crise produçao etanol interfaces politicas publicas

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Considerando-se a complexidade da agroindústria canavieira, independentemente de crises, de euforias e de indicadores interpretativos, é importante o aprofundamento de estudos em temas como: as mudançasna regulação e formas distintas de tributação entre etanol e gasolina no âmbito dos estados; o novo papel e osefeitos de atos mandatórios de mistura; as novas perspectivas de expansão e de usos da eletricidade da biomassa;e a influência dos demais elos (distribuição e revenda) na competitividade setorial, inclusive os impactos de suasdinâmicas nos elos para trás da cadeia (indústria e agricultura).

TRANSCRIPT

  • A CRISE NA PRODUO DO ETANOL E AS INTERFACES COM AS POLTICAS PBLICAS1

    Gesmar Rosa dos Santos2

    Eduardo Afonso Garcia3

    Pery Francisco Assis Shikida4

    1 INTRODUO

    A palavra crise, na cadeia produtiva ou no setor sucroenergtico, tem sido amplamente utilizada para indicar situaes desde o fluxo de caixa negativo, em um ou dois anos, at a reduo da produo fsica em parte das indstrias, o alto endividamento superando as receitas, ou o fechamento de fbricas. De fato, levantamentos realizados por Figliolino (2012), Nastary (2014), Neves (2014), Nascimento (2014) e Tribunal de Contas da Unio (TCU) (Brasil,2012), registram tais dificuldades. H tambm uma persistente situao de dificuldades regionais, endividamento e dependncia de subsdios, como mostram Carvalho (2009) e Santos e Caldeira (2014).

    Entre as causas centrais da atual crise na agroindstria canavieira destacam-se o aumento dos custos, as perdas de matria-prima em funo de seguidas intempries e a diminuio da competitividade do etanol, agravada pelo controle estatal do preo da gasolina. Entretanto, pelo fato de haver alguma previsibilidade nos sistemas agroindustriais, como destacado por Farina e Zylbersztajn (1998) e Zylbersztajn e Neves (2000), mesmo nos casos de propenso crise, torna-se importante distinguir dificuldades inerentes atividade de crises propriamente ditas.

    Embora no haja a inteno de aprofundamento, neste artigo, em aspectos de crises econmicas em geral,5 cabe delimitar a compreenso de crise na rea sucroenergtica. Sem adotar um referencial terico especfico, considera-se que uma crise de natureza econmica em uma cadeia produtiva diz respeito contrao do seu nvel de produo, ou a um persistente desequilbrio econmico-financeiro, ao ponto de afetar a autonomia produtiva, assim como apresenta componentes internos ao sistema ou ambiente produtivo e, eventualmente, externos a ele. Tal situao provoca impactos negativos na comercializao, no consumo, nos preos e nos empregos, podendo afetar fornecedores e outras atividades em dado perodo.

    Uma concepo terica que se aplica agroindstria canavieira destacada em Reisman (1998), que aponta que uma forma de fugir de crises e de recesses evitar a expanso do crdito e as euforias causadas por situaes econmicas favorveis que antecedem as crises. O citado autor alerta que expanses artificiais da atividade econmica podem caracterizar desperdcios de riqueza, de bens de capital e de recursos escassos. Tais desperdcios reduzem a possibilidade de usos futuros mais produtivos desses bens. Para ele, quanto maior a durao da expanso econmica artificial, pior a devastao que pode vir em seguida.

    A meno crise no setor6 tem sido mais usual do que a meno crise na agroindstria canavieira. Na cadeia so conhecidas as dificuldades do produto etanol hidratado, concorrente da gasolina, que se encontra no centro da crise atual da agroindstria canavieira, como assinalam Moraes e Bacchi (2014). Outros produtos

    1. Os autores agradecem aos colegas da Diretoria de Estudos e Polticas Setoriais de Inovao, Regulao e Infraestrutura (Diset) do Ipea que participaram do debate deste boletim, especialmente a Jos Mauro de Morais, pelos comentrios e pelas sugestes ao texto. Eventuais erros ou omisses so de inteira responsabilidade dos autores.

    2. Tcnico de Planejamento e Pesquisa na Diset do Ipea.

    3. Engenheiro agrnomo, economista e pesquisador aposentado da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuria (Embrapa).

    4. Professor na Universidade do Oeste do Paran (Unioeste).

    5. Para detalhes acerca de crises em geral, ver, por exemplo, Kotz, McDonough e Reich (1994), Reisman (1998), Kindleberger e Aliber (2013) e Krugmann (1996).

    6. Setor, como referido neste artigo, engloba as atividades e as etapas anteriores e posteriores da produo da cana-de-acar, seus produtos industriais, os elos da distribuio, do transporte e da revenda, assim como todo o fornecimento de insumos, incluindo-se as estruturas dedicadas e especcas de exportao e de consumo. Mais restrita a cadeia produtiva, que se restringe s etapas agrcola e industrial, assim como seus fornecedores e suas estruturas de armazenagem e de distribuio.

  • 28 Radar | 39 | jun. 2015

    da cadeia produtiva, como a gerao de energia eltrica a partir do bagao e da palha da cana ou ainda a produo de derivados da alcoolqumica, passam imunes pela crise. O acar, mesmo com oscilaes de preos das commodities, tem sido um produto de menor propenso a crises.

    Para Milanez et al. (2012) e Moraes e Bacchi (2014), o etanol hidratado o produto no centro das dificuldades que levaram esta crise. A produo aumentou fortemente, em razo da euforia (novos entrantes e alto investimento de empresas frgeis) iniciada com o advento do carro flex, como relatam Torquato e Bini (2009). A esse fator, entretanto, devem ser somadas as iniciativas de incentivo dos governos federal e estaduais em seus planos com financiamento a taxas reduzidas, e as polticas de iseno fiscal, a partir de 2005.

    fato, tambm, que no se trata de retrao da demanda como hiptese de determinante da crise, dado que o pas importa o bem substituto do etanol hidratado, a gasolina, que compe um mercado interno de 52 bilhes de litros (l)/ano (soma de etanol e gasolina), ante a oferta de 25 bilhes l de etanol carburante. Esse aspecto posiciona internamente os setores pblico e privado com o desafio de superar as dificuldades e as inconsistncias na poltica e na dinmica produtiva. Tratando-se de energias renovveis, e mesmo sendo o etanol produzido h dcadas no Brasil, a necessidade de apoio estatal produo um fato.7 O Estado atua ou pode atuar quando deseja induzir ou direcionar a produo, conforme a sua poltica para o suprimento de energia.

    Em razo de as aes do Estado voltarem-se tanto para as cadeias produtivas quanto para os produtos especficos, a interlocuo entre os agentes, sejam eles pblicos ou privados, contempla uma srie de indicadores, nem sempre consensuais. No curso das crises so enfatizados indicadores relativos ao alto grau de endividamento das empresas, fechamento de indstrias, pedidos de recuperao judicial e alta nas taxas de financiamento.

    A esse respeito ilustrativo o fato de que, entre as 402 empresas do cadastro do Ministrio da Agricultura, Pecuria e Abastecimento (Mapa) de 2009, ou das 384 plantas autorizadas a funcionar pela Agncia Nacional do Petrleo, Gs Natural e Biocombustveis (ANP) em 2014, grande parte apresenta dificuldades operacionais e alto nvel de endividamento em relao receita. Tal diagnstico aparece em levantamentos como Brasil (2012), Nascimento (2014), Nastary (2014), Figliolino (2012) e Gomes e Arajo (2015).

    Tendo em vista esse cenrio, o objetivo deste trabalho revisar a literatura, discutir os principais indicadores da crise e trazer novos elementos ao debate. Para tanto, utilizam-se dados de levantamentos da produo e da situao econmico-financeira das empresas em dificuldades, assim como de bases do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), a exemplo da Pesquisa Industrial Anual (PIA) e da Pesquisa Pecuria Municipal (PAM).

    Este artigo conta com quatro sees, alm desta introduo. A seo 2 trata dos elementos de potencial crise. A seo 3 aborda as formas e os indicadores mais usuais de explicitar dificuldades e crises, enquanto a seo 4 discute os determinantes da atual crise. Por fim, a seo 5 traz as consideraes finais e os apontamentos para novos estudos.

    2 ELEMENTOS POTENCIALIZADORES DE CRISES NA AGROINDSTRIA

    Zylbersztajn e Neves (2000) e Farina (2000) apontam uma srie de elementos essenciais para a compreenso das cadeias produtivas agroindustriais. Eles destacam a necessidade de ateno contnua na gesto e na dinmica produtiva em si, tendo como horizonte a competitividade. Farina (2000) sintetiza, para a agroindstria como um todo, o termo ambientes, mencionando quatro fundamentais, que so sempre concatenados e dependentes de equilbrio entre si, em razo das especificidades das atividades agrcolas. So eles: o organizacional, o institucional, o tecnolgico e o competitivo. Estes quatro ambientes so aqui referenciais para a interpretao e a discusso de indicadores e elementos explicativos das dificuldades ou da crise atual na cadeia produtiva do etanol.

    7. As medidas de apoio s energias renovveis, no Brasil e nos demais pases, incluem nanciamento pesquisa e desenvolvimento (P&D), subsdios produo e ao consumo, garantias de mercado, reduo de tributos, bnus por tipo de fonte e atos regulatrios especcos (Santos, 2015).

  • 29A Crise na Produo do Etanol e as Interfaces com as Polticas Pblicas

    Inicialmente deve-se observar que as cadeias agroindustriais so fortemente suscetveis a crises. Isso ocorre pelo fato de elas fornecerem mercadorias que, de acordo com as condies de seus comrcios, so chamadas no comercializveis (produtos com pouca ou nenhuma viabilidade no comrcio internacional). Este o caso do biocombustvel etanol, em que a formao do preo est parcialmente dissociada do custo dos produtos e da formao de preos em mercados internacionais. A esse respeito, Bressan Filho (2010) destaca que a subordinao do ciclo agronmico da cana, sazonal e semiperene (ciclo de seis a sete anos) deixa a cadeia ainda mais sujeita a crises. Alm disso, havendo uma safra com resultados econmicos ruins (por exemplo, na ocorrncia de intempries ou de nvel de preos relativamente baixos), a oportunidade de recuperao ocorre somente nas colheitas seguintes e, ainda assim, a depender novamente das condies do clima, do manejo da lavoura e do ano do ciclo em que se encontra o cultivo.

    A todos esses aspectos se soma o fato de o preo do produto etanol ser determinado a partir do elo distribuio, sendo os elos indstria e agricultura tomadores de preos. Com isso, na rea sucroenergtica os impactos de dificuldades se manifestam fortemente nesses dois primeiros elos da cadeia produtiva, vindo a seguir os reflexos na distribuio e no varejo. Como estes ltimos so ancorados no setor de petrleo e derivados, que tem dinmica distinta e mais slida, passam praticamente imunes pelas crises. Por ser dependente, em grande parte (logstica, transporte, distribuidoras e postos, alm da regulao e do controle), do setor de combustveis em geral, a agroindstria canavieira afetada, de forma direta, em seus ambientes competitivo, organizacional, tecnolgico e institucional (alm de marketing, comercializao etc.).

    Assim, nos ltimos quarenta anos da produo de etanol em larga escala, as indstrias e os produtores de cana-de-acar passaram por dois momentos de grandes dificuldades, de acordo com Ramos (2012): o primeiro, de 1989 at o incio da dcada de 2000, em razo da queda na cotao do petrleo; e o atual momento, marcado pelas situaes adversas j apontadas e outras destacadas adiante. Ambas ocorreram aps um ambiente facilitador da expanso e incentivador da atividade, tanto nas dcadas de 1970 e 1980, quanto entre 2004 e 2008. Grupos econmicos nacionais slidos superaram e at cresceram durante as crises, indicando, conforme admitem Carvalho (2009), Ramos (2012), Farina e Zylbersztajn (1998), espaos para o controle ou a minimizao de crises a partir da gesto empresarial mais eficiente. O ambiente institucional (e as organizaes que dele cuidam), entretanto, um elemento importante e no resolvido, haja vista as recentes mudanas em atribuies, formas de decidir, acompanhar e definir rumos e polticas que afetam a produo.8

    Em resumo, os mais ressaltados elementos potencializadores de crises na agroindstria canavieira e, em particular, do etanol, so: i) dependncia (por vezes submisso) de um agente (ou etapa produtiva) em relao a outro; ii) dependncia da ao estatal quanto poltica de preo da gasolina C; iii) baixa competitividade do preo do etanol em relao gasolina (biocombustveis tm custos de produo mais elevados do que os derivados do petrleo); iv) imprevisibilidade do clima e intempries; e v) sazonalidade da produo as indstrias param entre quatro e sete meses por ano, o que encarece a formao de estoques e afeta a comercializao, ao concentrar grande oferta em curto perodo.

    3 ALGUMAS FORMAS DE EXPLICITAR A CRISE

    A baixa rentabilidade e as reduzidas margens econmicas, a interrupo do funcionamento ou o fechamento de indstrias, a reduo do investimento e o alto grau de endividamento tm sido apontados como indicativos da crise (Brasil, 2012; Figliolino, 2012; Nastary, 2014; Nascimento, 2014). Entre os fatores mais listados para explicar os resultados negativos esto: a conteno dos preos da gasolina; a no compensao tributria relativa aos impactos dos combustveis fsseis; a elevao dos custos de produo; e a lenta adoo de tecnologias disponveis para elevar a produtividade. De acordo com alertas anteriores atual crise, conforme Farina e Zylbersztjan (1998), Carvalho (2009) e Ramos (2012), ineficincias na gesto das indstrias e da agricultura so tambm causas histricas de dificuldades.

    8. Entre as importantes, e talvez tardias, mudanas recentes, esto a nova congurao de atribuies, iniciadas em meados da dcada de 1990 e ainda no consolidadas, entre o Mapa, o Ministrio de Minas e Energia (MME), o Ministrio do Desenvolvimento, Indstria e Comrcio Exterior (MCDIC), a Agncia Reguladora de Energia Eltrica (Aneel) e a ANP.

  • 30 Radar | 39 | jun. 2015

    Tomando o exemplo das indstrias fechadas, que caracteriza a situao de mxima crise, entre as 58 ocorrncias de paralisao das atividades (grfico 1), 21 se localizam em regies de baixa produtividade da cana por rea plantada e que historicamente contam com subsdios produo regio Nordeste, Rio de Janeiro, Esprito Santo e parte de Minas Gerais (Carvalho, 2009; Santos e Caldeira, 2014). Entretanto, as dificuldades atingem todas as regies, pois as demais 37 (64%) das empresas fechadas encontram-se no Centro-Sul do pas (sendo 22 em So Paulo), regio em que a atividade produtiva mais dinmica.

    GRFICO 1Fechamento e abertura de indstrias de acar e etanol (2005-2015)

    -20

    -10

    0

    10

    20

    30

    40

    2005/2006 2006/2007 2007/2008 2008/2009 2009/2010 2010/2011 2011/2012 2012/2013 2013/2014 2014/20151

    Indstrias novas Indstrias fechadas

    8

    0 0

    -2 -2 -3-5

    -14 -13-9

    -12

    1822

    29

    21

    10

    3 2 2 1

    Fonte: Nastary (2014).Nota: 1 O dado de fechamento de indstrias em 2014/2015 uma previso.

    A condio de endividamento e total comprometimento da receita operacional de grupos econmicos tem sido outro indicador utilizado pelo setor produtivo para ilustrar a situao de crise. A tabela 1 aponta o alto percentual (34,5%, somadas as situaes ruim e pssima) da capacidade total de moagem (220 milhes de toneladas (t)/ano) no Centro-Sul atribuda aos grupos (Ita BBA, 2012 apud Setor..., 2014), com dados de 2012.

    TABELA 1Dados da sade nanceira dos grupos do setor sucroenergtico (2012)

    ParmetroCondio nanceira dos grupos

    tima Boa Ruim Pssima

    Total de grupos 12 30 26 -

    Capacidade de moagem (t milhes) 232 185 104 116

    Capacidade de moagem (%) 36,4 29,0 16,3 18,2

    Fonte: Setor... (2014).

    Cabe o destaque de que mesmo a mais grave situao econmica dos grupos ou o fechamento de indstrias no significa reduo total da produo de cana, uma vez que em grande parte ela tem sido moda por outras indstrias. Estimativas do setor produtivo indicam que a moagem efetiva das indstrias paradas soma 56 milhes de t/ano, equivalentes a 12% da moagem total. J os dados de cadastro da ANP, quando cruzados com os da RPA Consultoria (Nascimento, 2014), apontam que 34 das 65 empresas em pior situao (interveno judicial, falidas e paradas) respondem por 6,3% da capacidade de moagem. As demais (31) no contavam com cadastro e registro concludos da ANP, at 2014.

    De todo modo, mesmo com 65,4% da capacidade de moagem de cana em poder de grupos em situao tima ou boa, em 2012, estimativas mais recentes apontam agravamento da situao. Contudo, os levantamentos no tm se aprofundado na identificao das parcelas especficas das operaes ou das dvidas que decorrem dos mercados de acar, da gerao de energia ou de etanol, ou a que contas, datas e indexadores se referem tais dvidas.

  • 31A Crise na Produo do Etanol e as Interfaces com as Polticas Pblicas

    Na safra 2012/2013 havia estimativa de endividamento total de quase R$60 bilhes (grfico 2), equivalentes a 100% do faturamento da cadeia produtiva. Este percentual , de fato, indicador de uma situao preocupante, inclusive havendo estimativas de continuidade de margem negativa na produo do etanol hidratado.

    GRFICO 2Endividamento do setor sucroenergtico por safra (2002/2013)(Em R$ bilhes)

    0

    10

    20

    30

    40

    50

    60

    70

    2002/2003 2003/2004 2004/2005 2005/2006 2006/2007 2007/2008 2008/2009 2009/2010 2010/2011 2011/2012 2012/2013 2013/2014

    Endividamento do setor

    3,5 5,1 5,08,3

    15,3

    31,0

    36,5

    31,3

    37,5

    55,259,0

    66,31

    Fonte: Adaptado de Nastary (2014).Nota: 1 Valor da safra 2012/2013 estimado por Nastary (2014). A safra 2013/2014 teve estimativa dos autores.

    Outra ilustrao da situao de crise na cadeia produtiva consta de levantamento da RPA Consultoria (Nascimento, 2014), que aponta que, na safra 2013/2014, entre 439 instaladas havia 343 indstrias em operao normal, de acordo com registros prprios. Das 439 instaladas, 55 se encontravam em recuperao judicial (das quais 22 em operao e 33 paradas) e dez usinas tiveram falncia decretada. Ressente-se, contudo, de dados mais precisos, como perfil, nvel de produtividade agroindustrial e histrico de endividamento desses grupos e empresas para que se possa aprofundar em estudos ligando esse perfil aos ambientes destacados e a outros.

    No tocante perda de postos de trabalho, de fato preocupante o caso da indstria de base,9 principalmente nos municpios situados no ncleo produtivo mais dinmico, entre Campinas e Ribeiro Preto, destacando-se Piracicaba e Sertozinho, no estado de So Paulo. Chama ateno a reduo da atividade na indstria de equipamentos e de manuteno, cujo capital predominantemente nacional. Segundo Farina (2014), houve reduo de 50 mil empregos na indstria de bens de capital e de 30 mil na cadeia produtiva da cana. De fato, dados do IBGE, disponibilizados na PIA (grfico 3) ilustram que, na parte industrial da cadeia produtiva, tem havido oscilao considervel no nmero de ocupados, desde 1996, mas com taxas positivas desde o ano 2000, tendo atingido 485 mil ocupados em 2012.

    Dois aspectos merecem destaque no tocante a emprego: a mudana no perfil da agroindstria e a perda de postos de trabalho. O perfil do emprego na cadeia produtiva tem se modificado de forma positiva nas lavouras (reduo do trabalho degradante e das queimadas). Aps desenvolver o corte manual com alto rendimento, qualidade (baixo ndice de impurezas) e baixo custo, desde a dcada de 1970, as mudanas para um maior grau de mecanizao tendem a contribuir, aps adaptaes, para a incorporao tecnolgica.

    9. A reduo de postos de trabalho na lavoura em razo da mecanizao do corte da cana pode ser vista como avano necessrio, por ser trabalho degradante e precrio, embora se estime a reduo de 100 mil empregos.

  • 32 Radar | 39 | jun. 2015

    GRFICO 3Ocupao formal na indstria sucroalcooleira (indstrias com cinco ou mais ocupados)(Em % e milhares de postos de trabalho)

    -25

    -20

    -10

    -5

    0

    5

    10

    15

    25

    20

    1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 201220112010

    -15

    -

    50

    150

    200

    250

    300

    350

    400

    550

    500

    Post

    os

    de

    trab

    alh

    o (

    milh

    ares

    )

    450

    100

    Taxa PO PO total

    Fonte: PIA/IBGE ([s.d.]). Elaborao dos autores.Obs.: Consideram-se os dados do IBGE agrupados nas Classicaes Nacionais de Atividades Econmicas (CNAEs) 15.3 e 10.7 (fabricao de acar) e 23.4 e 19.3 (produo de lcool).

    Estes grupos no incluem insumos, transporte do produto nal, distribuio e armazenagem fora das indstrias ou outros servios neste mbito.

    Dado que os motores da mudana tm sido o aumento da fiscalizao para aplicao de leis trabalhistas e legislao ambiental, assim como a imposio de leis e acordos de partes da cadeia produtiva para todos, os aspectos organizacional e institucional novamente se mostram falhos, tardios. Ainda assim, embora no haja dados precisos na lavoura, o setor produtivo considera cerca de 500 mil ocupados nessa etapa, entre temporrios e permanentes. Faltam dados sobre a informalidade. Nesse aspecto, necessita-se de uma maior sistematizao dos dados, inclusive considerando-se a cadeia sucroenergtica separada de outras cadeias que tambm processam a cana-de-acar.

    4 DETERMINANTES DA ATUAL CRISE NA AGROINDSTRIA CANAVIEIRA

    No intuito de iniciar a discusso sobre as causas que levam situao de crise, so levantados, nesta seo, alguns pontos que se pretende aprofundar em trabalhos subsequentes.

    4.1 A forte elevao dos custos de produo

    Distintos levantamentos apontam a elevao dos custos, destacando-se o agrcola (Nachiluk e Oliveira, 2013; Xavier, 2012). Em valores aproximados, o cultivo da cana responde por 68% dos custos de produo em toda a cadeia a indstria responde por 23% e a administrao/comercializao por 9% (XAVIER, 2012). Bressan Filho (2010) apontou 62% do custo na agricultura, a valores de 2009. So ilustrativos os seguintes dados sobre custos:

    a) apontamentos da Unio da Indstria da Cana-de-Acar (Unica) indicam aumento do custo nominal de produo do etanol em 70%, entre 2007 e 2012, considerando esse o fator central da crise, alm da poltica de conteno dos preos da gasolina (Farina, Rodrigues e Zechin, 2014);

    b) estudos do Programa de Educao Continuada em Economia e Gesto de Empresas da Universidade de So Paulo (Pecege/USP) (Xavier, 2012) apontam que os custos com fertilizantes aumentaram a uma taxa anual mdia de 9,24% para 9,28%, entre 2007 e 2011; os corretivos do solo subiram de 11,17% para 11,74%, no mesmo perodo; e herbicidas e inseticidas tiveram queda de preo no perodo. Tomando-se como exemplo a produo de fornecedores, o custo total mdio passou de R$48,11/t de cana, na safra 2007/2008, para R$70,63/t na safra 2011/2012 para reas de cultivo tradicional (Xavier, 2012). A taxa de aumento anual oscilou de acordo com a regio e os municpios, ficando entre 5,5% e 11,5% ao ano (a.a).

  • 33A Crise na Produo do Etanol e as Interfaces com as Polticas Pblicas

    c) entre diferentes sistemas de produo, segundo metodologia do Instituto de Economia Agrcola (IEA), os custos totais oscilavam entre R$36 t/hectare (ha) e R$74 t/ha, na safra 2011/2012, no estado de So Paulo (Nachiluk e Oliveira, 2013).

    Sobre esse assunto so relevantes, para polticas pblicas, alm dos estudos acerca de distintos sistemas de produo, outros dados sobre diferenas e possibilidades entre as regies, assim como sobre os fatores determinantes das dificuldades de se elevar o nvel tecnolgico.

    4.2 A elevao do custo do crdito e a reduo de margens

    Mendona, Pitta e Xavier (2012) apontam que parte da crise que afeta a produo de etanol se deve crise financeira mundial. Esta, segundo os autores, trouxe mudanas significativas para a agroindstria em relao ao padro desenhado anteriormente, quando as usinam tomavam emprstimos em dlar, aproveitando, inicialmente, os subsdios e, logo depois, a valorizao do real. Ainda segundo eles, diante da reverso dessa tendncia, e com a valorizao do dlar em relao moeda brasileira, o setor acumulou dvida bilionria e as empresas deixaram de investir, por exemplo, na renovao de canaviais, em tratos culturais e em insumos para ganho de produtividade.

    Registra-se, tambm, grande disparidade nas margens econmicas da produo da cana no Centro-Sul, que oscilou, entre as safras 2007/2008 e 2011/2012, entre 0,3% e 35%, de acordo com Xavier (2012). Tambm so grandes as oscilaes nas margens do acar de diferentes tipos (entre 7,5% e 39% na safra 2011/2012), enquanto para o etanol essas margens ficaram entre 3,1% e 24%. Alm dos fatores regionais e tributrios, parte dessas oscilaes pode ser atribuda ao comportamento do mercado e ao aumento dos custos, ao ponto (ano do corte) do ciclo de cultivo ao qual se referem os dados e ao perfil individual das indstrias.

    A disponibilizao de dados da produo e do consumo, assim como os de preos, de margens por elo da cadeia produtiva, de qualidade do etanol e outros, a cargo da ANP e do MME, de grande valia para as anlises. Esses dados, entretanto, passaram a ser sistematizados somente aps a efetivao da nova estrutura de fiscalizao da produo, ocorrida a partir de 2008. Uma vez que as informaes constantes na PIA/IBGE sofreram alteraes estruturais de difcil compatibilizao entre a classificao antes e aps 2007, necessita-se de mais dados do setor privado, em aspectos como margens operacionais e lucratividade em cada elo da cadeia produtiva. Dados fornecidos pela ANP e Unica apontam que a distribuio tem mantido margens mais confortveis na cadeia produtiva, quando comparada com as demais etapas/elos.

    4.3 O controle do preo da gasolina

    A medida externa cadeia produtiva que mais afeta o desempenho da agroindstria canavieira a do controle de preos da gasolina, embora no haja consenso sobre o quo defasado eles ficaram entre 2005 e 2014. Tal dvida se deve, inclusive, em razo da oscilao da carga de tributos por exemplo, da contribuio sobre interveno no domnio econmico (Cide Combustveis) e da variao do imposto sobre circulao de mercadoras e servios (ICMS) nos estados. certo, porm, que investimentos desenhados e efetivados no perodo de estmulo ao aumento da produo, aps 2004, que foram pautados no preo livre da gasolina, no tiveram a confirmao das margens.

    Mesmo com o retorno da Cide, em 2015, e com a elevao dos preos da gasolina, a partir do final de 2014, possibilitando recuperao das margens na cadeia de produo do etanol como um todo, no possvel afirmar ainda qual elo desta cadeia (agrcola, indstria ou distribuio) ser o mais beneficiado. Esse tambm um tema a ser tratado na continuidade deste trabalho, abrindo-se a hiptese de que o elo distribuio, concentrado em trs grandes empresas, tende a continuar com margens mais estveis.

    tambm prematuro apontar se o grupo de indstrias de menor dinamismo, que registra baixa produtividade e com plantas industriais antigas, possa sair da crise no mdio prazo a partir da liberao de preos. Entre as alternativas a serem mais bem estudadas est a do proer do setor sucroenergtico, proposta pelos empresrios e especialistas ligados ao setor produtivo. Em todo caso, ressalta-se que medidas de recuperao da situao financeira podem sinalizar sada da crise para as indstrias em recuperao judicial, no implicando, de imediato, aumento da produo.

  • 34 Radar | 39 | jun. 2015

    4.4 Ondas de otimismo com aumento da rea de produo e lento ganho de produtividade

    O quarto aspecto que se deseja apontar de forma preliminar neste trabalho se refere ao planejamento e gesto pblica (no contexto da poltica energtica e de biocombustveis) e privada (no contexto da cadeia produtiva). So conhecidos os impulsos internos e externos cadeia produtiva que causaram nela impactos positivos. H fortes sinais de que eles, aliados aos incentivos para a elevao da capacidade de produo, entre 2004 e 2007, levaram a uma onda de otimismo no setor.

    De forma resumida, os impulsos se identificam com os perodos de euforia com a atividade, conforme j apresentado neste texto. Tendo como referncia as trajetrias de produtos e do insumo terra (grfico 4) pode-se identificar, de um lado, os perodos de euforia e, de outro lado, os marcos das crises do setor.

    GRFICO 4Evoluo da produo, crises e impulsos na atividade canavieira no Brasil

    1980

    /198

    1

    1982

    /198

    3

    1984

    /198

    5

    1986

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    7

    1988

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    9

    1990

    /199

    1

    1992

    /199

    3

    1994

    /199

    5

    1996

    /199

    7

    1998

    /199

    9

    2000

    /200

    1

    2002

    /200

    3

    2004

    /200

    5

    2006

    /200

    7

    2008

    /200

    9

    2010

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    1

    2012

    /201

    3

    0

    5.000

    15.000

    20.000

    25.000

    30.000

    35.000

    40.000

    45.000

    10.000

    0

    2.000.000

    4.000.000

    6.000.000

    8.000.000

    12.000.000

    re

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    ol (

    mil

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    e a

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    )

    10.000.000

    Etanol anidro (mil m3)Acar (mil t) Etanol hidratado (mil m3) rea plantada (ha)Cana moda (mil t)

    Fonte: PAM/IBGE (2014) e base de dados Unica.10

    Elaborao dos autores.

    As trajetrias mostradas no grfico 4 sinalizam, em relao aos impulsos agroindstria canavieira: i) grande aumento da produo e da rea agrcola demandada; ii) crescimento regular da produo do etanol anidro, por ser esse um mercado mais estvel (devido garantia de adio obrigatria gasolina e a margens mais vantajosas para a indstria em relao ao hidratado); e iii) trs ocasies de impulsos marcantes (momentos de euforia), quais sejam: vigncia do Programa Nacional do lcool (Prolcool) antes dos anos 1980 (anterior ao perodo mostrado); expanso do mercado do acar a partir de meados da dcada de 1990; e notvel expanso do mercado de etanol, em razo do surgimento do carro flex (2003). O quarto evento de impulso pode ser considerado o Programa de Incentivo a Fontes Alternativas de Energia (Proinfa), iniciado em 2002, que, somado a iniciativas do MME junto Aneel e Empresa de Pesquisa Energtica (EPE), tem aumentado de forma significativa a gerao eltrica a partir da biomassa da cana-de-acar.

    O boom de investimentos no setor, aps 2004, fez com que, segundo levantamento da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab, 2014), realizado junto aos produtores, a capacidade mxima de esmagamento superasse 1,4 bilho de t/ano, ante o esmagamento efetivo de 600 milhes t/ano. Tal excedente de capacidade de produo se assemelha, em termos percentuais, ao existente poca do Prolcool, na dcada de 1970 (Ramos, 2012). Contudo, esse boom ps-2004 foi incentivado e impulsionado pelo Estado, conforme registrado no Plano

    10. Dados disponveis em Unicadata: .

  • 35A Crise na Produo do Etanol e as Interfaces com as Polticas Pblicas

    Nacional de Agroenergia (PNA) (Brasil, 2006), no Plano Nacional de Energia 2030 (PNE) e no Plano Decenal de Expanso de Energia (PDE),11 em todas as suas edies anuais, desde 2007. A deciso da Petrobras de contar com o biocombustvel para atender a cerca de 50% da demando do ciclo Otto no pas, sem exigncia de novas refinarias, foi outro impulso a novas plantas.

    Uma diferena da crise atual em relao s demais reside no aumento da concentrao da produo. Segundo dados do Sistema de Cadastro de Produtores de Etanol, da ANP, e levantamentos de Siqueira (2013) e Ita BBA (Figliolino, 2012), os dez maiores grupos eram responsveis por 30% da produo na safra 2005/2006, passando para 43% a partir da safra 2011/2012. H, contudo, usinas de menor porte em boa situao, assim como unidades de grandes grupos em dificuldades, sugerindo que as empresas no superam a crise autonomamente.

    A concentrao da produo acompanhada de alteraes tambm no controle de capital em parte de grandes grupos, uma vez que, entre as duas safras citadas, os cinco maiores grupos, cujo capital era 100% nacional, passaram parte do controle a grupos estrangeiros. Essa mudana foi decorrente, inclusive, de iniciativas de crescimento dos prprios grupos, que dobraram a capacidade de produo em seis anos, sinalizando condies econmicas distintas em relao ao grupo de empresas que se encontra em crise.

    4.5 Mudanas nos sinais das polticas pblicas e nas respostas do mercado: possvel alternativa?

    Um grande trunfo da agroindstria sucroenergtica a possibilidade de produo e de acesso aos mercados de acar e de etanol, de acordo com o tipo de planta industrial instalada. Segundo Ramos (2012), desde a dcada de 1970 as usinas do tipo mista (que produzem etanol e acar) predominam no pas. Levantamento da Conab de 2012 apontou que das 402 indstrias, 257 tinham esta caracterstica (Conab, 2014).

    As empresas optam, ao construrem ou ampliarem as fbricas, entre uma planta destinada a utilizar o acar total recupervel (ATR) para uma faixa ou mix de um ou outro produto (no sendo 100% flexveis).12 Pesam sobre suas escolhas, antes mesmo da instalao da indstria, as perspectivas de preos, condies de concorrncia, porte do mercado e outros fatores econmicos. No caso do etanol, sinais de apoio e garantia de mercado tm sido determinantes para a deciso de investir no combustvel ou no acar, ressalvada alguma flexibilidade entre ambos (a depender do custo de instalao da indstria e outros).

    A trajetria de destinao do ATR entre os dois produtos mostra a proporo alocada ao longo dos anos (grfico 5) como fator de equilbrio da cadeia produtiva. Destacam-se, no grfico, trs momentos de crise, em perodos de tempo situados entre as polticas de incentivo, sendo que, atualmente, cerca de 50% do ATR destinado produo de etanol, ante menos de 20% na dcada de 1970.

    Com a ajuda do grfico 5 podem ser feitas outras inferncias no intuito de dialogar com polticas pblicas. Na dcada de 1970 era grande a possibilidade de mudana do mix (entre etanol ou acar), na hiptese de escassez de recursos para investimento, em resposta s polticas pblicas (no caso, estmulos do Prolcool, marcado por taxas de juros atrativas, garantia de mercado e vantagens tributrias). No perodo seguinte, na dinamizao da atividade canavieira, com menor grau de interveno do Estado (Vian, 2003; Jank e Nappo 2009; Ramos, 2012), a opo de alocar o ATR para o acar foi natural, em razo do grande crescimento do consumo nos pases importadores e da primeira crise do etanol, em virtude da retirada do estmulo produo.

    11. Para mais informaes sobre o tema e os instrumentos mencionados, ver MME, disponvel em: .

    12. A deciso entre investir na produo de mais etanol ou mais acar , a rigor, denida na instalao das indstrias, nas suas adaptaes ou ampliaes, em razo dos custos envolvidos. Essa escolha, alm de ser inuenciada pelos mercados dos dois produtos, responde tambm a incentivos e sinais das polticas pblicas.

  • 36 Radar | 39 | jun. 2015

    GRFICO 5Trajetria da destinao do ATR entre acar e etanol(Em %)

    18 21 1623

    53

    71 6864

    48 54

    0

    10

    20

    30

    40

    50

    60

    70

    80

    90

    100

    1963

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    4 19

    64/1

    965

    1965

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    6 19

    66/1

    967

    1967

    /196

    8 19

    68/1

    969

    1969

    /197

    0 19

    70/1

    971

    1971

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    2 19

    72/1

    973

    1973

    /197

    4 19

    74/1

    975

    1975

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    6 19

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    977

    1977

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    979

    1979

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    0 19

    80/1

    981

    1981

    /198

    2 19

    82/1

    983

    1983

    /198

    4 19

    84/1

    985

    1985

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    6 19

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    987

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    8 19

    88/1

    989

    1989

    /199

    0 19

    90/1

    991

    1991

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    2 19

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    993

    1993

    /199

    4 19

    94/1

    995

    1995

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    6 19

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    997

    1997

    /199

    8 19

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    999

    1999

    /200

    0 20

    00/2

    001

    2001

    /200

    2 20

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    4 20

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    005

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    6 20

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    007

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    /200

    8 20

    08/2

    009

    2009

    /201

    0 20

    10/2

    011

    2011

    /201

    2

    ATR Acar ATR Etanol

    Segunda crisePrimeira crise

    Prolcool Reduo da interveno Carros ex PNA/PDE

    Fonte: Brasil (2013). Elaborao dos autores.

    Por fim, o ltimo momento apontado no grfico mostra que a flexibilidade de destinao da matria-prima entre os produtos diminuiu desde 2001. Esse fato sugere, por um lado, que h maior definio de posies no mercado em relao a perodos anteriores (ou, em outras palvras, maior dificuldade em migrar de um produto para outro); por outro lado, sugere que as aes do Estado perderam a fora de sinalizar caminhos, ao passarem a ser mais indutivas do que direcionadoras das escolhas dentro do mix. Na atual crise, desde a safra 2007/2008, a oscilao na destinao do ATR ocorreu, tambm, em razo da queda e das oscilaes nos preos do acar, desde 2009, e da qualidade da cana na safra 2009/2010.13

    5 CONSIDERAES FINAIS

    Foram destacados, neste texto, ambientes e aspectos indicativos de crise na produo do etanol, com impactos em toda a cadeia produtiva, frisando que o foco da crise atual encontra-se nas fragilidades de concorrncia do produto etanol hidratado diante da gasolina. Foram ressaltadas as dificuldades das empresas (endividamento, aumento dos custos, prejuzos com intempries e reduo de margens) em dados ainda no conclusivos sobre o impacto na produo. As pastas governamentais que cuidam do ambiente institucional passaram por mudanas de atribuies recentes, com avanos, mas estando, ainda, em fase de consolidao. As mudanas pelas quais passa a cadeia produtiva antepem, historicamente, fases de grande crescimento, com sinais de euforias, sendo seguidas de crises. Os sinais que levam a euforias tm sido originados, inclusive, de polticas de incentivo e de direcionamento da produo (entre etanol e acar), em distintos momentos da trajetria do setor, desde o Prolcool.

    Merece destaque o fato de que as sadas possveis para os grupos com maiores dificuldades (aqueles apontados como em situao ruim e pssima neste artigo) no so vislumbradas apenas com as receitas e os resultados da produo, uma vez que a receita lquida negativa e crescente, segundo os levantamentos consultados.

    13. Ressalta-se que a denio de qual produto ser fabricado no de grande exibilidade depois que a planta industrial instalada. Tambm se deve limitar a comparao do mercado do acar com o etanol hidratado, dado que o anidro tem outra dinmica e mercado cativo, com margens mais fortemente relacionadas gasolina.

  • 37A Crise na Produo do Etanol e as Interfaces com as Polticas Pblicas

    Reaes de acomodao no mercado (fuses e incorporaes) tm sido apontadas como alternativas nesses casos. Nasce, tambm, a partir do setor privado, a reivindicao de um amplo programa de saneamento do setor, de modo a voltar o investimento. Mesmo nessa hiptese, admite-se que grupos mais atrasados, no sentido tecnolgico e de gesto, sairiam do mercado, como j tem ocorrido. Tais sinais levam a uma questo j bastante destacada no debate do tema, que a necessidade de uma poltica contundente para o produto etanol hidratado, com especial ateno para os elos agricultura e indstria.

    Ao mesmo tempo, os estudos evidenciam um considervel nmero de indstrias que tm superado ou convivido com as dificuldades setoriais, mantendo viabilidade econmica pelo menos na perspectiva de mdio prazo. Este indicativo aponta que h atrasos a serem saneados. Ainda assim, cabe observar que a esse grupo de sobreviventes da crise, que convivem com ela sem interromper a produo, tambm cabem medidas de dinamizao, com vistas ao aumento da concorrncia, reduo de custos e adoo de novas tecnologias para o alcance de maior produtividade, como admitem os prprios produtores e a literatura.

    Considerando-se a complexidade da agroindstria canavieira, independentemente de crises, de euforias e de indicadores interpretativos, importante o aprofundamento de estudos em temas como: as mudanas na regulao e formas distintas de tributao entre etanol e gasolina no mbito dos estados; o novo papel e os efeitos de atos mandatrios de mistura; as novas perspectivas de expanso e de usos da eletricidade da biomassa; e a influncia dos demais elos (distribuio e revenda) na competitividade setorial, inclusive os impactos de suas dinmicas nos elos para trs da cadeia (indstria e agricultura).

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