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Departamento de Letras
CRISE DAS IDENTIDADES MULTIPLAS:
CAPITÃO AMÉRICA E UM DISCURSO LITERARIO ADQUIRINDO NOVAS IDEOLOGIAS
Aluno: Raphael Aguiar de Loiola
Orientador: Liana Biar
Introdução Este trabalho foi realizado como parte das atividades do Programa de Educação Tutoria l
do departamento de Letras da PUC-Rio. Nele, busquei apresentar reflexões sobre a constituição
da linguagem no âmbito das histórias em quadrinhos, suas diferentes formas de organização e investigar a construção de sentido em narrativas dicotômicas a partir de analises da trajetória
ideológica do personagem “Capitão América”.
Objetivos
Este estudo visa, através de análises de duas narrativas que compõem o cânone de
histórias do “Capitão América”, “O Soldado Invernal” e “Impotente”, ambas lançadas em momentos políticos distintos na história dos Estados Unidos, investigar a forma como o personagem é retratado tanto na cultura popular como dentre o público leitor.
Metodologia
Afim de identificar o discurso político atribuído ao personagem, me embasei nas obras “Microfísica do Poder” e “Vigiar e Punir” de Michel Foucault. Os conceitos de “Panóptico de Betheam” e da reformulação Corpo Político provocada pelo estado, apresentados pelo filoso fo,
dialogam com narrativa do super-herói e suas origens nacionalistas, podendo assim evidenciar novos significados dentro desse arquétipo. Já o conceito de “micro resistências” auxilia a compreensão da relevância política e cultural do personagem e evidencia a produção das
histórias em quadrinhos enquanto instrumentos de comunicação e difusão de valores ideológicos.
Através de estudos dentro do campo da semântica, em especial as análises pragmáticas de exemplos discursivos, pude trazer para dentro da pesquisa um entendimento mais amplo dos significados embutidos no texto. O estudo da semântica é, resumidamente, o estudo do
significado e da ciência das significações, dedicada a desbravar os problemas suscitados sobre o significado (Tudo tem significado? Significado é imagem acústica, ou imagem visual?).
A pragmática por sua vez seria o ramo da linguística que estuda a linguagem no contexto de seu uso na comunicação. As palavras, em sua significação comum, assumem muitas vezes outros significados distintos no uso da língua. Gostaria de mencionar que o objetivo deste
trabalho não está voltado para o estudo desses recursos, estando mais interessado em fornecer um exemplo de como as áreas da semântica e da pragmática podem ser usadas para enriquecer uma análise interpretativa, evidenciando os diferentes sentidos presentes em um discurso no
formato de obra literária. Além disso, inspirado pelo ensaio “O nó metafórico”, de Umberto Eco, pretendo aqui
reconhecer a caracterização visual também como um objeto discursivo, afim de compreender
seu acontecimento simbólico na discursivização do social sob o prisma da imagem, podendo analisar aspectos visuais do corpo como metáforas visuais dentro do discurso ideológico do
personagem “Capitão América”.
Departamento de Letras
Conclusões
A relação entre personagem Capitão América e os Estados Unidos é simultaneamente óbvia (ele usa as estrelas e listras e leva o nome do próprio pais) e sutil. O subtexto da trama “Imponente”, por exemplo, atribui um novo significado ao corpo do Capitão América, um que remete por exemplo a Hobbes e a noção do “corpo político”, onde o estado-nação é imaginado
como um corpo humano. O filosofo inglês visualiza o estado-nação como uma junção do povo da nação compondo o corpo enquanto o rei ocupa o papel da cabeça (o controle).
Foucault anos mais tarde alega que houve uma mudança no modelo de corpo político, pois dessa vez não existe mais essa divisão já que dentro do sistema o corpo do soberano (ou do estado) passou a ser aceito como o único corpo, um corpo soberano. O Corpo de Steve Rogers
aqui pode ser visto como um exemplo do corpo soberano proposto por Foucault, trazendo a tramas como as da saga “Impotente” um tom de crítica à fragilidade da hegemonia do governo
americano. Elementos filosóficos como esses, interligados de forma orgânica na trama, tanto no que diz respeito ao discurso textual quanto à construção visual do personagem, acabam transformando características clichês do gênero em alegorias políticas. Gostaria de reforçar
com este trabalho a qualidade literária que pode ser encontrada nas histórias em quadrinhos; sendo assim, acredito que o assunto está longe de ser esgotado. Apesar de existir uma evolução
na forma como os quadrinhos são vistos, ainda existe muito preconceito por parte do meio acadêmico em relação a esse gênero de produção literária, que definitivamente não deve ser visto como um produto midiático de alienação ou de distração.
Referências Bibliográficas
1 - FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: o nascimento da prisão. 20ª ed. Tradução Raquel Ramalhete. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999.
2 - FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. São Paulo: Editora Graal, 2007.
3 - ARROJO, Rosemary. RAJAGOPALAN, Kanavillil. A noção de literalidade: Metáfora Primordial. Petrópolis, RJ : Vozes, 2000.
4 - PEREIRA, Carlos Eduardo Boaretto. 1954: As histórias em Quadrinhos do Capitão
América como Panfleto Anticomunista. Paraná: Unioeste. 2005.
6 - ECO, Umberto. O nó metafórico. In: Semiótica e filosofia da linguagem. Trad. de Maria
Rosaria Fabris e José Luiz Fiorin. São Paulo: Ática, 1991.
7 - ARROJO, Rosemary e RAJAGOPALAN, Kanavillil. “O ensino de leitura e a escamoteação da ideologia”. In: Rosemary Arrojo (org.). O signo desconstruído. Pontes, São Paulo. 1992