dança à mineira

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DOMINGO Caderno2 Edição de Esportes ATLETISMO EM CRISE É grande o risco de o Brasil não ganhar uma só medalha na Olimpíada do Rio. PÁG. D6 DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO DANÇA À MINEIRA Grupo Corpo celebra 40 anos com estreia de Suíte Branca e Dança Sinfônica Haddad executa 6,5% de gastos na saúde C alais, na França, é o novo símbolo da explosão mi- gratória que desafia a Eu- ropa, informa Andrei Netto, dire- tamente do “new jungle”, campo de refugiados no coração do con- tinente. INTERNACIONAL / PÁG. A12 23H30 JULIO MESQUITA (1862 - 1927) SP irregular. Construções à beira da Represa Billings: faltam obras para preservar e despoluir reservatórios Tempo em SP 27 Máx. 13° Mín. O LADO SOMBRA Migração ilegal FOTOS JOSE LUIZ PEDERNEIRAS Casa Casa Planalto aposta no Senado para barrar crise política Governo põe ministros e líderes petistas para tentar melhorar relação com Renan Calheiros após recesso Cuidado com o sócio O empreendedor muitas vezes es- quece que sócio não pode ser man- dado embora. Uma briga desse tipo pode ficar anos na Justiça. ECONOMIA / PÁG. B11 Os sete compromissos firmados pelo prefeito Fernando Haddad (PT) no Plano de Metas para a área da saúde consumiriam, nos quatro anos de mandato, cerca de R$ 1,6 bilhão. Até agora, somente R$ 108,9 milhões, ou 6,5% do total, foram gastos. Na educa- ção seriam 20 Centros Educacionais Unificados (CEUs) até o fim de 2016. Mas, por enquanto, foi entregue ape- nas o de Heliópolis. Já no Programa Mananciais não há sinal de obras. METRÓPOLE / PÁGS. A18, A21 e A22 ‘ESSE PT CHEGOU AO FIM DO CICLO’ José Alexandre Scheinkman. ‘Não podemos ficar paralisados. Brasil precisa retomar ambição de longo prazo.’ PÁG. B5 Beatriz Accioly mostra dubiedade da internet na violência contra a mulher. “Ao julgarmos a mulher, dizemos que é culpada.” NOVA SELVA FRANCESA Aluno de universidade ainda patina no inglês METRÓPOLE / PÁG. A26 Palmeiras lota arena contra o Atlético-PR EDIÇÃO DE ESPORTES / PÁG. D1 Cara do lugar. Casas de Rio e BH mostram diferentes estilos Empresas nacionais endividadas em moeda estrangeira estão em alerta. Além do aumento do dólar e do custo de captações no exterior, a deterioração da economia dificulta a rolagem de dívi- das. Desde 2008, a dívida externa subiu 75%, para US$ 348 bilhões. A parcela da iniciativa privada representou 61% do total e cresceu 130%. ECONOMIA / PÁG. B1 Dívida em dólar de empresas cresce 130% l Câmara vai interpelar advogada Eduardo Cunha (PMDB-RJ) anunciou que a advogada Beatriz Catta Preta será interpelada judicialmente para esclarecer acusação de que foi ameaçada por integrantes da CPI da Petrobrás. PÁG. A7 Tratadopelo Planalto como peça-chave paraimpediroagravamentodacrisepo- lítica, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), tem sinalizado quepodevoltaracolaborarcomogover- no Dilma Rousseff a partir desta sema- na, na volta do recesso parlamentar. Mas cobrará “faturas” nas áreas política e econômica em troca da ajuda. Há duas semanas, logo após o anúncio do rompi- mentodopresidente da Câmara, Eduar- do Cunha (PMDB-RJ), o governo deci- diu reforçar operação envolvendo mi- nistros e lideranças petistas para corte- jar Renan. O objetivo é recriar a relação do primeiro mandato, quando ele foi o principal interlocutor do governo no Congresso. O afastamento ocorreu na esteira da Lava Jato. Nos bastidores, Re- nan acusa o Planalto de ter atuado para incluí-lo entre os investigados. Dilma tambémtentaneutralizarefeitosdepro- vável decisão desfavorável do TCU no julgamento das contas. POLÍTICA / PÁG. A4 FUNDADO EM 1875 l Entrevistas Multimídia. Veja infográficos e assista aos vídeos em estadao.com.br/e/metasp A rticuladorpolíticodeumafren- te nacional de esquerda, Tarso Genro disse a Vera Rosa que o PSDB ou mesmo o PMDB pode ven- cer a eleição presidencial de 2018, se o governo Dilma Rousseff não mudar sua política econômica nem fizer as pazescomsuabasesocialecomaclas- se média. POLÍTICA / PÁG. A6 Entrevista Tarso Genro EX-GOVERNADOR DO RIO GRANDE DO SUL Somos todos É sempre mais fácil dizer que os ou- tros estão errados e prejudicando o bom andamento do mundo do que localizar em nós os pontos negativos. CADERNO2 / PÁG. C4 ANDREI NETTO/ESTADÃO Afegãos. Bahadel e Kabil 6 Antônio Delfim Netto. ‘Dilma preci- sa assumir o protagonismo, tem de en- frentar o panelaço que lhe cabe.’ PÁG. B4 RENATO CRUZ NOTAS & INFORMAÇÕES A desconfiança como legado A responsabilidade pelo descrédito nos políticos não pode ser debitada somente a Dilma Rousseff. PÁG. A3 Sol. Dia seco. Pág. A26 FERNANDO HENRIQUE Lobo ou cordeiro? Será que é tempo de rezar pela sorte de setores empresariais e políticos? A hora para agir já não é mais do Con- gresso e dos partidos, mas da Justiça. ESPAÇO ABERTO / PÁG. A2 Esta publicação é impressa em papel certificado FSC® garantia de manejo florestal responsável, pela S. A. O Estado de S. Paulo FÁBIO PORCHAT 2 DE AGOSTO DE 2015 R$ 6,00 ANO 136 Nº 44483 EDIÇÃO DE estadão.com.br

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Page 1: Dança à mineira

DOMINGOCaderno2Edição de

EsportesATLETISMOEM CRISEÉ grande o risco deo Brasil não ganharuma só medalha naOlimpíada do Rio. PÁG. D6

DANIEL TEIXEIRA/ESTADÃO

DANÇAÀ MINEIRAGrupo Corpo celebra40 anos com estreiade Suíte Brancae Dança Sinfônica

Haddad executa 6,5% de gastos na saúde

C alais, na França, é o novosímbolo da explosão mi-gratória que desafia a Eu-

ropa, informa Andrei Netto, dire-tamente do “new jungle”, campode refugiados no coração do con-tinente. INTERNACIONAL / PÁG. A12

23H30

JULIO MESQUITA(1862 - 1927)

SP irregular. Construções à beira da Represa Billings: faltam obras para preservar e despoluir reservatórios

Tempo em SP

27 Máx. 13° Mín.

O LADO SOMBRA

Migração ilegal

FOT

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S

CasaCasa

Planalto aposta no Senadopara barrar crise políticaGoverno põe ministros e líderes petistas para tentar melhorar relação com Renan Calheiros após recesso

Cuidado com o sócioO empreendedor muitas vezes es-quece que sócio não pode ser man-dado embora. Uma briga desse tipopode ficar anos na Justiça.ECONOMIA / PÁG. B11

Os sete compromissos firmados peloprefeito Fernando Haddad (PT) noPlano de Metas para a área da saúdeconsumiriam, nos quatro anos demandato, cerca de R$ 1,6 bilhão. Até

agora, somente R$ 108,9 milhões, ou6,5% do total, foram gastos. Na educa-ção seriam 20 Centros EducacionaisUnificados (CEUs) até o fim de 2016.Mas, por enquanto, foi entregue ape-

nas o de Heliópolis. Já no ProgramaMananciais não há sinal de obras.METRÓPOLE / PÁGS. A18, A21 e A22

‘ESSE PTCHEGOU AOFIM DO CICLO’

José Alexandre Scheinkman. ‘Nãopodemos ficar paralisados. Brasil precisaretomar ambição de longo prazo.’ PÁG. B5

Beatriz Accioly mostradubiedade da internetna violência contra amulher. “Ao julgarmosa mulher, dizemos queé culpada.”

NOVA SELVAFRANCESA

Aluno de universidadeainda patina no inglêsMETRÓPOLE / PÁG. A26

Palmeiras lota arenacontra o Atlético-PREDIÇÃO DE ESPORTES / PÁG. D1

Cara do lugar. Casas de Rioe BH mostram diferentes estilos

Empresas nacionais endividadas emmoeda estrangeira estão em alerta.Alémdo aumento do dólar e do custo decaptações no exterior, a deterioraçãoda economia dificulta a rolagem dedívi-das. Desde 2008, a dívida externa subiu75%, para US$ 348 bilhões. A parcela dainiciativa privada representou 61% dototal e cresceu 130%. ECONOMIA / PÁG. B1

Dívida em dólarde empresascresce 130%

l Câmara vai interpelar advogadaEduardo Cunha (PMDB-RJ) anunciouque a advogada Beatriz Catta Pretaserá interpelada judicialmente paraesclarecer acusação de que foiameaçada por integrantes da CPI daPetrobrás. PÁG. A7

Tratadopelo Planaltocomo peça-chaveparaimpediroagravamentodacrisepo-lítica, o presidente do Senado, RenanCalheiros (PMDB-AL), tem sinalizadoquepodevoltaracolaborarcomogover-no Dilma Rousseff a partir desta sema-na, na volta do recesso parlamentar.Mas cobrará “faturas” nas áreas política

e econômica em troca da ajuda. Há duassemanas,logoapósoanúncio dorompi-mentodopresidentedaCâmara, Eduar-do Cunha (PMDB-RJ), o governo deci-diu reforçar operação envolvendo mi-nistros e lideranças petistas para corte-jar Renan. O objetivo é recriar a relaçãodo primeiro mandato, quando ele foi o

principal interlocutor do governo noCongresso. O afastamento ocorreu naesteira da Lava Jato. Nos bastidores,Re-nan acusa o Planalto de ter atuado paraincluí-lo entre os investigados. Dilmatambémtentaneutralizarefeitosdepro-vável decisão desfavorável do TCU nojulgamento das contas. POLÍTICA / PÁG. A4

FUNDADO EM1875

l Entrevistas

Multimídia. Veja infográficos e assistaaos vídeos em estadao.com.br/e/metasp

Articuladorpolíticodeumafren-te nacional de esquerda, TarsoGenro disse a Vera Rosa que o

PSDB ou mesmo o PMDB pode ven-cer a eleição presidencial de 2018, se ogoverno Dilma Rousseff não mudarsua política econômica nem fizer aspazescomsuabasesocialecomaclas-se média. POLÍTICA / PÁG. A6

EntrevistaTarso GenroEX-GOVERNADOR DO RIO GRANDE DO SUL

Somos todosÉ sempre mais fácil dizer que os ou-tros estão errados e prejudicando obom andamento do mundo do quelocalizar em nós os pontos negativos.CADERNO2 / PÁG. C4

ANDREI NETTO/ESTADÃO

Afegãos. Bahadel e Kabil

6

Antônio Delfim Netto. ‘Dilma preci-sa assumir o protagonismo, tem de en-frentar o panelaço que lhe cabe.’ PÁG. B4

RENATO CRUZ NOTAS & INFORMAÇÕES

A desconfiança como legadoA responsabilidade pelo descréditonos políticos não pode ser debitadasomente a Dilma Rousseff. PÁG. A3

Sol. Diaseco.Pág. A26

FERNANDO HENRIQUELobo ou cordeiro?Será que é tempo de rezar pela sortede setores empresariais e políticos?A hora para agir já não é mais do Con-gresso e dos partidos, mas da Justiça.ESPAÇO ABERTO / PÁG. A2

Esta publicação é impressa em papel certificado FSC® garantiade manejo florestal responsável, pela S. A. O Estado de S. Paulo

FÁBIO PORCHAT

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2 DE AGOSTO DE 2015 R$ 6,00 ANO 136 Nº 44483 EDIÇÃO DE estadão.com.br

Page 2: Dança à mineira

%HermesFileInfo:C-1:20150802:C1 DOMINGO, 2 DE AGOSTO DE 2015 ANO XXIX – Nº 9906 O ESTADO DE S. PAULO

Caderno2

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Dança àmineira

Sinônimo de excelência, Grupo Corpo comemora40 anos com a estreia de duas obras, ‘Suíte Branca’e ‘Dança Sinfônica’. Págs. C6 e C7

A volta do Becodas GarrafasUm dos berços dabossa nova, pontocarioca renascePág. C12

JOSE LUIZ PEDERNEIRAS/DIVULGAÇÃO

Renovação. Ex-bailarina dacompanhia, Cassi Abranchesassina um dos balés

Page 3: Dança à mineira

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C6 Caderno 2 DOMINGO, 2 DE AGOSTO DE 2015 O ESTADO DE S. PAULO

Dança

Após criar vocabulário único em4décadas,GrupoCorpo

abre espaço para nova coreógrafa, de olho na renovação

l Janeiro de 1975Grupo Corpo é criado em BeloHorizonte. A sede da companhiaé a casa da família Pederneirasna Rua Barão de Lucena.

l 1º de abril de 1976EstreiaMaria Maria, com coreo-grafia do argentino Oscar Araiz,música de Milton Nascimento eroteiro de Fernando Brant.

l 11 de maio de 1978Inauguração da nova sede eestreia de Rodrigo Pederneirascomo coreógrafo. Foi o ano daprimeira turnê internacional.

DEPOIMENTO

Tradiçãoe futuro

Juliana RavelliBELO HORIZONTE

Tudocomeçouno lar deuma fa-míliamineira.Em1975,osirmãosPaulo,RodrigoeMiriamtransfor-marama casa onde nasceramnasede do Grupo Corpo, que ti-nham acabado de criar. Os paisforammorar de aluguel para darespaçoaosonhodos filhos.Qua-renta anos depois, quem entranoedifíciodetrêsandares–ergui-doem1978,emoutroendereço–,no bairro Mangabeiras, em BeloHorizonte,aindasenteoclimafa-miliar. Lá, é fácil acharumaxíca-radecafé ebompapo.Masa sin-gelezaestáaoladodeoutrapecu-liaridade: a dedicação extrema àarte.Foiotrabalhosério,doqualos Pederneiras gostam, que ele-vou o Corpo ao posto de maiorcompanhiadedançabrasileira.Como disse o diretor artístico

Paulo Pederneiras: “Nós todossomosmuito exigentes. Mas es-se rigor não ofende ninguém”.Em quatro décadas, o Corpo seapresentou pelo mundo, multi-plicou parcerias com profissio-nais de outras artes, desdobrou-seemprojetossociaisesetornousinônimodeexcelência.Para ce-lebrar tantas conquistas, apre-senta duas obras inéditas nestemês em Belo Horizonte e SãoPaulo e, em setembro, no Rio:Dança Sinfônica e Suíte Branca.Éaprimeiravezem24anosqueacompanhia temduas estreias namesma noite. Também é a pri-meiravez,desde1988,quecolocaemcenaumbalénãocoreografa-doporRodrigoPederneiras.A temporada comemorativa

começa no dia 5 no Palácio dasArtes, na capital mineira. Assim,o Corpo volta no tempo para asua própria estreia naquele pal-co, em 1.º de abril de 1976. Foi láque o público conheceu o baléque se tornaria um clássico,Ma-ria Maria. Com coreografia doargentinoOscarAraiz,músicadeMilton Nascimento e roteiro deFernandoBrant, a obra virou fe-nômeno. Lotou plateias e abriuportasparaogrupo.“Não sei se (a longevidade do

grupo) tem segredo. Mas nóstemos um convívio muito ho-nesto.Nãotemespaçoparavai-dades exacerbadas”, explicaPaulo. “Temos uma maneiraaberta de se comportar. Nãotemfrescura.Outraquestãoim-portante é a excelência artísti-ca. Não só dos bailarinos, masde toda a equipe. Não dá paradeixarmais oumenos.”Aolongodopercurso,oCorpo

desenvolveu um repertório quetransita com naturalidade entre

oerudito eopopular, o urbanoeoregional.Coreógrafo-residentedacompanhiadesde1978,Rodri-go crioumovimentosque tradu-zem a brasilidade para a dança.EssepercursoéomotedeDançaSinfônica, de Rodrigo. “Quis fa-zerumacoisaMinasGerais”, dizocoreógrafo.“Agentecaminhoudemais.E,agora,estamosvoltan-doparaoninho.Sebemquenun-casaímosdoninho.”Os 40 anos ganham significa-

doprofundocomamúsicatrans-cendental de Marco AntônioGuimarães (criador do grupoUakti), interpretada pela Or-questra Filarmônica de MinasGerais, regida pelo maestro Fá-bioMechetti. A emotividade es-tá por toda parte, do cenáriocommais demil fotos feitas por

quem passou pelo Corpo desde1975atéopasdedeuxcomavete-rana SilviaGaspar.“Eume lembrei que costumo

guardarcertasideiasali,nagave-ta.TemumlivrodoCaioFernan-do Abreu que adorava, que sechamaOvelhas Negras. Era isso,ideias antigas que ele não tinhapublicado. Pensei: ‘Vou fazer amesma coisa que ele’. Pegueiideias antigas e tentei misturarcom coisas novas, de hoje, quegostaria de fazer. E tambémcom alguma coisa da históriadas pessoas. Não vou citar no-mes,masháhomenagensquefa-çoadeterminadasfigurasquees-tão aqui e que passaram poraqui”, revela Rodrigo.

Nova geração. Se oprimeiroba-

lé é uma ode à memória e tradi-çãodoCorpo,osegundorevelaapreocupação da companhia emsempre se renovar. Suíte Brancaé coreografia da paulista CassiAbranches, que foi bailarina dogrupopor 12 anos.Ela conta que teve total liber-

dade, recebeu “uma folha embranco” para criar o que quises-se. A ideia se materializou tam-bémnocenárioe figurinos, tudobranco. “O conceito da noite élindo. É contar os 40 anos, comasfotos, eolharpara frente, comobranco”, dizCassi.Para reforçar esse espírito de

juventude, o Corpo convocouSamuel Rosa e seu grupo Skankparacriara trilha, que tempega-da rock-and-roll. As notas casa-ramcoma ideiadeCassi deusar

agravidade comoreferênciapa-raosmovimentos. “Quandomederam o primeiro acorde da tri-lha, não sei por que, imaginei omovimento de cair. Então, per-gunteipara ameninaquecome-çao balé oquanto ela conseguiadeixar o corpo cair sem se ma-chucar. A partir daí, fui constru-indoosmovimentos,brincandocomessa coisa do risco.”É para Cassi que Rodrigo

quer passar o bastão de princi-pal coreógrafa do Corpo. Masisso, ele garante, nada temavercomofatodeapaulistasercasa-dacomseufilho,GabrielPeder-neiras, coordenador técnico dacompanhia. “Ela é o máximo.Tem linguagem própria”, dizRodrigo.“Quandoa‘lorinha’es-tava fazendoapeçadela,não fa-lei um ‘a’.” Paulo concorda. “Agente sentequeela temmaturi-dade suficiente. Estamos apos-tandonisso,renovação”,afirmao diretor artístico.Pénochão,Cassiestáhabitua-

daao“modoPederneiras”detra-balhar e sabe que, para conquis-tarseuespaço,precisacriar sozi-nhasuaidentidadeartística.“Evi-to (pedir ajuda). Independente-mente de o ‘Digo’ ser meu mes-tre, ele pensa diferente de mimem algumas coisas. Tenho umpouco de receio de perguntar e,de repente, não ser o caminhoqueestouseguindo.Possoatéer-rar, mas, se recebo uma interfe-rência, talvez saia do que estoutentando fazer.”

Inês BogéaESPECIAL PARA O ESTADO

“Fui bailarina do Grupo Cor-po de 1989 a 2001 e isso mar-cou profundamente a minhatrajetória na dança. Aprendimuito com eles, especialmen-te um rigor e uma entrega a ca-da detalhe da construção dostrabalhos. O que se vê na cenaé resultado de uma decanta-ção de ideias que perpassamtodas as áreas do Grupo, daprodução à criação.Como bailarina vivenciei

muitos processos de criaçãocoreográfica e o encadeamen-to dos elementos da cena. OGrupo, desde seu início, jácom a direção artística de Pau-

lo Pederneiras, revela um pro-jeto muito cuidadoso de mos-trar o Brasil em movimento,seja nas primeiras obras – Ma-ria Maria e Último Trem – do ar-gentino Oscar Araiz ou nasobras mais emblemáticas (21,Parabelo, Breu, entre outras) deRodrigo Pederneiras, coreógra-fo que criou uma identidadede movimento para o Grupo.Essa identidade, que vai

além dos gestos, apresentauma maneira de construir acena como um todo, ligandoos diferentes elementos (dan-ça, música, figurinos, cenáriose luz). Essa identidade é obrados irmãos Pederneiras e doscolaboradores que a cada co-reografia se juntam e inven-tam uma maneira singular dever o nosso tempo, uma iden-tidade que revela uma culturabrasileira forte, autônoma,confiante em si a ponto de es-capar das definições. E comobailarina, não posso deixar decomentar que o corpo do bai-

larino do Corpo dança em vá-rios ritmos, pulsa no tempo,em uma dança atual e arcaica,malemolente e precisa, dinâ-mica e fluida, que contagia aplateia nas mais diferentespartes do mundo.E essa dança é afinada nos

ensaios com a presença sem-pre marcante dos ensaiado-res. Na minha época, Car-mem Purri e Miriam Pedernei-ras eram as duas ensaiadoras,que conheciam o movimentono corpo por terem participa-do desde o início do Grupo,decantando um aprendizadovivido nas transformaçõesdas diferentes épocas. Paramim, foi uma inspiração e umgrande privilégio aprender econviver com esses grandesartistas da dança.”

]

INÊS BOGÉA É DIRETORA ARTÍSTICA

DA SÃO PAULO COMPANHIA DE

DANÇA E FOI BAILARINA DO

GRUPO CORPO DURANTE 12 ANOS

GRUPO CORPO 40 ANOSTeatro Alfa. R. Bento Branco deAndrade Filho, 722. Tel.: 5693-4000. Estreia 12/8. 4ª e 5ª, às 21h;6ª, às 21h30; sáb., às 20h, e dom.às 18h. R$ 50/R$ 130. Até 23/8

REPRODUÇÃO

CRONOLOGIA

Lembranças. Inês Bogéa em ‘Parabelo’, de 1997, um dos marcos da companhia mineira

‘Aprendi umrigor e umaentrega a cada detalhe’Diretora artística da SãoPaulo Companhia deDança, Inês Bogéa foibailarina do Grupo Corpode 1989 a 2001

DIVULGAÇÃO

A REPÓRTER VIAJOU A CONVITE

DA PRODUÇÃO DO GRUPO

Page 4: Dança à mineira

O ESTADO DE S. PAULO DOMINGO, 2 DE AGOSTO DE 2015 Caderno 2 C7

Corpo já passou por maisde 200 cidades; extensaagenda fora do Brasilobrigou grupo a estrearuma obra a cada 2 anos

A música é o ponto de partidapara a concepção de todo espe-táculo do Grupo Corpo. É elatambém uma das principais res-ponsáveis por ditar a personali-dade de cada balé. É por issoque, quando o público assiste àcompanhia, consegue ver as no-tas musicais ganhando movi-mento por meio dos bailarinos.

Apartirde21,coreografadoporRodrigo Pederneiras em 1992, oCorpo optou por usar apenas tri-lhasoriginais(aexceçãofoiLecuo-na, em 2004). A música desse es-petáculoédeMarcoAntônioGui-marães, que já havia colaboradocom a companhia em Uakti(1988), balé homônimo ao grupocriadoporeleem1978.Agora,Gui-marães é o responsável pela com-posição de Dança Sinfônica, suaquintacontribuição paraogrupo.

Em rara entrevista, Guima-rães conta ao Estado que já co-nhece a maneira de Rodrigo co-reografar. Desta vez, noentanto,foi um pouco mais complexo.“Opessoalresolveufazeralgo di-ferente. Nunca tinha sido enco-mendada uma coisa gravada poruma sinfônica. Quando Paulo eRodrigo me procuraram, já ti-nham conversado com o maes-tro (Fabio) Mechetti e a direçãoda Filarmônica (de Minas Gerais,que executa a composição).”

O fundador do Uakti afirmaque se inspirou em toda a sua ex-periência para compor a músicadeDançaSinfônica.AlunodaEsco-la de Música da Universidade Fe-deraldaBahianosanos1960,teveaulas de composição com ErnstWidmer e, com Walter Smetak,aprendeu a criar os próprios ins-trumentos. “Ano que vem faz 50anosqueentreinaoficinadoSme-tak. Eu não sabia quem ele era e,quandoentrei lá,nãosabiaqueis-so iria mudar minha vida.”

Depois da faculdade, Guima-rães tocou violoncelo em sin-fônicas durante 15 anos, passan-do pela (Osesp) recém recriadapor Eleazar de Carvalho. “Paraa trilha desse balé, peguei todoesse material. É o que o Rodrigofalou. Fui aos baús antigos, revia vivência da sinfônica e peçasque escrevi há mais tempo, coma experiência que tenho hoje.”

O outro balé comemorativodos 40 anos, Suíte Branca, tem a

trilha assinada por Samuel Rosae o Skank. Embora tenha sidouma experiêncianova, Rosa con-ta que o processo ocorreu semmuitoesforço.Asreferênciaspa-ra a composição estão no “DNAda banda”, segundo o músico.“Tem, nessa trilha, tudo o que oSkankfoinessesmaisde20anos,um pouco de psicodelia, o dub,que é a psicodelia jamaicana e amistura com coisas mineiras.”

Liberdade, sempre. O únicoproblemaparaoSkankfoiencon-traroequilíbrionoexcessodeau-tonomiaqueosirmãosPedernei-ras deram, como fazem com to-dos os compositores. “Falavam‘vai lá, cria à vontade’. Em um se-

gundomomento, apontavam ‘is-so funciona mais, isso menos’”,diz Rosa. “No começo, fomosum pouco afoitos demais. Paulofalou: ‘Não vou ter bailarino paraisso’. Perguntei: ‘Por que, o elen-co é pequeno?’ Ele respondeu:‘Não, você vai cansar os caras.Precisa ter mais nuances’.”

Lenine, que contribuiu com atrilha de Breu (2007) e Triz(2013), também sentiu o peso e oprivilégiodaautonomia.“Aliber-dade opressora, sem briefing, éuma janela muito poderosa”,diz. “Para mim, é uma possibili-

dade de exercitar uma musicainstrumental que raras vezes te-nhoa oportunidade de tocar. Foiincrívelver pela primeiravez mi-nha música em três dimensões.”

Sobre as experiências, Leni-ne diz que foi um aprendizado.“Quando fiz Breu, tudo era no-vo. Com Triz, já tinha uma di-mensão real do que poderia es-timular a expressão daquelescorpos. O que não mudou foi aliberdade de fazer a música.”Por isso, ele é grato. “Nós, damúsica, temos um débito enor-me com o Corpo. Duranteanos, eles persistiram em acre-ditar na composição de trilhasoriginais.” / J.R.

Companhia passa a maior partedo ano em turnê no exterior

l 18 de junho de 1992A partir de 21 (foto), o grupo deci-de usar só trilhas originais paraos balés. Marco Antônio Guima-rães compõe a música da obra.

l 1998Companhia desenvolve o projetoSambalelê, que passa a atender120 crianças da periferia dacapital mineira.

l 2015Corpo faz 40 anos, com obrasinéditas: Suíte Branca, de CassiAbranches, e Dança Sinfônica(foto), de Rodrigo Pederneiras.

Maria Maria levou o GrupoCorpo para a primeira turnê in-ternacional em 1978. Na oca-sião, passou por sete países daAmérica Latina, além de Lisboae Paris, onde lotou o Théâtre dela Ville. Desde aquela vez, aagenda no exterior só cresceu.Segundo o diretor artístico dacompanhia, Paulo Pederneiras,a maior parte das apresenta-ções é realizada fora do País, oque garante certa estabilidadefinanceira em tempos de crise.

Neste rastro de aparições pormais de 200 cidades do mundo– de Anchorage, no Alasca, aZug, na Suíça –, o Corpo fez his-tória como o primeiro grupobrasileiro a se apresentar emteatros e festivais históricos.“Seu trabalho no palco não é na-da menos do que eletrizante. Acompanhia é um tesouro nacio-nal brasileiro e respeitada glo-balmente por sua força na dan-ça”, afirma Joseph Melillo, pro-

dutor executivo do BrooklynAcademy of Music, onde o Cor-po já se apresentou cinco vezes.

“Eu estava pesquisando tra-balhos de dança na América doSul e fui a uma apresentação de-les em outra cidade aqui nos Es-tados Unidos. Fiquei imediata-mente impressionado com aqualidade artística da coreogra-fia e as habilidades extraordiná-rias dos bailarinos”, diz Melillo.

A fama do Corpo também seespalha pelo boca a boca. Dire-tora artística da casa de espetá-culos austríaca FestspielhausSt. Pölten, Brigitte Fürle soubedas qualidades da companhia

por meio de amigos em uma via-gem ao Brasil. Na ocasião, o gru-po não estava no País. “Tive deesperar até vê-los em Barcelo-na, meses depois. Trabalhamosmuito para coordenar as datas.Na primeira temporada que fiza programação do Festspie-lhaus St. Pölten, o Corpo estavano programa. Fiquei muito or-gulhosa. Ter a companhia pelaprimeira vez na Áustria foi mui-to significativo”, diz Brigitte.

Sem parar. A extensa agendafora do Brasil foi o que obrigouo Corpo a estrear um novo baléa cada dois anos – e não maisanualmente –, a partir de 1999.Agora, os estrangeiros que jáconhecem a companhia tor-cem para que ela conquiste ain-da mais reconhecimento no ce-nário internacional.

“Não podemos comparar oCorpo a nenhuma outra compa-nhia. Diria que é um estilo úni-co”, elogia Brigitte. “Lecuona,Onqotô, Benguelê, Breu, Imã eSem Mim demonstraram cresci-mento coreográfico e curiosida-de musical. O que tem sido con-sistente é a disciplina artísticaexcepcional dos bailarinos”,afirma Melillo. / J.R.

Criadores.O Skanke CassiAbranches(acima)e MarcoAntônioGuimarães

NA WEB

FOTOS JOSÉ LUIZ PEDERNEIRAS/DIVULGAÇÃO

São 40 anos construindo um pensamen-to de dança. Não somente um jeito defazer coreografias – o que já seria lou-

vável –, mas algo a mais. Trata-se de um sa-ber sobre o que compõe os seus nascimen-tos. Esse pensamento da dança começa narelação entre criação e elenco, na qual amúsica tem um papel central, vital, e queculmina com modo como os bailarinos es-tão vestidos, maquiados, penteados, qualluz vai tornar visível o que fazem, e em quetipo de cenário vão apresentar tudo isso.

Talvez tenha sido essa a marca mais forteque o Grupo Corpo imprimiu na cena dadança no Brasil. Fazendo do rigor o seu dia-pasão, transformou seu nome em um selode qualidade. Os responsáveis pela confec-ção deste padrão foram aqueles que, ao lon-go dessas quatro décadas de atuação, fize-ram parte da equipe comandada por PauloPederneiras, o diretor artístico, aquele quesabe organizar e modelar a matéria preexis-tente (o demiurgo, no sentido de Platão).

Cada qual, no seu fazer específico, agre-gou várias camadas de expertise nessa lapi-dação permanente.

Nos últimos anos, esse núcleo acabou seconcentrando na longa parceria entre PauloPederneiras (também responsável pela ce-nografia e iluminação), Rodrigo Pedernei-ras (coreografia) e Freusa Zechmeister (fi-

gurinos e visagismo).O desenvolvimento de uma língua pró-

pria empreendido por Rodrigo Pederneirasocupa o eixo central nesse processo.

Guiado pela música, seu modo de coreo-grafar sempre esteve poroso às danças queexistiam nos corpos dos seus intérpretes.

À medida que os bailarinos foram trazen-do informações que não mais vinham exclu-sivamente do treinamento para a cena, seuprocesso de criação ganhou soluços, que-bras, curvas, espiralamentos, outros tiposde ênfase no ataque e na finalização do mo-vimento.

Mas foi nos pas-de-deux – que tratou co-mo mini laboratórios de vários tipos de ou-sadias – que ele conquistou a maestria. Secoubesse falar em um legado, quem sabepossa estar sendo desenhado agora, quandoa companhia celebra seu 40º aniversárioapresentando uma nova coreógrafa, CassiAbranches.

Assim como Rodrigo Pederneiras fez arefundação do Grupo Corpo quando come-çou a riscar o que o tempo transformaria nasua assinatura pessoal na dança, quem sabecaberá a Cassi Abranches uma próxima re-fundação, neste fluxo de vivacidade quevem tecendo a história desta companhia.

Quando aposta nesta possibilidade, a sóli-da trajetória do Grupo Corpo, pelo Brasil epelo mundo, explicita que pavimentará acontinuidade do seu percurso tecendo o ho-je com o agora. Reconhecido nacional e in-ternacionalmente, o Grupo Corpo transfor-mou-se em uma potente referência na e dadança que se produz no Brasil. Em temposde mesmice globalizada, não é pouca coisa.

Inspiração. ‘DançaSinfônica’ homenageiapessoas que passarampelo Grupo Corpo

Composições são pontode partida dos trabalhos

Grupo constrói, há 40anos, um pensamentoespecífico de dança

l Antes de se tornar a sucessoraanunciada de Rodrigo Pedernei-ras, Cassi Abranches teve de sedesdobrar para ser aceita comobailarina do Grupo Corpo. Fezduas audições da companhia. Foipreterida em ambas. Só conse-guiu a vaga após se mudar paraBelo Horizonte e pedir para fazer

aulas na sede do grupo. A insis-tência resultou na contratação.

No Corpo, dançou de 2001 a2013. Resolveu deixar o palcopara se dedicar ao trabalho decoreógrafa, que havia começadoem 2009. “Foi difícil parar”, diz.“Entendi que precisava me desco-lar e andar com minhas própriaspernas, até para que um dia euvoltasse.” Entre os projetos queganharam sua assinatura estão obalé GEN, da São Paulo Compa-nhia de Dança, e um segmentodo filme Rio Eu Te Amo. / J.R.

Novos trabalhos têmtrilha de Marco AntônioGuimarães e Samuel Rosa;o ponto em comum é aliberdade para compor

Fotos. Vejaimagens de todosos espetáculos

estadao.com.br/e/ocorpo

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ANÁLISE: Helena Katz

Cassi só entrouno grupo naterceira tentativa

MIGUEL AUN/DIVULGAÇÃO

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NA WEBEspecial. Conheçaos momentoshistóricos

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