cpdoc - reis, gustavo moraes rego

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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENTAÇÃO DE HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA DO BRASIL (CPDOC) Proibida a publicação no todo ou em parte; permitida a citação. Permitida a cópia xerox. A citação deve ser textual, com indicação de fonte conforme abaixo. REIS, Gustavo Moraes Rego. Gustavo Moraes Rego Reis (depoimento, 1992). Rio de Janeiro, CPDOC, 2005. 144 p. dat. GUSTAVO MORAES REGO REIS (depoimento, 1992) Rio de Janeiro 2005

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FUNDAO GETULIO VARGAS CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENTAO DE HISTRIA CONTEMPORNEA DO BRASIL (CPDOC) Proibidaapublicaonotodoouemparte;permitidaacitao. Permitida a cpia xerox. A citao deve ser textual, com indicao de fonte conforme abaixo. REIS,GustavoMoraesRego.GustavoMoraesRegoReis (depoimento, 1992).Rio de Janeiro, CPDOC, 2005. 144 p. dat. GUSTAVO MORAES REGO REIS (depoimento, 1992) Rio de Janeiro 2005 Gustavo Moraes Rego Reis Ficha Tcnica tipo deentrevista: temtica entrevistador(es): Glucio Ary Dillon Soares; Maria Celina DAraujo levantamento de dados: Equipe pesquisa e elaborao do roteiro: Equipe sumrio: Priscila Riscado conferncia da transcrio: Ignez Cordeiro de Farias copidesque: Leda Maria Marques Soares tcnico de gravao: Clodomir Oliveira Gomes local: Rio de Janeiro - RJ - Brasil data: 16/07/1992 a 22/07/1992 durao: 7h 20min fitas cassete: 08 pginas: 140 Entrevistarealizadanocontextodoprojeto"1964eoregimemilitar",desenvolvidopelo CPDOC, com apoio da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), no perodo de 1992 e 1995. A pesquisa contou com a participao de Glucio Ary Dillon Soares. A partir de 1997, passou a integraroprojeto"Brasilemtransio:umbalanodofinaldosculoXX",apoiadopelo Programa de Apoio a Ncleos de Excelncia (Pronex) do Ministrio da Cincia e Tecnologia. O projeto resultou na publicao da trilogia "VISES do golpe: a memria militar sobre 1964" / Introduo e Organizao de Maria Celina DAraujo, Glucio Ary Dillon Soares, Celso Castro. RiodeJaneiro:Relume-Dumar,1994.,"OSANOSdechumbo:amemriamilitarsobrea represso"/IntroduoeorganizaodeMariaCelinaDAraujo,GlucioAryDillonSoares, CelsoCastro.RiodeJaneiro:Relume-Dumar,1994.e"AVOLTAdosquartis:amemria militar sobre a abertura" / Introduo e organizao de Glucio Ary Dillon Soares, Maria Celina DAraujo, Celso Castro. Rio de Janeiro: Relume-Dumar, 1995, alm do livro de depoimentos "ERNESTO Geisel" / Organizadores Maria Celina DAraujo e Celso Castro. Rio de Janeiro: Ed. Fundao Getulio Vargas, 1997. temas: Ato Institucional, 1 (1964), Ato Institucional, 5 (1968), Carlos Lamarca, Costa E Silva, Destacamentos Militares, Emlio Garrastazu Mdici, Ernesto Geisel, Espionagem, Estado Maior doExrcito,Exrcito,GolberydoCoutoeSilva,Golpede1964,GuerrilhaRural,Guerrilha Urbana,GustavoMoraesRegoReis,HumbertodeAlencarCasteloBranco,JuarezTvora, OperaoBandeirantes(1968-1970),OrlandoGeisel,Petrobras,RepressoPoltica,Servio NacionaldeInformaes,SistemaNacionaldeInformaes(Sisni),TorturaGustavo Moraes Rego Reis Sumrio Entrevista: 16.07.1992 ASegundaGuerraMundialeseuimpactosobreoentrevistado;aexperinciadosmilitares brasileiros no exterior e sua possvel influncia na criao da Escola Superior de Guerra (ESG); relato sobre a ESG e as principais idias que existiam no incio de sua formao; contato com Golbery e Rodrigo Otvio; relato sobre o os militares que compunham o "grupo da Sorbonne"; contatocomogeneralCasteloBranco;participaodoentrevistadonafaseconspiratriado golpe de 1964 e funo que ocupava na poca; relacionamento entre Castelo Branco e Costa e Silva;relaodoentrevistadocomErnestoGeiseledestecomoentopresidenteCastelo Branco;ogrupoda"linha-dura"naditaduramilitar;projetospolticosdosgruposmilitares envolvidosnaconspiraoparaogolpemilitarde1964;diferenasentreo"grupodos7"eo "grupo dos 11", formado por militares do Exrcito; relato sobre a possibilidade de um desfecho diferente para o golpe de 1964; comentrios sobre os militares que faziam parte do "grupo dos 7"edo"grupodos11";aviolncianogovernoCasteloBranco;aposiodosmilitaresda "linhadura"edeCostaeSilva;observaessobreosmovimentosseparatistasnoBrasil;o ConselhodeSeguranaNacional;acriaodoServioNacionaldeInformaeseseupapel duranteaditaduramilitar;quebradahierarquiaentreosmilitaresduranteaditaduramilitar,o funcionamentoeasligaesexistentesentreosrgosdeinformaes;relaoentreCastelo Branco e Cordeiro Farias; a priso de parentes de oficiais durante a ditadura militar e a atuao dosrgosdeinformaes;funcionamentodosDestacamentosdeOperaesdeInformaes (DOI) e dos Centros de Operaes de Defesa Interna (CODI); relaes entre Foras Armadas e civis durante a ditadura; principais razes que levaram ao golpe militar em 1964; o Conselho de Segurana Nacional e as cassaes no governo Castelo Branco; a escolha de Figueiredo para a sucesso de Geisel na presidncia da Repblica; comentrios sobre os grupos radicais existentes no Exrcito; a escolha de Mdici para a presidncia; participao do entrevistado na sucesso de ErnestoGeisel;aorigemdoDestacamentodeOperaesdeInformaes(DOI);asfunes atuaisdoCentrodeInformaesdoExrcito(CIE)eda2Seo;otratamentodadopela imprensaaosmilitarescomofimdaditadura;opiniodosmilitaressobreasescolhasdos presidentesduranteaditadura;anlise da posio radical de oposio do general Frota at sua sadadoExrcito;ogovernoGeiselea"diluio"dosgruposdelinhaduraeaparticipao destes e dos rgos de informao no governo Figueiredo; as medidas contra o abuso da tortura no governo Geisel; o Ministrio do governo Geisel e seu papel na poltica de abertura; os casos detorturaocorridosnasdependnciasdosDestacamentosdeOperaesdeInformao(DOI), comoeleschegavamaoconhecimentodosoficiais;acompetioexistenteentreos rgos de informaes; explicao sobre a longa durao do regime militar; a influncia do comunismo no Exrcito; observaes sobre a pena de morte no Brasil durante a ditadura militar; relato sobre o "grupo dos 11" e o "grupo dos 7" generais; Costa e Silva e seu papel na ditadura militar; reao da linha dura, dos grupos militares de direita durante os governos Geisel e Mdici; negociao em torno das candidaturas de Geisel e Figueiredo a presidncia da Repblica; Golbery e o "Caso Riocentro";aaoeofuncionamentodaJustiaMilitarduranteaditadura;conversasobre personagens civis e militares que tiveram importante papel durante a ditadura e a possibilidade de que estes concedessem entrevistas.Gustavo Moraes Rego Reis 1a Entrevista: 16.07.1992 M.A.-NstemosnoCPDOCumProgramadaHistriaOral,quejentrevistouo generalCordeirodeFarias,ogeneralMurici,AmaralPeixoto,etc.Agentegostaria tambm de fazer com o senhor um depoimento longo... G.S.-Masestaconversahojemaistemticaelimitadaaumasrie de questes que estavamacontecendodurantesuapocanaativaequeningumsabe.Osenhorfoi promovido a aspirante durante a Segunda Guerra Mundial, que teve um impacto grande nopensamentomilitar.Qualfoiesseimpactosobreoseupensamentoemparticular, tanto militar quanto em relao organizao do Estado nacional e poltica? G.R. - Quando o Brasil declarou guerra aos pases do Eixo, em agosto de 1942, eu ainda era cadete e cursava a Escola Militar do Realengo. O noticirio at ento era escasso e censurado,quandonovoltadoexaltaodasvitriasmilitaresdoEixo.OjornalO Globo tem publicado uma resenha, O Globo h 50 anos, que bem retrata esse quadro naquela poca. Com o torpedeamento dos cinco navios brasileiros que conduziam para o Nordeste uma unidade de artilharia, houve realmente um impacto, a conscientizao de que estvamos na guerra. O fato militar. Medidas de defesa civil, blackout das praias, convocaodereservistas.Osoficiaisnadacomentavamconosco.Emfinsde1941 ocorreranaescolaumepisdiomuitosignificativo.Ocomandantedaescola,coronel atuante e oficial de muito prestgio junto ao ministro da Guerra, general Eurico Dutra, comoderestoumapondervelparceladacpuladoExrcito,erareconhecidamente inclinado para a Alemanha. O nacionalismo exacerbado, a fixao permanente contra o perigocomunistaexploradapelaampliaodoriscoqueteriaapresentadoaIntentona de 1935, e, afinal, as sucessivas vitrias militares alems, tudo isso condicionava aquela inclinaodemuitos.Assimquenaquelaocasio,ocoroneladidomilitarjunto embaixadadaAlemanha,quetinhalivreacessoanossosquartiseorganizaesdo Exrcito, ofereceu para exibio, para cadetes e oficiais, um filme documentrio sobre asvitriasalemsnaocupaodaPolnia.Malpassadosunspoucosminutosde exibio,foiestainterrompidaporforadeestrondosavaiadoscadetes.O constrangimentofoiterrveleoalemoretirou-serevoltadonoescondendoseu desagrado.Adecepodocoronelnossocomandantefoipenosa.Nohaviaporm, ainda,umaconscinciapolticaentrens.Asdemocraciaseuropiasdecadentese Gustavo Moraes Rego Reis derrotadaseosEstadosUnidosaindaenigmticosemseuisolacionismo,no conseguiamassimseoferecercomoexemplos,penetrandoemnossomeiomilitar enclausurado, custodiado pela alta hierarquia ainda comprometida pelo estabelecimento epelamanutenodoregimedoEstadoNovoeaperpetuaodeGetlioVargasno poderditatorialatoutubrode1945.Tudomuitoobscuroecontraditrio.Quando fomosdeclaradosaspirantes-a-oficial,emjaneirode1944,aFEBestavasendo organizada na Vila Militar, no Rio. Ns queramos ir para a guerra. A guerra , afinal, a razo de ser de nossa profisso. E, sob este aspecto, frustrante, posto que a guerra no podeserdesejada.Ensnosprepararmos,profissionalmente,paraelaavidainteira. Trscamaradaseeuescolhemosparaservirdeacordocomnossaclassificaoao trmino do curso no 2 Regimento Moto-Mecanizado, na Vila Militar. Era a primeira unidadearecebermaterialnorte-americanoarmamento,viaturasmotorizadase blindadas.Nanossavisoumaquantidadeenormedematerialrdios,armamento, ferramentas, sobressalentes, munies uma coisa incrvel para nossos hbitos da velha escolafrancesa.Tudoissotinhadeseridentificado,adaptado,traduzidoparaa formaodopessoalsubalternocabosesoldadoseparansmesmos,oficiaise sargentosoriundosdacavalaria.Tudoissoconstituaumdesafio.Inicialmente, parece que era a inteno enviar duas divises de infantaria, ou seja, um efetivo aproximado de 80.000 homens, tendo sentido pois a participao de nosso regimento. Posteriormente, comareduoestabelecidapelosamericanosparaapenasumadiviso,nossa unidade contribuiu com apenas um esquadro. Por razes que no atinamos at hoje, nenhum de ns quatro foi classificado naquela subunidade que em seu regresso recebeu o nome de EsquadroTenenteAmaro,oficialdareservaconvocado,mortoemcombatenaItlia. Em julho de 1944, o regimento, com todo o seu material e pessoal, inclusive familiares, foiembarcadoemtrsnavios-transporteeseguiuparaoRioGrandedoSul.Medida adotadafaceposiodaArgentina,aindainclinadaparaoEixo,apesardeguardar neutralidade. Pern havia assumido. Assim, podemos concluir que a conjuntura mundial provocou,semdvida,umforteimpactodopontodevistadosmeiosmateriais, disponibilidadederecursosdetodaordemcombustveisemuniovontade, dedicaointegralinstruo,enfim,umadestramentocompleto.Diga-se,abemda verdade,quehumamarcaindelvelnaformaodeumtenenteadeseuprimeiro capitocomandante.Nstivemosestasorte:umvelhogacho,capitoManoelde Freitas Ribeiro. No fez carreira, reformou-se cedo. Mas eu lhe devo muito. J o coronel comandantedoregimentonosedestacava,apesardaimportnciadaunidadeeda Gustavo Moraes Rego Reis expectativadesuamisso.Nossainstruoedisciplinaeramcalcadasnomodelo francs, com as necessrias adaptaes que nossa vivncia foi modificando. A doutrina erafrancesa.Osregulamentosdasarmaseservioserammuitobemfeitose, principalmente,muitobemredigidos.AFEB,emseuregresso,trouxenovaordemde problemas. A disciplina dos americanos, ingleses e franceses muito mais rgida do que anossa,principalmenteadisciplinadecombate.Porm,quandoasunidadeseram retiradasdafrentedecombatepararepousoousubstituio,naretaguardahavia excessosdetodaordem,liberdadedescontrolada,transgresses,indisciplinaeno poucoscrimescontraapopulaocivildesarmada,principalmente,asmulheres italianas.Conseqnciadopotencialdeagressividadeexacerbadonocombatentepela guerra e para a guerra. AreintegraodoscontingentesquevoltavamdaItliavidaedisciplinado tempodepaznofoifcil.Impunha-se,comofoifeito,adesmobilizaoeo encaminhamentodoscontingentesssuasprimitivassedesSoJooDelRei,em Minas,ovaledoParabaparaosdeSoPaulo,eoutrosmenoresquetiveramsua origememdiversosestados.Eramtodosheris.Ou,pelomenos,assimse consideravam,emparticularaquelesquenohaviamsido.Houveacusaesde perseguio, propsito de diluir a FEB com receio de golpes contra o governo e outras alegaesatcertopontoprocedentes.NofoioretornodaFEBquepromoveuo processo poltico do Brasil at a derrubada de Getlio Vargas em outubro de 1945. Foi a prpria evoluo da conjuntura mundial e a hegemonia inconteste dos Estados Unidos aps a derrota do Eixo e do Japo. A palavra democracia, mais do que o contedo, e as quatroliberdadesdeRoosevelt,maiscitadasdoqueenumeradas,eramgrandestemas queosbrasileirosouvirambastantenaItlia.Masnocreioque,necessariamente, associassemaoprocessoeaoquadropolticobrasileiro.Getlioerapoliticamente combatido,atacado,masnoeraodiado,muitomenostemido.Osistemavigentese exauriu,semqualquerresistncia.Foramfatoresdeordemeconmicamaisdoque polticae,muitomenos,militar.Provaquenotendosidoeleexiladonemcassado, elegeu-sesemqualquerobjeopolticaoumilitarsenadorpordoisestadose deputado por outros sete, carregando assim seus suplentes, que assumiram uma grande bancada nacional, eleita graas ao seu enorme prestgio e incongruncia da legislao entovigente.Porseuturno,oPartidoComunistaelegeutrssenadoressendoum deles Prestes e cerca de dez deputados. Gustavo Moraes Rego Reis M.A. - Esta ida para fora foi um instrumento de socializao do militar brasileiro? Isso influiu tambm para a criao da ESG? G.R.-No.Aintegraodosquadrosoficiaisesargentoscomatropasemprefoi muito boa em nosso Exrcito. A oportunidade da FEB na Itlia ofereceu uma excelente amostragemdenossasolidariedadesocialedoespritodacoletividadebrasileira,sem discriminao de raas, credos e origens. Filhos de sargentos e de funcionrios humildes chegamaosaltospostosedesempenhamfunesdeimportncianasinstituies militares. Sempre foi assim. Um excelente oficial de minha turma recebeu sua espada de aspirantedasmosdeseupai,umvelhocaboreformadodaPolciaMilitar,ambos fardados, o pai prestando continncia ao filho antes de proceder entrega. Os Colgios Militares do Rio, Porto Alegre e Fortaleza acessveis a filhos de militares de qualquer graduao,edecivis,omeucasoprestam,hmaisdeumsculo,umaimportante contribuio para a socializao do militar brasileiro. Atente-se, principalmente, para o fato de significativa parcela no seguir a carreira militar. Perduram assim, no decorrer dos anos, as antigas e saudosas recordaes da juventude reavivadas nas comemoraes das turmas, nos aniversrios dos colgios ocasio em que se irmanam civis e militares e nas associaes de ex-alunos. Curioso que os civis so muito mais ciosos dessas reunies e efemrides. Diferente, por exemplo, do Exrcito argentino, o nosso jamais foi elitista. Embora sem qualquer tipo de contato com foras ou elementos russos na Itlia, umsignificativoncleodeintegrantesdaFEBjdispunhadeconvicesideolgicas firmadas. Da a efetiva, audaz e rpida expanso do comunismo entre os integrantes da FEB e da Marinha Mercante que prestaram servios no exterior. muito provvel que seus adeptos mais destacados j expusessem aquelas idias mesmoantesdaidaparaItlia.Casoque,emoutubrode1945,foifundadaa Associao dos Ex-Combatentes da FEB com o objetivo de defender os interesses de seusmembrosdastrsforasarmadasedaMarinhaMercantequehaviamprestado serviosnoexterior.Desdelogo,comreconhecidainiciativaeperseverana,os comunistas inclusive oficiais da ativa procuraram formar chapas para a disputa das eleies para os diretrios regionais nos estados e no Distrito Federal (Rio de Janeiro). EmsuagrandemaioriaeramjcivisdesmobilizadosapsoregressodaItlia,muito atuantesnadefesadeseusinteressese,principalmente,noempenhodeparticipao polticadecontextoideolgico,nalinhadeatuaopolticadoPartido.Em1946foi eleito, com o apoio dos comunistas para a presidncia da Associao, seo do Distrito Gustavo Moraes Rego Reis Federal,oex-caboOsvaldoAranha,filhodoconhecidopolticogetulistaOsvaldo Aranha. No se tratava de uma demonstrao democrtica, mas sim de uma manobra de descrdito contra a oficialidade, tirando partido do entusiasmo e da ambio do jovem Aranha.OPartidoComunistavoltaralegalidade.E,nachapadeAranha,inclura vriosdeseusmembrosnoConselhoNacionaldaAssociao.Posteriormente desgostoso,Aranhaacabourompendocomeles.Em1947eradecisivoodomniodos comunistas nos mais elevados cargos da Associao. O major Henrique Cordeiro Oest, que combatera na Itlia comandando um batalho, elegeu-se deputado pelo PCB. Seus antecedentescomunistasvinhamde1935.Posteriormenteforaanistiado.PedroPaulo SampaioLacerda,funcionriodoBancodoBrasil,perderaumapernaquandomenino atacadodeparalisiainfantil,nemporissodeixaradeserviraFEB,graduadocomo tenente-coronelnaseofinanceiradoBanconaItlia.Eraopresidentedaseoda AssociaonoDistritoFederalefaziapartedaclulacomunistadoBancodoBrasil, bastanteinfiltradadesde1935.OpolmicocoronelJooCarlosGross,quechegoua general,eradosmaissolidriosaoscomunistas,noporconvicoideolgica,mas talvez por obstinao e pirronismo. Alm desses, havia o capito Kardek Leme, Jacob Gorender e muitos outros. A reao dos que a eles se opunham foi a de dar por perdida a associao. Criaram ento uma outra organizao de veteranos, composta somente de oficiais do Exrcito. Discriminativa, teve vida curta e inexpressiva. Voltaram eles ento alutar,tentandoarecuperaodaassociao,conseguindoelegerotenentecoronel CasteloBrancoparapresidentedaseodoDistritoFederaleobrigando-oaconviver durantedoisanoscomoscompanheiroscomunistas.QuantocriaodaESG,em outubrode1948,almdeCordeirodeFarias,queexerceuocomandodaArtilharia Divisionria na FEB,entogeneraldebrigada,Golberi1,tenente-coronel, que tambm participaram da FEB, os demais fundadores e primeiros membros do corpo permanente daescolaoscoronisIdlioSardenberg,HeitorHerrera,ErnestoGeisel,Rodrigo Otvio Jordo Ramos, JaimeGraa,SenaCampos,Murici2foramosmaisatuantes. Pouco depois, Golberi foi encarregado da Diviso de Assuntos Internacionais da escola, passandoaserumdosexpoentesdogrupo.AsatividadesdaESGeseusprimeiros estudos sua estrutura e as especulaes sobre a parte conceitual da segurana nacional foramlevadasaefeitoporestegrupo.DeleparticipavamoficiaisdaMarinhaeda 1 Golberi do Couto e Silva, assim como Ernesto Geisel e Rodrigo Otvio Jordo Ramos, foram para a ESG no ano de 1952. 2 Antnio Carlos Murici foi para a ESG no ano de 1951. Gustavo Moraes Rego Reis Aeronutica,aparentementesemmaiorinteresse.Aassistnciaprestadapelos americanosnemsempreeracordial,facecondioqueosnossosbuscavamde encontrar solues adaptadas nossa realidade.A partir de 1948 foi assinado um acordo militar Brasil-Estados Unidos e criada umacomissomistaparaimplementaroprocessodecooperaofornecimentode armamentos,munies,viaturas,materiaisdiversosecursosdeespecializaonas escolas militares americanas. A assistncia ESG estava ali includa. O general Juarez sucedeuaCordeironocomandodaESG,em1953.Vriosoficiais,inclusiveosj citados, freqentaram o NWC. O contato inicial do general Castelo com a ESG somente ocorreuem1954,quandofoitransferidodocomandoda10RegioMilitar,em Fortaleza, para a sub-chefia do Exrcito no Estado-Maior das Foras Armadas (EMFA), sob as ordens do marechal Mascarenhas de Morais. Com o suicdio de Getlio, Castelo nomeadopelopresidenteCafFilhocomandantedaEscoladeEstado-Maior,onde permaneceatabrilde1956,quandoentonomeadoparaocorpopermanenteda ESG. Ali permanece at fins de 1958. Concluindo, a influncia para a criao da ESG no foi da FEB e seu regresso, foi a evoluo da conjuntura que propiciou a cooperao e, afinal, um modelo adaptado do National War College. G.S. - Esse grupo que comeou com a ESG, que idias tinha naquela poca a respeito de geopoltica?ComoelesestavamvendoomundojdivididoemLeste/Oeste?Ouessa percepo veio depois? G.R.-Naquelapocaeueraummodestocapito,instrutordaEscoladeMoto-Mecanizao,emDeodoro,emepreparavaparaprestarconcursoparaaEscolade Estado-Maior.Oprogramalimitava-segeografiaeconmica,histriamilitarda Amrica do Sul e duas provas de lnguas. Estava dispensado das provas de ttica face ao resultado de meu curso na Escola de Aperfeioamento de Oficiais (EsAO). No tinha, pois,neminformaonemacessoquiloquesedesenvolvianaESG.Euqueriasaber ttica, o resto viria a seu tempo. Nossa grande aspirao era a ECEME. AESGaindanotinhaprojeonosescalesintermediriosmajorese capites. muito interessante a apreciao do ministro Abelardo Jurema sobre a Escola de Estado-Maior quando, em abril de 1964, foi a ela recolhido por horas.Gustavo Moraes Rego Reis Creio,porm,queamelhorindicaoparaatenderperguntaseriaencontrada na apresentao do prprio Golberi em seu livroGeopoltica do Brasil3. Como o autor explica,sopalestraseensaiosescritosemvriosanosduranteadcadade50, traduzindo concretamente a evoluo de um pensamento geopoltico. Em 1955, Golberi publicou Planejamento Estratgico4, edioda Biblioteca do Exrcito. No sei se ao livro de Alfred Stepan5 que o senhor se refere, mas a propsito, h nele uma passagem interessantssima.Refiro-mesurpresadoautorfaceobservaopessoaldogeneral GolberidequeaESGnohaviasidodefatoimportantecomocentrodeideologiae polticadepoisde1964,equequasenuncahaviautilizadoqualquerdesuasanlises polticas. Emseudiscursocomoparaninfodosestagiriosde1953,ogeneralJuarez reclamava mais planificao e, sobretudo, coordenao geral das atividades pblicas e, at onde possvel, democraticamente, das atividades privadas que cooperam no campo da economia. Em 1950, o general Cordeiro de Farias fizera do mote do anticomunismo atnica,denunciandoainflaocomunistaquesedisfaraemultranacionalistae protetoradosfracos.Assim,oobjetobsicodaESGeraesemprefoidesenvolvere aperfeioarumatcnicadeplanejamentonacionalcomacoordenaodasatividades pblicaseeventualmente,privadas,nosdiversoscamposdopodernacionalo econmico, o poltico, psico-social e o militar. Os estagirios so, em sua maioria, civis denveluniversitrioselecionadoseindicadospelosdiversosministriosereasde atividade e militares das trs foras j diplomados pelas respectivas escolas de estado-maior. Para tanto, os estagirios assistem palestras do mais alto nvel, que proporcionem um quadro geral da conjuntura nacional e internacional, e efetuam trabalhos em grupo, seminrios,visitasareasdoBrasiledoexterior,tudoissoemcercadedezmeses. Afinal, levam a efeito uma tentativa de planejamento nacional esquemtica e cada qual apresenta uma tese sobre um tema proposto pela escola. V-sepois,queaescolarealiza,emuitobem,umprocessocontnuode atualizaoeaperfeioamentodeumatcnicadeplanejamentonacional,cujos elementossovariveiscomaconjunturaecomavisodosagentesgovernamentais. Soapenasasgrandeslinhas.Seriainvivelpretenderqueemumano,estagiriosde formaesasmaisdiversas,assimcomoocorpopermanentedaescola,osinstrutores 3SILVA,GolberidoCoutoe.GeopolticadoBrasil.RiodeJaneiro:JosOlympio, 1967. 4 SILVA, Golberi do Couto e. Planejamento Estratgico. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exrcito, 1955.5 STEPAN, Alfred. Os militares: da Abertura Nova Repblica. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986. Gustavo Moraes Rego Reis nem sempre permanentes, elaborassem trabalhos de maior profundidade. Trata-se assim, apenasdeumatcnicadeaprendizageme,principalmente,deestreitaconvivnciae trocasalutardeexperinciasprofissionaisentrecivisemilitares.Odocumentofinal, fecho de todo o trabalho de planejamento, seria o conceito estratgico nacional. Trata-se deumdocumentoextremamenteacuradoqueperduraapenasnaespeculao.Tanto quenemmesmoosfundadoresdaESGjulgaramadequadaouindispensvelsua formulaoefetiva,salvoogovernoCostaeSilvaquandotentadopelosmenos preparadosparatalempreitada,comodefatoseevidenciouem1967/1969faces graveseprevisveiscrisesinstitucionaisquesedesenrolaramnaqueleperodo.Sob outroaspecto,aESGsecaracterizavaporumadiferenciaopolticaemilitarem relao ao grupo no poder. Paradoxalmente, desde a sua origem 1949/1950, a ESG tinha emseusquadrospermanenteseentreosestagiriosdesafetosdosgovernosGetlio, Juscelino e Joo Goulart. Depois de 1964, a escola foi perdendo progressivamente essa expresso poltica. As oportunidades de participao efetiva nas atividades de governo, tanto militares quanto civis, comandos efunes de relevo, mantiveram a escola como uma espcie de desvio sem, todavia, caracterizar-se por abrigo de oposicionistas a cadaumdosgovernosmilitaresoraaoscastelistas,oraaoscostistas,emtermos relativos. A ESG no poderia dispor de um repertrio atualizado de informaes de toda ordem que possibilitasse uma efetiva anlise poltica confivel. Da a afirmao sincera e autorizada do general Golberi. M.A.-OsenhorestfalandodoGolberiedoRodrigoOtvio.Dequandovemoseu contato com esses generais? G.R. - Vem de muito depois dessa poca da criao e implantao da ESG. Vale aqui umaexplicaoquensempregamoscomumente servirequeparecenotraduzir exatamente seu significado. A circunstncia de freqentarmos uma escolajuntos, como colegasetrabalharmosnamesmaorganizaomilitarsejanacondiode companheiro,subordinadoouchefeecomandantecrialaosderelacionamento, avaliao,conhecimentorecprocoeatmesmodeamizade.Assimqueconhecio Golberi, servindo com ele na presidncia da Repblica, no governo Castelo. Ele, chefe doSNIeeu,assistentedogeneralGeisel,chefedoGabineteMilitar.Assimcomeou nosso relacionamento e, at mesmo, o relacionamento com o prprio Geisel, com quem no tivera qualquer convivncia at essa poca. At ento meu relacionamento era com Gustavo Moraes Rego Reis oCastelo,comquemserviraantesemBelmedepoisnoRecife.ComoRodrigo Otvio, s fui conhec-lo na Amaznia. Foi meu comandante militar da Amaznia, com sede em Manaus, em 1969, na ocasio em que eu, coronel, comandava o Comando de FronteiradoSolimes,comsedeemTabatinga,de1969a1971.Atentooqueeu sabia deles era fama. G.S.-Sobreissoeugostariadefazerumapergunta.Algunsjornalistasdapoltica brasileira,algunsestudiosos,comoporexemplooAlfredStepan,falammuitodo grupodaSorbonne,cujasementeteriasidoplantadaduranteaSegundaGuerra Mundial. O senhor conheceu alguns desses membros importantes, inclusive o marechal Castelo Branco ? G.R.-OlivrodeStepanmuitodocumentado,tendoconseguidoentrevistar-se com GeiseleGolberi,elesemdvida,marcouumtempo.QuantoalusoSorbonneem relaoESGe,emparticular,quelegrupoinicial,seusfundadoreseformuladoresda poltica de segurana nacional e seus desdobramentos, no encontrei explicao, salvo umarefernciaadmissvelcitadaporJ.F.Dulles,atribuindoaOsvaldoAranha descreveraESGcomoaSorbonnedoBrasilpelaamplitudedeseusestudos.Jme referi aos outros aspectos da indagao. No que tange ao general Castelo Branco, como disse,suapermannciaetrabalhonaESGdeu-sede1956a1958.Osdoisanos anteriores haviam sido muito tumultuados na vida de Castelo. Servindo ele no EMFA, o ambiente militar agitava-se: o Memorial dos 82 coronis contra o governo; as eleies do Clube Militar com a escolha do general Canrobert, apoiado pelo pessoal da ESG; o episdioqueculminoucomosuicdiodeGetlioequeCasteloacompanhoupassoa passo pela assistncia que prestava ao marechal Mascarenhas, amigo do presidente e seu chefenoEMFA.NomeadopelonovogovernoparaocomandodaEscoladeEstado-Maior,apesardograndeinteresseeentusiasmosoboaspectoprofissional,no conseguiriamanteraescolaafastadadaagitaopolticaqueenvolviaomeiomilitar, divididofaceexpectativadaderrotadocandidatoJuarezporJuscelino,como aconteceu. Os episdios de 11 e 22 de novembro de 1955, com a participao de alguns oficiaisinstrutoresealunosdaescola,levaramaorompimentodasrelaesentreo ministroHenriqueLotteCastelo,quefoiexoneradodocomandoemjaneirode1956. EmabrilfoinomeadoparaaESG.SuapresenanaESGpropicioudoisimportantes resultados. De um lado, ofereceu-lhe um auditrio atento, ecltico e de alto nvel civis Gustavo Moraes Rego Reis emilitaresdastrsforasarmadasvivamenteinteressadosnasexposiese, principalmente,nosdebatessobreosvariadosassuntosdeimportncianacionale internacional. A Castelo desenvolveu as bases para uma nova doutrina militar brasileira e a destinao constitucional das foras armadas, temas que j vinha explorando desde seuregressodaItlia,inicialmentecomodiretordoensinoe,posteriormente,na condio de comandante da Escola de Estado-Maior.Deoutrolado,ogeneral Castelo exposto indagao e ao debate, podendo demonstrar toda sua capacidade intelectual, suasidias,suapersonalidade,tornou-seconhecidoporquaseduascentenasde estagirios das trs turmas, (1956/1957/1958) principalmente no meio civil poltico e empresarial. Fator de importncia capital para a adeso a seu nome em 1964 e, depois, no curso de seu governo. Em novembro de 1956 houve o conhecido episdio da espada deourooferecidaaogeneralLott,candidatoaogovernocujasposiespolticase militaresem passado recente haviam levado ao rompimento de relaes com Castelo. A comissoencarregadadoevento,maldosamente,enviouumconvitepessoalaCastelo encarecendo sua decisiva adeso pblica gigantesca demonstrao popular. Castelo ficou to perplexo e perturbado com a provocao que decidiu responder, publicamente, enviandoaoOGloboafamosacartadaespadadeouro.Oincidenteteveenorme repercusso, tanto nos meios militar, poltico e empresarial, como na opinio pblica e na imprensa. Seu fraterno amigo, o general Ademar de Queirs declarou, em entrevista, a importncia da resposta de Castelo por ter sido essa a primeira vez em que ele tomou, publicamente,umaatitudepessoalemoposioaosqueexerciamaautoridade. Curiosamente, nenhum dos demais generais servindo no Rio, e sabidamente adversos posiodeLott,recebeuoofcio-convite.ApenasCastelo,justamenteomenos indicado. Os termos do ofcio-convite so de tal maneira provocativos e at debochados, dada a incongruncia de suas alegaes, que no poderia ser outra a atitude de Castelo. Humaversoplausveldequeoconviteteriasidopropositalmentemanipuladopor dois amigos seus, inconformados com sua atitude reservada. Assim, visavam provocar a reao,decisivaparaodesdobramentodoprocessopolticoeseuposicionamento militar. Nunca foi apurado. Caso que a reao de Castelo foi decisiva para marcar sua posio. G.S. - O que caracterizava esse grupo Sorbonne? Em que elesse diferenciavam dos demais oficiais de nvel? Gustavo Moraes Rego Reis G.R. -Eramprofissional eintelectualmente muito bem preparados. Destacavam-se em suas respectivas armas Cordeiro, Sardenberg, Herrera, Geisel e Murici, na artilharia; Juarez e Rodrigo Otvio, na engenharia; Golberi e Mamede na infantaria. A Marinha e a Aeronutica tambm participavam, em menor nmero e menos expressiva ao. Haviam alguns cursado o National War College como tambm cursos de suas armas nos Estados Unidos.LottfoiestagirionaESG.Cursara,talcomoCastelo,aEscolaSuperiorde GuerranaFrana,correspondentenossaEscoladeEstado-Maior. Conheciam bem o Brasil, tanto o Sul como o Nordeste, e seus problemas, pela vivncia revolucionria a ColunaPrestes,comJuarezeCordeiro;aexperincianaadministraonordestina de GeiseleMamede.Herrera,RodrigoOtvioeMuricimaisvoltadosparaoSul.Liam tudo,desdejovenstenentes.Etodoscommuitapersonalidade,oquedeviadificultar sobremaneira as discusses por ocasio da organizao da ESG, contidos pelo esprito moderadordogeneralCordeiro.Umdosmaistrabalhadoresededicadosfoiocoronel Idlio Sardenberg, que depois afastou-se do grupo, apoiando o general Lott e servindo em seu gabinete. G.S. - E seu contato com o marechal Castelo? G.R. - Quando terminei o curso de estado-maior em 1958 escolhi o comando Militar da Amaznia para servir. ramos oito majores estagirios. Depois de demorada viagem de navio,chegamosaBelm.Seguiasozinhoenodiaseguinteapresentei-me ao general Castelo,ocomandante.Recebeuminhaapresentaoformalecerimoniosamente. Perguntou sobre a escola e o curso. Desejou saber a razo de minha escolha por Belm. Aleguei,semfalsamodstia,queaAmazniahaviamedadoumaoportunidade excepcionalparaconhec-la,quandoaliserviraem1955.Viajarabastantepela fronteira,conheceraseusproblemasesuagente.Aindamais,graasaumconvnio entreaFundaoGetulioVargaseaSPVEA,hojeSUDAM,freqenteiumcursode PlanejamentoRegional,emBelm.Porisso,julgavaagorameudever,habilitadopelo cursodeestado-maior,retribuirumpoucodomuitoqueoExrcitohaviame proporcionado. No comentou nada. Perguntou-me sobre a documentao do curso os famigeradospolgrafos,temastticosdesenvolvidosnacarta,comsituaesque evoluem e sobre os quais so levantadas questes e debatidos os ensinamentos a serem aprendidos. Uma vasta papelada mimeografada, muito bem elaborada como instrumento detrabalho,massemqualquerfinalidadeprticaposterior,salvoacpiaservil,sem Gustavo Moraes Rego Reis nenhummrito.Declareiqueoshaviajogadoforadepoisdecadaprova.Afirmeisem qualquercomentrio.ECastelodemonstrouseudesconfortoimediato.Enchi-mede coragem e expliquei que admitia aquele material necessrio apenas para adestrar-nos no hbito, na prtica e, afinal, na incorporao de um mtodo de raciocnio, o chamado EstudodeSituao,enaabordagemesoluodetodoproblema,emparticularno terrenottico.Emais,oentendimento,arealapreensodosprincpiosdeguerra economiadeforas,segurana,surpresa,iniciativa,unidadedecomando,liberdadede manobra conclui que julgava ter aprendido a lio, prova que jogara fora a papelada. Castelodesanuviouafisionomia,masnocomentounada.Afinal,perguntou-me, abruptamente, o que eu estava lendo. Creio que foi a minha salvao. Havia comprado um livro para a longa viagem de navio, La Dfense Nationale, coletnea de conferncias demilitaresecivislevadasaefeitonoCentrodeCinciasPolticasdoInstitutode Estudos Jurdicos de Nice, publicada em 1958. Um senhor livro de mais de seiscentas pginas e muito marcado, como meu costume. Castelo imediatamente transformou-se. Cordialeacessvel,declarouquenoconheciaepediu-meparatrazernodiaseguinte para emprestar-lhe. A despeito de seu formalismo, era cordial e extremamente educado notrato,muitociosodesuaautoridade,intransigentefacepreguia,desleixo, incompetnciaefaltadeespritomilitar.Era,contudo,toleranteeatmesmozeloso quando se apercebia que faltava ao subordinado discernimento bastante para atender a umaexignciaouresolverumaquestoousituao.Assimque,naAmaznia reconhecendoacarnciademeioseasdeficinciasdepessoal,naqualidadedeseu assistente,enviava-meprecedendoaumainspeosuaparaorientarocomandantea respeito daquilo que seria indagado. E recomendava-me com ironia: Quero que ele se saiamuitobem.svezeserarspidoe,noraro,irnico,semnoentantomagoaro subordinado.Sobesseltimoaspecto,quandopresente,suaesposa,donaArgentina, gentilmenteoobservaradesfazendoumpossvelmal-estarouconstrangimentodo subordinado.AslongasviagensemaviesanfbiosCatalinadaFAB,queogeneral Castelorealizavaconoscoparainspecionaraspequenaselongnquasguarniesde fronteiraOiapoque,BoaVista,Cucu,Japur,Ipiranga,Tabatinga,Estirodo Equador,PortoVelho,GuajarMirim,FortedoPrncipedaBeira,almdeMacape Manaus , com pernoites em condies precrias e convivncia relativamente confinada durante cerca de 15 ou mais dias, contribua para estabelecer um forte vnculo entre o generalens,majoresnovosdeseuestado-maior.Todasessascircunstncias promoveramoconhecimentorecproco,aconfianaeofortalecimentodosmelhores Gustavo Moraes Rego Reis laos de camaradagem militar. Quatro meses aps, terminando o nosso estgio, Castelo convidou-meparaseuassistente-secretrio.Noseiporqu.Assim,nasceuuma amizade que perdurou at a sua morte, em 1967. Emfinsdenovembro,porocasiodavisitadocandidatoJnioQuadrosa Belm,emsuademagogiadepalanque,Jnioreferiu-sePetrobrasdemaneira irreverenteedesairosa.OmajorPassarinho,superintendenteregionaldaempresa, revidoupublicamente,emjornal,comaspereza.Passarinho,talcomoseuadjunto tenente-coronel Jos Pinto, apesar de anti-lottistas exaltados desde alunos da Escola de Estado-Maior,sobocomandodeCastelo,nohaviaresistidoaosapelosdeLottpara aceitaraquelescargos.Contudonolhesfaltavacompetncia.Oincidenteenvolveu, indiretamente,ogeneralCastelo.JnioenviouumacartaatenciosaaCastelo,em respostaquelaquePassarinhopublicaranosjornais,defendendoaPetrobrase elogiando Lott. Castelo, a despeito da solidariedade a Passarinho, no podia endossar os elogios a Lott. No incio de dezembro, outro episdio mais grave. Um reduzido grupo deaviadores,noqualsedestacavamotenente-coronel-aviadorHaroldoVelosoeo coroneldoExrcitoLusMendesdaSilva,velhoamigodeCastelo,levamaefeitoa destrambelhada aventura de seqestrar um avio comercial com passageiros, levando-o paraointeriordeGois,emAragaras.Afinal,frustradoomovimento,oavio conseguiudecolarevoarparaaArgentina.UminquritoinstauradoporLott, sendo encarregadoogeneralEstevoTaurinodeResende,colegadeturmadeCastelo, pretendeuindici-losobalegaodeenvolvimentocomarebeliodeAragaras.A inquiriofaziarefernciaaumdocumentoqueteriasidoenviadoaconspiradoresno RioporoficiaisdaFABemBelm,afirmandoquecasoarebeliosejaadotada, devemosprenderoudeterogeneralCasteloBranco,atqueelesedecidaemnosso favor.Atumexercciocomtroparealizadoemnovembro,foialegadocomoum pretextodetreinamentoparaarebelio.Casteloficoumagoadoeindignado.dessa pocaumacartaqueescreveuparaomajorFreixinho.Diziaele:Oepisdiode Aragaras mais um empurro que recebemos, no plano inclinado em que deslizam as foras armadas. Idealismo, possivelmente. Mas, alm de inpcia, h um erro de viso: o de que o Brasil no pode melhorar dentro do regime constitucional. S e s dentro da constituiopensoeu,comopenseisempre.Ssefazumarevoluodentrodeuma ideologiaeimpelidoporumafortecorrentedaopiniopblica.OBrasilnoquer quarteladas, nem revoluo, pelo menos no perodo que atravessamos. Em conseqncia da rebeldia do Mendes e do Veloso os carcomidos bastidores do palcio da Guerra e a Gustavo Moraes Rego Reis suaimprensametomaramcomorebelde.Spodemcombateraminhapessoacom infmias. Meu trato continuado com o general Castelo, o conhecimento entranhado de suas convices e o entendimento do dever militar que ele tinha demonstrado, exposto e defendidocomveemncianasdiversasoportunidadesecircunstncias,sempre coincidente com meus juzos e meus sentimentos de soldado, foram de definitiva valia para meu posicionamento poltico e militar. At mesmo sem que com ele tivesse contato oportuno,talcomoaconteceuem1961,comarennciadeJnio,enosantecedentes prximosa1964.Porseuturno,estousegurodequeelenotinhaqualquerdvidaa meu respeito. Curiosamente, o ento major Nilton Freixinho, a quem Castelo admirava pela inteligncia brilhante, era um devotado lottista e, aps a renncia de Jnio, tornou-se um janguista entusiasmado, comandante de importante unidade do dispositivo militar deconfianadogovernonoRio,atabrilde1964.Casteloeraumchefecoerentee conseqente. Diferente de Mouro, por exemplo. M.A. - Mas por que o senhor no tinha confiana no general Mouro? G.R.-MeuconhecimentosobreMourodecorriadeinformaesdoCastelo,seu colega de turma na Escola Militar. Mouro era inteligente e com certa cultura. No era umprofissionalrespeitado,menosaindacomochefe.Eradesleixadonaapresentao pessoalenotrato.Osbonsprofissionaisqueconheciequecomelehaviamservido como subordinados, faziam dele um juzo pouco lisonjeiro. Quando capito, em 1937, Mouro, que era integralista, foi conivente com um documento forjado, contendo uma ameaacomunistasobadenominaodePlanoCohen.Afarsafoiengendradapara sensibilizarasforasarmadaseomeiopolticodemaneiraajustificarasmedidas preparatriasparaaimplantaodoEstadoNovocomaCartade1937.Mouro, carreirista e oportunista, era frustrado em relao a seus companheiros de turma que se destacaramprofissionalmente.Foisemdvidaativasuaparticipaonafase conspiratria. Creio porm, que no era levado muito a srio. Efetivamente no seria um nome to respeitado que empolgasse o Exrcito. G.S. - General, quer dizer que durante a etapa conspiratria da revoluo o senhor no teve participao?

Gustavo Moraes Rego Reis G.R. - A partir de agosto de 1962 servia com o general Castelo Branco na condiode seuassistente-secretrionocomandodoIVExrcito,nacidadedoRecife.Comando bastante complexo e com caractersticas polticas delicadas face conjuntura nacional, j que se estendia do Maranho at a Bahia, ou seja, por nove estados e o territrio de FernandodeNoronha.Osprefeitosdascapitaisedosmunicpiosdointerior,cercade 20 ou mais bispos, efetivos das Polcias Militares, as Ligas Camponesas, lderes como o governadorMiguelArrais,FranciscoJulio,padreMelo,padreCrespo.Eramseis generaissubordinadosaogeneralCastelo,algunsdelesafinadospoliticamentecomo presidente Goulart. Serviam tambm na rea um almirante e um brigadeiro. O general Castelomantinhaumrelacionamentoprofissionalerespeitoso,pormmuitociosode suaautoridadeeresponsabilidade.Mantinha-semuitobeminformadoedemonstrou intransigncianaaplicaoderecursosdisciplinares,atsuasltimasconseqncias, semprequeasituaoassimoexigiu.Compropriedade,emtodasasoportunidades, inclusiveparaescolasecursosquevisitavamnossarea,observavaeenfatizavao quadro pr-revolucionrio e a penetrao comunista no Nordeste. Assim, nossa posio eraaderesguardodasinstituies,particularmenteasmilitares,jcomeandoaser envolvidasnosclubesdesargentos.Essaeraanossaconspirao,postoque realmente, os antecedentes e o prprio engajamento dos chefes mais responsveis pelo movimentode1964eramodeumacontra-revoluopreventivafaceaoquadrode perturbaodaordem,decomprometimentodadisciplinaedahierarquiae, principalmente, de deteriorao do governo e de sua autoridade legal. Assim, vivamos noRecifeumclimadeguerradopontodevistadetenso,situaesinopinadase provocaes, no raro estimulados ou aprovados subrepticiamente. Conhecia, portanto, o pensamento do general Castelo, suas posies, sua determinao. Conhecia tambm a situaogerale,particularmente,asituaonasunidadesecomandosdosestadosdo NordesteedaAmazniaeoambientedoestado-maiordoExrcitoedaguarniodo Rio de Janeiro, onde servira um ano atrs. Tambm todos aqueles que me conheciam e, principalmente,asminhasrelaespessoaiscomCastelonasfunesdeconfiana pessoal que exercera na Amaznia e no comando do IV Exrcito participando, nessas condies e na medida adequada, de suas decises e atitudes tudo isso seria suficiente paraajuizaraminhacondutaquandonecessrio.Comodefatofoi.Estefoiomeu comportamentoeaminhaparticipaonacondiodesoldado.Masnuncapertencia grupos de conspirao poltica. Em julho de 1963, Castelo foi convidado pelo ministro JairDantasRibeiroparaasfunesdechefedoestado-maiordoExrcito.Naocasio Gustavo Moraes Rego Reis escreveuumacartaaogeneralJair,seucolegadeturma,expondosuavisoe responsabilidadesdocargoqueiriaexercersuasprerrogativasfuncionaisnocargo mais elevado da fora, inclusive o acesso direto ao ministro para o debate de assuntos importantes,semexcluirospertinentescondutadoExrcitofaceaoquadropoltico emcurso.Jairrespondeucordialmente,ressalvandopormsuaautoridadee competncias,nacondiodeministro,notratodosassuntospolticos.Muitoembora pudesse Castelo transferir-me para acompanh-lo de volta ao Rio, j que o acompanhara no ano anterior para o Recife, no o fez. Sem qualquer explicao pessoal deixou-me no IV Exrcito. Tambm no indaguei. Era seu estilo. E o meu. Em agosto fui promovido a tenente-coroneleCasteloconsultou-mesegostariadeservirnaDivisoBlindada, no Rio.Realmente,quelaalturaumoficialligadoaogeneralCasteloserclassificadona Diviso Blindada algum no pertencente ao dispositivo militar do governo era de fato inusitado. Sem dvida uma demonstrao de prestgio e habilidade de Castelo. No exercciodeminhasfunescomooficialdeoperaesdaDB,trabalheimuito.Aps alguns anos, estava voltando s minhas origens nos blindados. Absolutamente leal aos meusdoissucessivoscomandantes,osgeneraisdebrigadalvaroBragaeLuna Pedrosa,ambosbemrelacionadoscomoministroJairecomocomandantedoI Exrcito,generalncora.Declareiaambos,comamaiorfranqueza,minhasrelaes comogeneralCastelo,alisconhecidas,eminhaeventualposiofaceexpectativa paraqueseencaminhavaoBrasil.Alertei-os,porm,dequecasotivesseeudetomar alguma deciso, seriam eles os primeiros a ser informados. Jamais os trairia. Eram meus comandantes. O general ncora tambm me conhecia. Fora meu instrutor-chefe quando major,eeucadetedecavalarianoRealengo,naEscolaMilitar.Conheciaminhas ligaes com Castelo. M.A. - E sobre o relacionamento do presidente Castelo com Costa e Silva? G.R. - Julgo pertinente fazer antes algumas consideraes. Nas relaes entre militares, principalmente entre oficiais-generais, o princpio bsico da hierarquia a antigidade no posto, ou seja, o tempo de servio na profisso o mais importante e decisivo. Essa precednciarigorosamenterespeitada,inclusiveentremembrosdasdiversasforas quando servindo na mesma organizao militar, como por exemplo, o EMFA, a ESG, a Secretaria do Conselho e o Gabinete Militar da Presidncia da Repblica. Ao civil, no raro,escapaopesoeasimplicaesdetalfator.Em1964,osgeneraisdoAlto Gustavo Moraes Rego Reis Comando,quatroestrelas,eramcolegasdeturmadeCastelooucontemporneosde escola. ncora, Kruel, Galhardo, Alves Bastos, Dcio Escobar, Ururahy, Lira Tavares, Jair ento ministro de Goulart e Costa e Silva. Mouro e Guedes, ainda generais-de-divisocomcomandosemMinasGerais,tambmpertenciamaessaturmadaescola. Por sugesto de Castelo e por consenso, desencadeado o movimento, Costa e Silva, por seromaisantigonoRio,assumiuoComandoRevolucionrio,cabendoaCasteloa articulaopolticadomovimento.CostaeSilvaconvidouotenente-brigadeiro FranciscoMelo,chefedoestado-maiordaAeronutica,eovice-almiranteAugusto Rademaker que, antecipando-se, na companhia de colegas seus Levi Aaro Reis, Melo Batista, Saldanha da Gama e Mario Cavalcanti declarara que a Marinha estava sob seu controle. Porm a averso de Rademaker a Castelo era conhecida, assim como tambm no dispunha de uma liderana em sua fora que justificasse a ultrapassagem abrupta de quatroalmirantes-de-esquadraecincovice-almirantesqueoprecediamnaordem hierrquica.AscincoDionnes,refernciajocosasgmeasamericanas,comoeram conhecidosnaprpriaMarinha,destacavam-sepeloradicalismoeviolnciadesuas propostas e atitudes na represso e em seu obcecado anticomunismo. No eram lderes. Na Marinha, o princpio foi violado e as conseqncias e seqelas perduraram por longo tempo.Essefoiumdosncleosmaisradicaisdalinhadura.AsrelaesdeCastelo comoAltoComando,sendoCostaeSilvaministro,noeramfceis,justamenteem conseqnciadaintimidadeanterior,reduzidadrasticamentepeloformalismoepelo extremo zelo de Castelo em resguardar sua autoridade de presidente. Talvez um pouco deinsegurana,frutodavulnerabilidadedeumpoderconsentidoporseuscolegas. HaviatambmsuapermanenteeinabalvelpreocupaoemnodividiroExrcitoe dissociarasforasarmadas,abaladaspelasdissensesinternas,frutodoradicalismo extremado existente na Marinha e na Aeronutica. M.A. - O seu contato com o general Geisel s se deu depois da revoluo? G.R. - Para no dizer nunca, houve um episdio menor e irrelevante para ele em 1947. Naocasio,Geiseleramajor,chefedegabinetedaDiretoriadeMoto-Mecanizao, e eu,tenente,fuidesignadoparaparticipardeumacomissonaqueladiretoria. Apresentei-me a ele com uniforme de servio, inadequado para uma apresentao. Fui advertidoporele.DepoisdaeleiodeCastelopeloCongresso,procurei-onoestado-maior do Exrcito para cumpriment-lo. At ento, h meses no tinha contato com ele. Gustavo Moraes Rego Reis Semconversa,mandou-meprocurarogeneralGeiselqueseencontravaemsala prximareunidoaAdemardeQueirs,Cordeiro,Golberieunspoucos.Creioque examinando nomes para o novo governo. Apresentei-me militarmente e ele entregou-me umapassagemareadizendo-me:VparaBrasliaprepararachegadadopresidente Castelo. E como se diz ao trmino de uma inquirio: E mais no disse e nem lhe foi perguntado. Assim foi. Retirei-me, arrumei minha mala e parti para Braslia. M.A. - Preparar a chegada do presidente? Como? Foi uma demonstrao de confiana ter sido convidado pelo general Geisel? G.R.-SuponhoqueoprprioCastelotenhameindicadoparademonstraraosqueo cercavamnaquelapocasuaconfiananaminhalealdadeeaminhareconhecida integraoaomovimento.Acircunstnciadeserviremposio-chavenaDiviso Blindadadentrododispositivomilitardogoverno,noRioe,principalmente,minha lealdade ao Castelo e seu esprito legalista contriburam para um juzo indeciso a meu respeito por parte, possivelmente, de conspiradores mais radicais que no me conheciam ounoconfiavam.NaquelapocaaGuarniodeBrasliaerareduzidssima.Esem sinal de reao do governo e do presidente Goulart, que fugiu para o Sul e depois para o exterior,permaneceramsomenteemseuspostosunspoucosfuncionrios administrativosdopalciodoPlanalto.Depoisverificamosqueesteseramosque realmente trabalhavam, tanto que continuaram conosco, para surpresa de muitos.Osdemais,emsuaimensamaioria,eramfantasmas,apenaslotadosna presidncia para receber todas as vantagens proporcionadas pelo governo Juscelino por ocasiodatransfernciadacapital.Quatrooficiaisrevolucionriososcoronis AntnioCarlosdeAndradaSerpaeFranciscoBoaventuraCavalcanti,eosmajores Jurcio e Natalino Brito haviam chegado dias antes a Braslia e instalado um Gabinete Militar,afastandoosquealiserviam,semqualquerreao.Ditavamsuasordens, inclusiveapublicaodoDirioOficial.Umalinhadiretaatravsdeprecarssimo telefonedecampanhaeumtelexrudimentarasseguravamligaocomaSecretaria Geral do Conselho de Segurana Nacional, ocupada pelo coronel Jaime Portela e outros noRiodeJaneiroe,porseuintermdio,comoComandoSupremodarevoluo, instalado no Ministrio da Guerra. Avisados de minha chegada e misso, mandaram um carroapanhar-menoaeroporto.Pelasobservaesquejfiz,noencontreimuita receptividadeporpartedeles,salvooBoaventura.Mandarameumeentendercomo Gustavo Moraes Rego Reis presidenteMazzilli,virtualpresidentedaRepblica,quejseinstalaranopalcioda Alvorada,apesardaprecariedadedesuasituaofaceautoridadeincontestedo generalCostaeSilvanoRio.Anunciado,Mazzilliveioreceber-memuitotenso,mas controlado.Cumprimentei-omilitarmente,comurbanidade,dissedaminhamissoe indagueiquandopoderiadeixaropalcioeradia13eCastelochegariaa15. Respondeu-me que imediatamente. Procurei deix-lo vontade, contudo ele no estava tranqilo. No era para menos. M.A. - E a organizao do Gabinete Militar sob a chefia de Geisel? G.R. - Castelo e Geisel no tinham qualquer intimidade. No curso de suas carreiras no tiveram oportunidade de convivncia profissional, salvo o relacionamento com amigos comunstaiscomoAdemardeQueirs,MuricieCordeirodeFarias.Creioquepor sugestodestesfoioconvitefeitoaGeiseleporeleaceito.Salvoosamigosmuito ntimos,colegasdeturmaealgunssubordinados,aconvivnciacomCasteloera,em geral, considerada difcil. Muito cioso de sua autoridade, no raro intransigente em seus pontos de vistas, talvez pelo hbito prolongado na condio de instrutor nas escolas. Era polmico,quandocomseuspares.QuandodiretordeensinodaEscoladeComandoe Estado-MaiordoExrcito,aindacoronel,tiveraumdesagradvelatritocomoento coronel Orlando Geisel, instrutor da escola e uma inteligncia privilegiada, levando este a afastar-se da funo. Tambm aqueles amigos comuns teriam sido responsveis pela indicaodogeneralGolberiparaorganizaroSNI,juntando-seaissoafraterna amizade que unia Golberi a Geisel. Sem dvida, porm, havia antes de tudo um respeito profissional,oespritomilitarticoeadedicao,semreservas,aosinteresses nacionais,sentimentosrecprocosemCasteloeGeisel.OGabineteMilitarera organizadoemquatrosub-chefiasMarinha,Exrcito,AeronuticaeAdministrativa. Alm disso, o general Geisel era o secretrio-geral do Conselho de Segurana Nacional, dispondoparatantodeumasecretaria,queaindafuncionavanoRiodeJaneiro,com cerca de 40 funcionrios entre oficiais e civis. As sub-chefias tinham cada uma quatro oficiais superiores com o curso de estado-maior ou correspondente. H um atributo que, adespeitodeessencial,infelizmentenotoencontradoassimadisciplina intelectual. Muito diferente da disciplina da obedincia pura e simples da ordem, da lei, ou da autoridade competente que elementar e pura execuo, desde que entendida a disciplina intelectual muito mais do que isso, a adeso integral deciso tomada. Gustavo Moraes Rego Reis Ela tanto mais se caracteriza quanto mais o chefe estimula seus subordinados ao debate, aoquestionamentodassoluespossveis,dasvantagensedesvantagensdecadauma delas.Depois,adecisodochefe.Eisagoraavezdadisciplinaintelectual.Trata-se, ento, do empenho sincero, honesto, dedicado, fazendo a sua sem subterfgios deciso tomada.Nahoradodebate,napresenadoresponsvelpeladeciso,todosos questionamentos so acatados, defendidos com calor e veemncia. No fcil. Defender adecisoquefoitomadacomosefossesua,exigeumagrandeintegridadee honestidade intelectual. a adeso, no apenas a simples obedincia. No decorrer dos trsanosemqueassessorouopresidenteCastelo,ogeneralGeiselfoiexemplar,em todas as circunstncias. Antes de levar um problema a Castelo, Geisel discutia o assunto com dois ou trs oficiais do Gabinete Militar. Expunha tambm as suas idias, o que nos levavaapercebersuaposio.Apsadecisodopresidente,nicoresponsvel,no raro at contrariamente ao pensamento de Geisel, que em no poucos assuntos era mais conhecedor,elenodeixavamaisningumquestionaradeciso,muitomenospara lembrar-lhesuaposioanterior.Eraverdadeiramentemodelar,engajava-seafundo, exigiaempenhototalparaqueodecididoproporcionasseoresultadoalmejado.Pela personalidadedosdois,foiemverdadeumextraordinrioexemplodedisciplina intelectual no que diz respeito a Geisel. No caso de Golberi, junte-se a esse destacado atributoanotvelcapacidadedeapresentaraopresidenteCastelosuasinformaese avaliaes absolutamente isentas de juzo pessoal. Muito poucas pessoas tinham acesso aGeisel,salvoseusfamiliareseunspoucosamigosantigos.Discreto,retrado, concentrado,concisoedepoucaspalavras,notratocordial,lhanoecuidadosono externardesuasopiniesejuzos.Ultrapassadaaeventualbarreiradacerimnia,no cursodasrelaesdeservio,acessvel,compreensivo,atento,abertoaodilogo, paciente para ouvir e generoso em seus sentimentos. Amigo de seus amigos. objetivo e pragmtico. M.A. - E a origem da linha dura? O senhor pode falar alguma coisa? G.R.-Aorigemdadenominaoeunoconheo.Casoqueseusprprios componentes,melhordizendo,aquelesassimidentificadosequedissoseorgulhavam, caracterizavam-sepeloradicalismo,arbitrariedade,intransignciaepelaadoode meioseprocessosviolentosdeintimidaoecoao.Sinceros,pormradicais,como bemcaracterizouopresidenteGeisel.Porm,nemsempreenemtodossinceros.Os Gustavo Moraes Rego Reis linha dura no chegaram a constituir organizaes estveis, segmentos ordenados ou estruturasmaisoumenoshierarquizadas.Aocontrrio,tumultuadaspordisputas menoresdevedetismonosIPMsenasquerelascomrgosdoJudicirioecomo prpriogoverno,alimentadaspelooportunismo,pelocarreirismoepelaimpunidade, noencontravammaioresobjeesnemmesmoentreossincerospormradicais, mesmoreconhecendoomalquecausaramnapoca.Creioqueoradicalismo anticomunistafoihistoricamentealimentadonoBrasilpelaincompetnciadonosso Partido Comunista, pela animadverso inarredvel votada ao getulismo, ao juscelinismo e ao janguismo, por correntes minoritrias de cunho revanchista com o rano udenista, estimuladas pelo lacerdismo incendirio e inconseqente, ambicioso e frustrado em seus dioserecalques.Junte-seaissoasambiespessoais.Assimqueahierarquiafoi, no raro, atropelada pela exaltao e sofreguido revolucionria, com estragos quase sempre graves e conseqncias insanveis ou de longa repercusso. M.A. - O senhor poderia dizer quem era o pessoal da linha dura? G.R. - No sei a origem da expresso linha dura; muito possivelmente deve ter sido cunhadaporseuselementosmaisnotrios,enemporissomaisexpressivose respeitados.Ocoronel-professordoColgioMilitarOsneliMartinelieocoronel-intendenteGersondePinaencarregadosrespectivamentedosIPMsdoGrupodos OnzedeBrizolaedoInstitutoSuperiordeEstudosBrasileiros,ISEButilizaram-se dos encargos para se autopromoverem atravs da imprensa e de atos de arbtrio de toda ordem,atmesmocriandoimpassesmuitosrioscomoPoderJudicirio.Emmeados de1965umaLigaDemocrticaRadicalLider,lanouummanifestodeMartineli que classificava Castelo como nada mais do que um delegado do Comando Supremo da revoluo. Martineli foi preso por 30 dias no Forte de Copacabana onde recebeu as visitasdogovernadorCarlosLacerdaedocoronelGersondePina.Ocoronel Ferdinando de Carvalho, que foi encarregado do IPM sobre o Partido Comunista onde pretendiaincriminarNegrodeLima,candidatoeleitogovernadordaGuanabara. Coronel-aviadorJulioValente,coronel-aviadorRobertoHiplito,brigadeiroRoberto Brandini,JooPauloBurnier,MrcioCoqueirodeJesus,osdoisltimosdaFAB.E ainda, coronis Luis Araripe, Euclides de Oliveira Figueiredo Filho, Sebastio Chaves, Hlio Ibiapina de Lima, Adir Fiza de Castro, Sebastio Jos Ramos de Castro, Csar Montagna de Sousa, Erasmo Dias, Osvaldo Ferraro, Confcio Danton de Paula Avelino, Gustavo Moraes Rego Reis JoaquimVitorinoPortelaAlves,AugustoCidCamargoOzrio,CabralRibeiroque chegouaministrodoSTM,ConfcioPamplona,AmerinoRaposoFilho,Antonio CarloseLuisGonzagaAndradaSerpa,HlioLemos,HlioMendes,RuideCastro, PlnioPitaluga,ValterPires,FlorimarCampelo,AntonioBandeira,HeitorCaracas Linhareseocoronel-aviadorGustavoBorges,osdoisltimosligadosaLacerda.Na Marinha,almdoscincoalmirantesconhecidosportodospelaintransignciaepelo radicalismo em suas posies Melo Batista, Levi Pena Aaro Reis, Rademaker, Mrio Cavalcanti e Saldanha da Gama, todos na ativa havia tambm os almirantes da reserva PenaBoto,SilvioHeckeoscomandantesBaltasardaSilveira,DuarteBonoso, Chamoun e outros. Exacerbavam o radicalismo com um deformado esprito de corpo, uminarredvelpreconceitocontraasduasoutrasForaseemparticularcontrao Exrcito,portradiesquasehistricasqueadvmdaRepblica.Sobesseaspectoo clmaxfoiatingidoporocasiodadecisodopresidenteCastelo,emjaneirode1965, relativamente aviao embarcada e seu emprego nas operaes navais. Do dia 14 de dezembrode1964a18dejaneirode1965,opresidenteCastelo,comextraordinria autoridadeecompetncia,substituiusucessivamentedoisministrosdaAeronutica LavanreeMrciodeMeloeSousa,esteltimocaracterizadamentelinhadurana FAB chegando afinal ao brigadeiro Eduardo Gomes. E na Marinha, com repercusso muitomaisgrave,substituiuoalmiranteMeloBatistaeochefedoestado-maior da Armada, o almirante Levi Aaro Reis, alm de reagir ao esdrxulo propsito levantado porMeloBatistadequenenhumalmirantedaativaaceitariaadecisopresidencial. Castelo, no se expondo desfeita, nomeou o almirante reformado Paulo Bossio, que com notvel autoridade implantou operacionalmente a unidade area da FAB no porta-avies Minas Gerais. A 28 de janeiro um helicptero da Marinha conduzia o presidente eogeneralGeiselepousavaemalto-marnoconvsdoMinasGerais.Eregressaram separados, em aviesde operaes da FAB que decolaram do navio-aerdromo. Mas a MarinhaeaAeronuticanotiveramgrandezaparareconheceracertodessadeciso, louvadapordiversoschefesnavaisestrangeirosemocasiesqueassistiramsua eficincia,decisoquejamaisprovocouumacidentesequer.MasaMarinhatanto quantoaAeronuticanotiveramgrandezaparareconheceroacertodadeciso.De meumodestopontodevistafoiestaaconsagraomilitardogeneralCasteloBranco. Costa e Silva e Mdici no a alteraram. Gustavo Moraes Rego Reis M.A. - J que estamos falando em grupos, e o grupo dos 11 generais? E os sete coronis mais atuantes da linha dura? G.R. - Vejam bem. Tal como as Dionnes, tratava-se apenas de recursos mnemnicos, refernciasnumricasqueeventualmentecoincidiamcomoutrosfatosmarcantese populares. Assim, grupo dos onze era uma simples e jocosa associao com o Grupo dosOnzedeBrizola.CreioquefoiogeneralBarrosNunes,amigodelestodose freqentadorassduodogeneralGolberi,quandonoRio,queminventouapilhria. Casoqueeramdefato11osgeneraismaisatuantesemaiscrticosdapolticade Castelo.AssimquecedopassaramaempolgaroprestgiodeCostaeSilva, envolvendo-oealimentandosuasaspiraes,easdelestambm.Erameles:Sizeno Sarmento,SlvioFrota,RamiroTavaresGonalves,ArthurDuarteCandal,Afonsode AlbuquerqueLima,EdnardoDvilaMelo,OscarLuisdaSilva,JosAnchietaPaes, Henrique Assuno Cardoso, Clovis Brasil, Joo Dutra de Castilho. Todos serviam no RioouSoPaulo.Portela,aindacoronel,chefedoGabinetedoministroemBraslia, fazia as ligaes com o Congresso a favor da candidatura. Com o afastamento de Costa e Silva do ministrio para descompatibilizar-se, assumiu o marechal Ademar de Queirs e nomeouseu chefe de gabinete o general Oscar Lus que comandava uma Diviso de CavalarianoSul.QuandoCostaeSilvaassumiu,os11forampremiados.Candalna Petrobras, Afonso Albuquerque Lima no Ministrio do Interior, Frota chefe de Gabinete do ministro do Exrcito Lira Tavares, Sizeno comandante da 1 Regio Militar, Ramiro naSecretariadoExrcito,ClovisBrasilnomeadointerventornacidadedeSantos, Castilhocomandantedospra-quedistas,eassimpordiante.Portela,jpromovidoa general,foinomeadochefedoGabineteMilitardeCostaeSilva,emBraslia.Mas vejam, as nomeaes eram legtimas, havia apenas a coincidncia. M.A. - E o grupo dos sete? Quem eram os coronis? G.R. - A no havia razo para uma ligao mnemnica. Sete porque eram sete.Meus colegasecontemporneosdeEscolaMilitar.Todosmuitobons.OBoaventura,irmo dodeputadoecoronelCostaCavalcanti,destacava-sepeloespritodeiniciativa, inteligncia,capacidadeintelectualecompetnciaprofissional.Maseraumobstinado quenoconsideravaasconseqnciasdeseusatos.Comojdisse,encontrei-ono palcio do Planalto nos primeiros dias de abril de 1964. Dos quatro que l se achavam o Gustavo Moraes Rego Reis Boaventura foi o ltimo mantido pelo general Geisel, com a anuncia de Castelo. Durou pouco,porm.Doismesesdepois,inconformadocomumacrticapublicadaemO Globosobreosrumosdarevoluo,Boaventurarespondeemcartaabertaemcarter individual,contrariandofrontalmenteasnormasdedisciplina.Emconseqncia,foi exonerado do Gabinete Militar. Talvez esse episdio tenha sido a motivao para surgir oncleodosseteoficiaisqueseprojetariamcomoporta-vozesdalinhadura.No sendo sabidamente os mais intolerantes e, muito menos, os mais arbitrrios e violentos. Boaventura,emnovembrode1965,emcartaabertaaopresidenteCastelo,sedizia porta-voz da linha dura e nessa condio declarava a disposio das foras armadas, lembrandoaopresidenteasresponsabilidadesdalinhadura,etc.Eramos democratascontraosresultadosdaseleiesdiretasparagovernadores.Afinal,em maio de 1969, foi o coronel Boaventura transferido para a reserva pela aplicao do AI-5, com o ineditismo de fundamentar o ato considerando desprimoroso, hostil e que feria a honra e a dignidade do oficial. Uma indignidade irreparvel. M.A. - Mas eles participavam da cadeia de comando? Como atuavam? G.R.-Elesnosecontentavamemcooperarnonvelenoescaloqueocupavam, aceitando e acreditando na competncia. Inclusive nesse problema da radicalizao dos IPMsderammuitotrabalho.AlgunsdelesatforamaogabinetedoCostaeSilva, ficaramabanandoacandidaturadoCostaeSilvacomosgeneraismaisprximos. Comearam a alimentar um processo de rivalidades, uma arregimentao de ressentidos e desencantados, visando sempre incutir desconfiana entre Costa e Silva e Castelo. Acho que o Costa e Silva inicialmente era alheio. Esse pessoal que trabalhou a candidatura dele. Quando o Costa e Silva esboou o ministrio dele, esses coronis, na casadoAmerindo,sabatinaramosministros.OAndreazzavaiseroministrodos Transportes, ele era assistente-secretrio do Costa e Silva. O Andreazza foi sabatinado por eles e tolerou ser sabatinado: O que que voc vai fazer, o que no vai. E assim o Hlio Beltro, o Costa Cavalcanti, e outros. At que o Delfim Neto deixou vazar aquele procedimento. M.A.- Esse grupos dos sete e dos 11 se formaram na conspirao para a Revoluo de 64 ou depois da revoluo? Gustavo Moraes Rego Reis G.R. - O general Hugo Abreu, em seu livro, citando nomes de companheiros, confessa-se conspirador desde 1950. Assim, o processo de adeso foi fruto do quadro em curso. A comearam as aspiraes, as pretenses sobre o ritmo e o encaminhamento que eles achavam que a revoluo devia ter. Mas deveficar presente que a reao indisciplina era comum e constante. M.A. - Qual era o projeto desses militares? G.R. - Nenhum. Porque a revoluo no tinha projeto. pura verdade, sem dvida. A revoluofoifeitasimplesmenteparaevitarqueoJangofizesseoquequeriafazer. Tanto que houve inicialmente muita tendncia para a colocao de que era uma contra-revoluodoJango.Eraumacontra-revoluo.Ento,aausnciadeumareaodo governo,afaltadeumaideologiaedeumprojeto,inicialmentedeixaramtodos perplexos.Todos!DepoisdapossedoCastelo,oRobertoCamposeoBulhes esboaram um plano de combate inflao, crise cambial, recuo do desenvolvimento. G.S. - O que parece, corrija-me se estou errado, que s depois comeou a aparecer um projeto baseado na ESG, na idia de desenvolvimento e segurana, aquele binmio, etc.

G.R.-RobertoCamposeraconsideradomuitoligadoaogovernoJuscelinoeaodo prprioJangoemuitosuspeitoemrelaoaosamericanosesuasposiesditas entreguistas. Assim tambm o Juarez Tvora e o Bulhes. O gravssimo problema a enfrentareraainflao.AESGinicialmentenoinfluenciou.Obinmio desenvolvimento e segurana alis, desde aquela poca sugeri ao presidente associar semprequelasduasidiasasdeprogressoeordem,comoumacontinuidade republicana,masficousasugesto,obinmiofoiadotadojustamenteporfaltade uma ideologia realmente original. G.S.-Entosdepoisquecomeouaapareceralgumacoisacomoumesboo de projeto? G.R. - Sim. Ali, na falta de um projeto... Basicamente, no Brasil, um projeto tem que olhar a parte econmica e social. A revoluo no pensava nisso, a revoluo pensava em deter o comunismo desse pessoal, a caracterstica comum era o anticomunismo. No Gustavo Moraes Rego Reis tinha nada de social nem de econmico, era o anticomunismo, era a posio exacerbada deles, era ideolgica tambm. Isso realmente deu coeso s foras armadas quando ns sentimosoprocessosubversivoatingirosargento,asnossasunidades,asnossas organizaes.AMarinha,porexemplo,entrounumacriseque...AMarinhatemtrs, quatro oficiais dentro de um navio pequeno para 20 ou mais marinheiros e outros. Num processo desses subversivo, a Marinha entrou em pnico. Houve uma ocasio em que os 27 almirantes se recusavam a receber qualquer comisso, qualquer funo. Foi quando o Jango nomeou o almirante reformado Paulo Mrio da Cunha Rodrigues. M.A.-Bom.Osenhorestdizendoqueoprojetodessaspessoasmaisradicaiserao anticomunismo? G.R. - No era projeto. Era uma posio que lhes dava maior ou menor coeso. Alis os ltimos e talvez nicos propsitos e princpios que asseguravam a nossa coeso eram os da preservao da disciplina e da hierarquia nas foras armadas e da paz social face s ameaasiminentesdaaosubversivacomunista.Esteeraumfatoincontestvel. Nessas posies os radicais e intolerantes naturalmente se evidenciavam. G.S.-Umacoisaqueeuestavaquerendoentenderaseguinte:quandonsfalamos, porexemplo,dentrodeumadisciplinaacadmica,quefulanodeumadeterminada escola, normalmente se pode traar como esse pesquisador passou a ser daquela escola estudou na Inglaterra ou tal lugar, onde essa escola dominante, etc. No caso particular doExrcito,comoqueogrupodosseteeogrupodos11chegaramase diferenciardogrossodaoficialidade,nosentidodeassumirposiesradicais?Oque ter influenciado? O senhor tem alguma idia a respeito disso? G.R. - Carlos Lacerda declarou em certa ocasio que a carreira militar era a nica que proporcionavaumaformaoverdadeiramenteuniversitria,nosentidodequenossos sucessivos cursos, cada vez abrangentes e compulsrios, nos facultavam o domnio de umuniversocadavezmaisamplo.Issoquandonoestavaaindageneralizadoo sistemadecursosdeps-graduaomestradoedoutoradotalcomohoje.Masa nossaformaohomogneaesistemticaformao,aperfeioamento, especializao,estado-maioreeventualmenteSuperiordeGuerra.Naturalmenteos Gustavo Moraes Rego Reis currculosevoluem,masnochegamadiferenciarsobesseaspectoqueosenhor aborda. A sua indagao porm, leva a considerar, em pocas mais remotas, as grandes reformasdoMarechalHermesem1905,sobinflunciaalem,aMissoFrancesaa partirde1919eoimportantepapeldesempenhadopelarevistaADefesaNacional na modernizao do Exrcito. Mas na dcada de 60, o Exrcito estava relativamente bem equipadoeassistido,salvoocrnicoproblemadosvencimentos.Nossaformao era homogneaenossasconcepesmilitaresadequadasrealidadebrasileira.Aqueles gruposnotinhamexpressodopontodevistaprofissional.Eramatitudespolticas isoladasedepenetraomuitorestritaat1964,quando,porforadosconflitos hierrquicosconseqentesdoprocessorevolucionrio,passaramelesaposiesde relevo espordico. G.S. - Mas a partir de 1964 esses grupos chegaram a constituir uma escola, para usar uma expresso acadmica? G.R.-AgrandeescolaquedaestruturaprofissionaleintelectualdoExrcitoa Escola de Comando e Estado-Maior do ExrcitoECEME. So trs anos de integral dedicao e estreita convivncia de oficiais de todas as quatro armas. Quanto aos grupos demilitaresaquemereferi,seuscomponentesnosediferenciaram;iguaisaeles,a gente pode citar carradas de nomes. Eles no eram expoentes, no eram nicos. O que ocorreuque,eventualmente,elesestavamaindaemposiesaquinoRio,ecomea que o Rio era o Rio, ningum faz revoluo sem o Rio de Janeiro. Todos serviam aqui. No fim do governo do Castelo, o Frota comandava a Diviso Blindada, que era a fora mais operacional e equipada, a fora mais forte aqui no Rio. Ento, cada um deles tinha uma posio de destaque e de relevo, tinha influncia, e tinha os comandantes, tinha os subordinados. A revoluo mudou todos os comandantes de unidades aqui no Rio que erammaisfavorveisouligadosaogovernodoJango.Osnovoscomandantesforam todosescolhidosporessesgeneraisquecomandavama.Sizenoerachefedogabinete do Costa e Silva... Ento, no que eles s se destacassem; que eles, eventualmente, serviamaquieeramrealmentemaisradicais.Mastinhamuitos,noeraums.Esses sete tambm se destacaram, e talvez eu os conhecesse mais. O importante disso tudo que nenhum deles se aproveitou... Depois exerceram cargos legtimos, que atendiam a umaaspiraolegtima.Umgeneraldesses,oCandal,iaserministrodas Gustavo Moraes Rego Reis Comunicaes. Na ltima hora, o Lus Viana, que j era governador da Bahia, escreveu umacartamelosaalegandoquenuncatinhahavidoumministrioquetivesseum ministrobaiano,noseioqu,eoCostaeSilvatirouoCandaleaproveitouum professor da Bahia indicado pelo Lus Viana, e Candal foi para a Petrobras. Mas foi um bompresidentedaPetrobras,muitoqualificado,muitocompetente.Joministrodas Comunicaes, afilhado do Lus Viana, era sem qualquer expresso para um ministrio que estava sendo implantado. M.A.-Essegrupo,almdeanticomunista,tinhaumavisonacionalistaeestatizante, no tinha? G.R.Ah,tinha...OgeneralAfonsoAlbuquerqueLima,emboracompletamente afastadodoscomuno-nacionalistasquehaviamagitadooClubeMilitarnosidosde 1950,lideradospelogeneralEstillacLeal,eradeumnacionalismoradical,eassim procuravapolarizarosanseiosdalinhaduraesensibilizarosoficiaismaisjovense maisardentesnabuscadesoluesrpidas,emboraarbitrrias.Decertamaneira arvorava-secomoseulderjuntoaosjovens.OgeneralHugoAbreu,emseulivro TempodeCrise,confessaquedesde1950tinhaparticipaopessoalnalutapoltica internadopas,quevoltaemeiaenvolviaasforasarmadaseemoutubrode1961 participavadeumgrupodeoficiaisconspiradores,desde1954naEscoladeEstado-Maior,entreeles:IvandeSousaMendes,AmerinoRaposo,AdolfoDieguez,Jarbas Passarinho e Vilar de Aquino. G.S. - O desfecho em 1964 poderia ter sido diferente? G.R.-FosseoutraadisposiodopresidenteGoulart,avontadederesistir,a capacidademnimadeconduzirosacontecimentos.Oschefes,osgeneraise comandantes de unidades que no Rio constituam o chamado dispositivo militar, no tinham firmes convices a respeito de suas posies polticas. verdadeque se Jango estava prisioneiro de seu dispositivo sindical-militar, caso levasse a efeito uma reao comosradicaisdeesquerdaficariaprisioneirodonovodispositivo.Faltavaaele vontade poltica para superar a crise.O Jango foi vtima, de um lado, da desinformao e dos maus conselheiros, por inapetncia e por incompetncia. Ao general Assis Brasil, eu no o conheci, faltou o conhecimento antecipado e oportuno. Era uma inteligncia no Gustavo Moraes Rego Reis Exrcito,masoqueaconteceucomoJango,80%foisuaculpa.Errosgravesde avaliao da situao e descaso, na condio de chefe do Gabinete Militar e secretrio-geraldoCSN.Tantoquantoosministrosmilitarescompletamenteomissose desinformados. G.S. - Ou seja, ele no passou ao Jango as informaes? G.R. - Muito pior! Ele no sabia! O Gabinete Militar no sabia de nada. Nada. O Jango alegou muitas vezes que no podia trair aqueles que tinham sempre ficado do lado dele, queeramossindicatos,omovimentodeesquerda.Aquilotudoeramanipulado.No haviasinceridadeefaltavaprincipalmentevontadeparacomandarumareao,uma liderana realmente capaz, eficiente. O cabo Anselmo, na Marinha, at hoje no se sabe quemera.Seeraumagenteduplo...Umarevoluoprecisadeduascoisas:climae vontade.Imaginando-sequefosseumagrandeaodeesquerda,umarevoluodo governo,umgolpedelescomotudoindicavaquefosse,umacoisadetalgravidade precisaria ter um clima muito evidente e uma vontade, tanto de um como de outro lado, consolidadanumaliderana.Quemexpressaemltimainstnciaavontadea liderana.Nohavendoissonohrevoluo.Atendnciasemprealegalidade, aceitararegradojogo,aceitarumasituaoquepodeterlseuspercalos,masa tendncianorevoluo.Osconspiradoressonecessrioseimportantes,masno fazem uma revoluo sozinhos, muito menos podem depois conduzi-la. M.A. - O senhor tem enfatizado a violncia pessoal que foi para o senhor ter que ficar doladodasuacorporaoeconseqentementecontraogoverno,queaquema corporao devia obedincia, no ? G.R.-Vejamumasituaocompletamentediferente.Em1984,nasucessode Figueiredo. Eu j estava na reserva h mais de trs anos. Trabalhava na diretoria de uma pequena empresa de projetos de minerao e engenharia a Paulo Abib Engenharia comummodestoescritrioemBraslia.Aindatinhamuitasrelaescomovice-presidente Aureliano Chaves e com polticos como Marco Maciel, Bornhausen, Severo Gomes,Sarney,NeiBragaeAfonsoCamargo,quemeprocuravamconstantemente, dadas as minhas relaes com o general Geisel, com quem estava semanalmente no Rio, no escritrio da Norquisa. Viajava toda semana para So Paulo e em seguida para o Rio. Gustavo Moraes Rego Reis Assim participei ativamente dos entendimentos que redundaram na fixao do nome do Tancredoe,principalmente,suaaceitaopeloex-presidenteGeisel.Tudosclaras. Citei esse fato para que comparem. Em 1984 eu j estava na reserva, tratava-se de um problemadenaturezapolticadeimportnciacapital,cujodesdobramentovisava primordialmenteoafastamentodefinitivodosmilitaresedeumcandidatomilitar Medeiros,Andreazza,CostaCavalcantiouoprprioFigueiredoreeleito.Assinei inclusiveoprimeirodocumentodefundaodaFrenteLiberal.Tudosclaras.Sem conspirao. Evidentemente jogo poltico, mais nada. M.A. - O Newton Cruz estava num desses grupos dos 11 ou dos sete? G.R.-Curiosamente,no.Aocontrrio,eledecertaformaacompanhavaos movimentos desses grupos. Newton era tenente-coronel, junto com Figueiredo, instrutor da Escola de Estado-Maior nos dias da revoluo. Foram em seguida os fundadores da Agncia-RiodoSNIemumdosandaresdoantigoMinistriodaFazenda.Seu radicalismo veio aflorar no prprio SNI, particularmente em 1969 e depois. G.S.-Desses,quaisaindaestovivos,equaisosenhorachaquenspoderamos entrevistar? Tanto dos 11 quanto dos sete. G.R. - Os generais ainda vivos esto beirando os 80. Os coronis, como eu, acima de 70. No creio que tenham muito interesse em relembrar. Talvez... G.S.-Alis,euvoulhefazerumaperguntapessoal:comoqueosenhortema memria que tem? Eu tenho dez anos menos e j estou perdendo a minha... G.R. - Memriasinaldevelhice... mas os livros tm muita coisa certa. Isso a, acho queporqueeuviviintensamenteminhaprofissoeconvivicommuitaspessoasde personalidade marcante, que de certa maneira eram protagonistas da Histria. Eu tenho cuidado, porque no quero faltar com a verdade. Guardava muitos recortes de jornais e revistas e lia tudo o que era e ainda publicado a respeito. Essa revoluo me marcou demais, e foi uma inciso. Eu vivia aqui no Rio sozinho no QG de Grande-Unidade, o QGerapequeno,masmuitoimportanteenotinhaningumpensandocomoeu, ningumcomquemeupudessemeabrir.Eupodiaatacabarmalldentrodo Gustavo Moraes Rego Reis MinistriodoExrcito.Tomarumaposiocontraogovernosemhipocrisiasesem traies,foiumproblemamuitodifcil.Nopelasconseqncias,maspelacerteza moral do acerto de minha deciso. G.S. - Certamente, para vrias pessoas como o senhor foi muito penoso. G.R.-Muito,muitopenoso.Semquererentrarnoproblema,masumgoverno,seele no...ocasodoJango.Euatreleiosvezesaqueleepisdio,aquelecomcioda Central. Eu estava a cem metros do palanque do Jango, ali em frente central. Se Jango notivessecomparecidoefoiditovriasvezesaele,insistiramcomele,ogeneral KrueldeSoPauloinsistiucomele,maselefoisemreao,compelidopelas circunstncias. Uma declarao do Jango anticomunista, um chamamento disciplina e contraasubversoeaindisciplina,quejseinstalavanasforasarmadas,teria proteladoporalgumtempo.Algunscomandosfracoseincapazesdereagir comunizao poderiam ter sido substitudos. Em suma, a incompetncia foi muitssimo maiordoqueaprpriasubverso.Provaquenoforamcapazesdedefenderum governo sem dvida legal, a despeito de questionvel quanto a seus propsitos e feio ideolgicareconhecidamentedeesquerda.Masgovernogoverno,scaisefor inteiramente incapaz. A falncia do governo de Jango foi sua ltima linha de defesa, foi o to decantado dispositivo militar do general Assis Brasil. M.A. -Masgeneral, no incio do governo Castelo Branco a gente tem informaes de muitas prises no Nordeste e de muita violncia tambm, principalmente em Recife. O senhor conhece isso? G.R.-Sim.Nsfomosl.EufuicomogeneralGeisel.Nessaocasioascoisasque aconteciamerammaishumilhaesdoqueperversidadesemaldadesfsicas.Fizeram GregrioBezerradesfilaracorrentadoaumjipe.Issoumahumilhao,uma barbaridade! Houve uma acusao muito grave naquela ocasio na Cmara e no Senado contraopresidenteCastelo.Opresidente,ento,mandouqueogeneralGeisel percorresse todos os lugares em que tivesse acusao. Eu fui com ele. Eu e um coronel do SNI, o Hlio Mendes.Fomos a Fernando de Noronha, falamos com Arrais. Lgico queelesestavampresos,presosnumlugarconfinado.Masnohaviaperversidade, Gustavo Moraes Rego Reis maldade!EstivemosemSoPaulo,emtodosesseslugares.Falaramvontadecomo general Geisel. O general depois apresentou seu relato a Castelo. Maistardeasinformaesdele,semasconhecerem,foramcontestadasna imprensaenoCongresso.MinistrodoSuperiorTribunalMilitar,defendeu-sedas acusaesperanteseusparesnoSTMenoCongressoporintermdiodeumsenador, oferecendoaversocorretadasinformaesprestadasaopresidenteCastelo.Ainda hoje,agora,emplenoEstadodeDireito,nosomenteaquinoRio,masnoBrasil,no mundo,diariamenteaimprensadivulgaatosdearbtrio,deviolnciaedemaldade, muitosemuitospermanecendoimpunes.Vejamagoranumclimarevolucionrio,de amplitude nacional como foi a Revoluo de 1964. Mesquinharias, recalques, vinganas pessoais, toda a misria humana. Era o preo. M.A. - No h dados precisos sobre a represso no governo Castelo Banco, nmero de prises, etc. J que o senhor foi averiguar in loco o que estava ocorrendo em termos de represso,poderianosdizerondeagenteachainformaosobreisso?Osenhortem documentos? O senhor fez relatrios sobre isso?

G.R. - No. Alm disso, essa coleta de dados, nmeros de presos etc, no era objetivo damissodogeneralGeisel.Oobjetivoeraobservaremquecondiesospresos estavam.Noerasaberquantospresoshavia.Eraapuraraverdadeiraextensode alegadosmaustratosaqueteriamsidosubmetidosospresospolticos.OMilton Campos dizia muito bem: Eu no tenho medo do presidente. Tenho medo do guarda do quarteiro,naadoodelegislaoarbitrriaesuacompreenso.Masogrande obstculoqueopresidenteCasteloencontravaeraaomisso,oconformismo,o comodismo, a tolerncia, para no dizer a timidez e at certos pavores e medo de muitos chefesresponsveisdeseremtachadosdeanti-revolucionrios.Noreprimiam,no coibiam,noenfrentavamasatitudesecomportamentosmaisradicaisquedepunham contra nossas instituies e que desafiavam o prprio presidente. Era, ento, ele prprio que tinha de responder s acusaes e desafios e determinar as providncias e punies quando fosse o caso. Da a impresso de que o radicalismo tinha uma amplitude muito maior do que tinhana realidade. O processo revolucionrio compromete gravemente a hierarquia e a disciplina. A violentao da lei e da ordem, o afrouxamento da disciplina eaconivnciamargemdahierarquia,expemchefesesubordinadosaumpenoso desgaste de difcil reparao. Os mais afoitos, os mais audazes, os mais ambiciosos, os Gustavo Moraes Rego Reis mais oportunistas e os mais incompetentes se recusam a voltar s suas antigas e corretas posiesessuasnormaiserotineirasatividades.Ganharamoutroritmo,outra dimenso e uma falsa notoriedade revolucionria. M.A. - E os endurecimentos? Os aparentes retrocessos? G.R.-Quandoseconseguiadardeterminadoandamento,caminharumpouconessa direo,derepentehaviaumadessascoisasinopinadaseosradicaisseenchiamde razo ou aparentemente se atribuam razo. Isso aconteceu inmeras vezes. Aquele livro doZuenirVenturamostraodesencontro.Inclusiveelesnosconheciamesabiamo esforoqueagenteestavafazendo,masnonosajudavam.Aocontrrio.Cada destemperodesses,nsandvamosparatrs.Davamchanceparaqueosradicais,que eram minoria, se adiantassem ou bloqueassem certas pretenses. Assim foi em outubro de1965comoAI-2,foiumaviolnciaterrvel.OuoCasteloassinavaaqueleatoou caa. O resultado das eleies de 1965, com a vitria da oposio em Minas com o Israel Pinheiro e no Rio com o Negro, irritaram profundamente a linha dura. M.A. - Mas quem tinha esse poder sobre Castelo? G.R. - No havia propriamente um poder sobre Castelo, este que dispunha de um poder consentido,questionveledisputadoemconseqnciadeestmulospolticos ambiciosos.Paracomear,ospolticosquenooajudaram.Navsperadoato,o CastelofoiparaopalciodaAlvoradaeeufiqueinopalciodoPlanaltocomuma datilgrafa e com o ato institucional na mquina. O ato tinha sido redigido por Neemias Gueiros,jurista,eporJuraci,Cordeiroeoutros.Redigiram,foramemboraeme deixaram com o rascunho para datilografar. Eu era ento assistente-secretrio do general Geisel. Castelo enviara um projeto ao Congresso procurando contemporizar a repetio deoutraderrotaeleitoral,masosadeptosdeambiespresidenciaisdoCostaeSilva, polticos que apoiavam as modificaes para eleies indiretas e outras que atendessem suasambies,queriamaderrotadoprojetodogoverno.Fiqueiemcontatocoma Cmara e com ele at que o general Cordeiro, que estava no Congresso, informou que noiapassar,tinhasidoderrotado.AviseiaoCastelo.Nodiaseguinte,houvea cerimnia do Ato. A falta total de sensibilidade poltica da oposio levava a impasses Gustavo Moraes Rego Reis deenfrentamentodogovernocomalinhadurainclusivecontandocoma participao de polticos radicais ditos governistas. M.A. - O senhor disse que o AI-2 veio por presso dos prprios polticos? G.R. - A derrota eleitoral em Minas e no Rio foi extraordinariamente explorada pelos polticos ligados a Lacerda e Magalhes Pinto. A linha dura aproveitou os bajuladores dos radicais, tambm radicais como eles, interesseiros, as vivandeiras como Castelo osdenominava,asmulheresquecercavamastropasdeNapoleo,eraaalusopouco lisonjeira, mas muito usada por Castelo. M.A. - E o Costa e Silva, como reagia? G.R.-OCostaeSilva,eleprprionochegavaaliderar,maseradessasfigurasque empolgavapelacapacidadedeficarfrentedosacontecimentossemquechegasse necessariamenteaprovoc-los.Naminhaobservao,CostaeSilvatinhaumnotvel sensodeoportunismo.Sabiabuscaroseulugarnumacrise.Enotinhamedo.No tinha tradio no Exrcito nem mesmo em sua arma, a Infantaria. Foi adido militar na Argentina entre 1945 e 19476, ainda coronel. Como general de diviso, comandou a 2 Regio Militar em So Paulo, durante o primeiro governo Ademarde Barros7; general de Exrcito, comandou o IV Exrcito, no Nordeste, antecedendo a Castelo. Em 1964 era diretordeObraseFortificaes,noRio.Todososcargosexercidossemqualquer significado maior. Sem marcar sua passagem profissionalmente na organizao militar.QuandofoiparaoRio,em1962,CostaeSilvajestavaacomodado,notinhagosto nem interesse. Era comodista sim. No era de fazer fora, muito menos de se dedicar. Nodemonstravagosto,empenhopelocomando.Contudo,eracapazdesecolocar frente de um acontecimento e empolgar pela iniciativa. Foi meu comandante, assim, na EscoladeMoto-Mecanizao,emDeodoro,deoutubrode1944amarode1945;era tenente coronel. J em 1965, aps o episdio de manobra de Itapeva em So Paulo, com a crise provocada por seu destempero verbal, ele ficou mais contido. 6 Costa e Silva foi adido militar junto embaixada do Brasil em Buenos Aires de janeiro de 1950 a maio de 1952. 7 O primeiro governo de Ademar de Barros foi de 1947 a 1951, e Costa e Silva comandou a 2a Regio Militar em So Paulo no ano de 1955. Gustavo Moraes Rego Reis M.A.-Castelonotinhacondiesdereagir?AforamilitardeCostaeSilvaera maior, mais atuante? G.R. - O Castelo sempre teve excessivo cuidado em no dividir o Exrcito. Sempre. A prpriacandidaturadoCostaeSilvafoifrutodisso.Foivitoriosaparanodividiro Exrcito.SeCastelotivesseempolgadooExrcito,seriadiferente.Geisel,comono tinhareceiodedividiroExrcito,nochegouaenfrentaresseproblema.Masns podamos ter chegado a uma diviso. Ns somos unidos obedecendo. Ningum obedece a liderana, a gente s obedece o comandante. Ou comandante e a gente obedece e no discute, ou lder, e a gente discute. O Castelo exerceu a presidncia da Repblica, mas tinhaumaautoridadeconsentida,talcomoosqueoseguiram.Eletalvezmais questionadopelofatodetersidooprimeiro.Seno,nohaviaessequestionamento como houve. O perodo era de turbulncia. Era um perodo difcil e sua autoridade era contestada. Havia a legalidade, mas a legitimidade era questionvel. Sempre foi assim.

G.S. - Eu li dois livros recentemente a respeito do Costa e Silva. Um, do Carlos Chagas, no qual ele descreve o Costa e Silva como basicamente um prisioneiro da linha dura. Ouseja,comoalgumquetinhaasmelhoresintenesequequerianofimdoseu mandato uma nova constituio democrtica e no aquela dureza do AI-5, etc. Depois eu li o livro do Portela, no qual ele descreve o Costa e Silva como um lder e um lder de direita. G.R.-OCostaeramaisoqueoCarlosChagasdisse.OCostaeSilvafoioprimeiro aluno da sua turma no Colgio Militar, na frente do Castelo. Depois foi primeiro aluno de infantaria, na frente do Castelo, na Escola Militar. Tudo isso irrelevante. preciso queapessoatenhadepoisumadedicaoprofissionaleumempenhode aperfeioamento profissional que justifique isso. Um resultado acadmico importante, interessanteetemvalor,masanossaprofissoestcheiadeexcelentesalunosque foram pssimos professores, e quanto aos demais desempenhos... Sua candidatura, no digoquechegouaserimposta,masfoiumtrabalhodopessoaldalinhaduraque julgavaquepodiamanipul-lo.Junte-seaissoacerimniadeCastelocomCordeiro, com Juraci, com Roberto Campos. Uma indeciso. Queria o timo, segundo ele, e no conseguiu nem o bom. Muito escrpulo legalista. Eu dizia: Castelo queria fazer uma revoluodentrodalei.JGeisel,naquelapoca,queriaaleidentrodarevoluo. Gustavo Moraes Rego Reis Geiselaindatinhaoespritoderevolucionriode1930.Castelosempreforalegalista. Casteloconsideravaumaindignidadeopresidenteterumcandidatonobolsodo colete.Expressoantiga,pejorativa,masparaocandidato.Masacontecequeo presidente umchefepoltico,partidrio,ecomotaltemdeconduzirsuasucesso. Mais ainda num processo revolucionrio. O AI-2 e logo em seguida o AI-3 impediram quediversosmilitares,generaisecoronis,estimuladosporpolticos caso de Kruel em So Paulo, em ligao com os deputados da oposio Ulisses Guimares e Doutel de Andrade se candidatassem. M.A. - E o senhor est dizendo que o Ato 3, ao instituir as eleies indiretas, impediu que uma srie de generais tomasse esses postos de governo? G.R.-Jestavamprontos!EramKruelemSoPaulo,oJustinoemPortoAlegre, Murici em Pernambuco e um coronel para cada capital dessas, e por a afora. J estavam prontos. Foram impedidos pela exigncia moralizadora do domiclio eleitoral, posto que aseleiesparagovernadoresseriamindiretas,tudopeloAI-3deinciode1966, seguindo o AI-2. O domiclio eleitoral exigido era de 4 anos. M.A. - Mas estes nomes seriam escolhidos por quem? G.R.-Porinteresseebajulaodospolticosestaduaisedosrespectivosentourages. Tanto que houve uma reao grande, e h escritos sobre isso. Comandavam os exrcitos esesentirampreteridos.QuandooCasteloagiu,umadasrazesfoiessa,justamente. Porqueiamsetransformaremstrapas,aquelesgeneraisassrios.Cadaumtomava contadeumestado,iaserisso.EraoJustinonoRioGrande,oKruelemSoPaulo, Murici no Recife, por a afora. J tinha prefeito para Recife, j tinha prefeito para Porto Alegre.Agora,umavergonha,emuitospolticosafavorparapegaras sobras. Mas esses no aparecem nunca; apiam, estimulam... M.A. - Seriam feitas intervenes em cada estado? G.R. - No. No, a seriam eleies indiretas, pelas assemblias estaduais. M.A. - Movidas pelo pessoal mais radical, que queria fazer as suas revolues... Gustavo Moraes Rego Reis G.S. - Eles diziam que queriam eleger pessoas amigas, confiveis... G.R.-Nemtanto,eramesmoambiopessoal.LnoRecifeeraoAntnioBandeira, quequeriafazeroMurici.Eporaafora.Querdizer,asatrapiadecadageneral.Iam dandocorda,ejuntavam-seospolticosdecadaestado.Agora,umaspectoquenunca houvenocursotododarevoluofoioseparatismopodiahaverregionalismo,mas semqualquerespritoseparatista.Umadasminhaspaixesanossaintegridade nacional.Querdizer,houvemovimentosdevultocomoaRevoluoFarroupilha,a Confederao do Equador, a Cabanagem e quantas agitaram o perodo da Regncia e o 2 Imprio. Nada disso pode existir. Separar at as ltimas conseqncias, nunca. Uma coisamaravilhosanoBrasilanossaintegridadeterritorialeanossaintegrao nacional.So,semdvida,osmaisfortesesignificativosobjetivosnacionais permanentes.Estodentrodens.Detodosnsbrasileiros.Julgooportunoobservar que,adespeitodainquestionvelaversodosconstituintesde1988atudoaquiloque tivessealgumaemaisremotarelaocomaRevoluode1964ecomasprprias forasarmadase,emparticular,comaESG,nosartigos10e30daConstituiode 1988constamnosfundamentosenos princpiosobjetivosnacionaispermanentes comopreconizadospelaESG.Issojamaisseriaconseguido,nemmesmotentadopor nsem1964oumesmonasreformasconstitucionaisde1967e1969.Elesestol porquesoemverdadenacionaisepermanentes.Estoelesnaalmaenoespritode todos os brasileiros. So inseparveis do ser brasileiro, de sua identidade. G.S.-Agora,general,apropsitodisso,jexisteumgrupoquerendoformaruma repblica do Sul porque se sentem prejudicados na questo da representao. G.R. - No sei se vocs conhecem isto, mas a Veja ou a Isto fez uma enquete no Brasil inteiroesteano.UmaenquetenoBrasilinteiro,separandoporregies,fazendoum levantamento estatstico de quem queria se separar do Brasil. Ento,o Amazonas quer se separar, o Nordeste quer se separar, e o Sul sem a mais elementar noo geopoltica das nossas origens. Agora, essa questo da representao proporcional ao eleitorado ou populao, ningum define como pode ser feito de maneira diferente. O que tambm no justo que So Paulo tenha uma bancada de duzentos deputados e l o Nordeste no tenha, no ? Quer dizer, tem que ser uma coisa equilibrada. Agora, o grave disso, o Gustavo Moraes Rego Reis gravefoihojemearrependoprofundamenteteropinadoafavordaextinodos partidos polticos, muito embora eu no tivesse importncia alguma nem peso. Hoje ns teramos aqueles partidos como tradio, teriam superado a revoluo, teriam chegado at agora UDN, PSD, PTB, mal ou bem j teriam 20 anos. Ns acabamos tudo. Isso por causa de uma utopia do Castelo. O Castelo partiu do seguinte princpio: no h mais ningum contra a revoluo. Todo mundo a favor da revoluo. O Castelo dizia isso. Ento, ns vamos ter dois partidos, mas nenhum deles contra a revoluo. Tanto que o pessoal nosso foi para o MDB a pedido do Castelo. Amaral Peixoto e outros foram para o