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A Declaração de Independência dos Estados Unidos da América: Elementos do Conservadorismo Prof. Rodrigo Belinaso Guimarães

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A Declaração de Independência dos Estados Unidos da América:

Elementos do Conservadorismo

Prof. Rodrigo Belinaso Guimarães

Contra as Utopias SociaisA independência Norte-Americana de 1776 foi um movimento político que se justificava por uma série de opressões que o povo americano sofria dos Ingleses, relatadas por seus líderes na Declaração. Não se tratava de um movimento revolucionário de tipo Iluminista que proporia a substituição da classe social dominante e a criação de uma nova sociedade, mas da afirmação da soberania de um povo e da permanência de suas tradições.

“Quando, no curso dos acontecimentos humanos, se torna necessário a um povo dissolver os laços políticos que o ligavam a outro, e assumir, entre os poderes da Terra, posição igual e separada, a que lhe dão direito as leis da natureza e as do Deus da natureza, o respeito digno para com as opiniões dos homens exige que se declarem as causas que os levam a essa separação.”

Reafirmação da Natureza Humana

As bases para o movimento político norte-americano estão na ideia de povo enquanto unidade abstrata que experimenta uma história comum e, principalmente, na de indivíduos soberanos que necessitam de um ambiente propício para vivenciar suas potencialidades e predisposições psicológicas.

“Consideramos estas verdades como evidentes por si mesmas, que todos os homens são criados iguais, dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, que entre estes estão a vida, a liberdade e a procura da felicidade.”

Limitação do GovernoO Estado, em si mesmo, é um perigo constante para a comunidade humana que centraliza, ou seja, sempre haverá o risco de ser criada uma concentração de poder econômico e político que restrinja a liberdade. Assim, o governo não deve apenas ser limitado pelas leis, que podem ser revogadas por ele mesmo, mas também pelo próprio povo, potencializado pela permissão ao porte de armas pelos indivíduos.

“(…) governos são instituídos entre os homens, derivando seus justos poderes do consentimento dos governados; que, sempre que qualquer forma de governo se torne destrutiva de tais fins, cabe ao povo o direito de alterá-la ou aboli-la e instituir novo governo, baseando-o em tais princípios (vida, liberdade e busca pela felicidade) e organizando-lhe os poderes pela forma que lhe pareça mais conveniente para realizar-lhe a segurança e a felicidade.”

Prudência

As ações humanas precisam ser sempre pensadas em suas consequências de longo prazo. Assim, se alguma política ou ideal parecem um bem no momento imediato, eles podem ter consequências catastróficas com o tempo.

“(…) a prudência recomenda que não se mudem os governos instituídos há muito tempo por motivos leves e passageiros; e, assim sendo, toda experiência tem mostrado que os homens estão mais dispostos a sofrer, enquanto os males são suportáveis, do que a se desagravar, abolindo as formas a que se acostumaram.”

RestauraçãoPor não seguirem qualquer utopia social, que delegaria ao futuro a justificação de seus atos presentes, os conservadores acreditam que a ação política precisa estar baseada nos valores que constituíram a civilização ocidental e que foram fundamentais no passado para a geração de bem-estar e segurança. Portanto, a mudança social para os conservadores não pode ser motivada por ideais futuros abstratos, mas na restauração de valores éticos perdidos.

“quando uma longa série de abusos e usurpações, perseguindo invariavelmente o mesmo objetivo, indica o desígnio de reduzi-los (indivíduos) ao despotismo absoluto, assistem-lhes o direito, bem como o dever, de abolir tais governos e instituir novos Guardiães para sua futura segurança.”

Ordem Moral

Frente a constatação de um cenário social e político caótico e injustificável, o conservador reafirma seu dever para com a comunidade, suas responsabilidades para com seus semelhantes, a busca pela justiça e a valorização da honra. Estes são os valores morais que o moveriam para a ação política.

“Tal tem sido o sofrimento paciente destas colônias e tal agora a necessidade que as força a alterar os sistemas anteriores de governo. A história do atual Rei da Grã-Bretanha compõe-se de repetidas injúrias e usurpações, tendo todas por objetivo direto, o estabelecimento da tirania absoluta sobre estes Estados.”

Liberdade PolíticaAssim como a liberdade de espírito e tal como as demais liberdades, a liberdade política é fundamental para a autodeterminação de um povo. Porém, diferentemente dos liberais, a liberdade não é um valor acima de outros para os conservadores, ou seja, para estes há uma série de tradições que são igualmente importantes para a vida comunitária.

“Proibiu (Rei da Grã-Bretanha) aos governadores a promulgação de leis de importância imediata e urgente, a menos que a aplicação fosse suspensa até que se obtivesse o seu assentimento, e, uma vez suspensas, deixou inteiramente de dispensar-lhes atenção. Recusou promulgar outras leis para o bem-estar de grandes distritos de povo, a menos que abandonassem o direito de representação no legislativo, direito inestimável para eles e temível apenas para os tiranos.”

Ordem PolíticaEmbora os conservadores anseiem por um Estado limitado em seu poder de concentração econômico, cultural e político; há a necessidade de haver uma ordem política baseada em leis e no consentimento do povo. Desse modo, o Estado passa a ser um guardião da estabilidade, para que não haja a ação destrutiva de multidões enfurecidas.

“Recusou (Rei da Grã-Bretanha) por muito tempo, depois de tais dissoluções (legislativo), fazer com que outros fossem eleitos; em virtude do que os poderes legislativos incapazes de aniquilação voltaram ao povo em geral para que os exercesse; ficando durante esse tempo o Estado exposto a todos os perigos de invasão externa ou convulsão interna.”

Convivência com Diferenças CulturaisQualquer nação não precisa ter, necessariamente, uma unidade étnica, religiosa, ideológica, etc. Assim, é salutar que haja dentro dos limites de um povo a convivência entre indivíduos com diferenças culturais. Porém, essa convivência possui limites demarcados pela capacidade com que cada grupo consegue se integrar aos valores mais amplos da civilização ocidental. Sendo impossível, aos conservadores, a convivência com aqueles que não estão predispostos a aderirem aos valores da potencialidade individual, do amor ao próximo e da limitação legal.

“Procurou (Rei da Inglaterra) impedir o povoamento destes estados, obstruindo para esse fim as leis de naturalização de estrangeiros, recusando promulgar outras que animassem as migrações para cá e complicando as condições para novas apropriações de terras. (…) Provocou insurreições internas entre nós e procurou trazer contra os habitantes das fronteiras os índios selvagens e impiedosos, cuja regra sabida de guerra é a destruição sem distinção de idade, sexo e condições.”

Judiciário Independente

É preciso ter um poder independente do político e econômico para a reparação e punição dos crimes contra os indivíduos e a sociedade.

“Dificultou (Rei da Grã-Bretanha) a administração da justiça pela recusa de assentimento a leis que estabeleciam poderes judiciários. Tornou os juízes dependentes apenas da vontade dele para gozo do cargo e valor e pagamento dos respectivos salários.”

Estado Reduzido ao Mínimo

Qualquer adoção de direitos, regulações, obras e políticas por parte do Estado requer um conjunto de funcionários para operar a burocracia necessária à execução dessas ações. Além disso, esse conjunto de servidores precisam ocupar prédios, aumentando seus custos. Deste modo, qualquer nova intervenção estatal na sociedade vai requerer o aumento da carga tributária, retirando a liberdade dos indivíduos de usarem seus recursos como bem entenderem.

“Criou (Rei da Grã-Bretanha) uma multidão de novos cargos e para eles enviou enxames de funcionários para perseguir o povo e devorar-nos a substância.”

Liberdade EconômicaA liberdade econômica pode ser restringida pelo Estado caso a concentração de poder econômico acabe por prejudicar a própria sociedade, por exemplo, o surgimento de monopólios. Assim, a liberdade econômica para os conservadores não é um bem em si mesmo, mas depende da manutenção de outros valores. Nada mais apavorante para um conservador do que a concentração de poder político associada com grandes empresas monopolistas.

“(fez) (Rei da Grã-Bretanha) cessar o nosso comércio com todas as partes do mundo; (lançou) impostos sem nosso consentimento.”

Contra Governos TotalitáriosA concentração de poder é um fenômeno tipicamente moderno, nenhum império da antiguidade teria sonhado com os recursos econômicos, culturais, políticos, militares que o Estado moderno detém para impor suas vontades às populações e aos indivíduos. Desse modo, um dos elementos do conservadorismo é o de dotar o povo das condições de impedir tal concentração de recursos nas mãos do Estado como, por exemplo, através da reivindicação por uma baixa carga tributária.

“Saqueou (Rei da Inglaterra) os nossos mares, devastou as nossas costas, incendiou as nossas cidades e destruiu a vida do nosso povo. Está, agora mesmo, a transportar grandes exércitos de mercenários estrangeiros para completar a obra de morte, desolação e tirania, já iniciada em circunstâncias de crueldade e perfídia raramente igualadas nas idades mais bárbaras e totalmente indignas do chefe de uma nação civilizada.”

Tradição

A principal ligação que os indivíduos têm entre si para o pensamento conservador não está nem na economia tampouco na existência de um governo central, mas encontra-se na consciência de uma história comum, ou seja, nas experiências comuns que constituem os povos. Assim, o conhecimento da tradição é essencial para a ligação entre os homens do presente com os do passado.

“Lembramos-lhes das circunstâncias de nossa migração e estabelecimento aqui. Apelamos para a justiça natural e para a magnanimidade, e conjuramo-los, pelos laços de nosso parentesco comum, a repudiarem essas usurpações que interromperiam, inevitavelmente, nossas ligações e a nossa correspondência.”

TranscendênciaO apelo ao Deus criador entre os conservadores, revela além de seu apego aos valores cristãos, a consciência da falibilidade humana e da impossibilidade de uma ordem social perfeita ser construída por indivíduos falhos. Assim, a busca da misericórdia de Deus torna-se uma necessidade entre os conservadores. A transcendência também se revela na adoção de ideais que estão acima da vida humana individual.

“Nós, por conseguinte, representantes dos ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA, reunidos em CONGRESSO GERAL, apelando para o Juiz Supremo do mundo pela retidão das nossas intenções, em nome e por autoridade do bom povo destas colonias, publicamos e declaramos solenemente: que estas colonias unidas são e de direito têm de ser ESTADOS LIVRES E INDEPENDENTES. (… ) E em apoio desta declaração, plenos de firme confiança na proteção da Divina Providência, empenhamos mutuamente nossas vidas, nossas fortunas e nossa sagrada honra.”

Conclusão

Esta apresentação teve a intenção de aproximar alguns dos valores que hoje podem ser caracterizados enquanto pertencentes a uma cosmovisão conservadora com a Declaração de Independência dos Estados Unidos da América. O documento escrito em 1776 é um dos principais da história moderna e possui muitas diferenças da concepção iluminista revolucionária francesa. É possível que grande parte do anti-americanismo presente na cultura brasileira advenha de seus laços com os ideais conservadores e não daqueles propriamente revolucionários.