de colonos a agricultores familiares: uma trajetória de ... · revolucionários latino-americanos....

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Grando, M. Z.; Mertz, M. M. De colonos a agricultores familiares: uma trajetória de .... De colonos a agricultores familiares: uma trajetória de resistência Marinês Zandavali Grando * Marli M. Mertz * Neste texto, abordam-se as transformações socioeconômicas das unidades de produção agrícola de caráter familiar do Rio Grande do Sul, vistas pelos olhares dos pesquisadores que tratam dessa realidade segundo as tendências teóricas e conceituais privilegiadas em suas análises. Embora se pretenda focar os principais fenômenos que as caracterizam desde os anos 80, para contextualizar as transformações estruturais que se sucederam, este estudo parte da situação dessas unidades produtivas antes da modernização conservadora e dos impactos que elas experimentaram logo depois desse fenômeno maior da agricultura brasileira. Assim, primeiro, resgatar-se-ão alguns estudos econômicos realizados até a década de 70 nos quais a agricultura desenvolvida nas explorações familiares do Rio Grande do Sul é denominada de “agricultura colonial”; “lavoura colonial” ou “agricultura dos colonos”. Na sequência, far-se-á um apanhado dos principais estudos produzidos a partir dos anos 80 que dêem conta da evolução e das transformações dessas explorações, já sob os efeitos da modernização agrícola, para se integrarem e se adaptarem ao mercado e dos novos conceitos explicativos utilizados para compreender o seu funcionamento diante da acelerada revolução agrícola nacional. Economista, Técnica da FEE. * Historiadora, Técnica da FEE. As autoras agradecem a Carlos Roberto Winckler e Maria Domingues Benetti pelas sugestões à versão original deste texto. O movimento da produção. (Três décadas de economia gaúcha, v.2). 2010 93

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Page 1: De colonos a agricultores familiares: uma trajetória de ... · revolucionários latino-americanos. ... emprega terras impróprias para a mecanização, ... de pessoas que se dirigiram

Grando, M. Z.; Mertz, M. M. De colonos a agricultores familiares: uma trajetória de ....

De colonos a agricultores familiares: uma trajetória de resistência

Marinês Zandavali Grando∗

Marli M. Mertz∗

Neste texto, abordam-se as transformações socioeconômicas

das unidades de produção agrícola de caráter familiar do Rio Grande

do Sul, vistas pelos olhares dos pesquisadores que tratam dessa

realidade segundo as tendências teóricas e conceituais privilegiadas

em suas análises. Embora se pretenda focar os principais fenômenos

que as caracterizam desde os anos 80, para contextualizar as

transformações estruturais que se sucederam, este estudo parte da

situação dessas unidades produtivas antes da modernização

conservadora e dos impactos que elas experimentaram logo depois

desse fenômeno maior da agricultura brasileira. Assim, primeiro,

resgatar-se-ão alguns estudos econômicos realizados até a década de

70 nos quais a agricultura desenvolvida nas explorações familiares do

Rio Grande do Sul é denominada de “agricultura colonial”; “lavoura

colonial” ou “agricultura dos colonos”. Na sequência, far-se-á um

apanhado dos principais estudos produzidos a partir dos anos 80 que

dêem conta da evolução e das transformações dessas explorações, já

sob os efeitos da modernização agrícola, para se integrarem e se

adaptarem ao mercado e dos novos conceitos explicativos utilizados

para compreender o seu funcionamento diante da acelerada

revolução agrícola nacional.

Economista, Técnica da FEE.∗Historiadora, Técnica da FEE.As autoras agradecem a Carlos Roberto Winckler e Maria Domingues Benetti pelas sugestões à versão original deste texto.

O movimento da produção. (Três décadas de economia gaúcha, v.2). 2010 93

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O termo referido no rico debate que se produziu nacionalmente

em torno da importância econômica e social desses agricultores nos

anos 80 era “pequeno produtor”. Período em que se notabilizaram

pelas intensas mobilizações em busca de visibilidade e pela conquista

do espaço político que se seguiu. Os anos 90 assinalaram, finalmente,

o reconhecimento de uma identidade para esses produtores no

cenário nacional, os quais passam a ser denominados de “agricultores

familiares”, expressão oriunda do meio acadêmico e que foi

institucionalmente assimilada, encontrando-se hoje presente na

linguagem sindical, na legislação e nos órgãos governamentais que

dão sustentação às políticas públicas e aos direitos sociais recém-

-adquiridos, mas, longamente demandados.

Configura-se no debate nacional, nos dia que correm, um

importante papel para a agricultura familiar. Questões relacionadas à

busca de uma alimentação livre de agrotóxicos e ao desenvolvimento

de uma nova agricultura que seja a menos nefasta ao meio ambiente

preocupam a sociedade. Uma versão alternativa de desenvolvimento

rural propõe o emprego de processos biológicos e de conhecimentos

ecológicos na produção. Nessa nova versão, há espaço para aqueles

agricultores tidos como atrasados (“inviáveis”, “inadequados”)

relativamente ao modelo dominante. As ações de políticas públicas,

desta vez, ao invés de terem como meta o aumento da

produtividade, buscam dar prioridade à sustentabilidade das

populações locais ou regionais, estimulando a exploração

diversificada dos recursos disponíveis e do potencial das

comunidades.

Há pouco tempo, por ocasião do lançamento do Censo

Agropecuário 2006, o Ministro do Desenvolvimento Agrário fez a

seguinte declaração em reconhecimento à grande expressividade da

agricultura familiar do Rio Grande do Sul:

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Agora, sabemos que 86% dos estabelecimentos rurais gaúchos são da Agricultura Familiar (estabelecimentos com até 4 módulos fiscais, ou seja, no caso do RS, no máximo 160ha), que estes estabelecimentos ocupam 992.088 pessoas (81% das pessoas ocupadas no campo) e que ela participa com 54% do valor bruto da produção, mesmo ocupando apenas 31% da área agricultável. Com mais clareza: a Agricultura Familiar no RS é mais produtiva que a chamada agricultura “dos grandes”. Se compararmos os indicadores de produtividade por hectare isto fica ainda mais claro: R$ 1.462,00/ha/ano na Agricultura Familiar contra apenas R$ 547,00/ha/ano na agricultura de escala. Ou seja, no Rio Grande do Sul, a Agricultura Familiar é 67% mais produtiva. Outra informação importante: a Agricultura Familiar ocupa 16,1 pessoas para cada 100ha, enquanto o outro modelo ocupa apenas 1,7 pessoas para os mesmos 100ha (Cassel, 2009).

Esses são os seguimentos promissores de uma trajetória de

mais de 180 anos, a contar da data dos primeiros colonos aqui

chegados da Europa (1824). De lá para cá, as explorações agrícolas

de caráter familiar foram submetidas a uma diversidade de situações,

cujas mutações mais recentes pretende-se abordar neste artigo.

Serviu de base às autoras os estudos analíticos disponíveis sobre

essa realidade no Rio Grande do Sul, mas tão somente aqueles de

contornos gerais, o que implica notificar que não foi aqui

contemplada a enorme gama de estudos de casos oriundos,

sobretudo, da academia.

1 PERÍODO PRÉ-MODERNIZAÇÃO CONSERVADORA

De agricultura colonial...

Como é sabido, a origem da agricultura familiar do Extremo Sul

encontra-se no projeto desenvolvido no período Imperial, do qual

resultou uma forma de exploração agrícola totalmente nova para a

época no País, baseada na pequena propriedade e explorada

exclusivamente pela família que detinha a propriedade da terra.

Vinculada, portanto, à colonização, que se estendeu por um período

longo da história do Rio Grande do Sul (de 1824 ao final da década

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de 40 do século passado), a atividade desenvolvida pelos

colonizadores ficou conhecida como “agricultura colonial”1. Em razão

de persistir, por mais de um século, no mesmo sistema de produção

baseado em uma forma de cultivo predatória e caracterizada pela

ausência de incorporação de novos conhecimentos técnicos, ao final

dos anos 50, essa agricultura estava em plena crise, agravada pela

divisão das propriedades entre os filhos dos “colonos”, o que

ocasionou o fenômeno da minifundização (Mertz, 2004).

Findo o período da ocupação das terras consideradas próprias à

colonização, as deficiências do processo produtivo da pequena

propriedade colonial e sua precariedade começaram a chamar a

atenção dos pesquisadores, de forma que, nos anos 60, surgiu uma

série de trabalhos sobre a crise da economia gaúcha, cujo foco residia

na agricultura.

Essas análises desenhavam um futuro negro para o Estado.

Títulos como Rio Grande do Sul um Novo Nordeste, de Franklin de

Oliveira, publicado em 1960, Crise Econômica no Rio Grande do

Sul, de Paulo R. Schilling, de 1961, e Análise do Insuficiente

Desenvolvimento Econômico do Rio Grande do Sul, de Cláudio

Accurso et al., do ano de 1965, procuravam apontar os entraves e

gargalos da economia gaúcha e concluíam residir na agricultura o

maior problema da situação estadual.

...à agropecuária colonial

Desde os anos 50, a camada de pobres rurais do Rio Grande do

Sul, composta por agricultores de exíguas terras, meeiros e

trabalhadores rurais sem terra, cresceu em expressão na estrutura

1Destacam-se, dentre outros, o estudo da Comissão Interestadual da Bacia Paraná--Uruguai (1958), o de Paulo Schilling (1961), o de Jean Roche (1969), o de Antonio Barros de Castro (1972) e o de Paul Singer (1974).

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social agrária gaúcha e em organização social, em mobilizações de

cunho político nacional. 2

Em meados dos anos 60, o Rio Grande do Sul passou a se

constituir em uma das áreas prioritárias de reforma agrária do Brasil,

fato que ocasionou o estudo intitulado Levantamento dos Recursos

Naturais, Sócio-Econômicos e Institucionais do RS, elaborado

pelo INCRA (1973), com o objetivo de equacionar a problemática da

agricultura no Estado e estabelecer bases para a formulação de

políticas de desenvolvimento. Desse amplo e complexo estudo,

ressalta-se aqui o tratamento ao que foi nomeado de agropecuária

colonial, vista sob uma perspectiva histórica e inserida na

problemática estrutural do Estado. Os autores do estudo concluem

pelo insatisfatório desempenho desse segmento produtivo, que

apresentava taxas de crescimento estagnadas e se mostrava incapaz

de absorver os crescentes contingentes de pessoas continuamente

lançados no mercado. Pressupõem, nas suas palavras, que, se

mantidas as tendências observadas da estrutura produtiva do Setor

Primário, os problemas originários do defeituoso regime de posse e

uso da terra vigorante no Estado tenderiam a se agravar e que os

impactos positivos sobre a produção, a renda, a produtividade, o

emprego e o nível de vida da população rural seriam maiores num

processo de reforma agrária integral do que num processo de

modernização do setor agrícola.

O conceito de agropecuária colonial adotado no estudo do

INCRA encontra-se novamente em estudo publicado no final dos anos

70 pela FEE sobre a agricultura do Rio Grande do Sul (FEE, 1982),

mas seus autores, ao mesmo tempo em que o retomam, distanciam-

-se dele, ao incorporarem conceitos analíticos da economia política.

Vivia-se um momento em que a economia camponesa se encontrava

2Um movimento de destaque de luta pela terra foi o Movimento dos Agricultores Sem Terra do Rio Grande do Sul (MASTER), vinculado ao movimento nacional pela reforma agrária.

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no centro do debate intelectual e na origem dos movimentos

revolucionários latino-americanos. No auge do interesse pelo estudo

do campesinato, foi produzido vasto conjunto de livros, monografias

e artigos com influências intelectuais marxistas. Para os analistas da

FEE, a agropecuária colonial é um segmento produtivo não

capitalista, “[...] onde as relações familiares dão a tônica das relações

de produção”, sobressaindo a

[...] presença do proprietário-trabalhador que, detendo os meios de produção, trabalha com a sua família, para obter, no mínimo, a sua sobrevivência. Geralmente, emprega terras impróprias para a mecanização, possui uma área de dimensões reduzidas e utiliza eventualmente mão-de-obra assalariada como complemento da força de trabalho familiar (FEE, 1982, p. 95).

E, nessa linha de caracterização consensual, salientam, também, que,

embora as relações familiares fossem a tônica das relações de

produção, não produziam somente para subsistência, pois

canalizavam o excedente físico para o mercado

Presente no estudo da FEE também está a tendência, em voga

então, de interpretar os fenômenos econômicos de acordo com a

evolução das fases da acumulação industrial da economia brasileira

(Castro, 1972). Seguindo esse procedimento, a FEE aponta uma fase

de relativa prosperidade para a agropecuária colonial vigente no

padrão de acumulação calcado em bens não-duráveis (que vigorou

até meados dos anos 50), graças à produção de uma grande

diversidade de bens de primeira necessidade, destinados a abastecer

o mercado nacional. Fornecendo alimentos para as populações

urbanas, esse segmento produtivo cumpria a função de reduzir o

custo da reprodução de mão de obra urbano-industrial. Entretanto

essa agricultura, praticada com baixa capitalização e baseada no

crescimento extensivo, esgotou-se e perdeu importância, no mercado

nacional, para outras regiões fornecedoras de alimentos, com maior

produtividade (Grando, 2001). Encontrou seu limite de crescimento

no esgotamento da fronteira agrícola do Estado, o que ocasionou a

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fragmentação das pequenas propriedades e um intenso movimento

de pessoas que se dirigiram para os Estados de Santa Catarina e do

Paraná. Ao abordar o processo de “minifundização”, o estudo da FEE

menciona as regiões denominadas Alto Uruguai e Colônia Velha como

as predominantemente mais fragilizadas, devido às terras com fortes

limitações de utilização, o que forçou uma importante parcela de

agricultores a vender força de trabalho para a lavoura empresarial

que despontava, a migrar para os centros urbanos ou, ainda, a

buscar alternativas nas frentes de expansão agrícola então existente

no País (FEE, 1982).3

As análises de então apresentam dois caminhos para a saída da

crise agrícola: a reforma agrária, que previa a divisão das terras de

campo ocupadas pela pecuária extensiva e subaproveitadas, ou uma

mudança tecnológica sem implicar a desconcentração da terra.

2 TRANSITANDO PELA MODERNIZAÇÃO CONSERVADORA

Derrotada pelo golpe militar de 1964, a pretendida reforma

agrária no Brasil não se efetuou. O que equivale a dizer que as

pequenas explorações agrícolas não foram privilegiadas como veículo

portador das relações de produção capitalistas, pois isso implicaria

uma profunda mudança nas relações de propriedade da terra.

3Seguem-se alguns dados registrados na época. O número de pessoas que viviam da exploração de pequenas áreas agrícolas nos anos 70 equivalia a 40% da população rural e correspondia a mais de 50% da População Economicamente Ativa do Estado. Se for levado em conta que esse conjunto de agricultores ocupava somente ¼ da superfície agrícola, compreende-se o desequilíbrio homem/terra característico da região com predominância de pequenas explorações no Rio Grande do Sul (Grando, 1977). O grande número de pessoas que não recebiam remuneração monetária pelos trabalhos executados nas explorações de até 50 hectares mostra o caráter familiar dessas explorações: segundo o IBGE, em 1970, para cada 100 pessoas que trabalhavam nessas explorações, 95 faziam parte do grupo familiar do chefe da exploração e não eram remuneradas (Grando, 1977). Se se considerar que, no processo produtivo dessas unidades de produção, a utilização de mão de obra era intensa, devido à inexistência de mecanização e dada a exiguidade das terras, percebe-se que uma grande parte dessa força de trabalho era desperdiçada. Ou seja, a potencialidade do trabalho dessas famílias era muito maior que o volume de trabalho empregado na produção. No período 1973-75, foi avaliado um excedente dessa mão de obra da ordem de 22%, chegando a 34% em 1965 (Estudo PII-RS e ACIRIS apud Grando, 1977).

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Frustrou-se, assim, a esperança de, por meio de uma maior eficiência

de uso da terra, melhorar a distribuição de renda (FEE, 1982). A

modernização conservadora da agricultura brasileira ganhou força

nos anos 70.

A modernização agrícola deu ensejo à unidade de análise então

chamada de complexo agroindustrial, assim compreendido por

Müller:

A noção do complexo agroindustrial, CAI, denota um espaço configurativo ou de representação (no sentido de mostrar a figura, o feitio) das relações intersetoriais indústria- -agricultura-comércio-serviços, quando no chamado setor agrícola predomina o padrão agrário moderno (Müller, 1990, p. 27).

É a interdependência das atividades agrárias em relação à indústria,

responsável pelo progresso técnico, que define o padrão tecnológico

da agricultura; enquanto a interdependência em relação à

agroindústria, supermercados e mercado internacional pressiona por

transformações da organização produtiva e distributiva da agricultura

e pela difusão de técnicas, impondo exigências sobre o tipo e a

qualidade do produto e a escala de produção (Müller, 1990, p. 31-

-32).

As condições de produção para a agricultura modificavam-se, e

as questões a ela relacionadas ganharam novas interpretações. No

Rio Grande do Sul, significativa parcela de explorações agrícolas

passou pelo processo de integração agroindustrial e, como observa

estudo realizado pela FEE e pela UFRGS, a ligação com a indústria

deixou de ser indireta e secundária, pois

[...] não é mais para o comércio local ou regional que a produção é preferencialmente dirigida, mas diretamente para a indústria. Os agricultores tendem a se especializar em certos tipos de produtos pela imposição dos grupos industriais, e, em função dessa especialização, ocorre um desenvolvimento das força produtivas. Essa agricultura tornou-se consumidora de máquinas e insumos ofertados pelo parque industrial e fornecedora de matérias-primas para o setor agroindustrial. Ao absorver uma importante parte dessa produção, a agroindústria situa-se numa posição de domínio no mercado comprador (Santos et al., 1989, p. 271).

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Esse processo é seletivo e conduz à formação de um sistema de

produção que substitui o sistema tradicional dos pequenos

agricultores, que consiste em associar a policultura à pequena criação

de animais.

O fato de o caráter familiar de produção agrícola ter sobrevivido

à revolução tecnológica da agricultura foi alvo de grandes debates no

mundo acadêmico. As explicações variaram. Uns as viam articuladas

com o sistema dominante, outros, submetidas ao capital

agroindustrial ou, então, simplesmente como uma etapa de um longo

processo de decomposição.

O pequeno agricultor, um novo processo produtivo com perda

de autonomia

Com o advento da modernização da agricultura, processo

também chamado de industrialização da agricultura, impulsionado

pelas grandes firmas internacionais de química, de mecânica e pela

indústria agroalimentar, as análises baseadas no conceito de

agricultura/agropecuária colonial caíram em desuso. O conceito de

pequenos agricultores/pequena produção, que deriva do debate

suscitado por Lênin, Kaustki e Engels em torno da pequena produção

mercantil, ganhou força. Grande parte dos trabalhos datados desse

período foram influenciados pela literatura francesa (Servolin, 1972;

Amin; Vergopoulos, 1977). A tendência predominante então era a de

considerar a pequena produção mercantil agrícola, em oposição à

agricultura capitalista, como uma forma de produção saída do modo

simples de mercadoria, mas integrada e submetida ao modo de

produção capitalista dominante (Mollard, 1978).

A corrente de interesse pelo estudo das especificidades da

pequena produção agrícola no Rio Grande do Sul foi inaugurada por

Liedke (1977) e Santos (1978), com suas obras pioneiras sobre as

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relações dos pequenos produtores com a indústria na produção de

fumo e na produção de vinho respectivamente, duas culturas

tradicionais que remontam ao início da colonização, cujas produções

passaram por um processo de rearticulação e reorganização com a

intervenção do capital agroindustrial.

Santos (1978), com os Colonos do Vinho, reconstitui o

processo de trabalho historicamente reproduzido e, dessa

perspectiva, analisa as relações dos produtores de uva com a

indústria do vinho na região chamada de Velha Colônia Italiana.

Conclui que esse colono “[...] realiza a reprodução simples”, isto é, a

cada novo ciclo produtivo, ele repete a escala de produção do ciclo

anterior e repõe, na mesma proporção, os meios de produção e a

força de trabalho. Verifica que a agricultura de diversificada tende à

especializada, em função da venda de matéria-prima para a indústria

vinícola. Portanto, a relação desse agricultor com o mercado é

preferencialmente com a indústria, composta, de um lado, pelas

cooperativas e sociedades anônimas propensas a se tornarem

oligopólios e, por outro lado, pelas centenas de estabelecimentos de

pequeno porte. A indústria do vinho, que, até fins da década de 60,

não apresentou alterações substanciais, passou por uma

reorganização na década seguinte, com fusões entre as empresas,

ingresso de novas empresas e de multinacionais no setor. Com o

aumento da concorrência industrial, ocorreu uma disputa pela compra

de matéria-prima que levou ao aparecimento do contrato de

produção.

No caso da indústria do fumo, trata-se claramente de oligopólio.

Liedke (1977) mostra como o setor industrial reorganizou essa

produção agrícola, induzindo-a a certo nível de especialização com

ganhos em produtividade. A fim de garantir os patamares de

qualidade e quantidade exigidos para o fumo em folha, as empresas

empregam técnicos para orientar as atividades do processo de

produção. Atuando junto aos produtores, esses técnicos têm como

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função repassar-lhes os insumos adiantados pelas empresas

industriais, orientar e controlar o processo técnico de produção e,

finalmente, garantir a venda do fumo em folha para a mesma

empresa que adiantou o insumo. “O que está em jogo nesse processo

é a canalização de um máximo de trabalho excedente para a

indústria” (Liedke,1977, p. 22). Ou seja, de acordo com acumulação

que deseja, a indústria determina os níveis de remuneração aos

produtores e destina-lhes o suficiente para cobrir seus custos de

produção e para que se reproduza enquanto força de trabalho.

Apropria-se, assim, do sobretrabalho gerado no processo de

produção.

Além do capital agroindustrial, que atuou como rearticulador e

organizador do processo de produção das explorações familiares em

função de suas necessidades de matérias-primas, destacaram-se,

particularmente no Sul, as cooperativas agrícolas, que vieram a

constituir um cooperativismo empresarialmente desenvolvido. Houve

um estímulo por parte do Estado do RS no sentido de induzir os

produtores à associação em cooperativas, com vistas a neutralizar os

fortes movimentos sociais que apareceram nas regiões coloniais, na

virada da década de 50, em contraposição aos movimentos pela

reforma agrária (Benetti, 1982). Ademais, ao longo dos anos 60 e 70,

formam-se os sindicatos dos trabalhadores rurais, tutelados

originalmente pela ala conservadora da Igreja Católica,4 contribuindo

para diminuir a combatividade dos agricultores e dar espaço ao

crescimento das idéias de assistência técnica e cooperativização.

Coradini (1981) observa que agricultores com terras de determinadas

dimensões, com capacidade de endividamento individual ou coletiva

através das cooperativas, alcançaram relativo desenvolvimento e se

sustentaram no mercado graças a certa especialização na produção,

em função da agroindústria — situação analisada no tocante à

4Posteriormente, houve envolvimento também da ala mais progressista da Igreja Católica.

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produção de trigo e soja. Essa parcela das explorações que já vinha

capitalizando-se na lavoura de trigo e de soja, a qual foi “um caso

peculiar de capitalização inicial da lavoura com mão de obra familiar”,

recebeu real impulso com a política de modernização conservadora,

conforme registrou Goodman (1986, p. 147).

Respaldadas pelos contratos, as firmas integradoras intervêm

profundamente na estrutura de produção agrícola, dando-lhe um

caráter globalizado. Ao analisarem a relação integrador/integrado,

Sorj, Pompermayer e Coradini (1982) salientam que o conteúdo dos

contratos (formalizados juridicamente ou não)

[...] diz respeito substancialmente à exclusividade na aquisição dos insumos por parte do produtor rural, ao padrão tecnológico e manejo a ser posto em prática sob orientação e assistência técnica da empresa e, fundamentalmente, à exclusividade e garantia da produção agropecuária por parte da empresa integradora (Sorj; Pompermayer; Coradini, 1982, p. 41)5.

No Rio Grande do Sul, significativa parcela de pequenos produtores

aderiu à integração agroindustrial (quer sejam empresas privadas,

quer cooperativas), com destaque para os produtores de aves, suínos

e leite, além dos, já mencionados acima, produtores de fumo, uva e

de grãos, sobretudo trigo e soja. Na condição de fornecedores de

matérias-primas, alcançaram certo desenvolvimento agrícola.

Contrariando as previsões teóricas (notadamente as marxistas),

que viam as unidades de produção de caráter familiar como um

obstáculo ao desenvolvimento e, por consequência, condenadas ao

desaparecimento, elas mostraram grande capacidade de adaptação a

diferentes situações. Não obstante, há que se considerar a formação

de fluxos de agricultores que, não alcançando as condições de

intensificar a produção em escala ampliada, entram em decadência.

No Rio Grande do Sul, um caso estudado em que os agricultores não

conseguiram revolucionar seus processos de trabalho como o

5Nas zonas produtoras de trigo, houve a integração dos pequenos produtores nas grandes cooperativas sob o controle dos “granjeiros”. Entre os granjeiros, contavam-se também profissionais liberais originários das regiões coloniais (Benetti, 1982).

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requerido pela indústria agroalimentar ocorreu com produtores de

pêssego na região de Pelotas. A “Colônia Francesa”, assim chamada

devido à origem e seus habitantes, desapareceu, da quarta para a

quinta geração de agricultores, por não ter desenvolvido as condições

de absorver progresso técnico e, portanto, de produzir com

perspectiva de evolução (Grando, 1989).

A outra face do produtivismo

No decênio dos anos 80, especialmente na segunda metade, a

agricultura brasileira alcançou recordes de produtividade, seguindo a

dinâmica mundial de crescimento baseada no uso intenso da terra.

Enquanto isso, ocorreu um notável empobrecimento dos pequenos

agricultores. A reforma agrária voltou a figurar na agenda política,

como resultado da luta por terra levada através de mobilizações e

ocupações de terras. A década foi pontuada por lutas sociais, que

refletiam, em alguma medida, no dizer de Medeiros “[...] as

profundas alterações pelas quais passava a agricultura brasileira” e

“[...] expressavam identidades constituídas no próprio processo de

crítica e enfrentamento das condições vigentes no meio rural”

(Medeiros, 2002, p. 164).

Ao abordar o recrudescimento da luta pela reforma agrária no

Rio Grande do Sul, Almeida (1999) refere-se ao fato de a

modernização agrícola praticada não ter alcançado uma parcela de

agricultores que, ameaçados de exclusão, se somaram a uma massa,

já existente, de agricultores sem terras. O autor também observa

uma outra face perversa do modelo de desenvolvimento implantado

que ocorria em determinadas zonas do solo gaúcho, a da especulação

fundiária, que, devido à valorização das terras mais aptas à

mecanização, induziu os pequenos a se desfazerem de suas

propriedades6. Em um contexto de tensões sociais e escalada de

6Na década de 70, para resolver os problemas fundiários, iniciou-se a formação de projetos de colonização, com apoio governamental e de cooperativas, para

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movimentos reivindicando mudanças, nasceu, no Rio Grande do Sul,

o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), que, na década

seguinte, fortemente interligado à Comissão Pastoral da Terra

(CPT) — vinculada à Igreja Católica —, se expandiu para além das

fronteiras gaúchas.

Segundo o critério que considera a linha pobreza para a

população rural abaixo de 0,25% do salário mínimo mensal, em 1980

havia, no Rio Grande do Sul, cerca de 500 mil pobres rurais, o que

correspondia a 19% da população rural gaúcha. Em 1991, essa

população pobre passou para cerca de 700 mil, ou 32% da população

rural.7

Nos anos 90, houve grandes mudanças na agricultura brasileira

decorrentes da abertura comercial, da ampliação das relações

comerciais com o Mercosul e da tendência à queda mundial dos

preços agrícolas, que pressionaram o setor agropecuário a elevar a

produtividade e a reduzir custos. No estudo Agribusiness, Benetti

(1998) mostra como a agricultura da Metade Norte do Estado,

vinculada às cadeias agroindustriais e nas quais se integra a

produção agrícola familiar, entrou em crise devido à concorrência

acelerada entre os agricultores. Em outro estudo publicado pela FEE,

Benetti (2000) aponta a redução de 1 milhão de hectares, entre 1985

e 1995, nas áreas de até 50 hectares com produção dos cinco

principais grãos da lavoura gaúcha, arroz, soja, trigo, milho e feijão.

Essa redução incidiu nas áreas de predomínio histórico das

explorações familiares, cujo exemplo mais expressivo é a Região do

Alto Uruguai. Dados do IBGE indicam, para o mesmo período, uma

redução de 84% (312 mil pessoas) das pessoas envolvidas nas

explorações familiares gaúchas.

transferir agricultores gaúchos minifundiários e/ou sem terra para Mato Grosso, Pará, Acre, Amazonas e Roraima.7Este e o parágrafo que segue estão baseados no Primeiro Relatório de Avaliação Sócio-Econômica do Componente Alívio à Pobreza Rural (Grupo A) (Grando, 2001).

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Depois do grande movimento migratório ocorrido, na década de

70, em direção às cidades, às grandes lavouras ou às fronteiras

agrícolas, a propensão a migrar da população rural gaúcha caiu nos

anos 80 e mais ainda nos 90, como observa Barcellos (1995). A

autora pondera que as articulações entre indústria e agroindústria, de

um lado, e os produtores familiares, de outro, foi um “[...] elemento

interveniente no lócus rural, com certo potencial no sentido de

promover uma maior retenção de população”, mas enfatiza que a

crise econômica dos anos 80 é considerada como o grande fator na

redução do êxodo rural. Primeiramente, a indústria em crise reduziu a

demanda por mão de obra. Posteriormente, a agricultura patronal

perdeu dinamismo e também deixou de contratar mão de obra. Sem

essas alternativas, cristalizaram-se, em determinadas regiões do

Estado historicamente ocupadas pelos “colonos,” situações de

pobreza rural, como no Noroeste e no Alto Uruguai. Estudos

desenvolvidos com base no Índice de Desenvolvimento Social (IDS),

criado pela FEE em 1995, apontam elevada concentração de pobreza

rural nas áreas ocupadas pelas explorações agrícolas de origem

colonial (Ávila; Ambros, 1998; Schneider; Fialho, 2000).

Em 1997 e nos anos subsequentes, o Governo do Estado do Rio

Grande do Sul viabilizou a implantação de um projeto de

investimentos, financiando pelo Banco Mundial, destinado às

comunidades rurais pobres, chamado Projeto de Manejo dos Recursos

Naturais e de Alívio à Pobreza. Coube à FEE, em conjunto com a

Emater-RS, fazer a avaliação do componente socioeconômico do

Projeto. A pesquisa de campo indicou que o público-alvo se

compunha de proprietários rurais com um “[...] sistema de produção

manual e/ou de tração animal, praticado em solos com restrições de

uso e nos quais a terra e a mão de obra são intensamente usadas”,

baseado em uma agricultura “fortemente de subsistência” e com

renda proveniente, majoritariamente, da produção agropecuária.

Importante parcela desses agricultores detinha menos de 15 hectares

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de terras. Os graus de escolaridade eram muito baixos. Na área da

infraestrutura social básica, havia carência de energia elétrica e de

disponibilidade adequada de água, e as condições de moradia e

saneamento básico eram precárias (Grando, 2001).

A diferenciação social que se produziu no universo dos

descendentes dos nossos colonos, ao longo do processo de

modernização da agricultura, expressa-se pela diversidade das

formas de exploração agrícola que podem ser observadas no solo

gaúcho e que, supostamente, estão articuladas ou subordinadas ao

sistema global. Essa situação de desigualdades é justificável, se for

considerado que, de um lado, a pequena produção mercantil não

consegue promover sua própria transformação, porque só alcança

desenvolvimento limitado, e, de outro lado, que o desenvolvimento

do capitalismo na agricultura se caracteriza por ser um processo não

homogêneo.

3 NOVAS DIMENSÕES DO RURAL

Nas últimas décadas, o espaço rural vem passando por

mudanças estruturais em função de fatores tais como um processo de

urbanização que se estende pelas zonas rurais, uma industrialização

difusa, o desenvolvimento turístico e a valorização das relações com

a natureza (Carmo, 2009), empreendimentos agropecuários em áreas

urbanas, moradores do meio rural que trabalham em zonas urbanas,

moradores urbanos que procuram viver no meio rural, dentre outros

tantos. Por razões como essas, o rural passou a não ser mais

confundido com o agrícola. Michel Blanc (1997) chama atenção para

o fato, assinalando a condução de numerosos trabalhos, nos últimos

anos, sobre a evolução de zonas rurais que evidenciam o papel das

populações e das atividades não agrícolas, e é enfático ao afirmar

que não há mais um conceito único de rural. Diz que tantos são os

diferentes modos de construí-lo quanto as diferentes maneiras de

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questionar a sua heterogeneidade. Ou seja, cada approche remete a

um questionamento diferente sobre o rural.

No Brasil, um estudo precursor sobre as atividades não

agrícolas que passaram a responder pela nova dinâmica do meio rural

foi o projeto Caracterização do Novo Rural Brasileiro, coordenado

por José Graziano da Silva, que ficou conhecido como Projeto

Rurbano. Essa pesquisa mostra o “estado das artes” na diversificação

das formas de ocupação, no meio rural brasileiro, nos anos 80 e 90,

impulsionadas pelas atividades urbanas.

Da agricultura em tempo parcial à pluriatividade

Uma das formas de desordenação ocorrida no seio das

pequenas unidades de produção familiares do Rio Grande do Sul foi

estudada por Schneider (1999). O autor observa que o processo de

modernização da estrutura produtiva da agricultura não se verificou

no Vale do Rio dos Sinos e nem na Encosta da Serra (Colônias

Velhas), onde os colonos tiveram seu modo de vida desarticulado

pela “[...] industrialização difusa do setor coureiro calçadista e pela

própria incapacidade de aprimoramento do tradicional sistema

produtivo que inviabilizou a reprodução familiar dos colonos”. Por

esse motivo, teria surgido um novo tipo de agricultor, que seria

aquele que, além de ter sua pequena propriedade, se emprega como

operário na indústria calçadista, tornando-se agricultor por tempo

parcial.

Essa veio a ser a solução para o segmento mais empobrecido

dos agricultores daquela região, em função de uma conjunção de

fatores tais como terras insuficientes, solos degradados,

equipamentos agrícolas ineficientes e velhos e contínua prática do

tradicional sistema de rotação das terras, etc. Em consequência da

crise e da desarticulação do sistema produtivo colonial, ocorreu o

desenvolvimento da acaciocultura na região, como atividade

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comercial dos pequenos agricultores, e cresceu a importância dos

empregos assalariados extra-agrícolas no orçamento das famílias.

Nas análises sobre casos desse tipo, focadas no fenômeno da

penetração da indústria em zonas rurais, com vistas a utilizar a mão

de obra ali existente, encontra-se o uso do termo agricultura em

tempo parcial (part time farming) até meados da década de 80.

Sacco dos Anjos (Anjos, 2001), ao analisar a importância e as

características dos termos para entender as transformações que

ocorrem não só no mundo rural, diz

Ainda que persistam enormes controvérsias com respeito aos critérios de definição do conceito de “agricultura a tempo parcial”, o certo é que, até o final dos anos 70 e princípios dos 80, a maior parte dos estudos sobre este tema coincidia em considerá-lo como um fenômeno de transição (Kolankiewic, 1979: 67), que, no limite, anunciava a definitiva desaparição das explorações camponesas na agricultura contemporânea. Admitia-se tratar-se, portanto, de manifestação palpável do processo de êxodo rural e de uma das estratégias de sobrevivência utilizadas por famílias camponesas detentoras de explorações pouco modernizadas (Naredo, 1996, p. 180-182 apud Anjos, 2001).

De fato, até o final dos anos 70, a agricultura a tempo parcial era

considerada como um fator que freava o desenvolvimento capitalista

na agricultura, tal como este havia sido previsto pelos autores

clássicos, muitos deles de filiação marxista, como Kautsky, e que

haviam cunhado o que se pode denominar de “paradigma de la

proletarización agrária” (Arnalte, 1980, p. 222 apud Anjos, 2001, p.

4).

Os estudiosos da agricultura de caráter familiar passaram a

percebê-la, a partir de meados dos anos 80 e começo dos anos 90,

com a forma como ela é explorada, principalmente após a

constatação da existência de uma diversidade de atividades não

transitórias, combinando tarefas agrícolas e não agrícolas,

desenvolvidas pelos membros de uma mesma unidade familiar de

produção e reconhecidas como partes integrantes do

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desenvolvimento rural. Esse fenômeno passou, então, a ser

designado pelos especialistas como pluriatividade (Schneider, 1999;

Anjos, 2001 ;Schneider, 2003; 2005; Schneider et al., 2006).

Estudos indicam que a pluriatividade vem crescendo no meio

rural gaúcho. Schneider (2005) aponta, nas regiões da Encosta da

Serra, Vale do Caí e Vale do Taquari, o fenômeno da pluriatividade. O

resultado de uma pesquisa amostral realizada em parceria entre a

UFRGS e a UFPEL8 identificou, no nordeste do Estado, a Serra Gaúcha

com um percentual de quase 60% de famílias pluriativas — mas,

mais ao norte, no Alto Uruguai, a pluriatividade atingia menos de

29%. Comparativamente, segundo os pesquisadores, as famílias

pluriativas estudadas são numericamente maiores, têm maior nível

de escolaridade, detêm e exploram menos áreas de terras que as

famílias monoativas (Schneider, 1994; Schneider et al., 2006). Não

obstante, a pluriatividade deixou de ser vista, pelos analistas, como

uma estratégia de sobrevivência unicamente das explorações menos

competitivas, diante da constatação de que se trata de uma

redefinição dos processos produtivos das explorações agrícolas,

devido à crescente participação de rendas não agrícolas no

orçamento familiar (Schneider, 2005). Dentre elas, vem crescendo

aquelas vinculadas à prestação de serviços, como turismo rural,

turismo ecológico, lazer, construção civil, etc. Tendência observada

também nos países desenvolvidos.

Agricultura familiar, o reconhecimento de uma identidade

Nos anos 90, as expressões pequena agricultura/pequena

produção/pequenos agricultores foram substituídas pela expressão

agricultura familiar9. Grande responsável pela difusão da expressão

8Pesquisa desenvolvida pelo Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural da UFGRS e pelo Programa de Pós-Graduação em Agronomia da UFPEL.9A expressão adquire status legal com a chamada Lei de Agricultura Familiar (nº 11.326/06), que define os conceitos de agricultura familiar e de agricultor familiar.

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foi a série de estudos realizados, em convênio, pelo INCRA e pela

FAO, que elegeu um conceito de produção familiar construído com

base nas relações sociais de produção e não mais restrito aos limites

de área e de valor da produção. A definição plena encontra-se no

estudo da série intitulado Novo Retrato da Agricultura Familiar: o

Brasil redescoberto (Guanziroli, 2000). Considera ser

estabelecimento familiar aquele cuja direção dos trabalhos é exercida

pelo produtor e em que o trabalho familiar, superior ao trabalho

contratado, é praticado em extensões de terras que a família pode

explorar com trabalho próprio aliado à tecnologia que dispõe. Essa

noção passou a ser usada pelos gestores públicos e na definição de

políticas voltadas para o universo desses agricultores.

No bojo do debate sobre o desenvolvimento brasileiro, discute-

-se o papel da agricultura familiar em torno de questões como

desenvolvimento sustentável, geração de emprego e renda,

segurança alimentar e desenvolvimento local (Bittencourt; Di

Sabatto, 2000). Em 2003, foi criado o Ministério do Desenvolvimento

Agrário,

[...] para tratar das questões e dos temas relativos ao fortalecimento e a consolidação da agricultura familiar no País, bem como ao reconhecimento do direito ao acesso a políticas públicas e à reprodução econômica e social sustentável da diversidade de populações e povos existente no meio rural, muitos deles condenados anteriormente à “invisibilidade” (Delgado, 2009, p. 35).

O conjunto de estudos desenvolvido no âmbito do convênio

FAO/INCRA10 tornou-se uma referência entre pesquisadores e

técnicos governamentais brasileiros. A metodologia empregada,

baseada nos Sistemas Agrários, de origem francesa11, passou a ser

amplamente utilizada nos estudos voltados à agricultura familiar.

10O primeiro estudo realizado no âmbito do Projeto de Cooperação FAO/INCRA sobre agricultura familiar no Brasil foi com base no Censo Agropecuário 1985. Posteriormente, com metodologia aperfeiçoada, foi desenvolvido o segundo estudo com base no Censo Agropecuário 1995/96.

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Trata-se de um instrumental bastante adequado para orientação de

estratégias para estabelecer políticas de desenvolvimento. Consiste

em uma análise da evolução histórica e da diferenciação geográfica

da agricultura. Segundo essa concepção, o funcionamento do sistema

agrário resulta da interação existente entre os três conjuntos de

elementos que o compõem: características do meio físico;

características do meio humano e organização social; e os meios

técnicos. A análise de um sistema agrário consiste em explicar as

interações entre seus diferentes componentes e em compreender

como eles intervêm no funcionamento do sistema. O enfoque tem o

objetivo de compreender as práticas sociais, econômicas e técnicas

empregadas na exploração do meio. O modo de exploração do meio

resulta de um processo de adaptação histórica: adaptação às

modificações do meio físico, adaptação às transformações sociais,

técnicas e econômicas. A análise histórica visa retroceder às grandes

etapas de instalação da comunidade e a identificar as condições de

mudanças que trouxeram a situação presente, com o objetivo de

permitir formular hipóteses sobre o futuro eventual da sociedade.

No Rio Grande do Sul, a teoria dos Sistemas Agrários foi

adotada no Departamento de Estudos Agrários da Unijuí e no

Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural da UFRGS,

berços de inúmeros trabalhos em nível de mestrado e doutorado com

essa orientação. No ano 2000, sob a coordenação da equipe de

professores da Unijuí e em parceria com a Emater-RS, foi

desenvolvido o estudo Avaliação e Caracterização Sócio-

Econômica dos Sistemas Agrários de Produção12, com vistas a

identificar os grandes sistemas agrários do Estado, formular um

11Foi preconizada pela disciplina Agricultura Comparada e Desenvolvimento Agrícola no Instituto Nacional Agronômico de Paris-Gignon (INA-PG). Atualmente, faz parte do Instituto dos Seres Vivos e do Ambiente — AgroParis Tech.12Posteriormente publicado em Silva Neto e Basso (2005).

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diagnóstico da situação e de propor eixos de desenvolvimento e

intervenção. Nele, os autores identificam os sistemas agrários com

base na agricultura familiar como os “mais dinâmicos social e

economicamente” e recomendam como estratégia de

desenvolvimento rural a promoção de “sistemas de produção com

equidade social, em que a agricultura familiar desempenharia um

papel essencial”, com ênfase no fortalecimento das atividades

agropecuárias (Silva Neto; Basso, 2005).

É do conhecimento geral que, historicamente, a agricultura

familiar tem sido a grande responsável pela produção de alimentos

dos brasileiros e, no entanto, esteve à margem das políticas públicas

até 1996, quando foi instituído o Programa Nacional de

Fortalecimento à Agricultura Familiar (Pronaf), viabilizado pela

Constituição Federal de 1988, depois de décadas de reivindicações

dos movimentos sociais rurais. O Pronaf tem o objetivo de financiar

projetos individuais ou coletivos destinados a gerar renda aos

agricultores familiares e assentados da reforma agrária, com taxas de

juros reduzidas. No dizer de Mattei (2005), o estabelecimento dessa

política pública de âmbito nacional “[...] representou a legitimação de

uma nova categoria social — os agricultores familiares”.

O Rio Grande do Sul vem sendo grandemente beneficiado pelo

Pronaf. Estudo do IPEA (Ferreira; Silveira; Garcia, 2001) indica o

Estado como o maior tomador da principal linha de ação do Pronaf, o

crédito de custeio à produção, para o período 1997-2000, quando

30% do montante financiado foi destinado a agricultores gaúchos,

sobretudo àqueles integrados ao setor agroindustrial, com destaque

para produtores de fumo, soja, aves e suínos. Mattei (2005)

estabelece um ranking, para o período de 2001 a 2004, dos 100

maiores municípios brasileiros tomadores de crédito do Pronaf, onde

o Rio Grande do Sul figura com 43 municípios, o que representa uma

concentração de praticamente 50% dos recursos do ranking. Dados

fornecidos por Toledo e Schneider (2008) dão conta de que, no

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período de 1998 a 2008, o Estado recebeu 21,26% do total dos

recursos disponibilizados e 22,93% do total dos contratos efetuados,

fato visto como a comprovação da capacidade de organização dos

agricultores familiares gaúchos em acessar o Programa. Mattei

(2006), analisando a produção acadêmica sobre o Pronaf, refere-se

aos limites do Programa comumente apontados pelos analistas, cujo

ponto principal seria o de não provocar, de uma forma adequada,

interferência no sentido de mudar o padrão de desenvolvimento

vigente, de viés produtivista, calcado no uso dos insumos modernos.

Mas, em que pesem seus limites em promover um desenvolvimento

rural sustentável, Guanziroli (2007) considera que um dos seus

principais impactos reside no fato de permitir que agricultores

familiares invistam em suas atividades.

A Constituição Federal trouxe, também, seguridade social

previdenciária para o homem e a mulher do meio rural que tenham

trabalhado em regime de economia familiar, garantindo-lhes o acesso

à renda de um salário mínimo mensal. Adquirindo os mesmos direitos

do trabalhador urbano, houve uma verdadeira mudança no status do

trabalhador rural. Essa medida de proteção é considerada da maior

importância para a agricultura familiar. As transformações produzidas

no interior gaúcho foram objeto de uma reportagem do jornal

caxiense Correio Riograndense. Baseada em dados do Ministério da

Previdência Social para o ano de 2002, a reportagem dá conta de

que, nesse ano em que o número de beneficiários rurais atingiu a

cifra de 550 mil no Rio Grande do Sul, na Serra gaúcha, por exemplo,

os Municípios de Flores da Cunha e Nova Pádua receberam “26.754

salários anuais, o equivalente a R$ 6,43 milhões, cerca de sete vezes

o orçamento da Secretaria da Agricultura de Flores da Cunha”, valor

que possibilitaria a compra de 59 mil toneladas de calcário, segundo

a matéria. Mas, além do aspecto econômico, dá destaque para os

ganhos sociais, como é o

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[...] caso das mulheres, principalmente, porque foi o marco do reconhecimento da profissão de trabalhadora rural daquela que antes era tida como “ajudante” do marido. Ela passou a ser reconhecida e se reconhecer como cidadã (Correio Riogr., 2003).

Em um estudo sobre a Previdência Social e as economias municipais

do Brasil, França (2003) revela que, no Rio Grande do Sul, o

pagamento de benefícios previdenciários era relativamente maior que

o Fundo de Participação dos Municípios em 65,19% dos municípios

(ou seja, em 323 do total de 497).

Uma renovação do passado?

Nas últimas décadas, têm sido observadas, no mundo todo,

importantes mudanças nos hábitos alimentares motivadas pela busca

de alimentos saudáveis, aliadas, paralelamente, a um

questionamento sobre o modelo de desenvolvimento produtivista

baseado no uso intensivo de produtos químicos e em procedimentos

tecnológicos que degradam os recursos naturais (Vilela, 1999).

No Brasil, essas questões emergem em contraposição à

chamada “revolução verde”, através de um movimento focado,

principalmente, nos agricultores excluídos da modernização agrícola e

com poucas relações com o mercado. A busca de uma estratégia de

desenvolvimento rural sustentável tem como alvo a viabilização da

agricultura praticada nas pequenas unidades familiares, adaptada às

situações culturais, sociais e agronômicas desses agricultores e

respeitando o conhecimento que acumularam em suas relações com o

agroecossistema (Altieri, 2009).

Um espaço de aprendizagem para a construção dessa

alternativa foram os assentamentos rurais. Almeida (1999) chama

atenção para o papel das organizações não governamentais (ONGs)13

13A forte influência das ONGs, que, com seus projetos, experiências de produção, têm por objetivo a defesa do pequeno agricultor, pode ser observada pela atuação “[...] de seus técnicos e lideranças, cujo trabalho, que se situa entre a assistência e o militantismo, permite a universalização de conhecimentos, o aporte de informações e a ação pedagógica, buscando tornar o seu público assistido mais

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e de outros grupos de apoio formados por participantes de

organizações, movimentos da sociedade civil e técnicos

governamentais na promoção do desenvolvimento dessa agricultura

nos assentamentos. Schmitt (2002) mostra como as pastorais da

Igreja Católica, dos setores progressistas da Igreja Luterana, dos

sindicatos combativos de trabalhadores do campo e dos movimentos

de luta pela terra foram os incentivadores da produção ecológica hoje

existente no Sul do Brasil e a contribuição decisiva do Projeto

Tecnologias Alternativas da Federação de Órgãos para Assistência

Social e Educacional (PTA-Fase), organizado em nível nacional e que,

desde seu nascimento, contou com a participação de entidades da

Região Sul. A autora observa também que a importância dessa

agricultura (sem correlação com os padrões produtivistas de

produção) para a viabilização econômica, social e ecológica da

agricultura familiar e dos assentamentos de reforma agrária foi

percebida por significativa parcela das organizações de trabalhadores

do campo com atuação no Sul do País, incluindo aí o MST, a

Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul

(Fetraf-Sul) e o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA).

Almeida (1999) atenta para a dificuldade de uma definição

única para as chamadas agriculturas alternativas, devido ao grande

número de correntes, dentre as quais, citam-se a biodinâmica, a

biológica, a orgânica, a natural, a permacultura. Esse mesmo autor

faz uma síntese das concepções globais dos diferentes grupos e

organizações em torno das seguintes características fundamentais:

[...] a agricultura alternativa (ou seus homônimos) determina uma relação mais estreita e mais equilibrada entre o meio ambiente natural e aquele criado pelo homem; beneficia a diversidade social, econômica, ecológica e cultural; implica a criação e gestão de sistemas de produção

eficiente em suas reivindicações” (Almeida, 1999, p. 24).“A maior parte das ONGs brasileiras nasceram entre 1960 e 1980, tendo em comum o fato de existirem, até então, de maneira quase clandestina, ligadas especialmente aos ‘movimentos sociais de base’ e executando serviços concernentes aos setores da educação, da saúde, da moradia, da assistência e do acompanhamento de atores sociais ditos ‘populares’.”(Almeida, 1999, p. 59-60).

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que buscam um maior engajamento pessoal e uma produção mais direta, promovendo uma maior autonomia no plano produtivo; e conduz à construção de um futuro no qual os indivíduos sejam livres e possam constituir uma sociedade verdadeiramente autônoma e democrática (Almeida, 1999, p. 69).

Não obstante a diversidade existente, seus proponentes

utilizam-se do enfoque sistêmico, anteriormente referido, para a

análise e o aprimoramento da produção, como observa Castro

(1993). Ressalta-se que a abordagem sistêmica tem como proposta

uma metodologia integradora da compreensão da realidade, com

vistas a definir estratégias de desenvolvimento sustentável, que

supera os enfoques setoriais tradicionalmente utilizados para a

apreensão da agricultura familiar. Para Castro, todas essas correntes

têm em comum, grosso modo, uma oposição às explorações

monoculturais, ou seja, à simplificação dos sistemas de produção

decorrente da agricultura dita moderna, e preconizam, além da

diversificação, a interação das atividades animais, vegetais e

florestais.

Cabe aqui um destaque para o surgimento da Agroecologia no

debate sobre os rumos do rural. Derivada dos movimentos

ecologistas, a Agroecologia vem consolidando-se como uma ciência

que organiza um sistema conceitual e metodológico das diversas

formas de cultivos opostas à do modelo dominante e que pode

contribuir para o entendimento das razões que o tornam

insustentável. Oferece as bases científicas (com princípios

agronômicos, ecológicos e socioeconômicos, conceitos e metodologia)

para viabilizar o desenvolvimento de tipos de agriculturas compatíveis

com as concepções de sustentabilidade (Caporal; Costabeber, 2005).

Portanto, graças ao advento dos ideários de sustentabilidade e

de novos hábitos de consumo, grupos sociais que não se adequavam

aos padrões de produção ditos modernos, em razão de deficiências

produtivas, têm hoje oportunidades de se desenvolverem econômica

e socialmente, produzindo para “nichos” de mercados, que, no dizer

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Grando, M. Z.; Mertz, M. M. De colonos a agricultores familiares: uma trajetória de ....

de Vilela (1999), estão oportunizando o fortalecimento da agricultura

familiar marginalizada, com os mesmos recursos naturais

incompatíveis com o modelo predominate. O autor chama atenção

para o papel relevente, nessa via de desenvolvimento, das redes

associativas nas mais diversas formas.

No Rio Grande do Sul, sabe-se da existência de um gande

número de associações de produtores engajados nessa proposta de

união para a difusão dos conhecimentos técnicos necessários para

viabilizar as produções alternativas e sua comercialização, mas não

se dispõe de informações precisas acerca da penetração e do alcance

dessas práticas no âmbito do Estado.

Essa nova agricultura que está sendo construída nos dias atuais

tem pontos em comum com a agricultura dos nossos antigos colonos.

Para começar, ambos os sistemas baseiam-se preponderantemente

nos recursos disponibilizados pela natureza, com uma importante

ressalva: os colonos beneficiavam-se da fertilidade natural do solo

sem a preocupações em preservá-lo; e o agricultor de hoje é

orientado pelo preceito de uma agricultura regenerativa, o que

pressupõe eliminar o uso dos agrotóxicos e adotar um conjunto de

práticas de manejo e de conservação do solo com vistas a melhorar a

vida do solo e a qualidade da produção. Também, como os colonos

faziam no passado, os agricultores alternativos estão produzindo as

suas próprias sementes, hoje denominadas “crioulas”, em

contraposição às matrizes tecnológicas das grandes corporações.

Outro ponto em comum consiste na maior proximidade do agricultor

com os consumidores dos seus produtos: nos dias atuais, a venda

direta ao consumidor é praticada através do um crescente número de

feiras ecológicas situadas em centros urbanos. Trata-se, pois, de um

conjunto de ações que resgatam uma tradição cultural, valorizam

antigas práticas, preservam os saberes dos agricultores familiares

(como é o caso da fabriação de produtos típicos, ditos colonias) e

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Grando, M. Z.; Mertz, M. M. De colonos a agricultores familiares: uma trajetória de ....

resultam em maior autonomia e autossuficiência para as

comunidades envolvidas.

4 PARA FINALIZAR...

Com essa revisão dos conceitos sucessivamente utilizados pelos

autores que se propuseram a analisar o universo gaúcho das

explorações agrícolas de caráter familiar, buscou-se sinalizar os

elementos centrais das mudanças que marcaram essas explorações

nas últimas décadas. Nesse sentido, constata-se uma riqueza de

contribuições que recaem sobre a modernização da agricultura e o

avanço industrial em zonas rurais gaúchas como os fatores que

imprimiram as transformações nas explorações familiares. De

maneira explícita ou subjacente, a literatura examinada aponta a

incidência das mudanças nos seguintes quesitos: na estrutura

social das comunidades rurais, na medida em que houve a

integração de agricultores ao modelo de desenvolvimento dominante

e exclusão de outros; no modo de produzir dos agricultores, devido

à imposição tecnológica da agroindústria, que acarretou a

simplificação dos sistemas de produção para alguns e em razão de

outras estratégias de desenvolvimento rural para outros; no modo

de vida dessas famílias, graças ao acesso à sociedade de consumo,

seja porque alcançaram um desenvolvimento agrícola em razão do

aumento da produtividade, seja porque obtiveram rendimentos

extra--agrícolas característicos da pluriatividade; e, finalmente, na

paisagem rural, por fatores decorrentes de novas formas de

ocupação do solo, da instalação de indústrias, da construção civil, de

abertura de estradas, do aumento de transportes, do turismo rural,

etc.

Nos dias atuais, a tendência é olhar a agricultura familiar de

perspectivas teóricas mais amplas. A complexidade dos processos de

transformação pelos quais passa o mundo rural contemporâneo não

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Grando, M. Z.; Mertz, M. M. De colonos a agricultores familiares: uma trajetória de ....

para de crescer, e diversificadas são as teorias que tratam dessa

problemática, como observa Mior (2006). As novas abordagens

teórico-metodológicas, advindas de um amplo debate internacional

sobre o que está sendo convencionado como “novo rural”,

contemplam a integralidade do meio rural, em razão de sua dinâmica

já não ser explicada só pelas atividades agrícolas: as atividades não

agrícolas tendem a crescer e, em consequência, diminui a

importância das atividades agrícolas. Ou, nas palavras de Navarro

(2001), a função produtiva das comunidades rurais não se restringe

mais à agricultura. Abramovay (2000), na busca de uma definição do

que seria esse novo rural, opta pelo que há em comum nos trabalhos

europeus e norte-americanos que tratam a questão: essa definição

não mais se dá pela oposição entre o rural e o urbano, mas, sim, pela

inter-relação desses núcleos. A partir desse entendimento, torna-se

mais adequada a abordagem territorial para interpretar o rural, em

detrimento do enfoque setorial. Portanto, como chama atenção

Wanderlei (2004), temas como ruralidade, desenvolvimento rural e

desenvolvimento local impõem-se hoje no debate exercido tanto na

comunidade acadêmica quanto entre os representantes dos

movimentos e organizações sociais, nos órgãos governamentais,

podendo-se acrescentar ainda outros temas, como o desenvolvimento

territorial, o desenvolvimento sustentável, as redes sociais, etc., tidos

como próprios da agricultura familiar (Verardi Fialho; Waquil, 2008).

Transposta para a realidade brasileira, essa discussão sobre o novo

rural avançou em âmbito nacional, mas só muito recentemente tende

a se fazer presente na literatura relacionada à realidade do Rio

Grande do Sul com um caráter menos eventual.

Dessa forma, conclui-se que alguns assuntos que se encontram

relativamente ausentes na literatura revisada e que podem ser

identificados como o “novo rural” na agricultura familiar gaúcha

tendem a ser analisados no âmbito dessas contribuições teóricas

recentes. Não obstante, as autoras são da opinião de que fazem falta

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estudos econômicos que relacionem as transformações da agricultura

familiar gaúcha com os aportes que ela recebe decorrentes das ações

que lhe dão sustentação. Fala-se aqui, mais precisamente, de

estudos com enfoques abrangentes, que mostrem o impacto

socioeconômico para o Rio Grande do Sul das ações de políticas

públicas com forte incidência sobre a agricultura familiar, como é a

política de reforma agrária e aquelas decorrentes do advento da

Constituição Federal de 1988, o Pronaf e o Sistema de

Aposentadorias Rural. O mesmo pode-se dizer em relação aos

escassos registros sobre a dimensão que atinge, no Estado, a

agricultura praticada segundo os princípios da preservação dos

recursos naturais e dos valores culturais das comunidades envolvidas.

Sabe-se de repercussões locais através de alguns estudos pontuais,

focalizados em regiões ou municípios gaúchos identificados como

zonas de incidência da agricultura familiar, como são, por exemplo,

os estudos de caso em torno de temas como: o desenvolvimento de

novas formas de produção no assentamento X do MST; os efeitos da

Previdência Social na produção Y, ou os efeitos da Previdência Social

nos municípios A e B; as cooperativas e as redes que alguns

produtores formam para melhor viabilizar a produção, etc.

Mas pergunta-se: qual é a dimensão desses aportes para a

agricultura familiar gaúcha em âmbito estadual? Quais os seus

impactos na produção estadual, no desenvolvimento regional, na

distribuição da renda, na redução da pobreza? Não obstante as

evidências de se estarem impondo as tendências teóricas, acima

apontadas, para compreender as transformações recentes do rural,

uma abordagem dos aspectos estruturais que venha a dar conta dos

efeitos das políticas de sustentação da agricultura familiar em todo o

território gaúcho nos dias atuais pode contribuir para o conhecimento

do quanto essas políticas públicas complementam a atividade

produtiva em nosso Estado e pode contribuir para orientar a gestão

estadual em ações que, por ventura, se fizerem necessárias na

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promoção de um desenvolvimento mais sustentável para as

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