolar, medida que certamente é grandiosa demais para os propósitos do programa, tanto pelos aspectos metodológicos quanto pela abrangência de tal proposta.

Cabe registrar que, para a segunda turma no Espírito Santo, houve sérios problemas de descontinuidade, com perda significativa de profissionais da equipe, tendo em vista o extremo rigor e indução do MEC/SEB quanto à análise do Plano de Trabalho (PTA) no que se refere à especificação detalhada na planilha de custos, o que exigia dos coordenadores um conhecimento técnico, contábil e legal de legislações do FNDE e de acórdãos do Tribunal de Contas da União, muito distante da formação e da atuação dos coordenadores

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(professores universitários) e de seu papel de articulador político-pedagógico do curso. Esses problemas nos fizeram questionar o significado do termo “descentralização” de recursos para a realização do PNEGEB nas IFES, uma vez que sabidamente essas instituições contam com departamentos contábeis, jurídicos, colegiados e com fundações de apoio que têm exatamente a função de observar as normas de vigentes quanto à devida e correta utilização dos recursos destinados às IFES.

Ademais, é preciso levar em conta que as universidades que oferecem o curso, se vêem sobrecarregadas, tanto com a intensificação do trabalho docente - no cumprimento das atividades administrativas, de ensino, de pesquisa e extensão inerentes às funções das universidades – quanto com outras demandas de oferta de cursos de graduação, especialização, aperfeiçoamento via Universidade Aberta do Brasil (UAB), Escola Ativa, entre outros.

Enfim, em que pese as tensões entre MEC/IFES, há um potencial político, científico e pedagógico no Programa e do Curso no sentido da possibilidade de constituição de redes de profissionais da educação básica e da educação superior (pré) ocupados com o sentido ético e democrático das políticas de formação continuada de gestores no País. Dessa forma, só nos resta afirmar como na música “Minha Casa”, que serviu de epígrafe ao texto, que a experiência exigiu de todos os envolvidos a disponibilidade, a dignidade e a coragem de nem ser triste como o poeta na loja de conveniências nem um cão alegre passeando com seu dono no sol de domingo.

Referências

ARAUJO, Gilda Cardoso de. Tempo de unir esforços. Revista Nova Escola. São Paulo: Editora Abril, ago. 2008. Edição Especial “Gestão Escolar”.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO – MEC/ SECRETARIA DA EDUCAÇÃO BÁSICA – SEB- Diretrizes Nacionais do Curso de Especialização Em Gestão Escolar. Brasília, 2007. (mimeo)

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Programa Escola de Gestores: um olhar sobre as práticas

curriculares e avaliativas

Wagner dos Santos

Introdução

A educação a distância vem, gradativamente, assumindo um lugar de destaque no cenário educacional nacional e internacional, sendo reconhecida como uma modalidade de ensino alternativa para atender as exigências da educação ao longo da vida, tendo em vista as mudanças no mundo contemporâneo e o novo paradigma social (Gomes; Lopes, 2002).

Enquanto modalidade educativa, a educação a distância contribui para a viabilização dos processos de formação inicial e contínua, revalorizando os contextos, os meios e os caminhos para viver a experiência educativa em si mesma, ou seja, a complexa interação entre os diferentes sujeitos participantes do processo, os conteúdos, os meios, os materiais e os demais elementos que intervêm no processo educativo.

Para as autoras a particularidade desse distinto modo de ensinar e de aprender, transcende o entendimento da modalidade a distância como uma estrita questão geográfica e espacial. Implica a organização e estruturação de um sistema específico, que possui componentes essenciais ao seu funcionamento. A espacialidade, característica própria do ensino a distância, não deve ser vista como elemento impeditivo ou dificultador do seu funcionamento, mas reconhecida como elemento intrínseco, cuja superação ocorre, por um lado, devido o paradigma de ensino-aprendizagem adotado, de outro, mediante o sistema de comunicação utilizado para mediar o processo educativo. O sistema comunicativo deve, dessa forma, possibilitar o diálogo entre os protagonistas, a participação, o compartilhamento, as trocas, enfim, os elementos necessários à realização da aprendizagem dos atores envolvidos.

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Diante das questões apresentadas procurei, neste trabalho, tratar da modalidade educação a distância tomando como objeto a ser investigado o Programa Nacional Escola de Gestores de formação continuada. Esse Programa é parte integrante do Sistema Nacional de Gestão da Educação Básica e está ligado a outros cursos de formação na área da gestão educacional envolvendo as seguintes secretarias: Secretaria de Educação Básica, Secretaria de Educação a Distância e Secretaria de Educação Especial.

Ele é definido como um programa de formação continuada e em serviço, organizado na modalidade a distância, para gestores escolares que se encontram em exercício nas escolas públicas estaduais e municipais do país. Sua preocupação é melhorar a formação desses profissionais e, conseqüentemente, a gestão das unidades escolares onde os mesmos atuam a fim de fortalecer o compromisso com a gestão democrática e participativa..

É importante destacar que por formação docente continuada se entende um processo integrado que se inicia com a formação na graduação e continua com o aperfeiçoamento e a atualização durante toda a carreira profissional do professor. Assim, considera-se a inserção na prática e o aperfeiçoamento em exercício como momentos decisivos para a conexão entre teoria e prática (a reflexão na ação) porque é nesse âmbito que os problemas mostram suas dimensões reais e adquirem autêntico sentido (FELDFBER; THISTED, 1998).

No que tange as dimensões e proposições apresentadas pela gestão democrática nunca é demais lembrar que ao estabelecer a Educação como direito de todos e dever do Estado e da Família a Constituição Federal de 1988, apresenta em seu art. 206 a Gestão Democrática do Ensino Público na forma de lei, visando uma educação de qualidade e igualitária.

Em consonância com a Constituição, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 93.94/96 e o Plano Nacional de Educação aprovado pela Lei n. 10.172/2001, definem a descentralização, a autonomia e a gestão democrática e participativa como prerrogativas das escolas e as universidades.

A educação a distância, a formação contínua de professores, a gestão democrática e o próprio programa escola de gestores são alguns dos diferentes temas que poderiam ser abordados neste trabalho. No entanto, por me encontrar em um lugar que permite um mergulho profundo de dentro do próprio programa, já que fui professor da turma composta pelos gestores da Região do Caparaó no Estado do Espírito Santo, procurei, neste trabalho,

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compreender a constituição dos saberes pedagógicos via as práticas curriculares e avaliativas.1

Currículo e avaliação: práticas e saberes

De acordo com o Projeto do Curso de Especialização em Gestão Escolar (2006), o Programa Nacional Escola de Gestores foi implementado, em caráter experimental, em 2005, sob a coordenação do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), em 2006 foi re-elaborado e ampliado para dez Estados da federação.2 Trata-se de curso de pós-graduação lato sensu a distância realizado em parceria com as instituições de ensino superior, no caso específico deste trabalho com o Centro Pedagógico da Universidade Federal do Espírito Santo, voltado para a formação continuada e pós-graduada de dirigentes da educação básica.

Esse Programa surgiu da necessidade revelada pelo Censo Escolar (2004) em oferecer cursos de formação inicial e contínua na área da gestão escolar, já que do total de dirigentes, 29,32% possuem apenas formação em nível médio, sobretudo nos estados das regiões norte, nordeste e centro-oeste. O percentual desses dirigentes com formação em nível superior é de 69,79%, enquanto apenas 22,96% possuem curso de pós-graduação lato sensu.

Os dados apresentados pelo Censo Escolar revelaram a urgência de se projetar ações efetivas de formação inicial e continuada que alcancem maior número possível de gestores educacionais, sendo que o caminho escolhido para tal intento foi a educação a distância.

1 É oportuno ressaltar que a divisão das turmas foi realizada tomando como critério as proximidades dos municípios de acordo com as regiões do Estado do Espírito Santo. Nesses termos, a turma em que fui professor era formada por quarenta gestores de dezoito municípios da Região do Caparaó, sendo eles: Alegre, Afonso Cláudio, Apiacá, Bom Jesus do Norte, Conceição do Castelo, Cachoeiro do Itapimirim, Castelo, Divino de São Lourenço, Guacuí, Ibitirama, Iuna, Jerônimo Monteiro, Laranja da Terra, Muniz Freire, Piúma, Presidente Kennedy, Santa Maria de Jetibá, São José do Calçado.

2 A re-elaboração do Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica teve como referência, a avaliação do projeto-piloto implementado pelo INEP e do Programa de Capacitação a Distância para Gestores Escolares – PROGESTÃO, do Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica, do Programa de Formação Continuada de Gestores da Educação Infantil e Fundamental – PROGED, do Centro Interdisciplinar de Formação Continuada de Professores – CINPOP, do Programa de Formação de Gestores da Educação Pública – UDJF.

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No contexto das mudanças que invadiram o cenário educacional e a gestão escolar, a formação continuada vem ganhando progressiva importância, como sinal de que o aprendizado deve assumir caráter permanente e dinâmico na vida dos profissionais de qualquer organização humana. A formação passa a ser vista como instrumento fundamental para o desenvolvimento de saberes, envolvendo valores, conhecimentos e habilidades para lidar com as mudanças aceleradas, com contextos complexos, diversos e desiguais, para aprender a compartilhar decisões, lidar com processos de participação e adaptar-se permanentemente às novas circunstâncias e demandas institucionais (Machado, 2000).

Nesse caso, o Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica (2006) propõe uma formação contínua, por meio da educação a distância, baseada na relação dialética teoria e prática, valorizando a prática cotidiana como momento de ampliação e tessitura de conhecimento, por meio da reflexão, análise e problematização das ações desenvolvidas no âmbito da gestão escolar. Observa-se que as concepções de formação contínua presentes no programa se aproximam da tríade ação-reflexão-ação apresentadas por Nóvoa (1992) e Zeichner (1992).

Fundamentada em uma concepção de educação como processo construtivo e permanente, o Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica (2006, p. 11), implicando no(a):

a) Reconhecimento da especificidade do trabalho docente, que conduz à articulação necessária entre a teoria e a prática (ação/reflexão/ação) e à exigência de que se leve em conta a realidade da escola, da sala de aula e da profissão docente, ou seja, das condições materiais e institucionais em que atua o gestor escolar.

b) Organização do currículo em blocos temáticos, articulados por eixos norteadores, de modo que os conteúdos das áreas temáticas não se esgotem na carga horária atribuída a cada uma.

c) Metodologia de resolução de problemas, permitindo que a aprendizagem se desenvolva no contexto da prática profissional do cursista.

d) Integração e na interdisciplinaridade curriculares, dando significado e relevância aos conteúdos.

e) Favorecimento à construção do conhecimento pelo cursista, valorizando sua vivência investigativa e o aperfeiçoamento da prática.

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O objetivo era promover uma reflexão teórico-prática-teórico em suas dimensões filosóficos, políticos, sociais, culturais e epistemológicos a fim de possibilitar a apreensão da gestão escolar como expressão da prática social, bem como analisar as dimensões macro-estruturais das políticas educacionais em todos os níveis e sua relação com o cotidiano escolar. Além disso, a formação efetuada por meio do Programa Escola de Gestores buscava oferecer um instrumental que permitia os professores-gestores planejar, monitorar e avaliar os processos de execução do projeto político pedagógico e das políticas educacionais no campo da gestão, de modo a impulsionar a melhoria do desempenho dos estudantes.

Com base nessas questões e na intenção de procurar compreender o processo de formação contínua e sua relação com as bases teórico-metodológicas que sustentam o Programa Escolas de Gestores da Educação Básica fui me aproximando das proposições teóricas apresentadas por Sacristán (2000) sobre currículo. O autor ao definir o currículo como um projeto seletivo da cultura, destaca as diversas concepções que permearam a construção histórica do currículo, dentre elas, a racionalidade técnica, as questões burocráticas e administrativas, e as tendências instrumentais. Esse projeto envolve questões: culturais, políticas, administrativas, e materializa-se na prática pedagógica de acordo com o contexto de cada instituição.

Segundo o autor a teorização sobre o currículo consiste numa prática complexa, que por vezes é retratada de forma parcial por diversas perspectivas. Currículo, longe de ser apenas um conceito, diz respeito a uma construção social, um modo de organizar as práticas educativas, de assegurar “[...] comportamentos didáticos, políticos, administrativos, econômicos, etc., atrás dos quais se encobrem muitos pressupostos, teorias parciais, esquemas de racionalidade, crenças, valores, etc., que condicionam a teorização sobre currículo” (SACRISTáN, 2000, p. 13).

Com o intuito de compreender as práticas complexas que constituem o currículo, o autor sugere a análise do sistema curricular ligado a oito subsistemas ou âmbitos do sistema educativo que o influenciam diretamente. Para ele, esses subsistemas “[...] mantém relações de determinação recíprocas entre si, de força distinta, segundo os casos. O conjunto dessas inter-relações constitui o sistema curricular, compreensível apenas dentro de um determinado sistema social geral” (SACRISTáN, 2000, p. 26).

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Ao retratar os subsistemas ilustrativamente, relaciona determinantes externos e internos à escola, que expressam ação reguladora tanto no currículo quanto nos sujeitos escolares. Fazem parte dessa estruturação as prescrições políticas e administrativas; os conselhos e associações de professores, pais, alunos; as ordenações em níveis, ciclos, modalidades, especialidades; os meios que servem de instrumentos para prática pedagógica do professor (como o livro didático); as produções científicas e culturais que estreitam relação entre pesquisas acadêmicas e a escola; e o que se materializa efetivamente nos espaços escolares, também conhecido como ensino.

Mediante as reflexões apresentadas por Sacristán emerge o questionamento: quais as possibilidades de se perceber, em um processo de formação continuada a distância, a tessitura de um currículo e sua relação com os subsistemas. Acredito que uma das condições essenciais é compreender o currículo como campo de conhecimento, ou seja, ele apresenta conhecimento e subsistemas que lhe são próprios, e toda essa estrutura materializa-se numa prática pedagógica. Não é apenas a prática pedagógica ou a parte burocrática, é um entrecruzamento de diversas práticas que converge para tudo o que denomina-se prática pedagógica nas aulas e nas escolas (SACRISTáN, 2000).

Dessa maneira, foi a partir do enredamento dos saberes e fazer tecidos pelos cursistas durante a formação continuada nos diferentes espaços e tempos do programa como a realização de leituras, a construção das atividades, as tentativas de retratar e intervir na gestão escolar, os diálogos tramados nos chats etc., que os entrecruzamentos do currículo foram produzidos.

Contudo, ao considerar o currículo como um processo de construção, Sacristán distingue seis momentos no seu desenvolvimento, denominadas objetivações do currículo, que se caracterizam como campos especializados e integrados de forma recíproca. “É preciso utilizar, nesses níveis, perspectivas e metodologias diversas, o que mostra que o campo do currículo é também de integração de conhecimentos especializados, paradigmas e modelos de pesquisas diversos” (SACRISTáN, 2000, p. 104).

São objetivações do currículo as orientações prescritas nas leis e diretrizes nacionais, estaduais e municipais; os planos e projetos de órgãos centrais como as Secretarias de Educação e os documentos das instituições educativas subjacentes; a prática pedagógica materializada em meio às diversas situações previstas e imprevistas; e, por fim, as influências que os documentos e práticas apresentam-se aos sujeitos escolares.

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Na perspectiva adota pelo autor, as objetivações do currículo, de forma individual e coletiva, representam: a) o currículo prescrito: orientações ou referências prescritas, tais como as Leis e Diretrizes nacionais, que servem de controle do sistema ou de ponto de partida para sua elaboração; b) o currículo apresentado aos professores: mediações feitas do currículo prescrito para os/as professores/as, que trazem uma abordagem geral e insuficiente para orientação da atividade educativa, como o Plano de Ação de cada instituição educativa; c) o currículo moldado pelos professores: produção de planos e/ou programas feitos pelos professores, de maneira individual ou coletiva, tais como os seus planos de aula ou de curso; d) o currículo em ação: refere-se ao que está acontecendo, se materializando na prática em meio às complexas influências e interações; e) o currículo realizado: trata-se do que foi materializado, e que produz efeitos complexos, visíveis ou indefinidos, nos alunos, nos professores, na escola e fora dela; f) o currículo avaliado: trata-se de influências exteriores que definem uma forma de controle da atuação dos professores e do saber dos alunos.

Ao analisarmos o currículo prescrito percebemos que o Programa Nacional Escola de Gestores para Educação Básica se encontra no bojo das ações delineadas pelo Plano Nacional de Educação, cujo intuito é promover práticas formadoras a fim de melhorar o ensino público no país.

A opção tomada para que essa intencionalidade se revelasse na formação dos professores-gestores, foi estruturar o curso em três eixos articulados entre si: direito à educação e a função social da escola básica; políticas de educação e a gestão democrática da escola; projeto político pedagógico e práticas democráticas na gestão escolar. Esses eixos estão consubstanciados nas chamadas salas ambientes: fundamentos do direito à educação; políticas e gestão na educação; práticas na gestão escolar. Além das salas ambientes que integram os três eixos que compõem a estrutura básica do curso, há ainda três outras salas: tópicos especiais; oficinas tecnológicas e projeto vivencial.

Esse foi o currículo prescrito apresentado aos professores e alunos participantes do programa, fato interessante é que ele oferecia uma pequena margem de moldagem por parte dos professores e dos alunos. A estrutura e os conteúdos curriculares foram apresentados de maneira fechada à única ação que poderia ser feita no Programa era a definição das seleções das atividades opcionais de cada sala ambiente.

Nessa perspectiva, mesmo tendo como centralidade da formação a gestão democrática e os processos de autonomia pedagógica o Programa Escola de

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Gestores para a Educação Básica, de alguma maneira, acaba por dificultar essa autonomia ao propor um currículo prescrito que não permitia possibilidade de se imprimir a pluralidade de cada realidade.

As pesquisas realizadas no campo da formação continuada como as de André et al. (1999), Belintane (2002), Duarte (2004) e Gatti (2003) demonstram justamente a necessidade de se considerar a regionalização bem como as singularidades dos processos de formação. Dito de outro modo, é preciso dimensionar as particularidades da educação dos estados participantes da pesquisa, suas regiões e os respectivos municípios. Ao acompanhar a formação dos gestores da Região do Caparaó no Estado do Espírito Santo observamos, por exemplo, que o programa não levava em consideração as inúmeras singularidades apresentadas pelos gestores.

É preciso ressaltar que a opção tomada pelos professores do curso foi a de selecionar todas as atividades disponíveis nas salas ambientes para serem feitas pelos alunos, o que correspondeu a 41 atividades obrigatórias e 17 opcionais. O número significativo de atividades gerou algumas dificuldades durante o processo de formação tanto para os alunos como para os professores de turma, para se ter uma idéia na turma composta pela Região do Caparaó foram enviadas um total de 1.345 trabalhos.3

É oportuno destacar que esse quantitativo é fruto da perspectiva avaliativa assumida que tomou como referência os processos de aprendizagem em desenvolvimento. Assim, as leituras dos trabalhos enviados pelos cursistas foram feitas com o intuito de contribuir para a formação dos alunos, ou seja, foram várias as atividades que tiveram de ser aprofundadas a fim de qualificar o processo. De acordo como o Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica (2006, p. 19) a avaliação deveria ser realizada:

3 Com base no levantamento quantitativo das atividades e os respectivos trabalhos enviados em cada sala observamos a seguinte configuração: nas 8 atividade obrigatórias introdução ao curso foram enviados 50 trabalhos; na sala projeto vivencial foram encaminhados 362 trabalhos distribuídos nas 6 atividades; na sala tópicos especiais encontramos 10 atividades e 327 trabalhos, na políticas e gestão na educação verificamos 327 trabalhos em 10 atividades; na sala oficinas tecnológicas possui um quantitativo de 106 trabalhos em 3 atividades; na sala fundamentos do direito à educação foram enviados 161 trabalhos em 5 atividades; na sala planejamento e práticas da gestão escolar verificamos 112 trabalhos em um contingente de 3 atividades.

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Considerando os pressupostos, os objetivos, a natureza e a dinamicidade da proposta pedagógica do Curso, as atividades desenvolvidas pelos cursistas serão acompanhadas e avaliadas de modo contínuo pelos professores orientadores, especialistas, assistentes e coordenação. Essa equipe manter-se-á em constante interação, visando a troca de informações, à apreciação conjunta das dificuldades e à busca de soluções relacionadas às dificuldades de cada componente curricular.

Assumir uma perspectiva avaliativa que se caracteriza como uma ação investigativa no/do próprio processo de formação não foi tarefa fácil para os sujeitos envolvidos na formação – cursistas, professores orientadores, especialistas, assistentes e coordenação. Ao recorrer a essa postura foi necessário fazer com que os alunos compreendessem o erro como parte constitutiva da formação, devendo ser lido de maneira positiva.

O erro não é simplesmente um não-acerto, que deve ser lamentado, ou cujo absurdo deve ser condenado, mas parte integrante do processo. Para Charlot (2000), uma leitura negativa explica o fracasso escolar pelo que o aluno não é, não fez, pelas suas carências. Uma leitura positiva é prestar atenção ao que faz, consegue, sabe da vida e não somente às suas falhas. Para o autor, a leitura positiva é antes de tudo uma postura epistemológica e metodológica. Praticar uma leitura positiva, dessa maneira, não é apenas, nem fundamentalmente, perceber conhecimentos adquiridos ao lado de carências, é ler de outra maneira o que é lido como falta pela leitura negativa.4

[...] Assim, ante um aluno que fracassa num aprendizado, uma leitura negativa fala em deficiências, carências, lacunas e faz entrar em jogo os processos de reificação e aniquilamento que analisamos, enquanto que uma leitura positiva se pergunta ’o que está ocorrendo’, qual a atividade implementada pelo aluno, qual o sentido da situação para ele, qual o tipo das relações mantidas com os outros, etc. A leitura positiva busca compreender como se constrói a situação do aluno que fracassa em um aprendizado e, não, ‘o que falta’ para essa situação ser uma situação de aluo bem-sucedido (CHARLOT, 2000, p. 30).

4 Para saber mais sobre o assunto ver trabalho de Santos (2005).

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A leitura positiva dos processos de formação a partir de uma avaliação investigativa permitiu, por meio das pistas e indícios produzidos pelos sujeitos participantes da Escola de Gestores, evidenciar os processos emergentes, em construção, que podiam anunciar novas possibilidades de aprendizagem e de desenvolvimento.

O desafio colocado em relevo por essa perspectiva foi justamente:

[...] construir uma avaliação capaz de dialogar com a complexidade do real, com a multiplicidade de conhecimentos, com as particularidades dos sujeitos, com a dinâmica individual/coletivo, com a diversidade de lógicas, dentro de um processo costurado pelos múltiplos papéis, valores e vozes sociais, perpassado pelo confronto de interesses individuais e coletivos [...] (Esteban, 2002, p. 24).

As questões apresentadas nas práticas avaliativas permitiam o acompanhamento sistemático da materialização do currículo. As operações produzidas pelos alunos nas diferentes atividades e sua correlação com o cotidiano escolar davam a tonalidade do currículo realizado. Nesse caso, o currículo realizado foi tecido por meio das salas ambientes a fim de favorecer a formação nos eixos norteadores direito à educação e a função social da escola básica; políticas de educação e a gestão democrática da escola; projeto político pedagógico e práticas democráticas na gestão escolar. Nesse caso, essas salas foram se abrindo e articulando-se, tendo como fio condutor as atividades obrigatórias e opcionais.

Na sala ambiente fundamentos do direito à educação os cursistas foram engendrando os seus saberes a partir da indissociabilidade teoria e prática a fim de analisar os processos que constituíram os pressupostos teóricos e filosóficos da educação como um direito universal. Nesses contornos, os alunos tiveram que identificar o modo como o direito à educação vem sendo historicamente considerado tanto em suas dimensões políticas macro-estruturais coma nas dimensões micro.

A análise produzida contribuiu para que os alunos pudessem efetuar uma leitura das políticas educacionais, de sua relação com o que é proposto pelas agências internacionais como: Declaração dos Direitos da Criança; Convenção Relativa à Luta contra as Discriminações na Esfera do Ensino etc., e das implicações e apropriações dessas políticas no cotidiano das escolas.

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Na sala ambiente políticas e gestão na educação foram abordadas as questões concernentes aos valores democráticos, as políticas de educação e organização dos sistemas de ensino no Brasil, permitindo conhecer o ordenamento jurídico-político no qual se assentam a educação e a escola, bem como os planos, programas, projetos que a elas se vinculam que permitem e possibilitam a implementação de uma gestão democrática.

Mais uma vez os gestores tiveram que estabelecer uma estreita ponte entre as dimensões teóricas e seus engendramentos no cotidiano escolar. O exemplo dessa assertiva pode ser encontrado nas atividades que se destinaram a compreender o papel do conselho escolar e o modo como eles operam nas escolas de cada aluno participante do curso.

As temáticas e atividades que integraram a sala planejamento e práticas na gestão escolar propiciaram aos alunos saberes referentes às práticas e procedimentos de gestão democrática, bem como ofereceram um instrumental que lhes permitam planejar, monitorar e avaliar os processos de execução do projeto político pedagógico e das políticas educacionais no campo da gestão.

No trato das problematizações apresentadas nessa sala ambiente os alunos tiveram que analisar algumas questões que visavam estabelecer a relação entre os saberes teóricos e o saberes do cotidiano escolar, tais como: quais a principais dificuldades enfrentadas em sua escola para viabilizar a participação de professores, equipe de apoio, pais, alunos e outros segmentos na construção do PPP? Quais os canais, mecanismos e estratégias que poderiam ser utilizados em sua escola para viabilizar a participação dos diferentes segmentos na construção ou revisão do PPP de sua escola? Em que consiste a avaliação institucional? Qual a contribuição da avaliação para a construção da gestão democrática da escola e a construção do PPP? Na perspectiva da gestão democrática, como deve se organizar e desenvolver a avaliação institucional na escola?

Como pode ser observado a natureza teórica e metodológica assumida no Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica tomou como ponto de partida e de chegada a prática dos profissionais gestores participantes da formação continuada e sua ressignificação a partir dos saberes teóricos consubstanciados durante o curso.

Para Sacristán (2000), a relação entre teoria e prática no currículo não se refere apenas de um discurso legitimador. Trata-se de uma reflexão teórica em busca de uma prática emancipatória e de uma orientação curricular

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que estabeleça uma relação mais autônoma com o sistema educativo, o professorado e a administração na sua construção e efetivação.

A melhora da prática implica tomar partido por um quadro curricular que sirva de instrumento emancipatório para estabelecer as bases de uma ação mais autônoma. Para isso, a teoria deve servir de instrumento de analise da prática, em primeiro lugar, e apoiar a reflexão crítica que torne consciente a forma como as condições presentes levam à falta de autonomia (SACRISTÁN, 2000, p. 48).

De acordo com o autor, ao valorizar a concepção prática em torno do currículo, os professores deixam de ser vistos apenas como instrumentos, e são percebidos como atores participantes que tomam decisões com reflexões prévias ou imediatas, de acordo com o contexto.

Ao serem estimulados a pensar sobre os condicionamentos histórico-institucionais das práticas pedagógicas e sobre a dimensão ético-política da ação educativa, os professores tomam consciência de que “[...] a prática pedagógica é uma atividade que gera cultura, à medida que é praticada, portanto, a prática docente em movimento é produtora de conhecimento, ela é práxis” (SACRISTáN, 1998, p. 83).

No que se refere a análise das salas ambientes, é preciso ressaltar ainda que a sala projeto vivencial foi assumida como lugar articulador do processo de formação. Nela os cursistas deveriam formular e desenvolver projetos de intervenções nas escolas com estreita vinculação com o projeto político pedagógico, assumido como mecanismo fundamental para a realização da gestão democrática na educação e na escola, o que deveria culminar no Trabalho de Conclusão do Curso (TCC).

Nesses termos, a sala ambiente projeto vivencial procurava, a partir dos saberes teóricos estudados nas demais salas, tematizar as questões referentes à gestão escolar, tendo como referência os contextos cotidianos dos sujeitos participantes da formação. O estabelecimento desse diálogo permitia uma transversalização entre os diferentes eixos norteadores do Programa, bem como a produção de sentidos sobre o que se estudava.

Tendo como base a articulação teoria-prática-teoria essa sala tratou das questões: projeto político pedagógico, gestão democrática, políticas de gestão educacional e suas implicações na escola, educação como direito, autonomia pedagógica etc. O objetivo não era fazer com que o cursista

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ressaltasse o significado das dimensões apresentas, mas como essas questões se apresentavam nas práticas de gestão de cada escola, ou ainda, indicando ações concretas que permitissem a sua realização.

Diante das intencionalidades apresentadas podemos afirmar, ao analisarmos as atividades dos cursistas, que de fato houve a tentativa de se compreender as questões concernentes a gestão tendo como lugar problematizador da realidade plural de cada escola, fato esse que também ficou revelado nos trabalhos de conclusão de curso.

Apesar dos oito trabalhos de conclusão de curso realizados pelos alunos da Região do Caparaó tratarem de objetos de estudos diferentes, todos nasceram da necessidade de se buscar compreender os problemas enfrentados no cotidiano das escolas e as suas implicações para o campo da gestão educacional.

Considerações finais

As reflexões apresentadas durante este trabalho sinalizaram que a organização em eixos temáticos entrecruzados pelas salas ambientes permitiu uma articulação entre as diferentes áreas que tangenciam o conhecimento da gestão e sua correlação com as práticas cotidianas. Assim, a estrutura curricular assumida no curso transgrediu a lógica disciplinar, estabelecendo uma outra perspectiva para a tessitura de conhecimento. Nesse caso,

[...] o uso das novas tecnologias da informação e da comunicação, paulatinamente, abrem espaço a configurações horizontais em rede. Essas novas configurações possibilitam maior circulação e expansão da informação, novas formas de relações e, em conseqüência, novos modelos de gestão. O desafio que se coloca para os sistemas de ensino é o de adotar alternativas de formação, resultando em formas e estratégias mais flexíveis de gestão (GOMES; LOPES, 2000, p. 18).

Essa perspectiva favoreceu uma leitura dinâmica e complexa da realidade, permitindo um diálogo entre os diferentes participantes do curso sempre contextualizados nas práticas dos profissionais e nos projetos institucionais das escolas.

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De acordo com Belintane (2002) a formulação de uma ambiência de formação contínua traz também um profícuo campo de pesquisa interdisciplinar entre a educação e a informática, cuja preocupação fundamental é o trabalho contextualizado de pesquisar ferramentas e arquiteturas de interfaces gráficas que, diferentemente das existentes, procurem favorecer as ambiências coletivas de trabalho, de formação e de autorias coletivas.

Nesses termos, a troca de experiências, a formação de redes, o intercâmbio, os fóruns de discussões, os chats de conversas, a tentativa de resolução dos problemas cotidianos, o auto-estudo, entre outros, se apresentaram como estratégias potencializadora do programa de formação continuada e em serviço Escola de Gestores.

Corroboramos com Gomes e Lopes (2000) ao salientarem que a educação a distância, por sua especificidade, deve ser compreendida no conjunto de ações e requisitos próprios ao seu desenvolvimento que envolve atores diversos, materiais didáticos específicos, meios de comunicação e outros recursos peculiares. É preciso nesse caso, para além das denúncias, analisar, na e a partir da especificidade, quais possibilidade a formação continuada a distância pode trazer para o campo da educação.

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Programa Nacional Escola de Gestores: o gênero textual mensagem como artefato tecnológico

potencializador da educação a distância

Elane Nardotto Rios

Introdução

A apropriação de conhecimentos nos ambientes virtuais vem ganhando espaço nos últimos anos, resultado da revolução tecnológica, a qual permite o desenvolvimento das Novas Tecnologias de Informação e Comunicação como aliadas para a aprendizagem. Nesse contexto, chamamos a atenção para a modalidade de Ensino à Distância (EAD), configurada, a nosso ver, de forma diferenciada do que convencionalmente concebemos como processo de ensino/aprendizagem. Ademais, chamamos a atenção como tal modalidade pode ser dinamizada se atrelarmos com os recursos das mídias comumente disponíveis nos cursos de EAD.

Desse modo, para além de uma relação ensino/aprendizagem face a face, ressalte-se que na EAD há um desdobramento que se estabelece como estratégias diferenciadas para materializar a mediação do professor na apropriação dos conhecimentos por parte dos alunos. Sabemos que tradicionalmente as relações de ensino/aprendizagem trazem como estratégia o contato presencial entre os interlocutores atrelado a uma exposição oral feita por um professor. Na EAD, a materialidade das ações faz-se por uma interlocução não presencial, a qual substitui o contato pessoal professor/aluno como meio preferencial de ensino. Com isso, o processo de ensino/aprendizagem não se limita ao espaço da sala de aula, pois o aluno tem possibilidade de constituir o seu conhecimento em outros espaços, como na sua casa ou mesmo no seu trabalho. O que não quer dizer que não haja uma mediação por parte do professor. A mediação é algo, a nosso ver, que se faz presente a partir dos recursos que são disponibilizados e concebidos como artefatos tecnológicos para contribuir com a apropriação do conhecimento pelos alunos. Nesse contexto, problematizamos o modo como tais recursos tecnológicos possibilitam o processo de apropriação de

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conhecimentos e, ao mesmo tempo, subsidiam alunos e professores no diálogo, no trabalho colaborativo e mediativo da relação ensino/aprendizagem.

Acreditamos que a mediação do modo como defende Vigotski (2001) possa auxiliar na reflexão da modalidade de ensino a distância, apontando que, para além de um espaço físico delimitado, a produção de conhecimento também ocorre no espaço virtual. Para o autor, o processo de transformação da consciência humana ou o desenvolvimento intelectual do sujeito é considerado como algo que se modifica no curso das relações constituídas historicamente entre os homens. Nesse bojo, Vigotski traz o conceito de mediação que, por sua vez, foi teorizado num momento histórico em que a relação ensino/aprendizagem comumente ocorria num espaço presencial e a colaboração se dava face a face.

Embora temos o dado de que o processo de desenvolvimento intelectual no espaço escolar, defendido por Vigotski, dá-se no contato, na experiência e na troca de conhecimentos por meio da colaboração, de modo presencial, devemos considerar que o princípio vigotskiano, que por sua vez, está pautado numa perspectiva histórico materialista dialética, concebe o sujeito como aquele que compreende a realidade e apropria-se dos conhecimentos no meio social e num determinado tempo histórico. Nesse sentido, os sujeitos/alunos que participam e se apropriam de conhecimentos organizados no espaço virtual são sujeitos constituídos em um espaço configurado neste momento histórico, numa modalidade de ensino à distância.

Conforme dito por nós, a mediação pode ocorrer levando em consideração os recursos tecnológicos que materializam a interação professor/aluno para a apropriação do conhecimento. Nesse contexto, discutiremos sobre o processo mediativo e colaborativo ocorrido por meio do gênero textual mensagem, no curso de Especialização em Gestão Escolar, no âmbito do Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica. Curso oferecido pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC) em colaboração com a Secretária de Educação à Distância (SEED). O Programa surgiu diante da necessidade de se constituir uma formação de gestores escolares, pautada nos princípios da gestão democrática indicando uma concepção de escola pública da inclusão social e da emancipação humana.

O curso foi oferecido na modalidade à distância e subsidiado pela Plataforma Moodle. Os componentes curriculares foram denominados de Salas ambientes, totalizando sete salas. Em cada sala havia atividades obrigatórias e opcionais, conteúdo programático, artigos e documentos governamentais relacionados

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ao processo de gestão democrática no espaço das escolas de Educação Básica. A mediação feita pelo professor de turma para a realização das atividades, bem como para a leitura dos textos, documentos e conteúdos ocorria por meio da mensagem, dos comentários e dos fóruns. Neste estudo, conforme mencionado, refletiremos sobre o processo de mediação dos conhecimentos disponibilizados na plataforma, a partir do gênero textual mensagem. Para a nossa análise, tomaremos as mensagens trocadas num período de 30/07/2007 à 02/09/2008 entre a professora de turma e um cursista/gestor do Curso.

Da mediação não presencial: possibilidade para a apropriação de conhecimentos

Abordar a mediação na perspectiva de Vigotski (2001) implica trazer à tona a concepção de constituição de ser humano defendida por este autor. Podemos inferir que Vigotski desenvolveu um estudo voltado para a área de Psicologia ao revisar teorias que compreendiam o desenvolvimento psicológico humano dicotomizado em vertentes racionalista ou empirista. Para isso, defendeu uma relação dialética entre tais vertentes da Psicologia e apontou que, entre a polarização do plano sensitivo (o sujeito1 motivado por fins biológicos) e do plano racional, não havia uma anulação entre um plano e outro, e sim uma inter-relação materializada na vida cultural e histórica dos homens.

Freitas (2005) nos indica que na base das teorizações de Vigotski, subjaz os princípios filosóficos de Marx e Engels. Desse modo, para os autores de Ideologia Alemã, o que diferencia os homens dos outros animais é a forma como eles começaram a produzir seus meios de existência numa relação com a natureza. Logo, a primeira condição para se falar na história humana é que se deve partir da premissa da existência de seres humanos vivos, reais, que ao produzirem seus meios de sobrevivência, transformam não só o meio em que vivem, mas também transformam a si mesmos. Essa produção, porém, não pode ser vista apenas como a reprodução da existência física dos seres

1 Marilena Chauí em Convite à filosofia, traz conceitos (eu, pessoa, cidadão, sujeito) como parte constitutiva da formação da consciência. Não nos deteremos nas especificidades de cada conceito, o que implicaria um estudo mais aprofundado. Neste texto, concebemos os termos sujeito, consciência e homem como sinônimos.

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humanos, mas como uma maneira determinada de manifestar a sua vida.Dado que para Marx e Engels, o homem se transforma ao interagir com

os seus semelhantes, no trabalho de transformação da natureza e com o uso dos instrumentos construídos socialmente, tem-se uma concepção de sujeito que compreende a realidade e apropria-se dos conhecimentos organizados no meio social e num determinado tempo histórico.

Em consonância com esses princípios, Vigotski traz o dado de que o processo de constituição do sujeito dá-se nas relações sociais e, sobretudo, na troca de conhecimentos por meio da mediação que pode ocorrer entre as pessoas. Para Marx e Engels (1989), a interação entre os homens ocorre devido ao trabalho social, atrelado aos instrumentos construídos entre os próprios homens como consolidação dessa relação. Vigotski (1994) traz, além dos instrumentos, os sistemas de signos (a linguagem, a escrita, a álgebra) como aqueles que mediarão a relação entre os homens ou, mais precisamente, a concretização do processo colaborativo de apropriação do conhecimento cultural humano.

Para defender essa idéia, Vigotski aponta o espaço escolar como um espaço privilegiado que pode materializar a referida colaboração. De acordo com Freitas (2005), as implicações da tese de Vigotski no espaço escolar podem resultar em um trabalho pedagógico que se transforma numa ação compartilhada, ou seja, num trabalho de mediação feito pelo professor.

Nessa perspectiva, tomamos o conceito de mediação defendido por Vigotski (2001), pois no espaço virtual o processo de alteridade torna-se fundamental para o estabelecimento da relação professor/cursista no processo de apropriação de conhecimentos. Conforme dito, Vigotski discutiu o ensino/aprendizagem de conceitos científicos entre professores/crianças no espaço escolar, de forma presencial. Mas a base das teorizações desse autor aponta o encontro entre os homens através da interação que pode ocorrer, a nosso ver, na combinação dos recursos tecnológicos e humanos.

Consideramos que o espaço de ensino/aprendizagem virtual é o ponto principal de interação entre cursistas e professor e, consequentemente, o espaço onde a mediação pode ocorrer por meio dos recursos tecnológicos. Tais recursos se configuram como mecanismos que possibilitam a interação/mediação e ganham relevância na medida em que concebemos a EAD como uma nova forma de produzir conhecimento. Vale destacar que a proposta do Ensino à Distância nos impele a pensar em intervenções que ultrapassem a delimitação geográfica da sala de aula.

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Atrelado a isso, o professor deixa de ser o único responsável pela produção do conhecimento, já que ele não é mais a fonte principal de informação, tornando-se um mediador da aprendizagem do aluno. É importante destacar que os suportes tecnológicos estão presentes não só para que os alunos, solitariamente, apropriem-se do conhecimento. Nesse caso, o acompanhamento do professor é fundamental para a constituição da aprendizagem dos alunos. Vigotski (2001) aponta a zona de desenvolvimento proximal como a zona em que a pessoa, com a intervenção de outra pessoa, resolve problemas sem autonomia, o que resultará “no futuro” a autonomia para resolver os mesmos problemas, já que teve “hoje” a colaboração e mediação do outro. Para esse autor, um escolar orientado e ajudado pelo outro, sempre pode fazer mais que sozinho. E mais, o ensino/aprendizagem deve apoiar-se na zona de desenvolvimento proximal, para que os escolares possam fazer amanhã o que hoje fazem em colaboração com o outro.

Acreditamos que a mediação, defendida por Vigotski, tomou um “novo” impulso pelas possibilidades e também pelas exigências de “novos” espaços para a apropriação de conhecimento. Para além de um detentor do saber materializado na figura do professor, a prática docente, pautada na mediação, passa a ter um movimento de descentralização, instaurando-se uma relação dialógica que ultrapassa a palavra autoritária tão cara para a perspectiva teórica de Bakhtin. De acordo com o autor,

O discurso autoritário exige nosso reconhecimento incondicional, e não absolutamente uma compreensão e assimilação livre em nossas próprias palavras. Também ela não permite qualquer jogo com o contexto que a enquadra, ou com seus limites, quaisquer comutações graduais ou móveis, variações livres criativas e estilizantes (BAKHTIN, 1993, p. 144).

Em oposição ao discurso autoritário, ou mesmo no aspecto ritualístico e escolástico de transmissão de conteúdos, concebamos o diálogo, a troca de experiências e o debate como parte constitutiva da EAD. O professor, nesse contexto, torna-se mediador das atividades e dos conteúdos didáticos necessários para que os cursistas desenvolvam-se intelectualmente. Com isso, estabelecemos uma interconexão, tecida em vínculos, que auxiliam os contatos entre o professor e os alunos, conforme materializado em uma mensagem para a professora, por uma cursista do referido Curso de Especialização em Gestão Escolar:

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sábado, 23 fevereiro 2008MARIA2 [15:49]: Obrigada professora, não tem como deixar de cumprir tarefas com uma professora como a senhora. rsrsr beijinhos. Ontem eu estava na SEDU e numa conversa sobre este curso “escola de gestores” eu dizia para algumas pessoas de lá que pensavam que este curso era frio, distante. “Nunca vi minha professora, mas gosto tanto dela que poderia dizer que sou apaixonada por ela, por tudo que ela me proporciona” e eles ficaram impressionados em ouvir o meu depoimento, e é pura verdade JOANA. Parece que somos tão próximas. Valeu!3

O gênero textual Mensagem: artefato tecnológico potencializador do trabalho mediativo do docente

Conforme mencionado na introdução deste trabalho, alguns gêneros textuais constituíram-se em recursos tecnológicos para a materialização do trabalho mediativo estabelecido entre o professor e os cursistas. Escolhemos o gênero textual mensagem como objeto de análise, haja vista ter sido esse gênero de grande utilidade para a interlocução que se fez presente nos 15 meses de realização do curso. Além disso, esse gênero, do modo como foi utilizado no espaço virtual, concretizou-se com as mesmas finalidades que o gênero textual e-mail. Isso porque contamos com a velocidade na transmissão, com a sincronia, com o envio de um mesmo texto para mais de um cursista ao mesmo tempo, com a facilitação do trabalho colaborativo, como um espaço de discussão das atividades propostas e com a facilidade de manter um contato constante com os cursistas.

Sobre a sincronia, percebemos que a velocidade da transmissão pode unir membros de uma comunidade discursiva, possibilitando o processo mediativo e estabelecendo uma interação virtual que, a nosso ver, facilita o contato entre os interlocutores. Com isso, o gênero textual mensagem foi uma ferramenta que

2 Os nomes que aparecem nas mensagens são fictícios.3 Esta mensagem foi retirada do Histórico de Mensagens do Curso de Especialização em Gestão Escolar. Curso

sediado pelo Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica e oferecido pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC) em colaboração com a Secretária de Educação à Distância (SEED).

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possibilitou as discussões de forma dialógica sobre as atividades e os conteúdos das salas ambientes, superando desse modo, as limitações de tempo e de espaço, tão caro para a nossa tradição escolástica.

Nessa perspectiva, Paiva (2004) destaca, em seu trabalho, que o gênero textual e-mail tem um caráter dialógico. A nosso ver, esse dado acena para o que discutimos acerca do conceito de diálogo numa perspectiva bakhtiniana, pois percebemos uma relação dialógica no processo de apropriação de conhecimento por parte dos cursistas, conforme exemplo abaixo:

quarta, 18 julho 2007JOANA (Professora) [19:07]:ROBERTOFiz a leitura da atividade que me enviou (sala 02, ativ. 01). mas senti falta das discussões que deveriam estar presente. portanto, gostaria que lesse de novo as orientações da opçao 2. estou aguardando. Um grande abraço.

quarta, 25 julho 2007ROBERTO [12:39]: Olá querida professora, bom dia!Profesora me desculpe por ter enviado o documento errado para a atividade 01 da sala 02. Ja recebi teu recado e apaguei o que estava errado e gravei o novo. Colquei, portanto a atividade nº 01 da sala 02. Espero que eu tenha acertado. Abraço carinhoso e fraterno.JOANA [23:12]: Boa noite ROBERTOAdorei o seu texto (ativ. 01, sala 02) muito bom e bem escrito!!!!!!! Vou citá-lo como exemplo .. Aprovamos na nossa plataforma . 4

Podemos observar que, além de um trabalho mediativo sobre a atividade realizada pelo aluno, ocorreu um diálogo na relação entre professor e cursista e o gênero textual mensagem foi parte constitutiva desse processo. Desse modo, percebemos a alternância dos sujeitos do discurso que se manifesta em réplicas (a alternância enunciativa entre os interlocutores), materializada na ativa atitude responsiva. Como aponta Bakhtin (2003), na ativa atitude responsiva o ouvinte ao compreender (não codificar) o significado ou sentido do discurso do falante poderá concordar, discordar, completar, etc. Diferentemente de

4 Ver nota de rodapé 2.

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um discurso pedagógico5, logo autoritário, que comumente se perfaz sobre a égide de um impedimento das ativas atitudes responsivas.

Com esses dados preliminares, passemos para uma análise mais detida sobre a mediação/interlocução pedagógica ocorrida no período de 30 de maio de 2007 a setembro de 2008, entre a professora de turma e um cursista. Ressalte-se que fizemos uma escolha de mensagens configuradas por um gestor que, a nosso ver, participou efetivamente do curso e manteve-se nesse período em contato constante com a professora. Iniciemos com a apresentação da Tabela 1, a qual materializa a quantidade de mensagens enviadas entre a professora e o cursista.

Tabela 1 Quantitativo das mensagens trocadas entre a professora e o cursista

Mês/ano Número de Mensagens Mensagens mensagens enviadas pela enviadas pelo professora cursistaMaio/2007 5 3 2Junho/2007 27 12 15Julho/2007 28 18 10Agosto/2007 49 32 17Setembro/2007 43 23 20Outubro/2007 59 41 18Novembro/2007 39 26 13Dezembro/2007 14 9 5Janeiro/2008 26 12 14Fevereiro/2008 14 12 2Março/2008 23 16 7Abril/2008 13 12 1Maio/2008 16 10 6Junho/2008 12 7 5Julho/2008 11 6 5Agosto/2008 16 10 6Setembro/2008 4 2 2Total 393 246 147

5 Termo utilizado por Eni Pulcinelli Orlandi em A linguagem e seu funcionamento: as formas do discurso.

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Observamos um total de 393 mensagens num período de maio de 2007 a setembro de 2008. Com tal resultado, inferimos que ocorreu uma interlocução no decorrer do curso, embora constatemos que, a quantidade de mensagens dispostas nos meses diferenciou-se. Além disso, o número de mensagens nos primeiros meses foi mais significativo. Esse dado indica que, no início do curso, os cursistas estavam com dificuldade na resolução das atividades e, ao mesmo tempo, no processo de apropriação do “manuseamento” dos recursos tecnológicos disponíveis na plataforma moodle. Nesse contexto, levemos em consideração também que a modalidade de ensino à distância, nos momentos iniciais do curso, configurou-se como um “estranhamento” e a familiaridade com o ambiente virtual foi sendo conquistada através de um trabalho colaborativo entre a professora e os cursistas. No exemplo abaixo, tem-se uma troca de mensagens entre a professora de turma e o cursista num mesmo dia do mês de junho de 2007. Essas mensagens trazem a materialidade do processo de “estranhamento” com a modalidade de ensino e, sobretudo, com o espaço virtual.

[...] ROBERTO[16:19]: Estou um pouco perdido nas atividades, ou sei lá, na internet.rsrsrsrROBERTO [16:22]: Demorei para te responder porque fico tentando achar onde devo teclar, entrar. Nunca fiz um curso de computação. Tudo que sei aprendi me esforçando. Ter e-mail e ter orkut me ajudou um pouco nesta hora.rsrsrs. não ria d emim, por favor.rsrsrROBERTO [16:23]: Estou um pouco confuso e perdido com relação à sala Projeto Vivencial. Que saudades da professora assistente RAQUEL.rsrsrJOANA [16:24]: Não estou rindo. .(rs,rs). bom se tiver dúvida com relação também a atividade da sala vivencial já sabe os horários que estou aqui. mas não é difícil. na verdade a atividade deve sair do próprio contexto em que atua. Um grande abraçoJOANA [16:25]: Não tem como entrar emcontato com a RAQUEL?ROBERTO [16:25]: Tenho sim. Moro perto de Colatina. Vou fazer isso assim que der.JOANA [16:28]: É interessante, visto que ela pode ajudar vc a lidar com essa tecnologia. mas não tem mistério. vc tira de letra. já está tirando. não está aqui?ROBERTO [16:29]: Obrigado pela força e pelo incentivo.

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ROBERTO [16:30]: vc é muito gentil professora!JOANA [16:36]: Vi agora a foto da sua escola!ROBERTO [16:38]: Professora aquelas fotos estão com problemas. estava escuro as novas fotos serão ainda colocadas.Tiramos foto de foto. Não ficaram boas.ROBERTO [16:41]: É uma escola velha, bem no interior. Entrei lá como diretor a pouco tempo. Era uma escolinha que funcionava com apenas uns 12 alunos com uma professora. O prefeito da cidade resolveu, após pedirmos colocar mais outras séries. Estamos com mais de cem alunos. Temos da Educação Infantil até a 6ª série. Vamos chagar até na oitava.ROBERTO [16:42]: A reforma e ampliação está prevista para ainda esté ano, segundo a Secretária Municipal de Educação. vamos fazer PPP, e muitas outras coisas.JOANA [16:44]: Vc sabe que essas fotos serão utilizadas futuramente na sala vivencial 5, onde tentaremos construir um sítio. vai ser bem legal!!! Vejo que gosta muito do que faz. isso é muito bom!!!! [...]ROBERTO [17:20]: Desapareci, pois tive um problema na internet aqui da Prefeitura. Só tenho acesso aqui. Em minha escola não existe ainda e nem onde moro. Não tem sinal lá. Vui que dificuldade!!! Abraços

Percebemos, com o exemplo, o esforço do cursista em familiarizar-se com o ambiente virtual e, a professora, por sua vez, em mediar não só o conteúdo e as atividades, como também a inserção do gestor no espaço virtual. Isso acena para a democratização do conhecimento, se observarmos a dificuldade do cursista em presentificar-se no ambiente e, ao mesmo tempo realizar as atividades. Esse gestor morava numa cidade do interior do Espírito Santo e só podia acessar na Prefeitura de uma cidade vizinha, já que na localidade onde morava não tinha sinal para a Internet. Ressalte-se que nenhuma das dificuldades apontadas por ele resultou em desistência do curso.

Ainda sobre a Tabela 1, consideramos que o número de mensagens enviadas pela professora foi mais quantitativo. O motivo para tal dado deveu-se ao fato de que algumas mensagens eram enviadas para toda a turma e não especificamente para o referido cursista. Esse dado foi constatado por nós, através da Tabela 2.

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Tabela 2 – Distribuição das 393 mensagens

Mensagens enviadas pela professora para todos os 105 cursistas (orientações sobre conteúdos e atividades)Mensagens enviadas pela professora para todos os 25 cursistas (avisos e interação)Total parcial 130Mensagens enviadas pelo cursista para a 52 professora (dúvidas sobre conteúdos e atividades)Mensagens trocadas entre o cursista e a 143 professora (interação e avisos)Mensagens enviadas pela professora para o 68 cursista (mediação sobre conteúdos e atividades)Total parcial 263

Total 393

A Tabela 2 sinaliza a distribuição das 393 mensagens trocadas entre o cursista/gestor e a professora de turma. Do modo como organizamos os dados, constatamos que 105 mensagens enviadas para o cursista não era só para ele, mas para todos os cursistas. Tais mensagens configuravam orientações “gerais” sobre determinadas atividades e conteúdos propostos na plataforma, o que a nosso ver, materializou mediações no processo de apropriação do conhecimento, conforme exemplo:

JOANA [10:24]: Ola turma!!! Fiz uma pequena pesquisa sobre alguns generos textuais que circulam na esfera pública, mais precisamente na esfera academica, tais como: ‘artigo cientifico’, ‘ensaio’, ‘resenha’, ‘resenha critica’, ‘relato de experiencia’, ‘sintese de texto’.Achei interessante visto que, a depender da situaçao, bem como o exercicio de escritura academica, teremos que nos atentar para as diferenças entre esses generos. Coloquei pequenas definiçoes no nosso glossario. Fica ai a dica. Com relaçao a resenha,formato de texto da atividade 06, sala 06, seguem algumas dicas: – Na estrutura essencial da resenha ha certos elementos que nao devem faltar: nome da obra, nome do autor, a descriçao do conteudo da obra e a avaliaçao (nesse momento entra o ponto de vista do autor da resenha. Abraços

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Observamos ainda que, a professora enviou para todos os cursistas 25 mensagens que materializaram a interação (saudações, despedidas, incentivos, elogios) como também avisos gerais sobre eventos, congressos, entre outros. Inferimos que, nesse momento, o professor tornou-se um orientador/mediador emocional, o qual motiva, incentiva e estimula o aluno com empatia (MOraN, 2000).

Entre o cursista e a professora tem-se o total de 263 mensagens divididas entre mensagens enviadas pela professora, mensagens enviadas pelo gestor e mensagens trocadas entre os dois. Sobre as mensagens voltadas para a apropriação do conhecimento (atividades e conteúdos), constatamos que, ocorreu uma relação de equilíbrio, haja vista termos uma diferença de 16 mensagens, estabelecendo desse modo, um processo de mediação numa perspectiva vigotskiana. Nesse sentido, tem-se um trabalho colaborativo e mediativo entre sujeitos professora e aluno, distanciando-se de uma relação de reprodução, repetição e assujeitamento.

Consideramos ainda que, a professora enviou 68 mensagens e o cursista, por sua vez, 52 mensagens. Nesse contexto, chamamos a atenção para uma relação ensino/aprendizagem que, longe de constituir-se como monológica, trouxe o dialogismo, ampliando o nosso conceito de aula, de espaço e de tempo, estabelecendo “pontes” virtuais de interlocução entre professora e aluno, conforme exemplo.

quarta, 15 agosto 2007JOANA [20:16]: Querido ROBERTO. Seu texto enviado (atividade 01, sala 03) esta otimo. mas faltou um dado de suma importancia. que e exatamente vc abordar um programa que vc aplique na sua escola e dizer como isso ocorre na pratica. o seu texto eu quero que fique do jeito que esta. porque esta muito bom. apenas que no final acrescente esse programa e como ocorre. so isso. como e agil e inteligente fara rapidamente. AbraçosJOANA

quinta, 16 agosto 2007ROBERTO [10:52]: Ok.ROBERTO [12:08]: Olá querida professora,Já acrescentei um comentário sobre nossa prática dentro de políticas na educação. Qualquer coisa me informe. Tenho um pouco de dificuldades, já que nossa escola só começou a funcionar no ano passado. Ou melhor o ensino

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começou a ser ampliado no ano passado. Antes só existia uma professora onde funcionava as 4 séries iniciais (1ª a 4ª) em uma única sala. Agora temos vários professores e mais turmas. Muita coisa ainda é feito na Secretaria de Educaçao, aos poucos estão passando para a escola. Abraços.

Observamos que a troca de mensagens ocorreu de um dia para o outro, o que aponta o interesse do cursista em presentificar-se e participar das atividades no espaço virtual, embora já constatemos que, esse cursista vivia numa localidade onde não havia“sinal”para internet. Convém mencionar que a mensagem enviada pela professora traz no bojo um tratamento individual com o texto escrito pelo gestor, indicando a valorização do sujeito como ser que se constitui e se autoconstitui na experiência da realidade social e, no nosso caso, no espaço virtual. Além disso, percebemos que a forma como o conhecimento foi apropriado pelo cursista está para além de uma transmissão de informações, pois ele empreendeu uma relação dialética entre o conteúdo disponível na plataforma e a prática vivenciada, diferenciando-se, a nosso ver, de um ensino acadêmico pautado no distanciamento da realidade circundante, conforme apontado por estudiosos (MASSETO, 2000). Isso porque o modo como a professora mediou o texto atendia parte dos objetivos da atividade e o cursista compreendeu que o que estava “faltando” no seu texto era exatamente estabelecer uma “ponte” entre a teoria disponível na plataforma e a realidade da escola.

Desse modo, a mediação se tornou parte constitutiva do processo de apropriação do conhecimento e da realização das atividades presentes na plataforma Moodle. Convém mencionar que, o curso de Especialização em Gestão Escolar, proposto pelo MEC, além de trazer uma perspectiva interdisciplinar entre as salas ambientes, trata os aspectos teóricos em articulação com problemas concretos e vivenciados no espaço escolar, valorizando a produção de saberes construídos no próprio trabalho do gestor, ampliando, dessa forma, o conhecimento no campo da gestão democrática.

Consideramos ainda que, o processo mediativo foi possível através dos recursos tecnológicos. No nosso caso, as mensagens. Masseto (2000, p. 159) apresenta o correio eletrônico como um recurso muito forte no processo de ensino/aprendizagem à distância, pois pode facilitar

[...] o atendimento a um pedido de orientação urgente [...] o professor pode entender ser interessante se comunicar com todos os seus alunos [...] a resposta do professor poderá ser para o grupo todo ou para um aluno em

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particular. Neste segundo caso, há que atender à situação concreta e individual daquele aluno, o que fará de cada resposta “uma” resposta particular. Isto quer dizer que, conhecendo o aluno, suas dificuldades ou as situações particulares pelas quais está passando, a resposta sempre devera ser individualizada, e poderá ser diferente de um aluno para outro.

As indicações do autor vieram ao encontro do que configuramos na Tabela 2. As mensagens foram utilizadas para todos os alunos ao mesmo tempo bem como para particularizar mediações individuais com cada cursista. Nesse sentido, a tecnologia apresenta-se como meio para colaborar no processo de ensino/aprendizagem e sua importância está atrelada ao trabalho de mediação realizada por um professor. Com isso, a mediação pedagógica compreendida como diálogo permanente entre professor e aluno, pode ser feita nas estratégias “convencionais” de ensino e também à distância, acenando que a mediação ocorre na relação face a face, como também na relação não presencial. A ocorrência ou não da mediação depende, a nosso ver, pelo modo como

[...] o comportamento do professor que se coloca como um facilitador, incentivador ou motivador da aprendizagem, que se apresenta com a disposição de ser uma ponte entre o aprendiz e sua aprendizagem [...] é a forma de se apresentar e tratar um conteúdo ou tema que ajuda o aprendiz a coletar informações, relacioná-las, organizá-las, manipulá-las [...] (MASSETO, 2000, p. 144-145).

Algumas considerações

Embora não tenhamos aprofundado sobre a temática voltada para o trabalho mediativo na EAD, observamos no decorrer de nosso estudo possibilidades de refletir acerca dessa modalidade e, sobretudo, a mediação pedagógica que pode ocorrer no espaço virtual. Não podemos desconsiderar a presença das novas tecnologias6 na sociedade atual, incluindo a EAD, que traz como proposta novas formas de nos relacionarmos com o conhecimento. E nesse caso, por

6 Para Masseto (2000) novas tecnologias estão vinculadas ao uso do computador, à telemática e à educação a distância.

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que não pensar em um trabalho que leve em conta a qualidade no processo de apropriação e produção desse conhecimento? Incluímos, nessa perspectiva, a mediação como forma de diálogo entre professores e alunos, em que espaço e tempo virtuais estejam a serviço de objetivos de ensino para o desenvolvimento intelectual dos participantes. Não é de hoje que temos as teorizações de Vigotski circulando no meio educacional e, para esse autor, o espaço de ensino é o espaço por excelência privilegiado que pode materializar a mediação do professor como fator essencial da transformação intelectual dos alunos.

Com tais considerações, apontamos o conceito de mediação de Vigotski (1994, 2001) integrado ao dialogismo proposto por Bakhtin (2003) que, a nosso ver, são conceitos que estão inter-relacionados, haja vista os autores conceberem o sujeito na sua inserção social em parceria com outro, por meio da atividade de significação dos signos. Nesse sentido, a mediação pedagógica deve ocorrer através do modo como o professor estabelece a relação de apropriação do conhecimento pelos alunos. E mais, o nosso estudo ensejou apontar que é possível empreender tal postura, desde que professores e alunos estejam imbuídos no trabalho colaborativo de ensinar e aprender mutuamente.

Referências

BAKHTIN, Mikhail. Questões de literatura e estética: a teoria do romance. 3 ed. São Paulo: Editora Unesp, 1993.

______. Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

CHAUÍ, M. Convite à filosofia. 12 ed. São Paulo: Ática, 2002.

FREITAS, M. T. de A. Nos textos de Bakhtin e Vigotski. In: BRAIT, Beth (Org.). Bakhtin: dialogismo e construção de sentido. Campinas (SP): Editora da Unicamp, 1997.

MARX, K.; ENGELS, F. Ideologia Alemã [I-Feuerbach]. São Paulo: Editorial Grijalbo.1989.

MASSETO, Marcos T. Mediação pedagógica e o uso da tecnologia. In: MORAN, José Manuel; MASSETO, Marcos T.; BEHRENS, Marilda Aparecida. Novas tecnologias e mediação pedagógica. 10 ed. São Paulo: Papirus, 2000.

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MORAN, José Manuel. Ensino e aprendizagem inovadores com tecnologias audiovisuais e telemáticas. In: MORAN, José Manuel; MASSETO, Marcos T.; BEHRENS, Marilda Aparecida. Novas tecnologias e mediação pedagógica. 10 ed. São Paulo: Papirus, 2000.

ORLANDI, Eni Pulcinelli. A linguagem e seu funcionamento: as formas do discurso. 4 ed. Campinas: Pontes Editores, 2006.

PAIVA, Vera Lúcia Menezes de Oliveira. E-mail: um novo gênero textual. In: MARCUSCHI, Luiz Antonio; XAVIER, Antonio Carlos dos Santos. Hipertextos e gêneros digitais. Rio de Janeiro: Lucerna, 2004, p. 68-90.

VIGOTSKI, L. S. A construção do pensamento e da linguagem. Tradução Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1994.

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Projeto Político Pedagógico: reflexões para a construção de uma escola participativa

Paulo da Silva Rodrigues

Introdução

O presente artigo tem como objetivo principal mostrar que é possível construir, através da participação, o Projeto Político Pedagógico da escola com o intuito de organizar as ações pedagógicas, administrativas e financeiras de uma unidade de ensino.

Para tanto, partimos1 de um trabalho que envolveu uma pesquisa qualitativa participativa entre os envolvidos no processo educativo no cotidiano da EMEF Irmã Jacinta Soares de Souza Lima – doravante denominada EMEF IJSSL – associado a um levantamento bibliográfico e documental que embasasse e fundamentasse de forma teórica a prática de pesquisa e análise de dados que fundamentaria todo o processo de elaboração do PPP.

A EMEF IJSSL onde o trabalho foi desenvolvido localiza-se no município de Vitória, numa comunidade que fica bem próxima ao centro da capital. Atende a uma comunidade que possui vários problemas de infra-estrutura. Em relação à comunidade onde a escola está instalada, trata-se de um bairro localizado na Ilha de Vitória e que possui uma parte plana, porém a maior parte dos moradores localiza-se nas encostas e no alto do morro.

É uma escola que está num prédio antigo, com salas de aula pequenas, pouco arejadas e com ventilação natural insuficiente; pátios externo, interno e refeitório também pequenos para o número de alunos atendidos – sendo uma matrícula que gira em torno de 320 alunos por turno. Além disso, não permite o acesso de crianças e/ou outras pessoas com determinados tipos de deficiência, pelo fato de não possuir rampas de acesso e por ser constituída de três andares.

1 Opto por usar a primeira pessoa do plural por acreditar que este texto não foi desenvolvido por uma única pessoa, mas sim por um coletivo composto por estudiosos da área e pelos profissionais da EMEF IJSSL.

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Atende crianças e adolescentes de sete a quatorze anos, nas turmas de 1ª a 8ª séries, sendo que no turno matutino têm-se doze turmas de 1ª a 4ª e no vespertino 12 turmas de 4ª a 8ª séries. A clientela é pertencente às classes econômicas menos favorecidas da sociedade, onde grande parte das famílias desempenha profissões que não necessitam de qualificação e/ou atuam em atividades consideradas como subempregos.

Entretanto, apesar do exposto, as famílias são presentes ao cotidiano escolar, participam das atividades e demonstram muita preocupação com o desenvolvimento educacional dos filhos matriculados na EMEF. Esse fato acarreta uma participação política muito positiva na gestão da escola por parte da comunidade.

Apesar disso, possui um corpo docente, técnico, pedagógico e de apoio muito participante, com boa formação técnica e pedagógica dentro de suas funções, e que está na escola há um tempo considerável – em média cinco anos para os efetivos.

Isso tudo faz com que esta escola goze de um certo prestígio nas comunidades ao seu entorno, uma vez que não apresenta problemas consideráveis referentes à indisciplina, violência, drogas e outros casos que a mídia veicula diariamente.

A elaboração coletiva do projeto político pedagógico da escola: reflexões pertinentes

Neste início de século, em um país que a todo instante se apresenta como democrático, não é mais possível pensar nesta organização tão complexa chamada escola, sem que os sujeitos pertencentes a ela – pais, alunos e educadores – tomem a iniciativa e assumam a responsabilidade de construir, de forma participativa, uma proposta pedagógica com a finalidade de organizar todo o trabalho a ser realizado na escola para que esta esteja apta a oferecer uma educação de qualidade a todas as crianças e jovens da sociedade.

De acordo com Veiga (2004, p.12)

Ao construirmos os projetos de nossas escolas, planejamos o que temos intenção de fazer, de realizar. Lançamo-nos para diante, com base no que temos, buscando o possível. É antever um futuro diferente do presente.

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Concordando com Veiga (2004), o projeto político pedagógico tem sido objeto de estudos para professores, pesquisadores e instituições educacionais e, vem causando muita inquietação em todos os envolvidos nesse processo. Cabe ressaltar, que a grande maioria das escolas de nosso país, por razões diversas, ainda não conseguiu elaborar este documento tão importante, que quando bem entendido e quando construído a partir do coletivo da escola, poderá organizar e direcionar todas as ações a serem desenvolvidas através de um trabalho em equipe, para que os objetivos e metas pretendidos sejam alcançados.

No contexto educativo atual, não é mais possível conceber uma educação desvinculada de uma perspectiva política e pedagógica. Nesse sentido, ao se propor a elaboração do projeto político pedagógico, tem-se em mente que este processo prima pela organização didática, pedagógica, metodológica e institucional de uma práxis educativa permeada pela constância do diálogo e voltada para os novos paradigmas sociais que emergem da modernidade que caracterizam a sociedade deste início de século.

Mas o que é um projeto da escola? Analisando a autonomia da escola pública pela via do enfoque operacional, Neves (2004), faz uma série de considerações sobre o projeto político pedagógico e seu processo de elaboração, implementação, concretização e avaliação no contexto educacional. Para tanto, destaca que o projeto é uma possibilidade de aprimoramento da educação em todos os lugares onde se torna realidade.

Segundo a autora (2004, p. 112) o Ministério da Educação da França, por exemplo, valoriza o projeto da escola e o resume da seguinte forma: • Acolocaçãoempráticadosobjetivosnacionais,levandoemcontaas

situações locais e as necessidades específicas da clientela; • Umconjuntodeobjetivosconcretoserealistas; • Umplanoprecisodeaçõescoerentes,articuladasentresi,reunidasem

torno de objetivos e cujos efeitos são avaliáveis; • Otrabalhodeumaequiperesponsáveldecididaatrabalharemconjunto; • Umprogramaplurianual,umcalendáriocomumaprogramaçãoeprazos

precisos para cada fase; • Umconjuntodeaçõesconcebidasparaosalunose,sepossível,comeles.

Nesse sentido, concordamos com Neves (2004, p.112-113) quando diz que “para a escola, um projeto ilumina princípios filosóficos, define políticas, racionaliza e organiza ações, otimiza recursos humanos, materiais e financeiros,

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facilita a continuidade administrativa, mobiliza os diferentes setores na busca de objetivos comuns e, por ser de domínio público, permite constante acompanhamento e avaliação”.

Diante do exposto, como podemos permitir que nossas escolas continuem desenvolvendo suas atividades sem apresentar à comunidade sua proposta de trabalho? E, como podemos aceitar que o projeto político pedagógico seja pensado e elaborado apenas por diretores, pedagogos ou simplesmente encaminhado pelos sistemas de ensino, sem considerar o coletivo, as especificidades e as realidades das comunidades escolares, e ainda, as expectativas que estas têm em relação à qualidade da educação que será oferecida aos alunos?

Precisamos assumir nossas responsabilidades e sabemos que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BraSIL, 1996) é clara em seu Art. 13. Inciso l quando destaca que:

Art. 13. Os docentes incumbir-se-ão de:I – participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de

ensino;

Estamos cientes que para a construção de uma proposta pedagógica, que ao ser executada seja capaz de oferecer às classes populares uma educação verdadeiramente de qualidade é preciso muito mais do que uma legislação que obrigue a participação de educadores neste processo. Precisamos de verdade que cada um se envolva e se conscientize que não é mais possível permitir que esta organização continue oferecendo uma educação que não esteja sistematizada em uma proposta pedagógica elaborada a partir do coletivo da unidade de ensino, envolvendo toda a comunidade escolar.

Para Hora (1994) a consolidação de uma gestão democrática da escola, não é um processo espontâneo e fácil. A dinâmica das relações de poder pode dificultar o sucesso (avanço) do processo, fazendo com que seja necessário que se faça um grande esforço, seja ele coletivo e encaminhado em função de decisões de grupo e não de indivíduo, dessa forma, Hora (1994) acata a afirmação de Arroyo que diz:

Democratização da administração não significa eliminar a presença do estado nos serviços públicos, mas buscar mecanismos para submeter às decisões do estado ao debate e ao controle pela opinião pública, pais, grupos e partido. (ARROYO, 1979, apud HORA, 1994, p. 4).

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Nós, educadores, precisamos acreditar que temos a capacidade de construir tal proposta, mesmo sabendo da complexidade da escola, da abrangência do projeto e dos inúmeros obstáculos que irão surgir. Profissionais da educação não desistem, o que precisamos é colocar em discussão e, a partir do coletivo, apontar as dificuldades e apresentarmos sugestões para solução das questões.

Na Escola Municipal de Ensino Fundamental “Irmã Jacinta” o processo de elaboração do Projeto Político Pedagógico de forma coletiva, contribuiu significativamente para que os segmentos que compõem a comunidade escolar entendessem a importância de sua participação na gestão da escola. Cabe ressaltar, que quando falamos em participação não estamos nos referindo apenas à presença desses segmentos em reuniões de pais, plantões pedagógicos, conselhos de classes, conselho de escola e outras, mas sim, de participação na tomada de decisões.

A gestão democrática que se pretende exercitar é aquela que se pauta no fato de que “o objetivo central da educação deve ser a construção de personalidades mais autônomas, críticas, que almejam o exercício competente da cidadania. Para tanto, ela deve embasar-se nos princípios democráticos da justiça, da igualdade, da eqüidade e da participação ativa de todos os membros da sociedade na vida pública e política” (AraUJO, 2002, p. 41).

Sendo assim, é fundamental que os sistemas de ensino promovam ações com a finalidade de propiciar o entendimento acerca da ação democrática da educação, incentivando e mobilizando a comunidade escolar para a construção de uma proposta pedagógica da escola. Proposta esta que, além de ir ao encontro das expectativas dos sujeitos envolvidos no processo, acaba permitindo que todos tenham a oportunidade de receber um atendimento diário de qualidade ao mesmo tempo em que participa da gestão da educação num processo coletivo de tomada de decisões.

De acordo com Esteban (2006, p.15);

Pensar e fazer uma escola pública de qualidade para as classes populares tem sido um grande desafio para os educadores comprometidos com a construção de uma sociedade verdadeiramente democrática. Em períodos de transformações tão profundas como o que estamos vivendo, este desafio parece tornar-se ainda mais complexo, pois a incerteza acompanha cada passo.

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Na EMEF “Irmã Jacinta” o processo de construção do seu projeto teve inicio em 2002 e só conseguimos sistematizar esta proposta no final do ano 2007. Durante nossa caminhada encontramos muitos obstáculos e dentre eles podemos citar: a rotatividade dos profissionais, a pouca experiência em participação dos envolvidos neste processo e, ainda a falta de tempo-espaço para realização dos estudos necessários para a construção do Projeto Político Pedagógico.

É preciso ressaltar, que em virtude dos obstáculos encontrados interrompemos essa construção por várias vezes e a partir de 2005, com um grupo que já não se modificava tanto, retomamos o processo e conseguimos vencer as seguintes etapas: caracterização da comunidade escolar, estudos sobre tendências pedagógicas, correntes filosóficas, teorias do conhecimento, alfabetização, currículo, avaliação, disciplina, e ainda, por inúmeras vezes, em virtude da rotatividade dos profissionais, tivemos que socializar as etapas já vivenciadas para aqueles que estavam chegando.

Após vivenciar as etapas citadas acima é que conseguimos ter, de fato, a dimensão da abrangência do projeto e ainda, quais os alcances possíveis que este trabalho em equipe pode proporcionar. Por várias vezes chegamos a pensar que não seria possível a conclusão deste trabalho.

Um dos fatores que contribuíram para a concretização do PPP foi quando, a partir de fevereiro de 2004, o Ministério da Educação e Cultura, enviou às unidades escolares, o material Indicadores da Qualidade na Educação (BRASIL, 2004a) e podemos afirmar que este material veio contribuir, de forma significativa, com o processo de elaboração do projeto político pedagógico da Escola Municipal de Ensino Fundamental “ Irmã Jacinta soares de Souza Lima”.

Durante o período de realização do diagnóstico, tivemos a oportunidade de observar e discutir as dimensões abordadas no material citado, que orientaram o nosso fazer, nesta etapa de elaboração da proposta pedagógica escolar.

O material enfatiza que a escola precisa ser um ambiente educativo, alegre, onde a amizade e a solidariedade estejam presentes e, através da construção de regras claras de convivência procura combater a discriminação, respeitando o direito das crianças e dos adolescentes.

Neste sentido, a prática pedagógica deve ser realizada diante de uma proposta elaborada coletivamente e apresentada a todos os sujeitos da comunidade escolar, valorizando o planejamento e o trabalho em equipe,

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procurando contextualizar os conteúdos e diversificar as estratégias e recursos de ensino-aprendizagem, e ainda, respeitando as diferenças e toda a diversidade cultural presente no interior da escola.

No que tange a avaliação, o material destaca que esta é parte fundamental do processo educativo, onde a escola, através de vários instrumentos, possa investigar e acompanhar o aluno no seu desenvolvimento, oferecendo o suporte necessário para a superação das dificuldades apresentadas.

Outra importante dimensão abordada nos Indicadores da Qualidade na Educação é a gestão democrática, como mecanismo propulsor da participação, que possibilita que poder da direção seja descentralizado e as decisões tomadas considerando o coletivo. Vale lembrar, que além desse material, o Ministério da Educação, através da Secretaria de Educação Básica, publicou também, em novembro de 2004, o material do Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares (BraSIL, 2004b), e através dele as escolas tiveram a oportunidade de organizar e fortalecer este importante colegiado e, a partir daí, iniciar um verdadeiro processo de democratização da escola pública e construção da cidadania.

Não podemos deixar de falar na formação e condições de trabalho dos profissionais, pois de acordo com o material, nesta dimensão é fundamental que cada profissional dê continuidade a sua formação inicial, onde a unidade de ensino deve promover e viabilizar a participação dos educadores com o objetivo e melhorar a sua práxis e também a prática pedagógica realizada na escola.

O material traz, ainda, a preocupação com o ambiente físico escolar, que deve ser um espaço organizado, limpo, arejado, agradável, com materiais adequados à realidade da escola, com recursos que permitam a prestação de serviços de qualidade.

Outra dimensão abordada no documento trata do acesso, permanência e sucesso na escola, que são os principais desafios de uma instituição de ensino, que precisa pensar em uma escola que contribua para o sucesso escolar de todos os alunos matriculados na unidade de ensino.

Diante do exposto, podemos afirmar que o material, Indicadores da Qualidade na Educação, está muito bem organizado, abordando dimensões que precisam ser observadas, debatidas e utilizadas no cotidiano escolar, e ainda, podemos afirmar que este instrumento poderá contribuir significativamente no processo de realização do diagnóstico da escola para a construção da sua proposta pedagógica.

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A elaboração do projeto político pedagógico é um processo muito rico e esta experiência provocou mudanças significativas na comunidade escolar. Entendemos que o projeto é o organizador das nossas ações e coloca em discussão o papel da escola, a concepção de educação, de homem, de mundo e de sociedade que queremos construir de forma coletiva, envolvendo todos os autores e atores responsáveis por esta construção.

De acordo com Veiga (2004, p.14),

A principal possibilidade de construção do projeto político-pedagógico passa pela relativa autonomia da escola, de sua capacidade de delinear sua própria identidade. Isto significa resgatar a escola como espaço público, lugar de debate, do diálogo, fundado na reflexão coletiva.

Entendemos que não foi nada fácil, pois sabemos que a direção da unidade de ensino tem um papel fundamental neste processo de elaboração, e concordando com Veiga (2004), reafirmamos que escola é lugar de diálogo, discussão, planejamento, estudo e, é lógico, de muito trabalho; e tudo isso fica muito difícil de ser feito, nesta organização, respeitando uma legislação que prevê um calendário com um mínimo de duzentos dias letivos.

O corpo técnico administrativo, ou seja, diretor, pedagogos e coordenadores, formam o grupo que ficou com a responsabilidade de articular todo esse trabalho, garantindo a participação dos sujeitos que precisam se envolver com essa construção.

No início de 2007, a partir de uma discussão com o grupo de educadores, em virtude da importância e necessidade da elaboração do projeto, conseguimos assegurar que os dias previstos em calendário escolar para Formação Continuada na Escola, fossem destinados ao processo de elaboração do projeto, o que possibilitou um avanço significativo nesta caminhada.

Então começamos a trabalhar com o Marco Referencial – que se constitui na junção dos marcos situacional, teórico e operativo. Para tanto realizamos um encontro onde conseguimos reunir todos os funcionários da escola: professores, coordenadores, pedagogos, merendeiras, auxiliares de serviços gerais, assistentes administrativos, bibliotecária, estagiárias e diretor e, através de pequenos grupos, aplicamos um questionário que trata do Marco Situacional – que visa conhecer aspectos da situação sócio-econômico-político-cultural- educativo da comunidade onde a escola está inserida. Depois socializamos no grupão.

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Em seguida, realizamos um encontro para tratarmos do Marco Teórico – buscando identificar a visão de mundo, ser humano, sociedade e educação presentes no imaginário do grupo de profissionais – e o Marco Operacional, onde utilizamos questionários para pequenos grupos de profissionais contendo questões que proporcionariam um profundo debate sobre aspectos teórico-metodológicos da educação e da sociedade de modo geral, para depois discutirmos coletivamente os dados coletados.

Em reunião, o corpo técnico administrativo apontou algumas preocupações com o processo de elaboração do PPP, pois estávamos chegando ao final do cronograma que construímos no coletivo, contendo as etapas que consideramos importante vivenciar e aí nos perguntamos: O que faremos com tantos dados e informações? Quem ficará responsável pela organização de todos esses dados e informações para sistematização do PPP? Quais serão os elementos constitutivos do nosso projeto? Como garantir a execução dessa proposta tão abrangente?

Diante do exposto, apresentamos para a Secretaria de Educação todo o conjunto de dados colhidos e discutidos no coletivo da escola, para, a partir daí, buscarmos respostas às questões acima destacadas. Solicitamos então, a Secretaria de Educação um profissional com disponibilidade de tempo e capacidade para sistematizar em forma de texto todos os dados produzidos.

Em outubro de 2007, nossa solicitação foi aceita e em dezembro do mesmo ano já estávamos com o Projeto Político Pedagógico da EMEF “Irmã Jacinta” sistematizado. Este, por sua vez foi submetido à apreciação do grupo onde novas questões foram levantadas, críticas foram feitas e, assim, conseguimos chegar ao início de 2008 com o projeto estruturado, tanto no que se refere ao texto quanto no que tange às discussões numa perspectiva democrática e dialética de educação.

Como gestor desta Unidade de Ensino, é preciso destacar que esta experiência já provocou mudanças significativas na comunidade escolar, não só na organização da escola como um todo, mas na forma como as relações são estabelecidas, na integração da equipe, no crescimento e aprimoramento profissional de cada educador provocando mudanças positivas na condução do processo educacional e, podemos afirmar que fez com que esta organização se tornasse um local prazeroso para alunos, educadores, pais e toda a comunidade local.

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Com uma proposta já sistematizada, passamos agora a outra tarefa muito difícil, a de colocar em prática tudo o que foi elaborado a partir do coletivo, ou seja, a implementação do projeto, acompanhando no interior da escola o desenvolvimento de todas as ações, verificando quais têm contribuído ou não para a melhoria da prática educativa e através de um processo de avaliação coletiva, realizar as modificações que se fizerem necessárias para garantirmos a realização de um trabalho que permita à escola a cumprir o seu papel: dar sentido ao processo educacional.

De acordo com Penin & Vieira (2002, p. 20) “a finalidade da educação é o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para a cidadania e sua qualificação para o trabalho. Isto significa que a missão da escola, tal como definido em lei é, justamente, promover o pleno desenvolvimento do educando, preparando-o para a cidadania e qualificando-o para o trabalho”, daí a importância do envolvimento de representantes de todos os setores da escola e da comunidade escolar de modo geral.

Considerações finais

Nada grandioso pode-se fazer na vida sem sentimento poderoso (VIGOTSKI, 1996).

Pensando nas palavras de Vygotsky de que tudo de grande que fazemos tem que vir de um sentimento poderoso e, logo, grandioso, podemos dizer que pensar um projeto político pedagógico para uma escola nada mais é do que ter um sentimento poderoso – o de uma educação democrática, de qualidade, viva e vibrante. E é esse sentido que nos faz refletir sobre uma escola que não se contenta com o mínimo, com pouco, mas que busca a cada dia o melhor para seus sujeitos.

A Escola Municipal de Ensino Fundamental Irmã Jacinta Soares de Souza Lima tem experimentado esse processo de mudança movido por este sentimento poderoso, tanto é que conseguimos implementar um processo de debate, estudo, discussões que agora encontram-se reunidos no projeto político pedagógico.

Projeto este que reflete os desejos, anseios e perspectivas de alunos, pais, professores, comunidade escolar, em torno de uma escola aberta à diversidade,

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inserida numa conjuntura sócio – política – educacional que não se pauta em dogmas tradicionais, mas prima pela educação para a cidadania.

A elaboração do projeto político pedagógico proporcionou mudanças de posturas no que tange à formação continuada dos professores, nova visão acerca do processo ensino-aprendizagem, além de uma nova forma de encarar o currículo, a avaliação e as relações interpessoais.

Em suma, podemos considerar que temos certeza que com esta iniciativa demos um passo importante para a melhoria na qualidade da educação oferecida pela EMEF Irmã Jacinta e acredito que a participação nesse processo, como gestor, contribuiu de forma significativa para alcançarmos sucesso na elaboração desta proposta e, se é verdade que a escola tem a cara do diretor, precisamos ficar atentos, pois sua escolha irresponsável pode arruinar o ensino.

Referências

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Gestão democrática na escola pública: ação sócio-pedagógica que se faz ao caminhar

Aurelina Sandra Barcellos de OliveiraCarlos Cezar Gonçalves da Rocha

Dagilza Lopes Sant’AnaLessi Nunes de Moraes Braz

Maria Madalena Loureiro

Introdução

A gestão escolar democrática passou a fazer parte do conjunto de mudanças que se introduziram no contexto educativo a partir do período de redemocratização do país. Neste contexto surge esse novo conceito de gestão, implicando mudanças de paradigmas nas diferentes instâncias que compõem o sistema escolar.

Discutir esta problemática foi o que incentivou a escolha do tema, ao considerar que uma ação democrática exige a discussão coletiva dos problemas.

Surge, diante desta perspectiva, uma nova forma de administrar, que segun-do Bordignon (2004), “constitui-se num fazer coletivo, permanentemente em processo” (p.124). A esta forma, conceitua-se gestão democrática.

Compreende-se que educar para a cidadania requer criar condições para que os sujeitos da educação possam participar ativamente do processo de gestão da escola. É preciso, portanto, que a escola conceda autonomia para todos os segmentos envolvidos.

Nesta perspectiva, quais estratégias facilitadoras da gestão democrática podem ser implementadas na escola e quais situações são consideradas inibidoras da gestão democrática?

Na expectativa de encontrar respostas para o problema apresentado, a pesquisa realizada teve como objetivo principal discutir a gestão democrática no âmbito da escola pública, identificando as situações inibidoras desta

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forma administrativa. Além disso, procuramos refletir acerca das ações potencializadoras que contribuem para a participação dos diferentes segmentos da comunidade escolar em uma escola pública, apresentando estratégias que facilitaram a gestão democrática neste contexto apresentado.

A cultura democrática no âmbito da instituição escolar

A demanda da educação pública, a partir dos anos 80, passou a ter como foco de preocupação a qualidade do ensino oferecido, e neste sentido, compreende-se que essa qualidade está associada ao tipo de gestão realizada no contexto escolar, uma vez que a educação necessária para promover os princípios da cidadania está ligada às diferentes formas de concepção de educação, de homem e de sociedade.

Neste contexto, uma educação democrática se faz pela ação dos atores envolvidos, como o diretor, pedagogos, alunos, professores e outros profissionais que constituem o espaço escolar.

É preciso compreender que a gestão não se resume em ações de ordem administrativa no interior da escola. A mesma está diretamente ligada a outras instâncias, configurando, assim, uma hierarquia de poderes.

Verifica-se a existência de uma relação vertical entre os órgãos da administração, e “nessa relação verticalizada, as escolas se percebem sem poder de decisão e o necessário envolvimento dos sujeitos que atuam no seu interior não ocorre na intensidade requerida” (CERQUEIra, 2000, p. 30).

De todas as instâncias que compõem o sistema de ensino, é na escola que se caracteriza mais amplamente a democracia, pois as relações, neste caso, apresentam-se de maneira horizontal.

Na medida em que se conseguir a participação de todos os setores da escola - educadores, alunos, funcionários e pais - nas decisões sobre seus objetivos e seu funcionamento, haverá melhores condições para pressionar os escalões superiores a dotar a escola de autonomia e de recursos (PARO, 2001, p.12).

Sobre a participação dos segmentos mencionados pelo autor, algumas questões podem ser discutidas a fim de se compreender a complexidade da gestão democrática no nível da escola.

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A primeira questão se refere ao diretor da escola, uma vez que ele próprio precisa ser uma pessoa democrática, pois “não pode haver democracia plena sem pessoas democráticas para exercê-la” (PARO, 2001, p.25).

A segunda questão diz respeito às convicções do diretor quanto às vantagens de uma gestão democrática. Estando o diretor convencido de que deseja para a escola uma gestão democrática, o processo para que a mesma se torne uma realidade é facilitado e, assim, o seu papel será o de convencer aos outros segmentos da comunidade escolar a se empenharem para que as mudanças necessárias se estabeleçam.

A terceira questão é reconhecer que o processo de tornar efetiva a gestão escolar democrática exige aprendizagem, ou seja, “a participação da comunidade na escola, como todo processo democrático, é um caminho que se faz ao caminhar” (PARO, 2001, p.17).

De acordo com as relações existentes na escola, os sujeitos envolvidos estarão aprendendo a conviver em um espaço coletivo em que as situações são propícias para o debate e a reflexão coletiva.

A quarta questão que se pode apontar é a necessidade de identificar e enfrentar as dificuldades encontradas. Em cada contexto podem aparecer diferentes dificuldades que inibem a prática de uma gestão democrática e cada uma deve ser percebida como um desafio.

Um dos desafios é envolver os sujeitos do processo educacional desenvolvido dentro e fora da escola, para exercitarem juntos uma nova relação educador-educando, diretor-professor, diretor-aluno, diretor-funcionário, diretor-pai de aluno, escola-Secretaria de Educação e assim por diante (CERQUEIRA, 2000, p.35).

Como se percebe, não é fácil praticar a gestão democrática na escola pública, uma vez que são muitos os sujeitos envolvidos e cada um apresenta pontos de vista que podem divergir dos demais. Entretanto, o respeito à coletividade é que fornece as bases para a interação dentro de um espaço democrático.

Como salienta Torres (1998, p.16), “a democratização não é um dado, mas uma conquista da própria sociedade”. Neste sentido, atualmente, percebe-se que o diretor passa a contar com aliados e parceiros dentro da comunidade escolar para encontrar soluções para os problemas.

A participação do aluno nesta coletividade é discutida por Paro (1996).

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Segundo o autor, a necessidade de participação ativa do aluno como sujeito do processo supõe uma modificação na natureza do objeto de conhecimento.

Se a educação realmente se efetivou, o aluno sai do processo diferente de como ele era quando ali entrou. Essa diferença, que não é simples acréscimo, já que supõe uma real transformação na personalidade viva do educando, é que se constitui no efetivo produto do processo pedagógico escolar (p.144).

O aluno está presente no processo democrático, participando nas decisões, e isto requer aprendizagem, o que representa um dos desafios enfrentados pela escola, que percebendo a sua mudança de papel, não pode mais considerar a aprendizagem de conteúdos o único objetivo a ser alcançado. O espaço da sala de aula sofre mudanças para que o aluno adquira habilidades de participação.

O professor é, portanto, um dos agentes propiciadores da gestão democrática, pois é com ele, em sala de aula, que as oportunidades para o diálogo e as reflexões acontecem. Compreende-se que o processo de organização da escola democrática articula autonomia colegiada e participativa de todos os seus segmentos, e, assim, os alunos, professores e pais estão envolvidos da mesma maneira quanto o diretor da escola.

Torres (1998) destaca que o próprio conteúdo da gestão democrática se sustenta pela ação coletiva, e, portanto, pelo projeto coletivo. A autora também enfoca algumas características que permitem distinguir a cultura autoritária da cultura democrática:

A cultura autoritária é, reconhecidamente, um forte elemento limitativo das práticas democráticas, pois os mais caros valores nela presentes, como o individualismo, o egoísmo, a competição, contrariam, frontalmente, os princípios da comunidade de interesses, da solidariedade, do diálogo com vistas à construção coletiva. Estes últimos são valores típicos da consciência crítica que se reconhece, e por isso mesmo, é capaz de identificar a mudança como instrumento de humanização. A cultura autoritária demarca, de forma rígida e hierárquica, as posições dos homens na execução de uma tarefa coletiva. Já a cultura democrática é maleável, ela se utiliza do princípio da ação-reflexão-ação, como forma de aperfeiçoar um processo (TORRES, 1998, p.16).

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As diferenças apontadas pela autora mostram bem o tipo de cultura que se deseja construir no ambiente da educação do cidadão, uma vez que educar para a cidadania é educar pelo diálogo, em busca de solidariedade e tudo isso exige aprimoramento no relacionamento com as outras pessoas.

Estratégias facilitadoras da gestão democrática: práticas para além da escola

Na perspectiva da gestão democrática, democracia1 e cidadania2 são processos complementares, pois ambos se encontram mediados por instituições e criam espaços de participação.

A qualidade desta participação depende, principalmente, do grau de conscientização do papel dos atores envolvidos no processo de elaboração desses instrumentos e da maneira como as relações ocorrem no cotidiano da escola, uma vez que o projeto político pedagógico não pode ser compreendido simplesmente como um documento legal, da mesma forma como o Conselho de Escola não pode representar apenas um grupo de pessoas que tomam decisões isoladas. Ambos precisam ser percebidos como uma expressividade do conjunto de pessoas envolvidas no compromisso político da educação da instituição que representam.

Ciseski e Romão (1997) assim definem o Conselho de Escola: “um colegiado formado por pais, alunos, professores, diretor, pessoal administrativo e operacional para gerir coletivamente a escola” (p.66).

Compreender a educação como um ato político já foi mencionado por diversos autores, entre eles Veiga (1996), para quem todo projeto pedagógico

1 A palavra democracia foi utilizada pela primeira vez pelo historiador grego Heródoto, combinando as palavras gregas “demos”, que significa “o povo”, e “kratein”, que significa governar. Desde o século V a.C até os dias atuais este conceito foi sendo ampliado e recebeu diferentes significados conforme as situações em que era empregado, mas estando sempre associado às idéias de igualdade.

2 A cidadania é um conceito histórico, e, como tal, o seu sentido varia no tempo e no espaço. Este conceito tem origem na Grécia, e remete à participação dos cidadãos atenieneses nas assembléias do povo, com plena liberdade para votar as leis que governavam a cidade - a Polis - tomando decisões políticas. Naquele momento histórico estavam excluídos da cidadania os estrangeiros, as mulheres e os escravos. Ao longo dos anos este conceito passou por transformações e no contexto atual, cidadania é uma condição política de direitos e obrigações frente ao coletivo e as pessoas com as quais se convive.

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da escola é, também, um projeto político “porque expressa um compromisso com a formação do cidadão para um tipo de sociedade” (p.13).

Freire (1996), assim como Veiga, percebe que toda ação pedagógica é uma ação política. Para Freire, “a educação não vira política por causa da decisão deste ou daquele educador. Ela é política” (p.124). A afirmação de Freire se dá pelo fato de que não existe educação neutra, pois o diálogo estabelecido nas relações que se dão no cotidiano escolar está impregnado de intenções, podendo levar à transformação da realidade, ou na manutenção da mesma, ou seja, a prática dos educadores contribui para a emancipação ou para a permanência da desigualdade existente.

A obrigatoriedade da elaboração de um projeto político pedagógico foi evidenciada a partir da LDB 9394/96, aparecendo implícita ou explicitamente como será visto a seguir.

A LDB 9394/96, no Título II - Dos Princípios e Fins da Educação Nacional, no Art. 2º cita que

A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Diante das finalidades da educação mencionadas nesta lei, presume-se que a educação tem como uma de suas funções criar condições político-pedagógicas para o desenvolvimento do educando. Desta maneira, sendo a educação um dever da família e do Estado (representado aqui pela instituição escolar), é direito e dever da família e da escola estarem juntas na elaboração do projeto político-pedagógico. Quanto ao exercício da cidadania, percebe-se que nas práticas coletivas, onde se discutem os rumos da escola, esse exercício se faz fortemente presente, uma vez que por meio da participação constrói-se uma prática fundamentalmente democrática.

Percebe-se que mudanças significativas já ocorreram, uma vez que a os artigos 12, 14 e 15 da LDB 9394/96, enfocam a autonomia das escolas, o que vem de fato acontecendo no sentido de integração dessa instituição com a comunidade, por meio da elaboração do seu Projeto Político Pedagógico, que passa a ser um dos instrumentos que busca a participação de todos os envolvidos, criando, assim, a parceria e a distribuição de compromissos com a melhoria da educação oferecida.

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No inciso V do artigo 12 da LDB 9394/96, é citado que os estabelecimentos de ensino terão a incumbência de “articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade com a escola” (BraSIL, 1998, p.19).

Já o artigo 14 menciona que os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades, mencionando no inciso II o seguinte princípio: “participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes”.

A autonomia da escola também é enfocada no artigo 15:

Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito financeiro público.

Percebe-se que atualmente a educação tem assumido, por meio da equipe escolar, maior preocupação em cumprir as determinações legais. A razão pode estar relacionada a vários fatores, como por exemplo, a abertura incentivada pela gestão democrática, em que a sociedade se torna mais participativa, e mais exigente quanto a ação da escola na formação de seus educandos.

Nesta perspectiva, a definição de princípios, a elaboração ou execução de estratégias concretas e trabalho coletivo são os fundamentos para a construção do projeto político-pedagógico. É preciso compreender que as ações programadas não devem priorizar apenas a elaboração de um documento, e, sim, uma mudança constante, a fim de realizar uma participação ativa.

Mais importante do que produzir um documento perfeito e tecnicamente de acordo com os jargões científicos ou burocráticos, é dizer com clareza o que a escola vai realmente fazer, a partir de suas condições, de acordo com as estratégias que são factíveis e com os recursos que, mesmo ainda não disponíveis, têm condições de ser alocados (PADILHA, 2001, p.90).

No entender do autor, o projeto político-pedagógico traduz as expectativas das pessoas envolvidas na sua elaboração, e, por isto, na ação coletiva as discussões precisam estar respaldadas pelo bom senso, ou seja, pelo sentido da

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realidade percebida. O conjunto dos participantes necessita ter conhecimentos acerca da escola, dos recursos existentes e, enfim, obter informações que permitam traçar objetivos que poderão ser alcançados, para não correr o risco de tornar o projeto um sonho impossível de ser realizado.

O projeto político-pedagógico tem uma dimensão política, e é esta dimensão que possibilita a criação do espaço para a cidadania, ou seja, “a partir da visão do planejamento socializado e ascendente, contribuindo para que as pessoas, as escolas e a sociedade sejam cidadãs” (PADILHA, 2001, p.95).

Compreende-se que exercitando-se no espaço de discussões criado na escola, o grupo vai tornando-se autônomo. Finalizando as discussões sobre o significado político do projeto da escola, pode-se rever o sentido deste projeto no enfoque dado por Padilha (2003, p.12-15), para quem o projeto político pedagógico pode ser inicialmente entendido como um processo de mudança e de antecipação do futuro.

O autor afirma que o projeto político pedagógico estabelece princípios, diretrizes e propostas de ação para melhor organizar, sistematizar e significar as atividades desenvolvidas pela escola como um todo. Na sua percepção, ao desenvolvê-lo, as pessoas ressignificam suas experiências, refletem suas práticas, resgatam, reafirmam e atualizam valores, explicitam seus sonhos e utopias, demonstram seus saberes, dão sentido aos seus projetos individuais e coletivos, reafirmam suas identidades, estabelecem novas relações de convivência e indicam um horizonte de novos caminhos, possibilidades e propostas de ação.

Diante das reflexões levantadas, entende-se que o projeto político pedagógico da escola é um instrumento facilitador da gestão democrática da escola pública, e, vai além dos muros da escola, acaba por “educar” para a cidadania.

O sentimento de cidadania resgata a participação no processo de tomada de decisões que acontece no interior da escola. Desta maneira, uma das formas de propiciar as condições de uma participação ativa, configurando os fundamentos e princípios da gestão democrática, é o trabalho coletivo, do qual o Conselho de Escola também se tornou-se uma estratégia reconhecidamente facilitadora da gestão democrática.

Como um colegiado representante da escola, o Conselho de Escola é formado por todos os segmentos da comunidade escolar, ou seja, pais, alunos, professores, diretor e demais funcionários da escola, e outros representantes

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da comunidade em que a escola está inserida. Desta maneira, cada segmento escolhe um representante para fazer parte do colegiado.

Devido à importância deste colegiado, as opiniões sobre o mesmo são variadas, como mostram Ciseski e Romão (1997):

• Háosquevêemnelesumaameaça;• outrososaceitam,mastentamfragilizá-lospelaburocratização;• outros aindaos aceitam,masnãoospercebemcomo instrumentos

eficientes contra as administrações personalistas e autoritárias;• finalmente, há os queos defendemcomo a única possibilidadede

democratização de gestão escolar, desde que tenham competências deliberativas e normativas (CISESKI; ROMÃO, 1997, p.72).

Sobre o primeiro grupo, os autores mencionam aquelas pessoas que percebem a força que os Conselhos de Escola podem ter para minar os instrumentos autocráticos, e, portanto, por meio deles, pode acontecer o enfraquecimento dos mandos e desmandos que configuram a administração autocrática.

Já os grupos dos que aceitam este colegiado, mas tentam fragilizá-lo, percebe-se o desejo de limitar os aspectos administrativos aos que ocupam o cargo de direção, percebendo que as questões administrativas devem ser de competência profissional e que a comunidade não está apta a participar destas questões.

Os que não percebem o Conselho de Escola como instrumento contra a administração autoritária, acreditam que não há necessidade de instâncias coletivas de decisão, uma vez que as críticas e sugestões poderiam ser colocadas sem problema. Todavia, como afirmam Ciseski e Romão (1997), “dificilmente as pessoas formadas e vividas no autoritarismo apresentam abertura para críticas, ao mesmo tempo em que não abrem mão de dar a palavra final” (p.73).

Os que percebem o Conselho de Escola como possibilidades de democratização escolar, acreditam nas potencialidades do colegiado. Todavia, é preciso reconhecer as dificuldades existentes.

Ciseski e Romão (1997) reconhecem que, num país de pouca ou nenhuma tradição democrática, o funcionamento dos coletivos democráticos, eficientes e eficazes, em qualquer nível ou âmbito das relações sociais, apresenta uma série de dificuldades.

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Acreditamos que estas dificuldades não devem servir de justificativa para conservar a hierarquia existente, pois com o projeto político pedagógico e com o Conselho de Escola, é possível democratizar a educação, tendo em vista contribuir para o exercício da cidadania. Mais uma vez se pode afirmar a importância do papel da escola como instituição fundamental para a conquista da cidadania, uma vez que neste contexto, a educação é percebida como “precondição para o exercício da cidadania. Sem ela, torna-se difícil concretizar os direitos civis, políticos e sociais, porque se tornam difíceis, por exemplo, a leitura e a compreensão deles” (VEIGA, 1996, p.72).

É neste sentido que a educação torna-se um fenômeno complexo, bem mais amplo do que transmitir conteúdos, e não se esgota ao segmento de alunos, pois envolve outros agentes, que também se tornam aprendizes, e, assim, tanto o projeto político pedagógico quanto o Conselho de Escola pretendem ser instrumentos de “leitura do mundo, que viabilizam a interação dos diversos segmentos escolares e comunitários em torno da escola e da educação em geral” (PADILHA, 2001, p.70).

Diante disto, entende-se que o aperfeiçoamento das práticas sociais acontecerá na medida em que forem exercitados o debate e as discussões, tomando como ponto de partida reflexões sobre as opiniões apresentadas e a avaliação dos resultados das decisões tomadas.

A gestão democrática exercitada em uma escola da rede pública

O primeiro momento da pesquisa envolveu a observação do contexto escolar, e, paralelamente realizou-se entrevista com a pedagoga, e aplicação de questionários a um grupo de alunos do Ensino Médio. A escola pesquisada é a EEEFM Zumbi dos Palmares, da rede estadual de educação, localizada no bairro Cidade Continental, município da Serra. Esta instituição atende ao Ensino Fundamental e Médio.

Verificou-se junto a uma pedagoga, que o projeto político pedagógico foi elaborado no ano de 2002, com a participação de um grupo de pais, algumas pessoas da comunidade e pessoal da escola. Este foi reavaliado no segundo semestre de 2004, já sob a administração da gestora atual e também no ano de 2008, quando procedimentos estão sendo tomados para avaliação e atualização do mesmo.

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Segundo a pedagoga, os momentos para reavaliar o documento têm como finalidade levantar propostas para adequar o projeto às necessidades atuais da escola.

Quando nos dedicamos à construção de um novo projeto para determinada escola (instituinte), precisamos necessariamente partir do que já existe, das experiências da comunidade escolar, do conhecimento que elas têm de si mesmas e dos resultados dos seus projetos, dos seus subprojetos e principalmente das aprendizagens apresentadas por seus alunos e alunas (PADILHA, 2001, p.102).

A pedagoga do turno noturno informou que a avaliação da escola ocorre periodicamente e de diferentes maneiras. De maneira mais ampla, uma das avaliações foi realizada pela própria Secretaria de Educação, por meio do PAEBES - Programa de Avaliação da Educação Básica no Espírito Santo.

A escola também realiza outro tipo de avaliação, por iniciativa da diretora, pedagogos e coordenadores de turno, o que ocorre periodicamente. Esta avaliação é planejada pelos pedagogos e coordenadores de turno que junto à diretora selecionam questões para serem respondidas pelos professores e alunos de todos os turnos.

Durante a realização desta pesquisa, o questionário utilizado para conhecer a opinião dos alunos em relação à gestão democrática foi um dos instrumentos que serviram para análise e avaliação.

Foi mencionado pela pedagoga que os pais e outras pessoas da comunidade são convidados para reuniões e nestes encontros discutem sobre diversas questões, como por exemplo, as confraternizações com familiares, Feira Cultural, planejamento de palestras de interesse da comunidade e outras atividades que incentivam a participação dos familiares dos alunos e outros moradores.

O momento que envolveu a aplicação de um questionário para os alunos, contou com a participação de oitenta estudantes do Ensino Médio, cujo critério foi a aceitação dos mesmos em fazerem parte do estudo.

Percebeu-se que a escola apresenta preocupação em adequar o ambiente para a conquista da cidadania, promovendo atividades que contribuem para que o aluno sinta prazer em freqüentá-la, e, não somente impor à freqüência

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a fim de cumprir as determinações legais. Esta preocupação é sentida desde o cuidado com a estrutura física, a disponibilidade dos recursos didáticos pedagógicos, os planejamentos e outras providências que configuram o respeito ao direito à educação, e, mais do que isto, uma educação de qualidade que contribua para a conquista da cidadania.

No sentido da definição da proposta pedagógica em uma escola democrática, percebe-se que a mesma deve envolver a participação de todos os segmentos. “Não basta pensar apenas nos professores. Os funcionários, os pais e os alunos também devem ser formados para a participação” (PADILHA, 2001, p.63).

Foi solicitado que os alunos avaliassem a escola quanto aos aspectos democráticos referentes às questões pedagógicas.

A maior parte dos alunos considerou que a sua escola é aberta e transparente quanto ao processo pedagógico fornecendo informações e incentivando sugestões e discussões quanto às propostas pedagógicas.

Apesar de a maioria considerar a escola aberta e transparente quanto ao processo pedagógico, para outros, a escola não permite a participação de famílias e estudantes na elaboração de suas propostas.

Com base na observação realizada na escola percebe-se que estes alunos não compreendem que as suas opiniões influenciam nas tomadas de decisões referentes à proposta pedagógica, pois os mesmos opinam sobre diversos assuntos, como o tipo de técnica e metodologia utilizadas para o estudo de determinado conteúdo, inclusive, em algumas situações, podem escolher a forma de avaliação, se preferem um trabalho em grupo ou individual, se desejam utilizar um ou outro recurso, etc., e, então, mesmo que não percebam, estão participando da elaboração da proposta, mesmo que isso não esteja claro para eles.

Os dados analisados confirmam um fato já bastante conhecido, que é a dificuldade de envolver alunos e familiares na elaboração da proposta pedagógica, e como diz Padilha (2001), “o planejamento é socializado quando o processo de decisão é possibilitado a todos e não limitado aos ‘especialistas’ ou mesmo a ‘um grupo de coordenação” (p.66).

O autor menciona que “quando falamos na participação em todas as fases do planejamento, isso não significa que todos farão tudo a todo o momento, pois isso seria inviável e impraticável” (p.70). É importante que sejam estabelecidas regras claras sobre como se dará essa participação.

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Os fatores analisados levam à percepção de que o trabalho que está sendo realizado na escola parte da perspectiva de ensinar a pensar e refletir, e percebe-se que este aprendizado favorece a conquista da autonomia pelos alunos.

Um aspecto fundamental para a gestão democrática é a qualidade das relações entre as pessoas no ambiente escolar. Assim, buscou-se também conhecer o grau de satisfação dos alunos na relação com os professores.

Na perspectiva de uma escola democrática, os dados coletados evidenciam que os alunos, em sua maioria, estão satisfeitos com a relação professor x aluno. Esta deve ser uma das preocupações daqueles que ocupam a liderança na escola, pois é com os professores que os alunos interagem a maior parte do tempo em que se encontram na escola.

Freire (1996) é um dos autores que declara a importância do professor na formação do aluno, dizendo que “sua presença na sala de aula é de tal maneira exemplar que nenhum professor ou professora escapa ao juízo que dele ou dela fazem os alunos” (p.65). No caso da escola pesquisada esse juízo se revela positivo, propiciador de uma gestão democrática.

Com base nos estudos de Paulo Freire, pode-se afirmar que independente de suas características, o professor deixa marcas no aluno, como se verifica nas palavras do próprio autor:

O professor autoritário, o professor licencioso, o professor competente, sério, o professor incompetente, irresponsável, o professor amoroso da vida e das gentes, o professor mal-amado, sempre com raiva do mundo e das pessoas, frio, burocrático, racionalista, nenhum deles passa pelos alunos sem deixar sua marca (FREIRE, 1996, p.66)

Compreende-se, portanto, que o professor influencia fortemente no comportamento do aluno, ou seja, na sua formação, é esta é uma grande responsabilidade, exigindo deste profissional uma constante reflexão sobre a sua presença frente aos alunos.

A satisfação dos alunos se evidencia nos momentos da realização das aulas, na utilização de técnicas e recursos que favorecem a sua aprendizagem, na reciprocidade presente no dia-a-dia.

No que tange à satisfação dos alunos em relação ao Conselho de Escola, os dados coletados revelaram que um maior número de alunos demonstra satisfação em relação ao tipo de relação, pois a consideram excelente ou muito

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boa. Entretanto, existem os que não estão satisfeitos, e assim, foi possível perceber que um dos fatores que inviabiliza uma relação mais satisfatória entre o Conselho de Escola e os segmentos que cada um dos eleitos representa é a falta de comunicação entre o representante e seus representados.

Os dados coletados nesta pesquisa, por meio da observação realizada no contexto escolar, ou por meio das informações obtidas nas respostas do questionário aplicado aos alunos e das falas emitidas nos momentos de entrevista e conversa informal, quando se interagiu com os educadores e educandos, permitiram compreender a complexidade da gestão democrática no âmbito escolar. Porém, pode-se afirmar que assim como esta escola encontrou formas de tornar o seu ambiente democrático, outras instituições escolares podem realizar o mesmo feito, mas para isto, algumas condições são necessárias.

Uma destas condições, e, possivelmente a mais importante, é contar com um gestor democrático, pois dele depende a abertura de canais que favorecem a democratização do espaço escolar, e, conseqüentemente, a gestão escolar.

Considerações finais

Diante do estudo realizado, percebe-se que, no caso específico da gestão escolar, se a intenção é promover um ambiente democrático, é preciso romper com uma série de práticas caracterizadas pela hierarquia de poderes do sistema de ensino. Neste sentido, algumas estratégias facilitam a gestão democrática, como por exemplo, a criação do projeto político pedagógico e o Conselho de Escola. Todavia, é preciso que a participação dos envolvidos aconteça de fato e não apenas para mascarar a realidade, pois assim, estará criando uma pseudodemocracia no contexto da instituição.

Verificou-se também, que na escola, muitas mudanças vêm ocorrendo, porém, não se pode ignorar que uma das maiores dificuldades encontradas no processo de gestão democrática está, principalmente, na transformação do pensamento daqueles que atuam nas instâncias superiores à ela. Verifica-se que a autonomia da escola é, na verdade, limitada pela ação administrativa dos órgãos centrais. Este é um dos obstáculos mais difíceis de serem rompidos, dada a valorização do poder decisório destes órgãos dos quais depende a escola pública.

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A pesquisa realizada na EEEFM Zumbi dos Palmares mostrou que é possível realizar a gestão escolar democrática na escola pública, e que este tipo de gestão é uma ação pedagógica que se faz ao caminhar.

Conclui-se que nesta escola, os espaços foram abertos para a participação dos diferentes segmentos que compõem a comunidade escolar, e assim, alunos, família, professores e demais profissionais da escola exercitam a cidadania no dia-a-dia, aprendendo a lidar com responsabilidades e liberdade na busca incessante pela autonomia individual e coletiva.

Pôde-se concluir que o gestor da escola é uma peça fundamental no processo da democratização do espaço escolar, pois é ele quem primeiro sensibiliza e conscientiza os demais educadores da escola a também promoverem situações em que os alunos e seus familiares e pessoas da comunidade sejam ouvidos, que tenham voz, que sintam prazer em participar de um trabalho coletivo.

Na perspectiva de uma escola pública de qualidade cuja intenção principal é oportunizar o desenvolvimento integral de seus alunos, como é a Escola Zumbi dos Palmares, não se trabalha de maneira isolada. O gestor faz de sua liderança uma oportunidade de compartilhar o espaço escolar com toda a equipe, o que exige aprendizado constante para o aperfeiçoamento de tomar decisões coletivamente.

Referências

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85DEMOCraCIA, FORMAçãO E GESTãO ESCOLAR

O compromisso da gestão democrática na garantia de acesso e permanência

do aluno na escola

Deuza Lorencini BarrosJosé Francisco Barbosa

Maria Julia de Medeiros Mangaravite

Introdução

A educação é um bem social indispensável a todo cidadão que deseja progredir. Esse bem implica em uma formação cidadã para o exercício consciente na sociedade e esta espera que a escola faça a diferença na vida dos alunos. Isso implica dizer que é importante que todo estudante saia da escola diferente de como nela entrou: que saiba mais sobre si e sobre a sociedade onde está inserido; que pense a respeito da realidade a sua volta e que consiga discernir, no ambiente em que vive, o justo do inaceitável, agindo de maneira coerente e ética e, ao mesmo tempo, contribuindo para concretizar as mudanças necessárias no convívio social.

Para que a escola cumpra sua função de garantir a entrada do educando e o acesso ao conhecimento, promovendo o desenvolvimento de seus alunos, é necessário que todos estejam engajados num mesmo propósito, ou seja, envolvidos de forma responsável, com o processo ensino-aprendizagem e as questões que interferem no sucesso do educando, e que se faça valer o direito constitucional de acesso à escola pública gratuita e de qualidade a todos que nela desejarem ingressar.

A legislação atual garante em seus textos o acesso e a permanência do aluno à escola. A Constituição Federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei n° 9394/96, o Plano Nacional de Educação – Lei 10.172/2001, efetivam essa garantia, destacando os princípios e regras da administração pública até as diretrizes que regem os currículos da educação escolar. Existem, ainda, vários documentos de caráter internacional, assinados por países da Organização das Nações Unidas, que também reconhecem e garantem este direito a seus cidadãos.

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Como afirma Cury (2008 p.1) “[...] hoje, praticamente, não há país no mundo que não garanta, em seus textos legais, o direito de acesso, permanência e sucesso de seus cidadãos à educação escolar básica”.

A gestão democrática da educação – uma aprendizagem em construção

Gestão democrática, gestão compartilhada e gestão participativa são termos que embora não se restrinjam ao campo educacional, fazem parte da luta de educadores e movimentos sociais organizados em defesa de um projeto de educação pública de qualidade social e democrática.

Apesar das lutas em prol da democratização da educação pública de qualidade fazerem parte das reivindicações de diversos segmentos da sociedade, somente a partir da aprovação na Constituição Federal de 1988, esse processo de democratização tornou-se real, uma vez que a legislação estabeleceu princípios para a educação brasileira como obrigatoriedade, gratuidade, liberdade, igualdade e gestão democrática, regulamentados através de leis complementares.

A gestão democrática na escola é entendida como a participação efetiva dos vários segmentos da comunidade escolar, pais, professores, estudantes e funcionários na organização, na construção e avaliação do projeto pedagógico, na administração dos recursos da escola, enfim, em todos os processos decisórios. Trata-se, portanto, de uma maneira de organizar o funcionamento da escola pública com a finalidade de dar maior transparência às ações e atos do gestor.

Lück (2007) afirma que a gestão escolar participativa é importante para melhorar a qualidade pedagógica do processo educativo; garantir ao currículo escolar maior sentido de realidade e atualidade; aumentar o profissionalismo dos professores; combater o isolamento físico, administrativo e profissional dos gestores e professores; motivar o apoio das comunidades escolar e local às escolas e desenvolver objetivos comuns na comunidade escolar.

O Conselho Escolar, órgão colegiado presente nas escolas públicas, tem o papel decisivo na democratização da educação e da escola. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei n° 9394/96, em seu artigo 14, sinaliza para a autonomia da escola no que se refere à gestão democrática:

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Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios:I - participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto

político pedagógico da escola;II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou

equivalentes.

Assim, a LDB – Lei 9394/96 e o Plano Nacional de Educação – Lei n° 10.172/ 2001, definem objetivos e prioridades que devem orientar as políticas públicas de educação no período de dez anos. Dentre os objetivos previstos no PNE, destaca-se a democratização da gestão do ensino público, salientando-se mais uma vez, a participação dos profissionais da educação na elaboração do Projeto Político Pedagógico da escola e a participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes, bem como, a descentralização da gestão educacional, com o fortalecimento da autonomia da escola e a garantia da participação da sociedade na gestão da escola e da educação.

É importante destacar que a LDB e o PNE são instrumentos que dão respaldo legal às políticas concretas de fortalecimento da gestão democrática das escolas públicas. Desse modo, na perspectiva da gestão democrática, o gestor não é o líder que conduz seus liderados numa relação de subordinação, mas, ao contrário, promove suas ações, exercita sua função na direção da construção de instâncias democráticas de deliberação como conselhos escolares e outros colegiados, garantindo que o exercício do partilhamento do poder não dependa da “sua pessoa”, mas da organização e mobilização da comunidade escolar.

Vale a pena destacar que a democratização da escola implica o aprendizado e a vivência do exercício de participação e tomada de decisões. É um processo construído coletivamente e que deve considerar as especificidades de cada escola, visto que a unidade escolar é um espaço de contradições e diferenças, que exige do gestor o diálogo permanente, o respeito e a liberdade de expressão, na busca da construção de projetos coletivos e no partilhamento do poder.

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Garantia de acesso à educação – implicações legais

O direito à educação é uma garantia constitucional (CF/1988 - Art. 205). Assim, compete ao gestor assumir e liderar a efetivação desse direito no âmbito de suas atribuições. Conforme orienta a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – Lei 9394/96, artigo 5°, incisos I, II, III e IV, é dever do gestor:

I - recensear a população em idade escolar para o ensino fundamental e os jovens e adultos que a ele não tiveram acesso.

II - fazer-lhes a chamada pública.III - zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela freqüência à escola.IV - informar os pais e responsáveis sobre a freqüência e o rendimento dos

alunos, bem como sobre a execução de sua proposta pedagógica.

É importante que o gestor busque parcerias junto a outros Órgãos, como o Conselho Tutelar, Poder Judiciário e, quando necessário, deve enviar correspondência ao Juiz da comarca descrevendo a situação faltosa de cada educando. Conforme sinaliza o artigo 12, inciso VIII, da LDB é também função do gestor:

[...] notificar ao Conselho Tutelar do Município, ao juiz competente da Comarca e ao respectivo representante do Ministério Público a relação de alunos que apresentem quantidade de faltas acima de cinqüenta por cento do percentual permitido.

Por ouro lado, conforme determina a LDB (Art. 6°), além do gestor e dos órgãos competentes, é dever dos pais ou responsável efetuar a matrícula dos menores, a partir dos sete anos de idade, no ensino fundamental. Além disso, o documento que garante a proteção integral à criança e ao adolescente - Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei 8.069/90) no inciso V, artigo 53, assegura ao estudante o acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência.

Importante ressaltar que o estado tem uma parcela significativa de responsabilidade pelo atendimento ao aluno no ensino fundamental, através da garantia de programas suplementares como o material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde (ECA - artigo 54, inciso VII).

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Esta ação conjunta do estado, da família, dos órgãos públicos e do gestor escolar visa à entrada do aluno à escola, mas outras de igual importância são indispensáveis para promover a sua permanência, com qualidade, na escola. Respeitar os saberes culturais e artísticos dos educandos e promover atividades que valorizem sua auto-estima são ações que podem contribuir para a sua permanência na escola. Como destaca o Estatuto da Criança e do Adolescente no artigo 53, inciso II, à criança e ao adolescente é assegurado o direito de ser respeitado por seus educadores. O mesmo documento, no artigo 58, destaca princípios importantes para a busca da permanência com sucesso do aluno na escola, quando afirma:

[...] No processo educacional respeitar-se-ão os valores culturais, artísticos e históricos próprios do contexto social da criança e do adolescente, garantindo-se a estes a liberdade da criação e o acesso às fontes de cultura.

Qualidade da educação x currículo: uma construção coletiva em busca da superação das desigualdades

A busca pela qualidade tem sido o “motor” das políticas e das ações na educação. A definição de qualidade da educação é uma tarefa complexa porque envolve contextos, atores e situações diversificadas. É, em síntese, um desafio para o gestor.

Nos últimos anos, o conceito de qualidade prevalente nas políticas públicas esteve associado ao argumento de que o Brasil havia atingido a quase universalização do ensino fundamental, com mais de 90% de atendimento. Entendia-se, assim, que as escolas e salas de aula eram suficientes para atender a todos. Neste contexto, a existência de crianças e jovens fora da escola era atribuída apenas à reprovação e à evasão escolar. Segundo essa concepção, a qualidade se reduz à superação do problema da reprovação e da evasão e não mais para a sua democratização, em sentido amplo.

Gentilli (1994), ao discutir essa visão, registra que a palavra qualidade em educação tem sido muito utilizada como uma “nova retórica conservadora no campo educacional”, num discurso utilitarista que reafirma uma postura que nega um processo educativo emancipador para as maiorias.

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Numa educação emancipadora, o sentido de “qualidade” precisa ser decorrente do desenvolvimento das relações sociais (políticas, econômicas e culturais) contextualizadas e sua gestão deve contribuir para o fortalecimento da escola pública, construindo uma relação efetiva entre democratização e qualidade. Uma educação de qualidade visa à emancipação dos sujeitos sociais.

A educação escolar, assim compreendida como instrumento para a transformação social, é conhecida como educação emancipadora. Ela, segundo Rodrigues (1996 p. 81):

[...] “possibilita a todos a compreensão elaborada da realidade social, política e econômica do momento vivido pelos educandos; o desenvolvimento de suas habilidades intelectuais e física para a intervenção nessa realidade, e a posse da cultura letrada e dos instrumentos mínimos para o acesso às formas modernas do trabalho [...]”.

Assim, a educação emancipadora rompe com qualquer padrão de qualidade, em decorrência do próprio desenvolvimento das relações sociais, não cabendo, portanto “modelos” ou “esquemas”.

Outro fator recorrente para a concretização de uma educação emanci-padora é o respeito e o cultivo da diferença na educação das pessoas. Para que a escola ofereça essa contribuição, é preciso respeitar a história de vida das crianças, seu conhecimento, sua sensibilidade, seus valores, produzidos na convivência cotidiana na sua comunidade. Cada pessoa é diferente. É na diferença que está a originalidade, o sentido e a riqueza de ser gente.

Educar, na perspectiva do respeito às diferenças é totalmente diferente de treinar, domesticar, adaptar, moldar, incutir um padrão ou modelo. Educar, nessa perspectiva, é formar pessoas autônomas, sujeitos livres e responsáveis. Assim, a escola não existe para treinar ou adaptar as crianças. A função da escola é garantir uma educação de qualidade a todos os estudantes, contribuindo para que se tornem sujeitos, isto é, autores de suas vidas. Isso significa criar oportunidades para que eles decidam, pensem, opinem, tornem-se livres e responsáveis, autônomos, emancipados.

E para que isso aconteça, é necessário que os estudantes se apropriem ou incorporem a cultura da comunidade onde vivem e, ao mesmo tempo, assimilem os saberes científicos para intervir no mundo, na construção da história, na melhoria das condições de vida, enfim, na transformação da sociedade. Aprende-se, então, construindo e reconstruindo saberes.

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Ressalta-se, porém, que numa sociedade contraditória, com interesses opostos em jogo, a escola tende a reforçar os interesses dos grupos que detêm maior poder na sociedade. Cabe ao gestor enveredar esforços, no sentido de manter no ambiente escolar ações que possam de fato alterar o curso da história. Torna-se imperioso modificar as práticas educativas, tornando-as mais humanas e éticas, respeitar e cultivar as diferenças para que as pessoas possam decidir, pensar e se tornar livres e responsáveis.

Nesse sentido, quando o saber e a cultura dos estudantes são desrespei-tados, negam-se suas origens geopolíticas, étnicas e sociais com todas as suas contribuições e história. Esse desrespeito é discriminatório, abre caminho para a intolerância, para a insensibilidade e a falta de ética. Deixa-se margem para a imposição de uma verdade única, numa sociedade plural.

Por outro lado, a negação do saber do estudante na relação pedagógica provoca a evasão escolar por falta de estímulo, porque quando não há valorização da cultura do cidadão ele se sente excluído. Provoca, também, a desqualificação da educação, pois uma escola de qualidade respeita os seus educandos e promove a sua inserção social.

É indispensável que todos os que integram a escola, em especial o Conselho Escolar, permaneçam atentos e vigilantes, para evitar que a escola contribua para reforçar as condições e práticas que ajudam a manter a injustiça e as desigualdades sociais. Somente dessa forma a escola evitará a prática que discrimina o saber do estudante e promoverá uma aprendizagem emancipadora, rompendo com a pedagogia da exclusão.

Percebe-se, ainda, que a qualidade da educação está associada também à estrutura e às características da escola, em especial quanto aos projetos desenvolvidos; o ambiente educativo; a gestão da prática pedagógica; os espaços coletivos de decisão; o Projeto Político Pedagógico da escola; a participação e integração da comunidade escolar; a avaliação da aprendizagem e do trabalho escolar realizado; a formação e as condições de trabalho dos profissionais da escola, dentre outros.

Todos esses aspectos impactam positiva ou negativamente a qualidade da aprendizagem na escola. Nessa direção, de acordo com Matsuura (2004, p.1), uma escola de qualidade ou uma boa escola é

[...] aquela em que existe um clima favorável à aprendizagem, em que os professores e gestores são líderes animadores e em que a violência é substituída

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pela cultura da paz e pelo gosto de os alunos irem a uma instituição que atende às suas necessidades. Uma boa escola tem um currículo significativo: mantém um pé no seu ambiente e outro na sociedade em rede.

Outro fator decisivo para que a qualidade se efetive nas escolas, sobretudo às que atendem as populações mais pobres, é tornar o aluno no foco central do sistema educativo, de modo que sejam ativos no processo de aprendizagem.

Portanto, a produção de qualidade da educação, sob o ponto de vista extra-escolar, implica, por um lado, em políticas públicas, programas compensatórios e projetos escolares para enfrentamento de questões como: fome, violência, drogas, sexualidade, desestruturação familiar, trabalho infantil, racismo, transporte escolar, acesso à cultura, saúde e lazer, dentre outros.

Implica, ainda, em efetivar uma visão democrática da educação como direito e bem social que deve expressar-se por meio de um trato escolar pedagógico que ao considerar a heterogeneidade sócio-cultural dos sujeitos-alunos seja capaz de implementar processos formativos emancipatórios.

No compromisso com uma educação de qualidade, o gestor tem um papel muito sério, inescapável: ele deve motivar a comunidade escolar local no sentido de participar efetivamente dos destinos da escola como forma de garantir a permanência com qualidade do aluno na escola.

A escola como espaço privilegiado de encontro com o diferente deve ter um papel muito claro e verdadeiramente democrático, e ela se democratiza quando garante os direitos e cobra os deveres de cada um e faz com que todos os alunos dali se respeitem.

Portanto, a construção de um Projeto Político Pedagógico que seja da escola e que seja construído coletivamente, com objetivos e metas bem definidos além de um currículo que garanta em sua essência, conteúdos significativos e o respeito à diversidade podem contribuir para uma qualidade desejável na educação.

O dilema da evasãoA evasão escolar ainda é um dos desafios que afligem muitas unidades

escolares. Este é um problema complexo e está relacionado à prática pedagógica da escola, à forma de avaliação e ao currículo escolar, além de outros fatores. Os gestores comprometidos com a sua função, não podem ficar indiferentes a

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essa situação. Ao perceberem um índice de 4,7% de evasão escolar no ensino fundamental no período de 2005-2007, na EEEFM “Waldemiro Hemerly”, a equipe técnico-pedagógica sentiu a necessidade de implantar ações para a imediata solução da questão.

As causas da evasão escolar ou infreqüência do aluno podem ser agrupadas da seguinte maneira: escola não atrativa, autoritária, professores despreparados e desmotivados, currículos pouco significativos; aluno – desinteressado, sem perspectiva, repetente, trabalho infantil, indisciplinado, problemas de saúde, gravidez; família – desestrutura familiar, desinteresse em relação ao destino dos filhos; social – violência e agressividade entre os alunos, necessidade de complementação da renda familiar, uso e tráfico de drogas.

No Brasil, de acordo com o Ministério da Educação e Cultura, a reprovação e o abandono atingem 27% dos alunos, ou seja, em cada 100, 27 são reprovados ou abandonam a escola. Esse índice é resultado de fatores como a incapacidade das escolas fazerem o aluno progredir adequadamente ou ainda, a falta de estratégias para que o mesmo permaneça no sistema.

A escola deve buscar meios de atrair o aluno, criando um ambiente educativo acolhedor e prazeroso, priorizando práticas pedagógicas mais atraentes e respeitosas, promovendo atividades mais dinâmicas e interativas, elaborando o Projeto Político Pedagógico e garantindo um currículo mais significativo. E ao governo, cabe manter os programas de incentivo ao acesso e a permanência do aluno na escola, conforme sinaliza a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Lei – 9394/96 (Art. 4°, inciso VIII)

Para combater a evasão escolar, portanto, é preciso atacar duas frentes: uma de ação imediata, que busca resgatar o aluno “evadido”, e outra, de estrutura interna, que implica na discussão e avaliação das práticas pedagógicas.

A gestão democrática da educação e a importância da participação coletiva no trabalho pedagógico

Sabe-se que grande parte das escolas ainda não tem um gestor que atua sob os princípios da gestão democrática. Apesar dos avanços, muito ainda há para se fazer, no contexto escolar, de forma que todas as ações a serem implementadas na escola tenham participação efetiva de representantes de todos os segmentos.

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Cury (2008) afirma que a gestão democrática da educação é, ao mesmo tempo, por injunção da nossa Constituição, (Art. 37): transparência e impessoalidade, autonomia e participação, liderança e trabalho coletivo, representatividade e competência. A própria Constituição Federal preconiza que a educação é um direito de todos e sua promoção deve se dar com a colaboração da sociedade.

Mas, mesmo tendo ocorrido avanços, muitas escolas ainda apresentam um caráter autoritário. Na sociedade moderna não cabe mais um gestor que assume um papel centralizador, que se julga dono dos recursos, dono do saber e dono das decisões. Entende-se por gestão democrática quando o gestor tem um relacionamento interpessoal, quando se predispõe a ouvir, quando vê que se pode melhorar, mesmo havendo erros, quando aceita críticas com maturidade, sem agredir ou ofender ninguém.

A autonomia da unidade escolar é uma estratégia de democratização da gestão, mas a falta de autonomia administrativa e financeira é um sério obstáculo à realização da política educacional. Um dos itens que fundamentam a gestão democrática é a implantação do conselho de escola, importante parceiro para se ter uma escola de qualidade.

Enfim, a gestão democrática, com participação efetiva em todas as decisões a serem tomadas na escola, é o caminho em busca de uma educação de qualidade, onde todos os participantes do contexto escolar têm chance de emitir suas opiniões, sem medo de represálias.

A LDB, Lei n° 9394/96, no artigo 14 trata dos princípios da Gestão Democrática, no inciso II – “participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes”. Os conselhos escolares, implantados dentro dos princípios da gestão democrática, auxiliam o gestor a resolver os problemas da escola e da comunidade em que a escola está inserida.

A gestão democrática é de suma importância nas escolas, pois contribui para garantir a participação de todos os segmentos nas decisões e nos Projetos Pedagógicos a serem implantados na escola. Por outro lado, é importante ressaltar que a escola não é uma empresa de produção ou uma loja de vendas. Assim, a gestão democrática é, antes de tudo, uma abertura ao diálogo e à busca de caminhos mais conseqüentes com a democratização da escola brasileira em razão de seus fins maiores, postos no artigo 205 da Constituição Federal.

Porém, de nada adianta democratizar a escola, abrindo canais de participação para a comunidade, se for para manter o mesmo projeto pedagógico que

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reprova em massa e exclui os alunos do acesso aos conhecimentos escolares mais elementares, aumentando os índices de evasão e repetência.

Vale a pena citar Marques (2003) quando ele diz que uma educação de qualidade só se constrói através de discussões coletivas que levem a um posicionamento crítico diante de um tema.

Considerações finais

Procurou-se neste artigo, abordar o compromisso da gestão democrática na garantia de acesso e permanência do aluno na escola, destacando a educação como um bem social indispensável à sociedade e a necessidade de uma oferta eqüitativa desse bem, e com qualidade capaz de transpor as desigualdades e formar cidadãos mais conscientes e comprometidos com a transformação da sociedade.

Através da revisão da literatura e da realidade vivenciada no cotidiano da EEEFM “Waldemiro Hemerly”, localizada na sede do município de Rio Novo do Sul, Espírito Santo, chegou-se às seguintes conclusões:

É dever do gestor garantir o acesso e a permanência do aluno na escola, cumprindo a legislação e incentivando práticas educativas mais democráticas, além de favorecer a elaboração coletiva do Projeto Político Pedagógico da Escola. É aconselhável que se tenham Programas como o Mais Tempo na Escola visando retirar das ruas os alunos de classe social menos favorecida, garantindo-lhes mais oportunidade de estudos e acesso às atividades culturais.

A escola é, por excelência, um local privilegiado de encontro com o diferente. Neste sentido, o trabalho pedagógico deve ser pautado nos princípios democráticos da igualdade, do respeito, da não discriminação, da ética, do desenvolvimento de atividades que promovam a auto-estima do educando.

Espera-se que este artigo traga contribuições aos gestores das escolas públicas, no sentido de possibilitar-lhes uma reflexão acerca da função da gestão democrática e do compromisso com o fazer pedagógico dentro da unidade escolar. Além disso, espera-se que os gestores reforcem a importância de se implementar práticas educativas emancipadoras, elaborem o Projeto Político Pedagógico e mantenham as parcerias necessárias para a manutenção de uma escola de qualidade, que garanta o acesso, mas também a permanência do aluno à escola.

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Por outro lado, é importante destacar que este artigo não pretende esgotar o assunto, pois a dinâmica da sociedade moderna trará constantemente novos desafios à ação educativa e ao trabalho do gestor, exigindo novas competências, novos saberes e novas atitudes à função desse profissional que precisa estar em permanente formação.

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FUNDEB e gestão democrática: formação dos conselhos e controle social dos recursos

Maria de Lourdes Mendes GavaMaristela Wassoler

Introdução

FUNDEB é o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica. Foi criado através da Emenda Constitucional n. 531/06, aprovada em 06 de dezembro de 2006. Seu objetivo é proporcionar a elevação e uma nova distribuição dos investimentos em educação.

Esse recurso veio atender, além do Ensino Fundamental, também a Educação Infantil, o Ensino Médio e a Educação de Jovens e Adultos. Garante a todo cidadão brasileiro a Educação Básica, inclusive àqueles que não tiveram oportunidade de tê-la na infância.

Sua vigência está estimada em 14 anos, partindo da sua implantação. É um Fundo de Natureza Contável, formado com recursos provenientes das três esferas do governo.

É pretendido, assim, fazer um estudo através da exploração documental a respeito da Gestão do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica, a formação dos Conselhos, bem como a importância do planejamento desse recurso e o Controle Social dos próprios. Não se pode pensar numa gestão democrática da educação sem que se pense numa política que além de se preocupar com os que estão envolvidos no ensino básico, também se preocupe com aqueles que, por motivos sócio-econômicos, foram alijados desse direito.

Espera-se verificar a regulamentação desse recurso, o seu funcionamento, o seu objetivo, a sua utilização, a importância da formação e atuação dos Conselhos para que haja controle desse fundo.

Mediante essas considerações, foi possível realizar uma pesquisa que propusessem ações relevantes na utilização dos recursos do FUNDEB e que tornassem essas ações claras e transparentes em relação à comunidade escolar e

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local, visto que o Controle Social desses mesmos recursos é possível, mediante um acompanhamento sério e eficaz de Conselhos Representativos.

Uma gestão baseada nesses princípios caracteriza uma gestão educacional participativa. Assim, Oliveira (2003, p. 28) afirma que: (...) democracia participativa além de funcionar como uma nova forma de controle social e de recuperação de iniciativas autônomas da população (...), opera no sentido de legitimá-lo.

Dessa forma, o que caracteriza uma gestão democrática não é mais a coerção e a manipulação dos recursos financeiros e humanos, mas o dirigismo com base nas práticas da motivação, cooperação e integração; nesse contexto, percebe-se, sobretudo, um controle da ação coletiva.

FUNDEB – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica

Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica – FUNDEB, instituído pela Emenda Constitucional nº 53/06, aprovada em 06 de dezembro de 2006, tem por objetivo proporcionar a elevação e uma nova distribuição dos investimentos em educação.

O novo fundo atende não só o Ensino Fundamental, como também a Educação Infantil, o Ensino Médio e a Educação de Jovens e Adultos, proporciona a garantia da Educação Básica a todos os brasileiros, da creche ao final do Ensino Médio, inclusive àqueles que não tiveram acesso à educação em sua infância.

O FUNDEB terá vigência de 14 anos, a partir do primeiro ano da sua implantação, não é considerado Federal, Estadual, nem Municipal, trata-se de um Fundo de Natureza Contábil, formado com recursos provenientes das três esferas de governo. A regulamentação da FUNDEB deu-se através de medida provisória (MPM nº 339, 2006), teve como objetivo apressar o repasse dos recursos em 2007.

Uma das muitas novidades trazidas pela E.C. nº 53/06 para a valorização dos profissionais de educação, foi a referência a pisos salariais, a definição de um piso salarial nacional para os profissionais da educação escolar pública.

Os recursos do FUNDEB serão distribuídos entre o Distrito Federal, os Estados e seus Municípios, considerando-se exclusivamente as matrículas

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presenciais efetivas. A implantação do Fundo dar-se-á gradualmente, obedecendo a uma gradação de três anos. Para efeito de distribuição de recursos para o FUNDEB, para cada uma das etapas, modalidades e tipos são atribuídos anualmente um fator de ponderação, cujo objetivo é o de refletir as diferenças de custo para a manutenção dos alunos. O FUNDEB passou a vigorar a partir de 1º de janeiro de 2007 e manteve-se a sistemática de repartição de recursos previstos pelo FUNDEF.

Quanto à parcela destinada à valorização do profissional do magistério, compreendida aquela que será utilizada para pagamento de salários e outras vantagens, a M.P. nº 339/06 trata dessas questões em seu art. 22; admite a inclusão de profissionais contratados temporariamente; define remuneração como sendo o total de pagamentos efetuados aos profissionais incluindo-se os encargos sociais; expressa a proibição da utilização desta verba para pagamentos de inativos. Os recursos do FUNDEB devem ser totalmente utilizados durante o exercício em que forem creditados.

Para exercer o controle sobre os recursos dos Fundos, além da fiscalização exercida pelos controles internos e tribunais de contas, a M.P. nº 339/06 estabeleceu a criação de conselhos instituídos para esse fim, determinando os aspectos desse recurso, definidos assim: Vigência de 14 anos; Alcance – Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio; Número de Alunos- 48,1 milhões (censo de 2005); Fontes de recursos que compõem Fundo – Contribuição de Estados, Distrito Federal e Municípios; Fundo de Participação dos Municípios; ICMS; IPLesp/ ITCMD; IPVA; ITR e Complementação da União; Montante dos Recursos Previstos – R$ 41,1 bilhões no primeiro ano; R$ 45.9 bilhões no segundo ano e R$ 50.5 bilhões no terceiro ano; Complementação da União ao Fundo – R$ 2 bilhões no primeiro ano; R$ 3 bilhões no segundo ano e R$ 4,5 bilhões no terceiro ano, 10% do montante resultante da contribuição dos Estados e Municípios,a partir do quarto ano; Total geral de recursos do Fundo – Previsões (2206) R$ 43.1 bilhões no primeiro ano; R$ 48.9 bilhões no segundo ano e R$ 55,2 bilhões no terceiro ano. Distribuição dos recursos – de acordo com dados do Censo Escolar do ano anterior, observada a seguinte escala de inclusão: alunos do Ensino Fundamental e Especial – 100% a partir do primeiro ano; alunos da Educação Infantil, Ensino Médio e EJA, 33% no primeiro ano – 66,66% no segundo ano e 100% a partir do terceiro ano; Utilização dos recursos – mínimo de 60% para remuneração dos Profissionais do Magistério da Educação Básica. O

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restante dos recursos em outras despesas de manutenção e desenvolvimento da Educação Básica Pública. Valor Mínimo Nacional por aluno/ano – a especificação anual dos valores da ponderação anual ficou a cargo da Junta de Acompanhamento dos Fundos. Esses valores foram fixados para 2007 na Resolução nº 01/07, do Ministério da Educação; Salários – Educação – Vinculados à Educação Básica (não podem ser utilizados para fins de custeio da Complementação da União do FUNDEB).

Dessa maneira, é necessário que se crierio que se d para que esses recursos sejam bem geridos e bem utilizados.s necessidades de cada comunidade escolar. A formaç condições para que esse recurso seja aplicado dentro do limite da Lei e atendendo as necessidades de cada comunidade escolar. A formação de Conselhos participativos e funcionais é fundamental para que esses recursos sejam bem geridos e bem utilizados.

Gestão democrática e controle social dos recursos do FUNDEB

Para Arroyo (2000), É urgente mudar as formas de gerir os sistemas escolares e as escolas, de gerir currículos e os profissionais. (...) inovar as formas de gerir as inovações educativas.

A gestão da educação brasileira tem apresentado, nas últimas décadas, uma tendência pela atuação urgente no planejamento, implantação e implementação de ações voltadas ao desenvolvimento dos processos sócio-político-educacionais das instituições de ensino, especialmente aquelas ações direcionadas à promoção da aprendizagem dos alunos.

Tal contexto aponta a gestão da escola e, especialmente à atuação do seu diretor, como espaço de posicionamento e ação frente aos objetivos educacionais, sociais e políticos propostos por um grupo social. A participação direta dos principais sujeitos da comunidade educativa aponta os caminhos experimentados na busca de maior participação de todos. A participação, o diálogo coletivo, autonomia, a eleição direta do diretor da escola, são práticas que pressupõem uma gestão democrática.

Trata-se da implantação de ações, políticas e projetos que consolidem uma escola pública que pretenda atender, de modo cada vez mais significativo, os segmentos que dela usufruem, de forma responsável e com qualidade.

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A Constituição Federal de 1988 adota como um dos princípios a Gestão Democrática do Ensino Público na forma da Lei, em seu art.206, inciso VI.

Entende-se que a Gestão Democrática da Educação é parte do processo de democratização do Estado, de auto-organização da sociedade e de construção da cidadania. Articula-se com a busca permanente – individual e coletiva - de uma nova qualidade da educação, em todas as diferentes instâncias educacionais. A participação é um processo político.

Ao fazer um passeio na história da educação brasileira, verifica-se que o termo Gestão Democrática do ensino Público é enfatizado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) – apesar da superficialidade, ao determinar que “um dos princípios que deve reger o ensino é a gestão democrática” (art. 3º inc. VII). Porém, o artigo 14 define que os sistemas de ensino devem estabelecer “normas” para o desenvolvimento da gestão democrática, e que essas por sua vez, precisam estar de acordo com as peculiaridades de cada sistema. A participação na gestão da escola implica no poder real de tomar parte no processo educacional. Precisa-se refletir sobre a participação da comunidade dentro de escola pública, nos conselhos escolares, no projeto pedagógico.

O PNE define a gestão democrática do ensino público efetivo com a participação da comunidade e deve desenvolver padrão de gestão que tenha como elementos à destinação de recursos para as atividades – fim, a descentralização, a autonomia da escola, a eqüidade, o foco na aprendizagem dos alunos e a participação da comunidade.

No exercício de sua autonomia, cada sistema de ensino deve implantar a gestão democrática. Em nível de gestão de sistema na forma de Conselhos de Educação que reúnam competência técnica e representatividade dos diversos setores educacionais; em nível das unidades escolares, por meio da formação de conselhos escolares de que participe a comunidade educacional e formas de escolha da direção escolar que associem a garantia da competência ao compromisso com a proposta pedagógica emanada dos conselhos escolares e a representatividade e liderança dos gestores escolares.

Para alcançar essa finalidade, as diferentes instâncias constitutivas do sistema educacional devem estar sintonizadas em torno de uma unidade de propósito – a educação como direito humano básico. A escola é, então, o centro do sistema educacional: centro promotor da formação humana, centro da gestão do sistema educacional.

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A escola pública democrática, participante, competente e feliz que se busca, organizará seu dia-a-dia de forma diferenciada, evidenciando mudanças que se refletem até mesmo em questões rotineiras, superando o individualismo, o corporativismo e a resistência às mudanças.

A gestão democrática exige o cultivo da cultura da participação, do trabalho coletivo, da ação colegiada, da realização pelo bem comum. Enfim, é preciso possibilitar momentos de experimentação da democracia na escola para se tornar uma prática efetiva, consolidada e possível de ser efetivamente vivenciada.

A gestão democrática pressupõe a formação de Conselhos que tenham compromisso com a história da unidade escolar e responsabilidade com a utilização dos recursos que essa recebe. E dentre essas verbas, destaca-se o FUNDEB.

Nesse sentido, a formação de um Conselho de Escola consciente do seu papel, compromissado com a organização da escola e, acima de tudo, ciente da importância da sua participação é fundamental para que a gestão seja realmente democrática e ativa.

A prática da democracia na escola precisa ser colocada em prática e, para tanto, é necessário que se faça dela um espaço de participação. E um desses espaços é o Conselho Escolar, uma vez que sua função está intimamente ligada à essência do trabalho escolar. Assim, o papel primordial do CE é político-pedagógico.

Entre as tantas atribuições do Conselho Escolar, destacam-se a elaboração do Projeto Político Pedagógico e o acompanhamento do desenvolvimento das ações escolares, tendo como fim maior a construção de uma educação democrática e emancipadora.

Nesse entendimento, o CE tem como atividade principal a discussão e definição do tipo de educação a ser desenvolvida na entidade escolar, fazendo um reconhecimento da realidade local e indicando os caminhos que a levem a atingir à realidade esperada.

É muito difícil lidar com as diferenças mesmo sabendo ser a escola um espaço múltiplo que lida com pessoas diversas e com potencialidades diferentes. Vê-se que a escola reproduz as relações econômicas e sociais da sociedade, gerando conflitos que não podem ser evitados. Por outro lado, ela tende a camuflá-los, minimiza-los e, até, desconsidera-los, desrespeitando o diferente.

Dessa forma, o Conselho Escolar precisa, cumprindo seu papel de intermediador dos conflitos, buscar uma linha de entendimento dentro do

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contraditório instaurado pelas desigualdades sociais e econômicas. A atuação do CE deve criar espaços para que todos sejam ouvidos, concretizando o debate de opiniões sobre os interesses da escola.

Assim, o Conselho Escolar deve ser a garantia de um espaço democrático na escola, respeitando e fazendo que respeitem o pluralismo e as diferenças.

Sendo o Conselho Escolar um espaço de debates e discussões de opiniões, deve propor sempre a discussão no sentido de se obter uma educação emancipadora, ou seja, sentido de qualidade que decorre do desenvolvimento de relações sociais contextualizada, sabendo que, a partir de uma gestão participativa e democrática, a escola pública poderá se sentir mais fortalecida. Isso oportunizará a construção de uma relação efetiva entre a qualidade e a democratização.

Portanto, para que a instituição escolar consiga obter um ensino de qualidade precisa transformar sua realidade, levando em conta que essa prática educativa inclui a aprendizagem do estudante, porém não pode se restringir a ela.

Sendo a escola um equipamento social público, há necessidade de que suas ações sejam transparentes. Dessa forma, o Conselho Escolar, em parceria com a equipe administrativa da entidade – direção - deve recolher e analisar dados e informações a respeito do processo educacional.

Essas análises devem indicar planos e ações a serem colocadas em prática e que possam contribuir para a construção de uma educação emancipadora para todos os que participam do processo.

Controle social dos recursos do FUNDEB

Segundo Coll (2000, p. 64), a institucionalização de mecanismos de participação tem conseguido envolver a população e dialogar com ela para a constituição de um programa de gestão democrática da educação.

É através desses mecanismos que a escola tem conseguido superar muitos desafios e, principalmente, assumir autonomia diante das atitudes que devem ser tomadas para a construção de uma unidade mais democrática e representativa no universo educacional.

Autonomia é aquela pessoa ou instituição que é capaz de fixar normas de sua conduta no âmbito de sua natureza específica, portanto escola pública

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estatal autônoma deve ser aquela capaz de fixar as normas de seu próprio existir e agir, levando em conta seus limites e suas potencialidades. A autonomia é uma conquista coletiva defendida pelos colegiados e conselhos escolares.

É preciso obter de cada um deles, profissional da educação, estudantes, pais e comunidades, o compromisso com a qualidade de ensino, e esta qualidade se concretiza na formação do estudante. Só pode formar cidadãos autônomos a escola que é, dentro dos parâmetros possíveis, independentes e autônomos na gestão do seu projeto pedagógico e dos seus recursos administrativos, de pessoal e materiais.

Torna-se autônoma a escola que, primeiro, situa e adapta seu projeto pedagógico à realidade local, incorporando e buscando compreender os valores culturais, as práticas sociais, os costumes e as manifestações artísticas da comunidade, adquirindo identidade.

O Conselho Escolar desempenha papel fundamental para a consolidação do processo dessa Gestão Democrática nas escolas, é um importante órgão garantido por lei, contribuindo para o processo de gestão participativa. Trabalhar em parceria com o pai, alunos, funcionários e comunidade visando um só objetivo: o de obter o sucesso no ensino-aprendizagem. Visando, realmente, uma gestão democrática e uma educação de qualidade, buscando uma escola pública democrática, participativa e competente, para que se torne um espaço coletivo de formação de cidadãos críticos, conscientes e capazes de trabalhar e lutar pela sua própria libertação.

É essa escola que se deseja construir. Essa construção é possível com a formação eficiente de conselhos que, realmente, funcionem e contribuam com o controle de recursos recebidos pela escola. Aqui, mais diretamente, falando-se do FUNDEB.

O processo de mudança na forma de gerir escolas tem se fortalecido devido à institucionalização da democracia, associada ao aprimoramento da eficiência e da qualidade da educação pública.

O movimento em favor da descentralização e da democratização da gestão das escolas tem encontrado apoio nas reformas educacionais e nas proposições legislativas. Esse movimento concentra-se em algumas vertentes básicas da gestão – a participação da comunidade escolar na seleção dos gestores; a criação de um colegiado/conselho escolar que tenha tanto autoridade deliberativa como poder decisório e o repasse de recursos financeiros às escolas e, consequentemente, aumento de sua autonomia.

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Dentre essas vertentes, a formação do Conselho Escolar tem funcionado como um excelente suporte para a gestão escolar e o desenvolvimento das instituições. O Conselho Escolar ou Colegiado é constituído de representantes de professores, dos funcionários, dos pais e os gestores da escola, com autoridade deliberativa e poder decisório.

Para que o conselho funcione é necessário que o gestor crie um ambiente estimulador para essa participação, através de ações que vialbilizem a eficácia desse conselho. Assim, é imprescindível que seja criada uma visão de conjunto associada a uma ação de cooperação; que seja promovido um clima de confiança; valorização das capacidades e aptidões dos componentes do conselho; que sejam associados esforços, quebradas arestas, eliminadas divisões com integrações de esforços. È preciso estabelecer demanda de trabalho centrado nas idéias e não em pessoas e desenvolver a prática de assumir responsabilidades em conjunto. Esse tipo de gestão é baseada no conceito de autoridade compartilhada, por meio da qual o poder também é compartilhado com representantes dos segmentos da escola e da comunidade local e as responsabilidades administrativas são assumidas em conjunto.

A escola possui uma organização administrativa de forma que há disponibilização constante de informações sobre a organização, tais como orçamento ou atas de reuniões, promovendo a compreensão e o comprometimento com os objetivos mais amplos da organização, por parte daqueles em níveis hierárquicos inferiores.

Também os estudantes possuem envolvimento, através de representações, das decisões da gestão escolar, sendo essa respaldada em elementos que garantem a liderança e o apoio nessa, tais como: enfoque pedagógico do gestor; ênfase às relações humanas; criação de ambiente positivo; ações voltadas para metas claras, realizáveis e relevantes; disciplina em sala de aula garantida pelos professores; capacitações voltadas para questões pedagógicas; consenso sobre valores e objetivos; planejamentos; apoio das comunidades escolar e local.

O intercâmbio entre a escola e as demais do município e, até fora dele, é constante. Normalmente, nossas escolas funcionam como pólo para reuniões gerais, em nível de estado e município. Há uma reciprocidade bastante evidente entre as escolas do município, exemplo disso é o controle do material didático feito nelas para que as possíveis sobras possam ser aproveitadas por aquelas que não possuem material suficiente.

À função da escola, através de sua gestão e organização, criar condições

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para a existência de troca de informações profissionais entre os segmentos da instituição, bem como os elementos que compõem a comunidade escolar.

Sendo assim, a gestão participativa é capaz de afetar positivamente a qualidade escolar. Escolas cuja gestão pratica um estilo consultivo e que busca as opiniões de um número selecionado de funcionários e comunidade local criam um ambiente de aprendizagem mais eficaz. Preparar a comunidade escolar para a gestão democrática é a essência da transformação do sistema de ensino.

Considerações finais

Uma escola com atuação diferenciada, mesmo diante das grandes dificuldades, está no trabalho integrado da comunidade: funcionários dedicados, alunos engajados e comunidade envolvida. Esses são fatores fundamentais para que seja desenvolvida uma gestão verdadeiramente atuante e democrática.

Muitos incentivos para que essa verdade se transforme em realidade têm sido dados por parte daqueles que se responsabilizam pelo sistema educacional desse país. A exemplo disso pode-se destacar a importância do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica, criado a partir da Emenda Constitucional nº 53, aprovada em 06 de dezembro de 2006, com o objetivo de proporcionar a elevação e uma nova distribuição dos investimentos em educação. Seu funcionamento passa ter vigor a partir de 1º de janeiro de 2007.

Devido à sistemática de sua utilização, os recursos devem ser muito bem controlados e bem administrados para que a escola goze desses benefícios com transparência, exatidão e, principalmente, com atendimento às necessidades mais urgentes e que contribuam com o desenvolvimento escolar.

Percebe-se que embora esses recursos sejam controlados e fiscalizados pelo Tribunal de Contas e controles internos, as instituições dos conselhos foram muito importantes, uma vez que foi a grande oportunidade das comunidades escolar e local participarem do destino das unidades escolares a que pertencem.

A formação dos Conselhos de Escola foi uma decisão muito favorável à sustentação de uma escola democrática, pois o Conselho Escolar, formado legalmente pelo representante dos professores; dos alunos; dos pais e pelo

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gestor. Os objetivos desse órgão são definir formas de permanência de alunos na escola, sugerir ações, estimular a efetiva participação da escola nas decisões, assegurar a autonomia escolar, fortalecendo, assim, a administração democrática e participativa, para que juntos, escola e comunidade construam uma unidade educacional de qualidade, transparente em suas ações, solidária e, acima de tudo, democrática.

Nessas Instituições (E.E.E.F. “Wilson Resende” e E.E.E.F.M. “Amélia Toledo do Rosário”), há funcionalidade do Conselho de Escola, uma vez que a participação de seus membros efetiva-se em conformidade com as situações preestabelecidas e, quando ocorrem casos extraordinários, os representantes sempre acolhem as convocações.

Esse órgão atua com muita ética, responsabilidade e compromisso, pois reconhece o importante papel que desempenha, enquanto representação.

As atribuições do Conselho de Escola contemplam aspectos administrativos, financeiros e pedagógicos, valorizando, dessa maneira, a gestão democrática participativa.

Percebe-se, dessa forma, que o FUNDEB veio proporcionar um acréscimo nos recursos destinados à educação, assim como uma ampliação nas modalidades de ensino contempladas. Segundo Gentili e McCowan (2003), tudo o que a gente puder fazer no sentido do convocar os que vivem em torno da escola e, dentro da escola, servirá de fortalecimento para melhoria da qualidade social da educação para todos.

E sendo assim, a educação é vista como um importante instrumento no planejamento do desenvolvimento à medida que deve prover o país de conhecimentos técnicos e de um grau de evolução que traga favorecimento do crescimento da produção e a melhoria do nível de vida dos habitantes. Para tanto, é necessário que se pense em Educação como integração com o planejamento econômico, fixando metas e quantificando recursos, qualificando o processo educacional e, acima de tudo, proporcionar uma gestão democrática que garanta toda eficiência do processo educacional.

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Referências

ALVES, Nilda; GARCIA, Regina Leite; GALLO, Sílvio; MORIN, Edgar; FERRAÇO, Carlos Eduardo. O sentido da escola. 4. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2004.

ARROYO, Miguel G. Ofício de mestre: imagens e auto-imagens. 7. ed. Petrópolis: Vozes, 2000.

GADOTTI, Moacyr e ROMÃO, José E. Autonomia da escola: princípios e propostas. 6. ed. São Paulo: Cortez: Instituto Paulo Freire, 2004.

GENTILI, Pablo; MCCOWAN, Tristan (orgs.). Reinventar a escola pública – política educacional para o novo Brasil. Petrópolis: Vozes, 2003.

VEIGA, Ilma Passos A. Projeto político pedagógico da escola - uma construção possível. 18. ed. Campinas: Papirus, 1995.

OLIVEIRA, Dalila Andrade. Gestão democrática da educação. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2003.

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A participação popular do Conselho Escolar na gestão democrática

Adriana Alves dos SantosMaria Cristina Silva de Santana

Sara Santos Mercier

Introdução

No Brasil, desde 1980 a população vem reivindicando o direito de participar das tomadas de decisões no setor público. A educação está inserida nesse processo de redemocratização. O empenho do povo em busca da democratização cria a necessidade de se rever o papel do Estado e da Escola Pública, e assim, priorizar a educação.

Passou-se então a falar sobre a gestão democrática, que é traduzida como a abertura das escolas para a comunidade. É nesse cenário que surge o Conselho Escolar, protagonizando esta abertura e tornando a escola mais corajosa para enfrentar os desafios a ela impostos. Um estudo sobre o Conselho Escolar faz-se então necessário. É essencial que se crie na escola um ambiente que favoreça a participação de todos os segmentos das comunidades escolar e local.

Buscamos investigar, através de observações, as causas da precária participação dos integrantes dos Conselhos de Escola do Centro Municipal de Educação Infantil “Vovó Sinhá” (CMEI), situada na sede do município de Aracruz, o Centro Municipal de Educação Infantil “Vovó Jandira” (CMEI), localizado na Barra do Riacho e o Centro Municipal de Educação Básica “álvaro Souza” (CMEB), em Vila do Riacho, e descobrir formas para incentivá-los a um maior envolvimento.

Democratização da escola e o exercício da participação

As profundas modificações que têm ocorrido no mundo do trabalho trazem novos desafios a Educação e sua gestão. São mudanças que operam no plano sócio-econômico, ético-político, cultural e educacional. Para muitos, trata-se

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de uma crise do processo civilizatório. O capitalismo vive um novo padrão de acumulação, decorrente da globalização da economia e da reestruturação produtiva, que por sua vez determina novas formas de relação entre Estado e sociedade. Segundo BASTOS, et al (2005, p. 7)

A gestão democrática da educação, reivindicada pelos movimentos sociais durante o período da ditadura militar, tornando-se um dos princípios da educação na Constituição Brasileira de 1988, a ser aplicada apenas ao ensino público, abriu uma perspectiva para resgatar o caráter público da administração pública. A gestão democrática restabelece o controle da sociedade civil sobre a educação e a escola pública, introduzindo a eleição de dirigentes escolares e dos conselhos escolares, garante a liberdade de expressão, de pensamento, de criação e de organização coletiva na escola, e facilita a luta por condições materiais para aquisição e manutenção dos equipamentos escolares, bem como por salários dignos a todos os profissionais da educação.

A democratização da educação vem sendo conquista resultante de muitas lutas e conflitos. Estão estabelecidos na Constituição Federal do país princípios para a educação brasileira, dentre eles: obrigatoriedade, gratuidade, liberdade, igualdade e gestão democrática, sendo estes regulamentados através de leis complementares. De acordo com o PNE (BraSIL, 2001)

[...] esse colegiado de apoio, criado segundo espírito integrador tanto dos compromissos internacionais do Brasil, quanto da própria Lei, deixa claro que o país não atingirá os resultados desejados sem uma grande orquestração de forças do Estado e da sociedade. Por isso mesmo essa comissão interinstitucional está construída de representantes das Comissões de Educação do Senado Federal e de Educação, Cultura e Desporto da Câmara dos Deputados do Ministério da Educação, da organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), do Conselho Nacional dos Secretários de Educação (CONSED), da União Nacional dos Dirigentes Municipais (UNDIME) e da Associação Brasileira de Organizações não governamentais (ABONG)

Quem ganha com esse acordo é a comunidade escolar e local, pois a partir daí eles passaram a ter direito de participar dos processos decisórios da vida da

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escola. Esses pressupostos fundamentais, objetos de construção teórica e prática no campo da administração da educação, materializam-se por meio da luta dos educadores, numa conquista que se consubstanciou na nossa Carta Magna da Educação. A Lei 9.394 (1996, p. 19) em seu artigo 14 estabelece que

Os sistemas de ensino definirão as normas de gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios:I – participação dos profissionais da Educação na elaboração do projeto

pedagógico da escola;II – participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou

equivalentes.

A elaboração do Plano Nacional de Educação (PNE), objetiva elucidar problemas referentes às diferenças sócio-econômicas, políticas, regionais, bem como as que se referem à qualidade do ensino e à gestão democrática. Dessa forma, o PNE (2001, p. 15) afirma que

[...] em seus objetivos e prioridades, e em mais quatro partes, tratam dos níveis e modalidades de ensino e educação, do magistério da educação básica, do financiamento e gestão, e do acompanhamento e avaliação do Plano. Desse modo, faz o diagnóstico e fixa diretrizes, objetivos e metas [...]

Essas metas devem ser discutidas, examinadas e avaliadas, tendo em vista a democratização da educação em nosso país. A gestão democrática é entendida como participação efetiva dos vários segmentos da comunidade escolar: pais, professores, estudantes e funcionários na organização, na construção e avaliação dos projetos pedagógicos, na administração dos recursos da escola e nos processos decisórios da unidade escolar.

Portanto, para que haja a participação dos membros da comunidade escolar, é necessário que o gestor, em parceria com o Conselho Escolar crie um ambiente propício, que estimule os trabalhos conjuntos, que considere igualmente todos os setores, coordenando os esforços de funcionários, professores, pessoal técnico-pedagógico, alunos e pais envolvidos no processo educacional.

A participação só será eficaz se os agentes que compõem essa comunidade conhecerem as leis, as políticas governamentais propostas para a educação,

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as concepções que norteiam essas políticas e principalmente, se estiverem engajados na defesa de uma escola democrática, que tenha entre seus objetivos a construção de um projeto de transformação do sistema vigente.

Assim, entendemos que a democratização começa no interior da escola, por meio da criação de espaços nos quais professores, funcionários, alunos, pais de alunos e outros da comunidade local possam discutir, com discernimento, o cotidiano escolar. A função da escola é formar indivíduos críticos, criativos e participativos, com condições para participar do mundo do trabalho e de lutar pela democratização da educação em nosso país. Podemos concordar com a reflexão de PARO (1996, p. 15) para quem

[...] a possibilidade de uma administração democrática no sentido de sua articulação, na forma e no conteúdo com os interesses da sociedade como um todo tem a ver com os fins e a natureza da coisa administrada. No caso da Administração Escolar, sua especificidade deriva, pois: a)dos objetivos que se buscam alcançar com a escola; b)da natureza do processo que envolve essa busca. Esses dois aspectos não estão de modo nenhum desvinculados do outro. A apropriação do saber e o desenvolvimento da consciência crítica, com objetivos de uma educação transformadora, determinam, (...), a própria natureza peculiar do processo pedagógico escolar; ou seja, esse processo não se constitui em mera diferenciação do processo de produção material que tem lugar na empresa, mas deriva sua especificidade de objetivos (educacionais) peculiares, objetivos estes articulados com os interesses sociais mais amplos e que são, por isso, antagônicos aos objetivos de dominação subjacentes à atividade produtiva capitalista.

Portanto, a democratização da gestão escolar implica a superação dos processos centralizados de decisão e a vivência da gestão colegiada, onde as decisões nascem das discussões coletivas, envolvendo todos os segmentos da escola num processo pedagógico.

Nesse âmbito, torna-se necessário o papel significativo do diretor da escola na gestão do trabalho escolar. A participação, o diálogo, a discussão coletiva e a autonomia são práticas indispensáveis da gestão democrática, mas o exercício da democracia não significa ausência de responsabilidades. Uma vez tomadas as decisões coletivamente, é preciso pô-las em prática. Para isso, a escola deve estar bem coordenada e administrada.

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O sucesso da escola não reside unicamente na pessoa do diretor ou em uma estrutura administrativa autocrática, na qual ele centraliza todas as decisões. Ao contrário, trata-se de entender o papel do diretor como alguém que consegue aglutinar as aspirações, os desejos e as expectativas da comunidade escolar. Articula a adesão e a participação de todos os segmentos da escola na gestão de um projeto comum. O diretor não pode ater-se apenas às questões administrativas. Como dirigente, cabe-lhe ter uma visão de conjunto e uma atuação que apreenda a escola em seus aspectos pedagógicos, administrativos e culturais.

No contexto educacional, gestão é uma expressão que ganhou espaço acompanhando uma mudança de paradigma no encaminhamento das questões desta área. Em linhas gerais, é caracterizada pelo reconhecimento da importância da participação consciente e esclarecida das pessoas, nas decisões sobre a orientação e planejamento do seu trabalho. O conceito de gestão está associado ao fortalecimento da democratização do processo pedagógico, à participação responsável de todos nas decisões necessárias e na sua efetivação, mediante um compromisso coletivo com resultados educacionais cada vez mais efetivos e significativos. Observemos o que diz Luck (1993, p. 37) sobre o tema:

Conforme afirmado em trabalho conjunto entre UNESCO e MEC, “o diretor é cada vez mais obrigado a levar em consideração a evolução da idéia de democracia, que conduz o conjunto de professores, e mesmo os agentes locais, à maior participação, à maior implicação nas tomadas de decisão” (Valérien 1993:15). A essa exigência estaria vinculada a necessidade de interpenetração da dimensão pedagógica e política, na questão administrativa. Em conseqüência, os antigos fundamentos de administração educacional seriam insuficientes – embora importantes – para orientar o trabalho do dirigente educacional com essa nova dimensão.

A gestão escolar democrática que se desenvolve e se realiza por meio da efetiva participação comprometida de todos, precisa se basear numa definição abrangente do conceito de “junção”, num compromisso de construir uma comunidade que é tanto da escola quanto da sociedade onde ela existe. Dessa forma, é necessário pautar-se em um conjunto de valores e colocá-los em prática: ampliar a participação nos movimentos sociais e na escola, fortalecer

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indivíduos em grupos em geral silenciados, criar novas formas de articular o mundo real e os problemas sociais reais com a escola, conectando-se integralmente às experiências das pessoas em suas vidas cotidianas.

Conselho Escolar – um breve relato

A origem dos Conselhos é tão remota quanto à própria história da humanidade. Segundo o Programa de Fortalecimento dos Conselhos Escolares, elaborado por Bordignon (2004, p.13), “os registros históricos indicam que já existiam, há quase três milênios, no povo hebreu, nos clãs visigodos e nas cidades-Estado do mundo greco-romano, Conselhos como formas primitivas e originais de gestão dos grupos sociais.”

A instituição da vida gregária (em grupo) foi gradativamente estabelecida por meio de deliberações coletivas. Uma vez que a solução dos conflitos via autoridade superior ou de relações de linhagem não constituíam uma maneira satisfatória e eficaz para a resolução dos problemas, havia um descontentamento, pois o povo desejava participar das decisões.

O critério utilizado para a escolha dos membros do Conselho era a sabedoria e a reputação das pessoas diante da comunidade. Com o passar do tempo o critério adotado passou a ser o poder da influência, seja ela econômica, militar ou intelectual. Bordignon (2004, p. 15) afirma que no Brasil, até 1980 os Conselhos de governo eram escolhidos desta forma.

A partir da década de 80, a população passou a reivindicar participação na gestão pública. Esse desejo de participação foi incluído nos debates da Constituinte e efetivou a institucionalização dos Conselhos Gestores de políticas públicas no Brasil. Hoje temos Conselhos Municipais, Estaduais ou Nacionais que atuam nas áreas da saúde, educação, cultura etc. A partir dos movimentos em defesa dos direitos humanos vimos surgir em nosso país os conselhos do direito da mulher, da criança, do adolescente e do idoso. Jamil Cury (apud Bordignon, 2004, p. 21), conceitua o termo Conselho a partir de sua etimologia.

Conselho vem do latim Consilium. Por sua vez, Consilium provém do verbo consulo/consulere, significando tanto ouvir alguém quanto submeter algo a

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uma deliberação de alguém, após uma ponderação refletida, prudente e de bom senso. Trata-se, pois, de um verbo cujos significados postulam a via de mão dupla: ouvir e ser ouvido. Obviamente a recíproca audição se compõe com o ver e ser visto e, assim sendo, quando um Conselho participa dos destinos de uma sociedade ou de parte destes, o próprio verbo consulere já contém um princípio de publicidade.

Apresentamos acima uma conceituação de Conselho compreendida de forma genérica, que se aplica a todo tipo de Conselho. Quanto ao Conselho Escolar, espaço onde se permite a participação do povo e onde se promove a gestão democrática, Navarro (2004, p.15) diz

[...] os Conselhos Escolares são órgãos colegiados que representam as comunidades escolar e local, atuando em sintonia com a administração da escola e definindo caminhos para tomar decisões administrativas, financeiras e político-pedagógicas condizentes com as necessidades e potencialidades da escola.

Isto significa que o Conselho Escolar é um espaço onde se permite a participação do povo e onde se promove a gestão democrática. A criação, reativação e consolidação do Conselho Escolar compete ao diretor da unidade ou a qualquer outro representante da comunidade. Seja ele morador do bairro ou profissional do ensino, o seu compromisso com a gestão democrática se dá numa prática que vise a participação de tantas pessoas quantas puder envolver na construção de uma escola para todos, propondo a eleição dos diversos segmentos pelo voto direto e garantindo a mobilização para o aprofundamento do debate educacional.

Conforme a Legislação, para se constituir um Conselho de Escola é preciso que haja representação dos alunos, dos pais ou responsáveis pelos alunos, dos professores e demais funcionários, da direção escolar e da comunidade local. Reunido, este órgão tem grande poder de decisão. Porém, fora dele, ninguém tem autoridade e/ou privilégios especiais, só porque dele participa. Este Conselho possui funções que podem ser classificadas como: deliberativa (decidir, deliberar, aprovar, elaborar), consultiva (opinar, emitir parecer, discutir, participar), mobilizadora (apoiar, promover, estimular) e fiscal (fiscalizar, acompanhar, supervisionar, aprovar prestação de contas). A importância dessas

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funções, segundo Navarro (2004, p.21) é acompanhar o desenvolvimento da prática educativa e, nela, o processo ensino-aprendizagem.

Assim, a função do Conselho Escolar é fundamentalmente político-pedagógica. É política, na medida em que proporciona mudanças na prática educativa escolar, e pedagógica quando define estratégias para que essas transformações aconteçam. Podemos trazer mais algumas contribuições de Navarro (2004, p. 48-49), para quem o Conselho Escolar possui as seguintes atribuições:

Elaborar o regimento interno da escola; Coordenar o processo de discussão, elaboração ou alteração do Regimento Escolar; Convocar assembléias-gerais da comunidade escolar ou de seus segmentos; Garantir a participação das comunidades escolar e local na definição do Projeto Político Pedagógico da unidade escolar; Promover relações pedagógicas que favoreçam o respeito ao saber do estudante e valorize a cultura da comunidade local; Propor e coordenar alterações curriculares na unidade escolar, respeitada a legislação vigente, a partir de análise, entre outros aspectos, do aproveitamento significativo do tempo e dos espaços pedagógicos na escola; Propor e coordenar discussões junto aos segmentos e votar as alterações metodológicas, didáticas e administrativas na escola, respeitada a legislação vigente; Participar da elaboração do calendário escolar, no que competir à unidade escolar, observada a legislação vigente; Acompanhar a evolução dos indicadores educacionais (abandono escolar, aprovação, aprendizagem, entre outros) propondo, quando se fizerem necessárias intervenções pedagógicas e/ou medidas sócio-educativas visando à melhoria da qualidade social da educação escolar; Elaborar o plano de formação continuada dos conselheiros escolares, visando ampliar a qualificação de sua atuação; Aprovar o plano administrativo anual, elaborado pela direção da escola, sobre a programação e a aplicação dos recursos financeiros, promovendo alterações, se for o caso;Fiscalizar a gestão administrativa, pedagógica e financeira da unidade escolar; Promover relações de cooperação e intercâmbio com outros Conselhos Escolares.

O Conselho de Escola tem atribuições consultivas, deliberativas e fiscais em questões definidas na legislação estadual ou municipal e no regimento escolar. Essas questões, geralmente, envolvem aspectos pedagógicos, administrativos

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e financeiros constitui uma aprendizagem na partilha dos direitos e responsabilidades, contribuindo assim para gestão democrática na escola.

Participação - novos rumos para a democracia

O que buscamos problematizar é o porquê da não participação dos membros do Conselho Escolar das instituições de ensino CMEI “Vovó Sinhá”, CMEI “Vovó Jandira” e CMEB “álvaro Souza”, uma vez que esse é o principal meio de se fazer valer e assegurar a gestão democrática. Permite conhecer os objetivos da escola, as metas, ações da organização escolar, bem como o funcionamento do Projeto Político Pedagógico. Segundo Cunha (apud FERREIra, 2006, p. 55)

O termo participação (do latim participationis) significa fazer parte de, tomar parte em, fazer saber, informar, anunciar. É fazer parte de uma ação, portanto, agindo em uma ação que é coletiva. Significa ação conjunta de “um fazer” que também é conjunto e que se destina a todos.

Para se alcançar uma gestão democrática, essa participação não pode ser esporádica, precisa acontecer periodicamente. Vale ressaltar ainda, que para que a escola funcione bem, é imprescindível a adesão dos membros do Conselho aos propósitos educativos da instituição. Segundo Navarro (2004, p. 48)

A garantia de efetivação da participação cidadã sugere, portanto, a vivência de dinâmicas coletivas de participação nas esferas de poder e de decisão, pois os processos de participação, cuja natureza, caráter e finalidades se direcionam para a implementação de dinâmicas coletivas, implicam o compromisso com o partilhamento do poder por meio de mecanismos de participação envolvendo os atores e o seu papel nesse processo.

A Concepção democrática participativa está ligada à participação ativa da direção e dos membros do Conselho de Escola. A gestão precisa ser atuante e o Conselho tem de fazer valer suas atribuições. Para tanto, faz-se necessário adotar alternativas criativas que contribuam para uma mudança de atitude dos grupos sociais na busca pela escola democrática.

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Analisando as três escolas mencionadas na pesquisa, foi fácil compreender a pouca participação dos membros do Conselho de Escola. No CMEI “Vovó Sinhá”, os membros do Conselho ficavam restritos somente a prestação de contas da verba do Programa de Descentralização de Recursos (PRODER). Desde 2003, as reuniões vêm acontecendo esporadicamente, quando na realidade, precisam acontecer periodicamente. Por ser um Centro de Educação Infantil, entendia-se que não seria necessária a participação do colegiado no âmbito da unidade escolar.

No CMEI “Vovó Jandira”, não muito diferente, os membros não entendiam sua função no Conselho. Analisando a ata, observou-se que a última eleição aconteceu em 2004. A dificuldade do gestor em manejar as reuniões resultou na pouca participação dos membros. Na realidade, o gestor não conseguia direcionar as reuniões para que essas se efetivassem. O CMEI não possuía um cronograma e não sabia o que discutir diante do Conselho. Entende-se com isso, que existem ainda gestores que desconhecem o “poder” que o Conselho de Escola exerce na unidade educacional.

Quanto ao CMEB “álvaro de Souza”, o Conselho estava desestruturado, faltavam membros e o que tinha, não reuniam para discutir e refletir situações da escola. Os funcionários não entendiam para quê, ter um Conselho de Escola. O CMEB é a unificação da creche/pré-escola e ensino fundamental de 1º ao 5º ano, ou seja, funciona num mesmo prédio, e organizar o trabalho coletivo exige muita dedicação.

Nas unidades educacionais citadas, foram realizadas ações significativas que culminaram na reestruturação do Conselho e suas atividades. A primeira atitude foi fazer uma nova eleição. Na reunião para eleição foi realizada uma palestra sobre as atribuições do Conselho e a função de cada membro. Apresentou-se o Projeto Político Pedagógico da escola, suas metas e realizações, as datas de chegada e prestação de conta da verba do Programa de Descentralização de Recursos.

Uma das propostas das nossas primeiras reuniões (ver fotos em anexo) foi a definição de um cronograma de encontros numa perspectiva de longo prazo, debatida e aceita por ampla maioria. As escolas envolvidas no processo de reativação dos Conselhos Escolares vêm aprendendo a organizar os seus tempos para discutir com toda a comunidade os conflitos com os quais nos defrontamos no interior das nossas instituições de ensino. O cronograma foi organizado seguindo uma ordenação de um dia por mês.

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No decorrer dessas reuniões, o diretor conduzirá o Conselho Escolar a debater e tornar os objetivos e os valores possíveis, definir prioridades, contribuir para a organização do currículo escolar, bem como estudo e reflexão contínuas, que incluam, principalmente, a avaliação escolar.

Serão abordadas ainda, questões referentes ao processo pedagógico, considerando o desenvolvimento no qual se dá a aprendizagem das crianças, visto que estamos nos referindo às crianças de 0 a 5 anos e séries iniciais do Ensino Fundamental. Outro assunto pertinente que será discutido nas reuniões é quanto ao manuseio do dinheiro público. É preciso envolver o conselho escolar a fim de otimizar a aplicação dos recursos; nos encontros pretende-se também, discutir com o gestor ações administrativas que possam definir melhor a organização da escola. É importante ressaltar que o Conselho será convocado ainda, para reuniões extraordinárias.

Os problemas e conflitos também se encontram para além dos muros das nossas escolas, e são desafios de nossa sociedade contemporânea, que percebe a escola como local privilegiado para a superação de dilemas tais como democracia e cidadania, num país marcado por forte tradição autoritária. A história recente mostrou que o afastamento dos movimentos sociais das decisões sobre os rumos da educação trouxe-nos considerável prejuízo. É importante entender que o papel do Conselho Escolar é o de garantir a efetiva participação das comunidades escolar e local, contribuindo assim para a melhoria da qualidade social da educação ofertada para todos.

Referente a essa participação, Bordignon (2004, p. 57) comenta que “[...] a cidadania radica no coletivo, é uma condição de relação com o outro – não há cidadania no isolamento, na exclusão”. A escola se abre para que todos possam participar de sua gestão, pois o que é público deve ser administrado coletivamente. Catani e Gutierrez (apud NAVARRO, 2004, p.24) ao discutirem a relação e a participação e a gestão escolar, afirmam que

[...] toda e qualquer organização que tente implantar e desenvolver práticas de natureza participativa vive sob a constante ameaça da reconversão burocrática e autoritária dos seus melhores esforços. As razões para isso são diversas: História de vida de seus membros, supervalorização ideológicas das formas tradicionais de gestão demandas especificas difíceis de conciliar. De tudo isso, contudo, um ponto deve ser destacado: a participação se funda no exercício do diálogo entre as partes.

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Esse é um risco que é defensável, com base na construção de um plano coletivo que só pode ser efetivado com a participação de pessoas com diferentes formações. A democratização dos estabelecimentos de ensino implica na aprendizagem e vivência no exercício de participação e tomada de decisões. Segundo Libâneo, Oliveira & Toschi (2003, p. 340), a estrutura é representada graficamente em um organograma.

Organograma básico da escola

Toda instituição escolar possui finalidades e determina papéis e responsabilidades entre seus segmentos. Para garantir a gestão democrática, faz-se necessário organizar uma estrutura de ordem interna, no sentido de definir e dispor de funções que assegurem o funcionamento da escola.

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Constatou-se contudo, que os Conselhos das três escolas funcionavam precariamente, com as intervenções realizadas foi possível que o Conselho do CMEI “Vovó Sinhá” juntamente com o líder comunitário e representante do legislativo, conseguisse com que o prefeito assinasse a ordem de serviço da construção de um novo CMEI. A representatividade do Conselho foi fundamental para que essa conquista fosse possível, pois o CMEI funciona numa casa improvisada a 14 anos num espaço precário.

No CMEI “Vovó Jandira” atualmente, com o conselho fortalecido de esclarecimentos, vem acontecendo reuniões mensais com questões pertinentes voltada para a participação do colegiado, o objetivo é para que os membros possam opinar e refletir sobre problemas e conflitos existentes no interior do CMEI.

No CMEB “álvaro de Souza” os integrantes do Conselho Escolar, agora mais atuante, fazem visitas pedagógicas, essas visitas acontecem no horário de planejamento; nos dias destinados ao Estudo com professores. A participação do Conselho nas discussões administrativas tem definido as prioridades na hora de adquirir materiais de consumo e permanente para o CMEB. Os membros do Conselho vêm auxiliando a escola nos problemas de relacionamento professor/aluno. O Conselho atuante faz com que a escola caminhe no regime democrático, as conquistas esperadas foram através de aquisições de conhecimentos teóricos voltados para apropriação do cotidiano escolar.

Considerações finais

Após análise bibliográfica e estudos realizados, entende-se que o Conselho de Escola no pleno exercício de sua função converge todos os segmentos das comunidades escolar e local, tornando-os co-responsáveis pelo desenvolvimento das Instituições Públicas de Ensino.

O Conselho das três escolas não se reunia com freqüência, não participava das tomadas de decisões, enfim, não conseguia exercer o poder a ele conferido. Considera-se ainda que essa precariedade esteja diretamente ligada a fatores tais como: a falta de capacitação técnica de alguns conselheiros; a indisponibilidade (pois a função não é remunerada), a ausência do gestor, a falta de conhecimento de seus direitos e deveres e a grande interferência de órgãos superiores

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(ministério público, promotoria) nas escolas. Face a essa realidade, o gestor tem um papel que é decisivo na reversão desse quadro. E foi com essa perspectiva que os gestores das escolas conseguiram discutir a problemática e definir ações significativas para direcionar melhor o trabalho democrático.

No processo de reestruturação do Conselho Escolar foi proposto aos novos integrantes, estudos relacionados à atribuição e funcionamento dos Conselhos Escolares. Para tanto, foi utilizado o caderno 1 do MEC, Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos, que está subdividido em duas partes. A primeira refere-se a realidade brasileira e ao Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares e a segunda está direcionada aos Conselhos Escolares e a construção da proposta educativa da escola.

É relevante enfatizar, que apesar das dificuldades enfrentadas, o Conselho de Escola constitui um dos mais importantes mecanismos de democratização da gestão escolar. É preciso fortalecê-lo como uma instância de participação, buscando meios para que professores, coordenadores, funcionários, pais de estudantes e a comunidade local participem ativamente, efetivando um processo de gestão inovador que torne possível a construção de uma nova cultura escolar.

Referências

BASTOS, João Baptista. Gestão democrática. 4. ed. Rio de Janeiro: DP&A: SEPE, 2005.

BORDIGNON, Genuíno. Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares: Conselhos Escolares: Uma estratégia de gestão democrática da educação pública. Brasília: MEC, SEB, 2004.

BRASIL. Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional, nº 9394 de 20 de dezembro de 1996.

______. Plano Nacional de Educação. Brasília: Senado Federal, 2001.

FERREIRA, Naura Syria Carapeto. Gestão educacional e organização do trabalho pedagógico. Curitiba: IESDE, 2006.

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LIBÂNEO, José Carlos. OLIVEIRA, José Ferreira de. TOSCHI, Mirza SEABRA. Educação escolar: políticas, estruturas e organização. São Paulo: Cortez, 2003.

LUCK, Heloísa. A gestão participativa na escola. Petrópolis: Vozes, 2006.

NAVARRO, Ignez Pinto et. al Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares: Conselho Escolar e aprendizagem na escola.Brasília: MEC, SEB, 2004.

PARO, Vitor Henrique, Eleições de diretores: a escola pública experimenta a democracia. Campinas: Papirus, 1996.

______. Gestão democrática da escola pública. São Paulo: Ática, 1997.

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Políticas públicas de combate à evasão escolar na Educação de Jovens e Adultos – EJA – nas escolas da rede municipal de Vitória

Isabel Cristina Ribeiro ChagasLeila dos Santos Vieira

Marly SiqueiraSoraya Luana Rodrigues Souza

Iniciando nosso diálogo

Abrir a Escola para todos não é uma escolha entre outras: é a própria vocação dessa instituição, uma exigência consubstancial de sua existência, plenamente coerente com seu princípio fundamental. Uma escola que exclui não é uma escola: é uma oficina de formação, um clube de desenvolvimento pessoal, um curso de treinamento para passar em concursos, uma organização provedora de mão-de-obra ou uma colônia de férias reservada a uma elite social. A Escola, propriamente, é uma instituição aberta a todas as crianças, uma instituição que tem a preocupação de não descartar ninguém, de fazer com que se compartilhem os saberes que ela deve ensinar a todos. Sem nenhuma reserva (MEIRIEU, 2005, p. 44).

O pensamento de Meirieu que abre este diálogo nos convida pensar e refletir que o ato de estudar, pesquisar, aprender, confrontar conhecimentos é um direito universal que necessita estar estendido a todos os cidadãos, pois é aprendendo e conhecendo que homens e mulheres vão se constituindo sujeitos críticos e reflexivos, capazes de interferir e inteligir criticamente o meio que os cerca, propondo possibilidades de mudanças para a transformação de um mundo mais humano, fraterno e aberto às diferenças humanas.

Por isso, Meirieu nos convida abrir a escola. Fazer da sala de aula, espaço de aprendizagens para todos os alunos. Apostar na educabilidade humana. Escolher a inclusão em detrimento da exclusão. Acolher e não descartar, uma

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vez que esta é a aposta, ou seja, o desafio a ser assumido. É justamente pensando nesses movimentos que o autor reitera o papel social da instituição escolar na formação de sujeitos críticos e reflexivos, pois formar, ensinar, aprender, provocar mudanças são movimentos que nos constituem humanos e ao mesmo tempo a vocação da instituição escolar.

Mulheres e homens, somos os únicos seres que, social e historicamente, nos tornamos capazes de aprender. Por isso, somos os únicos em quem aprender é uma aventura criadora, algo, por isso mesmo, muito mais rico do que meramente repetir a lição dada. Aprender para nós é construir, reconstruir, constatar para mudar, o que não se faz sem abertura ao risco e à aventura do espírito (FREIRE, 1996, p. 69).

Nos últimos tempos, democratizar a escola de educação básica tem sido o lema do processo de educação para todos, alimentada pela perspectiva de garantia de permanência dos alunos no cotidiano escolar e a oferta de educação com qualidade. Nesse movimento passamos a falar em inclusão social e a defender os princípios e fundamentos da escola inclusiva, ou seja, uma escola única e aberta a todos: negros, índios, brancos, quilombolas, pomeranos, pessoas com ou sem deficiência, sujeitos com percursos diferenciados de escolarização e, ainda, outros que regressam à escola após anos de exclusão, isto é, jovens e adultos trabalhadores. O encontro dessas diferenças culturais, econômicas, históricas e sociais convida às escolas de educação básica a se configurarem inclusivas para contemplarem o desenvolvimento de todos os alunos que a ela recorrem com o interesse de melhores perspectivas de vida para si e suas famílias.

Para que a diversidade humana possa se fazer presente como valor universal, a escola precisa assumir uma postura de desconstrutora da igualdade, visando incluir na tessitura social aqueles que vêm sendo sistematicamente excluídos (JESUS, 2006, p. 91).

Instituir essa perspectiva de escola não tem se configurado ação política linear, pois os desafios que educadores e profissionais da educação vêm enfrentando para garantir a permanência desses sujeitos no contexto escolar tem sido pauta de discussão em congressos de âmbito nacional e internacional, uma vez que o fracasso e a evasão escolar têm sido movimentos que se fazem

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presentes neste processo de democratização, principalmente quando analisada a educação ofertada a jovens e adultos trabalhadores.

Nesse movimento, estatísticas revelam índices de 50% de reprovação e 48%1 de evasão escolar no primeiro ano do ensino médio nas escolas da rede pública de ensino no Estado do Espírito Santo, extremamente ligados à dificuldade de os alunos se apropriarem de padrões mínimos de leitura e de escrita, somados à falta de perspectiva de continuidade dos estudos e necessidades de trabalho.

Dados do Ministério da Educação e Cultura2 também sinalizam a existência de percentuais altíssimos de evasão escolar na Educação de Jovens e Adultos, uma vez que contamos com 65 milhões de estudantes sem conclusão da Educação Básica no Brasil; mais de 30 milhões que mal freqüentaram as quatro primeiras séries do Ensino Fundamental e ainda quase 15 milhões que não sabem ler e escrever. Tais indicadores nos falam de desafios a serem superados, ou seja, de práticas segregacionistas que precisam ser problematizadas; potencialização da formação inicial e continuada de educadores; ressignificação do currículo escolar e, ainda, de instituição de políticas públicas voltadas para o combate ao fracasso e evasão escolar.

Pensando nestes indicadores, somos levados a dialogar com Freire (1992) que nos diz que para a instituição de políticas públicas de democratização da escola de educação básica, é importante distanciá-la de ideologias fatalistas, que alimentam o discurso neoliberal, que com ares de pós-modernidade, insiste em nos convencer de que nada podemos fazer contra a realidade social. Falar: “A realidade é assim mesmo, que podemos fazer?”. “O desemprego no mundo é uma fatalidade do fim do século”. “Eles não sabem nada, porque o professor vai se esforçar para ensiná-los?” são discursos que expressam a indiscutível vertente imobilizadora do pensamento neoliberal e que precisam ser superados para fazer da escola espaço de permanente aprendizado para aqueles que a busca.

Para o distanciamento dessa concepção de educação imobilizadora e de seres humanos adaptados à realidade social, faz-se necessário assumir as contribuições que a instituição escolar tem no processo de implementação

1 Dados obtidos no Jornal A Gazeta de circulação no Estado do Espírito Santo, conforme divulgado em 03/10/2007.

2 Dados obtidos no censo escolar do Ministério da Educação e Cultura no site http://www.inep.gov.br/basica/censo/

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de uma sociedade mais respeitosa às diferenças humanas e na construção das subjetividades humanas, pela via de uma pedagogia crítica e problematizadora que assuma as implicações existentes no ato de ensinar-aprender. Em outras palavras faça emergir o ato educativo no espaço da sala de aula.

‘[...] o ato educativo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens. Assim, o objeto da educação diz respeito, de um lado à identificação dos elementos culturais que precisam ser assimilados pelos indivíduos da espécie humana para que eles se tornem humanos e, de outro lado e concomitantemente, à descoberta das formas mais adequadas para atingir esse objetivo (SAVIANI, apud PADILHA, p.17, 2005 – grifo nosso).

É pensando na possibilidade de fazer emergir o ato educativo no contexto da sala de aula e por essa via garantir a permanência de alunos jovens e adultos trabalhadores nas propostas pedagógicas desenvolvidas pela escola, que Freire (1987) argumenta a necessidade de rompermos com práticas pedagógicas pautadas em uma perspectiva bancária de educação, ou seja, propostas educacionais que colocam o professor como centro do processo ensino-aprendizagem e os alunos como recipientes dóceis onde serão depositados conhecimentos, uma vez que nesta abordagem educativa “[...] cabe ao educador nenhum outro papel que não o disciplinar a entrada do mundo nos educandos. [...] O de encher os educandos de conteúdos, [...] de comunicados – falso saber – que ele considera como verdadeiro saber”. (FREIRE, 1987, p. 63).

Contrapondo a esta perspectiva de educação, Freire (1987) argumenta em favor da instituição de uma pedagogia crítica e problematizadora que pautada na capacidade humana de ensinar e aprender com seus pares, postula pela formação de cidadãos críticos e reflexivos, portadores e produtores de conhecimentos, capazes de provocar movimentos e transformar o meio social em que habitam, por se constituírem sujeitos históricos e sociais, seres inacabados, por isso em constante processo de formação e construção de aprendizagens.

É na inconclusão do ser, que se sabe como tal, que se fundamenta a educação como processo permanente. Mulheres e homens se tornaram educáveis na medida em que se reconheceram como inacabados. Não foi a educação que fez mulheres e homens educáveis, mas a consciência de sua inconclusão é que gerou a educabilidade [...] (FREIRE, 1996, p. 58).

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É refletindo sobre esta perspectiva de inconclusão, de formação permanente, de produção contínua de conhecimentos que vislumbramos possibilidades para falarmos em construção coletiva da Proposta Curricular para a Educação de Jovens e Adultos, envolvendo os conhecimentos dos sujeitos nela integrados, ou seja, alunos e professores que trazem vivências, experiências, anseios, aspirações e conhecimentos para o contexto da sala de aula, que somadas a outros saberes-fazeres apontarão caminhos para o questionamento: Que conteúdos devem ser trabalhados na Educação de Jovens e Adultos, considerada as necessidades dos educandos e as demandas enfrentadas por eles socialmente?

Construir coletivamente esse programa, problematizando como trabalhar o conhecimento científico para o desenvolvimento dos alunos, dentro de uma trama dialética, eleva os profissionais da educação a professores problematizadores e nos aproxima do pensamento freireano quando nos ensina que “[...] ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo” (Freire, 1987, p. 69).

Os esforços imbuídos em favor desta construção curricular, com toda certeza, nos permitirá refletir sobre a práxis educativa, colocar em suspensão conceitos estabilizadores e suscitar questões, que nos apontarão encaminhamentos para engendrarmos estratégias significativas no trabalho com a EJA nas escolas de educação básica, ou seja, questões como: Como realizar práticas educacionais significativas, registrar, (re)planejar, (re)avaliar, avançar, propor em constante interação com os alunos? Como se organizar em grupos de trabalho na escola? Como compor/ajustar currículos? Como organizar o tempo das necessidades com o tempo letivo? Como não fazer da nossa prática um “empurrar para frente” indiscriminado, sem levar em consideração à constituição histórica e social dos alunos?” (PADILHA, 2005).

Levantando estas questões passamos a falar em partilha, produção coletiva, diálogo entre pares, formação permanente, nova relação educando-educador, pois para a construção de uma proposta curricular que prime pela emancipação, libertação, abertura de novas possibilidades de participação social e novas perspectivas de subjetivação da relação ensinar e aprender cabe ao educador progressista desenvolver sua ação educativa dentro de uma trama social considerando que:

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É preciso que o (a) educador (a) saiba que seu “aqui” e o seu “agora” são sempre o “lá” do educando. Mesmo que o sonho do (a) educador (a) seja não somente tornar o seu “aqui-agora”, o seu saber, acessível ao educando, mas ir mais além de seu “aqui-agora” com ele ou compreender, feliz, que o educando ultrapasse o seu “aqui”, para que esse sonho se realize tem que partir do “aqui” do educando e não do seu. No mínimo tem que levar em consideração a existência do “aqui” do educando e respeitá-lo. No fundo, ninguém chega lá, partindo de lá, mas de um certo aqui. Isto significa, [...], que não é possível ao educador (a) desconhecer, subestimar ou negar os “saberes de experiências feitos” com que os educandos chegam à escola. (FREIRE, 1992, p. 59).

Essa experiência em construir coletivamente, entrelaçando conhecimentos de alunos e professores, nos leva concordar com Jesus (2006), quando argumenta que essa interação nos oferece possibilidades inesgotáveis e, dentre elas, a possibilidade de interpretação da experiência vivida. Permite-nos ser um espaço-tempo de convergência/divergência de saberes, uma vez nesse movimento podemos “[...] conhecer o contexto onde está inserida a escola e de gerar um movimento capaz de fazer com que seus atores possam intervir instituindo novos/outros possíveis” ( JESUS, 2006, p. 6).

Tal dinâmica se configura como possibilidade para rompermos com ações pedagógicas que vem encurralando os conhecimentos historicamente acumulados em produções escolares e para assumirmos os desafios que os educandos trazem para a Educação de Jovens e Adultos que perpassam desde a necessidade em constituí-los leitores e produtores textuais até a conscientização das contribuições que a instituição escolar exerce na abertura de novas possibilidades de participação social.

Para Meirieu (2002) esse é o desafio a ser assumido, ou seja, absorver essa tensão como momento ápice da atuação docente, pois é pela via do confronto com o imprevisto, do não-esperado, do que nos desafia, do que se mostra resistente que o momento pedagógico emerge e a educabilidade humana impera como mola-mestra da consolidação da instituição escolar.

[...] o momento pedagógico é o instante em que o professor é levado pela exigência daquilo que diz, pelo rigor de seu pensamento e dos conteúdos que deve transmitir e em que, simultaneamente, percebe um aluno concreto, um aluno que lhe impõe um recuo que nada tem de renúncia. [...] Esse instante em

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que o professor, sem renegar seu projeto de transmitir, descobre que o aluno, diante dele, escapa ao seu poder [...] (MEIRIEU, 2002, p. 57-58).

Precisamente refletindo sobre essa possibilidade apontada pelo trabalho educativo escolar em promover às grandes massas novas formas de estar e viver em sociedade que Meirieu (2005) nos fala da necessidade de rompermos com estratégias de ensino, pensada para o processo educacional das classes hegemônicas e caminharmos rumo à construção de uma pedagogia diferenciada que toma a assimilação dos conhecimentos historicamente acumulados como possibilidades de participação e inclusão social.

‘Diferenciar a pedagogia’ não é absolutamente uma ‘revolução’ na Escola, nem, um fortiori, uma renúncia aos princípios ou mesmo à existência de uma instituição que se diluiria em uma infinidade de procedimentos individuais justapostos. ‘Diferenciar a pedagogia’ é, ao contrário, reforçar uma instituição escolar incorporando em seu seio o que jamais deveria ser abandonado à esfera privada, familiar ou comercial: o acompanhamento individualizado dos alunos. ‘Diferenciar a pedagogia’ é oferecer a cada um os meios de apropriar-se dos saberes respeitando suas necessidades específicas e acompanhando-os o melhor possível em sua trajetória de aprendizagem (MEIRIEU, 2005, p. 122).

É pensando no desencadeamento de constantes “momentos pedagógicos”, pela via dessa pedagogia diferenciada, nas práticas escolares que Alarcão (2001) argumenta em favor da constituição de escolas reflexivas e aprendentes, ou seja, instituições escolares que frente os desafios trazidos pelos alunos para o contexto da sala de aula, também não recua, não abre mão do seu ofício de ensinar. Onde os professores, pela reflexão crítica da práxis se formam pedagogos em processo3 (MEIRIEU, 2002) e assumem-se co-responsáveis pela construção de políticas públicas educacionais propiciadoras da garantia de acesso, permanência e ensino com qualidade a esses sujeitos que necessitam estar inseridos na sociedade, mas com oportunidades iguais de participação social.

A escola que se pensa e se avalia em seu projeto educativo é uma organização aprendente que qualifica não só apenas os que nela estudam, mas também os que nela ensinam ou apóiam estes e aqueles. É uma escola que gera conhecimento

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sobre si própria como escola específica e, desse modo, contribui para o conhecimento sobre a instituição chamada escola (ALARCÃO, 2001, p. 13).

Uma escola, como nos faz pensar Alarcão (2001), aberta a uma população trabalhadora com necessidades de ocupação de novas posições sociais e espaço para a continuidade com a formação docente, uma vez que como nos diz Freire (1992, p. 98) “[...] o que não podemos é [...] parar de aprender e buscar, de pesquisar a razão de ser das coisas. Não podemos existir sem nos interrogar [...] em torno de como fazer concreto o ‘inédito’ viável demandando de nós a luta por ele”.

Desta forma, somos levados a refletir que esses movimentos, só serão levados para o contexto das escolas de educação básica, à medida que passarmos a construir com o outro, a trocar opiniões, a ver em nossos pares uma possibilidade de troca, emanadas pela cultura do diálogo, pois “[...] sem ele não há comunicação e sem esta não há verdadeira educação. [...] Somente o diálogo, que implica um pensar crítico, é capaz também, de gerá-lo” (FREIRE, 1987, p. 83).

Esta linha de raciocínio nos faz argumentar em favor da instituição de políticas públicas de valorização do trabalho docente e de investimentos na formação continuada de educadores para que esses sujeitos, frente à necessidade de promover a permanência dos alunos no contexto escolar, façam salutar na sala de aula, práticas pedagógicas alimentadas por uma “obstinação didática” (MEIRIEU, 2002), ou seja, a prospecção incansável de formulações que leva o educador a aprender aquilo que quer transmitir, a inventar permanentemente novas situações de aprendizagem, a buscar demonstrações mais eficazes de aprendizagens e ainda “[...] indagar sobre como fazer da sala de aula um lugar de inovação, de imaginação e de encontros” (MEIRIEU, 2002, p. 145).

Pensando positivamente no trabalho docente e na formação permanente dos profissionais da educação possivelmente chegaremos à conclusão que “[...] é possível recuperar juntos a convicção de que algo é possível no trabalho em

3 Adotando as políticas de formação inicial e continuada de educadores no contexto francês para reflexão, Meirieu sinaliza que o professor ao tomar os desafios da práxis como possibilidade de formação profissional forma-se pedagogos em processo, podendo aqui no Brasil ser compreendido como professores que se tornam pesquisadores de novos-outros saberes a partir da articulação entre teoria-prática e assunção dos desafios encontrados em sala de aula como possibilidade de formação contínua.

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sala de aula, algo que não seja a mera contemplação resignada da reprodução social, algo que permita encontrar o prazer no sentido de ensinar [...]” (MEIRIEU, 2002, p. 69).

É justamente considerando os desafios propostos à Educação de Jovens e Adultos e o compromisso social da escola em respondê-los que vislumbramos a necessidade de reflexão constante sobre processos de formação inicial e continuada de educadores com vistas a garantir a formação de profissionais capazes de lidar com a diversidade presente em sala de aula, problematizando os desafios encontrados e engendrando possibilidades de fazer da escola um espaço de aprendizagem para todos que nela habita, pois segundo as palavras de Meirieu:

Aprender é nascer para outra coisa, descobrir mundos que desconhecíamos até então. Aprender é ver suas certezas balançarem, é desestabilizar-se e sentir necessidade, para não se perder ou desanimar, de referências estáveis que apenas um profissional do ensino pode oferecer (MEIRIEU, 2006, p. 21).

É a busca por mudanças pedagógicas, por novas possibilidades de ensinar-aprender que nos leva pensar que necessitamos trilhar outros caminhos para reflexão da educação ofertada a jovens e a adultos trabalhadores. Necessitamos romper com olhares enviesados sobre os profissionais que atuam na EJA, muitas vezes subjetivados como aqueles responsáveis pela evasão destes sujeitos da escola, por atuarem em consonância com proposta curricular pensada para o ensino diurno ou que escolheram a modalidade pelas “facilidades” ofertadas e reduzido número de alunos.

Precisamos colocar em suspensão esses discursos e compreender que fatores de ordem social, econômica, política e cultural se entrelaçam no processo educacional desses sujeitos e que nesse momento histórico não nos cabe a busca por culpados ou inocentes, mas ao contrário, empreender esforços coletivos para garantir que o elevado número de alunos presentes nas salas de aula no início de cada ano letivo permaneça até o fechamento das atividades letivas, pela via da construção de um currículo fundamentado nas necessidades dos alunos e nas exigências sociais que demandam a formação de sujeitos críticos, capacitados e capazes de responder aos avanços que a sociedade globalizada e tecnológica requer.

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[...] ressignificar o cotidiano escolar por meio da construção de novos diálogos, de cujo contexto ninguém seja excluído, do qual emerja e se consolide a maior de todos os valores da atualidade: o reconhecimento e o respeito pela diversidade humana como base de uma sociedade mais justa e solidária (MARQUES, 2007, p. 153).

Retomando os desafios a serem respondidos para a minimização de processos de evasão na Educação de Jovens e Adultos, Nóvoa (1992, p. 27) nos diz que realmente há necessidade de se investir positivamente nos saberes que o professor é portador, explorando-os de um ponto de vista teórico e conceitual, pois os problemas da prática docente não são meramente instrumentais; comportando situações problemáticas que obrigam decisões num terreno de grande complexidade, incerteza, singularidade e de conflito de valores. Nas suas palavras, “[...] as situações que os professores são obrigados a enfrentar (e a resolver) apresentam características únicas, exigindo, portanto respostas únicas: o profissional competente possui capacidades de autodesenvolvimento reflexivo” (NÓVOA, 1992, p. 27).

É justamente pensando que a prática docente se faz de desafios e que a formação docente neles se entrelaça que vislumbramos a necessidade de as agências formadoras de professores e os profissionais responsáveis pela formação contínua, instituírem olhares mais prospectivos para os profissionais em atuação na Educação de Jovens e Adultos, considerando-os como sujeitos pesquisadores de novos-outros saberes e colaboradores na implementação de políticas públicas voltadas para o combate à evasão escolar, pela via da construção coletiva de proposta curriculares fundamentadas em conhecimentos fundantes da emancipação e inclusão de homens e mulheres na sociedade atual.

A formação de professores deve ser concebida como uma das componentes da mudança, em conexão estreita com outros sectores e áreas de intervenção, e não como uma condição prévia da mudança. A formação não se faz antes da mudança, faz-se durante, produz-se nesse esforço de inovação e de procura dos melhores percursos para a transformação da escola. É esta perspectiva ecológica de mudança interactiva dos profissionais e dos contextos que dá um novo sentido às práticas de formação de professores centradas nas escolas (NÓVOA, 1992, p. 28).

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É apostando no investimento da formação docente e na valorização do magistério que poderemos vislumbrar no contexto das escolas que ofertam Educação de Jovens e Adultos o esboço feito por Góes (2002) da perspectiva de educador que gostaríamos de ter, ou seja, um educador que fosse:

[...] orientado prospectivamente, atento à criança, às suas dificuldades e, sobretudo, às suas potencialidades, que se configuram na relação entre a plasticidade humana e as ações do grupo social. É aquele que é capaz de analisar e explorar recursos especiais e de promover caminhos alternativos, que considera o educando como participante de outros espaços do cotidiano, além do escolar, que lhe apresenta desafios na direção de novos objetivos, que o considera integralmente, sem se centrar no não, na deficiência (GÓES, apud FERREIRA, 2005, p. 151-152).

Enfrentar os desafios impostos pela Educação de Jovens e Adultos nos fala na necessidade de instituirmos políticas públicas educacionais para problematização que contemplem as necessidades trazidas pelos educandos para o contexto escolar, relacionando-as às exigências sociais que emergem da sociedade moderna, para que ao concluírem seus estudos nesta etapa de ensino, possam se sentir mais preparados para lidar e confrontar com os desafios presentes na sociedade moderna.

Construindo práticas e políticas de combate à evasão escolar na EJA: uma experiência em construção

Assumindo o desafio de instituir práticas pedagógicas que garantam acesso, permanência e ensino com qualidade a educandos que buscam na Educação de Jovens e Adultos, novas possibilidades de participação social a Escola Municipal de Ensino Fundamental “PRVG”4, do Sistema Municipal de Ensino de Vitória, ao buscar fundamentação teórico-metodológica nos princípios e fundamentos da pesquisa-ação encontrou caminhos para refletir e engendrar estratégias pedagógicas para minimizar uma problemática que há anos vinha se arrastando na modalidade, ou seja, a crescente evasão de alunos, que por situações diversas abandonavam a escola não concluindo o ensino fundamental obrigatório.

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A adoção pela metodologia investigativa efetivou-se mediante possibilidades apontadas pela pesquisa-ação em fomentar processos de formação contínua para os educadores refletirem sobre a problemática e conseqüentemente engendrarem práticas e políticas que provocassem mudanças no contexto da Educação de Jovens e Adultos, principalmente relacionadas à evasão escolar, pois segundo as bases que a fundamentam,

[...] a pesquisa-ação [...] não pretende apenas compreender ou descrever o mundo da prática, mas transformá-lo [...] é sempre concebida em relação à prática – ela existe para a melhoria da prática. Os pesquisadores críticos da ação tentam descobrir aqueles aspectos da ordem social dominante que minam nossos esforços para perseguir objetivos emancipatórios (KINCHELOE, apud PIMENTA, 2005, p. 15).

Mergulhados nos princípios e fundamentos da pesquisa-ação professores, pedagogos e gestor escolar da EMEF “PRVG” constituíram-se pesquisadores de novos/outros saberes-fazeres, levantando dados relativos à evasão na modalidade que assinalava índices de até 50% de abandono das atividades escolares até o primeiro semestre letivo. Contagiados pelo desejo de provocar mudanças, instituíram processos de formação contínua para aprofundamento teórico-prático da Educação de Jovens e Adultos, assumindo seus desafios, engendrando, neste contexto, o Projeto “Atendimento aos Filhos de alunas-mães-trabalhadoras”, cujo objetivo centrava-se em proporcionar meios para que concluíssem o Ensino Fundamental Obrigatório, pela via de trabalhos desenvolvidos na escola com seus filhos, no período em estavam em sala de aula, uma vez as mesmas sinalizavam que:

Não está dando pra vim porque não tenho com quem deixar o meu filho. Não moro com meu esposo e minha mãe já fica com ele durante o dia para eu trabalhar. Ficar à noite com ele é cansativo para ela. Ela já está bem cansada e a idade também já não ajuda muito (aluna da EMEF “Clarice Lispector”).Ah! Diretora, a situação está difícil. Meu desejo é voltar a estudar, mas estou encontrando dificuldade em encontrar alguém para ficar com as crianças. Já

4 Adotamos nome fictício para preservar a identidade da unidade de ensino e os profissionais que nela atuam.

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entrei na escola várias vezes e acabo saindo. Meu desejo é estudar para ajudar as crianças nos deveres de casa. Tenho o sonho de aprender a ler e a escrever para fazer isso (aluna da EMEF “Clarice Lispector participante do projeto de alfabetização).

Barbier (2004, p. 18) nos diz que “[...] a mudança, quer dizer, o vivente, implica a existência de conflitos abertos entre as instâncias internas e externas no âmago dos indivíduos e dos grupos”, por isso, somente assumindo os desafios da EJA que o grupo vislumbrava possibilidade de falar em acesso, permanência e ensino com qualidade na educação desses sujeitos que mais uma vez retornavam aos bancos escolares na busca por novas perspectivas de trabalho e acompanhamento dos avanços tecnológicos e científicos produzidos pela humanidade.

O Projeto “Atendimento aos Filhos de alunas-mães-trabalhadoras” abria possibilidades para que as estudantes reingressassem na escola e nela permanecessem, uma vez que, pela via da ação pedagógica de uma educadora contratada para o projeto, vinte crianças eram assistidas em espaço alternativo da escola com atividades voltadas para exibição de filmes, contação de histórias, atividades recreativas, teatro com fantoches, dramatizações, uso do laboratório de informática, favorecendo o processo de escolarização de quinze mães matriculadas nos projetos de alfabetização, pós-alfabetização e séries finais do Ensino Fundamental, encontrando assim possibilidades para voltar a estudar e projetar um futuro mais promissor.

Neste movimento, o projeto desenvolvia-se no período noturno, das 18h00min às 21h30min, de segunda a quinta-feira, uma vez as políticas da Educação de Jovens e Adultos implementadas pelo Sistema Municipal de Educação de Vitória, assegurava às sextas-feiras planejamento coletivo para os educadores instituírem propostas de trabalhos interdisciplinares para serem desenvolvidas no transcorrer da semana, não aula neste dia.

Estar em sala de aula, sentar novamente nos bancos escolares, segurar um lápis entre os dedos, folhear livros e cadernos, ter contato com a leitura e a escrita, conflitar-se novamente com os desafios trazidos pela matemática, problematizar, refletir, conversar, trocar informações, produzir e acompanhar conhecimentos eram movimentos que traziam novas perspectivas para as alunas que, muitas vezes, relatavam seus anseios por uma melhor qualificação profissional, ajuda aos filhos nas tarefas escolares, ampliação da renda

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familiar, sendo tais aspirações extremamente ligadas e alimentadas pelo reingresso escolar.

A melhor coisa que aconteceu foi o projeto na escola. O projeto me ajudou a voltar pra escola. Está ajudando a minha filha aprender mais. Está ajudando também mães que não estavam estudando, porque tinham filhos e não tinha com quem deixar as crianças. O projeto veio para ajudá-la a gente que queria voltar para a escola e que sonha com um futuro melhor (Aluna-mãe-trabalhadora, matriculada na 6ª série do Ensino Fundamental da Educação de Jovens e Adultos).Eu acho que esse projeto está sendo muito bom para mim e para meu filho. Para mim porque eu posso voltar a estudar e meu filho pode estar aqui comigo, porque se não tivesse esse projeto, eu não teria voltado a estudar e nem estar tentando terminar meus estudos, porque eu não tinha ninguém para ficar com ele. O bom é que ele gosta muito de vim comigo para a escola porque tem as aulas de informática e ele já fala pra todo mundo que está aprendendo mexer com computador e fica muito feliz. Eu também estou gostando muito (Aluna matriculada no projeto de alfabetização).

Pensando nesses movimentos Meirieu (2005) nos diz que o compromisso social da escola é apostar na educabilidade humana, assumindo o desafio de educar todos aqueles que buscam no trabalho educativo escolar novas possibilidades de participação social, engendrando para tanto políticas e estratégias que apostem na inclusão em detrimento da exclusão e nas contribuições do trabalho escolar na construção de uma sociedade mais justa, harmônica, abertas às diferenças humanas e capaz de se constituir espaço de trabalho e produção para todos os sujeitos nela integrados.

Educabilidade: a palavra é lançada. O grande desafio. A aposta fundamental: ‘Toda criança, todo homem é educável’. e a história da pedagogia, assim como das instituições escolares, nada mais é do que a implementação cada vez mais audaciosa dessa aposta: a escolha da educação contra a da exclusão. A transgressão permanente de todos os fatalismos. A afirmação de que nada jamais está perdido e que, ao contrário, tudo pode ser ganho se nos dedicarmos, obstinadamente, a inventar métodos que permitam integrar as crianças no círculo do humano. Uma aposta fundamental do próprio ofício:

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aquele que não acredita na educabilidade de seus alunos faria melhor se o abandonasse. Uma aposta heurística: sem ela, não há pesquisa pedagógica ou didática, mas a mera admiração embevecida pelos eleitos e pelas aptidões que despertam. Uma aposta ética: é preciso esperar sempre o melhor, pois este é o único meio de consegui-lo. Uma aposta prudente: nada jamais permite afirmar que tudo já foi tentado e que não há mais nada a fazer (MEIRIEU, 2005, p. 43).

Por isso, Padilha (2005) conclama a necessidade de organização das escolas de forma tal que o acesso ao conhecimento científico seja oportunizado pela via de “[...] programas educacionais flexíveis, contribuindo com a promoção de desafios, de forma a superar as necessidades grupais ou individuais, compreendendo e reorganizando ações educativas que garantam aprendizagem de novos conhecimentos” (p. 129), ofertando condições de permanência dos educandos nos contextos escolares pela via de instituição de políticas que garanta o pilar do processo educacional, ou seja, acesso, permanência e ensino com qualidade.

Arroyo (2000, p. 67) também nos leva refletir que a EMEF “PRVG” ao buscar nos princípios e fundamentos da pesquisa-ação possibilidades para reverter o quadro de evasão escolar que se presentificava na Educação de Jovens e Adultos fomentava processos de formação continuada em contexto, uma vez que tais movimentos permitiam aos profissionais refletir sobre os desafios presentes nas escolas de educação básica, o contexto social, econômico, cultural e afetivo dos educandos que afetam incisivamente seus processos de aprendizagens, construindo possibilidades de aperfeiçoamento docente e de permanência desses sujeitos no contexto da sala de aula, pois “[...] educar é revelar saberes, significados, mas antes de mais nada revelar-nos como docentes educadores em nossa condição humana. É nosso ofício. É nossa humana docência”.

O Projeto “Atendimento aos Filhos de alunas-mães-trabalhadoras” foi uma possibilidade que tivemos para nos encontrar, refletir, estudar e aperfeiçoar a nossa prática docente. Com relação às alunas que não tinham com quem deixar seus filhos foi um divisor de águas para que continuassem estudando. Este projeto tem potencializado a aprendizagem das alunas, pois as mesmas sentem-se valorizadas e incentivadas. As crianças também têm um ganho,

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pois enquanto esperam por suas mães, aprendem através de atividade lúdicas variadas (Professor de Língua Inglesa).Na escola precisamos assumir os desafios e necessidades que os alunos trazem como possibilidades de aperfeiçoamento docente. O projeto não só atendeu às necessidades das mães, mas nos ofertou possibilidades de estudo, encontros e construção coletiva de estratégias de trabalho. Acredito que é de suma importância a iniciativa da escola em viabilizar o Projeto às alunas mães, pois se garante assim a participação assídua e efetiva às aulas, combatendo a evasão escolar (Professora que desenvolve os trabalhos com as crianças).

Neste movimento, o projeto nos permitia refletir que investir na formação docente e apostar na inclusão em detrimento da exclusão é também investir na instituição escolar como espaço de produção de conhecimento para alunos e, também, para professores ao considerarmos que os educadores “[...] são seres da práxis. São seres do quefazer [...] porque seu fazer é reflexão e ação. É a práxis. É a transformação do mundo [...]. O que fazer é teoria e prática. É reflexão e ação [...]” (FREIRE, 1987, p. 121).

Aprender é nascer para outra coisa, descobrir mundos que desconhecíamos até então. Aprender é ver suas certezas balançarem, é desestabilizar-se e sentir necessidade, para não se perder ou desanimar, de referências estáveis que apenas um profissional do ensino pode oferecer (MEIRIEU, 2006, p. 21).

Foi pensando coletivamente que professores, pedagogo e gestor escolar da EMEF “PRVG”, envolvidos com a Educação de Jovens e Adultos, instituíram possibilidades para que muitas alunas que entravam e saíam da escola, por não terem com quem deixar seus filhos, passassem a freqüentar regularmente as aulas, encontrando no contexto escolar apoio para que o ensino considerado obrigatório pela legislação nacional fosse a elas ofertado para além vias legais, mas, também, pela via da ação colaborativa de profissionais que acreditam na educabilidade humana e nas contribuições que o processo de escolarização tem na vida de homens e mulheres que sonham com dias mais promissores, melhores condições de trabalho e futuro promissor para suas famílias.

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Finalizando este diálogo

Reconhecendo que as questões que envolvem o processo educacional de jovens e adultos não se esgotam nas discussões aqui levantadas nem nas proposições implementadas pela EMEF “PRVG”, uma vez que muitas situações que perpassam esse processo necessitam continuar sendo problematizadas, principalmente ao considerarmos que a evasão e fracasso escolar é uma realidade que assombra a educação nacional, estando a temática amplamente discutida por pesquisas e teorizações voltadas para o trabalho desenvolvido com alunos e jovens trabalhadores, acreditamos que o desenvolvimento do Projeto “Atendimento aos Filhos de alunas-mães-trabalhadoras” possibilitou aos profissionais da unidade de ensino refletir sobre as contribuições que professores, pedagogos, gestores escolares e alunos têm no processo de democratização da educação básica.

Tal iniciativa nos possibilita pensar que os desafios presentes na Educação de Jovens e Adultos são reais, complexos e de responsabilidade de todos, uma vez necessitamos continuar discutindo sobre implementação de propostas curriculares, combate à evasão e fracasso escolar e principalmente sobre como fazer da escola espaço de aprendizado para todos, independentes de diferenciações culturais, sociais, econômicas e cognitivas que os alunos possam ter. Acreditamos ainda que apostar na educabilidade humana é o caminho para enfrentarmos os desafios presentes nas escolas de educação básica e percebermos que nem todas as fichas foram apostadas, que nem tudo está perdido e que sempre há algo a ser feito para que a inclusão sobreponha a exclusão de nossos educandos do contexto educacional.

Aprendemos também que vale a pena pesquisar, construir coletivamente, trocar com nossos pares, pois como nos ensina Freire o que não podemos é parar de pesquisar, de argumentar o porquê das coisas e esse é o movimento que alimenta a produção de conhecimento da humanidade.

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Referências

ALARCAO, Isabel (Org.). Escola reflexiva e nova racionalidade. Porto Alegre: Artmed, 2001.

ARROYO, Miguel. Ofício de mestre: imagens e auto-imagens. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 2000.

BARBIER, Renné. A pesquisa-ação. Tradução de Lucie Didio. Brasília: Líber Livro Editora, 2004.

FERREIRA, Maria Cecília Carareto. Os movimentos possíveis e necessários para que uma escola faça a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais. In: JESUS, Denise Meyrelles de; BAPTISTA, Claudio Roberto; VICTOR, Sonia Lopes (Org.). Pesquisa e educação especial: mapeando produções. Vitória: EDUFES, 2005.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

______. Pedagogia da esperança: um encontro com a pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

______. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

JESUS, Denise Meyrelles de. Vozes e narrativas na ação grupal: trajetórias de formação de professores-pesquisadores na perspectiva da inclusão escolar. In: JESUS, Denise Meyrelles de et. al. (Org.). Inclusão, práticas pedagógicas e trajetórias de pesquisa. Porto Alegre: Mediação, 2007.

MARQUES, Carlos Alberto. Rompendo paradigmas: as contribuições de Vygotsky, Paulo Freire e Foucaut. In: JESUS, Denise Meyrelles de et. al. (Org.). Inclusão, práticas pedagógicas e trajetórias de pesquisa. Porto Alegre: Mediação, 2007.

MEIRIEU, Philippe. A pedagogia entre o dizer e o fazer: a coragem de recomeçar. Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2002.

______. O cotidiano da escola e da sala de aula: o fazer e o compreender. Porto Alegre: Artmed. 2005.

______. Carta a um jovem professor. Tradução de Fátima Murad. Porto Alegre: Artmed, 2006.

NÓVOA, Antonio (Org.). Os professores e sua formação. Lisboa: Nova Enciclopédia, 1992.

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PADILHA, Anna Maria Lunardi. Necessidade especial do trabalho educativo geral ou necessidade educ ativas especiais? In: JESUS, Denise Meyrelles de; BAPTISTA, Claudio Roberto; VICTOR, Sonia Lopes (Org.). Pesquisa e educação especial: mapeando produções. Vitória: EDUFES, 2005. p. 125 -138.

PIMENTA, Selma Garrido. Pesquisa-ação crítico-colaborativa: construindo seu significado a partir de experiência com a formação docente. Revista Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31. n. 3, set./dez. 2005.

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Formação continuada em contexto: forjando ações colaborativas entre

professor de educação especial e de ensino regular para garantia de acesso,

permanência e educação com qualidade a educandos com

necessidades educacionais especiais

Dinéa Guiomar Loureiro da SilveiraEloisa Elena Corteletti ErllerMaria Raquel Marques Valle

Considerações iniciais

O presente é tão grande, não nos afastemos.Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas. [...]

O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,a vida presente.

Carlos Drummond de Andrade

A inclusão de alunos com necessidades educativas especiais tem se configurando um dos maiores desafios propostos à educação atual, uma vez que imprime a necessidade de implementação de políticas públicas que garantam acesso, permanência e ensino com qualidade a esses educandos no contexto das escolas de educação básica.

Contemplar as questões educacionais trazidas por esses alunos tem sido uma proposta desafiadora, uma vez que a formação inicial dos educadores historicamente vem forjando profissionais para atuar a partir de uma perspectiva de aluno padrão e dentro uma escola despreparada para lidar com as questões da diversidade humana.

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O desafio em fazer da sala de aula espaço para produção de conhecimento para alunos com ou sem deficiência tem motivado educadores e pesquisadores do campo educacional a desenvolver estudos e pesquisas, visando colaborar com a escola no que diz respeito à instituição de ações colaborativas em seu cotidiano, de práticas pedagógicas flexibilizadas, de apoios ao professor e de problematização da avaliação escolar que necessita ser pensada como instrumento para acompanhamento do desenvolvimento dos alunos e reflexão crítica sobre as ações desenvolvidas em sala de aula.

Por isso, Padilha (2005) conclama a necessidade de organização das escolas visando “[...] oferecer programas educacionais flexíveis, contribuindo com a promoção de desafios, de forma a superar as necessidades grupais ou individuais, compreendendo e reorganizando ações educativas que garantam aprendizagem de novos conhecimentos” (PADILHA, 2005, p. 129).

A emergência dessa nova organização escolar nos permite pensar na necessidade que temos em investir na formação docente e na valorização do magistério para que os profissionais da educação se sintam “[...] capazes de criar ambientes educativos em que diferentes alunos, com os mais diversificados percursos de escolarização, consigam participar; que contribuam com experiências de sucessos” ( JESUS, 2006, p. 100).

Tomando como ponto para reflexão os momentos de planejamento, formação continuada e conselhos de classe rememoramos que ao discutirmos o processo educacional de alunos com necessidades educacionais especiais, comumente, os educadores e pedagogos sinalizam que se sentem despreparados para lidar com as questões da diversidade, que não foram capacitados para esses trabalhos, que necessitam de colaboração e que, muitas vezes, não sabem avaliar e instituir práticas que envolvam essas crianças nas atividades levadas para a sala de aula, o presente artigo tem como objetivo apresentar os movimentos realizados por uma unidade de ensino fundamental do Sistema Municipal de Vitória que ao adotar a formação continuada em contexto encontrou caminhos para engendrar ações colaborativas entre professores de ensino regular e de Educação Especial na instituição de ações pedagógicas que transformasse o contexto da sala de aula espaço para aprendizagem de alunos com ou sem deficiência.

Não sabemos lidar com as crianças com necessidades educacionais especiais. Não sabemos avaliar, construir trabalhos que atenda suas aprendizagens e ainda dizer o que eles precisam aprender. Dizem que estão na escola para socializar,

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mas temos que fazer alguma coisa por eles. Com isso há uma cobrança muito grande sobre os pedagogos [...]. Eu vejo o pedagogo como uma pessoa a mais na escola para estar estruturando [...]. Não vejo o pedagogo como um super-homem do saber. [...] O professor cobra muito da gente [...] Eu me sinto um pouco sufocada, porque às vezes você é tão cobrada. Você tenta dar conta, mas não consegue dar conta de tudo e as coisas ficam mal feitas e as coisas vão sendo atropeladas e no final das contas o que se ouve é: o pedagógico não funciona. Mas quem é o pedagógico? Isso provoca um sentimento de frustração na gente que não conseguimos explicar (Pedagoga).

Não tivemos formação para trabalhar com essas crianças. A sala de aula também está muito cheia e não temos tempo de dar a atenção que essas crianças merecem. Eu estou frustrada, a palavra é essa. Eu cheguei aqui com uma disposição! Xérox, eu estava com um bolo de xérox, achando que eu estava fazendo alguma coisa para ajudar e ai cheguei ao final e vi que não estava ajudando nada. As crianças não avançaram como eu esperava. Eu preciso de apoio em sala de aula, mas nem sei se um dia vou conseguir isso (Professora Maria – 1ª Série).

Refletindo sobre as questões suscitadas pelas professoras Ferreira (2005, p. 150) ao desenvolver estudos sobre o trabalho docente com alunos com necessidades educacionais especiais nos fala que “[...] a esses alunos os professores não sabem como ensinar e, de fato, não foram preparados para ensiná-los”, pois

Não sabem gerar dados que sejam pedagogicamente relevantes; não conseguem transformar dados relevantes em estratégias que atendam às necessidades dos alunos. Não sabem como tornar significativo um ensino; não conseguem decidir sobre quais conhecimentos devem privilegiar. Não se apropriam de bases teóricas para desenvolver uma prática fundamentada nem dela geram conhecimento para se desenvolver profissionalmente (FERREIRA, 2005, p. 151).

Foi considerando o quadro explicitado que tomamos a escola como espaço-tempo para formação de alunos e professores, pois acreditamos que pela via da reflexão crítica da práxis, da assunção dos desafios trazidos pelos alunos para o contexto escolar e da instituição de práticas que dialogassem com estas situações aos professores seriam proporcionadas condições para

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aperfeiçoamento profissional e neste movimento reflexivo e formativo, criadas condições para articulação de ações colaborativas entre os trabalhos do professor de educação especial e de ensino regular, visando fazer da sala de aula foco de intervenção desses profissionais e de construção de aprendizagens para alunos com ou sem deficiência.

A formação passa pela experimentação, pela inovação, pelo ensaio de novos modos de trabalho pedagógico. E por uma reflexão crítica sobre a sua utilização. A formação passa por processos de investigação, directamente articulados com a prática educativa (NÓVOA, 1992, p. 28).

Mendes (2005, p. 158) nos diz que a instituição de políticas públicas de formação de educadores, atualmente, se configura como um dos “[...] pilares para a construção da inclusão escolar, pois a mudança requer um potencial instalado, em termos de recursos humanos, em condições de trabalho para que ela possa ser posta em prática”.

Assim sendo, a formação continuada em contexto nos abriu possibilidades para pensar os profissionais da educação como pesquisadores de sua prática educativa, capazes de instituírem o espírito da colaboração e reflexão individual e coletiva no cotidiano da escola, permitindo a esses sujeitos refletir que “[...] ensinar inexiste sem aprender e vice-versa e foi aprendendo socialmente que, historicamente, mulheres e homens descobriram que era possível ensinar” (FREIRE, 1996, p. 23-24).

Foi sentando, discutindo, implementando, trocando idéias, construindo conhecimentos e aprofundando outros que encontramos no trabalho colaborativo, possibilidades para que professores de ensino regular e de Educação Especial articulassem seus saberes-fazeres e levassem para a sala propostas de trabalhos flexibilizadas vivenciando os educandos experiências de sucesso em seus processos de ensino e aprendizagens.

Capelini (2005) nos fala que ações colaborativas na escola trazem benefícios para educandos e educadores, pois aos alunos é propiciada condição para participação em contextos diversificados de aprendizagens, ao passo que ao professores é ofertada possibilidades de participação em novas formas de organização e enriquecimento da prática docente.

Nas palavras de Ashton e Webb (apud FULLAN; HARGREAVES, 2000, p. 62) “[...] o maior benefício da colaboração é sua capacidade de

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reduzir a sensação de impotência dos professores e aumentar sua sensação de eficiência”.

Foi pensando na possibilidade em romper com a sensação de impotência, fracasso e ineficiência que assumimos o desafio de conceber cada educando como sujeito singular, que no olhar de Padilha (2005) somos todos nós e proporcionar condições para que o professor de sala de aula regular em colaboração com o especialista em Educação Especial articulasse ações que respeitassem o ritmo dos educandos, seus processos e percursos de aprendizado, suas necessidades, pensando e instituindo ações que favorecessem a construção dos conhecimentos a eles necessários, pela via de uma pedagogia diferenciada, por acreditarmos que tínhamos o compromisso de ofertá-los condições para serem subjetivados de forma mais produtiva na sociedade vigente.

‘Diferenciar a pedagogia’ não é absolutamente uma ‘revolução’ na Escola, nem, um fortiori, uma renúncia aos princípios ou mesmo à existência de uma instituição que se diluiria em uma infinidade de procedimentos individuais justapostos. ‘Diferenciar a pedagogia’ é, ao contrário, reforçar uma instituição escolar incorporando em seu seio o que jamais deveria ser abandonado à esfera privada, familiar ou comercial: o acompanhamento individualizado dos alunos. ‘Diferenciar a pedagogia’ é oferecer a cada um os meios de apropriar-se dos saberes respeitando suas necessidades específicas e acompanhando-os o melhor possível em sua trajetória de aprendizagem (MEIRIEU, 2005, p. 122).

O trabalho docente, pautado nessa “pedagogia diferenciada”, nos permite falar em docentes que venham a se tornar os sujeitos que construirão os processos inclusivos nas escolas, para superar práticas de submissão ancoradas em mudanças apenas na legislação ou nos códigos políticos (FERREIra, 2005). Em tal contexto, a construção de práticas comprometidas com o aprendizado de todos os alunos ganha pleno sentido, uma vez que o ensino faz-se atrelado a um profissional progressista que concebe seu aluno como sujeito capaz de indagar, procurar respostas, produzir conhecimentos, assumir-se como ser social e histórico, como ser pensante, comunicante, transformador, criador, realizador de sonhos, para além de suas limitações físicas ou intelectuais.

A escola pode ser um espaço privilegiado para plantar a semente do prazer de aprender. Para isso, é preciso reconhecer a criança como produtora de

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conhecimento, alguém que está sempre indagando e procurando respostas para tudo que vê, ouve, toca, sente. e, nesse sentido, à medida que encontra respostas, vai produzindo conhecimentos a respeito do mundo. A curiosidade é uma característica natural, que provoca no ser humano o desejo de aprender. Plantar a semente do prazer de aprender significa dar respostas a essa curiosidade, e não matá-la ou silenciá-la, como freqüentemente o fazem o adulto e a escola (ARAÚJO, 1996, p. 102).

Para a implementação dessa pedagogia diferenciada e para a construção dessa concepção de aluno como ser único, concreto, complexo e indivisível, foi necessário nos posicionarmos como profissionais que trabalham sobre o saber a ser ensinado (MEIRIEU, 2002) e, para tanto, estudamos continuamente, pois o “[...] professor(a) só ensina em termos verdadeiros na medida em que conhece o conteúdo que ensina, quer dizer, na medida em que se apropria dele, em que o apreende” (FREIRE, 1992, p. 81).

Assim para explicitação dos movimentos que nos levaram instituir momentos de formação continuada para que professores de Educação Especial e de ensino regular conjugassem seus saberes-fazeres e constituíssem contextos de aprendizagem apresentaremos a unidade de ensino onde organizamos esses trabalhos, os desafios enfrentados e como a ação colaborativa apontou caminhos para minimização da problemática presente no contexto da sala de aula.

A EMEF “Lavoisier” e o processo de inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais em seu contexto

A Escola Municipal de Ensino Fundamental “Lavoisier”1 pertence ao Sistema Municipal de Ensino de Vitória, atendendo 382 educandos em seu primeiro turno de funcionamento e outros 374 no vespertino, perfazendo um quantitativo de 756 alunos matriculados na primeira e segunda etapa do Ensino Fundamental. Nessas matrículas constava a presença de 18 crianças com necessidades educacionais especiais no turno matutino e outras 25 no vespertino vivenciando processos de inclusão escolar trazendo alguns desafios para o contexto da sala de aula.

1 Utilizamos nome fictício para preservar a identidade da escola e de seus profissionais neste artigo.

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Estando estas crianças com necessidades educacionais especiais matriculadas nas quatro primeiras séries do Ensino Fundamental apresentavam percursos de escolarização bem distante dos demais alunos, ainda em processo inicial de alfabetização, sendo assistidas pela professora de Educação Especial na sala de recursos, sem articulação com os trabalhos desenvolvidos na sala de aula regular e sem o acompanhamento sistemático da professora de ensino comum. De posse de horário para atendimentos coletivos e individuais a professora especialista desenvolvia ações com os alunos uma hora por dia, trabalhando com atividades que envolviam reconhecimento de letras, números, escrita de palavras simples, montagem de quebra-cabeças, manipulação de materiais de encaixe, cores, dentre outros, sendo encaminhados esses educandos para o contexto da sala de aula assim que concluído seu processo de intervenção.

O retorno desses alunos para a sala de aula imprimia à escola repensar os trabalhos desenvolvidos com este público uma vez que não acompanhavam os conteúdos trabalhados pela professora regente, as discussões tecidas estavam em pleno movimento quando retornavam para este contexto, ficando esses alunos muitas vezes à margem do que acontecia naquele ambiente de produção de conhecimentos, conforme discurso da professora Tereza da 3ª série B.

Quando eles estão na sala de recursos com a professora de Educação Especial fico pensando no que se passa lá. Fico torcendo para que ela consiga fazer alguma coisa por eles. Coisas que eu não consigo fazer em minha sala de aula. Quando eles voltam, já estou com o quadro cheio, o conteúdo está andando e eles acabam ficando de lado. Não dá para começar de novo. Ai eles ficam perdidos, a aula vai se desenrolando assim até bater o sinal. Isso traz um sentimento de fracasso, angustia e frustração que acaba com o nosso dia (Tereza – 3ª Série B).

Como podemos ver o sentimento de frustração e angústia podiam ser constatados nos discursos dos professores regentes quando sinalizavam suas expectativas em parar a escola, para os educadores sentarem e engendrarem novas possibilidades de trabalho com estas crianças, revelando a necessidade de gestão de apoios ao professor em sala de aula para elaboração de trabalhos flexibilizados e diversificados que contemplassem os percursos de aprendizagens de todos os alunos neste contexto.

“Ah! Está ali só para socializar”. “Ah! É só socialização”! Tipo assim: - Não se preocupe não! Então ta, está ali para socializar, para a gente não se preocupar.

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Só que eles incomodam a gente. Eles precisam aprender. [...] Com isso fico pensando: - “O que eu vou fazer com esse menino aqui”? O que eu vou fazer? O que eu posso fazer? O que eu posso ajudar? Na verdade eu preciso de apoio, de ajuda. Não adianta ele sair e quando volta fica a mesma coisa. Não estou dando conta sozinha de trabalhar e entender estas questões. (Professora Joana – 2ª série).O que eu estou pensando é a gente colocar em pauta, tirar um dia para fazer uma formação continuada dentro da escola para que possamos pensar outras maneiras de trabalhar com as crianças especiais. Tirar da sala de aula não tem adiantado [...]. Penso em uma formação onde tenhamos a oportunidade de refletir sobre outras experiências, outros relatos [...]. Tenho alunos com necessidades educacionais especiais na 4ª série que ainda não sabem ler e escrever. Penso que a escola tinha que parar pelo menos uma vez por semana para discutir esse assunto para todo mundo ficar interagido com a Educação Especial. E essa escola há necessidade, e muita. (Professora Stela – 4ª Série).

As questões suscitadas pelas educadoras e a necessidade que as mesmas apontavam sobre a instituição de momentos para reflexão das ações desenvolvidas pela escola no trabalho com alunos com necessidades educacionais especiais nos levava rememorar Saviani quando argumenta que a escola é uma instituição socialmente pensada para produção de conhecimentos e não somente lugar de socialização e incorporação de atitudes de civilidade, uma vez que o objetivo que fundamenta suas práticas é trabalhar o ato educativo, ou seja,

[...] o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens. Assim, o objeto da educação diz respeito, de um lado à identificação dos elementos culturais que precisam ser assimilados pelos indivíduos da espécie humana para que eles se tornem humanos e, de outro lado e concomitantemente, à descoberta das formas mais adequadas para atingir esse objetivo (SAVIANI, apud PADILHA, p.17, 2005 – grifo nosso).

Freire (1996) argumenta que o trabalho educativo tem como meta constituir sujeitos históricos e sociais capazes de produzir conhecimentos, provocar mudanças e acompanhar os avanços e retrocessos que a sociedade

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moderna e globalizada vem vivenciando. Assim sendo, a presença de alunos com necessidades educacionais no contexto da sala de aula, jamais pode ser reduzida a processos de socialização, uma vez que a eles é estendido o direito de aprender, cabendo a nós, educadores, ensiná-los e à escola perguntar-se o que, como e de que forma esses sujeitos apropriam-se dos conhecimentos historicamente acumulados.

Uma das tarefas mais importantes da prática educativo-crítica é propiciar as condições em que os educandos em suas relações uns com os outros e todos com o professor ou a professora ensaiam a experiência de assumir-se. Assumir-se como um ser social e histórico, como ser pensante, comunicante, transformador, criador, realizador de sonhos, capaz de ter raiva porque é capaz de amar. Assumir-se como sujeito porque capaz de reconhecer-se como objeto [...] (FREIRE, 1996, p. 41).

Refletindo sobre esta necessidade irrefutável de aprofundar os conhecimentos docentes para a compreensão dos desafios presentes nos cotidianos escolares e anunciar outras novas possibilidades de ação, pensamos que o encontro entre pesquisa e formação, abre possibilidades para que os professores possam se perguntar constantemente: como realizar práticas educacionais significativas, bem como registrar, (re)planejar, (re)avaliar, avançar, intervir, para que os alunos, principalmente os com necessidades educacionais especiais, possam se apropriar dos conhecimentos historicamente acumulados, tão necessários para sua inclusão escolar? Como potencializar os tempos e espaços escolares, de forma a torná-los fecundos para o desenvolvimento dos alunos? Como significar o currículo escolar em face às demandas apresentadas pela prática? Como fazer da instituição escolar um espaço de produção coletiva de conhecimentos? “[...] Como não fazer da nossa prática um ‘empurrar para frente’ indiscriminado, sem levar em consideração a constituição histórica e social dos alunos?” (PADILHA, 2005, p.135).

Considerando a necessidade de levantarmos esses questionamentos nos contextos escolares, assumirmos o desafio de fazer da escola espaço aberto às diferenças humanas e provocarmos mudanças neste cotidiano para que a sala de aula se configurasse em espaço de atuação de professores de ensino regular, de Educação Especial e de produção de conhecimentos para todos os alunos, principalmente ao considerarmos que:

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Um estado de não-mudança não faz parte da natureza do ser vivo. Toda problemática científica que, desde então, não leve em consideração, não pode estudar a criatura viva em toda a sua complexidade. A mudança, quer dizer, o vivente, implica a existência de conflitos abertos entre as instâncias internas e externas no âmago dos indivíduos e dos grupos (BARBIER, 2004, p. 48).

Tomando os desafios trazidos pelos alunos com necessidades educacionais especiais, o compromisso social da escola em com eles trabalhar para serem subjetivados de maneira mais produtiva e prospectiva e os anseios dos educadores em parar, sentar, problematizar as ações implementadas pela escola neste movimento de inclusão escolar e instituir outras para superação das dificuldades enfrentadas em sala de aula constituímos processos de formação continuada em contexto para os educadores se encontrarem, aprofundarem conhecimentos, articula-los com as práticas desenvolvidas com os alunos e instituírem novas possibilidades de articulação do trabalho docente.

Forjando processos de formação continuada em contexto para aprofundamento teórico-prático da ação docente

Mediante as questões levantadas tomamos os desafios vivenciados pelos professores como possibilidade de aperfeiçoamento docente e desenvolvimento de pesquisa no cotidiano da escola visando colaborar com reflexões, instituição de novos possíveis e produção de conhecimento acerca do processo educacional de alunos com necessidades educacionais especiais. Para tanto apoiamo-nos nos princípios e fundamentos da pesquisa-ação uma vez que

Obriga o pesquisador a implicar-se. Ele percebe como está implicado pela estrutura social na qual ele está inserido e pelo jogo de desejos e interesses de outros [...] o pesquisador descobre que na pesquisa ação [...] não se trabalha sobre os outros, mas com os outros (BARBIER, 2004, p.14, grifo nosso).

Nosso desejo como gestores escolares era também assumir as questões pedagógicas trazidas por estes educandos, gestando apoios ao professor da sala de aula comum para que o mesmo se sentisse mais seguro, preparado, apoiado para desenvolver ações que garantissem o aprendizado de todos os

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alunos e ao mesmo tempo tomasse estas questões como oportunidades para aperfeiçoamento da prática e de sua profissionalidade docente.

A adoção desta metodologia investigativa efetivou-se mediante as possibilidades apontadas pela pesquisa-ação em constituir a escola como grupo envolvido para resolução de situações consideradas conflituosas, unindo todos seus segmentos em um objetivo comum e ainda por assumir os professores como profissionais críticos, reflexivos e pesquisadores de novos-outros saberes individuais e coletivos.

[...] falar dos professores como educadores reflexivos é proporcionar-lhes elementos por meios dos quais possam romper com as ideologias tecnocráticas e instrumentais que, na maioria das vezes, perpassam a sua prática cotidiana. É colocá-los no patamar de sujeitos políticos, capazes de refletir as mediações que estão postas no espaço dos seus mundos vividos e no espaço social, onde as interações se constituem em uma rede de subjetividades, mediadas pela linguagem, e onde os saberes são gestados a partir de suas próprias positividades, repletas de possibilidades [...] (BENASSULY, 2002, p. 190).

Conceber a escola como espaço-tempo para formação de educandos e educadores, os profissionais da educação como pesquisadores de novos-outros saberes e a formação centrada na escola como movimento retroalimentador da prática docente nos fazia pensar que, ao adotarmos os pressupostos da pesquisa-ação, estaríamos criando possibilidades para que os profissionais da escola projetassem um metaolhar sobre suas ações, refletindo sobre algumas que necessitavam ser potencializadas e/ou modificadas e, dessa forma, instituir ações colaborativas que conjugasse de forma mais sistemática os trabalhos desenvolvidos por professor de Educação Especial e de ensino comum no contexto da sala de aula.

[...] a pesquisa-ação [...] não pretende apenas compreender ou descrever o mundo da prática, mas transformá-lo [...] é sempre concebida em relação à prática – ela existe para a melhoria da prática. Os pesquisadores críticos da ação tentam descobrir aqueles aspectos da ordem social dominante que minam nossos esforços para perseguir objetivos emancipatórios (KINCHELOE, apud PIMENTA, 2005, p. 15).

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Neste movimento, aproveitamos os dias já instituídos para formação continuada na escola em calendário escolar visando promover aprofundamento teórico-prático sobre os fundamentos do movimento de inclusão escolar, promovendo ainda encontros quinzenais no período de 11h00min as 12h00min para que os professores de ensino comum, de Educação Especial, pedagogos e diretor escolar buscassem na literatura que vem versando sobre a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais subsídios para compreensão dos desafios vivenciados.

Adotamos três encontros previstos para formação continuada para reflexão sobre a temática, sendo discutidos no primeiro encontro o texto “Necessidade Especial do Trabalho Educativo Geral ou Necessidades Educativas Especiais” Padilha (2005); já no segundo as idéias da mesma autora trabalhadas no livro “Possibilidades de História ao Contrário” (2002), subsidiando-nos com reflexões sobre a construção de práticas com alunos que apresentavam deficiência mental, e um último dialogando com as teorizações de Ferreira (2005) que nos fala sobre “Os movimentos possíveis e necessários para que uma escola faça a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais, sendo o primeiro e último texto extraídos do livro Pesquisa e Educação Especial: Mapeando Produções, organizado por Jesus, Baptista e Vitor (2005).

Nos encontros quinzenas aproveitamos para dar continuidade a esses processos reflexivos, engendrando planejamentos para que os professores pudessem flexibilizar os conteúdos a serem levados para a sala de aula, desenvolvessem trabalhos pela via da pedagogia de projetos, contando com a colaboração da professora de Educação Especial que passava focalizar a sala de aula como espaço para intervenção. Essa dinâmica formativa permitia aos educadores emergirem das situações que os afligia, trocar com seus pares, vislumbrar possibilidades de superação dos desafios enfrentados e engendrar novas possibilidades de articulação dos conteúdos trabalhados em sala de aula, conforme relato da professora de Educação Especial.

Eu acho necessário pensar a escola como espaço de formação de professores. Eu acho que sim. Eu acho necessário pensar dessa maneira. Mas alguém puxando isso, de maneira ordenada, coordenada, para atingir um objetivo, com avaliação do processo como vivenciamos aqui na escola. Com esse processo de formação organizado pela dirigente escolar aprendemos que temos que criar expectativas e inquietações, mas ao mesmo tempo temos que gerar

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resultados. Temos que esperar por resultados que se quer e se cobrar esses resultados (Professora Silvia – Educação Especial).

A formação continuada centrada na escola nos permite pensar que “[...] é possível recuperar juntos a convicção de que algo é possível no trabalho em sala de aula, algo que não seja a mera contemplação resignada da reprodução social, algo que permita encontrar o prazer no sentido de ensinar [...]” (MEIRIEU, 2002, p. 69).

Nóvoa (1992, p. 25) nos diz que “[...] a formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de (re)construção permanente de uma identidade profissional”, por isso entendemos que ao adotarmos os desafios vivenciados engendramos possibilidades para que a sala de aula se presentificasse como espaço-tempo para produção de conhecimentos para alunos com e sem deficiência e oportunidades para os professores vivenciarem experiências de sucesso com esses sujeitos e contextos para aperfeiçoamento docente.

Instituindo ações colaborativas na sala de aula e engendrando possibilidades para alunos com e sem deficiência aprenderem neste contexto

Adotando os encontros quinzenais para elaboração de ações flexibilizadas pensando incluir todos os alunos nas atividades desenvolvidas em sala de aula, traremos neste texto, a experiência vivenciada com os alunos da 2ª série B que após planejamento articulado entre pedagogo, professor de Educação Especial, de ensino comum e gestor escolar, trabalharam com o Projeto “Trabalhando com as Diferenças Humanas, envolvendo cinco alunos com necessidades educacionais especiais em atividades de contação de histórias, produção de textos, recorte e colagem e ilustração da história contada. Tal trabalho desenvolveu-se pela via da intervenção em sala de aula de professor de Educação Especial de ensino comum, fazendo como nos diria Meirieu (2002) da sala de aula um lugar de encontros.

Vejamos o planejamento adotado para o desenvolvimento do projeto:

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PLANEJAMENTO PROJETO – “Trabalhando com as Diferenças Humanas” PROFESSORES ENVOLVIDOS: Silvia – Educação Especial, Marta – Pedagoga e Joana – Professora da 2ª série B.

Objetivo - Aprimorar o desenvolvimento da escrita dos alunos;

- Envolver os alunos com necessidades educacionais especiais nas atividades desenvolvidas;

- Refletir sobre: Diferenças Humanas, Respeito a si e ao próximo e solidariedade.

Metodologia de - Trabalharemos com a dinâmica:Intervenção Minha imagem é um presente? - Criação de Roda de História. - Aula expositiva e dialogada. - Produção escrita dos alunos mediada

pelos professores de Educação Especial e de ensino comum.

Adequação da - Envolver os alunos com necessidadesatividade para os educacionais especiais dinâmica trabalhadaalunos com N.E.E. com a turma e na contação de historia. - Apresentar palavras relativas à temática para

reconhecimento de letras trabalhadas com alguns alunos.

- Incentivar os alunos a recontarem a historia pela via de desenhos e palavras.

De posse do planejamento anteriormente elaborado, a intervenção dos professores na sala da 2ª série B foi assim desenvolvida:

As professoras organizaram a sala de aula em semicírculo apresentando uma caixa de presentes para que cada aluno a abrisse e visualizasse o conteúdo contido no seu interior. Disseram às crianças que ali estava um presente

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muito valioso, solicitando que um a um destapasse a caixa, mas permitindo que o colega que estava ao seu lado percebesse o seu conteúdo. Os alunos inicialmente mostravam-se curiosos, alguns ao destapar o objetivo sorriam, outros faziam cara de espanto, sinalizando não ter apreciado o que viam. Os alunos com necessidades educacionais especiais participaram da atividade obedecendo às regras previstas. Assim que todos fizeram esse movimento, a professora da sala de aula perguntou o que haviam observado na caixa e todos sinalizavam que era um espelho que refletia a sua imagem. Alguns alunos diziam que se achavam feios e que não gostaram do que viram, outros sinalizavam que queriam ter outra imagem ou que pretendiam mudar alguma coisa em seu rosto e um terceiro grupo dizia que se achavam bonitos e estavam satisfeitos com o que tinham. Assim a professora falou sobre diferenças humanas, respeito ao próximo, humanidade e como necessitamos esses valores vem perdendo o seu espaço na sociedade contemporânea. Terminada essa atividade inicial foi distribuída uma folha em branco para que os alunos representassem suas imagens utilizando desenhos. Utilizando uma música para trabalhar a atividade, os alunos foram orientados a trocar as folhas assim que a professora abaixasse o som. Nesse movimento os alunos se mostraram eufóricos e sorridentes e, toda vez, que dado o comando procuravam acrescentar um novo traço no desenho do colega que estava ao seu lado. Assim a professora trabalhava com os alunos nossa constituição histórica e social, dizendo para os alunos sobre a importância que nossos pares têm em nosso processo de desenvolvimento e formação, ou seja, que nos tornamos homens e mulheres a partir da mediação social que se dá pela via de nossas relações sociais. Com esta atividade foi confeccionado um painel servindo de mural para a entrada da escola com o seguinte dizer: “Somos diferentes e construídos pelo olhar do outro”. Aproveitando o ensejo a educadora discutiu com os alunos que nós, humanos, também, nos constituímos pelo olhar do outro e que é pela via dessa interação que nos fazemos homens e mulheres capazes de produzir conhecimento. Concluída a roda de história foi solicitado que os alunos fizessem uma releitura da atividade utilizando quadrinhos, acrósticos, desenhos, charges, narrativas, contos, estando os mesmos livres para escolher qual recurso que melhor contemple a sua necessidade de produção. Organizada, agora, a turma em grupos, os alunos foram auxiliados pela professora de Educação Especial e da sala de aula na resolução das atividades propostas, envolvendo sistematicamente os alunos com

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necessidades educacionais especiais nas mesmas. O processo de mediação, além de se efetivar pela via das educadoras, também se dava pelo trabalho dos alunos que auxiliavam os educandos com percursos mais diferenciados na resolução das atividades que envolviam desde tarefas que perpassavam a confecção de desenhos, listas de palavras até a produção de pequenos textos (Anotações feitas pela pesquisadora em seu Diário de Campo).

Conjugar os trabalhos de professores de Educação Especial e de ensino comum possibilitou às educadoras vivenciarem experiências de sucesso com seus educandos, construindo possibilidades para compreenderem que a sala de aula é o espaço propício para todos os alunos aprenderem e para que os profissionais da educação possam dar continuidade ao seu processo de aperfeiçoamento docente, pela via da reflexão crítica da práxis e construção de novas estratégias para se ensinar e aprender. Em momento oportuno, o grupo se reuniu para avaliar a execução do planejamento elaborado aprofundando os conhecimentos teórico-práticos de todos os envolvidos no processo, discutindo outras possibilidades de trabalho com os alunos.

Almeida (2005) salienta que o ensino em níveis diversificados representa uma das plurais possibilidades que vêm sendo discutidas em vários países no qual há um grande movimento em prol da inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais. Dessa forma, como todas as propostas deve ser previamente analisado e avaliado pela escola e professores, no sentido de promover uma prática educativa contextualizada com a realidade local.

Continuando nos diz que o trabalho em multiníveis propicia atender as especificidades de cada aluno, sem perder de vista a totalidade da classe, pela via de estratégias diferenciadas e adaptações necessárias à prática inclusiva, exigindo que o professor sistematize sua ação educativa sem perder de vista que:

[...] é fundamental que todos os alunos tenham acesso ao currículo comum com abordagens diversificadas. Isto para que a diversificação não seja instrumento de exclusão, uma vez que todos os alunos têm o direito de desenvolver seus conhecimentos de forma que possa participar da vida educacional e social com igualdade de oportunidades. Cumpre destacar que, para a construção de uma prática educativa inclusiva, que atenda à diversidade dos alunos, alguns aspectos necessitam ser considerados: a aprendizagem cooperativa; o planejamento e a organização sistemática do ensino; o manejo

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das relações em sala de aula; a flexibilização e a adaptação curricular; a observação constante e sistemática dos alunos a partir da investigação; o compromisso com o ensinar; a adoção da crítica e da cooperação; e a busca pela melhoria das práticas a partir da pesquisa e da relação entre teoria e prática (ALMEIDA, 2005, p. 11).

Assim sendo, a articulação dos saberes-fazeres de professores de Educação Especial e de ensino comum se configuraram em estratégias para desenvolvimento de trabalhos em níveis diferenciados, respeitando os ritmos e percursos de aprendizagens de cada aluno, possibilitando aos educadores envolvidos na intervenção conjugarem suas práticas reconhecendo os educandos como sujeitos únicos, concretos, singulares e com necessidades a serem respondidas.

Atuar colaborativamente e buscar na formação continuada em contexto alternativa para atuação docente em contextos onde a heterogeneidade significativa se faz presente, a nosso ver, se configura como possibilidades para superação dos desafios vivenciados em sala de aula e como nos diz Padilha (2005) caminhos para não fazermos de nossa atuação um “empurrar para frente indiscriminado”.

Revisitando resultados e colocando um ponto final nesta conversa

As experiências construídas pela EMEF “Lavoisier” nos permitem pensar que o processo de democratização da educação básica traz novos desafios que necessitam ser enfrentados com novas metodologias de ensino e estratégias pedagógicas diversificadas.

Nesse movimento vislumbramos os fundamentos e princípios da pesquisa-ação favorecendo a construção de novos/outros conhecimentos para a educação atual, pois “[...] se a educação fica esvaziada de conteúdo, há esvaziamento do ser humano. O que se busca é a valorização da escola, do saber do professor, do conhecimento científico socialmente existente – e não qualquer um” (PADILHA, 2005, p. 131).

Assumir as questões trazidas pelo processo de democratização remonta a necessidade de promovermos encontros para que os educadores possam

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socializar os desafios vivenciados, aprofundar seus conhecimentos teórico-práticos e construir estratégias para superação dos mesmos, pois como nos diz Alarcão atuar no contexto da diversidade nos fala da necessidade que temos em promovermos mudanças paradigmáticas na escola, ou seja, “[...] não apenas nos currículos, mas na organização disciplinar, pedagógica, organizacional. Nos valores e nas relações humanas que nela se vivem (ALARCãO, 2001, p. 18).

Centrar a formação continuada na escola possibilita aos professores procurar por apoios, problematizar as situações vivenciadas, levar para a sala de aula ações ricas, criativas em conteúdo e em metodologia e a superarem o sentimento de fracasso e frustração que vem abatendo os educadores por não conseguirem, sozinhos, contemplar todas as situações que o ato de ensinar e aprender trazem para o contexto da sala de aula.

Desde que passamos a nos reunir, estudar, ler alguns textos, passamos entender o porquê dos alunos com deficiência aqui na escola. Na verdade ensinar todos na sala de aula é um desafio, mas a partir do momento em que passamos a estudar estas questões aprendemos que podemos contar com apoio. A ida da professora de Educação Especial para a minha sala de aula me proporcionou possibilidades para respeitar, porque pude atender aos alunos que antes ficavam de lado. Acho que esse trabalho nos possibilitou explorar mais os momentos para planejamento e desenvolver aulas onde as crianças que não eram deficientes passaram também a se desenvolver melhor ( Joana – professora da 2ª Série B).

Vejo que o meu lugar é trabalhar na sala de aula com a professora regente. Ela fica mais segura e tem condições de trabalhar com os alunos especiais enquanto dou assistência para a turma. As aulas ficam mais criativas porque temos mais de uma pessoa pensando e fazendo juntas. A colaboração na escola atual se faz necessária para enfrentamento das necessidades que os alunos trazem para este contexto (Professora de Educação Especial).

O trabalho colaborativo na escola e a formação continuada que instituímos permitiu aos professores entender o papel do pedagogo na escola. Pude também entender melhor o meu papel. Vimos que esse profissional não é um super-homem do saber, porque para construirmos uma escola inclusiva temos que juntar e não separar forças (Pedagoga).

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Como forma de dialogar com essas situações, Meirieu (2002) considera que o ato educativo, mediante tantas tensões/desafios, necessita ser trabalhado na perspectiva da “obstinação didática”, ou seja, rumo a um ensino que se faz a partir da crítica e da recusa ao ensino “bancário” e que toma por pressuposto adotar condições de verdadeira aprendizagem para que os educandos se transformem em “[...] reais sujeitos da construção e da reconstrução do saber ensinado, ao lado do educador, igualmente sujeito em processo” (FREIRE, 1996, p. 26).

O pedagogo deve investir, lançando mão do que chamamos várias vezes de uma salutar ‘obstinação didática’, na prospecção incansável de formulações que permitam apreender aquilo que se quer transmitir. Ele deve inventar permanentemente novas situações de aprendizagem, investir sua energia na busca de demonstrações mais eficazes e de mediações que permitam ao aluno ter acesso à cultura que o livrará de seus preconceitos e que lhe oferecerá os meios de se pensar no mundo. É por isso que seu trabalho parece uma espécie de ‘caça ao aleatório’, uma procura sistemática dos obstáculos que impedem de aprender e um esforço constante para trabalhar os saberes e trabalhar sobre os saberes até se conseguir superar tais obstáculos (MEIRIEU, 2002, p. 123).

Finalizando esta discussão rememoramos a necessidade que temos em construirmos a escola da diversidade, ou seja, a que possua uma proposta inclusiva tanto para alunos e professores pela via da articulação dos saberes-fazeres de todos os profissionais que direta ou indiretamente estão implicados no ato educativo. Neste mesmo movimento pensamos que ações colaborativas na escola trazem benefícios para alunos e professores, uma vez que aos educandos configuram-se oportunidades para apropriação dos conhecimentos acumulados ao passo que aos professores são gestadas possibilidades para aperfeiçoamento docente, pois na medida em que a formação continuada se processa como alicerce do trabalho pedagógico os profissionais vão se assumindo como críticos, reflexivos e autores do fenômeno inclusivo educacional.

[...] se quisermos que a formação de professores tenha um impacto significativo sobre seu pensamento e a sua prática, ela tem de estar intimamente ligada ao aperfeiçoamento da escola. Isto implica mudanças no local de trabalho e na forma como se organiza a formação do pessoal nas escolas (AINSCOW, 1996, p.26).

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Assim sendo apostando no investimento da formação docente e na valorização do magistério que poderemos vislumbrar no contexto das escolas o esboço feito por Góes (2002) da perspectiva de educador que gostaríamos de ter, ou seja, um educador que fosse:

[...] orientado prospectivamente, atento à criança, às suas dificuldades e, sobretudo, às suas potencialidades, que se configuram na relação entre a plasticidade humana e as ações do grupo social. É aquele que é capaz de analisar e explorar recursos especiais e de promover caminhos alternativos, que considera o educando como participante de outros espaços do cotidiano, além do escolar, que lhe apresenta desafios na direção de novos objetivos, que o considera integralmente, sem se centrar no não, na deficiência (GÓES, apud FERREIRA, 2005, p. 151-152).

Foi apostando na capacidade que temos em aprender com nossos pares, de enfrentarmos de pé os desafios da vida e de acreditarmos na educabilidade humana, mesmo quando os desafios enfrentados nos fizessem pensar o contrário, que desenvolvemos este trabalho no cotidiano de uma escola pública de ensino fundamental repleta de diversidades e adversidades, mas cientes que todo homem, toda criança é educável (Meirieu, 2005), por isso vale a pena incluir e lutar sistematicamente contra processos de inclusão e depreciação da essência e dos valores humanos. Esta foi nossa aposta e o desejo que nos moveu participar deste curso de especialização e de desenvolvimento deste estudo.

Referências

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A “evasão” da família no espaço escolar

Andréa Zamprogno CaserDenise Pinheiro Quadros

Vânia Neves M. EspíndulaVivian Ferrari Bremenkamp

Introdução

O objetivo do presente trabalho evidencia-se na falta de participação familiar no contexto escolar e nas conseqüências no processo de busca pela qualidade da educação. Um distanciamento que prejudica não apenas o desempenho dos alunos como também influencia nas relações entre os professores e a família.

Estudos na área de educação apontam para a necessidade de interação que a família precisa ter com a escola e vice-versa, contribuindo para o incentivo do hábito de ler, escrever e o ato de acompanhar o que os alunos estão estudando. Em uma ação conjunta entre pais/escola/comunidade deve ser valorizada não apenas o ingresso na escola, assim como também o regresso (em caso de evasão), a permanência e o sucesso, concretizando-se nessas relações que misturam não apenas afetividade, mas na valorização das crianças/jovens como seres únicos (individuais pelas suas características e necessidades).

A responsabilidade social e legislativa da família x escola

O dever da família com o processo de escolaridade e a importância da sua presença no contexto escolar é publicamente reconhecido na legislação nacional e nas diretrizes do Ministério da Educação aprovadas no decorrer dos anos 90, como podemos citar:

• LeideDiretrizeseBasesdaEducaçãoNacional,quetratadosPrincípiose Fins da Educação Nacional em seu art. 2º estabelece que:A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de

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liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Ou seja, a família e a escola são co-responsáveis pelo desenvolvimento do educando, devendo primar por isso no processo de compartilhamento de responsabilidades e tomada de decisões. A escola pode efetivar esse movimento de aproximação e parceria apresentando os profissionais e projetos desenvolvidos no âmbito escolar aos pais, abrir espaço para que haja uma discussão sobre a efetivação desses projetos e mostrar-se disponível, mesmo quando não houver possibilidade de horários determinados.

• EstatutodaCriançaedoAdolescente(Lei8069/90),artigo4ºe55º,apresenta que:Art. 4º - É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.Parágrafo único: a garantia de prioridade compreende:a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;b) precedência de atendimento nos serviços público ou de relevância pública;c) preferência na formulação e execução das políticas sociais públicas;d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a

infância e à juventude.Art. 55° - Os pais têm obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino.

• PolíticaNacionaldeEducaçãoEspecial,queadotacomoumadesuasdiretrizes gerais:Mecanismos que oportunizem a participação efetiva da família no desenvolvimento global do aluno. E ainda, conscientiza e compromete-se com os segmentos sociais, a comunidade escolar, a família e o próprio portador de necessidades especiais, na defesa de seus direitos e deveres. Entre os objetivos específicos, destacam-se o envolvimento familiar e da comunidade no processo de desenvolvimento da personalidade do educando (PCN, 1998).

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Registra-se ainda a iniciativa do MEC que instituiu a data de 24 de abril como o Dia Nacional da Família na Escola, assim como a publicação de cartilhas com o objetivo de aproximar as famílias no contexto escolar. A Organização das Nações Unidas, há mais de uma década, trouxe o tema para reflexão ao instituir o Ano Internacional da Família.

Estabelecendo um diálogo com a teoria

Ressalta-se que a estrutura familiar dos tempos atuais é bem diferente de décadas atrás, conseqüentemente as necessidades dessa família e principalmente dos(as) filhos(as) também. Não podemos pensar na criança/adolescente como um ser estático; a estrutura familiar mudou; a criança/adolescente não é aquela pertencente apenas a uma família monogâmica tradicional, onde havia o controle excessivo das suas vontades e necessidades. Houve uma transformação social e à escola restou a responsabilidade de assimilar e lidar com o novo ser que se apresentava cheio de conflitos e diversidade: o aluno.

Portanto, a escola precisou rever e adequar-se aos novos conceitos, signi-ficados, experiências, conflitos, estabelecendo um espaço para fortalecimento do diálogo, da compreensão e trocas culturais de construção do saber e desen-volvimento para os envolvidos nesse processo.

A diversificação do núcleo familiar (para além do núcleo pais/filhos), sobretudo depois que a mulher deixou o lar e foi para o mercado de trabalho, gerou uma participação maior do professor na educação não-escolar do estudante, em que ele substitui os pais em determinadas tarefas. Tal exigência levou a uma queixa geral dos professores de sobrecarga de trabalho.

Através dos teóricos estudados na área da educação como Paro; Acúrcio, Carvalho, entre outros; revelou-se que quando há necessidade da representação de um responsável pelo filho(a), essa cobrança recai sobre a mãe, mesmo que esta esteja tão atarefada quanto o pai, evidenciando diante de tal postura, um preconceito relacionado ao gênero em questão: o papel da mulher na família e na sociedade. Como destaca Carvalho (2004):

Na conversa entre as vizinhas na cartilha elaborada pelos profissionais da escola, a obrigação de acompanhar o dever de casa, de estimular os estudos e de dar afeto ao filho é só da mãe, mesmo se esta trabalha o dia inteiro, como

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o pai. Ser analfabeta não é desculpa: a mãe pode sentar junto do filho e ver o dever de casa. O pai está ausente da educação no espaço do lar. Porém, no mundo público, na reunião na escola, é o pai quem fala. Essa cartilha reproduz a separação público/masculino-privado/feminino e a dicotomia dos papéis sexuais e de gênero em casa e na escola (p.55).

E cabe questionarmos, que reflexos essa relação que aqui se estabelece, passa de exemplo aos nossos alunos.

É importante ressaltar que cada um deles (família: pai/mãe/responsável e a escola), tem a sua função definida na sociedade e que a integração desses papéis solidifica o processo de humanização.

Em entrevista exclusiva à Atividades & Experiências, Isabel Parolin afirma que:

Família e escola são instituições distintas, que têm objetivos semelhantes, pautas de desempenho próximas, mas que devem ser vistas de maneira diferente, desempenhando seus papéis sociais de forma diferente. (...) À escola cabe determinar suas funções específicas e auxiliar a família nesse entendimento. (...) A atuação de pais e professores jamais deve ser confundida (www.educacional.com.br/revista/0204/default.asp).

Em artigo no site do Senador Cristovam Buarque, do PDT, que aborda a educação e a participação da família, um estudo realizado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que reúne 30 países, aponta que:

Um dos fatores responsáveis pelo baixo desempenho acadêmico dos estudantes brasileiros é a pouca participação dos pais na vida escolar dos filhos. (...) De acordo com o trabalho, existe uma relação direta entre a participação da família e os bons resultados escolares. Os estudantes dos países asiáticos como Japão e Coréia do Sul, por exemplo, aonde as mães chegam a fazer cursos para ajudar os filhos, estão entre os melhores do mundo (www.cristovam.org.br).

Não basta apenas clamarmos pela participação da família. A escola precisa achar meios de atrair realmente essa participação se abstendo de preconceitos

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arraigados na sociedade e na própria instituição educacional e principalmente refletir sobre qual o objetivo que deseja alcançar com a participação efetiva dos pais. O grupo escolar está aberto para debates? Os(as) professores(as) se interessariam em estar sanando eventuais dúvidas dos “leigos pais” sobre assuntos no âmbito pedagógico?

Segundo Acúrcio (2004):

A parceria se estabelece uma relação entre iguais, entre pares. Havendo subordinação, submissão, é impossível falar de parceria. Democratizar relações é o caminho. O respeito pelos conhecimentos e valores que as famílias possuem, evitando qualquer tipo de preconceito e favorecendo a participação dos componentes da instituição familiar em diferentes oportunidades, estimulando ao diálogo com os pais e possibilitando-lhes, também, obter um ganho enquanto sujeitos interessados em evoluir e se aperfeiçoar e como seres humanos e cidadãos compromissados com a transformação da realidade. A escola precisa ser o espaço de formação/preparação das novas gerações (p. 65).

Conforme nos faz refletir Carvalho (2004):

Quando se fala na parceria escola-família, é importante considerar: as relações de poder variáveis e de mão dupla, relações de classe, raça/etnia, gênero e idade que, combinadas, estruturam as interações entre essas instituições e seus agentes; a diversidade de arranjos familiares e as desvantagens materiais e culturais de uma parte considerável das famílias e as relações de gênero que estruturam as relações e a divisão de trabalho em casa e na escola (p. 42).

Destaca-se ainda o envolvimento do gestor educacional, abrindo situações de diálogo, de indagações entre os atores dessa relação, buscando uma contribuição além da esperada, por conta do aprendizado contínuo que será possibilitado pelas reflexões e sugestões apresentadas por esse grupo. Servindo como base, Acúrcio (2004) afirma:

Não ter dúvida que o diretor deve gastar parte do seu tempo para aprimorar a relação entre família e escola. Há muito que aprender, de ambos os lados, para que está relação tenha resultados que, de fato, contribuam para a qualidade da educação (p. 65).

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A pesquisa realizada: concepções metodológicas e práticas

A pesquisa envolveu quatro escolas da rede Municipal de Vitória, com a participação de pais, no período de novembro 2007 a março 2008. Foi utilizada uma amostra probabilística dos pais, representados por um percentual de 10% do universo pesquisado. Desse modo, a metodologia utilizada foi à pesquisa-ação que se configura como:

(...) tipo de pesquisa social e com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes das situações ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo e participativo (THIOLLENT, 1985, p. 35).

Realizaram-se levantamentos de dados qualitativos e a coleta de dados deu-se através de entrevista aplicada em formato de questionário preenchido pela família dos alunos. Analisaram-se os fatores que contribuem para o distanciamento da família no contexto escolar visando resgatar a participação destes através de ações efetivas.

Conforme Moysés “a análise de dados qualitativos é um enfoque que permite fazer um enlace constante e permanente entre a teoria e a prática, durante o próprio desenrolar do trabalho” (1994, p.12).

Acúrcio (2004) aponta que:

Em algumas situações, a melhor maneira de trabalhar a relação com a família é cuidar da relação com os professores e demais funcionários. É preciso educá-los para essa relação. Em todos os lugares, em todos os momentos, da escola, por meio das pessoas que nela trabalham e dos instrumentos de que se utilizam, está sendo vista e avaliada. São ações, instrumentos, que podem trazer ou afastar a família da escola (p. 65).

Nesse sentido, retifica-se que como se trata de um processo onde as partes envolvidas estão se integrando para um bem comum, vale a princípio, realizar técnica que privilegie a conscientização para essa relação.

Segundo Michelat (1987):

Numa pesquisa qualitativa, só um pequeno número de pessoas é interrogado. São escolhidas em função de critérios que nada têm de probabilistas e não

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constituem de modo algum uma amostra representativa no sentido estatístico. É, sobretudo, importante escolher indivíduos os mais diversos possíveis. E, na verdade, (...) é o indivíduo que é considerado como representativo pelo fato de ser quem detém uma imagem, particular é verdade, da cultura (ou das culturas) à qual pertence. Tenta-se aprender o sistema, presente de um modo ou de outro em todos os indivíduos da amostra, utilizando as particularidades das experiências sociais dos indivíduos enquanto reveladores da cultura tal como é vivida (p.199).

O que se busca, é a revelação dos motivos individuais de cada família estar ou se fazer afastada da escola. São realidades diferentes que precisam ser analisadas na sua exclusividade.

Entendendo e analisando os dados coletados

O presente estudo se deu por meio do envolvimento de quatro Unidades de Ensino, da Prefeitura Municipal de Vitória - Espírito Santo, que atendem alunos nos turnos matutino, vespertino e, em algumas delas também o noturno. Estão localizadas nas várias regiões administrativas de Vitória atendendo, desse modo, alunos de diferentes classes econômicas e sociais.

A pesquisa apontou que em relação a situações em que as famílias comparecem na escola 88 (24%) participam quando convocados, 76 (21%) participam quando convidados para eventos escolares, 41 (11%) participam por iniciativa própria, 92 (25%) dos pais pesquisados responderam que participam em reuniões de pais/plantão de atendimento, 29 (8%) participam apenas em reuniões do Conselho de Escola, 41 (11%) se fazem presente na eleição de Diretor e/ou conselheiro do Conselho de Escola, 1 (0%) Outros e 1 (0%) Não respondeu como participam.

Quando questionados por que não participam da escola, foi constatado que 33 (26%) dos pais responderam que é por falta de tempo, 37 (29%) não responderam por que participam, 31 (24%) expõe que um dos motivos é o horário incompatível com a sua disponibilidade, 8 (6%) alegaram não terem sido solicitados, 3 (2%) acreditam que cabe a escola a educação geral de seu filho, 3 (2%) reclamaram sobre o tempo despendido para essas reuniões, 1 (1%) alegaram medo de ser constrangido por falta de escolaridade e 1 (1%) por cansaço.

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Algumas justificativas apontadas pelos pais entrevistados são relevantes para futuras reflexões. Informam que participam das seguintes formas: “Quando pode está sempre presente”; “comparece”; “não participo quando não recebo bilhete com antecedência”; “sempre participo na medida do possível”; “participo sempre que julgo necessário”; “procura participar o mais que pode na vida escolar”; “participo quando posso falar só do filho”; “não participo, pois ocorre conflito de horário com o trabalho”.

Ao analisar os dados levantados na pesquisa, percebemos que os pais gostariam de estar mais presentes no cotidiano escolar, não se opondo a tal parceria, mas que alguns fatores impedem a efetivação desta participação. Conforme gráfico 1: a falta de tempo e horário não atende, foram os mais relevantes.

Segundo Paro (2000):

As condições de vida da população, enquanto fator determinante da baixa participação dos usuários da escola pública, se mostram tanto mais sérias e de difícil solução quando se atenta para o fato de que este é um problema social, cuja solução definitiva escapa às medidas que se podem tomar no âmbito da unidade escolar. Entretanto, parece que isto não deve ser motivo para se proceder de forma a ignorar completamente providências que a escola pode tomar no sentido, não se superar os problemas, obviamente, mas de contribuir para a diminuição de seus efeitos sobre a participação na escola (p. 321).

Evidencia-se, portanto que a escola deve superar essas pequenas dificuldades que se estabelecem pela condição profissional ou financeira da família, através de novas propostas para efetivar-se o diálogo e a aproximação com a mesma. Repensar a possibilidade de realizar reuniões em grupos menores ou individuais, sem deixar de considerar as ‘propostas’ feitas por todas as famílias participantes das reuniões; criar um canal mais direto e aberto para esse diálogo/comunicação da família com a escola: disponibilizar e-mail da instituição, no site da escola disponibilizar espaço para sugestões, troca de opiniões; oferecer um número telefônico que a família possa ter acesso a um serviço de atendimento ao cliente como um ‘sac escolar’. Lembremos que a condição financeira das famílias de escola pública configura-se na classe baixa, baixa/média, média/média e média/alta. Diante dessa variedade a escola deve preparar-se para atender aos mais diversos níveis de dificuldade no que diz respeito ao diálogo e interação familiar.

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Propiciar também oficinas ou palestras na área pedagógica (para esclarecer, suprir dúvidas), realizando antes uma pesquisa de campo buscando verificar qual o nível de interesse da família em participar dessas oficinas/palestras, sugerir uma gincana familiar (com a participação de pais/mães/responsáveis/filhos e irmãos(as), seria a princípio uma boa forma de aproximação/interação.

Educação e família: uma união fundamental

A integração da comunidade com a escola tem sido objeto de preocupação de vários segmentos da sociedade. O fato de a escola estar à procura da participação efetiva dos pais não significa abdicar de sua responsabilidade, mas sim retomar àquela que cabia a eles. Até porque a indisciplina que se configura no âmbito escolar e social das crianças/adolescentes/jovens de hoje, nasce da permissividade familiar que se apresenta atualmente. A família na realidade não cobra mais nada de substancial de seus filhos, por vários motivos: por falta de tempo, por não querer renunciar ao momento do futebol na TV, jornal ou novelas, ou pelo simples “cansaço inerente aos mortais”. Assim as crianças/adolescentes/jovens se emancipam com maior rapidez e a escola por sua vez não consegue acompanhar essas transformações advindas desse processo precoce. Sobre isso Sacristan (1999) cita Ariès e Duby (1989) que se posicionam:

Os pais são agora mais permissivos, deve-se em parte a que já não tem muito o que impor a seus filhos, já que a aprendizagem da vida em sociedade foi delegada à escola, aos pares e a diferentes redes de comunicação. Não controlando o tempo de seus filhos, os pais tampouco controlam tanto sua vida. Com a transferência de funções educativas para a escola, a criança experimenta na vida pública escolar sua formação e preparação para a vida, gerando-se para os escolares um espaço privado dentro do novo espaço público escolar, fora do controle direto da família (p. 219).

Vale a pena rever também os conceitos de desempenho que a escola e a família cobram dos alunos, uma vez que para este a palavra ‘desempenho’ está intrinsecamente ligada aos conhecimentos adquiridos e avaliados pelos métodos convencionais (provas, trabalhos de pesquisas escolares, vestibulares, provões, entre outros). Concordamos que há a necessidade de se avaliar pelos

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métodos convencionais, mas o aprendizado também deve se efetivar no âmbito histórico e cultural desses alunos, levando-os a refletir sobre o seu papel como cidadão digno de direitos e deveres na sociedade.

A escola precisa estimular a construção de valores éticos, motivá-los e construir argumentos racionais e substanciais para incentivar o aluno a participar, assim como também envolver os pais mostrando que apesar das limitações de conhecimentos ou leitura que estes possam ter, o incentivo em casa ao filho é sempre bem vindo. Separar um pequeno tempo para ver o que o(a) filho(a) produziu durante as aulas; pedir para que leiam em voz alta um texto que foi apresentado à eles nesse dia; convidá-lo para passear em bibliotecas, livrarias da cidade; estimulá-lo a sempre estar lendo os cartazes na rua, fazendo as devidas interpretações; assistir os jornais locais e nacionais juntos e construírem comentários acerca das matérias veiculadas. são ações que contribuem para a interação da família com a escola no processo de busca pela qualidade da educação.

No que concerne à participação presencial, a escola poderá facilitar com as seguintes ações: • Tomadadeconsciênciaporpartedoseducadores,daimportância

da participação dos pais na vida escolar de seus filhos e da necessária continuidade entre educação familiar e escolar.

• Desenvolverumavisãopositivadoseducadoresarespeitodaimpor-tância da escola para a comunidade.

• Levarospaisdealunoseacomunidadeemgeralateremumaconcep-ção positiva da escola.

Ainda em relação à pesquisa realizada, quando os pais foram questionados sobre o que a escola deve propor para que a participação dos mesmos fosse mais efetiva, responderam que gostariam de mais ações de interação entre pais e filhos; melhor horário para as reuniões/eventos e mais passeios, cursos, encontros, confraternizações. Consideram as atividades propostas pelas as escolas válidas, porém frisaram a dificuldade em relação ao tempo.

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Considerações finais

Considerar que a escola de hoje em nada evoluiu com relação a escola de trinta anos atrás é um equívoco, até porque, hoje os profissionais participam mais efetivamente de formações continuadas, existem trabalhos interessantes sobre como avaliar a qualidade da escola e a participação das famílias. O que se verifica é que os alunos dentro de suas necessidades sofreram grandes transformações, assim como as famílias; portanto, há que rever e buscar antenar-se as novas exigências dessa classe que se apresenta precoce, com críticas, incertezas e principalmente desafiadora.

É interessante que a escola se apresente atrativa, não apenas para o aluno em questão, mas também para família. Há um esgotamento por parte dos professores, por conta de arcarem não apenas com a responsabilidade de “serem professores”, mas na maioria dos casos, fazerem papel de pais, mães, avós e avôs. Contudo, concordam, que a escola com o auxílio de toda a equipe, deve buscar maneiras de interagir/aproximar-se da família para que haja estreitamento do laço de colaboração entre as partes, propiciando as participações coletivas, escolhendo em consonância com os demais atores desse processo as instâncias colegiadas de caráter deliberativo, implementando o processo de escolha de dirigentes escolares, construindo em parceria o projeto político pedagógico e definindo, com transparência, a aplicação dos recursos financeiros liberados pelo poder público.

A divulgação da legislação vigente e as políticas governamentais propostas para a educação também devem ser trazidas à luz para que contemplem grupos de discussões em prol da transformação do sistema autoritário atual.

A equipe escolar deve ter em mente que a responsabilidade de educar e formar não estão apenas relacionados aos alunos que recebe, mas também devem ser concedidos as famílias e indivíduos que fazem parte desta comunidade.

Segundo Paro (1995):

A situação atual do ensino público brasileiro “exige movimentos de pressão em todos os níveis e instâncias da sociedade civil”, ocupando a participação dos usuários na unidade escolar apenas uma dessas instâncias ou níveis. O fato de ser um espaço muito importante não pode levar a vê-lo como único (p. 331).

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Há de se realizar uma transformação nas formas de diálogo dos professores com os pais, como também deve sofrer uma revisão para que qualquer fala arrogante seja suprimida. A linguagem utilizada deve ser simples, sem jargões pedagógicos e o processo deve ser realizado como forma de ‘produção em parceria’ (trabalhar juntos e não trabalhar pelo outro).

Nas entrevistas aplicadas verificamos que os pais das unidades de ensino pesquisadas se interessam muito nessa aproximação e querem se fazer presentes e atuantes, mas que ocorrem impedimentos que estão fora do controle deles, tais como: conflitos de horários de trabalho; reuniões em horários difíceis, cansaço, etc.

E, então, como envolver a família? Sobre este aspecto, Paro (1987, p. 53) sugere:

- patrocinar a efetiva participação dos pais e alunos nas reuniões mensais dos segmentos representativos do Conselho de Escola;

- garantia em lei (Constituição), isenção de horas de trabalho no emprego que facilitasse a participação dos pais na escola pública.

Na pesquisa realizada nas quatro unidades, os pais propõem às escolas para melhorar a sua participação: • melhorarohoráriodeatendimentodasreuniões(ànoite,aossábados,

individualmente quando o pai não conseguir comparecer à reunião no horário pré- estabelecido);

• realizareventos/açõesdeinteraçãopaisefilhos; • programarcalendáriodereuniões/eventos; • congressodepais.

Que as famílias, a escola, enfim todos os cidadãos possam refletir seus papeis e buscarem ações para alcançarem uma escola pública de qualidade, potencializando assim a população de condições mínimas para a vida melhor.

Para que possamos conceber uma gestão democrática nas escolas públicas devemos antemão buscar a ruptura dos paradigmas impostos ou implícitos na comunicação entre a escola, a família e a comunidade, respeitando as peculiaridades de cada unidade de ensino e da própria comunidade a que pertence e possibilitando a consolidação dos espaços de discussões coletivos e favorecendo a participação de todos.

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179DEMOCraCIA, FORMAçãO E GESTãO ESCOLAR

Referências

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181DEMOCraCIA, FORMAçãO E GESTãO ESCOLAR

Ambiente escolar democrático combatendo a indisciplina

Grace Luz DiasMaria do Carmo Pereira Butkowsky

Maria José Gomes de SouzaMarilia Lucia Pansini

Introdução

A indisciplina escolar tem sido motivo de queixas por parte dos professores, principalmente daqueles que atuam na Educação Básica. Os alunos estão agitados, inquietos, irritadiços e impacientes. Não demonstram bons hábitos e atitudes, saem da aula sem permissão ou sem comunicar. Algumas vezes depredam o patrimônio escolar, riscam os carros estacionados em frente à escola e respondem mal aos colegas e professores. São essas algumas dentre muitas das queixas dos professores, que conseqüentemente, ocasionam conflitos na sala de aula.

Dessa forma, a manutenção da disciplina tornou-se um desafio individual e coletivo para todos aqueles que se acham envolvidos com o processo educacional. A partir desta constatação, apresenta-se neste estudo a seguinte situação-problema: Que ações podem promover um ambiente escolar democrático nas séries finais do Ensino Fundamental, envolvendo toda a comunidade escolar a fim de que todos se sintam comprometidos e responsáveis pela construção de uma disciplina consciente e desejada, podendo com isso minimizar os conflitos que surgem em função da indisciplina escolar?

Partimos de uma reflexão que toma a realidade e os conhecimentos acerca da indisciplina escolar como ponto de partida. Procuramos apresentar dados empíricos que possam subsidiar o quanto um ambiente escolar democrático contribui diretamente e indiretamente para a promoção de benefícios sociais, educativos e interpessoais, favorecendo o desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem, e acima de tudo, “[...] na construção de uma disciplina consciente e interativa, marcada por participação, respeito,

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responsabilidade, construção do conhecimento, formação do caráter e da cidadania” (VASCONCELLOS, 2004, p. 131).

Para alcançar os objetivos propostos neste artigo foram utilizados instrumentos como observação da rotina escolar, entrevista á professores e pedagogos e questionário á alunos realizados nas quatro escolas envolvidas na pesquisa. Os registros pertencem a cada escola e os resultados foram apresentados citando as escolas como Escola A, B, C e D. A análise e interpretação dos dados foram feitas a partir das respostas às questões obtidas através do uso de tais instrumentos dentro e fora da sala de aula.

A pesquisa foi realizada em quatro escolas públicas de Ensino Fundamental do município de Vila Velha/ES. Os dados foram coletados no mês de maio de 2008, nas turmas de 5ª a 8ª séries das escolas, com alunos na faixa etária entre 11 e 17 anos, oriundos das classes populares, e professores dessas escolas públicas.

As diferentes formas de ver a indisciplina no sistema educacional

Podemos partir de uma concepção acerca das finalidades da escola a partir de um pensamento que nos ainda é bastante familiar. O conceito de disciplina está associado à tirania, à opressão e ao enquadramento. Sendo assim, “[...] apresentar condutas indisciplinadas pode ser entendida como uma virtude: desafiar os padrões vigentes, se opor à tirania muitas vezes presente no cotidiano escolar” (REGO, 1996, p. 85).

No entanto, a indisciplina manifestada por um indivíduo ou grupo, normalmente, é “[...] compreendida como um comportamento inadequado, um sinal de rebeldia, intransigência, desacato, traduzida muitas vezes como falta de educação ou de respeito pelas autoridades, na bagunça ou agitação motora” (REGO, 1996, p.83).

A autoridade e o poder são condições da relação pedagógica. Portanto, é necessário que os alunos reconheçam o professor como autoridade, alguém que deve ser obedecido. “Não uma autoridade atuando por proibições e constrangimentos severos, mas que ressalte do prestígio que, pelo seu exemplo, pelo seu ensinamento e, sobretudo, pela sua atitude, ele tiver sabido adquirir junto dos seus alunos” (DOTTRENS, 1974, p.39). Nesta perspectiva, pela sua conduta, o professor deve ser um exemplo, para que possa exercer, sem autoritarismo, a sua

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função educativa. Deve proporcionar, na sala de aula, um clima de participação e respeito, sem esquecer que o aluno é um indivíduo com direito a ter dúvidas, a ter dificuldades, a ter opiniões, a colaborar e a ser jovem.

Antigamente, segundo nos lembra Foucault (2003), corrigia-se fisicamente, através de palmatória. Mas hoje, isso não é aceitável. Como diz Aquino (1996, p. 9) “[...], estamos em outro tempo e precisamos estabelecer outras relações”.

A escola, assim como a sociedade, é um texto escrito por várias mãos e sua leitura pressupõe o entendimento não apenas de suas conexões com a sociedade, mas também de seu interior. Para a escola concretizar a construção de seu ideal precisa ter clareza do seu aluno, do ser cidadão que deseja alicerçar-se. Precisa estar organizada em princípios democráticos, valorizar o interativo e, por fim, precisa contar com profissionais que priorizem as orientações teórico-metodológicas de construção coletiva.

A função da escola é formar cidadãos críticos e politizados. Que coloquem a teoria (conhecimento-sistematizado) em prática. Nesse sentido, a escola passa a ser potencialmente um lugar gênese de novas relações com repercussão tanto individual quanto coletiva. Para obter essa função faz-se necessário compromisso dos professores, da família, da escola, enfim, de todos os envolvidos nesse processo.

Compreendemos a importância de se resolverem os conflitos que surgem em função da indisciplina de forma cooperativa. Permitir-se-á, assim, uma ação pedagógica orientada no sentido do desenvolvimento pessoal e social dos alunos. Sugerimos que o conflito seja encarado como um problema a resolver, objetivando satisfazer as partes, estimulando o desenvolvimento de formas de comunicação que favoreçam relações de confiança mútua. Aquino (1996, p. 53) mostra a importância do diálogo na resolução desse problema, afirmando que:

Esta guinada na compreensão e no manejo disciplinares vai requerer, enfim, uma conduta dialógica por parte do educador, pois é ele quem inaugura a intervenção pedagógica. E não há a possibilidade de ação docente sem agenciamentos de diferentes tipos, uma vez que não se trata de um trabalho solitário; muito pelo contrário. Em suma, o ofício docente exige negociação constante, quer com relação às estratégias de ensino ou de avaliação, quer com relação aos objetivos e até mesmo aos conteúdos preconizados – sempre com vistas à flexibilização das delegações institucionais e das formas relacionais.

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Haidt (2001) reforça a importância de uma atitude dialógica, que favoreça o intercâmbio de informações e experiências e, assim, tanto o professor como o aluno são respeitados. E ninguém falou melhor em diálogo do que Freire (1999) que considerava que esse é o procedimento principal para uma educação de sucesso, sendo uma forma de manter a consciência transitiva crítica, entendendo-a como a consciência articulada com a práxis.

A satisfação dos atores da escola envolvidos na pesquisa, em especial dos alunos, ao serem ouvidos, atestam a importância do diálogo nas relações escolares.

Apresentando os dados da pesquisa

Apresentamos a seguir os resultados da pesquisa realizada através de observações e da aplicação de entrevista s envolvendo 10 professores, 03 pedagogos e 100 alunos das turmas de 5ª a 8ª séries, de 04 escolas públicas de Vila Velha/ES. Para tanto, foi elaborado um roteiro para a pesquis. Apresentamos a entrevista feita com os professores e pedagogos e em seguida o questionário aplicado aos alunos.

Na questão 01 dirigida a pedagogos e professores: “O que você entende por indisciplina escolar?”, conforme se observa no quadro a seguir, identificou-se nas respostas dos professores e pedagogos que eles efetuam relações com “comportamentos inadequados” como definição para a indisciplina. Entretanto, é compreendida, principalmente, como desrespeito aos outros (professores e colegas) e às regras. O fato de professores e pedagogos apontarem diferentes atitudes dos alunos como definição para a indisciplina confirma: 1º - a ausência de clareza e consenso a respeito do termo; e 2º - que o aluno, na maioria das vezes, é responsabilizado pelos atos indisciplinados.

Escola A- Falta de educação;- Não estudar;- Não respeitar os

professores e os colegas de turma;

- Parte também dos pais.

Escola B- Brigas;- Desrespeito ao

regulamento da escola;

- Sair da disciplina;- Desrespeito aos

outros.

Escola C- Infringir regras;- Questionamentos

quanto às regras impostas.

Escola D- Bagunça;- Atrapalhar

as aulas;- Desatenção;- Desrespeito.

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Nos principais argumentos citados pelos professores e pedagogos acerca dos sentidos atribuídos para a indisciplina escolar, que compuseram a amostra desta investigação, é possível apreender a relação entre indisciplina e o desrespeito, o descumprimento das regras e comportamentos dos alunos que implicam em não estudar, em brigar e desorganizar o espaço da sala de aula. Nesse sentido, Chagas (2001) aponta que a indisciplina no meio educacional é vista como a manifestação de um aluno com um comportamento inadequado, um sinal de rebeldia, intransigência, desacato, traduzido na falta de educação ou desrespeito pelas regras estabelecidas, na bagunça, agitação ou desinteresse.

Evidenciamos que os termos disciplina e indisciplina são considerados contrários pelos entrevistados, pois quando definem indisciplina citam comportamentos que prejudicam o aprendizado, como bagunçar e atrapalhar a aula. Afirmam que está relacionada ao comportamento do aluno, como respeito, por exemplo. Assim, indisciplinado é tido como aquele que se insurge contra a disciplina.

Quando indagados sobre a questão 02 “Quais as causas dos atos indisciplinados dos alunos?”, os professores e pedagogos entrevistados identificaram as manifestações de indisciplina relacionadas a alguns fatores, como por exemplo: 1º - Indisciplina focalizada nos aspectos relacionados ao aluno: falta de vontade de estudar e 2º - Indisciplina focalizada a partir de questões familiares: falha na educação recebida.

Escola A- Falta de orientação

dos pais;- Não quer aprender;- Não sabem se

relacionar

Escola B- Violência em casa;- Não estão

acostumados a regras;

- Não tem respeito por autoridades.

Escola C- Questionamentos

quanto às regras impostas.

- Não conseguem se concentrar.

- Falta de interesse

Escola D- Os pais não

acompanham- não tem bom

exemplo em casa;- Problemas de

relacionamento;- Insatisfação.- Não gostam de

regras;

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186 ESCOLA DE GESTORES DA EDUCAçãO BáSICA

Rego (1996) esclarece que é comum atribuir o comportamento indisciplinado do aluno à educação recebida na família e à dissolução do modelo nuclear familiar, como se a responsabilidade pelo comportamento do aluno na escola fosse única e exclusivamente da família. Nesse sentido, é nítido que a escola se isenta de uma revisão interna, já que o problema é descolado para fora de seu domínio.

No decorrer da pesquisa observamos em reuniões escolares com os professores que tentativas de estabelecer a parcela de responsabilidade do professor no processo de indisciplina escolar gera conflito e debate improdutivo. Mesmo quando um professor aponta uma atitude de professor que gera indisciplina, refere-se á colegas, não á ele mesmo. O que acaba por também gerar conflitos.

Nas respostas dos professores e pedagogos à questão 03: “Você acredita que a indisciplina e as dificuldades de aprendizagem são termos considerados causa e efeito, ou seja, se o aluno é indisciplinado conseqüentemente, ele apresenta dificuldade de aprendizagem?”, destaca-se uma relação de causa e efeito entre indisciplina e dificuldades de aprendizagem. O aluno indisciplinado é apontado como aquele que terá maiores dificuldades em aprender e concentrar-se em suas atividades. Há também a consideração da indisciplina como um comportamento independente da aprendizagem. No quadro a seguir estão explicitadas as principais citações dos professores e pedagogos em relação à indisciplina e as dificuldades de aprendizagem.

Escola A- Não aprende;- Nem sempre

aprende;- Perde a explicação;- Não presta a

atenção.

Escola B- Depende da

vontade do aluno; o bagunceiro não entende porque não quer;

- Não há relação entre indisciplina e aprendizado (idéia ligada à capacidade do aluno);

- Relativo, mas muitas vezes tem a ver.

Escola C- O aluno vai ter

mais dificuldades;- O aluno que não

tem disciplina pode ir bem ou não, geralmente ele vai mal;

- Tem aluno que não consegue se concentrar em sala, mas em casa sim;

- Ele vai bem quando é pressionado;

- Quando está indo mal, pressionar não é a melhor solução.

Escola D- As vezes a

indisciplina de alguns atrapalha a aprendizagem de toda turma;

- Não aprende;- Não presta atenção;

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187DEMOCraCIA, FORMAçãO E GESTãO ESCOLAR

Mais uma vez está lançada a responsabilidade sobre o aluno. Observa-se isto nas expressões: ‘depende da vontade do aluno’, ‘ o bagunceiro não aprende porque não quer’. Uma das expressões menciona que o aluno indisciplinado, além de prejudicar sua própria aprendizagem, atrapalha os colegas. Em algumas situações toda a turma.

No que se refere à questão 04: “Quais as medidas adotadas pela escola para resolver os problemas de indisciplina?” foi possível concluir, através das colocações dos professores e pedagogos, que as medidas tomadas pelas escolas ainda estão restritas a recursos coercitivos e à punição das manifestações dos alunos. São poucas as tentativas de se abrir o diálogo sobre tais manifestações e quais suas reais ligações com o contexto escolar ou com os procedimentos pedagógicos adotados. No entanto, alguns mencionaram conversas como uma das atitudes adotadas. O que nos remete á idéia de uma oportunidade do aluno colocar seus questionamentos relacionados ao seu envolvimento com problemas de indisciplina.

Diante de tal constatação, podemos afirmar que a indisciplina escolar desafia os profissionais da educação a refletir, propor e repensar as estratégias de ações pedagógicas. Na verdade, “[...] há que se trabalhar visando não mais um tipo ideal de homem, mas trabalhar tendo em vista o sentido da vida humana” (MEDINA, 2004, apud GENTILE, 2002, p. 16). Sentimos a veracidade dessas palavras quando observamos na colocação de professores e pedagogos a idéia de que nem sempre é conveniente a conversa com os pais de alguns alunos, por recear que tais pais possam disciplinar os filhos com violência física ou emocional.

Escola A- Auxílio da

diretora;- Conversas.

Escola B- Com auxílio

da diretora;- Assinatura de

termo;- Chamam os

pais;- Tarefas extra-

classe.

Escola C- Chama a orientadora ou a diretora;- Telefona para os pais;- Exige a assinatura do pai na

ocorrência;- Conversa com os alunos que não

cumprem as regras;- Tira o aluno da sala;- Às vezes não se toma nenhuma

atitude, pois os pais do aluno são agressivos com o mesmo.

Escola D- Auxílio da

diretora.- Bilhete para os

pais.

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188 ESCOLA DE GESTORES DA EDUCAçãO BáSICA

No questionário aplicado aos alunos foram usadas perguntas similares ás da entrevista com pedagogos e professores. Algumas delas iguais. Isto facilitou a análise dos dados e as comparações entre a maneira de cada um desse segmentos encarar a indisciplina, suas causas e conseqüências.

Nos dados coletados a partir de observações e o questionário aplicados aos alunos, encontramos similaridades e contradições em relação aos dados coletados a partir de pedagogos e professores.

Foi perguntado também ao aluno: “O que você entende por indisciplina escolar?” Destacamos algumas expressões dos alunos ao procurar definir indisciplina:

Bagunça, conversa, não cumprir as tarefas, não cumprir as regras da escola, falar muito alto, não respeitar os professores, jogar bolinha de papel nos colegas, ficar em pé, conversando. (ALUNO DA 5ª SÉRIE)

Turma que não está estudando bem, bagunceira, que tira nota baixa, não presta atenção na aula, não cumpre com as tarefas de sala de aula, conversa, não respeita o professor. (ALUNO DA 6ª SÉRIE)

Bagunça, coisa errada, responder às pessoas, falar palavrões, gritar, ficar levantando, esquecer materiais, tudo isso é indisciplina. (ALUNO DA 7ª SÉRIE)

É o comportamento ruim, não prestar atenção na aula, conversar, esquecer material, não participar das aulas, gritar em sala de aula, não respeitar as regras da escola, desobedecer ao professor fazendo bagunça. (ALUNO DA 8 ª SÉRIE)

Podemos observar que os alunos associam a indisciplina a comportamentos inadequados e ao desrespeito aos outros (professores e colegas) e às regras. Também se conclui que o aluno é responsabilizado pelos atos indisciplinados.

Evidenciamos que os termos disciplina e indisciplina estão intimamente relacionados pelos alunos a transgressão e não transgressão das regras da escola. “[...] disciplinado é aquele que obedece, que cede, sem questionar às regras e preceitos vigentes em determinado contexto” (FERREIra, 1993, p. 463).

Algumas das expressões dos alunos indicam também que percebem como indisciplina os atos que cometem e por causa deles são chamados a atenção

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189DEMOCraCIA, FORMAçãO E GESTãO ESCOLAR

por coordenadores e professores, mesmo que sejam atos triviais como ficar em pé, conversar, esquecer material. Parecem não raciocinar sobre atos que demonstrem indisciplina, apropriam-se dos conceitos dos professores.

As respostas para a questão 02: “Quais as causas dos atos indisciplinados dos alunos?” Os alunos pesquisados identificaram as manifestações de indisciplina com focalização em sujeitos como, por exemplo: 1º - Indisciplina focada no aluno: falta de organização dos alunos e 2º - Indisciplina focada no professor: excesso de autoridade do professor.

Voltando a citar Aquino (1996, p. 9) “[...], estamos em outro tempo e precisamos estabelecer outras relações”. As respostas dos alunos denunciam a necessidade de profissionais que priorizem as orientações teórico-metodológicas de construção coletiva. Vejamos abaixo alguns depoimentos dos alunos:

Se tivesse mais jogos para montar, ao terminar o dever, eu iria para o cantinho para jogar ou ler, ou contar história. (ALUNO DA 5ª SÉRIE)

Vejo os meus amigos fazerem bagunça e me dá vontade de fazer também. Penso que isso é legal mesmo sabendo que é prejudicial para mim. Acho que deveríamos ter mais atividades no dia-a-dia, e ter alguém para vigiar a sala quando a professora sair. (ALUNO DA 6ª SÉRIE)

Os professores devem dar coisas mais interessantes. Fazer atividades mais longas para que os alunos fiquem mais tempo ocupados, e assim não façam bagunça. Isso é muito importante. (ALUNO DA 7ª SÉRIE)

Eu não gosto que a pessoa fique mandando em mim. A professora até que eu deixo, mas eu fico com raiva. Vou para casa com raiva porque os colegas implicam comigo, e no outro dia repito tudo o que eles fizeram comigo. (ALUNO DA 8ª SÉRIE)

À medida que apontam causa da indisciplina os alunos deixam escapar sugestões como atividades alternativas para alunos desocupados, aumento de propostas de atividades, atividades de interesse dos alunos, enfim, manter os alunos ocupados.

Um dos comentários de aluno chega a sugerir vigilância maior sobre os alunos. Fica evidente a necessidade do desenvolvimento da responsabilidade, autonomia e autoconfiança.

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Foi possível observar que quando o professor inicia a aula conversando com os alunos, mostrando interesse em ouvi-los e explicando o que farão durante a aula, estes produzem e participam das atividades propostas pelo professor com interesse.

Observamos que a maior dificuldade que o aluno encontra para estudar é a falta de motivação. Quando estão interessados em alguma coisa, são mais animados e disciplinados. Portanto, podemos afirmar que o professor precisa cativar o aluno para que ele acredite ser interessante o conteúdo que está estudando, despertando, assim, sua motivação.

A questão 03, Você acredita que o aluno indisciplinado apresenta mais dificuldades de aprendizagem? Para os alunos, aquele que é indisciplinado tem muitas dificuldades em aprender, visto que não presta atenção nas explicações e a aprendizagem fica prejudicada. Há consenso entre eles que a indisciplina acarreta conseqüências negativas para a aprendizagem, reconhecendo a importância da disciplina no processo ensino-aprendizagem.

Mesmo aqueles alunos considerados indisciplinados responderam que sim. Um apresentou o seguinte motivo: os professores não dão atenção ao aluno que faz bagunça. Um outro: quando o aluno bagunceiro resolve prestar atenção ou realizar as atividades a turma ‘fica zoando’.

Observamos, então que nesta questão professores e alunos têm visões diferentes. O aluno, uma visão restrita de que aluno indisciplinado não aprende. Os professores, uma visão mais ampla de que a indisciplina atrapalha a aprendizagem, mas não a impede.

Na questão 04 “Quais as medidas que se adotadas pela escola resolveriam os problemas de indisciplina?” podemos afirmar que como conhecedores de nossa história educacional podemos compreender o fato de aluno propor que os professores instituam castigos para evitar a indisciplina. Isto se percebe nos depoimentos transcritos, a seguir:

O professor deveria tirar as aulas de Arte, Informática e Educação Física. Ir para a biblioteca, quando estiver aberta, para ler livros. (ALUNO DA 5ª SÉRIE).

O professor deveria passar mais dever, não deixar ficar parado tempo nenhum. (ALUNO DA 6ª SÉRIE).

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Mais uma vez percebemos os alunos se apropriando dos conceitos dos professores ao recomendar como solução para a indisciplina as ações que vêem os professores e coordenadores executarem.

Embora tenham apontado como causa da indisciplina o autoritarismo dos professores ao apontar soluções volta a citar a necessidade de manter os alunos ocupados.

A partir dos dados apresentados levanta-se a seguinte questão: Como lidar com a indisciplina? A solução começa pelo diálogo. Já está evidente que broncas e castigos não são boas ferramentas para a educação e a disciplina. Esses recursos só revelam o descontrole de pais e mestres. Contudo, as explicações, os limites e os elogios podem oferecer resultados desejados e garantir a disciplina, com autoridade “[...]que ressalte do prestígio que, pelo seu exemplo, pelo seu ensinamento e, sobretudo, pela sua atitude, ele tiver sabido adquirir junto dos seus alunos” (DOTTRENS, 1974, p.39).

A solução passa também pela conscientização, fazendo com que o aluno perceba as conseqüências dos seus atos. Se pichar uma parede, deve pintá-la. Se quebrar uma carteira, deve consertá-la.

Há necessidade da participação, do envolvimento de todos no enfrentamento do problema. Deve-se organizar o próprio trabalho escolar envolvendo os pais e os alunos com princípios democráticos. Já destacamos na pesquisa que alunos estão se apropriando dos conceitos dos professores. Tais conceitos não estão em geral alicerçados em princípios democráticos. Então, a disciplina na escola tem que ser construída por todos os envolvidos, para que os conceitos sejam reconstruídos, os princípios democráticos sejam estabelecidos e o ambiente produzido possa resultar em frutos positivos e permanentes.

Um ambiente regido por regras e respectivas punições tem gerado indisciplina e descontentamento. A razão de a escola existir, o desenvolvimento integral do homem, tem deixado de acontecer. Grande parte dos alunos indicou como medida para combater a indisciplina manter os alunos ocupados. A proposta da construção de um ambiente democrático sugere uma boa ocupação.

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192 ESCOLA DE GESTORES DA EDUCAçãO BáSICA

Considerações finais

O trabalho de investigação que foi realizado veio comprovar que a indisciplina representa no cotidiano escolar um dos principais fenômenos geradores de dificuldades. Estão relacionadas às assimetrias entre professores (as) e alunos (as), entre alunos (as) e alunos (as), entre direção e alunos (as). Na verdade, o fato vem se agravando de tal forma que a escola não está conseguindo resolver e nem minimizar o problema da indisciplina escolar.

As medidas adotadas pelas escolas frente à questão precisam ser revistas, pois elas permanecem atreladas à imposição de regras e regimentos, com ênfase na punição. Portanto, ainda se fazem necessárias práticas pedagógicas escolares democráticas, marcadas pelo respeito, responsabilidade, construção do conhecimento, interação, participação, formação do caráter e da cidadania, formando assim alunos críticos, participativos, ativos e conscientes de seu próprio desenvolvimento.

É necessário fomentar discussões sobre o processo democrático da escola e a disciplina escolar. Dessa forma, cabe a escola analisar as contradições existentes entre o fazer pedagógico e a proposta pedagógica da escola. Também é necessário que a instituição escolar avance para uma mentalidade preventiva quando o assunto é indisciplina escolar, encarando esse fenômeno como previsível e deixando de vê-lo apenas no nível de intervenção.

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195DEMOCraCIA, FORMAçãO E GESTãO ESCOLAR

Formação continuada de professores no âmbito escolar

Deneci Nascimento SecchimHelio Pettene

Janete Bindaco Akisaski SilvaMarilene de Souza Duarte

Marlene Martins Rosa Patrocino

Introdução

O objeto deste estudo é a formação continuada de professores no âmbito escolar, partindo do pressuposto de que a formação dos profissionais da educação deve ser a base de qualquer iniciativa de construção de um projeto de educação. A emergência dos novos paradigmas da educação e o reconhecimento do processo de formação dos docentes, que não se finaliza com a obtenção do título de licenciado, é o que justifica a relevância deste trabalho.

Uma política de democratização da escola pública que coloca em primeiro plano a qualidade social da educação necessita também do professor de qualidade, o que requer uma formação profissional, com vistas à reflexão-ação-reflexão das suas práticas. É preciso refletir a democracia da e na escola, bem como o espaço e o tempo escolar. Nesse espaço consolidam-se decisões e atitudes positivas na convivência do aprender, buscam-se respostas e superam-se dificuldades. A formação deve orientar as ações da equipe gestora e dos profissionais da educação com o propósito de potencializar a aprendizagem que liberta e democratiza.

A realidade vivida no interior da Escola Dom Daniel Comboni, Nova Venécia – ES retrata uma diversidade de situações que interfere no processo ensino-aprendizagem tais como: apatia, desinteresse, dificuldade de aprendizagem, evasão e repetência. Estes elementos nos impulsionaram a realizar o projeto-intervenção, objetivando a formação do professor na construção coletiva de saídas para os desafios que se apresentam.

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196 ESCOLA DE GESTORES DA EDUCAçãO BáSICA

Constata-se a iniciativa dos professores que ingressam em cursos de especialização, e que participam de eventos educacionais como via de formação e desenvolvimento profissional. Entretanto, o que se defende é a formação continuada em serviço, que permite a troca de experiência com os diferentes atores do universo da escola. Ela apresenta alternativas, propostas e ações concretas aos desafios da instituição.

Buscou-se realizar uma pesquisa, tendo como foco de atenção os(as) professores(as) que atuam nesta escola. O desafio foi na direção de encontrar elementos que permitissem compreender a ótica dos docentes sobre essa temática.

O objetivo do estudo nos conduziu à opção pela pesquisa de campo para compreender a realidade que nos propusemos a estudar. Ainda, analisamos as principais contribuições teóricas existentes, que conjugadas com a pesquisa realizada, fundamentaram nosso trabalho.

Formação continuada no âmbito escolar

Para identificar a política de formação continuada dos docentes, delimitamos o estudo da legislação educacional brasileira e seu desdobramento a partir da década de 1970, com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases do Ensino de 1° e 2° Graus nº 5.692/1971, implantada no país, mas que não assegurava a formação continuada. Essa lei estabelecia o aperfeiçoamento e atualização dos professores e especialistas da educação, através dos sistemas de ensino. A característica principal, durante sua vigência, era a qualificação ou a auto-qualificação, marcada pelo estilo da reciclagem, que se utilizava de professores multiplicadores. Da mesma forma que a formação inicial dos docentes era considerada limitada para garantir a educação escolar de qualidade, também os treinamentos descontínuos não se tornaram eficazes para superar as deficiências de formação e reflexão da prática.

Somente após a aprovação da Constituição de 1988, é que mudanças significativas ocorreram ao tratar da formação inicial e continuada de professores. Em seu artigo 206, inciso V, fica garantida a valorização dos profissionais do ensino. Nessa valorização, inclui-se a formação, que numa perspectiva social deve ser defendida como um direito, assegurado nas políticas públicas educacionais.

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A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº. 9394/96 incorpora a formação e a carreira do magistério. No título “Dos Profissionais da Educação”, pelo menos, três artigos são destinados a fundamentar a formação inicial e continuada de professores: artigos 61, 63 e 67. Simultaneamente, a Lei 9424/96 – FUNDEF teve como um de seus objetivos criar condições para a valorização do magistério. Uma década depois, a Lei nº 11.494/07 regulamenta o FUNDEB ratificando que o plano de carreira e remuneração deverá contemplar capacitação profissional especialmente voltada à formação continuada.

O Plano Nacional de Educação, Lei 10.172/2001, embora não tenha caráter normativo, faz referência à formação de professores. Neste documento fica definida uma política global de formação e valorização do Magistério, implicando a formação profissional inicial, as condições de trabalho, salário, carreira e a formação continuada.

Para atender a formação continuada de professores, o Ministério da Educação criou em 2003 a Rede Nacional de Formação Continuada de Professores da Educação Básica “com o objetivo de contribuir para a melhoria da formação dos professores e dos alunos” (MEC/SEB, Portal, 2008).

A escola convive com paradoxos e situações que impulsionam a busca permanente de saídas e estratégias para bem desempenhar sua função social. Por isso, nos propusemos a pensar a formação contínua no âmbito escolar, pois o professor ao se envolver com sua realidade, questionando-a e problematizando-a, apropria-se de novos horizontes na atuação profissional. Concordamos com Nóvoa (2001, p. 2) ao argumentar que “[...] a lógica da formação continuada deve ser centrada nas escolas e deve ser centrada numa organização dos próprios professores”.

A prática docente gera produção do conhecimento e como condição deve ser uma prática reflexiva. Entretanto, não se deve eximir de reivindicar o campo da teoria neste processo, em busca de contribuições dos grandes pensadores que embasam o fazer pedagógico. Nesse sentido Freire (2002, p. 32) postulou que a prática docente requer indagação, busca e pesquisa. “[...] não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino [...]. Pesquiso para constatar, constatando, intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar [...] a novidade”.

O espaço formativo na instituição é promissor para pensar alternativas. Nesta ótica, não basta que sejam criados espaços. É necessário que o tempo

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tenha um sentido muito profundo, criando vínculos com o que o professor está produzindo. Precisa ser fecundado de significado. Defender a formação continuada no âmbito escolar é caminhar numa direção em que os professores sejam produtores de sua profissão.

O ato de educar exige a dialética do conhecimento com a prática. Assim “[...] os professores deveriam se tornar intelectuais transformadores se quiserem educar os estudantes para serem cidadãos ativos e críticos”. (GIROUX, 1997, p. 163). Diante dos desafios para a educação, é fundamental procurar alternativas que promovam mudanças, unindo a linguagem da crítica e linguagem da possibilidade. Para Giroux (1977, p. 163) é essencial o educador tornar o pedagógico mais político e o político mais pedagógico. Essa nova competência pedagógica pode se originar na própria prática, no movimento dialético ação-reflexão-ação, no dia-a-dia da experiência vivida.

Sobre a natureza do processo de reflexão, argumentamos que “[...] a prática reflexiva tem um caráter emancipatório, quando é capaz de perceber e desmistificar as desigualdades e injustiças que se produzem na sala de aula, a partir da própria ação do professor e dos alunos” (RIBAS; CARVALHO, 2003, p. 42-43).

Freire (2002) defende que na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática. Nenhum profissional está protegido da dúvida. A formação da prática reflexiva é uma condição necessária, e favorece ao professor uma relação mais ativa e autônoma diante dos crescentes dilemas que enfrenta. Nessa perspectiva, a formação continuada precisa estar intimamente ligada à existência dos projetos educativos nas escolas, com repercussão em suas atividades. De acordo com Laranjeira et al. (1999, p. 26),

O desenvolvimento profissional permanente requer um processo constante e contínuo de estudo, reflexão, discussão, confrontação e experimentação coletiva, para o qual é necessário não só que as instituições contratantes assumam a responsabilidade de propiciar as condições institucionais e materiais, mas que o professor tome para si a responsabilidade por sua formação.

É positivo o desejo que muitos professores(as) estão sentindo por necessidade de fundamentar o saber. Quando procura uma formação, o professor se sente

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realimentado e estimulado para desempenhar o seu trabalho e “[...] quanto mais formado se é, mais desejo se tem de formação” (DELORS, 2001, p. 105).

Formação continuada no contexto da EEEM Dom Daniel Comboni

Objetivando levantar elementos que mapeassem as concepções, contribuições e perspectivas dos professores sobre a formação continuada, realizamos uma pesquisa na EEEM Dom Daniel Comboni - Nova Venécia - ES. No período entre os dias 15 a 19 de maio de 2008, foi aplicado um questionário envolvendo trinta e seis docentes que representam 72% do universo de professores atuantes nesta escola. Estamos diante de um quadro de profissionais onde a predominância é do sexo feminino, com idade entre 20 e 49 anos, cujo tempo de serviço é inferior a dez anos.

Através deste questionário foram coletados dados que permitiram investigar o que os professores pensam sobre a formação continuada no âmbito escolar. Uma das questões trata do reconhecimento ao direito à formação profissional em serviço, assegurado em lei. Outra abordagem foi a participação em eventos da educação, voltados para a formação profissional. E ainda, levantar alternativas para a realização de formação continuada em serviço conciliando-a na jornada de trabalho escolar.

Os professores ratificam o grau de importância da formação continuada.. Indagados sobre o que deve proporcionar a formação continuada no âmbito escolar, acreditam ser: possibilidade de traduzir os novos saberes em novas práticas, produção e ampliação do conhecimento, mudanças na atuação em sala de aula e um processo que contribui para a reflexão-ação-reflexão, conforme tabela a seguir.

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Tabela 1 – A formação continuada proporciona efetivamente

Deve proporcionar Frequência % absolutaPossibilidade de traduzir os novos saberes em novas práticas 26 27Produção e ampliação do conhecimento 21 21Mudanças na sua atuação em sala de aula, 21 21 com alteração de resultados nos trabalhos da escolaProcesso que contribui para a 14 14 reflexão-ação-reflexão de sua práticaUm valor que se incorpora à educação contemporânea 08 8Valorização pessoal e ressignificação da identidade profissional 07 7Forma de aperfeiçoamento e 02 2 reconhecimento profissional pelo mantenedorTotal 99 100

Nesse caso, os respondentes puderam manifestar até três alternativas. Sendo assim, os números absolutos não condizem com o número de indivíduos participantes.

Através deste estudo e da pesquisa pode-se afirmar que a formação continuada precisa ser tratada como direito do professor, enquanto categoria profissional. Deve, portanto, possibilitar a progressão funcional, impulsionando uma ação qualitativa e transformadora da educação. Nossa classe reconheceu o direito à formação através da LDB nº 9394/96 e do Projeto Político-Pedagógico, como demonstra a próxima tabela.

Tabela 2 – Direito à formação profissional

Fonte de informação Frequência % absolutaLei de diretrizes e bases da educação nacional - LDB 9394/96 34 57%Projeto Político-Pedagógico ou similar 12 20%Constituição Federal de 1988 08 13%Estatuto do Magistério Estadual 06 10%Total 60 100%

Nesse caso, os respondentes puderam manifestar livremente as alternativas. Sendo assim, os números absolutos não condizem com o número de indivíduos participantes.

A pesquisa evidenciou que 86% dos professores têm participado de eventos educacionais. Na ausência de um programa de formação continuada, propriamente em serviço, a pesquisa revela que os professores não estão alheios aos eventos de natureza educacional, o que confirma a tabela três.

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Tabela 3 – Participação em eventos educacionais

Evento Freqüência % absolutaSeminários 16 34%Fóruns 14 29%Congressos 07 15%Videoconferências 03 6%Conferências 01 2%Outros 04 8%Não participou 03 6%Total 48 100%

Nesse caso, os respondentes puderam manifestar até duas alternativas. Sendo assim, os números absolutos não condizem com o número de indivíduos participantes.

Os docentes, de acordo com a tabela quatro, afirmaram ter produção própria de conhecimento. Esta prática pode ser aprimorada à medida que o professor estiver inserido em programas de formação que lhe proporcione experiência de pesquisas.

Tabela 4 – Produção própria de conhecimento

Tipos de produção Freqüência % absolutaProjetos pedagógicos 24 48%Artigo 10 20%Resenha 08 16%Publicação para jornais/revistas 05 10%Outros 01 2%Nenhuma produção 02 4%Total 50 100%

Nesse caso, os entrevistados puderam assinalar quantas opções fossem necessárias. Sendo assim, os números absolutos não condizem com o número de indivíduos participantes.

Os recursos utilizados com maior freqüência para estudo são internet, livros e jornais, indicados na tabela cinco. Acreditamos que através da formação continuada seja possível estimular o desenvolvimento profissional, potencializando a formação de professor pesquisador entre as múltiplas possibilidades de fontes de pesquisas.

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Tabela 5 – Recurso de acesso mais freqüente para estudo

Recursos Freqüência % absolutaInternet 33 43%Livros 18 24%Jornais 16 21%Revistas e periódicos de circulação nacional 06 8%Revistas especializadas em educação 03 4%Total 76 100%

Nesse caso, os entrevistados puderam manifestar até duas alternativas. Sendo assim, os números absolutos não condizem com o número de indivíduos participantes.

Sobre o conhecimento e experiência de que possuem para sua prática docente, a tabela seis indica que grande parte considera suficientes para atender à clientela escolar com a qual trabalham, e satisfatórios às necessidades básicas de aprendizagem e aos padrões atuais da educação. Os professores (as), através do espaço de formação poderão compartilhar aos seus pares experiências e práticas que evidenciem êxito nas aprendizagens dos alunos, como também, buscar alternativas para as situações que dificultam o processo ensino aprendizagem.

Tabela 6 – Conhecimento e experiência para a prática docente

Grau de conhecimento Freqüência % absolutaSuficiente para atender a clientela escolar que trabalha 18 50%Satisfatórios para as necessidades de 10 28% aprendizagem da educação atual Limitados para uma educação inovadora 08 22%Insuficientes para responder aos 0 0% desafios da atividade docente Total 36 100%

A tabela sete revela que os(as) professores(as) reconhecem que a formação continuada deve se fixar no âmbito da escola, a partir de suas necessidades e interesses. Como proposição, apontam que é importante estabelecer um plano de formação profissional, planejado e organizado com temas de interesse coletivo.

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Tabela 7 – Proposições para realização da formação continuada

Alternativas Freqüência % absolutaPlano de formação profissional por meio de seminários e 27 42% palestras, definidos conforme necessidades e interesses do grupoEncontros planejados e organizados por 20 31% temas de interesse coletivoPlano básico de estudo definido de forma participativa 10 16% contemplando tópicos específicos das diversas disciplinasFormação de grupos autônomos apoiados pela SEDU 07 11%Total 64 100%

Nesse caso, os respondentes puderam manifestar até duas alternativas. Sendo assim, os números absolutos não condizem com o número de indivíduos participantes.

Para conciliar formação e jornada de trabalho escolar, os docentes apontam que parte da jornada de trabalho pode ser utilizada para a formação em serviço, incorporando-a no plano de carreira. Outra alternativa seria incluir dias específicos no calendário escolar, o que se verifica na próxima tabela.

Tabela 8 – Formação continuada e jornada de trabalho escolar

Propostas Freqüência % absolutaParte da jornada de trabalho para formação continuada, 18 50%incorporada ao plano de carreiraIncluir no calendário escolar dias destinados a formação em serviço 13 36%Extensão de carga horária semanal de 5 h/a 03 8%Organizar grupos de estudos em horário alternado ao turno 02 6%Total 36 100%

A última tabela demonstra que os (as) professores (as) concordaram e justificaram que a formação continuada favorece a reflexão dos acontecimentos no interior da escola e a busca de possíveis soluções.

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Tabela 9 – A formação continuada como objeto de reflexão e superação de entraves no interior da escola

Indicação sobre a afirmativa Freqüência % absolutaConcordo 34 94%Discordo 02 6%Total 36 100%

Considerações finais

A reflexão sobre a formação continuada no âmbito escolar teve como eixo estimular e impulsionar a cultura de revitalização profissional dos professores, ao transformá-los em educadores-pesquisadores.

Diante dos dados coletados na pesquisa de campo, concluímos que houve reconhecimento da relevância da formação em serviço centrada na escola. O coletivo dos(as) professores(as) aponta valiosas contribuições, constituindo-se em elementos imprescindíveis para que a equipe gestora da EEEM Dom Daniel Comboni, apoiada pela Secretaria de Estado da Educação, possa elaborar, implementar e avaliar o programa de formação continuada, integrando-o ao Projeto Político-Pedagógico.

As condições propostas pelos(as) professores(as) para se efetivar a formação continuada no âmbito escolar requerem uma ação integrada da escola com a SEDU na definição do calendário escolar, na alteração do plano de cargos e salários e na constituição e estruturação de uma equipe para sua operacionalização. No formato deste programa é fundamental aliar teoria e prática, observando os interesses e as necessidades mais emergentes da complexidade escolar.

Sendo a formação continuada um direito do professor, é pertinente promover incentivo a esta categoria, consolidando mudança no modelo remuneratório com a progressão funcional. Acreditamos que a formação em serviço e as práticas pedagógicas inseridas numa política de valorização profissional, impulsionam uma ação qualitativa e transformadora da educação.

A formação continuada precisa nascer do desejo do aprender e de mudar a prática docente e espontaneamente o professor decide pela sua participação. Que acima da necessidade esteja o prazer; que acima de um resultado esteja a relação saudável e motivadora, que acima de solucionar problemas esteja

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a reinvenção e a imaginação propositiva e recriadora da educação escolar. Imaginar sempre esse espaço rico pela sua heterogeneidade, múltiplo, diverso e criativo do nosso fazer educação.

Referências

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988.

BRASIL. Lei nº 5.692, de 11 de agosto de 1971. Fixa Diretrizes e Bases para o ensino de 1º e 2º graus. Disponível em www.planalto.gov.br. Acesso em: 15 maio 2008.

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, Dispõe sobre as diretrizes e bases da educação nacional. In: Coletânea do programa de apoio aos secretários municipais de educação - PRASEM III. Brasília: FUNDESCOLA / MEC, 2001.

BRASIL. Lei nº 9.424, de 24 de dezembro de 1996. Dispõe sobre o fundo de manutenção e desenvolvimento do ensino fundamental e de valorização do magistério. In: Coletânea do programa de apoio aos secretários municipais de educação - PRASEM III, Brasília: FUNDESCOLA / MEC, 2001.

BRASIL. Lei nº 10.172, de 09 de janeiro de 2001, Aprova o Plano Nacional de Educação. In: Coletânea do programa de apoio aos secretários municipais de educação – PRASEM III. Brasília: FUNDESCOLA / MEC, 2001.

BRASIL. Lei nº 11.494, de 20 de junho de 2007. Regulamenta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB. Disponível em <www.mec.gov.br>. Acesso em: 15 maio 2008.

BRASIL. MEC/SEB. Rede Nacional de formação Continuada de Professores da Educação Básica. Disponível em <http//portal.mec.gov.br/seb>. Acesso em: 15 maio 2008

DELORS, Jacques. Educação: um tesouro a descobrir. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2001.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 23. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2002.

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206 ESCOLA DE GESTORES DA EDUCAçãO BáSICA

GIROUX, Henry A. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Trad. Daniel Bueno. Porto Alegre: Artmed, 1997.

LARANJEIRA, Maria Inês et al. Referências para a formação de professores. In: BICUDO; Maria Aparecida Viggiani; SILVA JÚNIOR, Celestino Alves. Formação do educador e avaliação educacional. São Paulo: UNESP, v. 2, 1999.

NÓVOA. Antonio. O Professor Pesquisador e Reflexivo. 2001. Disponível em <http://www.tvebrasil.com.br/salto/entrevistas/antonio_novoa.htm>. Acesso em 01 junho 2008

RIBAS, Marina Holzmann; CARVALHO, Marlene de Araujo. O caráter emancipatório de uma prática pedagógica possível. In: ALONSO, Myrtes (Org.). QUELUZ, Ana Gracinda. O trabalho docente: teoria & prática. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2003.

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Gilda Cardoso de AraujoGraduada em História pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), onde também obteve o título de Mestre em Educação. Realizou Doutorado em Educação pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente é professora adjunta da UFES atuando na graduação e no Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) na área de Política e Gestão Educacional com orientações e pesquisas enfatizando as seguintes temáticas: políticas públicas de educação, gestão escolar, direito à educação, pacto federativo, municipalização e organização dos sistemas de ensino. Coordenou, na UFES, o projeto piloto (1ª turma) do Curso de Especialização em Gestão Escolar, inserido no Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica da Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação, de 2007 a 2008.

Cleonara Maria SchwartzDoutora em Educação pela Universidade de São Paulo, professora da Universidade Federal do Espírito Santo e integrante da linha de pesquisa Educação e Linguagens do Programa de Pós-Graduação em Educação do Centro de Educação. Atualmente, coordena o Núcleo de Pesquisa em Alfabetização, Leitura e Escrita do Espírito Santo (NEPALES) e é vice-coordenadora do Curso de Gestão Escolar da UFES. Autora do livro A escola e a construção da subjetividade (Editora da UFES), integrou a comissão organizadora do livro Desafios da Educação Básica: a pesquisa em educação e colaborou em alguns livros com capítulos que tratam da história do ensino da leitura no Espírito Santo.

Wagner dos SantosLicenciado em Educação Física pela UFES, Mestre em Educação pela UFMG e Doutorando em Educação pelo PPGE/UFES. Professor do Centro Universitário Vila Velha e do Curso de Especialização Escola de Gestores. Dentre as obras publicadas destacam-se os livros: Catálogo de Periódicos da Educação Física e Esportes-1930-2000 e Currículo e Avaliação na Educação Física: do mergulho à intervenção.

Elane Nardotto RiosMestre em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo. Professora de Práticas de Ensino do Curso de Letras da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia/Campus Jequié. Coordenadora de Pesquisa do Centro de Estudos da Leitura/CEL/UESB. Atuou como Professora de Turma no Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica/ Espírito Santo.

Sobre os autores

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Paulo da Silva RodriguesLicenciado em Matemática, Especialista em Planejamento Educacional pela UNIVERSO, Especialista em Gestão Escolar pela Escola de Gestores UFES/MEC, Mestrando em Educação pelo PPGE/UFES.

Aurelina Sandra Barcellos de OliveiraLicenciada em Geografia e Pedagogia, Especialista em Gestão Escolar pela UFES, Especialista em Supervisão, Planejamento e LIBraS pela UFES, Gestora da Escola Estadual de Educação Oral e Auditiva de Vitória.

Carlos Cezar Gonçalves da RochaEspecialista em Gestão Escolar pela UFES, Gestor da EEEFM Major Alfredo Pedro Rabaioli.

Dagilza Lopes Sant’AnaGraduada em Pedagogia, Especialista em Gestão Escolar pela UFES, Gestora da EEEFM Zumbi dos Palmares.

Lessi Nunes de Moraes BrazEspecialista em Gestão Escolar pela UFES, Gestora da EEEFM Iracema Conceição Silva.

Maria Madalena LoureiroLicenciada em Desenho e Artes Plásticas pela UFES, Especialista em Gestão Escolar pela UFES, Gestora da EEEM Prof. Fernando Duarte Rabelo.

Deuza Lorencini BarrosDiretora da EEEFM “Waldemiro Hemerly” – Rio Novo do Sul/ES, Especialista em Gestão Escolar pela UFES, Especialista em Administração Escolar – Unigranrio, Graduada em Ciências para o 1° grau – Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, Madre Gertrudes de São José, Licenciada em Matemática – UNIG

José Francisco BarbosaDiretor da EEEFM “Cel. Antônio Duarte” Iconha/ES, Especialista em Gestão Escolar pela UFES, Especialista em Matemática pela Unigranrio, Graduado em Ciências para o 1° grau - Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, Madre Gertrudes de São José, Licenciado em Matemática - UNIG

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Maria Julia de Medeiros MangaraviteDiretora da EEEFM “Virgínia Nova” Rio Novo do Sul/ES, Especialista em Gestão Escolar pela UFES, Especialista em Planejamento Educacional - Faculdades Integradas de São Gonçalo, em Administração Escolar UNIGraNRIO e em Língua Portuguesa – Faculdades Integradas Simonsen, Graduada em Letras – Português-Literaturas pela UFRJ.

Maria de Lourdes Mendes GavaDiretora da E.E.E.F. “Wilson Resende”, Especialista em Gestão Escolar pela UFES.

Maristela WassolerDiretora da E.E.E.F.M “Amélia Toledo do Rosário”. Especialista em Gestão Escolar pela UFES

Adriana Alves dos SantosLicenciada em Letras, Especialista em Gestão Escolar pela UFES,Diretora do CMEI Vovó Sinhá – Aracruz-E.S.

Maria Cristina Silva de SantanaLicenciada em Letras, Especialista em Gestão Escolar pela UFES, Diretora do CMEI Vovó Jandira – Aracruz-E.S.

Sara Santos MercierLicenciada em Pedagogia, Especialista em Gestão Escolar pela UFES, Diretora do CMEB álvaro Souza – Aracruz-E.S.

Isabel Cristina Ribeiro ChagasLicenciada e especialista em Letras/Português, Especialista em Gestão Escolar pela UFES, Diretora da Escola Municipal de Ensino Fundamental “Edna Mattos Siqueira Gáudio” da Rede Municipal de Ensino de Vitória.

Leila dos Santos VieiraPedagoga, especialista em Planejamento Educacional, Especialista em Gestão Escolar pela UFES, Diretora da Escola Estadual de Ensino Médio “Desembargador Paes Barreto” da Rede Estadual de Ensino.

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Marly SiqueiraPedagoga, Especialista em Planejamento Educacional, Especialista em Gestão Escolar pela UFES, Diretora da Escola Municipal de Ensino Fundamental “Regina Maria Silva” da Rede Municipal de Ensino de Vitória.

Soraya Luana Rodrigues SouzaPedagoga, Especialista em Psicopedagogia, Especialista em Gestão Escolar pela UFES e Diretora da Escola Municipal de Ensino Fundamental “Paulo Roberto Vieira Gomes” da Rede Municipal de Ensino de Vitória.

Dinéa Guiomar Loureiro da SilveiraPedagoga, Especialista em Planejamento Educacional, Especialista em Gestão Escolar pela UFES, Diretora da EMEF “Ceciliano Abel de Almeida” PMV.

Eloisa Elena Corteletti ErllerPedagoga, Especialista em Políticas Públicas Educacionais, Especialista em Gestão Escolar pela UFES, Ex-Diretora da EMEF “Suzete Cuendet” PMV.

Maria Raquel Marques VallePedagoga, Especialista em Educação, Especialista em Gestão Escolar pela UFES, Diretora da EMEF “Otto Ewald Júnior” PMV.

Andréa Zamprogno CaserEspecialista em Gestão Escolar pela UFES, Especialista em Educação Escolar pela FAESA – ES, Diretora do Centro Municipal de Educação Infantil “Dr. Thomaz Tommasi”.

Denise Pinheiro QuadrosEspecialista em Gestão Escolar pela UFES, Especialista em Técnicas Desportivas - Ginástica Olímpica pela USP – SP, Diretora da Escola Municipal de Ensino Fundamental “Adevalni Sysesmundo Ferreira de Azevedo”.

Vânia Neves M. EspíndulaEspecialista em Gestão Escolar pela UFES, Graduação em Química pelo MIT – MG, Ex-Diretora da Escola Municipal de Ensino Fundamental “álvaro de Castro Mattos” PMV.

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Vivian Ferrari BremenkampDiretora da Escola Municipal Ensino Fundamental “Experimental de Vitória – UFES”, Especialista em Gestão Escolar pela UFES, Especialista em Séries Iniciais pela UFES - ES.

Grace Luz DiasDiretora da Escola Estadual de Ensino Médio “Terra Vermelha”, Licenciada em Matemática pela UFES, Especialista em Gestão Escolar pela UFES.

Maria do Carmo Pereira ButkowskyDiretora da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio “Florentino ávidos”, Licenciada em Pedagogia pela UFES, Especialização em Administração Escolar pela Universidade Salgado Oliveira, Especialista em Gestão Escolar pela UFES.

Maria José Gomes de SouzaDiretora da Escola Estadual de Ensino Fundamental “Catharina Chequer”, Licenciada em Letras e Pedagogia pela UFES, Especialização em Planejamento Educacional e em Administração Escolar pela ASSOEC, em Inspeção Escolar pela FACEVV e Especialista em Gestão Escolar pela UFES.

Marilia Lucia PansiniDiretora da Escola Estadual de Ensino Fundamental “Francelina Carneiro Setúbal”, Licenciada em Ciências Sociais pela FAFI e em Direito pela FADI, Especialização em Administração Escolar pela Universidade Salgado Oliveira e Especialista em Gestão Escolar pela UFES.

Deneci Nascimento SecchimLicenciada em Pedagogia, pela FAFIC-ES, Especialista em Planejamento Educacional, FISG- São Gonçalo – RJ, Especialista em Didática no Ensino Superior, pela UNIVEN- Nova Venécia- ES, e Especialista em Gestão Escolar pela UFES. Pedagoga, atuando na SRE-Nova Venécia e na EEEM Dom Daniel Comboni.

Helio PetteneGraduado em Filosofia, pela PUC-PR, Especialista em Planejamento Educacional, FISG – São Gonçalo – RJ, Especialista em Didática no Ensino Superior, pela UNIVEN – Nova Venécia – ES e Especialista em Gestão Escolar pela UFES. Diretor na EEEM Dom Daniel Comboni e Professor na Univen.

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212 ESCOLA DE GESTORES DA EDUCAçãO BáSICA

Janete Bindaco Akisaski SilvaLicenciada em Educação Física pela UFES, Especialista em Educação Física Escolar, UNIVERSO – RJ, Especialista em Gestão Escolar, pela UFES. Diretora da EEEM “Nossa Senhora de Lourdes”.

Marilene de Souza DuarteLicenciada em Pedagogia NEAD/UFES, Especialista em Gestão e Supervisão Escolar UNIVEN Nova Venécia/ES, Especialista em Educação Especial nas áreas de Deficiência Visual e Locomoção, Especialista em Gestão Escolar pela UFES. Diretora da EMPEF Governador Carlos Lindemberg.

Marlene Martins Rosa PatrocinoGraduada em História – FAFIC-ES, Especialista em Gestão Escolar pela UFES, Especialista em História e Geografia do Brasil - Caratinga, MG. Especialista em Supervisão Escolar- UNIGRANRIO/RJ. Especialista para Orientadores Acadêmicos na Modalidade EAD-UFES/UFMT. Mestranda em Ciências da Educação - Universidade Americana/Assunção/PY. Atua como técnica da SRE de Barra de São Francisco.

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