curso de termodinamica computacional

159
Termodinâmica Aplicada Emanuel Rocha Woiski UNESP-Ilha Solteira Termodinâmica Computacional

Upload: robinson-erazo

Post on 06-Aug-2015

111 views

Category:

Documents


6 download

TRANSCRIPT

Page 1: Curso de Termodinamica Computacional

Termodinâmica Aplicada

Emanuel Rocha Woiski

UNESP-Ilha Solteira

Termodinâmica

Computacional

Page 2: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

À Tânia,

meu amor,

pela infinita paciência e

compreensão

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL2

Page 3: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Sumário

A Abertura ................................................................................................................................................ 7

Introdução: O que é a Termodinâmica Clássica? ................................................................................ 12

0.1.Uma Definição para Substância Pura e Sistema ..................................................................... 12

0.2.Que tal Um Exemplo? ................................................................................................................. 12

0.3.Estado e Propriedades ................................................................................................................ 13

0.4.Trabalho, Calor e Fluxo de Massa ............................................................................................. 14

0.5.O Trabalho Mecânico ................................................................................................................. 15

0.6.O Calor ......................................................................................................................................... 16

0.7.Sistema Fechado, Aberto ou Isolado ......................................................................................... 16

0.8.Uma Outra Definição de Termodinâmica ................................................................................. 17

0.9.Representação em Forma de Grafo ........................................................................................... 17

1.O Comportamento P, v, T das Substâncias Puras .............................................................................. 20

5.1.Sistema Compressível Simples ................................................................................................... 20

1.1.O Postulado dos Estados ............................................................................................................. 20

1.2.O Comportamento da Água ....................................................................................................... 21

1.3.O Gás Perfeito ............................................................................................................................. 27

1.4.Comportamento dos Gases Reais .............................................................................................. 29

1.5.Regra dos Estados (Quase) Correspondentes ........................................................................... 31

1.6.O Fator Acêntrico de Pitzer ....................................................................................................... 33

1.7.A correção de Wu e Stiel ............................................................................................................. 34

1.8. As propriedades não mensuráveis ............................................................................................ 34

2.A Primeira Lei da termodinâmica ...................................................................................................... 35

2.1.Consequências da Primeira Lei para Sistema Fechado .......................................................... 36

2.2.Energia Interna, Cinética e Potencial ....................................................................................... 37

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 3

Page 4: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

2.3.O Sistema Aberto ou Volume de Controle ................................................................................ 40

2.4.A Conservação da Massa para Sistema Aberto ........................................................................ 41

2.5.A Primeira Lei para Volume de Controle ................................................................................. 42

2.6.A Propriedade Termodinâmica Entalpia .................................................................................. 43

2.7.O Regime Permanente ................................................................................................................ 44

2.8.O Regime Transiente ................................................................................................................... 44

3.A Segunda Lei para Sistema Fechado ............................................................................................... 46

3.1.A Entropia .................................................................................................................................... 47

3.2.Consequências da Segunda Lei para Sistema Fechado ........................................................... 49

3.3.As Máquinas Térmicas e Os Refrigeradores ............................................................................ 50

3.4.A Segunda Lei para Sistema Aberto .......................................................................................... 52

3.5.O Regime Permanente ................................................................................................................ 53

3.6.Regime Transiente ....................................................................................................................... 54

4.Combinação da Primeira e da Segunda Leis da Termodinâmica ..................................................... 56

4.1.Trabalho Reversível em Sistema Fechado ................................................................................ 60

4.2.A Exergia de Fluxo ...................................................................................................................... 60

4.3.A Exergia de Não Fluxo .............................................................................................................. 62

4.4.Rendimento Termodinâmico pela Segunda Lei ........................................................................ 65

4.4.O Procedimento para o Modelamento dos Problemas ............................................................ 66

5.As Propriedades Termodinâmicas e o Estado .................................................................................... 67

5.3.Um Pouco de Cálculo .................................................................................................................. 68

5.4.As Relações de Maxwell .............................................................................................................. 69

5.5.A Equação de Estado ................................................................................................................. 72

5.6.A Energia Interna a Partir da Temperatura e do Volume ....................................................... 72

5.7.A Entropia a Partir da Temperatura e do Volume ................................................................... 75

5.8.A Entalpia e a Entropia a Partir da Temperatura e da Pressão ............................................. 76

6. Determinação das Propriedades Termodinâmicas ........................................................................... 78

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL4

Page 5: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

6.1.A Variação da Entalpia, Energia Interna e Entropia para o Gás Perfeito ............................ 78

6.2.A Energia Interna em Coordenadas Generalizadas ................................................................ 78

6.3.A Entalpia em Coordenadas Generalizadas ............................................................................. 80

6.4.A Entropia em Coordenadas Generalizadas ............................................................................ 81

6.5.A Fugacidade de Substâncias Puras .......................................................................................... 82

6.6.Os Diagramas Generalizados com Lee-Kesler e Fluidos Simples .......................................... 83

6.7.O Programa LK_WS_NR e o pacote LK_proptermo ............................................................. 85

7.Misturas Homogêneas de Substâncias Puras .................................................................................... 90

7.1.O Postulado Estendido dos Estados .......................................................................................... 90

7.2.Propriedades Molares Parciais .................................................................................................. 90

7.3.Mais do que Uma Questão de Nomenclatura ........................................................................... 92

7.4.As Misturas Homogêneas Binárias e Multicomponentes ........................................................ 93

7.5.As Soluções Ideais ....................................................................................................................... 95

7.6.Retomando o Exemplo ................................................................................................................ 96

7.7.As Misturas de Gases Perfeitos ................................................................................................ 100

7.8.Revisitando o Exemplo Usando Mistura de Gases Perfeitos ................................................. 102

7.9.As Pseudo-Substâncias Puras e os Modelos Pseudo-Críticos ................................................ 103

7.10.O Nosso Exemplo Usando Pseudo-Substância Pura ............................................................ 105

7.11.Exemplo Numérico .................................................................................................................. 107

8.Misturas Homogêneas Reativas ....................................................................................................... 112

8.1.Uma Questão de Massa ............................................................................................................. 112

8.2.O Grau de Reação ..................................................................................................................... 113

8.3.A Base da Entalpia de Formação ............................................................................................. 116

8.4.A Base da Entropia Absoluta .................................................................................................... 118

8.5. Revendo o Exemplo agora com Reações Químicas ............................................................... 119

8.6. A Temperatura Adiabática de Chama e o Poder Calorífico ................................................. 125

8.7. As Reações Químicas Reversíveis e O Equilíbrio Químico .................................................. 127

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 5

Page 6: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

8.8. O Método dos Multiplicadores de Lagrange ......................................................................... 128

8.9. A Determinação dos Potenciais Químicos .............................................................................. 131

8.10. O Método das Constantes de Equilíbrio .............................................................................. 134

9.Misturas Heterogêneas: Equilíbrio de Fases .................................................................................. 144

9.1.A Regra das Fases de Gibbs ..................................................................................................... 147

9.2.A Relação de Clausius-Clapeyron ........................................................................................... 148

9.3.O Sistema Binário Bifásico ....................................................................................................... 149

9.5.A Fugacidade de Misturas Homogêneas ................................................................................. 153

9.6.A Fugacidade no Equilíbrio de Fases ...................................................................................... 153

9.7.O Modelo de Solução Ideal para o Equilíbrio ........................................................................ 154

9.8.O Modelo Regra de Raoult-Gás Perfeito ................................................................................ 156

10.Introdução aos Ciclos Termodinâmicos ......................................................................................... 157

10.1.Ciclo de Rankine ..................................................................................................................... 157

10.2.Ciclo de Refrigeração por Compressão de Vapor ................................................................ 157

10.3.Ciclos Padrão de Ar de Otto, Diesel e Stirling ...................................................................... 158

10.4.Ciclo Padrão de Ar de Brayton de Turbina a Gás ............................................................... 158

10.5.Ciclos Mistos ............................................................................................................................ 158

Bibliografia Comentada ...................................................................................................................... 159

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL6

Page 7: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

A AA ABERTURABERTURA

Os textos tradicionais de Termodinâmica geralmente contém tabelas de uma ou dupla

entrada que representam os valores das principais propriedades termodinâmicas para um

número selecionado de substâncias puras, usualmente com valores escalonados da sua

temperatura e/ou pressão. Mediante uma ou duas interpolações lineares, o aluno poderá

então obter o valor das propriedades sob valores intermediários. De fato, essa abordagem

abriga alguns graves problemas. Em primeiro lugar, o aluno ficará com uma sensação de

que as tabelas foram entregues aos humanos por alguma divindade, quando na verdade

elas provém de equações cujos valores foram calculados em um passado recente por meio

de “grandes” computadores. Deve ser recordado aqui que ainda nas décadas de 80-90, o

computador 'pessoal' era um objeto raro e caro. Em segundo lugar, o aluno será

praticamente incapaz de resolver problemas cujo modelamento vá além de uma equação –

uma incógnita (ou eventualmente duas equações - duas incógnitas), o que não lhe permite

vislumbrar o alcance e as potencialidades oferecidas a ele pelo Postulado dos Estados e

pelo conceito de propriedade termodinâmica de substância pura como função 'conhecida' de

apenas duas propriedades termodinâmicas independentes (no caso de sistemas

compressíveis simples). Em terceiro lugar, para o aluno lidar com uma substância pura e

suas propriedades já parece complicado, como poderá este investigar problemas mais

complexos que contenham misturas reativas e não reativas, com ou sem equilíbrio de fases,

ideais ou modeladas como pseudo-substâncias puras? Em quarto lugar, e de certa forma

como um corolário de todas as razões anteriores, ao aluno ficarão vedados os problemas

que envolvem otimização e simulação de sistemas termodinâmicos, ou seja, exatamente

aqueles que são mais interessantes e com os quais ele certamente irá se defrontar na sua

vida real!

Sabe-se que hoje em dia os computadores portáteis possuem muito mais poder

computacional (sob qualquer métrica!) dos que os mainframes de outrora e que, além disso,

são acessíveis a todo mundo, de modo que as tabelas termodinâmicas tradicionais deveriam

seguir a mesma rota das tabelas trigonométricas e logarítmicas – a extinção. Para contribuir

com esse processo, no presente texto nós pretendemos resgatar um certo fundamentalismo,

pelo qual as propriedades termodinâmicas serão determinadas a partir de uma equação de

estado generalizada, utilizando-se extensivamente os conceitos de fator de

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 7

Page 8: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

compressibilidade, coeficiente de fugacidade e propriedades residuais. Além disso, modelos

pseudo-críticos apropriados serão utilizados no caso de misturas homogêneas não ideais.

Dentre todas as equações de estado generalizadas disponíveis na literatura, optamos

pela implementação da equação de estado de Lee-Kesler com a correção dada pelo fator

acêntrico ω de Pitzer e pelo fator Y de Wu-Stiel, quando disponível, para uma correção

adicional que se aplica a moléculas polares, como a água. Obtendo erros relativos da

ordem de no máximo 5% quando comparados com as tabelas, não estamos tão

preocupados, no momento, com uma extrema acuracidade dos valores obtidos, mas com o

desenvolvimento de um procedimento geral e rigoroso para o tratamento de sistemas

termodinâmicos com o uso de computador.

Por outro lado, escolhemos para a implementação a linguagem Python, por ser

dinâmica, interpretada, de fácil sintaxe e aprendizado, muito alto nível, orientada a objetos,

multiplataforma e de fonte aberta. Com as bibliotecas apropriadas, Python é cada vez mais

empregada no meio científico, seja em substituição ao proprietário e dispendioso MATLAB,

seja como linguagem de ligação para as linguagens compiladas, como Fortran, C e C++. De

fato, pode-se afirmar que, segundo a métrica do conhecido TIOBE, Python corresponde à

quinta ou sexta linguagem de programação mais utilizada no mundo.

Este texto é fruto de uma concepção cujo objetivo foi fornecer ao leitor cujo tempo é

limitado e precioso, um substrato rigoroso, embora sucinto às vezes, omisso em partes,

sobre o qual ele ou ela poderá, em primeiro lugar, modelar e estruturar as possíveis

soluções para problemas de Termodinâmica Clássica de complexidade acima do trivial e,

em segundo lugar, construir um caminho para o aprofundamento em qualquer direção que

mais lhe interessar ou necessitar, sempre utilizando o computador como a ferramenta

principal.

Isto posto, dividimos a obra em dez capítulos e uma Introdução. No Capítulo de

Introdução, a partir dos conceitos mais fundamentais de sistema, meio-ambiente, fronteira,

propriedades e interações na fronteira: de trabalho, calor e fluxo de massa, definimos a

Termodinâmica de forma a satisfazer os nossos propósitos. No Capítulo 1, apresentamos de

forma intuitiva o comportamento das propriedades termodinâmicas mensuráveis pressão,

temperatura e volume específico da água como substância pura em uma única fase e na

forma de mistura heterogênea de fases, com grande ênfase em líquido e vapor. Elaboramos

a respeito das equações de estado, definimos o fator de compressibilidade e Introduzimos o

conceito de região de comportamento de gás perfeito. Finalmente, generalizamos o

comportamento de líqudo e vapor para quaisquer substâncias puras e apresentamos a

equação de estado generalizada. De posse dessas ideias, analisamos o comportamento

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL8

Page 9: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

geral das substâncias puras, dispensando algum espaço para a região em torno da

saturação liquido-vapor e salientamos, a partir do conceito de equação de estado e de gás

perfeito, que, para todas as substâncias puras haverá uma região de comportamento de gás

(quase) perfeito. Apresentamos em seguida, no Capítulo 2, a Primeira Lei para sistema

fechado e aberto e a definição de energia interna e entalpia. Para que o leitor se convença,

de uma vez por todas, que uma lei não existe sem a outra, abordamos imediatamente, no

Capítulo 3, a Segunda Lei para sistema fechado e aberto, abrindo caminho para a

importante definição de entropia. Nada mais natural, portanto, que analisemos a combinação

da Primeira e da Segunda lei, em seguida, no Capítulo 4, quando apresentamos os

conceitos de trabalho reversível, irreversibilidade (trabalho perdido) e da propriedade

combinada disponibilidade (exergia) tanto para fluxo, como não fluxo. Embora a

fundamentação anterior seja suficientemente geral, para que possamos resolver problemas

de modelagem da realidade, particularizamos, no Capítulo 5, o nosso universo de trabalho,

para sistemas compressíveis e, com a ajuda do Postulado dos Estados e de umas poucas

ferramentas do Cálculo e de suas consequências para a Termodinâmica, desenvolvemos a

importante noção de derivadas parciais, de relação funcional e de integral de linha entre as

propriedades termodinâmicas dependentes e independentes. Obtemos então, no Capítulo 6,

as formas algébricas para as diferenças (e os desvios residuais) das propriedades

termodinâmicas para qualquer substância pura: energia interna, entalpia e entropia, em

coordenadas adimensionais generalizadas. Desenvolvemos, assim, com o apoio da Regra

dos Estados (quase) Correspondentes, o fator de compressibilidade. Apresentamos algumas

equações de estado e, por escolha pessoal, nos fixamos na equação generalizada de Lee-

Kesler, que nos leva imediatamente ao fator acêntrico de Pitzer e ao fator de correção Y de

Wu-Stiel, como uma das estratégias para obter resultados que correspondam melhor aos

dados experimentais para as diversas substâncias puras. Aproveitamos para definir a

fugacidade (e o coeficiente de fugacidade) de substâncias puras. Imaginando que o leitor já

está dotado da capacidade de obter as (diferenças de) propriedades termodinâmicas de

qualquer substância pura, bem como as fugacidades, desde que lhe sejam fornecidos os

seus dados do ponto crítico, o fator de Pitzer e a correção de Wu-Stiel, apresentamos o

programa LK_WS_NR e o pacote LK_proptermo, abrindo assim ao aluno um universo

enorme de aplicações envolvendo centenas de substâncias puras, sem a necessidade de

lançar mão de uma única tabela sequer. Como uma sequência natural, abordamos, no

Capítulo 7, as misturas homogêneas não reativas de substâncias puras de uma forma bem

geral, a partir do Postulado Extendido dos Estados e da importante noção de propriedade

molar parcial. Com isso, abrimos espaço para a apresentação dos modelos de soluções

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 9

Page 10: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

ideais e de mistura de gases perfeitos, como casos particulares. Para o caso destes

modelos não se aplicarem, ou até mesmo para a simplificação da resolução de problemas,

apresentamos ainda ao leitor dois modelos de pseudo-substância pura, do mais simples, a

regra de Kay, ao razoavelmente sofisticado modelo de Lee-Kesler, que inclui os fatores

acêntricos e os fatores de Wu-Stiel. Sob o tópico de misturas reativas, no Capítulo 8,

discutimos o grau de reação e as reações químicas, tomando como exemplo a combustão,

incluindo em detalhes uma discussão sobre reações reversíveis, equilíbrio químico e a

minimização da função de Gibbs. Assim, mostramos detalhadamente a aplicação do método

dos multiplicadores de Lagrange à mistura de produtos de combustão em equilíbrio.

Discutimos os potenciais químicos e a sua determinação em relação a outras propriedades,

bem como as propriedades das substâncias puras no estado padrão. Estudamos em

seguida o método das constantes de equilíbrio e suas importantes consequências.

Posteriormente, analisamos com algum detalhe, no Capítulo 9, a partir da minimização da

função de Gibbs, o equilíbrio de fases em misturas heterogêneas multicomponentes,

exibindo exemplos de diagramas de fases para misturas binárias. Nesse ponto definimos a

propriedade fugacidade do componente na mistura. Com isso, podemos discutir o modelo

de solução ideal para cada fase da mistura e, finalmente, analisar o modelo extremamente

simplificado da regra de Raoult-gás perfeito, o qual pode ser utilizado quando o sistema

contendo vapor quando uma das fases está sob pressões moderadas. No Capítulo 10,

abordamos sucintamente o tópico de Ciclos Termodinâmicos, que deve ser, na verdade,

considerado como aplicações de tudo o que foi visto nos capítulos anteriores. Dividimos,

então, em: ciclos com mudança de fase de Rankine e de refrigeração por compressão de

vapor; os ciclos padrão de ar de Otto, Diesel e Stirling, que modelam sob determinadas

limitações os motores de combustão interna; o ciclo padrão de ar de Brayton, que modela os

motores de jatos e as turbinas a gás; e os ciclos mistos ou combinados.

Se seremos bem-sucedidos em nosso propósito de apresentar um texto compacto de

Termodinâmica Clássica que auxilie o leitor não especialista, na modelagem estruturada dos

aspectos termodinâmicos não triviais da realidade e que lhe desperte o interesse para

aprender muito mais, só o tempo e a experiência dirão. Porém, se isso porventura ocorrer,

remetemos o leitor para a curta Bibliografia comentada ao final da obra para auxiliar na

jornada.

Agradecemos aos colegas professores do Departamento de Engenharia Mecânica,

pelo apoio e pela oportunidade que tivemos de elaborar e submeter as versões preliminares

do presente texto a uma audiência que, embora de formação em ciências exatas, ainda

assim era relativamente heterogênea. Agradecemos especialmente aos nossos amigos e ex-

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL10

Page 11: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

alunos, hoje cientistas, Marcos e Colmeia por haverem respondido tão prontamente às

demandas que lhes impusemos quando do início do desenvolvimento dos códigos

computacionais em Python. Finalmente, estendemos nossos agradecimentos às centenas

de estudantes das disciplinas Termodinâmica I e II, do Curso de Engenharia Mecânica, que,

ao utilizarem o presente texto, nos forneceram a oportunidade de continuamente aperfeiçoá-

lo, assim como ao código computacional correspondente. É importante acrescentar que o

seu código-fonte esteve desde o início disponível a todos que o quisessem. Esperamos

sinceramente corresponder às expectativas de todos.

Ilha Solteira, aos 21 dias de fevereiro de 2012.

Emanuel Rocha Woiski

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 11

Page 12: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

IINTRODUÇÃONTRODUÇÃO: O : O QUEQUE ÉÉ AA T TERMODINÂMICAERMODINÂMICA C CLÁSSICALÁSSICA??

Para começar, o que é a Termodinâmica? Uma resposta possível pode ser obtida da

literatura: “é um ramo da ciência fundamental e aplicada que descreve de forma

macroscópica as forças motrizes que estabelecem os fluxos de energia (na forma de

trabalho e calor) e as condições para o equilíbrio dentro de um sistema (região arbitrária no

espaço). Entende-se por equilíbrio um estado do sistema onde estas forças motrizes estão

ausentes ou inoperantes e o referido sistema não possui mais a capacidade de se alterar

espontaneamente.”

Parece muito complicado, não?

0.1.Uma Definição para Substância Pura e Sistema

Vamos tentar construir aos poucos uma definição mais acessível, embora talvez

menos abrangente. Para isso, precisamos estabelecer um vocabulário comum

fundamentado em uma série de conceitos.

Substância pura é aquela porção de matéria de composição química definida e que

mantém a sua composição mesmo sob mudança de fase (água pura na forma de sólido,

liquido ou vapor não deixa de ser água...).

O sistema termodinâmico será para nós qualquer região delimitada no espaço que,

ou contém uma ou mais substâncias puras, ou é composto de subsistemas que por sua vez

são sistemas termodinâmicos (claramente uma definição recursiva de sistema...).

Além disso, tudo o que não pertence ao sistema é o seu meio-ambiente e exatamente

na interface entre o sistema e o seu meio-ambiente, existe uma região imaginária

extremamente importante chamada fronteira do sistema. Observe-se com atenção que

tanto o meio-ambiente como a fronteira são ambos determinados relativamente ao sistema

escolhido.

0.2.Que tal Um Exemplo?

Vejamos então um exemplo: Seja um cilindro de aço de paredes com determinada

espessura contendo gás natural (uma mistura de substâncias puras). Poderemos, de acordo

com a nossa definição, estabelecer um sistema termodinâmico como sendo a porção de gás

natural encerrada no cilindro. Neste caso, o meio-ambiente será tudo o mais além daquele

volume de gás – as paredes do cilindro, o ambiente externo ao cilindro, etc. A fronteira do

sistema estará delimitada pela interface entre o volume de gás e a parede interna do

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL12

Page 13: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

cilindro. Por outro lado, o nosso sistema poderia ser o gás mais o cilindro. Permaneceríamos

ainda dentro de nossa definição, pois este seria composto de uma mistura de gases e de

uma liga metálica. Neste caso, a fronteira do sistema estaria entre a parede externa do

cilindro e o ambiente exterior, que neste caso confunde-se com o meio-ambiente do sistema.

Sob esta escolha, o sistema poderá ser dividido em dois subsistemas: a porção de gás e o

cilindro sólido, cada um deles composto de uma mistura de substâncias puras. A propósito,

lembre-se sempre que o subsistema é também um sistema de pleno direito e, portanto,

dotado de seu próprio meio-ambiente e respectiva fronteira!

Acredite, a indefinição na escolha do sistema é, provavelmente, um dos maiores

responsáveis pelos erros cometidos na interpretação e solução de problemas em

termodinâmica...

0.3.Estado e Propriedades

Pois bem, a nossa definição especializada de sistema tem um propósito: o estado (de

equilíbrio) do sistema termodinâmico é caracterizado através do valor “instantâneo” de suas

propriedades termodinâmicas (o “retrato” de suas propriedades). Mas o que são as tais

propriedades termodinâmicas?

Propriedades termodinâmicas são aquelas propriedades do sistema cujo valor

presente não depende dos valores passados ou futuros, ou seja, da história da evolução do

sistema, ou da sucessão de estados do sistema, ou ainda em outras palavras, do processo

termodinâmico pelo qual passou o sistema para chegar naquele estado presente (pode-se

dizer: a propriedade é...).

As propriedades termodinâmicas podem ser extensivas, quando dependem

linearmente da massa do sistema, como é caso do volume (dividindo-se a massa por uma

proporção, o volume divide-se na mesma proporção) e intensivas, cujo valor não se altera

com a alteração da massa, como é a densidade (massa específica) do sistema, que

permanece a mesma, não importa a proporção de massa do sistema que selecionemos.

Todas as propriedades extensivas podem ser divididas pela massa, criando-se dessa forma

uma nova propriedade intensiva correspondente. Se dividirmos o volume - propriedade

extensiva - do sistema pela sua massa, obteremos o volume específico, propriedade

intensiva, ou para distinguir das propriedades intensivas próprias, chamaremos de

“intensivada”. Podemos citar, então, a temperatura T e a pressão absolutas P como

propriedades intensivas e o volume V e a própria massa m como propriedades extensivas.

Encontraremos ainda muitas outras propriedades extensivas e intensivas ao longo do nosso

estudo, mas todas elas tem as mesmas características.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 13

Page 14: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Se apenas uma (das, por enquanto inumeráveis) propriedades termodinâmicas do

sistema sofrer uma alteração infinitesimal, o estado também será alterado

infinitesimalmente.

0.4.Trabalho, Calor e Fluxo de Massa

Está claro então que as propriedades são definidas internamente ao sistema. Mas

como podem seus valores sofrer alteração? De um modo geral através de interações na

fronteira do sistema da Fig.0.1. Existem duas espécies de interações através da fronteira,

durante o intervalo de tempo dt: interações de energia, através da realização de trabalho

mecânico (δW) pela transferência de calor (δQ), que são duas formas distintas de fluxo de

energia; e interação de massa, através de transferência de massa (δm) em qualquer parte da

fronteira.

Quanto às interações de trabalho, calor e fluxo de massa: 1) só são identificadas

auscultando-se toda a fronteira do sistema; 2) só têm existência enquanto o processo

(possivelmente infinitesimal) ocorre entre dois estados; e 3) dependem de cada processo

que ocorre entre os mesmos dois estados. Esta é razão pela qual adotamos a notação δ, de

diferencial não ordinária (cujo valor depende do caminho ou processo), para essas

grandezas.

Além disso, se escolhermos outro sistema para representar um aspecto da

modelagem do mesmo problema real, então as interações de trabalho, calor e massa, bem

como as propriedades termodinâmicas do sistema, deverão ser avaliadas exclusivamente na

fronteira (e respectivamente no interior) deste novo sistema.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL

fronteiraSistema

δQ

δW

δm

dm, dT, dV

dv,dP

meio-ambiente

Fig.0.1 – O sistema termodinâmico e suas interações

14

Page 15: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

0.5.O Trabalho Mecânico

Sabemos da Mecânica, que a definição de trabalho é

W =−∫ F⋅d x , (0.1)

que é a representação matemática do produto interno das forças que atuam sobre o corpo

pelo deslocamento do ponto de aplicação daquelas mesmas forças. Estamos adotando na

presente obra a convenção de que o trabalho realizado pelo sistema termodinâmico é

positivo, daí o sinal negativo. Note que esta convenção não é, de forma alguma, universal.

Em termodinâmica, o trabalho mecânico puro é toda aquela interação na fronteira

cujo efeito sobre o meio-ambiente puder ser substituído unicamente pelo levantamento de

um peso. Este, de fato, é o trabalho realizado por uma força cujo ponto de aplicação

acompanha o movimento.

No caso de sistemas de potência e refrigeração existem duas únicas formas de

trabalho mecânico que irão nos interessar. Uma delas é a de deslocamento da fronteira dV

em resistência a uma força F realizada por uma pressão P, com P = F/A :

W =∫Pdv , (0.2)

que é um trabalho positivo para deslocamentos positivos da fronteira (uma vez que a

pressão é sempre positiva). Podemos afirmar que a força motriz para trabalho é o

“gradiente” de pressão. A pressão, por sua vez, é uma propriedade termodinâmica intensiva

do sistema. A outra forma de trabalho mecânico será o trabalho de cisalhamento na fronteira

ou trabalho de eixo.

Um reservatório de pressão (ou reservatório de trabalho) é um sistema especial cuja

única interação é o trabalho mecânico e cuja pressão não se altera, qualquer que seja a

demanda ou fornecimento de trabalho em sua fronteira.

Um tipo de fronteira de zero-trabalho pode então ser representada por um recipiente

rígido (isto é, que não sofre deformação alguma sob gradientes de pressão), isto é dV = 0,

ou com expansão não resistida, ou seja, não há um ponto de aplicação de uma força

durante a expansão, e sem trabalhos de eixo.

Se a restrição sobre o sistema impede qualquer transferência de trabalho mecânico,

então todos os processos serão de zero-trabalho.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 15

Page 16: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

0.6.O Calor

Calor é a interação na fronteira de um sistema que não é nem de trabalho e nem de

fluxo de massa. Calor é, alternativamente, a interação que pode ocorrer entre dois corpos

em contato, devido à sua diferença finita de temperatura. Uma vez isolados os dois corpos

em contato, após um certo tempo, cessará o fluxo de calor entre eles. Dizemos então que

eles estão em equilíbrio térmico. Para que se possa falar em temperatura, é necessário que

possamos medi-la e compará-la sem ambiguidade. Para isso lançamos mão de um axioma

fundamentado na experiência cotidiana, conhecido como Lei Zero da Termodinâmica: Se

dois corpos estão em equilíbrio térmico com um terceiro, então estão em equilíbrio térmico

entre si, ou seja, eles estão à mesma temperatura. A temperatura, por sua vez, é uma

propriedade termodinâmica intensiva do sistema sempre positiva e a força motriz para o

calor é o potencial ou “gradiente” de temperatura.

Talvez as definições de interação de calor, em termos de temperatura, ou de trabalho

mecânico, a partir da pressão, lhe tenham parecido um tanto quanto circulares. De fato,

primeiro aprenderemos a distinguir rigorosamente ambas as interações de energia entre si

quando estudarmos a Segunda Lei da Termodinâmica e mais tarde aprenderemos como

definir temperatura e pressão sem ambiguidades, quando estudarmos as relações que

podem ser construídas entre as propriedades termodinâmicas.

Um reservatório de temperatura (ou reservatório térmico) é um sistema especial cuja

única interação na fronteira é calor e cuja temperatura não se altera, qualquer que seja a

demanda ou fornecimento de calor em sua fronteira.

Se alguma parte da fronteira não houver fluxo de calor através dela, então aquela

parte é dita adiabática. Se em toda a fronteira o fluxo de calor não é permitido, então o

sistema todo é dito adiabático. Neste último caso, todos os processos que ocorrem sobre o

sistema serão necessariamente adiabáticos.

0.7.Sistema Fechado, Aberto ou Isolado

Se a fronteira do sistema for impermeável à massa, então o sistema é dito fechado.

Caso contrário, é conhecido como sistema aberto ou volume de controle. Quando nem calor,

nem trabalho ou fluxo de massa são permitidos, o sistema é dito isolado. Neste caso,

claramente os valores das propriedades no interior de um sistema isolado só podem ser

modificados através de uma evolução espontânea do sistema de um certo estado para outro

até alcançar um novo estado de equilíbrio. Por outro lado, se a fronteira é permeável a

qualquer intensidade de fluxo de calor ela é diatérmica e se ela é permeável a apenas

algumas espécies químicas é chamada semipermeável.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL16

Page 17: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

0.8.Uma Outra Definição de Termodinâmica

De posse do nosso vocabulário básico, podemos então redefinir a Termodinâmica

como o ramo das ciências básicas e aplicadas que se dedica a estudar a relação entre as

alterações macroscópicas dos valores das propriedades termodinâmicas no interior de um

determinado sistema termodinâmico e as interações em sua fronteira de trabalho, calor e de

fluxo de massa com o seu meio-ambiente.

Antes de prosseguir, estude até entender bem todos os conceitos expostos na

definição do parágrafo anterior e em seguida compare com aquela do início deste Capítulo.

Consegue ver as diferenças e semelhanças entre as duas definições?

0.9.Representação em Forma de Grafo

Para um sistema fechado, é instrutivo que representemos o processo entre os

estados 1 e 2 do sistema como linhas unindo os dois estados, como na Fig. 0.2. Note que

poderá haver mais de um processo conectando os mesmos dois estados e que para cada

processo percebemos que poderá existir uma interação de calor e de trabalho e que elas

são diferentes para cada processo. Em outras palavras, as interações de energia na

fronteira são dependentes do processo, ou seja, dependem da história detalhada da

evolução do sistema. Revendo então a nossa definição de propriedade termodinâmica,

concluímos que trabalho e calor não se qualificam como propriedades (por quê?).

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL

δQB

δWBδQ

A

δWA

δQC

δWC

A

B

C1

2

D

δQD

δWD

Fig.0.2 – Representação em forma de grafo dos processos em um sistema

17

Page 18: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Os processos podem ser reversíveis ou irreversíveis. Processos reversíveis são

aqueles cuja direção pode ser exatamente revertida (passando sobre os mesmos estados) e

ao revertê-los, seus efeitos sobre o meio-ambiente desaparecem, ou seja, o meio-ambiente

é restituído ao seu estado original. Nos processos reversíveis, todos os estados que compõe

a trajetória do processo podem ser identificados, ao passo que nos processos irreversíveis,

só se consegue identificar o estado inicial e o final, como no processo D, representado na

Fig 0.2. Uma discussão mais extensa sobre irreversibilidade será adiada até estudarmos a

Segunda lei da Termodinâmica.

Portanto, você já sabe que as interações de energia na fronteira são de forma a que:

δQA ≠ δQB ≠ δQC ≠ δQD e δWA ≠ δWB ≠ δWC ≠ δWD. Observe também que trabalho e calor só

existem durante a ocorrência de cada processo que leva do estado inicial 1 para o estado

final 2, daí a afirmação de que calor e trabalho representam formas de energia em trânsito

através da fronteira do sistema. Na verdade, como já dissemos, a notação “δ” é comumente

utilizada para calor e trabalho em processos infinitesimais, ou seja, um infinitésimo separa o

estado 1 do estado 2. Pois bem, imagine que a temperatura e a pressão referentes ao

estado 1 sejam respectivamente T(1) e P(1) ao passo que a temperatura e a pressão

referentes ao estado 2 sejam T(2) e P(2)

respectivamente. A propósito, ao longo deste trabalho

usaremos a notação de sobrescrito entre parênteses para o estado e reservaremos o

subscrito para componente, no caso de misturas. Como estes estados 1 e 2 estão

infinitesimalmente separados e, de acordo com a definição, as propriedades termodinâmicas

não dependem do processo, a variação de temperatura e de pressão entre os dois estados

será dT = T(2)– T(1) e dP = P(2) – P(1). A notação “d” será reservada para variação infinitesimal

(diferenciais ordinárias) de qualquer propriedade termodinâmica. Você consegue notar a

diferença entre os símbolos “δ” e “d” que aparecem nestas grandezas infinitesimais?

Claramente, devido à dependência do processo e a energia em trânsito, não tem sentido

algum falarmos em “variação” de calor ou de trabalho, ao passo que é muito natural nos

referirmos à variação de temperatura, volume, massa, pressão ou de qualquer outra

propriedade termodinâmica.

Se o processo for finito (e não infinitesimal) a notação passa a ser 1Q2A e 1W2A para

trabalho e calor e ∆T e ∆P para temperatura, pressão (e, enfim, para qualquer propriedade

termodinâmica), tal que

Q2A1 =∫1

2

δQ A (1.3)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL18

Page 19: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

e

W 2A1 =∫1

2

δW A . (1.4)

A propósito, apenas por convenção, ambos, o calor que entra no sistema e o trabalho

realizado pelo sistema (que “sai” do sistema) são considerados positivos, enquanto que o

calor que sai do sistema e o trabalho realizado sobre o sistema (“entra” no sistema) são

ambos negativos. Embora a convenção a respeito do calor seja universal, preste atenção à

do trabalho, pois existe muita literatura, principalmente da Engenharia Química, que adota a

convenção contrária a nossa. Assim, Na Fig 1.2, o calor e o trabalho foram representados

positivos.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 19

Page 20: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

1.O C1.O COMPORTAMENTOOMPORTAMENTO P, P, VV, T , T DASDAS S SUBSTÂNCIASUBSTÂNCIAS P PURASURAS

Afirmamos no início que o estado (de equilíbrio) de um sistema deve ser estabelecido

pelo valor de suas propriedades. A pergunta natural que deveria nos ocorrer é: no mínimo

quantas - e quais - as propriedades termodinâmicas que são necessárias para se fixar o

estado do sistema? Existe alguma relação de dependência entre elas, ou seriam elas todas

independentes entre si, ou seja, poderiam ser alteradas independentemente?

5.1.Sistema Compressível Simples

Bem, embora não tenhamos uma resposta definitiva que se aplique a qualquer

sistema termodinâmico em geral, um importante postulado virá em nosso socorro. Mas

antes precisamos definir o sistema compressível simples, que é sistema especial para o qual

os únicos trabalhos mecânicos relevantes são o de expansão e compressão da fronteira do

tipo PdV além de um possível trabalho de cisalhamento (trabalho de eixo) que atravessa a

fronteira. Essa condição, não por coincidência, representa a nossa ênfase em sistemas de

potência e refrigeração.

1.1.O Postulado dos Estados

Podemos afirmar que para um sistema compressível simples (composto de uma

única substância pura), o estado termodinâmico será definido pelo valor de duas

propriedades intensivas independentes além da extensão do referido sistema. Este é o

chamado Postulado dos Estados e possui uma imensa importância prática, pois nos permite

afirmar que o estado intensivo de um sistema compressível simples (uma substância pura)

pode ser representado por um par ordenado construído com os valores de duas

propriedades termodinâmicas intensivas independentes, como por exemplo T ,v ou

P ,T .

A extensão do sistema a que o Postulado dos Estados se refere será dada direta ou

indiretamente por qualquer uma das massas que compõem o sistema. De fato, graças a

nossa definição de propriedade termodinâmica extensiva como sendo linear com a massa,

podemos adotar como princípio que qualquer uma das massas envolvidas no problema que

estamos modelando poderá exercer o papel de fator de escala para aquele problema.

Portanto, qualquer problema de Termodinâmica sempre poderá ser descrito em termos de

propriedades intensivas e “intensivadas”, bastando para isso dividirem-se as equações por

qualquer uma das massas.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL20

Page 21: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Por causa do Postulado dos Estados, se selecionarmos quaisquer duas propriedades

intensivas ou “intensivadas” independentes entre si para compor os eixos de um sistema de

coordenadas retangulares, todas as demais propriedades intensivas ou “intensivadas” serão

necessariamente dependentes e terão seus valores sobre o terceiro eixo determinados de

alguma forma, gerando assim um espaço tridimensional de estados para cada uma das

propriedades dependentes.

1.2.O Comportamento da Água

Imagine uma panela com água pura à pressão atmosférica ao nível do mar de 101,32

kPa (o que é a pressão atmosférica?) e à temperatura de 25°C. Note que, pelo que já

aprendemos a respeito de sistemas compressíveis simples, uma vez que duas propriedades

intensivas independentes são fornecidas, o estado termodinâmico intensivo está definido.

Sabemos pela nossa experiência científica cotidiana que neste estado a água se encontra

na fase líquida (água de torneira comum), na região chamada de líquido comprimido. Vamos

então, enquanto mantendo a pressão constante, aquecer lentamente, isto é, fornecer calor,

à água. A temperatura da água vai aumentando e, portanto, altera-se o seu estado. O que

acontece com o volume específico (que é o inverso da densidade)? Entretanto, sabemos da

experiência que a temperatura não aumenta indefinidamente! Ao chegar aos 100°C nesta

pressão, vapor de água - inodoro, insípido e incolor - começa a se formar. É o ponto de

líquido saturado. Se continuarmos com o aquecimento, notaremos que a temperatura

estaciona nos 100°C e o vapor vai se tornando mais e mais abundante. Esta é a região de

saturação, dentro da qual coexistem as fases líquida e vapor. Exatamente quando água

líquida deixa de existir, este é o ponto de vapor saturado (ou vapor saturado seco). Se

prosseguirmos com o calor, a temperatura volta a aumentar e obteremos um vapor cada vez

mais quente. Esta é a região de vapor superaquecido. Vejamos na Fig.1.1 este

comportamento em um plano de T, v mantendo-se P constante.

Na região de líquido comprimido, em que a temperatura T é menor do que a

temperatura de saturação TSAT dada pela pressão P, T < TSAT(P), o volume específico v varia

muito pouco com a pressão, o que era de se esperar, pois o líquido (como os sólidos) é

muito pouco compressível.

Na região de saturação, em que a temperatura é exatamente igual a TSAT(P), o sistema

água torna-se heterogêneo e passa a ser composto de dois subsistemas: o líquido saturado,

com volume específico vl e o vapor saturado, com volume específico vv. Observe que para a

determinação do volume específico do líquido saturado e do volume específico do vapor

saturado basta conhecermos a temperatura TSAT ou a pressão P.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 21

Page 22: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Como o sistema pode ser composto desde pouco líquido e muito vapor até muito

vapor e pouco líquido, passando por todos os estados intermediários, é necessário que seja

definida uma nova grandeza para representar esta distribuição. Seja m a massa invariante

do sistema e V o seu volume total. A massa e o volume da fase líquida serão ml, Vl e para a

fase vapor serão mv, Vv respectivamente. Podemos então escrever

V = Vl + Vv e m = ml + mv (1.1)

e, portanto,

mv = mlvl + mvvv . (1.2)

Se definirmos o título do vapor x como x = mv /m então (prove...):

v = (1- x) vl + x vv . (1.3)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL22

T

P

TC

P > PC

vvC

Vl

Vv

P << PC

líquido

comprimido

vapor

superaquecido

saturação

líquido saturado

vapor saturado

TSAT

PC

Fig.1.1 – A saturação líquido-vapor na projeção T-v

Page 23: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Como o título x foi definido a partir de uma combinação de propriedades

termodinâmicas, é por sua vez uma propriedade termodinâmica (intensiva ou extensiva?).

Portanto, o estado intensivo da mistura heterogênea estará completamente estabelecido

pela pressão (ou pela temperatura) e pelo título x. (Você consegue determinar os valores de

x para líquido saturado e vapor saturado? Como seria uma linha de x constante na Fig. 1.1?)

A significativa diferença entre vv e vl diminui a medida que aumentamos a temperatura

(ou a pressão) até se reduzir a um único ponto (vC) no ponto crítico, cuja temperatura é TC e

a pressão PC e acima do qual a região de saturação deixa de existir. Além disso, exatamente

no ponto crítico, a curva de pressão crítica possui um ponto de inflexão (o que é isso?) e é a

única curva de pressão que tem esta característica. Quando a pressão é maior do que PC

não existe mais distinção entre gás e líquido (trata-se de uma única fase muito densa).

Na região de vapor superaquecido, em que a temperatura T é maior do que TSAT na

pressão P, T > TSAT(P), o volume específico varia bastante com a temperatura, uma

característica da compressibilidade dos gases e vapores. Por outro lado, quando a pressão

é muito menor do que PC a curva de pressão constante na região de vapor superaquecido

torna-se praticamente uma reta e o gás torna-se pouco denso. Esta é a região do gás

perfeito (ou ideal), na qual, quando a pressão (que é muito baixa) é constante, o volume do

gás é diretamente proporcional à sua temperatura.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 23

líquido

comprimido

vapor

superaquecido

sólido

linha tripla

vvC

Vl

Vv

Vs

P

S+

L

L+V

S+V

Ptriplo

Fig.1.4 – Saturação sólido-líquido-vapor para a água no plano P-v

Page 24: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Acabamos de analisar o comportamento da água através da variação da temperatura

enquanto mantemos a pressão constante.

Vejamos então o que acontece no plano P, v enquanto se mantém T constante, como

representado na Fig.1.2.

Consideremos a água novamente a 2 MPa e à temperatura de 100°C, ou seja, como

líquido comprimido (pois T < TSAT). Vamos diminuir a pressão, enquanto mantemos a

temperatura inalterada (tente imaginar um experimento que possa realizar este processo).

Quando alcançarmos a pressão de 101,325 kPa, surgirão as primeiras bolhas de vapor: o

ponto de líquido saturado. Se continuarmos o processo (como?), a pressão PSAT(T)

permanecerá constante enquanto a quantidade de vapor irá aumentando: esta é a região de

saturação.

Quando a última gota de líquido converter-se em vapor, que é o ponto de vapor

saturado, a pressão poderá voltar a cair outra vez e estaremos na região de vapor

superaquecido.

Se a pressão continuar caindo, chegaremos a uma região (P << PC) em que a

pressão e o volume específico assumirão um caráter hiperbólico, do tipo Pv = constante (por

quê?).

No ponto crítico, ou seja, na isoterma da temperatura crítica TC, à pressão crítica PC e

volume específico vC, existe, como vimos anteriormente, um - e único - ponto de inflexão. Por

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL24

líquido

comprimido

vapor

superaquecido

saturação

P

v

líquido saturado

vapor saturado

T

TC

PC

vC

Vl

Vv

T << TC

T > TC

PSAT

Fig.1.2 – Saturação líquido-vapor no plano P-v

Page 25: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

outro lado, se reduzirmos a pressão ao longo de uma isoterma tal que T > TC não obteremos

nenhuma mudança de fase no processo, mesmo que cheguemos a uma pressão

extremamente baixa.

Vejamos o que acontece com a água no plano P, T enquanto mantemos v constante,

conforme mostrado na Fig 1.3. Na figura observamos as três fases principais para a água:

gás, líquido e sólido. Aprendemos anteriormente que a mudança de cada uma destas fases

para a outra se faz enquanto a pressão e a temperatura se mantêm constantes. Então as

regiões de saturação devem ser reproduzidas no plano P, T como linhas curvas.

Já conhecíamos a região líquido-vapor da qual se origina a curva de vaporização (ou

curva de pressão de vapor). Além disso, podem ser vistas: a região sólido-líquido, que dá

origem à curva de fusão; a região sólido-vapor, que fornece a curva de sublimação e a

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 25

fase sólida

fase liquida

fase gasosa

P

TTC

PC

Ttriplo

Ptriplo

ponto crítico

ponto triplo

curva de fusão

curva de vaporização

curva de sublimação

Fig.1.3 – Comportamento no plano P-T da água

Page 26: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

região em que convivem em equilíbrio sólido-líquido-vapor, a qual dá origem ao ponto triplo,

cujos valores de pressão e temperatura são únicos para cada substância pura.

Devemos notar que a água, diferentemente das demais substâncias puras, tem o seu

volume específico aumentado sob congelamento. De fato, a experiência cotidiana diz que o

gelo flutua e em geral ocupa mais volume do que a água liquida. De fato, observe da Fig.6.4

que o volume específico da água sólida vs é sempre maior do que o volume específico da

água líquida vl.

Exceto no caso da água, retratada nas Figs. 1.3 e 1.4, as demais substâncias puras

se comportam como expresso nas Figs. 1.5 e 1.6. Embora não haja muita diferença

qualitativa na região líquido-vapor, observe que a fase sólida tem um volume específico vs

menor do que o volume específico vl , como era de se esperar.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL26

ponto crítico

curva de vaporização

P

TTC

PC

Ttriplo

Ptriplo

fase sólidafase liquida

fase gasosa

ponto triplo

curva de fusão

curva de sublimação

Fig.1.5 - Comportamento no plano P-T das demais substâncias

Page 27: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

1.3.O Gás Perfeito

A região de gás perfeito (ou ideal) é aquela na fase gasosa em as partículas (átomos,

moléculas) se encontram tão afastadas umas das outras que praticamente não interagem

entre si, ou seja, as forças intermoleculares são desprezíveis. Nessas condições, o volume

ocupado pelo gás será dado pelo volume do recipiente e a pressão que o gás exerce será

dada unicamente pela colisão das partículas com as paredes. Podemos então escrever, pela

Lei de Clapeyron

P V = mRT ou P v = RT , (1.4)

onde R é a constante específica de cada gás. Podemos expressar ainda na forma molar

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 27

líquido

comprimido

vapor

superaquecido

sólido

linha tripla S + L + V

vvC

Vl

Vv

Vs

P

S+L

L+V

S+V

Ptriplo

Fig.1.6 - Saturação sólido-líquido-vapor para as demais substâncias no plano P-v

Page 28: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

P V =n RT ou Pv=R T . (1.5)

onde R é a constante universal dos gases, cujo valor é 8,31451 kJ/kmol K em unidades do

SI.

O número de moles n está relacionado com o fato de que um dado volume de

qualquer substância pura nas mesmas condições de temperatura e pressão contém o

mesmo número de moléculas. O mol de qualquer coisa (lápis, grãos de arroz, moléculas) é

definido como a quantidade de matéria que corresponde ao número de 6,023x1023 para

qualquer coisa (lápis, grãos de arroz, moléculas), conhecido como o número de Avogadro.

Devido aos diferentes átomos, a massa que corresponde ao mol depende da massa

molecular desta substância. A massa molecular, por sua vez, é obtida a partir da massa

atômica dos constituintes da composição química da substância e é a partir da comparação

com 1/12 do isótopo 12 do carbono. De qualquer modo, a massa molecular (M) de todas as

substâncias puras está devidamente tabelada (por que os valores de massas moleculares

não fornecem valores redondos?). Podemos então, estabelecer as relações entre o número

de moles n, a massa m e a massa molecular M, bem como entre a constante universal dos

gases perfeitos R e a constante particular do gás perfeito para a substância pura R:

n = m/M e, logo R = R /M (1.6)

O número de moles não passa de uma forma de representar a massa, mas devido a

sua conveniência é largamente utilizado. Lembra-se da massa como fator de escala? Pois é,

exatamente o mesmo princípio se aplica a respeito do número de moles. Um cuidado,

porém: a massa sempre é conservada, mas o número de moles só se conserva o mesmo se

não houverem reações químicas envolvidas.

Por outro lado, se você tiver dúvidas sobre se deve dividir ou multiplicar pela massa

molecular M, basta recordar-se que os valores molares são sempre maiores do que os seus

correspondentes em massa (por quê?).

Lembre-se que a massa molecular é tomada em unidades de massa, tais como o

grama, o quilograma, a libra-massa. O mol, por sua vez, assume a mesma unidade. Por

exemplo, a massa molecular (M) do metano CH4 é 16,043, ou seja, para m em gramas,

16,043 gramas por grama-mol, para m em kg, 16,043 quilogramas por kg-mol, para m em

libras-massa, 16,043 libras-massa por lb-mol, de modo que o número de moles é sempre o

mesmo, não importando a unidade de massa envolvida. Neste texto nós usaremos o kmol

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL28

Page 29: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

(kg-mol) e, portanto, associado com a massa em kg. A propósito, o valor da constante do

gás para o metano é 0,5182446 kJ/kg K (ou J/g K). Estes valores também se encontram

usualmente tabelados ou podem ser computacionalmente obtidos, como veremos.

Na verdade, exceto para os estados incompressíveis, a equação dos gases perfeitos

é provavelmente uma das mais simples equações de estado (que relacionam P, v, T). Para

os líquidos e sólidos, quando puderem ser considerados incompressíveis, a equação de

estado torna-se v = constante.

Com frequência precisaremos determinar o valor de ∫P dV sob diversas

circunstâncias. Qual seria o valor daquela integral para um caminho isotérmico, isobárico e

politrópico, considerando-se o gás como perfeito? E para um fluido incompressível? Você

acha que a integral de Pdv é uma propriedade termodinâmica?

1.4.Comportamento dos Gases Reais

De modo geral, para uma região em que a substância pura não se comporta como

gás perfeito, Pv≠RT . Vamos, então, definir a propriedade termodinâmica fator de

compressibilidade, Z, que representa a relação entre o volume específico real v ou ( v ) e o

volume específico que a substância exibiria se fosse gás perfeito a T e P. Dessa forma,

Z =v

RTP

=P vR T ou Z=

PvRT

. (1.7)

Claramente, limP0

Z=1 , ou seja, a definição de Z coincide com a equação do gás

perfeito quando a pressão se torna muito menor do que a pressão crítica. Para as demais

regiões não saturadas (e para as de saturação?),

Z = Z(P,T) = Z(P,v) = Z(T,v) (1.8)

que não deixa de ser uma equação de estado, pois se obtivermos alguma informação sobre

o fator de compressibilidade Z em função das propriedades mensuráveis, então poderemos

substituir de volta na equação de definição de Z e então obter todas as demais propriedades

(como?). Você deve notar que, para os líquidos, Z é um valor muito menor do que 1 ao passo

que para os gases longe do ponto crítico, o valor de Z será geralmente um pouco menor ou

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 29

Page 30: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

um pouco maior do que 1. Você sabe dizer o que acontece com o valor de Z no ponto crítico,

ou seja ZC?

Conclusões retiradas de observações experimentais de dados de P, v ,T ou de

resultados teóricos obtidos da mecânica estatística indicam que o fator de compressibilidade

pode ser aproximado por uma série infinita de 1/ v onde os coeficientes da expansão são

funções da temperatura, da seguinte forma:

Z = 1 + BT

v

C T

v2

DT

v3

. . . (1.9)

que é a chamada equação do virial. A equação de Van der Waals (1873), uma alteração da

equação do gás perfeito é dada por:

P = R Tv−b

−a

v2 (1.10)

com as constantes

a = 2764

R2 T C2

PC

(1.11)

e

b = RT C

8PC, (1.12)

é bastante simples de se utilizar, porém pouco acurada. O fator de compressibilidade no

ponto crítico ZC é

ZC = PCvC

RT C

=38

, (1.13)

um resultado que é significativamente maior do que o ZC para qualquer outra substância

conhecida!

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL30

Page 31: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Uma equação de estado quase igualmente simples - e entretanto

surpreendentemente precisa - é, sem dúvida, a equação de Redlich-Kwong (RK) de 1949,

que é utilizada até hoje em alguns cálculos de propriedades de misturas e equilíbrio de

fases:

P=R Tv−b

−a

v vb T 1 /2 (1.14)

com as constantes

a = 0,42478 R2 T C

3/2

PC

e (1.15)

b = 0,08664 RT C

PC. (1.16)

Tanto as constantes da equação de Van der Waals, quanto as de Redlich-Kwong

foram obtidas, sabendo-se que a isoterma crítica TC tem um ponto de inflexão no ponto

crítico (TC, PC). Muitas outras modificações da equação RK foram propostas e utilizadas em

anos mais recentes, tais como Peng-Robinson e Peng-Robinson Modificada.

Na linha de equações semi-empíricas, foi desenvolvida para hidrocarbonetos a

equação de Benedict-Webb-Rubin (1940) (BWR) contendo oito constantes empíricas. Em

1975 surgiu a equação de Lee-Kesler (LK), como uma modificação da equação BWR,

contendo 12 constantes empíricas, que será objeto de uma discussão mais detalhada no

presente trabalho.

1.5.Regra dos Estados (Quase) Correspondentes

Todas as substâncias puras têm um comportamento P,v,T qualitativamente

semelhante à descrição que fizemos para a água, principalmente na região de vapor e na

saturação líquido-vapor, muito embora os valores absolutos das propriedades para os

diversos estados possam diferir enormemente. Entretanto, se definirmos as grandezas

adimensionais temperatura reduzida Tr e pressão reduzida Pr em relação ao ponto crítico TC

e PC (que são únicos para cada substância pura):

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 31

Page 32: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

T r=TT

C

e P r=PP

C

, (1.17)

então descobrimos que Z(Pr,Tr) assumirá quase os mesmos valores, independentemente da

substância pura que estamos considerando. Esta é a chamada “Lei” ou Regra dos Estados

(quase) Correspondentes.

Por outro lado, todas as equações de estado podem ser expressas em termos de

coordenadas reduzidas. A equação de Van der Waals se torna:

Z3−[ P r

8T r

1]Z 2[ 27P r

64T r2 ]Z−

27P r2

512T r3 =F Z , P r ,T r=0 . (1.18)

A equação generalizada de Lee-Kesler, com as 12 constantes b1, b2, b3, b4, c1, c2, c3, c4,

d1, d2, β e γ , que são tabeladas para um fluido de referência e para um fluido simples será:

Z=P r v ' r

T r

=1B

v ' r

Cv ' r

2

Dv ' r

3

c4

T r3 v ' r

2[ β

γv ' r

2]exp[

−γv ' r

2] (1.19)

B=b1−b2

T r

−b3

T r2−

b4

T r3 (1.20)

C=c1−c2

T r

c3

T r3 (1.21)

D=d 1d 2

T r(1.22)

v ' r=v

RTC/P

C

≠vr . (1.23)

Observe aqui a definição de v ' r ao invés de vr=v /vC , pois é difícil obter-se o

volume crítico vC experimentalmente.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL32

Page 33: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

1.6.O Fator Acêntrico de Pitzer

Entre as muitas possibilidades de se aperfeiçoar o modelo generalizado, uma delas

se tornou muito popular: o uso, além de Tr e Pr, do fator acêntrico de Pitzer ω como um

terceiro parâmetro para se definir Z, utilizando-se a seguinte forma linear de correção:

Z T r , P r ,=Z 0T r ,P rZ1

T r , P r , (1,24)

Os valores de Z(0) são aqueles obtidos com a aplicação direta de LK e seus resultados

se aplicam muito bem para os chamados fluidos simples, por exemplo Xe, Ra, Ar e ao CH4,

cujas moléculas são não-polares e mantém simetria esférica. Devido a sua origem a partir

de BWR e dos hidrocarbonetos, optou-se por usar o n-octano como substância de

referência.

Por outro lado, observou-se que para os fluidos simples o valor da pressão reduzida

de saturação P r SAT para Tr = 0,7 era igual a 0,1 e que, além disso, este valor era diferente

para cada uma das demais substância puras. Definiu-se então o fator acêntrico de forma

que para os fluidos simples resultasse em ω=0 (por quê?).

=−1−log10P r SAT T r=0.7 , (1.25)

Existem na literatura tabelas de ω para as substâncias puras, bem como tabelas e

programas de computador para as correções Z(1) bem como para as demais correções. Com

o apoio desses programas, seu uso não é tão complicado quanto possa parecer. Um desses

programas, bem como suas aplicações, será estudado detalhadamente mais tarde.

A propósito, podemos agora perceber porque os resultados para o metano no nosso

exemplo foram tão próximos dos valores da tabela: ω do metano é igual a 0,011, tornando-o

muito próximo de um fluido simples...

Os diagramas generalizados com as correções do fator acêntrico também produzem

bons resultados na região de saturação das substâncias puras, para as moléculas não

polares. Voltemos ao metano: qual seria a pressão de saturação correspondente a –110°C?

Pelos diagramas generalizados, PSAT = 1,7896 MPa e pelas tabelas do metano saturado, PSAT

= 1,803 MPa, o que dá cerca de 0,7 % de diferença!

Na região de saturação, onde x é o título, podemos escrever (prove...):

Z=Z l x Z v−Z l , (1.26)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 33

Page 34: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

onde cada um dos termos em Z sofre a correção do fator acêntrico ω, da mesma forma que

já foi exposto anteriormente.

1.7.A correção de Wu e Stiel

Embora com a correção a três parâmetros Tr, Pr e ω se obtenham resultados

adequados para substâncias puras não polares ou até mesmo fracamente polares, para

substâncias fortemente polares, como H2O ou NH3, os erros podem ser muito significativos.

Surgiu, então, a ideia de usar um parâmetro adicional, denominado fator Y de Wu-Stiel, da

seguinte forma:

Z T r , P r , ,Y =Z 0 T r , P r Z1 T r , P rY Z 2T r ,P r , (1.27)

de forma que Y = 1,0 para a água, Y = 0 para as substâncias não polares e terá valores

intermediários para as demais substâncias. Nessa abordagem, a água é usada como

referência e para a obtenção das propriedades da água é empregada a equação de estado

de Keenan.

1.8. As propriedades não mensuráveis

Note que até agora só pudemos nos referenciar às propriedades termodinâmicas

mensuráveis P,T,v, das quais apenas duas delas podem ser independentes no mesmo

estado de uma substância pura. Por outro lado, qual é a origem das propriedades

termodinâmicas não mensuráveis e como avaliar-se o seu valor? Esses tópicos serão

objetos de discussão nos próximos capítulos.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL34

Page 35: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

2.A P2.A PRIMEIRARIMEIRA L LEIEI DADA TERMODINÂMICATERMODINÂMICA

Consideremos o sistema fechado entre os estados infinitesimais 1 e 2. Vamos repetir

aqui a figura 0.x com a representação em forma de grafo de vários processos entre os

mesmos estados.

Sejam os processos infinitesimais A, B, C reversíveis e D irreversível entre os estados

1 e 2. Sabemos que, de um modo geral, δQA ≠ δQB ≠ δQC ≠ δQD e δWA ≠ δWB ≠ δWC ≠ δWD ,

ou seja, o calor e o trabalho associados a cada processo são diferentes para cada processo.

Entretanto, observa-se que, para qualquer processo que leva do estado 1 para o

estado 2 do sistema fechado da Fig. 2.1:

δQA - δWA = δQB - δWB = δQC - δWC = δQD - δWD = δQ - δW. (2.1)

Note que esta diferença se mantém constante não importando o processo que

escolhermos entre 1 e 2. Sendo assim, podemos atribuir a ela o caráter de uma variação de

uma propriedade termodinâmica no interior do sistema. Vamos chamá-la de variação da

energia total do sistema dE. Então

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 35

δQB

δWBδQ

A

δWA

δQC

δWC

A

B

C1

2

D

δQD

δWD

Fig.2.1 – Representação em forma de grafo dos processos em um sistema

Page 36: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

δQ - δW = dE (2.2)

ou, para variações finitas de estado,

1Q2 - 1W2 = ∆E = E(2) – E(1) , (2.3a)

ou, ainda,

∑j

Q j−W =dEdT

(2.3b)

na forma de equação diferencial, quando existem j interações de calor na fronteira do

sistema.

As Eqs. 2.2 e 2.3 representam uma formulação matemática da Primeira Lei da

Termodinâmica, ou da Conservação da Energia, e valem para todos os processos que

ocorrerem em qualquer sistema fechado.

2.1.Consequências da Primeira Lei para Sistema Fechado

Um processo é dito cíclico quando o estado inicial coincidir com o estado final do

sistema ao término do processo. Ora se o estado do sistema é definido pelo valor de suas

propriedades, a estados idênticos correspondem idênticos valores para todas as

propriedades do sistema, ou seja, em um processo cíclico, a variação de qualquer

propriedade do sistema é zero para ciclos completos. Isto vale para T, P, V e certamente

também para a energia total E, recém-definida. Em consequência desse fato,

∆E = 0, e portanto

∮δQ=∮ δW (2.4)

O significado físico é que para qualquer processo cíclico que ocorra em sistema

fechado, o trabalho total realizado pelo sistema é sempre exatamente igual ao calor total por

ele recebido (ou, invertendo os sinais, o trabalho total efetuado sobre o sistema é

exatamente igual ao calor total por ele dissipado). A Eq. 2.4 pode ser considerada uma

forma alternativa da Primeira Lei da Termodinâmica.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL36

Page 37: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Ora, como estamos interessados em produzir potência, poderíamos então selecionar

um sistema fechado operando ciclicamente, e a partir da potência de calor de um

reservatório de calor, obteríamos potência mecânica continuamente. Aplicamos a Primeira

Lei ao sistema em um processo cíclico, concluiríamos que o trabalho mecânico obtido seria

igual ao calor obtido do reservatório térmico. Entretanto, logo descobriríamos que, embora

sem violar a Primeira Lei, o nosso aparato jamais funcionaria!

Imaginemos então que chegamos à conclusão que para funcionar, parte do calor

recebido do reservatório térmico teria que ser rejeitada ao meio-ambiente do sistema. Por

outro lado, quanto menor este, maior a parcela do calor do reservatório térmico que se

converte em potência mecânica. Então, a próxima pergunta seria: qual o menor calor que

deve ser rejeitado para que o nosso aparato funcione? Observe que a resposta a esta

questão, como veremos, não pode ser obtida com base puramente na Primeira Lei da

Termodinâmica e terá que ser adiada até a discussão sobre a Segunda Lei.

Agora, dentre todos os processos que conectam dois estados de um sistema fechado,

selecionemos um deles que seja adiabático. Então, pela primeira lei:

-δW = dE , pois δQ = 0 (processo adiabático) (2.5)

e, uma vez que dE não depende de nenhum processo, concluímos que o trabalho realizado

por qualquer processo adiabático que conecte os mesmos estados de um sistema fechado é

independente do processo. Este é o princípio da conservação da energia mecânica. Por um

raciocínio análogo, o calor envolvido nos processos de zero-trabalho entre os mesmos

estados de um sistema fechado também é independente do processo e este seria o princípio

da conservação da energia térmica.

Além disso, se o processo for adiabático e de zero-trabalho ao mesmo tempo

(sistema isolado) o que acontecerá com a variação da energia total? Isso mesmo, a energia

total de um sistema isolado não se alterará jamais! Percebe de onde vem a noção de

conservação de energia? Atenção: aqui não se trata de processo cíclico - todas as demais

propriedades termodinâmicas podem se alterar, exceto a energia total do sistema.

2.2.Energia Interna, Cinética e Potencial

Do que se trata, afinal de contas, esta tal de energia total? Considere um volume de

gás de massa m e temperatura T encerrado em um recipiente rígido e adiabático. Admita que

o recipiente com o gás esteja em movimento com uma velocidade V, em uma cota vertical z.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 37

Page 38: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Sabemos que, nessas condições, o gás possui suas energias cinética Ec e potencial Ep

dadas respectivamente pelas expressões

E c=m2

V 2e Ep = mgz . (2.6)

Sabemos que a energia total E deste gás (desprezando-se o recipiente), que está

isolado, não deve se alterar. Se a energia total fosse apenas a soma da sua energia cinética

com a energia potencial, como poderia E manter-se inalterado, se a velocidade V e a cota z

podem ser facilmente modificadas? Ora, então, se subtrairmos a soma das energias cinética

e potencial da energia total do sistema, o que resta deve ser também uma forma de energia.

Por outro lado, as moléculas dentro do gás estão em um agitado movimento que, de acordo

com a teoria cinética dos gases, depende da sua temperatura T. Concluímos que esta

agitação térmica das moléculas tem a sua representação macroscópica expressa através

desta nova forma de energia, a energia interna U. Assim,

E=U E cE p . (2.7)

Se admitirmos (hipótese bem comum aliás) que que Ec = Ep = 0 então E = U . Note que

dividindo-se a energia interna do sistema U pela sua massa m, obteremos a energia interna

específica u.

Pois bem, sabemos que a agitação térmica das moléculas do nosso gás e, portanto, a

sua energia interna, depende, graças à teoria cinética dos gases, da temperatura do gás. O

que poderíamos dizer a respeito da energia interna dos líquidos? Imagine a água líquida e o

seu vapor à pressão ambiente: você pode dizer qual seria a fase cuja energia interna seria

maior?

A conservação da energia interna de um sistema isolado é muito útil. Vejamos o

exemplo clássico da mistura de gases a partir de uma expansão não resistida, representado

na Fig.2.2. Seja um gás em em estados distintos A e B em cada uma das partições de um

recipiente rígido e adiabático de volume V, tal que cada um ocupa uma fração do volume

total e separados apenas por uma membrana também rígida e adiabática. Rompe-se então

a membrana e as porções do gás nas partições se misturam. Quanto vale então a energia

interna da mistura final do gás?

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL38

Page 39: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Vamos desprezar as energias cinética e potencial. Podemos descrever o processo

como evoluindo de um estado 1 para um estado 2, como será descrito.

Estado 1:

De acordo com a nossa definição de sistema, poderemos escolher como o sistema o

volume encerrado pelos dois gases envolvidos. Este é claramente composto de dois

subsistemas: o gás com energia interna U A1

e massa mA1 e o gás com energia interna

U B1 e massa mB

1 .

A energia interna do sistema neste estado é a soma das energias internas dos seus

subsistemas. A propósito, este princípio vale para qualquer propriedade extensiva. Por

exemplo, o volume V(1) do sistema é a soma de V A1V B

1 . Entretanto, nunca se podem

somar propriedades intensivas entre si.

No estado 1 não tem sentido falar-se em temperatura e pressão do sistema pois os

dois subsistemas podem estar a temperaturas T A1 , PA

1 e T B1 , PB

1 completamente

diferentes (você pode dizer por quê?).

Estado 2:

O sistema gás torna-se uma mistura homogênea, cuja definição mais formal será

vista mais tarde. Como escolhemos um sistema fechado, a massa do sistema m(2)

permanece sendo mA1 mB

1 . A energia interna agora provém da mistura dos gases A e B

originalmente no estado 1.

Então, quanto vale a energia interna do sistema no estado 1?

U (1)=U A(1)+U B

(1)=m A(1) uA

(1)(T A(1) , P A

(1))+m B(1)uB

(1)(T B(1) , P B

(1)) . (2.8)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 39

Fig.2.2 – Exemplo de expansão não-resistida

A B A + B

1. Antes de romper-se a membrana 2. após o rompimento

Page 40: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Quanto vale a energia interna do sistema no estado 2?

U (2)=m(2)u(2)

=(m A(1)+mB

(1))u(2)

(T (2) , P(2)) . (2.9)

Aplicando-se a Primeira Lei, obtém-se que U(1) = U(2) e assim podemos escrever que

(mA(1)+mB

(1)) u(2)(T (2) , P(2))=mA(1)uA

(1)(T A(1) , P A

(1))+mB(1) uB

(1)(T B(1) , PB

(1)) . (2.10)

Portanto, para este sistema e presente processo, a energia interna específica do gás

nos estado 2 após o rompimento da membrana é dada pela média, ponderada pelas

massas, das energias internas específicas do gás nos estados A e B, calculadas antes do

rompimento da membrana, estado 1.

Podemos rearranjar também da seguinte forma:

m A(1)[u(2)

(T (2) , P(2))−uA

(1)(T A

(1) , P A(1))]+mB

(1)[u(2)

(T (2) , P(2))−uB

(1)(T B

(1) , PB(1)

)]=0 . (2.11)

A Eq. 2.11 ilustra o seguinte princípio, que se aplica a todas as equações

termodinâmicas: é sempre possível restruturarem-se as equações na forma de diferenças

de propriedades termodinâmicas, embora às vezes isto não seja fácil ou aparente.

Concluímos, de fato, que o valor de uma propriedade termodinâmica referente a um

estado é arbitrário, ou seja, depende de uma base arbitrariamente escolhida.

Além disso, para manter a consistência física das equações, as diferenças das

propriedades termodinâmicas não podem depender das bases estabelecidas para sua

determinação. Este resultado é extremamente importante e será utilizado um número de

vezes em nosso estudo.

2.3.O Sistema Aberto ou Volume de Controle

Até este ponto de nosso estudo não havíamos permitido as interações de massa

através da fronteira do sistema. Entretanto, nem sempre conseguiremos modelar os nossos

problemas reais por meio de sistemas fechados. Relaxando então esta restrição, ou seja,

permitindo o transporte de massa através de qualquer parte da fronteira, obtemos um

sistema aberto, ou volume de controle. Para o volume de controle, a fronteira costuma ser

denominada também de superfície de controle. Em relação ao sistema aberto da Figura 2.2,

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL40

Page 41: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

sejam os calores Q j provenientes dos reservatórios de calor a T j , o calor Q0

proveniente do reservatório do meio-ambiente a T 0 , o trabalho mecânico W VC e as

massas que entram no sistema meke que saem do sistema, tudo durante o intervalo dt.

Note que separamos o calor do meio-ambiente por conveniência futura. Nesse mesmo

intervalo de tempo, as interações na fronteira causarão no interior do sistema a alteração de

muitas de suas propriedades termodinâmicas, dentre as quais já conhecemos pelo menos

dT VC , dV VC , dvVC , dPVC , dmVC , dEVC , deVC , dU VC , duVC . Você é capaz de identificar cada uma

delas? Verifique que para a energia total no volume de controle:

dEVC=d mVC eVC =mVC deVCeVC dmVC

e uma expressão análoga pode ser obtida para qualquer propriedade extensiva

relativamente a sua respectiva propriedade intensivada e a massa.

2.4.A Conservação da Massa para Sistema Aberto

Sabemos que, fora do contexto relativístico, massa não pode ser destruída e nem

produzida. Sendo assim, deveremos ser capazes de, uma vez identificado o sistema, manter

durante qualquer intervalo de tempo dt um preciso inventário da massa que entra e que sai

através da superfície de controle, bem como daquela que permanece dentro do volume de

controle (VC). Para sistemas fechados, a conservação da massa é trivialmente satisfeita. O

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL

T(1)

T(j)T(2)

T0

meio-ambiente

Q1

Q2

Qj

Q0

1em

2em

1smdt

dEVC

dt

dSVC

WVC

Fig.2.2 – Esquema de volume de controle

41

Page 42: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

que devemos sempre lembrar no momento da escolha do sistema fechado, é que a massa

em seu interior tem que se manter constante a qualquer custo.

A conservação de massa para o sistema aberto pode matematicamente ser expressa

como:

dmVC=∑e

me−∑s

ms (2.12)

ou

dmVC

dt=∑

e

me−∑s

ms (2.13)

onde ∑e

me é a soma das vazões de massas que entram no VC e ∑s

ms é a soma das

vazões de massas que saem do VC no intervalo de tempo dt e a somatória se aplica a todas

as entradas e saídas de massa na superfície de controle.

2.5.A Primeira Lei para Volume de Controle

Vimos, pela Primeira Lei para sistema fechado, que a diferença entre as interações de

calor e de trabalho não depende do processo e denominamos esta diferença de variação da

energia total do sistema, que é a soma da variação de sua energia cinética, potencial e

interna. De fato, estamos procedendo a um inventário de energia no sistema. Em um

sistema aberto, como nas Figs. 1.1 e 2.2, para procedermos a este inventário de energia em

seu interior, precisamos, além das interações de calor e de trabalho na fronteira, levar em

conta o fluxo líquido de energia total associado aos fluxos de massa que entram e que saem

do VC no intervalo de tempo. Mais ainda, devemos, também, acrescentar o trabalho líquido

de colocar para dentro ou colocar para fora estes fluxos de massa. Assim, ms v s P s

corresponde ao trabalho positivo realizado pelo sistema durante o intervalo dt para colocar a

massa ms para fora de suas fronteiras e me ve P e é o trabalho negativo realizado

contra o sistema pela massa me para penetrar na fronteira do sistema. Ambos estas

grandezas são denominadas trabalhos de fluxo. Em forma de vazões de massa e de

potências, podemos escrever m s vs P s e me ve Pe para a potências necessárias. Podemos

proceder de modo análogo com os trabalhos de fluxo associados a cada uma das vazões de

massa para dentro e para fora do volume de controle.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL42

Page 43: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Assim, a variação da energia total por unidade de tempo no interior do volume de

controle será dada pelo balanço líquido das vazões de energia interna transportadas pelas

vazões das massas que entram e saem do volume de controle, adicionadas da potência do

calor que entra ou sai do volume de controle, e subtraídas do trabalho associado ao

deslocamento da superfície de controle por unidade de tempo, da potência de eixo, e das

potências de fluxo líquidas associadas às vazões das massas que entram e saem do volume

de controle. Matematicamente, podemos escrever:

d me VC=∑e

me uPvV 2

2gz e−∑

s

msuPvV 2

2gz s∑

j≠0

Q j Q0−W VC

(2.14)

ou, na forma de equação diferencial:

ddt

meVC=∑e

me uPvV 2

2gz e−∑

s

msuPvV 2

2gz s∑

j≠0

Q jQ 0−W VC .

(2.15)

2.6.A Propriedade Termodinâmica Entalpia

Vamos definir então a propriedade termodinâmica entalpia H=UPV , bem como a

entalpia específica h=uPv . Este importante agrupamento aparecerá repetidamente de

agora em adiante e não apenas no contexto de volume de controle. De fato, é uma

consequência da sua definição que as propriedade termodinâmicas uma vez criadas se

desprendam do contexto em que foram definidas e se agreguem ao conjunto de

propriedades termodinâmicas, passando a ter vida própria, por assim dizer. Assim ocorrerá

com a entalpia, propriedade extensiva, que surgirá associada tanto aos trabalhos de fluxo

das vazões de massa, quanto ao interior de qualquer sistema termodinâmico fechado ou

aberto. De fato, qualquer combinação de propriedades termodinâmicas poderia se qualificar

por sua vez como propriedade termodinâmica. Então, revendo a definição de propriedades

termodinâmicas, você saberia dizer por que o produto PV é uma propriedade e o produto

UV não pode ser?

Agrupando-se adequadamente, a equação completa da Primeira Lei para volume de

controle ficará:

dEVC

dt=

ddt

(me)VC=∑e

me( h+V 2

2+ gz )e−∑

s

ms(h+V 2

2+ gz )s+∑

j≠0

Q j+ Q 0−W VC .

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 43

Page 44: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

(2.15)

ou, na forma diferencial,

dEVC=d (me)VC=∑e

δme (h+V 2

2+ gz )e−∑

s

δms( h+V 2

2+ gz )s+∑

j≠0

δQ j+ δQ0−δW VC

(2.16)

Vejamos em seguida alguns casos particulares de problemas com volume de

controle.

2.7.O Regime Permanente

Chamamos regime permanente aquele na qual o tempo não tem significado, ou seja,

desaparecem os termos explícitos no tempo e todos os demais termos são constantes.

Podemos então escrever:

0=∑e

me hV 2

2gz e−∑

s

ms hV 2

2gz s∑

j≠0

Q jQ0−W VC . (2.17)

Se o volume de controle for adiabático e as energias cinéticas e potenciais puderem

ser desprezadas:

W VC=∑e

me he−∑s

ms hs . (2.18)

Se não houver realização de trabalho no volume de controle, mas houver fluxo de

calor, e se as energias cinéticas e potenciais puderem ser desprezadas:

QVC=∑s

ms hs−∑e

me he . (2.19)

As equações 2.17, 2.18 e 2.19 são efetivamente algébricas. Quando você imaginaria

ser essa hipótese adequada?

2.8.O Regime Transiente

Seja agora o regime transiente, ou não permanente, isto é, devemos agora incluir os

termos explícitos no tempo e todos os termos são funções do tempo. Então, a Eq. 2.16,

uma vez integrada entre os estados 1 e 2, fornece:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL44

Page 45: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

(m(2)u(2)−m(1)u(1)

)VC=

∑e∫1

2

(h+V 2

2+ gz )e δme−∑

s∫1

2

( h+V 2

2+ gz )sδ ms+∑

j≠0

Q2 j1 + Q201 − W 2VC1

. (2.20)

na qual as integrais não poderão ser resolvidas enquanto não se definirem hV 2

2 gz e e

hV 2

2 gz s , bem como a história das massas que entram e saem do volume de controle

δme e δms ao longo do processo que vai do estado 1 ao estado 2. Esta expressão é

quase sempre utilizada conjuntamente com a conservação da massa:

m2 −m1

VC=∑e∫1

2

me−∑s∫

1

2

ms=∑e

m2e1 −∑s

m2 s1 . (2.21)

Note que m2 e1 e m2 s1 representam respectivamente toda a massa que entrou e

toda a massa que saiu através de cada porta de entrada ou saída durante o processo

determinado que ocorreu do estado 1 até o estado 2.

Existem muitas possibilidades para processos que ocorrem em um sistema aberto,

muitas delas em regime não permanente. Você consegue imaginar um problema real e

modelá-lo utilizando a expressão para a Primeira Lei?

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 45

Page 46: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

3.A S3.A SEGUNDAEGUNDA L LEIEI PARAPARA S SISTEMAISTEMA F FECHADOECHADO

A nossa experiência cotidiana nos diz que existem tipos de energia que se convertem

umas nas outras com facilidade, ao passo que o contrário não é verdadeiro. Assim, se

pisarmos nos freios de um automóvel, a energia cinética será transformada em calor e o

carro vai eventualmente parar. Mas se tiramos o pé do freio, o calor do freio não será

reconvertido em energia cinética. Da mesma forma, podemos misturar o café ao leite, ao

passo que é muito complicado e difícil separá-los novamente. Também, por alguma razão o

calor sempre flui da temperatura mais alta para a temperatura mais baixa e nunca ao

reverso, bem como o sal flui naturalmente da carne seca para a água pura. Mais ainda,

afirmamos anteriormente que se deixarmos um sistema isolado em paz, ele poderá evoluir

espontaneamente para um estado de equilíbrio (que depende de suas restrições internas) a

partir do qual não sairá jamais. O que está por trás destes fenômenos?

Se lançarmos mão da Primeira Lei, verificaremos com inquietação que, do ponto de

vista desta, não haveria impedimento algum para que todos estes processos impossíveis

pudessem ocorrer! De fato, a única pergunta que a primeira lei faz ao sistema é a seguinte:

”Energia em todas as suas manifestações está se conservando?” Se a resposta for

afirmativa, então “tudo pode”. Precisamos, portanto, de algo mais do que a Primeira Lei para

se modelar o comportamento da natureza.

Vamos, então, com auxílio da Fig.3.1, retomar ao nosso diagrama de grafos, que

muito nos auxiliou para a descoberta da Primeira Lei.

Por hipótese, os processos A, B e C são reversíveis, isto é, podem ser exatamente

revertidos sem deixar marcas no meio-ambiente ao passo que o processo D é irreversível,

tendo sido representado em linhas pontilhadas, pois sequer conseguimos determinar os

seus estados intermediários. Lembre-se ainda que todos estes diferentes processos

ocorrem entre os mesmos estados 1 e 2, que estão infinitesimalmente à parte.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL46

Page 47: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Já sabíamos que δQ A≠δQB≠δQC≠δQD , pois calor, assim como trabalho, é uma função de

cada processo. Porém se observarmos o comportamento de δQ /T , onde T é a temperatura

que pode variar ao longo do processo, para cada processo reversível A, B e C, obteremos o

seguinte resultado, que até certo ponto é surpreendente:

δQT

Arev

=δQT

Brev

=δQT

Crev

(3.1)

isto é, embora os δQ sejam todos distintos, os δQ /T são idênticos, independentemente do

processo reversível que consideremos. A propósito, 1/T é conhecido matematicamente

como fator integrante devido ao seu papel de transformar uma diferencial inexata em uma

diferencial ordinária (ou exata).

3.1.A Entropia

Da mesma forma que fizemos com a energia total, vamos então definir a variação da

propriedade termodinâmica entropia como sendo

dS≡δQT

rev

(3.2)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL

δQB

δQB/T

δQA

δQA/T

δQC

δQC/T

1

2

A

B

C

D

δQD

δQD/T

Fig.3.1 – Grafos de processos salientando cada δQ

47

Page 48: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

para qualquer processo reversível infinitesimal que vá de 1 até 2.

Mas o que acontece com o processo irreversível D? Descobriremos que

δQT

Arev

=δQT

Brev

=δQT

Crev

=dSδQT

Dirrev

, (3.3)

ou seja, para todos os processos irreversíveis, a variação de entropia, que só depende dos

estados 1 e 2, será sempre maior do que o valor de δQ /T avaliado ao longo daquele

processo.

Resumindo, escrevemos a Segunda Lei para Sistemas Fechados como:

dS≥δQT

para qualquer processo, sendo que a igualdade só existirá exclusivamente para processos

reversíveis.

Uma formulação muito útil e importante busca eliminar a desigualdade,

acrescentando-se um termo positivo ou nulo δS gen , que é conhecido como a entropia

produzida devido à irreversibilidade do processo (você acha que δS gen é uma propriedade

termodinâmica?):

dS=δQT

δS gen tal que δS gen≥0 . (3.4)

Na forma integrada, a segunda lei para sistema fechado fica:

ΔS =S 2 −S 1

=∫1

2δQT

S 2gen1 com S 2 gen1 ≥0 . (3.5)

Note que a integração só poderá ser realizada quando conhecermos a evolução de

δQ e de T ao longo de um processo especificado entre 1 e 2.

Um enunciado alternativo para a segunda lei afirma que a entropia produzida

irreversivelmente devido aos processos que ocorrem nos sistemas é sempre positiva ou no

mínimo será nula, sendo que este último caso ocorrerá exclusivamente para processos

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL48

Page 49: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

reversíveis. Tenha bastante cuidado com a confusão comum entre a entropia produzida

irreversivelmente δS2 gen1 , e a variação da entropia do sistema ΔS =S 2−S 1 que pode

ser positiva, negativa, ou nula.

Observe também que trabalho mecânico não desempenha papel algum na Segunda

Lei da Termodinâmica. Lembra-se quando chamamos a sua atenção para a circularidade

aparente das definições das energias de calor e de trabalho mecânico na fronteira do

sistema? Agora já podemos distinguir as duas interações de energia entre si sem a

necessidade de recorrermos à pressão ou à temperatura. Graças à Segunda Lei, sabemos

que o calor é a interação de energia que transporta entropia pela fronteira, ao passo que o

trabalho mecânico não.

3.2.Consequências da Segunda Lei para Sistema Fechado

Seja um processo adiabático ocorrendo em um sistema fechado. Aplicando-se a

Segunda Lei ao sistema, ficamos com

ΔS =S 2 −S 1

= S 2gen1 ≥0 , (3.6)

ou seja, sob qualquer processo adiabático em um sistema fechado, a entropia nunca poderá

decrescer. A entropia do sistema só permanecerá constante se o processo adiabático for

reversível. São, portanto, impossíveis os processos adiabáticos que tentam diminuir a

entropia do sistema. Em outras palavras, a entropia hierarquiza os estados de um sistema,

de tal forma que só podem ser alcançados por processos adiabáticos aqueles estados cuja

entropia seja - até mesmo infinitesimalmente – maior. Essa assimetria, inexistente na

Primeira Lei, é o que caracteriza os processos reais.

Mediante um raciocínio análogo, a entropia de um sistema isolado também não pode

decrescer (por quê?). Neste sentido, considerando que o sistema e o seu meio-ambiente

formam um sistema isolado - o universo - então a entropia conjunta do sistema e de seu

meio-ambiente (ou do universo) também não pode decrescer. Esta afirmação pode ser

considerada um enunciado bastante sintético da Segunda Lei.

Sabemos que um reservatório térmico na temperatura T poderá fornecer qualquer

quantidade de calor 1 Q2 . Você pode determinar a variação da energia interna do

reservatório? Por outro lado, pela Segunda Lei, a sua variação de entropia será dada por

ΔS =S 2 −S 1

=Q21

T, (3.7)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 49

Page 50: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

pois T é constante e este processo, precisamos acrescentar, é por conveniência considerado

internamente reversível.

Os processos podem ser divididos em internamente e externamente irreversíveis.

Como exemplos de processos que são internamente irreversíveis, temos as misturas e

muitas reações químicas. O exemplo mais característico de irreversibilidade externa é a

transferência de calor com diferença finita de temperatura. Por outro lado, a mudança de

fase de uma substância pura é um exemplo de processo internamente reversível.

Você já deve ter percebido que, devido a Segunda Lei, precisa ficar muito mais atento

à origem ou destino dos fluxos de calor. Além disso, quando colocar um reservatório de calor

a T em contato com a fronteira de um sistema, você deve assumir que pelo menos o

segmento da fronteira em contato com o reservatório deve estar igualmente a T (pode dizer

por quê?).

Imagine agora um processo cíclico em um sistema fechado. Como vimos, o estado

final do processo coincide com o seu estado inicial, então a variação de todas as

propriedades termodinâmicas, quando se considera um número inteiro de ciclos, é nula.

Ora, isto também vale para a variação da entropia ΔS . Então, aplicando-se a segunda lei

0=∮δQT

S gen , com S gen≥0 , (3.8)

ou

∮δQT

≤0 , (3.9)

que é a chamada desigualdade de Clausius.

A Segunda Lei nos afirma que nos processos cíclicos em sistemas fechados, δQ /T

líquido integrado sobre todo o ciclo tem em geral que ser negativo, ou no máximo nulo e

nesse caso apenas se todos os processos que compõem o ciclo forem reversíveis, ou seja

se o ciclo for reversível. A propósito, você é capaz de discutir quantos processos podem

compor um ciclo?

3.3.As Máquinas Térmicas e Os Refrigeradores

Máquinas térmicas (Fig.3.1) são sistemas termodinâmicos cujo fluido de trabalho

opera em processo cíclico, e que produzem trabalho líquido positivo às custas da

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL50

Page 51: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

transferência de calor de um corpo a temperatura elevada para outro a temperatura mais

baixa.

Refrigeradores (Fig.3.1), por sua vez, são sistemas termodinâmicos cujo fluido de

trabalho opera em processo cíclico, e que produzem a transferência de calor de um corpo a

temperatura mais baixa a outro a temperatura mais elevada, às custas de trabalho líquido ou

de calor.

A variação de entropia dos ciclos da máquina térmica (M) e do refirgerador (R) é zero,

de tal forma que o inventário de entropia envolve apenas e tão somente os reservatórios

térmicos TH e TL. Da mesma forma, a variação da energia interna dos ciclos é zero, de modo

que o balanço de energia envolve os calores QMH, QML, QRH e QRL trocados entre os

reservatórios e os ciclos, bem como os respectivos trabalhos WM e WR. Quando se discute

máquinas térmicas, costuma-se adotar as grandezas em módulo de tal forma que o sinal

será dado pela própria formulação. Assim

W M =QMH −QML e QRL=QRH−W R 1ª Lei , (3.10)

QMH

T H

−QML

T L

≤0 e QRL

T L

−QRH

T H

≤0 2ª Lei . (3.11)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL

TH

TL

WMT

QMH

QML

WR

QRH

QRL

Fluido de trabalho

operando em ciclo

Reservatório

térmico

Fig.3.2 – Máquina térmica (esq.) e refrigerador (dir.)

51

Page 52: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Se o ciclo é reversível, obtemos o chamado Ciclo de Carnot. Vamos definir o

rendimento da máquina térmica como sendo a razão entre a energia que se deseja e a

energia que se gasta. Você pode então demonstrar que:

a) o rendimento do Ciclo de Carnot não depende do fluido de trabalho do ciclo,

b) não existe rendimento de máquina térmica, reversível ou não, maior do que o de

Carnot quando operando entre os mesmos reservatórios térmicos e que

c) o rendimento do Ciclo de Carnot é sempre menor do que 100%.

Finalmente, analise o enunciado de Kelvin-Planck da Segunda Lei: É impossível

construir um dispositivo que opere num ciclo e que não produza outros efeitos além da

realização de trabalho e da troca de calor com um único reservatório térmico.

Agora compare com o enunciado proposto por Clausius: É impossível realizar um

dispositivo que opere em um ciclo e que não produza outros efeitos que a passagem de

calor de um corpo frio para outro mais quente.

Pois bem, utilizando a nossa formulação da Segunda Lei, agora você deve ser capaz

de demonstrar a equivalência de todos estes enunciados.

Finalmente, lembre-se que, assim como a Primeira Lei, você não pode provar ou

disprovar as Leis da Termodinâmica...

3.4.A Segunda Lei para Sistema Aberto

Existem claramente três maneiras de se alterar a entropia no interior de um sistema

aberto. A primeira, através dos fluxos de calor Q j que atravessam as regiões da

superfície de controle cuja temperatura é T j , por meio da avaliação dos Q j /T j ; a

segunda, através do fluxo líquido de entropia que atravessa a superfície de controle

transportada pelas massas me ,ms e a terceira, por meio da produção irreversível de

entropia S gen , que leva em conta todas as irreversibilidades. Sinteticamente,

dS VC=d msVC=∑e

me se−∑s

ms s s∑j≠0

Q j

T j Q0

T 0

S gen , S gen≥0 , (3.12)

ou, na forma de equação diferencial:

dSVC

dt=

d (ms)VC

dt=∑

e

me se−∑s

ms ss+∑j≠0

Q j

T ( j)+

Q0

T 0

+ S gen , S gen≥0 . (3.13)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL52

Page 53: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

onde, por conveniência, separamos o fluxo de entropia associado ao reservatório do meio-

ambiente a T 0 dos demais fluxos a T j . Integrando-se a Eq. 3.12 ou 3.13 no processo

especificado que leva do estado 1 ao estado 2, obtemos

m2 s2 −m1 s1

VC=∑e∫

1

2

se me−∑s∫

1

2

ss ms∑j≠0

∫1

2 δQ j

T j Q201

T 0

S 2 gen1 , S 2 gen1 ≥0 ,

(3.14)

e para que as integrais possam ser avaliadas, precisamos conhecer as respectivas funções

para se , ss ,Q j ,T j , j≠0 , ao longo do processo particular que vai do estado 1 para o

estado 2. Uma vez que T 0 é constante, podemos expressar o calor total trocado com o

meio-ambiente por Q2 01 .

3.5.O Regime Permanente

Eliminando-se a dependência explícita no tempo, ou seja, assumindo que todos os

termos são constantes, obtemos:

S gen=∑s

ms s s−∑ms

me se−∑j≠0

Q j

T j −Q0

T 0

, S gen≥0 . (3.15)

Seja um processo adiabático e em regime permanente que ocorre em um volume de

controle com uma única entrada e uma única saída de massa (você consegue imaginar uma

aplicação deste modelo?). Então, utilizando a conservação de massa, concluímos pela

Segunda lei que

ss≥se (3.16)

e, pela Primeira Lei:

w=W VC

m=he−hs . (3.17)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 53

Page 54: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

3.6.Regime Transiente

Se existe a dependência com o tempo, então trata-se do regime transiente. Nesse

caso, cada problema deve ser analisado cuidadosamente, frequentemente a partir das

equações na forma de diferenciais, como no exemplo a seguir.

Seja um tanque rígido cheio de gás em um estado definido. A partir de um

determinado instante, passa a ocorrer um vazamento rápido, através de um processo que

pode ser considerado adiabático. Investigue o modelamento do vazamento. Se o vazamento

for para a atmosfera, até quando ele ocorre?

Trata-se claramente de um processo transiente com apenas uma saída de massa.

Pela Primeira Lei para sistema aberto, assumindo processo adiabático e fronteira rígida,

desprezando as energias cinéticas e potenciais, simplificamos a Eq. 2.15 na forma

diferencial para obtermos:

d (mu)VC=−hs δms (3.18)

Pela Segunda Lei, simplificando-se a Eq. 3.12:

d msVC=−ss msδS gen , δS gen≥0 . (3.19)

Pela conservação de massa:

dmVC=− m s . (3.20)

Expandindo-se na Eqs. 3.18 e 3.19 respectivamente a energia interna e a entropia

total do volume de controle e substituindo nelas a Eq. 3.20:

uVC dmVC+ mVC duVC=hs dmVC=us dmVC+ (Pv )s dmVC , (3.21)

sVC dmVC+ mVC dsVC=ss dmVC+ δS gen , δS gen≥0 . (3.22)

Consideremos agora que o estado de saída seja o estado instantâneo do interior do

volume de controle. Então uVC=us e (Pv)VC=(Pv)s . Além disso,

d (mv)VC=mVC dvVC+ vVC dmVC=0 e, portanto,

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL54

Page 55: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

mVC duVC=( Pv)VC dmVC=−mVC PVC dvVC , (3.23)

de onde obtemos que

(du+ P dv )VC=0 . (3.24)

O resultado na Eq. 3.24 tem importantes implicações que só poderão ser discutidas

posteriormente, quando estudarmos as relações entre as propriedades termodinâmicas. Por

outro lado,

sVC≈ss , (3.25)

pois a entropia da massa que sai pode ser considerada igual à da massa que resta no

volume de controle, se desprezarmos o processo irreversível no local do vazamento. Assim,

mVC dsVC≈δS gen≥0 , (3.26)

se levarmos em conta as irreversibilidades internas no processo de esvaziamento. Agora, se

considerarmos o processo como reversível,

dsVC=0 ou sVC=constante , (3.27)

ou seja, o vazamento adiabático poderia ser modelado como se a entropia específica da

massa restante no tanque não se alterasse, ou em outros termos, a massa restante sofreria

um processo adiabático reversível, um resultado curioso, mas bastante utilizado na prática.

Agora refaça o problema do esvaziamento do tanque, só que considere o

esvaziamento tão lento que ocorre isotermicamente, ou seja, o sistema troca calor com o

seu meio-ambiente durante todo o processo. Você consegue imaginar algum exemplo real

desse processo? Perceba que os processos reais de vazamento geralmente ocorrerão entre

estas duas hipóteses: adiabático e isotérmico.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 55

Page 56: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

4.C4.COMBINAÇÃOOMBINAÇÃO DADA P PRIMEIRARIMEIRA EE DADA S SEGUNDAEGUNDA L LEISEIS DADA T TERMODINÂMICAERMODINÂMICA

Ao contrário do que o aluno muitas vezes pensa, as duas Leis da Termodinâmica

nasceram praticamente juntas e devem ser satisfeitas conjuntamente. A violação da primeira

lei constitui um moto perpétuo de primeira espécie, ao passo que a violação da segunda lei

constitui um moto perpétuo de segunda espécie.

Considerando então que todos os processos entre dois estados de um sistema

qualquer devem satisfazer simultaneamente a Primeira e a Segunda Lei, no que estamos

realmente interessados agora é na capacidade ou potencial de realizar o trabalho que as

transformações de estado encerram.

Seja um reservatório térmico à temperatura T. Se extrairmos o calor Q do reservatório,

a segunda lei nos proíbe de transformar, através de um processo cíclico, todo o Q em

trabalho W, sem rejeitar pelo menos algum calor Q0 para o meio-ambiente. Pois bem, em

relação ao reservatório do meio-ambiente a T0, qual é o máximo trabalho que poderia

potencialmente ser recuperado?

Já aprendemos, quando estudamos o Ciclo de Carnot, que, para o reservatório a T

trocando reversivelmente o calor Q, em relação ao meio-ambiente a T0, a máxima

capacidade de realizar trabalho será dada por:

W rev=Q [1−

T 0

T ] . (4.1)

Lembremos também que, ao mínimo valor do calor rejeitado para o meio-ambiente,

Q0rev , corresponde ao máximo trabalho W rev .

Considere agora na Fig.4.1 um volume de controle, com múltiplas entradas e saídas

de massa, trocando calor com vários reservatórios térmicos e também com o meio-

ambiente.

Vamos aplicar a Primeira Lei ao sistema aberto, isolando o trabalho mecânico:

W VC=∑e

me hV 2

2gz e−∑

s

mshV 2

2gz s∑

j≠0

Q jQ0−dEVC

dt. (4.2)

Agora, apliquemos a Segunda Lei ao mesmo sistema:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL56

Page 57: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

dSVC

dt=∑

e

me se−∑s

ms ss∑j≠0

Q j

T jQ0

T 0

S gen com S gen≥0 (4.3)

Colocando, então, Q0 em evidência em ambas as equações e igualando, obtemos:

∑e

me hV 2

2gz−T 0 s e−∑

s

m shV 2

2gz−T 0 s s

∑j

Q j1−T 0

T j−

ddt

E−T 0 S VC−T 0 S gen=W VC

. (4.4)

Vamos então supor como constantes: todas as propriedades das massas que entram

e que saem; todos os fluxos de calor dos reservatórios T(j); a variação das propriedades no

interior do volume de controle. Em outras palavras, só podemos alterar W VC , S gen e, em

consequência da Primeira Lei, Q0 . Podemos restruturar a Eq. 4.2 como:

Q0−W VC=C 1 , (4.5)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL

T(1)

T(j)T(2)

T0

meio-ambiente

Q1

Q2

Qj

Q0

1em

2em

1smdt

dEVC

dt

dSVC

WVC

Fig.4.1 – Esquema de volume de controle

57

Page 58: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

onde C1 é constante. Então, por causa da constante C1 se tentarmos extrair mais

potência VCW produzida pelo volume de controle, o fluxo de calor 0Q recebido do meio-

ambiente a T0 terá que aumentar consistentemente. Como profissionais, poderíamos

perguntar-nos se poderíamos aumentar indefinidamente a potência produzida pelo sistema.

A resposta limitante vem da Segunda Lei, pela expressão da Eq. 4.3:

Q0T 0 S gen=C2, S gen≥0 , (4.6)

onde C2 é outra constante. Concluímos então que, como T0 e S gen são sempre positivos,

o máximo 0Q será obtido quando S gen=0 , ou seja, quando todos os processos forem

reversíveis.

A máxima potência, portanto, W VCrev , será obtida fazendo-se S gen=0 na Eq. 4.4 e

será dada por

∑e

me hV 2

2gz−T 0 s e−∑

s

m shV 2

2gz−T 0 s s

∑j

Q j1−T 0

T j−

ddt

E−T 0 S VC=W VCrev

, (4.7)

que corresponde aos quatro primeiros termos do lado direito da Eq. 4.4 para VCW , nos

permitindo escrever ainda

T 0 S gen=W VCrev

−W VC≡ I , (4.8)

através de cuja expressão definimos I com sendo a irreversibilidade (por unidade de

tempo), ou trabalho perdido (potência perdida). Desse modo, a irreversibilidade, que é

sempre positiva (ou nula) é avaliada pela diferença entre a potência reversível e a potência

real do processo. Esta importante relação é o chamado Teorema do Trabalho Perdido de

Guoy-Stodola.

Observe ainda que a diferença entre a potência reversível e a potência real é

algébrica, o que significa que a potência reversível ou é a máxima potência realizável pelo

sistema - um valor positivo, ou então a mínima potência imposta sobre o sistema - um valor

negativo. Além disso, deve estar claro que nem o trabalho reversível e muito menos a

irreversibilidade são propriedades termodinâmicas (por quê?).

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL58

Page 59: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Vamos analisar a expressão da potência reversível mais de perto. Existem os termos

∑j

Q j (1−T 0

T ( j))≡∑

j

E Q j, (4.9)

que o leitor atento perceberá, ao comparar com a Eq. 4.1, como sendo a máxima potência,

ou a exergia por unidade de tempo, que se poderia obter a partir dos fluxos de calor jQ a

partir dos reservatórios a T(j), em relação ao meio-ambiente a T0. Note que a exergia

associada ao reservatório do meio-ambiente é nula (por quê?).

Encontramos também termos do tipo

∑ mhV 2

2gz−T 0 s , (4.10)

tanto para os fluxos de massa que entram, como os que saem. Observe que, embora o

agrupamento h - T0 s seja novo, as propriedades que o compõe já são nossas conhecidas.

Além disso, o novo agrupamento é uma propriedade termodinâmica, cujo valor depende não

apenas da entropia e da entalpia do fluxo de massa associado, mas também de T0 do meio-

ambiente.

O último termo,

ddt

E−T 0 S VC , (4.11)

representa a variação temporal da grandeza STE 0− , agrupamento de propriedades que

está associado à massa instantânea no interior do volume de controle, em relação ao meio-

ambiente a T 0 .

Que esteja bem claro: o trabalho reversível representa o máximo trabalho que poderia

ser obtido de uma estrutura quando se substitui o sistema original por outro que seja

composto apenas de processos reversíveis, ao mesmo tempo em que se mantêm fixadas

todas as condições originais de entrada e saída de massa, todos os fluxos de calor que não

sejam com o meio-ambiente e obtendo-se a mesma variação de propriedades no seu

interior.

No sentido exposto, o trabalho reversível representa uma generalização do princípio

envolvido no Ciclo de Carnot, através do qual substituímos o ciclo real por um outro

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 59

Page 60: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

reversível, enquanto mantivemos as temperaturas dos reservatórios térmicos, bem como o

calor QH e maximizamos o rendimento, isto é, obtemos o trabalho reversível, enquanto

deixamos flutuando o calor QL (ou Q0).

4.1.Trabalho Reversível em Sistema Fechado

A expressão da potência reversível para sistema fechado será obtida da Eq. 4.7

considerando nulas as entradas e saídas de massa:

W rev=∑

j

Q j1−T 0

T j −ddt

E−T 0 S , (4.12)

ou, na forma de diferenciais:

δW rev=∑j

δQ j(1−T 0

T ( j) )−d (E−T 0 S ) , (4.13)

que em regime permanente ou em processo cíclico torna-se

W rev=∑

j

Q j(1−T 0

T ( j) )=∑j

E Q j , (4.14)

que não por acaso coincide com a discussão sobre máquinas térmicas, refrigeradores e

ciclos de Carnot.

Em regime transiente, de forma integrada, ficamos com:

W 2rev

1 =m [( u+V 2

2+ gz−T 0 s )(1 )

−(u+V 2

2+ gz−T 0 s )(2 )]+∑

j

Q21 j(1−T 0

T ( j) ) . (4.15)

Observe que em sistemas fechados o agrupamento notável é do tipo (u – T0 s) e não

(h – T0 s), como vimos para as vazões de massa em sistemas abertos. Voltaremos a esta

questão quando discutirmos exergia de não-fluxo no item 4.3.

4.2.A Exergia de Fluxo

Percebemos que no inventário para a determinação do trabalho (ou potência)

reversível, existe um papel muito importante para a propriedade termodinâmica

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL60

Page 61: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

(h+V 2

2+ gz – T 0 s ) associada a cada vazão de massa m que entra ou que sai pela

superfície de controle. Qual seria, então, a máxima potência reversível que poderia ser

obtido de uma determinada vazão de massa m que carrega consigo uma determinada

entalpia h, entropia s, velocidade V e elevação z? Basta calcularmos a potência reversível

para a vazão m entrando em um volume de controle em regime permanente que troca

calor apenas com o meio-ambiente a T0, e tal que na saída esta mesma vazão esteja em

equilíbrio com o meio-ambiente a T0 e P0. Assim,

W VC maxrev

=m [ hV 2

2gz−T 0 s −h0−T 0 s0]=m [h

V 2

2gz−T 0 s−g0] , (4.16)

onde h0, s0 e g0=h0−T 0 s0 são os valores da entalpia, entropia e função de Gibbs quando o

estado termodinâmico da vazão de massa é o de equilíbrio de pressão e de temperatura

com o meio-ambiente a T0 e P0. Note que neste estado de equilíbrio a velocidade e a

elevação são nulas. Então, definimos a exergia de fluxo ψ por unidade de massa como

sendo

ψ ≡ W VC max

rev

m = h

V 2

2gz−T 0 s −h0−T 0 s0 = h

V 2

2gz−T 0 s −g0 . (4.17)

A potência reversível será dada, então, por

W VCrev

=∑e

me ψe−∑s

ms ψs+∑j

Q j (1−T 0

T ( j ) )−ddt

( E−T 0 S )VC , (4.18)

A potência reversível é, portanto, obtida a partir do inventário entre as exergias de

fluxo totais das massas que entram e que saem, da exergia proveniente dos fluxos de calor

dos reservatórios térmicos a T(j) , j≠0 , e da variação com o tempo da propriedade

VCSTE )( 0− das massas no interior do volume de controle.

Podemos escrever alternativamente:

ψ=(h−h0+V 2

2+ gz )−T 0(s−s0 ) , (4.19)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 61

Page 62: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

que também é uma formulação muito utilizada para a exergia de fluxo.

4.3.A Exergia de Não Fluxo

Consideremos agora a capacidade que um sistema fechado de massa m em um

determinado estado a T e P possui de realizar o trabalho reversível máximo enquanto troca

calor apenas com o meio-ambiente, até alcançar o equilíbrio térmico e mecânico com o

meio-ambiente, isto é, quando estiver a T 0 e P0 , com velocidade e nível referência

nulos. Note que a massa original m deverá estar no estado final a (T 0 , P0) de forma que o

volume específico final será v0 . Então, a partir da Eq. 4.15, escrevemos:

W maxrev

=m [( u+V 2

2+ gz−T 0 s )−(u0−T 0 s0)] . (4.20)

Subtraindo-se do trabalho reversível na Eq. 4.20 o trabalho do sistema realizado

contra a pressão atmosférica P0, trabalho normalmente considerado inútil e que é dado por

P0(V 0−V )=m P0(v0−v ) , (4.21)

onde V0 é o volume do sistema em equilíbrio com o meio-ambiente a T0 e P0, definimos,

finalmente, a exergia de não fluxo φ por unidade de massa:

φ≡W util max

rev

m=(u+

V 2

2+ gz−T 0 s)−(u0−T 0 s0)−P0(v0−v) . (4.22)

O trabalho reversível para sistema fechado dado pela Eq. 4.12, em termos das

exergias de não-fluxo φ1 e φ2 dos estados 1 e 2 ficará:

W 2rev

1 =m(φ(1)−φ(2))+∑j

Q 21 j(1−T 0

T ( j) )−m P0(v(1 )−v(2)) . (4.23)

A exergia de não fluxo φ por unidade de massa pode também ser expressa nas

seguintes formas equivalentes:

φ=(e+ P0 v−T 0 s)−(u0+ P0 v0−T 0 s0)=(e+ P0 v−T 0 s)−g 0 , (4.24)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL62

Page 63: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

onde, é claro, e0, s0, v0 e g0 são os valores de energia total, entropia, volume específico e

função de Gibbs quando o sistema está em equilíbrio com o meio-ambiente a T0, P0. Você

deve ter notado que embora h seja diferente de uP0 v , h0 é igual a u0P0 v0 e, como

antes, g0 é igual a h0 – T 0 s0 .

Por outro lado, derivando-se a Eq. 4.24, obtém-se uma expressão infinitesimal para a

exergia de não-fluxo, que pode ser útil em problemas transientes:

dφdt

=ddt

(e−T 0 s )+ P0dvdt

=ddt

( e+ P0 v−T 0 s ) . (4.25)

Como uma aplicação, vejamos o interessante exemplo do tijolo quente de massa m

à temperatura T . Se o tijolo trocar calor apenas com o ambiente a T 0 , vamos avaliar o

trabalho reversível se ele esfriar de T até a temperatura do ambiente. Admitamos ainda

que o tijolo é incompressível e que o calor específico constante é c .

É aconselhável empregarmos a forma infinitesimal, pois no intervalo dt o tijolo perde

o calor −δQ enquanto sua temperatura se altera em dT < 0 . Se o trabalho real é nulo,

então o trabalho reversível infinitesimal é convertido em irreversibilidade, que por sua vez, é

igual a T 0 δS gen . Se considerarmos a perda de calor internamente reversível, então, pela

primeira e segunda leis no sistema fechado tijolo, tanto a energia interna, quanto a entropia

devem diminuir:

−δQ=dU =mc dT < 0 e dS=mcdTT

< 0 , (4.26)

ao passo que para o meio-ambiente, a segunda lei revela que a entropia deverá aumentar:

dS 0=−mcdTT 0

. (4.27)

Entretanto, devido a irreversibilidade produzida no meio intermediário entre o tijolo e o

meio-ambiente, a soma algébrica das variações de entropia deve ser positiva e igual a

δS gen , de forma que:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 63

Page 64: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

δS gen=dS+ dS0=mcdTT

−mcdTT 0

=−mc(1

T 0

−1T

)dT , (4.28)

e finalmente, o trabalho reversível será:

δW rev=T 0 δS gen=−mc(1−

T 0

T)dT . (4.29)

Por outro lado, o trabalho reversível deverá ser produzido pela queda de exergia de

não-fluxo do tijolo ao resfriar-se, de acordo com a Eq 4.23. Lembremo-nos também que o

tijolo só troca calor com o ambiente a T 0 e que, sendo incompressível, o seu volume

específico não se altera (v=v0) . Então, o trabalho reversível será dado por

δW rev=−m d ϕ=−md (u−T 0 s)=−dU + T 0 dS . (4.30)

Substituindo na Eq. 4.30 os valores de dU e dS obtidos da Eq. 4.26, obtemos

δW rev=−mc(1−

T 0

T)dT , (4.31)

que é a mesma expressão da Eq. 4.29, como já era esperado, pois, afinal de contas, trata-

se da combinação das mesmas primeira e segunda leis.

Se integrarmos a Eq. 4.31 entre as temperaturas T e T 0 obteremos o máximo

trabalho reversível, ou seja, a queda total de exergia de não fluxo para o resfriamento do

tijolo. Então,

W maxrev

=−∫T

T 0

mc(1−T 0

T)dT =mc {(T−T 0)−T 0 ln (

TT 0

)} , (4.32)

ou, com alguma manipulação e com a definição de exergia de não-fluxo:

ϕ

c T 0

=W max

rev

mc T 0

=(TT 0

−1)−ln (TT 0

)} , (4.33)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL64

Page 65: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

uma função do tipo y=(x−1)−ln(x ) . Estude a função, com x variando de 0,1 a 10. Você

pode dizer quais são os pontos notáveis e o seu significado?

Considerando novamente a Eq. 4.25, podemos reelaborar a Eq. 4.18, que se aplica a

um sistema aberto, em uma forma equivalente:

W VCrev

=∑e

me ψe−∑s

ms ψ s+∑j

E Q j−

ddt

(Φ−P0 V )VC , (4.34)

onde Φ=mφ é a exergia de não-fluxo associada à massa instantânea m do volume de

controle denotado por VC.

Analisando a Eq.4.34, concluímos que ela expressa a conversão das exergias de

fluxo associadas às vazões das massas que entram e saem do volume de controle, em

exergia de não-fluxo da massa no interior do volume de controle e vice-versa. Como um

caso prático, pense na abertura de uma válvula em um tanque de ar comprimido!

4.4.Rendimento Termodinâmico pela Segunda Lei

Como a irreversibilidade é dada por

I =W rev−W ≥0 , (4.35)

então se revW > 0, revW será sempre maior do que W . Uma expressão possível para o

rendimento será

η II=W

W rev , (4.36)

pela Segunda Lei, pois envolve o trabalho reversível ou a irreversibilidade. O inverso da Eq.

4.36 deverá ser utilizado quando revW <0 (por quê?).

Na verdade, as formulações de rendimentos, sejam elas pela Primeira Lei ou pela

Segunda Lei, dependem da análise detalhada da utilização das energias, das exergias, dos

trabalhos reais e das irreversibilidades envolvidas no sistema.

Até agora estudamos formulações da conservação da massa, da Primeira Lei, da

Segunda Lei e até mesmo da importante combinação entre as duas leis, tanto para sistemas

fechados quanto para sistemas abertos.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 65

Page 66: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Observe que em nenhum momento assumimos qualquer hipótese limitadora em

relação às substâncias envolvidas no sistema, sejam elas substâncias puras ou misturas,

reativas ou não, com ou sem alteração de fase. Ressaltamos, assim, o caráter geral das

Leis da Termodinâmica e esse fato é importante quando abordarmos um problema que

temos que modelar e resolver, segundo um procedimento sistemático que manteremos até o

final de nosso curso. Este procedimento é descrito a seguir.

4.4.O Procedimento para o Modelamento dos Problemas

Antes de mais nada precisamos estabelecer os sistemas que representam

completamente o problema e delimitar cada uma de suas fronteiras. Em seguida,

auscultamos cuidadosamente essas mesmas fronteiras para descobrimos as interações que

lá ocorrem durante os processos que os sistemas sofrem, prestando especial atenção às

condições das eventuais trocas de calor. Devemos estabelecer também hipóteses

simplificadoras consistentes com o problema. Finalmente escrevemos expressões as mais

gerais possíveis, que possam ser compatíveis com os processos e com as hipóteses

adotadas, para a conservação da massa, para a Primeira e a Segunda Leis e eventualmente

para as duas combinadas.

Entretanto, logo descobriremos que não poderemos avançar enquanto não

estudarmos o comportamento das substâncias puras sob determinadas circunstâncias. Mais

tarde, à luz do que aprendermos com as substâncias puras, procederemos com as misturas.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL66

Page 67: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

5.A5.ASS P PROPRIEDADESROPRIEDADES T TERMODINÂMICASERMODINÂMICAS EE OO E ESTADOSTADO

Neste momento de nosso estudo, vamos proceder a um inventário das propriedades

termodinâmicas que conhecemos até agora. Temos as propriedades intensivas próprias, a

temperatura T e a pressão P, as “intensivadas”: volume específico v, energia total específica

e, energia interna específica u, entalpia específica h, entropia específica s, exergia de fluxo

ψ , exergia de não fluxo φ e as extensivas - massa m, volume V, energia total E, energia

interna U, entalpia H, entropia S, exergia de fluxo Ψ e exergia de não fluxo Φ .

Salientamos, uma vez mais, que as vazões (interações) de massa para dentro e para fora

de um volume de controle não são em geral propriedades termodinâmicas, pois dependem

de uma história do processo, muito embora tais vazões sejam portadoras das propriedades

termodinâmicas. Os valores de algumas dessas propriedades podem ser obtidos por meio

de instrumentos e portanto são mensuráveis, como m, P, T , V e v. Todas as demais

propriedades são não mensuráveis e os seus valores só podem ser obtidos de forma

indireta.

Genericamente podemos escrever z=z x , y , onde x, y, z podem ser quaisquer

propriedades intensivas e x, y devem ser, como já sabemos, independentes entre si. Assim,

a cada par x, y corresponde um valor de z. Observe que estamos usando, por conveniência,

a notação pela qual confundimos a variável dependente z com o nome da função z(x,y).

Utilizando-se uma representação geométrica na Fig.5.1:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL

x y

z

z = z(x,y)

y = constantex = constante

z = constante

)yx

z∂∂

)xy

z∂∂

Fig.5.1 – Representação geométrica do espaço de estados 67

Page 68: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

A derivada parcial ∂ z /∂ x y , que é uma função M(x,y), representa nada mais do que a

tangente à curva produzida pela intersecção da superfície z(x,y) com qualquer plano de y

constante, como mostra a figura. De modo análogo, a derivada parcial ∂ z /∂ y x , que

também é uma função N(x,y), representa a tangente à curva produzida pela intersecção da

superfície z(x,y) com qualquer plano de x constante. Ressaltamos que, ao contrário do que

você poderia pensar, ∂ z /∂ x y e ∂ z /∂ y x são ambas funções tanto de x como de y. Se

você fixar essa noção geométrica de derivada parcial, provavelmente nunca mais terá

problemas para entender e utilizar o conceito.

5.3.Um Pouco de Cálculo

De z = z(x,y) podemos escrever de imediato,

dz=∂ z∂ x

y dx∂ z∂ y

x dy=M x , y dxN x , ydy , (5.1)

conhecida como a Regra da Cadeia. Além disso,

∂ z∂ x

)y∂ x∂ z

)y=1 (5.2)

conhecida como a Regra da Inversão. Se você estudar atentamente a Eq. 5.2, entenderá as

vantagens da notação que adotamos em relação a variável dependente e a respectiva

função. A primeira derivada refere-se a uma função z x , y ao passo que a segunda

derivada está relacionada a x z , y .

Podemos demonstrar também que, para quaisquer x,y e z:

∂ x∂ y

z∂ y∂ z

x∂ z∂ x

y=−1 (5.3)

conhecida como a Regra Cíclica. Mais ainda,

∂M x , y

∂ yx=

∂N x , y

∂ xy , (5.4)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL68

Page 69: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

onde o M(x,y) e o N(x,y) foram definidos anteriormente. Esta é a Regra das Derivadas

Cruzadas.

Além disso, podemos expandir as derivadas parciais da seguinte forma:

∂ z∂ x

)y=∂ z∂ w

)y∂w∂ x

)y ,

onde w é uma propriedade termodinâmica qualquer distinta de y . Vamos denominar

esta de Regra da Quarta Propriedade.

Não se assuste, pois este, além do conceito de integral de linha a ser discutido, é

(quase) todo o cálculo de que precisaremos!

5.4.As Relações de Maxwell

Seja a Primeira Lei para sistema fechado,

du=δq−δw . (5.5)

Se os processos forem todos reversíveis, então

du=Tds−Pdv . (5.6)

Esta última equação, conhecida como a relação fundamental na forma de energia

interna, relaciona apenas propriedades e, portanto, pode ser integrada por qualquer

processo ou caminho que imaginemos, desde que respeitemos a relação entre as

propriedades ao longo do caminho escolhido. Por outro lado, embora nela existam cinco

propriedades u, T, P, s, v , já sabemos (por que razão?) que apenas duas podem ser

independentes e as demais serão necessariamente dependentes destas duas. Escrevemos

então,

du=T s , vds−P s , v dv (5.7)

e, pela regra da cadeia, identificamos

T=∂ u∂ s

v=M x , y e −P=∂ u∂v

s=N x , y . (5.8)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 69

Page 70: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Perceba que poderíamos, então, ter definido rigorosamente a temperatura absoluta

como a variação da energia interna do sistema fechado com a entropia, mantendo-se

constante o volume, ou definido a pressão absoluta, como sendo a negativa da variação da

energia interna com o volume, enquanto mantemos a entropia constante e assim nos

livramos do último elo da dependência da definição circular para o calor e para o trabalho

mecânico.

Pelas derivadas cruzadas temos

∂T∂ v

s=−∂ P∂ s

v (I) (5.9)

que é uma relação muito interessante para nós, pois envolve três propriedades mensuráveis

P,v,T e uma não mensurável s.

Lembra-se da entalpia? Definimos como sendo h=uPv . Na forma diferencial

dh=duPdvvdP (5.10)

ou, substituindo-se a expressão para du, obtemos a relação fundamental na forma de

entalpia:

dh=TdsvdP=T s , Pdsv s ,P dP . (5.11)

Pela regra da cadeia,

T=∂ h∂ s

P=M x , y (5.12)

e, também,

v=∂ h∂ P

s=N x , y . (5.13)

Novamente pela regra das derivadas cruzadas,

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL70

Page 71: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

∂T∂P

s=∂ v∂ s

P (II) (5.14)

e mais uma vez obtivemos uma relação de P,v,T com s .

Se definirmos a função (ou energia livre) de Helmholtz como

a≡u−Ts , (5.15)

então, na forma diferencial, encontramos a relação fundamental na forma de função (ou

energia livre) de Helmholtz:

da=du−Tds−sdT =Pdv−sdT (5.16)

de onde obtemos a relação,

∂P∂T

v=∂ s∂ v

T . (III) (5.17)

Se definirmos a função (ou energia livre) de Gibbs como sendo

g≡h−Ts , (5.18)

então, na forma diferencial, achamos a relação fundamental na forma de função (ou energia

livre) de Gibbs:

dg=dh−Tds−sdT=vdP−sdT , (5.19)

de onde extraímos

∂ v∂T

P=−∂ s∂P

T (IV) . (5.20)

Note que (I), (II), (III) e (IV) são as Relações de Maxwell, que nos fornecem as

combinações de P, v, T e s e que são muito utilizadas para a manipulação das relações

termodinâmicas.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 71

Page 72: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Precisamos ainda definir mais duas propriedades importantes. A primeira é o calor

específico a volume constante CV da forma:

CV ≡∂u∂T

v (5.21)

e a outra é o calor específico a pressão constante CP:

C P=∂ h∂T

P . (5.22)

Vamos lembrar uma vez mais que o calor específico a volume constante e a pressão

constante são propriedades termodinâmicas intensivas (por quê?) e, portanto, não estão

associados a nenhum processo especial a pressão ou volume constante e muito menos têm

a ver com o calor identificado na fronteira do sistema. Estamos conscientes que chamá-los

de “calor específico” é receita para muita confusão, mas estes nomes possuem fortes

conotações históricas.

5.5.A Equação de Estado

Considere apenas a tripla de propriedades intensivas mensuráveis P, v, T. Como tudo

depende da escolha das duas propriedades intensivas independentes, deve estar claro que

podemos expressar as superfícies tridimensionais, de forma: v = v(P,T), explícita em v, P=

P(v,T), explícita em P e T = T(P,v) , explícita em T, ou, ainda, em quatro dimensões, de forma

implícita: f(P,v,T) = constante (Qual seria o valor da constante?).

A relação entre as propriedades P,v,T é chamada tradicionalmente de equação de

estado para a substância pura em questão. Na análise que se segue, podemos supor, por

um momento, que já conhecemos as equações de estado explícitas em P ou em v conforme

for conveniente.

5.6.A Energia Interna a Partir da Temperatura e do Volume

Vamos supor que a temperatura T e o volume específico v de um determinado

sistema, são escolhidos como propriedades independentes. Então todas as demais

propriedades são dependentes de T,v. A pressão P pode ser expressa como P = P(T,v) e a

equação de estado é explícita em P. Deve ficar claro para você que também que

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL72

Page 73: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

conhecemos as propriedades termodinâmicas∂ P∂T

)v (T ,v) e também∂P∂ v

)T (T , v) mesmo

que estas tenham que ser determinados numericamente. Então a energia interna será

u=u T ,v (5.23)

e pela regra da cadeia,

du=∂ u∂T

)v(T ,v )dT+∂ u∂ v

)T (T ,v)dv (5.24)

mas

∂ u∂T

)v=C V (5.25)

e, pela relação fundamental na forna de energia interna:

∂u∂ v

)T=T∂ s∂ v

)T−P . (5.26)

Finalmente, substituindo-se∂ s∂v

)T por∂P∂T

)v devido à Relação de Maxwell (III):

du=CV T ,v dT[T ∂ P∂T

v T ,v −P T ,v ]dv , (5.27)

na qual a relação funcional de T,v foi enfatizada. Integrando-se esta expressão entre dois

estados dados por (T(1),v(1)) e (T(2),v(2))), o resultado será u(2)- u(1), o que era de se esperar, pois

as propriedades termodinâmicas, como vimos, sempre têm uma base arbitrária. A variação

da propriedade, por sua vez, não pode e nem deve depender de base alguma, pois seria um

contra-senso e um absurdo se os resultados físicos de calor e trabalho da Primeira Lei

estivessem vinculados a uma base especificada da energia interna!

Note também, que se trata de uma relação apenas entre propriedades. Portanto, a

determinação de u(2) - u(1) não deve depender de processo ou caminho de integração, o que

não significa que todos os caminhos sejam igualmente convenientes.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 73

Page 74: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

De fato, estamos diante de um exemplo de integral de linha, que é a última peça do

Cálculo que nos faltava. Na Eq. 5.27 vemos que a primeira parcela da direita corresponde a

uma isovolumétrica, pois ao longo dos caminhos de integração em que o volume v

permanece constante, a outra parcela se anula. Do outro lado, a segunda parcela é uma

isotérmica, pois ao longo dos caminhos de integração em que a temperatura T é constante,

é a primeira parcela, por sua vez, que desaparece. Em razão disso, concluímos que para a

determinação da energia interna u em função de T,v, o melhor caminho de integração será

aquele composto de isovolumétricas e isotérmicas, embora deve ficar claro que o número de

isotérmicas e isovolumétricas é arbitrário, da mesma forma que se você puder andar só em

ângulos retos para ir de um lugar a outro, ainda assim poderá fazê-lo ao longo de infinitas

possibilidades...

Para que você tenha uma visão mais concreta, seja uma equação de estado explícita

em P, por exemplo a equação de Van der Waals:

P T ,v=RT

v−b−

a

v 2 (5.28)

donde obtemos

∂P∂T

v=R

v−b(5.29)

e então as isotermas da energia interna são da forma,

duT=[T ∂ P∂T

v−P ]dvT=[ RTv−b

−P] dvT=av2 dvT (5.30)

que integrada, fornece, ao longo de qualquer isoterma T, desde o volume v(1) até o volume

v(2), isto é, integrando-se de (T, v(1)) até (T, v(2)):

u2−u1

T=a [ 1

v1−

1

v2 ] . (5.31)

Note, por outro lado, que para determinarmos as isovolumétricas, precisamos

conhecer o comportamento do calor específico a volume constante Cv T ,v , o que não é

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL74

Page 75: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

nada conveniente. Como resolver isso? A solução completa do problema ficará clara quando

estudarmos as propriedades de uma substância pura, em particular na região de gás

perfeito. Entretanto, parte da solução surge na discussão seguinte.

Veja o esquema na Fig.5.2, no qual estão representados no plano T−v pelo menos

dois caminhos de integração: 1-3-2 e 1-3-4-5-2. As pressões correspondentes ao segundo

caminho são muito menores do que no caminho 1-3-2. Em compensação, existe uma

isotérmica a mais!

Integrando-se ao longo do caminho 1-3-4-5-2,

u2−u1

=u2−u 5

T 2 u 5−u4

v3 u 4 −u1

T 6

u2−u1 =a [ 1

v5−

1

v2 ]∫T1

T2

C V T ,v 3dTa[ 1

v1−

1

v 4 ] (5.32)

5.7.A Entropia a Partir da Temperatura e do Volume

A partir da relação fundamental na forma de energia interna Eq. 5.7:

∂ u∂T

v=T∂ s∂T

v=CV . (5.33)

Escrevendo s=s T ,v pela regra da cadeia, expandimos para:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL

isotérmica

isovolumétrica

isotérmica

T

v3

v1

T2

T1

v2 v

1

25

43P

1

P5

P4

P2

P3

Fig.5.2 – Caminhos de integração no plano T-v

75

Page 76: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

ds=∂ s∂T

v dT∂ s∂ v

T dv (5.34)

e, portanto,

ds=CV T ,vdTT

∂ P∂T

v T ,vdv . (5.35)

5.8.A Entalpia e a Entropia a Partir da Temperatura e da Pressão

Consideremos agora T,P como variáveis independentes e, portanto, v=v P ,T é a

equação de estado explícita em v. Como antes, de h=h T , P , pela regra da cadeia,

expandimos para:

dh=∂ h∂T

P dT ∂ h∂P

T dP . (5.36)

A partir de dh=TdsvdP temos

∂ h∂P

T=T∂ s∂ P

Tv (5.37)

e∂ h∂T

P=T∂ s∂T

P=C PT , P . (5.38)

Então, utilizando-se ainda a Relação de Maxwell (IV):

dh=C PT , PdT [v T , P−T∂ v∂T

P T , P ]dP (5.39)

e também, para entropia:

ds=C P T , P dTT

−∂ v∂T

P T , P dP . (5.40)

E se resolvermos obter u em função de T,P ou h em função de T,v? Tente como exercício e

verá que não é tão fácil. Como sugestão, inicie por h=h (T ,v ) e expanda pela regra da

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL76

Page 77: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

cadeia. Então, utilize a relação fundamental na forma de entalpia e como no caso da energia

interna, obtenha e avalie as derivadas parciais da entalpia, com apoio das relações de

Maxwell. Pela complexidade do resultado, percebe-se claramente que T,v são as

propriedades naturais para u, ao passo que para h as propriedades naturais são T,P. Por

outro lado, como vimos, para a entropia a escolha é indiferente, ressaltando-se

respectivamente o uso de C P(T , P) ou de CV (T ,v ) .

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 77

Page 78: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

6. D6. DETERMINAÇÃOETERMINAÇÃO DASDAS P PROPRIEDADESROPRIEDADES T TERMODINÂMICASERMODINÂMICAS

6.1.A Variação da Entalpia, Energia Interna e Entropia para o Gás Perfeito

Como conhecemos a equação de estado para o gás perfeito e ela pode ser

explicitada tanto em v como em P , podemos determinar facilmente (faça como exercício!) a

variação da energia interna, entalpia e entropia para o gás perfeito. Note que o asterisco

superior sempre denotará estado termodinâmico de gás perfeito. Encontraremos então:

du*=CV0 T dT , dh*

=C P0T dT , (6.1)

ou seja, a entalpia, a energia interna e os calores específicos do gás perfeito são funções

apenas da temperatura. Para a entropia, obtemos,

ds*=CV0 T

TdT R

dvv

=C P0 T

TdT−R

dPP

. (6.2)

Observe que, mesmo para o gás perfeito, a entropia é função de T,v ou de T,P.

Finalmente, da igualdade das expressões para entropia,

C P0T −CV0T =R (6.3)

6.2.A Energia Interna em Coordenadas Generalizadas

Se você observar a equação do virial, Eq. 1.9 perceberá a razão pela qual a maior

parte das equações de estado disponíveis é explicita em P. Isto nos leva a assumir T,v como

propriedades independentes e, portanto, nos leva também de forma natural primeiramente à

avaliação da energia interna.

Pois bem, se considerarmos como válida a Regra dos Estados Correspondentes,

poderemos adimensionalizar, por meio de Z=P r v ' r /T r , exatamente como foi feito em LK, a

isotérmica da energia interna. Assim, obteremos uma formulação em coordenadas

generalizadas que poderia ser utilizada, em principio, para determinar as propriedades de

qualquer substância pura, bastando para isso o conhecimento do comportamento

generalizado de Z.

Mediante substituições apropriadas, a isotérmica adimensional de u na Eq. 5.25 se

torna:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL78

Page 79: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

duT

r

RTC

=T r

2

v ' r

∂Z∂T r

v ' rdv ' rT

r

. (6.4)

Basta integrar a Eq. 6.4 e a parcela isotérmica fica resolvida. Entretanto, a parte

isovolumétrica ainda representa um obstáculo, pois, como já descobrimos anteriormente,

precisaríamos conhecer o calor específico C v T r , v ' r para cada substância pura. Para

resolver o problema, integramos as isotérmicas até uma isovolumétrica v* que alcance o

comportamento do gás perfeito. O valor de v* não é importante, pois sabemos que daí em

diante, a energia interna u* e o calor específico CP0 passam a ser funções apenas da

temperatura.

Observamos o esquema da Fig.6.1 e escrevemos então:

u2−u1

=u*−u

1−u*

−u2 u* 2

−u*1 (6.5)

onde

u*−u

RT C

=∫v 'r

∞ T r2

v ' r

∂ Z∂T r

v' rd v ' r (6.6)

são as isotermas até a região de gás perfeito. Observe que u*−u é chamada de energia

interna residual ou desvio de energia interna, pois só é diferente de zero se no estado

correspondente a u a substância não for gás perfeito. Esta é a mesma razão pela qual o

limite superior de integração é infinito. Ainda,

u*2−u* 1

=∫T1

T 2

CV0 T dT (6.7)

é a integral de CP0 entre T1 e T2 na região do gás perfeito, cujo caminho de integração não

precisa nem sequer ser isovolumétrico (por quê?).

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 79

Page 80: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

6.3.A Entalpia em Coordenadas Generalizadas

Para a avaliação da entalpia, temos:

h2−h1=u 2 −u1P 2 v 2 −P 1 v 1 . (6.8)

Portanto, podemos facilmente mostrar que (faça-o como exercício!)

h*−h

RT C

=u*

−uRT C

T r 1−Z . (6.9)

Então, o desvio de entalpia (ou entalpia residual) pode ser obtido diretamente da

energia interna residual sem maiores dificuldades.

Para completar, portanto, o cálculo da variação da entalpia entre dois estados 1 e 2,

resta-nos apenas acrescentar a integração de CP0(T), exatamente como o fizemos para a

energia interna. O resultado torna-se:

h2−h1

=h*−h

1−h*

−h2

h*2−h* 1

, (6.10)

onde

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL

isotérmica

Região do gás

perfeito

isovolumétrica

Tr

vr’*v

r’1

Tr2

Tr1

vr’2

vr’

1

22*

1*3

isotérmica

Fig.6.1 – Um caminho de integração até o gás perfeito

80

Page 81: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

h*2−h*1

=∫T1

T 2

C P0 T dT . (6.11)

6.4.A Entropia em Coordenadas Generalizadas

Infelizmente o esquema exposto não dará certo para a entropia, pois esta depende de

v ou de P mesmo na região do gás perfeito. A isotérmica da entropia em coordenadas

generalizadas é dada por:

sv ' r*

*−sv ' r

R=∫

v ' r

v ' r*

1v ' r [Z+ T r

∂Z∂T r

)v ' r]d v ' r , (6.12)

e limv ' r

*→∞

∫v ' r

v ' r*

dv ' r

v ' r

= ∞ , donde concluímos que a integral se torna ilimitada, o que não nos

interessa nem um pouco. Façamos então:

sv ' r*

*−sv ' r

*

R = ln v ' r

*

v ' r = ∫

v' r

v' r*

1v ' r

d v ' r , (6.13)

onde sv' r

* é o valor que a entropia teria, se assumíssemos gás perfeito em T ,vr' , ou seja,

um estado de gás perfeito hipotético. Resta-nos, então, cancelarmos as singularidades,

subtraindo a Eq. 6.12 da Eq. 6.13 (mostre!):

sv ' r

*−sv ' r

R = ∫

v ' r

∞ 1v ' r [ZT r

∂Z∂T r

v ' r−1]d v ' r . (6.14)

Assim, o desvio de entropia (ou entropia residual) é calculado no estado T r , v ' r em

relação ao valor que a entropia teria se fosse gás perfeito hipotético neste mesmo estado.

Observe que os estados hipotéticos não serão incomuns em nosso estudo. Isso não

deve nos assustar, pois sempre estarão acompanhados das devidas correções que darão

conta dos desvios entre a hipótese e o estado físico real. De fato, os nossos primeiros

exemplos dessas correções são exatamente os desvios de energia interna, entalpia e de

entropia.

A diferença de entropia entre dois estados 1 e 2 será dada por:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 81

Page 82: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

s2−s1

= s*−s1− s*

−s2 s* 2

−s* 1 , (6.15)

onde:

s* 2−s*1

=∫T 1

T 2 C P0T

TdT−R ln P 2

P1 , (6.16)

ou então,

s* 2−s*1

=∫T 1

T 2 C V0 T

TdT R ln v 2

v 1 . (6.17)

Sabemos agora, em princípio, como expressar as diferenças de energia interna Eq.

6.5, de entalpia, Eq. 6.10, bem como de entropia, Eq. 6.15, para uma substância pura entre

dois estados 1 e 2 em termos de diferenças relativas ao gás perfeito de energia interna, Eq.

6.7, entalpia Eq. 6.11 e entropia Eqs. 6.16 ou 6.17, entre estes mesmos estados,

devidamente alteradas pelos desvios de energia interna (ou energia interna residual), Eq.

6.6, entalpia (ou entalpia residual), Eq. 6.9 e entropia (ou entropia residual), Eq. 6.14, em

cada um destes estados.

Sabemos, também, como determinar numérica ou algebricamente as diferenças de

energia interna, entalpia e entropia do gás perfeito entre dois estados, conhecendo uma

expressão para os calores específicos de uma substância pura em função da temperatura T.

Resta-nos então determinar as energias internas, entalpias e entropias residuais em

um dado estado. De maneira geral, devido a natureza complexa das equações de estado

que serão utilizadas, as diferenciações e integrações nas equações terão que ser resolvidas

de forma numérica, mediante programas de computador. Entretanto, antes de nos

dedicarmos a esta tarefa, vamos definir uma propriedade termodinâmica bastante útil, a

fugacidade.

6.5.A Fugacidade de Substâncias Puras

Seja uma substância pura. Podemos escrever a parte isotérmica da relação

fundamental na forma de função de Gibbs e substituir v :

d gT=v dPT=Z R T

PdPT=Z RT d ln P T . (6.18)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL82

Page 83: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Por outro lado, para o gás perfeito, temos:

d gT*=v

* dPT=RTP

dPT=R T d ln P T . (6.19)

Comparando as duas expressões, percebemos que podemos definir uma propriedade

que chamaremos de fugacidade f como:

d gT=v dPT=Z R T

PdPT=RTd ln f T , (6.20)

desde que

limP0

fP =1 . (6.21)

Em outras palavras, ao invés de usarmos Z para enfatizarmos a diferença de não ser

gás perfeito, podemos criar efeito semelhante, quando substituirmos f no lugar de P nas

equações. Por essa razão, a fugacidade é chamada também de pseudo-pressão. Você pode

mostrar que na região do gás perfeito a fugacidade coincide com a pressão.

A fugacidade, como qualquer outra propriedade termodinâmica intensiva, é uma

função de duas propriedades intensivas independentes e, portanto, também pode ser

expressa em coordenadas generalizadas, da seguinte forma (mostre):

ln fP

T r

T r , P r , ,Y =∫0

Pr

Z−1d ln P rT r , (6.22)

onde o adimensional fP

, ou o seu logaritmo, é denominado coeficiente de fugacidade.

6.6.Os Diagramas Generalizados com Lee-Kesler e Fluidos Simples

Se admitirmos a validade universal da Regra dos Estados Correspondentes, então,

de posse de uma - ou mais de uma - equação de estado confiável expressa na forma

generalizada, tal como a equação de estado de Lee-Kesler, podemos, com ajuda do

computador, proceder às necessárias derivações e integrações numéricas e tabular os

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 83

Page 84: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

dados resultantes. Historicamente, têm sido comuns as tabelas contendo o fator de

compressibilidade, o desvio de entalpia e o desvio de entropia, como função das variáveis Pr

e Tr , não apenas para a região de vapor superaquecido, mas também para as regiões de

saturação e de líquido comprimido.

De posse das tabelas ou programas de computador, se você souber o que está

fazendo, não precisa nem se preocupar com o desenvolvimento matemático anterior.

Vejamos um exemplo:

Estrangula-se metano de 2MPa e 25°C a 0,1MPa num processo adiabático e em

regime permanente. Determine a temperatura final do metano.

Pela Primeira Lei, desprezando-se as energias cinética e potencial, como não existe

trabalho e nem calor:

he=hs onde he = h(Pe,Te) e hs = h(Ps,Ts) , com Ts desconhecido. Para podermos utilizar

coordenadas generalizadas precisamos obter PC ,TC , R e CP0 do metano: PC = 4,60 Mpa, TC =

190,4 K, R = 0,51832 kJ/kg K e CP0 = 2,2537 kJ/kg K e, então, determinar Tr e Pr :

Tre = 298,15190,4

= 1,566 Pre = 2,04,60

= 0,4347 Prs = 0,14,60

= 0,0217

Por outro lado, expandindo-se a entalpia:

he−hs=hs*−hshe

*−hs*−he

*−he=0 , (6.23)

na qual o primeiro termo depende de Trs, Prs, o termo intermediário representa a integral do

calor específico de Te até Ts e o último termo depende de Tre, Pre. Observe que, embora a

única incógnita seja Ts (ou Trs), a solução deve ser encontrada por iteração.

Vamos então encontrar a solução, admitindo que o estado de saída não é saturado,

mas que o calor específico do gás perfeito não pode ser considerado constante.

Das tabelas de entalpia residual, para T re=1,566 e P re=0,4347 , )( *ee hh − =

(0,19581)(0,51835)(190,4) = 19,325 kJ/kg K e a equação final se torna:

he*(T e)−hs

*(T s)+ ((hs

*−hs)

RT c)(T rs , P rs) RT c−19,325=0 , (6.24)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL84

Page 85: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

6.7.O Programa LK_WS_NR e o pacote LK_proptermo

Utilizando a equação de estado de Lee-Kesler na forma generalizada, o fator

acêntrico de Pitzer e o fator de correção de Wu-Stiel, desenvolvemos em Python o aplicativo

denominado LK_WS_NR. Python é uma linguagem de programação de código aberto, muito

alto nível, interpretada para uma máquina virtual, orientada a objetos, de tipagem dinâmica,

multiplataforma e de sintaxe simples.

Para podermos obter as propriedades termodinâmicas de uma substância pura, além

de Python 2.5 a 2.7 e do módulo LK_WS_NR, são necessários ainda: a biblioteca de

módulos numpy, para a construção de arrays multidimensionais; o módulo robustNR_args,

para a obtenção de raízes de sistemas de equações não lineares por um método modificado

de Newton-Raphson, com jacobiano sintético; a base de dados tabelaA1A3.db, contendo as

propriedades das Tabelas A1 e A3 do livro do Assael e o módulo a1_assael, para se obterem

os valores das propriedades críticas Tc,Pc,Vc, da massa molecular M, da constante do gás

R, do fator acêntrico ω, do fator Y de Wu-Stiel e do calor específico, entalpia e entropia do

gás perfeito em função da temperatura e pressão, dados por um polinômio de terceira

ordem.

Colocamos a seguir, para referência imediata, as docstrings dos módulos bem como

as tabelas com os resultados calculados com os módulos e aqueles obtidos através das

tabelas do Van Wylen 4a edição, para os casos da amônia e da água. Note que os erros

relativos para os estados selecionados são menores do que 0,5 %. Estude bem todo o

Apêndice, bem como os exemplos, para aprender sobre a forma adequada de utilização dos

módulos.

****************************************************************************

EQUAÇÃO DE ESTADO GENERALIZADA DE LEE-KESLER e WU-STIEL (para Y >= 0.)

**************************************************************************** Para a utilização do módulo, instâncias da classe H_S na saturação (misturalíquido-vapor) e fora dela (liquido comprimido e vapor super-aquecido)devem ser criadas, respeitando-se as respectivas assinaturas dos seusconstrutores, como pode se ver nos exemplos abaixo.

Seja na saturação ou fora dela, se o cálculo for bem-sucedido,a instância terá como atributo um dicionário prop,contendo todas as demais propriedades (sendo self a instância).Se for, por exemplo, na saturação, prop conterá (fora dessa ordem) osvalores adimensionais:* a pressão reduzida de saturação: self.prop['Pr'],* a temperatura reduzida de saturação: self.prop['Tr'],* os desvios de energia interna: self.prop['ul'], self.prop['uv'], self.prop['u'],* os desvios de entalpia: self.prop['hl'], self.prop['hv'], self.prop['h'],* os desvios de entropia: self.prop['sl'], self.prop['sv'], self.prop['s'],* os fatores de compressibilidade: self.prop['Zl'], self.prop['Zv'], self.prop['Z'],* o título do vapor: self.prop['x'].

Se for fora da saturação, prop conterá (fora dessa ordem) os valoresadimensionais:self.prop['Tr'], self.prop['Pr'], self.prop['h'], self.prop['s'],self.prop['u'], self.prop['Z'], self.prop['cf'], self.prop['fase'].Em todos os casos, self.w e self.Y são sempre os atributos da instância.

******* PROBLEMAS DIRETOS:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 85

Page 86: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

As instâncias da classe H_S podem ser utilizadas para se obter:* a pressão reduzida de saturação Pr, conhecidos Tr e w e Y;* a temperatura reduzida de saturação Tr, conhecidos respectivamente Pr e w e Y,desde que se forneça um título x qualquer entre 0. e 1. * As propriedades termodinâmicas adimensionais, conhecidos Tr, Pr, w e Y.

******* PROBLEMAS INVERSOS:Instanciando-se H_S adequadamente, um número de problemas INVERSOS,na saturação ou fora dela, são passíveis de solução, ou seja, geram self.prop:* Tr (ou Pr) e desvios de entalpia (ou de entropia) adimensionais;* Tr (ou Pr) e fator de compressibilidade Z;* Tr (ou Pr) e título do vapor x.

Observe com atenção que se for fornecido Tr < 1 e outra propriedade que não x,das DUAS soluções possíveis, a instância retorna com a self.prop da SATURAÇÃO,ao passo que se for fornecido Pr e outra propriedade,a instância retorna com a ÚNICA self.prop possível, seja ela nasaturação ou fora dela. Isto significa que se se desejar uma única solução para oproblema inverso, deve se dar preferência ao fornecimento de Pr, ao invés de Tr.

*********************************Os resultados para Y = 0. estão sendo em alguns casos comparados com os obtidos através do software fechado CATT2 (Van Wilen & Sonntag (1996)). Interessantemente, o Tr para Pr = 0.1 obtido pelo CATT2 está completamente ERRADO! :)

*********************************NOTA: Tente permanecer longe do ponto crítico, ou pelo menos de Pr = 1...

rev 05-01-2010.

-----------------Criação do banco de dados e tabela---------------------------

Foi criado um banco de dados com nome A1_Assael.db e uma tabela chamada A1 dentro delecom as seguintes colunas: [Id, NomeDoComposto, Formula, Tb, Tc, Pc, Vc, Dipm, w, Cp0, Cp1, Cp2, Cp3, M, Y]

----------------Inserindo valores na tabela com SQL---------------------------

Na linha de comando do python:

>>> import sqlite3>>> conn = sqlite3.connect('path da tabelaA1A3.db')>>> c = conn.cursor()>>> c.execute('insert into A1 values (Id, 'NomeDoComposto', 'Formula',Tb, Tc, Pc, Vc, Dipm, w, Cp0, Cp1, Cp2, Cp3, M)')>>> conn.commit()

obs: em c.execute as aspas simples do começo podem ser substituidas por tres aspas("),seguir a ordem dos dados do exemplo pra não colocar os dados errados na tabela.Sites recomendados sqlite3:www.sqlite.orghttp://eupodiatamatando.com/2007/08/13/sqlite-resolvendo-problemas-simples-com-um-banco-simples/

--------------------------------Operando com a1_assael.py-------------------- Exemplos:>>> p = Composto(nome='methane') #instancia a classe com o nome do composto>>> p = Composto(formula='CH4') #instancia a classe com a fórmula do composto>>> p.constantes #retorna o dicionario com os valores das constantes do composto>>> p.Tc,p.Pc,p.M,p.R,p.w,p.Y #retorna os valores Tc,Pc,M,R,w,Y diretamente como atributo>>> p.lista #lista os nomes e fórmulas de todos os compostos do banco de dados>>> p = H_Sgp('methane',hfo=0.,so=0.) # propriedades do gás perfeito do composto (pelo nome)>>> p = H_Sgp(formula ='CH4',hfo=0.,so=0.) # propriedades do gás perfeito do composto (pela fórmula)>>> hst = p.Hstarm(T) #agora determinando a entalpia do gás perfeito a T [K]>>> sst = p.Sstarm(T,P) #agora determinando a entropia do gás perfeito a T [K] e P [MPa]

-------------------INSTRUÇÕES RÁPIDAS PARA O USUÁRIO:-------------------------Crie uma instância (self) de H_Sgp com o construtor(nome='nome',hfo=0.,so=0.) ou (formula='formula',hfo=0.,so=0.),onde 'nome' ou 'formula' provêem da substância da tabela A1.Você pode escolher para hfo a entalpia de formação do gás perfeitoa To=298.15 K, e para so a entropia absoluta do gás perfeitoa To= 298.15 K e Po = 0.1MPa, ou então hfo = 0 e so = 0 por default.Esta instância corresponderá à substância escolhida.

Utilize então os métodos:* self.Cpom(T): calor específico molar a pressão constante do gás perfeito,* self.Hstarm(T,To=298.15): entalpia molar do gás perfeito,* self.Sstarm(T,P,To=298.15 K, Po=0.1): entropia molar do gás perfeito.

Observe que, em geral, são as diferenças de propriedades do gásperfeito que são relevantes nos problemas. Seja, por exemplo, avariação da entalpia e da entropia (molares) do gás perfeito entre osestados definidos por (T1,P1) e (T2,P2) [K,MPa].

As variações serão dadas por:self.Sstarm(T2,P2) - self.Sstarm(T1,P1)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL86

Page 87: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

self.Hstarm(T2) - self.Hstarm(T2).

----------------------------Divirtam-se---------------------------------------

# ## Unesp - Ilha Solteira - 25/04/2010 ## André Massashi Komatsu e Emanuel Rocha Woiski ## v.0.8 ## #"""****************************************************************************

A1_ASSAEL DETERMINAÇÃO DO CALOR ESPECÍFICO, ENTALPIA E ENTROPIA DO GÁS PERFEITO

**************************************************************************** INSTRUÇÕES PARA O USUÁRIO:Crie uma instância (self) de H_Sgp com o construtor(M,Cp0,Cp1,Cp2,Cp3,hfo=0.,so=0.), escolhendo para hfo a entalpiade formação do gás perfeito a To=298.15 K, e para so a entropiaabsoluta a To= 298.15 K e Po = 0.1MPa (ou então hfo = 0 e so = 0por default).Esta instância corresponderá à substância escolhida.

Utilize então os métodos:* self.Cpom(T): calor específico molar a pressão constante do gás perfeito,* self.Hstarm(T,To=298.15): entalpia molar do gás perfeito,* self.Sstarm(T,P,To=298.15 K, Po=0.1): entropia molar do gás perfeito.

Observe que, em geral, são as diferenças de propriedades do gásperfeito que são relevantes nos problemas. Seja, por exemplo, avariação da entalpia e da entropia (molares) do gás perfeito entre osestados definidos por (T1,P1) e (T2,P2) [K,MPa].

As variações serão dadas por:self.Sstarm(T2,P2) - self.Sstarm(T1,P1)self.Hstarm(T2) – self.Hstarm(T2).

rev 06-01-2010

**************************************************************************** NH3 - VALORES CALCULADOS E TABELADOS (1) T1,P1 = -20+273.15,0.125 [K,MPa] (2) T2,P2 = 160+273.15,1.8 [K,MPa] -------------------------------------------------------------------------------------- CALCULADO TABELADO UNIDADES ERRO RELATIVO LK_WS_NR + TAB. A.2.2 AO VALOR TABELADO proptermo_assael Van Wylen 4a (%) -------------------------------------------------------------------------------------- v1 0.96590404593 0.9627 m3/kg 0.333 v2 0.112416095135 0.1119 m3/kg 0.461 h2-h1 370.272193283 368.6 kJ/kg 0.454 u2-u1 288.661227781 287.5175 kJ/kg 0.398 s2-s1 -0.161305216348 -0.1608 kJ/kgk 0.314 --------------------------------------------------------------------------------------

-------------------------------------------------------------------------------------- H2O - VALORES CALCULADOS E TABELADOS (1) T1,P1 = 50+273.15,0.01 [K,MPa] (2) T2,P2 = 200+273.15,10. [K,MPa] -------------------------------------------------------------------------------------- CALCULADO TABELADO UNIDADES ERRO RELATIVO LK_WS_NR + TAB. A.2.2 AO VALOR TABELADO proptermo_assael Van Wylen 4a (%) -------------------------------------------------------------------------------------- v1 14.8700386541 14.869 m3/kg 0.007 v2 0.00114517466568 0.001148 m3/kg 0.246 h2-h1 -1735.08696825 -1736.63 kJ/kg 0.089 u2-u1 -1597.83832836 -1599.41 kJ/kg 0.098 s2-s1 -5.85442128058 -5.8571 kJ/kgk 0.046 -------------------------------------------------------------------------------------- ********************************************************************

Você já aprendeu, com tudo o que desenvolvemos até agora, que o valor absoluto

das propriedades termodinâmicas das substâncias puras não tem significado a não ser

relativamente a uma base arbitrária. Por outro lado, para que as leis da termodinâmica

tenham consistência física, a diferença das propriedades termodinâmicas entre dois estados

tem que ser independente de qualquer base, ou seja, é invariante. Vamos utilizar este fato

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 87

Page 88: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

em nosso próprio benefício para simplificar consideravelmente a nossa interface

computacional.

Seja uma substância pura tal que assume-se uma entalpia hb e uma entropia sb no

estado b . Podemos expressar, então, a entalpia h (P , T ) e a entropia s( P ,T ) em um

estado qualquer (P ,T ) em relação à base b , da seguinte forma, respectivamente:

h (P , T )=hb+ (h*−h)b−(h*

−h)(P ,T )+ (h*(T )−hb

*(T b)) , (6.25)

s( P ,T )=sb+ (s*−s)b−(s*−s)( P ,T )+ (s*(P , T )−sb*(Pb ,T b)) . (6.26)

Observe que as entalpias e entropias residuais, bem como as propriedades do gás

perfeito são obtidas computacionalmente, considerando-se apenas os estados (P ,T ) e a

base b .

Veja a seguir um exemplo, executando-se o pacote LK_proptermo, com o refrigerante

amônia, considerando-se uma base compatível com as tabelas termodinâmicas do livro do

Van Wylen, para efeito de comparação:

Tb,xb = -40.+273.15,0. T1,P1 = -50.+273.15,1.

T2,P2 = 30. + 273.15, 0.1

base = Base(Tb=Tb,xb=xb) # Usou-se a mesma base para todos os refrigerantes (VW)...

A instância da classe Estado representa o estado real da substância pura <sub> a(T,P) ou (T,x) ou (P,x), fornecidos os valores de base, uma instância da classe Basecujo construtor são os valores para a base:hb,sb,Tb,Pb,xb,gp - entalpia e entropia de base a (Tb,Pb) ou (Tb,xb) ou (Pb,xb) - umadestas combinações deve ser fornecida! Por outro lado, Se os valores de hb ou sbnão forem fornecidos, o seu default será o valor nulo. Se gp for True, como é o casoda base da entalpia de formação e da entropia absoluta para gases, então os desviosda entalpia e da entropia na base serão nulos. O valor default de gp é False.

A instância da classe Estado tem como atributos: base - instância da classe Base, repetida por conveniência; e - estado generalizado a T,P, exposto por conveniência; T - a temperatura em K; P - a pressão em MPa; hmb_gp, smb_gp - entalpia e entropia do gás perfeito nas condições da base; hm_gp, sm_gp - entalpia e entropia do gás perfeito nas condições dadas.

Os valores a seguir dependem da base fornecida: u - a energia interna em kJ/kg; h - a entalpia em kJ/kg; s - a entropia em kJ/kgK; v - o volume específico em m3/kg.

O uso da classe pode ser verificado ao executar-se o módulo, sem importá-lo. *** Emanuel Rocha Woiski - Ilha Solteira - 2010-12-20 *** FUNÇÃO AUXILIAR: Função auxiliar para fatorar o código comum necessário para a avaliaçãodas propriedades reversas. Observe o uso da função gettatr, que estabelecede forma dinâmica, ou seja, no chamado da função auxiliar, a relação entre oatributo da instância de Estado (e.v, e.h, e.s, etc.) e o seu valor. Em outraspalavras, o atributo e o seu valor correspondente só serão estabelecidos quandona chamada da função auxiliar. Se o atributo não existir, uma exceção seráproduzida. Estude os exemplos abaixo com atenção.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL88

Page 89: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

******************************************************************************** EXEMPLOS COM ['ammonia', 'R134a', 'R12', 'R22', 'R152a']: Compare, se houver, com os valores das tabelas VW. Os erros relativos serão em geral menores do que 2%.

Path absoluto da tabela: /home/erwoiski/tabelaA1A3.db******************************************************************************** Exemplo de utilização com 'ammonia': ********************************************************************************

T1: -50.000 ºC, P1: 1.000 MPaT2: 30.000 ºC, P2: 0.100 MPa

e1: T1 P1{'Pr': 0.0881057268722467, 's': 9.6815278040039221, 'u': 6.5164668694964316, 'h': 7.0593361287954544, 'Z': 0.013517881937021161, 'Tr': 0.5503082614056719, 'cf': -3.1464390354608214, 'fase': 'liquido'}

e2: T2 P2{'Pr': 0.00881057268722467, 's': 0.024729382728124139, 'u': 0.018443840064201324, 'h': 0.024915378107937973, 'Z': 0.9913435306721583, 'Tr': 0.7475955610357583, 'cf': -0.0085979661841926961, 'fase': 'vapor'}

e3: liq sat T1{'Pr': 0.0037910358231929547, 'Zl': 0.00058209918866212985, 'sl': 12.823617211779798, 'hv': 0.034125204430928049, 'uv': 0.026613097866165177, 'Tr': 0.5503082614056719, 'sv': 0.048529066426472443, 'ul': 6.5143738193901992, 's': 12.823617211779798, 'u': 6.5143738193901992, 'hl': 7.0643617468033932, 'h': 7.0643617468033932, 'x': 0.0, 'Zv': 0.98634927532148176, 'Z': 0.00058209918866212985, 'fase': 'saturacao'}

Psat: 0.043 MPa da temperatura -50.000 ºC

e4: vap sat P1{'Pr': 0.0881057268722467, 'Zl': 0.011518281138782579, 'sl': 8.3581308081089194, 'hv': 0.31891306378624656, 'uv': 0.23926947126225112, 'Tr': 0.7346227420674097, 'sv': 0.33494087802277411, 'ul': 5.486769699025122, 's': 0.33494087802277406, 'u': 0.23926947126225129, 'hl': 6.2129308498184557, 'h': 0.31891306378624673, 'x': 1.0, 'Zv': 0.89158572425915006, 'Z': 0.89158572425915006, 'fase': 'saturacao'}

Tsat: 24.740 ºC da pressão 1.000 MPa

e5: liq sat P2{'Pr': 0.00881057268722467, 'Zl': 0.0012919199906940388, 'sl': 11.678386936689973, 'hv': 0.062072571390843101, 'uv': 0.048020682105853044, 'Tr': 0.5889744030910845, 'sv': 0.082067552428545437, 'ul': 6.3037943635039397, 's': 11.678386936689973, 'u': 6.3037943635039397, 'hl': 6.8920078587896638, 'h': 6.8920078587896638, 'x': 0.0, 'Zv': 0.97614176573507738, 'Z': 0.0012919199906940388, 'fase': 'saturacao'}

Tsat: -34.321 ºC da pressão 0.100 MPa

e6: vap sat T2{'Pr': 0.10318938871895537, 'Zl': 0.01341363727209648, 'sl': 8.1146775678703982, 'hv': 0.35871605879382323, 'uv': 0.26876359172618186, 'Tr': 0.7475955610357583, 'sv': 0.37058560063872548, 'ul': 5.4105972523950978, 's': 0.37058560063872559, 'u': 0.26876359172618203, 'hl': 6.1481648377488929, 'h': 0.3587160587938234, 'x': 1.0, 'Zv': 0.87967763352819206, 'Z': 0.87967763352819206, 'fase': 'saturacao'}

Psat: 1.171 MPa da temperatura 30.000 ºC

v1: 0.00147 v2: 1.46725 v3: 0.00147 v4: 0.12967 v5: 0.00151 v6: 0.11117 [m3/kg]

h1-h2: -1554.955, h1: -40.403, h2: 1514.552, h3: -41.398, h4: 1445.322, h5: 23.640, h6: 1448.467 kJ/kg

s1-s2: -6.4594, s1: -0.1831, s2: 6.2763, s3: -0.1813, s4: 4.9639, s5: 0.1000, s6: 4.9061 kJ/kgK

Realizado em 21.621 segundos.*********************************************************************************************************

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 89

Page 90: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

7.M7.MISTURASISTURAS H HOMOGÊNEASOMOGÊNEAS DEDE S SUBSTÂNCIASUBSTÂNCIAS P PURASURAS

O gás natural é uma mistura homogênea de substâncias puras. Contém cerca de 50 a

95% de metano, mas também etano, propano, butano e outros hidrocarbonetos mais

pesados. O ar puro é uma mistura de nitrogênio, oxigênio e argônio, também uma mistura

homogênea. Misturas homogêneas de substâncias puras são as misturas cujas

propriedades termodinâmicas são uniformes em toda a mistura. E a mistura de fases? Esta

é heterogênea, pois suas propriedades (exceto a temperatura e a pressão que garantem o

equilíbrio) não são uniformes ao longo de toda a mistura.

Torna-se claro que se quisermos ampliar a nossa capacidade de modelar e resolver

os problemas reais precisamos descobrir alguma maneira de obter as propriedades

termodinâmicas das misturas homogêneas. Mas como?

7.1.O Postulado Estendido dos Estados

Parece um questão de bom-senso científico deduzir que o estado de uma mistura

homogênea, ou seja, suas propriedades termodinâmicas, deve depender de algum modo

das propriedades de seus componentes. Assim, se em uma mistura homogênea binária a T

e P, isto é, com apenas dois componentes A e B, houver muito mais A do que B, as

propriedades tenderão a ficar mais próximas de A e vice-versa.

Estabeleceremos, inicialmente, que para os sistemas compostos de misturas

homogêneas, cujo trabalho mecânico relevante for do tipo PdV, além do trabalho de eixo, o

estado intensivo da mistura será estabelecido por duas propriedades termodinâmicas

intensivas independentes e pela composição da mistura. Esta afirmação é conhecida como

o Postulado Estendido dos Estados e, assim como a sua contrapartida para substâncias

puras, é de fundamental importância para a solução de problemas que envolvem misturas.

Como consequência, sabemos que qualquer propriedade termodinâmica intensiva de

uma mistura homogênea, definida ou a definir, não passa de uma variável dependente, ou

uma função, de P e T da mistura, se estas forem independentes, bem como da composição

da mistura.

7.2.Propriedades Molares Parciais

Seja um sistema fechado que é uma mistura composta de apenas duas substâncias

puras A e B, uma mistura binária. O número de moles de A é nA e de B é nB. As frações

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL90

Page 91: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

molares de A e B na mistura são respectivamente, sendo n=nAnB o número total de

moles da mistura:

y A=nA

n e y B=

nB

n . (7.1)

Evidentemente:

y A y B=1 . (7.2)

Consideremos o volume da mistura. Pelo Postulado Estendido dos Estados sabemos

que o volume total da mistura V será dado por uma função de duas propriedades intensivas

independentes, por exemplo, T,P e dos números de moles de A e de B:

V =V T ,P ,nA , nB (7.3)

e, pela regra da cadeia,

dV =∂V∂T

P , nA , nBdT

∂V∂ P

T , nA , nBdP

∂V∂ nA

T , P , nBdnA

∂V∂ nB

T , P , nAdnB . (7.4)

Se quisermos analisar o comportamento do volume total da mistura somente devido

as alterações do número de moles, enquanto mantendo a temperatura e a pressão

inalteradas:

dV T , P=∂V∂n A

T , P , nBdnA

∂V∂ nB

T , P , nAdnB , (7.5)

Tendo em vista que os coeficientes de dnA e dnB são propriedades intensivas (por

quê?), ou seja, não se alteram com a extensão do sistema, e que as propriedades

extensivas dependem linearmente da massa, podemos integrar a Eq. 7.4, obtendo-se

V =∂V∂ nA

T , P , nBnA

∂V∂ nB

T , P , nAdnB . (7.6)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 91

Page 92: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Definimos, então, V i , o volume parcial molar (ou molar parcial) do componente i na

mistura a T e P como:

V i≡∂V∂ ni

T , P , n j≠ i, ∀ i , (7.7)

e substituímos os volumes parciais molares na Eq. 7.6 :

V =V AT , P , nA , nBnA V BT , P , nA , nBnB , (7.8)

onde fica claro que cada volume parcial molar parece ser uma função da temperatura, da

pressão e do número de moles de cada um dos componentes. Entretanto, sabemos que as

propriedades parciais molares são propriedades intensivas e, portanto, pelo Postulado

Estendido dos Estados dependem de duas propriedades intensivas independentes e da

composição e não diretamente do número de moles dos componentes.

A definição na Eq. 7.7 serve, na verdade, para qualquer propriedade extensiva X,

qualquer que seja o número de componentes da mistura. Assim, para N componentes:

X =∑N

X iT , P , y1, y2 , ... , yn−1ni , x=Xn

=∑N

X i T , P , y1, y2 , ... , yn−1 y i . (7.9)

Você poderá ter percebido de passagem que, a partir de

dX =∑N

X i dni ,

e da Eq. 7.9, podemos concluir que

∑N

ni d X i = 0 , (7.10)

que são conhecidas como as Equações de Gibbs-Duhem.

7.3.Mais do que Uma Questão de Nomenclatura

A nomenclatura pode ser bastante confusa, se não formos bem cuidadosos e

consistentes. Então, X(j), x(j) e x j são respectivamente X total, x específico e x específico

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL92

Page 93: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

molar da mistura no estado j; X i j , x i

j e x i j são respectivamente X total, x específico e x

específico molar do componente puro i no estado j. Finalmente, X i j corresponde a X

parcial molar de i na mistura no estado j. Se você tem dúvidas, experimente substituir X por

uma propriedade extensiva, tal como o volume... De qualquer maneira você não deve

prosseguir sem que tenha o completo domínio dessa nomenclatura.

Reiteramos aqui também a notação para caracterizar o estado. Assim, n A1 indica o

número de moles do componente A no estado 1. Lembre-se: subscrito - componente;

sobrescrito - estado. O que será então V 2 ? Isso mesmo, volume total da mistura no

estado 2... Note que com essas convenções no presente texto você nunca encontrará X ,

assim sem subscrito, pois isto não tem significado algum.

7.4.As Misturas Homogêneas Binárias e Multicomponentes

Pois bem, seja o sistema fechado que é a mistura binária de nA(1) moles do

componente A e nB(1) moles do componente B.

Como já sabemos, podemos escrever: V B 1 , V A

1 , U A 1 , H B

1 ,S B1 e assim por diante,

pois cada propriedade extensiva tem as suas correspondentes molares parciais para cada

componente da mistura respectivamente.

Pela própria definição, as propriedades molares parciais se combinam da mesma

forma que as propriedades extensivas da mistura. Assim, de H = U + PV obtemos

H i= U iP V i e de G=H – TS , obtemos Gi= H i−T S i para cada componente i da

mistura (consegue demonstrar?).

Por outro lado, seja a diferença de X, denominada excesso de X, dada por

ΔX =X − X AX B= X A nA X B nB−x An Ax B nB (7.11)

ou

ΔX = X A−x AnA X B−xBnB . (7.12)

Lembre-se que X pode ser qualquer propriedade extensiva. Vamos então utilizar o

volume V. A Eq. 7.12 afirma que quando eu misturo nA moles da substância pura A à

temperatura T e pressão P e ocupando o volume VA, com nB moles de B à temperatura T e

pressão P e ocupando o volume VB, então o volume final da mistura V a T e P será maior ou

menor do que VA + VB pela quantidade dada pela Eq. 7.12. Em outras palavras, para que o

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 93

Page 94: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

sistema a T e P conserve volume ao misturar A e B, ambos a T e P, cada um dos V i tem que

ser igual a v i , isto para todo i.

Voltemos ao volume de uma mistura homogênea qualquer a dois componentes.

Sabemos, que v=v T , P , y A . Você saberia dizer por que yB não aparece nesta relação

funcional? Da Eq. 7.9 escrevemos

v=V A y A V B y B= V A y A V B1− y A= V A−V B y AV B= V B−V A1− y AV A .

(7.13)

Derivando em relação a yA, enquanto mantemos T,P constantes:

d vdy A

= V A−V B (7.14)

e, então,

v=d vdyA

yAV B=−d vdy A

1− y AV A . (7.15)

Estas duas equações representam uma mesma reta tendo por inclinação o valor da

derivada de v em yA e cuja interseção em yA = 0 é V B e em yA = 1 corresponde a V A .

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL

yA0 1

v

),( PTvB

),( PTvA

),,( AyPTv

),,( AB yPTV

),,( AA yPTVT,P

B puro

A puro

yB 01

Fig.7.1 – Variação do volume específico com a fração molar de A na mistura binária

94

Page 95: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Veja esses resultados sumarizados no diagrama da Fig 7.1, que nos mostra a

variação de v com yA, mantendo-se T e P constantes. Aproveite a oportunidade e fixe a

nomenclatura utilizada.

Utilizamos uma mistura binária porque seu estado é definido por apenas três

propriedades independentes (por quê?). Se fixarmos T,P então resta apenas uma variável

independente (qual?) e a produção do gráfico no plano torna-se possível. Entretanto, todas

as definições e relações anteriores se aplicam, com alterações óbvias, a misturas

multicomponentes, mas as curvas se tornam hiper-superfícies.

7.5.As Soluções Ideais

As misturas homogêneas multicomponentes especiais que conservam o volume, ou

seja, nas quais o excesso de volume ΔV =0 , são denominadas soluções ideais.

Observando a Fig. 7.1, o que você pode dizer a respeito da mistura nestas condições

de T,P: Trata-se de uma solução ideal? O excesso de volume é positivo ou negativo em

relação a A e B puros? Em sua opinião, qual é a curvatura de uma solução ideal?

Pode-se demonstrar que se a solução for ideal, isto é, se V=0 :

H= U=0 (7.16)

e, portanto, para cada componente i da mistura a T,P, para todo i:

H i=h iT , P e U i=u iT , P . (7.17)

As relações da Eq. 7.17 são extremamente importantes por causa de suas

implicações, como veremos em detalhes. Então, para uma solução ideal a T e P, podemos

substituir o volume, a entalpia e a energia interna parcial molar de cada componente i da

mistura pelo correspondente volume, entalpia (e energia interna) específicos molares do

mesmo componente puro i, calculados a T e P.

Uma vez que nós já sabemos como determinar as propriedades de substâncias

puras, pelo menos o problema das misturas que se comportam como soluções ideais

parece-nos completamente resolvido...

Sabemos como ficam o volume, a energia interna e a entalpia de uma solução ideal.

Entretanto, como fica a entropia? Pode-se também demonstrar que, para uma solução ideal

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 95

Page 96: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

S=−R∑N

n i ln yi , (7.18)

ou seja, mesmo para soluções ideais, o excesso de entropia ΔS não é nulo! A entropia

parcial molar se torna então, para cada componente i

S i=siT , P −R ln y i . (7.19)

7.6.Retomando o Exemplo

Lembra-se do exemplo clássico da mistura de um gás A originalmente no estado 1

com o gás B originalmente no estado 2 através de uma expansão não resistida,

esuqematizado novamente na Fig.7.2? Vamos agora assumir que no recipiente rígido e

adiabático, estão inicialmente nA moles de A à temperatura TA(1) e pressão PA

(1), separados por

uma membrana também rígida e adiabática de nB moles de B à temperatura TB(1) e pressão

PB(1).

Em um dado momento, rompe-se a membrana e permite-se que a pressão e a

temperatura se equalizem nos valores de T(2) e P(2). O sistema é composto inicialmente de

dois subsistemas: o subsistema gás A e o subsistema gás B. Não há trabalho, nem calor,

portanto o sistema está isolado.

Da mesma forma que antes, por causa da Primeira Lei,

U 1−U 2

=0 . (7.20)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL

Fig.7.2 – Exemplo de expansão não-resistida

A B A + B

1. Antes de romper-se a membrana 2. após o rompimento

96

Page 97: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

A Segunda Lei será:

S 2−S 1

= S 2 gen1 ≥0 . (7.21)

Estando os fluidos A e B separados no estado 1:

U 1=n Au A

1 T A , PA nB uB

1T B ,P B , (7.22)

e tornando-se uma mistura homogênea de A e B no estado 2:

U 2 T 2 , P2 , nA , nB= U A

2T 2 , P 2 , y A

2 nA U B

2T 2 , P 2 , y A

2 nB . (7.23)

Observe que conhecemos tudo do estado 1, pois as propriedades TA(1), PA

(1), TB(1), PB

(1),

nA e nB estão definidas para cada um dos subsistemas. Entretanto, não sabemos de maneira

geral como determinar as propriedades parciais molares. Para avançar na solução,

precisamos de um modelo para a mistura do estado 2. Vamos então admitir que ela se

comporta como uma solução ideal. Dessa forma,

n Au A1T A

1 , P A1nB u B

1T B

1 , P B1=nAuA

2 T 2 , P2

nB uB2

T 2 , P 2 .(7.24)

Por causa da necessária independência das bases, todos os problemas podem e

devem ser equacionados como diferenças de propriedades termodinâmicas. Neste caso,

n A[uA1

T A1 , P A

1 −uA

2 T 2 , P2

]nB[uB1

T B1 , PB

1−uB

2T 2 , P 2

]=0 (7.25)

na forma de diferenças de energia interna de substâncias puras. Observe que nós estamos

com apenas uma equação e duas incógnitas (T(2),P(2)). Precisamos de mais uma equação.

Esta surgirá da hipótese que o recipiente é rígido e, portanto

V(1) – V(2) = 0. (7.26)

No estado 1 as substâncias puras A e B estão separadas:

V 1=V A

1V B

1=nAv A

1T A

1 , P A1nB vB

1T B

1 , PB1

, (7.27)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 97

Page 98: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

ao passo que no estado 2 é uma mistura homogênea:

V 2T 2 , P 2 , nA , nB=V A

2T 2 , P 2 , y A

2 nA V B

2 T 2 , P2 , y A

2nB . (7.28)

Por hipótese, trata-se de uma solução ideal em 2, portanto:

V 1=n AvA

1T A

1 , P A1

nB v B1

T B1 , PB

1=nA v A

2 T 2 , P 2

nB vB2

T 2 , P2

(7.29)

que nos fornece a segunda equação nas mesmas incógnitas (T(2),P(2)) e, portanto, o sistema

formado pelas Eqs. 7.25 e 7.29 poderia em princípio ser considerado resolvido.

Vamos então proceder a uma solução computacional mais detalhada. Primeiro,

expandimos as diferenças das energias internas da Eq. 7.25 em termos de funções de

coordenadas generalizadas, da forma :

[u*−uA

2T rA

2 , P rA2 ,A , Y A−u

*−u A

1 T rA

1 ,P rA1 ,A ,Y A ] nA

[uA* 1

T 1−u A

*2T A

2 ] nA

[u*−uB

2T rB

2 , P rB2 ,B , Y B−u

*−u B

1T rB

1 , P rB1 ,B ,Y B ] nB

[uB* 1

T 1−uB

*2T B

2 ] nB = 0

. (7.30)

Em seguida, expandimos a Eq. 7.29, com cada um dos volumes sendo expresso em

fatores de compressibilidade Z como funções de coordenadas generalizadas:

[Z A1T rA

1 , P rA1 ,A , Y A

T A1

P A1

−Z A2

T rA2 ,P rA

2 ,A ,Y AT 2

P 2 ]nA

[Z B1T rB

1 , P rB1 ,B , Y B

T B1

PB1 −Z B

2T rB

2 , P rB2 ,B , Y B

T 2

P 2 ]nB=0

(7.31)

nas quais, são conhecidos:

T rA1 =

T A1

T CA

, T rB1 =

T B1

T CB

, P rA1=

P A1

PCA

, P rB1=

P B1

PCB

, (7.32)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL98

Page 99: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

e a serem determinados:

T rA2=

T 2

T CB

, T rB2=

T 2

T CB

, P rA2 =

P2

PCA

, P rB2 =

P2

PCB

. (7.33)

Para que o sistema de seis equações 7.30, 7.31 e 7.33 associado às Eqs. 7.32 seja

resolvido, precisamos fornecer os valores de MA, TCA, PCA, ωA, YA, MB, TCB, PCB, ωB, YB, e uma

expressão para os calores específicos CV0AT e CV0BT (ou C P0AT e C P0BT ).

A estas alturas você já deve ter percebido a importância de uma boa e consistente

notação para as diversas grandezas envolvidas em um problema. De fato, acreditamos que,

além do estabelecimento dos sistemas e das hipóteses adequadas, uma outra grande fonte

de confusão que o estudante encontra para a resolução de problemas está na notação

utilizada.

Bem, não se deixe enganar pela aparente complexidade das equações anteriores. A

forma funcional, ou seja, a separação clara das variáveis dependentes como funções das

variáveis independentes, nos revela tudo que precisamos. Desse modo as funções devem

ser consideradas como conhecidas, mesmo que estejam representadas numericamente em

um programa de computador, tal que os seus valores serão determinados no momento em

que forem atribuídos valores aos seus argumentos. As incógnitas T rA 2 , T rB

2 , PrA2 e P rB

2

serão resolvidas assim que tivermos valores para T(2),P(2) ao passo que os termos em T A1 ,

T rA1 , T B

1 , T rB1 , P A

1 ,, P rA1 , PB

1 e P rB1 já são determinados pelos dados do problema e

pelas Eqs. 7.32.

Por outro lado, exceto pela hipótese que a mistura de A e B deve se comportar como

solução ideal no estado 2, observe que nada mais foi particularizado a respeito de A e de B

e, mesmo assim, pudemos estruturar a solução completa do nosso exemplo, graças ao

poder da formulação em coordenadas generalizadas. Observe também que na nossas

expansões de u e Z utilizamos os fatores acêntricos de Pitzer ωA e ωB e os fatores de Wu-

Stiel YA e YB para que sejamos capazes de produzir resultados realmente compatíveis com

os dados experimentais, para um grande número de substâncias puras.

Que tal a aplicação da Segunda Lei? Podemos escrever, para as substâncias puras A

e B separadas no estado 1:

S 1 =nA s A

1 T A

1 ,P A1 nBsB

1T B

1 , PB1

, (7.34)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 99

Page 100: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

e para uma solução ideal no estado 2:

S 2=nA S AnB S B=nA [s A2T 2 , P 2−R ln y A

2 ]nB [s B2T 2 , P 2−R ln yB

2 ] .(7.35)

Substituindo-se nas Eqs. 7.34 e 7.35 pelas expressões das entropias, torna-se

n A [s A2

T 2 ,P 2−s A

1T A

1 , P A1

−R ln y A2 ]

nB [s B2

T 2 ,P 2−sB

1T B

1 , PB1

−R ln yB2 ] = S 2gen1

(7.36)

Expandindo as diferenças de entropia na Eq. 7.36 em coordenadas reduzidas,

obtemos:

[s*−s A

1T rA

1 , P rA1 ,A ,Y A−s

*−sA

2 T rA

2 , P rA2 ,A , Y A ] nA

[s A*2

T 2 , P2−s A

*1T A

1 , P A1

−R ln y A2 ] nA

[s*−s B

1T rB

1 , P rB1 ,B ,Y B−s

*−sB

2T rB

2 , P rB2 ,B , Y B ] nB

[sB*2

T 2 , P2−s B

*1T B

1 , PB1

−R ln y B2 ] nB = S 2 gen1

, (7.37)

onde

y A2 =

nA

nAnB e yB

2 =

nB

nAnB ou y A

2 yB

2 =1 . (7.38)

A obtenção de S 2 gen1 , através da solução da Eq. 7.37, associada às Eqs. 7.38,

agora é imediata, pois já conhecemos T(2),P(2). Note que uma vez que conhecemos tudo

sobre os estados 1 e 2, temos condições de responder a muitos outros questionamentos em

torno do problema original. Por exemplo, qual seria a variação da exergia e valor do

trabalho reversível entre os estados 1 e 2?

Lembramos que não fizemos nenhuma hipótese a respeito de A e B, a não ser que

são substâncias puras e que no estado 2 que formam uma solução ideal. O que aconteceria

se A e B estivessem na região de gás perfeito e formassem uma mistura de gases perfeitos

no estado 2?

7.7.As Misturas de Gases Perfeitos

Você se lembra das peculiaridades da região do gás perfeito? A equação de estado

se torna muito simples, pois Z = 1. Seja a mistura (gás perfeito) a T e P de nA moles de A

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL100

Page 101: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

(gás perfeito) originalmente a T e P, com nB moles de B (gás perfeito) originalmente também

a T e P . Então,

PV=nAnB RT e Pv=R T , para a mistura, (7.39)

PV A=nAR T e P v A=R T , para A , e (7.40)

PV B=nBR T e P vB=R T , para B. (7.41)

Destas expressões, concluímos que, para a mistura,

V = V AV B = nAV AnB

V B = nA v AnBvB = v nAnB , (7.42)

ou seja, a mistura de gases perfeitos conserva volume, no sentido que definimos

anteriormente e portanto, é uma solução ideal. Na verdade é um caso particular de solução

ideal, pois

V A = V B = v A = v B = v . (7.43)

Se você retornar à figura 7.1, você consegue dizer qual seria a curva para v no caso

de misturas de gases perfeitos?

A propósito, os volumes VA e VB são chamados de volumes parciais e a conservação

do volume da mistura, Eq. 7.42, é conhecida como Lei de Amagat.

Se mantivéssemos o valor do volume V, à mesma temperatura T, tanto para a mistura

quanto para os componentes A e B, teríamos um outro conjunto de equações:

PV =n AnB R T , para a mistura, (7.44)

P AV =n AR T , para A e (7.45)

P BV =nBR T , para B. (7.46)

Concluímos, então, que, para a mistura,

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 101

Page 102: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

P=P AP B (7.47)

onde PA e PB são as pressões parciais que A e B respectivamente exercem na mistura. A Eq.

7.47 é conhecida como Lei de Dalton.

Você pode demonstrar também, que

y A = P A

P =

V A

V , para A e (7.48)

yB = P B

P =

V B

V , para B, (7.49)

e, portanto, e apenas para a mistura de gases perfeitos, a composição molar se confunde

com a composição volumétrica, um resultado frequentemente utilizado sem muitas

explicações.

7.8.Revisitando o Exemplo Usando Mistura de Gases Perfeitos

Se uma mistura de gases perfeitos é uma solução ideal, para resolver o nosso ubíquo

exemplo da Seção 7.1 só precisamos especializar as nossas equações finais para o caso de

gases perfeitos. Vejamos, então, como fica a Eq. 7.30, após eliminarmos os desvios de

energia interna apenas no estado 2:

[u*−uA

2T rA

2 , P rA2 ,A , Y A ] nA

[uA* 1

T 1−u A

*2T A

2 ] nA

[u*−uB

2T rB

2 , P rB2 ,B , Y B ] nB

[uB* 1

T 1−uB

*2T B

2 ] nB = 0

(7.50)

e nesta equação só nos resta uma incógnita T(2)! A Eq. 7.31 tornar-se-á, após fazermos todos

os fatores de compressibilidade Z = 1:

[Z A1T rA

1 , P rA1 ,A , Y A

T A1

P A1

−T 2

P 2 ]nA

[Z B1T rB

1 , P rB1 ,B , Y B

T B1

PB1 −

T 2

P 2 ]nB=0

, (7.51)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL102

Page 103: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

resolvendo, assim, para a última incógnita P(2). E a entropia? Basta eliminar os termos com

desvios de entropia no estado 2:

[s*−s A

1T rA

1 , P rA1 ,A ,Y A] n A

[s A*2

T 2 , P2−s A

*1T A

1 , P A1

−R ln y A2 ] nA

[s*−s B

1T rB

1 , P rB1 ,B ,Y B ] nB

[sB*2

T 2 , P2−s B

*1T B

1 , PB1

−R ln y B2 ] nB = S 2 gen1

. (7.52)

Pela simplicidade das equações quando se utiliza a hipótese de mistura de gases

perfeitos, não é de se admirar que as pessoas a prefiram a qualquer outra, sempre que

possível e, às vezes, até indevidamente. Mas quando é que sabemos quando é possível? A

hipótese de solução ideal fornece, como vimos, uma base sólida e muito mais geral, de onde

se pode concluir sobre qual parte do problema podem-se aplicar gases perfeitos, pois, como

já aprendemos, cada um dos desvios de entalpia, energia interna e entropia, se torna

desprezível ou nulo em condições locais de gás perfeito.

Por outro lado, a simplificação utilizando-se gases perfeitos pode, muitas vezes, ser

empregada na obtenção de dados iniciais que alimentem um processo iterativo na busca

pela solução de sistemas de equações.

Finalmente, embora tenhamos nos servido de uma mistura binária como exemplo, as

relações permanecem as mesmas - ou a sua alteração é trivial - se a mistura for

multicomponente (demonstre).

Está tudo certo se pudermos formular a hipótese de solução ideal ou, melhor ainda,

de mistura de gases perfeitos. Mas será que não poderíamos resolver os problemas sem

essas asserções? Como veremos, este será o papel extremamente importante exercido

pelos modelos pseudo-críticos.

7.9.As Pseudo-Substâncias Puras e os Modelos Pseudo-Críticos

Que tal se pudéssemos assumir que uma mistura homogênea se comporta como uma

substância pura? Poderíamos então resolver os estados da mistura como se fosse

substância pura, ou seja, uma pseudo-substância pura, por meio do desenvolvimento e

utilização de tabelas, como fazemos com o ar - um gás perfeito, ou até mesmo por meio da

expansão em coordenadas generalizadas. Para este último caso, teríamos um obstáculo:

qual o (PCm,TCm,ωm,Ym,Mm) deveríamos empregar na expansão? Ora, parece-nos adequado

considerarmos (por quê?) um tipo de média que deve depender da composição da mistura,

da mesma forma que a massa molecular da mistura:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 103

Page 104: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

M m=∑N

y i M i . (7.53)

Uma primeira tentativa óbvia de um modelo pseudo-crítico foi fundamentada na média

ponderada das frações molares, da mesma forma que a massa molecular na Eq. 7.53:

T Cm=∑N

y iT Ci PCm=∑N

yi PCi , (7.54)

denominada Regra de Kay. Acontece que essas aproximações simples fornecem resultados

razoáveis apenas quando os T Ci e os PCi não diferem muito entre si.

Um modelo pseudo-crítico mais sofisticado foi desenvolvido baseado na equação de

Lee-Kesler, com a modificação de Wu-Stiel, levando-se em conta o efeito das interações

entre os pares distintos de moléculas. A formulação completa para um número qualquer de

componentes na mistura homogênea é dada por:

vCm=∑j∑

k

y j yk v cjk , (7.55)

vCm T Cm=∑j∑

k

y j yk v cjk T cjk , (7.56)

vcjk=18vCj

1/3vCk

1 /3

3, (7.57)

T cjk=T Cj T Ck 1/2 , (7.58)

m=∑j

y j j , (7.59)

Y m=∑j

y j Y j , (7.60)

ZCm = 0,2905−0,085m (7.61)

e, finalmente

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL104

Page 105: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

PCm=ZCm

R T Cm

vCm

, (7.62)

onde o subscrito m denota os valores para a mistura como uma pseudo-substância pura e o

subscrito j ou k representa o componente j ou k.

Os modelos pseudo-críticos oferecem resultados muito mais consistentes com os

dados experimentais. Observe que precisaremos avaliar os novos parâmetros pseudo-

críticos da mistura cada vez que a composição desta for alterada, mantenham-se ou não os

mesmos componentes.

Como empregar os modelos de pseudo-substância pura? Como regra geral,

inicialmente assumimos que a mistura é de gases perfeitos e, em seguida, acrescentamos

os termos de correção para a mistura como se fosse uma substância pura com TCm, Pcm, ωm e

Ym calculados a partir das equações do modelo pseudo-crítico escolhido, como por exemplo

o modelo representado pelas Eqs. 7.55 a 7.62.

7.10.O Nosso Exemplo Usando Pseudo-Substância Pura

Deve ser óbvio que nada deve ser alterado no raciocínio anteriormente desenvolvido

no exemplo da Seção 7.1 para se obter o sistema dado pelas Eqs. 7.20, 7.21 e 7.26.

De fato, na maior parte das vezes, devemos ser capazes de dividir a solução do

problema em três partes: primeiro, em uma formulação literal fundamentada nas Leis da

Termodinâmica, em algumas hipóteses razoáveis sobre o processo e sobre as restrições na

fronteira e as restrições internas ao sistema; segundo, na utilização das hipóteses que

balizarão o comportamento das substâncias puras ou das misturas envolvidas no sistema; e

terceiro, na formulação da solução do sistema de equações resultante.

As equações de energia interna deverão ser desenvolvidas de forma diferente:

[−u*−u A

1T rA

1 , P rA1 ,A ,Y A ] nA

[uA* 1

T A1−u A

*2T 2

] nA

[−u*−u B

1T rB

1 , P rB1 ,B ,Y B ] nB

[uB* 1

T B1−uB

*2T 2

] nB

[u*−um

2T rm

2 , P rm2 ,m ,Y m ]nAnB = 0

, (7.63)

onde

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 105

Page 106: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

T rm 2=

TT Cm

e P rm2 =

PPCm

. (7.64)

Em comparação com o desenvolvimento da Eq. 7.30, percebemos que os desvios de

energia interna no estado 1 ainda permanecem na Eq. 7.63. Tratamos, então, a mistura em

2 como se fosse uma mistura de gases perfeitos e aí incluímos um termo de correção para a

mistura, como se fosse uma substância pura com parâmetros TCm, PCm e ωm , cujos valores

são determnados por meio de um modelo pseudo-crítico, como por exemplo, o pseudo-

crítico de Lee-Kesler, Eqs. 7.55 a 7.62. Este é, de fato, o padrão geral para a aplicação do

modelo de pseudo-substâncias puras.

A equação dos volumes Eq. 7.31 se tornará:

[Z A1T rA

1 , P rA1 , A , Y A

T A1

P A1 ]nA

[Z B1T rB

1 , P rB1 ,B , Y B

T B1

PB1 ]nB−

[Z m2

T rm2 , P rm

2 ,m ,Y mT 2

P 2 ]nAnB=0

. (7.65)

Note na Eq. 7.65 que o último termo corresponde ao volume específico molar da

mistura em 2 tratada como se fosse uma pseudo-substância pura.

A segunda lei, Eq. 7.37, ficará, por sua vez, da seguinte forma:

[s*−s A

1T rA

1 , P rA1 ,A ,Y A] n A

[s A*2

T 2 , P2−s A

*1T A

1 , P A1

−R ln y A2 ] nA

[s*−s B1T rB

1 , P rB1 ,B ,Y B ] nB

[sB*2

T 2 , P2−s B

*1T B

1 , P A1

−R ln y B2 ] nB

[−s*−s m

2T rm

2 , P rm2 ,m , Y m ]nAnB = S 2 gen1

. (7.66)

Observe que nas Eqs. 7.63 e 7.66 despareceram respectivamente a energias interna

e entropia residuais no estado 2, tendo sido substituídas pelos desvios da energia interna e

da entropia da mistura considerada como uma pseudo-substância pura. Todos os demais

termos referentes aos desvios no estado 1 e a gases perfeitos, tanto em 1 como em 2,

permaneceram os mesmos.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL106

Page 107: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Existem duas vantagens nessa formulação: a primeira é que em momento algum

utilizamos a hipótese de solução ideal; e a segunda é que reduzimos o número de termos

referentes aos desvios da mistura no estado 2 efetivamente a apenas um único termo (os

termos em m como subscrito). Imaginemos essa última vantagem para o modelo pseudo-

crítico, se a mistura do problema tivesse mais de dois componentes...

Salientamos, finalmente, que este modelamento é tão bom quanto a qualidade

preditiva do modelo pseudo-crítico que utilizarmos em nossas misturas homogêneas. Na

prática acadêmica e industrial, os modelos são frequentemente ajustados a resultados

experimentais e, não raro, empregados para a predição dos estados de misturas

multicomponentes em equilíbrio de fases. Nós estudaremos o equilíbrio de fases nesta obra,

mas não com essa profundidade.

7.11.Exemplo Numérico

Repetimos aqui o nosso problema da Fig. 7.2. São dados, em um recipiente rígido e

adiabático, separados por uma membrana rígida e adiabática:

Substância A no Estado 1: 8 kmol de CH4 a 500K e 2 MPa;

Substância B no Estado 1: 4 kmol de C2H6 a 800 K e 3 MPa.

Retira-se a membrana, de forma que os gases se misturam, alcançando um estado de

equilíbrio. Determine a temperatura, a pressão deste estado, bem como a entropia

produzida irreversivelmente no processo, admitindo:

A) gases reais e solução ideal;

B) gases perfeitos e mistura de gases perfeitos;

C) gases reais e modelo pseudo-crítico de Lee-Kesler e Wu-Stiel.

Você não deve sequer pensar em chegar perto do computador enquanto não

estabelecer o sistema de equações na forma funcional e as respectivas incógnitas que

resolvem o problema.

Em nosso caso, as soluções já estão explicitadas nas Eqs 7.30, 7.31 e 7.37, para o

item A; Eqs. 7.50, 7.51 e 7.52 para o item B; Eqs. 7.63, 7.65 e 7.66, para o item C, levando-

se em conta que se calcularam previamente as propriedades pseudo-críticas através do

modelo pseudo-crítico de Lee-Kesler-Wu-Stiel, representado pelas Eqs. 7.55 a 7.62.

Pode-se também resover o problema proposto conhecendo-se alguma base e as

propriedades do gás perfeito para cada uma das substâncias puras, e,no caso de pseudo-

substância pura, as propriedades pseudo-crticas.

Estude aqui então os programas-fonte correspondentes a essas formulações, bem

como os resultados, que foram consolidados na Tab. X.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 107

Page 108: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Programa: # termo2_problema_7_11.pyimport a1_assael as a1

from robustNR_args import robustNewton as rN

met = a1.H_Sgp('methane')

eth = a1.H_Sgp('ethane')

nmet,TA1,PA1 = 8.,500.,2.

neth,TB1,PB1 = 4.,800.,3.

ymet = nmet/(nmet + neth)

yeth = 1 - ymet

eA1 = lkw.H_S(Tr=TA1/met.Tc,Pr=PA1/met.Pc,w=met.w,Y=met.Y)

eB1 = lkw.H_S(Tr=TB1/eth.Tc,Pr=PB1/eth.Pc,w=eth.w,Y=eth.Y)

def residual(TP,args):

T2,P2 = TP

emet2 = lkw.H_S(Tr=T2/met.Tc,Pr=P2/met.Pc,w=met.w,Y=met.Y)

eeth2 = lkw.H_S(Tr=T2/eth.Tc,Pr=P2/eth.Pc,w=eth.w,Y=eth.Y)

res = np.array((

((-eA1.prop['u'] + emet2.prop['u'])*nmet*met.Ru*met.Tc +

(-eB1.prop['u'] + eeth2.prop['u'])*neth*met.Ru*eth.Tc +

(met.Hstarm(TA1) - met.Hstarm(T2) - met.Ru*(TA1 - T2))*nmet +

(eth.Hstarm(TB1) - eth.Hstarm(T2) - eth.Ru*(TB1 - T2))*neth),

((eA1.prop['Z']*TA1/PA1 - emet2.prop['Z']*T2/P2)*nmet +

(eB1.prop['Z']*TB1/PB1 - eeth2.prop['Z']*T2/P2)*neth)

))

return res

print '************SOLUÇÃO IDEAL****************'

print eA1.prop

print eB1.prop

print

TP,ite,res = rN(residual,(500.,3.))

print TP,ite,res

print

T2,P2 = TP

print 'T2:',T2,'K ,','P2:',P2,'Mpa'

print

emet2 = lkw.H_S(Tr=T2/met.Tc,Pr=P2/met.Pc,w=met.w,Y=met.Y)

eeth2 = lkw.H_S(Tr=T2/eth.Tc,Pr=P2/eth.Pc,w=eth.w,Y=eth.Y)

Sgen12 = ((eA1.prop['s'] - emet2.prop['s'])*nmet*met.Ru -

nmet*met.Ru*np.log(ymet) +

(eB1.prop['s'] - eeth2.prop['s'])*neth*met.Ru -

neth*eth.Ru*np.log(yeth) +

(met.Sstarm(T2,P2) - met.Sstarm(TA1,PA1))*nmet +

(eth.Sstarm(T2,P2) - eth.Sstarm(TB1,PB1))*neth)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL108

Page 109: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

print 'Sgen12:',Sgen12, 'kJ/K'

#*********************************************************

def residual_gp(TP,args):

T2,P2 = TP

res = np.array((

((-eA1.prop['u'] )*nmet*met.Ru*met.Tc +

(-eB1.prop['u'] )*neth*met.Ru*eth.Tc +

(met.Hstarm(TA1) - met.Hstarm(T2) - met.Ru*(TA1 - T2))*nmet +

(eth.Hstarm(TB1) - eth.Hstarm(T2) - eth.Ru*(TB1 - T2))*neth),

((eA1.prop['Z']*TA1/PA1 - T2/P2)*nmet +

(eB1.prop['Z']*TB1/PB1 - T2/P2)*neth)

))

return res

TP,ite,res = rN(residual_gp,(500.,3.))

print

print '*********MISTURA DE GASES PERFEITOS EM 2***********'

print TP,ite,res

print

T2,P2 = TP

print 'T2:',T2,'K ,','P2:',P2,'Mpa'

print

emet2 = lkw.H_S(Tr=T2/met.Tc,Pr=P2/met.Pc,w=met.w,Y=met.Y)

eeth2 = lkw.H_S(Tr=T2/eth.Tc,Pr=P2/eth.Pc,w=eth.w,Y=eth.Y)

Sgen12_gp = ((eA1.prop['s'] )*nmet*met.Ru -

nmet*met.Ru*np.log(ymet) +

(eB1.prop['s'] )*neth*met.Ru -

neth*eth.Ru*np.log(yeth) +

(met.Sstarm(T2,P2) - met.Sstarm(TA1,PA1))*nmet +

(eth.Sstarm(T2,P2) - eth.Sstarm(TB1,PB1))*neth)

print 'Sgen12_gp:',Sgen12_gp, 'kJ/K'

#***********************************************************

Tcm,Pcm,wm,Ym = Lmv.props_pcrit((ymet,yeth),

(met.Tc,eth.Tc),

(met.Pc,eth.Pc),

(met.w,eth.w),

(met.Y,eth.Y))

print

print '*********PSEUDO-SUBSTÂNCIA PURA***************'

print met.Tc,eth.Tc

print met.Pc,eth.Pc

print met.w,eth.w

print Tcm,Pcm,wm,Ym

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 109

Page 110: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

def residual_ps(TP,args):

T2,P2 = TP

e2 = lkw.H_S(Tr=T2/Tcm,Pr=P2/Pcm,w=wm,Y=Ym)

## print e2.prop

res = np.array((

((-eA1.prop['u'] )*nmet*met.Ru*met.Tc +

(-eB1.prop['u'] )*neth*met.Ru*eth.Tc +

e2.prop['u']*(nmet+neth)*met.Ru*Tcm +

(met.Hstarm(TA1) - met.Hstarm(T2) - met.Ru*(TA1 - T2))*nmet +

(eth.Hstarm(TB1) - eth.Hstarm(T2) - eth.Ru*(TB1 - T2))*neth),

((eA1.prop['Z']*TA1/PA1 - e2.prop['Z']*T2/P2)*nmet +

(eB1.prop['Z']*TB1/PB1 - e2.prop['Z']*T2/P2)*neth)

))

return res

TP,ite,res = rN(residual_ps,(500.,3.))

print TP,ite,res

print

T2,P2 = TP

print 'T2:',T2,'K ,','P2:',P2,'Mpa'

print

e2 = lkw.H_S(Tr=T2/Tcm,Pr=P2/Pcm,w=wm,Y=Ym)

Sgen12_ps = ((eA1.prop['s'] )*nmet*met.Ru -

nmet*met.Ru*np.log(ymet) +

(eB1.prop['s'] )*neth*met.Ru -

neth*eth.Ru*np.log(yeth) -

e2.prop['s']*(nmet+neth)*met.Ru +

(met.Sstarm(T2,P2) - met.Sstarm(TA1,PA1))*nmet +

(eth.Sstarm(T2,P2) - eth.Sstarm(TB1,PB1))*neth)

print 'Sgen12_ps:',Sgen12_ps, 'kJ/K'

Resultados:Python 2.6.5 (r265:79063, Apr 16 2010, 13:57:41)

[GCC 4.4.3] on linux2

Type "copyright", "credits" or "license()" for more information.

****************************************************************

Personal firewall software may warn about the connection IDLE

makes to its subprocess using this computer's internal loopback

interface. This connection is not visible on any external

interface and no data is sent to or received from the Internet.

****************************************************************

IDLE 2.6.5

>>> ================================ RESTART ================================

>>>

************SOLUÇÃO IDEAL****************

{'Pr': 0.43487714720591431, 's': 0.024946554915488802, 'u': 0.066105313236450025, 'h': 0.067170789657535299, 'Z':

0.9995939469359244, 'Tr': 2.6239832065074782, 'cf': -0.00065223302299790425, 'fase': 'gas comprimido'}

{'Pr': 0.6158899609936358, 's': 0.036145477940403625, 'u': 0.095896105718873262, 'h': 0.087676281353621349, 'Z':

1.003137198716803, 'Tr': 2.6201159401303511, 'cf': 0.0026827292082771161, 'fase': 'gas comprimido'}

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL110

Page 111: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

[ 656.37389235 2.5705314 ] 5 [ 0.00000000e+00 2.78532752e-11]

T2: 656.373892346 K , P2: 2.57053140078 MPa

Sgen12: 82.7875545612 kJ/K

*********MISTURA DE GASES PERFEITOS EM 2***********

[ 653.79636368 2.55622118] 5 [ 1.45519152e-11 0.00000000e+00]

T2: 653.796363678 K , P2: 2.55622118096 MPa

Sgen12_gp: 82.9149855508 kJ/K

*********PSEUDO-SUBSTÂNCIA PURA***************

190.55 305.33

4.599 4.871

0.011 0.099

230.795657656 4.79668493565 0.0403333333333 0.0

[ 656.14177245 2.57242206] 9 [ -5.82076609e-11 1.15960574e-11]

T2: 656.141772454 K , P2: 2.5724220598 MPa

Sgen12_ps: 82.6774553904 kJ/K

>>>

Tab. X – Temperatura e pressão finais e entropia irreversivelmente produzida.

T(2) (K) P(2) (MPa) Sgen12 (kJ/K)

A – solução ideal 656,37 2,57 82,79

B – mistura de gases perfeitos 653,80 2,56 82,91

C – pseudo-substância pura 656,14 2,57 82,68

Pela análise da Tab. X, podemos concluir que os três modelos acabaram por produzir

valores muito semelhantes entre si, resultado este devido ao estado particular da mistura

final e que não pode, obviamente, ser generalizado.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 111

Page 112: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

8.M8.MISTURASISTURAS H HOMOGÊNEASOMOGÊNEAS R REATIVASEATIVAS

Até agora lidamos com misturas cujos componentes não reagem entre si. Se existir

esta possibilidade para a mistura, então novos componentes poderão surgir magicamente.

Embora o processo deva atender à conservação de massa e às leis da Termodinâmica,

poderá haver uma alteração significativa das propriedades termodinâmicas e da composição

da mistura ao seu fim. Então o problema-chave aqui é: se algumas substâncias puras da

mistura reagirem entre si, como aplicaremos as leis da termodinâmica e da conservação da

massa? Como seremos capazes de escrever as equações das diferenças das propriedades

termodinâmicas, se as substâncias puras envolvidas poderão ser completamente

substituídas por outras distintas?

A resposta está na conservação da identidade de todas as espécies químicas

envolvidas, pois as reações químicas sempre preservam os núcleos dos átomos. Devemos

ser capazes, também por causa disso, de desenvolver bases para as propriedades

termodinâmicas, cujo grau de arbitrariedade deve refletir e ser consistente com esta

conservação.

8.1.Uma Questão de Massa

As reações químicas representam, devido à conservação das espécies químicas

envolvidas, simplesmente uma proporção entre os integrantes da reação. Sabe-se então

que a modificação da quantidade de qualquer um dos componentes da reação refletirá

obrigatoriamente sobre a quantidade de todos os outros exatamente na proporção dos seus

coeficientes estequiométricos naquela reação.

Portanto, é importante que fique claro que os coeficientes estequiométricos da reação

não têm, em princípio, nada a ver com a massa (ou número de moles) instantânea dos

componentes da mistura, sejam eles integrantes das diversas reações que podem ocorrer

entre eles na mistura ou completamente inertes nas condições dadas da mistura.

Nas condições da mistura, uma reação pode ser irreversível, quando pelo menos um

dos reagentes se esgota ao fim do processo da reação química, ou então reversível, quando

todos os envolvidos na reação, sejam “reagentes” e “produtos” passam ao final de um certo

tempo de relaxação, a coexistir em equilíbrio dinâmico e, para as restrições estabelecidas,

este representa o fim do processo. Equilíbrio dinâmico significa que a taxa de destruição de

cada componente da mistura torna-se igual a sua taxa de produção, de forma que a

composição macroscópica da mistura não se altera. As condições para que exista um

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL112

Page 113: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

equilíbrio dinâmico em uma reação química, ou seja, para que ela seja reversível, serão

objeto de nosso estudo. Iniciaremos trabalhando sobre o exemplo detalhado da reação de

combustão do metano, porém sem considerar que os produtos por sua vez podem se

converter em outros, dissociando-se ou se recombinando.

8.2.O Grau de Reação

A qualquer reação química pode ser atribuído um grau (ou extensão) de reação ε ,

através do qual se pode avaliar o avanço da reação de reagentes para produtos, ou vice-

versa.

Para exemplificar, seja uma mistura em um sistema fechado contendo inicialmente

nCH4(0) moles de CH4 , nO2

(0) moles de O2, associados à quantidade adequada de ar puro seco,

nCO2(0) moles de CO2 e também nH2O

(0) kmoles de H2O. Vamos avaliar o avanço da reação e

discutir o resultado final.

Consideremos a reação química de combustão do metano com oxigênio puro, nas

proporções estequiométricas, sem sobra de oxigênio no produtos e sem dissociação dos

produtos:

1 CH4 + 2 O2 1 CO2 + 2 H2O (8.1)

Quantos n moles de ar são necessários para nO2 moles de O2? O ar padrão é definido

como 21% de O2 e 79% de N2, em base molar. Para cada mol de O2 temos que ter 4,76 moles

de ar (por quê?). Portanto,

n = nO 23,76nN 2

= 4,76 nO2 moles de ar .

Para analisar em detalhes, estudemos a Tab.8.1.

coef 1 2 1 2

inicial nCH4(0) nO2

(0) nCO2(0) nH2O

(0)

avanço -1 ε -2 ε 1 ε 2 ε

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL

Tab.8.1 – Efeito do grau de avanço sobre cada componente da reação

113

Page 114: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

local nCH4(0) - ε nO2

(0) - 2 ε nCO2(0) + ε nH2O

(0) + 2 ε

final 0 nO2(0) - 2(nCH4

(0)) nCO2(0) + nCH4

(0) nH2O(0) + 2(nCH4

(0))

Na Tab.8.1 a linha coef representa os coeficientes estequiométricos da reação

original Eq. 8.1; a linha inicial, os valores que iniciaram a reação química, fornecidos

externamente pelas condições iniciais da mistura; a linha avanço representa o avanço da

reação definido pelo produto dos coeficientes estequiométricos e o grau de avanço ε ; a

linha local, os valores instantâneos dos números de moles de cada componente da reação

em função de ε ; a linha final, os valores dos números de kmoles de cada componente da

reação, supondo-se que esta se deslocou totalmente para a direita, caracterizando uma

combustão completa, a qual esgotou pelo menos um dos reagentes no processo, no caso, o

metano.

O número instantâneo de moles, bem como a sua variação, para cada um dos

componentes da mistura será dado por:

nCH4=nCH4

0 − dnCH 4=−d

nO2 =nO 2

0−2 dnO2

=−2d

nCO2=nCO2

0 dnCO2

=d

nH 2 O=nH 2 O0

2 dnH 2O=2d

. (8.2)

Como vemos, a variação do número de moles é proporcional ao grau de avanço da

reação, através do respectivo coeficiente estequiométrico.

O número instantâneo de moles da mistura será dado por:

nm ε=nCH 4

0nO 2

0 nCO2

0nH 2 O

03,76 nO 2

−−2 2 . (8.3)

O número de moles instantâneo da mistura, nm( ε ) ,deve incluir também o número de

moles de nitrogênio N2, que, embora inerte na reação química em questão, pertence também

à mistura.

As frações molares dos componentes da mistura são dadas por:

yCH 4=

nCH 4

0−ε

nm ε , (8.4)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL114

Page 115: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

yO2=

nO2

0 −2ε

nmε , (8.5)

yCO2=

nCO2

nmε , (8.6)

y H 2 O=nH 2 O

0 2ε

nm ε , (8.7)

e, também,

y N2=

3,76 nO 2

0

nmε . (8.8)

Se todo o metano for queimado, então ε1=nCH 4

0 e basta substituirmos este valor de

ε para obtermos que o oxigênio restante será

nO2

1=nO2

0 −2nCH 4

0 . (8.9)

Observe que qualquer que seja o número de moles, nunca pode ser negativo, de

modo que as frações molares das Eqs. 8.4 a 8.8 bem como a Eq. 8.9, devem satisfazer essa

restrição para qualquer valor de ε.

Define-se a relação ar-combustível molar (ou em massa) AC como o número de

moles (ou massa) de ar por mol (ou por unidade de massa) de combustível. O mínimo

número de moles n de ar que garante a combustão completa na reação fornecida será

aquele que extingue também o oxigênio. Este é denominado o ar teórico ou estequiométrico

ACs desta reação. Portanto:

AC s = min n

nCH 4

0 =

4,762 nCH 4

0

nCH 4

0 = 9,52 moles de ar/mol de CH4. (8.10)

Naturalmente, se nCH4

0 = 1 então min n = 9,52 e o número inicial de moles de

oxigênio será simplesmente 2, como era de se esperar.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 115

Page 116: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

A relação combustível-ar CA para uma dada reação de combustão é simplesmente a

inversa de AC, assim como CAs é a inversa de ACs. Define-se adicionalmente a relação de

equivalência ϕ como:

= CACAs

= AC s

AC. (8.11)

O inverso da relação de equivalência ϕ é conhecido na indústria por λ . A relação

de equivalência, Eq. 8.11, é um parâmetro importante porque se ϕ é menor do que 1, a

reação de combustão, qualquer que seja ela, contém mais oxigênio do que o

estequiométrico e portanto, haverá sobra de oxigênio nos produtos. Se ϕ for maior do que 1,

por outro lado, o número de moles de oxigênio será menor do que o estequiométrico e a

reação se torna muito mais complicada.

Na realidade, a Termodinâmica clássica é capaz de dizer se alguma reação pode ou

não ocorrer, mas não pode predizer o que vai acontecer, ou que produtos serão formados.

Precisamos agora aplicar a conservação de massa e as Leis da Termodinâmica. Para

isso, vamos retomar o assunto das bases arbitrárias para as propriedades termodinâmicas.

8.3.A Base da Entalpia de Formação

Seja a seguinte reação química em regime permanente, com reagentes separados à

temperatura padrão T 0 de 298,15K e à pressão padrão P0 de 0,1 MPa e o único produto

também a 298,15K e 0,1 MPa :

C(s) + O2(g) CO2(g) . (8.12)

Se aplicarmos a primeira lei, obteremos

QVC=H CO 2−HC s −H O2

=hCO2−hC s −hO2 . (8.13)

Observe que QVC, que é mensurável e tabelado, não pode depender das bases

arbitrariamente escolhidas para as entalpias. Então, se adotarmos uma base arbitrária para

o carbono C(s) e outra para o oxigênio O2, a entalpia do CO2 será fixada por estas duas bases

e pelo valor de QVC.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL116

Page 117: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Ora, se podemos escolher as bases, vamos adotar h f C s0

=h f O2

0=0 , ou seja, vamos

atribuir valor zero à entalpia de todos os elementos (em sua forma isotópica mais comum) a

T0 = 25°C e P0 = 0,1 MPa. Além disso, o valor de h f0 será tabelado para os gases a 25 ºC,

considerados perfeitos. Esta é a fórmula que define a base da entalpia de formação h f0 .

Em consequência da primeira lei e das bases escolhidas, a entalpia do CO2 na base

da entalpia de formação fica fixada e igual a

h f CO2

0=QVC=−393522 kJ /kmol . (8.14)

Os valores de h f0 para as substâncias puras são determinados por medidas

calorimétricas e com a ajuda da termodinâmica estatística e podem ser obtidos em tabelas.

Para manter a consistência, todas as entalpias envolvidas na reação precisam ser

convertidas para a mesma base da entalpia de formação.

Como qualquer conversão de base, funciona da seguinte forma, onde a e b são duas

bases distintas para a propriedade termodinâmica x:

Δx base a=Δxbase b ou x 2 −x1

base a=x 2−x 1

base b . (8.15)

É muito importante que lembremos que na Eq. 8.15 existe um valor da propriedade

termodinâmica x(i) na base a e um valor distinto para a mesma propriedade x(i) na base b,

mas estas correspondem ao mesmo estado termodinâmico i e portanto, à mesma fase.

Assim, se o estado i for considerado como gás perfeito, as duas propriedades x devem se

referir ao gás perfeito em i.

Para converter qualquer entalpia molar a (T,P) para a base da entalpia de formação

usamos então a expressão:

h T , P = h f0T 0 , P0

ΔhT0 ,P 0

T , P . (8.16)

Todas as transformações ficaram encerradas em Δ h que, como já sabemos, pode

ser expressa em qualquer base. Vamos supor que o estado (T,P) de uma determinada

substância pura não esteja na região de gás perfeito. Estamos interessados em expressar

h T , P na base da entalpia de formação. Sejam T0 e P0 os parâmetros para o estado

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 117

Page 118: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

padrão. Então, utilizando para Δ h a expansão das entalpias em coordenadas

generalizadas,

h T , P =h f0h*

T −h*T 0

−h*−hT r , P r , w , Y h*

−h0T r

0 , P r0 , w ,Y .(8.17)

Observe que na Eq. 8.17 todas as entalpias devem corresponder umas às outras, de

forma que h*T e h T , P ambas “cancelam” h*

−hT r , P r , w , Y , ao passo que

h0 *T 0 e h f0T 0 , P0

ambas “cancelam” h*−h0T r0 ,P r

0 ,w ,Y . por outro lado, o valor de

h f0T 0 , P0

deve ser fornecido ou obtido de tabelas.

Você consegue modificar a Eq. 8.16 se consideramos h f0 *T 0

? E se

adicionalmente h*T , ou seja a substância pura puder ser considerada como gás perfeito

a T,P? Você precisa se sentir à vontade com cada uma destas conversões antes de

prosseguir.

8.4.A Base da Entropia Absoluta

Nas reações químicas, ao aplicarmos a Segunda Lei, nos deparamos com uma

situação análoga a da entalpia. Poderíamos, então, utilizar uma solução semelhante a da

entalpia de formação. Entretanto, no caso da entropia, costumamos adotar uma outra base:

a da entropia absoluta.

Sabemos que a entropia tem um valor nulo para um cristal absolutamente perfeito na

temperatura de zero absoluto. Este é um dos enunciados da Terceira Lei da Termodinâmica,

devido a Nernst e Max Planck, no começo do século XX.

Portanto, se determinarmos o valor da entropia para os elementos químicos

empregando a base da entropia absoluta, poderíamos utilizar estes valores para garantir a

consistência da entropia dos componentes das reações químicas.

Para efeito de tabelas, costuma-se adotar a referência padrão P0 = 0,1 MPa e a

temperatura padrão T0 = 25°C, da mesma forma que procedemos para a entalpia de

formação. Novamente, não se deve confundir (T0,P0) condições do meio-ambiente padrão,

com (T0,P0), temperatura e pressão do estado padrão, embora muitas vezes seus valores

possam coincidir por conveniência.

A mudança de base para a entropia absoluta segue os mesmos princípios que

estabelecemos para a entalpia de formação. A conversão de base será

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL118

Page 119: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

s T , P = s f0 T 0 , P0 Δs

T 0 , P 0T , P

. (8.18)

Da mesma forma que para a entalpia, a transformação da entropia está encerrada em

s . A formulação completa em coordenadas generalizadas é a seguinte, para o caso em

que s T ,P e sT 0

0=s T 0 , P0

não sejam gases perfeitos:

s T , P=sT 0

0T 0 , P0

−s*−sT r , P r ,w ,Y s

*−s

0T r

0 ,P r0 ,w ,Y

s*T , P −s

*T 0 , P0

. (8.19)

Devemos ficar particularmente atentos para as pressões envolvidas, pois a entropia

do gás perfeito, ao contrário da entalpia e energia interna, depende da temperatura e da

pressão. Da mesma forma que a expansão da entalpia, para verificarmos se a Eq. 8.19 está

correta deve haver uma correspondência entre as entropias no mesmo estado. Assim,

ambos os termos sT 0

0T 0 , P0

e s*T 0 , P0

devem “cancelar” s*−s

0T r

0 , P r0 ,w ,Y , ao

passo que, da mesma forma, os termos s T , P e s*T ,P devem “cancelar”

s*−s T r , P r ,w ,Y . Como fica a Eq. 8.19 para sT 0

0 *T 0 , P0 ? E se adicionalmente,

s*T ,P ? Você não deveria prosseguir até se sentir confortável com todas as conversões

para a base da entropia absoluta.

8.5. Revendo o Exemplo agora com Reações Químicas

Seja o exemplo da Fig.2.1, agora com A = CH4 e B = ar puro. Resolva novamente o

problema da expansão não resistida, incluindo agora a reação química de combustão de nA

moles de metano com nB moles de oxigênio provenientes da quantidade adequada de ar

puro, depois que se rompe a membrana.

Da nossa discussão anterior sobre grau de reação (lembra-se?), já determinamos que

o número final de moles de O2 será nB – 2nA . Então, a reação completa, sem dissociação,

será

n ACH 4nB O23,76nB N 2 n ACO2nB−2n AO22n A H 2 O3 .76nB N 2 .(8.20)

Da mesma forma que antes, você deve mostrar que a Primeira Lei para o processo

neste sistema será dada pela Eq. 7.20 e a Segunda Lei pela Eq. 7.21. O lado A é composto

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 119

Page 120: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

de metano a TA(1),PA

(1) e o lado B conterá ar puro seco a TB(1),PB

(1). A energia interna do sistema

em 1 será, então

U 1=nA uCH 4

1 T A

1 , P A1

nB U O2

13,76nB U N 2

1 , (8.21)

ao passo que a energia interna do sistema em 2 ficará

U 2 =nA U CO2

2 nB−2nA U O2

2 2 nA U H 2 O

23,76nB U N 2

2 . (8.22)

Vamos supor em 1 que o ar é um gás perfeito, uma hipótese bem realista para o ar e

que o metano é um gás real. Já a mistura no estado 2 será assumida como uma solução

ideal. Então:

U 1=nA uCH 4

1 T A

1 , P A1

nB uO2

*1T B

1 3,76 nB uN 2

* 1T B

1 . (8.23)

A energia interna no estado 2 será expressa como

n AuCO2

2 T 2 , P2

nB−2nAuO22

T 2 ,P 2

2 nA uH 2 O2

T 2 , P23,76nB u N2

2 T 2 , P2

= U 2 . (8.24)

Substituindo-se as energias internas por entalpias, para o estado 1:

n AhCH 4

1T A

1 ,P A1 nB

hO 2

* 1T B

13,76nB

hN 2

*1T B

1−

n A ZCH 4

1T A

1 , P A1 R T A

1−4,76nB

RT B1 = U 1 (8.25)

e para o estado 2:

n AhCO2

2 T 2 , P2

nB−2nAhO2

2 T 2 , P2

2 nAhH 2 O

2 T 2 , P2

3,76nBhN 2

2T 2 ,P 2

[nA Z CO2

2 T 2 , P2

nB−2nAZ O2

2T 2 , P2

] R T 2−

[2nA Z H 2 O2

T 2 , P23,76nB Z N 2

2T 2 , P 2

] R T 2 = U 2

. (8.26)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL120

Page 121: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Agora, como acabamos de aprender, cada entalpia nas Eqs. 8.25 e 8.26 deve ser

escrita em uma base comum, a base da entalpia de formação e na forma das entalpias

residuais e coordenadas reduzidas, conforme a Eq. 8.17 de conversão de base:

hCH4T A

1 ,P A1 =h f CH 4

*0−h*

−hCH4T r , P r , , Y CH 4

1h*

T A1

−h*T 0

CH 4 , (8.27)

hO2

*T B

1=h*

T B1−h*

T 0O2

, (8.28)

hN 2

*T B

1=h*

T B1−h*

T 0N2

, (8.29)

hCO2T 2 , P2

=h f CO2

*0−h*

−hCO2T r ,P r , , Y CO2

2h*

T 2−h*

T 0CO2

, (8.30)

hH 2 OT2 , P 2 =h f H 2 O

* 0 −h*−hH 2OT r , P r , ,Y H 2 O

2 h*T 2−h*T 0H 2 O , (8.31)

hO2T 2 ,P 2

=−h*−hO2

T r ,P r , , Y O2

2h*

T 2 −h*

T 0O 2

, (8.32)

hN 2T 2 , P 2

=−h*−hN2

T r , P r , , Y N 2

2 h*

T 2−h*

T 0N 2

, (8.33)

cujos valores devem ser substituídos nas Eqs. 8.25 e 8.26. Em cada uma das Eqs. 8.27 a

8.33, os valores de Tr, Pr devem ser determinados conhecendo-se os respectivos valores

das propriedades críticas Tc e Pc, além, é claro, de ω, Y, M e CP0(T), para cada uma das

substâncias puras.

Entretanto, da mesma forma que o problema original, não conhecemos os valores de

T(2) e de P(2) e, se não considerarmos as equações das propriedades reduzidas (pois são

simplesmente proporcionais às propriedades criticas), resta-nos apenas a Eq.7.20. Como

anteriormente, a outra equação será dada pela conservação do volume do sistema, Eq.

7.26.

As equações para os volumes dos estados 1 e 2 respectivamente, ficarão:

V 1=V A1V B

1=nA ZCH 4

T r , P r , , Y CH 4

1 R T A1

P A1

4,76 nB

R T B1

PB1 , (8.34)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 121

Page 122: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

[nA Z CO2T r , P r , , Y CO2

2nB−2nAZ O2

T r ,P r , , Y O2

2 ]R T 2

P 2

[2nA Z H 2 O T r , P r , , Y H 2 O2

3,76nB Z N 2T r , P r , ,Y N 2

2 ]RT 2

P2 = V 2 . (8.35)

Uma vez resolvidos os valores de T(2) e P(2), podemos aplicar na Segunda Lei da

Termodinâmica, Eq. 7.21, para obtermos a produção irreversível de entropia 1Sgen2. O

processo é uma expansão não resistida, que é irreversível, associada a uma reação de

combustão, que também é altamente irreversível. Estamos, portanto, interessados em

avaliar a produção irreversível de entropia (ou irreversibilidade). Para isto, precisamos

aplicar a Segunda Lei, cuja formulação básica não sofreu alteração, pois nada foi alterado

na fronteira do sistema. A entropia no estado 1 será

S 1 =nA sCH 4

1 T A1 , PA

1nBS O2

13,76 nBS N 2

1 , (8.36)

e no estado 2:

S 2=nASCO2

2 nB−2 nA S O2

2 2 n AS H 2 O

2 3,76 nBS N 2

2 . (8.37)

Considerando ar puro seco como gás perfeito e metano como gás real em 1 e

solução ideal em 2, obtemos para a entropia em 1:

S 1 =nA sCH 4

1T A

1 , PA1

nB [sO 2

* 1T B

1 , P B1−R ln yO2

1 ]3,76nB [s N 2

* 1 T B

1 ,P B1 −R ln y N 2

1 ](8.38)

e para a entropia em 2:

n A [sCO2

2T 2 , P2

−R ln yCO2

2 ]nB−2nA [sO2

2T 2 ,P 2

−R ln yO2

2 ]2 nA [sH 2 O

2T 2 ,P 2

−R ln yH 2O2 ]3,76nB [s N 2

2 T 2 , P2

−R ln y N 2

2 ] = S 2 , (8.39)

De forma semelhante às entalpias, precisamos converter cada uma das entropias

para a base da entropia absoluta. Para isso, lançaremos mão das entropias residuais.

Assim,

sCH 4T A

1 , P A1

=sCH 4

*0−s

*−s CH 4

T r , P r , ,Y CH 4

1s

*T A

1 ,P A1 −s

*T 0 , P0

CH4,

(8.40)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL122

Page 123: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

sO 2T B

1 ,P B1 =sO 2

*0−s

*−sO 2

T r , P r , , Y O 2

1s

*T B

1 , P B1−s

*T 0 , P0

O 2, (8.41)

s N 2T B

1 , PB1=sN 2

*0−s

*−sN 2

T r , P r , , Y N 2

1 s

*T B

1 ,P B1 −s

*T 0 , P0

N 2, (8.42)

sCO2T 2 , P 2

=sCO2

*0−s

*−sCO2

T r , P r , ,Y CO2

2s

*T 2 ,P 2

−s*T 0 , P0

CO2,

(8.43)

s H 2 O T 2 , P2=s H 2 O

*0−s

*−s H 2 O T r , P r , , Y H 2 O

2s

*T 2 , P2

−s*T 0 ,P0

H 2 O ,

(8.44)

sO 2T 2 , P2

=sO 2

* 0−s

*−s O2

T r ,P r , , Y O2

2 s

*T 2 ,P 2

−s*T 0 ,P0

O 2, (8.45)

s N 2T 2 , P2

=s N 2

*0−s

*−s N 2

T r , P r , , Y N 2

2 s

*T 2 ,P 2

−s*T 0 ,P0

N 2, (8.46)

cujos valores devem ser substituídos nas Eqs. 8.38 e 8.39. A propósito, se pudéssemos

separar a irreversibilidade causada somente pela expansão não resistida, poderíamos

avaliar os efeitos da combustão sobre a irreversibilidade total (Como você poderia realizar

essa separação?).

Se a mistura em 2 fosse uma mistura de gases perfeitos, então todos os termos

h*−hT r , P r , ,Y e s*−sT r , P r , ,Y seriam nulos e todos os Z seriam iguais a 1

(faça como um exercício).

Agora, vamos considerar a mistura em 2 como uma pseudo-substância pura, então a

energia interna, a entropia e o volume do estado 1 não se alteram. A equação da energia

interna em 2 ficará:

n AhCO2

*2T 2

nB−2 nAhO2

*2T 2

2 nAhH 2 O

* 2 T 2

3,76 nBhN 2

*2 T 2

nAnB−2nA2 nA3,76 nB [−R T 2h*

−hmT r , P r , ,Y m2 ] = U 2 . (8.47)

Como em todos os casos de modelos pseudo-críticos, consideramos uma mistura de

gases perfeitos em 2 e corrigimos para a mistura como se fosse uma pseudo-substância

pura. Uma vez determinados os valores de Tcm, Pcm, Mm, wm e Ym , avaliamos as propriedades

reduzidas com subscrito m.

A equação para a igualdade dos volumes se torna:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 123

Page 124: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

[nA Z CH 4T r , P r , ,Y CH 4

1 R T A1

PA1

4,76 nB R T B1

PB1 ]=

[ nAnB−2 nA2 nA3,76 nB ] Z mT r , P r , ,Y m2 RT 2

P2

. (8.48)

A entropia no estado 2 se torna

n A [sCO2

* 2T 2 , P 2

−R ln yCO2

2 ]nB−2nA [sO 2

* 2T 2 , P 2

−R ln yO 2

2 ]2 nA [sH 2 O

*2T 2 ,P 2

−R ln yH 2O2 ]3,76nB [s N 2

*2 T 2 , P2

−R ln yN 2

2 ][n AnB−2nA2n A3,76nB ]− s*

−s m2

T r ,P r , , Y m2 = S 2

. (8.49)

As equações de mudança de base para a entalpia de formação são as mesmas,

exceto que os termos h*−hT r , P r , e s

*−s T r ,P r , são todos nulos, como no

caso de gás perfeito. Precisamos da composição da mistura ao final da combustão, no

estado 2. O total de moles da mistura n(2) será a soma do número de moles dos

componentes da mistura em 2. Assim,

n2 = n AnB−2 nA2 n A3,76nB = n A4,76 nB . (8.50)

Note que o número de moles no estado 2 é igual ao do estado 1, mas, cuidado, essa

é uma situação particular para essa reação (por quê?). A composição da mistura em 2 torna-

se

yCO 2=n A

nA4, 76nB, (8.51)

yO2=nB−2n A

nA4,76nB, (8.52)

y H 2 O2

=2n A

nA4,76nB, (8.53)

y N2

2 =

3,76nB

nA4,76nB. (8.54)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL124

Page 125: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Para que o problema tenha sentido físico, todas as frações molares devem ser

maiores ou iguais a zero. Neste caso, basta que nB−2 n A≥0 . Se nB=2 n A então não

haverá O2 na mistura final e, portanto, teremos queimado o metano precisamente com o ar

teórico.

Por outro lado, se fixarmos a temperatura e a pressão da mistura final, então,

dependendo dos valores escolhidos para T(2),P(2), talvez haja uma (ou mais de uma) solução

física para as únicas incógnitas nA e nB.

8.6. A Temperatura Adiabática de Chama e o Poder Calorífico

Como no presente exemplo, o processo é adiabático, pode-se prever que a

temperatura e a pressão finais serão muito elevadas(~3000K), pois toda a energia de

combustão estará sendo utilizada para aquecer os produtos.

A temperatura que ocorre sob um processo adiabático de combustão é muitas vezes

chamada de temperatura adiabática de chama, TAC, posto que a combustão se propaga

como uma chama ao longo da câmara. Para se reduzir a temperatura final você acha que

precisaria aumentar ou diminuir a quantidade de ar?

Seja agora um sistema aberto (volume de controle) não adiabático no qual o

combustível (1) entra nas condições padrão a T0,P0 e o ar estequiométrico (2) também a

T0,P0. Suponha que os produtos de combustão (sem dissociação) saem separadamente,

cada um deles a T0,P0. Para que isso aconteça, os produtos de combustão devem perder

calor para o ambiente. A Primeira Lei aplicada a este sistema, considerando-se regime

permanente, sem trabalho mecânico, desprezando-se as energias cinéticas e potenciais e

se usarmos a vazão molar de combustível como referência de escala, ficará:

H P0−H R

0=Q=hRP

0 , (8.55)

onde os subscritos R e P se referem a reagentes e produtos respectivamente e o sobrescrito

refere-se ao estado padrão.

Para fixar ideias, vamos assumir daqui em diante um combustível cuja composição

molar equivalente pode ser escrita como CαHβOγNδ . Você é capaz de obter a quantidade

estequiométrica de ar necessária para um mol desse combustível? Para isso, considere que

os únicos produtos de combustão devem ser CO2, H2O, O2 e N2 e conte o número de átomos

de elementos em ambos os lados da seguinte reação de combustão:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 125

Page 126: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

C H O N as

O23,76 N 2 nCO2

CO2nH 2OH 2OnO2

O2nN 2N 2 , (8.56)

onde

AC =4,76as

, (8.57)

e obterá então

C : α – nCO2 = 0 ,

H: β – 2 nH2O = 0 ,

O: γ + 2 as/ϕ – (2 nCO2 + nH2O + 2 nO2) = 0 ,

N: δ + 3,76 (2 as) – 2 nN2 = 0, (8.58)

de onde encontramos que

as=4−

2

, (8.59)

e portanto, a reação estequiométrica ficará

C H O N 4−

2O23,76 N 2CO2

2

H 2O[3,764−

2

2 ]N 2

(8.60)

Lembrando-nos que a base da entalpia de formação para O2 e N2 é zero, a Eq. 8.55

se torna

hRP0

=h f CO2

0

2h f H 2 O

0−h f C H O N

0, (8.61)

onde hRP0 é conhecido como calor de combustão, ou entalpia de combustão, um valor

negativo (por quê?). Seu valor em módulo é denominado poder calorífico do combustível no

estado padrão, em kJ / kmol de combustível. Você pode mostrar que o valor de hRP0 será

alterado dependendo da fase em que o combustível se encontra e também dependendo da

fase da água nos produtos. Se á agua estiver em estado de vapor, trata-se do poder

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL126

Page 127: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

calorífico inferior, PCI, ao passo que se a água estiver na fase condensada, está-se

referindo ao poder calorífico superior, PCS (qual deles é maior? Por quê?).

Já estabelecemos os fundamentos pelos quais utilizamos as Leis da Termodinâmica

para alguns casos de misturas homogêneas reativas, incluindo as reações químicas que

consomem um dos reagentes. Mas e as reações reversíveis? Como veremos, elas formam a

essência do equilíbrio químico.

8.7. As Reações Químicas Reversíveis e O Equilíbrio Químico

Se os produtos de combustão de um combustível cuja composição equivalente é

C H O N são CO2 , H 2 O ,O 2 e N 2 , de onde surgem os demais produtos de

combustão CO , NO ,H 2, H ,O ,OH ? Vamos nos fixar nestes dez produtos, embora

possam haver muitos mais, pois estes já nos permitem o modelamento razoavelmente

realista de grande parte dos sistemas de combustão em condições normais.

Consideremos a reação química do combustível com uma determinada quantidade de

ar como ponto de partida e se houver um equilíbrio a T e P, será obtido a partir dessa

mistura, da seguinte forma:

C H O N as

O23,76 N 2

n1CO2n2 H 2 On3 N 2n4 O2n5 COn6 H 2n7 Hn8 On9 OHn10 NO(8.62)

A função de Gibbs da mistura de produtos de combustão a T e P será dada por:

G=∑ μ i ni ∀ i (8.63)

onde μ i= G i=∂ G /∂ ni T , P ,n j ≠i é o potencial (eletro-)químico do componente i na mistura a T

e P, o mesmo que a função de Gibbs parcial molar do componente i na mistura a T e P.

No caso da nossa reação, a Eq. 8.63 para G ficará da seguinte forma:

G=μ1 n1μ2 n2μ3 n3μ4 n4μ5 n5μ6 n6 μ7 n7μ8 n8μ9 n9μ10 n10 . (8.64)

O equilíbrio da mistura dos produtos de combustão a T,P será dado pela minimização

da função de Gibbs, ou seja, dG=0 .Portanto, diferenciando G e levando-se em conta as

equações de Gibbs-Duhem (por quê?), obtemos:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 127

Page 128: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

dG=μ1 dn1μ2 dn2μ3dn3μ4 dn4μ5 dn5

μ6 dn6μ7 dn7μ8 dn8μ9 dn9μ10 dn10=0 . (8.65)

Pela conservação dos elementos químicos C, H, O e N envolvidos na reação química,

deveremos ter à direita da reação o mesmo número que à esquerda, isto para cada

elemento químico:

C :n1n5−=0H : 2n22n6n7n9−=0O :2n1n22 n4n5n8n9n10−2as /=0N :2n3n10−2 3,76as/=0

. (8.66)

Claramente não podemos variar independentemente os números de moles dos

componentes da mistura na Eq. 8.65, pois estão vinculados pelas quatro equações de

conservação, Eqs. 8.66, de forma que a minimização da função de Gibbs da mistura deve

satisfazer também às restrições, Eqs. 8.66.

8.8. O Método dos Multiplicadores de Lagrange

Dentre as várias maneiras de se resolver este problema, dentre as quais a

substituição sucessiva, vamos utilizar aqui o método dos multiplicadores de Lagrange. Para

isso, escrevemos a forma estendida da função G a ser minimizada, G , cujo mínimo deverá

ser o mesmo de G, pois cada um dos λ, conhecidos como os multiplicadores de Lagrange, é

multiplicado pela sua respectiva equação de conservação, Eqs. 8.66:

G=GC n1n5−

H 2n22n6n7n9−

O 2n1n22n4n5n8n9n10−2as/

N 2n3n10−23,76as/

. (8.67)

Diferenciamos, então, G e substituimos dG, da seguinte forma:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL128

Page 129: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

d G=μ1 dn1μ2 dn2μ3 dn3μ4 dn4μ5 dn5

μ6 dn6μ7 dn7μ8 dn8μ9 dn9μ10 dn10

C dn1dn5

H 2dn22dn6dn7dn9

O 2dn1dn22 dn4dn5dn8dn9dn10

N 2dn3dn10

d C n1n5−

d H 2n22n6n7n9−

d O2n1n22n4n5n8n9n10−2as /

d N 2n3n10−2 3,76as/=0

. (8.68)

Coletando-se os termos da diferenciais nesta equação, obtemos:

G=1C2Odn122HOdn232N dn3

42Odn45COdn562H dn6

7H dn78Odn8

9OH dn910NOdn10

n1n5−d C

2n22 n6n7n9−d H

2n1n22 n4n5n8n9n10−2as /d O

2n3n10−2 3,76as /d N=0

. (8.69)

Uma vez que agora na Eq. 8.69 cada diferencial pode variar arbitrariamente, para que

d G se anule cada um dos respectivos coeficientes deve ser igualado a zero, produzindo

assim o sistema:

1C2O=0 CO2

22HO=0 H 2 O

32N=0 N 2

42O=0 O2

5CO=0 CO

62H=0 H 2

7H=0 H

8O=0 O

9OH=0 OH

10N O=0 NO

n1n5−=02 n22 n6n7n9−=02 n1n22 n4n5n8n9n10−2 as /=02 n3n10−2 3,76as/=0n1n2n3n4n5n6n7n8n9n10−n=0

, (8.70)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 129

Page 130: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

onde n é o número total de moles nos produtos.

Por outro lado, cada um dos potenciais químicos pode ser escrito:

μ iT , P , y1, y2 ,... , y9=G i=μi0T , P0

R T ln f iT ,P , y1, y2 ,... , y9

f i0T ,P0

, ∀ i=1,2 , ...,10

(8.71)

onde μ i0T , P0

é o potencial químico de i puro a T e P0 ;

f iT , P , y1, y2 ,... , y9 é a fugacidade do componente i na mistura a T e P;

f i0T , P0

é a fugacidade do componente i puro a T e P0 .

Observe que a temperatura da Eq. 8.71 é T e que a pressão P0 refere-se a um

estado padrão arbitrário, frequentemente adotado como a pressão do meio-ambiente padrão

P0 para efeito de tabelas.

Se cada um dos componentes puros i for assumido como gás perfeito a T e P0

então a Eq. 8.71 ficará:

μ iT , P , y1, y2 ,... , y9=G i=μi*0T , P0

RT ln f i T , P , y1, y2 , ... , y9

P0 , ∀ i=1,2 , ...,10

(8.72)

pois, como i é um gás perfeito a T e P0 , então f i0T , P0

=P0 .

Como em situações anteriormente encontradas, não poderemos avançar enquanto

não fornecermos um modelo para a fugacidade de cada componente i na mistura a T e P.

Vamos, então, admitir que a mistura nessas condições é uma solução ideal. Aplicando-se a

Lei de Lewis-Randall, a Eq. 8.72 torna-se:

μ iT , P , y1, y2 ,... , y9=G i=μi*0T , P0

RT ln y i f iT , P

P0 ,∀ i=1,2 , ... ,10 (8.73)

pois f iT , P , y1 , y 2 , ... , y9= yi f iT , P , ∀ i=1,2 ,... ,10 . Cada uma das frações molares é

y i=ni / n , tal que ∑i=1

10

y i=1 .

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL130

Page 131: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Se, além disso, se a água nos produtos estiver toda ela na forma de vapor e a mistura

de produtos de combustão a T e P puder ser considerada como de gases perfeitos, uma

hipótese aliás bem razoável em processos de combustão comuns, então todos os

f iT , P=P . Com isso, os potenciais químicos ficarão:

μ i=μ i*0T , P0

RT [ ln n i

n ln PP0 ] , ∀ i=1,2 , ...,10 . (8.74)

As Eqs. 8.74 devem ser utilizadas em substituição aos potenciais químicos no

sistema das Eqs. 8.70. Se como no nosso exemplo, forem dez os produtos de combustão,

teremos uma equação para as , Eq. 8.59, dez equações referentes aos potenciais químicos

i , quatro equações da conservação de C, H, O e N e mais uma equação do número total

de moles n, representando um sistema com dezesseis equações. Quantas e quais seriam as

incógnitas? Vejamos: Analisando o sistema, Eqs. 8.70, associado às Eqs. 8.74, descobrimos

o conjunto de variáveis

, , , , , as , n1 , n2 , n3 , n4 , n5 , n6 , n7 , n8 , n9 , n10 ,C ,H ,O ,N , n ,T , P , o que perfaz um

total de vinte e três incógnitas, sete a mais do que o número de equações no sistema.

Portanto, para que este tenha uma solução determinada, ou são necessárias mais sete

equações, ou então que sete das variáveis sejam conhecidas de antemão. Podemos afirmar

de um modo geral que as sete equações-extra ou os meios para a sua obtenção devem

provir dos dados e especificações estabelecidas para cada problema.

Deixamos para discutir à parte a determinação dos valores para

i*0T , P0

=g i* 0T , P0

, nas Eqs. 8.71, 8.72 e 8.73, assumindo-se gases perfeitos a cada

um dos componentes puros i na temperatura T e pressão padrão P0 .

8.9. A Determinação dos Potenciais Químicos

Vimos que na expressão da minimização da Função de Gibbs de uma mistura de n

componentes em equilíbrio químico a T e P, aparece a função de Gibbs parcial molar de

cada componente i nas condições da mistura, ou seja, Gi=μ iT , P , y1, y2, ... , y n−1 também

chamado de potencial químico do componente i na mistura a T e P.

Mas como determinamos os valores destes potenciais?

Vamos recuperar o que vimos a respeito, agora de forma geral:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 131

Page 132: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

μ iT , P , y1, y2 ,... , yn−1= G i=μi0 T , P0R T ln f iT ,P , y1, y2 ,... , y n−1

f i0T , P0

, ∀ i=1,2 , ... , n

Se i puro for gás perfeito a T e P0 :

μ iT , P , y1, y2 ,... , yn−1=g i* 0T , P0

R T ln f iT , P , y1, y2 ,... , yn−1

P0 ,∀ i=1,2 , ... , n

Por outro lado, se em T e P a mistura homogênea for solução ideal:

μ iT , P , y1, y2 ,... , yn−1=g i* 0T , P0

R T ln y i f iT , P

P0 ,∀ i=1,2 ,... , n

Ainda, se a solução ideal for uma mistura de gases perfeitos:

μ iT , P , y1, y2 ,... , yn−1=g i* 0T , P0

R T ln y i P

P0 , ∀ i=1,2 , ... , n .

Muito bem, até agora, mas como determinarmos o valor de g i*0T , P ?

Se estivermos lidando com reações químicas, já sabemos que todas as propriedades

deverão ser trazidas para uma mesma base, comum a todos os integrantes da reação.

Neste caso, por conveniência, usaremos a base da função de Gibbs de formação, g f0 cuja

definição é idêntica a da base da entalpia de formação h f0 , ou seja, onde se nesta lê

entalpia substitua-se naquela por função de Gibbs.

Podemos expressar a função de Gibbs de qualquer substância pura i a T,P por uma

expressão análoga a que desenvolvemos para a entalpia:

g i T , P = g f i0

T 0 , P0 g i

T 0 , P 0T , P

. (8.75)

Nesta última equação, o termo da esquerda que queremos determinar e o primeiro

termo da direita estão ambos na base da função de Gibbs de formação. O último termo da

direita poderá estar, como sabemos, em uma base qualquer. O valor de g f i0 , por sua vez,

pode ser obtido, quando possível, das tabelas termodinâmicas. Muitas vezes i é assumido

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL132

Page 133: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

como gás perfeito em T 0 ,P0 , o que, como já discutimos, não implica em perda de

generalidade. Quanto aos demais termos da direita, podemos escrever:

g iT 0 , P 0

T , P

=g i T , P−g iT0 , P0=h T −h T 0i−T s iT , PT 0

s i T0 , P0 .(8.76)

Para escrever esta equação, lançamos mão da definição de função de Gibbs para

substância pura g=h−Ts . A diferença de entalpias, bem como as entropias, podem ser

obtidas como já estudamos. Um caso interessante e importante é quando a base é adotada

como gás perfeito. Então, substituindo-se nas Eqs. 8.75 e 8.76 os termos que devem ser

gases perfeitos, a expressão completa para a função de Gibbs molar (ou o potencial

químico) de uma substância pura i a T,P será dada por

g i T , P = iT ,P =

g f i*0g T ,P −g

*T 0 , P0

i =

g f i*0hT −h

*T

0i−T s iT , P T

0si

*T

0,P

0

. (8.76)

No caso de nossa reação química, precisávamos determinar o valor de

i*0 T , P0=g i

*0T ,P0 . Pois bem, basta substituirmos adequadamente na Eq. 8.76 :

g i*0T , P0 = i

*0 T , P0 =

g f i*0g

*T , P0−g*T 0 , P0i =

g f i*0h*

T −h*T 0

i−T s i*T , P0

T 0si

*T 0 , P0

, (8.77)

A Eq. 8.77 é claramente muito conveniente para o usuário, pois envolve apenas

valores do gás perfeito para a substância pura i.

A estas alturas você já deve estar dominando com tranquilidade todas estas

transformações, não é verdade? Como ficaria a Eq. 8.76 com todas as expansões em

coordenadas generalizadas e nas bases adequadas? Com algum cuidado e atenção (faça!),

você deve chegar a

g i T , P = iT , P =

g f i* 0−h*

−hi T r , P r , , Y iT , Ph*T −h*

T 0i

T [s*−s i T r , P r , , Y iT , P−s

*T , P −s

*T 0 , P0

i ]T 0−T sT 0 i

*0

, (8.78)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 133

Page 134: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

na qual sT 0 i*0 é o valor da entropia absoluta da substância pura i como gás perfeito no

estado padrão a T 0 , P0 . Como ficaria a Eq. 8.78 se a substância pura i fosse gás perfeito

também a T , P ? E como ficaria a Eq. 8.77, que, como você percebeu, é avaliada

inteiramente a P0 ?

8.10. O Método das Constantes de Equilíbrio

Vamos repetir aqui a reação química dada pela Eq.8.62:

C H O N as

O23,76 N 2

n1CO2n2 H 2On3 N 2n4 O2n5COn6 H 2n7 Hn8On9 OHn10 NO.(8.79)

Vimos também que o equilíbrio químico da mistura homogênea dos produtos de

combustão será dado pela minimização da função de Gibbs da mistura a T,P:

dG= μ1 dn1 μ2 dn2 μ3 dn3μ4 dn4μ5 dn5

μ6 dn6μ7 dn7μ8 dn8 μ9 dn9 μ10dn10=0 , (8.80)

sujeita esta às restrições estabelecidas pela conservação dos elementos químicos, no nosso

caso C,H,O e N. Vimos em uma seção anterior a incorporação (isto é, a satisfação) dessas

restrições utilizando o método dos multiplicadores de lagrange. Havíamos comentado a

respeito de outros métodos para isso. Dentre eles, nessa seção apresentaremos o método

das constantes de equilíbrio.

Vamos então expressar a produção dos dez produtos de combustão

CO2 , H 2 O , N 2 ,O2 ,CO , H 2 , H , O ,OH , NO , na forma das seguintes seis reações químicas:

1/2 H 2 ⇔H 1

1/2O2⇔O 2

1/2 H 21/2O2 ⇔OH 31/2 N 21/2O2⇔NO 4

H 21 /2O2⇔ H 2O 5

CO1 /2O2⇔CO2 6

. (8.81)

Perceba que todos os produtos de combustão estão representados nestas seis

equações e poderíamos também demonstrar que quaisquer outras reações seriam

necessariamente combinações lineares dessas seis. Pois bem, como vimos anteriormente a

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL134

Page 135: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

cada uma destas reações podemos atribuir um grau de reação k , ∀ k=1,...,6 . A

variação total do número de moles dn i , ∀ k=1,... ,10 para cada um dos produtos pode ser

descrita em função da proporção do avanço da variação do grau de reação (ou seja, do

deslocamento de cada reação para a direita na direção dos “produtos”) de cada uma das

reações nas quais cada um dos produtos aparecem, da seguinte forma:

dn1 = d 6 CO 2

dn2 = d 5 H 2O

dn3 = −1/2 d 4 N 2

dn4 = −1 /2 d 2−1/2 d 3−1/2 d 4−1 /2 d 5−1/2 d 6 O 2

dn5 = −d 6 CO

dn6 = −1/2 d 1−1 /2 d 3−d 5 H 2

dn7 = d 1 H

dn8 = d 2 O

dn9 = d 3 OH

dn10 = d 4 NO

. (8.82)

Você deve ter percebido que o objetivo das relações, Eqs. 8.82, é fazer com que as

variações dos números de moles dos produtos satisfaçam as restrições impostas pela

conservação dos elementos químicos C,H,O e N. Portanto, já deve ter concluído que o

próximo passo é substituirmos as variações dos números de moles dos produtos na Eq.

8.80:

dG = 1 d 62 d 5−1/23 d 4

4−1/2 d 2−1/2d 3−1/2 d 4−1/2 d 5−1 /2d 6−5 d 6

6−1/2 d 1−1/2 d 3−d 57 d 18 d 29 d 310 d 4

. (8.83)

Colocando as diferenciais dos graus de reação em evidência e igualando a zero,

obtemos:

dG = 7−1/26d 1

8−1 /24d 2

9−1/26−1/24d 3

10−1 /23−1 /24d 4

2−6−1/24d 5

1−5−1 /24d 6 = 0

. (8.84)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 135

Page 136: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Uma vez que todas as variações dos graus de reação na Eq. 8.84 são arbitrárias,

cada um dos seus coeficientes deve ser zero, para que ela seja satisfeita. Deve ficar claro

que, uma vez alcançado o equilíbrio a T,P, a composição da mistura não se alterará mais, de

forma que tentativas de deslocamento de quaisquer das seis reações, Eqs. 8.81, para a

esquerda ou para a direita implicará imediatamente aumento da função de Gibbs total da

mistura e consequentemente haverá um movimento de restituição no sentido contrário até

se restabelecer o equilíbrio.

Repetindo aqui a Eq. 8.71, mas com n componentes:

μ iT , P , y1, y2 ,... , yn−1= G i=μi0T , P0

R T ln f iT ,P , y1, y2 ,... , y n−1

f i0T , P0

, ∀ i=1,2 , ... , n

Para simplificar a notação, vamos definir a atividade do componente i em qualquer

mistura homogênea de n componentes a T,P em relação ao estado padrão a T , P0 como:

a i≡f i

f i0T ,P0

, ∀ i=1,2 ,... , n (8.85)

e a Eq. 8.71 pode ser rescrita como

μ i= G i=g i0T ,P0R T ln a i , ∀ i=1,2 , ... , n . (8.86)

Substituimos os potenciais químicos dados pelas Eqs. 8.86 na Eq. 8.84 e obtemos:

dG = [ g 70R T ln a7−1 /2 g6

0R T ln a6 ] d 1

[ g80RT ln a8−1/2 g 4

0R T ln a4 ] d 2

[ g90RT ln a9−1/2 g6

0R T ln a6−1 /2 g 40R T ln a4 ] d 3

[ g100R T ln a10−1/ 2 g3

0RT ln a3−1/2 g4

0R T ln a4 ] d 4

[ g20RT ln a2−g6

0RT ln a6−1/2 g 4

0R T ln a4 ] d 5

[ g10RT ln a1−g 5

0R T ln a5−1/2 g4

0R T ln a4 ] d 6 = 0

. (8.87)

Colocando em evidência o termo R T , rearranjamos a Eq. 8.87, e, lembrando que a

soma de logaritmos corresponde ao logaritmo de produtos, chegamos a seguinte

expressão:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL136

Page 137: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

dG = [ g70−1/ 2g6

0RT ln

a7

a61/2 ] d 1

[ g80−1/2 g 4

0R T ln

a8

a41 /2 ]d 2

[ g90−1/2 g6

0−1/2 g4

0R T ln

a9

a61 /2a4

1/2 ]d 3

[ g100−1 /2 g3

0−1 /2 g4

0R T ln

a10

a31 /2 a4

1/2 ]d 4

[ g 20−g6

0−1/2 g4

0R T ln

a2

a6 a41/ 2 ] d 5

[ g10−g5

0−1/2 g4

0R T ln

a1

a5 a41 / 2 ]d 6 = 0

. (8.88)

Cada um dos termos entre parenteses na Eq. 8.88 é equivalente à variação da função

de Gibbs G k0T ,P0

=GP k0

−G R k0 , ∀ k=1,...,6 , por convenção, dos “reagentes” (esquerda)

para os “produtos” (direita), com cada “reagente” e cada “produto” assumido estar a T , P0 ,

para cada uma das seis reações, da seguinte forma:

1/2 H 2 ⇔H 1/2 H 2 H G10 = g7

0−1/2 g6

0

1/2O 2⇔O 1 /2O2 O G20 = g 8

0−1/2 g 4

0

1/2 H 21/2O2 ⇔OH 1/2 H 21/2O2 OH G30 = g9

0−1 /2 g6

0−1 /2 g4

0

1/2 N 21/2O 2⇔NO 1/ 2 N 21/2O2 NO G40 = g10

0−1 /2 g3

0−1 /2 g4

0

H 21 /2O2⇔ H 2O H 21/2 O2 H 2O G50 = g2

0−g6

0−1 /2 g4

0

CO1 /2O2⇔CO2 CO1/2O 2CO 2 G60 = g1

0−g5

0−1/2 g 4

0

(8.89)

Observe como cada um dos G k0 T , P0 nas Eqs. 8.89 está vinculado a sua

respectiva reação k não apenas na direção - da esquerda para a direita, mas também

no valor de seus coeficientes estequiométricos. Podemos então afirmar que se

multiplicarmos qualquer das equações k por um número positivo ou negativo, o seu

respectivo G k0T ,P0

será multiplicado pelo mesmo número. Além disso, qualquer

combinação linear entre as seis equações incorrerá na mesma combinação linear para os

respectivos G k0 . Vejamos um exemplo importante. Peguemos a equação 6 e

multipliquemos por -1:

CO2⇔CO1/2 O 2 CO 2 CO1/2 O 2 G 70 = −g 1

0g5

01/2 g 4

0 . (8.90)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 137

Page 138: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Se somarmos a equação 7 com a equação 5, resultará na equação 8:

H 2CO 2⇔H 2 OCO H 2CO2 H 2 OCO G 80=g 2

0g5

0−g6

0−g1

0 . (8.91)

A reação química reversível da Eq. 8.91 é extremamente importante e ocorre com

qualquer temperatura dos produtos sempre que a razão de equivalência for maior do que 1,

ou seja o ar utilizado na combustão é menor do que o ar estequiométrico para o

combustível. Ela é chamada de reação água-gás.

Como inicialmente estabelecemos, poderíamos ter escolhido as reações 7 ou 8, ou

mesmo ambas, para substituir uma ou duas reações do sistema de seis, Eqs. 8.81. Seja

qual for a nossa escolha, enfatizamos que só podemos encontrar seis reações que são

independentes entre si, nem mais e nem menos.

Vamos definir a constante de equilíbrio K k T para uma reação reversível k como

sendo:

ln K k T =−G k

0T , P0

R T, ∀ k=1,...,6 . (8.92)

Observe que as constantes de equilíbrio não são realmente constantes, mas uma

função da temperatura da reação química T. Entretanto, este nome acabou permanecendo

por razões históricas. De que maneira a constante de equilíbrio varia com a temperatura?

Voltaremos a essa questão, mas antes vamos obter as equações de equilíbrio que utilizam

as constantes.

A partir da Eq. 8.88, igualando-se cada coeficiente a zero e substituindo-se para as

constantes de equilíbrio, obteremos equações que representam para cada reação química

reversível a relação entre a respectiva constante de equilíbrio e as atividades e as

fugacidades dos componentes que participam daquela reação, dentro da mistura

homogênea de produtos de combustão em equilíbrio a T,P. Assumiremos, além disso, por

conveniência que no estado padrão a T e P0 os componentes puros i são gases perfeitos,

isto é, f iT , P0=P0 . Obtemos assim:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL138

Page 139: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

K 1T =a7

a61 /2 =

f 7/ P

f 6/P 1/2 P

P0 1/2

K 2T =a8

a41/2 =

f 8/ P

f 4/ P 1 /2 P

P0 1 /2

K 3T =a9

a61 /2 a4

1/2=

f 9/ P

f 6/ P 1 /2

f 4/P1/2 P

P0 0

K 4T =a10

a31/2 a4

1 /2 =f 10 /P

f 3/P 1/2

f 4/P 1 /2 P

P0 0

K 5T =a2

a6 a41/2 =

f 2/P

f 6/P f 4 /P 1/2 P

P0 −1/2

K 6T =a1

a5 a41/2 =

f 1/P

f 5/P f 4/P 1 /2 P

P0 −1 /2

. (8.93)

Como sempre, pouco poderemos avançar se não modelarmos as fugacidades dos

componentes na mistura. Pois bem, se a mistura de produtos de combustão puder ser

considerada como solução ideal a T,P, então as Eqs. 8.93 se desdobrarão em:

K 1T =a7

a61 /2 = y7

y61 /2 f 7/ P

f 6/ P 1 /2 P

P0 1/2

K 2T =a8

a41/2 = y8

y41/2 f 8/ P

f 4/P1/2 P

P0 1/2

K 3T =a9

a61 /2 a4

1/2 = y9

y61 /2 y4

1/2 f 9/P

f 6/P 1/2

f 4/ P 1 /2 P

P0 0

K 4T =a10

a31/2 a4

1 /2 = y10

y31/2 y4

1 /2 f 10/P

f 3/ P1/2

f 4 /P 1/2 P

P0 0

K 5T =a2

a6 a41/2 = y2

y6 y 41 /2 f 2/P

f 6/P f 4/ P1/2 P

P0

−1 /2

K 6T =a1

a5 a41/2

= y1

y5 y41 /2 f 1/P

f 5/P f 4/P 1/2 P

P0 −1 /2

. (8.94)

Nas Eqs. 8.94 os termos f i / P são os coeficientes de fugacidade do componente i

puro a T,P, que poderiam ser obtidos através das coordenadas generalizadas.

Finalmente, se a solução ideal dos produtos de combustão a T,P puder ser

considerada como uma mistura de gases perfeitos, os coeficientes de fugacidade serão

todos iguais a unidade e obteremos as equações das constantes de equilíbrio na sua forma

mais conhecida:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 139

Page 140: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

K 1T = y7

y61 /2 P

P0 1/2

K 2T = y8

y41 /2 P

P0 1 /2

K 3T = y9

y61 /2 y4

1/2 PP0

0

K 4T = y10

y31/2 y4

1 /2 PP0

0

K 5T = y2

y6 y41/2 P

P0

−1 /2

K 6T = y1

y5 y41/2 P

P0 −1 /2

. (8.95)

Chamamos a sua atenção para o fato de que as conhecidas Eqs. 8.95 só podem ser

empregadas quando a mistura em equilíbrio puder ser considerada como de gases perfeitos

a T,P, uma hipótese, aliás, bem razoável nos processos de combustão encontrados na

prática.

Em cada uma das reações de equilíbrio a reação se desloca para a esquerda ou

direita conforme alteramos a pressão ou a temperatura da reação.

Como poderemos saber a direção em que uma determinada reação se deslocará se

alterarmos a sua pressão, enquanto mantemos a sua temperatura inalterada?

Vamos estudar a primeira (ou a segunda) das Eqs. 8.95. Como o produto do lado

direito é constante, se aumentarmos a pressão P, o numerador da relação de frações

molares deve diminuir e o denominador aumentar, ou seja, a reação se desloca em direção

aos reagentes, para a esquerda.

Vamos ver agora a reação 5 (ou a reação 6): o aumento da pressão implicará o

aumento do numerador (por quê?) e a diminuição do denominador, deslocando a reação

para a direita, no sentido dos produtos.

O que podemos dizer das reações 3 ou 4? Claramente a alteração da pressão não

terá efeito sobre estas reações (por quê?).

Então, já podemos estabelecer uma regra: se o número de moles dos produtos for

maior do que o número de moles dos reagentes, então o aumento da pressão causará um

deslocamento para os reagentes e vice-versa. Este é o chamado princípio de Le Chatelier.

O que podemos dizer a respeito do efeito da temperatura? Se o valor da constante de

equilíbrio aumentar com a temperatura, então um aumento da temperatura implica um

deslocamento da reação no sentido dos produtos (por quê?). Ao contrário, se o valor da

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL140

Page 141: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

constante de equilíbrio decrescer com o aumento da temperatura, então a reação

correspondente se deslocará para os reagentes. Ou seja, não poderemos decidir qual é o

efeito enquanto não analisarmos com mais detalhes o comportamento da constante de

equilíbrio com a temperatura.

Para uma substância pura i podemos escrever:

d g i=−S i dT v i dP

A diferencial calculada a pressão constante ficará:

d g i P=−si dT P=−h i−g i

TdT P . (8.96)

Rearranjando a Eq. 8.96 e dividindo-se por T 2 :

T d g i P−g i dT P

T 2 =−hi

T 2 dT P , (8.97)

de onde obtemos:

d g i

T P

=−hi

T 2 dT P . (8.98)

Vamos rescrever a mesma expressão para a substância pura i mas no estado padrão

a T , P0 , dividindo adicionalmente por R :

d g i0

RT P0

=−hi

0

RT 2 dT P 0 . (8.99)

Então, para qualquer uma das reações de equilíbrio k podemos escrever:

d Gk0

RT P 0

=− H k

0

R T 2 dT P 0 , (8.100)

ou ainda, da definição de constante de equilíbrio:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 141

Page 142: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

d ln K k = H k

0

R T 2 dT P0=− H k

0

Rd 1

T P 0

. (8.101)

Assim como a variação da função de Gibbs associada a cada uma das k reações,

podemos também definir H k0T , P0 , a entalpia de reação no estado padrão a T ,P0 .

De fato, por analogia com as Eqs. 8.89, podemos escrever:

1/2 H 2 ⇔H 1/2 H 2 H H 10 = h7

0−1/2h6

0

1/2O 2⇔O 1 /2O2 O H 20 = h8

0−1/2h4

0

1/2 H 21/2O2 ⇔OH 1/2 H 21/2O2 OH H30 = h9

0−1/ 2h6

0−1 /2h4

0

1/2 N 21/2O 2⇔NO 1/ 2 N 21/2O2 NO H 40 = h10

0−1 /2h3

0−1/2h4

0

H 21 /2O2⇔ H 2O H 21/2 O2 H 2O H50 = h2

0−h6

0−1 /2h4

0

CO1 /2O2⇔CO2 CO1/2O 2CO 2 H 60 = h1

0−h5

0−1/ 2h4

0

.

(8.102)

A característica principal da entalpia de reação é que o seu valor é positivo para as

reações endotérmicas, ou seja, que absorvem energia, como as de dissociação 1 e 2 e

negativo para as reações exotérmicas, ou seja, que liberam energia, como as de oxidação

3, 4, 5 e 6. Assim como a função de Gibbs do estado padrão, a entalpia de reação também

está estreitamente associada a uma determinada reação de equilíbrio. Se multiplicarmos a

reação por um número positivo ou negativo, a entalpia de reação será afetada da mesma

forma.

Da análise da Eq. 8.101 podemos concluir duas coisas. A primeira, que o logaritmo da

constante de equilíbrio varia linearmente com o inverso da temperatura absoluta, se a

entalpia de reação for razoavelmente constante no intervalo de temperatura considerado. A

segunda, que a variação da constante de equilíbrio com a temperatura depende apenas do

sinal da entalpia de reação. Se a reação considerada for endotérmica, o valor da constante

de equilíbrio aumenta com a temperatura, ou seja, a dissociação aumenta com a

temperatura (por quê?), ao passo que o valor decresce com o aumento da temperatura para

as reações exotérmicas, ou seja, a reação se desloca no sentido dos reagentes (por quê?).

A propósito, a Eq. 8.101 é denominada equação de Van't Hoff.

Retornando ao equacionamento do problema original, vamos assumir que os

produtos de combustão formam uma mistura de gases perfeitos a T,P. Expressando as Eqs.

8.95 em termos de número de moles:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL142

Page 143: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

K 1T =n7

n61/2 n1 /2 P

P0 1/2

K 2T =n8

n41 /2 n1/2 P

P0 1 /2

K 3T =n9

n61/2 n4

1 /2 PP0

0

K 4T =n10

n31 /2 n4

1/2 PP0

0

K 5T =n2 n1 /2

n6 n41 /2 P

P0 −1/2

K 6T =n1 n1 /2

n5 n41 /2 P

P0 −1/2

. (8.103)

Quantas e quais são afinal as equações do sistema? Vejamos: são as seis equações

com as constantes de equilíbrio, Eqs. 8.103, adicionadas das quatro equações de

conservação dos elementos químicos, Eqs. 8.66, a soma do número de moles n encontrada

na última das Eqs. 8.70 e uma equação para as , Eq. 8.59, em um total de doze equações.

Analisando as Eqs. 8.59, 8.66, 8.70 e 8.103, chegamos ao seguinte conjunto de dezenove

variáveis:

, , , , , as , n1 , n2 , n3 , n4 , n5 , n6 , n7 , n8 , n9 , n10 , n , T , P , ou seja, sete a mais do que o

número de equações do sistema, consistente com o número que obtivemos com o método

dos multiplicadores de Lagrange. Da mesma forma que com aquele método, precisamos de

sete equações ou dos meios para obter o valor de sete variáveis, para que possamos buscar

soluções para o problema. Em geral, , , , e consequentemente as , são valores

dados pela escolha do combustível e a razão de equivalência é um parâmetro a ser

investigado. Resta-nos então a temperatura T e a pressão P dos produtos de combustão.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 143

Page 144: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

9.M9.MISTURASISTURAS H HETEROGÊNEASETEROGÊNEAS: E: EQUILÍBRIOQUILÍBRIO DEDE F FASESASES

Até esta parte do nosso estudo, adquirimos a capacidade de resolver qualquer tipo de

problema que possa ser modelado como misturas homogêneas, seja considerando-as como

solução ideal, seja tratando-as como pseudo-substâncias puras e lançando mão de um

modelo pseudo-crítico apropriado. Resta-nos a questão: o que fazer quando a mistura for

heterogênea? Mesmo se não tenhamos a resposta ao problema mais geral, pelo menos um

caso de mistura nestas condições vale a pena abordar: a mistura em equilíbrio de fases.

Seja então o sistema fechado binário bifásico à temperatura T e pressão P uniformes,

contendo nA moles de A e nB moles de B, sendo que cada fase (1) e (2) contém ambas as

substâncias A e B. Determine as condições pelas quais há equilíbrio de fases.

A fração molar de cada componente em cada fase será dada por:

y A1=

nA1

nA1nB

1 , (9.1)

yB1=

nB1

nA1nB

1 , (9.2)

y A2 =

nA2

nA2nB

2 (9.3)

e

yB2 =

nB2

nA2nB

2 . (9.4)

Claramente,

y A1 yB

1=1 e y A

2 yB

2 =1 (9.5)

mas veremos que a relação entre y A1 e y A

2 ou então entre yB1 e yB

2 não é nada

trivial, muito ao contrário, pertence à essência do que vamos estudar agora.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL144

Page 145: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Quando se fixa a temperatura e a pressão de um sistema, a propriedade

termodinâmica natural para se analisar o seu comportamento é a função (ou energia livre)

de Gibbs. Pode-se mostrar que com T e P constantes, o sistema irá se aproximar do

equilíbrio através da minimização da função de Gibbs total G da mistura. Como cada fase é

uma mistura homogênea, podemos escrever:

G 1=G 1

T , P , n A 1 , nB

1 e G 2

=G 2T , P , n A

2 , nB 2

(9.6)

e pela regra da cadeia,

dG 1=∂G 1

∂ T

P ,nA1

, n B1 dT

∂G1

∂ P

T ,nA1 , n

B1 dP

∂G 1

∂ nA1 T , P , n

B 1 dnA

1

∂G1

∂nB1

T , P ,n

A1 dnB

1 ,

(9.7)

dG 2 =∂ G 2

∂T

P , nA 2

, nB 2 dT

∂G2

∂PT ,n

A 2 , n

B2 dP

∂G2

∂ nA2

T , P ,n

B 2 dnA

1

∂G2

∂nB 2 T , P , n

A 2 dnB

2.

(9.8)

Observe que, conforme aprendemos, os dois últimos termos de cada equação

definem a função de Gibbs parcial molar de cada componente em cada fase (1) e (2). Além

disso, vamos manter a temperatura e a pressão constantes para analisar o efeito sobre a

função de Gibbs total do sistema provocado pela variação das concentrações dos

componentes nas fases. Podemos, então, escrever

dGT , P=dGT , P1

dGT , P2

=

GA1

T , P , y A1 dnA

1 GB

1T , P , y A

1 dnB

1

GA2

T , P , yA2

dnA2 GB

2T , P , yA

2dnB

2

. (9.9)

A propósito, o coeficiente de dni para cada componente i é o potencial de

transferência de massa do componente i na mistura, denominado potencial químico (ou

eletroquímico) μ i do componente i na mistura a T e P. Se o equilíbrio térmico é a igualdade

de temperaturas e o equilíbrio mecânico é a igualdade de pressões, podemos supor que o

equilíbrio químico será dado pela igualdade de potenciais químicos do componente. Você

pode verificar que o potencial químico coincide com a função de Gibbs parcial molar e, de

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 145

Page 146: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

fato. Ambos podem ser usados intercambiavelmente. (Será que o potencial químico pode

ser igual a entalpia parcial molar, por exemplo?)

Bem, o que temos aqui? qualquer decréscimo de A em (1) ( dn A 1

0 ) deve ser

acompanhado de um aumento de A idêntico em (2) ( dn A 2

=−dnA1 ) e analogamente para B.

Portanto,

dGT , P=[ GA1−GA

2]dnA

1[ GB

1−GB

2]dnB

1 , (9.10)

de modo que )1(Adn e )1(

Bdn são verdadeiramente independentes. No equilíbrio, desde que T,P

sejam constantes, a composição das fases não mais se altera. Para obter-se o equilíbrio, a

minimização da função de Gibbs do sistema exige que PTdG , = 0 e, portanto, concluímos que

GA1

T , P , y A1 =G A

2T , P , y A

2 , (9.11)

GB1

T , P , y A1 =GB

2T , P , y A

2 . (9.12)

A forma funcional ressalta que temos quatro variáveis independentes T , P , y A1 , y A

2 ,

porém, somente duas equações! Isso quer dizer que, para que possamos resolver este

sistema de equações, temos que fornecer o valor de quaisquer duas destas variáveis.

Vamos supor que fornecemos T e P. Então, todas as demais variáveis estarão determinadas

pela solução do sistema de equações dado pelas Eqs. 9.11 e 9.12.

De um modo geral, seja uma mistura a T e P com p fases e n componentes, cada um

destes fazendo parte da composição da mistura homogênea em cada uma das fases. A

fração molar de cada componente i em cada fase j será dada por:

y i j =

ni j

∑i=1

n

ni j . (9.13)

para cada componente i de cada fase j.

As variáveis independentes para esta mistura passam a ser

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL146

Page 147: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

T , P , y11 , y2

1 , ... , yn−11 , y1

2 , y22 , ... , yn−1

2 , ... , y1 p , y2

p ,... , y n−1 p cujo total é de p n−12

incógnitas (por quê?). O sistema de equações, por sua vez, será dado pelas igualdades dos

potenciais químicos de cada componente em cada fase:

11

T , P , y11 , y2

1 ,... , y n−11

=12

T , P , y12 , y2

2 ,... , yn−12

=...=1 p

T , P , y1 p , y2

p , ... , yn−1 p

21

T , P , y11 , y2

1 ,... , y n−11

=22

T , P , y12 , y2

2 ,... , yn−12

=...=2 p

T , P , y1 p , y2

p , ... , yn−1 p

...n

1T , P , y1

1 , y21 ,... , y n−1

1=n

2 T , P , y1

2 , y22 ,... , yn−1

2=...=n

p T , P , y1

p , y2 p , ... , yn−1

p

(9.14)

que é, na verdade, um sistema de p−1n equações (por quê?).

Vamos estudar o caso de uma única substância pura com mais de uma fase:

g 1

T , P =g 2

T , P , (9.15)

uma equação com T,P como as duas únicas variáveis. Ora, se fornecermos uma delas, a

outra estará determinada, ou seja, T=T P ou P=P T , resultado que demonstra as

afirmações que fizemos sobre o comportamento de uma substância pura na saturação. Se

forem três as fases:

g 1

T ,P =g 2

T , P =g 2

T , P , (9.16)

e obteremos agora, duas equações com duas variáveis: T e P. Portanto, o sistema está

determinado, de forma que T e P são fixos em qualquer um dos estados do ponto triplo de

uma substância pura, como aliás você já sabia! Agora, aproveite seus conhecimentos e

verifique as possibilidades com quatro fases.

9.1.A Regra das Fases de Gibbs

De fato, temos um padrão aqui: se o número de componentes é n e o número de

fases é p, já sabemos que teremos n p−1 equações do equilíbrio. Em compensação,

sabemos também que o sistema envolve p n−12 variáveis. Então, os graus de

liberdade (ou variança) V, ou seja, o número de incógnitas menos o número de equações do

sistema, será dada por

V =p n−12−n p−1=n− p2 . (9.17)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 147

Page 148: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

A Eq. 9.17 é conhecida como a Regra das Fases de Gibbs. Através dela ficamos

sabendo quantas variáveis são livres em sistemas multicomponentes multifásicos em

equilíbrio. Escreva as equações e as incógnitas e estude a variança que é obtida para uma

mistura com 2 ou 3 componentes com um número crescente de fases.

9.2.A Relação de Clausius-Clapeyron

Voltemos ao sistema com um componente e duas fases. Podemos escrever, pela

definição de g:

h1−T s

1 =h2

−T s2

ou

h2−h1

=T s2−s

1 . (9.18)

Por outro lado,

d g1=d g

2 (9.19)

e também,

s1 dT v

1 dP=s2 dTv

2 dP (9.20)

que, re-arranjando, torna-se

dPdT

=s

2−s

1

v2−v

1=h2

−h1

T v2−v

1

. (9.21)

Esta importante equação, conhecida como Relação de Clausius-Clapeyron, estabelece a

relação funcional entre P e T durante a saturação de quaisquer duas fases em equilíbrio de

uma única substância pura e fornece a base para o estabelecimento das curvas de pressão

de vapor e das propriedades da saturação, encontradas nas tabelas termodinâmicas. Sejam

as fases liquido e vapor. Podemos escrever

h lv= hv−hl e Z lv=Z v−Z l

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL148

Page 149: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

e, para os volumes específicos,

vv=Z v

R T

P T e v l=

Z lR T

P T .

Substituindo-se na Eq. 9.21, obtemos

dPP

=hlv

Z lv RdTT 2 =−

hlv

Z lv Rd

1T

=d ln P . (9.22)

Se h lv/ Z lvR , que é um valor sempre positivo (por quê?), for constante no intervalo

de temperaturas considerado, a Eq. 9.22 representa uma reta decrescente entre ln P e

1/T .

Na forma de coordenadas reduzidas,

d ln P r=−[h*

−hl−h*−hv

Z lvR T C

]d 1T r

. (9.23)

9.3.O Sistema Binário Bifásico

Retornemos ao caso de um sistema binário (dois componentes A e B) bifásico (duas

fases) e vamos admitir novamente que as fases sejam líquido e vapor. Você deve

demonstrar que, pela regra das fases de Gibbs, temos dois graus de liberdade e que as

incógnitas devem ser T ,P , y AL , y A

V . Assim, se fixarmos a pressão do sistema P, e

variamos a sua temperatura T, as concentrações serão funções apenas de T, ou seja,

postas em gráfico bidimensional. Um dos possíveis diagramas de fase está na Fig. 9.1.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 149

Page 150: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Quando se aquece um líquido de composição yA a partir do ponto H, ao chegar no

ponto J, surge a primeira bolha de vapor com uma concentração bastante elevada de B. O

lugar geométrico desses pontos representa a curva de ponto de bolha. Desse ponto J em

diante vão se alterando as concentrações de A (e de B) tanto na fase do líquido como na do

vapor. Quando passar pelo ponto K, as concentrações no vapor e no líquido serão yA(V) e yA

(L)

respectivamente. Chegando ao ponto M, desaparecerá a última gota de líquido, que terá

uma elevada concentração de A. A linha que une esses pontos é denominada curva de

ponto de orvalho. Daí em diante, se continuarmos aumentando a temperatura do sistema,

obteremos somente vapor cuja concentração será a mesma concentração original yA, é

claro.

Note que as concentrações de A (e de B) foram definidas dentro de cada fase e,

portanto, concentrações em fases diferentes não estão diretamente relacionadas (não se

somam, por exemplo). Perceba, também, que quando yA é igual a zero, trata-se de B puro e,

portanto, a temperatura desse ponto corresponde simplesmente à temperatura de saturação

à pressão P. Por raciocínio análogo, quando yA é igual à unidade, trata-se da temperatura de

saturação de A puro em P. Notemos, de passagem, que B é mais volátil do que A (por

quê?), um fato importante quando desejamos separar B e A por destilação. Pense em etanol

e água, por exemplo.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL

vaporPPTT

yA

0 1yA

(V) yA

(L)

líquido

saturação

H

M

K

Jlíquido-vapor

Fig.9.1 – Diagrama de fases para P constante de sistema binário bifásico

150

Page 151: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Aumentando-se a pressão, as curvas que encerram a região de saturação se

deslocam para cima e seu limite é estabelecido por uma envoltória limitada à esquerda e à

direita pelos pontos críticos de B e de A (Você sabe dizer por quê?).

Uma seção de temperatura constante enquanto se varia a pressão do sistema, revela

um cenário similar ao descrito no que se refere às concentrações de A (e de B) no líquido e

no vapor.

Existem sistemas binários bifásicos nos quais, sob uma concentração bem definida, o

líquido passa diretamente para a fase vapor como se fosse uma substância pura. Estas são

as misturas azeotrópicas, que tem tido importância crescente como fluidos refrigerantes,

para substituir os fluoro-carbonados.

Os diagramas de fase do tipo da Fig. 9.1 são adequados para líquidos e vapores

miscíveis em todas as proporções. Se os líquidos forem parcialmente miscíveis, mas

imiscíveis em grandes concentrações tanto de A em B, como de B em A, o diagrama exibirá

mais duas fases, com mostra a Fig. 9.2.

Observe que no caso dos diagramas do tipo da Fig. 9.2, existirão várias regiões

bifásicas Lβ + Lα, Lβ + Vapor, Vapor + Lα e um ponto trifásico (onde está?), onde as três fases

convivem em equilíbrio.

Uma discussão completamente análoga pode ser apresentada para sistemas binários em

líquidos, sólidos e na região bifásica líquido + sólido.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL

VaporPP

TT

yA

0 1

Vapor + Lα

Lβ + Vapor

αβ LL +

βL

αL

Fig.9.2 – Diagrama de fases para líquidos parcialmente miscíveis

151

Page 152: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Estes são aspectos qualitativos ou até mesmo obtidos experimentalmente.

Gostaríamos, entretanto, de sermos capazes de modelar quantitativamente o equilíbrio de

fases. Para isso, precisaremos da propriedade termodinâmica fugacidade, que para o caso

de substância pura foi definida na Seção 6.8.

Seja o caso de um único componente em equilíbrio líquido-vapor. Então, da Eq. 9.15

e da definição de fugacidade de substância pura, obtemos:

f l T , P= f v T , P . (9.24)

Já sabemos que existe uma relação entre P e T. Além disso, observe que a Eq. 9.24 é

razão pela qual não existem linhas separadas de liquido saturado e de vapor saturado (um

domo de vapor), como é o caso da entalpia e da entropia. Se o vapor saturado estiver na

região de gás perfeito a T:

f l= f v=PSATT . (9.25)

A fugacidade do líquido comprimido f LC (e do sólido) pode ser obtida integrando-se

a Eq. 6.X desde PSAT a um P qualquer, mantendo-se a temperatura T constante:

ln f LC

f lT

=∫P SAT

PvR T

dPT . (9.26)

Vamos definir o Fator de Poynting F como sendo

F=exp ∫P SAT

Pv

R TdPT . (9.27)

Como v e muito pequeno, podemos ainda, se as diferenças de pressão não forem

muito grandes, aproximar a Eq. 9.27 por:

F≃exp [ vR T

P−PSAT ]≃1 . (9.28)

Substituindo-se F na Eq. 9.26 e rearranjando-se:

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL152

Page 153: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

f LCP ,T = f l T F≃ f l T , (9.29)

donde concluímos ainda que, se o vapor saturado for gás perfeito

f LCP ,T ≃ f l F=PSATT F≃PSAT

T (9.30)

e mediante raciocínio análogo, você pode mostrar que o mesmo vale para a fugacidade de

sólidos e a saturação sólido-vapor de uma substância pura.

9.5.A Fugacidade de Misturas Homogêneas

Aproveitando-se do conceito estabelecido para substância pura, podemos definir a

fugacidade do componente i, f i , em uma mistura homogênea qualquer a T e P como:

d G iT=RT d ln f iT (9.31)

desde que

limP0

f i

y i P =1 . (9.32)

Em outras palavras, se a fugacidade de i puro, fi , tende à pressão P, então nada

mais natural que a fugacidade de i na mistura, f i , tenda à pressão parcial de i na mistura

de gases perfeitos. Fique atento à nossa notação: a fugacidade do componente i na mistura

tem uma barra por cima da letra f, além do componente i como subscrito, ao passo que a

fugacidade do componente puro não tem a barra por cima.

9.6.A Fugacidade no Equilíbrio de Fases

Consideremos um sistema binário bifásico a T,P. Então, vimos pelas Eqs. 9.11 e 9.12

que podemos expressar o equilíbrio das fases 1 e 2 por:

GA1

T ,P , y A1 =G A

2 T , P , y A

2

GB1

T ,P , y A1 =GB

2 T , P , y A

2

ou A

1T , P , y A1=A

2T , P , y A2

B1

T , P , y A1=B

2T , P , y A

2

de onde concluímos que

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 153

Page 154: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

d G A1

T=d GA2T

d GB1

T=d GB2T

(9.33)

e, substituindo-se pelas fugacidades na mistura a T e P,

f A1T , P , y A

1=f A

2 T , P , y A

2

f B1T , P , y A

1=f B

2 T , P , y A

2

, (9.34)

ou seja, o equilíbrio químico é obtido quando, para todos os componentes que participam do

equilíbrio, a fugacidade de cada componente em cada fase é igual à fugacidade do mesmo

componente em cada uma das fases.

De modo geral, para uma mistura de n componentes e p fases:

f 11T , P , y1

1 , y21 ,... , yn−1

1 =f 12T ,P , y1

2 , y22 , ... , yn−1

2 =...=f 1 p T , P , y1

p , y2 p ,... , yn−1

p

f 21T , P , y1

1 , y21 ,... , yn−1

1=f 2

2T ,P , y1

2 , y22 , ... , yn−1

2=...=f 2

p T , P , y1

p , y2 p ,... , yn−1

p

...f n

1T , P , y1

1 , y21 ,... , yn−1

1=f n

2T ,P , y1

2 , y22 , ... , yn−1

2=...=f n

p T , P , y1

p , y2 p ,... , yn−1

p

(9.35)

com as variáveis T ,P , y11 , y2

1 , ... , yn−11 , y1

2 , y22 ,... , yn−1

2 ,... , y1 p , y2

p , ... , yn−1 p .

Bem, embora a formulação da Eq. 9.39 seja bastante geral, ainda não podemos

determinar quantitativamente o equilíbrio sem um modelo para as fugacidades de cada

componente na mistura homogênea de cada fase. Aproveitando o nosso conhecimento

sobre misturas homogêneas, vamos estudar alguns modelos a partir da solução ideal, da

mistura de gases perfeitos e finalmente da mistura como pseudo-substância pura.

9.7.O Modelo de Solução Ideal para o Equilíbrio

Pode-se demonstrar que, para uma mistura homogênea que se comporta como

solução ideal a T,P:

f i= y i f iT , P (9.36)

para todos os componentes i da solução ideal. Esta relação entre a fugacidade do

componente na mistura e a fugacidade do componente puro, é conhecida como Lei de

Lewis-Randall.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL154

Page 155: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

Consideremos um sistema binário bifásico de A e B, em equilíbrio líquido-vapor a T,P.

Vamos admitir que tanto o líquido como o vapor se comportam como soluções ideais. Então,

substituindo a regra de Lewis-Randall nas equações de equilíbrio, temos

yA L f A

LT ,P = y A

V f AV

T , P

1− y AL

f B L

T , P =1− yAV

f BV

T , P . (9.37)

As variáveis são T ,P , y AL , y A

V . Observe que, se conhecermos T,P podemos, em

princípio, determinar as fugacidades das substâncias puras A e B. O problema é que nós

temos duas fugacidades distintas, uma para cada fase L e V, para o mesmo T,P. Temos,

então, que lançar mão de estados hipotéticos! Vamos discutir um exemplo: água pura a

25°C e 0,1 MPa está, como já vimos anteriormente, em um estado de líquido (levemente)

comprimido, ao passo que água naquelas mesmas condições, mas em forma de gás, só

pode ser um estado hipotético...

Se você não entendeu o aparecimento do estado hipotético da água, considere o ar

úmido, que é ar seco misturado com vapor de água. Se este ar estiver em equilíbrio com a

água (A) líquida a T = 25°C e P = 0,1 MPa, então, aplicando-se a Lei de Lewis-Randall

somente para a água (por que não aplicamos para o ar seco também?):

y AV f A

V T , P= f A

LT , P . (9.38)

Sabemos que a fugacidade da água como líquido comprimido a T,P , onde F é o Fator

de Poynting, pode ser expressa por:

f ALT , P =P A

SAT T F≃P ASAT T (9.39)

Veja bem: a fugacidade da água líquida pura a T,P, que é líquido levemente

comprimido, é aproximadamente igual à pressão de saturação em T. Por outro, lado, qual

seria a fugacidade da água pura como vapor (V) a T,P? Estamos claramente diante de um

estado hipotético da água... A fugacidade da água na fase vapor, se puder ser considerada

como gás perfeito a T,P ficará:

f AV T ,P =P (9.40)

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 155

Page 156: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

de forma que a equação do equilíbrio Eq. 9.39 se torna:

y AV P=PA

SAT T F≃PASAT T , (9.41)

ou seja, a pressão parcial que a água exerce no ar úmido considerado como uma mistura de

gases perfeitos em equilíbrio a T,P com a água líquida é praticamente igual a pressão de

saturação da água pura na temperatura T. Você consegue entender agora a diferença entre

a saturação líquido-vapor de uma substância pura e a saturação daquela mesma substância

com o líquido na presença de seu vapor acrescido de um gás não condensável?

9.8.O Modelo Regra de Raoult-Gás Perfeito

O desenvolvimento anterior nos dá a pista para evitarmos os estados hipotéticos no

equilíbrio líquido-vapor: Basta considerarmos a fase vapor como se fosse gás perfeito.

Assim, juntando o modelo de solução ideal com gás perfeito, obtemos, para um sistema

binário bifásico a T,P em equilíbrio líquido-vapor:

y A L P A

SATT = y A

V P

1− y AL

PBSAT

T =1− yAV

P(9.42)

que representa um sistema de duas equações a quatro incógnitas. Se fornecermos T,P,

então seremos capazes de determinar todas as concentrações de A e B, tanto na fase

líquida, como na fase vapor. Este é o modelo da Regra de Raoult-gás perfeito, que é simples

e funciona razoavelmente bem apenas para pressões moderadas. Reveja o exemplo

anterior do ar úmido saturado e você se dará conta de que utilizamos a Regra de Raoult-gás

perfeito para resolvê-lo.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL156

Page 157: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

10.I10.INTRODUÇÃONTRODUÇÃO AOSAOS C CICLOSICLOS T TERMODINÂMICOSERMODINÂMICOS

Verificamos em capítulos anteriores que poderíamos, desde que não violássemos a

primeira e a segunda lei da termodinâmica, obter trabalho (ou minimizar o trabalho) em um

processo cíclico trocando calor com uma fonte quente e uma fonte fria, daí o conceito de

máquina térmica e refrigerador. Aprendemos também que o ciclo de Carnot, composto de

processos completamente reversíveis, é o que apresenta o maior rendimento entre todos os

ciclos que operam entre as mesmas temperaturas. Então, nada mais natural que

procuremos emular o melhor que pudermos o ciclo de Carnot. Descobriremos sem muito

esforço que, para um rendimento razoável do nosso ciclo, precisaremos lançar mão de

quatro processos básicos, sendo que dois deles operariam trocando calor à temperatura

constante alta e baixa do ciclo respectivamente e os outros dois processos fariam a conexão

que fecharia o ciclo.

10.1.Ciclo de Rankine

Quando se observa o comportamento das substâncias puras, chama-nos a atenção a região

de saturação na qual a temperatura permanece constante enquanto a pressão não se altera.

Então, na região de saturação, se evaporarmos, de um lado, e condensarmos, do outro,

uma substância pura e conectarmos, pelos processos mais reversíveis que pudermos obter,

o lado de baixa pressão com o lado de alta pressão, poderíamos ter um ciclo realizado na

prática e com eficiência razoável. Quando a evaporação no evaporador (ou gerador de

vapor) se dá no lado de alta pressão; a queda da pressão de alta para a baixa é

transformada em trabalho mecânico, dentro de uma turbina adiabática; a condensação

acontece no lado de baixa pressão, no condensador; e o ciclo é fechado por meio de uma

bomba adiabática que repõe o fluido de trabalho na pressão de alta, temos o ciclo de

Rankine.

10.2.Ciclo de Refrigeração por Compressão de Vapor

Se o evaporador troca calor no lado de baixa pressão; o fluido de trabalho gasoso é

comprimido para a pressão de alta no compressor adiabático; o condensador troca calor na

pressão de alta e, finalmente, o fluido líquido é estrangulado para a pressão de baixa

através de uma válvula, então temos o ciclo de refrigeração por compressão de vapor.

Trata-se de um refrigerador, se o espaço de alta pressão (e, portanto, temperatura) for o

meio-ambiente, este considerado um reservatório térmico em T0, e de uma bomba de calor

se o meio-ambiente for o espaço de temperatura mais baixa.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 157

Page 158: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

10.3.Ciclos Padrão de Ar de Otto, Diesel e Stirling

Se considerarmos agora um gás perfeito, veremos que podemos construir um ciclo de

Carnot em um sistema fechado composto por duas isotérmicas a volume constante e duas

expansões adiabáticas. Este é o ciclo de Otto, que simula o comportamento de um motor de

combustão interna de ignição por centelha. Se substituirmos o processo de calor

isovolumétrico que substitui a combustão, por uma troca de calor à pressão constante,

obtemos o ciclo de Diesel, que simula um motor de combustão interna de ignição por

compressão. Se tivermos transferência de calor também durante os dois processos a

volume constante, além do calor trocado nos dois processos a temperatura constante,

obteremos o ciclo de Stirling.

10.4.Ciclo Padrão de Ar de Brayton de Turbina a Gás

Consideremos agora um ciclo do gás perfeito que ocorra através de quatro processos em

ciclo aberto e regime permanente. Então, haverá uma compressão adiabática, uma troca de

calor para o fluido à pressão constante, uma expansão adiabática e uma rejeição de calor do

fluido de trabalho para o ambiente. Com esse procedimento, criamos o ciclo de Brayton, que

simula motores a jato, turbo-hélice e turbinas a gás.

10.5.Ciclos Mistos

Existem muitas situações em que é desejável combinarmos dois ciclos, tanto os de potência

quanto os de refrigeração, em série, tal que o evaporador de um é parte do condensador do

outro e assim por diante, nos chamados ciclos combinados.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL158

Page 159: Curso de Termodinamica Computacional

TERMODINÂMICA APLICADA

BBIBLIOGRAFIAIBLIOGRAFIA C COMENTADAOMENTADA

Todos os livros de Termodinâmica são muito parecidos entre si, embora a abordagem

deste ou daquele tópico seja feita com maior ou menor aprofundamento. Em nível de

graduação em Engenharia Mecânica, destacamos o Van Wylen et al em sua antiga quarta

edição, a qual vem com um disquete cujo conteúdo não apenas substitui com vantagem

todas as tabelas do livro, mas também inclui um aplicativo que facilita tremendamente a

utilização das coordenadas generalizadas de Lee-Kesler, com fator acêntrico e tudo e, até

mesmo, rotinas em Fortran 77, para incluir em programas desenvolvidos pelo leitor. Mas por

que a quarta edição? Porque esta é a última edição que ainda continha a mais completa

abordagem de misturas ideais que já encontramos em graduação em Engenharia Mecânica.

Temos ainda Moran, um livro-texto que tem sido muito adotado nas escolas. Três outros

livros, para além da graduação, são: Callen, com a sua abordagem axiomática geral, Modell

& Reid, que tratam muito bem a questão das restrições internas a um sistema e Bejan, que,

além de uma revisão rigorosa da Termodinâmica Clássica, analisa a eficiência do ponto de

vista exergético e da minimização da geração irreversível da entropia, para modelos de

sistemas de potência e refrigeração típicos.

Referências:

VAN WYLEN, G.L., SONNTAG, R.E. & BORGNAKKE, C., Fundamentos da Termodinâmica

Clássica, Ed. Edgard Blücher Ltda., 4a edição, 1994.

MORAN, M.J. & SHAPIRO, H.N., Fundamentals of Engineering Thermodynamics, John

Wiley & Sons, Inc., 1992.

MODELL, M., REID, R. Thermodynamics and Its Applications, Prentice-Hall, Second Edition,

1983.

CALLEN, H. B. Thermodynamics, John Wyley, 1960.

BEJAN, A. Advanced Engineering Thermodynamics, John Wiley, Second Edition, 1997.

TERMODINÂMICA COMPUTACIONAL 159