da pintura e fotografia as vinhetas na tv

23
AS JANELAS DA PINTURA, FOTOGRAFIA E DESIGN NAS VINHETAS DE TELEVISÃO Rogério Abreu Resumo: Neste artigo discorremos acerca da idéia das janelas, que constam na maioria das artes da imagem - como a fotografia, pintura, desenho e outras manifestações imagéticas, e que acaba, não só fragmentando, como também delimitando nossa visão. Assim como no vídeo, o processo é análogo, e as imagens videográficas ou design na televisão, que têm maiores possibilidades de explorar estes recursos pictóricos, aparecem nas vinhetas de abertura de programas na televisão. Abstract: In this article we not only discourse concerning the idea of the windows, that consist in the majority of the arts of the image - as the photograph, painting, drawing and other images manifestations, and that it finishes, breaking up, as also delimiting our vision. As well as in the video, the process is analogous, and the videographics images or design in the television, that have more possibilities to explore these resources pictorial, appear in the vignettes of opening of programs in the television.

Upload: abreurogerio

Post on 12-Jun-2015

646 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Rogério Abreu designer mestre pela PUC Rio de Janeiro ex integrante da equipe Videographics CGCOM/Rede Globo de televisão

TRANSCRIPT

Page 1: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

AS JANELAS DA PINTURA, FOTOGRAFIA E DESIGN NAS

VINHETAS DE TELEVISÃO

Rogério Abreu

Resumo:

Neste artigo discorremos acerca da idéia das janelas, que constam na maioria das

artes da imagem - como a fotografia, pintura, desenho e outras manifestações

imagéticas, e que acaba, não só fragmentando, como também delimitando nossa

visão. Assim como no vídeo, o processo é análogo, e as imagens videográficas ou

design na televisão, que têm maiores possibilidades de explorar estes recursos

pictóricos, aparecem nas vinhetas de abertura de programas na televisão.

Abstract:

In this article we not only discourse concerning the idea of the windows, that

consist in the majority of the arts of the image - as the photograph, painting,

drawing and other images manifestations, and that it finishes, breaking up, as also

delimiting our vision. As well as in the video, the process is analogous, and the

videographics images or design in the television, that have more possibilities to

explore these resources pictorial, appear in the vignettes of opening of programs in

the television.

Introdução

Segundo Barthes no livro A Câmara Clara, a fotografia pode ser objeto de três

práticas: fazer - fotógrafo/ operator; suportar - spectrum/ espetáculo/ espectro -

olhar - spectator. "Diante da objetiva sou ao mesmo tempo: aquele que me julgo,

aquele que eu gostaria que me julgassem, aquele que o fotógrafo me julga e

aquele de que ele se serve para exibir sua arte." (p. 27). Partindo dessa

afirmação, dentro do campo da fotografia, procuramos no presente texto relacionar

Page 2: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

os estudos de Barthes acerca da imagem fotográfica às imagens das vinhetas na

TV.

Destacamos a idéia das janelas, que constam na maioria das artes da imagem -

como a fotografia, pinturas, desenhos e outros, e que acaba, não só

fragmentando, como também delimitando nossa visão. Esta delimitação é o

chamado campo, que é a imagem propriamente dita, e o fora de campo. Barthes

aponta esses elementos como respectivamente, studium e punctun, este último

podendo ser uma imagem que não se pode constatar visualmente, mas que é

complementada pelo imaginário ou repertório do observador. Essa ocorrência de

campo/fora de campo, que aparece na fotografia e na linguagem televisual, já foi

há mais de um século, explorada por pintores impressionistas, entre eles Degas e

Toulouse Lautrec. Sua técnica consistia em fazer uso da imagem fotográfica para

reproduzir, na pintura, o instante do movimento. Essa maneira de captar a

imagem de forma inusitada, muito explorada pela arte fotográfica, acabou também

por influenciar o cinema na exploração da perspectiva ou na composição da cena

e, mais especificamente, na utilização das cores. Apesar de Barthes ter decretado

que gostava da foto contra o cinema, do qual, todavia, não chegava a separá-la.

Assim, a fotografia bem como a pintura podem ser consideradas agentes da

passagem entre a imagem e vídeo, como percebemos no que discorre Peixoto:

A pintura é a referência principal do cinema contemporâneo. O arcaico no presente, o artesanal na reprodução técnica, o matérico no cinético. (...) é justamente a partir do plano - do movimento e da decupagem supostos nessa noção - que cineastas podem se comparar a pintores. O plano - que pode ser composto, construído, como um quadro - é o que aproxima o cinema da pintura. (...) (PEIXOTO apud PARENTE 1993: 246- 247).

No vídeo, o processo é análogo. Dentre as imagens videográficas, as que têm

maiores possibilidades de explorar estes recursos pictóricos aparecem nas

vinhetas de abertura de programas. É justamente em momentos como esses que

1

Page 3: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

a dimensão estética integra-se à signagem da televisão, criando valores artísticos

consideráveis. Neste texto pretendemos focalizar algumas vinhetas de abertura

de programas, enfatizando os procedimentos que lhes imprimem um relevo

semiótico de caráter estético, assim como Barthes fez no livro A Câmara Clara ao

analisar o processo da fotografia.

Um olhar sobre as obras impressionistas permite a comparação com as vinhetas

de televisão.

(Quadro de Edgar Degas: Danseuses - 1873

2

Page 4: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

(Cartaz de Toulouse Lautrec – 1892-3)

Tanto em Degas quanto em Lautrec percebe-se a tentativa de prosseguir com às

fantasias da visão na captação audaciosa do movimento das bailarinas: seja no

cancan, ou no ballet clássico, o que observamos é um movimento inigualável.

Clarões artificiais iluminam as cenas carregadas de intensa leveza dos gestos e

das nuances cromáticas.

Verdade e imaginação integram-se paradoxalmente, para recriar a eclosão

vibrante de uma poética da visualidade dinâmica, assim como no studium e

punctun da fotografia, onde Barthes afirma que, o punctun não está relacionado

com as intenções do fotógrafo, com a cultura do operator, com sua visão de

mundo. Ele depende do espectator se sentir ferido, pungido por determinada

imagem. Ao contrário do studium que é uma espécie de educação, de ¨saber¨ que

permite encontrar, para Barthes, o operator e suas intenções. É o que instaura,

nas obras dos referidos pintores, o jogo entre campo e fora de campo, que

permite a abertura necessária para o imaginário do espectator e antecipa, em

décadas, as propostas dinâmicas e cromáticas da linguagem televisual.

A produção dos pintores impressionistas confere aos corpos das bailarinas uma

mobilidade que se multiplica como em facetas plenas de vida e de sonho, numa

celebração da agilidade e da espontaneidade do jogo plástico, bastante

semelhante às propostas das vinhetas de abertura de novelas e de programas na

Televisão

Dentro do mesmo tema das bailarinas, lembro a histórica vinheta de abertura do

Fantástico, da TV Globo.

3

Page 5: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

(Vinheta de abertura do Fantástico - TV Globo)

Os frames acima apenas ilustram a impossibilidade de reproduzir a intensa e

expressiva movimentação das bailarinas na antológica vinheta do referido

programa. Esta é considerada uma das mais conhecidas vinhetas de abertura

criada anos 80, época em que o design e a computação gráfica ainda eram

conhecidos como a magia da televisão, com sua fluidez de movimento,

coreografia e surpreendentes efeitos especiais. Assim como foi a evolução da

fotografia que transformava o sujeito em objeto, e ate mesmo, em objeto de

museu. Segundo Barthes, para fazer os primeiros retratos era preciso submeter o

sujeito a longas poses atrás de uma vidraça em pleno sol, o sujeito tornando-se

objeto, isso fazia sobre como uma operação cirúrgica. Inventou-se então um

aparelho, um apoio para a cabeça, invisível para a objetiva, que sustentava e

mantinha o corpo em sua passagem para a imobilidade.

Tendo em vista trabalhos como a vinheta do Fantástico apontada acima, contata-

se que, passado mais de um século, realiza-se, na tela da TV, o sonho cultivado

pelos pintores impressionistas e iniciado pela fotografia, de captar o movimento do

instante. Barthes observa que, o vídeo tem um poder que, à primeira vista, a

fotografia não tem: a tela não é um enquadramento, mas um esconderijo; o

personagem que sai dela continua a viver: um ¨campo cego¨ duplica

incessantemente a visão espacial.

4

Page 6: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

Como foi enorme a evolução das técnicas de desenho e animação em

computador, os videodesigners agora têm acesso a recursos que permitem efeitos

sofisticados de animação em duas e três dimensões, com altas resoluções, além

de uma profusão de cores simultâneas. Mobilizam-se procedimentos essenciais

ao desenvolvimento da arte na cibercultura, mas, como alerta Arlindo Machado,

com relação ao videoclipe,

(...) para que se possa tirar dele todas as conseqüências é preciso que as pessoas que o praticam se mostrem dispostas a colocar entre parênteses os esquemas adquiridos e se ponham a explorá-lo com sensibilidade renovada e decisão crítica. É essa e apenas essa a geração de realizadores que nos deve interessar. (MACHADO, 1987 : 41)

O mesmo pode ser dito quanto às propostas de renovação da linguagem das

vinhetas apresentadas na TV contemporânea. Sabe-se que os procedimentos de

trucagem e de efeitos especiais, freqüentes nos filmes contemporâneos, foram

inaugurados pela TV. Graças ao Truca Numérico - um computador que permite

efeitos quase imperceptíveis como tais - são operadas transformações e ilimitadas

manipulações nas imagens hoje usualmente encontradas nos videoclipes, nos

comerciais, nas vinhetas de abertura de telenovelas e programas, bem como nos

filmes de ação.

Muito embora ainda continuem vinculados às informações sobre a programação

ou sobre os produtos anunciados, muitas dessas produções aproximam-se das

obras de arte, por apresentarem relevo semiótico diferenciado das produções

massificadas.

Plaza e Tavares, em seu abrangente estudo sobre os processos criativos com os

meios eletrônicos, ratifica o exposto acima:

Nos processos criativos com estes meios, a qualidade é evidenciada como compromisso estabelecido entre a subjetividade daquele que inventa e as regras sintáticas inerentes aos programas por ele utilizados. Estas

5

Page 7: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

tecnologias, ao participarem deste tipo de criação, instituem-se como formas de expressão, manifestada pelo diálogo ente a materialidade do meio e o insight criativo. (PLAZA; TAVARES , 1998 : 63)

A Vinheta e sua origem

Acerca do surgimento da vinheta na Idade Antiga, Aznar (1997: 20) deixa evidente

que, através da oralidade como forma da videira, a vinheta era utilizada para

expressar todo o simbolismo do Antigo Testamento, considerada um dos bens

mais preciosos do homem primitivo, que tendenciava naturalmente para uma visão

simbólico-alegórica do universo. Na antiguidade a vinheta era oral, sagrada e

simbólica.

A videira e seus elementos se definiram como representantes de realidades além

da realidade individual de cada um e compareceram como imagens no universo

das artes, das letras e da doutrina religiosa cristã. Tornaram-se símbolos.

Fernando Lemos (1980:17) diz que a vinheta é vinhática, de vinha e vinhedo,

parreira ou videira mansa. Assim é o primeiro passo de seu aprendizado no

mundo da visualidade apreendida. Os elementos da videira tornaram-se

exclusivos para a imagem divulgadora dos estilos artísticos e arquitetônicos,

escultóricos, visuais e da ilustração religiosa.

Segundo Aznar (1997:27), Frederico Porta (1966:158-159) desenvolveu a primeira

definição de vinheta: Vinheta é um ornato tipográfico, baseado em linhas

geométricas, flores, folhagens, seres vivos ou coisas inanimadas, para servir de

enfeite ou cercadura, em páginas de composição e trabalhos de fantasia.

Do francês. Vignette, diminutivo de vigne, vinha são os ornamentos que

representavam na origem, cachos e folhas da videira, símbolo da abundância.

6

Page 8: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

Na idade Média, como pode ser observado na imagem abaixo, a vinheta

aparece como complemento decorativo das iluminuras, passando para o

simbólico-gráfico.

Imagem extraída da Coleção Abril Cultural – A Bíblia, vl, p.33. Anônimo (Séc. XV)

A iluminura descrita por Aznar (1997: 28), foi durante a Idade Média uma

expressão gráfica do texto sagrado; contribuiu na difusão das escrituras sagradas

como traço entre homens unidos pela mesma crença e separados pela distância,

com o objetivo de chamar a atenção do leitor para o conteúdo do texto sagrado.

Tais representações visuais alegóricas, que ornamentavam as iluminuras, eram

vinhetas.

O profissional que desenvolvia as iluminuras também era o calígrafo. Tal

escrevente do livro ornamentava-o com letras coloridas e vinhetas.

Uma curiosidade nesta época é a distinção entre vinheta e ilustração. Aznar

(1997: 32) diz que ao desenhar uma vinheta, o vinhetista está realizando uma

ação gráfica que não se caracteriza em ato ilustrado. Portanto está realizando

uma ação gráfica decorativa (ornare). Desse modo, vinheta exerce uma função

decorativa, estando indiretamente ligada ao texto, ao passo que a ilustração está

7

Page 9: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

diretamente associada a ele. A iluminura seria a representação visual do texto,

comportando, ilustração, vinheta e caligrafia.

Já na Idade Moderna, a vinheta é utilizada como gráfico-decorativa. Com o

surgimento da imprensa, dá-se a caracterização do termo vinheta, “pequena

vinha”.

Na editoração, a vinheta deriva dos adornos de livros manuscritos medievais e nos

ornatos encontramos formas como folhas de acanto, flores e ramagens diversas.

Nas artes gráficas, chama-se vinheta, por extensão, a todo motivo ornamental ou

figurado, cada um lembrando estilos como bizantino, gótico, barroco, rococó etc,

conforme pode ser observado na imagem abaixo

Imagem extraída da Coleção Artes no Brasil,v.1, p.434 – Pintura de Manuel da Costa Ataíde. São

Simão Stock com Nossa Senhora do Carmo. Museu da Inconfidência, Ouro.

Com o surgimento da imprensa, em 1450, por Gutenberg, o termo vinheta passou

a ser amplamente utilizado. A característica mais marcante são as molduras

8

Page 10: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

decorativas para textos onde podemos constatar sua utilização em formas

estabelecidas.

Para Aznar (1997: 33), a vinheta vai ser uma das primeiras manifestações da

programação visual, que, tendo suas raízes nas iluminuras, mostra que uma forma

estilística é o reflexo de outras formas anteriores de arte já utilizadas.

Na Idade Contemporânea evidencia-se o termo vinheta, que é adaptado para o

cinema, rádio, televisão e Internet. Para Aznar (1997:47), a especificidade da

vinheta no cinema é de apresentação dos créditos do filme, não tendo o caráter

mercadológico da vinheta para a televisão. As vinhetas de aberturas dos filmes em

grande parte não são interpretadas pelo público. Além disso, as vinhetas dos

filmes são vistas normalmente uma vez.

O homem com o braço de ouro, cinema

Coração Alado,telenovela TV Globo

A aparição das vinhetas no cinema surge nos anos 50 a fim de quebrar a

monotonia da apresentação dos créditos. Dentre as primeiras vinhetas de

aberturas para cinema temos as criadas por Saul Bass para o “O homem do braço

de ouro”, “A volta ao mundo em 80 dias”, “Psicose”, “Intriga Internacional”, Um

corpo que cai”, James Pollac para “Os pássaros, Maurice Binder para “Charada” e

9

Page 11: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

O Satânico Dr. No” e Robert Freeman para “Os reis do iê-iê-iê”e “Socorro!”.

(Arlindo Machado, 1988:201).

Filmes: Psicose, Um corpo que cai e Volta ao mundo em 80 dias

Décio Pignatari (1984:14) afirma que nos anos 50, particularmente no cinema

americano, o espírito inovador nessa área começou a ser observado já que a

forma rotineira costumava irritar o público.

A natureza eletrônica da televisão por si só a aproximava de tendências

avançadas das artes gráficas contemporâneas, que pesquisavam a sintetizarão de

imagens no vídeo. Com o passar do tempo foram se transformando e adaptando

todos os materiais encontrados, procurando novas formas de expressar tal mundo

mágico e sedutor.

Segundo Ernest Fischer (apud Aznar 1983:21), o homem se apodera da natureza,

transformando-a. O autor vê o trabalho como a transformação da natureza. O ser

humano sonha com um trabalho mágico que transforme a natureza, sonha com a

capacidade de mudar os objetos e dar-lhes nova forma por meios mágicos. Trata-

se de um equivalente na imaginação àquilo que o trabalho significa na realidade.

O indivíduo é, por princípio, um mágico. Através da necessidade lúdica

ornamenta-se tudo que está em nossa volta, assim, busca-se envolver com a arte

da ornamentação, estabelecendo relação próxima à comunicação objetiva, fato

que nos leva a ver no mesmo objeto a possibilidade de criar outros objetos.

10

Page 12: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

Percebemos que o artista foi requisitado pela TV para ornamentá-la e incrementá-

la, surgindo assim o design na TV comercial.

Edward Stasheff (1978:43), diz que entre as diferentes formas de comunicação, a

TV abre um campo limitado para a consciência simbólica – como a expressão do

inconsciente coletivo. Uma síntese de conteúdos comunicativos. A articulação

inteligente dos simbólicos dentro do universo estético dos códigos humanos vai

permitir o surgimento de uma nova linguagem, a arte televisiva.

Assim vinhetas são fantasias visuais que estão presentes no vídeo, levando aos

telespectadores emoção, ação e criações artísticas, e na busca de compreender a

trajetória da vinheta na TV, começamos com a inauguração da PRF-3 TV

Difusora, mais tarde a TV Tupi de São Paulo, em 18 de setembro de 1950.

As primeiras vinhetas apresentavam-se imóveis, assim como um cartaz. Eram

feitas em cartões colocados numa caixa tipo estante. A câmera de TV focalizava o

cartão acompanhado pela locução.

Como pode ser observado na imagem abaixo, Mário Fanucchi foi o criador das

primeiras vinhetas sem animação (Aznar, 1997:53). Trata-se de um momento

histórico para a cultura brasileira, sendo tais vinhetas de grande importância não

só como documento para a história do design na televisão, mas também para

conhecimento das novas gerações.

11

Page 13: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

Vinhetas criadas por Mário Fanucchi TV Tupi 1950– Arquivo prof. Mário Fanucchi

No início, além de servir como abertura dos programas, a vinheta na televisão

também anunciava a próxima atração, ficando no ar de 10 a 40 minutos. E era

criada em processo artesanal.

Com o surgimento do videotape na década de 60, as vinhetas em televisão

começam a evoluir em qualidade de forma acentuada, exigindo projetos bem

produzidos.

As vinhetas ganham movimento, e hoje entende-se, também, por vinhetas,

aberturas de novelas e os mais variados projetos que servem como embalagem

para os programas de televisão.

Segundo o designer Hans Donner, a vinheta para o programa Planeta dos

Homens, de 1977, constitui-se como o marco inovador na televisão, com a

utilização do videotape, (equipamentos de edição linear utilizado em todas as

dimensões. As imagens são gravadas separadamente e sobrepostas. Assim

podemos visualizar a bailarina de forma reduzida surgindo da banana, nos

proporcionando a sensação de que a cena é real). Conforme pode ser observado

na imagem abaixo.

12

Page 14: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

Vinheta Planeta dos Homens TV Globo 1977 – Arquivo CEDOC TVGlobo

Hoje o Brasil conta com equipamentos mais sofisticados para a produção de

vinhetas, oferecendo a possibilidade de criação com as mais diferentes técnicas.

Na televisão comercial as vinhetas são dirigidas para o grande público, com a

função de prender a atenção do telespectador, o mais importante é que se faz

presente no vídeo de todas as classes sociais.

A vinheta e o repertório

Assim como aconteceu no discurso (sociológico, semiológico e psicanalítico) da

fotografia desenvolvido por Barthes, e que resultou no livro A Câmara Clara,

podemos evidenciar as vinhetas de acordo com os mesmos aspectos. Assim, bem

como na fotografia, a vinheta compõe uma imagem que reflete diferentes

contextos histórico-culturais. A linguagem se modifica para cada suporte,

absorvendo aquilo que é peculiar do meio. Com a evolução tecnológica utilizada

nas criações e produções, as vinhetas compreendem um vasto repertório o qual

podemos perceber pelo studium e punctun descrito por Barthes ao escrever

acerca da fotografia.

John Berger (1999: 10) afirma que a maneira como vemos as coisas é afetada

pelo que sabemos ou pelo que acreditamos. Apresenta o olhar como um ato de

escolha e o resultado dessa escolha e aquilo que vemos é traduzido para o âmbito

do nosso alcance. Dessa forma o entendimento de uma vinheta, considerando ser

uma imagem ou conjunto de imagens, não é o mesmo para todas a pessoas, seu

13

Page 15: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

significado está aliado ao repertório, ao modo de ver do seu receptor. Como diz

Roland Barthes, “A minha fenomenologia aceitava comprometer-se com uma

força, o afeto. O afeto era o que eu não queria reduzir. ” “Como espectator, eu só

me interessava pela fotografia por sentimento, eu queria aprofundá-la, não como

uma questão (um tema), mas como uma ferida. Vejo, sinto, portanto noto, olho e

penso. ”

Para Décio Pignatari (1971: 83) estamos no terceiro nível da linguagem que é

aquele que diz respeito ao repertório do receptor da imagem. E que o repertório

não varia por acaso, a modos de ver de pessoas para pessoa; ele depende da

vivência e da cultura de cada um, e a cultura depende da faixa sócio-econômica

em que se situa o receptor.

Portanto, para o entendimento de uma forma, é necessário que ela faça parte do

repertório de cada indivíduo, e dessa forma nos remete a outra mais abstrata,

através da analogia, da metáfora e da alegoria que ela expressa no vídeo, sendo

então compreendida e decodificada pelo receptor. As viagens de Barthes ao

imaginário fotográfico é a forma adotada para comunicar o conteúdo da imagem,

assim é a vinheta ao telespectador, pois tais viagens estão ligadas à ação e

emoção que despertam no indivíduo.

O repertório da televisão compreende uma grande variedade de assuntos e pela

sua principal característica - que é a velocidade - são distribuídos em recortes

muito rápidos. Através das chamadas, ela informa o telespectador de sua

programação. Comunica as manchetes mais importantes e outras informações

relevantes para a emissora. Com o objetivo de administrar esta quantidade de

informação, a televisão passa a utilizar o recurso da vinheta, uma forma de

linguagem capaz de dar suporte e organização a produção televisiva.

No entanto, podemos constatar que as vinhetas, além de suas funções

operacionais, possuem outros objetivos, como o de consolidar estética e

14

Page 16: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

simbolicamente a imagem da emissora. Se entendermos a origem e o contexto

histórico das vinhetas, suas formas de linguagem e a sua adaptação à linguagem

televisiva, as funções das vinhetas na televisão tornam-se mais compreensíveis.

Considerações finais

Vemos, portanto, que em nossos dias, a TV e o cinema tornam-se os suportes das

experiências de decomposição e recomposição das imagens, nas tentativas de

descobrir novas formas de escrita que exploram um tempo dos deslocamentos em

todas as direções, o que consideramos do maior interesse para a análise das

manifestações artísticas contemporâneas.

Diz Peixoto: “Todos esses movimentos têm seu espaço no vídeo, na imagem

eletrônica. O vídeo assimila todas as outras imagens, permite a passagem entre

os suportes, a transição entre pintura, fotografia e cinema.” (PEIXOTO apud.

PARENTE, 1996 : 243) Completando a assertiva acima poderíamos dizer que a

referida transição envolve também a linguagem poética, hoje assimilada pelo

vídeo e pelos sites na Internet, como por exemplo, na poesia multimídia, que

integra palavras em movimento aos gestos, imagens, sons, cores e ritmos, num

processo intersemiótico de efeitos surpreendentes.

Esses textos poéticos em novos suportes – os clipoemas - falam simultaneamente

com diferentes sistemas de signos digitais e analógicos, tal como as vinhetas

televisivas. Para apreciá-los artisticamente, o importante é perceber seus

mecanismos expressivos ou suas estratégias discursivas, no entre-lugar das

imagens da cibercultura, com suas múltiplas identidades que redimensionam os

conceitos estéticos.

Referencias bibliográficas

15

Page 17: Da Pintura e Fotografia as Vinhetas Na TV

AZNAR, Sidney Carlos. Vinheta: do Pergaminho ao Vídeo. São Paulo: Arete &

Ciência/ UNIMAR, 1997.

BARTHES, Roland. A Câmara Clara. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980

GUIMARÃES, Denise. Poesia multimídia: uma leitura do vídeo Nome, de Arnaldo

Antunes. Anais do XV Encontro Nacional da ANPOLL. Niterói: UFF, 2.000. (CD-

Rom)

_____. O papel mediador da atividade poética entre a Arte e a Tecnologia. Anais

do Seminário XIV Nacional da ANPOLL. Campinas: Ed. UNICAMP, 1998 (CD-

Rom)

MACHADO, Arlindo. Máquina e imaginário. O desafio das poéticas

tecnológicas. São Paulo: EDUSP, 2001.

____. A arte do vídeo. São Paulo: Brasiliense, 1987

PARENTE, André. Org. Imagem-máquina. A era das tecnologias do virtual. Rio

de Janeiro: Ed. 34, 1993.

(PEIXOTO apud PARENTE 1993: 246- 247).

PIGNATARI, Décio. Letras, Artes, Mídia. São Paulo: Editora Globo, 1995.

_____. Signagem da televisão. São Paulo: Brasiliense, 1984.

_____. Informação. Linguagem. Comunicação. São Paulo : Perspectiva, 1971.

16