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1 CRESCIMENTO E CRISE NA ARGENTINA NOS SÉCULOS XIX E XX: ANÁLISE DO PERÍODO FRONDIZI Maria Heloisa Lenz 1 – UFRGS – [email protected] Vinícius Dias Fantinel 2 – UFRGS – [email protected] Resumo O presente trabalho analisa as principais políticas econômicas e sociais implementadas na Argentina no período compreendido entre o final do seculo XIX, quando o país experimentou o início de seu intenso crescimento, até o século XX, o qual foi marcado por diversas instabilidades políticas e econômicas, causando o fim do período de crescimento acelerado, que acabou culminando com a chegada ao poder de Perón e Frondizi. O trabalho está dividido em três partes. Na primeira parte, serão examinadas as características do período de crescimento iniciado no século XIX, a Belle Èpoque. Na segunda parte, dedicada ao século XX, serão examinadas as principais características do mesmo, com destaque no governo peronista. Na terceira parte, será analisado o período do governo de Frondizi, com ênfase na sua política industrializante, evidenciando o caráter do desenvolvimentismo econômico proposto pelo presidente. Palavras-chave: Argentina, Frondizi, crises econômicas Abstract This paper analyzes the main economic and social policies implemented in Argentina during the period between the late nineteenth century, when the country experienced the beginning of their intense growth, until the twentieth century, which was marked by several political and economic instabilities, causing the end of the trh period of accelerated growth, which culminated with the coming to Power of Perón and Frondizi. The work is divided into three parts. The first part will examine the characteristics of the growth period started in the nineteenth century, the Belle Epoque. In the second part, devoted to the twentieth century, will examine the main features of it, especially in the Peronist government. In the third part will analyze the government's Frondizi period, with emphasis on its industrialization policy, emphasizing the character of the president's proposed economic desenvolvimentista. Keywords: Argentina, Frondizi, economic crisis Área Temática: 4. História Econômica Geral e Economia Internacional 1 Professora do Programa de Pós-Graduação em Estudos Estratégicos Internacionais e do Departamento de Economia da UFRGS. 2 Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Economia Aplicada da UFRGS.

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CRESCIMENTO E CRISE NA ARGENTINA NOS SÉCULOS XIX E XX:

ANÁLISE DO PERÍODO FRONDIZI

Maria Heloisa Lenz1– UFRGS – [email protected]

Vinícius Dias Fantinel2 – UFRGS – [email protected]

Resumo O presente trabalho analisa as principais políticas econômicas e sociais implementadas na Argentina no período compreendido entre o final do seculo XIX, quando o país experimentou o início de seu intenso crescimento, até o século XX, o qual foi marcado por diversas instabilidades políticas e econômicas, causando o fim do período de crescimento acelerado, que acabou culminando com a chegada ao poder de Perón e Frondizi. O trabalho está dividido em três partes. Na primeira parte, serão examinadas as características do período de crescimento iniciado no século XIX, a Belle Èpoque. Na segunda parte, dedicada ao século XX, serão examinadas as principais características do mesmo, com destaque no governo peronista. Na terceira parte, será analisado o período do governo de Frondizi, com ênfase na sua política industrializante, evidenciando o caráter do desenvolvimentismo econômico proposto pelo presidente.

Palavras-chave: Argentina, Frondizi, crises econômicas Abstract This paper analyzes the main economic and social policies implemented in Argentina during the period between the late nineteenth century, when the country experienced the beginning of their intense growth, until the twentieth century, which was marked by several political and economic instabilities, causing the end of the trh period of accelerated growth, which culminated with the coming to Power of Perón and Frondizi. The work is divided into three parts. The first part will examine the characteristics of the growth period started in the nineteenth century, the Belle Epoque. In the second part, devoted to the twentieth century, will examine the main features of it, especially in the Peronist government. In the third part will analyze the government's Frondizi period, with emphasis on its industrialization policy, emphasizing the character of the president's proposed economic desenvolvimentista.

Keywords: Argentina, Frondizi, economic crisis Área Temática: 4. História Econômica Geral e Economia Internacional

1Professora do Programa de Pós-Graduação em Estudos Estratégicos Internacionais e do Departamento de Economia da UFRGS. 2Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Economia Aplicada da UFRGS.

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Introdução O objetivo principal deste trabalho é analisar três períodos da história econômica

argentina: o final do século XIX; o século XX, com as turbulências do governo

peronista; e o governo de Frondizi, enfatizando este último. O governo de Frondizi, que

governou o país entre 1958 e 1962, é um período pouco estudado na história argentina.

A Argentina é principalmente lembrada em dois momentos: pelo seu período de intenso

crescimento iniciado no final do século XIX, a Belle Èpoque, e também no século XX,

pelas turbulências do período peronista. Entretanto, o período de Frondizi, que sucedeu

a todos estes acontecimentos ficou obscurecido indevidamente, pois o caráter

desenvolvimentista do seu governo trouxe características inéditas para o seu governo.

O crescimento iniciado no final do século XIX, o qual foi alavancado com a

abertura de novas terras, imigração européia e exportações de produtos agrícolas, foi

levado à exaustão até os anos trinta, sendo sucedido pelo governo de Perón, que

governou a Argentina no período 1946-55. Perón trouxe uma mudanca radical na

condução da economia, tanto no tratamento das questões sociais e econômicas, mas

principalmente nas novas relações com as classes populares. Com a queda de Perón por

um golpe militar, ocorreu um período conturbado politicamente, quando foi instalado

um governo provisório. Foi nesta sequência que Frondizi assumiu o governo nacional.

O período de adoção do modelo primário exportador se inicia por volta de

1860/70 e termina, para a maior parte dos autores, no ano de 1930. Este término foi

determinado principalmente pela Grande Depressão de 1929, que assolou os países

capitalistas desenvolvidos. O auge desse período de intenso crescimento econômico

argentino se inicia nos anos 1880 e vai até momentos antes do início da Primeira Guerra

Mundial, em 1914, momento em que houve uma queda no crescimento determinado por

questões internacionais, já que nesse modelo havia profunda dependência argentina do

mercado externo. Nesse período, o crescimento econômico argentino foi impulsionado

pelo crescimento de suas exportações, que tinham como principal destino a Inglaterra.

A partir de 1930, a Argentina teve de buscar um novo rumo para a sua economia.

A Grande Depressão de 1929 havia gerado uma crise econômica global que fez com que

fosse diminuído o comércio mundial. Essa situação foi agravada mais ainda com a

Segunda Guerra Mundial, que conteve mais ainda as transações comerciais. A indústria

se desenvolve nesse momento, principalmente voltada ao mercado interno.

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Juan Perón assumiu o comando da Casa Rosada, presidência da Argentina no

período de 1946 a 1955. No momento que Perón assumiu a presidência em 1946, foi

iniciado na Argentina um fenômeno político característico da América Latina do pós-

guerra: um governo forte, cuja liderança detinha o apoio popular, adepto do discurso e

prática nacionalistas. A política econômica do presidente era fortemente caracterizada

por uma grande participação do Estado na condução e na regulamentação da economia,

monopolizando o comércio exterior e nacionalizando vários setores da economia.

Estava presente na Argentina sob o comando de Perón um fenômeno chamado

por alguns de “populismo”, que localmente passou a chamar-se Peronismo. Perón

incentivou a ampliação dos direitos trabalhistas e a organização dos movimentos

sindicais argentinos. A sua perspectiva política coadunava tanto elementos de caráter

populista como mecanismos de centralização do poder.

Já Frondizi, que assumiu o poder em 1958, possuía um discurso mais moderno,

com referências claras aos problemas estruturais do país e uma proposta nova, na qual

ressaltava a importância do desenvolvimento das forças produtivas e o papel que os

empresários deveriam cumprir. No período do seu governo, foram efetuados diversos

investimentos na indústria, objetivando retirar a Argentina da situação de estagnação

econômica em que se encontrava no fim da década de 1950. O presidente buscava as

novas bases para a consolidação da modernização argentina. Sua política econômica foi

a de promover a desnacionalização da economia com o incentivo aos investimentos de

capitais estrangeiros, favorecendo a iniciativa privada em setores de responsabilidade

estatais. As bases de sua política econômica foram às leis de permanência de capitais

estrangeiros e de promoção industrial, sancionadas antes do fim de 1958. Seu programa

econômico propunha o fomento de investimentos externos na economia argentina, com

entrada de capital e tecnologia, de modo a possibilitar a substituição das importações, a

diversificação das exportações e a consolidação de uma política fiscal voltada para o

desenvolvimento.

O presente trabalho está estruturado da seguinte forma. Na primeira parte serão

examinadas as características do período de crescimento iniciado no século XIX, a Belle

Époque. Na segunda parte, dedicada ao século XX, serão examinadas as principais

características do mesmo, com destaque no governo peronista. Já na terceira parte, será

analisado o período do governo de Frondizi, com ênfase na sua política industrializante,

evidenciando o caráter do desenvolvimentismo econômico proposto pelo presidente.

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O crescimento da economia argentina: final do século XIX e início do século XX

A Argentina experimentou um período de intenso crescimento no final do século

XIX, a Belle Époque, a ponto de no início do século XX despontar como uma dos mais

importantes nações em relação ao crescimento econômico. Conforme Lenz (2004), este

intenso crescimento levou a Argentina a ser comparada a países como Estados Unidos e

Canadá. Entretanto, ao longo do século XX, o país passou a enfrentar períodos com

enormes problemas econômicos, sociais e políticos. O final desta fase de crescimento

econômico ainda é objeto de intenso debate na literatura3, variando entre 1914 e 1929,

mas, independente dessa discussão, o fato é que, ao longo do século XX, a Argentina

sofreu períodos de intensa instabilidade econômica, política e social. Contudo, o mais

importante é que o período de crescimento que iniciou no final do século XIX

caracterizava-se por uma grande abertura com o exterior, sendo o seu grande parceiro a

Grã-Bretanha, através de produtos, de mão-de-obra e, principalmente, de capitais. Esses

capitais, que chegaram ao país sob a forma de investimento estrangeiro, eram

preponderantemente de origem britânicos e destinados primordialmente à construção de

estradas de ferro no país. O alto grau de desenvolvimento econômico alcançado pela

economia européia, principalmente o logrado pela Inglaterra, de acordo com Cortés

Conde (1963), culminou na ampliação dos mercados além dos seus níveis nacionais.

Furtado (2007) menciona que a Argentina foi um país que cresceu muito devido

ao processo de expansão de suas exportações, que tinham como destino a Europa. Para

o autor, a sociedade e a economia argentina sofreram profundas modificações,

principalmente devido às ondas de imigrações provenientes da Europa desde a segunda

metade do século XIX e da penetração de grandes quantidades de capitais

internacionais.

A Argentina, segundo Cortés Conde (1963), possuía condições especiais para se

tornar receptora de capitais europeus, principalmente ingleses. O país possuía, por volta

de 1860, uma organização política relativamente estável e um sistema jurídico que

garantia segurança aos investimentos realizados por estrangeiros. Ademais, havia

facilidade para se realizar inversões, pois não havia limites às remessas de lucros ao

exterior e o capital era altamente rentável. Por último, também havia grandes 3 Em suma, a discussão entre as várias posições mostra unanimidade em relação às causas do esgotamento do modelo argentino de crescimento aberto por volta dos anos próximos da I GM, - o estreitamento monetário europeu na segunda metade de 1913, que reduziu o fluxo de capitais, a falência das colheitas de 1914, e também a I GM -, sendo que a discordância gira em torno da profundidade da crise e da manutenção do crescimento durante os anos vinte. (Lenz , 2006).

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quantidades de recursos naturais e era uma região propícia para o desenvolvimento de

uma economia primário exportadora.

A partir das décadas finais do século XIX, o livre mercado e a abertura ao capital

estrangeiro constituíram a visão do mundo que sustentou a estratégia do modelo

primário exportador: comércio, imigrantes e capitais. As construções das ferrovias

resolveram o problema dos transportes, reduzindo radicalmente os fretes e

possibilitando que os territórios mais rechaçados dos portos de embarque e dos centros

de consumo entrassem em produção.

Nesse período, em relação ao papel do Estado, não havia políticas creditícias

preferenciais para os investimentos industriais e outros instrumentos de políticas ativas

de transformação efetiva, o que configurou a política da economia primária exportadora.

O ajuste do sistema monetário ao padrão-ouro equilibrava o balanço de

pagamento através de seu mecanismo, garantia a estabilidade da moeda nacional, não

permitia a expansão monetária sem lastro no ouro e fazia com que o governo argentino

cumprisse os acordos relativos ao pagamento da dívida pública externa.

Como destaca Cortés Conde (1974), a expansão argentina nesse período não

somente se reduziu ao mercado externo. Pode-se dizer que, com a redução dos custos de

transportes e a incorporação de terras férteis, surgiu também um mercado nacional. Esse

mercado nacional incentivou o surgimento de indústrias. A composição das importações

mostrava a inexistência de uma política de promoção do desenvolvimento de

determinados setores da atividade manufatureira. O desenvolvimento industrial ficou

restrito a algumas indústrias de pouca densidade de capital e baixa complexidade

técnica, principalmente a de alimentação e a indústria metalúrgica leve ou também as

destinadas à exportação, como a frigorífica.

A Argentina do século XX: conseqüência da Crise de 1929 e a chegada do peronismo

Para Lenz (2001), nas primeiras décadas do século XX, as indústrias apareceram

nos ramos que possuíam matéria-prima mais próxima aos locais de produção e cujos

preços permitiam competir com a produção importada e chegar aos mercados

estrangeiros.

A situação econômica argentina sempre foi de alto crescimento econômico na

época analisada, exceto nos períodos da crise bancária de 1890 e durante a Primeira

Guerra Mundial. O crescimento foi maior no período posterior a crise de 1890 até a

Primeira Guerra Mundial. Conde (1974) revela que, às vésperas da Primeira Guerra

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Mundial, a Argentina havia obtido um crescimento extraordinário de cinco décadas. A

Argentina havia passado de um país pobre e atrasado para um dos de renda per capita

mais alta do mundo.

O resultado da IGM, assim como a crise que abalou o sistema capitalista em

1929, afetou profundamente os países da América Latina, e, portanto, a Argentina,

influenciando suas opções de crescimento. Como marco da política internacional,

ocorreu o declínio da Grã-Bretanha como principal potência hegemônica no sistema

ocidental, marcando, concomitantemente, a ascensão dos Estados Unidos para esta

posição. Os Estados Unidos saíram da I GM como a nação mais favorecida, passando

da posição de potência regional para mundial. Uma decorrência natural dessa nova

posição foi o aumento de sua influência nos países da América Latina, começando um

movimento que se denominou de “expansão da influência do dólar na área tradicional

da libra”. A Argentina, principal país exportador de produtos alimentícios, com seu

desempenho sempre ligado ao aspecto externo - mãos-de-obra, capital e mercado

externo - teve de buscar novas alternativas.

Na década de 1920, quando as condições externas se modificaram, pondo fim à

entrada de imigrantes e de capitais estrangeiros no país, a economia argentina já estava

mostrando sinais de saturação em relação a sua capacidade de absorver recursos

externos, com muitas dificuldades em encontrar novos caminhos para substituir a

economia primária exportadora.

A partir dos anos trinta do século XX, assim como a maioria dos demais países da

América Latina, a Argentina começou a formular um modelo alternativo, iniciando,

dessa forma, o processo de industrialização substitutivo de importações sob o manto do

nacionalismo e da proteção econômica. O objetivo era tanto a construção de um parque

industrial, como também a construção de um forte mercado interno.

Segundo Diaz Alejandro (2002), o PIB argentino sofreu redução entre 1929 e

1932 de aproximadamente 14%. Após esse momento de contração econômica, o PIB

voltou a se expandir, ano após ano, até 1940. Entre 1929 e 1939, o PIB argentino

apresentou acréscimo de 15%. O valor agregado das manufaturas argentinas foi

incrementado em 62%. Apesar da redução de volume de exportações na década de

1930, alguns produtos ainda possuíam importância na pauta de exportações. Os

principais produtos de exportação na década de 1930 continuaram sendo o trigo e a

carne, representando 37% e 39% do valor total, respectivamente. (Fausto & Devoto,

2005)

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A indústria, segundo Rapoport (2000), passou a ser o impulsionador do

crescimento econômico e gerou uma importante transformação na estrutura produtiva, a

qual acelerou o processo substitutivo de importações. Os setores de maior crescimento

eram aqueles que se destinavam à produção de bens de consumo final, eram mais

intensivos em capital e importavam maquinarias e insumos intermediários necessários a

sua produção.

Para Fausto & Devoto (2005), a neutralidade argentina na Segunda Guerra

Mundial agravou a situação, pois “batia de frente” com o país mais poderoso da época,

os Estados Unidos. Nesse período, o Brasil fazia aliança com os EUA e a Argentina

perdia muitas oportunidades de investimentos. 4

Em 1943, o presidente Ramon Castillo foi deposto pelos militares, que assumiram

o controle do país. A partir desse ano, despontava a figura do militar Juan Perón, que

evoluía cada vez mais no cenário político argentino. Desde 1943, o coronel Juan

Domingo Perón já ganhava destaque no governo como Ministro do Trabalho e da

Previdência Social, atraindo para o regime o apoio dos sindicatos. Como responsável

pelas secretarias do Trabalho e Previdência, interveio amplamente nas relações

trabalhistas. Desde o início, o governo militar teve a apoio dos trabalhadores, já que o

salário teve um incremento real significativo e houve a criação de inúmeros benefícios.

Em 1945, o coronel acumulou também os cargos de Ministro da Guerra e Vice-

Presidente.

A política econômica peronista se caracterizou por ser fortemente intervencionista

e por buscar promover a industrialização. Foi responsável por nacionalizar diversos

setores da economia nacional e também pela realização de políticas sociais, que

melhoram substancialmente a condição de vida dos trabalhadores locais.

A Argentina acabou por não aderir aos acordos de Bretton Woods e investiu em

acordos bilaterais. Perón não acreditava na liberalização e na multilaterização da

economia e optou por adotar políticas fortemente intervencionistas, contrariando a

maior parte do mundo desenvolvido naquele momento. (Candeas, 2005)

De acordo com Rapoport (2000), as medidas sociais lançadas em 1945 foram

ampliadas no período 1946-1949. Os salários começaram a subir consideravelmente

através de negociações coletivas asseguradas por lei. Também houve a introdução e a

ampliação de muitos benefícios, como as férias remuneradas, as licenças por doença ou

4 O país somente aderiu aos Aliados – constituído por Estados Unidos, Inglaterra e França – em 1944.

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os sistemas sociais de saúde e turismo, que foram logradas também pela presença ativa

dos sindicatos.

Não obstante, as melhorias das condições de vida da população foram diminuídas

substancialmente nos anos que se seguiram à crise de gastos estatais de 1949. Os gastos

públicos tiveram que ser reduzidos e o governo não tinha mais recursos suficientes para

financiar a sua política de desenvolvimento social. Existiam poucos investimentos

externos e as abundantes reservas internacionais tinham se reduzido consideravelmente

com o passar dos anos.

Essa distribuição de renda e riqueza favorável aos trabalhadores foi financiada

através da realização de muitos gastos públicos, fator responsável por reduzir em grande

quantidade a riqueza argentina obtida durante a Segunda Guerra Mundial. Essa situação

acabou se tornando insustentável, visto que o crescimento econômico argentino também

se reduziu fortemente durante governo peronista.

A nacionalização de grande quantidade de empresas teve um papel muito

importante na evolução do setor público. Segundo Diaz Alejandro (2002), esse processo

dava ao Estado a possibilidade de corrigir alguns desequilíbrios econômicos, já que se

tornava mais responsável pela geração de empregos e ampliação e melhoria dos serviços

públicos. Foram nacionalizados os setores de distribuição nacional de gás, de telefonia,

dos transportes (estradas de ferro) entre outros.

De acordo com Bussola (2008), a nacionalização das estradas de ferro teve um

importante valor simbólico para a Argentina, já que cortou os laços com os capitais

estrangeiros e inaugurou um período de relativa independência econômica, o que dava

ao governo o seu caráter nacionalista. Entretanto, essa situação impediu a realização de

novos investimentos externos na economia argentina, fator que impossibilitou um maior

crescimento econômico argentino no período peronista.

Em 1952, após sua reeleição, Perón apresentou o Segundo Plano Qüinqüenal, que

entraria em vigor em 1953 e teria validade até 1957. De acordo com o plano, o Estado

era responsável pelo controle do comércio exterior guiado pelo objetivo de defender a

produção nacional e obter termos de troca eqüitativos. A gestão do plano era orientada

para a consolidação dos mercados de exportação e importação e alguns setores-chave

eram fixados de acordo com uma ordem de prioridades. (Haines, 2008)

A política internacional peronista foi denominada de Terceira Posição, pois estava

eqüidistante do bloco capitalista, liderado pelos EUA, e do socialista, liderado pela

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União Soviética. De acordo com Candeas (2005), com essa política de não-alinhamento,

a Argentina procurava a máxima autonomia dentro do Hemisfério Ocidental.

No segundo mandato de Perón (1952-1955), o antiamericanismo acabou sendo

revertido de forma pragmática e foi iniciada uma fase de fluxo de capitais

estadunidenses ao país. Foi celebrado inclusive um acordo com a Standart Oil em 1955,

que previa a constituição de uma “Califórnia Argentina de Petróleo S.A.”. Essa

transferência de capitais estrangeiros foi de fundamental importância para uma

recuperação parcial da economia argentina. A riqueza do país havia sido reduzida

consideravelmente e se fazia necessário o ingresso de investimentos externos para não

dificultar ainda mais a conjuntura econômica do país.

Para Gerchunoff & Llach (2003), o governo peronista assumiu uma postura

nacionalista e industrializante, restringindo as importações que pudessem competir com

as indústrias nacionais e se responsabilizou em fornecer créditos subsidiados à indústria

local. Ademais, o Instituto Argentino para la Promoción del Intercambio (IAPI),

monopolizou a comercialização agrícola e transferiu a renda obtida para o setor

industrial

A evolução do investimento industrial coincidiu com a do produto. Para Diaz

Alejandro (2002), os investimentos industriais em máquinas e equipamentos,

imprescindíveis para qualquer melhoria tecnológica e produtiva, foram extremamente

importantes no período 1946-1948, sendo resultado de importações principalmente de

origem estadunidense. Entre 1949 e 1952, o setor industrial obteve um desenvolvimento

mais lento que no nos anos anteriores. A taxa de crescimento global foi de 2,9% e os

setores mais dinâmicos foram o de máquinas e aparatos elétricos, derivados do petróleo,

veículos e produtos têxteis.

Mesmo com a redução da participação da indústria de alimentação em relação ao

total, ela ainda assim se manteve preponderante no período peronista. Em segundo lugar

em participação, se encontrava o setor têxtil, se mostrando forte durante o período. O

setor passou por um incremento nos primeiros anos do governo Perón, para depois uma

redução na participação, chegando a um nível um pouco mais baixo se comparada com

o do fim da Segunda Guerra Mundial.

O processo de industrialização havia permitido substituir importações, de maneira

que em meados da década de 1950 se fabricava localmente um conjunto de bens de

consumo substancialmente maior que antes se comprava do exterior. Porém, esse

processo suscitou um crescimento veloz da importação de insumos diretos e indiretos,

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além de máquinas. Portanto, pode-se dizer que a produção industrial argentina era

extremamente dependente dos ciclos econômicos mundiais. No longo prazo, seu

crescimento dependia de que as exportações geradas pelo setor primário agropecuário

gerassem divisas suficientes para cobrir as importações de insumo e bens de capital.

Quando Perón iniciou seu mandato em 1946, o novo governo herdou uma

importante quantidade de reservas internacionais, cerca de 1,6 bilhão de dólares. De

1946-1948, o governo adotou uma política claramente expansionista, estimulando

fortemente a produção industrial e realizando uma redistribuição de rendimentos em

favor dos setores populares (Diaz Alejandro, 2002). A oferta monetária aumentou

250%, o gasto público passou de 16 para 29% do PIB e os salários e benefícios sociais

foram consideravelmente elevados (Ferrer, 2006).

Nesses três primeiros anos de governo, o PIB aumentou em 16% e os bens e

serviços disponíveis em 29%. As importações, que foram muito reduzidas durante o

período pós Depressão, delimitadas pela redução para capacidade de importar do país,

cresceram aceleradamente nesses anos. (Fausto & Devoto, 2005). Além disso, o capital

estrangeiro, que em 1913 era equivalente a 50% do ativo fixo do país, foi reduzido para

5% em 1955. As mudanças na estrutura produtiva, a elevação do emprego na indústria e

nos serviços, o aumento das migrações internas, a urbanização e as políticas sociais

peronistas contribuíram em grande escala para a integração do tecido social e para o

estabelecimento de maior equidade na distribuição de renda.

A taxa média de crescimento do PIB no período compreendido entre 1946 e 1955

foi de 3,6%, sofrendo, entretanto, oscilações de elevadas amplitudes. Nos três primeiros

anos o crescimento foi bastante acelerado, alcançado o pico em 1947 com 11,1% de

crescimento. Após três anos de grande crescimento, o PIB se reduziu drasticamente no

ano de 1949, sendo inclusive negativo. Em 1950 e 1951 há uma recuperação, situação

que piora muito com a queda de 6,6% no ano seguinte. Porém, nos três anos

subseqüentes, há uma inflexão na conjuntura determinada por acréscimos no PIB de no

mínimo 4% em relação aos anos anteriores. O investimento, que foi muito reduzido

durante a II GM, aumentou consideravelmente a partir de 1945. Ele sofreu reduções nos

anos de 1952-53, mas se recuperou nos dois últimos anos do governo. Em 1955, atingiu

índice menor somente que nos três primeiros anos do governo.

O consumo também teve alto crescimento no período do governo peronista.

Obteve maior crescimento nos anos de 1946 a 1948, mas continuou crescendo até 1951,

em taxas menores. Após uma queda no ano posterior, somente em 1954 o valor

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consumido superou o de 1951, voltando a crescer no ano subseqüente, representando o

melhor valor da época analisada.

A chamada etapa “clássica” do peronismo abarcou um lapso de tempo de apenas

três anos, entre 1946 e 1948. Já em 1949, a economia entrou em crise, principalmente

devido à queda nos preços de intercâmbio argentino, enfraquecendo os mecanismos de

sustentação do primeiro plano qüinqüenal, que apoiava a industrialização e se viu

prejudicado pelos problemas de déficit na balança comercial.

Para Diaz Alejandro (2002), com a diminuição das exportações do país a partir de

1949, houve um grande estrangulamento de divisas, pois a substituição de importações

nos três anos anteriores não deixou quantidade suficiente requeridas para a economia

argentina continuar crescente a altas taxas. Após sua reeleição em 1952, Perón

conseguiu implantar medidas que, apesar de impopulares, visavam combater a inflação

e os déficits nas contas externas. Dessa forma, o plano econômico de 1952 resultou na

redução dos gastos do governo em mais de 20% e na adoção de uma política monetária

restritiva. A moeda foi desvalorizada e o governo introduziu um reajuste nas tarifas dos

serviços públicos. (Diaz Alejandro, 2002)

Desta forma, o plano de estabilização tornou a inflação controlada, enquanto que

em relação às contas externas o problema foi resolvido apenas temporariamente, já que

depois de grandes déficits nos anos 1951 e 1952, essas contas se tornaram superavitárias

em 1953 e 1954, mas voltaram a apresentar déficits já em 1955. (Rapoport, 2000)

Em 16 de setembro de 1955, um golpe de Estado denominado Revolução

Libertadora derrubou Perón do governo e assumiu o poder o Eduardo Lonardi de

maneira provisória. Dois meses após assumir o cargo provisório de presidente

argentino, Lonardi teve de renunciar e acabou sendo substituído pelo general Pedro

Aramburu, que tinha uma relação mais próxima dos setores antiperonistas (Romero,

2005). Aramburu, que governou provisoriamente até 1958, foi o responsável por

dissolver o Partido Peronista, o que causou muitas revoltas nos sindicatos.

Em 1956, a Argentina aderiu ao Acordo de Bretton Woods, passando a ter acesso

ao FMI. Também foi substituída a política de acordos bilaterais pela participação

multilateral de comércio. Foi reaberta a dependência a empréstimos internacionais, que

tinham a função de financiar a infra-estrutura e compensar os desequilíbrios comerciais.

Análise do Governo Frondizi: período de 1958-1962

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Frondizi surgiu como um intelectual progressista, proveniente da esquerda da

UCR e era um político opositor aos conservadores, aos militares, ao peronismo e à

direita de seu próprio partido. Presidiu o governo entre maio de 1958 e março de 1962 e

era favorável ao nacionalismo econômico e progressismo e defendia a anistia dos presos

políticos.

O desenvolvimento argentino identificava um bloco social que buscava a

promoção do progresso, integrado pelos empresários industriais, os trabalhadores, parte

dos intelectuais, a Igreja e o Exército. Contrário a esse bloco, exista outro composto

pelo setor latifundiário e incluía a maior parte dos grupos relacionados à Argentina

agroexportadora, considerados por eles responsáveis pelo subdesenvolvimento

argentino. (Caraballo et al., 1998)

A estratégia do novo governo era baseada na idéia de que não poderia se esperar

um novo crescimento do setor agropecuário e também que o país tinha que tomar uma

nova diretriz de um desenvolvimento industrial integrado, com base no processo de

substituição de importações. Souza (2008) destaca que a proposta desenvolvimentista

do novo presidente combinava a ação do Estado e a presença de capital estrangeiro.

A retórica do novo presidente incorporava o tema novo do desenvolvimento,

associado aos investimentos estrangeiros, e o unia à condenação do velho imperialismo

britânico. Todas as forças do país moderno foram convocadas a se unir em oposição aos

interesses locais e externos forjados na fase agroexportadora.

Frondizi implementou um programa econômico desenvolvimentista, que seria

responsável por retirar o país de um período de estagnação econômica em que se

encontrava desde o começo da década de 1950. Tal programa privilegiou investimentos

do Estado na indústria de base e petroquímica, além do setor de transportes. (Souza,

2008)

Ao iniciar o governo, Frondizi não apenas encontrou uma economia com graves

problemas estruturais, mas também com uma conjuntura complicada. Conforme Acotto

& Giugliano (2000), o comércio exterior havia alcançado um déficit elevado e as

reservas internacionais do Banco Central argentino se reduziram fortemente, além de

uma considerável parcela já se encontrar comprometida para o pagamento dos próximos

vencimentos de créditos externos. Esse panorama econômico demonstrava sérias

dificuldades para importar, que piorava com a diminuição do estoque de gado. A

inflação aparecia como um novo problema devido ao déficit fiscal crescente.

13

Frondizi buscou propiciar um novo equilíbrio nas relações entre a Argentina e os

Estados Unidos e também reforçar a identidade latino-americana no discurso

diplomático para dissipar as desconfianças que tanto comprometiam a sua pretensão de

liderança no mundo em desenvolvimento. De acordo com Mattei & Santos Junior

(2000), a abertura ao capital norte-americano, a cooperação econômica internacional e a

integração das cadeias produtivas na região estavam na base do projeto

desenvolvimentista de corte industrial que a sua equipe deveria implementar.

Para Rapoport (2000), a proposta de desenvolvimento do novo governo levava

em consideração três conceitos fundamentais de política econômica. Primeiramente, se

fazia uma forte crítica ao liberalismo econômico como forma para se obter o

desenvolvimento econômico. Se a debilidade do processo de acumulação provinha da

própria estrutura e era ampliada com as características do próprio comércio exterior,

uma política liberal poderia contribuir para se melhorar a eficiência, entretanto mantinha

os mecanismos que bloqueavam a acumulação. Por esse motivo, o Estado deveria

intervir de maneira firme, fixando as prioridades em relação aos setores a desenvolver e

estabelecer um conjunto de estímulos, tais como uma forte proteção tributária, um

regime de promoção industrial – que utilizava uma política tributária favorável e crédito

abundante – e o estímulo à criação de tecnologias aplicadas, incentivando o crescimento

dos investimentos naqueles ramos que o setor privado não poderia oferecer uma

resposta considerada satisfatória.

O segundo conceito era a necessidade de acelerar a proposta de desenvolvimento,

pois com o passar do tempo a brecha com os países desenvolvidos tenderia a crescer e

agravar as dificuldades estruturais, freando paulatinamente a acumulação, aumentando a

pobreza e as diferenças regionais.

Por último, a aplicação dessa política desenvolvimentista poderia se realizar de

dois modos. O primeiro consistia em potenciar a acumulação das empresas locais com

uma severa distribuição regressiva de renda. No segundo, deveria se recorrer

maciçamente ao capital estrangeiro. O primeiro modo apresentava alguns problemas na

sua execução, visto que a contração do consumo poderia desencadear uma crise de

superprodução e também a diminuição do nível de vida provocado pela redistribuição

de renda geraria muitos problemas sociais, de modo que a política de desenvolvimento

somente poderia ser realizada com uma forte repressão que eliminasse por completo a

democracia. Por isso, optou-se pelo capital estrangeiro como a única alternativa possível

14

para sustentar o ritmo desejado de expansão das forças produtivas, numa situação de paz

social e legalidade.

Devido às razões sociais e herança política nesta época na Argentina, a questão do

consumo interno era considerava mais relevante que a do crescimento econômico. Por

isto, segundo (Fausto & Devoto, 2005), foi decretado um aumento de 60% dos salários

básicos, que estavam congelados desde 1956, como parte de uma política que visava o

incremento do consumo, mas, sobretudo, no intuito de cumprir as promessas eleitorais

feitas a Perón e as peronistas e aumentar sua popularidade. Ainda no início do seu

governo, Frondizi anunciou a abertura da exploração do petróleo ao capital estrangeiro.

Para estes autores, esse fato causou uma polêmica muito forte e conturbou ainda mais o

clima que já era tenso, pois a iniciativa da medida ocorreu por meio de decretos

presidenciais e não passou pela aprovação do Congresso Nacional.

Conforme a concepção teórica desenvolvimentista, a indústria chave por

excelência era a siderúrgica. Entretanto, a situação da Argentina exigia o afastamento

desse caminho proposto, visto que o déficit energético condicionava qualquer estratégia

que não o levava em consideração. Desde 1957, o setor de energia era representado

principalmente pela combustão de derivados do petróleo, mineral que era consumido

quase 14 milhões de m³ por ano e era extraído localmente apenas 4 milhões. A

importação de petróleo representava quase 25% das compras externas totais, totalizando

cerca de 350 milhões de dólares, quantia que superava o déficit comercial do país.

Para Fausto & Devoto (2005), a política econômica de Frondizi mostrou a

possibilidade de acelerado lançamento de uma política agressiva de investimentos

orientada para a expansão da capacidade produtiva em setores considerados essenciais,

como combustíveis e indústrias dinâmicas.

De acordo com Rapoport (2000), qualquer esforço em direção ao crescimento

econômico supunha aumentar o consumo de energia, fato que elevava a demanda por

importações e dificultava ainda mais o já problemático equilíbrio das contas externas. O

governo então tinha como objetivo principal obter o auto-abastecimento do petróleo,

que parecia ser uma condição imprescindível para o desenvolvimento econômico do

país. Contudo, o avanço na extração local do petróleo não era uma tarefa fácil, pois o

país não possuía recursos e equipamentos suficientes para incrementar substancialmente

a produção no curto prazo. De fato, nos anos anteriores, o crescimento de sua produção

havia sido menor que o aumento do consumo, de modo que a brecha a cobrir com

importações havia crescido enormemente. (Acotto & Giugliano, 2000)

15

A falta de recursos podia ser superada com o capital estrangeiro, sendo

considerada uma questão contraditória de Frondizi. Em 1954, ele havia criticado

duramente o contrato que Perón havia estabelecido com a empresa estadunidense

Standart Oil, mostrando-se ser contra o capital estrangeiro no país. Contudo, começou a

mudar seu ponto de vista a partir de sua campanha eleitoral, evidenciando que sem a

ajuda de investimentos estrangeiros seria impossível resolver o problema do petróleo,

posição que gerou muita antipatia dos setores esquerdistas e da direita nacionalista.

A chamada “batalha do petróleo” foi iniciada com a nacionalização das reservas

de hidrocarbonetos e a renegociação dos contratos de importação assinados durante a

Revolução Libertadora, obtendo uma diminuição de 5 dólares por m³ de parte da British

Petroleum. De acordo com Romero (2005), o auto-abastecimento do petróleo era uma

precondição para a adoção política de desenvolvimento. No mesmo ano se lançou a

“batalha do aço”, demonstrando que o aço também era um produto muito importante

para a política desenvolvimentista.

Na política econômica de Frondizi, as exportações não tinham um papel de

extrema importância. Como elas foram dificultadas pela falta de capacidade de

aumentar seus preços e pelo controle estrangeiro dos mercados exportadores.

O governo de Frondizi introduziu mudanças severas na política econômica e uma

nova estratégia para combater o estrangulamento do balanço de pagamentos. Conforme

Ferrer (2006), o que o novo governo entendia era de que os déficits no balanço de

pagamentos eram decorrentes do subdesenvolvimento das indústrias básicas e da

dependência das importações de materiais industriais essenciais, como o aço e os

produtos químicos. O crescimento industrial das últimas décadas havia tido importante

contribuição para o agravamento do problema. Dado que seu epicentro estava nas

indústrias leves, havia a necessidade de importar bens de capital, insumos

intermediários e combustíveis.

Segundo Rapoport (2000), a crescente transferência de valor através da

deterioração dos meios de intercâmbio era considerada a causa da inflação e do

persistente déficit comercial que afetam a Argentina e não poderiam ser eliminados se

não houvesse uma política desenvolvimentista. Dessa maneira, se desqualificavam

aqueles planos que propunham que primeiramente se realizasse uma estabilização para

depois se iniciar uma política de crescimento. Quando atacasse suas causas, seria

impossível obter a estabilização e o crescimento econômico seria adiado.

16

Apesar da industrialização ser vista como a solução para o problema do

subdesenvolvimento, além de causadora do estancamento do setor agrícola, originado

na baixa disponibilidade de bens de capital e de produtos agroquímicos os quais o país

não produzia, aquela deveria tomar o caminho inverso ao seguido até então, iniciando

por fomentar as indústrias básicas, como a petroquímica, a metal-mecância, a

automotriz, a siderúrgica, a de maquinarias e a geradora de energia. (Diaz Alejandro,

2002)

O essencial da política econômica foi marcado pelas leis de permanência de

capitais estrangeiros e de promoção industrial, sancionadas em 1958. As novas leis

garantiam aos investidores estrangeiros liberdade para a remessa de lucros e para a

repatriação do capital. De acordo com Romero (2005), foi estabelecido um regime

diferenciado para investimentos em setores considerados essenciais para a nova etapa de

desenvolvimento, nos quais se encontravam o siderúrgico, o petroquímico, o de

celulose, o automotor, o energético e o petrolífero. Os setores escolhidos eram

apontados como o maior gargalo do crescimento industrial. Houve um tratamento

preferencial em questões de direitos aduaneiros, créditos, impostos, fornecimento de

energia e compras do Estado, como também na proteção tarifária do mercado local.

De acordo com Gerchunoff & Llach (2003), o governo também se empenhou na

construção de obras públicas e em outras metas que diziam respeito à construção de

uma ampla rede de estradas, ao mesmo tempo em que seria estimulada a produção

nacional de automóveis e caminhões. O que se buscava com o desenvolvimento do setor

de transportes era a integração regional. Consta que naquela época 50% da população,

70% dos transportes e 80% da atividade industrial nacional estavam situados em um

raio de 300 km de Buenos Aires. Para o governo, um mercado unificado proporcionaria

uma fonte de demanda consistente para os novos produtos industriais.

Para Frondizi e sua equipe, não se tratava apenas de concretizar este conjunto de

prioridades, mas também de executá-los em um curto período de tempo e em todas as

suas partes. Assim, para conseguir o capital necessário para extrair petróleo, construir

pontes e estradas, aumentar a produção de aço, estabelecer indústrias químicas e de

celulose e obter ferro e carvão, foi imprescindível um massivo aporte de capital externo.

Desta forma, o recurso aos investimentos estrangeiros se tornou a base de sustentação

do projeto desenvolvimentista argentino. (Gerchunoff & Llach, 2003)

Para os desenvolvimentistas, não era possível produzir um desenvolvimento

industrial espontâneo, já que os custos iniciais de novos empreendimentos, a

17

necessidade de uma etapa de aprendizagem e os interesses vinculados à importação

desses bens comprometia esse processo (Rapoport, 2000). Por isso, foram estabelecidos

altos tributos aduaneiros e a sanção de uma lei de promoção industrial, que protegiam a

produção nacional e estimulavam as exportações de origem industrial. Também se sabia

que a acumulação interna era extremamente fraca para sustentar um processo de

desenvolvimento e, portanto, era necessário o estímulo à entrada de capitais externos. A

auto-suficiência em petróleo quase foi atingida e a produção de aço e de veículos

automotores cresceu de forma espetacular.

A partir de 1958, os ramos industriais que lideravam o crescimento no passado –

relacionado aos bens de consumo não-duráveis – sofreram uma estagnação relativa,

enquanto que os de produção de bens intermediários e de bens de consumo duráveis

adquiriram um grande dinamismo. Obtiveram destaque os setores petroquímicos e

metal-mecânico.

O desenvolvimento industrial argentino logo assumiu a direção esperada pelo

governo Frondizi. Na área energética, a produção anual de petróleo, que era de 5,6

milhões de metros cúbicos, dois anos e meio depois passou a ser de 16 milhões e a

economia de divisas obtida representou cerca de 300 milhões de dólares anuais. (Diaz

Alejandro, 2002)

Similar ao crescimento petroleiro foi o crescimento da siderurgia. O início do

funcionamento da usina SOMISA fez a produção de aço triplicar. Ademais, também

foram iniciadas as explorações de minério de ferro dos reservatórios de Sierra Grande,

ao mesmo tempo em que a petroquímica se destacou como uma das atividades com os

maiores níveis de investimentos estrangeiros. O aumento das construções acompanhado

pelo incremento do nível geral de investimentos determinou um importante crescimento

da produção de cimento, atingindo a taxa de 32%. (Gerchunoff & Llach, 2003)

Contudo, em nenhuma atividade houve um crescimento tão vertiginoso e

desordenado como na indústria automobilística. Segundo Gerchunoff & Llach (2003),

cerca de 80% do incremento da produção manufatureira, entre 1958 e 1961, pode ser

explicado pela expansão deste ramo industrial. A fabricação de automóveis triplicou em

um período de três anos e se mostrou muito atrativa para os investimentos estrangeiros,

atraídos pelas vantagens oferecidas pela percepção de que havia uma demanda

reprimida disposta a consumir em grandes quantidades. A indústria automobilística

ilustrou como nenhum outro setor o ímpeto progressista e a intenção da industrialização

desenvolvimentista.

18

A produção de veículos automotores cresceu rapidamente nos anos de governo do

presidente Frondizi. Observa-se que a produção nacional passou de 28.990 em 1957

para 134.418 em 1961, apresentando uma pequena redução no ano seguinte. Portanto,

houve um crescimento de mais de 400% na sua produção durante esses cinco anos.

Portanto, no período de 1958-1962, a liderança do crescimento da indústria recaiu

em setores intensivos em capital, com índices elevados de produtividade e com uma

maior complexidade tanto do ponto de vista tecnológico como do organizacional. Dessa

forma, começaram a ser introduzidas determinadas inovações nos processos produtivos,

o uso de técnicas derivadas da organização científica do trabalho e a implantação mais

freqüente de cadeias de montagem do tipo fordista.

Não obstante, existia um problema para a continuidade do desenvolvimento. A

instalação de novas indústrias exigia um substancial crescimento inicial de importações

e bens de capital e de alguns insumos, que poderia provocar uma situação crítica no

balanço de pagamentos argentino. Desse modo, a concretização dos projetos dependia

da disponibilidade de créditos no exterior e de um considerável fluxo de investimentos

estrangeiros, que deveriam fornecer divisas suficientes para cobrir o déficit comercial

que iria ser produzido. (Diaz Alejandro, 2002)

A indústria argentina revelou grande crescimento durante os anos do governo

Frondizi, exceto no seu segundo ano, no qual apresentou considerável queda, provocada

pela adoção de uma política bastante recessiva no mesmo ano. Esse ano de substancial

queda (1959) certamente foi o pior e mais conturbado ano para indústria local, que

conseguiu se recuperar nos anos subseqüentes. Os anos de 1960 e 1961 foram os que

apresentaram maior crescimento, com taxas de 10% ao ano. Em 1962, o crescimento

continuou, contudo a uma taxa menor (5,5%).

Apesar de indústria apresentar altas taxas de crescimento durante o período

frondizista, a estrutura da indústria nacional continuava mostrando vazios em alguns

setores de extrema importância. A matriz de importações refletia um evidente déficit de

produtos químicos, plásticos, metalúrgicos e siderúrgicos. Entretanto, as principais

deficiências se encontravam no setor de maquinarias, instrumentos e materiais de

transporte, que em alguns momentos superaram os 50% do valor das importações. A

fragilidade desse ramo condicionava toda a estratégia futura de avançar no processo de

industrialização, tornando a Argentina muito dependente dos bens de capital e

tecnologia do exterior. Portanto, apesar dos grandes avanços realizados, a

industrialização seguia incompleta e desintegrada. (Diaz Alejandro, 2002).

19

A política desenvolvimentista provocou um grande aumento dos gastos públicos.

Houve o aumento dos salários dos trabalhadores e também foi lançado um amplo

programa de construção de obras públicas. Já que os últimos meses do governo

Aramburu haviam deixado um grande déficit fiscal, esses financiamentos tinham de ser

realizados através de expansão da oferta monetária. A grande expansão de moeda fez a

economia crescer, mas com isso também apareceu o fenômeno inflacionário, que

rapidamente corroeu os reajustes salariais. (Fausto & Devoto, 2005).

Os gastos estatais aumentaram profundamente desde 1957, somente sendo

contidos em 1959, com a adoção da política de estabilização. Em 1958, houve um

incremento de mais de 100% dos gastos e em 1959 um aumento de mais de 70%,

apresentando uma elevação quantitativamente maior se comparada a do ano anterior.

A razão déficit fiscal/PIB também se elevou de 1957 para 1958, conseguindo se

recuperar no ano seguinte. Nos dois anos subseqüentes, logrou valores próximos a de

1957, mas voltou a apresentar alta substancial em 1962, outro ano de crise governo

Frondizi. A forte expansão monetária efetuada pelo governo gerou uma forte inflação e

sérias dificuldades no controle do balanço de pagamentos. No fim de 1958, apenas após

oito meses do início do mandato de Frondizi, o país pediu ajuda externa ao FMI e foi

lançado um plano de estabilização. De acordo com Romero (2005), foi aplicado um

programa ortodoxo de desvalorização, congelamento de salários e eliminação de

controles e regulamentações estatais, cujas conseqüências foram uma forte redução de

renda dos trabalhadores e um desemprego generalizado.

Em meados de 1959, Frondizi tornou o plano ortodoxo ainda mais drástico, com a

nomeação de Álvaro Alsogaray para o Ministério da Economia. O novo ministro era

um liberal ortodoxo que possuía um bom relacionamento com os militares, fator que era

facilitador ao presidente no sentido de desenvolver a política econômica. Alsogaray

aprofundou a tendência recessiva do plano, efetuando uma forte contração da oferta

monetária através do aumento do depósito compulsório dos bancos e o corte dos gastos

públicos, o que acabou provocando até mesmo atrasos nos pagamentos de fornecedores

e funcionários públicos. (Ferrer, 2006)

A inflação subiu bastante em 1959, atingindo variação de 129,5% no IPC e

133,4% no atacado. A política de estabilização conseguir reduzi-la no ano seguinte,

diminuindo mais ainda em 1961. Contudo, em 1962, com o fim da política de

estabilização, o índice de preços chegou a um percentual próximo ao de 1960 (no IPC).

20

Ademais, as importações também aumentaram bastante, graças à grande demanda

de insumos da indústria em expansão, o que reduziu em grande quantidade as reservas

internacionais do país. Para a continuidade da política desenvolvimentista, era

necessário que houvesse a importação de bens de capital e intermediário, que não

poderiam ser produzidos em quantidades suficientes no país.

Em 1959, a crise econômica deixava Frondizi numa situação muito dificultada.

Havia uma forte mobilização social e as revoltas populares se multiplicavam. No ano

seguinte, o governo implementou um plano contra a agitação social conhecido como

Plano Conintes (Conmoción Interna del Estado), voltado para a repressão das

atividades terroristas e afins, mas também daqueles que agissem como instigadores,

promotores e cúmplices da subversão da ordem.

De acordo com Diaz Alejandro (2002), a economia já dava sinais de melhora em

1960, com os investimentos estrangeiros sofrendo elevados incrementos. Nesse ano o

ministro Algosaray foi substituído por outro também de ideais ortodoxos, Roberto

Alemann, que não promoveu mudanças substanciais na política econômica até então

exercida.

O desenvolvimentismo argentino resultou basicamente da combinação de

investimentos e créditos estrangeiros com políticas monetárias e fiscais ortodoxas, o que

implicava a limitação do papel do Estado como dinamizador da economia. O objetivo

prioritário era o equilíbrio fiscal, o que implicava uma tendência a reduzir o Estado

empreendedor, que fora promovido por Perón nos anos de seu governo. (Acoto &

Giugliano, 2000).

No início de 1961, Frondizi encerrou a política de estabilização e adotou uma

política social mais flexível e se lançou à árdua tarefa de enfrentar eleitoralmente os

peronistas, cuja proibição não poderia ser mais mantida. A economia começava a

desandar, afetada principalmente pela queda dos investimentos externos. (Rapoport,

2000).

No início do governo Frondizi, o déficit da produção petrolífera demonstrava o

quadro de dependência externa, já que a produção nacional de combustíveis e de

produtos industriais básicos era insuficiente. A composição das importações explicita

essa situação de dependência externa. Em 1957, as importações de petróleo

ultrapassaram 300 milhões de dólares e representaram quase um quarto. Metade das

importações era basicamente composta por produtos siderúrgicos e outros materiais

destinados ao abastecimento da indústria manufatureira. O objetivo que era buscado,

21

portanto, era o rápido desenvolvimento das indústrias de base e de petróleo. (Ferrer,

2006). O setor de maquinarias se revelou o oposto da situação do petróleo. Para um

processo mais avançado de substituição de importações, se exigia uma mudança na

composição dos produtos importados, como é o caso dos bens de capital e

intermediários. Logo, se verifica que as maquinarias passaram de 24,2% em 1957 para

45,3% em 1961.

Em relação à balança comercial, houve déficit comercial em quase todos os anos

do governo Frondizi. Somente em 1959, com a presença de uma política fortemente

contracionista, foi observado um superávit, da ordem de 16 milhões de dólares. Nesse

ano, as importações sofreram uma redução considerável, enquanto as exportações

continuaram em valores próximos aos dos dois anos anteriores. A relação

exportações/PIB oscilou entre 8,7 e 12,0 no período de 1957 a 1962, demonstrando ser

um índice relativamente estável no período.

O PIB apresentou altas taxas de crescimento em quase todos os anos do governo

Frondizi. Apenas em 1959 e 1962 houve decréscimos, sendo que no primeiro foi muito

relevante, que confirmou o pior ano da administração frondizista, determinado pela

política ortodoxa de 1959. O segundo ano de queda (1962) confirmou outra crise do

governo Frondizi, que não suportou mais um ano no poder.

Nos anos que se seguiram após o Peronismo, a economia argentina não apenas se

transformou substancialmente, mas, no conjunto, cresceu, apesar de menos que o

esperado. No setor industrial, houve o crescimento de setores novos e a retração de

alguns tradicionais. Na agricultura, as melhorias tecnológicas foram responsáveis para a

produção aumentasse substancialmente. As crises surgiam com regularidade e foram

seguidas por políticas econômicas de estabilização. (Romero, 2005).

Os ciclos econômicos durante o processo de industrialização argentino

determinavam qual o setor que iria ser mais beneficiado. Quando a economia estava

numa fase ascendente, as importações de bens de capital e produtos intermediários eram

incrementadas, devido à aceleração do processo produtivo, favorecendo aos industriais.

Essa conjuntura gerava déficits na balança comercial, obrigando o governo a realizar

política de ajuste, como através da desvalorização da moeda nacional. Isso fazia com

que as importações fossem reduzidas, visto que os produtos estrangeiros se tornaram

muito “caros”, marcando uma fase descendente da indústria. Assim, as exportações

cresciam e poderiam geram divisas suficientes para uma nova fase de ascensão da

indústria. (Rapoport, 2000)

22

Contudo, as desvalorizações cambiais não apresentavam um resultado muito

satisfatório, porque após a Segunda Guerra Mundial, a demanda por produtos

agropecuários havia deixado de ter um caráter expansivo com conseqüência das

políticas protecionistas dos países desenvolvidos.

Isso explica a notável redução da participação argentina no comércio mundial

entre as décadas de 1940 e 1960. A evolução da participação dos três principais

produtos exportados argentinos – carne de gado, trigo e milho -, que nos anos anteriores

à IIGM era de 55%, 26% e 60% respectivamente, nos anos iniciais da década de 1960

passou a ser 30%, 10% e 20% do comércio mundial total.

Os novos setores industriais, como petróleo, aço, celulose, produtos

petroquímicos e veículos automotores cresceram aceleradamente, devido a incentivos e

aproveitando a existência de uma demanda insatisfeita e crescente. Já os setores que

lideraram o crescimento no período peronista, como o têxtil e o de eletrodomésticos, se

estagnaram ou até mesmo encolheram, pois o seu mercado já estava saturado. Houve

também a concentração da indústria, mudando a estrutura relativamente dispersa

herdada da etapa peronista. (Gerchunoff & Llach, 2003)

Apesar do governo Frondizi não ter conseguido resolver os problemas mais sérios

da economia Argentina, conseguiu superar o permanente déficit energético do país,

além de fabricar um processo de capitalização, modernização e concentração em vários

setores industriais. Isso se revelou de profunda importância para a continuidade do

desenvolvimento econômico e social argentino nos anos seguintes, deixando uma

herança que seria de extrema utilidade.

Com a introdução de tecnologias intensiva em capital, ocorreu uma queda da

ocupação e uma deterioração salarial. Entre 1956 e 1959 os salários reais decresceram

mais de 30%, em grande parte provocada pela política extremamente recessiva de 1959.

Já em 1960, houve uma tendência ascendente, que se confirmou no governo do

presidente Illia, que assumiu o cargo de presidente em 1962, após a queda de Frondizi.

Em relação à participação dos trabalhadores na renda nacional, houve uma

recuperação parcial a partir da política de estabilização de 1959, voltando a crescer em

1961, atingindo 42,4%. Esse valor que em 1955 era de 49,8%, tinha sido reduzido

consideravelmente até 1960, chegando a 39%.

Durante a década de 1960 se confirmou uma tendência, perceptível desde meados

da década de 1940, que marcava uma diminuição dos gastos básicos da população

urbana – moradia e alimentação. Houve um incremento do consumo considerado

23

excedente, ou seja, compra de bens duráveis e de serviços de saúde e educação,

principalmente os bens gerados pela nova fase de industrialização.

A política frondizista de desnacionalização da economia com o incentivo aos

investimentos de capitais estrangeiros concorreu para que em 1962, sendo taxado de

antinacionalista, em virtude das concessões dadas ao capital estrangeiro e de

empréstimos junto ao Banco Mundial e também taxado de antipopular, ele fosse

deposto através de mais um Golpe Militar. A situação se complicou quando os militares

começaram a perceber tendências esquerdistas em Frondizi e sua equipe. O encontro do

presidente com Ernesto Che Guevara foi o ponto decisivo para que as Forças Armadas

aumentassem as pressões sobre seu governo. Junto a esse fato, o apoio peronista ao

governo foi se reduzindo ao longo de seu mandato. Dessa maneira, depois de seguidas

crises políticas, as forças armadas novamente interferiram no processo democrático

argentino e depuseram Frondizi em 1962.

Considerações finais

Um dos fatores importantes que devem ser ressaltados é que, quando Perón

assumiu o poder, encontrou um país em boas condições financeiras, com uma relação

próspera com o exterior, evidenciada pela grande quantidade de reservadas acumuladas

no período da Segunda Guerra Mundial. Assim, foi essa situação favorável que permitiu

a realização de grandes investimentos no setor industrial pelo Estado. A política do

governo peronista foi financiada pela queima dessas reservas, que foram diminuídas

substancialmente ao longo dos anos de governo. Isso prejudicou extremamente o país,

que com a redução de reservas não conseguia realizar os gastos e investimentos que a

economia argentina necessitava. O governo Perón incentivou à industrialização do país,

pois acreditva que o crescimento econômico deveria basear-se na expansão do mercado

interno, criticando o modelo anterior visto como extremamente dependente do mercado

internacional. A questão do crescimento econômico não foi satisfatória, já que a

economia argentina apresentou altas taxas somente nos primeiro anos, devido à situação

externa amplamente favorável. Nos anos seguintes, as reservas internacionais se

tornavam escassas e o crescimento decaiu bastante em relação aos anos anteriores. Com

as reservas reduzidas, o governo não conseguiu continuar a realizar os investimentos e

melhorias na qualidade de vida da população em quantidades suficientes. O resultado

da política econômica peronista revelou um aumento relevante dos gastos estatais,

gerados principalmente pela política populista para a população de baixa renda e pela

política de nacionalização de empresas.

24

Já Frondizi implementou um programa econômico desenvolvimentista, que tinha

a incumbência de retirar o país de uma situação de dificuldades econômicas em que se

encontrava desde o início dos anos 1950. Esse programa privilegiou investimentos do

Estado na indústria de base e petroquímica, além do setor de transportes. Foram

sancionadas as leis de permanência de capitais estrangeiros e de promoção industrial,

garantindo aos investidores estrangeiros liberdade para a remessa de lucros e para a

repatriação do capital. No início do governo Frondizi, as reservas internacionais eram

muito reduzidas, além de uma substancial parte já estar comprometida para o

pagamento dos vencimentos vindouros de empréstimos externos. Esse panorama

econômico revelava sérias dificuldades para importar, que comprometia o processo

desenvolvimentista. Dessa forma, o capital estrangeiro teve papel fundamental na

promoção do desenvolvimento e modernização do setor industrial argentino.

Além disso, nos últimos anos da década de 1950, havia uma enorme dependência

externa argentina em relação ao petróleo, já que a produção nacional de combustíveis e

de produtos industriais básicos não era satisfatória. Frondizi anunciou a abertura da

exploração do petróleo ao capital estrangeiro, no intuito de diminuir essa dependência.

Houve um grande incremento na produção petroleira nos anos de seu governo. O setor

siderúrgico também logrou um grande crescimento, assim como a indústria

automobilística, que foi o mais destacado.

O governo Frondizi teve muitos méritos em conseguir superar o déficit energético

do país, além de realizar um processo modernização e incremento da indústria. A sua

política desenvolvimentista permitiu que Argentina pudesse lograr altos níveis de

desenvolvimento econômico nas décadas de 1960 e 1970, devido à capacidade ociosa

produtiva deixada pelo seu governo.

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