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DAS LUTAS INGLÓRIAS ÀS POLÍTICAS EDUCATIVAS DE AÇÕES

AFIRMATIVAS: A FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES E

PROFESSORAS COMO PRÁTICAS DE VIDA

Fábio Luiz Alves de Amorim1

Janete Magalhães Carvalho2

Universidade Federal do Espírito Santo

Eixo 3 – Formação de Professores e Trabalho Docente

Categoria: Pôster

1 – INTRODUÇÃO

Iniciativas diversas têm se efetivado no cenário educacional no que diz respeito às ações

afirmativas articuladas à formação continuada de professores/as, bem como o papel dos fóruns

nesse processo. A participação da sociedade nos fóruns se intensificou a partir das deliberações

da CONAE/2010,3 que impulsionou a instituição do Fórum Nacional de Educação por meio da

Portaria nº. 1407, de 14/12/2010, do Ministério de Estado da Educação – MEC que considerou a

necessidade de traduzir, no conjunto de suas ações, políticas educacionais que garantissem à

democratização da gestão e da qualidade social da educação.

A importância do Plano Nacional de Educação, sua abrangência e complexidade, abarcam

estudos e um indispensável aprofundamento temático devido à trajetória socioeconômica do

país, marcada por fortes desigualdades sociais e regionais. Nesse sentido, nos debates

fomentados na CONAE/2010, mesmo que em processo de tramitação, e o papel cada vez mais

relevante da educação tomada como uma política pública tem sido, de alguma forma, vinculada

à busca por justiça social, por meio de ações afirmativas para a diminuição das desigualdades

acumuladas ao largo da história, pela garantia de igualdade de oportunidades, na tentativa de

contrapesar perdas derivadas da marginalização e marcadas por motivos étnicos, religiosos e de

gênero.

Pautar as políticas educativas de ações afirmativas nas escolas e, especificamente na formação

continuada de professores/as, parte da noção de que a unidade escolar além de espaço de ensino

1 Doutorando no Programa de Pós-Graduação em Educação – Centro de Educação da Universidade

Federal do Espírito Santo. 2 Professora Doutora do Programa de Pós-Graduação em Educação – Centro de Educação da

Universidade Federal do Espírito Santo. 3 CONFERÊNCIA NACIONAL DE EDUCAÇÃO – Brasília/2010 – cujo tema para reflexões, debates e

proposições para o Plano Nacional de Educação (2011-2020) era “Construindo o Sistema Nacional Articulado de Educação: O Plano Nacional de Educação, Diretrizes e Estratégias”.

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é antes de tudo de promoção de justiça social. Noção essa que “[...] se evidencia nas políticas

educativas adotadas em nível internacional, em diferentes países e continentes, atribuindo à

escola funções sociais, muitas vezes de caráter assistencial” (OLIVEIRA, 2009, p. 17).

O tema referente às políticas de ações afirmativas, tem sido foco de muitos debates nas redes e

sistemas de ensino, seja pela formalidade da legislação ou pela via da atuação dos fóruns em

busca da garantia e do direito à educação pelas minorias. A Secretaria de Estado da Educação

tem assento em todos os fóruns ligados à educação, seus representantes têm o papel de articular

às políticas educacionais em atendimento às demandas relativas a cada especificidade. Tomando

como base a formação continuada de professores/as, como uma das possibilidades de garantir a

promoção e igualdade social, torna-se imprescindível a participação desses sujeitos no debate,

considerando a formação sociopolítica e econômico-cultural, bem como as características atuais

da educação no Brasil.

Segundo Linhares (2009), desde o Governo Lula tem-se atentado para essas questões e as

políticas sociais e educacionais têm dado sinais de que antigos problemas da educação e da

escola sempre estiveram em foco. Porém, ressalta a autora, não podemos fingir desconhecer que

a potência das estruturas seculares de opressão ainda está presente e não deixa abater por

medidas pontuais e lineares.

Os princípios norteadores do Currículo Básico da Escola Estadual (CBEE, 2009), representam a

base da política educacional de escolarização de crianças, jovens e adultos. Esses princípios

buscam tornar o estudante como foco de todo o processo educativo. Nesse sentido, o currículo

da rede estadual pressupõe a ação educativa norteada pelos seguintes princípios: a)Valorização

e afirmação da vida, entendendo a vida como dimensão integradora das relações na escola e,

em sua fragilidade, exige autocuidado e o respeito ao outro; b) O reconhecimento da

diversidade na formação humana, ou seja, pelo reconhecimento da diversidade como traço da

realidade social, apresentando a diversidade como princípio norteador de uma proposta

curricular que implica em compreender o processo de formação humana, que se realiza em um

contexto histórico, social, cultural e político; c) A educação como bem público, concebendo a

escola pública com o compromisso social, espaço de visibilidade, onde liberdade com

responsabilidade legitima a participação de todos e de cada um; d) A aprendizagem como

direito do educando, no direito de aprender se insere o direito a um ambiente e contextos de

aprendizagens adequados às necessidades e expectativas dos/as estudantes, em que a prática

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educativa seja sustentada por um currículo aberto à vida e que promova a conquista da

autonomia intelectual do sujeito.

A proposta assumida pela SEDU, no CBEE (2009), tem como eixos estruturantes a ciência, a

cultura e o trabalho, que consta no referido documento, como projeto educacional cuja

formação humana promova a construção do conhecimento, a partir dos princípios trabalho,

ciência e cultura, em um movimento permanente de inovação do mundo material e social em

que estamos inseridos.

Percebe-se que os documentos orientadores pressupõem ações que versam o respeito à diferença

e a busca por uma educação pautada na dignidade humana, objetivando o protagonismo dos/as

estudantes em seu processo formação. Contrastando ao que orienta o CBEE (2009), percebe-se

também, que os processos de formação continuada de professores/as não atendem a essas

demandas, os princípios que são norteadores e eixos que são estruturantes não conseguem

atravessar a realidade no/do cotidiano nas/das escolas.

No mapeamento feito na pesquisa de mestrado, observamos que os processos de formação

continuada, são vistos, em boa parte, como possibilidades de ação na busca pela “[...] melhoria

educacional em várias frentes, estabelecendo-se uma interdependência político-pedagógica não

só na gestão da escola, mas também na gestão de políticas mais amplas de formação

continuada” (AMORIM, 2010, p. 120). As possibilidades de formações em seminários,

congressos e/ou em cursos de especialização organizados por instituições públicas ou privadas

nas áreas das temáticas da diversidade (Educação para as Relações Étnico-Raciais, Educação

Ambiental e Direitos Humanos), bem como nas modalidades educacionais são inúmeras, porém,

nota-se que de certa forma os/as profissionais envolvidos têm perfil de militância nas questões

que são, ou deveriam ser, atravessadas nas diversas áreas do conhecimento.

No transcorrer da pesquisa citada, foram apontadas também as dificuldades de compreensão das

dimensões políticas/pedagógicas da formação continuada pelos sujeitos da escola, “[...] o que

nos faz refletir sobre os formatos, a abrangência, a burocracia e o atendimento às políticas

ditadas pela lógica neoliberal, perceptíveis nos programas e projetos de formação continuada”

(AMORIM, 2010, p.121). Contudo, em nossas análises, indagamos sobre a possibilidade de

relações solidárias entre os sujeitos da escola, por meio das quais se formam comunidades

tecidas em redes de subjetividades compartilhadas como comunidades

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heterológicas/interpretativas (CARVALHO, 2009) “que tornam possíveis as negociações para

concretização dos processos de formação continuada” (AMORIM, 2010, p. 119).

Nesse sentido, foram problematizadas as implicações e os desafios em torno da formação

continuada, o que não teve pretensão de esgotar as possibilidades de compreensão desses

processos de formação, permitindo ampliar o diálogo com os múltiplos sujeitos da escola.

Assim, diante dos questionamentos emergidos a partir das pistas fornecidas na pesquisa de

mestrado, a pretensão se constitui em buscar a “[...] potência das redes de conversações das

relações praticaspolíticas que articulam a constituição nos currículos” (FERRAÇO;

CARVALHO, 2012, p. 3).

Nessa perspectiva, busco compreender a produção do currículo escolar a partir das

possibilidades de conhecimento, o que significa ampliar as redes de conversações e ações

(CARVALHO, 2011), formadas a partir de “[...] um número ilimitado de modelos de ordem,

cada qual gerado por seu conjunto relativamente autônomo de práticas” (BAUMAN, 2010, p.

19), que possivelmente podem se constituir em momentos potenciais de formação continuada

para os/as professores/as.

2 – REFERENCIAL TEÓRICO

As reflexões propostas neste estudo configuram-se, como nos auxilia Linhares (2009), ao inferir

a respeito do tempo que vivemos com suas inseguranças, dúvidas, polêmicas e ambivalências.

Segundo a autora esse processo vem crescendo freneticamente, embaralhando as fronteiras entre

acertos e erros, entre relatividades crescentes e dogmatismos sem medida, o que faz com que

conviver seja também confrontar medos e esperanças, não podemos deixar de apontar uma

quase unanimidade quando se trata de afirmar a relevância escolar.

De acordo com Linhares (2009), se esta unanimidade em torno da escola expressa um desejo,

que vem se expandindo, arraigado no imaginário social e, que vem por isso mesmo, sendo

aproveitada para produzir um discurso concordante, que opera na direção de acelerar as ações

imediatistas da escola, atropelando as criações, os entendimentos de outro tipo, nos desafios

deste tempo que nos constitui e que aceita reproduções de modelos.

Para este estudo é preciso considerar as possíveis convergências/divergências entre os

participantes do processo educativo, no que se refere aos modos e formas como compreendem e

praticam a educação e os processos de aquisição de conhecimentos, bem como as práticas

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cotidianas desenvolvidas por esses praticantes (CERTEAU, 1994), em especial, as questões

ligadas às políticas de formação continuada. Por conseguinte, ampliar as vozes dos praticantes,

potencializando os saberes e fazeres nas tantas e tão diferentes histórias vividas, das “artes de

fazer” (CERTEAU, 1994) cotidianamente, nas escolas. Para tanto, é preciso identificar os/as

professores/as, na diversidade de suas vivências no cotidiano, como sujeito e praticante que cria

com aquilo que recebe e não, exclusivamente, como um ser passivo. Isso exige estudá-lo no

contexto das diversas práticas culturais e sociais das quais faz parte, num atravessamento de

múltiplas e complexas relações.

Nesse sentido, faz-se necessário potencializar as práticas dos/das professores/as, buscando

compreendê-las e estudá-las a partir de suas manifestações cotidianas escolares, de suas

experiências, lembradas e contadas, no local onde são reproduzidos, transmitidos e criados

valores nas inúmeras relações que mantêm com a escola nas “[...] novas formas de comunidade

e que, nesse sentido, podem potencializar o cotidiano escolar produzindo bons encontros”

(CARVALHO, 2011, p. 104).

Nesse esforço reflexivo, Ferraço e Carvalho (2012) auxiliam apontando a potência política das

conversações e/ou narrativas, destacando a concepção de currículo como redes de conversações

que criam novas formas de comunalidade expansiva, o que pressupõem admitir a ideia de

“potência de ação coletiva”.

[...] pensar o currículo como conversação complexa e como políticas da

narratividade, em especial, considerando as redes de sociabilidade que

atravessam a escola.

Desse modo, o currículo, como conversações em políticas da narratividade,

envolve uma compreensão de currículo que potencializa o estabelecimento

de “zonas de comunidade” de modo a permitir a construção do coletivo

como comunalidade expansiva. Sendo assim, na prática, o que tende a

ocorrer e o que necessitamos buscar? Ir além, não mais procurar o que o

outro se assemelha a nós, mas o que no outro é irredutível, ou seja, sua

diferença absoluta, sua singularidade radical.

Por fim, busca produzir deslizamento de saberes, fazeres, afetos e poderes

para a formação de outro modo de produção de políticas de

compartilhamento do espaço público: de modo público, valorizando as

diferentes vozes que sinfônica e caoticamente compõem o mosaico de

conhecimentos, linguagens, afetos e poderes que constituem os currículos

escolares (FERRAÇO; CARVALHO, 2012, p. 14).

A partir das ponderações de Ferraço e Carvalho (2012), ampliamos o diálogo às reflexões de

Bauman (2000, 2003, 2009, 2010, 2011a, 2011b, 2012), que trazem aspectos atuais da

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sociedade, os quais segundo o autor, incidem em um mundo fragmentado associado à escassez

de atenção, em particular as questões do humano, da vida e suas relações.

No pensamento de Bauman (2009, 2011b), encontramos suporte para questões e reflexões a

respeito da vida, ao compará-la a uma obra de arte, na qual podemos fazer escolhas, pois,

segundo o autor, a vida humana consiste num confronto eterno entre as “condições externas”.

[...] (percebidas como “realidade”, por definição um assunto sempre

resistente, e muitas vezes desafiador, à vontade do agente) e designa seus

autores/atores: seu propósito de superar a resistência, o desafio e/ou inércia,

ativos ou passivos, da matéria e reconstruir a realidade de acordo com a

[vida] que escolheram.

Para Bauman (2011a), o mundo o qual chama de „líquido moderno‟ traduz o eu, os outros, os

prováveis, compartilhamos esse mundo de incertezas, mas que “é nosso lar, nós, seus

moradores, planejadores, atores, usuários e vítimas, devemos estar sempre prontos a mudar:

todos precisam ser [...] flexíveis” (BAUMAN, 2011a, p. 8).

Com base nessas reflexões, buscamos analisar e compreender a vida a partir da visão pela qual,

em princípio pós-moderna, “[...] a de um número ilimitado de modelos de ordem, cada qual

gerado por um conjunto relativamente autônomo de práticas. A ordem não precede as práticas e,

por conseguinte, não pode servir como medida externa de validade” (BAUMAN, 2010, p. 19).

Os vários modelos de ordem só tem significado em termos das práticas que os validam.

Nesse sentido, a validação introduz critérios que são desenvolvidos, segundo Bauman (2010),

no interior de uma tradição particular e são sustentados pelos hábitos e crenças de uma

“comunidade de significados” e não admitem outros testes de legitimidade. Os critérios, os

quais são descritos como “modernos” não é exceção a essa regra geral, pois são validados por

muitas possíveis “tradições locais”, o que incide em seu destino histórico e dependente da

tradição nas quais residem. “Se, de um ponto de vista moderno, o relativismo era um problema

com que lidar e afinal superar na teoria e na prática, do ponto de vista pós-moderno, a

relatividade do conhecimento (isto é, sua „inserção‟ na própria tradição sustenta em comum) é

um traço duradouro do mundo” (BAUMAN, 2010, p. 19).

Bauman (2010) caracteriza a estratégia moderna de trabalho intelectual pela metáfora do papel

do “legislador”, ou seja, o que faz afirmações autorizadas e autoritárias que arbitrem

controvérsias de opiniões e escolham aquelas que, uma vez selecionada, tornem-se correta e

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associativa. Contrapondo a essa, o autor caracteriza a estratégia pós-moderna de trabalho

intelectual pela metáfora do papel do “intérprete”, o que traduz afirmações feitas no interior de

uma tradição baseada em termos comunais, “[...] a fim de que sejam compreendidas no interior

de um sistema de conhecimento fundamentado em outra tradição” (BAUMAN, 2010, p. 20). É

importante entender que Bauman (2010), adverte que a estratégia pós-moderna não implica a

eliminação da moderna; ao contrário, considera que só pode ser concebida a partir da

continuação desta última.

O sentido de dar luz, ou seja, glórias às lutas inglórias, das quais emergem as políticas

educativas de ações afirmativas, consiste em buscar estratégias que ultrapassem a dimensão

individual. É como afirma Bauman (2010). É preciso encontrar diferentes discursos que

extrapolem a lógica determinista, ou que, de forma individual, encontremos soluções para

problemas vividos no coletivo. Assim, pesquisar a produção do currículo escolar, as práticas e

o cotidiano, significa reconhecer e acompanhar movimentos que vão “[...] transformando a

cultura escolar, fortalecendo a criação coletiva e individual e individual, ou seja, questionar os

„possíveis‟ do coletivo inseridos no cotidiano escolar, para que se constituam nas dimensões

pessoal, profissional e coletiva de forma processual e relacional” ( FERRAÇO; CARVALHO,

2012, p. 14).

3 - OBJETIVOS

Compreender as práticas de professores/as nas unidades escolares estaduais na abordagem

das temáticas da diversidade;

Investigar a produção do currículo escolar da rede estadual a partir das possibilidades de

conhecimento, buscando a ampliação das redes de conversações e ações;

Articular documentos orientadores e as produções nas práticas dos/as professores/as nas

escolas estaduais, buscando compreender a configuração do cotidiano escolar;

Compreender as implicações dos debates nos planejamentos coletivos na formação de

professores/as nas escolas da rede estadual de ensino.

4 – METODOLOGIA E DESENVOLVIMENTO

Para compreender a produção do currículo escolar a partir das possibilidades de conhecimento,

o que segundo Ferraço e Carvalho (2012), significa ampliar as redes de conversações e ações, é

preciso entender as praticasteóricas curriculares cotidianas como políticas de currículo o que

“[...] implica não só questionar algumas dicotomias herdadas pela Educação no discurso

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hegemônico da ciência moderna, [...] mas, sobretudo, colocar sob suspeita toda e qualquer

proposta de fazer com que a prática se torne política” (FERRAÇO; CARVALHO, 2012, p. 9),

que pode compor tecidos potentes vivenciados em processos de formação continuada dos/as

professores/as no cotidiano escolar.

Lopes e Macedo (2011) ao apresentarem uma análise em torno da Prática e o Cotidiano, inferem

que a escolarização só faz sentido na medida em que constrói condições para que os sujeitos

possam resolver problemas sociais. Identificam o mundo concreto de um lado, especialmente o

mercado de trabalho, o que define as metas educacionais e, por outro, a luta por aferir eficiência

e racionalidade às decisões curriculares seria uma forma de legitimação que tem a prática por

referência.

Pérez (2003) aponta que a complexidade das questões contemporâneas nos coloca diante do

desafio de tecer outras configurações teórico-metodológicas tanto para pesquisa em educação,

quanto para a formação inicial e continuada de professores/as. Nesse sentido, é preciso olhar o

cotidiano como território complexo que nos desafia a exercitar outras formas de enxergar as

diferentes realidades produzidas nos espaços-tempos escolares.

Os estudos nos/dos/com os cotidianos, possivelmente tem como aspecto relevante a sua recusa

em lidar com a separação entre escola e os demais contextos de vida dos sujeitos. Dessa forma,

“[...] operam com a interpretação dos múltiplos contextos habitados pelos sujeitos numa

tessitura complexa, denominada redes de conhecimentos e práticas, que ocorre em muitos

espaçostempos” (LOPES; MACEDO, 2011, p. 159).

Nessa perspectiva, o desenho teórico-metodológico proposto para esta pesquisa, inspira-se na

prática do estudo de caso, pressupondo trabalhar o currículo escolar com o cotidiano em direção

à constituição do comum, o que tange a inseparabilidade entre conversações e narrativas

provenientes de diferentes contextos de produção das praticasteóricas curriculares que “[...]

envolvem os projetos e propostas curriculares „oficiais‟ e as narrativas curriculares produzidas

no cotidiano, nas condições concretas de sua realização” (FERRAÇO; CARVALHO, 2012, p.

10). O que implica assumir os cotidianos escolares a partir das redes de relações que são tecidas

e partilhadas, incluindo tanto os usos quanto as negociações, traduções e hibridizações que se

enredam nas redes de conhecimento.

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Dessa maneira, a importância de considerar os documentos oficiais, ou seja, as prescrições, está

na problematização dos mesmos, desconstruindo a ideia de currículo como documento oficial e

ampliando-o com a noção de currículo em redes de saberes, fazeres e poderes, “[...] que se

manifestam em conversações, narrativas e ações tecidas e compartilhadas nos cotidianos

escolares, que não se limitam a esses cotidianos, mas prolongam para além deles, enredando

diferentes contextos vividos pelos sujeitos praticantes” (FERRAÇO; CARVALHO, 2012, p.

10).

Diante do exposto, busco a potencialidade das praticasteóricas dos sujeitos praticantes em seus

mais variados cotidianos, por meio das conversações e narrativas produzidas em sua

contemporaneidade e em meio às redes de conhecimentos estabelecidas nos diálogos/encontros

dos/com os múltiplos sujeitos na constituição dos possíveis em processos de formação

continuada dialogada e vivida na ação pedagógica desenvolvida nas escolas.

5 – CONCLUSÕES PARCIAIS

Os resultados parciais apontam para ações fragmentadas e ações isoladas de formação

continuada de professores. Nesse sentido, configura-se em práticas de formação para a diferença

mais no intuito de atendimento legislativo que na constituição de processos de respeito às

diferenças no cotidiano da escola. É importante ressaltar, que em momentos de planejamento e

de debates no coletivo escolar o tema diferença não é contemplado.

6 - REFERÊNCIAS

AMORIM, Fábio L. A. Dimensões políticas/pedagógicas em percursos negociados da formação

continuada de professores e professoras nas escolas. Dissertação (Mestrado) – Universidade

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