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DE DELIVERY DE SALADAS A FINTECHS:
DEZ ESTUDOS DE CASO DE NEGÓCIOS COM
IMPACTO SOCIAL E AMBIENTAL
Negócios Vencedores da Iniciativa Incluir 2017
Tajla Medeiros
Brasília-DF
2018
3
2018. Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e
Pequenas Empresas – Sebrae
Informações e contatos
Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas
Empresas – Sebrae Unidade de Desenvolvimento de
Produtos e Cultura Empreendedora
SGAS 605 – Conjunto A – CEP: 70200-904 –
Brasília/DF
Telefone: 0800 570 0800
www.sebrae.com.br
Presidente do Conselho Deliberativo Nacional
Robson Braga de Andrade
Diretor-Presidente
Guilherme Afif Domingos
Diretora Técnica
Heloisa Regina Guimarães de Menezes
Diretor de Administração e Finanças
Vinicius Lages
Unidade de Desenvolvimento de Produtos e
Cultura Empreendedora
Gerente
Mirela Malvestiti
4
Gerente Adjunta
Olívia Castro
Autora
Tajla Medeiros
Editoração
Lourdes Hungria
Luciana Rodrigues
Revisão Ortográfica
Discovery – Formação Profissional Ltda. – ME
Capa
Jéssica Martins
5
AGRADECIMENTOS
Do Sebrae, à equipe de Negócios de Impacto
Social e Ambiental – Frederico Cabaleiro,
Rafael Rodrigues De Lima e Valéria Barros – e
à estagiária e estudante de Jornalismo Thalita
Ribeiro.
Do PNUD, à Natália Torres e à Luciana de
Aguiar.
E aos (às) empresários (as) dos negócios
vencedores da Iniciativa Incluir 2017, por tão
atenciosamente cederem entrevistas e
colaborarem com a revisão dos casos – e por
terem histórias tão incríveis para contar.
6
SUMÁRIO
Prólogo ........................................................................... 9
Primeira parte Negócios com foco em
alimentação saudável que apostaram na
mulher como agente de transformação social
......................................................................................... 15
Muda Meu Mundo: como ampliar o acesso
à alimentação saudável e sem agrotóxicos
para todas as classes sociais? ....................... 18
Saladorama: como ampliar o acesso à
educação nutricional e à alimentação
saudável às comunidades de baixa renda?
................................................................................... 41
Plant – Fazendas Urbanas: Como criar um
negócio de hortas de alto impacto social?
................................................................................... 61
Segunda parte Impacto social com soluções
de arquitetura rural e urbana ............................. 84
Estúdio Flume: Como utilizar soluções de
arquitetura para auxiliar cooperativas de
produtores de alimento no interior do
Maranhão? ............................................................ 86
7
Moradigna: Como elevar a qualidade das
reformas habitacionais da população de
baixa renda? ....................................................... 102
Terceira parte Busca por escala e impacto
social com startups financeiras ........................ 121
Firgun: como facilitar o acesso ao crédito
produtivo e à educação financeira? ......... 123
SmartMEI: como fornecer serviços para
empresas de pequeno porte por meio de
uma solução tecnológica escalável? ........ 141
Quarta parte Tecnologias inovadoras e
soluções para questão hídrica ......................... 159
Adapta Sertão: como promover o
desenvolvimento sustentável da agricultura
e da pecuária no contexto de intensificação
da seca do semiárido brasileiro? ............... 161
Marina Tecnologia: como transformar
resíduos agrícolas em produtos
sustentáveis e de alta tecnologia? ............ 186
Quinta parte Inclusão de pessoas mais velhas
no mercado de trabalho ..................................... 195
MaturiJobs: como recolocar pessoas da
melhor idade no mercado de trabalho? 197
8
Notas de Fim ........................................................... 212
9
PRÓLOGO
Negócios vencedores da Iniciativa Incluir
Ações concretas para tempos melhores.
Iniciativas de quem consegue enxergar
problemas sociais, analisá-los e colocar em
prática propostas autossustentáveis para
solucioná-los. Os casos que relatamos aqui
fazem parte dessa nova forma de fazer
negócio, em que a sustentabilidade, tida em
seu sentido amplo – que envolve a
preservação de recursos nos campos social,
econômico e ambiental –, é parte
indissociável.
Primeiramente, faz-se necessário tratar da
questão conceitual. Para o Instituto YUNUS,
“negócios sociais são empresas que têm a
única missão de solucionar um problema
social, são autossustentáveis financeiramente
e não distribuem dividendos. É uma empresa
na qual o investidor recupera seu
investimento inicial, mas o lucro gerado é
reinvestido na própria empresa para
ampliação do impacto”. Já a Força Tarefa de
10
Finanças Sociais, coordenada pelo Instituto
em Cidadania Empresarial (ICE), estabelece
quatro princípios para todo negócio social:
propósito de gerar impacto socioambiental
positivo explícito na missão; avaliação
periódica do impacto gerado; lógica
econômica que permita receita própria; e
governança que considere interesses de
investidores, clientes e comunidade.
Os casos premiados da Iniciativa Incluir 2017
são negócios, em diferentes estágios de
maturidade, com impacto social e/ou
ambiental em um ou mais dos quesitos que
podemos chamar de “por quem”, “como” ou
“para quem”. Produzem impacto ao incluir,
por exemplo: práticas e políticas que
envolvam pessoas em situação de
vulnerabilidade na estrutura societária e
gerencial da empresa (por quem); ao
capacitar e empregar pessoas em situação de
vulnerabilidade de forma contínua e
sistemática (como); ou ao ter como público-
alvo públicos marginalizados e sem acesso a
produtos e serviços básicos (para quem). Em
todas as vencedoras, um ou mais quesito está
presente em seu modelo de negócio,
11
caracterizando um modelo de negócio de
impacto. Assumindo diferentes configurações
jurídicas (associações, cooperativas ou
empresas), são todas iniciativas que já
possuem ou estão em via de possuir
resultado financeiro positivo.
Os estudos de caso
Todo estudo de caso do Sebrae é orientado
por um problema. Aqui, achamos útil centrar
nossa análise no problema fundador: como
cada negócio se organizou e concentrou
esforços para resolver o problema social
identificado?
O título de cada caso revela o dilema tal
como enxergado pelo empreendedor, a
pergunta que levou à formulação do negócio
que propiciaria a mitigação do problema
social. O título revela, ainda, que as
motivações para empreender em um negócio
social são várias. Algumas perguntas
confundem-se com propósitos de vida; outras
deixam evidente o olhar empreendedor de
quem busca a escala, a melhor oportunidade
de negócio; outras, ainda, são fruto do
12
contexto de empreendedores que queriam
solução para o problema que afetava a
própria vida – empreendedores que talvez
quisessem não ter sido protagonistas da
solução, para que pudessem ter sido eles
mesmos beneficiários, em momento anterior.
Em seguida, o caso traz o contexto do
problema social. Por suas complexidades, os
problemas demandam um conjunto de
iniciativas públicas e privadas para solução –
mas, principalmente, demandam que os
primeiros passos sejam dados. O objetivo
dessa seção é levar informação de contexto
para o leitor, que embora já possa ter tido
contato com o assunto em noticiário, talvez
possa ter uma nova visão dos fatos – e, quem
sabe, ser inspirado a novas ideias e negócios.
A descrição do modelo de negócio e dos
elementos-chave do negócio social vem na
seção “solução”. Informações sobre conexões
e parcerias; busca de oportunidades; erros e
acertos; vantagens competitivas; viabilidade
financeira, entre outros.
13
Por fim, apresentamos os resultados
almejados ou já conquistados até o momento
de apuração do caso, tanto sociais e
ambientais quanto financeiros.
Cada caso traz um aprendizado único: uns
pela capacidade de estabelecer parcerias;
outros pelo compromisso com a maximização
do impacto social; outros pela sagacidade de
detectar oportunidade de negócio; outros
pelas características empreendedoras; outros,
ainda, pela coragem de empreender em
ramos ainda pouco valorizados e que exigem
mudança de cultura. Esperamos que ao
menos um lhe inspire e lhe faça querer
empreender também.
A estrutura do livro
Os casos estão agrupados pela semelhança
dos problemas que visavam solucionar.
Na primeira parte, conhecemos a Muda Meu
Mundo, o Saladorama e a Plant – Fazendas
Urbanas, negócios que atuavam com
alimentação saudável e que também tinham
em comum o investimento no poder
transformador da mulher.
14
Na segunda parte, tratamos do Estúdio Flume
e da Moradigna, negócios com soluções
arquitetônicas para regiões com pobres
relações econômicas, sociais e ambientais e
marcadas pelo baixo planejamento e
desenvolvimento.
Na terceira parte, falamos da Firgun e da
SmartMEI, exemplos de fintechs que atuavam
com a alta concentração bancária e a
exclusão financeira no Brasil.
Na quarta parte, estudamos o Adapta Sertão
e a Marina Tecnologia, negócios sociais que
utilizaram pesquisa e desenvolvimento para
construir tecnologias no contexto da crise
hídrica mundial.
Na quinta parte, analisamos a MaturiJobs,
plataforma de emprego que visava inserir
profissionais maduros no mercado,
desafiando o preconceito de idade no Brasil.
15
PRIMEIRA PARTE
NEGÓCIOS COM
FOCO EM
ALIMENTAÇÃO
SAUDÁVEL QUE
APOSTARAM NA
MULHER COMO
AGENTE DE
TRANSFORMAÇÃO
SOCIAL
16
A questão da segurança alimentar
permanecia preocupante.
Em 2017, a Organização das Nações Unidas
para a Alimentação e a Agricultura (FAO)
constatou que a fome no mundo havia
voltado a crescer depois de anos em queda
devido, essencialmente, aos deslocamentos
forçados.
Os mais vulneráveis eram os principais
prejudicados: a pobreza era um fator
relevante para os problemas de saúde
decorrentes de má alimentação. Além disso,
cada vez mais estudos confirmavam que a
agricultura convencional, com a alta
concentração de terra e a prática da
monocultura, degradava os solos e gerava
perda de biodiversidade, afetando a
segurança alimentar das gerações atuais e
futuras – o que fortaleceu o debate sobre a
produção agroecológica.
Nesse contexto, três vencedoras da Incluir
2017 empreendiam para atuar com essas
questões: o Muda Meu Mundo, promovendo
a acessibilidade de orgânicos e o
17
fortalecimento do produtor rural; o
Saladorama, com capacitação, produção e
distribuição de alimentos saudáveis nas
comunidades de menor desenvolvimento; e a
Plant – Fazendas Urbanas, atuando com
segurança alimentar e redução de ilhas de
calor com hortas de telhado.
Em comum, as iniciativas também investiam
na alta capacidade das mulheres de promover
transformações sociais.
18
MUDA MEU MUNDO: COMO AMPLIAR O
ACESSO À ALIMENTAÇÃO
SAUDÁVEL E SEM AGROTÓXICOS PARA TODAS AS CLASSES
SOCIAIS?
Com a motivação inicial de mudar a
alimentação de crianças em situação de
pobreza, as irmãs Déborah e Priscilla Veras
fundaram o Muda Meu Mundo para fortalecer
a agricultura familiar e promover o comércio
justo em Fortaleza (CE).
19
INFORMAÇÕES GERAIS
Em contexto de importantes setores políticos
e econômicos a favor da manutenção da
agricultura convencional, o Muda Meu
Mundo capacitava agricultores familiares para
produção agroecológica e promovia a
comercialização justa dos produtos em feiras,
eliminando a figura do atravessador. Fundado
em 2016 pelas empreendedoras Déborah e
Priscilla Veras, o negócio ainda buscava
sustentabilidade financeira e impactava
diretamente 35 famílias e uma cooperativa
composta por dez mulheres no primeiro ano
de existência. Em 2017, foi reconhecido por
três prêmios relacionados a
empreendedorismo de impacto. A meta era
apoiar diretamente ao menos 400 famílias e
dez cooperativas de mulheres até 2020.
20
AS SÓCIAS DÉBORAH E PRISCILLA VERAS.
21
INTRODUÇÃO
Otimizando conhecimentos, experiências e
parcerias
A experiência profissional das sócias do Muda
Meu Mundo foi a chave para o negócio social.
Priscilla era licenciada em Pedagogia com
ênfase em supervisão escolar pela
Universidade Católica de Pernambuco
(Unicap). A empreendedora havia atuado por
dez anos na Compassion International,
Organização Não Governamental (ONG) de
desenvolvimento de crianças e adolescentes,
onde foi facilitadora de parcerias e gerente de
projetos.
“O trabalho na Compassion é muito
importante. Mas me inquietava as crianças
terem alimentação saudável na ONG, e
comida com pouca qualidade quando iam
para casa”, contou Priscilla, falando de sua
motivação para fundar o Muda Meu Mundo.
Já Déborah era formada em Secretariado
Executivo pela Universidade Federal de
22
Pernambuco (UFPE) e tinha bastante
experiência na área de administração e
finanças. Além disso, estava atuando há cerca
de oito anos com trabalhos voluntários, em
organizações como WWF Brasil, Novo Jeito
e Compassion.
Motivadas para mudar o mundo e possuindo
conhecimentos complementares, as duas
irmãs começaram a trabalhar a questão da
soberania alimentar por meio da implantação
de hortas urbanas em Fortaleza, mas
perceberam que era preciso ir à raiz do
problema. “A questão da soberania alimentar
não dependia da quantidade de hortas
urbanas, mas do fortalecimento da agricultura
familiar”, contou Priscilla.
Começaram, então, a estudar mais sobre
negócios de impacto e sobre a agricultura
familiar no Ceará. Com experiência em
consultoria para projetos sociais e programas
socioeducativos no Nordeste, Priscilla não
teve dificuldade para se inserir entre os
produtores rurais. “Um grupo foi
apresentando o outro e fomos entendendo as
necessidades deles”, contou.
23
Pesquisando e entendendo o problema
“Os produtores agrícolas familiares não eram
capacitados, não tinham competitividade.
Ficavam à mercê dos atravessadores, que
chegavam a comprar um produto por oito e
vender por quarenta reais. Assim, perdia
agricultor e perdia consumidor”, relataram as
sócias.
As sócias perceberam necessidade de
melhoria não apenas na distribuição, mas
também na produção dos alimentos. “Não
bastava que a produção fosse sem
agrotóxicos. Era preciso preservar o solo, a
água e garantir a diversificação”, contou
Priscilla.
Nesse processo de contato com os
agricultores, as parcerias foram fundamentais.
Destacaram-se a com a Agência de
Desenvolvimento Econômico Local (ADEL),
que tinha foco no protagonismo juvenil das
comunidades rurais; e com o Centro de
Educação Popular em Defesa do Meio
Ambiente (CEPEMA). Com esse último, a
parceria foi focada em projetos de liderança
24
feminina para sustentabilidade e soberania
alimentar.
CONTEXTO DO PROBLEMA
Efeitos nocivos dos agrotóxicos e o
potencial do mercado orgânico
O Brasil vinha ocupando o espaço de um dos
maiores consumidores de agrotóxicos desde
2009. De 2000 para 2012, houve crescimento
de 288% no uso. Em 2014, o faturamento da
indústria de agrotóxicos no Brasil havia sido
de US$ 12 bilhões.1
Havia crescido, também, o número de
pesquisas que indicavam os diversos efeitos
nocivos desses compostos químicos. De
acordo com estudo da Organização das
Nações Unidas (ONU),2 os pesticidas eram
responsáveis por 200 mil mortes por
intoxicação aguda a cada ano. O estudo
também associou a exposição crônica aos
pesticidas a algumas formas de câncer, como
Alzheimer e Parkinson. Sobre os danos do
agrotóxico, destacavam-se, ainda, os estudos
25
do Instituto Nacional do Câncer (INCA) e
os do Conselho Nacional de Segurança
Alimentar (CONSEA).
A rejeição aos agrotóxicos levou ao
crescimento da demanda e da produção de
orgânicos, principalmente nos Estados
Unidos. No país que era o maior consumidor
e o maior produtor de orgânicos do mundo, a
gigante Walmart havia adquirido, em 2017, a
Whole Foods Market, considerada, então, a
maior rede de varejo de orgânicos e produtos
naturais de todo planeta, em uma transação
de US$ 13,4 bilhões.3
No Brasil, o mercado de orgânicos também
vinha crescendo, com projeção de 20% ao
ano no período de 2014 a 2017.4 No mesmo
ano, o Ministério da Agricultura Pecuária e
Abastecimento (MAPA) registrou 16 mil
produtores orgânicos cadastrados, sendo
cerca de 75% agricultores familiares. Mas
ainda faltava muito: pesquisa do Conselho
Brasileiro da Produção Orgânica e Sustentável
(ORGANIS, 2017) verificou que apenas 15%
dos brasileiros consumiam produtos
orgânicos – para referência, esse número era
26
de 82% nos Estados Unidos. A alegação para
o não consumo havia sido, principalmente, o
alto preço; além da falta de interesse e de
local para compra. Para o diretor da ORGANIS
Ming Liu, “para chegar um dia aos números
dos Estados Unidos, precisamos conscientizar
e educar o consumidor, valorizar o trabalho
local e garantir a segurança dos produtos”.5
Os lados da moeda
Na defesa dos agrotóxicos estavam,
principalmente, os grandes produtores e
exportadores de produtos primários,
representados, no Congresso Nacional, pela
bancada ruralista. Desde 2002, haviam
colocado em tramitação vários Projetos de Lei
que buscavam alterar a Lei Federal n°
7.802/1989, que tratava do tema dos
agrotóxicos.
As principais críticas dos pró-orgânicos aos
Projetos de Lei, que chamavam de “pacote do
veneno”, eram: a proposta de mudar a
nomenclatura de agrotóxico para defensivo
fitossanitário; o fim da propaganda específica;
a possibilidade de registro de substâncias
27
cancerígenas; e o fim da necessidade de
aprovação do agrotóxico pelo Ministério do
Meio Ambiente (MMA). Já os ruralistas
alegavam que as medidas visavam
modernizar a legislação; e diminuir o número
de instâncias de aprovação, reduzindo a
apenas um órgão de controle – que seria
criado.
Em reação, movimentos populares
organizaram-se em torno da campanha
“Chega de agrotóxicos”, pela aprovação do
Projeto de Lei n° 6.670/2016, que instituía a
Política Nacional de Redução de
Agrotóxicos (PNaRa). Destacava-se, ainda, a
Campanha Permanente Contra os
Agrotóxicos e Pela Vida. Os movimentos
eram apoiados por instituições como
Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Fórum
Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar
e Nutricional (FBSSAN) e Greenpeace.
Enquanto o conflito em torno dos agrotóxicos
aparentava estar longe de se resolver, o
debate foi ampliado com o conceito de
agroecologia. Questionava-se não só o uso
de agrotóxicos, mas a monocultura e seus
28
impactos socioeconômicos; as diversas
formas de degradação do solo, como as
queimadas; a poluição das águas; o impacto
do uso de fertilizantes químicos no efeito
estufa; a relação da produção rural com o
sustento e a alimentação das comunidades
rurais, entre outros temas. Regulada pela Lei
nº 10.831/2003 e pelo Decreto nº
6.326/2007, a agricultura orgânica era
produzida sem modificação genética,
produtos químicos sintéticos ou artificiais. Já
no debate da agroecologia, questionava-se,
por exemplo, a agricultura convencional e as
práticas de monocultura.
Embora ainda não houvesse certificação para
a produção agroecológica, a Associação
Brasileira de Agroecologia (ABA), a Agência
Nacional de Agroecologia (ANA), a Organis e
a Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária (Embrapa) estudavam e
divulgavam o tema. A apresentadora e chef
de cozinha Bela Gil ficou famosa pela defesa
da alimentação saudável e da produção
agroecológica e ajudou a dar visibilidade ao
tema à população. “A gente parou de
diversificar o campo. A gente devasta e planta
29
uma, duas ou três monoculturas e isso acaba
afetando o modo como a gente consome,
como a gente come”.6 A ONU também
entendia que a agroecologia era chave para
erradicar a fome e buscava levar o tema em
suas campanhas e eventos sobre o combate à
fome. Era demanda da Organização “novo
tratado global para eliminar gradualmente o
uso de pesticidas perigosos na agricultura e
avançar em práticas agrícolas sustentáveis”.7
No Ceará
De acordo com o Diário do Nordeste, Adriano
Custódio, secretário executivo da Comissão
da Produção Orgânica (CPOrg), entendia que
os maiores desafios para a produção orgânica
no Ceará estavam no alto custo da
certificação, visto que não havia entidades
certificadoras no estado. Também entendia
que havia poucos locais de comercialização
direta, em comparação com outras regiões do
país.8
No estado, em 2013, a multinacional
Delmonte Fresh Produce foi condenada a
pagar indenização por danos morais e
30
materiais, além de verbas trabalhistas, pela
morte do trabalhador rural Vanderlei Matos,
contaminado pela exposição crônica a
agrotóxicos na Chapada do Apodi, em
Limoeiro do Norte.9 Para contar a história das
vítimas de intoxicação por agrotóxicos na
atividade agrícola, o jornal Diário do Nordeste
possuía série especial.
SOLUÇÃO
Capacitação para produção agroecológica
Com a implantação de métodos de produção
agroecológica nas propriedades apoiadas, o
Muda Meu Mundo buscava a diversificação
da produção, a renovação do solo e o
reaproveitamento da água. “Nossos produtos
não são apenas livres de agrotóxicos, mas de
exploração humana, comercial e animal”,
contou Priscilla. O aumento da retenção da
água nas plantações e a criação de banco de
sementes eram uns dos temas trabalhados no
programa de desenvolvimento agroecológico
da empresa. Além disso, os produtores eram
31
capacitados em noções administrativas sobre
o negócio.
O fortalecimento das famílias agricultoras, por
meio de visitas, diagnósticos e capacitações,
era um dos principais investimentos de
tempo e recursos financeiros do Muda Meu
Mundo. “Nós visitamos e conhecemos
agricultores de todos os lugares do estado e
criamos uma rede de formação para
diversificação, escalonamento e melhoria da
produção”, contou Priscilla.
Embora o Muda Meu Mundo possuísse
técnicos especialistas em permacultura e
sistema agroflorestal, a chave para as
transformações pretendidas no campo era o
conhecimento prático e profundo da
comunidade rural. “Temos um
relacionamento próximo com os agricultores.
Conhecemos mais que suas plantações, mas
seus amigos, suas famílias, seus sonhos”,
relataram as sócias.
Além das visitas a campo, o Muda Meu
Mundo estava em constante contato com os
agricultores por WhatsApp. “O grupo também
32
é importante para que eles troquem
experiências entre si”, contou Priscilla.
Produtora, mãe, irmã e cidadã: abordagem
holística de cliente e produtor(a)
O Muda Meu Mundo possuía uma
abordagem holística do ser humano, em que
tanto cliente quanto produtor eram vistos
como um ser humano integral. “Não fazia
sentido apenas o produto chegar às feiras. Se
as famílias agricultoras não estavam bem, se
os filhos dos produtores estavam cheios de
piolho, tinha alguma coisa errada”, contou
Priscilla.
A abordagem era coerente com o conceito de
agroecologia, em que o que importava não
era apenas a qualidade do alimento, mas
também os impactos humanos, sociais e
ambientais que ele gerava. Ou seja, não
importava só o que se comprava, mas de
quem era comprado e como aquilo havia sido
produzido. Em uma das ações com essa
abordagem, o Muda Meu Mundo realizou
uma vivência sobre mindfulness, em parceria
com o Grupo Inspirar. Toda a renda
33
arrecadada com a ação foi destinada para a
compra de um presente de casamento para o
“Seu Pelé”, agricultor familiar que finalmente
havia realizado o sonho de casar na igreja,
após 16 anos vivendo com a esposa. Quem
participou, sabia de tudo. É como se o Muda
Meu Mundo quisesse que o cliente soubesse
que “aquela alface tinha uma cara”; que, de
certa forma, carregava as emoções da família
que a criou.
A própria vivência mindfulness foi uma forma
de levar ao cliente a importância de se pensar
o ser humano como um todo: não era
suficiente cuidar apenas da alimentação, mas
também da mente. “A oficina levou a
consciência do ser humano integral, da
importância de se viver no presente”,
contaram as sócias.
34
“O SR. ROBERTO CUIDA DE VOCÊ E VOCÊ CUIDA DO SR.
ROBERTO. A ALFACE QUE VOCÊ COMPRA NAS FEIRAS
AGROECOLÓGICAS LEVA RENDA, VALOR E ESPERANÇA
AOS AGRICULTORES” – PRISCILLA VERAS.
Encontrando caminhos para a
sustentabilidade financeira
Até 2017, quase toda a receita da empresa
vinha da venda dos produtos nas feiras. Havia
baixa margem de lucro sobre o produto: eram
baratos para o cliente e retornavam valores
justos para os agricultores familiares,
equivalentes ao que era definido pela Central
de Abastecimento (CEASA), com seu
35
Programa de Garantia de Preços para a
Agricultura Familiar (PGPAF).
Com o baixo volume de vendas, o Muda Meu
Mundo ainda não havia alcançado o ponto de
equilíbrio. Muitas vezes, recorreriam a
crowdfundings para levantar dinheiro para
elaboração das feiras. Para mudar o cenário,
as empreendedoras estavam investindo em
diferentes frentes. Além dos produtos in
natura, vendiam produtos artesanais, como
molhos de tomate 100% natural, sem açúcar
ou conservantes, e bolos de banana sem
açúcar. A manufatura também fazia parte da
estratégia de desperdício zero.
36
GELEIA DE MELANCIA, ÓLEO DE COCO E MOLHO DE
TOMATE. “O MOLHO DE TOMATE ESTAVA VIRANDO
REFERÊNCIA” – PRISCILLA VERAS.
Com a Cepema, o Muda Meu Mundo também
estava buscando formas de agregar valor às
entregas, por meio de criação de certificação
para os produtos. Com o Sebrae, elaborava
estratégia para a entrega de cestas delivery
para empresas. Além disso, a entrega do
conhecimento também era forma de
monetização pela empresa: palestras em
eventos sobre sustentabilidade e cursos de
horta urbana eram uns dos exemplos. “É
muito legal levar os agricultores aos eventos
e palestras para que eles possam passar seu
conhecimento”, contou Priscilla.
37
RESULTADOS DE NEGÓCIO
Reconhecimentos e premiações
Ainda abaixo do ponto de equilíbrio, o Muda
Meu Mundo almejava estabilizar uma
margem de lucro de 35% a 45%. “Nosso lucro
estará na quantidade de venda, nos cursos e
produtos prontos, e não no superfaturamento
dos nossos produtos”, relataram as sócias.
Além do Prêmio Incluir 2017, o negócio havia
conseguido outras duas premiações, que
eram uma forma de chancelar a viabilidade
do negócio e dar visibilidade, atraindo
possíveis investidores. Com o Muda Meu
Mundo, Priscilla foi uma das vencedoras do
Prêmio Citi Jovens Microempreendedores,
promovido pela Aliança Empreendedora em
abril de 2017. Em setembro, ganhou prêmio
para jovens empreendedores da região da
América Latina e do Caribe (Young
Entrepreneur of the Year), promovido por
Youth Business International (YBI) e Inter-
American Development Bank (IADB).
38
No mesmo ano, a empresa também foi
convidada para ser incubada nas instalações
de coworking do Hub Inovação Nordeste
(Hubine), iniciativa do Banco do Nordeste
que apoiava empreendimentos que criassem
soluções para a economia regional.
RESULTADOS SOCIAIS
Segurança alimentar, melhor nutrição e
agricultura sustentável
Até 2017, o negócio impactava diretamente
cerca de 35 famílias e uma cooperativa com
dez mulheres, com perspectiva de treinar, no
curto prazo, mais 50 famílias de agricultores e
dois grupos de mulheres, em quilombos e
assentamentos do estado. A meta era, até
2020, ter ao menos 400 famílias e dez grupos
de mulheres diretamente apoiados.
Também planejava implementar indicadores
para medir o impacto, como: análise do
melhoramento do solo e da evolução das
técnicas de armazenamento de água; análise
do surgimento de agroflorestas e de outras
39
questões relativas a queimadas do solo,
umidade da terra e uso de coberturas
orgânicas nas plantações. As sócias
estudavam, ainda, formas de medir o
desenvolvimento socioeconômico das
famílias participantes.
O Muda Meu Mundo estava, principalmente,
alinhado com o Objetivo de Desenvolvimento
Sustentável (ODS) 2 – acabar com a fome,
alcançar a segurança alimentar e melhoria
da nutrição e promover a agricultura
sustentável. “Não se trata apenas de levar os
orgânicos às feiras. Buscamos a soberania
alimentar do Ceará”, relataram as sócias.
FEIRA AGROECOLÓGICA DO MUDA MEU MUNDO.
40
Vencedora Incluir 2017 na categoria
“Mulheres de Impacto”
facebook.com/mudameumundo/
41
SALADORAMA: COMO AMPLIAR O ACESSO À
EDUCAÇÃO NUTRICIONAL E À
ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL ÀS
COMUNIDADES DE BAIXA RENDA?
Com o lema “alimentação saudável é direito, e
não privilégio”, Hamilton Silva, Mariana
Fernandes e Isabela Ribeiro criaram o
Saladorama, negócio social de comidas
saudáveis focado nas classes C, D e E.
42
INFORMAÇÕES GERAIS
Com quase três anos de existência, o
Saladorama era um negócio que trabalhava
com franquias de saladas e lanches naturais a
preços acessíveis por delivery, em loja física
própria e em lojas de revendas. Também
possuía almoços com self-service do tipo
“pague quanto achar justo” e fornecia
lancheiras saudáveis para crianças, por meio
de parcerias. No final de 2017, já possuía
franquia em cinco estados brasileiros. Para
vender a preços baixos, a empresa capacitava
e utilizava mão de obra e fornecedores das
próprias comunidades onde funcionavam as
franquias. O Saladorama acreditava no
potencial de replicação do impacto social da
mulher e, por isso, eram elas que lideravam as
lojas e davam conta das cozinhas. A retenção
era de 30% dos royalties e o faturamento
total estava em cerca de R$ 1 milhão ao ano.
43
HAMILTON SILVA, FUNDADOR DO SALADORAMA.
INTRODUÇÃO
Entendendo que a necessidade pessoal
poderia ser coletiva
De São Gonçalo (RJ), Hamilton Silva tinha 25
anos quando teve a ideia de abrir um negócio
de alimentação saudável para as pessoas de
menor renda.
Em 2014, trabalhava em famoso espaço de
coworking no Rio de Janeiro. Ele, que era
engenheiro, adorava coxinhas e comidas de
boteco, mas percebeu com espanto que seus
colegas de trabalho, que tinham melhores
condições financeiras, optavam por opções
44
mais saudáveis. “Não entendia por que meus
colegas com mais dinheiro preferiam lasanha
de berinjela a uma boa picanha”, contou.
Tomou tanto gosto por esses tipos de comida
que, um dia, estava em São Gonçalo quando
bateu aquela vontade de um lanche mais
nutritivo: uma empada de legumes, uma
lasanha de berinjela, um churrasco de
melancia, quem sabe. Ao constatar que na
região esse tipo de refeição não era fácil de
encontrar, logo viu na contrariedade uma
oportunidade de negócio. “Será que as
pessoas daqui não comem porque não tem?”,
questionou-se.
Com a amiga e nutricionista Mariana
Fernandes – que era da Penha (RJ), uma
região na qual também não encontraram esse
tipo de refeição –, participaram do programa
de mentoria e aceleração da Yunus Negócios
Sociais Brasil para criarem um modelo de
negócio que atendesse a essa demanda. E,
em janeiro de 2015, com investimento inicial
de R$ 300, venderam a primeira salada pelo
Saladorama.
45
Comportamentos empreendedores e redes
de contato
Alguns pontos da carreira de Hamilton
levaram o empreendedor ao aprimoramento
de características empreendedoras e ao
contato com pessoas e conhecimentos
essenciais para o Saladorama.
Com sua característica proatividade, havia
fundado, em 2013, a Empresa Júnior da
faculdade onde cursava Engenharia de
Produção, enquanto também trabalhava com
consultorias para ter experiência de mercado.
Nesse período, sua busca por propósito na
vida profissional o levou à Artemísia.
“Imediatamente me identifiquei com a frase
‘entre ganhar dinheiro e mudar o mundo,
fique com os dois’”, contou Hamilton,
referindo-se ao slogan da Organização.
Hamilton também considerou essencial a
experiência que teve trabalhando em espaço
de coworking do Rio de Janeiro. Lá ele teria
aprendido a habilidade de se ter respostas e
reações rápidas, sem hesitações – o que, para
ele, seria uma das principais qualidades de
46
um empreendedor. Foi lá também que teve a
oportunidade de conviver com pessoas de
distintas classes sociais e histórias de vida, em
um ambiente de diversidade, que propiciou
que uma lasanha de berinjela, alimento que
era estranho para Hamilton, virasse ideia de
negócio.
Na Yunus, percebeu outro segredo para o
sucesso: pessoas apaixonadas pela causa. Foi
por meio de conexões que conseguiu
orgânicos, embalagens e clientes para as
primeiras vendas, mesmo com capital inicial
tão baixo. E era por meio de pessoas
entusiasmadas que seguia expandindo sem
gastar um centavo com publicidade.
“É sobre o empreendedor, e não sobre o
negócio”, acreditava Hamilton, que já havia
tido ideias legais de negócio antes da
Saladorama, mas sem a autoconfiança
necessária para levar as ideias para frente.
“Percebi que eu podia fazer acontecer. Perdi o
medo de errar”, contou.
47
CONTEXTO DO PROBLEMA
Doenças crônicas não transmissíveis e a
faixa da pobreza
Com um pouco de pesquisa, Hamilton diz ter
ficado espantado ao saber como a falta de
opções de alimentos saudáveis afetava a
qualidade e a expectativa de vida das pessoas
das classes sociais mais baixas no Brasil.
O assunto também preocupava o Ministério
da Saúde (MS). A partir do entendimento da
gravidade das doenças crônicas não
transmissíveis (DCNT) no país, o MS elaborou
o Plano de Ações Estratégicas para o
Enfrentamento das DCNT, abrangendo o
período 2011-2022. As principais doenças que
motivaram o plano eram as cardiovasculares,
as respiratórias crônicas, o diabetes e o
câncer.
De acordo com o Ministério, a maior parte
dessas doenças incluíam fatores de risco
modificáveis, como sedentarismo, consumo
insuficiente de frutas e hortaliças e
tabagismo. Além disso, elas atingiriam mais as
48
camadas pobres da população e grupos
vulneráveis. Devido ao impacto da renda na
compra de alimentos adequados, a redução
dos preços dos alimentos saudáveis era uma
das ações previstas no Plano.10
Diversas pesquisas já haviam associado o
aumento da obesidade e de outras doenças
crônicas não transmissíveis à pobreza e à falta
de recursos. De acordo com estudo de 2016
da Vigitel Brasil,11
por exemplo, a obesidade
no Brasil teria crescido 26,3% em dez anos e
atingido a preocupante marca de 53,8% em
2016. A incidência seria maior entre aqueles
com menor escolaridade. Outro estudo, da
FAO (2017)12
, relatou que, na América Latina e
no Caribe, 26,8% das mulheres eram
consideradas obesas, contra 18,5% dos
homens. Os índices de sobrepeso seriam
sintoma da pobreza e da falta de acesso a
serviços integrais de saúde e a educação
nutricional. Estudo de 2017 publicado pela
revista médica The Lancet13
trouxe o baixo
nível socioeconômico como um dos mais
fortes indicadores de mortalidade prematura
do mundo, devendo ser incorporado como
49
fator de risco pelas políticas da Organização
Mundial de Saúde (OMS).
Mulheres faziam a diferença
O Saladorama acreditava no poder da mulher
de transmitir os conhecimentos sobre
alimentação saudável para famílias e amigos.
Ela era que cozinhava em casa; seriam elas,
então, que fariam as comidas do restaurante
e liderariam as franquias.
“Aprendemos na prática que a renda captada
pelas mulheres gerava um alcance maior do
que a captada pelos homens”, contou Isabela.
Os sócios haviam observado que grande
parte do dinheiro gerado pelas mulheres do
Saladorama ia para alimentação e
manutenção dos custos básicos da família,
diferentemente dos casos que puderam
observar com os homens na mesma faixa
etária (entre 18 e 30 anos).
A FAO reconhecia o fortalecimento da mulher
e a promoção da igualdade de gênero como
os fatores mais importantes para determinar a
segurança alimentar de um país. Além de
produtoras, elas atuariam também como
50
principais encarregadas da alimentação das
crianças e da aquisição, da manipulação e da
preparação de alimentos. Na América Latina e
no Caribe, a agricultura familiar seria o
segmento mais importante na produção de
alimentos, onde as mulheres contribuiriam de
maneira fundamental. Em uma escala global,
elas produziriam mais da metade de todo o
alimento do mundo. Em regiões como a
África Subsaariana e o Caribe, esse número
poderia chegar a 80%.14
JANAÍNA SILVA, PARTE DA EQUIPE DO SALADORAMA.
51
SOLUÇÃO
Franquia para a classe C: entendendo o
modelo de negócio
“Como o negócio era escalável e lucrativo, já
chegaram a pedir cinco franquias de uma vez.
Mas não rolava”, contou a sócia do
Saladorama, Isabela, enfatizando que eram
vários os requisitos para aprovação da
franquia. Não bastava ter noção de negócios,
era preciso ter propósito social compatível
com o Saladorama.
Com foco na classe C, uma franquia podia
custar entre R$ 15 e 35 mil para o
franqueado, ou melhor: para a franqueada.
“Franqueamos sempre para mulheres, pois
percebemos que elas impactam mais a
comunidade, levam comida saudável para
casa e repassam o conhecimento”, contou
Hamilton.
Desencorajadas a pedir empréstimos e a
endividarem-se para aquisição do negócio, as
franqueadas podiam se unir a mais pessoas
para abrir a franquia. Além disso, os royalties
52
da franquia incidiam apenas em cima do
lucro, com margem de 30% para os
franqueadores. “Eu só ganho se você ganhar.
Por isso, força!”, contou Hamilton sobre o que
dizia às franqueadas.
As franqueadas tinham relativa autonomia
para tocar os negócios, e o Saladorama ficava
por conta da gestão da marca. Mas alguns
princípios deviam ser mantidos: o fornecedor
dos alimentos e a equipe da cozinha e da
entrega deveriam ser da comunidade. Além
do impacto na geração de renda local, isso
era efetivo para o negócio. “Isso diminuía
custos de compra e logística, aumentando a
margem de lucro e a competitividade
comercial”, contou Isabela.
O modelo de rentabilidade das franquias
estava apoiado, principalmente, em cinco
pilares.
1) Delivery: pedidos por WhatsApp, Facebook,
iFood ou pelo site. Estavam disponíveis
diversos tipos de salada, lanches e pratos
quentes. O preço variava de acordo com o
produto, mas era acessível para a classe C,
53
variando de R$ 8 a R$ 21. De bicicleta, as
entregas eram feitas sem frete em um raio de
até cerca de 5 quilômetros da unidade. A
depender da unidade, fretes eram atribuídos
a regiões mais distantes.
2) Restaurante da comunidade: como opção
aos econômicos “pratos feitos”, o Saladorama
servia almoços, e os consumidores pagavam
o quanto achavam justo pela refeição. “A
comunidade se apoia. Ninguém vai passar a
perna no restaurante da tia ou do amigo da
mãe”, contou Hamilton. Isabela também
lembrou da cobrança social: “Vai pagar só
isso, pirangueiro?” – cobravam os clientes uns
dos outros, usando expressão carioca para
mão-de-vaca, pão-duro, muquirana.
3) Alimentação infantil (“lancheirinhas”): por
meio de parcerias com ONG, o Saladorama
fornecia cerca de 60 combinações diferentes
de lanches saudáveis para crianças das
comunidades de baixo desenvolvimento, com
sucos e sanduíches naturais, além de muffins
saudáveis.
54
4) Vendas itinerantes: em comunidades
vizinhas às franquias, mas onde o negócio
não conseguia atender, o Saladorama
trabalhava em parceria com revendedores
autônomos, que vendiam refeições e lanches
saudáveis por meio de carroças ou bicicletas
com estrutura para refrigeração dos
alimentos, modelo de alimentação de rua que
estava bastante popular, com os conhecidos
food bikes e food trucks.
5) Revendas: o Saladorama também estava
presente em lojas de varejo de produtos
naturais, como a Mundo Verde.
Como incentivavam o empreendedorismo das
franqueadas, por vezes, vendiam produtos
que elas produziam, como doces de cascas de
frutas. “Elas utilizavam nossa marca, que tinha
mais força, e nós ficávamos com parte da
venda”, contou Isabela.
Conhecendo a comunidade e a franqueada
Com o sucesso, o Saladorama já havia
recebido vários convites, inclusive para atuar
no Morro da Babilônia e no Complexo do
55
Alemão, populosos bairros favelizados no Rio
de Janeiro.
Mas existia um processo para a abertura de
franquias. Depois de escolher um lugar em
potencial, Hamilton fazia imersão na
comunidade, de um a três meses. Era preciso
identificar líderes que tivessem as
características buscadas e entender a
dinâmica da região. “A dinâmica na
comunidade é como a de uma residência.
Você não entra na casa de alguém que você
não conhece e pega uma Coca-Cola na
geladeira sem perguntar nada, né? Você
também não chega na comunidade e já vai
empurrando ideias novas, sem conhecer
nada”, contou Hamilton, que havia aprendido
isso na prática, depois de ter apanhado com
as primeiras experiências do Saladorama.
Para conhecer melhor a região, Hamilton
alugava um cantinho e ficava lá, vivendo o dia
a dia, jogando bola, interagindo.
Rapidamente, já tinha amigos e já estavam
um almoçando na casa do outro, e é aí que
ele apresentava a Saladorama e seus
56
produtos, desde a lasanha de berinjela a
outras comidas saborosas e saudáveis.
“Eles já queriam saber quanto custava. E eu
devolvia perguntando: quanto você pode
pagar?”, contou Hamilton, que destacou que
cada comunidade possuía aspectos
socioeconômicos próprios e que era preciso
entender o valor do tíquete médio do prato
feito (PF), por exemplo.
Ele também buscava identificar os potenciais
fornecedores e o melhor local para o
funcionamento do restaurante. “Precisávamos
entender a linguagem da comunidade
também. Fazia sentido falar em delivery, por
exemplo?”, contou.
Se a oportunidade de uma franquia na
comunidade era confirmada, começavam a
mapear as líderes em diversos locais,
principalmente em salões de beleza. As ONG
parceiras também apoiavam nesse processo.
As mulheres selecionadas recebiam
capacitações por cerca de quatro meses sobre
alimentação saudável, boas práticas no
manuseio de alimentos e gestão de negócios.
57
“O interessante é que as comunidades já
capacitadas, de outros estados, que levavam
o conhecimento”, relataram os sócios.
Nenhum conhecimento era desperdiçado:
quem era capacitada, mas não virava
franqueada ou empregada da empresa,
poderia virar fornecedora ou, até mesmo,
abrir seu próprio negócio.
RESULTADOS DE NEGÓCIO
Expansão e convite para internacionalizar
Em 2016, o faturamento do Saladorama foi de
R$ 1,2 milhão; já o lucro foi de R$ 360
mil. Com quase três anos de empresa, os
sócios já tinham cinco franquias e vários
convites para ampliar. “Cerca de 30 a 40
pedidos de franquias por mês”, contaram.
Até 2017, estavam presentes no Recife (PE),
no Rio de Janeiro (RJ), em Florianópolis (SC),
em São Luís (MA) e em Sorocaba (SP). Com a
meta de serem o maior delivery de comida
saudável do Brasil, os sócios já haviam
58
recebido convite para atuarem até nos
Estados Unidos e no México.
RESULTADOS SOCIAIS
Subsistência alimentar, inclusão de
minorias e monitoramento do impacto
Apesar de o negócio ter sido criado para
atender pessoas de baixa renda, clientes das
classes A e B representavam mais da metade
dos clientes. Mas além dos cerca de 40% de
clientes das classes mais baixas já serem
significativos, o Saladorama possuía um forte
modelo de impacto em sua cadeia de
produção.
Ao capacitar mulheres de comunidades mais
pobres em noções de alimentação saudável e
permitir que elas tivessem renda própria, o
Saladorama aumentava as chances de
alimentos saudáveis chegarem aos lares
dessas regiões. A capacitação e o
fortalecimento de pequenos produtores rurais
também contribuíam para o cumprimento do
propósito social do negócio.
59
Os sócios também apostavam na capacidade
de fortalecer outros negócios do ramo. “Ao se
colocar como grande cliente e parceiro dos
fornecedores de orgânicos na região, o
Saladorama fortalece esses negócios e
estimula a abertura de outros focados em
alimentação saudável, contribuindo para a
subsistência alimentar nas comunidades”,
afirmou Isabela.
O Saladorama também buscava ampliar seu
impacto social, ministrando cursos de
empreendedorismo para pessoas de baixa
renda não diretamente ligadas ao negócio,
incluindo aquelas em situação de maior
vulnerabilidade, como negras, trans e gays.
Para aprimorar o monitoramento de seu
impacto, chegou a acompanhar por quatro
meses um grupo de pessoas entre 8 e 45
anos em Nova Descoberta (PE) que se
propuseram a aderir à dieta e ao sistema de
educação propostos pelo Saladorama, com
bons resultados na redução de taxas
consideradas de eminência e risco.
60
Ao fim de 2017, a empresa também estudava
monitorar seus impactos e adquirir
certificação B Corps, atribuída a empresas
com impactos sociais e ambientais
comprovados por meio de metodologia de
verificação do Sistema B Brasil. O Sistema B
estava presente em mais de 50 países e
possuía cerca de 2.100 empresas
certificadas.15
_______________________
Vencedora Incluir 2017 na categoria
“Inclusiva na Cadeia de Valor”
https:/saladorama.com/
61
PLANT – FAZENDAS URBANAS: COMO CRIAR
UM NEGÓCIO DE HORTAS DE ALTO IMPACTO SOCIAL?
Buscando realizar propósito pessoal, Edileusa
Andrade criou a Plant, para venda de hortas de
telhado para corporações, unindo economia na
manutenção predial para as empresas, com
redução das ilhas de calor nas cidades, e
segurança alimentar e inclusão
socioeconômica para as classes C, D e E.
62
EDILEUSA ANDRADE, FUNDADORA DA PLANT –
FAZENDAS URBANAS.
INFORMAÇÕES GERAIS
Fundada em 2016, a Plant (SP) vendia
telhados verdes feito de hortas orgânicas
para corporações (B-B). Para cada horta
vendida, uma equivalente era plantada em
comunidade em situação de vulnerabilidade,
com a utilização de um terço do lucro da
venda para instalação, plantio e apoio com a
manutenção. Além de reduzir as ilhas de
calor, a proposta fomentava a alimentação
63
saudável para diferentes classes
socioeconômicas e buscava inclusão social e
produtiva por meio de parceria com
catadores, agricultores familiares e mulheres
em situação de vulnerabilidade social na
montagem e manutenção das hortas. Para as
corporações, a horta de telhado podia
ocasionar a redução do Imposto Predial e
Territorial Urbano (IPTU), nos municípios com
essa regulamentação. No final de 2017, com
uma margem de lucro de cerca de 70%, o
negócio estava em fase inicial de operação e
otimista com a carteira de clientes.
INTRODUÇÃO
Empreendendo com propósito
“O que você gosta de fazer?”, foi essa
pergunta feita por um coach, em 2016, que
revolucionaria a vida da geógrafa Edileusa
Andrade. Na época, “Lê”, como a
empreendedora gostava de ser chamada,
estava com crise do pânico e em busca de
novos caminhos pessoais e profissionais.
64
“Percebi a necessidade de se ter um
propósito na vida”, contou.
Foi quando ela decidiu que queria
empreender com hortas, para ganhar dinheiro
e ajudar as pessoas das comunidades em
situação de vulnerabilidade social a se
alimentarem melhor. “Minha primeira ideia foi
ter um negócio em que, para cada horta
vendida, uma seria doada”, contou.
O interesse por trabalhos com
desenvolvimento vinha marcando toda a
carreira de Edileusa. Geógrafa e com
mestrado em fortalecimento comunitário com
ênfase em geração de renda para
comunidades em situação de extrema
pobreza pela Universidade de Valparaíso do
Chile, ela havia atuado com desenvolvimento
comunitário por quase 15 anos. “Já atuei no
polígono da seca. Aprendi a fazer farinha de
osso de vaca morta para melhorar a
qualidade do solo”, contou a empresária.
Com uma horta que deu errado, a empresária
teve o impulso que faltava para começar a
empreender. No Jardim Pantanal (SP), região
65
localizada na várzea do Rio Tietê e conhecida
pelas constantes enchentes, horta urbana
elaborada por ONG em que trabalhava
alagou. A empreendedora, que já estava
desmotivada com os perigos e as ameaças
por atuar em regiões com alta criminalidade,
decidiu que era momento de mudar os rumos
profissionais, mas sem abandonar a ideia de
trabalhar com horta e ajudar a quem
precisava.
O TRABALHO NO JARDIM DO PANTANAL TEVE O
ENGAJAMENTO DA COMUNIDADE...
66
...MAS NÃO RESISTIU ÀS ENCHENTES.
Em 2016, depois de participar do Encontro
de Jovens Transformadores (EJT), motivou-
se a estruturar o seu negócio. Com um nome
que remetia a caminho (via) e natureza
(natus), abriu a Vianatus. Pouco tempo
depois, a empresa virou Plant – Fazendas
Urbanas, para evidenciar o que viria a ser o
forte da marca: levar a produção de alimentos
orgânicos para grandes centros urbanos.
A empresa começou com venda de hortas
verticais e tinha os donos de espaços de
coworking como seus clientes principais. Parte
do lucro era destinada à doação de horta
67
equivalente a comunidades com baixo
desenvolvimento. Nesse período, a então
Vianatus chegou a ganhar um prêmio do
concurso de projetos sociais da Fundação
Arymax.
Encontrando o diferencial do negócio
Em fevereiro de 2017, Lê participou da
maratona The Big Hackathon da Campus
Party Brasil, que reconheceria os projetos
que tivessem maior aderência à Agenda 2030.
Embora tenha chegado à Campus Party por
acaso, a convite de um amigo que havia lhe
dado o ingresso, foi lá que a empreendedora
conseguiu entender melhor os problemas
sociais nos quais sua empresa atuaria e os
diferenciais competitivos de seu negócio.
A ideia da maratona promovida pelo
Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PnuD) era chancelar
projetos que promovessem os ODS por meio
de novas tecnologias. Lá, a empreendedora
rapidamente arrumou um grupo de pessoas
que compraram a ideia da Plant. Com a
obrigatoriedade do fator tecnológico, o
68
grupo deu a ideia de utilizar aplicativo para
gestão e monitoramento das hortas, que
avisaria sobre tempo de colheita e
necessidade de regar, por exemplo.
Mas o mentor do Hackathon não aprovou:
“foi um choque o mentor não ter gostado da
ideia. Disse que não oferecia diferencial, que
não tinha apelo”, contou Lê, lembrando que,
no dia, ouviu o veredicto aos choros.
Após a rejeição, o grupo conseguiu chegar a
uma proposta bem superior do ponto de vista
social e de negócios, batizada, então, de Teto
de Verde. A iniciativa foi uma das vencedoras
da maratona, recebendo a chancela do PNUD
por trabalhar 14 dos 17 ODS.
Na nova proposta, o produto de venda seria
telhados verdes feito de hortas orgânicas. O
público-alvo seriam as corporações, que
poderiam ter reduzidos os custos de
manutenção predial com o abatimento no
IPTU, nos municípios em que havia essa
regulamentação. Para cada horta vendida, um
terço do lucro seria revertido para
implantação de horta em comunidade em
69
situação de vulnerabilidade. Além do estímulo
à alimentação saudável para diferentes
classes sociais, a ideia atuava com a
harmonização dos espaços urbanos e a
redução das ilhas de calor. O impacto social
também seria expandido, com a parceria com
catadores e agricultores familiares, para
fornecimento do material da horta; e
mulheres em situação de vulnerabilidade
social, para auxílio com plantio e manutenção.
“Achamos nosso diferencial. Até então, os
telhados verdes eram paisagísticos”,
comentou Lê. E complementou: “Fizemos
várias pesquisas e ficamos satisfeitos com a
verificação do impacto que poderíamos
causar, especialmente na questão das ilhas de
calor”, complementou.
CONTEXTO DO PROBLEMA
Pela segurança alimentar e pelo meio
ambiente
Com a proposta de obter impacto em vários
pontos da cadeia de produção e distribuição,
70
o core business da Plant eram os telhados
verdes com hortas. Com as hortas, tratava do
problema da segurança alimentar e
nutrição.16
Já com os telhados verdes, tinha a
proposta de melhorar o clima, a
biodiversidade e a poluição dos centros
urbanos.
Telhado verde e descontos no IPTU
O Imposto Predial Territorial e Urbano (IPTU)
era uma das principais fontes de receita
municipal, cujos contribuintes eram pessoas
físicas ou jurídicas proprietárias de imóveis
urbanos.
Em 2010, o município de Guarulhos (SP) foi o
primeiro do Brasil a conceder descontos no
IPTU às pessoas que adotassem princípios de
sustentabilidade em suas propriedades, por
meio da Lei n° 6.793/2010. O conjunto de
incentivos fiscais ficou conhecido como IPTU
Verde.
Em 2017, municípios como Vila Velha (ES),
Goiânia (GO), Salvador (BA), Curitiba (PR) e
Camboriú (SC) também já tinham
regularizado a prática. Os descontos variavam
71
entre 10% e 100%, a depender do município e
da observância aos critérios estabelecidos
para a concessão do benefício.
O telhado verde, que costumava ser um dos
critérios para aquisição do desconto no IPTU,
teria vários benefícios de acordo com alguns
estudos, como o artigo do International
Journal of Sustainable Built Environment17
sobre a performance dos telhados verdes sob
perspectiva ambiental; e os estudos de caso
de telhados verdes, divulgado por City of
London Corporation.18
As pesquisas
indicavam que ele auxiliava na purificação do
ar poluído das grandes cidades; na redução
da temperatura ambiente, minimizando os
efeitos das ilhas de calor; na regulagem da
temperatura interna das construções,
causando economia de custos com energia
elétrica; e na promoção de biodiversidade,
proporcionando espaços mais felizes e verdes
– em contraponto ao predominante cinza das
grandes cidades.
Outros critérios utilizados para concessão do
benefício eram: sistema de captação e
utilização de água da chuva, uso de energia
72
solar, tratamento de resíduos para reciclagem
e calçadas arborizadas.
A Proposta de Emenda Constitucional n°
306/2013 propunha a alteração do art. 156
da Constituição Federal, que tratava do IPTU,
para estabelecer critérios ambientais para a
cobrança desse imposto, além de desonerar
terrenos com vegetação nativa. Se aprovada,
a proposta poderia incentivar a compra de
imóveis que adotassem tecnologias
sustentáveis em nível nacional.
Tetos verdes, jardins verticais e
compensação ambiental
A compensação ambiental era uma espécie
de indenização devida por empreendimentos
cuja construção ou operação envolvesse
poluição, uso ou degradação de recursos
ambientais.
A compensação estava definida pela Lei
Federal nº 9.985/2000 (Sistema Nacional de
Unidades de Conservação – SNUC), cuja
regulamentação foi realizada com o Decreto
Federal nº 4.340/2002, que estabeleceu
ordem de prioridades para a aplicação dos
73
recursos oriundos da compensação e
estabeleceu a instituição da câmara de
compensação ambiental no âmbito do
Ministério do Meio Ambiente (MMA), para
avaliar e auditar a metodologia e os
procedimentos de cálculo do valor da
compensação ambiental, entre outros. Para os
licenciamentos ambientais nos âmbitos
estadual e municipal, também foram criadas
câmaras de compensação ambiental com
atribuições relacionadas.
Em São Paulo, o então prefeito Fernando
Haddad (PT) incluiu, em 2015, a possibilidade
de compensação ambiental com jardins
verticais e telhados verdes. Ou seja,
construtoras que desmatavam para construir
prédios, por exemplo, teriam a opção de
construir jardins em áreas de paredes e
telhados. O decreto dizia que “a conversão
da compensação em obras e serviços, jardins
verticais e coberturas verdes será admitida
excepcionalmente, mediante decisão
fundamentada do Colegiado da Câmara
Técnica de Compensação Ambiental –
CTCA”.19
74
Um dos casos mais famosos oriundo da nova
regulamentação era o corredor verde da
Avenida 23 de Maio. Com 6 quilômetros de
extensão, havia sido inaugurado em 2017, na
gestão de João Doria (PSDB) – prefeito que,
antes, havia mandado pintar de cinza as
pichações dessa que era uma das mais
movimentadas avenidas do município de São
Paulo.
Mas a efetividade das paredes e dos telhados
verdes não era consenso. Não só o
apagamento das pichações foi questionado,
mas também os possíveis benefícios desses
instrumentos como compensação ambiental,
além dos custos de manutenção. Em
setembro de 2017, a 1ª Promotoria de Justiça
de Meio Ambiente de São Paulo teria
ajuizado uma ação pública para proibir que
os jardins verticais fossem usados como
forma de compensação ambiental, alegando
que as paredes verdes não equivaleriam em
serviços e ganhos ambientais às árvores, com
menor capacidade de fotossíntese e
evapotranspiração. Embora reconhecesse os
benefícios desses recursos para a cidade, o
autor da ação, Marcos Stefani, entendia que
75
não eram um substituto aceitável para a
remoção de espécies arbóreos.
SOLUÇÃO
Testes e protótipos
Durante o Hackathon, a empreendedora,
inadvertidamente – e afortunadamente –, fez
um pitch para o gerente de sustentabilidade
da DOW Química, Daniel Pedrozo, que se
comprometeu a ser o primeiro cliente caso a
ideia fosse vencedora. “Assim que ganhei, fui
atrás dele. E ele me pediu que eu testasse a
ideia e levasse um orçamento”, contou.
Lê, que já trabalhava com hortas, quis pôr a
ideia em prática. Com a falta de interesse do
restante do grupo que havia participado da
maratona em dar continuidade, encabeçou a
ideia pela Plant.
Com investimento inicial de cerca de R$ 10
mil, Lê investiu em vários protótipos de horta
de telhado: na casa da mãe, do pai, dos
amigos, e até no prédio em que morava o ex-
76
namorado, em Curitiba, onde fez uma horta
vertical de 18 metros que rendeu ao
condomínio uma considerável redução no
IPTU. “O protótipo em Curitiba levou a uma
parceria com as Secretarias Estaduais de Meio
Ambiente e Educação para projeto de
educação ambiental nas escolas”, contou a
empreendedora, lembrando que a Secretaria
Municipal do Abastecimento de Curitiba,
responsável por chancelar a horta, foi muito
importante no processo.
Segura da técnica e das necessidades do
projeto, Lê voltou para São Paulo e
apresentou orçamento para DOW.
Sobre valores de orçamento, a empresária
relatou que o custo era muito variável. “O
valor da horta varia muito. Chegamos a fazer
horta de dez e outras de R$ 80 mil. O projeto
é customizado e planejado de acordo com as
necessidades do cliente”, contou Edileusa. As
variáveis que influenciavam no preço eram,
por exemplo, o material utilizado (vidro,
palete etc.), o tipo de plantação (hortaliça,
tempero etc.) e a presença ou não de sistema
de irrigação automática.
77
Plantando a primeira horta
Edileusa contava com felicidade a experiência
na DOW. “Já de início, o projeto reduziu o
desperdício no restaurante que atendia a
empresa, que era alto. Os alimentos que
seriam desperdiçados foram usados em
composteira, que virou adubo para a horta da
DOW”, relatou.
A busca pelas pessoas que a Plant chamava
de social makers, que seriam pessoas cuja
inclusão de renda tinha alto impacto em suas
famílias e comunidades, foi demandante e se
beneficiou do networking que a
empreendedora possuía.
“Eu saía andando e parava os catadores na
rua”, contou Lê. Para os materiais reciclados
para a horta, precisou de 400 caixas de
plásticos que, normalmente, eram derretidas
pelas fábricas para outro uso. “Tive que me
comprometer com as cooperativas que
realmente compraria as caixas, se não elas
teriam prejuízo”, comentou a empreendedora,
lembrando que o processo para aquisição
não foi fácil, já que as cooperativas tinham
78
que ir às fábricas antes do processo de
derretimento.
Em relação aos agricultores que forneceriam
as mudas para replantação, Lê pactuou com
cooperativa de agricultoras familiares de São
Roque (SP). “Eram mulheres trabalhando para
gerar renda para a família”, comentou Lê
sobre a afinidade da cooperativa com a
proposta da Plant.
Quanto às duas mulheres em situação de
vulnerabilidade que fariam a montagem da
horta, a empreendedora conheceu por
intermédio de uma amiga que trabalhava no
ADUS, Instituto de Reintegração de
Refugiados, e em sua busca pelas
comunidades de São Paulo. Ana, haitiana que
havia adotado esse nome no Brasil, era
refugiada e sem oportunidades de renda; já
Patrícia, a outra jardineira, tinha 33 anos e
sete filhos para criar.
A empresária ensinou tudo o que sabia para
as duas mulheres, que auxiliaram com a
montagem da horta e com a capacitação dos
colaboradores da DOW para a sua
79
manutenção. “Foi uma inversão do que é
socialmente esperado. Eram duas mulheres
em situação de vulnerabilidade, de quem não
se espera nada, que estavam levando
conhecimento para a elite, para pessoas de
uma grande corporação”, contou.
A partir da experiência, a DOW passou a
visitar sempre a comunidade. “Os
colaboradores estavam muito envolvidos com
o projeto”, contou Lê. Eles chegaram a fazer
dinâmica de planejamento de manutenção e
expansão das hortas, momento batizado de
Hortathon. Também estavam pensando em
instituir “a hora do chá”, para ser o momento
de interação com a horta – que não se
limitava ao ambiente do trabalho, já que os
colaboradores podiam levar mudas para suas
casas.
“Era legal ver como o lixo que eles geravam
virava comida. Não vão chegar ao desperdício
zero de alimento, mas sempre vão ter adubo
para gerar alimento, reiniciando o ciclo”,
enfatizou a empresária.
80
A HORTA ERA COMPARTILHADA E OS COLABORADORES
PODIAM ATÉ LEVAR MUDAS PARA CASA.
RESULTADOS DE NEGÓCIO
Alta margem de lucro e novos clientes
O negócio de Edileusa tinha uma margem de
cerca de 70% de lucro, com um terço do valor
convertido para doação de hortas.
Com o sucesso do projeto na DOW, a Plant
vinha conseguindo prospectar novos clientes.
O Rochaverá Corporate Towers, condomínio
em que a DOW funcionava, gostou tanto da
ideia que contratou um projeto para horta
81
subterrânea em São Paulo e um projeto de
400m² em Seropédica, no Rio de Janeiro.
“Ter a DOW como cliente foi um ganho e
comemoramos essa conquista até hoje”,
comentou Lê, que já estava em fase de
planejamento para levar o projeto de hortas
para diversas DOW do Brasil, da América
Latina e dos Estados Unidos.
O cenário estava positivo e a Plant também
estava envolvida em projeto de horta em
loteamento de casas populares, em Cotia (SP).
RESULTADOS SOCIAIS
Alimentação, renda e dignidade
“Quando comecei, minha ideia era só levar
comida para as comunidades. Mas, hoje, vejo
que levamos muito mais. Levamos renda;
levamos dignidade”, emocionou-se Lê, que
adorava almoçar nas casas das comunidades
beneficiadas pelas hortas doadas e ver que
tinha cenoura e tomate nos pratos, “que eles
estavam plantando e cuidando de tudo”.
82
Com a proposta de realizar avaliação
semestral do impacto social, utilizando
indicadores da Agenda 2030 como referência,
Edileusa acreditava que o negócio poderia
contribuir para a redução do lixo dispensado
no planeta, do aquecimento global e do
consumo de produtos industrializados.
Também acreditava que produzia outros
impactos sociais de mais difícil mensuração.
“Quando convidamos executivos para ir às
plantações nas comunidades, mostramos a
eles quem está no entorno, na favela ao lado;
ressignificando uma relação que talvez nem
existisse se não fosse por essa oportunidade.
A gente tira da invisibilidade, para o mundo
corporativo, uma comunidade inteira”,
contou.
Para as comunidades, a Plant também levava
mais que alimentos. “Os moradores se
fortalecem e entendem o quanto eles podem
crescer. As hortas podem gerar renda para o
grupo, tudo depende do quanto eles se
organizam para isso”, complementou a
empresária.
83
______________
Vencedora Incluir 2017 na categoria
“Negócio com Solução de Impacto
Ambiental”
https://www.plant.agr.br/
84
SEGUNDA PARTE
IMPACTO SOCIAL
COM SOLUÇÕES DE
ARQUITETURA
RURAL E URBANA
85
No estado com o segundo melhor e naquele
com o segundo pior Índice de
Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM)
do país, um problema similar: presença de
infraestrutura e moradia precárias, que
afetava drasticamente a qualidade de vida, a
saúde e a geração de trabalho e renda. Em
São Paulo, o negócio social Moradigna levava
reformas residenciais a baixo custo para
aqueles que sofriam com as constantes
enchentes; no Maranhão, o Estúdio Flume
buscou levar soluções agroecológicas para
produção de alimentos, suprindo as
necessidades de saneamento e acesso à água
da região. Em comum, os dois negócios
propunham soluções arquitetônicas em
contextos com pobres relações econômicas,
sociais e ambientais entre as áreas urbanas,
periurbanas e rurais, marcadas pelo baixo
planejamento e desenvolvimento. E
ensinavam, ainda, como a completa imersão
para entender as necessidades de
comunidades vulneráveis poderia levar a
soluções de alto impacto.
86
ESTÚDIO FLUME: COMO UTILIZAR SOLUÇÕES DE
ARQUITETURA PARA AUXILIAR
COOPERATIVAS DE PRODUTORES DE
ALIMENTO NO INTERIOR DO MARANHÃO?
Proposta arquitetônica para agricultura
familiar agroecológica do Estúdio Flume
mostrou a importância de se escutar a
comunidade local na resolução de problemas
sociais.
87
INFORMAÇÕES GERAIS
Após mais de três anos de experiência com
arquitetura social para geração de renda em
vários estados brasileiros, o Estúdio Flume
(SP) elaborou proposta arquitetônica para
produção agroecológica de alimentos em
pequenas propriedades agrícolas das classes
econômicas D e E, no interior do Maranhão. A
proposta permitia captação de água da
chuva, tratamento ecológico de dejetos e
excrementos e uso de mão de obra local para
a construção. Em 2017, após duas
premiações, o Estúdio estava em fase de
revisar a economicidade do projeto para
vender os primeiros módulos a instituições
públicas e privadas de fomento ao
desenvolvimento local e à geração de renda.
88
PROTÓTIPO DE BABAÇU DO ESTÚDIO FLUME PARA
AGROINDÚSTRIAS DE BAIXO CUSTO.
INTRODUÇÃO
A experiência com arquitetura social para
geração de renda
Fundado em 2015, o escritório de arquitetura
e construção dos arquitetos Noelia Monteiro
e Christian Teshirogi estava no centro de São
Paulo.
A palavra que dava nome ao estúdio, “Flume”,
significava curso de água. Para os arquitetos,
a palavra simbolizava a missão de estar em
constante movimento, como o percurso de
89
um rio, “buscando espaços de oportunidades
em detrimento do resultado estético”.
E foi com essa fluidez que as rotas de Noelia
e Christian, em parceria com a arquiteta Desy
Frezet, desembocaram no Maranhão para a
construção de espaços que suportassem as
atividades empreendedoras de municípios de
baixo desenvolvimento econômico.
Lá ancoraram a convite do Instituto de
Socioeconomia Solidária (ISES),
Organização da Sociedade Civil de Interesse
Público (Oscip) que apoiava Negócios
Inclusivos para o combate à pobreza. Em
parceria com o ISES, o Estúdio Flume já havia
passado por vários estados brasileiros para
trabalhos de fomento à geração de renda,
como Espírito Santo, Goiás, Minas Gerais, Pará
e São Paulo.
Durante a atuação no Maranhão com o ISES,
os arquitetos aplicaram tecnologias sociais
em 15 cooperativas que trabalhavam com
agricultura e produção de alimentos para
comercialização local, com foco em mulheres
empreendedoras. Mergulharam, por exemplo,
90
na zona rural de Arari, comunidade de
Bubasa, para projetar a padaria Três Amores e
o ateliê de costura Atelie Bubasa Estilo.
Também propuseram soluções arquitetônicas
para o Núcleo Terra das Palmeiras,
cooperativa que envolvia cerca de 30
mulheres empreendedoras da cidade Alto
Alegre do Pindaré (MA).
CONSTRUÇÕES DO ESTÚDIO NA COMUNIDADE DE
BUBASA.
91
Atuando em espaços produtivos no
contexto de extrema pobreza no
Maranhão
As obras realizadas pelo Estúdio Flume na
região do Maranhão restauraram e
reestruturaram os espaços existentes,
adequando-os às normas e legislações.
Também implantaram soluções para
condições adversas de trabalho, como o calor
excessivo da região, incorporando soluções
bioclimáticas como a ventilação cruzada, por
meio de cobogós (elemento vazado) e
cobertura dupla, formando duas camadas de
proteção às altas temperaturas, gerando um
“colchão de ar” entre os planos. O Estúdio
fazia pequenas reformas: assentar cerâmica
no piso, dissociar o banheiro da área
produtiva, e outras medidas que fomentavam
a higiene para a produção de alimentos.
Com um olhar atento para a comunidade, os
arquitetos buscaram construir espaços que
dignificassem o processo produtivo dos
moradores, que estimulassem o
empreendedorismo e transformassem a vida
dos beneficiados e das comunidades.
92
Mas o Maranhão possuía uma realidade que
os arquitetos até então não tinham visto,
mesmo nos vários anos em que trabalharam
com arquitetura social. “Às vezes ficamos em
nossas bolhas e não reparamos que essa
realidade, de escassez generalizada, muita
falta de água e infraestrutura muito precária,
ainda existe”, contou Noelia.
Os esgotos em fossas rudimentares eram
comuns na região e contaminavam os
terrenos de produção e os lençóis
subterrâneos de água, dificultando a
prosperidade da produção de alimentos.
Além disso, a região era marcada por baixas
provisões de água potável e longos períodos
de seca.
No município de Alto Alegre do Pindaré (MA),
os arquitetos decidiram, então, fazer estudo e
diagnóstico para um projeto arquitetônico
que oferecesse solução aos vários problemas
e limitações da produção de alimentos das
cooperativas que atuavam na região,
chegando ao protótipo de babaçu para
agricultura familiar. “Buscamos a inclusão
social por meio de projetos que auxiliam na
93
independência econômica e dignificam o
espaço ocupado. O resultado apresentado
com o protótipo do babaçu é fruto da
evolução desse trabalho”, contou Noelia.
CONTEXTO DO PROBLEMA
Pobreza, saneamento precário e falta de
água no Maranhão
O tratamento de esgoto e a captação de água
da chuva eram um dos principais diferenciais
da construção agroecológica do Estúdio
Flume, uma vez que os produtores rurais das
comunidades assistidas estavam inseridos em
região com infraestrutura precária.
De acordo com pesquisa de 2017 do Instituto
Trata Brasil20
, o Maranhão era um dos estados
menos assistidos por água e rede de esgoto
do país. Apenas 56,2% do estado teria acesso
à água e 12,1% a esgoto, colocando o estado
entre os seis piores do país no quesito. O Pará
também possuía situação alarmante, com
47,1% de cobertura de água e 4,9% de
esgoto.
94
Segundo estado com menor Índice de
Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM)
do país, o Maranhão também liderava outros
índices preocupantes, ligados à pobreza
extrema e à baixa educação. Juntamente ao
Pará, era o estado em que mais havia
casamento infantil. Ao lado de Pernambuco,
possuía um dos maiores números de crianças
e adolescentes em situação de pobreza. Era,
ainda, o estado com o maior número de
miseráveis do país, com 12,9% da população,
quase quatro vezes mais que a média
nacional (3,56%).21
O estado, marcado por desigualdades, tinha
uma das menores rendas per capita do Brasil.
As maiores médias do rendimento mensal
real de todos os trabalhos, em 2015, foram
registradas no Distrito Federal (R$ 3.553), em
São Paulo (R$ 2.266) e no Rio de Janeiro
(R$ 2.212); já Maranhão (R$ 1.106), Sergipe
(R$ 1.112) e Piauí (R$ 1.127) apresentaram as
menores médias (IBGE).22
95
SOLUÇÃO
Cocriando a solução com as cooperadas da
comunidade
Apesar da localização do Estúdio Flume, não
foi no centro de São Paulo que surgiu a
solução para as comunidades produtoras do
Alto Alegre do Pindaré, município do
Maranhão distante 347 km de São Luís.
“Nossa proposta de trabalho era sempre
realizada por meio de reuniões participativas
com a comunidade, para entendermos as
demandas e as possibilidades de aplicação de
soluções locais”, disse Noelia. Mas, no estado
do Maranhão, a escuta atenta e o contato
com a comunidade tiveram papel ainda mais
relevante. “Nos estados por quais passamos, a
situação era diferente, não havia tamanho
estado de miséria. Tivemos que ouvir muito
os moradores, para aprender a lidar com essa
realidade”, complementou a arquiteta. A troca
de ideias e experiências também fazia parte
da estratégia de incentivar a comunidade a
desenvolver o sentimento de pertencimento e
identificação com a solução proposta.
96
Após alguns testes, os arquitetos chegaram a
um protótipo para agroindústrias de menor
porte, que contemplava desde a captação da
água da chuva e a transformação de efluentes
do esgoto em adubo até o uso do artesanato
local para a vedação das estruturas, que era
feita com folhas de babaçu.
Outro diferencial era o transporte dos
módulos pré-fabricados para lugares de difícil
acesso. “Nesses lugares, os métodos de
construção industrial tradicional não eram
viáveis”, comentou Noélia. As estruturas pré-
fabricadas permitiam a montagem em poucos
dias e o uso de trabalho comunitário.
97
AS ESTRUTURAS DE VEDAÇÃO DO PROTÓTIPO ERAM
FEITAS DA PLANTA DE BABAÇU, TIPO DE PALMEIRA
COMUM NO MARANHÃO.
98
Vantagens do protótipo de babaçu
PROBLEMA SOLUÇÃO
Longos
períodos de
estiagem.
Captação de água pluvial para sistema
de irrigação.
Esgoto a céu
aberto.
Banheiro; tratamento ecológico dos
efluentes, por meio de fossa séptica
biodigestora para o tratamento do
esgoto, e de um círculo de bananeiras
para o tratamento das águas cinzas.
Condições
precárias de
cultivo.
Abrigo ventilado e sombreado para
longas permanências da trabalhadora,
incluindo pernoite para as épocas de
colheita.
Difícil
acesso.
Construção pré-fabricada e
simplificada, para facilitar transporte e
reduzir necessidade de mão de obra
local especializada, que é escassa.
Baixa
inclusão
produtiva.
Painéis de folha em babaçu trançado
para vedação do abrigo, fortalecendo
trabalho artesanal e cultura regional.
Baixo
recurso
financeiro.
Módulos de baixo custo, pré-
fabricados, que poderiam ser
construídos em mutirão com a
comunidade no local das hortas.
99
RESULTADOS DE NEGÓCIO
Em fase de validação
O protótipo chamava atenção pelo
envolvimento entre a comunidade local e o
ecossistema em que estava inserida, e a
potencialidade de replicação. Além do Prêmio
Incluir (2017), o escritório recebeu o Prêmio
Call for Solutions I (2016), promovido pela
Fondazione Giacomo Brondolini, da Itália.
O desafio do escritório era, então, entender
os interesses e requisitos de ONG, instituições
privadas e governamentais para a
implementação do protótipo. “O Estúdio
Flume está estudando formas de execução e
revendo a economicidade do projeto para
captar clientes”, relatou Noelia.
RESULTADOS SOCIAIS
Qualidade de vida no campo
Para as primeiras implantações do projeto, os
arquitetos pretendiam fortalecer 23 pequenos
100
negócios de cooperativas no Nordeste do
Brasil, com foco no Maranhão, beneficiando
150 famílias diretamente.
Um benefício possível da implantação era o
desincentivo às migrações rurais.
“Acreditamos que o fortalecimento da rede
de empreendedores rurais, além de
proporcionar maior qualidade de vida para as
pessoas que moram no campo, também
promove o respeito ao meio-ambiente,
desincentivando a migração aos grandes
centros urbanos e estimulando a economia
local”, relataram os arquitetos.
Ecologicamente sustentável, o protótipo
também possibilitaria uma autossuficiência de
cerca de 94% no consumo de água e
aproveitamento de 80% dos efluentes
lançados, de acordo com estudos feitos pelo
Estúdio Flume.
Os impactos do protótipo eram diversos e
transversais, não à toa ganhou o Prêmio
Incluir 2017 na categoria “Integração dos
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável”.
Um dos objetivos do Estúdio no trabalho de
101
arquitetura social era fomentar a autonomia e
a independência dos beneficiados. “Com o
fortalecimento da rede local de produção de
alimentos, haverá aumento da renda média
da comunidade. Também acreditamos no
crescimento da percepção dos
empreendedores sobre seu poder de
provocar mudança, sua autoestima”,
relataram os arquitetos.
_____________________
Vencedora Incluir 2017 na categoria
“Integração dos ODS”
http://www.estudioflume.com/
102
MORADIGNA: COMO ELEVAR A QUALIDADE
DAS REFORMAS HABITACIONAIS DA
POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA?
Tendo sofrido por 20 anos com o mofo, os
“puxadinhos“ e as eternas reformas na casa de
sua mãe no Jardim Pantanal, Matheus
Cardoso começou a querer melhorar a
residência das pessoas quando ainda tinha
sete anos, 13 anos antes de fundar o
Moradigna.
103
INFORMAÇÕES GERAIS
Fundado em 2015, o Moradigna era um
negócio focado em reformas simples para
melhorar a salubridade, a higiene e o
conforto de residências das classes C, D e E
na Zona Leste de São Paulo. Os serviços eram
prestados em até cinco dias por meio da
“reforma express”, que compreendia a mão de
obra, o material e o gerenciamento da obra.
Pago em até 12 vezes no boleto ou no cartão,
o serviço tinha garantia de um ano.
Comandado pelos sócios Matheus Cardoso,
Rafael Veiga e Vivian Sória, o negócio tinha
lucro líquido de até 10% e realizava cerca de
25 reformas ao mês. Com o valor médio de
R$ 5 mil por reforma, até 2017 a empresa já
havia faturado o total de R$ 1,5 milhão.
104
OS SÓCIOS VIVIAN SÓRIA, MATHEUS CARDOSO E RAFAEL
VEIGA.
INTRODUÇÃO
Empatia: resolvendo um problema pessoal,
familiar e da vizinhança
O engenheiro civil Matheus Cardoso tinha
sete anos quando começou a levantar os
tijolinhos do Moradigna. Ele dizia que podia
não saber à época, mas a motivação para
abrir o negócio começou naquele dia em que
sua mãe pediu desculpas a ele e a seu irmão
mais novo por mais um período de transtorno
causado pelas recorrentes enchentes, que os
faziam perder quase todos os móveis, quase
todos os anos.
105
Em cada um dos 20 anos em que Matheus
morou no Jardim Pantanal, que ficava às
margens do Rio Tietê, os moradores do bairro
já começavam a se organizar no final do ano
para arrecadar alimentos e a se preparar para
as enchentes do início do próximo. “Com
apenas 11 anos de idade, eu já ajudava a
liderar a arrecadação de alimentos”, contou.
Matheus acreditava que ter vivenciado o
problema das enchentes e inundações, com
todas as consequências para saúde, bem-
estar e dignidade de sua família e amigos, foi
essencial para que pudesse idealizar um
negócio que levasse soluções para o
problema das moradias insalubres das classes
de baixa renda. “A empatia é chave para um
negócio social. Se você não passou pelo
problema, tem que, pelo menos, conhecê-lo a
fundo”, acreditava. “No início da Moradigna,
fui desacreditado por ser muito novo. As
pessoas diziam que ninguém iria me dar
confiança. Mas o profundo conhecimento de
causa me fez seguir adiante”, complementou.
106
Buscando conhecimentos
Matheus fez ensino básico em “escola que
tinha a fama de ser uma das piores da região
da Zona Leste” e ensino médio em escola
técnica do bairro da Penha. Tendo
conseguido fazer curso pré-vestibular com
bolsa-auxílio, tirou nota alta no Exame
Nacional do Ensino Médio (Enem) e entrou
para o curso de Engenharia Civil na
Universidade Mackenzie, o qual cursou com
auxílio do Programa Universidade para Todos
(Prouni).
Embora tenha tido, inicialmente, a intenção
de cursar Engenharia Civil para ficar muito
rico e levar a família para um bairro nobre,
uma matéria que fez na faculdade sobre
negócios sociais o fez acreditar que a solução
não era sair do problema, mas ficar e ajudar a
resolver. O engajamento com a rede Choice,
da Artemísia, também teria sido chave de
virada para que Matheus amadurecesse sua
proposta de negócio social.
Outros conhecimentos importantes para o
Moradigna foram adquiridos com o
107
Programa Vivenda. Para auxiliar a
elaboração de seu modelo de negócio, pediu
um estágio para a empresa, que também
trabalhava com reformas rápidas e de baixo
custo para um público de baixa renda. A
proposta das duas, aliás, era bastante
semelhante. “No lugar de trabalhar com kit
cozinha ou kit banheiro, como fazia o
Vivenda, o Moradigna trabalhava com
espécies de kit mofo ou kit insalubridade”,
comparou Matheus.
O empreendedor também continuou
investindo na educação formal. Quando
começou a empresa, Matheus era técnico em
edificações e estudante de graduação de
Engenharia. Dois anos depois, fazia pós-
graduação em negócios sociais e mestrado
em políticas públicas para habitação, área em
que tinha certeza que o Moradigna muito
contribuiria, em um cenário em que o
governo passaria a ser um dos principais
parceiros da empresa. Mas o “governo
parecia não saber disso até então”, brincava o
empreendedor.
108
Propósito, persistência e primeiros passos
Ainda na faculdade, em 2014, Matheus
chamou mais quatro pessoas para levar um
projeto de “reforma sem dor de cabeça” para
a pré-incubadora de empresas do
Mackenzie. Ao fim do semestre, só havia
sobrado ele no projeto.
Pouco tempo depois, determinado a colocar
o negócio em prática, chamou seu padrinho,
que era pedreiro e, com o cartão de crédito
da irmã, comprou parcelado o material para
sua primeira obra, que ocorreu no quintal de
Dona Alice – que ficava na parte da frente da
casa. “Ser na frente da casa fez com que
várias pessoas vissem o que estava
acontecendo, o que ajudou a divulgar o
negócio”, contou.
Matheus fez suspense para revelar que a
primeira cliente e a pessoa que inspirou o
negócio, 13 anos antes, eram a mesma: sua
mãe. Orgulhoso, ele contou como a reforma
de um lugar que, antes, estava tão entulhado
que gerava até acidentes, virou fonte de
renda extra para Dona Alice, que trabalhava
109
como empregada doméstica. “O quintal virou
garagem com duas vagas, que ela passou a
alugar”, comentou.
À época, incerto sobre a viabilidade do
negócio, Matheus ainda trabalhava em
empresa de Engenharia. Chegou a gastar,
durante um período, quatro horas e meia de
deslocamento por dia para conciliar o
trabalho na Promon Engenharia com a
faculdade. Outro tanto de inteligência
emocional foi investido para conciliar a
realidade da favela em que morava com as
dos bairros nobres Vila Olímpia e
Higienópolis, para onde ia todos os dias. E
embora pensasse que aqueles lugares nobres
tivessem sido desenhados para outro tipo de
sociedade, da qual ele não pertencia, chegou
a ambicionar ser presidente da Promon.
Realizado com a escolha profissional,
Matheus contava, vibrando, que o Moradigna
era sua grande motivação. “Mudar a vida de
pessoas que vivem o que vivi por 20 anos é o
que me faz acordar todos os dias”, declarou.
110
Aceleradoras e investidores
No começo de 2015, o Moradigna foi pré-
incubado na Faculdade Presbiteriana
Mackenzie e pré-acelerado no Choice UP, da
Artemísia.
Em abril desse mesmo ano, Matheus
convidou a arquiteta Vivian Sória para co-
fundar a empresa. Nesse período, foram
acelerados pela Yunus Negócios Sociais
Brasil e receberam mentoria do Programa
Impulso da Fundação Fenômenos. Também
participaram do Social Good Lab, iniciativa
que apoia empreendedores a desenhar e
validar ideias que geram impacto social.
Em outubro, a empresa já tinha até CNPJ e
uma sala comercial emprestada no Instituto
Alana. E, pouco tempo depois, Rafael
integrou o time com sua experiência em
finanças e estratégia. Com quase nenhum
capital inicial, o negócio começou fazendo
sete reformas ao mês. Menos de dois anos
depois, a empresa já realizava 25 obras
mensalmente e possuía uma fila de espera de
cerca de 50 clientes.
111
Para parcelar o pagamento para o público, a
empresa buscava soluções de crédito no
mercado, e isso ainda era limitante para sua
expansão. No final de 2016, o Moradigna
atraiu investimentos com a participação no
Shark Tank Brasil, da Sony – programa de
entretenimento em que empreendedores
apresentavam sua ideia a potenciais
investidores –, mas a oferta de crédito ainda
permanecia um ponto de atenção para a
empresa.
CONTEXTO DO PROBLEMA
Enchentes no Jardim do Pantanal
As notícias de enchentes no Jardim Pantanal
eram constantes. O bairro, que era composto
por aglomerados de casas com baixa
infraestrutura, ficava submerso por águas
contaminadas a cada chuva mais forte que
caía sobre São Paulo.
Situado na Zona Leste, estava construído
sobre uma área de várzea do Rio Tietê, em
112
Área de Proteção Ambiental (APA) de cerca
de R$ 1 milhão de metros quadrados.
Os moradores, cujas propriedades estavam
irregulares, haviam sofrido com a pior
enchente da região entre final de 2009 e
início de 2010, quando tiveram que conviver
com alagamentos dentro e fora de suas
residências por três meses.
A capacidade dos moradores de se adaptar e
resistir às inundações por tantos anos foi
tema de dissertação23
(2016) da bióloga
Nayara dos Santos Egute. Ela concluiu que
uma das motivações para a permanência no
bairro era o sentimento de propriedade em
relação às suas residências. O investimento
que os moradores faziam em suas casas –
construindo segundo andar, elevando o piso
ou erguendo comportas para evitar a invasão
da água – aumentariam a conexão do
morador com a casa, a despeito das
documentações irregulares ou dos “contratos
de gaveta”.
113
Jardim Pantanal é área inundada de São
Paulo que ninguém quer abandonar
(Globo, 2009)
Moradores do Jardim Pantanal (SP)
revivem drama das enchentes
(Globo, 2011)
SP: Chuva deixa 300 residências alagadas
no Jardim Pantanal
(Band, 2013)
Jardim Pantanal, na zona leste de SP, tem
ruas alagadas há duas semanas
(Folha, 2017)
Piora no acesso à moradia digna
A situação dos moradores do Jardim Pantanal
não era muito diferente da de outros milhões
de brasileiros. De acordo com o Censo do
IBGE de 2010, o número de pessoas vivendo
em favelas havia passado de 10,6 milhões
(2000) para 11,2 milhões (2010). Belém era a
capital com a maior proporção de pessoas
residindo nessas ocupações (54,5%). Já
Brasília havia sido a capital com o
114
crescimento mais discrepante: aumento de
50,7% de pessoas morando em favela, contra
a média de 6% do restante do país.
Para a ONU, o agravamento da precariedade
das moradias era um problema mundial.
Cerca de 100 milhões de habitantes (ou 10%
da população) viveriam em assentamentos
precários, podendo chegar a três bilhões até
2050. Para a Organização, a regressão na
qualidade e na acessibilidade das moradias
não afetava apenas os países em
desenvolvimento, mas países como Inglaterra
e Estados Unidos. Além disso, a ONU também
havia denunciado que, enquanto mais de um
bilhão de pessoas careciam de moradias
adequadas, o número de moradias
desocupadas estava aumentando, lembrando
que a questão afetava essencialmente os mais
pobres e vulneráveis24
.
A questão estava retratada no ODS 11 –
Cidades e Comunidades Sustentáveis, em que
uma das metas era, até 2030, garantir o
acesso de todos à habitação segura,
adequada e a preço acessível.
115
SOLUÇÃO
Diferenciais competitivos
O Moradigna acreditava que possuía
vantagens para os clientes em relação à
forma tradicional que eles costumavam fazer
as reformas, que, na maioria das vezes,
acontecia sem planejamento, sem prazo para
acabar e sem previsão de gastos. Mesmo que
a contratação do serviço diretamente com um
pedreiro pudesse parecer, à primeira vista,
mais barata, os sócios estimavam que, com o
Moradigna, o cliente poderia fazer uma
economia total de até 40% com as finanças e
100% com as dores de cabeça.
116
PARA OS SÓCIOS, AS REFORMAS DO MORADIGNA ERAM
FEITAS COM MAIS PLANEJAMENTO E GERAVAM MENOS
RETRABALHO.
A parceria com empresas do ramo de
construção, como a Votorantim Cimentos, a
Schneider Electric e a Coral Tintas, seria
outra vantagem. Por ser um negócio social e
comprar em grande escala, o Moradigna
conseguia bons preço com as marcas líderes
no ramo. Com as parcerias, ganhava o cliente,
que tinha material de maior qualidade e
durabilidade; ganhavam as empresas
fornecedoras, que começavam a conquistar
os públicos das classes C e D; e ganhava o
Moradigna, que, além de tudo, tinha os
funcionários capacitados por essas empresas.
117
Com três sócios e cerca de nove funcionários,
o Moradigna utilizava, em todo serviço, mão
de obra local. “Essa renda gerada é muito
importante para as comunidades. Gera uma
estrutura para o empoderamento”, contaram
os sócios. Além disso, era mais vantajoso para
a empresa, que economizava com o
transporte dos trabalhadores e, ainda,
ganhava a simpatia do cliente. “As pessoas
gostam de contratar pessoas com quem têm
afinidade”, contou Matheus.
O MORADIGNA CONSEGUIA BONS PREÇO COM AS
MARCAS LÍDERES NO RAMO.
118
Expandindo o público
Atuando no Jardim Pantanal e no Parque
Paulistano, na Zona Leste de São Paulo, o
Moradigna tinha a pretensão de ampliar seus
serviços para outras regiões, mas o baixo
capital de giro ainda era um empecilho. Até o
final de 2017, com a restrição da oferta de
crédito, a captação de clientes era reativa: o
cliente mandava sua história, que era
analisada pela equipe.
Para alcançar também a classe E, o Moradigna
fazia parceria com instituições que
financiavam cerca de dez reformas por mês
para esse público.
RESULTADOS DE NEGÓCIO
Lucro reinvestido
Aderindo ao conceito de negócio social da
Yunus, o Moradigna reinvestia todo o lucro
no negócio para ampliar o impacto social,
mantendo um salário equivalente ao de
mercado para os sócios e funcionários.
119
Até 2017, a empresa chegava a faturar cerca
de R$ 1,5 milhão ao ano e tinha a meta de
aumentar esse número para R$ 5 milhões em
três anos.
O ponto crítico para expansão do negócio era
capital de giro. Para manter a facilidade de
pagamento para o cliente e continuar
crescendo, o Moradigna buscava parceiros
para soluções de crédito.
RESULTADOS SOCIAIS
Ampliando a medição do impacto
Os serviços do Moradigna eram tão simples
quanto retirar o mofo, colocar uma janela,
instalar uma porta, fazer pintura e colocar
revestimento no banheiro. Mas Matheus sabia
o que isso impactava na motivação de uma
criança para ir à escola ou na disposição para
o trabalho de uma diarista. E era isso que
ouvia de seus clientes. “Ouvíamos que as
crianças voltaram a estudar porque tinha
banho quente. Ou que os pais tinham mais
motivação para trabalhar, agora que tinham
120
onde se arrumar”, contou. “Ao reformar a sala
de uma cliente, víamos a felicidade de quem
agora teria onde tirar as fotos do casamento
da filha”, complementou.
O Moradigna já havia beneficiado 1250
pessoas e os sócios queriam multiplicar esse
número por dez em três anos, mas ainda
buscavam formas para amadurecer a medição
do impacto social. “A questão da moradia é
negligenciada. Quando um bebê fica doente
por dormir ao lado de uma parede mofada,
isso cai na conta dos índices de saúde”,
contou Matheus.
__________________
Vencedora Incluir 2017 na categoria
“Juventude de Impacto”
http://moradigna.com.br/
121
TERCEIRA PARTE
BUSCA POR ESCALA
E IMPACTO SOCIAL
COM STARTUPS
FINANCEIRAS
122
De 2014 a 2017, o segmento das fintechs
estava em plena expansão. O Brasil, país com
alta concentração bancária e exclusão
financeira, estava à frente de países como
Austrália e Japão em relação ao volume de
investimentos atraídos para essas startups.
Uma das perspectivas era a reconfiguração da
indústria de serviços financeiros, beneficiando
as pequenas e médias empresas (PME) e
reduzindo a lacuna de financiamento que
afetava o setor produtivo da região. Dada a
dimensão do público potencialmente
beneficiado e a grande possibilidade de
escala, as fintechs foram reconhecidas como
estratégicas por instituições de fomento e
desenvolvimento social, como a Artemísia e o
Banco Interamericano de Desenvolvimento
(BID). Com as finalistas do Incluir 2017 Firgun,
plataforma de financiamento coletivo; e
SmartMEI, conta digital e aplicativo móvel de
gestão de finanças empresariais, entendemos
como duas jovens fintechs bem diferentes
entre si identificaram oportunidades de
negócio no setor e como planejavam
expandir.
123
FIRGUN: COMO FACILITAR O ACESSO
AO CRÉDITO PRODUTIVO E À
EDUCAÇÃO FINANCEIRA?
Com modelo de negócio ainda incipiente no
Brasil, a Firgun promovia o empréstimo
coletivo e a educação financeira. O objetivo
era ajudar as pessoas de classes econômicas
mais baixas a realizarem seus sonhos.
124
INFORMAÇÕES GERAIS
Fundada em 2016 e sob gestão dos sócios
Fábio Hideki Takara e Lemuel Simis, a Firgun
era uma plataforma de P2P lending que
conectava empreendedores das classes C, D e
E que precisavam de capital a pessoas
dispostas a emprestar pequenas quantias,
que seriam devolvidas sem correção
monetária. Além da retenção de até 3% do
valor das transações, a Firgun também
buscava monetizar com porcentagem sobre
uso de cartões pré-pagos e cursos de
educação financeira. Estava em fase inicial de
operação e a meta era, até 2020, estabelecer
uma movimentação financeira média de R$2
mi ao mês, gerando faturamento de R$
40mil/mês para Firgun e beneficiando
diretamente a vida de, pelo menos, 650
pessoas/mês.
125
OS SÓCIOS FÁBIO HIDEKI TAKARA E LEMUEL SIMIS.
INTRODUÇÃO
Inspirando-se com realidades mais
igualitárias
O empreendedor Fábio Hideki Takara (29) era
paulista e havia crescido em Guarulhos. Ele
fazia parte da terceira geração brasileira de
uma família descendente de japoneses. Com
uma infância de privações, foi para o Japão
aos 12 anos e só voltou ao Brasil com 16.
Fábio tinha o sonho de fazer a faculdade na
Escola Politécnica da Universidade de São
Paulo (USP), e conseguiu. A aprovação era
concorrida, a Poli oferecia um total de 750
126
vagas para o curso de Engenharia. A cada
ano, cerca de 12 mil candidatos se inscreviam
no vestibular para a carreira. A relação
candidato/vaga era superior a 15.
Durante a faculdade em Engenharia, teve a
oportunidade de realizar um intercâmbio na
Bélgica, no quarto ano de faculdade. Lá
percebeu que a infância não precisava ser tão
sofrida, nem a luta por educação de
qualidade tão concorrida.
“Fiquei chocado como as pessoas tinham
facilidade de acesso a tudo; como a saúde, a
educação e o acesso a serviços básicos em
geral eram democratizados”, contou. E isso o
motivou, mais tarde, a buscar uma solução de
negócio social que atuasse com a inclusão de
renda.
Fazendo o que gostava
Ao voltar para o país, Fábio concluiu a
faculdade e chegou a trabalhar por dois anos
na ABB no Brasil, empresa renomada na área
de tecnologias de energia e automação.
127
Buscando novos desafios profissionais,
participou do programa Liderança Na
Prática, da Fundação Estudar, e teve contato
com negócios sociais pela primeira vez. O
programa possuía dois modelos, o de 16 e o
de 32 horas de conteúdo, ambos divididos
em dois módulos, que ocorriam com o
espaço de um mês entre um e outro. Nesse
intervalo, os potenciais líderes eram
desafiados a dar um salto na carreira
profissional, a colocar os conhecimentos
adquiridos no primeiro módulo em prática
para exercitar sua capacidade de realização. E
foi aí que a ideia da Firgun começou a nascer.
“Lá aprendi o quanto era importante fazer o
que se gosta”, contou Fábio, que, assim que
terminou o segundo módulo do programa,
aproveitou que havia saído da empresa em
que trabalhava e começou a empreender com
a Firgun, que ofereceria três serviços:
inspirado no Kiva25
, microcrédito para
empreendedores; inspirado no Nubank,
cartão pré-pago; e, ainda, cursos de educação
financeira.
128
Com o modelo de negócio pronto e em
operação já há alguns meses, Fábio cooptou
Lemuel Simis para sócio, com o objetivo de
atuar de forma mais efetiva na estratégia de
comunicação.
CONTEXTO DO PROBLEMA
A questão do acesso ao crédito
O contexto do problema social que a Firgun
queria ajudar a resolver era similar ao da
SmartMEI: a exclusão bancária e financeira
das classes econômicas mais baixas da
população, que acabava afetando as
oportunidades de crescimento dos
empreendimentos de pequeno porte.
Enquanto a SmartMEI melhoraria o perfil do
empreendedor para que ele tivesse mais
chance de adquirir crédito, a Firgun focava
em facilitar o acesso ao crédito via
empréstimo coletivo.
De acordo com pesquisa da Federação
Brasileira de Bancos (Febraban)26
, 40% da
população não possuía conta bancária em
129
2014. As regiões mais desbancarizadas seriam
as Norte e Nordeste.
O difícil acesso ao crédito pelos pequenos
negócios também era um ponto de atenção.
O Sebrae divulgou27
que 84% dos pequenos
negócios não teriam tomado empréstimos no
primeiro semestre de 2017 e que quase a
metade deles (49%) jamais teria conseguido
financiamento como pessoa jurídica. Os
principais entraves seriam a alta taxa de juros
(48%), a falta de garantias reais (20%) e a falta
de fiador (16%). Oitenta por cento dos
pequenos negócios entrevistados no estudo
nunca tinham acessado uma linha de
financiamento do Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES), principal instrumento de concessão
de crédito para as micro e pequenas
empresas.
Não à toa, estudo do BID e da Finnovista
sobre as fintechs da América Latina e do
Caribe (2017) demonstrou que uma em cada
quatro startup financeiras via as micro e
pequenas empresas como principais clientes,
independentemente de já estarem ou não
130
bancarizadas28
. De acordo com o estudo,
pouco mais da metade das Fintechs da região
atuavam ou como plataformas de
financiamento alternativo (25,6%) ou com
soluções de pagamentos (25,2%). Isso poderia
significar uma resposta às limitações e
deficiências do sistema financeiro tradicional.
Baixa educação financeira
Outro problema que a Firgun visava
solucionar estava relacionado à alfabetização
financeira do brasileiro.
Um relatório divulgado pela Organização para
a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE)29
no final de 2016 sobre
conhecimento, atitude e comportamento
financeiro em 30 países apontou que o Brasil
ficou 1,2 ponto percentual abaixo da média.
No quesito “conhecimento financeiro”, menos
da metade dos adultos brasileiros conseguiu
acertar a pontuação mínima desejada de pelo
menos cinco dos sete itens avaliados na
pesquisa.
O Brasil ficou abaixo da média das notas dos
30 países em quase todas as questões, exceto
131
as relativas à importância de diversificar
investimentos, ao valor do dinheiro no tempo
e às questões referentes a risco e retorno.
Outro ponto preocupante para os brasileiros
ressaltado na pesquisa foi o fato de, no Brasil
(e em outros países como Polônia, África do
Sul e Tailândia), as pessoas que consideraram
ter um nível alto ou muito alto de
conhecimento financeiro atingiram uma
média de pontuação similar àquelas que
achavam que tinham conhecimento
financeiro mediano. Isso sugeriria um grande
nível de autoconfiança, podendo levar a
maior vulnerabilidade a fraudes, por exemplo.
SOLUÇÃO
Analisando a viabilidade jurídica
Com R$ 16 mil, retirados do próprio bolso, os
sócios começaram o investimento na
empresa. Os gastos foram, principalmente,
com pesquisa e seleção do primeiro
empreendedor a ser financiado, elaboração
132
do vídeo institucional e contratação de
advogados.
Por meio da consulta a advogados, os sócios
perceberam que deveriam ter dois CNPJ. Para
atuar com empréstimo coletivo sem custos de
transações, uma atividade regulada pelo
Banco Central, era preciso criar uma
associação. Dessa forma, conseguiriam atuar
em parceria com a MOIP – instituição de
pagamento, emissora de moeda eletrônica e
instituidora de arranjo de pagamentos
regulamentados pelo Banco Central do Brasil.
Ela que seria responsável pelas transações
financeiras. Para emissões de cartões e oferta
de outros serviços financeiros que gerassem
receita para a Firgun, era preciso criar
empresa limitada. Assim, tinham uma
estrutura mista.
Viabilidade financeira com produtos e
serviços de baixa margem de lucro
A Firgun funcionava com um modelo de calda
longa, buscando obter escala na oferta de
produtos e serviços que possuíam baixa
margem de lucro.
133
A) P2P lending
Em relação ao principal serviço oferecido, o
empréstimo coletivo, o trabalho maior ficava
na fase de selecionar o(a) empreendedor(a) a
ser beneficiado(a) e contar sua história por
meio de vídeo didático e interessante. Ainda
assim, a oferta do serviço era facilmente
escalável, acreditavam os sócios.
A plataforma funcionava como um
crowdfunding de ideias empreendedoras. Mas
no lugar das recompensas, o doador recebia
o dinheiro que emprestou.
Sobre o empréstimo, a Firgun retinha até 3%
do valor total, a título de taxa de
administração. Também como em um site de
financiamento coletivo, a ideia da Firgun era
funcionar como marketplace, reunindo vários
projetos interessantes em plataforma digital
para escolha do usuário que quisesse apoiar
uma boa ideia.
Para diluir o risco de quem emprestava o
dinheiro, cada pessoa poderia emprestar até
R$ 400 mil.
134
B) Cartão pré-pago
A Firgun estudava oferecer cartões para os
microempreendedores por meio de parceria
com a Moip. Ainda em análise, a ideia era
que o cartão não tivesse taxas e a
monetização incidisse apenas sobre o uso do
cartão, com uma parte da taxa da transação
destinada à Firgun.
Também em parceria com a Moip, seriam
viabilizadas máquinas de cartão para os
empreendedores apoiados pelo projeto, com
taxa apenas sobre as transações.
C) Educação financeira
Em relação aos cursos de educação financeira,
os sócios ainda estavam prospectando
clientes pagantes. A ideia era prover cursos
básicos de educação financeira a preços
acessíveis para os empreendedores
beneficiados. “Para além de financiar o
microempreendedor também o educamos em
relação às finanças pessoais e da empresa,
dando segurança para que este atue de forma
autônoma e esteja financeiramente
capacitado”, contou Fábio.
135
Os cursos também seriam oferecidos a ONGs
que trabalhassem com pessoas em estado de
vulnerabilidade social ou a empresas que
quisessem capacitar os colaboradores.
A primeira financiada
“Firgun é uma palavra de origem hebraica,
que significa 'compartilhar momentos de
alegria e fortuna com outras pessoas, com o
coração puramente generoso e sem ciúmes' e
também pode ser 'um sentimento de prazer
genuíno ou orgulho pelas conquistas de outra
pessoa, sem ciúmes'”, relatou Fábio. E era
com esse sentimento que Fábio contava a
história de Maria, a primeira beneficiada pelo
microcrédito coletivo.
Maria da Consolação Pimentel era
empreendedora desde seus 16 anos, na área
de corte e costura. Ela comandava a Aba Pai
Confecções, no Capão Redondo (SP),
trabalhando sob encomenda e fornecendo
para grifes locais. A demanda havia
aumentado e ela não estava conseguindo dar
conta com a infraestrutura disponível à época.
Ela havia sido indicada para Firgun pela ONG
136
A Banca, por meio do projeto de
Aceleradora de Negócio com Impacto da
Periferia (NIP).
“Ficamos impressionados com o perfil dela.
Ela é conectada com a comunidade e focada
em passar o conhecimento que tem para os
demais. Não gosta de desperdícios e
aproveita qualquer retalho para fazer roupas
de bebê ou patchworking”, contou Fábio.
Fizeram, então, o vídeo para divulgar o
financiamento de Maria. A divulgação foi toda
espontânea, por meio de grupos de
WhatsApp e Facebook.
Com os R$ 4 mil adquiridos, que foram
emprestados por 38 pessoas, Maria começou
a expandir sua pequena fábrica de costura.
Antes da Firgun, ela havia ido ao banco pedir
a mesma quantia e tinha ficado assustada
com a quantidade de juros que teria que
pagar. Com o empréstimo sem juros, ela
realizou a reforma do ateliê e já estava
pagando as dez parcelas de R$ 400, valor que
era distribuído entre os apoiadores de acordo
com os valores emprestados.
137
MARIA DA CONSOLAÇÃO PIMENTEL, PRIMEIRA
FINANCIADA PELA FIRGUN, ERA EMPREENDEDORA DESDE
SEUS 16 ANOS.
RESULTADOS DE NEGÓCIO
Metas de médio prazo
Até 2020, a Firgun queria estabelecer uma
média de movimentação financeira ao mês de
R$2 mi, gerando faturamento mensal de R$
40 mil e impactando a vida de cerca de 650
pessoas/mês.
Apostando na escalabilidade, os sócios
também queriam modelar metodologia de
educação empreendedora para captar
“Fellows Firgun”, indivíduos que replicariam o
138
conteúdo dos cursos de educação financeira.
“Esperamos ter 30 fellows ministrando aulas
para 900 pessoas por mês, o que corresponde
a um faturamento mensal de R$180.000 para
a Firgun”, contou Lemuel.
Também pensavam em monetizar de outras
formas, como com loja virtual na plataforma
para vender itens produzidos pelos
financiados, processo no qual ficariam com
uma comissão das vendas realizadas.
RESULTADOS SOCIAIS
Inclusão financeira e produtiva das classes
C, D e E
O negócio de Fábio e Lemuel estava alinhado
ao 8º Objetivo de Desenvolvimento
Sustentável (ODS) – Emprego Digno e
Crescimento Econômico. Mais
especificamente aos itens 8.3, que incentivava
a formalização e o crescimento de micro,
pequenas e médias empresas; e 8.10, que
tratava da expansão do acesso aos serviços -
139
bancários, financeiros, e de seguros para
todos.
Ainda sem indicadores de mensuração do
impacto social, Fábio e Lemuel acreditavam
que, ao possibilitar acesso a crédito sem juros
para microempreendedores e ao passar
ensinamentos sobre educação financeira,
esses indivíduos seriam capazes de identificar
e se engajar em atividades que
representariam um incremento às rendas
familiares.
O objetivo era que o público beneficiado
fosse das classes C, D e E. “Queremos elevar o
conhecimento desse público, que compõe
mais da metade da população brasileira,
sobre juros, inflação, investimentos, poupança
e sonhos. Afinal, educação financeira não é
apenas economizar, é saber fazer escolhas
que podem mudar vidas”, acreditavam os
sócios.
140
Vencedora Incluir 2017 na categoria
“Ideia Inovadora”
http://financiamentos.firgun.com.br/
141
SMARTMEI: COMO FORNECER SERVIÇOS PARA EMPRESAS DE
PEQUENO PORTE POR MEIO DE UMA SOLUÇÃO
TECNOLÓGICA ESCALÁVEL?
Depois de muitas pesquisas e testes, nasceu o
aplicativo SmartMEI para prover serviços
financeiros e de suporte ao
Microempreendedor Individual (MEI). A
ambição era atender a um público de quase 40
milhões de pessoas, entre empreendedores
formais e informais.
142
INFORMAÇÕES GERAIS
Fundada em 2015 pelos sócios Carlos Dejavite
e Marcello Picchi, a SmartMEI já atendia a um
público de 75 mil empreendedores em 2017,
quando seu capital social era superior a R$
750 mil. Embora os sócios ainda não
planejassem medir de maneira objetiva e
sistemática os impactos sociais, buscavam
contribuir com a redução na taxa de
mortalidade das empresas; a redução na
inadimplência; e o aumento no volume de
empréstimos destinados aos MEI.
143
OS SÓCIOS MARCELLO PICCHI E CARLOS DEJAVITE.
INTRODUÇÃO
Pesquisas, MVP e testes com os clientes
Foi durante o MBA que faziam na
Universidade Stanford, em 2015, que Carlos
Dejavite e Marcello Picchi se conheceram e
começaram a testar modelos de negócio que
oferecessem serviços para descomplicar a
gestão das empresas brasileiras. “Nos Estados
Unidos, o empreendedorismo é muito forte.
No Brasil, tudo parece muito difícil e
burocrático para as empresas. Sabíamos que
144
havia aí uma oportunidade de negócio”,
contou Marcello.
Com a aproximação do fim do MBA, eles
queriam voltar para o país, mas estavam
receosos. “A crise econômica estava grande,
mas o Brasil me deu muita coisa. Queria voltar
e retribuir”, disse Marcello.
Com experiência e conhecimento em
tecnologia e o interesse por prover soluções
para empresários (as), os sócios começaram a
prospectar possíveis clientes e suas demandas
ainda em Palo Alto, Califórnia. “Foi no Vale do
Silício que conheci quem era o MEI”, brincou
Marcello, em referência a ter identificado o
potencial da figura mais simples do
empreendedorismo brasileiro – que possuía
faturamento de até 60 mil e, no máximo,
um(a) empregado(a) – em uma região
estadunidense conhecida pelas empresas de
alta inovação e tecnologia.
Com investimento inicial de US$ 100 a US$
200 em adwords, os sócios chegaram aos
primeiros potenciais clientes:
empreendedores interessados em resolver
145
problemas da burocracia trabalhista.
Colocaram, então, no mercado, a solução
SmartRH, que oferecia serviços que visavam
garantir a adequação das empresas à
legislação trabalhista e resguardar os (as)
empresários (as) de futuras dores de cabeça.
“Os clientes eram desconfiados. Muitos não
queriam ficar pagando os serviços para só
depois de cinco anos, quando fossem demitir
alguém, descobrirem se tinha ou não valido a
pena”, revelou Marcello.
Continuaram fazendo pesquisas com
potenciais clientes, buscando identificar
necessidades que pudessem gerar um
negócio. Viram, por exemplo, que o registro
de funcionários era uma demanda.
“Entrevistamos 3800 empresários para checar
o real interesse. Vinte confirmaram que
queriam contratar o serviço, mas nenhum
deles pagou o boleto de R$ 30 que emitimos
para que o serviço fosse realizado.
Resolvemos deixar a ideia de lado”, relatou
Marcello, ressaltando que o lançamento do
Produto Mínimo Viável (MVP, pela sigla em
inglês) havia sido fundamental para o
processo. “O custo de desenvolvimento de
146
uma solução tecnológica é muito alto.
Buscávamos escala e tínhamos que ter certeza
da demanda”, complementou.
“Nesse processo de testar a aceitação de uma
solução para a burocracia trabalhista fomos
procurados por alguns MEI, que acabavam
pedindo ajuda com outros problemas que
tinham com as suas empresas. Aí que
percebemos que o MEI, um público
gigantesco e desamparado, era uma grande
oportunidade”, contou Marcello.
Começaram, então, a testar a demanda por
serviços de contabilidade acessíveis pelo
celular com cerca de 200 MEI, usando
ferramentas como WhatsApp, Google Docs e
e-mail. Checaram as reais necessidades destas
empresas, ofereceram serviços
complementares e testaram os preços. E foi
assim que chegaram ao aplicativo móvel
SmartMEI, que envolvia a oferta, em interface
amigável, de serviços essenciais para o MEI
que eram facilmente automatizados, como
alteração cadastral, declaração anual e
controle de impostos e de caixa; além de
serviços bancários básicos, que permitiam ao
147
MEI operar o negócio de maneira mais
profissional, com emissão de boleto, por
exemplo, por meio de uma conta digital.
O investimento em oferta de uma conta
digital parecia estratégica, considerando o
público. “Tivemos a sacada de que o MEI
ainda possui um mindset de empreendedor
informal. Não percebe o valor de ter
relacionamento formal com os bancos, com o
uso de CNPJ. Por outro lado, os bancos
também não têm interesse nesses clientes
com menor rentabilidade e com dificuldade
em comprovar histórico financeiro”, contou
Marcello.
CONTEXTO DO PROBLEMA
Deparando-se com um setor em
efervescência
Com essa sacada dos sócios, a SmartMEI
entrava no segmento das fintechs, startups
que ofereciam soluções de serviços
financeiros. Elas tendiam a ser enxutas, ter
baixíssimo custo de operação, e possuir
148
plataformas atrativas e com boa usabilidade.
Eram exemplos mais conhecidos o Nubank,
do setor de cartões; a Creditas, que oferecia
empréstimos; e o GuiaBolso, aplicativo para
controle de gastos.
A área era promissora. Segundo estudo do
Banco Goldman Sachs divulgado pela New
York Times,30
as fintechs brasileiras gerariam
uma renda de cerca de US$ 24 bilhões até
2027. Estudo da FintechLab31
também trouxe
dados encorajadores: de 2015 para 2016 as
fintechs brasileiras teriam crescido 87%. A
expansão colocou o país em primeiro lugar
no segmento na América Latina (BID;
Finnovista, 2017) e em oitavo lugar no mundo
em relação ao volume de investimentos
atraídos (cerca de R$ 515 milhões), à frente
de países como Austrália e Japão (FintechLab,
2017).
Exclusão financeira e produtiva
O grande sucesso das fintechs entre os
brasileiros tinha, entre uns dos motivos, a alta
taxa de população desbancarizada: era
estimado que cerca de 40% dos adultos não
149
tivessem uma conta bancária em 2014.32
A
grande concentração do setor bancário em
cinco principais bancos,33
que ofereceriam
uma das taxas de juros mais altas do
mundo,34
também tornava o mercado
brasileiro muito atraente para essas startups.
Pesquisa do McKinsey Global Institute35
relatou que 200 milhões de negócios nas
economias emergentes não tinham acesso a
crédito e a outros serviços financeiros;
quando tinham, pagavam caro por uma gama
limitada de produtos.
Setores ligados ao desenvolvimento
econômico e social no Brasil estavam atentos
ao problema. O Fórum de Cidadania
Financeira, organizado pelo Banco Central,
Governo Federal e Sebrae, já ia para sua
quarta edição e tinha como um dos temas de
debate a inclusão financeira dos pequenos
negócios.
Do lado das fintechs, isso representava uma
oportunidade de negócio. Pesquisa do BID e
da Finnovista (2017) relatou que mais da
metade das startups financeiras B2B tinham as
150
pequenas e médias empresas (PME) como
principais clientes. Em relação à facilitação do
acesso ao crédito, geralmente atuavam no
setor de pontuação alternativa (scoring),
fornecendo às instituições financeiras
tradicionais diferentes formas de avaliação de
risco de crédito; no setor de financiamento
alternativo, com diferentes condições e taxas
para os pequenos negócios, geralmente bem
mais baixas que nos bancos; e no setor de
gestão de finanças empresariais, permitindo
que o histórico das transações financeiras e
operações do negócio pudesse ser usado
para avaliar risco de crédito pelas instituições
financeiras tradicionais e melhorar as
oportunidades de financiamento dos
pequenos negócios. Além de atuar como
conta digital, a SmartMEI também se
encaixava nessa última categoria.
SOLUÇÃO
Conta digital não bancarizada
Por meio da oferta de uma conta digital, a
SmartMEI possibilitava a abertura e operação
151
online da conta, com emissão de boleto
bancário, compras com cartão, transferências
e, ainda, saque em terminais e maquininha de
cartão. Nesse tipo de conta, o usuário abria
uma conta digital em instituição regularizada
pelo Banco Central (ou ligada a uma, como
era o caso da SmartMEI). Geralmente, o
cliente era isento das taxas de manutenção,
pagando apenas pelos serviços utilizados, e
não precisava comprovar renda ou nome
limpo.
Com os dados das transações financeiras do
usuário, a SmartMEI conseguia, ainda, de
maneira automatizada, gerar relatório de
vendas, despesas e lucros. Por meio de
integração com o Programa Gerador do DAS
MEI, Documento de Arrecadação do Simples
Nacional (PGMEI), também permitia ao
usuário o acesso às guias de pagamento dos
impostos e às informações sobre quitação
pelo aplicativo.
Na visão dos sócios, estes serviços eram
suficientes para que o MEI tivesse controle
contábil da sua empresa, sem necessidade de
contratação de contador. “O fato de integrar
152
todo o back office da empresa nos dá
algumas possibilidades únicas, como a
capacidade de já usar os dados de
movimentação financeira da empresa para
ajudar o empreendedor a entender
automaticamente se está tendo lucro ou
prejuízo, sem a necessidade de fazer contas”,
explicou Marcello.
Automatização e escala
A premissa dos sócios com a ideia da
SmartMEI era que o MEI estava
“completamente desamparado” e havia uma
grande oportunidade de negócio para
atuação com esse público. Essa oportunidade
de negócio poderia ser operada a baixíssimo
custo, demandando, basicamente, a
automatização de alguns processos que
permitisse operação e gestão básica do
negócio do cliente e das questões legais. A
oferta deveria ser por meio de uma solução
simples, agregadora e acessível pelo celular.
O valor por serviço era baixo, mas o público
gigantesco; com o enorme potencial de
escala, o faturamento seria alto.
153
“Por não ter agências físicas e operar 100%
online, a SmartMEI tem eficiência operacional
muito grande e é altamente escalável”,
contou Carlos. E complementou: “sabíamos
desde o começo que os preços precisavam
ser mais baixos que nos bancos e nos
preparamos para isso. Os clientes pagantes
deixam uma margem muito saudável para a
empresa”.
Como o foco era ter escala, os sócios
buscavam automatização quase integral dos
serviços oferecidos. Em relação ao serviço de
suporte ao usuário, buscavam melhorar o
desempenho dos chatbots.
Diferencial e concorrência
Com um modelo Freemium, a SmartMEI
oferecia serviços sem custo para atrair
usuários e produtos e serviços pagos dentro
do aplicativo. As taxas sobre as operações
variavam.
Com o crescimento do MEI, várias soluções
de mercado estavam surgindo. Qipu,
AceleraMEI e MEI fácil eram alguns dos
nomes. Uma concorrente direta, que também
154
trabalhava com conta digital para
empreendedores de pequeno porte era a
conta.MOBI.
Os sócios acreditavam ter conseguido reunir
em um aplicativo acessível as principais
questões para o sucesso do MEI. “Facilitamos
o MEI a se manter em dia com as obrigações
com o governo, melhorar a gestão financeira
da empresa e comprovar o faturamento e a
renda líquida em nome da empresa,
fundamentais para contratação de
empréstimos”, contaram.
RESULTADOS DE NEGÓCIO
Solução escalável
Em abril de 2017, a SmartMEI foi uma das
vencedoras do “Desafio de Negócios de
Impacto Social – Educação Financeira e
Serviços Financeiros para Todos”. A iniciativa,
promovida pela Artemísia e pela Caixa,
investiu cerca de R$ 200 mil na SmartMEI e
em cada uma das outras quatro startups
finalistas, que também ofereceriam soluções
155
escaláveis, com potencial de atender milhões
de pessoas de menor renda.
Em 2017, o capital social da empresa era de
mais de R$ 750 mil. Embora não quisessem
falar de números, os sócios estavam felizes
com os resultados. “Por conta dos números
interessantes que apresentamos e pela
experiência da equipe, temos tido facilidade
em atrair os investimentos necessários”,
resumiu Carlos.
A empresa atendia um público de 75 mil
empreendedores, mas os sócios queriam
crescer exponencialmente. “Queremos
atender absolutamente todos os 7,5 milhões
de MEI que já estão em atividade no
momento, além de ajudar outras quase 40
milhões de pessoas a formalizarem a sua
situação de trabalho e entrarem no MEI”,
contou Carlos, referindo-se ao número de
pessoas com renda que não contribuem para
a Previdência (INSS, 2017).
156
RESULTADOS SOCIAIS
Acesso a serviços financeiros para todos
Por seu impacto no desenvolvimento
socioeconômico com a expansão dos serviços
bancários e financeiros e o fortalecimento dos
pequenos negócios, a SmartMEI estava
alinhada ao 8º Objetivo de Desenvolvimento
Sustentável (ODS) – Emprego Digno e
Crescimento Econômico.
Embora os sócios ainda não planejassem
medir de maneira objetiva os impactos
sociais, acreditavam que alguns indicadores
possíveis eram: redução na taxa de
mortalidade das empresas; aumento no
número de postos de trabalho gerados por
MEI; redução na inadimplência; e aumento no
volume de empréstimos destinados aos MEI.
“De maneira geral, queremos aumentar as
chances de sucesso do microempreendedor
e, consequentemente, ter um impacto
positivo na geração de renda e nos postos de
trabalho neste tipo de empresa”, resumiu
Carlos.
157
A SmartMEI estava inserida em segmento de
startups sobre o qual se tinha muitas
expectativas em relação aos possíveis
impactos sociais. A pesquisa do McKinsey
Global Institute (MGI) de 2017 relatou que as
finanças digitais teriam o potencial de
fornecer acesso a serviços financeiros para 1,6
bilhão de pessoas em economias emergentes,
mais da metade delas mulheres. Poderiam,
ainda, aumentar o volume de empréstimos
concedidos a indivíduos e empresas em US $
2,1 trilhões. No geral, calculavam que o amplo
acesso às finanças digitais poderia aumentar
o Produto Interno Bruto (PIB) anual de todas
as economias emergentes em US$ 3,7 trilhões
até 2025.
158
Vencedora Incluir 2017 na categoria
“Negócio de Impacto em Escala”
https://www.smartmei.com.br/
159
QUARTA PARTE
TECNOLOGIAS
INOVADORAS E
SOLUÇÕES PARA
QUESTÃO HÍDRICA
160
Com grande investimento em pesquisa e
desenvolvimento, o Adapta Sertão e a Marina
Tecnologia se destacaram por sua atuação
com o desenvolvimento de tecnologias que
buscavam promover regiões que tinham
acesso precário à condição essencial para a
existência humana: água. Com o Adapta,
conhecemos o “MAIS”, conjunto de
tecnologias sociais para adaptação das
pequenas produções agrícolas à mudança
climática no semiárido, tipo de região que
seria uma das mais afetadas pelo fenômeno
mundial de desertificação. Já com a Marina,
conhecemos o “Carborroz”, projeto de
equipamento filtrante de água simples,
ecológico, barato e altamente atrativo para
exportação, podendo beneficiar não só as
então mais de 35 milhões de pessoas sem
acesso à água tratada no Brasil,36
mas as 2,1
bilhões do mundo.37
161
ADAPTA SERTÃO: COMO PROMOVER O
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DA
AGRICULTURA E DA PECUÁRIA NO CONTEXTO DE
INTENSIFICAÇÃO DA SECA DO SEMIÁRIDO
BRASILEIRO?
Idealizado e coordenado por três organizações
(Rede de Desenvolvimento Humano, Onda
Verde e Cooperativa Ser do Sertão), o Adapta
atuava com tecnologias sociais de adaptação a
mudanças climáticas para promover
segurança alimentar, redução da pobreza e
preservação da Caatinga no Território Bacia do
Jacuípe e regiões vizinhas, na Bahia.
162
INFORMAÇÕES GERAIS
Em local de intensa seca e longos períodos de
estiagem na região do semiárido no interior
da Bahia, os produtores rurais sofriam com a
produtividade baixa e oscilante, agravando a
pobreza extrema da região. Para atuar com
essa questão, o Adapta Sertão reestruturava
as propriedades rurais por meio do programa
MAIS (Módulo Agroclimático Inteligente e
Sustentável), fortalecendo os produtores com
aplicação de tecnologias sociais; promoção
de capacitações; e acompanhamento técnico
sistematizado. O Adapta também fomentava
o desenvolvimento rural por meio de
cooperativismo agrícola e parcerias com
institutos de pesquisa, entidades públicas e
privadas e instituições financeiras. Com o
Programa MAIS, havia atendido mais de 100
propriedades familiares, que chegaram a ter
aumento de mais de 50% na produção e
200% na renda.
163
______________________________________________________________
AGRICULTORES DO JACUÍPE EM CAPACITAÇÃO.
164
INTRODUÇÃO
Experimentações e parcerias para
sustentabilidade e replicação
Para atuar com os problemas de produção
rural no semiárido baiano, que eram muitos e
complexos – condições climáticas extremas,
baixa qualificação produtiva, alto índice de
pobreza e analfabetismo, baixa eficácia das
políticas públicas e devastação ambiental
crescente –, muitos também foram os
envolvidos: o Adapta Sertão foi fruto de uma
parceria entre o Centro de Estudos Integrados
sobre Meio Ambiente e Mudanças Climáticas
(Centro Clima) da Coppe, a cooperativa Ser
do Sertão, a Escola de Relações Internacionais
e Estudos do Pacífico da Universidade da
Califórnia (EUA), a empresa Onda Verde
(coordenadora técnica) e a Rede de
Desenvolvimento Humano (REDEH),
coordenadora geral do projeto.
Ao longo dos seus mais de dez anos de
história, contou, ainda, com vários outros
parceiros e investidores, como: REEEP;
SouthSouthNorth; Fondazione Cariplo;
165
Trócaire; CNPQ; Itaú social; e World
Resources Institute.
A iniciativa que se consolidou “Adapta Sertão”
deu os primeiros passos em 2006, no
município de Pintadas. Sob o nome de
“Pintadas Solar”, utilizava bombas de água
com energia solar e irrigação por
gotejamento para lidar com a escassez de
água e estabilizar a produção. Mas em
meados de 2008, o projeto foi reformulado.
As bombas não tiveram os resultados
esperados e ainda se estava em busca de
fatores que pudessem garantir a adaptação
da produção da agricultura e da pecuária ao
clima na região do semiárido de maneira
replicável e sustentável.
Com novas tecnologias e estratégias – como
introdução de ração balanceada; uso de água
carregada de sais para irrigação; e promoção
de trocas sistemáticas de experiência entre os
produtores –, expandiram o projeto para os
municípios de Baixa Grande e Quixabeira (BA).
Pouco tempo depois, já possuíam 35
projetos-piloto e dois prêmios
internacionais: o Prêmio da Agência das
166
Nações Unidas para Habitação/ Dubai e o
Prêmio SEED, promovido
por PNUD, PNUMA e IUCN.
Pesquisa e desenvolvimento
O investimento em pesquisa para o
desenvolvimento foi essencial para o Adapta
Sertão. Em meados de 2012, os
coordenadores técnicos se dedicaram a
monitorar e consolidar os dados das
experiências com os produtores e tiveram
interessantes conclusões sobre as ações mais
adequadas para a produtividade sustentável
no semiárido, como a adoção de práticas de
criação de gado sem queimadas e com
reflorestamento parcial.
Após o amadurecimento do projeto com
estudos teóricos e práticos sobre as melhores
técnicas para resultados com alta eficácia,
receberam investimento de R$ 2,2 milhões do
Fundo Nacional sobre Mudança do Clima
(Fundo Clima), que apoiava iniciativas de
adaptação das populações vulneráveis às
mudanças do clima e de mitigação e
compensação de emissões de carbono.
167
A solução MAIS
O financiamento possibilitou grande evolução
do modelo de atendimento e assistência aos
produtores familiares: com o
desenvolvimento da metodologia MAIS
(Módulo Agroclimático Inteligente e
Sustentável), os conhecimentos adquiridos
com as várias atuações com os produtores
rurais foram sistematizados em um modelo
produtivo integrado.
Foi com o MAIS que, após mais de dez anos
aplicando diversas metodologias de
resiliência produtiva ao clima hostil do
semiárido, o Adapta Sertão consolidou um
modelo que permitiria o desenvolvimento
sustentável da agricultura e da pecuária no
contexto de intensa seca do semiárido
brasileiro. Para atuar de forma mais
customizada às necessidades do produtor,
desenvolveram, ainda, as linhas segmentadas
para leite, cordeiro, pasto com Caatinga, e
policultivo.
O módulo, que deveria ser implementado nos
períodos de pluviosidade regular, por ser
168
medida preventiva à seca, foi concebido para
garantir, no mínimo, a alimentação de nove
vacas de leite paridas com bezerros e 12
animais (entre bezerras, novilhas e vacas fora
da lactação) ou 100 matrizes de ovinos, por,
pelo menos, dois anos de seca. Na medida
em que o MAIS ia sendo aplicado pelo(a)
produtor(a), os ganhos poderiam ser maiores,
com superação de secas ainda mais
prolongadas, ampliação do rebanho e a
possibilidade de inclusão de um número
maior de módulos.
“O conceito de módulo foi fundamental para
o dimensionamento da menor área produtiva
possível que permitisse gerar o mínimo de
dois salários mínimos para o produtor, renda
mínima suficiente para manter a atividade
produtiva”, afirmou Daniele Cesano, um dos
coordenadores técnicos do Adapta Sertão.
169
CONTEXTO DO PROBLEMA
Semiárido brasileiro: seca, desigualdades
sociais e resistência
Quase 24 milhões de habitantes: essa era a
população aproximada do semiárido
brasileiro no período (ISGBA, 2014). Dos 1,7
milhão de estabelecimentos agropecuários na
região, 89% eram agricultura familiar. Maior
parte do semiárido estava no Nordeste do
país, onde também estava 59,1% dos
brasileiros em situação de extrema pobreza –
destes, mais da metade (52,5%) vivia em áreas
rurais da região.38
Com o agravamento da seca, que era uma
das piores que já havia afetado a região, o
mapa do semiárido havia sido ampliado em
2017 para 1.262 municípios, com a inclusão
de 73 cidades. A partir de então, esses novos
municípios também poderiam se beneficiar
dos instrumentos de políticas públicas
federais para o desenvolvimento da região,
como o Fundo Constitucional de
Financiamento do Nordeste (FNE).39
170
Além das ações emergenciais de convivência
com a seca, o semiárido demandava diversas
políticas de desenvolvimento social e
econômico. De acordo com o IBGE (2010), a
taxa de analfabetismo da região era de 24,3%,
quase o triplo da média nacional, que era de
9,63%. Além disso, cerca de 3,4 milhões de
famílias do semiárido haviam sido
beneficiadas pelo Bolsa Família em 2012,40
o
que correspondia a quase todas as famílias.
Com cerca de 42% da população composta
por jovens de até 17 anos, a região abrigava
cerca de 30% de toda a agricultura familiar e
80% das comunidades quilombolas do país.
Neste contexto, o Adapta Sertão estava
inserido entre as iniciativas que buscavam
promover a segurança alimentar por meio do
desenvolvimento da resiliência produtiva do
semiárido, fomentando a cultura da
cooperação e disseminando tecnologias.
Outra iniciativa no tema era a Associação do
Semiárido Brasileiro (ASA), rede formada por
mil organizações da sociedade civil que
atuavam na gestão e no desenvolvimento de
políticas de convivência com a
região semiárida. O Sebrae também atuava
171
com o fortalecimento da agricultura familiar,
por meio do Programa Viver Bem no
Semiárido, que promovia a competitividade e
a sustentabilidade dos empreendimentos
rurais do semiárido baiano. 41
SOLUÇÃO
Combate mundial à desertificação
Embora a escassez de chuva fosse fenômeno
natural e cíclico em regiões semiáridas, o
semiárido brasileiro vivia sua pior seca dos
últimos 50 anos. De acordo com estudos do
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(Inpe, 2013), parte dele poderia se tornar
deserto no ano 2100.
O Secretariado da Convenção das Nações
Unidas de Luta contra a Desertificação
advertiu que, até 2030, 135 milhões de
pessoas estariam em risco de deslocamento
por causa da desertificação mundial, com a
perspectiva de que 60 milhões migrassem da
África Subsaariana para o Norte da África e
para a Europa. As previsões mostravam que
172
as regiões áridas e semiáridas seriam as mais
afetadas pelo fenômeno e pelos movimentos
populacionais.42
O Brasil, e outros 192 países, era signatário da
Convenção das Nações Unidas para o
Combate à Desertificação e Mitigação dos
Efeitos das Secas (UNCCD). Um dos
compromissos era reduzir o desmatamento, o
extrativismo e o desgaste dos diferentes
biomas brasileiros. Juntamente à Mata
Atlântica, à Caatinga e ao Cerrado, os dois
biomas que ocorriam no semiárido, estavam
entre os três mais degradados do país. Por
meio do Projeto SIMSAB, o INSA realizava
monitoramento das áreas do semiárido
propensas a sofrerem desertificação.
Iniciativas como a do Adapta Sertão tinham
papel relevante no combate à desertificação,
com foco na capacitação das famílias
agricultoras para manejo sustentável e para
convivência com o semiárido com menos
impactos ambientais e agravamento das
condições climáticas.
173
Diferenciais competitivos do Sistema
MAIS: sustentável para o produtor e
seguro para o investidor
A) Beneficiários selecionados
Em geral, os clientes do Sistema MAIS eram
as cooperativas, com o fim de aumentar a
produtividade dos cooperados. Pela baixa
margem de lucro, havia escala mínima para
compra do Módulo – que variava, podendo
ser de cerca de dois mil módulos.
“É possível que o produtor adote sozinho,
mas precisa, necessariamente, trabalhar todas
as vertentes para garantir a sustentabilidade
do seu empreendimento no médio e longo
prazo”, afirmou Daniele Cesano, coordenador
técnico do Adapta Sertão.
B) Investimento seguro
Eram as cooperativas que identificavam os
agricultores mais adequados para receber a
capacitação e cumprir com os planos de
produção e contratos de fornecimento.
174
A eficácia comprovada do uso da
metodologia, que havia sido testada e tido
resultado em mais de 100 propriedades –
com aumento de até 50% na produção e
200% na renda –, também era um diferencial
para investidores, fomentadores e
formuladores de políticas públicas. “Os
agricultores são, então, capazes de pagar seu
empréstimo mais facilmente e gerar sua
renda a partir do que eles produzem. Dá
segurança ao banco que empresta, de que vai
ter retorno. É uma metodologia comprovada”,
afirmou Daniele Cesano.
C) Acompanhamento técnico
Para garantir que o MAIS fosse aplicado de
maneira correta, os acompanhamentos
técnicos feitos pelo Adapta eram viabilizados
por meio de consórcios com o governo local
ou investimentos de instituição de fomento
ao desenvolvimento, como o BID. Os serviços
também poderiam ser contratados
diretamente pelo produtor, com pagamento
de um valor fixo e um valor variável, que
incidia sobre a produtividade adicional
175
conseguida – aquela que estaria acima da
produtividade pactuada.
D) Pesquisa e desenvolvimento
O Adapta liderava ações de pesquisa com
parceiros para aprimoramento da
metodologia. Diálogos com formuladores de
políticas públicas também ajudavam a criar
estrutura favorável para sustentação e difusão
do modelo.
E) Experiência prática
Os coordenadores técnicos do Adapta
acreditavam que o principal diferencial do
MAIS era a construção baseada em mais de
dez anos de experiência com os produtores
rurais da região.
“O Módulo Agroecológico Inteligente e
Sustentável (MAIS) foi cuidadosamente
desenhado a partir de experimentação e
observação prática, conhecimentos que
corrigiram erros comuns dos produtores.
Antes, os trabalhadores causavam
desmatamento e queimadas, por exemplo”,
relataram.
176
F) Adequação à realidade do beneficiado
Eram essenciais para o sucesso do Módulo
MAIS tanto a compreensão da cultura do
produtor, por parte dos aplicadores da
metodologia; quanto o compromisso com a
aplicação, por parte do produtor rural. “No
início, o produtor não acredita nos resultados.
Quando faz direito, os resultados acontecem,
e aí ele se convence. Mas é preciso que ele
modifique a propriedade, senão é tempo
perdido”, contou Daniele.
Para compreensão da cultura do produtor,
ocorrem encontros de formação (mutirões)
para entender a realidade e a cultura local. “É
preciso fortalecer a região de forma sistêmica,
se as ações chegam desligadas da realidade,
têm um impacto muito aquém do esperado”,
complementou o coordenador.
G) Monitoramento e transparência
O Adapta Sertão usava sistema de
monitoramento online, o MeuSoft-MAIS. Por
ele, era possível monitorar dados produtivos
e econômicos das propriedades. “Além de
instrumento útil para o produtor, garante
177
transparência para os parceiros públicos e
privados”, afirmou Valdirene dos Santos,
coordenadora do Adapta Sertão.
AGRICULTORES RECEBEM CAPACITAÇÃO SOBRE NOVAS
TÉCNICAS DE CONSTRUÇÃO DE RESERVATÓRIOS DE
ÁGUA EM ESTRUTURA DE FERRO E SOLO-CIMENTO, QUE
SERIAM ATÉ 50% MAIS BARATOS QUE CISTERNAS DE
PLACA.
Frentes de atuação
Entendendo que a sustentabilidade da
produção agrícola familiar no semiárido
passava não apenas por tecnologias e
capacitação, mas também por questões como
comercialização e financiamento, o Adapta
Sertão possuía oito linhas de atuação,
divididas em três grupos: i) grupo
178
estruturante para a base produtiva:
tecnologias sociais agrícolas, capacitação, e
capitalização e financiamento; ii) grupo
consolidante para melhorar o acesso ao
mercado: fomento ao cooperativismo,
industrialização e comercialização; iii) grupo
institucionalizante para estruturar ações de
escala a partir dos resultados de sucesso:
pesquisa científica para a sistematização das
experiências, e políticas corporativas ou
públicas para dar escala às ações.
As frentes de atuação eram complementares
e interdependentes. Por exemplo, os
produtores eram indicados ao banco rural
local para receber empréstimo para financiar
o Sistema MAIS. Com a aplicação do Sistema,
eles poderiam fornecer volumes mais
constantes de produtos às cooperativas –
que, por sua vez, escoavam os produtos para
agroindústrias e mercados regionais.
Com essa estratégia, o Adapta minimizava as
perdas do processo. Um problema na
produção podia afetar a comercialização, por
exemplo. “O escoamento dos produtos vinha
sendo gargalo, porque a produção tinha
179
muita sazonalidade”, comentou Daniele. Em
outro exemplo, resultados obtidos com
pesquisas impactaram drasticamente a
produção. “Serviço que era realizado em sete
dias, passou a ser realizado em poucas horas”,
complementou.
Linhas de ação do MAIS
EIXO ESTRUTURANTE
Tecnologias do
MAIS
Fornecer padrão tecnológico e
produtivo agroclimático para o
produtor.
Capacitação Prover assistência técnica para
correta aplicação do MAIS.
Capitalização e
financiamento
Articular obtenção para que o
produtor pudesse adquirir as
tecnologias do MAIS.
EIXO CONSOLIDANTE
Industrialização Escoar a produção imprópria para
comercialização in natura.
Melhorar a qualidade da produção
com a industrialização do processo.
Cooperativismo Fortalecer organizações produtivas
(cooperativas, associações ou
empresas privadas) na área de
180
gestão e negócio.
Comercialização Fortalecer o acesso a mercado e a
comercialização dos produtos.
EIXO INSTITUCIONALIZANTE
Pesquisa Fazer parceria com instituições de
pesquisa e desenvolvimento para
buscar aprimoramento constante.
Políticas públicas e
corporativas
Dialogar para fortalecimento do
empreendedorismo e
desenvolvimento de programas
para resiliência climática.
RESULTADOS DE NEGÓCIO
Reconhecimento e referência
Com cerca de dez anos de experiência no
semiárido baiano, o Adapta Sertão tinha
como principais clientes as instituições
públicas e privadas que fomentavam o
desenvolvimento socioeconômico. De 2006 a
2017, o projeto já havia beneficiado mais de
800 famílias e acumulado diversos prêmios
nacionais e internacionais, como o Prêmio
Celso Furtado do Ministério de Integração
181
Nacional (MI) e o Prêmio Mandacaru, do
Instituto Ambiental Brasil Sustentável (IABS).
Os resultados econômicos do projeto eram
animadores. Em piloto de aplicação do MAIS
Leite, por exemplo, foi identificado que para
cada R$ 1 investido, quase R$ 10 eram
gerados: R$ 2,37 para os produtores; R$ 4,89
para o setor de laticínio; R$ 1,22 para o setor
público e R$ 1,41 em benefícios
compartilhados. “Isso foi mais uma evidência
que o MAIS é economicamente interessante
para diferentes stakeholders”, disse Daniele.
Até o início de 2018, ainda estavam
envolvidos com a primeira aplicação da
Metodologia, por meio de projeto com o
BID/FOMIN, com o qual atuavam com 100
famílias, metade produtoras de cordeiro e a
outra de hortaliças e frutas. Estavam, ainda,
estudando dois projetos de aplicação do
MAIS com a prefeitura da Bahia.
182
Estratégia de escala
Para expandir a aplicação do Programa, foi
criada o Adapta Group, empresa fundada
para desenvolver e implementar o MAIS em
parceria com empresas de médio e grande
porte, cooperativas, entidades públicas, ONGs
e investidores de impacto. Com isso,
buscavam abranger as principais commodities
do setor agropecuário, como carne, cacau,
café e açaí.
"Estamos começando uma nova fase. Vamos
escalar a nossa metodologia de
transformação social MAIS para mais
produtores, território e estados”, disse
Daniele.
183
RESULTADOS SOCIAIS
Insumos para as políticas públicas
Ao fim de 2017, o Adapta Sertão realizou
relatório de avaliação sobre o projeto que
realizava com 100 famílias, financiado pelo
BID/FOMIN. Foi verificado que o Sistema
MAIS havia aumentado a renda mínima da
família produtora de R$ 650 ou menos para
mais de R$ 1 mil por mês, em um prazo
relativamente curto de tempo. Em média, 62%
dos produtores perceberam muitas
transformações positivas nas práticas diárias
da produção, além de melhorias na produção
e na renda.
Também foram verificados efeitos positivos
da inclusão da mulher na dinâmica da
implementação do MAIS. A capacidade de
reflorestamento de áreas degradadas
também foi destaque no relatório. A empresa
responsável pela avaliação foi a Florestar
Soluções Ambiental.
184
Transformações percebidas por
produtores(as)
Um dos maiores impactos sociais do Adapta
Sertão era a valorização do agricultor familiar.
“O agricultor familiar é, muitas vezes,
esmagado pelo setor privado e visto como
pobre coitado pelo setor público. Mas é um
recurso, alguém que gera valor, gera
arrecadação de imposto para o estado. Nós
elaboramos um modelo de desenvolvimento
local que articula recursos públicos, recursos
privados e sabedoria local”, disse Daniele.
185
Vencedora Incluir 2017 na categoria
“Solução com Impacto Rural”
http://www.adaptasertao.net/
186
MARINA TECNOLOGIA: COMO TRANSFORMAR RESÍDUOS AGRÍCOLAS
EM PRODUTOS SUSTENTÁVEIS E DE ALTA TECNOLOGIA?
Foi essa a pergunta que motivou a Marina
Tecnologia a desenvolver o protótipo do
Carborroz, equipamento filtrante de baixo
custo elaborado a partir das cinzas da casca de
arroz, o que seria solução para a destinação
desse passivo agrícola e para questões de
saneamento básico no Brasil e no mundo.
187
INFORMAÇÕES GERAIS
Empresa especialista em Nanotecnologia e
em Ciência dos Materiais, a Marina
Tecnologia estava no mercado desde 2009.
Fundada pela química Diana Finkler, estava
instalada na Feevale Techpark, em Campo
Bom (RS), e tinha como principal produto o
pneu verde, também desenvolvido a partir da
mesma matéria-prima. Com o Carborroz, a
empresa daria outra destinação ao resíduo:
produção de carvão ativado para
equipamentos filtrantes, a partir das
toneladas de cinzas de casca de arroz
descartadas anualmente por termoelétricas
do Brasil que realizavam a queima da casca
de arroz para geração de energia. No médio
prazo, a tecnologia poderia beneficiar cerca
de 400 mil brasileiros com acesso à água
tratada.
188
INTRODUÇÃO
Tudo começou com cinzas
A Marina Tecnologia estava na maior região
produtora de arroz do Brasil: o Sul respondia
por 75% (ou nove milhões de toneladas) da
safra de um país que era o maior consumidor
e produtor mundial fora da Ásia.43
Com o uso
da casca para geração de energia por
termoelétricas, a região era também uma
grande produtora de cinzas: cerca de 200
mil/ano só no Rio Grande do Sul.
E foi das cinzas que surgiu a Marina
Tecnologia. A empresa foi aberta após Diana
decidir investir na oportunidade de trabalhar
com “pneu verde”, produzido a partir da
mesma matéria-prima. “A cinza do arroz é
uma fonte de Sílica para pneus que tem
menor custo e menos impacto no meio
ambiente que as fontes tradicionais usadas
no mercado. Além disso, costuma produzir
pneus mais duráveis, apresentando melhor
custo-benefício”, comentou a empresária.
189
CONTEXTO DO PROBLEMA
O passivo ambiental da produção de arroz
A casca de arroz representava cerca de 20%
do peso total de um grão. Com a média de
produção de 15 milhões de toneladas ao ano,
o Brasil gerava três milhões de tonelada de
casca anualmente.
Dado o contexto de crise energética e a busca
de fontes alternativas, as cascas eram
usualmente fonte de energia para
termoelétricas no mundo inteiro. Mas a casca
de arroz era um dos resíduos vegetais que
mais produzia cinzas quando queimada, e o
descarte em aterros provocava poluição do
solo, do ar e dos lençóis freáticos.
Por serem ricas em composto químico
valorizado por ramos industriais (Sílica ou
Dióxido de Silício), as cinzas passaram a ser
objeto de estudo por universidades e
institutos de pesquisa, em parceria com
empresas como a Marina Tecnologia, para
desenvolvimento de produtos de origem
190
sustentáveis derivados da cinza da casca do
arroz.
Não é coincidência que seja da Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC) e da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS) muitos desses estudos. Destacamos,
como exemplo, a tese de Doutorado que
tratou do beneficiamento da cinza da casca
de arroz residual para produção de cimento;44
artigo sobre a aplicação em argamassas e
assentamentos;45
e pesquisa sobre a
reciclagem de resíduos agroindustriais e cinza
de casca de arroz como fonte alternativa de
Sílica. 46
SOLUÇÃO
Carborroz: solução barata e ecológica para
saneamento básico
O uso do carvão ativado Carborroz em
equipamentos filtrantes faria a remoção da
turbidez, impurezas e microrganismos da
água, tornando-a potável. “A tecnologia
permitirá o tratamento a baixo custo de
191
águas em locais de difícil acesso”, afirmou
Diana. “O Carborroz é vantajoso em relação
aos demais carvões ativados do mercado, que
utilizam fontes fósseis. Possui as mesmas
características técnicas, mas agrega economia
e sustentabilidade”, complementou.
Em relação à aquisição da matéria-prima, a
Marina Tecnologia já possuía parceria com as
termoelétricas do estado: São Borja, Candiota
e Itaqui. Entre os clientes almejados, estavam,
além das empresas estatais que realizavam o
tratamento de água e esgoto dos municípios,
multinacionais como Cabot, Whirlpool,
Brascarbo e Alphacarbo. “Acreditamos que
há forte interesse dessas empresas, que
aplicam carvão ativado oriundo de fontes
fósseis em seus produtos, em optar um
produto mais sustentável e econômico”,
comentou Diana.
192
RESULTADOS DE NEGÓCIO
Alto valor de mercado
Com investimento visionário em
transformação de resíduos agrícolas
aparentemente inservíveis em produtos com
alto valor agregado, a Marina Tecnologia já
possuía cerca de dez anos de mercado. A
empresa, que tinha entre seus clientes
grandes empresas como a Petrobras, havia
faturado cerca de R$ 600 mil em 2017.
Em relação aos resultados financeiros do
Carborroz, a expectativa era atingir produção
de três mil toneladas, faturamento de R$ 12
milhões e uma lucratividade média anual de
12% no médio prazo.
Havia, ainda, planos de exportação. “Em
termos globais, a capacidade de produção de
carvão ativado é concentrada em poucos
países ou regiões, incluindo os Estados
Unidos, o Japão, os países da Europa
Ocidental e a China. É evidente que o
Carborroz, com produção de três mil
toneladas ao ano, colocaria o Brasil em
193
destaque, que seria o único a produzir carvão
ativado a partir da casca do arroz”, relatou
Diana.
RESULTADOS SOCIAIS
Impactos imediatos
Além de atuar com a questão do saneamento
básico, o Carborroz também traria ganhos
ambientais, com a redução do descarte das
cinzas, que causavam desertificação e
incêndio.
No médio prazo, a Marina Tecnologia
planejava transformar as 200 mil toneladas de
cinza em 18 mil toneladas de carvão ativado,
que permitiriam o tratamento de 36 milhões
de m³ de água, dando para abastecer
pequenas cidades e beneficiando até 400 mil
pessoas.
194
Vencedora Incluir 2017 na categoria
“Negócio com Solução de Impacto Social”
MARINA TECNOLOGIA
http://www.marinatecnologia.com.br/
195
QUINTA PARTE
INCLUSÃO DE
PESSOAS MAIS
VELHAS NO
MERCADO DE
TRABALHO
196
Entre 2005 e 2015, enquanto a proporção de
idosos de 60 anos ou mais na população do
país aumentava de 9,8% para 14,3%, o nível
de ocupação entre eles caía de 30,2% para
26,3%.47
Considerando o envelhecimento da
população uma das transformações
demográficas mais importantes do século, a
ONU (2016) estimava que o número de
pessoas com mais de 60 anos deveria chegar
aos dois bilhões em 2050. Era preciso
repensar o envelhecimento da sociedade,
para que ocorresse com dignidade e garantia
de direitos. Estudo da OMS (2016) relatava
que 60% das pessoas consideravam que os
idosos não eram respeitados. Entre os
diversos preconceitos sociais, já se conhecia o
sexismo e o racismo, mas era hora de debater
o etarismo. Havia necessidade de mudança
de normas sociais, para combater
discriminações contra idosos. E era nesse
contexto que a MaturiJobs corajosamente
atuava, buscando romper com estereótipos e
valorizando a força de trabalho da população
mais velha.
197
MATURIJOBS: COMO RECOLOCAR PESSOAS DA MELHOR IDADE NO
MERCADO DE TRABALHO?
Tendo visto a saúde da avó paterna decair
rapidamente após parar de trabalhar, Mórris
Litvak abriu negócio focado em melhorar a
empregabilidade de pessoas mais velhas, mas
ainda esbarrava na falta de consciência sobre
a discriminação etária no Brasil.
198
INFORMAÇÕES GERAIS
Fundada em 2015, a MaturiJobs era uma
plataforma online que conectava pessoas
acima de 50 anos a postos de trabalho.
Semelhante a negócios como Catho, LinkedIn
e InfoJobs, o negócio contava com cerca de
56 mil candidatos a vagas e 570 empresas
cadastradas em 2017. Ainda em busca do
modelo para sua viabilidade financeira, a
empresa estava testando outros serviços,
como cursos e workshops sobre transição de
carreira. Com vagas para todo o Brasil, a
empresa tinha sede em São Paulo.
MÓRRIS LITVAK, FUNDADOR DA MATURIJOBS.
199
INTRODUÇÃO
Motivação e experiência com voluntariado
A ideia nasceu com a morte. Keila Litvak, avó
paterna de Mórris, faleceu em 2013, com 91
anos. “Trabalhou até os 80 e poucos anos.
Mas quando parou de trabalhar, deixou de
ficar ativa e sua saúde decaiu rapidamente.
Logo desenvolveu doenças como o
Alzheimer”, comentou o empreendedor. Ele,
que já era sensível a questões sobre
qualidade de vida e bem-estar dos idosos,
fazia trabalho voluntário em asilo desde 2011.
Mas foi com a perda da avó que decidiu
aprofundar o entendimento sobre
envelhecimento no Brasil e atuar com o tema
mais diretamente.
Formado em Engenharia de Software pela
FIAP, Mórris Litvak já era empreendedor à
época: tinha uma empresa de sistema de
reserva online de hotel com o pai. Com a
decisão de entender e buscar solução para a
questão da empregabilidade dos idosos,
vendeu a empresa em 2012 e começou a
estudar a sério sobre longevidade, tendo
200
participado de vários eventos na área. Nesse
período, fez curso de Gestão em Inovação
Social pelo Amani Institute em São Paulo e de
Empreendedorismo e Inovação na
Universidade de Tel Aviv, em Israel.
Durante o processo, conheceu muita gente
idosa em situação de ociosidade. “Vi muito
idoso passar o dia vendo TV, sem ter como
compartilhar os conhecimentos que tinha”,
contou. Foi quando teve a ideia de fundar o
projeto “Conectando Gerações”, que buscava
conectar idosos a pessoas de todo o Brasil,
para troca de experiências e conhecimentos
por meio de conversas online por vídeo.
A MaturiJobs
Durante a pesquisa sobre a exclusão dos
idosos do mercado de trabalho, Mórris
encontrou muita resistência das empresas.
“Quando conversava com as pessoas dos
departamentos de Recursos Humanos, eles
falavam que não tinham preconceito, mas
que também não tinham interesse em
contratar”, contou.
201
O empreendedor acreditava que o chamado
etarismo, que era o preconceito em função da
idade, era, sem dúvida, o maior desafio. “As
empresas preferem contratar pessoas mais
novas. Acreditam que elas custam menos e
são mais produtivas, acham que os idosos
não estão prontos para os novos desafios do
mercado”, contou.
Apesar da resistência que viu em muitas
empresas, criou a plataforma de empregos
MaturiJobs em 2015. Inicialmente, a
plataforma era gratuita para candidatos e
empresas. Dois anos depois, começou a
funcionar em modelo freemium. Mas a
demanda por serviços pagos ainda era tímida,
e Mórris acreditava que os estereótipos
geracionais respondiam por grande parte da
baixa adesão aos serviços por parte das
empresas. “O Brasil não está preparado para
receber o idoso no mercado de trabalho,
como já acontece na Europa e no Japão”,
relatou.
202
CONTEXTO DO PROBLEMA
“Velho” não é xingamento: situação do
idoso e preconceito de idade no Brasil
O IBGE (2016) 48
estimava que, em 40 anos, a
população idosa do país iria triplicar: de 19,6
milhões (10% do total) em 2010, para 66,5
milhões em 2050 (29,3%). Esse processo de
envelhecimento exigiria prioridade em
políticas públicas relacionadas às
necessidades desse público, abrangendo
reformas na previdência e assistência social,
nas redes de atendimento hospitalar, nos
sistemas de transporte, entre outros.
Desde a década de 1990, o Brasil vinha
construindo políticas públicas que ajudavam a
melhorar a qualidade de vida das pessoas
idosas, como a Política Nacional do Idoso
(1994), o Estatuto do Idoso (2003) e o
Benefício de Prestação Continuada (2007).
Mas o país ainda tinha muito o que avançar.
De acordo com o Global AgeWatch Index
2015, que media a qualidade de vida do idoso
em 96 países, o Brasil estava em 56º lugar.
Dos países sul-americanos avaliados,
203
estávamos na frente apenas do Paraguai e da
Venezuela. Pontuavam na frente os vizinhos
Chile (21º), Uruguai (27º), Argentina (31º),
Colômbia (36º), Peru (48º) e Bolívia (55º).
Analisando apenas os fatores emprego e
educação, o país caía para 58º; já quando se
analisavam quesitos de ambiente, como
segurança e transporte, caía para o 87º
lugar.49
O preconceito de idade no Brasil também
merecia atenção, manifestando-se das formas
mais sutis às mais violentas. Dados
da Sociedade Internacional de Cirurgia
Plástica e Estética (Isaps 2015) revelavam que
o Brasil era um dos países que mais realizava
cirurgia plástica no mundo, atrás apenas dos
Estados Unidos. Cirurgia da pálpebra;
preenchimento de rosto; e liftings de rosto,
pescoço, pálpebra e mama estavam entre os
procedimentos mais realizados e revelavam a
rejeição à velhice.
Essa rejeição também se expressava em
números mais preocupantes: de 2011 a 2015
o Disque 100 registrou crescimento de 292%
no número de denúncias de violência contra
204
o idoso.50
Negligência, violência psicológica,
abuso financeiro e violência física eram tipos
comuns de agressões relatadas. Era
imprescindível, contudo, considerar os fatores
gênero, raça e orientação sexual. Dos casos
que tinham o gênero relatado (89%), 60% dos
agredidos eram mulheres. Em relação à
orientação sexual, apenas dez casos tiveram o
perfil informado: quatro gays, quatro lésbicas
e duas pessoas bissexuais. O impacto do fator
raça também tinha que ser melhor apurado:
35% dos agredidos eram brancos, 31% pretos
e pardos, e 34% não tiveram raça informada.
A questão do trabalho
Alguns estudos e pesquisas traziam reflexões
e informações relevantes sobre o idoso no
mercado de trabalho. Em livro do Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) sobre os
novos idosos brasileiros, discutiu-se, entre
outros, sobre “a necessidade, até o momento
negligenciada, de adequar um número
expressivo de novos postos de trabalho no
Brasil à absorção de um contingente
crescente de mão-de-obra idosa”51
– e os
desafios apresentados pela menor
205
escolaridade desse público. Já Luana Giatti e
Sandhi M. Barreto,52
em pesquisa sobre
saúde, trabalho e envelhecimento no Brasil,
reforçaram como a capacidade de trabalho e
a qualidade de vida dos idosos eram
determinadas por educação e saúde durante
a juventude, chamando atenção para
investimentos públicos nessas áreas. Nereida
Salette da Silveira e Guilherme Loth
acreditavam que a temática discriminação de
idade prometia ser cada vez mais dominante
no Brasil e deveria ser melhor compreendida
no âmbito das organizações.53
Conforme
quadro a seguir, os autores propuseram a
revisão na literatura dos estereótipos
associados aos profissionais maduros.
206
Estereótipos etários
AUTORES ESTEREÓTIPOS
POSITIVOS
ESTEREÓTIPOS
NEGATIVOS
Minichello,
Brow e
Kendig
(2000)
Digno de
sabedoria,
respeito.
Custoso,
inflexível, difícil
de ser treinado.
McGregor
e Gray
(2002)
Confiável,
comprometido,
leal.
Limitado,
menor
performance,
resistente à
mudança.
Alpass e
Mortimer
(2007)
Mais experiência,
tendência a se
manter no
emprego.
Saúde,
adaptabilidade.
Salomão
(2000)
Experiência,
compromisso,
motivação.
Inflexível,
resistente à
tecnologia.
Ávila
(1992)
Sensibilidade,
responsabilidade.
Menos
adequado a
cargos de
chefia.
CRÉDITO: MARCELO GUILHERME BLAUTH LOTH E NEREIDA
SILVEIRA
207
SOLUÇÃO
Em busca de modelos de monetização
Mórris, que tinha 34 anos, contava com mais
dois colaboradores. Judith, 68 anos, cuidava
da parte logística e de cursos e eventos; já
Antônio, 59 anos, trabalhava com o pós-
venda e a operação do negócio. A negociação
com as empresas, a apresentação do portfólio
e a busca por parcerias era feita por Mórris.
Na ideia inicial do empreendedor, a oferta de
serviços adicionais às empresas cadastradas,
em um modelo do tipo freemium, seria a
principal fonte de monetização, mas logo
percebeu que o interesse por esses serviços
era muito baixo. As versões pagas ofereciam,
por exemplo, os serviços de pré-seleção de
candidatos, além de divulgação das vagas em
newsletters e redes sociais. “Poucas empresas
queriam pagar por esses serviços. As
contratações, quando aconteciam, eram bem
pontuais”, contou.
Dessa forma, Mórris teve que ampliar as
possibilidades de renda. Estava em fases de
208
testes a venda de cursos e workshops, para
empresas e pessoas físicas, focados em
transição de carreira e longevidade. A
MaturiJobs também estava estudando
modelo de solução para “startups maduras”,
cuja ideia era promover a conexão entre
startup de pessoas mais velhas e investidores,
com comissão de 20% a 30% sobre o valor do
projeto.
Com o objetivo de superar a resistência das
empresas e desconstruir as crenças do
pensamento etarista, Mórris pesquisava muito
sobre comportamentos e resultados no
trabalho com recorte de geração e possuía
uma apresentação das vantagens de se
contratar uma pessoa mais velha sempre à
mão. Menor turn over e absenteísmo; maior
responsabilidade e sabedoria em lidar com
problemas; capacidade para oferecer
mentoria aos mais jovens; e habilidade em
atender bem clientes e fornecedores eram
alguns dos diferenciais competitivos dos 50+.
209
RESULTADOS DE NEGÓCIO
Mercado promissor
Ainda não tendo atingido a sustentabilidade
financeira, Mórris acreditava no potencial da
empresa. “As oportunidades são muitas
porque nosso público é a faixa que mais
cresce no país. A reforma da Previdência
também está trazendo à tona essa questão. Já
estamos começando a ser procurados por
grandes empresas”, relatou.
Embora ainda não vislumbrasse possíveis
incentivos governamentais, o empreendedor
sabia que o estabelecimento de cotas para
idosos era um cenário possível e que poderia
beneficiar a MaturiJobs. “Se todas as
empresas precisam contratar idosos e não
sabem como fazer, elas podem me procurar”,
contou.
210
RESULTADOS SOCIAIS
Renda e dignidade na melhor idade
A MaturiJobs era um negócio que poderia
contribuir com a geração de renda,
proporcionando um envelhecimento mais
digno para grande parte da sociedade.
“Queremos melhorar a qualidade de vida e
auxiliar também a Previdência Social e o
sistema de saúde pública”, contou Mórris.
Ainda que não soubesse exatamente como
mensurar os possíveis impactos sociais de seu
negócio, o empreendedor buscava
indicadores que iriam além do número de
pessoas empregadas. “Ajudar mil ou dez mil
idosos a conseguir emprego é um número
que não diz muita coisa. O idoso está bem
empregado? Está em um emprego que o
ajuda a ter qualidade de vida? Está
desempenhando uma atividade digna?”,
comentou o empresário, enfatizando que o
maior impacto que a MaturiJobs buscava era
na qualidade de vida do idoso, a quem,
muitas vezes, era negado a chance de
desenvolvimento de sua capacidade de
211
contribuição com a sociedade por meio do
trabalho, o que poderia causar problemas
emocionais e psicológicos.
_______________________
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“Soluções para Melhor Idade”
https://www.maturijobs.com/
212
NOTAS DE FIM
1 Fonte: Dossiê ABRASCO, 2014.
2 Informações do relatório da relatora especial da ONU
sobre o direito à alimentação, Hilal Elver, e o
especialista das Nações Unidas para os direitos
humanos e substâncias e resíduos perigosos, Baskut
Tuncak.
3 Informações divulgadas pela New York Times.
4 Dados do OrganicsNet (2017).
5 LIU, Ming. “Qual o tamanho do mercado de
orgânicos no Brasil?”. Revista Globo Rural, 6 jul. 2017.
Disponível em:
<https://revistagloborural.globo.com/Noticias/Agri
cultura/noticia/2017/07/qual-o-tamanho-do-
mercado-de-organicos-no-brasil.html>. Acesso em:
20 de março 2018.
6 Odara, Norma. “Bela Gil: ‘Agroecologia é a única
forma de comida sem veneno no prato de todo
mundo’”. Brasil de Fato, 16 de outubro de 2017.
Disponível em:
<https://www.brasildefato.com.br/2017/10/16/bel
a-gil-agroecologia-e-a-unica-forma-de-comida-
sem-veneno-no-prato-de-todo-mundo/>. Acesso
em: 20 de março de 2018.
213
7 ONU – ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS.
Agroecologia é a chave para erradicar a fome na
América Latina e Caribe, afirma FAO. ONU, 3 de julho
de 2015. Disponível em:
<https://nacoesunidas.org/agroecologia-e-a-
chave-para-erradicar-a-fome-na-america-latina-e-
caribe-afirma-fao/>. Acesso em: 20 de março de
2018.
8 Barbosa, Honório. Produção de orgânicos é crescente
no Estado do Ceará. Diário do Nordeste, 8 de julho de
2017. Disponível em:
<http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cade
rnos/regional/producao-de-organicos-e-crescente-
no-estado-do-ceara-1.1784315>. Acesso em: 20 de
março de 2018.
9 JÚNIOR, Melquíades. TRT mantém decisão que
condena multinacional. Diário do Nordeste, 14 de
novembro de 2014. Disponível em:
<http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cade
rnos/cidade/trt-mantem-decisao-que-condena-
multinacional-1.1150525>. Acesso em: 20 de março
de 2018.
10 BRASIL. Ministério da Saúde. Plano de Ações
Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças
Crônicas não Transmissíveis (DCNT) no Brasil 2011-
2022. Brasília: MS, 2011.
11 BRASIL. Ministério da Saúde. Vigitel Brasil 2016 –
Hábitos dos brasileiros impactam no crescimento
214
da obesidade e aumenta prevalência de diabetes e
hipertensão. Brasília: MS, 2017. Disponível
em:<http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pd
f/2017/abril/17/Vigitel.pdf>. Acesso em: 20 de
março de 2018.
12 ONU – ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS.
Pobreza e obesidade afetam mais mulheres do que
homens na América Latina e Caribe. ONU, 8 mar. 2017.
Disponível em: <https://nacoesunidas.org/pobreza-
e-obesidade-afetam-mais-mulheres-do-que-
homens-na-america-latina-e-caribe/>. Acesso em:
20 de março de 2018.
13 STRINGHINI, S.et al. Socioeconomic status and the
25 × 25 risk factors as determinants of premature
mortality: a multicohort study and meta-analysis of 1·7
million men and women. Lancet, fevereiro de 2017.
14 FAO & ADB. Gender equality and food security:
women's empowerment as a tool against. Hunger,
2013. Disponível em:
<http://hdl.handle.net/11540/1503>. Acesso em: 20
de março de 2018.
15 B CORPORATIONS. What are B Corps? B
Corporations, [s.d.]. Disponível em:
<https://www.bcorporation.net/what-are-b-
corps>. Acesso em: 20 mar. 2018.
16 LEIA MAIS SOBRE A QUESTÃO DA SEGURANÇA
ALIMENTAR NO ESTUDO DE CASO DO SALADORAMA,
215
EM DOENÇAS CRÔNICAS NÃO TRANSMISSÍVEIS E A
FAIXA DA POBREZA.
17 LI, W.C.; YEUNG, K. K. A. A comprehensive study of
green roof performance from environmental
perspective. International Journal of Sustainable
Built Environment, 20 de maio de 2014. Disponível
em:
<https://www.sciencedirect.com/science/article/pii
/S2212609014000211?via%3Dihub>. Acesso em: 20
de março de 2018.
18 CITY OF LONDON CORPORATION. Green Roof Case
Studies. City of London Corporation, 20 nov. 2011.
Disponível em:
<https://www.cityoflondon.gov.uk/services/enviro
nment-and-planning/planning/heritage-and-
design/Documents/Green-roof-case-studies-
28Nov11.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2018.
19 BRASIL. Decreto Federal nº 4.340, de 22 de agosto
de 2002. Regulamenta artigos da Lei nº 9.985, de 18 de
julho de 2000, que dispõe sobre o Sistema Nacional de
Unidades de Conservação da Natureza - SNUC, e dá
outras providências. Diário Oficial da União, Brasília,
2002.
20 INSTITUTO TRATA BRASIL. Ranking do
Saneamento Instituto Trata Brasil 2017. São Paulo:
Instituto Trata Brasil, fev. 2017. Disponível em:
<http://www.tratabrasil.org.br/datafiles/estudos/ra
216
nking/2017/relatorio-completo.pdf>. Acesso em: 20
de março de 2018.
21 Os estudos sobre a situação socieconômica do
Maranhão tinham, como principal fonte, o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010).
Algumas organizações, como a Plan International, a
Fundação Abrinq e o Pnud realizavam trabalho de
análise, interpretação e divulgação desses dados.
22 IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E
ESTATÍSTICA. Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios (Pnad) 2015. Rio de Janeiro: IBGE, 2015.
23 EGUTE, Nayara dos Santos. Quando a água
sobe: análise da capacidade adaptativa de moradores
do Jardim Pantanal expostos às enchentes.
Tese (Doutorado) – Faculdade de Saúde Pública da
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2016.
24 ONU – ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Em
dia mundial, ONU-Habitat defende políticas
habitacionais e moradias acessíveis. ONU, 2 out. 2017.
Disponível em: <https://nacoesunidas.org/em-dia-
mundial-onu-habitat-defende-politicas-
habitacionais-e-moradias-acessiveis/>. Acesso em:
20 de março de 2018.
25 O Nubank emitia e gerenciava cartão de crédito e
não cobrava anuidade ou tarifas. Já o Kiva era uma
organização que permitia o empréstimo de pequenas
217
quantidades a pequenos negócios ou a iniciativas
empreendedoras em países em desenvolvimento.
26 FEBRABAN – FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE BANCOS.
Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária. São
Paulo: Febraban, 2014. Disponível em:
<http://www.febraban.org.br/7Rof7SWg6qmyvwJc
FwF7I0aSDf9jyV/sitefebraban/Pesquisa%20FEBRAB
AN%20de%20Tecnologia%20Banc%E1ria%20-
%202014%20(2).pdf>. Acesso em: 20 de março de
2018.
27 AGÊNCIA SEBRAE. Juros e burocracia prejudicam
acesso de pequenos negócios ao crédito. ASN, 1º set.
2017. Disponível em:
<http://www.agenciasebrae.com.br/sites/asn/uf/N
A/juros-e-burocracia-prejudicam-acesso-de-
pequenos-negocios-ao-
credito,e10d51158cd3e510VgnVCM1000004c00210
aRCRD>. Acesso em: 20 de março de 2018.
28 BID; FINNOVISTA. Inovações que não sabia que
eram da América Latina e o Caribe. [s.l.]: BID;
Finnovista, 2017.
29 OECD – ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-
OPERATION AND DEVELOPMENT. OECD/INFE
International Survey of Adult Financial Literacy
Competencies. Paris: OECD, 2016. Disponível em:
<http://www.oecd.org/daf/fin/financial-
education/OECD-INFE-International-Survey-of-
218
Adult-FInancial-Literacy-Competencies.pdf>. Acesso
em: 20 de março de 2018.
30 SREEHARSHA, Vinod. Goldman Sachs Sees Big
Potential for Fintech in Brazil. The New York Times, 15
mai. 2017. Disponível em:
<https://www.nytimes.com/2017/05/15/business/d
ealbook/goldman-sachs-sees-big-potential-for-
fintech-in-brazil.html>. Acesso em: 20 de março de
2018.
31 FINTECHLAB. Report Fintechlab 2017 Brasil. [s.l.]:
FintechLab, 2017. Disponível em:
<http://fintechlab.com.br/wp-
content/uploads/2017/02/Report_FintechLab_2017-
2.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2018.
32 FEBRABAN – FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE BANCOS.
Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária. São
Paulo: Febraban, 2014. Disponível em:
<http://www.febraban.org.br/7Rof7SWg6qmyvwJc
FwF7I0aSDf9jyV/sitefebraban/Pesquisa%20FEBRAB
AN%20de%20Tecnologia%20Banc%E1ria%20-
%202014%20(2).pdf>. Acesso em: 20 de março de
2018.
33 Banco Central do Brasil, 2017.
34 INFINITY ASSET MANAGEMENT. Ranking Mundial
de Juros Reais – Fev/18. Infinity Asset Management,
2018. Disponível em: <http://moneyou.com.br/wp-
219
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218.pdf>. Acesso em: 20 de março de 2018.
35 MCKINSEY GLOBAL INSTITUTE. Digital Finance for
all: powering inclusive growth in emerging economies.
McKinsey Global Institute, 2016.
36 Instituto Trata Brasil, 2016.
37 WHO/Unicef, 2017.
38 SIGSAB e ASA Brasil, 2018.
39 BRASIL. Governo Federal. Inclusão de municípios
no semiárido brasileiro possibilita apoio federal.
Brasília: Governo Federal, 2017. Disponível em:
<http://www.brasil.gov.br/infraestrutura/2017/11/i
nclusao-de-municipios-no-semiarido-brasileiro-
possibilita-apoio-federal>. Acesso em: 20 de março
de 2018.
40 Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA), 2018.
41 Destacavam-se, ainda, as ações do Instituto
Nacional do Semiárido (Insa), unidade de pesquisa
integrante do Ministério da Ciência, Tecnologia,
Inovações e Comunicações (MCTIC). Outras instituições
também possuíam projetos para desenvolver o
semiárido, como o Pnud, com o projeto “Manejo do
uso sustentável da terra no semiárido do Nordeste
brasileiro” – em parceria com o Ministério do Meio
Ambiente (MMA), a Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária (Embrapa), o governo do estado de
220
Sergipe, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis (Ibama, o Fundo Global
para o Meio Ambiente (GEF) e outros parceiros locais.
A FAO desenvolvia o Projeto Redeser: Revertendo o
Processo de Desertificação nas Áreas Suscetíveis do
Brasil — Práticas Agroflorestais Sustentáveis e
Conservação da Biodiversidade, com o MMA. Outras
iniciativas: Projeto Bramar, desenvolvido por
instituições de pesquisa do Brasil e da Alemanha, para
desenvolvimento de estratégias e tecnologias de
mitigação da seca.
42 ONU – ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS.
Unesco adverte para risco de aumento dos refugiados
ambientais devido à desertificação. ONU, 16 de junho
de 2017. Disponível em:
<https://nacoesunidas.org/unesco-adverte-para-
risco-de-aumento-dos-refugiados-ambientais-
devido-a-desertificacao/>. Acesso em: 20 de março
de 2018.
43 Brazilian Rice, 2015.
44 POUEY, Maria Tereza Fernandes. Beneficiamento
da cinza da casca de arroz residual com vistas à
produção de cimento composto e/ou pozolânico.
Tese (Doutorado em Engenharia) – Programa de Pós-
Graduação em Engenharia Civil, Universidade Federal
do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2006.
221
45 BEZERRA, Izabelle M. T. et al. Aplicação da cinza da
casca do arroz em argamassas de
assentamento.Revista Brasileira de Engenharia
Agrícola e Ambiental, v. 15, n. 6, 2011, p. 639, 2011.
46 DELLA, V. P.; KUHNA, I.; HOTZA, D. Reciclagem de
resíduos agroindustriais: cinza de casca de arroz como
fonte alternativa de sílica. Cerâmica Industrial, v. 10, p.
22-25, 2005.
47 Fonte: IBGE. Síntese de Indicadores Sociais (SIS):
uma análise das condições de vida da população
brasileira. Rio de Janeiro, 2016.
48 IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E
ESTATÍSTICA. Brasil: uma visão geográfica e ambiental
no início do século XXI. Rio de Janeiro: IBGE, 2016.
49 HELPAGE INTERNATIONAL. Global AgeWatch
Index 2015. [s.l.]: HelpAge International, 2015.
50 MDH. Balanço das Denúncias de Violações de
Direitos Humanos. [s.l.]: MDH, 2016.
51 IPEA – INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA
APLICADA. Os novos idosos brasileiros – muito além
dos 60? Rio de Janeiro: Ipea, 2004, p. 453-479.
222
52 GIATTI, Luana; BARRETO, Sandhi M. Saúde, trabalho
e envelhecimento no Brasil. Cad. Saúde Pública, v. 19,
n. 3, p. 759-771, 2003.
53 Loth, G. B.; Silveira, N. Etarismo nas organizações:
um estudo dos estereótipos em trabalhadores
envelhecentes. Revista de Ciências da Administração,
v. 16, n. 39, p. 65-82, 2014.