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Cursinho VIA Vivenciando InterAprendizagem facebook.com/projvia projvia.wordpress.com

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Cursinho VIA

Vivenciando InterAprendizagem

facebook.com/projvia

projvia.wordpress.com

O mês de abril é conhecido como o mês de falar da cultura indígena por causa do dia 19 de Abril, que

é “o Dia do Índio”. Por ocasião da data, é comum encontrar nas escolas comemorações com fantasias,

crianças pintadas, músicas e atividades culturais. No entanto, temos que tomar muito cuidado e

questionar a maneira como algumas dessas práticas são conduzidas, pois além de reproduzir antigos

preconceitos e estereótipos, não geram aprendizagem alguma.

Como afirma a antropóloga Majoí Gongora “Ser

índio não é estar nu ou pintado, não é algo que se

veste. A cultura indígena faz parte da essência da

pessoa. Não se deixa de ser índio por viver na

sociedade contemporânea”.

É muito comum caracterizarmos os povos através

de gravuras de livros que representam povos do

século XV e XVI, reproduzindo mais estereótipos.

Hoje, muitos têm acesso à tecnologia, à

universidade e a tudo o que a cidade proporciona

e nem por isso deixam de ser indígenas e de

preservar a cultura e os costumes.

Além disso, precisamos entender que o Brasil tem cerca de 305 povos, que falam cerca de 274 línguas

e que cada etnia tem sua identidade, rituais, modo de vestir e de se organizar. Não devemos tratar todas

como iguais ou se prender a uma única.

É necessário que conheçamos os povos indígenas para além do olhar “branco”. Tem um monte de

coisas que podemos aprender com eles, como nos sentir parte da terra e a cuidar melhor dela, tal como

fazem e valorizam as sociedades indígenas.

Apesar de em nosso cronograma, do cursinho VIA, os encontros sobre a história, a cultura e a atual

condição indígena estarem marcados para o mês de abril, acreditamos que é necessário aprender e

conhecer sobre esses povos durante todo ano. Retomaremos as questões que os envolvem diversas

vezes durante o cronograma porque, para eles, esse mês e essa data não são mais que dias comuns, já

que tantos dezenoves de abril já se passaram e esses povos continuam lutando incessantemente por

suas terras e seus direitos que são negados com frequência e conquistados e reconquistados com muitas

dificuldades.

Fonte: Indioeduca – textos de Marina Cândido Marcos e Alex Makuxi – adaptado.

“O dia do Índio” e o mês de abril

“A minha professora falava que Pedro Álvares Cabral

descobriu o Brasil, mas ele invadiu. Ela tocava muito no

nome da Princesa Isabel, porque próximo ao Morro do

Preventório [ onde Carol vive] existe a casa de bonecas onde ela

brincava. E lá também existe um cemitério onde os escravos

eram enterrados. E mesmo assim a professora repetia que ela

foi a salvadora dos negros, e não foi. Dandara e Zumbi

representam tudo. Se hoje eu estou aqui nessa mesa, tranquila,

dando uma entrevista, é graças a eles e não graças à Princesa

Isabel. Como os escravos já deveriam ser libertados naquela

época, resolveram colocar uma branca como ‘rainha dos

negros’. Mas eram Dandara e Zumbi que lutavam”, completa

Carol.

Segundo a FUNAI, a

população do Brasil PRÉ-

CABRALINO (antes de 1500)

era estimada em 4 milhões de

indígenas. Até o final do

BRASIL COLÔNIA (1815), essa

população já havia sido

reduzida a 360 mil e

representava apenas 9% do

total de habitantes.

Não Foi

Cabral

MC Carol

Professora me desculpe Mas agora vou falar Esse ano na escola As coisas vão mudar Nada contra ti Não me leve a mal Quem descobriu o Brasil Não foi Cabral Pedro Álvares Cabral Chegou 22 de abril Depois colonizou Chamando de Pau-Brasil Ninguém trouxe família Muito menos filho

Porque já sabia Que ia matar vários índios Treze Caravelas Trouxe muita morte Um milhão de índio Morreu de tuberculose Falando de sofrimento Dos tupis e guaranis Lembrei do guerreiro Quilombo Zumbi Zumbi dos Palmares Vitima de uma emboscada Se não fosse a Dandara Eu levava chicotada

“Sou do morro, sou

favelada, nunca vou

perder a essência do

funk e vou ser pra

sempre a Carol de

Niterói.”

Sarampo, varíola,

gripe, entre outras

doenças trazidas da

Europa dizimaram

os nativos, além das

guerras entre as

tribos e o massacre

dos colonizadores.

O Brasil tem cerca de

305 povos indígenas

que falam cerca de

274 línguas. Os

tupinambás foram

os primeiros que

tiveram contato com

os europeus porque

ocupavam o litoral

do país.

Comandante militar

português de família

nobre que invadiu o

Brasil com suas

caravelas em 1532.

Árvore que os portugueses

extraíram quando chegaram

ao Brasil. Eles utilizaram a

mão de obra indígena em

troca de objetos baratos em

Portugal, como espelhos e

pentes, enquanto vendiam a

tinta e a madeira por um alto

preço na Europa.

A história que não aprendemos

“Os portugueses descobriram o Brasil!” É com essa frase que inicia a história do país. A

descoberta do Brasil aconteceu em 1500, mais precisamente em 26 de janeiro, quando o

português chamado Vicente Pizón e seus homens chegaram a uma praia deserta do cabo

de Santo Agostinho no litoral do Estado de Pernambuco.

Porém, a “descoberta oficial” se deu com a

chegada de Pedro Álvares Cabral, em 22 de

abril do mesmo ano, com todo seu comando,

representando Portugal.

E o que encontraram ao chegarem?

ÍNDIOS, nus, com língua estranha,

selvagens.

É assim que aprendemos na escola, com os professores e livros didáticos, “O

descobrimento do Brasil”. Pois bem, se já havia povos habitando essa região, porque então

da “descoberta”?

Isso só nos remete uma visão etnocêntrica de uma história europeia e que ignora

qualquer outra história, sendo a sua de maior valor.

Os povos indígenas que aqui viviam tinham sua história, sua própria vivência, sua

cultura e seus costumes. E, isso não se leva em conta nos livros didáticos que os colocam

em uma posição de “inferioridade”.

Esse conceito usado de “descoberta” remete a uma concepção de que a história anterior a

1500 não existia. Então surge a pergunta: o que foi descoberto?

A retirada das riquezas naturais do brasil realmente começou em 1500, e é justamente

em decorrência desse fato que o Brasil foi descoberto.

Descoberto no sentido literal e, para exemplar esse significado, usarei as palavras

contidas no dicionário de língua portuguesa da editora Avenida, que diz o seguinte:

“Descoberto: que não tem coberta, destapado, divulgado”.

Foi dessa forma que ficou o nosso querido Brasil após 1500 - descoberto, sem sua

cobertura verde original. Eis que de lá pra cá o descobrimento só veio a continuar.

Começou pela retirada da madeira vermelha, o pau-Brasil - depois outras plantas nativas

deram lugares as imensas plantações de cana de açúcar, soja, algodão e, por último, as

lindas e imensas árvores deram lugar aos pastos de criação de gado bovino.

Fonte: Indioeduca – texto de Alex Makuxi – adaptado.

Quem descobriu o Brasil?

Quando os portugueses chegaram ao Brasil, em 1500, eles buscavam ouro e prata. Em

um primeiro momento, não encontraram esses metais preciosos no território brasileiro e

não tiveram muito interesse em colonizar o país. Começaram, então, explorando o pau-

brasil para comercializar sua madeira e sua tinta de tom avermelhado. Apesar de

parecer a mesma coisa, explorar é uma atividade muito mais simples do que colonizar.

Colonizar exige ocupação, povoamento e organização de uma lógica produtiva dentro do

território.

Os portugueses realizavam a

exploração do pau-brasil

através de um sistema de

feitorias, que eram armazéns

onde realizavam o escambo -

a troca da árvore retirada

pelos povos indígenas por

objetos supérfluos e baratos

dos europeus. Isso aconteceu

de 1500 a 1530, sem que os

portugueses invadissem, em

grande número, o território

dos povos indígenas.

Para os lusos, era muito mais lucrativo negociar temperos e especiarias com os indianos,

já que compravam barato e vendiam muito caro na Europa.

O fato de os portugueses não darem tanta “atenção” assim ao Brasil, fez com que outros

países, como a França, começassem a invadir o território também. Por medo de “perder”

as terras que havia invadido, Portugal começou, enfim, a colonizar o país.

Essa política de invadir territórios e formar colônias era reflexo do sistema econômico

que predominava na Europa do século XV até a Revolução Industrial – o mercantilismo.

A base desse sistema era o acúmulo riqueza, baseada na quantidade de metal precioso

(ouro e prata) que cada país possuía. Esse acúmulo era medido pelo lucro nacional,

nomeado balança comercial favorável – quando o país exportava mais do que

importava, ou seja, “vendia mais que comprava”.

Por que Portugal invadiu o Brasil?

Para manter essa balança favorável, as metrópoles tomavam algumas medidas como

aumentar os impostos para a importação e formar monopólios comerciais com as

colônias, através de pactos. Esses pactos determinavam que as colônias só podiam

negociar com as metrópoles. O Brasil, por exemplo, só podia negociar com Portugal.

Evidentemente, esse comércio era benéfico apenas para os portugueses, já que eles

exploravam as riquezas brasileiras que iam de graça ou praticamente de graça para lá.

Todo o sistema de exportações e importações era

controlado pelo rei de cada metrópole, que tinha poder

total sobre todas as decisões tomadas dentro do país e

em suas colônias. Esse modelo de governo é chamado de

monarquia absolutista – exatamente o poder absoluto

do rei, que, apoiado pela burguesia (comerciantes ricos)

e pelo clero (igreja), controlava todas as esferas de poder

do Estado – o legislativo, o executivo e o judiciário.

A maneira mais fácil de acumular riquezas e formar

monopólios que os reis encontravam era invadir países e

colonizá-los e era isso que faziam as grandes potências

europeias da época, como Portugal.

Em 1532 começou, de fato, a colonização do Brasil, quando se criou, em São Vicente, a

primeira Câmara Municipal. Pelo medo de que outros países tomassem o território

brasileiro, Portugal começou a povoá-lo, dividindo o litoral em 15 faixas horizontais de

terra nomeadas Capitanias Hereditárias. Quem tomava conta dessas faixas eram os

donatários – homens ricos que faziam favores ao rei português, cobrando os impostos

encaminhados à metrópole e governando as regiões. Em 1548, devido a alguns problemas

de administração nas capitanias, foi criado o Governo-geral, com sede em Salvador e

posse de Tomé de Souza, de modo que Portugal pudesse ampliar o controle sobre a

colônia.

Dessa forma, cada vez mais Portugal ia

invadindo e tomando conta dos

territórios indígenas, roubando suas

riquezas e sua paz. Em 1549, chegaram

ao país os jesuítas, com o intuito de

cristianizar os nativos, como se sua

religião fosse a “certa”, a “única”,

explorando e destruindo a cultura dos

povos que aqui viviam. Obviamente a

ação dos jesuítas foi extremamente

violenta e a colonização não foi pacífica

como alguns livros colocam, sendo que os

povos indígenas lutaram bravamente.

Rei Luís XIV da França, o rei Sol

A exploração e a destruição que começou há 500 anos parece nunca terminar e os povos

indígenas continuam perdendo seus territórios para os “colonizadores”, que hoje são os

grandes fazendeiros ou latifundiários - homens muito ricos que exploram o território

brasileiro e ficam ainda mais ricos vendendo os produtos para o exterior.

Os Guarani Kaiowá, do Mato Grosso Sul, por exemplo, denunciam que estão sendo

obrigados a deixar a terra que sempre ocuparam. Ao todo, são mais de 40 mil deles

ameaçados pela monocultura de cana de açúcar, que devido ao alto lucro, se espalha

rapidamente na região. Mesmo os territórios já reconhecidos como de propriedade

indígena no estado estão sendo desocupados.

Os latifundiários roubam as terras indígenas para plantar cana e produzir etanol – o

“combustível completão” que a mídia tanto valoriza. Sem contar os que mantêm a

monocultura da soja e a criação de gado, todos ligados a mesma classe. Quem deveria

garantir a demarcação dos territórios indígenas – o Estado – possui uma grande bancada

de latifundiários que só pensa em garantir a preservação e ampliação de seus negócios.

Em uma comparação simples, é como se os três porquinhos tivessem que depender do

Lobo Mau pra proteger sua casa. Lógico que isso é impossível, por isso os povos indígenas

se organizam de diversas formas, interna e externamente, porque sabem que estão

praticamente sozinhos em sua luta.

A propriedade indígena é muito diferente, até hoje, da propriedade privada – herança

europeia. É uma propriedade coletiva, delimitada de modo que haja preservação dos

recursos ambientais necessários a seu bem-estar e necessária à sua reprodução física e

cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.

Complicado é pensar que, hoje, a propriedade indígena precisa ser delimitada,

demarcada, limitada por um Estado que não valoriza sua cultura. Há dois séculos, os

Como estão os povos indígenas hoje?

Guarani Kaiowá ocupavam cerca de 8 milhões de hectares no Mato Grosso do Sul e

atualmente, ocupam menos de 1% disso.

No Mato Grosso do Sul, os povos que antes

viviam da caça, da coleta junto à natureza

natureza, agora são obrigados a trabalhar

em regime semiescravo ou escravo nas

plantações de cana ou na criação de gado.

São removidos de seu ambiente e jogados

em outro mundo completamente diferente e

extremamente nocivo.

O mesmo acontece em várias regiões do Brasil, como no município de Altamira, no Pará,

onde está sendo construída a hidrelétrica de Belo Monte, com barragens no rio Xingu.

Será a 3º maior hidrelétrica do mundo e é necessário inundar uma grande área para

construí-la. Boa parte dessa área corresponde a terras indígenas, da tribo Kayapó e o

projeto estava pronto sem que ao menos eles tivessem sido consultados. Só depois que

estava tudo pronto para ser construído que foram avisar a tribo dos impactos ambientais

no local e não houve diálogo – as populações ribeirinhas (que moram próximo ao rio)

seriam removidas e realocadas. Muitas pessoas foram obrigadas a morar em pequenas

cidades, precisando trabalhar para pagar pela moradia, fazendo dívidas e contas que elas

nunca tiveram enquanto viviam do rio Xingu.

Ainda que muitos povos indígenas, devido a

um processo histórico, tenham incorporado

parte da cultura imposta pelos europeus,

boa parte ainda mantém seus costumes e

crenças. Não viver nos moldes do mundo

ocidental e globalizado não é demérito

algum - pelo contrário. Lutar para

preservar sua história e cultura é algo

muito digno e nós, que vivemos nas cidades,

deveríamos pensar no quanto podemos

aprender com eles – obviamente sem

romantiza-los, tratando-os com distância e,

sim, entendendo suas tradições e seus

valores. Um bom começo seria passar a

enxergar a natureza como parte da vida,

deixando de considera-la um recurso a ser

explorado.

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O que podemos aprender com eles?

Quem nos ajudou? - Vídeos nas aldeias - videosnasaldeias.org.br

- Indioeduca - indioeduca.org

- Documentário - À sombra de um delírio verde

- Documentário - Belo Monte: O anúncio de uma guerra

- Filme - Uma história de Amor e Fúria

- Livros do professor Daniel Munduruku