de - repositorio.unb.brrepositorio.unb.br/bitstream/10482/1607/1/artigo_internacionminor... ·...

13
CADERNOS CADDO reoES o Transi~ao da escravidao para 0 trabalho livre no Caribe (1780-1890) o Transi~ao da rnao-de-obra escrava para a livre em Rio Bonito e Vassouras (1870-1890) o Desigualdade racial no Brasil e nos Estados Unidos: urna cornpara~ao estatistica o Ra~a, classe, genero e discrimina~ao salarial no Brasil o Etnopolitica - a dimirnica do espa~o afro-baiano DE o,Japao urn pais etnicamente hornogeneo? Considera~oes sobre 0 caso Kajiyarna o Antologia de textos do jornal '0 Africano' (1908-1919) estudos AFRO- .. ' : ~J.~' ~' :: : .., ."." ~:-.

Upload: vantuyen

Post on 09-Dec-2018

222 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: DE - repositorio.unb.brrepositorio.unb.br/bitstream/10482/1607/1/ARTIGO_InternacionMinor... · Borges Pereira, Joao Jose Reis, Joel Rufino dos Santos, Juana Elbein dos Santos, Ju-lio

CADERNOSCADDO reoES

o Transi~ao da escravidao para 0 trabalho livre no Caribe(1780-1890)

o Transi~ao da rnao-de-obra escrava para a livre em Rio Bonitoe Vassouras (1870-1890)

o Desigualdade racial no Brasil e nos Estados Unidos: urnacornpara~ao estatistica

o Ra~a, classe, genero e discrimina~ao salarial no Brasil

o Etnopolitica - a dimirnica do espa~o afro-baiano

DE o,Japao urn pais etnicamente hornogeneo? Considera~oessobre 0 caso Kajiyarna

o Antologia de textos do jornal '0 Africano' (1908-1919)

estudosAFRO-

.. ' :~J.~' ~ '••::

: .., ."." ~:-.

Page 2: DE - repositorio.unb.brrepositorio.unb.br/bitstream/10482/1607/1/ARTIGO_InternacionMinor... · Borges Pereira, Joao Jose Reis, Joel Rufino dos Santos, Juana Elbein dos Santos, Ju-lio

CADERNOSCAtoIDO IVER)ES

estudos

DiretorCandido Mendes

Vice-DiretorCarlos A. Hasenbalg

Page 3: DE - repositorio.unb.brrepositorio.unb.br/bitstream/10482/1607/1/ARTIGO_InternacionMinor... · Borges Pereira, Joao Jose Reis, Joel Rufino dos Santos, Juana Elbein dos Santos, Ju-lio

Publica~ao do Centro de Estudos Afro-Asiaticos - CEAAConjunto Universitario Candido Mendes

DiretorCandido Mendes

EditoresCarlos A. HasenbalgJose Maria Nunes Pereira

Conselho EditodalCandido Mendes, Carlos A. Hasenbalg, Charles Pessanha, Colin Darch, Denise Fer-reira da Silva, Ernani Teixeira Torres Filho, Giralda Seyferth, Jacques d'Adesky, JoseMaria Nunes Pereira, Juarez Pinheiro Coqueiro, Kabengele Munanga, Luiz ClaudioBarcelos, Marta Aimee Rangel Batista, Nelson do Valle Silva, Olfvia Maria RodriguesGalvao, Olfvia Maria dos Santos Gomes, Ronaldo Vainfas, Tereza Cristina Nasci-mento Araujo e Yvonne Maggie

Conselho ConsultivoBeatriz G6is Dantas, Carlos Moreira Henriques Serrano, Climerio Joaquim Ferreira,Cl6vis Moura, Eduardo J. Barros, Fernando A. Albuquerque Mourao, Joao BaptistaBorges Pereira, Joao Jose Reis, Joel Rufino dos Santos, Juana Elbein dos Santos, Ju-lio Braga, LUIsa Lobo, Manuela Carneiro da Cunha, Maria Beatriz Nascimento, Mari-sa Correa, Milton Santos, Octavio Ianni, Roberto Motta e Robert W. Slenes

Supervisao GrMicaCarlos Augusto de Oliveira Lima

Secretaria de Reda~aoHamilton Magalhaes Neto

Servi~os de Tradu~aoAnne Marie Millon, Carlos Alberto Medeiros, Diane Grosklaus, Monica MagnaniMonte

Produ~ao GrmcaHamilton Magalhaes Neto (coordenador); Luiz Carlos Palhares (revisor); Gicelia daConceic;ao, Sonia Maria e Tarciso Pereira (compositores); Rodilson Gonc;alves de Sa(arte-fmalista)

Os conceitos emitidos em artigos assinados silo de absoluta e exclusiva responsabili-clade de seus autores.

We ask for exchange

Price: Single Copies: US$ 8.00Annual Subscription (two issues): US$ 15.00 (air mail)

Assinatura, correspondencia e pedido de numeros atrasados devem ser encaminhados a:Subscriptions, correspondence and request for back issues made payable and addres-sed to: Sociedade Brasileira de Instruc;ao - Centro de Estudos Afro-Asiaticos

Rua da Assembleia, 10/Conj. 501, Tel. 224-8622/R. 259, Fax (021)507-115520011- Rio de Janeiro - RJ - Brasil

Page 4: DE - repositorio.unb.brrepositorio.unb.br/bitstream/10482/1607/1/ARTIGO_InternacionMinor... · Borges Pereira, Joao Jose Reis, Joel Rufino dos Santos, Juana Elbein dos Santos, Ju-lio

Internacionaliza~ao e minorias no Japao.Considera~6es sobre 0 caso Kajiyama*

* Recebidoparapubli~ emnovembro de 1991.

** Pesquisador associado i\ Mea do Japao e Pac£fico no Centro de Estudos EconomicosInternacionais (Ceri) do Instituto de Economia da Unicamp.

Em meados de setembro de 1990, por mo-tivos de salide, 0 entao ministro da Justi~aShin Hasegawa foi substitufdo por SeirokuKajiyama, 64, um membro do Partido Liberal-Democrata que ja tinha side antes ministro deAssuntos Internos e ministro da Indlistria e doComercio Exterior. No dia 21 desse mesmomes, Kajiyama acompanhou 0 trabalho da Po-lfcia na repressao a industria do sexo num dosquarteir6es mais badalados de T6quio: 0 fa-moso Kabuki-cM, no bairro Shinjuku. Diantedas cameras de televisao, 0 novo ministro jus-tificou a ~ao dizendo que as prostitutas (nagrande maioria, oriundas do Sudeste asiatico)arruinavam 0 ambiente daquela vizinhan~a,"( ...) como nos Estados Unidos, onde certoslugares se tornam promfscuos porque os ne-gros ingressam neles e for~am a safda dosbrancos" (Asahi Evening News, 29.9.90).1

Essa analogia malsucedida, utilizada paradramatizar os efeitos de tal crime no pais (aprostitui~ao e ilegal pelas leis japonesas), des-pertou protestos dentro e fora do Japao. NosEstados Unidos: entidades negras como a Na-

tional Association for the Advancement ofColored People (As~ Nacional para 0

Progresso das Pessoas de Cor) eo US BlackBusiness Council (Conselho de EmpresliriosNegros dos EUA) pediram a caOO;ado minis-tro e propuseram um boicote aos produtos ja-poneses em territ6rio norte-americano. Parla-mentares negros aprovaram uma resolu~aoexigindo nao somente que 0 governo japon&apresentasse desculpas oficiais e demitisse Ka-jiyama, bem como pediam que 0 Japao to-masse medidas urgentes para "combater asatitudes racistas que ainda predominam no go-verno japones (...) e se empenhasse numa ini-ciativa educacional agressiva (...) para elevar 0

entendimento (...) dos elementos positivos dassociedades multi6tnicas e multirraciais". NoJapao, alem dos protestos dos parlamentaresde varios partidos de oposi~ao e de embaixa-dores de seis pafses africanos e do pedido dedemissao do ministro apresentado pelo comiteencarregado de recepcionar 0 tider sul-africa-no Nelson Mandela, que faria uma visita aoJapao no mes seguinte, os jornais publicaram

Page 5: DE - repositorio.unb.brrepositorio.unb.br/bitstream/10482/1607/1/ARTIGO_InternacionMinor... · Borges Pereira, Joao Jose Reis, Joel Rufino dos Santos, Juana Elbein dos Santos, Ju-lio

diariamente artigos e cartas de leitores indig-nados com 0 fato.

o caso Kajiyama teve dois precedentes, em1986 e 1988, que tiveram igualmente reper-cussao intemacional. Em setembro de 1986, 0

entao primeiro-ministro Nakasone disse, numareuniao de seu partido, que "0 Japiio setransformou em uma sociedade altamente edu-cada - muito mais educada que a sociedadeamericana, quando se compara 0 myel memo[de conhecimento]. Nos Estados Unidos hlinegros, porto-riquenhos e mexicanos, por issoa media e ainrli muito baixa." Dois anos de-pois, 0 ex-ministro das Finan¥as Michio Wata-nabe sugeriu que os negros norte-americanosseriam descuidados em saldar dfvidas. Em am-bos os casos, uma chuva de protestos for¥ou aapresenta¥lio de desculpas perante a sociedadenorte-americana e, em particular, as minoriasprejudicadas.

Todos esses incidentes revelam 0 provin-cianismo de algumas das lideranlias polfticasjaponesas e a resistencia que certos setorestem em conviver com a diversidade social. Portras dessas· atitudes, hli uma cren¥a bastantedifundida segundo a qual 0 Japlio seria umana¥lio etnicamente homogenea. Trata-se deuma cren¥a sem fundamento, pois na realidadeha minorias etnicas e sociais, tanto na origemdo povo japones quanto na base da pinimidesocial do Japiio modemo. Regredindo algunsmilhares de anos na hist6ria japonesa, iremostentar esclarecer como 0 caso Kajiyama se re-laciona com a origem do povo ni¢nico, aforma¥iio de minorias no arquipelago, a nega-¥lio da existencia dessas minorias e 0 processode intemacionaliZ3.\(iio tiio necessano a essana¥lio, que se frrma cada vez mais como po-tencia economica e tecnol6gica mundial.

Qual a origem do povo japones? Porquanto tempo 0 homem tem vivido nas ilhasque comp6em 0 que e hoje 0 arquipelago ni-

¢nico? Ate que ponto 0 Japiio e uma na¥iiohomogenea no que diz respeito a sua composi-¥lio etnica? Essas slio perguntas que podempassar pela cabe\(a de alguns de n6s, mas quenem sempre siio suficientemente respondidas,seja pela dificuldade de acesso a tais informa-¥Oes, seja pelo numero ainda reduzido de tra-balhos publicados no Brasil abordando 0 tema.

o Japiio esteve ligado ao continente asiati-co durante a ultima era glacial (aproximada-mente um milhao a 11 mil anos a.C.). Ate 0 fi-nal desse perfodo, os achados arqueol6gicossiio apenas alguns implementos de pedra epartes de esqueletos humanos, deixando ospesquisadores sem condi¥Oes de farer afrrma-¥Oes mais taxativas. 0 que se sabe com certezae que os primeiros habitantes das ilhas ni¢ni-cas tem uma origem plural. Entre as etniasprincipais que estiio na base da forma¥iio dosprotojaponeses, podemos citar a etnia mong6-lica, a malaio-polinesia e a ainu (Hori, 1963,p. 3). 0 resultado dessa mistura foi a predomi-film-Ciada etnia mong6lica. Daf que 0 biotipodos japoneses e muito mais pr6ximo dos chi-neses e coreanos do que dos indonesios, porexemplo.

Uma das principais fontes de informa¥aosobre 0 Japiio antigo siio documentos chineses,entre os quais 0 mais velho eo Wei Chih ouHist6ria do reino de Wei, escrito no s6culo III.Esse relato contem muitas informa¥Oes pre-ciosas sobre 0 costume do "povo de Wa" Ua-poneses) e de sua situa¥iio polftica. Diz-nos eleque havia muitos estados ou tribos semi-inde-pendentes que mantinham contato com a Chi-na desde 0 ano 57. Isso quer dizer que, mesmoque a separa¥iio geograflca com 0 continentepossa ter interrompido temporariamente 0 in-tercambio entre as duas partes, esse intercam-bio foi retomado pelo menos no come\(o da eracrista (provavelmente, hem antes disso).

Ate 0 seculo V, 0 conhecimento da escritachinesa ainda era muito reduzido no arquipe-lago japones. Ou seja, 0 Japiio nlio possufa umsistema de escrita pr6prio e adotou a escritachinesa mais ou menos nessa epoca. No en-

Page 6: DE - repositorio.unb.brrepositorio.unb.br/bitstream/10482/1607/1/ARTIGO_InternacionMinor... · Borges Pereira, Joao Jose Reis, Joel Rufino dos Santos, Juana Elbein dos Santos, Ju-lio

tanto, os primeiros relatos hist6ricos japoneses(escritos em chines) s6 foram aparecer no se-culo VIII: 0 Kojiki (Relato dos fatos antigos)no ano 712 e 0 Nihongi ou Nihon-shoki (Cro-nicas do Japiio) em 720. Mas esses relatos es-too tao imbufdos da mitologia nativa que difi-cilmente podem ser considerados relatos his-t6ricos fidedignos, embora sejam preciosos emtermos religiosos. Por exemplo, eles alegamuma origem mftico-divina a familia imperial, aqual seria descendente da deusa do Sol, Ama-terasu.

Um registro oficial compilado no ano 815,o Shinsen-shOji roku (Registro recem-selecio-nado de dtulos e nomes defa17U1ias),classifica-va da seguinte maneira as 1.065 famllias resi-dentes na capital (Quioto) e vizinhan9a: 404familias shinbetsu (descendentes diretos dadeusa do Sol, a ancestral da familia imperial efundadora do pafs); 335 familias kObetsu (fa-mllias mais novas, que se ramificaram da linhaimperial); e 326 famllias banbetsu (estrangei-ros radicados no arquipelago) (Hori, 1969, p.84). Ou seja, aproximadamente um ter90 daaristocracia japonesa daquela epoca era com-posta de elementos estrangeiros, provavel-mente vindos do continente. De fato, sabe-seque do seculo I ao s6culo VII houve intensointercambio entre Japao, Coreia e China, re-sultando na transferencia de grande m1mero deimigrantes desses pafses para 0 arquip6lago ja-pones. Esses imigrantes trouxeram consigonovos costumes, novas Pfllticas e cren9as reli-giosas, novas t6cnicas agrlcolas, metallirgicasetc.

Essa euf6rica impor~OO da cultura chi-nesa (diretamente ou via Coreia) atingiu 0apogeu no perlodo Asuka (500-710). Nesseperlodo, 0 sistema de escrita chines com~ou aser mais utilizado na corte e foram adotados 0calendario chines e 0 budismo (ano 538 ou552). Depois disso, 0 Japao continuou a man-dar para 0 continente expedi90es com especia-listas e aprendizes do artesanato chines, masno que concerne a composi9OOetnica das ilhasnip6nicas houve uma certa estabili~ao. 0

estoque racial interno continuou a se misturar,embora praticamente nao tenha havido maio-res alter~Oes causadas pela entrada de imi-grantes de outras regi6es.

Tanto os imigrantes quanta os demais ellis(ujl) do arquipe1ago foram sendo unificadosem torno do cIa Yamato (familia imperial).A figura do "imperador" passou a ser umaverdadeira institui9OO,que foi fundamental noprocesso de unifi~OO nacional, bem como setornou um dos principais elementos da identi-dade cultural dos japoneses. Mas tambem setornou urn dos maiores tabus da sociedade ja-ponesa ate recentemente. Assim, ainda hoje ebastante delicado falar com imparcialidade daorigem do cla Yamato ou teeer criticas ao sis-tema imperial.

A IDEOLOGIA DA 'HOMOGENEIDADE RACIAL'CONFRONTADA PELAS MINORIAS

Outro tabu da sociedade japonesa sao suasminorias etnicas, sociais e culturais. Como javimos anteriormente, desde 0 com~ da his-t6ria japonesa ha a presen9a de diversas etnias.No entanto, a origem multi6tnica do Japaotende a ser desprezada, visto que os primeirosgrupos que imigraram para 0 arquipelago sedilufram no processo de fo~OO do povo ja-pones, havendo uma enfase na sua homogenei-dade racial.

o regime Tokugawa (1600-1868) foi im-portante na form~OO legal de algumas das mi-norias sociais do Japao. esse periodo, a so-ciedade foi congelada na seguinte estratifica-9ao social com base na ocup~o: nobre-zaJguerreiros, camponeses, artesaos e comer-ciantes. Alem dessas castas, havia tambem os"panas", sendo que os principais sao os eta eos hinin. A origem dos eta ("[pessoa] cheia depolui9ao") - tambem conhecidos como toku-shu burakumin (literalmente, "pessoas de vilasespeciais"), burakumin ou buraku-no-hi-to ("pessoa da vila") - nao e muito clara, masha varias teorias que tentam descreve-los co-

Page 7: DE - repositorio.unb.brrepositorio.unb.br/bitstream/10482/1607/1/ARTIGO_InternacionMinor... · Borges Pereira, Joao Jose Reis, Joel Rufino dos Santos, Juana Elbein dos Santos, Ju-lio

mo sendo descendentes do povo negrito dasFilipinas ou de uma tribo hindu, ou sendo umatribo desgarrada de Israel ou a ramific~lioorochon do povo tung us (que vivia em Sakali-na), ou sendo descendentes de coreanos queforam capturados como escravos ou que vie-ram para 0 arquip61ago como imigrantes quetrabalhavam com curtume. Fala-se tambemque a palavra eta seria derivada de etori ("co-letores de comida") (Price, 1967, p. 11-12,19). Os eta lidavam basicamente com a matan-~a de animais, a manufatura e venda de artigosde couro, 0880e pele. Os hinin (hi, "nlio"; nin,"ser humano") eram pessoas itinerantes, en-tretenedores, carrascos, mendigos, prostitutase outros. 0 hinin nlio era considerado tlio"polufdo" quanto urn eta e are poderia se tor-nar cidadiio comum em certas condi~Oes.Coma Restaur~iio Meiji (1868), tanto as castasquanto as subcastas do sistema feudal foramextintas legalmente. Embora 0 termo hinin janao seja mais utilizado, estima-se que hojeexistam tres milh6es de burakumin (em tornode 3% da popul~ao total), espalhados emaproximadamente seis mil comunidades (Leo-nel, 1986, p. 2).

No extremo norte do Japlio, na ilha Hok-kaido, concentram-se os descendentes dos na-tivos ainu (24.331 pessoas s6 nessa ilha, se-gundo dados oficiais). Esse povo ocupava boaparte do arquipelago japones, mas foi empur-rado gradualmente para a parte norte e assi-milado culturalmente na medida em que 0 paisse unificava. 0 ultimo levante ainu de resis-tencia ao governo japones se deu em 1789,com a chamada guerra da Kunashiri Menashi.Devido a politica de ass~iio (dbka seisaku)adotada pelo governo japones desde 0 periodoMeiji (1868-1912), e cada vez menor 0 nu-mero de ainu que tern 0 dominio de sua pr6-pria lingua. Befu (1971, p. 125) afirma que"os eta do Japlio estiio para os negros dos Es-tados Unidos assim como os ainu estiio para osfndios [americanos]".

Outra minoria "nativa" sao os okinawa-ji,!(pessoas oriundas da ilha de Okinawa). 0 rei-

no de Okinawa manteve uma rel~iio de vas-salagem com a China, de 1372 a 1874. A rela-~iio desse reino com 0 Japiio se dava atravesdo dominio de Satsuma (atual provincia deKagoshima), que com~ou a estender seu po-derio politico pelas ilhas ao norte de Okinawaa partir do seculo XIII. Em 1609, Satsumaempreende uma guerra punitiva contra 0 reinookinawense e toma 0 rei como prisioneiro. Apartir de entiio, are a Restaura~iio Meiji, Sat-suma exige 0 pagamento de tributos e utilizaOkinawa para 0 empreendimento de urn ren-!livel contrabando. Em 1879,0 rei Sho Tai foidestronado e for~ado a morar em T6quio.Uma vez transform ada em "provincia" japo-nesa, Okinawa passa entiio por urn nipido pro-cesso de mudan~a e, sobretudo, de niponiza-fao. Com a ocup~iio aliada do territ6rio japo-nes ap6s a Segunda Guerra, Okinawa ficousob a tutela norte-americana de 1945 a 1972,sendo entao restitufda ao Japlio.

Fora esses grupos minoritarlos nativos quepossuem uma hist6ria mais antiga, hci outrosmais recentes, como as vftimas da bomba at6-mica, as crian~as japonesas que foram deixa-das na China quando as tropas nipanicas ba-teram em retirada desse pais, os fllhos de exe-cutivos ou trabalhadores japoneses nascidos(e/ou criados) no exterior (kikoku shijo) e ou-tros. Esses grupos tern em comum 0 fato deserem vftimas de algum tipo de preconceito ediscrimina~lio. A expressiio japonesa "Ware-ware Nihon-jin. ••" ("N6s, japoneses .••") servecomo uma tabua rasa para camuflar a existen-cia dessas minorias e ditar como urn japonesdeve se comportar, pensar, sentir etc. No en-tanto, essa f6rmula que diz muito da culturanipanica serve sobretudo para expressar aforte barreira que os japoneses sentem em re-l~iio ao estrangeiro. Assim, existe 0 termogaijin ("pessoa de fora, estrangeiro") paradistinguir os japoneses dos outros.2

De certa forma, 0 estrangeiro em geralcomp6e uma minoria no Japao (em termos so-cio16gicos), visto que, para urn japones, s6 everdadeiramente japones quem possui uma as-

Page 8: DE - repositorio.unb.brrepositorio.unb.br/bitstream/10482/1607/1/ARTIGO_InternacionMinor... · Borges Pereira, Joao Jose Reis, Joel Rufino dos Santos, Juana Elbein dos Santos, Ju-lio

cendencia japonesa. Sem essa ascendencia,mesmo que a pessoa n~a no Japao, incorporeos costumes, aprenda a lfugua e at6 ganhe a ci-dadania japonesa, dificilmente sera aceito co-mo japones (ao menos como japones de verda-de). Ha uma tendencia japonesa para a confu-saD de nacionalidade com etnicidade. Diz-secom certa freqiiencia que 0 estrangeiro no Ja-pao tern muitas regalias e 6 em geral bem tra-tado. Mas isso enquanto cumpre 0 papel deoutsider. As rel~Oes mudam quando se tratade urn estrangeiro que imigra permanente-mente para 0 Japao.

E como fica a situ~ao das crian9as de ca-sais mistos? AM 1985, s6 quando 0 pai eraja-pones e que os fIlhos recebiam a nacionalidadejaponesa. Com a revislio da Lei da Nacionali-dade nesse ano, os fIlhos de pais estrangeiros emaes japonesas tambem passaram a ter 0

mesmo direito. Essa lei revisada tambem re-quer que, nesse caso, a crian9a deve escolherou desistir da nacionalidOOejaponesa ao atingir22 anos. Essas crian9as eram pejorativamentechamadas de ainoko ("mesti90"), mas hoje seusa mais 0 termo haffu (do ingles half = "me-tade"), significando "mesti90" ou "meio-japo-nes". Se antes havia urn claro desdem peloshaffu, hoje se pode dizer que 0 sentimento e decontradi9ao. Por exemplo, se urn haffu naoconsegue acompanhar 0 ritmo da escola japo-nesa, e freqiiente recorrerem ~ sua ascenden-cia estrangeira para justificar 0 fracasso, ouseja, a pessoa nao esta conseguindo acompa-nhar 0 nfvel da escola porque nao e japonespuro. Por outro 1000, 0 haffu esta surgindocomo·urn novo padrao de beleza que com~a aser reconhecido e apreciado pelos japoneses.

Existem igualmente infuneros grupos mi-noritanos estrangeiros no Japao, sendo que osprincipais sao os coreanos, os chineses e ostaiwaneses. Talvez 0 grupo mais problerru1ticoseja 0 dos coreanos. A Coreia foi governOOapelo Japao como uma de suas colllnias por 36anos, de 1910 a 1945. Nao se sabe exatamentequantos coreanos (Kankoku-jin) foram trans-feridos voluntana ou invo1untariamente para 0

Japao nesse perlodo, mas em 1945 havia porvolta de 10% da pop~ao total da Coreia vi-vendo no arquipe1ago japon&. Hoje, estima-seem aproximadamente 700 mil 0 nfunero decoreanos e descendentes no Japao. A polfticaoficial em rel~ao a essa minoria - 85% dosquais nascidos no Japao - tern mudOOodesde aSegunda Guerra, mas a discrimin~ao em rela-900 a ela ainda pode ser sentida no trabalho,na escola, no tratamento legal etc., denuncian-do uma tendencia japonesa de relegar os resi-dentes coreanos como ex-suditos (Oguri,1990).

Essas minorias nativas e estrangeiras estaomuito lentamente ganhando acei~ao no Ja-pao, mas isso se deve antes de mais nOOaapressOes internacionais e ao fato de essas mi-norias terem com~OOo a se manifestar easeorganizar. Por exemplo, os militantes mais ra-dicais dos burakumin fundaram a Liga de Li-be~ao dos Buraku; existe 0 Grupo de Co-reanos Residentes no Japao (Mindan) e aFrente Democratica dos Coreanos no Japao(Minsen); entre os ainu ha 0 grupo militanteSociedOOe Ainu Yay Yukar e a Associ~aoUtari. Ate estrangeiros mais recentes esmosentindo a necessidOOede se organizar. 0 pri-meiro sindicato de trabalhOOores fundOOoex-clusivamente por estrangeiros no Japao surgiuno come90 de 1990, liderado por seis traba-lhOOoresfilipinos. Com a ida em massa para 0Japao de descendentes de japoneses nascidosna Am6rica Latina, foi criOOoem meados de1990 0 Comire de Apoio aos TrabalhOOoresLatino- Americanos no Japao.

A conform~ao geografica do arquipe1agojapones favoreceu 0 sentimento de iso1amentoe distancia (tanto geografica quanta cultural)em rel~ao a outros parses. 0 sistema imperiale a lingua japonesa, dada a sua dificuldade deaprendizOOopor nao-japoneses, tambem con-tribufram para a unidade nacional e para 0

Page 9: DE - repositorio.unb.brrepositorio.unb.br/bitstream/10482/1607/1/ARTIGO_InternacionMinor... · Borges Pereira, Joao Jose Reis, Joel Rufino dos Santos, Juana Elbein dos Santos, Ju-lio

surgimento de uma mentalidade japonesa deserem e1es um povo separado, distinto, unicono mundo. Os dois s6culos e meio de isola-mento imposto ao pavo japones pelo governofeudal (xogunato) reforliOu essa mentalidade egerou uma sociedade altamente padronizada ealienada do convIvio internacional. Hli 80-

mente pouco mais de um seculo, 0 Japlio seabriu para 0 contato direto com outros povos.Desde entiio 0 povo japones tem sido agil eeficiente na adOl(iio da tecnologia e culturaocidentais.

Para um pars que estava praticamente fe-chadD ao contato com 0 mundo ate a segundametade do s6culo passado, ate que 0 Japlio fezmuito a myel de re~Oes internacionais e demoderniza\(iio e crescimento de sua economia.Mas ainda deixa muito a desejar no que dizrespeito as re1~ humanas. Diante das de-clara\(Oesde Nakasone, Watanabe e Kajiyama,percebe-se 0 desprezo desses l1derespelas mi-norias de outros pafses. Mas 0 que e mais gra-ve e 0 desprezo e nega\(lio das minorias inter-nas do Japiio. Ainda hli muito a ser feito pelosgrupos minoritarios nativos que lutam pelo re-conhecimento por parte do governo e da so-ciedade.3 E 0 mesmo pode ser dito com rela-liiioas minorias estrangeiras do Japiio.

Depois de tudo 0 que foi visto nos t6picosanteriores, dificilmente se pode afirmar que 0

Japiio e um pars homogeneo. Ao contrano,alem da origem etnica plural e da existencia deminorias na atualidade, ocorrem transforma-liOes imperativas no mundo e dentro da pr6-pria sociedade japonesa que estimulam a intro-dUliiio de novos estrangeiros no arquipelagojapones. A prosperidade economica do paisesta atraindo um numero cada vez maior detrabalhadores. Por outro 1ado, 0 pr6prio go-verno japones reconhece que 0 pais tem umademanda de aproximadamente dois milhoes detrabalhadores especializados (The Japan Ti-mes, 19.9.90). Ou seja, a demanda e tanto defora para dentro, quanta de dentro para fora.Outro fenomeno tambem relacionado com 0

ingresso de imigrantes no pars e 0 hanayome-

busoku ou "escassez de noivas". Hli decadas, 0

exodo de mulheres de areas rurais do Japiiotem causado um grande problema para os mo-lioSremanescentes na hora de procurarem umanoiva. A solUliiioencontrada foi a media\(iiodealgumas firmas especializadas em contatarpreteruientes da Coreia, Filipinas, Sri-Lanka eate do Brasil.

Mas, afinal, pode-se afirmar que 0 Japlio eum pals cosmopolita? Isso depende muito daperspectiva tomada. T6quio e sem duvida umagrande metr6pole que faz parte do circuitointernacional, seja financeiro, seja cultural,seja da moda. A NHK (Nippon H{\so Kyokai,rede publica de televislio e radio) ensina, pe10VIdeo, ingles, frances, alemiio, espanhol, russo,italiano, coreano e chines, 0 quedemonstraque hli pt1blico interessado em todas essas lfno.guas. Hli inumeros jornais e revistas em inglesabordando temas variados e de todas as partesdo mundo. Nas grandes cidades japonesas po-de-se deliciar pratos da cozinha de todos oscontinentes. Cada vez mais produtos estran-geiros estiio sendo consumidos no Japlio; maisjaponeses estiio viajando para 0 exterior; maisestrangeiros estiio entrando no Japlio para tra-balhar, estudar e/ou fazer turismo.

Em termos economicos, mesmo com aacusa\(iio de ser um mercado fechado, 0 Japiiopode ser considerado internacional, pois con-tinua ainda dependendo de parses produtoresde materias-primas para a indt1stria japonesa;de produtores de alimentos e manufaturadospara os seus cidadiios; de consumidores de seucapital, tecnologia e produtos manufaturados;e, mais recentemente, de fornecedores demao-de-obra. Na medida em que os interesseseconomicos japoneses ultrapassam suas fron-teiras, sua forma de relacionamento com osoutros parses deve mudar: a percePliao tradi-cional japonesa dos outros povos bem como desuas pr6prias minorias internas tende a serbastante abalada e 0 Japao deve continuar aser solicitado a respeitar as minorias de seusaliados.

Page 10: DE - repositorio.unb.brrepositorio.unb.br/bitstream/10482/1607/1/ARTIGO_InternacionMinor... · Borges Pereira, Joao Jose Reis, Joel Rufino dos Santos, Juana Elbein dos Santos, Ju-lio

No entanto, essa face do Japao modernotern uma boa por~ao de superficialidade. Em1990 a rede NHK de nidio e televisiio empre-endeu uma pesquisa para saber a opiniao dosjaponeses sobre 0 que viria a ser uma pessoainternacional ou cosmopolita (kokusai-jin).A resposta mais escolhida foi: kokusai-jin e apessoa que fala ingles. Ou seja, a n~ao decosmopolitismo ainda e bastante limitada e su-perficial. Antes de tudo, porque, mais do queuma postura ou visao de mundo, 0 cosmopoli-tismo esta reduzido ao domfnio de urn idioma- e somente urn idioma, 0 ingles; ou seja, seuma pessoa falar chines, russo ou portuguesparece nlio contar muito.

A internacion~lio e urn fenomenomundial indiscutfvel eo Japlio nao esta imunea essa tendencia. S6 que esse processo pareceestar sendo orientado por uma politica e porpoliticos que perpetuam 0 desinteresse e des-prezo pelas minorias. Por outro lado, 0 japonescomum, em sua maioria, tambem "tende a mi-nimizar a gravidade dos problemas das mino-rias. Ele esta propenso a pensar que [tais] pro-blemas estao desaparecendo e que nada precisaser feito. Conseqiientemente, ele da poucoapoio aos diversos movimentos sociais paramelhorar as condi~6es das minorias" (Befu,1971, p. 126). Por essas e outras raz6es, 0 Ja-pao esta sendo cada vez mais instigado a reco-nhecer seus grupos minoritarios e a assumir abandeira de urn cosmopolitismo mais consis-tente e verdadeiro.

As declar~Oes do ministro Kajiyama obti-veram uma resposta imediata da comunidadenegra dos Estados Unidos e abriram mais urnponto de atrito entre esses dois parceiros poll-tico-economicos. 0 ministro nao foi demitido,mas teve de se retratar e pedir desculpas ~ so-ciedade norte-americana. 0 ex-ministro daEduc~lio e atual chefe do grupo parlamentar

para quest6es raciais, Yoshiro Mori, e 0 se-cretano desse grupo parlamentar, MotojiKondo, foram enviados aos Estados Unidospara amenizar as conseqiiencias do incidenteatraves de urn encontro previsto com os par-lamentares negros e lideres da National Asso-ciation for the Advancement of Colored Peo-ple (NAACP). Enfim, 0 repl1dio foi tao grandeque ate 0 Nihon Keizai Shimbun, 0 mais res-peitado jornal economico do pafs, pediu a de-misslio do ministro. 0 governo japon&, em-bora nao tenha demitido 0 ministro, fez 0 quep&le para solucionar 0 caso.

Uma declar~lio como a de Nakasone ou deKajiyama demonstra nlio s6 0 desdem pelosgrupos minoritanos como tambem urn profun-do desconhecimento da realidade hist6rica dasminorias de outros pafses. Se os negros e his-panicos dos Estados Unidos possuem 0 padrliode vida e myel de escolaridade mais baixos dopafs nlio e porque queiram ou sejam incapazesde progredir; 0 que essa dura realidade dizmais e sobre as disparidades s6cio-economicasda sociedade norte-americana. Quando Na-kasone, Watanabe e Kajiyama fizeram aquelasdeclar~es, eles se esqueceram de que 0 Ja-plio tern uma origem plural; que ha minoriasetnicas, sociais e culturais dentro de seu pr6-prio pafs que precisam de mais apoio gover-namenta1;e que os japoneses tambem siio pas-sfveis de ser discriminados no exterior, como 0

foram os imigrantes japoneses que vieram paraas Americas.

"0 que 0 japones na rua esta pensando, se eisso 0 que esta vindo de cima?", disse 0 chefedo US Black Business Council, Albert Nel-lum, a urn jomalista do jornal japones The Ja-pan Times. Felizmente, nlio podemos generali-zar e dizer que todos os japoneses pensam co-mo alguns de seus lfderes pollticos. Ha pessoasno Japlio que, mesmo nlio fazendo parte degrupos minoritarios, estlio preocupadas comas minorias e trabalham para 0 melhor enten-dimento entre os povos. Urn exemplo disso e afamilia Arita, da cidade de Sakai (provfnciade Osaka), que convidou 0 quinteto Roberts'

Page 11: DE - repositorio.unb.brrepositorio.unb.br/bitstream/10482/1607/1/ARTIGO_InternacionMinor... · Borges Pereira, Joao Jose Reis, Joel Rufino dos Santos, Juana Elbein dos Santos, Ju-lio

Revival, da igreja cat6lica Saint Augustine, deWashington D.C., para uma serie de concertosno Japllo logo ap6s 0 incidente com 0 ministroKajiyama. Os concertos faziam parte de umacampanha de dois anos empreendida pelo gru-po de 60 pessoas lideradas pela famflia Aritapara acabar com a discrimin~lio contra os ne-gros no Japlio (Shibazaki, 1990). Sao essaspessoas que nos dlio a certezade que a elimi-~00 dos estere6tipos e discrimin~Oes no Ja-plio esta em andamento.

Por fim, resta afmnar que 0 etnocentrismoacompanha a grande maioria das sociedadeshumanas e que 0 racismo nlio e privilegio dosjaponeses. 0 tabu do racismo esta presentemesmo em n~Oes como 0 Brasil, que cultiva 0

mito de ser uma "democracia racial". S6 queno Japao 0 debate em tome das minorias e re-

cente tanto quanta urgente. E esse debate sur-ge no contexto do processo de intemacionali-z~ao da sociedade japonesa. 4 Dado 0 seu sta-tus de pot:encia mundial, 0 Japao tem uma ne-cessidade muito grande de promover 0 reco-nhecimento e convivencia pacIfica com a di-versidade social e cultural, tanto dentro desuas fronteiras quanta a myel intemacional.Ate recentemente, os japoneses puderamalentar a ilusiio de formarem uma n~ao etni-camente homogenea; no entanto, 0 confrontocom a realidade de pertencer a uma n~aomultirracial, adicionado a mudanc;as queocorrem no mundo e no pr6prio Japao, podeacelerar 0 processo irreversfvel de intemacio-naliz~lio da sociedade japonesa. Nesse pro-cesso, e natural que venham A tona dec~Oespolemicas como a do ministro Kajiyama.

1. A decl~ao do ministro apareceu no Asahi Evening News (29.9.90), da seguinte forma: "Kajiyama saidprostitutes settling in a neighborhood spoil its atmosphere, ••..like in America when neighborhoods become mi-xed because blacks move in, and whites are forced out' ."

2. A re~lio entre japoneses (nihon-jin) e estrangeiros (gai-jin) mereceria outro artigo. Gostaria apenas de ci-tar um caso verfdico para ilustrar qulio forte era a distinglio dessas duas categorias sociais na cabega de um japo-nes a~ recentemente. Jared Taylor (1986, p. 30), um norte-americano que nasceu e passou seus 16 primeirosanos no Japlio, relata uma curiosa conversa que manteve com "uma japonesa de meia-idade" sobre casamentoentre norte-americanos e japoneses:"- Sempre me surpreendeu 0 fato desses casais poderem ter filhos - disse-me ela."-0que voce quer dizer? - indaguei."- Os pais siio tlio diferentes fisicamente. Al6m disso, os japoneses tem a temperatura do corpo mais baixa e urnperfodo de gestaglio mais longo que 0 dos ocidentais. Realmente, 6 de causar espanto que eles possam ter filhosdoces assim:'

3. 0 govemo da provfncia de Hokkaid6 fez uma pesquisa com 300 famfiias ainu e constatou que, em 1984, arenda per capita anual dos ainu era de 800 mil ienes, 0 que correspondia a menos da metade da renda m6dia emHokkaid6 para 0 mesmo perfodo, a qual era de 1.900 mil ienes. Al6m disso, somente 78,4,* dos jovens ainu in-gressavam no 22 grau escolar, enquanto a m6dia na provincia era de 94'*; e somente 8,1'* desses jovens prosse-guiam a~ a universidade (The Japan Times, 8.11.86). Ou seja, a existencia dos ainu 6 um fato indiscutfvel, assimcomo a discriminagao social sofrida por eles.

4. Nos ultimos 20 anos, kokusai-ka ("intemacionalizaglio") e,kokusai-jin ("pessoa intemacional ou cosmopo-lita") silo termos cada vez mais presentes na mfdia e na vida dos japoneses. Embora apresente limimg6es, a in-temacionalizagao 6 um processo em andamento no Japao. Tanto 0 govemo (central, provincial e municipal)quanto entidades sociais tem feito contribui<;6esa esse processo. Para citar apenas alguns exemplos, em 1972 foicriada a Fundaglio Japao, para promover 0 intercambio cultural e academico entre 0 Japlio e os demais parses.

Page 12: DE - repositorio.unb.brrepositorio.unb.br/bitstream/10482/1607/1/ARTIGO_InternacionMinor... · Borges Pereira, Joao Jose Reis, Joel Rufino dos Santos, Juana Elbein dos Santos, Ju-lio

InI1merasprovfncias patrocinam anualmente um programa em que estudantes estrangeiros passaro em tomo de 5a 15 dias morando com famfiias japonesas (Homu sutei puroguramu, do ingl& Home-stay program). Algumasprefeituras publicam livros em ingl& para a orien~lio de residentes estrangeiros e oferecem ajuda financeira aestudantes estrangeiros sem bolsa de estudo.

ASAHI EVENING NEWS. "Demonstrators want corporate Japan to pay for insulting American blacks",29.9.90.

BEFU, Harumi JAPAN: an antlwpological introduction. San FranciscolScrantonILondreslToronto, Chandler Pu-blishing,1971.

HORI, Icbiro. Folk religion in Japan: continuity and change.ChicagolLondres, The Univ. of Chicago Press, 1969(r!ed., 1968).

LEONEL, JWria.Brief considerations about buraku discriminated reality in Japan: in a minority perspective. Osa-ka, monografia in6di.ta, 1986.

OGURI, Keitar6. "Resident Koreans are native speakers too". Japan Quarterly, outubro-dezembro, 1990, p.424-31.

PRICE, John. "A history of the outcaste: untouchability in Japan". Japan's invisible race: caste in culture andpersonality. Ed. por George de Vos e Hiroshi Wagatsuma. BerkeleylLos Angeles, Univ. of California Press,1967,p.6-30.

SHIBAZAKI, Tomoko. "Family spotlights ignorance of society as the gospel truth about discrimination". TheJapan Times, 16.10.90.

TAYLOR, Jared. Shadows of the rising sun: a critical uiew of the "Japanese miracle". T6quio, Charles E. TuttleCo., 1986 (l"!edi~o do autor, 1983; l!edi~lio da Tuttle, 1985)

THE JAPAN TIMES. "Ainu face discrimination in all areas of society", 8.11.86; "Nearly 2 million skilled wor-kers needed". 19.9.90.

In September 1990, the recently-appointed Japa-nese Minister of Justice, Seiroku Kajiyama, after ta-king part in a national antiprostitution campaign,drew an analogy between prostitutes and Americanblacks, saying that both of them lower the tone of theneighbourhoods where they live or work. This re-mark, widely reported by the media, provoked pro-tests inside the country and abroad. In this article, the"Kajiyama case" is placed in the context of Japanesehistory. from earliest times up to the present day. Ja-

pan has multi-ethnic origins, and is a multi-racialcountry, although one of the major challenges it pre-sently faces is the recognition, both officially and so-cially, of its ethnic minorities, and the solution ofthespecific problems of these minority groups. The"Kajiyama case" is seen as reflecting the internalcontradiction of Japanese society, an inherent part ofthe inevitable and necessary process of the intematio-nalisation of any contemporary country, and espe-cially a country which is a major power.

Page 13: DE - repositorio.unb.brrepositorio.unb.br/bitstream/10482/1607/1/ARTIGO_InternacionMinor... · Borges Pereira, Joao Jose Reis, Joel Rufino dos Santos, Juana Elbein dos Santos, Ju-lio

En septembre 1990, apres avoir accompagne uneoperation de repression a la prostitution, et peu apressa prise de pouvoir, Ie ministre japonais de la justice,Seiroku Kajiyama, etablit une analogie entre les noirset les prosti~u6es.Tous deux provoquaient, selon lui,une devalorisation de leur voisinage ou de leur lieu detravail. Cette analogie fut amplement divulgu6e parles media et suscita des protestations aussi bien au Ja-pon qu'a I'etranger. Cet essai presente une analyse du"cas Kajiyama" dans Ie contexte de l'histoire japo-naise des origines a nos jours. Le Japon a une origineethnique plurielle. II s'agit aiJssi d'un pays multira-

cial. Neanmoins, l'un des plus grands defis auxquels ildoit faire face actuellement est celui-ci: la reconnais-sance officielle et sociale des minorites ethniques, so-ciales et culturelles, ainsi que la resolution des pro-bl~mes propres a ces groupes minoritaires. Le "casKajiyama" est, a ce qu'il semble, un reflexe de lacontradiction interne de la societe japonaise, inherenteau processus d'intemationalisation auquel tout payscontemporain - particuli~rement quand il s'agit d'unepuissance de premi~re grandeur - doit inevitablementet n6cessairement faire face.