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DEGRADAÇÃO da CAATINGA no SERIDÓ PARAIBANO e as TENDÊNCIAS ao PROCESSO de “DESERTIFICAÇÃO”. Eduardo Rubens de Medeiros. (Estudante Geografia - UFPB) [email protected] Maria José Vicente de Barros: Geógrafa, Mestranda do Programa de Pós- Graduação em Agronomia do DESER/CCA/UFPB [email protected] Prof. Paulo Roberto de Oliveira Rosa. UFPB [email protected] RESUMO A área caracterizada como objeto de estudo apresenta um quadro natural formado por vegetação de Caatinga, no semi-árido do Seridó paraibano, mais precisamente no município de Picuí. A Caatinga é um ecossistema típico do sertão do nordeste brasileiro, distribui-se geralmente em uma região de clima semi-árido com presença de solos litólicos e rasos, com elevadas temperaturas durante todo o ano e uma distribuição irregular das chuvas, apresentando apenas duas estações definidas: uma seca com períodos prolongados e outra com chuvas, reduzidas a períodos relativamente curtos e de alta magnitude, ficando toda a região sujeita a longos períodos de estiagem que repercutem diretamente nas condições de permanência de determinadas populações ali radicadas. A adaptação das plantas a essas condições climáticas, é uma das principais características apresentadas pela flora da caatinga, que é composta por espécies caducifólias, afilas (sem folhas) e cactáceas. A degradação das zonas semi-áridas, áridas e sub-úmidas secas, são resultantes de fatores diversos. como variações climáticas esta porém de ordem natural sujeita cuja elasticidade ambiental permite o retorno aos sistema antecedente e as atividades humanas inadvertidas cuja persistência acabam por causar a redução da cobertura vegetal e dos recursos hídricos, gerando uma qualidade de vida caracterizada como desertificação. Palavras-chaves: Degradação Ambiental, Desertificação, Paisagem.

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Page 1: DEGRADAÇÃO DA CAATINGA NO SERIDÓ PARAIBANO

DEGRADAÇÃO da CAATINGA no SERIDÓ PARAIBANO e as TENDÊNCIAS ao PROCESSO de “DESERTIFICAÇÃO”.

Eduardo Rubens de Medeiros. (Estudante Geografia - UFPB)[email protected]

Maria José Vicente de Barros: Geógrafa, Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Agronomia do DESER/CCA/UFPB

[email protected]. Paulo Roberto de Oliveira Rosa. UFPB

[email protected]

RESUMO

A área caracterizada como objeto de estudo apresenta um quadro natural formado por vegetação de Caatinga, no semi-árido do Seridó paraibano, mais precisamente no município de Picuí. A Caatinga é um ecossistema típico do sertão do nordeste brasileiro, distribui-se geralmente em uma região de clima semi-árido com presença de solos litólicos e rasos, com elevadas temperaturas durante todo o ano e uma distribuição irregular das chuvas, apresentando apenas duas estações definidas: uma seca com períodos prolongados e outra com chuvas, reduzidas a períodos relativamente curtos e de alta magnitude, ficando toda a região sujeita a longos períodos de estiagem que repercutem diretamente nas condições de permanência de determinadas populações ali radicadas. A adaptação das plantas a essas condições climáticas, é uma das principais características apresentadas pela flora da caatinga, que é composta por espécies caducifólias, afilas (sem folhas) e cactáceas. A degradação das zonas semi-áridas, áridas e sub-úmidas secas, são resultantes de fatores diversos. como variações climáticas esta porém de ordem natural sujeita cuja elasticidade ambiental permite o retorno aos sistema antecedente e as atividades humanas inadvertidas cuja persistência acabam por causar a redução da cobertura vegetal e dos recursos hídricos, gerando uma qualidade de vida caracterizada como desertificação.

Palavras-chaves: Degradação Ambiental, Desertificação, Paisagem.

Page 2: DEGRADAÇÃO DA CAATINGA NO SERIDÓ PARAIBANO

Introdução

A desertificação é um processo que vem preocupando pesquisadores de todo o mundo.

No Brasil, de acordo com estudos realizados, os núcleos de desertificação têm sua ocorrência

no Nordeste e dentre os estados nordestinos, a Paraíba é um dos que se destacam com núcleos

que apresentam susceptibilidade a esse processo.

Localizado na parte central do Estado, no seu limite setentrional, mais precisamente na

Microrregião do Seridó Oriental Paraibano, o município de Picuí possui uma área territorial de

734,1km2 (ver Fig.1), onde apresenta alguns núcleos com suscetibilidade ao processo de desertificação,

tornando-se pois objeto deste estudo. A sede do município localiza-se sob as coordenadas 6º33’19” de Latitude

Sul e 36º20’56” de Longitude Oeste, a uma altitude de 439 m. O município é cortado pelo rio Picuí, que dá nome

a sub-bacia que deságua na bacia do Piranhas já no Estado do Rio Grande do Norte; a altimetria varia entre 200 e

600m ficando sua maior parte em torno dos 400m. O clima é quente e seco com chuvas em curtos períodos e

estação seca prolongada, caracterizando-se por apresentar temperaturas médias anuais em torno de 26,5º C, com

nebulosidade variando de 6/10 a 5/10 do céu, e uma média pluviométrica de 334mm/ano com variabilidade

média de 40mm.

Figura 1 - Localização do município de Picuí.

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A Microrregião do Seridó Oriental fica compreendida na Mesorregião da Borborema,

entre o Sertão e o Agreste. Embora seja uma das regiões mais antigas do Estado, em termos de

povoamento, o Seridó apresenta os mais baixos índices de densidade demográfica do Estado e,

associado a isso, estão os baixos índices de precipitação, o que faz com que a atividade

agrícola sofra as conseqüências dessas limitações climáticas. Trata-se portanto, de uma região

fortemente individualizada, pelas limitações naturais, pela atividade econômica ou pela baixa

densidade demográfica. O Seridó abrange a maior parte do Estado do Rio Grande do Norte e

uma pequena porção do Estado da Paraíba. Esta região caracteriza-se por apresentar uma

vegetação baixa, muito espaçada e um solo raso, arenoso e seco, apresentado ainda

afloramentos graníticos. Essas características tornam-se determinantes para aumentar a

fragilidade do ambiente, favorecendo a instalação de processos de degradação ambiental.

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O município de Picuí está incluso nessa pequena porção do Estado paraibano em que o

Seridó abrange, apresentado condições semelhantes com pequenas variabilidades. Em seu

quadro natural, pode-se destacar a vegetação, que se constitui de caatinga arbustiva arbórea. A

fisionomia dessa sub-formação é marcada por uma vegetação caducifólia, podendo ser aberta

ou fechada conforme a densidade e distribuição das espécies, sendo basicamente constituída

por estrato arbustivo e arbóreo significativos e distintos.

A Caatinga é um bioma típico do sertão do nordeste brasileiro, distribui-se geralmente

em uma região de clima semi-árido, que apresenta insolação e temperaturas elevadas, baixa

nebulosidade, distribuição irregular das chuvas durante o ano, e apenas duas estações

definidas, uma seca com períodos prolongados e uma com chuvas, reduzida, ficando assim toda a

região sujeita a longos períodos de estiagem, que repercutem diretamente nas condições de permanência de

determinadas populações ali radicadas. Em decorrência de todas essas condições, essa região foi delimitada pelo

Conselho Nacional de Geografia em 1949 e denominada de “Polígono das Secas” (Duque, 1980, p.25). Os

impactos dessas condições ecológicas repercutem na cobertura vegetal e no solo, que geralmente, é pouco friável

e desgastado. As espécies da caatinga. (ver Fig. 2), em sua grande maioria, apresentam afilia e/ou caducifólia,

bem como, outras adaptações para suportarem as condições do rigor climático presentes no local, das quais pode-

se destacar o engrossamento da cutícula, cobertura de cera, redução da superfície foliar; entre outros mecanismos

que permitam-lhes a sobrevivência.

Figura 2 – Vegetação da Caatinga no município de Picuí. Data: abril/2003

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Antes da colonização, a caatinga já era bastante utilizada pelas tribos indígenas que

habitavam a região, depois a exploração ficou por conta dos colonizadores que iniciaram o

processo de utilização do solo para a prática da agricultura que se faz presente, pecuária, que é

praticada de forma extensiva, extração mineral e vegetal e assim, o processo de devastação da

vegetação da Caatinga foi cada vez mais se intensificando. Essa utilização, em alguns

momentos, de forma indevida, acaba por propiciar uma mudança no ritmo dos elementos

formadores desse bioma. Essa mudança no ritmo desencadeia alterações nesse ambiente, com

um elevado índice de degradação em algumas regiões, com isso pode-se identificar manchas

desnudas de vegetação, expondo assim o solo aos agentes intempéricos, acarretando processos

erosivos provocados pelo escoamento superficial, que vão degradar os solos, tirando destes a

pouca formação pedogenética existente, o que provoca posteriormente, o assoreamento dos

cursos d’água existentes na região.

A expansão dessas manchas faz com que a região das caatingas, caracterize-se como

um ecossistema propício aos processos de desertificação, problema esse definido pelas Nações

Unidas como sendo "a degradação das terras áridas, semi-áridas e subúmidas secas resultantes

de vários fatores, incluindo variações climáticas e atividades humanas" (Conti,1998. p 66).

Segundo o conceito pode-se dizer que existem duas características de desertificação: a

climática e a ecológica. A climática ocorre com a redução progressiva das precipitações de

uma determinada região provocada por causas naturais. A ecológica, ocorre quando o

ecossistema perde sua capacidade de regeneração, verificando-se a rarefação da fauna e a

redução da cobertura vegetal, seguida da degradação dos solos. As principais causas da

degradação1 das zonas semi-áridas se constituem do uso indevido dos recursos da terra,

agravados pelas secas. A partir de então busca-se saber quais os elementos que contribuem

para a ocorrência dos possíveis processos de “desertificação” no Seridó paraibano.

A proposta de se fazer um estudo sobre essa área, justifica-se por ela estar localizada

na zona semi-árida e em área limítrofe identificada pelo Ministério do Meio Ambiente como

Núcleo de Desertificação, áreas onde os efeitos do processo estão concentrados em pequena e

delimitada parte do território, porém, com danos de profunda gravidade. A partir de então

1 A degradação é por nós entendida como sendo a alteração da paisagem a partir do desgaste ocorrido nos componentes do ambiente como solo, recursos hídricos, vegetação e biodiversidade, que acaba afetando na qualidade de vida das pessoas.

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busca-se, através de observação empírica, perceber as modificações que essa paisagem vem

sofrendo nos últimos tempos, principalmente no que refere à sua cobertura vegetal.

Sendo assim cabe-nos investigar de maneira aprofundada através de observações no campo

quais os processos de degradação que essa região vem sofrendo, e tentar mostrar soluções para

que eles não venham desencadear o desequilíbrio desse ecossistema.

Referencial Teórico Conceitual

A problemática da desertificação vem preocupando cientistas do mundo todo. De

acordo com Conti (1998, p.66) essa problemática “pode ser entendida como um conjunto de

fenômenos que conduz à transformação de determinadas áreas em desertos ou a eles

assemelhados”. Nimer (1988, p. 10) também discute a temática, relacionado-a ao clima, e em

um segundo momento às ações humanas. Assim o autor diferencia o processo de

desertificação do deserto propriamente dito, onde conceitua o deserto como sendo “um

fenômeno de certa forma acabado e resultante da evolução de processos que alcançaram uma

certa estabilidade final, e que pode ser definida como um clímax ecológico”; o processo de

desertificação é caracterizado como “um fenômeno em transformação dinâmica cuja evolução

ambiental está apontada para a direção do deserto” (id).

No Brasil alguns locais são apontados como sendo suscetível a esse processo, entre

eles, as terras do nordeste seco cujo clima predominante é o semi-árido, esses ambientes são

indicados devido à sua sensibilidade decorrente das condições climáticas inerentes a essa

paisagem. Tratando da temática, Ab’Sáber conceitua “como processos parciais de

desertificação, todos aqueles fatos pontuais ou areolares, suficientemente radicais para criar

degradações irreversíveis da paisagem e dos tecidos ecológicos naturais” (1977, p. 1). O autor

atribui o acréscimo de degradações pontuais no domínio das caatingas às atividades agrárias

rústicas praticadas pela população, dessas destaca o pastoreio extensivo juntamente com outras

ações deliberadas como propiciantes das “ulcerações dos tecidos ecológicos” (Ibid, p 2). A

partir de então, observa-se a inserção de outros termos que devem ser discutidos com

profundidade para o entendimento da questão.

A Terra é regida por um sistema de componentes ligados entre si que funcionam como uma

unidade (Drew, 1986). Partindo da Teoria dos Sistemas que aponta a entrada, processo e saída

de energia e matéria no sistema, observamos a paisagem como sendo a interação dos

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conjuntos naturais litológico, o climático e o hidrográfico processando energia e matéria de

forma sistêmica (Strahler e Strahler, 1989 e Drew, id); essa interatividade faz com que a

paisagem esteja sempre em movimento, por isso dinâmico.

O termo paisagem tem sido trabalhado por diversos autores, entre eles Dolfuss, que

indica “toda paisagem é composta, formada por um conjunto de elementos geográficos que se

interagem uns com relação aos outros” (1973:p. 13). Porém Tricart (1982) em exposição mais

contundente realça que o “conceito científico de paisagem abrange uma realidade que reflete

profundas relações, freqüentemente não visíveis, entre os elementos”. O autor apresenta ainda

o seguinte conceito como forma mais substancial “Uma paisagem é uma porção perceptível a

um observador onde se inscreve uma combinação de fatos visíveis e invisíveis e interações as

quais, num dado momento, não percebemos senão o resultado global” (id). A vegetação pode

ser entendida como o resultado das condições desses conjuntos componentes da paisagem em

cada específico (Strahler e Strahler, 1989).

Métodos e Técnicas

A concepção analítica da compreensão da organização de qualquer ambiente que

envolve atores, requer uma relação o mais fidedigna possível dos conceitos como forma e

fundo, que é o real. Nesse sentido a busca de autores que se transformaram em cânones na

leitura geográfica do Nordeste Seco é premissa indiscutível para uma análise mas significativa

e assim podermos, nas investidas no campo, olhar e ver o aparente e buscar o desvelamento do

“invisível” na paisagem.

A visita a área inicialmente foi uma excursão preliminar, para que pudéssemos

identificar em imagem de satélite as nuances relativas a descontinuidade da cobertura vegetal

no Município picuiense. A imagem Landsat disposnibilizada pela EMBRAPA, nos permite

uma primeira aproximação pois a escala do zoom chega até a 1:25.000, e a falsa cor permite a

identificação das áreas com e sem cobertura vegetal, cuja representação da vegetação é pela

presença do verde e as demais cores ausência (ver Fig 3). A partir dessa excursão virtual é

imprescindível uma outra análise que nos remeteu a verificação em campo das regiões

degradadas, é a leitura de dados relativos às precipitações pluviais no município. Esses dados

estão no boletim da SUDENE que disponibiliza o volume e o local em que se encontra a

Estação coletora.

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Figura 3 – Imagem LANDSAT denunciando em falsa cor as áreas descobertas de vegetaçãoFonte: EMBRAPA http://www.cdbrasil.cnpm.embrapa.br/

Os dados climáticos foram transportados para planilha eletrônica e tratados de forma

estatística para o fornecimento de gráficos que melhor fossem visualizados e indicando as

correlações concernentes às possíveis inferências relativas ao processo de desertificação no

cenário em tela. A partir desse elenco de dados fez-se necessária uma visita ao campo, para

checagem aproximativa dos dados e das informações

No trabalho de campo observamos os elementos que constituem o ecossistema da

caatinga, procurando compreender a relação conseqüente entre os processos que vêm

ocorrendo, antrópicos ou de ordem natural com a questão considerada como processo de

desertificação.

Resultados e Discussão

Para verificar a ocorrência do processo de desertificação no sentido de relação

climática com o ambiente, foram tratados, de forma estatística, os dados pluviométricos

contidos no Boletim da SUDENE referente a três períodos distintos no município de Picuí. Os

dados tratados são médias mensais, cujo somatório aponta a média de intervalos anuais

compreendidos nas décadas entre 1911 a 1920, de 1951 a 1960 e de 1979 a 1985 (Ver Tabela

1).

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Tabela 1 – Inventário climático registrando o comportamento médio pluvial no Município de Picuí

ANO JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ TOTAL1911 15,6 22,5 87,1 16,7 6,9 1,2 5,4 9,1 0,3 0 4,8 7,4 1771912 38,9 123,1 129,1 43,4 62,7 22,4 7,5 9,4 0 0 10 0 446,51913 1,3 270,2 43,4 175,4 89,1 36,9 31,1 0 0 0 0 0 647,41914 160,9 60,1 67,1 34,4 89 74,9 26,1 112,2 8,3 12,4 0 0 645,41915 5,5 0 15 76,5 20,2 4,8 12,2 4,7 0 0 0,2 9,2 148,31916 56 39,2 80,3 69,6 69,3 13,7 4,2 0 0 0 1,2 1,8 335,31917 12,9 216,6 106,2 22,4 130 2,8 2,7 0 3,5 0 0,1 2,3 499,51918 25,1 44,1 42,5 80,9 59,3 40,2 0 12,1 9,3 0 0 8,7 322,21919 0 9,8 0 15,9 13,5 37,4 6,9 0 0 1,5 0 0 851920 7,3 2,5 130,5 157,3 23,1 18,5 6,9 0 0 1,5 0 14,5 362,1

Média 366,871951 0 0 15 9,5 8 43 0 0 0 0 0 63 138,51952 0 12 73 14 13 18 0 0 0 0 0 4 1341953 0 0 0 17 16 76 3 0 0 0 0 0 1121954 7 36 12,7 11,9 70,5 40,6 0 0 0 0 0 0 178,71955 33,5 12,8 131,4 84,7 28,7 0 0 2 0 0,5 0 0 293,61956 0 35 128,1 91,6 10,3 29,3 23,6 1 0 0 0 0 318,91957 2,2 0 89 59,3 0 0 23 7,3 0 0 0 0 180,81958 6 25,5 0 0 32 3 11 2,2 0 0 0 0 79,71959 0 51,7 90,2 4,7 25,8 22,2 13,7 18,7 0 0 0 0 2271960 14 7,6 386,1 19,6 0 11,6 17,5 3 0 0 0 1,4 460,8

Média 212,41979 0,2 11,8 10,4 29,2 24,1 16,9 40 0 23,3 0 1 2 158,91980 1 84,8 26,4 14,5 0,2 27,6 1 2,2 1,4 1,2 1,3 7,4 1691981 34,3 57,3 250,9 31,8 10,3 14,3 1,4 0 1,2 0 2,3 58,2 4621982 0 40,9 22,9 71 20,5 10,3 2,1 13,1 0 0 2,2 0 1831983 1,2 47,2 32,1 10,8 9,6 7,4 0,4 6 0 5,8 0 0 120,51984 3,7 17,4 96,9 132,7 29 0,8 13,5 10,4 4,4 4,8 0,3 15 328,91985 7,9 196,4 199,3 372 71,3 17,1 27,4 4,4 0 0 5 14,7 915,5

Média 333,97Tabela 1 - Dados pluviométricos do município de Picuí – PB.Fonte: SUDENE - Banco de Dados Hidroclimatológicos do Nordeste -

Verificamos que a distribuição das chuvas durante o ano está concentradas em um

período compreendido entre os meses de fevereiro a abril, chegando as vezes até o mês de

junho, começando a partir daí a escassez das precipitações pluviais a tal ponto que de

setembro a dezembro praticamente não ocorre. Nota-se também uma tendência para as

anormalidades, com oscilações apresentando muita dispersão, para mais ou para menos em

relação à média pluviométrica da região. Na década de 1950 verificou-se que ocorreu a média

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mais baixa, em virtude de ter ocorrido longos períodos de estiagem (secas), onde a média

dessas precipitações só ultrapassaram os 200mm anuais nos anos de 1955, 1956 e 1959,

podendo apontar que nesses anos o clima teve uma conotação de árido.

De acordo com o gráfico 1 verifica-se uma irregularidade muito grande na distribuição

das chuvas, ultrapassando os 600mm em 1914, porém no ano seguinte ficando apenas

próximo dos 150mm; a linha de tendência mostra-se estável, estando próxima dos 300 mm

anuais de precipitação. Especulando no sentido de alerta a um processo que poderíamos

considerar como a borda de desastre que, se o processo continuasse de forma decrescente, a

longo prazo se torna um problema, mostrando um dos indicadores para “a desertificação

climática que corresponde à redução progressiva das chuvas, determinada por causas naturais”

(Conti, 1998,p.66), no entanto esse fato não foi constatado por isso consideramos que a área

não apresenta dados climáticos que comprovem uma susceptibilidade ao processo de

desertificação climática.

Gráfico 1 – Distribuição anual das chuvas, observando-se linha de tendência.

A ocorrência de secas periódicas (a estiagem pode durar de sete a nove meses)

estabelece regimes intermitentes aos rios e deixa a vegetação sem folhas, deixando o sol

incidir direto no solo, fazendo com que as folhas que caem sejam consumidas pelo calor sem

formar manta florestal. Com a chegada das chuvas, mesmo com um período muito curto,

chegando de três a cinco meses, os vegetais apresentam um poder de regeneração e

rebrotamento muito vigoroso, com isso a paisagem muda muito rapidamente cobrindo-se de

Page 11: DEGRADAÇÃO DA CAATINGA NO SERIDÓ PARAIBANO

folhas e o solo fica forrado de pequenas plantas, por isso pode-se afirmar que a Caatinga

apresenta uma grande eficiência no convívio em ambientes de clima rigoroso.

A visita ao Município de Picuí permitiu uma aproximação real entre o conceito por nós

trabalhado e o cenário que contempla o fenômeno denominado de desertificação. A coleta de

informes junto aos habitantes do lugar nos permitiu um breve aprofundamento na questão

relativa à ocorrência da dinâmica de processos de degredacionais. Numa primeira vista a

paisagem, bastante antropizada com a presença de atividades sócio-econômicas, aponta uma

situação inadvertida no trato como o meio ambiente relativo àquela paisagem sensível à

presença de duas grandes indústrias de cerâmica, cuja matéria prima utilizada é a argila para a

fabricação de tijolos e telhas, sendo a energia que se utiliza nos fornos de origem vegetal.

A Caatinga naquele lugar, encontra-se bastante alterada a partir da substituição de

espécies vegetais nativas por cultivos e pastagens (ver Fig. 4). O desmatamento ainda é uma

prática comum no preparo da terra para a agricultura e para a pecuária que, além de destruir a

cobertura vegetal, a qualidade da água, o equilíbrio do clima e consequentemente do solo,

prejudica a manutenção de populações da fauna existente (ver Fig. 5). Apesar do elevado grau

de antropismo ainda pudemos observar a presença de várias espécies típicas, tais como: coroa-

de-frade (Melocactus bahiensis), facheiro (Pilosocereus squamosus), faveleira (Cnidosculus

phyllacanthus), jurema-preta (Mimosa nigra), macambira (Bromelia laciniosa), mandacaru

(Cereus jamacaru), marmeleiro (Croton sincorensis), mofumbo (Combretum leprosum),

pinhão (Jatropha pohliana), xique-xique (Pilosocereus gounellei), entre outras.

Figura 4 – Cultivo de leguminosas(abril/2003) Figura 5 – Antropismo com queimada(abril/2003)

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Considerações Finais

A interpretação está ainda no nível elementar pois a paisagem contida no cenário

referente ao Município de Picuí, apesar de ser considerado pelo MMA como sendo um Núcleo

de Desertificação, não nos pareceu como tal. Tomamos como parâmetro as questões climáticas

e também a diversidade de indivíduos vegetais componentes daquele lugar. Porém, o que ficou

caracterizado é que há uma situação de clima cuja estiagem é e tem sido real e que os

habitantes do lugar não conseguiram ainda conviver, com a questão da estiagem vista como

seca.

Nos períodos de “tempo bom”, aqueles momentos de precipitação pluvial com relativa

abundância, a população vegetal consegue se recuperar e as atividades sócio-econômicas,

voltadas para a agricultura de subsistência, tiram certo proveito desses momentos em que o

solo permite uma produção de adequação de mercado.

Num outro momento pode-se averiguar que a relação entre a sociedade e o meio

natural não tem sido de forma adequada, pois o uso de procedimentos agrícolas estressam o

solo, ou mesmo a alteração da paisagem de cenário natural para um cenário agrícola, tem sido

uma atividade inadequado em relação à convivência com o ritmo ambiental. Não resta dúvida

que domar o clima não tem sido possível, porém conviver com ele e suas nuances pode ser

uma alternativa não apenas de cunho econômico mas sim cultural. A cultura da seca precisa

ser substituída pela cultura da convivência com a estiagem, por isso deve-se compreender a

oscilação climática e saber aproveitar o tempo bom no quesito estocagem de água, a partir de

modelos convencionais como os açudes e principalmente pela forma do uso das cisternas

aproveitamento os telhados das casas.

A cultura da estiagem é uma forma temática que deve ser abordada por dentro dos

temas geográficos, observados no ensino fundamental e médio, e assim a convivência com o

clima rigoroso tendo a estiagem e não a seca como referência no saber da geografia do

Nordeste seco.

Page 13: DEGRADAÇÃO DA CAATINGA NO SERIDÓ PARAIBANO

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