da aplicabilidade das inovações trazidas pela lei 11.382/06 ao feito executivo fiscal
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A lei 11382/06 que trouxe inovações ao sistema das execuções extrajudiciais visando conferir maior efetividade ao processo de expropriaçãode bens do devedor deve ter sua abrangência alargada para atingir também o processo de execução movido pelas Fazendas Públicas, com base legal no art. 1º da Lei 6.830/80. Buscar-se-á neste estudo apresentar considerações acerca de inovações polêmicas trazidas pela recente alteração legislativa e sua aplicabilidade ao campo da Execução Fiscal.The Law 11382/06 has brought innovations to the out of courtdebtor execution systems. In order to give greater effectiveness to the processof expropriation of property of the debtor it should have its scope expanded to also reach cases brought by the National Treasury, based on item 1 of Law 6830/80. This study has the purpose of making considerations about innovations brought by the recent controversial legislative changes and their applicability to the field of Tax Enforcement.Autores:CARLOS FONSECA MONNERAT é Juiz de Direito em São Paulo, Doutor em Direito pela PUC-SP, professor universitário e Coordenador de Área da Escola Paulista da Magistratura.MARCOS NEVES VERISSIMO é Procurador de Estado em São Paulo, Especialista em Direito Processual Civil pela UNISANTOS e Mestrando na UNIMES.TRANSCRIPT
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DA APLICABILIDADE DAS INOVAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI 11.382/06 AO FEITO EXECUTIVO FISCAL.
CARLOS FONSECA MONNERAT1 MARCOS NEVES VERISSIMO2
SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. O novo regime das execuções por títulos extrajudiciais e a Lei de Execução Fiscal; 3. Da ordem de preferência dos bens a serem penhorados; 4. Da penhora em dinheiro; 5. O novo regramento dos embargos à execução; 6. Conclusão; 7. Bibliografia.
RESUMO: A lei 11382/06 que trouxe inovações ao sistema das execuções
extrajudiciais visando conferir maior efetividade ao processo de expropriação
de bens do devedor deve ter sua abrangência alargada para atingir também o
processo de execução movido pelas Fazendas Públicas, com base legal no
art. 1º da Lei 6.830/80. Buscar-se-á neste estudo apresentar considerações
acerca de inovações polêmicas trazidas pela recente alteração legislativa e
sua aplicabilidade ao campo da Execução Fiscal.
Palavras-chave: Lei 11.382/06 – Execução Fiscal – Ordem legal de penhora -
Embargos do devedor – Penhora de dinheiro.
ABSTRACT: The Law 11382/06 has brought innovations to the out of court
debtor execution systems. In order to give greater effectiveness to the process
of expropriation of property of the debtor it should have its scope expanded to
also reach cases brought by the National Treasury, based on item 1 of Law
6830/80. This study has the purpose of making considerations about
innovations brought by the recent controversial legislative changes and their
applicability to the field of Tax Enforcement.
1 Carlos Fonseca Monnerat é Juiz de Direito em São Paulo, Doutor em Direito pela PUC-SP, professor universitário e Coordenador de Área da Escola Paulista da Magistratura. 2 Marcos Neves Veríssimo é Procurador de Estado em São Paulo, Especialista em Direito Processual Civil pela UNISANTOS e Mestrando na UNIMES.
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Keywords: Law 11382/06 - Tax Collection Proceedings - Legal order of
attachment - Motion of the debtor - Attachment of money.
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem o objetivo de demonstrar a possibilidade
de extensão das novas normas aplicáveis às execuções lastreadas em títulos
extrajudiciais, introduzidas no ordenamento pela Lei 11.382/06 para o feito
executivo promovido pela Pessoa Jurídica de Direito Público, regulado pela Lei
6.830/80.
Buscar-se-á aplicação destas normas em razão do escopo do
legislador ao promover a reforma no processo de execução regulado no
Código de Processo Civil, a saber, conferir maior efetividade e celeridade ao
processo executivo, buscando meios mais eficientes de satisfação do crédito
exeqüendo.
A norma vem de encontro aos mandamentos da Emenda
Constitucional nº 45 de 2004, que versou sobre a Reforma do Judiciário, que,
no que toca ao tema aqui tratado, introduziu o inciso LXXVIII ao art. 5º, que
possui a seguinte redação:
LXXVIII - A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a
razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua
tramitação.
Com o escopo de atender aos anseios de toda a sociedade por
uma justiça mais ágil e efetiva, o constituinte derivado trouxe ao ordenamento
brasileiro, com status de direito individual do cidadão a obtenção de um Poder
Judiciário eficiente, conferindo maior credibilidade a este Poder da República
perante a população.
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Sabido que o Estado vedou a autotutela entre seus jurisdicionados,
reservando com exclusividade para si a jurisdição, certo é que exercer tal
mister não se refere tão somente na prestação da tutela jurisdicional. Esta
deve se dar de forma adequada e efetiva, extinguindo de forma cabal a lide
que lhe foi levada, sob pena de negação da prestação deste dever estatal.
A garantia constitucional da inafastabilidade da jurisdição já trazia
em seu bojo a imprescindibilidade de uma prestação jurisdicional adequada e
célere, pois do contrário prestação jurisdicional não haveria, contribuindo para
a disseminação de condutas contrárias ao Direito sem a necessária e eficiente
repreensão judicial.
Como bem leciona o professor Candido Rangel Dinamarco a visão
da efetividade do processo evoluiu sobremaneira no último século, passando
da visão individual e positivista, a uma preocupada com as repercussões
sociais e políticas do processo3. Acompanhando este entendimento a doutrina
processualista deixou de enxergar o processo como instrumento de
composição de conflitos para lhe erigir a instrumento de pacificação social,
conferindo-lhe caráter mais abrangente.
Em razão dessas alterações passou-se a entender que “o
processo deve ser apto a cumprir integralmente toda sua função sócio-político-
jurídica, atingindo em toda sua plenitude os seus escopos institucionais”.4
Não obstante a efetividade e celeridade processuais poderem ser
extraídas do texto constitucional originário, o Poder Constituinte Derivado
tratou de trazer o tema expressamente ao texto constitucional através da
EC45/04, como dito alhures5.
3 DINAMARCO, Candido Rangel. A instrumentalidade do Processo. 10.ed. São Paulo: Malheiros, 2002,p.331. 4 Idem, p181 e ss. 5 Vide texto já transcrito acima.
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A busca da efetividade processual deve se dar sempre em atenção
aos demais princípios constitucionais do processo, não podendo ser alcançada
de forma desmedida em detrimento do sistema constitucional vigente.
O que se quer é um processo que atente às garantias
constitucionais individuais daqueles que são postos em litígio, porém há de se
vedar condutas que impliquem em dilação indevida do feito, expediente este
observado com frequencia no cotidiano forense.
No bojo dessa reformulação constitucional cabe ao Legislativo
ordinário acompanhar esse vetor trazido pelo texto maior, com a elaboração de
diplomas normativos outros que acompanhem essa tendência de conferir
maior efetividade na prestação jurisdicional, desde que respeitadas as demais
garantias insculpidas na Constituição Federal.
Foi dentro desse panorama esperançoso de alcançar esta
efetividade que foi promulgada a Lei 11.382 aos 06 de dezembro de 2006
alterando a execução por título extrajudicial. Cabe ao exegeta verificar a
aplicabilidade das novas normas ao feito executivo fiscal.
Há um sistema de proteção ao crédito tributário, uma vez que este
merece proteção em razão da existência de um dever legal de pagar impostos,
custeando as atividades estatais. Entretanto, não há que se admitir sua
sobreposição às demais normas jurídicas, em especial àquelas que garantem
os direitos fundamentais do cidadão, ora contribuinte, não se admitindo a
leniência dos demais poderes da República quanto à indevida atuação estatal
constrangendo o patrimônio dos indivíduos de uma sociedade.
O debate sobre a execução fiscal e os aspectos que a cercam
assume importância, pois extrapola o campo jurídico e adentra no campo da
plenitude da cidadania tributária. Cidadania que não se limita à invocação de
direitos e garantias fundamentais, posto que deve abranger os deveres
fundamentais que emanam do convívio social. Assim, direitos, garantias e
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deveres, não se excluem mutuamente, devem ser compostos de modo
equilibrado viabilizando a coexistência.
No sistema brasileiro cabe ao Poder Judiciário conter as medidas
vorazes não só do Executivo quanto à arrecadação da dívida ativa, mas
também controlar os atos promovidos pelo Poder Legislativo que muitas vezes
são dissonantes do ordenamento já vigente autorizando condutas a serem
perpetradas pelos agentes estatais em evidente confronto com as garantias
processuais e constitucionais outorgadas aos cidadãos.
Este sistema brasileiro, que atende aos reclamos da forma
republicana de governo, difere de legislações estrangeiras que admitem a
cobrança administrativa da dívida tributária, na qual embora o controle judicial
possa vir a existir, é posterior e apenas age mediante provocação daquele que
se sente injustiçado.
Sem adentrar ao mérito dessa questão, que não é o objeto do
presente estudo, certo é que a experiência estrangeira, em qualquer área do
direito, deve ser vista com ressalvas quanto a sua aplicabilidade em solo
brasileiro, seja pela experiência anterior e vivência serem diversas, seja pela
inserção das normas em um contexto fático-axiológico diferente, seja por
último pelo ordenamento jurídico estrangeiro estar apoiado em pressupostos
diferentes, como, por exemplo, a existência de verdadeira jurisdição
administrativa em contraponto com o sistema brasileiro no qual prevalece a
plenitude de jurisdição ao Poder Judiciário.
Uma vez criadas novas normas aplicáveis ao processo executivo,
torna-se dever do operador do Direito verificar sua aplicabilidade aos feitos
executivos promovidos pela Fazenda e sua compatibilidade aos ditames da
legislação específica a estes aplicável, bem como promover uma interpretação
sistemática de todo o ordenamento, garantindo a compatibilidade dos novos
institutos.
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2. O NOVO REGIME DAS EXECUÇÕES POR TÍTULOS EXTRAJUDICIAIS E
A LEI DE EXECUÇÃO FISCAL
As alterações legislativas vieram com o escopo de alcançar maior
efetividade da jurisdição incidente nos processos de execução,
especificamente nas execuções lastreadas em títulos extrajudiciais.
Este foi o principal objetivo buscado pelo legislador que o deixou
assentado na exposição de motivos da Lei 11382/06, explicitando que o
projeto almejava aprimorar o processo de execução forçada tornando-o
compatível com a garantia constitucional da duração razoável do feito,
introduzida expressamente pela EC 45/04.
A grande parte das alterações produzidas pelo novo sistema
legislativo teve como objetivo acelerar a satisfação do direito do credor, uma
vez que dotado de título líquido, certo e exigível, não satisfeito, visando o
legislador fornecer meios eficientes para combate da inadimplência do
devedor, direcionando o Estado-Juiz neste sentido no curso do feito.
Ao mesmo tempo em que em que houve a simplificação do
processo de expropriação de bens do devedor, foram também minimizados os
caminhos a serem percorridos pelo executado em sua defesa, objetivando
evitar defesas temerárias e procrastinatórias tão freqüentes sob o regime da
legislação revogada.
Pode-se exemplificar o acima exposto com a possibilidade de
alienação do bem penhorado por iniciativa particular, a atualização na ordem
legal de bens à penhora inserindo o dinheiro em primeiro lugar, a
regulamentação da penhora de dinheiro, a nova disciplina imposta aos
embargos, sem a necessidade de penhora de bens e, regra geral, sem efeito
suspensivo, a autorização de parcelamento do débito mediante o depósito de
30% de seu valor, entre outras alterações.
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Pelos exemplos citados pode-se verificar que o legislador
realmente buscou conferir meios tendentes a satisfazer os interesses do credor
no processo executivo, partindo do pressuposto de que se deve dar guarida
para que de forma mais célere sejam expropriados bens do devedor e
satisfeito o crédito exeqüendo.
Este vetor de interpretação legislativa não deve ser tomado como
absoluto, cabendo ao operador do direito proceder à análise constitucional dos
dispositivos e mecanismos criados, evitando atividades arbitrárias do credor
sob a chancela do Poder Judiciário.
A Lei 6.830 de 22 de setembro de 1980 – Lei de Execução Fiscal -
regula a cobrança da dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal,
dos Municípios e respectivas autarquias, aplicando-se subsidiariamente a suas
normas as constantes do Código de Processo Civil, nos termos de seu art.1º.
Trata-se de norma específica, aplicável à cobrança de créditos
tributários, conferindo à Fazenda credora prerrogativas processuais com o
escopo de obter maior proteção ao erário, preservando antes de tudo o
interesse público, caracterizado nestas hipóteses pelo pronto ingresso aos
cofres públicos dos valores inadimplidos pelo contribuinte-executado.
Vários dispositivos da norma em comento ilustram este
entendimento, como se pode extrair, apenas para exemplificar: a possibilidade
de substituição do título que embasa a execução fiscal, a prescindibilidade de
requerimento de produção de provas pela Fazenda exeqüente e a presunção
de certeza e liquidez que afeta a certidão da dívida ativa.
A existência dessas prerrogativas encontra agasalho ainda no que
chamamos de adequação à realidade fática daquilo que foi previsto pelo
legislador quando da edição da lei. Assim, nas palavras de Hans Kelsen, trata-
se na verdade na aproximação do dever-ser ao mundo do ser, este muitas
vezes divorciado daquele.
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Antes do recebimento dos valores devidos pelo contribuinte possui
o Estado-credor tão somente a expectativa de ingresso do numerário nos
cofres públicos, não havendo qualquer certeza que efetivamente existirá o
incremento do erário com o pagamento do que é devido.
O grande desafio objetivado pela Lei de Execução Fiscal nada
mais é que materializar uma expectativa em resultado prático, conferindo à
Fazenda exequente meios processuais para que se ultime o fim perseguido
que é o ingresso de recursos nos cofres públicos.
Passaremos a analisar a partir de agora as inovações trazidas pela
Lei 11.382/06 ao Código de Processo Civil, no tocante ao sistema das
execuções embasadas em títulos extrajudiciais e pontualmente verificaremos a
compatibilidade de alguns institutos e alterações promovidas por esta nova lei
para o mundo do Direito Tributário, especificamente sua utilização no campo
da cobrança da dívida ativa fazendária.
3. DA ORDEM DE PREFERËNCIA DOS BENS A SEREM PENHORADOS.
A primeira inovação que passaremos pontualmente a analisar é a
que alterou o artigo 655 do Código de Processo Civil, modificando a ordem
legal de nomeação de bens à penhora a ser observada pelo devedor.
A redação original constante do Código de Rito estatuía que: “Art. 655. Incumbe ao devedor, ao fazer a nomeação de bens, observar a seguinte ordem: I - dinheiro; II - pedras e metais preciosos; III - títulos da dívida pública da União ou dos Estados; IV - títulos de crédito, que tenham cotação em bolsa; V - móveis; Vl - veículos; VII - semoventes;
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Vlll - imóveis; IX - navios e aeronaves; X - direitos e ações. § 1o Incumbe também ao devedor: I - quanto aos bens imóveis, indicar-lhes as transcrições aquisitivas, situá-los e mencionar as divisas e confrontações; II - quanto aos móveis, particularizar-lhes o estado e o lugar em que se encontram; III - quanto aos semoventes, especificá-los, indicando o número de cabeças e o imóvel em que se acham; IV - quanto aos créditos, identificar o devedor e qualificá-lo, descrevendo a origem da dívida, o título que a representa e a data do vencimento; V - atribuir valor aos bens nomeados à penhora. § 2o Na execução de crédito pignoratício, anticrético ou hipotecário, a penhora, independentemente de nomeação, recairá sobre a coisa dada em garantia”
A ordem legal foi introduzida no ordenamento com o objetivo de
atender ao quanto previsto no art. 6206 do mesmo codex que prescreve que a
execução deve se dar da maneira menos gravosa ao devedor.
O rol legal insculpido no ordenamento segue este entendimento.
Por ser norma que atende aos princípios do processo executivo, passou-se a
estender o alcance do dispositivo para fazer valer a ordem legal também para
os casos de bens indicados pelo credor, quando o devedor quedar-se inerte,
não os oferecendo ao juízo.
A inércia do devedor não pode ser hábil a lhe retirar as
prerrogativas previstas no ordenamento, não podendo sofrer gravame maior do
que o necessário na expropriação de seus bens.
Analisando de forma sistemática o ordenamento processual
conclui-se que o credor também deve atentar para a ordem legal supra
colacionada atendendo à menor onerosidade do feito executivo fiscal.
Observando a ordem legal pode-se concluir que o sistema era
direcionado para uma maior defesa daquele que estava sendo executado,
6 CPC - Art. 620 – Quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso ao devedor
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tratando de expropriar os bens seguindo uma ordem que pudesse lhe
ocasionar o menor gravame possível, garantindo ao executado uma
subsistência digna, buscando interferir minimamente em seu cotidiano.
Justificava-se à época com este fundamento a preferência da
penhora recair sobre bens tais como jóias, títulos da dívida pública ou títulos
de crédito em detrimento de outros que possuem maior liquidez como
automóveis ou bens imóveis.
Buscava-se a satisfação do credor com o menor sacrifício possível
a ser imposto ao executado que não seria ceifado de seus bens mais
importantes, mantendo-os consigo ao passo em que outros, dispensáveis,
sofreriam a constrição judicial.
Com o advento da Lei 11.382/06 houve significativa alteração na
ordem do art. 655 que passou a prever: Art. 655. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem: I - dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira; II - veículos de via terrestre; III - bens móveis em geral; IV - bens imóveis; V - navios e aeronaves; VI - ações e quotas de sociedades empresárias; VII - percentual do faturamento de empresa devedora; VIII - pedras e metais preciosos; IX - títulos da dívida pública da União, Estados e Distrito Federal com cotação em mercado; X - títulos e valores mobiliários com cotação em mercado XI - outros direitos. . § 1o Na execução de crédito com garantia hipotecária, pignoratícia ou anticrética, a penhora recairá, preferencialmente, sobre a coisa dada em garantia; se a coisa pertencer a terceiro garantidor, será também esse intimado da penhora. § 2o Recaindo a penhora em bens imóveis, será intimado também o cônjuge do executado.
O novo rol de bens trazido pela legislação em análise vem de
encontro ao que fora antes explanado sobre a efetividade do feito executivo.
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Ao tempo em que a nova ordem legal dos bens observa em sua
essencialidade a liquidez do bem constrito, admite-se a expropriação de bens
integrantes do cotidiano do devedor que cede passo em favor da satisfação do
crédito que o credor leva a juízo.
Isto se dá, sobretudo, em razão da preferência da penhora recair
sobre bens que despertam maior interesse para alienação em hasta pública
como automóveis e bens móveis, em detrimento de outros que antes
ocupavam suas posições como os títulos da dívida pública da União ou
Estados, que se consagraram nos últimos anos como “dinheiro podre” não
possuindo qualquer liquidez, sendo inaptos a garantir o pagamento da dívida
exeqüenda.
Apesar do Código de Processo Civil possuir estas alterações
visando atender à processualística moderna, a Lei 6.830/80 possui disposição
própria a respeito, conforme seu art. 11 que dispõe:
Art. 11 - A penhora ou arresto de bens obedecerá à seguinte ordem: I - dinheiro; II - título da dívida pública, bem como título de crédito, que tenham cotação em bolsa; III - pedras e metais preciosos; IV - imóveis; V - navios e aeronaves; VI - veículos; VII - móveis ou semoventes; e VIII - direitos e ações. § 1º - Excepcionalmente, a penhora poderá recair sobre estabelecimento comercial, industrial ou agrícola, bem como em plantações ou edifícios em construção. § 2º - A penhora efetuada em dinheiro será convertida no depósito de que trata o inciso I do artigo 9º. § 3º - O Juiz ordenará a remoção do bem penhorado para depósito judicial, particular ou da Fazenda Pública exeqüente, sempre que esta o requerer, em qualquer fase do processo.
A legislação que rege o processo de execução fiscal, portanto, não
sofreu qualquer alteração, permanecendo ainda sob a influência de uma
perspectiva já ultrapassada do processo, segundo a qual o direito do credor
sofreria mitigação em razão da preservação da dignidade do devedor que
deveria continuar com a disponibilidade de seus bens essenciais.
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Apesar de se tratar de norma específica aplicada à execução fiscal
nos parece que não pode ela sobrepor-se a nova sistemática processual
vigente.
Esta posição ganha corpo ao se analisar o pronunciamento de
nossos Tribunais quanto à obrigatoriedade de respeito à ordem legal pelo
credor ao diligenciar para obter a constrição judicial de bens do devedor.
Mesmo antes da alteração legislativa, o Superior Tribunal de Justiça
reiteradamente explicitava seu entendimento no sentido da admissibilidade da
flexibilização da ordem legal em razão do processo executivo dar-se no
interesse do credor.
A Fazenda Pública pode a qualquer tempo requerer a substituição
do bem penhorado, nos termos do art. 15, II da LEF, bastando para tanto
demonstrar que existem outros bens pertencentes ao executado que
despertam maior interesse em hasta pública, atraindo um maior número de
interessados, prestigiando o recebimento efetivo do crédito fazendário.
Neste sentido cabe colacionar recentíssimo julgado do STJ que
ilustra a posição exposta:
“... em relação à fase de execução, se é certo que a expropriação de bens deve obedecer a forma menos gravosa ao devedor, também é correto afirmar que a atuação judicial existe para satisfação da obrigação inadimplida. Necessário a “ponderação de valores e princípios” das regras processuais, para ensejar sua eficácia e efetividade.
Conforme precedentes da corte, a ordem legal estabelecida para a nomeação de bens à penhora não tem caráter absoluto, podendo o magistrado recusar a nomeação de títulos da dívida pública de difícil e duvidosa liquidação, para que esta recaia em dinheiro ou outros bens de melhor liquidez.
Nesses termos, tendo o tribunal recorrido firmado posicionamento no sentido de ser “perfeitamente possível a penhora sobre os títulos da dívida pública”, dissentiu ele da orientação traçada por esta corte. Recurso especial conhecido, em parte, e provido.” 7
E a doutrina também se inclina neste sentido, conforme se extrai
do escólio do professor Jose Miguel Garcia Medina: “A ordem disposta no 7 RESP 296.893/MT ,rel. Ministro Luis Felipe Salomão, quarta turma, julgado em 07/08/2008, dju 18/08/2008
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art.655, assim, não precisa ser observada de maneira absoluta, podendo ceder
sempre que se apresentarem circunstâncias especiais, que autorizem concluir
que outra é a gradação a ser adotada, no caso.” 8
Uma interpretação sistemática nos obriga a concluir que as
alterações perpetradas pela Lei 11.382/06 no art. 655 do Código de Processo
Civil, embora não acompanhadas de qualquer modificação na lei 6.830/80 no
mesmo sentido, devem ser aplicadas irrestritamente no campo da execução
fiscal como forma de prestigiar uma justiça mais efetiva, consoante as novas
tendências do Processo Civil moderno e atendendo aos mandamentos
constitucionais.
4. DA PENHORA DE DINHEIRO
Passar-se-á a partir deste momento a estudar o primeiro dos bens
a sofrer a constrição judicial de penhora para garantia da execução. Como já
visto alhures9 trata-se do dinheiro, que ocupa esta posição em razão de sua
liquidez, havendo a imediata satisfação do credor em caso de levantamento da
quantia penhorada.
Esta posição é ocupada pelo dinheiro desde a redação original do
Código de Processo Civil, que seguiu a orientação trazida pelo Código de
Processo Civil de 1939 (Decreto-Lei 1.608/1939) que já àquela época trazia o
dinheiro como o primeiro bem a ser penhorado, nos termos de seu art. 93010.
O que nos interessa para o presente estudo foi a alteração
provocada pela Lei 11.382/06 que introduziu o art. 655-A regulamentando pela
primeira vez dentro do Código de Processo Civil a forma como deverá ser feita
a penhora de dinheiro.
8 in Processo Civil Moderno – Execução, p. 161 9 Art. 11 da Lei 6.830/80, já transcrito. 10 Art. 930- A penhora poderá recair em quaisquer bens do executado, na seguinte ordem: I – Dinheiro, pedras e metais preciosos; II - ...
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Dispõe o dispositivo em comento, in verbis:
Art. 655-A. Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exeqüente, requisitará à autoridade supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no mesmo ato determinar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução.
§ 1o As informações limitar-se-ão à existência ou não de depósito ou aplicação até o valor indicado na execução.
§ 2o Compete ao executado comprovar que as quantias depositadas em conta corrente referem-se à hipótese do inciso IV do caput do art. 649 desta Lei ou que estão revestidas de outra forma de impenhorabilidade.
§ 3o Na penhora de percentual do faturamento da empresa executada, será nomeado depositário, com a atribuição de submeter à aprovação judicial a forma de efetivação da constrição, bem como de prestar contas mensalmente, entregando ao exeqüente as quantias recebidas, a fim de serem imputadas no pagamento da dívida.”
Em um primeiro momento a penhora de dinheiro ou ativos
financeiros do executado era realizada através de expedição de ofício pelo
juízo da execução ao Banco Central visando obter informação acerca de quais
bancos possuíam depósitos de valores pertencentes ao executado. Uma vez
obtida esta informação a exeqüente requeria nova expedição de ofícios, desta
feita destinados aos bancos informados pela agência reguladora, visando a
penhora dos valores existentes nas contas já mencionadas.
Posteriormente, o Oficial de Justiça diligenciava à agência bancária
formalizando a penhora e nomeando o gerente da agência bancária como
depositário dos valores penhorados.
Já em uma primeira análise verifica-se que este sistema pecava
pela sua completa ineficiência. A burocracia exigida bem como a
movimentação de papel de forma desnecessária tornavam os processos de
execução em volumosos amontoados de ofícios sem qualquer informação
relevante, dificultando o labor daqueles que militam nesta seara.
Este sistema conferia aos executados uma “garantia” extra.
Tratava-se da fraude ao sistema perpetrada comumente por alguns gerentes
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das agências bancárias que ao receber em mãos o ofício expedido pelo juízo
da execução contatava o executado e lhe orientava a retirar os valores de sua
conta corrente ou investimento frustrando a execução em curso.
Mesmo que não ocorresse o ardil acima descrito, infelizmente
comum no cotidiano forense, em razão da excessiva demora no cumprimento
das diligências necessárias para a constrição dos valores, o advogado do
executado em muitas vezes se antecipava ao juízo e ao ver o deferimento da
diligência sugeria a seu cliente que sacasse seus recursos, inviabilizando a
efetividade da medida.
Com o escopo de evitar essas medidas tendentes a fraudar o feito
executivo, através de um convênio celebrado em meados de 2002 entre o
Banco Central e o Poder Judiciário foi criado o sistema BACEN-JUD, tendente
a racionalizar a medida garantindo sua eficiência.
O sistema Bacen-Jud elimina a necessidade de o Juiz enviar
documentos (ofícios e requisições) na forma de papel para o Banco Central,
toda vez que necessita quebrar sigilo bancário ou ordenar bloqueio de contas-
correntes de devedores em processo de execução. As requisições são feitas
através de site próprio na Internet, ao qual o Juiz tem acesso por meio de
senha que lhe é previamente fornecida. Em espaço próprio do site, o Juiz
solicitante preenche uma minuta de documento eletrônico, onde coloca
informações que identificam o devedor e o valor a ser bloqueado. A requisição
eletrônica é enviada diretamente para os bancos, que cumprem a ordem e
retornam informações ao Juiz. Ou seja, o sistema permite que um ofício que
antes era encaminhado em papel seja enviado eletronicamente, através da
Internet, racionalizando os serviços e conferindo mais agilidade no
cumprimento de ordens judiciais no âmbito do Sistema Financeiro Nacional.
Dentro desse panorama cumpre destacar a experiência inovadora
do Tribunal de Justiça paulista que, através de sua Corregedoria de Justiça,
editou o provimento nº 21/2006 que dispõe expressamente sobre o fim da
expedição de ofícios ao Banco Central, determinando que qualquer
transmissão de determinação judicial neste tocante seja realizada por meio
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eletrônico através do sistema Bacen-Jud, vedando a expedição de ofícios por
papel11.
Facilmente se percebe que a alteração legislativa perpetrada pela
Lei 11.382/06 ao introduzir o art. 655-A no Código de Rito tratou tão somente
de instrumentalizar o quanto previsto no inciso I do artigo antecedente, não
inovando no ordenamento processual, possuindo escopo único de demonstrar
aos operadores do Direito a forma como deve se materializar a penhora de
ativos financeiros, privilegiando mais uma vez a efetividade processual.
Esse sistema deve ser o adotado nas execuções fiscais em
estreito atendimento ao quanto previsto no art. 1º da LEF pela aplicação
subsidiária do CPC às execuções fiscais.
Mais uma vez a alteração legislativa que visa preservar a
efetividade do processo deve ser trazida ao campo da execução promovida
pela Fazenda Pública, regida por lei especial, mas que deve ser privilegiada
pela nova perspectiva adotada nos processos de execução.
Por fim, há quem sustente que a penhora de dinheiro ou ativos
financeiros contrarie o princípio da menor onerosidade do feito executivo em
razão da possibilidade de um bloqueio indiscriminado e amplo de contas
bancárias, acarretando ônus excessivo ao devedor. Ainda, afirma-se que o
bloqueio eletrônico pode alcançar verbas impenhoráveis do executado como a
percebida de seu salário ou aquelas dotadas de natureza alimentar. Com a
devida vênia não podemos concordar com este entendimento.
Primeiro, porque é de se ter em vista que o princípio da "menor
onerosidade" não se sobrepõe a outros que também informam o processo de
execução, especificamente aquele inserido no art. 61212, que consagra o
11 Art. 1º - A transmissão de determinações judiciais de bloqueio e desbloqueio de contas e de ativos financeiros, de requisições de informações sobre a existência de contas-correntes e das aplicações financeiras, saldos, extratos e endereços de clientes do Sistema Financeiro Nacional será feita exclusivamente pela Internet ao banco Central do Brasil, segundo os parâmetros do sistema Bacen-Jud. 12 Ressalvado o caso de insolvência do devedor, em que tem lugar o concurso universal (art. 751,III), realiza-se a execução no interesse do credor, que adquire, pela penhora, o direito de preferência sobre os bens penhorados.
22
princípio da maior utilidade da execução para o credor e impede que seja
realizada por meios ineficientes à solução do crédito exeqüendo. É preciso,
portanto, uma compatibilização entre esses princípios, tendo-se sempre em
mente que a necessidade de se imprimir à execução uma real efetividade não
pode prescindir de um sistema que desburocratiza atos processuais.
Necessário, a propósito, lembrar que a jurisprudência já afastava
qualquer lesão ao princípio da menor onerosidade pela simples razão de a
penhora atingir dinheiro depositado em conta bancária. As ementas abaixo
transcritas são elucidativas desse entendimento:
"Processual civil. Agravo regimental no agravo de instrumento. Execução.
Nomeação de bens à penhora. Interpretação do art. 620 em harmonia com
o art. 655, ambos do CPC. Súmula 83/STJ. Verificação dos motivos que
justificaram a rejeição dos bens oferecidos à penhora. Súmula 7/STJ
- O art. 620 do CPC há de ser interpretado em consonância com o art. 655
do CPC, e não de forma isolada, levando-se em consideração a harmonia
entre o objetivo de satisfação do crédito e a forma menos onerosa para o
devedor.
- A jurisprudência dominante do STJ é no sentido de que, desobedecida
pelo devedor a ordem de nomeação de bens à penhora prevista no art. 655
do CPC, pode a constrição recair sobre dinheiro, sem que isso implique em
afronta ao princípio da menor onerosidade da execução previsto no art.
620 do Código de Processo Civil" 13
Mais específico, no sentido de que a penhora possa recair em
dinheiro depositado em conta-bancária, sem que isso implique ofensa ao art.
620:
"Este Tribunal de Uniformização, realizando interpretação
sistemática dos arts. 620 e 655 da Lei Processual Civil, já se
13 STJ-3a. Turma, AgRg no Ag 633357/RS, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 28.06.05, DJ 01.08.05.
23
manifestou pela possibilidade do ato constritivo incidir sobre
dinheiro depositado em conta bancária de titularidade de pessoa
jurídica, sem que haja afronta ao princípio da menor onerosidade da
execução disposto no art. 620 da Norma Processual (cf. REsp nº
528.227/RJ, REsp nº 390.116/SP)” 14
O princípio da economicidade, realmente, não pode superar o
princípio maior da utilidade da execução para o credor, propiciando que a
execução se realize por meios ultrapassados e ineficientes à solução do crédito
exeqüendo. Por essa razão, deve haver uma preferência pela penhora de
dinheiro, através do sistema eletrônico de requisições judiciárias, método
idôneo e suficiente para alcançar o resultado pretendido com o processo de
execução.
Por outro lado, o Juiz tem sempre a possibilidade de determinar o
desbloqueio (total ou parcial) de contas, quando a constrição se revela
excessiva ou recai sobre valores que possuam natureza de impenhorabilidade
(art. 649 do CPC). Cabe ao magistrado sempre avaliar a necessidade de
eventual desbloqueio, se verificar algumas das situações que contrariam
dispositivos legais (constrição de salários, proventos de aposentadoria,
pensões e outras verbas de caráter alimentar) ou que demonstrem que a
penhora deva ser feita de uma maneira menos excessiva ou menos gravosa.
Mas, em todo caso, ele sempre poderá exigir do devedor outras garantias,
antes de efetuar o desbloqueio. Nessa situação, de o devedor já se encontrar
com recursos de suas contas bancárias retidos, é muito mais fácil que ele
aceite oferecer outros bens ou indicar uma das contas bancárias em que possa
ser mantido o bloqueio. O sistema Bacen-Jud na nova versão (2.0) possibilita
que esse desbloqueio seja realizado num prazo máximo de 48h, o que evita
maior prejuízo ou transtorno ao devedor.
5 STJ-4a. Turma, AgRg no Ag 612382/RS, rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 15.0905, DJ 17.10.05.
24
A possibilidade de a constrição alcançar valores de natureza
alimentar ou acima do valor da execução sempre existiu, mesmo quando era
feita na forma tradicional, por meio de ofício (impresso em papel) remetido pelo
correio e mandado cumprido por Oficial de Justiça. Ocorrendo essa situação,
eventual desbloqueio poderia demorar prazo muito mais largo do que se exige
para efetuá-lo via Bacen-Jud.
O sistema Bacen-Jud não criou uma nova modalidade de
execução; apenas permite que a penhora de numerário existente em contas e
aplicações bancárias do devedor seja feita de forma eletrônica. No sistema
antigo, quando o Juiz a determinava através de ofício (em papel) também havia
a possibilidade de o bloqueio recair sobre depósitos e recursos de origem
salarial, contas destinadas ao depósito de pensões etc. Só que a possibilidade
de prejuízo era muito maior, porque as respostas dos bancos só chegavam
tardiamente ao conhecimento do Juiz, o qual, para ordenar o desbloqueio,
também não tinha meios mais velozes, somente podendo ordená-lo por meio
de novo ofício, que levava tempo bastante largo para ser enviado à instituição
bancária. O processamento de uma ordem de desbloqueio, por meio da
utilização do sistema Bacen-Jud, é feito de forma muito mais rápida e simples,
o que concorre em favor da utilização desse sistema.
Sabedor dos eventuais entraves que podem advir do sistema
eletrônico o Conselho Nacional de Justiça editou aos 07 de outubro de 2008
sua resolução nº 61 que permite o cadastramento por qualquer pessoa, física
ou jurídica, de conta única na qual deverão incidir eventuais ordens de bloqueio
de ativos financeiros realizados pelo Bacen-Jud, nos termos de seu art. 4º 15.
A pessoa interessada, nos termos da resolução citada, se obriga a
manter na conta selecionada recursos suficientes para garantia de
cumprimento integral de toda a ordem de bloqueio direcionada por qualquer
órgão do poder Judiciário16, sob pena de redirecionamento imediato da ordem
15 Art. 4º. Qualquer pessoa natural ou jurídica poderá solicitar o cadastramento de conta única apta a acolher bloqueios realizados por meio do BACENJUD.
16 Art. 7º. A pessoa natural ou jurídica que solicitar o cadastramento de que trata esta Resolução obriga-se a manter valores imediatamente disponíveis em montante suficiente para o atendimento das ordens
25
às demais contas de sua titularidade nas quais a pessoa possua valores
disponíveis.
Em caso de inexistência de recursos suficientes, estará ainda o
devedor sujeito a procedimento administrativo iniciado a partir de comunicação
obrigatória do juiz da causa ao Tribunal Superior a que é vinculado, no qual
poderá ser determinado o cancelamento do cadastramento efetuado, tudo nos
termos do art. 8º da Resolução 61.17
Verifica-se a preocupação do órgão de controle do Judiciário em
aperfeiçoar o método que hoje se mostra eficaz, sendo um verdadeiro avanço
na busca pela efetividade da tutela executiva.
Por todo o exposto, embora ainda não se tenha atingido a
perfeição no sistema, o que talvez nunca se alcançará, certo é que o novo
procedimento a ser adotado na penhora de valores encontra-se em
consonância com o objetivo primordial do processo de execução que é o
alcance da satisfação do direito do credor, recebendo seu crédito, devendo
esta nova sistemática ser aplicada in totum às execuções promovidas pelas
Fazendas Públicas preservando o erário e buscando minimizar a ocorrências
de fraudes ao dinheiro público, diuturnamente verificadas pelos procuradores
fazendários.
judiciais que vierem a ser expedidas, sob pena de redirecionamento imediato da ordem de bloqueio, pela autoridade judiciária competente, às demais contas e instituições financeiras onde a pessoa possua valores disponíveis.
17 Art. 8º. Caso seja insuficiente o saldo encontradiço na conta única cadastrada na forma desta Resolução:
I - a autoridade judiciária requisitante da ordem frustrada comunicará, em cinco dias, o fato a uma das autoridades indicadas no art. 5º a que estiver vinculada;
II - a autoridade responsável pela gestão do Sistema Nacional de Cadastramento de Contas Únicas, no âmbito do tribunal superior comunicado (art. 5º), instaurará procedimento administrativo para oitiva do titular da conta única frustradora da ordem judicial de bloqueio, no prazo de cinco dias, após o que, no mesmo prazo, decidirá pela manutenção ou cancelamento do cadastramento respectivo;
III - a autoridade que decretar o cancelamento do cadastramento de conta única comunicará o outro tribunal superior e efetivará, eletronicamente, a exclusão do respectivo beneficiário.
26
5. O NOVO REGRAMENTO DOS EMBARGOS À EXECUÇÃO
A última alteração pontual trazida pela Lei 11.382/06 que
analisaremos neste trabalho diz respeito à manifestação do devedor no
processo de execução. Trata-se do novo regime introduzido para os embargos
à execução, estabelecendo que, regra geral, a oposição da defesa não
suspenderá a execução em curso.
Dispõe, em sua nova redação, o art. 739-A do Código de Processo
Civil:
“Art. 739-A. Os embargos do executado não terão efeito suspensivo.
§ 1o O juiz poderá, a requerimento do embargante, atribuir efeito suspensivo aos embargos quando, sendo relevantes seus fundamentos, o prosseguimento da execução manifestamente possa causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação, e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficientes.
§ 2o A decisão relativa aos efeitos dos embargos poderá, a requerimento da parte, ser modificada ou revogada a qualquer tempo, em decisão fundamentada, cessando as circunstâncias que a motivaram.
§ 3o Quando o efeito suspensivo atribuído aos embargos disser respeito apenas a parte do objeto da execução, essa prosseguirá quanto à parte restante.
§ 4o A concessão de efeito suspensivo aos embargos oferecidos por um dos executados não suspenderá a execução contra os que não embargaram, quando o respectivo fundamento disser respeito exclusivamente ao embargante.
§ 5o Quando o excesso de execução for fundamento dos embargos, o embargante deverá declarar na petição inicial o valor que entende correto, apresentando memória do cálculo, sob pena de rejeição liminar dos embargos ou de não conhecimento desse fundamento.
§ 6o A concessão de efeito suspensivo não impedirá a efetivação dos atos de penhora e de avaliação dos bens.”
Houve a inversão completa do regime outrora vigente que pregava
a suspensão da execução com a mera oposição dos embargos. Tal hipótese
passa a ocorrer tão somente quando o magistrado verificar a presença de
relevância na fundamentação articulada e o risco de dano irreparável ao
27
executado em caso de prosseguimento dos atos de expropriação, nos termos
do §1º supra transcrito.
Mais uma vez o desafio será verificar a aplicabilidade deste novo
regime aos embargos à execução fiscal.
Parte da doutrina, capitaneada pelo professor Ives Gandra da Silva
Martins inclina-se a afirmar a permanência do efeito suspensivo aos embargos
à execução fiscal. Afirma o jurista: "Lei especial não pode ser revogada por lei
geral, a menos que esta expressamente o determine. A Lei 11.382/2006, que é lei
geral, nada mencionou acerca da execução da dívida ativa das pessoas políticas, de
forma que não tem o condão de alterar a Lei especial 6.830/80. Desta forma, os
embargos à execução continuam a manter o efeito suspensivo que lhe outorga a Lei
6.830/80"18.
Afirma-se neste sentido que a Lei 6.830/80 não possui explícito
regramento quanto aos efeitos em que devem ser recebidos os embargos uma
vez que remetia ao previsto no CPC em sua redação anterior, tornando
despicienda norma com igual teor em seu bojo, bem como a partir da análise
de outros dispositivos da LEF dos quais se podia extrair a existência do efeito
suspensivo.
Dentre esses dispositivos podemos citar os arts. 17 e 18, segundo
os quais caso sejam opostos embargos a Fazenda será intimada a impugná-
los, mas, caso não o sejam, a Fazenda será intimada a se manifestar sobre a
garantia da execução; o art. 24, I, pelo qual a Fazenda só pode adjudicar os
bens antes do leilão se a execução não for embargada, ou em caso de sua
rejeição e o art. 32, §2º pelo qual a devolução do depósito ofertado como
garantia à execução só será levantado com o trânsito em julgado da decisão
dos embargos.
O professor Hugo de Brito Machado segue esta fundamentação ao
afirmar que: “A lei 6830/80 não alberga dispositivo a dizer expressamente que os
18 in Execução Fiscal, editora Revista dos Tribunais, p. 36
28
embargos produzem efeito suspensivo. Entretanto, em seus arts. 18, 19, 24, I e 32,
§2º, deixa bastante clara a ocorrência desse importante efeito dos embargos, o que
nos autoriza a dizer que no âmbito da execução fiscal a interposição de embargos do
executado produz efeito suspensivo automático. (...) O Efeito suspensivo dos
embargos, no âmbito da execução fiscal, acolhido pela doutrina e jurisprudência,
decorre desses dispositivos da lei especifica. Jamais resultou de aplicação subsidiária
do Código de Processo Civil"19.
Defende esta corrente não poder o operador do Direito valer-se
apenas da aplicação subsidiária do CPC para defender a tese de que aos
embargos à execução fiscal não mais será concedido efeito suspensivo como
regra geral.
Em que pese o entendimento exposto, esta não se afigura como a
melhor solução para a celeuma trazida à baila.
O efeito suspensivo dos embargos à execução fiscal derivava,
exclusivamente, da aplicação subsidiária do art. 739, § 1.º do Código de
Processo Civil. Nesse sentido, o professor Luiz Rodrigues Wambier,
comentando, em lição anterior à revogação do § 1.º do art. 739 pela Lei
11.382/2006, a eficácia dos embargos à execução fiscal, afirmava:
“A oposição de embargos suspende a execução, embora isso não esteja
expresso na lei especial, mas decorra do texto do art. 739, § 1.º, do CPC,
que se aplica subsidiariamente.”20
Se o efeito suspensivo dos embargos em processo executivo fiscal
encontrava seu fundamento em dispositivo do Código de Processo Civil, o § 1.º
do art. 739, natural que a revogação deste atinja aqueles embargos.
Não aproveita à argumentação daqueles que sustentam a
manutenção da eficácia suspensiva dos embargos à execução fiscal, portanto,
o caráter especial da Lei de Execução Fiscal em relação ao Código de
19 idem, p. 68/69 20 Curso Avançado de Processo Civil, vol. 2, Processo de Execução, 7.ª ed., São Paulo, Saraiva, 2005, p. 387
29
Processo Civil, já que não regulados os efeitos dos embargos naquela,
fundamento da incidência subsidiária deste diploma legal no particular.
Mesmo considerando o caráter especial da Lei de Execução Fiscal
em relação ao Código de Processo Civil, é de se concluir pela ausência de
efeito suspensivo dos embargos à execução fiscal, já que a matéria não é
objeto de disciplina na lei especial, razão pela qual incide, nesse ponto, o
regramento geral.
No mesmo sentido, assevera o professor Leonardo Jose Carneiro
da Cunha:
“ A Lei n.º 6.830/1980 não trata dos efeitos decorrentes da propositura dos
embargos do executado. Incidem, diante disso, as novas regras contidas
no Código de Processo Civil. Significa, então, que, ajuizados os embargos,
a execução fiscal não estará, automaticamente, suspensa. Os embargos
não suspendem mais a execução fiscal, cabendo ao juiz, diante do
requerimento do executado e convencendo-se da relevância do argumento
e do risco de dano, atribuir aos embargos efeito suspensivo.”21
Também não resiste a uma análise mais profunda o argumento de
que a suspensividade dos embargos decorre implicitamente das demais
normas da lei de Execução Fiscal.
As normas citadas visam apenas preservar a segurança jurídica
impedindo atos de apropriação de patrimônio pela Fazenda Pública que
possam vir a ser desfeitos por decisão judicial posterior. Isso em razão da
dificuldade de operacionalização dessa “devolução” de valores ou bens pela
Fazenda, o que justifica a manutenção dessas regras no sistema jurídico,
permitindo que a incorporação no patrimônio público dos bens aconteça
apenas com a imutabilidade da decisão proferida em sede de embargos.
Deve prevalecer a tese da aplicação subsidiária do CPC à
execução fiscal, quando ausente regra específica neste, não mais ocorrendo a
suspensão da execução a partir da mera oposição dos embargos, tratando-se 21 A Lei n.º 11.382/2006 e seus reflexos na execução fiscal, Revista Dialética de Direito Processual n.º 49, São Paulo, Dialética, 2007, p. 100
30
agora de efeito excepcional, presente apenas nas hipóteses do §1º do art. 739-
A. Neste sentido, já se manifestou o Tribunal de Justiça de São Paulo,
conforme as seguintes ementas:
PROCESSUAL CIVIL - embargos à execução fiscal opostos na vigência da Lei n° 11.382/06 - suspensão da execução limitada às hipóteses do art.739-A, § Iº, do CPC. Recurso não provido.22 Embargos a execução fiscal. Recebimento sem efeito suspensivo. Aplicabilidade da regra do artigo 739, § 1° do CPC. Agravo de instrumento provido.23
A análise do processo de execução fiscal deve passar ainda pela
observância das normas tributárias, em especial aquelas constantes do Código
Tributário Nacional, recepcionado pela Constituição de 1988 como Lei
Complementar.
A suspensão do crédito tributário prevista no art. 151 do CTN deve
ser analisada em conjunto com o contido no art. 16, § 1º da Lei de Execuções
Fiscais, que afirma que a oposição dos embargos à execução só pode ocorrer
após a garantia do juízo.
Dentre as hipóteses arroladas cabe aqui destacar aquela prevista
no art. 151 inciso II que prevê a suspensão para os casos em que houver
depósito do montante devido. Interpretando o dispositivo citado o Superior
Tribunal de Justiça editou o verbete sumular nº. 112 que prevê: “O depósito
somente suspende a exigibilidade do crédito tributário se for integral e em
dinheiro”.
Trazendo para o campo da execução fiscal a hipótese versada,
lícito é concluir que uma vez depositado o valor exeqüendo no bojo da
execução fiscal, garantindo o feito, estamos diante de uma hipótese de
suspensão do crédito tributário, nos termos do quanto previsto no CTN.
Suspensa a exigibilidade do crédito tributário não faz sentido
admitir-se o prosseguimento da execução fiscal correlata, pois não se podem
admitir atos expropriatórios de bens do executado uma vez que o crédito 22 AGRAVO DE INSTRUMENTO n° 751.662.5/0 - SÃO JOSÉ DOS CAMPOS Rel. Des. Coimbra Schmidt 23 AGRAVO DE INSTRUMENTO N 722 524 5/4-00 Rel. Des. Aguilar Cortez
31
encontra-se com sua exigibilidade suspensa, obstando a continuidade de um
processo executivo de cobrança.
Em conclusão de tudo que foi exposto, cremos que os embargos à
execução fiscal não mais possuem o efeito suspensivo inerente à sua
interposição. Eventual suspensão do processo executivo dependerá, nos
termos do art. 739-A do Código de Processo Civil, de pedido expresso do
embargante, quando, por relevantes fundamentos, o prosseguimento da
execução possa lhe trazer grave dano e de difícil reparação, além de existir a
prévia garantia do juízo. Exceção à ausência de efeito suspensivo aos
embargos, como visto, fica por conta da existência de depósito do valor devido
na execução fiscal, hipótese na qual o executado obterá a suspensão da
exigibilidade do crédito tributário com fundamento no art. 151, II, do Código
Tributário Nacional, inviabilizando a prática de atos expropriatórios na
execução fiscal para cobrança desse mesmo débito.
6. CONCLUSÃO
Por todo o exposto verifica-se que as novas regras que alteraram
significativamente o processo de execução por título extrajudicial possuem
incidência no feito executivo fiscal não apenas nas matérias não
regulamentadas na Lei de Execução Fiscal, em razão da aplicação subsidiária
do Código de Processo Civil nos termos do art. 1º de seu texto, mas também
incidirão ainda que exista normatização diversa em legislação específica.
Este entendimento preserva a atual processualística, agora
explicitamente privilegiada no texto constitucional, que busca cada vez mais a
obtenção da aclamada efetividade processual, como resposta a ser dada para
toda a sociedade, buscando resgatar um conceito positivo para o Poder
Judiciário, tão desacreditado atualmente.
Esta nova mensagem de celeridade e eficácia deve possuir maior
incidência no processo executivo, no qual o credor já possui um titulo que
demonstra seu direito, cabendo ao Estado Juiz fornecer meios para efetivação
32
da tutela jurisdicional pleiteada. O mesmo raciocino deve ser utilizado para as
execuções fiscais, devendo o Judiciário garantir a aplicação dos meios para a
efetiva satisfação do credor fazendário.
A aplicação dos novos instrumentos trazidos pelo Legislativo
através da edição da Lei 11.382/06 ao campo da execução fiscal, procedendo-
se a uma análise sistemática da legislação, atualiza a cobrança da dívida ativa,
obstando a prática de atos maliciosos e meramente protelatórios tão
comumente observados nas lides fiscais, garantindo o incremento do erário e
atuando com caráter inibitório, incentivando o escorreito recolhimento de
tributos aos cofres públicos, viabilizando a implementação de políticas públicas
tão cobradas pela sociedade.
33
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