cordel quilombola

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Cordel que debate os problemas enfrentados pelas comunidades quilombolas.

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Cárlisson Galdino nasceu em 1981 no município de Arapiraca, Alagoas, sendo Membro Efetivo da Academia Arapiraquense de Letras e Artes (ACALA) desde 2006, com a cadeira de número 37, do patrono João Ribeiro Lima.

Poeta, contista e romancista, possui um livro de poesias publicado em papel, além de dois romances, duas novelas, diversos

contos e poesias publicados na Internet, em seu sítio pessoal: http://www.carlissongaldino.com.br/.

Como cordelista, iniciou publicando o Cordel do Software Livre, que foi distribuído para divulgação dos ideais desse movimento social.

Bacharel em Ciência da Computação pela Universidade Federal de Alagoas, onde hoje trabalha, é defensor do Software Livre e mantém alguns projetos próprios. Presidente do GUSLA – Grupo de Usuários de Software Livre de Arapiraca.

Literatura de cordel é um tipo de poesia popular especialmente no Nordeste brasileiro. Tradição de Portugal, os livretos deste tipo de poesia eram vendidos em feiras, pendurados em barbante (ou cordel).

O Cordel Quilombola é escrito em sétimas (estrofe de sete versos com rima x-A-y-A-B-B-A) em redondilhas maiores (versos de sete sílabas poéticas).

Agradecimentos a muita gente que ajudou com o tema. Em especial, Ana Paula Moraes, que ajudou desde antes de o cordel ser escrito..

2011

Cordel Quilombola

Nossa história hoje começaMuito além, além do marNuma Terra tão antigaTerra de leão, jaguarElefantes e savanasÉ nas terras africanasQue tudo vai começar

Mas o que falo a seguirNão é em nada ilusãoEste cordel é de HistóriaNão fala de ficçãoLeia tudo até o finalEste problema é realE é causa de aflição

Mas chega dessa conversaVamos logo começarA história dessa vezPois não gosto de enrolarEis o Cordel QuilombolaTenha boa lida agoraQuem a ele se dedicar

Ó bravo povo africanoForte e livre em seu lugarSim, nem sempre havia pazMas sabia guerrearCom sua própria ciênciaSeus costumes, sua crençaE seu modo de falar

Faziam sua própria históriaAté vir um povo ufanoTrazido por águas turvasDesse inconstante oceanoCom sua própria ciênciaSeus costumes, sua crençaDiferentes do africano

Era esse o povo brancoDe bravos navegadoresOrgulhosos das proesasDe suas crenças, valoresQue cegos pela vaidadePerderam a humanidadeE empreenderam horrores

Para expandir seu impérioTêm que ter trabalhadoresOs mais baratos possíveisMas fortes como tratoresE na ganância da ideiaPlanejaram uma odisséiaDe um caos viraram atores

Estimulando o combateEntre tribos que eram amigasCompravam presos de guerraDas tribos que eram vencidasPartiam barcos ligeirosLevando um povo guerreiroPara lhes dar nova vida

Eram navios reforçadosOrgulho de um povo inteiroGuiado por homens mausDesses porcos traiçoeirosQue levavam os sequestradosNesses barcos lá chamadosPor eles navios negreiros

Nas colônias, povo negroCom seu passado gloriosoVirou escravo dos brancosExplorados até o ossoSem ter ninguém que os salveÓ que vida, Castro Alves!Ó que destino odioso!

Trabalhando nos engenhosComo fossem animaisQualquer erro ou cansaçoVinha logo o capatazSe do chicote servidoEra o mais leve castigoPois havia muitos mais

Se o senhor daquele engenhoGostasse de uma escravaLevava a seus aposentosE a agredia e estupravaSua família na senzalaVendo o capataz levá-laNão podiam fazer nada

Foi então que começaramA testar a própria sorteE fugir dessas fazendasNum grande risco de mortePor pura necessidadeMas a tal da liberdadeEra o desejo mais forte

Fugindo só não deu certoPodiam levar um tiroE se escapassem com vidaOnde iriam? Que retiro?Pois eram recuperadosE os castigos mais pesadosEram prêmio garantido

Começaram a se juntarTodo negro fujitivoNuma vila independentePara se manterem vivosQuilombos eram chamadosEsses lugares criadosA esperança dos cativos

Quilombos foram surgindoCombatidos com crueldadeOs senhores de escravosNão mostravam piedadeContra eles, que brigavamPois tudo o que desejavamEra ter a liberdade

Foi mesmo um grande caminhoPra acabar a escravidãoPor medo da InglaterraProibiram importaçãoPunindo o navio negreiroCapitão e o povo inteiroEnvolvido na infração

Pouco a pouco foi chegandoA liberdade sonhadaMas para isso foi precisoMuita luta e muita estradaMuito sangue correu o chãoMuitos mortos sem caixãoA disputa foi pesada

Os intelectuaisBrigavam lá no senadoEram os abolicionistasQue lutavam de bom gradoContra os colegas de láFaziam o que precisarPra libertar os escravos

Assim leis foram surgindoEm auxílio àquela genteFoi a Lei do Ventre LivreE outras vinham mais à frenteMesmo sendo complicadoCobrar que fosse aplicadoO que a Lei diz tão solene

A Lei Áurea foi, por fimA que abriu portas no céuLhes dando a liberdadeTudo justo no papelDecreta com precisãoO final da escravidãoPela Princesa Isabel

Assim o tempo passouTudo passa nessa vidaE o negro hoje é igualA vitória é conseguidaE sendo assim, desse jeitoA todos, iguais direitosA todos, igual medida

Claro que o pior passouMas e tudo o que foi feito?E a cultura violada?E os anos de preconceitoDesde um tempo mais distanteE ainda hoje está tão grande?Como está está direito?

Muitos negros hoje vivemNa luta, aqui, na marraNa nossa sociedadeCom orgulho e muita garraHonestidade e respeitoMesmo assim, há preconceitoEssa vida é uma barra

Outros ainda têm raízesNo passado, suas naçõesE se orgulham de manteremSeus valores, religiõesSeus costumes, seus assuntosE se agrupam, vivem juntosPra preservar tradições

São estas comunidadesQuilombolas conhecidasPor alguns, por outros nãoÉ onde eles levam a vidaDe artesanato e plantioHá várias pelo BrasilMas sua luta é sofrida

É desde oitenta e oitoPra reparar todo o erroCometido contra todosNo passado que o GovernoReconheceu de verdadeDiversas comunidadesQuilombolas nesse termo

É nesses "novos quilombos""Aceitos" pelo EstadoQue vivem os quilombolasMantendo vivo o passadoA cultura e o restanteTudo aquilo que é importanteNão dá pra deixar de lado

Mesmo a constituiçãoReconhecendo o direitoDessas tais comunidadesNem tudo saiu perfeitoÉ enorme o tormentoPra ter reconhecimentoDe uma terra desse jeito

Ainda são poucos terrenosQue estão legalizadosEsse "aceite" do GovernoNão é fácil nem folgadoDe todas as formas, tentamMas tanto problema enfrentamÉ um fim de mundo danado

O Governo tem a verbaPrópria pra auxiliarGente de comunidadesQuilombolas, sempre háMas tem que pedir primeiroFormalmente e o dinheiroParece nunca chegar

Pra completar esse quadroDe tanta dificuldadeAinda há certos doutoresQue vêm da UniversidadeCom projetos tão enormesRecolhem verba e se somemNada chega na verdade

Alguns ainda se aproveitamDa cultura popularDas pessoas quilombolasColhem plantas do lugarFalam com o povo localSobre o uso medicinalPra depois patentear

O que tem desses projetosBonitos, são quase um céuDe plantio, de benefíciosTudo lindo no papelVem a verba e, então, agoraTodo mundo vai emboraNem centavo no chapéu...

Pena que todos esquecemQue essas comunidadesCada uma é diferenteTem próprias necessidadesNão se pode assim tratarSempre a generalizarNão ajuda: eis a verdade

Parece que não notaramQue toda aquela genteSão pessoas, mesmo tendoUma cultura diferenteE precisam de respeitoIsso é de todos direitoMais respeito urgentemente!

O povo negro sofrendoPra ajudar, Governo vemParece que só pensaramNum "nome bom", nada além"Pra ficar bonito agoraChão de preto é quilombola"Isso enche a pança de quem?

E esses projetos fajutosQue vêm sempre procurarAs pessoas quilombolasPra no fim só explorarCriem vergonha na caraE o Governo, olhe paraPunir quem quer enrolar!

Já passou mais de um séculoQue a escravidão findouCom ela a desigualdadeOu era o que se pensouPois a ver a trajetóriaAo consultar a HistóriaMe pergunto: o que mudou?

-- Cárlisson Galdino-- http://www.carlissongaldino.com.br/

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