curso de propriedade intelectual & inovação no...

189
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento ISBN: 978-85-7426-111-9 curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócio Brasil 2º Semestre 2010 Módulo II Indicação Geográfica 2ª Edição

Upload: lamlien

Post on 08-Feb-2019

224 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Ministério da Agricultura, Pecuária e AbastecimentoISBN: 978-85-7426-111-9

curso de propriedade intelectual& inovação no agronegócio

Brasil 2º Semestre 2010

Módulo IIIndicação Geográfica

2ª Edição

Page 2: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Catalogação na publicação por: Onélia Silva Guimarães CRB-14/071

© 2010. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento Todos os direitos reservados. É permitida a reprodução parcial e total desta obra, desde que citada a fonte e que não seja para a venda ou qualquer fim comercial.

A responsabilidade pelos conteúdos técnicos dos textos e imagens desta obra é dos autores.

Tiragem: 800 exemplares

2ª edição. Ano 2010.

Elaboração, distribuição, informações: MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO

Secretaria de Desenvolvimento Agropecuário e Cooperativismo - SDC

DEPARTAMENTO DE PROPRIEDADE INTELECTUAL E TECNOLOGIA DA AGROPECUÁRIA - DEPTA

Esplanada dos Ministérios, Bloco D, Edifício Anexo, Ala A, Segundo Andar, Sala 233 - Brasília - DF - Brasil - Cep: 70043-900

Telefones: (61) 3218 2361 / 2761

Fax: (61) 3322 0676

Email: [email protected]

Homepage: www.agricultura.gov.br

B823c Brasil. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento Curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócio : Módulo II, indicação geográfica / Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento ; organização Claire Marie Cerdan, Kelly Lissandra Bruch e Aparecido Lima da Silva. – 2ª ed. – Brasília : MAPA, Florianópolis : SEaD/UFSC/FAPEU, 2010. 376 p. : il.

Inclui bibliografia ISBN: 978.85.7426.111-9 1. Agronegócios. 2. Indicações geográficas. 3. Produtos agropecuários. 4. Fomento. 5. Proteção. 6. Educação a distância. I. Cerdan, Claire Marie. II. Bruch, Kelly Lissandra. III. Silva, Aparecido Lima da. IV. Título.

CDU: 338.43

Page 3: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

REITORProf. Alvaro Toubes Prata

VICE-REITORProf. Carlos Alberto Justo da Silva

Secretaria de Educação a Distância (SEaD)

COORDENAÇÃO GERALProf. Cícero Ricardo França Barboza

COORDENAÇÃO FINANCEIRAProf. Vladimir Arthur Fey

Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária (FAPEU)

DIRETORIA EXECUTIVAProf. Pedro da Costa Araújo – Superintendente Geral

Prof. Cleo Nunes de Souza - Diretor GeralProf. Gilberto Vieira Ângelo – Diretor AdministrativoProf. Elizabete Simão Flausino – Diretora Financeira

Page 4: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Organização do Conteúdo

Claire Marie Thuillier Cerdan, Kelly Lissandra Bruch, Aparecido Lima da Silva e Luiz Otávio Pimentel

Produção de Conteúdo

Aparecido Lima da Silva, Carolina Quiumento Velloso, Claire Marie Thuillier Cerdan, Delphine Vitrolles, Kelly Lissandra Bruch e Michele Copetti, Aluizia

Cardori, Liliana Locatelli e Klenize Fávero.

Revisão, Atualização e Ampliação

Aparecido Lima da Silva, Carolina Quiumento Velloso, Claire Marie Thuillier Cerdan, Delphine Vitrolles, Kelly Lissandra Bruch e Michele Copetti

Revisão do Conteúdo

DEPARTAMENTO DE PROPRIEDADE INTELECUTUAL E TECNOLOGIA DA AGROPECUÁRIA DA SECRETARIA DE DESENVOLVIMENTO AGROPECUÁRIO E

COOPERATIVISMO – DEPTA/SDC

Beatriz de Assis JunqueiraEduardo Antonio Soares de MagalhãesGilberto Carlos Cerqueira Mascarenhas

José Carlos RamosJosé Maurício Andrade TeixeiraLudimila Cesar Moura Gaspar

Patrícia Metzler SaraivaReinaldo Carvalho Vergara

Apoio

O curso contém reflexões produzidas no âmbito do projeto CAPES-COFECUB n° 649/2009 “Pluralidade de selos de qualidade e arranjos

institucionais na França e no Brasil: contribuição para a produção de políticas públicas de desenvolvimento rural sustentável” que associa a Universidade Federal de Santa Catarina e a Universidade Federal Rural

de Rio de Janeiro, no Brasil, e a Universidade de Lyon 2 e UMR - Innovation et Développement dans l’Agriculture et l’Agroalimentaire - CIRAD, na França.

Page 5: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Desenvolvimento Educacional – Secretaria de Educação a Distância

PLANEJAMENTO EDUCACIONAL E SUPERVISÃO GERALAna Luzia Dias Pereira

DESIGN INSTRUCIONALMaria Hermínia Schenkel

DESIGN GRÁFICOMax Vartuli Raísa Rocha

APOIO PEDAGÓGICOAna Maria Elias Rodrigues

Débora Inácio do NascimentoGissele Cristina Pinto

Karin Rodrigues Moritz

TECNOLOGIA DE INFORMAÇÃORafael Jackson da RozaRosemeri Maria Pereira

SUPORTE TÉCNICO EM COMPUTAÇÃOAkhnaton Nunes Rebelo

Rafael Michels MottaWilton José Pimentel Filho

PRODUÇÃO DE MÍDIAS AUDIOVISUAISÁureo Moraes

Delmar dos Santos GularteGiulia Stadnick Mauro Flores

UNIDADE ADMINISTRATIVA E MONITORIACamila Napoleão

Diego Lapa da SilveiraFrancilelly Moreira Tierri

Jaqueline da SilvaNádia Rodrigues de Souza

Newton Knabben Filho

Page 6: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Apresentação

Page 7: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

O Brasil é um país com um grande número de produtos com qualidade diferencia-da, que podem ter forte identidade com sua origem geográfica dada a influência de aspectos étnicos, culturais, geográficos e climáticos. Por estas características diferen-ciadas, estes produtos podem ser objeto de interesse de mercados capazes de valo-rizar essas particularidades permitindo a agregação de valor por meio da Indicação Geográfica - IG.

Desta forma, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA iden-tifica a IG como importante ferramenta de desenvolvimento do setor agropecuário, visto que ela resgata valores como conhecimento tradicional, segurança alimentar e contribuição para o desenvolvimento rural, fixação do homem no campo, agrega-ção de valor e valorização do meio rural.

Entre os principais atores na implementação de políticas públicas voltadas para as IG estão o MAPA, na condição de agente de fomento à identificação de produtos com potencial para alcançar registro como Indicação Geográfica, e o Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI, na condição de agente responsável pela análise da pertinência da indicação e realização do registro, assegurando a segurança jurídica necessária aos detentores do direito de uso das IG e protegendo-os quanto à utiliza-ção indevida das denominações protegidas.

Para incentivar a capacitação de novos técnicos, gestores e agentes atuantes nesta ferramenta da Propriedade Industrial, o MAPA, em parceria com a Universidade Fe-deral de Santa Catarina – UFSC, dá continuidade ao curso com a segunda edição do módulo sobre Indicação Geográfica. Esta etapa é dedicada à contextualização para o reconhecimento das IG, os aspectos jurídicos, os requisitos para o registro, os im-pactos sociais, econômicos e ambientais, a delimitação geográfica, o Regulamento de Uso e o Conselho Regulador. Ao final, serão contempladas informações sobre as primeiras Indicações Geográficas brasileiras reconhecidas: Vale dos Vinhedos, Re-gião do Cerrado Mineiro, Paraty, Pampa Gaúcho da Campanha Meridional, Vale do Sinos e Vale do Submédio São Francisco.

A proposta deste trabalho é contribuir na capacitação de agentes fomentadores, pes-quisadores e técnicos em prol dos conhecimentos sobre Indicações Geográficas e outros sinais distintivos como ferramenta da Propriedade Industrial na consolidação de políticas públicas para desenvolvimento territorial sustentável, valorização dos produtos agropecuários, agregação de valor e promover a competitividade do agro-negócio em benefício da sociedade brasileira.

Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

Page 8: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Guia do Aluno

Page 9: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Caro Aluno,

Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade Intelectual e Inovação no Agronegócio – Indicação Geográfica - 2ª edição.

Este Curso é promovido pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), realizado pela Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária (FAPEU) com o apoio da Secretaria de Educação a Distância (SEaD) da Universidade Federal de Santa Ca-tarina (UFSC).

O Módulo II – Indicação Geográfica - será realizado em dez semanas, contabilizando 120 horas-aula. Durante o Curso, você contará com uma equipe especializada para acompa-nhá-lo em seu percurso: o Sistema de Apoio ao Aluno a Distância, formado por Monitores Pedagógicos, Assistentes de Conteúdo e Professores.

Para iniciar seu estudo, você recebeu um kit didático composto por um livro e uma video-aula em DVD. Além desse kit, encontram-se à sua disposição outros recursos educacionais também muito importantes para o desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem realizado a distância. São eles:

•• Teleconferências

•• Fóruns

•• Lição Virtual

•• Enquetes

•• Exercícios Complementares

•• Questionário

•• Biblioteca Virtual

•• Biblioteca Participativa

Vale ressaltar que todos esses recursos estarão disponíveis no Ambiente Virtual de Ensino e Aprendizagem (AVEA). O AVEA é o ambiente virtual em que serão desenvolvidas todas as atividades didático-pedagógicas programadas para este segundo Módulo.

Page 10: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Este Módulo, como já foi evidenciado anteriormente, tem 120 horas-aula, distribuídas em dez semanas de atividades, conforme disposto na programação a seguir:

Aulas/Carga-horária Temática Atividades

Aula 1

10h/a

Capítulo 1

Indicação Geográfica de Produtos Agropecuários: Importância Histórica e atual

Fórum de Conteúdo

Enquete

Exercícios complementares

Aula 2

10h/a

Capítulo 2

Indicações Geográficas e outros sinais distintivos: aspectos legais

Fórum de Conteúdo

Enquete

Exercícios complementares

Aula 3

15h/a

Capítulo 3

Identificação dos produtos e organização dos produ-tores

Teleconferência 1

Fórum de Conteúdo

Enquete

Exercícios complementares

Abertura do Questionário de Avaliação

Aula 4

10h/a

Capítulo 4

Delimitação Geográfica da Área: Homem, História e Natureza

Fórum de Conteúdo

Enquete

Exercícios complementares

Abertura da Lição Virtual

Aula 5

10h/a

Capítulo 5

Elaboração de regulamento de uso, Conselho Regulador e definição do controle

Fórum de Conteúdo

Enquete

Exercícios complementares

Page 11: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Aulas/Carga-horária Temática Atividades

Aula 6

10h/a

Capítulo 6

Procedimento de registro

Fórum de Conteúdo

Enquete

Exercícios complementares

Aula 7

10h/a

Capítulo 7

Gestão e controle pós-reconhe-cimento das indicações geográ-ficas

Fórum de Conteúdo

Enquete

Exercícios complementares

Aula 8

10h/a

Capítulo 8

Estudo de caso

Fórum de Conteúdo

Enquete

Exercícios complementares

Aula 9

10h/a

Capítulo 9

Estudo de caso

Fórum de Conteúdo

Enquete

Exercícios complementares

Aula 10

15h/a

Oficina Virtual

Socialização das possíveis indi-cações geográficas

Fechamento da Lição virtual

Fechamento do Questionário de Avaliação

Page 12: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

ENTENDA A ICONOGRAFIA CONTIDA NO LIVRO

O Livro constitui a base do Curso, pois aborda os principais conteúdos que serão apro-fundados no AVEA, na Videoaula e nas Teleconferências deste Módulo. Para uma melhor assimilação do conteúdo, sugerimos que você:

•• utilize o material impresso de maneira integrada com os demais recursos didáticos, como o Ambiente Virtual de Ensino e Aprendizagem e a Videoaula;

•• sublinhe todas as passagens que você achar importante e elabore seus próprios resumos;

•• tenha o hábito de fazer esquemas e anotações ao longo do texto;

•• anote as dúvidas que surgirem durante a leitura para esclarecê-las com seus colegas e professores quando você participar dos fóruns de conteúdo, dos blogs, do estudo de casos, das teleconferências etc;

•• preste atenção ao modo como seu livro está estruturado. Ele sinaliza informações relevantes, como representado a seguir.

Vários ícones sinalizam a integração do material impresso com outros recursos pedagógi-cos e fontes de informação no Ambiente Virtual de Ensino e Aprendizagem, o AVEA, ou em referências bibliográficas. Vamos ver o que significam.

Sinaliza as temáticas que serão aborda-das nos Fóruns de Conteúdo

Informação complementar disponível na internet.

Material disponível na Biblioteca Virtual.

Legislação disponível na Biblioteca Virtual.

Page 13: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Lembre-se: Estudar a distância demanda iniciativa e autonomia. Você define o seu ritmo! Mas para obter bom aproveitamento é fundamental ter uma postura reflexiva, cooperativa e disciplinada. Participe das propostas sugeridas! Questio-ne, dê sua opinião, troque informações com seus colegas e professores!

SISTEMA DE APOIO AO ESTUDANTE A DISTÂNCIA

O Sistema de Apoio ao Estudante a Distância está organizado para realizar o acompa-nhamento e a avaliação do seu processo de estudo e de aprendizagem. Ele é formado por monitores administrativos, pedagógicos e assistentes de conteúdo, que irão lhe oferecer os subsídios necessários para um melhor aproveitamento do Curso.

Horário de atendimento (segunda à sexta-feira)

Manhã: 08h00min às 12h00min

Tarde: 14h00min às 18h00min

Monitoria Administrativa

Entre em contato com a monitoria administrativa caso ocorra alguma das seguintes situa-ções:

•• mudança de endereço postal ou e-mail. Até o momento de receber o seu certificado, é fundamental que seus dados estejam sempre atualizados;

•• dificuldade em acessar o AVEA, em função de problemas com logins e/ou senhas;

•• erro nas informações (nome completo e/ou endereço) que constam na etiqueta da embalagem deste kit;

•• não recebimento do kit completo deste Módulo (um livro e um DVD).

iLeituras complementares indicadas pe-los autores.

Dicas dos autores sobre as temáticas abordadas.

Page 14: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Monitoria Pedagógica

Esses monitores estarão à sua disposição para orientá-lo a respeito dos procedimentos para a utilização do AVEA e a realização das atividades propostas, inclusive a avaliação individual. Eles mantêm uma comunicação dinâmica com você via e-mail, motivando-o a participar das atividades propostas.

Assistentes de conteúdo

Os assistentes de conteúdo irão auxiliá-lo em tudo o que está relacionado às temáticas abordadas neste Módulo. Eles serão os mediadores entre você e os seus professores, bus-cando esclarecer suas dúvidas e orientando-o.

Certificação

Todos os estudantes que obtiverem aproveitamento de no mínimo setenta por cento no questionário de avaliação individual vão receber um certificado de extensão universitária registrado pela Universidade Federal de Santa Catarina.

O Questionário de Avaliação Individual é uma atividade obrigatória, composta de cin-quenta questões de múltipla escolha.

Fica disponível no AVEA a partir da terceira semana de aula e você poderá refazê-lo, se assim achar necessário, até a última semana, quando será encerrado.

Se você tiver qualquer dúvida, entre em contato conosco!

Anote o endereço eletrônico, o telefone e o fax de contato da SEaD.

Page 15: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

CONTATOS

Secretaria de Educação a Distância

Universidade Federal de Santa Catarina

Rua Dom Joaquim, 757

Centro

CEP 88015-310

Florianópolis – SC

Telefone: (48) 3952-1900

Fax: (0xx48) 3952-1945

(0xx48) 3952-1904

E-mail:[email protected]

Page 16: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Sumário

Page 17: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

1. Indicação Geográfica de produtos agropecuá-rios: importância histórica e atual...........................28

1.1 Importância histórica e atual das Indicações Geográficas............291.2. Indicações Geográficas: impactos econômicos, sociais e ambien-tais............................................................................................................................401.3 Relativizando o sucesso e refletindo as IG..........................................481.4 Fatores chaves para o sucesso de uma IG..........................................49Resumo...................................................................................................................53Notas........................................................................................................................54

2. Indicação Geográfica e outros sinais distintivos: aspectos legais.............................................................58

2.1 Indicações geográficas e outros sinais distintivos: aspectos legais.....................................................................................................59

2.2 Diferença entre IG e outros sinais distintivos.....................................75Resumo....................................................................................................................87Notas........................................................................................................................88

3. Identificação dos produtos potenciais e organi-zação dos produtores.................................................94

3.1 Identificação dos produtos e seus diferenciais: notoriedade ou qualidade?..............................................................................................................953.2 Organização dos produtores..................................................................1053.3 Formalização do grupo requerente.....................................................113Resumo.................................................................................................................122Notas.......................................................................................................................123

4. Delimitação geográfica da área: homem, história e natureza..................................................................130

4.1 A relação entre homens, produtos e territórios..............................1314.2 Estudo histórico e cultural.......................................................................1324.3 Delimitação Geográfica da área...........................................................141Resumo ...............................................................................................................155

Notas.....................................................................................................................156

Page 18: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

5. Elaboração de regulamento de uso, conselho regulador e definição do controle.........................160

5.1 A definição das regras de obtenção do produto ...........................1615.2 Conselho regulador e órgão de controle..........................................179Resumo.................................................................................................................188Notas.....................................................................................................................189

6. Procedimento de registro das Indicações Geo-gráficas........................................................................192

6.1 Introdução.....................................................................................................1936.2 Requisitos para registro de uma IG no Brasil ..................................1936.3 Depósito e processamento do pedido de registro........................2026.4 Análise dos pedidos de registro...........................................................2046.5 Aspectos jurídicos não regulados relativos à concessão de um pedido de IG.......................................................................................................216Resumo.................................................................................................................218Notas.....................................................................................................................219

7. Gestão e controle pós-reconhecimento das Indi-cações Geográficas...................................................224

7.1 Gestão externa de uma IG......................................................................2257.2 Gestão interna de uma IG.......................................................................234Resumo ................................................................................................................255Notas......................................................................................................................256

8. Estudo de Caso: IP Vale dos Vinhedos, IP Paraty e IP Vale do Submédio São Francisco.......................260

8.1 Indicação de Procedência Vale dos Vinhedos..................................2618.2 Indicação de Procedência Paraty..........................................................2728.3 Vale do Submédio São Francisco ........................................................284Resumo.................................................................................................................294Notas......................................................................................................................295

Page 19: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

9. Estudo de Caso IP Pampa Gaúcho da Campanha Meridional, IP Região do Cerrado Mineiro e IP Vale do Sinos......................................................................300

9.1 IP Pampa Gaúcho da Campanha Meridional....................................3019.2 IP Região do Cerrado Mineiro................................................................3209.3 IP Vale do Sinos...........................................................................................334Resumo.................................................................................................................345Notas......................................................................................................................346

Glossário.....................................................................350

Referências ................................................................356

Page 20: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Siglas

Page 21: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas

ACIAJ - Associação Comercial, Industrial e Agrícola de Juazeiro

ACIP - Associação Comercial e Industrial de Paraty

AICSUL - Associação das Indústrias de Curtume do Rio Grande do Sul

ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária

AOC - Appellation d’Origine Contrôlée (França)

AOP – Appellation d’Origine Protégée (União Européia)

APACAP - Associação dos Produtores e Amigos da Cachaça Artesanal de Pa-raty

APEX BRASIL - Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investi-mentos

APPUB - Associação dos Pequenos Produtores de Uva de Bebedouro

APPCC - Análise de Perigo e Pontos Críticos de Controlo

APR-NVI - Associação dos Produtores Rurais do Núcleo VI

APRONZE - Associação dos Produtores Rurais do Núcleo 11

APROPAMPA - Associação dos Produtores de Carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional

APROVALE - Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vi-nhedos

ASPIN-04 - Associação dos Produtores Irrigantes do Núcleo 04

BGMA - Brazilian Grapes Marketing Association ou Associação dos Ex-portadores de Uvas do Vale do São Francisco

CACCER - Conselho de Associações de Cafeicultores & Cooperativas do CerradoCAJ - Cooperativa Agrícola Juazeiro da Bahia

CAP Brasil - Cooperativa Agrícola de Petrolina

CIG - Coordenação de Incentivo à Indicação Geográfica de Produtos Agrope-cuários do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

CIRAD - Centro de Cooperação Internacional em Pesquisa Agronômica para o Desenvolvi mento

Page 22: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

CIVC – Comité Interprofessionnel du Vin de Champagne – Comité inter-profissional do vinho de Champagne

CODEVASF - Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francis co e do Parnaíba

COMAIAMT - Cooperativa Mista dos Agricultores Irrigantes da Área Maria Tereza

COOPAR - Cooperativa Mista dos Pequenos Agricultores da Região Sul Ltda

COOPEXVALE – Cooperativa de Produtores e Exportadores do Vale do São Francisco

COREDE - Conselho Regional de Desenvolvimento

CUP - Convenção da União de Paris para a Proteção da Propriedade Indus-trial

DO - Denominação de Origem (Brasil)

DOC – Denominación de Origen Calificada (Espanha)

DOP - Denominação de Origem Protegida (União Européia)

EMATER- Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural

EMBRAPA - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

EPAGRI - Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Ca-tarina

EPAMIG - Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais

FAEPE - Federação da Agricultura do Estado de Pernambuco

FAPERGS – Fundação Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul-FARSUL - Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul

FUNDACCER - Fundação de Desenvolvimento do Café do Cerrado

HACCP - Hazard Analysis and Critical Control Points (em português APPCC - Análise de Perigo e Pontos Críticos de Controlo)

IBC - Instituto Brasileiro do Café ( já extinto)

IBD - Associação de Certificação Instituto Biodinâmico (originalmente era Instituto Biodinâmico de Desenvolvimento Rural)

Page 23: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IBRAVIN - Instituto Brasileiro do Vinho

IG - Indicação Geográfica (Brasil)

IGP – Indicação Geográfica Protegida (União Européia)

IGP - Índice Geral de Preços

IMA - Instituto Mineiro de Agropecuária

INAO - Institut National de l’Origine et de la Qualité (França - originalmente Institut National des Appellations d’Origine) 

INMETRO - Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial

INPI - Instituto Nacional da Propriedade Industrial

INT - Instituto Nacional de Tecnologia

IP - Indicação de Procedência (Brasil)

IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional

ISO -  International Organization for Standardization– (Organização Interna-cional de Padronização ou Normalização)

MAPA - Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

MDA - Ministério do Desenvolvimento Agrário

MMA - Ministério do Meio Ambiente

NBR - Normas Brasileiras de Referência

OMC - Organização Mundial do Comércio (WTO – World Trade organi-zation)

OMPI - Organização Mundial da Propriedade Intelectual (WIPO - World Intellectual Property Organization)

ONG - Organização não Governamental

PEQUI - Pesquisa e Conservação do Cerrado

PROGOETHE - Associação dos Produtores da Uva e do Vinho Goethe

Page 24: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

SIF - Serviço de Inspeção Federal – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abstecimento

SAA - Sistemas Agroalimentares

SAPI- Sistema Agropecuário de Produção Integrada

SCAA - Specialty Coffee Association of America

SDC - Secretaria de Desenvolvimento Agropecuário e Cooperativismo – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abstecimento

SEBRAE - Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas

SENAI – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial

SENAR - Serviço Nacional de Aprendizagem Rural

SICADERGS - Sindicato da Indústria de Carnes e Derivados do Estado do Rio Gran de do Sul

SIGEOR - Sistema de Informação da Gestão Estratégica Orientada para Resultados

SINER-GI - Strengthening International Research on Geographical Indi cations

SISBOV - Serviço Brasileiro de Rastreabilidade da Cadeia Produtiva de Bovinos e Bubalinos

SSM - Soft Systems Methodology

TRIPS - Trade-related aspects of intellectual property rights (ADPIC - Acor-do sobre aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados ao Comércio)

UCS – Universidade de Caxias do Sul

UFRGS - Universidade Federal do Rio Grande do Sul

UFRRJ - Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro

UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina

UNIVALE – Conselho da União das Associações e Cooperativa dos produ-tores de uva de mesa e mangas do Vale do Submédio São Francisco

Page 25: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

VALEXPORT - Associação de Produtores e Exportadores de Hortigranjei-ros e Derivados do Vale do São Francisco

VCPRD - Vinos de calidad producidos en regiones determinadas (Espanha)

RPI - Revista de Propriedade Industrial

GRU – Guia de recolhimento da União

PIF – Produção Integrada de frutas

SEDAI – Secretaria de Desenvolvimento dos assuntos internacionais

Page 26: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade
Page 27: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade
Page 28: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Indicação Geográfica de produtos agropecuários: importância histórica e atual

Neste• primeiro• capítulo,• convidamos• você• a• conhecer• a•origem,•e•os•benefícios•econômicos,•sociais•e•ambientais•das•Indicações•Geográficas•(IG).Primeiramente,•trataremos•da•origem•e•da•história•da•In-dicação•Geográfica•(IG),•buscando•explicar•como•seu•uso•tem•se•tornado•relevante•para•os•agentes•rurais•no•contex-to•da•globalização•da•economia•e•da•abertura•dos•merca-dos.Em•um•segundo•momento,•do•ponto•de•vista•sociológico,•econômico•e•ambiental,•apresentaremos•os•benefícios•das•IG•para•os•produtores,•prestadores•de•serviço•e•demais•en-volvidos•diretamente,•bem•como•para•a•região•reconheci-da•e•para•o•país•como•um•todo.

28

Page 29: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

1.1 Importância histórica e atual das Indicações GeográficasPara melhor compreensão do curso, vamos conhecer qual é o significado de uma Indicação Geográfica (IG)?

Essa noção de IG surgiu de forma gradativa, quando produtores e con-sumidores passaram a perceber os sabores ou qualidades peculiares de alguns produtos que provinham de determinados locais. Ou seja, qualida-des – nem melhores nem piores, mas típicas, diferenciadas – jamais encon-tradas em produtos equivalentes feitos em outro local. Assim, começou-se a denominar os produtos – que apresentavam essa notoriedade – com o nome geográfico de sua procedência1. Os vinhos foram os primeiros nos quais se observou a influência sobretudo dos fatores naturais (clima, solo, relevo, etc.).

As qualidades de produtos como esses – ligadas à origem – se devem, to-davia, ao ambiente, que vai muito além das condições naturais e inclui o fator humano e suas relações sociais. Dessa maneira, o conceito de indica-ção geográfica mostra-se importante, pois destaca as particularidades de diferentes produtos de diferentes regiões, valorizando, então, estes terri-tórios. Cria um fator diferenciador para produto e território, que apresen-tam originalidade e características próprias2. Assim, as indicações geográ-ficas não diferenciam somente os produtos ou serviços, mas os territórios.

Vários produtos agroalimentares se diferenciam pela sua qualidade ou sua reputação devidas, principalmente, a sua origem (o seu lugar de produ-ção). Essas diferenças podem estar ligadas a um gosto particular, uma his-tória, um caráter distintivo provocado por fatores naturais (como clima, temperatura, umidade, solo, etc.) ou humanos (um modo de produção, um saber fazer). Em alguns casos, os produtores e/ou os agentes de uma região se organizam para valorizar essas características, mobilizando um direito de propriedade intelectual: a Indicação Geográfica. A IG permite preservar essas características ou essa reputação e valorizá-las ao nível dos consumidores (Figura 1.1).

Portanto, em um primeiro momento, definiremos a IG como sendo um nome geográfico que distingue um produto ou serviço de seus semelhan-tes ou afins, por que este apresenta características diferenciadas que po-dem ser atribuídos à sua origem geográfica, configurando nestes o reflexo de fatores naturais e humanos.

29

CAPÍTULO 01

Page 30: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Figura 1.1 - O que é uma indicação geográfica.Fonte: Velloso (2009)

1.1.1 Uma breve história sobre os sinais distintivos e as Indicações Geográficas (IG)

Os diversos sinais distintivos nasceram de um objetivo em comum: dis-tinguir a origem (seja geográfica ou pessoal) de um produto. A IG e as marcas se confundiam na antiguidade. Mesmo na Bíblia, encontram-se in-dicações de sinais distintivos de uma origem, como os vinhos de En-Gedi3 e o cedro do Líbano4, além desta interessante comparação: “Voltarão os que habitam à sua sombra; reverdecerão como o trigo, e florescerão como a vide; o seu renome será como o do vinho do Líbano” 5.

Na Grécia e em Roma, havia produtos diferenciados justamente pela sua origem, como o bronze de Corinto, os tecidos da cidade de Mileto, as os-tras de Brindisi e o até hoje renomado mármore de Carrara6.

Figura 1. 2 - Bandeira do Líbano, que leva como insígnia seu produto mais típico e conhecido desde a antiguidade: o cedroFonte: http://perspectivabr.files.wordpress.com Acesso realizado em: 10 jul. 2010.

Indicação Geográ�ca

Forma de Preservar

• Cultura• Tradição• Lealdade• Reputação• Constância• História• Terroir• Savoir-Faire

• Registro do Sinal Distintivo• Marketing• Publicidade• Administração• Controle

30

Page 31: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Na época dos romanos, já se utilizava a sigla RPA – res publica augustano-rum, inscrita nos vasos de barro fabricados nos fornos do fisco romano. Também eram conhecidos nesta época os vinhos de Falernum, que antes de indicar o produtor, indicavam a procedência do produto7

Durante a Idade Média, apareceram as marcas corporativas, utilizadas para distinguir os produtos fabricados por um grêmio de uma cidade, de um grêmio de outra cidade. Esses grêmios, ou corporações de ofício, pos-suíam Estatutos e Ordenações que detalhavam todos os aspectos e opera-ções da produção, fixando as normas que seus associados deviam cumprir para fabricar os produtos.

Para se distinguir os produtos de um grêmio específico, utilizava-se um selo, marca local ou gremial que, muitas vezes, era o nome da própria cidade ou da localidade. Nesse período, ainda não se utilizavam marcas individuais para identificar o fabricante do produto.8

Contudo, havia associados que elaboravam produtos de melhor ou pior qualidade. Para distingui-los entre si e para poder responsabilizar os pro-dutores nos casos em que os produtos eram contrários às boas práticas, passou-se a utilizar uma marca. Assim, sobre os produtos começaram a aparecer duas marcas: a do fabricante e a do grêmio ou corporação a que este pertencia.9

Dessa forma, de uma indicação de origem única à diferenciação entre os fabricantes de um produto de uma mesma corporação, vislumbra-se a evolução dos signos distintivos.

A primeira intervenção estatal na proteção de uma IG ocorreu em 1756, quando os produtores do Vinho do Porto, em Portugal, procuraram o então Primeiro-Ministro do Reino, Marquês de Pombal, em virtude da queda nas exportações do produto para a Inglaterra. O Vinho do Porto ha-via adquirido uma grande notoriedade, o que fez com que outros vinhos passassem a se utilizar da denominação “do Porto”, ocasionando redução no preço dos negócios dos produtores portugueses.

Em face disso, o Marquês de Pombal realizou determinados atos visan-do à proteção do Vinho do Porto. Primeiro, agrupou os produtores na Companhia dos Vinhos do Porto. Em seguida, mandou fazer a delimita-ção da área de produção – não era possível proteger a origem do produto sem conhecer sua exata área de produção.

Como também não era possível proteger um produto sem descrevê-lo

31

CAPÍTULO 01

Page 32: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

com exatidão, mandou estudar, definir e fixar as características do Vinho do Porto e suas regras de produção.

Por fim, mandou registrar legalmente, por decreto, o nome Porto para vinhos, criando, assim, a primeira Denominação de Origem Protegida10.

De certa forma, ainda hoje, esses são os passos a serem seguidos para dar proteção estatal a uma indicação geográfica.

Figura 1.3 - Demarcação Pombalina dos vinhedos do Vinho do Porto.Fonte: http://www.cm-tabuaco.ptAcesso realizado em: 10 jul. 2010.

No início, os sinais distintivos não eram propriamente protegidos, conse-quentemente havia muitas falsificações. Alguns países criaram legislações nacionais, como a França, para regular o uso indevido. Mas o problema persistia quando se tratava do comércio internacional, muito crescente em meados do século XVIII.

Primeiramente países como a França buscaram fazer acordos bilaterais que protegessem reciprocamente suas IG. Mas estes acabaram por se mostrar muito frágeis e difíceis de serem cumpridos. Os países produ-tores, especialmente de vinho, optaram então, por organizar um tratado internacional, mas do qual os principais países produtores e consumido-res fizessem parte e se obrigassem mutuamente. Não era apenas a IG,

32

Page 33: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

mas também outros direitos de propriedade industrial que precisavam desta proteção internacional. E a troca de concessões entre os diversos países permitiu que isso se concretizasse por meio da celebração do tra-tado constitutivo da Convenção•União•de•Paris•para•a•proteção•da•pro-priedade• industrial• (CUP), firmado em 1883 e contando com diversas revisões e aprimoramentos. Ressalta-se que o Brasil foi um dos países que originalmente assinou a este tratado.

O objetivo inicial era coibir a falsa indicação de procedência. Mas a for-ma de sua regulação permitia, por exemplo, o uso de “Champagne” da Califórnia, posto que neste caso a verdadeira procedência estaria ressal-tada.

Todavia, esta forma de proteção não se mostra suficiente para países como a França, que buscaram então um tratado adicional para obter uma proteção mais consistente contra o uso da falsa indicação de procedência. Este se dá por meio do Acordo•de•Madri•para•a•Repressão•das•Falsas•Indicações•de•Procedência (Acordo•de•Madri), firmado em 1891, e con-tanto também com algumas revisões. Também a este tratado o Brasil ade-riu originariamente.

O objetivo deste tratado era uma repressão mais efetiva contra o uso das falsas indicações de procedência, especialmente para produtos vinícolas. Neste caso não se admitiam exceções para estes produtos e também de-terminava-se que estes não poderiam ser considerados como genéricos, como seria o caso de um vinho tipo “champagne”. Todavia o número de adesões foi bem menor que à CUP.

Posteriormente ocorreu a primeira (1914-1918) e a segunda guerra mun-dial (1939-1945), intercaladas pela quebra da bolsa de valores de Nova York, também conhecida como a Grande Depressão (1929). Após estes acontecimentos as relações internacionais, a economia, as trocas comer-ciais, o mundo é outro.

Somente em 1958 novo avanço se deu em termos de regulação das IG em níveis internacionais. A CUP se reuniu novamente e os países tradicional-mente produtores buscaram uma nova forma de avançar na proteção das IG. Tanto a CUP quanto a alteração no Acordo de Madri não avançaram suficientemente para a proteção das IG. Assim, firmou-se o Acordo•de•Lisboa• relativo• à• proteção• das• denominações• de• origem• (Acordo• de•Lisboa).•Este prevê uma proteção positiva para as IG, na forma de deno-minações de origem, bem como um reconhecimento recíproco das IG

33

CAPÍTULO 01

Page 34: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

já existentes pelos países que firmam este acordo, mediante um registro internacional.

Também é a primeira vez que se define a denominação de origem como sendo uma denominação geográfica de um país, uma região ou uma lo-calidade, que serve para designar um produto dele originário, cujas quali-dades ou características são devidas exclusiva ou essencialmente ao meio geográfico, incluindo os fatores naturais e os fatores humanos.

Este tratado também prevê a proibição do uso de qualquer IG, mesmo que acompanhado da verdadeira origem, proíbe o uso de termos retifi-cativos, como “tipo” ou “gênero”, e determina que uma IG não pode se tornar genérica.

Todavia, poucos países aderiram a este acordo, o qual acabou por ter uma aplicação muito reduzida. O Brasil tão pouco o assinou. Ressalta-se que todos estes acordos a partir de 1967 passam a ser administrados pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI). Os países pode-riam participar da OMPI fazendo parte de um ou mais tratados, mas não sendo obrigados a assinarem a todos. Um dos problemas da OMPI é que esta não possuía um sistema que permitisse que um país fosse punido pelo descumprimento de um acordo.

Neste mesmo período pós-guerra, precisamente em 1947, também é firmado outro tratado relacionado ao comércio. O Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio, também conhecido como GATT, evoluiu em um período de grande prosperidade econômica, conhecida como anos de ouro, que seguiu até o final da década de 1970.

É neste contexto que os países começam a discutir a inclusão no GATT da discussão da proteção da propriedade intelectual (e das IG). Isso se con-cretiza com a criação da Organização Mundial do Comércio (OMC), em 1994. No âmbito desta organização, além de tratados relacionados com tarifas e comércio, negocia-se e aprova-se o Acordo sobre aspectos dos direitos de propriedade intelectual relacionados ao comércio (TRIPS ou ADIPC). Este, obrigatório para todos os membros da OMC – que hoje conta com mais de 153 países – abarca o previsto pela CUP e estabelece, dentre outros, a proteção obrigatória das IG. Deve ficar claro que o TRIPS é um acordo que prevê um mínimo, ou seja, o que os seus membros mi-nimamente devem proteger ou garantir, podendo cada um estabelecer formas mais efetivas de proteção.

A IG é definida, em seu artigo 22, “indicações que identifiquem um pro-duto como originário do território de um Membro, ou região ou locali-

34

Page 35: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

dade deste território, quando determinada qualidade, reputação ou outra característica do produto seja essencialmente atribuída à sua origem geo-gráfica”.

Com a adesão à OMC e ao TRIPS consequentemente, por meio do Decreto nº 1.355 de 30 de dezembro de 1994, as disposições previstas nes-te acordo passam a vigorar no Brasil.

Para colocar em prática esta adesão o Brasil promulga a Lei 9.279 de 14 de maio de 1996. Esta define como se dá a proteção dos direitos de proprie-dade industrial, e, especialmente em seus artigos 176 a 182, regulamenta as IG no Brasil. Não que não houvesse proteção à IG no Brasil anterior-mente a 1996, todavia esta proteção de dava conforme previsto na CUP e no Acordo de Madri, combatendo as falsas indicações de procedência. A partir de 1996 têm-se uma proteção positiva destes direitos.

Conforme estudado no Módulo Básico de Propriedade Intelectual, esta lei classificou as IG em duas espécies:

a. indicação•de•procedência (IP)− que indica o nome geográfico que tenha se tornado conhecido pela produção ou fabricação de deter-minado produto, ou prestação de determinado serviço; e,

b. denominação•de•origem (DO)− que indica o nome geográfico do local que designa produto, ou serviço, cujas qualidades ou caracte-rísticas se devam essencialmente ao meio geográfico, incluídos os fatores naturais e humanos.

O estudo mais detalhado sobre o TRIPS e a Lei se dará no capítulo 2.

Vale ressaltar que esta implementação de leis que protegessem as IG, seja de forma positiva ou combatendo as falsas indicações, também se deu em diversos países que aderiram à OMC. Mas, apesar de haver esta previsão ainda não há hoje um registro internacional de IG, e sua proteção conti-nua se dando de forma territorial, em cada país.

Ao longo de todos esses anos, vimos surgir um grande número de IG, ou seja, nomes geográficos que indicam uma origem renomada de um determinado produto: além do Vinho do Porto, podemos citar os casos do queijo Roquefort, do vinho espumante da região de Champagne, do vinho Chianti, do queijo Feta, da Carnalentejana, dos queijos Grana Padano, Gorgonzola, Parmigiano Reggiano, do Prosciutto di Parma, da Tequila, do Cognac, etc.

35

CAPÍTULO 01

Page 36: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Mais do que apenas indicar a procedência de um produto, as IG tiveram como função, ao longo do tempo, garantir determinadas características ao produto em decorrência da sua origem. E este uso tem repercussões sociais, econômicas e ambientais que serão analisadas no próximo ponto.

1.1.2 Indicação geográfica: uma prática comercial antiga e uma resposta às evoluções dos mercados

As IG continuam sendo, hoje, um tema da atualidade fortemente debati-do ao nível internacional e que reflete, em grande parte, a evolução dos sistemas agroalimentares (SAA).

A abertura dos mercados e a circulação acelerada das mercadorias impli-caram novas formas de regulação entre os diferentes países e à definição de regras ao nível internacional de natureza pública (codex alimentarius) e privada (eurepGap).

Alem disso, novas práticas comerciais aparecem. Ampliou-se a utilização para fins comerciais de termos ou nomes indígenas de produção por pa-íses terceiros, para poder tornar os seus produtos um pouco mais “exóti-cos” e atrativos. Foi o caso do Rooibos (Aspalathus linearis), planta da África do Sul, que foi registrada como marca nos EUA, por uma empresa priva-da. O caso também do cupuaçu (Theobroma grandiflorum) do Brasil, que foi registrado como marca por uma empresa japonesa, impedindo o uso do nome pelos produtores de origem. (Esses casos já foram revertidos).

Outros países usam o nome de uma região para se beneficiar da sua boa re-putação, ou obter um melhor preço de venda do seu produto. Atualmente, 6 milhões de quilos de café “Antigua” são produzidos na região de mesmo nome, na Guatemala, entretanto, 50 milhões de quilos de café são vendi-dos no mundo inteiro com esse nome. Do mesmo modo, 10 milhões de quilos de chá “Darjeeling” são produzidos na Índia e 30 milhões de quilos de chá são vendidos com o mesmo nome no mundo.

Esses exemplos confirmam como é importante e urgente para os países emergentes implantarem e mobilizarem sistemas de proteção do seu pa-trimônio intangível e da sua biodiversidade.

Outros fatores explicam essa re-atualização do tema das IG. Nós desta-caremos a seguir o surgimento de nichos de mercados e as mudanças de percepção e de comportamento dos consumidores em relação aos produ-tos tradicionais.

36

Page 37: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

A) Surgimento de nichos de mercado

Observamos o surgimento de novos nichos de mercados (orgânico, co-mercio justo, IG)10. Na Tabela 1.1, são apresentados os principais merca-dos e estratégias de valorização dos produtos. As indicações geográficas estão inseridas nesse movimento global de segmentação dos mercados. De certo modo, esse movimento favorece a valorização dos recursos ter-ritoriais.

Novos mercados para produtos tradicionais e agricultura familiar

Mercado Perfil Exemplos

Especialidades

O mercado das especialidades baseia-se na valoriza-ção de qualidade particular

associação produto/ localidade / tradição

Indicação geográfica

Produtos da terra (mercados da terra do movimento Slow Food)

Produto com Garantia de origem (iniciativa privada de empresa de distribuição CARREFOUR)

Orgânicos Um produto orgânico é um produto agrícola ou um alimento produzido de forma que respeite mais o meio ambiente e à saúde.

Produto da ECOVIDA

Produto com certificado ECOCERT, IBD

Artesanais Produtos produzidos de forma artesanal

Indicação geográfica

Produtos coloniais

Produtos da agricultura familiar

Solidários

O movimento do Comércio Justo surgiu da iniciati-va de organizações e consumidores do Hemisfério Norte, visando a melhoria das condições de vida de produtores e trabalhadores em desvantagens e pouco valorizados nos países do Sul.12

As Redes solidárias são representadas por grupos de produtores, consumidores e entidades de assessoria, envolvidos na produção, processamento, comercia-lização e consumo de alimentos agroecológicos.13 Trata-se de uma nova forma de comercializar os produtos agrícolas e de pensar as relações entre o mundo rural e urbano.

Max Havelaar

Oxfam

Rede das feiras da ECOVIDA

Mercados da Terra do Movimento Slow food

Tabela 1.1 Fonte: Cerdan (2009) adaptado de Wilkinson (2008)14

37

CAPÍTULO 01

Page 38: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

A Figura 1.4 apresenta diversos sinais distintivos de produtos e serviços do mundo rural, dando-nos uma ideia de selos e de marcas que surgiram nesses últimos dez anos.

Figura 1.4 - Exemplos de sinais distintivos para produtos tradicionais. Podem ser observados sinais distintivos públicos (AOC, Appelation d’Origine controlée fran-cesa e indicação geográfica protegida européia), privados (Carrefour, Agreco) para produtos agrícolas ou para serviços de hospedagem em meio rural (qualité touris-me, acolhida na Colônia, accueil Paysan)Fonte: Velloso (2009)

B) O gosto da Origem

Constata-se uma procura cada vez maior, por parte dos consumidores ur-banos, por produtos de origem. Será que a Origem de um produto tem um gosto particular, produz um prazer específico para o consumidor?

Uma das explicações é a perda da confiança nos produtos alimentares. As crises profundas que atingiram os sistemas agroalimentares (doença da vaca louca-Encefalopatia Espongiforme Bovina, sementes transgênicas, uso de hormônios) provocaram mudanças no nível da percepção dos con-sumidores. Em reação, iniciou-se um movimento generalizado, exigindo mais garantias sobre a origem dos produtos, a sua inocuidade e os seus modos de obtenção. Nesse quadro, o nome do produto ou da região de origem é reconhecido pelos consumidores e inspira confiança.

38

Page 39: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Ressaltam-se, também, novos comportamentos de consumidores, como a reivindicação regional, cultural ou política. Nesse sentido, o consumidor não é mais considerado como um agente passivo, mas um sujeito capaz de reagir e promover certos modelos de desenvolvimento. Alguns autores falam de “consum’ator”, evidenciando o consumidor engajado, o consu-midor consciente.

Assim, ao comer um bode assado, um prato de sarapatel, o Nordestino manifesta o seu sentimento de pertencer a uma comunidade, a um grupo, a uma cultura15. (Figura 1.5)

Figura 1.5 - O gosto da origem e as referências identitárias na região Nordeste. Quem viajou por esta região Nordeste ou quem observa essas fotos, se da conta da importância da pecuária, das paisagens particulares, das condições climáticas na identidade coletiva e do forte consumo dos produtos, animal (produtos derivados de carne e de queijo)

A escolha de comprar um produto de origem não é apenas uma prática comercial ou uma questão de gosto, é também uma “reivindicação identi-tária”. Trata-se de consumir o que está mais próximo de si, com a sensação de resistir à globalização, de não perder os seus valores.

Cabe salientar que essas evoluções não acontecem apenas para produ-tos tradicionais e ancorados num território como o Queijo Serrano dos campos sulinos do Brasil ou o Tacacá da Amazônia. Surpreendentemente essas dinâmicas também referem-se a produtos estandardizados. Vários estudos evidenciam a emergência das “Cocas-Cola alternativas” (Figura 1.6). Trata-se de bebidas de inspiração regional, que promovem um con-sumo engajado, militante, oscilando entre religião, identidade, política, etc., reivindicando uma postura contra a circulação globalizada de certos produtos (Coca ColaTM).

39

CAPÍTULO 01

Page 40: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Figura 1.6 - Interpretações regionais da bebida Coca- ColaFonte: http://paragonanubis.files.wordpress.com/2008/05/zamzam-cola-2.jpghttp://www.cdi.org.pe/Noticias_2006/Fotografias/inca_kola.jpghttp://www.tribuneindia.com/2003/20031016/biz1.jpghttp://www.breizhcola.fr/images/affiche-breizh-cola-400.jpgAcesso realizado em: 10 jul. 2010.

1.2. Indicações Geográficas: impactos econômicos, sociais e ambientais

1.2.1 A importância das IG na União Européia

Percebe-se a importância atual das IG na União Europeia, com destaque para França, Itália e Espanha, considerando o registro de mais de 5.000 produtos (4.200 para vinhos e destilados e 812 para outros produtos). A título ilustrativo, pode-se sublinhar que as 593 IG da França (466 para vi-nhos e destilados e 127 para outros produtos) representam um valor de 19 bilhões de euros em comércio (16 bilhões para vinhos e destilados e 3 bilhões para outros produtos), apoiando 138.000 propriedades agrícolas.

40

Page 41: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Da mesma forma, as 420 IG da Itália (300 para vinhos e destilados, e 120 para outros produtos) correspondem a um volume de receitas de 12 bi-lhões de euros (5 bilhões para vinhos e destilados e 7 bilhões para outros produtos), empregando mais de 300.000 pessoas. Na Espanha, as 123 IG rendem 3,5 bilhões de euros, aproximadamente (2,8 bilhões de euros para vinhos e destilados e 0,7 bilhões para outros produtos). Entre 1997 e 2001, o número de produtores franceses sob IG aumentou 14% enquanto, no mesmo período, constatou-se uma diminuição de 4% no número de pro-dutores. 16

1.2.2 Os benefícios de uma IG

A proteção de uma IG pode imprimir inúmeras vantagens para o produ-tor, para o consumidor e para a economia da região e do país. O primeiro efeito que se espera de uma IG é uma agregação de valor ao produto ou um aumento de renda ao produtor. Além disso, os benefícios das IG são de diversas dimensões.

Destacam-se os benefícios econômicos (acesso a novos mercados internos e exportação), os benefícios sociais e culturais (inserção de produtores ou regiões desfavorecidas), benefícios ambientais (preservação da biodiversi-dade e dos recursos genéticos locais e a preservação do meio ambiente).

Apesar dessa apresentação dos diferentes benefícios possíveis, recomen-damos considerá-los com cuidado: o registro de uma IG, por si só, não garante a priori um sucesso comercial determinado.

Veja na Tabela 1.2 os principais benefícios observados na Europa e em outros países (México, Peru, Chile, África do Sul, Bolívia).

41

CAPÍTULO 01

Page 42: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Principais vantagens da IG

• Gera satisfação ao produtor, que vê seus produtos comercializados no mer-cado com a IG, valorizando o território e o conhecimento local;

• Facilita a presença de produtos típicos no mercado, que sentirão menos a concorrência com outros produtores de preço e qualidade inferiores;

• Contribui para preservar a diversificação da produção agrícola, as particula-ridades e a personalidade dos produtos, que se constituem num patrimônio de cada região e país;

• Aumenta o valor agregado dos produtos, sendo que o ciclo de transforma-ção se dá na própria zona de produção;

• Estimula a melhoria qualitativa dos produtos, já que são submetidos a con-troles de produção e elaboração;

• Aumenta a participação no ciclo de comercialização dos produtos e estimu-la a elevação do seu nível técnico;

• Permite ao consumidor identificar perfeitamente o produto nos métodos de produção, fabricação e elaboração do produto, em termos de identidade e de tipicidade da região “terroir”;

• Melhora e torna mais estável a demanda do produto, pois cria uma confian-ça do consumidor que, sob a etiqueta da IG, espera encontrar um produto de qualidade e com características determinadas;

• Estimula investimentos na própria zona de produção (novos plantios, me-lhorias tecnológicas no campo e na agroindústria);

• Melhora a comercialização dos produtos, facilitando o acesso ao mer-cado através de uma identificação especial (Indicação Geográfica ou Denominação de Origem); isso se constata, especialmente, junto às coope-rativas ou associações de pequenos produtores que, via de regra, possuem menor experiência e renome junto ao mercado.

• Gera ganhos de confiança junto ao consumidor quanto à autenticidade dos produtos, pela ação dos conselhos reguladores que são criados e da auto-disciplina que exigem;

• Facilita o marketing, através da IG, que é uma propriedade intelectual cole-tiva, com vantagens em relação à promoção baseada em marcas comerciais.

• Promove produtos típicos;

• Facilita o combate à fraude, ao contrabando, à contrafação e às usurpações;

• Favorece as exportações e protege os produtos contra a concorrência des-leal externa.

Tabela 1.2 - Fonte: Silva (2009)

42

Page 43: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Para conhecer os benefícios das IG consulte os sites:

http://www.wipo.int/geo_indications/es/

http://origin.technomind.be/

http://www.origin-food.org/2005/base.php?cat=20 (projeto Europeu SINERGI)

http://www.foodquality-origin.org/esp/index.html

Acesso realizado em: 10 jul. 2010.

Vamos ilustrar esses benefícios a partir de alguns exemplos citados na lite-ratura17 e as informações disponíveis na internet.

1.2.3 Um melhor preço de venda dos produtos e uma notoriedade protegida

A valorização dos produtos IG pode ser mensurada. Para os produtores de leite franceses, o ganho das produções de queijo com IG valoriza mais o litro de leite: enquanto o leite vendido pelos produtores é pago em mé-dia nacional 0,30 euros o litro, o leite para a fabricação de queijo AOP Beaufort é vendido a 0,57 euros o litro.

O óleo de oliva italiano “Toscano” é vendido 20% mais caro desde o regis-tro dessa IG•em 1998.

O molho vietnamita IG “Nuoc Mam de Phu Quoc” é outro exemplo: de-pois que a proteção de IG foi aceita em 2001, o valor desse produto tripli-cou, passando de 0,5 euros o litro, em 2000, a 1,5 euros o litro em 2003.

Na China, o reconhecimento do álcool de arroz amarelo de Shaoxing, como IG, permitiu reduzir os contrabandos provenientes de Taiwan e do Japão. Os preços aumentaram em 20%, o mercado interno se desenvolveu e as exportações para o Japão aumentaram em 14%.

De modo geral, sobre preço observado nas IG europeias (AOP e IGP) variam entre 10 e 15%.

43

CAPÍTULO 01

Page 44: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

1.2.4 Novas regras coletivas, inovações e relações equilibradas nas cadeias produtivas

A presença de regras coletivas, visando fixar os preços e estabelecer con-tratos entre os processadores e os produtores, melhora a competitividade da cadeia produtiva.

Os consumidores sabem de onde vêm os produtos, os produtores sabem para onde vão os produtos. A IG favorece uma distribuição equilibrada da mais-valia em toda a cadeia produtiva e neutraliza mais eficazmente os comportamentos oportunistas intra-cadeia produtiva.18

No Brasil, a implantação da Indicação de Procedência (IP) Carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional se baseia em um controle preci-so da procedência dos animais. Assim, se o consumidor desejar, ele pode, a partir do código de barra, verificar no site da associação de qual animal vem o corte de carne que ele acaba de comprar, conhecer a fazenda de produção e sua localização.

O regulamento da IP Vale dos Vinhedos19 incorpora 12 inovações em rela-ção à produção convencional de vinhos no Brasil. Tais inovações incluem aspectos da produção, do controle e da comercialização de vinhos de qua-lidade.20

As IG também reforçam o valor e, sobretudo, a credibilidade do trabalho do produtor junto aos consumidores.

Visite os sites da APROPAMPA no endereço eletrônico abaixo e conheça a origem da carne a partir do código de barras.

www.carnedopampagaucho.com.br

Acesso realizado em: 10 jul. 2010.

1.2.5 Novas oportunidades para as regiões pobres ou desfavorecidas

As IG são, com frequência, originárias de regiões agrícolas desfavorecidas, onde os produtores não têm condições de reduzir o custo de produção. Dessa forma, eles são levados a apostar na valorização da qualidade e dos conhecimentos locais (savoir-faire).

Apresentamos como exemplo a Champagne (França) que era uma região pobre, situada no limite norte da zona climática de produção de uvas, com

44

Page 45: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

solos geralmente ácidos. O método “champenoise” de vinificação, bem adaptado às dificuldades dessa matéria-prima, permitiu o sucesso econô-mico que conhecemos hoje. A maioria das denominações de origem de queijos, na frança, está situada em regiões de montanha ou classificadas como zonas difíceis.

Um dos elementos chaves das IG foi de promover, criar e implementar no-vas formas de governança local e de regulação entre os diferentes agentes da cadeia produtiva. A emergência de comitês interprofissionais e a busca de uma melhor harmonização dos interesses entre os diferentes agentes permitiram o fortalecimento da região e dos produtores.

1.2.6 Região de produção mais atrativa

A presença de um produto IG numa região pesa na decisão de jovens agri-cultores pela instalação ou implantação de empresas, à medida que ela induz uma estruturação em setores e uma remuneração a priori garanti-da. Essa atratividade oferece novas perspectivas em termos de emprego, permitindo aos jovens permanecerem em suas regiões.

Ela pode se traduzir, com freqüência, por um aumento do preço das ter-ras agrícolas na região. A valorização do preço das terras na IP Vale dos Vinhedos, em Bento Gonçalves (RS), aumentou de 200 a 500%.21

1.2.7 Sinergia entre produto IG e outras atividades numa região

O reconhecimento de uma IG, em uma região, pode induzir a abertura e o fortalecimento de atividades e de serviços complementares, relaciona-das à valorização do patrimônio, à diversificação da oferta, às atividades turísticas (acolhida de turistas, rota turística, organização de eventos cul-turais e gastronômicos), ampliando o número de beneficiários.

A construção de cestas de bens e de serviços22 é uma forma de articular atividades, produtos e serviços para compor uma oferta global. Cria-se sinergia entre agentes locais, entre o produto ou serviço da IG e outras atividades de produção ou de serviço.

Na Serra Gaúcha, a forte competição dos vinhos no mercado nacional levou as vinícolas a investirem no desenvolvimento do turismo local ao redor do vinho e da cultura italiana. Assim, desenvolveram-se numerosas atividades relacionadas com alojamento (hotéis, pousadas), gastronomia

45

CAPÍTULO 01

Page 46: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

(restaurantes, fabricação artesanal de produtos típicos), enologia e imigra-ção italiana.

Em Roquefort (França), os agentes políticos e turísticos se apoiam na no-toriedade internacional do queijo para assegurar a promoção de um ter-ritório. Além de uma bacia de produção de leite e queijo fortemente es-truturada, a AOC Roquefort contribuiu para o surgimento de uma oferta turística localizada.

Os produtores de Paraty (RJ) aproveitaram a atividade turística da cidade para relançar uma produção tradicional, a cachaça. Paraty é uma cidade pequena, classificada como Patrimônio Histórico Nacional desde 1958, com grande afluência turística o ano todo.

Visite o site do Vale dos Vinhedos e dos Caminhos de Pedra e avalie o nível de integração das atividades.

http://www.valedosvinhedos.com.br/

http://www.caminhosdepedra.org.br/

Acesso realizado em: 10 jul. 2010.

1.2.8 O orgulho do homem por seu produto, sua região, sua identidade e sua iniciativa coletiva

Os agricultores na França estimam que a produção de leite IG (AOP) é mais interessante, pois está fundamentada em uma finalidade concreta: o produto de origem, ele mesmo carregando os valores positivos.23 Esse apego dos produtores ao seu novo estatuto é observado em diversas ca-deias produtivas (vinhos, queijos).

Os membros da APROPAMPA (Associação dos Produtores de Carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional) e da PROGOETHE (Associação dos Produtores de Uva e de Vinho de Goethe) demonstram uma grande satisfação pela sua iniciativa coletiva. Eles declararam estar dispostos a participar de novas instâncias particulares ou públicas para testemunhar suas experiências e contribuir na construção de um projeto favorável à região, da qual eles têm muito orgulho.24

46

Page 47: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

1.2.9 Preservação e valorização do patrimônio biológico e cultural

As IG exprimem o reconhecimento de um patrimônio agrícola, gastronô-mico, artesanal e/ou cultural, que elas contribuem para conservar. Uma raça animal, uma variedade vegetal, uma paisagem, um ecossistema, cor-respondem a um acúmulo de conhecimentos, de práticas e de adaptação.

Numerosas IG são baseadas em recursos genéticos locais e valorizam essa biodiversidade:

• O óleo de “arganier”, arbusto espinhoso do Marrocos.

• O vinho da região de Urussanga é produzido a partir de uma varie-dade de uva que está em via de extinção (variedade Goethe).

• O regulamento de uso da produção de carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional propõe uma exploração consciente dos cam-pos do Pampa Gaúcho para a alimentação do gado bovino.

1.2.10 Uma imagem de qualidade e de excelência

Os produtos sob IG induzem uma imagem de excelência nos territórios rurais claramente identificados. Muitos são os nomes das IG que evocam sensações gustativas originais e fazem surgir imagens de paisagens agríco-las emblemáticas: os vinhedos da região de Bordeaux (França), os vinhe-dos da Serra Gaúcha, os vastos campos verdes do Pampa Gaúcho, a selva e a floresta Amazônica.

Com frequência, encontramos essas imagens nos cartazes e prospectos publicitários dos produtos IG. Nesse sentido, as IG podem desempenhar um papel importante na proteção, gestão ou criação de paisagens: expri-mindo-se de múltiplas maneiras (terraços, modificações em cursos de água, etc.); concentração de uma vegetação particular induzida pela pro-dução considerada (videira, pomares, campos, etc.); presença de animais de raças específicas, contribuindo, eles também, a tipificar fortemente a paisagem local; inserção na paisagem de construções estreitamente liga-das à atividade de produção destacada pela IG.25

Essa atenção particular nos permite considerar relações possíveis entre produção típica (IG) e desenvolvimento sustentável (preservação do meio ambiente).

47

CAPÍTULO 01

Page 48: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

1.2.11 Uma resposta aos desafios da sustentabilidade ecológica do território

No caso da IG, a qualidade não se reduz apenas ao produto, ela também define regras de preservação e valorização do meio ambiente, do homem com sua organização, história e cultura.

Além da inscrição possível de regras visando à preservação do meio am-biente, os promotores dos projetos de IG no Brasil se encontram geral-mente mobilizados para discutir problemas ambientais de sua região, para se comprometerem com projetos de preservação dos recursos naturais.

O interesse da ONG Internacional “BirdLife” de associar os produtores da APROPAMPA nas suas ações de conservação do bioma Pampa se ins-creve dentro dessa perspectiva. BirdLife Internacional é um movimento de conservação da natureza e dos pássaros, cuja esfera de ação se estende desde a ação local até àquela de nível político internacional. Suas ativida-des repousam em parceiros nacionais que demonstraram capacidade para a utilização do meio ambiente de forma sustentável.

Conheça as atividades da “BirdLife” com os produtores da APROPAMPA http://www.birdlife.org/worldwide/national/brazil/index.html

Acesso realizado em: 10 jul. 2010.

Além da viabilidade econômica, que concerne aos produtores propria-mente ditos, as IG contribuem para o desenvolvimento territorial através de atividades específicas que, por efeito, agem sobre a economia local (tu-rismo, atividades conexas, etc.) e sobre o patrimônio e por uma resposta adequada às demandas sociais (paisagens, bem estar animal, comércio jus-to).

1.3 Relativizando o sucesso e refletindo as IG Esses indicadores, referidos anteriormente, geralmente são avaliados por métodos qualitativos que refletem, com frequência, as opiniões ou os pontos de vista de alguns agentes. É difícil distinguir o que é causado pela proteção legal versus o sistema de regras da IG. Pode-se cogitar que uma formalização da produção com outro signo distintivo poderia contribuir da mesma forma ao desenvolvimento rural.

Portanto, é importante considerar essas informações com cuidado, anali-

48

Page 49: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

sando quem avalia a experiência (técnicos, produtores, comerciantes, pes-soa externa ao processo) e quais são os seus interesses.

Existe também riscos potenciais na implementação de uma IG. Em certas situações, o sucesso econômico do produto (valor agregado) pode gerar efeitos negativos numa produção específica ou num território.

O reconhecimento de um produto pode induzir à sobre-exploração de recursos específicos no mercado. Hoje, por exemplo, não se sabe se os sistemas agrícolas tradicionais de produção de mandioca ou de inhame da África ou de outros países da América Latina, serão capazes de responder e de se adaptar ao crescimento da demanda relacionada ao reconhecimen-to do produto. De acordo com alguns especialistas, ele pode induzir uma sobre-exploração das terras.

Em muitas situações, tem-se demonstrado que a IG pode ser um instru-mento de mercado e/ou de desenvolvimento rural relevante, oferecendo novas oportunidades para as regiões rurais. Entretanto, os efeitos das IG no desenvolvimento rural não são automáticos ou determinados previa-mente; eles dependem de vários elementos internos ao sistema de IG, as-sim como de vários fatores externos, sendo o mais importante o apoio do quadro institucional (presença de instituições de apoio, políticas públicas voltadas para a promoção das IG).

1.4 Fatores chaves para o sucesso de uma IG Algumas experiências permitem identificar quais são os fatores importan-tes para garantir o sucesso de uma IG.26

• Uma organização de produtores e de agentes territoriais, sensibili-zada e preparada (capacitação) para promover e proteger o seu pro-duto;

• Produto(s) com reputação e/ou características valorizadas nos mer-cados - os consumidores serão capazes de reconhecer essa diferença;

• Potencial de coordenação na cadeia produtiva (incluindo se possível os diferentes elos da cadeia);

• Apoio financeiro e técnico nas fases iniciais de reconhecimento e implantação da iniciativa e no manejo das IG;

49

CAPÍTULO 01

Page 50: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

• Uma promoção nacional do conceito de IG;

• Uma organização das leis de fiscalização em nível federal e estadual, bem como estudos no sentido de preservar a tipicidade dos produ-tos;

• Políticas públicas voltadas para o reconhecimento e manutenção das IG;

A IG se constitui em um elemento importante da política agrícola comum da União Europeia. Na França, a origem da política pública para apoiar as IG surgiu das pressões dos produtores de vinhos e dos negociantes da região da Bourgogne para lutar contra as práticas de usurpação.

Progressivamente, a política de qualidade se tornou mais ampla. Os prin-cípios que orientaram o desenho das políticas públicas rurais passaram a destacar os benefícios das IG, enfatizando as iniciativas como instrumento potencial para uma política de desenvolvimento rural.

Hoje, existem movimentos sócio-políticos ao redor das IG, como: Slow Food, ORIGIN e Associação das regiões europeias dos produtos de ori-gem. Constituíram-se, assim, redes de ação política (policy networks).

Principais justificativas e orientações das políticas de proteção da origem e da qualidade na França.

PeríodoJustificação das políticas de proteção da origem e da qualidade

1905-1970Regras da concorrência, um sistema de concorrência justa e leal

1970-1985

Regulação da oferta agrícola, Regulação do mercado, diversificação / segmentação dos mercados

Intervenção do Estado na oferta agrícola

1985-2000Desenvolvimento territorial, desenvolvimento rural, Política econômica local, externa, desenvolvimento agrícola/desenvolvimento rural

A partir do ano 2000

Direitos de propriedade intelectual e proteção dos saberes

Patrimônio e conservação dos recursos (culturais e biológicas) Biodiversidade, proteção dos saberes locais

Tabela 1.3 - Fonte: ALLAIRE et al. (2005)

50

Page 51: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

No Brasil, uma política pública de proteção da origem para o setor agrí-cola começa a ser definida e estruturada. Além disso, observamos uma convergência de diferentes programas, que podem contribuir para a cons-trução de um quadro institucional favorável ao desenvolvimento das IG.

A Secretaria de Desenvolvimento Agropecuário e Cooperativismo (SDC), do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA), tem, en-tre seus objetivos, contribuir para a formulação da política agrícola no que se refere ao desenvolvimento do agronegócio. A Portaria nº 85, de 10 de abril de 2006, formalizou a criação de uma coordenação para planejamen-to, fomento, coordenação, supervisão e avaliação das atividades, progra-mas e ações de IG•de produtos agropecuários brasileiros.

Dessa forma, foi oficializada a atuação do MAPA nas questões que envol-vem IG de produtos agropecuários. Desde a sua criação, essa coordena-ção está apoiada em várias iniciativas que oferecem capacitação e apoio financeiro para a organização dos produtores e realização de estudos para promoção e reconhecimento de uma IG.

O Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI possui atribuição legal para estabelecer as condições de registro das IG no Brasil, segundo o artigo 182, parágrafo único, da lei 9.279/1996. E este, desde 1997, tem orientado associações e instituições no registro da IG.

Existem, também, outros programas de políticas públicas ou iniciativas convergentes apoiadas por outros ministérios: o registro de certos pro-dutos nos livros do Patrimônio Imaterial27, as políticas e programas do Ministério do Meio Ambiente (MMA) a agroecologia, o movimento Slow Food, o apoio à comercialização dos produtos da agricultura fami-liar, coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). Recentemente, a Portaria n°45, de 28 de Julho de 2009 instituíu o Selo de Identificação da Participação da Agricultura Familiar e dispõe sobre os critérios e procedimentos relativos à permissão, manutenção, extinção de uso.

Desde 2007, o programa de cooperação técnica Brasil-França para o for-talecimento da gestão integrada e participativa em mosaicos de áreas pro-tegidas, desenvolve atividades sobre a valorização da identidade territorial e a valorização dos produtos, recursos, serviços, cultura e tradição. Esses diferentes programas consideram as IG como um elemento potencial para o desenvolvimento rural, a preservação da biodiversidade e do meio ambiente.

51

CAPÍTULO 01

Page 52: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

De maneira mais geral, o panorama das políticas para o desenvolvimen-to rural na América Latina e no Brasil foi marcado pela emergência da abordagem territorial. O que significa uma busca de articulações entre municípios e entre setores, uma atenção maior para a valorização dos re-cursos locais, das riquezas dos territórios, assim como para uma inserção mais forte das populações na execução e elaboração dos programas (fó-runs participativos).

Esses elementos podem contribuir para a implementação de um quadro institucional favorável e uma valorização dos produtos típicos ou produ-tos da terra pelos consumidores, elementos chaves para o desenvolvimen-to das IG no Brasil.

Para conhecer as orientações e diretrizes da política agrícola e de desen-volvimento rural nacional assim como as orientações para salvaguardar o patrimônio imaterial brasileiro, visite o site do MAPA, do MDA, e do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN):

www.agricultura.gov.br -> Serviços -> Indicação Geográfica (CIG) 

www.mda.gov.br/saf/

www.iphan.gov.br

Acesso realizado em: 10 jul. 2010.

52

Page 53: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

ResumoNeste capítulo, vimos que a IG se tornou relevante para os agentes do mundo rural no contexto da globalização da economia e da abertura dos mercados.

Verificamos que as IG constituem um meio de valorizar uma localidade/região e um país de origem. Elas podem transformar-se em instrumento de competitividade no mercado e/ou instrumento de desenvolvimento rural, trazendo uma série de benefícios potenciais:

a. benefícios econômicos (abertura de mercado, agregação de valor);

b. benefícios sociais (emprego, dinamização de regiões carentes);

c. benefícios ambientais (preservação da biodiversidade, práticas pro-dutivas mas adequada para o meio ambiente).

Observamos, ainda, que os efeitos das IG no desenvolvimento rural não são automáticos, dependem de fatores internos (organização) e fatores externos, (presença de instituições de apoio, política pública voltada para a promoção das IG).

53

CAPÍTULO 01

Page 54: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Notas

1. KAKUTA et al., 2006

2. INAO, 2010.

3. BÍBLIA, Cânticos, I, 14.

4. BÍBLIA, Cânticos, III, 9, e Reis, V, 6.

5. OSÉIAS, 2010.

6. ALMEIDA, 2001

7. PÉREZ ÁLVAREZ, 2009.

8. PÉREZ ÁLVAREZ, 2009.

9. PÉREZ ÁLVAREZ, 2009.

10. A descrição do processo de proteção do Vinho do Porto foi re-alizada por Ana Soeiro, em sua palestra proferida no painel “Indicações Geográficas como instrumento de competitivida-de estratégica de organizações”, em 9 de outubro de 2008, às 13:00h, no Simpósio Internacional sobre Indicações Geográficas ocorrido em Porto Alegre.

11. Wilkinson, 2008

12. Mascarenhas, 2007.

13. Andion, 2007.

14. WILKINSON, 2008, p.17

15. CERDAN, 2004

16. Dupont, 2005.

17. Sautier, 2004; Larson, 2007.

18. Rangnekar, 2004.

19. Aprovale, 2010.

20. Tonietto, 2002; Locatelli, 2008.

21. Locatelli, 2006, 2008.

54

Page 55: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

22. Pecqueur, 2001.

23. Frayssignes, 2005.

24. Cerdan et al., 2009.

25. INAO, 2010.

26. Mascarenhas, 2008.

27. Oficio das Baianas de Acarajé, o modo artesanal de fazer Queijo de Minas nas regiões da Serra e das Serras da Canastra e do Salitre.

55

CAPÍTULO 01

Page 56: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade
Page 57: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade
Page 58: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Indicação Geográfica e outros sinais distintivos: Aspectos Legais

Este•capítulo•aborda•a•atual•regulamentação•da•IG•no•Bra-sil,•além,•é•claro,•de•comparar•as•duas•espécies•de•indica-ção• geográfica:• indicação• de• procedência• e• denominação•de•origem.•Em•um•segundo•momento,•para•melhor•com-preensão•da•matéria,•far-se-á•uma•comparação•da•indica-ção•geográfica•com•diferentes•sinais•distintivos,•buscando•demonstrar•suas•semelhanças,•diferenças•e•possíveis•con-flitos• que• podem• surgir• a• partir• da• utilização• de• nomes•geográficos,•especialmente,•no•âmbito•dos•produtos•agro-alimentares.• Especificamente,• serão• abordados• a• origem•e•os•sinais•distintivos,•as•marcas•de•produto•e•serviço,•as•marcas•coletivas,•as•marcas•de•certificação,•o•nome•empre-sarial,•o•título•de•estabelecimento,•os•nomes•de•domínio•e•outros•sinais•que,•embora•não•regidos•diretamente•pelo•direito•de•propriedade•industrial,•podem•ser•confundidos•com•a•indicação•geográfica.•

58

Page 59: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

2.1 Indicação geográfica e outros sinais distintivos: aspectos legais A IG, assim como as marcas, os nomes comerciais e os logos são sinais distintivos que possuem um objetivo comum: diferenciar os produtos e in-dicar a sua origem comercial. Diferenciar o produto significa indicar para o mercado, especialmente para o consumidor, que um produto é diferente do outro. A indicação da origem comercial prenuncia o produtor, garan-tindo sua procedência em termos comerciais. As IG, além de diferencia-rem o produto e seu produtor, apontam para uma determinada origem geográfica e condições de produção.

Todavia, quando um determinado sinal passa a ser conhecido e o consu-midor passa a valorizá-lo, este adquire um valor diferenciado, despertando o desejo, em terceiros mal intencionados, que se aproveitam indevidamen-te deste sinal conhecido no mercado. Para prevenir tal abuso, conforme já explanado no Capítulo 1, foram implementadas formas de proteção a estes sinais distintivos. Busca-se, com isso, garantir que apenas o legítimo titular (proprietário) ou terceiro legitimado (licença, por exemplo) possa utilizar o sinal.

No Brasil, desde o século XIX, há legislação que regulamenta a proteção e o uso de sinais distintivos. Embora já houvesse a CUP de 1883, o Acordo de Madri de 1891 e o Acordo de Lisboa de 1958, é apenas com o TRIPS, de 1994, que alguns padrões mínimos de proteção para estes sinais são universalizados, ou seja, estendidos para todos os 153 países que fazem parte da OMC.

2.1.1 Qual a importância do TRIPS para a IG?

Além de regular a proteção das marcas, o TRIPS também regula, especifi-camente as IG em seus artigos 22 a 24. Por este acordo,•as IG são aquelas que identificam um produto como originário do território de um Estado Membro, ou região, ou localidade naquele território, onde uma determi-nada qualidade, reputação, ou outra característica deste produto, é essen-cialmente atribuída a sua origem geográfica.

O TRIPS veda, inicialmente, a utilização de qualquer meio que sugira que o produto é originário de região diferente da verdadeira origem, induzin-do o consumidor a erro. Assim, a mera citação “Queijo Bento Gonçalves” ou “Queijo com a qualidade da Serra Gaúcha”, nos termos do TRIPS, é

59

CAPÍTULO 02

Page 60: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

vedada se a origem sugerida não for verdadeira.1 Essa restrição também é feita para as IG que, embora sejam verdadeiras, possam induzir o con-sumidor a erro, como é o caso da existência de dois nomes geográficos idênticos.

No caso de vinhos há uma previsão específica para as indicações homôni-mas e legítimas. Neste caso, ambas as indicações estarão protegidas, sen-do que cada Membro determinará as condições práticas pelas quais serão diferenciadas entre si as indicações geográficas homônimas em questão, levando em consideração a necessidade de assegurar tratamento eqüita-tivo aos produtores interessados e de não induzir a erro os consumidores (art. 23.3 do TRIPS). Os vinhos espanhóis e argentinos que usam a deno-minação “Rioja” são exemplos fáticos desta situação.

Além disso, o TRIPS determina que os Estados Membros devem recusar o registro de uma marca, ou invalidá-lo, quando consista em uma falsa IG•suscetível de induzir o consumidor a erro.2 Este seria o exemplo de uma marca que se denomine “Castanha do Pará”, sem contudo, indicar um produto originário do Pará.

Este acordo dispõe que inexiste obrigação de proteger indicações que não estejam protegidas no país de origem do produto, bem como aquelas que tenham caído em desuso ou tenham se transformado em IG genéricas. 3

No que se refere aos vinhos e destilados, o TRIPS estabelece uma prote-ção diferenciada, consistente na proibição de se utilizar uma IG para estes produtos quando originários de uma região diversa da indicada pela IG, ainda que a verdadeira origem esteja descrita no produto.4

Se um vinho foi produzido na Espanha - mesmo que isso esteja descrito no rótulo, ele não pode dizer que é um Champagne, pois somente o vinho espumante produzido na região de mesmo nome, localizada ao norte da França, é que pode fazer uso desta indicação. Um ponto negativo desta proteção, inserido nas pautas das atuais negociações da OMC, é que ela não se aplica aos demais produtos, tão somente aos vinhos e destilados.

Neste cenário, cumpre ressaltar que o TRIPS não estabeleceu um registro internacional de IG, embora já existam negociações no âmbito da OMC que objetivam a criação deste. Para que uma IG seja válida e reconhecida no Brasil, ela precisa requerer seu registro no INPI. Para que a proteção de uma IG•seja•válida no território de outros países, é necessário requerer, se for o caso, o registro – em cada um destes países. A União Européia é uma

60

Page 61: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

exceção a este sistema, porquanto nesta união existe um registro comuni-tário, que gera efeitos em todos os países que a constituem.

Após tais apontamentos sobre o TRIPS, é importante ressaltar que a in-ternalização desses conceitos em cada um dos países ocorre de forma di-ferenciada. No caso do brasileiro, apesar da internalização do TRIPS, a proteção das IG é regulamentada por meio da Lei n. 9.279/1996.

Para melhor entendimento do significado dos dispositivos legais, torna-se imprescindível compreender quais os princípios e os fundamentos que regem os sinais distintivos, especialmente aqueles que identificam uma origem geográfica – como é o caso das IG. Isso ser fará primeiramente explicando estes princípios e, posteriormente, demonstrando o que não pode ser considerado uma IG.

2.1.2 Princípios que regem os sinais distintivos

A origem se torna um sinal distintivo quando passa a influir sobre o pro-duto ou serviço a ponto de diferenciá-lo dos demais produtos semelhantes ou afins. E é esta origem que poderá se tornar objeto de proteção por uma IG. Para compreender melhor esta distinção, faz-se necessário o esclareci-mento de alguns princípios que norteiam os sinais distintivos: disponibili-dade, anterioridade, territorialidade, especialidade e notoriedade.

• Princípio•da•disponibilidade

O princípio da disponibilidade determina que um sinal deve estar dispo-nível para que possa ser apropriado. Isso porque não é justo reconhecer a propriedade privada e exclusiva sobre um sinal quando sobre tal já existe direito idêntico e alheio, ou se toda a comunidade tem direito de usar o termo.

Conceder a um produtor de doces de cupuaçu o direito exclusivo de utili-zar o nome “cupuaçu”, por exemplo, levaria a todos os outros produtores a impossibilidade de dizer de que se constitui o seu doce, não podendo sequer informar ao consumidor que se trata de um doce desta fruta. Desta maneira, nomes da fauna e flora brasileira, assim como o nome comum ou descritivo de um determinado produto (tapioca) ou serviço (extensão rural) são sinais que não estão disponíveis, pois pertencem a toda a coleti-vidade, são de domínio público.

61

CAPÍTULO 02

Page 62: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

• Princípio•da•anterioridade

O princípio da anterioridade resguarda o direito do primeiro requerente de um determinado sinal distintivo a ter sobre ele exclusividade, se conce-dido o referido registro e na forma de sua concessão. Significa que o sinal deve ser diferente dos demais em uso e/ou protegidos - o que se verifica a partir de uma análise baseada na anterioridade – para que ele possa ser apropriado, conferindo o direito de propriedade ao titular.

É o princípio da anterioridade que irá nortear a solução dos casos de con-flito, pois “quando dois sinais distintivos não podem conviver pacifica-mente, deve sucumbir aquele que for mais recente”.5

• Princípio•da•territorialidade

O princípio da territorialidade estabelece que determinados direitos de propriedade industrial têm sua proteção restrita ao país onde esta prote-ção foi requerida. Isso significa que as IG, têm sua proteção restrita ao país onde foram reconhecidas, ou seja, no país onde seu registro foi concedido. Não há um reconhecimento mundial, embora existam acordos, como o de Lisboa, que estabeleçam um reconhecimento recíproco entre os países signatários do Acordo.

O caso da Região dos Vinhos Verdes é muito interessante, pois está protegido em Portugal e no Brasil sob no IG970002. O mesmo ocorre com os vinhos Franciacorta da Itália, concedido sob no IG200001 e com o destilado de vinho da França Cognac, que foi reconhecido pelo INPI sob no IG980001.

O mesmo se dá com a IP brasileira Vale dos Vinhedos para vinhos, que além do reconhecimento brasileiro6, também foi reconhecido pela União Européia7, sendo protegido, por conseqüência, em todos os países que a compõe.

Assim, torna-se claro que IG estrangeiras protegidas em seu país de ori-gem, desde que não consideradas genéricas e cumpridas os requisitos le-gais e administrativos, podem ser registradas e reconhecidas no Brasil, mediante um processo administrativo realizado perante o INPI.

• Princípio•da•especialidade•e•da•notoriedade

Segundo o princípio da especialidade, “a exclusividade de um sinal se es-gota nas fronteiras do gênero de atividades que ele designa”.8 Ou seja, se uma fábrica de maquinários agrícolas possui uma marca que foi registrada para distinção destes maquinários no mercado, nada impede que a mes-

62

Page 63: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

ma marca (desde que não se trate de concorrência parasitária ou desleal) possa ser utilizada para distinguir um grupo de música, pois o campo de abrangência é completamente diferente.

Como exemplo, tem-se a marca Jacto, que está registrada para diversas classes relacionadas com máquinas agrícolas e correlatos, como se pode verificar nos registros nos 826107524, 821593455, 821593501, 826582796, etc. do INPI. De outro lado, Alexandre Magalhães Barbosa requereu tam-bém o registro da marca Jacto, conforme pedido no 822468280, para sua banda de música. Assim, fica claro que o âmbito de concorrência é outro, o que é característico do sistema de marcas.

A questão é saber se as IG estão limitadas ao princípio da especialidade, posto que a submissão da IG ao princípio da especialidade iria oportuni-zar, sem dúvida, o aproveitamento parasitário de outras empresas que, com base na notoriedade da região, poderiam se beneficiar com o registro de uma marca, ainda que para identificar produtos diferentes.

A regra é que as IG não se submetem ao referido princípio e seu registro deveria impedir, em tese, registros de novas marcas e mesmo novas IG, ainda que para produtos diferentes.

Por outro lado, a notoriedade de um sinal distintivo se refere à capacidade que um comprador em potencial tem de reconhecer ou de se recordar de um sinal como integrante de uma categoria de produtos. É importante sa-lientar que a idéia de notoriedade está ligada não apenas ao conhecimento que se tem do sinal, mas da associação signo-produto.

Além disso, a notoriedade deve existir precisamente onde se pretende que seja efetivada a sua proteção9, não obstante é claro, o princípio da recipro-cidade entre países seja considerado no momento da concessão de uma IG estrangeira.

Uma distinção em relação à notoriedade e a reputação são pertinentes, pois enquanto a notoriedade está relacionada ao conhecimento que um determinado número de consumidores possui em relação ao sinal distin-tivo, a reputação abarca além do conhecimento do público a noção de va-lores, geralmente advindos da qualidade do produto que conferem a este sinal distintivo uma determinada fama, celebridade, renome, prestígio. Portanto, a notoriedade está para a dimensão quantitativa assim como a dimensão qualitativa está para a reputação.10

63

CAPÍTULO 02

Page 64: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

2.1.3 Como são definidas as IG na lei brasileira?

A legislação brasileira que reconhece e regulamenta a IG é bastante sucin-ta. As IG encontram amparo na Lei n° 9.279/1996, em seus artigos 176 a 182, produto da harmonização da legislação brasileira com o TRIPS. Além desta lei, a Resolução n° 75/2000, editada pelo INPI, regulamenta o registro da IG no Brasil. Por fim, o Decreto nº 4.062, de 21 de Dezembro de 2001, protege, de forma sui generis, as expressões “Cachaça” e “Brasil”, conferindo a estas o status de indicação geográfica.

A Lei n° 9.279/1996, em seu artigo 176, define o que é uma IG. Sucintamente, a IG é entendida como sendo:

a. indicação•de•procedência (IP)− que indica o•nome•geográfico que tenha se tornado•conhecido pela produção ou fabricação de deter-minado produto, ou prestação de determinado serviço; e,

b. denominação•de•origem (DO)− que indica o•nome•geográfico do local que designa produto, ou serviço, cujas qualidades•ou carac-terísticas se devam exclusiva ou essencialmente•ao•meio•geográ-fico, incluídos•os•fatores•naturais•e•humanos.

Observamos que a lei não define o gênero IG em si, apenas as suas espé-cies: IP e DO. Entretanto, pode-se compreender que a IG indica o nome geográfico que tenha uma relação com um produto ou serviço específico e tenha notoriedade ou uma característica ou qualidade decorrente dos fatores naturais e humanos.

A IG necessariamente refere-se à relação entre um produto (ou serviço) e um nome•geográfico pelo qual este produto é reconhecido.

Cabe salientar que o legislador brasileiro não internalizou de forma literal a definição de IG contida no TRIPS. Por um lado, restringiu-a em deter-minados aspectos, como no caso do uso de um nome geográfico, tendo em vista que o TRIPS permite o uso de qualquer nome, desde que este lembre uma localização geográfica.

Um exemplo de um nome não geográfico, mas que é reconhecido como tal por se identificar com uma região é o vinho espumante Cava, elabora-do pelo método tradicional em determinada região da Espanha.

Por outro lado, a Lei no 9.279/1996 expandiu o TRIPS, notadamente ao estender a proteção de uma IG também para os serviços. De maneira geral,

64

Page 65: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

não é comum, especialmente na Europa, a proteção de “serviços geográ-ficos”, mas trata-se de uma oportunidade a ser explorada. TRIPS apenas estabelece patamares mínimos, cada país, ao internalizá-lo, defini seu cri-térios - mais restritivos ou mais abrangentes. A Tabela 2.1, a seguir, sinteti-za a internalização da definição de IG feita pelo legislador brasileiro e seu significado original no acordo TRIPS:

Internalização do TRIPS

Acordo TRIPS Lei 9.279/1996

Gênero Indicação Geográfica Indicação Geográfica

Espécie --Indicação de Procedência

Denominação de Origem

Nome a ser protegido Qualquer indicação Nome geográfico Nome geográfico

Abrangência Produto Produto ou serviço Produto ou serviço

Origem

Território de um Membro, ou região ou localidade do terri-tório

País, cidade, região ou localidade de seu território

País, cidade, região ou localidade de seu território

FundamentoQualidade ou reputa-ção ou outra caracte-rística

Tenha se tornado co-nhecido (reputação)

Qualidade ou carac-terística

Produção ou origem da matéria-prima

Atribuída essencial-mente à sua origem geográfica

Centro de extração, produção ou fabri-cação do produto ou de prestação do serviço

Atribuída exclusiva ou essencialmente ao meio geográfico,

Incluídos fatores naturais e humanos.

Tabela 2.1 - Fonte: Bruch (2008).

A Cachaça do Brasil: uma proteção “sui generis”

Além da Lei no 9.279/1996 e a Resolução no 75/2000 cabe mencionar o Decreto nº 4.062/2001, pois este diploma define e protege, de forma sui ge-neris, as expressões “Cachaça”, “Brasil”, “Cachaça do Brasil” como de “uso restrito aos produtores estabelecidos no País”. Entretanto, este decreto não tratou de conceituar a cachaça. Esta definição, encontra-se esculpida no art. 53 do Decreto nº 6.871, de 4 de Junho de 2009, que regulamenta a Lei nº 8.918, de 14 de julho de 1994, que dispõe sobre a padronização, a classificação, o registro, a inspeção, a produção e a fiscalização de bebidas.

65

CAPÍTULO 02

Page 66: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Em conformidade com o art. 3o do Decreto nº 4.062/2001, as expressões protegidas somente poderão ser usadas para indicar o produto que atenda às regras gerais estabelecidas na Lei nº 8.918/1994, e no Decreto nº 2.314, de 4 de setembro de 1997, e nas demais normas específicas aplicáveis.

Assim, pelo Decreto nº 4.062/2001, art. 1o e 2o, respectivamente, o “nome ‘cachaça’, vocábulo de origem e uso exclusivamente brasileiros, consti-tui indicação geográfica para os efeitos, no comércio internacional” e o “nome geográfico ‘Brasil’ constitui indicação geográfica para cachaça”, nos termos do art. 22 do TRIPS.

Note-se que esta é a única IG brasileira protegida por decreto. O seu enquadramento justifica-se na medida em que o mencionado art. 22 do TRIPS permite que os países membros protejam determinadas indica-ções de produto como originário de seu território e foi exatamente isso que ocorreu com a Cachaça do Brasil. Este termo, embora não sendo um nome geográfico, possui conotação geográfica vinculada ao território brasileiro, situação semelhante a que ocorreu com a tequila no México, bebida alcoólica mexicana por excelência. No caso mexicano, a Secretaria de Indústria e Comércio do México, em 9 de dezembro de 1974, outorgou a proteção da denominação de origem tequila.11

Assim, a declaração de que a expressão cachaça é um vocábulo de origem e uso exclusivamente brasileiros, constituindo IG para os efeitos do mer-cado internacional, foi uma medida política de salvaguarda, para evitar que a expressão fosse indevidamente utilizada por terceiros no mercado internacional, até porque existem outros países que também fabricam aguardente de cana-de-açúcar, como o Peru e a Costa Rica.

2.1.4 Principais características e diferenças entre IP e DO, entre serviços e produtos

Compreendidas as principais diferenças entre a definição de IG prescrita pelo TRIPS e pela Lei no 9.279/1996, cumpre analisar, a partir deste mo-mento, as principais características que diferenciam as espécies de IG no Brasil, ou seja, a IP e a DO e quais são os significados quando se trata de um produto ou de um serviço (Figura 2.1).

66

Page 67: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Figura 2.1 - Diferenciação entre IP e DO segundo a legislação brasileiraFonte: Bruch (2009)

O entendimento da IP e da DO pode assim ser resumido:

• Indicação de procedência: exige somente a notoriedade do local de origem dos produtos/serviços.

• Denominação de origem: exige elementos que comprovem que o produto/serviço possui uma qualidade ou característica que se deve essencialmente ao local (meio geográfico) de origem, conside-rando-se os fatores naturais (como, por exemplo, ao clima, ao solo, etc.) e humanos (a forma de elaborar o produto).

IG Produtos / IG Serviços

A IG para produtos e a IG para serviços apresentam algumas diferenças, tanto em termos de seu significado, como das características e dos requi-sitos necessários para o seu reconhecimento. Passemos ao estudo desses elementos.

•• •Produtos:•No caso das IG para produtos, as principais característi-cas a serem analisadas estão no fundamento da constituição de uma IP ou DO, ou seja, quais são os fatores que devem obrigatoriamente influenciar os produtos. Isso significa uma análise do local de extra-ção, da origem da matéria-prima, do local de elaboração ou benefi-ciamento do produto, do local de embalagem, envelhecimento ou outros processos posteriores à elaboração, bem como da existência de um regulamento de uso e a forma de controle deste.

67

CAPÍTULO 02

Page 68: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

•• Serviços:•No caso de IG para serviços, as principais características, que estão relacionadas ao fundamento para o reconhecimento de uma IP ou DO, são o local da prestação do serviço, a existência de um regulamento de uso e a forma de controle deste regulamento de uso.

•• Fundamento:•O fundamento para que uma IP seja protegida – tan-to para produtos quanto para serviços - segundo a legislação atual é “ter se tornado conhecida” ou ainda, que o território tenha “re-putação”, segundo o TRIPS. Sem dúvida, esta definição é vaga, mas remete diretamente ao princípio da notoriedade, anteriormente mencionado.

• No tocante à qualidade ou às características que estejam relaciona-das ao meio geográfico, estas apenas são exigidas para constituir uma DO.

•• •Fatores: Para uma IP não se exige a influência de fatores naturais e humanos, somente a notoriedade do local de origem dos produtos/serviços. Para o reconhecimento de uma DO, além da notoriedade do local de origem exige-se influência de fatores naturais e huma-nos, requisito complicado para o caso de uma DO de serviços.

•• Regulamento•de•uso:•No que tange à existência de um regulamento de uso, ele é obrigatório tanto para a IP como para a DO.� Todavia, inexistem critérios mínimos que devem constar no regulamento de uso das mencionadas espécies, ficando esta análise a critério do bom senso do examinador do pedido.

•• Controle:•A Resolução INPI no 75/2000 dispõe sobre a obrigatorie-dade da existência de um controle, tanto para a IP como para a DO.

Requisitos especiais para produtos

•• Extração: No caso da IP, determina-se que o local deve ser conhe-cido como centro de extração, mas nada dispõe até que ponto todo o produto extraído deve vir do local delimitado. Para a DO, as qua-lidades ou características do produto devem estar relacionadas, ex-clusiva ou essencialmente, ao meio geográfico, o que deixa claro que a extração deve ocorrer no local, mas também não determina o quantun, já que a palavra essencialmente não significa a totalidade.

68

Page 69: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

•• Matéria-Prima: Para a IP basta que o produto seja elaborado na região, já que a lei silencia quanto à exigência de origem ou prove-niência da matéria-prima. Contudo, no caso da DO, em decorrência do próprio conceito, é imprescindível que uma parte substancial da matéria-prima provenha do local da DO, embora a legislação não defina o percentual.

•• Elaboração•/•Beneficiamento: Com relação à produção, no caso da IP, parece claro que se o local se tornou conhecido por produzir ou fabricar um determinado produto, é neste mesmo local que deve ocorrer a fabricação. Entretanto, não há uma restrição expressa que obrigue a isso, ou seja, a produção poderia ocorrer fora da região delimitada.

• Para a DO, nada se menciona com relação ao local de produção, mas para que os fatores naturais e humanos influenciem nas quali-dades ou características do produto, parece essencial que isso ocor-ra no local delimitado.

•• Acondicionamento/• Envelhecimento: Inexiste menção sobre esta questão, tanto para IP quanto para DO. Contudo, sabe-se que o acondicionamento garante, em grande parte, a preservação das características do produto, impedindo inclusive sua falsificação ou adulteração.

Requisitos especiais para serviços

Com relação à IP, se um local se tornou conhecido pela prestação de deter-minado serviço, nada mais óbvio que este seja realizado exclusivamente na região delimitada, mas não há disposição legal expressa nesse sentido. O mesmo vale para a DO, ressaltando que neste caso, as características ou qualidades desse serviço devem ser atribuídas exclusiva ou essencialmente aos fatores humanos do local, o que se presume que o serviço deve ser prestado na região delimitada ou pelo menos a partir desta.

69

CAPÍTULO 02

Page 70: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Comparativo dos critérios adotados hoje e considerados ideais que definem uma IP e uma DO

Tabela 2.2 - Fonte: Bruch e Copetti (2009) Legenda: Hoje (Critérios estabelecidos na Lei no 9.278/1996 e/ou na Resolução no 75/2000). Ideal (Critérios que poderiam ser regulados e/ou obrigatórios). Critério obrigatório, deve ser comprovado.

Critério não obrigatório, não precisa ser comprovado. ? Não há disposição legal sobre o tema.

70

CRITÉRIOS COMUNSIP DOHoje Ideal Hoje Ideal

FundamentoTer se tornado conhecida ?

Qualidade, outra característica

Fatores Naturais e humanos

Regulamento de uso

Existência de um regulamento de uso

Critérios mínimos

ControleExistência de um controle

Forma de controle determinada

PRODUTO

Extração100% da área delimitada ? ?Pode ocorrer fora da área delimitada

? ?

Matéria-Prima100% da área delimitada ? ?Pode vir de fora da área delimitada

? ?

Elaboração beneficiamento

100% na área delimitada ? ?

Pode realizar-se fora da área delimitada

? ?

Acondicionamento /envelhecimento

Obrigatório 100% da área delimitada

? ?

Não obrigatório 100% da área delimitada

? ?

SERVIÇO

Prestação do serviço

100% da área delimitada ? ?Pode realizar-se fora da área delimitada

? ?

Matéria-Prima envolvida

100% da área delimitada ? ?Pode vir de fora da área delimitada

? ?

Page 71: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

2.1.5 Natureza, titularidade e direitos conferidos segundo a lei brasileira

Embora a doutrina não seja clara quanto à natureza jurídica de uma IG, é corrente reconhecer-la, tanto para IP quanto para DO, como direito de propriedade ou direito à exclusividade do uso pelo seu titular. De qual-quer forma, no Brasil entende-se este como um direito privado. O proble-ma reside em definir quem é o titular.

De um lado, a Lei nº 9279/1996, em seu artigo 182, apenas expressa que “o uso da IG é restrito aos produtores•e•prestadores•de•serviço•estabe-lecidos•no•local, exigindo-se, ainda, em relação às denominações de ori-gem, o atendimento de requisitos•de•qualidade”. Esta expressão se refere a um direito de uso da coletividade local.

De outro lado, o artigo 5o da Resolução no 75/2000/INPI, dispõe que “as associações, os institutos e as pessoas jurídicas representativas•da coleti-vidade legitimada ao uso exclusivo do nome geográfico e estabelecidas no respectivo território” podem requerer o registro, na qualidade de substi-tutos processuais. 13

Com relação aos direitos conferidos, interpretando as disposições aplica-das às demais figuras dos direitos de propriedade industrial, tais como as patentes14 e as marcas15, e considerando as condutas penalizadas como cri-mes contra as IG16, pode-se concluir que há•um•direito•de•impedir•que•um•terceiro,•sem•consentimento,•utilize•uma•IP•ou•uma•DO•em•seus•produtos• ou• serviços,• incluindo-se• nisso• o• nome• e• os• demais• sinais•que•a•distinguem.

Por definição a titularidade da IG é coletiva, ou seja, é um direito exten-sivo a todos os produtores ou prestadores de serviço que estejam na área demarcada e que explorem o produto ou o serviço objeto da indicação. Isso é o que se depreende do estudo da IG de maneira geral.

Maiores esclarecimentos sobre IG para produtos agropecuários pode-rão ser encontrados no Guia para solicitação de registro de indicação geo-gráfica para produtos agropecuários, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, disponível no site: http://www.agricultura.gov.br/pls/portal/docs/PAGE/MAPA/SERVICOS/IG_PRODUTOS_AGROPECUARIOS/CONSTRUINDO_AS_IG/GUIA%20IG%20FINAL_0.PDFAcesso realizado em: 10 jul. 2009.

71

CAPÍTULO 02

Page 72: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

2.1.6 O que não é uma IG?

Após entender o que é uma IG resta claro que esta pressupõe um nome conhecido, notório. E isso não ocorre “do dia para a noite”! Portanto, um nome geográfico desconhecido não pode se constituir em uma indicação geográfica. Assim, se não existe o elo entre a notoriedade do lugar e o produto ou serviço nele produzido, não há uma indicação geográfica a ser reconhecida. Por isso, ao contrário das marcas comuns, as marcas notórias e as indicações geográficas são construídas com o tempo.

Diante do exposto podemos afirmar o que não é Indicação Geográfica:

• •Um•nome•geográfico•desconhecido

A própria expressão nome geográfico desconhecido traduz a idéia de que o sinal não é conhecido, ou seja, inexiste qualquer elo que simbolize um produto ou serviço em particular.

Assim, a pergunta é: Um nome geográfico desconhecido pode se consti-tuir em uma IG? Em regra não, posto que a sua reputação ou notoriedade é requisito essencial para seu reconhecimento e proteção. Desta forma, o uso do nome de um local desconhecido para distinguir um produto não se constituiria em uma falsa IG, desde que respeitado o disposto na legis-lação sobre a forma de uso deste referido nome.17

Todavia, em determinados casos não se concede a exclusividade do uso do nome de uma localidade, pois o Estado estaria conferindo um status vantajoso a um único titular, em detrimento dos demais moradores do mesmo local, ainda que este espaço geográfico não seja notório. Este foi o caso do sinal Lindóia ou Lindóya. Na época não se tratava de um nome ge-ográfico conhecido e poderia ser registrado como marca. Mas o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), na Apelação Cível no 215.846-1/1994, en-tendeu que este nome não poderia ser apropriado por uma única pessoa, posto que pertenceria a todos àqueles que exploram a lavra de água, esta-belecidos nesta cidade denominada Águas de Lindóia.18

• Nome•geográfico•em•potencial

O nome geográfico em potencial, ao contrário, se refere a um sinal que lembra ou simboliza um produto ou serviço em particular, embora ain-da não esteja formalmente reconhecido como uma IG. Neste caso, seu registro como outra forma de sinal distintivo, que não como IG, torna-se temerário.19

72

Page 73: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

A Serra Gaúcha, por exemplo, é conhecida em todo Brasil por sua pro-dução de vinhos. Seria adequada a concessão de uma marca para vinhos intitulados “Serra Gaúcha”, impedindo assim, o uso desta expressão pelos produtores da região, mesmo ela não sendo reconhecida como uma indi-cação geográfica? Parece que não. Contudo, conforme se verifica, há três registros de marca concedidos para o termo “Serra Gaúcha” e um deles, sob nº 815334818, foi registrado especialmente na classe de vinhos.20

• Nome•geográfico•que•se•tornou•genérico

O nome geográfico que se tornou genérico é aquele que perdeu sua dis-tinguibilidade, ou seja, deixou de ligar um produto ou serviço a uma de-terminada região para se transformar no nome descritivo ou comum do próprio produto ou serviço. Ao se referir a um queijo parmesão, a um queijo minas ou a um queijo prato, a idéia que vem à mente é o tipo do queijo e não a sua origem geográfica.21

Cabe mencionar a teoria da diluição ou da degeneração às IG. Trata-se de nomes que se tornaram genéricos, embora designem uma região, como é o caso do queijo prato ou do queijo parmesão. O INPI indeferiu três pe-didos que parecem refletir o uso da teoria da diluição. Trata se de Parma (no IG970001) para presuntos, Roquefort (no IG200102) para queijos e Asti (no IG200202) para vinhos.

• •Nome•que•usa•a•referencia•“tipo”

Há uma lacuna na legislação brasileira22 que permite a utilização de “tipo”, “espécie”, etc. para a identificação de um produto, desde que ressaltada a verdadeira procedência. O problema é que esta permissão pode auxiliar na diluição ou degeneração de uma IG, posto que em pouco tempo esta poderá estar designando um tipo de produto e não mais uma origem geo-gráfica. Um exemplo seria a utilização, para queijos, das expressões “tipo gouda” e “tipo gruyère”.

• •Nome•de•fantasia

Há outros nomes que, mesmo conhecidos, são passíveis de serem concebi-dos como outro sinal distintivo que não uma IG. Trata-se de referências a um determinado local, sem que isso induza o consumidor a erro. Veja-se, por exemplo, os nomes como Cerveja Antártica ou Sandálias Havaianas (Figura 2.2). Dificilmente o consumidor irá imaginar que citada cerveja foi produzida na Antártida ou que as referidas sandálias vieram do Havaí.

73

CAPÍTULO 02

Page 74: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

O mesmo é válido para cidades já extintas ou imaginárias, que em ne-nhum momento poderão causar qualquer confusão23, como por exemplo, Atlântida.

Figura 2.2 - Sandálias HavaianasFonte: http://www.princigalli.com/files/havaianas-main.jpg

• Falsa•indicação•quanto•à•origem

A situação é diversa quando o sinal pode induzir a uma falsa indica-ção quanto à origem. Nesse sentido, há disposição expressa na Lei n° 9.279/1996, que veda o registro de uma marca que induza a falsa indica-ção quanto à origem ou procedência do produto.24

Esta mesma advertência vale não só para o nome geográfico em si, mas para outros sinais ou símbolos, bem como para adjetivos que possam le-var ao erro quanto à origem do produto ou serviço.25

Nesses casos, é indiferente se a marca pretendida refere-se a um mesmo produto, ou a produto diverso daquele defendido pelo titular do direi-to. Este foi o caso da disputa judicial em que figurava o Institut National des Appellations D’origine de Vins et Eaux-De-Vie (INAO), INPI e a empre-sa Bordeaux Buffet S.A. Não se justifica o uso indiscriminado de designa-ções conhecidas, principalmente notórias, como é o caso da região de Bordeaux, ainda que para designação de produtos ou serviços diversos. Isso porque é evidente a intenção de aproveitamento parasitário.26

74

Page 75: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

2.2 Diferença entre IG e outros sinais distintivosPrimeiramente, vale lembrar que uma IG não substitui a marca de um produto ou serviço abrangido por esta, ao contrário, complementa-a, in-formando ao consumidor características diferenciadoras dos demais pro-dutos afins encontrados no mercado.

A pergunta é como o consumidor pode distinguir se um produto específi-co provém ou não de uma indicação geográfica?

No caso do Vale dos Vinhedos, IP reconhecida pelo INPI sob no IG200002, utiliza-se um selo de controle, que leva o sinal misto protegido acompa-nhado de uma numeração seriada que permite identificar a origem do vinho e da uva (Figura 2.3).

Figura 2.3 - Representação da IP Vale dos VinhedosFonte: Bruch, Copetti, Fávero e Aprovale (2009)

Neste caso, embora todos os produtos tenham sido elaborados dentro da região demarcada, nem todos possuem o sinal correspondente, seja por que não optaram em fazê-lo, seja por que o produto não foi aprovado pelo Conselho Regulador.

Já na União Européia, que usa classificação diferente do Brasil, foram es-tabelecidos selos, com cores diferentes, que indicam se o produto é uma Indicação Geográfica Protegida (azul) ou uma Denominação de Origem Protegida (vermelho) (Figura 2.4).

75

CAPÍTULO 02

Page 76: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Figura 2.4 - Selos de IGP e DOP da União Européia (BRUCH e COPETTI, 2010).

2.2.1 Marcas e IG

Marcas são sinais nominativos, figurativos, mistos ou tridimensionais, des-tinados a identificar e distinguir determinados produtos ou serviços de outros, de procedência diversa. Para que o sinal possa ser registrado como marca é necessário que os requisitos da novidade, distinguibilidade, ainda que relativa, e da licitude estejam presentes. No Brasil, as marcas são re-guladas pela Lei no 9.279/1996, especialmente nos artigos 122 a 175, além de outras disposições esparsas, e devem ser registradas no INPI, conforme já estudado no curso anterior.

As marcas podem ser de produto e/ou serviço, coletivas e de certificação. As características de cada uma são bastante diferenciadas, razão pela qual se vislumbra uma maior ou menor proximidade em relação às indicações geográficas.27

a. Marcas•de•produtos•e•serviços

Neste caso, o que pode ocorrer é o conflito entre o sinal utilizado para uma marca de produto ou serviço na forma de um “nome geográfico” e a utilização desse mesmo “nome geográfico” para uma IG. Recorde-se que, conforme estudado no curso anterior, o titular da marca é o legítimo detentor do registro e o utiliza na diferenciação dos produtos ou serviços por ele elaborado e/ou comercializado. Assim,•a•marca•de•produto•ou•serviço•não•se•confunde•de•forma•alguma•com•uma•IG.

Neste assunto a lei não determina se deve prevalecer a marca ou a IG, nem tampouco se deve ser aplicado o princípio da anterioridade e o princípio da disponibilidade, já estudados.

76

Page 77: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Na prática, o INPI tem reconhecido IG para marcas já depositadas, bem como o contrário, desde que os sinais sejam suficientemente distintos.

Este é o caso no nome geográfico Paraty. A marca Parati está registrada sob no 740107895, dentre outros, desde 17/06/1974 para diversas classes. Entretanto, recentemente foi reconhecida como IG para cachaça com a grafia Paraty, registrada no sob no IG2000602. Esta decisão demonstra que a convivência é possível (Figura 2.5).

Figura 2.5 - Paraty x ParatiFonte: www.parati.com.br, www.paraty.tur.br

Ressalta-se que há países que não permitem a convivência entre marcas e IG idênticas, pois entendem que pode se caracterizar um comportamen-to parasitário por parte do titular de uma marca se esta for depositada posteriormente ao registro de uma IG e vice-versa. No entanto, outros permitem desde que haja suficiente distinção entre os sinais distintivos utilizados. Ainda há países onde a IG prevalece sobre o direito marcário, podendo uma IG reconhecida posteriormente anular uma marca já exis-tente.Outro caso interessante trata-se do perfume Champagne, lançado pela co-nhecida marca Yves Saint Laurent (YSL), que foi retirado de circulação em face da atuação do Conselho Interprofissional dos Vinhos de Champagne (CIVC), por se entender que haveria um comportamento parasitário por parte do titular da nova marca em face da notoriedade da IG internacio-nalmente reconhecida (Figura 2.6).

Figura 2.6 – Marca para perfume Champagne x IG Champagne. Fonte: www.99perfume.com

77

CAPÍTULO 02

X

Page 78: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Para mais detalhes sobre a atuação da CIVC na proteção da Denominação de Origem Champagne consulte o site:

http://www.maisons-champagne.com/orga_prof/defense_appellation.htm

Acesso realizado em: 23 maio 2010.

b. Marcas•coletivas

A marca coletiva identifica produtos ou serviços provindos de membros de uma determinada entidade. Este tipo de marca também tem uma função diferenciadora. Ela pode ser utilizada por Associações ou Cooperativas, por exemplo, cujos associados ou cooperados elaboram produtos que são disponibilizados no mercado com uma mesma marca. Isso pode garantir uma maior visibilidade e força à marca, o que não aconteceria se cada um dos associados ou cooperados utilizasse uma marca própria.

A marca coletiva se diferencia da IG, principalmente, pela titularidade, que é da entidade que representa seus componentes, e pela não vincula-ção ao espaço geográfico determinado. No caso da IG, a entidade é uma representante legal da coletividade e não a titular da IG.

É claro que a IG e a marca coletiva traduzem o direito de uso coletivo sobre o mesmo sinal, já que a coletividade utilizará o sinal. Sucede que, na marca coletiva somente os integrantes da entidade poderão usar livre-mente o sinal quando respeitadas as regras estabelecidas por eles mesmos no Regulamento desta Marca Coletiva. Este regulamento poderá dispor acerca de padronização, mas, não tem nenhuma obrigatoriedade de con-trole.

Na IG, o produtor localizado na região, faça ele parte da entidade repre-sentativa ou não, somente poderá usar o sinal quando atender aos requi-sitos do Regulamento de Uso da IG. O atendimento aos requisitos deverá ser verificado mediante a atuação de um órgão de controle, que é obriga-tório neste caso.

Em resumo, a IG aponta obrigatoriamente para determinada região, no-tória por determinado produto ou serviço (IP) e com características ou qualidades que se devam a este lugar (DO). Para a marca coletiva isso não é um requisito.

Os produtores, no caso da IG, se encontram ligados ao meio geográfico,

78

Page 79: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

ao terroir, que engloba fatores naturais e humanos. Logo, existe um míni-mo de características naquele produto ou serviço que os tornarão únicos em face da sua procedência. Nas marcas coletivas, basta participar da en-tidade coletiva e respeitar seus regulamentos para poder utilizar o sinal.

c. Marcas•de•certificação

As marcas de certificação são usadas para atestar a conformidade de um produto ou serviço com determinadas normas ou especificações técnicas. O titular da marca de certificação é um terceiro que verifica se um produ-to ou serviço foi elaborado conforme o regulamento por ele criado - com base em normas técnicas. Se aprovado, permite a utilização do sinal que identifica esta avaliação/certificação.

O titular é alheio ao produto ou serviço que se pretende que seja certifica-do, independentemente da região de proveniência do produto.

Ressalta-se que mesmo levando a marca de certificação, cada produto con-tinua utilizando a sua própria marca, como pode ser visualizado na Figura 2.7 da Associação de Certificação Instituto Biodinâmico (IBD), titular do depósito nominativo nº 828917477.

Figura 2.7 - Produtos certificados pelo IBDFonte: Elaboração de Bruch, Copetti e Fávero com base em: http://3.bp.blogspot.com/_5f8TWVrli64/SWpJE2zbD5I/AAAAAAAAAww/gwm3258XHX8/s400/ibd.JPGhttps://www.essenciais.com.br/imagens/produtos/231/feijao_preto_viapaxbio.gifhttp://1.bp.blogspot.com/_bklKChSAoIY/RtoMo0mt0BIAAAAAAAAABE/ttlmItv_LRA/Sl600-h/arroz_organico.gif

79

CAPÍTULO 02

Page 80: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Essa Associação tem como finalidade certificar produtos biodinâmicos, tais como os apresentados na Figura 2.7. Vale ressaltar que mesmo levan-do a marca de certificação, cada produto continua utilizando a sua própria marca.

Destaca-se que no Brasil, o titular de uma marca de certificação não pre-cisa ser acreditado ou credenciado por um organismo oficial como o Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (INMETRO), embora isso seja obrigatório em outros países.

A vantagem de ser acreditado por um órgão oficial é a possibilidade de que esta certificação seja reconhecida internacionalmente.

Na Biblioteca virtual você encontrará um material suplementar sobre acreditação e credenciamento: BRUCH, K; COPETTI, M. “Noções gerais sobre outros sinais distintivos”.

2.2.2 Nome empresarial

O nome empresarial é regularmente protegido após o arquivamento dos atos constitutivos da sociedade ou da cooperativa na Junta Comercial e da associação, sociedade civil ou fundação no Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas.28 Ele é empregado pelo empresário que desempenha uma ativi-dade comercial e podem ser equiparados a este a denominação das socie-dades simples, das associações, das cooperativas e das fundações. 29

Na biblioteca virtual você encontrará a legislação que regula o nome empresarial, tal como os artigos pertinentes do Código Civil e a Lei no 8.934, de 18 de novembro de 1994, que dispõe sobre o Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins e dá outras providências e o Decreto no 1.800, de 30 de janeiro de 1996, que regulamenta a Lei nº 8.934, de 18 de novembro de 1994.

Um dos pontos que diferencia o nome empresarial da IG é a composi-ção do nome. A composição do sinal para formar o nome empresarial é livre, desde que disponível e a única ressalva é em relação aos elemen-tos que obrigatoriamente irão compô-lo, como por exemplo, os prefixos Cooperativa, Associação e sufixos Ltda. S/A. Por outro lado, a IG só pode ser constituída por um nome geográfico e/ou sua representação da loca-lidade. A cachaça é uma exceção a esta regra, pois possui uma regulação especial, conforme exposto.

80

Page 81: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Por outro lado, não há nenhuma disposição legal que vede a averbação de nome empresarial que contenha um nome geográfico ou mesmo uma IG já reconhecida. Todavia isso pode se caracterizar como uma tentativa de concorrência desleal ou mesmo de um comportamento parasitário o que, por analogia a outras disposições legais, deve igualmente ser evitado.

Mas este será um trabalho para a entidade representativa da IG: atuar para coibir que terceiros utilizem indevidamente da IG ou expressão afim ou semelhante que possam prejudicar a própria IG ou induzir ao erro os con-sumidores.

2.2.3 Título de estabelecimento

O título de estabelecimento é o sinal distintivo do local de comércio. Logo não se confunde com o nome da pessoa jurídica, ou nome empresarial. Trata-se do cognome da empresa, ou seja, é o sinal estampado na fachada da loja, o nome fantasia. Como exemplo, tem-se o caso da empresa Bunge. Seu nome empresarial é Bunge Alimentos S/A, enquanto seu título de es-tabelecimento é apenas Bunge,•e Benta Mix, Soya, Cyclus, Salada, Primor, Delícia são marcas de produtos por ela comercializados.

Ao contrário dos demais sinais distintivos, o título de estabelecimento não tem um registro que o reconheça e proteja. Ele se consolida através do uso e do reconhecimento que se dá por meio de sua clientela e seus con-correntes.

Todavia, seu uso por meio de título comercial por um terceiro que não esteja autorizado poderá caracterizar concorrência desleal ou mesmo de um comportamento parasitário, além de levar o consumidor a erro, sendo isso expressamente vedado pela Lei nº 9279/1996.

2.2.4 Nome de Domínio

O nome de domínio é outra modalidade de sinal distintivo, criado com o advento da Internet. Em síntese, o domínio é uma atribuição de um nome a um IP (internet protocol), o qual se caracteriza por ser um endereço da internet composto por uma sequencia numérica (ex: 161.58.231.240), substituído por nomes (domínio), pois facilitam sua memorização (Ex: www.agricultura.gov.br), protegido como sinal distintivo.

As IG são reconhecidas pela sua notoriedade, assim, qualquer registro de um nome de domínio semelhante ou igual a uma IG se caracterizaria

81

CAPÍTULO 02

Page 82: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

como concorrência desleal ou aproveitamento parasitário, além de poder levar o consumidor a erro.

O que se veda não é o registro do mesmo nome, mas o aproveitamento in-devido da reputação alheia. Dessa forma, uma IG reconhecida e registrada (Champagne, por exemplo) pode não conseguir o registro de seu domínio www.champagne.org, porquanto outra pessoa já o registrou. E se o referido registro não se constituir como aproveitamento indevido, não poderá ser anulado.

2.2.5 Selos

Por último, faz-se necessário analisar os selos que encontramos em di-versos produtos e serviços, sem que os mesmos constituam em si uma indicação geográfica, uma marca de certificação, um nome empresarial ou uma marca.

Tratam-se de insígnias ou símbolos; públicos ou privados, que extrapolam os sinais distintivos (Figura 2.8). Estes signos são protegidos e utilizados in-dependentemente de possuírem registro como Marca de Certificação. 

São signos institucionais, regulamentados por lei (no caso dos selos pro-venientes de órgãos públicos) ou por uma norma reconhecida internacio-nalmente (como é o caso da ISO). Em regra é esta norma ou lei que traz o regulamento de uso destes selos e o seu cumprimento autoriza o seu uso.

Figura 2.8 - SelosFonte: yhttp://www.lentille-blonde.fr/wp-content/uploads/label_rouge.jpg, http://www.horizonborracha.com.br/img/logo_iso_9001.jpg, http://www.badaueonline.com.br/dados/imagens/inmetro.JPG, http://3.bp.blogspot.com/_FUStZEV ol yl/SYbGKuWcBgl/AAAAAAABPQ/0ISzNH7riok/s400/Simbolo+bio.jpg, www.agricultura.gov.br, http://www.frigon.com.br/logo_sif.jpg

82

Page 83: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Todavia, nada impede que um selo como este também seja registrado como uma marca de certificação. O que deve ficar muito claro é que são institutos diferentes. As marcas de certificação tem sua proteção e regula-ção pelos direitos de propriedade industrial. Os selos em regra são insti-tuídos por lei ou norma, e é este instrumento que impede o seu uso por terceiros.

Estes selos são conferidos a um determinado produto ou serviço por meio de uma avaliação de conformidade. A Avaliação da Conformidade é um processo sistematizado, com regras pré-estabelecidas, que é devidamente acompanhado e avaliado, de forma a propiciar um adequado grau de con-fiança ao produto, processo ou serviço. Ela atesta que foram cumpridos requisitos pré-estabelecidos por normas ou regulamentos aprovados.

Essas normas ou regulamentos são documentos estabelecidos por con-senso e aprovados por um organismo reconhecido (por exemplo a Organização Internacional de Normalização -ISO, sigla em inglês - que fornece, para uso comum e repetitivo, regras, diretrizes ou características para atividades ou para seus resultados) (ZIBETTI, 2009).

Em regra esta avaliação é feita por organismos que não participam da relação comercial e que têm por objetivo atestar publicamente (mediante autorização da aposição do referido selo no produto, por exemplo) que este está em conformidade com determinados requisitos específicos, que podem estar relacionados com higiene, qualidade do produto, origem da matéria-prima, etc. (GONÇALVES, 2007).

Para um maior esclarecimento sobre avaliação de conformidade, leia em nossa biblioteca virtual livreto sobre Avaliação de Conformidade, tam-bém disponível no site http://www.inmetro.gov.br/infotec/publicacoes/acpq.pdf

Para um maior entendimento da importância do tema, leia também dis-ponível em nossa biblioteca virtual: ZIBETTI, Fabíola Wüst. A relação entre propriedade intelectual e normalização técnica no cenário do comércio inter-nacional, Pontes, Volume  5, Número  1, março de 2009. Disponível em: http://ictsd.net/i/news/pontes/43377/

Acesso realizado em: 23 maio 2010.

A Tabela 2.4 a seguir resume os diferentes sinais distintivos.

83

CAPÍTULO 02

Page 84: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Com

para

tivo

dos

dife

rent

es s

inai

s di

stin

tivos

84 1. G

êner

oIn

dica

ção

Geo

gráfi

caM

arca

Nom

e Em

pres

aria

lN

ome

de D

omín

io2.

Esp

écie

Indi

caçã

o de

Pr

oced

ênci

aD

enom

inaç

ão d

e O

rige

mM

arca

de

prod

uto

ou

serv

iço

Mar

ca c

olet

iva

Mar

ca d

e ce

rtifi

caçã

o

3. F

unçã

o le

galm

ente

pr

oteg

ida

Indi

car a

ori

gem

do

pro

duto

e/o

u se

rviç

o qu

e te

nha

uma

dete

rmin

ada

repu

taçã

o

Indi

car a

ori

gem

do

pro

duto

e/

ou s

ervi

ço. D

eve

ter r

elaç

ão c

om

fato

res

natu

rais

e/

ou h

uman

os.

Dife

renc

iar u

m

prod

uto

e/ou

ser

viço

de

out

ro s

emel

hant

e ou

afim

.

Dife

renc

iar u

m

prod

uto

e/ou

se

rviç

o de

out

ro

sem

elha

nte

ou

afim

, mas

pod

e se

r ut

iliza

do d

e fo

rma

cole

tiva.

Cert

ifica

r que

um

pro

duto

e/

ou s

ervi

ço s

egui

u as

esp

ecifi

caçõ

es

esta

bele

cida

s no

re

gula

men

to d

e us

o.

Dife

renc

iar u

ma

empr

esa

das

dem

ais

e a

indi

vidu

aliz

a, b

em c

omo

lhe

gara

nte

capa

cida

de

para

cer

tos

atos

.

Iden

tifica

r a p

esso

a fís

ica

ou ju

rídi

ca n

a re

de m

undi

al d

e co

mpu

tado

res,

por

quan

to

sem

o re

gist

ro d

o do

mín

io

as p

esso

as e

/ou

empr

esas

o sã

o en

cont

rado

s na

w

eb. A

liás,

mai

s qu

e is

so,

o do

mín

io s

ingu

lari

za, u

m

ende

reço

.

4. T

itula

r

Cará

ter c

olet

ivo,

vin

cula

do a

o es

paço

ge

ográ

fico.

“Titu

lari

dade

col

etiv

a”

Pess

oa fí

sica

ou

jurí

dica

(pri

vada

* ou

blic

a).*

*

* Só

pod

erá

requ

erer

pa

ra a

quel

as

ativ

idad

es q

ue e

xerc

e de

form

a líc

ita e

ef

etiv

a.

** P

ode

have

r co-

titul

arid

ade,

ain

da

que

haja

sile

ncio

na

lei.

Som

ente

pes

soa

jurí

dica

que

re

pres

ente

um

a co

letiv

idad

e po

de re

quer

er o

re

gist

ro d

a m

arca

co

letiv

a (p

riva

da o

u pú

blic

a).

Qua

lque

r pes

soa

físic

a ou

jurí

dica

(p

riva

da o

u pú

blic

a). C

ontu

do

não

pode

ter

inte

ress

e co

mer

cial

na

cer

tifica

ção.

A p

esso

a ju

rídi

ca,

regu

larm

ente

co

nstit

uída

.

“Titu

lari

dade

sin

gula

r –

ut s

ingu

li”

Qua

lque

r pes

soa

físic

a ou

jurí

dica

que

pri

mei

ro

depo

site

, sem

qua

lque

r re

quis

ito.

“Titu

lari

dade

sin

gula

r – u

t si

ngul

i”

5. V

incu

laçã

o a

um e

spaç

o ge

ográ

fico

Sim

.N

ão.

Não

, sal

vo s

e a

mar

ca ti

ver a

lgum

a re

laçã

o co

m u

m

dete

rmin

ado

luga

r.

Não

, sal

vo s

e a

cert

ifica

ção

tiver

al

gum

a re

laçã

o co

m

um d

eter

min

ado

luga

r .

Não

.N

ão.

Page 85: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

85

CAPÍTULO 02

6. E

lem

ento

s de

com

posi

ção

do s

inal

A IG

pode

ser

con

stitu

ída

por u

m

nom

e ge

ogra

fico

e/ou

sua

repr

esen

taçã

o da

loca

lidad

e, s

egun

do a

Lei

no

9.27

9/19

96.

Segu

ndo

o TR

IPS

tam

bém

pod

e se

r co

nstit

uída

por

um

nom

e qu

e le

mbr

e um

a lo

calid

ade.

Cons

tituí

da p

or d

istin

tos

elem

ento

s, re

spei

tada

s as

pro

ibiç

ões

lega

is e

lenc

adas

no

artig

o 12

4, L

ei n

º 9.2

79/1

996.

Livr

e, p

orém

com

re

ssal

vas

de e

lem

ento

s qu

e ob

riga

tori

amen

te

irão

com

por o

nom

e,

com

o po

r exe

mpl

o,

os p

refix

os e

sufi

xos

Coop

erat

iva,

Ass

ocia

ção

e su

fixos

Ltd

a. S

/A, e

tc.

Livr

e. Q

ualq

uer n

ome

pode

ser

util

izad

o, d

esde

qu

e a

pesq

uisa

na

base

do

Com

mon

Gat

eway

In

terf

ace

(CG

i) re

sulte

di

spon

ivel

. Atu

alm

ente

po

de te

r ace

nto

e ca

ract

er e

spec

ial (

“ç”,

por

exem

plo)

.7.

For

ma

de

apre

sent

ação

do

sin

al

Nom

inat

iva,

figu

rativ

a , m

ista

e

trid

imen

sion

al

Nom

inat

iva,

fig

urat

iva,

mis

ta e

tr

idim

ensi

onal

.

Nom

inat

iva,

fig

urat

iva,

mis

ta e

tr

idim

ensi

onal

.

Nom

inat

iva,

fig

urat

iva,

mis

ta e

tr

idim

ensi

onal

.N

omin

ativ

aN

omin

ativ

a.

8.

Tran

sfer

ênci

a de

tit

ular

idad

e:

9. L

icen

ça

10. C

essã

o

Não

.

As

IG p

ossu

em c

arát

er c

olet

ivo,

são

in

alie

náve

is e

indi

visí

veis

, bem

com

o nã

o po

dem

ser

lice

ncia

das.

Sim

,

São

alie

náve

is

(lice

ncia

r ou

cede

r)

tant

o pa

ra p

edid

o de

dep

ósito

ou

o re

gist

ro d

a m

arca

. Po

dem

ain

da, o

fert

á-la

com

o ga

rant

ia e

m

um e

mpr

éstim

o, p

or

exem

plo.

Alg

uns

país

es

expr

essa

men

te

veda

m a

tr

ansm

issã

o da

mar

ca. A

lei

bras

ileira

é o

mis

sa.

Ass

im, a

inda

que

se

apliq

uem

as

regr

as

gera

is e

m re

laçã

o às

m

arca

s, n

o to

cant

e à

tran

smis

são

por

suce

ssão

, (ar

tigo

151,

I, L

ei n

º 9.

279/

1996

)31

A le

i bra

sile

ira

não

auto

riza

ex

pres

sam

ente

a

cess

ão. C

ontu

do,

por a

nalo

gia,

en

tend

e-se

não

se

r pos

síve

l (ar

tigo

151,

I, L

ei n

º 9.

279/

1996

)32

No

caso

de

licen

ça, s

eu u

so

inde

pend

ente

de

sta,

poi

s é

o re

gula

men

to

que

disp

õe s

obre

co

ndiç

ões

de u

so.

Pela

lei s

ão in

alie

náve

is,

sepa

rada

men

te d

a em

pres

a.

Não

veda

ção

quan

to

a lic

ença

e a

ces

são

é pe

rmiti

da.

11. P

razo

de

Prot

eção

Não

prev

isão

lega

l.

Pres

ume-

se in

dete

rmin

ado

10 a

nos,

com

reno

vaçã

o.En

quan

to a

soc

ieda

de

exis

tir.

1 an

o, c

om re

nova

ção.

12. F

orm

a de

regi

stro

e

espa

ço

geog

ráfic

o da

pr

oteç

ão

Regr

a: IN

PI, v

alid

ade

naci

onal

.

Exce

ção:

dec

reto

ou

lei,

valid

ade

naci

onal

.

INPI

Valid

ade

naci

onal

.

exce

ção.

Junt

a Co

mer

cial

ou

Cart

ório

do

Regi

stro

Civ

il da

s Pe

ssoa

s Ju

rídi

cas

Valid

ade

esta

dual

.

“.br

” no

Cgi.b

r,

Toda

web

.

ICA

NN

Toda

web

Page 86: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Tabe

la 2

.3 -

Fon

te: B

ruch

& C

opet

ti (2

009)

86 13.

Regu

lam

ento

de

uso

Sim

.Si

m.

Não

.Ex

iste

um

con

junt

o de

nor

mas

.Si

m.

Não

. N

ão.

14. G

estã

oSi

m, p

ela

entid

ade

repr

esen

tativ

a le

gitim

idad

a.Pe

lo ti

tula

r.Pe

la e

ntid

ade

titul

ar

repr

esen

tativ

a da

co

letiv

idad

e.

Pela

ent

idad

e ce

rtifi

cado

ra e

tit

ular

da

mar

ca.

Pelo

repr

esen

tant

e le

gal

da e

mpr

esa.

Pelo

titu

lar d

o re

gist

ro.

15. C

ontr

ole

de 1

, 2 o

u 3

part

es

Sim

.

Embo

ra n

ão h

aja

regu

lam

enta

ção

sobr

e a

form

a de

con

trol

e a

ser a

dota

da.

Pelo

titu

lar.

Pela

ent

idad

e tit

ular

re

pres

enta

tiva

da

cole

tivid

ade.

Pela

ent

idad

e ce

rtifi

cado

ra e

tit

ular

da

mar

ca.

Pelo

repr

esen

tant

e le

gal

da e

mpr

esa.

Pelo

titu

lar d

o re

gist

ro.

16. P

rinc

ípio

s ap

licáv

eis

Dis

poni

bilid

ade

Not

orie

dade

Ant

erio

rida

de

Terr

itori

alid

ade

Dis

poni

bilid

ade

Ant

erio

rida

de

Espe

cial

idad

e

Terr

itori

alid

ade

Ant

erio

rida

de

Terr

itori

alid

ade

Esta

dual

Ant

erio

rida

de

17. L

egis

laçã

o re

laci

onad

a

Lei n

o 9.2

79/1

996.

Dec

reto

nº 4

.062

/200

1

Ato

Nor

mat

ivo 

nº 1

34/1

997 

Reso

luçã

o IN

PI n

º 75/

2000

Lei n

o 9.2

79/1

996.

Ato

Nor

mat

ivo

nº 1

60/2

001,

Ato

Nor

mat

ivo

nº 1

59/2

001,

Ato

N

orm

ativ

o nº

151

/199

9, A

to N

orm

ativ

o nº

150

/199

9, A

to N

orm

ativ

o nº

145

/199

9, R

esol

ução

nº 0

83/2

001,

Res

oluç

ão 1

27/2

006,

Re

solu

ção

nº 1

28/2

006,

Res

oluç

ão n

º 144

/200

7 do

INPI

.

Não

qual

quer

dis

posi

ção

espe

cífic

a qu

e re

gule

as

Mar

cas

Cole

tivas

e a

s M

arca

s de

Cer

tifica

ção

Lei n

º 10.

406/

2002

(cód

i-go

civ

il),

Lei n

o 8.9

34/1

994,

Lei n

º 5.7

64/1

971,

Lei n

º 6.0

15/7

3 e

Dec

reto

nº 1

.800

/199

6.

Dec

reto

nº 4

.829

/200

3

Port

aria

Inte

rmin

iste

rial

147

/199

5

Reso

luçã

o nº

CG

I.br/

RES/

2008

/008

/IP

Exis

tem

out

ras

port

aria

s e

reso

luçõ

es.

18. M

ais

info

rmaç

ões.

http

://w

ww

.inpi

.gov

.br/

men

u-es

quer

do/

indi

caca

o

http

://w

ww

.agr

icul

tura

.gov

.br/

http

://w

ww

.inpi

.gov

.br/

men

u-es

quer

do/m

arca

http

://w

ww

.cg.

org.

br/

http

://re

gist

ro.b

r/in

dex.

htm

l

http

://w

ww

.ican

n.or

g/

Page 87: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Resumo

Nesse capítulo, foram diferenciadas as espécies de indicação geográfica, quais sejam: Indicação de Procedência e Denominação de Origem. Em um segundo momento, comparou-se a indicação geográfica com outros sinais distintivos, relembrando os conceitos estudados no Módulo I, de forma a compreender as semelhanças, as diferenças e os possíveis confli-tos que podem advir da utilização de nomes geográficos, especialmente no âmbito dos agronegócios. O objetivo foi o de esclarecer e aperfeiçoar os conhecimentos anteriormente obtidos, notadamente acerca da rele-vância assumida no mercado pelas indicações geográficas e outros sinais distintivos.

87

CAPÍTULO 02

Page 88: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Notas

1. LOCATELLI, 2007.

2. TRIPs, art. 22, 3.

3. TRIPs, art. 24, 5, 6 e 9.

4. TRIPs, art 23, 1.

5. SCHMIDT, Lélio Denicoli. Princípios aplicáveis aos sinais distin-tivos. In: JABUR, Wilson Pinheiro; SANTOS, Manoel J. Pereira dos. Propriedade intelectual: sinais distintivos e tutela judicial e administrativa. São Paulo: Saraiva, 2007. p.71.

6. Registro INPI n. IG200002 em 22/11/2002.

7. Geographical indication: Vale dos Vinhedos, Publication: JOCE 10.5.2007 2007/C/106 p. 1. Quality type: Wine with a geogra-phical indication. Disponível em: http://ec.europa.eu/agricul-ture/markets/wine/e-bacchus/index.cfm?event=resultsPThirdgis&language=EN. Acesso em: 10 jul. 2010.

8. BARBOSA, 2010.

9. A notoriedade para as marcas também deve ser analisada no ter-ritório onde se pretende a proteção a marca, tida como notória. Para saber mais você pode ler o material de marcas inserido no módulo I. Para a González-Bueno, afirma que a única notorieda-de relevante é a que concorre no território em que se pretende invocar a proteção. Sendo o registro concedido, cabe ao titular da marca proceder ao pedido de anulação do registro, provando ser a notoriedade de sua marca anterior ao registro. GONZÁLEZ-BUENO, Carlos. Marcas notorias y renombradas: en la ley y la jurisprudência. Madri: La Ley, 2005. p. 93.

10. MORO, Maitê Cecília Fabbri. Direito de marcas: abordagem das marcas notórias na Lei nº 9279/1996 e nos acordos internacio-nais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 77

11. MÉXICO. Declaración General de Protección de la Denominación de Origen Tequila. Disponível em: <http://www.impi.gob.mx/wb/IMPI/declaracion_general_de_proteccion_de_la_denomi-na11>. Acesso em: 22 maio 2010.

88

Page 89: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

12. Veja Resolução no 75/2000/INPI.

13. Artigo 182 da Lei nº 9.279/1996.

14. Artigo 42 da Lei nº 9.279/1996.

15. Artigo 130 da Lei nº 9.279/1996.

16. Artigos. 192 a 194 da Lei no 9.279/1996.

17. GONÇALVES, 2007.

18. BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Apelação cível nº 215.846-1/2004. Apelantes: Água de Lindóia Mineração e Comércio Ltda. e Lindoiano Hotel Fontes Radioativas Ltda. - Apeladas: As mesmas, Minalin Empresa de Mineração Ltda. e Moinho Berbel Indústria e Comércio Ltda. Relator: Benini Cabral. São Paulo, 18/08/1994. Disponível em: www.tj.sp.gov.br . Acesso em: 10 jul. 2010.

19. GONÇALVES, 2007.

20. NCL (9) 33.

21. Para entender melhor como alguns sinais se tornam genéricos leia sobre a Teoria da Diluição ou degeneração. A diluição ou degeneração de um produto ocorre quando um sinal perde seu caráter distintivo, ou seja, o nome não serve mais para distin-guir um produto de seus semelhantes ou concorrentes.   Isso pode ocorrer por que este sinal ou nome passa a descrever o pró-prio produto, como ocorre com o “queijo minas” ou o “xerox”, “fórmica”, etc.. Embora esta teoria esteja constantemente rela-cionada às marcas, é igualmente aplicável as IG. Leia mais em: BARBOSA, Denis Borges. Proteção das marcas: uma perspectiva semiológica. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2008.

22. Lei n. 9279/1996 art. 193, o qual determina que constitui crime: “Usar, em produto, recipiente, invólucro, cinta, rótulo, fatura, circular, cartaz ou em outro meio de divulgação ou propagan-da, termos retificativos, tais como “tipo”, “espécie”, “gênero”, “sistema”, “semelhante”, “sucedâneo”, “idêntico”, ou equivalen-te, não ressalvando a verdadeira procedência do produto.” E Lei nº 7.678/1988 art. 49: “É vedada a comercialização de vinhos e derivados nacionais e importados que contenham no rótulo de-signações geográficas ou indicações técnicas que não correspon-

89

CAPÍTULO 02

Page 90: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

dam à verdadeira origem e significado das expressões utilizadas. § 1º Ficam excluídos da proibição fixada neste artigo os produ-tos nacionais que utilizem as denominações champanha, conha-que e Brandy, por serem de uso corrente em todo o Território Nacional. § 2º Fica permitido o uso do termo “tipo”, que poderá ser empregado em vinhos ou derivados da uva e do vinho cujas características correspondam a produtos clássicos, as quais serão definidas no regulamento desta Lei.”

23. GONÇALVES, 2007.

24. Artigo 124, inciso X, Lei no 9.279/1996.

25. GONÇALVES, 2007.

26. BRASIL.Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Apelação Cível nº 113855.2ª Turma Especializada. Apelante: Institut National des Appellations D’origine de Vins et Eaux-De-Vie. Apelado: Instituto Nacional De Propriedade Industrial - INPI e Bordeaux Buffet S.A. Relator: Juiz Guilherme Diefenthaeler. Rio de Janeiro, DJU 21/09/2005, p. fls. 156. Disponível em: <http://www.trf2.gov.br>. Acesso em: 10 jul. 2010.

27. Artigo 130 da Lei nº 9.279/1996.

28. Artigo 61 do Decreto nº 1.800/1996.

29. Essa proteção, além disso, é restrita ao Estado, ou Distrito Federal, onde foi feito o arquivamento dos atos. Em suma, se um nome empresarial estiver protegido em Pernambuco, por exemplo, mediante o depósito dos atos constitutivos da empresa na Junta Comercial, apenas neste Estado este nome estará prote-gido, podendo haver nome empresarial semelhante e até mesmo igual registrado na Junta Comercial do Estado da Paraíba.

90

Page 91: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade
Page 92: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade
Page 93: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade
Page 94: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Identificação dos produtos potenciais e organização dos produtores

Neste•capítulo,•veremos•como•identificar•produtos•e•ser-viços• que• apresentam• diferenciais• ligados• a• sua• origem,•possuindo• qualidade• ou• notoriedade.• Estabelecendo• as•diferenças• entre• produtos• com• qualidade• ligada• ao• meio•geográfico• e• produtos• com• notoriedade,• vamos• abordar•como•os•produtos•ou•serviços•podem•se•apresentar•como•potenciais• IP•ou•DO.•Contando•com•exemplos•nacionais•e•internacionais,•espera-se•que,•ao•final•do•capítulo,•você•seja•capaz•de•identificar•e•avaliar•produtos•potenciais•para•IP•ou•DO.•Ainda,•abordaremos•a•organização•dos•produtores•e•pres-tadores•de•serviços•para•o•trabalho•de•reconhecimento•de•uma•IG•para•um•possível•registro.•Serão•analisados•quem•são• os• requerentes• de• uma• indicação• geográfica,• de• que•forma•estes•podem•se•organizar•para•alcançar•seu•objetivo•e•quais•são•os•seus•papéis.•Este•capítulo•tem•também•por•objetivo•chamar•atenção•para•a•participação•e•mobilização•dos•produtores•e•reforçar•a• ideia•da• indicação•geográfica•como•instrumento•para•o•desenvolvimento•local.•

94

Page 95: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

3.1 Identificação dos produtos e seus diferenciais: notoriedade ou qualidade?

3.1.1 A importância de identificar produtos potenciais e registrar IG

Por que identificar produtos com diferenciais ligados ao território? Essa é uma das primeiras perguntas que fazemos dentro da atual perspectiva nacional de incentivo à implementação de IG.

Os motivos para tal incentivo, em grande parte, já foram apresentados e discutidos no Capítulo 1 deste nosso curso, através das dimensões e im-pactos positivos das IG no desenvolvimento territorial e nacional (econô-mico, social, cultural e ambiental).

O Brasil é um país muito rico em diversidade cultural e biológica. Ele abri-ga a maior diversidade vegetal do planeta, com 22% de todas as espécies já descritas no mundo.1

Com toda sua vastidão, sua história e trajetórias distintas em cada uma de suas regiões (colonização de povoamento no Sul, concentração de povos indígenas no Norte), certamente a biodiversidade não é sua única riqueza. Aliadas a ela estão as populações com suas diversidades étnicas, culturais e conhecimentos tradicionais. Assim, temos a noção de sociobiodiversida-de, que nada mais é do que a junção disso tudo.2

No Brasil, assim como em outros países em desenvolvimento, onde as IG fazem parte de uma temática bastante recente e ainda desconhecida pela maioria de seus habitantes, a pergunta torna-se ainda mais pertinente.

Nesses países, onde existem comunidades e conhecimentos tradicionais, riquezas culturais e biológicas, sabores particulares, artesanatos típicos; observa-se um processo de ameaça à sua existência, seja pela pressão da homogeneização dos processos produtivos, seja pela apropriação indevida de tais recursos (materiais e imateriais) por “competidores desonestos”.

Neste sentido, as IG contribuem também como uma nova alternativa para a proteção e a defesa da sociobiodiversidade enquanto um patrimô-nio comum da humanidade.

95

CAPÍTULO 03

Page 96: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

3.1.2 Notoriedade e ligação do produto ao meio geográfico

Antes de passarmos para a primeira fase desse processo, ou seja, como identificar tais produtos, é necessário que tenhamos claras duas noções presentes nas definições das IG: notoriedade e qualidade, pois será a partir delas que determinaremos se nosso produto é uma potencial indicação de procedência ou denominação de origem.

Como vimos nos Capítulos 1 e 2 do curso, para que tenhamos uma IP, segundo a legislação brasileira, é necessário que haja notoriedade de um produto ou serviço ligada a um nome geográfico, isto é, que este tenha se tornado “conhecido como centro de produção, fabricação ou extração de determinado produto ou prestação de determinado serviço”.

O que significa notoriedade de um produto ou serviço?

Notoriedade é a fama que um produto ou serviço tem em função de suas qualidades (ou renome) reconhecidas pelos consumidores. Ela pode estar ligada, por exemplo, a uma marca, a um produtor, ou a uma região, como é o caso das IG, que sempre se reportam a uma região ou localidade.

Notório é o certo e verdadeiro, o que não precisa ser provado porque é sabido ou conhecido pelo público.3

Como exemplo, temos os doces de Pelotas (RS) e Guaraná de Maués (AM). Estes são produtos que possuem notoriedade ao menos regional-mente. Quem da Região Norte nunca ouviu falar no Guaraná de Maués, ou da Região Sul não ouviu falar no doce de Pelotas? Em nível global, poderíamos também citar a Champagne (da região de Champagne, na França), o Vinho do Porto (Portugal) e o mármore de Carrara (na Itália, famoso desde a Roma Antiga), entre tantos outros.

Ressalta-se que a notoriedade está relacionada com o reconhecimento pelo público. O produto ou serviço precisa se consolidar no tempo para que adquira notoriedade. Assim, a história desempenha um papel funda-mental na construção da notoriedade de um produto que, inicialmente, pode ser o resultado de tentativas e erros, de experimentações, de suces-sivas aproximações, adaptações, até então chegar ao seu resultado final, reconhecido por muitas pessoas.

Praticamente, todo produto tem uma história que pode ser contada, por mais recente ou limitada que ela seja, mas nem todo produto possui noto-riedade. Se o produto tem notoriedade tem história.

96

Page 97: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Surge, assim, outra pergunta ligada ao tempo e à notoriedade: desde quando um produto ou serviço, ligado a um lugar, precisa ser notório para que possa se consolidar como IP?

A legislação não define este tempo. Ou seja, um produto que através de marketing, por exemplo, crie sua notoriedade num curto espaço de tem-po poderia sim, teoricamente, ser aceito como uma indicação de proce-dência. A notoriedade alcançada em pouco tempo, no entanto, não revela um produto com forte ligação cultural, posto que lhe falta a história.

Em todo caso, é importante que todo produto ligado ao território pos-sua a sua história para contar e que possua notoriedade. Quanto maior a anterioridade (o tempo) da notoriedade, melhor e mais chances de ser reconhecida a IP.

Mas que dimensão precisa ter essa notoriedade (local, regional, nacional ou internacional)?

Este é outro questionamento que nossa legislação não permite esclarecer. No entanto, não há dúvidas de que quanto maior a sua dimensão, maior será a necessidade em protegê-la de usurpações ou apropriações deso-nestas. E também maiores os impactos, sobretudo econômicos. Assim, o deferimento de uma IG para este caso seria praticamente irrefutável, a menos que já tivesse se tornado de uso genérico.

Por outro lado, não significa que produtos que tenham notoriedade em menor dimensão territorial não sejam passiveis de registros como IP. Cabe a nós questionarmos, no entanto, quais seriam os impactos da implemen-tação da IP nesses casos.4 Imaginemos algumas situações:

1. Existe um produto local típico (que ao longo do tempo diminui o seu volume, tornando-o mais escasso que antigamente) no terri-tório “X”. Pessoas de territórios vizinhos vêm até o território “X” para comprar o produto. Esporadicamente, aparecem mesmo pessoas de territórios mais distantes para comprá-lo. O que falta neste caso para que os atores locais (do território “X”) se mo-bilizem na tentativa de valorizar e proteger o seu produto? Por enquanto, não existem indícios de usurpações do produto, mas possivelmente a história “natural” nos diria que, havendo noto-riedade, a demanda provavelmente aumentaria, o preço subiria e surgiriam usurpações. Assim, os produtores veriam a necessi-dade em proteger seu produto e sua boa reputação. Mas quanto

97

CAPÍTULO 03

Page 98: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

tempo para que isso aconteça? Não existem motivos para não adiantarmos esse processo ou mesmo construirmos uma histó-ria mais ou menos inversa, ou seja, podemos primeiramente ter uma IP ou DO para que o produto atinja então maior notorieda-de. O processo de reconhecimento da IG, nesse caso, permitiria o seu não desaparecimento e de toda a cultura e conhecimentos ligados a ele, preservando o meio e a comunidade local.

2. O território “Y” possui uma história um pouco diferente. A pro-dução ainda é tradicional, mas o produto (que realmente é bem típico e distinto) é somente consumido dentro do próprio ter-ritório, por toda a comunidade, embora ela seja pequena. Um certo dia, chega no território “Y” um indivíduo do território “A”, um território bem distante, num outro país quem sabe. Surgem então algumas pessoas de fora encantadas pelo diferencial e qua-lidade do produto e motivam os produtores a agregar valor, bus-car um diferencial, “quem sabe exportar, certamente poderiam ganhar muito dinheiro”. E então assim acontece. O produto, que antigamente era consumido pela própria comunidade, e muitas vezes comercializado na forma de trocas, passa a ter um valor agregado, mas a produção não é tão alta. Algumas pessoas da co-munidade, que não tem capacidade de comprar os produtos, dei-xam de consumi-los (algo que antes fazia parte da sua cultura e hábito alimentar). Nem os que produzem querem mais trocá-los como antes, pois a demanda para exportação é “grande” e eles não podem perder a negociação, que irá sustentar sua família.

Agora, por outro lado, para que tenhamos uma denominação de origem (DO), segundo a Lei nº 9.279/1996, não é necessário que haja obrigatoria-mente a notoriedade, mas sim que se comprove que as qualidades ou ou-tras características do produto (ou serviço) se devem ao meio geográfico.

Embora isso não esteja explícito na legislação brasileira (ou seja, que um produto precisa de notoriedade para se tornar uma DO), a notoriedade ainda é um dos princípios básicos das indicações geográficas, pois foi este elemento que fez com que surgissem as primeiras indicações geográficas protegidas pela lei. Por quê? Um produto que possui notoriedade pode ser “falsificado”, isto é, algumas pessoas desonestas se aproveitam do renome do produto para conseguir melhores preços no mercado. Assim, as IG surgem como forma de proteção ao produto, produtor, consumidor e a sua origem.

98

Page 99: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

A base de uma DO, no entanto, está relacionada à qualidade do produto, que é única e é devida a fatores do meio onde é produzido, ou seja, que ja-mais terá as mesmas características se produzido em qualquer outro local.

A notoriedade é algo que geralmente vem com o tempo, à medida que mais pessoas passam a reconhecer essas qualidades diferenciadas no pro-duto. Certamente, as primeiras denominações de origem no mundo quando foram registradas já eram reconhecidas, possuíam notoriedade. Hoje em dia, todavia, não há impedimentos para que este caminho ocorra de forma inversa, ou seja, que seja primeiro registrada uma DO para que então esta adquira maior notoriedade.

Mas ressalta-se que alguma notoriedade a DO deve possuir, posto que do contrário, estaria se utilizando isso mais como uma estratégia de marke-ting para promover o local e seu produto ou serviço do que, necessaria-mente, o objeto de se proteger uma DO: evitar a sua usurpação.

O que existe então no meio geográfico que pode fazer com que um pro-duto apresente características particulares? Existem fatores físicos do meio – como clima, relevo, vegetação e solo – que afetam significantemente a qualidade do produto.

Um queijo, por exemplo, pode possuir um sabor peculiar porque é produ-zido a partir de leite de vacas alimentadas por uma pastagem específica de uma região. O presunto de Parma deve sua capacidade de conservação, aromas e textura mantidos graças ao clima seco e com grande incidência de ventos das montanhas onde é produzido.

Essa interpretação é mais facilmente invocada no caso de produtos vege-tais, sobre os quais a influência do solo e do clima parece ser direta. Por exemplo, a mesma variedade de uva plantada em diferentes locais pode produzir vinhos que se diferem muito entre si em termos de estrutura e aroma.

Um produto que se fundamenta somente em fatores físicos do meio, no entanto, tem de certa forma seus limites, pois estes não são os únicos fa-tores a intervir na sua qualidade. Ainda que o meio geográfico possua um potencial agronômico particular, é preciso que este se expresse, seja revelado através das técnicas precisas de produção. Tais práticas técnicas, tais modos de elaboração criados pelo homem ao longo do tempo irão influenciar a produção e intervir em diferentes níveis nas características finais do produto. Sua importância depende das situações e dos tipos de produto. A•qualidade•final•do•produto•é•resultado•também•das•práticas•humanas,•do•saber-fazer.

99

CAPÍTULO 03

Page 100: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

A importância dessas práticas e técnicas, todavia, manifesta-se mais em produtos transformados. A “receita” de fabricação de um queijo é tão im-portante quanto o leite utilizado, assim como a maneira de se fazer uma salsicha é tão importante quanto a sua matéria-prima (a carne).

Barjolle et al destacam – citando exemplos europeus – que, em alguns casos, elementos da “receita” estarão relacionados a limitações físicas e am-bientais (queijo de leite cru em regiões pobres em madeira, o que não per-mitia aquecer o leite a uma temperatura muito elevada), limitações técnicas (uma camada de carvão era aplicada sobre a coalhada do “queijo Morbier” para evitar que o queijo se alterasse ao esperar que se acrescentasse a ou-tra metade fabricada com o leite do “segundo tratamento”), limitações eco-nômicas (as peças do “queijo Emmental” pesam em torno de 100 quilos porque os queijos antigamente eram taxados por peça, ao invés de por peso) ou as limitações culturais (nos Alpes suíços, os queijos fabricados de-veriam ser de guarda, pois não poderiam ser transportados cotidianamen-te ao pé dos Alpes, até onde estavam as cidades. Por isso ele é um queijo de consistência dura).5

Entenda melhor a influência de fatores do meio geográfico (naturais e humanos) sobre a qualidade final de um produto (e aqui temos uma po-tencial DO) através do exemplo ilustrado na Figura 3.1. A qualidade final do queijo é resultado de uma combinação complexa dessas influências.

Figura 3.1: Influência de fatores do meio geográfico (naturais e humanos) na qua-lidade final do produto. Fonte: Velloso (2009) adaptado de Nascimento e Souza (2004, p. 185).

100

Page 101: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

3.1.3 Notoriedade X Qualidade, IP X DO

Embora para uma espécie de IG seja exigido que se comprove a noto-riedade e para outra que se comprove que a qualidade se deve ao meio geográfico (fatores naturais e humanos), as duas noções estão bastante in-terligadas. É muito comum encontrarmos tanto notoriedade quanto uma qualidade particular no produto que não se encontra em nenhum outro produto de fora de seu território. O difícil, em muitos casos, é comprovar que tais qualidades se devam de fato ao meio geográfico, mesmo em casos em que a “reputação” afirme não existir produto igual em qualquer outro lugar.

Assim, podemos encontrar quatro situações diferentes:

1. Uma IP (ou potencial IP) que possui notoriedade, mas não uma qualidade específica ligada ao território. Exemplo: o município de Franca, em São Paulo, é bastante conhecido pela fabricação de calçados. A qualidade destes, no entanto, não está necessaria-mente ligada ao meio geográfico, uma vez que poderia ser fabri-cado em outro local e apresentar qualidades muito semelhantes.

2. Uma IP (ou potencial IP) que possui notoriedade e também uma qualidade específica ligada ao território, mas com difícil compro-vação dessa ligação. Esse pode ser o caso de produtos produzidos numa área geográfica muito grande (como o Café do Cerrado) ou em casos onde a principal influência do meio são os fatores humanos, pois a comprovação (“científica”) nesses casos é mais complicada. Isso não significa, no entanto, que essa IP não se torne um dia uma DO. Assim, acabamos tendo indicações de procedência, mas com potencial para DO.

3. Uma DO (ou potencial DO) que não possui ainda uma notorie-dade, mas tem qualidades específicas que se devem comprovada-mente ao meio. Como um produto que possui essas qualidades e é comprovadamente único não possui reputação? Esse pode ser o caso, por exemplo, de um produto bastante específico que não possui muita história, um produto recente no mercado que foi buscar no local mais propício possível (seja por experimentações, por particularidades físicas do meio ou utilização de alta tecnolo-gia) a sua origem de produção.

101

CAPÍTULO 03

Page 102: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

4. Uma DO (ou potencial DO) possui notoriedade e qualidades es-pecíficas que se devem comprovadamente ao meio. O presun-to de Parma, na Itália, é um desses casos. Ele apresenta grande notoriedade (aliada ainda a uma história) e suas qualidades são devidas, sobretudo, a influências climáticas.

Se tivermos um produto potencial que se enquadra em uma dessas quatro possibilidades, o que precisamos então reunir para fazer o pedido no INPI?

Para uma IP, tudo o que se pede é a comprovação da notoriedade. Isso não impede, no entanto, que se incorporem elementos que façam a ligação do produto ao território além da notoriedade.

Aliás, quanto mais elementos forem reunidos e incorporados ao dossiê de pedido, mais força ele terá perante o INPI, como IG a ser registrada.

O mesmo vale para uma DO, onde temos uma situação inversa, isto é, onde é obrigatória a comprovação da qualidade ligada ao território e não necessariamente a comprovação da notoriedade. A incorporação desta no pedido o enriquece muito e lhe dá mais credibilidade.

3.1.4 Como fazer o levantamento do potencial desses produtos?

Já vimos quais são as bases para uma IG: notoriedade e qualidade ligada ao meio geográfico. Portanto, já sabemos quais as primeiras perguntas a fazer.

A tipicidade e a qualidade diferenciada de um produto geralmente são os primeiros pontos que nos fazem pensar em um produto com potencial para IG. Ou seja, um produto existente somente naquele local com tais características, um produto típico, um sabor particular, um saber-fazer es-pecífico, uma ligação histórica forte... São produtos diferenciados, intima-mente ligados a uma região ou localidade e a um grupo de atores sociais.

Acesse o AVEA do Curso e discuta com seus colegas as seguintes ques-tões no Fórum de Conteúdo: Você é capaz de identificar produtos assim na sua região? Quais os produtos na sua região ou Estado que, em princí-pio, você acredita que teriam potencial para IG? Por quê?

A partir, então, desses produtos que fomos capazes de identificar, pode-mos fazer uma série de perguntas com a finalidade de confirmar sua po-tencialidade, bem como “quantificá-la”. Como assim quantificá-la?

102

Page 103: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Vejamos algumas perguntas que podem ser feitas com relação ao produ-to. Quanto mais respostas positivas tivermos, maior a potencialidade do produto:

1. O produto tem notoriedade?

2. Essa notoriedade é ligada ao local?

3. Há elementos do local (ou região) que influenciam na qualidade do produto?

4. O produto tem preço diferenciado?

5. Existe potencial para a agregação de valor ao produto?

6. O produto é comercializado no Estado?

7. O produto é comercializado em outros Estados?

8. O produto é exportado?

9. Os produtores estão organizados?

10. A produção é ambientalmente sustentável?6

11. A produção respeita os direitos humanos?7

Veja alguns exemplos de produtos potenciais para IP ou DO no Brasil:

Guaraná de Maués – Região Norte

O município de Maués, no Amazonas, é também conhecido como a cida-de do guaraná. Existe uma ligação histórica muito forte entre o produto e a localidade, além de notoriedade, importância econômica e certa relação com a sociobiodiversidade.

Farinha de Cruzeiro do Sul – Região Norte

O município de Cruzeiro do Sul, no Acre, destaca-se pela grande tradição na produção de farinha de mandioca. Estima-se que o arranjo produtivo local da farinha produzida nessa região envolva cerca de 3.600 unidades de produção familiar. Esse produto é considerado estratégico para a econo-mia regional, despontando como um dos principais fatores de desenvol-vimento, considerando-se, além dos aspectos econômicos, o respeito aos costumes e tradições das populações locais.

103

CAPÍTULO 03

Page 104: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Capim Dourado – Cerrado brasileiro

O capim dourado existe em todo o Cerrado brasileiro, mas a sua fama está relacionada principalmente à região do Jalapão, no Estado de Tocantins, onde ele pode ser encontrado em abundância. É de lá que sai a maior produção do capim dourado em forma de artesanato. Ele tornou-se co-nhecido mundialmente e passou a ter um valor econômico tão alto que “contrabandistas de outras regiões passaram a tirar a planta de áreas de coleta tradicional, prejudicando as comunidades e a própria sobrevivência da espécie”8. Neste caso a IG poderia ajudar a conservar a sociobiodiver-sidade.

Para ver mais sobre o capim dourado e a sustentabilidade do seu artesa-nato leia a cartilha que a Associação PEQUI (Pesquisa e Conservação do Cerrado) elaborou.

http://www.botany.hawaii.edu/gradstudentpages/Grad_Student_Pubs/Schmidt_cartilha_cd_e_buriti.pdf

Acesso realizado em:18 jun. 2010.

Açafrão de Mara Rosa - GO – Região Centro-Oeste

O cultivo de açafrão possui grande importância socioeconômica para a agricultura familiar no Estado de Goiás, em especial nos municípios de Mara-Rosa, Estrela do Norte, Alto Horizonte e Amaralina. Segundo al-guns relatos, a planta foi introduzida pelos bandeirantes, como indicador dos caminhos percorridos em áreas de fronteira e como demarcador de áreas onde poderia haver ouro9. Ao contrário dos outros Estados, onde a produção do açafrão é fragmentada, em Goiás ela se concentra na região de Mara Rosa, onde a planta encontrou características climáticas ideais e solo fértil.

Cacau do Sul da Bahia – Região Nordeste

Historicamente presente em pinturas e romances (como no romance de Jorge Amado “Terras do Sem Fim”), a cultura do cacau encontrou no Sul da Bahia (introduzida em meados do século XVIII) um dos melhores solos e clima para a sua expansão. Embora sua capacidade produtiva tenha sido reduzida em até 60% com a “vassoura-de-bruxa”, doença causada por um fungo, o cacau ainda é uma grande alternativa econômica para a região. Nos sistema de produção cabruca, o cacau é produzido sob a sombra de

104

Page 105: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

espécies nativas da Mata Atlântica, o que contribui para a conservação da biodiversidade.

Queijo Minas Artesanal do Serro – Região Sudeste

Minas Gerais é um Estado famoso pela fabricação de queijo. Afinal, de onde vem o termo “Queijo Minas” que se tornou de uso genérico? Existem variações do famoso queijo Minas, uma delas é o queijo minas ar-tesanal do Serro, um dos mais apreciados pelos mineiros. A região produz em torno de 720 quilos de queijo por dia, elaborados, em grande parte, por agricultores familiares.10 Sua técnica de fabricação foi registrada como o primeiro patrimônio imaterial do Estado de Minas Gerais. Ressalta-se apenas que este tipo de queijo, para ser comercializado fora do Estado de Minas Gerais, deve atender a totalidade da legislação sanitária federal. Os produtores da região têm investido significativos esforços neste sentido.

Ostras de Florianópolis – Região Sul

Florianópolis, capital do Estado de Santa Catarina, é também conhecida como a “Capital Nacional das Ostras”. Ela ocupa a liderança em produção no Brasil, com 70% da produção nacional. Embora a atividade ali seja re-lativamente recente, a existência de condições oceanográficas favoráveis ao cultivo, como a presença de inúmeras áreas protegidas, formadas por baías, enseadas e estuários e, também, pela qualidade da água, justificam sua reputação.

3.2 Organização dos produtoresNum país amplo e diverso como o Brasil, possivelmente conseguiremos identificar muitos produtos com diferenciais ligados ao território, sendo que cada caso será diferente. O processo de implementação de uma IG não pode ser planejado e realizado a portas fechadas. Trata-se de um processo coletivo e participativo, no qual os atores locais (produtores, transforma-dores da matéria prima, pessoas ligadas ao comércio, ao turismo etc.- toda a cadeia produtiva deve ser envolvida) precisam ser protagonistas. A par-ticipação representativa de diferentes atores do território é imprescindível para a construção da IG. Grande parte do sucesso de uma IG reside aí.

Cada território é diferente e possui sua própria identidade.11 As estraté-gias para o seu desenvolvimento, portanto, devem ser traçadas para cada

105

CAPÍTULO 03

Page 106: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

realidade, considerando as redes de atores locais, os recursos naturais, a infra-estrutura existente, o capital social e econômico, a capacidade em-preendedora dos atores, as vocações e oportunidades do território etc. A combinação de todas essas características determinará o êxito da organi-zação.

O ideal no processo de desenvolvimento de um território é que ele seja endógeno e de baixo pra cima. Ele depende dos atores do território, de suas vontades e escolhas, mesmo que seja induzido de modo exógeno. 12

Nem sempre, na maioria dos casos brasileiros e de países em vias de de-senvolvimento, ocorre dessa maneira. Os atores territoriais não se veem como protagonistas do processo e nem os agentes externos - os tomado-res de decisão - reconhecem sua capacidade para tal. Geralmente é preciso “estimular o protagonismo local”13, aumentar a auto-estima, a liberdade e a equidade social na região em que se trabalha uma IG. Isso requer um conjunto de mudanças políticas, sociais e econômicas.

Neste sentido, esse subcapítulo, visa ressaltar a importância da organiza-ção de produtores e seus papéis no processo de implementação de uma IG, apresentar as possíveis formas dessa organização e como organizar um grupo partindo de interesses comuns.

3.2.1 Representatividade e legitimidade do grupo

Todo e qualquer pedido de reconhecimento de uma indicação geográ-fica, segundo o Artigo 5º da Resolução nº 075/2000 do INPI, deverá ser apresentado por um sindicato, uma associação, um instituto ou qualquer outra pessoa jurídica de representatividade•coletiva, com legítimo inte-resse e estabelecida no respectivo território.

As indicações geográficas se caracterizam por ser um bem coletivo, todos os “produtores” ou “prestadores de serviço” estabelecidos na área delimi-tada pela IG terão direito ao uso da indicação geográfica.

Uma indicação geográfica precisa, portanto, em primeiro lugar, que o grupo requerente (a entidade representativa) seja o legítimo representan-te dos produtores locais, interessados na consolidação de uma IG.

O que significa essa representatividade? Se o produto a receber uma indi-cação geográfica é um produto transformado, por exemplo, é interessan-te que diferentes atores da cadeia produtiva participem na organização,

106

Page 107: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

como produtores, transformadores, comerciantes e até mesmo pesquisa-dores e consumidores.

A participação no grupo, geralmente é voluntária e visa o alcance de ob-jetivos comuns. Embora as indicações geográficas sejam muito mais uma ferramenta de diferenciação econômica e mercadológica, não podemos deixar de pensar nelas como instrumento para o desenvolvimento territo-rial. Neste sentido, quanto mais representativo for o grupo, maiores serão as oportunidades de inclusão e menores os riscos de exclusão social.

A representatividade deve estar relacionada à produção na área geográfica delimitada (ou a ser delimitada). Informações como número de produto-res e volume (ainda que aproximado) de produção no território devem ser conhecidos a fim de mobilizar os diferentes atores em torno de um objetivo comum.

Entretanto, existem dois contrapontos:

a. quanto maior o número e a diversidade de produtores e atores en-volvidos, maiores as possibilidades de dinamização do local ou da região e, portanto, de desenvolvimento local e melhoria da qualida-de de vida da população.

b. Por outro lado, quanto maior o número e diversidade de produtores e atores, maiores as possibilidades de surgimento de conflitos, de divergências e talvez, mais demorado possa ser o processo, pode ser difícil (não impossível) encontrar o interesse comum.

Portanto, vale destacar que quanto maior o número e a diversidade de produtores, mais árduo será o trabalho de sua organização, mas, se bem realizado, se bem mediado, maiores serão as possibilidades para a dina-mização e desenvolvimento locais. E também, mais forte e representativa será a IG.

3.2.2 Quem participa da organização?

A organização dos atores sociais locais relacionados ao processo de indi-cações geográficas geralmente têm sido consolidadas na forma de associa-ções, embora haja outras formas de se organizar a entidade representativa.

Os papéis e objetivos da entidade podem ser diversos e complexos, bus-cando alcançar vários pontos em comum, que vão além da promoção do produto da IG. Primeiramente, espera-se que façam parte da entidade os

107

CAPÍTULO 03

Page 108: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

produtores locais (que tem, entre outros interesses, o de promover seu produto). Mas outras pessoas que façam parte da cadeia produtiva podem ter interesses convergentes, como comerciantes, transformadores e mes-mo consumidores. Além destes, também pessoas ligadas à pesquisa e ex-tensão (seja de entidades públicas, privadas ou autônomos) podem apoiar e fazer parte da entidade representativa, como ocorre em muitos casos.

Dentro da entidade representativa deverá existir um Conselho Regulador. Este será o órgão responsável pelo acompanhamento dos produtores que queiram apresentar seu produto com a designação da IG, com a finalidade de verificar se estes estão cumprindo as normas estabelecidas no regula-mento de uso elaborado pela própria Entidade Representativa de maneira coletiva e participativa.14

Veja o exemplo das associações responsáveis pelas primeiras quatro indi-cações geográficas brasileiras reconhecidas pelo INPI para entender como podem ser organizadas as entidades representativas.

a) APROVALE – Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos

A Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos foi fundada em 1995 com a associação de seis vinícolas, sendo que na época a lei brasileira que regula direitos e obrigações relativos à propriedade in-dustrial, incluindo as Indicações Geográficas ainda não havia sequer sido publicada.

Hoje são 59 associados, 31 vinícolas e 28 não produtores de vinho, entre hotéis, pousadas, restaurantes, artesanatos, queijarias e outros.

b) CACCER – Conselho das Associações dos Cafeicultores do Cerrado

O Café da Região do Cerrado Mineiro está delimitado numa grande área. Assim, grande também é o número de produtores e associados em toda a região. São aproximadamente 4.000 produtores, em 55 municípios, as-sociados a uma das seis associação ou seis cooperativas que fazem parte do Conselho das Associações dos Cafeicultores do Cerrado. A diretoria do CACCER é formada pelos presidentes de cada entidade associada (asso-ciações e cooperativas), formando um conjunto de redes capaz de tomar rápidas decisões.

108

Page 109: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Imagine trabalhar com 4000 membros – com reuniões, discussões, toma-das de decisão – em uma única associação. Certamente não seria um tra-balho nada fácil.

Hoje o responsável pela indicação de procedência “Região do Cerrado Mineiro” para café é a Federação dos Cafeicultores do Cerrado.

c) APROPAMPA – Associação dos Produtores de Carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional

Ao todo são 55 membros que participam da APROPAMPA. Destes, 54 são produtores primários - criadores de gado e 1 é um frigorífico.

d) APACAP – Associação dos Produtores e Amigos da Cachaça de Paraty

A APACAP é a menor associação dentre as quatro. São nove associados que dela fazem parte, sendo que todos são transformadores (industriais, processadores, ou seja, donos de alambiques, onde se faz a cachaça).

Note a diversidade de pessoas envolvidas no primeiro exemplo - APROVALE. Isso porque uma IG pode ser muito mais do que promotora do produto. Ela pode promover também a região e o turismo local e ou-tras cadeias produtivas, dinamizando a região e as relações nela existentes. Assim, quanto maior a diversidade entre os atores também maiores serão as chances de desenvolvimento local.

3.2.3 Formação da organização

Em alguns casos, ao se trabalhar com um produto identificado como po-tencial para IG, já existe uma certa forma de organização dos produtores. Isso facilita o processo de implementação, eles, provavelmente, já traba-lham por algum objetivo em comum.

Em outros casos, porém, não existe ainda consolidada uma rede de atores. Eles trabalham de forma individualizada, com suas dificuldades, muitas vezes comuns entre eles. Assim o trabalho para implementação de uma IG pode ser mais árduo. Há maior necessidade de um trabalho colabora-tivo para desenvolver a região e proteger a tipicidade e/ou qualidade dos produtos, requerendo até, às vezes, apoio externo.

109

CAPÍTULO 03

Page 110: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

A adesão voluntária das pessoas é o que garante o estabelecimento de la-ços numa Rede, mas•essa•adesão•só•nasce•em•função•de•uma•motivação•que consiga reunir em torno de si as expectativas e os investimentos de cada um dos diferentes integrantes. A razão de existir da Rede é o conjun-to de propósitos comuns a todos os participantes.15

Para construir uma forte dinâmica entre os atores e consolidar a Entidade Representativa:

1. identificar e eleger um conjunto de valores e objetivos que pos-sam ser compartilhados entre os atores,

2. mobilizar e reunir os atores para concretização das ações que levem ao alcance dos objetivos comuns.

Existem alguns trabalhos que discutem metodologias muito interessan-tes para a construção participativa de processos. Alguns deles você pode encontrar on-line! Exemplo:

http://www.pronaf.gov.br/dater/arquivos/21_metodologia_da_pesqui-sa_participativa_em_agroecologia.pdf

http://www.ufmg.br/congrext/Direitos/Direitos8.pdf

Acesso realizado em: 18 de jun.2010.

Outra metodologia particularmente interessante é a “Soft Systems Methodology” (ou SSM), que considera a complexidade dos sistemas e propõe uma construção coletiva e participativa. Você encontra artigos sobre o assunto, disponíveis na Biblioteca Virtual do curso.

3.2.4 Os papéis da organização

A partir de uma organização constituída, esta adquire importantes e dife-rentes papéis, que evoluem á medida que ela se fortalece. No caso de or-ganizações ligadas a um processo de implementação de IG, seus principais papéis são:

a. Promover•a•“implementação•da•IG”: A organização é responsável pela promoção e andamento das ações para implementação da IG.

b. Agir•como•interlocutor: A organização é responsável também pe-las articulações entre os próprios produtores e outros atores locais, entre instituições públicas e privadas, locais, estaduais e nacionais e outros atores que possam estar envolvidos.

110

Page 111: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

c. Promover,•preservar•e•proteger•a•IG.•

d. Garantir•a•disciplina•e•o•respeito entre si e com as outras indica-ções geográficas, dentro e fora da cadeia produtiva, formando sóli-das redes de negociação e articulação.

Outro papel interessante, seria articular a formação redes de atores e entidades locais que não estão no grupo relacionado diretamente a IG, propondo o desenvolvimento de ações que promovam a organização e desenvolvimento do território.

Os papéis certamente não param por aí. Cada organização, segundo seus interesses (que devem ir além da consolidação de uma IG), estabelece seus próprios papéis, seus objetivos e as estratégias para alcançá-los.

3.2.5 A participação dos atores locais

A participação dos atores locais nas reuniões, discussões e decisões da or-ganização nem sempre é fácil.

Velloso, ao acompanhar o processo de organização de um grupo de atores reunidos em uma associação ligada a um projeto de implementação de IG, constatou baixa motivação, com o passar do tempo, de alguns atores com relação à Entidade Representativa.16

Veja, na figura 3.2, como foi a participação dos atores desse grupo nos encontros presenciais (reuniões) desde a sua formação (em 2005) até o início de 2008.17

Figura 3.2 - Fonte: Velloso (2008)

111

CAPÍTULO 03

Page 112: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

No início, mais atores estavam envolvidos e motivados. Pode-se ver que entre os atores estavam produtores (da matéria prima, neste caso produ-tores de uva), transformadores (aqui identificados pelas vinícolas) e outros atores (instituições, comerciantes, parceiros). O número de produtores primários, sobretudo, é o que mais diminui, tornando-se praticamente ausente ao final da avaliação. Por que isso aconteceu?

É bem visível um maior engajamento em alguns atores, que geralmente se revelam como lideranças no grupo. O foco principal, no grupo, era o “projeto IG” e os aspectos econômicos.

Os produtores, assim como os transformadores, em geral, querem resul-tados em curto prazo e têm dificuldade em visualizar e se empenhar em projetos que tragam resultados em longo prazo.

No desencadeamento, os transformadores estavam mais engajados, cada vez participavam mais e os produtores menos. Apesar de ambos concor-darem com a IG e considerarem que esta traria benefícios para o todo (em longo prazo), seus interesses e necessidades não eram os mesmos.

É importante destacar que, após a finalização desse estudo18, a situação com relação à associação e à participação dos atores foi um pouco modi-ficada. O grupo percebeu a falta de motivação por parte dos produtores e resolveu tomar algumas atitudes como identificar e trabalhar com seus in-teresses, formando “dois grupos” dentro da associação, além de diminuir a taxa de mensalidade para os produtores, que em geral possuíam menor renda familiar.

Essa situação é comum em muitos outros casos em que o produto final (aquele reconhecido pela IG) é um produto transformado.

A valorização do produto a partir de uma IG é, geralmente, refletida no aumento de preço do produto final, mas nem sempre da matéria-prima. Isso gera divergências entre o grupo, pois esse reflexo deveria ser repassa-do, também, aos produtores primários. O surgimento de alguns conflitos é comum. Significa que o grupo interage e expõe suas preocupações, pos-sibilitando novas iniciativas. Assim, quanto melhor forem geridos e solu-cionados os conflitos, melhor será a harmonia, participação e motivação de todos.

Mas como trabalhar com um universo muito grande de atores? Bem, a participação de todos é importante, nesse caso a melhor alternativa foi criar subdivisões, formar grupos, cada qual com suas lideranças.

112

Page 113: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Uma ferramenta muito interessante para identificação da complexidade da situação e o levantamento de interesses é o “desenho rico” (que faz parte da metodologia SSM antes mencionada e que se encontra em al-guns artigos da Biblioteca Virtual), como este apresentado na figura 3.3.

Figura 3.3 – Fonte: Velloso (2009)

3.3 Formalização do grupo requerenteA formalização deve-se dar por meio de uma pessoa jurídica que represen-te a coletividade estabelecida no território onde o produto é elaborado, conforme o artigo 5 da Resolução INPI n. 75/2000. Existem duas exce-ções, se o produtor ou prestador do serviço é o único legitimado ao uso ou se o pedido é de reconhecimento de uma IG estrangeira. No primeiro, é possível que o requerente seja uma pessoa física ou jurídica, que pode requerer o registro em nome próprio. Na segunda, será o titular da IG reconhecido no país de origem, não se estabelecendo ou requerendo que este seja representante da coletividade local.

113

CAPÍTULO 03

Page 114: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

3.3.1 Instrumento de formalização

No direito Brasileiro se admite duas formas de personalidade jurídica: a adotada pela pessoa natural ou pessoa física e a adotada pela pessoa jurí-dica.

A pessoa natural compreende todo ser humano nascido com vida, sen-do este capaz de direitos e obrigações desde o seu nascimento até a sua morte. Ela se diferencia fundamentalmente da pessoa jurídica, que é um instrumento criado pelo próprio ser humano para representá-lo. Esta re-presentação em regra implica em uma coletividade. Não há associação ou empresa que se constituía de um único sócio ou associado.

A pessoa jurídica é, portanto, um instrumento abstrato, criado pela práti-ca e consolidado pelo direito, para representar as pessoas físicas em deter-minadas situações e cujas modalidades têm finalidades diferentes que são definidas pela lei, especialmente o Código Civil.

A existência de uma pessoa jurídica, ao contrário da pessoa natural, não começa com o seu nascimento. Sua existência legal apenas tem início com a inscrição do seu ato constitutivo (estatuto ou contrato social) no Registro adequado. A Lei que dispõe sobre as pessoas é o Código Civil.

Deve ser ressaltado que a existência legal da pessoa jurídica de direito pri-vado, com fins lucrativos, inicia com a inscrição do seu ato constitutivo, em regra, denominado Contrato Social, na Junta Comercial do Estado, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato consti-tutivo19.

Já a existência legal da pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrati-vos, inicia com a inscrição do seu ato constitutivo, em regra denominado Estatuto, no respectivo Cartório de Registro Civil das Pessoas Jurídicas, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato consti-tutivo.

As Associações de Direito Privado são constituídas pela união de pessoas (físicas e ou jurídicas) que se organizam para fins não econômicos, quer dizer que não pagam dividendos aos associados.

Há pessoas jurídicas de direito público, ou seja, que representam entes pú-blicos, como a União, os Estados, os Municípios, e mesmo, no âmbito ex-terno, os Estados e as Organizações Internacionais. 20 Claro está que estas pessoas jurídicas não representam uma coletividade na acepção estrita do

114

Page 115: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

termo, elas representam o poder público em suas diversas esferas e não in-teresses particulares, ou outras pessoas, sejam estas naturais ou jurídicas.

Também há pessoas jurídicas de direito privado, que representam as pessoas naturais dentro de uma determinada finalidade, como uma Associação, uma Sociedade, uma Fundação, um Partido Político e mesmo uma Organização Religiosa. 21

No caso de uma IG a Resolução nº 75/2000 cita expressamente a asso-ciação, o instituto ou outra•forma•de•pessoa•jurídica que represente a coletividade. Além disso, a Resolução determina como regra geral que esta entidade represente “a coletividade legitimada•ao•uso•exclusivo•do•nome•geográfico e estabelecidas•no•respectivo•território”.

A Associação•no seu estatuto pode instituir como objetivo a representa-ção de uma coletividade de um determinado território e pode estabelecer como fim a gestão da indicação geográfica.

Deve ser ressaltado que a possibilidade de entrada e saída de um associado é regulada tão somente pelo próprio estatuto, não havendo qualquer re-gra que obrigue a associação a aceitar um novo associado. Deve ser consi-derado, ainda, que a Constituição Federal determina que ninguém poderá ser obrigado a associar-se.22

De outra forma, não existe no direito brasileiro uma figura jurídica de-nominada “instituto” que se diferencie de associação. Ou seja, um ins-tituto, uma entidade de fins não econômicos, uma Organização Não Governamental (ONG), etc. em regra, são associações e legalmente é as-sim que deveriam ser denominados.

Nessa mesma situação encontram-se os Sindicatos, seja dos trabalhadores ou patronais, que nada mais são do que Associações que representam uma coletividade específica que são os seus sindicalizados.23

Outra pessoa jurídica que represente a coletividade poderia englobar as outras modalidades de pessoas jurídicas já citadas. Mas deve-se ter muito cuidado nesta definição e compreender o que a Lei e a Resolução efetiva-mente querem dizer, para que se possa escolher a forma jurídica correta.

3.3.2 Como entender a titularidade de uma IG?

Em regra, para se compreender a titularidade de um bem, faz-se necessá-rio definir-se a natureza deste bem. Para isso mais uma vez recorremos às definições de bens do código civil.

115

CAPÍTULO 03

Page 116: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

A primeira divisão decorre de se compreender o bem como sendo público ou privado.24 São públicos os bens de domínio nacional pertencentes a pessoas jurídicas de direito público interno (União, Estados, Municípios). São particulares todos os demais.25

Esclarece-se que são considerados bens públicos: a) os de uso comum do povo – rios, mares, estradas, ruas e praças; b) os de uso especial - edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração fe-deral, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias; c) dominicais - constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas en-tidades. 26

Claro está que uma IG não se trata de um bem público, posto que não é de uso comum do povo – apenas os localizados na região poderão utilizá-la cumprindo as disposições legais; não é de uso especial e tampouco é um bem dominical. Trata-se, portanto, de um bem privado com característi-cas especiais.

Dentre estas características, observa-se tratar de um bem móvel por deter-minação legal27; infungível – posto que não pode ser substituído por outro da mesma qualidade, quantidade e espécie28; inconsumível 29; indivisível 30; e pode ser considerado um bem acessório31 com relação ao território pos-to que com a venda de uma gleba que esteja localizada no espaço delimi-tado pela IG, vende-se também, e por isso, esta terá um valor diferenciado, a possibilidade de uso da IG ao novo comprador que, atendendo a todos os requisitos legais, poderá usufruir deste direito. Além disso, o direito ao uso da IG e a própria IG não podem ser separados do seu território de origem sem perder a sua característica essencial.

Considerando as características acima expostas, verifica-se que não se tra-ta de um bem privado comum, mas que tem certas peculiaridades que o tornam diferenciado. Isso por que este bem não se adquire com uma venda ou cessão, nem se pode dispor do mesmo como se o faria de um carro ou de uma casa.

Isso por que este bem nasce de uma forma muito mais complexa: sua formação se dá da conjunção entre um determinado lugar e os produtos ou serviços deste, agregando-se a isso o saber fazer de quem se encontra neste lugar e os fatores naturais que podem influenciar na criação ou ela-boração deste bem.

116

Page 117: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Para Locatelli32, trata-se de um direito que pertence a toda coletividade instalada na região, estando a titularidade ligada ao fator geográfico, ter-ritorial.

3.3.3 Qual a melhor forma jurídica para a entidade representativa: cooperativa ou associação

Esclarecida a natureza do bem e a sua titularidade, entramos agora na formalização prática da entidade que deverá representar a coletividade.

Para se fazer uma escolha adequada, deve-se conhecer dois tipos de estru-tura jurídica, suas vantagens e desvantagens.

Associação

Uma das formas mais simples de constituição de uma pessoa jurídica cer-tamente é uma Associação, que exige um mínimo de pessoas suficientes para compor a diretoria estabelecida no estatuto, com objetivos comuns e cuja entidade não deverá ter fins lucrativos, embora possa fazer o controle e gestão de uma IG, bem como cobrar mensalidades e anuidades, cobrar pelo controle, etc. Ela pode, inclusive, ter “sobras” ao final do período, mas estas não podem ser distribuídas entre os associados, devem ser rea-plicadas na própria associação.

Para sua constituição, basta a elaboração de um Estatuto – em duas vias, acompanhado da ata de fundação33, na qual deverá constar a lista de as-sociados fundadores. A lei exige que alguns requisitos mínimos apareçam neste estatuto, quais sejam: a denominação, os fins, a sede, o tempo de duração e o fundo social, quando houver; o nome e a individualização dos fundadores ou instituidores, e dos diretores; o modo por que se admi-nistra e representa, ativa e passivamente, judicial e extrajudicialmente; se o ato constitutivo (ata de criação e estatuto) é reformável no tocante à administração, e de que modo; se os membros respondem, ou não, subsi-diariamente, pelas obrigações sociais; as condições de extinção da pessoa jurídica e o destino do seu patrimônio, nesse caso.34

Especialmente no caso das Associações, a lei estabelece ainda que o es-tatuto deverá obrigatoriamente determinar: a sede da associação; os re-quisitos para a admissão, demissão e exclusão dos associados; os direitos e deveres dos associados; as fontes de recursos para sua manutenção; o modo de constituição e funcionamento dos órgãos deliberativos e admi-

117

CAPÍTULO 03

Page 118: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

nistrativos.35 Também deverá estar previsto no estatuto que, a assembléia geral terá competência e poderes para eleger os administradores; destituir os administradores; aprovar as contas e; alterar o próprio estatuto. 36 

Há obrigatoriedade do Estatuto ser revisado e assinado por um advogado ou contador, que são profissionais que conhecem as regras para a elabo-ração deste documento.

Após elaborado, devidamente aprovado pela Assembléia Geral de fun-dação, estes documentos serão depositados para inscrição no Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas do município da sede da Associação. Constituída a Associação, esta deverá possuir um contador que, em regra, se responsabiliza pelos demais trâmites necessários para se obter o CNPJ, a inscrição estadual e o alvará municipal.

Desse trâmite todo o que mais deve interessar aos associados é a elabora-ção do estatuto, que deve se dar de forma conjunta para que represente efetivamente os objetivos de toda a coletividade. No caso específico de uma IG, algumas peculiaridades podem ser acrescentadas.

Dentre os objetivos da Associação deve constar o trabalho para o reco-nhecimento e a gestão da IG, de forma clara e precisa. Na composição dos órgãos da Associação, além da Assembléia Geral (ordinária e extraor-dinária) que é obrigatória, e uma Diretoria, ou Conselho Diretivo, e um Conselho Fiscal, faz-se importante criar um órgão específico para Gestão e Controle da IG.

O ideal é que haja uma estrutura de gestão da IG separada da estrutura de Controle, para que haja imparcialidade no controle dos produtos ou ser-viços. Também é recomendável que da estrutura de controle participem, como convidados, terceiros que não fazem parte da Associação, mas que conhecem a IG, tais como técnicos, especialistas, consumidores, etc.

No caso do(s) órgão(s) de gestão e de controle, devem ser definidos seus objetivos, seus deveres, bem como – o que é interessante – a elaboração de um regimento interno, que permita uma liberdade de organização das questões administrativas, sem que se faça necessário, a cada alteração, al-terar o próprio Estatuto (o que é um trabalho considerável).

Dentro dessa estrutura geral deve haver uma pessoa responsável pela Gestão e outra para o Controle, suas atribuições devem ficar bem claras.

Também deve ser prevista a redação do Regulamento de Uso da IG, sua

118

Page 119: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

forma de controle e aplicação, se possível, bem como as penalidades para o descumprimento deste por parte dos associados e a atuação da Associação em face a terceiros que não tenham o direito ao uso da IG. Uma disposi-ção muito interessante seria regular o tratamento dos não associados que se encontram na área geograficamente delimitada – caso existam, para que seja possibilitado o uso da IG com o controle feito pela Associação.

Isso pode ser feito quando da fundação da Associação ou, no caso de uma já existente, mediante alteração do Estatuto para inclusão destas particu-laridades.

Vale ressaltar que uma Associação deve ser um organismo em constante aperfeiçoamento, para que possa se adaptar às realidades de sua região e da própria IG. Não deve ser engessada por meio de normas rígidas de-mais, mas deve ter um rigor mínimo que estabeleça o respeito pela IG.

Para uma melhor compreensão mediante um exemplo concreto, dispo-nibilizamos na Biblioteca Virtual o Estatuto da Associação de Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos, o qual nos foi gentilmente forne-cido pela Aprovale.

Cooperativa

Outra opção é a organização mediante o formado de uma Sociedade Cooperativa. Trata-se de uma pessoa jurídica um pouco diferente da Associação, embora sua constituição também se dê mediante a elabora-ção de um Estatuto37, o qual deve ser aprovado em uma Assembléia Geral de fundação, comprovada mediante a elaboração da respectiva Ata de Fundação.38 Além disso, seus atos constitutivos devem ser apresentados à Junta Comercial, seguindo-se após os mesmos trâmites já descritos para a Associação.

O que mais a difere da Associação é que a cooperativa reúne pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com produtos ou serviços para o exercício de uma atividade econômica de utilidade comum, sem objetivo de lucro.39 Claro fica que há uma atividade econômica, mas o objetivo da cooperativa em si não é o lucro, é auxiliar seus cooperados para que estes trabalhem.

Do ponto de vista legal, as cooperativas•são sociedades de pessoas (natu-rais ou jurídicas), com forma e natureza jurídica próprias, não sujeitas à falência, constituídas para prestar serviços aos associados. Sua regulamen-

119

CAPÍTULO 03

Page 120: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

tação se dá pelos artigos 1.093 e seguintes do Código Civil, e pelas disposi-ções especiais da Lei nº 5.764/1971 – Lei das Cooperativas.

As principais características das cooperativas são: a possibilidade de va-riabilidade ou dispensa de capital social (o que difere de uma sociedade comum, sendo que não existe capital social para uma Associação); con-curso de sócios em número mínimo necessário a compor a administração da sociedade, sem limitação de número máximo; com limitação do valor da soma de quotas do capital social que cada sócio poderá tomar; com intransferibilidade das quotas do capital a terceiros estranhos à sociedade, ainda que por herança; com quorum, para a assembléia geral funcionar e deliberar, fundado no número de sócios presentes à reunião, e não no ca-pital social representado; com direito de cada sócio a um só voto nas deli-berações, tenha ou não capital a sociedade, e qualquer que seja o valor de sua participação(uma pessoa = um voto); com distribuição dos resultados, proporcionalmente ao valor das operações efetuadas pelo sócio com a so-ciedade, podendo ser atribuído juro fixo ao capital realizado (o que difere sobremaneira da Associação); com indivisibilidade do fundo de reserva entre os sócios, ainda que em caso de dissolução da sociedade.

Ao contrário das Associações, onde os associados não têm responsabilida-des com relação a terceiros e a Associação, salvo o caso de gestão temerá-ria, na sociedade cooperativa, a responsabilidade dos sócios pode ser limi-tada ou ilimitada. Ou seja, eles respondem pelas perdas das Cooperativas, como também podem receber as sobras destas.

Além disso, a Lei de Cooperativas estabelece que40: a adesão à cooperativa é voluntária; há possibilidade de retorno das sobras líquidas do exercício, proporcionalmente às operações realizadas pelo associado, salvo delibe-ração em contrário da Assembléia Geral; a cooperativa deve manter neu-tralidade política e não discriminação religiosa, racial e social; deve haver prestação de assistência aos associados, e quando previsto nos estatutos, aos empregados da cooperativa.

Em suma, possui regras por um lado mais restritivas, mas, por outro, mais vantajosas aos seus cooperados que as associações. Vale ressaltar que há diferentes tipos de cooperativas: de primeiro, segundo e terceiro graus.

As cooperativas singulares, ou de primeiro grau, caracterizam-se pela prestação direta de serviços aos associados. Já as cooperativas centrais e federações de cooperativas, ou de segundo grau, objetivam organizar, em comum e em maior escala, os serviços econômicos e assistenciais de inte-

120

Page 121: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

resse das filiadas, integrando e orientando suas atividades, bem como fa-cilitando a utilização recíproca dos serviços.41 As cooperativas de terceiro grau são formadas pelas federações de cooperativas e tem como objetivo ordenar o funcionamento e gestão de todas, proporcionando formação e auxílio, por vezes técnico e financeiro.

Vale ressaltar que, conforme disposição constitucional, não há mais obri-gatoriedade de se pedir a autorização para o funcionamento de uma co-operativa. 42

As IG Brasileiras registradas até o momento perante o INPI constituíram a forma jurídica de Associações para representar e organizar os seus pro-dutores. Cada uma delas será apresentada e trabalhada nos Capítulos 8 e 9.

E agora, o que fazer?

Após conhecidas as maneiras de formalização da Entidade Representativa, aconselha-se que seja debatido entre os legitimados para uso da IG qual a forma que melhor se adapta aos objetivos destes.

Escolhida a forma jurídica, será muito importante promover um traba-lho conjunto para elaboração do Estatuto (embora uma minuta prévia possa ser apresentada), para que todos possam participar das decisões e sentirem-se parte do processo. Além disso, um profissional do direto ou da contabilidade será necessário para formalizar o ato bem como para auxiliar na parte mais técnica da elaboração destes documentos.

Mas lembre-se que o processo pode ser concomitante aos demais que serão apresentados nos Capítulos 4 e 5. Todavia, haverá necessidade de encontrar-se constituída a Entidade Representativa quando do requeri-mento de seu registro perante o INPI, o que será analisado no Capítulo 6.

121

CAPÍTULO 03

Page 122: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Resumo

Neste capítulo você conheceu a importância da notoriedade e da qualidade ligada ao meio geográfico para uma IG. Tratou-se dos princípios básicos das indicações geográficas, que são: a notoriedade e a qualidade ligada ao meio geográfico. Vimos que cada espécie da IG (a IP e a DO) se baseia num desses critérios. Enquanto para uma IP precisamos, obrigatoriamente, ter notoriedade, para uma DO precisamos, obrigatoriamente, provar que as qualidades do produto ou serviço se devem a fatores do meio geográfico.

Tendo as bases das IG, vimos como identificar produtos potenciais, apre-sentando perguntas norteadoras para avaliarmos a potencialidade real dos produtos e serviços identificados. O produto tem reputação? Essa reputa-ção é ligada ao local? Há elementos do local (ou região) que influenciam na qualidade do produto? O produto tem preço diferenciado? Existe po-tencial para a agregação de valor ao produto? O produto é comercializado no Estado? O produto é comercializado em outros Estados? O produto é exportado? Os produtores estão organizados? A produção é ambiental-mente sustentável? A produção respeita os direitos humanos?

Você verificou a importância da organização dos produtores no processo de implementação da IG, que são também os responsáveis pelo pedido da IG. A participação e o envolvimento dos agentes locais são impres-cindíveis para o sucesso da IG, sendo que o grupo possui importantes e diversos papéis nesse processo. A promoção do desenvolvimento local a partir de um processo de implementação de IG depende da dinamização do território pelos produtores e outros agentes locais.

122

Page 123: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

Notas

1. Vasconcellos et al., 2003.

2. De acordo com a Portaria Interministerial no239 de 21 de julho de 2009, sociobiodiversidade é a inter-relação entre a diversidade biológica e a diversidade de sistemas socioculturais. Segundo a mesma portaria, produtos da sociobiodiversidade são bens e ser-viços (produtos finais, matérias primas ou benefícios) gerados a partir de recursos da biodiversidade, voltados à formação de ca-deias produtivas de interesse dos povos e comunidades tradicio-nais e de agricultores familiares, que promovam a manutenção e valorização de suas práticas e saberes, e assegurem os direitos decorrentes, gerando renda e promovendo a melhoria de sua qualidade de vida e do ambiente em que vivem.

3. SILVA, de Plácido e. Vocabulário Jurídico. 7ªed. Rio:Forense,1982,4v.

4. Você verá no capítulo 4 como mobilizar documentos que com-provem essa notoriedade.

5. Barjolle et al., 1998.

6. Não obrigatório.

7. Não obrigatório. A sustentabilidade ambiental e o respeito aos direitos humanos não são pontos explícitos como “requisitos” para uma IG. Não podemos desconsiderar, no entanto, outras legislações também existentes. Além disso, “[...] as políticas lo-cais devem, no mundo da globalização, buscar a inclusão social da população, a qual deve assumir as prerrogativas da inclusão no mundo produtivo, inclusão no mundo do consumo, inclusão no mundo da cidadania e do respeito aos direitos humanos.” CALDAS, 2003, p. 30.

8. ISPN, 2008.

9. Teixeira et al, 1999.

10. Rosa, 2008.

11. Paula, 2004.

123

CAPÍTULO 03

Page 124: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

12. Paula, 2004.

13. Paula, 2004, p. 77.

14. As etapas de elaboração do regulamento de uso e da definição da forma de controle serão abordadas detalhadamente na Aula 5.

15. BRASIL, 2008, p.126.

16. Velloso, 2008.

17. Velloso, 2008.

18. Velloso, 2008.

19. Artigo 45, Lei nº10.406/2002.

20. Código Civil – Lei nº 10.406/2002, Artigos 40 a 43.

21. Código Civil – Lei nº 10.406/2002, Artigos 44 e seguintes.

22. Artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988:

XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar;

XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de coopera-tivas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento;

XIX - as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvi-das ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigin-do-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado;

XX - ninguém•poderá•ser•compelido•a•associar-se•ou•a•perma-necer•associado;

23. SIQUEIRA, Graciano Pinheiro de. Natureza jurídica e órgão re-gistrador das entidades sindicais. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, nº 818, 29 set. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7355>. Acesso em: 12 maio 2009.

24. Código Civil – Lei nº 10.406/2002, Artigos 79 a 103.

25. Código Civil – Lei nº 10.406/2002, Artigo 98.

124

Page 125: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

26. Código Civil – Lei nº 10.406/2002, Artigo 99.

27. Conforme define o Artigo 5 da Lei nº 9.279/1996.

28. Código Civil – Lei nº 10.406/2002, Artigo 85

29. Código Civil – Lei nº 10.406/2002, Artigo 86.

30. Código Civil – Lei nº 10.406/2002, Artigo 87.

31. Código Civil – Lei nº 10.406/2002, Artigo 92.

32. Locatelli, 2008, . 237-242

33. Para a criação de uma associação será necessária a realização de uma assembléia. Nesse momento os associados colocarão em votação uma proposta de estatuto, elegerão os membros que irão compor o primeiro mandato dos seus órgãos internos (di-retoria, conselho fiscal entre outros órgãos, conforme o estatuto aprovado dispuser), bem como a definição de sua sede provisória ou definitiva. Após o término da assembléia deverá ser elaborada a ata de criação da associação na qual constará: a informação de se tratar de uma ata de criação com a denominação da associa-ção; o nome e CPF de cada associado fundador; a pauta da reu-nião (criação da associação, aprovação do estatuto, definição da sede e eleição dos membros dos órgãos internos da associação). A ata será assinada por todos os associados fundadores ou acom-panhada por uma lista de presença que contenha a identificação dos presentes.

34. Artigo 46, Lei nº10.406/2002.

35. Artigo 54, Lei nº10.406/2002.

36. Artigo 59, Lei nº10.406/2002.

37. Os seguintes itens devem constar no estatuto de uma coopera-tiva: I - a denominação, sede, prazo de duração, área de ação, objeto da sociedade, fixação do exercício social e da data do levanta-mento do balanço geral; II - os direitos e deveres dos associados, natureza de suas respon-sabilidades e as condições de admissão, demissão, eliminação e exclusão e as normas para sua representação nas assembléias gerais;

125

CAPÍTULO 03

Page 126: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

III - o capital mínimo, o valor da quota-parte, o mínimo de quotas-partes a ser subscrito pelo associado, o modo de inte-gralização das quotas-partes, bem como as condições de sua retirada nos casos de demissão, eliminação ou de exclusão do associado; IV - a forma de devolução das sobras registradas aos associados, ou do rateio das perdas apuradas por insuficiência de contribui-ção para cobertura das despesas da sociedade; V - o modo de administração e fiscalização, estabelecendo os respectivos órgãos, com definição de suas atribuições, poderes e funcionamento, a representação ativa e passiva da sociedade em juízo ou fora dele, o prazo do mandato, e o processo de substi-tuição dos administradores e conselheiros fiscais; VI - as formalidades de convocação das assembléias gerais e a maioria requerida para a sua instalação e validade de suas deliberações, vedado o direito de voto aos que nelas tiverem interesse particular sem privá-los da participação nos debates; VII - os casos de dissolução voluntária da sociedade; VIII - o modo e o processo de alienação ou oneração de bens imóveis da sociedade; IX - o modo de reformar o estatuto; X - o número mínimo de associados.

38. Conforme Lei nº 5.764/1971.

39. O ato constitutivo (ata de funcação), sob pena de nulidade, deve-rá declarar: a denominação da entidade, sede e objeto de funcio-namento; o nome, nacionalidade, idade, estado civil, profissão e residência dos associados fundadores que o assinaram, bem como o valor e número da quota-parte de cada um; a aprovação do estatuto da sociedade; o nome, nacionalidade, estado civil, profissão e residência dos associados eleitos para os órgãos de ad-ministração, fiscalização e outros (conforme Lei nº 5.764/1971).

40. Artigo 3º, Lei nº 5.764/1971.

41. Artigo 4º, Lei nº 5.764/1971.

42. Artigos 7°, 8º, Lei nº 5.764/1971.

126

Page 127: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade
Page 128: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade
Page 129: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade
Page 130: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

130

Delimitação geográfica da área: homem, história e natureza

Neste•capítulo,•apresentaremos•uma•visão•geral•e•prática•sobre•os•elementos•necessários•para•a•delimitação•geográ-fica•da•área•de•uma•IG.•Essa•delimitação•deverá•ser•reali-zada•e•respaldada•por•argumentos•técnicos,•constando•em•relatórios• e• abordando,• principalmente,• o• levantamento•histórico•e•o•estudo•de•fatores•naturais•(clima,•solo,•relevo,•vegetação,• paisagem,• etc.).• Nosso• objetivo• é• promover• a•reflexão•para•incentivar•novas•propostas•de•estudos•e•pes-quisas,•visando•à•criação•de•metodologias•próprias•para•o•Brasil.•O•nosso•grande•território•nos•impõe•desafios•me-todológicos•e•técnicos•de•delimitação•geográfica•de•área•e,•também,•entre•as•relações•sociais•dos•agentes•locais•para•construção•de•uma•visão•coletiva•das•IG.•Então,•será•tra-tado•o•estudo•histórico•e•cultural•necessário•para•iniciar•a•delimitação•de•uma•IG,•o•qual•representa•uma•etapa•cen-tral•para•o•reconhecimento•da• IG.•Ele• tem•o•objetivo•de•buscar•informações•e•elementos•comprobatórios•da•noto-riedade•da•região.•Será• tratada• também•a•delimitação•da•área•geográfica•em•si.•Serão•apresentados•e•discutidos•al-guns•métodos•e•critérios•utilizados•na•delimitação•geográ-fica•em•outros•países•de•maior• tradição,•principalmente,•da•Comunidade•Européia.•Além•disso,•vamos•analisar•e•re-fletir•sobre•os•métodos•e•critérios•para•a•especificidade•do•Brasil,•pois•a•grande•extensão•territorial•brasileira,•aliada•à•diversidade•étnica,•biológica,•cultural,•etc.,•impõe•desafios•metodológicos•e•técnicos•para•a•delimitação•geográfica•de•área•para•as•futuras•IG.

Page 131: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

131

CAPÍTULO 04

Fatores Naturais Fatores Humanos

Produto

4.1 A relação entre homens, produtos e territórios

Todos os elementos e atividades que vamos apresentar a seguir levam a um mesmo objetivo geral que é o de reunir produtos, homens e territó-rios. Os produtos apresentam características particulares e são reconheci-dos pelos consumidores; os territórios abrigam os recursos naturais espe-cíficos, criando uma notoriedade; e, os homens têm uma história coletiva de conhecimentos locais (savoir-faire) que dividem entre si.

Figura 4.1 - A reunião do homem, produto, território na indicação geográfica.Fonte: Velloso (2009)Alguns métodos e critérios permitem comprovar a legitimidade da solici-tação de registro (comprovar a notoriedade, para uma IP, ou comprovar as características específicas do produto que são ligadas à região de origem, incluídos aí os fatores naturais e humanos, isso para uma DO) na elabora-ção do relatório histórico-cultural e na delimitação geográfica da área de produção.

IP e DO correspondem a filosofias diferentes. A filosofia da IP é de prote-ger um nome geográfico, pois se baseia na notoriedade – ou seja, é preciso demonstrar que a região ou localidade se tornou conhecida pelo produto ou serviço ali prestado ou elaborado, considerando sua história e quali-dades. Para a DO, por outro lado, a filosofia é de proteger, através de um nome geográfico, um produto único e não reproduzível em outra região. Temos que demonstrar, neste caso, que o produto ou o serviço possui relação com a origem geográfica, a qual é responsável essencial ou exclu-sivamente por esta característica ou qualidade únicas.

Page 132: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

132

4.2 Estudo histórico e culturalO levantamento histórico cultural representa uma etapa fundamental, que visa buscar informações e elementos comprobatórios da notoriedade da região. É importante o levantamento de evidências concretas deste re-conhecimento para acompanhar o pedido de solicitação de registro junto ao órgão competente. Além de comprovar a legitimidade da solicitação da região como IG, esse levantamento vai ajudar em outras etapas do processo, como a delimitação geográfica da área de produção, a origem da matéria-prima, a definição do processo de produção, etc.

A parte histórica não deve ser considerada pelas entidades requerentes como apenas um elemento necessário para a solicitação do registro, mas sim como um meio de aprofundar e aperfeiçoar os seus conhecimentos técnicos, sociais e culturais sobre o produto e a região, quer dizer, de co-nhecer de fato o produto.

4.2.1 Um passo importante na vida do grupo

O levantamento histórico, muitas vezes, é a primeira atividade concreta do grupo de produtores da futura IG. Assim, esta etapa é também um momento de aprendizagem para todos os membros do grupo.

Esse passo permite a aproximação dos diferentes membros do grupo. Existe, em geral, certo consenso no que diz respeito à história e aos even-tos que marcaram a região, não havendo risco, portanto, de que a iniciati-va seja fragilizada por alguns conflitos de interesse.

O levantamento histórico da região é uma etapa fundamental do processo que permite a comprovação da notoriedade e sua legitimidade a se tor-nar uma IG. Ele é uma oportunidade para uma melhor aproximação dos agentes locais e a construção de uma visão coletiva do projeto de IG.

Entretanto, a tendência observada no Brasil e também na Europa, é do grupo de produtores se desfazer desses trabalhos, contratando o serviço de um historiador - prestador de serviços - que vai realizar o estudo his-tórico.

Essa prática, por um lado, pode facilitar o trabalho da associação: os pro-dutores muitas vezes não têm tempo suficiente, nem prática e experiência (ou competência) para buscar os diferentes arquivos históricos e outros elementos.

Page 133: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

133

CAPÍTULO 04

Por outro lado, a contratação de profissionais pode trazer problemas, pois não fortalece os debates e trocas de visão entre os membros do grupo e, como nem sempre os historiadores vão conseguir juntar todos os elemen-tos necessários, o grupo perde a oportunidade de redescobrir a história da sua própria região.

4.2.2 “Certos produtos têm mais histórias para contar do que outros!”

O título acima foi extraído de um documento da União Européia de Berard e Marchenay1. Certas regiões produzem há mais de 500 anos o mesmo produto. Ao lado destas, outras se tornaram conhecidas com um produto mais recente (10 ou 30 anos). Um produto IG não precisa ser, necessariamente, um produto muito antigo.

No Brasil, a região dos perímetros irrigados do nordeste (Vale do São Francisco - PE/BA) se tornou conhecida pela produção de frutas entre os anos 1970 e 1990 (região recente). No entanto, o litoral brasileiro já apre-senta produtos e atividades típicas de origem açoriana há mais 300 anos, como exemplo a cachaça de Paraty /RJ (região antiga).

Mais do que a história, o importante é a presença de uma memória co-letiva dos produtores e de saberes compartilhados. Nessa perspectiva, na elaboração de um documento histórico e da comprovação da origem, de-vem constar elementos sobre as comunidades locais, sua história e seus conhecimentos compartilhados, tenham origem escrita ou não.

4.2.3 Como fazer o levantamento histórico e cultural?

A História é o estudo dos fatos, eventos e acontecimentos passados. Ela se torna um elemento de leitura chave para identificar as riquezas do local e entender o processo de construção da notoriedade da região. Ela pode ser mais ampla que a história do produto em si.

Trata-se de reunir não só materiais científicos, mas também a história transmitida no tempo no qual podem se misturar relatos, lendas e fatos curiosos. Apresentamos como exemplo o contexto histórico das quatro primeiras IG brasileiras e de IG reconhecidas em outros países:

a. Vale•dos•Vinhedos

A Serra Gaúcha está localizada ao noroeste do Estado do Rio Grande do Sul e sua ocupação remonta ao final do século XIX, principalmente, com a

Page 134: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

134

chegada dos imigrantes italianos. A instalação desses imigrantes ocorreu com o apoio do Governo Brasileiro, interessado na ocupação da região.

Entretanto, as condições de colonização foram muito difíceis na mata virgem, em uma região isolada e perduraram por muitas décadas. Período de muitas dificuldades sócio-econômicas, com falta de apoio aos setores de educação, saúde e transportes, além de grandes dificuldades para a produção agrícola e para o escoamento dos excedentes para mercados. Inicialmente, desenvolveu-se como uma região de agricultura basicamen-te familiar, onde o plantio da uva e a produção do vinho logo tiveram destaque, além de outros produtos para consumo das próprias famílias e de abastecimento local.

Atualmente, a região possui uma economia muito diversificada, com a forte presença do setor industrial (metalúrgico, moveleiro) e do turismo (enoturismo, ecoturismo, turismo de aventura). No entanto, foi na vitivi-nicultura, que faz parte da historia e cultura local, que a região se notabili-zou economicamente no cenário nacional e obteve o reconhecimento da primeira IG nacional.

b. Região•do•Cerrado•Mineiro

A história do café da Região do Cerrado Mineiro começou no final da década de 1960, quando ocorreu a maior geada que a cafeicultura brasi-leira conheceu, trazendo consequências desastrosas para os cafezais dos Estados do Paraná e São Paulo.

As dificuldades climáticas somadas ao crescimento econômico das lavou-ras de soja conduziram os cafeicultores a vender suas terras. As políticas de modernização e as facilidades ofertadas pelos créditos governamentais orientaram a fuga dos barões do café, que compraram terras totalmente mecanizáveis, por preços acessíveis, em Minas Gerais.

Da entrada dos barões do café paranaenses e paulistas resultou a diversifi-cação da economia previamente voltada para pecuária de corte, pecuária de leite e produção de cachaça, desta região mineira. No entanto, dentre as várias regiões cafeicultoras, a Região do Cerrado Mineiro foi a primeira a se beneficiar do reconhecimento da sua notoriedade com o recebimento de uma IG.

c. Paraty

A história de Paraty/RJ está relacionada com as funções comerciais que

Page 135: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

135

CAPÍTULO 04

a cidade assumiu desde o século XVI. A Vila de Paraty cresceu ao ritmo dos ciclos econômicos. Como único caminho ligando o Rio de Janeiro às minas. A partir de 1695 se transformou em cidade e conheceu um forte desenvolvimento econômico.

A cachaça produzida no município virou moeda de troca para adquirir es-cravos e também ouro. Porém, a abertura de outras vias de comunicação e a má qualidade daquelas conduzindo à Paraty, foi dificultando o acesso e a cidade conheceu quase 100 anos de abandono. Muitos alambiques fe-charam.

A abertura, em 1950, da primeira estrada circulável terminou com o isola-mento do município e abriu as portas para novas atividades econômicas, como o turismo, permitindo também o resgate da produção de cachaça artesanal e o reconhecimento de uma IG.

d. Pampa•Gaúcho•da•Campanha•Meridional

A notoriedade e a tradição dos Gaúchos da região sul do Brasil iniciaram com a colonização do país. O território, o idioma e a cultura resultam das inúmeras guerras internas e externas ligadas à conquista do território. A economia do Rio Grande do Sul está relacionada à epopéia belicosa do Estado, e também aos grandes ciclos econômicos: couro, charque, frigo-rífico.

A região da Campanha Meridional se destacou ao longo do tempo como uma zona de terminação do gado bovino, devido a seus campos naturais de alta qualidade, e a habilidade dos seus pecuaristas em lidar com cavalos e bois. Esta região, com sua história, extensão de terras, biodiversidade e reconhecida diversidade da carne bovina, permitiu o registro e reconheci-mento de uma IG.

e. Roquefort

A título de comparação, apresentamos o exemplo do queijo Roquefort, França, e as duas faces de sua história.

Da lenda: a lenda diz que esse queijo nasceu da distração de um pastor, que um dia esqueceu pedaços de pão e de queijo em uma caverna quan-do vislumbrou uma bela jovem. Alguns dias mais tarde, ele encontrou o queijo manchado de verde, porém comestível e bem melhor que antes.

Da verdade: a história do Roquefort inicia no reinado de Carlos Magno (Rei da França), que o descobre durante uma viagem. Em 1411, os ha-

Page 136: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

136

bitantes do vilarejo de Roquefort sur Soulzon obtêm do rei Carlos VI um documento lhes acordando o privilégio de trabalhar na produção e matu-ração do queijo, tornando-o mais puro e melhor curado. Privilégio este confirmado em 1666 por uma decisão administrativa do Parlamento de Toulouse. Em 1782, Diderot o consagrou como o “rei dos queijos do ter-roir da França”. Até em 1842, sua produção e seu comércio foram assegu-rados por produtores independentes. Voltaire, no seu livro “le temple du gout” (1733) e outros escreveram sobre o Roquefort.

Para consultar as referências históricas das IG brasileiras acesse os ende-reços eletrônicos:

http://www.valedosvinhedos.com.br/

http://www.ibravin.org.br/

http://www.abic.com.br/

http://www.panoramio.com/user/216087

Para conhecer a história do queijo Roquefort, da França:

http://www.maison-du-lait.com/prodlait/AOC/roquef.html

http://www.roquefort.fr/

Acesso realizado em: 24 jul. 2009.

4.2.4 Do levantamento histórico e cultural à comprovação da reputação

O levantamento permite identificar e contextualizar elementos que po-dem servir para comprovar a reputação ou a ligação à origem. Dois crité-rios são fundamentais: a realidade econômica histórica e a realidade eco-nômica atual.

•• A•realidade•econômica•histórica:

A realidade econômica histórica procura a localização dos primeiros pro-dutores que deram origem à reputação da região.

Os produtos seguem os homens. Observarmos variações nos limites das bacias de produção. Essas variações são, com frequência, causadas pelos homens e ligadas à trajetória de desenvolvimento das regiões: novas ati-

Page 137: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

137

CAPÍTULO 04

vidades econômicas, migrações, movimentos de população, evolução da cadeia produtiva.

• A fabricação de um produto típico começou numa região e, ao longo do tempo, se espalhou.

• Ou, então, a fabricação de um determinado produto era muito comum numa grande região, entretanto, apenas uma comuni-dade se especializou ou continuou produzindo aquele produto, enquanto os vizinhos deixaram de produzir.

Essas evoluções explicam uma redução ou um aumento da região produ-tiva.

•• Realidade•econômica•atual:

A realidade econômica atual se baseia na caracterização das atividades presentes no território hoje e em nível de especialização ou de diversifica-ção. Ela descreve a cadeia produtiva, as principais oportunidades e amea-ças para o produto, para os homens e para a região.

Além de comprovar a origem, a realização do levantamento histórico da região e os elementos que comprovem a reputação antiga (realidade eco-nômica histórica) e a reputação atual (realidade econômica atual) podem contribuir também como apoio à delimitação geográfica da área, à defi-nição das regras de produção e ao projeto coletivo dos atores locais e ao fortalecimento da IG (Tabela 4.1).

Contribuição dos elementos históricos na elaboração do dossiê de IG.

AtividadesComprovar a origem

Apoio à delimitação geográfica da área

Apoio à definição das regras de produção

Contribuição ao projeto coletivo e ao fortalecimento

Realização do levantamento histórico da região e das comunidades locais

X X

Elementos que comprovem a reputação antiga

X X X X

Elementos que comprovem a reputação atual

X X X

Tabela 4.1 Fonte: Cerdan, Silva (2009)

Page 138: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

138

4.2.5 Quais as fontes que podemos trabalhar?

Várias fontes permitem reconstruir a história da região, desde fontes escri-tas, tais como dados estatísticos, documentos e trabalhos acadêmicos (que podem ser mobilizados por atores locais, pessoas envolvidas no projeto), até fontes orais e mesmo visitas à região.

• As•fontes•escritas

O exercício consiste aqui em reunir materiais que nos permitam contar a história da região e demonstrar as especificidades do produto ou do servi-ço. As fontes escritas podem ser mobilizadas e procuradas pelos próprios atores locais envolvidos no processo para a realização desse primeiro le-vantamento. Trata-se para os agentes locais de visitar os serviços estatísti-cos (escritórios municipal e regional do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE), as bibliotecas municipais e universitárias, os museus locais, as prefeituras, outros diferentes serviços e arquivos pessoais. Veja na Tabela 4.2 e na Figura 4.2 alguns exemplos de fontes (documentos) que podem contribuir para o levantamento histórico.

Principais fontes escritas para a elaboração do levantamento histórico.

Tabela 4.2 - Fonte: Cerdan, Silva (2009)

Dados estatísticos Documentos Trabalhos acadêmicos

Estatísticas agrícolas antigas;

A enciclopédia dos municípios mostra inúmeros dados, tipo de atividades da região, data de colheita, núme-ro e tipo de empresas.

Relatórios administrativos, de obras, técnicos;

Atos de associações agrícolas, associação de raças;

Obras técnicas, livros locais consagradas à agricultura;

Jornais especializados agrí-colas;

Relatos de aventureiros, ro-mances, biografias;

Relato de eventos folclóricos, danças;

Obras Artigoísticas (foto-grafias, músicas, pinturas, poesias...).

Estudos de historiadores, geógrafos, antropólogos, economistas, agrônomos;

Teses e dissertações;

Page 139: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

139

CAPÍTULO 04

Além de reconstruir a história da região, das comunidades locais e dos produtos potenciais, os produtores devem procurar, na medida do possí-vel, documentos originais para ser apresentados junto com a solicitação de registro, comprovando a notoriedade da região, tais como: fotos, regis-tros oficiais, diplomas, certificados, etc.

Figura 4.2 2 - Fonte: Velloso (2008)3, Vale dos Vinhedos (exposição 130 anos da imigração italiana, Casa Valduga, 2005, www.cultura.rs.gov.br Acesso realizado em: 13 ago. 2009.

• As•fontes•orais•e•as•visitas•às•comunidades

Documentos escritos e arquivos não existem para todos os produtos, principalmente, se eles tiveram, antigamente, uma realidade doméstica e familiar. Entretanto, essa falta de provas escritas não quer dizer que os produtos não têm uma existência histórica.

É necessário, então, recorrer a outras fontes. Uma visita ao local é in-dispensável permitindo a compreensão da vida da região, bem como da produção, transformação e venda dos produtos. Essa visita passa por en-trevistas junto aos agentes locais: produtores, moradores, atacadistas, pro-prietários de restaurantes, membros de sindicatos, além das autoridades municipais e regionais, antigas e atuais.

Page 140: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

140

A visita da área também permite observar em que medida o produto mar-ca a paisagem “[...] os animais, a cor da pelagem, a freqüência que apare-cem as cabras; a cultivar de fruta, a forma do pomar e a arquitetura das plantas não aparecem nos mapas”4. Observe na Figura 4.3 como a imagem do produto típico da região é utilizada na paisagem, no cenário da região. Ao se chegar à cidade o visitante já associa a região ao produto, já sabe que está em uma região produtora de maçã e com baixa temperatura (frio).

Figura 4.3 5 - Fonte: Marquis (2006)

O reconhecimento de uma IG é para os produtores “uma ocasião de ver, de visitar sua propriedade com outro olhar... e encontrar...ou reinventar um território, um passado, uma tradição...um patrimônio natural” 6.

Visite os sites das IG brasileiras e verifique como eles estão valorizando a história dos seus territórios

www.carnedopampagaucho.com.br

http://www.ilhaverde.net/iv/paraty.htm

http://www.cafedocerrado.org/

Acesso realizado em: 24 jul. 2009.

Page 141: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

141

CAPÍTULO 04

4.3 Delimitação Geográfica da área

4.3.1 O que é a delimitação geográfica de área?

A área geográfica delimitada para uma IG designa o espaço no qual se realiza a produção e/ou transformação do produto. Lembramos que vi-mos nos capítulos anteriores, que uma solicitação de registro IG somente é justificada se ela conta com a presença de um ou mais produtos típi-cos e de qualidade. Mas que produtos típicos são esses? Como vimos no capítulo anterior, temos diferentes produtos nacionais passíveis de uma IG. Esses produtos podem ser in natura (ou não transformado), como é o caso, por exemplo, da maçã de São Joaquim, do guaraná de Maués, etc., ou transformados, como é o caso dos vinhos de altitude (SC), do queijo do serro (MG) e Cajuína (PI). Neste sentido, a delimitação da área pode se distinguir de um caso para outro, como veremos a seguir.

Em ambos os casos, contudo, a delimitação geográfica da área deve ser precisa, claramente justificada ou argumentada. Ela deverá ser realizada e respaldada por argumentos técnicos oficiais (como os resultados de estu-dos e pesquisas), constando em relatório os fatores naturais (clima, solo, relevo, vegetação, paisagem, etc.). Os técnicos e pesquisadores podem contribuir significativamente nessa etapa.

Para visualizar a Resolução nº 75/2000 do INPI e o Guia IG do MAPA aces-se:

http://www.inpi.gov.br/menu-esquerdo/indicacao/legislacao-1

http://www.agricultura.gov.br/pls/portal/docs/PAGE/MAPA/SERVICOS/IG_PRODUTOS_AGROPECUARIOS/CONSTRUINDO_AS_IG/GUIA%20IG%20FINAL_0.PDF

Há diferença entre a delimitação geográfica de uma área para uma IP e para uma DO?

A delimitação da área de produção e/ou de transformação atribui um grande espaço aos fatores naturais e humanos. As áreas de produção va-riam se estamos trabalhando em uma DO ou em uma IP.

Para uma DO, a área de produção é a zona onde o produto apresenta características específicas, que são determinadas por um conjunto de fato-

Page 142: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

142

res naturais e humanos - efeito terroir. Nesse caso, são necessários mapas edafoclimáticos (solo, clima, vegetação, etc...), sem, no entanto, excluir os saberes locais (savoir-faire), os modos de organização da produção, da transformação e as práticas dos agentes do território.

Para uma IP, a área é construída em função de uma série de critérios, como os saberes locais, a importância econômica e histórica do produto. Esse caso “IP”, a priori, é menos exigente em termos de estudos para a demonstração da ligação do produto com a origem.

A noção de terroir é amplamente utilizada na Europa, especialmente, na França, mas sua definição é bastante complexa. Para saber mais, você deve ler o texto “Afinal o que é o terroir?”7

Sobre o tema, consulte ainda os seguintes sites:

http://www.cnpuv.embrapa.br/publica/artigos/afinal_o_que_terroir.pdf

http://www.biblioteca.sebrae.com.br/bds/BDS.nsf/E1C3CE6A43DBDB3203256FD6004907B7/$File/NT000A61AE.pdf (p.179-199).

http://201.2.114.147/bds/BDS.nsf/304869CC2D5D5FBF0325713F004CC682/$File/NT000AF6AA.pdf

http://www.oiv2007.hu/documents/viticulture/327_d_finition_du_ter-roir_oiv_budapest.pdf

Acesso realizado em: 24 jul. 2009.

Os limites da área geográfica podem ser os limites administrativos (dis-trito, município, região, Estado), uma ruptura na paisagem (montanha, morro), rios, riachos ou mesmo em alguns casos, uma linha imaginária entre dois pontos de referência (produtos do mar), ou os contornos de elementos geográficos (micro bacias hidrográfica), como mostram alguns exemplos de IG a seguir e no próximo item deste capítulo.

A área delimitada de uma IG não é necessariamente contínua. Na IP Pampa Gaúcho da Campanha Meridional (RS), a área não inclui regiões de campos com arvoredos (Figura 4.4), pois eles apresentam caracterís-ticas de savana, com árvores, arbustos e pasto mais alto que favorecem o desenvolvimento de ectoparasitos para os quais o gado bovino, e mais especificamente, o gado de raça britânica, é pouco resistente.

Page 143: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

143

CAPÍTULO 04

Figura 4.4 - Região delimitada do IP Pampa Gaúcho da Campanha MeridionalFonte: MAPA (2009).

A delimitação geográfica da IP Paraty (RJ) baseou-se nas pesquisas sobre as zonas do município aptas à produção das cultivares de cana-de-açúcar, adequadas para cachaça de qualidade, o resgate histórico da produção de aguardente e as características sócio-econômicas. Os resultados demons-traram que somente uma parte do município foi selecionada e delimitada (Figura 4.5). As áreas próximas a Angra dos Reis foram excluídas, pois apresentaram características sócio-econômicas diferentes.

Figura 4.5 - Região delimitada da IP ParatyFonte: MAPA (2009)

Page 144: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

144

O Regulamento da IP Vale dos Vinhedos (RS) estabelece que a área geográ-fica delimitada localiza-se nos municípios de Bento Gonçalves, Garibaldi e Monte Belo do Sul, no Estado do Rio Grande do Sul, com área total de 81,23 km2. Os limites do Vale foram estabelecidos pelas cotas e pontos altimétricos da linha do divisor de águas do mesmo (Figura 4.6).

Figura 4.6- Região Delimitada da IP Vale dos VinhedosFonte: MAPA (2009).

Na IP Região do Cerrado Mineiro, para café, tem-se uma delimitação geográfica muito mais abrangente, onde 55 municípios delimitam a área (Figura 4.7). Apesar da grande abrangência da IG, existem alguns fatores ambientais que caracterizam essa região, como solo, clima e vegetação predominante.

Figura 4.7 - Região delimitada da IP Região do Cerrado MineiroFonte: MAPA (2009).

Page 145: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

145

CAPÍTULO 04

4.3.2 O que acontece quando as etapas de produção e do processamento são em regiões distintas?

Se o produto reconhecido pela indicação geográfica não é um produto transformado (como a maçã), certamente a delimitação deverá abranger a área de produção em que o produto apresente as características particu-lares. No caso de produtos transformados, por outro lado, não necessaria-mente a delimitação geográfica deverá abranger a área de produção, mas obrigatoriamente a zona de transformação. Não devemos desconsiderar, no entanto, que a qualidade da matéria-prima seguramente influenciará no resultado final, ou seja, na qualidade do produto transformado. Assim, é interessante considerarmos uma delimitação também de produção para produtos transformados, mesmo que essa zona (de produção) não coinci-da com a zona de transformação.

Para registro de uma IG, é necessário listar as diferentes operações que serão realizadas em uma área geográfica delimitada (origem da maté-ria-prima, diferentes etapas de produção, transformação, elaboração). Algumas IG podem registrar várias áreas oficialmente delimitadas: uma para a produção e outra para a transformação. Podem, ainda, registrar somente a área delimitada da etapa que é a responsável pela especificidade do produto.

No seu regulamento de uso, a IP Paraty define uma área delimitada de produção de cana-de-açúcar e elaboração da cachaça ao redor da cidade de Paraty (RJ). Porém, ela assinala que parte da matéria-prima (cana-de-açúcar) pode provir do exterior da área de fabricação da cachaça (apro-ximadamente 40-50%), principalmente, do Estado de São Paulo. Outra opção poderia ser uma proposta de duas áreas, uma área delimitada de elaboração da cachaça em Paraty, e outra área de produção de cana-de-açúcar no Estado de São Paulo.

Para uma melhor compreensão apresentamos dois exemplos de delimita-ção geográfica da área localizados na França:

a. Presunto•de•Bayonne•(IGP•–•EU•–•França):

A origem da denominação do presunto vem do lugar de sua comercializa-ção, pois através do porto de Bayonne os presuntos eram expedidos para o exterior. Na realidade, o presunto “de Bayonne” é o produto de uma região situada entre o mar e a montanha, à beira do Atlântico e aos pés dos “Pyrénées Atlantiques” (Bacia do Rio Adour) (Figura 4.8). As condições

Page 146: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

146

geológicas e climáticas são particularmente propícias aos procedimentos para salgar o presunto, devido à alternância de tempo seco sob efeito do vento do sul e umidade proveniente do Oceano Atlântico, que induz uma desidratação e uma reumidificação do presunto. Essa IGP apresenta três áreas delimitadas: a área de elaboração dos presuntos responsáveis pela especificidade do produto, a área dos frigoríficos e a área de criação de suínos.

Figura 4.8 – áreas delimitadas para a IGP Presunto de BayonneFonte: http://www.jambon-de-bayonne.com – Acesso realizado em: 29 jul. 2009.

b. Mariscos•de•Bouchot•(IGP•–•EU•–•França):•

A área geográfica delimitada de produção dos mariscos compreende uma área de criação (no mar) e uma área de preparação e embalagem (no con-tinente). A área de criação dos mariscos se localiza na baía do Mont Saint Michel, situada ao sul de uma linha imaginária (alinhamento da torre de uma igreja e de uma formação rochosa extraordinária) e a oeste do limite da região (limite administrativo). A área de preparação e de embalagem dos mariscos se estende sobre sete municípios costeiros.

Page 147: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

147

CAPÍTULO 04

Visite os sites da IGP e DOP da França e de Portugal e analise as áreas delimitadas para alguns produtos:

http://www.inao.gouv.fr/public/home.php?pageFromIndex=textesPages/Bibliographie395.php~mnu=395

http://ptqc.drapc.min-agricultura.pt/documentos/cartogramas.htm

Acesso realizado em: 24 jul. 2009.

4.3.3 A delimitação da área: um procedimento por critérios

Quando imaginamos delimitar uma área geográfica, com frequência nos deparamos ou referimos às condições pedoclimáticas (solo, clima) ou na-turais. No entanto, quando verificamos como isso ocorreu em diferentes países, principalmente da União Européia, observamos que os elementos econômicos e políticos foram os preponderantes para a primeira avaliação da área desejada. Os critérios econômicos se referem à realidade atual ou histórica da produção.

Retornando a IP Paraty, salientamos que para delimitar a área de produ-ção, os produtores e os representantes das instituições podiam confirmar a desconexão entre a área de elaboração da cachaça e a região da produ-ção de cana de açúcar. Entretanto, eles decidiram delimitar uma só área de produção e de transformação (Paraty), visando favorecer, num prazo de três anos (2010), os pequenos produtores de cana presentes na região. Isso foi uma opção política em favor de um desenvolvimento local. O volume de produção de cana de açúcar ainda é insuficiente para responder à de-manda dos alambiques, mas o regulamento prevê uma autorização para o aprovisionamento fora da área delimitada.

Para uma discussão mais aprofundada de métodos e critérios operacio-nais para a delimitação da área geográfica, nós apresentamos abaixo seis critérios a serem identificados e ponderados, com base em uma pesquisa coletiva realizada por professores e pesquisadores franceses que participa-ram de um projeto financiado pela região Rhône-Alpes (França), a partir da análise de várias IGP existentes na França e na Europa.8 Os seis critérios, relacionados a produtos in natura ou transformados, são:

1. A origem•das•matérias-primas, considerando os fatores ecoló-gicos (elementos naturais, clima, solo, relevo, exposição ao sol, etc.) que compõem estes territórios. E vale a pena aqui ressaltar que alguns desses fatores podem ser modificados pelo homem

Page 148: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

148

(pastagens, solo, etc), outros não. Para os produtos transforma-dos (ou processados), os fatores ecológicos e a origem da ma-téria-prima devem ser levados em conta na delimitação, pois a qualidade das matérias-primas influencia de forma significativa nas características finais do produto transformado.

2. Os conhecimentos•locais (savoir-faire), que estabelecem os mo-dos de produção e/ou consumo do produto e destacam sua es-pecificidade.

3. A realidade• econômica• atual, isto é, identificar e mensurar a presença dos produtores, o volume e a escala de produção, a existência de especialização no interior das empresas, etc.

4. A realidade•econômica•histórica, retomando a localização dos primeiros produtores. O critério histórico é mobilizado em al-guns casos de forma a permitir e/ou argumentar a inserção de um território (na delimitação) que aparentemente não está sen-do considerado, como por exemplo, o caso de uma região que contribuiu para a construção da notoriedade, mas que atualmen-te não produz mais.

5. A existência•de•um•zoneamento•anterior (zona de proteção, unidades de conservação, parques nacionais, zona de perímetros irrigados, delimitação administrativa) utilizando o mesmo nome geográfico ou aproximado, e que precisa ser levado em conta na reflexão.

6. A reputação é um critério difícil de mobilizar para a delimitação geográfica da área. Os estudos de notoriedade utilizados no setor de promoção se restringem a verificar se o nome é conhecido (ver Capítulo 3), mas não identificam os limites de uma área.

Para conhecer em detalhe esse trabalho, acesse o texto do relatório final do projeto.

http://publication.isara.fr/IMG/pdf/rapport_final_IGP.pdf

Acesso realizado em: 24 jul. 2009.

Page 149: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

149

CAPÍTULO 04

A delimitação geográfica da área deve ser a mais precisa possível e para isso ela se baseia em critérios objetivos. Nesse exercício, não se trata ape-nas de delimitar uma área, mas sim de ser capaz de argumentar e explicar o porquê dessa delimitação, devendo isso ser feito de maneira satisfatória com uma avaliação ponderada dos vários critérios presentes. Esses crité-rios são os fatores naturais, os saberes locais, importância econômica atual e histórica, e a presença de zona prévia. 9

A combinação desses critérios na delimitação geográfica da área depende do produto e do seu nível de elaboração (in natura ou processado), de sua natureza (animal ou vegetal), das condições de produção e dos objetivos dos agentes locais.

Se os agentes privilegiam o desenvolvimento local ou a preservação dos recursos locais (caso das IG Paraty e Pampa Gaúcho da Campanha Meridional), a origem da matéria-prima e os fatores ecológicos serão de-terminantes.

Quando a dimensão cultural é base da reputação do produto (por exem-plo: o acarajé de Salvador - BA), os saberes locais, entendidos como o sa-ber fazer (savoir-faire) e a realidade histórica do produto, poderão ser colo-cados em primeiro plano.

Para uma DO é preciso realizar estudos mais aprofundados para demons-trar se as características e as qualidades do produto se devem exclusiva-mente ou essencialmente ao meio geográfico de origem, incluindo fatores naturais e humanos. A delimitação se baseia, então, nessas demonstra-ções.

No caso do arroz produzido no litoral norte do Rio Grande do Sul (DO com solicitação de registro no INPI), estudos demonstraram que o cli-ma é o principal responsável por um produto mais solto, translúcido e de maior rendimento. O vento constante e a presença de grande quantida-de de água na região, devido à proximidade com a Lagoa dos Patos e o Oceano Atlântico, são os fatores que criam um clima com temperaturas estáveis e ideais para o cultivo do arroz, ou seja, entre 20 e 25°C no verão. A área delimitada se localiza em uma faixa de terra entre o mar e a Lagoa dos Patos.10

Page 150: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

150

4.3.4 A delimitação da área: uma abordagem pela “área coração”

Outro método também pode ser mobilizado ou complementar ao méto-do dos seis critérios acima apresentados. Ele parte do princípio que, para alguns produtos, a área de produção pode ser dividida em três áreas en-tremeadas11:

• “área coração” cujo direito de pertencer à área é imediatamente ad-quirido porque 100% dos produtos apresentam características ho-mogêneas específicas;

• “fora da área”, região onde não se encontra mais a característica específica do produto;

• “área intermediária” entre a “área coração” e a região “fora da área”. É nessa região intermediária que os estudos e pesquisas com-plementares deverão se focalizar para uma delimitação precisa.

Para isso, geralmente é necessário visitar e fazer as pesquisas e entrevistas nessa área intermediária, para aprimorar os critérios e afinar os contornos da área (taxa mínima de produtos apresentando as características encon-tradas na “área coração”, importância econômica, histórica ou atual).

Esse método é utilizado para a delimitação geográfica de áreas de produ-ção de frutos, em regiões onde a influência climática e a altitude são bem determinantes.12 São exemplos onde esse método pode ser utilizado os ca-sos da maçã Reineta Del Bierzo na Espanha, da maçã do Limousin na França e da maçã Fuji de São Joaquim em Santa Catarina – Brasil.

4.3.5 Existem limites no tamanho da área delimitada de produção?

Não existem limites, a priori, para a dimensão de uma área a ser delimi-tada desde que ela apresente características homogêneas e possua uma reputação. Entretanto, grandes áreas acarretam problemas logísticos e ne-cessitam uma organização descentralizada de gestão e de controle, como foi feito pelo Conselho de Associações de Cafeicultores e Cooperativas do Cerrado (CACCER) na IP Região do Cerrado Mineiro.

Constatamos uma grande diferença entre as quatro primeiras IP brasilei-ras, conforme mostra a Tabela 4.3.

Page 151: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

151

CAPÍTULO 04

Áreas delimitadas para as quatro primeiras IG brasileiras.

Produto Vinhos - RS Café - MG Carne – RS Cachaça – RJ

IPVale dos Vinhedos

Região Cerrado Mineiro

Pampa

Gaúcho da Campanha Meridional

Paraty

Município3 municípios da Serra Gaucha

55 municípios da região do Cerrado Mineiro

13 municípios do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional do RS

1 município do RJ

Dimensão da área

81 123 km2

8 112,38 Ha

122 289,56 km2

11 228 956 Ha

12 935 km2

1 293 600 Há2 Km2

Tabela 4.3 - Fonte: MASCARENHAS (2008)13

Outros métodos e critérios de delimitação geográfica da área ainda de-verão surgir para abranger toda especificidade do Brasil, que é um país riquíssimo em produtos típicos, com uma diversidade étnica, cultural, gastronômica, biológica, paisagística, muito grande (regiões agrícolas imensas, floresta Amazônica, presença de comunidades distintas, biodi-versidade, etc.).

Atualmente, a delimitação geográfica de área de produção, transformação e elaboração em regiões da Amazônia torna-se um verdadeiro desafio me-todológico. Como delimitar uma área de produção em regiões de grande extensão de terra, coma a floresta Amazônica?

Segundo Tonietto, “[...] se a ideia é valorizar o açaí de uma grande região, pode ser que se encontre uma justificativa por aí, mas isso não impede que se façam outras delimitações menores, quando houver caracteres que di-ferenciem uma região produtora de outra”, ou seja, um mesmo produto pode ter inúmeras indicações geográficas”.14

4.3.6 O papel da pesquisa: quem faz o que na delimitação?

A condução de pesquisas e estudos científicos justifica a participação de professores universitários, pesquisadores e estudantes que realizam teses, dissertações e trabalhos científicos relacionados com o tema. A presença

Page 152: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

152

de equipes multidisciplinares favorece as trocas e a construção social da qualidade do produto. Os estudos que podem ser realizados no âmbito da implantação de uma IG abrangem vários setores, como por exemplo:

• Estudo histórico;

• Estudos dos fatores ambientais (clima, solo, vegetação, etc.);

• Análise da percepção da tipicidade e qualidade do produto pelos agentes;

• Estudo e apoio à organização;

Os estudos históricos e naturais (clima, solo, variedade) realizados para a PROGOETHE, por um grupo de professores e pesquisadores (EPAGRI, UFSC, SEBRAE) demonstraram que a área delimitada “Vales da Uva Goethe” apresenta 458,9 Km2 nos municípios de Urussanga, Pedras Grandes, Cocal do Sul, Morro da Fumaça e Treze de Maio, com limi-tes nos vales formados pelas sub-bacias dos rios: América, Caeté, Cocal, Carvão e Maior que são afluentes do rio Urussanga e o vale principal desse mesmo rio. Acrescidas das sub-bacias dos rios Lajeado, Molha, Armazém e Azambuja que fazem parte da bacia do rio Tubarão (Figura 4.9).

Figura 4.9 - Limites estabelecidos através das sub-bacias na delimitação geográfica dos “Vales da Uva Goethe”.Fonte: relatório projeto PROGOETHE (2008)

Page 153: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

153

CAPÍTULO 04

Essa região do sul de Santa Catarina, a partir de sua colonização no final do século XIX, está intimamente ligada à cultura e tradição italiana na pro-dução da uva e vinho Goethe (savoir-faire ou fator humano), apresentando solos e condições climáticas distintas (fatores naturais).

Esse território, encravado entre o mar e as montanhas, apresenta um di-ferencial de gradientes térmicos. Durante o dia, devido à incidência de radiação solar, ocorre o aquecimento das montanhas. Este aquecimento provoca um gradiente de pressão e faz com que os ventos se desloquem montanhas acima.

Estes ventos se elevam e passam sobre a linha do cume, que no caso da área delimitada “Vales da Uva Goethe” chegam a alturas ou altitudes de 1800 metros, e alimentam uma corrente superior de retorno para com-pensar os ventos dos vales e encostas. À noite, o gradiente de pressão é invertido. A região do planalto resfria-se muito rapidamente pela perda de energia. O ar frio e denso se desloca vertente abaixo para a região dos Vales da Uva Goethe (Figura 4.10).

Figura 4.10 - Esquema do perfil do relevo no sentido leste-oeste e da circulação diurna e noturna da atmosfera na área geográfica “Vales da Uva Goethe”.Fonte: relatório projeto PROGOETHE (2008)

A área de produção da variedade Goethe, delimitação geográfica “Vales da Uva Goethe”, apresenta uma identidade climática influenciada pela “at-mosfera” do Oceano Atlântico, com temperaturas altas no verão e massas de ar frio que vêm do Planalto com temperaturas negativas no inverno. Considerando essas condições (latitude, proximidade mar e montanhas),

Page 154: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

154

constata-se que este território apresenta condições únicas e identidade cli-mática diferente de outras do Brasil e do mundo.

Para saber mais sobre a PROGOETHE verifique os links:

www.progoethe.com.br

www.pos.ufsc.br/arquivos/41000382/diversos/Carolina.pdf

Acesso realizado em: 24 jul. 2009.

O conjunto de todos os estudos são instrumentos ou ferramentas para ajudar os agentes locais na tomada de decisões. Entretanto, convém sa-lientar que os técnicos devem auxiliar a associação sem impor uma visão determinante.

É importante salientar que, embora se tenha verificado que fatores histó-ricos, políticos, econômicos, edafoclimáticos e sociais se conjugam para delimitar a área geográfica, faz-se necessário que seja mantido da melhor forma possível o equilíbrio entre estes fatores. É o seu conjunto, a harmo-nia de sua observação, que auxiliarão na mais adequada delimitação da área geográfica que servirá como base para uma IP ou uma DO.

Para conhecer mais sobre IG em produtos da região da Amazônia, suge-rimos as seguintes leituras:

GIUNCHETTI, C.S. Indicações Geográficas: uma abordagem pragmática acerca de sua apropriação por comunidades tradicionais da Amazônia. In: CARVALHO, P. L. Propriedade Intelectual. Curitiba: Juruá, 2006. p. 391-420.

LIMA, F.D.; GIESBRECHT, H.O.; LIMA, S.U. Indicação Geográfica: agregação de valor aos produtos amazônicos. T&C Amazônia, Ano V, Número 11, Junho de 2007.

Quais aspectos (fatores naturais, fatores humanos, história, cultura) de-vem ser considerados e analisados para se realizar a delimitação geográ-fica de uma IG?

Não deixe de participar deste Fórum de Conteúdo, a sua opinião é extre-mamente importante para esta discussão.

i

Page 155: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

155

CAPÍTULO 04

Resumo A delimitação geográfica da área para uma IG (IP ou DO) deve ser respal-dada por argumentos técnicos, devendo considerar-se sempre o levanta-mento histórico-cultural e os fatores naturais presentes na região.

Esses estudos deverão exprimir as relações sociais de produção, transfor-mação e elaboração do produto, bem como da prestação do serviço, tan-to entre os agentes situados no interior da área geográfica, quanto entre aqueles que estão fora da área. É o conjunto dessas relações que convêm elucidar e articular para se chegar à delimitação desejada.

A delimitação geográfica da área para uma IG deve ser a mais precisa pos-sível e para isso se baseia em critérios objetivos e justos. Trata-se de um trabalho que exige profissionais com conhecimentos históricos e técnicos, mas com poderes limitados, pois não devem substituir os agentes locais na delimitação da área.

Os agentes locais são fundamentais tanto para resgatar a história e a cultu-ra da região, quanto para se estabelecer a região delimitada, não devendo este trabalho ser completamente relegado a terceiros.

Por fim, ressalta-se que os fatores históricos, políticos, econômicos, edafo-climáticos e sociais devem se conjugar de forma harmônica e equilibrada para delimitar a área geográfica, pois é a observação destes princípios que auxiliarão na mais adequada delimitação geográfica da área que servirá como base para uma IP ou uma DO.

Page 156: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

156

Notas1. BERARD e MARCHENAY, 2004.

2. Fotografias que fortalecem a comprovação da história. À esquer-da, por exemplo, tem-se uma foto de documentos que compro-vam a existência de uma pessoa chave na história da uva Goethe na região de Urussanga. À direita, uma foto antiga mostrando como a viticultura era presente no Vale dos Vinhedos. Pode-se verificar que a colheita é manual, envolvendo vários “colonos” e empregados (trabalho coletivo) e a paisagem evidencia a presen-ça de vários vinhedos.

3. VELLOSO, 2008

4. BÉRARD e MARCHENAY, 2004.

5. À esquerda: monumento em homenagem ao pesquisador que contribuiu amplamente para o desenvolvimento da maçã na re-gião. À direita: boneco de neve e compõem o cenário central da cidade de São Joaquim-SC.

6. CORMIER SALEM & ROUSSEL, 2005.

7. TONIETTO, 2007.

8. BÉRARD et al., 2001.

9. BÉRARD et al., 2001.

10. NABINGER, 2008.

11. PILLEBOUE, 2008.

12. MARQUIS, 2006.

13. MASCARENHAS, 2008

14. MORAIS, 2009.

Page 157: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade
Page 158: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade
Page 159: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade
Page 160: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

160

Elaboração de Regulamento de Uso,Conselho Regulador e Definição do Controle

Neste•capítulo,•estudaremos•como•definir•as•normas•e•os•métodos• de• produção,• transformação• e/ou• de• comercia-lização•do•produto•a•ser•inserido•no•regulamento•de•uso.•Veremos•quais•tipos•de•normas•podem•ser•descritas,•quais•etapas•e•elementos•que•garantem•as•características•espe-cíficas• do• produto.• A• partir• de• exemplos• e• de• situações•concretas,•identificaremos•as•principais•dificuldades•desta•etapa.•Estudaremos•sugestões•de•como•estabelecer•um•dis-positivo•de•controle.•A•definição•das•normas•de•produção•exige•a•implantação•de•um•plano•de•controle•confiável.•O•papel•da•associação•é•de•participar•de•sua•avaliação•através•do•estabelecimento••um•dispositivo•de•controle.•Isso•passa•pela•criação•de•um•“conselho•regulador”.•

Page 161: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

161

CAPÍTULO 05

5.1 A definição das regras de obtenção do produto

A partir de agora vamos estudar como definir as normas de obtenção de um produto no regulamento de uso. Cabe desde já lembrarmos que o registro de uma Indicação Geográfica é uma prática voluntária e coletiva. Portanto, nos parece relevante salientar a importância de distinguir as regras que são do domínio da qualidade genérica e obrigatória e as regras mais específicas, elaboradas no estabelecimento do regulamento de uso do nome geográfico.

5.1.1 A definição das normas: uma etapa imprescindível?

O sucesso de uma Indicação Geográfica está fundamentado na sua legiti-midade e na sua credibilidade.

Legitimidade: o requerente deve demonstrar que sua demanda é justifi-cada. Ela se baseia na demonstração (comprovação) da existência de uma ligação entre o produto e a origem geográfica e/ou na demonstração de que a região possui uma notoriedade, que se tornou conhecida por aquele produto. Para ser legítima, a iniciativa deve também partir de uma organi-zação representativa do conjunto dos produtores do território.

A credibilidade está baseada na capacidade de uma área geográfica e de seus representantes fornecerem um produto com uma tipicidade e quali-dade constantes para o consumidor.

A organização deve, então, definir normas coletivas sobre as condições de obtenção e manutenção das características particulares do produto, colo-cá-las em funcionamento e participar de sua avaliação através da implan-tação de um órgão de controle, definindo um plano de controle preciso.

As normas de produção são uma etapa chave no processo de implemen-tação de uma indicação geográfica. Elas devem ser claramente descritas e passíveis de ser objeto de controle; elas são o resultado de acordos coleti-vos entre os membros da região e da cadeia produtiva (representado pela entidade requerente).

Page 162: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

162

5.1.2 Quais são as normas que entram no regulamento de uso?

No Capítulo 6, vimos quais são os requisitos para o pedido de registro de uma indicação geográfica junto ao órgão competente (o INPI), seja ela IP ou DO. O regulamento de uso da indicação geográfica é um dos docu-mentos que deverão estar anexados ao pedido, segundo as condições que o INPI estabelece através da Resolução n°075/2000.

A legislação em si não estabelece minimamente os requisitos ou o que deve conter ou não um regulamento de uso, mas, através das próprias definições de IP e DO que ela apresenta, temos “dicas” sobre o que deve constar nele. O regulamento de uso, na verdade, servirá para o contro-le dos produtores (ou servidores) sobre a qualidade de seu produto (ou serviço). O que (quais os fatores), para cada caso, promove a qualidade desejada (reconhecida pela IG) no produto? Essa é a pergunta norteadora para a construção de um regulamento de uso, que deverá ser definido pe-las pessoas envolvidas no processo produtivo (produtores, consumidores, pesquisadores, etc.).

Assim, partimos para as normas que devem entrar no regulamento de uso. Salientamos a importância de considerar duas noções de qualidade: genérica e especifica.

5.1.3 A necessidade de distinguir dois níveis de qualidade: genérica e específica

Mas o que significa qualidade genérica e qualidade específica? A qualidade dos alimentos é um conceito amplo, relacionado às necessidades e às ex-pectativas dos consumidores, que contém diferentes dimensões: sanitária (inocuidade), nutricional, praticidade, preservação do ambiente, as tradi-ções, sociais e éticas, o bem-estar animal e assim por diante.

Propõe-se, então, a distinção de duas categorias de qualidade: a qualidade genérica e a qualidade específica.

• A qualidade• genérica é o padrão mínimo de qualidade que um produto deve apresentar para ser comercializado no mercado. Tem, portanto, um caráter normativo, os governos devem garantir a se-gurança, saúde e informação do consumidor. A qualidade genérica é obrigatória e se refere no que diz respeito às legislações e regula-mentações em vigor: aspectos nutricionais, sanitários, ambientais, sociais (lei trabalhista).

Page 163: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

163

CAPÍTULO 05

• A qualidade•específica•difere da qualidade genérica pelo seu caráter voluntário. Ela concerne a produtos que estão dentro das normas obrigatórias e que apresentam características específicas que podem ser relacionadas à sua composição, aos seus métodos de produção, transformação e comercialização. Essas características podem se re-ferir às expectativas sociais crescentes, como a preservação do meio ambiente, o comércio justo e a promoção do patrimônio. Também pode corresponder à valorização de práticas tradicionais ou de re-cursos de um território particular.

Neste capitulo, não se pretende discutir as questões das regulamentações sanitárias, ambientais ou trabalhistas, que são do domínio do padrão míni-mo exigido (qualidade genérica). Isso quer dizer que os regulamentos rela-cionados à produção, circulação e comercialização dos produtos (MAPA), qualidade sanitária (ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária - Ministério da Saúde), exigências ambientais e exigências trabalhistas de-vem ser respeitadas pelo requerente da IG independentemente de constar no regulamento de uso, por se tratar de uma norma obrigatória a todos os produtos comercializados no Brasil. Portanto, o regulamento de uso não aborda as exigências citadas acima, pois entende que elas foram con-sideradas.

A qualidade genérica refere-se ao padrão mínimo (legislação), é obriga-tória para todos os produtos e não constitui um fator de diferenciação. A qualidade especifica é complementar à qualidade genérica, não é obriga-tória (iniciativa voluntária). Ela é identificada através de selos de qualida-de oficiais ou privados, e representa um instrumento de diferenciação no mercado.

Estas regulamentações devem ser obedecidas independentemente de ha-ver ou não uma IG. Observe na Tabela 5.1 a diferença entre a qualidade genérica e específica para o caso do queijo serrano de Bom Jesus da Serra (RS) no Sul do Brasil.

Page 164: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

164

Diferença entre qualidade genérica e qualidade específica no queijo serrano

Tabela 5.1- Fonte: Cerdan (2009)

O respeito ao regulamento de uso de um produto IG não libera os pro-dutores a cumprir as regras mínimas exigidas pelos órgãos responsáveis. Também o regulamento de uso de uma IG não pode ser apenas um re-sumo ou uma enumeração das legislações em vigor. O respeito às regras exigidas pela legislação federal, estadual ou municipal é obrigatório e não constitui um diferencial.

Resumindo, uma parte do regulamento de uso é consagrada à descrição dos métodos de obtenção do produto. As normas que entram no regu-lamento de uso dizem respeito às etapas e elementos que garantem as características específicas do produto final.

Qualidade genérica

Queijo serrano

Qualidade específica

IG queijo serrano de Bom Jesus da Serra (RS).

Origem das normas Estado Grupo de produtores, iniciativas voluntárias

ObrigatoriedadeObrigatório para todos os produ-tores de queijo

Obrigatório para os produtores de Bom Jesus da Serra que querem ven-der o seu produto com IG

Normas

Legislações sanitárias

Legislações trabalhistas

Legislações ambientais

Normas de produção

Regulamento de uso definido pelos produtores e registrado no INPI

Exemplo: produzir o leite e o queijo na área delimitada

Respeitar as normas

Tipo de controle Controle Federal, Estadual e Municipal

Controle interno (conselho regulador) e/ou externo (certificadora)

Informação ao consumi-dor Selos de qualidade

Etiqueta informando empresa, ingredientes, data de fabricação, validade

Representação gráfica (selo IG)

Page 165: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

165

CAPÍTULO 05

No Rio Grande do Sul, no Pampa Gaúcho da Campanha Meridional, está comprovada e reconhecida que a carne bovina é de boa qualidade. Os produtores afirmam que essa qualidade está relacionada à raça do animal (de origem britânica) e de uma alimentação nos campos. Eles precisam definir normas que regulamentam esses dois aspectos: só vão admitir os animais de raças britânicas e vão exigir uma alimentação a pastos na área delimitada.

Exemplo 1:

Extraído do regulamento de uso da IP Pampa Gaúcho da Campanha Meridional:

Artigo 6º – Raças autorizadas

O gado apto para fornecer carne com destino a Indicação de Procedência “Pampa Gaúcho da Campanha Meridional” procede, única e exclusivamente, das raças Angus•e•Hereford ou de cruzas entre elas. A definição destas raças para a correta identificação dos animais está no documento técnico 01, formulado pelas associações das raças ANGUS e HEREFORD.

Artigo 7º – Alimentação autorizada:

A alimentação dos animais amparados por esta indicação geográfica se realiza basicamente em pastagens•nativas e pastagens•nativas•melhoradas, podendo também ser terminada em pastagens culti-vadas de inverno, nativas ou exóticas, em regime extensivo. Os ani-mais devem permanecer livres todo o ano [....].1

Exemplo 2:

Extraído do regulamento de uso da IP Vale dos Vinhedos

Artigo 2º – Cultivares Autorizadas

São autorizadas para a IP Vale dos Vinhedos exclusivamente cultiva-res de Vitis vinífera de acordo com a relação abaixo:

- Cultivares•tintas: Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc, Merlot, Tannat, Pinot Noir, Gamay, Pinotage, Alicante Bouschet, Ancelotta e Egiodola;

- Cultivares• brancas: Chardonnay, Riesling Itálico, Sauvignon

Page 166: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

166

Blanc, Sémillon, Trebbiano, Pinot Blanc, Gewurztraminer, Flora, Prosecco, Moscattos e Malvasias.

Visando o aprimoramento qualitativo da vitivinicultura, o Conselho Regulador da IP Vale dos Vinhedos pode autorizar, em caráter ex-perimental, a inclusão de outros cultivares Vitis vinifera L. não rela-cionadas acima, desde que apresentem potencialidade agronômica e enológica comprovada para a IP.2

Consultar, na biblioteca virtual, os regulamentos de uso das IP Pampa Gaúcho (carne fresca) e do Vale dos Vinhedos (vinhos).

5.1.4 Definição das normas de uma IG: uma construção coletiva pelos agentes locais

Nos processos de certificação, como da produção orgânica ou do comér-cio justo, as normas são, a priori, definidas e regulamentadas, seja por or-ganismos particulares (fair trade, associação Ecovida), seja por organismos públicos (Lei n°10.831/2003 sobre os produtos orgânicos). Os produtores que desejam aderir a esses processos devem adaptar seu modo de produ-ção para respeitar as normas exigidas.

No caso das IG, as regras, a priori, não existem (exceto, bem entendido, as exigências mínimas necessárias que falamos anteriormente).

Elas são construídas caso a caso, para cada produto, pelos agentes locais. Trata-se, então, de uma construção local e coletiva, reunindo pessoas que geralmente se conhecem bem: vizinhos, familiares, consumidores e pro-dutores, muitas vezes concorrentes no mercado. Em seguida, esse regula-mento será aprovado e reconhecido oficialmente pelo Estado, através do procedimento de registro do INPI.

A definição das normas pelos agentes locais é uma construção coletiva que exige discussão e avaliação por parte de todos. Não se faz de um dia para o outro. Para chegar a normas precisas, claras e transparentes, suge-re-se quatro (4) etapas como importantes, conforme mostra a Tabela 5.2:

Page 167: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

167

CAPÍTULO 05

Sugestão para a construção coletiva de um Regulamento de Uso

Etapa 1Descrever as principais características do produto, destacan-do suas características específicas.

Etapa 2Identificar todos os agentes locais que têm um papel na produção, elaboração e comercialização do produto e/ou um impacto sobre a qualidade ou as características do produto.

Etapa 3

Determinar a importância (hierarquia) de cada atividade conduzida pelos agentes em relação à qualidade do produto. Normatizar essas diferentes operações: redigir as práticas e as regras.

Etapa 4Propor um plano de controle, agregando outros pontos de controle se necessário.

Tabela 5.2 - Fonte: Cerdan (2009)

O processo de definição das regras parte de um resultado (um produto com características particulares) e procura definir os métodos que permi-tem obter esse resultado. Haverá, então, para os produtores, obrigações do como fazer (meio) e obrigações de resultado final (produto apresen-tando o mínimo de características requisitadas - teor em açúcar, acidez, pH, etc.).

• Etapa 1: Descrever o produto e suas principais características

De acordo com a Resolução nº 75/2000 do INPI, a descrição do produto e de suas características específicas deve constar no regulamento de uso. A descrição deve mostrar as características do produto, permitindo distin-gui-lo objetivamente de outros de mesma categoria. Trata-se de ressaltar a especificidade dos produtos. Para apresentar essa especificidade, podemos recorrer a parâmetros de natureza diferentes (Tabela 5.3)

Page 168: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

168

Principais parâmetros para a descrição do produto.

Tabela 5.3 - Fonte: Cerdan (2009)

A descrição do produto requer uma atenção particular para se tentar ex-plicar a origem dessas características (fatores naturais e humanos). Uma vez identificada uma característica (uma diferença comparando com o produto genérico), os agentes locais devem, então, procurar identificar as razões dessa diferença, a influência do ambiente e dos fatores naturais, a influência do saber fazer, da história. As sessões de degustação coletiva podem contribuir para identificar essas características e para formalizar os laços entre o gosto local e a origem.3

Parâmetros Exemplo

Físico e químico

Granulação (farinha de mandioca)

Teor de açúcar, pH, acidez (frutas)

Antocianinas e taninos (vinho, café)

Organoléptico

Cor

Sabor

Textura, maciez

Odor

Microbiológico Presença de levedura e fungos específi-cos

Cultivar, raça

Cultivar (para uva: Cabernet Sauvignon, Goethe) (para maçã: Fuji, Gala)

Raça animal (Angus, Hereford, Crioulo Lageano)

Nível de elaboração Prensado, curado, fresco (queijo)

Verde, torrado, moído (café)

Forma de apresentação do produto Embalado, em saco, engarrafado, em caixa

Tipo de categoria, quando existe (fruta)

Categoria I, II, III, calibre 100, 120 (maçã)

Ausência de resíduos Antibiótico (carne, leite queijo); Produtos químicos e agrotóxicos (vinho, café, leite queijo); Água (cachaça, leite)

Page 169: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

169

CAPÍTULO 05

Para a Denominação de Origem, deverá ser demonstrado em que os fato-res naturais e humanos da área geográfica delimitada contribuem para a especificidade: qualidade ou características específicas.

Veja quatro exemplos (2 brasileiros, 2 europeus) da apresentação das ca-racterísticas dos produtos das seguintes IG:

Exemplo 1:

Apresentação das características da Carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional:

Artigo 19 - Características do produto:

As características da carne depois do abate são:

Animais até 24 meses: Cor vermelha rosada com gordura branca, textura fina.

Animais de 24 a 42 meses: Cor vermelha rosada com gordura de coloração cremosa e textura fina.

A carne com acabamento recomendado possui moderado marmo-reio intramuscular.4

Exemplo 2:

Apresentação das características dos Vinhos do Vale dos Vinhedos:

Artigo 7º - Padrões de Identidade e Qualidade Química dos Produtos

Quanto às suas características químicas, os produtos da IP Vale dos Vinhedos deverão atender ao estabelecido na legislação brasileira quanto aos padrões de identidade e qualidade do vinho. De forma complementar, visando garantir melhor padrão de qualidade para os produtos amparados pela IP Vale dos Vinhedos, os mesmos de-verão atender padrões•analíticos•máximos a seguir especificados:

- quanto à acidez•volátil, expresso em meq/l:·

- limite máximo para todos os produtos: 15 meq/l;

- quanto ao anidrido•sulfuroso•total, expresso em g/l:

- limite máximo para o vinho branco seco e vinho rosado seco: 0,15g/l;

Page 170: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

170

- limite máximo para o vinho tinto seco: 0,13g/l;

- limite máximo para o vinho leve, vinho espumante natural, vi-nho moscatel espumante e vinho licoroso: 0,20g/l.5

Exemplo 3:

Veja um exemplo de Apresentação de um produto em Portugal:

A criação de suínos da raça Bísara ocorre em todo o Norte de Portugal e, em particular, em áreas bastante desfavorecidas de Trás-os-Montes. Em Vinhais é maior a incidência da criação destes animais e os produtores se organizaram para reconhecer Alheira de Vinhais como IGP.

A Alheira de Vinhais é um enchido tradicional fumado, obtido a partir de carne de porco de raça Bísara ou do seu cruzamento desde que com 50% de sangue Bísaro [animais F1, resultantes do cruza-mento de animais da raça Bísara em linha pura, inscritos no Livro genealógico, com animais de outras raças], carne de aves (usada basicamente só para a preparação da calda), pão regional de trigo e azeite de Trás-os-Montes DOP, condimentados com sal, alho e colorau.6

Exemplo 4:

Veja Apresentação das características da maçã do Limousin (DOP) – França:

A Maçã do Limousin é uma maçã fresca que se caracteriza por:

• uma forma ligeiramente alongada, com olho e cavidade ocular bem marcada,

• um calibre mínimo de 65 mm,

• uma polpa branca e firme, textura crocante, com suco e não fari-nhenta,

• um gosto equilibrado açúcar/acidez

Ela é produzida a partir da variedade « Golden delicious ».

A Maçã do Limousin apresenta um índice refratométrico pelo me-nos igual a 12,5° Brix, firmeza pelo menos igual a 5Kg/cm² e aci-dez pelo menos igual a 3,7g/l de ácido málico.7

Page 171: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

171

CAPÍTULO 05

No início, as características de um produto particular não são necessaria-mente formalizadas pelos diferentes agentes locais. As percepções podem mesmo variar de um produtor para outro, assim como as razões dessas especificidades. Isso se verificou na maçã de São Joaquim8. A maioria dos agentes locais reconhece um diferencial na maçã produzida na região de São Joaquim. Os critérios diferenciadores são: a aparência da fruta (co-loração, formato, tamanho da fruta, epiderme lisa), o gosto (suculência, sabor, equilíbrio acidez/açúcar) e outros critérios (produtividade, armaze-namento...). Quando se buscam as razões dessas diferenças, destacam-se três grupos de agentes com percepções distintas: o primeiro grupo atribui maior importância para os fatores naturais; o segundo grupo menciona um equilíbrio entre os fatores naturais e humanos, já o terceiro grupo valoriza os fatores humanos. Assim, observou-se que enquanto os produ-tores justificaram a maior importância dos fatores humanos na qualidade da maçã, os técnicos abordaram mais a influência dos fatores naturais.

• Etapa 2: Identificar os agentes e as etapas que têm um papel na pro-dução, elaboração e comercialização do produto e/ou um impacto sobre a qualidade ou as características específicas do produto.

O produto passa por várias mãos. A identificação dos diferentes agentes permite rastrear o produto e identificar as etapas que estão na origem das características do produto final. Os principais serão os produtores, os transformadores e os demais agentes diretamente implicados na elabora-ção e na comercialização do produto. Em seguida, trata-se de descrever brevemente as principais atividades e práticas no processo de elaboração dos produtos.

Deve-se pensar no conjunto de atividades que estão envolvidos os produ-tores, os transformadores, mas também os fornecedores de equipamen-tos, se necessário. Se, por exemplo, a qualidade da madeira da barrica de-sempenha um papel decisivo na elaboração de um vinho, algumas regras para os fornecedores de barricas de carvalho para o vinho deveriam cons-tar no regulamento de uso daquele vinho.

Esse trabalho de identificação de quem faz, o que e como se faz pode ser feito coletivamente durante uma reunião. Ele pode ser completado por uma visita na propriedade uns dos outros, ou pela visita de um técnico nas propriedades dos diferentes membros da associação requerente.

Page 172: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

172

Essas visitas são necessárias no caso de produtos artesanais tradicionais, como o queijo, por exemplo, que são produtos antigos, com tradição e história, podendo existir uma grande diversidade de equipamentos, de métodos, de práticas.

Para outros produtos de produção mais recentes, seu desenvolvimento está geralmente ligado com a difusão de um “pacote tecnológico”, e as va-riações das práticas e saberes são mínimas (casos da maçã no sul do Brasil ou das frutas irrigadas no Nordeste).

• Etapa 3: Determinar (hierarquizar) a importância de cada atividade em relação à qualidade e à especificidade do produto e redação das regras.

Cada etapa do processo considerado como determinante deve ser bem descrita: como se faz, onde e quando. Trata-se aqui de redigir as normas, identificando os pontos a ser controlados para garantir as características do produto final.

Na descrição do processo de elaboração do produto, considera-se a va-riabilidade das práticas, sendo que algumas delas podem ser descartadas a partir de uma avaliação coletiva. Lembramos que as IG permitem uma diversidade de práticas, no limite de regras de produção definidas coletiva-mente. “Definir práticas” não significa uniformizar os produtos.

Veja apresentação dos processos de transformação do café da Colômbia (IGP) por via úmida – Colômbia:

A separação da mucilagem por fermentação é feita deixando os grãos despolpados em tanques e recipientes com água, geralmente durante 14 a 18 horas dependendo das condições de temperatura do lugar onde fica a propriedade e o beneficiamento (transformação).9

O regulamento técnico não considera o conjunto das operações unitárias e as práticas estabelecidas pelos agentes para obter o produto. Ele descre-ve unicamente as etapas ou as práticas que são essenciais para a manuten-ção das características do produto. Essas etapas devem ser coerentes com as partes do regulamento de uso que comprovam a relação da ligação com a origem.

Page 173: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

173

CAPÍTULO 05

Para melhor compreensão na descrição do processo de produção, um es-quema sintetizado das ostras na França é apresentado na Figura 5.1.

Figura 5.1 – Descrição dos métodos de produção das ostras�. Fonte: Traduzido do caderno de normas do INAO - www.inao.gouv.fr - Acesso realizado em: 27 jul. 2009.

Page 174: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

174

Em função da natureza do produto, o regulamento de uso poderá ser mais ou menos completo. Para o queijo, por exemplo, o regulamento poderá estabelecer normas para as espécies (vaca, cabra), os animais (raças), sua alimentação (ração), as condições de ordenha e de coleta do leite, as con-dições de fabricação do queijo, os modos de conservação e de embalagem.

A Tabela 5.4 resume as principais normas estabelecidas para três produtos diferentes (carne, fruta in natura, queijo).

Principais variáveis consideradas para a elaboração do regulamento de uso

Etapa (agentes)Produto animal

(carne fresca)

Produto animal processado (queijo)

Fruta in natura ou proces-sada

Implantação (produtor)Preparo do solo

Mudas (certificadas)

Produção

(produtor)

Raça

Condução do rebanho (número de cabeça, tipo e modo de repro-dução)

Controle de conformi-dade da criação (vem de fora)

Tempo de permanên-cia dos animais na área IG

Tratamentos sanitá-rios

Raça

Condução do rebanho (nú-mero, reprodução)

Tratamentos sanitários

Cultivares

Densidade, sistema de con-dução, poda

Técnicas culturais, irrigação

Rendimento

Tratamentos fitossanitários

Alimentação

do rebanho

(produtor)

Tipo de alimentação (pastagens)

Gestão das pastagens

Ração

% de alimentação produzida na área

Tipo de alimentação (pasta-gens)

Gestão das pastagens

Ração

% de alimentação produzida na área

Page 175: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

175

Abate

Colheita

(frigorífico, transportador, indústria)

Idade, peso do animal

Condições de trans-porte (bem-estar animal)

Condições de ordenha e coleta do leite

Condições de coleta

Tempo máximo entre a or-denha e a transformação

Data da colheita (°Brix, acidez, pH)

Forma de colheita (manual/ mecanizada)

Condições de transporte e de manutenção do produto

Tratamentos

Indústria ou Frigorífico

Tratamentos da carca-ça (lavagem ou não)

Tratamentos do leite (tem-peratura, equipamento)

Transformação

Indústria ou produtor (transformação caseira)

Tipo de levedura, bactérias

Equipamentos utilizados (formas, prensas, tanque, tacho)

Tempo de fermentação

Tempo de prensagem

Temperatura de cozimento

Fermentação (vinhos, su-cos, cozimento, doces)

Estocagem

Indústria ou Cooperativa ou Produtor

Câmara fria (tempe-ratura)

Tempo de conserva-ção

Maduração, tempo, tempe-ratura

Condições de estocagem, material e equipamentos

Tempo de conservação

Câmara fria

Atmosfera controlada (tem-peratura baixa e umidade relativa) e modificada (tem-peratura baixa, umidade relativa e CO2 e O2)

Tempo de conservação

Etiquetagem no fruto para evitar a mistura com outros produtos

Caixa papelão (acima de 18 quilos, os frutos podem sofrer lesões)

Condicionamento Comercialização

Indústria Distribuidor

Forma de apresen-tação

Selo, etiqueta

Forma de apresentação

Selo, etiqueta

Tipo de categoria (cat 1, calibre de 60-120).

Caixas de 18 quilos

Selo, etiqueta na fruta

Rastreabilidade

Tabela 5.4 - Fonte: Cerdan e Silva (2009), elaboração a partir da análise de regula-mento de uso de IG.

Page 176: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

176

5.1.5 Quem redige as regras, quem decide?

Numerosos técnicos, pesquisadores, representantes administrativos par-ticipam na redação do regulamento técnico, sendo que as suas contribui-ções (estudos técnicos) ajudam na decisão coletiva. Eles podem desempe-nhar, então, um papel decisivo. Entretanto, constatamos, na Europa e em outros paises, uma tendência desses técnicos quererem impor sua visão de como fazer e definir todas as regras, inclusive privilegiando a qualidade sanitária dos produtos, buscando o defeito “zero”, e esquecendo de outros elementos importantes.

No caso de queijo de coalho no Nordeste, ocorreram diferentes visões referentes às características do produto entre os diferentes agentes envol-vidos (técnicos e queijeiros).11

Outro exemplo é o queijo francês (Abondance) cujo sabor um pouco amar-go está ligado a um modo de escorrimento específico. O técnico que es-tava envolvido na descrição do produto considerou esse sabor como um defeito de fabricação e não como um elemento determinante da especifi-cidade do produto.12

O ideal é reunir as diversas visões e compor o regulamento de uso, de forma que este possa descrever os processos e o produto que mais se apro-xima da realidade tradicional da região.

5.1.6 Propor um plano de controle

A partir da definição das regras e de suas formas de avaliá-las, pode ser ela-borado um plano de controle. Certos pontos do controle não são neces-sariamente úteis para garantir as características específicas dos produtos, mas são necessários para garantir o cumprimento de outras exigências, para outras regulamentações. Precisa-se considerá-las nesta etapa.

Durante a redação das normas de produção, os agentes devem pensar em estabelecer um sistema de controle e de avaliação dos resultados. Evita-se assim propor e redigir normas “incontroláveis”, pois elas podem gerar conflitos ou suspeitas entre os agentes.

Page 177: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

177

CAPÍTULO 05

5.1.7 Principais dificuldades e desafios na elaboração das regras de produção

A definição das regras se torna um momento decisivo para a associação requerente, uma vez que ela determina, em parte, o futuro da IG. Quando se começa essa etapa, os membros da associação já se conhecem, já ti-veram tempo para construir uma visão comum sobre o produto e suas características. Entretanto, isso não impede a emergência de conflitos e de dificuldades durante o processo de definição das normas. Aqui, podemos listar algumas dessas dificuldades e suas razões:

a. Discordância• sobre• a• inserção• no• regulamento• de• uma• práti-ca• realizada• por• apenas• uma• parte• do• grupo• de• produtores. Apresentamos o exemplo de uma associação de produtores de quei-jo que deseja registrar o seu produto como IP ou DO. Todavia, os associados possuem perfis distintos, sendo que uns produzem e também vendem o leite, outros produzem o leite, mas um terceiro compra o leite e faz o queijo. Cada grupo tem um mercado dife-renciado (venda na feira, venda para cidades maiores e venda para supermercados). Na hora de definir as práticas e normas, um grupo exigia a possibilidade de congelar a coalhada para poder produzir queijo o ano todo. No entanto, outros se recusavam a inserir essa prática recente no sistema de produção em nome da autenticidade, da tradição e da notoriedade.

b. As•regras•construídas•podem•deixar•parte•dos•produtores•fora•do•processo. Uma organização de produtores, para ter um produto de excelente qualidade e para responder a um mercado exigente, pode acabar esquecendo a realidade local e o contexto de produção. Observa-se, nesses casos, o descompasso entre o que se produz e as normas de produção.

c. A•questão•da•exclusão•dos•agentes•é um tema que já foi abordado no Capítulo 3. Cabe lembrar que essas dinâmicas de exclusão po-dem surgir em vários momentos, principalmente na hora de deli-mitar a área e definir as normas de produção (quando se estabelece uma área, há pessoas que ficam dentro e pessoas que ficam fora). Por isso, não se deve considerar apenas os aspectos técnicos, mas considerar também os aspectos políticos ( jogo dos atores). A ques-tão da exclusão não considera apenas os pequenos produtores, pois as regras estabelecidas podem também excluir outros agentes, tais como empresa ou indústria.

Page 178: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

178

d. Outro•problema•está•relacionado•ao•fato•de•estarmos•trabalhan-do•com•um•patrimônio•vivo•que•evolui•no•decorrer•do•tempo. Apresentamos o exemplo do queijo de coalho de Nossa Senhora da Glória (SE) que ilustra bem essa situação. O queijo de coalho está sendo produzido no Nordeste do Brasil há mais de 100 anos. Os idosos se lembram de ter comido esse queijo quando crianças. Nos seus relatos, descrevem queijos muito secos, duros e muitos salgados (os queijos eram deixados embaixo do telhado e podiam se conservar por vários meses). Hoje, o queijo de coalho que se come nas praias ou padarias das cidades do Nordeste é bem diferen-te: ele é branco, muito fresco, muito úmido e pouco salgado. Além de Glória, existem outras regiões produzindo esse queijo que tem notoriedade e que pode pretender um reconhecimento oficial como indicação geográfica. O desafio é de definir qual é o queijo de coa-lho e as suas características, considerando sua história e sua forma atual no mercado.

e. Uma• última• dificuldade• está• ligada• à• presença• de• uma• grande•diversidade•de•produtos•(com•o•mesmo•nome)•e•de•processos•de•fabricação•e•de•práticas. Nós encontramos geralmente essas difi-culdades no caso dos produtos artesanais, que foram processados nas fazendas, na cozinha das famílias (cada uma tendo uma receita, um segredo de família). É difícil codificar esse tipo de produto sem perder a riqueza desse patrimônio. A escolha por uma ou outra das práticas se torna complicada: qual prática escolher? A mais frequen-te? Aquela que é considerada como a mais autêntica pelos agentes? Aquela que se torna mais fácil para controlar? A preferida do líder do projeto? Entre um processo único e demais processos impossí-veis de controlar, é preciso escolher. Os especialistas podem ajudar, mas no final das contas são os agentes locais que decidem.

Page 179: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

179

CAPÍTULO 05

5.2 Conselho regulador e órgão de controle

5.2.1 O que é um sistema de controle

Um sistema de controle visa verificar se as características e as condições de produção, transformação e elaboração estão de acordo com as exigências planejadas e definidas no regulamento de uso. O ato de controlar compõe-se de diferentes fases: conhecer os textos (regulamento de uso), conhecer os fatos e as práticas, avaliar e aprovar ou recusar (propor ações correti-vas). Distinguem-se três formas de conduzir um controle: o autocontrole, o sistema de controle interno e o sistema de controle externo (Figura 5.2).

Figura 5.2 – Proposta de sistemas de controle de IG.Fonte: Vitrolles (2009) O autocontrole é realizado diretamente pelo produtor. O controle inter-no é realizado pelo conselho regulador junto com os seus membros. O controle externo é realizado por uma estrutura independente, imparcial, credenciada para essa função (orgãos oficiais ou certificadoras privadas). Ela é solicitada pela associação. Esse controle externo pode ter uma fre-quência definida.

Page 180: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

180

O sistema de controle implementado pelas quatro primeiras IG brasileiras.

Tipo de controle IP Vale dos Vinhedos

IP Pampa Gaúcho da Campanha Meridional

IP Paraty

IP Região Cerrado Mineiro

Autocontrole X X X X

Controle interno X X X X

Controle por certificadora

- - - X

Tabela 5.5 – Fonte: Cerdan, Vitrolles (2009)

Conheça o processo de certificação do Café do Cerrado Mineiro

http://www.cafedocerrado.com.br/intranet/docs/fluxograma_certde-propriedade_caccer.pdf

Acesso realizado em: 16 jun. 2010

Veja a apresentação do sistema de controle externo do café da Colômbia (IGP) – Colômbia:

Estatutariamente a sociedade ALMACENES GENERALES DE DEPOSITO DE CAFÉ S.A.-conhecida como ALMACAFÉ-, é uma certificadora colombiana que, por delegação da Federação, desem-penha o papel de controle da origem do “Café de Colômbia” para o café exportado, desempenhando o papel de entidade de controle objetivo e imparcial.13

5.2.2 Quais são as funções do conselho regulador?

Os diferentes agentes, do produtor até o distribuidor, devem assumir certa responsabilidade para garantir o bom encaminhamento do processo de produção. Cada um deverá se comprometer a realizar um autocontrole.

Além desses autocontroles, o conselho regulador deve ser criado, tendo como principais funções controlar e orientar a produção, a elaboração e

Page 181: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

181

CAPÍTULO 05

a qualidade do produto da IG, conforme as normas definidas no regula-mento de uso.

Não há instruções normativas ou regras para a composição desses conse-lhos, que dependem muito do produto, da sua natureza e da sua forma de distribuição. As duas Tabelas, 5.6 e 5.7, detalham a categoria dos mem-bros das associações das 4 primeiras IG brasileiras. Constatam-se as se-guintes diferenças: há associações que só reúnem produtores, outras que só reúnem industriais ou processadores. Na composição dos conselhos reguladores aparecem novos agentes e instituições, tais como: os comer-ciantes, as entidades técnicas e científicas, os órgãos públicos e de apoio. Observam-se conselhos nos quais 100% dos membros são da mesma ca-tegoria, enquanto, outros privilegiaram a presença de várias categorias de agentes.

Veja os exemplos nas Tabelas 5.6 e 5.7, que mostram a composição das associações e dos conselhos reguladores, onde A, B, C e D indicam quatro diferentes indicações geográficas brasileiras existentes.

Composição das associações responsáveis pelas 4 primeiras IG registradas no INPI , segundo a categoria (produtor ou processador) dos membros.

Tabela 5.6 - Fonte: MASCARENHAS (2008)

Page 182: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

182

Composição dos Conselhos Reguladores de cada IG brasileira registrada no INPI, segundo a função dos participantes na cadeia produtiva.

Tabela 5.7 - Fonte: MASCARENHAS (2008)14

5.2.3 O que controlar?

Devemos reforçar que as regras de produção se fundamentam em um resultado (um produto com características particulares) e definem os mé-todos que permitem obter esse resultado.

Encontramos esses mesmos princípios ao nível de implantação do con-trole. As organizações podem fazer um exame visual ou organoléptico (degustação coletiva, análise sensorial) e um controle da realização das práticas exigidas no regulamento de uso, bem como uma análise dos com-ponentes químicos e mesmo uma análise documental para comprovar a origem de uma determinada matéria-prima.

O controle organoléptico se apoia em membros reconhecidos pelos seus colegas devido ao seu bom conhecimento do produto, da região, das pes-soas originárias da região. Essas pessoas devem provar a sua capacidade sensorial (capacidade de identificar variações gustativas, olfativas leves, de analisar e classificar os diferentes produtos).

Um grande rigor é exigido nesses processos. Trata-se de formalizar o con-junto das etapas: como selecionar os degustadores, quais as condições de degustação, estabelecimento do teste às cegas, registro das observações em fichas (classificação e organização das fichas, que devem ser guardadas para o caso de haver reclamações).

Page 183: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

183

CAPÍTULO 05

Além do controle organoléptico, podem ser implementados outros tipos de controles, relacionados com as questões dos componentes químicos, físicos e biológicos dos produtos, bem como os controles documentais, que atestam à procedência da matéria-prima.

Por exemplo, o conselho regulador da IP Vale dos Vinhedos mantém atu-alizado o cadastro dos vinhedos da área delimitada, utilizando o cadastro oficial do Ministério da Agricultura, coordenado pela Embrapa–Uva e Vinho e também o cadastro dos estabelecimentos vinícolas de elabora-ção, envelhecimento ou engarrafamento da IG. Além disso, o conselho regulador também controla e arquiva as declarações de colheita de uva da safra e a declaração de produtos elaborados.

Veja o exemplo dos pontos de controle da produção da Carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional:

Artigo 24 – Dos Controles de Produção

Serão objeto de controle do conselho regulador as declarações de produção e de produtos elaborados. O Conselho regulador estabe-lecerá controles relativos às operações de produção, no sentido de assegurar a garantia de origem dos produtos da I.P. Pampa Gaúcho da Campanha Meridional. Tais controles incluem o manejo alimen-tar, raças dos animais, permanência da área de produção, bem-estar animal, transporte dos animais, sanidade animal, controle ambien-tal, abate, desossa, maturação, e comercialização, de forma a as-segurar a rastreabilidade dos produtos protegidos pela I.P. Pampa Gaúcho da Campanha Meridional.

Os instrumentos e a operacionalização dos controles de produção serão definidos através de Norma Interna do Conselho Regulador.15

5.2.4 Como controlar? Proposta para definir um plano de controle

De acordo com trabalho realizado por Traore para o Institut National de la Qualité et de l’Origine na França, o controle deve ser efetuado de forma rigorosa e transparente, baseando-se na identificação dos operadores, das suas atividades e dos pontos críticos ou práticas a serem avaliadas.16

Page 184: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

184

Um plano de controle deve apresentar:

• Identificação dos agentes;

• Definição das tarefas de controle e dos pontos críticos a ser contro-lados (classificar as exigências);

• Definição de quem controla (autocontrole, controle interno ou ex-terno);

• Definição dos métodos de avaliação;

• Frequência dos controles;

• Definição das sanções.

Para apresentar o plano de controle, podemos recorrer a critérios associa-dos a valores de natureza diferentes (Tabela 5.8)

Sugestão de pontos críticos a incluir nos planos de controle.

Critérios Valores Metodologia e Frequência

Autocontrole

(produtor)

Controle Interno

(Conselho Regulador)

Controle Externo

(Certificadora)

Origem Geográfica

Conjunto de critérios que depende da origem

Locais, ati-vidades na área da IG

Verificar e assegurar a procedência das matérias- primas e da realização das atividades na área da IG

Controle visual (visita) e documentação

Controle visual (visita) e docu-mentação

Práticas de Obtenção do Produto

Conjunto de práticas típi-cas, que contri-buem para a qualidade

Definida no regulamen-to de uso

Assegurar-se da conformidade das

Práticas

Controle da docu-mentação, visitação, análise, cálculo, etc.

Controle docu-mentação, visi-tação, análise, cálculo, etc.

Page 185: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

185

CAPÍTULO 05

Características do Produto

Características físico-químicas

Definida no regulamen-to de uso

Organizar autoavalia-ções de seus produtos (análise)

-Procedimento de amos-tragem

-Procedimento anônimo

-Análise interna

- Degustação coletiva, análise sensorial

- Análise e valida-ção dos procedi-mentos

- Controle da quali-ficação dos analisa-dores

Características organolépticas

Definida no regulamen-to de uso

Organizar autoavalia-ções de seus produtos e/ou formar anali-sadores

qualificados

-Procedimento de seleção dos julgadores/ qualifica-ção dos analisadores

-Procedimento de amos-tragem

-Procedimento de exame sensorial

(composição do papel,

quorum, regras de

decisão /deliberação)

-Ficha de anotação

-Exame interno

-Análise e validação dos procedimentos

- Controle da quali-ficação dos analisa-dores

Tabela 5.8- Fonte: Vitrolles (2009) adaptado de Traore (2007).

Segundo o estudo, esses planos de controle podem ser sistematizados em forma de tabelas, separando por tipo de agentes (produtores, transforma-dores, frigoríficos, distribuidores). As etapas que serão controladas são re-partidas em três categorias:

a. A•origem•geográfica (implantação de um sistema de rastreabilida-de ou outra forma de garantir a procedência do produto);

b. Hábitos•e•práticas (savoir-faire);

c. Características•do•produto (degustação, análise sensorial).

Para cada tema, o método poderá ser o autocontrole, o controle interno ou o controle por uma certificadora externa.

Para cada ponto de controle, o nível do controle e o método de avaliação devem ser estabelecidos (visita de observação visual, consulta de docu-mentos de registro - cadernos de campo, ficha sanitária, etc.).

Page 186: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

186

5.2.5 Que tipo de sanções?

As práticas não conformes com as regras estabelecidas podem ser nume-rosas e colocadas em diferentes níveis. Quando o produtor percebe seu erro, deve retificá-lo. Quando o conselho regulador o detecta, ele recorre a um sistema progressivo de sanções e propõe soluções para a correção.

Cabe salientar que nem todas as práticas identificadas como não confor-mes vão induzir a uma perda definitiva das características específicas dos produtos.

As práticas não conformes podem ser consideradas como:

•• Menor: por exemplo, um caderno de campo não atualizado;

•• Graves: induzem à perda da rastreabilidade (não há mais possibili-dade de seguir o produto, mas não há perda definitiva das caracte-rísticas;

•• Muito•graves: podem provocar uma perda definitiva das caracte-rísticas. Por exemplo, rebanho bovino britânico cruzado com raça zebu para aumentar a produtividade ou a resistência do rebanho.

As sanções podem variar de uma advertência por escrito, uma multa e a suspensão temporária ou definitiva da associação até a proibição do uso da referência e selo da IG.

No caso de uma prática não conforme e grave, o produtor poderá pagar uma multa ou ser temporariamente suspenso (sem poder comercializar o seu produto com IG durante um período estabelecido). Em caso de risco de perda completa das características do produto (caso muito grave), o conselho regulador pode enviar cartas de advertências para que o produ-tor possa corrigir a sua prática o mais rápido possível. Uma prática usada em outros países, é a organização de reuniões de sensibilização ou de for-mação para os produtores, com a finalidade de evitar desvios ao nível dos sistemas de produção e/ou de transformação.

Portanto, a definição da estrutura do controle não é só uma condição im-prescindível para o pedido de registro ao INPI, mas também uma estra-tégia coletiva para garantir o bom desempenho da IG e também evitar conflitos e desvios que podem aparecer no futuro. Cabe salientar, como vimos no inicio deste capítulo, que uma atuação não firme e precisa do Conselho Regulador poderá levar a uma perda de credibilidade da IG, as-

Page 187: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

187

CAPÍTULO 05

sim como a um enfraquecimento desse importante instrumento de valo-rização e promoção do produto.

Quais aspectos devem ser levados em consideração para a elaboração do regulamento de uso de uma IG? Para fomentar essa discussão acesse o AVEA e participe do Fórum de Conteúdo.

Acesse o link para conhecer em detalhes a metodologia geral de redação de planos de controle adaptados às indicações geográficas (AOP/IGP). Para encontrar o documento: ver site do INAO (http://www.inao.gouv.fr/) e procurar o ícone “bibliographie” para baixar a dissertação intitulada: “Méthodologie générale de rédaction de plans de controles adaptes aux indications géographiques (AOP/IGP)”.

Acesso realizado em: 11 jun 2010.

i

Page 188: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

188

Resumo

Neste capítulo, vimos como definir as normas e os métodos de produção, obtenção e/ou de comercialização do produto. Entendemos como construir e organizar o regulamento de uso. Os exemplos brasileiros, colombianos e europeus mostram a diversidade e a riqueza dos casos, e também a complexidade. Nesse sentido, a implementação e o respeito aos pontos críticos de controle são indispensáveis, assim como a implicação própria dos produtores, da associação e o apoio de uma certificação externa para legitimar a IG.

Page 189: curso de propriedade intelectual & inovação no agronegócionbcgib.uesc.br/nit/ig/app/papers/0253410909155148.pdf · Você está iniciando o segundo Módulo do Curso de Propriedade

189

CAPÍTULO 05

Notas

1. Regulamento de uso da APROPAMPA (2005) em VITROLLES (2007).

2. Regulamento de uso Vale dos Vinhedos (VITROLLES, 2006).

3. CASABIANCA e VALCESCHINI, 1996.

4. Extraído do regulamento de uso da Carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional (VITROLLES, 2007).

5. Regulamento de uso Vale dos Vinhedos em VITROLLES (2006).

6. Caderno de especificações da Alheira de Vinhais, 2009, p.6.

7. Cahier des charges da maçã do Limousin, 2009.

8. MARQUIS, 2006.

9. Pluego de condiciones de la Indicacion Geográfica Protegida café de Colombia, 2009 p. 24.

10. Observa as diferentes áreas de cultivo, depuração e preparação das ostras. Entre o inicio do cultivo, três etapas de seleção e uma triagem permitem descartar as ostras cujo a forma, o aspecto ou o tamanho não correspondem ao padrão definido.

11. CERDAN, 1999.

12. BERARD e MARCHENAY, 2007, p 31.

13. Pluego de condiciones de la Indicación Geográfica Protegida café de Colombia, 2009 p. 24.

14. MASCARENHAS, 2008.

15. Extraído do regulamento de uso do Carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional, Vitrolles, 2007.

16. TRAORE, 2007.