cpi da celg - relatorio da fipe

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ASSEMBLIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE GOIS

ANLISE DA EVOLUO DO ENDIVIDAMENTO DA CELG (1984/2008)

RELATRIO FINAL

SO PAULO DEZEMBRO/2009

RESUMO O presente texto o relatrio final de um estudo sobre o endividamento da CELG no perodo 1984/2008. Nenhum fator isoladamente constitui uma explicao razovel para uma dvida que, em 2008, estava em R$ 4,1 bilhes (54% de curto prazo), montante 8 vezes superior ao capital prprio da empresa. Descapitalizao a palavra sntese do estudo. Descapitalizao produzida por resultados negativos oriundos da dificuldade para reduzir despesas operacionais, da compra de energia a preos acima do mercado, das elevadas despesas com juros (lquidos da receita financeira), da entrega de servios a preos subsidiados e do no ajuste das receitas em conseqncia da inadimplncia junto a ELETROBRS. Descapitalizao proveniente tambm da entrega de patrimnio sem entrada de recursos correspondentes no caixa. A continuidade da coexistncia do problema econmico (no gerar renda) com o problema financeiro (com presso do capital de giro) acentuou a necessidade de tomar dvidas e a dificuldade para gerenci-las.

EQUIPE TCNICA Ana Paula Paulino da Costa (Coord.) Armnio de Souza Rangel Atlio Gerson Bertoldi

NDICE 1. O objeto de estudo ______________________________________________________ 1 2. Existe um problema de tamanho da dvida? ___________________________________ 3 3. Existe um problema com a estrutura da dvida? ________________________________ 7 4. Como esses problemas foram gerados? _____________________________________ 13 5. Como a CELG enfrentou essas condies de instabilidade? _____________________ 27 6. Eventos notveis _______________________________________________________ 35 7. Consideraes adicionais ________________________________________________ 51 8. Um alerta ____________________________________________________________ 58 9. Consideraes finais ____________________________________________________ 62 ANEXO - Tratamento das Informaes _______________________________________ 64

1. O OBJETO DE ESTUDO A Fundao Instituto de Pesquisas Econmicas (FIPE) foi contratada pela Assemblia Legislativa do Estado de Gois para realizar um estudo sobre o endividamento das Centrais Eltricas de Gois (CELG), sua evoluo nos ltimos 25 anos, principais causas e fatores de agravamento. O primeiro passo do estudo, portanto, foi verificar o montante, e a composio desse endividamento. Pode-se denominar dvida todo o montante de capital de terceiros ou apenas aqueles credores que sistematicamente financiam a empresa. No caso da CELG, esses credores que sero considerados dvida. A CELG, conforme consta da Tabela 1, segundo suas Demonstraes Financeiras, em 31/12/2008, tinha uma dvida total no montante de cerca de R$ 4,1 bilhes. Cerca de R$ 1,1 bilho junto aos bancos, R$ 1,4 bilho junto

ELETROBRS, R$ 1,4 bilho junto a fornecedores e R$ 0,2 bilho so os encargos da dvida pendentes nesta data. Dos R$ 1,1 bilho devido aos bancos, R$ 0,7 bilho dvida de longo prazo e R$ 0,4 bilho de curto prazo. Dos R$ 1,4 bilho devido ELETROBRS, R$ 0,8 bilho dvida de longo prazo e R$ 0,6 bilho de curto prazo. Dos R$ 1,4 bilho devido aos fornecedores, R$ 0,4 bilho dvida de longo prazo R$ 1,0 bilho de curto prazo. Assim, R$ 1,8 bilho dvida de longo prazo e R$ 2,3 bilhes so de curto prazo. As dvidas de curto prazo superam as de longo prazo. A dvida com credores do setor (fornecedores e Eletrobrs) representa 70%.

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2Curto Prazo 355.290 229.975 125.315 Longo Prazo Total % de emprstimos e financiamentos % de endividamento total 34% 1.061.950 99.689 553.263 210.345 79.764 118.889 646.547 26.785 619.762 771.992 43.143 728.849 1.418.539 69.928 1.348.611 52% 1.417.240 329.664 678.578 210.345 79.764 118.889 69% 34%

T abela 1. P os i o em 31/12/2008 do endividamento

Fonte: Demonstraes financeiras CELG 2008

FORNECEDORES Furnas Itaip CDSA Outros Materiais

ELETROBRS Acordos Outros acordos taxas regulamentares

s e t o r

41% 1.102.156 962.598 139.558 186.411

27% 31%

BANCOS Nacional Estrangeiro 186.411

386.067 368.592 17.475

716.089 594.006 122.083

ENCARGOS

7%

5%

b a n c o s

2.707.106 100% 4.124.346 100% 486.814 4.611.160

100%

TOTAL EMPRSTIMOS E FINANCIAMENTOS Total 1.219.025 1.488.081 % 45% 55% TOTAL EMPRSTIMOS, FINANCIAMENTO E FORNECEDORES Total 2.280.975 1.843.371 % 55% 45%

100%

PATRIMNIO LQUIDO

TOTAL CAPITAL INVESTIDO

2. EXISTE UM PROBLEMA DE TAMANHO DA DVIDA? Esses valores so preocupantes? Dito de outra maneira, h um problema de dvida? A resposta, obviamente, depende do ponto de vista. No h, a rigor, critrio cientfico para fundamentar a resposta. fundamentem a resposta. As respostas, costumeiramente, iniciam-se com uma comparao da empresa em tela com as demais do mesmo ramo de atividade. Se os valores no diferem muito do comum, eles so considerados normais. Tal comparao, no entanto, pode ser mais enganosa do que esclarecedora. Cada empresa tem uma funo de produo, ou seja, um modo especfico de operar, um jeito particular de ser gerida, diferenas que acabam sendo expressas nos valores dos diferentes itens do balano. A proximidade entre valores de diferentes empresas serve mais para indicar se as empresas tm caractersticas prximas do que para indicar a eficincia, a boa gesto, o bom desempenho de cada empresa. O estudo, por essa razo, comeou tratando da dvida em sua relao com algumas variveis, algumas caractersticas, da prpria empresa. Uma primeira relao foi com o patrimnio lquido. Constata-se que a dvida total da CELG, em 2008, no montante de R$ 4,1 bilhes, mais de oito vezes maior que o valor do patrimnio lquido da empresa (R$ 0,5 bilho) nesse mesmo ano (Tabela 2). Tal informao, no entanto, ainda no Isso, no entanto, no impede que consideraes razoveis

suficiente para indicar se a dvida um problema e, em caso afirmativo, qual o tamanho do problema. Trabalhar alavancado no necessariamente um problema. A tarefa seguinte foi observar a relao entre a dvida e os lucros da CELG. Isso sim constitui uma base razovel para levar alguns a afirmar que a dvida da CELG pode ser vista como um problema.

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Tabela 2. Alavanc ag em em 31/12/2008Fonte: Demonstraes financeiras CELG 2008 R$ Capital de terceiros Fornecedores de Energia Eletrobrs Bancos Capital prprio Capital Investido Ativo Total 4.124.346 1.417.240 1.418.539 1.288.567 486.814 4.611.160 6.253.829 11% 100% Composio 89% 31% 31% 28% 11% 100% 0,66 8,47 Alavancagem

F ontes de c apital inv es tidoCapital prprio 11% Capital de terceiros 89%

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Uma nota faz-se necessria. O endividamento em 2008 fruto de uma histria. preciso, portanto, definir o perodo antecedente a 2008 para ser estudado. No existe um critrio cientfico para tal definio. Critrios de conhecimento do problema, a razoabilidade da associao entre eventos, ainda que subjetivos, so decisivos. A Assemblia Legislativa de Gois decidiu que o estudo deve retroceder ao ano de 1984, perfazendo um total de vinte e cinco anos. A Tabela 3 mostra que a CELG, entre 1984 e 2008, em vinte e cinco anos, apurou lucro em nove anos e a CELG teve prejuzo em dezesseis anos. A valores de 2008, a soma dos lucros anuais resulta no montante de R$ 1 bilho e a soma dos prejuzos anuais resulta no montante de R$ 3,1 bilhes. A comparao entre lucros e prejuzos anuais, no perodo 1984-2008 mostra liquidamente um prejuzo de R$ 2,1 bilhes que representa 50% do valor total da dvida da CELG (R$ 4,1 bilhes) em 2008. Prejuzos, mais do que lucros, so a caracterstica da CELG entre 1984 e 2008. No descabido, portanto, o juzo de valor de que se est frente a um quadro preocupante quanto sobrevivncia de uma empresa que tem como uma de suas caractersticas resultados anuais em vinte e cinco anos consecutivos que, atualizados monetariamente para 2008, mostram liquidamente um prejuzo - prejuzo esse que representa 50% de uma dvida, cujo valor total oito vezes maior que o valor do patrimnio lquido.

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T abela 3. L ucro L quidoFonte: Demonstraes Financeiras CELG Dados atualizados e convertidos para R$ de 31/12/2008

Ano 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 Sub Total Lucros Sub Total Prejuzos TOTAL

Lucro Lquido ou Prejuzo do Ano 7.123.086 83.308.396 72.864.091 58.708.185 (3.278.997) (144.694.093) (2.467.000) (203.333.674) (103.068.151) (180.894.678) 98.359.173 (225.946.311) (97.193.274) 19.043.791 (230.033.015) (74.379.471) (112.697.784) (301.257.382) (644.972.618) 400.130.431 93.352.439 134.603.984 (296.340.593) (197.833.994) (253.942.000) 967.493.576 (3.072.333.034) (2.104.839.458)

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3. EXISTE UM PROBLEMA COM A ESTRUTURA DA DVIDA? O passo seguinte do estudo foi investigar a estrutura dessa dvida. A ferramenta utilizada para tal investigao foi a anlise do capital de giro de Fleuriet. Segue-se uma exposio sumria dessa tcnica. Toda empresa precisa de recursos para financiar seus investimentos, seu nvel de atividade operacional normal (descasamento caracterizado entre contas a pagar e contas a receber diretamente relacionadas operao da empresa) e as oscilaes eventuais, transitrias ou mesmo sazonais. Quando os recursos de longo prazo superam em montante necessrio s aplicaes no longo prazo (capital circulante lquido positivo, CCL>0) e, adicionalmente, o descasamento operacional (diferena entre os dias para pagar e receber) favorvel empresa (necessidade de investimento em giro negativa, NIG0), tanto sobras de recursos de longo prazo quanto do prprio giro. Nesse caso, a empresa apresenta uma folga financeira para fazer frente a oscilaes extraordinrias, transitrias ou sazonais. Essa estrutura de financiamento, segundo Fleuriet, excelente. Quando os recursos de longo prazo superam as necessidades de aplicaes no longo prazo (CCL>0), mas j necessrio usar parte do que sobra em caixa (SD>0) para financiar o descasamento desfavorvel, ou seja, o nvel normal de atividade operacional (NIG>0), a empresa tem sua folga financeira diminuda ou at suprimida para fazer frente a necessidades extraordinrias. Essa estrutura de financiamento slida. Quando os recursos de longo prazo so suficientes para financiar seus investimentos permanentes (CCL>0), mas a empresa obrigada a recorrer a recursos onerosos (bancos) de curto prazo (SD0), a estrutura de financiamento insatisfatria.

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Quando os recursos de longo prazo no so suficientes para financiar as necessidades de aplicaes de longo prazo (CCL