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45 CRISTO E OS CRISTÃOS AMIN A. RODOR, TH.D. Professor de Teologia Sistemática e diretor da Faculdade Adventista de Teologia, Unasp Campus Engenheiro Coelho RESUMO: Este artigo busca demonstrar as contradições internas da teoria pós-lap- sariana. Além das questões relacionadas à exclusiva identidade e missão de Jesus Cristo, que o tornam absolutamente sepa- rado de nossa natureza pecaminosa, o autor trata demoradamente da noção bíblica do pecado, insistindo que Jesus não poderia ser infectado pela natureza caída dos des- cendentes de Adão. A doutrina do pecado é também discutida à luz dos ensinos de Ellen G. White. O autor também toma tempo para discutir questões tais como a controversa carta a W. L. H. Baker, com seus cinco parágrafos cristológicos que ex- põem a posição doutrinária Ellen G. White quanto ao tópico. A alegada noção do assim chamado “adventismo histórico” é exposta como uma contradição de termos. Os textos em aparente conflito na cristologia de Ellen G. White são colocados no amplo contexto dos seus ensinos sobre a natureza humana de Jesus Cristo. Em essência, este artigo ar- gumenta que Cristo está infinitamente sepa- rado de todos os seres humanos quanto ao problema do pecado, inclusive dos cristãos, que, mesmo depois do novo nascimento, embora não estejam mais sob o domínio do pecado, ainda permanecem com a natureza caída até a glorificação final. ABSTRACT: This article highlights the in- ternal contradictions of the postlapsarian theory. Besides pointing out the questions related to the exclusive Identify and Mis- sion of Jesus Christ, what makes Him ab- solutely separated from our sinful nature, the author deals, at some length, with the biblical notion of sin. The sin doctrine is also underscored in the light of the teach- ing of Ellen G. White. The author also takes time to discuss topics such as the controversial letter to W. L. H. Baker and its five paragraphs dealing with the nature of Christ, what makes clear the Ellen G. White´s doctrine of the human nature of Christ. The so called notion of the “his- torical adventism” is exposed as a con- tradiction of terms. The texts in apparent contradiction in the Christology of Ellen G. White are placed in the broad context of her teaching about the human nature of Jesus Christ. In essence this article argues that Christ is infinitely set apart from all human beings in relation to the problem of sin, including the Christians, that even after the new birth, although not governed by sin, will remain with the fallen nature, until the final glorification. INTRODUÇÃO A encarnação de Cristo é a doutrina- chave do cristianismo. O ensino central da cristã. Sem ela, todo o cânon bíblico se tornaria um documento incompreensível, um verdadeiro non sense. Em função desta percepção, através dos séculos, a doutrina de Cristo tem preservado seu lugar de im- portância vital. A posição da igreja cristã quanto à cristologia, freqüentemente, tem sido considerada como um indicador de sua ortodoxia ou de tendência herética. Karl Barth está correto ao afirmar que a cris- tologia é um tipo de aferidor da teologia.

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Cristo e os Cristãos Amin A. rodor, th.d.Professor de Teologia Sistemática e diretor da Faculdade Adventista de Teologia, Unasp Campus Engenheiro Coelho

resumo: Este artigo busca demonstrar as contradições internas da teoria pós-lap-sariana. Além das questões relacionadas à exclusiva identidade e missão de Jesus Cristo, que o tornam absolutamente sepa-rado de nossa natureza pecaminosa, o autor trata demoradamente da noção bíblica do pecado, insistindo que Jesus não poderia ser infectado pela natureza caída dos des-cendentes de Adão. A doutrina do pecado é também discutida à luz dos ensinos de Ellen G. White. O autor também toma tempo para discutir questões tais como a controversa carta a W. L. H. Baker, com seus cinco parágrafos cristológicos que ex-põem a posição doutrinária Ellen G. White quanto ao tópico. A alegada noção do assim chamado “adventismo histórico” é exposta como uma contradição de termos. Os textos em aparente conflito na cristologia de Ellen G. White são colocados no amplo contexto dos seus ensinos sobre a natureza humana de Jesus Cristo. Em essência, este artigo ar-gumenta que Cristo está infinitamente sepa-rado de todos os seres humanos quanto ao problema do pecado, inclusive dos cristãos, que, mesmo depois do novo nascimento, embora não estejam mais sob o domínio do pecado, ainda permanecem com a natureza caída até a glorificação final.

AbstrACt: This article highlights the in-ternal contradictions of the postlapsarian theory. Besides pointing out the questions related to the exclusive Identify and Mis-sion of Jesus Christ, what makes Him ab-solutely separated from our sinful nature, the author deals, at some length, with the

biblical notion of sin. The sin doctrine is also underscored in the light of the teach-ing of Ellen G. White. The author also takes time to discuss topics such as the controversial letter to W. L. H. Baker and its five paragraphs dealing with the nature of Christ, what makes clear the Ellen G. White´s doctrine of the human nature of Christ. The so called notion of the “his-torical adventism” is exposed as a con-tradiction of terms. The texts in apparent contradiction in the Christology of Ellen G. White are placed in the broad context of her teaching about the human nature of Jesus Christ. In essence this article argues that Christ is infinitely set apart from all human beings in relation to the problem of sin, including the Christians, that even after the new birth, although not governed by sin, will remain with the fallen nature, until the final glorification.

introdução

A encarnação de Cristo é a doutrina-chave do cristianismo. O ensino central da fé cristã. Sem ela, todo o cânon bíblico se tornaria um documento incompreensível, um verdadeiro non sense. Em função desta percepção, através dos séculos, a doutrina de Cristo tem preservado seu lugar de im-portância vital. A posição da igreja cristã quanto à cristologia, freqüentemente, tem sido considerada como um indicador de sua ortodoxia ou de tendência herética. Karl Barth está correto ao afirmar que a cris-tologia é um tipo de aferidor da teologia.

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Em suas próprias palavras, “cristologia é a pedra de toque de todo conhecimento de Deus, em sentido cristão, a pedra de toque de toda teologia”.1 Não é por acaso, portan-to, que o cristianismo durante mais de três séculos, se debateu com sérias distorções deste tema central. Ebionismo, docetismo, monarquianismo, arianismo, apolinaria-nismo, nestorianismo, eutiquianismo e outros “ismos”, relacionados à cristologia, foram desvios, que, com diferentes graus de apelo, representaram ameaças ao ensino bíblico a respeito de Cristo, e à própria sobrevivência da fé cristã. É importante observar que estas heresias representaram desvios de duas verdades fundamentais: primeiro, que Jesus era pleno Deus e pleno homem; e, segundo, que Ele era uma pessoa e não duas.

Como seria de se esperar, cristologia tem sido de fundamental importância para a vida e missão dos Adventistas do Sétimo Dia. Para Ellen G. White, “a humanidade do Filho de Deus é tudo para nós. Ela é a cadeia de ouro que une nossas almas a Cristo, e através de Cristo a Deus. Este é o tema do nosso estudo”.2 A discussão cristo-lógica entre os adventistas, particularmente nos últimos 50 anos, tem-se centralizado no tipo de natureza humana que Jesus Cristo assumiu na encarnação. Basicamente a questão é esta: Onde Jesus Cristo iniciou a vida na encarnação? Exatamente na mesma condição de todos os homens, ou, há entre Cristo e todos os outros uma diferença fun-damental? Em essência, como geralmente indicado, duas posições, se dividem, em ênfases opostas.

A primeira vertente, buscando preservar a singularidade de Cristo, como o segundo Adão, defende que, na encarnação, Ele, do ponto de vista moral e espiritual, assumiu a natureza de Adão antes da queda (posição pré-lapsariana, ou anterior à queda), não sendo, portanto, infectado pelas propen-sões do pecado e tendências corruptas com as quais todos os demais seres humanos

nascem. Embora, e isto deve ser observado, se afirme que sua humanidade teria sido afetada pelas conseqüencias da queda, partilhando, assim, das marcas benignas do pecado, ou da humanidade física, en-fraquecida pela queda. Cristo, portanto, experimentou as deficiências físicas (fome, sede, fadiga, cansaço, tristeza, e a própria morte), que caracterizam os seres humanos, sem, contudo, partilhar da natureza peca-minosa de todos os demais descendentes de Adão.

Por outro lado, a segunda posição (pós-lapsariana), como observa Norman R. Gulley, “procura preservar o fato de que Ele [Jesus] tornou-se o filho de Maria. A ênfase é colocada na identificação de Jesus com a na-tureza humana caída”.3 Assim, se a primeira posição, em relação ao problema do pecado, busca distanciar Cristo da humanidade pós-queda, sublinhando o significado dEle como nosso imaculado substituto, a segunda, na preocupação de torná-lo nosso exemplo, busca, precisamente o oposto, estreitando, ou mesmo obscurecendo a brecha entre Cristo e a humanidade pecaminosa. Desta forma, desconsidera fundamentalmente o caráter único de sua identidade e missão, como veremos.

Este artigo trata primariamente com as contradições teológicas da teoria pós-lap-sariana, em confronto com os ensinos das Escrituras e os escritos de Ellen G. White.

A posição pós-lApsAriAnA

O argumento básico dos defensores da teoria pós-queda insiste que na encarnação Jesus assumiu a natureza humana pecami-nosa, tanto física quanto moral e espiritual, com todas as características da humanidade caída. Pós-lapsariana significa depois do lapso, depois da queda, posterior à entrada do pecado registrada em Gênesis 3. Assim, nesta formulação, Jesus, em termos de sua completa natureza humana, foi exatamente como qualquer um de nós – cem por cento

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igual. Absolutamente em nada diferente de qualquer outra criatura nascida no planeta Terra. Como A. T. Jones, um dos pioneiros desta noção, afirmou na sessão da Assem-bléia da Associação Geral de 1895, “em sua natureza humana não há uma partícula de diferença entre Ele [Jesus] e vós”.4

Esta posição está sustentada na ambígua compreensão de que uma pessoa nascida em “carne pecaminosa não necessita ser um pecador”.5 Assim, na tentativa de evitar o que consideram o dogma católico romano do pecado original,6 os proponentes da teoria pós-lapsariana acabam negando ou minimizando e distorcendo o ensino bíblico da corrupção universal como claramente testemunhado nas páginas das Escrituras. É evidente que se o pecado fosse simples-mente uma questão de atos pecaminosos, seria possível conceber a encarnação de Jesus em “carne pecaminosa” e, ao mesmo tempo, sem pecado. Contudo, não é verdade que o pecado não está presente, até que ele se manifeste em atos. Por outro lado, não é de surpreender que, com sua compreensão superficial de pecado, o pós-lapsarianismo chegue fatalmente à teoria perfeccionista: “Jesus foi como nós, e nós podemos ser como Ele”, é o raciocínio decorrente.7

A vitória de Cristo em “carne peca-minosa” é, para eles, a garantia de que nós também podemos “vencer como Ele venceu”.8 A idéia, contudo, pode ser bem intencionada, mas deixa de entender que nós não somos chamados para duplicar a vitória de Cristo. De fato, os cristãos não vencem como Jesus venceu, antes, vence-mos porque Ele venceu. Nesta teoria, como indicado, o pecado é visto como meros atos do estilo de vida, e por isso pode ser “ple-namente vencido”, a ponto de se alcançar impecaminosidade absoluta, como crêem os advogados da natureza pós-queda de Cristo. É claro que tal teoria, enraizada na idéia dos padroeiros do pós-lapsaria-nismo adventista, como Jones, Waggoner e Andreasen, entre outros, desconsidera a

profunda noção bíblica de pecado, e aca-ba passando por alto a compreensão do pecado original,9 expressa na Palavra de Deus. Pecado (o estado, a condição), nas Escrituras, é muito mais do que pecados (os atos externos). Um é a doença, os outros são apenas os sintomas de sua presença, ou as suas conseqüências naturais. A sombria verdade é que podemos estar em pecado, independente de cometer os atos pecami-nosos. Pecado é um estado que escraviza a vontade, um poder destrutivo, enterrado nas profundezas da natureza humana.

os efeitos do peCAdo

James Stalker está correto ao afirmar que “todas as heresias resultam de um inadequado senso de pecado”,10 e, cer-tamente, como Gerhard C. Berkouwer indica, “qualquer tentativa de minimizar o pecado está radicalmente em oposição à totalidade da mensagem das Escrituras”.11 Errar no diagnóstico, como sabemos, é o primeiro passo para se errar no tratamento de uma enfermidade. Aqueles que, como os fariseus dos dias de Cristo, externali-zam o pecado, compreendendo-o apenas em termos de ações do comportamento, e não como uma doença maligna, sistêmica, nas palavras de Ellen G. White, uma “le-pra... profundamente enraizada, mortal, e impossível de ser purificada pelo poder humano”,12 estão destinados a enganos grosseiros. É desta má compreensão que emergem, tanto o legalismo como o perfec-cionismo. O primeiro buscando justificação perante Deus através de atos meritórios de justiça humana, o que, comparativamente, equivale à tentativa ridícula de se tentar curar leucemia com aspirinas.

O segundo, o perfeccionismo, trivializa o ideal divino, reduzindo a norma de per-feição bíblica, para entendê-la em termos de atos externos como dieta vegetariana, abstenção de açúcar, e outros desempenhos semelhantes, julgando-se que é aí que o pe-

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cado reside, e que ele será vencido quando nos abstivermos de determinadas práticas. Nesse caso, temos de admitir que completa perfeição (impecaminosidade), como advo-gada pelo pós-lapsarianismo adventista, se torna um alvo plenamente alcançável em nossa condição atual, porque a noção de pecado é reclassificada, e a norma se torna consideravelmente simplificada. Tal teoria termina desenvolvendo a arrogância humana, espírito acusador e complexo de superioridade espiritual.13 Provavelmente esta é uma das mais fortes razões porque se exige que Cristo seja “cem por cento igual a nós” para que Ele se torne um modelo imitável. A vida cristã, nesse caso, passa a ser vista como um tipo de “competição” com Cristo, como se estivéssemos em uma maratona, e assim, como em geral argumentado, Ele não poderia ter nenhuma “vantagem” sobre nós

Se a primeira verdade que aprendemos nas Escrituras a respeito do homem é que ele é um ser criado por Deus (Gn 1:26-28), a segunda verdade fundamental acerca do ser criado por Deus, é que ele, pela entrada do pecado, alienou-se do Criador (Gn 3: 5). Pela queda, o homem destronou Deus de sua vida, e colocou-se a si mesmo em seu lugar. Sua natureza foi assim depravada e corrompida. Em conseqüência, toda a posteridade de Adão herdou os resultados e a inclinação de seu [de Adão] pecado, sendo a maior delas a separação de Deus, e desta decorrem todos os outros tipos de desvios. Tal ruptura entre o homem e Deus não é uma ilusão ou mito, que pode ser desconsiderada por qualquer “ginástica” humana. Como Edward Heppenstall obser-va, “a queda envolveu todos os homens. Os efeitos desta catástrofe histórica levaram este planeta a ser habitado por uma raça de pecadores, cuja mente carnal está em inimizade contra Deus (Rm 8:7, 8)”14. A humanidade tornou-se como um rio po-luído na sua fonte. Os pecadores não são um mero “terreno neutro.” Eles não são meramente pessoas que deixam de fazer o

bem, mas, como Leon Morris indica, eles se tornaram “inimigos ... colocando seus esforços na direção oposta a Deus”15.

Desde a queda, o homem natural não pode pensar direito, sentir direito, ver direito ou agir direito. Cada parte do seu ser foi radicalmente afetada. Em relação a Deus, o homem está em rebelião, em re-lação a si mesmo, está dividido. O pecado perverteu e desorganizou sua natureza. Do ponto de vista humano, esta doença é incurável, sobretudo porque é o único tipo de enfermidade que leva a vítima a fugir do Médico. Pecado e morte mantêm domínio sobre o homem caído. O pecado produziu uma insanidade radical na na-tureza humana, a tal ponto que o homem tornou-se como um navio cujo leme está fixo, amarrado no ângulo errado. Como descrito pelo puritano Thomas Gataker, o coração natural “é como um livro estraga-do por erros e enganos de impressão”.16

Esta desordem moral e espiritual cobre toda a história humana, perpetuada em cada geração, desde a queda do primeiro Adão. Não importa quão ignorantes as pessoas possam ser, J. C. Ryle indica, “elas sempre sabem como pecar”.17 E isto, porque os homens, universalmente, “são filhos da ira” (Ef 2:3); “filhos da desobediência” (Ef 5:6); naturalmente “andando nos desejos da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos”, por natureza “mortos em delitos” (Ef 2:3, 5). Através da ofensa de Adão sobreveio a todos “juízo e conde-nação” (Rm 5:18); pela desobediência de Adão todos foram infectados com o vírus do mal (Rm 5:15-16); em Adão todos foram expulsos do Éden, e morreram. De fato, no capítulo 5:12-21 da carta aos Romanos, Adão é descrito como o cabeça da velha era, a era da morte. Adão não é meramente um indivíduo que viveu muito tempo atrás. Adão tem significado corporativo, como o cabeça da “velha humanidade”, da mesma forma que é o cabeça da era presente, ex-cluindo-se a Cristo. Aquilo que aconteceu

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à cabeça envolveu também todo o corpo, e, em Adão, a sorte da humanidade foi estabe-lecida. Portanto, desde Adão o destino da raça humana foi determinado a permanecer em escravidão aos poderes da destruição. A morte tornou-se soberana, e reina sobre toda a existência. Esta é a sorte comum desde Adão. Paulo usa dois verbos acer-ca do pecado, que devem ser percebidos claramente. Segundo o apóstolo, o pecado “entrou” (eisnlten) e a morte “passou” (dielten) a todos os homens, e assumiu pleno controle, pois todos, naturalmente, nascem em cumplicidade com Adão.

Criado à imagem de Deus (Gn 1:26,27), depois da queda, Adão gerou filhos “à sua imagem” (Gn 5:2), o que indica a heredi-tariedade moral corrompida, que o pai da raça legou à sua descendência. Assim, não se poderia exagerar na ênfase de que “ori-ginal” não se refere ao caráter original do homem, como criado por Deus, mas ao seu caráter original como descendente de Adão. Ellen G. White concorre com tal ênfase, ao afirmar que “com relação ao primeiro Adão, os homens nada recebem dele, senão a culpa [as conseqüências da queda], e a sentença de morte”,18 ou ainda, segundo ela, o egoísmo, profundamente arraigado em nosso ser, “nos veio por herança”.19 A queda de Adão afetou a orientação espiritual de sua posteridade. Para Ellen G. White, “o coração do homem é, por natureza frio, escuro e desagradável”.20 E se alguém reivindicar não ter sido infectado pelo vírus do pecado, tal noção contradiz tanto a revelação como a observação e o senso comum. Embora as Escrituras não usem a expressão “pecado original”, a noção, quando despida de suas conotações histórico-dogmáticas, é claramente bíblica: em primeiro lugar porque ela é derivada da raiz original da raça; em segundo, porque ela está presente em cada indivíduo desde o momento do seu nascimento; e, em terceiro lugar, porque ela é a raiz interior de todos os atos pecaminosos que mancham a vida do homem.

Jesus definiu o pecado em termos que si-lenciam qualquer noção simplista, superfi-cial e farisaica da doença: “Pois do interior do coração dos homens saem os maus pen-samentos, os adultérios, as prostituições, os homicídios...” (Mc 7:21), e o catálogo é considerável. A questão, devemos notar cuidadosamente, é que para Jesus, pecado não é uma questão, meramente, de atos pecaminosos, mas de uma condição, na qual o homem natural é nascido. Não é que somos pecadores porque cometemos peca-dos A, B, C, D, etc., antes, porque somos pecadores é que cometemos tal sorte de de-litos. Os atos são apenas o sintoma de uma mal mais grave, arraigado nos porões de nossa natureza. “O mais lindo bebê”, Ryle descreve com realismo quase cruel, “não é como sua mãe carinhosamente o chama, um pequeno anjo... mas um pequeno peca-dor”.21 Não que ele conscientemente peque, mas pecador no sentido de que nasceu com a tendência natural para escolher o pecado, tão logo tenha a idade para fazê-lo.

Só no Antigo Testamento encontramos 11 termos hebraicos para descrever o peca-do, e não são meramente sinônimos, como poderíamos pensar.22 Cada um deles ilumina um aspecto desta enfermidade maligna, que infecta a todos. As Escrituras falam das trevas, apostasia e rebelião do homem, e da oposição humana a tudo que Deus intencionou ao criá-lo à sua imagem. Ca-tegoricamente a revelação divina enfatiza a depravação e a profundidade a que o pecado arrastou o homem. A expressão depravação total, em teologia, é utilizada para descrever o pecador em seu estado caído. A palavra total refere-se aqui à totalidade do homem, como um ser infectado pelo pecado. Isto é, nem uma parte dele, absolutamente nada, ficou sem receber o sinistro impacto da queda. O homem completo foi atingido e deteriorado no nível de sua vontade, sen-timentos e razão. A doutrina de Pelágio de que a queda de Adão não afetou sua poste-ridade, e que o pecado não é um problema da natureza, mas apenas da vontade humana,

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simplesmente não tem qualquer sustentação bíblica.23 Berkouwer corretamente enfatiza: “Não há nenhum limite ou fronteira dentro da natureza humana além da qual podemos encontrar uma última reserva humana não tocada pelo pecado; é o próprio homem que é totalmente corrupto.”24

As Escrituras empregam em sua compre-ensão do pecado, palavras que não deixam qualquer sombra de dúvida quanto à sua natureza devastadora. “Enganoso é o cora-ção, mais do que todas as coisas, e corrupto, quem o conhecerá?” (Jr 17:9). Ou, segundo Isaías, “toda a cabeça está enferma e todo o coração fraco. Desde a planta do pé até a cabeça não há nele coisa sã, senão feridas, contusões, chagas podres, não espremidas, nem atadas, nem amolecidas com óleo” (Is 1:5, 6). “Todos nós somos como o imundo, e todos os nossos atos de justiça, como trapo de imundícia” (Is 64:6). Para Davi, a vida humana não escapa aos efeitos do pecado, mesmo em seu estágio formativo: “Certamente em iniqüidade fui formado e em pecado me concebeu a minha mãe” (Sl 51:5). O pecado é um poder que domina a própria atmosfera na qual o homem vive. Para Paulo, somos carnais, “vendidos como escravos sob o pecado” (Rm 7:14). “Todos estão debaixo do pecado” (Rm 3:9); “Não há um justo, nem um sequer” (Rm 3:10). “Todos se extraviaram e se fizeram inúteis” (v. 12). Tais textos, e uma multidão de outros semelhantes, indicam o estado em que cada pessoa nasce no planeta Terra, trazendo em seu DNA um grave defeito de fabricação, que se tornou a nossa natureza primária. É precisamente a enormidade do problema que exigiu salvação tão suprema, levada a efeito pelo próprio Deus, em pessoa.

A pAlAvrA se fez CArne: Como Adão ou Como nós?

Defensores do pós-lapsarianismo como Colin e Russel Standish e Ralph Larson, en-tre outros, se deleitam em acusar os que dis-

cordam deles, de seguidores do catolicismo romano, quanto à idéia do pecado original. Para os Standish, “muitos [adventistas], seguindo parte do pacote agostiniano da falsidade, ensinam que a natureza humana de Cristo foi não caída. Contudo, a posição de Agostinho foi estabelecida sobre a falsa premissa do pecado original do homem”.25 No mesmo tom, Larson, em seu livro The Word Was Made Flesh, que, como parte do seu título, pretende conciliar “100 Anos da Cristologia Adventista”, acusa as igrejas protestantes, de, segundo ele, terem aceito a doutrina antibíblica do pecado original, sen-do, assim, forçadas a adotarem a “errônea posição” quanto à natureza de Cristo – isto é, que Ele tenha “nascido com a natureza de Adão antes da queda”.26 A mesma idéia é expressa por Joe Crews, ao afirmar que a posição da impecaminosidade de Cristo é “diametralmente oposta” às Escrituras, as quais ensinam que “Jesus tinha a natureza humana exatamente como a nossa”.27 Em-bora Crews não nos diga exatamente onde as Escrituras ensinam isto.

Robert Wieland e Donald K. Short, parecem falar por todos os pós-lapsarianos, ao afirmarem claramente que o ensino “de que Cristo tomou a natureza impecaminosa de Adão antes da queda ... [é] um legado do Romanismo, a insígnia do mistério da iniqüidade”.28 O raciocínio desses autores é relativamente simples: no nível elementar da acusação, está a idéia de que a posição pré-lapsariana, quanto à natureza moral e espiritual de Cristo na encarnação, é um sub-produto do dogma católico/agostiniano do pecado original, e, portanto, não um ensino bíblico.

Mas, em segundo lugar – e isto deve ser claramente percebido –, encontra-se o raciocínio segundo o qual para que Cristo seja como nós, absolutamente igual a nós, em sua humanidade, é fundamentalmente necessário estabelecer a idéia de que nós não herdamos absolutamente nada de Adão, que intrinsicamente necessite de redenção.29

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Só podemos entender a idéia exposta por esses autores, como uma grosseira má representação, senão algo pior.30 Dificil-mente um teólogo adventista, ou qualquer outro teólogo contemporâneo, defenderia a noção de uma transmissão mecânica do pecado original através da procriação sexual. Como mantido pelo catolicismo, o pecado original significa uma transmissão automática de culpa. Como o teólogo lu-terano Willian Hordern observa, “poucos teólogos hoje aceitam o ponto de vista de que a culpa pode ser herdada”. Embora, como o próprio Hordern indica “[os] teó-logos hoje afirmam que o homem está em descompasso com a vontade de Deus, e o seu propósito para ele”.31 E, excetuando-se Jesus Cristo, isto é verdade válida para toda raça humana. Como indicado acima, todos somos pecadores a partir do nascimento. “Desviam-se os ímpios desde a madre, andam errados desde que nascem...”(Sl 58-3), ou, como o profeta Isaías enfatiza em palavras gráficas, “rebeldes desde o ventre” (Is 48:8).32

Assim, é das Escrituras, não de qualquer dogma da tradição católica, que derivamos nossa compreensão do pecado original. Ao contrário da visão católica, não recebemos a culpa de Adão, mas a herança espiritual de sua queda. Isto porque, segundo as Es-crituras, o pecado é pessoal (cf. Ez 18:20, Dt 24:16), e não apenas pessoal, mas moral. Contudo, na própria lei, o Senhor afirma: “Visitarei a maldade dos pais nos filhos” (Êx 20:5). Ellen G. White observa: “É inevitável que os filhos sofram as conse-qüências das más ações dos pais, mas eles não são castigados pelas culpas deles.” Ela acrescenta: “Dá-se, entretanto, em geral o caso de os filhos andarem nas pegadas de seus pais. Por herança e exemplo os filhos se tornam participantes do pecado do pai. Más tendências, apetites pervertidos e mo-ral vil, assim como enfermidades físicas e degeneração, são transmitidos como um legado de pai a filho.”33 Enquanto, pecado e culpa, em sentido moral, não podem ser

transmitidos, a herança, a inclinação, a propensão para o pecado, estes são trans-mitidos. Tal propensão permanece e se torna nossa tendência primária, até que seja contrabalançada pela conversão, e a experiência do novo nascimento. Conclu-ímos, portanto, com Norman Gulley, que “os adventistas crêem na doutrina bíblica do pecado original. Morte, não culpa, pas-saram de Adão para todos”.34

Por outro lado, o nascimento incon-taminado de Jesus, não deve, também, ser confundido com a doutrina católica da “imaculada conceição”, teoria segun-do a qual, a natureza de Maria foi feita incorruptível, tornando assim possível o nascimento incontaminado de Jesus. As Escrituras completamente desconhecem qualquer idéia de natureza corruptível sendo transformada em incorruptível, an-tes do segundo advento de Jesus, quando, então, e só então, finalmente, aquilo “o que é corruptível se revestirá de incorruptitili-dade” (1Co 15:51-55). Como evidente pelo testemunho das Escrituras, Jesus tornou-se um ser humano real, e sua humanidade não foi docética ou parcial. Ele foi um genuíno ser humano. Ele tomou a natureza física, sujeita a todos os efeitos do pecado, exceto o próprio pecado. “Ele se tornou osso dos nossos ossos, carne da nossa carne.”35 Além disso, por imputação, Ele tomou sobre si os pecados e a culpa de todo o mundo (2 Co 5:21). Mas dito isso, devemos nos apressar em dizer que, sua identificação conosco, não deve obscurecer duas verda-des fundamentais para a nossa discussão: 1) A extensão de sua identificação conosco foi determinada por quem Ele era, e, 2) A extensão de sua identificação conosco foi também determinada por sua missão como o Salvador da humanidade.

sua identidade

Em primeiro lugar, portanto, como o monogenes de Deus (Jo 3:16; mono +

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genos = o único de seu tipo), Jesus foi um ser único, exclusivo, irrepetível. Deus em carne. Ellen G. White, em seus artigos na Review and Herald, entre 1872 a 1914, cen-to e vinte cinco vezes observa que Cristo “vestiu sua divindade com a humanidade”, ou que Ele “velou sua divindade com a humanidade”.36 Nestes textos, ela diz o que Jesus sacrificou ao tornar-se homem: “sua glória”, “sua coroa e trono”, “as cortes reais”, “seu alto comando”, “seu lar celes-tial”, “seu glorioso diadema”.37 Contudo, ela nunca diz que Cristo tenha abandonado sua divindade essencial, ao adotar a huma-nidade. Numa passagem reveladora, ela diz: “Cristo não tinha trocado a divindade pela humanidade, mas Ele tinha vestido sua divindade na humanidade”.38 Isto deveria servir de advertência para aqueles que querem tornar Cristo completamente humano. Ao afirmar que Ele era filho de Maria, não se deve perder de vista o que é dito dEle como gerado pelo Espírito Santo. Assim, em seu próprio nascimento já temos a confirmação de que Ele era radicalmente diferente de nós.

sua missão

Em segundo lugar, a extensão da iden-tificação de Cristo com a humanidade foi também determinada por sua missão. Com que natureza teria Jesus nascido? A nossa natureza caída ou a natureza de Adão antes da queda? A resposta é consideravelmente simples: se Ele tivesse vindo com a nature-za de todos os demais membros da espécie humana, Ele seria parte do problema do pecado, e não a solução para o mesmo. Em outras palavras, sua missão como o Redentor do mundo teria sido fundamen-talmente alterada. Para ser nosso Salvador, Jesus deveria tornar-se um conosco, mas tal identificaçao não poderia ir além dos reque-rimentos de sua missão. Ele não poderia tornar-se, em si mesmo um pecador (em natureza e ato).39 Portanto, como Benjamin Rand observa, “a missão de Cristo poderia

ser realizada apenas por um cordeiro sem mácula ou mancha”.40 Na tipologia do Antigo Testamento, aquele que oferecia um cordeiro, afirmando sua fé no redentor futuro, fora advertido, “nenhuma coisa em que haja defeito oferecereis, porque não seria aceita a vosso favor”(Lv 22:20). Não é de surpreender que para Ellen G. White, “o homem não pode fazer expiação pelo homem,” uma vez que, “sua condição caída constituiria uma oferta imperfeita”.41 As-sim, ela afirma, “por um lado Cristo é um representante perfeito de Deus; por outro, Ele é um espécime perfeito da humanidade sem pecado”.42 E a conclusão lógica é ine-vitável: “Ele [Jesus Cristo] não necessitou de expiação.”43

Em conexão com a exigência básica de sua missão, podemos referir a Romanos 8:3: “Pois o que era impossível à lei, vis-to que estava enferma pela carne, Deus, enviando seu Filho em semelhança (ho-moioma), da carne do pecado, pelo pecado condenou o pecado na carne.” Como Rand observa, o texto não diz que que Jesus veio “em carne pecaminosa”, e o texto também não diz que Jesus tivesse vindo em “semelhança de carne”.44 No primeiro caso, Paulo estaria afirmando que sua carne foi pecaminosa, e no segundo que Ele não foi um ser humano real, Ele apenas teria aparentado carne, confirmando então a teoria docética. Contudo, Jesus, segundo as Escrituras, veio em semelhança (e esta é a palavra-chave) de carne pecaminosa.45 Nesse texto, Paulo enfatiza quão vital foi a vinda de Cristo para quebrar o círculo sem esperança de nossa condição no pecado. O que a lei era incapaz de fazer, visto que havia sido enfraquecida pela natureza pe-caminosa, Deus fez, enviando seu Filho em semelhança do homem pecaminoso, para ser a oferta pelo pecado. E, claro, se Jesus tivesse vindo em carne pecaminosa, cem por cento como nós, como exige a teoria pós-lapsariana, então o “justo preceito da lei” permaneceria sem ser cumprido, como sempre, frustrado por sua natureza carnal.

Cristo e os Cristãos / 53

O texto afirma a afinidade e solidariedade de Cristo, mas ao mesmo tempo sublinha sua crucial distinção de nós – distinção que, como afirma Roy Adams, “faz toda a diferença para nós”.46 E isto é indicado pelo uso do sutil termo grego homoioma. Jesus veio em “semelhança” da carne pecamino-sa, e semelhança, tanto no grego, como em português, é semelhança, não igualdade.

imPeCaminosidade

Retornando à questão de sua identi-dade, devemos observar duas afirmações do próprio Cristo, quanto à Sua completa distância do pecado – pecado entendido não apenas em termos de atos pecamino-sos, mas pela própria definição de Jesus, pecado como um estado, que transcende as ações exteriores e tangíveis. Em João 8:46, Jesus desafia sua audiência: “Quem de vós me convence de pecado?”47 Diante deste desafio de impecaminosidade, todos, por nascimento e escolhas, estão desquali-ficados. Apenas a Ele, descrito como “ente Santo,” o Salmo 51:5 (“em iniqüidade fui formado, e em pecado me concebeu a mi-nha mãe”), não se aplica. Ele foi nascido do Espírito Santo (Mt 1:18, Lc 1:35), o que, quanto à sua natureza essencial, o coloca, por assim dizer, a milhões de anos luz de distância de todos os demais membros da espécie humana.

O segundo texto é João 14:30: “Pois se aproxima o príncipe deste mundo, e ele nada tem em mim.” De quantos seres humanos isto poderia ser afirmado? Ellen G. White, comentando esta passagem, expande: “Satanás encontra nos corações humanos algum ponto onde ele pode es-tabelecer sua base; algum desejo pecami-noso é acariciado, por meio do qual suas tentações firmam seu poder. Mas Cristo declarou de si mesmo, ‘se aproxima o príncipe deste mundo. Ele nada tem em Mim’.”48 Por associação, este texto evoca Hebreus 7:26, que é crucial para a resposta

à pergunta formulada no título desta seção: “Convinha-nos tal sumo sacerdote, santo, inocente, imaculado, separado dos pecado-res, e feito mais sublime do que os céus.” A linguagem aqui não poderia ser mais clara, e não a podem compreender apenas aqueles que se fizeram cegos por suas próprias teorias e opiniões desenvolvidas à margem da Palavra de Deus. Segundo este texto da carta aos Hebreus, a qualificação de Jesus como sumo sacerdote é exclusiva e inquestionável. Porque Ele foi feito “mais alto que os céus”, separado dos pecadores, Ele pode realizar sua extraordinária obra de resgate sobre a terra.

Como Adão antes da queda ou como nós? Norman Gulley enfatiza que os dois, o primeiro e o segundo Adão, podem ser comparados, em vários pontos de conver-gência. O primeiro Adão saiu perfeito das mãos do Criador, o que incluía impecami-nosidade absoluta e capacidades humanas plenas. Da mesma forma, o segundo Adão, Jesus, veio das mãos do Criador-Espírito Santo, como “um Ser santo,” (Lc 1:35); da mesma forma que o primeiro Adão, o se-gundo Adão também, na encarnação, veio como resultado do poder criador de Deus. Milagres estiveram envolvidos em ambas as criações. Contudo, Jesus não veio como um homem no Éden. Ele tornou-se homem em Belém. Aquele que é sem pecado, en-trou no mundo afetado pelas limitações do pecado, embora preservando a santidade, como o novo Adão, singularmente “gera-do”. Ele assumiu a condição posterior à queda, limitado em cada aspecto, exceto em propensões pecaminosas. Havia nEle tanto a santidade da nova criação, como a deterioração de quatro mil anos de história da queda humana. Nós o encontramos, não criado como um homem adulto, à semelhança do primeiro, mas como uma indefesa criança, na manjedoura.49 Afetado, mas não infectado pelo pecado!

Ellen G. White, em vários textos, cola-bora com esta comparação, observando, por

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exemplo, que “Cristo é chamado o segundo Adão. Em pureza e santidade, conectado com Deus e amado por Deus, Ele começou onde o primeiro Adão havia começado. Ele passou pelo mesmo terreno onde Adão caiu, e redimiu a falha de Adão.”50 Observe-se cuidadosamente a frase em destaque, claramente indicando precisa-mente, onde Cristo iniciou na encarnação (“onde Adão havia começado”). Ellen G. White, enfatiza ainda, que “Ele [Cristo] venceu satanás, na mesma natureza sobre a qual, no Éden, Satanás, havia obtido a vitória”.51 A comparação não é entre Cristo e os demais seres humanos, depois da queda, como alguns supõem, mas entre Ele e o primeiro Adão, na mesma nature-za, como originalmente criado por Deus. “Ele [Cristo] deveria tomar sua posição como o cabeça da humanidade, tomando a natureza, mas não a pecaminosidade do homem.”52 A seguinte declaração de Ellen G. White, apropriadamente sumariza esta sessão de nossa discussão: “Por causa do seu [de Adão] pecado, sua posteridade nasce com inerente propensão para a deso-bediência. Mas Jesus Cristo foi o unigênito [monogenes] de Deus. Ele tomou sobre si a natureza humana, ele foi tentado em todos os pontos como a natureza humana é tentada. Ele poderia ter pecado. Ele poderia ter caído, mas nem por um momento houve nEle uma propensão maligna.”53

ellen G. White e A nAturezA de Cristo nA enCArnAção

Para Ellen G. White, a encarnação de Cristo é o “mistério de todos os misté-rios”.54 E isto deveria servir de precaução a todo estudante deste tópico. Para ela, “a encarnação de Cristo tem sido e permane-cerá para sempre um mistério”.55 Assim, por um lado ela estimula o estudo do tema: “O estudo da encarnação de Cristo, seu sacrifício expiatório e mediador, empregará a mente do estudante diligente, enquanto o tempo durar.”56 Tal mistério “pode empre-

gar”, ela afirma em outro contexto, “a pena e os mais altos poderes mentais dos homens mais sábios, desde agora, até quando Cristo for revelado nas nuvens do céu, em poder e grande glória”.57 Somos, por outro lado, entretanto, advertidos a depender do Espí-rito Santo, em nossa busca e conhecimento: “Que Deus seja assim, manifesto em carne é de fato um mistério; e sem a ajuda do Espírito Santo não podemos compreender este tema. A mais humilhante lição que o homem deve aprender é a inutilidade da sabedoria humana, e a tolice de tentar, em seus esforços desajudados, descobrir Deus.”58 Diante de tal mistério não pode-mos senão confessar que “o poço é fundo, e não temos com o que tirar a água” (Jo 4:11), se dependermos de nossos métodos.

Em uma enorme quantidade de tex-tos, Ellen G. White mantém em perfeito equilíbrio a divindade e a humanidade em Cristo. Ela ensina que, na encarnação, Cristo reteve sua divindade. Segundo ela, Jesus não foi apenas parcialmente divino. Ele era pleno Deus, enquanto na Terra. Como mencionado anteriormente, ela de forma clara indica que a divindade foi “velada na”, ou “revestiu-se da” “huma-nidade”, e que os plenos poderes de sua divindade, não deveriam ser utilizados. Contudo, como ela indica, em determinadas ocasiões cruciais, sua divindade irrompe através da humanidade. Eric C. Webster, em seu minucioso estudo da cristologia de Ellen G. White observa que “a intenção de Ellen G. White” é instruir “que Cristo não desejou que os homens cressem que Ele foi simplesmente um homem muito bom, dependendo completamente de seu Pai celestial, mas que Ele era o divino Filho de Deus, em relacionamento dependente com o Pai”.59

Além disto, Ellen G. White nutria forte compreensão quanto a importância da hu-manidade de Cristo. De fato, a realidade de sua humanidade é vista por ela como vital para o plano da salvação. Era impor-

Cristo e os Cristãos / 55

tante, à luz de um extraordinário volume de passagens, que Cristo fosse um homem genuíno e real, para que pudesse passar pelo mesmo terreno onde Adão havia pas-sado, e assim redimir sua queda. “Cristo não fez-de-conta que tomou a natureza humana; realmente Ele a assumiu. Ele, em realidade possuía a natureza humana.”60 Ela mantém que Cristo “foi feito como seus irmãos, com as mesmas suscetibilidades, mental e fisicamente”,61 descendo, assim, ao nível da humanidade. De fato, para ela, em função de sua genuína humanidade, Cristo foi trazido ao “nível das fracas fa-culdades do homem”.62 “Ele tomou sobre Si a humanidade, para enfrentar o teste e a provação, que o primeiro Adão falhara em resistir”.63 A vida de Cristo seria vida substitutiva, vivida na mesma humanidade que ela deveria redimir.64

Tendo em vista que Ellen G. White mantém em perfeito equilíbrio a divindade a humanidade em Cristo, a questão que isto suscita é: que tipo de natureza humana foi assumida por Ele? Nesta área não somos deixados em dúvida. Para ela, “Cristo é uma perfeita representação de Deus, de um lado, e um perfeito representante da humanidade impecaminosa, por outro lado”.65 Mas se julgarmos que ela está se referindo apenas a atos pecaminosos, não faríamos justiça ao profundo conceito de pecado expresso em seus escritos. “Se a lei se estendesse apenas à conduta exterior, os homens não seriam culpados por seus pensamentos errados, desejos e desígnios. Mas a lei requer que a própria alma seja pura e a mente santa, que os pensamentos e sentimentos possam estar de harmonia com a norma do amor e justiça”.66

Em face da realidade do pecado, que infecta a todos os demais membros da es-pécie humana, quer em termos de conduta exterior ou de caráter interior, como Ellen G. White percebeu a natureza de Cristo? Novamente, é absolutamente claro que, para ela, Cristo foi livre de todo o egoísmo

e pecado.67 Ele foi inocente e puro.68 Em Cristo nunca houve imperfeição, egoísmo, mácula ou mancha do mal.69 Guiada por sua clara compreensão, tanto da identidade única, bem como de sua exclusiva missão, como já afirmado anteriormente, ela indica que, tivesse Jesus participado da condição do pecado, Ele estaria desqualificado para sua obra redentiva.70 É precisamente tal estado pecaminoso, que torna o homem uma oferta imperfeita, e dasabilitado para operar sua própria salvação.71 Comentando a profecia da inimizade entre a serpente e a mulher, e entre a descendência da primeira e o descendente da segunda (Gn 3:15), Ellen G. White enfatiza que, em nós esta inimizade não é natural. “Não existe, por natureza, nenhuma inimizade entre o homem pecador e o originador do pecado.”72 Ao contrário, natural é a nossa amizade com o pecado e o seu originador. Em relação a Jesus, entretanto, Ellen G. White declara que, com Cristo, tal “ini-mizade era em certo sentido natural. ... E nunca se desenvolveu a inimizade a ponto tão notável como quando Cristo se tornou habitante da terra.”73 Portanto, ela conclui um pouco depois, ainda no mesmo con-texto: “Não devemos ter qualquer dúvida acerca da perfeita ausência de pecado na natureza humana de Cristo.”74

Ellen G. White utiliza uma considerável variedade de termos para indicar o absolu-to estado de impecaminosidade de Cristo – significando com isto uma condição de completa ausência da corrupção e contami-nação. Ela escreve de Cristo, por exemplo, que “Ele foi incontaminado pela corrupção, um estranho ao pecado”.75 Linguagem semelhante é utilizada quando afirma que “Jesus foi incorruptível e incontaminado.”76

Através de sua vida, Cristo foi imaculado quanto à corrupção da iniqüidade. Obser-ve-se a linguagem que forma o contexto desta declaração: “Ele ergueu-se diante do mundo, desde a sua entrada nele, imacu-lado quanto à corrupção, embora cercado dela.”77 Se tal condição de impecabilidade

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recua à sua entrada no mundo, isto só pode significar que ela não está se referindo a desempenho em termos de ações.

Em lugar de oferecer o segredo do vitorioso poder de Cristo, como, por exemplo, fé e dependência no Pai, o que o pós-lapsarianismo adventista poderia esperar, ela sublinha que o segredo de sua absoluta incontaminação está diretamente relacionado com a divindade de sua pessoa, desde o momento inicial de sua entrada no planeta Terra. Ellen G. White claramente indica que Cristo “nasceu sem uma man-cha de pecado, embora Ele tenha vindo ao mundo de maneira semelhante à família humana”.78 Esta é uma poderosa declaração dialética, demonstrando o pensamento de Ellen G. White quanto ao nascimento de Cristo. Novamente, é evidente que ela não está falando aqui de atos, mas de um estado. Para ela, Cristo não foi maculado com o pecado original, que, segundo a Bíblia, é a marca característica de todos os demais seres humanos.

À luz da última citação, em compara-ção com raciocínio da noção pós-lapsaria-na, estamos justificados em perguntar: se Ellen G. White afirma que Cristo entrou no mundo sem a corrupção ou a mancha do pecado, incontaminado quanto à sua poluição, e se entre Ele e nós, como de-fendido pelos seguidores modernos de A. T. Jones, “não existe uma partícula de diferença”, estaria então ela ensinando que todos os outros homens também vêm ao mundo no mesmo estado incontaminado? Qualquer pessoa sensata seria capaz de perceber a precariedade lógica desta teo-ria. Observando a questão de outro ângulo, lemos ainda da pena de Ellen G. White, com ênfase na singularidade de Cristo na encarnação, em sua infância: “Ele [Cris-to] não era como as demais crianças.”79

Um pouco depois, no mesmo parágrafo, ela fala da “sua inclinação para o que é justo”, ou, no parágrafo seguinte: “Nin-guém, olhando para Ele ... poderia dizer

que Cristo foi como as outras crianças.”80 Conhecemos alguma outra criança que venha ao mundo com a “inclinação para o que justo”? Aqui, como Woodrow W. Whidden observa, encontramos uma das mais fortes e inequívocas declarações de Ellen G. White quanto à impecaminosi-dade da exclusiva natureza de Cristo.81 E claro, “nascido sem uma mancha de peca-do”, não é uma referência à sua história de impecável desempenho posterior.

Em outro contexto, falando a respeito de Sete, nascido relativamente próximo do estado original de Adão (Gn 5:3), mas, ago-ra não mais à imagem de Deus, em sentido comparativo com Adão, seu pai (Gn 1:27), mas à semelhança dele depois da queda, Ellen G. White observa que embora tivesse caráter nobre, e devesse tomar o lugar de Abel, não obstante “ele tinha a natureza de Adão [depois da queda], tão destituído de bondade natural como Caim. Ele foi nasci-do em pecado”.82 Contrariamente a Pelágio e todos os que tentam negar os resultados da queda, Ellen G. White não trivializa tais efeitos sobre a família humana. Entretanto, de Cristo, nascido quatro mil anos depois, e tendo aceito “os resultados da operação da grande lei da hereditariedade”,83 ela afirma no capítulo “Em Criança” do seu livro O Desejado de Todas as Nações: “Nenhum traço de pecado desfigurava nEle a ima-gem divina”,84 e mais adiante: “Cristo foi o único ser livre de pecado que já existiu na terra.”85 Assim, o contraste entre Cristo e Sete, não poderia ser mais evidente: Um nasceu em pecado, enquanto o outro “nas-ceu sem qualquer mancha do pecado”.

A CArtA A bAker

Na carta escrita em 1895/686 a W. L. H. Baker,87 um ministro adventista tra-balhando na ilha da Tasmânia, Ellen G. White dedica cinco parágrafos à questão da humanidade de Cristo. A importância do tratamento dado ao tópico, neste contexto,

Cristo e os Cristãos / 57

é de absoluto significado,88 primariamente não pela proeminência de Baker no minis-tério adventista, ou mesmo pela extensão do documento, mas porque aí, nestes cinco parágrafos de interesse cristológico, ela aborda especificamente a questão da natureza de Cristo em relação ao pecado. É doutrinariamente claro que a Carta 8, como o documento passou a ser conhe-cido, discute e corrige noções incorretas sobre a humanidade de Cristo (não sua divindade), aparentemente incorporados ao ensino distorcido de Baker sobre a questão. Além disto, a advertência e conselho a este obreiro, expressos nesses parágrafos, claramente revelam o pensamento de Ellen G. White quanto à singularidade de Cristo na encarnação.

No primeiro parágrafo, ela chama a atenção para Cristo, Adão e a posteridade caída deste. Em palavras que dificilmente poderiam significar outra coisa, Ellen G. White adverte que Cristo não deve ser apresentado diante das pessoas, como um homem com propensões para o pecado:

Sede cuidadoso, extremamente cuidadoso, em como tratais com a natureza humana de Cristo. Não o apresentes diante das pes-soas como um homem com as propensões para o pecado. Ele é o Segundo Adão. O primeiro Adão foi criado um ser puro, não contaminado pelo pecado, sem uma mancha de pecado sobre ele; ele poderia cair, e de fato ele caiu, através da transgressão. Por causa do pecado, sua posteridade nasce com inerente propensão para a desobediência. Mas Jesus foi o Filho Unigênito de Deus. Ele tomou sobre Si a natureza humana, e foi tentado em todos os pontos como a natureza humana é tentada, mas nem por um momento houve nEle uma inclinação maligna. Ele foi assaltado por tentações no deserto, como Adão foi assaltado com tentações no Éden.89

A palavra-chave neste texto é propen-sões, que Wieland, em defesa da teoria pós-lapsariana, tenta confundir,90 obscu-

recendo a clareza do texto, que compara a pecaminosa posteridade de Adão com a singularidade impecaminosa de Cristo. Quatro pontos no texto são evidentes: 1) Enquanto todos os membros da espécie hu-mana nascem com inerente propensão para o pecado, Cristo desconhecia tal inclinação; 2) É óbvio também que Ellen G. White não está discutindo propensões cultivadas, mas propensões inerentes; 3) Como o primeiro Adão é descrito? “Um ser puro, não con-taminado pelo pecado, sem uma mancha de pecado sobre ele.” E a conclusão pode ser apenas uma: É precisamente assim que Cristo encarnou a condição humana, pois a comparação é entre o primeiro Adão, como criado por Deus, e o Segundo Adão, Cristo; 4) finalmente, a natureza incontaminada, sem qualquer mancha ou propensões para o pecado foi o que Cristo assumiu, não o que Ele desenvolveu. Em outras palavras, uma natureza sem a inclinação maligna, foi a sua herança, não “desenvolvimento de caráter”.

No segundo parágrafo da carta em con-sideração, Ellen G. White aconselha Baker a evitar “toda questão em relação à huma-nidade de Cristo, a qual seja passível de má compreensão. [Pois] a verdade encontra-se perto da vereda da presunção.” Então ela continua: “Ao tratar com a humanidade de Cristo, necessitais guardar cuidadosa-mente cada afirmação a menos que vossas palavras sejam tomadas como significando mais do que elas querem dizer, e assim percais ou anuvieis as claras percepções de Sua humanidade, como combinada com sua divindade.” Aí ela passa a indicar o nascimento sobrenatural de Jesus: “Seu nascimento foi um milagre de Deus.” E cita o texto de Lucas 1:35: “Descerá sobre ti o Espírito Santo e o poder do Altíssimo te envolverá com a sua sombra; por isto, também o ente santo que há de nascer, será chamado Filho de Deus.” Ellen G. White então inicia o terceiro parágrafo, concluindo o pensamento do segundo: “Estas palavras não se referem a qualquer

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ser humano, exceto ao Filho do Deus Infi-nito.”91 Desta forma, ela elucida como foi possível Cristo superar a infecção universal do pecado. O que é claro neste texto é que, embora Jesus seja “um conosco”, Ele não é “um de nós”.

Ellen G. White, então, continua o tercei-ro parágrafo, com uma solene advertência: “Nunca, de nenhuma forma, deixeis a mais leve impressão sobre as mentes humanas, de que a mancha, ou inclinação para a cor-rupção repousou sobre Cristo, ou que Ele, sob qualquer circunstância, tenha cedido à corrupção.”92 Poderia Baker estar dando, em suas apresentações, a impressão falsa, desaconselhada na advertência? É possível! Ellen G. White neste texto, nega tanto que tenha havido em Cristo “mancha ou incli-nação” para o pecado, o que tem que ver com a sua natureza, bem como que Ele tivesse “cedido à corrupção”, o que trata com atos exteriores do comportamento. E isto ela explica: “É um mistério deixado não explicado para os mortais.” Ainda neste parágrafo, Ellen G. White, cita parcialmen-te o clássico texto de Deuteronômio 29:29: “Aquilo que é revelado é para nós e nossos filhos”, e inclui a mais séria advertência da carta: “mas que cada ser humano seja advertido do perigo de tornar Cristo com-pletamente humano, tal como um de nós”, arrematando, então: “pois isto não pode ser”.93 A linguagem dificilmente poderia ser mais clara. Ellen G. White não apenas indica por comparação, o contraste entre Ele e nós, mas seriamente adverte contra o perigo de torná-lo “completamente hu-mano”, pois, creiamos ou não, “isto não pode ser”! Em que sentido Cristo poderia ser tornado “completamente humano”? Neste contexto, só podemos pensar em uma única possibilidade: rebaixando-o à condição da pecaminosidade essencial dos demais seres humanos.

No quarto parágrafo, ela continua a ênfase sobre os perigos de se tratar com o tópico da natureza humana do Filho, já

sugeridos antes. E, finalmente, o quinto parágrafo cristológico da carta a Baker continua a comparação e contraste entre o primeiro e o segundo Adão, concluindo que “Satanás não encontrou nada nEle [Cristo] que pudesse encorajar seus assédios”.94 O que se torna evidente nestes parágrafos, é que Jesus, segundo o pensamentto de Ellen G. White, era um ser único, exclusivo, e isso porque Ele não veio apenas para ser um exemplo, mas sobretudo, para ser o nosso Salvador. E, como Roy Adams corretamen-te observa, “se Ele fosse completamente como nós – 100% – se Ele tivesse partilha-do exatamente da mesma forma a herança do pecado e culpa que todos recebemos de Adão, então, Ele teria sido limitado como Salvador. Mais do que isto, Ele próprio necessitaria de um Salvador”.95

A carta a Baker constituiu-se num dos maiores obstáculos à teoria pós-lapsariana de alguns adventistas contemporâneos. E não nos surpreendem as tentativas ridículas de se evadir às evidências, ou de “explicá-las”, obscurecendo a clareza da cristolo-gia de Ellen G. White, aí expressa. Jean Zurcher, além de outros como Wieland e Larson, oferece um exemplo desta atitude, como indicado por Denis Fortin, em sua avaliação crítica do livro Tocado pelos Nossos Sentimentos, distribuído no Brasil de maneira não solicitada, pelos publicado-res da edição em português. “Zurcher não apenas evita uma exposição clara da carta a Baker, mas também a cita de forma dis-torcida e fora do contexto.” Fortin sugere que “para provar o seu ponto de vista, Zur-cher cita apenas parte da mesma carta [de Baker], e deixa de fora duas importantes sentenças curtas, nas quais Ellen G. White estabelece um contraste marcante entre a natureza de Cristo e a nossa”.96 Fortin se-gue indicando as formas em que Zurcher distorce, nega ou omite as evidências. Esta atitude de teimosia diante das evidências é, provavelmente, o aspecto mais negativo do legado dos pioneiros originais da idéia, como veremos a seguir.

Cristo e os Cristãos / 59

em ApArente ContrAdição

No vasto material de Ellen G. White, tratando com a natureza de Cristo na en-carnação, nós encontramos duas linhas de pensamento, aparentemente em contradi-ção. De um lado, quando enfatizando a singularidade e exclusividade de Cristo, em citações como esta do Review and Herald, de 1872, encontramos que “Ele foi perfeito, e não contaminado pelo pe-cado. Ele foi imaculado e sem mancha”.97 Ou ainda, como nesta outra de Signs of the Times, em 1902: “Ele deveria assumir sua posição como cabeça da humanidade, tomando a natureza mas não a pecami-nosidade do homem.”98 Entretanto, ao enfatizar a identificação de Cristo conosco, ela, em algumas declarações, descreve-o como tendo uma natureza degradada,99 enfraquecida,100 deteriorada,101 caída,102 fraca,103 pecaminosa,104 enferma105 e com as mesmas susceptibilidades106 que nós, ao mesmo tempo em que afirma que Ele não tinha as propensões malignas.107

A questão, portanto, é: Como alguém pode ter natureza pecaminosa sem pro-pensões pecaminosas? Se as propensões pecaminosas são extraídas da natureza pecaminosa, o que resta? Aqui devemos aplicar dois princípios básicos de inter-pretação. Primeiro, devemos interpretar os textos obscuros pelos claros, não o contrário. E, segundo, quem Cristo é deve nos informar o que estas expressões apa-rentemente em contradição significam, e não o contrário, isto é, interpretar quem Ele é a partir dos textos contraditórios. Provavelmente, a citação que aparece em Signs of the Times, em 1898, na qual Ellen G. White apresenta os dois aspectos da na-tureza humana de Cristo, em tom dialético, clarifica a questão:

Ao tomar sobre si mesmo a natureza hu-mana em sua condição caída, Cristo não teve a mínima participação em seu pecado. Ele foi sujeito às enfermidades e fraquezas

pelas quais o homem é envolvido, para que seja cumprido o que foi dito por Isaías, o profeta, dizendo “Ele tomou sobre si as nossas enfermidades e suportou as nossas enfermidades.” Ele foi tocado com os senti-mentos de nossas enfermidades, e foi tenta-do em todos os pontos, como nós somos. E, contudo, Ele “não conheceu pecado.” Não deveríamos ter qualquer má compreensão quanto à perfeita impecaminosidade da natureza humana de Cristo.108

Aqui, num único parágrafo, encon-tramos combinados os pensamentos da impecaminosidade da natureza humana de Cristo, com o fato de que Ele tomou sobre si a natureza caída do homem. Ela indica que, como já enfatizado anteriormente, Jesus não foi isento de pecado meramente em atos, mas em sua natureza essencial. Ellen G. White define a “natureza caída/pe-caminosa” que Cristo assumiu, como sendo “sujeita às enfermidades e fraquezas” que o homem enfrenta, tornando clara a distinção entre “enfermidades e fraquezas” de um lado, e “pecado” do outro. “Em todos os pontos, exceto no pecado, a divindade de-veria tocar a humanidade”, ela clarifica.109

E esta, certamente, é uma extraordinária exceção, excluindo todo o pecado da hu-manidade de Cristo. Como Ellen G. White diz, Cristo tomou “a natureza, mas não a pecaminosidade do homem”.110

Assim, qualquer tentativa de explicar o conceito de Cristo “tomando sobre si a natureza caída e pecaminosa”, deve levar em consideração o ensino total de Ellen G. White sobre a inerente impecaminosidade da natureza humana de Cristo, do contrá-rio distorcemos seu ensino, e colocamos Ellen G. White contra ela mesma. Como Webster observa: “Deveríamos, portan-to, manter que quando Ellen G. White diz que Cristo tomou sobre si a natureza caída e pecaminosa do homem, ela quer dizer que Cristo tomou sobre si, todos os efeitos do pecado, sem ser infectado pelo pecado. Ele ergueu-se na mesma posição

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e circunstâncias do homem caído, experi-mentando todos os sofrimentos, fraquezas e condições do homem. Ele tomou a na-tureza física sujeita a todos os efeitos do pecado, exceto o pecado.”111 Isto é, Ele foi afetado, pelas conseqüências do pecado, sem ser infectado pelo pecado. Por nós, Ele aceitou a mortalidade e as enfermidades da condição humana, tais como cansaço, fome, sede, tristeza e sujeição à tentação. Ele se colocou onde o homem pecaminoso se encontra, para abrir a possibilidade de salvação, da mesma forma que Ele tomou sobre si os pecados e a culpa de toda a raça, mas permanecendo ainda o imaculado Cordeiro de Deus. Tendo o pecado sobre Ele, mas não nEle. Morrendo na cruz, mas não da cruz!

Qualquer leitura responsável de Ellen G. White não deixaria passar despercebido o seu cuidado em tornar claro, além da dú-vida razoável, que Cristo não participou da corrupção do homem, de suas paixões ou propensões malignas, do orgulho humano, inveja, rivalidade, egoísmo ou qualquer in-clinação para o mal. Para ela, mesmo entre Cristo e os cristãos existe uma imensurável distância. Falando das orações, louvor e confissão dos verdadeiros crentes, que ascendem ao céu, e chegam ao santuário celestial, onde Cristo ministra, ela diz: “Mas, passando através dos corrompidos canais da humanidade, elas são tão con-taminadas que, a menos que purificadas pelo sangue, nunca teriam qualquer valor perante Deus.”112 Contudo, para ela, Cristo tomou sobre si a natureza humana, e nunca precisou de purificação pelo sangue ou de um mediador, para tornar suas orações aceitáveis perante o Pai. Cristo não tinha corrupção inerente, ao contrário dos ver-dadeiros crentes e santos, que necessitam constantemente dos méritos de Cristo.113

A trAdição dos AnCiãos

Qualquer tentativa de entender a questão básica formulada pela teoria pós-lapsaria-

na fatalmente passa por nomes da história denominacional, tais como E. J. Waggo-ner, Alonzo T. Jones, além de incluir as idéias posteriores de M. L. Andreasen. Pós-lapsarianos dos ministérios indepen-dentes e seus simpatizantes, como vimos, se regozijam em acusar os que discordam deles de serem seguidores do “romanismo católico”. Contudo, a verdade é o oposto. São precisamente eles que se aproximam da mentalidade católica romana, canonizando os ensinos dos dois “pais”, de suas idéias, e elevando tradição de Minneápolis, 1888, praticamente ao status de um outro “con-cílio” da tradição.

Para Donald K. Short, “em compara-ção com Jones e Waggoner, Lutero teve um problema relativamente simples em enfrentar a violenta oposição do papado e da hierarquia católica, em relação à sua mensagem”.114 A própria apostasia dos dois “santos padroeiros” do pós-lapsarianismo dissidente, envolvidos nas brumas do pan-teísmo de Kellog no início de século vinte, é explicada da forma mais bizarra. Por que eles se apostataram? Segundo Wieland e Short, não por causa de qualquer “ponto de vista extremo”, deixando de reconhecer que especialmente Jones fosse especialista em posições extremistas.115 Para Short, “eles foram desviados por causa da per-sistente e irrazoável oposição dos irmãos a quem Deus os enviara para iluminar”.116 O que causa ainda maior perplexidade é a sugestão de que foi Deus quem, como fez com Moisés, “enterrou secretamente os seus mensageiros (Jones e Waggoner)”, removendo, por este ato, “toda a ocasião para idolatria”, das gerações futuras.117

A conclusão do raciocínio de Wieland e Short nos deixa estarrecidos. Para estes au-tores, “que melhor método de ‘enterrar’, do que permitir que os mensageiros perdessem o seu caminho na desgraça?”118 Como Roy Adams119 observa, uma interpretação desta natureza só pode significar que, para estes líderes do pós-lapsarianismo, a apostasia

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de Jones e Waggoner deveu-se um plano divino, para que eles não se tornassem “objetos de idolatria”. Em primeiro lugar, só podemos deplorar esse tipo absurdo de caracterização de Deus; e, em segundo lugar, se esta foi a intenção do Senhor, seu plano não teve muito sucesso, como evidente na fixação dos ministérios inde-pendentes na figura dos dois mensageiros de Minneápolis.

A apostasia de Jones e Waggoner nada tem a ver com um plano divino, como de pessoa alguma. Por um lado, consideran-do-se a vida destes dois personagens da perspectiva do início da carreira deles, poderia parecer incompreensível que eles tenham, afinal, se desviado da fé. Por outro lado, contudo, para quem está fa-miliarizado com as histórias deles – seus triunfos e tragédias, considerando-se as tendências de suas vidas, o orgulho, a arrogância, autoritarismo, personalidade agressiva, a dificuldade em pedir conselho ou ouvi-los, a disposição para extremismos, particularmente de Jones –, especialmente os últimos capítulos da história pessoal de Jones e Waggoner, não é, afinal, uma grande surpresa. O maior legado de Jones a seus herdeiros modernos, foi sua imbatível teimosia. Mesmo quando confrontado com evidências cabais, contrárias às suas idéias, a indisposição em admitir o erro acabava prevalecendo. Como seu biógrafo, George Knight, indica, “Jones, que tinha escrito tanto sobre o Espírito Santo através dos anos, não aprendeu a submeter sua vida à influência do Espírito”.120

Jones, deploravelmente, tornou-se o patrono do espírito de seus seguidores atu-ais: Toda a igreja está errada, e apenas eles estão certos. No final de sua vida, quando alguém apelava para seu retorno à grand old adventist message, invariavelmente Jones respondia que ele estava na mensa-gem, enquanto a denominação, incluindo Ellen G. White, havia deixado os antigos ensinos.121 Todos, exceto ele, haviam se

apostatado. Quanto a E. J. Waggoner, suge-rimos a leitura do livro escrito por David P. McMahon,122 estabelecendo uma distinção entre o Waggoner, personagem da história, e o Waggoner, vulto da mitologia de certos adventistas.123 Não negamos a contribuição de Jones e Waggoner, quanto ao artigo da justificação pela fé, particularmente na histórica sessão de Associação Geral, em Minneápolis, 1888. Quanto ao resultado final de seus sucessos e fracassos, não so-mos chamados a julgá-los, isto deixamos para uma corte mais alta decidir. Mas o que quer que eles tenham representado para o adventismo, isto não deve obscurecer desacertos cruciais de sua carreira e final abandono da fé do advento.

Contrariamente à idéia generalizada entre pós-lapsarianos, não se dispõe de nenhuma evidência de que a histórica as-sembléia da Associação Geral em Minne-ápolis (1888) tenha tratado com a questão da natureza humana de Cristo. Isto é cla-ramente confirmado pelo cuidadoso estudo de George Knight.124 A idéia da natureza pecaminosa de Cristo, nos ensinos de Jones e Waggoner, a partir dos registros disponí-veis, só surgiria na década de 1890, isto é, depois de Minneápolis. É na Assembléia da Associação Geral, em 1895, que Jones in-siste: “A natureza de Cristo é precisamente nossa natureza. Em sua natureza humana não há uma partícula de diferença entre ele e nós.”125 É precisamente então, que, quando confrontado com a clara citação de Ellen G. White: “Ele [Cristo] é um irmão em nossas fraquezas, mas não em possuir idênticas paixões”,126 Jones tenta se evadir da questão, articulando uma resposta, na melhor das hipóteses, absurda, fazendo uma diferença “entre a carne de Cristo e sua mente”.127 Isto é, segundo Jones (num tipo de retrocesso à heresia defendida pelo apolinarianismo), Jesus foi feito igual a nós segundo a carne pecaminosa, mas não em igualdade da mente pecaminosa. Como, então, poderia Jesus ser exatamente igual a nós, e ter uma outra mente? Como

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Knight observa, afinal “Jones demonstrou que houve mais do que ‘uma partícula’ de diferença entre Cristo e os demais seres hu-manos”.128 Não é nossa mente parte integral da nossa natureza? Não é precisamente aí que se trava o grande conflito entre carne e espírito? Como Cristo poderia, então, ser precisamente igual a nós, e diferente nesse aspecto crucial? A precariedade de tal teo-logia não poderia ser mais flagrante.

Qual o interesse dos pós-lapsarianos adventistas em incluir o tópico da natureza humana nas discussões da Assembléia de Minneápolis, em 1888? Evidentemente, para capitalizar o endosso de Ellen G. White às afirmações de Jones e Waggoner em Minneápolis. Contudo, além do fato de que Minneápolis (1888), como já discutido, não ter tratado com o tópico da humanidade de Cristo.

Um outro aspecto crucial a ser obser-vado é que, mesmo supondo que Jones e Waggoner já defendessem, então, qual-quer idéia pós-lapsariana, o endosso da profetiza não foi um cheque em branco. Como Knight observa, Ellen G. White, “livremente disse aos delegados reunidos, em primeiro de novembro de 1888, que ‘al-gumas interpretações das Escrituras, dadas pelo Dr. Waggoner, eu não considero como corretas’”.129 Além disto, ela discordou de dois aspectos fundamentais da cristologia de Waggoner. Primeiro, Ellen G. White frontalmente discordou da idéia de Waggo-ner de que Cristo não pudesse pecar.130 E, segundo, ela discordou da idéia ariana de Waggoner, isto é, que Cristo tivesse tido um começo.131 Uma objeção à pretenção de que Ellen G. White tenha oferecido endosso não qualificado às teorias de Jones e Waggoner, é oferecida nas próprias pa-lavras da profetiza: “Eu creio, sem dúvida que Deus nos enviou preciosa verdade, no tempo certo, pelo irmão Jones e pelo irmão Waggoner. [Mas] Eu os considero, então, como infalíveis? Digo eu que eles não farão declarações ou terão idéias que não possam

ser questionadas? Ou que não possam estar em erro? Digo eu isto? Não, eu não digo tal coisa. ... Mas eu digo que Deus nos enviou luz”.132 Assim, apesar destas claras delimi-tações, há ainda aqueles que tratam Jones e Waggoner como infalíveis, e assim sendo, diria Sócrates, “são mais amigos dos seus amigos, do que amigos da verdade”.

Ainda nesta conexão encontramos a idéia fixa do pós-lapsarianismo dos mi-nistérios independentes, de se julgarem os representantes exclusivos do “adventismo histórico”. E, claro, a palavra “histórico” é utilizada como sinônimo de “ortodo-xia”, ou “tradicional”, algo que a Igreja Adventista do Sétimo Dia sempre creu, e que hoje é reivindicado por estas versões separatistas e polêmicas da fé do advento de forma exclusiva. Algo que se observa na superfície é que a noção de “adventismo histórico”, quase que se restringe à teoria pós-lapsariana quanto à natureza de Cristo, e noções relacionadas a este tópico (como o perfeccionismo, além de algumas noções escatológicas também associadas a ele). Por outro lado, nestes últimas 50 anos, como Whidden observa, “os assim cha-mados adventistas históricos tem desejado elevar os seus pontos de vistas distintivos quanto à humanidade de Cristo ao nível de um ‘pilar’ ou fundamento, na plataforma da verdade presente”.133

Enquanto Ralph Larson tenta demons-trar que “houve consenso” sobre a noção pós-queda da natureza de Cristo, no período anterior a 1950, tal teoria é desacreditada pelo fato de que já em 1895, Jones foi confrontado com a citação de Ellen G. White, em Testemunhos para a Igreja, volume 2, página 202 (“Ele é um irmão em nossas fraquezas, mas não em possuir idênticas paixões”), já mencionada acima, em oposição à sua idéia. Além disto, os parágrafos da Carta a Baker, também já mencionados, erguem forte objeção à teoria dos “adventistas históricos”. Assim, para serem os “históricos”, o que eles preten-

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dem ser, isto deixaria Ellen G. White fora deste círculo. É verdade que Waggoner e Jones, na década de 1890, foram fortes pro-ponentes da teoria pós-queda da natureza de Cristo, e posteriormente outros, como Albion Fox Ballanger e M. L. Andreasen, também advogaram tal idéia, e sob a influ-ência deles, outros nomes ilustres podem ser acrescentados à lista. Mas isso prova apenas que alguns decidiram seguir suas próprias idéias, ou as idéias dos seus men-tores espirituais.

Além do mais, ao ler toda a ênfase pós-lapsariana do auto-proclamado “adventis-mo histórico”, somos forçados a perguntar, quão genuína e autenticamente adventistas são algumas das idéias encontradas no “ad-ventismo histórico?” O que dizer das idéias anti-trinitarianas de alguns pioneiros? E das noções arianas ou semi-arianas quanto à divindade de Cristo?134 Ou das noções er-radas quanto guarda à do sábado, ou do sis-tema de benevolência sistemática, ou ainda conceitos completamente equivocados sobre os princípios de saúde? Isto para não se falar das objeções de alguns pioneiros à organização da Igreja, por exemplo. O que dizer, ainda, das idéias dos próprios heróis, Jones e Waggoner, quanto ao panteísmo, assimilado de Kellog,135 da idéia da “afini-dade espiritual” de Waggoner,136 as noções de Jones, quanto à “nova voz profética”, manifestada, segundo ele, na Srta. Anna Philips?137 O que dizer a teoria extremista de Jones quanto à “cidadania”,138 vista por Ellen G. White como “fogo estranho”, ou de sua idéia de violação provocativa das leis dominicais?139 O que dizer ainda das idéias convergentes de Jones, com o movi-mento da “carne santa”?140 Ou o que dizer das noções materialísticas de santidade, mantidas por grupos adventistas, que criam que seus cabelos brancos seriam restaura-dos à sua cor natural, ou mesmo da idéia de Waggoner, ensinando que se alguém realmente tivesse a justiça de Cristo, nunca ficaria enfermo?141 Deveria todo este peso morto da dogmática destes pioneiros ser

também incluído dentro do “adventismo histórico”? É claro que o bom senso su-gere a resposta. Necessitamos orar mais, estudar mais, e submeter-nos à direção do Espírito Santo, que progressivamente expurgou do adventismo muitos destes tópicos estranhos, além de completamente equivocados. Os ministérios independentes e seus simpatizantes devem entender que o compromisso primário dos Adventistas do Sétimo Dia, não é manifestar lealdade a qualquer pioneiro do movimento, seja Jones, Waggoner, ou qualquer outro. Nossa consciência está cativa à Palavra da revelação, e é diante da revelação, que nos curvamos em lealdade, compromisso e obediência.

ConClusão

Um dos problemas mais complexos da cristologia é a questão do relacionamento da divindade e humanidade em Cristo, e este artigo tratou com algumas facetas deste tópico e seus desdobramentos na comunidade Adventista do Sétimo Dia, focalizando em particular a teoria defen-dida por alguns segmentos do adventismo contemporâneo.

Tratamos primeiramente com a noção bíblica de pecado, conceito básico para a compreensão do tema. Como discutido, pecado, na visão das Escrituras, trans-cende qualquer noção superficial que transforma esta enfermidade sistêmica em manifestações exteriores da conduta. É a natureza humana que foi profundamente afetada e infectada pela queda original, produzindo uma atitude fundamental de rebelião. Todos, por nascimento, partilham de propensões malignas, que nos colocam alienados de Deus, e em linha de colisão com sua vontade. Os seres humanos sofrem de um mal muito mais grave e profundo do que os sintomas manifestos na superfície. Pecado, mais que ações pecaminosas, é um estado de degeneração moral e espiritual,

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com o qual todos os seres humanos entram no planeta Terra, e que coloca a todos, sem excessão, em imediata necessidade de salvação. Houvessem os pioneiros do pós-lapsarianismo, Waggoner e Jones e outros, entendido o ensino paulino de pecado, e não apenas isolado alguns textos joaninos, adequados à sua teoria, e certamente a história das idéias que eles desencadearam seria outra.

O tópico do pecado foi também explora-do do ponto de vista dos escritos de Ellen G. White. Explicitamente, a escritora afirma a realidade da depravação pecaminosa e corrupção humana, como um estado. Ela fala de pecado em termos de uma condição natural de todos os humanos. Devemos lembrar, sumariza ela, “que nosso coração é naturalmente depravado, e somos inca-pazes em nós mesmos de seguir a direção certa”.142 Ou “como resultado da desobedi-ência de Adão, cada ser humano é um trans-gressor da lei, vendido sob o pecado”.143 “O egoísmo”, diz ela, “está integrado em nossa essência”, “e isto nos vem por herança”.144 Curiosamente, Ellen G. White utiliza a expressão pecado original uma única vez, e aí ela afirma nossa direta relação com as conseqüências da queda: “A própria fonte da natureza humana foi corrompida. E desde então, cada pecado tem continuado sua obra odiosa, passando de mente para mente. Cada pecado cometido, desperta ecos do pecado original.”145

O aspecto crítico da nossa discussão, portanto, centraliza-se na questão: Poderia Jesus ter nascido com a mesma natureza que recebemos de Adão? No mesmo estado em que todos os demais seres hu-manos nascem, e ainda assim ser o nosso Salvador? Poderia Ele ser o Salvador, o substituto sacrificial, a oferta pelo pecado, e, ao mesmo tempo, ser chamado de “de-pravado”, “corrupto”, e ser caracterizado como tendo as “propensões e tendências malignas do pecado” ou “inclinações para o mal”? Como discutido, qualquer tentativa

de tornar Cristo um de nós desconsidera dois aspectos fundamentais, na resposta a estas questões: Primeiro, sua identidade, isto é, quem Ele era, como o monogenes de Deus, o único do Seu tipo, exclusivo, singular, um “ser santo” (Lc 1:35), que, em relação ao pecado, está separado e distinto de todos membros da espécie humana. Esta verdade funciona como uma salvaguarda, estabelecendo os limites de sua identifi-cação conosco, não permitindo que tais fronteiras sejam violados, no interesse de qualquer teoria, por melhor intencionada que seja. E, segundo lugar, a extensão de sua identificação conosco, não pode des-considerar sua missão, também exclusiva e única. Para ser nosso Salvador e oferta pelo pecado, Cristo deveria ser, como afir-ma Hebreus 7:26, “puro, santo, imaculado, separado dos pecadores”. Ellen G. White, entendeu claramente este binômio da cris-tologia bíblica e numa multidão de textos deixa a questão absolutamente clara.

A íntima união de Cristo com a humani-dade caída não significa que Ele tenha tido a mínima ou a mais remota participação em nossa condição pecaminosa. Em termos de lógica bíblica, afirmar que Cristo assumiu a natureza caída e pecaminosa em qual-quer sentido preciso, equivale a dizer que sua vontade esteve em contradição com a vontade de seu Pai, e isto coloca o pós-lap-sarianismo numa posição de insustentável conflito com a ortodoxia cristã, com a qual eles dizem estar comprometidos. Um conosco, mas não um de nós, e é precisa-mente aí que residia o poder de sua vitória em nosso favor. Certamente gostaríamos de ter maior compreensão sobre como tal união de divindade e humanidade em Cris-to, foi possível. O mistério é como Cristo pôde combinar, de um lado a realidade de não ser infectado pela humanidade caída, em termos morais e espirituais, enquanto afetado por ela, assumido as conseqüências físicas da queda. Contudo, não somos chamados a explicar, mas a aceitar o mistério. Nas palavras de Ellen

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G. White: “A missão de Cristo não foi explicar a complexidade de sua natureza, mas dar abundante luz para aqueles que a receberiam em fé.”146 Não temos revelação absoluta, apenas revelação necessária. O que realmente necessitamos é aceitar e crer naquilo que nos está disponível, sem permitir que nossa lógica e opiniões cir-culares, interfiram na revelação.

Substancialmente, a cristologia de Ellen G. White é doutrinariamente explícita nos cinco parágrafos da famosa Carta a Baker, tratando com o tópico, conhecidos de memória por qualquer estudante sério do tema. Pós-lapsarianos podem tentar toda sorte de contorcionismo e malabarismo interpretativos, para “explicar” tais textos. Mas o que aí está claramente expresso tem caráter devastador para a teoria: “Nem por um momento houve nEle propensão maligna.” Ou: “Não o apresenteis como um homem com as propensões para o pe-cado.” “Seu nascimento foi um milagre de Deus. ... Nunca de nenhuma forma, deixeis a mais leve impressão sobre as mentes hu-manas que a mancha ou a inclinação para a corrupção permaneceu sobre Cristo.” E mais: “Que cada ser humano seja adverti-do acerca de tornar Cristo completamente humano, tal como um de nós, pois isto não pode ser.”147

Além disso, os textos que poderiam sugerir qualquer contradição nos escritos de Ellen G. White, devem ser entendidos à luz da totalidade de seu ensino, e inter-pretados à luz de quem Cristo é, não ao contrário, isto é, definir quem Ele é, apartir de nossa interpretação pré-concebida destes textos. Ellen G. White, tornar claro que a humanidade de Cristo, embora afetada pelo pecado, não é uma exata duplicação de nossa natureza. Do ponto de vista empí-rico do homem pecaminoso, sua natureza humana é vista por Ellen G. White, como exclusiva e única. Finalmente, os auto-pro-clamados representantes do “adventismo

histórico” deveriam repensar tal convicção, porque afinal, como discutido, nem tudo no “adventismo histórico” é essencialmente adventista.

Finalmente, aos que querem tornar Cristo tão identificado conosco a ponto de obscurecer sua identidade essencial e natureza de sua missão, relembramos, nas palavras da voz profética aos crentes ad-ventistas: “Não ver o marcante contraste entre Cristo e nós, significa não nos co-nhecermos a nós mesmos. Aquele que não aborrece a si mesmo, não pode entender o signficado da redenção”.148 Mesmo entre Cristo e os cristãos – e estes deveriam ser os primeiros a reconhecerem isso – permanece uma distância incalculável, porque a conversão e o novo nascimento não eliminam completamente nossa dis-torcida natureza básica, que, embora não mais reine, subsiste até a redenção final do “nosso corpo abatido”, no segundo advento. Talvez o aspecto mais deplo-rável da cristologia pós-lapsariana, não entendido por seus defensores, é a tenta-tiva de explicar a humanidade de Cristo a partir de nossa humanidade. Jesus assumiu “verdadeira humanidade”, mas no sentido intencionado por Deus. Assim, “verdadei-ra humanidade” não pode ser definida em termos da natureza humana como nós a conhecemos em nós próprios, mas apenas em termos da humanidade assumida pela Palavra, e estas duas, de nenhuma maneira, significam a mesma coisa. O grande erro, portanto, é nos apresentarmos como a nor-ma da humanidade, e então perguntarmos quanto Cristo deve se conformar com esta norma. Mas se a fé cristã é verdadeira, nós somos pobres espécimes de humanidade, mesmo os melhores de nós, não somos apenas imperfeitos, mas corrompidos pelo pecado. A Palavra, portanto, assumiu um tipo especial de natureza, semelhante, mas não completamente igual à daqueles a quem Ele “não se envergonha de chamar irmãos” (Hb 2:11).

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referênCiAs

1 Karl Barth, Dogmatics in Outline (London: SCM Press, 1966), 66

2 Ellen G. White, Mensagens Escolhidas (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1987), 1:243-244 (grifo nosso).

3 Norman R. Gulley, “Behold the Man” (Adven-tist Review, June 30, 1983), 4.

4 A. T. Jones, 1895, General Conference Bulle-tin, 231, 233, 436, citado por G. Knight, From 1888 to Apostasy (Hagerstown, MD: Review and Herald, 1987), 136.

5 Veja Kenneth Gage (pseudônimo), “What Human Nature Did Jesus Take? Fallen”, Ministry, June/1985, 9-10. Claro que tal idéia representa um tipo de rabinismo piorado. E. P. Sanders sumariza a posição rabínica, segundo a qual “a possibilidade existe que uma pessoa pode não pecar. A despei-to da tendência para desobedecer, o homem é livre para obedecer ou desobedecer” (E. P. Sanders [Phi-ladelphia: Fortress Press, 1977], 114, 115). Assim, as pessoas podiam, tecnicamente viver vida impe-caminosa, em sua própria força.

6 Veja Ralph Larson, The Word Made Flesh (Cherry Valley, CA: The Cherrystone Press, 1986), 330-350; veja abaixo, referência 19. Veja também, para estabelecer o equilíbrio, o capítulo “Sin: Ori-ginal and Not So Original”, em George Knight, The Farisees Guide do Perfect Holiness (Boise, ID: Pa-cific Press, 1992), 31-55. Aliás, todo o livro, é uma excelente avaliação dos resultados da trivialização do pecado.

7 No pós-lapsarianismo desenvolvido entre os adventistas dos ministérios independentes e seus simpatizantes, perfeccionismo é apenas o ponto de partida. Abaixo da superfície, estão pontos su-tis, de toda uma estrutura teológica, nem sempre percebida ou entendida pela maioria. Quando a teoria é compreendida em suas implicações, lon-ge de algo inocente, como alguns poderiam jul-gar, torna-se evidente, que estamos diante de um iceberg, de enormes proporções que escapam a olhares superficiais. Roy Adams coloca o indi-cador na jugular do problema, enumerando a se-qüência lógica de quatro pilares principais: 1) A natureza humana de Cristo foi exatamente como a nossa – cem por cento igual. 2) Uma vez que Cristo viveu vida sem pecado em natureza huma-na caída – uma natureza absolutamente igual a nossa –, então nós também podemos e devemos, como Ele, viver “sem pecado” (para esses refor-mistas, esta foi a grande descoberta da pregação da justificação pela fé que veio aos adventistas em 1888, e que, segundo, eles, a Igreja Adventista,

de maneira coorporativa, continua a rejeitar). 3) Quando a igreja remanescente finalmente aceitar esta mensagem e chegar a um estágio de absoluta perfeição impecaminosa, o caráter de Cristo será então plenamente reproduzido em seu povo, e Ele virá para reclamá-lo como seu. 4) Enquanto a igreja falhar em alcançar este estágio de absoluta perfeição impecaminosa, a chuva serôdia não cai-rá, o alto clamor de Apocalipse 18 não será dado em sua plenitude, e Cristo não retornará (Veja Roy Adams, The Nature of Christ [Hagerstown, MD: Review and Herald, 1994], 24-25). É destes pon-tos de ênfases, escorados numa multidão de textos de Ellen G. White, a maioria deles isolados dos seus contextos, e interpretados de acordo com opi-niões preconcebidas, que os proponentes da teoria derivam uma auto-proclamada missão de refor-mar a igreja. Daí, naturalmente, emergem o zelo incendiário e divisivo, o espírito de superioridade espiritual, e atitude acusatória contra todos aque-les que discordam da teoria.

8 Para Robert Wieland, o povo de Deus deve ven-cer como Cristo venceu. “Eles devem ter deixado de continuar pecando” (The 1888 Message [Washing-ton DC: Review and Herald, 1980], 94). A mesma ênfase é encontrada em Albion Fox Ballanger, M. L. Andreasen, e outros “reformistas” contempo-râneos. É claro que não deveríamos ter qualquer problema com a idéia da santificação e perfeição bíblicas. O que incomoda nestes autores, contudo, é o tom arrogante e acusatório, além da defesa de uma noção extremamente superficial de perfeição, decorrente da noção superficial de pecado. Colin e Russel Standish acusam de “novo adventistmo” e de “defensores do pecado” os que discordam deles: “Um tema central no novo adventismo” diz ele, “é que nós continuaremos pecando até o segundo ad-vento” (Adventism Vindicated, 63). Para uma exce-lente discussão deste tópico, veja Roy Adams, The Nature of Christ, o capítulo 6, “What is Sin? The Issue at the Heart of the Debate”. Adams expõe a fragilidade dos argumentos perfeccionistas. Além disso, devemos observar que 1 João 3:9 afirma: “Aquele que nasce de Deus não peca”, e, no verso 8: “Quem comete pecado é do diabo.” Mas isto não é tudo o que a epístola tem a dizer sobre o pecado. Em 1:8 lemos: “Se dissermos que não temos peca-do nenhum, enganamo-nos a nós mesmos, e não há verdade em nós.” Porém, mais sério ainda, no verso 10: “Se dissermos que não pecamos fazemos Deus mentiroso, e a sua palavra não está em nós.” Ou a Bíblia está em contradição, ou ela opera com um conceito de pecado mais complexo do que aquilo que é percebido pelos “reformistas adventistas”. E é precisamente isto que é indicado na mesma carta joanina, em 5:16. O próximo número de Parousia, tratará com esta questão.

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9 Admitimos que “pecado original” pode não ser a melhor expressão, particularmente pelo peso da tradição dogmática. Contudo, alguns adventistas têm denegrido o conceito, sem plenamente analisar o seu significado. Veja no livro de Knight, The Pha-risees Guide, além do capítulo tratando com o peca-do original, os capítulos tratando com pecado e san-tificação. Sem usar a expressão “pecado original” (exceto por uma única ocorrência, na Review and Herald de 16 de Abril, de 1901), Ellen G. White refere-se à mesma condição humana descrita pelo apóstolo Paulo e por teólogos ao longo dos séculos. “Por herança e exemplo, os filhos se tornam parti-cipantes do pecado do pai. Más tendências, apetites pervertidos e moral vil ... são transmitidos como um legado de pai a filho, até a terceira e quarta gera-ção.” Ellen G. White, Patriarcas e Profetas (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1989), 312.

10 James Stalker, The Atonement (New York, NY: American Tract Society, 1909), 88.

11 G. C. Berkouwer, Sin (Grand Rapids, MI: Wm. Eerdmans Publishing Co., 1970), 276

12 Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1990), 266.

13 O conhecido evangélico H. A. Ironside, des-crevendo o seu passado como perfeccionista, ou sua defesa de “santidade na carne”, observa a tendência dos perfeccionistas de se tornarem “cortantes, cen-suradores, sem caridade e duros em seu julgamento dos outros” (citado em John MacArthur, The Va-nishing Conscience [Nashiville,TN: Nelson Books, 1994], 128-129).

14 Edward Heppenstall, Salvation Unlimited, Perspectives in Righteousness by Faith (Washing-ton, DC, Review and Herald, 1974), 13.

15 Leon Morris, The Atonement (Downers Gro-ve, Ill.: InterVarsity Press, 1983), 136, 137.

16 Thomas Gataker, citado em B. W. Ball, The English Connection: The Puritan Roots of Seventh-day Adventist Belief (Cambridge, England: James Clarke, 1981), 68. Veja também Bernard Ramm, Offense to Reason: A Theology of Sin (San Francis-co, CA: Harper & Row, 1985), 68.

17 J. C. Ryle, Holiness: Its Nature, Hindrances, Difficulties, and Roots (Welwyn, England: Evange-lical Press, 1979), xiv, xv.

18 Ellen G. White, Orientação da Criança (Ta-tuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1996), 475.

19 Idem, Historical Sketches (Basle: Imprimerie Polyglotte, 1886), 138, 139.

20 Idem, O Maior Discurso de Cristo (Santo An-

dré, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1968), 21. 21 Ryle, Holiness: Its Nature, Hindrances, Diffi-

culties, and Roots, xiv, xv. 22 Veja o Interprerter´s Dictionary of the Bible,

Charles M. Laymon, ed., (Nashville, TN: Abingdon Press, 1980), “Sin.” Tais palavras podem ser estu-dadas individualmente no autoritativo Theological Dictionary of the Old Testament, G. Honannes Bot-terweck e Hermer Ringgren, eds., (Grand Rapids, MI: Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1979).

23 Sobre Pelágio, veja Justo L. Gonzales, A History of Christian Thought (Hashvill: Abing-don Press, 1971), vol. 2, 27-31; veja também W. Walker, História da Igreja Cristã (São Paulo, SP: ASTE, 2006), 244-248. Se o pecado fosse devido à livre escolha, como defendido por Pelágio, não de-veria haver razão para que ele fosse universal. Sua universalidade sugere um elemento de necessidade, uma tendência natural ou predisposição para o mal, que precede o exercício da liberdade. Veja Albert C. Knudson, The Doctrine of Redemption (New York, NY: Abingdon-Cokesbury Press, 1933), 263. Ellen White concorre com esta compreensão, ao observar que nós não apenas temos “tendências cultivadas para o mal”, mas também tendências herdadas. E, por causa destas tendências herdadas para o peca-do, uma criança não necessita ser ensinada a pecar” (Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações, 671; veja também Patriarcas e Profetas, 306).

24 G. C. Berkouwer, The Image of God (Grand Rapids, MI: Wm. B. Eerdmans Publishing Com-pany, 1962) 135).

25 Colin e Russel Standish, Adventism Vindi-cated (Rapidan, VA: Hartland Publications, 1980), 62.

26 Ralph Larson, The Word Was Made Flesh, 330. Larson troveja: “Deveria a doutrina do peca-do original de Agostinho ser acrescentada à teolo-gia adventista do sétimo dia?” E acrescenta: “Uma vez que é de conhecimento comum que a doutrina agostiniana do pecado original é agora recomenda-da para adição na teologia da Igreja Adventista do Sétimo Dia, parece que um cuidadoso exame de tal doutrina seja assumido por todos os que partilham preocupação pela pureza da fé adventista” (idem). Ele então dedica 20 páginas de discussão no tópi-co (idem, 330-350). Somos, contudo, deixados a nos perguntar: Onde se encontra tal “recomenda-ção” de se incluir a teoria agostiniana na teologia adventista? Ou, ainda, somos forçados a perguntar se Larson entendeu o ensino bíblico sobre pecado. Ellen G. White claramente fala da depravação na-tural da condição humana: “Devemos lembrar que nossos corações são naturalmente depravados, e somos incapazes em nós mesmos de trilhar a ve-

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reda correta” (Ellen G. White, In Heavenly Places [Washington, DC: Review and Herald, 1967], 195; veja também Conselhos aos Pais Professores e Es-tudantes, 544).

27 Joe Crews, Christ’s Human Nature (Amazing Facts, s.d.), 6, 47).

28 Robert Wieland e Donald K. Short, 1888 Re-examined: The Story of a Century of Confrontation Between God and His People (Mountain View, CA: 1888 Message Study Committee, 1987), iii.

29 Veja Roy Adams, The Nature of Christ (Ha-gerstown, MD, Review an Herald, 1994), 25.

30 Se a posição pré-lapsariana depende do dog-ma católico do pecado original – como sustenta a acusação dos defensores da noção pós-queda –, podemos dizer que o pós-lapsarianismo, com sua insistência de que Jesus é um homem como qual-quer outro, é dependente do liberalismo teológico do século 19, com raízes em F. Schleiermarcher, A. Ritschl e outros, que, negligenciando a divinda-de de Cristo, colocaram toda ênfase em sua huma-nidade, diferentemente dos demais homens, se-gundo eles, apenas em certo grau de superioridade moral, mas, afinal, em tudo semelhante aos de-mais. Veja Russel F. Aldwinckle, More Than Man, A Study in Christology (Grand Rapids, MI: Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1976). Aldwinckle, observa que “tornou-se moda, em alguns setores … dizer que a Palavra assumiu nossa natureza hu-mana caída” (p. 115). Como Aldwinckle argumen-ta que afirmar, contudo, que Jesus foi pecaminoso, em qualquer sentido preciso, significa dizer que sua vontade estava em contradição com a vontade do seu Pai, e isto estaria em claro conflito com a ortodoxia (idem).

31 Willian Hordern, em Alan Richardson, ed., A Dictionary of Christian Theology (Grand Ra-pids, MI: Wm. Eerdmans Publishing Co., 1989), 149. John Miley e R. Sheldon, teólogos da tra-dição Arminiana/Wesleyana, embora admitam o “pecado original”, negam que o homem seja tido como culpado por causa dele. Veja John Miley, Systematic Theology, 2 volumes (New York: NY: Eaton and Main, 1892), 1:512. Para uma longa lista de teólogos tratando da noção do pecado ori-ginal, veja David L. Turner, “Ephesians 2:3c and Peccatum Originale”, em Grace Theological Jour-nal, 1.2 (spring 1980), 195-219. Edward T. Oakes observa que mesmo naquelas denominações que se orgulham de aderência a dogmas ortodoxos, a noção agostiniana do pecado original é negada, ou tratada com silêncio. Oakes indica que mesmo o Universal Catechism of the Catholic Church, trata a questão do pecado original de maneira que surpreenderia o próprio Agostinho, que tinha uma

“compreensão vívida e quase física/biológica do primeiro pecado. Para Oakes, tal doutrina está em crise, mesmo entre os católicos. Veja “Original Sin: A Disputation”, First Things, 16 de novem-bro de 1998, 16.

32 Veja nesta edição de Parousia, o artigo de Benjamin Rand.

33 Ellen G. White, Patriarcas e Profetas, 312.34 Gulley, “Behold the Man”, 5. 35 Ellen G. White, Manuscript 165, 1899, (cita-

do em The Faith I Live Bay, 48).36 Para uma lista destas ocorrências, veja Eric

Claude Webster, Crosscurrents in Adventist Chris-tology, (Berrien Springs, MI: Andrews University Press, 1984), 74-80.

37 Ibid., 75-7638 Ellen G. White, Review and Herald, 29 de

Outubro, 1895. 39 Benjamin Rand, “Que Natureza Humana Je-

sus Tomou”, 2.40 Ibidem.41 Ellen G. White, Review and Herald, 17 de

dezembro de 1872.42 Don F. Neufeld, ed., Seventh-day Adventist

Bible Commentary (Jagerstown, MD: Review and Herald, 1979), 7:907.

43 Idem, Review and Herald, 21 de setembro de 1886.

44 Veja Rand, “Que Natureza Humana Jesus To-mou”, 2.

45 Para sólida discussão e significado do crucial termo homoioma/homoiomati, veja Gehard Kittel e Gehard Friedrich, eds., Theological Dictionary of the New Testament (Grand Rapids, MI: Wm. Eeer-dmans Publishing Co., 1979), vol. 5, 191-198. Em Romanos 8:3 Paulo enfantiza que Cristo veio em “semelhança de carne pecaminosa”, mas “com o seu en homoiomati, Paulo está demonstrando que com toda a similaridade entre o corpo físico de Cristo e o corpo físico dos homens, há uma diferen-ça essencial entre Cristo e os homens. Mesmo em sua vida terrena Ele era ainda o Filho de Deus. Isto significa que Ele tornou-se homem sem entrar em relação com o pecado humano. As palavras en ho-moiomati preserva-nos de uma dedução que Paulo não desejou fazer, isto é, a de que Cristo tornou-se sujeito ao poder do pecado, e que de fato pecou. ... Assim, o homoioma indica duas coisas: primeiro, a semelhança em aparência e, segundo, a distinção em essência. ... Com este corpo intrinsecamente sem pecado, Cristo tornou-se o representante da

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humanidade pecaminosa. ... Cristo assumiu a se-melhança da carne pecaminosa para que Deus, em Cristo, pudesse realizar a libertação da humanidade do pecado” (p. 196).

46 Adams, The Nature of Christ, 63.47 Para Raymond E. Brown, o contexto de João

8:46 é Isaías 53:9: “nele não houve engano”. Bro-wn indica ainda, por associação, Hebreus 4:15: “Pois não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se de nossas fraquezas, porém um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado” (The Gospel According to John [Garden City, NY, Doubleday & Company, 1981], 358).

48 Ellen G. White, “Humility Before Honor”, Review and Herald, 8 de novembro de 1887.

49 Veja Gulley, “Behold the Man”, 5.50 Ellen G. White, The Youth Instructor, 2 de

junho de 1898.51 Idem, 5 de abril de 1901.52 Idem, Signs of the Times, 29 de maio de

1901.53 Idem, SDA Bible Commentary, 5:1128.54 Idem, Carta 276/1904, SDA Bible Commen-

tary, 6:1082.55 Idem, SDA Bible Commentary, 5:1129.

56 Idem, Obreiros Evangélicos (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1998), 251. Ellen G. White, em outro contexto afirma que “o estudo da encar-nação é um campo frutífero que recompensará ao investigador sincero que cava fundo pela verdade escondida” (Manuscrito 67, 1898).

57 Ellen G. White, Carta 280, 1904, citada no SDA Bible Commentary, 6:1082.

58 Idem, Review and Herald, 5 de abril de 1906.

59 Webester, Crosscurrents in Adventist Cristo-logy, 88. Em muitos textos, Ellen G. White coloca Cristo em pé de igualdade com o Yahweh do Antigo Testamento, e faz as mais altas reivindicações em favor da divindade de Cristo.

60 Ellen G. White, Review and Herald, 5 de abril de 1906. Para ela, “Cristo possuía todo o organis-mo humano” (Carta 32, 1899, citada no SDA Bible Commentary, 5:1130. Tinha um corpo como o nos-so (Review and Herald, 5 de fevereiro de 1895).

61 Idem, “Notes on Travel”, Review and Herald, 10 de fevereiro de 1885.

62 Idem, Review and Herald, 11 de dezembro de 1888. Para Jesus, a oração era vista como “uma

necessidade e um privilégio” (Review and Herald, 8 de dezembro de 1904).

63 Idem, Signs of the Times, 10 de Maio, 1899, no SDA Bible Commnentary, 5:1082-3; veja tam-bém 4:1116; e, ainda, Review and Herald, 10 de junho de 1890.

64 Ellen G. White não obscurece o fato de que Cristo, além de substituto do homem, foi também seu exemplo. Portanto, se Ele “não tivesse a nature-za do homem, Ele não poderia ser o nosso exemplo. Se Ele não fosse um participante de nossa nature-za, Ele não poderia ser tentado como o homem tem sido. Ele não poderia ser nosso ajudador. Foi uma solene realidade que Cristo veio lutar as batalhas como homem, em favor do homem” (“How to Meet a Controverted Point of Doctrine”, Review and He-rald, 18 de fevereiro de 1890. Contudo, tal identifi-cação não poderia, por outro lado, estender-se além dos limites determinados por sua identidade única e missão exclusiva.

65 Ellen G. White, Manuscrito 44, 1898, citado no SDA Bible Commentary, 7:907.

66 Idem, Review and Herald, 5 de abril de 1898.

67 Idem, “Aggressive Work to be Done”, Review and Herald, 2 de agosto de 1906.

68 Idem, “Principle Never to be Sacrificed for Peace”, Review and Herald, 24 de julho de 1894.

69 Idem, “Contemplate Christ’s Perfection, not Man’s Imperfection”, Review and Herald, 8 de agosto de 1893. Tal ênfase é destacada em uma enorme variedade de contextos: Cristo tinha “um caráter sem mancha” (Review and Herald, 20 de se-tembro de 1909); uma “justiça imaculada” (Review and Herald, 9 de janeiro de 1883); “uma pureza sem mancha” (Review and Herald, 28 de agosto de 1883); uma “vida sem mancha” (Review and He-rald, 20 de janeiro de 1885). O que está em foco aqui não são atos, mas natureza.

70 Idem, “Sacrificial Offerings”, The Signs of the Times, 15 de julho de 1880.

71 Idem, Review and Herald, 17 de dezembro de 1872.

72 Idem, O Grande Conflito, 505.73 Idem, Mensagens Escolhidas, vol. 1, 254.74 Ibid., 25675 Idem, “An Appeal to Ministers”, Review and

Herald, 19 de maio de 1885.76 Idem, “How to Deal With the Erring”, Review

and Herald, 19 de maio de 1885.

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77 Idem, Manuscrito 16, 1890, citado no SDA Bible Commentary, 7:907.

78 Idem, Carta 95, 1898, citada no SDA Bible Commentary, 7:952. Contrastando a lepra do pe-cado com a pura vida de Cristo, Ellen G. White escreve: “Mas vindo habitar na humanidade, não recebeu poluição” (ibidem).

79 Idem, Youth Instructor, 8 de setembro de 1898.

80 Ibidem.81 Woodrow W. Whidden, Ellen White on the

Humanity of Christ (Berrien Springs, MI, Adventist Institute for Theological Advancement, 2006), 54.

82 Ellen G. White, The Signs of the Times, 20 de fevereiro, de 1879.

83 Idem, O Desejado de Todas as Nações, 33.84 Ibid., 49.85 Ibidem.86 O Ellen White Estate indexou este documento

como a Carta 8, de 1895, e ela aparece no SDA Bible Comentary , 5: 1128-1129. Embora datada de 1895, Lyell Heise, em The Christology of Ellen G. White Letter 8 (Andrews University Monographs, 1895) apresenta evidências de que a carta foi realmente escrita em 1896.

87 W. L. H. Baker tivera uma considerável car-reira editorial, na Pacific Press, na Califórnia. Pos-teriormente, uniu-se à então recém fundada Echo Publishing House, na Austrália. Mas ao tempo em que recebeu a carta de encorajamento e conselho, de Ellen G. White, ele estava envolvido em ativida-des pastorais e evangelísticas na Tasmânia.

88 A carta não deriva sua importância da proemi-nência de Baker no ministério adventista, ou mesmo da extensão do documento (17 páginas, no original). Seu significado básico emerge dos cinco parágra-fos discutindo a humanidade de Cristo. Esta carta, descoberta e publicada inicialmente em meados da década de 1950, é vista como a principal causa para os debates entre as posições pré e pós-queda no ad-ventismo. Whidden considera mesmo que sua desco-berta foi um “wake-up call” à discussão cristológica. Segundo ele, o seu surgimento marcou o desperta-mento da consciência acerca das muitas declarações de Ellen G. White enfatizando a singularidade impe-caminosa de Cristo (Woodrow Whidden, Ellen Whi-te on the Humanity of Christ, 59). Da carta infere-se que a natureza de Cristo, na compreensão de Baker, sofria de desequilíbrio básico. Aparentemente, ele estivera pregando que Cristo tinha “inclinação para a corrupção”. Lyell Vernon Heise, em uma mono-grafia preparada para a Andrews University sob o título “The Christology of Ellen G. White Letter 8,

1985: An Historical Contextual and Analytical Stu-dy”, argumenta que Baker, com muita probabilidade recebera suas noções quanto a natureza de Cristo de proeminentes escritores adventistas contemporâne-os, tais como A. T. Jones, E. J. Waggoner e W. W. Prescott (8 a 20).

89 Ellen G. White, Carta 8, 1895, citada no SDA Bible Commentary, 5:1128. Curiosamente, Wie-land tenta confundir a clareza desta declaração. Em seu The 1888 Message, ele trata com esta carta nas páginas 59-63. Em duas colunas ele tenta oferecer uma comparação entre a citação de Ellen G. White mencionada acima, e a seleção de um artigo de E. J. Waggoner, publicado na Signs of the Times, em 21 de Janeiro de 1889. Contudo, enquanto Waggo-ner trata com a natureza divina de Cristo, Wieland obscurece aquilo que Ellen G. White diz, dando a impressão de que ela está afirmando o mesmo que Waggoner. Uma cuidadosa análise dos cinco pará-grafos da carta em questão, que tratam da sua cris-tologia, revela que ela está discutindo a humanida-de de Cristo, não sua natureza divina (veja Webster, Crosscurrents, 130).

90 O que se entende por “propensão maligna”? Os defensores da teoria pós-lapsariana, como Wieland, fazem um extraordinário esforço para fu-gir à clareza de significado da expressão, que, se aceita na intenção de Ellen G. White, tem caráter devastador para a teoria deles. Para Wieland, a pa-lavra propensão significaria apenas “participação em atos pecaminosos” (Veja Wieland, The 1888 Message, 62). Assim, ele nega que “propensão para o pecado”, “propensão maligna”, ou, ainda, “inclinação para a corrupção”, significam, natural, pura e simplesmente “inclinação para o pecado”. A evidência mais clara contra Wieland, além do dicio-nário, é o próprio contexto literário da carta, onde Ellen G. White descreve a posteridade de Adão, que “nasce com inerente propensão para a desobediên-cia”. Portanto, é o uso que Ellen G. White faz da palavra “propensão”, no mesmo contexto, que deve determinar o seu significado. Portanto, a questão é simples: se alguém nasce com a propensão para o pecado, como pode essa propensão ser identificada como a participação posterior no pecado?

91 SDA Bible Commentary, 5:1128.92 Ellen G. White, Carta 8, 1895, citada no SDA

Bible Commentary, 5:1128.93 Ibidem. Curiosamente, Wieland, seguindo o

hábito das “elipses”, verificado em autores pós-lap-sarianos, omite completamente esta seção da carta. Jean Zurcher, em seu Tocado pelos Nossos Senti-mentos, segue também a mesma prática de omitir o que não sustenta a sua teoria quanto a natureza de Cristo. Denis Fortin, em sua análise do livro de Zurquer, observa: “Zurcher não apenas evita uma

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exposição clara da carta a Baker, mas também a cita de forma distorcida e fora do contexto” (veja Denis Fortin, Andrews University Studies, vol. 38, Nº 2, outono de 2000, 343).

94 Ibid., 1129.95 Admans, The Nature of Christ, 71.96 Fortin, Andrews University Studies, vol. 38,

Nº 2, outono de 2000, 344.97 Ellen G. White, Review and Herald, 17 de

dezembro de 1972.98 Idem, Signs of the Times, 29 de maio de 1902.

No Review and Herald, de 11 de Setembro de 1898, Ellen G. White afirma que “sua natureza foi mais exaltada, pura, e santa do que aquela da raça pe-cadora por quem Ele sofreu”. Na Review and He-rald de maio de 1884, ela enfatiza a diferença entre Cristo e a humanidade. “Não havia nenhum pecado nEle, sobre o qual Satanás pudesse triunfar, nenhu-ma fraqueza ou defeito que ele pudesse usar para sua vantagem. Mas nós somos pecadores por na-tureza, e temos um trabalho a fazer para purificar o templo da alma de cada impureza”. A expressão “nenhum pecado nEle” fortemente implica uma natureza impecaminosa, particularmente quando usada em contraste com os humanos, a quem ela entendeu serem “pecaminosos por natureza”.

99 Idem, The Youth Instructor, 20 de dezembro de 1900.

100 Idem, O Desejado de Todas as Nações, 49.101 Idem, Mensagens Escolhidas, 1:253.102 Idem, O Desejado de Todas as Nações, 112.103 Idem, Review and Herald, 11 de dezembro

de 1888. 104 Idem, Medical Ministry (Mountain View,

CA: Pacific Press, 1963), 181.105 Idem, Mensagens Escolhidas, 1:267,

268.106 Idem, Review and Herald, 17 de julho de

1885.107 The SDA Bible Commentary, 5:1126 (co-

mentário de Ellen G. White sobre 1 João 1:1-3).108 Ellen G. White, The Signs of the Times, 9 de

junho de 1898, citado no SDA Bible Commentary, 5:1131.

109 Idem, “Written for Our Admonition, Nº 2”, Review and Herald, 7 de janeiro de 1904. Veja, ain-da, Signs of the Times, 17 de abril de 1884, e Review and Herald, 20 de janeiro de 1863.

110 Ellen G. White, The Signs of the Times, 29

de maio de 1901, citado no SDA Bible Comentary, 7:912.

111 Webster, Crosscurrents, 124. Devemos en-tender que para Ellen G. White, Cristo “possui a nossa natureza, embora não contaminado pelo pe-cado” (Review and Herald, 7 de Maio de 1901).

112 Ellen G. White, Manuscrito 50, 1900, citado no SDA Bible Commentary, 6:1078.

113 Ibidem.114 Robert Wieland e Donald K. Short, 1888 Re-

examined (Medow Vista, CA: The 1888 Message Study Committtee, 1987), 118.

115 As tendências extremistas de Jones, bem como sua natureza impetuosa e arrogante, sua pena, freqüentemente imersa na tinta cáustica da ironia e da crítica, o modo rude por que tratava as pes-soas, são todas características bem avaliadas por Knight, em From 1888 to Apostasy, particularmen-te nos três últimos capítulos. No final da década de 1890, quando novamente indicado como editor do American Sentinel, C. P. Bollman, um dos seus co-editores do período anterior, escreveu uma séria advertência contra essa indicação, salientando a sua inclinação extremista, e apresentou uma série de circunstâncias em que Jones estivera errado. Na sua opinião, a indicação de Jones para tal posição re-presentava um perigo para a denominação. O extre-mismo de Jones quanto à questão da cidadania, foi vista por Ellen G. White, de acordo com Bollman, como “fogo estranho” (Veja Knight, From 1888 to Apostasy, 163-164). Veja o extraordinário material preparado por Arthur L. White, então, secretário do Ellen G. White Estate, “What Became of A. T. Jones and E. J. Waggoner”, com declarações de El-len G. White sobre estes dois líderes, incluído no apendix B, em A. V. Olson, 1888 – 1901, 13 Crisis Years (Washington, DC: Review and Herald, 1981), 312-325.

116 Ibid., 116.117 Ibid, p. 123.118 Ibidem.119 Adams, The Nature of Christ, 30.120 Knight, From 1888 to Apostasy, 253.121 Ibid., 248. A despeito dos insistentes apelos

de Ellen G. White, advertindo-o contra os perigos de sua associação com Kellog, Jones permaneceu irredutível. Quando Jones decidiu associar-se a Kellog na reconstrução do Battle Creek College, em seu último encontro com Ellen G. White antes de dirigir-se para o antigo centro do movimento adventista, a voz profética aos adventistas, em so-lene mensagem o adventiu: “Em visão eu o tinha

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visto [Jones] sob a influência do Dr. Kellog. Finas teias estavam sendo tecidas ao redor dele, até que estivesse completamente imobilizado, mãos e pés, e sua mente e seus sentidos estivessem se tornado cativos” (EGW to WCW, 18 de agosto de 1903, ci-tado por Knight, From 1888 to Apostasy, 210). O futuro confirmaria plenamente a veracidade desta predição. Mais comovente ainda foi o apelo de A. G. Daniels a Jones, em 1909. Com a mão estendida e voz embargada, Daniels, insiste “Venha irmão Jo-nes. ... Venha irmão Jones, una-se, ombro a ombro, com os seus irmãos no serviço do Senhor. Jones, que inicialmente estende sua mão sobre a mesa, na direção de Daniels, afinal a recolhe, dizendo: “Não, não” (ibid., 247).

122 David P. McMahon, Ellet Joseph Waggoner, The Myth and the Man (Falbrook, CA: Verdict Pu-blications, 1979).

123 Os seguintes mitos são relacionados por Mc-Mahon: 1) O mito de que sua mensagem de jus-tificação pela fé, em 1888, foi muito além do que ensinado desde Paulo até Lutero e Wesley. Wie-land cheda mesmo a reivindicar que “a mensagem de 1888 foi uma pregação de justificação pela fé mais amadurecida e desenvolvida e mais prática do que ela fora pregada pelo apóstolo Paulo” (cf. A. L. Hudson, A Warning and its Reception [Baker, Oreg.: Hudson Printing, Co., s.d.], 50) Ele mantém a tese de que Paulo pregou apenas um evangelho “parcial”. 2) O mito de que aquilo que Waggoner e Jones escreveram depois de 1888 apresenta suas mensagens na histórica conferência de Minneápo-lis. O fato de que não existe uma transcrição da mensagem pregada por Jones e Waggoner em 1888 não detém seus seguidores contemporâneos de, ba-seados em conjecturas perfeccionistas, continuarem apregoando que o material escrito por eles depois é precisamente o que eles apresentaram em Minneá-polis. 3) Esses mesmos seguidores esquivam-se das aberrações pessoais cometidas por Waggoner, que chegou mesmo a desenvolver a teoria da “afinidade espiritual” para justificar sua união, naturalmente mais do que “espiritual”, com a srta. Edith Admans, o que fez com que sua esposa solicitasse o divórcio. 4) Há o mito de que ele permaneceu basicamente na fé. Embora se tenha explícitas evidências de que Waggoner tornou-se confuso e perdido em meio ao nevoeiro do panteísmo, influenciado por Kellog. E para McMahon, os sentimentos panteístas em Wa-ggoner, começaram a aparecer em seus escritos já no inicio da década de 1890. 5) Há o mito de que os sentimentos panteístas naquilo que Waggoner es-creveu posteriormente a 1988, não tenham conexão intrínseca com suas idéias sobre a natureza huma-na de Cristo. As evidências, ao contrário, apontam para a conclusão de que o panteísmo de Waggoner foi uma parte integral do seu sistema teológico.

124 Veja Knight, 136-138, e também Adams, 31-36. Uma das fortes evidências contrárias à to-ria pós-lapsariana, quanto à discussão da natureza humana de Cristo em Minneápolis 1888, é o diá-rio de R. De Witt Hottel, um ministro adventista que servia na Virgínia, durante os últimos anos da década de 1880. Ele assistiu a assembléia de Min-neápolis como delegado, tomou notas regularmen-te das reuniões numa espécie de diário. Veja Ron Graybill, “Elder Hottel goes to General Conferen-ce”, Ministry, fevereiro de 1988, 19-21. Knight faz referências a outras evidências contrárias à teoria pós-lapsariana sobre Minneápolis. Veja as páginas do From 1888 to Apostasy, mencionadas acima. Em vão se busca qualquer citação de Ellen G. White que dê sustentação à teoria pós-queda.

125 1895, General Conference Bulletin, 231, 233, 436, citado em Knight, From 1888 to Apos-tasy, 136.

126 Ellen G. White, Testemunhos para a Igreja (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2005), 2:202. Curiosamente, este texto, que certamente pertence ao período do “adventismo histórico”, não é mencionado pelos pós-lapsarianos adven-tistas, tais como Wieland, Short, Zurcher e os irmãos Standish.

127 Veja Knight, From 1888 to Apostasy, 138.128 Ibid., 139. 129 Ibid., 72, cf. Ellen G. White, Manuscrito 15,

1888.130 E. J. Waggoner, Signs of the Times, 21 de

janeiro de 1889, cf. Knight, From 1888 to Apos-tasy, 39. Em vão se busca qualquer citação de Ellen G. White, em seus comentários de 1888, que remotamente dê sustentação à teoria de que a pós-queda tenha sido um tópico de discussão na histórica assembléia.

131 E. J. Waggoner, Christ and his Rightousness, publicado em 1890, 20-22. E, claro, Ellen G. White escreve em O Desejado de Todas as Nações que “em Cristo estava vida, original, não gerada, não derivada” (p. 530).

132 Ellen G. White, Manuscrito 56, 1890, citado em Knight, From 1888, 72.

133 Whidden, Ellen White on the Humanity of Jesus, 77, 78.

134 Veja Leroy Edwin Froom, Movement of Des-tiny (Washingtron, DC: Review and Herald, 1978), 291-292. Nesta seção, Froom discute alguns dos desvios interpretativos de Waggoner quanto à eter-nidade Cristo.

135 Veja Knith, From 1888 to Apostasy, 210-215.

Cristo e os Cristãos / 73

Que Jones e Waggoner endossaram o problemático livro The Living Temple, de Kellog, é evidente no prefácio do volume, onde eles aparecerem como “approving readers”. Knight observa que, embora Jones não pareça ter sido um panteísta como Kellog e Waggoner, ele certamente usou a linguagem e simbolismo em harmonia com a teologia do The Living Temple (ibid., 214).

136 Em conseqüência do seu relacionamento com a srta. Edith Adams, iniciado enquanto Wa-ggoner estava na Inglaterra, e continuado poste-riormente em Battle Creek, sua esposa solicitou o divórcio, alegando adultério. Um ano depois, Waggoner casou-se com a srta. Adams. O curioso é que muito antes do fracasso do seu casamento, Waggoner havia defendido a teoria da “afinidade espiritual”. Segundo ele, pessoas não casadas legal-mente nesta vida, pode tornar-se parceiros na vida porvir, e isto permitia a “presente união espiritual”. Veja McMahon, Ellet Joseph Waggoner, the Myth and the Man, 22, 23. Ellen White considerou tal teoria como “fábula enganadora e perigosa”. Ela afirmou ainda que Waggoner “por muito tempo”, estivera lançando as sementes de teorias satânicas na Inglaterra (Ellen G. White, Carta 121, 1906, ci-tada em A. V. Olson, 1888-1901. 13 Crisis Years. O que realmente impressiona é que, à semelhança de suas advertências a Jones, Ellen G. White escreveu a Waggoner: “Satanás está trabalhando ... para oca-sionar a sua queda ... ele está determinado a tornar-se o seu mestre ... e espera desviar suas afeições de sua esposa, e fixá-las em outra mulher ... até que através de afeição não santificada, ela se torne o seu deus” (Ellen G. White, Carta 231, 1903. Publicada em Medical Ministry, 100, 101).

137 Veja Arthur L. White, The Australian Years, 1891-1900 (Hagerstown, MD: 1983), 125-132.

138 Veja acima, referência 114. 139 Veja Knight, From 1888 to Apostasy, 248-249.

140 Knight observa que através dos seus edito-riais na Review and Herald, em 1898, Jones ensi-nava noções da teologia da carne santa. Para ele, “perfeita santidade envolve a carne bem como o espírito, inclui o corpo, bem como a alma” (ibid., 179). Knight observa que Jones, apesar do relacio-namento dos seus ensinos com as idéias da carne santa, rejeitou o movimento porque os seus líderes diferiam dele quanto a posição da pecaminosida-de da natureza humana de Cristo. “[Jones] não os rejeitou primariamente por causa do entusiasmo pentecostal”, pois, afinal, diz Knight, “a última afi-liação religiosa de Jones foi com um grupo de pen-tecostais guardadores do sábado, que falavam em línguas” (ibidem). Knight observa ainda: “Um pro-blema maior com os ensinos de Jones, Waggoner e Prescott, sobre a justificação pela fé, é que eles, freqüentemente se excediam em literalizar o ensino bíblico da habitação do Espírito Santo no crente. Tal problema tornou difícil para eles resistirem aos ensinos do panteísmo, e predispôs muitos dos seus leitores a aceitarem o perfeccionismo da carne san-ta” (ibid., 171).

141 Ellet J. Waggoner, General Conference Bul-letin, 1899, 53, citado em Knight, The Pharisee´s Guide, 151.

142 Ellen White, In Heavenly Places, 163, 193. 143 Ibid., 146.144 Idem, Historical Sketches (Basle: Imprime-

rie Polyglotte, 1886), 139.145 Idem, Review and Herald, 16 de abril de

1901.146 Ibid., 23 de abril de 1895.147 Todas estas citações são extraídas da Carta 9,

citada no SDA Bible Commentary, 5:1128, 1129.148 Ellen G. White, “Self-exaltation”, Review

and Herald, 25 de setembro de 1900.