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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 Produção Didático-Pedagógica Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7 Cadernos PDE VOLUME I I

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O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE

2009

Produção Didático-Pedagógica

Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7Cadernos PDE

VOLU

ME I

I

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CCaaddeerrnnoo PPeeddaaggóóggiiccoo

AAsssseemmbblleeiiaass EEssccoollaarreess ee PPaarrttiicciippaaççããoo::

eessttrraattééggiiaass ppaarraa rreessoolluuççããoo ddee ccoonnfflliittooss ffrreennttee

aaoo bbuullllyyiinngg ee àà vviioollêênncciiaa eessccoollaarr

FFLLOORRIINNDDAA DDEE LLIIMMAA BBAASSSSII

Campo Mourão 2010

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CCAADDEERRNNOO PPEEDDAAGGÓÓGGIICCOO

Assembleias Escolares e Participação: estratégias para a resolução

de conflitos frente ao bullying e à violência escolar

Tema: Prática Escolar

Área de concentração: Pedagogia

Professora PDE: Florinda de Lima Bassi

Escola: Colégio Estadual Olavo Bilac - Ensino Fundamental e Médio

Professora orientadora: Cristina Satiê de Oliveira Pátaro

Ilustradores: Bárbara Bassi Mallio e João Victor de Oliveira Pátaro

Universidade Estadual de Maringá - UEM

Faculdade Estadual de Ciências e Letras de Campo Mourão

Secretaria de Estado da Educação/NRE - Campo Mourão

Município: Peabiru - PR

E-mail: [email protected]

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SSUUMMÁÁRRIIOO

Apresentação .......................................................................................... 5

Introdução .............................................................................................. 7

Unidade I

1.1 Primeiras palavras ............................................................................... 12

1.2 A função da escola: instrução e formação ............................................. 13

1.3 Educação e conflitos ........................................................................... 16

1.4 Considerações finais ........................................................................... 18

1.5 Atividades .......................................................................................... 19

1.6 Materiais complementares ................................................................... 20

Unidade II

2.1 Primeiras palavras ............................................................................... 22

2.2 O fenômeno bullying ........................................................................... 23

2.3 Alguns dados de pesquisa .................................................................... 28

2.4 Considerações finais ........................................................................... 37

2.5 Atividades .......................................................................................... 38

2.6 Materiais complementares ................................................................... 39

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Unidade III

3.1 Primeiras palavras ............................................................................... 41

3.2 O que são assembleias escolares? ........................................................ 42

3.3 Como organizar uma assembleia de classe? .......................................... 44

3.4 O funcionamento das assembleias de classe ......................................... 48

3.5 Mudanças nas relações humanas a partir das assembleias ...................... 52

3.6 Considerações finais ........................................................................... 55

3.7 Atividades .......................................................................................... 57

Referências Bibliográficas ...................................................................... 58

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AAPPRREESSEENNTTAAÇÇÃÃOO

O caderno pedagógico “Assembleias Escolares e Participação: estratégias

para resolução de conflitos frente ao bullying e à violência escolar” aborda a

questão da violência escolar, mais especificamente a prática do bullying no

contexto da escola. Foi planejado com a preocupação de refletir sobre a temática e

buscar caminhos para a formação de educandos e educandas que almejem uma

convivência pacífica e valorizem o diálogo na resolução de problemas do seu

cotidiano.

Entendemos que a escola pode ajudar no desenvolvimento de ações voltadas

ao combate ou redução do fenômeno bullying e da violência escolar de maneira

geral. Neste sentido, a intenção deste material é trazer elementos para a discussão

da temática, bem como apresentar uma possibilidade de trabalho voltada para a

resolução de conflitos, as assembleias escolares – prática que acreditamos ser uma

estratégia possível para trabalhar com a formação em valores de alunos e alunas e

garantir sua participação em seu próprio processo de desenvolvimento moral.

Esse caderno é parte da produção vinculada ao Programa de

Desenvolvimento Educacional (PDE). Tem por finalidade a capacitação de

professores da Educação Básica e estudantes do curso de formação de docentes, por

meio de um curso de extensão certificado pela FECILCAM, cujo objetivo será o de

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instrumentalizar educadores e educadoras a respeito do objeto de estudo

apresentado anteriormente.

O Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) é um programa de

políticas públicas do Estado do Paraná que estabelece um diálogo entre a Educação

Básica e o Ensino Superior por meio de estudos orientados e do desenvolvimento

de um projeto de intervenção pedagógica, o qual culmina na produção de material

didático pedagógico e também na confecção de artigo científico. O programa

promove o afastamento do professor de suas atividades escolares habituais da rede

da Educação Básica, levando-o à universidade para que, por meio de estudos

pesquisas, produção e implementação, busque problematizar e possibilitar

estratégias de enfrentamento das questões presentes no cotidiano escolar.

Neste contexto, o presente material foi elaborado para servir de base a uma

proposta de capacitação docente que configura-se como uma das ações do projeto

de intervenção aqui proposto.

Essa proposta de capacitação docente dará origem a um curso que tem como

objetivo contribuir com a comunidade escolar no sentido de possibilitar a

compreensão da importância das assembleias escolares, enquanto prática que

possibilita a participação dos diferentes membros da escola, democratizando as

relações e a gestão escolar. Defende-se a prática das assembleias escolares como

uma das estratégias possíveis a serem aplicadas no enfrentamento do problema

causado pelo fenômeno bullying e pela violência escolar. Neste sentido, a intenção

é possibilitar o desenvolvimento de atividades (estudos, debates, reflexões escritas,

análise de filmes) voltadas para os temas centrais de nossa proposta, a saber: o

fenômeno bullying, a violência e a prática de assembleias escolares.

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IINNTTRROODDUUÇÇÃÃOO

O projeto de intervenção pedagógica ao qual se vincula o presente material

partiu da importância de desenvolvermos práticas para despertarmos em nossos

alunos e alunas o respeito à diversidade, e também da necessidade de promover

uma maior reflexão sobre o fenômeno bullying presente nas escolas.

Alguns dos fatores determinantes para o estudo e desenvolvimento de tal

temática estão presentes nos anos de inquietações do fazer pedagógico no cotidiano

escolar. O inconformismo e a sensação de impotência ao presenciar alunos e alunas

que passavam pela escola sem serem preparados adequadamente para o exercício

de uma cidadania plena também colaboraram para a escolha da temática que aqui

abordaremos. Além disso, muitos desses educandos e educandas acabavam

adotando comportamentos prejudiciais ao seu próprio desenvolvimento e à

convivência com seus pares, o que nos permite afirmar que a escola não pode se

omitir diante de tais problemas, sob o risco de deixar de exercer uma de suas

funções ao reproduzir as relações de violência que serão foco de nossa análise.

Tal constatação vinha repercutindo há muitos anos no fazer pedagógico

anteriormente destacado, o que também nos fazia refletir sobre a função formadora

e transformadora da instituição escolar. Percebíamos que ocorriam comportamentos

inadequados no espaço escolar, os quais eram imitados e incorporados por outros

alunos e alunas. Assim, enquanto alguns estudantes tornavam-se alvo de maus

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tratos constantes, outros presenciavam as situações pacificamente, sem esboçar

nenhuma reação de solidariedade com o sofrimento alheio. Tais situações muitas

vezes provocavam a evasão, o remanejamento constante de turnos e até mesmo

transferências de alunos e alunas. Também eram causa de fracasso escolar e

distúrbios de aprendizagem, sem que ações metodológicas eficazes fossem tomadas

por parte dos agentes formadores. O que se via, comumente, eram ações paliativas

imediatas, tomadas apenas na ocasião dos conflitos vividos, sem uma maior

reflexão ou preocupação com as causas dos conflitos e com as formas de resolução

dos mesmos.

Percebíamos que, na função de professora pedagoga, a atuação limitava-se,

muitas vezes, à mediação na resolução dos problemas imediatos, os quais se

tornavam cada vez mais recorrentes. O dia a dia do fazer escolar muitas vezes não

propiciava momentos de reflexão, estudo e investigação com o objetivo de

desenvolver um trabalho de pesquisa mais sistematizado, na busca de um resultado

consistente e que pudesse transformar hábitos e comportamentos. Tal oportunidade

surgiu apenas com o PDE (Programa de Desenvolvimento Educacional da

SEED/PR). Diante dessa possibilidade de estudo e pesquisa, optamos por

desenvolver o trabalho tomando como objeto de estudo o fenômeno bullying e a

violência existente no contexto escolar. Além disso, buscamos uma nova

metodologia de trabalho com os conflitos escolares, pautada em uma estratégia de

ação denominada assembleias escolares.

As assembleias escolares, conforme veremos adiante, adotam os conflitos

como matéria-prima para o trabalho educativo. O princípio da participação escolar

permite a construção coletiva de regras de convívio e a aprendizagem de formas de

resolução dos conflitos baseadas no diálogo e reflexão coletivas.

De acordo com Arantes (2007, p.64), a mediação nas assembleias escolares

não fica a cargo de uma autoridade que vai decidir o que é certo e o que é errado. A

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prática se pauta em um modelo de democracia participativa, buscando no diálogo

uma possibilidade de reflexão sobre os fatos e os conflitos, respeitando as

diferenças de valores, crenças e desejos de todos os sujeitos envolvidos. A partir

disso, temos que o objetivo das assembleias não é somente obter soluções para os

problemas postos em discussão, mas também explicitar as diferenças. A partir do

diálogo entre posturas e ideias diferentes, promove-se a reflexão, com o objetivo de

construir mecanismos para dar suporte a uma convivência em que as diferenças não

se transformem em desigualdades e discriminação – como ocorre, por exemplo, no

caso das práticas de bullying. A prática de assembleias escolares pressupõe que

essas diferenças sejam trabalhadas pelo grupo de forma regular e sistemática,

contribuindo para as mudanças de postura dos estudantes frente aos conflitos.

Diante da temática que aqui se coloca, o presente material está organizado da

seguinte maneira:

Na Unidade I, apresentaremos algumas reflexões a respeito do papel da escola

enquanto espaço de formação e de aprendizagem significativa e democrática.

Entendemos que a escola deve almejar a formação de cidadãos críticos e

conscientes, buscando, para tanto, práticas educativas que levem à instrução –

entendida como a aprendizagem dos conteúdos escolares –, mas também à

formação – que engloba a dimensão dos valores e da convivência,

imprescindíveis para o desenvolvimento intelectual e moral dos indivíduos.

A Unidade II trata especificamente do fenômeno bullying no cotidiano escolar e

suas consequências para o desenvolvimento saudável dos educandos e

educandas, bem como suas implicações para o processo de ensino e

aprendizagem. A Unidade II traz também alguns resultados de pesquisa

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realizada junto a estudantes do Ensino Fundamental e Médio de uma escola do

interior do estado do Paraná.

Já a Unidade III tem como objetivo instrumentalizar os envolvidos com a

educação, dando lhes condições teóricas e práticas pra lidarem com os conflitos

gerados pela prática do bullying entre os estudantes, por meio do conhecimento

da estratégia de assembleias escolares para a prática pedagógica. A prática das

assembleias tem como uma de suas características a aquisição das capacidades

dialógicas necessárias para a formação de sujeitos capazes de lidar com seus

conflitos pessoais, na relação com o outro, com o grupo e consigo mesmo.

Por fim, esperamos também que este material auxilie no levantamento de

questionamentos acerca das temáticas abordadas, possibilitando um primeiro passo

rumo à reflexão e aprendizado de estratégias e possibilidades para professores e

professoras lidarem com o fenômeno bullying e a violência presente nas escolas.

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UUNNIIDDAADDEE II

Figura 11

1 João Victor de Oliveira Pátaro, tem 8 anos, estuda a 3ª série

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“Educar mentes e corações será o maior desafio dos educadores do século XXI”

(Cosete Ramos)

11..11.. PPrriimmeeiirraass ppaallaavvrraass

____________________________________________________________________________________________________________________________________

________________________________________________________________________________________

__________

_________________________________________________________________________________________________________________________________

______________________________________________________________________________________

_______________

Como encarar os conflitos e as dificuldades que

emergem das relações interpessoais presentes no

espaço escolar?

Qual o papel da

escola na

sociedade?

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A partir destas questões colocadas anteriormente, esta unidade tem como

objetivo discutir a função da escola enquanto instituição incumbida de instruir e

formar as futuras gerações, primando por uma educação para a cidadania, mas sem

deixar de lado os conteúdos escolares, fundamentais para a formação humana.

11..22.. AA ffuunnççããoo ddaa eessccoollaa:: iinnssttrruuççããoo ee ffoorrmmaaççããoo

Sem dúvida, uma das funções da escola hoje é ensinar e, portanto, sua

prática educativa deve mediar o encontro do saber e da cultura do(a) aluno(a) e da

comunidade com o saber e cultura da humanidade de forma mais ampla.

De acordo com o Projeto Político Pedagógico do Colégio Estadual Olavo

Bilac2, a escola deve garantir uma educação baseada em princípios de

democratização das relações pessoais e de socialização dos conhecimentos para

todos os seus membros, a fim de criar condições favoráveis para uma aprendizagem

de qualidade.

2 Escola em que será realizada a intervenção pedagógica baseada no presente material.

______________________________________________

______________________________________________

______________________________________________

______________________________________________

______________________________________________

______________________

O que entendemos

por Educação para

a cidadania

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[...] o respeito, as relações interpessoais, o diálogo e o trabalho

cooperativo como práticas que devemos privilegiar. Democratizar o Colégio significa ter capacidade para dialogar com os diversos

segmentos que o compõem: alunos, pais, professores, funcionários e instituições. ( PPP Olavo Bilac, 2005, p. 31)

Sob a ótica que adotamos para o presente trabalho, portanto, a educação deve

promover o desenvolvimento e a formação de cidadãos autônomos, críticos,

criativos, responsáveis e participativos, que sejam capazes de colaborar para o

processo de construção de uma sociedade democrática. Para tanto, é necessário

que, em sala de aula, estejam presentes práticas pautadas no diálogo, na

cooperação, na troca de informações mútuas e no confronto de pontos de vista

divergentes que possibilitem a construção de relações interpessoais positivas. Para

tanto, consideramos importante que tais práticas considerem os conflitos como

elementos naturais inerentes ao convívio humano e que devem ser transformados

em oportunidade de diálogo e formação3.

Dessa forma, percebemos que o trabalho do pedagogo, enquanto mediador

das práticas educativas pode contribuir para a construção de alternativas de

mudança da realidade escolar. Se considerarmos que uma das funções do pedagogo

– visto como orientador das práticas educativas – é buscar a construção de uma

escola autônoma, com a possibilidade de organizar e mediar processos de

mudanças no interior da escola, com base nas necessidades que se apresentam em

cada contexto escolar.

Para mediar tais processos de mudança no interior da escola, no entanto, não

podemos nos esquecer que o papel da escola engloba duas grandes dimensões: a

instrução e a formação. Neste sentido, a escola deve, por um lado, trabalhar com

alunos e alunas o conhecimento acumulado pela humanidade ao longo da história e

organizados na escola em torno dos conteúdos curriculares. Por outro lado, visando

as mudanças anteriormente destacadas, é necessário que os objetivos escolares

3 Sobre tal perspectiva diante dos conflitos, consultar “Conflitos sim, vio lência não”, de Izabel Galvão,

disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Etica/13_galvao.pdf

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contemplem também a formação dos sujeitos, auxiliando no processo de construção

de valores e de relações interpessoais que visem a superação das desigualdades e de

toda a forma de exclusão.

Assim, a escola deve ser vista como instrutora e formadora, incumbida de

trabalhar com o conhecimento acumulado pela humanidade e também de formar a

personalidade moral de alunos e alunas. Acreditamos que a escola não pode ignorar

em seu currículo a importância das relações interpessoais e dos conflitos para a

formação integral dos seus educandos, sob o risco de presenciar suas funções

básicas (instruir e formar) serem colocadas de lado mediante as situações de

violência escolar que presenciamos cotidianamente nas escolas.

Uma dos meios de formar em valores é através da vivência, da prática,

estimulando a reflexão e diálogo sobre situações reais de convivência. Segundo

Araújo (2007),

[...] aprender a ser cidadão e a ser cidadã é, entre outras coisas, aprender a agir com

respeito, solidariedade, responsabilidade, justiça, não-violência, aprender a usar o

diálogo nas mais diferente situações e comprometer-se com o que acontece na vida

coletiva da comunidade e do país. Esses valores e essas atitudes precisam ser

aprendidos e desenvolvidos pelos estudantes, e portanto podem e devem ser

ensinados na escola. (BRASIL, 2007, p.69)

Assim, evidencia-se que o convívio é muito importante na formação ética do

(a) estudante, sendo a escola um espaço que possibilita tal formação através do

convívio social e relações interpessoais, que devem objetivar a construção da

democracia e da autonomia dos sujeitos que ali convivem.

Se entendemos que a educação é instrução e formação, estamos dizendo que com a

educação queremos cumprir dois objetivos: ensinar conhecimentos e formar a

personalidade moral de nossos alunos. Se ensinar conhecimentos é algo

relativamente claro, não sucede o mesmo com formação moral. O que pretendemos

ver aqui é precisamente isso: o que entendemos por personalidade moral?

A personalidade moral está constituída por uma trama formada pelos seguintes

elementos:

A consciência de si mes mo e a capacidade que se outorga de dirigir-se com

autonomia.

A inteligência moral ou conjunto de capacidades que permitem deliberar e atuar

em situações sociais.

A experiência biográfica singular que modela a identidade, valores e a maneira

de ser. (PUIG, 2003, p.42)

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Assim, entendemos que as metodologias utilizadas pelos educadores e

educadoras na escola devem promover situações em que os (as) estudantes se

defrontem com os diferentes saberes, culturas, crenças e princípios morais que os

desafie, questionando seu modo de ver e estar no mundo. O encontro desses saberes

pode possibilitar aos sujeitos envolvidos novas aprendizagens, dentro de uma

relação dialógica e de respeito à maneira como pensam e percebem o que sabem do

mundo. Acreditamos que tal dinâmica possibilita uma vivência democrática

importante ao processo de emancipação de um sujeito que precisa ser autônomo e

construtor de sua própria história.

11..33.. EEdduuccaaççããoo ee ccoonnfflliittooss

Abordar a questão do papel da escola e a democratização das relações nela

presente implica compreendermos que os critérios e as normas que regulam uma

sociedade democrática não podem ser os mesmos para uma instituição escolar. Isso

porque a escola tem uma singularidade em relação à sociedade, uma vez que

alunos, alunas, professores e professoras não têm as mesmas responsabilidades e

não estão em igualdade de condições quanto aos seus conhecimentos e experiência

de vida. No entanto, é possível dizer que na escola democrática, educandos (as) e

educadores (as) podem se respeitar, entender e participar juntos em iniciativas e

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decisões importantes para ambos, no que se refere à organização dos propósitos

inerentes à formação humana.

Como já dito, partimos do princípio de que a escola pode e deve trabalhar

não apenas com os conteúdos sistematizados, mas também com a formação moral

dos (as) estudantes, buscando uma educação em valores pautada em princípios de

democracia, cidadania, justiça, solidariedade e respeito. A escola comprometida

com a formação para a cidadania deve, então, incumbir-se de trabalhar com os

alunos e alunas não apenas o conhecimento sistematizado, mas, também as relações

de convivência. Buscando promover estratégias para o autoconhecimento, o

diálogo, a resolução de conflitos, a participação, a construção de valores e outros

aspectos referentes à construção de relações interpessoais de qualidade e uma

convivência democrática participativa.

Entendemos que os conflitos fazem parte da vida humana, da convivência, e

que não podem ser ignorados, sob o risco de negligenciarmos algumas

possibilidades importantes de trabalho com valores, incorrendo inclusive em

relações de injustiça, desrespeito e violência. No entanto, o que presenciamos é que

as dificuldades nas relações interpessoais vêm se agravando cada vez mais, sem

que a escola e os docentes desenvolvam satisfatoriamente estratégias para lidar com

as diferenças e os conflitos. De acordo com Sastre e Moreno (2002), a escola não

tem atentado devidamente para o trabalho com as relações interpessoais,

enfatizando primordialmente os conteúdos sobre o mundo físico e externo e

esquecendo-se da formação do ser humano. Argumentando nesta mesma direção,

Araújo (2007b) afirma que:

A escola que conhecemos tem seu grau de responsabilidade neste processo de

formação que ignora a importância das relações interpessoais e dos conflitos para a

formação integral dos seres humanos. Um currículo com base apenas no mundo

externo e umas limitações espaço-temporais que justificam as dificuldades que

impõem ao trabalho com as relações humanas fazem com que os sistemas

educativos não cumpram com um importante papel que lhes é atribuído pela

sociedade: o da formação de cidadãos e cidadãs autônomos(as), que tenham

competências necessárias para lidar de modo ético com seus conflitos pessoais e

sociais. (ARAÚJO; 2007b, p.19)

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Diante da realidade que presenciamos em nossas escolas – destacando-se em

especial, para o presente projeto, o fenômeno bullying e as diferentes formas de

violência, entre elas a moral – entendemos ser fundamental que a escola forme

sujeitos capazes de lidar com os conflitos presentes nas relações interpessoais.

Acreditamos, inclusive, que uma das formas de se fazê-lo é justamente estimulando

as reflexões e vivências, por meio dos exemplos da prática e da discussão de

situações reais de convivência. Por isso, o convívio é muito importante na

formação ética do estudante, uma vez que, por meio do convívio social e das

relações interpessoais pode-se buscar a construção da democracia.

A educação com base na resolução de conflitos é, portanto, uma das formas

de se trabalhar a convivência democrática e a construção de valores. A

comunicação e a participação devem ser respeitadas, dando ao educando condições

de análise e reflexão sobre questões e problemas que ocorrem em seu cotidiano,

ajudando-o a buscar soluções de maneira coletiva. Para tanto, torna-se necessária

uma prática cotidiana dialógica e participativa, pautada na compreensão, no

respeito e que vise a construção de ações coletivas.

Assim, acreditamos que a escola deve reconhecer que o problema da

violência existe na sociedade e dentro do próprio ambiente escolar. A partir disso, é

importante que a escola busque entendê-lo e assuma o compromisso de que o aluno

é um ser humano que busca conhecer e formar-se no mundo.

11..44.. CCoonnssiiddeerraaççõõeess ffiinnaaiiss

Consideramos como ponto de partida que o processo educativo é

fundamental para o desenvolvimento humano, sendo uma das condições pelas quais

o sujeito adquire seus atributos fundamentais ao longo do processo histórico e

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social. Neste sentido, a escola desempenha papel fundamental, sendo a instituição

responsável por promover intencionalmente os processos educativos voltados às

novas gerações.

Como instituição educativa, a escola tem como uma de suas funções a

formação, de modo que não pode contemplar apenas a transmissão dos conteúdos,

mas deve estar comprometida com o desenvolvimento pleno de seus alunos e

alunas. Devemos, assim, estar comprometidos com o desenvolvimento do sujeito

para o exercício de sua cidadania plena, pensar nos fundamentos teóricos e

metodológicos que possam dar sustentação a uma prática pedagógica

emancipadora.

Concluímos que é fundamental, enquanto educadores, que atuemos como

mediadores no diagnóstico, prevenção e combate a todo tipo de violência presente

na escola, investindo na formação de nossos alunos, na qualidade das relações

interpessoais, fundamentais para o processo do desenvolvimento humano.

11..55.. AAttiivviiddaaddeess

A partir das reflexões proporcionadas por esta unidade, reflita a respeito das

seguintes questões:

1) De que forma você pensa que a escola vem

desempenhando atualmente seu papel enquanto instituição

que deve contemplar a instrução e a formação dos seres

humanos?

2) De que modo o(a) pedagogo(a) pode contribuir para

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efetivar modificações nos processos educativos proporcionados pela escola, a fim

de buscar uma educação para a cidadania?

3) Segundo Araújo (2007b), a escola vem ignorando a importância das relações

interpessoais e dos conflitos para a formação integral dos seres humanos e para a

cidadania

11..66.. MMaatteerriiaaiiss ccoommpplleemmeennttaarreess

Para saber mais a respeito das temáticas discutidas nesta unidade, você pode

consultar os seguintes materiais:

PUIG. J et al. Democracia e Participação Escolar: propostas

de atividades. São Paulo: Ed. Moderna, 2000.

BRASIL/MEC. Ética e Cidadania: construindo valores na escola

e na sociedade. Módulo: Convivência Democrática. Brasília: MEC,

2004.

Como tem sido sua

postura diante desses conflitos?

Como sua

escola vê as

relações de conflitos

existentes no

dia a dia

escolar?

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UUNNIIDDAADDEE IIII

Figura 2 Bárbara Bassi Mallio4

4 Bárbara Bassi Mallio tem 9 anos, estuda a 3ª série.

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22

“Todas as Crianças e Adolescentes têm direito a uma escola onde exista alegria, amizade, solidariedade e o respeito às

características individuais de cada um.” (ABRAPIA)

22..11.. PPrriimmeeiirraass PPaallaavvrraass

Um dos grandes problemas presentes no contexto escolar na

contemporaneidade é a violência física e moral que se manifesta na convivência

entre os alunos e alunas. Dentre estas formas de violência, podemos destacar o

fenômeno conhecido como bullying, que se concretiza em atitudes de falta de

respeito, brincadeiras de mau gosto, apelidos pejorativos, racismo, discriminação,

ameaças, roubos, agressões verbais e físicas, vitimizando crianças e jovens com

freqüência. Obviamente que tais ações não se dão sem nenhuma intervenção por

parte dos gestores escolares, registros de ocorrências, pedidos de desculpas,

esclarecimentos, diálogos, que acabam por repercutir de alguma forma

minimizando, prevenindo e combatendo esses comportamentos indesejáveis.

Porém, faz-se necessário buscar estratégias fundamentadas e sistematizadas

para lidar com tais conflitos, uma vez que é comum constatarmos as conseqüências

danosas, muitas vezes irreversíveis, que o fenômeno bullying pode trazer à vida de

nossos alunos e alunas.

Apesar das ações que a escola vem desenvolvendo para lidar com as atitudes

de violência, episódios como o bullying continuam acontecendo, em muitos casos,

de forma sutil e camuflada, vista como brincadeiras entre os estudantes. Isto nos

leva a considerar que muitas das intervenções que vem sendo realizadas na escola

não têm sido capazes de criar junto aos alunos e alunas, uma cultura da “não

violência”. Convém destacarmos que, para Fante (2005), se quisermos construir

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uma sociedade em que a violência seja repudiada, é necessário que o olhar das

autoridades esteja voltado à educação.

Nesta Unidade, buscaremos discutir sobre as especificidades do fenômeno

bullying – entendido como uma forma de manifestação da violência escolar – na

intenção de auxiliar os educadores a compreender de que forma este fenômeno

ocorre e quais as possíveis conseqüências para os sujeitos envolvidos. A fim de

aprofundarmos nossas discussões, apresentaremos também os resultados de uma

pesquisa realizada junto aos estudantes, buscando demonstrar de que forma o

bullying vem sendo visto pelos sujeitos que o protagonizam: os próprios alunos e

alunas.

22..22.. OO ffeennôômmeennoo bbuullllyyiinngg

Nas relações escolares, é comum a existência de vários conflitos e tensões,

muitas vezes concretizados em interações agressivas, manifestadas como diversão e

utilizadas para auto-afirmação, para o estabelecimento de domínio de forças e de

poder entre os estudantes. Neste material, nossa discussão recai sobre parte destes

conflitos interpessoais: a violência escolar.

Ao falarmos em violência escolar, muitos seriam os campos de estudo que

nos possibilitariam uma maior aproximação a este fenômeno. No contexto deste

trabalho, utilizamos o termo violência moral para nos referirmos às pressões e

efeitos de natureza psicológica que se fazem presentes nas relações entre os

estudantes na escola: humilhação, ameaças, exclusão, xingamentos, etc. (PUPO,

2007).

Neste sentido, entendemos o bullying como uma das formas de violência

moral, e cabe, desta forma, uma maior aproximação a este conceito, a fim de

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compreendermos possibilidades de intervenção em busca de relações interpessoais

mais justas e solidárias.

Fante (2005) nos auxilia na compreensão deste tipo de violência muito

presente nas escolas:

[...] por definição universal, bullying é um conjunto de atividades agressivas,

intencionais e repetitivas que ocorrem sem mot ivação evidente, adotado por um ou

mais alunos contra outro(s), causando dor, angústia e sofrimento. Insultos,

intimidações, apelidos cruéis, gozações que magoam profundamente, acusações

injustas, atuação de grupos que hostilizam, ridicularizam e infern izam a vida dos

outros alunos, levando-os a exclusão, além dos danos físicos, morais e materiais, são

algumas das manifestações do comportamento bullying. (FANTE, 2005, p. 28-29)

Podemos afirmar que, no cotidiano escolar, são bastante frequentes os

problemas e comportamentos relacionados ao fenômeno bullying e a outras formas

de violência moral. Em muitos destes casos, a escola e seus profissionais

demonstram dificuldades para lidar com esse problema da agressão, do assédio e do

desrespeito que ocorre entre os estudantes nas escolas, e que tem aparecido com

freqüência na mídia. Muitas vezes, tenta-se apontar culpados dentro da instituição

escolar, sem que necessariamente sejam propostas formas de resolução e prevenção

da violência. De acordo com a autora,

As crianças vitimizadas pelo comportamento bullying sofrem terrivelmente ao longo

dos anos, muitas vezes sob a vista de seus professores no ambiente escolar, nas salas

de aulas. Sofrem silenciosamente, de maneira cruel e velada, maus tratos

humilhação pública, rejeição social, gozações, perseguições, angústias, medos,

desrespeitos constante e repetitivo, quase sempre por serem diferentes em seu

biótipo. (FANTE, 2005, p.11)

O fenômeno aqui em questão pode ocorrer em qualquer escola, pública ou

particular, que atenda a sujeitos de todas as classes sociais. A criança vitimizadas

pelo bullying pode tornar-se refém de uma ansiedade, pela excessiva mobilização

psíquica de medo, constrangimento, angústia e raiva reprimida, que irão interferir

em todo o desenvolvimento e também no seu processo de aprendizagem escolar.

Conforme nos apresenta Fante (2005), os sujeitos vítimas do fenômeno bullying:

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[...] poderão aprisionar sua mente a construções inconscientes de cadeias de

pensamentos, que resultarão em dinâmicas psíquicas destrutivas de si mes mo e da

sociedade como, por exemplo, a instalação de desejo de matar, por vingança, o

maior número de pessoas seguido de suicídio. [...] O resultado, nesse caso, é que a

experiência vivenciada, reg istrada com forte carga emocional, afetará

profundamente a sua memória, prejudicando a mente na construção da sua história

intrapsiquica, no desenvolvimento da sua inteligência, na sua capacidade de auto-

expressão e na sua atitude de primar por cidadania e qualidade de vida, decorrente

dos traumas sofridos. (FANTE, 2005, p.12)

Para Midelton e Zavadski (2007), os atos repetidos de agressividade – física

e moral – entre os estudantes e um certo desequilíbrio de poder são as principais

características que possibilitam a intimidação da vítima. A relação desigual de

poder se manifesta de diferentes maneiras – diferenças na estatura, força,

características físicas e psíquicas, opressão do grupo –, intimidando a vítima,

impedindo-a de se defender.

Para os autores estudiosos do tema, os comportamentos de bullying

apresentam características específicas, diferenciando-os de outras formas de

violência. Cabe destacar que o bullying pode ser cometido em vários outros

espaços onde existam relações interpessoais nas quais se expressem uma relação

desigual de poder: escolas, asilos, prisões, clubes, locais de trabalhos. No entanto,

neste caso, nossa preocupação recai sobre a prática desse fenômeno no contexto

escolar, visto que tem sido cada vez mais frequente entre os estudantes.

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Entendemos que a escola, por sua função de instância formadora do sujeito, pode

auxiliar no combate e na prevenção de tais atitudes.

Tomando por base os atos de bullying, é possível destacarmos algumas

características importantes que nos ajudam a identificar o modo de envolvimento

de cada aluno. Tais características estão vinculadas aos papeis que os estudantes

podem vir a representar: vítima, agressor e espectador. A seguir, para uma maior

compreensão das ocorrências do bullying, descreveremos cada um destes papeis:

VÍTIMA

A vitima é tomada sempre por muita insegurança, podendo apresentar baixo rendimento

escolar, faltas constantes e sem motivo aparente. Em muitos casos, alega perda de seus

pertences, prefere manter-se afastada dos demais colegas, e pode apresentar arranhões e

manchas pelo corpo que não sabe explicar a origem. Estes estudantes são prejudicados e

sofrem as consequências dos comportamentos de outros. Não possuem recursos para,

nas relações estabelecidas, resistir, minimizar ou acabar com os atos danosos contra si.

Em geral, são pouco sociáveis, e a insegurança acaba por impedi- los de pedir auxílio na

escola ou mesmo em casa. Sentem que não há possibilidade de se adaptarem ao grupo, e

muitas vezes, sofrem sem que ninguém perceba ou intervenha. com baixa auto-estima,

alguns desses alunos e alunas acreditam que sejam merecedores das críticas e agressões

a que são vítimas. Nos casos extremos, acabam entrando em depressão profunda, sendo

levados pelo desespero a tentar ou cometer suicídio.

AGRESSOR

O agressor de modo geral é temido, manipula os colegas ao redor para que outros

participem de seus atos agressivos. Anda sempre em grupo, não suporta ser contrariado.

Geralmente, são alunos que apresentam pouca empatia e falta de limites. Os sujeitos que

cometem o bullying possuem grande probabilidade de se tornarem adultos com

comportamentos anti-sociais e/ou violentos, podendo vir a preferir, até mesmo, atitudes

delinquentes ou criminosas.

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ESPECTADOR

Os espectadores assistem a tudo, em geral sem se manifestar. Em alguns casos, acaba

por participar dos atos de agressão e violência, temendo contrariar o agressor. Os

espectadores é representado por grande parte dos alunos, que estão familiarizados com a

violência e acabam por optar pelo silencio diante da situação, por medo de se tornarem

os próximos alvos. Apesar de não sofrerem as agressões de uma forma direta, muitos

podem se incomodar com o que vêem, mas se sentem inseguros sobre o que fazer e

como resolver os conflitos.

Como educadores e como instituição educativa, devemos ter a consciência

das consequências provocadas pelo bullying e pelas demais formas de violência

moral, uma vez que temos o compromisso de primar pelo desenvolvimento dos

estudantes em busca de uma educação cidadã, considerando o desenvolvimento das

condições físicas, psíquicas, cognitivas ideológicas, científicas e culturais.

Com isto, são necessárias formas de intervenção e esforços coletivos com a

participação de toda a comunidade escolar: diretores (as), pedagogos (as),

professores (as), administradores (as), bibliotecários (as), zeladores (as), familiares

e principalmente os (as) alunos (as).

Entendemos que a escola tem um papel fundamental na

construção de valores éticos e de cidadania que possibilitem a

formação dos membros que ali convivem para que pautem sua

vida pessoal e coletiva no respeito às diferenças. Valores como

o respeito, a solidariedade e a justiça certamente auxiliam no

combate aos comportamentos e pensamentos que estimulam a exclusão e os atos de

agressão e violência a que aqui nos remetemos.

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22..33.. AAllgguunnss ddaaddooss ddee ppeessqquuiissaa

A fim de auxiliar na compreensão do fenômeno bullying, e de que forma o

mesmo vem sendo vivenciado e significado pelos estudantes, apresentaremos a

partir de agora dados referentes a pesquisa realizada com alunos e alunas do

Colégio Estadual Olavo Bilac, em agosto de 2007. Tais dados, apresentados a

seguir, foram coletados junto a um total de 1.215 alunos de 11a 18 anos de 5ª à 8ª

séries e do Ensino Médio, estudantes dos períodos matutino, vespertino e noturno.

A pesquisa envolveu a aplicação de um questionário, conforme modelo

abaixo apresentado:

QUESTIONÁRIO

1. Você já sofreu algum tipo de Bullying?

( ) Sim ( ) Não

2. Que tipo de Bullying foi?

( ) Apelidar ( ) Difamar ( ) Agredir

( ) Ameaçar ( ) Excluir ( ) Tomar pertences

( ) Humilhar ( ) Perseguir ( ) Zoar

( ) Outros: __________________________________________________________

3. Quais foram seus sentimentos?

( ) Não se incomodou ( ) Raiva ( ) Medo

( ) Vergonha ( ) Ficou assustado

( ) Não quis mais ir para escola

( ) Outros: __________________________________________________________

4. O que você fez?

( ) Deixou pra lá ( ) Fez cessar, impôs-se ( ) Brigou

( ) Contou para seus pais ( ) Avisou os professores, orientadora, direção

( ) Outros: __________________________________________________________

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5. Você já praticou algum tipo de Bullying?

( ) Sim ( ) Não

Quais os motivos que o levaram a essa prática?

_____________________________________________________________________

_____________________________________________________________________

6. Quais os motivos que o levou a essa prática?

( ) Vingança ( ) Era engraçado

( ) Pelas características do colega

( ) Outros: _________________________________________________________

7. O que você sentiu ao praticar o Bullying?

( ) Prazer ( ) Sentiu-se vitorioso ( ) Foi engraçado

( ) Pena ( ) Sentiu que era merecido ( ) Vergonha

( ) Ficou com medo que outros vissem

( ) Outros: __________________________________________________________

8. Você já testemunhou algum tipo de Bullying?

( ) Sim ( ) Não.

Como foi? ____________________________________________________________

_____________________________________________________________________

9. Quer descrever algum fato sobre o assunto?

_____________________________________________________________________

_____________________________________________________________________

_____________________________________________________________________

O questionário apresentado foi elaborado com base no material da Revista

Época, “Sutil e Cruel” (31/05/2004), e teve como objetivo de levantar dados sobre

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o bullying em nosso dia a dia na escola, para buscar possíveis caminhos para

redução e controle deste fenômeno.

A Questão 08 permitiu que tivéssemos acesso a diferentes vivências dos

alunos e alunas no que diz respeito a situações de bullying, descritas a seguir:

“Na sala de aula uns falam mal dos outros não tem respeito e não se

importam com os sentimentos dos outros.”

“Fui maltratada e me calei, sabia que não dariam importância, seria

encarada como brincadeira.”

“Foi uma experiência horrível, queria morrer.”

“Eu sei o que é ser humilhada, não gosto de fazer com os outros o que não quero para mim.”

“Foi horrível me senti envergonhada, queria desaparecer sumir e nunca

mais voltar à escola.”

“A escola toma medidas calmas, o que faz com que esses alunos fiquem

acomodados para fazerem o que bem entenderem.”

“É algo horrível cruel, só quem não tem caráter é que faz.”

“Fui humilhada discriminada por causa da classe social, por ser baixinha e

não ter coisas de valor.”

“Eu nunca consegui ter uma vida boa na escola, eram apelidos,

humilhações, ameaças e outros, eu sempre ficava quieta mas um dia explodi.

Já passei por muitos tratamentos psicológicos.”

“Às vezes as pessoas não se sentem satisfeitas com elas mesmas, querem

magoar os outros, para que se sintam iguais a eles.”

“Quando uma pessoa te difama, você sabe que é mentira,

mas as outras pessoas, o que ficam pensando?”

“Tem que ter uma lei para punir esse tipo de violência.”

“Humilham uma colega minha só porque ela é gordinha.”

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“Me discriminam por causa da minha raça.”

“É um assunto muito delicado pois mexe com o lado sentimental do ser humano.”

“Me chamam de Bombril, Assolam, na frente de todos e todos riem de mim,

sinto muita vergonha.”

“Os diretores a orientadores precisam tomar atitude, tem muita gente triste

e com medo dentro da escola.”

A partir das respostas dadas pelos alunos à questão de Número 9, pudemos

coletar alguns depoimentos e sugestões dos alunos, apresentados a seguir:

Ter amizade e

paciência

Não fazer parte

do bullying

Que os professores dêem

maior importância aos atos

de bullying dentro da

escola. Que todos

parem de

bater e falar

palavrões

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Continuar fazendo

palestras de orientação

para não haver mais

humilhações e racismo

Amor ao

próximo

Ser realmente amigos

e pedir desculpas

quando ocorrer uma

situação de bullying

Parar com o

preconceito e o

racismo com as

pessoas

Ter compaixão

Conversar

com as

pessoas e

orientar

para não

fazer mais

isso

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As demais questões aplicadas foram tabuladas, e os dados a seguir

representam as respostas dadas pelos estudantes pesquisados:

GRÁFICO1

FONTE: COLÉGIO ESTADUAL OLAVO BILAC, Equipe Pedagógica, 2007

GRÁFICO 2

FONTE: COLÉGIO ESTADUAL OLAVO BILAC, Equipe Pedagógica, 2007

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GRÁFICO 03

FONTE: COLÉGIO ESTADUAL OLAVO BILAC, Equipe Pedagógica, 2007

GRÁFICO 04

FONTE: COLÉGIO ESTADUAL OLAVO BILAC, Equipe Pedagógica, 2007

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GRÁFICO 05

FONTE: COLÉGIO ESTADUAL OLAVO BILAC, Equipe Pedagógica, 2007

GRÁFICO 06

FONTE: COLÉGIO ESTADUAL OLAVO BILAC, Equipe Pedagógica, 2007

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GRÁFICO 07

FONTE: COLÉGIO ESTADUAL OLAVO BILAC, Equipe Pedagógica, 2007

GRÁFICO 08

FONTE: COLÉGIO ESTADUAL OLAVO BILAC. Equipe Pedagógica, 2007

Tabuladas todas as informações coletadas nos questionários, foi

surpreendente o alto índice de alunos vítimas do bullying, que atingiu 87% dos

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estudantes da escola pesquisada. Destes, o apelido foi indicado como a prática mais

habitual (29%), seguido por zoar (17%), humilhar (9%), excluir, empurrar, agredir,

difamar ( representando entre 8% e 6%) e outros com menor incidência.

Quanto aos sentimentos presentes nessas relações conflituosas, a raiva foi a

mais recorrente (46%), seguida da vergonha (21%), indiferença (16% que alegou

não se incomodar), medo (6%), vontade de abandonar a escola (5%), dentre outros.

Quanto à reação diante de uma atitude de bullying, a maioria dos estudantes

não tomou nenhuma atitude (37%), enquanto que 21% alegou ter brigado, 15%

recorreu aos pais e 14% aos professores, dentre outras formas de reação.

No levantamento sobre a prática do bullying, o resultado foi inesperado: 69%

dos alunos pesquisados disseram já ter praticado. Na questão referente ao

sentimento após esta prática, 26% justificou dizendo ser merecido, enquanto que

22% sentiu pena, 18% considerou engraçado, dentre outros sentimentos apontados.

Acerca dos motivos dessa prática, os dados pesquisados indicaram a vingança

(50%) como sendo o fator preponderante.

22..44.. CCoonnssiiddeerraaççõõeess ffiinnaaiiss

Concluímos que é constante a ocorrência de várias formas de violência nas

escolas, apresentando índices alarmantes, sendo um dos motivos de grande

preocupação das instituições educativas.

Nossa preocupação com o bullying, enfoque desta Unidade, decorre do fato

de esta ser uma forma de violência que, na maioria das vezes, apresenta-se de

forma velada e sutil, interpretada pelo meio escolar como brincadeira da idade. No

trabalho de pesquisa desenvolvido em 2007, cujos dados foram aqui apresentados,

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pudemos verificar que o bullying é uma forma de violência frequente entre os

escolares, que muitas vezes dá origem a outras formas de violência, podendo

desencadear uma série de problemas no contexto escolar e no desenvolvimento dos

sujeitos envolvidos.

Não há como negar, portanto, a existência do fenômeno bullying em nossas

escolas. Cabe-nos, deste modo, buscar soluções para resolver esse fenômeno e

outras formas de violência, que refletem relações de injustiça e desrespeito, que

causam sofrimento e até mesmo distúrbios. Tais manifestações acabam por

interferir no desenvolvimento, no processo do saber sistematizado e também no

processo de construção da cidadania de todos os envolvidos (vítimas, agressores,

espectadores), sendo causas de faltas constantes, reprovações, evasão escolar,

transferências, remanejamentos de turno e gerando consequências inclusive para a

vida adulta dos alunos e alunas.

22..55.. AAttiivviiddaaddeess

São muitas as diversidades existentes no ambiente escolar.

Essas diferenças, se reconhecidas e bem encaminhadas no trabalho

escolar, podem se constituir em elemento importante e

enriquecedor para a aprendizagem e desenvolvimento dos

estudantes. Considerando o fenômeno bullying como uma prática

constante em nossa escola, conforme os dados da pesquisa

apresentada, responda, tecendo comentários:

1) Existem ações concretas da escola voltadas a essa problemática?

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2) Que ações poderiam ser efetivadas pela escola no sentido de buscar a

consciência e o respeito às diferenças, a serem encaradas de forma positiva e

enriquecedora no processo de ensino e aprendizagem?

3) Tendo em vista a pesquisa apresentada no item 2.3, analise os dados da Questão

8 (em que alunos e alunas vítimas do bullying relatam o sofrimento vivenciado).

Em seguida, responda e comente: pode o bullying ser a causa de problemas de

indisciplina, evasão e do fracasso escolar de muitos de nossos alunos?

22..66.. MMaatteerriiaall ccoommpplleemmeennttaarr

Para saber mais sobre os temas tratados nesta Unidade, você pode consultar

os seguintes vídeos, que trazem reportagens e debates acerca do fenômeno

bullying:

http://www.youtube.com/watch?v=mGbmqdGeokM

http://www.youtube.com/watch?v=XHEfAW9FIkw

http://www.youtube.com/watch?v=GEZdqDX41rQ

http://www.diaadia.pr.gov.br/tvpendrive/modules/debaser/singlefile.php?id=16191

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UUNNIIDDAADDEE IIIIII

Figura 3 Bárbara Bassi Mallio 5

5 Bárbara Bassi Mallio tem 9 anos, estuda a 3ª série.

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33..11.. PPrriimmeeiirraass ppaallaavvrraass

Como vimos na Unidade I, podemos dizer que o conflito faz parte da

construção e da vida do ser humano. Sabemos também que as diferenças são

importantes, pois tornam a vida mais rica e variada, no entanto, em muitos

momentos, tais diferenças acabam sendo tomadas como motivo de discriminação,

preconceito e violência, como vimos na Unidade II.

Diante disso, é preciso saber trabalhar com as diferenças, tomando-as como

um conteúdo capaz de formar pessoas mais preparadas para viver em sociedade.

Sabemos que a escola, por seu caráter institucional, recebe pessoas diferentes que

convivem por boa parte do dia, compartilhando valores, crenças, desejos, histórias

e culturas diversas. Sendo assim, trata-se de um espaço privilegiado para se

desenvolver um trabalho com as diferenças e com os conflitos que delas emergem.

É a partir de tal crença que buscamos, na prática das assembleias escolares,

uma possibilidade de trabalho com a resolução de conflitos na escola.

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33..22.. OO qquuee ssããoo AAsssseemmbblleeiiaass EEssccoollaarreess??

As assembleias escolares são momentos em que um

grupo se reúne de forma organizada e sistematizada na

escola. Como define Puig (2003), é o momento

institucional da palavra, do diálogo. Isso quer dizer que, em

uma assembleia, está garantido o espaço para o debate, para

a negociação, para o diálogo acerca de problemas ou

conflitos vividos por um grupo de pessoas que convivem. É por meio do diálogo,

da discussão, reflexão e análise que o grupo elabora regras ou normas, claras e bem

definidas, necessárias à convivência e muito importantes ao desenvolvimento das

relações interpessoais. Deste modo,

[...] as assembléias são o momento institucional da palavra e do diálogo. O

momento em que o coletivo se reúne para refletir, tomar consciência de si mesmo e

transformar tudo aquilo que seus membros consideram oportuno. É um momento

organizado para que alunos e alunas , professores e professoras possam falar das

questões que lhes pareçam pertinentes para melhorar o trabalho e a convivência

escolar. (PUIG et al apud ARAÚJO, 2004, p.22)

As assembleias escolares tratam de temáticas voltadas ao interesse de um

grupo, e Araújo (2004) apresenta diferentes modalidades de assembleias:

Assembleias de classe – acontecem em encontros semanais, com a

participação do docente e de todos os educandos e educandas. O objetivo de uma

assembleia de classe é melhorar a convivência e as relações interpessoais por meio

do diálogo. Os participantes utilizam o espaço da assembleia para conversar sobre

os conflitos ou discutir questões que, de alguma forma, interferem no desenrolar

das atividades no cotidiano escolar. Ao reunirem-se em assembleia, alunos e alunas

são incentivados ao protagonismo, à participação e ao diálogo, havendo o respeito

às diferenças, valores e crenças de cada membro do grupo.

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Nas séries iniciais do Ensino Fundamental, sugere-se que o professor ou

professora assuma a função de coordenador(a), definindo o horário em que

acontecerão as reuniões semanais e seguindo rigorosamente. Já nas séries finais do

Ensino Fundamental e no Ensino Médio, devido à grade horária com várias

disciplinas e professores(as), sugere-se definir a aula de uma disciplina em que

ocorrerão as assembleias, ficando acertado dia e horário fixos para a realização

destas e um(a) professor(a) ou pedagogo(a), que assume o papel de coordenador

das assembleias de classe.

Assembleias de escola – acontecem em encontros mensais e contam com a

participação de todos os seguimentos da comunidade escolar, com o intuito de

discutir assuntos pertinentes à instituição escolar, em suas necessidades ligadas a

relações de trabalho, organização interna, relações interpessoais e convivência no

âmbito dos espaços coletivos.

Assembleias docentes – são voltadas à discussão de temáticas pertences a

este grupo, a fim de regulamentar questões referentes ao relacionamento e ao

convívio entre os docentes, gestores e equipe pedagógica. Também fazem parte

destas discussões o envolvimento destes com o projeto político pedagógico e outras

questões que envolvam a vida funcional e administrativa da instituição.

Diante disso, entendemos que a prática das assembleias escolares, seja qual

for a modalidade, possibilita uma aprendizagem formativa, essencial para lidar com

os conflitos interpessoais por meio da construção de novos alicerces e valores,

sustentados pela justiça, igualdade, equidade, solidariedade e diálogo. Segundo

Araújo (2007a)

Dentre outras coisas, o que se tenta com essa forma de se trabalhar os conflitos é

reconhecer e articular os princípios de igualdade e de equidade nas relações

interpessoais nos espaços de convivência humana, o que nos remete à construção da

democracia e da justiça. [...] Em um espaço de assembléia ao se dialogar sobre um

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conflito, é garantido a todos os membros que dela participam a igualdade de direitos

de expressar seus pensamentos, desejos e modos de ação, ao mesmo tempo que é

garantido também a cada um de seus membros o direito à diferença de pensamentos,

desejos e modo de ação. Pelo diálogo, mediado na assembléia pelo grupo, as

alternativas de solução ou de enfrentamento de um problema são compartilhadas, e

as diferenças vão sendo explicitadas e trabalhadas pelo grupo regularmente, durante

um longo processo e período. (ARAÚJO, 2007a, p.24 e 25)

Com isso, vemos que um dos objetivos da prática de assembleias no

cotidiano escolar é permitir que estudantes tenham garantido seu direito à

participação, pois na assembleia todos podem expressar seus sentimentos e

pensamentos. Ao mesmo tempo, a prática de assembleias possibilita que alunos e

alunas entrem em contato com a diversidade de opiniões e diferenças de conduta, o

que permite que se pense sobre sua postura e a dos outros membros do grupo de

maneira prática e cotidiana, em toda e qualquer situação de conflitos que possa ser

discutida em assembleia.

33..33.. CCoommoo oorrggaanniizzaarr uummaa AAsssseemmbblleeiiaa ddee

CCllaassssee??

Descrevemos anteriormente três diferentes modalidades de

assembleias escolares (assembleias de classe, de escola e docente).

Embora cada uma dessas modalidades tenha características e

objetivos específicos, o processo para o desenvolvimento de tais

assembleias é comum a todas as modalidades. A seguir,

descreveremos os passos para a implementação das assembleias na escola, de

acordo com Puig (2003) e Araújo (2007a):

1. A mobilização do grupo

O primeiro passo é o desenvolvimento de atividades didáticas que

proporcionem o conhecimento para a classe sobre o que é uma a assembleia e a

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importância da construção de um espaço de diálogo para a resolução de conflitos.

O livro “Democracia e participação escolar” (Puig et al, 2003) – presente em nossa

bibliografia – pode ajudar professores e professoras a desenvolver este trabalho de

mobilização do grupo em torno da importância do diálogo para a convivência

democrática.

2. A sistematização da periodicidade

Para que os objetivos das assembleias sejam alcançados, os dias e horários

de sua realização devem ser respeitados. Uma possível sugestão de periodicidade é:

a. Assembleia de classe: semanal;

b. Assembleia de escola: mensal;

c. Assembleia docente: mensal.

É importante ressaltar que a certeza de que a assembleia ocorrerá no dia e

horário marcado é fundamental para a construção de valores. Isto é o que permite

que os conflitos sejam discutidos frequentemente, em um processo, e não

pontualmente ou apenas em ações paliativas imediatas, tomadas na ocasião dos

conflitos vividos sem reflexão ou preocupação com as causas dos conflitos e com

as formas de resolução do mesmos.

3. Os temas das assembleias

Sobre o que alunos e alunas falam nas assembleias? Existem dois grandes

eixos de assuntos importantes a serem tratados nas assembleias. Ambos afetam

diretamente a vida coletiva e as relações de convívio entre os membros de um

grupo. São eles:

a. Temas relacionados ao convívio escolar;

b. Temas relacionados às relações interpessoais entre os membros do grupo.

Nas assembleias de classe os temas devem permear as relações existentes no

convívio da turma de crianças. Os conflitos entre colegas, perseguições, relações

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autoritárias, assédios, chantagens, agressões, enfim todo e qualquer comportamento

oriundo das más relações interpessoais.

O diálogo é o mecanismo principal dessa prática, porém, o coletivo não pode

tomar decisões que não sejam de sua responsabilidade. Nas palavras de Araújo:

Para exemplificar, os estudantes de um grupo podem discutir a violência na escola e

apontar caminhos para seu enfrentamento, mas jamais podemos lhes outorgar o

direito de estabelecer sanções àqueles que descumprirem uma regra de não brigar. A

sanção, quando necessária, deve ser aplicada por quem tem a responsabilidade e a

formação profissional para tal. (2007ª, p.56)

Com isso, vemos que a prática de assembleias não desfaz a ordem de papeis

existentes entre estudante e educadores. Ao mesmo tempo em que reconhece o

direito à participação de todos os membros da comunidade escolar, as assembleias

funcionam dentro da assimetria natural dos papeis de discentes e docentes nas

relações escolares.

4. A preparação e composição da pauta

A pauta da assembleia deve ser construída coletivamente. No caso das

assembleias de classe, o(a) professor(a) e seus alunos(as) escrevem os temas na

pauta ao longo de toda a semana. Estes são organizados em dois blocos para

discussão: Críticas e Felicitações. O intuito é o de discutir não só os conflitos e

problemas vividos pelos membros do grupo (críticas), mas também valorizar os

aspectos positivos (felicitações).

As pautas geralmente são organizadas em uma cartolina afixada em um lugar

bem visível da classe, para que todos e todas possam escrever, como no exemplo a

seguir:

EU CRITICO

-

-

-

EU FELICITO

-

-

-

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Como já dito, ao longo da semana os membros da turma vão escrevendo as

críticas e sugestões que querem discutir durante a assembleia. No processo de

construção coletiva da pauta é muito importante que seja preservado o anonimato

de quem escreve na pauta. Além disso, os temas devem ser escritos na pauta de

maneira impessoal, referindo-se às ações criticadas, e não à pessoas concretas. Por

fim, a visibilidade da pauta deve ser observada, a fim de que exerça um papel de

regulação do grupo, contribuindo para um melhor funcionamento da classe.

No momento da discussão dos assuntos escritos na pauta, também é

importante destacar que não é necessário seguir a ordem em que os assuntos foram

escritos. Muitas vezes surgem temas repetidos e/ou semelhantes que precisam ser

reorganizados e reunidos. Assim, a sugestão é que, antes da assembleia, o(a)

professor(a) e mais dois alunos ou alunas se reúnam rapidamente para organizar a

pauta e somente depois se dê início à assembleia com a presença de todos os

membros.

5. O registro por meio de atas

Durante a realização das assembleias é importante que se faça o registro das

decisões do grupo para consultas posteriores ou, se necessário, a retomada de

discussões e acordos, regras e encaminhamentos firmados em outras reuniões.

A proposta é adotar um livro/caderno-ata simples no qual são anotados:

a. o cabeçalho com data, local e tipo de assembleia;

b. cada um dos temas constantes na pauta e, junto a eles, as regras elaboradas

e/ou as decisões tomadas;

c. os encaminhamentos sugeridos para o enfrentamento do conflito e

cumprimento das regras.

No final da assembleia, a ata deverá ser assinada por todos os membros que

dela participaram, constando a identificação da equipe que coordenou a assembleia.

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6. Coordenação e representação nas assembleias

Em uma assembleia de classe, além do professor ou professora que coordena

a assembleia, é necessário que se tenha dois estudantes-coordenadores que auxiliam

o docente na organização da pauta definitiva da assembleia. A função dos

estudantes pode ser de coordenação, sob a supervisão docente, e de relatoria.

Os cargos existentes nas assembleias escolares são rotativos, não podem ser

fixos, de modo que possam ser experienciados por todos os estudantes.

33..44.. OO ffuunncciioonnaammeennttoo ddaass aasssseemmbblleeiiaass ddee ccllaassssee

Em uma assembleia, a disposição física do espaço na sala deve se dar de

forma que todos possam ver e ouvir uns aos outros enquanto dialogam. Os lugares

da sala devem ser arrumados em círculo ou semicírculo.

A assembleia tem início com a equipe responsável escrevendo no quadro ou

lendo a pauta do dia. Enquanto se explica a ordem das temáticas da pauta, pode-se

oferecer a oportunidade para que todos que colocaram temas se manifestem, caso

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desejem. Após se colocarem de acordo com a pauta, o coordenador(a) começa com

o primeiro assunto da pauta. As críticas são abordadas primeiro, deixando para o

final as felicitações. A discussão de cada pauta é divida em três momentos:

1º momento: Dialogando sobre o tema

É um momento de esclarecimentos sobre o tema da pauta. Neste momento o

coordenador ou coordenadora pergunta se a pessoa que colocou a crítica quer se

manifestar. Este momento é importante, pois quem colocou o tema na pauta não é

obrigado a se identificar. Somente depois da manifestação do autor da crítica ou de

seu silêncio é que o(a) coordenador(a) da assembleia abre a discussão para os

outros membro]s do grupo.

O diálogo é a ferramenta essencial para coordenar uma assembleia, ele deve

ser aprendido na prática. Durante a assembleia é importante colocar ordem nas

manifestações (pedindo que se levante a mão, por exemplo), saber cortar as falas

que fogem da discussão (geralmente as crianças levam as discussões para casos

pessoais), e controlar o tempo para que a pauta seja cumprida. Além disso, é

importante saber evitar que a discussão se concentre nas mãos dos mais

extrovertidos, abrindo espaço para os tímidos se manifestarem também. Apesar da

participação não ser obrigatória, é importante que se faça uma rodada de perguntas,

oferecendo oportunidade para todos e todas se manifestarem, (caso alguém se

recuse, deve ser respeitado).

2º momento: Construindo regras de convivência

A função primeira das assembleias é a elaboração de regras que possam

regular a convivência e as relações interpessoais em um grupo, de forma que as

diferenças possam ser manifestadas democraticamente, e não de maneira violenta.

A construção dessas regras deve acontecer de modo coletivo, a partir do

diálogo. Assim, as regras não podem ser impostas exclusivamente pela autoridade

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instituída – o (a) professor (a) –, pois são elas que regulam o convívio e as relações

interpessoais.

A votação das regras deve passar por todos, sem exceção. A manifestação

deve acontecer, seja a “favor”, “contra” ou mesmo em forma de “abstenção”. Cada

decisão deve ser respeitada. Mesmo em uma votação unânime o(a) coordenador(a)

da assembleia deve fazer as perguntas “Quem é a favor da regra proposta? Quem é

contra? Quem se abstém?”, pois os participantes da assembleia precisam saber que

essas possibilidades sempre estarão presentes, em todas as votações.

3º momento: A resolução de conflitos e as sugestões para se cumprir as

regras

Depois de discutido o assunto escrito na pauta e formulada a regra a respeito

da ação criticada, é hora de se buscar sugestões para que a regra formulada pelos

estudantes seja cumprida. Esse momento é fundamental, pois trata-se de um

momento em que as próprias pessoas que são vitimas de comportamento agressivos

envolvem-se na busca por saídas não-punitivas e não-violentas para os problemas

vividos. O próprio grupo elabora alternativas que podem pressionar os

comportamentos inadequados. O coordenador ou coordenadora deve ter

consciência que um mesmo problema pode ser resolvido de várias maneiras

diferentes e, através das discussões em assembleia, buscar soluções e

encaminhamentos.

4º momento: As felicitações

Ao terminar de discutir as “críticas”, deve-se reservar os minutos finais para

refletir sobre as “felicitações”. Assim, sugere-se que seja lida individualmente cada

felicitação e se o autor ou autora gostaria de explicar as razões da felicitação. Ao

final, pode-se perguntar se existe alguém que gostaria de se manifestar, encerrando

com uma salva de palmas.

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5º momento: Encerramento da assembleia

Antes de encerrar a assembleia devem ser organizadas ações a serem

cumpridas diante das decisões tomadas. Assim, são definidos os responsáveis e as

tarefas que serão executadas. Por exemplo, se para uma determinada crítica foi

definida uma regra que exija a confecção de um cartaz, um grupo fica responsável

pela elaboração, outra pela afixação, procedimento este que deve ser acordado e

registrado em ata, assinado por todos.

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33..55.. MMuuddaannççaass nnaass rreellaaççõõeess hhuummaannaass aa ppaarrttiirr

ddaass aasssseemmbblleeiiaass

A seguir, apresentamos alguns relatos de docentes, alunos, alunas e famílias

que puderam vivenciar a prática de assembleias de classe. Tais relatos estão

presentes no livro “A construção de escolas democráticas: histórias sobre

complexidade, mudanças e resistências”, de Ulisses Ferreira de Araújo (2002).

Relatos de professoras

Profa. Kátia Cilene Souza, 1ª série

No tocante ao diálogo este foi aprimorando a cada assembleia realizada,

às vezes acontecia de um falar junto com o outro, mas aos poucos foram

aprendendo a ouvir os colegas (...) percebi que eles começam a entender

o sentido do diálogo. Não foi fácil mudar esse tipo de atitude, mas agora

já resolvem a maioria dos problemas sem falar em punições. Também

falavam muito em levar para diretoria ou chamar os pais. Hoje essa

atitude mudou bastante. (...) Isso se deve ao fato de questioná-los sobre

de quem era o problema: era da diretora? Era dos pais que estavam no

trabalho? Eles refletiam e decidiam de uma outra forma.

(...) percebe-se, assim, que no início do projeto tínhamos um grupo de

alunos que não conseguiam dialogar, não falavam de seus problemas,

não paravam para ouvir a opinião dos colegas e não estavam atentos ao

que acontecia em sua volta. Ao término do projeto encontramos alunos

que refletem sobre seu problemas, buscam soluções através do diálogo,

têm senso de justiça, lutam pelos seus direitos e param para ouvir os

colegas. (ARAÚJO, 2002, p. 133)

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Profa. Adriana Comin Franguelli, 2ª série

Os alunos adoram as assembleias; a cada assembleia realizada eles me

surpreendem com as atitudes. Recordo-me bem de um fato; as meninas

começaram a reclamar dos meninos passarem a mão no bumbum delas;

na verdade era só um menino, mas como nas assembleias tratamos do

assunto e não de quem cometeu o ato, o autor do ato quis falar como se

nada tivesse a ver com ele. Em assembleia posterior; o assunto estava em

pauta novamente, pois esse aluno continuava passando a mão nas

meninas, porém, dessa vez, o seu comportamento em relação ao fato foi

bem diferente, não abriu a boca durante toda a discussão. Após essa

assembleia não tivemos mais esse tipo de problema.

Os pais também notaram as mudanças de comportamento nos seus

filhos. Em uma reunião a mãe da aluna Mirtes disse-me que sua filha,

que tanto batia na irmã, já não batia mais, apenas conversava. Percebe-se

que as mudanças de atitudes já repercutem no âmbito familiar.

No início do ano a turma não conseguia conversar, os alunos gritavam

demais na sala, se agrediam fisicamente, enfim não havia respeito entre

eles. Hoje por mais que ainda existam conflitos, as crianças conseguem

se entender, as agressões físicas raramente acontecem, todos colaboram

entre si, se tornaram mais autônomos. Muita coisa boa passou a

acontecer após a realização das assembleias. (idem, p. 133-134)

Relatos de alunos e alunas

Antes, quando não tinha assembléias na classe, tinha muita violência,

eles xingavam, batiam, e até ameaçavam se a gente não entregasse o

nosso lanche no recreio. (ARAÚJO, 2002, p. 135)

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Antes, quando não tinha as assembleias na classe, tinha muita violência,

eles xingavam batiam e até ameaçavam se a gente não entregasse o nosso

lanche no recreio

Na 3ª série F, antes das assembleias, quando as crianças tinham um

probleminha como brigas, empurra-empurra, jogar água nos outros etc.

iam correndo contar para a professora ou para a mãe, e a mãe ia

conversar com o aluno ou com a professora, que não tinha nada a ver

com isso.

Agora nossa classe está melhorando muito, tem poucas brigas e mais

respeito.

Agora, quando as crianças têm algum problema, escrevem nos cartazes e

no dia da assembleia todos podem falar e dar soluções para os

problemas. Até conseguem resolver alguns, e não fica bom só pra um,

fica bom pra todos. (idem, p. 135)

A partir dos relatos citados anteriormente (que envolvem professores,

professoras, alunos, alunas e também pais e mães), podemos perceber que o

trabalho com assembleias para resolução de conflitos escolares pode se transformar

em uma prática que ajuda a promover mudanças, educa e transforma, não somente

no plano individual e coletivo do âmbito escolar, como também para além dos

muros da escola, promovendo a transformação no nível social e também individual

das relações humanas.

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33..66.. CCoonnssiiddeerraaççõõeess ffiinnaaiiss

A prática das assembleias escolares – mais especificamente das assembleias

de classe tratadas neste material – é uma possibilidade de trabalho para a

aprendizagem da resolução de conflitos. Ao mesmo tempo em que possibilita aos

estudantes uma maior participação no processo educativo, as assembleias de classe

instauram em sala de aula um processo democrático de tomada de decisões e

acordos coletivos, firmados a partir de princípios como justiça e igualdade de

direitos. A ideia básica é a de atribuir voz e vez a todos e todas que participam do

processo educativo.

O trabalho com as assembleias escolares baseado no diálogo é um

instrumento para levar educandos(as) a aumentar sua participação escolar, o

diálogo entre pares, a compreensão do outro e de si mesmo, o respeito, o interesse

no bem comum, a democracia, enfim o protagonismo.

Com o trabalho das assembleias escolares os indivíduos que dela participam

podem conhecer e praticar os valores e princípios éticos que fundamentam as

relações de convivência saudáveis e não-violentas e, ao mesmo tempo, construir-se

enquanto sujeitos preparados para lidar com os conflitos no mundo em que

vivemos.

A instituição de um momento formal para a elaboração e reelaboração

constante das regras que permeiam a convivência escolar traduz-se em momentos

de diálogo, negociação e encaminhamentos dos conflitos vividos no dia a dia.

É nestes momentos que os professores e professoras terão oportunidade de

aproximarem-se de seus alunos e alunas e perceberem que a questão da disciplina e

da indisciplina não é apenas de responsabilidade da autoridade docente, mas que,

ela pode ser compartilhada com seus educandos também, que passam a ter maior

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oportunidade de se constituírem enquanto sujeitos mais preparados para viverem

em sociedade e almejarem o bem estar individual e coletivo. É com esta formação

em valores que esperamos ter colaborado ao longo da confecção deste trabalho. E

viva a diversidade! E viva a democracia e a participação escolar!

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33..77.. AAttiivviiddaaddeess

As atividades referentes a esta unidade serão realizadas com base no vídeo

intitulado “Assembleias Escolares”. Alguns trechos deste material podem ser

encontrados nos seguintes endereços eletrônicos:

http://www.youtube.com/watch?v=_zmOP2cvpN0

http://www.youtube.com/watch?v=SxOD_pClM0c

http://www.youtube.com/watch?v=ozX8D w7zjYg

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RReeffeerrêênncciiaass BBiibblliiooggrrááffiiccaass

ARAÚJO, Ulisses F. A construção de escolas democráticas: histórias sobre

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